REGIME PENAL ESPECIAL PARA JOVENS
PENA DE PRISÃO
Sumário

(da responsabilidade da relatora):
I - O Regime Especial dos Jovens Delinquentes consagrado pelo DL n.º 401/82, de 23 de setembro, em cujo artigo 4.º se prevê que se ao caso for aplicável pena de prisão, deve o juiz atenuar especialmente a pena nos termos dos artigos 72.° e 73.°do Código Penal, não é nem de aplicação automática nem de aplicação obrigatória, mas antes pressupõe um juízo de prognose, a formular sobre a existência de vantagens para a reintegração na sociedade do jovem condenado.
II - Os antecedentes criminais registados pelos recorrentes não justificam nem permitem tratamento benevolente, mas antes reclamam, pela necessidade de prevenir o cometimento de futuros crimes, acentuada emenda cívica, impondo-se a execução da prisão.

Texto Integral

Em conferência, acordam os Juízes na 5ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:
I – Relatório
1. No processo comum coletivo n.º 33/22.6PESNT, em que são arguidos AA e BB, melhor identificados nos autos, foi proferido acórdão a 18.03.2024, que decidiu, para o que importa, nos seguintes termos:
• Condenar AA pela prática, em coautoria material, de:
• um crime de roubo, na forma consumada, p. e p. pelo art. 210.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 3 (três) meses de prisão;
• um crime de tentativa de coação, p. e p. pelos arts. 22.º, 23.º, 73.º e 154.º, n.ºs 1 e 2, do Código Penal, na pena de 9 (nove) meses de prisão.
• Em cúmulo jurídico destas penas, nos termos do art. 77.º do Código Penal, condenar o arguido na pena única de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão efetiva.
• Condenar BB pela prática, em coautoria material, de:
• um crime de roubo, na forma consumada, p. e p. pelo art. 210.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos de prisão;
• um crime de tentativa de coação, p. e p. pelos arts. 22.º, 23.º, 73.º e 154.º, n.ºs 1 e 2, do Código Penal, na pena de 8 (oito) meses de prisão.
• Em cúmulo jurídico destas penas, nos termos do art. 77.º do Código Penal, condenar o arguido na pena única de 2 (dois) anos e 3 (três) meses de prisão efetiva.
2. Os arguidos não se conformaram com as respetivas condenações e interpuseram recurso do acórdão.
2.1. O arguido BB finalizou a motivação do recurso com as seguintes conclusões (transcrição):
(…)
32. O recorrente entende que, salvo melhor opinião, dada a factualidade e as demais circunstâncias provadas, a pena aplicada é excessiva NO QUE TANGE - Na pena de prisão efectiva de 2 (anos) e 3 (três) meses
33. A determinação da pena concreta deverá fixar-se entre um limite mínimo e um limite máximo adequados á culpa tendo como referência os fins de prevenção geral e especial, isto é a protecção dos bens jurídicos e a reintegração social do agente.
34. Caso assim não se entenda, a pena de prisão efectiva deverá ser substituída por prisão suspensa na sua execução, nos termos do disposto no art.º 50º. E 53º. Do Código Penal, sob regime de prova.
35. O recorrente não sabia nem tinha a consciência do que era estar privado de liberdade, nunca o esteve, é uma aprendizagem para a vida, e o querer retomar a sua formação na ..., local onde estava a exercer a sua formação na companhia de sua mãe e padrasto. Pois que.
36. Esta Arrependido.
37. Aplicar justiça no caso concreto padece de excessividade as penas a que foi condenado, ATENTO AOS FACTOS.
38. Tal pena , deveria ser vertida para a reassocialização do recorrente para a sociedade , E, não encarcerando o jovem que se reabilita o mesmo para a sociedade , o jovem sera tão só e bem recuperado, se ingressar no mercado de trabalho , tendo de cumprir regras extremamente “apertadas” bem sabendo que tera sempre o regresso a establecimento prisional se violar as regras.
39. O espectro de privação de liberdade estara sempre a condicionar a sua margem de liberdade de atuação.
40. O recorrente mostrou-se sincero arrependimento pela sua conduta.
41. A sua conduta embora ilícita e condenada perante o direito penal, devera ser atenuada em termos de culpa.
42. Condenando o recorrente a pena de prisão suspenda na sus execução, por aplicação de especial atenuação do regime especial para jovens. Decreto –Lei 401/82 de 23 de setembro.
43. O recorrente obteve a nacionalidade portuguesa.
44. Nestes termos e nos mais de direito deve a Douta Sentença recorrida ser revogada e proferida outra em que se determine:
2) Que a pena aplicada seja substituída:
A) Por pena de prisão suspensa na sua execução de 2(dois) anos e 3 (três) meses nos termos do artº 50º e 53º. Código Penal
2.2. O arguido BB finalizou a motivação do recurso com as seguintes conclusões, (transcrição):
(…)
II. O Recorrente discorda e não se conforma com o Acórdão recorrido, e querendo a sua sindicância à Veneranda Relação, com os seguintes fundamentos:
A). Erro quanto às penas concretamente aplicadas na dissometria das penas parcelares e do cúmulo jurídico daí decorrente;
B). Aplicação do regime penal especial para jovens, estabelecido pelo decreto-lei n.º 401/82, de 23 de setembro.
III. Principiando, o Tribunal a quo no Acórdão recorrido, tal como resulta do iter decisório, deu como provado que:
- O tribunal concluiu, sem qualquer dúvida, que se verificou tudo o descrito nos pontos 1.º a 18.º da factualidade provada e já referidos em 2.1.1 deste articulado;
IV. Resulta, portanto, somente atendendo ao iter decisório que o Tribunal a quo deu, simultaneamente, como facto provado que o Arguido agiu, conjuntamente com o arguido AA e assim e em co-autoria material, praticaram:
- um crime de roubo, na forma consumada, p. e p. pelo art. 210.º, n.º 1, do Código Penal,
- um crime de tentativa de coacção, p. e p. pelos arts. 22.º, 23.º, 73.º e154.º, n.ºs 1 e 2, do Código Penal.
V. A existência do apontado vício é de conhecimento oficioso pelo Tribunal sendo tal violação subsumível ao disposto no nº1 do artigo 410º do CPP.
VI. Relativamente à dosometria das penas parcelares concretamente aplicadas e do cúmulo jurídico, sempre se dirá que, sendo o Arguido condenado em dolo directo, modalidade presente no artigo 14.º, n.º 1, do Código Penal e com consciência da ilicitude, artigo 17.º, do Código Penal, pelo pela prática, em co-autoria material, de um crime de roubo, na forma consumada, p. e p. pelo art. 210.º, n.º 1,do Código Penal, e pela pratica em co-autoria de um crime de tentativa de coacção, p. e p. pelos arts. 22.º, 23.º, 73.º e154.º, n.ºs 1 e 2, do Código Penal, a sua pena terá que ser necessariamente revista.
VII. Sendo, nesse sentido, aplicada pena inferior a 2 anos de prisão, tendo em conta que estamos perante um Arguido que se encontra socialmente e familiarmente integrado, facto, de resto, dado como provado pelo Acórdão nos pontos 42. a 72, não se aferindo da conduta do Arguido uma tendência ou perfil de personalidade violenta propício ao cometimento de novos crimes, mas antes uma ocasionalidade da conduta.
VIII. Pelo que não se mostra esgotado o sentido pedagógico e reeducativo do instituto, relativamente ao Arguido Recorrente, e aplicação da suspensão da execução da prisão, ainda que sujeita a regime de prova, nos termos do artigo 50.º do C.P., o que sempre se requer.
