EXECUÇÃO
TRIBUNAL COMPETENTE
ANIMAIS DE COMPANHIA
DESPESAS DE ALIMENTAÇÃO
DESPESAS COM VETERINÁRIO
COBRANÇA COERCIVA
Sumário

A competência para tramitar a ação executiva destinada a obter o pagamento das quantias em dívida pelo executado relativas a despesas com a alimentação e cuidados veterinários com os animais de companhia fixada por decisão judicial é dos Juízos de Execução, por força do disposto no art.º 129º, nº 1, da LOSJ.

Texto Integral

Acordam na 7ª secção do Tribunal da Relação de Lisboa:

RELATÓRIO
Em 26.12.2023, NN, intentou a presente execução “especial p/ alimentos nos próprios autos”, contra MM, com vista a obter o pagamento da quantia de €7.301,04, a título de despesas com a alimentação e cuidados veterinários com animais de companhia fixada por decisão judicial, transitada em julgado em 10.7.2023.
Efetuada a penhora e notificado o executado, foi proferido despacho a convidar a exequente a pronunciar-se sobre eventual verificação da exceção de incompetência, o que esta fez pugnando pela sua não verificação.
Em 22.3.2024, foi proferido o seguinte despacho: “A exequente instaurou a presente execução especial por alimentos com fundamento na decisão proferida nos autos principais. Contudo, a decisão ali proferida não respeita, de todo, a alimentos devidos a menor, a cônjuge ou a ex-cônjuge. Portanto, e salvo melhor opinião, os Juízos materialmente competentes para tramitarem esta ação executiva são os Juízos de Execução – art.º 129º, nº 1 da Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto). Pelo exposto, julgo pela verificação da exceção dilatória de incompetência absoluta e declaro este Juízo incompetente, em razão da matéria, para tramitar a presente execução, sendo materialmente competentes, para o efeito, os Juízos de Execução (Cf. artigos 96.º, alínea a), 97.º, n.º 2, 576.º, nºs 1 e 2 e 577.º, alínea a) do CPC). Custas a cargo da exequente, sem prejuízo do benefício de apoio judiciário. Notifique. Oportunamente, conclua.”.
Não se conformando com o teor da decisão, apelou a requerente, formulando, a final, as seguintes conclusões, que se reproduzem:
1ª – Como muto bem sintetiza a decisão sumária proferida pelo Tribunal da Relação de Lisboa nos presentes autos, de que foi Relatora a Desembargadora Maria do Rosário Gonçalves, Vice-Presidente do mesmo e para onde se remete para melhor compreensão, “Se para a formalização do divórcio é necessário definir o destino dos animais de companhia quando os há, bem como, a quem os confiar de acordo com os interesses dos cônjuges ou dos filhos e o bem-estar daqueles, não se torna necessário criar um preceito legal atributivo da competência do tribunal de família e menores para decidir todos os desenvolvimentos relacionados com as questões dos animais.
Não se trata de apreciar aqui o regime jurídico dos animais, mas antes, apreciar um incidente relacionado com o processo de divórcio que correu seus termos.
Com efeito, perante a análise das competências atribuídas à jurisdição de família e menores, em conjugação com os preceitos do Código Civil enunciados, bem como, a necessidade de harmonização das normas legais dentro do espírito do sistema, não vemos como não enquadrar a questão suscitada no requerimento apresentado, naqueles tribunais.”;
2ª – A presente execução assenta no incumprimento do acordo de divórcio entre as partes, na parte respeitante à regulação dos animais de companhia, nomeadamente nos valores devidos a título de alimentos a que o executado estava e está obrigado, sendo fundamentada no disposto no artigo 1775º nº 1 alínea f) do Código Civil; Tem por base uma decisão homologatória da Conservatória do Registo Civil que, para os presentes efeitos, tem o valor de sentença, bem como na já proferida pelo Tribunal a quo nos autos principais;
3ª – Nos termos do disposto pela alínea f) do nº 1 do artigo 122º da LOSJ, compete aos juízos de família e menores preparar e julgar execuções por alimentos entre ex-cônjuges, reforçando o nº 2 do artigo 129º de tal códice, a exclusão de competência dos juízos de execução para os termos da presente execução.
4ª – A presente execução por alimentos, é da competência exclusiva do Juízo de Família e Menores do Barreiro!
