SUSPEIÇÃO
ACTOS PROCESSUAIS
DISCORDÂNCIA
Sumário

O incidente de suspeição não é o mecanismo adequado para expressar a discordância jurídica ou processual de uma parte sobre o curso processual ou sobre os atos jurisdicionais levados a efeito pelo julgador.

Texto Integral

I.
1. “A”, requerido no processo de regulação das responsabilidades parentais, instaurado por “B” em 29-06-2023 e que, com o n.º 2179/23.4T8CSC, corre termos no Juízo de Família e Menores de Cascais – Juiz (…), veio, por requerimento apresentado em juízo em 25-06-2024, requerer incidente de suspeição, nos termos do disposto no artigo 120.°, n° 1 alínea g) do CPC, relativamente à Sra. Juíza “C”.
Para tanto, alegou o requerente da suspeição “haver motivos, sérios e graves, adequados a gerar desconfiança sobre a imparcialidade, independência e diligência da Meritíssima Juíza do presente processo de regulação das responsabilidades parentais”, em suma, pelo seguinte:
“i. A Meritíssima Juíza tem ignorado todos os requerimentos do Recusante, não dando resposta ou seguimento aos mesmos;
ii. Desentranhou um pedido de esclarecimentos relativamente ao relatório da CPCJ;
iii. Não deu seguimento ao incidente de incumprimento das responsabilidades parentais que o recusante deu entrada;
iv. Aceitou como prova relatórios nos quais o recusante não teve intervenção.
v. Na diligência do passado dia 18 de junho de 2024 – na conferência de progenitores – evidenciou que a falta de resposta é deliberada (o que até ao momento o Recusante até poderia atribuir desconhecimento ou falta de tempo) e demonstrou uma clara inclinação para defesa dos interesses, não dos menores, mas sim da progenitora mãe.
vi. Na referida diligência ignorou o progenitor pai a propósito da necessidade de o filho “M” ter necessidade de apoio psicológico”.
2. No processo referido em 1., por despacho de 07-08-2023, foi conferida natureza urgente aos autos e designada conferência de pais, com vista à fixação de regime provisório de regulação das responsabilidades parentais, a qual teve lugar em 21-08-2023.
3. Da ata da diligência de 21-08-2023 consta, nomeadamente, escrito o seguinte:
“(…) Quando eram 10:30 horas e não antes porque à hora marcada não estavam presentes todos os intervenientes, pela Mm.ª Juiz foi de imediato, tentado obter o acordo entre as partes, o que não se mostrou possível, tendo as mesmas, em suma, prestado as seguintes declarações:
Declarações prestadas pela progenitora “B”: Pela progenitora foi dito que em 26 de maio foi passar cinco dias com os filhos a casa dos seus pais em Paredes e o progenitor aproveitou o fato de ela ter saído de casa para a ocupar, indo viver para lá com a amante.
Referiu que, face a este acontecimento, ficou a viver em casa dos seus pais em Paredes com os filhos, tendo-os lá já matriculado na escola, onde têm vaga.
Questionada informou que, o “X” anda na escola de (…) e a “Z”, o “S” e o “M”, andam todos na mesma escola (…).
Informou ainda que cá não tem qualquer rede de apoio, não tem cá casa e de momento também não está a trabalhar.
As suas declarações encontram-se registadas na aplicação informática H@bilus Media Studio e em formato digital.
Declarações prestadas pelo progenitor “A”:
Pelo progenitor foi dito que, estão separados como casal desde 2016, mas só em 26 de maio de 2023 é que se separaram mesmo, tendo sido obrigado nesta data a sair de casa.
Informou que foi viver lá para casa a 17 de julho e não vê os filhos desde 9 de julho.
Questionado informou que se sair lá de casa, só tem a casa da sua mãe que é também na Parede e que aufere mensalmente €1000,00.
Referiu ainda, que não concorda que os filhos vão morar para Penafiel.
As suas declarações encontram-se registadas na aplicação informática H@bilus Media Studio e em formato digital.
*
Neste momento pelas partes foi solicitada a suspensão da instância pelo prazo de 14 dias.
*
Após, pela Meritíssima Juiz, foi proferido o seguinte:
-DESPACHO-
Atendendo que as partes por acordo requerem a suspensão da instância por 14 dias tendo em vista a obtenção de acordo, defere-se o requerido, em conformidade designo o próximo dia 5 de setembro pelas 09:30 horas, para a continuação da presente Conferência de Pais, data acordada neste momento com todos os presentes.
Caso as partes não lograrem alcançar acordo, notifique-se os progenitores para no mesmo prazo (14 dias), juntarem aos autos as três últimas declarações de IRS apresentadas, tendo em vista a averiguação dos respetivos rendimentos para eventual fixação de pensão de alimentos, de acordo com o regime provisório que eventualmente venha a ser fixado.”.
4. Em 05-09-2023, nos autos principais, teve lugar a continuação da conferência de pais, constando da respetiva ata, nomeadamente, o seguinte:
“Quando eram 09:55 horas e não antes porque à hora marcada não estavam presentes todos os intervenientes, pela Mm.ª Juiz foi de imediato, tentado obter o acordo entre as partes, o que não se mostrou possível, tendo as mesmas, em suma, prestado as seguintes declarações:
Declarações prestadas pela progenitora “B”: Pela progenitora foi dito que, desde o dia 15/07/2023, vive com os filhos na casa dos seus pais em Penafiel.
