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SUSPEIÇÃO
DISCORDÂNCIA DE DECISÕES JURISDICIONAIS
Sumário
1. Do facto de um juiz ter proferido decisões desfavoráveis a uma das partes não pode extrair-se qualquer ilação quanto a eventuais sentimentos de amizade ou inimizade ou, até, de mera simpatia ou antipatia por uma delas, ou ainda de parcialidade. 2. No seu requerimento, a requerente da suspeição invoca, tão-só, questões de natureza jurisdicional, manifestando a sua discordância com as decisões jurisdicionais tomadas no processo, mas este descontentamento não pode ser apreciado em incidente de suspeição.
Texto Integral
I.
1. “A”, mãe do menor “B”, a que se referem os autos de promoção e proteção que, com o n.º 10621/19.2T8LRS-C.L1 correm termos no Juízo de Família e Menores de Loures – Juiz (…), veio, por requerimento apresentado em juízo em 18-06-2024, requerer incidente de suspeição, nos termos do disposto nos artigos 119.º a 122.º do CPC, relativamente à Sra. Juíza “C”.
Para tanto, alegou a requerente da suspeição que a Sra. Juiz não reúne “condições para exercer a sua função com imparcialidade”, pelo seguinte: “1 – Com data de 11 de Junho de 2024 foi notificado à Requerente, através da sua mandatária, o último despacho proferido nos autos, no Apenso C, pela Sra. Juiz, nos termos do qual, e uma vez mais, a Sra. Juiz persiste em ignorar toda a muita informação técnica existente nos autos, que impõe a alteração da regulação das responsabilidades parentais relativas ao menor em causa nos autos. Sucede, 2 – Neste último despacho a Sra. Juiz vai ao ponto de, sem qualquer justificação, pôr em causa a informação técnica junta aos autos pela EMAT, a 14 de Maio de 2024, afirmando “Sufragam a perspectiva da mãe”. 3 – “A perspectiva da mãe”, como resulta da análise dos autos, é a da necessidade de cuidar e proteger o seu filho menor. Com efeito, 4 – A Sra. Juiz insiste em que os pais do “B” necessitam de terapia familiar, como se tal bastasse para justificar a não alteração das medidas em vigor, bem como do regime de residência do menor, em manifesta oposição com todos os pereceres técnicos das várias entidades que têm acompanhado o menor, bem como os pais. 5 – Os pais do menor não conseguem estabelecer entre si a melhor comunicação e, admite-se que sessões de terapia possam melhorar a comunicação entre os pais do menor. Porém, 6 – A Sra. Dra. Juiz centra-se na comunicação entre os pais e descura a atenção devida ao menor. 7 – A afirmação de que a última informação da EMAT sufraga a perspectiva da mãe é bem reveladora da falta de objectividade e análise crítica da Sra. Dra. Juiz relativamente à informação em causa. Aliás, 8 – A afirmação em causa é manifestamente ofensiva da dignidade profissional da técnica subscritora de tal informação, Ou seja, 9 – Toda a informação que foi trazida para os autos e que dá suporte às muitas questões colocadas pela mãe do menor relativamente à execução do regime de responsabilidades parentais que tem vigorado, é imediatamente desconsiderada porque a Sra. Juiz não é objectiva, não é imparcial, não é isenta e não cuida, como o exercício do cargo lhe exige, do interesse do menor. 10 – Não é a mãe que elabora os relatórios técnicos, nem influência os técnicos sobre o que devem escrever, antes tais documentos técnicos resultam do trabalho independente de quem os realiza, utilizando para o efeito as ferramentas que a legis artis impõe, e extraindo as conclusões que resultam da sua apreciação técnica, nada mais! (…)”.
