ACIDENTE DE TRABALHO
VIOLAÇÃO CULPOSA DAS REGRAS DE SEGURANÇA
PROVA DO AUMENTO DA PROBABILIDADE DA SUA OCORRÊNCIA
MAS SEM EXIGÊNCIA DE DEMOSNTRAÇÃO DE QUE NÃO TERIA OCORRIDO SEM A REFERIDA VIOLAÇÃO.
Sumário

I - Para que se possa imputar o acidente e suas consequências danosas à violação culposa das regras de segurança pelo empregador ou por uma qualquer das pessoas mencionadas no artigo 18.º, n.º 1, da LAT, é necessário apurar se nas circunstâncias do caso concreto tal violação se traduziu em um aumento da probabilidade de ocorrência do acidente, tal como ele efetivamente veio a verificar-se, embora não seja exigível a demonstração de que o acidente não teria ocorrido sem a referida violação.
II - A atribuição ao sinistrado do direito a quaisquer outras[prestações], seja qual for a sua forma, desde que necessárias e adequadas à sua recuperação para a vida ativa” (art.º 23/1, L98/2009), prende-se com o princípio geral da reposição natural quanto à indemnização no domínio da responsabilidade civil, estabelecido no artigo 562.º do Código Civil.
III - Não sendo viável a readaptação do veículo do sinistrado, a obrigação da seguradora consiste em proporcionar-lhe um veículo que ele possa legalmente conduzir no seu dia-a-dia, isto é, equipado com caixa de velocidades automática, tendo em vista a sua recuperação para a vida ativa.
IV - Para cumprimento do referido em III, não é necessário que seja um veículo novo, nem mesmo da mesma marca, exigindo-se apenas que se encontre funcional de modo a cumprir cabalmente o objetivo de reparação a que se destina, desde que pertença ao mesmo segmento do veículo do sinistrado.
V - No cumprimento da obrigação a responsável não está obrigada a suportar despesas que vão para além do montante correspondente a 12 vezes o valor de 1,1 IAS à data do acidente.

Texto Integral

Processo nº 5408/16.7T8MAI.P1

Origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo do Trabalho da Maia – Juiz 2


Recorrente: AA
Recorridas: A... – Companhia de Seguros, S.A., B..., Unipessoal, Lda. e C...,S.A.



Relatora: Teresa Sá Lopes
1ª Adjunta: Desembargadora Eugénia Pedro
2ª Adjunta: Desembargadora Rita Romeira







Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:


1. Relatório (aproveita-se parte do relatório efetuado na sentença, com texto em formato de letra diferente):
Identificação das partes
O A. AA, residente em ..., intentou a presente ação especial emergente de acidente de trabalho contra a R. Companhia de Seguros, A..., S.A., com sede no Porto.

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Identificação do objeto do litígio
Peticiona o Sinistrado a condenação da R. no pagamento da pensão anual e vitalícia e atualizável no montante anual de €4.890,67, calculada com base na retribuição anual de €8.733,34, que auferia à data do acidente e com base na IPP de 30,00% fixada pelo médico perito de avaliação de dano do INML; da quantia de €4.393,52 a título de subsídio de elevada incapacidade; da quantia de €118,22 a título de indemnização ainda em falta pelos períodos de incapacidades temporárias; da quantia de €35,00 a título de deslocações ao GML e ao tribunal; o tratamento médico, incluindo os de medicina física e reabilitação necessários para a reparação das lesões sofridas no acidente de trabalho; o montante de €20.000,00 a título de readaptação de automóvel ou substituição por outro adaptado às suas limitações físicas e funcionais, ou seja, com caixa de velocidades automática; e dos juros de mora sobre todas as quantias em que vier a ser condenada desde os respetivos vencimentos até integral pagamento.
Para além disso, requer que nos termos e ao abrigo do disposto no art. 75º, nº 2 e com os limites impostos pelas respetivas alíneas a) e b), se determine a imediata remição parcial da pensão anual fixada ao Sinistrado.
Para tanto, alega o A. que em 10-11-2015, pelas 14:40 horas, em ..., quando sob as ordens, direção e fiscalização de “B..., Unipessoal, Lda.”, desempenhava as funções de serralheiro, sofreu um acidente, nomeadamente quando trabalhava no telhado de um edifício sofreu uma eletrocussão.
Alega, ainda, que desse evento resultaram queimaduras de 1º e 2º grau da mão direita e esquerda e queimadura de 3º grau no pé esquerdo (hallux e planta).
À data do acidente, o A. auferia o salário anual de €8.733,34 (€550,00 x 14 meses + €93,94 x 11 meses), a título de retribuição base e subsídio de alimentação, respetivamente, encontrando-se a responsabilidade infortunística transferida para a R. Companhia de Seguros pelo contrato de seguro titulado pela apólice nº ...78.
Acrescenta que após a data da consolidação médico-legal das lesões em 09-01-2017, o A. ficou afetado de várias sequelas graves, designadamente dismorfia da região da planta do pé esquerdo na zona do arco do 3º e 4º dedos, com área ulcerada com 3 por 2,5 cm de maiores eixos; dismorfia do 1º dedo do pé esquerdo, com excerto de pele circundante; pele fria da metade distal do pé esquerdo (dorso e região plantar, por comparação ao contra lateral); movimento de retirada ao toque de toda a metade distal do pé esquerdo (dorso ou planta); bem como restante membro inferior esquerdo com atrofia ligeira dos diferentes grupos musculares por comparação com o membro inferior contra lateral.
Refere que as sobreditas sequelas correspondem a algodistrofia do membro inferior esquerdo, com alterações tróficas e impotência funcional no pé e dedos esquerdos, correspondente a uma IPP de 30%, com IPATH, conforme resulta do relatório de perícia do INML.
Aduz que na Tentativa de Conciliação, realizada em 03-05-2018, a R. Companhia de Seguros declarou aceitar a existência e caracterização do acidente como de trabalho; o nexo de causalidade entre as lesões e o acidente; a sua responsabilidade até ao limite do salário para si transferido e acima definido; pagar as despesas com deslocações a este tribunal e ao INML no valor de €35,00; o grau de incapacidade permanente atribuído pelo perito médico do INML; que o A. se encontra afetado de incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual e que necessita de tratamentos de medicina física e reabilitação, com regularidade a decidir nesta consulta, para evitar agravamento do quadro de algodistrofia do membro inferior esquerdo, tal como como consta do relatório de perícia do INML.
Contudo, a mesma R. Companhia de Seguros, declarou não aceitar que o A. carece de auxílios técnicos, nomeadamente um veículo automóvel com mudanças automáticas, bem como de frequência de ação no âmbito da reabilitação profissional, razão pela qual não foi possível a conciliação entre as partes.
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Citada para o efeito, veio a R. Companhia de Seguros apresentar contestação, invocando que aceita a transferência da responsabilidade pela remuneração anual de €8.733,34, a existência do acidente, o nexo causal entre o mesmo e as sequelas sofridas e confirmadas pelos serviços clínicos da R. Companhia de Seguros, não aceitando, assim, que as sequelas de que o demandante padece se mostrem causais e justificativas do alegado enquanto prestações em espécie por auxílios técnicos com veículo automóvel, com caixa de velocidades automática e com frequência de ação, em reabilitação profissional, pelo que requer a realização de exame por junta médica; igualmente invoca que o acidente resultou da violação de normas de segurança por parte da Empregadora, B..., Unipessoal, Lda. verificando-se, deste modo, a violação culposa de normas de segurança.
Alegou a R. Seguradora que naquele dia, hora e local, a mando da Empregadora, o A., encontrava-se na cobertura do edifício de uma sociedade terceira, cliente da Empregadora, para aí efetuar a reparação de infiltrações e falhas na estanquicidade dessa mesma cobertura, quando pegou numa escada móvel de alumínio, propriedade da Empregadora, que se mostrou necessária para poder escalar e subir ao cimo da referida cobertura, colocou a dita escada posicionada a cerca de 1 metro do topo da platibanda daquela cobertura, procedeu à movimentação da mesma, altura em que o material metálico de que era composta essa escada, funcionou como arco elétrico conduzindo à produção de uma descarga sobre o corpo do A., devido à existência de uma linha aérea elétrica de média tensão que se encontrava a cerca de entre 3,5 e 4 metros onde o A. se encontrava, sabendo a Empregadora e o A. da existência dessa linha, estando a mesma perfeitamente visível.
Invocou a R. que o acidente se deveu ao facto de a Empregadora ter incumprido, além do mais, as disposições específicas respeitantes aos equipamentos de trabalho que devem proteger os trabalhadores expostos contra os riscos de contacto direto ou indireto com a eletricidade, bem como, as condições específicas de distância em segurança publicamente exigidas pelo operador-distribuidor D..., de afastamento de, pelo menos, 1,50 metros, duma qualquer linha de média tensão.
Conclui, assim, que o acidente ocorreu exclusivamente pelo grosseiro incumprimento da Empregadora, quer dos preceitos legais gerais, quer das específicas normas legais e regulamentares atinentes às prescrições de segurança para a concreta atividade que explorava e tipo de trabalho que ordenou ao A. Tais omissões exclusivamente causais e culposas na produção do acidente, além de que de todo estranhas ao risco próprio de categoria profissional do A. determinaram culpa da Empregadora, pelo que deverá a ação ser julgada em conformidade e, bem assim, requer seja citada a Empregadora nos termos do regime previsto no art. 129º, nº 1, alínea a) do CPT e seja ordenado a abertura de apenso para fixação e incapacidade por junta médica.
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Respondendo, veio o Sinistrado defender-se alegando que os factos sobre os quais tenha havido acordo na tentativa de conciliação devem ser assentes por confissão, uma vez que do Auto da Tentativa de Conciliação realizada em 03-05-2018, resulta que a R. Companhia de Seguros, através da sua representante declarou aceitar expressa e inequivocamente tais factos, pelo que não se compreende que a R. venha agora alegar a exceção consistente em imputação de responsabilidade à entidade patronal do A. por suposta violação de regras de segurança, tratando-se de defesa extemporânea e sem qualquer fundamento. Acrescenta que é impertinente vir também agora pretender discutir as lesões que o Sinistrado padece resultantes das sequelas sofridas no acidente, em virtude de confissão irretratável pela R. aceite também pelo Sinistrado, pelo que deverá o objeto do litígio se resumir apenas às questões que motivaram a não conciliação, deverá ser rejeitado o pedido de intervenção provocada da entidade patronal do Sinistrado, deverá ser rejeitado o pedido de abertura do apenso para junta médica e, bem assim, julgadas improcedentes as exceções invocadas pela R..
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Por despacho datado de 12-9-2018, foi determinada a intervenção da entidade empregadora B..., Unipessoal Lda, com sede em ....
Citada para o efeito, veio a R. Empregadora apresentar contestação, invocando que o A. era seu trabalhador, ao abrigo de um contrato por tempo indeterminado, tinha a categoria profissional de serralheiro civil, exercia nomeadamente as funções de executar, montar e reparar estruturas metálicas, caixilharias e outros elementos metálicos, de acordo com as especificações técnicas, auferia o salário anual de €8.733,34, que se encontrava totalmente transferido, à data do acidente, para a R. Companhia de Seguros.
Invoca, ainda, que as referidas funções foram exercidas sempre segundo as ordens e orientações da R. Empregadora, respeitando as normas de segurança, higiene e saúde no trabalho e de proteção do ambiente
Alega que teve conhecimento da ocorrência do acidente, ao qual não assistiu, mas que lhe foi transmitido, pelo que desconhece as reais condições em que o mesmo se verificou, tendo participado a ocorrência do mesmo de acordo com o que lhe foi transmitido.
Aduz que, se dedicava, à data do acidente, e ainda se dedica à atividade de serviços elétricos, telecomunicações e metalomecânica, tudo isto era do conhecimento da R. Companhia de Seguros, a quem regularmente eram enviadas, não só as folhas de férias de funcionários com as respetivas categorias, bem como certidão permanente da R. Empregadora, na qual consta o respetivo objeto social.
Acrescenta que, na tentativa de conciliação a R. Companhia de Seguros assumiu a responsabilidade pelo acidente, não tendo colocado nunca em causa uma eventual responsabilidade quer do A., quer da própria entidade patronal, estando aquela na posse de todos os elementos ocorridos e geradores do acidente.
Refere que, à data do acidente, o A. exercia funções para a R. Empregadora e, como tal, foi destacado para prestar serviços numa cliente da R. Empregadora, desconhecendo os concretos atos que o A. teria que praticar, sendo certo que fossem quais fossem os mesmos, o A. tinha instruções para cumprir escrupulosamente todas as normas de segurança no trabalho. Adita que, quando o A. ou qualquer outro funcionário da R. Empregadora, tivesse que efetuar serviços que exigissem material e/ou equipamento especifico para os fazer em segurança, tinham instruções rigorosas para comunicarem tal serviço à sua entidade patronal, mencionando todo o material de segurança que necessitassem, normalmente na véspera, tendo assim, todos os meios técnicos de segurança ao dispor.
Alega que sabia que o A. estaria a verificar da necessidade de uma eventual intervenção nos rufos, caleiras e cobertura do edifício, serviços e trabalhos para os quais tinha competência profissional, sendo certo que nunca o A. comunicou em concreto o serviço que ia efetuar, ignorando a partir daí toda a dinâmica que terá provocado o acidente, inclusive a linha aérea elétrica de média tensão mencionada nos autos, estaria ela mesma indevida e ilegalmente colocada, situada em zona (altura) que lhe estaria vedada, como o demonstra o facto de escassos dias após o acidente a D.../REN haver procedido ao seu alteamento. Sabia, ainda, da existência da referida linha aérea num dos topos do edifício em causa, sempre tendo pensado que a mesma se encontraria a uma altura segura, sendo que desconhecia em concreto que o serviço/averiguação levada a cabo pelo A., fosse feita precisamente nesse topo do edifício.
Acrescenta que desconhece a que escada se refere a R. Companhia de Seguros, já que nenhuma escada sua foi utilizada no referido acidente.
Conclui, assim, que não aceita que lhe seja imputada qualquer culpa, muito menos grosseira, na produção do evento, já que não só à data como em qualquer circunstância, é cumpridora de todas as regras e normas de segurança e não contribuiu por ação ou omissão para a produção do acidente, nem à mesma pode ser imputada qualquer culpa ou até simples negligência, pelo que deverá a ação ser julgada de acordo com o supra alegado e a R. absolvida de qualquer pedido.
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Notificada para o efeito, veio a R. Empregadora alegar que aceita o resultado do exame médico do INML quanto ao coeficiente atribuído, bem como aceita que o Sinistrado se encontra afetado de uma IPA para a profissão habitual, bem como, aceita a apontada necessidade de tratamentos e períodos de incapacidade temporária sofridos pelo Sinistrado.
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Foi proferido o despacho saneador, onde se verificou a regularidade da instância, selecionaram-se os factos assentes e a base instrutória. Não foi determinado o desdobramento do processo para fixação da incapacidade para o trabalho, atenta a factualidade já assente por acordo das partes – ref. datada de 28-2-2019.”
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Em 02.10.2022, a “Massa insolvente da B..., Unipessoal, Lda”, representada pelo respetivo Administrador, juntou aos autos procuração, constituindo como mandatário, o Mandatário da Entidade empregadora.
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“No decurso da audiência e julgamento (cfr. ref. datada de 30-11-2022), veio o Sinistrado requerer a intervenção de C..., S.A., com sede em ..., ..., alegando que resulta da prova até então produzida que esta seria beneficiária da atividade laboral do A., porquanto foi no cumprimento de ordens diretas da Chamada que o A. subiu ao telhado do armazém na altura em que ocorreu o fatídico acidente, concluindo que o acidente foi causado pelo incumprimento ostensivo das mais elementares regras de segurança, quer pela R. Empregadora, quer principalmente pela Chamada C..., reclamando a responsabilidade agravada de ambas as entidades, de acordo com o disposto no art. 18º, nº 1, da LAT, pelo que peticiona a ampliação do pedido título de ressarcimento de danos de cariz não patrimonial, pelo montante de €50.000,00.
Além disso, requereu a ampliação do pedido. Com efeito, na PI havia o A. reclamado o montante de €20.000,00 a título de readaptação de automóvel ou substituição por outro adaptado às suas limitações físicas e funcionais, ou seja, com caixa de velocidades automática. Adita o ora A. que através do relatório pericial datado de 23-05-2022, tomou conhecimento de que, afinal, a sua viatura automóvel não é passível de readaptação para caixa de velocidades automática e, bem assim, que uma viatura idêntica tem o custo de €42.347,14. Assim, requer a ampliação do pedido inicialmente formulado para custeio de viatura de substituição adaptada às suas necessidades e limitações, para o montante de €42.347,14 ou fornecimento da viatura.
Notificada para o efeito, a R. Companhia de Seguros aderiu ao Chamamento da C..., declinou qualquer responsabilidade pelo agravamento da reparação em virtude de violação de regras de segurança e opôs-se à ampliação do pedido.
(…)
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Citada para o efeito, veio a Chamada C..., S.A. apresentar contestação, invocando que os factos sobre os quais houve acordo na tentativa de conciliação e/ou resultem reconhecidos em sede de articulados das partes, devem considerar-se assentes por confissão.
Acrescenta que, impugna todo o conteúdo descrito no requerimento de intervenção apresentado pelo A., uma vez que toda a matéria ali versada se mostra controvertida com os factos anteriormente confessados pelo A..
Alega que a R. Empregadora em resposta à ampliação do pedido requerido pelo A. escusou-se, repentinamente, de qualquer responsabilidade no acidente sofrido pelo A, aproveitando-se, indevidamente, de si para lhe imputar tais causas. Acrescenta que se analisarmos atentamente o teor da Contestação apresentada pela R. Empregadora, é possível apurar conclusões diferentes entre este e o teor do requerimento da referida resposta.
Aduz que não se compreende que a R. Companhia de Seguros, em sede de tentativa de conciliação, tenha assumido total responsabilidade pelo acidente, sem nunca ter colocado em causa uma eventual responsabilidade da Chamada C... e, agora, estranhamente, não se opôs à sua intervenção no processo, como responsável pelo acidente ocorrido.
Com efeito, conclui que não houve ordens, diretas ou indiretas, da Chamada C..., a ordem foi emanada da Ré Empregadora; a linha de média tensão era claramente visível a todos, incluindo o A., conforme se verifica pelo conjunto de fotografias juntas aos autos; o A. conhecia da linha de média tensão e, ainda assim, não adotou as medidas de segurança necessárias para a execução do serviço; a R. Empregadora conhecia a existência de linha de média tensão e não se absteve, ainda assim, de ordenar ao A. que realizasse o trabalho sozinho, quando havia outros trabalhadores da R. Empregadora no local, e sem previamente definir um plano de segurança; a R. Empregadora não disponibilizou ao A. os equipamentos específicos para a realização do trabalho em segurança e a escada metálica foi utilizada, vários dias, pelo A., no entanto, não foi a causa direta do acidente, pelo que o nexo de causalidade não se tem como verificado.
Adita que a causa direta do acidente foi a movimentação da escada para a cobertura, realizada pelo A., que violou a distância de segurança existente entre a cobertura e a linha de média tensão; a produção do acidente determina, em concreto, a culpa da Entidade Empregadora, como única obrigada a ministrar formação profissional sobre normas de segurança, trabalhos em altura e trabalhos em exterior, o que não o fez e não pode a C... responder pelo descaimento da linha elétrica, na medida que em que a sua instalação e manutenção, enquanto rede pública, é da responsabilidade da D... Distribuição.
Acrescenta que, a C... dispõe de planos de prevenção de riscos e segurança no trabalho, inclusive em matéria de transporte de cargas e manuseamentos de escadas móveis; ministra formação profissional a todos os seus trabalhadores, inclusive, em matéria de regras de segurança e saúde no trabalho; tomou um conjunto de medidas preventivas de segurança, como ainda um conjunto de medidas que visam impedir que acidentes similares ao ocorrido com o A. voltem a suceder-se; com a eletrocussão, a escada metálica caiu no passeio junto ao edifício, sendo que os seus trabalhadores que apareceram em primeiro lugar ao local e socorreram o A. utilizaram a dita escada para acederem à cobertura; tal como os bombeiros que ali se deslocaram e, inclusive, subiram e desceram a maca também pela escada metálica que pertencia à Chamada C..., pois esta escada não representava qualquer perigo como a presente ação quer fazer crer.
Refere a Chamada C... que não existiu qualquer violação e/ou omissão, que motivem a imputação de responsabilidades a esta.
Conclui, assim, que a intervenção de entidades terceiras só se peticiona quando verificada a violação das regras de segurança por parte desta, o que não foi o caso da Chamada C..., pelo que deverá a ação ser julgada totalmente improcedente por não provada e a Chamada C... ser absolvida dos pedidos formulados pelo A..”