IX. Mas mesmo que assim não se entenda, o Recorrente não prescinde de alegar que, tendo em conta a moldura penal abstrata, o conjunto dos factos e a sua gravidade, mas também as condições pessoais do recorrente(que constam de «42.» a «72» ) a personalidade evidenciada, e sopesada a culpa, resulta que as penas parcelares aplicadas se mostram desproporcionadas, sobretudo acima do limiar da culpa-em coaturia 2 anos de prisão por um crime de roubo e 6 meses de prisão por tentativa de coação sendo, consequentemente, o cúmulo jurídico operado - pena única que se fixou em 2 anos e 3 meses de prisão acima do limiar da culpa, que se mostra desproporcional, e não obedecendo assim o Tribunal a quo aos critérios decorrentes do disposto nos artigos 40.º, 71.º e 77.º do CP.
X. A culpa reduzida do arguido, as necessidades de prevenção especial, que no caso, são reduzidas, e as de prevenção geral, que são igualmente diminutas, entende-se que teria sido mais adequado e proporcional, aplicar ao arguido uma pena parcelar mais próxima do mínimo legal de 1 ano, devendo esta ser reduzida ex officio, o que desde já expressamente se requer com o douto suprimento da Veneranda Relação.
XI. Quanto à prevenção geral, sufragamos a lição do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, proc. n.º 85/09.4PBPST.L1.S1, de 15/02/2012 que afirma: “Nunca é demais acentuar o papelda culpa como critério fundamentador da medida da pena, ao invés da preponderância que alguns outorgam à prevenção geral, colocando-a acima da retribuição da culpa pelo delito quando é esta, na realidade, que justifica a intervenção penal. A culpa é a razão de ser da pena e, também, o fundamento para estabelecer a sua dimensão. A prevenção é unicamente uma finalidade da mesma.”
XII. Assim sendo, se a culpa é a razão de ser da pena, o fundamento para estabelecer a sua dimensão e o seu limite, então, é por demais evidente que a decisão recorrida enferma de manifesta desproporção e de erro, ao condenar o Arguido a conduta do Arguido situa-se no grau menos culposo.
XIII. Ponderada a concreta culpa do Arguido recorrente, tal remete-nos aproximadamente para o limite mínimo da pena de 1anos e nunca para os 2 anos e 3 meses, situados a meio da pena, concretamente aplicados pelo Tribunal.
XIV. Tal com dispõe o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, proc. n.º 06P124, 16/02/2006, que declara o que pela sua relevância se transcreve: “– No plano constitucional, ao lado do princípio da igualdade, ao menos no mesmo plano, situam-se os princípios da proporcionalidade, da adequação, da necessidade e da justiça e devem ser especialmente considerados os princípios da legalidade e da culpa, uma vez que devem ser respeitados os critérios e valores legais e a pena deve ser ajustada à culpa, que constitui um limite inultrapassável:”
XV. Pelo que, o Tribunal a quo violou, deste modo, as disposições constantes dos artigos 40°, 70°, 71.º, n.ºs 1 e 2, e artigo 77.º, n.º 1, todos do CP, assim como os artigos 13.º, n.º 1, e 18.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa.
*
XVI. Por último, não se prescindirá, de requerer a sindicância da Veneranda Relação no que concerne à aplicação do regime penal especial para jovens, estabelecido pelo decreto-lei n.º 401/82, de 23 de setembro, erradamente não aplicada ao Recorrente.
XVII. Como se retira de ampla jurisprudência dos tribunais superiores, e.g. Acórdãos do Supremo, no proc. n.º 610/15.1PCLSB.S1, de 08/09/2016, e no proc. n.º 499/14.8PWLSB.L1.S1, de 31/03/2016, entendemos não se poder simplesmente retirar da gravidade do crime praticado a impossibilidade de reintegração do agente.
XVIII. Face ao exposto, tendo em conta a matéria de facto dada como provada, pontos 2.1.1 De 1 a 72. - e da fundamentação da decisão, não se retira que o arguido não tirará quaisquer vantagens para a sua reintegração social daquela diminuição, como resulta precisamente o contrário.
XIX. Não existem razões sérias para duvidar da capacidade do arguido, aqui recorrente, de se conformar com o direito e não cometer novos crimes, porquanto o seu percurso de vida merece uma visão de esperança e um juízo de prognose positiva que permitia ao Tribunal ter decidido pela aplicação do aludido regime.
XX. Logo, com a não aplicação da atenuação especial, violou o Tribunal a quo o disposto no artigo4.º, assim como o artigo 73.º, n.º 1, al.s a) e b) do CP, e nessa conformidade a pena aplicada, ou a aplicar pela Veneranda Relação, deverá ser reduzida no limite mínimo a 1/5 e no limite máximo reduzido de 1/3.
3. A Magistrada do Ministério Público junto da 1ª instância apresentou resposta aos recursos interpostos pelos arguidos, no sentido de que o acórdão não merece censura, concluindo, quanto a cada um deles, nos seguintes termos (transcrição):
• Arguido AA:
(…)
2. O regime especial dos jovens adultos
- não é de aplicação necessária e obrigatória;
- nem opera de forma automática, sendo de apreciar casuisticamente;
- é de conhecimento oficioso;
- a consideração da sua aplicação não constitui uma mera faculdade do juiz,
- mas antes um poder-dever vinculado que o juiz deve (tem de) usar sempre que se verifiquem os respectivos pressupostos, sendo de concessão vinculada;
- de aplicar sempre que procedam sérias razões para crer que da atenuação resultam vantagens para a reinserção social do jovem condenado, sendo a aplicação em tais circunstâncias, obrigatória e oficiosa,
- havendo a obrigação, ou pelo menos, não se dispensando a equacionação da pertinência ou inconveniência da sua aplicação;
- justificando-se a opção ainda que se considere inaplicável o regime, isto é, devendo ser fundamentada a não aplicação.
3. A avaliação das vantagens da atenuação especial para a reinserção especial do jovem tem de ser equacionada perante as circunstâncias concretas do caso e do percurso de vida e não perante considerações vagas e abstractas desligadas da realidade (neste sentido vd. acórdãos de 17.10.2007, processo n.º 3495/07-3ª, de 16.01.2008, processo n.º 4837/08-3ª, de 20.02.2008, processo n.º 211/08-3ª e de 05.11.2008, processo n.º 2861/08-3ª, disponíveis em dgsi.pt).
4. No presente caso há que ter em consideração que o arguido tendo feito uso do seu direito ao silêncio, posteriormente, no final da audiência de julgamento negou os factos que lhe foram imputados, reconhecendo, apenas, que estava presente no dia em causa, mas não ameaçou nem tocou em ninguém. Ou seja, não confessou os factos e, consequentemente, também não mostrou qualquer arrependimento.
5.Por outro lado, há que considerar o contexto em que cometeu os factos.
6. De salientar, ainda, que o Recorrente já regista antecedentes criminais com condenações anterior e posterior aos factos aqui em causa.
7. Como foi dado como provado, o Recorrente adquiriu a nacionalidade portuguesa em …2022 (ponto 23º).
8. O pai, falecido há 5 anos, foi figura ausente da sua vida (ponto 24º).
9. A mãe e a avó emigraram para Portugal há cerca de 12 e 20 anos, respectivamente, procurando melhores condições de vida (ponto 25º).
10. Em Portugal, o Recorrente passou a viver na zona de ..., num contexto socioeconómico estável, com a mãe, que tinha então um negócio de … (ponto 26º).
11. Em 2019, acompanhou a família, constituída pela mãe, pelo padrasto e por uma irmã uterina, no processo de emigração para a ... (ponto 27º).
12. Regressou a Portugal de férias, altura em que incrementou o convívio com pares marginais, incumprindo horários impostos pela família, contexto em que ocorreram os factos que determinaram os seus contactos com a justiça penal (ponto 28º).