5ª – A Exequente invocou nos autos e o Tribunal a quo desconsiderou, a posição assumida por AUGUSTA PALMA - Os Animais de Companhia na Jurisdição da Família e das Crianças, in Direito dos Animais, CEJ, 2019, p. 72 e seguintes, “(…) em coerência, com as devidas adaptações, entendemos dever seguir-se a tramitação processual relativa às crianças e jovens, em particular a inerente à ação tutelar comum, de acordo com os artigos 67.º do Regime Geral o Processo Tutelar Cível (RGPTC) e segundo os princípios processuais da jurisdição voluntária, como decorre dos artigos 986.º a 988.º ambos do CPC", onde expressamente se remete para os artigos 292º a 295º do CPC, observando-se ainda a estatuição do artigo 85º e do mesmo códice. 6ª – Destarte e em coerência, quaisquer incidentes relativos ao incumprimento ou a alteração dessa regulação do destino dos animais de companhia, como a execução in casu, serão da competência do Juízo de Família e Menores.
7ª – Estabelece o artigo 122º nº 1, da LOSJ que compete aos Juízos de Família e Menores preparar e julgar ações e execuções por alimentos entre cônjuges e entre ex-cônjuges e outras ações relativas ao estado civil das pessoas e da família, acrescendo o artigo 123º nº 1 alínea d), do mesmo códice que é da competência dos Juízos de Família e Menores, a regulação das responsabilidades parentais e questões conexas.
8ª – Os autos principais reportam a ação que alterou o acordo de divórcio entre as partes (ali Autor e ré, aqui executado e Exequente), na parte respeitante à regulação dos animais de companhia, fundamentada no disposto no artigo 1775º nº 1 alínea f), do CC e o artigo 1793º-A deste, estatui que os animais de companhia, não integram a comunhão geral de bens, razão porque se convencionou a necessidade de também regular o seu destino em caso de divórcio considerando, nomeadamente, “(…) os interesses de cada um dos cônjuges e dos filhos do casal e também o bem-estar do animal.” – no que não será alheio o regime jurídico dos animais.
9ª – Resulta, assim, inequívoco, que deixando de ser aplicáveis aos animais de companhia, as normas que regulavam as coisas e a propriedade, a regulação do seu destino não configura uma mera entrega de uma coisa, de uma pessoa a outra mediante certas condições, antes estando, a confiança a que se refere o artigo 1793º-A do CC, muito mais próxima, juridicamente, da regulação do exercício das responsabilidades parentais, atenta a ponderação de interesses que tem de ser efetuada.
10ª – E nestes termos, a competência para tramitar a presente execução, só pode ser a do Juiz 3 do Juízo de Família e Menores do Barreiro.
Termina pedindo se reconheça e declare de forma expressa, a competência do Juízo de Família e Menores do Barreiro – Juiz 3 para, por apenso aos autos principais, prosseguir na normal tramitação da lide da presente execução, seguindo-se o demais até final. Caso assim se não entenda – o que se admite por mera cautela de patrocínio – sempre deve o presente recurso proceder, revogando-se a decisão proferida e ordenando-se a remessa dos autos, nos termos do disposto pelo nº 2 do artigo 85º do CPC, aos Juízos de Execução de Almada, a fim de ali prosseguir a presente execução.     
Notificado das alegações, o apelado não apresentou contra-alegações.
QUESTÕES A DECIDIR
Sendo o objeto do recurso balizado pelas conclusões da recorrente (arts. 635º, nº 4 e 639º, nº 1, do CPC), a questão a decidir é se o tribunal recorrido (Juízo de Família e Menores do Barreiro) é ou não competente, em razão da matéria, para tramitar o presente processo executivo.
Cumpre decidir, corridos que se mostram os vistos.
FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
A matéria de facto relevante é a supra referida no relatório, e ainda:
1- Em 03/04/2018, no âmbito do processo de divórcio por mútuo consentimento que correu termos sob o nº 346/2018 na Conservatória do Registo Civil da Baixa da Banheira foi estabelecido acordo relativo à regulação dos animais de companhia [1], que foi homologado pelo Sr. Conservador.
2- Em 4.3.2021, o, aqui, executado intentou no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, Juízo de Família e Menores do Barreiro, ação de cessação/alteração do acordo relativo à Regulação dos Animais de Companhia referido em 1., pedindo a cessação do pagamento da quantia devida a título de despesas com alimentação e cuidados veterinários, com efeitos a partir Julho de 2020; ou, caso todos animais ainda se encontrem na posse da requerida, a redução para quantia não superior a €25,00 mensais, acrescido de metade das quantias paga pela requerida em consultas médicas veterinárias, com efeitos desde maio de 2020; ou, caso a requerida já não se encontre na posse de algum ou alguns dos animais, a redução da referida quantia de forma proporcional ao número de animais na posse da requerida, com efeitos desde maio de 2020.