Ainda em resposta ao mesmo requerimento do Sinistrado, veio a “Massa insolvente da B..., Unipessoal, Lda”, com mandatário constituído, manifestar que não se opõe à requerida ampliação do pedido, recusando que tivesse incumprido as regras de segurança, pelo que não lhe pode ser assacada qualquer responsabilidade no acidente.
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O Sinistrado e a Ré Companhia de Seguros, no exercício do contraditório, impugnaram o alegado no articulado de defesa da Chamada.
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Foi realizada audiência final com observância do formalismo legal, conforme se colhe do teor da respetiva ata.

Foi realizada a audiência de discussão e julgamento com observância de todas as formalidades legais, após o que foi proferida sentença, de cujo dispositivo consta:
“Decisão
Na desinência do exposto, julgo a presente ação parcialmente procedente, por parcialmente provada, e em consequência, declaro que o sinistrado AA sofreu um acidente de trabalho no dia 10-11-2015, encontrando-se afetado de IPP de 45% com IPATH desde 10-1-2017, e em consequência, condeno a entidade responsável Companhia de Seguros A... S.A.:
I) a pagar ao sinistrado a quantia remanescente de 118,22€ (cento e dezoito euros e vinte e dois cêntimos), pela indemnização por incapacidades temporárias, acrescida de juros de mora desde a data do vencimento até integral pagamento;
II) a pagar a sinistrado a pensão anual, vitalícia e atualizável, no montante de 5.152,67€ (cinco mil cento e cinquenta e dois euros e sessenta e sete cêntimos), acrescida de juros, à taxa anual de 4%, desde o dia seguinte à data da alta, até efetivo e integral pagamento;
III) a pagar ao sinistrado o subsídio de elevada incapacidade permanente no valor de 4.617,16€ (quatro mil seiscentos e dezassete euros e dezasseis cêntimos), acrescido de juros, à taxa anual de 4%, desde o dia seguinte à data da alta, até efetivo e integral pagamento;
IV) a pagar ao sinistrado a quantia de 35,00€ (trinta e cinco euros) a título de despesas com transportes, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a data da tentativa de conciliação (3-5-2018), até integral e efetivo pagamento.
V) no fornecimento de uma canadiana com renovação a cada dois anos;
VI) no fornecimento de dois pares anuais de calçado específico, Reebok DMX series ou sapatilha equivalente;
VII) na readaptação do veículo automóvel, pertença do sinistrado ou que este adquira com características idênticas, com a instalação de caixa de velocidades automática, até ao limite de 5.533,70€ (cinco mil quinhentos e trinta e três euros e setenta cêntimos);
VIII) Determino a dedução nos valores ora fixados da quantias entretanto pagas pela seguradora a título de pensão provisória.
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IX) Absolvo a R. seguradora A... – Companhia de Seguros S.A. do demais peticionado.
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X) Absolvo a R. B... Lda. e C... S.A. dos pedidos contra si formulados.
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Custas da fase contenciosa da ação a cargo da R. seguradora – art. 527º, nºs 1 e 2 do CPC.
*
Valor da ação: o somatório do que corresponderia ao capital de remição acrescido de 5.533,70€ + 35,00€ + 4.617,16€ + 118,22€ - art. 120º, nºs 1 e 3 do CPT.
Registe e notifique.”

Não se conformando com o assim decidido, o Autor apelou.
Foram as seguintes as suas conclusões que se transcrevem:
“1.ª Nos termos do disposto nos artigos 662.º e 640.º, ambos do Código de Processo Civil, o Tribunal da Relação pode, no caso vertente, alterar a decisão sobre a matéria de facto, uma vez que os apelantes a impugnaram, os depoimentos estão gravados e constam dos autos todos os elementos e documentos com base nos quais foi proferida.
2.ª Tendo em conta as declarações de parte do Autor e os depoimentos das testemunhas BB e CC, o Tribunal a quo podia e devia ter julgado de modo diverso a matéria dos pontos 12, 13, 14, 15, 16, 18, 25, 28 e 31 dos Factos Provados.
3.ª Com efeito, da conjugação desses depoimentos, com as demais provas disponíveis, as respostas em causa deverão ser alteradas para as que seguem
Ponto12 - O A. encontrava-se diariamente nas instalações da chamada C..., sendo este o seu local de trabalho.
Ponto 13 - No âmbito do contrato de prestação de serviços entre a Ré B... e a chamada C..., a B... colocava trabalhadores seus permanentemente nas instalações da chamada.
Ponto 14 – Os serviços eram prestados pelos trabalhadores da B..., que posteriormente cobrava tais serviços.
Ponto 15 - Os trabalhadores da B..., incluindo o Autor, tinham obrigação de reportar a esta todos os trabalhos realizados, após a sua execução, inexistindo plano prévio de trabalhos.
Ponto 16 - O modo de execução dos serviços era definido entre a chamada C... e os trabalhadores residentes da B..., atendendo às necessidades apresentadas pela C....
Ponto 18 - Foi a chamada C..., através do diretor de manutenção adjunto quem ordenou ao Autor a reparação do telhado.
Ponto 25 - Na altura do acidente, o Autor, a mando da C..., encontrava-se no exterior do edifício a fazer trabalhos de manutenção.
Ponto 28 - Para executar a ordem da C..., o Autor colocou a escada posicionada de molde que o cimo da escada ultrapassava o topo da cobertura onde iria trabalhar.
4.ª Por sua vez, a materialidade inserta no ponto 31 deverá dar-se como não provada.
5.ª Operadas as alterações da matéria de facto acima preconizadas, torna-se evidente que a pretensão deduzida pelo Autor relativa à condenação solidaria da Ré B... e da chamada C... em indemnização por responsabilidade agravada deverá ser julgada procedente.
6.ª Com efeito, tanto a Ré B..., como a chamada C... sabiam da existência da linha elétrica de média tensão, pelo que tinham de estar cientes do riso associado a essa presença.
7.ª Apesar disso, nem uma nem outra trataram de estabelecer um plano de trabalhos que contemplasse e prevenisse esse risco.
8.ª As mais elementares regras de conhecimento comum impunham que se adotassem medidas de segurança, tais como pedir à D... que cortasse temporariamente a emergia elétrica.
9.ª Mas não, a chamada C..., ordenou, através do seu responsável de manutenção, que o Autor executasse o trabalho de reparação no telhado, ao qual este tinha de subir, através de uma escada metálica que lhe disponibilizou.
10.ª A completa omissão pela entidade empregadora e pela Chamada de cumprimento dos deveres de identificar os riscos, designadamente, de electrocução, bem assim de organizar e planear o trabalho de modo a eliminá-los ou, pelo menos, a reduzi-los tanto quanto possível, em conformidade com as regras legais definidas para o efeito, levou a que a probabilidade objetiva de ocorrer um acidente de trabalho, designadamente, de eletrocução, devido a essa omissão de medidas, fosse muito elevada.
11.ª Nesta consideração, conclui-se pela existência de nexo de causalidade entre a omissão daquele conjunto de deveres e a ocorrência do acidente que vitimou o sinistrado, aqui recorrente.
12.ª De sorte que, existindo responsabilidade agravada, quer a Ré B..., quer a chamada C..., serão solidariamente responsáveis pela indemnização agravada a que o Autor tem direito.
13.ª Nas apontadas circunstâncias, será apodítico concluir que, na procedência do pedido formulado pelo Autor, deverão a Ré B... e a chamada C... ser solidariamente condenadas a pagar-lhe os montantes peticionados decorrentes de responsabilidade agravada (danos não patrimoniais e pagamento de pensão anual agravada).
14.ª Cabendo referir que o montante de 50.000,00€, liquidado a título de ressarcimento dos danos de natureza patrimonial sofridos pelo Autor, não encerra, atenta a suma gravidade destes, qualquer exagero.
15.ª Ao decidir como decidiu, a douta sentença recorrida violou o disposto no art. 18.º da LAT.
16.ª Do exame colegial por junta médica da especialidade de Medicina Física e de Reabilitação de 19-04-2021, resultou por unanimidade, entre o mais, que “o Autor necessita de tratamentos de medicina física e de reabilitação, para evitar o agravamento sequelar das lesões ao nível do pé esquerdo, 40 sessões anuais, por provadas julgadas adequadas às necessidades do sinistrado, comum a periodicidade sem anal de2 a 3 semanas(num total de 40 sessões anuais).
17.ª Este facto deverá ser acrescentado ao acervo da factualidade apurada e a seguradora responsável deverá ser condenada a asseguram e custear tais necessidades do Autor, acrescentando-lhe um ponto 60.
18.ª Por fim, no que respeita à necessidade de viatura adaptada às condições físicas do Autor, provou-se que o veículo que o Autor possuía não era, nem é suscetível de adaptação.
19.ª Mais se apurou, através do relatório da Autopédico e da proposta no mesmo contida, que uma viatura idêntica, devidamente adaptada a poder ser conduzida pelo Autor tem o custo de 42.347,14€, facto este que deverá ser aditado ao elenco da factualidade provada, sob o ponto 61.
20.ª De sorte que deverá a Ré Seguradora ser condenada no pagamento do montante de 42.347,14, para aquisição de uma viatura automóvel adaptada às suas necessidades deduzindo-se o valor de retoma da viatura anterior, ou relegar-se para liquidação posterior.
21.ª A condenação a tal título ditada pela douta sentença recorrida - 5.533,70€, apenas – é manifestamente exígua e insuficiente para proporcionar a recuperação do sinistrado para a vida ativa incluindo todos os aspetos da sua vida pessoal e social, mesmo que com carácter lúdico.
Termos em que deve ser concedido provimento ao recurso, revogando-se a decisão recorrida, seja no que se refere à apreciação da matéria de facto, seja no que concerne às soluções de direito adotadas, e substituindo-se por uma outra que decida em conformidade com o exposto.
Assim se fará e melhor e mais sã JUSTIÇA!” (realce e alteração do tamanho de letra aqui introduzidos)

A Recorrida “C..., S.A.”contra-alegou, pugnando pela confirmação da sentença proferida, aduzindo para tal:
“i. A douta sentença de fls. não violou qualquer preceito legal, sendo a mesma inteiramente pertinente e acertada na parte de que se recorre, razão pela qual se deve manter nos precisos termos em que se encontra, sendo o presente recurso julgado totalmente improcedente.
ii. Não existe erro na matéria de facto dada como não provada, sendo totalmente acertados os pontos que foram dados como provados nos artigos 12, 13, 14, 15, 16, 18, 25, 28 e 31, ouça-se a este respeito o depoimento de Recorrente, gravado no dia 4 de novembro de 2022, das 10h15 às 11h26, mais concretamente, dos minutos 00:04:00 a 00:05:07, 00:06:33, 00:07:30, 00:15:10, 00:15:23, 00:19:47, 00:19:52, 00:21:38, 00:39:48, 00:40:31, DD, gravado no dia 4 de novembro de 2022, das 14h58 às 15h14 dos minutos 00:06:36 a 00:06:38, 00:07:56 a 00:08:16 e 00:12:20 a 00:12:32, BB, gravado no dia 4 de novembro de 2022, das 15h14 às 15h29, dos minutos 00:04:02 a 00:04:28, 00:05:16 a 00:05:31, 00:09:39 a 00:10:12, CC, gravado no dia 24 de maio de 2023, das 15h01 às 16h04, dos minutos 00:04:57 a 00:06:22, 00:08:43 a 00:09:07, 00:09:09 a 00:10:03, 00:10:05 a 00:11:30, 00:14:38 a 00:15:37, 00:20:27 a 00:21:44, 00:21:45 a 00:22:08, 00:23:38 a 00:24:03; e, EE, gravado no dia 24 de maio de 2023, das 16h05 às 17h04, mais concretamente, dos minutos 00:02:45 a 00:04:37, 00:05:16 a 00:06:43, 00:06:48 a 00:09:18, 00:16:01 a 00:17:28, 00:17:31 a 00:19:21, 00:32:39 a 00:34:37, 00:40:21 a 00:42:39, 00:44:01 a 00:45:03 e 00:45:03 a 00:45:22.
iii. Da análise atenta dos depoimentos que se acabam de salientar, e sem prejuízo da audição total dos mesmos, não podem resultar dúvidas da inexistência de erro na apreciação da matéria de facto.
iv. Os factos dados como provados resultaram da explicação exaustiva, idónea e clara que foi feita sobre os alegados factos como causa geradora do acidente de trabalho ocorrido.
v. Bem como, da prova documental junta aos autos a fls. 396.
vi. No que respeita à matéria de direito, dir-se-á igualmente que não assiste razão ao Recorrente, considerando que nos termos dos artigos 18.º da Lei n.º 98/2009 de 04.09 e 342.º e 563.º, ambos do Código Civil, a teoria da causalidade adequada, na sua formulação negativa, determina, no que diz respeito às regras de segurança, que a responsabilização do empregador e/ou da entidade beneficiária dos serviços prestados pressupõe, para além da violação pelos mesmos de tais regras, a existência de nexo causal entre essa violação e o acidente, incumbindo a quem arroga o agravamento da responsabilidade fazer tal prova.
vii. Deste modo, não basta ter havia uma atuação culposa, mas é necessário que se verifique o nexo de causalidade entre tal violação e o acidente.
viii. Isto significa que, a responsabilização da Entidade Empregadora e/ou da aqui, Recorrida pressupõe, além da violação pelos mesmos de tais regras, a existência de nexo causal entre essa violação e o acidente.
ix. Porquanto, há que fazer apelo à teoria da causalidade adequada, consagrada no artigo 563.º, do Código Civil, a qual impõe «para que um facto seja causa de um dano é necessário que, no plano naturalístico, ele seja condição sem a qual o dano não se teria verificado e, em abstrato ou em geral, seja causa adequada do mesmo».
x. Deste modo, por um lado, «o facto gerador do dano só pode deixar de ser considerado sua causa adequada se se mostrar inidóneo para o provocar ou quando para a sua produção tiverem contribuído decisivamente circunstâncias anormais, excecionais, extraordinárias ou anómalas, que intervieram no caso concreto».
xi. É, ainda, manifesto, por outro lado, que, «a implementação de qualquer medida de proteção só é obrigatória quando esse risco efetivamente existir face a um juízo de prognose (…) e, não, face a um juízo a emitir com base em circunstâncias ou dados que só após o acidente se tornaram conhecidos ou cognoscíveis».
xii. Ou seja, exige-se que que o facto não tenha sido, de todo em todo, indiferente para a produção do dano, dentro dos juízos de previsibilidade que decorrem das regras da experiência comum.
xiii. A acrescer, a responsabilidade agravada pressupõe, nos termos do artigo 18.º da Lei n.º 98/2009 de 04/09, a verificação cumulativa do dever de observância de regras de segurança, do seu incumprimento e de uma relação de causalidade adequada entre a omissão e o acidente.
xiv. E, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 342.º do Código Civil, impende sobre a parte que invoca o direito às prestações agravadas o ónus de alegação e prova dos factos que integram a violação de regras de segurança e o nexo de causalidade entre a violação e o acidente.
xv. Sucede que, nem o Recorrente, nem a Entidade Seguradora lograram fazer prova do agravamento da responsabilidade requerida.
xvi. No presente caso, os factos reportam-se ao ano de 2015, data em que vigorava um contrato verbal de prestação de serviços celebrado entre a Recorrida e a Entidade Empregadora do Recorrente.
xvii. No decurso desse contrato, semanalmente, a Entidade Empregadora do Recorrente destacava alguns dos seus trabalhadores para se deslocarem às instalações da Recorrida, para aí realizarem os serviços que fossem solicitados, em especial, em serralharia.
xviii. Os serviços eram, individualmente, acordados entre a Entidade Empregadora do Recorrente e a Recorrida, segundo valores definidos previamente à execução dos trabalhos.
xix. Para o efeito, a Ré B... destacava o Encarregado ou Responsável para se deslocar ao local da obra e aí fazer uma avaliação do local, para apuramento de valores e definição de trabalhos a executar, bem como indicar meios e pessoas necessárias para a realização da tarefa adjudicada.
xx. Motivo pelo qual, o Recorrente tinha, por um lado, obrigação de reportar à sua Entidade Empregadora todos os serviços que iriam realizar ou realizavam, para verificação do cumprimento do plano de trabalhos definido e, por outro lado, executar os serviços nos termos definidos com a sua Entidade Empregadora e atendendo às necessidades apresentadas pela Recorrida.
xxi. Mais a mais, o Recorrente tinha ainda obrigação de solicitar à sua Entidade Empregadora todo o material e/ou equipamento específico que necessitasse, normalmente, na véspera, para a execução dos serviços.
xxii. Desta forma, a Recorrida detetou claros indícios de infiltrações numa cobertura de um dos seus armazéns instalada, anteriormente, pela Entidade Empregadora do Recorrente, razão pela qual foi acordado com esta a sua reparação, a qual veio a ser executada pelo Recorrente, por ordem da sua Entidade Empregadora, o qual se deslocou, vários dias e no dia do acidente, à dita cobertura, utilizando uma escada metálica para aceder, com vista a efetuar os trabalhos de reparação da cobertura.
xxiii. Ora, é em virtude de o acesso à dita cobertura se ter efetuado vários dias através da escada metálica (conforme o Recorrente confirmou em sede de depoimento), que a Recorrida afirmou que o acidente não aconteceu por se ter utilizado essa escada como forma de acesso à cobertura.
xxiv. Ao invés, o acidente ocorreu, porque naquele dia e pela primeira vez, o Recorrente, quando já se encontrava na cobertura e sem que nada o fizesse prever, decidiu mover a escada para cima da dita cobertura, violando e comprometendo a distância de segurança existente entre a linha elétrica de média tensão e a cobertura do edifício.
xxv. Em concreto, o acidente ocorreu quando o Recorrente, encontrando-se já posicionado em altura na cobertura, procedia à movimentação da escada, sendo que o material metálico, de que era composta essa escada, serviu de atração e funcionou como arco elétrico que produziu uma descarga sobre o corpo do Recorrente.
xxvi. Com efeito, a escada encontrava-se posicionada de modo que o seu topo ultrapassava em 1 metro a platibanda da cobertura, o que encurtou, nessa exata medida, a distância para a linha de média tensão.
xxvii. Sendo forçoso, assim, concluir, ter sido o movimento da escada metálica com 4 metros de extensão, colocada por forma a ultrapassar em 1 metro a bordadura da cobertura, no vão de uma linha elétrica, que naquele local distava 4,10 de altura, a atuar como condição causadora do arco elétrico que atingiu o Recorrente.
xxviii. Dessa forma, a escada metálica foi utilizada, vários dias, pelo Recorrente, no entanto, não foi a causa direta do acidente, pelo que o nexo de causalidade não se tem como verificado.
xxix. A causa direta do acidente foi a movimentação da escada metálica para a cobertura, realizada pelo Recorrente, que violou a distância de segurança existente entre a cobertura e a linha de média tensão.
xxx. Aliás, com a eletrocussão, a escada metálica caiu no passeio junto ao edifício, sendo que os trabalhadores da Recorrida que apareceram em primeiro lugar ao local e socorreram o Recorrente utilizaram a dita escada para acederem à cobertura;
xxxi. Bem como, os bombeiros que ali se deslocaram e, inclusive, subiram e desceram a maca também pela escada metálica.
xxxii. De igual forma, verifique-se o teor do relatório elaborado pelos engenheiros FF e GG da D..., os quais escreveram que «o acidentado iria proceder à reparação da cobertura do edifício, momento do acidente estaria a movimentar uma escada metálica, terá efetuado a sua movimentação de forma a violar a distância de segurança à minha de média tensão, situação que provocou um curto-circuito fase-terra e consequente eletrocussão do trabalhado».
xxxiii. Deste modo, a escada metálica não representava qualquer perigo como o Recorrente quer fazer crer.
xxxiv. Resultou claro que, não foi a mera utilização da escada metálica que provocou a ocorrência do acidente, mas, outrossim, a movimentação da escada para cima da cobertura.
xxxv. E, portanto, o Recorrente ao fazer esse movimento, efetivamente, viola a distância de segurança que existe entre a cobertura e a linha elétrica de média tensão e, por sua vez, acaba por provocar o acidente.
xxxvi. Apraz referir que, esse movimento não foi ordenado pela Recorrida, nem pela Entidade Empregadora do Recorrente.
xxxvii. Ademais, pelo próprio teor do relatório elaborado pela D..., resultou claro que no local onde o acidente ocorreu não existia um descaimento da linha elétrica de média tensão, portanto, no local do acidente, não havia uma violação de distância de segurança entre a cobertura e a linha elétrica de média tensão -essa distância é violada, apenas, por uma atuação isolada e não ordenada do Recorrente.
xxxviii. Ainda, urge clarificar que não resultou demonstrado que a colocação de um andaime, para acesso à cobertura, atenta a composição dos seus materiais e tamanho dos mesmos, não provocaria igual resultado.
xxxix. Mais, o corte de energia na linha elétrica de média tensão não era uma medida de proteção obrigatória em face das circunstâncias à data cognoscíveis, porquanto, por um lado, o sinistrado naquela semana vinha utilizando a escada em causa para aceder à cobertura para execução daqueles mesmos trabalhos.
xl. Como, o relatório elaborado pela D... assim o confirma, tanto que, durante as operações de resgaste, os agentes de proteção civil e bombeiros também não solicitaram tal corte, pois não havia proximidade com a linha elétrica de média tensão que assim o justificasse.
xli. Ficou, assim, por demonstrar que qualquer omissão de segurança por parte da Entidade Empregadora e da Recorrida — «em abstrato, suscetíveis de causar o evento danoso — se inseriram no processo causal de a modo que, não fora a omissão, ele provavelmente não teria ocorrido.».
xlii. Por tudo quanto fica exposto, o acesso à dita cobertura, como se salientou, já tinha sido feito várias vezes, noutros dias, através da escada metálica, inclusive, no próprio dia do acidente, pelo que o acidente não aconteceu por força da utilização desta escada como forma de acesso à cobertura, mas, porque naquele dia e pela primeira vez, o Recorrente decidiu mover a escada para cima da dita cobertura, violando assim a distância de segurança que deve existir entre a cobertura e a linha elétrica de média tensão.
xliii. Pelo que, não se tem por verificado qualquer nexo de causalidade entre a escada e o acidente, nem os pressupostos constantes do artigo 18.º, da Lei n.º 98/2009 de 04.09 e 342.º e 563.º, ambos do Código Civil, enquanto requisitos necessários para a imputação de responsabilidade agravada à Recorrida.
Nestes termos e nos mais de Direito, presente recurso não deve merecer provimento, mantendo-se a douta sentença recorrida.
Assim decidindo, V. Exªs. farão, como sempre, inteira J U S T I Ç A!” (realce e alteração do tamanho de letra aqui introduzidos)