2. Com data de 02-06-2024 foi proferido no mencionado apenso C, despacho onde se lê, nomeadamente, o seguinte: “Proceda conforme promovido remetendo cópia da Douta Promoção que antecede [datada de 24-05-2024 e onde se lê o seguinte: “A medida de promoção e protecção aplicada nos autos foi revista e mantida a 23.04.2024. As informações remetidas aos autos pela EMAT, a 14.05.2024, sufragam a perspectiva da mãe. Não foram trazidos aos autos informações relevantes para reverter de imediato o regime praticado, afigurando-se-nos, todavia, essencial que se inicie a terapia familiar de forma a que os progenitores consigam encontrar uma plataforma de entendimento e para que aprendam a tomar em conjunto as melhores decisões a favor da criança e não se centrem apenas, cada um deles, no seu próprio ponto de vista, sem se ouvirem mutuamente. Quanto à frequência escolar, sendo certo que implica um sacrifício económico, afigura-se-nos que a criança deverá completar o primeiro ciclo no mesmo estabelecimento de ensino se resultar que está bem inserido. Face ao exposto, p. se insista para que os pais iniciem a sessões de terapia familiar na Associação Portuguesa de Terapia Familiar e Comunitária em Loures ou se encaminhem para entidade que possa dar início às sessões com mais brevidade.”] com a qual se concorda na íntegra.- Relativamente à transferência do “B” para escola pública entendemos, pese embora o sacrifício económico que tal importará para os pais, ser de todo benéfico que o “B” conclua pelo menos o 1º ciclo no Colégio que atualmente frequenta, devendo aí manter-se a menos que os progenitores de comum acordo sem discussões e conflitos encontrem uma solução de comum acordo que satisfaça os interesses da criança e não deles próprios.--- No que diz respeito ao período de férias do “B” o mesmo mostra-se estabelecido por acordo celebrado na conferência de pais realizada no dia 17 de junho de 2020 no processo principal, não vislumbrando razões para não ser colocado em prática nos termos que aí se mostram definidos.--- A revisão da medida aplicada a favor do “B” foi efetuada por despacho proferido em 23 de abril de 2024 sendo incompreensível que somente em 15 de maio de 2024 venha ao conhecimento do tribunal a posição da entidade que irá proceder à intervenção que se pretendeu e pretende seja urgente.--- Assim e face ao exposto solicite de imediato com pedido de elevada urgência a intervenção já determinada à entidade competente remetendo-lhe cópia do despacho que antecede.--- (…) Reitero a advertência aos pais da criança de que deverão continuar a cumprir o determinado no acordo e as indicações e orientações da Exma. Técnica, gestora do processo, devendo os mesmos colaborar com os técnicos respetivos, mantendo as consultas de psicologia dos próprios e do “B” devendo, além do mais, ter bem presente as razões da inoperacionalidade da intervenção do CAFAP nos termos que ficaram determinados e os malefícios e impacto negativo que os comportamentos dos mesmos estão a ter na estabilidade emocional desta criança, devendo colaborar com a intervenção técnica que se mostra determinada e se espera se inicie o mais rapidamente possível.--- D.N., cumprindo de imediato e notificando o teor do relatório que antecede.-”.
3. No referido apenso C consta junto aos autos, em 14-05-2024, comunicação da EMAT, em cujo relatório se lê, nomeadamente, o seguinte: “(…)Identificação da criança /jovem Nome “B” (…) Caracterização dos agregados familiares Não se verificaram alterações nos agregados familiares em apreço. Avaliação da situação A 2023/4/30, a Sra. “A” contactou a técnica signatária tendo referido estar preocupada relativamente à situação escolar do “B” para o próximo ano letivo. Informou ter enviado um email ao pai, no qual propôs matricular o “B” na escola próxima de sua casa, não tendo obtido uma resposta por parte do mesmo. Salientou que, como é habitual passearem o cão e passearem/jogarem à bola perto de casa, o “B” tem amigos da sua idade que moram perto de sua casa e que frequentam a escola próxima da sua residência. Afirmou que foi efetuada uma renovação de matrícula na escola que o “B” frequenta atualmente, o Externato (…), para garantir uma vaga para o próximo ano letivo. No entanto, acrescentou que não concorda com a continuidade do “B” naquela escola, onde paga uma mensalidade e, se necessitar que o filho vá para a sala de estudo, ainda tem que pagar mais um valor. Disse, ainda, que o pai referiu, há algum tempo, que também não concordava que o “B” continuasse a frequentar o ensino privado, por implicar uma despesa avultada. Mais referiu que a proposta do pai foi matricular o “B” junto da área de residência do mesmo, local onde o “B” não tem referências. A Sra. “A” informou que o “B” passou 5 semanas seguidas consigo, pelo facto de o pai ter sido operado a um joelho. Salientou que, durante essas semanas, o “B” andou mais calmo e esteve feliz. Afirmou que, caso o Tribunal decida, de facto, alterar a medida de promoção e proteção aplicada, isso será benéfico para o “B”. Acrescentou que, assim, o mais adequado será o “B” frequentar a escola perto de sua casa, no