3. Por despacho de 19.3.2021, o Juízo de Família e Menores do Barreiro declarou-se absolutamente incompetente em razão da matéria para conhecer da ação referida em 2.
4. Na sequência de pedido do, aqui, executado, foram os autos remetidos ao Juízo Local Cível da Moita, que proferiu despacho liminar a declarar-se incompetente, e suscitou conflito de competência, que veio a ser decidido pela Vice-Presidente deste Tribunal da Relação em 28.5.2021, que julgou competente para prosseguir na lide, o Juízo de Família e Menores do Barreiro.
5. Em 16.2.2023, foi proferida sentença que julgou parcialmente procedente a ação, e em consequência, decidiu: 1- Reduzir o quantitativo da “pensão de alimentos” acordada pelas partes para acorrer às despesas com alimentação e cuidados veterinários com tais animais, fixando-o na quantia mensal de €70,00 (setenta euros), por referência à data da entrada da ação em juízo. 2- Absolver a ré do restante peticionado, decisão que veio a ser confirmada por acórdão desta Relação de 22.6.2023.
FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
A presente execução destina-se a obter o pagamento das quantias em dívida pelo executado relativas a despesas com a alimentação e cuidados veterinários com os animais de companhia fixada por decisão judicial, transitada em julgado.
O valor mensal a pagar pelo executado relativo a despesas com a alimentação e cuidados veterinários com os animais de companhia que ficaram confiados à exequente foi acordado no âmbito da ação de divórcio por mútuo consentimento, que correu termos na CRC, e foi homologado pelo Sr. Conservador, vindo a ser objeto de alteração por sentença transitada em julgado proferida no Juízo de Família e Menores do Barreiro.
A presente execução (dessa decisão) foi instaurada no Juízo de Família e Menores do Barreiro, que se considerou incompetente, em razão da matéria, para prosseguir os seus termos, considerando competente para o efeito os Juízos de Execução, por força do disposto no art.º 129º, nº 1, da Lei n.º 62/2013, de 26.08 (doravante, LOSJ).
Insurge-se a apelante contra o decidido sustentando a competência do tribunal recorrido para a presente execução, por força do disposto nos arts. 122º, nº 1, al. f) e 123º, nº 1, al. d), da LOSJ, ponderada a decisão da Sra. Vice-Presidente deste Tribunal a que se alude 4 da fundamentação de facto.
Vejamos.
Dispõe o art.º 1775º, nº 1, do CC, que o divórcio por mútuo consentimento pode ser instaurado na CRC acompanhado da relação especificada de bens comuns, ou acordo sobre a partilha ou pedido de elaboração do mesmo (al. a)), certidão da sentença de regulação das responsabilidades parentais ou acordo sobre o seu exercício (al. b)), acordo sobre a prestação de alimentos (al. c)), acordo sobre o destino da casa de morada de família (al. d)), escritura da convenção antenupcial, caso tenha existido (al. e)), e acordo sobre o destino dos animais de companhia, caso existam (al. f)).
Se os cônjuges, embora querendo divorciar-se, não conseguirem chegar a acordo quanto às questões referidas, devem apresentar o requerimento de divórcio por mútuo consentimento no tribunal, cabendo ao juiz fixar as consequências do divórcio quanto ao exercício das responsabilidades parentais, a prestação de alimentos ao cônjuge que deles careça, o destino da casa de morada da família e o destino dos animais de companhia, como se se tratasse de um divórcio sem consentimento de um dos cônjuges, após o que decreta o divórcio (art.º 1778.º-A).
Na subsecção sobre os efeitos do divórcio, estipula o art.º 1793º-A do CC, que “Os animais de companhia são confiados a um ou a ambos os cônjuges, considerando, nomeadamente, os interesses de cada um dos cônjuges e dos filhos do casal e também o bem-estar do animal.”.
A al. f) do nº 1 do art.º 1775º e o art.º 1793º-A, do CC, foram introduzidos pela Lei nº 8/2017, de 3.03, que estabeleceu “um estatuto jurídico dos animais, reconhecendo a sua natureza de seres vivos dotados de sensibilidade”.