13. À data dos factos supra descritos a que se refere este processo, residia com amigos; devido à sua recusa em cumprir as orientações e regras determinadas pela família, nomeadamente ao nível do cumprimento de horários, estava incompatibilizado com esta (ponto 29º).
14. Ora, não obstante, ter tido todas as condições para uma integração, isso não o impediu de praticar, para além do mais, os factos aqui em apreciação.
15. Pelo que a falta de projecto de mudança de vida, efectiva e séria vontade de integração, não só, no mundo laboral, mas ainda, num meio envolvente propício a que se afaste de ambientes, lugares e pessoas que o poderão levar, novamente, para a prática de actos da mesma natureza dos ora praticados, não só, não tornam diminuta a ponderação das exigências de prevenção especial, como, pelo contrário, constituem circunstâncias que, colidem, de forma preponderante, com as exigências mínimas e irrenunciáveis de defesa do ordenamento jurídico e a garantia de protecção dos bens jurídicos, assumidas, em sede de prevenção geral.
16. Face ao exposto, pode-se concluir não existir um forte e fundado juízo de prognose de não voltar a praticar actos delituosos e, por outro lado, da materialidade apurada há que concluir, igualmente, que não concorrem sérias razões no sentido de que, assim, se facilitará a reinserção do Recorrente, não resultando igualmente, com uma razoabilidade evidente, que daí possam resultar vantagens para a sua ressocialização.
17. O que, então, impede a aplicação do regime previsto no referido artigo 4.º do Decreto Lei 401/82.
18. Tal como decidiu o tribunal a quo ao não aplicar ao Recorrente o regime constante do art.º 4.º do DL n.º 401/82, de 23 de Setembro, atenta a gravidade do crime e as necessidades de prevenção geral e especial.
19. Tendo em consideração os antecedentes criminais do Recorrente, a personalidade do Recorrente e demais circunstâncias do caso, não foi possível ao tribunal a quo emitir um juízo de prognose favorável e concluir que a simples ameaça de execução da pena seria bastante para o impedir de cometimento de novos crimes.
20. De notar que, não obstante o Recorrente ter sido condenado pela prática de crime de roubo em pena de prisão substituída por multa, a
21. Tal condenação não foi suficiente para o afastar do cometimento de crimes da mesma natureza.
22. Há, assim, que concluir pela necessidade de aplicação de uma pena de prisão efetiva.
23. No mais, não se mostrará violado qualquer preceito legal nem desrespeitado qualquer direito.
24. Nesta conformidade, negando-se provimento ao recurso e mantendo-se o douto acórdão recorrido, será feita justiça.
• Arguido BB:
(…)
2. O regime especial dos jovens adultos
- não é de aplicação necessária e obrigatória;
- nem opera de forma automática, sendo de apreciar casuisticamente;
- é de conhecimento oficioso;
- a consideração da sua aplicação não constitui uma mera faculdade do juiz,
- mas antes um poder-dever vinculado que o juiz deve (tem de) usar sempre que se verifiquem os respectivos pressupostos, sendo de concessão vinculada;
- de aplicar sempre que procedam sérias razões para crer que da atenuação resultam vantagens para a reinserção social do jovem condenado, sendo a aplicação em tais circunstâncias, obrigatória e oficiosa,
- havendo a obrigação, ou pelo menos, não se dispensando a equacionação da pertinência ou inconveniência da sua aplicação;
- justificando-se a opção ainda que se considere inaplicável o regime, isto é, devendo ser fundamentada a não aplicação.
3. A avaliação das vantagens da atenuação especial para a reinserção especial do jovem tem de ser equacionada perante as circunstâncias concretas do caso e do percurso de vida e não perante considerações vagas e abstractas desligadas da realidade (neste sentido vd. acórdãos de 17.10.2007, processo n.º 3495/07-3ª, de 16.01.2008, processo n.º 4837/08-3ª, de 20.02.2008, processo n.º 211/08-3ª e de 05.11.2008, processo n.º 2861/08-3ª, disponíveis em dgsi.pt).
4. No vertente caso há que ter em consideração que o arguido, tendo feito uso do seu direito ao silêncio, posteriormente, no final da audiência de julgamento apenas referiu que pretendia pedir desculpa, bem como ao ofendido, que fez actividades no estabelecimento prisional onde se encontra em cumprimento de pena e pediu uma oportunidade para poder mudar.
5. Ou seja, tendo-o feito no fim da audiência de julgamento – muito embora tenha o direito de falar em qualquer altura da audiência -, após a produção de prova, há que entender que não colaborou, de forma alguma, para a descoberta da verdade e boa decisão da causa.
6. Bem como não mostrou qualquer arrependimento efectivo.
7. Por outro lado, há que considerar o contexto em que cometeu os factos.
8. De salientar, ainda, que o Recorrente já regista antecedentes criminais com condenações posteriores aos factos aqui em causa, relativas a crimes cometidos uns antes e outros depois destes.
9. De notar, ainda, que não obstante o Recorrente ter tido todo o apoio familiar, o Recorrente desistiu e abandonou a escola, por desmotivação e desinteresse, no contexto da influência do seu grupo de pares (factualidade dada como provada no ponto 51.º), ausentou-se da sua residência sem autorização e conhecimento da mãe, permanecendo vários dias em parte incerta sem a contactar, numa atitude autocentrada e de satisfação imediata dos seus impulsos e necessidades (factualidade dada como provada no ponto 53.º), tendo estado ausente de casa desde o mês de Novembro de 2021 a Fevereiro de 2022 sem dar noticias (factualidade dada como provada no ponto 55.º).
10. Ora, não obstante, ter tido todas as condições para uma integração, isso não o impediu de praticar, para além do mais, os factos aqui em apreciação.
11. Pelo que a falta de projecto de mudança de vida, efectiva e séria vontade de integração, não só, no mundo laboral, mas ainda, num meio envolvente propício a que se afaste de ambientes, lugares e pessoas que o poderão levar, novamente, para a prática de actos da mesma natureza dos ora praticados, não só, não tornam diminuta a ponderação das exigências de prevenção especial, como, pelo contrário, constituem circunstâncias que, colidem, de forma preponderante, com as exigências mínimas e irrenunciáveis de defesa do ordenamento jurídico e a garantia de protecção dos bens jurídicos, assumidas, em sede de prevenção geral.
12. Face ao exposto, pode-se concluir não existir um forte e fundado juízo de prognose de não voltar a praticar actos delituosos e, por outro lado, da materialidade apurada há que concluir, igualmente, que não concorrem sérias razões no sentido de que, assim, se facilitará a reinserção do Recorrente, não resultando igualmente, com uma razoabilidade evidente, que daí possam resultar vantagens para a sua ressocialização.
13. O que, então, impede a aplicação do regime previsto no referido artigo 4.º do Decreto Lei 401/82.
14. Tal como decidiu o tribunal a quo ao não aplicar ao Recorrente o regime constante do art.º 4.º do DL n.º 401/82, de 23 de Setembro, atenta a gravidade do crime e as necessidades de prevenção geral e especial.
15. Os crimes praticados pelo Recorrente são puníveis, em abstracto, com pena de prisão de 1 a 8 anos (roubo previsto no art.º 210.º, n.º 1, do CP) e 1 mês até 2 anos ou com pena de multa de 10 a 240 dias (coacção, na forma tentada, p. e p. pelos arts.º 22.º, 23.º, 73.º e 154.º, n.ºs 1 e 2, do CP).
16. Na determinação da concreta medida das penas de prisão há que atender:
• À ilicitude dos factos, que é elevada;
• Ao dolo, que é directo e intenso;
• Às exigências de prevenção geral deste tipo de crimes, que são especialmente prementes, atenta a sua natureza, a gravidade das suas consequências nos ofendidos e de prevenção especial, atento a necessidade de afastar o arguido da prática de novos crimes.