Agrupamento de Escolas da (…), conforme propôs ao pai. Disse que matriculou o filho num Centro de Estudos, perto de sua casa, para que o “B” faça os trabalhos de casa e estude. Mencionou ter informado o pai sobre a sua decisão, não tendo obtido resposta por parte do mesmo. Referiu que no Centro de Estudos estão pares que o “B” já conhece e, caso o “B” vá para a escola perto de sua casa, já terá como referência amigos que conhece da vizinhança, com quem costuma jogar à bola e, também, do Centro de Estudos. A Sra. “A” reencaminhou os emails trocados com o pai sobre o assunto “escola”, que seguem em anexo, tendo solicitado a intervenção da técnica signatária junto do pai. A 2024/4/30, o Sr. (…) enviou email para a técnica signatária, sobre o assunto “férias de verão 2024”, que segue em anexo. A técnica enviou email ao pai, a 2024/5/6, que segue igualmente em anexo, tendo colocado questões relativamente ao assunto “escola”. A 2024/5/7, a Sra. “A” contactou a técnica signatária, tendo referido que, como o despacho do Tribunal prorrogou a medida de promoção e proteção de apoio juntos dos pais, essa decisão torna a questão da tomada de decisão da matrícula do “B” na escola para o próximo ano letivo mais complicada. Informou que ainda não recebeu resposta do pai ao email que lhe enviou, no qual lhe propôs matricular o “B” na escola próxima de sua casa. Disse que o prazo para as matrículas será entre 06 e 16 de julho p.f. e, nesse sentido, considera importante que se tome uma decisão. Salientou que continua a considerar que o “B” deverá ser matriculado na escola próxima de sua casa, onde terá amigos que conhece da zona onde reside e amigos do Centro de Estudos. A 2024/5/7, esta EMAT remeteu email à APTeFC - Associação Portuguesa de Terapia Familiar e Comunitária a informar ter rececionado o despacho do Tribunal e a solicitar se o pedido de acompanhamento aos pais do “B” já havia sido efetuado pelo Tribunal ou se teria que ser efetuado pela EMAT, tendo questionado, ainda, qual seria a previsibilidade de tempo para o início do acompanhamento. A 2024/5/9, foi rececionada a seguinte resposta: “No seguimento da vossa solicitação vem a APTeFC esclarecer que à luz do protocolo estabelecido com o Tribunal de Lisboa, Comarca Norte, os pedidos de intervenção terapêutica deverão ser remetidos pelo próprio tribunal por documento escrito ou digital e ao cuidado da nossa equipa de gestão de processos. No que diz respeito ao tempo de resposta ele dependerá sempre do período em que o pedido for efetuado e da disponibilidade na nossa equipa. Tendo em conta esta imprevisibilidade, poderemos dizer que, habitualmente, damos resposta no primeiro mês após a data de receção do pedido. Mais se informa que em relação ao processo supracitado não encontramos qualquer pedido para intervenção na nossa base de dados” (sic). A 20247/5/11, o pai enviou um email à técnica signatária, que segue em anexo, a referir: “Na sequência da última decisão do Tribunal julgo ser mais sensato deixar estes temas para as reuniões de terapia familiar. Quando vai iniciar e quem vai comunicar? Vou estar ausente para a tal viagem ao Japão de 30 maio a 10 junho” (sic). A 2024/5/13, a técnica signatária respondeu ao pai, tendo-o informado acerca da resposta da Associação Portuguesa de Terapia Familiar e Comunitária e tendo referido que será necessário tomar uma decisão o quanto antes, pelo facto de haver um prazo para a matrícula na escola. Na mesma data, o pai respondeu à técnica: “Concordo com a programação da matrícula escola, no entanto estive a consultar quando são as matrículas e envio abaixo: 2.º, 3.º, 4.º, 5.º anos do ensino básico: 6 de julho a 10 de julho. Para mim é mais importante a articulação das férias de cada pai com o “B” e o aniversário do irmão do “B”, e aqui volto a reforçar o pedido de articulação sensibilização junto da mãe. No bom senso a mãe não marcava férias para apanhar a data de anos do “D”” (sic). A 2024/5/13, a Sra. “A” contactou a técnica signatária, tendo solicitado informações sobre a resposta do pai relativamente ao assunto “escola”. A técnica informou a mãe acerca da resposta da Associação Portuguesa de Terapia Familiar e Comunitária e acerca da resposta do pai. A Sra. “A” afirmou que o pai ainda não a informou sobre a data da viagem ao Japão, que coincide com um fim-de-semana que o “B” passaria com o pai. Mencionou que é habitual o pai só a avisar na véspera, pelo facto de considerar que a mesma está sempre disponível. Comentou que, embora o filho seja uma prioridade na sua vida, trabalha e tem responsabilidades e, nesse sentido, precisa organizar-se com antecedência. A Sra. “A” afirmou ainda que o “B” queixar-se da casa do pai, estando mais queixoso desde que retomaram a residência alternada. Referiu que, desde que o “B” voltou a ir para a casa do pai em semanas alternadas, anda a replicar o comportamento que tem em casa do pai na sua casa. Mencionou que a situação do “B” nas duas casas está a tornar-se grave, pela diferença de regras, e, nessa sequência, o filho está a atravessar uma fase complicada. Disse que o pai não dá a medicação ao “B” e não o lembrou