O recurso foi admitido, como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e efeito devolutivo.

Remetidos os autos a este Tribunal da Relação, apresentados que foram ao Exmo. Procuradora-Geral Adjunto, foi exarado Parecer, no qual sustenta que o recurso deverá merecer em parte provimento, aí se lendo:
3. Analisados os fundamentos do recurso, acompanhamos parcialmente a posição do A. Sinistrado.
Na verdade, no que diz respeito à necessidade do sinistrado beneficiar de tratamentos de Medicina Física e de Reabilitação, já em sede de tentativa de conciliação, na fase conciliatória do processo, esta considerava adequado esse pedido.
Citamos, tal como consta na ata da tentativa de conciliação: “Pela representante da Companhia de Seguros foi dito que a sua representada aceita a existência e caracterização do acidente como de trabalho, aceita o nexo de causalidade entre as lesões e o acidente, aceita a sua responsabilidade pelas consequências do sinistro até ao limite do salário para si transferido e acima definido, aceita pagar a quantia de € 118,22 de indemnizações por incapacidades temporárias, aceita pagar as despesas com deslocações a este Tribunal e ao INML no valor de € 35,00, aceita o grau de incapacidade atribuído pelo Perito Médico do INML, aceita que o sinistrado se encontra afetado de incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual e que necessita de tratamentos de Medicina Física e Reabilitação, com regularidade a decidir nesta consulta, para evitar agravamento do quadro de algodistrofia do membro inferior esquerdo, tal como consta do relatório de perícia do INML,[…]”
Aliás, gorou-se a tentativa de conciliação em 03/05/2038 porque a Cª Seguros não aceitou a necessidade do A. quanto a auxílios técnicos, nomeadamente um veículo automóvel com mudanças automáticas bem como de frequência de ação no âmbito da reabilitação profissional.
Assim, considerando o disposto nos arts.112º e 131º, nº1, al. c) do Código de Processo de Trabalho, esses factos deveriam ser tidos como assentes, e daí retiradas as legais consequências.
Para além do supra indicado, nenhum outro erro ou vicio patenteia a douta sentença em crise.

Esta analisa criticamente a prova produzida em audiência e a constante dos autos, decide em conformidade com esta, e justifica de facto e de direito esta sua posição, assertivamente.
Pelo exposto, somos de parecer de que o Recurso interposto pelo Recorrente sinistrado deve ser julgado parcialmente procedente e, consequentemente, deve alterar-se nesses termos a decisão recorrida.
*
Corridos os vistos legais e nada obstando ao conhecimento do mérito, cumpre decidir.
*
Objeto do recurso:
Sendo pelas conclusões que se delimita o objeto do recurso (artigos 635º, nº4 e 639º, nºs 1 e 2, ambos do Código de Processo Civil – aplicável ex vi do artigo 87º, nº1 do Código de Processo do Trabalho –, integrado também pelas que são de conhecimento oficioso e que ainda não tenham sido decididas com trânsito em julgado, são as seguintes as questões a decidir:
- impugnação da matéria de facto;
- saber se existe responsabilidade agravada, quer da Ré Empregadora, quer da Chamada C... e se estas deverão ser solidariamente condenadas a pagar ao Sinistrado/Apelante os montantes peticionados decorrentes de responsabilidade agravada;
- quais as consequências relativamente à necessidade de tratamento médico, incluindo de medicina física e reabilitação, necessário para a reparação das lesões sofridas no acidente de trabalho;
- necessidade de viatura adaptada às condições físicas do Autor.

2. Fundamentação:
2.1. Fundamentação de facto:
2.1.1. Na fundamentação da decisão de facto, lê-se na sentença:
“Factos provados:
Da discussão da causa resultaram provados os seguintes factos com relevo para a decisão de mérito:
Das partes e da relação entre estas:
1) O autor AA nasceu no dia ../../1979.
2) O autor é trabalhador da sociedade ré B..., Unipessoal, Lda. (adiante designada por B..., Lda), ao abrigo de um contrato de trabalho por tempo indeterminado.
3) À data de 10-11-2015 tinha a categoria profissional de serralheiro civil, atividade que exercia por conta, no interesse e ao serviço da dita sociedade, sob as ordens, instruções e orientações desta.
4) O autor exercia nomeadamente as funções de executar, montar e reparar estruturas metálicas, caixilharias e outros elementos metálicos, de acordo com as especificações técnicas.
5) O autor à data de 10-11-2015, ao serviço da B..., Lda., auferia o salário anual total de € 8.733,34 (€ 550,00 x 14 meses + €93,94 x 11 meses – salário base e subsídio de alimentação, respetivamente).
6) À data de 10-11-2015, a B..., Lda., tinha já celebrado e em vigor com a ré seguradora um contrato de seguro do ramo acidentes de trabalho de trabalhadores por conta de outrem, na modalidade de prémio fixo, titulado pela apólice nº ...78 cujas condições particulares se mostram juntas a fls. 11 a 13 dos autos e que aqui se dão como reproduzidas, mediante o qual e na indicada data tinha transferido para a seguradora a responsabilidade infortunística relativa a acidentes em que fosse interveniente o autor relativamente à retribuição anual de € 8.733,34.
7) A B..., Lda, dedicava-se à data de 10-11-2015 à atividade de eletricidade, telecomunicações e metalomecânica, sendo que o seu CAE principal era o 43210.
8) A B..., Lda, tinha também como atividades as correspondentes aos CAE’s secundários 25110 e 41200.
9) A B..., Lda preencheu e assinou a proposta de seguro constante a fls. 157 verso a fls. 159 dos autos (e também a fls. 6 a 10 dos autos), cujo teor se dá aqui como integralmente reproduzido.
10) Na referida proposta de seguro, que antecedeu a emissão da identificada apólice nº ...78, a aí mera “proponente” B..., Lda expressamente declarou “cumprir todas as normas e regulamentos de segurança em vigor para a respetiva atividade”, sendo que, ao final, ratificou sem reservas, “ter respondido de forma exata e completa aos quesitos d(est)a proposta, sabendo que em caso contrário fica sujeito às prescrições legais aplicáveis”.
11) Na data de 10-11-2015 o autor exercia funções para a B..., Lda, era seu trabalhador e como tal foi destacado para prestar serviços numa cliente daquela sociedade.
12) No decurso do contrato prestação de serviços celebrado entre a Chamada C... e a Ré B..., semanalmente, a Ré B... destacava alguns dos seus trabalhadores para se deslocarem às instalações da Chamada C..., para aí realizarem os serviços que fossem solicitados, em especial, em serralharia.
13) Os serviços eram acordados entre a Ré B... e a Chamada C..., segundo valores definidos previamente à execução dos trabalhos.
14) Para o efeito, a Ré B... destacava o Encarregado ou Responsável para se deslocar ao local da obra e aí fazer uma avaliação do local, para apuramento de valores e definição de trabalhos a executar.
15) Motivo pelo qual, os trabalhadores da Ré B..., incluindo o Autor, tinham obrigação de reportar a esta todos os serviços que iriam realizar ou realizavam, para verificação do cumprimento do plano de trabalhos definido.
16) O modo de execução dos serviços era definido entre a Ré B... e os seus trabalhadores, atendendo às necessidades apresentadas pela C... à B....
17) A C... detetou que a cobertura de um dos seus armazéns apresentava infiltrações.
18) Como a colocação daquela cobertura tinha sido uma obra anteriormente executada pela B..., foi acordado entre as partes que esta realizaria a reparação dessa cobertura.
19) O acesso para a cobertura, naquela data, não tinha andaime, nem escada fixa.
20) A Chamada C... disponibilizou ao Autor, no primeiro dia em que este se deslocou à cobertura para levantamento de trabalhos a realizar, a uma escada metálica.
21) O Autor para aceder à dita cobertura solicitava, diariamente, à C... a utilização da escada metálica móvel desta.
*
Da dinâmica do evento:
22) No dia 10-11-2015, pelas 14,40 horas, enquanto se encontrava no exercício das suas funções, em ..., o autor, quando estava no telhado de um edifício, sofreu uma eletrocussão.
23) Existia uma linha aérea elétrica de média tensão num dos topos do edifício onde o autor se encontrava a trabalhar aquando do acidente referido em 22).
24) A B..., Lda sabia da existência da linha aérea elétrica de média tensão referida em 23).
25) Nas circunstâncias referidas em 22), a mando da B..., Lda, o autor encontrava-se no exterior de um edifício a fazer manutenção, para aí efetuar a reparação de infiltrações e falhas de estanquicidade dessa mesma cobertura.
26) Para o efeito o autor dispunha duma escada móvel, de alumínio, com 4 metros de comprimento.
27) Equipamento que se mostrou necessário a poder escalar e subir ao cimo daquela cobertura.
28) Para executar a ordem da B..., Lda, o autor colocou a dita escada posicionada de molde que o cimo da escada ultrapassava aproximadamente um metro o topo da platibanda da descrita cobertura onde ia trabalhar.
29) A linha aérea elétrica aludida em 23) estava situada 4,10 metros de altura do local onde o autor se encontrava a trabalhar, o que era do conhecimento da B..., Lda.
30) Já posicionado em altura, e quando o autor procedia à movimentação da dita escada, o material metálico de que era composta essa escada que usava, serviu de atração e funcionou como arco elétrico que teve, como ponto final, a produção de uma violenta descarga sobre o corpo do autor.
31) Quando o autor ou qualquer outro funcionário da B..., Lda tivesse que efetuar serviços que exigissem material e/ou equipamento específico para os fazer em segurança, tinham instruções para comunicarem tal serviço à sua entidade patronal, mencionando todo o material de segurança que necessitassem, normalmente na véspera.
32) Após a ocorrência do acidente, a 28-12-2015 a D.../REN procedeu ao alteamento da linha aérea elétrica de média tensão.
33) A “C...” não assegurou a coordenação dos demais empregadores através da organização das atividades de segurança e saúde no trabalho ao determinar a realização de obra de manutenção.
34) A “C...” não solicitou à D... o alteamento da linha ou o desligamento preventivo da linha de média tensão antes da realização da reparação da cobertura.
35) Nem a “B...”, nem a “C...” realizaram as fichas de procedimento de segurança, para os trabalhos nas proximidades de linhas de média tensão.
36) Não foi realizado localmente o levantamento das condições existentes nem pela “B...”, nem pela “C...”, tais como a proximidade de linhas de média tensão.
37) Não foi organizado um plano de trabalhos de acordo com os riscos identificados;
38) Apenas o Autor, desacompanhado de qualquer outro trabalhador, foi incumbido das tarefas para a manutenção da cobertura;
39) Não foi disponibilizada ao A. a colocação de andaime para acesso à cobertura naquela semana.
40) Não foi dada ao Autor formação para a realização de trabalhos em altura e/ou na presença de riscos elétricos.
41) Não foi delineado plano de resgate e socorro.
42) Após o acidente, a C... procedeu à colocação de uma escada fixa à parede do edifício, com resguardo para as costas, vedou o acesso à escada com um aloquete de segurança.
*
Das consequências do evento
43) Em consequência do evento referido em 22), o autor sofreu queimadura de 1º e 2º grau nos dedos da mão direita e esquerda e queimadura de 3º grau no pé esquerdo (hallux e planta).
44) Como consequência desse mesmo evento, resultaram para o autor os seguintes períodos de incapacidade temporária:
- Incapacidade temporária absoluta (ITA, correspondente ao período durante o qual o autor esteve totalmente impedido de realizar a sua atividade profissional) desde 11-11-2015 até 10-10-2016 e desde 31-10-2016 a 31-12- 2016;
- Incapacidade temporária parcial de 60% (ITP de 60%, correspondente ao período durante o qual foi possível o autor desenvolver a sua atividade profissional, ainda que com certas limitações) desde 11-10-2016 até 30-10- 2016;
- Incapacidade temporária parcial de 30% (ITP de 30%, correspondente ao período durante o qual foi possível o autor desenvolver a sua atividade profissional, ainda que com certas limitações) desde 1-01-2017 até 9-01-2017.
45) O autor teve alta clínica definitiva no dia 9-01-2017, data da consolidação médico-legal das lesões.
46) Como consequência do evento em referência e das lesões emergentes do mesmo, resultaram para o autor as seguintes sequelas no membro inferior esquerdo: dismorfia da região da planta do pé na zona do arco do 3º e 4º dedos com área ulcerada com 3 por 2,5 cm de maiores eixos; dismorfia do 1º dedo do pé, com enxerto de pele circundante; pele fria da metade distal do pé (dorso e região plantar – por comparação com a contra-lateral); movimento de retirada ao toque de toda a metade distal do pé (dorso ou planta); restante membro inferior com atrofia ligeira dos diferentes grupos musculares por comparação com o membro inferior contra-lateral mas sem alterações dos componentes articulares deste membro (atrofia eventual por desuso); área levemente hipopigmentada no terço médio da face anterior da coxa com 6 por 5 cm de maiores eixos (compatível com área dadora de enxerto cutâneo).
47) As sobreditas sequelas correspondem a algodistrofia do membro inferior esquerdo, sendo enquadráveis no Capítulo III, 6.2.8. b) da Tabela Nacional de Incapacidades, e determinam que o autor se ache afetado de um coeficiente de desvalorização de incapacidade permanente parcial para o trabalho de 30%, com IPATH (incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual).
48) O autor necessita de tratamentos de medicina física e de reabilitação, para evitar agravamento do quadro de algodistrofia do membro inferior esquerdo, num total de 40 sessões anuais, com uma periodicidade semanal de 2 a 3 vezes, com a regularidade e nos períodos a decidir nesta consulta.
49) As sequelas acima descritas implicam que o autor esteja impossibilitado de realizar determinados movimentos, ações e tarefas com o membro inferior esquerdo, mormente o seu pé, por impotência funcional do pé e dedos esquerdos na medida da IPP atribuída.
50) Para ajuda na marcha o A. carece de uma canadiana para descarga do membro inferior afetado, com necessidade de renovação a cada dois anos.
51) O A. tem dificuldade em permanecer de pé por períodos prolongados.
52) Por lhe conferirem maior conforto e desempenho nas deslocações ao longo do dia, o A. carece de calçado Reebok DMX serie, ou sapatilha equivalente, com previsível necessidade de dois pares anuais.
53) Por não conseguir o apoio plantar, o A. não consegue pressionar com o seu pé esquerdo o pedal de embraiagem pelo que necessita de adaptação do veículo automóvel com caixa automática de velocidades.
54) Em virtude do acidente dos autos, o A. padeceu de dores, submeteu-se a prologados e dolorosos tratamentos, sentido complexos, vergonha, revolta e desgosto das sequelas de que ficou afetado.
55) No âmbito dos presentes autos, o autor gastou em despesas de deslocações a este Tribunal e ao INML a quantia de € 35,00.
56) O autor recebeu da ré seguradora a quantia de € 6.821,56 pelos períodos de incapacidades temporárias.
*
57) O autor era e é proprietário do veículo automóvel de marca ... com a matrícula ..-DB-.., do ano de 2007, o qual utilizava diariamente, quer nas suas utilizações pessoais e deslocação para o local de trabalho, veículo esse com caixa manual.
58) Até à data do acidente, o autor utilizava diariamente o referido veículo automóvel como meio de transporte para se locomover nas tarefas diárias relacionadas com o trabalho e outras necessidades suas e dos seus familiares, designadamente em visitas a familiares, amigos, passeios e outras ocupações de lazer.
59) O veículo descrito em 56) não é passível de adaptação para caixa de velocidades automática.
*