• A que o arguido, em audiência de julgamento, não demonstrou a interiorização da gravidade das suas condutas.
17. Tudo ponderado, entendeu o tribunal a quo aplicar ao arguido a pena de:
• 2 anos de prisão quanto ao crime de roubo – muito perto do mínimo legal -;
• 8 meses de prisão quanto ao crime de tentativa de coacção – abaixo do meio da pena aplicável em abstracto -.
18. E, operando o cúmulo jurídico entre estas penas, aplicar a pena única de 2 anos e 3 meses de prisão.
19. A qual se mostra adequada e proporcional.
20. Tendo em consideração o que ficou referido, designadamente os antecedentes criminais do Recorrente, a personalidade do Recorrente e demais circunstâncias do caso, não foi possível ao tribunal a quo emitir um juízo de prognose favorável e concluir que a simples ameaça de execução da pena seria bastante para o impedir de cometimento de novos crimes.
21. A segurança individual e colectiva merecem ser olhadas à escala real considerando a frequência do crime de roubo e seus maus efeitos.
22. Para além de que, quem os pratica carece de acentuada emenda cívica e não de tratamento benevolente.
23. Há, assim, que concluir pela necessidade de aplicação de uma pena de prisão efetiva.
24. No mais, não se mostrará violado qualquer preceito legal nem desrespeitado qualquer direito.
25. Nesta conformidade, negando-se provimento ao recurso e mantendo-se o douto acórdão recorrido, será feita justiça.
4. Parecer
Nesta Relação, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer, no sentido da improcedência dos recursos e manutenção do acórdão recorrido, acompanhando a resposta da Digna Magistrada do Ministério Público junto da 1.ª Instância nesse mesmo sentido.
5. Cumprido o disposto no art. 417.º, n.º 2 do Código de Processo Penal, foi apresentada resposta por ambos os recorrentes, reiterando, no essencial, cada um deles, tudo quanto deixaram dito nas suas alegações e conclusões.
6. Colhidos os vistos, foram os autos à conferência.
Cumpre apreciar e decidir.
II – Fundamentação
1. Objeto do recurso
De acordo com o estatuído no art.º 412.º do CPP e com a jurisprudência fixada pelo Acórdão do Plenário da Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça n.º 7/95, de 19 de outubro de 1995, o âmbito do recurso é definido pelas conclusões que o recorrente extrai da respetiva motivação, que delimitam as questões que o tribunal ad quem deve apreciar, sem prejuízo das que sejam conhecimento oficioso, mormente os vícios enunciados no art. 410.º n.º 2 CPP.
No caso concreto, conforme as conclusões das respetivas motivações, cumpre apreciar as seguintes questões:
• Da aplicação do regime penal especial para jovens – DL n.º 401/82 de 23 de setembro;
• Do quantum das penas de prisão;
• Da suspensão da execução das penas.
2. Do acórdão recorrido
2.1. O tribunal a quo deu como provada e não provada a seguinte factualidade (transcrição):
1. Factos Provados
1. No dia 24.01.2022, entre as 12h30 e as 13h00, os arguidos AA e BB planearam que iriam, em comunhão de esforços e intentos, abordar terceiros, sobretudo adolescentes, em locais isolados, sem casas nem pessoas por perto, com o propósito de se apoderarem dos objectos e valores que estes tivessem consigo, com recurso a força física se necessário, e fazerem-nos seus.
2. Em execução desse plano por ambos previamente traçado, os arguidos deslocaram-se à ..., sita na área de ....
3. Aí chegados, os arguidos deslocaram-se para junto do elevador existente na passagem aérea daquela estação de comboios, junto da saída para ....
4. Nessas circunstâncias de tempo e lugar, os arguidos avistaram o ofendido CC, que se encontrava sozinho junto do referido elevador, formulando o propósito de se apoderarem dos objectos e valores que o mesmo tivesse na sua posse e fazerem-nos seus.
5. Em execução de tal propósito, os arguidos deslocaram-se em direcção do ofendido, alcançando-o.
6. No momento em que se aproximaram do ofendido, os arguidos rodearam-no e perguntaram-lhe se tinha dinheiro.
7. De imediato, os arguidos, em conjugação de esforços e intentos, agarraram com força na carteira do ofendido e, com um forte puxão, arrancaram-na da posse dele.
8. Já na posse dessa carteira, os arguidos retiraram as moedas que se encontravam no seu interior e apropriaram-se das mesmas.
9. Após os arguidos ordenaram ao ofendido que os acompanhasse até à moradia devoluta existente na ..., em ..., área desta comarca.
10. Nessa sequência, e por temer pela sua integridade física e vida, tendo em conta o tipo de abordagem, a estatura dos arguidos e a sua superioridade numérica, o ofendido, que se encontrava sozinho, acatou a ordem, acompanhando os arguidos até ao referido local, não oferecendo resistência, mas caminhando contra a sua vontade.
11. Aí chegados, os arguidos, em conjugação de esforços e intentos, ordenaram ao ofendido que despisse a roupa que trajava e que lhes entregasse a mesma, juntamente com os objectos que tivesse em seu poder.
12. Nessa sequência, e por temer pela sua integridade física e vida, o ofendido acatou, entregando, contra a sua vontade, os objectos infra discriminados, no valor total de 570€ (quinhentos e setenta euros), aos arguidos:
- um telemóvel, da marca OPPO FIND, modelo X3 5 G, preto, com o IMEI ..., que operava com o cartão da operadora Vodafone com o número ..., no valor de 350 € (trezentos e cinquenta euros);
- um fato-de-treino de cores cinza e preta, da marca Nike, modelo Hibrid Fleece, no valor de 130€ (cento e trinta euros);
- um par de ténis de cor preta, da marca Nike, modelo semelhante ao Court Vison, no valor de 40€ (quarenta euros);
- um gorro;
- um par de luvas, da marca Nike, de cor preta, no valor de 30€ (trinta euros);
- um par de auscultadores, da marca Xiaomi, modelo AirDots, de cor preta, no valor de 20€ (vinte euros).
13. Em seguida, os arguidos exigiram ao ofendido que lhes exibisse os seus documentos de identificação, o qual acatou.
14. Nesse instante, os arguidos, utilizando o aparelho telefónico que tinham na sua posse, tiraram fotografia aos documentos de identificação do ofendido, dizendo-lhe, em simultâneo, que, caso fizesse queixa, iriam atrás dele.
15. Já na posse dos referidos objectos, os arguidos, em conjugação de esforços e intentos, abandonaram o referido local, encetando fuga apeada, levando-os consigo e, dessa forma, fizeram-nos seus.
16. Ao actuarem do modo descrito, os arguidos agiram com o propósito, concretizado, de, mediante a imobilização e a intimidação, através da superioridade numérica e do elemento surpresa, visando assim anular qualquer resistência por parte do ofendido, se apropriarem das peças de roupa e dos demais referidos objectos que o ofendido tinha consigo, pretendendo integrá-los nos seus patrimónios, bem sabendo que tais objectos não lhes pertenciam e que agiam contra a vontade do seu legítimo dono.
17. Ao actuarem do modo descrito nos pontos 13.° a 15.°, dizendo-lhe o referido no ponto 14.° com firmeza e seriedade, os arguidos agiram com intenção de convencer o ofendido de que efectivariam o prometido, de forma adequada a fazê-lo recear pela sua integridade física e a afectar a sua liberdade de determinação, com o propósito de o constranger a não apresentar queixa contra os mesmos junto das autoridades judiciais e a não colaborar com estas, o que não lograram por circunstâncias inteiramente alheias às vontades dos arguidos.
18. Os arguidos agiram sempre de forma livre, voluntária e conscientemente, de comum e prévio acordo e em comunhão de esforços e intentos, cada um aceitando os resultados das condutas do outro, bem sabendo serem as suas condutas proibidas e punidas por lei.
