CORRUPÇÃO PASSIVA E ACTIVA
MOMENTO DA CONSUMAÇÃO DO CRIME
PRESCRIÇÃO
FUNCIONÁRIO
ALTERAÇÃO DA QUALIFICAÇÃO JURÍDICA
TIPOLOGIAS OU MÉTODOS DE BRANQUEAMENTO
FRAUDE FISCAL
OBRIGAÇÃO DE DECLARAÇÃO DE RENDIMENTOS DE ORIGEM ILÍCITA
NEMO TENETUR SE IPSUM ACCUSARE
Sumário

- O momento da consumação do crime de corrupção passiva e activa corresponde, respectivamente, ao momento da promessa de vantagem e aceitação da mesma.
- Os elementos do tipo quando estão preenchidos aquando do acordo corruptivo.
- Se não chegar a haver acordo e existir apenas pagamento/recebimento a consumação ocorre, do lado activo e passivo, respectivamente, com o pagamento/recebimento.
- Para efeitos de prescrição o crime de corrupção consuma-se com o acordo corruptivo (estão verificados todos os elementos do tipo) mas se depois deste acordo houver um “mais”, no caso, o pagamento, deve ser a partir desta última data que se inicia a contagem do prazo da prescrição;
- Se o pagamento for feito em momentos diversos a contagem do tempo de
prescrição inicia-se com o último pagamento;
- O conceito de funcionário para efeitos penais definido na alínea c) do n° 1 do art. 386° do C.P. é um conceito “alargado” e autónomo, que se extrai “não por interpretação analógica, ou mesmo extensiva, mas por mera interpretação declarativa” e que se justifica por razões de política criminal.
- O Ministério Público não tem legitimidade para, em sede do presente recurso de decisão de não pronúncia, pedir a alteração da qualificação jurídica dos crimes por si acusados;
- O branqueamento de capitais faz-se mediante o uso de porteiros (“Gatekeepers”), o uso de veículos corporativos ou fundos, o uso de Offshores ou jurisdições terceiras, o uso de testas de ferro/fiduciários (Nominees), uso de dinheiro vivo e uso de instituições financeiras locais;
- A omissão de declaração sobre uma realidade que ao agente cumpre documentar não pode consubstanciar uma falsificação, destruição ou ocultação de documentos, já que estas condutas pressupõem, obviamente, um documento e este, por sua vez, pressupõe a existência de uma declaração. A violação do dever de emitir recibos, nos casos em que a lei o exige, constitui a contra-ordenação prevista e punível pelo artigo 123.º, n.º 1, do RGIT.
- Verificado o facto gerador do imposto deve haver tributação dos rendimentos, independentemente de, a jusante, ser proferida declaração da sua perda a favor do Estado, e, por outro, caso no momento da prolação dessa declaração tais rendimentos já tiverem sido tributados, o juiz da condenação deverá deduzir nessa declaração o montante do imposto entretanto entregue ao Estado.
- O princípio “nemo tenetur” não afasta o dever de declarar o rendimento por facto ilícito, consubstanciando a ocultação do mesmo nos termos taxativamente previstos no artigo 103.º, n.º 1, do RGIT, uma vez verificados os restantes pressupostos do tipo legal, a prática dum crime de fraude fiscal., sem que se mostre violado aquele ou qualquer outro princípio constitucional.
- o cometimento do crime de fraude fiscal, nas modalidades em questão nos autos, por qualquer pessoa, e não apenas pelo sujeito passivo da relação tributária, não viola os princípios da legalidade e tipicidade, traduzidos, no essencial, em matéria incriminatória, em não poder existir crime que não resulte de lei prévia, certa e precisa, nem qualquer outro princípio constitucional.

Texto Integral

Acordam, em conferência, as Juízes Desembargadoras da 9ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa

1. RELATÓRIO 
Por decisão instrutória de 09.04.2021 para a qual se remete, dando como totalmente reproduzido o seu teor,  foi decidido ( além da parte relativa à pronúncia, mas que não cumpre aqui  apreciar).
Não Pronunciar os Arguidos:
1- AA, pela prática de:
- Um crime de Corrupção Passiva de Titular de Cargo Político, em co-autoria com o arguido BB, com referência a actos praticados no interesse do Grupo LENA entre 2005 e 2011, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 1º, 2o, 3o, n.º 1, alínea d), 17°, n.º 1 e 19°, n.ºs 2 e 3 da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n° 108/2001, de 28 de Novembro - Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos, com referência aos arts. 28.° e 202. °, alínea b) do Código Penal;
- Um Crime de Corrupção Passiva de Titular de Cargo Político, com referência a actos praticados no interesse do arguido CC, relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 1º, 2o, 3o, n.º 1, alínea d), 17°, n.º 1 e 19°, n.ºs 2 e 3 da Lei 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n° 108/2001, de 28 de Novembro - Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos, e com referência aos arts. 28° e 202°, alínea b) do Código Penal;
- Um Crime de Corrupção Passiva de Titular de Cargo Político, em co-autoria com o arguido DD, com referência a actos praticados no interesse dos arguidos EE e FF com utilização das sociedades do Grupo VALE DO LOBO, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 1º, 2o, 3o, n.º 1, alínea d), 17°, n.º 1 e 19°, n.ºs 2 e 3 da Lei 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n° 108/2001, de 28 de Novembro - Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos, com referência aos arts.28° e 202°, alínea b) do Código Penal;
- Um crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos BB e GG relativamente aos movimentos financeiros com origem no Grupo LENA e com passagem pelas contas da ... tituladas por este último arguido e realizados a partir de 2007, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
-Um crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos BB e GG e com as sociedades LEC SA e XLM, relativamente à utilização desta última sociedade, entre 2009 e 2015, para a colocação de fundos destinados ao arguido AA e utilização dos mesmos no seu interesse através do pagamento de despesas e de distribuição de dividendos para contas tituladas pelo arguido BB, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
- Um crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos CC, HH, II e BB, relativamente à utilização entre 2006 e 2008, de contas na ... em que este último era autorizado e operações financeiras realizadas a partir das mesmas, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
- Um crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos CC, HH, II e BB, relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados no ano de 2007 e até ao início de 2008, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
- Um crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos CC, HH, e BB e GG, relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados a partir de 2008, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, e com intervenção das contas da ... do arguido GG, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
- Um crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos CC, HH, BB e GG, e com as sociedades LEC SA, LEC SGPS, LENA SGPS e XLM, relativamente aos movimentos financeiros ocorridos a partir de 2010, abrangidos pela operação CEL_2010, justificados através de contrato promessa de compra e venda com perda de sinal referente ao imóvel ..., sito em ..., e introdução desses fundos no Grupo LENA, crime p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
- Um crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos BB, GG, DD, EE, FF e JJ, relativamente às transferências com origem em conta do cidadão ... KK, referentes aos financiamentos concedidos ao Grupo Vale do Lobo, com passagem por conta bancária da ... do arguido GG, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs l, 2 e 3 do Código Penal;
- Um crime de Branqueamento, em co-autoria com o arguido BB, relativamente à concentração dos fundos em novas contas bancárias da ... tituladas por sociedades em offshore controladas por BB e sua transferência para contas tituladas por este último arguido em Portugal, ao abrigo do RERT II, crime previsto e punido pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
- Um crime de Branqueamento, em co-autoria com o arguido BB relativamente à dissipação dos fundos por outras contas em Portugal, de que este último arguido era titular e autorizado, e à confusão de patrimónios de ambos nessas contas bancárias, crime p. e p. pelo art.º368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
- Um crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos BB e LL, quanto a aquisição de imóveis em Portugal com o retorno do preço pago para a esfera patrimonial do arguido AA, de forma justificada, factos ocorridos entre 2010 e 2012, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
- Um crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos BB e LL, relativamente à aquisição e subsequente arrendamento de um imóvel em ..., com intenção de ocultação da titularidade do activo, factos praticados entre 2012 e 2014, previsto e punido pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
- Um crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos LL e BB, relativamente à entrega por este último arguido de quantias pertencentes ao arguido AA para depósito em contas bancárias do arguido LL e para guardar em cofre bancário e em contas tituladas pelo mesmo, de forma a ocultar a propriedade desses valores pelo arguido AA, factos ocorridos nos anos de 2012 e 2013, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
- Um crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos BB e MM, relativamente à aquisição de um imóvel, designado “Monte ...”, com intenção de que passasse a integrar o património familiar do arguido AA, com registo em nome de terceiro e montagem de operação de financiamento entre 2011 e 2014, crime p. e p. pelo art.º 368.º, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
- Um crime de Falsificação de documento, em co-autoria com o arguido BB, relativamente à declaração de adesão ao RERT II e outra documentação produzida e utilizada para esse efeito no que se reporta à titularidade dos elementos patrimoniais declarados, concentrados nas contas da ... até final do ano de 2010, crime p. e p. pelo art.º 256.º, n.º 1, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
- Um crime de Falsificação de documento, em co-autoria com os arguidos BB e GG, relativamente ao primeiro contrato de prestação de serviços celebrado entre a LEC S.A. e a XLM, facturas e outra documentação produzida ao abrigo do mesmo, factos ocorridos a partir de 2009, p. e p. pelo art.º 256.º, n.º 1, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
- Um crime de Falsificação de documento, em co-autoria com os arguidos BB e NN, com referência aos contratos de prestação de serviços celebrados entre as sociedades XLM e RMF Consulting, bem como facturas e outra documentação produzida ao abrigo dos mesmos, que servira, de suporte à circulação de quantias entre estas sociedade, com origem e destino no arguido AA, crime p. e p. pelo art.º 256.º, n.º 1, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
- Um crime de Falsificação de documento, em co-autoria com os arguidos BB, CC, HH e GG, relativamente ao conjunto de documentos que incluem o contrato promessa de compra e venda de imóvel em ..., denominado ..., contrato de intermediação EMP02... e XLM, cartas de admissão do seu incumprimento e perda de sinal e celebração de segundo contrato de prestação de serviços entre a LEC e a XLM, bem como facturas e outra documentação produzida ao abrigo destes contratos, factos ocorridos a partir de 2010, crime p. e p. pelo art.º 256.°, n.º l, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
- Um Crime de Falsificação de Documento, em co-autoria com os arguidos BB e MM, com referência aos contratos de prestação de serviços celebrados entra a XLM e a arguida MM, que serviram de suporte ao recebimento de quantias por esta ultima com origem no arguido AA, crime p. e p. pelo art.º 256. °, n.º l, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
- Um Crime de Falsificação de Documento, em co-autoria com o arguido BB, com referência aos contratos de prestação de serviços celebrados entra a XLM e a arguida OO, bem como facturas e outra documentação produzida ao abrigo dos mesmos, que serviram de suporte ao recebimento de quantias por esta última com origem no arguido AA, crime p. e p. pelo art.º 256. °, n.º l, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
- Um crime de fraude fiscal, p. e p. pelo artigo 103.º, n.º 1, al. a) do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2006, consumado no dia 28-03-2007;
-Um crime de fraude fiscal, p. e p. pelo artigo 103.º, n.º 1, al. a) do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2007, consumado no dia 11-04-2008;
 -Um crime de fraude fiscal, p. e p. pelo artigo 103.º, n.º 1, al. a) do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2008, consumado no dia 08-04-2009.
-Um crime de fraude fiscal, p. e p. pelo artigo 103.º, n.º 1, al. a) do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2009, consumado no dia 13-04-2010.
-Um crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelos artigos 103.º, n.º 1, al. a) e 104.º, n.º 2 do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2010, consumado no dia 12-04-2011.
-Um crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelos artigos 103.º, n.º 1, al. a) e 104.º, n.º 2 do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2011, consumado no dia 16-04-2012.
-Um crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelos artigos 103.º, n.º 1 a) e 104.º, n.ºs 2, alínea a) e 3 do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2012, consumado no dia 08-01-2014.
-Um crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelos artigos 103.º, n.º 1, al. a) e 104.º, n.ºs 2, alínea a) e 3 do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2013, consumado no dia 31-12-2014.
-Um crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelos artigos 103.º, n.º 1, al. a) e 104.º, n.ºs 2, alínea a) e 3 do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2014, consumado no dia 08-09-2015.
-Um crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelos artigos 103.º, n.º 1, al. a) e 104.º, n.ºs 2, alínea a) e 3 do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2015, consumado em Abril de 2016.
2- BB, pela prática de:
- Um crime de Corrupção Passiva de Titular de Cargo Político, em co-autoria com o arguido AA, com referência a actos praticados no interesse do Grupo LENA entre 2005 e 2011, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 1º, 2o, 3o, n.º 1, alínea d), 17°, n.º 1 e 19°, n.ºs 2 e 3 da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n° 108/2001, de 28 de Novembro - Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos, com referência aos arts. 28.° e 202. °, alínea b) do Código Penal;
- Um crime de Corrupção Activa, em co-autoria com os arguidos GG, PP e com as sociedades XMI MANAGEMENT INVESTMENTS SA, LEC SA, LEC SGPS e LENA SA relativamente à pessoa do arguido QQ, com referência a factos ocorridos nos anos de 2007 a 2009, crime p. e p. pelo art.º 374. °, n.º 1 do Código Penal;
- Um crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA e GG relativamente aos movimentos financeiros com origem no Grupo LENA e com passagem pelas contas da ... tituladas por este último arguido e realizados a partir de 2007, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
-Um crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA e GG e com as sociedades LEC SA e XLM, relativamente à utilização desta última sociedade, entre 2009 e 2015, para a colocação de fundos destinados ao arguido AA e utilização dos mesmos no seu interesse através do pagamento de despesas e de distribuição de dividendos para contas tituladas pelo arguido BB, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
- Um crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos GG, PP, QQ e com a sociedade XMI, relativamente a utilização desta última sociedade e sua contabilidade para a colocação de fundos na esfera patrimonial do arguido QQ, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal.
- Um Crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, CC, HH e II, relativamente à utilização, entre 2006 e 2008, das contas na ... em que este último era autorizado e operações financeiras realizadas a partir das mesmas, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
- Um Crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, CC, HH e II, relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados no ano de 2007 e até ao início de 2008, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
- Um crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos CC, HH, AA e GG, relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados a partir de Abril de 2008, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, e com intervenção das contas da ... do arguido GG, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
- Um crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos CC, HH, AA e GG, e com as sociedades LEC SA, LEC SGPS, LENA SGPS e XLM, relativamente aos movimentos financeiros ocorridos a partir de 2010, abrangidos pela operação CEL_2010, justificados através de contrato promessa de compra e venda com perda de sinal referente ao imóvel ..., sito em ..., e introdução desses fundos no Grupo LENA, crime p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
- Um crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, GG, DD, EE, FF e JJ, relativamente às transferências com origem em conta do cidadão ... KK, referentes aos financiamentos concedidos ao Grupo Vale do Lobo, com passagem por conta bancária da ... do arguido GG, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs l, 2 e 3 do Código Penal;
- Um crime de Branqueamento, relativamente à concentração dos fundos em novas contas bancárias da ... tituladas por sociedades em offshore controladas por BB e sua transferência para contas tituladas por este último arguido em Portugal, ao abrigo do RERT II, crime previsto e punido pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
- Um crime de Branqueamento, em co-autoria com o arguido AA relativamente à dissipação dos fundos por outras contas em Portugal, de que este último arguido era titular e autorizado, e à confusão de patrimónios de ambos nessas contas bancárias, crime p. e p. pelo art.º368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
- Um crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA e LL, quanto a aquisição de imóveis em Portugal com o retorno do preço pago para a esfera patrimonial do arguido AA, de forma justificada, factos ocorridos entre 2010 e 2012, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
- Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA e LL, relativamente à aquisição e subsequente arrendamento de um imóvel em ..., com intenção de ocultação da titularidade do activo, factos praticados entre 2012 e 2014, previsto e punido pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
- Um crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos LL e AA, relativamente à entrega por este último arguido de quantias pertencentes ao arguido AA para depósito em contas bancárias do arguido LL e para guardar em cofre bancário e em contas tituladas pelo mesmo, de forma a ocultar a propriedade desses valores pelo arguido AA, factos ocorridos nos anos de 2012 e 2013, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
- Um crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA e MM, relativamente à aquisição de um imóvel, designado “Monte ...”, com intenção de que passasse a integrar o património familiar do arguido AA, com registo em nome de terceiro e montagem de operação de financiamento entre 2011 e 2014, crime p. e p. pelo art.º 368.º, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
- Um crime de Falsificação de documento, em co-autoria com o arguido AA, relativamente à declaração de adesão ao RERT II e outra documentação produzida e utilizada para esse efeito no que se reporta à titularidade dos elementos patrimoniais declarados, concentrados nas contas da ... até final do ano de 2010, crime p. e p. pelo art.º 256.º, n.º 1, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
- Um crime de falsificação de documento, em co-autoria com os arguidos AA e GG, relativamente ao primeiro contrato de prestação de serviços celebrado entre a LEC S.A. e a XLM, facturas e outra documentação produzida ao abrigo do mesmo, factos ocorridos a partir de 2009, p. e p. pelo art.º 256.º, n.º 1, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
- Um crime de falsificação de documento, relativamente aos relatórios de actividades da XLM, em co-autoria com os arguidos NN e GG, relativos ao forjar e execução do primeiro contrato entre a LEC S.A. e a XLM, factos ocorridos entre 2011 e 2013, p. e p. pelo artigo 256.º. n.º 1, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
- Um crime de Falsificação de documento, em co-autoria com os arguidos AA e NN, com referência aos contratos de prestação de serviços celebrados entre as sociedades XLM e RMF Consulting, bem como facturas e outra documentação produzida ao abrigo dos mesmos, que servira, de suporte à circulação de quantias entre estas sociedade, com origem e destino no arguido AA, crime p. e p. pelo art.º 256.º, n.º 1, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
- Um crime de Falsificação de documento, em co-autoria com os arguidos AA, CC, HH e GG, relativamente ao conjunto de documentos que incluem o contrato promessa de compra e venda de imóvel em ..., denominado ..., contrato de intermediação EMP02... e XLM, cartas de admissão do seu incumprimento e perda de sinal e celebração de segundo contrato de prestação de serviços entre a LEC e a XLM, bem como facturas e outra documentação produzida ao abrigo destes contratos, factos ocorridos a partir de 2010, crime p. e p. pelo art.º 256.°, n.º l, alíneas a), d) e e) do Código Penal.
- Um Crime de Falsificação de Documento, em coautoria com os arguidos AA e MM, com referência aos contratos de prestação de serviços celebrados entra a XLM e a arguida MM, que serviram de suporte ao recebimento de quantias por esta última com origem no arguido AA, crime p. e p. pelo art.º 256.°, n.º l, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
- Um Crime de Falsificação de Documento, em co-autoria com o arguido AA, com referência aos contratos de prestação de serviços celebrados entra a XLM e a arguida OO, bem como facturas e outra documentação produzida ao abrigo dos mesmos, que serviram de suporte ao recebimento de quantias por esta última com origem no arguido AA, crime p. e p. pelo art.º 256. °, n.º l, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
- Um crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelos artigos 103.º, n.º 1, alS. a) e c) e 104.º, n.º 1, als. d), e) e f) do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2006, consumado em Abril de 2007;
- Um crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelos arts 103.º nº 1 al. a) e c) e 104.º, n.º 1, als. d), e) e f) do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2007, consumado em Abril de 2008.
 - Um crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelos art.ºs 103.º, n.º 1, als. a) e c) e 104.º, n.º 1, als. d), e) e f) do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2008, consumado em Abril de 2009.
 - Um crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelos art.ºs 103.º, n.º 1, als. a) e c) e 104.º, n.º 1, als. d), e) e f) do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2009, consumado em Abril de 2010.
- Um crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelos artigos 103.º, n.º 1, als. a), b) e c) e 104.º, n.º 1, al. d), e) e f) do RGIT, actualmente n.º 2 alínea a) do artigo 104.º do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2010, consumado em Abril de 2011.
- Um crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelos artigos 103.º, n.º 1, als. a), b) e c) e 104.º, n.º 1, al. d), e) e f) do RGIT, actualmente n.º 2, alíneas a) e n.º 3 do artigo 104.º do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2011, consumado em Abril 2012.
- Um crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelos artigos 103.º, n.º 1, als. a), b) e c) e 104.º, n.º 1, als. d), e) e f) do RGIT, actualmente n.º 2 alíneas a) e n.º 3 do artigo 104.º do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2012, consumado em Abril de 2013.
- Um crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelos artigos 103.º, n.º 1, als. a), b) e c) e 104º nº 1 al. d), e) e f) do RGIT, actualmente nº 2 alínea a) e nº 3 do artigo 104º do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2013, consumado em Abril de 2014.
- Um crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelos art.ºs 103.º, n.º 1, als. a), b) e c) e 104.º, n.º 1, als. d), e) e f) do RGIT, actualmente n.º 2 alíneas a) e n.º 3 do artigo 104.º do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2014, consumado em Abril de 2015.
- Um crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelos artigos 103.º, n.º 1, als. a), b) e c) e 104.º, n.º 1, als. d), e) e f) do RGIT, actualmente n.º 2 alíneas a) e n.º 3 do artigo 104.º do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2015, consumado em Abril de 2016.
3- GG, pela prática de:
- Um crime de Corrupção Activa de Titular de Cargo Político, relativamente à pessoa do arguido AA, este com mediação do arguido BB e em benefício do Grupo LENA, com referências aos anos de 2005 a 2011, crime p. e p. pelos art.ºs 2°, 3°, n.º 1, alínea d) e 18°, n.º 1 e 19°, n.º 2 e 3 da Lei 34/87, de 16 de Julho, com a redacção introduzida pela Lei n° 108/2001 28 de Novembro - Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos, com referência ao art.º 202.°, alínea b) do Código Penal;
- Um crime de Corrupção Activa, em co-autoria com os arguidos BB, PP, e com as sociedades XMI MANAGEMENT INVESTMENTS SA, LEC SA, LEC SGPS e LENA SA relativamente à pessoa do arguido QQ, com referência a factos ocorridos nos anos de 2007 a 2009, crime p. e p. pelo art.º 374. °, n.º 1 do Código Penal;
- Um crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA e BB relativamente aos movimentos financeiros com origem no Grupo LENA e com passagem pelas contas da ... do arguido GG, realizados a partir de 2007, crime p. e p. pelo art.º 368°-A, n° 1, 2 e 3 do Código Penal;
-Um crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos BB, AA e com as sociedades LEC SA e XLM, relativamente à utilização desta última sociedade, entre 2009 e 2015, para a colocação de fundos destinados ao arguido AA e utilização dos mesmos no seu interesse através do pagamento de despesas e de distribuição de dividendos para contas tituladas pelo arguido BB, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
- Um crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos BB, PP, QQ e com a sociedade XMI, relativamente a utilização desta última sociedade e sua contabilidade para a colocação de fundos na esfera patrimonial do arguido QQ, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
-Um Crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos BB, AA, NN e com as sociedades LEC SA, XLM e RMF CONSULTING relativamente a utilização desta última sociedade, entre 2010 e 2014, para a colocação de fundos destinados ao arguido AA e utilização dos mesmos no seu interesse através do pagamento de despesas suas e colocação de numerário à sua disposição, crime p. e p. pelo art.368°-A, n° 1, 2 e 3 do Código Penal;
-Um Crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, CC, HH, BB e com as sociedades LEC SA., LEC SGPS, LENA SGPS e XLM relativamente aos movimentos financeiros, ocorridos a partir de 2010, abrangidos pela operação CEL_2010 e justificados através de contrato promessa de compra e venda com perda de sinal referente ao imóvel ..., sito em ..., e introdução desses fundos no Grupo LENA, crime p. e p. pelo art.368°-A, n.º 1, 2 e 3 do Código Penal;
-Um crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, BB, CC e HH relativamente aos movimentos financeiros abrangidos pelos contratos EMP01... realizados a partir de Abril de 2008 com origem na conta da ES ENTERPRISES com intervenção das contas do arguido GG, crime p. e p. pelo art.368°-A, n.º 1, 2 e 3 do Código Penal;
- Um crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos BB, AA, DD, EE, FF e JJ, relativamente às transferências com origem em conta do cidadão ... KK, referentes aos financiamentos concedidos ao Grupo Vale do Lobo, com passagem por conta bancária da ... do arguido GG, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs l, 2 e 3 do Código Penal;
- Um crime de falsificação de documento, em co-autoria com os arguidos AA e BB, relativamente ao primeiro contrato de prestação de serviços celebrado entre a LEC S.A. e a XLM, facturas e outra documentação produzida ao abrigo do mesmo, factos ocorridos a partir de 2009, p. e p. pelo art.º 256.º, n.º 1, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
- Um crime de falsificação de documento, relativamente aos relatórios de actividades da XLM, em co-autoria com os arguidos BB e NN, relativos ao forjar e execução do primeiro contrato entre a LEC S.A. e a XLM, factos ocorridos entre 2011 e 2013, p. e p. pelo artigo 256.º. n.º 1, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
- Um crime de Falsificação de documento, em co-autoria com os arguidos AA, BB, CC e HH, relativamente ao conjunto de documentos que incluem o contrato promessa de compra e venda de imóvel em ..., denominado ..., contrato de intermediação EMP02... e XLM, cartas de admissão do seu incumprimento e perda de sinal e celebração de segundo contrato de prestação de serviços entre a LEC e a XLM, bem como facturas e outra documentação produzida ao abrigo destes contratos, factos ocorridos a partir de 2010, crime p. e p. pelo art.º 256.°, n.º l, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
-Um crime de fraude fiscal, p. e p. pelo artigo 103º nº 1 al. a) do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2009, consumado no dia 13-04-2010.
-Um crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelos artigos 103º nº 1 a) e 104º nº 2 do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2010, consumado no dia 12-04-2011.
-Um crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelo artigo 103º nº 1 a) e 104º nº 2 do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2011, consumado no dia 16-04-2012.
-Um crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelos artigos 103º nº 1 a) e 104º nº 2 alínea a) e nº 3 do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2012, consumado no dia 08-01-2014.
- Um crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelos artigos 103º nº 1 a) e 104º nº 2 alínea a) e nº 3 do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2013, consumado no dia 31-12-2014.
- Um crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelos artigos 103º nº 1 a) e 104º nº 2 alínea a) e nº 3 do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2014, consumado no dia 08-09-2015.
- Um crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelos artigos 103.º n.º 1, al. a) e 104º nº 2 alínea a) e nº 3 do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2015, consumado em Abril de 2016.
4- QQ, pela prática de:
- Um crime de corrupção passiva, relativamente aos pagamentos recebidos enquanto Director da RAVE, no âmbito da PPP1, mediante acordo celebrado com a XMI, crime p. e p. pelo art.º 373.º, n.º 1 do Código Penal, com referência ao artigo 386.º, n.ºs 1 e 2 do mesmo diploma legal;
- Um crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos BB, GG, PP, e com a XMI relativamente à utilização desta sociedade e sua contabilidade para a colocação de fundos na esfera patrimonial do arguido QQ, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
5- PP, pela prática de:
- Um crime de Corrupção Activa, em co-autoria com os arguidos BB, GG e com as sociedades XMI MANAGEMENT INVESTMENTS SA, LEC SA, LEC SGPS e LENA SA relativamente à pessoa do arguido QQ, com referência a factos ocorridos nos anos de 2007 a 2009, crime p. e p. pelo art.º 374.°, n.º 1 do Código Penal;
- Um crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos BB, GG, QQ e com a sociedade XMI, relativamente a utilização desta última sociedade e sua contabilidade para a colocação de fundos na esfera patrimonial do arguido QQ, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
6- CC, pela prática de:
- Um Crime de Corrupção Activa de Titular de Cargo Político relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES no que concerne aos pagamentos efectuados ao arguido AA, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 1.º, 2.º, 3.º, n.º 1, al. ad), 18.º, n.º 1 e 19.º, n.ºs 2 e 3 da Lei n.º 34/87, de 16/07, na redacção introduzida pela Lei n.º 108/2001, de 28/11- Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos, e 202.º, al. b) do Código Penal;
-  Um Crime de Corrupção Activa, relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES no que concerne aos pagamentos efectuados ao arguido RR, crime p. e p. pelos arts.374°, n.º 1 e 374°-A, n.ºs 2 e 3 do Código Penal, com referência aos arts.202°, al. b) e 386°, n.º 2 do mesmo diploma legal;
- Um Crime de Corrupção Activa, relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES no que concerne aos pagamentos efectuados ao arguido SS, crime p. e p. pelos arts.374°, n.º 1 e 374°-A, n.ºs 2 e 3 do Código Penal, com referência aos arts.202°, al. b) e 386°, n.º 2 do mesmo diploma legal.
- Um Crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, HH, BB e II, relativamente à utilização, entre 2006 e 2008, de contas na ... em que este último era autorizado e operações financeiras realizadas a partir das mesmas, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
- Um Crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, HH, BB e II, relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados no ano de 2007 e até ao início de 2008, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
- Um Crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, HH, BB e GG, relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados a partir de Abril de 2008, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES e com intervenção das contas do arguido GG, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
- Um Crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, HH, BB e GG, e com as sociedades LEC SA, LEC SGPS, Lena SGPS e XLM, relativamente aos movimentos financeiros abrangidos pela operação CEL_2010. Ocorridos a partir de 2010, justificados através de contrato promessa de compra e venda com perda de sinal referente ao imóvel ..., sito em ..., e introdução desses fundos no Grupo Lena, crime p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
- Um Crime de Branqueamento, em co-autoria com o arguido RR, relativamente aos pagamentos PT e CEL_2010, realizados entre 7 de Dezembro de 2007 e 20 de Setembro de 2011, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n°s 1, 2 e 3 do Código Penal;
- Um Crime de Branqueamento, em co-autoria com o arguido SS, relativamente aos pagamentos PT e CEL_2010, realizados entre 9 de Julho de 2007 e 23 de Novembro de 2012, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n°s 1, 2 e 3 do Código Penal;
- Um Crime de Branqueamento, relativamente a transferência de €4.000.000,00, com origem em conta da ES ENTERPRISES na ... para conta do CREDIT SUISSE, titulada pela sociedade em offshore EMP03..., controlada por si, em 21 de Outubro de 2011, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
- Um Crime de Branqueamento, em co-autoria com o arguido HH, relativamente à transferência de €2.750,00, com origem em conta da ES Enterprises na ..., de conta titulada pela sociedade EMP04... na ..., controlada pelo arguido HH, para conta do Crédit Suisse, titulada pela sociedade em offshore EMP03..., controlada por si, em Novembro de 2011, crime p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
- Um Crime de Branqueamento, em co-autoria com o arguido SS, relativamente a transferência de €3.967.611,00 (CHF 4.900.000,00), com origem em conta do banco PICTET titulada por este último e com destino a conta do Banco LOMBARD ODIER titulada pela sociedade em offshore EMP05..., controlada pelo arguido CC, em 22 de Novembro de 2011, crime p. e p. pelo art.368°A, n.º 1, 2 e 3 do Código Penal;
- Um Crime de Falsificação de Documento, em co-autoria com o arguido HH, relativamente à elaboração e uso de contrato justificativo dos pagamentos CEL_2010 realizados através das contas da ... de HH (“Justificativos dos pagamentos CEL_2010-HH”) cujo objecto se referia à prestação de serviços no ... e outros países ..., p. e p. pelo art.º 256.º, n.º 1, als. a), d) e e) do Código Penal;
- Um Crime de Falsificação de Documento, em co-autoria com o arguido RR, relativamente a elaboração e uso de contrato justificativo dos pagamentos PT e CEL_2010 efectuados ao arguido RR, crime p. e p. pelo art.º 256. °, n.º 1, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
- Um crime de Falsificação de documento, em co-autoria com os arguidos AA, BB, HH e GG, relativamente ao conjunto de documentos que incluem o contrato promessa de compra e venda de imóvel em ..., denominado ..., contrato de intermediação EMP02... e XLM, cartas de admissão do seu incumprimento e perda de sinal e celebração de segundo contrato de prestação de serviços entre a LEC e a XLM, bem como facturas e outra documentação produzida ao abrigo destes contratos, factos ocorridos a partir de 2010, crime p. e p. pelo art.º 256.°, n.º l, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
- Um Crime de Fraude Fiscal qualificada, p. e p. pelo artigo 103.º, al. a) e 104.º, n.º 3, no que tange ao IRS apurado quanto ao ano de 2011, em co-autoria com o arguido SS, crime p. e p. pelos arts. l03. °, n.º l, al. a), e 104. °, n.º 3 do RGIT;
- Um Crime de Fraude Fiscal, em co-autoria com o arguido HH, no que tange ao IRS apurado quanto ao ano de 2006 relativamente a este último, crime p. e p. pelo art.º l03.º, n.º l, al. a) do RGIT;
- Um Crime de Fraude Fiscal, em co-autoria com o arguido HH, no que tange ao IRS apurado quanto ao ano de 2010 relativamente a este último, crime p. e p. pelo art.º l03. °, n.º l, al. a) do RGIT.
7- RR, pela prática de:
Um Crime de Corrupção Passiva relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES no que concerne aos pagamentos recebidos do arguido CC com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, crime p, e p. pelas disposições conjugadas dos art.ºs 373. °, n.º 1, 374.°- A, n.ºs 2 e 3, e com referência aos art.ºs 202.°, al. b) e 386.°, n.º 2, todos do Código Penal;
- Um Crime de Branqueamento de Capitais, em co-autoria com o arguido CC, relativamente aos pagamentos PT e CEL_2010, realizados entre 7 de Dezembro de 2007 e 20 de Setembro de 2011, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES e com destino para contas tituladas por si na ..., crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
- Um crime de Falsificação de Documento, em co-autoria com o arguido CC, relativamente à elaboração e uso de contrato justificativo dos pagamentos PT e CEL-2010 (“Justificativos dos Pagamentos PT e CEL 2010 – RR”) efectuados ao arguido RR, crime p e p pelo art. 256º nº 1, alíneas a), d) e e) do CP;
- Um crime de fraude fiscal, p. e p. pelo artigo 103.º, n.º 1, al. a) do RGIT (relativo ao IRS de 2007);
- Um crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelos artigos 103.º, n.º 1 al. a) e 104.º, n.º 3 do RGIT (relativo ao IRS de 2011);
8- SS, pela prática de:
- Um Crime de Corrupção Passiva relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES, no que concerne aos pagamentos recebidos do arguido CC, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.ºs 373.°, n.º 1, 374.°- A, n.ºs 2 e 3, e com referência aos art.ºs 202.°, al. b) e 386.°, n.º 2, todos do Código Penal;
- Um Crime de Branqueamento, em co-autoria com o arguido CC, relativamente aos pagamentos PT e CEL_2010, realizados entre 9 de Julho de 2007 e 23 de Novembro de 2012, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES e com destino para contas tituladas por si na ..., crime p. e p. pelo art.º 368°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
- Um Crime de Peculato relativamente aos pagamentos efectuados pela PT a EMP06..., no período compreendido entre 30 de Julho de 2007 e 9 de Julho de 2008, no valor total de € 618.310,00, crime p. e p. pelo art.º 375. °, n.º 1 do Código Penal, com referência ao art.º 386. °, n.ºs 1 e 2 do mesmo diploma legal;
- Um Crime de abuso de Confiança, em co-autoria com CC, relativamente a transferência de €3.967.611,00 (CHF 4.900.000,00), com origem em conta do banco PICTET titulada pelo arguido SS e com destino a conta do Banco LOMBARD ODIER titulada pela sociedade em offshore EMP05..., controlada pelo arguido CC, em 22 de Novembro de 2011, crime p. e p. pelo art.º 205. °, n.ºs l e 4, alínea b) do Código Penal;
- Um Crime de Branqueamento, em co-autoria com CC, relativamente a transferência de €3.967.611,00 (CHF 4.900.000,00), com origem em conta do banco PICTET titulada pelo arguido SS e com destino a conta do Banco LOMBARD ODIER, titulada pela sociedade em offshore EMP05..., controlada pelo arguido CC, em 22 de Novembro de 2011, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
- Um Crime de Fraude Fiscal qualificada, no que tange ao IRS apurado quanto ao ano de 2007, de que foi beneficiário, crime p. e p. pelo artigo 103.º, n.º 1, als. a), b) e c) e 104.º, n.º 1, als. d), e) e f) do RGIT;
- Um Crime de Fraude Fiscal qualificada, no que tange ao IRS apurado quanto aos anos de 2010 a 2012, de que foi beneficiário, crime p. e p. pelo artigo 103.º, n.º 1, als. a), b) e c) e 104.º, n.º 1, als. d), e) e f) do RGIT;
- Um Crime de Fraude Fiscal qualificada, em co-autoria com o arguido CC, no que tange ao IRS apurado quanto ao ano de 2011, crime p. e p. pelo artigo 103.º, n.º 1, als. a), b) e c) e 104.º, n.º 1, als. d), e) e f) do RGIT;
9- DD, pela prática de:
- Um Crime de Corrupção Passiva de Titular de Cargo Político, em co-autoria com o arguido AA, com referência a actos praticados no interesse dos arguidos EE e FF com utilização das sociedades do Grupo Vale de Lobo, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.ºs 1.°, 2.°, 3.°, n.º 1, alínea d), 17.°, n.º 1 e 19.°, n.º s 2 e 3 da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n° 108/2001, de 28 de Novembro - Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos, com referência aos art.ºs 28.° e 202.°, alínea b) do Código Penal;
- Um Crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, BB, GG, EE, FF e JJ, relativamente as transferências com origem no cidadão ... KK, referentes aos financiamentos concedidos ao Grupo VALE DO LOBO, com passagem por conta bancária da ... do arguido GG, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
- Um Crime de Fraude Fiscal Qualificada, no que tange ao IRS apurado quanto aos anos de 2005 a 2008 de que foi beneficiário, crime p. e p. pelos art.ºs 103. °, n. l, als. a), b) e 104.º, n.º 1, als. d) e f), ambos do RGIT;
- Um Crime de Fraude Fiscal Qualificada, no que tange ao IRS apurado quanto ao ano de 2008 de que foi beneficiário, crime p. e p. pelos art.ºs l03.°, n.º l, als. a), b) e 104.º, n.º 1, als. d) e f), ambos do RGIT;
10- JJ, pela prática de:
- Um crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos BB, GG, DD, EE, FF e AA, relativamente às transferências com origem em conta do cidadão ... KK, referentes aos financiamentos concedidos ao Grupo Vale do Lobo, com passagem por conta bancária da ... do arguido GG, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs l, 2 e 3 do Código Penal;
- Um Crime de Branqueamento, a título de cumplicidade, e do qual é autor material o arguido DD, relativamente à transferência de fundos para Portugal com origem em contas tituladas pelas sociedades em offshore EMP07... e EMP08... na ... com utilização da sociedade EMP09... LDA., crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal.
11- FF, pela prática de:
- Um Crime de Corrupção Activa de Titular de Cargo Político, em co-autoria com o arguido EE, com referência a actos praticados por AA e DD no interesse dos primeiros, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. l°, 2°, 3°, nº 1, alínea d), 18°, nº 1, 19°, nº 2 e 3 e 30° da Lei 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n° 108/2001, de 28 de Novembro - Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos), com referência ao art.º 202°, alínea b) do Código Penal;
- Um crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos BB, GG, DD, EE, AA e JJ, relativamente às transferências com origem em conta do cidadão ... KK, referentes aos financiamentos concedidos ao Grupo Vale do Lobo, com passagem por conta bancária da ... do arguido GG, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs l, 2 e 3 do Código Penal;
- Um Crime de Fraude Fiscal Qualificada, em co-autoria com os arguidos VALE DO LOBO RESORT TURÍSTICO DE LUXO, SA, OCEANO CLUBE EMPREENDIMENTOS TURÍSTICOS DO ALGARVE, SA E EE, no que tange ao IRC apurado quanto ao ano de 2007 da sociedade VALE DO LOBO RESORT turístico DE LUXO, SA, crime p. e p. pelos arts.l03°-l a), b) e c) e 104°- 1 d) e g) do RGIT;
- Um Crime de Fraude Fiscal Qualificada, de que foi beneficiário, em co-autoria com os arguidos VALE DO LOBO RESORT TURÍSTICO DE LUXO, SA, OCEANO CLUBE EMPREENDIMENTOS TURÍSTICOS DO ALGARVE, SA, no que tange ao IRS apurado quanto ao ano de 2009, p. e p. pelos arts. l03°-l a), b) e c) e 104°- 1 d) e g) do RGIT;
12- EE, pela prática de:
- Um Crime de Corrupção Activa de Titular de Cargo Político, em co-autoria com o arguido FF, com referência a actos praticados por AA e DD no interesse dos primeiros, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. l°, 2°, 3°, nº 1, alínea d), 18°, nº 1, 19°, nº 2 e 3 e 30° da Lei 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n° 108/2001, de 28 de Novembro - Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos), com referência ao art.º 202°, alínea b) do Código Penal;
- Um Crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, BB, GG, DD, FF e JJ, relativamente as transferências, referentes aos financiamentos concedidos ao Grupo VALE DO LOBO, com passagem por conta bancária da ... do arguido GG, crime p. e p. pelo art.368°-A, n° 1, 2 e 3 do Código Penal;
- Um Crime de Fraude Fiscal Qualificada, em co-autoria com os arguidos VALE DO LOBO RESORT TURÍSTICO DE LUXO, SA, OCEANO CLUBE EMPREENDIMENTOS TURÍSTICOS DO ALGARVE, SA E FF, no que tange ao IRC apurado quanto ao ano de 2007 da sociedade VALE DO LOBO RESORT turístico DE LUXO, SA, crime p. e p. pelos arts. l03°-l a), b) e c) e 104°- 1 d) e g) do RGIT;
- Um Crime de Fraude Fiscal Qualificada, de que foi beneficiário, em co-autoria com os arguidos VALE DO LOBO RESORT TURÍSTICO DE LUXO, SA, OCEANO CLUBE EMPREENDIMENTOS TURÍSTICOS DO ALGARVE, SA, no que tange ao IRS apurado quanto ao ano de 2009, p. e p. pelos arts. l03°-l a), b) e c) e 104°- 1 d) e g) do RGIT;
- Um Crime de Fraude Fiscal Qualificada, em co-autoria com a arguida PEPELAN - CONSULTORIA E GESTÃO, no que tange ao IRC apurado quanto ao ano de 2008, crime p. e p. pelos arts. l03°-l a), b) e c) e 104°- 1 d) e f) do RGIT;
- Um Crime de Fraude Fiscal Qualificada, em co-autoria com a sociedade PEPELAN - CONSULTORIA E GESTÃO relativamente a justificativos criados para o recebimento de fundos através da alienação de imóvel cuja propriedade estava titulada por esta sociedade e com utilização da sociedade em offshore EMP10... LIMITED, crime p. e p. pelo art.368°-A, nº 1, 2 e 3 do Código Penal.
13- II, pela prática de:
- Um Crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, CC, HH e BB, relativamente à utilização das contas em que o mesmo era autorizado na ... e operações realizadas a partir das mesmas, entre 2006 e 2008, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
- Um Crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, CC, HH e BB relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados no ano de 2007 e ate ao inicio de 2008, a partir de conta da ... da ES ENTERPRISES, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal.
14- HH, pela prática de:
- Julgo verificada a excepção dilatória de falta do pressuposto processual de competência internacional da lei penal portuguesa e, em consequência, absolvo o arguido HH da instância quanto ao crime de abuso de confiança, previsto e punido pelo artigo 205.º, n.ºs 1 e 4, alínea b) do CP e quanto ao crime de branqueamento de capitais, previsto e punido pelo artigo 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 4 do Código Penal, relativamente à transferência de 2.750.000,00€ e a sua não pronúncia quanto a estes dois crimes;
- Um Crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, CC, II e BB, relativamente à utilização das contas em que o mesmo era autorizado na ... e operações realizadas a partir das mesmas, entre 2006 e 2008, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
- Um crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, CC, II e BB relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados no ano de 2007 e até ao início de 2008, a partir de conta da ... da ES ENTERPRISES, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
- Um crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, CC, BB e GG relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados a partir de Abril de 2008, com origem em conta da ... da ES Enterprises com intervenção das contas do arguido GG, crime p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
- Um crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, CC, BB e GG e com as sociedades LEC SA, LEC SGPS, LENA SGPS e XLM, relativamente aos movimentos financeiros abrangidos pela operação CEL_2010, ocorridos a partir de 2010, justificados através de contrato promessa de compra e venda com perda de sinal referente ao imóvel ..., sito em ..., e introdução desses fundos no Grupo Lena, crime p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
- Um crime de Falsificação de documento, em co-autoria com o arguido CC, relativamente à elaboração e uso de contrato justificativo dos pagamentos CEL_2010 realizados através das contas da ... de HH (“Justificativos dos pagamentos CE_2010- HH”), cujo objecto se referia à prestação de serviços no ... e em outros países ..., crime p. e p. pelo art.º 256.º, n.º 1, als. a), d) e e) do Código Penal;
- Um crime de Falsificação de documento, em co-autoria com os arguidos AA, BB, CC e GG, relativamente ao conjunto de documentos que incluem o contrato promessa de compra e venda de imóvel em ..., denominado ..., contrato de intermediação EMP02... e XLM, cartas de admissão do seu incumprimento e perda de sinal e celebração de segundo contrato de prestação de serviços entre a LEC e a XLM, bem como facturas e outra documentação produzida ao abrigo destes contratos, factos ocorridos a partir de 2010, crime p. e p. pelo art.º 256.°, n.º l, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
- Um crime de Fraude Fiscal, de que foi beneficiário, em co-autoria com o arguido CC, no que tange ao IRS apurado quanto ao ano de 2006, crime previsto e punido pelos artigos 103.º, n.º 1, al. a), RGIT consumado no dia 25-05-2007;
- Um crime de Fraude Fiscal, de que foi beneficiário, em co-autoria com o arguido CC, no que tange ao IRS apurado quanto ao ano de 2010, crime previsto e punido pelos artigos 103.º, n.º 1, al. a), RGIT consumado no dia 31-05-2011;
15- LL, pela prática de:
-Um Crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA e BB, quanto a aquisição de imóveis em Portugal, com o retomo do preço pago para a esfera patrimonial do arguido AA, de forma justificada, factos ocorridos entre 2010 e 2012, crime p. e p. pelo art.º 368°-A, n°s 1, 2 e 3 do Código Penal;
-Um Crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA e BB, relativamente à produção e uso de documentação referente a aquisição e subsequente arrendamento do apartamento de ..., sito na Av. ..., crime p. e p. pelo art.º 368°-A, n°s 1, 2 e 3 do Código Penal;
-Um Crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA e BB, relativamente a entrega por este último arguido de quantias pertencentes ao arguido AA para depósito em contas bancárias do arguido LL e para guardar em cofre bancário e em contas tituladas pelo mesmo, com intenção de ocultar a titularidade das mesmas pelo arguido AA, factos ocorridos nos anos de 2012 e 2013, crime p. e p. pelo art.368°-A, n° 1, 2 e 3 do Código Penal;
-Um Crime de Falsificação de Documento, em co-autoria com os arguidos AA e BB, relativamente a produção e uso de documentação referente à aquisição e subsequente arrendamento do apartamento de ..., sito na Av. ..., crime p. e p. pelo art.º 256°, nº l, alíneas a), d) e e) do Código Penal.
16- TT, pela prática de:
- Um crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos BB e AA, relativamente à disponibilização das suas contas bancárias junto do Montepio Geral para recepção de fundos provenientes do arguido BB para entrega ao arguido AA, ocultando a titularidade destas quantias por este último arguido, factos ocorridos nos anos de 2013 e 2014, crime p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
17- UU, pela prática de:
- Um Crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA e BB, com referência aos factos relacionados com a utilização da sua conta bancaria para a passagem de fundos pertencentes ao arguido AA recebidos do arguido BB, e sua transferência subsequente para a conta do arguido AA, factos ocorridos nos anos de 2011 a 2014, crime p. e p. pelo art.368°-A, n° 1 e 2 do Código Penal;
18- MM, pela prática de:
- Um Crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA e BB relativamente ao recebimento de quantias com origem no arguido AA através da sociedade XLM a aquisição de um imóvel, designado “Monte ...”, no interesse de integrar património familiar do arguido AA, com registo em nome desta arguida, incluindo montagem de operação de financiamento e formas de custear as prestações da mesma, factos ocorridos entre 2011 e 2014, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
- Um Crime de Falsificação de Documento, em coautoria com os arguidos AA e BB, com referência aos contratos de prestação de serviços celebrados entra a XLM e a arguida MM, que serviram de suporte ao recebimento de quantias por esta última com origem no arguido AA, crime p. e p. pelo art.º 256.°, n.º l, alíneas a), d) e e) do Código Penal.
19- NN, pela prática de:
-Um Crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, BB, GG e com as sociedades LEC SA, XLM e RMF CONSULTING relativamente a utilização desta última sociedade para a colocação de fundos destinados ao arguido AA e utilização dos mesmos no seu interesse através do pagamento de despesas e colocação de numerário à sua disposição, entre 2010 e 2014, crime p. e p. pelo art.º 368°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
-Um Crime de Branqueamento relativamente aos relatórios de actividades da XLM, em co-autoria com os arguidos BB e GG, relativos ao forjar e utilização da execução do primeiro contrato entre a LEC SA e a XLM, factos ocorridos entre 2011 e 2013, crime p. e p. pelo art.º 256°, nº l, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
-Um Crime de Falsificação de Documento, praticado, em co-autoria, com os arguidos AA e BB com referência aos contratos de prestação de serviços celebrados entre as sociedades XLM e RMF CONSULTING, bem como facturas e outra documentação produzida ao abrigo dos mesmos, que serviram de suporte a circulação de quantias entre estas sociedades, com origem e destino no arguido AA, crime p. e p. pelo art.º 256. °, n.º 1, als. a), d) e e) do Código Penal;
- Um Crime de Falsificação de Documento, com referência aos contratos de prestação de serviços celebrados entre a sociedade RMF CONSULTING e VV e WW, bem como facturas e outra documentação produzida ao abrigo dos mesmos, que serviram de suporte ao recebimento de quantias por estes últimos com origem no arguido AA, crime p. e p. pelo art.º 256°, nº1 als. a), d) e e) do Código Penal;
- Um Crime de Falsificação de Documento, com referência aos contratos de prestação de serviços celebrados entre a sociedade RMF CONSULTING e XX e YY, bem como facturas e outra documentação produzida ao abrigo dos mesmos, que serviram de suporte ao recebimento de quantias por estes últimos, com origem no arguido AA, crime p. e p. pelo art.º 256°, n.°l, alíneas a), d) e e) do Código Penal.
20- LENA ENGENHARIA E CONSTRUÇÕES, S.A., pela prática de:
- Um crime de Corrupção Activa, em co-autoria com as sociedades LEC SGPS SA e LENA SGPS SA, relativamente a factos referentes à pessoa do arguido AA, este com mediação do arguido BB, e em benefício do Grupo Lena, com referências aos anos de 2005 a 2011, crime p. e p. pelos art.ºs 374.º e 374.º-A, n.º 2 do Código Penal, com referência aos artigos 11.º, n.º 2 e 20.ç do mesmo diploma legal;
- Um crime de Corrupção Activa, em co-autoria com os arguidos BB, GG, PP e com as sociedades XMI MANAGEMENT INVESTMENTS SA, LEC SGPS e LENA S.A., relativamente à pessoa do arguido QQ, com referência a factos ocorridos nos anos de 2007 a 2009, crime p. e p. pelo art.º 374. °, n.º 1 do Código Penal, com referência ao artigo 11.º, n.º 2 do mesmo diploma legal;
- Um Crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, BB, GG e a sociedade XLM, entre 2009 e 2015, relativamente a utilização desta última sociedade para a colocação de fundos destinados ao arguido AA e utilização dos mesmos no seu interesse no pagamento de despesas e por distribuição de dividendos para contas tituladas pelo arguido BB, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal, com referência ao art.º ll.°, n.º 2 do mesmo diploma legal;
- Um Crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, BB, GG, NN e com as sociedades XLM e RMF CONSULTING, relativamente a utilização desta última sociedade, entre 2010 e 2014, para a colocação de fundos destinados ao arguido AA e utilização dos mesmos no seu interesse através do pagamento de despesas e colocação de numerário a sua disposição, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal, com referência ao art.º l1°, n.°2 do mesmo diploma legal;
- Um Crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, CC, HH, GG e BB e com as sociedades LEC SGPS, LENA SGPS e XLM, relativamente aos movimentos financeiros abrangidos pela operação CEL_2010, ocorridos a partir de 2010, justificados através de contrato promessa de compra e venda com perda de sinal referente ao imóvel ..., sito em ..., e introdução desses fundos no Grupo LENA, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal, com referência ao art.º 11.°, n.º 2 do mesmo diploma legal;
-Um crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelo103.º nº 1 al. a) e c) e 104º nº 1 al. d), e) e f) do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2009, consumado em Abril de 2010.
-Um crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelo artigo 103º nº 1 al. a), b) e c) e 104º nº 1 al. d), e) e f) do RGIT, actualmente nº 2 alínea a) do artigo 104º do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2010, consumado em Abril de 2011.
-Um crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelo artigo 103.º, nº 1 al. a), b) e c) e 104º nº 1 al. d), e) e f) do RGIT, actualmente nº 2 alínea a) e nº 3 do artigo 104º do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2011, consumado em Abril 2012.
-Um crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelo artigo 103.º, n.º 1 al. a), b) e c) e 104º nº 1 al. d), e) e f) do RGIT, actualmente nº 2 alínea a) e nº 3 do artigo 104º do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2012, consumado em Abril de 2013.
-Um crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelo artigo 103.º, nº 1 al. a), b) e c) e 104º nº 1 al. d), e) e f) do RGIT, actualmente nº 2 alínea a) e nº 3 do artigo 104º do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2013, consumado em Abril de 2014.
-Um crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelo artigo 103.º, nº 1 al. a), b) e c) e 104º nº 1 al. d), e) e f) do RGIT, actualmente nº 2 alínea a) e nº 3 do artigo 104º do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2014, consumado em Abril de 2015.
-Um crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelo artigo 103.º, n.º 1 al. a), b) e c) e 104º nº 1 al. d), e) e f) do RGIT, actualmente nº 2 alínea a) e nº 3 do artigo 104º do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2015, consumado em Abril de 2016.
21- LENA ENGENHARIA E CONSTRUÇÃO SGPS, pela prática de:
- Um crime de Corrupção Activa, em co-autoria com as sociedades LEC SGPS SA e LENA SGPS SA, relativamente a factos referentes à pessoa do arguido AA, este com mediação do arguido BB, e em benefício do Grupo Lena, com referências aos anos de 2005 a 2011, crime p. e p. pelos art.ºs 374.º e 374.º-A, n.º 2 do Código Penal, com referência aos artigos 11.º, n.º 2 e 20.ç do mesmo diploma legal;
- Um crime de Corrupção Activa, em co-autoria com os arguidos BB, GG, PP e com as sociedades XMI MANAGEMENT INVESTMENTS SA, LEC SA, e LENA SA relativamente à pessoa do arguido QQ, com referência a factos ocorridos nos anos de 2007 a 2009, crime p. e p. pelo art.º 374°, nº 1 do Código Penal, com referência ao artigo 11.º, n.º 2 do mesmo diploma legal;
- Um Crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, CC, HH, GG e BB e com as sociedades LEC SA, LENA SGPS e XLM, relativamente aos movimentos financeiros abrangidos pela operação CEL_2010, ocorridos a partir de 2010, justificados através de contrato promessa de compra e venda com perda de sinal referente ao imóvel ..., sito em ..., e introdução desses fundos no Grupo LENA, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal, com referência ao art.º 11.°, n.º 2 do mesmo diploma legal;
22- LENA SGPS, pela prática de:
- Um crime de Corrupção Activa, em co-autoria com as sociedades LEC SGPS SA e LENA SGPS SA, relativamente a factos referentes à pessoa do arguido AA, este com mediação do arguido BB, e em benefício do Grupo Lena, com referências aos anos de 2005 a 2011, crime p. e p. pelos art.ºs 374.º e 374.º-A, n.º 2 do Código Penal, com referência aos artigos 11.º, n.º 2 e 20.ç do mesmo diploma legal;
- Um crime de Corrupção Activa, em co-autoria com os arguidos BB, GG, PP e com as sociedades XMI MANAGEMENT INVESTMENTS SA, LEC SA, e LEC SGPS relativamente à pessoa do arguido QQ, com referência a factos ocorridos nos anos de 2007 a 2009, crime p. e p. pelo art.º 374°, nº 1 do Código Penal, com referência ao artigo 11.º, n.º 2 do mesmo diploma legal;
- Um Crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, CC, HH, GG e BB e com as sociedades LEC SA, LEC SGPS e XLM, relativamente aos movimentos financeiros abrangidos pela operação CEL_2010, ocorridos a partir de 2010, justificados através de contrato promessa de compra e venda com perda de sinal referente ao imóvel ..., sito em ..., e introdução desses fundos no Grupo LENA, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal, com referência ao art.º 11.°, n.º 2 do mesmo diploma legal;
23- XLM- SOCIEDADE DE ESTUDOS E PROJECTOS LD.ª, pela prática de:
- Um Crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, BB, GG e a sociedade LEC SA, entre 2009 e 2015, relativamente a utilização desta última sociedade para a colocação de fundos destinados ao arguido AA e utilização dos mesmos no seu interesse no pagamento de despesas e por distribuição de dividendos para contas tituladas pelo arguido BB, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal, com referência ao art.º ll.°, n.º 2 do mesmo diploma legal;
- Um Crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, BB, GG, NN e com as sociedades LEC SA e RMF CONSULTING, relativamente a utilização desta última sociedade, entre 2010 e 2014, para a colocação de fundos destinados ao arguido AA e utilização dos mesmos no seu interesse através do pagamento de despesas e colocação de numerário a sua disposição, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal, com referência ao art.º l1°, n.°2 do mesmo diploma legal;
- Um Crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, CC, HH, GG e BB e com as sociedades LEC SGPS, LEC SA e LENA SGPS, relativamente aos movimentos financeiros abrangidos pela operação CEL_2010, ocorridos a partir de 2010, justificados através de contrato promessa de compra e venda com perda de sinal referente ao imóvel ..., sito em ..., e introdução desses fundos no Grupo LENA, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal, com referência ao art.º 11.°, n.º 2 do mesmo diploma legal;
- Um crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelo103.º, n.º 1 als. a) e c) e 104.º, n.º 1, als. d), e) e f) do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2009, consumado em Abril de 2010;
-Um crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelo artigo 103.º n.º 1, als. a), b) e c) e 104.º, n.º 1, als. d), e) e f) do RGIT, actualmente n.º 2 alínea a) do artigo 104.º do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2010, consumado em Abril de 2011;
-Um crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelo 103.º, n.º 1 als. a), b) e c) e 104.º, n.º 1, als. d), e) e f) do RGIT, actualmente n.º 2 alínea a) e n.º 3 do artigo 104.º do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2011, consumado em Abril 2012;
-Um crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelo 103.º, n.º 1 als. a), b) e c) e 104.º, n.º 1, als. d), e) e f) do RGIT, actualmente n.º 2, alínea a) e n.º 3 do artigo 104.º do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2012, consumado em Abril de 2013;
-Um crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelo 103.º, n.º 1 als. a), b) e c) e 104.º, n.º 1, als. d), e) e f) do RGIT, actualmente n.º 2, alínea a) e n.º 3 do artigo 104.º do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2013, consumado em Abril de 2014;
-Um crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelo art.º 103.º, n.º 1 als. a), b) e c) e 104.º, n.º 1 als. d), e) e f) do RGIT, actualmente n.º 2, alínea a) e n.º 3 do artigo 104.º do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2014, consumado em Abril de 2015;
-Um crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelo art.º 103.º, n.º 1, als. a), b) e c) e 104.º, n.º 1 als. d), e) e f) do RGIT, actualmente n.º 2 alínea a) e n.º 3 do artigo 104.º do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2015, consumado em Abril de 2016;
24- RMF- CONSULTING, GESTÃO E CONSULTORIA ESTRATÉGICA, LD.ª. pela prática de:
- Um Crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, BB, GG, NN e com as sociedades LEC SA e XLM, relativamente a utilização desta última sociedade, entre 2010 e 2014, para a colocação de fundos destinados ao arguido AA e utilização dos mesmos no seu interesse através do pagamento de despesas e colocação de numerário a sua disposição, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal, com referência ao art.º l1°, n.°2 do mesmo diploma legal;
25- XMI- MANAGEMENT & INVESTMENTS S.A., pela prática de:
- Um crime de Corrupção Activa, em co-autoria com os arguidos BB, GG, PP e com as sociedades LEC SA, LENA SGPS e LEC SGPS relativamente à pessoa do arguido QQ, com referência a factos ocorridos nos anos de 2007 a 2009, crime p. e p. pelo art.º 374°, nº 1 do Código Penal, com referência ao artigo 11.º, n.º 2 do mesmo diploma legal;
- Um Crime de Branqueamento, em co-autoria com os arguidos GG, PP E QQ relativamente à utilização da sociedade XMI e sua contabilidade para a colocação de fundos na esfera patrimonial do arguido QQ, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal, com referência ao artigo 11.º, n.º 2 do mesmo diploma legal;
26 - OCEANO CLUBE – EMPREENDIMENTOS TURÍSTICOS DO ALGARVE, SA, pela prática de:
- Um Crime de Fraude Fiscal Qualificada, em co-autoria com os arguidos VALE DO LOBO RESORT TURÍSTICO DE LUXO, SA, EE e FF, no que tange ao IRC apurado quanto ao ano de 2007 da sociedade referida em primeiro lugar, crime p. e p. pelos arts. l03.°, n.º l, als. a), b) e c) e 104.º, n.º 1. Als. d) e g) do RGIT e art.º 7.° deste diploma legal;
- Um Crime de Fraude Fiscal Qualificada, em co-autoria com os arguidos VALE DO LOBO RESORT TURÍSTICO DE LUXO, SA e EE, no que tange ao IRS apurado quanto ao ano de 2009, de que foi beneficiário o arguido referido em ultimo lugar, crime p. e p. pelos art.ºs l03.°, n.º l, als. a), b) e c) e 104.º, n.º 1, als. d) e g) do RGIT e art.7.° deste diploma legal;
- Um Crime de Fraude Fiscal Qualificada, em co-autoria com os arguidos VALE DO LOBO RESORT TURÍSTICO DE LUXO, SA e FF, no que tange ao IRS apurado quanto ao ano de 2009, de que foi beneficiário o arguido referido em último lugar, crime p. e p. pelos art.ºs l03.°, n.º l, als. a), b) e c) e 104.°, n.º 1, als. d) e g) do RGIT e art.º 7° deste diploma legal;
27 - VALE DO LOBO RESORT TURÍSTICO DE LUXO, S.A., pela prática de:
- Um Crime de Fraude Fiscal Qualificada, em co-autoria com os arguidos Oceano Clube Empreendimentos Turísticos do Algarve, SA, EE e FF, no que tange ao IRC apurado quanto ao ano de 2007 da sociedade referida em primeiro lugar, crime p. e p. pelos art.ºs l03.°, n.º l, als. a), b) e c) e 104.º, n.º 1. Als. d) e g) do RGIT e art.º 7.° deste diploma legal;
- Um Crime de Fraude Fiscal Qualificada, em co-autoria com os arguidos Oceano Clube Empreendimentos Turísticos do Algarve, SA e EE, no que tange ao IRS apurado quanto ao ano de 2009, de que foi beneficiário o arguido referido em ultimo lugar, crime p. e p. pelos art.ºs l03.°, n.º l, als. a), b) e c) e 104.º, n.º 1, als. d) e g) do RGIT e art.7.° deste diploma legal;
- Um Crime de Fraude Fiscal Qualificada, em co-autoria com os arguidos Oceano Clube Empreendimentos Turísticos do Algarve, SA e FF, no que tange ao IRS apurado quanto ao ano de 2009, de que foi beneficiário o arguido referido em último lugar, crime p. e p. pelos art.ºs l03.°, n.º l, als. a), b) e c) e 104.°, n.º 1, als. d) e g) do RGIT e art.º 7° deste diploma legal;
28 - Pepelan- Consultoria e Gestão, S.A., pela prática de:
- Um crime de fraude fiscal qualificada, de que foi beneficiária, em co-autoria com o arguido EE, crime p. e p. pelos artigos 103.º, n.º 1, alíneas a), b) e c) e 104.º, n.º 1, alíneas d) e f), do RGIT, no que tange ao IRC apurado quanto ao ano de 2008;
- Um crime de branqueamento de capitais, em co-autoria com o arguido EE relativamente a justificativos criados para o recebimento de fundos através de alienação de imóvel cuja propriedade estava titulada por esta sociedade e com utilização da sociedade em offshore EMP10... Limited, crime p. e p. pelo artigo 368.º-A, n.º 1, 2 e 3 do Código Penal, com referência ao artigo 11.º, n.º 2 do mesmo diploma legal;
Nota:
Resulta do texto da decisão instrutória – cfr. fls 3237 que o Sr. Juiz  de Instrução relativamente ao crime de fraude “- Um crime de fraude fiscal, praticado e de que foi beneficiário BB, no que tange ao IRS apurado quanto aos anos de 2010 e 2011, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alíneas a) e b) do RGIT”  decidiu desdobrá-lo em dois (2) crimes, que não pronunciou, mas, na parte do decisório, esqueceu-se de  os mencionar.
Uma vez que se tratou de um lapso manifesto, compreensível pela extensão dos crimes em causa, este tribunal de recurso terá, igualmente, em consideração esses crimes- artigo 380º nº 1 al. b) e nº 2 CPP:
Um crime de fraude fiscal, praticado e de que foi beneficiário BB, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2010, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alínea a), do RGIT;
Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário BB, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2011, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alínea a), e 104.º, n.º 3, do RGIT;
*
O Digno Magistrado do MP em 1ª instância, não se conformando com o teor da decisão, veio interpor recurso.
Depois da motivação apresenta as  CONCLUSÕES – anexo 1 ( cujo teor é parte integrante deste acórdão)

