CAUÇÃO
IDONEIDADE DO MEIO
CREDITOS LITIGIOSOS
Sumário

(artigo 663.º, n.º 7, do CPCivil):
I. A idoneidade da caução, enquanto garantia especial de uma obrigação, decorre da sua capacidade de assegurar qualitativa e quantitativamente o cumprimento da obrigação garantida.
II. Um crédito litigioso entre as partes, objeto de uma outra ação declarativa condenatória, não pode ser oferecido como caução pelo aqui réu, no propósito de que seja atribuído efeito suspensivo ao recurso por ele interposto nos presentes autos.

Texto Integral

Acordam na 2.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa

I.
RELATÓRIO.
Em 05.09.2022, a A., VEYEL, CONSTRUÇÕES, LDA., intentou ação comum de declaração contra o R. “A”, pedindo a condenação deste no pagamento:
- da quantia de €104.483,23, acrescida de juros vencidos e vincendos, conforme contrato celebrado entre as partes.
- dos trabalhos a mais executados e bens fornecidos, a liquidar em execução de sentença.
Por decisão de 29.03.2023, a ação foi julgada procedente e o R. foi condenado conforme peticionado pela A.
Inconformado, em 15.05.2023 o R. recorreu daquela decisão, pedindo, além do mais, que o recurso seja recebido com efeito suspensivo, «mediante a prestação de caução em prazo a fixar» pelo «Tribunal, considerando que a imediata execução da decisão de que se recorre, causará ao Apelante prejuízo grave».
Na mesma data, em 15.05.2023, o R. suscitou o «incidente de nulidade por falta de citação».
Por decisão de 28.09.2023 tal incidente foi julgado improcedente.
Inconformado com aquela decisão, em 30.10.2023 o R. dela recorreu, pedindo que o recurso seja recebido com efeito suspensivo, «mediante a prestação de caução em prazo a fixar» pelo «Tribunal, considerando que a imediata execução da decisão de que se recorre, causará ao Apelante prejuízo grave».
Tal requerimento de interposição de recurso foi autuado como apenso de prestação de caução (Apenso A).
Em 06.12.2023, foi proferida decisão nos seguintes termos:
«(…)
O pedido formulado pelo aqui Recorrente, aquando da apresentação das suas alegações recursivas, provém de quem tem legitimidade para o efeito, é idóneo para o efeito pretendido e foi tempestivamente apresentado.
Destarte, admite-se o pedido para prestação de caução e, em consequência, determina-se que a Secção calcule o valor provável em dívida, correspondente ao montante em que foi sancionado na Sentença, acrescido de juros e das custas processuais.
(…)».
(Negrito da autoria dos aqui subscritores).
Em 15.03.2024 a Secção emitiu guia para pagamento pelo R. da quantia de €104.534,23.
Em 05.04.2024 o R. requereu a retificação daquela guia por forma que a mesma contemplasse igualmente o montante devido a título de juros.
Em 09.05.2023 foi proferida a seguinte decisão:
«O pedido formulado pelo requerente da caução, que faz fs. 25/26, não foi objecto de qualquer pronúncia por parte da Requerida, na esteira do despacho que faz fs. 27.
Sendo assim, mantém-se o valor calculado pela Secção e de que aquele foi, há muito, notificado.
Prazo improrrogável para a prestação de caução: dez dias»
A Secção emitiu nova guia para pagamento pelo R. da referida quantia de €104.534,23.
Notificado do indicado despacho de 09.05.2024 e daquela guia, o R. veio, além do mais, requerer a prolação de novo despacho «que fixe o valor provável da dívida que incluía o montante líquido da condenação e o cálculo provável da condenação ilíquida (juros de mora), e ordene a notificação do Apelante para que venha indicar aos autos a forma como pretende prestar a caução, seguindo-se os demais termos até final».
Cumprido o contraditório, em 06.06.2024 foi proferida decisão nos seguintes termos:
«(…)
No que tange à fixação do valor provável em dívida, trata-se de uma repetição de anterior requerimento por si formulado, inserto a fs. 25/26, sobre o qual foi exercido o contraditório, tendo recaído o despacho que faz fs. 28, pelo que, neste conspecto, nada mais há a acrescentar.
(…)
Defere-se ao pedido do requerente de, em dez dias, indicar o modo como pretende prestá-la [a caução], devendo a contraparte pronunciar-se sobre eventual aceitação do modo oferecido».
