EXCEÇÃO DA LITISPENDÊNCIA
CAUSA DE PEDIR
CONFORMAÇÃO DA RELAÇÃO JURÍDICA CONTROVERTIDA EM AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE DESPEDIMENTO
Sumário

I - Visando-se evitar que o tribunal seja colocado em posição de se poder contradizer, a exceção dilatória da litispendência pressupõe, à semelhança do caso julgado, a repetição de uma causa, o que ocorre quando entre duas causas existe identidade de sujeitos (quando as partes são as mesmas do ponto de vista da sua qualidade jurídica), identidade de pedido (quando em ambas as causas se visa obter o mesmo efeito jurídico) e identidade de causa de pedir (quando a pretensão deduzida em amas procede do mesmo facto jurídico) – se a causa se repete quando a anterior ainda está pendente estamos perante a litispendência; se a repetição se verifica quando a anterior já se encontra decidida com transito em julgado ocorre o caso julgado”.
II - Salvos os casos excecionados na lei, além dos efeitos substantivos ou de direito material, a citação do réu, produzindo vários efeitos processuais, nesses se inclui, também, a constituição da exceção da litispendência, assim a inadmissibilidade da propositura de ação com o mesmo objeto e a estabilidade dos elementos essenciais, subjetivos e objetivos, da causa.
III - A causa de pedir refere-se ao facto jurídico concreto e específico invocado pelo autor como fundamento da sua pretensão.
IV - A conformação da relação jurídica controvertida, no caso de ações destinadas a impugnar atos tidos como de cessação da relação laboral por despedimento que se quer ver declarado ilícito, a pretensão de tutela jurisdicional consistirá, em regra, na formulação dum pedido de afirmação dessa ilicitude, com as consequências que dessa afirmação resultam da lei e que se pretendem ver acauteladas, tendo tal pretensão por forçosa referência, só assim se identificando, para efeitos de litispendência e / ou caso julgado, a causa de pedir que a suporta, mormente os concretos factos que são invocados pelo trabalhador como configuradores do despedimento de que diz ter sido alvo, ou seja, o pedido não se identifica senão por referência ao concreto facto ilícito, sendo este o alicerce das consequências que se pretendem ver afirmadas, para que tende assim a pretensão formulada – o direito surge jurídico-geneticamente daquele facto ilícito, não podendo ser suportado por outro, no sentido de que se for outro o facto jurídico, o direito a exercer será com base nesse.

Texto Integral

Apelação / processo n.º 401/24.9T8PRT.P1
Tribunal Judicial da Comarca do Porto Juízo do Trabalho do Porto - Juiz 3

Autor/recorrente: AA

Ré/recorrida: Associação ...


_______

Nélson Fernandes (relator)

António Luís Carvalhão

Rita Romeira

Acordam no Tribunal da Relação do Porto

I - Relatório

1. AA propôs a presente ação, sob a forma de processo comum emergente de contrato de trabalho, contra Associação ..., requerendo desde logo a suspensão da instância.

Deduz no final os seguintes pedidos:

“A) Deve ser declarado ilício o despedimento da Autora, por o mesmo não ter sido precedido do respetivo procedimento, nos termos do disposto no artigo 381.º, alínea c), do Código do Trabalho;

B) Deve a Ré ser condenada a pagar à Autora as retribuições que a mesma deixou de auferir desde a data do despedimento (31 de Dezembro de 2022) até ao trânsito em julgado da decisão do Tribunal que declare a ilicitude do despedimento, considerando a retribuição base mensal no valor de € 1.515,00 (mil quinhentos e quinze euros), a quantia mensal de € 375,00 (trezentos e setenta e cinco euros), que era paga a título de retribuição de isenção de horário de trabalho, e a quantia mensal de € 300,00 (trezentos euros), que era paga a título de «coord. executiva 3C», acrescidas de juros de mora vencidos, desde a data de liquidação e vincendos à taxa legal, até integral pagamento;

C) Deve a Ré ser condenada a reintegrar a Autora no mesmo estabelecimento, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade ou, em substituição da reintegração, deve a Ré ser condenada a pagar à Autora uma indemnização, cabendo ao Tribunal determinar o seu montante, entre 15 e 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fração de antiguidade, atendendo ao valor da retribuição e ao grau de ilicitude decorrente da ordenação estabelecida no artigo 381.º, devendo o Tribunal atender ao tempo decorrido desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão judicial, acrescida de juros de mora vencidos desde a data da citação e até integral pagamento, calculados à taxa legal em vigor;

D) Deve a Ré ser condenada a pagar à Autora a quantia de €1.100,00 (mil e cem euros), referente às 40 horas dos módulos que a mesma ministrou no referido curso de Técnico de Apoio à Vítima, acrescida de juros de mora vencidos desde o dia 01 de Janeiro de 2023 e vincendos calculados à taxa legal em vigor, desde a data da citação e até integral pagamento;

E) Deve a Ré ser condenada a pagar à Autora a quantia de €137,73 (cento e trinta e sete euros e setenta e três cêntimos), correspondente a 02 (dois) dias de retribuição descontados, indevidamente, ao vencimento da Autora em Dezembro de 2022, acrescida de juros de mora vencidos desde o dia 01 de Janeiro de 2023 e vincendos calculados à taxa legal em vigor, desde a data da citação e até integral pagamento;

F) Deve ser a Ré condenada a pagar à Autora, a título de danos não patrimoniais, a quantia de, pelo menos, 14.500,00€ (catorze mil e quinhentos euros), acrescida dos juros de mora à taxa legal vencidos e vincendos desde a data da citação e até integral pagamento”.