OS CRIMES QUE O MP QUER VER PRONUNCIADOS:
O MP termina o seu recurso dizendo que, “em face do acima exposto e da apreciação acima feita relativamente aos factos que envolveram o Grupo LENA, o Grupo VALE DO LOBO e a PORTUGAL TELECOM e o GES, desconsiderando os crimes relativamente aos quais terá ocorrido entretanto a prescrição do procedimento criminal e os crimes já objecto de decisões de pronúncia que se encontram em fase de julgamento e ainda face à extinção e liquidação da sociedade XMI MANAGEMENT & INVESTMENTS SA e considerando as alterações de qualificação jurídica que devem ser operadas, entendemos que deve, a final, ser proferida decisão de pronúncia que abranja os seguintes crimes”:
CRIMES RELACIONADOS COM OS FACTOS QUE ENVOLVEM O GRUPO LENA
Arguido AA:
Um CRIME DE CORRUPCÃO PASSIVA PARA A PRÁTICA DE ACTOS CONTRÁRIOS AOS DEVERES DO CARGO, QUER COMO TITULAR DE CARGO POLÍTICO, QUER COMO FUNCIONÁRIO, em co-autoria com o arguido BB, com referência a actos praticados no interesse do GRUPO LENA, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 1°, 2°, 3°, n.° 1, alínea d), 17°, n.° 1 e 19°, n.°s 2 e 3 da Lei 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n° 4/2013, de 14/01 - Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos, em concurso de normas com os arts. 373.º-1 e 374º-A, n.º 2 do Cod. Penal, com referência aos arts. 202°, al. b) e 386°, n.° 4, do mesmo diploma legal na versão da Lei 4/2011, de 16/02;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos BB e GG, relativamente aos movimentos financeiros com origem no GRUPO LENA e com passagem pelas contas da ... tituladas por este último arguido e realizados a partir de 2007, crime p. e p. pelo art.368°-A, n.° 1, 2 e 3 do Código Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos BB e GG e com as sociedades LEC SA e XLM, relativamente à utilização desta última sociedade, entre 2009 e 2015, para a colocação de fundos destinados ao arguido AA e utilização dos mesmos no seu interesse através do pagamento directo de despesas ou por distribuição de dividendos para contas tituladas pelo arguido BB, crime p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos BB, GG, NN e com as sociedades LEC SA, XLM e RMF LDA, relativamente à utilização desta última sociedade, entre 2010 e 2014, para a colocação de fundos destinados ao arguido AA e utilização dos mesmos no seu interesse através do pagamento de despesas suas e colocação de numerário à sua disposição, crime p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos CC, HH, BB e GG relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados a partir de Abril de 2008, com origem em conta na ... da ES ENTERPRISES e com intervenção das contas da ... do arguido GG, crime p. e p. pelo art.368°-A, n.° 1, 2 e 3 do Código Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos CC, HH, GG e BB e com as sociedades LEC SA, LEC SGPS, LENA SGPS e XLM, relativamente aos movimentos financeiros, ocorridos a partir de 2010, abrangidos pela operação CEL_2010, justificados através de contrato promessa de compra e venda com perda de sinal referente ao imóvel ..., sito em ..., e introdução desses fundos no GRUPO LENA, crime p. e p. pelo art.368°-A, n.° 1, 2 e 3 do Código Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos BB e MM, relativamente à aquisição de um imóvel, designado “Monte ...”, com intenção de que passasse a integrar o património familiar do arguido AA, com registo em nome de terceiro e montagem de operação de financiamento e formas de custear as prestações da mesma, factos ocorridos entre 2011 e 2014, crime p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
Um CRIME DE FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO, em co-autoria com os arguidos BB e GG, relativamente ao primeiro contrato de prestação de serviços celebrado entre a LEC SA e a XLM LDA, facturas e outra documentação produzida ao abrigo do mesmo, factos ocorridos a partir de 2009, crime p. e p. pelo art.º 256.º, n.º 1, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
Um CRIME DE FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO, em co-autoria com os arguidos BB e NN, relativamente aos contratos de prestação de serviços celebrados entre as sociedades XLM e RMF LDA, bem como às facturas e outra documentação produzida ao abrigo dos mesmos, que serviram de suporte à circulação de quantias entre estas sociedades, com origem e destino no arguido AA, crime p. e p. pelo art.º 256.º, n.º 1, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
Um CRIME DE FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO, em co-autoria com os arguidos BB, CC, HH e GG, relativamente aos factos referentes ao conjunto de documentos que incluem o contrato promessa de compra e venda de imóvel em ..., denominado ..., contrato de intermediação EMP02... e XLM, cartas de admissão do seu incumprimento e perda de sinal e celebração de segundo contrato de prestação de serviços entre a LEC e a XLM, bem como facturas e outra documentação produzida ao abrigo destes contratos, factos ocorridos a partir de 2010, crime p. e p. pelo art.º 256°, n.° 1, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
Um CRIME DE FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO, em co-autoria com os arguidos BB e MM, relativamente aos contratos de prestação de serviços celebrados entre a XLM LDA e arguida MM, que serviram de suporte ao recebimento de quantias por esta última com origem no arguido AA, crime p. e p. pelo art.256°, n.° 1, alínea d) do Código Penal;
Um CRIME DE FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO, em co-autoria com o arguido BB, relativamente aos contratos de prestação de serviços celebrados entre a XLM LDA e OO, que serviram de suporte ao recebimento de quantias por esta última com origem no arguido AA, crime p. e p. pelo art.256°, n.° 1, alínea d) do Código Penal;
Um CRIME DE FRAUDE FISCAL QUALIFICADA, de que foi beneficiário, em co-autoria com o arguido BB, no que tange ao IRS apurado quanto aos anos de 2006 a 2009, crime p. e p. pelos arts. 103°- 1, als. a), b) e c) e 104°- 1, als. d), e) e f) do RGIT;
Um CRIME DE FRAUDE FISCAL QUALIFICADA, de que foi beneficiário, em co-autoria com os arguidos BB, GG, LENA ENGENHARIA E CONSTRUÇÕES SA e XLM LDA, no que tange ao IRS apurado quanto aos anos de 2009 a 2012, crime p. e p. pelos arts. 103°- 1, als. a), b) e c) e 104°- 1, als. d), e) e f), e n.º 2, do RGIT, actualmente n.º 2, alínea a), do art.º 104.º, do RGIT;
Um CRIME DE FRAUDE FISCAL QUALIFICADA, de que foi beneficiário, em co-autoria com os arguidos BB, GG, LENA ENGENHARIA E CONSTRUÇÕES SA e XLM LDA, no que tange ao IRS apurado quanto aos anos de 2013 a 2015, crime p. e p. pelos arts. 103°- 1, als. a), b) e c) e 104°- 1, als. d), e e), n.º 2, alínea a) e n.º 3 do RGIT.
Ao arguido BB:
Um CRIME DE CORRUPCÃO PASSIVA PARA A PRÁTICA DE ACTOS CONTRÁRIOS AOS DEVERES DO CARGO, QUER COMO TITULAR DE CARGO POLÍTICO, QUER COMO FUNCIONÁRIO, em co-autoria com o arguido AA, com referência a actos praticados no interesse do GRUPO LENA, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 1°, 2°, 3°, n.° 1, alínea d), 17°, n.° 1 e 19°, n.°s 2 e 3 da Lei 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n° 4/2013, de 14/01 - Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos, em concurso de normas com os arts. 373.º-1 e 374º-A, n.º 2 do Cod. Penal, com referência aos arts. 28.º, 202°, al. b) e 386°, n.° 4, do mesmo diploma legal na versão da Lei 4/2011, de 16/02;
Um CRIME DE CORRUPÇÃO ACTIVA, em co-autoria com os arguidos GG, PP, LEC SA, LEC SGPS e LENA SGPS, relativamente ao funcionário QQ, nos anos de 2007 a 2009, crime p. e p. pelo art.º 374°, n.° 1 do Código Penal, com referência aos arts. 28.º e 386°, n.°s 1 e 2, do mesmo diploma legal na versão da Lei 59/2007, de 04/09;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos AA e GG, relativamente aos movimentos financeiros com origem no GRUPO LENA e com passagem pelas contas da ... tituladas por este último arguido e realizados a partir de 2007, crime p. e p. pelo art.368°- A, n.° 1, 2 e 3 do Código Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos AA e GG e com as sociedades LEC SA e XLM, relativamente à utilização desta última sociedade, entre 2009 e 2015,  para a colocação de fundos destinados ao arguido AA e utilização dos mesmos no seu interesse através do pagamento directo de despesas ou por distribuição de dividendos para contas tituladas pelo arguido BB, crime p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos AA, GG, NN e com as sociedades LEC SA, XLM e RMF LDA, relativamente à utilização desta última sociedade, entre 2010 e 2014, para a colocação de fundos destinados ao arguido AA e utilização dos mesmos no seu interesse através do pagamento de despesas suas e colocação de numerário à sua disposição, entre 2010 e 2014, crime p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos GG, PP e QQ, relativamente à utilização da sociedade XMI e sua contabilidade, para a colocação de fundos na esfera patrimonial do arguido QQ, crime p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos AA, CC, HH e GG relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados a partir de Abril de 2008, com origem em conta na ... da ES ENTERPRISES e com intervenção das contas da ... do arguido GG, crime p. e p. pelo art.368°-A, n.° 1, 2 e 3 do Código Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos AA, CC, HH e GG, e com as sociedades LEC SA, LEC SGPS, LENA SGPS e XLM, relativamente aos movimentos financeiros, ocorridos a partir de 2010, abrangidos pela operação CEL_2010, justificados através de contrato promessa de compra e venda com perda de sinal referente ao imóvel ..., sito em ..., e introdução desses fundos no GRUPO LENA, crime p. e p. pelo art.368°-A, n.° 1, 2 e 3 do Código Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos AA e MM, relativamente à aquisição de um imóvel, designado “Monte ...”, com intenção de que passasse a integrar o património familiar do arguido AA, com registo em nome de terceiro e montagem de operação de financiamento e formas de custear as prestações da mesma, factos ocorridos entre 2011 e 2014, crime p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
Um FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO, em co-autoria com os arguidos AA e GG, relativamente ao primeiro contrato de prestação de serviços celebrado entre a LEC SA e a XLM LDA, facturas e outra documentação produzida ao abrigo do mesmo, factos ocorridos a partir de 2009, crime p. e p. pelo art.º 256.º, n.º 1, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
Um FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO, em co-autoria com os arguidos AA e NN, relativamente aos contratos de prestação de serviços celebrados entre as sociedades XLM e RMF LDA, bem como às facturas e outra documentação produzida ao abrigo dos mesmos, que serviram de suporte à circulação de quantias entre estas sociedades, com origem e destino no arguido AA, crime p. e p. pelo art.º 256.º, n.º 1, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
Um FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO, em co-autoria com os arguidos GG e NN, relativamente aos relatórios de actividades da XLM, relativos ao forjar e execução de primeiro contrato entre a LEC SA e a XLM LDA, factos ocorridos entre 2011 e 2013, crime p. e p. pelo art.º 256.º, n.º 1, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
Um CRIME DE FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO, em co-autoria com os arguidos AA, CC, HH e GG, relativamente aos factos referentes ao conjunto de documentos que incluem o contrato promessa de compra e venda de imóvel em ..., denominado ..., contrato de intermediação EMP02... e XLM, cartas de admissão do seu incumprimento e perda de sinal e celebração de segundo contrato de prestação de serviços entre a LEC e a XLM, bem como facturas e outra documentação produzida ao abrigo destes contratos, factos ocorridos a partir de 2010, crime p. e p. pelo art.º 256°, n.° 1, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
Um CRIME DE FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO, em co-autoria com os arguidos AA e MM, relativamente aos contratos de prestação de serviços celebrados entre a XLM LDA e arguida MM, que serviram de suporte ao recebimento de quantias por esta última com origem no arguido AA, crime p. e p. pelo art.256°, n.° 1, alínea d) do Código Penal;
Um CRIME DE FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO, em co-autoria com o arguido AA, relativamente aos contratos de prestação de serviços celebrados entre a XLM LDA e OO, que serviram de suporte ao recebimento de quantias por esta última com origem no arguido AA, crime p. e p. pelo art.256°, n.° 1, alínea d) do Código Penal;
Um CRIME DE FRAUDE FISCAL QUALIFICADA, de que foi beneficiário, no que tange ao IRS apurado quanto aos anos de 2010 e 2011, crime p. e p. pelos arts. 103°- 1, al. a) e 104.°- 3, do RGIT;
Um CRIME DE FRAUDE FISCAL QUALIFICADA, em co-autoria com o arguido AA, no que tange ao IRS apurado relativamente a este último, quanto aos anos de 2006 a 2009, crime p. e p. pelos arts. 103°- 1, als. a), b) e c) e 104°- 1, als. d), e) e f) do RGIT;
Um CRIME DE FRAUDE FISCAL QUALIFICADA, em co-autoria com os arguidos AA, GG, LENA ENGENHARIA E CONSTRUÇÕES SA e XLM LDA, no que tange ao IRS apurado quanto aos anos de 2009 a 2012, relativamente ao arguido referido em primeiro lugar, crime p. e p. pelos arts. 103°- 1, als. a), b) e c) e 104°- 1, als. d), e) e f), e n.º 2, do RGIT, actualmente n.º 2, alínea a), do art.º 104.º, do RGIT;
Um CRIME DE FRAUDE FISCAL QUALIFICADA, em co-autoria com os arguidos AA, GG, LENA ENGENHARIA E CONSTRUÇÕES SA e XLM LDA, no que tange ao IRS apurado quanto aos anos de 2013 a 2015, relativamente ao arguido referido em primeiro lugar, crime p. e p. pelos arts. 103°- 1, als. a), b) e c) e 104°- 1, als. d), e e), n.º 2, alínea a) e n.º 3 do RGIT.
Ao arguido GG:
Um CRIME DE CORRUPCÃO ACTIVA DE TITULAR DE CARGO POLÍTICO, relativamente à pessoa do arguido AA, este com mediação do arguido BB, em benefício do GRUPO LENA, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 1°, 2°, 3°, n.° 1, alínea d), 18°, n.° 1 e 19°, n.°s 2 e 3 da Lei 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n° 4/2013, de 14/01 - Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos, em concurso de normas com os arts. 374.º-1 e 374º-A, n.º 2 do Cod. Penal, com referência aos arts. 28.º, 202°, al. b) e 386°, n.° 4, do mesmo diploma legal na versão da Lei 4/2011, de 16/02;
Um CRIME DE CORRUPÇÃO ACTIVA, em co-autoria com os arguidos BB, PP, LEC SA, LEC SGPS e LENA SGPS, relativamente ao funcionário QQ, nos anos de 2007 a 2009, crime p. e p. pelo art.º 374°, n.° 1 do Código Penal, com referência aos arts. 28.º e 386°, n.°s 1 e 2, do mesmo diploma legal na versão da Lei 59/2007, de 04/09;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos AA e BB, relativamente aos movimentos financeiros com origem no GRUPO LENA e com passagem pelas contas da ... por si tituladas e realizados a partir de 2007, crime p. e p. pelo art.368°- A, n.° 1, 2 e 3 do Código Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos AA e BB e com as sociedades LEC SA e XLM, relativamente à utilização desta última sociedade, entre 2009 e 2015, para a colocação de fundos destinados ao arguido AA e utilização dos mesmos no seu interesse através do pagamento directo de despesas ou por distribuição de dividendos para contas tituladas pelo arguido BB, crime p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos BB, PP e QQ, relativamente à utilização da sociedade XMI e sua contabilidade, para a colocação de fundos na esfera patrimonial do arguido QQ, crime p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos AA, BB, NN e com as sociedades LEC SA, XLM e RMF LDA, relativamente à utilização desta última sociedade, entre 2010 e 2014, para a colocação de fundos destinados ao arguido AA e utilização dos mesmos no seu interesse através do pagamento de despesas suas e colocação de numerário à sua disposição, crime p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos AA, CC, HH e BB relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados a partir de Abril de 2008, com origem em conta na ... da ES ENTERPRISES e com intervenção das contas da ... do arguido GG, crime p. e p. pelo art.368°-A, n.° 1, 2 e 3 do Código Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos AA, CC, HH e BB, e com as sociedades LEC SA, LEC SGPS, LENA SGPS e XLM, relativamente aos movimentos financeiros, ocorridos a partir de 2010, abrangidos pela operação CEL_2010, justificados através de contrato promessa de compra e venda com perda de sinal referente ao imóvel ..., sito em ..., e introdução desses fundos no GRUPO LENA, crime p. e p. pelo art.368°-A, n.° 1, 2 e 3 do Código Penal;
Um FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO, em co-autoria com os arguidos AA e BB, relativamente ao primeiro contrato de prestação de serviços celebrado entre a LEC SA e a XLM LDA, facturas e outra documentação produzida ao abrigo do mesmo, factos ocorridos a partir de 2009, crime p. e p. pelo art.º 256.º, n.º 1, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
Um FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO, em co-autoria com os arguidos BB e NN, relativamente aos relatórios de actividades da XLM, relativos ao forjar e execução de primeiro contrato entre a LEC SA e a XLM LDA, factos ocorridos entre 2011 e 2013, crime p. e p. pelo art.º 256.º, n.º 1, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
Um CRIME DE FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO, em co-autoria com os arguidos AA, CC, HH e BB, relativamente aos factos referentes ao conjunto de documentos que incluem o contrato promessa de compra e venda de imóvel em ..., denominado ..., contrato de intermediação EMP02... e XLM, cartas de admissão do seu incumprimento e perda de sinal e celebração de segundo contrato de prestação de serviços entre a LEC e a XLM, bem como facturas e outra documentação produzida ao abrigo destes contratos, factos ocorridos a partir de 2010, crime p. e p. pelo art.º 256°, n.° 1, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
Um CRIME DE FRAUDE FISCAL QUALIFICADA, em co-autoria com os arguidos AA, BB, LENA ENGENHARIA E CONSTRUÇÕES SA e XLM LDA, no que tange ao IRS apurado quanto aos anos de 2009 a 2012, relativamente ao arguido referido em primeiro lugar, crime p. e p. pelos arts. 103°- 1, als. a), b) e c) e 104°- 1, als. d), e) e f), e n.º 2, do RGIT, actualmente n.° 2 a) do art. 104.° do RGIT;
Um CRIME DE FRAUDE FISCAL QUALIFICADA, em co-autoria com os arguidos AA, BB, LENA ENGENHARIA E CONSTRUÇÕES SA e XLM LDA, no que tange ao IRS apurado quanto aos anos de 2013 a 2015, relativamente ao arguido referido em primeiro lugar, crime p. e p. pelos arts. 103°- 1, als. a), b) e c) e 104°- 1, als. d), e e), n.º 2, alínea a) e n.º 3 do RGIT.
Ao arguido QQ:
Um CRIME DE CORRUPCÃO PASSIVA, relativamente ao pagamentos recebidos enquanto Director da RAVE, no âmbito da PPP1, mediante acordo celebrado com a XMI, crime p. e p. pelas disposições conjugadas do art.º 372°, n.° 1 do Código Penal, na redacção introduzida pela Lei 108/2001, com referência ao art.º 386.°, números 1 e 2, do mesmo diploma legal.
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos BB, PP e GG, relativamente à utilização da sociedade XMI e sua contabilidade, para a colocação de fundos na sua esfera patrimonial, crime p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
Ao arguido PP:
Um CRIME DE CORRUPÇÃO ACTIVA, em co-autoria com os arguidos BB, GG, LEC SA, LEC SGPS e LENA SGPS, relativamente ao funcionário QQ, nos anos de 2007 a 2009, crime p. e p. pelo art.º 374°, n.° 1 do Código Penal, com referência aos arts. 28.º e 386°, n.°s 1 e 2, do mesmo diploma legal na versão da Lei 59/2007, de 04/09;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos BB, GG e QQ, relativamente à utilização da sociedade XMI e sua contabilidade, para a colocação de fundos na esfera patrimonial do arguido QQ, crime p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
Ao arguido HH:
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos AA, CC, BB e GG relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados a partir de Abril de 2008, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES com intervenção das contas do arguido GG, crime p. e p. pelo art.368°-A, n.° 1, 2 e 3 do Código Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos AA, CC, GG, BB e com as sociedades LEC SA, LEC SGPS, LENA SGPS e XLM, relativamente aos movimentos financeiros abrangidos pela operação CEL_2010, ocorridos a partir de 2010, justificados através de contrato promessa de compra e venda com perda de sinal referente ao imóvel ..., sito em ..., e introdução desses fundos no GRUPO LENA, crime p. e p. pelo art.368°-A, n.° 1, 2 e 3 do Código Penal;
Um CRIME DE FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO, em co-autoria com os arguidos AA, BB, CC e GG, relativamente aos factos referentes ao conjunto de documentos que incluem o contrato promessa de compra e venda de imóvel em ..., denominado ..., contrato de intermediação EMP02... e XLM, cartas de admissão do seu incumprimento e perda de sinal e celebração de segundo contrato de prestação de serviços entre a LEC e a XLM, bem como facturas e outra documentação produzida ao abrigo destes contratos, factos ocorridos a partir de 2010, crime p. e p. pelo art.256°, n.º 1, alíneas a), d) e e) do Código Penal.
À arguida MM:
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos AA e BB, relativamente ao recebimento de quantias com origem no arguido AA através da sociedade XLM e à aquisição de um imóvel, designado “Monte ...”, com intenção de integrar património familiar do arguido AA, com registo em nome desta arguida, incluindo montagem de operação de financiamento e formas de custear as prestações da mesma, factos ocorridos entre 2011 e 2014, crime p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
Um CRIME DE FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO, em co-autoria com os arguidos AA e BB, relativamente aos contratos de prestação de serviços celebrados entre a XLM LDA e arguida MM, que serviram de suporte ao recebimento de quantias por esta última com origem no arguido AA, crime p. e p. pelo art.256°, n.° 1, alínea d) do Código Penal;
Ao arguido NN:
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos AA, GG e BB e com as sociedades LEC SA, XLM e RMF LDA, relativamente à utilização desta última sociedade para a colocação de fundos destinados ao arguido AA e utilização dos mesmos no seu interesse através do pagamento de despesas suas e colocação de numerário à sua disposição, entre 2010 e 2014, crime p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
Um CRIME DE FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO, em co-autoria com os arguidos AA e BB, relativamente aos contratos de prestação de serviços celebrados entre as sociedades XLM e RMF LDA, bem como às facturas e outra documentação produzida ao abrigo dos mesmos, que serviram de suporte à circulação de quantias entre estas sociedades, com origem e destino no arguido AA, crime p. e p. pelo art.º 256.º, n.º 1, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
Um CRIME DE FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO, em co-autoria com os arguidos GG e BB, relativamente aos relatórios de actividades da XLM, relativos ao forjar e execução de primeiro contrato entre a LEC SA e a XLM LDA, factos ocorridos entre 2011 e 2013, crime p. e p. pelo art.º 256.º, n.º 1, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
Um CRIME DE FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO, em co-autoria com os arguidos AA e BB, relativamente aos contratos de prestação de serviços celebrados entre a sociedade RMF LDA e VV e WW, bem como às facturas produzidas ao abrigo dos mesmos, que serviram de suporte ao recebimento de quantias por estes últimos com origem no arguido AA, crime p. e p. pelo art.256°, n.° 1, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
Um CRIME DE FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO, em co-autoria com os arguidos AA e BB, relativamente aos contratos de prestação de serviços celebrados entre a sociedade RMF LDA e XX e YY, bem como às facturas produzidas ao abrigo dos mesmos, que serviram de suporte ao recebimento de quantias por estes últimos com origem no arguido AA, crime p. e p. pelo art.256°, n.° 1, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
À LENA ENGENHARIA E CONSTRUÇÕES SA:
Um CRIME DE CORRUPCÃO ACTIVA, em co-autoria com as sociedades LEC SGPS SA e LENA SGPS, relativamente a factos referentes à pessoa do arguido AA, este com mediação do arguido BB, em benefício do GRUPO LENA, crime p. e p. pelos arts. 374.º-1 e 374º-A, n.º 2 do Cod. Penal, com referência aos arts. 11.º, n.º 2, 202°, al. b) e 386°, n.° 4, do mesmo diploma legal na versão da Lei 4/2011, de 16/02;
Um CRIME DE CORRUPÇÃO ACTIVA, em co-autoria com os arguidos BB, GG, PP, LEC SGPS e LENA SGPS, relativamente ao funcionário QQ, nos anos de 2007 a 2009, crime p. e p. pelo art.º 374°, n.° 1 do Código Penal, com referência aos arts. 11.º, n.º 2 e 386°, n.°s 1 e 2, do mesmo diploma legal na versão da Lei 59/2007, de 04/09;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos AA, BB, GG e a sociedade XLM, relativamente à utilização desta última sociedade, entre 2009 e 2015, para a colocação de fundos destinados ao arguido AA e utilização dos mesmos no seu interesse através do pagamento directo de despesas ou por distribuição de dividendos para contas tituladas pelo arguido BB, crime p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal, com referência ao art.º 11.º, n.º2, do mesmo diploma legal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos AA, BB, GG, NN e com as sociedades XLM e RMF LDA, relativamente à utilização desta última sociedade, entre 2010 e 2014, para a colocação de fundos destinados ao arguido AA e utilização dos mesmos no seu interesse através do pagamento de despesas suas e colocação de numerário à sua disposição, crime p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal, com referência ao art.º 11.º, n.º2, do mesmo diploma legal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos AA, CC, HH, GG e BB, e com as sociedades LEC SGPS, LENA SGPS e XLM, relativamente aos movimentos financeiros, ocorridos a partir de 2010, abrangidos pela operação CEL_2010, justificados através de contrato promessa de compra e venda com perda de sinal referente ao imóvel ..., sito em ..., e introdução desses fundos no GRUPO LENA, crime p. e p. pelo art.368°-A, n.° 1, 2 e 3, do Código Penal, com referência ao art.º 11.º, n.º2, do mesmo diploma legal;
Um CRIME DE FRAUDE FISCAL QUALIFICADA, em co-autoria com os arguidos AA, BB, GG e XLM LDA, no que tange ao IRS apurado quanto aos anos de 2009 a 2012, relativamente ao arguido referido em primeiro lugar, crime p. e p. pelos arts. 103°-1 a), b) e c) e 104°- 1 d), e) e f) e n.° 2 do RGIT, actualmente n.° 2 a) do art.° 104.° do RGIT e art.° 7.° do mesmo diploma legal;
Um CRIME DE FRAUDE FISCAL QUALIFICADA, em co-autoria com os arguidos AA, BB, GG e XLM LDA, no que tange ao IRS apurado quanto aos anos de 2013 a 2015, relativamente ao arguido referido em primeiro lugar, crime p. e p. pelos arts. 103.°-1 a), b) e c) e 104.°- 1 d), e) e n.° 2 a) e n.°3 do RGIT e art.° 7.° do mesmo diploma legal.
À LENA ENGENHARIA E CONSTRUÇÃO SGPS:
Um CRIME DE CORRUPCÃO ACTIVA, em co-autoria com as sociedades LEC SA e LENA SGPS, relativamente ao arguido AA, este com mediação do arguido BB, em benefício do GRUPO LENA, crime p. e p. pelos arts. 374.º-1 e 374º-A, n.º 2 do Cod. Penal, com referência aos arts. 11.º, n.º 2, 202°, al. b) e 386°, n.° 4, do mesmo diploma legal na versão da Lei 4/2011, de 16/02;
Um CRIME DE CORRUPÇÃO ACTIVA, em co-autoria com os arguidos BB, GG, PP, LEC SA e LENA SGPS, relativamente ao funcionário QQ, nos anos de 2007 a 2009, crime p. e p. pelo art.º 374°, n.° 1 do Código Penal, com referência aos arts. 11.º, n.º 2 e 386°, n.°s 1 e 2, do mesmo diploma legal na versão da Lei 59/2007, de 04/09;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos AA, CC, HH, GG e BB, e com as sociedades LEC SA, LENA SGPS e XLM, relativamente aos movimentos financeiros, ocorridos a partir de 2010, abrangidos pela operação CEL_2010, justificados através de contrato promessa de compra e venda com perda de sinal referente ao imóvel ..., sito em ..., e introdução desses fundos no GRUPO LENA, crime p. e p. pelo art.368°-A, n.° 1, 2 e 3, do Código Penal, com referência ao art.º 11.º, n.º 2, do mesmo diploma legal;
À LENA SGPS:
Um CRIME DE CORRUPCÃO ACTIVA, em co-autoria com as sociedades LEC SA e LEC SGPS, relativamente ao arguido AA, este com mediação do arguido BB, em benefício do GRUPO LENA, crime p. e p. pelos arts. 374.º-1 e 374º-A, n.º 2 do Cod. Penal, com referência aos arts. 11.º, n.º 2, 202°, al. b) e 386°, n.° 4, do mesmo diploma legal na versão da Lei  4/2011, de 16/02;
Um CRIME DE CORRUPÇÃO ACTIVA, em co-autoria com os arguidos BB, GG, PP, LEC SA e LEC SGPS, relativamente ao funcionário QQ, nos anos de 2007 a 2009, crime p. e p. pelo art.º 374°, n.° 1 do Código Penal, com referência aos arts. 11.º, n.º 2 e 386°, n.°s 1 e 2, do mesmo diploma legal na versão da Lei 59/2007, de 04/09
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos AA, CC, HH, GG e BB, e com as sociedades LEC SA, LEC SGPS e XLM, relativamente aos movimentos financeiros, ocorridos a partir de 2010, abrangidos pela operação CEL_2010, justificados através de contrato promessa de compra e venda com perda de sinal referente ao imóvel ..., sito em ..., e introdução desses fundos no GRUPO LENA, crime p. e p. pelo art.368°-A, n.° 1, 2 e 3, do Código Penal, com referência ao art.º 11.º, n.º2, do mesmo diploma legal;
À XLM LDA:
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos AA, GG e BB, e com a sociedade LEC SA, relativamente à utilização desta última sociedade, entre 2009 e 2015, para a colocação de fundos destinados ao arguido AA e utilização dos mesmos no seu interesse para pagamento de despesas e por distribuição de dividendos para as contas de BB, crime p. e p. pelo art.368°-A, n.° 1, 2 e 3, do Código Penal, com referência ao art.º 11.º, n.º2, do mesmo diploma legal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos AA, GG, NN, BB, e com as sociedades LEC SA e RMF LDA, relativamente à utilização desta última sociedade, entre 2010 e 2014, para a colocação de fundos destinados ao arguido AA e sua utilização no seu interesse através do pagamento de despesas e colocação de numerário à sua disposição, crime p. e p. pelo art.368°-A, n.° 1, 2 e 3, do Código Penal, com referência ao art.º 11.º, n.º2, do mesmo diploma legal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos AA, CC, HH, GG e BB, e com as sociedades LEC SA, LEC SGPS e LENA SGPS, relativamente aos movimentos financeiros, ocorridos a partir de 2010, abrangidos pela operação CEL_2010, justificados através de contrato promessa de compra e venda com perda de sinal referente ao imóvel ..., sito em ..., e introdução desses fundos no GRUPO LENA, crime p. e p. pelo art.368°-A, n.° 1, 2 e 3, do Código Penal, com referência ao art.º 11.º, n.º 2, do mesmo diploma legal;
Um CRIME DE FRAUDE FISCAL QUALIFICADA, em co-autoria com os arguidos AA, BB, GG e LENA ENGENHARIA E CONSTRUÇÕES SA, no que tange ao IRS apurado quanto aos anos de 2009 a 2012, relativamente ao arguido referido em primeiro lugar, crime p. e p. pelos arts. 103°- 1, als. a), b) e c) e 104°- 1, als. d), e) e f), e n.º 2, do RGIT, actualmente n.° 2 a) do art. 104.° do RGIT;
Um CRIME DE FRAUDE FISCAL QUALIFICADA, em co-autoria com os arguidos AA, BB, GG e LENA ENGENHARIA E CONSTRUÇÕES SA , no que tange ao IRS apurado quanto aos anos de 2013 a 2015, relativamente ao arguido referido em primeiro lugar, crime p. e p. pelos arts. 103°- 1, als. a), b) e c) e 104°- 1, als. d), e e), n.º 2, alínea a) e n.º 3 do RGIT.
À RMF CONSULTING, GESTÃO E CONSULTORIA ESTRATÉGICA LDA:
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos AA, BB, GG, NN e com as sociedades LEC SA e XLM, relativamente à utilização da sociedade RMF LDA, entre 2010 e 2014, para a colocação de fundos destinados ao arguido AA e utilização dos mesmos no seu interesse através do pagamento de despesas suas e colocação de numerário à sua disposição, crime p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal, com referência ao art.º 11.º, n.º2, do mesmo diploma legal.
CRIMES RELACIONADOS COM OS FACTOS QUE ENVOLVEM O GRUPO VALE DO LOBO E SEUS ADMINISTRADORES
Arguido AA:
Um CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA PARA A PRÁTICA DE ACTOS CONTRÁRIOS AOS DEVERES DO CARGO, QUER COMO TITULAR DE CARGO POLÍTICO, QUER COMO FUNCIONÁRIO, em co-autoria, com o arguido DD, p. e p. no art. 17.º-1 da actual versão da Lei 34/87, de 16 de Julho, correspondente à data dos factos ao art. 16.º-1 da Lei 34/87 na versão da Lei 108/2001, de 28 de Novembro, em concurso de normas com o art. 372.º do Cod. Penal na versão da Lei 108/2001, de 28 de Novembro;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, relativo à instrumentalização das contas de KK e de GG para o pagamento, justificação e passagem de uma quantia de € 2.000.000,00, em co-autoria directa com os arguidos DD e BB e mediata com os arguidos EE, FF, GG e JJ, crime p. e p. no art. 368.º-A,- 1, 2 e 3 do Cod. Penal.
Arguido DD:
Um CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA PARA A PRÁTICA DE ACTOS CONTRÁRIOS AOS DEVERES DO CARGO, QUER POR TRANSMISSÃO DA QUALIDADE DE TITULAR DE CARGO POLÍTICO, QUER COMO FUNCIONÁRIO, em co-autoria, com o arguido AA, p. e p. no art. 17.º-1 da actual versão da Lei 34/87, de 16 de Julho, correspondente à data dos factos ao art. 16.º-1 da Lei 34/87 na versão da Lei 108/2001, de 28 de Novembro, em concurso de normas com o art. 372.º do Cod. Penal na versão da Lei 108/2001, de 28 de Novembro;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, relativo à instrumentalização das contas de KK e de GG para o pagamento, justificação e passagem de uma quantia de € 2.000.000,00, em co-autoria directa com os arguidos AA, BB, EE, FF e JJ, e mediata com o arguido GG, crime p. e p. no art. 368.º-A,- 1, 2 e 3 do Cod. Penal;
Quatro CRIMES DE FRAUDE FISCAL QUALIFICADA, relativos aos anos de 2005 a 2008, p. e p. no art. 103.º.1 a) e 104.º-1 d) e f) do RGIT.
Arguido EE:
Um CRIME DE CORRUPÇÃO ACTIVA, em co-autoria com o arguido FF, p. e p., quer como relativa a titular de cargo político no art. 18.º-1 da actual versão da Lei 34/87, de 16 de Julho, correspondente à data dos factos ao art. 18.º-1 da Lei 34/87 na versão da Lei 108/2001, de 28 de Novembro, em concurso de normas com o art. 374.º-1 do Cod. Penal na versão da Lei 108/2001, de 28 de Novembro;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, relativo à instrumentalização das contas de KK e de GG para o pagamento, justificação e passagem de uma quantia de € 2.000.000,00, em co-autoria directa com os arguidos FF e DD e mediata com os arguidos AA, BB, JJ e GG, crime p. e p. no art. 368.º-A,- 1, 2 e 3 do Cod. Penal;
Um CRIME DE FRAUDE FISCAL QUALIFICADA, relativo a IRS de 2009, em que se associou, em co-autoria, com as sociedades VALE DO LOBO RTL e OCEANO CLUBE, crime p. e p. no art. 103.º-1 a) e b) e 104.º-1 d) e g) do RGIT;
Um CRIME DE FRAUDE FISCAL QUALIFICADA, relativo a IRC 2008 da sociedade PEPELAN, com quem se encontra em co-autoria, crime p. e p. no art. 103.º-1 a) e b) e 104.º-1 d) e g) do RGIT;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com a sociedade PEPELAN, relativo ao montante da fraude fiscal supra e com a instrumentalização da entidade EMP10... LIMITED, p. e p. no art. 368.º-A – 1, 2 e 3 do Cod. Penal.
Arguido FF:
Um CRIME DE CORRUPÇÃO ACTIVA, em co-autoria com o arguido EE, p. e p., quer como relativa a titular de cargo político no art. 18.º-1 da actual versão da Lei 34/87, de 16 de Julho, correspondente à data dos factos ao art. 18.º-1 da Lei 34/87 na versão da Lei 108/2001, de 28 de Novembro, em concurso de normas com o art. 374.º-1 do Cod. Penal na versão da Lei 108/2001, de 28 de Novembro ;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, relativo à instrumentalização das contas de KK e de GG para o pagamento, justificação e passagem de uma quantia de € 2.000.000,00, em co-autoria directa com os arguidos EE e DD e mediata com os arguidos AA, BB, JJ e GG, crime p. e p. no art. 368.º-A,- 1, 2 e 3 do Cod. Penal;
Um CRIME DE FRAUDE FISCAL QUALIFICADA, relativo a IRS de 2009, em que se associou, em co-autoria, com as sociedades VALE DO LOBO RTL e OCEANO CLUBE, crime p. e p. no art. 103.º-1 a) e b) e 104.º-1 d) e g) do RGIT.
Arguidos BB e GG:
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, relativo à instrumentalização das contas de KK e de GG para o pagamento, justificação e passagem de uma quantia de € 2.000.000,00, em co-autoria com os arguidos EE, FF, DD, AA e JJ, crime p. e p. no art. 368.º-A,- 1, 2 e 3 do Cod. Penal.
Arguida JJ:
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, relativo à instrumentalização das contas de KK e de GG para o pagamento, justificação e passagem de uma quantia de € 2.000.000,00, em co-autoria directa com o arguido DD e mediata com os arguidos AA, BB, EE, FF e GG, crime p. e p. no art. 368.º-A,- 1, 2 e 3 do Cod. Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, a titulo de cumplicidade e do qual é autor material o arguido DD, relativo à conversão dos fundos transferidos para a conta da entidade EMP09..., p. e p. no art. 368.ºA -1, 2 e 3 e no art. 27.º do Cod. Penal.
Arguida sociedade VALE DO LOBO RESORT TURÍSITICO DE LUXO SA:
Um CRIME DE FRAUDE FISCAL QUALIFICADA, relativo a IRS de 2009 de EE, em que se associou, em co-autoria, com a sociedade OCEANO CLUBE e com o arguido EE, crime p. e p. no art. 103.º-1 a) e b) e 104.º-1 d) e g) do RGIT;
Um CRIME DE FRAUDE FISCAL QUALIFICADA, relativo a IRS de 2009 de FF, em que se associou, em co-autoria, com a sociedade OCEANO CLUBE e com o mesmo arguido FF, crime p. e p. no art. 103.º-1 a) e b) e 104.º-1 d) e g) do RGIT.
Arguida sociedade OCEANO CLUBE EMPREENDIMENTOS TURÍSTICOS DO ALGARVE SA:
Um CRIME DE FRAUDE FISCAL QUALIFICADA, relativo a IRS de 2009 de EE, em que se associou, em co-autoria, com a sociedade VALE DO LOBO RTL e com o arguido EE, crime p. e p. no art. 103.º-1 a) e b) e 104.º-1 d) e g) do RGIT;
Um CRIME DE FRAUDE FISCAL QUALIFICADA, relativo a IRS de 2009 de FF, em que se associou, em co-autoria, com a sociedade VALE DO LOBO RTL e com o mesmo arguido FF, crime p. e p. no art. 103.º-1 a) e b) e 104.º-1 d) e g) do RGIT.
Arguida sociedade PEPELAN CONSULTORIA E GESTÃO SA:
Um CRIME DE FRAUDE FISCAL QUALIFICADA, relativo a IRC 2008, em co-autoria com EE, crime p. e p. no art. 103.º-1 a) e b) e 104.º-1 d) e g) do RGIT;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com EE, relativo ao montante da fraude fiscal supra e com a instrumentalização da entidade EMP10... LIMITED, p. e p. no art. 368.º-A – 1, 2 e 3 do Cod. Penal.
 CRIMES RELACIONADOS COM OS FACTOS QUE ENVOLVEM A PORTUGAL TELECOM E OS INTERESSES DO SEU ACCIONISTA BES DETERMINADOS PELO ARGUIDO CC
Aqui, e sem prejuízo de alguns dos crimes a seguir referidos, por contenderem igualmente com os negócios / movimentações financeiras que envolveram o GRUPO LENA, terem já acima sido elencados no anterior ponto anterior dos autos resulta suficientemente indiciada a prática de factos relativos à PORTUGAL TELECOM consubstanciadores dos seguintes crimes pelos quais os arguidos que se passam a identificar deverão ser pronunciados:
- Arguido CC:
Um CRIME DE CORRUPCÃO ACTIVA DE TITULAR DE CARGO POLÍTICO, relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES no que concerne aos pagamentos efectuados ao arguido AA, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 1°, 2°, 3°, n.° 1, alínea d), 18°, n.° 1 e 19°, n.°s 2 e 3 da Lei 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n° 4/2013, de 14/01 - Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos, em concurso de normas com os arts. 374.º-1 e 374º-A, n.º 2 do Cod. Penal, com referência aos arts. 202°, al. b) e 386°, n.° 4, do mesmo diploma legal na versão da Lei 4/2011, de 16/02;
Dois CRIMES DE CORRUPCÃO ACTIVA, relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES no que concerne aos pagamentos efectuados aos arguidos RR e SS, crimes p. e p. pelos arts. 374°, n.° 1 e 374°-A, n.°s 2 e 3 do Cód. Penal, com referência aos arts. 202°, al. b) e 386°, n.° 2 do mesmo diploma legal na versão da Lei 4/2011, de 16/02;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos AA, HH, BB e II, relativamente à utilização, entre 2006 e 2008, de contas na ... em que este último era autorizado e operações financeiras realizadas a partir das mesmas, crime p. e p. pelo art.368°-A, n.° 1, 2 e 3 do Código Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos AA, HH, II e BB, relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados no ano de 2007 e até ao início de 2008, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, crime p. e p. pelo art. 368°-A, n° 1, 2 e 3 do Código Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos AA, HH, BB e GG, relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados a partir de Abril de 2008, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES e com intervenção das contas do arguido GG, crime p. e p. pelo art.368°-A, n.° 1, 2 e 3 do Código Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos AA, HH, GG, BB e com as sociedades LEC SA, LEC SGPS, LENA SGPS e XLM, relativamente aos movimentos financeiros abrangidos pela operação CEL_2010, ocorridos a partir de 2010, justificados através de contrato promessa de compra e venda com perda de sinal referente ao imóvel ..., sito em ..., e introdução desses fundos no GRUPO LENA, crime p. e p. pelo art.368°-A, n.° 1, 2 e 3 do Código Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com o arguido RR, relativamente aos pagamentos PT e CEL_2010, realizados entre 7 de Dezembro de 2007 e 20 de Setembro de 2011, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, crime p. e p. pelo art.368°-A, n° 1, 2 e 3 do Código Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com o arguido SS, relativamente aos pagamentos PT e CEL_2010, realizados entre 9 de Julho de 2007 e 23 de Novembro de 2012, com origem em conta da ... na ES ENTERPRISES e com destino para as contas da ... deste último arguido, crime p. e p. pelo art. 368°-A n.° 1, 2 e 3 do Código Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com o arguido HH, relativamente à transferência de €2.750.000, com origem em conta da ES ENTERPRISES na ..., de conta titulada pela sociedade EMP04... na ..., controlada pelo arguido HH, para conta do CRÉDIT SUISSE, titulada pela sociedade em offshore EMP03..., controlada por si, em Novembro de 2011, crime p. e p. pelo art. 368°-A, n.° 1, 2 e 3 do Código Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com o arguido SS, relativamente à transferência de €3.967.611,00 (CHF 4.900.000,00), com origem em conta do banco PICTET titulada por este último e com destino a conta do Banco LOMBARD ODIER titulada pela sociedade em offshore EMP05..., controlada pelo arguido CC, em 22 de Novembro de 2011, crime p. e p. pelo art. 368°A, n.° 1, 2 e 3 do Cód. Penal;
Um CRIME DE FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO, em co-autoria com o arguido HH, relativamente à elaboração e uso de contrato justificativo dos pagamentos CEL_2010 realizados através das contas da ... de HH (“JUSTIFICATIVOS DOS PAGAMENTOS CEL 2010 - HH”) cujo objecto se referia à prestação de serviços no ... e em outros países ..., p. e p. pelo art.256°, n.° 1, alíneas a), d) e) do Código Penal;
Um CRIME DE FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO, em co-autoria com os arguidos AA, BB, HH e GG, relativamente aos factos referentes ao conjunto de documentos que incluem o contrato promessa de compra e venda de imóvel em ..., denominado ..., contrato de intermediação EMP02... e XLM, cartas de admissão do seu incumprimento e perda de sinal e celebração de segundo contrato de prestação de serviços entre a LEC e a XLM, bem como facturas e outra documentação produzida ao abrigo destes contratos, factos ocorridos a partir de 2010, p. e p. pelo art. 256°, n.° 1, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
Um CRIME DE FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO, em co-autoria com o arguido RR, relativamente à elaboração e uso de contrato justificativo dos pagamentos PT e CEL_2010 efectuados ao arguido RR, crime p. e p. pelo art. 256°, n.° 1, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
Um CRIME DE FRAUDE FISCAL QUALIFICADA, de que foi beneficiário, no que tange ao IRS apurado quanto ao ano de 2011, em co-autoria com o arguido SS, crime p. e p. pelos arts. 103°, n.º 1, al. a), e 104°, n.ºs 1, als. d) e f), e 3, do RGIT;
Um CRIME DE FRAUDE FISCAL QUALIFICADA, em co-autoria com o arguido HH, no que tange ao IRS apurado quanto ao ano de 2006 relativamente a este último, crime p. e p. pelos arts. 103°-1 als. a), b) e c) e 104°- 1 als. d), e), f) e g) do RGIT;
Um CRIME DE FRAUDE FISCAL QUALIFICADA, em co-autoria com o arguido HH, no que tange ao IRS apurado quanto ao ano de 2010 relativamente a este último, crime p. e p. pelos arts. 103°-1, als. a), b) e c) e 104°- 1 als. d), e), f) e g) do RGIT.
Arguido AA:
Um CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA PARA A PRÁTICA DE ACTOS CONTRÁRIOS AOS DEVERES DO CARGO, QUER COMO TITULAR DE CARGO POLÍTICO, QUER COMO FUNCIONÁRIO, com referência a actos praticados no interesse do arguido CC, relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 1°, 2°, 3°, n.° 1, alínea d), 17°, n.° 1 e 19°, n.°s 2 e 3 da Lei 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n° 4/2013, de 14/01 - Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos, e com referência ao art.º 202°, alínea b) do Código Penal, em concurso de normas com os art.ºs 373.º, n.º 1, 374-A, n.ºs 2 do Cod. Penal na versão da Lei 4/2011, de 16/02, com referência aos arts. 202°, al. b) e 386°, n.° 4, do mesmo diploma legal na versão da Lei 4/2011, de 16/02;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos CC, HH, BB e II, relativamente à utilização, entre 2006 e 2008, de contas na ... em que este último era autorizado e operações financeiras realizadas a partir das mesmas, crime p. e p. pelo art.368°-A, n.° 1, 2 e 3 do Código Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos CC, HH, II e BB relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados no ano de 2007 e até ao início de 2008, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, crime p. e p. pelo art.368°-A, n° 1, 2 e 3 do Código Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos CC, HH, BB e GG relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados a partir de Abril de 2008, com origem em conta na ... da ES ENTERPRISES e com intervenção das contas da ... do arguido GG, crime p. e p. pelo art.368°-A, n.° 1, 2 e 3 do Código Penal; (crime também acima elencado no ponto 7.1 do presente capítulo E.)
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos CC, HH, GG e BB e com as sociedades LEC SA, LEC SGPS, LENA SGPS e XLM, relativamente aos movimentos financeiros, ocorridos a partir de 2010, abrangidos pela operação CEL_2010, justificados através de contrato promessa de compra e venda com perda de sinal referente ao imóvel ..., sito em ..., e introdução desses fundos no GRUPO LENA, crime p. e p. pelo art.368°-A, n.° 1, 2 e 3 do Código Penal; (crime também acima elencado no ponto 7.1 do presente capítulo E.)
Um CRIME DE FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO, em co-autoria com os arguidos BB, CC, HH e GG, relativamente aos factos referentes ao conjunto de documentos que incluem o contrato promessa de compra e venda de imóvel em ..., denominado ..., contrato de intermediação EMP02... e XLM, cartas de admissão do seu incumprimento e perda de sinal e celebração de segundo contrato de prestação de serviços entre a LEC e a XLM, bem como facturas e outra documentação produzida ao abrigo destes contratos, factos ocorridos a partir de 2010, crime p. e p. pelo art.256°, n.° 1, alíneas a), d) e e) do Código Penal; (crime também acima elencado no ponto 7.1 do presente capítulo E.)
Um CRIME DE FRAUDE FISCAL QUALIFICADA, de que foi beneficiário, em co-autoria com o arguido BB, no que tange ao IRS apurado quanto aos anos de 2006 a 2009, crime p. e p. pelos arts. 103°, n.º 1, als. a), b) e c) e 104°- 1 d), e) e f) do RGIT; (crime também acima elencado no ponto 7.1 do presente capítulo E.)
Um CRIME DE FRAUDE FISCAL QUALIFICADA, de que foi beneficiário, em co autoria, com os arguidos GG, BB, LENA ENGENHARIA E CONSTRUÇÕES SA e XLM - SOCIEDADE DE ESTUDOS E PROJECTOS LDA, no que tange ao IRS apurado quanto aos anos de 2009 a 2012, crime p. e p. pelos arts. 103°- 1 a), b) e c) e 104°- 1 d), e) e f) e n.° 2 do RGIT, actualmente n.° 2 alínea a) do art. 104.° do RGIT; (crime também acima elencado no ponto 7.1 do presente capítulo E.)
Um CRIME DE FRAUDE FISCAL QUALIFICADA, de que foi beneficiário, em co-autoria, com os arguidos GG, BB, LENA ENGENHARIA E CONSTRUÇÕES SA e XLM - SOCIEDADE DE ESTUDOS E PROJECTOS LDA no que tange ao IRS apurado quanto aos anos de 2013 a 2015, crime p. e p. pelos arts. 103°- 1 a), b) e c) e 104°- 1 d), e) e n.° 2 alínea a) e n.° 3 do RGIT; (crime também acima elencado no ponto 7.1 do presente capítulo E.)
Arguido SS:
Um CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA, relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES no que concerne aos pagamentos recebidos do arguido CC com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts.374°, n.° 1, 374°- A, n.°s 2 e 3, e com referência aos arts.202°, al. b) e 386°, n.° 2, todos do Código Penal, na versão da Lei 4/2011, de 16/02;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com o arguido CC, relativamente aos pagamentos PT e CEL_2010, realizados entre 9 de Julho de 2007 e 23 de Novembro de 2012, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES e com destino para contas tituladas por si na ..., crime p. e p. pelo art.368°-A, n.° 1, 2 e 3 do Cód. Penal;
Um CRIME DE PECULATO, relativamente aos pagamentos efectuados pela PT à EMP06..., no período compreendido entre 30 de Julho de 2007 e 9 de Julho de 2008, no valor total de €618.310,00, crime p. e p. pelo art.375°, n.° 1 do Código Penal, com referência ao art.386°, n.° 1 e 2 do mesmo diploma legal;
Um CRIME DE ABUSO DE CONFIANÇA, em co-autoria com o arguido CC, relativamente à transferência de €3.967.611,00 (CHF 4.900.000,00), com origem em conta do banco PICTEC titulada pelo arguido SS e com destino a conta do Banco LOMBARD ODIER titulada pela sociedade em offshore EMP05..., controlada pelo arguido CC, em 22 de Novembro de 2011, crime p. e p. pelo art.205°, n.º 1 e n.°4, alínea b) do Código Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com o arguido CC, relativamente à transferência de €3.967.611,00 (CHF 4.900.000,00), com origem em conta do banco PICTET titulada pelo arguido SS e com destino a conta do Banco LOMBARD ODIER, titulada pela sociedade em offshore EMP05..., controlada pelo arguido CC, em 22 de Novembro de 2011, crime p. e p. pelo art.368°A, n.° 1, 2 e 3 do Cód. Penal;
Um CRIME DE FRAUDE FISCAL QUALIFICADA, no que tange ao IRS apurado quanto ao ano de 2007 de que foi beneficiário, crime p. e p. pelos arts. 103°¬1 a), e 104°- 1 d) e f) do RGIT;
Um CRIME DE FRAUDE FISCAL QUALIFICADA, no que tange ao IRS apurado quanto aos anos de 2010 a 2012 de que foi beneficiário, crime p. e p. pelos arts. 103°- 1 a), e 104°- 1 d), e f) e 3do RGIT;
Um CRIME DE FRAUDE FISCAL QUALIFICADA, em co-autoria com o arguido CC, no que tange ao IRS apurado quanto ao ano de 2011, crime p. e p. pelos arts. 103°-1 a), e 104°- 1 d), e f) e 3 do RGIT.
Arguido RR:
Um CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA, relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES no que concerne aos pagamentos recebidos do arguido CC com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts.374°, n.° 1, 374°- A, n.°s 2 e 3, e com referência aos arts.202°, al. b) e 386°, n.° 2, todos do Código Penal, na versão da Lei 4/2011, de 16/02;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com o arguido CC, relativamente aos pagamentos PT e CEL_2010, recebidos entre 7 de Dezembro de 2007 e 20 de Setembro de 2011 com origem na ES ENTERPRISES, crime p. e p. pelo art.368°-A, n.° 1, 2 e 3 do Código Penal;
Um CRIME DE FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO, em co-autoria com o arguido CC, relativamente à elaboração e uso de contrato justificativo dos pagamentos PT e CEL-2010 (“JUSTIFICATIVOS DOS PAGAMENTOS PT E CEL_20I0 - RR”) efectuados ao arguido RR, crime p. e p. pelo art.256°, n.° 1, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
Um CRIME DE FRAUDE FISCAL QUALIFICADA, no que tange ao IRS apurado quanto ao ano de 2011 de que foi beneficiário, crime p. e p. pelos arts. 103°, n.º 1, al. a) e 104°, n.ºs 1, als. d) e f), e 3, do RGIT;
Arguido II:
Um CRIME DE BRANOUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos AA, CC, HH e BB, relativamente à utilização das contas em que o mesmo era autorizado na ... e operações realizadas a partir das mesmas entre 2006 e 2008, crime p. e p. pelo art.368°-A, n.° 1, 2 e 3 do Código Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos AA, CC, HH e BB relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados no ano de 2007 e até ao início de 2008, a partir de conta da ... da ES ENTERPRISES, crime p. e p. pelo art.368°-A, n° 1, 2 e 3 do Código Penal;
Arguido HH:
Um CRIME DE ABUSO DE CONFIANÇA, em co-autoria com o arguido CC, relativamente à transferência de €2.750.000,00 com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, de conta titulada pela sociedade EMP04... na ..., controlada por si, para conta do CRÉDIT SUISSE, titulada pela sociedade em offshore EMP03..., controlada pelo arguido CC, em Novembro de 2011, crime p. e p. pelo art.205°, n.° 1 e n.° 4, alínea b) do Cód. Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos AA, CC, II e BB relativamente à utilização das contas em que II era autorizado na ... e operações realizadas a partir das mesmas entre 2006 e 2008, crime p. e p. pelo art.368°-A, n.° 1, 2 e 3 do Código Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos AA, CC, II e BB relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados no ano de 2007 e até ao início de 2008, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, crime p. e p. pelo art.368°-A, n° 1, 2 e 3 do Código Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos AA, CC, BB e GG relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados a partir de Abril de 2008, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES com intervenção das contas do arguido GG, crime p. e p. pelo art.368°-A, n.° 1, 2 e 3 do Código Penal; (crime também acima elencado no ponto 7.1 do presente capítulo E.)
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos AA, CC, GG, BB e com as sociedades LEC SA, LEC SGPS, LENA SGPS e XLM, relativamente aos movimentos financeiros abrangidos pela operação CEL_2010, ocorridos a partir de 2010, justificados através de contrato promessa de compra e venda com perda de sinal referente ao imóvel ..., sito em ..., e introdução desses fundos no GRUPO LENA, crime p. e p. pelo art.368°-A, n.° 1, 2 e 3 do Código Penal; (crime também acima elencado no ponto 7.1 do presente capítulo E.)
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com o arguido CC, relativamente à transferência de €2.750.000, com origem em conta da ES ENTERPRISES na ..., de conta titulada pela sociedade EMP04... na ..., controlada por si, para conta do CRÉDIT SUISSE, titulada pela sociedade em offshore EMP03..., controlada pelo arguido CC, em Novembro de 2011, crime p. e p. pelo art. 368°-A, n.° 1, 2 e 3 do Código Penal;
Um CRIME DE FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO, em co-autoria com o arguido CC, relativamente à elaboração e uso de contrato justificativo dos pagamentos CEL_2010 realizados através das contas da ... de HH (“JUSTIFICATIVOS DOS PAGAMENTOS CEL 2010 - HH”), cujo objecto se referia à prestação de serviços no ... e em outros países ..., crime p. e p. pelo art.256°, n.° 1, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
Um CRIME DE FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO, em co-autoria com os arguidos AA, BB, CC e GG, relativamente aos factos referentes ao conjunto de documentos que incluem o contrato promessa de compra e venda de imóvel em ..., denominado ..., contrato de intermediação EMP02... e XLM, cartas de admissão do seu incumprimento e perda de sinal e celebração de segundo contrato de prestação de serviços entre a LEC e a XLM, bem como facturas e outra documentação produzida ao abrigo destes contratos, factos ocorridos a partir de 2010, crime p. e p. pelo art.256°, n.º 1, alíneas a), d) e e) do Código Penal; (crime também acima elencado no ponto 7.1 do presente capítulo E.)
Um CRIME DE FRAUDE FISCAL QUALIFICADA, de que foi beneficiário, em co-autoria com o arguido CC, no que tange ao IRS apurado quanto ao ano de 2006, crime p. e p. pelos arts. 103°-1 a), b) e c) e 104°- 1 d), e), f) e g) do RGIT;
UM CRIME DE FRAUDE FISCAL QUALIFICADA, de que foi beneficiário, em co-autoria com o arguido CC, no que tange ao IRS apurado quanto ao ano de 2010, crime p. e p. pelos arts. 103°-1 a), b) e c) e 104°- 1 d), e), f) e g) do RGIT;
Arguido BB:
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos AA, CC, HH e II, relativamente à utilização, entre 2006 e 2008, das contas na ... em que este último era autorizado e operações financeiras realizadas a partir das mesmas, crime p. e p. pelo art.368°-A, n.° 1, 2 e 3 do Código Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos AA, CC, HH e II relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados no ano de 2007 e até ao início de 2008, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, crime p. e p. pelo art.368°-A, n° 1, 2 e 3 do Código Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos AA, CC, HH e GG relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados a partir de Abril de 2008, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES com intervenção das contas da ... do arguido GG, crime p. e p. pelo art.368°-A, n.° 1, 2 e 3 do Código Penal; (crime também acima elencado no ponto 7.1 do presente capítulo E.)
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos AA, CC, HH e GG e pelas sociedades LEC SA, LEC SGPS, LENA SGPS e XLM, relativamente aos movimentos financeiros, ocorridos a partir de 2010, abrangidos pela operação CEL_2010, ocorridos a partir de 2010 e justificados através de contrato promessa de compra e venda com perda de sinal referente ao imóvel ..., sito em ..., e introdução desses fundos no GRUPO LENA, crime p. e p. pelo art.368°-A, n.° 1, 2 e 3 do Código Penal; (crime também acima elencado no ponto 7.1 do presente capítulo E.)
Um CRIME DE FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO, em co-autoria com os arguidos AA, CC, HH e GG, relativamente aos factos referentes ao conjunto de documentos que incluem o contrato promessa de compra e venda de imóvel em ..., denominado ..., contrato de intermediação EMP02... e XLM, cartas de admissão do seu incumprimento e perda de sinal e celebração de segundo contrato de prestação de serviços entre a LEC e a XLM, bem como facturas e outra documentação produzida ao abrigo desses contratos, crime p. e p. pelo art.256°, n.° 1, alíneas a), d) e e) do Código Penal; (crime também acima elencado no ponto 7.1 do presente capítulo E.)
Um CRIME DE FRAUDE FISCAL QUALIFICADA, em co-autoria com o arguido AA, no que tange ao IRS apurado relativamente a este último, quanto aos anos de 2006 a 2009, crime p. e p. pelos arts 103°-1 a), b) e c) e 104°- 1 d), e) e f) do RGIT; (crime também acima elencado no ponto 7.1 do presente capítulo E.)
Um CRIME DE FRAUDE FISCAL QUALIFICADA, em co-autoria com os arguidos AA, GG, LENA ENGENHARIA E CONSTRUÇÕES SA e XLM LDA, no que tange ao IRS apurado quanto aos anos de 2009 a 2012, relativamente ao arguido referido em primeiro lugar, crime p. e p. pelos arts. 103°- 1, als. a), b) e c) e 104°- 1, als. d), e) e f), e n.º 2, do RGIT, actualmente n.º 2, alínea a), do art.º 104.º, do RGIT; (crime também acima elencado no ponto 7.1 do presente capítulo E.)
Um CRIME DE FRAUDE FISCAL QUALIFICADA, em co-autoria com os arguidos AA, GG, LENA ENGENHARIA E CONSTRUÇÕES SA e XLM LDA, no que tange ao IRS apurado quanto aos anos de 2013 a 2015, relativamente ao arguido referido em primeiro lugar, crime p. e p. pelos arts. 103°- 1, als. a), b) e c) e 104°- 1, als. d), e e), n.º 2, alínea a) e n.º 3 do RGIT. (crime também acima elencado no ponto 7.1 do presente capítulo E.)
Arguido GG:
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos AA, CC, HH, BB e com as sociedades LEC SA., LEC SGPS, LENA SGPS e XLM relativamente aos movimentos financeiros, ocorridos a partir de 2010, abrangidos pela operação CEL_2010 e justificados através de contrato promessa de compra e venda com perda de sinal referente ao imóvel ..., sito em ..., e introdução desses fundos no GRUPO LENA, crime p. e p. pelo art.º 368°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal; (crime também acima elencado no ponto 7.1 do presente capítulo E.)
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos AA, BB, CC e HH relativamente aos movimentos financeiros abrangidos pelos contratos EMP01... realizados a partir de Abril de 2008 com origem na conta da ES ENTERPRISES com intervenção das contas do arguido GG, crime p. e p. pelo art.368°-A, n.°s 1, 2 e 3 do Código Penal; (crime também acima elencado no ponto 7.1 do presente capítulo E.)
Um CRIME DE FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO, em co-autoria com os arguidos AA, BB, CC e HH, relativamente ao conjunto de documentos que incluem o contrato promessa de compra e venda de imóvel em ..., denominado ..., contrato de intermediação EMP02... e XLM, cartas de admissão do seu incumprimento e perda de sinal e celebração de segundo contrato de prestação de serviços entre a LEC e a XLM, bem como facturas e outra documentação produzida ao abrigo destes contratos, factos ocorridos a partir de 2010, crime p. e p. pelo art.256°, n.º 1, alíneas a), d) e e) do Código Penal; (crime também acima elencado no ponto 7.1 do presente capítulo E.)
Um CRIME DE FRAUDE FISCAL QUALIFICADA, em co-autoria com os arguidos AA, BB, LENA ENGENHARIA E CONSTRUÇÕES SA e XLM - SOCIEDADE DE ESTUDOS E PROJECTOS LDA, no que tange ao IRS apurado quanto aos anos de 2009 a 2012, relativamente ao arguido referido em primeiro lugar, crime p. e p. pelos arts. 103°-1 a), b) e c) e 104°- 1 d), e) e f) e n.° 2 do RGIT, actualmente n.° 2 a) do art. 104.° do RGIT; (crime também acima elencado no ponto 7.1 do presente capítulo E.)
Um CRIME DE FRAUDE FISCAL QUALIFICADA, em co-autoria, com os arguidos AA, BB, LENA ENGENHARIA E CONSTRUÇÕES SA e XLM - SOCIEDADE DE ESTUDOS E PROJECTOS LDA, no que tange ao IRS apurado quanto aos anos de 2013 a 2015, relativamente ao arguido referido em primeiro lugar, crime p. e p. pelos arts. 103°- 1 a), b) e c) e 104°- 1 d), e) e n.° 2 a) e n.°3 do RGIT. (crime também acima elencado no ponto 7.1 do presente capítulo E.)
Sociedade arguida LENA ENGENHARIA E CONSTRUÇÕES SA:
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos AA, CC, HH, GG e BB e com as sociedades LEC SGPS, LENA SGPS e XLM, relativamente aos movimentos financeiros abrangidos pela operação CEL_2010, ocorridos a partir de 2010, justificados através de contrato promessa de compra e venda com perda de sinal referente ao imóvel ..., sito em ..., e introdução desses fundos no GRUPO LENA, crime p. e p. pelo art.368°-A, n.° 1, 2 e 3 do Código Penal, com referência ao art. 11°, n.° 2 do mesmo diploma legal; (crime também acima elencado no ponto 7.1 do presente capítulo E.)
Um CRIME DE FRAUDE FISCAL QUALIFICADA, em co-autoria com os arguidos AA, BB, GG e XLM - SOCIEDADE DE ESTUDOS E PROJECTOS LDA, no que tange ao IRS apurado quanto aos anos de 2009 a 2012, relativamente ao arguido referido em primeiro lugar, crime p. e p. pelos arts. 103°-1 a), b) e c) e 104°- 1 d), e) e f) e n.° 2 do RGIT, actualmente n.° 2 a) do art.° 104.° do RGIT e art.° 7.° do mesmo diploma legal; (crime também acima elencado no ponto 7.1 do presente capítulo E.)
Um CRIME DE FRAUDE FISCAL QUALIFICADA, em co-autoria, com os arguidos AA, BB, GG e XLM - SOCIEDADE DE ESTUDOS E PROJECTOS LDA, no que tange ao IRS apurado quanto aos anos de 2013 a 2015, relativamente ao arguido referido em primeiro lugar, crime p. e p. pelos arts. 103.°-1 a), b) e c) e 104.°- 1 d), e) e n.° 2 a) e n.°3 do RGIT e art.° 7.° do mesmo diploma legal. (crime também acima elencado no ponto 7.1 do presente capítulo E.)
Sociedade arguida LENA ENGENHARIA E CONSTRUÇÃO SGPS:
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos AA, CC, HH, GG e BB e com as sociedades LEC SA, LENA SGPS e XLM, relativamente aos movimentos financeiros abrangidos pela operação CEL_2010, ocorridos a partir de 2010, justificados através de contrato promessa de compra e venda com perda de sinal referente ao imóvel ..., sito em ..., e introdução desses fundos no GRUPO LENA, crime p. e p. pelo art.368°-A, n.° 1, 2 e 3 do Código Penal, com referência ao art.º 11°, n.° 2 do mesmo diploma legal. (crime também acima elencado no ponto 7.1 do presente capítulo E.)
Sociedade arguida LENA SGPS:
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos AA, CC, HH, GG e BB e com as sociedades LEC SA, LEC SGPS e XLM, relativamente aos movimentos financeiros abrangidos pela operação CEL 2010, ocorridos a partir de 2010, justificados através de contrato promessa de compra e venda com perda de sinal referente ao imóvel ..., sito em ..., e introdução desses fundos no GRUPO LENA, crime p. e p. pelo art.368°-A, n.° 1, 2 e 3 do Código Penal, com referência ao art.º 11°, n.° 2 do mesmo diploma legal. (crime também acima elencado no ponto 7.1 do presente capítulo E.)
Sociedade arguida XLM – SOCIEDADE DE ESTUDOS E PROJECTOS LDA:
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com os arguidos AA, CC, HH, GG e BB e com as sociedades LEC SA, LEC SGPS e LENA SGPS, relativamente aos movimentos financeiros abrangidos pela operação CEL_2010, ocorridos a partir de 2010, justificados através de contrato promessa de compra e venda com perda de sinal referente ao imóvel ..., sito em ..., e introdução desses fundos no GRUPO LENA, crime p. e p. pelo art.º 368°-A, n.°s 1, 2 e 3 do Código Penal, com referência ao art.º 11°, n.° 2 do mesmo diploma legal. (crime também acima elencado no ponto 7.1 do presente capítulo E.)
OUTROS CRIMES
Arguido AA:
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com o arguido BB, relativamente à concentração dos fundos em novas contas bancárias na ..., tituladas por sociedades em off-shore e sua transferência para contas em Portugal, ao abrigo do RERT II, crime p. e p, no art. 368.º-A, nº 1, 2 e 3 do Cod. Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS em co-autoria com o arguido BB, relativamente à dissipação dos fundos por outras contas em Portugal, da titularidade do mesmo BB, e à confusão de patrimónios de ambos os arguidos nessas contas bancárias, crime p. e p, no art. 368.º-A, nº 1, 2 e 3 do Cod. Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS em co-autoria com os arguidos BB e LL, quanto à aquisição de imóveis em Portugal, com o retorno do preço pago para a esfera patrimonial do arguido AA, factos ocorridos entre 2010 e 2012, crime p. e p, no art. 368.º-A, nº 1, 2 e 3 do Cod. Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS em co-autoria com os arguidos BB e LL, quanto à aquisição de um imóvel em ..., com a intenção de ocultação da titularidade do activo, crime p. e p, no art. 368.º-A, nº 1, 2 e 3 do Cod. Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS em co-autoria com os arguidos BB e LL, relativo à entrega por BB de quantias pertencente ao arguido AA para depósito em contas bancárias e em cofre bancário onde figurava como titular LL, de forma a ocultar a propriedade desses montantes, crime p. e p, no art. 368.°-A, n° 1, 2 e 3 do Cod. Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS em co-autoria com BB e UU, relativo à utilização de contas bancárias tituladas por este último, em Portugal, como contas de passagem de fundos de origem ilícita entregues pelo arguido BB e destinados à esfera patrimonial de AA, operações ocorridas entre 2011 e 2014, crime p. e p, no art. 368.°-A, n° 1, 2 e 3 do Cod. Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS em co-autoria com os arguidos BB e MM, relativamente à aquisição de um imóvel designado de “Monte ..., com a montagem de operação de financiamento e de suporte das prestações bancárias, destinado a integrar o património familiar do arguido AA, factos ocorridos entre 2011 e 2014, crime p. e p, no art. 368.°-A, n° 1, 2 e 3 do Cod. Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS em co-autoria com os arguidos BB e TT, relativamente à utilização de contas bancárias de TT junto do MONTEPIO GERAL e à recepção de fundos provenientes de BB para entrega ao arguido AA, com ocultação da titularidade dos montantes, crime p. e p, no art. 368.°-A, n° 1, 2 e 3 do Cod. Penal.
Arguido BB:
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria com o arguido AA, relativamente à concentração dos fundos em novas contas bancárias na ..., tituladas por sociedades em off-shore e sua transferência para contas em Portugal, ao abrigo do RERT II, crime p. e p, no art. 368.°-A, n° 1, 2 e 3 do Cod. Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS em co-autoria com o arguido AA, relativamente à dissipação dos fundos por outras contas em Portugal, da titularidade do mesmo BB, e à confusão de patrimónios de ambos os arguidos nessas contas bancárias, crime p. e p, no art. 368.°-A, n° 1, 2 e 3 do Cod. Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS em co-autoria com os arguidos AA e LL, quanto à aquisição de imóveis em Portugal, com o retorno do preço pago para a esfera patrimonial do arguido AA, factos ocorridos entre 2010 e 2012, crime p. e p, no art. 368.°-A, n° 1, 2 e 3 do Cod. Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS em co-autoria com os arguidos AA e LL, quanto à aquisição de um imóvel em ..., com a intenção de ocultação da titularidade do activo, crime p. e p, no art. 368.°-A, n° 1, 2 e 3 do Cod. Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS em co-autoria com os arguidos AA e LL, relativo à entrega por BB de quantias pertencente ao arguido AA para depósito em contas bancárias e em cofre bancário onde figurava como titular LL, de forma a ocultar a propriedade desses montantes, crime p. e p, no art. 368.°-A, n° 1, 2 e 3 do Cod. Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS em co-autoria com AA e UU, relativo à utilização de contas bancárias tituladas por este último, em Portugal, como contas de passagem de fundos de origem ilícita entregues pelo arguido BB e destinados à esfera patrimonial de AA, operações ocorridas entre 2011 e 2014, crime p. e p, no art. 368.°-A, n° 1, 2 e 3 do Cod. Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS em co-autoria com os arguidos AA e MM, relativamente à aquisição de um imóvel designado de “Monte ..., com a montagem de operação de financiamento e de suporte das prestações bancárias, destinado a integrar o património familiar do arguido AA, factos ocorridos entre 2011 e 2014, crime p. e p, no art. 368.°-A, n° 1, 2 e 3 do Cod. Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS em co-autoria com os arguidos AA e TT, relativamente à utilização de contas bancárias de TT junto do MONTEPIO GERAL e à recepção de fundos provenientes do mesmo BB para entrega ao arguido AA, com ocultação da titularidade dos montantes, crime p. e p, no art. 368.°-A, n° 1, 2 e 3 do Cod. Penal.
Arguido LL:
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS em co-autoria com os arguidos AA e BB, quanto à aquisição de imóveis em Portugal, com o retorno do preço pago para a esfera patrimonial do arguido AA, factos ocorridos entre 2010 e 2012, crime p. e p, no art. 368.°-A, n° 1, 2 e 3 do Cod. Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS em co-autoria com os arguidos AA e BB, quanto à aquisição de um imóvel em ..., com a intenção de ocultação da titularidade do activo, crime p. e p, no art. 368.º-A, nº 1, 2 e 3 do Cod. Penal;
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS em co-autoria com os arguidos AA e BB, relativo à entrega pelo mesmo BB de quantias pertencente ao arguido AA para depósito em contas bancárias e em cofre bancário onde figurava como titular LL, de forma a ocultar a propriedade desses montantes, crime p. e p, no art. 368.º-A, nº 1, 2 e 3 do Cod. Penal;
Um CRIME DE FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO, em co-autoria com os arguidos BB e AA, relativamente à produção e uso de documentos relativos à aquisição e subsequente arrendamento do imóvel sito em ..., crime p. e p. no art. 256.º nº1 a), d) e e) do Cod, Penal.          
Arguido UU:
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS em co-autoria com AA e BB, relativo à utilização de contas bancárias tituladas por UU, em Portugal, como contas de passagem de fundos de origem ilícita entregues pelo arguido BB e destinados à esfera patrimonial de AA, operações ocorridas entre 2011 e 2014, crime p. e p, no art. 368.º-A, nº 1, 2 e 3 do Cod. Penal.
Arguida TT:
Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS em co-autoria com os arguidos BB e AA, relativamente à utilização de contas bancárias da mesma TT, junto do MONTEPIO GERAL, e à recepção de fundos provenientes de BB para entrega ao arguido AA, com ocultação da titularidade dos montantes, crime p. e p, no art. 368.º-A, nº 1, 2 e 3 do Cod. Penal.
**
Note-se que, em face da Decisão Instrutória, o MP conformou-se (não tendo recorrido) com a não pronúncia dos crimes:
- CRIME DE CORRUPÇÃO ACTIVA PRATICADO PELA ARGUIDA XMI relativamente à pessoa do arguido QQ, com referência a factos ocorridos nos anos de 2007 a 2009, crime p. e p. pelo art.º 374. °, n.º 1 do Código Penal;
-  CRIME DE BRANQUEAMENTO PRATICADO PELA ARGUIDA XMI relativamente a utilização desta sociedade e sua contabilidade para a colocação de fundos na esfera patrimonial do arguido QQ, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal)
- UM CRIME DE FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO IMPUTADO A AA EM CO-AUTORIA COM O ARGUIDO BB, relativamente à declaração de adesão ao RERT II e outra documentação produzida e utilizada para esse efeito no que se reporta à titularidade dos elementos patrimoniais declarados, concentrados nas contas da ... até final do ano de 2010, crime p. e p. pelo art.º 256.º, n.º 1, alíneas a), d) e e) do Código Penal,
-UM CRIME DE FRAUDE FISCAL SIMPLES IMPUTADO AO ARGUIDO RR, (relativo ao IRS de 2007), p. e p. pelos arts. l03°-l a) do RGIT.
- UM CRIME DE FRAUDE FISCAL PRATICADO, EM CO-AUTORIA, PELOS ARGUIDOS FF, EE e às sociedades “Vale do Lobo Resort Turístico de Luxo, SA” e “Oceano Clube Empreendimentos Turísticos do Algarve, SA”,  no que tange ao IRC apurado quanto ao ano de 2007 da sociedade “Vale do Lobo Resort Turístico de Luxo, SA”, crime p. e p. pelos arts. l03°-l a), do RGIT.
- UM CRIME DE BRANQUEAMENTO IMPUTADO AO ARGUIDO CC,  relativamente a transferência de €4.000.000,00, com origem em conta da ES ENTERPRISES na ... para conta do CREDIT SUISSE, titulada pela sociedade em offshore EMP03..., controlada por CC, em 21 de Outubro de 2011, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal.
O Ministério público aceitou, ainda, a nulidade dos despachos judiciais constantes de fls. 15883 (Apenso de Busca 73), fls. 15560 (Apenso de Busca 69), fls. 19716 (Apenso de Busca 72-A), fls. 38132 (Apenso de Busca 164).
*
Os arguidos que responderam  ao recurso- anexo 2. (que faz integrante deste acórdão)

DATAFLS.ARGUIDO RESPONDENTEVOL.
30/08/202266391NN180º
07/12/202266558GG E GRUPO LENA180º
15/12/202266787LL180º
19/12/202266802RR181º
19/12/202266840MM181º
19/12/202266855PARECER de GG e Grupo LENA181º
19/12/202266877PP e QQ181º
20/12/202266897VALE DO LOBO, S.A.           e     OCEANO CLUBE, S.A.181º
21/12/202266961FF181º
21/12/202267211SS182º
21/12/202267522HH183º
21/12/202267580JJ183º
22/12/202267758EE e PEPELAN, SA184º
03/01/202367915Requerimento RR em complemento à resposta184º
04/01/202367926DD184º
06/01/202367955II184º
06/01/202367994TT184º
06/01/202368009BB185º
06/01/202368270AA 186º

Já nesta Relação, o Ex. Sr. Procurador Geral Adjunto apresentou Parecer, sendo que, no que em particularmente importa, aderiu às alegações do recurso apresentadas pelo Ministério Público da primeira instância considerando que o tribunal recorrido apreciou incorrectamente os factos imputados aos Recorridos e sustentou que os factos se mostram como suficientemente indiciados relativamente ao Grupo Lena, ao Grupo Vale do Lobo e à Portugal Telecom e ao GES, desconsiderando os crimes relativamente aos quais terá ocorrido, entretanto ,a prescrição do procedimento criminal e os crimes já objecto de decisões de pronúncia que se encontram em fase de julgamento e ainda face à extinção e liquidação da sociedade XMI Management & Investments SA e considerando as alterações de qualificação jurídica que devem ser operadas, sustenta a procedência do recurso e, consequentemente, a revogação da Decisão Instrutória na parte relativa à Não Pronúncia e a sua substituição por outra que abranja os crimes referidos no ponto 7 do Capítulo e da Motivação de Recurso (Os factos pronunciados, sob recurso, e os que devem ser pronunciados) matéria dada como reproduzida na conclusão 2255 das conclusões formuladas Cfr.  anexo 3 (que faz integrante deste acórdão)
*
Cumprido o art. 417º, nº 2, do CPP houve respostas ao Parecer- anexo 4 (que faz integrante deste acórdão)
*
Colhidos os vistos, o processo foi presente à Conferência.

2. FUNDAMENTAÇÃO
**
1.1 Delimitação do Objecto do Recurso
Como tem sido entendimento unânime, o objecto do recurso e os poderes de cognição do tribunal da Relação definem-se pelas conclusões que o recorrente extrai da respectiva motivação, onde deve sintetizar as razões da discordância do decidido e resumir as razões do pedido - artigos 402º, 403.º e 412.º, n.º 1 do Código de Processo Penal -  naturalmente que sem prejuízo das matérias de conhecimento oficioso (cfr. Silva, Germano Marques, Curso de Processo Penal, Vol. III, 1994, p. 320; Albuquerque, Pinto de, Comentário do Código de Processo Penal, 3ª ed. 2009, pag 1027 e 1122, Santos, Simas, Recursos em Processo Penal, 7.ª ed., 2008, p. 103; entre outros os Acs. do S.T.J., de 25.6.1998, in B.M.J. 478, p. 242; de 3.2.1999, in B.M.J. 484, p. 271; de 28.04.1999, CJ/STJ, Ano VII, Tomo II, p. 196).
No caso vertente, em face das conclusões do recurso, são as seguintes as questões a apreciar:

a. TEMAS SOBRE A RECOLHA DA PROVA/NULIDADES
- A NULIDADE DOS ACTOS JURISDICIONAIS PRATICADOS PELO TCIC NO ÂMBITO DO PROCESSO 7406/14.... APÓS A DECLARAÇÃO DA INCOMPETÊNCIA DO TCIC
- UTILIZAÇÃO DOS RERT ( REGIME ESPECIAL DE REGULARIZAÇÃO TRIBUTÁRIA)
- OS PROCEDIMENTOS DE PREVENÇÃO DE BRANQUEAMENTO     
- UTILIZAÇÃO DE ESCUTAS TELEFÓNICAS DE OUTROS PROCESSOS
- O VARRIMENTO ELECTRÓNICO
- VALIDADE DA RECOLHA DE CORREIO ELECTRÓNICO
- DA NULIDADE PROCESSUAL RESULTANTE DO ARGUIDO SS NÃO TER SIDO OUVIDO SOBRE PARTE DE MATÉRIA CONSTANTE DA ACUSAÇÃO
B . OS CRIMES
- DOS CRIMES DE CORRUPÇÃO
- DA CONSUMAÇÃO
- DA QUALIFICAÇÃO
- DA PRESCRIÇÃO
- DOS INDÍCIOS
- DO CRIME DE PECULATO
- DOS CRIMES DE ABUSO DE CONFIANÇA
- DOS CRIMES DE BRANQUEAMENTO
- NULIDADES E FALTA DE COMPETÊNCIA INTERNACIONAL DOS TRIBUNAIS PORTUGUESES                                   
- DECISÃO DE NÃO PRONÚNCIA RELACIONADA COM OS ELEMENTOS OBJECTIVOS DO TIPO.
- DECISÃO DE NÃO PRONÚNCIA RELACIONADA COM OS ELEMENTOS SUBJECTIVOS DO TIPO
- DOS INDÍCIOS
- DOS CRIMES DE FALSIFICAÇÃO
- DOS CRIMES DE FRAUDE FISCAL
- DA UNIDADE OU PLURALIDADE DE INFRACÇÕES;
- DA QUALIFICAÇÃO DOS CRIMES;
- DA PRESCRIÇÃO DO PROCEDIMENTO CRIMINAL;
- DO DEVER JURÍDICO-TRIBUTÁRIO DE DECLARAÇÃO DE RENDIMENTOS DE PROVENIÊNCIA ILÍCITA:
- DO PREENCHIMENTO DOS PRESSUPOSTOS CONTIDOS NAS NORMAS DE INCIDÊNCIA APLICÁVEIS AOS RENDIMENTOS EM CAUSA;
- QUANTO AO ARGUIDO HH, DA OBTENÇÃO DOS RENDIMENTOS EM CAUSA EM TERRITÓRIO PORTUGUÊS;
- DA (NÃO) VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO “NEMO TENETUR SE IPSUM ACCUSARE”;
- DA RESPONSABILIDADE DAS PESSOAS COLECTIVAS;
- DA CO-AUTORIA;
- DOS INDÍCIOS.

NOTAS PRÉVIAS
Perante um recurso de uma decisão de não pronúncia, em que se pretende decidir se o processo deve ou não ir a julgamento e em que termos ( sem prejuízo dos casos em que, por falta de indícios ou porque as soluções das questões já estão  devidamente assentes na comunidade jurídica , seja evidente a não pronúncia) o tribunal terá sempre em conta as várias soluções plausíveis de Direito.
*
Em primeiro lugar trataremos de todas as questões teóricas relacionadas com cada tipo de crime e prova.
Conheceremos do recurso por referência ao tipo de crime e não aos arguidos, pela simples razão que as questões jurídicas serão conhecidas uma única vez.
*
Desde já avançamos que, em nosso entender, o MP não tem legitimidade, em sede de recurso de decisão de não pronúncia (como é o caso), para pedir a alteração da qualificação jurídica dos crimes por si acusados- tratava-se, pois, de uma segunda oportunidade dada ao acusador que não encontra fundamento em norma ou princípio legal.
Isto, sem prejuízo do tribunal poder/dever alterar a qualificação jurídica dada pelo acusador.
Da mesma forma, temos que entender que os arguidos, em sede de resposta a um recurso intentado pelo M.P. da decisão de não pronúncia, não têm legitimidade para suscitarem nenhuma nova questão, desde logo porque não são recorrentes.

*
No recurso interposto diz o Sr. Procurador que “Relativamente aos factos inicialmente objecto de acusação e que não foram objecto de pronúncia, ficam de fora do presente recurso os relativos à sociedade XMI MANAGEMENT & INVESTMENTS SA e os relativos aos arguidos CC, UU e DD, que foram objecto de pronuncia e separação de processos.
Já no que se refere aos factos pelos quais foram pronunciados os arguidos AA e BB, os mesmos serão considerados no presente recurso, na perspectiva de vir a ser reconhecida a nulidade dessa parte da pronúncia, para o que se encontram recursos interposto nestes autos, pelo Ministério Público e pelos arguidos, e que se poderá considerar como uma questão prévia ao presente recurso – na medida em que o reconhecimento da nulidade da pronúncia implicará o acréscimo de factos não pronunciados e alarga o objecto do presente recurso.”

APRECIANDO
De facto, como diz o Sr. Procurador, fica de fora do âmbito deste recurso a matéria relativa à sociedade XMI MANAGEMENT & INVESTMENTS SA ( julgada extinta) e aos arguidos CC, UU e DD, que foram objecto de pronúncia e separação de processos.
Não podemos concordar com o Sr. Procurador no que toca aos factos pronunciados  relativamente aos arguidos  AA e BB, dos quais há recurso pedindo a nulidade da pronúncia.
Independentemente da nossa opinião relativamente à bondade da separação dos processos, o certo é que  aquela existiu e, mesmo sendo procedente aquele recurso, tal implicará que o processo regresse à 1ª instância para nova decisão instrutória, não podendo este tribunal “ultrapassar” essa fase.
Haverá sempre a hipótese de, em caso de pronúncia, aqueles serem apensados a este processo na fase de julgamento.
O tribunal não terá em conta nenhum dos factos que constam da decisão de pronúncia.

1.2 TEMAS SOBRE A RECOLHA DA PROVA/NULIDADES

1.2.1 A NULIDADE DOS ACTOS JURISDICIONAIS PRATICADOS PELO TCIC NO ÂMBITO DO PROCESSO 7406/14.... APÓS A DECLARAÇÃO DA INCOMPETÊNCIA DO TCIC

TEMA EM DISCUSSÃO
Saber se, tendo havido um despacho do Sr. Juiz, na sequência de promoção do Ministério Público, considerando  que o TCIC ( Tribunal Central de Instrução Criminal) era incompetente para a tramitação dos actos jurisdicionais do processo ( ainda em fase de  inquérito)  em virtude da falta do pressuposto de dispersão processual, o mesmo Sr. Juiz podia ter  continuado a praticar actos, que considerou urgentes, antes da remessa do processo ao tribunal competente.

DECISÃO INSTRUTÓRIA
Em sede de Decisão Instruitória, foi proferida a seguinte decisão, que se transcreve nas partes relevantes:
 “(...) [A] decisão que declarou a incompetência deste TCIC, proferida no dia 18­-12-2014, por não ser susceptível de recurso, produziu caso julgado formal que se impôs ao próprio juiz que proferiu essa decisão. Esta decisão, para além de produzir efeito de caso julgado formal, fez esgotar o poder jurisdicional do JIC que se declarou incompetente.
Não há dúvida de que, proferido o despacho de incompetência, se esgota o poder jurisdicional do juiz, apenas este podendo praticar actos processuais urgentes, ou seja, actos relativos a arguidos detidos ou presos, ou indispensáveis à garantia da liberdade das pessoas ou a prática de actos absolutamente indispensáveis e inadiáveis relativos à aquisição da prova. É o que diz o nº 2 do artigo 33º do CPP: o tribunal declarado incompetente pratica os actos processuais urgentes.
(…)
Assim sendo, proferido o despacho de incompetência a 18-12-2014, a consequência que se impunha seria a remessa imediata dos actos ao tribunal considerado competente para a prática dos actos jurisdicionais.
Conforme resulta dos autos, não obstante a declaração de incompetência, o JIC do TCIC não só não ordenou a remessa dos autos ao tribunal considerado competente, como continuou a praticar actos processuais no processo até ao dia 22-4-2015.
Para além disso, cumpre referir que a invocada urgência não se mostra verificada, dado que não estavam em causa actos relacionados com arguidos detidos ou presos e nem estava em causa a prática de actos absolutamente inadiáveis relativos à aquisição da prova. Com efeito, no dia 18 de Dezembro de 2014, por ser uma Quinta-feira, era perfeitamente possível ter sido remetido o processo ao tribunal competente, também este localizado em .... Para além disso, o despacho de 18-12-2014 que ordenou a realização das buscas, agendou para o dia 6 de Janeiro de 2015 a realização das mesmas e não para o período das férias judiciais de 22-12-2014 a 03.01.2015. Por último, cumpre referir que, apesar das férias judiciais entre 22-12-2014 a 3-1- 2015 (artigo 28 da Lei 62/2013 de 26 de Agosto) existe, conforme impõe o artigo o artigo 36º da citada Lei, um juiz de turno para a prática dos actos de natureza urgente.
Deste modo, a mera cronologia dos acontecimentos demonstra que a alegada urgência é falaciosa e não se enquadra dentro daquilo que o legislador considerou como actos de natureza urgente.
(…)
Para além disso, cumpre referir que a incompetência do tribunal configura, em regra, uma nulidade insanável, de conhecimento oficioso e a todo o tempo até ao trânsito em julgado da decisão final, conforme resulta do artigo 119.º, alínea e), do CPP. Existe uma excepção a esta regra que é a incompetência em razão do território, a qual configura uma nulidade sanável – artigo 32º nº 2 do CPP.
(…)
Tendo em conta o caso concreto, verifica-se que, para além da falta de poder jurisdicional após 18-12-2014, existe, também, uma incompetência funcional e material do TCIC o que provoca uma nulidade insanável nos termos do artigo 119º e) do CPP.
(…)
Verifica-se, ainda, que os direitos fundamentais dos visados foram restringidos por um JIC que, como o próprio admitiu no despacho de fls. 57 proferido a 18­-12-2014, não cumpria os requisitos decorrentes do juiz natural. “
Decide a final o seguinte:
“Ao abrigo do disposto nos artigos 119.º, al. e) do CPP, 119.º e 120.º, n.º 1 da Lei 62/2013, de 26/08, 84.º, n.º 1, al. e) do D.L. n.º 49/2014, de 27/03, do princípio do juiz natural consagrado no artigo 32.º, n.º 9 da CRP, e artigo 6.º, n.º 1 da CEDH, declaro a nulidade insanável dos actos praticados pelo JIC do TCIC após o despacho que julgou verificada a incompetência do TCIC.
Em consequência, todos os actos jurisdicionais praticados pelo JIC do TCIC, e subsequente prova carreada para o apenso 7406/14...., após a sua declaração de incompetência material e funcional decretada em 18-12-2014, nomeadamente o despacho que ordenou a realização da busca às instalações da EMP11..., constante de fls. 57ss, o despacho que ordenou a apreensão de correspondência no âmbito da busca às instalações da PTSGPS, fls. 74, auto de busca e apreensão constante de fls. 87 relativo à busca às instalações da EMP11..., apreensão do correio electrónico efectuado no âmbito da busca às instalações da Portugal Telecom SGPS SA, constante do auto de apreensão de fls. 105ss, auto de abertura de correio electrónico constante de fls. 128, visualização de correio electrónico constante do despacho de fls. 131, despacho de fls. 161 relativo às gravações e transcrições recolhidas na busca à EMP11..., despachos de fls. 181, 198 e 206.»

O RECORRENTE
Insurge-se o recorrente contra esta decisão, requerendo a sua revogação, alegando, em síntese, que “todos os actos praticados pelo Juiz de Instrução do TCIC, após a declaração de incompetência, estão suportados em preceitos que determinam a extensão da competência judicial, primeiro com base na urgência, nos termos do art.° 33°-2 do CPP, e depois com base na dependência de uma decisão anterior, por força do disposto no art.° 179°-3 do Código de Processo Penal” e que “o Juiz de Instrução que veio a ser o competente, logo que chamado a intervir, compulsou os autos e não proferiu qualquer juízo negativo de anulação dos actos praticados no âmbito do TCIC”.