Em 20.09.2024 o R. veio requerer que 
«(…) seja admitido como meio idóneo de prestação de caução o crédito litigioso reclamado pelo Recorrente no âmbito do processo n.º (…)/22.0T8LSB, o qual corre termos no Juízo Central Cível de Lisboa- Juiz 12, no montante global de 142.049,52€ (cento e quarenta e dois e mil e quarenta e nove euros e cinquenta e dois cêntimos), seguindo-se os demais termos, nomeadamente, o proferimento de despacho de admissão do recurso nos autos principais, com subida imediata e efeito suspensivo».
Em 11.07.2024 o Juízo Central Cível de Lisboa proferiu a seguinte decisão:
«(…)
A prestação de caução destina-se a garantir o cumprimento da obrigação reconhecida em sentença, ainda que não exequível, por não ter transitado em julgado, e ao mesmo tempo, acautelar um determinado efeito que se pretende que a instância recursiva passa a ter, e que de outra forma não teria: o efeito suspensivo.
A forma de a prestar oferecida pelo Requerente, e à qual objectou a Requerida, não se afigura idónea, exactamente por se tratar de um crédito litigioso, o qual (ainda) não assegura o cumprimento da obrigação pecuniária que a sentença entendeu existir na esfera jurídica da contraparte.
Indefere-se, desta forma, a pretensão formulada».
Inconformado com tal decisão, dela recorreu o R., tendo apresentado as seguintes conclusões:
«1- Na sequência da notificação para indicação do modo de prestação de caução, o Requerente, ora recorrente, ofereceu o crédito existente a seu favor no âmbito do processo n.º (…)/22.0T8LSB, o qual corre termos no Juízo Central Cível de Lisboa-Juiz 12, em que é Autor “A” e Réu Veyelcons, Lda.;
2- Nesse processo, o Requerente é credor do montante 142.049,52€ (cento e quarenta e dois e mil e quarenta e nove euros e cinquenta e dois cêntimos), respeitante ao excesso de pagamento feito pelo mesmo, relativamente aos trabalhos executados no âmbito do contrato de empreitada, justificadamente resolvido com efeitos a partir de 19/09/2022;
3- Por ter sido um direito contestado em juízo contencioso pelo empreiteiro, o valor consubstancia um crédito litigioso nos termos do artigo 579.º, n.º 3 do Código Civil, no entanto, tal não afeta, do ponto de vista material, a sua existência e exigibilidade perante o empreiteiro;
4- Quanto à suficiência do modo de prestação de caução, verifica-se que o crédito do aqui Requerente (“A”) é de montante superior ao crédito da ora requerida (Veyelcons, Lda.), sob o qual foi proferida decisão condenatória no âmbito dos autos principais ((…)/22.3T8LRA), sendo assim apto a cobrir o crédito da Requerida, bem como, juros de moras e demais encargos;
5- Acresce que, este requisito estaria sempre preenchido, uma vez que nesse processo n.º (…)/22.0T8LSB, o Recorrente peticiona também o valor de 52.275,00€ (cinquenta e dois mil duzentos e setenta e cinco euros) a título de indemnização por incumprimento definitivo do contrato, correspondente ao acréscimo de despesas necessárias à conclusão da obra e 237.600,00€ (duzentos e trinta e sete mil e seiscentos euros), nos termos previstos na cláusula 7.ª, n.º 5 do Contrato de Empreitada, acrescidos de juros de mora à taxa legal em vigor, acrescidas acrescidos de juros de mora à taxa legal em vigor, desde a citação até efetivo e integral pagamento, totalizando 431.924,52€ ( quatrocentos e trinta e um novecentos e vinte e quatro euros e cinquenta e dois cêntimos);
6- Este crédito litigioso é legalmente admissível como meio de prestação de caução, uma vez que o elenco previsto no artigo 650.º, n.º 3 do CPC não é taxativo;
7- O artigo 623.º, n.º 3 do Código Civil não prevê a definição de idoneidade e quais os requisitos que são necessários observar para o seu preenchimento, pelo que, a sua concretização tem sido feita pela jurisprudência e pela doutrina, considerando a mesma que a caução é idónea quando assegura o cumprimento da obrigação que cauciona;
8- Ao contrário do defendido pelo douto Tribunal a quo, o facto do crédito litigioso não ter sido ainda reconhecido judicialmente com força executiva, tal não constitui requisito determinante para aferição da sua idoneidade;
9- Exemplo disso e conforme previsto no artigo 773.º e seguintes do CPC, são os créditos que os executados detêm sobre terceiros, que após penhora são suscetíveis de ser considerados litigiosos e objeto de adjudicação ou transmissão ao exequente;