19. O arguido AA já foi condenado:
- pela prática, em 06.05.2021, de um crime roubo, na pena de 4 meses de prisão, substituída por 120 dias de multa, à taxa legal de 5 €, por sentença proferida em 25.05.2021, transitada em julgado em 24.06.2021; esta pena extinguiu-se, pelo pagamento, em 23.08.2021 (Proc. n.º 379/21.0PHSNT do Juízo Local de Pequena Criminalidade de Sintra - Juiz 1);
- pela prática:
- no dia 27.01.2022, de três crimes de roubo, p. e p. pelos arts. 14.º, n.º 1, 26.º e 210.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 1 ano de prisão por cada um;
- no dia 27.01.2022, de um crime de roubo tentado, p. e p. pelos arts. 22.º, als. b) e c), 23.º, 26.º, 73.º e 210.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 7 meses de prisão;
- no dia 26.01.2022, de três crimes de roubo, p. e p. pelos arts. 14.º, n.º 1, 26.º e 210.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 1 ano de prisão por cada um.
Em cúmulo jurídico dessas penas, foi condenado na pena única de 3 anos e 6 meses de prisão efectiva, por acórdão transitado em julgado em 15.11.2023 (Proc. n.º 50/22.6PXLSB do Juízo Central Criminal de Lisboa - Juiz 16).
20. O arguido BB já foi condenado:
- pela prática, em Julho de 2021, de dois crimes de roubo, p. e p. pelo art. 210.º, n.º 1, do Código Penal, na pena única de 2 anos e 8 meses de prisão, suspensa na sua execução, com sujeição a regime de prova, por igual período de tempo, por acórdão proferido em 03.02.2023, transitado em julgado em 07.03.2023 (Proc. n.º 726/21.5PHSNT do Juízo Central Criminal de ... - Juiz 3);
- pela prática, em 25.08.2021, de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelos arts. 2.º, n.º 1, al. m), 3.º, n.º 2, al. ab), e 86.º, n.º 1, al. d), da Lei n.º 5/2006, de 23.02, na pena de 120 dias de multa, à taxa diária de 5 €, por sentença proferida em 15.02.2023, transitada em julgado em 17.03.2023; esta pena extinguiu-se, pelo pagamento, em 25.03.2023 (Proc. n.º 320/21.0PDOER do Juízo Local Criminal de Oeiras - Juiz 2);
- pela prática, em 22.04.2022, de dois crimes de roubo, p. e p. pelo art. 210.º, n.º 1, do Código Penal, e de um crime de roubo agravado, p. e p. pelo art. 210.º, n.ºs 1 e 2, al. b), com referência ao art. 204.º, n.º 2, al. f), do Código Penal, na pena única de 4 anos e 6 meses de prisão, suspensa na sua execução, com sujeição a regime de prova, por igual período de tempo, por acórdão proferido em 21.03.2023, transitado em julgado em 20.04.2023 (Proc. n.º 622/22.9PDAMD do Juízo Central Criminal de ... - Juiz 4);
- pela prática:
- no dia 27.01.2022, de três crimes de roubo, p. e p. pelos arts. 14.º, n.º 1, 26.º e 210.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 1 ano de prisão por cada um;
- no dia 27.01.2022, de um crime de roubo tentado, p. e p. pelos arts. 22.º, als. b) e c), 23.º, 26.º, 73.º e 210.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 7 meses de prisão;
- nos dias 22 e 24.01.2022, de quatro crimes de roubo agravados, p. e p. pelos arts. 14.º, n.º 1, 26.º e 210.º, n.ºs 1 e 2, com referência ao art. 204.º, n.º 2, al. f), do Código Penal, na pena de 1 ano e 8 meses de prisão por cada um.
Em cúmulo jurídico dessas penas, foi condenado na pena única de 4 anos e 3 meses de prisão efectiva, por acórdão transitado em julgado em 15.11.2023 (Proc. n.º 50/22.6PXLSB do Juízo Central Criminal de Lisboa - Juiz 16).
21. O arguido AA nasceu em ........2004, na ..., e tem nacionalidades ... e portuguesa; não tem filhos.
22. Imigrou para Portugal em 2011, com cerca de 7 anos.
23. Em …2022 adquiriu a nacionalidade portuguesa.
24. O pai, falecido há 5 anos, foi figura ausente da sua vida.
25. A mãe e a avó emigraram para Portugal há cerca de 12 e 20 anos, respectivamente, procurando melhores condições de vida.
26. Em Portugal, AA passou a viver na zona de ..., num contexto socioeconómico estável, com a mãe, que tinha então um negócio de …
27. Em 2019, AA acompanhou a família, constituída pela mãe, pelo padrasto e por uma irmã uterina, no processo de emigração para a ....
28. AA regressou a Portugal de férias, altura em que incrementou o convívio com pares marginais, incumprindo horários impostos pela família, contexto em que ocorreram os factos que determinaram os seus contactos com a justiça penal.
29. À data dos factos supra descritos a que se refere este processo, residia com amigos; devido à sua recusa em cumprir as orientações e regras determinadas pela família, nomeadamente ao nível do cumprimento de horários, estava incompatibilizado com esta.
30. Actualmente, cumpre a pena única de prisão em que foi condenado no Proc. n.º 50/22.6PXLSB, à ordem do qual está privado da liberdade desde 28.01.2022, verificando-se desde então e por isso uma reaproximação a familiares.
31. A mãe e o padrasto continuam a residir na ..., pretendendo AA juntar-se-lhes logo que possível, objectivo que acolhe a aprovação da avó; todavia, a mãe não atendeu a tentativa de chamada feita pela DGRSP no âmbito da elaboração do relatório social, pelo que se desconhece a sua disponibilidade para o apoiar.
32. Em Portugal, AA conta com o apoio dos avós maternos, que residem em zona residencial suburbana, calma, sem problemáticas sociais específicas, num apartamento de tipologia 3, adquirido por aqueles mediante empréstimo bancário; a casa é composta por três quartos, um dos quais para AA, uma cozinha e casa-de-banho, tendo boas condições de habitabilidade; a presença do arguido AA não suscita reacções adversas dos vizinhos.
33. O seu percurso escolar iniciou-se em Portugal até ao 8.° ano; na ... deu continuidade aos estudos; sem dificuldades de aprendizagem, aquele percurso alterou-se a partir do 7.° ano, altura em que AA começou a faltar às aulas para estar com os colegas; teve então numa retenção; era tendencialmente agitado e teve situações de conflitos com colegas, em contexto de jogo, que conduziram a situações de sanção disciplinar; na ..., sentiu dificuldades com a língua, em particular na escrita, tendo beneficiado de apoio/orientação de um técnico ao nível do planeamento do percurso escolar.
34. Não tem experiência profissional.
35. Sem rendimentos próprios, AA depende do apoio dos familiares; a sua avó explora uma mercearia de produtos africanos, o que lhe proporciona uma situação económica estável, e está receptiva a suportar os custos daquele.
36. No que respeita a actividades de tempos livres, AA praticou … no "...” e mais tarde passou a praticar ..., em diferentes clubes, o último dos quais em ....
37. À data dos factos supra descritos a que se refere este processo não praticava nenhuma modalidade e não tinha actividade laboral nem formativa; nessa altura recusava a supervisão familiar e geria o seu dia-a-dia em função dos seus interesses, de forma ociosa, acompanhando outros jovens com idêntico estilo de vida, sendo permeável à influência de pares com comportamentos marginais.
38. Tem boas capacidades cognitivas e de comunicação, sabendo expor os seus pontos de vista.
39. Vive a sua actual privação de liberdade com pesar e ansiedade.
40. No estabelecimento prisional, apresenta uma sanção disciplinar de 30 dias de permanência obrigatória no alojamento, por factos ocorridos em Julho de 2023.