APRECIANDO
Cumpre considerar o seguinte iter processual:
-  Em 16.12.2014, o Ministério Público, a fls. 49 a 54, referindo que o processo havia sido remetido a este TCIC por lapso, suscitou a incompetência absoluta do TCIC, por inexistência de dispersão territorial da factualidade em causa jurídico-processualmente relevante, com remessa dos autos ao tribunal competente, e, simultaneamente, requereu ao TCIC a realização de diligência urgente (buscas) durante o período férias judiciais, ao abrigo do artigo 33.º, n.º 2 do CPP, e ainda autorização para apreensão das mensagens de correio electrónico ou registo comunicações natureza semelhante;
- Por despacho judicial de 18-12-2014, fls. 56 a 62, foi declarada a incompetência do Tribunal Central de Instrução Criminal, para a prática dos actos jurisdicionais no âmbito dos autos, e competente a Secção de Instrução Criminal ... do Tribunal da Comarca ....
Foi ainda decidido que:
“Não obstante o despacho supra, atenta a natureza urgente da diligência requerida pelo detentor da acção penal, que promove seja encetada sem as limitações impostas pelo período de férias judiciais que se avizinha, nos termos do disposto no n.° 2, do art.° 33.° do CPP, o JIC signatário, tomará, desde já, decisão, quanto ao promovido em “2”, da douta promoção vertente.
Assim:
Da autorização de realização de diligências de busca.(…)
Como aduzido pelo titular da acção penal, pese embora as diligências encetadas junto da EMP11... (EMP11...) e da Portugal Telecom, SGPS, SA (PT), não se logrou obter o relatório realizado pela EMP11... a pedido do conselho  de administração da PT, que visou a análise dos procedimentos e dos actos relativos às aplicações de tesouraria na EMP12..., SA.
Verifica-se, como referido pelo titular da acção penal que, o teor de tal relatório não foi apresentado aos accionistas na assembleia geral da PT realizada no dia 08/09/2014, tendo sido mantidos vários contactos entre a CMVM e a EMP11... e a PT, no sentido daquele relatório ser disponibilizado àquela entidade, contactos esses que se revelaram infrutíferos.
Indicia-se que os elementos de prova reveladores de eventuais ilícitos criminais relacionados com as referidas aplicações de tesouraria não sejam devidamente preservados, o que permite inferir a possibilidade de a recusa de dísponibilizar à CMVM o referido relatório se possa prender com a possibilidade de a versão final apresentada pela EMP11... ter sofrido ou poder ainda vir a sofrer alterações que possam comprometer a sua integridade e a sua conformidade com a realidade.
Corrobora-se o aduzido pelo titular da acção penal de que o conjunto de circunstâncias relatadas consubstancia um cenário em que se impõe a recolha, com a maior urgência possível, da versão final do referido relatório (ou de outras que porventura lhe tenham antecedido), assim como de todos os elementos de base que lhe serviram de fundamentação.
Atento os indícios supra referidos e, tendo em vista a apreensão de documentos essenciais para recolha da prova dos factos e descoberta da verdade, sendo proporcionais aos crimes sob investigação nos presentes autos, nos exactos termos promovidos pelo detentor da acção penal, autorizo, ao abrigo do disposto nos artigos 174°-2, 176°, 177°-5, 178° e 180° do CPP e 72° a 72°- B do Dec. Lei 224/2008, a realização de busca nas seguintes instalações:” Sociedade EMP11... (…)
[D]eclaro a quebra de sigilo da correspondência e autorizo, no âmbito das buscas a realizar, o acesso a todos os documentos informáticos contidos nos computadores e outros documentos abrangidos por sigilo existentes nos locais a buscar, objecto de mandado de busca. (…)
Data para realização das diligências de busca: 06/01/2015.”
- Por promoção datada de 22.12.2014, de fls. 71, foi requerida ao Juiz do TCIC, autorização de pesquisa, nos terminais informáticos existentes nas instalações da PT SGPS;
- Por despacho proferido em 23.12.2014, (férias judiciais) de fls. 73 a 75, foi deferido o promovido;
 - No dia 6-1-2015 teve lugar a realização da busca, presidida pelo Juiz deste TCIC, às instalações da EMP11..., conforme auto de fls. 87;
- No dia 6-1-2015 teve lugar a busca às instalações da PT Portugal Telecom, SGPS SA, conforme auto de fls. 105ss, na sequência da qual foi apreendido correio electrónico de ZZ, AAA, BBB, CCC, DDD, EEE, FFF, GGG;
- No dia 19-1-2015 o Juiz do TCIC procedeu, conforme resulta do auto de fls. 128, à abertura de correio electrónico e verificação de conteúdos relativamente à EMP11...;
- No dia 20-1-2015 o juiz do TCIC procedeu, conforme despacho de fls. 131, à visualização perfunctória do correio electrónico apreendido na busca realizada à PT. 
- No dia 30-1-2015 o juiz do TCIC, na sequência da promoção de fls. 149-157, admite a apreensão dos elementos relativos às gravações e transcrições recolhidas nas buscas à EMP11...;
- No dia 3-2-2015 o juiz do TCIC procedeu, conforme despacho de fls. 182, à visualização do correio electrónico relativo ao DVD Mail 1 e autorizou a recuperação de ficheiros apagados ou protegidos com password
- No dia 20-2-2015 o juiz do TCIC procedeu, conforme despacho de fls. 206, à destruição dos suportes informáticos aí identificados; 
- Em 09.03.2016 (fls. 408), o processo é remetido ao Juízo de Instrução Criminal, Instância Central Comarca ...;
- A fls. 409, no dia 10-3-2016, é proferido despacho pelo Juiz ... do Juízo de Instrução Criminal, Instância Central Comarca ..., determinando a especial complexidade dos autos.
Preceitua o art. 33º do CPP com a epígrafe” Efeitos da declaração de incompetência” que:
 “1 - Declarada a incompetência do tribunal, o processo é remetido para o tribunal competente, o qual anula os actos que se não teriam praticado se perante ele tivesse corrido o processo e ordena a repetição dos actos necessários para conhecer da causa.
2 - O tribunal declarado incompetente pratica os actos processuais urgentes. (…)”
Decorre do normativo legal em apreço que a declaração de incompetência do tribunal tem como consequência a remessa dos autos ao tribunal competente, prevendo-se, contudo, a possibilidade de o tribunal incompetente praticar os atos processuais urgentes, como, aliás, reconhece o Juiz a quo no despacho recorrido. Por conseguinte, da qualificação da natureza urgente, ou não, dos atos processuais em causa decorre a possibilidade de o tribunal declarado incompetente os praticar.
No caso, o Sr. Juiz do processo 7406/14...., considerando os atos urgentes, determinou a realização das buscas, não podendo o Sr. Juiz de Instrução sindicar a sua natureza urgente, apenas porque tem um entendimento diferente, e, com esse fundamento, anular as diligências ordenadas e efetuadas, funcionando como tribunal de recurso.
Sempre se diga que, contrariamente ao que considerou o Sr.  Juiz a quo, entendemos verificada a urgência das diligências determinadas, por se tratarem de atos cuja demora pode acarretar perigo para a aquisição e conservação de prova. O MP, a quem compete a direção do inquérito, definiu como indispensável a realização das diligências em causa, o que mereceu a concordância do Sr. Juiz, e, de facto, não podemos deixar de concluir que, pela sua natureza, tratam-se de atos urgentes para efeitos do disposto no referido n.º 2 do artigo 33.º do CPP e, consequentemente, pela competência do tribunal declarado incompetente para ordenar a sua realização e assegurar a observância do disposto no n.º 3 do art.º 179.º da mesmo diploma.
Buscas e apreensões de correio eletrónico, que não sejam efetuadas no tempo devido, podem colocar em causa a obtenção de prova essencial.
O despacho em causa, datado de 18-12-2014, foi proferido um dia antes do encerramento dos tribunais. As buscas foram designadas para o dia 06-01-2015, o que se justifica, uma vez que a sua realização implicava a articulação de várias entidades. Por promoção datada de 22.12.2014, foi requerida ao Juiz do TCIC, autorização de pesquisa, nos terminais informáticos existentes nas instalações da PT SGPS, o que foi deferido em 23.12.2014. Os restantes atos processuais referem-se à tramitação subsequente das diligências antes determinadas.
Além disso, conforme se extrai da conduta do sr. Juiz do Tribunal de Instrução Criminal para onde foi remetido o processo – declarando a especial complexidade do processo- o mesmo considerou que não houve da parte do Colega do TCIC a tomada de qualquer actuação que extravasasse a sua competência, caso em que seria aplicado o art.º 33.º, n.º 1, do CPP.
Pode ler-se no Acórdão da Relação de Lisboa de 10-04-2014, tirado no processo 56/09.0TELSB-A.L1-9, relatado pelo Sr. Desembargador João Abrunhosa, “ Na verdade, existe a competência do MP, no inquérito, a competência do TIC, na instrução, e a competência do tribunal do julgamento. Durante o inquérito só está definida a competência territorial do MP (art.º 264º do CPP). A competência do JIC para intervir no inquérito só está definida em termos de reserva de jurisdição (art.ºs 17º, 268º e 269º do CPP), não havendo qualquer norma que defina a competência do JIC no inquérito, já que a norma do art.º 288º/2 do CPP, pela sua inserção sistemática se refere à competência para a instrução.”
No Acórdão da Relação de Lisboa de 11-12-2018, tirado no processo 213/17.6TELSB-B.L1-3 relatado pela Sr.ª Desembargadora MARIA PERQUILHAS in www.dgsi.pt, na sequência do que foi dito no Acórdão anteriormente citado pode ler-se:  Assim, tem pois razão o recorrente quando invoca a incompetência material dos JIC ... para a prática do acto. Contudo, a verificação desta incompetência não tem as consequências que o mesmo pretende. No entender do recorrente a incompetência dos JIC que determinou a realização das buscas, por constituir uma nulidade insanável expressamente prevista no art.º 119º, al. e) do CPP, acarreta a nulidade dos actos subsequentes, nos termos do art.º 122.º, n.º 1 do CPP e por conseguinte das buscas realizadas (bold nosso) Mas não é assim.O recorrente apela ao regime geral das nulidades, o consagrado nos art.ºs 118.º a 123.º do CPP. Mas no que à nulidade decorrente da inobservância das regras da Competência diz respeito, o regime a observar é o que especificamente se dispõe nos art.ºs 32.º e 33.º do mesmo CPP. Consequentemente, declarada a incompetência do Tribunal, a declaração dos seus efeitos compete, não a este tribunal de recurso, mas sim ao tribunal competente nos termos do disposto no art.º 33.º, n.º 1, o qual decidirá se “anula os actos que se não teriam praticado se perante ele tivesse decorrido o processo e ordena a repetição dos actos necessários “
Pelo exposto, revoga-se a decisão recorrida na parte em que declarou a nulidade dos actos jurisdicionais praticados pelo JIC do TCIC, e subsequente prova carreada para o apenso 7406/14...., após a sua declaração de incompetência decretada em 18-12-2014, nomeadamente o despacho que ordenou a realização da busca às instalações da EMP11..., constante de fls. 57ss, o despacho que ordenou a apreensão de correspondência no âmbito da busca às instalações da PTSGPS, fls. 74, auto de busca e apreensão constante de fls. 87 relativo à busca às instalações da EMP11..., apreensão do correio electrónico efectuado no âmbito da busca às instalações da Portugal Telecom SGPS SA, constante do auto de apreensão de fls. 105ss, auto de abertura de correio electrónico constante de fls. 128, visualização de correio electrónico constante do despacho de fls. 131, despacho de fls. 161 relativo às gravações e transcrições recolhidas
                                                      
1.2.2 UTILIZAÇÃO DOS RERT ( REGIME ESPECIAL DE REGULARIZAÇÃO TRIBUTÁRIA)
Esclarecimento prévio: Desde 2004 até ao presente, foram aprovados três Regimes Extraordinários de Regularização Tributária, a fim de o Estado arrecadar receitas, extraordinárias, e ao mesmo tempo, permitir aos sujeitos passivos a regularização de dívidas e a “legalização" de património detido no exterior, através do pagamento de taxas reduzidas (5 e 7,5%), incomparáveis com as taxas normais de tributação de rendimentos em sede de Imposto sobre o Rendimento (IRS e IRC). Nestes autos estão em causa o  RERT I e RERT II

TEMA EM DISCUSSÃO
A questão em causa desdobra-se em duas:
1º - saber se, para efeitos de investigação criminal, era necessário o recurso ao mecanismo do art. 135º do CPP para obter as informações constantes das declarações de RERT.
2º -saber se os  elementos de prova conexos com a adesão ao RERT,  além de extinguirem as obrigações tributárias exigíveis em relação aos valores patrimoniais em causa (atento o disposto no artigo 5.º, n.º 5 da Lei 39-A/2005, de 29.07.2005 (RERT I) e Lei n.º 3-B/2010, de 28/04 (RERT II), não podem ser “por qualquer modo” utilizadas como indícios ou meios probatórios no quadro de qualquer procedimento penal (princípio “nemo tenetur se ipsum accusare”, ou direito à não- inculpação).

DECISÃO INSTRUTÓRIA
1º- Na Decisão Instrutória, o Sr. Juiz, invocando a  violação das regras da competência material e da hierarquia do tribunal, ao abrigo do disposto do disposto nos artigos 119.º, al. e), ex vi artigos 12.º, n.º 3, al. e), 17.º, 135.º, n.º 3, todos do CPP, e 29.º, 32.º, 33.º, n.º 1, 67.º, n.º 1, 73.º, al. h), 79.º, todos da Lei 62/2013, de 26/08, declarou a nulidade dos seguintes despachos judiciais:
06.09.2013, a fls. 425 a 427 do Volume II dos autos principais;
17.01.2014, a fls. 1643 a 1647, do Volume IV dos autos principais;
11.02.2014, a fls. 1991 a 1993, do Volume V dos autos principais;
16.01.2017, a fls. 33412 a 33413, do Volume 86 dos autos principais;
16.02.2017, a fls. 35033 a 35034, do Volume 89 dos autos principais,
Tal como, as provas de:
Fls. 1724 a 1733 do Volume V dos autos principais, referente ao RERT I;
A documentação junta no Apenso Temático B referente aos RERT II e III do arguido BB;
A documentação junta no Apenso bancário 124, referente à adesão do arguido RR ao RERT III;
A documentação junta no Apenso bancário 131, referente à adesão do arguido CC ao RERT I;
A documentação junta no Apenso bancário 20-L, referente à adesão ao RERT I do arguido HH,
A documentação junta no Apenso Bancário 81-C referente à adesão ao RERT I do arguido FF.
Mais, entendeu que “tal afecta toda a prova carreada para os autos que alicerçavam a factualidade constante do libelo acusatório referente aos arguidos BB e AA que respeitavam à declaração de adesão aos RERT pelo arguido BB como “testa de ferro” do arguido AA, o que determina a não pronúncia, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 119º al. e), 126º nº 3, 308º nº 3, todos do CPP e artigo 26º e 32º nº 8 da CRP, no que concerne à imputação aos arguidos:
- AA, de um Crime de falsificação de documento, em co-autoria com o arguido BB, relativamente a declaração de adesão ao RERT II, crime p. e p. pelo art.º 256. °, n.º 1, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
- BB, de um Crime de falsificação de documento em co-autoria com o arguido AA, relativamente a declaração de adesão ao RERT II, crime p. e p. pelo art.º 256º, n.º 1, alíneas a), d) e e) do Código Penal.”
Para tanto, entendeu que a obtenção junto do Banco de Portugal da documentação de adesão ao RERT exigia lançar mão do incidente previsto no art.º 135.º, n.º 3, do CPP, aplicável por força do n.º 2 do art.º 80.º do RGICSF.
Com efeito, pode ler-se na decisão instrutória que:
“[I]nteressa-nos unicamente, para o caso sub judice, o artigo 80.º, n.º 2 do RGICSF (Dever de segredo do Banco de Portugal), que remete para a lei penal e processual penal.
Não se aplicando, em nosso entender, in casu, as disposições especiais que limitem o dever de segredo, tal como a Lei de combate à criminalidade organizada e económico-financeira (Lei n.º 5/2002, de 11 de Janeiro), e a Lei sobre branqueamento de capitais (Lei n.º 25/2008, de 08 de Junho e Lei 83/2017 de 18 de Agosto), sendo que nestas leis se estabelece o dever de as instituições bancárias prestarem as informações necessárias para a investigação das respectivas infracções, tendo as instituições bancárias o dever de prestar às autoridades de investigação criminal as informações que lhes forem solicitadas, cedendo o segredo bancário nessas situações por imposição legal ao interesse público de investigação criminal, sendo a eventual recusa das instituições bancárias em prestar informações às autoridades de investigação sempre ilegítima, porquanto estas apenas se encontram previstas para as instituições bancárias previstas nos artigos 78.º, e 79.º, n.º 2, al. h) do RGICSF, e já não para o dever de segredo do Banco de Portugal previsto no artigo 80.º do mesmo diploma legal.”
*
Quanto à segunda questão, o Sr. Juiz aborda o tema com base na tese suscitada pelo arguido  BB em sede de requerimento de abertura de instrução  e com a qual concorda, qual seja - a nulidade de utilização dos documentos de adesão ao RERT no ano de 2005 e 2010, bem como das cópias das declarações bancárias exibidas pelo aderente, invocando que depois de declarados os valores, e pago o imposto, o RERT extingue as obrigações tributárias exigíveis em relação aos valores patrimoniais em causa, atento o disposto no artigo 5.º, n.º 5 da Lei 39-A/2005, de 29.07.2005 (RERT I) e Lei n.º 3-B/2010, de 28/04 (RERT II). A declaração de regularização não pode ser “por qualquer modo” utilizada como indício ou meio probatório no quadro de qualquer procedimento penal (princípio “nemo tenetur se ipsum accusare”, ou direito à não- inculpação).
Afirmou o Sr. Juiz que estamos perante a existência de um procedimento materialmente enganoso, porquanto os contribuintes não foram previamente informados de que os elementos que os mesmos declararam no âmbito dos RERT poderiam, mais tarde, vir a servir para a abertura e a instrução de procedimentos de inspecção e de processos de contra-ordenação ou criminais, como, aliás, os RERT previam a (absoluta) confidencialidade desses elementos.

O RECORRENTE
Diz o Recorrente que, para obter junto do Banco de Portugal a declaração de adesão ao RERT, não se exigia  lançar mão do incidente previsto no art.º 135.º-3 do Código de Processo Penal, com o suscitar da intervenção do Tribunal da Relação, por não ter havido sequer uma recusa da disponibilização da informação, mas tão só uma exigência de ponderação judicial, que o mesmo Banco de Portugal acatou.
Relativamente à segunda questão, diz o Recorrente que a possibilidade de utilização, como prova, dos documentos em que se consubstancia a adesão ao RERT e dos documentos que tenham sido entregues para a instrução do pedido, não contraria nem o disposto nas Leis que criaram os referidos regimes de RERT, tanto mais que o mesmo não impede a perseguição do aderente por outros crimes, que não os de natureza fiscal, nem se entende estarmos perante uma utilização de elementos de prova violadores do princípio de não auto-incriminação.

APRECIANDO
Quanto à primeira questão levantada, defendeu o Sr. Juiz não serem aplicáveis ao caso as disposições especiais que limitam o dever de segredo previstas na Lei de combate à criminalidade organizada e económico-financeira (Lei n.º 5/2002, de 11 de Janeiro), e na Lei do combate ao branqueamento de capitais (Lei n.º 25/2008, de 08 de Junho e Lei 83/2017 de 18 de Agosto), entendimento que não acompanhamos.
Com efeito, estando os presentes autos no âmbito de aplicação normativa das referidas Leis, entendemos serem aplicáveis ao Banco de Portugal -, que, neste particular, centraliza a documentação de adesão ao RERT -, as normas especiais aí previstas referentes à quebra do sigilo profissional (artigos 2.º da Lei n.º 5/2002, de 11.01, 18.º da Lei n.º 25/2008, de 05.06, e 53.º da Lei n.º 83/2017, de 18.08), que prevalecem sobre o art.º 135.º do CPP e que caiem ainda dentro da remissão feita para a lei penal pelo invocado n.º 2 do art.º 80.º do RGICSF.
Nestes termos, o JIC tinha competência para proferir os despachos que prolatou, mostrando-se destituída de fundamento a necessidade de fazer intervir o Tribunal da Relação para apreciar incidente de levantamento do sigilo do Banco de Portugal.
Sempre se diga que não resulta dos autos ter havido qualquer escusa por parte do Banco de Portugal, podendo este tê-lo feito.
Além disso, como diz o Recorrente, os factos conhecidos por via dos documentos de adesão ao RERT foram também indiciados por outros meios de prova, designadamente, através da análise aos extractos bancários, uma vez que os fundos remetidos da ... para Portugal, entraram em contas nacionais, do mesmo arguido, junto do BESI, num montante total de 23.013.156,18€, conforme se encontra narrado nos pontos 5814 e seguintes da acusação, em particular no ponto 5837 e seguintes, onde se narram as 41 (quarenta e uma) operações de transferência de valores, entre a ... e Portugal, ocorridas entre os dias 16 de Outubro de 2010 e 15 de Abril de 2011.
*
No que toca ao segundo ponto:
A questão prende-se, pois, com saber se  os documentos de adesão ao RERT no ano de 2005 (RERT I) e no ano de 2010 (RERT II) podem ser utilizados como indícios ou meios de prova no quadro de qualquer procedimento penal, designadamente, se tal utilização não viola o direito à não-inculpação “nemo tenetur se ipsum accusare”.
Desde já afirmamos concordar com o Sr. Juiz quando diz “ Embora o art.º 2.º dos RERT se refira ao "sujeito passivo", nada impede, a nosso ver,  dizia o Sr. Juiz de Instrução, que, tal como sucede com a regularização tributária plasmada no art.22º do RGIT, a declaração seja apresentada e o pagamento do montante correspondente a 5% dos valores patrimoniais declarados seja feito por um terceiro. Neste caso, a isenção da pena aproveita apenas ao titular dos valores patrimoniais declarados, ao sujeito passivo, e não ao terceiro extraneus. “ e “a diferença patrimonial detectada entre os valores declarados em sede de RERT II e os valores transferidos e depositados em conta bancária sediada em Portugal, quer assente em omissões ou inexactidões, quer decorra do funcionamento normal do mercado, pode e deve ser resolvida no quadro do RERT II. A letra dos artigos 2.º, 3.º, 5.º e 6.º e o espírito do diploma possibilitam soluções para qualquer dos cenários. Se esta conclusão for correcta, como julgamos ( dizia o Sr. Juiz)  então é aplicável àquela discrepância patrimonial o regime do RERT, inclusive o efeito do art.º 4. °, n.º 1, al. b) e o arguido estará isento de pena por fraude fiscal simples ou qualificada.
Deixamos de concordar com o Sr. Juiz quando refere que “ o procedimento é materialmente enganoso porquanto os contribuintes não foram previamente informados de que os elementos que os mesmos declararam no âmbito dos RERT poderiam, mais tarde, vir a servir para a abertura e a instrução de procedimentos de inspecção e de processos de contra-ordenação ou criminais, como, aliás, os RERT previam a (absoluta) confidencialidade desses elementos.”
Enganoso porquê? O procedimento é descrito na Lei, sendo apontado o seu objectivo e a “facilidade “ que é dada àquele que pretenda regularizar, fiscalmente, quantias que detinha em contas sediadas do estrangeiro.
Vejamos a Lei n.º 39-A/2005, de 29 de Julho
Artigo 5.º Regularização tributária de elementos patrimoniais colocados no exterior
1 - É aprovado o regime excepcional de regularização tributária de elementos patrimoniais que não se encontrem no território português em 31 de Dezembro de 2004, abreviadamente designado pela sigla RERT, nos termos e condições de seguida transcritos:
'Artigo 1.º
Objecto
O presente regime excepcional de regularização tributária aplica-se a elementos patrimoniais que não se encontrem no território português em 31 de Dezembro de 2004, que consistam em depósitos, certificados de depósito, valores mobiliários e outros instrumentos financeiros, incluindo apólices de seguro do ramo 'Vida' ligados a fundos de investimento e operações de capitalização do ramo 'Vida'.
Artigo 2.º
Âmbito subjectivo
1 - Podem beneficiar do presente regime os sujeitos passivos pessoas singulares que possuam elementos patrimoniais referidos no artigo anterior.
2 - Para efeitos do presente regime, os sujeitos passivos devem:
a) Apresentar a declaração de regularização tributária prevista no artigo 5.º;
b) Proceder ao pagamento da importância correspondente à aplicação de uma taxa de 5% sobre o valor dos elementos patrimoniais constantes da declaração referida na alínea anterior.
3 - A importância paga nos termos da alínea b) do número anterior não é dedutível nem compensável para efeitos de qualquer outro imposto ou tributo.
(…)
Artigo 4.º
Efeitos
(…)
a) Extinção das obrigações tributárias exigíveis em relação àqueles elementos e rendimentos, respeitantes aos períodos de tributação que tenham terminado até 31 de Dezembro de 2004;
b) Exclusão da responsabilidade por infracções tributárias que resultem de condutas ilícitas que tenham lugar por ocultação ou alteração de factos ou valores que devam constar de livros de contabilidade ou escrituração, de declarações apresentadas ou prestadas à administração fiscal ou que a esta devam ser revelados, desde que conexionadas com aqueles elementos ou rendimentos;
c) Constituição de prova bastante para os efeitos previstos no n.º 3 do artigo 89.º-A da lei geral tributária.
2 - Os efeitos previstos no número anterior não se verificam quando à data da apresentação da declaração já tenha tido início procedimento de inspecção ou qualquer outro procedimento para apuramento da situação tributária do contribuinte, bem como quando já tenha sido desencadeado procedimento penal ou contra-ordenacional de que, em qualquer dos casos, o interessado já tenha tido conhecimento nos termos da lei e que abranjam elementos patrimoniais susceptíveis de beneficiar do regime previsto na presente lei.
Artigo 5.º
Declaração e pagamento (…)
5 - Nos limites da presente lei, a declaração de regularização tributária não pode ser, por qualquer modo, utilizada como indício ou elemento relevante para efeitos de qualquer procedimento tributário, penal ou contra-ordenacional, devendo os bancos intervenientes assegurar o sigilo sobre a informação prestada. (…)
Artigo 7.º
Falta, omissões e inexactidões da declaração (…)
2 - São excluídos da aplicação do regime excepcional aprovado pelo número anterior os elementos patrimoniais situados em países ou territórios considerados não cooperantes pelo Grupo de Acção Financeira (GAFI).”
O que resulta da lei?
Na base daquele procedimento  RERT estão factos tributários não regularizados, sendo permitido que a regularização aconteça, anunciando a existência de uma “amnistia” fiscal. Parece-nos óbvio que aquelas quantias cuja regularização fiscal se pretende, constituam, ilícito fiscal, mas não de outra natureza.
Aliás, estão excluídos do próprio regime do RERT “ os elementos patrimoniais situados em países ou territórios considerados não cooperantes pelo Grupo de Acção Financeira (GAFI).” ( cfr. nº 7 supra)
O Grupo de Acção Financeira (GAFI) é um organismo intergovernamental que tem como objectivo desenvolver e promover políticas, nacionais e internacionais, de combate ao branqueamento de capitais e ao financiamento do terrorismo. O GAFI (i) emite recomendações destinadas a prevenir e a reprimir esses crimes (consideradas standards internacionais nestas matérias), (ii) promove a avaliação mútua da observância desses standards (iii) determina contramedidas relativamente às jurisdições com deficiências relevantes e (iv) identifica novos riscos e metodologias de combate a estas actividades criminosas. As recomendações do GAFI constam, desde 2012, de um documento único, disponível na “Informação Relacionada” na página do site do Banco de Portugal.  Actualmente são membros do GAFI 35 países ou territórios (África do Sul, Alemanha, Argentina, Austrália, Áustria, Bélgica, Brasil, Canadá, China, Dinamarca, Espanha, E.U.A., Finlândia, França, Grécia, Hong Kong, Índia, Irlanda, Islândia, Itália, Japão, Luxemburgo, Malásia, México, Noruega, Nova Zelândia, Países Baixos, Portugal, Reino Unido, República da Coreia, Rússia, Singapura, Suécia, ... e Turquia) e duas organizações regionais (Comissão Europeia e Conselho de Cooperação do Golfo). Pela negativa, ou seja, os países actualmente considerados como não cooperantes, porque implementaram insuficientemente ou não implementaram medidas efectivas de combate à lavagem de dinheiro, são: Egipto, Filipinas, Granada, Guatemala, Ilhas Cook, Indonésia, Myanmar, Nauru, Nigéria, São Vicente e Granadinas e Ucrânia.
Parece-nos seguro afirmar que o disposto no art.º 5º-5 do RERT I (relativo aos rendimentos no exterior até ao final de 2004) e no art.º 5º-5 do RERT II (relativo aos rendimentos no exterior até ao final de 2009) não significa que não possa haver investigação relacionada com a origem dos fundos declarados para efeitos de regularização, caso se suspeite terem origem na prática de qualquer outro crime, que não os ilícitos fiscais.
O regime do RERT não impediu o Banco de Portugal de ter comunicado aquela operação como suspeita, ao abrigo da então Lei 25/2008 (actualmente  revogada pela Lei n.º 83/2017, de 18 de Agosto), destinada ao combate ao branqueamento de capitais e do financiamento ao terrorismo.
A lei refere-se expressamente à parte fiscal, pressupondo, cremos nós, que se o contribuinte tiver praticado um crime, terá sido um crime fiscal. Não decorre da lei que se pretenda  “branquear” qualquer outro crime.
 O contribuinte, sabendo que aquela regularização pode trazer ínsita a descoberta da prática de outro ilícito, decidirá  se deve ou não beneficiar da amnistia fiscal concedida pelo RERT. Não pode o contribuinte, dizemos nós, é beneficiar do “bom dos dois mundos”.
Não vemos, pois, que o aproveitamento probatório da documentação junta a procedimento de adesão voluntária, cujo regime se mostra claramente definido na lei, no âmbito de, utilizando as palavras do Sr. Juiz a quo, “infrações que extravasem a identificada delimitação legal [artº. 5º nº 5 do RERT] ” “nomeadamente relativas aos crimes de corrupção, de branqueamento de capitais e de fraude fiscal cometidas por meios não excluídos pelos RERT”, viole o princípio “nemo tenetur se ipsum accusare” ou qualquer outro princípio constitucional.
Não há como considerar inconstitucional aquela leitura do artº. 5º nº 5 do regime do RERT.
A este propósito ler Tomás Cantista Tavares in “REVISTA ELECTRÓNICA DE FISCALIDADE DA AFP (2020) ANO II – NÚMERO 2, REGIMES EXCEPCIONAIS DE REGULARIZAÇÃO VOLUNTÁRIA (RERT): ALGUMAS QUESTÕES.
“(…) 4.3.  A AMNISTIA É APENAS DO CRIME DE FRAUDE FISCAL. Os comportamentos de fraude fiscal inseríveis no RERT podem ou não envolver também a prática de outros crimes (como associação criminosa, corrupção, peculato, falsificação de documentos…). Tudo depende, afinal, dos contornos, vicissitudes e características subjacentes aos ilícitos praticados. A letra da lei é clara: a adesão ao RERT apenas amnistia o crime de fraude fiscal (simples ou qualificada) associada aos comportamentos regularizados. Os demais crimes não são amnistiados e nem sequer se lhes pode associar um automático efeito atenuante, por causa da adesão ao RERT. O mecanismo do RERT tem, como se viu, dois momentos distintos: a) No primeiro, aquando da adesão, o sistema do RERT, via intermediação do sistema financeiro, assegura a confidencialidade do sujeito passivo, essencialmente para que as autoridades (fiscais e criminais) não conhecessem esses comportamentos ilícitos e os demais crimes cometidos pelos sujeitos; b) no segundo, aquando da exibição voluntária do RERT pelo sujeito passivo (em sede inspectiva), o sujeito passivo pode ficar numa posição delicada: ao mesmo tempo que declara a adesão ao RERT, com a amnistia do crime de fraude fiscal, está do mesmo passo, a confessar (ainda que de forma implícita) a prática de outros crimes, porventura ainda não prescritos – que as autoridades terão de investigar, por dever de ofício. Aliás, o contribuinte é livre, nesse segundo momento, de exibir ou não o RERT, na ponderação que assegure a melhor tutela dos seus interesses. Nada há aqui de ilegal ou ilícito: estamos perante uma esfera de liberdade de iniciativa do sujeito passivo, que sabe, desde o momento de adesão ao RERT, que era este o regime que se lhe aplicava (sem a amnistia dos demais crimes). Assim, no momento futuro, tomará livremente a seguinte decisão: ou não mostra o RERT, e não tem forma de comprovar os efeitos positivos deste regime para efeitos da sua esfera jurídica (mas também não confessa os demais crimes não amnistiados); ou exibe a regularização e para lá da amnistia da fraude fiscal, confessa, de forma indireta, a prática de outros hipotéticos crimes.  (…) Uma das condições de base dos RERTS era o anonimato da adesão, conseguida pela intermediação do Banco de Portugal. Os sujeitos passivos aderiram a este regime, com base nesse pressuposto legal. Se, posteriormente, não fossem inspecionados (por normais inspecções tributária ou de base criminal ou por alegadas manifestações de fortuna), então o RERT cairia no esquecimento e nunca “sairia à luz do dia”. Se, ao invés, fossem alvo de alguma inspeção, os contribuintes decidiram o que fazer: a) Ou exibiam o RERT, obtendo em concreto os seus efeitos benéficos, em sede fiscal e criminal – mas as autoridades ficariam a saber que praticou esses ilícitos e poderiam (teriam) de investigar a correção do RERT (se é um RERT total), se manteve ou não tais ilícitos no futuro, após a data de corte do RERT e se os comportamentos ilícitos se associam a outros crimes, que não a fraude fiscal.b) Ou não exibiam o RERT, apesar de a ele terem aderido, por receio de investigação de outros crimes (não amnistiados) ou de continuação das mesmas práticas após a data de corte do RERT – e, com isso, o sujeito opta por evitar a sua própria autoincriminação. c) Mas, o ponto decisivo era este: o sujeito aderiu porque sabia, por imposição legal, que as Autoridades só conheceriam a adesão ao RERT por sua declaração espontânea.”
O mesmo Autor dá um exemplo ilustrativo da adesão ao RERT” Coloquemos um exemplo simples para melhor se perceber esta ideia fulcral: imagine-se que A, pessoa singular residente fiscal em Portugal, obtém, em 2007, rendimentos de 1 milhão de euros que não os leva à tributação (seja rendimentos de trabalho [dependente ou independente], ou uma mais valia tributada [imobiliária ou financeira sujeita a imposto] ou como uma distribuição oculta de lucros...) e aplica esse dinheiro em instituição bancária não residente (para escapar ao radar de controlo das autoridades nacionais), onde obtém juros simples, por efeito dos depósitos bancários, à taxa de 10% ao ano, entre 2008 e 2010 inclusive. Ora, pelas regras gerais de tributação, este sujeito passivo, em 2007, teria de levar o rendimento original à tributação (imagine-se que decorre de rendimentos de trabalho oriundos no exterior, com uma taxa efetiva de 50% - e portanto teria de pagar 500 mil euros); e nos anos seguintes, de 2008 a 2010 (3 anos) teria de incluir o imposto sobre os juros gerados no exterior na sua base fiscal do IRS, que, se tributados a uma taxa de 28%, perfaz 28 mil euros por ano (e 84 mil euros nos 3 anos [1M€ x 10% x 28% x 3 anos]). Assim sendo, pelas regras gerais de tributação em IRS, estaria sujeito a impostos sobre o rendimento, entre 2007 e 2010, de 584 mil euros – que tipicamente os contribuintes não declaravam e o Estado não tinha ferramentas adequadas de fiscalização e controlo. Se, em 2010, optasse por aderir ao RERT III – pagaria 7,5% sobre o património, que é de 1,3 milhões de euros (1 milhão originado em 2007 e 100 mil euros de juros dele decorrentes em cada um dos três anos seguintes). Logo, pagaria 97.500 euros (1,3M€ x 7,5%) – e ficaria liquidado e extinto, por substituição, todo o imposto sobre o rendimento escamoteado voluntariamente com base nas regras gerais do IRS.”
Este largo benefício, dizemos nós, faz com que o contribuinte, mesmo sabendo da possibilidade de lhe ser “descoberta” a prática de outro ilícito, que não fiscal, arrisque.
O mesmo Autor, a propósito da inconstitucionalidade ( que não a levantada pelo Sr. Juiz ) diz “ “É hoje um dado assente – também em matéria fiscal – que os princípios constitucionais não têm um valor absoluto - GOMES CANOTILHO, Direito Constitucional e teoria da constituição, 3ª edição, ..., 1999, p. 949 a 955. (…) Pode-se comprimir a generalidade e a igualdade (fiscal) em atenção a outros princípios relevantes, a maior parte das vezes de raiz extra fiscal, como a estabilidade das finanças públicas (e obtenção de receitas), a luta contra a evasão fiscal, a simplificação da relação tributária e a contribuição do lesado (estado) para o estado generalizado de fuga aos impostos. São estes os fundamentos legitimadores dos RERTS (sobretudo do RERT III). O RERT III requer uma interpretação contextual. É uma medida, inserida num pacote legislativo mais vasto, de luta contra a fraude e evasão fiscal, com o generoso aumento dos prazos de caducidade e prescrição das situações envoltas com países de baixa tributação”

CONCLUSÃO
Julga-se procedente o recurso interposto e revoga-se a decisão instrutória quando  determina a eliminação, por nulidade, da prova obtida através da junção aos autos das declarações de adesão ao RERT.
Deste modo, consideram-se válidos os despachos de 06.09.2013, a fls. 425 a 427 do Volume II dos autos principais;
17.01.2014, a fls. 1643 a 1647, do Volume IV dos autos principais;
11.02.2014, a fls. 1991 a 1993, do Volume V dos autos principais;
16.01.2017, a fls. 33412 a 33413, do Volume 86 dos autos principais;
16.02.2017, a fls. 35033 a 35034, do Volume 89 dos autos principais,
Bem como as provas de:
Fls. 1724 a 1733 do Volume V dos autos principais, referente ao RERT I;
A documentação junta no Apenso Temático B referente aos RERT II e III do arguido BB;
A documentação junta no Apenso bancário 124, referente à adesão do arguido RR ao RERT III;
A documentação junta no Apenso bancário 131, referente à adesão do arguido CC ao RERT I;
A documentação junta no Apenso bancário 20-L, referente à adesão ao RERT I do arguido HH,
A documentação junta no Apenso Bancário 81-C referente à adesão ao RERT I do arguido FF,

1.2.3 OS PROCEDIMENTOS DE PREVENÇÃO DE BRANQUEAMENTO      
Nota prévia: não obstante a amplitude do tema – os procedimentos de prevenção do branqueamento – constante dos  requerimentos de abertura de instrução, a Decisão Instrutória restringiu a discórdia apenas ao  Apenso A (relatório de informação sobre o arguido BB). Deste modo, o recurso diz apenas respeito a esta decisão.

TEMA EM DISCUSSÃO
Saber se a informação de natureza fiscal, colhida em sede de averiguação preventiva, que funcionou como princípio de prova e que foi  junta aos autos, após a quebra do sigilo fiscal, tinha suporte legal no âmbito da Lei 25/2008.

DECISÃO INSTRUTÓRIA
Na Decisão em causa, o Sr. Juiz considerou que o Ministério Público acedeu a informação fiscal relativa aos imóveis e rendimentos do arguido BB através da base de dados disponíveis nas Finanças sobre o contribuinte (visão do contribuinte).  Toda a situação fiscal, patrimonial e económico-financeira do cidadão BB  foi conseguida fora do inquérito crime.
Na perspectiva do Sr. Juiz de instrução, da leitura dos artigos 3º e 4º da Lei 25/2008, de 5 Junho, não resulta que a Autoridade Tributária seja uma das “entidades sujeitas”.
Assim, tendo em conta a natureza do sigilo fiscal e o regime legal vigente à data dos factos (regime anterior à Lei 30/2017, de 30 de Maio), o afastamento do dever de confidencialidade fiscal, fora dos casos expressamente previstos na lei, estava genericamente dependente da aplicação do disposto no artigo 135.º do CPP.
O Sr. Juiz vai ainda mais além.
Entende que, estando em causa uma acção de prevenção realizada ao abrigo da Lei 25/2008, de 5 de Junho e tendo o despacho de fls. 311, do dia 7-6-2013, sido proferido pelo MP numa fase em que ainda não existia inquérito, faz com que o mesmo não tenha amparo legal nem no artigo 135º do CPP, nem no artigo 2º da Lei 5/2002 e nem no artigo 3º do D.L. n.º 93/2003, de 30 de Abril e se traduza numa violação no disposto no artigo 26º da CRP e artigo 64º nº 2 al. d) da LGT.
A interpretação normativa dos artigos 18º e 41º da Lei 25/2008, de 5 de Junho no sentido de ser permitida uma quebra do sigilo fiscal no âmbito dos procedimentos de prevenção é inconstitucional por violação do disposto no artigo 26º e 32º nº 8 da CRP.

RECORRENTE
O Recorrente veio dizer que,  na data do início da investigação neste processo, o regime de prevenção do branqueamento de capitais era regulado em Portugal pela Lei 25/2008, de 5 de Junho, que procedeu à transposição do conjunto das designadas terceiras directivas relativas à prevenção da utilização do sistema financeiro para efeito de branqueamento de capitais e de financiamento do terrorismo – Directiva 2005/60/CE do Parlamento Europeu e do Conselho ( cfr. artigo 2º que no seu número 3 diz que estão sujeitas à Directiva a) Auditores, técnicos de contas externos e consultores fiscais;))  e a Directiva 2006/70/CE da Comissão.
Encontrava-se previsto no disposto no art.º 16º-2 e 18º da Lei 25/2008, de 5 de Junho, então vigente, correspondentes ao disposto nos arts. 53º e 56º-7 da Lei 83/2017, de 18 de Agosto, agora vigente, a possibilidade de utilização dos elementos obtidos em sede de prevenção no âmbito do processo penal.
Foram iniciados procedimentos de prevenção de branqueamento com base em comunicações do Banco de Portugal e da CGD e que envolviam o nome de BB, tendo, no âmbito dos mesmos, sido realizadas diligências que se limitaram à recolha de informação bancária e societária e junto de processos judiciais, quer de outros processos do DCIAP quer registados noutros serviços do Ministério Público, sempre tendo em vista uma decisão de instauração de inquérito ou de encaminhamento da informação para inquérito já pendente.
No entanto, a informação fiscal acedida no âmbito do designado PA 806/2013 resultou de um pedido deduzido pelo Ministério Público, nas vésperas da tomada de decisão sobre se devia ou não instaurar inquérito, dirigido ao OPC no Processo 207/11.5 TELSB, no sentido de verificar a conexão entre a origem dos fundos identificados no referido procedimento de prevenção e os movimentos que já haviam sido identificados naquele inquérito – decisão transcrita na página 435 da decisão instrutória, ponto 22.
 O referido Apenso A veio a ser transferido da fase de prevenção para a fase de Inquérito do presente processo, onde veio a ser proferido despacho de quebra de sigilo fiscal quanto à pessoa de BB.
           
APRECIANDO
O Sr. Juiz  faz uma análise aprofundada dos Procedimentos de Averiguação Preventiva de Branqueamento e Financiamento do Terrorismo.
Começa por fazer uma descrição, cronológica, dos factos mais relevantes e que se prendem com a criação do Apenso Temático ER e ES e dos despachos e diligências aí tomados.
Faz um enquadramento relativo ao fenómeno do Branqueamento regressando à década de oitenta, à Organização das Nações Unidas e ao “modelo das três fases” de que também fala o GAFI - Colocação (placement); Circulação ou camuflagem (layering) e Integração (Integration). Relativamente ao Branqueamento Internacional descreve os sucessivos avanços conseguidos, referindo-se a todas as Directivas e Convenções existentes a propósito do tema.
Relativamente a Portugal, refere os vários instrumentos legislativos existentes, centrando-se na Lei 25/2008 de 05.06, vigente à data dos factos em causa nos autos.
  Os objectivos elementares desta lei tinham dois vectores - prevenção e repressão, interligados entre si, desde logo determinando um conjunto de obrigações e deveres a que estão sujeitas entidades financeiras e não financeiras e submetendo a violação de tais deveres a responsabilidade contra-ordenacional ou penal, visando-se, fundamentalmente, que o crime de branqueamento não se verifique ou verificando-se, que seja facilmente detectado após a sua concretização.
Na mesma Lei estão indicadas quais são as entidades financeiras e não financeiras obrigadas ao cumprimento daquela.
Após este intróito, o Sr. Juiz considerou improcedentes as inconstitucionalidades e ilegalidades invocadas pelo arguido BB, bem como a proibição de prova quanto às informações bancárias obtidas ao abrigo do disposto no artigo 18º da lei 25/2008, de 5 de Junho.
Porém, apegando-se ao argumento literal desta Lei (25/2008, de 5 de Junho), ou seja, à circunstância de a AT não figurar nas “entidades” financeiras a quem incumbem os deveres de comunicação, considera que a prova obtida através das informações provindas da AT é uma prova nula.
Estamos  de acordo com o Recorrente quando diz que, em sede de princípios e da restrição de direitos, liberdades e garantias, não existe qualquer diferença relativamente ao grau de intrusão na esfera privada quanto aos dados bancários e à informação fiscal. A existir distinção, dizemos nós, até haverá maior grau de intrusão quando se escrutinam dados bancários, na medida em que qualquer extracto, mais do que as informações da AT, permite “reconstruir” a vida do contribuinte.
Assim, o único “impedimento” a esse acesso aos dados fiscais resultaria do facto de não estar prevista a sua consulta no âmbito da Lei 25/2008.
Segundo a decisão instrutória, o acesso a informação de carácter fiscal não se encontrava previsto no âmbito da Lei 25/2008, de 5 de Junho, ao contrário do que ocorre com a Lei agora vigente, a Lei 83/2017, de 18 de Agosto – páginas 478 e seguintes.
Na verdade, na Lei actual – Lei 83/2017 – está expressamente previsto um direito de acesso à informação, com especificação da sua origem poder ser financeira, administrativa, judicial e policial.
Mas tal significa que no regime da Lei 25/2008 estivesse vedado aquele acesso, ou a inclusão na Lei 83/2017 foi mera concretização  formal do que já se entendia caber no espírito daquela outra lei?
Como explicar que, no domínio da Lei 25/2008, uma das entidades sujeitas ao dever de comunicação, fossem os revisores oficiais de contas, os consultores financeiros (cfr. art. 4 al.e)? Que informação estavam estes obrigados a prestar?
Na mesma Lei 25/2008 e a propósito da supervisão e fiscalização, podemos ver que o artigo 38º inclui como autoridades de fiscalização do cumprimento dos deveres previstos na lei (….) c) À Ordem dos Revisores Oficiais de Contas, relativamente aos revisores oficiais de contas; d) À Câmara dos Técnicos Oficiais de Contas, relativamente aos técnicos oficiais de contas;
Além disso, a Unidade de Informação Financeira (UIF) podia aceder a essa informação fiscal através de elementos da AT colocados na sua orgânica – cfr. art. 1, 4º 5º do DL 93/2003 de 30.04.
Já no quadro da Lei 25/2008 se encontrava conferida à Unidade de Informação Financeira (UIF) a possibilidade de aceder a essa mesma informação fiscal através de elementos da AT colocados na sua estrutura orgânica, conforme arts. 1.º 4.º e 5.º do Dec. Lei 93/2003, de 30 de Abril, onde integram um órgão de apoio designado de Grupo Permanente de Ligação (GPL), informação essa que não era só destinada à fase do inquérito, mas estava prevista para acções de investigação criminal ( em sede de inquérito quanto  crimes tributários) e em qualquer fase processual no que toca a crimes de branqueamento de capitais.
Na verdade, não é compreensível o impedimento legal avançado pelo Sr. Juiz, sobretudo tendo em conta a coerência do sistema e a operacionalidade do procedimento de combate ao branqueamento.
A informação de natureza fiscal colhida em sede de averiguação preventiva, por confronto, aliás, com os dados já existentes no NUIPC 207/11.5 TELSB, teve esse acolhimento como princípio de prova no presente processo, uma vez que só foi formalizada a sua junção aos autos, no referido Apenso Temático A, depois de ter sido quebrado, nos termos da Lei 5/2002, de 11 de Janeiro, o sigilo fiscal, através do já referido despacho de folhas 212 dos autos.
Deste modo, entendemos que,  já no âmbito da Lei 25/2008, existia suporte legal para esse aceso à informação fiscal, que funcionou como princípio de prova e que foi junto  aos autos, após a quebra do sigilo fiscal.
Entendendo nós que esse pedido de informação cabe no âmbito da lei e não se tendo argumentado que “aquelas informações surgiram com base no dever de colaboração das entidades sujeitas”,  nem se coloca a questão da inconstitucionalidade levantada pelo Sr. Juiz.
Deste modo, a decisão não pode ser outra que não seja a de revogar o despacho em causa.
Em abono da verdade, convém referir que o conhecimento desta questão apenas se tornou efectivo porquanto fazia parte do recurso interposto, na medida em que, não se compreende qual o relevo da declaração de nulidade do apenso A decretada pelo Sr. Juiz.
O Sr. Juiz de Instrução considera que esses dados fiscais foram acedidos sem  disposição legal habilitante, representando uma violação do sigilo fiscal e uma forma abusiva de intromissão na vida privada do sujeito passivo fiscal, pelo que determina, a página 540 da decisão instrutória, que o referido Apenso A deve ser eliminado, após trânsito em julgado da decisão instrutória, pese embora não retire então outras consequências em sede da prova dos factos, até porque a mesma informação veio a ser solicitada e junta aos autos em fase de inquérito, com base em quebra específica do sigilo fiscal e bancário – despacho de folhas 212 do presente processo.

CONCLUSÃO
Em face de tudo o que dissemos decide-se revogar o despacho do Sr. Juiz de instrução que julgou procedente a invocada proibição da prova obtida na sequência da quebra do sigilo fiscal no âmbito do procedimento de prevenção constante do Apenso A (Relatório de informação sobre o arguido BB) e determinou a sua eliminação, decidindo manter o mesmo nos autos.
           
1.2.4 UTILIZAÇÃO DE ESCUTAS TELEFÓNICAS DE OUTROS PROCESSOS

TEMA
A questão em causa prende-se com a validade /invalidade da prova- transcrições de escutas telefónicas - que o Ministério Público solicitou directamente ao NUIPC 362/08.1JAAVR ( havendo omissão de despacho judicial por parte do JIC) a fim de ser junta a estes autos.
Prende-se, ainda, com a validade do despacho proferido pelo Tribunal da Relação do Porto, onde se encontrava o processo, em recurso, que deferiu a requerida junção.

DECISÃO INSTRUTÓRIA
O Sr. Juiz de instrução considerou que, no que toca à utilização, nos presentes autos, como meio de prova, de intercepções telefónicas colhidas noutro processo, apesar do Ministério Público ter competência para considerar como adequada a junção aos autos de uma certidão – de transcrições de escutas telefónicas – retirada de outro processo, compete em exclusivo ao Juiz de instrução criminal autorizar e ordenar a sua junção.
Tendo o Ministério Público solicitado directamente tal meio de prova, entende o Sr. Juiz que aquele se arrogou uma competência que não lhe pertencia, por falta de jurisdição e usurpação judicial, cfr. artigos 17.º, 187.º, n.ºs 7 e 8, 268.º, n.ºs 1, al. f), 2, 269.º, n.ºs 1, al. e) e 2, todos do CPP, e 32.º, n.º 4 da CRP), dando por verificado o vício da inexistência, logo, insusceptível de produzir efeitos jurídicos.
Esta inexistência é insusceptível de ser sanada com o despacho posterior do JIC, porquanto estamos perante um meio de prova obtida mediante intromissão na vida privada e nas telecomunicações, sem que tenha passado pelo crivo da competência exclusiva do JIC, estando, por isso, perante método proibido de prova, ao abrigo do disposto no artigo 126.º, n.º 3, do CPP, constituindo uma prova nula.
Relativamente ao despacho proferido pela Sr. Desembargadora da Relação do Porto “Passe e entregue certidão nos termos promovidos”, entendeu o Sr. Juiz de instrução que estamos perante uma nulidade insanável – 119º al. e) CPP – por violação das regras de competência material previstas no art. 12º do CPP, além do vício da falta de fundamentação quanto aos pressupostos do artigo 188º nº 7 do CPP.
Terminou, declarando inexistente o despacho proferido em 12.10.2016, a fls. 31266 e 31267 dos autos principais -que determinou a migração das intercepções telefónicas do processo Face Oculta para estes autos-,  e nulo o despacho proferido em 08.03.2017, a fls. 35838 a 35841, do 91.º Volume, dos autos principais, bem como nulas as provas de “Certidão extraída do Processo 362/08.1JAAVR.P1, a fls. 32315, do 83.º Volume dos autos principais; Apenso BB, referente a certidão extraída do Processo 362/08.1JAAVR.P1 (cfr. fls. 32350, do 83.º Volume dos presentes autos, foi lavrada cota, em 09.11.2016, onde se fez constar que foi criado o Apenso BB);  Apenso de Transcrição 32 - Alvo 40037M - Telemóvel ...- DD; Apenso de Transcrição 33 - Alvo 40039M - Telemóvel ...92- DD; Apenso de Transcrição 34 - Alvo 1X372M - Telemóvel ...60- DD.”

O RECORRENTE
O Recorrente veio dizer que  o Sr. Juiz de Instrução descobre, formula e  inicia a apreciação de uma nova questão, não suscitada por qualquer interveniente processual, que identifica como sendo a falta de intervenção de Juiz de Instrução no pedido de certidão de parte das intercepções telefónicas que haviam decorrido no Proc. 362/08.1 JAAVR e a falta de ponderação da decisão judicial que autorizou a extracção da certidão.
O Sr. Juiz de Instrução socorre-se dos dispositivos constitucionais para invocar um “direito ao Juiz”, que decorre do disposto no art 32.º-4 da Constituição da República, o que aliás parece incontestável, para procurar retirar do mesmo um reforço de intervenção em sede da possibilidade de convocação de elementos de prova – página 665 da decisão instrutória.
O princípio legal de que compete em exclusivo ao Juiz de Instrução autorizar e ordenar a junção aos autos da certidão de intercepções telefónicas realizadas noutro processo é entendido pelo Sr. Juiz com o sentido de que a definição das intercepções a transferir e o pedido de certidão ao processo onde as escutas   ocorreram teria que ser feito por um Juiz de Instrução.

APRECIANDO
Centremo-nos na fase do inquérito.
Nos termos do artigo 262º do CPP “1 - O inquérito compreende o conjunto de diligências que visam investigar a existência de um crime, determinar os seus agentes e a responsabilidade deles e descobrir e recolher as provas, em ordem à decisão sobre a acusação. (…)
Nos termos do artigo 263º do CPP “ 1 - A direcção do inquérito cabe ao Ministério Público, assistido pelos órgãos de polícia criminal. 2 - Para efeito do disposto no número anterior, os órgãos de polícia criminal actuam sob a directa orientação do Ministério Público e na sua dependência funcional.
O Ministério Público pratica os actos e assegura os meios de prova necessários à realização das finalidades referidas no n.º 1 do artigo 262.º, nos termos e com as restrições constantes dos artigos seguintes – cfr. art. 267º CPP
Não obstante a direcção do inquérito caber ao MP, existem actos que são praticados pelo Juiz de instrução.
Assim, pode ler-se no art. 268 CPP que - Durante o inquérito compete exclusivamente ao juiz de instrução:
a) Proceder ao primeiro interrogatório judicial de arguido detido;
b) Proceder à aplicação de uma medida de coacção ou de garantia patrimonial, à excepção da prevista no artigo 196.º, a qual pode ser aplicada pelo Ministério Público;
c) Proceder a buscas e apreensões em escritório de advogado, consultório médico ou estabelecimento bancário, nos termos do n.º 5 do artigo 177.º, do n.º 1 do artigo 180.º e do artigo 181.º;
d) Tomar conhecimento, em primeiro lugar, do conteúdo da correspondência apreendida, nos termos do n.º 3 do artigo 179.º;
e) Declarar a perda a favor do Estado de bens apreendidos, com expressa menção das disposições legais aplicadas, quando o Ministério Público proceder ao arquivamento do inquérito nos termos dos artigos 277.º, 280.º e 282.º;
f) Praticar quaisquer outros actos que a lei expressamente reservar ao juiz de instrução.
2 - O juiz pratica os actos referidos no número anterior a requerimento do Ministério Público, da autoridade de polícia criminal em caso de urgência ou de perigo na demora, do arguido ou do assistente.
3 - O requerimento, quando proveniente do Ministério Público ou de autoridade de polícia criminal, não está sujeito a quaisquer formalidades.
4 - Nos casos referidos nos números anteriores, o juiz decide, no prazo máximo de vinte e quatro horas, com base na informação que, conjuntamente com o requerimento, lhe for prestada, dispensando a apresentação dos autos sempre que a não considerar imprescindível.
No art. 269º do CPP estão elencados os actos a ordenar ou a autorizar pelo juiz de instrução – 1 - Durante o inquérito compete exclusivamente ao juiz de instrução ordenar ou autorizar:
a) A efectivação de perícias, nos termos do n.º 3 do artigo 154.º;
b) A efectivação de exames, nos termos do n.º 2 do artigo 172.º;
c) Buscas domiciliárias, nos termos e com os limites do artigo 177.º;
d) Apreensões de correspondência, nos termos do n.º 1 do artigo 179.º;
e) Intercepção, gravação ou registo de conversações ou comunicações, nos termos dos artigos 187.º e 189.º;
f) A prática de quaisquer outros actos que a lei expressamente fizer depender de ordem ou autorização do juiz de instrução.
2 - É correspondentemente aplicável o disposto nos n.os 2, 3 e 4 do artigo anterior.
De um modo simplista, podemos dizer que, na fase do inquérito, o juiz de instrução intervém sempre que possam estar directamente em causa direitos, liberdades e garantias fundamentais das pessoas (art. 32º nº 4 da CRP).
“(….)  durante a fase de inquérito compete ao juiz de instrução criminal praticar ou sindicar todos os actos que contendam com os direitos, liberdades e garantias individuais e, portanto, também conhecer de eventuais nulidades” (João Conde Correia in Contributo para a Análise da Inexistência e das Nulidades Processuais Penais, Studia Juridica n.º 44, Coimbra Editora, 1999, página 190, nota de rodapé n.º 439).
Pode ler-se no Acórdão nº 121/2021 do Tribunal Constitucional, tirado no processo n.º  1126/2019: “ (..) o Acórdão n.º 23/90, acima parcialmente transcrito, que taxativamente reconhece que “a estrutura acusatória exige diferenciação entre o órgão que investiga e (ou) acusa e o órgão que julga”. O mesmo ensina J.J. Gomes Canotilho e V. Moreira (Constituição da República Portuguesa Anotada, Vol. I, 4.ª Edição Revista, Coimbra Editora, Coimbra, 2007, p. 522), quando afirmam que a “densificação semântica da estrutura acusatória faz-se através da articulação de uma dimensão material (fases do processo) com uma dimensão orgânico-subjectiva (entidades competentes). Estrutura acusatória significa, no plano material, a distinção entre instrução, acusação e julgamento; no plano subjectivo, significa a diferenciação entre juiz de instrução (órgão de instrução) e juiz julgador (órgão julgador) e entre ambos e órgão acusador”.
Nestes termos, o Ministério Público emerge do desenho jurídico-constitucional como um órgão de justiça independente e autónomo que, entre outras atribuições, exerce “a acção penal orientada pelo princípio da legalidade” (artigo 219.º, n.º 1, da CRP). A partir desta atribuição constitucional específica, combinada com o princípio do acusatório, recorta-se o estatuto do Ministério Público enquanto único sujeito processual com intervenção necessária no processo (já que este pode ser arquivado sem que tenha ocorrido qualquer constituição de arguido ou intervenção judicial) e poder exclusivo de direcção do inquérito. Alguma doutrina refere-se mesmo a uma reserva de Ministério Público no processo penal, que impõe o respeito pelas funções próprias e pela autonomia daquele, em termos que determinam a exclusão, por violação da Constituição, de qualquer solução legal que coloque “o Ministério Público na dependência processual do juiz” (neste sentido, veja-se, P. Dá Mesquita, Direcção do Inquérito Penal e Garantia Judiciária, Coimbra Editora, Coimbra, 2003, p. 51-52).
Neste contexto, a intervenção do Juiz de Instrução Criminal em sede de inquérito deve pautar-se por um princípio da intervenção enquanto juiz das liberdades (e não como juiz de investigação), respeitando o modelo constitucional de divisão de funções entre a magistratura judicial e a magistratura do Ministério Público (cfr. artigos 32.º, n.º 4 e 5, e 219.º da CRP). Por isso, o momento adequado para apreciação jurisdicional dos actos do Ministério Público – que não estão, como é evidente, a ela imunes – terá lugar, em regra, e dentro da arquitectura do sistema, na fase de instrução, de acordo com os preceitos legais que a regem. Esta deve funcionar como um mecanismo de comprovação judicial da decisão de deduzir acusação ou de encerrar o inquérito, devendo igualmente ser de controlo exclusivo pelo Juiz de Instrução Criminal, cuja intervenção, limitada, na prévia fase de inquérito, lhe permite conduzi-la sem pré-juízos decisivos.
Assim, um excessivo protagonismo do Juiz de Instrução Criminal, durante o inquérito, que lhe atribuísse um âmbito de competência alargado, permitindo a reapreciação jurisdicional de todos, ou quase todos, os actos praticados pelo Ministério Público (sempre sem prejuízo de apreciação em sede de instrução, segundo as regras próprias dessa fase processual), significaria uma inversão do paradigma constitucionalmente estabelecido. De facto, isso equivaleria, em grande medida, a entregar a direcção do inquérito ao Juiz, já não mais juiz das liberdades, mas sim juiz da acusação. Como, aliás, alega o recorrido nos presentes autos, o Juiz de Instrução Criminal estaria, assim, a co-exercer “o poder de iniciativa do Ministério Público”, “participando no exercício da acção penal, restringindo desproporcionadamente faculdades ínsitas nos princípios do acusativo e da autonomia do Ministério Público”.
Todavia, e como também repetidamente se afirmou na jurisprudência constitucional já citada, nada do que se disse afasta as garantias de defesa constitucionalmente garantidas, em particular em matéria de direitos fundamentais.
Neste encadeamento, a segunda premissa necessária ao presente juízo, e directamente relacionada com a primeira, diz respeito à leitura constitucional dos poderes do Juiz de Instrução Criminal. Ou seja, está em causa o significado do princípio constitucional da reserva de função jurisdicional (ou reserva de juiz) e o conjunto dos actos que se incluem no seu âmbito de competência. Na sua definição, impõe-se a compatibilização do disposto nos artigos 202.º e 32.º, n.º 4, da CRP com o princípio da estrutura acusatória do processo (n.º 5 do artigo 32.º da CRP) e a tutela jurisdicional efectiva (artigo 20.º da CRP).
A este propósito, parecem desenhar-se, na jurisprudência e na doutrina, duas teses divergentes.
Uma primeira tese, quanto à extensão dos poderes jurisdicionais do Juiz de Instrução Criminal durante o inquérito, sustenta que o mesmo só tem competência para intervir nos casos expressa e taxativamente tipificados nos artigos 268.º e 269.º do CPP. Qualquer acto que não esteja incluído nesse catálogo, situar-se-á, necessariamente, fora do seu âmbito de competência, quer para a sua realização ou autorização, quer quanto à sua revisão a posteriori. Se se subscrever esta tese, o Ministério Público terá, assim, durante o inquérito, competência exclusiva para apreciar nulidades e irregularidades de quaisquer actos que se situem fora do catálogo constante dos artigos 268.º e 269.º do CPP. O controlo jurisdicional desses actos só pode, pois, ter lugar nas fases seguintes do processo, a saber, a instrução ou o julgamento, que têm natureza judicial, sendo dirigidas por um juiz.
Esta visão sustenta-se na compatibilização do princípio constitucional da autonomia do Ministério Público (artigo 219.º, n.º 2, da CRP) e noutros princípios estruturantes do processo, designadamente, o princípio acusatório e a titularidade pelo Ministério Público da acção penal (artigo 32, n.º 5 e 219.º, n.º 1, da CRP). Para esta posição, a intervenção do Juiz de Instrução Criminal na fase de inquérito afigura-se excepcional, devendo acontecer apenas relativamente a actos lesivos de direitos fundamentais, previamente considerados como tal pelo legislador. No mais, a direcção do inquérito caberá ao Ministério Público.
Uma segunda tese, que lê com maior amplitude os poderes do Juiz de Instrução Criminal em fase de inquérito, sustenta que os princípios constitucionais da reserva de jurisdição e da tutela jurisdicional efectiva impõem uma interpretação mais flexível do princípio da reserva de juiz, no que respeita a limitações de direitos fundamentais que tenham lugar na pendência do inquérito. Ou seja, levada a sério, esta tese implica a inconstitucionalidade da limitação de competência do Juiz de Instrução Criminal para, durante o inquérito, controlar actos praticados pelo Ministério Público, se estes forem restritivos de direitos fundamentais.
Aliás, de acordo com esta posição, o próprio CPP atribui ao Juiz de Instrução Criminal competência para a tomada de decisões sobre actos processuais praticados pelo Ministério Público ou por um órgão de polícia criminal que se situam fora dos casos previstos nos artigos 268.º e 269.º do CPP; este facto demonstraria que o papel daquele Juiz no quadro do processo penal português vai bem além das fronteiras estabelecidas por tais normas, sendo decisiva, apenas, a circunstância de se estar perante um acto que afecte direitos fundamentais, caso no qual sempre estará legitimada a intervenção do Juiz de Instrução Criminal. Nas palavras de J. Figueiredo Dias e Nuno Brandão “o regime legal engloba, desta forma, três categorias de actos do juiz de instrução no inquérito, que se diferenciam em função do envolvimento do juiz na produção dos actos de inquérito e no controlo da projecção dos seus efeitos e do momento – anterior, contemporâneo ou posterior à sua realização – em que exerce o seu poder jurisdicional: os actos a praticar pelo juiz de instrução (art. 268.º do CPP); os actos a ordenar ou autorizar pelo juiz de instrução (art. 269.º do CPP); e os actos de controlo de actos já praticados por outros sujeitos ou participantes processuais” (cfr. J. Figueiredo Dias e Nuno Brandão, “O controlo pelo juiz de instrução das invalidades e proibições de prova durante a fase de inquérito”, in J. Lobo Moutinho et al. (orgs.), Homenagem ao Professor Doutor Germano Marques da Silva, II, 2020, p. 1160).
Sobre a questão da necessidade de intervenção de Juiz quando se trate da prática de actos lesivos de direitos fundamentais, no quadro do processo penal, a posição deste Tribunal é clara, desde o Acórdão n.º 7/87, que acima parcialmente se transcreveu: “a intervenção do juiz (...) justifica-se "para salvaguardar a liberdade e a segurança dos cidadãos no decurso do processo-crime e para garantir que a prova canalizada para o processo foi obtida com respeito pelos direitos fundamentais". A exigência de intervenção judicial no inquérito em relação a actos que afectem direitos fundamentais institui-se, pois, como pilar da arquitectura sistémica que se foi construindo para o processo penal português.
Na doutrina, esta posição ecoa nas palavras de Figueiredo Dias, segundo o qual os “actos processuais singulares que, na sua pura objectividade externa, se traduzem a ataques a direitos, liberdades e garantias das pessoas constitucionalmente protegidos” devem inscrever-se na competência do Juiz de Instrução Criminal durante o inquérito (cfr. J. Figueiredo Dias, “Sobre os sujeitos processuais no novo Código de Processo Penal”, in O Novo Código de Processo Penal, ..., Coimbra, 1988, p. 16, e ainda Nuno Brandão, “O controlo de proibições de prova pelo juiz de instrução no decurso do inquérito”, in Revista Portuguesa de Ciência Criminal, ano 29, n.º 1, Janeiro Abril de 2019, p. 50).
Todavia, daqui nada decorre sobre que actos concretos, no curso do processo, afectam, potencialmente, direitos fundamentais, com uma intensidade tal que se justifique a intervenção imediata do Juiz de Instrução Criminal. Nesse conjunto contar-se-ão, em quaisquer circunstâncias, os actos previstos nos artigos 268.º e 269.º do CPP, em relação aos quais essa avaliação foi feita, a priori, pelo legislador. Todavia, no caso de se determinar haver um outro acto abstractamente passível de forte lesão dos direitos fundamentais, o problema de constitucionalidade vê os seus contornos ligeiramente alterados, consoante a tese, de entre as acima descritas, que se entenda sufragar.
Se nos inclinarmos no sentido da primeira tese, o Juiz de Instrução Criminal não pode intervir, durante o inquérito, fora dos casos taxativamente previstos nos artigos 268.º e 269.º do CPP. Contudo, tendo como ponto de partida a posição do Tribunal Constitucional, afigura-se que, sendo praticados, no processo, actos restritivos de direitos fundamentais não contidos naquele catálogo, será obviamente inconstitucional a eventual limitação de competência do Juiz de Instrução Criminal.
Se, pelo contrário, se entender dever proceder a segunda tese que acima se apresentou, tal significa admitir-se que o Juiz de Instrução Criminal possa intervir em todos os casos em que se demonstre haver afectação grave de direitos fundamentais, em virtude de actos praticados durante o inquérito. Esta tese é, pois, a mais consentânea com a posição deste Tribunal em matéria de recurso de actos lesivos de direitos fundamentais.”
Voltando ao caso em apreço podemos considerar assentes os seguintes dados objectivos:
- no âmbito dos presentes autos o MP solicitou directamente ao processo nº 362/08.1 JAAVR a extracção de certidão de transcrição de escutas telefónicas efectuadas naqueles autos, mas que respeitavam, igualmente, a um arguido deste processo.
- após  tal certidão ter sido junta aos autos, o Sr. Juiz  proferiu o seguinte despacho “ Consigno que procedi à audição das sessões supra identificadas e, bem assim, dos elementos constantes do Apenso BB, com proveniência nos autos com o NUIPC 362/08.1JAAVR. (…)
Corrobora-se o entendimento sancionado pelo detentor da acção penal, supra transcrito, no tocante à relevância das intercepções em causa em ambos os processos, para a prova dos crimes em investigação nos presentes autos e, bem assim, quanto à verificação dos requisitos legais para utilização das mesmas no âmbito destes autos.
Verificando-se os requisitos previstos nos n.ºs 1 e 4 do art.º 187°, do CPP e a sua relevância e indispensabilidade para a prova dos crimes em causa nos presentes autos e para a descoberta da verdade, autoriza-se a transcrição em auto e junção aos presentes autos das sessões e demais elementos relativos às intercepções transferidas, por certidão, dos processos com o NUIPC 362/08.1JAAVR e NUIPC 207/11... - ex vi dos art.°s 187. ° e 188. °, do Código de Processo Penal”.
A questão que se coloca é a seguinte: uma vez que não estamos perante nenhum dos actos de competência exclusiva do Juiz de instrução – cfr. art. 269º CPP -  a actuação do MP, ao ter peticionado, directamente, a junção da certidão, colocou em causa os direitos, liberdades e garantias individuais, do arguido visado?
Cremos que a resposta é claramente negativa.
Concordamos com o Recorrente quando afirma que  os  princípios de intervenção do Juiz de Instrução neste procedimento de transferência de escutas entre processos, em nada afectam a definição de quem pede a extracção de certidão no processo de origem e quem pede e delimita o interesse pretendido para a prova no processo de destino, o que entendemos, inevitavelmente, tem que ser o detentor da acção penal, o Ministério Público.
No caso dos autos, a iniciativa partiu do processo de destino das escutas, ou seja, foi  neste processo que se identificou que o aqui arguido DD havia estado sob intercepção no decurso do ano de 2009, ano em que lhe foram imputadas, neste autos, condutas ilícitas relacionadas, além do mais, com a transmissão de fundos da ... para Portugal, com passagem pelo ... e com a utilização dos fundos para a compra de imóveis em Portugal.
Em face desse conhecimento, tendo em vista confirmar e dar suporte ao mesmo e identificar a existência de sessões de escuta cuja utilização como prova neste processo pudesse vir a ser considerada indispensável e pedida a sua utilização como prova, o Ministério Público tomou a iniciativa de pedir ao processo 362/08.1 JAAVR o envio de certidão relativa à totalidade das intercepções que decorreram sob determinados alvos, todos visando a pessoa DD, que era arguido em ambos os processos.
 O escutado DD era arguido nos dois processos e já tinha sido confrontado com as escutas no processo de origem. Não houve qualquer surpresa, nem preterição dos seus direitos de defesa...
Em face desse pedido, que preenche os requisitos do art. 187.º-7 do Código de Processo Penal, não havendo que acautelar qualquer transmissão de prova que pudesse ser surpresa para o arguido e tendo sido solicitada a totalidade das sessões registadas nos alvos pretendidos, sem possibilidade de truncagem que pudesse afectar os direitos da Defesa, não existe uma necessidade de aprofundamento da fundamentação para que a certidão fosse extraída.
Terminando, diremos que a passagem da certidão determinada pela Sr. Desembargadora do Relação do Porto não constitui nenhuma nulidade insanável. O despacho foi proferido por quem, no momento, tinha competência, para o fazer -  119º al. e) CPP e 12º do CPP.
Além disso, esse despacho, ao contrário das situações de migrações de escutas resultantes de conhecimentos fortuitos, não exige qualquer outra fundamentação além daquela que foi proferida, a seu tempo, no processo de origem.

CONCLUSÃO
 Não encontramos qualquer fundamento legal para a decisão do Sr. Juiz, pelo que, também neste particular, se revoga a decisão recorrida.

1.2.5 O VARRIMENTO ELECTRÓNICO
A decisão instrutória afirma ainda que o Juiz de Instrução, na fase de inquérito, violou a autonomia do Ministério Público, por ter autorizado uma diligência designada de “varrimento electrónico” que não foi promovida pelo Ministério Público.