2. Em 10 de janeiro de 2024, foi proferido despacho com o ter seguinte:

“Afigurando-se-nos que, nos termos em que a autora configura a acção, ocorrerá litispendência em relação à acção de impugnação de despedimento pendente no Juiz 1 do Juízo do Trabalho do Porto, sob o n.º 130/23.0T8PRT, notifique a mesma para, em 10 dias, quanto a tal excepção dilatória se pronunciar.”

3. Resulta do relatório constante da decisão recorrida, que aqui se transcreve, o seguinte:

“A sua pretensão é deduzida, segundo reconhece, à cautela, na medida em que se encontra pendente acção de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, no Juiz 1 deste Juízo do Trabalho, a qual foi proposta por si contra a ora ré.

A sua cautela advém da circunstância de, nessa acção, ter sido declarada a ilicitude do despedimento ao abrigo do artigo 98.º-J, do Código de Processo do Trabalho, por decisão ainda não transitada em julgado, e dado cumprimento ao disposto no artigo 98.º-J, n.º 3, alínea c), do mesmo diploma, na sequência do qual apresentou o respectivo articulado em que peticiona a condenação da ré:

“… a pagar à Autora, no mínimo, a uma indemnização correspondente a 30 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fracção de antiguidade, nos termos do disposto no artigo 98.º-J, n.º 3, alínea a), do Código de Processo do Trabalho, acrescida de juros de mora vencidos desde a data da citação da Ré e vincendos à taxa legal até integral pagamento;

b) Ser condenada a pagar à Autora as retribuições que a mesma deixou de auferir desde a data do despedimento (i.e., 02 de Janeiro de 2023), que que ascendem, à data de 30 de Setembro de 2023, a €22.816,00 (vinte e dois mil, oitocentos e dezasseis euros), até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do despedimento, acrescida de juros de mora vencidos, desde a data de liquidação e vincendos à taxa legal, até integral pagamento;

c) Ser condenada a pagar à Autora a quantia de € 1.100,00 (mil e cem euros), referente às 40 (quarenta) horas dos módulos que a mesma ministrou no referido curso de Técnico de Apoio à Vítima, acrescida de juros de mora vencidos desde o dia 02 de Janeiro de 2023 (data de cessação do contrato de trabalho da Autora) e vincendos calculados à taxa legal em vigor, desde a data da citação e até integral pagamento;

d) Ser condenada a pagar à Autora a quantia de €137,73 (cento e trinta e sete euros e setenta e três cêntimos), correspondente a 02 (dois) dias de retribuição descontados, indevidamente, ao vencimento da Autora em Dezembro de 2022;

e) Ser condenada a pagar à Autora, a título de danos não patrimoniais, a quantia de, pelo menos, € 14.500,00 (catorze mil e quinhentos euros), acrescida dos juros de mora à taxa legal vencidos e vincendos desde a data da citação e até integral pagamento”.

Sucede que, na contestação a tal articulado, a ré veio alegar que o contrato de trabalho da autora cessou por caducidade no dia 31/12/2022 e não por despedimento com invocação de justa causa.

Portanto, acaso venha a ser julgada procedente tal alegação, ocorrerá um erro na forma do processo, a acarretar a anulação dos actos praticados e, eventualmente, sem aproveitamento de nenhum deles.

Notificada a autora para se pronunciar quanto à eventual excepção dilatória de litispendência, veio a mesma, admitindo que ocorre identidade de sujeitos e de pedidos, considerar que a excepção não se verifica, por não haver identidade de causa de pedir: na presente acção, a autora pede que o seu despedimento seja declarado ilícito, porque estava vinculada à ré mediante contrato de trabalho sem termo e o seu despedimento não foi precedido do respectivo procedimento; na outra acção, pede que a ilicitude do despedimento decorra da inexistência da invocada justa causa.”

4. Foi proferido em 1.ª instância despacho de cujo dispositivo se fez constar:

“Termos em que, ao abrigo do disposto nos artigos 54.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho e 590.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, indefiro liminarmente a petição inicial, por se verificar a excepção de litispendência.

Custas a cargo da autora, atento o seu decaimento (artigo 527.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil).

Valor da acção: €15.737,73 (artigo 297.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil).

Registe e notifique.”

4.1. Dizendo-se inconformada, apresentou a Autora requerimento de interposição de recurso, finalizando as suas alegações com as conclusões seguintes:

“1. O presente recurso vem interposto do despacho que indeferiu liminarmente a petição inicial, por se verificar a excepção de litispendência, ao abrigo do disposto nos artigos 54.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho, e 590.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, doravante designado por despacho recorrido.