Factos não provados:
Da discussão da causa não resultaram provados os seguintes factos com relevo para a decisão de mérito:
i) A escada descrita em 32) era propriedade da B..., Lda..
ii) Ao ter destacado o autor, que para si trabalhava com a categoria de serralheiro, ordenando a execução daquela tarefa e naquele modo, a B... sabia que isso o colocaria num muito elevado risco de eletrocussão.
iii) Aquando do acidente, o autor estava a verificar da necessidade de uma eventual intervenção nos rufos, caleira e cobertura do edifício.
iv) O autor aquando do acidente apenas estava a averiguar as condições do local para posterior execução de um serviço nesse momento solicitado ao autor pela referida cliente da B..., Lda, C....
*
Motivação
A decisão da matéria de facto provada assentou nos documentos juntos aos autos e nos depoimentos prestados pelas testemunhas em sede de audiência de julgamento, concatenados entre si e à luz das regras da experiência comum.
Com efeito, a verdade processual, que se quer o mais próxima possível da verdade histórica, emerge como denominador comum entre a verdade dos sujeitos processuais, que reflectem a sua intervenção nos factos através da subjetividade inerente ao seu protagonismo nos mesmos, e a verdade das testemunhas, cuja perceção da realidade é muitas vezes filtrada pelas (des)afeições que nutrem por aqueles, e entrecortada por segmentos daquela realidade a que não assistiram, mas que mentalmente reconstruiram. Tudo apreciado de acordo com juízos de verosimilhança, por forma a que, no julgamento da matéria de facto, a verdade processual seja racionalmente fundamentada e, por conseguinte, sindicável.
Nas suas declarações, o sinistrado explicou que há 6 meses que desempenhava as suas funções nas instalações do cliente da R. Empregadora C..., fazendo tarefas de manutenção, seja detetando infiltrações e reparando-as, seja tomando medidas para maquinaria a realizar na fábrica da B.... As tarefas diárias eram-lhe indicadas pelo Engenheiro CC da fábrica C..., a quem igualmente reportava a sua conclusão. Em função das tarefas atribuídas, organizava as ferramentas, os materiais e os EPI, sendo uns já tinha nas instalações da C..., e outros levantava na B..., ambas sitas em ....
A respeito do acordado entre a B... e a C..., valorou o tribunal as declarações prestadas pela testemunha Eng. EE, atualmente Diretor de Infraestruturas e equipamentos da C..., à data chefe de serviço de manutenção da mesma. Neste conspecto, descreveu que a C... identificava as necessidades, cabendo à B... avaliar os trabalhos, dimensionar a equipa e apresentar o orçamento, sendo que todos os materiais consumíveis eram fornecidos pela B..., a avaliação de riscos era realizada pela B..., a quem que igualmente incumbia solicitar os equipamentos necessários, tais como os meios de elevação. Não obstante, à data dos factos a testemunha se encontrar a acompanhar outro projeto da C... em ..., a testemunha revelou um depoimento seguro, objetivo e isento, denotando conhecimento detalhado sobre a factualidade à qual depôs, pelo que mereceu a credibilidade do tribunal. Este esquisso mostra-se igualmente consentâneo com o documento de fls. 396. Esta dialética entre ambas as empresas foi confirmada tanto pela testemunha DD, funcionária administrativa da B..., como pela testemunha HH, à data serralheiro da B..., que igualmente havia desempenhado tarefas de manutenção nas instalações da C..., como ainda pela testemunha CC, engenheiro responsável pela manutenção na C... à data dos factos. Este concretizou que enquanto a manutenção no interior era realizada internamente por uma equipa por si gerida, a manutenção do exterior era adjudicada a várias entidades externas, sendo que a B... tinha uma equipa destacada para esse efeito, podendo a testemunha contactá-la diretamente, ou através do supervisor. Do documento supra id. se extrai igualmente que, além da identificação de vários trabalhadores da B... envolvidos em tarefas realizadas na C... no mês em causa nos autos, igualmente estão concretizadas a descrição dos serviços e dos materiais fornecidos.
Descendo ao dia em apreço nos autos, contextualizou o A. que iria fazer uma reparação na cobertura, tarefa que já vinha realizando desde 2ª feira dessa semana, e para a qual usou a escada que já usara anteriormente para o mesmo efeito.
Relativamente à escada, a mesma foi descrita, tanto pelo A., como pela testemunha Eng. CC, como uma escada de alumínio, portátil, pertença da C..., habitualmente usada para aceder à cobertura. A sua medida, 4 metros de comprimento, foi extraída do relatório do inquérito da ACT, constante de fls. 344ss, no qual se encontra igualmente fotografada (fls. 358).
A forma como colocou a escada para aceder à cobertura foi igualmente descrita pelo A.. Este relatou compassadamente, acompanhando o relato com uma espontânea movimentação corporal, que quando já se encontrava em pé em cima da cobertura, voltado para fora, agarrando a escada que lhe dava pela cintura, movimentou-a para a direita, altura em que sentiu o choque
As fichas de prevenção de riscos de fls. 396v e ss, não apresentam data, desconhecendo-se se à data do sinistro já existiam, nenhuma delas se referindo concretamente à realização de trabalhos na cobertura.
A descrição precisa da atividade a que se dedicava a B... era do conhecimento da Seguradora, constando da sua certidão comercial (ref. datada de 14-9-2018), passível de consulta pública, assim como a categoria do sinistrado constava da apólice e seus adicionais (fls. 11 e 12).
A ulterior realização do alteamento da linha elétrica de média tensão extrai-se da informação prestada pela D... à ACT no âmbito do inquérito desta (fls. 507 e 508), não se extraindo que os cabos de eletricidade tivessem cedido, diminuindo o vão.
A ulterior instalação de uma escada fixa, e suas características, resulta das fotografias de fls. 402v e ss.
A utilização do veículo, id. a fls. 145 a 147, por parte do sinistrado, quer nas suas deslocações pessoais, quer também para o trabalho, resultou das suas próprias declarações, corroboradas pelas declarações da testemunha II, sua esposa, que se afiguraram sinceras, credíveis, e consentâneas com a normalidade da vida familiar. Ainda relativamente ao veículo, valorou-se a perícia ao mesmo, que concluiu que este não é passível de adaptação para caixa automática, conforme relatório de fls. 290ss que, oportunamente notificado, não mereceu reparo das partes.
Os laudos periciais unânimes das Juntas Médicas, incluindo da especialidade de fisiatria, constantes de fls. 221ss, 244ss, atentas as respostas aos quesitos e respetiva fundamentação, permitiram ao tribunal escorar a sua convicção quanto às implicações das sequelas de que padece o sinistrado na marcha e na posição ortoestática, mormente quanto à necessidade de utilização de canadiana e de calçado específico para apoio.
Por fim, à necessidade de tratamentos e ajudas técnicas, fundou-se o tribunal nas respostas aos quesitos dadas pelos Srs. Peritos, subjacentes à decisão proferida no apenso de fixação de incapacidade.
Relativamente à demais factualidade dada como não provada, tal ficou a dever-se a não ter sido realizada prova cabal da verificação da mesma, mormente não resultando das declarações prestadas em sede de audiência ou dos documentos juntos aos autos analisados individual ou conjuntamente.”


2.1.2. Impugnação da matéria de facto:
De harmonia com o disposto no artigo 662º, nº1 do Código de Processo Civil (ex vi do artigo 1º, nº 2, al. A) do Código de Processo do Trabalho), o Tribunal da Relação deve alterar a decisão da 1ª instância sobre a matéria de facto, “se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”.
Os poderes da Relação sobre o julgamento da matéria de facto foram reforçados na atual redação do Código de Processo Civil.
Abrantes Geraldes, (in “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, 2014, 2ª edição, pág. 230) refere que, “… a modificação da decisão da matéria de facto constitui um dever da Relação a ser exercido sempre que a reapreciação dos meios de prova (sujeitos à livre apreciação do tribunal) determine um resultado diverso daquele que foi declarado na 1.ª instância”. Apesar de (obra citada, pág. 245), “… a reapreciação da matéria de facto no âmbito dos poderes conferidos pelo art. 662º não poder confundir-se com um novo julgamento, pressupondo que o recorrente fundamente de forma concludente as razões por que discorda da decisão recorrida, aponte com precisão os elementos ou meios de prova que implicam decisão diversa da produzida e indique a resposta alternativa que pretende obter”.
Na reapreciação da força probatória das declarações de parte, dos depoimentos das testemunhas e dos documentos, importa ter presente o princípio da livre apreciação, como resulta do disposto nos artigos 607º, nº5 e 466º, nº3, ambos do Código de Processo Civil e 396º e 366º.
Preceitua ainda o artigo 640º, nºs 1 e 2 do Código de Processo Civil:
«1- Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
(…)».
Entende a Apelante a Apelante que o Tribunal a quo apreciou de forma incorreta a prova testemunhal e documental produzida, julgando de forma incorreta os factos considerados como provados e não provados.
Analisando:
Conclui o Apelante que o Tribunal a quo podia e devia ter julgado de modo diverso a matéria dos pontos 12, 13, 14, 15, 16, 18, 25, 28 e 31 dos Factos Provados.
O Apelante invoca as declarações de parte do Autor e os depoimentos das testemunhas BB e CC.
Por seu turno a Apelada C..., S.A., conclui que não existe erro na matéria de facto dada como não provada, sendo totalmente acertados os pontos que foram dados como provados.
Invoca as declarações do Recorrente, os depoimentos de DD, BB, CC e EE, indicando os minutos da gravação onde ficaram registados os excertos tidos por relevantes, bem como a prova documental junta aos autos a fls. 396.
Lê-se na motivação da decisão recorrida:
A respeito do acordado entre a B... e a C..., valorou o tribunal as declarações prestadas pela testemunha Eng. EE, atualmente Diretor de Infraestruturas e equipamentos da C..., à data chefe de serviço de manutenção da mesma. Neste conspecto, descreveu que a C... identificava as necessidades, cabendo à B... avaliar os trabalhos, dimensionar a equipa e apresentar o orçamento, sendo que todos os materiais consumíveis eram fornecidos pela B..., a avaliação de riscos era realizada pela B..., a quem que igualmente incumbia solicitar os equipamentos necessários, tais como os meios de elevação. Não obstante, à data dos factos a testemunha se encontrar a acompanhar outro projeto da C... em ..., a testemunha revelou um depoimento seguro, objetivo e isento, denotando conhecimento detalhado sobre a factualidade à qual depôs, pelo que mereceu a credibilidade do tribunal. Este esquisso mostra-se igualmente consentâneo com o documento de fls. 396. Esta dialética entre ambas as empresas foi confirmada tanto pela testemunha DD, funcionária administrativa da B..., como pela testemunha HH, à data serralheiro da B..., que igualmente havia desempenhado tarefas de manutenção nas instalações da C..., como ainda pela testemunha CC, engenheiro responsável pela manutenção na C... à data dos factos. Este concretizou que enquanto a manutenção no interior era realizada internamente por uma equipa por si gerida, a manutenção do exterior era adjudicada a várias entidades externas, sendo que a B... tinha uma equipa destacada para esse efeito, podendo a testemunha contactá-la directamente, ou através do supervisor. Do documento supra id. se extrai igualmente que, além da identificação de vários trabalhadores da B... envolvidos em tarefas realizadas na C... no mês em causa nos autos, igualmente estão concretizadas a descrição dos serviços e dos materiais fornecidos.”
É este o teor do item 12):
- No decurso do contrato prestação de serviços celebrado entre a Chamada C... e a Ré B..., semanalmente, a Ré B... destacava alguns dos seus trabalhadores para se deslocarem às instalações da Chamada C..., para aí realizarem os serviços que fossem solicitados, em especial, em serralharia.
Lê-se, anda, na motivação da decisão recorrida:
“(…) o sinistrado explicou que há 6 meses que desempenhava as suas funções nas instalações do cliente da R. Empregadora C..., fazendo tarefas de manutenção, seja detetando infiltrações e reparando-as, seja tomando medidas para maquinaria a realizar na fábrica da B.... As tarefas diárias eram-lhe indicadas pelo Engenheiro CC da fábrica C..., a quem igualmente reportava a sua conclusão. Em função das tarefas atribuídas, organizava as ferramentas, os materiais e os EPI, sendo uns já tinha nas instalações da C..., e outros levantava na B..., ambas sitas em ....”
Entende o Apelante que o teor do item 12 deverá alterar-se para:
Ponto 12 - O A. encontrava-se diariamente nas instalações da chamada C..., sendo este o seu local de trabalho.
No requerimento de 30.11.2022, o Sinistrado veio, “1) Ao abrigo do disposto no art.º 127.º do CPT, requerer a intervenção da sociedade C..., S.A., NIPC ...51, com sede na Rua ..., ... ...; 2) Ampliar o pedido inicial, ao abrigo do disposto no art.º 28.º, n.º 3, do CPT e no art.º 265.º, n.º 2, do CPC”, aí referindo resultar da prova para já produzida oralmente em audiência de discussão e julgamento, nomeadamente que:
“O Autor prestava o seu trabalho nas instalações da chamada a intervir “C...”, sendo este o seu local de trabalho à data do acidente;” – alínea a) do mesmo requerimento (sublinhado nosso).
Ou seja, a alegação assim efetuada pelo Sinistrado foi circunscrita à data do acidente.
Diversamente do que alegou no referido articulado, pretende agora o Apelante que fique assente que o seu local de trabalho era nas instalações da Chamada.
Das suas declarações, o Apelante transcreve as passagens tidas por relevantes que lemos.
Não resulta das declarações do Apelante que o seu local de trabalho fosse nas instalações da Recorrida C..., antes que para aí foi destacado.
Aliás, o mesmo afirma “quando me destacaram para lá, a empresa, a B... disse-me (…)”, com reporte ao período de seis meses em que lá esteve.
A testemunha BB, confirmou que o Apelante “Era empregado também lá, na fábrica”, - Colega de trabalho onde? - “Na B...”.
A testemunha reportando-se à sua situação pessoal confirmou que dos 5 anos que trabalhou na B... a maior parte foi trabalhada nas instalações da C..., as informações à B... eram feitas telefonicamente e que “sentia-se mais trabalhador da C...”.
A testemunha CC, foi clara a referir “Ele trabalhou connosco na C..., por intermédio da B...”, “Havia diversos trabalhos que eram adjudicados à B...” e a B... “tinha lá sempre uma equipa quase residente”, “Residente, eu acho que ele era o único. Neste caso sim, era o único”, “Era suposto ele estar nas instalações. Estava lá todos os dias.”
Analisando:
A matéria que o Sinistrado pretende ver alterada, é vaga na medida em que aí não é explicitado se esse era o seu local de trabalho desde sempre ao serviço da B..., Unipessoal, Lda, ou se foi apenas durante um determinado período.
É que são coisas diferentes. Um trabalhador de uma empresa prestadora de serviços, pode prestar durante um determinado período o seu trabalho num determinado local – mesmo deslocando-se para aí diariamente – mas noutro período para outro local.
Em concreto, ficou assente no item 11 – facto considerado assente no despacho-saneador, proferido em 23.02.2019, sob a alínea T) - que na data de 10-11-2015, o Autor exercia funções para a B..., Lda, era seu trabalhador e como tal foi destacado para prestar serviços numa cliente daquela sociedade.
Ficou ainda assente no item 22 – facto considerado assente no despacho saneador, alínea E) – que nesse dia 10-11-2015, pelas 14,40 horas, enquanto se encontrava no exercício das suas funções, em ..., o Autor, quando estava no telhado de um edifício, sofreu uma eletrocussão.
No item 12, identifica-se a cliente - a Chamada C....
É contraditório com estar destacado, a matéria de fazer coincidir o local de trabalho com as instalações da cliente, ainda que no período em que decorreu esse destacamento, o Autor aí estivesse diariamente.
Improcede, como tal, nesta parte a pretensão do Apelante.

É este o teor do item 13):
- Os serviços eram acordados entre a Ré B... e a Chamada C..., segundo valores definidos previamente à execução dos trabalhos.
Deixamos já transcrito o que na motivação da decisão de facto foi valorado a respeito do acordado entre a B... e a C....
Entende o Apelante que o teor do item 13 deverá alterar-se para:
Ponto 13 - No âmbito do contrato de prestação de serviços entre a Ré B... e a chamada C..., a B... colocava trabalhadores seus permanentemente nas instalações da chamada.
Não indica o Apelante em que articulado foi tal matéria alegada.
A matéria “a B... colocava trabalhadores seus permanentemente nas instalações da chamada”, é matéria vaga e como tal conclusiva, uma vez que permanentemente pode significar ou não, diferentes trabalhadores, ou seja, ainda que a prestação de serviços fosse diária e contínua – permanente - poderia ser concretizada por diferentes trabalhadores para aí destacados.
Improcede a pretensão do Apelante.

É este o teor do item 14):
- Para o efeito, a Ré B... destacava o Encarregado ou Responsável para se deslocar ao local da obra e aí fazer uma avaliação do local, para apuramento de valores e definição de trabalhos a executar.
Deixamos já transcrito o que na motivação da decisão de facto foi valorado a respeito do acordado entre a B... e a C....
Entende o Apelante que o teor do item 14 deverá alterar-se para:
Ponto 14 – Os serviços eram prestados pelos trabalhadores da B..., que posteriormente cobrava tais serviços.
Não indica o Apelante em que articulado foi alegada a matéria “B... (…) posteriormente cobrava tais serviços”.
De resto, ficou assente como resulta do já decidido neste segmento da Apelação que no decurso do contrato prestação de serviços celebrado entre a Chamada C... e a Ré B..., semanalmente, a Ré B... destacava alguns dos seus trabalhadores para se deslocarem às instalações da Chamada C..., para aí realizarem os serviços acordados entre ambas, segundo valores definidos previamente à execução dos trabalhos.
Ou seja, resulta já da matéria assente que no âmbito do contrato de prestação de serviços entre a Ré B... e a Chamada C..., trabalhadores daquela prestavam serviços a esta, e que tal tinha um valor, ou seja, um custo, definido previamente à execução dos trabalhos.
Improcede a pretensão do Apelante.

