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JUSTO IMPEDIMENTO
DOENÇA
ATESTADO MÉDICO
Sumário
I. A doença do advogado para constituir uma situação de justo impedimento tem de ser súbita/imprevisível e tão grave que o impossibilite, em absoluto, de praticar o ato, avisar o constituinte ou substabelecer o mandato. II. O atestado médico que declara a impossibilidade de exercício da profissão por parte do advogado, sem esclarecer a gravidade da doença ou desacompanhado de outros meios de prova que demonstrem essa gravidade, não é suficiente para se concluir pela existência de justo impedimento. III. O atestado médico que apenas declara que o advogado se encontra incapacitado de exercer a sua profissão por um período de duração provável da doença de 30 dias não permite concluir que a ali referida doença seja incapacitante da prática atempada do ato, tanto mais que “duração provável” não é mais do que isso, tão só uma mera probabilidade. Tal atestado médico não permite concluir até quando durou efetivamente o alegado impedimento. Se o atestado médico, com essa vaga redação, fosse idóneo para justificar o alegado justo impedimento, seria o mesmo que deixar na mão do advogado/requerente a escolha da data da cessação da alegada incapacidade, e, consequentemente, a escolha da data que melhor lhe aprouvesse para a prática do ato, desde que ficasse compreendida dentro dos referidos 30 dias de duração provável da doença, escolha essa, portanto, sem qualquer possibilidade de controlo por parte do tribunal. [sumário elaborado pela relatora]
Texto Integral
Acordaram, em conferência, na Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães:
I - RELATÓRIO
I.1 No âmbito do processo comum-coletivo, com o n.º 17/17...., que corre termos pelo Juízo Central Cível e Criminal de Bragança - Juiz ..., do Tribunal Judicial da Comarca de Bragança, mediante decisão proferida a 08-05-2024, foi:
® considerada manifesta a ausência de fundamento constitutivo de justo impedimento quanto à não apresentação tempestiva, pelo arguido/recorrente AA, do recurso apresentado do acórdão condenatório proferido nos autos, que não foi admitido por extemporaneidade.
I.2 Recurso da decisão
Inconformado com tal decisão, dela interpôs recurso o arguido AA para este Tribunal da Relação, com os fundamentos expressos na respetiva motivação, da qual extraiu as seguintes conclusões [transcrição]:
Em conclusão: 1ª - Verificando-se, como ocorreu, de justo impedimento, deverá o acto praticado (interposição do recurso) fora de prazo ser admitido. 2ª - Não se aceitando a interpretação subjectiva do despacho de que se recorre, que não aceita a alegação de tal justo impedimento. 3ª - Apesar de, o mesmo estar suficiente e inquestionavelmente comprovado pelo pertinente atestado médico. 4ª - Sendo que, o conhecimento de tal justo impedimento foi atempadamente comunicado ao tribunal. 5ª - A decisão de que se recorre é por isso violadora, das regras do artº 139.º e 140.º do C.P. Civil. 6ª – Devendo consequentemente ser revogada, decidindo-se pelo reconhecimento do alegado justo impedimento e admitir-se o recurso. (…)”.
I.3 Resposta ao recurso
Efetuada a legal notificação, o Ex.mo Sr. Procurador da República junto da 1.ª instância respondeu ao recurso interposto pelo arguido, pugnando pela sua improcedência, apresentando as seguintes conclusões [transcrição]: “(…) Termos em que se formulam as seguintes CONCLUSÕES: 1.º Pretende o recorrente a impugnação do douto Despacho proferido a 08.05.2024, sob a referência ...87, por via do qual foi indeferida a invocação de justo impedimento do ato de interposição de recurso apresentado em 11.04.2024 sob a referência ...86. 2.º Concordando-se com todos os argumentos expendidos no Despacho recorrido e, bem assim, também os já antes indicados na Promoção de 06.05.2024 com a referência ...03, entende o MINISTÉRIO PÚBLICO que, pela falta de demonstração mas também da própria alegação da impossibilidade absoluta para a prática do ato tempestivamente, bem como pela sua alegação já tardiamente após a prolação de Despacho de não admissão de recurso, este datado de 17.04.2024, não se verificam quaisquer fundamentos para se considere justificado o impedimento da Ilustre Defensora. 3.º Como se vem entendendo nos Tribunais superiores, “A doença para constituir justo impedimento terá de impossibilitar absolutamente a prática atempada do ato por razões que não sejam imputáveis ao requerente, o que sucederá quando a doença seja súbita, imprevisível e grave.” (assim se decidiu no Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 08.03.2021, relatado pelo Exmo. Sr. Juiz Desembargador Armando Azevedo no processo n.º 35/19.0GCBRG.G1 e, de resto, em idêntico sentido, entre muitos outros, os Acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa de 04.11.2021, proferido no processo n.º 32/14.1JBLSB-U.L1-9, relator Desembargador Calheiros da Gama e do Supremo Tribunal de Justiça de 13.07.2021, proferido no processo n.º 4044/18.8T8STS-C.P1.S1, relator Conselheiro Ricardo Costa). 4.º Não se demonstrando que a Ilustre Defensora do arguido ora recorrente tivesse estado absolutamente impossibilitada para a prática do ato, mais decorrendo que a mesma já o tinha previamente preparado e à disposição da sua colaboradora, e, mais ainda, não tendo sequer arguido o mesmo em tempo – aqui, leia-se, aquando da prática do ato em causa – entende-se não ser de se expender sobre o Despacho recorrido qualquer juízo de censura devendo, como tal, o mesmo manter-se incólume e, assim, julgar-se manifestamente improcedente o recurso ora interposto. 5.º Tanto mais que, atente-se, nem sequer a defesa usou do mecanismo ínsito ao artigo 405.º do Código de Processo Penal, apresentando reclamação contra o Despacho que não admitiu o recurso, procurando, agora, por esta via dilatória, obter reflexamente aquele efeito. 6.º Porém, V. Exas. decidindo farão, pois, e como sempre, a tão acostumada JUSTIÇA. (…)”.