2. Há identidade de sujeitos da presente acção de processo comum em relação à Acção de Impugnação Judicial da Regularidade e Licitude do Despedimento registada sob o n.º 130/23.0T8PRT, que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo do Trabalho do Porto - Juiz 1, porque as partes são as mesmas sob o ponto de vista da sua qualidade jurídica.

3. Há identidade de pedido entre a presente acção de processo comum e a Acção de Impugnação Judicial da Regularidade e Licitude do Despedimento registada sob o n.º 130/23.0T8PRT, que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo do Trabalho do Porto - Juiz 1, porque numa e noutra causa se pretende obter o mesmo efeito jurídico.

4. Na presente acção de processo comum, a Recorrente pede, entre outros, (i) que se considere sem termo o contrato de trabalho que a vinculava à Recorrida a partir do dia 05 de Dezembro de 2016, porque esteve ininterruptamente ao serviço da Recorrida, a partir do dia 05 de Dezembro de 2016, através da celebração de sucessivos contratos de trabalho a termo, pelo que a estipulação de termo teve por fim iludir as disposições que regulam o contrato sem termo (artigos 40.º a 42.º, da petição inicial), (ii) que se considere que o contrato de trabalho que a vinculava à Recorrida a partir do dia 05 de Dezembro de 2016 se converteu em contrato de trabalho sem termo quando foi excedido o prazo de duração de três anos a que se referia o artigo 148.º, do Código do Trabalho, na redacção anterior à Lei n.º 93/2019, de 04 de Setembro, ou seja, em 06 de Dezembro de 2019 (artigos 43.º a 46.º, da petição inicial), e (iii) que o seu despedimento seja declarado ilícito, por o mesmo não ter sido precedido do respetivo procedimento, nos termos do disposto no artigo 381.º, alínea c), do Código do Trabalho, com as consequências legais.

5. Na Acção de Impugnação Judicial da Regularidade e Licitude do Despedimento registada sob o n.º 130/23.0T8PRT, que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo do Trabalho do Porto - Juiz 1, a Recorrente pede que o seu despedimento, no dia 26 de Dezembro de 2022, data que foi considerada pela Recorrida como senda a data do despedimento da Recorrente com invocação de justa causa, seja declarado ilícito, (i) nos termos do disposto no artigo 382.º, n.º 1, do Código do Trabalho, por já ter decorrido o prazo de um ano após a prática da infracção que se encontra estabelecido no n.º 1 do artigo 329.º, do Código do Trabalho, no que respeita aos factos descritos no artigo 4.º, alíneas i), j), k), l) e m), da nota de culpa, (ii) nos termos do disposto no artigo 382.º, n.º 1, do Código do Trabalho, porque o procedimento disciplinar é inválido, nos termos do disposto no artigo 382.º, n.º 2, alínea a), do Código do Trabalho, uma vez que os artigos 4.º, alíneas a), b), c), d), e), f), g), h), i), j), m), n), o), p), u) e v), 5.º, 6.º e 9.º, da nota de culpa, não contêm a descrição circunstanciada dos factos que são imputados à Recorrente, coartando o seu direito de defesa, em violação do disposto no artigo 353.º, n.º 1, do Código do Trabalho, (iii) nos termos do disposto no artigo 382.º, n.º 1, do Código do Trabalho, porque a decisão de despedimento da Recorrente não foi elaborada nos termos do n.º 4 do artigo 357.º, do Código do Trabalho, pelo que o procedimento é inválido, nos termos do disposto no artigo 382.º, n.º 2, alínea d), do Código do Trabalho, e (iv) nos termos do disposto no artigo 381.º, alínea b), do Código do Trabalho, porque os motivos justificativos do despedimento da Recorrente são improcedentes.

6. Não há identidade de causa de pedir entre a presente acção de processo comum e a Acção de Impugnação Judicial da Regularidade e Licitude do Despedimento registada sob o n.º 130/23.0T8PRT, que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo do Trabalho do Porto - Juiz 1, porque a pretensão deduzida nas duas ações não procede do mesmo facto jurídico.

7. O despacho recorrido deveria ter determinado a suspensão da presente acção de processo comum, ao abrigo do disposto no artigo 272.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, porque a decisão da mesma está dependente da questão suscitada pela primeira vez, pela Recorrida, na sua contestação ao articulado apresentado pela Recorrente, nos termos previstos no artigo 98.º-J, n.º 3, alínea c), do Código de Processo do Trabalho, no processo n.º 130/23.0T8PRT, de que o contrato de trabalho da Recorrente cessou por caducidade no dia 31 de Dezembro de 2022, e não por despedimento com invocação de justa causa, a qual ainda não foi objecto de decisão.

8. O despacho recorrido, ao ter indeferido liminarmente a petição inicial, por se verificar a excepção de litispendência, ao abrigo do disposto nos artigos 54.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho, e 590.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, violou o disposto nos artigos 580.º, n.º 1, 581.º, n.º 1, 581.º, n.º 4, e 272.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, padecendo, assim, de erro de julgamento da matéria de direito.”