Os arts. 1775º, nº 1, al. f) e 1793º-A do CC apenas prevêem a fixação por acordo do destino do animal, concretamente, a quem fica confiado, nada obstando que sejam estipuladas cláusulas quanto aos alimentos e visitas ao animal. 
Raúl Farias, em O direito dos animais (de companhia) no direito português da família após as alterações introduzidas pela Lei n.º 8/2017. Revista Jurídica Luso-Brasileira, ano 3, n.º 6, 2017, pp. 238 e 239, apud. Cristina Dias, em O divórcio e o destino dos animais de companhia, em ebook do CEJ Direito dos Animais, 2022, pág. 75, nota 10, preconiza que o acordo poderá ser entendido, na sua natureza, como um contrato atípico, quando se fixa o destino do animal com prestações de alimentos e de visitas pelo outro cônjuge, prestações que revestem natureza obrigacional.
Anabela Pedroso, em Animais e (em) família, ebook O Direito dos Animais, do CEJ, outubro de 2019, págs. 29/30, abordando a questão da competência dos Juízos de Família e Menores nesta matéria, escreve que, tendo em conta o disposto no  art.º 122º da LOSJ, “Atendendo a que os tribunais de família são competentes para as ações de divórcio, não se nos suscitam dúvidas relevantes de que, colocando-se a questão da necessidade de fixar o destino dos animais no âmbito do divórcio por mútuo consentimento, como um dos pressupostos do seu decretamento, o juízo de família e menores é competente para o conhecimento da questão. Diversamente, quando a questão dos animais surge noutro contexto, ou seja, não como um dos requisitos de que depende a possibilidade de decretar o divórcio por mútuo consentimento, mas como efeito do divórcio, temos dúvidas de que exista norma que habilite o tribunal de família a decidir. Com efeito, já não nos encontramos no âmbito do divórcio, porque esse já foi decretado, sendo certo que, em termos processuais, o legislador nada disse sobre a natureza processual da pretensão deduzida ao abrigo do disposto no artigo 1793.º-A do Código Civil. 5.4.2. Contrariamente ao que referiu a propósito da fixação do destino da casa de morada de família, na questão da fixação do destino dos animais, o legislador não referiu tratar-se de um processo de jurisdição voluntária. Se o tivesse feito, a competência dos juízos de família e menores decorria, desde logo, da alínea a) do n.º 1 do artigo 122.º. Veja-se que o artigo 546.º do CPC refere que o processo especial aplica-se aos casos expressamente designados na lei, sendo que o processo comum é aplicável a todos os casos a que não corresponda processo especial. Assim, levanta-se a questão de saber se esta foi efetivamente a vontade do legislador ou se se expressou mal e a sua vontade, face à inserção sistemática do artigo 1793.º-A do Código Civil, era a de, tal como relativamente à atribuição da casa de morada de família, configurar em termos processuais tal pretensão no contexto de um processo de jurisdição voluntária. É que, como já referimos, neste caso, os tribunais competentes seriam os tribunais de família sendo, para além do mais, que a decisão tomada poderia ser alterada posteriormente, com fundamento em circunstâncias supervenientes que justifiquem a alteração, de acordo com o previsto no artigo 988.º do Código de Processo Civil. De outra forma, trata-se de uma pretensão que terá que ser feita valer sob a forma de uma ação declarativa comum e cuja competência terá de ser reconhecida aos Juízos Cíveis.”.
Augusta Palma, em Os animais de companhia na jurisdição da família e das crianças, ebook Direito dos Animais 2019, do CEJ, edição março de 2020, págs. 72/73, escreve que “… não sendo aplicável aos animais de companhia o regime das coisas, o seu destino não pode ser decidido por entrega judicial ou extrajudicial. Resta a confiança de acordo com a bitola do artigo 1793.º-A do CC, que remete para os parâmetros resolutórios da regulação do exercício das responsabilidades parentais, a saber, interesse do animal de companhia e dos donos e seus filhos (cfr. os artigos 1793.º-A do CC), à semelhança do artigo 1906.º nºs 5 (…) e 7 (…) do Código Civil. … Continuando. Em coerência, com as devidas adaptações, entendemos dever seguir-se a tramitação processual relativa às crianças e jovens, em particular a inerente à ação tutelar comum, de acordo com os artigos 67.º do Regime Geral o Processo Tutelar Cível (RGPTC) e segundo os princípios processuais da jurisdição voluntária, como decorre dos artigos 986.º a 988.º ambos do CPC. O enquadramento assim engendrado cremos respeitar as regras integrativas vigentes no nosso sistema jurídico-civil (artigo 10.º do CC), sendo certo que a flexibilidade da ação tutelar comum permite a adaptação à especificidade de cada agregado em que se integra o animal de companhia. Ou seja, sem invasão da competência do legislador, o juiz pode criar o direito dentro da jurisdição voluntária.”, e, em coerência com tal entendimento, sustenta serem os tribunais de família e menores os competentes nesta matéria, quer por força do art.º 122º, nº 1, al. a) das LOSJ, quer por aplicação adaptativa do art.º 123º da mesma lei.