I.4 Parecer do Ministério Público
Remetidos os autos a este Tribunal da Relação, nesta instância também o Exmo. Sr. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso, apresentando a seguinte conclusão [transcrição]: “(…) o despacho criticado, em toda a sua extensão, não merece qualquer censura, por haver recusado a existência de uma situação de justo impedimento, devendo, por isso, ser confirmado, negando-se, então, provimento ao recurso.(…)”.
I.5. Resposta
Dado cumprimento ao disposto no artigo 417º, n.º 2, do Código de Processo Penal, veio o arguido/recorrente apresentar resposta ao sobredito parecer, reiterando a posição vertida na peça recursiva.
I.6. Concluído o exame preliminar, prosseguiram os autos, após os vistos, para julgamento do recurso em conferência, nos termos do artigo 419.º do Código de Processo Penal.
Cumpre, agora, apreciar e decidir:
II- FUNDAMENTAÇÃO
II.1- Poderes de cognição do tribunal ad quem e delimitação do objeto do recurso:
Conforme decorre do disposto no n.º 1 do art.º 412.º do Código de Processo Penal, bem como da jurisprudência pacífica e constante [designadamente, do STJ[1]], são as conclusões apresentadas pelo recorrente que definem e delimitam o âmbito do recurso e, consequentemente, os poderes de cognição do Tribunal Superior, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso a que alude o artigo 410º do Código de Processo Penal[2].
Assim, face às conclusões extraídas pelo recorrente da motivação do recurso interposto nestes autos, as questões a apreciar e decidir são as seguintes:
® Saber se a situação dos autos configura justo impedimento e, na afirmativa, se o recurso apresentado pelo arguido/recorrente do acórdão condenatório proferido nos autos é, ou não, de admitir.
II.2- Da decisão recorrida [transcrição]:
“ Ref.ª Citius ...11 (30.04.2024): A Ilustre Defensora do arguido AA veio, na sequência do despacho que, por extemporaneidade, não admitiu o recurso pela mesma apresentado do acórdão condenatório proferido nestes autos, arguir o justo impedimento da prática atempada do acto por motivo de doença, tendo, para o efeito, juntado um atestado médico. O Ministério Público pronunciou-se pela falta de fundamento do requerido, pugnando pelo indeferimento liminar do mesmo, nos termos da douta promoção com a ref.ª Citius 26001203 (06.05.2024). Tudo visto. A questão colocada pela Ilustre Requerente enquadra-se no disposto nos art.ºs 107.º, n.ºs 2 e 3, do C.P.P., e 140.º, n.ºs 1 e 2, do C.P.C. Dispõe o art.º 107.º do C.P.P.: “2. Os actos processuais só podem ser praticados fora dos prazos estabelecidos por lei, por despacho da autoridade referida no número anterior, a requerimento do interessado e ouvidos os outros sujeitos processuais a quem o caso respeitar, desde que se prove justo impedimento. 3. O requerimento referido no número anterior é apresentado no prazo de três dias, contado do termo do prazo legalmente fixado ou da cessação do impedimento”. O art.º 140.º do C.P.C., preceitua o seguinte: “1. Considera-se «justo impedimento» o evento não imputável à parte nem aos seus representantes ou mandatários que obste à prática atempada do ato. 2. A parte que alegar o justo impedimento oferece logo a respetiva prova; o juiz, ouvida a parte contrária, admite o requerente a praticar o ato fora do prazo se julgar verificado o impedimento e reconhecer que a parte se apresentou a requerer logo que ele cessou”. No caso vertente, a Ilustre Requerente remeteu ao processo o requerimento com a ref.ª Citius 2448286, com a sua assinatura certificada electronicamente e a data certificada “Quinta-feira, 11-04-2024 22:25:37 (UTC+01:00 Europe/Lisbon)”. Pretende agora a Ilustre Requerente que, nessa data, e desde 04.04.2024, se encontrava doente e incapacitada de exercer as suas funções profissionais. Justificou o envio do requerimento de recurso com a actuação anómala de um seu funcionário, que, num excesso de zelo, enviou a minuta que já se encontrava pronta desde 02.04.2024. Ora, sem necessidade de entrar sequer na questão da tempestividade da arguição do justo impedimento, as razões do seu indeferimento liminar radicam precisamente no teor do próprio requerimento. Desde logo, estando certificada a assinatura da Ilustre Requerente no requerimento de interposição de recurso, existe uma presunção natural de que o remetente é o/a Sr./a Advogado/a cuja assinatura é certificada. De outro modo, estar-se-ia a fazer “tábua rasa” do disposto no art.º 6.º, n.ºs 3 e 4, da Portaria n.