Conclui, no provimento do recurso, pela revogação da decisão recorrida, substituindo-se por outra que “,ao invés de indeferir liminarmente a petição inicial, por se verificar a excepção de litispendência, determine a suspensão da presente acção de processo comum, ao abrigo do disposto no artigo 272.º, n.º 1, do Código de Processo Civil”.

4.1.1. Contra-alegou a Ré, concluindo nos termos que se seguem:

1.ª As presentes Contra-Alegações Vêm apresentadas na sequência das Alegações de Recurso, interpostas pela Autora, do despacho do juiz a quo que indeferiu liminarmente a petição inicial, por se verificar a excepção de litispendência, nos termos do disposto nos artigos 54.º, n.º 1 do Código de Processo de Trabalho e 590.º, n.º 1 do Código de Processo Civil.

2.ª Há identidade de sujeitos na presente acção quando comparada com a que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo de Trabalho do Porto, Juiz 1 (Acção de Impugnação Judicial da Regularidade e Licitude do Despedimento – Proc. N.º 130/23.0T8PRT).

3.ª Há identidade de pedido na presente acção quando comparada com a que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo de Trabalho do Porto, Juiz 1 (Acção de Impugnação Judicial da Regularidade e Licitude do Despedimento – Proc. N.º 130/23.0T8PRT), pois nas duas causas o efeito prático-jurídico que se pretender obter é equivalente.

4.ª Há identidade de causa de pedir na presente acção quando comparada com a que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo de Trabalho do Porto, Juiz 1 (Acção de Impugnação Judicial da Regularidade e Licitude do Despedimento – Proc. N.º 130/23.0T8PRT), pois a pretensão deduzida é idêntica nas duas causas.

5.ª A verificação da identidade e individualidade das causas de pedir tem de aferir-se em função de uma comparação entre o núcleo essencial, não sendo afectada tal identidade, nem por via da alteração da qualificação jurídica dos factos concretos em que se fundamenta a pretensão, nem por qualquer alteração ou ampliação factual que não altere o núcleo essencial da causa de pedir que suporta ambas as acções, nem pela invocação na primeira acção determinada factualidade, perspectivada como meramente instrumental ou concretizadora de factos essenciais.

6.ª No que tange à identidade de pedidos, esta afere-se pela circunstância de em ambas as acções se pretender obter o mesmo efeito prático-jurídico, não sendo de exigir uma adequação integral das pretensões.

7.ª Não há, assim, qualquer erro de julgamento no despacho recorrido, pois a cominação da verificação da excepção de litispendência é o indeferimento da petição inicial, nos termos do disposto nos artigos 54.º, n.º 1 do Código de Processo de Trabalho e 590.º, n.º 1 do Código de Processo Civil.”

Conclui no sentido de ser negado provimento ao recurso apresentado, mantendo-se integralmente o despacho recorrido.

4.2. O recurso foi admitido em 1.ª instância como apelação, com subida imediata, nos próprios autos e efeito devolutivo.

5. Subindo os autos a este Tribunal da Relação, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto tomou posição no sentido de estar “vedada ao Ministério Público, no presente recurso, a possibilidade de emitir parecer, por inaplicabilidade do artigo 87º, n.º 3, do CPT.”

Cumpridas as formalidades legais, cumpre decidir:

II – Questões a resolver

Sendo pelas conclusões que se delimita o objeto do recurso (artigos 635º/4 e 639º/1/2 do Código de Processo Civil aprovado pela Lei 41/2013, de 26/6 – CPC – aplicável “ex vi” do art. 87º/1 do Código de Processo do Trabalho / CPT), a única questão a decidir passa por saber se a decisão recorrida aplicou adequadamente a lei e o direito ao ter concluído pela verificação da exceção da litispendência.


*

III – Fundamentação

A) Fundamentação de facto

Os elementos de facto a considerar resultam do relatório que antes se elaborou.

B. Discussão

1. Da exceção da litispendência

Como resulta das conclusões, a questão a decidir passa por saber se a decisão recorrida aplicou adequadamente a lei e o direito ao ter concluído pela ocorrência de uma situação de litispendência.

Com o referido objetivo, tendo em vista a apreciação por parte deste Tribunal da Relação da referida questão, assim sobre saber se o Tribunal a quo aplicou adequadamente a lei e o direito na decisão recorrida, importa que comecemos por ter presentes, desde já, os fundamentos constantes dessa decisão, em particular na parte em que, depois de fazer o enquadramento teórico que teve por justificado, na sua aplicação ao caso fez constar o seguinte (transcrição):

“(…) Se as duas causas estão simultaneamente pendentes, há litispendência; se uma causa é proposta depois de a anterior ter sido definitivamente decidida, há caso julgado – artigo 580.º, n.º 1 do Código de Processo Civil. Ora, o que diferencia estas duas situações é o momento em que se dá a repetição.