DECISÃO
O Sr. Juiz de Instrução que interveio na fase de inquérito dos presentes autos, além da autorização dos procedimentos de intercepção das comunicações, referiu-se a poder proceder-se a uma operação designada de “varrimento electrónico”, a qual não havia sido promovida pelo Ministério Público.
Tratou-se de um lapso. Nunca foi usado o varrimento electrónico.
Tanto basta para se revogar a decisão do Sr. Juiz de instrução que declara a nulidade do despacho proferido em 06.09.2013, a fls. 427 a 431 dos autos principais (2.º Volume), na parte respeitante ao varrimento eletrónico, e de “todas as provas obtidas com tais medidas, e bem assim as subsequentes numa relação de causalidade com aquelas”.
1.2.6 QUESTÕES RELACIONADAS COM O CORREIO ELECTRÓNICO
Antes de entrarmos na análise das questões em crise no recurso relacionadas com o correio electrónico,  vamos abordar, em breves notas, alguns temas relacionados com a prova digital.
Tomaremos como base o artigo “ APREENSÃO DE MENSAGENS DE CORREIO ELECTRÓNICO E DE NATUREZA SEMELHANTE (que serviu de base à apresentação feita na Acção  de Formação Contínua realizada no Centro de Estudos Judiciários, em Lisboa, no dia 22.02.2019) elaborado pelo Sr  Procurador da República e docente do CEJ, Rui Cardoso que citaremos, quase, na íntegra.
Não obstante já terem passado mais de quatro anos desde a apresentação em causa, o certo é que continua actual a afirmação de que “ É cada vez mais relevante a utilização como meio de prova no processo penal das mensagens de correio electrónico e de natureza semelhante que são encontradas apreendidas em sistemas informáticos, sistemas esses que são cada vez mais e mais diversos, incluindo agora também objectos que há uns anos eram de pura mecânica, como relógios e automóveis. Não obstante, e apesar de a Lei n.º 109/2009, de 15 de Setembro, autodenominada Lei do Cibercrime (LCC), ter já nove anos, continua escassa a jurisprudência existente sobre algumas das questões, não sendo raro encontrar-se acórdãos de tribunais superiores que ignoram a sua existência”.
O Autor propõs-se abordar o regime de apreensão de correspondência electrónica previsto no artigo 17º da LCC, no “ambito objectivo e subjectivo de aplicação, as competências dos órgãos de polícia criminal (OPC's), do Ministério Público e do juiz, prazos, procedimentos práticos e consequências da inobservância das formalidades. Um dos pontos essenciais estará na concretização da correspondente aplicação do regime da apreensão de correspondência previsto no Código de Processo Penal (CPP). Apesar de tal poder suceder também na fase de instrução ou mesmo na de julgamento, este meio de obtenção de prova é normalmente utilizado durante o inquérito e é nesses casos que as dúvidas têm surgido, nomeadamente na repartição de competências entre Ministério Público e juiz de instrução. A abordagem às questões procedimentais será assim feita visando apenas a fase de inquérito.
A origem histórica da LCC
A LCC estabelece as disposições penais materiais e processuais, bem como as disposições relativas à cooperação internacional em matéria penal, relativas ao domínio do cibercrime e da recolha de prova em suporte electrónico, transpondo para a ordem jurídica interna a Decisão-Quadro n.º 2005/222/JAI do Conselho, de 24 de Fevereiro de 2005, relativa a ataques contra sistemas de informação, e adaptando o direito interno à Convenção sobre Cibercrime do Conselho da Europa (STE 185), doravante CCiber, adoptada em Budapeste em 23 de Novembro de 2001, aprovada pela Assembleia da República através da Resolução n.º 88/2009, de 15 de Setembro, e ratificada pelo Decreto de Presidente da República n.º 91/2009, da mesma data – cfr. artigo 1.º.
A Decisão-Quadro n.º 2005/222/JAI do Conselho não contém disposições de natureza processual, contrariamente ao que sucede com a CCiber, que o faz no seu Capítulo II. Sobre a busca e apreensão de dados informáticos armazenados (search and seizure of stored computer data, no original inglês) rege o artigo 19.º. Porém, não contém previsão específica similar à do artigo 17.º da LCC, pois não versa directamente a “apreensão de correio electrónico ou registos de comunicações de natureza semelhante”. A inspiração para o artigo 17.º da LCC não está, pois, nem na CCiber, nem na Decisão-Quadro n.º 2005/222/JAI. A origem desse artigo está apenas na Proposta de Lei n.º 289/X/4.ª, tendo ele a mesma exacta redacção que o artigo 19.º desta. A mera leitura da Exposição de Motivos dessa Proposta de Lei evidencia que o Governo, reconhecendo a “desadequação da ordem jurídica nacional às novas realidades a implementar”, não pretendeu fazer uma mera extensão do regime das buscas e apreensões previsto no CPP à prova digital, antes assumindo a vontade de proceder a uma adaptação desse regime, superando-o quando necessário: “a forma como a busca e a apreensão estão descritas no CPP exigiam alguma adequação a estas novas realidades”. O legislador propôs-se adaptar estes regimes, não os aplicar integral e acriticamente. “
Como se pode ler no  Acórdão da Relação de Évora de 20.01.2015, tirado no processo nº 648/14.6GCFAR-A.E1 “ O regime processual das comunicações telefónicas previsto nos artigos 187º a 190º do Código de Processo Penal deixou de ser aplicável por extensão às «telecomunicações electrónicas», «crimes informáticos» e «recolha de prova electrónica (informática)» desde a entrada em vigor da Lei 109/2009, de 15-09 (Lei do Cibercrime) como regime regra. 2. Esse mesmo regime processual das comunicações telefónicas deixara de ser aplicável à recolha de prova por «localização celular conservada» - uma forma de «recolha de prova electrónica - desde a entrada em vigor da Lei 32/2008, de 17-07. 3. Para a prova electrónica preservada ou conservada em sistemas informáticos existe um novo sistema processual penal, o previsto nos artigos 11º a 19º da Lei 109/2009, de 15-09, Lei do Cibercrime, coadjuvado pela Lei nº 32/2008, neste caso se estivermos face á prova por «localização celular conservada». 4. Nessa Lei do Cibercrime coexistem dois regimes processuais: o regime dos artigos 11º a 17º e o regime dos artigos 18º e 19º do mesmo diploma. O regime processual dos artigos 11º a 17º surge como o regime processual «geral» do cibercrime e da prova electrónica. Isto porquanto existe um segundo catálogo na Lei n. 109/2009, o do artigo 18º, n. 1 do mesmo diploma a que corresponde um segundo regime processual de autorização e regulação probatória. Só a este segundo regime - o dos artigos 18º e 19º - são aplicáveis por remissão expressa os artigos 187º, 188º e 190º do C.P.P. e sob condição de não contrariarem e Lei 109/2009. 5. As normas contidas nos artigos 12º a 17º da supramencionada Lei contêm um completo regime processual penal para os crimes que, nos termos das alíneas do n. 1 do artigo 11º, estão (a) previstos na lei nº 109/2009, (b) são ou foram cometidos por meio de um sistema informático ou (c) em relação aos quais seja necessário proceder á recolha de prova em suporte electrónico. 6. A diferenciação de regimes assenta na circunstância de os dados preservados nos termos dos artigos 12º a 17º se referirem à pesquisa e recolha, para prova, de dados já produzidos mas preservados, armazenados, enquanto o artigo 18º do diploma se refere à intercepção de comunicações electrónicas, em tempo real, de dados de tráfego e de conteúdo associados a comunicações específicas transmitidas através de um sistema informático. “
Continuando com o Sr  Procurador da República, Rui Cardoso :
“Como regime-regra, a apreensão deve ser feita por ordem ou autorização da autoridade judiciária competente, que, no inquérito, será o Ministério Público – n.º 1. Os OPC's podem efectuar apreensões, sem prévia autorização da autoridade judiciária, (i) no decurso de pesquisa informática legitimamente ordenada e executada nos termos do artigo 15.º (ou (i.a) voluntariamente consentida por quem tiver a disponibilidade ou controlo desses dados, desde que o consentimento prestado fique, por qualquer forma, documentado, ou (i.b) em casos de terrorismo, criminalidade violenta ou altamente organizada, quando haja fundados indícios da prática iminente de crime que ponha em grave risco a vida ou a integridade de qualquer pessoa), bem como (ii) quando haja urgência ou perigo na demora – n.º 25. Neste caso, as apreensões são sempre sujeitas a validação pela autoridade judiciária (Ministério Público, durante o inquérito), no prazo máximo de 72 horas 6 – n.º 4. O incumprimento desta validação (ausência ou extemporaneidade) constitui mera irregularidade, pois, contrariamente ao que fez para a pesquisa (artigo 15.º, n.º 4, alínea a)), o legislador não cominou aqui o vício como de nulidade, o que se compreende e é similar ao regime de busca e apreensão do CPP, já que a violação da privacidade dá-se com a pesquisa, não com o acto formal de apreensão.
Estabelece o n.º 3 que “[c]aso sejam apreendidos dados ou documentos informáticos cujo conteúdo seja susceptível de revelar dados pessoais ou íntimos, que possam pôr em causa a privacidade do respectivo titular ou de terceiro, sob pena de nulidade esses dados ou documentos são apresentados ao juiz, que ponderará a sua junção aos autos tendo em conta os interesses do caso concreto.”. Aplica-se apenas a dados ou documentos informáticos já apreendidos, cujo conteúdo seja susceptível de revelar dados pessoais ou íntimos, mas não quaisquer dados pessoais ou íntimos: apenas aqueles que possam pôr em causa a privacidade do respectivo titular ou de terceiro. Durante o inquérito, o Ministério Público deverá apresentar estes dados, apesar de já apreendidos, ao juiz de instrução em suporte autónomo com requerimento fundamentado sobre a sua relevância para a prova dos factos em investigação. O juiz de instrução apreciará o requerido pelo Ministério Público e decidirá sobre a sua junção ou devolução (em caso de apreensão pela forma prevista no n.º 7, alínea a)) ou destruição (em caso de apreensão pela forma prevista no n.º 7, alínea b)). (…)
As apreensões relativas a sistemas informáticos utilizados para o exercício da advocacia e da actividade médica estão sujeitas, com as necessárias adaptações, às regras e formalidades previstas no artigo 180.º do CPP; para o exercício da actividade bancária, estão sujeitas, com as necessárias adaptações, às regras e formalidades previstas no artigo 181.º do CPP; para o exercício da profissão de jornalista, estão sujeitas, com as necessárias adaptações, às regras e formalidades previstas no Estatuto do Jornalista (artigo 11.º da Lei 64/2007) – n.º 5. O regime de segredo profissional ou de funcionário e de segredo de Estado previsto no artigo 182.º do CPP é aplicável com as necessárias adaptações – n.º 6. (…)
Dispõe o artigo 17.º da LCC, sob a epígrafe “Apreensão de correio electrónico e registos de comunicações de natureza semelhante” que “quando, no decurso de uma pesquisa informática ou outro acesso legítimo a um sistema informático, forem encontrados, armazenados nesse sistema informático ou noutro a que seja permitido o acesso legítimo a partir do primeiro, mensagens de correio electrónico ou registos de comunicações de natureza semelhante, o juiz pode autorizar ou ordenar, por despacho, a apreensão daqueles que se afigurem ser de grande interesse para a descoberta da verdade ou para a prova, aplicando-se correspondentemente o regime da apreensão de correspondência previsto no Código de Processo Penal.”. O legislador resolveu algumas das questões que se suscitavam na doutrina, nomeadamente quanto às mensagens de correio electrónico armazenadas (webmail) ainda nos servidores dos fornecedores de serviço de correio electrónico (ESP – e-mail service providers), estabelecendo claramente que, sendo possível aceder-lhes legitimamente através de sistema inicial a que se acede (legitimamente), também aí se procede a pesquisa informática (artigos 15.º, n.º 5, e 17.º da LCC), mas a forma de remissão para o regime de apreensão de correspondência previsto no CPP é, em nossa opinião, merecedora de crítica e tem gerado muitas dúvidas na doutrina e na jurisprudência. A matéria em análise – que respeita às mensagens de correio electrónico, mas também aos registos de comunicações de natureza semelhante – contende com direitos fundamentais, como é frequente em processo penal: directamente, com o direito à inviolabilidade da correspondência e das telecomunicações. A Constituição da República Portuguesa (CRP), no seu artigo 26.º, n.º 1, a todos reconhece os direitos à identidade pessoal, ao desenvolvimento da personalidade, à reserva da intimidade da vida privada e familiar. A matéria em análise – que respeita às mensagens de correio  electrónico, mas também aos registos de comunicações de natureza semelhante – contende com direitos fundamentais, como é frequente em processo penal: directamente, com o direito à inviolabilidade da correspondência e das telecomunicações. A Constituição da República Portuguesa (CRP), no seu artigo 26.º, n.º 1, a todos reconhece os direitos à identidade pessoal, ao desenvolvimento da personalidade, à reserva da intimidade da vida privada e familiar. A garantia do sigilo abrange não apenas o conteúdo da correspondência, mas o «tráfego» como tal (espécie, hora, duração, intensidade de utilização). No âmbito normativo do art. 34° cabe o chamado correio electrónico, porque o segredo da correspondência abrange seguramente as correspondências mantidas por via das telecomunicações. O envio de mensagens electrónicas de pessoa a pessoa («email») preenche os pressupostos da correspondência privada”. São manifestações de direitos fundamentais comuns: dignidade da pessoa, desenvolvimento da personalidade, garantia da liberdade individual, autodeterminação existencial e privacidade. (..)  em matéria de apreensão de dados informáticos armazenados de mensagens de correio electrónico ou de registos de comunicações de natureza semelhante, nunca estaremos nem completamente dentro, nem completamente fora quer do âmbito do segredo das telecomunicações, quer do âmbito do segredo da correspondência. Mas estaremos sempre perante perigo de ofensa de direitos fundamentais, como ao desenvolvimento da personalidade, à garantia da liberdade individual, à autodeterminação existencial e privacidade, e por isso com necessidade de tutela adequada.
O legislador deveria então ter criado um regime autónomo e auto-suficiente, com repartição equilibrada de competências entre o Ministério Público e o juiz de instrução, a este reservando o estritamente necessário à garantia de direitos dos visados, adequado às especificidades técnicas das comunicações electrónicas, muito diferentes da correspondência corpórea, e à estrutura acusatória do processo penal.
Porém, com ou sem motivo para tal, o legislador prescreveu ser de aplicar, correspondentemente, o regime de apreensão de correspondência previsto no CPP.
O normativo do artigo 17.º aplica-se a mensagens de correio electrónico ou registos de comunicações de natureza semelhante que, no decurso de uma pesquisa informática ou outro acesso legítimo a um sistema informático, forem encontrados, armazenados nesse sistema informático ou noutro a que seja permitido o acesso legítimo a partir do primeiro. Mais propriamente, dados informáticos que constituam correio electrónico ou registos de comunicações de natureza semelhante. (…)
Contrariamente ao que sucede nos casos a que se refere o artigo 16.º, n.º 3, as mensagens de correio electrónico ou semelhantes não estão formalmente apreendidas, pois tal só sucederá se o juiz o determinar. Porém, por regra, tais dados terão já sido objecto de algum dos tipos de apreensão material previstos no artigo 16.º, n.º 7, supra analisados, pois só assim haverá “algo” a apresentar ao juiz -- PEDRO VERDELHO chama-lhe apreensão cautelar ou provisória (“A nova Lei do Cibercrime”, Scientia Iuridica, Tomo LVIII, n.º 320, p. 743-744).. Assim apenas não sucederá nos casos em que o juiz estiver presente na pesquisa, perícia ou acesso permitido ao sistema informático, o que, na prática, só acontecerá se isso ocorrer no decurso de buscas, domiciliárias ou não domiciliárias, por ele presididas. (…)  Fora do campo de aplicação do artigo 17.º estão todas as situações que há consentimento de quem tem a disponibilidade ou controlo das mensagens de correio electrónico ou semelhantes (usualmente, aqueles que recebem e-mails ou sms com ameaças, injúrias, extorsões, etc.). Nesses casos, se o titular dos direitos que há a proteger voluntariamente deles prescinde, não é necessário fazer qualquer ponderação entre a protecção desses direitos e o interesse da administração da justiça, pelo que não é necessário fazer intervir o juiz de instrução. Assim, Ac. TRG 15.10.2012, P 68/10.1GCBRG.G1 (FERNANDO MONTERROSO) e ac. TRP 20.01.2016, P. 1145/08.4PBMTS.P1 (ARTUR OLIVEIRA).
O que é o correio electrónico? Aí incluímos, sem qualquer dúvida, o correio electrónico transmitido através da internet. Por esta via, as mensagens de correio electrónico são transmitidas por meio de servidores de correio electrónico, que são fornecidos por todos os ESP, usando vários protocolos, como SMTP, POP3 ou IMAP.  (…) O artigo 17.º da LCC não faz qualquer distinção entre mensagens de correio electrónico ou semelhantes abertas e não abertas. Como consta do seu Preâmbulo, a CCiber leva em consideração a Recomendação do Comité de Ministros do Conselho da Europa R (95) 13, relativa a problemas de processo penal relacionados com tecnologia de informação. Esta, no seu ponto I.2., recomenda aos governos dos Estados-membros que:“Criminal procedural laws should permit investigating authorities to search computer systems and seize data under similar conditions as under traditional powers of search and seizure. The person in charge of the system should be informed that the system has been searched and of the kind of data that has been seized. The legal remedies that are provided for in general against search and seizure should be equally applicable in case of search in computer systems and in case of seizure of data therein.”. As leis processuais penais devem permitir que as autoridades investigadoras investiguem sistemas informáticos e apreendam dados em condições semelhantes às dos poderes tradicionais de busca e apreensão. O responsável pelo sistema deve ser informado de que o sistema foi revistado e do tipo de dados que foram apreendidos. Os recursos legais previstos em geral contra busca e apreensão deverão ser igualmente aplicáveis em caso de busca em sistemas informáticos e em caso de apreensão de dados neles contidos.”. ( tradução livre).
Ou seja, também esta recomendação não faz qualquer distinção entre tipos de dados informáticos, e. g. dos de correio electrónico face aos demais. (….)Não é juridicamente correcto, nem tecnicamente adequado, interpretar o artigo 17.º da forma diferente para mensagens abertas e mensagens não abertas. O aberto ou não aberto ou, mais correctamente, lido ou não lido, não é uma qualquer forma de protecção do conteúdo da mensagem, contrariamente ao que sucede com os envelopes no correio corpóreo. Não são envelopes ou invólucros das mensagens, mas simples filtros que o utilizador pode definir (de acordo com as suas preferências ou critérios) para mais facilmente gerir o volume de mensagens de correio electrónico recebidas. A mensagem de correio electrónico, “por natureza, não é fechada, não é envelopável, não é unívoca quanto ao número de destinatários e não circula em ambiente seguro [...]. E, sobretudo, é, no seu estado natural imaterial.” Alguns dos prestadores de serviço de correio electrónico continuam a ter regimes de lido/não lido, mas que, contrariamente ao que sucede com a correspondência corpórea, podem ser facilmente alteráveis (e infinitamente) pelo utilizador, com um clique. O correio electrónico pode ser arquivado pelo destinatário sem ser lido; pode ser arquivado juntamente com mensagens enviadas e até rascunhos de mensagens eventualmente a enviar. Como distingui-los? Por outro lado, esses filtros de “lido/não lido” não existem sequer em vários telefones móveis/sistemas operativos de smartphones para as SMS/EMS/MMS, em vários dos programas de instant messaging e nos chats. Ainda, hoje, os utilizadores podem receber – e, em regra, recebem – o correio electrónico simultaneamente numa multiplicidade de plataformas: computadores (fixos e portáteis), tablets, smartphones, automóveis, relógios, etc. Numas, as mensagens poderão constar como lidas, noutras, como como não lidas, dependendo das definições de sincronização possíveis e adoptadas Não há, então, reais bases para fundamentar nessa ilusão do lido/não lido diferentes níveis de tutela jurídica das mensagens de correio electrónico ou semelhantes. Divergimos assim de JOÃO CONDE CORREIA e ainda de PAULO DÁ MESQUITA quando defendem precisamente que, ao determinar a aplicação do regime de apreensão de correspondência do CPP, se exclui da tutela especial as mensagens de correio electrónico já acedidas pelo destinatário- cfr. “Prolegómeno sobre prova electrónica e intercepção de comunicações no direito processual penal português – o Código e a Lei do Cibercrime”, in: Processo Penal, Prova e Sistema Judiciário, Coimbra: Coimbra Editora, 2010, p. 118. NdA. Também de TIAGO CAIADO MILHEIRO, ob. cit., 846-847, para quem “a intervenção judicial apenas se justifica em relação às comunicações não recebidas, já que a partir do momento em que tal sucede e ficam registadas não existe motivo para conferir uma tutela acrescida e diferenciada em relação às comunicações por sistemas informáticos no confronto com outras formas de comunicação. [...] Quando já estiverem abertos estamos perante prova documental, sem prejuízo da aplicação do art. 16.º/3 LC quando forem especialmente sensíveis”. O mesmo é defendido por DUARTE ALBERTO RODRIGUES NUNES, Os meios de obtenção de prova previtos na lei do cibercrime”, Coimbra: Gestlegal, p. 145-146. A apreensão de correspondência no CP Prescreve o artigo 179.º do CPP, sob a epígrafe “Apreensão de correspondência”  1 – Sob pena de nulidade, o juiz pode autorizar ou ordenar, por despacho, a apreensão, mesmo nas estações de correios e de telecomunicações, de cartas, encomendas, valores, telegramas ou qualquer outra correspondência, quando tiver fundadas razões para crer que: a) A correspondência foi expedida pelo suspeito ou lhe é dirigida, mesmo que sob nome diverso ou através de pessoa diversa; b) Está em causa crime punível com pena de prisão superior, no seu máximo, a 3 anos; e c) A diligência se revelará de grande interesse para a descoberta da verdade ou para a prova. 2 É proibida, sob pena de nulidade, a apreensão e qualquer outra forma de controlo da correspondência entre o arguido e o seu defensor, salvo se o juiz tiver fundadas razões para crer que aquela constitui objecto ou elemento de um crime. 3 O juiz que tiver autorizado ou ordenado a diligência é a primeira pessoa a tomar conhecimento do conteúdo da correspondência apreendida. Se a considerar relevante para a prova, fá-la juntar ao processo; caso contrário, restitui-a a quem de direito, não podendo ela ser utilizada como meio de prova, e fica ligado por dever de segredo relativamente àquilo de que tiver tomado conhecimento e não tiver interesse para a prova. (…)
Relevante é ainda o artigo 252.º, incluído no capítulo das medidas cautelares e de polícia, que dispõe: 1 – Nos casos em que deva proceder-se à apreensão de correspondência, os órgãos de polícia criminal transmitem-na intacta ao juiz que tiver autorizado ou ordenado a diligência. 2 – Tratando-se de encomendas ou valores fechados susceptíveis de serem apreendidos, sempre que tiverem fundadas razões para crer que eles podem conter informações úteis à investigação de um crime ou conduzir à sua descoberta, e que podem perder-se em caso de demora, os órgãos de polícia criminal informam do facto, pelo meio mais rápido, o juiz, o qual pode autorizar a sua abertura imediata.  – Verificadas as razões referidas no número anterior, os órgãos de polícia criminal podem ordenar a suspensão da remessa de qualquer correspondência nas estações de correios e de telecomunicações. Se, no prazo de quarenta e oito horas, a ordem não for convalidada por despacho fundamentado do juiz, a correspondência é remetida ao destinatário. Este regime tem várias dimensões normativas (para o que ora releva): 1. Competência – apenas o juiz é competente para autorizar ou ordenar, por despacho, a apreensão; 2. Âmbito objectivo – apreensão de cartas, encomendas, valores, telegramas ou qualquer outra correspondência, mesmo nas estações de correios e de telecomunicações; 3.   Redução do âmbito objectivo – a apreensão de correspondência só é meio de obtenção de prova 4.                Âmbito subjectivo – a correspondência tem de ser expedida pelo suspeito/arguido ou lhe ser dirigida, mesmo que sob nome diverso ou através de pessoa diversa; 5. Redução do âmbito subjectivo – a apreensão e qualquer outra forma de controlo da correspondência entre o arguido e o seu defensor só é admissível se o juiz tiver fundadas razões para crer que aquela constitui objecto ou elemento de um crime. 6. Necessidade probatória – tem de haver razões para crer que a diligência se revelará de grande interesse para a descoberta da verdade ou para a prova; 7. Procedimentos após a apreensão – os OPC's transmitem a correspondência intacta ao juiz que tiver autorizado ou ordenado a diligência e este é a primeira pessoa a tomar conhecimento do conteúdo da correspondência apreendida. Se a considerar relevante para a prova, fá-la juntar ao processo; caso contrário, restitui-a a quem de direito, não podendo ela ser utilizada como meio de prova, e fica ligado por dever de segredo relativamente àquilo de que tiver tomado conhecimento e não tiver interesse para a prova; 8. Invalidade – proibição de prova ou irregularidade.
Conjugação do artigo 17.º da LCC com o artigo 179.º do CP
O artigo 17.º determina a correspondente aplicação do regime de apreensão de correspondência do CPP, não a aplicação integral. Esta aplicação só deve ser feita naquilo que não contrariar o já previsto na própria LCC; a remissão para o CPP não pode sobrepor-se ao regime especial de prova electrónica previsto na LCC. Como vimos já, foi intenção do legislador adaptar às novas realidades a busca e a apreensão previstas no CPP, não aplicá-los integral e acriticamente para crimes puníveis com pena de prisão superior, no seu máximo, a 3 anos;  Acompanhamos PAULO PINTO DE ALBUQUERQUE (Comentário do Código de Processo Penal à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, Lisboa: Universidade Católica Editora, 3.ª Edição, p. 494) quando considera que existem proibições de prova, por violação do disposto no n.º 3 do artigo 126.º, quando há apreensão sem autorização judicial, quanto à apreensão de correspondência entre o arguido e o seu defensor, excepto se o juiz tiver fundadas razões para crer que aquela constitui objecto ou elemento de um crime, e ainda quanto à valoração de correspondência restituída. Porém, não o fazemos quanto à existência de nulidade prevista no artigo 120.º, n.º 2, alínea d) (dependente de arguição) quando existe omissão do exame. Este vício apenas ocorre quando o inquérito ou instrução são insuficientes por não terem sido praticados actos legalmente obrigatórios, não apenas por não terem sido praticados actos legalmente obrigatórios. Estes actos deverão ser apenas os que respeitem à finalidade de inquérito (diligências que visam investigar a existência de um crime, determinar os seus agentes e a responsabilidade deles e descobrir e recolher as provas – artigo 262.º, n.º 1) ou da instrução (comprovação judicial da decisão de deduzir acusação ou de arquivar o inquérito em ordem a submeter ou não a causa a julgamento – artigo 286.º, n.º 1). Se assim não fosse, todas as inobservâncias das prescrições legais no inquérito e na instrução integrariam esta nulidade – e o princípio da tipicidade do artigo 118.º seria subvertido e deixaria de fazer sentido. A omissão do exame pelo juiz, bem como se este ordenar a apreensão, mas depois ordenar ao OPC que primeiro tome conhecimento do conteúdo da correspondência e só depois fundamentar a sua relevância e junção ao processo, constituem apenas irregularidades.Note-se ainda que não há qualquer cominação de nulidade na letra da primeira parte do n.º 3 do artigo 179.º e que a prova é obtida com a apreensão ordenada pelo juiz – e é com esta que se verifica a intromissão na correspondência –, não com o conhecimento do seu teor por parte do Ministério Público ou dos OPC's, sendo por isso de afastar a proibição de prova prevista no artigo 126.º, n.º 3.
Deste modo, e esquematicamente:
No CPP, o âmbito objectivo é o de correspondência em trânsito ou ainda não aberta; na LCC, todas as mensagens de correio electrónico ou semelhantes, nos termos supra expostos, não havendo verdadeiramente regime aberto-lido e fechado-não lido;
No CPP, a apreensão de correspondência só é meio de obtenção de prova admissível para crimes puníveis com pena de prisão superior, no seu máximo, a 3 anos; na LCC, não há catálogo – por força do expressamente previsto no artigo 11.º, aplica-se a processos relativos a crimes (a) previstos nessa lei, (b) cometidos por meio de um sistema informático ou (c) em relação aos quais seja necessário proceder à recolha de prova em suporte electrónico, ou seja, em abstracto, a todos os tipos de crime; 
No CPP, a correspondência tem de ser expedida pelo suspeito/arguido ou lhe ser dirigida, mesmo que sob nome diverso ou através de pessoa diversa; na LCC, pode respeitar a qualquer pessoa (mais uma vez, o artigo 11.º não faz qualquer restrição de âmbito subjectivo)
No CPP e na LCC, o critério da necessidade para a prova é o mesmo: grande interesse para a descoberta da verdade ou para a prova;
O artigo 17.º da LCC não tem previsão sobre invalidades, pelo que deve operar a remissão para o CPP, aplicando-se o regime do artigo 179.º supra referido;
O artigo 17.º da LCC não tem previsão sobre a apreensão de correspondência electrónica ou semelhante entre o arguido e o seu defensor, pelo que deve operar a remissão para o CPP (só será admissível se o juiz tiver fundadas razões para crer que aquela constitui objecto ou elemento de um crime);
No que respeita aos procedimentos, no CPP os OPC's transmitem a correspondência intacta ao juiz que tiver autorizado ou ordenado a diligência e é este que procede à abertuura e primeiro toma conhecimento do seu conteúdo; na LCC, durante o inquérito, o Ministério Público, depois de tomar conhecimento do seu conteúdo, deve apresentar ao juiz suporte com as mensagens de correio electrónico ou semelhantes cautelarmente apreendidas (ou melhor, os dados informáticos que as constituem), juntamente com requerimento fundamentado para apreensão daquelas que considere de grande interesse para a descoberta da verdade ou para a prova, após o que o juiz apreciará, tomando conhecimento do seu conteúdo, e decidirá autorizar ou não autorizar a apreensão formal.
Procedimentos de selecção e apreensão
Posições discordantes
Este último aspecto, procedimental, é, na fase de inquérito, o mais polémico e é aquele que motiva o maior dissenso nas escassas doutrina e jurisprudência existentes sobre estas matérias.
Na jurisprudência, estão publicados três acórdãos sobre a matéria
O acórdão do TRL de 06.02.2018, P. 1950/17.0 T9LSB-A.L1-5 (JOÃO CARROLA) considerou que a LCC remete expressamente para o regime geral previsto no CPP, sem redução do seu âmbito, antes se impondo a sua aplicação na sua totalidade, pelo que, sob pena de nulidade, se exige que seja o juiz de instrução o primeiro a tomar conhecimento do conteúdo das comunicações. No mesmo sentido, foi o acórdão do TRL de 11-01-2011, P. 5412/08.9TDLSB-A.L1 (RICARDO CARDOSO).
Em sentido contrário, existe o acórdão do TRG de 29.03.2011, P. 735/10.0GAPTL- A.G1 (MARIA JOSÉ NOGUEIRA), em que se considerou ser de aplicar à apreensão de uma SMS o disposto no artigo 17.º da LCC, mas podendo o Ministério Público aceder ao seu conteúdo antes da decisão de apreensão [formal] do juiz de instrução.
Na doutrina, RITA CASTANHEIRA NEVES defende que a remissão para o regime de apreensão da correspondência do CPP respeita também ao facto de ter de ser o juiz que tiver autorizado ou ordenado a diligência a primeira pessoa a tomar conhecimento do conteúdo do correio electrónico e demais registos de comunicações apreendidos, mandando-os juntar ao processo se os considerar relevantes. SANTOS CABRAL  igualmente considera ser de aplicar integralmente o regime de apreensão de correspondência do CPP.
PAULO DÁ MESQUITA  manifesta concordância com a remissão para o regime da apreensão de correspondência do CPP (embora, como vimos, restringindo muito o campo de aplicação do artigo 17.º da LCC, considerando que respeita apenas a mensagens não lidas), afirmando que parece estar pressuposto a apresentação das comunicações ao juiz sem prévio acesso policial. Porém, não aprofunda a problemática do âmbito dessa remissão.
É PEDRO VERDELHO quem maior tratamento dá à questão. Defende esse Autor que o regime da apreensão de correspondência do CPP deve ser feito com as necessárias adaptações: a primeira, respeitando à possibilidade de apreensão cautelar das mensagens de correio electrónico ou semelhantes sem autorização prévia do juiz de instrução (sendo a existência de forma legal de acesso ao meio informático onde estavam armazenadas a única exigência legal para essa apreensão cautelar); depois, que não se exige que seja o juiz o primeiro a ter conhecimento de todas as mensagens (a letra da lei aponta antes para a possibilidade de quem procede à pesquisa encaminhar para o juiz mensagens concretas, com relevância para o caso concreto, que aquele depois apreenderá ou não)
Funda a sua posição em argumentos de: Literalidade, Coerência do sistema de tutela de direitos, Diferenças de natureza entre o correio corpóreo e correio electrónico ou semelhante, e, finalmente, na imposição constitucional de respeito pela estrutura acusatória do nosso processo penal.
 Em primeiro lugar, a letra do artigo 17.º oferece bons argumentos para a posição que defendemos. Se fosse intenção do legislador aplicar integralmente o regime de apreensão da correspondência do CPP, bastar-lhe-ia ter dito que “à apreensão de mensagens de correio electrónico ou registos de comunicações de natureza semelhante é aplicável o regime de apreensão de correspondência previsto no CPP”. Não o fez. Porquê seleccionar e repetir no artigo 17.º da LCC apenas um dos requisitos já previstos no artigo 179.º do CPP (grande interesse para a descoberta da verdade ou para a prova)? Nessa interpretação, seria redundante.
Outro argumento na letra do artigo 17.º está no segmento “o juiz pode autorizar ou ordenar, por despacho”, expressão que o CPP utiliza frequentemente a propósito da competência do juiz de instrução face a vários meios de prova ou de obtenção de prova, desde logo no artigo 269.º
 Na instrução, competirá ao juiz de instrução ordenar a apreensão; no inquérito, apenas autorizá-la. No inquérito, o juiz de instrução autoriza a apreensão, mas é o Ministério Público que a ela procederá (ou, por regra, determinará OPC a fazê-lo). Note-se que a apreensão poderá não ser de tudo o requerido pelo Ministério Público e assim haverá necessidade de proceder à apreensão apenas daquilo que for autorizado através da forma prevista no artigo 16.º, n.º 7, alínea b) (realização de uma cópia só com esses dados), para que será necessário conhecimentos técnicos e ferramentas informáticas que os magistrados dificilmente possuirão. Autorizar, como verbo transitivo, significa conceder licença para algo, conferir autoridade a, permitir, validar, apoiar. No caso, pressupõe, pois, que a iniciativa é de outrem, do Ministério Público, e que é desse a selecção das comunicações cuja apreensão se autorizará ou não. A não ser assim, o juiz de instrução nunca se limitaria a autorizar, antes sempre ordenaria a apreensão, deixando sem sentido aquilo que o legislador expressamente inseriu na redacção do artigo 17.º. Ora, o Ministério Público não pode requerer a apreensão das mensagens de correio electrónico ou semelhantes que se afigurem ser de grande interesse para a descoberta da verdade ou para a prova se não as conhece. Não as conhecendo, não haveria verdadeiro requerimento, mas apenas um impulso para uma decisão do juiz de instrução a que o Ministério Público seria completamente alheio. Levaria até a uma subversão de papéis: depois do juiz de instrução “autorizar” a apreensão, o Ministério Público sempre poderia não usar essa autorização, não procedendo à apreensão, v. g., por a considerar irrelevante para a descoberta da verdade ou a prova. A não ser assim, estaria o juiz de instrução a impor ao Ministério Público a utilização de concretos meios de prova.(..)
Sublinhe-se ainda que, apesar de o artigo 179.º do CPP e o artigo 17.º da LCC utilizarem diferentes nomenclaturas para os dois momentos do procedimento – (1.º) empossamento da comunicação e (2.º) sua admissão como meio de prova no processo –, estes não são substancialmente diferentes nos dois diplomas: assim, no CPP chama-se apreensão ao empossamento e, junção ao processo à admissão como meio de prova; na LCC, não se nomeia o empossamento, mas há uma verdadeira apreensão nos termos do artigo 16.º, n.º 7, ainda que cautelar ou provisória, e a admissão como meio de prova é denominada de apreensão. Porém, e esse é aspecto de grande relevância, o CPP reserva ao juiz a competência para ordenar o empossamento, enquanto na LCC essa competência é, no inquérito, do Ministério Público, podendo os OPC's fazê-lo apenas nas situações previstas no artigo 16.º, n.º 2.
Coerência do sistema de tutela de direitos - Se devemos presumir que o legislador soube exprimir o seu pensamento em termos adequados, também temos de presumir que consagrou as soluções mais acertadas – artigo 9.º, n.º 3, do Código Civil. Estas não seriam as mais acertadas se fossem radicalmente incoerentes entre três artigos (seguidos!) no mesmo diploma, oferecendo uma menor tutela a situações potencialmente mais lesivas dos direitos fundamentais.
Porém, é a isso mesmo que conduz a interpretação que defende que, no inquérito, o juiz de instrução é sempre o primeiro a tomar conhecimento das mensagens de correio electrónico ou semelhantes. Nos casos mais graves para a privacidade dos artigos 16.º, n.º 354, e 18.º, os OPC's e o Ministério Público podem e devem tomar primeiro conhecimento do conteúdo; nos casos menos graves, quando pode nem sequer existir qualquer violação de privacidade (aplica-se a todas as mensagens de correio electrónico ou semelhantes, independentemente do seu conteúdo), é o juiz de instrução que o deve fazer. Não encontramos razão de política criminal que sustente tal diferença.
Não se diga que, no inquérito, também nos casos do artigo 16.º, n.º 3, deve ser o juiz de instrução o primeiro a tomar conhecimento desses dados: só com o conhecimento dos mesmos é possível determinar se são ou não susceptíveis de revelar dados pessoais ou íntimos, que possam pôr em causa a privacidade do respectivo titular ou de terceiro e, depois, suscitar a intervenção do juiz de instrução – se assim não fosse, teria de ser sempre o juiz de instrução o primeiro a tomar conhecimento de todos os dados informáticos. Não é isso que ficou expressamente consagrado nos artigos 15.º e 16.º da LCC.
Por outro lado, quando há intercepção das comunicações electrónicas, também os OPC's e o Ministério Público delas tomam conhecimento antes do juiz de instrução, podendo fazê-lo até em tempo real (no decurso das comunicações) – artigo 188.º, n.ºs 1 a 4, do CPP, ex vi do artigo 18.º, n.º 4, da LCC. Os dados podem ser os mesmos: os das comunicações electrónicas e semelhantes, que, mais tarde, já armazenados, podem ser apreendidos nos termos do artigo 17.º. Para além dos aspectos tutelados pelo artigo 17.º, está aqui em causa o próprio sigilo das telecomunicações. Não se compreende que, durante a comunicação electrónica, os OPC's e o Ministério Público possam dela tomar conhecimento primeiro, mas não o possam fazer já depois de esta terminada.
Não colhe o argumento de que na intercepção houve já prévia intervenção do juiz de instrução, pois sem a sua autorização aquela não é possível. É que o problema não está no acesso, mas no conhecimento dos dados por parte dos “não juiz de instrução”: e esse é o mesmo, quer os dados estejam em transmissão, quer estejam já armazenados. A ofensa à privacidade do titular é a mesma.
Note-se que, mesmo com a interpretação por nós defendida, o regime continuará com uma significativa incoerência: para as intercepções telefónicas e as intercepções de comunicações electrónicas a selecção das conversações ou comunicações que valerão como prova é, em primeira linha, competência do Ministério Público (artigo 188.º, n.º 9, do CPP), enquanto que para os dados dessas mesmas comunicações já armazenados a competência será sempre do juiz. Mas essa foi indiscutivelmente a intenção do legislador. Não sendo inconstitucional, não pode ser afastada a aplicação da norma.
(…)
Acusatório e competências do juiz de instrução Para o fim deixámos o argumento que se nos afigura mais importante:   a necessidade de proceder à interpretação do artigo 17.º da LCC em conformidade com a estrutura acusatória do processo, consagrada no artigo 32.º, n.º 5, da CRP, o que significa, na fase de inquérito, respeitar a função do Ministério Público como titular do inquérito e do juiz de instrução como juiz de garantias.
De forma muito simplista, é possível dizer que existem dois grandes modelos de processo penal, ainda que, dentro deles, cada país tenha as suas particularidades, que em nenhum exista qualquer modelo em estado puro e que desde há muito que há uma gradual aproximação entre eles. No modelo inquisitório, quem dirige a investigação e acusa é o juiz (nessas vestes chamado de instrução); no acusatório, há separação entre quem acusa e quem julga. Dentro deste, há dois grandes grupos: um em que quem dirige a actividade de investigação criminal é a polícia, outro em que tal é competência do Ministério Público. Na fase de investigação, os juízes são “apenas” juízes de liberdades e garantias. O sistema português é o acusatório. Como referem GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, “trata-se de uma garantia essencial do julgamento independente e imparcial. Cabe ao tribunal julgar os factos constantes da acusação e não conduzir oficiosamente a investigação da responsabilidade penal do arguido (princípio do inquisitório). A «densificação» semântica da estrutura acusatória faz-se através da articulação de uma dimensão material (fases do processo) com uma dimensão orgânico-subjectiva (entidades competentes). Estrutura acusatória significa, no plano material, a distinção entre instrução, acusação e julgamento; no plano subjectivo, significa a diferenciação entre juiz de instrução (órgão de instrução) e juiz julgador (órgão julgador) e entre ambos e órgão acusador.”.  (…) Durante o inquérito, o juiz de instrução deve ser apenas juiz de liberdades e garantias: juiz de controlo, não de iniciativa. Deve ser garante dos direitos do visado pela investigação e controlador da actividade do Ministério Público e das polícias criminais que o coadjuvam, não tendo nem devendo por isso ter qualquer empenho nos interesses em conflito, não tomando parte activa na investigação, não dominando o seu impulso, o seu objecto ou o seu resultado.  O juiz não pode, ao mesmo tempo, representar o interesse público na repressão criminal e ser um terceiro imparcial, pois são interesses absolutamente incompatíveis. COMO ANABELA MIRANDA RODRIGUES bem adverte, “chamado cada vez mais à boca de cena – num processo crescentemente complexo e onde o conflito verdade/direitos fundamentais se exacerba –, correlativamente exige-se-lhe que se alheie da investigação do caso e da dialética do  processo.”65. Porém, salienta a mesma Autora, “o n.º 4 do artigo 32.º da CRP prossegue a tutela de defesa dos direitos do cidadão no processo criminal e, nessa exacta medida, determina o monopólio pelo juiz da instrução, juiz-garante dos direitos fundamentais dos cidadãos («reserva do juiz»)”, “(...) Intervenção do juiz que vale — e só vale — no âmbito do núcleo da garantia constitucional.”. Ou seja, concluímos nós, intervenção que apenas deve acontecer na estrita medida do necessário para protecção efectiva dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, mas não mais do que isso, sob pena de violação do acusatório e da imparcialidade do próprio juiz de instrução.  Este aspecto é salientado, de forma impressiva, pelo Tribunal Constitucional no acórdão 234/11, onde se lê (realces nossos):  “(...) o disposto no artigo 32.º, n.º 5, da Constituição, quanto aos actos processuais que pudessem ofender direitos fundamentais de qualquer pessoa, também exigiu a supervisão de um juiz, não só pelo seu estatuto de independência, mas também pela sua distância relativamente à actividade investigatória. A existir, pois, uma reserva ao Ministério Público na direcção da investigação preliminar, ela tem necessariamente de permitir a intervenção do Juiz de Instrução Criminal, nesta fase, em todos os actos instrutórios que possam afectar negativamente direitos fundamentais, de modo a cumprir-se a exigência contida no artigo 32.º, n.º 5, da Constituição. Nesse domínio, existe uma reserva de juiz (...) que comprime a alegada reserva do Ministério Público na direcção do inquérito, até onde se revele necessária para protecção efectiva dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos.”  Desde o primeiro momento, questionando-se a conformidade constitucional da direcção do inquérito pelo Ministério Público, muitas vezes o Tribunal Constitucional tem sido chamado a pronunciar-se sobre a estrutura acusatória do processo e a repartição de competência entre o juiz de instrução e o Ministério Público durante o inquérito; a necessidade de assegurar a imparcialidade do juiz de instrução e a relevância que, para esse aspecto, reside na própria aparência; a necessidade de impulso do Ministério Público. Desses, salientamos os seguintes, transcrevendo os excertos mais relevantes para o que ora nos ocupa (realces nossos).
No acórdão 129/07: “A verdade, porém, é que a imparcialidade dos tribunais é uma exigência não apenas contida no artigo 32º da Constituição, mas uma decorrência do Estado de direito democrático (artigo 2º), na medida em que se inscreve na garantia universal de defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos, através de um órgão de soberania com competência para administrar a justiça (artigo 202º n.º 1 Constituição). Ora, neste dever genérico de imparcialidade do tribunal inclui-se uma exigência de não suspeição subjectiva do juiz; a actividade do juiz não pode apresentar-se contaminada por circunstâncias geradoras de desconfiança quanto à sua imparcialidade. A interpretação conjugada do artigo 17.º da LCC e do artigo 179.º do CPP no sentido de aí fundar uma norma com o sentido de que é o juiz de instrução que, no inquérito, em primeiro lugar toma conhecimento das mensagens de correio electrónico ou semelhantes e que é ele que, oficiosamente, procede à selecção daquelas que são de grande interesse para a descoberta da verdade ou para a prova, para além de não se traduzir em qualquer real garantia, viola a estrutura acusatória do processo, pois essa é matéria essencial à direcção do inquérito e à definição do seu objecto, assim comprometendo a posição de imparcial juiz das liberdades66. O artigo 17.º da LCC determina a correspondente aplicação do regime de apreensão de correspondência do CPP, não a aplicação integral. Esta só deve ser feita naquilo que não contrariar o já previsto na própria LCC; a remissão para o CPP não pode sobrepor-se ao regime especial de prova electrónica previsto na LCC. Nomeadamente, não será de aplicar nem o âmbito objectivo nem o subjectivo do artigo 179.º do CPP, e, no que respeita aos procedimentos, no inquérito é ao Ministério Público que compete proceder à análise e selecção das mensagens com grande interesse para a descoberta da verdade ou para a prova, que depois apresentará ao juiz em suporte autónomo juntamente com requerimento fundamentado, após o que o juiz apreciará, tomando conhecimento do seu conteúdo, e decidirá autorizar ou não autorizar a apreensão formal. Esta a interpretação mais conforme à letra da lei, que maior coerência confere ao complexo normativo de tutela de direitos em matéria de dados de comunicações electrónicas, que  respeita as diferenças de natureza entre o correio corpóreo e correio electrónico ou semelhante, e, finalmente, a estrutura acusatória do nosso processo penal.
No ac. do TRL de 07.03.2018, P. 184/12.5TELSB-B.L1-3 (CONCEIÇÃO GONÇALVES), o tribunal decidiu que as mensagens de correio electrónico que se encontrem armazenadas num sistema informático só podem ser apreendidas mediante despacho prévio do juiz de instrução, devendo ser o juiz a primeira pessoa a tomar conhecimento do conteúdo da correspondência, conforme remissão para o artigo 179.º do CPP. No ac. do TRL de 08.05.2018, P. 184/12.5TELSB-C.L1 (CARLOS ESPÍRITO SANTO)  (http://www.pgdlisboa.pt/jurel/jurmostradoc.php?codarea=57&nid=5465), considerou o tribunal que incumbe ao juiz de instrução a primazia da tomada de conhecimento do conteúdo das comunicações apreendidas e que seria ilegal a sua prévia remessa e conhecimento à UTIC da Polícia Judiciária. Por outro lado, considerou que a selecção arbitrária efectuadas pelo juiz de instrução das palavras-chave indicadas pelo MP constitui uma verdadeira intromissão na selecção da prova validamente recolhida pelo MP, ou seja, em acto materialmente de inquérito, semanálise prévia da bondade probatória, o que constitui nulidade prevista no artigo 119.", alínea e), do CPP, a qual é insanável e de conhecimento oficioso, para além de ofender directamente os princípios do acusatório e da autonomia do MP, consagrados nos artigos 32.", n.º 5, e 219." da Constituição. O TRL considerou que o juiz de instrução restringiu de forma aleatória e não fundamentada o objecto da investigação, dado que a sua decisão não perpassou uma análise da prova recolhida, que obliterou, atendendo somente a um critério de quantidade, que não se mostra enformado por qualquer suporte legal.
Na decisão sumária do TRL de 06.02.2019, P. 152/16.8TELSB (AUGUSTO LOURENÇO), acessível em http://www.pgdlisboa.pt/jurel/jurmostradoc.php?nid=5594&codarea=57, o tribunal considerou que “[o] Juiz de Instrução deve ser o primeiro a tomar conhecimento das comunicações recolhidas, seja no momento em que estas são extraídas em busca por si presidida, seja ulteriormente quando os suportes onde estas foram alocadas lhe são apresentados”, mas “em casos como o dos autos, em que podem estar em causa milhares de documentos (emails), esse conhecimento objectivo de todo o conteúdo pelo JIC, tem-se afigurado de difícil concretização, todavia, nada obsta a que o Juiz de instrução, caso queira tomar previamente conhecimento desse conteúdo integral, o faça, selecionando o que entender relevante e devolva depois o processo ao Ministério Público com aquilo que for pertinente para a investigação”, podendo ainda devolver ao Ministério Público todos os suportes, “devendo o Ministério Público, após visualização da totalidade dos conteúdos de correio electrónico e registos de comunicações contidos nos suportes em causa, dar deles conhecimento à Juíza de Instrução, a fim de então, esta decidir quais têm relevância para a investigação e quais devem ser anexados aos autos, com observância de todos os formalismos legais vigentes”.
Finalmente, no ac. do TRL de 21.02.2019, P. 6/16.8TELSB-D.L1-9 (ANTERO LUÍS), o tribunal considerou, conforme consta do sumário elaborado pelo relator, que ao correio electrónico apreendido sem autorização judicial não se aplica o disposto no artigo 179.º, n.º 3, do Código de Processo Penal, e que a nulidade decorrente da apreensão de correio electrónico sem autorização judicial pode ser sanada com a autorização, a posteriori, da sua leitura pelo titular do direito ao sigilo da correspondência.”
(NB. Tudo o que se encontra a itálico e sinalizado com “ é uma citação)
Já depois deste artigo e dos Acórdãos supra referidos, foi prolatado o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 10/2023,   de 10 de Novembro publicação: Diário da República n.º 218/2023, Série I de 2023-11-10, páginas 83 – 100 que fixou a seguinte jurisprudência:
«NA FASE DE INQUÉRITO, COMPETE AO JUIZ DE INSTRUÇÃO ORDENAR OU AUTORIZAR A APREENSÃO DE MENSAGENS DE CORREIO ELETRÓNICO OU DE OUTROS REGISTOS DE COMUNICAÇÕES DE NATUREZA SEMELHANTE, INDEPENDENTEMENTE DE SE ENCONTRAREM ABERTAS (LIDAS) OU FECHADAS (NÃO LIDAS), QUE SE AFIGUREM SER DE GRANDE INTERESSE PARA DESCOBERTA DA VERDADE OU PARA A PROVA, NOS TERMOS DO ART. 17.º, DA LEI N.º 109/2009, DE 15/09 (LEI DO CIBERCRIME)».
Neste aresto a questão jurídica em causa consistia em saber se a circunstância de uma mensagem de correio electrónico se mostrar sinalizada como aberta ou lida, aquando da respetiva apreensão, afastava a aplicação do regime previsto no art. 17.º da Lei n.º 109/2009, de 15 de Setembro, ou se, diferentemente, essa circunstância é irrelevante, aplicando-se o regime da citada norma a todas as mensagens de correio electrónico apreendidas, independentemente do facto de as mesmas estarem sinalizadas como abertas ou lidas ou, ao invés, como fechadas ou não lidas.
Ora, enquanto o acórdão recorrido entendeu que o regime aplicável ao caso dos autos era o constante do art. 16.º, da Lei do Cibercrime, cabendo ao Ministério público seriar o material apreendido e determinar ele - e não o JIC - qual o material probatório que considera relevante, dado que os mails, porque previamente abertos, mais não são que meros documentos digitais, o acórdão fundamento, por seu vez, decidiu que as mensagens de correio electrónico que se encontrem armazenadas, num sistema informático, independentemente de se encontrem abertas ou fechadas, só podem ser apreendidas mediante despacho prévio do Juiz de Instrução Criminal, devendo, assim, o juiz a ser a primeira pessoa a tomar conhecimento do conteúdo da correspondência. Pode ler-se no Acórdão “ (…)Importa desde já referir que somos a entender, com o devido respeito por opinião diversa, que não esteve no espírito do legislador transpor para o correio eletrónico a distinção, por referência ao correio tradicional, de correio aberto ou fechado. No artigo 17.º não vem estabelecida qualquer distinção entre mensagens de correio eletrónico e/ou registos de comunicações de natureza semelhante, armazenadas em sistema informático, já acedidas, ou não, pelo respetivo destinatário [...]. [...] O elemento literal previsto no art. 17.º com a expressão «armazenados» pressupõe também que a comunicação já foi recebida/lida e, consequentemente, armazenada. Somos também a entender que o legislador não quis admitir qualquer destrinça entre correio eletrónico fechado ou aberto, por considerar igualmente não existirem razões para considerar diminuídas as exigências garantísticas do correio eletrónico quando aberto relativamente ao correio fechado, atenta a natureza própria destas comunicações. [...] Noutra perspetiva, podemos dizer que se o artigo 17.º da Lei do Cibercrime tivesse o seu âmbito de aplicação circunscrito à apreensão de correio eletrónico ainda não conhecido pelo destinatário, ou seja, ao correio eletrónico que já entrou no servidor do destinatário mas não foi ainda aberto, então a exigência de tutela jurisdicional para salvaguarda de direitos fundamentais (reserva e intimidade da vida privada) ficaria reduzida ao mínimo, correndo-se o risco de a autorização judicial deixar de ser necessária se, chegados ao local o buscado, momentos antes tivesse aberto a mensagem de correio eletrónico, ficando assim sem proteção o grosso da correspondência eletrónica. Acrescendo ainda, na tese defendida pelo recorrente, em relação às comunicações eletróncias sempre haveria que enfrentar o problema de não ser possível, com rigor, determinar quando é que uma mensagem de correio eletrónico foi lida ou não, pois como informam os técnicos nesta área, não existem programas informáticos forenses que determinem essa operação, existindo sempre a possibilidade de marcar uma mensagem como não lida, mesmo após ter sido lida. O que nos dá a dimensão de que o correio eletrónico e o correio tradicional são realidades tão diversas para poderem seguir lado a lado o mesmo regime. Por fim, referir que a lei parece não ignorar que cada vez mais os cidadãos guardam nos seus computadores em ambiente laboral documentos escritos, fotografias da família ou gravações sonoras, que são suscetíveis de revelar segredos da vida íntima, a impor um reforço de tutela de proteção relativamente às comunicações eletrónicas. Assim, em face de tudo o que se deixa exposto, diremos, em síntese conclusiva, que a Lei do Cibercrime criou em relação à apreensão de «correio eletrónico e registo de comunicações de natureza semelhante» um regime específico e unitário, que visou submeter ao regime de apreensão da correspondência, independentemente de as mensagens se encontrarem abertas ou fechadas. (…) Deste modo, somos a entender que as mensagens de correio eletrónico que se encontram armazenadas num sistema informático só podem ser apreendidas mediante despacho prévio do Juiz de Instrução Criminal, devendo ser o juiz a primeira pessoa a tomar conhecimento do conteúdo da correspondência, conforme remissão expressa para o artigo 179.º do CPP. Como é sabido, o correio eletrónico é muito diferente do correio tradicional ou corpóreo, não só por ser dotado de uma maior rapidez e riqueza de conteúdo(18), mas também por aquele ter uma natureza muito mais dinâmica, razão pela qual os regimes terão de ser diversos.
No que diz respeito às mensagens de correio eletrónico ou registos de comunicações de natureza semelhante, não faz verdadeiramente sentido distinguir entre regime aberto/lido ou fechado/não lido. (…) Assim, independente de a correspondência ter sido ou não aberta ou ter sido ou não lida, a pessoa a quem é dirigida tem sempre o direito de não ver essa correspondência devassada pot terceiros». (…) Por seu turno, no art. 269.º, do mesmo diploma legal - Atos a ordenar ou autorizar pelo juiz de instrução - enumeram-se as diligências que cabe ao juiz de instrução, em exclusivo, ordenar ou autorizar (não praticar). Assim: 1 - Durante o inquérito compete exclusivamente ao juiz de instrução ordenar ou autorizar: (…) d) Apreensões de correspondência, nos termos do n.º 1 do artigo 179.º; (…) Como atos limitativos de direitos fundamentais que são, compete exclusivamente ao juiz de instrução ordená-los ou autorizá-los, enquanto juiz das liberdades, não podendo, todavia, tomar essa iniciativa, dada a sua posição processual. Todos estes atos são obrigatoriamente reduzidos a auto (art. 375.º n.º 2). 5 - A apreensão de correio eletrónico ou de outros registos de comunicações de natureza semelhante. Embora os diferentes diplomas, com que nos confrontamos, não a definam, vem-se entendendo a prova digital como a informação relevante para fins probatórios produzida/obtida a partir de dados em formato digital (na forma binária, em que todas as quantidades se representam pelos números 0 ou 1) armazenados, processados ou transmitidos através de sistemas informáticos ou armazenados em suportes informáticos, muitas vezes com utilização de redes de comunicações eletrónicas. Ora, um dos meios, sem dúvida, mais difundido de comunicação proporcionados pelas novas tecnologias da informação é, precisamente, o correio eletrónico, definido como qualquer mensagem textual, vocal, sonora ou gráfica enviada através de uma rede pública de comunicações que possa ser armazenada na rede ou no equipamento terminal do destinatário, até que este a recolha (artº. 2.º n.º 1, alínea b) da Lei n.º 41/2004, de 18/08, que transpõe para o direito interno a Directiva 2002/58/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de Julho de 2002, relativa ao tratamento de dados pessoais e à proteção da privacidade no sector das comunicações eletrónicas - Directiva relativa à privacidade e às comunicações electrónicas). Em termos latos, abrange uma grande panóplia, como os SMS, EMS e MMS, conversações no Messenger, mensagens de voz relativas a comunicações ou arquivos de som e/ou imagem via Whatsapp, Viber, Skipe, Snapshat, Telegram, Facebook, etc(10).No que diz respeito às mensagens de correio eletrónico ou registos de comunicações de natureza semelhante, não faz verdadeiramente sentido distinguir entre regime aberto/lido ou fechado/não lido. Ao contrário do que sucede com o correio tradicional, é praticamente impossível determinar, aqui, quando é que terminou a comunicação e se a mensagem já foi ou não aberta/lida . O art. 17.º, da Lei n.º 109/2009(11), de 15/09, comummente designada por Lei do Cibercrime, que transpõe para a ordem jurídica interna a Decisão-Quadro n.º 2005/222/JAI, do Conselho, de 24 de Fevereiro, relativa a ataques contra sistemas de informação, e adapta o direito interno à Convenção sobre Cibercrime do Conselho da Europa, textua assim: Quando, no decurso de uma pesquisa informática ou outro acesso legítimo a um sistema informático, forem encontrados, armazenados nesse sistema informático ou noutro a que seja permitido o acesso legítimo a partir do primeiro, mensagens de correio electrónico ou registos de comunicações de natureza semelhante, o juiz pode autorizar ou ordenar, por despacho, a apreensão daqueles que se afigurem ser de grande interesse para a descoberta da verdade ou para a prova, aplicando -se correspondentemente o regime da apreensão de correspondência previsto no Código de Processo Penal. Nestes termos, na letra e no espírito deste preceito, a apreensão de correio eletrónico e de outros registos de comunicações de natureza semelhante terá de ser sempre autorizada ou ordenada pelo juiz de instrução, pelo que, sendo encontradas num sistema informático ou em suporte autónomo legitimamente acedidos, mensagens de correio eletrónico ou realidades análogas cuja aquisição tenha grande interesse para a investigação e descoberta da verdade, terá de ser requerida ao juiz autorização para a sua apreensão. Depreende-se também que inexiste, neste domínio, qualquer catálogo de crimes, mas a apreensão em causa terá de observar os ditames da adequação, necessidade e proporcionalidade, na vertente de proibição do excesso. Todavia, como adverte Rui Cardoso, a forma de remissão para o regime de apreensão de correspondência previsto no C.P.P. (17), não é isenta de dificuldades e tem gerado muitas dúvidas quer na doutrina quer na jurisprudência. Não poderá ser nunca a aplicação integral, só devendo ser efetuada naquilo que não contrariar o estatuído na Lei do Cibercrime, isto é, a remissão para o C.P.P. não pode, como é evidente, sobrepor-se ao regime especial de prova eletrónica prevista naquela lei. Assim, o n.º 3 do art. 179.º do C.P.P. não terá, aqui, aplicação.Como é sabido, o correio eletrónico é muito diferente do correio tradicional ou corpóreo, não só por ser dotado de uma maior rapidez e riqueza de conteúdo(18), mas também por aquele ter uma natureza muito mais dinâmica, razão pela qual os regimes terão de ser diversos. (…) Ainda mais proximamente, também este Supremo Tribunal de Justiça, no acórdão de 26/06/2023(22), perfilhou posição idêntica, considerando ser inquestionável que o art. 17.º, da Lei do Cibercrime, não faz qualquer distinção entre as mensagens de correio eletrónico abertas ou fechadas no momento de exigir a intervenção do juiz de instrução para autorizar ou ordenar a sua apreensão. Nesta conformidade, é praticamente pacífico, presentemente, que o regime de intromissão no correio eletrónico ou similar, para apreensão de mensagens armazenadas em sistema informático, estabelecido no citado art. 17.º, terá de exigir a intervenção do juiz de instrução, como juiz das liberdades, independentemente de as mensagens se encontrarem ou não assinaladas como abertas. Alerte-se, contudo, que as antigas divergências sobre a interpretação desta norma se estendiam à obrigatoriedade de existência de um despacho prévio do juiz de instrução, que autorizasse ou ordenasse a apreensão das mensagens de correio eletrónico, bem como à tomada de conhecimento, em primeiro lugar, do conteúdo de tais mensagens pelo juiz.
Com efeito, se se considerar que, como a norma em questão não faz qualquer menção a uma eventual apreensão cautelar ou provisória das mensagens de correio eletrónico, deveria ser, então, o juiz de instrução a primeira entidade a tomar conhecimento das mensagens, cabendo-lhe, seguidamente, ordenar a junção ou não das respetivas cópias ao processo.
Mas, se, numa outra perspetiva, se entender, como se nos afigura mais consentâneo com uma visão global do sistema, que em situações de perigo da demora, (o chamado periculum in mora), as autoridades - Ministério Público e OPC - poderão recorrer à medida cautelar prevista no art. 252.º, do C.P.P., então, nesse caso, a ordem dada ao fornecedor de serviço de não remessa do correio eletrónico para o destinatário terá de ser validada, a posteriori, através de despacho fundamento do juiz de instrução, no prazo de 48 horas.
Para concluirmos, não sendo a lei totalmente clara, dada a diversidade de regimes que se sobrepõem, levantando problemas de conjugação, que deveria merecer, no futuro, uma especial atenção, tendo em vista uma desejável clarificação, entendemos que a solução mais adequada, neste momento, passa pela aplicação do art. 17.º, da Lei do Cibercrime, ao correio eletrónico e similar, quer o seu conteúdo se encontre lido ou não lido, justificando-se, em ambas as situações, a mesma proteção constitucional. Acrescente-se, por último, que uma tal posição não interfere, em nada, com a estrutura acusatória do processo penal, no plano subjetivo(28) - art. 32.º n.º 5, da C.R.P.” (NB. Tudo o que se encontra a itálico e sinalizado com “ é uma citação)
Já indo longas as notas que pretendíamos fossem breves, não podemos deixar de partilhar uma dissertação apresentada à Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra no âmbito do 2° Ciclo de Estudos em Direito (conducente ao grau de mestre), na Área de Especialização em Ciências Jurídico-Forenses (ano 2019) por Mariana Oliveira Costa Pereira .
A dissertação tem o título “PROVA DIGITAL PROBLEMAS DE COMPATIBILIZAÇÃO ENTRE AS LEIS Nº 32/2008, Nº109/2009 E O CÓDIGO DE PROCESSO PENAL”
O desenvolvimento tecnológico é uma evidência , o certo é que associado a todos os benefícios, designadamente do uso da internet, constatamos a existência de mais um meio de cometimento de crimes.
Esta realidade efervescente e de evolução rápida obrigou os países a adequarem a sua legislação e a regular os cibercrimes.
Ao lado das normas substantivas, foi também necessário conciliar as normas processuais e de cooperação internacional.
A primeira lei que regulou a matéria de cibercrime em Portugal foi a lei da criminalidade informática, Lei nº 109/91, de 17 de Agosto . Este diploma, adequado à realidade que se destinava a regular na data em que entrou em vigor, pelo decurso de quase duas décadas, tornou-se deficitário”, cfr. exposição de motivos da proposta de Lei nº 289/X/4ª – Lei do Cibercrime, pg. 1. Essa Recomendação nº R (89) 9 de Setembro de 1989 continha uma lista mínima e outra facultativa de crimes informáticos, tendo sido na sequência aprovada a Lei nº 109/91 que regulou a criminalidade informática e praticamente copiou os crimes que continham naquela Recomendação.
A Lei de 91 tratava apenas do direito substantivo, dos crimes informáticos, sendo as disposições do Código Penal subsidiariamente aplicáveis aos crimes nela previstos. A matéria processual relativa ao tema era regulada pelo artigo 189º do CPP, que foi estendido ( posição discutida e discutível) com a reforma do CPP em 2007 através da Lei nº 48/2007, de 29 de Agosto, para abranger a recolha de prova electrónica, na medida em que o disposto nos artigos 187º, 188º, CPP, relacionados às escutas telefónicas, “é correspondentemente aplicável às conversações ou comunicações transmitidas por qualquer meio técnico diferente do telefone, designadamente correio electrónico ou outras formas de transmissão de dados por via telemática, mesmo que se encontrem guardadas em suporte digital e à intercepção das comunicações entre presentes”.
Essa mesma lei foi-se tornando obsoleta pois foram surgindo novos crimes informáticos que não eram regulados pela Lei portuguesa.
A circunstância do regime a aplicar estar dividido nas duas leis  (109/91 e Código Penal) criou ainda mais incertezas e inseguranças.
Conforme dispõe a exposição de motivos da proposta de Lei nº289/X/4ª, Lei do cibercrime, importa “superar o actual regime, de modo a fornecer ao sistema processual penal normas que permitam a obtenção de dados de tráfego e a realização de intercepções de comunicações em investigações de crimes praticados no ambiente virtual. É o que se pretende fazer por via da lei que agora se propõe”- Exposição de motivos da proposta de Lei nº 289/X/4ª, ..., p. 3.
A lei do Cibercrime foi inovadora.
Trouxe: conceitos novos, (dados de tráfego, fornecimento de serviços..), normas relativas à cooperação internacional , conjunto de meios de obtenção de provas novos,
Como refere a Autora da dissertação supra referida “ a pesquisa de dados informáticos (art. 15º, LCC) seria o equivalente às buscas, prevista nos artigos 174º, 251º, CPP; a apreensão de dados informáticos (art. 16º, LCC) corresponderia a apreensão de objectos do art. 178, nºs 1,3, CPP; a apreensão de correio electrónico e registos de comunicações de natureza semelhante (art. 17º, LCC) equivaleria à apreensão de correspondência prevista nos artigos 179º, 252º, CPP; a intercepção de comunicações (art. 18º, LCC) seria o equivalente ao disposto no regime da intercepção e gravação de conversações ou comunicações telefónicas constante dos artigos 187º a 190º, CPP e as acções encobertas (art. 19º, LCC) vieram alargar o âmbito de admissibilidade das mesmas já previstas na Lei 101/2001, art. 2º. É importante destacar que os artigos 18º e 19º, LCC, por preverem os meios de obtenção de prova mais intrusivos possuem uma aplicação mais reduzida comparada aos outros .  Assim, muito embora algumas figuras processuais da lei do cibercrime já existissem por estarem previstas no CPP, foram adaptadas aos crimes informáticos, ao ambiente digital.  “ (…)   quando a lei do cibercrime entrou em vigor houve uma dificuldade em saber qual diploma seria aplicado à recolha de prova electrónica, o artigo 189º, nº1, CPP ou as disposições processuais previstas na nova lei 109/2009 e reguladas do artigo 11º ao artigo 19º. (…) Em Budapeste, no dia 23 de Novembro de 2001, Portugal assinou a Convenção sobre o Cibercrime do Conselho da Europa que foi aprovada, e veio a ratificá-la posteriormente, com reservas (no que tange a matéria de extradição), apenas no dia 15 de Setembro de 2009, através da Resolução da Assembleia da República nº 88/2009 e do Decreto do Presidente da República nº91/2009. Essa Convenção, segundo a exposição de motivos da proposta de lei nº289/X/4ª, lei do cibercrime, “é o primeiro e mais importante trabalho internacional de fundo sobre crime no ciberespaço. Tem vocação universal e pretende-se que venha a ser aceite pela generalidade dos países do Mundo. Pretende harmonizar as várias legislações sobre a matéria, propiciar e facilitar a cooperação internacional e facilitar as investigações de natureza criminal. Incide sobre direito penal material (...) mas inclui também medidas processuais e de cooperação judiciária internacional”. (…) Segundo o preâmbulo da Convenção sobre o Cibercrime do Conselho da Europa, além de haver uma preocupação com a harmonização das legislações nacionais referentes ao cibercrime de modo que possa haver uma cooperação internacional com recolha electrónica de prova que facilite e torne mais eficaz a investigação e o combate à criminalidade digital, a Convenção preocupou-se também com “a necessidade de garantir um equilíbrio adequado entre os interesses da aplicação da lei e o respeito pelos direitos fundamentais do ser humano, tal como garantidos pela Convenção para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais do Conselho da Europa de 1950, pelo Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos das Nações Unidas de 1966, bem como por outros tratados internacionais aplicáveis em matérias de direitos do Homem (...) e, ainda, o direito ao respeito pela vida privada. Tendo igualmente presente o direito à protecção de dados pessoais, tal como é conferido, por exemplo, pela Convenção do Conselho da Europa de 1981, para a Protecção das Pessoas relativamente ao Tratamento Automatizado de Dados de Carácter Pessoal”, o que foi reiterado no artigo 15, nº1 da referida Convenção.  (NB. Tudo o que se encontra a itálico e sinalizado com “ é uma citação)
A Decisão-Quadro nº2005/222/JAI do Conselho da União Europeia de 24 de Fevereiro de 2005 relativa a ataques contra os sistemas de informação que foi transposta para a lei do cibercrime portuguesa, veio a ser substituída pela Directiva 2013/40/EU do Parlamento Europeu. 
As alterações foram tantas que os Estados- membros deveriam substituir integralmente aquela Decisão Quadro.
Note-se, porém, que a Lei 109/2009 que transpôs a decisão-quadro 2005/222/JAI de 2005 para a ordem jurídica interna ainda não foi adaptada à Directiva 2013/40/UE de 2013 que acabou por substituir a referida decisão-quadro.
Outra lei importante no âmbito da criminalidade informática em Portugal é a Lei nº32/2008 que segundo o artigo 1º “regula a conservação e a transmissão dos dados de tráfego e de localização relativos a pessoas singulares e a pessoas colectivas, bem como dos dados conexos necessários para identificar o assinante ou o utilizador registado, para fins de investigação, detecção e repressão de crimes graves por parte das autoridades competentes, transpondo para a ordem jurídica interna a Diretiva nº 2006/24/CE30 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de Março, relativa à conservação de dados gerados ou tratados no contexto da oferta de serviços de comunicações electrónicas publicamente disponíveis ou de redes públicas de comunicações (...)”.   
Nota-se em toda esta legislação uma preocupação no sentido de entender que certos limites devem ser respeitados  como forma de salvaguarda dos direitos fundamentais das pessoas
O TJUE (Tribunal da Justiça da União Europeia) declarou inválida a Diretiva nº 2006/24/CE30 em 2014 pelo facto de considerar que “ao impor a conservação desses dados e ao permitir o acesso às autoridades nacionais competentes, a directiva imiscui-se de forma especialmente grave nos direitos fundamentais ao respeito pela vida privada e à protecção dos dados pessoais”.
O TJUE esclareceu que os Estados-Membros deveriam regular a questão da compaginação da Directiva com a Lei 32/2008.
Em Portugal a Lei 32/2008 não foi alterada.
Foi através do Ac. do TC nº 420/2017 de 13 de Julho  que o Estado português discutiu a constitucionalidade do artigo 6º da Lei 32/2008.
Este Acórdão, cuja leitura é importante, não considerou inconstitucional o citado art. 6º .
A Autora refere, de novo, o carácter inovador da Lei do CIbercirme no que se refere ao tema da recolha e conservação de prova digital, foi inovadora na medida em que trouxe meios de obtenção de provas  que até à sua entrada em vigor não existiam, como os tratados nos artigos 12º, 13º e 14º, LCC. Também regulou figuras processuais que já estavam previstas na legislação portuguesa, mas foram adaptadas aos crimes informáticos, ao ambiente digital, encontradas do artigo 15º ao 19º, LCC. 
MILITÃO, Renato Lopes, “A propósito da prova digital...”, p. 263. Citado pela Autora diz que “ se está perante uma prova fragmentária  , dispersa, frágil, volátil, alterável, instável, apagável e manipulável, invisível e espacialmente dispersa. Sendo, por isso, extremamente difícil, complexo, e, até, aleatório  detectar, preservar, apreender, analisar, tratar, garantir a fiabilidade, assegurar a compreensibilidade a apresentar em julgamento as provas digitais  ”, o que dificulta as investigações  e o combate à cibercriminalidade, sendo necessário normas que regulem eficazmente  e de forma autónoma a recolha de prova digital, tal como o fez a lei 109/2009, mas deveria ter feito o CPP”.
Em cima da mesa está o perigo de violar os direitos fundamentais em nome da descoberta da verdade.
PINHO, Carlos, “Os problemas interpretativos resultantes da Lei nº 32/2008, de 17 de Julho”, Revista do MP, nº 129 (Jan-Mar 2012), p. 79.  Diz que “actualmente existem três regimes diversos de aquisição processual de dados de base, de tráfego e de localização: o regime processual penal geral, previsto no Código de Processo Penal e dois regimes especiais, o da Lei 32/2008, de 17 de julho e o da Lei 109/2009, de 15 de setembro (Lei do Cibercrime), todos com requisitos diversos e com diversas estipulações e implicações relativamente às obrigações de conservação dos dados. A sua compatibilização prática depende de esforço interpretativo ”.  “(..)há muitos acórdãos recentes do Tribunal da Relação de Évora  que deixam claro que no concernente à recolha de prova digital já não é mais aplicado o CPP, e sim a lei do cibercrime, devendo o art. 189º, nº1, CPP ser considerado parcialmente revogado de forma tácita pelo art. 18º, nº4, LCC, e o art. 189º, nº2 da mesma forma parcial e tacitamente revogado pelo art. 9º, nº1, lei 32/2008 no que tange a esta matéria. Segundo ac. TRE de 6-01-15, o artigo 189º, CPP foi parcialmente revogado por ainda estar em vigor no que se refere “às comunicações entre presentes e às comunicações não telefónicas que não impliquem a intervenção de qualquer ‘sistema informático’, se tal for possível  ” (…)  Complementa, ainda, o ac. do TRE , de 6-01-15 que “as Leis nº 32/2008, de 1707 e 109/2009, de 15-09 (Lei do Cibercrime) revogaram a extensão do regime das escutas telefónicas, previstos nos artigos 187º a 190º do CPP, às áreas das ‘telecomunicações eletrónicas’, ‘crimes informáticos’ e ‘recolha de prova electrónica ’”.No mesmo sentido está o Acórdão do TRE de 20-01-15 que complementa que “esse mesmo regime processual das comunicações telefónicas deixara de ser aplicável à recolha de prova por ‘localização celular conservada’ – uma forma de recolha de prova electrónica – desde a entrada em vigor da Lei 32/2008 (...). Nessa Lei do Cibercrime coexistem dois regimes processuais: o regime dos artigos 11º a 17º e o regime dos artigos 18º e 19º do mesmo diploma. O regime processual dos artigos 11º a 17º surge como o regime processual ‘geral’ do cibercrime e da prova eletrónica. Isto porquanto existe um segundo catálogo na Lei nº109/2009, o do artigo 18º, nº1 do mesmo diploma a que corresponde um segundo regime processual de autorização e regulação probatória. Só a este segundo regime – o dos artigos 18º e 19º – são aplicáveis por remissão expressa os artigos 187º, 188º e 190º do CPP e sob condição de não contrariarem a Lei 109/200991 ”, e desde que esteja em causa a intercepção de comunicações  , o que demonstra a aplicação subsidiária  desses dispositivos legais do CPP. Nota-se que essa remissão expressa do artigo 18º, nº4, LCC, não incluiu o artigo 189º, CPP, que acabou por ter seu regime de extensão substituído. Assim, o artigo 189º, CPP “nunca é aplicável a crimes informáticos, seja qual for o catálogo aplicável ”. (…) Em compatibilidade com a jurisprudência, a doutrina  possui o mesmo posicionamento, conforme João Conde Correia que acertadamente determina que “do ponto de vista doutrinal parece claro, desde logo, que a Lei 32/2008 e, depois, a Lei 109/2009 revogaram tacitamente parcelas importantes do regime consagrado no artigo 189º do CPP, reduzindo muito o seu alargado âmbito de aplicação inicial. Essas leis extravagantes sobrepõem-se àquele regime geral, que só subsiste naquilo que não foi depois especialmente regulado ”. No mesmo sentido dispõe Paulo Dá Mesquita que “o acesso, a intercepção, o registo e a recolha dos dados de conteúdo das telecomunicações electrónicas encontra-se regulada na lei do cibercrime, exceptuando o universo que continua subordinado ao regime da intercepção e gravação de conversações ou comunicações telefónicas  ”, o que invoca mais ume vez a revogação tácita e parcial do art. 189º, CPP.   Entretanto, em sentido contrário existe o posicionamento de Pedro Verdelho, que dispõe que “este regime especial (intercepção de comunicações) não revogou o previsto no art. 189º, CPP nem colide com o mesmo, limitando-se a criar um regime específico, de âmbito limitado aos crimes descritos na Lei do Cibercrime. Dessa forma, o regime do art. 189º mantém-se em vigor para todos os restantes casos ”. Paulo Pinto de Albuquerque 100 partilha dessa mesma opinião da qual discordamos.  “
Resulta das várias posições avançadas pela Autora que ainda não há unanimidade relativamente a esta matéria.
Sugere João Correia que “urge, por isso, recuperar a centralidade normativa do CPP, enquanto instrumento nevrálgico da perseguição criminal, reservando para a legislação especial aquilo que é acessório, técnico, excepcional. Normas como as que prevêem a prova digital, pela sua importância, pelos interesses que regulam, pelas consequências que desencadeiam e, até, pela frequência com que são utilizadas devem constar do CPP ”. (…) incompatibilidade do artigo 15º, nº3, al. a, LCC com o artigo 174º, nº5, al. b, CPP. Enquanto a lei do cibercrime permite que o órgão de polícia criminal realize a pesquisa de dados informáticos sem prévia autorização da autoridade judiciária quando “a mesma for voluntariamente consentida por quem tiver a disponibilidade ou controlo desses dados”, o CPP permite que o órgão de polícia criminal efectue revistas e buscas sem prévia autorização da autoridade judiciária em que os visados consintam. Percebe-se que nem sempre quem detém a disponibilidade ou controlo desses dados é o visado. Assim, como proceder quando, por exemplo, for realizada uma busca em uma empresa, em que esta detém os dados mas não há o consentimento do visado? Poderão os órgãos de polícia criminal proceder às buscas sem despacho prévio? (…)
Problema semelhante e que carece de regulamentação legal ocorre quando o possuidor do computador for coercivamente obrigado a fornecer a palavra-passe (password) que dá acesso aos conteúdos do mesmo. Nesse sentido dispõe João Correia que “quando o notificado for o próprio arguido, não havendo entre nós nenhuma norma habilitante, dificilmente se poderão superar os constrangimentos processuais penais decorrentes do princípio nemo tenetur se ipsum accusare. O arguido não pode ser forçado a contribuir para a sua própria condenação. Ainda assim, não se tratando de um princípio absoluto, o legislador poderá criar situações circunscritas em que seja proporcional impor a colaboração do arguido (...). Quando o notificado for uma mera testemunha (situação menos provável, mas ainda possível) a solução será mais fácil. Excepcionando os casos em que ele possa validamente recusar-se a prestar declarações (arts. 132º, nº2 e 134º do CPP), a recusa em fornecer a password será ilegítima, podendo ser sancionada (…) ”.
Outra questão que tem gerado discussão é entre o artigo 17º, lei 109/2009 e o artigo 179º, CPP . O artigo 17º traz uma norma específica na lei do cibercrime sobre apreensão de correio electrónico (meio de obtenção de prova que tem sido recorrentemente utilizado) ou registos de comunicação de natureza semelhante, que não havia na decisão quadro pelo facto dela não conter disposições processuais. Do mesmo modo, a Convenção do Cibercrime também não possui norma específica sobre apreensão de correio electrónico, apesar de ter trazido disposições processuais no seu capítulo II. Assim, segundo constata Rui Cardoso, “a inspiração para o artigo 17º da LCC não está, pois, nem na Cciber, nem na Decisão-Quadro nº 2005/222/JAI. A origem deste artigo está apenas na proposta de Lei nº 289/X/4ª, tendo ela mesma exacta redacção que o artigo 19º desta  ”O problema surge quando o artigo 17º faz uma remissão para aplicação correspondente do regime da apreensão de correspondência do CPP, regulada nos artigos 179º e 252º. Porém, como o legislador não delimita o que deve ser aplicado correspondentemente, quem fará essa delimitação será o juiz no caso concreto, o que pode causar disposições contrárias entre ele e o MP, já que o MP quererá sempre que possível aceder aos dados, e o juiz deve intervir sempre que estiver em causa direitos fundamentais, dados pessoais, conforme artigo 32º, nº4, CRP.    Ao comparar o regime da lei do cibercrime sobre apreensão de correio electrónico e o regime do CPP sobre apreensão de correspondência, percebe-se que há algumas incompatibilizações resultantes de omissões  por parte da lei do cibercrime. Enquanto o CPP dispõe que deve-se tratar de crime punível com pena de prisão superior a três anos (artigo 179º, nº1, b), a lei do cibercrime nada diz; e enquanto o CPP regula que o juiz que autorizou ou ordenou a apreensão da correspondência deve ser o primeiro a tomar conhecimento do seu conteúdo (artigo 179º, nº3), a lei do cibercrime é omissa nesse ponto no que tange ao conteúdo dos e-mails. Além dessas questões, nenhum dos dois diplomas (art. 17º, LCC e 179º, nº1, CPP) deixa claro sobre a necessidade ou não de haver despacho judicial prévio a autorizar ou ordenar a recolha de mensagens por correio electrónico ou apreensão de correspondência.   No que tange a primeira questão, percebe-se que grande parte dos tipos legais de crimes previstos na lei do cibercrime não têm moldura penal superior a três anos. Além disso, mesmo os artigos 18º e 19º, lei 109/2009 que prevêem os meios de obtenção de prova mais intrusivos são aplicados aos crimes previstos na própria lei, independentemente da moldura penal. Assim, esse requisito do CPP para poder haver apreensão de correspondência não deve ser aplicado aos crimes da lei do cibercrime no que se refere a apreensão de correio electrónico. Dessa forma, a apreensão de correio electrónico também pode ser aplicada a qualquer crime, independentemente da sua moldura penal.  No que se refere à segunda questão, João Correia  , em conformidade com Costa Andrade, Rita Castanheira Neves e Pedro Verdelho , faz uma distinção entre e-mails lidos e não lidos, muito embora a lei do cibercrime não a faça, o que se relaciona com a distinção entre correspondência aberta e não aberta  , conforme dispõe Rui Cardoso que “a correspondência merece tutela desde o momento do envio, fechada, até ao momento da abertura pelo destinatário. Como afirma Costa Andrade, ‘é precisamente este facto – estar fechada – que define a fronteira da tutela penal do sigilo de correspondência e dos escritos, em geral’. Daí que, após aberta, a correspondência fique sujeita ao regime geral de apreensão, previsto no artigo 178º do CPP ”.
Note-se que a esta última questão está ultrapassada com o Acórdão de fixação de jurisprudência n.º 10/2023, de 10 de Novembro.
(…)  terceira problemática, ambos os diplomas dispõem que o juiz pode autorizar (o requerimento do MP no âmbito do inquérito) ou ordenar (quando há ordem do próprio juiz) por despacho a apreensão de correio electrónico (LCC) ou apreensão de correspondência (CPP), mas não dizem se o despacho tem ou não que ser prévio.    O gabinete do cibercrime, mais precisamente, Pedro Verdelho “A obtenção de prova...”, p. 123., tem defendido que o MP e os órgãos de polícia criminal podem ordenar ou autorizar uma apreensão provisória ou cautelar das mensagens de correio electrónico, que depois deverá ser submetida ao juiz e ser por ele validada (apenas nesse momento dá-se efectivamente a apreensão), não se exigindo que haja uma prévia decisão judicial para essa apreensão, posicionamento este que está de acordo com o já referido ac. TRG de 29-03-11. No entanto, entendemos que essa ideia de apreensão provisória não deve existir, deve haver despacho prévio do juiz da instrução. Isso pelo facto da lei dispor que o juiz pode autorizar ou ordenar, logo, a apreensão deve ser feita depois de haver despacho judicial. “
Diz a Autora “ quando não houver urgência, em uma situação normal, não pode haver apreensão de correio electrónico e registos de comunicação de natureza semelhante sem despacho prévio de autorização ou ordenação do juiz competente, sendo esta a interpretação mais protectora possível dos direitos fundamentais das pessoas, principalmente a reserva da intimidade da vida privada e a inviolabilidade e o sigilo das comunicações, todos amparados constitucionalmente nos artigos 26º, nº1, 34º e 18º, CRP.  
A RECOLHA DE PROVA EM SUPORTE  ELECTRÓNICO — EM PARTICULAR, A APREENSÃO DE CORREIO ELECTRÓNICO Sónia Fidalgo, JULGAR - N.º 38 – 2019 “Como referimos, a jurisprudência tem vindo a considerar que a apreensão de correio electrónico ou de registos de comunicações de natureza semelhante está dependente de um despacho judicial prévio e que o juiz que ordenou ou autorizou a diligência deve ser a primeira pessoa a tomar conhecimento do conteúdo das mensagens apreendidas. Os nossos tribunais têm entendido que o despacho do Ministério Público que ordena a apreensão é nulo (artigos 17.º da Lei do Cibercrime e 179.º, n.º 1, do Código de Processo Penal) e que a omissão da análise da correspondência apreendida pelo juiz de instrução criminal — sendo este um acto da competência exclusiva deste juiz (artigo 268.º, n.º 1, alínea d), do Código de Processo Penal) — constituirá uma nulidade nos termos do artigo 120.º, n.º 2, alínea d), do Código de Processo Penal, por se tratar de um acto legalmente obrigatório. Tudo o que conduzirá, a final, segundo a jurisprudência, a que a prova que resulta dessa apreensão seja prova proibida, não podendo ser valorada (artigos 18.º, 32.º, n.º 8, e 34.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa, e 126.º, n.º 3, do Código de Processo Penal)29. Enquanto a lei se mantiver com a redacção actual, não deve o Ministério Público, na sua função de direcção do inquérito, obedecendo em todas as intervenções processuais a critérios de estrita objectividade (artigo 53.º do Código de Processo Penal), deixar de requerer autorização judicial para apreensão de correio electrónico; não deve o juiz de instrução criminal deixar de ser a primeira pessoa a tomar conhecimento do conteúdo das mensagens de correio electrónico apreendidas, sob pena de, a final, se perderem elementos de grande interesse para a descoberta da verdade.”
(NB. Tudo o que se encontra a itálico e sinalizadao com “ é uma citação)
Podemos concluir que o Acórdão do STJ de 10/2023 de 10 Novembro veio dar alguns passos no sentido de se clarificar a aplicação do chamado regime do Cibercrime.
Porém, também verificámos que muito há, ainda, a desbravar nesta área, onde, mais do que em qualquer outra, a vida anda mais rápido que a norma.

1.2.7 A VALIDADE DA RECOLHA DE CORREIO ELECTRÓNICO
O Sr. Juiz de instrução entende ser nula a prova obtida com a apreensão de correio electrónico em, pelo menos, 100 das buscas realizadas na fase de inquérito.
           
TEMA
Verificar se o despacho dado pelo Sr. Juiz aquando da tomada de conhecimento, em primeira mão, do correio electrónico apreendido é suficiente em face do que dispõe o art. 179º nº 3 e 268º nº 1 al. d) do CPP

DECISÃO INSTRUTÓRIA
Diz o Sr. Juiz que quanto ao correio electrónico constante dos apensos de busca, 54, 55, 64, 81, 117, 121, 126, 140, 149, 149-A, 159, 3-A, 6, 6-A, 8, 10, 11, 12, 15, 16, 21, 23, 27, 28, 30, 31, 35, 53, 61, 62, 64, 66, 69, 71,72-A, 73, 80, 82, 87, 89, 92, 106, 107, 109, 113, 116, 120, 131, 132, 133, 134, 137, 138, 147, 164, 166, 175, pelo teor dos despachos judiciais proferidos no cumprimento do disposto nos artigos 179º nº 3 e 268 nº 1 al. d) do CPP, verifica-se que a tomada de conhecimento, em primeira mão, pelo juiz de instrução de criminal foi feita através de uma análise perfunctória , sendo que a lei fala, de forma clara, em tomar conhecimento do conteúdo e não proceder a uma análise perfunctória ou superficial.

