De uma decisão do INPI cabe recurso para o Tribunal da Propriedade Industrial nos termos do art. 38.º/b) do CPI, sendo que da sentença por este (TPI) proferida há recurso para o Tribunal da Relação, porém, do Acórdão da Relação não é, nos termos do art. 45.º/3 do CPI, admissível revista (salvo nos casos, previstos no art. 629.º/2 do CPC, em que o recurso é sempre admissível).
ASTELLAS INSTITUTE FOR REGENERATIVE MEDICINE veio, ao abrigo do disposto no artigo 38.º do Código da Propriedade Industrial, interpor recurso judicial no TPI relativamente a despacho da Senhora Vogal do Conselho Diretivo do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) de 29-06-2023, que indeferiu o pedido de restabelecimento do direito à revalidação da Patente Europeia EP 2780022.
O processo seguiu os trâmites previstos no artigo 42.º do CPI, tendo o INPI remetido o processo ao TPI com resposta.
No dia 04/01/2024, o TPI proferiu decisão final com o seguinte teor: “[n]os termos e pelos fundamentos expostos, julga-se improcedente, por não provado, o presente recurso judicial e, em consequência, mantém-se o despacho recorrido da Senhora Vogal do Conselho Diretivo do Instituto Nacional da Propriedade Industrial, proferido em 29/06/2023 e publicado no Boletim da Propriedade Industrial de 6/07/2023, que indeferiu o pedido de restabelecimento de direitos apresentado pela Recorrente.”.
Inconformada com tal decisão, interpôs a ASTELLAS recurso de apelação, que foi admitido, tendo a Relação de Lisboa, por Acórdão de 18/03/2024, julgado o mesmo totalmente improcedente.
Ainda inconformada, interpõe a ASTELLAS o presente recurso de revista, visando a revogação do Acórdão da Relação e a sua substituição “pela concessão do restabelecimento do prazo do n.º 3 do artigo 82.º Código da Propriedade Industrial, resultando no restabelecimento da Patente Europeia n.º 2780022 em Portugal, ao abrigo do artigo 8.º do mesmo Código”; invocando, atenta a situação de dupla conformidade, que a revista seja admitida, a título de revista excecional (cfr. art. 671.º/3 e 672.º do CPC).
Recebidos os autos neste Supremo, foi pelo relator proferido o seguinte despacho:
O recurso interposto é o próprio (de revista), tempestivamente interposto e por quem tem legitimidade.
Verifica-se, porém, uma situação de dupla conformidade, pelo que a revista só será admissível a título de revista excecional (cfr. art. 671.º/3 e 672.º do CPC).
Assim, uma vez que se encontra interposto recurso como “revista excecional” – tendo sido invocado para o efeito o preceituado no art. 672.º/1/a) e b) do CPC – e visto que a verificação dos pressupostos da revista excecional compete à formação a que alude o art. 672.º/3 do CPC, remetam-se os autos à “Formação”.
E, remetidos os autos à Formação, esta, por Acórdão de 24/05/2024, admitiu o recurso de revista excecional.
Conclusos os autos, foi pelo relator proferido novo despacho do seguinte teor:
Em despacho anterior, foram os autos mandados à formação (a que alude o art. 762.º/3 do CPC), por, perante uma situação de dupla conformidade, se ter entendido que a revista só seria admissível a título de revista excecional (cfr. art. 671.º/3 e 672.º do CPC); e a formação admitiu a revista excecional.
Não se tomou na devida conta a circunstância de na origem do presente recurso de revista estar uma decisão do INPI, sendo assim convocável o disposto no art. 45.º do C. Propriedade Industrial.
Assim, admitindo que o Coletivo (formado pelo relator e pelos adjuntos) possa vir a entender que é ao caso aplicável o art. 45.º/3 do CPI e que do acórdão da Relação recorrido não cabe revista (por não se estar perante um caso em que o recurso é sempre admissível – art. 629.º/2 do CPC), notifiquem-se as partes para, querendo, se pronunciarem sobre a possibilidade da revista não ser admitida e não ser conhecido o seu objeto.
Ao que a recorrente veio responder, sustentando, em síntese, que o Acórdão que admitiu a revista excecional fez caso julgado, pelo que ofende tal caso julgado uma qualquer decisão que contrarie o ali decidido.
II – Fundamentação
Está em causa nos autos/recurso uma decisão do INPI, decisão essa que não admitiu o restabelecimento do direito à revalidação duma Patente Europeia (da Patente EP2780022).
Decisão de que coube recurso para o Tribunal da Propriedade Industrial nos termos do art. 38.º/b) do CPI, sendo que da sentença por este (TPI) proferida há recurso nos termos do art. 45.º do CPI, em que se dispõe:
“1 - Da sentença proferida cabe recurso, nos termos da legislação processual civil, para o tribunal da Relação territorialmente competente para a área da sede do tribunal de propriedade intelectual, sem prejuízo do disposto no n.º 3. (…)
3 - Do acórdão do tribunal da Relação não cabe recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, sem prejuízo dos casos em que este é sempre admissível”
É pois muito evidente que é aplicável ao Acórdão da Relação recorrido o art. 45.º/3 do CPI e que, por não se estar perante um caso em que o recurso é sempre admissível (casos previstos no art. 629.º/2 do CPC), não cabe do Acórdão da Relação recorrido revista.
Não obstante, o relator, como já se referiu, não se deu conta de tal evidência e, tendo sido invocado, atenta a situação de dupla conformidade, que a revista fosse admitida a título de revista excecional, remeteu os autos à “Formação” que admitiu a revista excecional.
E vem agora a recorrente – sem contestar a referida evidência – sustentar que o Acórdão da “Formação” transitou em julgado e que, por isso, a revista está em definitivo admitida.
Compreende-se a invocação da recorrente, porém, não pode ser assim.
É claro que o Acórdão da “Formação” transitou em julgado, todavia, só faz caso julgado em relação ao que julgou e que no mesmo estava em causa, ou seja, quanto à verificação da alínea a) do n.º 1 do art. 672.º do CPC.
Quanto ao mais, quanto a saber se é ou não aplicável ao caso o art. 45.º/3 do CPI, não houve (não podia haver) qualquer pronuncia no Acórdão da Formação.
Assim, quanto à convocação/aplicação do art. 45.º/3 do CPI, passa-se o mesmo que em relação a todas as posições assumidas pelo relator no despacho liminar.
Como refere Miguel Teixeira de Sousa (Estudos sobre o novo processo civil, pág. 551), “(…) se nada houver a corrigir ou a sanar e se o recurso estiver em condições de ser julgado quanto ao mérito, o recurso é admitido pelo relator. Mas esta admissão não constitui caso julgado, quanto à regularidade e admissibilidade do recurso (art. 708.º/1 do CPC – hoje, 658.º/1 do NCPC), nem sequer quanto ao preenchimento de qualquer pressuposto geral ou especial.”
Em síntese, é esta a situação em que nos encontramos: o relator, incorretamente, como já se evidenciou, disse que nada obstava à admissibilidade da revista, mas tal não faz caso julgado, sendo que agora o Coletivo, composto pelo relator e pelos adjuntos, corrige o lapso e não conhece da revista por, pela razão referida, a mesma não ser admissível
Pelo exposto, ao abrigo do art. 652.º/1/b) do CPC (ex vi 679.º do CPC), julga-se findo o recurso por não haver que conhecer do seu objeto.
Custas pela recorrente.
Lisboa,19/09/2024
António Barateiro Martins (relator)
Ferreira Lopes
Nuno Ataíde das Neves