º 280/2013, de 26 de Agosto, e a abrir a porta a toda a espécie de abusos e terrorismo processual. Ora, a Ilustre Requerente vem colocar em causa com a sua alegação toda a fé que o sistema de acesso aos tribunais coloca nas assinaturas certificadas digitalmente. Não só tal alegação não é tolerável como o risco de um eventual abuso por parte de um auxiliar da Requerente, com acesso permitido por esta a essa assinatura, como decorre do teor do requerimento, corre pela mesma (art.º 800.º, n.º 1, do Código Civil). Como tal, se tiver havido “um excesso de zelo” do funcionário da Ilustre Requerente, sibi imputet. Por outro lado, a mera admissão de que o funcionário da Ilustre Requerente estava autorizado a aceder à assinatura electrónica certificada desta, estando, para mais, pronta a minuta do recurso em 02.04.2024, esvazia completamente a própria alegação de justo impedimento. Na verdade, mesmo na situação de incapacidade (não especificada, note-se!), bastaria apenas um telefonema ou um sms para o funcionário dar entrada atempadamente do requerimento (não pode, naturalmente, aceitar-se que o funcionário possa servir apenas para justificar eventuais lapsos, não servindo para optimizar o serviço da organização do escritório da Ilustre Requerente). A este respeito, atente-se no que refere o ac. STJ de 27.05.2010 [Proc.º n.º 07B4184, Cons. Bettencourt de Faria, em www.dgsi.pt]: “I - O justo impedimento do mandatário, ou da parte, consiste na impossibilidade absoluta destes de praticarem o acto em causa (art. 146.º, n.º 1, do CPC). II - O atestado de doença que atesta a impossibilidade de exercício dos deveres profissionais, sem esclarecer a gravidade do mal, ou desacompanhado de outros meios de prova que demonstrem essa gravidade, não é suficiente para estabelecer o justo impedimento, uma vez que não indicia que não pudesse ser encarregada outra pessoa de praticar o acto. III - A mera entrega das conclusões de recurso pode ser efectuada por via informática ou, na pior das hipóteses, por terceiro, pelo que a doença concretamente invocada apenas seria atendível se se demonstrasse que impedia o requerente de tomar as necessárias providências para que outro praticasse por si o acto omitido. IV - Logo, tendo o requerente provado apenas a impossibilidade relativa de exercer a actividade processual que tinha o ónus de praticar, deve ter-se por não verificado o (justo) impedimento”. Refira-se ainda que, exigindo a lei a prova do justo impedimento, que, neste caso, passaria pela suposta actuação em “excesso de zelo” do seu funcionário, a Ilustre Requerente não a fez nem a ofereceu. Como tal, toda a alegação naufraga naturalmente. Por fim, não poderá deixar de concordar com a estranheza exteriorizada pelo Ministério Público quanto aos termos e à data em que foi emitido o atestado médico que foi junto com o requerimento, fazendo-se sublinhar a manifesta pouca fiabilidade do ali atestado, já que, apesar de referir um período provável de 30 dias de doença com incapacidade para o exercício da profissão, com início em 04.04.2024, o certo é que, já em 30.04.2024, ou seja, 26 dias depois do início estimado da doença, a Ilustre Requerente já se encontrava em condições de exercer actos típicos da profissão de Advogada. Por todo o exposto, é manifesta a ausência de fundamento constitutivo de justo impedimento, pelo que se indefere liminarmente o mesmo. Notifique. (…)”.
II.2- Apreciação do recurso
Com relevância para a decisão da causa, traz-se à colação o seguinte contexto processual:
® Nos autos de processo comum-coletivo, de que o presente recurso é dependência, mediante acórdão condenatório proferido a 26-02-2024, foi o arguido/recorrente AA condenado, pela prática de diversos crimes, na pena única de 5 [cinco] anos e 8 [oito] meses de prisão.
® Quer o arguido/recorrente quer a sua ilustre mandatária estiveram presentes na sessão da audiência de julgamento agendada para a leitura do acórdão [26-02-2024], tendo deste sido notificados na mesma data [cfr. ata de audiência de julgamento datada de 26-02-2024 - referência: ...27].
® Por sua vez, o acórdão foi depositado, na secretaria do respetivo juízo do tribunal, na data da sua leitura, ou seja, a 26-02-2024. [cfr. referência ...51].
® Desse acórdão o arguido/ora recorrente interpôs recurso, mediante requerimento apresentado nos autos, via eletrónica, a 11-04-2024, requerimento esse no qual se encontra aposta a assinatura digital da sua Ilustre Sr.ª Advogada: “BB”, tendo procedido ao pagamento imediato de multa no valor de 204,00, por, segundo ali refere, ter praticado o acto no 3.º dia útil após o prazo [cfr. referência ...86 de 11-04-2024].