APRECIANDO
Referiremos algumas das buscas supra referidas e os despachos do Sr. Juiz, sem pretendermos ser exaustivos.
Busca 3-A, - Apresentado os referidos suportes ao JIC para acesso ao seu conteúdo, nos termos do disposto no artº 179º, nº 3 do CPP, por despacho proferido em 11-02-2016, de fls. 25809, veio o JIC a consignar que:
“De uma análise perfunctória aos ficheiros contidos nos suportes magnéticos que me foi possível aceder, não se vislumbrou conteúdos subsumíveis à previsão das als. a) a c) do nº 6 do artº 188º do CPP, pelo que não se determina a destruição de quaisquer ficheiros.”
No mesmo despacho consta o seguinte (fls. 2810):
“Sem embargo e, porque se procedeu a uma análise perfunctória dos ficheiros apreendidos, determina-se que, caso venham a ser encontrados ficheiros com interesse para a prova, deverá o OPC proceder a cópia de tais ficheiros para novos suportes informáticos, procedendo, de seguida, à selagem dos suportes originais, o que permitirá que os ficheiros de cariz pessoal e sem interesse para os autos ou sujeitos a segredo, permaneçam resguardados, aquando da revelação da prova apreendida”
*
Busca 6, - Apresentado o referido suporte ao JIC para acesso ao seu conteúdo, nos termos do disposto no artº 179º, nº 3 do CPP, por despacho proferido em 25-03-2015, de fls. 14327, de fls. 26392, veio o JIC a consignar que:
De uma análise perfunctória aos ficheiros contidos nos suportes magnéticos que me foi possível aceder, não se vislumbrou conteúdos subsumíveis à previsão das als. a) a c) do nº 6 do artº 188º do CPP, pelo que não se determina a destruição de quaisquer ficheiros.
*
Busca 6-A, - Apresentado os referidos suportes ao JIC para acesso ao seu conteúdo, nos termos do disposto no artº 179º, nº 3 do CPP, por despacho proferido em 11-02-2016, de fls. 25809, veio o JIC a consignar que:
De uma análise perfunctória aos ficheiros contidos nos suportes magnéticos que me foi possível aceder, não se vislumbrou conteúdos subsumíveis à previsão das als. a) a c) do nº 6 do artº 188º do CPP, pelo que não se determina a destruição de quaisquer ficheiros.”.
*
Busca 8 -  Apresentado o referido suporte ao JIC para acesso ao seu conteúdo, nos termos do disposto no artº 179º, nº 3 do CPP, por despacho proferido em 14-04-2015, de fls. 14744, veio o JIC a consignar que:
De uma análise perfunctória aos ficheiros contidos nos suportes magnéticos que me foi possível aceder, não se vislumbrou conteúdos subsumíveis à previsão das als. a) a c) do nº 6 do artº 188º do CPP, pelo que não se determina a destruição de quaisquer ficheiros.”.
*
Busca 10 - Apresentado o referido suporte ao JIC para acesso ao seu conteúdo, nos termos do disposto no artº 179º, nº 3 do CPP, por despacho final proferido em 14-04-2015, de fls. 14745, veio o JIC a consignar que:
 “De uma análise perfunctória àqueles ficheiros não se vislumbrou conteúdos subsumíveis à previsão das als. a) a c) do nº 6 do artº 188º do CPP, pelo que não se determina a destruição de quaisquer ficheiros.” .
*
Busca 11 - Apresentado o referido suporte ao JIC para acesso ao seu conteúdo, nos termos do disposto no artº 179º, nº 3 do CPP, por despacho final proferido em 14-04-2015, de fls. 14745, veio o JIC a consignar que:
 “De uma análise perfunctória àqueles ficheiros não se vislumbrou conteúdos subsumíveis à previsão das als. a) a c) do nº 6 do artº 188º do CPP, pelo que não se determina a destruição de quaisquer ficheiros.” .
*
Busca 12 - Apresentado o referido suporte ao JIC para acesso ao seu conteúdo, nos termos do disposto no artº 179º, nº 3 do CPP, por despacho final proferido em 25-03-2015, de fls. 14327, veio o JIC a consignar que:
De uma análise perfunctória àqueles ficheiros não se vislumbrou conteúdos subsumíveis à previsão das als. a) a c) do nº 6 do artº 188º do CPP, pelo que não se determina a destruição de quaisquer ficheiros.” .
*
Busca 15 - Apresentado o referido suporte ao JIC para acesso ao seu conteúdo, nos termos do disposto no artº 179º, nº 3 do CPP, por despacho final proferido em 14/04/2015, de fls. 14745, veio o JIC a consignar que:
 De uma análise perfunctória àqueles ficheiros não se vislumbrou conteúdos subsumíveis à previsão das als. a) a c) do nº 6 do artº 188º do CPP, pelo que não se determina a destruição de quaisquer ficheiros.” .
*
Busca 16 -  Apresentado o referido suporte ao JIC para acesso ao seu conteúdo, nos termos do disposto no artº 179º, nº 3 do CPP, por despacho final proferido em 14/04/2015, de fls. 14745, veio o JIC a consignar que:
 De uma análise perfunctória àqueles ficheiros não se vislumbrou conteúdos subsumíveis à previsão das als. a) a c) do nº 6 do artº 188º do CPP, pelo que não se determina a destruição de quaisquer ficheiros.
Busca 21 - Apresentado o referido suporte ao JIC para acesso ao seu conteúdo, nos termos do disposto no artº 179º, nº 3 do CPP, por despacho final proferido em 14/04/2015, de fls. 14745, veio o JIC a consignar que:
 “De uma análise perfunctória àqueles ficheiros não se vislumbrou conteúdos subsumíveis à previsão das als. a) a c) do nº 6 do artº 188º do CPP, pelo que não se determina a destruição de quaisquer ficheiros.
Busca 23- Apresentado o referido suporte ao JIC para acesso ao seu conteúdo, nos termos do disposto no artº 179º, nº 3 do CPP, por despacho final proferido em 25/03/2015, de fls. 14327, veio o JIC a consignar que:
 De uma análise perfunctória àqueles ficheiros não se vislumbrou conteúdos subsumíveis à previsão das als. a) a c) do nº 6 do artº 188º do CPP, pelo que não se determina a destruição de quaisquer ficheiros.
Busca 27 -  Apresentado o referido suporte ao JIC para acesso ao seu conteúdo, nos termos do disposto no artº 179º, nº 3 do CPP, por despacho final proferido em 14/04/2015, de fls. 14745, veio o JIC a consignar que:
 “De uma análise perfunctória àqueles ficheiros não se vislumbrou conteúdos subsumíveis à previsão das als. a) a c) do nº 6 do artº 188º do CPP, pelo que não se determina a destruição de quaisquer ficheiros.”
Busca 28 - Apresentado o referido suporte ao JIC para acesso ao seu conteúdo, nos termos do disposto no artº 179º, nº 3 do CPP, por despacho final proferido em 29/01/2015, de fls. 10795, veio o JIC a consignar que:
 “Da visualização perfunctória, dos respectivos ficheiros, não foram detectados documentos de natureza estritamente pessoal susceptível de representar uma grave intromissão na reserva da vida privada dos visados e/ou ferir gravemente os direitos liberdades e garantias dos mesmos, outrossim foi detectada documentação eventualmente com interesse para a prova e para a descoberta da verdade.
Assim, não obstante, se afigurar existir também documentos que não tenham conexão com a matéria dos presentes autos, não determino a eliminação de quaisquer ficheiros contidos nos suportes supra mencionados, que ficarão disponíveis para a investigação proceder a selecção daqueles que interessem a prova dos presentes autos..”
Busca 30-  Apresentado o referido suporte ao JIC para acesso ao seu conteúdo, nos termos do disposto no artº 179º, nº 3 do CPP, por despacho final proferido em 05/10/2015, de fls. 21951, veio o JIC a consignar que:
 “Da sua visualização não detectei, perfunctoriamente, ficheiros que traduzam intromissão na vida privada dos visados pelo que os disponibilizo à investigação – ex vi do nº3 do artº 179ºº CPP”.
Busca 31- Apresentado o referido suporte ao JIC para acesso ao seu conteúdo, nos termos do disposto no artº 179º, nº 3 do CPP, por despacho final proferido em 14/04/2015, de fls. 14745, veio o JIC a consignar que:
 “De uma análise perfunctória àqueles ficheiros não se vislumbrou conteúdos subsumíveis à previsão das als. a) a c) do nº 6 do artº 188º do CPP, pelo que não se determina a destruição de quaisquer ficheiros.
*
Busca 35 - Apresentado os referidos suportes ao JIC para acesso ao seu conteúdo, nos termos do disposto no artº 179º, nº 3 do CPP, por despacho proferido em 25-03-2015, de fls. 14327, veio o JIC a consignar que:
 “De uma análise perfunctória aos ficheiros contidos nos suportes magnéticos que me foi possível aceder, não se vislumbrou conteúdos subsumíveis à previsão das als. a) a c) do nº 6 do artº 188º do CPP, pelo que não se determina a destruição de quaisquer ficheiros”.
*
Busca 39,  Busca 53- Apresentado os referidos suportes ao JIC para acesso ao seu conteúdo, nos termos do disposto no artº 179º, nº 3 do CPP, por despacho proferido em 14-04-2015, de fls. 14745, veio o JIC a consignar que:
 “De uma análise perfunctória àqueles ficheiros não se vislumbrou conteúdos subsumíveis à previsão das als. a) a c) do nº 6 do artº 188º do CPP, pelo que não se determina a destruição de quaisquer ficheiros.” .
*
Busca 61- Apresentado os referidos suportes ao JIC para acesso ao seu conteúdo, nos termos do disposto no artº 179º, nº 3 do CPP, por despacho proferido em 08-08-2017, de fls. 39630 veio o JIC a consignar que:
“De uma análise perfunctória àqueles ficheiros não se vislumbrou conteúdos subsumíveis à previsão das als. a) a c) do nº 6 do artº 188º do CPP, pelo que não se determina a destruição de quaisquer ficheiros.” .
*
Busca 62 - Apresentado os referidos suportes ao JIC para acesso ao seu conteúdo, nos termos do disposto no artº 179º, nº 3 do CPP, por primeiro despacho proferido em 16-06-2015, de fls. 17387 e despacho de 24-08-2015, de fls. 20814 veio o JIC a consignar que:
De uma análise perfunctória àqueles ficheiros não se vislumbrou conteúdos subsumíveis à previsão das als. a) a c) do nº 6 do artº 188º do CPP, pelo que não se determina a destruição de quaisquer ficheiros.” .
*
Busca 64- Apresentados os referidos suportes ao JIC para acesso ao seu conteúdo, nos termos do disposto no artº 179º, nº 3 do CPP, por primeiro despacho proferido em 05-10-2015, de fls. 21951 e despacho de 08-08-2017, de fls. 39630 veio o JIC a consignar que:
De uma análise perfunctória àqueles ficheiros não se vislumbrou conteúdos subsumíveis à previsão das als. a) a c) do nº 6 do artº 188º do CPP, pelo que não se determina a destruição de quaisquer ficheiros.” .
*
Busca 66 - Apresentados os referidos suportes ao JIC para acesso ao seu conteúdo, nos termos do disposto no artº 179º, nº 3 do CPP, por despacho de 08-08-2017, de fls. 39630 veio o JIC a consignar que:
 “De uma análise perfunctória àqueles ficheiros não se vislumbrou conteúdos subsumíveis à previsão das als. a) a c) do nº 6 do artº 188º do CPP, pelo que não se determina a destruição de quaisquer ficheiros.” .
*
Busca 69 - Apresentados os referidos suportes ao JIC para acesso ao seu conteúdo, nos termos do disposto no artº 179º, nº 3 do CPP, despacho de 16-06-2015, de fls. 17386 veio o JIC a consignar que:
De uma análise perfunctória àqueles ficheiros não se vislumbrou conteúdos subsumíveis à previsão das als. a) a c) do nº 6 do artº 188º do CPP, pelo que não se determina a destruição de quaisquer ficheiros.” .
*
Busca 71- Apresentados os referidos suportes ao JIC para acesso ao seu conteúdo, nos termos do disposto no artº 179º, nº 3 do CPP, despacho de 08-08-2017, de fls. 39630 veio o JIC a consignar que:
De uma análise perfunctória àqueles ficheiros não se vislumbrou conteúdos subsumíveis à previsão das als. a) a c) do nº 6 do artº 188º do CPP, pelo que não se determina a destruição de quaisquer ficheiros.” .
*
Busca 72-A - Apresentados os referidos suportes ao JIC para acesso ao seu conteúdo, nos termos do disposto no artº 179º, nº 3 do CPP, despacho de 10-09-2015, de fls. 21268 veio o JIC a consignar que:
De uma análise perfunctória àqueles ficheiros não se vislumbrou conteúdos subsumíveis à previsão das als. a) a c) do nº 6 do artº 188º do CPP, pelo que não se determina a destruição de quaisquer ficheiros.” .
*
Busca 73 -  Apresentados os referidos suportes ao JIC para acesso ao seu conteúdo, nos termos do disposto no artº 179º, nº 3 do CPP, por despacho proferido em 16-06-2015, de fls. 17387, veio o JIC a consignar que:
De uma análise perfunctória àqueles ficheiros não se vislumbrou conteúdos subsumíveis à previsão das als. a) a c) do nº 6 do artº 188º do CPP, pelo que não se determina a destruição de quaisquer ficheiros.” .
*
Busca 80 - Apresentado o referido suporte ao JIC para acesso ao seu conteúdo, nos termos do disposto no artº 179º, nº 3 do CPP, por despacho proferido na mesma data, 24-08-2015, de fls. 20814, veio o JIC a consignar que: Após ter percorrido perfunctoriamente o conteúdo dos ficheiros de estrutura de e-mail, contidos nos suportes autónomos, não vislumbrei quaisquer conteúdos que se revelassem manifestamente abrangidos pela previsão do artº 188º, nº 6 do CPP, pelo que não determino qualquer eliminação e disponibilizo, de imediato, os referidos suportes físicos à investigação para se proceder ao seu conhecimento e análise.”.
*
Busca 82 - Apresentado o referido suporte ao JIC para acesso ao seu conteúdo, nos termos do disposto no artº 179º, nº 3 do CPP, por despacho proferido na mesma data, 24-08-2015, de fls. 20814, veio o JIC a consignar que: “Após ter percorrido perfunctoriamente o conteúdo dos ficheiros de estrutura de e-mail, contidos nos suportes autónomos, não vislumbrei quaisquer conteúdos que se revelassem manifestamente abrangidos pela previsão do artº 188º, nº 6 do CPP, pelo que não determino qualquer eliminação e disponibilizo, de imediato, os referidos suportes físicos à investigação para se proceder ao seu conhecimento e análise.”.
Busca 87- Apresentado o referido suporte ao JIC para acesso ao seu conteúdo, nos termos do disposto no artº 179º, nº 3 do CPP, por despacho proferido na mesma data, 24-08-2015, de fls. 20814, veio o JIC a consignar que: “Após ter percorrido perfunctoriamente o conteúdo dos ficheiros de estrutura de e-mail, contidos nos suportes autónomos, não vislumbrei quaisquer conteúdos que se revelassem manifestamente abrangidos pela previsão do artº 188º, nº 6 do CPP, pelo que não determino qualquer eliminação e disponibilizo, de imediato, os referidos suportes físicos à investigação para se proceder ao seu conhecimento e análise.”.
*
Busca 89- aspresentado o referido suporte ao JIC para acesso ao seu conteúdo, nos termos do disposto no artº 179º, nº 3 do CPP, por despacho proferido na mesma data, 24-08-2015, de fls. 20814, veio o JIC a consignar que:
 “Após ter percorrido perfunctoriamente o conteúdo dos ficheiros de estrutura de e-mail, contidos nos suportes autónomos, não vislumbrei quaisquer conteúdos que se revelassem manifestamente abrangidos pela previsão do artº 188º, nº 6 do CPP, pelo que não determino qualquer eliminação e disponibilizo, de imediato, os referidos suportes físicos à investigação para se proceder ao seu conhecimento e análise.”.
*
Busca 92 - Nesse sentido, por despacho proferido 21-07-2015, de fls. 20449, veio o JIC, relativamente ao disco externo Toshiba com o S/N: 258ET6SJT3HB, a consignar que: “Após ter percorrido perfunctoriamente o conteúdo dos ficheiros de estrutura de e-mail, contidos nos suportes autónomos, não vislumbrei quaisquer conteúdos que se revelassem manifestamente abrangidos pela previsão do artº 188º, nº 6 do CPP, pelo que não determino qualquer eliminação e disponibilizo, de imediato, os referidos suportes físicos à investigação para se proceder ao seu conhecimento e análise.”.
Busca 92, apresentados novamente dispositivos relativos à busca, por despacho judicial proferido em 10-09-2015, de fls. 21268, veio o JIC a consignar que, relativamente aos suportes descritos nos Doc’s 82, 83 e 85:
 “De uma análise perfunctória àqueles ficheiros não se vislumbrou conteúdos subsumíveis a previsão das als. a) a c) do n° 6 do art° 188° do CPP, pelo que não se determina a destruição de quaisquer ficheiros”
Por despacho judicial proferido em 05-102015, de fls. 21951, veio o JIC a consignar que:
 “Tomei conhecimento dos elementos de estrutura de mail que me foram presentes. Da sua visualização não detectei, perfunctoriamente, ficheiros que traduzam intromissão na vida privada dos visados, pelo que os disponibilizo à investigação – ex vi do nº 3 do artº 179º do CPP.
*
Busca 106 - Apresentado o referido suporte ao JIC para acesso ao seu conteúdo, nos termos do disposto no artº 179º, nº 3 do CPP, por despacho proferido em 15-01-2016, de fls. 25066, veio o JIC a consignar que:
De uma análise perfunctória àqueles ficheiros não se vislumbrou conteúdos subsumíveis à previsão das als. a) a c) do nº 6 do artº 188º do CPP, pelo que não se determina a destruição de quaisquer ficheiros.” .
*
Busca 107- Apresentado o referido suporte ao JIC para acesso ao seu conteúdo, nos termos do disposto no artº 179º, nº 3 do CPP, por despacho proferido em 15-01-2016, de fls. 25066, veio o JIC a consignar que:
 “De uma análise perfunctória aqueles ficheiros não se vislumbrou conteúdos subsumíveis à previsão das als. a) a c) do nº 6 do artº 188º do CPP, pelo que não se determina a destruição de quaisquer ficheiros.” .
*
Busca 109- Apresentados os referidos suportes ao JIC para acesso ao seu conteúdo, nos termos do disposto no artº 179º, nº 3 do CPP, por despacho proferido em 15-01-2016, de fls. 25066 e 25067, veio o JIC a consignar que:
De uma análise perfunctória àqueles ficheiros não se vislumbrou conteúdos subsumíveis à previsão das als. a) a c) do nº 6 do artº 188º do CPP, pelo que não se determina a destruição de quaisquer ficheiros.” .
*
Busca 113 - Apresentado o referido suporte ao JIC para acesso ao seu conteúdo, nos termos do disposto no artº 179º, nº 3 do CPP, por despacho proferido em 11-02-2016, de fls. 25810, veio o JIC a consignar que:
De uma análise perfunctória àqueles ficheiros não se vislumbrou conteúdos subsumíveis à previsão das als. a) a c) do nº 6 do artº 188º do CPP, pelo que não se determina a destruição de quaisquer ficheiros.” .
*
Busca 116- Apresentado o suporte (disco externo Toshiba com o S/N:  Y5B1TYHVTZM5) pela primeira vez ao JIC para acesso ao seu conteúdo, nos termos do disposto no artº 179º, nº 3 do CPP, por despacho proferido em 19/07/2016, de fls. 30090, veio o JIC a consignar que:
De uma análise perfunctória àqueles ficheiros não se vislumbrou conteúdos subsumíveis à previsão das als. a) a c) do nº 6 do artº 188º do CPP, pelo que não se determina a destruição de quaisquer ficheiros.” .
Busca 120 - apresentados os suportes ao JIC para acesso ao seu conteúdo, nos termos do disposto no artº 179º, nº 3 do CPP, por despacho proferido em 19/07/2016, de fls. 30090, veio o JIC a consignar que:
De uma análise perfunctória àqueles ficheiros não se vislumbrou conteúdos subsumíveis à previsão das als. a) a c) do nº 6 do artº 188º do CPP, pelo que não se determina a destruição de quaisquer ficheiros.” .
*
Busca 131  -Apresentado o competente suporte ao JIC para acesso ao seu conteúdo, (já gravados pelos peritos da AT no disco do Apenso de Busca 49-A), nos termos do disposto no artº 179º, nº 3 do CPP, por despacho proferido em 09-09-2016, de fls. 30569, veio o JIC a consignar que:
De uma análise perfunctória aos ficheiros de estrutura de mail gravados nos supra identificados suportes magnéticos não se vislumbrou conteúdos subsumíveis à previsão das als. a) a c) do nº 6 do artº 188º do CPP, pelo que não se determina a destruição de quaisquer ficheiros.
*
Busca 132 - Apresentados os suportes ao JIC para acesso ao seu conteúdo, nos termos do disposto no artº 179º, nº 3 do CPP, por despacho proferido em 20-07-2016, o JIC releva para momento posterior a visualização dos ficheiros nele contidos.
Assim, por despacho judicial proferido em 16/08/2016, de fls. 30439, veio o JIC a consignar que:
De uma análise perfunctória aos ficheiros de estrutura de mail gravados nos supra identificados suportes magnéticos, não se vislumbrou conteúdos subsumíveis à previsão das als. a) a c) do nº 6 do artº 188º do CPP, pelo que não se determina a destruição de quaisquer ficheiros.” .
*
Busca 133- Apresentados os suportes ao JIC para acesso ao seu conteúdo, nos termos do disposto no artº 179º, nº 3 do CPP, por despacho proferido em 20-07-2016, o JIC releva para momento posterior a visualização dos ficheiros nele contidos.
Assim, por despacho judicial proferido em 16/08/2016, de fls. 30439, veio o JIC a consignar que:
De uma análise perfunctória aos ficheiros de estrutura de mail gravados nos supra identificados suportes magnéticos, não se vislumbrou conteúdos subsumíveis à previsão das als. a) a c) do nº 6 do artº 188º do CPP, pelo que não se determina a destruição de quaisquer ficheiros.” .
*
Busca 134 - Apresentados os suportes ao JIC para acesso ao seu conteúdo, nos termos do disposto no artº 179º, nº 3 do CPP, por despacho proferido em 20-07-2016, o JIC releva para momento posterior a visualização dos ficheiros nele contidos. Por despacho judicial proferido em 16/08/2016, de fls. 30439, veio o JIC a consignar que:
De uma análise perfunctória aos ficheiros de estrutura de mail gravados nos supra identificados suportes magnéticos, não se vislumbrou conteúdos subsumíveis à previsão das als. a) a c) do nº 6 do artº 188º do CPP, pelo que não se determina a destruição de quaisquer ficheiros.” .
*
Busca 137 -  por despacho judicial proferido em 16/08/2016, de fls. 30441, veio o JIC a consignar que: “De uma análise perfunctória aos ficheiros de estrutura de mail gravados nos supra identificados suportes magnéticos, não se vislumbrou conteúdos subsumíveis à previsão das als. a) a c) do nº 6 do artº 188º do CPP, pelo que não se determina a destruição de quaisquer ficheiros.” .
*
Busca 138 -  Presentes tais elementos em 08-08-2016 ao JIC, por despacho judicial proferido em 19-08-2016, de fls. 30531, relativamente aos doze postos de trabalho acima identificados, cujos ficheiros se encontram gravados nos 68 DVD’s (contendo 319.6 gigas) entregues pela visada pela busca, veio o JIC a consignar que:
De uma análise perfunctória aos ficheiros de estrutura de mail gravados nos supra identificados suportes magnéticos, não se vislumbrou conteúdos subsumíveis à previsão das als. a) a c) do nº 6 do artº 188º do CPP, pelo que não se determina a destruição de quaisquer ficheiros.” .
.”.
*
O Apenso de Busca 164, diz respeito a busca realizada em 22-05-2017, nas instalações da EMP09... LDA e da sociedade EMP13... - SOCIEDADE DE ADVOGADOS RL, da qual resultou, entre outras, à apreensão de correio electrónico.
Apresentados os suportes ao JIC para acesso ao seu conteúdo, nos termos do disposto no artº 179º, nº 3 do CPP, por despacho proferido em 01-07-2017, de fls. 38333, veio o JIC a consignar que:
De uma análise perfunctória aos ficheiros de estrutura de mail gravados nos supra identificados suportes magnéticos, não se vislumbrou conteúdos subsumíveis à previsão das als. a) a c) do nº 6 do artº 188º do CPP, pelo que não se determina a destruição de quaisquer ficheiros.
O Apenso de Busca 166, diz respeito a busca realizada em 22-05-2017, nas instalações do contabilista HHH da sociedade EMP14... SROC, da qual resultou, entre outras, à apreensão de correio electrónico.
Apresentados os suportes ao JIC para acesso ao seu conteúdo, nos termos do disposto no artº 179º, nº 3 do CPP, por despacho proferido em 01-07-2017, de fls. 38333, veio o JIC a consignar que:
De uma análise perfunctória aos ficheiros de estrutura de mail gravados nos supra identificados suportes magnéticos, não se vislumbrou conteúdos subsumíveis à previsão das als. a) a c) do nº 6 do artº 188º do CPP, pelo que não se determina a destruição de quaisquer ficheiros.” .
*
O Apenso de Busca 175, diz respeito a busca realizada em 09-06-2017, nas instalações da EMP15... SA, EMP16... SA e EMP17... SA, da qual resultou, entre outras, à apreensão de correio electrónico.
Apresentados os suportes ao JIC para acesso ao seu conteúdo, nos termos do disposto no artº 179º, nº 3 do CPP, por despacho proferido em 20-06-2017, de fls. 38885, veio o JIC a consignar que:
De uma análise perfunctória aos ficheiros de estrutura de mail gravados nos supra identificados suportes magnéticos, não se vislumbrou conteúdos subsumíveis à previsão das als. a) a c) do nº 6 do artº 188º do CPP, pelo que não se determina a destruição de quaisquer ficheiros.”.
As buscas repetem-se praticamente nos mesmos termos, assim como o despacho do sr. Juiz
- busca 164 - Consigno que tomei conhecimento dos “prints” dos ficheiros de correio electrónico supra identificados e que considero tais e-mails incluindo os seus anexos, com relevância para a prova e para a descoberta da verdade, conjugados com os demais elementos juntos aos autos, porquanto se reportam a intervenientes processuais e a temas que integram o objecto dos presentes autos, pelo que os valido e autorizo a sua junção em definitivo aos presentes autos - ex vi dos art.°s 17.° da Lei n.º 109/2009, de 15/09 e 179.° n.º 3, do CPP.
Limitar-nos-emos a citar um acórdão desta Relação de Lisboa, de 11.05.2023, tirado no processo 215/20.5T9LSB-C.L1-9 e com o qual concordamos.
Fazemos notar que, à data, ainda não tinha sido prolatado o Acórdão de fixação de jurisprudência de 11-10-2023.
Ali se escreveu:” (..) Seguindo os ensinamentos doutrinais do Exmº Procurador do Ministério Público Dr. João Conde Correia (em “Comentário Judiciário do Código de Processo Penal”, 3ª edição, Tomo II, págs. 657-669):
As regras relativas à apreensão foram alargadas pelo especialíssimo regime previsto, fora do CPP, através da Lei do Cibercrime para fazer face a novas realidades e inerentes especificidades, tais como dos dados informáticos e do correio electrónico. Justificando-se o sacrifício do interesse individual numa comunicação livre de interferências alheias, em prol do exercício do “ius puniendi” estadual.
Mas, a apreensão (mesmo gozando de legitimidade formal pela existência de prévia autorização ou ordem judicial de apreensão) não legitima, “per si”, a valoração dos elementos probatórios assim conseguidos.
Para o efeito, é ainda necessário que o Juiz seja a primeira pessoa a tomar conhecimento do conteúdo apreendido, sob pena de a omissão total do exame (enquanto acto processual legalmente obrigatório) configurar uma nulidade prevista no art. 120º, nº 2, al. d), do CPP.
E, depois, é necessário que o Juiz considere o respectivo conteúdo como relevante para a descoberta da verdade ou para a prova dos factos investigados. Esta ponderação judicial subsequente é sempre aferida em função do valor daquilo que concretamente tenha sido apreendido – sendo necessário este subsequente juízo de prognose favorável quanto àquilo que efectivamente tenha sido apreendido, para que o Juiz ordene a sua junção aos autos (através de despacho fundamentado e recorrível nos termos dos arts. 16º, nº 3, e 17º da LCC em conjugação com os arts. 97º, nº 5, e 399º do CPP “ex vi” do art. 28º da LCC), e só então ficará legitimada a sua utilização no processo.
Também recorrendo aos preciosos ensinamentos, quer doutrinais quer jurisprudenciais, expostos pelo Exmº Procurador e docente do CEJ Dr. Rui Cardoso (em “Apreensão de mensagens de correio electrónico e de natureza semelhante” contido em Jurisdição Penal do Centro de Estudos Judiciários – Direito Probatório, Substantivo e Processual Penal - 2019, págs. 61-122):
O regime especial contido na LCC relativo à pesquisa e recolha de dados já produzidos, mas preservados/armazenados em suporte electrónico, para poderem vir a servir de meios de prova [quer para crimes especiais ou cibercrimes previstos nos seus arts. 3º a 8º, quer para crimes cometidos por meio de um sistema informático, quer para quaisquer crimes em relação aos quais seja necessária a recolha de prova em suporte electrónico] justifica a compressão de direitos constitucionais, na medida do estritamente necessário para tal. (…) Ficando reservado ao Juiz de instrução o estritamente necessário à garantia de direitos dos visados, conjugando-o com as especificidades técnicas das comunicações electrónicas (muito diferentes da correspondência corpórea) e conjugando-o com a estrutura acusatória do processo penal. (…)
 A obrigatoriedade de ser o Juiz o primeiro a tomar conhecimento do conteúdo da correspondência corpórea fechada e apreendida (empossada) visa assegurar que o conteúdo da correspondência estava efectivamente nela contida. Não é para impedir que outros, que não o Juiz, tomem conhecimento do conteúdo dessa correspondência em caso de irrelevância probatória: se assim fosse, a decisão do Juiz de juntar ao processo ou devolver deveria ser irrecorrível – o que não é o caso. Ora, sem acesso ao respectivo conteúdo, o recurso da decisão seria uma mera ficção;
Sendo que, quanto ao conteúdo em suporte electrónico, a operação de “desencapsulamento” feita pelo JIC não é minimamente equiparável à abertura de correspondência corpórea, pois dados informáticos “encapsulados” que se supõe serem mensagens de correio electrónico ou semelhantes armazenadas no sistema informático não são o equivalente a correspondência fechada, porque: antes de mais, aquelas mensagens ou comunicações nunca estiveram fechadas; para além disso, tal não visa (nem consegue) assegurar a integridade do invólucro; finalmente, porque, por si não significa tomar conhecimento do respectivo conteúdo das mensagens;  (…) No CPP e na LCC, o critério da necessidade para a prova é o mesmo: grande interesse para a descoberta da verdade ou para a prova;
· O artigo 17.º da LCC não tem previsão sobre invalidades, pelo que deve operar a remissão para o CPP, aplicando-se o regime do artigo 179.º supra referido;
 O artigo 17.º da LCC não tem previsão sobre a apreensão de correspondência electrónica ou semelhante entre o arguido e o seu defensor, pelo que deve operar a remissão para o CPP (só será admissível se o juiz tiver fundadas razões para crer que aquela constitui objecto ou elemento de um crime).
 No que respeita aos procedimentos, no CPP os OPC's transmitem a correspondência intacta ao juiz que tiver autorizado ou ordenado a diligência e é este que procede à abertura e primeiro toma conhecimento do seu conteúdo; na LCC, durante o inquérito, no decurso de uma pesquisa informática ou de outro acesso legítimo a um sistema informático, o Ministério Público pode tomar conhecimento de dados ou documentos informáticos e apreendê-los cautelarmente, sem prévia autorização judicial, só estando sujeita a validação do juiz quando o conteúdo seja susceptível de revelar dados pessoais ou íntimos que possam pôr em causa a privacidade do respectivo titular ou terceiro; na LCC, durante o inquérito, no decurso de uma pesquisa informática ou de outro acesso legítimo a um sistema informático, se forem encontrados armazenados (nesse ou noutro sistema informático a que seja permitido acesso legítimo a partir do primeiro) mensagens de correio electrónico ou registos de comunicações de natureza semelhante, o juiz pode autorizar ou ordenar, por despacho, a apreensão daqueles que se afigurem de grande interesse para a descoberta da verdade ou para a prova;
. Em ambos os regimes há um primeiro momento de empossamento da correspondência corpórea/dados ou documentos informáticos ou correio electrónico ou registos de comunicações de natureza semelhante (abrangida pela ordem ou autorização judicial de apreensão), seguido do momento da tomada de conhecimento pelo Juiz, seguido do momento do conhecimento com fundamentada tomada de posição pelo Ministério Público e, finalmente, o momento da fundamentada e recorrível decisão judicial sobre a concreta admissão, ou não, como meio de prova a ser junto ao processo.
Sendo de salientar que a exigida tomada de conhecimento, em primeiro lugar, pelo JIC não visa impedir que outros tomem conhecimento subsequente do seu conteúdo.
Aliás, o seu não envio pelo JIC ao Ministério Público (antes da tomada de decisão pelo JIC) que impedisse o Ministério Público de tomar conhecimento do respectivo conteúdo, criaria um regime de segredo e, mais, faria com que o JIC assumisse a direcção do inquérito – algo que incumbe, exclusivamente, ao Ministério Público.              (…)
A «densificação» semântica da estrutura acusatória faz-se através da articulação de uma dimensão material (fases do processo) com uma dimensão orgânico-subjectiva (entidades competentes). Estrutura acusatória significa, no plano material, a distinção entre instrução, acusação e julgamento; no plano subjectivo, significa a diferenciação entre juiz de instrução (órgão de instrução) e juiz julgador (órgão julgador) e entre ambos e órgão acusador.
Durante o inquérito, o juiz de instrução deve ser apenas juiz de liberdades e garantias: juiz de controlo, não de iniciativa. Deve ser garante dos direitos do visado pela investigação criminal e controlador da actividade do Ministério Público e das polícias criminais que o coadjuvam. Não tendo nem devendo, por isso, ter qualquer empenho nos interesses em conflito, não tomando parte activa na investigação, não dominando o seu impulso, o seu objecto ou o seu resultado;
O Juiz chamado cada vez mais à boca de cena – num processo crescentemente complexo e onde o conflito verdade/direitos fundamentais se exacerba –, correlativamente exige-se-lhe que se alheie da investigação do caso e da dialéctica do processo.
O nº 4 do artigo 32.º da CRP prossegue a tutela de defesa dos direitos do cidadão no processo criminal e, nessa exacta medida, determina o monopólio pelo juiz da instrução, juiz-garante dos direitos fundamentais dos cidadãos («reserva do juiz»). Intervenção do juiz que vale — e só vale — no âmbito do núcleo da garantia constitucional. Ou seja, intervenção que apenas deve acontecer na estrita medida do necessário para protecção efectiva dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, mas não mais do que isso, sob pena de violação do acusatório e da imparcialidade do próprio juiz de instrução – que é uma decorrência do Estado de direito democrático (prevista no arts. 2º e 202º, nº 1 da CRP).
O juiz de instrução não pode ter qualquer “influência” ou “manipulação” sobre a definição do objecto do inquérito, deve ser alheio à definição da estratégia de investigação do Ministério Público e OPC's, devendo actuar apenas no campo da admissibilidade legal das intervenções requeridas. A competência do juiz de instrução durante a fase processual presidida pelo Ministério Público, sempre que estejam em causa actos que interferem com direitos fundamentais e outras matérias que a lei reserve ao juiz, obedece a um quadro de intervenção tipificada e provocada.(…)

Por isso, não se coadunaria com tal função do JIC proceder, oficiosamente, à selecção das provas recolhidas em suporte electrónico que são de grande interesse para a descoberta da verdade ou para a prova. Para além de tal não se traduzir em qualquer real garantia, violaria a estrutura acusatória do processo, pois essa é matéria essencial à direcção do inquérito e à definição do seu objecto e, assim, comprometeria a posição de imparcial juiz das liberdades.
Para além disso, alinhamo-nos na posição assumida por esta Relação de Lisboa em inúmeros acórdãos citados no Acórdão de 10/8/2020 (no processo nº 6330/18.8JFLSB-A.L1-3 acessível na dgsi.pt) no sentido de ser necessária uma intervenção inicial do Juiz no âmbito do art. 17º da LCC, isto é, a apreensão (enquanto empossamento) de mensagens de correio electrónico e/ou registos de comunicações de natureza semelhante, armazenados num sistema informático, carece sempre de autorização judicial ou ordem judicial prévia.
E, também, nos alinhamos com a posição assumida na decisão sumária de 6/2/2019 desta Relação de Lisboa (no processo nº 152/16.8TELSB em http://www.pgdlisboa.pt/jurel/jurmostradoc.php?nid=5594&codarea=57) segundo a qual: «[o] Juiz de Instrução deve ser o primeiro a tomar conhecimento das comunicações recolhidas, seja no momento em que estas são extraídas em busca por si presidida, seja ulteriormente quando os suportes onde estas foram alocadas lhe são apresentados”, mas “em casos como o dos autos, em que podem estar em causa milhares de documentos (emails), esse conhecimento objectivo de todo o conteúdo pelo JIC, tem-se afigurado de difícil concretização, todavia, nada obsta a que o Juiz de instrução, caso queira tomar previamente conhecimento desse conteúdo integral, o faça, seleccionando o que entender relevante e devolva depois o processo ao Ministério Público com aquilo que for pertinente para a investigação”, podendo ainda devolver ao Ministério Público todos os suportes, “devendo o Ministério Público, após visualização da totalidade dos conteúdos de correio electrónico e registos de comunicações contidos nos suportes em causa, dar deles conhecimento à Juíza de Instrução, a fim de então, esta decidir quais têm relevância para a investigação e quais devem ser anexados aos autos, com observância de todos os formalismos legais vigentes”.
Feita esta resenha legal, doutrinal e jurisprudencial, é tempo de voltarmos ao caso em apreço.

É indiscutível que houve prévio despacho judicial da Exmª JIC, transitado em julgado, autorizando a pesquisa e apreensão de dados, mensagens e correio electrónico relacionados com os crimes em investigação que fossem encontrados no servidor da sede da assistente, nos e-mails profissionais dos arguidos, no disco rígido do terminal Bloomberg e pastas que ali se encontrassem guardadas nas contas onedrive do arguido E.
Também é indiscutível que, na sequência dessa autorização judicial, foram apresentadas à Exmª Juiz um disco externo contendo 103GB de informação e uma PEN contendo 32.4GB de informação e que a mesma JIC tomou conhecimento, em primeiro lugar, por amostragem, do respectivo conteúdo. E, depois, a mesma JIC determinou que fossem enviadas ao Ministério Público para que este se pronunciasse sobre a relevância concreta para a prova e utilidade para a investigação em curso, com vista a subsequente decisão sobre junção, ou não, aos autos.
Por isso, a Exmª JIC autorizou essas apreensões de dados e documentos informáticos e de comunicações de correio electrónico que são meios de obtenção de prova electrónica.
Mas, prova esta que ainda não foi junta aos autos de inquérito – por isso mesmo, afigura-se-nos que [nesta sede, em face ao teor do despacho recorrido] está prejudicada qualquer apreciação sobre o concreto teor dessa prova e da legalidade, ou não, do seu teor. Apenas tendo sido validadas tais apreensões pela Exmª JIC através da tomada de conhecimento do respectivo conteúdo, por amostragem, com subsequente remessa dessa PEN e desse disco externo para o Ministério Público se pronunciar, antes de haver decisão judicial sobre a junção, ou não, aos autos de tais meios de prova electrónica.
Pois, conforme já referimos, o juiz de instrução (durante a fase de inquérito) não é um juiz investigador, é sim um juiz de direitos, liberdades e garantias a quem compete, nomeadamente, autorizar ou ordenar apreensões e a quem compete ser a primeira pessoa a tomar conhecimento da correspondência/correio electrónico/ registos de comunicações de natureza semelhante apreendidas.
E, depois dessa primeira tomada de conhecimento pelo JIC, caberá ao Ministério Público (enquanto autoridade judiciária que dirige o inquérito e a respectiva investigação criminal) a competência para tomar conhecimento de todos aqueles meios de prova em suporte electrónico apreendidos. Pois, só assim lhe será possível aferir e pronunciar-se, fundamentada e detalhadamente, sobre a concreta relevância probatória, ou não, de todos e cada um desses meios probatórios apreendidos em face dos crimes investigados pelo Ministério Público.
Por isso – contrariamente ao alegado pelos arguidos recorrentes e salvo o devido respeito – não consideramos que o despacho recorrido (contendo os descritos actos da Exmª JIC nos exactos termos supratranscritos) tenha provocado a alegada nulidade por insuficiência do inquérito prevista no art. 120º, nº 2, al. d), por remissão do art. 268º, nº 1, al. d), do CPP (segundo o qual: «Durante o inquérito compete exclusivamente ao juiz de instrução (…) Tomar conhecimento, em primeiro lugar, do conteúdo da correspondência apreendida, nos termos do nº 3 do art. 179º» ). (…) E, também conforme já referimos, a especificidades do regime especial da Lei do Cibercrime não se coaduna com a remissão total e acrítica (pretendida pelos recorrentes) para o regime geral do CPP – sob pena de se deitar por terra as, já sobreditas, virtualidades materiais e processuais conferidas pela LCC.
No âmbito da LCC, o Juiz de instrução é garante da compressão de direitos constitucionais, na medida do estritamente necessário, conjugado com as especificidades do domínio do cibercrime e com as especificidades técnicas da prova electrónica, nomeadamente das telecomunicações electrónicas – muito diferentes da tradicional correspondência corpórea a que se reporta o art. 179º, nº 3, do CPP.
Por isso, não consideramos ser obrigatório, em sede da Lei do Cibercrime (como é o caso dos autos) que o primeiro conhecimento judicial pelo JIC tenha de ser do respectivo conteúdo total /completo apreendido.
Ora, parece-nos óbvio que esta ponderação/avaliação, perante cada caso concreto no âmbito da Lei do Cibercrime, tem de ser feita pelo JIC após a tomada de conhecimento dos crimes investigados pelo Ministério Público, dos concretos factos indiciados e das respectivas provas necessárias para a descoberta da verdade material. (…) A este propósito importa referir o Acórdão do Tribunal Constitucional nº 651/2022 (acessível no respectivo site da internet), segundo o qual: Cabe ao Juiz de instrução a função de garantir os direitos fundamentais. Não lhe cabe, porém, concorrer com as funções do Ministério Público no inquérito. Ou seja, embora a direcção do inquérito seja da incumbência do Ministério Público e não de um Juiz, quando nesta fase se mostre necessário praticar quaisquer actos instrutórios que possam restringir severamente direitos fundamentais, deve ser um Juiz a decidir, na sua veste de Juiz das liberdades. Surgindo o Juiz de instrução como o garante dos direitos fundamentais dos diversos intervenientes no processo, ele não controla, porém, o exercício da acção penal, nem a bondade dos interesses invocados que pertence, por inteiro, ao Ministério Público.
A intervenção do Juiz de Instrução Criminal em sede de inquérito deve pautar-se por um princípio da intervenção enquanto Juiz das liberdades (e não como Juiz de investigação), respeitando o modelo constitucional de divisão de funções entre a magistratura judicial e a magistratura do Ministério Público (cfr. artigos 32.º, n.º 4 e 5, e 219.º da CRP).A reserva de Juiz comprime, portanto, a reserva do Ministério Público na direcção do inquérito. Uma tal compressão só encontra, porém, justificação na medida do necessário para a protecção efectiva dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos (sobre esta ponderação, vide Acórdão n.º 474/2012, 1.ª Secção, ponto 9.3.2.). O sacrifício ou compressão de direitos constitucionalmente protegidos, nomeadamente com a eventual junção de uma fotografia relativa ao âmbito da vida privada, não pode ser feito de ânimo leve pelo JIC, mas também não pode o JIC deixar de descurar as especificidades quer do domínio do cibercrime, quer da recolha de prova em suporte electrónico, quer das funções e reserva de competência do Ministério Público no âmbito do respectivo inquérito criminal em curso.
Ora, o raciocínio espelhado pelos recorrentes (parte interessada na lide enquanto arguidos/investigados) faz tábua rasa do supra-exposto e, por isso, não merece provimento. Aliás, a este propósito, não podemos deixar de citar as doutas palavras do Exmo Conselheiro Santos Cabral (no “Código de Processo Penal Comentado”, 3ª edição revista da ..., pág. 393) e que comungamos inteiramente:
Não merece aplauso o entendimento de alguns autores no sentido de que, para além das provas proibidas por intrínseca ilegitimidade objectiva, teríamos as provas proibidas por ilegitimidade procedimental se no processo concreto de restrição dos direitos fundamentais, não forem observados todos os requisitos formais para a legitimidade da intervenção. Pois, uma coisa é a autorização judicial, que corporiza a ultrapassagem de um direito constitucionalmente assegurado em função de outros interesses igualmente legítimos e outra, totalmente distinta, é o incumprimento de regras formais ou procedimentais, em relação a uma autorização já concedida. Aqui não está em causa nenhum dos pressupostos que informaram o juízo de proporcionalidade formulado pelo juiz ao conceder a respectiva autorização judicial para “quebra” de uma garantia constitucional, mas única e simplesmente uma regra procedimental que visa conformar a forma como aquela autorização judicial se concretiza processualmente, ou seja, uma regra de produção de prova.
Voltando ao caso em apreço, perante a apresentação das pastas (contidas no disco externo apreendido) com designações que remetem para a reserva da vida privada (família, amigos, fotografias) e perante a apresentação das comunicações de correio electrónico (contidas no disco apreendido e na PEN apreendida),
a Exmª JIC tomou conhecimento, em primeiro lugar, por amostragem, do conteúdo desse disco externo que continha 103 GG de informação e do conteúdo dessa PEN que continha 32.4 GB de informação. (…)
No mesmo sentido, ver Acórdão RLX 22.04.2021 184/12.5TELSB-N.L1-9 in www.dgsi.ptNas buscas a documentos, nomeadamente de correio electrónico quando em apenas algumas horas de um só dia se apreendem milhões de documentos, não é exigível, e bem, aos Juízes que presidem a essas diligências que tomem conhecimento de todas, e cada uma, das páginas de tais documentos, não sendo por isso que a apreensão respectiva é ilegal;”
(NB. Tudo o que se encontra a itálico e sinalizadao com “ é uma citação)
Nos termos do disposto no art. 179º nº 3 CPP  - O juiz que tiver autorizado ou ordenado a diligência é a primeira pessoa a tomar conhecimento do conteúdo da correspondência apreendida. Se a considerar relevante para a prova, fá-la juntar ao processo; caso contrário, restitui-a a quem de direito, não podendo ela ser utilizada como meio de prova, e fica ligado por dever de segredo relativamente àquilo de que tiver tomado conhecimento e não tiver interesse para a prova.
No caso em apreço, o Sr. Juiz tomou conhecimento do correio apreendido, entendendo nós que as expressões utilizadas foram adequadas a validar a apreensão.

DECISÃO
Em face do exposto considera-se que o acostumado despacho proferido pelo Sr. Juiz aquando da validação da apreensão do correio electrónico, cumpre, pelo mínimo,  os ditames da lei.
**
1.2.8 DA DECISÃO NA PARTE EM QUE DECLAROU NULOS ACTOS PROCESSUAIS      
A fls. 924 a 927 da DI, o Sr. JIC) atento o disposto nos art.ºs 18º, 34º, nº 1 e 4, 32º, nº 8, da C.R.P., art.ºs. 269º, nº 1, al. d), do C.P.P, 179º, nº 1, do C.P.P., conjugado com o art.º 17º, da Lei no 109/2009 e art.º 126º, nº 3, do C.P.P., declarou nulos os seguintes actos processuais:
a) O despacho do Ministério Público de fls. 30124, datado de 21/06/2016, no qual se determinou que a testemunha III procedesse à junção aos autos do disco externo contendo correio electrónico (Apenso de Busca 140);
b) O despacho judicial de fls. 31015 que determinou a apreensão do correio electrónico realizada no âmbito da busca 147 por falta de autorização judicial;
c) Os despachos judiciais fls. 13811, 16560, 18263, 28543, 28490, 38837, 29470, 31893, 39956, 37424, 25100, 25809, 6898, 25100, 6873, 6903, 6892, 8388, 8400, 8399, 8534, 8878, 13817, 15182, 15560, 19716, 15883, 18231, 18260, 18494, 18625, 18624, 23858, 25541, 28488, 29767, 30039, 31915, 38132, 38625 na parte em que foi autorizada a apreensão de correio electrónico a pessoas não suspeitas e fora das situações previstas na alínea a) do n.º 1 do art.º 179º do CPP;
d) A junção aos autos do correio electrónico relativo aos apensos de Busca 51, 119, 39, 40 e 41, por ausência de tomada de conhecimento pelo juiz, em primeira mão, do conteúdo do correio electrónico e por falta de decisão judicial a considerar qual o correio electrónico relevante para a prova;
e) O despacho do Ministério Público de fls. 39302, datado de 19/07/2017, no qual determinou a cópia e junção a estes autos do correio electrónico proveniente de outros processos (Apensos de Busca 179 a 188, 191 a 193 e 195);
f) declarou ainda, ao abrigo das acima referidas disposições legais, conjugadas com o disposto nos artigos 208º da CRP, 177º nº 5 e 180º do CPP e artigo 75º e 76º nº 1 e 4 do Estatuto da Ordem dos Advogados, a nulidade dos despachos judiciais constantes de fls. 15883 (Apenso de Busca 73), fls. 15560 (Apenso de Busca 69), fls. 19716 (Apenso de Busca 72-A), fls. 38132 (Apenso de Busca 164);
No que respeita a esta última alínea o Recorrente, a fls. 159 da motivação do recurso, diz que “Relativamente a alínea f) a fls. 926 respeitante ao correio electrónico apreendido nas buscas 69, 73, 72-A e 164, uma vez que apenas nas buscas 73 e 164 houve lugar à apreensão formal de correio electrónico (impressão de e-mails e sua junção ao processo) e que, a final, estes não se vieram a mostrar relevantes em sede de prova dos factos imputados na acusação, por economia processual não impugnaremos a decisão nessa parte.

1.2.8.1 ALÍNEAS A) E B) DO SEGMENTO DECISÓRIO A FLS. 924 A 927 

TEMA
Saber se houve alguma irregularidade na notificação de uma testemunha para juntar aos autos disco externo contendo cópia da sua caixa de correio electrónico no BESA ACTIF- (busca 140) e a bondade da decisão do Sr. Juiz que declarou nula a apreensão de correio electrónico realizada no âmbito da busca 147 por falta de autorização judicial e ausência de promoção da apreensão de correio electrónico pelo MP relativamente à busca.

DECISÃO INSTRUTÓRIA
O Sr. Juiz declarou a nulidade do despacho do MP proferido a fls. 30124 no âmbito da inquirição da testemunha III pelo qual se notificou aquela para juntar aos autos disco externo contendo cópia da sua caixa de correio electrónico no BESA ACTIF, que, depois de entregue voluntariamente, deu origem ao apenso de busca 140.
Considerou, ainda, no que toca à busca 147, que nem o despacho que autorizou a busca, nem a promoção do MP, refere o acesso a sistemas informáticos e apreensão de correspondência, incluindo via email.

RECORRENTE
O Recorrente diz que a testemunha III, de forma voluntária, se ofereceu para fornecer aos autos a cópia da sua caixa de correio electrónico, conforme se consignou a fls. 10 do auto do resumo da sua inquirição, constante do 3º volume do Apenso 1-C Resumos das Inquirições.
Refuta a posição tomada pelo Sr. Juiz porquanto na promoção efectuada pelo MP é feita referência à necessidade de recolher as comunicações remetidas dos departamentos centrais da CGD para o Gabinete de Empresas de ... – buscado. O Sr. Juiz remeteu para o teor dessa promoção.

APRECIANDO
O correio electrónico constante no Apenso de Busca 140, diz respeito a um disco externo, entregue no dia 01.08.2016, pela testemunha III, modelo ... ..., com o nº de serie ...1, contendo cópia da sua caixa de mail do BESA ASCTIF.
No dia 21 de Julho de 2016, conforme consta do auto de inquirição de fls. 30124, III, foi inquirido como testemunha nos presentes autos e não consta que tenha sido constituído arguido ao longo do processo.
A análise do correio electrónico da testemunha III teve lugar, na sequência de notificação aquando da sua inquirição para juntar aos autos o referido disco externo.
Por despacho judicial de fls. 30532, o correio electrónico apreendido no âmbito da busca 140 - disco externo, entregue no dia 01.08.2016, pela testemunha III, contendo copia da sua caixa de mail do BESA ASCTIF- foi presente ao juiz de instrução criminal, para efeitos do disposto no artigo 179° n° 3 do CPP, ou seja, para tomada de conhecimento do conteúdo da correspondência apreendida e decisão quanto à relevância para a prova. Essa apresentação teve lugar no dia 16.08.2016 e foi finda no dia 19 de Agosto de 2016 tendo sido proferido o seguinte despacho: «De uma análise perfunctória ao s ficheiros de estrutura “mail” gravados nos supra identificados suportes magnéticos não se vislumbrou conteúdos subsumíveis a previsão das als. a) a c) do n° 6 do art° 188° do CPP, pelo que não se determina a destruição de quaisquer ficheiros.».
Tal como já escrevemos supra nas notas prévias “Fora do campo de aplicação do artigo 17.º estão todas as situações que há consentimento de quem tem a disponibilidade ou controlo das mensagens de correio electrónico ou semelhantes (usualmente, aqueles que recebem e-mails ou sms com ameaças, injúrias, extorsões, etc.). Nesses casos, se o titular dos direitos que há a proteger voluntariamente deles prescinde, não é necessário fazer qualquer ponderação entre a protecção desses direitos e o interesse da administração da justiça, pelo que não é necessário fazer intervir o juiz de instrução. Assim, Ac. TRG 15.10.2012, P 68/10.1GCBRG.G1 (FERNANDO MONTERROSO) e ac. TRP 20.01.2016, P. 1145/08.4PBMTS.P1 (ARTUR OLIVEIRA).”
No que toca à busca 147, conforme consta dos autos, aquela foi autorizada por despacho judicial manuscrito, proferido em 04-11-2016, de fls. 31915:
“Nos termos e com os fundamentos de facto e de direito constantes da douta promoção que antecede, autorizo a realização de busca no local indicado – ex vi dos artºs 174º, nº 2, 176º, 178º e 181º do CPP, com referência aos crimes investigados de fraude fiscal, corrupção e branqueamento de capitais.
Para sua efectivação agendo o dia 9 de Novembro, pelas 10.30 horas, acto a que presidirei.
D.N. com cópia da promoção. Cumprido, devolva”  (Sic.)
Na promoção de fls. 31913,  o MP  requereu ao JI a emissão de mandados de busca em estabelecimento bancário, fazendo referência ao objectivo e fundamento da diligência requerida: a necessidade de recolher as comunicações remetidas dos departamentos centrais da CGD para o dito Gabinete de Empresas de ... buscado.
No mandado de busca e apreensão a fls. 2 do apenso 147 é feita referência expressa à correspondência electrónica, aí constando: Mais se consigna que todas as cartas ou outra correspondência que se encontre ainda fechada, mesmo em suporte informático, deverão ser inseridos em suporte digital autónomo e apresentados ao JIC, sem a sua prévia abertura, para exame e decisão sobre a sua junção, nos termos do art.0 1790-3, ex vi do art.0 1880, do CPP;
Do auto de busca em causa consta que foi efectuada pesquisa informática no servidor da buscada, bem como aos postos de trabalho, designadamente de JJJ, KKK e LLL, descritos nos autos como intervenientes no procedimento de financiamento a Vale do Lobo, de onde foram extraídos ficheiros de estrutura de email, num total de 4 DVD. Dos autos consta que JJJ foi inquirida na qualidade de testemunha, conforme Auto de fls. 313202. Conforme Auto de Inquirição de fls. 31336, KKK, foi inquirida na qualidade de testemunha. Conforme Auto de Inquirição de fls. 31416, LLL, foi inquirido na qualidade de testemunha, não constando dos autos que tenham sido constituídos arguidos nestes autos.
Apresentados os suportes ao JIC para acesso ao seu conteúdo, nos termos do disposto no artº 179º, nº 3 do CPP, por despacho proferido em 21-11-2016, de fls. 32561, veio o JIC a consignar que:
De uma análise perfunctória aos ficheiros de estrutura de mail gravados nos supra identificados suportes magnéticos, não se vislumbrou conteúdos subsumíveis à previsão das als. a) a c) do nº 6 do artº 188º do CPP, pelo que não se determina a destruição de quaisquer ficheiros
O Apenso de Busca 147, diz respeito à busca realizada em 09-11-2016, nas instalações da DIRECÇÃO DE EMPRESAS ... E Gabinete de Empresas de ... DA CGD, entre outras, à apreensão de correio electrónico.
Conforme consta dos autos, a presente busca foi autorizada por despacho judicial manuscrito, proferido em 04-11-2016, de fls. 31915, que abaixo transcrevemos:
Nos termos e com os fundamentos de facto e de direito constantes da douta promoção que antecede, autorizo a realização de busca no local indicado – ex vi dos artºs 174º, nº 2, 176º, 178º e 181º do CPP, com referência aos crimes investigados de fraude fiscal, corrupção e branqueamento de capitais.
Para sua efectivação agendo o dia 9 de Novembro, pelas 10.30 horas, acto a que presidirei.
D.N. com cópia da promoção. Cumprido, devolva”  (Sic.)
Apresentados os suportes ao JIC para acesso ao seu conteúdo, nos termos do disposto no artº 179º, nº 3 do CPP, por despacho proferido em 21-11-2016, de fls. 32561, veio o JIC a consignar que:
De uma análise perfunctória aos ficheiros de estrutura de mail gravados nos supra identificados suportes magnéticos, não se vislumbrou conteúdos subsumíveis à previsão das als. a) a c) do nº 6 do artº 188º do CPP, pelo que não se determina a destruição de quaisquer ficheiros.” .
*
O Sr. Juiz, por imposição legal, esteve presente na busca.
Deste modo, revoga-se a decisão do Sr. Juiz de instrução quando considerou nulo o despacho do Ministério Público de fls. 30124, datado de 21/06/2016, no qual determinou que a testemunha III procedesse à junção aos autos do disco externo contendo correio electrónico (apenso de Busca 140) e nula a apreensão de correio eletrónico realizada no âmbito da busca 147, considerando válidos os elementos de prova em causa. 

1.2.8.2 ALÍNEA C) DO SEGMENTO DECISÓRIO A FLS. 924 A 927:

TEMA
Está em causa apreciar a validade das apreensões de correio electrónico às pessoas identificadas no despacho recorrido.
 
DECISÃO INSTRUTÓRIA
Na alínea c) do segmento decisório, o Sr. JI declarou nulos os despachos judiciais fls. 13811, 16560, 18263, 28543, 28490, 38837, 29470, 31893, 39956, 37424, 25100, 25809, 6898, 25100, 6873, 6903, 6892, 8388, 8400, 8399, 8534, 8878, 13817, 15182, 15560, 19716, 15883, 18231, 18260, 18494, 18625, 18624, 23858, 25541, 28488, 29767, 30039, 31915, 38132, 38625, “na parte em que foi autorizada a apreensão de correio electrónico a pessoas não suspeitas e fora das situações previstas na alínea a) do n.º 1 do art.º 179º do CPP” e , consequentemente, nula a prova obtida com a apreensão efetuada do correio eletrónico, por ser prova proibida e insuscetível de valoração pelo Tribunal.
Assim decidiu o Sr. JI porquanto entende que, aplicando-se à apreensão do correio eletrónico o regime de apreensão de correspondência previsto no CPP, a mesma terá que seguir a disciplina do art.º 179º deste último diploma, daí resultando a impossibilidade processual de se apreender correio electrónico que não dos suspeitos ou arguidos e, in casu, o despacho judicial em causa não identificou os visados enquanto suspeitos ou arguidos.

RECORRENTE
Diz o recorrente que a Lei do Cibercrime, no seu art.º 11º, não faz qualquer restrição de âmbito subjectivo ao correio electrónico susceptível de ser apreendido, podendo assim tal apreensão respeitar a qualquer pessoa.

APRECIANDO
Nas notas prévias, fomos referindo as diversas posições na doutrina e na jurisprudência relativamente a este tema.
  Com a aprovação da Lei do Cibercrime, o regime de apreensão de correio electrónico passou a estar regulado no seu art.º 17º e, correspondentemente, por remissão desse artigo, pelos pressupostos e requisitos do art.º 179º do CPP, deixando assim de se aplicar a extensão legal prevista no art.º 189º, n.º 1, do CPP.
 Assim, nos termos do art.º 17º da Lei do Cibercrime, quando no decurso de uma  pesquisa informática […] forem encontrados […] mensagens de correio electrónico ou registos de comunicações de natureza semelhante, o juiz pode autorizar ou ordenar, por despacho, a apreensão daqueles que se afigurem ser de grande interesse para a descoberta da verdade ou para a prova, aplicando-se correspondentemente o regime de apreensão de correspondência previsto no Código de Processo Penal. (negrito nosso).
Por sua vez, o art.º 179º do CPP, sob a epígrafe Apreensão de correspondência, e na parte que aqui se revela pertinente, dispõe que apenas pode ser apreendida correspondência expedida pelo suspeito ou que lhe é dirigida (al. a) do n.º 1 do art.º), sendo o juiz que tiver autorizado ou ordenado aquela apreensão o primeiro a tomar conhecimento da correspondência apreendida, após o que, caso a considere relevante, fá-la juntar ao processo (n.º 3 do art.º).
Não desconhecemos as dificuldades de investigação no tipo de criminalidade em causa nos autos, nem a necessidade de alcançar um justo equilíbrio entre os direitos fundamentais ao respeito da vida privada e à proteção dos dados pessoais e a necessidade de administração da justiça penal inerente ao Estado de Direito.
Também não desconhecemos a discussão em torno da delimitação do âmbito subjetivo do regime de apreensão de mensagens de correio eletrónico.
Entendemos, contudo, com o Acórdão do TRL de 13.10.2021, proc. n.º 184/12.5TELSB-V.L1-3, que, estando o processo em fase de investigação aquando da prolação dos despachos judiciais em causa e face às promoções do Ministério Público, não era avisado por parte do Sr. Juiz fazer, à data, juízos de afastamento de suspeições.
Conforme refere o aludido aresto:
«Ainda no tocante à qualidade do cidadão LC_____, esgrimiu o juiz recorrido alguns argumentos no seu despacho defendendo que, que o mesmo foi ouvido na qualidade de testemunha e por consequência não sendo “suspeito”, não poderia o Ministério Público ter feito a apreensão da forma como o fez.
Estamos perante mais uma falsa questão. Apesar de ter sido citado e transcrito o conceito de “suspeito”, previsto no artº 1º al. e) do cód. proc. penal, no despacho impugnado, parece confundir-se o conceito de suspeito, com o de arguido.
Ainda que esta questão já não releve em face do que acima referimos, a verdade é que estando o processo ainda numa fase de investigação, não cabe ao sr. juiz conjecturar sobre se é ou não suspeito e muito menos poderá fazer um juízo de prognose quanto à sua qualidade futura, porquanto em termos de investigação, não raras vezes as testemunhas passam a suspeitos/arguidos e vice-versa.
Mas ainda assim, refira-se que de acordo com as afirmações do Ministério Público, “consta do mandado de revista, LC_____ já em Maio de 2009 (quando exercia as funções de financeiro na BPC/ODEBRECHT PORTUGAL) surgia referido num e-mail, remetido há alguns meses pelas autoridades judiciárias brasileiras, em que se alude a pagamentos suspeitos relativos à adjudicação da construção da barragem do Baixo-Sabor, pelo que não restam dúvidas que integra o conceito de suspeito constante do art. 1º al. e) do cód. proc. penal” – descrevendo-se depois os elementos que poderão ou não ser comprometedores para tal cidadão; factos que até podem conduzir eventualmente a indiciação futura.

Serve isto para referir que, estando o processo numa fase de investigação, é prematuro fazer conjecturas quanto ao afastamento de suspeições relacionadas com a qualidade processual de LC_____, pois o facto de ter sido ouvido como testemunha, não invalida que seja suspeito, o que não é de certo a mesma coisa que arguido e isso parece-nos claro, não estando por ora em causa. Uma coisa é a situação processual do indivíduo ouvido como testemunha e outra o aparelho de telemóvel que o mesmo detinha e que o Ministério considerou poder ter relevância para a investigação.»
Pelo exposto, revoga-se  o despacho de fls. 925, al. c) no qual o Sr. Juiz considerou nulos os despachos de fls. 13811, 16560, 18263, 28543, 28490, 38837, 29470, 31893, 39956, 37424, 25100, 25809, 6898, 25100, 6873, 6903, 6892, 8388, 8400, 8399, 8534, 8878, 13817, 15182, 15560, 19716, 15883, 18231, 18260, 18494, 18625, 18624, 23858, 25541, 28488, 29767, 30039, 31915, 38132, 38625.

1.2.8.3 ALÍNEA D) DO SEGMENTO DECISÓRIO A FLS. 924 A 927             

TEMA
Está em causa  concluir, ou não, pela existência de uma nulidade quando o Sr. Juiz não tenha sido o primeiro a tomar conhecimento do conteúdo electrónico apreendido, ou quando não profira decisão judicial a considerar qual o correio relevante para a prova.

DECISÃO INSTRUTÓRIA
O Sr. Juiz de instrução declarou nula a apreensão de correio electrónico realizada no âmbito das buscas 39, 40, 41, 51 e 119, por ausência de tomada de conhecimento pelo Juiz, em primeira mão, do conteúdo do correio electrónico e por falta de decisão judicial a considerar qual o correio relevante para a prova. Na mesma situação estaria o despacho dado pelo Sr. Juiz a fls. 40589.

RECORRENTE
Dizia o Recorrente que a questão jurídica aqui subjacente – apreendido, em inquérito, correio electrónico, qual a entidade que dele deve tomar conhecimento em primeiro lugar – tem-se revelado controversa, podendo-se identificar duas posições divergentes: No sentido de ser o MP o primeiro a tomar conhecimento: RUI CARDOSO, PEDRO VERDELHO, TIAGO CAIADO MALHEIRO E ACÓRDÃOS DO TRL DE 08.05.2018 (processo 6/16.8TELSB-C.L1-5) e de 22.04.2021 (184/12.5TELSB-N.L1-9), todos disponíveis no sítio da internet com o endereço dgsi.pt, tal como os restantes seguidamente referidos; No sentido de dever ser o JIC a tomar primeiro conhecimento: RITA CASTANHEIRA NEVES, PAULO DÁ MESQUITA, E ACÓRDÃOS DO TRL de 07.03.2018 (processo 184/12.5telsb), de 06.02.2018 (processo 1950/17.0t9lsb), de 11.01.2011 (processo 5412/08.9tdlsb) e de 04.02.2020 (processo 1286/14.9idlsb-a.l1-5).
Acrescenta o Recorrente que, no caso em concreto, acaba por ser inócua a defesa de uma ou outra das teses porquanto nenhum email foi recolhido e/ou referenciado na acusação.

DECISÃO
O Apenso de Busca 39, diz respeito a busca realizada em 07-01-2015, às instalações do BARCLAYS BANK, Agência Centro Premier ..., da qual resultou, entre outras, a apreensão de correio electrónico.
Conforme consta dos autos, a presente busca foi autorizada por despacho proferido pelo JIC, em 16-12-2014, de fls. 8878. No referido despacho, foi ainda, ao abrigo das disposições conjugadas nos artºs 179º, 180º, 182º, 183º, 268º-1, als. c) e e) e 269º-1, al. e) todos do CPP e artº 11º-1, al.) da Lei 109/2009, de 15/09, declarada a quebra de sigilo da correspondência e autorizada no âmbito das buscas a realizar, o acesso a todos os documentos informáticos contidos nos computadores e outros documentos abrangidos por sigilo existentes nos locais a buscar, objecto de mandado de busca.
Do auto de busca em causa consta que a informação referente aos gestores de conta do arguido BB, MMM, NNN e OOO, terá mais de 20Gb, não tendo sido possível proceder à sua partição, tendo a mesma de ser transferida em bloco, a partir do servidor parqueado no ..., estimando-se que essa importação não demoraria menos de 8 horas. Face às circunstâncias, foi notificado PPP, na qualidade de responsável operacional e de risco do Barclays Bank Landmark Premier, ..., para que a informação relativa aos gestores de conta fosse importada desde o ... e entregue no dia seguinte a elementos da AT.
Consta do Termo de Entrega e Recebimento do dia 08-01-2015, pelas 15h00, veio a ser entregue uma pen-drive de cor ... encriptada com tal informação. Resulta ainda daquele Termo que as mensagens dos referidos gestores que se encontram gravadas no arquivo “...” correspondem a, pelo menos 250Gb, não tendo sido possível concluir a sua extracção.
Conforme consta no Termo de Entrega e Recebimento de 14-01-2015, foi entregue 1 disco externo ..., com o S/N: ..., contendo toda a informação referente aos emails dos gestores acima indicados.  
Em 09-01-2015, de fls. 9638, foi MMM, inquirido como testemunha.
Não consta dos autos que o identificado MMM tenha sido constituído arguidos nos autos.
Não consta dos autos que NNN e OOO tenham sido tenham sido inquiridos como testemunhas ou que tenham sido constituídos arguidos nestes autos.
Do Relatório de Abril de 2016 do Núcleo de Informática Forense da AT, de fls. 27843 e ss., é possível verificar que o mesmo foi alvo de análise pericial.
O Apenso de Busca 40, diz respeito a busca realizada em 07-01-2015, às instalações do BPI AGÊNCIA DE ..., da qual resultou, entre outras, à apreensão de correio electrónico.
Conforme consta dos autos, a presente busca foi autorizada por despacho proferido pelo JIC, em 16-12-2014, de fls. 8878. No referido despacho, foi ainda, ao abrigo das disposições conjugadas nos artºs 179º, 180º, 182º, 183º, 268º-1, als. c) e e) e 269º-1, al. e) todos do CPP e artº 11º-1, al.) da Lei 109/2009, de 15/09, declarada a quebra de sigilo da correspondência e autorizada no âmbito das buscas a realizar, o acesso a todos os documentos informáticos contidos nos computadores e outros documentos abrangidos por sigilo existentes nos locais a buscar, objecto de mandado de busca.
Do auto de busca em causa consta que foi realizada pesquisa informática, com recurso a palavras passes ao computador portátil identificado na rede como “...”, de MMM, da qual resultou a gravação de 1 DVD com ficheiros de estrutura de email.
Em 09-01-2015, de fls. 9638, foi MMM, inquirido como testemunha.
Não consta dos autos que o identificado MMM tenha sido constituído arguidos nos autos.
Do Relatório de Abril de 2016 do Núcleo de Informática Forense da AT, de fls. 27843 e ss., é possível verificar que aquele suporte foi alvo de análise pericial.
Relativamente às buscas 39 e 40: a fls. 754 e 755, respectivamente, o Sr. Juiz consignou não identificar o despacho judicial proferido em cumprimento do disposto no n.º 3 do art.º 179º do CPP quando este se encontra a fls. 10892 dos autos, proferido na sequência de promoção do MP a fls. 10874.
Relativamente ao apenso de busca 41, consignou não identificar os despachos judiciais proferidos em cumprimento do disposto no n.º 3 do art.º 179º do CPP quando bastaria atentar no auto de busca no apenso de busca 41 para verificar que, e conforme aí consta, os ficheiros copiados das caixas de correio em causa foram visualizados pelos intervenientes e seleccionados com a sua colaboração, consentindo no seu uso para a prova.
Nos termos do n.º 3 do art.º 126º do CPP, “a contrario”, não são nulas as provas obtidas mediante intromissão na correspondência ou telecomunicações quando há consentimento do respectivo titular.
Apenso de Busca 51- correio electrónico apreendido, no dia 18 de Março de 2015.
Do auto de busca em causa consta que foi identificado um computador do seu gabinete, do qual foi retirado e apreendido o disco rígido com o nº de série: ...99, o qual foi inserto em envelope fechado com fita sigilo para apreciação judicial do seu conteúdo.
No Relatório Pericial elaborado pela AT, de fls. 19089, verificamos que o identificado disco rígido ... foi alvo de perícia e detectadas caixas de correio electrónico, as quais vieram a ser gravadas para o disco externo ... Elementos, identificado como “Busca 49”, designadamente para a pasta identificada como “122_26JUN”.
Do processo consta o seguinte despacho -  cfr. fls. 40589. “tomei conhecimento dos “prints” dos ficheiros de correio electrónico melhor identificados na douta promoção em apreço (fls. 40581 e 40582) e que considero tais emails incluindo os seus anexos, com relevância para a prova e para a descoberta da verdade, conjugados com os demais elementos junto aos autos, porquanto se reportarem a intervenientes processuais e a temas que integram o objecto dos presentes autos, pelo que os valido e autorizo a sua junção em definitivo aos presentes autos – ex vi dos artºs 17º, da lei nº 109/2009, de 15/2009, de 15/09 e artº 179º, nº 3 do CPP.” (sic.)
Daqui parece resultar que não foi o Sr. Juiz o primeiro a tomar conhecimento do correio electrónico.
O correio electrónico constante no Apenso de Busca 119, diz respeito ao correio electrónico apreendido, no dia 1 de Junho de 2016, na sequência da busca realizada à residência de QQQ. Do auto de busca em causa consta que foi apreendido um computador portátil, marca ....  O visado QQQ não foi ouvido nos presentes autos como testemunha, nem constituído arguido. A apreensão do correio electrónico ao visado QQQ teve lugar, na sequência do despacho judicial de 27 de Maio de 2016, (fls. 28490) ao abrigo das disposições legais previstas nos artigos 179°, 180°, 183°, 268 n° 1 al. c) e e) todos do CPP e artigo 11-1 al. c) da lei 109/2009, de 15-09. Por despacho judicial de fls. 29104, o correio electrónico apreendido no âmbito da busca 119 (passando a integrar o Apenso 49-A, cfr. promoção MP fls. 29066) - residência de QQQ - foi presente ao juiz de instrução criminal, para efeitos do disposto no artigo 179° n° 3 do CPP, ou seja, para tomada de conhecimento do conteúdo da correspondência apreendida e decisão quanto à relevância para a prova. Essa apresentação teve início no dia 23 de Junho de 2016, de fls. 29104, tendo ficado a aguardar prazo para conclusão da visualização. Por despacho proferido em 19-07-2016, de fls. 30090, o JIC dá por concluída a visualização do conteúdo dos ficheiros de estrutura de email do referido Apenso, ora gravados no disco externo ... do Apensos 49-A, tendo consignado que:  «De uma análise perfunctória ao s ficheiros de estrutura “mail” gravados nos supra identificados suportes magnéticos não se vislumbrou conteúdos subsumíveis a previsão das als. a) a c) do n° 6 do art° 188° do CPP, pelo que não s e determina a destruição de quaisquer ficheiros.».
Do Relatório de Abril de 2016 do Núcleo de Informática Forense da AT, de fls. 27843 e ss., é possível verificar que aquele suporte foi alvo de análise pericial.
Note-se, que, neste ínterim, foi proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça o Acórdão de fixação de Jurisprudência de 11.10.2023, tirado no processo 184/12.5TELSB-R.L1-A.S1 com o seguinte sumário: “«Na fase de inquérito, compete ao juiz de instrução ordenar ou autorizar a apreensão de mensagens de correio electrónico ou de outros registos de comunicações de natureza semelhante, independentemente de se encontrarem abertas (lidas) ou fechadas (não lidas), que se afigurem ser de grande interesse para descoberta da verdade ou para a prova, nos termos do art. 17.º, da Lei n.º 109/2009, de 15/09 (Lei do Cibercrime)».
Além disso, a discussão é meramente teórica, uma vez que, em todas as buscas referenciadas na al. D) a fls. 926 e despacho de 40589, nenhum e-mail com relevância probatória foi recolhido e/ou referenciado na acusação.
Deste modo,  revoga-se a decisão do Sr. Juiz de instrução que considerou nula a apreensão de correio electrónico realizada no âmbito das buscas 39, 40, 41, 51 e 119 e referida no despacho de fls. 40589, mantendo a sua validade.

1.2.8.4 ALÍNEA E) DO SEGMENTO DECISÓRIO A FLS. 924 A 927             

TEMA A APRECIAR
Saber se, para solicitar a um outro processo, certidão de correio electrónico aí apreendido, é necessária a prévia autorização do juiz.

DECISÃO INSTRUTÓRIA

O Sr. Jic declarou a nulidade do despacho do Ministério Público de fls. 39302, datado de 19/07/2017, no qual determinou a cópia e junção a estes autos do correio electrónico proveniente de outros processos (apensos de busca 179 a 188, 191 a 193 e 195). No entender do Sr Juiz dever-se-ia ter obtido autorização para tal, ou seja, do JIC destes autos, para aferir da verificação dos pressupostos de que depende a admissibilidade da apreensão de correio electrónico, designadamente o requisito do grande interesse para a descoberta da prova ou da verdade, cabendo ainda ao JIC ter primeiro conhecimento do conteúdo das mensagens de correio electrónico importadas.

RECORRENTE
Diz o Recorrente que nos apensos de busca 180, 185, 186, 187, 188, 191, 193 e 195  referidos pelo SR. JIc como sendo afectados pela nulidade do despacho do MP a fls. 39302, datado de 19/07/2017, que determinou a extracção de certidões do inquérito 207/11... que lhes deram origem, não constam quaisquer ficheiros de correio electrónico pelo que, também nesta parte, isto é, relativamente àquelas buscas, a decisão do SR. JIC que determinou inválido correio electrónico, que não existe, se revela inócua, logo inútil;
Refere, ainda, que o despacho do MP que determinou a extracção de certidão dos apensos de busca 15 e 51 do inquérito 207/11..., que deram origem, respectivamente, aos apensos de busca 193 e 195 destes autos e determinou, ainda, a junção de novos elementos de correio electrónico ao apenso de busca 181 e ao apenso R para o efeito criado, encontra-se a fls. 40359 a 40364, não sendo assim o despacho de fls. 39302 declarado nulo pelo SR. JI na citada alínea e), e, como tal, não podendo aqueles ser afectados por essa declaração de nulidade.

APRECIANDO
 Apenso de Busca 179 - trata-se de uma certidão extraída do NUIPC: 207/11..., que corre os seus termos no DCIAP, relativa à busca 32 daqueles autos, da qual constam ficheiros de estrutura de email.
 Apenso de Busca 180 - trata-se de uma certidão extraída do NUIPC: 207/11..., que corre os seus termos no DCIAP, relativa à busca 37 daqueles autos, da qual constam ficheiros de estrutura de email.
Apenso de Busca 181-  trata-se de uma certidão extraída do NUIPC: 207/11..., que corre os seus termos no DCIAP, relativa à busca 79 daqueles autos, da qual constam ficheiros de estrutura de email.
 Apenso de Busca 182 -trata-se de uma certidão extraída do NUIPC: 207/11..., que corre os seus termos no DCIAP, relativa à busca 82 daqueles autos, da qual constam ficheiros de estrutura de email.
 Apenso de Busca 183 - trata-se de uma certidão extraída do NUIPC: 207/11..., que corre os seus termos no DCIAP, relativa à busca 85 daqueles autos, da qual constam ficheiros de estrutura de email.
 Apenso de Busca 184-  trata-se de uma certidão extraída do NUIPC: 207/11..., que corre os seus termos no DCIAP, relativa à busca 87 daqueles autos, da qual constam ficheiros de estrutura de email.
 Apenso de Busca 185-  trata-se de uma certidão extraída do NUIPC: 207/11..., que corre os seus termos no DCIAP, relativa à busca 93 daqueles autos, da qual constam ficheiros de estrutura de email.
 Apenso de Busca 186 - trata-se de uma certidão extraída do NUIPC: 207/11..., que corre os seus termos no DCIAP, relativa à busca 95 daqueles autos, da qual constam ficheiros de estrutura de email.
 Apenso de Busca 188 - trata-se de uma certidão extraída do NUIPC: 207/11..., que corre os seus termos no DCIAP, relativa à busca 101 daqueles autos, da qual constam ficheiros de estrutura de email.
 Apenso de Busca 191 - trata-se de uma certidão extraída do NUIPC: 207/11..., que corre os seus termos no DCIAP, relativa à busca 105 daqueles autos, da qual constam ficheiros de estrutura de email.
 Apenso de Busca 192-  trata-se de uma certidão extraída do NUIPC: 207/11..., que corre os seus termos no DCIAP, relativa à busca 106 daqueles autos, da qual constam ficheiros de estrutura de email.
 Apenso de Busca 193 - trata-se de uma certidão extraída do NUIPC: 207/11..., que corre os seus termos no DCIAP, relativa à busca 15 daqueles autos, da qual constam ficheiros de estrutura de email.
 Apenso de Busca 195 - trata-se de uma certidão extraída do NUIPC: 207/11..., que corre os seus termos no DCIAP, relativa à busca 51 (Instalações das sociedades do GRUPO EMP18... SA) daqueles autos, da qual constam ficheiros de estrutura de email.
Parece-nos que, ao contrário do que diz o Recorrente, estamos sempre perante correio electrónico.
A questão, levantada pelo Recorrente, de que teria havido um lapso  do Sr. Juiz na indicação do despacho proferido pelo MP e que, por esse motivo, não se referia às buscas pretendidas, ruma  em sentido contrário ao que temos defendido neste acórdão.
Verificando-se que há um lapso manifesto, corrige-se o mesmo, mas não deixa de se apreciar a verdadeira questão.
Note-se que não está aqui em discussão a quem cabe a autoria da apreensão de correio electrónico.
O acórdão de Acórdão de Fixação de Jurisprudência de 11.10.2023, tirado no processo 184/12.5TELSB-R.L1-A.S1 veio esclarecer que “Na fase de inquérito, compete ao juiz de instrução ordenar ou autorizar a apreensão de mensagens de correio electrónico ou de outros registos de comunicações de natureza semelhante, independentemente de se encontrarem abertas (lidas) ou fechadas (não lidas), que se afigurem ser de grande interesse para descoberta da verdade ou para a prova, nos termos do art. 17.º, da Lei n.º 109/2009, de 15/09 (Lei do Cibercrime).
Nestes autos, o Magistrado do MP solicitou a extracção de certidão de um outro processo, certidão essa onde constava correio electrónico que tinha sido validamente adquirido por ter sido, primeiramente, apresentado ao JIC, e por este controlado.
Ao ter sido o MP a efectuar o pedido de certidão (seleccionando as mensagens que tinham relevo para estes autos) terá sido violada a Jurisprudência fixada?
 As mensagens (correio electrónico) em causa já estavam apreendidas, pelo que, a nosso ver, não faz sentido falar da competência para a apreensão.
No processo-fonte  já tinha havido o primeiro controlo pelo JI.
No processo de destino voltar-se-á a apreciar, designadamente para apurar se neste processo, aquele correio electrónico tem relevo probatório.
Conhecemos o entendimento de que a circunstância de não haver norma expressa quanto à importação de correio electrónico apreendido de um processo para outro não constitui obstáculo à sua efectivação, sendo certo que, como nos termos do art.º 11º da Lei do Cibercrime não há catálogo de crimes e inexiste qualquer restrição de âmbito subjectivo, não existe qualquer limitação a essa importação, que não a da sua validação pelo JIC no processo para onde aqueles vão ser exportados,  para aferição do preenchimento do requisito do grande interesse para a descoberta da verdade previsto no art.º 17º da Lei do Cibercrime. Porém, mesmo esta exigência não é unânime na jurisprudência.