É este o teor do item 15):
- Motivo pelo qual, os trabalhadores da Ré B..., incluindo o Autor, tinham obrigação de reportar a esta todos os serviços que iriam realizar ou realizavam, para verificação do cumprimento do plano de trabalhos definido.
Entende o Apelante que o teordo item 15 deverá alterar-se para:
Ponto 15 - Os trabalhadores da B..., incluindo o Autor, tinham obrigação de reportar a esta todos os trabalhos realizados, após a sua execução, inexistindo plano prévio de trabalhos.
Não indica o Apelante em que articulado foi alegada a matéria “inexistindo plano prévio de trabalhos”.
De resto a matéria “inexistindo plano prévio de trabalhos” é matéria contraditória com a matéria do item 14, onde ficou assente que ocorria a “definição de trabalhos a executar”, o que pressupõe a existência de um plano prévio de trabalhos.
Os meios de prova invocados pelo Apelante não nos permitem chegar a uma convicção diversa daquela que foi a do Tribunal a quo.
Como referido na decisão recorrida, com reporte ao documento de fls. documento de fls. 396, “Do documento supra id. se extrai igualmente que, além da identificação de vários trabalhadores da B... envolvidos em tarefas realizadas na C... no mês em causa nos autos, igualmente estão concretizadas a descrição dos serviços e dos materiais fornecidos.”
Acompanhamos ainda a credibilidade dada ao depoimento da testemunha EE, também a este respeito, a qual “(…) descreveu que a C... identificava as necessidades, cabendo à B... avaliar os trabalhos, dimensionar a equipa e apresentar o orçamento, sendo que todos os materiais consumíveis eram fornecidos pela B..., a avaliação de riscos era realizada pela B..., a quem que igualmente incumbia solicitar os equipamentos necessários, tais como os meios de elevação”.
Improcede, como tal, a pretensão do Apelante.

É este o teor do item 16):
- O modo de execução dos serviços era definido entre a Ré B... e os seus trabalhadores, atendendo às necessidades apresentadas pela C... à B....
Deixamos já transcrito o que na motivação da decisão de facto foi valorado a respeito do acordado entre a Ré B... e a Chamada C....
Entende o Apelante que o teor do item 16 deverá alterar-se para:
Ponto 16 - O modo de execução dos serviços era definido entre a chamada C... e os trabalhadores residentes da B..., atendendo às necessidades apresentadas pela C....
Não indica o Apelante em que articulado foi alegada a matéria “O modo de execução dos serviços era definido entre a chamada C... e os trabalhadores residentes da B...”.
No requerimento de 30.11.2022, o Sinistrado veio, “1) Ao abrigo do disposto no art.º 127.º do CPT, requerer a intervenção da sociedade C..., S.A., NIPC ...51, com sede na Rua ..., ... ...; 2) Ampliar o pedido inicial, ao abrigo do disposto no art.º 28.º, n.º 3, do CPT e no art.º 265.º, n.º 2, do CPC”, aí referindo também resultar da prova para já produzida oralmente em audiência de discussão e julgamento, entre mais, que obedecia a ordens e instruções diretas da chamada a intervir “C...”, assim sucedendo no dia-a-dia.
É matéria contraditória desde logo com a matéria do item 3: “3) À data de 10-11-2015 tinha a categoria profissional de serralheiro civil, atividade que exercia por conta, no interesse e ao serviço da dita sociedade [B..., Unipessoal, Lda], sob as ordens, instruções e orientações desta.”
Matéria que foi considerada assente no despacho saneador, sob a alínea C): o Autor “À data de 10-11-2015 tinha a categoria profissional de serralheiro civil, atividade que exercia por conta, no interesse e ao serviço da dita sociedade, sob as ordens, instruções e orientações desta.”
Improcede, como tal, a pretensão do Apelante.

É este o teor do item 18):
- Como a colocação daquela cobertura tinha sido uma obra anteriormente executada pela B..., foi acordado entre as partes que esta realizaria a reparação dessa cobertura.
Deixamos já transcrito o que na motivação da decisão de facto foi valorado a respeito do acordado entre a Ré B... e a Chamada C....
Entende o Apelante que o teor do item 18 deverá alterar-se para:
Ponto 18 - Foi a chamada C..., através do diretor de manutenção adjunto quem ordenou ao Autor a reparação do telhado.
Não indica o Apelante em que articulado foi alegada a matéria “Foi a chamada C..., através do diretor de manutenção adjunto quem ordenou ao Autor a reparação do telhado”.
No requerimento de 30.11.2022, o Sinistrado veio, “1) Ao abrigo do disposto no art.º 127.º do CPT, requerer a intervenção da sociedade C..., S.A., NIPC ...51, com sede na Rua ..., ... ...; 2) Ampliar o pedido inicial, ao abrigo do disposto no art.º 28.º, n.º 3, do CPT e no art.º 265.º, n.º 2, do CPC”, aí referindo também resultar da prova para já produzida oralmente em audiência de discussão e julgamento, também que foi no cumprimento de ordens diretas da Chamada que o Autor subiu ao telhado do armazém na altura em que ocorreu o fatídico acidente, a chamada era conhecedora da existência no local do trabalho em apreço da linha de média tensão e da grande perigosidade que tal implicava, não se coibindo, apesar disso, que ordenar ao Autor que subisse à cobertura do armazém.
É matéria que o Apelante pretende aditar é contraditória com a matéria dos itens 3, 15 e 16, dos quais resulta claramente que o mesmo trabalhava para a Ré, B..., Unipessoal, Lda, sob as ordens, instruções e orientações desta, os trabalhadores da Ré B..., incluindo o Autor, tinham obrigação de reportar a esta todos os serviços que iriam realizar ou realizavam, o modo de execução dos serviços era definido entre a Ré B... e os seus trabalhadores.
É também matéria contrária ao teor do item 28º: “Para executar a ordem da B..., Lda, o autor colocou a dita escada posicionada de molde que o cimo da escada ultrapassava aproximadamente um metro o topo da platibanda da descrita cobertura onde ia trabalhar.”
Improcede, como tal, a pretensão do Apelante.

É este o teor do item 25):
- Nas circunstâncias referidas em 22) [no dia 10-11-2015, pelas 14,40 horas], a mando da B..., Lda, o autor encontrava-se no exterior de um edifício a fazer manutenção, para aí efetuar a reparação de infiltrações e falhas de estanquicidade dessa mesma cobertura.
Entende o Apelante que o teor do item 25 deverá alterar-se para:
Ponto 25 - Na altura do acidente, o Autor, a mando da C..., encontrava-se no exterior do edifício a fazer trabalhos de manutenção.
Não indica o Apelante em que articulado foi alegada a matéria “Na altura do acidente, o Autor, a mando da C..., encontrava-se no exterior do edifício a fazer trabalhos de manutenção.”
No requerimento de 30.11.2022, o Sinistrado veio, “1) Ao abrigo do disposto no art.º 127.º do CPT, requerer a intervenção da sociedade C..., S.A., NIPC ...51, com sede na Rua ..., ... ...; 2) Ampliar o pedido inicial, ao abrigo do disposto no art.º 28.º, n.º 3, do CPT e no art.º 265.º, n.º 2, do CPC”, aí referindo também resultar da prova para já produzida oralmente em audiência de discussão e julgamento, ainda que foi no cumprimento de ordens diretas da chamada que o Autor subiu ao telhado do armazém na altura em que ocorreu o fatídico acidente, a chamada era conhecedora da existência no local do trabalho em apreço da linha de média tensão e da grande perigosidade que tal implicava, não se coibindo, apesar disso, que ordenar ao Autor que subisse à cobertura do armazém.
Valem aqui as considerações efetuadas a propósito da impugnação do item 18:
A matéria que o Apelante pretende aditar é contraditória com a matéria dos itens 3, 15 e 16, dos quais resulta claramente que o mesmo trabalhava para a Ré, B..., Unipessoal, Lda, sob as ordens, instruções e orientações desta, os trabalhadores da Ré B..., incluindo o Autor, tinham obrigação de reportar a esta todos os serviços que iriam realizar ou realizavam, o modo de execução dos serviços era definido entre a Ré B... e os seus trabalhadores.
É também matéria contrária ao teor do item 28º: “Para executar a ordem da B..., Lda, o autor colocou a dita escada posicionada de molde que o cimo da escada ultrapassava aproximadamente um metro o topo da platibanda da descrita cobertura onde ia trabalhar.”
Improcede, como tal, a pretensão do Apelante.

É este o teor do item 28):
- Para executar a ordem da B..., Lda, o autor colocou a dita escada posicionada de molde que o cimo da escada ultrapassava aproximadamente um metro o topo da platibanda da descrita cobertura onde ia trabalhar.
Entende o Apelante que o teor do item 28 deverá alterar-se para:
Ponto 28 - Para executar a ordem da C..., o Autor colocou a escada posicionada de molde que o cimo da escada ultrapassava o topo da cobertura onde iria trabalhar.
Não indica o Apelante em que articulado foi alegada a matéria “Para executar a ordem da C..., o Autor colocou a escada posicionada de molde que o cimo da escada ultrapassava o topo da cobertura onde iria trabalhar.”
Valem aqui as considerações tidas por pertinentes a propósito da impugnação da matéria dos itens 18º e 25º da factualidade provada.
Em suma, a matéria “Para executar a ordem da C...”, é contraditória com a matéria dos itens 3, 15 e 16, dos quais resulta claramente que o mesmo trabalhava para a Ré, B..., Unipessoal, Lda, sob as ordens, instruções e orientações desta, os trabalhadores da Ré B..., incluindo o Autor, tinham obrigação de reportar a esta todos os serviços que iriam realizar ou realizavam, o modo de execução dos serviços era definido entre a Ré B... e os seus trabalhadores.
É também matéria contrária ao teor do item 28º: “Para executar a ordem da B..., Lda, o autor colocou a dita escada posicionada de molde que o cimo da escada ultrapassava aproximadamente um metro o topo da platibanda da descrita cobertura onde ia trabalhar.”
Improcede, como tal, a pretensão do Apelante.

É este o teor do item 31):
- Quando o autor ou qualquer outro funcionário da B..., Lda tivesse que efetuar serviços que exigissem material e/ou equipamento específico para os fazer em segurança, tinham instruções para comunicarem tal serviço à sua entidade patronal, mencionando todo o material de segurança que necessitassem, normalmente na véspera.
Entende o Apelante que a matéria deste ponto 31 deverá dar-se como não provada.
Os meios de prova invocados pelo Apelante não nos permitem chegar a uma convicção diversa daquela que foi a do Tribunal a quo.
Com referido supra, acompanhamos a credibilidade dada ao depoimento da testemunha EE, também a este respeito, a qual “(…) descreveu que a C... identificava as necessidades, cabendo à B... avaliar os trabalhos, dimensionar a equipa e apresentar o orçamento, sendo que todos os materiais consumíveis eram fornecidos pela B..., a avaliação de riscos era realizada pela B..., a quem que igualmente incumbia solicitar os equipamentos necessários, tais como os meios de elevação”.
O item 31) está em coerência com a matéria dos itens 15º e 16º: os trabalhadores da Ré B..., incluindo o Autor, tinham obrigação de reportar a esta todos os serviços que iriam realizar ou realizavam, para verificação do cumprimento do plano de trabalhos definido; o modo de execução dos serviços era definido entre a Ré B... e os seus trabalhadores.
Improcede, como tal, a pretensão do Apelante.
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Mais conclui a Apelante que deverá ser acrescentado ao acervo da factualidade apurada:
- O Autor necessita de tratamentos de medicina física e de reabilitação, para evitar o agravamento sequelar das lesões ao nível do pé esquerdo, 40 sessões anuais, por provadas julgadas adequadas às necessidades do sinistrado, comum a periodicidade sem anal de 2 a 3 semanas (num total de 40 sessões anuais).
O que, invoca, resultou por unanimidade do exame colegial por Junta médica da especialidade de Medicina Física e de Reabilitação de 19-04-2021.
Foram estas as considerações efetuadas pelo Exm.º Procurador Geral-Adjunto, a este propósito, no excerto que novamente se transcreve:
“(…) consta na ata da tentativa de conciliação: “Pela representante da Companhia de Seguros foi dito que a sua representada aceita a existência e caracterização do acidente como de trabalho, aceita o nexo de causalidade entre as lesões e o acidente, aceita a sua responsabilidade pelas consequências do sinistro até ao limite do salário para si transferido e acima definido, aceita pagar a quantia de € 118,22 de indemnizações por incapacidades temporárias, aceita pagar as despesas com deslocações a este Tribunal e ao INML no valor de € 35,00, aceita o grau de incapacidade atribuído pelo Perito Médico do INML, aceita que o sinistrado se encontra afetado de incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual e que necessita de tratamentos de Medicina Física e Reabilitação, com regularidade a decidir nesta consulta, para evitar agravamento do quadro de algodistrofia do membro inferior esquerdo, tal como consta do relatório de perícia do INML,[…]”
(…)
Assim, considerando o disposto nos arts.112º e 131º, nº1, al. c) do Código de Processo de Trabalho, esses factos deveriam ser tidos como assentes, e daí retiradas as legais consequências.”
Porém mostra-se já assente no item 48º dos factos provados:
- 48) O autor necessita de tratamentos de medicina física e de reabilitação, para evitar agravamento do quadro de algodistrofia do membro inferior esquerdo, num total de 40 sessões anuais, com uma periodicidade semanal de 2 a 3 vezes, com a regularidade e nos períodos a decidir nesta consulta.

Por último, pretende o Apelante que se adite à factualidade provada:
- Uma viatura idêntica, devidamente adaptada a poder ser conduzida pelo Autor tem o custo de 42.347,14€.
Não indica o Apelante em que articulado foi alegada a mesma matéria.
A este respeito ficou assente:
- O autor era e é proprietário do veículo automóvel de marca ... com a matrícula ..-DB-.., do ano de 2007, o qual utilizava diariamente, quer nas suas utilizações pessoais e deslocação para o local de trabalho, veículo esse com caixa manual. (item 57 dos factos provados)
- Até à data do acidente, o autor utilizava diariamente o referido veículo automóvel como meio de transporte para se locomover nas tarefas diárias relacionadas com o trabalho e outras necessidades suas e dos seus familiares, designadamente em visitas a familiares, amigos, passeios e outras ocupações de lazer. (item 58 dos factos provados)
- O veículo descrito em 56) não é passível de adaptação para caixa de velocidades automática. (item 59dos factos provados)
Referencia como meio de prova o relatório da Autopédico e a proposta no mesmo contida.
A matéria é vaga e como tal conclusiva, já que não refere de que se trata, se de marca, modelo, ou ano, para se referir a uma viatura idêntica, nem a que ano a avaliação desse custo foi efetuada.
Em conformidade, decide-se nada mais aditar à factualidade provada.
Improcede na totalidade a impugnação de facto do Apelante.


2.2. Fundamentação de direito:
Começa por concluir o Apelante que operadas as alterações da matéria de facto por si preconizadas, torna-se evidente que a pretensão deduzida relativa à condenação solidaria da Ré B... e da Chamada C... em indemnização por responsabilidade agravada deverá ser julgada procedente.
Não obstante a improcedência da alegação do Recorrente em sede de impugnação da matéria de facto, a esse respeito, nomeadamente tendo em vista a responsabilização da Chamada/Recorrida, C..., S.A., impõe-se ainda assim atender à subsunção jurídica concretizada na sentença do Tribunal a quo relativamente à questão do agravamento da reparação em virtude de violação de regras de segurança, considerando a ampliação do pedido inicialmente formulado, perante a factualidade que resultou provada.
Lê-se na sentença:
“Invocou, por um lado, a R. Seguradora a violação de regras de segurança por parte da empregadora B..., e por outro o sinistrado a violação destas por parte também da utilizadora de mão-de-obra, C....
Apreciando.
Neste conspecto, prescreve o artigo 18º sob a epígrafe “Atuação culposa do empregador”: “1 - Quando o acidente tiver sido provocado pelo empregador, seu representante ou entidade por aquele contratada e por empresa utilizadora de mão-de-obra, ou resultar de falta de observação, por aqueles, das regras sobre segurança, e saúde no trabalho, a responsabilidade individual ou solidária pela indemnização abrange a totalidade dos prejuízos, patrimoniais e não patrimoniais, sofridos pelo trabalhador e seus familiares, nos termos gerais.
2 - O disposto no número anterior não prejudica a responsabilidade criminal em que os responsáveis aí previstos tenham incorrido.
3 – Se, nas condições previstas neste artigo, o acidente tiver sido provocado pelo representante do empregador, este terá direito de regresso contra aquele.
4 – No caso previsto no presente artigo, e sem prejuízo do ressarcimento dos prejuízos patrimoniais e dos prejuízos não patrimoniais, bem como das demais prestações devidas por atuação não culposa, é devida uma pensão anual ou indemnização diária, destinada a reparar a redução na capacidade de trabalho ou de ganho ou a morte, fixada segundo as regras seguintes
a) Nos casos de incapacidade permanente absoluta para todo e qualquer trabalho, ou incapacidade temporária absoluta, e de morte, igual à retribuição;
b) Nos casos de incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual, compreendida entre 70% e 100% da retribuição, conforme a maior ou menor capacidade funcional residual para o exercício de outra profissão compatível;
c) Nos casos de incapacidade parcial, permanente ou temporária, tendo por base a redução da capacidade resultante do acidente.
5 – No caso de morte, a pensão prevista no número anterior é repartida pelos beneficiários do sinistrado, de acordo com as proporções previstas nos artigos 59º a 61º.
6 – No caso de se verificar uma alteração na situação dos beneficiários, a pensão é modificada, de acordo com as regras previstas no número anterior”.
O artigo 18º prevê, assim, situações especiais de reparação nas quais a fixação das prestações obedece a um regime diferente do geral (as prestações sofrem um agravamento quando comparadas com o regime geral) e, para além dessa majoração, o sinistrado (ou seus beneficiários nas situações de morte) ainda têm direito ao ressarcimento dos prejuízos patrimoniais e não patrimoniais a fixar nos termos do regime geral da responsabilidade civil, sem prejuízo ainda das demais prestações devidas por atuação não culposa (v.g. apoio técnico).
Por seu turno, o nº 3 do artigo 79º estabelece que “verificando-se alguma das situações referidas no artigo 18º, a seguradora do responsável satisfaz o pagamento das prestações que seriam devidas caso não houvesse atuação culposa, sem prejuízo do direito de regresso”.
Este regime legal pressupõe uma atuação culposa do empregador, sendo jurisprudência pacífica que, para que o referido regime atue, é ainda necessário o nexo de causalidade entre essa conduta ou inobservância e a produção do acidente. (…)
Destarte, no que diz respeito às regras de segurança é pacífico, desde logo ao nível da jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, que a responsabilização do empregador pressupõe, para além da violação pelo mesmo de tais regras, a existência de nexo causal entre essa violação e o acidente. 8…)
(…)
O ónus de prova dos factos que agravam a responsabilidade do empregador cabe a quem dela tirar proveito, no caso, à R. seguradora que invocou tal responsabilização da ré entidade empregadora em termos agravados, para efeito de eventual direito de regresso, e ao sinistrado que fundou o pedido de agravamento na violação de segurança pela Chamada e pela R. empregadora.
*