Disse ser um apartamento de tipologia T4.
Que se encontra presentemente desempregada, estando à procura de emprego em Penafiel.
Referiu que, desde maio do presente ano que o requerido não comparticipa nas despesas das crianças.
As suas declarações encontram-se registadas na aplicação informática H@bilus Media Studio e em formato digital.
Declarações prestadas pelo progenitor “A”:
Pelo progenitor foi dito que, no dia 26 de maio do presente ano foi obrigado a sair da casa de família, mas que, entretanto, regressou à mesma quando a requerida se mudou para Penafiel.
Questionado, informou que está na disposição de sair da casa de família e mudar-se, provisoriamente, para a casa da sua mãe, que é também na Parede, até encontrar uma casa para onde ir viver definitivamente.
As suas declarações encontram-se registadas na aplicação informática H@bilus Media Studio e em formato digital.
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De seguida, dada a palavra à Digna Magistrada do Ministério Público, esta, no seu uso, promoveu o seguinte:
I- Atentas as declarações hoje prestadas por ambos os progenitores e considerando a impossibilidade de acordo, promovo que se fixe o seguinte regime provisório: (…)
II- Mais promovo que se remete os progenitores para Audição Técnica Especializada.
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Em seguida, pela Mm.ª Juiz foi proferido o seguinte:
DESPACHO
I- Atentas as declarações prestadas pelos progenitores e bem assim os elementos já constantes dos presentes autos, ao abrigo do disposto no art.º 28 º do RGPTC, decide-se fixar, a título provisório, o seguinte regime de exercício das responsabilidades parentais:
1º- Os menores ficam a residir com a progenitora na residência da Parede, mais propriamente na casa que foi morada de família, comprometendo-se o progenitor a entregar a mesma à progenitora até ao próximo sábado.
2º- As responsabilidades parentais referentes às questões de particular importância para a vida dos menores serão exercidas em comum por ambos os progenitores.
3º- Os menores passarão com o pai, os fins de semana alternados de 5ª a 2ª feira, indo buscar as crianças no início do horário escolar de 5ª feira e entregando-as no início do horário escolar de 2ª feira.
4º- O pai estará com os menores à 4ª feira nas semanas que antecedem o fim de semana da mãe, indo para o efeito buscá-las aos estabelecimentos de ensino depois do final das atividades letivas, entregando-as no dia seguinte, nos estabelecimentos de ensino, antes do seu início.
5º- O pai poderá ainda estar com os filhos sempre que quiser, mediante prévia combinação com a mãe, com a antecedência de 24H.
6º- Mais poderá estar com os filhos sempre que quiser, mediante prévia combinação com a mãe, com a antecedência de 24H.
7º- a) Os menores passarão metade do período correspondente às férias escolares de Natal, Páscoa e Verão, na companhia de cada um dos progenitores.
b) O período das férias de Verão deverá repartido em períodos de 15 dias ou uma semana, sendo acordado anualmente entre ambos, até 31 de maio.
c) Na falta de acordo, nos anos pares escolhe a mãe e nos ímpares o pai.
8º- Os menores passarão alternadamente a véspera de Natal e o dia de Natal (em bloco) com cada um dos progenitores e a véspera de Ano Novo e o dia de Ano Novo (igualmente em bloco) com cada um dos progenitores, alternando no ano seguinte, sendo que este ano passarão o Natal com a Mãe e a passagem de ano com o Pai (alternando nos anos seguintes).
9º- No dia de aniversário do pai e no dia do pai, as crianças passarão o dia com este, pernoitando em sua casa, entregando-os à mãe no dia seguinte.
10º- No dia de aniversário da mãe e no dia da mãe, as crianças passarão o dia com esta, pernoitando em sua casa, entregando-os ao pai no dia seguinte, se for dia correspondente á guarda daquele.
11º- O pai poderá contactar os filhos diariamente, através chamada ou videochamada, para o telemóvel da Mãe, ás 19 horas, devendo a Mãe para o efeito, ter o seu telemóvel disponível e carregado, sendo a mesma a efetuar a chamada.
12º- Nos dias em que as Crianças estejam com o Pai, deverá ser este a assegurar a realização das chamadas para que estas falem diariamente com a mãe pelas 19h.
13º- A título de pensão de alimentos, para cada criança, o progenitor pagará mensalmente a quantia de 100,00€, num total de 400,00€, através de transferência bancária a realizar para a conta bancária da Mãe até ao dia 8 de cada mês, quantia esta atualizável anualmente de acordo com o indicie da inflação por referência ao ano anterior.
14º- Os progenitores pagarão ainda as despesas escolares e das despesas médicas e medicamentosas na proporção de metade cada, no prazo de 10 dias, mediante apresentação do respetivo comprovativo.
15º - O progenitor irá deslocar-se, ainda no dia de hoje, à residência dos seus sogros, devendo chegar a casa destes previsivelmente às 20H, para ir buscar os filhos, os quais ainda jantarão com a mãe.
16º- As Crianças ficaram com o Pai até domingo, devendo ser entregues à Mãe na casa que foi morada de família no domingo na 2ª feira de manhã.