que tinha que levar o equipamento do futebol, esquecendo-se que o filho tem 9 anos de idade e necessita de cuidados e de atenção. Mais referiu que foi complicada a situação na sexta-feira passada de manhã com o “B”, em sua casa, pelo facto de, nesse dia à tarde, ele ir para a casa do pai, com o filho a questioná-la por que motivo tinha que ir para a casa do pai. Afirmou que a continuidade da residência alternada está a prejudicar o desenvolvimento do “B”, a relação do “B” com o pai e, atualmente, a relação do “B” consigo. Parecer técnico Segundo a informação aferida junto da Associação Portuguesa de Terapia Familiar e Comunitária, “os pedidos de intervenção terapêutica deverão ser remetidos pelo próprio Tribunal, por documento escrito ou digital, e ao cuidado da nossa equipa de gestão de processos. No que diz respeito ao tempo de resposta ele dependerá sempre do período em que o pedido for efetuado e da disponibilidade na nossa equipa. Tendo em conta esta imprevisibilidade, poderemos dizer que, habitualmente, damos resposta no primeiro mês após a data de receção do pedido” (sic). Assim sendo, esta EMAT vem por este meio sugerir ao Douto Tribunal que solicite o acompanhamento dos pais em sessões de terapia familiar à Associação Portuguesa de Terapia Familiar e Comunitária, em Loures. Tendo em consideração que a resposta da Associação Portuguesa de Terapia Familiar e Comunitária poderá demorar e atendendo ao facto de ser necessário decidir em que escola se irá matricular o “B” para o próximo ano letivo, esta EMAT sugere ao Douto Tribunal, mui respeitosamente, que considere a possibilidade de aplicar, com efeitos imediatos, a medida de promoção e proteção de apoio juntos dos pais, executada na pessoa da mãe, para que esta possa matricular o “B” na escola pública da sua área de residência, Agrupamento de Escolas da (…), local onde o “B” tem algumas referências. Esta EMAT vem, ainda, elencar, os pareceres que foram emitidos anteriormente, no âmbito do presente processo: - A 2023/11/14 foi: “Esta EMAT vem, por este meio, sugerir, mui respeitosamente, ao Douto Tribunal, que considere a possibilidade de agendar uma diligência, com a presença dos progenitores, e, se entender pertinente, com a presença do “B”, com o objetivo de refletir em conjunto sobre a medida mais adequada às necessidades do “B”, que assegure a sua estabilidade e o seu estado de equilíbrio, ou, se considerar mais adequado, cessar a medida de promoção e proteção, dando continuidade ao processo de alteração da regulação das responsabilidades parentais” (sic). - A 2024/2/20 foi: “Assim sendo, esta EMAT vem, por este meio, sugerir, mui respeitosamente, ao Douto Tribunal, a cessação do processo de promoção e proteção, tendo em consideração que, segunda as informações aferidas, o “B” não se encontra em perigo, tendo as suas necessidades asseguradas junto de cada um dos pais. Sugerimos, mui respeitosamente, ao Douto Tribunal que as questões referentes ao bem-estar e à estabilidade emocional do “B” possam ser solucionadas no âmbito do processo de Alteração da Regulação das Responsabilidades Parentais, que decorre nesse Douto Tribunal, tendo em consideração as seguintes informações: - Informações aferidas junto do “B”, a 2024/1/15, que afirmou que “quando está em casa do pai, logo na segunda-feira, pensa em quanto tempo falta para ir para a casa da mãe”; “na casa da mãe, o tempo passa a correr”; “queria ficar em casa da mãe”; “na casa da mãe, corre tudo 10 estrelas” (sic); - O relatório clínico elaborado pela psicóloga que acompanha o “B”, que refere: “existem diferenças na forma como o “B” se relaciona com cada um dos pais. Pese embora manifeste uma ligação afetiva com ambos, revela excessiva autonomia na relação com o pai e excessiva ansiedade de separação na relação com a mãe” (sic); - O relatório pericial da mãe, que conclui: “a examinada revela dispor de bons recursos internos e de capacidades para que consiga identificar, compreender e satisfazer a generalidade das diferentes necessidades básicas e psicoafectivas do seu filho, sem qualquer eventual comprometimento. A examinada expressa um funcionamento parental dentro de um modelo educativo positivo e democrático, conseguindo estabelecer com o filho uma vinculação segura, denotando proximidade emocional e uma relação empática, regendo-se através de estratégias parentais adequadas e dentro de um estilo de comunicação tendencialmente assertivo e funcional” (sic); - O relatório pericial do pai, que conclui: “o examinado revela dispor de recursos internos e de capacidades parentais suficientes para que consiga identificar, compreender e satisfazer a generalidade das diferentes necessidades básicas e psicoafectivas do seu filho. Constata-se que, em geral, que o examinado funciona num modelo e estilo educativo positivo e democrático, evidenciando um conjunto de atitudes e práticas que sugerem que conseguirá estabelecer uma relação afetiva com o seu filho, regendo-se num estilo de comunicação, tendencialmente, assertivo e sem recurso a práticas de natureza punitiva ou disruptiva. Não obstante o supra, admite-se o surgimento de dificuldades