A respeito da prevenção e reparação de acidentes de trabalho e doenças profissionais, estabelece o art. 281º do Código do Trabalho (CT/2009), sob a epígrafe Princípios gerais em matéria de segurança e saúde no trabalho:
1 - O trabalhador tem direito a prestar trabalho em condições de segurança e saúde.
2 - O empregador deve assegurar aos trabalhadores condições de segurança e saúde em todos os aspe-tos relacionados com o trabalho, aplicando as medidas necessárias tendo em conta princípios gerais de prevenção.
3 - Na aplicação das medidas de prevenção, o empregador deve mobilizar os meios necessários, nomeadamente nos domínios da prevenção técnica, da formação, informação e consulta dos trabalhadores e de serviços adequados, internos ou externos à empresa.
4 - Os empregadores que desenvolvam simultaneamente atividades no mesmo local de trabalho devem cooperar na protecção da segurança e da saúde dos respetivos trabalhadores, tendo em conta a natureza das atividades de cada um.
5 - A lei regula os modos de organização e funcionamento dos serviços de segurança e saúde no trabalho, que o empregador deve assegurar.
6 - São proibidos ou condicionados os trabalhos que sejam considerados, por regulamentação em legislação especial, susceptíveis de implicar riscos para o património genético do trabalhador ou dos seus descendentes.
7 - Os trabalhadores devem cumprir as prescrições de segurança e saúde no trabalho estabelecidas na lei ou em instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho, ou determinadas pelo empregador.
Por seu turno, o DL n.º 50/2005, de 25 de Fevereiro, transpõe para a ordem jurídica interna a Diretiva n.º 2001/45/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27 de Junho, relativa às prescrições mínimas de segurança e de saúde para a utilização pelos trabalhadores de equipamentos de trabalho.
Dispõe o artigo 3º do citado diploma, sob a epígrafe Obrigações gerais do empregador:
Para assegurar a segurança e a saúde dos trabalhadores na utilização de equipamentos de trabalho, o empregador deve:
a) Assegurar que os equipamentos de trabalho são adequados ou convenientemente adaptados ao trabalho a efetuar e garantem a segurança e a saúde dos trabalhadores durante a sua utilização;
b) Atender, na escolha dos equipamentos de trabalho, às condições e características específicas do trabalho, aos riscos existentes para a segurança e a saúde dos trabalhadores, bem como aos novos riscos resultantes da sua utilização;
c) Tomar em consideração os postos de trabalho e a posição dos trabalhadores durante a utilização dos equipamentos de trabalho, bem como os princípios ergonómicos;
d) Quando os procedimentos previstos nas alíneas anteriores não permitam assegurar eficazmente a segurança ou a saúde dos trabalhadores na utilização dos equipamentos de trabalho, tomar as medidas adequadas para minimizar os riscos existentes;
e) Assegurar a manutenção adequada dos equipamentos de trabalho durante o seu período de utilização, de modo que os mesmos respeitem os requisitos mínimos de segurança constantes dos artigos 10.º a 29.º e não provoquem riscos para a segurança ou a saúde dos trabalhadores.
Estabelece o artigo 5º, sob a epígrafe Equipamentos de trabalho com riscos específicos:
Sempre que a utilização de um equipamento de trabalho possa apresentar risco específico para a segurança ou a saúde dos trabalhadores, o empregador deve tomar as medidas necessárias para que a sua utilização seja reservada a operador especificamente habilitado para o efeito, considerando a correspondente actividade.
O DL n.º 273/2003, de 29 de Outubro, procedeu à revisão da regulamentação das condições de segurança e de saúde no trabalho em estaleiros temporários ou móveis, mantendo as prescrições mínimas de segurança e saúde no trabalho estabelecidas pela Diretiva n.º 92/57/CEE, do Conselho, de 24 de Junho.
Estabelece o art 2º do citado diploma, a respeito do seu âmbito:
1 - O presente diploma é aplicável a todos os ramos de atividade dos sectores privado, cooperativo e social, à administração pública central, regional e local, aos institutos públicos e demais pessoas coletivas de direito público, bem como a trabalhadores independentes, no que respeita aos trabalhos de construção de edifícios e de engenharia civil.
2 - O presente diploma é aplicável a trabalhos de construção de edifícios e a outros no domínio de engenharia civil que consistam, nomeadamente, em:
(…)
c) Construção, ampliação, alteração, reparação, restauro, conservação e limpeza de edifícios;
(…)
j) Isolamentos e impermeabilizações.
(…)
Por seu turno, prevê o artigo 17º, sobre as obrigações do dono da obra:
O dono da obra deve:
a) Nomear os coordenadores de segurança em projecto e em obra, nas situações referidas nos n.os 1 e 2 do artigo 9.º;
b) Elaborar ou mandar elaborar o plano de segurança e saúde, de acordo com os artigos 5.º e 6.º;
c) Assegurar a divulgação do plano de segurança e saúde, de acordo com o disposto no artigo 8.º;
d) Aprovar o desenvolvimento e as alterações do plano de segurança e saúde para a execução da obra;
e) Comunicar previamente a abertura do estaleiro à Inspecção-Geral do Trabalho, nas situações referidas no n.º 1 do artigo 15.º;
f) Entregar à entidade executante cópia da comunicação prévia da abertura do estaleiro, bem como as respectivas actualizações;
g) Elaborar ou mandar elaborar a compilação técnica da obra;
h) Se intervierem em simultâneo no estaleiro duas ou mais entidades executantes, designar a que, nos termos da alínea i) do n.º 2 do artigo 19.º, tomar as medidas necessárias para que o acesso ao estaleiro seja reservado a pessoas autorizadas;
i) Assegurar o cumprimento das regras de gestão e organização geral do estaleiro a incluir no plano de segurança e saúde em projecto definidas no anexo I.
Define ainda o art. 7º do aludido diploma, os riscos especiais:
O plano de segurança e saúde deve ainda prever medidas adequadas a prevenir os riscos especiais para a segurança e saúde dos trabalhadores decorrentes de trabalhos:
a) Que exponham os trabalhadores a risco de soterramento, de afundamento ou de queda em altura, particularmente agravados pela natureza da actividade ou dos meios utilizados, ou do meio envolvente do posto, ou da situação de trabalho, ou do estaleiro;
(…)
d) Efectuados na proximidade de linhas eléctricas de média e alta tensão;
(…)
j) Que o dono da obra, o autor do projecto ou qualquer dos coordenadores de segurança fundamentadamente considere susceptíveis de constituir risco grave para a segurança e saúde dos trabalhadores.
Volvendo ao caso vertente, o acidente ocorreu quando o sinistrado, encontrando-se já posicionado em altura na cobertura, procedia à movimentação da escada, sendo que o material metálico, de que era composta essa escada, serviu de atração e funcionou como arco elétrico que produziu uma descarga sobre o corpo do Autor. Com efeito, a escada encontrava-se posicionada de modo a que o seu topo ultrapassava em 1 metro a platibanda da cobertura, o que encurtou, nessa exata medida, a distância para a linha de média tensão.
Aqui chegados, concluímos ter sido o movimento de um instrumento metálico com 4 metros de extensão, colocado por forma a ultrapassar em 1 metro a bordadura da cobertura, no vão de uma linha eléctrica, que naquele local distava 4,10 de altura, a atuar como condição causadora do arco elétrico que atingiu o A..
É, pois, mister, concluir que as omissões supra identificadas, embora configurem violação de regras sobre segurança no trabalho, cometidas pela entidade empregadora e pela dona da obra, não podem ser tidas, cada uma, de per se, como um facto que atuou como condição do dano, ou seja, como sua causa efetiva ou real, já que nenhuma delas determinou a movimentação da escada pelo sinistrado já após a sua subida.
Com efeito, desconhece-se se a colocação de um andaime, para acesso à cobertura, atenta a composição dos seus materiais e tamanho dos mesmos, não provocaria igual resultado. Também o corte de energia na linha de média tensão não se afigura como medida de proteção obrigatória em face das circunstâncias à data cognoscíveis, porquanto o sinistrado naquela semana vinha utilizando a escada em causa para aceder à cobertura para execução daqueles mesmos trabalhos.
Em suma, ficou por demonstrar que a omissão da empregadora e da dona da obra — em abstrato, suscetíveis de causar o evento danoso — se inseriram no processo causal de a modo que, não fora a omissão, ele provavelmente não teria ocorrido.
Improcedem, assim, os pedidos de agravamento por violação culposa de regras de segurança.” (realce nosso)
Concluiu, em suma, o Apelante:
- Tanto a Ré B..., como a Chamada C... sabiam da existência da linha elétrica de média tensão, pelo que tinham de estar cientes do riso associado a essa presença.
- Nem uma nem outra trataram de estabelecer um plano de trabalhos que contemplasse e prevenisse esse risco.
- As mais elementares regras de conhecimento comum impunham que se adotassem medidas de segurança, tais como pedir à D... que cortasse temporariamente a emergia elétrica.
- A completa omissão pela Entidade empregadora e pela Chamada de cumprimento dos deveres de identificar os riscos, designadamente, de electrocução, bem assim de organizar e planear o trabalho de modo a eliminá-los ou, pelo menos, a reduzi-los tanto quanto possível, em conformidade com as regras legais definidas para o efeito, levou a que a probabilidade objetiva de ocorrer um acidente de trabalho, designadamente, de eletrocução, devido a essa omissão de medidas, fosse muito elevada.
- Conclui-se pela existência de nexo de causalidade entre a omissão daquele conjunto de deveres e a ocorrência do acidente que vitimou o sinistrado, aqui recorrente.
- Existindo responsabilidade agravada, quer a Ré B..., quer a chamada C..., serão solidariamente responsáveis pela indemnização agravada a que o Autor tem direito.
- Ao decidir como decidiu, a sentença recorrida violou o disposto no artigo 18º da LAT.
Concluiu, por seu turno, em suma, a Chamada/Apelada:
- Ficou por demonstrar qualquer omissão de segurança por parte da Entidade Empregadora e da Recorrida — «em abstrato, suscetíveis de causar o evento danoso — se inseriram no processo causal de a modo que, não fora a omissão, ele provavelmente não teria ocorrido.».
- O acesso à dita cobertura, já tinha sido feito várias vezes, noutros dias, através da escada metálica, inclusive, no próprio dia do acidente, pelo que o acidente não aconteceu por força da utilização desta escada como forma de acesso à cobertura, mas, porque naquele dia e pela primeira vez, o Recorrente decidiu mover a escada para cima da dita cobertura, violando assim a distância de segurança que deve existir entre a cobertura e a linha elétrica de média tensão.
- Não se tem por verificado qualquer nexo de causalidade entre a escada e o acidente, nem os pressupostos constantes do artigo 18º, da Lei nº 98/2009 de 04.09 e 342º e 563º, ambos do Código Civil, enquanto requisitos necessários para a imputação de responsabilidade agravada à Recorrida.
Vejamos:
É inquestionável a obrigação de o Empregador assegurar aos trabalhadores condições de segurança em todos os aspetos relacionados com o trabalho, devendo para o efeito aplicar as medidas necessárias, nomeadamente combatendo na origem os riscos previsíveis, anulando-os ou limitando os seus efeitos, dando prioridade à proteção coletiva em relação às medidas de proteção individual (Lei nº 102/2009 de 10/09, da qual se realça o disposto pelos artigos 15º e 17º quanto às obrigações gerais do empregador e do trabalhador, respetivamente).
Por sua vez, está o trabalhador obrigado a cumprir as prescrições de saúde e segurança no trabalho estabelecidas nas disposições legais e em instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho, bem como as instruções determinadas com esse fim pelo empregador (cfr. artigos 15º e 17º, nº 1 alínea a) da Lei 102/2009, de 10/09 e o artigo 128º, nº 1, als. e) e j) do Código do Trabalho).
Não ficou demonstrada a existência de condições de segurança estabelecidas pela Entidade empregadora ou previstas na lei, a violação, por ação ou por omissão, dessas condições, por parte do Autor, cuja atuação fosse voluntária, ainda que não intencional, e sem causa justificativa e que existiu nexo de causalidade entre essa violação e o acidente.
Ficou apenas assente que quando o Autor ou qualquer outro funcionário da B..., Lda tivesse que efetuar serviços que exigissem material e/ou equipamento específico para os fazer em segurança, tinham instruções para comunicarem tal serviço à sua entidade patronal, mencionando todo o material de segurança que necessitassem, normalmente na véspera. (item 31º dos factos assentes)
Afastada que está a responsabilidade do Autor pelo eclodir do acidente de trabalho, importa apurar se pelo mesmo foi responsável a Entidade Empregadora.
A responsabilidade agravada da Entidade empregadora em matéria de acidentes de trabalho, (cfr. artigo 18º, nº1 da Lei 98/2009, incluído na transcrição da sentença supra), de acordo com o preceito atrás citado, exige:
a) a demonstração da inobservância das regras sobre a segurança, higiene e saúde no trabalho por parte da entidade empregadora;
b) que foi essa inobservância a causa adequada do acidente.
Considerou a 1ª instância ter ocorrido violação por parte da Ré Empregadora e da Chamada, de concretas regras de segurança mas que não está provado o nexo de causalidade entre tal violação e a ocorrência do acidente que vitimou o Sinistrado.
Entendemos também ter ocorrido violação de normas de segurança por parte da Empregadora, B..., Unipessoal, Lda, pelo incumprimento por parte desta, além do mais, das disposições respeitantes aos equipamentos de trabalho e às condições de distância que devem proteger os trabalhadores expostos, por proximidade com uma linha de média tensão, contra os riscos de contacto direto ou indireto com a eletricidade.
Com efeito, assim se afere do que resultou provado e se salienta:
- Existia uma linha aérea elétrica de média tensão num dos topos do edifício onde o Autor se encontrava a trabalhar aquando do acidente; (item 23)
- A B..., Lda sabia da existência da linha aérea elétrica de média tensão referida em 23); (item 24)
- Nas circunstâncias referidas em 22), a mando da B..., Lda, o Autor encontrava-se no exterior de um edifício a fazer manutenção, para aí efetuar a reparação de infiltrações e falhas de estanquicidade dessa mesma cobertura. (item 25)
- Para o efeito o autor dispunha duma escada móvel, de alumínio, com 4 metros de comprimento. (item 26)
- Equipamento que se mostrou necessário a poder escalar e subir ao cimo daquela cobertura. (item 27)
- Para executar a ordem da B..., Lda, o autor colocou a dita escada posicionada de molde que o cimo da escada ultrapassava aproximadamente um metro o topo da platibanda da descrita cobertura onde ia trabalhar. (item 28)
- A linha aérea elétrica aludida em 23) estava situada 4,10 metros de altura do local onde o autor se encontrava a trabalhar, o que era do conhecimento da B..., Lda. (item 29)
- Já posicionado em altura, e quando o autor procedia à movimentação da dita escada, o material metálico de que era composta essa escada que usava, serviu de atração e funcionou como arco elétrico que teve, como ponto final, a produção de uma violenta descarga sobre o corpo do autor. (item 30)