II- Não se logrando obter nesta sede acordo entre os progenitores, ao abrigo do disposto no art.º 38, al. b) do RGPTC, suspende-se a presente Conferência de Pais e remetem-se os progenitores para Audição Técnica Especializada, pelo período de 2 (dois) meses.
Remeta cópia de todo o processado.
Para o efeito, solicite à EMAT de Cascais a imediata intervenção, devendo, no prazo de 10 dias indicar a Técnica que acompanhará o caso.
Decorrido um mês, solicite que indiquem que diligências já foram efetuadas ou já se encontram agendadas.
Decorridos dois meses, solicite o envio da informação sobre o resultado da ATE.
Decorrido os prazos fixados e nada sendo dito, insista-se de imediato; e, se necessário, via telefónica. (…)”.
5. Em 10-05-2024 foi apensado aos autos principais, o processo de promoção e proteção com o n.º (…)/23.4T8CSC-A, cuja petição foi apresentada em juízo, em 09-05-2024, pelo Ministério Público em benefício das crianças “X”, nascido em (…)2012, “Z”, nascida em (…) 2014, “S” nascido em (…)2015 e “M”, nascido em (…)2017, tendo sido alegado na petição inicial, nomeadamente, o seguinte:
“1. O “X” nasceu em (…)2012, a “Z” nasceu em (…)2014, o “S” nasceu em (…)2015, e o “M” em (…)2017.
2. São filhos de “A” (…) e de “B” (…).
3. Pende relativamente ás crianças o processo de regulação de responsabilidades parentais com o nº 2179/23.4T8CSC no Juízo de Família e Menores de Cascais (…), tendo por despacho proferido em 5/9/2023, se estabelecido a título provisório, para além do mais, que as crianças ficavam a residir com a progenitora.
4. Em 27/6/2023 foi instaurado pela CPCJ Cascais os processos de promoção e proteção nº (…)98, relativo ao “X”, nº (…)99, relativo á “Z”, nº (…)00, relativo ao “S”, e nº (…)01, relativo ao “M”, por sinalização policial, de 11/10/2022, dando conta de as crianças poderem ser exposta a contexto de violência doméstica entre os progenitores.
5. Em tal sinalização, tendo a matéria criminal dado origem ao inquérito nº (…)/23.3PGCSC, em síntese, o progenitor verbalizou a ocorrência de discussões, com expressões de carácter injurioso e quebra de objetos.
6. Por sua vez, a progenitora fez uma participação policial, que deu origem ao inquérito nº (…)/23.0PGCSC.
7. Em 28/7/2023, encontrando-se na casa dos avós maternos com as crianças, a progenitora deu o seu consentimento para a intervenção da CPCJ Cascais.
8. Em 30/8/2023, o progenitor deu o seu consentimento para a intervenção daquela comissão, tendo confirmado a ocorrência de discussões frequentes, que em 26/5/2023 saíra de casa para não expor a criança a conflitos entre os pais, que regressou para casa de morada da família por ter sido abandonada pela progenitora e que recusa que os filhos fiquem a viver com aquela em Penafiel.
9. Em 28/9/2023, em atendimento na CPCJ Cascais, a progenitora negou o que o progenitor lhe imputa, que aquele saiu de casa em 26/5/2023 para viver com outra mulher, que apenas se tinha ausentado temporariamente para casa dos seus pais aproveitando o período de férias escolares, que não impediu o contacto do progenitor com os filhos.
10. Em 24/4/2024, a progenitor retirou o consentimento para a intervenção da CPCJ Cascais, referindo que a situação se tinha agravado, que pretende que os filhos voltem para Penafiel, que nos períodos em que os filhos estão confiados ao progenitor, não faze refeições em conjunto com aqueles, que pernoita fora de casa, que ameaça os filhos se contam o que se passa na casa dos avós paternos, onde o pai se encontra a residir.
11. De acordo com o art.º 11.º, nº1, alínea c), da LCPJP, a intervenção judicial tem lugar quando não seja prestado o consentimento necessário para a intervenção da comissão de proteção.
12. De acordo com o disposto no artº 3º, nºs. 1 e 2, alínea f), da LPCJP, para além do mais, uma criança encontra-se numa situação de perigo quando «Está sujeita, de forma directa ou indirecta, a comportamentos que afectem gravemente a sua segurança e o seu equilíbrio emocional».
13. No caso dos autos, as crianças terão sido expostas a conflitos entre os progenitores que afectam de forma grave o seu bem-estar emocional, não se sabendo se as crianças beneficiam ou não, de um ambiente seguro e protegido de conflitos entre os progenitores.
14. Tanto mais, se encontrando em curso o processo de regulação do exercício das responsabilidades, em que os progenitores têm posições antagónicas quando á localidade onde os filhos deverão residir.
15. Podem, assim, as crianças se encontrar numa situação de perigo, sendo necessário aplicar uma das medidas de promoção e proteção previstas no artigo 35.º da LPCJP que proporcione as condições essenciais ao seu bem-estar emocional, formação, educação e normal desenvolvimento.”.
6. No apenso A ao processo identificado em 1. – processo de promoção e proteção – o Tribunal procedeu à audição da criança “X”, a qual ocorreu no dia 18-06-2024.