ao nível da relação com o seu filho, manifestando alguma intransigência e rigidez ao nível da operacionalização de regras e limites, com pouca flexibilidade a algumas necessidades emocionais do seu filho, o que será o principal foco de desgaste progressivo na relação e que nos parece tenderá a agravar-se, com prejuízo para a relação filial” (sic); - O relatório da perícia psicológica do “B” que refere “o regime parental vigente não será aquele que melhor contribui para a estabilidade psicoafectiva do menor, pois se o fosse o menor estaria num estado de equilíbrio relativo, que não parece ser o caso” (sic), “evidencia uma relação de maior estabilidade, proximidade e segurança afetiva na relação com a sua figura materna, sentimento esse que não está presente ao mesmo nível no que ao progenitor diz respeito, sendo este sentido como uma figura menos responsiva, menos equilibrada e mais punitiva do que a figura materna” (sic). Sugerimos, ainda, mui respeitosamente, ao Douto Tribunal, que, tendo em consideração a indicação do CAFAP, considere a possibilidade de solicitar o acompanhamento dos pais em sessões de terapia familiar à Associação Portuguesa de Terapia Familiar e Comunitária, em Loures” (sic). - A 2024/3/18 foi :“Vimos por este meio sugerir, respeitosamente, a aplicação da medida de promoção e proteção de apoio junto dos pais, a executar na pessoa da mãe, ficando “B” a residir com a mãe e a visitar o pai em fins-de-semana alternados, devendo este, para o efeito, ir buscar “B” à escola, à sexta-feira à tarde, e entrega-lo, na segunda-feira de manhã, na escola” (sic). Face ao acima exposto coloca-se à consideração desse Douto Tribunal, a tomada dos procedimentos considerados adequados na presente situação (…)”.
4. Na sequência do referido em 1., a Sra. Juíza de Direito “C”, por despacho de 11-07-2024, veio responder – nos presentes autos – que: “(…) Ao abrigo do disposto no n.º 1, do art.º 122.º do Código de Processo Civil, oferece-me responder o seguinte: Ponto prévio:--- Face à situação de risco, ainda não debelada, o único processo pendente que corre termos processuais a favor da criança, “B”, é de promoção e proteção, razão porque entendemos laborar em erro a progenitora, quando refere impor-se a alteração das responsabilidades parentais desta criança, quando não estando perante um processo dessa natureza, mas sim de um processo de promoção e proteção, por não se encontrarem ainda reunidas as condições para fazer cessar a medida protetiva e estabelecer a situação da criança no âmbito de processo tutelar cível.- De resto a signatária, enquanto titular do processo, proferiu todos os despachos de acordo com a lei e com a sua consciência ciente da função jurisdicional que exerce e das especificidades da jurisdição da família e menores.--- Destarte, em seu entendimento, não assiste razão à progenitora uma vez que a génese deste processo reside, além do mais, no elevado e agudizado conflito parental, sendo certo que os despachos proferidos refletem a preocupação do tribunal para que de forma célere sejam levadas a cabo diligências e procedimentos com vista a atingir o objetivo dos presentes autos, sendo disso exemplo o despacho colocado em crise proferido em 2 de junho de 2024 no âmbito do qual se chamou a atenção para o tempo, entretanto decorrido e o necessário atraso relativamente à intervenção da Associação de Terapia Familiar e Comunitária.-- Assim, as questões suscitadas no presente incidente resultam sem fundamento não sendo, por isso, “motivo, sério e grave, adequado a gerar desconfiança sobre a sua imparcialidade” uma vez que no despacho em referencia a signatária limitou-se, em concreto, a resolver a questão do estabelecimento de ensino frequentado pela criança, do período de férias a passar com cada um dos progenitores e dar conta do atraso com que, por vezes, a informação é junta ao processo.--- Igualmente não assiste razão à progenitora quando aí invoca que a signatária vai ao ponto de, sem qualquer justificação pôr em causa a informação técnica junta aos autos pela EMAT dizendo que “a afirmação de que a última informação da EMAT sufraga a perspetiva da mãe é bem reveladora da falta de objetividade e análise crítica da Sra. Dra. Juiz relativamente à informação em causa” aliás a afirmação em causa é manifestamente ofensiva da dignidade profissional da técnica subscritora de tal informação”. A signatária jamais desconsiderou a dignidade profissional da Exma. técnica não sendo, de resto, sequer esse o seu papel, estando ciente de que sempre agiu e agirá em defesa dos interesses da criança e não dos interesses do pai ou dos interesses da mãe, sem nunca descurar que o elevado conflito que envolve estes pais, constitui fator de risco repercutindo-se, sem qualquer duvida, no bem estar da criança, cabendo a todos nomeadamente aos técnicos intervenientes efetuar de forma célere as diligências e procedimentos que se mostrem necessárias, porque tal contribui e assegura a salvaguarda do superior interesse do “B”, reiterando que será sempre este interesse que move e moverá o exercício das suas funções neste e noutros processos (…)”.