CONCLUSÃO
Deste modo, revoga-se a decisão recorrida que declarou nulo o despacho do MP de fls. 39302 datado de 19.07.2017, no qual determinou a cópia e junção aos autos do correio eletrónico proveniente de outros processos (Apensos de busca 179 a 188, 191 a 193 e 195), mantendo a sua validade;

1.2.8.5 DA NULIDADE PROCESSUAL RESULTANTE DO FACTO DO ARGUIDO SS NÃO TER SIDO OUVIDO SOBRE A TOTALIDADE DA MATÉRIA CONSTANTE DA ACUSAÇÃO.
           
O TEMA  A DECIDIR
Está em causa saber se a circunstância de um arguido não ter sido confrontado, em sede de inquérito, com alguns dos factos que agora constam da acusação, constitui uma nulidade.

DECISÃO INSTRUTÓRIA
O Sr. Juiz, considerando que a falta de interrogatório do arguido quanto aos factos vertidos em 6.8., 6.9. e 7. da acusação consubstancia a omissão de acto legalmente obrigatório (cf. artigo 270.º, n.º 1, do Código de Processo Penal), julgou procedente a arguição da nulidade prevista no artigo 120.º, n.º 1, al. d) do Código de Processo Penal, tempestivamente arguida, e, consequentemente, determinou “a invalidade parcial do despacho de acusação no que concerne à factualidade constante em 6.8. (cf. artigos 3081.º a 3097), 6.9. (cf. artigos 3098.º a 3131.º e 3135.º a 3137.º, e 7. (artigos 3187.º a 3336.º e 13996.º a 13998.º), dando azo à prolação de Despacho de Não Pronúncia, nos termos conjugados dos artigos 120.º, n.º 2, al. d), 122.º, n.º 1 e 308.º, n.º 3, todos do Código de Processo Penal, no que concerne à imputação ao arguido SS:
- Um CRIME DE ABUSO DE CONFIANÇA, em co-autoria, relativamente à transferência de €3.967.611,00 (CHF 4.900.000,00), com origem em conta do banco PICTET titulada pelo arguido SS e com destino à conta do Banco LOMBARD ODIER titulada pela sociedade em offshore EMP05..., controlada pelo arguido CC, em 22 de Novembro de 2011, crime p. e p. pelo art.º 205. °, n.°s l e 4, alínea b) do Código Penal;
E de Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria, relativamente a transferência de €3.967.611,00 (CHF 4.900.000,00), com origem em conta do banco PICTET titulada pelo arguido SS e com destino a conta do Banco LOMBARD ODIER, titulada pela sociedade em offshore EMP05..., controlada pelo arguido CC, em 22 de Novembro de 2011, crime p. e p. pelo art.º 368º-A, n.°s 1, 2 e 3 do Código Penal.”
Mais acrescentou que a  recusa da interpretação feita pelo Ministério Público das normas vertidas nos artigos 61.º, n.º 1, alínea c) e do 141.º, n.º 4, alínea d), ambos do CPP, ao não permitir que o Arguido seja confrontado com todos os factos concretos, autónomos e essenciais que lhe são imputados na Acusação deduzida de forma a exercer cabalmente o seu direito ao contraditório, consubstancia uma violação do disposto nos artigos 20.º, n.ºs 1 e 4 e 32.º, n.ºs 1 e 5 da CRP e do artigo 6.º, n.º 1 e n.º 3, alínea a) da CEDH ex vi artigo 8.º CRP, sendo, por conseguinte, uma interpretação da lei materialmente inconstitucional.

RECORRENTE 
O Recorrente, reconhecendo que, de facto, não foram dados a conhecer ao arguido SS alguns dos factos constantes da acusação, entende que tal não constitui uma nulidade que afecte a acusação.

APRECIANDO
Constitui uma evidência que o arguido SS não foi ouvido  relativamente aos actos a que se reportam os artigos 3081º a 3129º (que dizem respeito à estratégia da PT para o ... gizada por CC e executada com a colaboração de SS mediante o pagamento de contrapartidas financeirase aos factos descritos na acusação artigos 3187.º a 3336.º, sob o título geral 7. Investimentos da Tesouraria da Portugal Telecom em aplicações financeiras do BES após 2010, e que se reportam ao favorecimento do BES por parte da PT na gestão da sua tesouraria.
Seguindo de muito perto o Acórdão n.º 72/2012 do Tribunal Constitucional, proferido no Processo n.° 502/2011, em 8.02.2012, publicado no Diário da República, 2.ª Série, n.° 51, de 12 de Março de 2012, bem como o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 12.11.2014, proferido no Processo n.° 248/13.8JACBR-B.C1, temos que as garantias de defesa, constitucionalmente consagradas no artigo 32.° da Constituição da República Portuguesa, mostram-se asseguradas nos autos.
O artigo 272.°, n.° 1, do C.P.P, estabelece que correndo inquérito contra pessoa determinada em relação à qual haja suspeita fundada da prática de crime, é obrigatório interrogá-la como arguido, salvo se não for possível notificá-la.
Se for possível a notificação, a falta de interrogatório como arguido, na fase de inquérito, de pessoa contra quem o mesmo corre por existência de fundadas suspeitas da prática de crime, integra a nulidade prevista no artigo 120.°, n.° 2, al. d), do Código de Processo Penal, de acordo com a jurisprudência fixada pelo Acórdão de Uniformização de Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça n.° 1/2006, proferido no processo n.° 2517/02, em 23.11.2005, publicado no Diário da República, 1.ª Série-A, n.° 1, de 02.01.2006. Tirando esta hipótese, não se vê que o CPP imponha a existência de interrogatórios complementares.
Decorre do Acórdão do STJ de fixação de jurisprudência n.° 1/2006 e do Acórdão do Tribunal Constitucional n.° 72/2012, , neste último decidindo-se “não julgar inconstitucionais as normas constantes dos artigos 272.°, n.° 1, 120.°, n.° 2, alínea d), 141.°, n.° 4, alínea c), e 144.°, todos do Código de Processo Penal, quando interpretadas no sentido de que não constitui nulidade, por insuficiência de inquérito, o não confronto do arguido, em interrogatório, com todos os factos concretos que venham a ser inseridos na acusação contra ele deduzida. (…)”
Note-se que foi esta a decisão do Sr. Juiz  no que toca ao arguido HH, quando concluiu  “que não tinham sido postergados os direitos de defesa do arguido, quando se não verifique, por parte deste, um conhecimento prévio à formulação da acusação de todos os factos que nela venham a ser inseridos
A este propósito seguiremos o entendimento defendido no processo nº 362/08.1JAAVR, Acórdão da Relação do Porto de 01.06.2014, conhecido como “FACE OCULTA”
“Ora, não se afigura integrar o referido vício de insuficiência de inquérito, a falta de confrontação do arguido devidamente constituído como tal, com factos indiciados depois do primeiro interrogatório judicial.
Na verdade, compete ao MP, enquanto titular do inquérito, de acordo com a estratégia por si definida, determinar quando deve proceder ao interrogatório de um suspeito.
O art. 32 da CRP quando se refere à estrutura acusatória do processo criminal implica que apenas após a acusação os arguidos tomam conhecimento da totalidade da factualidade que lhes é imputada e dos meios de prova que a sustentam.
A acusação ao definir e delimitar o objeto do processo permite ao arguido exercer de forma plena o contraditório.
Na verdade o preceito constitucional é bem claro ao referir a aplicação do principio do contraditório para os atos instrutórios e julgamento.
Na verdade a continua sujeição do arguido a interrogatórios durante a fase de inquérito seria até atentatória da celeridade processual que também tem consagração constitucional já que se prevê que o julgamento se realize no mais curto prazo possível.
Inexistindo qualquer imposição legal ou constitucional de re-interrogar o arguido sempre que se apurem factos novos relativamente aos que lhe foram comunicados em sede de interrogatório Tem de concluir-se que a omissão de tal diligência não acarreta a nulidade por insuficiência de inquérito, como se pronunciou o Tribunal Constitucional no Acórdão n°72/2012, que entendeu não serem inconstitucionais os artigos 272 n°1, 120 n°2 al.d), 141 n°4 al. c) e 144 do CPP, quando interpretados no sentido de que não constitui nulidade, por insuficiência de inquérito, o não confronto do arguido em interrogatório, com todos os factos concretos que venham a ser inseridos na acusação contra ele deduzida.
E nenhum prejuízo para as garantias de defesa se vislumbra nesta interpretação, já que o julgamento ainda poderá ser evitado através de diligências instrutórias.
Assim, também quanto a este ponto não assiste razão ao recorrente, pelo que este recurso, terá de ser julgado improcedente, não se vislumbrando também qualquer violação de princípios constitucionais como pretendido pelo recorrente.”
Não nos parece que seja, de relevo, acrescentar o que quer que seja.
Deste modo e concluindo, entendemos que não assiste razão ao arguido relativamente à falta de confrontação com a totalidade dos factos na pendência do inquérito.

CONCLUSÃO
Pelo exposto, revoga-se a decisão recorrida neste particular, declarando a validade do despacho de acusação no que concerne à factualidade constante em 6.8. (cf. artigos 3081.º a 3097), 6.9. (cf. artigos 3098.º a 3131.º e 3135.º a 3137.º) e 7. (artigos 3187.º a 3336.º e 13996.º a 13998.º).

1.3 ANÁLISE DOS CRIMES
Serão inseridos, em anexo, diagramas, como forma de auxiliar a leitura do texto e a compreensão dos vários caminhos seguidos pelo dinheiro, os quais  contendem de forma mais directa com os crimes de corrupção e branqueamento – anexo 5 ( cujo teor é parte integrante do acórdão)

1.3.1 DOS CRIMES DE CORRUPÇÃO

NA ACUSAÇÃO ESTÃO IMPUTADOS OS SEGUINTES CRIMES DE CORRUPÇÃO

1. - Um CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA DE TITULAR DE CARGO POLÍTICO, praticado pelo arguido AA EM CO-AUTORIA COM O ARGUIDO BB, com referência a actos praticados no interesse do Grupo LENA entre 2005 e 2011, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.º 1.°, 2.°, 3.°, n.º 1, alínea d), 17.°, n.º 1 e 19.°, n.ºs 2 e 3 da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n.º 108/2001, de 28 de Novembro (Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos), com referência aos art.º 28.° e 202.°, alínea b) do Código Penal;
2. Um CRIME DE CORRUPÇÃO ACTIVA DE TITULAR DE CARGO POLÍTICO, praticado por GG relativamente a pessoa do arguido AA, este com mediação do arguido BB e em benefício do Grupo LENA, com referências aos anos de 2005 a 2011, crime p. e p. pelos arts. 2°, 3°, n.º 1, alínea d) e 18°, n.º 1 e 19°, n.º 2 e 3 da Lei 34/87, de 16 de julho, com a redacção introduzida pela Lei n° 108/2001 28 de Novembro- Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos, com referência ao art. 202°, alínea b) do Código Penal
3.  Um CRIME DE CORRUPÇÃO ACTIVA praticado por LENA ENGENHARIA E CONSTRUÇÕES. SA em co-autoria com as sociedades LEC SGPS SA e LENA SGPS SA relativamente a factos referentes a pessoa do arguido AA, este com mediação do arguido BB e em benefício do Grupo LENA, com referências aos anos de 2005 a 2011, crime p. e p. pelos arts.374° e 374°-A, n.º 2 do Cód. Penal, com referência aos arts. 11°, n.º 2 e 202°, alínea b) do mesmo diploma legal;
*
4. UM CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA DE TITULAR DE CARGO POLÍTICO, praticado por AA, com referência a actos praticados no interesse do arguido CC, relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.º lº, 2.°, 3.°, n.º 1, alínea d), 17.°, n.º 1 e 19.°, n.ºs 2 e 3 da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n° 108/2001, de 28 de Novembro(Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos), com referência aos art.º 28.° e 202.°, alínea b) do Código Penal;
5.  Um CRIME DE CORRUPÇÃO ACTIVA DE TITULAR DE CARGO Político, praticado por  CC relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES no que concerne aos pagamentos efectuados ao arguido AA, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. l°, 2°, 3°, n.º 1, alínea d), 18°, n.º 1 e 19°, n.ºs 2 e 3 da Lei 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n° 108/2001, de 28 de Novembro- Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos, e 202°, alínea b) do Código Penal;
*
6. UM CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA DE TITULAR DE CARGO POLÍTICO, praticado por AA  em co-autoria com o arguido DD, com referencia a actos praticados no interesse dos arguidos EE e FF com utilização das sociedades do Grupo VALE DO LOBO, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.º 1º, 2.°, 3.°, n.º 1, alínea d), 17.°, n.º 1 e 19°., n.ºs 2 e 3 da Lei 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n° 108/2001, de 28 de Novembro- Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos, com referência aos art.º 28.° e 202.°, alínea b) do Código Penal;
7. Um CRIME DE CORRUPÇÃO ACTIVA DE TITULAR DE CARGO POLÍTICO, praticado por FF  em co-autoria com o arguido EE, com referência a actos praticados por AA e DD no interesse dos primeiros, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 2°, 3°, n.º 1, alínea d), 18°, n.º 1 e 19° n.ºs 2 e 3 e 30° da Lei 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n° 108/2001, de 28 de Novembro- Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos, com referência ao art.º 202°, alínea b) do Código Penal;
*
8.  Um CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA praticado por QQ relativamente aos pagamentos recebidos enquanto Director da RAVE, no âmbito da PPP, mediante acordo celebrado com a XMI, crime p. e p. pelo art.º 373. °, n.º 1 do Código Penal, com referência ao art.º 386. °, n.ºs 1 e 2 do mesmo diploma legal.
9. Um CRIME DE CORRUPÇÃO ACTIVA, praticado por BB em co-autoria com os arguidos GG e PP e com as sociedades XMI, LEC SA, LEC SGPS e LENA SA, relativamente ao funcionário QQ, nos anos de 2007 a 2009, crime p. e p. pelo art.º 374. °, n.º l do Código Penal;
*
10. Um CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA, praticado por RR relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES no que concerne aos pagamentos recebidos do arguido CC com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, crime p, e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 373°, n.º l, 374. °- A, n.ºs 2 e 3, e com referência aos arts.202°, al. b) e 386°, n.º 2, todos do Código Penal;
11. Um CRIME DE CORRUPÇÃO ACTIVA praticado por CC, relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES no que concerne aos pagamentos efectuados ao arguido RR, crime p. e p. pelos arts. 374°, n.º 1 e 374°-A, n.ºs 2 e 3 do Cód. Penal, com referência aos arts.202°, al. b) e 386°, n.º 2 do mesmo diploma legal;
*
12.  Um CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA praticado por SS, relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES no que concerne aos pagamentos recebidos do arguido CC com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts.373°, n.º l, 374°- A, n.ºs 2 e 3, e com referência aos arts.202°, al. b) e 386°, n.º 2, todos do Código Penal;
13. Um CRIME DE CORRUPÇÃO ACTIVA praticado por CC relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES no que concerne aos pagamentos efectuados ao arguido SS, crime p. e p. pelos arts. 374°, n.º 1 e 374°-A, n.ºs 2 e 3 do Cód. Penal, com referência aos arts.202°, al. b) e 386°, n.º 2 do mesmo diploma legal;
Estão aqui elencados os crimes de corrupção, do lado passivo e do lado activo, quer sejam crimes de corrupção de funcionário, p. e p. no Código Penal, quer sejam crime de corrupção de titular de cargo político, p. e p. na Lei n.º 34/87, de 16 de Julho.

1.3.1.1 A DETERMINAÇÃO DO MOMENTO DA CONSUMAÇÃO DO CRIME DE CORRUPÇÃO. 
Os crimes de corrupção mostram-se positivados normativamente com uma pluralidade de actos típicos, em sistema de dualidade alternativa típica, decorrente do uso da disjuntiva “ou”.
Referente à corrupção para ato ilícito, a Lei dos Crimes da Responsabilidade de Titulares de Cargos Políticos (n.º 34/87, de 16 de julho, na redação da Lei n.º 108/2001, de 28 de novembro, vigente à data dos acordos corruptivos), estabelece, nos artigos 18.º, n.º 1, e 16.º, n.º 1,  como ações típicas “der ou prometer”, na vertente ativa, e “solicitar ou aceitar” vantagem “ou a sua promessa”, na vertente passiva.
O Código Penal, por seu turno, reporta-se, nos artigos 374º, n.º 1, e 372º, n.º 1, (na versão da mesma Lei 108/2001, de 28.11), respetivamente, a “der ou prometer” vantagem, na vertente ativa, e “solicitar ou aceitar” vantagem ou a sua promessa”, na vertente passiva.
Ambos os enquadramentos legais, havendo reciprocidade das atuações do lado ativo e passivo, como é o caso dos autos, prevêem uma dualidade de ações típicas: promessa/aceitação da vantagem indevida ou pagamento/recebimento da vantagem indevida.
A determinação do momento da consumação do crime é um tema constante das conclusões do recurso, sem que, contudo, tenham sido adoptadas posições contrárias ou  equidistantes.
Há uma sintonia relativamente ao momento em que se considera consumado o crime de corrupção.
Em termos muito claros e simplistas podemos dizer que, quer o Recorrente, quer o Sr. Juiz de Instrução, entendem que o momento da consumação do crime de corrupção passiva e activa corresponde, respectivamente, ao momento da promessa de vantagem e aceitação da mesma.
Atrevemo-nos a dizer que a discussão se manteve porque, no âmbito do recurso,  começaram a confundir-se conceitos.
E é também esse o entendimento deste Tribunal.
Se perguntarmos quando se consuma o crime de corrupção, ou dito de outro modo, quando estão preenchidos os elementos do tipo, não temos dúvidas na resposta – aquando do acordo corruptivo.
Se não chegar a haver acordo e existir apenas pagamento/recebimento, obviamente a consumação ocorre, do lado activo e passivo, respectivamente, com o pagamento/recebimento.
A título doutrinal poderemos citar:
Manuel Leal-Henriques e Simas Santos, em “Código Penal Anotado”, Vol. II, 3.ª ed., Rei dos Livros, Lisboa, pág. 1616:
“O crime de corrupção ativa consuma-se com a simples dádiva ou promessa de dádiva e nesse momento é violado o bem jurídico protegido. O que quer dizer que a ilicitude a considerar é a resultante da prática daquelas condutas e não a que resulta da execução do ato ilícito por parte do corrupto passivo.”
Carla Cadador e Helena Moniz, em “Corrupção em Portugal – Avaliação legislativa e propostas de reforma, Formas do Crime”, ed. Universidade Católica, 2021, pág. 297:
“[P]edir/solicitar ou aceitar vantagem ou promessa de vantagem, e a de dar ou prometer vantagem, bastando isto para que o comportamento já constitua um comportamento típico e ilícito”.
Em termos jurisprudenciais, podem ser referidos, entre muitos outros:
O Ac. do TRC, proc. 247/94.7JAAVR.C1, datado de 01.10.2008, relatado por Fernando Ventura (disponível em dgsi.pt), onde se entendeu que “A consumação do crime de corrupção passiva ocorre no momento do conhecimento da solicitação de vantagem (ou promessa) pelo agente integrado no conceito jurídico-penal relevante pelo destinatário ou da sua aceitação, quando a iniciativa pertence a terceiro. Isto, independentemente da concretização de vantagem patrimonial ou não patrimonial ou da realização da conduta ilícita mercadejada, circunstâncias que não constituem elementos essenciais dos crimes de corrupção”.
O Ac. do STJ, proc. 736/03.04TOPRT.P2.S1, de 21.03.2018 (dgsi.pt), onde se defendeu que “o crime de corrupção activa tem-se por formalmente consumado com a mera promessa de vantagem e o crime de corrupção passiva considera-se formalmente consumado com a solicitação ou aceitação (ou a sua promessa), aquando do seu conhecimento pelo corruptor ativo.”.
Concluindo deste modo, onde está o litígio?
A divergência foi bem referida pelo Sr. Juiz na Decisão Instrutória e tem apenas que ver com o momento a partir do qual, nestes crimes, se deve iniciar a contagem do prazo da prescrição.
Esta antinomia a que se reconduz este tema, passou a ser tratada como “consumação para efeitos de prescrição (isto por causa da palavra “consumação usada no art. 119º do CP) e foi sendo encurtada para “consumação da corrupção”, o que gerou a confusão de conceitos já referida nos autos.
Assim, passemos à abordagem do tema, já devidamente enquadrado.

1.3.1.2 MOMENTO A PARTIR DO QUAL SE DEVE INICIAR A CONTAGEM DO PRAZO DA PRESCRIÇÃO, COMUMMENTE CHAMADO COMO “CONSUMAÇÃO PARA EFEITOS DA PRESCRIÇÃO”
Nos casos em que à promessa/aceitação se sucede, em momento cronologicamente posterior, o pagamento/recebimento, a questão referente ao momento do início da contagem do prazo de prescrição está envolta em profundas divergências, transversais aos Tribunais da Relação, ao Supremo Tribunal de Justiça e mesmo ao Tribunal Constitucional.
Relativamente a este tema existem duas posições:
- aquela que defende que o início do prazo da prescrição ocorre no momento do acordo corruptivo. Todos os comportamentos que estiverem depois deste primeiro acto são completamente irrelevantes para efeitos de prescrição.
Esta é a posição do Sr. Juiz que diz: “Assim, não podemos defender, em nome da realização da justiça, que quando não existe entrega da vantagem a mesma é irrelevante para o preenchimento do crime, para depois defendermos, quando está em causa o decurso do prazo de prescrição, que a entrega da vantagem já relevante para o momento da consumação do crime.”
- aquela que defende que o início do prazo da prescrição ocorre no momento do pagamento/recebimento. Parte da consumação do crime com o acordo corruptivo, mas entende que se houver um “mais” depois desse acordo, no caso o pagamento/recebimento, este tem que ser relevado.
Esta é a posição defendida pelo Recorrente.
Para esta tese importa distinguir entre consumação formal – com o acordo corruptivo - e consumação material – com o pagamento/recebimento.
Acolhendo a visão de JESCHEK, Hans-Heinrich e WEIGEND, Thomas, Tratado de Derecho Penal, Parte General, Trad. de Miguel Olmeda Cardenete, 5.ª ed., Granada, Editora Comares, 2002, p. 556: “(...), reiterada pelo Sr. Professor FIGUEIREDO DIAS em Direito Penal..., pp. 804-6: “A consumação típica ou formal verifica-se logo que o comportamento doloso preenche a totalidade dos elementos do tipo objetivo de ilícito. A consumação material, terminação ou conclusão dá-se apenas com a realização completa do conteúdo do ilícito em vista do qual foi erigida a incriminação, desde que o agente tenha actuado com o dolo de o realizar; dá-se, por outras palavras, com a verificação do resultado que interessa ainda à valoração do ilícito por directamente atinente aos bens jurídicos tutelados e à função de protecção da norma.” com significado prático “para efeito da prescrição do procedimento criminal”.

1.3.1.3 A IMPORTÂNCIA DA FIXAÇÃO Deste momento da CONSUMAÇÃO NO QUE TOCA À PRESCRIÇÃO
A  questão que se coloca e que tem a ver com aqueles que defendem que o início do prazo da prescrição deve partir do pagamento é a seguinte:
- se no art. 119º nº 1 do CP se refere que o prazo se inicia no momento da consumação do crime, como pode defender-se que, estando o crime consumado à data do acordo corruptivo, se dê valor, e, consequentemente, se inicie a contagem do prazo de prescrição nessa altura, aquando da consumação/pagamento (material, por contraposição a consumação formal que ocorre aquando do acordo corruptivo), considerando que esta última não faz parte do tipo ( embora  interesse à valoração do ilícito)?
No entendimento do Professor Figueiredo Dias (vide, “Direito Penal”, T.I, 3ª Ed., Geslegal, pág. 806) cumpre dar relevância ao resultado material não compreendido no tipo, nomeadamente em sede de início da contagem do prazo de prescrição do procedimento criminal.
Nas suas palavras: “A distinção entre consumação formal e material assume significado prático-normativo de relevo em múltiplos contextos. Antes de no da desistência da tentativa, como logo o comprova a circunstância de uma tal distinção ser pressuposta pelo art.º 24.º-1. (…) Mas também em matéria de comparticipação, na medida em que esta deve ocorrer, ao menos em via de princípio, antes da consumação. Ela pode relevar igualmente em tema de concurso de crimes (…) como para efeito de prescrição do procedimento criminal (art.º 119.º-4: “a verificação de resultado não compreendido no tipo de crime”).
A seu ver, essa relevância decorre de a “verificação do resultado” atípico “interessar ainda à valoração do ilícito por diretamente atinente aos bens jurídicos tutelados e à função de proteção da norma”.
Tal verifica-se em crimes de natureza diversa, como por exemplo nos crimes de perigo, em que o tipo é preenchido, independentemente da verificação do resultado que se pretende evitar.
Nos crimes de corrupção, tomando por referência os pagamentos/recebimentos ocorridos, que se sucedam a uma promessa/aceitação da promessa - situação mais comum - existe uma dualidade sucessiva de atos corruptivos, porém a consumação formal e material ocorrem em momentos temporalmente distintos.
Tem-se assistido a uma avolumar jurisprudencial e doutrinal no sentido de os referidos pagamentos/recebimentos, apesar de se constituírem como post factum não punível, não poderem deixar de ser relevados no que concerne ao início da contagem do prazo de prescrição.
O Professor Nuno Brandão, sob o título “Corrupção: A questão da consumação material e as suas consequências integrado na obra Corrupção em Portugal, Avaliação Legislativa e Propostas de Reforma, Editora Universidade Católica, 2021, “ citado pelo Recorrente, entende que o efeito lógico de atribuição de relevo típico ao momento da consumação material (vulgo, pagamento) é o de que será esse também o “dies a quo “do prazo de prescrição do procedimento relativo ao crime de corrupção respectivo.
Segundo aquele mesmo Autor, havendo inicialmente uma consumação formal, mas constatando-se que, depois desta, houve uma consumação material (simplificando, pagamento), haveria que dar significado a esta última e considerar esse o momento relevante para efeitos de contagem do início da prescrição.
Diz o Professor Nuno Brandão, obra citada, que “esta concepção, que, aliás, nada tem de original, sendo moeda corrente na generalidade dos ordenamentos penais que adoptam um modelo legislativo de repressão criminal da corrupção similar ao nosso, importa consequências de variada ordem, algumas delas demonstrativas da pura e simples insustentabilidade político-criminal da tese da atipicidade dos actos de consumação material posteriores à consumação formal. São essas consequências (…), designadamente, nas seguintes matérias: comparticipação, branqueamento de capitais, perda da vantagem e prescrição do procedimento criminal “
A favor da primeira tese, podemos referir, inter alia, o Ac. do TRL, proc. 712/00.9JFLSB.L1-5, relatado por Carlos Espírito Santo, datado de 13.07.2010 (conhecido pelo caso de Oeiras), no qual se começa por rejeitar a aplicação do n.º 2-a) e do n.º 4, do art.º 119º, por entender que o crime de corrupção não pode ser categorizado como crime permanente, nem como crime de resultado cortado.
Este aresto parte do pressuposto de que o crime de corrupção é instantâneo, dado que aviolação do bem jurídico é instantânea, ocorre no momento em que o agente solicita ou aceita a promessa de vantagem”, em razão do que “tudo o que se passa posteriormente é irrelevante; são os efeitos do crime, não são os seus elementos constitutivos”.
Tem implícito o argumento de que o termo “consumado”, constante do n.º 1, do citado artigo, é sinónimo de consumação formal ou típica.
Na fundamentação, o Acórdão alude a um parecer de Costa Andrade e Germano Marques da Silva e, bem assim, à posição defendida por Cláudia Cruz Santos, em cujas doutrinas se apoia.
Ainda a propósito desta tese não podemos deixar de referir o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 90/2019 (Relator Cláudio Monteiro, disponível em tribunalconstitucional.pt), que decidiu “[j]ulgar inconstitucional, por violação do princípio da legalidade criminal, os artigos 119.º, n.º 1 e 374.º, n.º 1, ambos do Código Penal, na versão posterior à entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de Março, quando interpretados no sentido de que o prazo de prescrição do crime de corrupção ativa é contado a partir da data em que ocorra a entrega de uma dada vantagem ao funcionário, e não a partir da data em que ocorra a promessa dessa vantagem.”
Pode ler-se neste aresto que:
«48. (…) [S]e o entendimento de que o crime de corrupção ativa não se consuma com a promessa de vantagem não encontra, de facto, respaldo no n.º 1 do artigo 374.º do Código Penal, o mesmo se pode dizer quanto à invocação do enunciado normativo constante do n.º 1 do artigo 119.º do mesmo Código.
A interpretação deste enunciado normativo na parte que se refere ao momento da consumação depende necessariamente do modo como dado crime se encontra legalmente tipificado – in casu, o crime previsto no n.º 1 do artigo 374.º do Código Penal –, pelo que a interpretação segundo a qual o crime de corrupção ativa não se encontra consumado com a promessa de vantagem, mas apenas com o recebimento da vantagem pelo funcionário não encontra, por si, suporte no preceituado no n.º 1 do artigo 119.º do CP.
Ou, dito de outro modo, não se encontra nesse preceito qualquer elemento textual que apoie entendimento normativo contrário ao que resulta da leitura do artigo 374.º, n.º 1, Código Penal; o elemento literal constante do n.º 1 do artigo 119.º não permite, por si, a afirmação de que mesmo que exista promessa da atribuição de vantagem, o início do prazo de prescrição do procedimento criminal relativo a crimes de corrupção ativa deve ser adiado até à entrega do “último suborno”.
49. Pelo contrário, se, nos termos do enunciado normativo constante do n.º 1 do artigo 374.º do Código Penal, o crime de corrupção ativa é tido por consumado com a promessa de entrega e, nessa exata medida, o agente já se encontra sujeito a perseguição criminal pela prática desse crime, então o início do prazo de prescrição acompanhará o momento do preenchimento do tipo, a não ser que o legislador tivesse expressamente adotado outra solução normativa – o que não se verifica.
(…)
53. Em definitivo, se de acordo com o expressamente enunciado pelo legislador, o bem jurídico protegido no crime de corrupção ativa é violado com a promessa de entrega da vantagem indevida e não necessariamente com a entrega dessa vantagem, o princípio da legalidade criminal, previsto no artigo 29.º, n.ºs 1 e 3, da Constituição, encontra-se irremediavelmente comprometido pela adoção da interpretação normativa, desfavorável ao arguido, segundo a qual o início do prazo de prescrição do crime de corrupção ativa deve ser retardado para o momento da entrega da coisa indevida, em detrimento do início da sua contagem com a promessa de entrega.
A decisão recorrida assenta o seu entendimento nos argumentos ínsitos neste aresto.
Por sua vez, a segunda tese foi defendida, entre outros, pelo Ac. do STJ, processo 736/03.4ORT.P2.S1, datado de 21.03.2018, conhecido pelo processo dos liquidatários (cujo recurso de constitucionalidade deu origem ao referido Acórdão do TC n.º 90/2019).
Na base estava o argumento de que a expressão normativa do n.º 1, do art.º 119.º do CP desde o dia em que o facto se tiver consumadodeve ser interpretado com o sentido “desde o dia em que finde a consumação material”, “a terminação”.
A conformidade constitucional desta interpretação (embora expressa em outro Ac. posterior) veio a passar por um segundo crivo do Tribunal Constitucional, que, em oposição ao Acórdão n.º 90/2019, decidiu, no Acórdão n.º 370/2023, “a) Não julgar inconstitucional o disposto nos artigos 119.º, n.º 1 e 374.º, n.º 1, ambos do Código Penal (na redação conferida pelo Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de março), quando interpretados no sentido de que o prazo de prescrição do crime de corrupção ativa é contado a partir da data em que ocorra entrega de uma dada vantagem ao funcionário, e não a partir da data em que ocorra a promessa dessa vantagem; e b) Não julgar inconstitucional o disposto nos artigos 119.º, n.º 1, do Código Penal e artigo 18.º, n.º 1, da Lei n.º 34/87, de 16 de julho (na redação conferida pela Lei n.º 108/2001, de 28 de novembro), quando interpretados no sentido de que o prazo prescricional do crime de corrupção ativa é contado a partir da data do pagamento dos subornos (leia-se, entrega da vantagem ao titular de cargo político) e não a partir da data em que se dá a oferta e aceitação da vantagem”.
Nele lê-se, com particular relevo:
“Perante um crime praticado por via da execução de uma multiplicidade de factos previstos no tipo, ainda que a infração se tenha por típica ou formalmente consumada com a prática do primeiro, a persistência na ação ofensiva do bem jurídico deslocará o ponto de consumação material para a realização do último facto lesivo. (…)
Este arquétipo constitui condição da realização da função tutelar do Direito criminal e repele paradoxos que decorreriam de outra forma de compreender as normas incriminatórias. Trata-se de um fator da coerência do sistema penal e da sua aptidão para a realização dos objetivos de política criminal a que se dirige: ainda que verificada a consumação típica (formal), a consumação material entender-se-á verificada apenas quando se esgote a atividade que sinaliza e convoca a anti-juridicidade inerente à incriminação, assim em consonância com o “mandato (também ele jurídico-constitucional) da esgotante valoração da matéria ilícita” (J. FIGUEIREDO DIAS, com colaboração de MARIA JOÃO ANTUNES, SUSANA AIRES DE SOUSA, NUNO BRANDÃO e SÓNIA FIDALGO, Direito Penal, Tomo I, 3.ª Ed., 2019, Gestlegal, p. 1151).
Está bom de ver, não se denota estarmos perante uma interpretação abrogante das normas previsivas dos artigos 374.º, n.º 1, do CP e 18.º, n.º 1, da Lei n.º 34/87, de 16 de julho, não se procede à integração do seu conteúdo, nem se convoca qualquer forma de analogia legis para concluir nos termos da doutrina adotada pelo acórdão recorrido: a pluralidade de atos compreendidos nos tipos significa atribuir relevo a todos eles quando se apure uma prática delitual nesses termos, o que importará a localização da consumação material da infração no último facto típico verificado:
“Deparamos [nos crimes de corrupção ativa e passiva], com efeito, com delitos de estrutura iterativa, por se tratar de tipos legais que incorporam uma pluralidade de atos individuais, aos quais é inerente a contraposição entre consumação formal e consumação material. Se é certo que para a consumação (formal) bastará a [promessa ou a] (…) realização dessa promessa, não estando os efeitos jurídicos das estatuições dos tipos legais dependentes nem da entrega da vantagem nem da sua aceitação, deve igualmente convir-se que, quando um Tribunal se depare com um cenário factual que agrega aquelas vários atos e momentos de forma sucessiva e interligada será a todo este quadro complexivo que deverá aplicar as normas incriminadoras respetivas. (…)
Quando, por seu turno, se demonstre que o agente público recebeu e aceitou a vantagem, depois de a ter solicitado ou de ter aceitado a sua promessa; e/ou que o corruptor entregou a vantagem ao agente público e este tomou conhecimento do seu recebimento, depois de a ter prometido, então é nos momentos da perceção do suborno e da sua disponibilização que os factos de corrupção passiva e ativa se deverão ter por (materialmente) consumados. Se se comprovar que houve um faseamento do fornecimento da vantagem, o termo da consumação material convergirá com a derradeira entrega.”
(NUNO BRANDÃO, Corrupção…, pp. 188-190)
(…)
É assim que a consumação do crime de corrupção é compreendida na Alemanha (onde a matéria não chega a ser sequer objeto de controvérsia), em Itália (Ac. Cassazione n.º 15.208/2010 de 25 de fevereiro de 2010, distinguindo uma forma de comissão «promessa seguida de entrega» e outra, subsidiária à primeira, de «promessa não-seguida de entrega» - Guida al Diritto italiano, gadit.it), em França (Acórdão da Cour de Cassation de 8 de outubro de 2003 no Proc. 03-82.589, considerando que, no âmbito de um pacto corruptivo em que intervém gestor bancário, cada um dos atos de concessão de empréstimos a taxas bonificadas integrados na execução do acordo importa uma nova localização da consumação do crime; courdecassation.fr) e no Brasil, países cujos respetivos quadros legais são francamente aparentados com o português em matéria de incriminação legal da corrupção (…)”.
No mesmo sentido, o Professor André Lamas Leite, “ Algumas notas sobre a consumação dos crimes de corrupção (no fenómeno desportivo) e sobre a prescrição do procedimento criminal “, in Academia.edu (updates@academia-mail.com):
“(…)  O art. 119.°, n.° 1 tem, como todas as normas, de ser interpretado e nele encontramos – seja na corrupção activa, seja na passiva – a hipótese de, na prática, existirem tais crimes em estrutura de mera consumação formal ou de terminação. As regras da boa hermenêutica aconselham a que ambas sejam respeitadas, o que, do prisma prescricional, corresponde a dizer que o prazo a quo se inicia com a mera oferta, dádiva, promessa, solicitação ou aceitação sempre que não há terminação. Quando de todo o procedimento sujeito a julgamento se retira que os factos dados como provados mostram que houve efectivo recebimento e entrega da vantagem, então aí o dies a quo só ocorre nesse último momento. Defender o contrário não encontra acolhimento no texto do art. 119.°, n.° 1, na interpretação que propomos de “consumação”, para além de conduzir a resultados catastróficos do prisma político-criminal, e ilógicos quanto ao amplo leque de protecção desejado nos crimes corruptivos, o que o intérprete é obrigado, pelo Código Civil, a afastar. Por fim, dado não vislumbrarmos, de imediato, pelo menos, conteúdo útil em “resultado não compreendido no tipo”, deixamos a inquietação sobre se faz ou não sentido manter o n.° 4 do art. 119.°, assim suscitando o debate.”
Aqui chegados, cumpre tomar posição.

1.3.1.4 A NOSSA POSIÇÃO
Este tribunal entende- em sintonia com a Decisão Instrutória e o Recorrente – que o crime de corrupção se consuma com o acordo corruptivo (estão verificados todos os elementos do tipo).
Se depois deste acordo houver um “mais”, no caso, o pagamento, deve ser a partir desta última data que se inicia a contagem do prazo da prescrição.
O art. 119º nº 1 do CPP permite a interpretação da consideração do resultado (a existir) para efeitos de início de contagem do prazo prescricional.
Estamos cientes que as discórdias jurisprudenciais só poderão ser esclarecidas através de decisões de uniformização da jurisprudência ou alteração legislativa (no sentido de esclarecer ou valorar as condutas típicas a jusante, na hipótese de ações sucessivas).
O legislador pretendeu, ao dar relevância típica autónoma à mera “promessa/aceitação da promessa”, proteger de modo antecipado o bem jurídico da autonomia intencional do Estado.
Porém, o pagamento/recebimento que se segue à promessa/aceitação não deixa de ser o expoente máximo da lesão do bem jurídico, o momento em que essa lesão é mais intensa, e é assim sentido comunitariamente.
Punir o acordo corruptivo e considerar irrelevante a sua execução, sequer para efeitos de prescrição, pode conduzir, em última instância, ao sentimento de que “o crime compensa”, posto que o pagamento/recebimento nenhum valor jurídico-penal tem, o que contribui para a erosão da confiança comunitária na proteção do bem jurídico.
Nessa medida, não relevar juridicamente tais pagamentos representa, em última instância, uma desvalorização da tutela do bem jurídico, que legitimou a criação do tipo.
Para efeitos de prescrição, a conduta do agente terá de ser avaliada como um todo.

1.3.1.5 DA INCONSTITUCIONALIDADE DA INTERPRETAÇÃO DO ARTIGO 119 Nº 1 E ART. 374º DO CP.

DECISÃO INSTRUTÓRIA
O Sr. Juiz julgou inconstitucional, por violação do princípio da legalidade, os artigos 119º nº 1 e 374º nº 1, ambos do Código Penal, na versão posterior à entrada em vigor do Decreto-Lei nº 48/95, de 15 de Março, quando interpretada no sentido de que o prazo de prescrição do crime de corrupção activa é contado a partir da data em que ocorra a entrega de uma dada vantagem ao funcionário, e não a partir da data em que ocorra a promessa dessa vantagem.
           
APRECIANDO
Relativamente a esta questão, este Tribunal remete para o Acórdão do Tribunal Constitucional nº 370/2023, com o qual concorda, não considerando inconstitucional a interpretação normativa em causa.

1.3.1.6 A FALTA DE EFEITO PRÁTICO DA TOMADA DE POSIÇÃO NA DECISÃO INSTRUTÓRIA
Toda esta discussão a propósito do momento da consumação do crime de corrupção para efeitos da prescrição, não obstante ter dado origem a longas dissertações nas diversas peças processuais, acaba, no caso destes autos, por ser estéril (tendo por referência  os crimes analisados pelo Sr. Juiz na Decisão Instrutória)
Na verdade, a questão da prescrição desses crimes de corrupção em concreto, teria a mesma decisão, quer se seguisse uma ou outra das teses.
Porquê?
Porque aplicando a tese mais restritiva e que mais favorece o arguido, ou seja, a tese defendida pelo Sr. Juiz, vamos concluir que, nenhum dos crimes apreciados na Decisão Instrutória,  estava prescrito.
De facto, o nó górdio deste processo, situava-se a montante e tinha a ver com a concreta qualificação dos crimes de corrupção de que trataremos de seguida.
                       
1.3.2 A QUALIFICAÇÃO DOS CRIMES DE CORRUPÇÃO

NA ACUSAÇÃO ESTÃO IMPUTADOS OS SEGUINTES CRIMES DE CORRUPÇÃO
1 - Um CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA DE TITULAR DE CARGO POLÍTICO, praticado pelo arguido AA EM CO-AUTORIA COM O ARGUIDO BB, com referência a actos praticados no interesse do Grupo LENA entre 2005 e 2011, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.º 1.°, 2.°, 3.°, n.º 1, alínea d), 17.°, n.º 1 e 19.°, n.ºs 2 e 3 da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n.º 108/2001, de 28 de Novembro (Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos), com referência aos art.º 28.° e 202.°, alínea b) do Código Penal;
2 Um CRIME DE CORRUPÇÃO ACTIVA DE TITULAR DE CARGO POLÍTICO, praticado por GG relativamente a pessoa do arguido AA, este com mediação do arguido BB e em benefício do Grupo LENA, com referências aos anos de 2005 a 2011, crime p. e p. pelos arts. 2°, 3°, n.º 1, alínea d) e 18°, n.º 1 e 19°, n.º 2 e 3 da Lei 34/87, de 16 de Julho, com a redacção introduzida pela Lei n° 108/2001 28 de Novembro- Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos, com referência ao art. 202°, alínea b) do Código Penal
3 Um CRIME DE CORRUPÇÃO ACTIVA praticado por LENA ENGENHARIA E CONSTRUÇÕES. SA em co-autoria com as sociedades LEC SGPS SA e LENA SGPS SA relativamente a factos referentes a pessoa do arguido AA, este com mediação do arguido BB e em benefício do Grupo LENA, com referências aos anos de 2005 a 2011, crime p. e p. pelos arts.374° e 374°-A, n.º 2 do Cód. Penal, com referência aos arts. 11°, n.º 2 e 202°, alínea b) do mesmo diploma legal;
*
4 UM CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA DE TITULAR DE CARGO POLÍTICO, praticado por AA, com referência a actos praticados no interesse do arguido CC, relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.º lº, 2.°, 3.°, n.º 1, alínea d), 17.°, n.º 1 e 19.°, n.ºs 2 e 3 da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n° 108/2001, de 28 de Novembro(Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos), com referência aos art.º 28.° e 202.°, alínea b) do Código Penal;
5 Um CRIME DE CORRUPÇÃO ACTIVA DE TITULAR DE CARGO Político, praticado por  CC relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES no que concerne aos pagamentos efectuados ao arguido AA, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. l°, 2°, 3°, n.º 1, alínea d), 18°, n.º 1 e 19°, n.ºs 2 e 3 da Lei 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n° 108/2001, de 28 de Novembro- Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos, e 202°, alínea b) do Código Penal;
*
6 UM CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA DE TITULAR DE CARGO POLÍTICO, praticado por AA  em co-autoria com o arguido DD, com referencia a actos praticados no interesse dos arguidos EE e FF com utilização das sociedades do Grupo VALE DO LOBO, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.º 1º, 2.°, 3.°, n.º 1, alínea d), 17.°, n.º 1 e 19°., n.ºs 2 e 3 da Lei 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n° 108/2001, de 28 de Novembro- Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos, com referência aos art.º 28.° e 202.°, alínea b) do Código Penal;
7 Um CRIME DE CORRUPÇÃO ACTIVA DE TITULAR DE CARGO POLÍTICO, praticado por FF  em co-autoria com o arguido EE, com referência a actos praticados por AA e DD no interesse dos primeiros, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 2°, 3°, n.º 1, alínea d), 18°, n.º 1 e 19° n.ºs 2 e 3 e 30° da Lei 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n° 108/2001, de 28 de Novembro- Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos, com referência ao art.º 202°, alínea b) do Código Penal;
*
8 Um CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA praticado por QQ relativamente aos pagamentos recebidos enquanto Director da RAVE, no âmbito da PPP, mediante acordo celebrado com a XMI, crime p. e p. pelo art.º 373. °, n.º 1 do Código Penal, com referência ao art.º 386. °, n.ºs 1 e 2 do mesmo diploma legal
9 Um CRIME DE CORRUPÇÃO ACTIVA, praticado por BB em co-autoria com os arguidos GG e PP e com as sociedades XMI, LEC SA, LEC SGPS e LENA SA, relativamente ao funcionário QQ, nos anos de 2007 a 2009, crime p. e p. pelo art.º 374. °, n.º l do Código Penal;
*
10 Um CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA, praticado por RR relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES no que concerne aos pagamentos recebidos do arguido CC com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, crime p, e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 373°, n.º l, 374. °- A, n.ºs 2 e 3, e com referência aos arts. 202°, al. b) e 386°, n.º 2, todos do Código Penal;
11 Um CRIME DE CORRUPÇÃO ACTIVA praticado por CC, relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES no que concerne aos pagamentos efectuados ao arguido RR, crime p. e p. pelos arts. 374°, n.º 1 e 374°-A, n.ºs 2 e 3 do Cód. Penal, com referência aos arts.202°, al. b) e 386°, n.º 2 do mesmo diploma legal;
*
12 Um CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA praticado por SS, relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES no que concerne aos pagamentos recebidos do arguido CC com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 373°, n.º l, 374°- A, n.ºs 2 e 3, e com referência aos arts.202°, al. b) e 386°, n.º 2, todos do Código Penal;
13 Um CRIME DE CORRUPÇÃO ACTIVA praticado por CC relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES no que concerne aos pagamentos efectuados ao arguido SS, crime p. e p. pelos arts. 374°, n.º 1 e 374°-A, n.ºs 2 e 3 do Cód. Penal, com referência aos arts .202°, al. b) e 386°, n.º 2 do mesmo diploma legal;
Estão aqui elencados os crimes de corrupção, do lado passivo e do lado activo, quer sejam crimes de Corrupção de Funcionário, p. e p. no Código Penal, quer sejam crime de Corrupção de titular de Cargo Político, p. e p. pela Lei n.º 34/87, de 16 de Julho.
A enunciação está de acordo com o relato, cronológico, dos factos da acusação.
Para a apreciação da decisão tomada e das questões do recurso, vamos conhecer, em primeiro lugar, dos Crimes de Corrupção de titular de Cargo Político previstos na Lei n.º 34/87, de 16 de Julho e, depois, dos crimes de corrupção do Código Penal.

1.3.2.1 CRIMES DE CORRUPÇÃO DE TITULAR DE CARGO POLÍTICO P. E P. PELA LEI n.º 34/87, de 16 de JULHO
               
A DECISÃO INSTRUTÓRIA  E A POSIÇÃO TOMADA RELATIVAMENTE A CADA UM DOS  CRIMES

1.3.2.1.1 CRIME PRATICADO PELOS ARGUIDOS AA E BB, DO LADO PASSIVO E POR GG DO LADO ACTIVO.
Um CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA DE TITULAR DE CARGO POLÍTICO, praticado pelo arguido AA EM CO-AUTORIA COM O ARGUIDO BB, com referência a actos praticados no interesse do Grupo LENA entre 2005 e 2011, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.º 1.°, 2.°, 3.°, n.º 1, alínea d), 17.°, n.º 1 e 19.°, n.ºs 2 e 3 da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n.º 108/2001, de 28 de Novembro (Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos), com referência aos art.º 28.° e 202.°, alínea b) do Código Penal;
O Sr. Juiz considerou não haver indícios da prática deste crime, pelo que a decisão foi de não pronúncia.
Considerou indiciada a prática de um crime de corrupção passiva de titular de cargo político sem demonstração de acto concreto p. e p.  pelo art. 17º nº 2 da lei 34/87 de 16.07 na redacção dada pela lei 108/2001, de 28-11 punível com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa até 360 dias quanto ao arguido AA. Do lado activo, decidiu o Sr. Juiz “estaríamos perante a prática pelo arguido BB de um crime de corrupção activa sem demonstração de acto concreto (cfr. artigo 18.º, n.º 2 da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n.º 108/2001, de 28 de Novembro (Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos), punido com pena de prisão até 6 meses ou com pena de multa até 60 dias. No entanto, estes crimes, na modalidade de corrupção sem demonstração de acto concreto, não se encontram imputados na acusação a nenhum dos arguidos, mas, por não implicarem uma imputação de crime de diverso e nem agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis, não nos conduz a uma alteração substancial dos factos, nos termos previstos no artigo 1º alínea f) e 309º do CPP.”
Continuou o Sr. Juiz,
“Tendo em conta a moldura penal prevista para o crime de corrupção activa sem demonstração de acto concreto que se mostra indiciado quanto ao arguido BB, prisão até 6 meses ou multa até 60 dias e o disposto no artigo 118º nº 1 al. a) e d) do CP, na redacção vigente à data dos factos (decreto-lei nº 48/95, de 15 de Março), o prazo de prescrição é de 2 anos. Quanto ao crime de corrupção passiva sem demonstração de acto concreto que se mostra indiciado quanto ao arguido AA, tendo em conta a moldura penal prevista, prisão até 3 anos ou multa até 300 dias e o disposto no artigo 118º nº 1 al. a) e c) do CP, na redacção vigente à data dos factos (decreto-lei nº 48/95, de 15 de Março), o prazo de prescrição é de 5 anos.  Assim sendo, uma vez que entre a data da consumação dos crimes em causa, finais de 2006  ( o Sr. Juiz considera relevante o acordo corruptivo), e a data em que ocorreu a primeira causa de interrupção da prescrição, constituição como arguidos quanto aos arguidos AA e BB, em 21 Novembro de 2014, decorreram 7 anos e 11 meses, o que faz com as condutas em causa há muito estavam prescritas.
APRECIANDO
Não conhecendo, por ora, dos indícios respeitantes à prática de cada um dos crimes, mas cingindo-nos, apenas,  à parte formal relativa à sua qualificação jurídica, parece-nos claro que a transmutação do crime no que toca à autoria do arguido BB – passa de co-autor de um crime de corrupção passiva de titular de cargo político, para autor de um crime de corrupção activa sem desmonstração de acto concreto -  é, sem sombra de dúvidas, uma alteração substancial dos factos. O corrompido passa a corruptor. É a história “ao contrário”.
Há, claramente, a imputação de um crime diverso (não apenas no que toca à qualificação) que corresponde a uma alteração substancial– art. 359º CPP.
Este normativo descreve qual deve ser a actuação do tribunal e qual pode ser a atitude dos intervenientes processuais.
 No caso, a interposição do recurso, no processo separado destes autos, quanto aos arguidos AA e BB, onde um dos temas é a alteração substancial dos factos da acusação, faz-nos concluir que, obviamente, nem os arguidos, nem o MP, estiveram de acordo na prossecução do processo  relativamente aos factos novos – art. 359º nº 3 CPP.
Nesta perspectiva, a decisão instrutória, quanto a este decisório, não será apreciada nestes autos, tanto mais que não faz parte do objecto deste recurso.
Aqui está em causa a decisão de não pronúncia relativamente:
Um CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA DE TITULAR DE CARGO POLÍTICO, praticado pelo arguido AA EM CO-AUTORIA COM O ARGUIDO BB, com referência a actos praticados no interesse do Grupo LENA entre 2005 e 2011, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.º 1.°, 2.°, 3.°, n.º 1, alínea d), 17.°, n.º 1 e 19.°, n.ºs 2 e 3 da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n.º 108/2001, de 28 de Novembro
Do lado activo temos:
Um CRIME DE CORRUPÇÃO ACTIVA DE TITULAR DE CARGO POLÍTICO, praticado por GG relativamente a pessoa do arguido AA, este com mediação do arguido BB e em benefício do Grupo LENA, com referências aos anos de 2005 a 2011, crime p. e p. pelos arts. 2°, 3°, n.º 1, alínea d) e 18°, n.º 1 e 19°, n.º 2 e 3 da Lei 34/87, de 16 de Julho, com a redacção introduzida pela Lei n° 108/2001 28 de Novembro- Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos, com referência ao art. 202°, alínea b) do Código Penal.
Constatamos, facilmente, que o crime de corrupção de titular de cargo político está indicado como previsto e punível:
- do lado passivo, pelos artigos 17.°, n.º 1 e 19.°, n.ºs 2 e 3 da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n.º 108/2001, de 28 de Novembro (Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos)
- do lado activo, pelos artigos 18°, n.º 1 e 19°, n.º 2 e 3 da Lei 34/87, de 16 de Julho, com a redacção introduzida pela Lei n° 108/2001 28 de Novembro.
Centremo-nos na redacção desses artigos vigente à data dos factos e nas versões subsequentes.
LEGISLAÇÃO A ATENDER:
-Em vigor em 2007
A Lei n.º 34/87, de 16 de Julho com a epígrafe “ CRIMES DA RESPONSABILIDADE DE TITULARES DE CARGOS POLÍTICOS”  com a redacção dada pela Lei n.º 108/2001, de 28 de Novembro  tinha a seguinte redacção:    
Artigo 16.º Corrupção passiva para acto ilícito
1 - O titular de cargo político que no exercício das suas funções, por si ou por interposta pessoa, com o seu consentimento ou ratificação, solicitar ou aceitar, para si ou para terceiro, sem que lhe seja devida, vantagem patrimonial ou não patrimonial, ou a sua promessa, para um qualquer acto ou omissão contrários aos deveres do cargo, ainda que anteriores àquela solicitação ou aceitação, é punido com pena de prisão de 2 a 8 anos. 2 - Se, por efeito da corrupção, resultar condenação criminal em pena mais grave do que a prevista no número anterior, será aquela pena aplicada à corrupção.
Artigo 17.º Corrupção passiva para acto lícito
1 - O titular de cargo político que no exercício das suas funções, por si ou por interposta pessoa, com o seu consentimento ou ratificação, solicitar ou aceitar, para si ou para terceiro, sem que lhe seja devida, vantagem patrimonial ou não patrimonial, ou a sua promessa, para um qualquer acto ou omissão não contrários aos deveres do cargo, ainda que anteriores àquela solicitação ou aceitação, é punido com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa até 300 dias. 2 - Na mesma pena incorre o titular de cargo político que por si, ou por interposta pessoa, com o seu consentimento ou ratificação, solicitar ou aceitar, para si ou para terceiro, sem que lhe seja devida, vantagem patrimonial ou não patrimonial de pessoa que perante ele tenha tido, tenha ou venha a ter qualquer pretensão dependente do exercício das suas funções.
Artigo 18.º Corrupção activa
1 - Quem por si, ou por interposta pessoa, com o seu consentimento ou ratificação, der ou prometer a titular de cargo político, ou a terceiro com conhecimento daquele, vantagem patrimonial ou não patrimonial que ao titular de cargo político não seja devida, com o fim indicado no artigo 16.º, é punido com pena de prisão de 6 meses a 5 anos. 2 - Se o fim for o indicado no artigo 17.º, o agente é punido com pena de prisão até 6 meses ou com pena de multa até 60 dias. 3 - O titular de cargo político que no exercício das suas funções, por si ou por interposta pessoa, com o seu consentimento ou ratificação, der ou prometer a funcionário ou a outro titular de cargo político, ou a terceiro com conhecimento destes, vantagem patrimonial ou não patrimonial que não lhes seja devida, com os fins indicados no artigo 16.º, é punido com a pena prevista no mesmo artigo.
Artigo 19.º Dispensa ou atenuação da pena (…)
1 - Se o agente, nos casos previstos nos artigos 16.º e 17.º, voluntariamente repudiar o oferecimento ou a promessa que aceitara, ou restituir a vantagem, ou, tratando-se de coisa fungível, o seu valor, antes da prática do facto, é dispensado da pena. 2 - A dispensa de pena prevista no número anterior aproveitará ao agente da corrupção activa se o mesmo, voluntariamente, antes da prática do facto, retirar a promessa feita ou solicitar a restituição da vantagem dada.3 - A pena é especialmente atenuada se o agente, nos casos previstos nos artigos 16.º, 17.º e 18.º, auxiliar concretamente na recolha das provas decisivas para a identificação ou a captura de outros responsáveis.
Com a  Lei n.º 41/2010, de 03 de Setembro a redacção dos artigos foi alterada. Assim:
Artigo 16.º Recebimento indevido de vantagem
1 - O titular de cargo político ou de alto cargo público que, no exercício das suas funções ou por causa delas, por si, ou por interposta pessoa, com o seu consentimento ou ratificação, solicitar ou aceitar, para si ou para terceiro, vantagem patrimonial ou não patrimonial, que não lhe seja devida, é punido com pena de prisão de 1 a 5 anos. 2 - Quem, por si ou por interposta pessoa, com o seu consentimento ou ratificação, der ou prometer a titular de cargo político ou alto cargo público, ou a terceiro por indicação ou conhecimento deste, vantagem patrimonial ou não patrimonial que não lhe seja devida, no exercício das suas funções ou por causa delas, é punido com pena de prisão até 5 anos ou com pena de multa até 600 dias.3 - Excluem-se dos números anteriores as condutas socialmente adequadas e conformes aos usos e costumes.
Artigo 17.º Corrupção passiva
1 - O titular de cargo político ou de alto cargo público que no exercício das suas funções ou por causa delas, por si ou por interposta pessoa, com o seu consentimento ou ratificação, solicitar ou aceitar, para si ou para terceiro, vantagem patrimonial ou não patrimonial, ou a sua promessa, para a prática de um qualquer acto ou omissão contrários aos deveres do cargo, ainda que anteriores àquela solicitação ou aceitação, é punido com pena de prisão de 2 a 8 anos.
2 - Se o acto ou omissão não forem contrários aos deveres do cargo e vantagem não lhe for devida, o titular de cargo político é punido com pena de prisão de 2 a 5 anos.
Artigo 18.º Corrupção activa
1 - Quem, por si ou por interposta pessoa, com o seu consentimento ou ratificação, der ou prometer a titular de cargo político ou alto cargo público, ou a terceiro por indicação ou com o conhecimento destes, vantagem patrimonial ou não patrimonial com o fim indicado no n.º 1 do artigo 17.º, é punido com pena de prisão de 2 a 5 anos. 2 - Se o fim for o indicado no n.º 2 do artigo 17.º, o agente é punido com pena de prisão até 5 anos. 3 - O titular de cargo político ou de alto cargo público que no exercício das suas funções ou por causa delas, por si ou por interposta pessoa, com o seu consentimento ou ratificação, der ou prometer a funcionário ou a outro titular de cargo político ou de alto cargo público, ou a terceiro com o conhecimento deste, vantagem patrimonial ou não patrimonial que não lhe seja devida, com os fins indicados no artigo 17.º, é punido com as penas previstas no mesmo artigo.
Artigo 19.º Agravação
1 - Se a vantagem referida nos artigos 16.º a 18.º for de valor elevado, o agente é punido com a pena aplicável ao crime respectivo agravada em um quarto nos seus limites mínimo e máximo 2 - Se a vantagem referida nos artigos 16.º a 18.º for de valor consideravelmente elevado, o agente é punido com a pena aplicável ao crime respectivo em um terço nos seus limites mínimo e máximo 3 - Para efeitos do disposto nos números anteriores, é correspondentemente aplicável o disposto nas alíneas a) e b) do artigo 202.º do Código Penal. 4 - Sem prejuízo do disposto no artigo 11.º do Código Penal, quando o agente actue nos termos do artigo 12.º deste Código é punido com a pena aplicável ao crime respectivo agravada em um terço nos seus limites mínimo e máximo.
A versão actual, introduzida pela - Lei n.º 94/2021, de 21/12
Artigo 16.º Recebimento ou oferta indevidos de vantagem
1 - O titular de cargo político que, no exercício das suas funções ou por causa delas, por si, ou por interposta pessoa, com o seu consentimento ou ratificação, solicitar ou aceitar, para si ou para terceiro, vantagem patrimonial ou não patrimonial, que não lhe seja devida, é punido com pena de prisão de 1 a 5 anos. 2 - Quem, por si ou por interposta pessoa, com o seu consentimento ou ratificação, der ou prometer a titular de cargo político, ou a terceiro por indicação ou conhecimento deste, vantagem patrimonial ou não patrimonial que não lhe seja devida, no exercício das suas funções ou por causa delas, é punido com pena de prisão até 5 anos ou com pena de multa até 600 dias 3 - O titular de cargo político que, por si ou por interposta pessoa, com o seu consentimento ou ratificação, der ou prometer a outro titular de cargo político, a titular de alto cargo público ou a funcionário, ou a terceiro com conhecimento destes, vantagem patrimonial ou não patrimonial, ou a sua promessa, que não lhe seja devida, no exercício das suas funções ou por causa delas, é punido com as penas previstas no número anterior 4 - Excluem-se dos números anteriores as condutas socialmente adequadas e conformes aos usos e costumes.
Artigo 17.º Corrupção passiva
1 - O titular de cargo político que, no exercício das suas funções ou por causa delas, por si ou por interposta pessoa, com o seu consentimento ou ratificação, solicitar ou aceitar, para si ou para terceiro, vantagem patrimonial ou não patrimonial, ou a sua promessa, para a prática de um qualquer acto ou omissão contrários aos deveres do cargo, ainda que anteriores àquela solicitação ou aceitação, é punido com pena de prisão de 2 a 8 anos. 2 - Se o acto ou omissão não forem contrários aos deveres do cargo e a vantagem não lhe for devida, o titular de cargo político é punido com pena de prisão de 2 a 5 anos.
Artigo 18.º Corrupção activa
1 - Quem, por si ou por interposta pessoa, com o seu consentimento ou ratificação, der ou prometer a titular de cargo político, ou a terceiro por indicação ou com o conhecimento deste, vantagem patrimonial ou não patrimonial com o fim indicado no n.º 1 do artigo 17.º, é punido com pena de prisão de 2 a 5 anos. 2 - Se o fim for o indicado no n.º 2 do artigo 17.º, o agente é punido com pena de prisão até 5 anos. 3 - O titular de cargo político que, no exercício das suas funções ou por causa delas, por si ou por interposta pessoa, c com o seu consentimento ou ratificação, der ou prometer a funcionário, a titular de alto cargo público ou a outro titular de cargo político, ou a terceiro com o conhecimento deste, vantagem patrimonial ou não patrimonial que não lhe seja devida, com os fins indicados no artigo 17.º, é punido com as penas previstas no mesmo artigo

NOTA:
PARTIMOS DO PRINCÍPIO DE QUE A LEI A APLICAR É A VIGENTE À DATA DOS FACTOS – circunstância que só alterará se sobrevier lei mais favorável ao arguido – art. 2º do Código Penal  ( o que não aconteceu).
Esclarecemos que sempre que se emprega a expressão “data dos factos” estamos a referir-nos, tal como resulta de tudo quanto já escrevemos, à data do acordo corruptivo.
Assim, à data dos factos, tal como perspectivada na Decisão Instrutória,  estava em vigor a Lei n.º 34/87, de 16 de Julho com a redacção dada pela Lei n.º 108/2001, de 28 de Novembro.
Diz o Sr. Juiz de Instrução o seguinte:
“ Como se verifica da qualificação jurídica feita pela acusação, ao arguido AA, na qualidade de agente corrompido, foi imputada a prática de um crime de corrupção passiva p e p pelo artigo 17º nº 1 da lei 34/87, de 16 de Julho na redacção dada pela lei 108/2001, de 28-11, ou seja, um crime de corrupção passiva para acto lícito.
Por sua vez, ao arguido GG, na qualidade de agente corruptor, foi imputada a prática de um crime de corrupção activa p e p pelo artigo 18º nº 1 e 16º da Lei 34/87, de 16 de Julho, na redacção dada pela lei 108/2001, de 28-11, ou seja, um crime de corrupção activa para acto ilícito.
Atenta a qualificação jurídica realizada pela acusação há que dizer que, não obstante os crimes de corrupção passiva e activa terem autonomia dogmática, isto é, pode existir condenação por corrupção activa sem condenação por corrupção passiva, não se compreende o motivo pelo qual ao corruptor activo, o arguido GG, foi imputado um crime de corrupção activa para acto ilícito enquanto que ao agente corrompido, arguido AA, foi imputado um crime de corrupção passiva para acto lícito.
Com efeito, é em função da conduta lícita ou ilícita do funcionário ou do titular de cargo político visada pelo suborno, ou mais precisamente, de acordo com a natureza do acto praticado ou omitido como contrapartida da solicitação ou aceitação do dinheiro ou vantagem que se distingue a corrupção para acto lícito ou para acto ilícito.”
O que diz o Recorrente relativamente a esta qualificação?
A decisão do Sr. JI quanto à verificação da prescrição do crime de corrupção imputado a AA e BB é também suportada na leitura da imputação jurídica feita na acusação, onde se faz referência a uma redacção dos tipos penais introduzida pela Lei 108/2001, de 28 de Novembro, com referência à numeração de artigos relativa à versão dessa mesma alteração, pese embora a mesma tenha sido posteriormente alterada.
Assim, entendemos que deveria prevalecer o entendimento de que o crime imputado é o previsto no art.° 17.°, n.° 1 da versão actual da Lei 34/87, de 16 de Julho, pese embora se refira que se atende à redacção introduzida pela Lei 108/2001, de 28 de Novembro, ressalvando que, no quadro desta última Lei, o referido artigo tivesse numeração diferente, já que era então o art. 16°.
Certo é que a imputação se refere ao crime previsto no art. 17.°, n.º 1, agravado nos termos do art.° 19.°, n.°s 2 e 3, da actual versão da Lei 34/87, de 16 de Julho, que se reporta ao crime de corrupção relativo à prática de actos contrários aos deveres do cargo, integração que é a coerente e necessariamente decorrente do narrativo acusatório, como se passará a analisar, neste capítulo, e se mostra ter sido aquela que foi atendida em sede da defesa dos arguidos ao longo do processo.
Mais seria, no mínimo, absurdo que o Ministério Público tivesse imputado ao arguido GG um crime de corrupção activa para acto ilícito e aos arguidos AA e BB a prática de um crime de corrupção passiva para acto lícito.
Note-se que, lida de outra forma, a imputação jurídica feita na acusação não faria sentido, até porque se refere a um art.° 19.°, n.°s 2 e 3, que, na versão da Lei 108/2001, se reportava aos pressupostos da dispensa da pena, sem qualquer correspondência com os factos narrados na acusação.
No entanto, o Senhor JI, invertendo a ordem dos diplomas legais referidos na imputação jurídica, fez prevalecer como tendo sido imputado o crime previsto no art° 17.º da Lei 108/2001, de 28 de Novembro (quando a acusação se reporta ao crime com o mesmo número mas da Lei 34/87, de 16 de Julho), pelo que entendeu como imputado o crime de corrupção para a prática de acto ou omissão não contrário aos deveres do cargo. (…)
Por esse motivo, ao fazer a interpretação supra exposta da imputação, que entendemos como errada, o Senhor JI deveria ter suscitado uma alteração não substancial dos factos, nos termos do disposto nos arts. 303.º-1 e 5 do Código de Processo Penal, face à manifesta desconformidade entre os factos narrados e o seu entendimento da imputação, diligência que omitiu, viciando os termos posteriores do processo, em particular quando fez prevalecer e decidiu com base na interpretação de imputação que é desconforme com os factos narrados.
Em face desses dois manifestos erros da decisão instrutória, relativos à definição da data da consumação dos crimes de corrupção e à interpretação da imputação jurídica feita na acusação, o Senhor JI considerou aplicável um prazo de prescrição de 5 anos e atendeu a uma consumação do crime ocorrida a 25.01.2007.”
(NB. Tudo o que se encontra a itálico e sinalizado com “ é uma citação)

APRECIANDO
O Sr. Juiz diz que as qualificações efectuadas ao crime de corrupção de titular de cargo político praticado pelos arguidos AA e BB não são concordantes no seu lado passivo (corrupção para acto lícito) e activo (corrupção para acto ilícito). De facto, não são.
O art. 18º da lei 34/87, de 16 de Julho na redacção dada pela lei 108/2001, de 28-11, contém duas incriminações, ao remeter para o art. 16º (acto ilícito) – cfr. nº 1 e para o art 17º ( acto lícito) – cfr. nº 2.
Na acusação, relativamente ao crime de corrupção activo vem citado o artigo 18°, n.º 1 e 19°, n.º 2 e 3 da Lei 34/87, pelo que a referência do artigo 16º só ocorre por remissão do art. 18º nº 1.
Assim, interpretando literalmente aquelas duas imputações, estaríamos perante um crime de corrupção activo para acto ilícito e passivo para acto lícito, ou seja, o crime imputado aos arguidos AA e BB por um lado e ao arguido GG, por outro, seria um crime de corrupção passiva para acto lícito e um crime de corrupção activa para acto ilícito, respectivamente.
O que aconteceu?
O MP não é claro na sua explicação  “ deveria prevalecer o entendimento de que o crime imputado é o previsto no art.° 17.°, n.º 1 da versão actual da Lei 34/87, de 16 de Julho, pese embora se refira que se atende à redacção introduzida pela Lei 108/2001, de 28 de Novembro, ressalvando que, no quadro desta última Lei, o referido artigo tivesse numeração diferente, já que era então o art.16º. Certo é que a imputação se refere ao crime previsto no art. 17.°, n.° 1, agravado nos termos do art.° 19.°, n.°s 2 e 3, da actual versão da Lei 34/87, de 16 de Julho, que se reporta ao crime de corrupção relativo à prática de actos contrários aos deveres do cargo”
Entendemos que o MP queria imputar o cometimento do crime com a redacção do actual artigo 17º da Lei 34/87, que correspondia ao artigo 16º da mesma Lei, mas com a redacção em vigor à data dos factos. Porém, não se compreende a manutenção da agravação do art. 19º nº 2 e nº 3 que só existe na versão actual da lei !!!!
Podemos concluir que houve dois lapsos.
Resulta evidente da alegação  fáctica constante da acusação, que o MP pretendeu imputar o  cometimento de um crime de corrupção passiva para acto ilícito de titular de cargo político, p. e p. à data dos factos pelo artigo 16º da Lei  34/87, de 16 de Julho, na redacção dada pela lei 108/2001, de 28-11 e um crime de corrupção activa para acto ilícito de titular de cargo político, p. e p. pelo art. 18º nº1 da Lei 34/87, de 16 de Julho, na redacção dada pela lei 108/2001, de 28-11.
As referências ao artigo 19º aplicável à data dos factos (na redacção dada pela lei 108/2001, de 28-11) com a epígrafe “Dispensa e atenuação da pena” não fazem qualquer sentido na incriminação.
Tratou-se de um lapso que decorria da simples leitura da acusação e cuja rectificação, que se impunha, não foi oficiosamente efectuada pelo Sr. Juiz, nem  requerida pelo  MP - art. 380º nº 1 al. b), nº 2 e nº 3 do CPP
Não nos parece que fosse necessário usar do mecanismo previsto nos  arts. 303.º-1 e 5 do Código de Processo Penal, face à manifesta desconformidade entre os factos narrados e o artigo concreto constante da imputação.
Neste sentido, o Acórdão da Relação de Lisboa de  11 de Abril de 2023 retirado no processo 5261/12.0JFLSB.L1-5 onde se pode ler um extracto de uma situação que parece um “decalque” da ocorrida nestes autos, pese embora aqui o MP não ter vindo invocar o erro de escrita:
 “ Onde se levanta o primeiro problema, já que os crimes de corrupção passiva imputados na acusação a três daqueles são apontados na acusação como sendo os previstos no nº 1 do artº 17º da Lei sobre os crimes de responsabilidade dos titulares de cargos políticos (Lei 34/87 de 16.7).
Ora, na altura da consumação dos crimes, Setembro de 2010, vigorava a versão daquela lei dada pela Lei 108/2001 de 28.11, perante a qual aquele nº 1 do artº 17º versava o crime de corrupção passiva para acto lícito.
Por requerimento de 27.5.2021, veio o Ministério Público esclarecer que aquela referência ao artº 17º se devia a erro de escrita, pois a menção correcta seria ao artº 16º da mesma Lei, ou seja, crimes de corrupção passiva para acto ilícito.
O tribunal recorrido, invocando o princípio da estabilidade da instância, não acolheu a pretensão do Ministério Público (ainda que este a haja dissimulado, já que então deveria ter requerido abertamente a correcção do erro).
Os arguidos recorrentes opuseram-se.
Perante a versão da mesma lei, tal como hoje, à data da acusação (dada pela Lei 94/2021 de 21.12), o crime de corrupção passiva para acto ilícito vinha previsto no nº 1 daquele artº 17º.
Já o crime de corrupção activa vinha previsto no artº 18º, o que vem sucedendo desde a versão original.
O crime de corrupção passiva respeitante a titulares de cargos políticos tem visto variar a sua sede legal ao longo do tempo.
Desde a versão original, repartida entre os art.ºs 16º e 17º, respectivamente, corrupção passiva para acto ilícito e corrupção passiva para acto lícito, mudando apenas com a alteração levada a cabo pela Lei nº 41/2010 de 3.9, em vigor desde 3.3.2011, a partir da qual passou a estar apenas prevista no art.º 17º (tratando o nº 1 da corrupção para acto ilícito e o nº 2 da restante). Repartição que se tem mantido até hoje.
Esta é, cremos, a razão de ser do problema, que salvo o devido respeito, não se resolve com a menção ao princípio da estabilidade da instância.
Tal princípio, em processo penal, é passível de diversas excepções, o que é natural, atendendo à proveniência processual civilística do mesmo.
Basta ter em mente e a propósito, as normas atinentes às possibilidades de alteração da qualificação jurídica, sobretudo na versão original do Código de Processo Penal, mas que actualmente se mantêm na sua essência.
Mas mesmo em processo civil, como para o penal, não deixa de valer, há milénios e de forma universal, o princípio da oficiosidade do conhecimento e aplicação do direito aos factos vindo do direito romano: “iura novit curia”.
Certo é que nem a tanto se tem de chegar, bastando constatar se existe, ou não, erro de escrita.
Ora, este deve ser notório no contexto em que se insere e neste caso, sem se sair da qualificação jurídica dada pela acusação, o erro é patente, logo no que respeita ao primeiro arguido, depois copiado para os demais.
Vem acusado pela prática de um crime de corrupção passiva para acto ilícito, segundo a redacção da lei à data da acusação, mas para acto lícito de acordo com a redacção em vigor à data da consumação dos crimes. Mas, tal crime de corrupção passiva vem, ainda nos termos da acusação, desencadeado por um crime de corrupção activa para acto ilícito.
Não pode ser.
Logo, a existência de erro de escrita é evidente, pelo que se impõe a correspondente correcção.
Para tanto, há que concluir qual das imputações está errada.
Ora, é também incontestável o carácter ilícito das condutas descritas na acusação e como se disse, a acusação buscou claramente a imputação de crime de corrupção passiva para acto ilícito, atribuindo a sede no local onde o mesmo se encontrava à data da respectiva elaboração.”
Note-se que, questão diferente, é a verificação do preenchimento de todos os elementos do tipo e da existência, ou não, de indícios, que será analisada oportunamente.
Fazendo a necessária correcção, na acusação passará a constar a redacção, que referiremos de seguida e que será a base para o trabalho subsequente.
Um CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA PARA ACTO ILÍCITO DE TITULAR DE CARGO POLÍTICO praticado, arguido AA EM CO-AUTORIA COM O ARGUIDO BB, com referência a actos praticados no interesse do Grupo LENA entre 2005 e 2011, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.º 1.°, 2.°, 3.°, n.º 1, alínea d), art. 16.°, n.º 1 da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n.º 108/2001, de 28 de Novembro (Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos) e 28º do CP.
Um CRIME DE CORRUPÇÃO ACTIVA PARA ACTO ILÍCITO DE TITULAR DE CARGO POLÍTICO, praticado por GG relativamente a pessoa do arguido AA, este com mediação do arguido BB e em benefício do Grupo LENA, com referências aos anos de 2005 a 2011, crime p. e p. pelos arts. 2°, 3°, n.º 1, alínea d) e 18°, n.º 1 da Lei 34/87, de 16 de Julho, com a redacção introduzida pela Lei n° 108/2001 28 de Novembro- Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos (esta redacção já  constava da acusação).