7. No referido apenso A consta da ata da diligência referida em 6., nomeadamente, o seguinte:
“DESPACHO
"Atenta a vontade expressa pelo “X” e por força do princípio do superior interesse da criança, determina-se que as declarações prestadas pela mesma sejam confidenciais, apenas podendo a elas aceder a autoridade judiciária."
De seguida, o tribunal deslocou-se para a sala de audiências e, de imediato, pelo progenitor foi pedida a palavra e no seu uso ditou para a ata requerimento que se encontra registadas no sistema informático H@bilus Media Studio.
De seguida, pela Mm.ª juiz foi proferido o seguinte:
-DESPACHO-
"Face ao requerimento do progenitor, afigura-se importante a realização pelo INML de perícia psicológica/psiquiátrica aos progenitores e, bem assim, aos menores, o que desde já se determina.
No mais, ficam os autos a aguardar o envio da informação adicional pela EMAT atenta a marcação de entrevista dessa entidade com o progenitor hoje conseguida.”
Do despacho que antecede ficaram os presentes notificados, os quais disseram ficar cientes.
De seguida, a Meritíssima Juiz deu por encerrada a presente conferência, quando eram 11:34 horas.”.
8. Na diligência referida em 6., a Sra. Juíza fez alusão ao RELATÓRIO SOCIAL DE AVALIAÇÃO DIAGNÓSTICA PROCESSO DE PROMOÇÃO E PROTEÇÃO, junto aos autos em 17-06-2024 pela EMAT (ISS) e questionou os progenitores sobre se concordavam com as medidas propostas.
9. O requerente da suspeição disse que não concordava com a proposta da EMAT e que pretendia ditar um requerimento para a ata, o que a Sra. Juíza lhe facultou, tendo aquele ditado o referido requerimento nos termos que foram objeto de gravação e que aqui se dão por integralmente reproduzidos.
10. Na sequência do referido em 1., a Sra. Juíza de Direito “C”, por despacho de 01-07-2024, veio responder – nos presentes autos – que:
“(…) Requerimento de 26.06.2024: Desentranhe e autue por apenso aos presentes autos, juntamente com o presente despacho.
Vem suscitado incidente de suspeição contra a signatária, pelo Pai das Crianças “X”, “Z”, “S” e “M”, “A”.
Assim sendo e considerando o disposto no artigo 125° n° 1 do Código de Processo Civil, os presentes autos de Promoção e Proteção seguem os seus termos, neles intervindo a Mma. Juiz substituta da signatária.
(…)
Ao abrigo do disposto no artigo 122° n° 1 do Código de Processo Civil, a signatária apresenta a seguinte resposta:
Não vislumbro, do teor do requerimento que antecede, que tenha sido articulada qualquer matéria fáctica suscetível de ser subsumida aos fundamentos jurídicos das causas de suspeição previstas no artigo 120° do Código de Processo Civil.
Efetivamente, não sendo o processo de promoção e proteção um processo de partes e encontrando-se o tribunal a fazer todas as diligências no sentido de assegurar o superior interesse destas Crianças (ouçam-se, a título de exemplo, as declarações prestadas pelo Jovem “X”), afigura- se que o presente incidente se prende com a insatisfação do Progenitor (advogado em causa própria) relativamente ao teor do relatório junto aos autos e à proposta de medida de promoção e proteção a aplicar e não com a falta de resposta aos requerimento apresentados, os quais respeita a questões que estão a ser articuladas pela Técnica Gestora do Processo.
Mas Vossa Excelência, Venerando Desembargador, Exmo. Senhor Presidente do Tribunal da Relação de Lisboa, com mais experiência e saber, melhor decidirá (…)”.
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II. Vejamos:
Nos termos do disposto no nº. 1 do artigo 120.º do CPC, as partes podem opôr suspeição ao juiz quando ocorrer motivo, sério e grave, adequado a gerar desconfiança sobre a sua imparcialidade, o que ocorrerá, nomeadamente, nas situações elencadas nas suas alíneas a) a g).
Com efeito, o juiz natural, consagrado na CRP, só pode ser recusado quando se verifiquem circunstâncias assertivas, sérias e graves.
E os motivos sérios e graves, tendentes a gerar desconfiança sobre a imparcialidade do julgador, resultarão da avaliação das circunstâncias invocadas.
O TEDH – na interpretação do segmento inicial do §1 do art.º 6.º da CEDH, (“qualquer pessoa tem direito a que a sua causa seja examinada, equitativa e publicamente, num prazo razoável por um tribunal independente e imparcial, estabelecido pela lei”) - desde o acórdão Piersack v. Bélgica (8692/79), de 01-10-82 (https://hudoc.echr.coe.int/fre?i=001-57557) tem trilhado o caminho da determinação da imparcialidade pela sujeição a um “teste subjetivo”, incidindo sobre a convicção pessoal e o comportamento do concreto juiz, sobre a existência de preconceito (na expressão anglo-saxónica, “bias”) face a determinado caso, e a um “teste objetivo” que atenda à perceção ou dúvida externa legítima sobre a garantia de imparcialidade (cfr., também, os acórdãos Cubber v. Bélgica, de 26-10-84 (https://hudoc.echr.coe.int/ukr?i=001-57465), Borgers v. Bélgica, de 30-10-91, (https://hudoc.echr.coe.int/fre?i=001-57720) e Micallef v. Malte, de 15-10-2009 (https://hudoc.echr.coe.int/fre?i=001-95031) ).