10- Deste regime legal resulta que, apesar do crédito ser considerado litigioso, tal não impede que o mesmo seja adjudicado ou transmitido ao exequente, ficando o mesmo com ónus de obter o reconhecimento do mesmo por via declarativa, se não existir título executivo, ou em caso positivo avançar com a ação executiva;
11- Atendendo à redação do artigo 751.º, n.º 1 do CPC, que prevê que a penhora deverá começar pelos bens “cujo valor pecuniário seja de mais fácil realização e se mostrem adequados ao montante do crédito do exequente”, a penhora daqueles créditos sobre terceiros, atento o risco de impugnação dos devedores, assumem uma natureza equiparada à de garantia patrimonial dos créditos dos exequentes;
12- Nessa medida, se em face executiva é admissível a penhora e adjudicação de créditos litigiosos ao exequente, por maioria de razão e em fase declarativa, tal também seria admissível para efeitos de prestação de caução, nomeadamente, no recurso.
13- Mesmo que não se considere os créditos litigiosos como modo de prestação de caução idóneo pela aplicação conjugada dos artigos 647.º, n.º 4, 650.º, n.º 3 do CPC e 623.º, n.º 3 do Código Civil, sempre se dirá que existe uma lacuna legal que deverá ser preenchida por via de aplicação analógica do regime previsto para a penhora de créditos previsto no artigo 773.º, n.º 1 e 775.º do CPC;
14- Apesar de estarmos em fases processuais distintas, a verdade é que esse regime de penhora de créditos litigiosos assume uma natureza e função similares à da caução em fase declarativa, o que conduz à semelhança das situações e atendendo ao princípio da igualdade, impõe a aplicação por analogia desse regime nos termos do artigo 10.º, n.º 2 do Código Civil;
15- Assim, o douto despacho proferido pelo douto tribunal a quo ao ter considerado que o modo de prestação de caução apresentado pelo Requerente não assegurava o cumprimento da obrigação pecuniária e, em consequência não era idóneo, violou os artigos 647.º, n.º 4, 650.º, n.º 3 do CPC e 623.º, n.º 3 do Código Civil;
16- Os artigos 647.º, n.º 4, 650.º, n.º 3 do CPC e 623.º, n.º 3 do Código Civil deverão ser interpretados e aplicados no sentido de incluir o crédito litigioso supra descrito nos meios legalmente admissíveis para prestação de caução e considerá-lo idóneo para o fim previsto no artigo 647.º. 4 do CPC;
17- Caso assim não se entenda, sempre se dirá que o crédito litigioso deverá ser considerado como meio idóneo para prestação de caução através da aplicação analógica do regime previsto nos artigos 773.º, n.º 1 e 775.º do CPC, por via do artigo 10.º, n.º 2 do Código Civil;
18- Saliente-se ainda que, atendendo à redação do artigo 647.º, n.º 4 do CPC, a atribuição do efeito suspensivo por via de prestação de caução, não acautela só o interesse do credor, mas também o do devedor, o qual se materializa em evitar os prejuízos decorrentes da execução da decisão proferida nos autos principais e também do facto do recurso não ser admitido e apreciado com a maior brevidade possível, o qual tem reflexo direto no processo n.º (…)/22.0T8LSB, cuja instância está suspensa a aguardar o transito em julgado da decisão que vier a ser proferida nos presentes autos (principais);
19- Saliente-se que, a sentença condenatória proferida no âmbito dos autos principais, não resultou de uma apreciação de factos controvertidos baseada no exercício do contraditório por parte do Réu, ora recorrente e nem de produção de prova em sede de julgamento, mas sim, de uma situação de revelia operante, pelo facto ter sido considerado que o Réu foi regularmente citado e não contestou;
20- Todavia, o Recorrente apenas teve conhecimento da existência do processo judicial aquando da notificação da sentença;
21- Na sequência da realização do incidente de nulidade citação deduzido pelo Recorrente e não obstante o douto Tribunal ter considerado que a citação foi regular, a verdade é, que das contradições existentes na prova testemunhal produzida, resultou provado que a citação foi rececionada no domicílio profissional do Recorrente, mas nunca chegou ao seu conhecimento, considerando assim ilidida a presunção legal.