® Tal recurso não foi admitido, por extemporaneidade, nos termos e pelos fundamentos constantes do despacho proferido a 17-04-2024, que é do seguinte teor [transcrição]: “Ref.ªs Citius 2447731 e 2448286 (11.04.2024) e ...98 (16.04.2024): Os arguidos CC e AA vieram interpor recurso do acórdão proferido nestes autos que os condenou pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de 6 (seis) crimes de furto qualificado. O acórdão em questão foi lido na presença dos arguidos em 26.02.2024 (cfr. acta com a ref.ª Citius 25820627), tendo sido depositado na Secretaria na mesma data (cfr. ref.ª Citius ...51). Dispõe o art.º 411.º, n.º 1, do C.P.P., que “o prazo para interposição de recurso é de 30 dias e conta-se: a) A partir da notificação da decisão; b) Tratando-se de sentença, do respectivo depósito na secretaria; c) Tratando-se de decisão oral reproduzida em acta, a partir da data em que tiver sido proferida, se o interessado estiver ou dever considerar-se presente”. Verifica-se, pois, que o primeiro dia do prazo para a interposição do recurso foi o dia 27.02.2024. Desde essa data até ao dia 23.03.2024 decorreram 26 dias. Entre 24.03.2024 (Domingo de Ramos) e 1 de Abril de 2024 (art.º 28.º Lei n.º 62/2013, de 26 de Agosto), o prazo suspendeu-se por força das férias judiciais da Páscoa, tendo retomado em 02.04.2024. O 30.º dia do prazo correspondeu, pois, ao dia 05.04.2024. Caso os recorrentes pretendessem lançar mão da possibilidade de apresentarem os respectivos recursos dentro dos três dias úteis subsequentes ao termo do prazo, como permitido pelos art.ºs 107.º-A, do C.P.P., e 139.º, n.ºs 5 e 6, do C.P.C., poderiam fazê-lo até ao dia 10.04.2024. Os recursos foram apresentados em 11.04.2024, ou seja, depois de decorrido o prazo legal e o prazo adicional excepcional. Assiste, pois, razão ao Ministério Público. Pelo exposto, nos termos do preceituado no art.º 414.º, n.º 2, do C.P.P., não admito os recursos dos arguidos CC e AA, por serem extemporâneos. Notifique. (…)”.
® Dessa decisão foi enviada notificação à ilustre mandatária do arguido, a 18-04-2024. [cfr. referência ...33 de 18-04-2024].
® Veio, então, a 30-04-2024, a ilustre mandatária do arguido/recorrente apresentar requerimento nos autos, invocando a existência de justo impedimento, e juntando atestado médico do seguinte teor [transcrição]: “Atestado Médico DD, licenciada pela Faculdade de Medicina, Hospital ..., da Universidade ..., portadora da cédula profissional nº ...41, da Ordem dos Médicos, atesta por sua honra profissional que BB, portadora do Cartão de Cidadão nº ...22, se encontra doente desde o dia 04 de Abril de 2024, sendo a duração provável da doença de 30 (trinta) dia(s), com incapacidade de exercer a sua profissão. Por ser verdade e me ter sido pedido, passo o presente atestado que dato e assino.”
[cfr. referência ...11 de 30-04-2024].
® É do despacho proferido a 08-05-2024, supra transcrito, por via do qual foi apreciado e indeferido o invocado justo impedimento da prática atempada do ato de interposição de recurso do acórdão condenatório, apresentado em 11-04-2024, que o arguido vem recorrer.
Porém, sem qualquer razão.
Expliquemos porquê:
Como se refere no despacho proferido pelo tribunal a quo a 17-04-2024 [ que não admitiu o recurso apresentado pelo arguido/recorrente, do acórdão condenatório proferido nos autos], sendo o prazo de recurso de 30 dias e tendo o acórdão sido depositado na secretaria do tribunal a 26-02-2024, expurgando-se o período que decorreu entre 24-03-2024 [Domingo de Ramos] e 1 de Abril de 2024 [art.º 28.º Lei n.º 62/2013, de 26 de Agosto], respeitante ao período de férias judiciais da Páscoa em que o prazo se suspendeu, o 30.º dia do prazo de recurso terminou a 05-04-2024 e caso o recorrente pretendesse lançar mão da possibilidade de apresentar o referido recurso dentro dos três dias úteis subsequentes ao termo do prazo, como permitido pelos art.ºs 107.º-A, do C.P.P., e 139.º, n.ºs 5 e 6, do C.P.C., poderia fazê-lo até ao dia 10-04-2024.
Porém, o arguido, ora recorrente, apenas apresentou o recurso do acórdão condenatório a 11-04-2024, ou seja, depois de ter decorrido quer o prazo legal de 30 dias, quer o prazo adicional de 3 dias, com pagamento de multa, de que dispunha para o efeito.
Razão pela qual, bem decidiu o tribunal a quo ao, nos termos do preceituado no art.º 414.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, não ter admitido o referido recurso por extemporaneidade.
Aliás, o arguido/recorrente, não põe em causa que o recurso tenha sido apresentado fora do prazo, tanto mais que, notificado de tal despacho, veio invocar a existência de justo impedimento como causa justificativa para não o ter feito atempadamente.