Assim, o TEDH tem vindo a entender que um juiz deve ser e parecer imparcial, devendo abster-se de intervir num assunto, quando existam dúvidas razoáveis da sua imparcialidade, ou porque tenha exteriorizado relativamente ao demandante, juízos antecipados desfavoráveis, ou no processo, tenha emitido algum juízo antecipado de culpabilidade.
A dedução de um incidente de suspeição, pelo que sugere ou implica, deve ser resguardado para casos evidentes que o legislador espelhou no artigo 120.º do CPC, em reforço dos motivos de escusa do juiz, a que se refere o artigo 119.º do CPC.
A imparcialidade do Tribunal constitui um requisito fundamental do processo justo.
“A imparcialidade, como exigência específica de uma verdadeira decisão judicial, define-se, por via de regra, como ausência de qualquer prejuízo ou preconceito, em relação à matéria a decidir ou às pessoas afectadas pela decisão” (assim, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13-02-2013, Pº 1475/11.8TAMTS.P1-A.S1, rel. SANTOS CABRAL).
O direito a um julgamento justo, não se trata de uma prerrogativa concedida no interesse dos juízes, mas antes, uma garantia de respeito pelos direitos e liberdades fundamentais, de modo a que, qualquer pessoa tenha confiança no sistema de Justiça.
Do ponto de vista dos intervenientes nos processos, é relevante saber da neutralidade dos juízes face ao objeto da causa.
Com efeito, os motivos sérios e válidos atinentes à imparcialidade de um juiz terão de ser apreciados de um ponto de vista subjetivo e objetivo.
Sintetizando, referiu-se no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24-11-2022 (Pº 38/18.1TRLSB-A, rel. ORLANDO GONÇALVES) que “de um modo geral, pode dizer-se que a causa da suspeição há de reportar-se a um de dois fundamentos: uma especial relação do juiz com alguns dos sujeitos processuais, ou algum especial contacto com o processo”.
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III. Colocados os parâmetros enunciados que importa observar, analisemos a situação concreta apreciando se o incidente de suspeição deverá proceder ou improceder.
No seu requerimento de suspeição em apreço, o respetivo requerente invocou diversas circunstâncias inerentes à tramitação dos vários apensos que compõem o processo nº 2179/23.4T8CSC e às vicissitudes dos mesmos, aduzindo, nomeadamente, o seguinte:
“(…) 7.Subjacente ao processo das responsabilidades parentais existe um processo de violência doméstica a correr, que dá origem ao processo de divórcio, em maio de 2023 (e que ao fim de mais de um ano ainda se aguarda por uma acusação ou arquivamento para se apurar quem é a vítima e quem é o agressor) (…).
9. A Meritíssima Juíza “C” não apensa os dois processos, divórcio litigioso e responsabilidades parentais, seguindo os mesmos separadamente.
10. Requerente e Requerido reúnem a 5 de setembro de 2023, pela primeira e única vez, com a, ora Meretíssima Juíza “C”.
11. Precedendo esta diligência o Pai teve oportunidade de informar o Tribunal que foi obrigado a sair de casa por estar a ser impedido de dormir por parte da Mãe.
12. O Tribunal teve conhecimento que as crianças estiveram durante três meses impedidas de estar com o Pai,
13. O Tribunal teve conhecimento que as crianças estiveram três meses impedidas de falar com o Pai.
14.e durante este tempo, estas crianças foram convencidas que não mais voltariam a privar com o Pai e que não tinham mais Pai.
15. As autoridades policiais nada fizeram.
16. E as autoridades judicias nada fizeram.
17. A Mãe, por duas vezes, compareceu no Tribunal de Cascais sem os filhos, 21 de agosto e 5 de setembro de 2023.
18. E o Tribunal não emitiu um juízo de censura ao comportamento da Mãe.
19. Aliás, se o Pai quis estar com os filhos teve que ir a (…) buscar os filhos.
(…) 23.A preocupação da Meritíssima Juíza “C” foi colocar a Mãe dentro de casa.
24. Mas não foi dada essa possibilidade ao Pai.
25. E porquê?
26. Não sabemos.
(…) 31.O Tribunal entendeu que o Pai não deveria ficar com os filhos até ao final das férias.
32. O Pai fez dois requerimentos escritos a pedir exatamente isso e não obteve resposta.
33. Poder-se-ia pensar que os requerimentos não foram lidos.
34. No entanto, a Meritíssima Juíza “C” ameaçou desentranhar os requerimentos do Pai na conferência de 5 de setembro de 2023.
35. Mas não respondeu ao pedido do Pai.
36. A Meritíssima Juíza “C” não permitiu que o Pai gozasse os últimos 9 dias de férias com os quatro filhos que não via há 3 meses.
37. Mas tão só 5 dias.
38. E porquê?
39. Não sabemos.
40. A Meritíssima Juíza “C” questionou o Pai e não a Mãe pelo seu comportamento, isto é, só ao Pai foi perguntado o porquê de não ter ido ver os filhos durante os três meses em que a Mãe esteve desaparecida com aqueles.