1.3.2.1.2 CRIME DE CORRUPÇÃO IMPUTADO AO ARGUIDO AA PELO LADO PASSIVO E CC PELO LADO ACTIVO

UM CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA DE TITULAR DE CARGO POLÍTICO, praticado por AA, com referência a actos praticados no interesse do arguido CC, relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.º lº, 2.°, 3.°, n.º 1, alínea d), 17.°, n.º 1 e 19.°, n.ºs 2 e 3 da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n° 108/2001, de 28 de Novembro(Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos), com referência aos art.º 28.° e 202.°, alínea b) do Código Penal;
 Um CRIME DE CORRUPÇÃO ACTIVA DE TITULAR DE CARGO Político, praticado por  CC relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES no que concerne aos pagamentos efectuados ao arguido AA, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. l°, 2°, 3°, n.º 1, alínea d), 18°, n.º 1 e 19°, n.ºs 2 e 3 da Lei 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n° 108/2001, de 28 de Novembro- Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos, e 202°, alínea b) do Código Penal;

Na DECISÃO INSTRUTÓRIA os arguidos não foram pronunciados:
Escreveu o Sr. Juiz de Instrução “ Ao arguido AA está imputada a prática de um crime de corrupção passiva de titular de cargo político, com referência aos actos praticados no interesse do arguido CC, relativamente a negócios do Grupo Portugal Telecom, crime p e p pelas disposições conjugadas dos artigos 1º, 2º, 3º nº 1 al. d), 17º nº 1 e 19º nº 2 e 3 da Lei 34/87, de 16 Julho, na redacção dada pela Lei 108/2001, de 28 de Novembro (regime vigente à data dos factos), com referência aos artigos 28º e 202º, alínea b) do Código Penal.
Como corruptor activo, a acusação imputou ao arguido CC um crime de corrupção activa p e p pelas disposições conjugadas dos artigos 1º, 2º, 3º nº 1 al. d), 18º nº 1 e 19º nº 2 e 3 da Lei 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei 108/2001, de 28 de Setembro.
Como já vimos acima, o crime em causa, tendo em conta os factos descritos na acusação, consumou-se, em termos formais, no dia 30 de Junho de 2010 e, em termos materiais, no dia 29-12-2010.
A apreciação que iremos fazer quanto à prescrição, recai, obviamente, sobre o crime de corrupção passiva para acto lícito, consabido que é por esse crime que o arguido AA se mostra acusado.
Vejamos, antes de mais, tendo em conta os factos descritos na acusação, o momento da consumação dos factos relacionados com o alegado crime de corrupção passiva com referência aos alegados actos praticados no interesse do arguido CC, uma vez que será a partir desse momento que terá início o decurso do prazo de prescrição.”
(…) Assim sendo, quanto ao arguido AA, o alegado pagamento dos subornos com origem no arguido CC consumou-se no dia 29-12-2010, com a transferência realizada pelo arguido HH em nome da sociedade EMP19... SA para a conta CGD, titulada pela sociedade arguida Lena Engenharia e Construção SGPS, ou seja, para a esfera do arguido AA. (artigos 3072, 5293, 5294, 5295, 5297, 5298 e 5300 da acusação).
Em termos formais, o alegado crime de corrupção passiva consumou-se pelo menos até ao dia 30 de Junho de 2010, data da solicitação e aceitação da vantagem, por sua vez, em termos materiais, a consumação teve lugar no dia 29-12-2010.
Tendo em conta o crime imputado ao arguido AA – corrupção passiva de titular de cargo político p e p pelos artigos 1º, 2º 3º nº 1 al. d), 17º nº 1 e 19º nº 2 e 3 da Lei 35/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela lei 108/2001, de 28 de Novembro- verifica-se, tendo em conta o regime vigente à data da prática dos factos, que o crime em causa corresponde ao crime de corrupção passiva para acto lícito o qual era punido com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa até 360 dias.
Posto isto, temos por certo não existirem dúvidas que o prazo de prescrição, tendo em conta a moldura penal aplicável ao crime de corrupção passiva para acto lícito, é de 5 anos (artº 118º nº 1 al. c) do Código Penal), tendo em conta o regime vigente à data dos factos.
Início do prazo da prescrição 30/6/2010.  (ii) Acto de Interrupção (depois da interrupção começa a correr novo prazo):a)-Constituição como arguido quanto ao arguido AA teve lugar no dia (fls. 7645) 21-11-2014 (sendo que nesta data não lhe foram imputados factos relacionados com o crime em causa) (fls. 7718 a 7749).O arguido AA voltou a ser interrogado nestes autos, perante o MP, no dia 27-5-2015, conforme resulta de fls. 16517 a 16525, sendo que nesta data também não lhe foram imputados factos relacionados com o crime agora em causa, ou seja, com universo Portugal Telecom.   
O arguido AA, quanto aos factos relacionados com o crime de corrupção relativo ao arguido CC e ao GRUPO Portugal Telecom, apenas foi confrontado em 13-3-2017, conforme resulta do auto de interrogatório de arguido de fls. 36171 a 36275.
O arguido AA foi convocado para este interrogatório através do despacho do MP constante de fls. 35989.
Assim sendo, a interrupção da prescrição quanto a este crime só se verificou no dia 13-3-2017, momento em que lhe foram imputados os factos em causa e o crime respectivo.
Cumpre dizer, ainda, que os factos relacionados com o Grupo Portugal Telecom estavam a ser investigados no âmbito do inquérito nº 7406/14.... e a apensação aos presentes autos apenas teve lugar no dia 27-7-2017 (fls. 936 Inquérito Apenso) (até 13-3-2017 decorreram 7 anos 9 meses e 13 dias considerando 30-6-2010).     
(ii) Acto de Suspensão: não ocorreu nenhum acto de suspensão.
Face ao exposto, ao abrigo dos artigos 118º, nº 1 al. c), artº 120º, nº 1, 2 e 3, artº 121º, nº 1 al. a) 2 e 3, todos do C.Penal, está prescrito o procedimento criminal em relação ao arguido AA quanto ao crime de corrupção de titular de cargo político p e p pelos artigos 1º, 2º 3º nº 1 al. d), 17º nº 1 e 19º nº 2 e 3 da Lei 35/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela lei 108/2001 (actos praticados no interesse do arguido CC).
Aquando da dedução da acusação, em 9 de Outubro de 2017, já o crime em causa encontrava-se prescrito desde o dia 30-6-2015.  
Mesmo para quem entenda que o prazo da prescrição só se iniciaria no dia 29-12-2010, ainda assim o crime estaria prescrito desde o dia 29-12-2015.
Pelo que determino, nesta parte, o arquivamento dos autos em relação ao arguido AA quanto ao crime de corrupção passiva de titular de cargo político, (Grupo PORTUGAL TELECOM e GES), p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. l°, 2°, 3°, n.º 1, alínea d), 17°, n.º 1 e 19°, n.ºs 2 e 3 da Lei 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n° 108/2001, de 28 de Novembro.
O Recorrente diz: “ A decisão do Sr. JI quanto à verificação da prescrição do crime de corrupção imputado a AA  é também suportada na leitura da imputação jurídica feita na acusação, onde se faz referência a uma redacção dos tipos penais introduzida pela Lei 108/2001, de 28 de Novembro, com referência à numeração de artigos relativa à versão dessa mesma alteração, pese embora a mesma tenha sido posteriormente alterada.
Assim, entendemos que deveria prevalecer o entendimento de que o crime imputado é o previsto no art.° 17.°, n. 1 da versão actual da Lei 34/87, de 16 de Julho, pese embora se refira que se atende à redacção introduzida pela Lei 108/2001, de 28 de Novembro, ressalvando que, no quadro desta última Lei, o referido artigo tivesse numeração diferente, já que era então o art. 16º.
Certo é que a imputação se refere ao crime previsto no art. 17.°, nº 1, agravado nos termos do art.° 19.°, n.°s 2 e 3, da actual versão da Lei 34/87, de 16 de Julho, que se reporta ao crime de corrupção relativo à prática de actos contrários aos deveres do cargo, integração que é a coerente e necessariamente decorrente do narrativo acusatório, como se passará a analisar, neste capítulo, e se mostra ter sido aquela que foi atendida em sede da defesa dos arguidos ao longo do processo.
Mais seria, no mínimo, absurdo que o Ministério Público tivesse imputado ao arguido CC um crime de corrupção activa para acto ilícito e aos arguidos AA a prática de um crime de corrupção passiva para acto lícito.”
(NB. Tudo o que se encontra a itálico e sinalizado com “ é uma citação)

APRECIANDO
Antes de mais, precisar que, na perspectiva da Decisão Instrutória e que pensamos estar acertada nessa parte, a lei a aplicar é, sempre, a Lei 34/87, de 16 de Julho redacção introduzida pela Lei 108/2001, de 28 de Novembro (vigente à data dos factos).
Mesmo quanto a estes crimes  que  estão, agora, em apreciação, pese embora os factos já se situarem em 2010, ainda não tem aplicação a Lei 41/2010, de 3 de Setembro porquanto a mesma só entrou em vigor em Março de 2011 ( 180 dias após a sua publicação no Diário da República de  03 de Setembro).
O Sr. Juiz, tal como nos crimes anteriores, diz que as qualificações efectuadas ao crime de corrupção de titular de cargo político praticado pelo arguido AA não são concordantes no seu lado passivo (corrupção para acto lícito) e activo (corrupção para acto ilícito).
Vamos repetir o que supra dissemos.
O art. 18º nº 1 da lei 34/87, de 16 de Julho na redacção dada pela lei 108/2001, de 28-11, contém duas incriminações, ao remeter para o art. 16º (acto ilícito)- cfr. nº 1 e para o art 17º ( acto lícito)- cfr. nº 2.
Na acusação, relativamente ao crime de corrupção activo, vem citado o artigo 18°, n.º 1 e 19°, n.º 2 e 3 da Lei 34/87. Não existe referência ao artigo 16º, a não ser por força da remissão do art. 18º nº 1.
Assim, interpretando literalmente aquelas duas imputações, estaríamos perante um crime de corrupção activo para acto ilícito e passivo para acto lícito, ou seja, o crime imputado ao arguido AA por um lado e CC, por outro, seria um crime de corrupção passiva para acto lícito e um crime de corrupção activa para acto ilícito, respectivamente.
O que aconteceu? Houve o lapso descrito supra.
Fazendo a necessária correcção, na acusação passará a constar a seguinte redacção:
UM CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA PARA ACTO ILÍCITO DE TITULAR DE CARGO POLÍTICO, praticado por AA, com referência a actos praticados no interesse do arguido CC, relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.º lº, 2.°, 3.°, n.º 1, alínea d), 16.° da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n° 108/2001, de 28 de Novembro(Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos).
 Um CRIME DE CORRUPÇÃO ACTIVA  PARA ACTO ILÍCITO DE TITULAR DE CARGO Político, praticado por CC relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES no que concerne aos pagamentos efectuados ao arguido AA, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. l°, 2°, 3°, n.º 1, alínea d), 18°, n.º 1 da Lei 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n° 108/2001, de 28 de Novembro- Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos (esta redacção já  constava da acusação)

1.3.2.1.3 CRIME DE CORRUPÇÃO IMPUTADO AOS ARGUIDOS AA E DD
UM CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA DE TITULAR DE CARGO POLÍTICO, praticado por AA  em co-autoria com o arguido DD, com referencia a actos praticados no interesse dos arguidos EE e FF com utilização das sociedades do Grupo VALE DO LOBO, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.º 1º, 2.°, 3.°, n.º 1, alínea d), 17.°, n.º 1 e 19°., n.ºs 2 e 3 da Lei 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n° 108/2001, de 28 de Novembro- Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos, com referência aos art.º 28.° e 202.°, alínea b) do Código Penal;
Um CRIME DE CORRUPÇÃO ACTIVA DE TITULAR DE CARGO POLÍTICO, praticado por FF  em co-autoria com o arguido EE, com referência a actos praticados por AA e DD no interesse dos primeiros, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 2°, 3°, n.º 1, alínea d), 18°, n.º 1 e 19° n.ºs 2 e 3 e 30° da Lei 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n° 108/2001, de 28 de Novembro- Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos, com referência ao art.º 202°, alínea b) do Código Penal;
Relativamente a estes crimes, a posição do Sr. Juiz de Instrução foi igual à analisada nos crimes anteriores, o mesmo acontecendo com o Recorrente, pelo que nos escusamos de repetir.
Fazendo as devidas correcções, os crimes em causa ficarão com a seguinte imputação:
UM CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA DE ACTO ILÍCITO DE TITULAR DE CARGO POLÍTICO , praticado por AA  em co-autoria com o arguido DD, com referencia a actos praticados no interesse dos arguidos EE e FF com utilização das sociedades do Grupo VALE DO LOBO, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.º 1º, 2.°, 3.°, n.º 1, alínea d), 16.° da Lei 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n° 108/2001, de 28 de Novembro- Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos.
Um CRIME DE CORRUPÇÃO ACTIVA DE TITULAR  DE ACTO ILÍCITO DE CARGO POLÍTICO, praticado por FF  em co-autoria com o arguido EE, com referência a actos praticados por AA e DD no interesse dos primeiros, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 2°, 3°, n.º 1, alínea d), 18°, n.º 1 e 30° da Lei 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n° 108/2001, de 28 de Novembro- Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos (esta redacção já  constava da acusação)
      
1.3.2.2 CRIMES DE CORRUPÇÃO P. E P. NO CÓDIGO PENAL
A DECISÃO INSTRUTÓRIA  E AO POSIÇÃO TOMADA RELATIVAMENTE A CADA UM DOS  CRIMES
1.3.2.2.1 CRIMES PRATICADOS PELOS ARGUIDOS BB em co-autoria com os arguidos GG, PP e com as sociedades LEC SA, LEC SGPS e LENA SA DO LADO ACTIVO E PELO ARGUIDO QQ, DO LADO PASSIVO:
Um CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA praticado por QQ relativamente aos pagamentos recebidos enquanto Director da RAVE, no âmbito da PPP, mediante acordo celebrado com a XMI, crime p. e p. pelo art.º 373. °, n.º 1 do Código Penal, com referência ao art.º 386. °, n.ºs 1 e 2 do mesmo diploma legal.
Um CRIME DE CORRUPÇÃO ACTIVA, praticado por BB em co-autoria com os arguidos GG e PP e com as sociedades, LEC SA, LEC SGPS e LENA SA, relativamente ao funcionário QQ, nos anos de 2007 a 2009, crime p. e p. pelo art.º 374. °, n.º l do Código Penal;

DECISÃO INSTRUTÓRIA
Escreveu o Sr. Juiz “ Deste modo, da análise feita ao crime de corrupção passiva p e p nos artigos 372º e 373º do CP, verifica-se que, no regime vigente à data dos factos descritos na acusação, (2007 a 2009) se distinguem três modalidades de corrupção passiva:
A corrupção para acto ilícito ou corrupção própria, em que se faz prova do acto ilícito com o qual o agente público pretende mercadejar com o cargo (artigo 372º do CP na versão da Lei 108/2001);
A corrupção passiva para acto lícito em que se faz prova do acto lícito com que o agente público pretende mercadejar com o cargo (artigo 373º nº 1 do CP na versão da Lei 108/2001;
A corrupção sem demonstração do acto concreto com que o agente público pretende mercadejar com o cargo (artigo 373º nº 2 do CP na versão da Lei 108/2001).
Como se refere no acórdão do STJ de 18-4-2013: «As modalidades previstas nos nºs 1 dos artigos 372 e 373.º não prescindem de um certo grau de prova quanto ao acto concreto pretendido, um certo grau de prova do acto concreto, lícito ou ilícito, que a vantagem visaria compensar. (…) Tendo em conta os factos descritos na acusação, em particular o alegado no artigo 1821, verifica-se que a alegada promessa de entrega de vantagem patrimonial por parte dos arguidos GG, BB e RRR, bem como a aceitação por parte do arguido QQ terá ocorrido em finais de 2007 e princípios de 2008.”

RECORRENTE
No recurso interposto diz-se “ O Ministério Público, na acusação proferida nestes autos, imputou, ao arguido QQ, designadamente um crime de corrupção passiva, relativamente aos pagamentos recebidos enquanto Director da RAVE, no âmbito da PPP1, mediante acordo celebrado com a XMI SA, crime p. e p. pelo artigo 373.°, n.° 1 do Código Penal, com referência ao art.° 386.°, n.°s 1 e 2, do mesmo diploma legal. O Senhor JI, a fls. 3017 a 3035, faz uma construção que o leva a concluir que o crime imputado na acusação, a este arguido, é o crime de corrupção previsto no art.° 373.°, n.° 1, do Código Penal, na redacção introduzida pela Lei 108/2001, de 28 de Novembro, em que previa o crime de corrupção passiva para acto lícito, com punição de pena de prisão até 2 anos.
Sucede, porém, que do texto da acusação e, entre outros, dos seus artigos 1821, 1822, 1823, 13662, 13663, 13664, 13665, 13666, 13667, 13668, 13669, decorre claramente que a actuação do arguido QQ foi toda ela conduzida de modo contrário aos deveres do cargo que exercia.
Mais seria, no mínimo, absurdo que o Ministério Público tivesse imputado aos arguidos BB, GG e PP um crime de corrupção activa para acto ilícito e ao arguido QQ tivesse imputado a prática de um crime de corrupção passiva para acto lícito.
Acresce que, no dispositivo da acusação em que o Ministério Público imputou ao arguido QQ a prática de um crime de corrupção p. e p. pelo artigo 373.°, n.° 1 do Código Penal, com referência ao art.° 386.°, n.°s 1 e 2, do mesmo diploma legal, não existe qualquer referência à redacção introduzida pela Lei 108/2001, de 28 de Novembro – vide fls. 44696 dos autos principais, primeiro parágrafo.
O Ministério Público ao imputar tal conduta a este arguido teve, pois, em conta o crime de corrupção passiva para acto ilícito previsto no art.° 373.°, n.°1 do Código Penal, na sua redacção actual.     
Poder-se-á colocar a questão de, atenta a data da prática dos factos (2007 a 2009), dever ter sido imputado ao arguido QQ não este dispositivo legal, mas antes o do art.° 372.°, n.° 1 do Código Penal, na redacção dada pela Lei 108/2001, de 28 de Novembro, que previa e punia o crime de corrupção passiva para acto ilícito.
O que não se pode aceitar é o entendimento (absurdo) de que o Ministério Público pretendeu imputar, a este arguido, um crime de corrupção para acto lícito, o que estaria em total contradição com todo o texto da acusação a ele relativo, bem como com o texto da acusação e crime nela imputado aos arguidos BB, GG e PP, que, do lado activo, o determinaram à prática de actos contrários aos deveres do cargo que então exercia, contra a entrega de vantagem patrimonial.
Assim, o que o Sr. JI devia ter feito, ao invés de declarar prescrito o crime em causa, era ter dado cumprimento ao disposto no art.° 303.°, n.°s 1 e 5 do CPP, comunicando a alteração da qualificação jurídica em causa (da imputação do art.° 373.°, n.° 1, na redacção actual, para a imputação do art.° 372.°, n.° 1 do Código Penal, na redacção dada pela Lei 108/2001, de 28 de Novembro, sempre com referência ao art.° 386.°, n.°s 1 e 2, do mesmo diploma legal), ao defensor, interrogando o arguido sobre ela e concedendo-lhe um prazo para a preparação da defesa.”
             
APRECIANDO
Antes de mais, vamos transcrever os artigos do Código Penal relativos a cada uma das incriminações.
EM VIGOR À DATA DOS FACTOS:
Artigo 372.º
Corrupção passiva para acto ilícito
1 - O funcionário que por si, ou por interposta pessoal, com o seu consentimento ou ratificação, solicitar ou aceitar, para si ou para terceiro, sem que lhe seja devida, vantagem patrimonial ou não patrimonial, ou a sua promessa, para um qualquer acto ou omissão contrários aos deveres do cargo, ainda que anteriores àquela solicitação ou aceitação, é punido com pena de prisão de 1 a 8 anos.
2 - Se o agente, antes da prática do facto, voluntariamente repudiar o oferecimento ou a promessa que aceitara, ou restituir a vantagem, ou, tratando-se de coisa fungível, o seu valor, é dispensado de pena.
3 - A pena é especialmente atenuada se o agente auxiliar concretamente na recolha das provas decisivas para a identificação ou a captura de outros responsáveis.
Redacção dada pelo seguinte diploma:  Lei n.º 108/2001, de 28 de Novembro
Artigo 373.º
Corrupção passiva para acto lícito
1 - O funcionário que por si, ou por interposta pessoa, com o seu consentimento ou ratificação, solicitar ou aceitar, para si ou para terceiro, sem que lhe seja devida, vantagem patrimonial ou não patrimonial, ou a sua promessa, para um qualquer acto ou omissão não contrários aos deveres do cargo, ainda que anteriores àquela solicitação ou aceitação, é punido com pena de prisão até 2 anos ou com pena de multa até 240 dias.
2 - Na mesma pena incorre o funcionário que por si, ou por interposta pessoa, com o seu consentimento ou ratificação, solicitar ou aceitar, para si ou para terceiro, sem que lhe seja devida, vantagem patrimonial ou não patrimonial de pessoa que perante ele tenha tido, tenha ou venha a ter qualquer pretensão dependente do exercício das suas funções públicas.
3 - É correspondentemente aplicável o disposto na alínea b) do artigo 364.º e nos n.os 3 e 4 do artigo anterior.
 Redacção dada pelo seguinte diploma:  Lei n.º 108/2001, de 28 de Novembro
Artigo 374.º
Corrupção activa
1 - Quem por si, ou por interposta pessoa com o seu consentimento ou ratificação, der ou prometer a funcionário, ou a terceiro com conhecimento daquele, vantagem patrimonial ou não patrimonial que ao funcionário não seja devida, com o fim indicado no artigo 372.º, é punido com pena de prisão de 6 meses a 5 anos.
2 - Se o fim for o indicado no artigo 373.º, o agente é punido com pena de prisão até 6 meses ou com pena de multa até 60 dias.
3 - É correspondentemente aplicável o disposto na alínea b) do artigo 364.º
  Redacção dada pelo seguinte diploma:  Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de Março
REDACÇÃO ACTUAL
Artigo 372.º
Recebimento ou oferta indevidos de vantagem
1 - O funcionário que, no exercício das suas funções ou por causa delas, por si, ou por interposta pessoa, com o seu consentimento ou ratificação, solicitar ou aceitar, para si ou para terceiro, vantagem patrimonial ou não patrimonial, que não lhe seja devida, é punido com pena de prisão até cinco anos ou com pena de multa até 600 dias.
2 - Quem, por si ou por interposta pessoa, com o seu consentimento ou ratificação, der ou prometer a funcionário, ou a terceiro por indicação ou conhecimento daquele, vantagem patrimonial ou não patrimonial, que não lhe seja devida, no exercício das suas funções ou por causa delas, é punido com pena de prisão até três anos ou com pena de multa até 360 dias.
3 - Excluem-se dos números anteriores as condutas socialmente adequadas e conformes aos usos e costumes.
Artigo 373.º
Corrupção passiva
1 - O funcionário que por si, ou por interposta pessoa, com o seu consentimento ou ratificação, solicitar ou aceitar, para si ou para terceiro, vantagem patrimonial ou não patrimonial, ou a sua promessa, para a prática de um qualquer acto ou omissão contrários aos deveres do cargo, ainda que anteriores àquela solicitação ou aceitação, é punido com pena de prisão de um a oito anos.
2 - Se o acto ou omissão não forem contrários aos deveres do cargo e a vantagem não lhe for devida, o agente é punido com pena de prisão de um a cinco anos.
Artigo 374.º
Corrupção activa
1 - Quem, por si ou por interposta pessoa, com o seu consentimento ou ratificação, der ou prometer a funcionário, ou a terceiro por indicação ou com conhecimento daquele, vantagem patrimonial ou não patrimonial com o fim indicado no n.º 1 do artigo 373.º, é punido com pena de prisão de um a cinco anos.
2 - Se o fim for o indicado no n.º 2 do artigo 373.º, o agente é punido com pena de prisão até três anos ou com pena de multa até 360 dias.
3 - A tentativa é punível.
Concordamos com o Recorrente quando refere que, em face do teor da acusação, apenas podia ser imputado ao arguido QQ um crime de corrupção passiva para acto ilícito p. e p. pelo art. 372º nº 1 do CP na redação vigente à data dos factos.
Isto, sem prejuízo de uma outra análise que se prende com o preenchimento dos elementos do tipo, que será oportunamente apreciada.
No entanto, tal como aconteceu anteriomente, o MP imputou ao arguido a prática do crime de corrupção passiva, indicando, erradamente, o art. 373º do CP na sua redação actual e não, conforme devia, na redacção à data da prática dos factos. Não fazia  nenhum sentido imputar o cometimento, do lado passivo, de um crime para acto lícito e, do lado activo, imputar o cometimento de um crime de corrupção para acto ilícito, contrário aos deveres do cargo.
O Sr. Juiz, para a tomada da decisão relativamente à prescrição, valorizou a indicação normativa dada pelo Recorrente, não cuidando de apurar se a mesma estava ou não de acordo com o contexto e a narrativa da acusação.
Porém, a nosso ver, não é caso de proceder a uma alteração da qualificação jurídica mas, sim, apenas, a uma correcção do normativo legal aplicável – art 380 nº 1 al b), nº 2 e nº 3 do CPP
Fazendo as devidas correcções, os crimes em causa passam a ter a seguinte imputação:
 Um CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA praticado por QQ relativamente aos pagamentos recebidos enquanto Director da RAVE, no âmbito da PPP, mediante acordo celebrado com a XMI, crime p. e p. pelo art.º 372. °, n.º 1 do Código Penal, com referência ao art.º 386. °, n.ºs 1 e 2 do mesmo diploma legal, na redacção introduzida pela Lei n° 108/2001, de 28 de Novembro
Um CRIME DE CORRUPÇÃO ACTIVA, praticado por BB em co-autoria com os arguidos GG e PP e com as sociedades XMI, LEC SA, LEC SGPS e LENA SA, relativamente ao funcionário QQ, nos anos de 2007 a 2009, crime p. e p. pelo art.º 374. °, n.º l do Código Penal; (esta redacção já  constava da acusação)
*
1.3.2.2.2 CRIMES PRATICADOS PELOS ARGUIDOS CC , RR E SS.
Um CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA, praticado por RR relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES no que concerne aos pagamentos recebidos do arguido CC com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, crime p, e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 373°, n.º l, 374. °- A, n.ºs 2 e 3, e com referência aos arts.202°, al. b) e 386°, n.º 2, todos do Código Penal;
Um CRIME DE CORRUPÇÃO ACTIVA praticado por CC, relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES no que concerne aos pagamentos efectuados ao arguido RR, crime p. e p. pelos arts. 374°, n.º 1 e 374°-A, n.ºs 2 e 3 do Cód. Penal, com referência aos arts.202°, al. b) e 386°, n.º 2 do mesmo diploma legal;
*
Um CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA praticado por SS, relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES no que concerne aos pagamentos recebidos do arguido CC com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts.373°, n.º l, 374°- A, n.ºs 2 e 3, e com referência aos arts.202°, al. b) e 386°, n.º 2, todos do Código Penal;
*
 Um CRIME DE CORRUPÇÃO ACTIVA praticado por CC relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES no que concerne aos pagamentos efectuados ao arguido SS, crime p. e p. pelos arts. 374°, n.º 1 e 374°-A, n.ºs 2 e 3 do Cód. Penal, com referência aos arts.202°, al. b) e 386°, n.º 2 do mesmo diploma legal;

APRECIANDO
O Sr. Juiz de Instrução relativamente a estes crimes proferiu decisão de não pronúncia com base na falta de um dos elementos objectivos do tipo -  a qualidade de funcionário dos arguidos RR e SS.
Nestes crimes, no que toca ao de corrupção passiva, verifica-se o mesmo lapso que já expusemos no que toca ao arguido QQ. Há, aqui, do mesmo modo, um engano na indicação do artigo do CP – os factos da acusação reportam-se, não ao artigo 373º CP, mas ao artigo 372º.
Fazendo as devidas correcções, os crimes em causa ficarão com a seguinte redacção:

Um CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA, praticado por RR relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES no que concerne aos pagamentos recebidos do arguido CC com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, crime p, e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 372°, n.º l e com referência  386°, n.º 2, todos do Código Penal, na redacção introduzida pela Lei n° 108/2001, de 28 de Novembro
Um CRIME DE CORRUPÇÃO ACTIVA praticado por CC, relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES no que concerne aos pagamentos efectuados ao arguido RR, crime p. e p. pelo arts. 374°, n.º 1 do Cód. Penal, com referência ao 386°, n.º 2 do mesmo diploma legal; (esta redacção já  constava da acusação)
*
Um CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA praticado por SS, relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES no que concerne aos pagamentos recebidos do arguido CC com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts.372°, n.º l e com referência ao art. 386°, n.º 2, todos do Código Penal, na redacção introduzida pela Lei n° 108/2001, de 28 de Novembro
Um CRIME DE CORRUPÇÃO ACTIVA praticado por CC relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES no que concerne aos pagamentos efectuados ao arguido SS, crime p. e p. pelos arts. 374°, n.º 1 do Cód. Penal, com referência aos art . 386°, n.º 2 do mesmo diploma legal; (esta redacção já  constava da acusação)

1.3.3 A PRESCRIÇÃO
Partiremos para a análise da questão da prescrição tendo em conta as correcções que foram efectuadas aos artigos referidos na imputação dos crimes de corrupção passiva.
Estabelece o art.º 118º, do Código Penal, na versão rectificada de 2007 (Lei 59/2007 e Ret. n.º 102/2007), epigrafado “prazos de prescrição”, nas partes ora com interesse:
1 - O procedimento criminal extingue-se, por efeito de prescrição, logo que sobre a prática do crime tiverem decorrido os seguintes prazos: (…)
b) 10 anos, quando se tratar de crimes puníveis com pena de prisão cujo limite máximo for igual ou superior a cinco anos, mas que não exceda dez anos; (…)          
Com as alterações ao CP introduzidas pela Lei n.º 32/2010, de 02 de Setembro (entrada em vigor em 01.03.2011, 180 dias após a sua publicação), os crimes de corrupção para ato ilícito previstos nos artigos 372.º, 374.º, do CP,  16º e 18º, da Lei dos Crimes da Responsabilidade de Titulares de Cargos Políticos (n.º 34/87, de 16 de julho), passaram a contar com um prazo de prescrição de 15 anos.
O art.º 120º, do CP, referente à “suspensão da prescrição” (a redação em vigor à data dos factos em causa no processo, na parte que ora importa, é idêntica), dispõe:
1 - A prescrição do procedimento criminal suspende-se, para além dos casos especialmente previstos na lei, durante o tempo em que: (…)
b) O procedimento criminal estiver pendente a partir da notificação da acusação;
2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior a suspensão não pode ultrapassar 3 anos.(…)
6 - A prescrição volta a correr a partir do dia em que cessar a causa da suspensão.
O art.º 121º, do CP, a propósito da “interrupção da prescrição” (a redação em vigor à data dos factos em causa no processo, na parte que ora importa, é em tudo idêntica), prescreve:
1 - A prescrição do procedimento criminal interrompe-se:
a) Com a constituição de arguido;
b) Com a notificação da acusação (…); (…)
2 - Depois de cada interrupção começa a correr novo prazo de prescrição.
3 – (…) [A] prescrição do procedimento criminal tem sempre lugar quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo normal de prescrição acrescido de metade. (…)
O crime de corrupção passiva para acto ilícito da Lei dos Crimes da Responsabilidade de Titulares de Cargos Políticos (n.º 34/87, de 16 de julho), era punido com pena de prisão de 2 a 8 anos (desatendendo as agravações, esta moldura não sofreu alterações).
O crime de corrupção ativa para ato ilícito da mesma lei tinha uma moldura abstrata superior de 5 anos de prisão (não considerando as agravações, esta moldura não sofreu alterações).
O crime de corrupção passiva para ato ilícito antes previsto no art.º 372.º, do CP, era punido com pena de prisão de 1 a 8 anos (esta moldura continua a ser a mesma - atual art.º 373º).
O crime de corrupção ativa para ato ilícito previsto no art.º 374.º do CP,  tinha uma moldura abstrata superior de 5 anos de prisão (esta moldura não sofreu alterações).
De onde resulta que, para qualquer um destes quatro crimes, o prazo regra de prescrição, antes de 01.03.2011 (data da entrada em vigor da Lei n.º 32/2010, de 02 de Setembro), é de 10 anos, o prazo máximo absoluto de extensão da prescrição é de 15 anos (10+5), o prazo máximo de suspensão, decorrente da notificação da acusação, é de 3 anos, o que tudo somado perfaz 18 anos (10+5+3) - art.ºs 118º, n.º 1, al. b), 120º, n.ºs 1, al. b), e 2, e 212, n.º 3, do CP.
Na análise da questão da prescrição, levaremos em conta as datas dos (primeiros) acordos corruptivos tal como perspetivadas na decisão instrutória, por serem as datas mais favoráveis aos arguidos, a não ser que se imponha a consideração de outras datas para a decisão deste recurso (o que, como veremos, só assumirá algum relevo numa única situação que analisaremos infra).
Aplicar-se-á a lei vigente à data destes factos típicos relevantes, circunstância que só se alteraria se sobreviesse lei mais favorável ao arguido (art.º 2º, do CP), o que não se verificou.
Vejamos cada um dos crimes declarados prescritos na decisão recorrida:

Um CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA PARA ACTO ILÍCITO DE TITULAR DE CARGO POLÍTICO praticado, arguido AA EM CO-AUTORIA COM O ARGUIDO BB, com referência a actos praticados no interesse do Grupo LENA entre 2005 e 2011, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.º 1.°, 2.°, 3.°, n.º 1, alínea d), art. 16.°, n.º 1 da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n.º 108/2001, de 28 de Novembro (Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos) e 28º do CP.
A decisão recorrida fixa o primeiro acordo corruptivo em 25.01.2007, data em que, na sua perspetiva, se consumou formalmente o crime.
Conforme antes vimos, o prazo de prescrição do procedimento criminal é de 10 anos- art.º 118.º, 1-b), do CP, na versão transcrita (e não 5 anos, como entendeu o Sr. Juiz).
AA e BB foram constituídos arguidos em 21.11.2014.
A acusação data de 09.10.2017 e os arguidos AA e BB foram dela notificados em 11.10.2017.
Entre a data do acordo corruptivo e estas datas de constituição como arguido e notificação da acusação não decorreram 10 anos.
A constituição como arguido e a notificação  da acusação determinaram a interrupção do prazo de prescrição e o reinício da sua contagem (art.º 120.º, 1-a) e b), 2, do CP).
Esta última circunstância impõe também a suspensão da contagem, no caso, pelo máximo de 3 anos (art.º 120.º, 1-b), 2, do CP).
Considerando o disposto no art.º 121.º, 3, do CP, o termo da prescrição do procedimento criminal, já contando com os 3 anos de suspensão, tem lugar 18 anos, contados, na tese da decisão recorrida, a partir de 25.01.2007.
É forçoso considerar que, não tendo decorrido 18 anos contados a partir desta data, mesmo na tese adotada pela decisão recorrida, ou seja, contando o prazo a partir da aceitação da promessa, o crime não se encontra prescrito.
Por maioria de razão, na tese de que o início da contagem do prazo de prescrição se inicia com o(s) recebimento(s) cronologicamente posteriores, o crime também não está prescritos.

CONCLUSÃO:
O CRIME CORRUPÇÃO PASSIVA PARA ACTO ILÍCITO DE TITULAR DE CARGO POLÍTICO, PRATICADO PELO ARGUIDO AA EM CO-AUTORIA COM O ARGUIDO BB, com referência a actos praticados no interesse do Grupo LENA entre 2005 e 2011, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.º 1.°, 2.°, 3.°, n.º 1, alínea d), 16.°, n.º 1 da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n.º 108/2001, de 28 de Novembro  não está prescrito.
*
UM CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA PARA ACTO ILÍCITO DE TITULAR DE CARGO POLÍTICO, praticado por AA, com referência a actos praticados no interesse do arguido CC, relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.º lº, 2.°, 3.°, n.º 1, alínea d), 16.° da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n° 108/2001, de 28 de Novembro(Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos).
A decisão recorrida datou o acordo corruptivo típico de 30 de Junho de 2010, momento em que, na sua perspetiva, se consumou formalmente o crime.
Conforme antes vimos, o prazo de prescrição do procedimento criminal é de 10 anos- art.º 118.º, 1-b), do CP, na versão transcrita (e não 5 anos, como entendeu o Sr. Juiz).
Considerando tudo quanto se disse no crime anterior sobre o prazo de prescrição, as datas de constituição como arguido do arguido AA e da notificação da acusação, a interrupção e a suspensão da contagem do prazo de prescrição, por força do disposto no art.º 121.º, 3, do CP, o termo da prescrição do procedimento criminal, já contando com os 3 anos de suspensão, tem lugar decorridos 18 anos, contados, na tese da decisão recorrida, a partir de 30.06.2010.
Não tendo decorrido 18 anos desde essa data, mesmo na tese adotada pela decisão recorrida (que contou o prazo a partir da aceitação da promessa), o crime não se encontra prescrito.
Por maioria de razão, na tese de que o início da contagem do prazo de prescrição se inicia com o(s) recebimento(s) cronologicamente posteriores, o crime não está prescrito.

CONCLUSÃO
O CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA PARA ACTO ILÍCITO DE TITULAR DE CARGO POLÍTICO, praticado por AA, com referência a actos praticados no interesse do arguido CC, relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.º lº, 2.°, 3.°, n.º 1, alínea d), 16.° da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n° 108/2001, de 28 de Novembro(Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos) NÃO ESTÁ PRESCRITO.
*
UM CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA DE ACTO ILÍCITO DE TITULAR DE CARGO POLÍTICO , praticado por AA  em co-autoria com o arguido DD, com referencia a actos praticados no interesse dos arguidos EE e FF com utilização das sociedades do Grupo VALE DO LOBO, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.º 1º, 2.°, 3.°, n.º 1, alínea d), 16.° da Lei 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n° 108/2001, de 28 de Novembro- Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos.
Um CRIME DE CORRUPÇÃO ACTIVA DE TITULAR  DE ACTO ILÍCITO DE CARGO POLÍTICO, praticado por FF  em co-autoria com o arguido EE, com referência a actos praticados por AA e DD no interesse dos primeiros, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 2°, 3°, n.º 1, alínea d), 18°, n.º 1 e 30° da Lei 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n° 108/2001, de 28 de Novembro- Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos.
Do lado passivo:
Na tese da decisão recorrida a solicitação da  vantagem para o  arguido DD e para o arguido AA terá ocorrido em Junho de 2006 e a promessa de entrega de vantagem patrimonial por parte dos arguidos EE e FF terá ocorrido também antes de 28 de Junho de 2006.
AA foi constituído arguido em 21.11.2014 e DD em 09.07.2015;
O arguido AA, quanto aos factos relacionados com o crime de corrupção relativo a Vale do Lobo, apenas foi confrontado em 27.05.2015 (fls. 16517 a 16525).
Os arguidos AA e DD foram notificados da acusação em 11.10.2017.
O prazo de prescrição do procedimento criminal é de 10 anos- art.º 118.º, 1-b), do CP, na versão transcrita (e não 5 anos, como entendeu o Sr. Juiz).
Considerando tudo quanto se disse nos crimes anteriores, o termo da prescrição do procedimento criminal, já contando com os 3 anos de suspensão, tem lugar decorridos 18 anos, contados, na tese da decisão recorrida, a partir de 28.06.2006.
Não tendo decorrido 18 anos desde essa data, mesmo contando o prazo a partir do acordo corruptivo (na tese adotada pela decisão recorrida), o crime não se encontra prescrito.
Por maioria de razão, na tese de que o início da contagem do prazo de prescrição se inicia com o(s) recebimento(s) cronologicamente posteriores, o crime não está prescrito.
Do lado activo:
Embora o Sr. Juiz não tenha declarado a prescrição do crime de corrupção do lado activo, impõe-se uma tomada de decisão relativamente ao arguido FF.       
Tendo por base a tese do início da contagem do prazo de prescrição a partir do acordo corruptivo:
Este foi constituído arguido a 07.02.2017.
De acordo com a decisão recorrida o crime consumou-se formalmente em 28.06.2006, data do acordo corruptivo.
Contando o prazo de prescrição de 10 anos a partir desta data, o procedimento criminal teria prescrito em 29.06.2016.
Na verdade, os 10 anos completaram-se antes mesmo da constituição como arguido, no decurso dos quais não ocorreu nenhuma circunstância que suspendesse ou interrompesse tal prazo.
O Recorrente entende que a acusação se suportou no entendimento de terem ocorrido sucessivos actos susceptíveis de preencherem o tipo penal da corrupção, num crescendo de formulação e de concretização que, em sede de acordo, terminaram no mês de Dezembro de 2007, antes da saída de DD da administração da CGD, com os pagamentos a consumarem-se a partir de Janeiro de 2008.
Partindo da data do acordo corruptivo, tal como entendida pelo Recorrente, mesmo na tese do início da contagem do prazo de prescrição a partir da consumação formal, o crime não está prescrito, posto que a constituição como arguido teve lugar em data anterior ao termo dos 10 anos, tendo sido interrompida a contagem antes desse termo.
Tendo por base a tese do início da contagem do prazo de prescrição a partir do pagamento/recebimento:
Os pagamentos das vantagens indevidas foram realizados em três parcelas, em 16.01.2008, 26.03.2088 e 04.04.2008.
Iniciando-se o prazo de prescrição na data do último pagamento - 04.04.2008 - e tendo em conta as interrupções já referidas, desde logo a decorrente da constituição de arguido em 02.02.2017, o procedimento criminal não prescreveu.

CONCLUSÃO:
NENHUM DESTES CRIMES ESTÁ PRESCRITO.         
*
 Um CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA praticado por QQ relativamente aos pagamentos recebidos enquanto Director da RAVE, no âmbito da PPP, mediante acordo celebrado com a XMI, crime p. e p. pelo art.º 372. °, n.º 1 do Código Penal, com referência ao art.º 386. °, n.ºs 1 e 2 do mesmo diploma legal.
Mais uma vez a decisão recorrida considerou prescrito o crime por ter aplicado o prazo de 5 anos (por referência ao crime de corrupção para acto lícito).
De acordo com o entendimento da decisão recorrida, o alegado crime de corrupção passiva consumou-se, em termos formais, pelo menos, até ao dia 31 de Março de 2008.
Considerando que o prazo de prescrição é de 10 anos e começou a contar a partir do dia 01.04.2008, o procedimento criminal prescreveria em 01.04.2018.
Porém, QQ foi constituído arguido a 8-6-2017 (termo de constituição de arguido junto a fls. 38697). Com essa notificação interrompeu-se o prazo, que voltou a correr no dia 09.06.2017. A acusação foi-lhe notificada no dia 11.10.2017, pelo que temos nova interrupção e novo início da contagem do prazo.
Considerando o prazo máximo de prescrição (15 anos) e a suspensão de 3 anos, concluímos que, mesmo contando o prazo de prescrição a partir da data do acordo corruptivo, o crime ainda não está prescrito.
Por maioria de razão, na tese de que o início da contagem do prazo de prescrição se inicia com o(s) recebimento(s) cronologicamente posteriores, o crime não está prescrito.

CONCLUSÃO: NENHUM DESTES CRIMES ESTÁ PRESCRITO.

1.3.3.1 CONCEITO DE FUNCIONÁRIO – ARTIGO 368º CP
Os arguidos SS e RR levantaram, em sede de instrução, a questão da definição do conceito de “funcionário”, considerando não integrar essa categoria.
Sustenta o  primeiro arguido que não era funcionário, nem do sector administrativo, nem do sector público empresarial, que a PT SGPS não era uma empresa pública, para efeitos penais, também não era uma empresa pública, para efeitos administrativos, também não era uma empresa de capitais públicos nem com participação maioritária de capital social, e também não era, na data dos factos, concessionária do serviço público de telecomunicações. A PT Comunicações S.A. assumiu o conjunto de direitos e de obrigações da concessionária de serviço público de telecomunicações em 2000. Sobre o facto de a qualificação do Arguido como funcionário decorrer da classificação da PT Comunicações como concessionária de serviços públicos, o Arguido defende que este entendimento contende de forma grosseira com o princípio constitucional da legalidade, porquanto em momento algum se poderá admitir que a qualidade de funcionário para efeitos da lei penal decorre da possibilidade de comunicação da qualidade de uma sociedade como empresa concessionária de serviços públicos a outra que o não seja, em função da sua relação de grupo. Sufraga ainda que a interpretação segundo a qual o conceito de funcionário possa ser alargado ao administrador de uma empresa não concessionária de serviço público, apenas pelo facto de uma sociedade do mesmo grupo ser concessionária, colide com a proibição de interpretação analógica prevista no artigo 1.º, n.º 3, do Código Penal, e viola o princípio da legalidade consagrado no artigo 29.º, n.º 1, da CRP.
O Sr. Juiz de Instrução entendeu que “a partir de Dezembro de 2000, concluído que foi o processo de privatização iniciado em 1995, a sociedade Portugal Telecom SA não só deixou de ser considerada como uma empresa pública, como alterou a sua denominação social para Portugal Telecom, SGPS SA e assumiu a natureza de uma típica entidade privada, uma vez que o Estado deixou de ter qualquer participação social.
Para além disso, inexistindo qualquer forma de influência pública dominante sobre a PT e não tendo esta a natureza de uma empresa participada é forçoso concluir que a partir de Dezembro de 2000 a PT está de fora do âmbito subjectivo de aplicação do regime jurídico do sector empresarial do Estado. Cumpre referir, também, que os arguidos SS e RR não foram eleitos para o Conselho de Administração da PT SGPS como administradores designados ou propostos pelo Estado, nos termos definidos no artigo 15º do DL 558/99, vigente à data dos factos. Os arguidos foram eleitos por indigitação dos maiores accionistas privados. Deste modo, nem em 2006 e nem posteriormente, os arguidos em causa poderiam ser qualificados como titulares de cargo público, por não terem sido designados pelo Estado, nomeadamente pelo Governo, para dirigirem uma entidade pública. (cfr. artigos 10.º e 11.º e 18.º e 19.º dos Estatutos da PT Apenso CL, 3.º Volume, fls. 12). (…)o facto da PT Comunicações, S.A. ser concessionária do serviço de telecomunicações (cfr. DL n.º 219/2000, de 09/09), não poderá tal qualidade transmitir-se à PT SGPS, porquanto a sua a actividade limitava-se à gestão das participações sociais de outras sociedades, inexistindo qualquer prova indiciária que seria a PT SGPS que tomava todas as decisões relacionadas com o contrato de concessão de serviço público e que dava indicações vinculativas à PT Comunicações, S.A. Não restam dúvidas, tal como é dito no Acórdão n.º 288/2004 do Tribunal Constitucional: “Importa começar por notar que está em causa a prossecução de uma indiscutível finalidade pública – assegurar a existência de um serviço público de telecomunicações (cfr. o artigo 8º, n.º 1, da citada Lei n.º 91/97, segundo o qual ao Estado incumbe assegurar a existência e disponibilidade de um serviço universal de telecomunicações) – com clara relevância constitucional, e que tem de ser prosseguida a nível nacional”.
No entanto, apesar dos direitos e deveres em que a concessionária PT Comunicações SA foi investida por força do contrato de concessão e apesar da prossecução de um interesse público, não faz com que esses direitos e deveres se estendam e se comuniquem a todo o universo empresarial do Grupo PT.  (…)Assim, não podem ser imputados aos arguidos RR e SS actuações na condição de funcionários para efeitos penais, bem como a prática de crimes de corrupção passiva, pois os actos que lhes são imputados na acusação são alheios à qualidade de administradores de uma empresa concessionária de serviço público.”
Termina o Sr. Juiz proferindo despacho de não pronúncia relativamente aos arguidos RR e SS, desde logo, porque falta um dos elementos do tipo  do crime (da corrupção quanto aos dois e de peculato, quanto ao segundo), ou seja, ser funcionário. Por força do art. 307º nº 4 do CPP, retira as mesmas consequências jurídicas relativamente ao arguido CC, que , deste modo, também não é pronunciado pela prática dos crimes de corrupção activa relativa àqueles dois arguidos.

APRECIANDO
Seguiremos mais uma vez o AC do STJ DE 21-03-2018 retirado do processo 736/03.4TOPRT.P2.S1, consultável em WWW.DGSI.PT onde se pode ler: “O denominado conceito alargado de funcionário abrange aqueles que, sem vinculação funcional ou pessoal, e por qualquer forma (temporária ou provisoriamente, onerosa ou gratuitamente, voluntária ou obrigatoriamente), tenham sido chamados a desempenhar ou a participar no desempenho de uma atividade compreendida na função pública administrativa ou jurisdicional ou, nas mesmas circunstâncias, a desempenhar funções em organismos de utilidade pública ou a nelas participar. Assim, o conceito de funcionário consagrado no Código Penal não coincide com o conceito administrativo do termo e, por isso, teve o legislador a necessidade de definir, para efeitos penais, aqueles que se devem considerar abrangidos por tal categoria de “funcionário”. Como se referiu nas Actas da Comissão Revisora do Código Penal (in B.MJ. n° 290, págs. 96 e 97), cura-se neste artigo de dar um conceito de funcionário público. Em vez de a respeito de cada tipo de crime se acrescentar uma definição conceitual de funcionário público, achou-se melhor técnica legislativa estabelecer num artigo final tal conceito. Como base deve admitir-se que o conceito válido para o Código Penal não tem de decalcar ou sequer assentar noutros conceitos estabelecidos para outros domínios do direito.” O conceito de funcionário para efeitos penais definido na alínea c) do n° 1 do art. 386° do C.P. é um conceito “alargado” e autónomo, que se extrai “não por interpretação analógica, ou mesmo extensiva, mas por mera interpretação declarativa” e que se justifica por razões de política criminal. Como refere Maia Gonçalves (in “Código Penal Português, Anotado e Comentado”, 14ª edição, pág. 997), “os fins específicos da tutela penal não se compadeceriam com uma fórmula restrita, que excluísse designadamente aqueles a quem são cometidas funções em serviços públicos sem permanência bastante para que, em Direito Administrativo, possam considerar-se funcionários públicos. E daí terem sido, com frequência, considerados funcionários públicos, para efeitos penais, certos indivíduos desempenhando aquelas funções, não obstante poderem ser livremente nomeados ou exonerados. É, fundamentalmente, a natureza das funções exercidas que dita e empresta a qualidade de funcionário a quem as exerce, isto segundo o critério da lei penal…”.Assim, e como justamente se acentua no despacho de pronúncia proferido nos presentes autos (convocando o Parecer n° 60/57, de 11 de Março de 1959 da Procuradoria Geral da República, in B.MJ. nº 88, pág. 170), é evidente que o liquidatário judicial não é funcionário público, de acordo com o conceito próprio do Direito Administrativo, por, no caso, não concorrerem os requisitos da investidura (feita directamente pela Administração, e aceita voluntariamente pelo investido), do cargo (que deve fazer parte dos quadros permanentes da Administração e envolver a prestação de trabalho não manual, ou predominantemente intelectual), bem como do exercício das funções (que deve implicar certa estabilidade e permanência, suscetível de determinar a profissionalidade das funções). Também Leal Henriques e Simas Santos (in “Código Penal Anotado”, 3ª edição, páginas 1650 e 1651), afirmando que o conceito de funcionário estabelecido no n° 1 do art. 386° do C.P. é indiscutivelmente mais amplo que o conceito meramente administrativo, dizem o seguinte: “a elasticidade da lei, neste âmbito, tem justificada razão, atendendo às múltiplas situações em que podem estar envolvidos cidadãos não rigorosamente funcionários, no sentido tradicional do termo, e que de outro modo não sofreriam censura jurídico-criminal ajustada aos seus atos, sendo certo que o seu comportamento não se afasta daquele que decorre dos servidores públicos como tal. Daí que a noção de funcionário, para estes fins, esteja intimamente ligada à ideia de função, que não propriamente ao formalismo da qualidade do agente”.
Salienta, por seu turno, Damião da Cunha (in “Comentário Conimbricense do Código Penal”, obra citada, página 808 e ss.)” que o Autor do Anteprojecto justificou a persistência desta disposição com a necessidade de um conceito de funcionário suficientemente abrangente para que se não verificassem lacunas de punibilidade. E defende que “A solução que o CP estabeleceu de criar um conceito autónomo e alargado de funcionário é político-criminalmente justificável. De resto, corresponde a uma necessidade sentida pela generalidade das legislações penais, embora a formulação e o âmbito de aplicação desses conceitos nem sempre sejam coincidentes.” Refere, ainda, que no art. 386º-1, a denominação de funcionário é determinada por duas considerações: ou por o agente ter uma qualificação subjectiva (a vinculação ou integração num serviço) ou por uma qualificação de ordem material-objectiva: o desempenho de funções num serviço público ou jurisdicional (ou se se quiser, de forma mais geral, num serviço público enquanto satisfação de uma necessidade colectiva individualmente sentida - cf. MARCELLO CAETANO, cit. 1067). Por outro lado, a referência à função jurisdicional, apenas vem clarificar o âmbito de um serviço público. De facto, poderia ser duvidoso se a função jurisdicional caberia no âmbito da Administração, enquanto tal, como, por outro lado, poderia haver dúvidas na eventual distinção entre função jurisdicional e administração da Justiça (esta também uma forma de Administração). Significa, portanto, que a intervenção de qualquer pessoa dentro de um processo que visa as finalidades da Jurisdição (no seu sentido próprio e específico) lhe confere a qualidade de funcionário (cfr. obra citada, páginas 814-815). Como se refere no acórdão da Relação de Coimbra de 20/6/2012 (disponível em www.dgsi.pt/jtrc.nsf), o conceito de funcionário, para o direito penal, consagra qualquer atividade realizada com fins próprios do Estado, e a atividade relacionada com a liquidação de patrimónios em processo de falência (assim como a venda em ação executiva) é fim próprio do Estado levada a efeitos através do órgão de soberania competente: os Tribunais. De resto, e como é salientado neste aresto, a alínea c) do mencionado art. 386º do CP, previa a qualificação com tal qualidade (de funcionário), para efeitos da lei penal, para todas as pessoas que sem vinculação funcional ou pessoal, e por qualquer forma (temporária ou provisoriamente, a título oneroso ou gratuito, voluntária ou obrigatoriamente) hajam sido chamadas a desempenhar ou a participar no desempenho de uma atividade compreendida na função pública administrativa ou jurisdicional (conceito alargado de funcionário). E, acentuando que aquele preceito legal nada tem de inovador – tendo-se limitado a Revisão de 1995 a consagrar aquilo que já era definido e pode efetivamente ser considerado como o conceito alargado de funcionário, para efeitos da lei penal, que já antes se continha no art. 437º do mesmo diploma legal, antes da citada revisão –, sublinha que, tanto ao nível da doutrina como da jurisprudência, sempre se considerou que basta que o agente participe no desempenho de qualquer dessas atividades, não sendo necessário que esteja sujeito a uma qualquer relação orgânica efetiva com a Administração Pública. Assim, embora o seu cargo não faça parte dos quadros permanentes da Administração e o exercício das respetivas funções se revista de carácter temporário, o liquidatário judicial (nomeado pelo Juiz na sentença de declaração de falência – artigos 128°, n° 1, alínea f), 132°, 133º e 135° do C.P.E.R.E.F. e 2° do D.L. 254/93 de 15/7) é chamado a desempenhar, mediante remuneração (atribuída pelo Tribunal, de harmonia com o disposto no art. 133º daquele Código e art. 5º do referido Decreto-Lei), uma atividade compreendida na função pública jurisdicional.(…) Na verdade, e conforme se retira da esmagadora maioria da doutrina e da jurisprudência (das quais se citam, a título de mero exemplo, Teresa Beleza, “Ilicitamente Comparticipando”, separata do Boletim da Faculdade de Direito de Coimbra, 1984 e o Acórdão STJ acabado de citar) a qualidade de funcionário é indiscutivelmente uma daquelas em que ocorre a possibilidade legal de comunicação, nos termos previstos no art. 28º do Código Penal. Como se refere no mencionado acórdão do STJ de 13/3/2008, “Resumindo, aquele que, sem o ser, juntamente com um funcionário (que pode ser meramente ocasional, nos termos já assinalados) cometer um crime dos que exigem aquela qualidade para que se verifiquem, incorre também na prática do mesmo delito”.
(NB. Tudo o que se encontra a itálico e sinalizado com “ é uma citação)
No processo nº 362/08.1JAAVR, Acórdão da Relação do Porto, conhecido como “FACE OCULTA” já citado, podemos ler: Quanto à qualidade de funcionário do co-arguido SSS temos a salientar que o tipo legal do tráfico de influência não exige a identificação do funcionário, mas sendo, como vimos, a EDP — Energias de Portugal, S.A, onde se incluem as empresas participadas, entre elas, a EDP — Imobiliária e Participações, - uma unidade para efeitos de funcionamento e politica empresarial, então é evidente que os trabalhadores e administradores desta empresa têm de ser equiparados a funcionários para todos os efeitos da lei Penal como claramente o impõe o art. 386 do CP, sendo opção do legislador que este conceito para efeitos penais seja mais vasto e abranja realidades diversas do conceito de funcionário para o direito administrativo. Na defesa do interesse público e no sentido de evitar lacunas de punibilidade, é neste caso manifesta a intenção do legislador de integrar nessa noção todas as hipóteses de atuação administrativa. Tudo visto também nenhuma dúvida subjaz quanto ao facto de a influência ter sido exercida junto de SSS e de este ser efetivamente equiparado a funcionário, já que, este como ficou demonstrado estava ao serviço de uma empresa também considerada integrante de uma entidade pública.”
Concordamos com o Recorrente quando diz “Aliás, e no tratamento de questão idêntica à aqui em análise (a circunstância de alguns dos arguidos exercerem funções em sociedade participada do Grupo EDP –Energias de Portugal no qual se incluía a sociedade EDP - Distribuição SA, concessionária da distribuição da energia elétrica a nível nacional), o Tribunal da Relação do Porto, no Acórdão de 05.04.2017 proferido no processo 362/08.1JAAVR (no denominado processo Face Oculta), sustentou que a equiparação a «funcionário» de gestores, titulares de órgãos de fiscalização e trabalhadores de empresas concessionarias de serviços públicos justifica-se, […] pelo relevo social do serviço público que prestam […] e que justifica também o contrato de concessão.
Que não pode dizer-se que o interesse público inerente à distribuição de energia eléctrica e ao contrato de concessão releva apenas na actuação da sociedade "EDP- Distribuição, S.A.", com a qual foi celebrado tal contrato. Releva na actuação da holding como um todo e como unidade empresarial coerente e coordenada. Releva, desde logo, na actuação da "sociedade-mãe" do "Grupo", a "EDP Energia, S.A.., a quem compete definir a estratégia global deste.
Fazendo-se aí notar ainda que não teria sentido que fosse incriminado um ato de corrupção, nos termos dos artigos 373.º e 374.º, do Código Penal, que envolvesse a EDP - Distribuição, S.A, e não o fosse, nos mesmos termos, um acto de corrupção que envolvesse a EDP-Energia, S.A, a quem compete definir a estratégia a que se subordina a actuação dessa e de todas as outras sociedades que compõem o Grupo.
Centrando-se na interpretação do teor literal da norma do n.º 2 do art.º 386.º do Código Penal, mais ali se decidiu que tanto corresponde ao sentido literal da expressão «empresa concessionária de serviço público» o conceito, mais formal e jurídico, de sociedade com a qual foi celebrado o contrato de concessão, como o conceito, mais substancial e económico de unidade empresarial que tem como objecto central a actividade a que é relativa a concessão, daí não resultando qualquer interpretação analógica ou extensiva da norma.”
Também se entende que os arguidos SS e RR, atento o disposto no n.º 2 do art. 386.º do Código Penal, são gestores de uma empresa concessionária de serviço público, e, como tal, funcionários nos termos e para os efeitos dessa norma.
1.3.3.2 O Primeiro-Ministro pode ser considerado funcionário para  os termos do crime de corrupção do Código Penal-  art.º. 368º do CP?
Relativamente a este tema a resposta é claramente negativa. O Primeiro Ministro é um funcionário, mas que exerce um cargo político, sendo que, relativamente a crimes cometidos por este, existe lei especial.
Embora lateral, pode ver-se o Acórdão nº 41/00 Proc. nº 481/97, 2ª Secção do Tribunal Constitucional, onde é efectuada a diferença entre funcionário e titular de cargo político (não obstante o tema objecto da decisão não ser esse).
*
1.3.4 CRIMES DE CORRUPÇÃO ACTIVA PRATICADO POR LENA ENGENHARIA E CONSTRUÇÕES. SA em co-autoria com as sociedades LEC SGPS SA e LENA SGPS SA

Um CRIME DE CORRUPÇÃO ACTIVA praticado por LENA ENGENHARIA E CONSTRUÇÕES. SA em co-autoria com as sociedades LEC SGPS SA e LENA SGPS SA relativamente a factos referentes a pessoa do arguido AA, este com mediação do arguido BB e em benefício do Grupo LENA, com referências aos anos de 2005 a 2011, crime p. e p. pelos arts.374° e 374°-A, n.º 2 do Cód. Penal, com referência aos arts. 11°, n.º 2 e 202°, alínea b) do mesmo diploma legal; ( crime 3 da lista)

A DECISÃO INSTRUTÓRIA proferiu um despacho de não pronúncia porquanto entendeu que aquelas sociedades arguidas, à data, não podiam responder criminalmente.

1.3.4.1 À DATA DA CONSUMAÇÃO DOS CRIMES  DE CORRUPÇÃO AS SOCIEDADES LENA ENGENHARIA E CONSTRUÇÕES. SA , LEC SGPS SA e LENA SGPS SA PODIAM SER ALVO DE RESPONSABILIDADE PENAL CONFORME  VÊM ACUSADAS?

TEMA
A questão prende-se com o seguinte: até à data da entrada em vigor da Lei  59/2007 de 4 de Setembro, o art. 11º  do CP previa que “só as pessoas singulares são susceptíveis de responsabilidade criminal”.
Atenta a data da consumação do crime de corrupção imputado àquelas arguidas, podiam as mesmas ser responsabilizadas criminalmente?

DECISÃO INSTRUTÓRIA
Quanto a esta questão, o Sr. Juiz decidiu do seguinte modo:
“O artigo 11º nº 2 do Código Penal foi alterado pela Lei 59/2007 de 4 de Setembro que entrou em vigor no dia 15 de Setembro de 2007.
Na sua versão original, o artigo 11º do CP tinha a seguinte redacção:
Salvo disposição em contrário, só as pessoas singulares são susceptíveis de responsabilidade criminal.
Com as alterações introduzidas pela Lei 59/2007 o mesmo artigo passou a ter a seguinte redacção quanto ao nº 1 e ao nº 2 Salvo o disposto no número seguinte e nos casos especialmente previstos na lei, só as pessoas singulares são susceptíveis de responsabilidade criminal.
2 - As pessoas colectivas e entidades equiparadas, com excepção do Estado, de outras pessoas colectivas públicas e de organizações internacionais de direito público, são responsáveis pelos crimes previstos nos artigos 152.º-A e 152.º-B, nos artigos 159.º e 160.º, nos artigos 163.º a 166.º, sendo a vítima menor, e nos artigos 168.º, 169.º, 171.º a 176.º, 217.º a 222.º, 240.º, 256.º, 258.º, 262.º a 283.º, 285.º, 299.º, 335.º, 348.º, 353.º, 363.º, 367.º, 368.º-A e 372.º a 374.º, quando cometidos: a) Em seu nome e no interesse colectivo por pessoas que nelas ocupem uma posição de liderança; ou b) Por quem aja sob a autoridade das pessoas referidas na alínea anterior em virtude de uma violação dos deveres de vigilância ou controlo que lhes incumbem.
Com as alterações introduzidas pela Lei 60/2013, de 23 de Agosto.
1 - Salvo o disposto no número seguinte e nos casos especialmente previstos na lei, só as pessoas singulares são susceptíveis de responsabilidade criminal
2 - As pessoas colectivas e entidades equiparadas, com excepção do Estado, de outras pessoas colectivas públicas e de organizações internacionais de direito público, são responsáveis pelos crimes previstos nos artigos 152.º-A e 152.º-B, nos artigos 159.º e 160.º, nos artigos 163.º a 166.º, sendo a vítima menor, e nos artigos 168.º, 169.º, 171.º a 176.º, 217.º a 222.º, 240.º, 256.º, 258.º, 262.º a 283.º, 285.º, 299.º, 335.º, 348.º, 353.º, 363.º, 367.º, 368.º-A e 372.º a 374.º, quando cometidos: a) Em seu nome e no interesse colectivo por pessoas que nelas ocupem uma posição de liderança; ou b) Por quem aja sob a autoridade das pessoas referidas na alínea anterior em virtude de uma violação dos deveres de vigilância ou controlo que lhes incumbem.
A Lei 30/2015, de 22 de Abril, visando dar satisfação às recomendações formulados pelo GRECO, pelas Nações Unidas, no âmbito da convenção de Mérida e pela OCDE introduziu alterações ao código penal, entre os quais o artigo 11º.  1 - Salvo o disposto no número seguinte e nos casos especialmente previstos na lei, só as pessoas singulares são susceptíveis de responsabilidade criminal 2 - As pessoas colectivas e entidades equiparadas, com excepção do Estado, de pessoas colectivas no exercício de prerrogativas de poder público e de organizações de direito internacional público, são responsáveis pelos crimes previstos nos artigos 152.º-A e 152.º-B, nos artigos 159.º e 160.º, nos artigos 163.º a 166.º sendo a vítima menor, e nos artigos 168.º, 169.º, 171.º a 176.º, 217.º a 222.º, 240.º, 256.º, 258.º, 262.º a 283.º, 285,º, 299.º, 335.º, 348.º, 353.º, 363.º, 367.º, 368.º-A e 372.º a 376.º, quando cometidos: a) Em seu nome e no interesse colectivo por pessoas que nelas ocupem uma posição de liderança; o b) Por quem aja sob a autoridade das pessoas referidas na alínea anterior em virtude de uma violação dos deveres de vigilância ou controlo que lhes incumbem.
Daqui resulta, desde logo, que até 15 de Setembro de 2007 a responsabilidade penal das pessoas jurídicas, apesar de já ser uma realidade com consagração em diversos diplomas penais avulsos, não se encontrava prevista no código penal.
Assim, apenas com a Lei n.º 59/2007, de 4 de Setembro, é que foi consagrada a responsabilidade criminal dos entes colectivos no Código Penal. Não obstante, como refere Nuno Brandão (in “O Regime Sancionatório das Pessoas Colectivas na Revisão do Código Penal” in Revista do CEJ, 1.º Semestre, 2008, N.º 8 (Especial): Jornadas sobre a Revisão do Código Penal, p. 41), a previsão legal levada a cabo por aquela lei “não constitui propriamente um facto novo no sistema penal português, que há mais de 20 anos” admite a responsabilidade das pessoas colectivas no âmbito do direito penal secundário (Decreto-Lei n.º 28/84, de 20 de Janeiro     – crimes contra a economia e saúde pública – e Decreto-Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho – Regime Geral das Infracções Tributárias)
O artigo 11º nº 2 do CP ao prever a responsabilidade penal das pessoas colectivas e a identificar os crimes do catálogo susceptíveis de serem praticados por e através de pessoas colectivas, representou uma grande alteração do código penal.
Daqui resulta, também, que o direito português não conhece o princípio geral da responsabilidade criminal das pessoas colectivas, mas sim o princípio da responsabilidade criminal das pessoas colectivas em certas áreas delimitadas de criminalidade, traduzidas no catálogo de crimes identificados no nº 2 do artigo 11º do CP.
A responsabilidade criminal das pessoas colectivas só pode ter lugar nos casos previstos na lei e quanto ao catálogo de crimes identificados (de forma taxativa e não meramente enunciativa) na lei, cumprindo-se, deste modo, o princípio da legalidade criminal previsto no artigo 29º da CRP e artigo 1º do CP. 
Assim, para que se possa falar em responsabilidade criminal da pessoa colectiva, a primeira questão que se coloca, tendo em conta o princípio da legalidade criminal, consiste em saber se estamos perante um crime de catálogo e só depois é que cumpre saber se estão preenchidos os demais pressupostos acima identificados.
Tendo em conta a factualidade descrita na acusação, o arguido AA exerceu o cargo de Primeiro-Ministro entre 12 de Março de 2005 e ../../2011 (artigo 5º da acusação).
De acordo com o artigo 80 da acusação, o arguido GG durante o período de 2005 a 2014, foi administrador do Grupo Lena, tendo estado a seu cargo a gestão efectiva desse grupo empresarial, especialmente na área da engenharia e construção civil.
 No desempenho dessas funções, desde o início da década de 2000 e até 2015, assumiu formalmente cargos no conselho de administração, nomeadamente, nas seguintes sociedades do Grupo LENA:
- Accionista e Vice-presidente da LENA SGPS SA, NIF 504556916, constituída em Setembro de 2000, com a denominação CONSTRUCTORA DO LENA SGPS;
- Presidente do Conselho de Administração da LENA ENGENHARIA E CONSTRUÇÃO SGPS SA, NIF 508466423, constituída em Março de 2008;
- Presidente da LENA ENGENHARIA E CONSTRUÇÕES SA, NIF 500073880, constituída em Maio de 1974, com a denominação CONSTRUCTORA DO LENA SA;
- Administrador da LENA CONCESSÕES E SERVIÇOS SGPS, NIF 506529533, constituída no dia 10 de Fevereiro de 2004.
 Independentemente do exercício dessas funções era o arguido GG quem tinha a seu cargo a gestão efectiva do Grupo LENA e o controlo das sociedades e dos activos que o compunham.
(…)
13650. Dos factos narrados no âmbito do Capítulo III, decorre que o arguido GG estava ciente da grande relação de proximidade pessoal e profissional e de confiança que mantinha com o arguido BB, bem como da relação de proximidade entre este arguido e o arguido AA.
13651. O arguido GG tinha ainda perfeito conhecimento das funções e deveres inerentes ao cargo de Primeiro-Ministro do Governo de Portugal exercidas pelo arguido AA, no período compreendido entre 2005 e 2011.
13652. Apesar disso, o arguido GG, no interesse das sociedades LEC SA, LEC SGPS SA e sua holding LENA SGPS SA, quis agir da forma descrita no Capítulo III, em violação da autonomia intencional do Estado, prometendo e entregando contrapartidas patrimoniais aos arguidos AA e BB, o que sucedeu no período compreendido entre 2005 e 2011.
13653. O arguido GG actuou da forma descrita com o propósito que o arguido AA, no exercício das suas funções de Primeiro-Ministro do Governo de Portugal, enquanto responsável e decisor político, exercesse o seu poder, condicionando a actuação do Estado, na defesa dos interesses do GRUPO LENA, designadamente das sociedades LENA SGPS SA, LENA ENGENHARIA E CONSTRUÇÃO SGPS SA e LENA ENGENHARIA E CONSTRUÇÕES SA.
Conforme resulta dos artigos 1019, 1020, 1022, 1573, 5461 e 5671, o acordo entre os arguidos AA e BB, do lado passivo, e o arguido GG, do lado activo, com vista à prática de actos em favor do Grupo Lena, por parte do arguido AA enquanto Primeiro-Ministro, mediante o recebimento do montante global de 6.748.999,93€, ocorreu em finais de 2006.
Deste modo, tendo em conta os factos descritos na acusação, em particular nos artigos 843, 847, 961, 962, 963, 964, 1002, 1019, 1020, 1561, 1562, 1563, 1573, 1961, 2158, 5461, 5671, 10725 e 19726 verifica-se que a alegada solicitação da vantagem para o próprio arguido AA, com intervenção do arguido BB, terá ocorrido em até ao dia 25-1-2007 e a promessa de entrega de vantagem patrimonial por parte do arguido GG terá ocorrido também antes dessa data.
Assim, de acordo com o descrito na acusação e de acordo com o entendimento do MP expressado em sede de debate instrutório, o alegado crime de corrupção passiva consumou-se, em termos formais, pelo menos até ao dia 25 de Janeiro de 2007.
Nesta conformidade, tendo em conta a data da alegada consumação do crime de corrupção activa por parte do arguido GG e actuando este também na defesa dos interesses das arguidas LEC SA, LEC SGPS SA e Lena SGPS SA, faz com que seja esta a data de consumação do crime de corrupção imputado às sociedades arguidas.
Tendo presente a data de 25 de Janeiro de 2007 e a data da entrada em vigor da Lei 59/2007 de 4 de Setembro (entrou em vigor no dia 15 de Setembro de 2007), verifica-se, desde logo, que à data da consumação do alegado crime de corrupção activa p e p pelo artigo 374º e 374º A, nº 2 do Código penal, a responsabilidade criminal das pessoas colectivas não se encontrava prevista no código penal e nem os crimes causa faziam parte do catálogo dos crimes que admitem a responsabilidade criminal das pessoas colectivas.
Até essa data, 15-09-2007, a responsabilidade penal das pessoas colectivas apenas estava prevista no âmbito do direito penal secundário.
Dispõe o artigo 1º nº1 do CP – princípio da legalidade – que só pode ser punido criminalmente o facto descrito e declarado passível de pena por lei anterior ao momento da sua prática.
Assim sendo, sob pena de violação do princípio da legalidade consagrado no artigo 29º da CRP e 1º do CP, às arguidas Lena Engenharia e Construções SA, Lena Engenharia e Construções SGPS e Lena SGPS não pode ser imputado o crime de corrupção activa p e p pelo artigo 374º e 374º A, nº 2 do Código Penal.”
DIZ O RECORRENTE que “da acusação, decorre que o designado “acordo corruptivo” ocorreu em finais de 2006 (Janeiro de 2007), sendo que entendemos que o crime de corrupção activa se deve ter por formalmente consumado com a mera promessa de vantagem e o de corrupção passiva com a solicitação ou aceitação (ou a sua promessa), aquando do seu conhecimento pelo corruptor activo.
 No entanto, não  se pode deixar de considerar que este mesmo acordo corruptivo se deve entender como que renovado aquando da realização de cada um dos pagamentos efectuados para a esfera do arguido AA, ou seja, com cada um destes pagamentos é renovado o acordo de vontades inicial entre corruptor activo e corruptor passivo.
 Ora, a ser assim, como entendemos ser, quando ocorreu o último pagamento, pelo Grupo Lena, ao arguido AA, já estava em vigor a redacção do art.º 11.º, n.º 2, do Código Penal, introduzida pela Lei 59/2007, de 4 de Setembro, de acordo com a qual, no que ao caso interessa, “… as pessoas colectivas (…) são responsáveis pelos crimes previstos nos artigos (…) 372.º a 376.º…”.
 Mais, havendo um renovar da conduta criminosa, a prática de actos de execução desse mesmo crime de corrupção, mesmo que apenas na parte ocorrida no domínio da lei nova, deve suscitar a aplicação imediata dessa nova lei, ainda que se afigure mais severa que a anterior.”

A NOSSA POSIÇÃO
A resposta a esta questão vai contender, de novo, com o tema da consumação.
Há que chamar à colação o “tempus delictis”, nas palavras do Sr. Professor Taipa de Carvalho -  “Aplicação da lei no tempo”.
O crime de corrupção é um crime instantâneo, ou seja,  consuma-se em momento determinado (consumação imediata), sem qualquer prolongamento. Não significa que ocorre rapidamente, mas que, uma vez reunidos seus elementos, a consumação ocorre peremptoriamente.
Concluindo, o crime de corrupção consuma-se (estão verificados todos os elementos do tipo) com o acordo corruptivo. Havendo um “mais”, que seja o pagamento do suborno, esta realidade não pode ser desconsiderada pelo Direito, não obstante não fazer parte do tipo. Uma consequência desta posição é  considerar que o art. 119º nº 1 do CPP permite a interpretação ( não contrariando o princípio da legalidade – art. 29º da CRP)  da consideração do resultado ( a existir)  para efeitos de início de contagem do prazo prescricional.
Porém, esta consideração do resultado não coincide com o acto de consumação ( verificação dos elementos do tipo).
Assim, entendendo-se que o crime se consuma com o “acordo corruptivo”  e como este, de acordo com a acusação, ocorreu em finais de 2006, Janeiro de 2007, não pode ser aplicada a Lei que admite a responsabilidade criminal das pessoas colectivas porquanto a mesma entrou em vigor em data posterior à consumação do crime.
Deste modo, concluímos, tal como a Decisão Instrutória, que as sociedades LENA ENGENHARIA E CONSTRUÇÕES. SA , LEC SGPS SA e LENA SGPS SA não podiam ser responsabilizadas pela prática de um crime de corrupção ( crime 3).
Esta solução acaba por ser quase irrelevante porque, mesmo para quem entendesse que aquelas sociedades podiam responder criminalmente, haveria um outro elemento formal que faria decidir em sentido contrário, como analisaremos de seguida.

1.3.4.2 PODEM AS SOCIEDADES LENA ENGENHARIA E CONSTRUÇÕES. SA , LEC SGPS SA e LENA SGPS SA RESPONDER POR CRIME DIFERENTE DO QUE É IMPUTADO AO SEU REPRESENTANTE (GG)?
A questão levantada é a de saber se as mesmas sociedades podem responder pela prática de um crime de corrupção activa previsto no Código Penal quando o agente corrompido (o arguido AA) responde pela prática de um crime de corrupção passivo de titular de cargo político e o representante daquelas mesmas sociedades responde pela prática de um crime de corrupção activo de titular de cargo político.

DECISÃO INSTRUTÓRIA
Escreveu o Sr. Juiz “ Da acusação resulta que, pelos mesmos factos dos imputados às sociedades arguidas, o arguido GG foi acusado da prática de um crime de corrupção activa de titular de cargo político, relativamente à pessoa do Arguido AA, este com mediação do Arguido BB e em benefício do Grupo LENA, com referência aos anos de 2005 a 2011, crime p. e p. pelos artigos 2.º, 3.º, n.º 1, alínea d) e 18.º, n.º 1 e 19.º, n.º 2 e 3 da Lei 34/87, de 16 de Julho, com a redacção introduzida pela Lei n.º 108/2001, de 28 de Novembro   – Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos, com referência ao art. 202.º, alínea b) do Código Penal.
Do lado passivo, o arguido AA está acusado da prática, quanto aos factos relacionados com o Grupo Lena, de um crime de corrupção passiva de titular de cargo político, em co-autoria com o arguido BB, com referência aos actos praticados no interesse do Grupo Lena, entre 2005 e 2011, crime p e p pelas disposições conjugadas dos artigos 1º, 2º, 3º, nº 1 alínea d), 17º nº 1 e 19º, nº 2 e 3 da Lei 34/87, de 16 de Julho , na redacção introduzida pela Lei 108/2001, de 28 de Novembro, com referência aos artigos 28º e 202º, alínea b) do CP.
O Recorrente diz ”(…) entendemos que o crime de corrupção activa imputado às sociedades arguidas LENA ENGENHARIA E CONSTRUÇÕES SA, LENA ENGENHARIA E CONSTRUÇÃO SGPS e LENA SGPS se consumou em 7 de Junho de 2013, data em que foi elaborada a última versão do contrato entre as sociedades LEC SA, representada por TTT, e XLM LDA, representada pelo arguido BB. (cf. art.°s 11483 a 11485 da acusação). O Ministério Público ao imputar tal conduta às sociedades arguidas em causa teve, pois, em conta o crime de corrupção activa para acto ilícito previsto no art.° 374.°, agravado nos termos do art.° 374.° A, n.°2, com referência aos artigos 11.°, n.° 2 e 202.°, alínea b), todos do Código Penal, que já se encontravam em vigor à data da consumação deste mesmo crime. (…) Concluindo-se no ponto antecedente pela previsão da responsabilidade criminal das pessoas colectivas ora identificadas, à data da consumação do crime de corrupção em causa, cumpre apreciar se, ainda assim, não lhes deveria ter sido imputada a prática de um crime de corrupção, previsto e punido pelos artigos 374.° e 374.° A, do Código Penal (corrupção activa para acto ilícito), por ter sido imputada, aos arguidos AA  e GG, seu administrador, respectivamente a prática de um crime de corrupção passiva e de um crime de corrupção activa, previstos e punidos pela Lei n.° 34/87, de 16 de Julho.
Não podemos deixar de discordar do entendimento do Senhor JI, ao afirmar a fls. 3142 da DI, que o crime de corrupção activa previsto no art.° 374.° do Código Penal não pode ser imputado, às sociedades arguidas, por não ter sido esse o crime que foi imputado ao seu administrador.(…) Os factos imputados ao arguido GG, seu administrador, são os mesmos factos que são imputados às sociedades arguidas, sendo toda a sua conduta perpetrada em nome e no interesse das sociedades de que é administrador, ou seja, desenvolvida com vista ao favorecimento dos interesses do GRUPO LENA. Encontra-se assim identificada não só a conduta como o ente singular que, enquanto seu órgão, ou representante, actuou. Ora, a conduta em causa (porque a mesma) é susceptível de consubstanciar a prática de um mesmo crime de corrupção activa, que se encontra, porém, previsto e punido em dois diplomas distintos, atento o carácter, se quisermos, qualificado das condutas previstas na Lei 34/87, de 16 de Julho. Isso não significa, no entanto, que preenchendo a conduta em causa o mesmo crime, mas previsto e punido no Código Penal, e em vigor à data da consumação desse mesmo crime, o mesmo não seja aplicável às sociedades arguidas em causa. Entendemos assim que a conduta das pessoas colectivas identificadas, narrada nos termos da acusação, se subsume aos elementos típicos do crime de corrupção activa, previsto nos termos dos artigos 374.º e 374.º A, do Código Penal, preenchendo-os. A mera circunstância de a responsabilidade criminal das pessoas colectivas não se encontrar prevista na Lei 34/87, de 16 de Julho, não pode ter como consequência a exclusão da aplicação da lei penal comum, quando é certo que se indicia a conduta corruptiva em causa.
O Princípio da Legalidade, consagrado no art.° 29.°, da CRP, implica que ninguém poderá ser condenado criminalmente sem lei prévia que declare punível a acção ou omissão.
A conduta das sociedades arguidas preenche os elementos típicos do crime de corrupção activa previsto no Código Penal e que se encontrava em vigor à data da consumação desse mesmo crime. Assim, a interpretação dos artigos arts. 374.° e 374.° A, n.° 2, do Código Penal, com referência aos art.°s 11.°, n.° 2 e 202.°, alínea b), do Código Penal, no sentido de a conduta das sociedades arguidas se subsumir ao referido crime de corrupção activa, previsto no Código Penal, não viola o mencionado princípio, não sendo, por conseguinte inconstitucional.”

A NOSSA POSIÇÃO
Como diz o Sr. Juiz,  pese embora a acusação não ter tido o cuidado de identificar em qual das alíneas do nº 2 do artigo 11º do CP integra a responsabilidade das sociedades, tendo em conta o facto do arguido GG ter a qualidade de administrador das pessoas colectivas arguidas, a alínea a ter em consideração é a alínea a) do nº 2 do artigo 11º do CP, segundo a qual as pessoas colectivas são responsáveis pelos crimes previstos no catálogo do nº 2 do artigo 11º quando sejam cometidos em seu nome e no interesse colectivo por pessoas que nelas ocupem uma posição de liderança.
Considerando que a pessoa colectiva não é responsabilizada quando o acto a imputar não dimane de um órgão, de um representante ou de alguém que assuma o controlo da sua actividade ou de parte dela no exercício vinculado das suas funções, será possível imputar um crime à pessoa colectiva diferente daquele que foi imputado à pessoa física?
O crime em causa é um crime específico próprio, isto é, um crime cujo tipo legal exige a intervenção de pessoas dum certo círculo, detentoras de certas qualidades especiais, ou seja, o agente tem de ser um titular de cargo político, nos termos do artigo 3º, ou titular de alto cargo público, nos termos do artigo 3º A.
Na resposta a esta questão secundamos o Sr. Juiz que, por sua vez, acompanhou, na íntegra, a posição das Sr. Professoras Maria João Antunes e Susana Aires de Sousa quando referem no parecer junto aos autos (fls. 52699) o seguinte:
“Assim sendo, em virtude de um modelo de responsabilização da pessoa colectiva adoptado pela lei penal, que não prescinde de um facto de conexão entre a responsabilidade desta e a da pessoa individual, tem de haver necessariamente coincidência entre o crime que é imputado ao ente colectivo e o crime que é imputado a quem, ocupando uma posição de liderança na pessoa colectiva, actua em seu nome e no interesse colectivo.
Decorre do exposto que, perante os mesmos factos, não pode ser imputado um crime de corrupção activa de titular de cargo político ao administrador das pessoas colectivas e um crime de corrupção activa de funcionário às sociedades Lena Engenharia e Construções SA, Lena Engenharia e Construções SGPS e Lena SGPS”.
Em face do exposto, o crime de corrupção activa previsto no artigo 374º do CP não pode ser imputado às sociedades arguidas, dado que não foi este o crime imputado ao arguido GG, sendo que só a partir 2021 (Lei n.º 94/2021, de 21 de Dezembro que procedeu à alteração da Lei i n.º 34/87, de 16 de Julho, aditando-lhe o artigo 6º A “As pessoas colectivas e entidades equiparadas, com excepção do Estado, de pessoas colectivas no exercício de prerrogativas de poder público e de organizações de direito internacional público, são responsáveis, nos termos gerais, pelos crimes previstos no n.º 2 do artigo 16.º e nos n.os 1 e 2 do artigo 18.º”) às primeiras começou a ser possível a  imputação de um crime de corrupção de titular de cargo político.
Além disso, o crime de corrupção do Código Penal não podia ser imputado ao arguido AA, dada a sua particular qualidade – apesar de funcionário (art. 386º do CP), não é funcionário para efeitos daquele artigo, mas titular de um cargo político.
Nesta conformidade, as pessoas colectivas apenas podiam ser responsabilizadas pelo crime de corrupção activa de funcionário, por força do artigo 11º nº 2 e 374º do CP, mas já não pelo crime de corrupção activa de titular de cargo político, p. e p. pelo artigo 18º da Lei 34/87, de 16 de Julho, sob pena de violação do princípio da legalidade criminal previsto no artigo 29º da CRP e artigo 1º do CP.
Note-se que esta solução apenas tem aplicação ao  CRIME DE CORRUPÇÃO ACTIVA praticado por LENA ENGENHARIA E CONSTRUÇÕES. SA em co-autoria com as sociedades LEC SGPS SA e LENA SGPS SA relativamente a factos referentes a pessoa do arguido AA, este com mediação do arguido BB e em benefício do Grupo LENA, com referências aos anos de 2005 a 2011, crime p. e p. pelos arts.374° e 374°-A, n.º 2 do Cód. Penal, com referência aos arts. 11°, n.º 2 e 202°, alínea b) do mesmo diploma legal;
Já relativamente ao crime elencado sob o número 9 - Um CRIME DE CORRUPÇÃO ACTIVA, praticado por BB em co-autoria com os arguidos GG e PP e com as sociedades XMI (esta já extinta), LEC SA, LEC SGPS e LENA SA, relativamente ao funcionário QQ, nos anos de 2007 a 2009, crime p. e p. pelo art.º 374. °, n.º l do Código Penal, o problema da aplicação do artigo 11º nº 2 do CP não se coloca.
O próprio sr. Juiz proferiu um despacho de não pronúncia quanto às arguidas Lena Engenharia e Construções SA, Lena Engenharia e Construções SGPS e Lena SGPS SA relativamente  ao crime de corrupção activa p e p pelo artigo 374º do CP relativamente ao funcionário QQ em virtude da inexistência de indícios- cfr. Decisão Instrutória fls. 2359.
Por todo o exposto, mantém-se a  decisão de não pronúncia quanto ao crime de corrupção activa p e p pelos artigos 374º e 374º A do CP, com referência aos artigos 11º nº 2 e 202º, alínea b) do mesmo diploma legal imputado, em co-autoria, às arguidas Lena Engenharia e Construções SA, Lena Engenharia e Construções SGPS e LENA SGPS relativamente aos factos imputados ao arguido AA, este em mediação com o arguido BB em benefício do Grupo Lena, com referência aos anos 2005-2011.
Não obstante esta decisão, os factos constantes da acusação e que diziam respeito a estas sociedades,  que não estão indiciados, não serão retirados da pronúncia porquanto fazem parte de um todo, dificilmente compreendido se  lhe fossem retiradas pequenas partes.