22- Aliás, não é concebível, mesmo para o cidadão comum, que o Recorrente, advogado de profissão, tendo conhecimento da propositura de uma ação judicial contra si e com um valor considerável, simplesmente, não exercesse o seu direito de defesa e corresse o risco de ser condenado;
23- Acresce que, o facto de a revelia ter sido considerada como operante, tal não conduz, de forma automática, a uma decisão condenatória;
24- Da análise da prova documental junta pelo Autor com a sua petição inicial verifica-se que o mesmo não juntou os autos de mediação que deram origem às faturas cujo pagamento reclama;
25- Assim, as faturas não poderiam ser consideradas, por si só, como elemento de prova suficiente para demonstrar que os valores faturados correspondiam efetivamente aos trabalhos realizados e que eram devidos;
26- E também não poderia ter considerado como provado que o Réu não tinha reclamado dos autos sem saber concretamente quais eram;
27- Pelo que, não deveria ter o douto Tribunal a quo considerado como provado o incumprimento contratual no âmbito do regime jurídico da empreitada, o que importaria a absolvição do Réu;
28- A condenação do Recorrente nos autos principais consubstancia assim uma situação de manifesta injustiça!
29- A não admissão do modo de prestação de caução oferecido e a admissão do recurso nos autos principais com efeito meramente devolutivo, prejudica duplamente o Requerente, uma vez que, após o proferimento desse despacho a Recorrida poderá executar a sentença, mas o processo n.º (…)/22.0T8LSB manter-se-á suspenso, não podendo aquele recuperar o seu crédito;
30- Atenta a particular relação existente entre os dois processos judiciais, em que o objeto do litígio, nomeadamente, o contrato de empreitada e as suas vicissitudes é comum a ambos, mostra-se essencial para o interesse do ora requerente que ambos os processos avancem com a maior brevidade possível;
31- Só assim serão cumpridos os princípios da economia e celeridade processual, bem como, de salvaguarda dos interesses legítimos das partes processuais e da igualdade, constantes dos artigos 2.º, 4.º 6.º e 7.º do CPC;
32- E, última instância assim se realizando a justiça material, na qual será possível concluir dois processos interligados, com os mesmos sujeitos processuais de forma célere e eficiente.
Nestes termos de nos mais de Direito Aplicável que V. Exas. mui doutamente suprirão, deverá o presente recurso ser julgado procedente, por provado e, em consequência, ser anulada a douta decisão proferida pelo douto Tribunal de 1.ª instância, e ser substituída por outra que admitida como meio idóneo de prestação de caução, o crédito litigioso reclamado pelo Recorrente no âmbito do processo n.º (…)/22.0T8LSB, o qual corre termos no Juízo Central Cível de Lisboa- Juiz 12, no montante global de 142.049,52€ (cento e quarenta e dois e mil e quarenta e nove euros e cinquenta e dois cêntimos), seguindo-se os demais termos, nomeadamente, o proferimento de despacho de admissão do recurso nos autos principais, com subida imediata e efeito suspensivo, como é de inteira Justiça!»
A A., aqui Recorrida, contra-alegou, sustentando a manutenção da decisão recorrida.
Colhidos os vistos, cumpre ora apreciar a decidir.
II.
OBJETO DO RECURSO.
Atento o disposto nos artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2, todos do CPCivil, as conclusões do recorrente delimitam o objeto do recurso, sem prejuízo do conhecimento de questões que devam oficiosamente ser apreciadas e decididas por este Tribunal da Relação.
Nestes termos, atentas as conclusões deduzidas pelo A./Recorrente, não havendo questões de conhecimento oficioso a dilucidar, nos presentes autos está em causa tão-só apreciar e decidir da idoneidade da caução que o A./Recorrente pretende prestar.
Excluído do objeto do presente acórdão está, pois, quer o recurso interposto da decisão condenatória da R., de 29.03.2023, quer o recurso interposto da decisão que conheceu a arguida nulidade por falta de citação, de 28.09.2023.