41. Tendo se escusado de questionar a Mãe do porquê de ter impedido os filhos de estarem e falarem com o Pai.
42. Ao que o Requerido respondeu que não lhe adiantava ir pois em primeiro lugar não sabia onde estavam,
43. E mesmo que soubesse o paradeiro dos filhos, caso a Mãe não permitisse a saída dos filhos de casa, o Pai e a GNR nada podiam fazer.
44. De referir que a Mãe trocou o seu número de telemóvel.
45.E trocou o número de telemóvel do filho “X” para impedir as comunicações entre o Pai e o filho.
46.A Juíza “C” não respondeu igualmente ao pedido que o pai fez para avaliar as competências de parentalidade da Mãe.
47. Aliás, o Pai juntou ao processo fotografias do apartamento onde estavam a viver as crianças.
48. A Meritíssima Juíza “C” não diligenciou junto da CPCJ para que se deslocasse ao apartamento.
49. A Meritíssima Juíza, “C”, não convocou nenhuma conferência para apurar a situação.
50. A Meritíssima Juíza “C” também não pediu qualquer esclarecimento à Mãe.
51. Desde 5 de setembro de 2023 que nada mais se passa no processo.
52. A EMAT foi por diversas vezes instada a fazer um relatório e nunca convocou ninguém durante 8 meses.
53. A Meritíssima Juíza “C”, a 24 de novembro de 2023, data da tentativa de conciliação no processo de divórcio, em que as partes não se entenderam quanto à pensão de alimentos à Requerente,
54. Remetendo o processo para julgamento sem tentar que as partes convolassem o divorcio atendendo que está no processo escrito que ambas as partes acordam no divórcio e no dia em que o mesmo deve produzir efeitos.
55. O Pai deu início a um incidente de incumprimento por não estar a conseguir falar com os filhos ao telefone conforme estipulado, a 30 de novembro de 2023.
56. A Meritíssima Juíza “C” ignorou completamente até hoje este incidente.
57. E consequentemente passou um ano e o Pai continua a não conseguir falar com os filhos ao telefone.
58. A Mãe acusa o Pai de agredir violentamente o filho “S”, na via pública na presença da avó materna.
59. A Meritíssima Juíza “C” não convoca de imediato uma conferência de pais para apurar o que se passa ou não notifica as partes para esclarecer.
60. A Meritíssima Juíza “C” não manda extrair uma certidão do requerimento para instruir um processo crime com base nestas afirmações.
(…) 63.A Meritíssima Juíza “C” no dia 18 de junho soube que a Mãe continua a não realizar as chamadas ou inviabiliza-las como aconteceu no dia 17 de junho, véspera da diligência.
64. A Juíza “C” tem conhecimento que a filha “Z” pediu para aprender a tocar guitarra.
65. E que a Mãe exigiu que fosse o Pai a pagar a totalidade as aulas.
66. A Meritíssima Juíza “C”, soube que o Pai acedeu pagar as aulas de música.
67. E que a Mãe impede as aulas de música por não permitir que a “Z” leve a guitarra para casa do Pai.
68. Feito um requerimento relativamente as estas questões o Tribunal,
69. O Tribunal não determina que a filha quando vá a casa do Pai que se faça acompanhar da guitarra decide uma vez mais não despachar.
70. O Tribunal tendo conhecimento na conferência progenitores que as chamadas não ocorrem.
71. E que os menores são mal-educados na presença da Mãe ao telefone.
72. Não questiona a Mãe sobre isso.
73. Quando a mesma se encontra presente.
74. A Juíza tendo notícia de que a escola referenciou a menor “Z” para ser acompanhada em sessão de Terapia da Fala e em psicologia na escola,
75. E que a Mãe está a tentar boicotar a filha de ser avaliada,
76. Indo buscar a filha à escola mais cedo.
77. Entendeu não se pronunciar, igualmente, sobre isto.
78. A CPCJ fez um relatório social em que o Pai não foi ouvido.
79. O Pai alertou a Juíza desse fato e das falsidades do relatório.
80. A Juíza mandou desentranhar o requerimento e suspender o processo das responsabilidades parentais.
81. Dando origem a um processo de promoção e proteção de menores.
82. Mas mantendo o regime das responsabilidades parentais.
83. A EMAT faz um relatório no processo de promoção e proteção datado de 17 de junho, sem ouvir o Pai novamente.
84. E a Juíza “C” convoca uma conferência para dia 18 de junho dando conhecimento aos pais das conclusões do relatório.
85. Dando o referido relatório como elemento de prova.
86. A Juíza “C” informa que no relatório dois (“X” e “S”) dos quatro filhos devem ter acompanhamento psicológico.
87. Ao que o Pai refere que existem elementos no processo carreados por si de que a própria escola entende que a filha “Z” deve ser acompanhada por um psicólogo.
88. Neste seguimento pergunta à Mãe o que acha do filho “M” também ser acompanhado esquecendo-se que o pai se encontra presente e que segunda a Lei também tem os meus direitos que a Mãe no que respeita aos filhos.