- Nem a “B...”, nem a “C...” realizaram as fichas de procedimento de segurança, para os trabalhos nas proximidades de linhas de média tensão. (item 35)
- Não foi realizado localmente o levantamento das condições existentes nem pela “B...”, nem pela “C...”, tais como a proximidade de linhas de média tensão. (item 36)
- Não foi organizado um plano de trabalhos de acordo com os riscos identificados; (item 37)
- Não foi disponibilizada ao A. a colocação de andaime para acesso à cobertura naquela semana. (item 39)
- Não foi dada ao Autor formação para a realização de trabalhos em altura e/ou na presença de riscos elétricos. (item 40)
- Não foi delineado plano de resgate e socorro. (item 41)
O Supremo Tribunal de Justiça pronunciou-se, recentemente, sobre a questão em apreciação, em diversos acórdãos.
Lê-se no sumário do Acórdão de 03.11.2023, do STJ (in www.dgsi.pt):
“I- A responsabilidade agravada do empregador pode ter dois fundamentos autónomos: um comportamento culposo da sua parte (a título de dolo ou negligência), criador de uma situação perigosa (e inerente esfera de risco); ou a violação pelo empregador de regras de segurança ou saúde no trabalho que ele estivesse diretamente obrigado a observar e de cuja omissão resulte o acidente (hipótese em que é desnecessária prova da culpa, ao contrário do que acontece naquele primeiro caso).
II- Ambos os fundamentos exigem (para além do “comportamento culposo” ou da violação normativa) a prova do nexo causal entre determinada conduta (ato ou omissão) e o acidente.
III- O ónus de alegar e provar os factos que agravam a responsabilidade do empregador compete ao respetivo beneficiário, nos termos do artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil.
(…)” (https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/696fa541231452a480258a6000333f2b?OpenDocument)
No Acórdão de 21.02.2024, do STJ (in www.dgsi.pt):
“Dispõe o artº 14º, nº 1, al. a), da Lei 98/2009 (LAT):
1 - O empregador não tem de reparar os danos decorrentes do acidente que:
a) For dolosamente provocado pelo sinistrado ou provier de seu ato ou omissão, que importe violação, sem causa justificativa, das condições de segurança estabelecidas pelo empregador ou previstas na lei”.
Quanto ao nexo de causalidade, temos que, e segundo Galvão Teles, Manual de Direito das Obrigações, 229, no direito civilístico português vigora a doutrina da causalidade adequada: "determinada ação ou omissão será causa de certo prejuízo se, tomadas em conta todas as circunstâncias conhecidas do agente e as mais que um homem normal poderia conhecer, essa ação ou omissão se mostrava, à face da experiência comum, como adequada à produção do referido prejuízo, havendo fortes probabilidades de o originar"
No Ac. do STJ de 23/9/2012, proc. 289/09.0TTSTB.E1.S1, disponível em www.dgsi.pt, escreveu-se o seguinte:
“Debruçando-se sobre esta temática, Pessoa Jorge começa por aludir à “teoria da equivalência das condições”, para a qual “... cada condição sine qua non seria causa de todo o efeito, porque, sem ela, as outras condições não teriam atuado” (in “Ensaio Sobre os Pressupostos Da Responsabilidade Civil” – “Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal”, Lisboa, 1 a 72, reedição, página 389).
Sendo notório, porém, que uma tal teoria jamais poderia ser transposta, na sua genuinidade, para o domínio da responsabilidade civil – por ser patentemente injusto responsabilizar alguém por prejuízos que nada tiveram a ver em concreto, com a sua conduta – haverá que eleger então, de entre as várias condições do dano, aquelas que legitimam a imposição, ao respetivo agente, da obrigação de indemnizar.
O nosso sistema positivo acolheu a “teoria de causalidade”, ao consignar, no artigo 563.º do Código Civil, que “...a obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão”.
A inadequação de uma dada causa para um resultado deriva da sua total indiferença para a sua produção, que, por isso mesmo, só ocorreu por circunstâncias excecionais ou extraordinárias.
A teoria da causalidade adequada impõe, pois, num primeiro momento, a existência de um facto naturalístico concreto, condicionante de um dano sofrido, para que este seja reparado; e, num segundo momento, que o facto concreto apurado seja, em geral e abstrato, adequado e apropriado para provocar o dano.
E assim sendo, o facto gerador do dano só pode deixar de ser considerado sua causa adequada se se mostrar inidóneo para o provocar ou quando para a sua produção tiverem contribuído decisivamente circunstâncias anormais, excecionais, extraordinárias ou anómalas, que intervieram no caso concreto- ac. do STJ de 25/10/2018, proc. 92/16.0T8BGC.G1.S2.
“(...) o artigo 563.º do Código Civil estabelece a respeito da obrigação de indemnização que esta “só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão” (…). Quer se considere que a norma consagra assim a chamada “causalidade adequada” na sua formulação negativa, quer se ponha o acento no escopo da norma violada e na interação entre o fundamento da responsabilidade e a imputação do dano ao agente 3, o lesado tem aqui apenas que invocar que a não observância das regras de segurança terá provavelmente influído na ocorrência do acidente. Como bem destacou o Tribunal da Relação de Guimarães, em Acórdão também ele recente, “trata-se de elaborar um juízo de prognose sobre se aquele facto, em abstrato e em condições normais, tem aptidão genérica para produzir aquele resultado típico que é, assim, sua consequência normal, recorrendo-se à probabilidade fundada em conhecimentos médios e em regras da experiência comum”- ac. do STJ de 3/11/2023, Proc. n.º 1694/20.6T8CSC.C1.S1.
Constitui jurisprudência deste STJ (veja-se, por exemplo, o acórdão de 23-06-2023, Proc. n.º 179/19.8T8GRD.C1.S1, para cuja fundamentação exaustiva remetemos) que, para prova do nexo causal, basta a demonstração de que o sinistro é uma consequência normal, previsível da violação das regras de segurança, independentemente de se provar ou não, com todo o rigor e extensão, “a vertente naturalística”, a chamada dinâmica do acidente - cfr., igualmente, o citado Ac. de 3/11/2023.” (https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/946e6082f7adc44d80258acb003bc011?OpenDocument)
No mesmo sentido, também o recente Acórdão do STJ de 22.05.2024 (in www.dgsi.pt):
“I - O nosso sistema positivo acolheu a “teoria de causalidade”, ao consignar, no artigo 563.º do Código Civil, que “...a obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão”.
II- Para prova do nexo causal, basta a demonstração de que o sinistro é uma consequência normal, previsível da violação das regras de segurança, independentemente de se provar ou não, com todo o rigor e extensão, a chamada dinâmica do acidente.”
Por último, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 6/2024, Uniformizando Jurisprudência, proferido em 17.04.2024:
«Para que se possa imputar o acidente e suas consequências danosas à violação culposa das regras de segurança pelo empregador ou por uma qualquer das pessoas mencionadas no artigo 18.º, n.º 1, da LAT, é necessário apurar se nas circunstâncias do caso concreto tal violação se traduziu em um aumento da probabilidade de ocorrência do acidente, tal como ele efetivamente veio a verificar-se, embora não seja exigível a demonstração de que o acidente não teria ocorrido sem a referida violação.» (realce aqui introduzido)
Em concreto, como considerado na sentença recorrida e acima afirmado, mostra-se violada uma regra de segurança específica.
E pode concluir-se que atentas as regras da experiência, era objetivamente provável que a omissão das medidas de segurança, que deveriam ter sido implementadas, no decurso da reparação de infiltrações e falhas de estanquicidade da cobertura do edifício, em que num dos topos existia uma linha aérea elétrica de média tensão e onde o Autor se encontrava a trabalhar, desencadeasse a eletrocussão deste provocando-lhe lesões e sequelas físicas que ficaram provadas?
A resposta é afirmativa com a explicitação que segue.
O acidente dos autos ocorreu em 10-11-2015, sendo aplicável a Lei nº 98/2009, de 04 de Setembro (LAT), a qual regulamenta o regime de reparação de acidentes de trabalho e de doenças profissionais.
Dispõe o artigo 7º da LAT que «é responsável pela reparação e demais encargos decorrentes de acidentes de trabalho (...), a pessoa singular ou coletiva de direito privado ou de direito público não abrangida par legislação especial, relativamente ao trabalhador ao seu serviço".
Daqui decorre que são os empregadores que, em primeira linha, respondem pela reparação do acidente, embora sejam obrigados a transferir essa responsabilidade para uma companhia de seguros que passará então a ser a responsável, nos termos do contrato de seguro - artigo 79º da LAT.
A reparação do acidente ao abrigo da Lei dos Acidentes de Trabalho só pode, pois, em princípio, ser pedida à entidade empregadora ou à sua seguradora.
Em princípio, desde logo, tratando-se de responsabilidade agravada, por a responsabilidade poder abranger outras entidades como resulta do artigo 18º nº1 da LAT: «1 - Quando o acidente tiver sido provocado pelo empregador, seu representante ou entidade por aquele contratada e por empresa utilizadora de mão-de-obra, ou resultar de falta de observação, por aqueles, das regras sobre segurança, e saúde no trabalho, a responsabilidade individual ou solidária pela indemnização abrange a totalidade dos prejuízos, patrimoniais e não patrimoniais, sofridos pelo trabalhador e seus familiares, nos termos gerais.»
No caso, porém, da factualidade provada não aferimos que a responsabilidade da Chamada possa ser valorizada para o efeito, ainda que como salientado na sentença ocorram também por parte da mesma e não só da Entidade empregadora, omissões que configuram violação de regras sobre segurança no trabalho.
Com efeito, provou-se que a Chamada, C...,S.A.:
- Não assegurou a coordenação dos demais empregadores através da organização das atividades de segurança e saúde no trabalho ao determinar a realização de obra de manutenção. (item 33 dos factos provados)
- Não solicitou à D... o alteamento da linha ou o desligamento preventivo da linha de média tensão antes da realização da reparação da cobertura. (item 34 dos factos provados)
Ainda que a Entidade empregadora e a Chamada:
- Não realizaram as fichas de procedimento de segurança, para os trabalhos nas proximidades de linhas de média tensão. (item 35 dos factos provados)
- Não realizaram localmente o levantamento das condições existentes, tais como a proximidade de linhas de média tensão. (item 36 dos factos provados)
Temos, porém, como decisivo, no que respeita à responsabilidade agravada, ter ficado provado que:
- O modo de execução dos serviços era definido entre a Ré Entidade empregadora e os seus trabalhadores, atendendo às necessidades apresentadas pela C... à B.... (item 16 dos factos provados)
- Nas circunstâncias em que decorreu o evento, era a mando da Entidade empregadora que o Autor se encontrava no exterior de um edifício a fazer manutenção, para aí efetuar a reparação de infiltrações e falhas de estanquicidade dessa mesma cobertura. (item 25 dos factos provados)
- Para executar a ordem da mesma, ou seja, da Entidade empregadora, o Autor colocou a dita escada posicionada de molde que o cimo da escada ultrapassava aproximadamente um metro o topo da platibanda da descrita cobertura onde ia trabalhar. (item 28 dos factos provados)
- A linha aérea elétrica de média tensão num dos topos do edifício onde o autor se encontrava a trabalhar aquando do acidente, estava situada 4,10 metros de altura daquele local onde o Autor se encontrava, o que era do conhecimento da Entidade empregadora. (item 29 dos factos provados)
E ainda que:
- Não foi dada ao Autor formação para a realização de trabalhos em altura e/ou na presença de riscos elétricos. (item 40 dos factos provados)
Formação que incumbia à Entidade empregadora – artigo 281º, nº3 do Código do Trabalho - e que temos como absolutamente relevante, atento o movimento com a escada efetuado pelo Trabalhador.
Com efeito, ficou também provado que:
- Já posicionado em altura, e quando o Autor procedia à movimentação da dita escada, o material metálico de que era composta essa escada que usava, serviu de atração e funcionou como arco elétrico que teve, como ponto final, a produção de uma violenta descarga sobre o corpo do autor. (item 30 dos factos provados)
Ou seja, a falta de formação para a realização de trabalhos em altura e/ou na presença de riscos elétricos, é suscetível de justificar a movimentação da escada pelo Sinistrado, já após a sua subida, tendo tal movimentação funcionado como causa do evento.
E como ponderado na sentença, “(…) desconhece-se se a colocação de um andaime, para acesso à cobertura, atenta a composição dos seus materiais e tamanho dos mesmos, não provocaria igual resultado. Também o corte de energia na linha de média tensão não se afigura como medida de proteção obrigatória em face das circunstâncias à data cognoscíveis, porquanto o sinistrado naquela semana vinha utilizando a escada em causa para aceder à cobertura para execução daqueles mesmos trabalhos.”
Daí que aferimos ser a Entidade empregadora, a responsável em termos agravados e não também a Chamada.
Tendo o acidente resultado da inobservância pela Empregadora de regras de segurança, a responsabilidade infortunística cabe à mesma, ou seja, é aquela a responsável pela reparação dos danos decorrentes do mesmo acidente, conforme resulta do artigo 18º da LAT.
Ocorrendo «Atuação culposa do empregador», dispõe o artigo 18º, nº4 da LAT:
«4 - No caso previsto no presente artigo, e sem prejuízo do ressarcimento dos prejuízos patrimoniais e dos prejuízos não patrimoniais, bem como das demais prestações devidas por atuação não culposa, é devida uma pensão anual ou indemnização diária, destinada a reparar a redução na capacidade de trabalho ou de ganho ou a morte, fixada segundo as regras seguintes:
a) Nos casos de incapacidade permanente absoluta para todo e qualquer trabalho, ou incapacidade temporária absoluta, e de morte, igual à retribuição;
b) Nos casos de incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual, compreendida entre 70 % e 100 % da retribuição, conforme a maior ou menor capacidade funcional residual para o exercício de outra profissão compatível;
c) Nos casos de incapacidade parcial, permanente ou temporária, tendo por base a redução da capacidade resultante do acidente.»
Por seu turno, a condenação da Ré Seguradora é limitada às prestações que seriam devidas caso não houvesse atuação culposa, sem prejuízo do direito de regresso:
Artigo 79º nº 3 da LAT:
«3 - Verificando-se alguma das situações referidas no artigo 18.º, a seguradora do responsável satisfaz o pagamento das prestações que seriam devidas caso não houvesse atuação culposa, sem prejuízo do direito de regresso.»
Procedendo aos cálculos da pensão agravada, nos termos do artigo 18º, nº4, alínea b) da LAT:
Assim, temos:
IPP de 45% com IPATH
- Remuneração anual de € 8.733,34
8.733,34 x 0, 70= 6.113,34
8.733,34 - 6.113,34 = €2.620,00
2.620,00 x 0,45= € 1.179,00
6.113,34 + 1.179,00 = € 7.292,34
O valor da pensão agravada devida é de € 7.292,34