A excepção deve ser invocada na acção para a qual o réu tenha sido citado posteriormente – artigo 582.º, n.º 1 do Código de Processo Civil –, ou seja, na presente acção, considerando que a citação da ré para os termos da presente acção teria sempre lugar, a ocorrer, em data ulterior àquela em que se concretizou a sua citação na acção de impugnação da ilicitude do despedimento.

A litispendência visa evitar que o tribunal venha, eventualmente, a reproduzir ou a contradizer uma decisão anterior – artigo 580.º, n.º 2 do Código de Processo Civil.

A litispendência pressupõe, então, a repetição de uma causa, que se verificará quando “se propõe uma acção idêntica a outra quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir” (artigo 581.º, n.º 1, do Código de Processo Civil).

É indubitável que ocorre identidade de sujeitos e de pedidos.

No que concerne aos limites objectivos do caso julgado (em perfeito paralelo com a litispendência), que se reportam à identidade de pedido e de causa de pedir, realce-se a finalidade subjacente a este instituto, que visa obviar à contradição prática de decisões, obstando a “decisões concretamente incompatíveis (que não possam executar-se ambas sem detrimento de algumas delas); a que em novo processo o juiz possa validamente estatuir de modo diverso sobre o direito, situação ou posição jurídica concreta definida por uma anterior decisão e, portanto, desconhecer no todo ou em parte os bens por ela reconhecidos e tutelados” [1] ou que possa excluir um efeito jurídico definido na primeira sentença[2].

Decorre do disposto no artigo 581.º, n.º 4, do Código de Processo Civil, que no Ordenamento Jurídico Português vigora a teoria da substanciação, que exige sempre a indicação do acto ou facto jurídico em que se funda o direito afirmado pelo autor, em que consiste a sua pretensão.

A extensão objectiva do caso julgado corresponde ao objecto da acção, constituído este pelo pedido e causa de pedir, devendo a definição dada pela sentença à situação ou relação material apreciada ser respeitada para todos os efeitos em qualquer novo processo, tendo-se por assente que a mesma situação ou relação jurídica subsista tal como aquela a definiu[3].

A causa de pedir é integrada pelo facto ou factos jurídicos que, de acordo com os preceitos aplicáveis, sirvam de substrato à pretensão deduzida.

De acordo com o princípio do dispositivo, aquele que se apresta a formular uma determinada pretensão contra um ou vários sujeitos, tem que deixar claro qual o fundamento ou fundamentos de facto que, a partir da aplicação de determinadas regras de direito, fazem projectar a pretensão ou as pretensões deduzidas.

As causas de pedir só na aparência são distintas, porquanto o que a autora pretende em ambas as acções é o reconhecimento de que o seu despedimento foi ilícito e, só duas hipóteses poderão ocorrer na acção pendente do Juiz 1: ou a decisão proferida é confirmada e o despedimento, seguindo o formalismo adequado, que é o da acção especial, é considerado ilícito, prosseguindo a acção somente para determinação dos créditos devidos à autora/trabalhadora, ou a decisão não é confirmada e abrir-se-á a discussão sobre a sua (i)licitude, mas circunscrita à invocação de justa causa imputável ao trabalhador (que foi essa que foi alegada no AMD, acompanhado do PD).

É que, o erro na forma do processo apenas poderia ter sido conhecido até à audiência de partes (artigo 98.º-I, n.º 3, do Código de Processo do Trabalho), o que não sucedeu, pelo que a hipotética anulação do processo é isso mesmo, meramente hipotética.

Aliás, a ré nunca colocou em causa no AMD que o despedimento ocorreu com invocação de justa causa imputável ao trabalhador, peticionando a final até esse reconhecimento.

Nessa medida, estamos perante uma excepção dilatória de conhecimento oficioso (artigo 578.º, do Código de Processo Civil), que obsta ao conhecimento do mérito da causa (artigo 278.º, n.º 1, alínea e), do Código de Processo Civil).”

Em face da citada pronúncia, defendendo o Recorrente que a mesma errou na aplicação da lei e do direito, cumprindo-nos apreciar, desde já adiantamos que não acompanhamos, com salvaguarda do respeito devido, a solução a que se chegou em 1.ª instância.

Em termos de melhor se perceber a nossa posição, importa que façamos previamente algumas considerações prévias, tendo em vista o enquadramento das questões que nos são colocadas, a respeito da exceção de litispendência – exceção dilatória que, como resulta expressamente da lei, é de conhecimento oficioso, nos termos previstos nos artigos 580.º a 582.º do CPC (sendo que a procedência de alguma exceção dilatória leva à absolvição da instância, como decorre do artigo 287.º, n.º 1, alínea e), do mesmo Código) –, tarefa a que nos dedicaremos de seguida, começando-se por relembrar que, pressuposto da aludida exceção, será a verificação, como aliás resulta expressamente da lei, assim o disposto no artigo 581.º do CPC, da repetição de uma causa, sendo que, como nesse preceito se dispõe: “1- Repete-se a causa quando se propõe uma ação idêntica a outra quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir. 2- Há identidade de sujeitos quando as partes são as mesmas sob o ponto de vista da sua qualidade jurídica. 3- Há identidade de pedido quando numa e noutra causa se pretende obter o mesmo efeito jurídico. 4- Há identidade de causa de pedir quando a pretensão deduzida nas duas ações procede do mesmo facto jurídico. Nas ações reais a causa de pedir é o facto jurídico de que deriva o direito real; nas ações constitutivas e de anulação é o facto concreto ou a nulidade específica que se invoca para obter o efeito pretendido.”