Por outro lado, em causa está apenas apreciar e decidir da idoneidade da caução oferecida pelo R./Recorrente, pois tal constituiu o objeto exclusivo da decisão recorrida, sendo que a dilucidação de outras questões seria a essa luz infundada, quer por estarem já sedimentadas nos autos em função de anteriores decisões judiciais, entretanto, transitadas em julgado, quer por constituírem questões novas, quer por respeitarem a recursos interpostos que noutra sede haverá que apreciar e decidir.
Assim.
III.
A factualidade a considerar na presente decisão é a que consta do relatório supra que a aqui se dá por integralmente reproduzida.
IV.
FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO.
Nos autos está em causa a prestação de caução para atribuição de efeito suspensivo ao recurso interposto pelo R./Recorrente, conforme artigo 647.º, n.º 4, do CPCivil.
Trata-se de incidente enxertado no recurso de apelação, no qual importa, além do mais, dilucidar da idoneidade da caução oferecida pelo apelante sempre que não haja acordo dos interessados na matéria, conforme artigos 915.º, n.º 1, e 913.º, n.ºs 1, 2 e 3, e 909.º do CPCivil, bem como artigo 623.º, n.º 3 do CCivil.
A idoneidade da caução, enquanto garantia especial de uma obrigação, decorre da sua capacidade de assegurar qualitativa e quantitativamente o cumprimento da obrigação garantida.
Como referem Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, volume I, edição de 2020, página 810, além do mais, «(…) é necessário que a caução se mostre idónea, tanto em termos qualitativos como quantitativos, para compensar o requerido (parte vencedora) da paralisação dos efeitos que imediatamente poderiam ser extraídos da decisão».
Por outras palavras, como refere Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, edição de 2018, página 235, a idoneidade da caução pressupõe que esta «se mostre qualitativa e quantitativamente ajustada à tutela efetiva dos interesses que foram reconhecidos ao recorrido».
Igualmente Diogo Castanheira Pereira, Processos Especiais, volume I, Prestação de Caução, edição de 2023, página 141, «[a] lei, subjetiva e adjetiva, não fixa qualquer critério de avaliação ao Tribunal pelo qual haja de ser aferido o juízo de idoneidade (cfr. artigos 623.º, n.º 3, e 624.º, n.º 2 do CC), embora seja corrente na jurisprudência o entendimento segundo o qual há que fazer coincidir a idoneidade com a segurança da sua suficiência para satisfazer a obrigação que ela cauciona, o que terá de ser apurado tanto do ponto de vista do sujeito que presta a garantia (…), como, de igual forma, da suficiência e espécie dos bens prestados (…)».
Na situação vertente.
O R., aqui Recorrente, ofereceu como caução um crédito litigioso, reclamado à A., aqui Recorrida, num processo declarativo pendente entre as partes.
Ora, atenta tal natureza, estando ainda em discussão entre as partes num outro processo tal alegado crédito oferecido aqui como caução, não se vislumbra que o mesmo crédito seja suscetível de assegurar por si só o cumprimento da obrigação que se pretende garantir com a caução.
Ou seja, no caso a caução oferecida mostra-se inidónea.
A pretendida aplicação na situação do disposto nos artigos 773.º e 775.º do CPCivil, por recurso ao artigo 10.º do CCivil, é absolutamente infundada, pois, desde logo, nos termos daqueles preceitos legais a penhora do crédito litigioso decorre do impulso processual do credor/Exequente, situação jurídica bem diversa da vertente, na qual o crédito litigioso foi oferecido em caução contra a vontade do credor, aqui Recorrido, sendo que este contesta a existência do mesmo crédito.
Em suma, improcede o recurso do R./Recorrente
*
Quanto às custas do recurso.
Segundo o disposto nos artigos 527.º, n.ºs 1 e 2, do CPCivil e 1.º, n.º 2, do Regulamento das Custas Processuais, «[a] decisão que julgue a ação ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa», entendendo-se «que dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção que o for».
Ora, in casu improcede na totalidade o recurso, pelo que sendo o R./Recorrente parte vencida no recurso, as custas deste serão integralmente suportados por aquele.
V.
DECISÃO.  
Pelo exposto, julga-se improcedente o recurso do R., pelo que mantém-se a decisão recorrida nos seus precisos termos.
As custas do recurso serão suportadas pelo R./Recorrente.

Lisboa, 26 de setembro de 2024
Paulo Fernandes da Silva
Arlindo Crua
Vaz Gomes