E como referido na sentença, “Para além da pensão, o Sinistrado tem ainda direito a um subsídio por elevada incapacidade permanente fixado entre 70% e 100% de 12 vezes o valor de 1,1 IAS, tendo em conta a capacidade funcional residual para o exercício de outra profissão compatível, sendo o valor IAS correspondente ao que estiver em vigor à data do acidente, correspondente a 4.617,16€ – cfr. art. 67º, nº3, da Lei nº 98/2009, de 4 de Setembro [(IAS x 1,1 x12 – IAS x 1,1 x 12 x 70%) x IPP + (IAS x 1,1 x 12 x 70%)], considerando o IAS = 419,22€ (Lei 82-B/2014, de 31/12).”(realce aqui introduzido)

Ficou provado:
- Como consequência desse mesmo evento, resultaram para o autor os seguintes períodos de incapacidade temporária:
Incapacidade temporária absoluta (ITA, correspondente ao período durante o qual o autor esteve totalmente impedido de realizar a sua atividade profissional) desde 11-11-2015 até 10-10-2016 e desde 31-10-2016 a 31-12- 2016;
Incapacidade temporária parcial de 60% (ITP de 60%, correspondente ao período durante o qual foi possível o autor desenvolver a sua atividade profissional, ainda que com certas limitações) desde 11-10-2016 até 30-10- 2016;
Incapacidade temporária parcial de 30% (ITP de 30%, correspondente ao período durante o qual foi possível o autor desenvolver a sua atividade profissional, ainda que com certas limitações) desde 1-01-2017 até 9-01-2017. (item 44º dos factos provados)
O Autor recebeu da Ré Seguradora a quantia de 6.821,56€ a título de indemnização pelos períodos de incapacidade temporária. (item 56 dos factos provados)
O Autor tem direito à indemnização agravada pelos períodos de incapacidade temporária para o trabalho, nos termos previstos no artigo 18º, nº4, alínea c) da LAT.
O Autor não pediu tal indemnização agravada, mas há que a atribuir, estando perante direitos indisponíveis- artigo 74º do Código de Processo do Trabalho.
E tal indemnização importa em € 9.850,72, assim calculada:
A base é a remuneração anual: € 8.733,34
Face aos períodos constantes no nº 44 dos factos provados e ao disposto no artigo 18º, nº4, alínea c) da LAT, temos:
- 397 dias de ITA= 8.733,34:365x 397dias= € 9.499,00
- 20 dias de ITP de 60%= 8.733,34:365 x0,60x 20 dias= € 287,12
- 9 dias de ITP de 30% = 8.733,34: 365x0,30x9 dias = € 64,60
O que totaliza: € 9.850,72
É assim devida ao Autor a quantia correspondente ao agravamento que corresponde à diferença entre a indemnização agravada e a indemnização normal, ou seja, € 9.850,72- €6.939,78= € 2.910,94
O Autor peticionou ainda o pagamento da quantia de € 50.000,00 a título de indemnização pelos danos morais.
Tendo o acidente resultado da violação das regras de segurança, nos termos do nº1 do artigo 18º da LAT, a indemnização abrange a totalidade dos prejuízos, patrimoniais e não patrimoniais, sofridos pelo trabalhador, nos termos gerais.
Conforme disposto no artigo 496º, nº1 do Código de Processo Civil, são indemnizáveis os danos não patrimoniais que, pela gravidade, mereçam a tutela do direito. E segundo o nº4 do mesmo normativo, o montante é fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494º, que manda considerar o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e às demais circunstâncias do caso.
Emerge do quadro factual assente que o acidente causou ao Autor, com 36 anos à data do acidente (item 1º dos factos provados), não só uma perda substancial da sua capacidade de ganho mas também sequelas graves que irão afetá-lo durante toda a sua vida.
Nos factos provados a ponderar, destacamos nas consequências do evento:
- Em consequência do evento, o Autor sofreu queimadura de 1º e 2º grau nos dedos da mão direita e esquerda e queimadura de 3º grau no pé esquerdo (hallux e planta). (item 43º dos factos provados)
- Como consequência do evento e das lesões emergentes do mesmo, resultaram para o autor as seguintes sequelas no membro inferior esquerdo: dismorfia da região da planta do pé na zona do arco do 3º e 4º dedos com área ulcerada com 3 por 2,5 cm de maiores eixos; dismorfia do 1º dedo do pé, com enxerto de pele circundante; pele fria da metade distal do pé (dorso e região plantar – por comparação com a contra-lateral); movimento de retirada ao toque de toda a metade distal do pé (dorso ou planta); restante membro inferior com atrofia ligeira dos diferentes grupos musculares por comparação com o membro inferior contra-lateral mas sem alterações dos componentes articulares deste membro (atrofia eventual por desuso); área levemente hipopigmentada no terço médio da face anterior da coxa com 6 por 5 cm de maiores eixos (compatível com área dadora de enxerto cutâneo). (item 46º dos factos provados)
- As sobreditas sequelas correspondem a algodistrofia do membro inferior esquerdo, sendo enquadráveis no Capítulo III, 6.2.8. b) da Tabela Nacional de Incapacidades, e determinam que o autor se ache afetado de um coeficiente de desvalorização de incapacidade permanente parcial para o trabalho de 30%, com IPATH (incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual). (item 47º dos factos provados)
- O Autor necessita de tratamentos de medicina física e de reabilitação, para evitar agravamento do quadro de algodistrofia do membro inferior esquerdo, num total de 40 sessões anuais, com uma periodicidade semanal de 2 a 3 vezes, com a regularidade e nos períodos a decidir nesta consulta. (item 48º dos factos provados)
- As sequelas acima descritas implicam que o Autor esteja impossibilitado de realizar determinados movimentos, ações e tarefas com o membro inferior esquerdo, mormente o seu pé, por impotência funcional do pé e dedos esquerdos na medida da IPP atribuída. (item 49º dos factos provados)
- Para ajuda na marcha o Autor carece de uma canadiana para descarga do membro inferior afetado, com necessidade de renovação a cada dois anos. (item 50º dos factos provados)
- O Autor tem dificuldade em permanecer de pé por períodos prolongados. (item 51 º dos factos provados)
- Em virtude do acidente dos autos, o Autor padeceu de dores, submeteu-se a prologados e dolorosos tratamentos, sentido complexos, vergonha, revolta e desgosto das sequelas de que ficou afetado. (item 54 º dos factos provados)
Por outro lado, é ainda de considerar o grau de censurabilidade da conduta omissiva da Entidade empregadora, entretanto insolvente, mas também que foram ulteriormente tomadas medidas para obviar a acidentes como o que vitimou o sinistrado:
- A B..., Lda sabia da existência da linha aérea elétrica de média tensão referida em 23). (item 24º dos factos provados)
- A linha aérea elétrica aludida em 23) estava situada 4,10 metros de altura do local onde o autor se encontrava a trabalhar, o que era do conhecimento da B..., Lda. (item 29º dos factos provados)
- Após a ocorrência do acidente, a 28-12-2015 a D.../REN procedeu ao alteamento da linha aérea elétrica de média tensão. (item 32º dos factos provados)
- Após o acidente, a C... procedeu à colocação de uma escada fixa à parede do edifício, com resguardo para as costas, vedou o acesso à escada com um aloquete de segurança. (item 42º dos factos provados)
Ponderando, temos como adequado arbitrar ao Autor a quantia de € 15.000,00, a título de compensação pelos danos não patrimoniais decorrentes do acidente.
Em suma:
Impõe-se considerar devida ao Sinistrado a pensão anual e vitalícia, em virtude de o acidente ter resultado da inobservância culposa das regras de segurança pela Empregadora, no valor de € 7.292,34 acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a data dos atinentes vencimentos.
A pensão é anualmente atualizável desde a data do vencimento em 10.1.2017.
Impõe-se ainda considerar devido um subsídio por elevada incapacidade permanente fixado entre 70% e 100% de 12 vezes o valor de 1,1 IAS, correspondente ao que estive em vigor à data do acidente, tendo em conta a capacidade funcional residual para o exercício de outra profissão compatível, correspondente a 4.617,16€, acrescido de juros, à taxa anual de 4%, desde o dia seguinte à data da alta, até efetivo e integral pagamento.
Impõe-se também, considerar devida ao Sinistrado a quantia de € 2.910,94 correspondente ao agravamento por diferença entre a indemnização agravada e a indemnização normal, pelos períodos de incapacidade temporária para o trabalho, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a data dos atinentes vencimentos.
Impõe-se ainda, considerar devida ao Sinistrado a compensação por danos não patrimoniais próprios, no valor de € 15.000,00, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a presente data até integral pagamento.
Justifica-se, assim a condenação da Entidade empregadora, dando-se conta de que é insolvente, tendo a “Massa insolvente da B..., Unipessoal, Lda”, tido intervenção nos autos, como referido.
No que do montante da pensão anual e vitalícia supra fixada, foi a Ré, Seguradora, A... – Companhia de Seguros, S.A., já condenada na sentença recorrida, como pensão anual vitalícia e atualizável, calculada sem agravamento, no montante de 5.152,67€ (cinco mil cento e cinquenta e dois euros e sessenta e sete cêntimos), acrescida de juros, responde a mesma Ré, solidariamente, sem prejuízo do direito de regresso.
Mais se justifica condenar a Massa insolvente da B..., Unipessoal, Lda., a pagar ao Sinistrado, a indemnização normal devida caso não houvesse agravamento, pelos períodos de incapacidade temporária para o trabalho, no valor de 6.939,78€ (seis mil novecentos e trinta e nove euros e setenta e oito cêntimos), a que o Sinistrado tem direito e de que a Ré, Seguradora, A... – Companhia de Seguros, S.A., responde solidariamente, sem prejuízo do direito de regresso (artigo 79º, nº3 da LAT), tendo já pago a quantia de € 6.821,56, foi condenada na sentença recorrida a pagar o remanescente correspondente a € 118,22.
Justifica-se, ainda, condenar a Massa insolvente da B..., Unipessoal, Lda., pelas demais prestações a que o Sinistrado tem direito e em que a Ré, Seguradora A... – Companhia de Seguros, S.A., ficou também condenada na sentença recorrida e responde solidariamente, sem prejuízo do direito de regresso (artigo 79º, nº3 da LAT), nos termos ali decididos:
“- a pagar ao sinistrado a quantia de 35,00€ (trinta e cinco euros) a título de despesas com transportes, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a data da tentativa de conciliação (3-5-2018), até integral e efetivo pagamento.
- no fornecimento de uma canadiana com renovação a cada dois anos;
- no fornecimento de dois pares anuais de calçado específico, Reebok DMX series ou sapatilha equivalente;
- na readaptação do veículo automóvel, pertença do sinistrado ou que este adquira com características idênticas, com a instalação de caixa de velocidades automática, até ao limite de 5.533,70€ (cinco mil quinhentos e trinta e três euros e setenta cêntimos).”
*
Sem prejuízo do direito de regresso da Ré Seguradora, decorrente da responsabilidade agravada da Entidade empregadora, quanto à condenação daquela decidida na sentença recorrida, o que aqui se decide, condenar também a Ré Seguradora, sem prejuízo do mesmo direito de regresso e a Massa insolvente da B..., Unipessoal, Lda, ainda no tratamento médico, incluindo os tratamentos de medicina física e de reabilitação, para evitar agravamento do quadro de algodistrofia do membro inferior esquerdo, num total de 40 sessões anuais, com uma periodicidade semanal de 2 a 3 vezes, com a regularidade e nos períodos a decidir nessa consulta.
*
Analisando agora o último segmento da Apelação, quanto à necessidade de viatura adaptada às condições físicas do Autor, concluiu o Apelante, em suma:
- Provou-se que o veículo que o Autor possuía não era, nem é suscetível de adaptação.
- Deverá a Ré Seguradora ser condenada no pagamento do montante de 42.347,14, para aquisição de uma viatura automóvel adaptada às suas necessidades deduzindo-se o valor de retoma da viatura anterior, ou relegar-se para liquidação posterior.
- A condenação a tal título ditada pela sentença recorrida - 5.533,70€ – é manifestamente exígua e insuficiente para proporcionar a recuperação do Sinistrado para a vida ativa incluindo todos os aspetos da sua vida pessoal e social, mesmo que com carácter lúdico.
Lê-se na sentença:
“Da readaptação do veículo automóvel:
Dispõe o artigo 23º da Lei 98/2009, de 4/9, sob a epígrafe “Princípio geral”:
O direito à reparação compreende as seguintes prestações:
a) Em espécie – prestações de natureza médica, cirúrgica, farmacêutica, hospitalar e quaisquer outras, seja qual for a sua forma, desde que necessárias e adequadas ao restabelecimento do estado de saúde e da capacidade de trabalho ou de ganho do sinistrado e à sua recuperação para a vida ativa.
b) Em dinheiro – indemnizações, pensões, prestações e subsídios previstos na presente lei.”.
Carlos Alegre defendia, ainda no âmbito da Lei nº 100/97 de 13-09, mas perfeitamente transponível para o regime atual, que o artigo 10º, al. a), dessa Lei [idêntico ao atual artigo 23º, al. a)] «delimita o conteúdo da reparação, apenas, às prestações necessárias e adequadas ao restabelecimento – do estado de saúde, - da capacidade de trabalho ou de ganho, - da recuperação para a vida ativa, da vítima». [Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais, 2ª edição, pág. 73].
Assim, e como vem sendo defendido na nossa jurisprudência, de que é exemplo o Acórdão da Relação do Porto de 10-10-2016 (processo nº 1025/08.3TTPNF.8.P1, disponível in www.dgsi.pt), do «citado art. 10º decorre que a reparação em espécie não abrange, apenas, o restabelecimento da capacidade de trabalho do sinistrado, mas também o seu estado de saúde e, ainda, da sua recuperação para a vida ativa. E, esta, não se restringe à sua vida ativa laboral [se assim não fosse não faria sentido a distinção legal], mas, como diz Carlos Alegre, in Regime Jurídico dos Acidentes de Trabalho e das Doenças Profissionais, 2ª Edição, Almedina, pág. 74, abrange também os aspetos ligados à sua condição humana. A sua vida ativa abrange todos os aspetos da vida pessoal e social que, aferida por padrões de normalidade, as pessoas levam a cabo na sua vivência, ainda que com caráter lúdico, também estes necessários a uma sã existência, física e psíquica».
Sobre esta matéria poderão colher-se, ainda, os ensinamentos dos Acórdãos do Tribunal da Relação de Coimbra de 15-09-2016, processo nº 254/10.4TTFIG.1.C1, e o Tribunal da Relação de Guimarães de 15-12-2016, processo nº 1095/09.7TTBRG.G1, todos in www.dgsi.pt.
Destarte se conclui que a prestação atinente à atribuição de um veículo automóvel adaptado aos condicionalismos exigidos pela condição física do sinistrado decorrente do acidente de trabalho dos autos é reconduzível às prestações previstas no citado artigo 23º.
Ademais, importa ter presente que o fornecimento de qualquer tipo de prestação em espécie não passa, à partida, pelo adiantamento em dinheiro ao sinistrado, antes deverá ser a entidade responsável a fornecer o equipamento, adaptando o veículo automóvel do sinistrado ou fornecendo outro que seja adequado à diminuição funcional que o sinistrado apresenta.
No caso dos autos, está em causa a incapacidade do A. em pressionar com o seu pé esquerdo o pedal da embraiagem, pelo que a prestação reparadora consistiria em proporcionar-lhe a adaptação do veículo para caixa de velocidades, não podendo as despesas ultrapassar o montante correspondente a 12 vezes o valor de 1,1 IAS à data do acidente.
Este limite tem vindo a ser aplicado por analogia ao subsídio para readaptação da habitação, como explana o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, datado de 17-11-2020, proferido no processo 3097/16.8T8MTS.P1, in www.dgsi.pt: “se para a readaptação da habitação entendeu o legislador que o subsídio expressamente previsto deve conter-se dentro de valores que entendeu razoáveis para assegurar a reparação do sinistrado, por identidade de razões e de sentido lógico, cremos justificar-se o recurso à analogia, nos termos admitidos pelo art.º 10.º n.ºs 1 e 2, do CC, dada a omissão de previsão para situações congéneres à em apreciação, para se estabelecer igualmente um limite máximo para o encargo a ser suportado pela responsável pela reparação quando se reconheça assistir ao sinistrado, por necessidade justificada, o direito à readaptação de veículo automóvel ou, quando aquela não for viável, à atribuição de veículo que cumpra o objetivo em vista”, nesse pressuposto tendo-se entendido “(..) que a seguradora está obrigada a suportar as despesas com a atribuição de veículo, nos termos acima apontados, mas “até ao limite de 12 vezes o valor de 1,1 IAS à data do acidente”.
Volvendo ao caso vertente, o limite da responsabilidade da seguradora, neste conspecto, corresponderá a 5.533,70€ [12 x 1,1 IAS à data do acidente = 12x 1,1 x 419,22€ - cfr. Lei 82-B/2014, de 31/12. Acresce que, resultou demonstrado que o veículo que o A. era proprietário à data do acidente não é passível de adaptação para caixa de velocidades automática.
Assim, concluindo-se pela necessidade e adequação da ajuda técnica peticionada, deverá a R. Seguradora assegurar o pagamento do montante máximo de 5.533,70€ relativo à (re)adaptação do veículo automóvel do sinistrado ou que este adquira com características idênticas, com instalação de caixa automática de velocidades, improcedendo o montante demais peticionado por exceder o limite da responsabilidade da seguradora – arts. 23º, a), 25º, nº 1 g), 41º e 43º da Lei 98/2009, de 4/9.”
É este também o entendimento que seguimos.
Não vemos razões para nos afastarmos daquele que tem sido o entendimento desta secção.
Com recurso ao Acórdão proferido no processo nº 3007/16.2T8MAI.P1, em 15.12.2021 desta secção (Relator Desembargador Jerónimo Freitas, com intervenção da aqui 2ª Adjunta, in www.dgsi.pt), com referência entre outros ao Acórdão desta mesma secção (relatado pelo mesmo Desembargador e com intervenção da aqui 2ª Adjunta), de 27-04-2020 [proc.º 236/14.7TTVRL-B.P1]:
“Atenta a similitude das situações e não se perfilando razões que justifiquem a alteração do entendimento afirmado no acórdão de 27-04-2020 - como adiante melhor explicaremos -, seguiremos de perto a fundamentação constante desse aresto, nomeadamente, nas partes que se passam a transcrever:
« [..]
Vejamos então, começando por enunciar o quadro legal a considerar.
O art.º 23.º, da Lei 98/2009, de 04 de Setembro [Regulamenta o Regime de Reparação de Acidentes de Trabalho e de Doenças Profissionais], estabelece, como a própria epígrafe elucida, o “Princípio Geral” no que respeita às prestações compreendidas no direito dos sinistrados à reparação, distinguindo dois tipos: “Em espécie” e “Em dinheiro”.
Interessam-nos aqui as primeiras, resultado da noção geral da norma que abrangem o seguinte: “prestações de natureza médica, cirúrgica, farmacêutica, hospitalar e quaisquer outras, seja qual for a sua forma, desde que necessárias e adequadas ao restabelecimento do estado de saúde e da capacidade de trabalho ou de ganho do sinistrado e à sua recuperação para a vida ativa”.
No mesmo diploma legal, mais adiante o artigo 25.º vem especificar, como a epígrafe também logo anuncia, as “Modalidades das prestações” em espécie. O n.º1, enuncia nas suas várias alíneas as prestações em espécie compreendidas “na alínea a) do artigo 23.º”, entre elas não constando prevista a readaptação ou atribuição de veículo automóvel com características adequadas para poder ser utilizado por sinistrados que em virtude das sequelas decorrentes de acidente de trabalho tenham ficado limitados na sua capacidade normal para conduzirem.
Não obstante, como se observa no acórdão desta Relação e Secção de 11-10-2011 [Proc.º 559/07.1TTPRT.P1, Desembargador Eduardo Petersen Silva, disponível em www.dgsi.pt], o art.º 25.º deve ser interpretado à luz do objetivo definido no art.º 23.º, onde se afirma expressamente que o direito à reparação abrange “(..) quaisquer outras (prestações), seja qual for a sua forma, desde que necessárias e adequadas ao restabelecimento do estado de saúde e da capacidade de trabalho ou de ganho do sinistrado e à sua recuperação para a vida ativa”. Parafraseando o citado aresto, “[O] que se pretende na reparação dos danos derivados dum acidente de trabalho é, não apenas compensar a perda da capacidade de ganho, mas tanto quanto possível recuperar o sinistrado para a vida ativa (..). O conceito de vida ativa não é colado ao conceito de vida ativa laboral, mas tem esse alcance mais geral, mais próximo da reparação natural, que é a vida que o sinistrado tinha – ou podia ter – antes de ter sofrido as lesões que lhe resultaram do acidente”.
No Acórdão de 24 de Abril de 2017, também desta Relação e Secção [Proc.º 992/10.1TTPNF-C. P1, disponível em www.dgsi.pt], relatado pelo aqui relator (…), afirmou-se esse mesmo entendimento, constando da fundamentação o seguinte: «A atribuição ao sinistrado do direito a essas prestações em espécie, tendo por finalidade assegurar-lhe o restabelecimento da capacidade de trabalho e a recuperação para a sua vida ativa, prendem-se com o princípio geral da reposição natural quanto à indemnização no domínio da responsabilidade civil, estabelecido no artigo 562.º do Código Civil, consistindo “no dever de se reconstituir a situação anterior à lesão, isto é, o dever de reposição das coisas no estado em que estariam, se não se tivesse produzido o dano” [cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Volume I, 4.ª edição, Coimbra Editora, 1987, p. 576]».
(…)
Coloca-se a derradeira questão de saber se tem justificação e cabimento na lei estabelecer um limite máximo do encargo a suportar pela responsável da reparação do direito do sinistrado, quando se reconheça, por necessidade justificada, que lhe deve ser assegurada a readaptação de veículo automóvel equipado com caixa de velocidades manual de que seja proprietário, para passar a ser dotado de caixa automática, ou a possibilidade de atribuição por aquela ou do próprio proceder à troca por um veículo que originariamente tenha essa característica, quando a primeira hipótese não seja viável.
(…)
No acórdão que vimos seguindo defendemos que “se para a readaptação da habitação entendeu o legislador que o subsídio expressamente previsto deve conter-se dentro de valores que entendeu razoáveis para assegurar a reparação do sinistrado, por identidade de razões e de sentido lógico, cremos justificar-se o recurso à analogia, nos termos admitidos pelo art.º 10.º n.ºs 1 e 2, do CC, dada a omissão de previsão para situações congéneres à em apreciação, para se estabelecer igualmente um limite máximo para o encargo a ser suportado pela responsável pela reparação quando se reconheça assistir ao sinistrado, por necessidade justificada, o direito à readaptação de veículo automóvel ou, quando aquela não for viável, à atribuição de veículo que cumpra o objetivo em vista”, nesse pressuposto tendo-se entendido “(..) que a seguradora está obrigada a suportar as despesas com a atribuição de veículo, nos termos acima apontados, mas “até ao limite de 12 vezes o valor de 1,1 IAS à data do acidente”.
Cremos que esta fundamentação responde ao primeiro argumento.
Quanto ao segundo argumento, se porventura essa solução pusesse em causa “o direito do sinistrado de obter um veículo do mesmo segmento com as mesmas características técnicas do seu anterior veículo”, mas equipado com caixa automática para lhe possibilitar a condução, então não procederiam “as razões justificativas da regulamentação do caso previsto na lei” (art.º 10.º/2, do CC), ficando de todo arredada a possibilidade de recurso à analogia.
(…)”

Improcede, nesta parte a Apelação.
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Termos em que se julga a apelação parcialmente procedente.
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Tendo em conta os valores das prestações agravadas, o valor da ação é alterado, como previsto no artigo 120º, nºs 1 e 3 do Código de Processo do Trabalho.
O valor da ação fica a ser: €135.701,85.

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3. Decisão:
Nesta conformidade, acordam as Juízas da Secção Social do Tribunal da Relação do Porto em revogar a decisão recorrida no segmento que absolveu a Entidade empregadora do pedido formulado e em conformidade:
1. Condenar a Massa Insolvente da Entidade empregadora B..., Unipessoal, Lda., a pagar ao Sinistrado/Autor:
a) A pensão anual e vitalícia, no valor de € €7.292,34 (sete mil, duzentos e noventa e dois euros e trinta e quatro cêntimos), devida desde 10.1.2017, anualmente atualizável nos termos legais, com juros de mora desde os respetivos vencimentos até integral pagamento.
b) A indemnização pelos períodos de incapacidade temporária para o trabalho, no montante de €9.850,72 (nove mil, oitocentos e cinquenta euros e setenta e dois cêntimos), deduzindo a quantia de € 6.821,56 que já foi paga pela R. Seguradora, sendo a quantia ainda em dívida no montante de € 3.029,16, com juros moratórios, à taxa legal, desde da data da alta até integral pagamento.
c) O subsídio de elevada incapacidade permanente no valor correspondente a 4.617,16€ (quatro mil, seiscentos e dezassete euros e dezasseis cêntimos), acrescido de juros de mora, à taxa legal, desde o dia seguinte à data da alta, até efetivo e integral pagamento.
d) A indemnização por danos não patrimoniais, no valor de €15.000,00 (quinze mil euros), acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde o trânsito em julgado da presente decisão, até integral pagamento.
e) A quantia de 35,00€ (trinta e cinco euros) a título de despesas com transportes, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a data da tentativa de conciliação (3-5-2018), até integral e efetivo pagamento.
f) A readaptação do veículo automóvel, pertença do sinistrado ou que este adquira com características idênticas, com a instalação de caixa de velocidades automática, até ao limite de 5.533,70€ (cinco mil quinhentos e trinta e três euros e setenta cêntimos).
2. Mais se condena a Massa Insolvente da B..., Unipessoal, Lda, a:
a) Fornecer ao Autor uma canadiana, com renovação a cada dois anos;
b) Fornecer ao Autor ao dois pares anuais de calçado específico, Reebok DMX series ou sapatilha equivalente;
c) Assegurar ao Autor os tratamentos de medicina física e de reabilitação para evitar agravamento do quadro de algodistrofia do membro inferior esquerdo, num total de 40 sessões anuais, com uma periodicidade semanal de 2 a 3 vezes, com a regularidade e nos períodos a decidir nessa consulta.
3. Manter a decisão recorrida, na medida em que condenou a Ré Seguradora A... – Companhia de Seguros, S.A., e, condena-se, ainda a mesma no fornecimento dos tratamentos de medicina física e de reabilitação estabelecidos no antecedente ponto 2.al. c), sem prejuízo do direito de regresso que detém.
4. Mantem-se a absolvição da Chamada, C..., S.A.
Fixa-se o valor da ação em € 135.701,85.
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Custas da ação da pelo Sinistrado, pela Ré Seguradora e pela Massa insolvente B..., Unipessoal, Lda., conforme decaimento.
Custas da apelação pelo Sinistrado e pela Massa insolvente B..., Unipessoal, Lda, conforme decaimento.
D.n.






Porto, de 28 de Junho de 2024.
Teresa Sá Lopes
Eugénia Pedro
Rita Romeira