89. Uma vez mais o pai é completamente ignorado e omitido em todo o processo.
90. Dá a palavra ao Pai para requerer para ata só porque não quer que o Pai exerça o direito de protesto.
91. Assim o diz.
92. Informa que mais requerimentos ao processo serão punidos com condenações em multa.
93. Interrompe o Pai cortando-lhe a palavra e o raciocínio dizendo que tem dois minutos para concluir porque tem outra diligência marcada.
94. Acenando negativamente com a cabeça e olhando para o relógio.
95. O Pai refere ao Tribunal que não foi ouvido pela EMAT e que no dia 17 de junho, data indicada pela técnica.
96. Véspera da conferência de pais
97. Estava impedido num julgamento em Tomar.
98. Ao que a Juíza “C” diz ao Pai que "é uma questão de prioridade".
99. O Pai foi convocado para as 10h15m para a realização da conferência de pais.
100. Pediu para ser ouvido pelo Tribunal conjuntamente com o Colega,
101. Antes da tomada de declarações do filho “X”.
102. E mais uma vez o Tribunal entendeu não permitir ouvir o Pai.
103. Referindo que trocaria impressões com as partes na conferência.
104. Situação que não ocorreu porque a Juíza entendeu que a mesma apenas servia para informar os progenitores da proposta da EMAT.
105. Todo este comportamento evidenciado pela Meritíssima Juíza “C” relativamente ao Pai e ao processo.
106. Demonstra uma quebra na imparcialidade do Tribunal.
107.A falta de resposta aos requerimentos do Pai em todos os processos.
108. A aceitação de relatórios no processo em que o Pai não foi ouvido em nenhum.
109. A forma como tratou o Pai em todas as diligências.
110. Não apreciando nenhuma matéria.
111. A Juíza “C” ignorou toda a informação no processo carreada pelo Pai.
112. A Juíza pretende que o Pai seja ouvido pela EMAT depois de ter dado a conhecer a proposta desta entidade,
113. Proposta que não acautela os interesses das crianças,
114. Transformando o processo das responsabilidades parentais num processo monoparental e sigiloso porque passou de um processo de Responsabilidade Parentais para um processo de promoção e proteção sem qualquer alteração do regime das responsabilidades parentais.
115. A Meritíssima Juíza “C” não diligenciou por nenhuma informação do Pai no Processo.
116. Desvalorizando sempre tudo apresentado pelo Pai.
117. O Pai nunca esteve em igualdade de circunstâncias com a Mãe.
118. Desde modo, requer-se o afastamento da Meritíssima Juíza “C” do processo das responsabilidades parentais e do processo da promoção e proteção de menores.
119. Uma vez que a Juíza apenas quer decidir com a versão da Mãe e com a informação carreada ao processo que ignora o Pai por completo (…)”.
A Sra. Juíza de Direito contrapôs, em suma, não vislumbrar que tenha sido articulada matéria fáctica suscetível de ser subsumida aos fundamentos jurídicos das causas de suspeição previstas no artigo 120° do Código de Processo Civil, pois, entendendo que o Tribunal se encontra a fazer todas as diligências no sentido de assegurar o superior interesse das crianças, decorrendo o incidente da “insatisfação do Progenitor (advogado em causa própria) relativamente ao teor do relatório junto aos autos e à proposta de medida de promoção e proteção a aplicar e não com a falta de resposta aos requerimento apresentados, os quais respeita a questões que estão a ser articuladas pela Técnica Gestora do Processo”.
Liminarmente, importa salientar que a apreciação sobre se a situação invocada pelo requerente da suspeição se enquadra, ou não, na previsão legal do artigo 120.º do CPC, prende-se, tão só, com a materialização ou não dos requisitos do incidente, e não, com qualquer apreciação de natureza jurisdicional ou substantiva, relativamente ao mérito da pretensão esgrimida por qualquer dos sujeitos processuais, a qual, não nos incumbe decidir, nem o poderemos efetuar.
Depois, cumpre salientar que não se patenteia qualquer das circunstâncias a que se referem as alíneas a) a f) do n.º 1, do artigo 120.º do CPC.
Quanto à alínea g) – existência de inimizade grave ou grande intimidade entre o juiz e alguma das partes ou seus mandatários – tem-se entendido que “não constitui fundamento específico de suspeição o mero indeferimento de requerimento probatório (RL, 7-11-12, 5275/09) nem a inoportuna expressão pelo juiz sobre a credibilidade das testemunhas (RG 20-3-06, 458/06)” (assim, Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa; Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, Almedina, 2018, p. 148).
Do facto de um juiz ter proferido decisões desfavoráveis a uma das partes não pode extrair-se qualquer ilação quanto a eventuais sentimentos de amizade ou inimizade ou, até, de mera simpatia ou antipatia por uma delas, ou ainda de parcialidade (assim, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16-05-2002, Pº 01P3914, rel. SIMAS SANTOS).
Efetivamente, a função jurisdicional “implica, pela sua própria natureza e quase sem excepções, a necessidade de dar razão a uma das partes e negá-la à outra, rejeitando as suas pretensões e sacrificando os seus interesses concretos. Daí que não seja possível retirar do facto de alguma, ou algumas, das pretensões formuladas por uma das partes terem sido rejeitadas a conclusão de que o julgador está a ser parcial ou a revelar qualquer inimizade contra a parte que viu tais pretensões indeferidas" (despacho do Presidente da Relação de Lisboa de 14-06-1999, in CJ, XXIV, 3.º, p. 75).