Como se refere no acórdão desta Secção de 8 de março de 2020[4], visando-se, “como aliás a lei o assinala, evitar que o tribunal seja colocado em posição de se poder contradizer ou de repetir decisão anterior, a exceção dilatória da litispendência pressupõe, à semelhança do caso julgado, a repetição de uma causa, o que ocorre quando entre duas causas existe identidade de sujeitos (quando as partes são as mesmas do ponto de vista da sua qualidade jurídica), identidade de pedido (quando em ambas as causas se visa obter o mesmo efeito jurídico) e identidade de causa de pedir (quando a pretensão deduzida em amas procede do mesmo facto jurídico) – se a causa se repete quando a anterior ainda está pendente estamos perante a litispendência; se a repetição se verifica quando a anterior já se encontra decidida com transito em julgado ocorre o caso julgado”.

Trata-se de questão que está também relacionada com o denominado princípio da estabilidade da instância, que decorre desde logo do CPC, assim seu artigo 260.º, quando se diz que, citado o réu, a instância deve manter-se a mesma quanto às pessoas, ao pedido e à causa de pedir, salvas as possibilidades de modificação consignadas na lei, no sentido de que, sem prejuízo dos desvios ou exceções taxativamente previstas na lei (processual civil, como ainda especificamente no CPT) – as alterações ou modificações da instância (subjetiva e/ou objetiva) só são admissíveis nas hipóteses de modificação previstas na lei –, nos demais casos, além dos efeitos substantivos ou de direito material, a citação do réu, nos termos previstos no artigo 564.º do CPC, produzindo vários efeitos processuais, nesses se inclui, precisamente, no que ao caso importa, a constituição da exceção da litispendência, assim a inadmissibilidade da propositura de ação com o mesmo objeto e a estabilidade dos elementos essenciais, subjetivos e objetivos, da causa, causa essa que, como é sabido, se identifica, precisamente, em face do n.º 1 do artigo 581.º antes citado, pelos seus três elementos essenciais: um primeiro, subjetivo, assim as partes, e os dois restantes objetivos, constituídos pelo pedido (isto é, a pretensão de tutela jurisdicional formulada pelo autor), e pela causa de pedir (que consiste em traços genéricos nos factos concretos que servem de suporte jurídico à pretensão deduzida.

Ora, no que ao presente recurso diz respeito, em face aliás da posição da Recorrente, a questão essencial a decidir, sobre a qual parece incidir no essencial a divergência, prende-se com saber se ocorre ou não identidade de causa de pedir, o que, esclareça-se, não afasta a possibilidade de se vir a considerar que outras questões se colocam, razão pela qual se justificam algumas considerações da nossa parte a esse respeito, o que faremos de seguida.

Se para Alberto dos Reis[5] a causa de pedir é o facto jurídico concreto de que emerge o direito que o autor se propõe fazer declarar, Lebre de Freitas e Isabel Alexandre[6], reconduzem, por sua vez, a causa de pedir ao acervo dos factos que integram o núcleo essencial da previsão da norma ou normas do sistema que estatuem o efeito de direito material pretendido[7][8].

Na Jurisprudência, socorremo-nos desde logo do que se afirma no Acórdão do Supremo Tribunal de 22 de Novembro de 2006[9], nos termos que seguidamente se transcrevem:

"O facto jurídico que serve de fundamento à acção" é a causa de pedir.

No artº 498º-4 do CPC, o legislador especifica certas causas de pedir: nas acções reais a causa de pedir é o facto jurídico de que deriva o direito real; nas acções constitutivas e de anulação é o facto concreto ou a nulidade especifica que se invoca para obter o efeito pretendido.

Daqui conclui Vaz Serra (in RLJ 109/313):

"Causa de pedir é (...) o facto jurídico concreto ou específico invocado pelo autor como fundamento da sua pretensão". Esta concretização ou especificidade destina-se, além do mais, "a impedir que o demandado seja compelido a defender-se de toda e qualquer possível causa de pedir, só tendo de defender-se da concretamente invocada pelo autor..."

E é desse concreto fundamento invocado - processualmente designado por causa de pedir - que o autor faz derivar o direito que se arroga, com vista a obter um determinado efeito jurídico (em que se traduz o pedido). Assim, se o senhorio pretende obter o pagamento da renda, invoca (como causa de pedir) o contrato de arrendamento. Se pretende obter a resolução do contrato (despejo) invoca o fundamento de resolução. Se pretende ser indemnizado (por conduta ilícita do inquilino) invoca o facto (ilícito) gerador do dano. Isto para dizer que, embora todas as situações ocorram no âmbito do mesmo contrato, são diferentes as causas de pedir nas diferentes acções”.