Como é sabido, o instituto do justo impedimento traduz-se num mecanismo de derrogação da regra da extinção do direito de praticar um ato pelo decurso de um prazo perentório, em situações excecionais não imputáveis à parte ou ao seu advogado.
A esse respeito estabelece o artigo 107.º, n.º 2, do Código de Processo Penal que:
“Os actos processuais só podem ser praticados fora dos prazos estabelecidos por lei, por despacho da autoridade referida no número anterior, a requerimento do interessado e ouvidos os outros sujeitos processuais a quem o caso respeitar, desde que se prove justo impedimento.”.
Acrescentando, por sua vez, o nº 3 do mesmo preceito legal que “O requerimento referido no número anterior é apresentado no prazo de três dias, contados do termo do prazo legalmente fixadoouda cessação do impedimento”.
Não define a lei processual penal o que se deve entender por justo impedimento, pelo que, ao abrigo do artigo 4.º do Código de Processo Penal, teremos de integrar tal lacuna legislativa com recurso às normas do processo civil e destas, concretamente do artigo 140.º, n.º 1 do CPC, decorre que justo impedimento é “o evento não imputável à parte nem aos seus representantes ou mandatários que obste à prática atempada do ato”, resultando, por sua vez, da parte inicial do seu n.º 2 que “A parte que alegar o justo impedimento oferece logo a respetiva prova”.
De tais preceitos legais decorre, assim, que o justo impedimento exige a verificação dos seguintes requisitos:
® Que o evento não seja atribuível à parte nem aos seus representantes ou mandatário;
® Que o evento determine a impossibilidade de praticar atempadamente o ato.
E que o requerente deve:
® Apresentar o requerimento acompanhado do ato a praticar, oferecendo a prova do justo impedimento; e que
® O requerimento tem de ser apresentado no prazo do n.º 3 do artigo 107.º do Código de Processo Penal.
No contexto processual dos presentes autos, veio a ilustre mandatária do arguido/recorrente suscitar a existência de justo impedimento por não ter apresentado atempadamente o recurso interposto do acórdão condenatório do arguido/recorrente.
Para tanto, alega, que no período de 4 de abril a ao dia 29 de abril [dia anterior à apresentação de tal requerimento], esteve incapacitada de exercer as suas funções profissionais, por motivo de doença, juntando, para prova do alegado, um documento, denominado de “atestado médico”, do qual, com relevo para a apreciação da questão dos autos, decorre que a Ilustre Sr.ª Advogada “se encontra doente desde o dia 04 de Abril de 2024, sendo a duração provável da doença de 30 (trinta) dia(s), com incapacidade de exercer a sua profissão.”.
E, para justificar o facto de a 11 de abril de 2024 ter sido apresentado nos autos o recurso do acórdão condenatório, mediante via eletrónica, onde consta certificada a sua assinatura eletrónica – data, portanto, em que à luz do referido atestado médico estaria incapacitada para exercer as suas funções – vem alegar que tal se deveu a envio anómalo, ocorrido por parte da funcionária do seu escritório que, sem quaisquer instruções por parte da exponente, num excesso de zelo, entendeu remeter tais alegações, uma vez que havia já uma minuta prévia preparada no escritório desde o dia 2 de abril, atitude tomada pela sua funcionária, após contacto com o Colega Dr. EE, mandatário do coarguido CC, o qual lhe referiu que o terceiro dia útil após o prazo seria o referido dia 11 (constatando-se que incorreu ele em lapso na contagem do prazo) tendo inclusive, sido ele que processou o pertinente pagamento da multa. Anomalia que, na sua ótica, não pode impedir a aplicação da situação em apreço do referido justo impedimento e, consequentemente, seja agora admitido o recurso cujo requerimento e motivação se encontra já nos autos.
Ora, antes do mais, centrando a nossa atenção na questão da tempestividade em que foi suscitado o incidente de justo impedimento, constata-se que o ato “omitido” a praticar consiste na apresentação do recurso do acórdão condenatório proferido nos autos a 26-02-2024, cujo prazo legal de 30 dias de que o arguido dispunha para recorrer se situou entre 27-02-2024 e 05-04-2024 [suprimido o período de tempo em que decorreram as férias judicias da páscoa de 24-03-2024 a 01-04-2024].
Porém, a Ilustre Sr.ª Advogada apenas suscitou o incidente de justo impedimento a 30-04-2024, após ter sido notificada da decisão que não admitiu o recurso apresentado do acórdão condenatório por ser extemporâneo, ou seja, muito além do prazo legalmente fixado para recorrer e até do referido prazo excecional de 3 dias, que, como vimos havia terminado a 10-04-2024.
É certo que diz ter sido acometida de doença que a impossibilitou de exercer as suas funções desde 04-04-2024 a 29-04-2024, ou seja, até um dia antes da data da apresentação do requerimento em que invocou o justo impedimento [30-04-2024], como se o justo impedimento tivesse cessado naquele dia e sido suscitando tempestivamente.