Salvo o devido respeito por opinião contrária, não se nos afigura que o tribunal de família e menores seja o competente para a execução por alimentos fixados a favor de animais de companhia, acordados no âmbito da ação de divórcio e posteriormente alterados pelo tribunal.
Os juízos de execução têm competência especializada (art.º 81º, nº 3, j), da LOSJ), exercendo a sua competência, no âmbito dos processos de natureza cível, em todos os que não estejam excluídos nos termos do nº 2 do art.º 129º da LOSJ, entre os quais se contam, precisamente, os processos atribuídos aos juízos de família e menores.
A competência dos tribunais de família e menores é especializada, estando fixada em função da natureza das questões colocadas.
Dispõe o art.º 122º, nº 1, al. f) da LOSJ que compete aos juízos de família preparar e julgar as ações e execuções por alimentos entre cônjuges e entre ex-cônjuges, e o art.º 123º, nº 1, al. e), da mesma Lei, prevê essa competência para “e) Fixar os alimentos devidos a menores e aos filhos maiores ou emancipados a que se refere o artigo 1880.º do Código Civil, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 47344, de 25 de novembro de 1966, e preparar e julgar as execuções por alimentos.”.
No caso em que as partes acordam que um dos ex-cônjuges contribuirá para o sustento dos animais que ficam entregues ao outro, não está em causa matéria relativa a alimentos entre ex-cônjuges, ou devidos aos filhos.
O que está em causa é uma obrigação prestacional assumida no âmbito do acordo sobre o destino dos animais de companhia, com natureza atípica como entende Raúl Farias, que não se enquadra nas referidas normas da LOSJ, as quais não admitem aplicação analógica.
Por outro lado, o art.º 85º do CPC não encerra norma de competência (neste sentido, ver José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, em CPC Anotado, Vol. 1º, 4ª ed., págs. 193/194), ou só “reflexamente dispõe sobre a competência do tribunal” (como entendem Paulo Ramos Faria [2] e Ana Luísa Loureiro, em Primeiras Notas ao Novo Código de Processo Civil, Vol. I, 2ª ed., págs. 113/114), sendo pelas normas da LOSJ que se determina o tribunal competente (nº 2 do art.º 85º).
Em conclusão do que se deixa escrito, afigura-se-nos que a competência para tramitar a presente ação executiva é dos Juízos de Execução, por força do disposto no art.º 129º, nº 1, da LOSJ, como entendeu o tribunal recorrido, improcedendo, pois, a apelação.
Transitada em julgado a decisão, deverá ser dado cumprimento ao disposto no nº 2 do art.º 85º do CPC.
As custas da apelação comportam, apenas, a modalidade de custas de parte.
Uma vez que as mesmas seriam a cargo da apelante (art.º 527º, nºs 1 e 2 do CPC), que beneficia de apoio judiciário, e o apelado não contra-alegou, não há lugar à condenação em custas.
DECISÃO
Pelo exposto, acorda-se julgar a apelação improcedente, mantendo-se a decisão recorrida.
Sem custas.
*
Lisboa, 2024.09.10
Cristina Coelho
Edgar Taborda Lopes
Paulo Ramos de Faria
_______________________________________________________
[1] Nos seguintes termos: “1º Os animais de companhia, nomeadamente três gatos e um cão, ficam confiados à Requerente NN 2º O Requerente MM pagará à Requerente NN a quantia de €200 (…) euros mensais, a título de despesas com alimentação e cuidados veterinários com os animais de companhia. 3º A referida quantia vigorará durante o período de vida dos animais, estando sujeita redução, a acordar entre os Requerentes perante a morte de um ou mais dos referidos animais”.
[2] Que subscreve o presente acórdão como 2º adjunto.