No mesmo sentido, o Acórdão do mesmo Tribunal de 12 de Setembro de 2007[10], em que se pode ler, para além do mais, a respeito do conceito causa de pedir, que esta se refere «ao facto jurídico concreto e específico invocado pelo autor como fundamento da sua pretensão» (cf. n.º 4 do artigo 498.º do Código de Processo Civil; também, VAZ SERRA, Revista de Legislação e Jurisprudência, 109.º, p. 313) (...).

Importa ainda esclarecer, também, a propósito da relação jurídica controvertida, como se refere no Acórdão desta Relação de 23 de maio de 2024[11], que essa só fica definida, com a ponderação da pretensão que é deduzida (o outro dos elementos objetivos da instância a que antes nos referimos), “existindo entre esses dois elementos, definidores da instância, uma relação de funcionalidade reversiva (pois a pretensão de tutela jurisdicional formulada pelo autor é corolário da causa de pedir, dos fundamentos invocados como seu suporte e este suporte não tem interesse senão reportado à pretensão que lhe dá significado e relevo)”, sendo que “em determinados casos a pretensão (o pedido - tutela jurídica pretendida) vai ainda buscar à causa de pedir a referência identificadora.

O que antes se referiu têm, aliás, real relevância em situações como a que aqui se aprecia, assim a respeito da conformação da relação jurídica controvertida, no caso de ações destinadas a impugnar atos tidos como de cessação da relação laboral, no que ao caso importa de despedimento que se quer ver declarado ilícito, em que a pretensão de tutela jurisdicional consistirá, em regra, na formulação dum pedido de afirmação dessa ilicitude, com as consequências que dessa afirmação resultam da lei e que se pretendem ver acauteladas. Na verdade, tal pretensão terá por forçosa referência (só assim se identificando, para efeitos de litispendência e / ou caso julgado, a causa de pedir que a suporta, mormente os concretos factos que são invocados pelo trabalhador como configuradores do despedimento de que diz ter sido alvo, até porque, como resulta expressamente do disposto no artigo 387.º do Código do Trabalho (CT), só podendo a regularidade e licitude do despedimento ser apreciada por tribunal judicial, sem esquecermos que o meio processual / forma processual, previsto para o efeito, pode afinal ser diverso, não dependendo propriamente da mera vontade do trabalhador a respetiva escolha, estando antes sujeito à forma processual prevista na lei para o efeito, como ainda, do mesmo modo, poderão ser afinal diversos os prazos de que dispõe para atacar judicialmente o ato – neste âmbito, para além de outros, veja-se o sumário do Acórdão desta Secção de 30 de maio de 2018[12]: “I - A acção especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento regulada no artigo 98.º B e seguintes do CPT, aplica-se apenas aos casos em que o trabalhador vem impugnar uma decisão de despedimento que lhe tenha sido comunicada por escrito e que seja fundada em despedimento disciplinar, inadaptação ou extinção do posto de trabalho (art.º 98.º C/1). II - Em todos os demais casos de impugnação de despedimento que não se enquadrem na previsão do art.º 98.º C/1, o meio processual próprio é o processo declarativo comum, regulado nos artigos 54.º e seguintes do CPT (art.º 48.º n.º 1 e 49.º n.º2).III - Nos casos em que se aplica a acção especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento, o direito de acção está sujeito ao prazo de caducidade de 60 dias (art.º 387.º n.º 2 do CT). IV - Nos demais casos de impugnação de despedimento em que o meio processual próprio é o processo comum, aplica-se o regime de prescrição estabelecido no art.º 337.º n.º1, do CT, abrangendo o prazo de um ano ai estabelecido quer a propositura da acção quer os créditos emergentes de despedimento ilícito. V - A acção proposta pela autora não se enquadra na previsão do n.º1, do art.º 98.º C, do CPT. Não basta que tenha havido uma comunicação por escrito, era também necessário que o despedimento fosse fundado em despedimento disciplinar, inadaptação ou extinção do posto de trabalho, não sendo esse o caso.VI - Assim, aplicando-se a forma de processo comum, o prazo aplicável para o exercício do direito de acção é o de prescrição, de um ano, estabelecido no art.º 337.º 1, do CT.”

Do exposto resulta, pois, que o pedido de declaração de ilicitude do despedimento não pode identificar-se senão por referência aos concretos factos que esse específico despedimento configuram, ligados esses factos àquela ilicitude (esta por necessária à procedência da ação) – ou seja, o pedido não se identifica senão por referência ao concreto facto ilícito, sendo este o alicerce das consequências que se pretendem ver afirmadas, para que tende assim a pretensão formulada – o direito surge jurídico-geneticamente daquele facto ilícito, não podendo ser suportado por outro (no sentido de que se for outro o facto jurídico, o direito a exercer será com base nesse.