No entanto, não se pode deixar de constatar que pese embora alegue ter estado incapacitada de exercer as suas funções devido a doença, desde 04-04-2024 até 29-04-2024, o certo é que em 11-04-2024, ou seja, dentro do referido período em que alegadamente estaria incapacitada para o fazer, a Ilustre Sr.ª Advogada praticou o ato omitido, apresentando o recurso do acórdão condenatório que ora pretende ver admitido. Assim sendo, tendo o ato omitido sido praticado em 11-04-2024, isso significa que, a ter ocorrido uma situação de justo impedimento, a mesma cessou, pelo menos, nessa data, caso contrário o referido ato não teria sido praticado, pelo que, também por esta via, a invocação da situação de justo impedimento, ao ter sido suscitada a 30-04-2024 ocorreu tardiamente, concretamente 19 dias depois.
Nestes termos, o requerimento de justo impedimento apresentado nunca poderia ser atendido, por ser extemporâneo.
Não se esquece que para justificar o facto de a 11-04-2024 ter sido apresentado nos autos o recurso do acórdão condenatório, mediante via eletrónica, onde consta aposta a assinatura eletrónica da Ilustre Sr.ª Advogada - data em que, a fazer fé no referido atestado médico, estaria incapacitada para exercer as suas funções – vem alegar que tal se deveu a envio anómalo, ocorrido por parte da funcionária do seu escritório que, sem quaisquer instruções por parte da exponente, num excesso de zelo, entendeu remeter tais alegações, uma vez que havia já uma minuta prévia preparada no escritório desde o dia 2 de abril, atitude tomada pela sua funcionária, após contacto com o Colega Dr. EE, mandatário do coarguido CC, o qual lhe referiu que o terceiro dia útil após o prazo seria o referido dia 11 (constatando-se que incorreu ele em lapso na contagem do prazo) tendo inclusive, sido ele que processou o pertinente pagamento da multa.
Porém, a requerente não indicou qualquer prova de tal factualidade, como lhe competia, nos termos do n.º2 do artigo 140.º do CPC ex vi artigo 4.º do Código de Processo Penal [relembre-se: “A parte que alegar o justo impedimento oferece logo a respetiva prova], e, além disso, como facilmente se compreenderá, tal situação nunca seria capaz de consubstanciar o invocado justo impedimento, pois se assim fosse estaria encontrada uma saída fácil para contornar os ditames legais nesta matéria, tanto mais que in casu, nos termos alegados pela própria requerente, a referida“minuta”do recursojá se encontrava preparada no escritório desde o dia 2 de abril”, pelo que semprepoderia ter sido enviada ao tribunal atempadamente, dentro do prazo legal de recurso, que, como vimos, só se esgotava a 05-04-2024, sem contar com o prazo excecional de 3 dias, com pagamento de multa, e poderia ter sido enviada pela própria requerente, pois que a alegada incapacidade para o exercício da sua profissão, nos termos do referido atestado médico, só ocorreu após o dia 04 de abril, data em que a peça recursiva já estava elaborada.
Note-se, aliás, que a requerente fala em “minuta” do requerimento de recurso, mas, na verdade, é da mesma que pretende fazer uso, pois não apresenta qualquer outra peça recursiva aquando da invocação do justo impedimento.
Na verdade, a situação invocada nunca poderia constituir fundamento de justo impedimento da prática do ato “omitido”.
Relembre-se que como fundamento do despacho de indeferimento que incidiu sobre o requerimento de justo impedimento, sustentou o tribunal a quo o seguinte: “No caso vertente, a Ilustre Requerente remeteu ao processo o requerimento com a ref.ª Citius 2448286, com a sua assinatura certificada electronicamente e a data certificada “Quinta-feira, 11-04-2024 22:25:37 (UTC+01:00 Europe/Lisbon)”. Pretende agora a Ilustre Requerente que, nessa data, e desde 04.04.2024, se encontrava doente e incapacitada de exercer as suas funções profissionais. Justificou o envio do requerimento de recurso com a actuação anómala de um seu funcionário, que, num excesso de zelo, enviou a minuta que já se encontrava pronta desde 02.04.2024. Ora, sem necessidade de entrar sequer na questão da tempestividade da arguição do justo impedimento, as razões do seu indeferimento liminar radicam precisamente no teor do próprio requerimento. Desde logo, estando certificada a assinatura da Ilustre Requerente no requerimento de interposição de recurso, existe uma presunção natural de que o remetente é o/a Sr./a Advogado/a cuja assinatura é certificada. De outro modo, estar-se-ia a fazer “tábua rasa” do disposto no art.º 6.º, n.ºs 3 e 4, da Portaria n.º 280/2013, de 26 de Agosto, e a abrir a porta a toda a espécie de abusos e terrorismo processual. Ora, a Ilustre Requerente vem colocar em causa com a sua alegação toda a fé que o sistema de acesso aos tribunais coloca nas assinaturas certificadas digitalmente. Não só tal alegação não é tolerável como o risco de um eventual abuso por parte de um auxiliar da Requerente, com acesso permitido por esta a essa assinatura, como decorre do teor do requerimento, corre pela mesma (art.º 800.º, n.