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II. Vejamos:
Nos termos do disposto no nº. 1 do artigo 120.º do CPC, as partes podem opor suspeição ao juiz quando ocorrer motivo, sério e grave, adequado a gerar desconfiança sobre a sua imparcialidade, o que ocorrerá, nomeadamente, nas situações elencadas nas suas alíneas a) a g).
Com efeito, o juiz natural, consagrado na CRP, só pode ser recusado quando se verifiquem circunstâncias assertivas, sérias e graves.
E os motivos sérios e graves, tendentes a gerar desconfiança sobre a imparcialidade do julgador, resultarão da avaliação das circunstâncias invocadas.
O TEDH – na interpretação do segmento inicial do §1 do art.º 6.º da CEDH, (“qualquer pessoa tem direito a que a sua causa seja examinada, equitativa e publicamente, num prazo razoável por um tribunal independente e imparcial, estabelecido pela lei”) - desde o acórdão Piersack v. Bélgica (8692/79), de 01-10-82 (https://hudoc.echr.coe.int/fre?i=001-57557) tem trilhado o caminho da determinação da imparcialidade pela sujeição a um “teste subjetivo”, incidindo sobre a convicção pessoal e o comportamento do concreto juiz, sobre a existência de preconceito (na expressão anglo-saxónica, “bias”) face a determinado caso, e a um “teste objetivo” que atenda à perceção ou dúvida externa legítima sobre a garantia de imparcialidade (cfr., também, os acórdãos Cubber v. Bélgica, de 26-10-84 (https://hudoc.echr.coe.int/ukr?i=001-57465), Borgers v. Bélgica, de 30-10-91, (https://hudoc.echr.coe.int/fre?i=001-57720) e Micallef v. Malte, de 15-10-2009 (https://hudoc.echr.coe.int/fre?i=001-95031) ).
Assim, o TEDH tem vindo a entender que um juiz deve ser e parecer imparcial, devendo abster-se de intervir num assunto, quando existam dúvidas razoáveis da sua imparcialidade, ou porque tenha exteriorizado relativamente ao demandante, juízos antecipados desfavoráveis, ou no processo, tenha emitido algum juízo antecipado de culpabilidade.
A dedução de um incidente de suspeição, pelo que sugere ou implica, deve ser resguardado para casos evidentes que o legislador espelhou no artigo 120.º do CPC, em reforço dos motivos de escusa do juiz, a que se refere o artigo 119.º do CPC.
A imparcialidade do Tribunal constitui um requisito fundamental do processo justo. “A imparcialidade, como exigência específica de uma verdadeira decisão judicial, define-se, por via de regra, como ausência de qualquer prejuízo ou preconceito, em relação à matéria a decidir ou às pessoas afectadas pela decisão” (assim, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13-02-2013, Pº 1475/11.8TAMTS.P1-A.S1, rel. SANTOS CABRAL).
O direito a um julgamento justo, não se trata de uma prerrogativa concedida no interesse dos juízes, mas antes, uma garantia de respeito pelos direitos e liberdades fundamentais, de modo a que, qualquer pessoa tenha confiança no sistema de Justiça.
Do ponto de vista dos intervenientes nos processos, é relevante saber da neutralidade dos juízes face ao objeto da causa.
Com efeito, os motivos sérios e válidos atinentes à imparcialidade de um juiz terão de ser apreciados de um ponto de vista subjetivo e objetivo.
Sintetizando, referiu-se no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24-11-2022 (Pº 38/18.1TRLSB-A, rel. ORLANDO GONÇALVES) que “de um modo geral, pode dizer-se que a causa da suspeição há de reportar-se a um de dois fundamentos: uma especial relação do juiz com alguns dos sujeitos processuais, ou algum especial contacto com o processo”.