41. Revela tendência para em situações de tensão ou conflito com os pares reagir de modo impulsivo, para tomar opções em função de interesses pessoais e da necessidade de satisfação imediata, tem uma atitude autocentrada e reduzido juízo crítico relativamente aos factos supra descritos a que se refere este processo.
42. O arguido BB nasceu em ........2005, em ..., e tem nacionalidade ..., sendo titular do passaporte n.° ...; não tem filhos.
43. É o único filho da relação vivida entre seus pais; o seu nascimento do ocorreu na fase de namoro daqueles que casaram em ....
44. Tem dois irmãos consanguíneos, com 16 e 15 anos de idade, fruto de outras relações ocasionais do pai, o que foi perturbador para a relação conjugal dos pais, que, apesar disso, se mantém.
45. O seu contexto familiar de origem proporcionou-lhe condições materiais e educacionais de desenvolvimento; teve uma infância feliz e tranquila; beneficia de um contexto sociofamiliar apoiante e comprometido com as normas e regras de vida em sociedade; apesar da instabilidade conjugal vivida pelos seus pais em certos momentos, encontra nas figuras parentais referências seguras e afectuosas.
46. Até 2019, viveu em ..., com os pais.
47. A mudança de ... para Portugal, em 2019, ocorreu por opção da mãe, de 40 anos, licenciada em …, que tinha como objectivo realizar mestrado em …; o seu pai continua a residir em ..., os contactos com o mesmo ocorrem via telefone e redes sociais e a mãe visita o país de origem e o cônjuge uma a duas vezes por ano.
48. BB acompanhou a avó materna e a mãe naquele projecto de imigração; inicialmente, ficaram a residir em Lisboa, no agregado familiar da avó materna, que era constituído por esta, um tio e sua mulher e duas primas, menores de idade.
49. Em Portugal, ingressou no 9.º ano de escolaridade na Escola ..., e concluiu-o, tendo até então sido um aluno médio, sem reprovações.
50. Iniciou o consumo de haxixe, em resina e em folhas, pouco tempo depois de ter chegado a Portugal, no contexto do grupo de pares; estes consumos eram realizados com regularidade diária, sem conhecimento da mãe.
51. Subsequentemente, a mãe inscreveu-o no 10.º ano de escolaridade numa escola no ...; passado pouco tempo, ainda durante o 1.° período, BB desistiu e abandonou a escola, por desmotivação e desinteresse, no contexto da influência do seu grupo de pares.
52. Posteriormente, a sua mãe arrendou habitação no ... e BB, embora contrariado, acompanhou-a para essa morada.
53. O mesmo manifestava problemas de comportamento, nomeadamente faltava à escola, ausentava-se de casa sem autorização da mãe e permanecia vários dias em parte incerta sem a contactar, numa atitude autocentrada e de satisfação imediata dos seus impulsos e necessidades.
54. Nestas ausências, BB acompanhava amigos e namorada nas zonas da ... e linha de ..., alguns dos quais com comportamentos desviantes.
55. Esteve ausente desde Novembro de 2021 a Fevereiro de 2022, sem dar notícias à mãe, que só o conseguiu encontrar após contactar com outros jovens que o conheciam e tinham contacto com ele; o mesmo estava em casa da namorada, sita na zona da ..., num bairro social.
56. Após "negociação” da mãe com o filho, e para que este regressasse a casa, acordaram que durante a semana o mesmo ficaria em casa da namorada e aos fins-de-semana iria com esta para casa da mãe, no ....
57. A casa da mãe é arrendada e tem um quarto, uma sala, uma casa- de-banho e uma cozinha; o arguido dormia no quarto e a mãe na sala; no ..., o mesmo tinha amigos, na generalidade com comportamentos pró-sociais.
58. Porém, BB passava mais tempo em Lisboa, onde acompanhava com outros jovens de idade próxima da sua e com idênticos comportamentos desviantes.
59. Economicamente, é o pai que assegura a sua subsistência em Portugal, enviando um valor variável entre os 500€ e os 700€.
60. O pai é técnico superior de recursos humanos numa empresa pública e possui uma situação financeira confortável.
61. A mãe já teve experiências laborais em Portugal, mas actualmente está desempregada e apenas focada no mestrado.
62. A situação económica é percepcionada como suficiente para assegurar as necessidades básicas da família.
63. BB foi preso preventivamente em 27.04.2022 e actualmente cumpre a pena única de prisão em que foi condenado no Proc. n.° 50/22.6PXLSB do Juízo Central Criminal de Lisboa - Juiz 16.
64. Vive a sua situação jurídico-penal com conformismo, embora com tristeza pelo sofrimento causado à mãe.
65. A mãe demonstra envolvimento afectivo com o mesmo e adopta uma postura crítica face às opções e condutas do filho que o conduziram à actual situação; demonstra incondicional disponibilidade para o apoiar, o que contribui para a respectiva estabilidade emocional; em contexto prisional, visita-o com regularidade e envia-lhe semanalmente cerca de 20 € para que vá à cantina e carregue o cartão de telefone.
66. BB participa nas actividades de … e ..., dinamizadas pelo ....
67. Não tem experiência profissional; tenciona dar continuidade aos estudos, a fim de concluir o 12.° ano.
68. Ocupa o seu tempo a ler e, sempre que possível, no convívio com os seus amigos/conhecidos dentro do estabelecimento prisional, jovens que já conhecia de, quando em liberdade, com eles conviver em contexto de festas e socialização.
69. No estabelecimento prisional, não apresenta consumos de drogas, mas apresenta registo disciplinar.
70. Tem boa capacidade de comunicação interpessoal.
71. Tem facilidade em fazer novos amigos.
72. Mantém a tendência para se autocentrar na procura da satisfação imediata dos seus desejos e necessidades e reduzido juízo crítico, com fraca reflexão sobre o desvalor do comportamento criminal.
*
73. Os arguidos não manifestaram real arrependimento relativamente às suas condutas, acima descritas, a que se refere este processo.
Factos não provados
a. aquando do descrito no ponto 17.° dos factos provados, os arguidos actuaram de forma adequada a fazer CC recear pela sua vida;
b. o arguido AA é titular da autorização de residência n.° ….
***
3. Apreciando
3.1. Da aplicação do regime penal especial para jovens – DL n.º 401/82 de 23 de setembro
Na determinação da medida concreta da pena avaliou o tribunal a quo que, à data da prática dos factos, ambos os arguidos tinham menos de 21 anos, equacionando a possibilidade de lhes ser aplicado o Regime Especial dos Jovens Delinquentes consagrado pelo DL n.º 401/82, de 23 de setembro, em cujo artigo 4.º se prevê que se ao caso for aplicável pena de prisão, deve o juiz atenuar especialmente a pena nos termos dos artigos 72.° e 73.°do Código Penal, quando tiver sérias razões para crer que da atenuação resultem vantagens para a reinserção social do jovem condenado.
Estamos perante situações excecionais, em que dos contornos do caso é possível concluir que o jovem condenado beneficiará, em termos de reinserção social, com a atenuação especial da pena.
Esse entendimento tem sido consagrado na generalidade da jurisprudência segundo a qual a aplicação da atenuação especial prevista no citado diploma supõe a prova de que esse regime irá propiciar melhor o afastamento do crime, especialmente por este ser uma simples decorrência da idade do agente.
Contudo, o regime em apreço não é nem de aplicação automática nem de aplicação obrigatória.
Ao invés, pressupõe um juízo de prognose, a formular sobre a existência de vantagens para a reintegração na sociedade do jovem condenado, a propósito do qual devem ser tidas em conta todas as circunstâncias atinentes à ilicitude do facto (gravidade e suas consequências), à culpa (tipo e intensidade do dolo e fins que subjazem ao ilícito) e às necessidades de pena, sempre tendo em conta a personalidade do jovem delinquente e suas condições pessoais, com relevância no que concerne ao comportamento anterior e posterior aos factos.