º 1, do Código Civil). Como tal, se tiver havido “um excesso de zelo” do funcionário da Ilustre Requerente, sibi imputet. Por outro lado, a mera admissão de que o funcionário da Ilustre Requerente estava autorizado a aceder à assinatura electrónica certificada desta, estando, para mais, pronta a minuta do recurso em 02.04.2024, esvazia completamente a própria alegação de justo impedimento. Na verdade, mesmo na situação de incapacidade (não especificada, note-se!), bastaria apenas um telefonema ou um sms para o funcionário dar entrada atempadamente do requerimento (não pode, naturalmente, aceitar-se que o funcionário possa servir apenas para justificar eventuais lapsos, não servindo para optimizar o serviço da organização do escritório da Ilustre Requerente). A este respeito, atente-se no que refere o ac. STJ de 27.05.2010 [Proc.º n.º 07B4184, Cons. Bettencourt de Faria, em www.dgsi.pt]: “I - O justo impedimento do mandatário, ou da parte, consiste na impossibilidade absoluta destes de praticarem o acto em causa (art. 146.º, n.º 1, do CPC). II - O atestado de doença que atesta a impossibilidade de exercício dos deveres profissionais, sem esclarecer a gravidade do mal, ou desacompanhado de outros meios de prova que demonstrem essa gravidade, não é suficiente para estabelecer o justo impedimento, uma vez que não indicia que não pudesse ser encarregada outra pessoa de praticar o acto. III - A mera entrega das conclusões de recurso pode ser efectuada por via informática ou, na pior das hipóteses, por terceiro, pelo que a doença concretamente invocada apenas seria atendível se se demonstrasse que impedia o requerente de tomar as necessárias providências para que outro praticasse por si o acto omitido. IV - Logo, tendo o requerente provado apenas a impossibilidade relativa de exercer a actividade processual que tinha o ónus de praticar, deve ter-se por não verificado o (justo) impedimento”. Refira-se ainda que, exigindo a lei a prova do justo impedimento, que, neste caso, passaria pela suposta actuação em “excesso de zelo” do seu funcionário, a Ilustre Requerente não a fez nem a ofereceu. Como tal, toda a alegação naufraga naturalmente. (…)”.
E, diga-se, com acerto, fundamentação que aqui também acolhemos e que nos dispensa, por despiciendas, prolongadas e repetitivas considerações sobre a situação em apreço.
De qualquer forma, sempre se dirá que “o atestado médico que declara a impossibilidade de exercício da profissão por parte do advogado/mandatário, sem esclarecer a gravidade da doença ou desacompanhado de outros meios de prova que demonstrem essa gravidade, não é suficiente para estabelecer o justo impedimento”[3].
Compreende-se o argumento da recorrente de que não é exigível face à obrigação clínica de sigilo profissional que o médico indique num atestado médico qual a doença ou grau de gravidade da mesma, mas daí pretender que, por tal razão, o atestado médico apresentado deva ser considerado suficiente para justificar o justo impedimento, bastando que do mesmo resulte a incapacidade do exercício profissional num determinado período temporal, vai um passo. Na verdade, o mesmo não permite conhecer as circunstâncias específicas que impedem a Ilustre Sr.ª Advogada do exercício das suas funções e, consequentemente, permitam considerar que houve, efetivamente, um evento não imputável à mesma, que a impediu de praticar o ato, ou seja, que permita ao tribunal avaliar e concluir pela existência de justo impedimento.
E, para assim concluirmos, basta atentar que o referido atestado médico, datado de 26 de abril de 2024 [precisamente após a Ilustre Sr.ª Advogada ter sido notificada do despacho de não admissão do recurso, datado de 17-04-2024], com efeitos anteriores reportados a 04 de abril de 2024, limita-se a dizer que a Ilustre Sr.ª Advogada se encontraria incapacitada de exercer a sua profissão por um período de “duração provável da doença de 30 (trinta) dia(s)”, o que, na verdade, é vago e não nos permite concluir que a sua alegada doença era incapacitante de atempadamente ter praticado o ato em causa nestes autos, tanto mais que “duração provável” não é mais do que isso, tão só uma mera probabilidade, e a apontada doença não só não incapacitou a requerente pelo período provável de 30 dias [pois que veio apresentar requerimento a 30-05-2024, antes, portanto, de terminar o provável prazo de doença], como não nos permite concluir até quandodurou efetivamente tal impedimento, sendo certo que se o atestado médico que foi junto aos autos, com a redação vaga que inculca, fosse idóneo para justificar o alegado justo impedimento, seria o mesmo que deixar na mão da requerente a escolha da data da cessação de tal incapacidade, e, consequentemente, a escolha da data que melhor lhe aprouvesse para a pratica do ato, desde que ficasse compreendida dentro dos referidos 30 dias de duração provável da doença, escolha essa, portanto, sem qualquer possibilidade de controlo por parte do tribunal.
Acresce dizer que “a doença de advogado só constitui justo impedimento se for súbita e tão grave que o impossibilite, em absoluto, de praticar o acto, avisar o constituinte ou substabelecer o mandato”[4], o que, também, não se encontra comprovado nos autos.
Ou seja, a doença para constituir justo impedimento terá de impossibilitar absolutamente a prática atempada do ato por razões que não sejam imputáveis ao requerente, sendo certo que do atestado médico em apreço não decorre que a invocada doença impedisse a Ilustre Sr.ª Advogada de providenciar para que o ato fosse praticado atempadamente, designadamente por terceira pessoa, fazendo chegar ao tribunal o requerimento de recurso que já havia elaborado, tanto mais que a invocada doença da requerente alegadamente só teve início a 04 de abril de 2024, ou seja, dois dias após a alegada “minuta” do recurso ter sido elaborada.