Revertendo então ao caso, não se questionando que ocorra no caso identidade das partes, no entanto, porém, em face precisamente do que antes se mencionou, dúvidas sérias se podem colocar a respeito de se estar perante um caso de identidade de pedido, pois que, sendo verdade que em ambas as ações se peticiona a declaração de ilicitude do despedimento, tal declaração de ilicitude, no entanto, tem por clara referência, a prática pela Empregadora / ré em ambas as ações de atos diversos, pois que se na ação sob o n.º 130/23.0T8PRT está em causa a apreciação do despedimento determinado pela Empregadora em 26 de dezembro de 2022 por invocada justa causa, já na presente ação, diversamente (vejam-se nomeadamente os artigos 47.º e 48.º da PI), trata-se de pretensão que visa sindicar judicialmente a comunicação da Empregadora, de 19 de outubro de 2022, de que o contrato a termo, dando cumprimento ao aviso prévio de 60 dias, cessaria, por caducidade, no dia 31 de dezembro de 2022, comunicação essa que a Trabalhadora considera que consubstancia um despedimento ilícito, ao abrigo do disposto no artigo 381.º, alínea c), do Código do Trabalho, por o mesmo não ter sido precedido do respetivo procedimento. Ou seja, nos termos em que antes o dissemos, porque o pedido de declaração de ilicitude do despedimento, em cada uma das ações, só pode identificar-se por referência aos concretos factos concretos que esse específico despedimento configuram, ligados esses factos àquela ilicitude (esta por necessária à procedência da ação) – surgindo o direito jurídico-geneticamente daquele facto ilícito, não podendo ser suportado por outro (no sentido de que se for outro o facto jurídico, o direito a exercer será com base nesse –, tal não ocorre no caso.

As considerações anteriores permitem-nos, também, sem necessidade aliás de maiores considerações, afirmar que não ocorre afinal identidade de causas de pedir, pois que, de modo inequívoco, os factos que essas causas integram, ou seja os concretos fundamentos invocados de que o autor faz derivar o direito que se arroga, com vista a obter um determinado efeito jurídico (em que se traduz o pedido), são diversos.

Coisa diversa, mas que já não se insere no âmbito da apreciação da exceção que se aprecia, serão as consequências a retirar, para a outra ação, de uma decisão que porventura venha a ser proferida na outra, com trânsito em julgado, e que justifique que se possa chamar à aplicação os efeitos do caso julgado, desde logo, diga-se, na eventualidade de se vir a entender, em 1.ª instância, que não ocorre fundamento para a o deferimento do pedido de suspensão formulado pela Autora.

Sendo deste modo, procede o presente recurso, por não ocorrer, como dito, uma situação de litispendência, o que se nos impõe declarar no presente acórdão, razão pela qual os autos devem seguir os seus termos subsequentes, salvo se outra razão o impeça, sem prejuízo, ainda, da apreciação, em 1.ª instância, do pedido de suspensão formulado pela Autora.

Por decaimento, as custas do recurso são da responsabilidade da Apelada (artigo 527, do CPC).


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Sumário – a que alude o artigo 663º, nº 7 do CPC:

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IV – DECISÃO

Acordam os juízes que integram esta Secção Social do Tribunal da Relação do Porto, na procedência do presente recurso, em considerar que não se verifica a exceção de litispendência, com a consequente revogação da decisão recorrida, determinando-se que os autos sigam os seus termos subsequentes, salvo se outra razão o impeça, nos termos afirmados no presente acórdão.

Custas pela Recorrida.


Porto, 10 de julho de 2024

(acórdão assinado digitalmente)

Nélson Fernandes (relator)

António Luís Carvalhão

Rita Romeira


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[1] Manuel de Andrade, “Noções Elementares de Processo Civil”, Coimbra Editora, 1963, p. 293 e segs.

[2] Teixeira de Sousa, “Estudos Sobre o Novo Processo Civil”, Ed. Lex, 1997, p. 578 e segs.
[3] Manuel de Andrade, Ob. Cit., p. 296 e segs.
[4] Apelação n.º 2217/19.5T8VNG.P1, relatada pelo também aqui relator, disponível em www.dgsi.pt.
[5] Comentário ao Código de Processo Civil, Coimbra Editora, vol. II, pág. 375.
[6] Código de Processo Civil Anotado, Almedina, 3vol. II, 3.ª edição, pág. 597.
[7] Estes autores equacionam assim a identidade da causa de pedir enquanto pressuposto do caso julgado, op. cit., págs. 597-8,
[8] Mais difícil será, porém, esclareça-se, saber se nos encontramos perante a mesma causa de pedir quando os mesmos factos integram a previsão de normas materiais constitutivas diversas – falando-se então de concorrência ou concurso de normas.
[9] Cujas considerações, apesar de feitas a respeito da versão anterior do CPC, se mantêm atuais - disponível em www.dgsi.pt.
[10] Disponível em www.dgsi.pt.
[11] Relator Desembargador Paulo Dias da Silva, in www.dgst.pt.
[12] Relator Desembargador Jerónimo Freitas, processo n.º 2613/16.0T8MTS-A.P1, in www.dgsi.pt.