No seu requerimento, o requerente da suspeição invoca, tão-só, questões de natureza jurisdicional, manifestando a sua discordância, ou com as decisões jurisdicionais tomadas no processo, ou com a conduta que considera omissiva do Tribunal, mas este descontentamento não pode ser apreciado em incidente de suspeição, cujo escopo não se destina a apreciar questões técnicas relacionadas com o mérito de uma pretensão apresentada em juízo ou com a ausência de pronúncia por banda do Tribunal.
Não se conformando com as decisões judiciais proferidas, o requerente da suspeição tem ao seu dispor todos os mecanismos legais de impugnação que sejam processualmente admissíveis.
De facto, os recursos (ou as reclamações ou outros meios impugnatórios) são os mecanismos legais para se poder reagir em tais situações e para se aquilatar da correta ou incorreta aplicação da lei.
A Justiça é feita caso a caso, tendo em consideração a real e objetiva situação a dirimir.
O Juiz não é parte nos processos, devendo exercer as suas funções com a maior objetividade e imparcialidade.
Com efeito, os juízes têm por função ser imparciais e objetivos, fundando as suas decisões na lei e na sua consciência.
Como dispõe o artigo 4.º, n.º 1 do Estatuto dos Magistrados Judiciais, os juízes julgam apenas segundo a Constituição e a lei e não estão sujeitos a ordens ou instruções, salvo o dever de acatamento pelos tribunais inferiores das decisões proferidas, em via de recurso, pelos tribunais superiores.
De acordo com o n.º 2 do artigo 4.º do Estatuto dos Magistrados Judiciais, a independência dos magistrados judiciais manifesta-se na função de julgar, na direção da marcha do processo e na gestão dos processos que lhes forem aleatoriamente atribuídos.
Podemos entender que o requerente da suspeição não se reveja no conteúdo de posições tomadas no processo pela Sra. Juíza, mas tal descontentamento não implica a constatação de alguma parcialidade do julgador.
O incidente de suspeição não é, de facto, o mecanismo adequado para expressar a discordância jurídica ou processual de uma parte sobre o curso processual ou sobre os atos jurisdicionais levados a efeito pelo julgador. A jurisprudência dos nossos tribunais superiores tem, de forma constante, evidenciado esta asserção (disso são exemplo as decisões expressas nos seguintes acórdãos: TRL de 11-10-2017, Pº 6300/12.0TDLSB-A-3, rel. JOÃO LEE FERREIRA; TRP de 21-02-2018, Pº 406/15.0GAVFR-A.P1, rel. ELSA PAIXÃO; TRP de 11-11-2020, Pº 1155/18.3T9AVR-A.P1, rel. JOSÉ CARRETO; TRE de 08-03-2018, Pº 13/18.6YREVR, rel. JOÃO AMARO).
De todo o modo, não logramos descortinar na invocação do requerente da suspeição ora em apreço nenhuma circunstância que possa conduzir ao afastamento da Sra. Juíza, não se demonstrando, o por si alegado, determinar a existência de motivo – muito menos, sério e grave - adequado a gerar desconfiança sobre a imparcialidade do julgador.
Observando os factos tal como o faria um cidadão médio, não se deteta nos atos processuais em que teve intervenção a Sra. Juíza, qualquer atitude pessoal reveladora de suspeita de quebra da sua imparcialidade.
Mesmo as considerações expendidas pela Sra. Juíza no decurso da diligência operada em 18-06-2024 se inserem no âmbito da disciplina da diligência e da boa gestão dos trabalhos, perante uma pronúncia do autor da suspeição que, embora tenha manifestado efetuar um “requerimento”, deambulava por considerações de diversa índole e de forma não estruturada.
Ao invés do invocado pelo requerente da suspeição, o curso processual da tramitação do processo principal e do seu apenso A encontra-se a ser assegurado, não se revelando qualquer comportamento da Sra. Juíza no sentido de ignorar requerimentos do recusante, de dar resposta ou seguimento aos mesmos, cuja inobservância, contudo, nunca representaria, em si mesmo, qualquer quebra da imparcialidade devida, mas o incumprimento do dever de decisão ou de atempada decisão.
A tomada de decisões pela Sra. Juíza também não denota alguma quebra da imparcialidade devida pelo julgador e, designadamente, alguma conduta parcial para com a progenitora.
Assim sendo, entendemos não se encontrarem reunidos os pressupostos que materializam o incidente, o que conduz à sua improcedência.
Não se nos afigura a existência de litigância de má-fé do requerente da suspeição, não se patenteando alguma das circunstâncias a que se reporta o n.º 2 do artigo 542.º do CPC.
*
IV. Face ao exposto, indefiro a suspeição deduzida relativamente à Sra. Juíza de Direito “C”.
Custas a cargo do requerente do incidente, sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficie.
Notifique.

Lisboa, 03-07-2024,
Carlos Castelo Branco.
(Vice-Presidente, com poderes delegados – cfr. Despacho 2577/2024, de 16-02-2024, D.R., 2.ª Série, n.º 51/2024, de 12 de março).