Ou seja, a avaliação das vantagens da atenuação especial da pena para a reinserção do jovem delinquente tem de ser verificada em face das circunstâncias concretas do caso e o percurso de vida do arguido.
No caso em apreciação, o tribunal não atenuou especialmente as penas, o que justificou do seguinte modo:
“Ponderando as condenações que os arguidos já registam - as do arguido AA relativas a crimes cometidos um antes e os demais depois daqueles a que respeitam os presentes autos e objecto condenações uma já anterior e a outra posterior à prática destes; as do arguido BB relativas a crimes cometidos uns antes e outros depois daqueles a que respeitam os presentes autos e objecto de condenações posteriores à prática destes -, continuando ambos a revelar fraco juízo crítico quanto às condutas criminosas aqui em causa, levadas a cabo com determinação e capacidade criminosas que, como referido, até há poucos anos apenas se encontravam em criminosos mais velhos e a respeito das quais não manifestaram efectivo arrependimento, e não tendo qualquer deles um rumo sério de vida - não demonstraram um empenhamento sincero, digno e decisivo nas suas vidas, não obstante as condições favoráveis de que beneficiaram, os (infrutíferos) esforços das respectivas famílias para conter os seus comportamentos desviantes e a privação da liberdade entretanto sofrida -, apesar de na data da prática dos factos terem respectivamente 17 e 16 anos de idade, entende este tribunal não ser de aplicar o disposto no art. 4.° do Decreto-Lei n.° 401/82, de 23.09 (regime de jovens adultos criminosos) e, por isso, não atenua especialmente as penas, precisamente por as circunstâncias que se lhes referem não permitirem realmente crer que esta atenuação possibilita mais facilmente a respectiva reinserção social (nenhum juízo de prognose desta natureza é possível efectuar de forma clara).”
Ora, olhando a essa exaustiva fudamentação, que encontra suporte efetivo nos autos, e ponderando essencialmente aquilo que se conhece sobre as condenações sofridas por qualquer um dos arguidos recorrentes (o arguido AA regista antecedentes criminais com condenações anterior e posterior aos factos respeitantes aos presentes autos; o arguido BB regista antecedentes criminais com condenações posteriores aos factos aqui em causa, relativas a crimes cometidos uns antes e outros depois destes), não se vislumbram, à semelhança da decisão recorrida, sérias razões para crer que da atenuação resultam vantagens para a reinserção dos arguidos.
No sentido inverso, antes se considera que a sujeição dos arguidos a uma pena decorrente da não atenuação melhor contribuirá para os fins das penas em concreto, desde logo pela sua maior morosidade no cumprimento.
Nessa medida, improcedem os recursos nesta parte.
3.2. Do quantum das penas
Sem prejuízo do exposto no sentido da não aplicação do disposto no art. 4.º do DL n.º 401/82, de 23.09, apelam ainda os recorrentes para a redução das penas em que se mostram condenados.
Tendo presente ser a essa a questão que importa decidir, cumpre avaliar se é caso de intervenção, alterando a pena aplicada na 1ª instância.
Partindo de molduras penais abstratas equivalentes a prisão de 1 a 8 anos para o crime de roubo, e prisão de 1 mês até 2 anos ou multa de 10 a 240 dias (multa que afastou) para o crime de tentativa de coação, considerou o tribunal a quo adequadas as seguintes penas:
Quanto ao arguido AA:
- 2 anos e 3 meses de prisão quanto ao crime de roubo;
- 9 meses de prisão quanto ao crime de tentativa de coacção.
E, operando o cúmulo jurídico entre estas penas, aplicou a pena única de 2 anos e 6 meses de prisão.
Quanto ao arguido BB:
- 2 anos de prisão quanto ao crime de roubo;
- 8 meses de prisão quanto ao crime de tentativa de coacção.
E, operando o cúmulo jurídico entre estas penas, aplicou a pena única de 2 anos e 3 meses de prisão.
Como é sabido as finalidades de aplicação de uma pena decorrem essencialmente da necessidade de tutela dos bens jurídicos e da preocupação em se atingir a reinserção do agente na comunidade - artigos 40.º e 71.º, ambos do Código Penal. Posto que, se terá de atender ao art. 71.º do Código Penal, que dispõe, no seu n.º 1, que a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, far-se-á em função da culpa do agente, tendo ainda em conta as exigências de prevenção.
No que respeita ao relacionamento entre aqueles dois critérios, defende Figueiredo Dias (in Direito Penal Português - As Consequências Jurídicas do Crime, Aequitas, Editorial Notícias, 1993, pág. 215), que à culpa compete fornecer o limite máximo da pena que ao caso deve ser aplicada, sendo em função de considerações de prevenção geral de integração e especial socialização, que deve ser determinada abaixo daquele máximo, a medida da pena.
Segundo o art. 71.º, n.º 2 do Código Penal, “na determinação concreta da pena, o tribunal atende a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele (...)”. Com efeito, os princípios da proibição da dupla valoração e do ne bis in idem implicam que não sejam de novo apreciadas, em sede de medida concreta da pena, as circunstâncias que outrora foram consideradas a propósito do tipo de crime.
Nessa medida, o tribunal a quo analisou os factos praticados pelos arguidos com vista à subsunção dos mesmos dentro dos concretos fatores da medida da pena, tendo fundamentado nos seguintes termos:
“Neste caso, relativamente a ambos os arguidos e aos dois crimes por que neste processo serão condenados, as exigências de prevenção geral revelam-se elevadas, atendendo ao alarme social que deriva da respectiva prática, pela sua frequência, prejuízos, perigos e insegurança de tal decorrentes, cada vez mais associados à mão de jovens com determinação e capacidade criminosas que até há poucos anos apenas se encontravam em criminosos mais velhos, experientes e socialmente excluídos, e pelo grau de violência/ameaça/inibidor de reacção concretamente utilizado, de modo desembaraçado, hábil e persistente - começando, como previamente planeado, em situação muito próxima do preenchimento da agravante prevista na al. b) do n.º 2 do art. 210.º por referência à al. b) do n.° 1 do art. 204.º do Código Penal e evoluindo com a forçada deslocação do ofendido para local mais isolado, onde para além do prosseguimento do roubo foi levada a cabo a descrita tentativa de coacção -, o que cada vez mais se generaliza e implica uma particular necessidade de afirmação das normas violadas.
As consequências dos crimes revelam-se de média intensidade, pelos bens subtraídos e pela violência/ameaça/forma de colocação na impossibilidade de resistir usadas, considerados também de forma conjugada.
Relativamente às exigências de prevenção especial, quanto a ambos os arguidos, constata-se que se revelam medianas a elevadas (apesar da tão jovem idade de ambos, e mais ainda quanto ao arguido AA tendo em conta a condenação que já registava quando praticou os crimes aqui em causa), considerando a insistência na respectiva actividade criminosa, a globalidade dos seus antecedentes criminais, nos termos expostos, a determinação por eles revelada nas circunstâncias e no modo de execução dos crimes, a ausência de real arrependimento e o fraco juízo crítico manifestados até ao presente apesar da privação da liberdade entretanto sofrida, as verificadas características das respectivas personalidades, com reflexo na prática dos factos em causa, a ausência de inserção laboral e formativa e a sua débil inserção social, apesar das condições favoráveis que as respectivas famílias empenhadamente lhes proporcionaram, não só do ponto de vista do conforto, mas sobretudo para que interiorizassem normas básicas de vida em família e em sociedade e para que se afastassem de contextos e comportamentos socialmente desviantes, criminógenos e criminosos.