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III. Colocados os parâmetros enunciados que importa observar, analisemos a situação concreta apreciando se o incidente de suspeição deverá proceder ou improceder.
No seu requerimento de suspeição em apreço, a respetiva requerente invocou diversas circunstâncias inerentes à tramitação do apenso C do processo acima identificado e às vicissitudes do mesmo, aduzindo, nomeadamente, o seguinte: “(…) Com data de 11 de Junho de 2024 foi notificado à Requerente, através da sua mandatária, o último despacho proferido nos autos, no Apenso C, pela Sra. Juiz, nos termos do qual, e uma vez mais, a Sra. Juiz persiste em ignorar toda a muita informação técnica existente nos autos, que impõe a alteração da regulação das responsabilidades parentais relativas ao menor em causa nos autos (…). (…) a Sra. Juiz vai ao ponto de, sem qualquer justificação, pôr em causa a informação técnica junta aos autos pela EMAT, a 14 de Maio de 2024 (…). (…) A Sra. Juiz insiste em que os pais do “B” necessitam de terapia familiar, como se tal bastasse para justificar a não alteração das medidas em vigor, bem como do regime de residência do menor, em manifesta oposição com todos os pereceres técnicos das várias entidades que têm acompanhado o menor, bem como os pais (…). (…) A Sra. Dra. Juiz centra-se na comunicação entre os pais e descura a atenção devida ao menor (…). (…) A afirmação de que a última informação da EMAT sufraga a perspectiva da mãe é bem reveladora da falta de objectividade e análise crítica da Sra. Dra. Juiz relativamente à informação em causa (…) é manifestamente ofensiva da dignidade profissional da técnica subscritora de tal informação (…). (…) Toda a informação que foi trazida para os autos e que dá suporte às muitas questões colocadas pela mãe do menor relativamente à execução do regime de responsabilidades parentais que tem vigorado, é imediatamente desconsiderada porque a Sra. Juiz não é objectiva, não é imparcial, não é isenta e não cuida, como o exercício do cargo lhe exige, do interesse do menor (…)”.
A Sra. Juíza de Direito contrapôs, em suma, que “proferiu todos os despachos de acordo com a lei e com a sua consciência ciente da função jurisdicional que exerce e das especificidades da jurisdição da família e menores (…) limitou-se, em concreto, a resolver a questão do estabelecimento de ensino frequentado pela criança, do período de férias a passar com cada um dos progenitores e dar conta do atraso com que, por vezes, a informação é junta ao processo (…)”. Mais respondeu “jamais desconsiderou a dignidade profissional da Exma. técnica não sendo, de resto, sequer esse o seu papel, estando ciente de que sempre agiu e agirá em defesa dos interesses da criança e não dos interesses do pai ou dos interesses da mãe, sem nunca descurar que o elevado conflito que envolve estes pais, constitui fator de risco repercutindo-se, sem qualquer duvida, no bem estar da criança, cabendo a todos nomeadamente aos técnicos intervenientes efetuar de forma célere as diligências e procedimentos que se mostrem necessárias, porque tal contribui e assegura a salvaguarda do superior interesse do “B”, reiterando que será sempre este interesse que move e moverá o exercício das suas funções neste e noutros processos”.
Liminarmente, importa salientar que a apreciação sobre se a situação invocada pela requerente da suspeição se enquadra, ou não, na previsão legal do artigo 120.º do CPC, prende-se, tão só, com a materialização ou não dos requisitos do incidente, e não, com qualquer apreciação de natureza jurisdicional ou substantiva, relativamente ao mérito da pretensão esgrimida por qualquer dos sujeitos processuais, a qual, não nos incumbe decidir, nem a poderemos efetuar.
Depois, cumpre salientar que não se patenteia qualquer das circunstâncias a que se referem as alíneas a) a f) do n.º 1, do artigo 120.º do CPC.
Quanto à alínea g) – existência de inimizade grave ou grande intimidade entre o juiz e alguma das partes ou seus mandatários – tem-se entendido que “não constitui fundamento específico de suspeição o mero indeferimento de requerimento probatório (RL, 7-11-12, 5275/09) nem a inoportuna expressão pelo juiz sobre a credibilidade das testemunhas (RG 20-3-06, 458/06)” (assim, Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa; Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, Almedina, 2018, p. 148).
Do facto de um juiz ter proferido decisões desfavoráveis a uma das partes não pode extrair-se qualquer ilação quanto a eventuais sentimentos de amizade ou inimizade ou, até, de mera simpatia ou antipatia por uma delas, ou ainda de parcialidade (assim, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16-05-2002, Pº 01P3914, rel. SIMAS SANTOS).