E não se diga que a dita colaboradora atuou com excesso de zelo, sem o seu conhecimento e à sua revelia, ao ter enviado ao tribunal, por via eletrónica, o referido recurso, do qual consta a assinatura eletrónica da Ilustre Sr.ª Advogada, pois se o fez foi porque lhe foi concedido o respetivo acesso para o efeito, tanto mais que não consta dos autos que o tenha conseguido obter de forma furtiva.
Na verdade, como refere o ilustre Procurador-Geral Adjunto no seu douto parecer “Há que reconhecer a irracionalidade do incidente suscitado pelo arguido pois que com ele, pretende aquele a prática de um acto processual afinal já por si validamente executado”. “Há que aceitar – e aqui de modo crucial e incontornável, que o recurso do arguido que recaiu sobre o acórdão condenatório se encontra assinado, assinado digitalmente, todavia com um reforço de autenticidade, com uma assinatura certificada por entidade, justamente a da advogada BB, a defensora daquele, a única que o podia assinar; estando assinado, na forma em que está, só esta causídica o assinou fazendo a sua entrada em juízo, apesar da atestada doença”.
Nesta conformidade, somos levados a concluir pela inexistência do invocado justo impedimento, pois que o ato em causa podia ter sido praticado atempadamente pela Ilustre Sr.ª Advogada.
Acresce relembrar que a invocação do justo impedimento tem de ser suscitada no preciso momento em que a parte se apresenta a praticar o ato fora de prazo e não apenas quando a parte é confrontada com a decisão de extemporaneidade da prática do ato, como ocorreu no caso dos autos.
Aqui chegados só nos resta concluir que a decisão recorrida não merece qualquer reparo, pelo seu acerto, correta e exemplar aplicação das normas legais aplicáveis, e escorreita fundamentação, em perfeita obediência aos ditames da lei que regem o instituto do justo impedimento.
E não existindo o invocado justo impedimento, não sobeja qualquer fundamento legal para admitir o recurso apresentado a 11-04-2024 do acórdão condenatório proferido pelo tribunal a quo a 26-02-2024.
Improcede, por conseguinte, in totum, o presente recurso.
III- DISPOSITIVO
Pelo exposto, acordam os Juízes Desembargadores da Secção Penal deste Tribunal da Relação de Guimarães em julgar improcedente ao recurso interposto pelo arguido AA, e, em consequência, confirma-se a douta decisão recorrida.
Custas pelo arguido/recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 3 UCS [artigos 513º, n.ºs 1 e 3 e 514.º, n.º 1, do Código de Processo Penal e artigo 8º, nº 9, do RCP, com referência à Tabela III].
Notifique.
Guimarães, 10 de setembro de 2024
[Elaborado e revisto pela relatora - artigo 94.º, n.º 2, do Código de Processo Penal]
Os Juízes Desembargadores
Isilda Maria Correia de Pinho [Relatora]
Florbela Sebastião e Silva [1.ª Adjunta]
António Bráulio Alves Martins [2.º Adjunto] – com declaração de voto
DECLARAÇÃO DE VOTO
Não obstante concordar com a decisão, bem como com a generalidade da fundamentação de direito expendida no acórdão, tenho entendido que a exigência de impossibilidade absoluta enquanto pressuposto da verificação de justo impedimento não está de acordo com a atual redação do preceito legal que fundamentalmente aqui está em causa – artigo 140.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.
Na verdade, a evolução legislativa, designadamente a utilização na redação atual do pertinente preceito do vocábulo obstar em vez do vocábulo impossibilidade, utilizado nos anteriores Códigos de Processo Civil, inculca que a apreciação deve ser relativa, por assim dizer, e não absoluta, tudo dependendo sempre do juízo prudencial do titular do processo, em face da situação objetiva e do evento alegado – ou seja, neste campo, as necessidades de garantir a possibilidade de realização de uma melhor justiça material devem sobrepor-se às necessidades de segurança.
A minha posição a este respeito consta do acórdão proferido no processo 932/22.5PBBRG-A.G1, deste Tribunal da Relação de Guimarães, de 18/06/2024, de que fui relator, publicado em www.dgsi.pt.
[1] Indicam-se, a título de exemplo, os Acórdãos do STJ, de 15/04/2010 e 19/05/2010, in http://www.dgsi.pt. [2] Conhecimento oficioso que resulta da jurisprudência fixada no Acórdão do STJ n.º 7/95, de 28 de dezembro, do STJ, in DR, I Série-A, de 28/12/95. [3] Cfr., entre outros, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 27-05-2010, Processo n.º 07B4184; Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 20-04-2018, Processo n.º 3188/17.8T8LRA-A.C1; Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 07-04-2011, Processo n.º 780/07.2TVPRT-C.G1, todos disponíveis em www.dgsi.pt [4]Acórdão do TRE, de 24-09-2020, in www.dgsi.pt. No mesmo sentido, entre outros, o Acórdão do TRP, de 07-10-2021, Processo 517/21.3T8AMT.P1.