Na determinação da medida da pena devem ser tidas em conta, de acordo com o disposto no art.º 71.º, n.º 1, do Código Penal, a culpa do agente e as exigências de prevenção, não podendo, em caso algum, a pena ultrapassar a culpa do agente (art.º 40.º, n.º 2, do Código Penal).
No presente caso, verifica-se que a culpa dos arguidos foi elevada (mais ainda a do arguido AA, atendendo à condenação que já registava), considerando que a sua actuação não foi meramente pontual e impulsiva (como evidencia a globalidade dos seus antecedentes criminais e o modo de execução das condutas aqui em causa), mas sim pré-determinada, com denodo e persistência, com dolo directo e intenso, sem que qualquer deles tivesse carências de ordem económica ou de enquadramento familiar que contextualizassem os seus comportamentos criminosos, antes tendo optado por sistematicamente seguir esse rumo, não por causa da sua juventude (na qual se poderia enquadrar uma actuação que fosse pontual e impulsiva), mas sim apesar dela (onde se enquadraram as que com planeamento maturado e execução hábil levaram a cabo).
Dessa forma, analisada por nós a fundamentação exarada pela primeira instância quanto à medida da pena, afigura-se-nos que o tribunal a quo individualizou, de forma correta, as diversas circunstâncias relevantes, tendo em conta que as exigências de prevenção geral são inquestionavelmente elevadas, e com elas confluem efetivas exigências de prevenção especial.
Mais ponderou, de forma igualmente equitativa, “a idade dos arguidos, os seus antecedentes criminais - a globalidade dos crimes praticados, as respectivas datas e as das suas condenações -, o demais verificado quanto à respectiva situação pessoal, com destaque para as circunstâncias de vida de cada um dos arguidos até à data dos factos e até ao presente, para a falta de verdadeiro arrependimento e para o fraco juízo crítico evidenciados, os bens em causa e o respectivo valor e a violência/ameaça/modo de colocação na impossibilidade de resistir utilizados”.
Todos aqueles fatores foram detalhadamente analisados pelo tribunal a quo de modo ao não se lhe apontarem distorções.
O mesmo se diga quanto às penas encontradas em cúmulo.
Ou seja, dentro da moldura encontrada (de 2 anos e 3 meses a 3 anos de prisão quanto ao arguido AA; de 2 anos a 2 anos e 8 meses de prisão quanto ao arguido BB), e “considerando o conjunto de todos os factos, designadamente, a natureza dos crimes cometidos, a violência/ameaça/forma de colocação na impossibilidade de resistir utilizadas, os antecedentes criminais dos arguidos, o demais explanado quanto à respectiva situação pessoal, com o já mencionado reflexo nas exigências de prevenção especial verificadas quanto a cada um dos arguidos, não obstante a sua juventude e sem prejuízo da consideração desta, atenta também a desenvoltura e/ou propensão evidenciada para a comissão de crimes contra o património e violentos, com manutenção de reduzido juízo crítico e sem real arrependimento, como já explanado, e tendo em conta que são fortes as exigências de prevenção geral destes delitos, causadores de alarme social crescente, a fim de se restaurar, na medida do possível, a segurança de cada um e dos seus bens e de realmente possibilitar a reinserção social dos arguidos”, fixou o tribunal a quo as respetivas penas únicas, as quais se mostram justas, adequadas às finalidades de prevenção, e proporcionais à culpa e personalidade do arguidos/recorrentes.
São, pois, de manter, porquanto não reclamam qualquer correção.
3.3. Da suspensão da execução das penas
Os arguidos pugnam pela suspensão da execução das penas de prisão em que se mostram condenados.
De acordo com o disposto no artigo 50.º n.º 1 do Código Penal, o tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça de prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
E, segundo o n.º 5 da mesma disposição legal, o período de suspensão é fixado entre um e cinco anos.
Perante este regime qualquer uma das penas, por não ultrapassar 5 (cinco) anos de prisão, é suscetível de suspensão.
Não obstante, assim não o considerou o tribunal a quo, o que fundamentou nos seguintes termos:
“No presente caso, verifica-se que os arguidos, apesar da sua juventude, têm os descritos antecedentes/percursos criminais, também por crimes violentos e contra o património, que quando o arguido AA cometeu os crimes pelos quais aqui será condenado já tinha sido condenado pela prática de um crime de roubo e que depois praticou mais crimes dessa natureza, que quando o arguido BB cometeu os crimes pelos quais aqui será condenado já tinha praticado dois crimes de roubo e um de detenção de arma proibida e depois continuou a praticar crimes de roubo, tentado e consumados, simples e agravados, embora por eles só tivesse sido condenado por decisões posteriores aos factos aqui em causa, que têm destacada gravidade pela pré-disposição e planeamento envolvidos na sua preparação e execução, levadas a cabo com desenvoltura e persistência nas descritas circunstâncias, tendo praticado os crimes pelos quais aqui serão condenados num contexto de vida em que não lhes faltava o essencial para viverem confortavelmente, sem que se possa afirmar qualquer evolução do reduzido juízo crítico evidenciado na sua prática e sem real arrependimento (que, como referido, não se confunde com a sua mera verbalização, com tristeza pelos efeitos para si e para os seus ou com anseio de liberdade), não revelando até ao presente consistente vontade de alterar o rumo e enquadramento que decidiram dar às suas vidas, apesar dos esforços contentores das respectivas famílias e da privação da liberdade entretanto sofrida, permanecendo ambos com uma atitude sobretudo autocentrada, o que leva o tribunal a concluir que não basta a simples censura dos factos e a ameaça da pena para o prevenir do cometimento de mais crimes.
Igualmente nos termos do referido art. 50.º, n.º 1, a suspensão da execução da pena de prisão deve mostrar-se adequada e suficiente à defesa do ordenamento jurídico que o caso concreto requer.
Estamos perante crimes que assumem gravidade também pelo alarme geral que provocam, como supra explanado, pelo que, neste caso, em particular, atendendo às suas circunstâncias e ao já exposto quanto aos arguidos, se conclui que também as exigências de prevenção geral só ficam adequada e suficientemente realizadas com a aplicação a ambos os arguidos de penas efectivas de prisão (neste sentido o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13 de Dezembro de 2007, integral em www.dgsi.pt “...Assim, se a admissibilidade da suspensão da execução da pena de prisão não está suficientemente justificada numa perspectiva de prevenção especial e colide com as exigências de prevenção geral, não é de suspender a execução da pena única de 5 anos de prisão imposta ao recorrente”).
Por conseguinte, as penas únicas de prisão em que os arguidos aqui vão ser condenados serão efectivas.”
Subscrevendo nós a argumentação expendida pelo tribunal a quo de modo a concluir pela não suspensão das penas de prisão, somos particularmente atentos aos antecedentes registados pelos recorrentes, que não justificam nem permitem tratamento benevolente, mas antes reclamam, pela necessidade de prevenir o cometimento de futuros crimes, acentuada emenda cívica.
Destarte, não se pode dizer que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
Assim considerando, julgamos que a execução da prisão é exigida quanto a ambos os recorrentes, nada havendo a alterar ao decidido pelo tribunal a quo.
Em suma, improcedem totalmente os recursos, não se mostrando violada qualquer disposição legal ou direito constitucionalmente protegido.
III – Decisão
Pelo exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar improcedentes os recursos interpostos pelos arguidos AA e BB, confirmando o acórdão recorrido.
Custas pelos recorrentes, fixando-se a taxa de justiça individual em 3 UC´s.
Notifique.
*
Lisboa, 24 de setembro de 2024
(texto processado e integralmente revisto pela relatora – artigo 94.º, n.º 2 do Código de Processo Penal)
Ester Pacheco dos Santos
Paulo Barreto
Manuel Advínculo Sequeira