Efetivamente, a função jurisdicional “implica, pela sua própria natureza e quase sem excepções, a necessidade de dar razão a uma das partes e negá-la à outra, rejeitando as suas pretensões e sacrificando os seus interesses concretos. Daí que não seja possível retirar do facto de alguma, ou algumas, das pretensões formuladas por uma das partes terem sido rejeitadas a conclusão de que o julgador está a ser parcial ou a revelar qualquer inimizade contra a parte que viu tais pretensões indeferidas" (despacho do Presidente da Relação de Lisboa de 14-06-1999, in CJ, XXIV, 3.º, p. 75).
No seu requerimento, a requerente da suspeição invoca, tão-só, questões de natureza jurisdicional, manifestando a sua discordância com as decisões jurisdicionais tomadas no processo, mas este descontentamento não pode ser apreciado em incidente de suspeição.
Não se conformando com as decisões judiciais proferidas, a requerente da suspeição tem ao seu dispor todos os mecanismos legais de impugnação que sejam processualmente admissíveis.
De facto, os recursos (ou as reclamações ou outros meios impugnatórios) são os mecanismos legais para se poder reagir em tais situações e para se aquilatar da correta ou incorreta aplicação da lei.
A Justiça é feita caso a caso, tendo em consideração a real e objetiva situação a dirimir.
O Juiz não é parte nos processos, devendo exercer as suas funções com a maior objetividade e imparcialidade.
Com efeito, os juízes têm por função ser imparciais e objetivos, fundando as suas decisões na lei e na sua consciência.
Como dispõe o artigo 4.º, n.º 1 do Estatuto dos Magistrados Judiciais, os juízes julgam apenas segundo a Constituição e a lei e não estão sujeitos a ordens ou instruções, salvo o dever de acatamento pelos tribunais inferiores das decisões proferidas, em via de recurso, pelos tribunais superiores.
De acordo com o n.º 2 do artigo 4.º do Estatuto dos Magistrados Judiciais, a independência dos magistrados judiciais manifesta-se na função de julgar, na direção da marcha do processo e na gestão dos processos que lhes forem aleatoriamente atribuídos.
Podemos entender que a requerente da suspeição não se reveja no conteúdo de posições tomadas no processo pela Sra. Juíza, mas tal descontentamento não implica a constatação de alguma parcialidade do julgador.
O incidente de suspeição não é, de facto, o mecanismo adequado para expressar a discordância jurídica ou processual de uma parte sobre o curso processual ou sobre os atos jurisdicionais levados a efeito pelo julgador. A jurisprudência dos nossos tribunais superiores tem, de forma constante, evidenciado esta asserção (disso são exemplo as decisões expressas nos seguintes acórdãos: TRL de 11-10-2017, Pº 6300/12.0TDLSB-A-3, rel. JOÃO LEE FERREIRA; TRP de 21-02-2018, Pº 406/15.0GAVFR-A.P1, rel. ELSA PAIXÃO; TRP de 11-11-2020, Pº 1155/18.3T9AVR-A.P1, rel. JOSÉ CARRETO; TRE de 08-03-2018, Pº 13/18.6YREVR, rel. JOÃO AMARO).
De todo o modo, não logramos descortinar na invocação da requerente da suspeição nenhuma circunstância que possa conduzir ao afastamento da Sra. Juíza, não se demonstrando, o por si alegado, determinar a existência de motivo – muito menos, sério e grave - adequado a gerar desconfiança sobre a imparcialidade do julgador.
Observando os factos tal como o faria um cidadão médio, não se deteta nos atos processuais em que teve intervenção a Sra. Juíza – cujas considerações têm, aliás, arrimo nos elementos processuais constantes dos autos - qualquer atitude pessoal reveladora de suspeita de quebra da sua imparcialidade. Em particular, as considerações expendidas pela Sra. Juíza no despacho de 11-06-2024 inserem-se, apenas e exclusivamente, no âmbito do objeto da decisão proferida, sem qualquer consideração reveladora de alguma parcialidade.
Assim sendo, entendemos não se encontrarem reunidos os pressupostos que materializam o incidente, o que conduz à sua improcedência.
Não se nos afigura a existência de litigância de má-fé da requerente da suspeição, não se patenteando alguma das circunstâncias a que se reporta o n.º 2 do artigo 542.º do CPC.
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IV. Face ao exposto, indefiro a suspeição deduzida relativamente à Sra. Juíza de Direito “C”.
Custas a cargo da requerente do incidente.
Notifique.
Lisboa, 15-07-2024,
Carlos Castelo Branco.
(Vice-Presidente, com poderes delegados – cfr. Despacho 2577/2024, de 16-02-2024, D.R., 2.ª Série, n.º 51/2024, de 12 de março).