1.3.4.3 O QUE SE DEVE ENTENDER POR ACTO CONTRÁRIO AOS DEVERES DO CARGO NO CASO DO CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA,  DESIGNADAMENTE SE TERÃO DE FAZER PARTE DO ELENCO FUNCIONAL DE UMA CONCRETA FUNÇÃO.
               
ENQUADRAMENTO DA QUESTÃO
Tomando por base os artigos que temos vindo a analisar relativamente aos crimes de corrupção passiva, facilmente constatamos que  a expressão “deveres do cargo” aparece como figura difenciadora entre a  corrupção passiva para acto ilícito e a corrupção passiva para acto lícito, quer no âmbito do CP, quer no âmbito da  Lei 34/87, de 16 de Julho.
Como escreve Ricardo Miguel Silva Tavares, na Dissertação de Mestrado apresentada à Faculdade de Direito do Porto com a orientação do Professor Doutor Almeida Costa  in “O Regime de Corrupção no Código Penal” – publicação de Julho de 2021 da Faculdades de Direito da Universidade do Porto e que seguiremos, “ Desde o CP de 95 foram registados três momentos que procederam a alterar o regime da corrupção: referimo-nos à (i) Lei n.° 108/2001, de 28 de Novembro; à (ii) Lei n.° 32/2010, de 2 de Setembro, que alterou o CP e à Lei n.° 41/2010, de 3 de Setembro, que alterou a Lei dos Crimes cometidos por Titulares de Cargos Políticos, e ainda à (iii) Lei n.° 30/2015, de 22 de Abril, rectificada, ainda no mesmo ano, a 25 de Maio. Neste ponto seguiremos de perto CLÁUDIA C. SANTOS (.SANTOS, Cláudia Cruz, “Os crimes de corrupção - notas críticas a partir de um regime jurídico-penal sempre em expansão” in Revista Julgar, n.º 28, Jan-Abr. 2016, pp. 89 e ss. e Idem, A Corrupção de Agentes Públicos..., pp. 12-35.)”
No regime em vigor à data dos acordos corruptivos, regime previsto na Lei 108/2001 de 28 de Novembro, distinguiam-se três modalidades de corrupção passiva:
a corrupção para acto ilícito ou corrupção própria, em que se faz prova do acto ilícito com o qual o agente público pretende mercadejar com o cargo, onde a descrição dos elementos do tipo reporta-se a acto/omissão “contrário aos deveres do cargo”.
a corrupção passiva para acto lícito em que se faz prova do acto lícito com que o agente público pretende mercadejar com o cargo, onde a descrição dos elementos do tipo reporta-se a acto/omissão “não contrário aos deveres do cargo”.
a corrupção sem demonstração do acto concreto com que o agente público pretende mercadejar com o cargo.
A Lei n.º 108/2001 inova com a eliminação da exigência de prova de sinalagma — na exposição de motivos da Proposta de lei n.º 91/Vii, precursora da Lei n.º 108/2001, refere-se que “No domínio da corrupção, as alterações justificam-se… sobretudo pela necessidade de aumentar a eficácia da repressão criminal destas condutas... um dos principais obstáculos à punição efectiva pela prática de crimes de corrupção prende-se com a necessidade da prova do nexo de causalidade entre a entrega por parte do agente da corrupção activa e a prática do acto, lícito ou ilícito, por parte do agente da corrupção passiva... este é um pseudo-sinalagma, na medida em que devem ser considerados crimes de corrupção e punidos como tal aqueles casos em que, à luz dos critérios de expectativa comum, a simples dádiva — tendo em conta, cumulativamente, o seu exagerado valor e as circunstâncias em que ocorreu ou a pessoa de quem proveio — não se mostre justificável de outro modo…”.
Para efeito de preenchimento das normas incriminadoras da corrupção passiva, em qualquer das modalidades típicas, é necessária a demonstração de que o funcionário, ou o titular de cargo político, solicita ou aceita uma vantagem que não lhe é devida.
A vantagem é comum a todos os tipos de corrupção, pelo que não pode ser esta a característica diferenciadora das várias modalidades.
Como refere Cláudia Cruz Santos, in Os Crimes de Corrupção – notas críticas a partir de um regime jurídico-penal, in Revista Julgar, nº 28, p. 93: “O reconhecimento de que a relevância prática da distinção entre corrupção própria e imprópria se atenuou (tendo em conta a aproximação das molduras penais) não significa, porém, que o aplicador possa eliminar as exigências específicas de cada uma delas, nomeadamente através do muitíssimo questionável entendimento de que a corrupção seria para acto ilícito sempre que o agente público fosse determinado pela vantagem (opinião que vingou em algumas decisões condenatórias por corrupção ainda que viesse depois a ser contrariado pela Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, nomeadamente no Acórdão de 18.04.2013 – Processo 180/05.9JACBR.C1.S1). Em tal entendimento (aquele que neste Acórdão se rejeitou) ia implícita a desconsideração de que na corrupção passiva própria se exige um plus: o acto ou omissão mercadejados, em si mesos desconformes com os deveres do cargo. Aquilo que se deve vincar é que, inerente àquela linha de pensamento segundo a qual haveria corrupção passiva para acto ilícito sempre que o agente, mesmo que no âmbito legítimo da sua actuação, se deixasse determinar pelo suborno, existia um vício inultrapassável. Este consistia em assim ‘fazer caber’ logo na corrupção mais grave toda e qualquer situação de corrupção, na medida em que lhe é sempre inerente uma determinação do agente público pela vantagem, para si ou para terceiro. Aquilo que se quer significar é que é intrínseco a qualquer corrupção passiva que o agente público que mercadeja com o cargo esteja ‘determinado pela vantagem’. Não se pode, portanto, eleger como critério que determina a subsunção na norma incriminadora mais grave – a corrupção passiva própria – um elemento que, à partida, é comum a toda a corrupção passiva. Sendo, por isso, insusceptível de ser erigido em critério diferenciador das suas várias modalidades. Dito de forma simples: a adoptar-se como critério para a existência de corrupção para acto ilícito o facto de o agente público se ter determinado pela vantagem, tal obrigaria a concluir que toda e qualquer corrupção para acto determinado seria para acto ilícito. Precisamente porque é inerente a toda a corrupção – e não apenas à mais grave – o facto de o agente ser determinado pela vantagem que o leva a mercadejar com o seu cargo. Aquele tratava-se, portanto, de entendimento que não podia ser sufragado. Considerar o contrário – considerar que a corrupção é para acto ilícito sempre que o agente público for determinado pela vantagem – significa, além do mais, uma confusão entre distintos elementos típicos, uns de índole objectiva e outros de natureza subjectiva”.
Mesmo com a eliminação da expressão “contrapartida “ ocorrida com a lei 108/2001, parece-nos evidente que a “vantagem” , solicitada ou aceite, exige sempre um acto ou uma omissão, contrário ao dever do cargo ou não contrário ao dever do cargo.
Não obstante a desnecessidade de um verdadeiro sinalagma, o certo é que cumpre saber qual o acto concreto a que se destina a vantagem. Tem, pois, que haver uma concretização do acto (ou omissão) que foi mercadejado, até para se saber se é contrário aos deveres do cargo, ou não.
A corrupção passiva, quer própria, quer imprópria, contitui, quanto ao seu autor,  um crime específico, uma vez que só pode ser cometido por determinados agentes, aqueles “às quais pertence uma certa qualidade ou sobre os quais recai um dever especial”. No caso, o crime de corrupção previsto no CP apenas pode ser cometido por “funcionário” (O conceito de funcionário encontra-se previsto no art. 386.º do CP) e quanto à corrupção prevista na Lei n.° 34/87 apenas por aquele que ocupe cargo político ou de alto cargo público, nos termos das definições dos arts. 3.° e 3.°-A do mesmo diploma. (…) .
Por funcionamento do artigo 28.°, n.° 1 do CP a qualidade de funcionário pode ser comunicada aos terceiros que influam no pacto e é apenas quanto a estes que importa o título comparticipativo.
Fora da tipicidade ficam as hipóteses em que o agente actua completamente fora da sua veste de funcionário e age como qualquer outro cidadão, não pertencente aos quadros da Administração, atuando na sua qualidade de pessoa privada (ALBUQUERQUE, Paulo Pinto de, Comentário do Código Penal à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, 3.ª ed., Univ. Católica Editora, 2015, p. 1187, e ALMEIDA COSTA, op. cit., p. 103.)
O núcleo do ilícito da corrupção passiva em qualquer das suas modalidades, consiste na solicitação ou aceitação de vantagem, como pagamento para a prática de um acto apenas passível de praticar em função da referida qualidade de funcionário público, consistindo assim num crime de execução livre no sentido em que não foi estatuído pelo legislador um concreto iter criminis mediante o qual deva ser efectuada aquela solicitação ou aceitação. Atenta à categorização como crime específico, não caberão no tipo da corrupção as hipóteses em que o agente actua na sua veste de pessoa privada, nem as condutas que não visem actos de serviço (ALMEIDA COSTA, António Manuel, Comentário Conimbricense do Código Penal [CCCP], Parte Especial, Coimbra, Coimbra Editora, 2001, p. 664.
DAMIÃO DA CUNHA - A Reforma Legislativa em Matéria de Corrupção - uma análise crítica das Leis n.ºs 32/2010, de 2 de Setembro, 45  - critica a sistematização conferida pela lei n º32/2010, de 2 Setembro, nomeadamente, a consagração autónoma do Recebimento Indevido de Vantagem e da Corrupção para acto lícito. Para o autor, a distinção típica de ambos os ilícitos é, por si só, “duvidosa” e as diferenças registadas ao nível das respectivas molduras legais são uma “novidade” (idem nº 26, p.85-86).
Com efeito, já para o legislador de 2001, o ilícito típico consumava-se pela simples aceitação/solicitação de vantagem por parte de funcionário, contrária ao exercício das suas funções públicas, prescindindo da verificação, em concreto, da conduta visada pelo suborno.
Portanto, pese embora (à primeira vista) parecer que o aditamento deste tipo legal significou um alargamento do elenco dos “crimes de corrupção” (em sentido amplo) visto que, até 2010, não se previa qualquer norma com idêntica/o epígrafe e teor literal, certo é que dada a realidade fática subsumível, somos forçadamente impelidos a afirmar que o recebimento indevido de vantagem (art.372º do actual CP) e a corrupção sem demonstração do acto concreto (anterior art. 373º, nº2 do CP) espelham realidades (quase) idênticas, havendo, inegavelmente, uma concordância ao nível do substrato incriminador.
Posto isto, “somos impreterivelmente partidários de que não foi intenção do legislador criar um novo tipo legal de crime (ou neocriminalização), mas tão somente conferir “um esclarecimento normativo” através da (res)sistematização do CP e  consequente consagração autónoma do presente tipo legal – escreve Ricardo Miguel Silva Tavares, com o qual concordamos.
Consideramos que o critério preponderante será a verificação, in casu, que a conduta apenas ocorre porque o funcionário exerce aquelas especificas funções públicas, sendo, portanto, irrelevante o momento temporal da ocorrência. Isto é, apenas existe uma solicitação/oferta de vantagem “por causa” das funções desempenhadas pelo funcionário, quer se verifiquem no contexto laboral ou fora dele.
Sempre que o agente trafica com o exercício da profissão, teremos corrupção
É, portanto, pelo conteúdo do acto ou da omissão do funcionário - ‘prestação’ do corrupto - que é possível estabelecer a distinção entre as duas modalidades de corrupção.
O que são, afinal, os “deveres do cargo”?
P. PINTO DE ALBUQUERQUE refere sucintamente que “os deveres de cargo são aqueles que estão fixados na lei e nos usos da profissão
Não é pela competência que se compreende a formulação dos deveres do cargo, nos termos do entendimento de ALMEIDA COSTA quando refere que «De harmonia com uma interpretação teleológica, que atenda ao específico bem jurídico que subjaz ao crime e, em particular, ao fundamento da distinção entre corrupção própria e imprópria, logo sobreleva opinião contrária. Como se verá, perspetivado a esta luz, o art. 372.º e a sua alusão à ofensa dos “deveres do cargo” reportam-se, apenas, aos casos em que o acto do funcionário é inválido por razões “substanciais” ou “de fundo” e não por motivos atinentes à respetiva forma ou à competência do agente. (...)
Caso contrário, o critério distintivo entre corrupção própria e imprópria acabaria por se resumir à competência ou incompetência do empregado público, i.e., ao facto de ele ter exercido a sua específica competência ou, pelo contrário, os meros “poderes de facto” daí derivados».
Estamos de acordo com o Sr. Juiz quando refere “ Segundo o descrito na acusação, o arguido AA terá aceitado uma vantagem patrimonial, traduzida no recebimento de um milhão de Euros, vantagem esta que, como é evidente, não lhe era devida.
Na verdade, essa contrapartida monetária (um milhão de Euros) alegadamente aceite pelo arguido AA é obviamente ilícita, desde logo porque sendo, como era, Primeiro-Ministro, se encontrava vedada qualquer outra função remunerada para além da prevista na lei. O único benefício que, no caso de funcionário, titular de cargo político ou agente da administração é devido, reconduz-se à remuneração, ordenado ou vencimento estipulado como contrapartida pelo exercício do cargo.
Para o preenchimento do tipo em causa, mostra-se irrelevante que o titular de cargo político tenha chegado ou não a receber a vantagem oferecida ou solicitada (sendo certo que in casu, segundo a acusação, o arguido terá recebido essa quantia), uma vez que para preenchimento do tipo basta que a oferta ao titular de cargo político chegue ao conhecimento deste e seja aceite por este.
A este respeito, diz Cláudia Santos, in “Liber Discipulorium”, p. 980, a corrupção “consuma-se com a adopção de uma conduta (a solicitação/aceitação da vantagem ou a promessa/oferta da mesma) a que acresce a produção de evento (a chegada ao destinatário da manifestação de vantagem) que importa um dano para a autonomia intencional do Estado.”.
Também não se levantam dúvidas quanto ao preenchimento do elemento do tipo traduzido em a vantagem ser destinada à prática pelo agente de um qualquer acto, uma vez que, segundo o descrito na acusação, o arguido AA se propôs a conceder o “seu conforto político enquanto Primeiro-Ministro e definidor dos interesses do accionista único da CGD, o Estado Português”, “o arguido AA aceitou vir a manifestar o seu apoio às decisões que viessem a ser proferidas no sentido de conceder os financiamentos pretendidos…”, “o arguido AA acedeu a subordinar a sua vontade, as suas iniciativas e as suas decisões pela peita prometida, manifestando a sua concordância com a concessão do financiamento e comprometendo-se, junto da administração da Caixa Geral de Depósitos, se e quando necessário, a suportar politicamente aquela decisão” (artigos 3416, 3427, 3428, 13689, 13690 e 13691 da acusação).
Resta-nos verificar, em detalhe, se, tendo em conta os factos descritos na acusação, os mesmos são suficientes para preencher o elemento do tipo consistente em os actos imputados ao arguido AA estarem dentro da esfera dos poderes atribuídos ao cargo de Primeiro-Ministro que então ocupava.
Como refere Almeida Costa (ob cit., p. 663) “a corrupção passiva, ao revestir a natureza de delito específico, apenas incide sobre “funcionários”(neste caso titulares de cargo político). Porém, “nem todos os actos praticados pelos últimos se mostram, contudo, susceptíveis de preencher o correspondente ilícito.”.
Com efeito, “nem todos os actos praticados pelos funcionários (titulares de cargo político) se mostram, susceptíveis de preencher os requisitos da corrupção passiva. Para que tal aconteça, é necessário que os actos a praticar, ou que se pretende sejam praticados, pelo funcionário, ou titular de cargo político, estejam dentro da esfera dos poderes do cargo que ocupa” (in Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 22/04/2010, proferido no processo n.º 263/06.8JFLSB.L1-9, in www.dgsi.pt).
Pode igualmente ler-se no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 18/04/2013, proferido no processo 180/05.9 JACBR.C1.S1, in ww.dgsi.pt, “no que toca ao âmbito das funções do agente as condutas subsumíveis ao ilícito não são apenas aquelas que correspondem às específicas competências ou atribuições legais do funcionário, mas sim todas aquelas que decorrem da posição “funcional do agente”, ainda que com meros poderes de facto; sendo assim suficiente para preencher a tipicidade do crime a simples circunstância de a actividade em causa se encontrar numa relação funcional imediata com o desempenho do respectivo cargo”.
Assim acontecerá sempre que a realização do acto subornado caiba no âmbito “fáctico” das suas possibilidades de intervenção, i. e., dos “poderes de facto” inerentes ao exercício das correspondentes funções, ou seja das possibilidades fácticas que apesar de o exorbitarem, são propiciadas pelo cumprimento normal das suas atribuições legais.”.
Na mesma senda, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 19/09/1990, citado por Maia Gonçalves, in Código Penal Português, 14.ª ed., em anotação ao art.º 372.º, segundo o qual, “no actual Código Penal basta que o acto praticado pelo funcionário implique violação dos deveres do seu cargo, bastando que se trate de acto relacionado com o cargo exercido, apenas se afastando aqueles a que o serviço do funcionário, em relação ao acto concreto praticado, é completamente alheio.”.
Também o Conselheiro Victor de Sá Pereira e Alexandre Lafayette, advogado, in “Código Penal Anotado e Comentado”, Quid Juris, 2008, p. 909, escrevem: “Será correcto afirmar-se que a corrupção passiva abrange, para além de certa actuação da competência do agente, os próprios poderes de facto que dela decorrem? As opiniões dividem-se, a propósito, e não falta quem exclua tais poderes do âmbito em causa. Parece, contudo, não exigir a lei uma pertinência exclusiva da conduta do corrupto “à esfera das suas específicas atribuições ou competências”, bastando “a simples circunstância de a actividade em causa se encontrar numa relação funcional imediata com o desempenho do respectivo cargo. Assim acontecerá sempre que a realização do acto subornado caiba no âmbito “fáctico” das suas possibilidades de intervenção, i. é., dos “poderes de facto” inerentes ao exercício das correspondentes funções (…). Para além do qual ou fora do qual, tratando-se de simples possibilidade fáctica ao alcance do agente, se estará fora do “propiciado pelo cumprimento “normal” das suas atribuições legais”, em plano distinto do da tipicidade de que aqui e agora se trata.”.
Daí que, refere Almeida Costa, ob. cit., p. 665, se excluam “da corrupção passiva as hipóteses em que o agente, não obstante revista a qualidade de funcionário e, em virtude dela, goze da capacidade fáctica para efectuar a conduta a que se destina a peita, não pertença ao serviço ou departamento a que está adstrito aquele sector de actividade social, nem com ele mantenha conexões institucionais directas. Na medida em que não participa da aludida “relação funcional imediata”, aquele empregado público apresenta-se como “estranho ao serviço e, portanto, numa posição equiparável à de um particular, não se enquadrando na óptica do ilícito acima referenciado. Ao invés, integra uma situação de corrupção passiva, por exemplo, o pagamento de um suborno ao contínuo de certo departamento administrativo, como contrapartida de ele haver subtraído determinado processo que estava para ser decidido pelo seu director. A circunstância de a análise ou a custódia daquele processo não estarem abrangidas nas suas atribuições, não afecta a “relação funcional imediata” do agente com o acto, circunstância que o coloca na órbita do tipo legal de corrupção passiva.
(…) Na verdade, a “autonomia intencional do Estado” resulta ofendida com igual intensidade, quer o acto subornado tenha sido realizado pelo próprio funcionário “competente”, quer provenha de outro que, possuindo uma relação funcional directa com o serviço, apenas o levou a cabo na actuação de meros “poderes de facto”. Na medida em que estes decorrem de uma relação funcional do agente, i.e., do posto que ocupa, o recebimento da “peita” pelo (ou para o) seu exercício constitui, ainda, uma transacção com o seu cargo e, por isso, uma situação de corrupção passiva”.
Assim sendo, há que demonstrar o vínculo da vantagem à qualidade do titular de cargo político, dado que o crime em causa, proíbe o mercadejar do cargo, e se não existir a relação da vantagem com o cargo do funcionário, neste caso, com o cargo de Primeiro-Ministro, a modalidade de corrupção em causa não se mostra verificada”
Deixamos de concordar com o Sr. Juiz quando diz que “quanto ao arguido AA, não é concretizado qual foi o acto praticado contra o dever do cargo. De facto, o exercício do cargo de Primeiro-Ministro permite um acesso a dados, informações, contactos ou meios que só o exercício dessa função permite alcançar. Porém, estas circunstâncias não são decisivas para converter uma acção em um acto do cargo.”
Aceitamos que, com efeito, não há corrupção para além ou fora do exercício do cargo. Só o mercadejar com as acções do serviço contende com os valores ou bens jurídicos protegidos pela incriminação do crime de corrupção.
A PERGUNTA QUE SE IMPÕE É A SEGUINTE: QUAL A RELEVÂNCIA DO TEMA PARA O PROCESSO?
Na Decisão Instrutória o Sr. Juiz entende que não se consegue determinar  - nos casos em que é imputado o cometimento de um crime de corrupção passivo contrário ao dever do cargo, ao  arguido AA – qual o acto ou actos concretos praticados pelo arguido, enquanto Primeiro Ministro, integrados no conteúdo funcional destas competências de Primeiro Ministro.
Segundo o Sr. Juiz, a conduta imputada ao arguido AA, no que concerne ao Grupo Lena, Vale de Lobos, Bes, pode contender com outros valores e até mesmo com outros bens jurídicos, mas nunca para preencher a tipicidade da corrupção em qualquer das suas modalidades.
O Sr. Juiz refere  a inexistência de imputação de um acto em concreto ao arguido AA e tece estas considerações a propósito de todos os crimes de corrupção passiva em discussão nos autos.
APRECIANDO
Em nosso entender, os actos concretos, estão alegados na acusação.
Ali está dito, de que forma, mercadejou com o cargo o arguido AA, o arguido QQ, RR e SS e DD
Coisa diferente é a existência de indícios, ou não, relativamente à prática de tais actos.
Segundo Fernanda Palma, in Conceito Material de Crime e Reforma Penal, in Anatomia do Crime – Revista de Ciências Jurídico-criminais, Nº 0, Julho – Dezembro de 2014, Lisboa: ..., p. 23,  citado na Decisão Instrutória, o alargamento da tutela penal na área da actividade política visa “consolidar o Estado de direito democrático, repor os níveis de confiança nas instituições públicas, na sua imparcialidade, na transparência das suas decisões e na equidade social “.
Em sede de debate instrutório disse o MP, a propósito do arguido AA Nestes autos, estamos perante a colocação à disposição do Grupo Lena, pelo arguido AA, através do arguido BB, dos poderes inerentes ao exercício funcional do seu cargo de Primeiro-Ministro de Portugal, e enquanto este mesmo status quo se mantiver, com total desrespeito e violação dos deveres próprios desse mesmo cargo. Não é uma conduta que se esgote, ou que se possa esgotar num só acto, é uma conduta reiterada ao longo do tempo em que tal situação – exercício do cargo em causa – se manteve.”
Tendo em conta a matéria constante da acusação, conseguimos compreender que o comportamento do arguido AA, conforme descrito naquela peça processual, era contrário ao princípio da livre concorrência e ao princípio da igualdade, que está obrigatoriamente subjacente ao exercício do cargo político.
Lembremos que, como referido pelo Sr. Juiz de instrução “o Primeiro‑Ministro, de acordo com o artigo 183º da CRP, assume a posição constitucional de chefe do Governo. Ao Primeiro-Ministro, através do Governo, compete dirigir a política geral do país, coordenando e orientando a acção de todos os ministros; dirigir o funcionamento do Governo e as suas relações de carácter geral com os demais órgãos do Estado; informar o Presidente da República acerca dos assuntos respeitantes à condução da política interna e externa do país; presidir e convocar o Conselho de Ministros; e exercer as demais funções que lhe sejam atribuídas pela Constituição e pela lei. (artigos 182º, 184º, 190º, 191º e 192º da CRP)”
Atenta a abrangência das actividades inerentes a este cargo político específico, o conceito de “deveres do cargo”  e “funções “,deve acompanhar essa dimensão e ter a elasticidade que aquele (cargo) permite.
Daí que, no nosso entender, só com a  análise dos indícios da prova existente nos autos, se poderá constatar a verificação, ou não, da omissão /omissões que o Sr Juiz diz que existe (em). Assim faremos. 
              
1.3.5 CRIMES DE CORRUPÇÃO: OS INDÍCIOS – “o caminho do dinheiro”.
Resolvidas que estão as questões formais,  passemos, então, à análise dos indícios.
Numa primeira linha, pensámos em efectuar tal tarefa começando por cada um dos crimes  de corrupção referidos na Decisão Instrutória e depois no Recurso, por referência aos três grandes grupos aí aludidos.
Porém,  entendemos que esta forma de abordar a prova, neste caso indiciária, não  permite ter uma visão global do que se pretende demonstrar com a acusação.
Assim, sem prejuízo de nos referirmos aos indícios existentes, ou não, relativamente a cada um dos grupos assinalados nas peças processuais (e correspondentes crimes), seguiremos o método do caminho do dinheiro”.
A expressão “Follow the Money” - Siga o Dinheiro - ganhou destaque em função das reportagens investigativas conduzidas na década de 70 pelos jornalistas ... UUU e VVV do jornal .... O trabalho dos dois repórteres acabou levando à renúncia do presidente dos ..., WWW, em 9 de Agosto de 1974. Tudo se iniciou com uma informação sobre uma tentativa de assalto à sede do comité do Partido ..., em ..., num conjunto de edifícios chamado ....
As matérias, que investigaram o “Caso ...”, mostraram que, na verdade, um grupo tinha invadido o local e instalado aparelhos de escuta para espionar os .... O próprio presidente WWW, que era do Partido ..., tinha conhecimento da espionagem. A principal fonte dos jornalistas foi uma pessoa com a identidade mantida em sigilo, apelidada por UUU de “Deep Throat” (garganta profunda). A dica dada aos repórteres foi: “Siga o dinheiro (Follow the Money) e vocês chegarão ao chefe do crime”.  Sim, “Follow the Money” é uma pista válida nas investigações de diversos actos ilícitos. Num esquema de corrupção, o dinheiro deixa rastros que, muitas vezes, levam até os poderosos. Porém, esse caminho é tortuoso, cheio de obstáculos e esconderijos quando se trata de crime organizado e corrupção. Os corruptos e corruptores fazem os acertos entre quatro paredes, sem deixar testemunhas, revestindo esses actos com aparência de legalidade.
Começando
Temos como certo que o valor ( arredondado)  de €34.000.000,00 pertencia ao arguido AA.
Como podemos fazer esta afirmação?  Esta é a tarefa que nos propomos efectuar, de seguida.
Do montante supra referido faz parte a quantia de 23.013.156,18€ existente nas contas UBS, na ..., repatriada ao abrigo do RERT II.
Desde 2004 até ao presente, foram aprovados três Regimes Extraordinários de Regularização Tributária, a fim de o Estado arrecadar receitas, extraordinárias, e ao mesmo tempo, permitir aos sujeitos passivos a regularização de dívidas e a “legalização" de património detido no exterior, através do pagamento de taxas reduzidas (5 e 7,5%), incomparáveis com as taxas normais de tributação de rendimentos em sede de Imposto sobre o Rendimento (IRS e IRC).
O 1º RERT foi aprovado, em 26/07/2005, pela Lei 39-A/2005 de 29 de Julho - Primeira alteração à Lei 55-B/2004, de 30 de Dezembro (Orçamento do Estado para 2005), no seu Art. 5o, sob a epígrafe "Regularização tributária de elementos patrimoniais colocados no exterior", já na vigência do Governo do Primeiro-Ministro AA. - o XVI Governo Constitucional de Portugal, vigorou de 17 de Julho de 2004 a 12 de Março de 2005, chefiado por Pedro Santana Lopes (Primeiro Ministro). O executivo foi nomeado pelo Presidente da República Jorge Sampaio na sequência do pedido de demissão do Primeiro-Ministro Durão Barroso, nomeado para o cargo de Presidente da Comissão Europeia. A 22 de Dezembro de 2004, Jorge Sampaio dissolveu a Assembleia da República e convocou eleições legislativas, dessa forma terminando antecipadamente o XVI Governo Constitucional e a IX Legislatura.
O XVII Governo Constitucional tomou posse a 12 de Março de 2005, presidido pelo Primeiro-Ministro AA, tendo cessado  funções a 26 de Outubro de 2009, na sequência do termo normal da legislatura, mantendo-se, porém, na legislatura seguinte, na sequência de sufrágio.
O RERT foi aprovado, em 26/07/2005, pela Lei n.o 39-A/2005 de 29 de Julho - já na vigência do Governo do Primeiro-Ministro AA. Esse regime, aplicava-se a elementos patrimoniais que não se encontrassem em território português em 31 de Dezembro de 2004 e só era aplicável a pessoas singulares. As declarações teriam de ser entregues até 16 de Dezembro de 2005. A taxa de imposto aplicável era de 5%, aplicada ao valor dos elementos patrimoniais declarados.
O RERT II é aprovado na vigência do XVIII Governo Constitucional de Portugal formado com base nas eleições legislativas de 27 de Setembro de 2009, tendo-se mantido em funções até  ../../2011, data da tomada de posse do XIX Governo Constitucional.
Na vigência deste Governo, foi aprovado mais um Regime Excepcional de Regularização Tributária, em 28 de Abril de 2010, pela Lei n.o 3-B/2010, de 28 de Abril (Orçamento do Estado para 2010)
O regime previa a aplicação de um imposto de 5% sobre os activos que fossem regularizados pelos contribuintes, havendo a obrigação de repatriamento desses valores sempre que estes se encontrassem fora da União Europeia ou do Espaço Económico Europeu, mas agora o regime é alargado às pessoas colectivas.
Já supra referimos o que entendemos estar englobado nesta  “amnistia fiscal”, pelo que remetemos para o que  ali se disse.
O arguido BB aderiu ao RERT I e II.
As verbas do RERT II foram repatriadas para Portugal, inicialmente para uma conta de transição no BES (a do Apenso Bancário 1-S) e, posteriormente, para a conta, igualmente no BES, com o no ...07 (Apenso Bancário 1-C).
Esta conta tem relevo para estes autos, designadamente a partir de finais de 2010 mas, mesmo antes, a mesma tinha verbas provindas do RERT I na qual eram efectuados movimentos financeiros de compra de imóveis por parte do seu titular – arguido BB – sem que depois este usufruísse de algum desses mesmos imóveis.
Os movimentos efectuados a partir de tal conta foram considerados suspeitos.
Sendo o regime do RERT uma "amnistia" , quanto às verbas que se lhe encontram associadas, não haveria necessidade de passar, utilizando outros meios,  à 3ª fase do crime do branqueamento de capitais, a Integração, porque já efectuada.
O uso desse dinheiro para aquisição de imóveis, para a constituição de um Fundo de investimento, para pagamentos e doações de/e a terceiros, porque actuações comuns a esta 3º fase do crime de branqueamento, começaram a criar a suspeita de que a pessoa que detinha o património não era verdadeiramente o proprietário dos imóveis.
Estando os capitais em causa “limpos”, para quê actuações que indiciam a prática de crimes de branqueamento?
Isto é, não haveria necessidade, sobre capitais que já se encontravam "limpos" pelo RERT, de promover o seu branqueamento.
Junto do BES INVESTIMENTO (BESI) e em nome de BB, surge um contrato com a designação Carteira ES Investiment Execucão (Contrato: ...52), com o nº de conta ...95.
Distinguem-se dois períodos na utilização desta conta: Antes da entrada de verbas e títulos com origem na ... e depois deste momento.
Assim, o marco na utilização desta conta do BESI é em finais de 2010.
- Entre 13/12/2010 e 31/12/2010, foram transferidos o correspondente a 10.989.403,04€ de diversas subcontas em euros e moedas estrangeiras, que se encontravam no exterior.
- E entre 16/10/2010 e 08/02/2011, a constituição de uma carteira de títulos na conta BESI com base em carteira de aplicações na UBS, num total valorizado, à data da transferência, em 12.337.719,52€.
O que perfaz um total de 23.327.122,56€, valorizados à data do repatriamento obrigatório para Portugal que, sensivelmente, é realizado um ano depois da data de referência para a adesão ao RERT II, que era 31/12/2009. 
Atentos aos IBAN's associados às transferências realizadas, determina-se que o código SWIFT do banco ordenante daquela transferência é o ..., que corresponde ao banco UBS, em ..., na ....
O número da conta é o ...00, titulada por EMP20... LTD, sociedade do tipo offshore, em que o beneficiário final, indicado à instituição financeira, é BB.
Transferências do BESI para a conta do Apenso Bancário 1-C
Após o recebimento daquelas verbas e títulos no BESI surgem, essencialmente, saídas para a conta do BES do Apenso Bancário 1-C, titulada por BB.
A conta do BESI foi meramente de transição, tendo os valores com origem na ... sido transferidos, em grande parte e logo de seguida, para outras contas nacionais tituladas por BB no BES:
No decorrer do ano de 2011, a carteira de títulos no BESI foi sendo vendida e deu lugar, posteriormente, à transferência do resultado dessa venda para as contas do BES, tituladas por BB.
Transferências do BESI para a conta do Apenso Bancário 1
Da conta do BESI, excepcionalmente, foram realizadas 3 transferências para a conta do Apenso Bancário 1 do BES, também titulada por BB, no valor total de 4.200.000,00. A primeira transferência de 1 milhão de euros, da conta do BESI para a conta do Apenso Bancário 1 do BES, teve, em 17/01/2011, como destino, em grande parte, a EMP21... (750 mil euros), sociedade ... do grupo EMP22... com os direitos televisivos da Euroleague de Basquetebol e da Liga de Futebol. Já os 3 milhões de euros com origem no BESI, de 14/02/2011, tiveram como posterior destino (em grande parte), a própria conta do Apenso Bancário 1-C, com as transferências de 1,5 milhões, em 28/02/2011, e 897 mil euros em 14/03/2011, a partir da conta do Apenso Bancário 1.
A conta beneficiária de maior relevância das verbas que, na sua origem, se encontravam em contas tituladas por sociedades offshores na UBS na ..., foi a conta do Apenso Bancário 1-C, a mesma que se indicia ser um património autónomo em nome de BB mas pertença ao suspeito AA.
Após a entrada dos fundos transferidos da ... ao abrigo do RERT II, nos anos de 2012 e 2013, na conta BES ...06 (Aba 1) foram creditadas quantias provenientes da XLM-SOCIEDADE DE ESTUDOS E PROJECTOS, LDA. que pertenciam ao arguido AA (como depois concluiremos) e foram utilizadas em despesas e levantamentos no seu interesse e de acordo com instruções.
A partir de Março de 2011, o arguido BB  permitiu a utilização das suas contas junto do Barclays, no sentido de, inicialmente, conseguirem alcançar a dispersão dos fundos e a diversificação dos investimentos.
.
 O arguido BB comunicou assim ao BES, por intermédio da sua gestora de conta, XXX, que pretendia transferir €2.000.000,00 da conta BES ...06 para a conta BARCLAYS ...83 os quais se destinariam a ser investidos num negócio no ....  Tais valores não foram aplicados em qualquer negócio no ..., tendo-lhes sido dado outro destino.
Foram realizadas operações bancárias diretas entre a conta BES ...06 e a conta BARCLAYS ...83: Depósito cheque n.º ...99 da conta BES ...06 Aba 1 €2.000.000,00 BARCLAYS ...83 Aba 1-E Aba 1, fls.433, 1204 Aba 1-E, fls.295 17.12.2013 BARCLAYS ...83 Aba 1-E Depósito cheque n.º ...88 da conta BARCLAYS ...83 Aba 1-E €500.000,00 BES ...06 Aba 1 Aba 1, fls.2150 Aba 1-E, fls.304 5987.
Entre os dias 30 de Setembro de 2013 e 18 de Dezembro do mesmo ano o arguido BB fez realizar transferências de fundos a partir da conta Barclays n.º ...83  no total de  €631.000,00.
Com a realização da transferência de € 400.000,00 para a conta Barclays no ..., conta com o IBAN  ...88 (Aba 1 AA), visava o arguido reforçar os fundos colocados naquela conta no exterior, que passou a atingir um saldo total de €500.000,00 (€100.000,00 transferidos inicialmente mais os €400.000,00 transferidos nesta ocasião.
Relativamente aos demais fundos movimentados a partir da conta Barclays n.º ...83 (Aba 1 E),  que integravam os montantes de €131.000,00 e € 100.000,00, os mesmos vieram a dar origem a aplicações financeiras.
Assim, o arguido BB, com os demais fundos já transferidos para a conta Barclays n.º ...72 (Aba 1 B) veio a constituir, associada à mesma, uma aplicação, na data de 20.12.2013, no montante de € 250.000,00.
O mesmo aconteceu com os fundos transferidos para a conta NIB ...39, junto do Deutsche Bank, no montante de € 100.000,00, através do depósito nesta conta do cheque n.º ...03, emitido pelo arguido BB,  sobre a conta Barclays n.º ...83 (Aba 1E).
Durante o último trimestre de 2013 foram sendo efetuados levantamentos através de cheque de quantias em numerário, mandadas executar pelo arguido BB, a partir da conta BARCLAYS ...83 (Aba 1-E)   no valor total de 400.000.
O arguido BB decidiu  começar por utilizar os seguintes cofres de que era titular: – Cofre bancário n.º 1860, referente ao contrato de aluguer n.º ...11 datado de 31 de Janeiro de 2011, situado na agência BES PRIVATE BANKING II e associado à Conta BES ...07 (Aba 1-C); – Cofre bancário n.º 28, contrato de serviço de aluguer de cofre forte junto do BARCLAYS BANK PLC – ..., Estrada ..., ..., ... ... e associado à Conta BARCLAYS ...83 (Aba 1-E). 
LL, a  pedido do arguido BB,  disponibilizou-se a abrir um cofre bancário em seu nome, no qual seriam guardados os montantes pecuniários que este último arguido lhe entregasse para o efeito.
No dia 12 de Julho de 2006, o arguido LL abriu, em seu nome, a conta bancária n.º ...97, junto do MILLENNIUM BCP (Aba 33-D), no balcão daquele banco designado de Fonte Nova Prestige.
 Em associação a essa conta, o arguido LL celebrou um contrato de cofre bancário, ao abrigo do qual lhe foi disponibilizado o cofre n.º 54, sito naquela agência. Na execução desta estratégia para a guarda do dinheiro levantado da conta Barclays n.º ...83 (Aba 1-E), o arguido BB fez guardar nos diversos cofres acima referidos, pelo menos, as seguintes quantias pecuniárias, que vieram a ser apreendidas à ordem dos presentes autos: COFRE TITULAR VALOR Cofre 28 Conta BARCLAYS ...83 (Aba 1-E) BB €57.910,00 Abu 18 Cofre 1860 Conta BES ...07 (Aba 1-C) BB €100.000,00 Abu 19 Cofre 54 Conta MILLENNIUM BCP ...97 (Aba 33-D) LL €200.000,00 Abu 44 total €357.910,00 6066.
Nos meses de Outubro e Novembro de 2013, a partir das quantias levantadas da conta Barclays n.º ...83 (Aba 1-E),  foi gasto o valor de € 42.090,00 para a compra de exemplares do livro “...” e para pagamento de despesas de promoção do mesmo livro.
O arguido BB determinou, antes de julho de 2014, a transferência do montante total de € 452.450,00 para a conta DEUTSCHE BANK com o IBAN ...39 (Aba 1-A),  com destino à conta BES ...06
No quadro da crise do Banco Espírito Santo, no dia 30 de julho de 2014, foi realizada a  transferência de €750.000,00 da conta BES ...06 (Aba 1) para a conta Deutsche Bank com o IBAN ...39 (Aba 1-A), já acima mencionada.
O dinheiro transferido para esta conta, no total de € 1.202.450,00 não registou saídas, permanecendo em aplicações financeiras junto do Deutsche Bank.
 Já no quadro da crise do Banco Espirito Santo, o arguido BB, que já anteriormente mantivera relacionamento com o BPI, onde era titular das contas com o nº ...407 (Aba 1-H) e com o nº ...70 (Aba 1-N), procedeu, com data de 05.09.2014, à abertura de uma nova conta, em seu nome e da arguida TT, junto do mesmo Banco, a qual tinha o n.º ...58... (Aba 1-U), com o propósito de receber os fundos provenientes do BES.
A transferência de fundos teve início logo no dia seguinte à activação da mesma conta, tendo o arguido BB recorrido à emissão de cheques sobre a conta BES n.º ...06, fazendo mobilizar fundos que sabia se encontravam depositados na mesma.
No período compreendido entre os dias 6 e 19 de setembro de 2014, por ordem do arguido BB foram transferidos da conta BES n.º ...06 (Aba 1) para a conta BPI n.º ...58... (Aba 1-U), no total de € 9.000.000,00,
No quadro da crise do Banco Espírito Santo, o arguido BB transferiu a partir da conta aberta junto do BES, para a sua conta da CGD.
Já no âmbito da CGD, tal montante veio a ser objeto de aplicação financeira, subscrição Caixa Liquidez, no mesmo valor, a 28.08.2014.
O arguido BB recorreu à constituição da sociedade XLM, para receber e disponibilizar fundos, mantendo o controlo nos casos em que fundos seus se misturavam com os deste último arguido.
O arguido BB determinou operações a débito da conta BES n.º ...06 (Aba 1) para contas das sociedades EMP23... e EMP24... NO TOTAL €754.000,00.
 No início de Fevereiro de 2010, as contas abertas junto do BES em nome do arguido BB dispunham dos seguintes saldos: – conta BES n.º ...06 (Aba 1), tinha apenas um saldo na conta DO de € 4.734,03, a que acrescia um montante de € 11.646,25, em contas poupança – conforme Aba 1, folhas 219 e 220; – conta BES n.º ...07 (Aba 1C), tinha um saldo global, incluindo aplicações financeiras, de € 883.632,76 (a 29.01.2010), sendo que na conta DO tinha apenas € 4.531,77 – conforme Aba 1C, folhas 268. 6120.
A partir dessa data, início de Fevereiro de 2010, a conta BES n.º ...06 (Aba 1) começou a ser utilizada para realizar pagamentos por conta da aquisição dos imóveis de YYY.
A partir de abril de 2010, o arguido BB fez transferir para a mesma conta BES com o n.º ...06 (Aba 1) os montantes provenientes da sociedade XLM, primeiro a título de adiantamento da devolução de suprimentos e depois corrigido para a título de distribuição de lucros.
No total, foi transferido para a mesma conta BES n.º ...06 (Aba 1),  o montante de € 2.798.100,00, entre 2010 e 2014, apenas com origem na sociedade XLM.
A partir do ano de 2010 os fundos com origem na ..., feitos transferir para contas junto de Bancos nacionais, num total de €23.350.161,89 
Na verdade, o montante disponível em Portugal a partir de contas tituladas pelo arguido BB, atingiu o valor de € 28.538.056,72, repartido pelas diversas origens : Distribuição de lucros da XLM 2 798 810,00, Repatriamento da ... 23 472 002,44 em aplicações e resultado da venda destas, Resultados Financeiros em contas em Portugal 2 267 244,28 Total (entrado ou gerado em contas em nome de BB em Portugal)
 No montante relativo ao repatriamento de fundos da ..., € 23.472.002,44 (já com o resultdo da venda das aplicações), está incluído o montante dos juros vencidos pelas aplicações financeiras transferidas da ..., mas já ocorrido nas contas bancárias em Portugal, entre os anos de 2011 e de 2015, no montante total de €312.323,23, o qual não foi objeto de manifesto fiscal em Portugal.
A conta BES n.º ...06 veio a registar créditos com origem na conta da sociedade XLM e nos fundos transferidos da ..., por via de transferências das contas do BESI n.º ...95 (Aba 1G) e do BES n.º ...07 (Aba 1-C), a que acresceram os resultados financeiros (juros-despesas bancárias).
 Foram realizadas pelo arguido BB movimentos que envolveram negócios a que estava ligado ZZZ, amigo pessoal do arguido AA, e que se traduziram nas seguintes operações,: A) negócio da compra e venda de direitos televisivos, através da sociedade EMP25... LDA, participada pela sociedade ... EMP26..., SA, que adquiriu os mesmos direitos à sociedade ... EMP21... e os vendeu depois à sociedade portuguesa EMP27..., SA (NIF ...33); B) realização de suprimentos na sociedade EMP28... SA (NIF ...08), participada pela sociedade ... EMP26..., SA ; C) realização de empréstimo à sociedade EMP29..., LDA (NIF ...59).
O arguido BB veio a determinar créditos e débitos na conta BES n.º ...06, no período entre 2 de Fevereiro de 2010 e 18 de Novembro de 2014:
Da conta bancária do BES com o n.º ...06 (Aba 1) foram realizadas operações a débito no montante total de € 6.763.690,97, excluindo os montantes transferidos para aplicações noutros Bancos (já acima referidos) e os montantes envolvidos no negócio dos direitos televisivos, entre a EMP25... e a EMP21... e posterior venda à EMP30... SGPS, bem como as entradas de fundos realizadas nas sociedades EMP29..., LDA. e EMP28... SA.,
Para a aquisição de participação, em nome de BB, na sociedade EMP26... SA e posterior aquisição, em nome desta, de participação na sociedade portuguesa EMP25... SA e financiamento do negócio, desenvolvido por esta última, de compra de direitos televisivos à sociedade ... EMP21... e posterior venda à EMP30... SGPS, foram realizadas várias operações, com movimentos a crédito e débito.
O arguido BB fez realizar na conta BES n.º ...07 (Aba 1-C), operações de crédito de fundos, com origem na conta BES n.º ...06 (Aba 1) e na conta BESI n.º ...95 (Aba 1 G) e na venda de aplicações transferidas da .... 
 No final do ano de 2014, a conta BES n.º ...07 (Aba 1-C) apresentava um saldo total de € 1.782.645,32, integrado pelas seguintes componentes: Apenso Bancario 1-C ...07 DO 101.499,64 100430990978 DP 1.000.000,00 CARTEIRA TÍT 681.145,68 Total 31/12/2014 1.782.645,32.
Nessa conta veio a ser realizado o depósito de uma quantia de € 100.000,00, no âmbito dos presentes autos, encontrada, na data de 21.11.2014, em numerário, no cofre bancário n.º 1860, titulado pelo arguido BB.
Face ao conjunto de créditos e débitos identificados na conta BES n.º ...07 (Aba 1-C),  o saldo atual da conta integra o montante € 786.304,57 da sua pertença.
As movimentações das contas bancárias geraram a tal suspeita de que a titularidade do dinheiro existente naquelas não pertenceria ao titular formal, mas a um terceiro.
Analisemos o comportamento do arguido AA.
O arguido AA é, desde o ano de 1996, titular da conta bancária n.º ...30 da Caixa Geral de Depósitos
O arguido AA no período de tempo que medeia entre 03.01.2005 e 20.06.2011, exerceu cargos públicos, sendo que até 11.03.2005, foi deputado na Assembleia da República e, a partir dessa data e até 20.06.2011, foi Primeiro-Ministro de Portugal.
 Durante esse período de tempo em que exerceu cargos públicos, designadamente, durante o período de tempo em que desempenhou as funções de Primeiro-Ministro, o arguido AA fez creditar na referida conta bancária da sua titularidade as verbas oriundas do seu vencimento, auferido no âmbito do exercício de funções nos referidos cargos.
A essas verbas, quando insuficientes para manter um saldo positivo da conta, o arguido AA fez acrescer, até final do ano de 2007, o crédito de quantias individualmente inferiores a €10.000,00 e apenas com origem em familiares, caso de transferências com origem em contas de AAAA e do arguido II, tio e primo daquele primeiro arguido, respetivamente.
Após Janeiro de 2008, o arguido AA, conhecedor dos fundos entretanto colocados na sua disponibilidade em contas bancárias na ... passou então a recorrer a financiamentos contraídos junto da CGD e a fazer gerar liquidez na esfera da sua mãe YYY, com origem em negócios combinados com o arguido BB.
Para o período de tempo considerado – 03.01.2005 a 20.06.2011 – a conta bancária do arguido AA contou com um reforço de créditos no montante global de €92.038,69.
O arguido AA não utilizava o serviço de “Homebanking” disponibilizado pela CGD aos seus clientes e apenas fazia uso do cartão Multibanco cuja titularidade lhe fora atribuída, quando dispunha da ajuda de terceiros para operar a realização de levantamentos em máquinas ATM.
O arguido AA deixou de exercer qualquer controlo sobre as suas despesas, chegando mesmo a desconhecer o valor global das mesmas, sem ter necessidade de outra preocupação que não fosse manter aprovisionada a conta da CGD a fim de esta poder dar cabal resposta aos débitos ali realizados.
Na verdade, entre ../../2011 e 24.09.2014 a conta bancária do arguido AA viria a suportar despesas que ultrapassaram €1.000.000,00,
O arguido AA perdia frequentemente a noção do que gastava e, desconhecia sistematicamente o saldo existente na sua conta bancária, chegando a utilizar cartões de débito e/ou de crédito sem que existisse plafond para esse efeito, vendo como tal recusada a possibilidade de realizar os pagamentos pretendidos através dos cartões associados à sua conta.
O arguido AA adquiriu, em 17.08.2011, uma viatura de marca ..., de matrícula ..-LV-.., passando a pagar a partir de Setembro de 2011, uma prestação mensal de cerca de €1.586,00, acrescido do pagamento de €101,22, à EMP31..., conforme se pode constatar da análise da sua conta bancária e do apenso de busca n.º 11 (Aba 11, fl. 47, 48; Abu 1, doc. 7, fl. 63).
Em Agosto de 2011, o arguido AA celebrou um contrato de trabalho com o arguido UU, nos termos do qual este passaria a prestar serviços como motorista, ficando ainda incumbido, na ausência daquele primeiro arguido em ..., de lhe tratar dos assuntos relacionados com recepção da correspondência, pagamento de despesas várias e de acompanhar e conduzir a mãe do arguido AA quando esta o solicitasse.
No período de 08.07.2011 a 31.12.2011, foi disponibilizada pelo arguido BB ao arguido AA, directamente ou por entrega de quantias em numerário ao arguido UU, na sequência de levantamentos realizados sobre a conta n.º ...06, do então BES (apenso bancário 1), a quantia global de €62.500,00,
No período entre 15.06.2011 e 31.12.2011, o arguido AA deu origem a despesas que atingiram um total de cerca de €185.000,00, correspondente à soma da quantia gasta por débitos verificados sobre a sua conta junto da CGD, representando um gasto médio mensal superior a €28.000,00.
O arguido UU recebeu na sua conta bancária, conta CGD n.º ...700, em Maio de 2012, a quantia de €15.000,00, lhe foi transferida pelo arguido BB, para de seguida, o mesmo UU emitir um cheque, sobre aquela sua conta, no mesmo montante, que depositou na conta da CGD do arguido AA.- (Aba 11, fls. 49; Aba 16, fls. 66).
Os fundos necessários para assegurar as despesas do arguido AA, no ano de 2012, foram obtidos, fundamentalmente, por transferências bancárias com origem na conta da mãe do arguido, YYY.
O arguido BB adquiriu um imóvel, pertença de YYY - andar sito na Rua ..., em ..., - concluindo um plano já anteriormente iniciado, com a aquisição, finalizada em 2011, de dois imóveis sitos no ..., conforme apenso de busca n.º 17, doc. 63.
A aquisição de tal imóvel veio a ser formalizada por escritura de compra e venda celebrada na data de 25.09.2012, justificando a colocação na esfera de YYY, a título de pagamento do preço, entre Junho e Setembro de 2012, da quantia de €600.000,00, com origem nos fundos que haviam sido transferidos da ... e que se encontravam em contas tituladas pelo arguido BB, conforme apenso temático NA e apenso bancário n.º 2.
O pagamento do sinal em causa para cada uma das frações foi realizado através dos cheques n.º...23 e ...15 datados de 01.02.2010 e emitidos pelo arguido BB, no montante de €3.750,00 e de €5.000,00, respetivamente, sacados sobre a conta n.º ...06 do BES, conforme se constata dos apensos bancários 2-B e 1 (Aba 02-B, fls. 41, 46, 56; Aba 02-B, fls. 57, 58; Aba 01, fls. 219, 1227, 1228).
Estes cheques foram depositados, e os respetivos montantes foram creditados na conta n.º ...930 da CGD, da titularidade de YYY, conforme apenso bancário 2-B, fls. 41, 46, 56, 57, 58.
Logo que recebidos os referidos cheques, ainda no mesmo dia 01.02.2010, YYY realizou um depósito de €5.000,00 na conta do seu filho, o arguido AA, sendo tal quantia parte do sinal recebido nesse mesmo dia.
Foram assinadas várias adendas a esse contrato-promessa de compra e venda, com reforços de sinal sacados sobre a conta n.º ...06 do BES – Abu 17, doc. 63, fls.15 e 29.
Em 2012, o arguido AA recebeu, com origem última nos fundos detidos pelo arguido BB,  transferências bancárias, recebidas na sua conta n.º...30 da CGD (apenso busca 11) no valor total de 543.371,23.
No ano de 2012, o arguido AA não teve problemas de liquidez na sua conta n.º ...30 da CGD.
Nesse ano de 2012, contrariamente ao que tinha acontecido nos anos anteriores, não realizou qualquer levantamento em numerário sobre a sua conta junto da CGD, nem mesmo através do cartão de débito e pelo sistema de Multibanco.
Analisados os movimentos bancários, desde logo, na conta da CGD do arguido AA levanta-se a questão: onde obteve  o arguido meios para, entre ../../2011 e 24.09.2014, a sua conta bancária suportar despesas que ultrapassaram €1.000.000,00?
Este valor das despesas é, desde logo, um indício de que o montante referido supra de €33 972 500,00,  pertencia ao arguido AA.
Analisemos outro.
A compra do apartamento em ... é, igualmente, um indício fortíssimo.
Em 3 de Setembro de 2013 já se encontravam detectados, através da análise das contas bancárias de BB, movimentos bancários de transferência para ..., de cerca de 3 milhões de euros.
Essa quantia teve como destino uma conta junto da CAISSE DES DEPOTS ET CONSIGNATIONS cujo titular era EMP32.... Verificou-se ser de um Notário em ....
As transferências efectuadas são justificadas como operações com vista à aquisição de um imóvel. Com efeito, e nesse seguimento, nos meses que se seguiram surgem na mesma conta, titulada por BB, outras transferências para ..., com destino a empresas francesas de mobiliário, lojas de decoração e a um administrador de condomínio -  Julho e Agosto de 2012 (meses em que foi pago o imóvel - pagamentos por via do Notário) e Setembro (pagamentos de bens mobiliários).
Muito embora a conta para proceder àqueles pagamentos tenha sido a conta que BB mais frequentemente utiliza (Conta ...06 - Apenso Bancário 1, do BES), constata-se que a origem do dinheiro vem, naquele imediato, da outra conta que se encontra também titulada em seu nome, com o no ...07, igualmente do BES (Apenso Bancário 1-C).
E concluiu-se, através da análise bancária, que o imóvel adquirido em nome de BB tinha sido comprado, na verdade, com verbas depositadas no BES (Apenso Bancário 1-C), cujos fundos teriam provindo, em 2010/2011, de uma conta aberta na ..., na UBS.
A ligação a ... do arguido AA  divide-se em 4 fases:
1ª Fase em ...
A que ocorreu entre finais de 2011 e meados de 2012, em que AA permaneceu na 17, Avenue ... ... (16éme), o primeiro apartamento arrendado e ocupado por aquele.
Pela análise efectuada, e até por ser uma questão que AA quis sempre tornar clara e pública, parte dos encargos com aquela sua estadia em ... naquele primeiro período foram suportados através da sua conta bancária em Portugal.
Veja-se que, neste primeiro período anunciado, da sua conta junto da CGD, Portugal, foram transferidos para ... grande parte dos montantes evidenciados nessa conta, num total de €165.060,00:
- um empréstimo bancário de 120 mil euros, em 21/06/2011 (sendo a única entrada que dispõe na conta até ao final do ano).
Este empréstimo, conjuntamente com o saldo anterior da conta (6.986,23€, na data de 20/06/2011), teve o mesmo destino (conforme Apenso Bancário 11).
Em 05/01/2012, AA dispunha na sua conta bancária na CGD em Portugal, o saldo de 4.352,65€.
Daqui retirando-se as seguintes ilações:
- No início de 2012, encontrava-se esgotado o dinheiro do empréstimo de 120 mil euros, contraído 6 meses antes (21/06/2011);
- Foram só transferidos para ..., 35 mil euros, eventualmente, para fazer face à permanência de AA em ... no segundo semestre de 2011;
- Necessitava de novos fundos para fazer face às despesas de 2012, ano no qual não dispõe, oficialmente, de qualquer fonte de rendimentos;
- A transferência de verbas da conta bancária da sua mãe, YYY, que, essencialmente, foi a fonte dos seus fundos para o ano de 2012:
Ou seja, para ... foram destinados 178.660,00€, isto admitindo que as verbas enviadas para MM tiveram como finalidade, tal como sucede em parte nos anos de 2013 e 2014, despesas daquela e do filho de ambos em ....
Verifica-se, assim, que grande parte daquelas despesas tiveram cobertura com entradas da conta bancária da mãe de AA. Aquelas verbas só foram possíveis transferir da conta de YYY já que houve escrituras públicas de compra e venda de imóveis entre aquela e o arguido BB, que originaram, entre Dezembro de 2010 e Setembro de 2012, a entrada na conta de YYY de, pelo menos 712.500,00€.
2ª Fase em ...
- Com a aquisição em Agosto de 2012 do apartamento em ..., registado em nome de BB, e com a compra de mobiliário verificada em Setembro de 2012, encontram-se reunidas as condições para o arguido AA ocupar tal imóvel, onde, pelos dados disponíveis nos autos,  permaneceu até Julho de 2013.
Aparentemente, o filho mais novo de AA, acompanhou nesse período o seu pai no referido imóvel, no qual permanecia, também, MM, nas ausências daquele de ....
A partir desse mês de Julho, AA e o filho deixam de permanecer neste imóvel de ..., não só por motivos da conclusão do mestrado e do início do período de férias, mas, também, porque o imóvel entrou em obras de remodelação.
3ª Fase em ...
- A partir de Setembro de 2013, com o imóvel adquirido em obras, e uma vez que continuavam os estudos do seu filho naquela cidade, AA viu-se obrigado a marcar estadias para aquele e para MM, num aparthotel no centro de ....
Para tal, solicitava a BB a marcação e pagamento do dito aparthotel, situação que perdurou até às férias de Natal de 2013.
Nessa ocasião, MM  afirmava que BB é que tinha a responsabilidade de marcar e pagar tal estadia, já que o outro imóvel se encontrava em obras. Ou seja, iniciou conversas, fazendo crer que AA  era inquilino no imóvel registado em nome de BB e, como tal, surgia a obrigação daquele encontrar alternativas enquanto decorriam as obras.
Esta situação foi, também, aproveitada por AA para justificar a marcação de hotéis em ..., perante a sua agência de viagens.
Nas intercepções telefónicas realizadas é perceptível que sempre foi o arguido AA a dar ordens relativamente ao apartamento. Em meados de Novembro de 2013, surge também a necessidade de marcar outro quarto no aparthotel em que MM e o filho se encontravam, visto que AA  assumiu um compromisso com BBBB de que ficava por sua conta a permanência em ... do filho daquele, de seu nome CCCC.
O arguido compromete-se a pagar um alojamento de um terceiro em ..., com o dinheiro de outrem? Não, obviamente, com o seu próprio dinheiro.
Diga-se, aliás, que gastos excessivos do arguido, contrariando todas as manobras de ocultação da origem do dinheiro, acabaram por facilitar a investigação e a conclusão a que esta chegou.
4ªFase em ...
Em Janeiro de 2014 começam a surgir notícias relacionando o arguido BB  ao arguido AA e, designadamente, à compra de imóveis que o primeiro teria efectuado à mãe do arguido AA.
Após este facto, nota-se que as conversas existentes entre o arguido AA e MM, até àquela data cifradas e lacónicas, passam a ser claras no sentido de referir que é o arguido AA quem suporta o pagamento das rendas de dois apartamentos em ... -  um para MM e seu filho e outro para CCCC, filho de BBBB.
A partir da conta do BES de BB (Apenso Ba) foram, ainda, suportadas despesas com mobiliário e um síndico (administrador de condomínios) que totalizam, com as transferências para o Notário ..., cerca de 3 milhões de euros de encargos relacionados com o referido imóvel em .... A partir daquela conta do Apenso Bancário 1 de BB no BES, são efectuadas as transferências bancárias para YYY, mãe de AA.
Estes movimentos serão os pagamentos do preço declarado na escritura pública de compra e venda do imóvel sito no Edifício ..., em ..., e os imóveis situados em ..., que se encontravam em nome de YYY e passaram, por aquela via, a estar registados em nome de BB.
Para fazer face àqueles pagamentos ao notário ..., para efeito da aquisição do imóvel de ..., e para pagamento a YYY (que mais tarde transfere para AA), a conta do BES de BB, do Apenso Bancário 1, recebeu a seguinte transferência: ABa Data Mov. Descritivo Déb. Créd. Nome da conta Origem ...12 TRANSFERENCIA DE ENG BB 3.500.000,00 BB (BES - Ap. Banc. 1-C)
Ou seja, foi com saldo da conta do Apenso Bancário 1-C que aqueles imóveis foram pagos, o que será o mesmo que dizer que foram com verbas oriundas da conta da ..., junto da UBS.
A ligação entre os dois arguidos constatou-se, inicialmente, pelas intercepções telefónicas efectuadas no âmbito da denominada “Operação ...” (NUIPC 207/11...), as quais, por certidão, constam dos presentes autos. Nas mesmas, verifica-se que aquela ligação não se resume apenas a razões de amizade, mas, também, a questões económico-financeiras.
Nas sessões constantes dos autos -  sessão 2398, de 22/07/2013,  sessão 2541 do Alvo 58978040, de 23/07/2013,  sessão 2686 do Alvo 58978040 – fácil e é concluir que quem manda e desmanda” relativamente ao apartamento de ... é o arguido AA.  A propósito das decisões dos materiais para o imóvel, refira-se uma conversa entre AA e BB. O facto de BB (o suposto senhorio) deixar nas mãos de AA a escolha dos materiais a utilizar na remodelação do apartamento, evidencia que este é mais que um mero inquilino ( que não paga renda) do mesmo:
Uma vez que  CCCC iria chegar a 16/11 e que se previa que as obras não ficassem concluídas num mês, foi pedido para arrendar novo alojamento por cerca de um mês, pois em meados de Dezembro quer MM e o filho, quer CCCC, viriam a Portugal: Das sessões transcritas, destaca-se a sessão 9641 do Alvo 60085040, em que DDDD questiona o pai, AA, sobre o que iria acontecer ao imóvel depois das obras terminarem. Refere que o pai terá dito que o imóvel seria vendido, queixando-se, ainda, de não poder falar destes assuntos ao telemóvel. AA garante ao filho DDDD que o imóvel não será vendido, mas que o filho e MM iriam para lá morar depois das obras acabarem.
 Ora, na hipótese de AA ser apenas um inquilino no imóvel, não poderia dar qualquer tipo de garantia de permanência no mesmo, já que quem decide se um imóvel é vendido ou não, é o proprietário do mesmo.
Das sessões dos autos resulta que BB tem como colaborador LL,  que foi sócio-gerente da XLM - SOCIEDADE DE ESTUDOS E PROJECTOS LDA, sociedade de que BB é gerente.  Sendo jurista, é um colaborador a quem o arguido BB recorre para tratar de diversos assuntos sobre o imóvel em causa.
A relação entre os dois arguidos não é exercida de forma independente, sendo o arguido LL que se ocupa, entre outras situações, das questões jurídicas das sociedades ligadas a BB, bem como das questões pessoais deste, como seja, a relação com AA. Nas questões de numerário, LL está, assim, a par de tudo quanto diz respeito ao imóvel em causa, intermediando a ligação de BB com o arquitecto EEEE, quando AA pede intervenção a BB.
EEEE é um arquitecto de interiores de ... (... ), que se encontra a tratar da remodelação do imóvel em causa, e XXX (XXX) é a gestora de BB no BES, com a qual o arguido BB fala e reúne inúmeras vezes.
Surgem várias transferências para este arquitecto, essencialmente entre Agosto de 2013 e Agosto de 2014, que perfazem um total superior a 480 mil euros, pagos a partir da conta do Apenso Bancário 1 (conta do BES, titulada por BB)
Surgem mais pessoas com conhecimento deste imóvel localizado em ..., nomeadamente, FFFF, pessoa próxima de AA. Nas intercepções telefónicas foi detectado o envio de uma mensagem de texto dirigida a AA com o seguinte conteúdo: Alvo Produto No Tipo Dia início Hora inicial Duração Auto Transc. Nome do Destinatário Nome A chamar ... SMS 22-09-2013 23:41:02 00:00:00 010 AA/ FFFF "mas vais ver q ela volta para ti. nao ha assim tantos ex pm com massa e casa em ... ... disponiveis."
AA  tenta disfarçar essa sua ligação ao imóvel -a título de exemplo, a 30/09/2013 pede a UU, seu motorista, para este falar com GGGG - da agência de viagens ... e que trata de todas as suas viagens.
Antes de se deslocar novamente a ..., AA tratou com HHHH, nova gerente da sucursal da agência da CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS (CGD) onde tem conta (...), da contratualização de um empréstimo adicional de 50 mil euros, justificado por despesas de instalação do filho em ... e por um pagamento que teria de efectuar à sua agência de viagens. Para fazer face às despesas em ..., AA solicitou a HHHH para fazer uma transferência de 25 mil euros para a sua conta naquele país, informando-a, ainda, que tem intenções de ir a ... e acrescentar como titular nessa conta MM, para que ela também possa movimentar a mesma.
Considerando que até Junho de 2014 os rendimentos oficiais de AA eram de 12.500 euros mensais, insuficientes para as suas despesas mensais mesmo antes desta nova situação, a partir daí AA teve de recorrer:
- a novo empréstimo na CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS,
- a um empréstimo da mãe,
- e, de seguida, foi articulada uma forma de AA auferir mais 12.500 euros por mês
Acresce, como já referido, paralelamente ao dinheiro transferido para a conta-conjunta de ..., indicia-se que em 09/05/2014 AA tenha recebido, em ..., 10 mil euros em numerário que lhe foi entregue por LL, após solicitação a BB. Também, por solicitação a BB, em 30/05/2014 AA recebeu nova entrega de 10 mil euros, imediatamente antes de nova deslocação a ....
Em relação ao imóvel da Avenue ..., os indícios apontam para que depois de concluídas as obras, o mesmo foi “entregue” a uma agência, para que o fosse alienado ou arrendado.
Sobre o assunto, destaca-se parte de uma conversa entre AA e BB: Alvo Produto No Tipo Dia início Hora inicial Duração Auto Transc. Nome do Destinatário Nome A chamar  ...73 Voz 10-06-2014 12:04:47 0:05:20 172 de onde resulta sem sombra de dúvidas que o arguido AA dá ordens ao arguido BB, formalmente o proprietário, relativamente ao destino do imóvel.
Assim, é por mais evidente, que o imóvel em causa é pertença de AA e não de BB, que terá servido de “testa de ferro” para tal aquisição.
Relativamente, ainda, ao imóvel de ..., este teria que ficar, necessariamente, em nome do arguido BB, como já tinha acontecido com os imóveis que eram propriedade de YYY,  uma vez que nem o dinheiro depositado na conta n.º ...07 do então BES, nem os bens imóveis adquiridos podiam figurar oficialmente em nome do arguido AA, por se tratar de pessoa “politicamente exposta” à data em que o dinheiro foi transferido para a ... e repatriado para Portugal.
Depois do arguido AA ter escolhido o imóvel a adquirir em ..., o arguido BB, com o acordo daquele primeiro arguido, encarregou o arguido LL de acompanhar todos os aspetos burocráticos tendentes à celebração do contrato de compra e venda do imóvel. Ou seja, foi com os fundos colocados na conta bancária n.º...07 do BES, em nome do arguido BB, a que corresponde o apenso bancário 1-C, que aqueles imóveis, incluindo o sito em ..., foram pagos, fundos esses que eram oriundos da conta UBS n.º ...99, aberta na ..., igualmente em nome do arguido BB, de onde provieram a maior parte dos fundos repatriados para Portugal .
A fim de assegurar a aquisição do imóvel de ..., bem como a realização de parte das transferências para a conta de YYY, sob a justificação de pagamento do preço da venda do apartamento da mesma no Edifício ... pertença da mãe do arguido AA, o arguido BB fez uma transferência de €3.500.000,00, em 29.08.2012, da conta bancária n.º...07 do BES para a conta n.º ...06, do mesmo Banco, como já referido, a partir da qual foram feitos os seguintes pagamentos referentes à casa de ..., conforme documentos do Aba 1-C, fls. 414 e do Aba 1, fls. 345: Data Movimento Descritivo Débito (€) Observações 30-07-2012 TRANSFERENCIA ...01 P/ EMP32... – Aba1, fls. 340 257.624,80 (124,80 de despesas) Notário ...: ... 30-08-2012 TRANSFERENCIA ...01 P/ EMP32... – Aba 1, fls. 345 2.609.924,80 (124,80 de despesas) Notário ...: ... Subtotal 2.867.549,60.
Como o montante remetido para o notário em ... compreendia uma estimativa dos encargos a suportar naquele país, uma vez liquidados os mesmos encargos e verificando-se o excesso do valor remetido, o mesmo notário veio a proceder à devolução das seguintes quantias, por transferência para a conta BES nº ...06: – Na data de 27.09.2012, a quantia de €5.468,50 e na data de 19.12.2012, a quantia de €515,44.
Assim, o preço do apartamento adquirido em ..., sito na Av. Prèsident ..., foi de € 2.600.000,00, a que acresceu o montante de encargos efectivamente pagos de €261.566,66, tendo assim sido suportado um total de €2.861.566,66.
No dia 31.08.2012, data da escritura do imóvel, o arguido AA realizou em ... uma compra de objetos para a sua nova casa, no valor de €7.000,00, na loja designada ... – ..., que é uma loja de artigos e mobiliário para decoração de interiores.
As compras de artigos de mobiliário e de decoração continuaram, por determinação do arguido AA, que instruiu que as mesmas fossem pagas através de transferências a débito da conta n.º...06 do BES, em nome do arguido BB (Aba 1), com quantias que tiveram origem na conta bancária n.º...07 do mesmo Banco (Aba 1-C). 6477.
 Nos 15 dias imediatos à compra do imóvel, foram realizadas despesas na compra de mobiliário e decoração, em ..., no valor €73.698,58: Aba 1, fls. 345 €13.927,76; ... 04-09-2012– Aba 1, fls. 345 €3.426,78 Loja em ...; 04-09-2012 - Aba 1, fls. 345 €21.245,10 ... 06-09-2012; - Aba 1, fls. 345 €12.171,48 ...; ... 17-09-2012 TRANSFERENCIA ...01 P/ EMP33... SA - Aba 1, fls. 350 €22.927,46 ... Subtotal em 15 dias €73.698,58 6478.
Por determinação do arguido AA, a conta n.º...06 do BES, alimentada por quantias provenientes da conta n.º ...07 do mesmo Banco, continuou nos meses subsequentes, a suportar encargos com o referido imóvel, quer no âmbito da compra de mobiliário e decoração, quer no âmbito de despesas de condomínio, Síndico Subtotal €18.003,73 .Total das duas operações 91.702,31.
A estes valores acrescem 2500,00€ orçamento de remodelação do imóvel; 480.240,72€ relativo às obras de remodelação; 1200,00€ a título de honorários pagos ao advogado ...; 9715,00€ relativo ao imposto de solidariedade relativo ao ano de 2013; 9702,00€ relativo ao imposto de solidariedade relativo ao ano de 2014.
A aquisição da casa de ... implicou a circulação de fundos, no valor de cerca de três milhões e meio de euros (3.5000.000,00) com origem na repatriação de fundos da ..., disponíveis na conta bancária BES ...07.
Durante o período de tempo em que o arguido AA e a família habitaram o imóvel sito na Av. ..., em ..., aquele nunca pagou, ainda que de forma aparente, qualquer renda por essa utilização, nem se preocupou em criar justificativo para a sua relação com o proprietário formal do imóvel, que era o arguido BB.
Por solicitação do arguido AA ao arguido BB, o arguido LL¸ entre 26.08.2013 ae 30.08.2013, fez diligências várias, através de e-mail, no sentido de arrendar um apartamento em ..., para o referido período, onde pudessem habitar o arguido AA, os seus filhos, QQQ e DDDD, e a mãe dos mesmos, a arguida MM.
O arguido LL telefonou a IIII, funcionária da EMP34... a qual, pelas 15.17 horas do dia 30.08.2013, lhe enviou um e-mail a confirmar a reserva de um apartamento T1 para 4 adultos (1 quarto + 1 sala) em ... ..., com chegada em 30.08.2013 e saída em 15.09.2013, sendo o custo do apartamento de €455,60 por noite – conforme folhas 70 do apenso busca 17.
Na sequência de uma reunião, em ..., ter sido adiada para o dia seguinte,  o arguido AA solicitou ao arguido UU que fizesse um contacto com a GGGG, colaboradora da ..., para lhe marcar um quarto no hotel da outra vez, (Hotel ...), dizendo ao arguido UU que era “porque o senhorio ainda está em obras” – cf. alvo 60085040, sessão 2151. 6527. Pelas 15.21 horas do dia 30.09.2013 GGGG ligou ao arguido AA para lhe dar conta de que “o Hotel ... tem os quartos todos cheios e só tem disponibilidade para uma suite de 800 euros por noite”, admitindo aquela a possibilidade de procurar um hotel mais barato, tendo o arguido AA acabado por decidir: “Ouça, eu prefiro ficar nesse que é perto das coisas. Marque lá esse e pronto”, determinando-lhe, dessa forma, que marcasse uma estada, no referido hotel, por duas noites, apesar do elevado preço que o mesmo custava – conforme alvo 60085040, sessão 2157.
Nessa altura o arguido AA tinha  recebido o salário que lhe era pago pela EMP35... em 23.09.2013 e dispunha nesse momento de um saldo de €2.985,96 na sua conta bancária, mas tal facto não o levou a procurar um hotel mais económico.
As notícias vindas a público no CORREIO DA MANHÃ e a conversa estabelecida entre o arguido BB e o arguido AA acabaram por ser determinantes para a modificação da estratégia destes arguidos.
Os arguidos deixaram de falar de forma codificada, passando o arguido AA a tratar o arguido BB, até à exaustão, como “proprietário/senhorio” do imóvel de ....
Começaram a dar prevalência a que fossem montados contratos que pudessem justificar a utilização do imóvel de ... pelo arguido AA, tarefa de que foi encarregado o arguido LL.
No dia 04.06.2014, quarta-feira, pelas 21.17 horas, o arguido AA telefonou a JJJJ para indagar, ao certo, qual o dia em que este ia para ..., tendo ele respondido que ia na sexta-feira, dia 06.06.2014. Referiu JJJJ que, na sexta e sábado, ia estar num hotel pago pela “...”, mas pretendia depois lá ficar com as outras pessoas, permanecendo em ... até terça-feira (cf. alvo 60085040, sessão 40867).
O arguido AA retorquiu dizendo que não precisava de ir para o hotel e que podia ficar de sexta a terça ou o tempo que quisesse, propondo-se, no dia seguinte, a explicar o que ele devia fazer na deslocação a ....
 O arguido AA dispôs-se a ceder-lhe o apartamento sito na Av. ..., tentando passar a ideia de ser um apartamento arrendado, sem nunca revelar ao seu convidado quem seria o pretenso senhorio.
Antes daquela mudança de estratégia, algumas das pessoas que lidavam com o arguido AA e necessitavam de dinheiro, recorriam a conversas codificadas, para dizerem que precisavam de dinheiro ou para agradecerem a entrega das quantias que o arguido AA colocava à sua disposição, tal como acontecia com KKKK, LLLL, MMMM, NNNN e YYY – ver, nomeadamente, alvo 60085040, sessão 17535 - 06.03.2014; alvo 60090040, sessão 7500 - 30.10.2013; alvo 60085040, sessão 17155 - 28.02.2014; alvo 60004040, sessão 31617 - 11.07.2014 e alvo 60504040, sessão 35827 - 08.07.2014.
 Por seu lado, também os arguidos BB e AA utilizavam entre si expressões codificadas, referindo-se a “dossier”, “livros”, “fotocópias”, “folhas”, “daquela coisa”, “daquilo”, “disso”, “disso das fotocópias”, “aquilo que era para…”, “disto que eu tenho” e/ou, “aquela coisa que eu gosto”, “quando puderes trazer aquilo”, “se me puderes trazer cá…”, “o resto das fotocópias” entre outras, para se referirem à entrega de quantias monetárias em notas do Banco Central Europeu.
De igual forma, os demais arguidos envolvidos nas entregas e recebimentos de numerário, caso de TT, UU e MM, bem como os que eram apenas beneficiários de subsequentes entregas de quantias, determinadas pelo arguido AA, caso de NNNN, LLLL, KKKK e MMMM, utilizavam também,  idênticas expressões e, ainda, outras, tais como: “não te esqueças de mim já estou a precisar”, “preciso de alguma coisa”, “as fotocópias mais pequenas” (referindo-se a notas de valores mais pequenos), “estou a precisar daquela coisa”, “estou à rasca”, “aquela coisa”, “como estamos no fim do mês…”, “não se esqueça”, “disso”, “do meu…”, “ia tratar disso”, “guita”, “massa”, “um papelito”, “um envelopezinho” ou ”testes do explicador do DDDD”.
O arguido AA que, de forma altruísta, auxilia terceiros que se cruzaram na sua vida (MMMM trabalhou, pelo menos durante um ano, em exclusivo para AA, como secretária (entre Abril de 2013 e Março de 2014). É esta que trata da sua agenda pessoal e profissional (nomeadamente, marcação de encontros, viagens, contactos, entre outros) realizando, nesse período, os seus trabalhos a partir de sua residência em .... Na época que AA exercia as funções de Primeiro-Ministro, já MMMM trabalhava com este. Aparentemente, a partir de Abril de 2013, MMMM obteve uma licença sem vencimento do Partido ... pelo período de um ano. Terminada a licença, tendo ainda sido posta a hipótese da sua prorrogação, acabou por regressar ao seu local de trabalho, o Partido ..., a partir de 1 de Abril de 2014. Contudo, e face aos elementos reunidos, esta continua a prestar serviços de secretariado a AA. Veja-se Transc. Nome do Destinatário Nome A chamar ...54 Voz 09-04-2014 16:56:05 00:04:55 126 AA MMMM (secretária de OOOO)  MMMM diz que o rendimento dela lá é uma porcaria, que leva para casa 900 euros. AA diz que tem de combinar isso...(…) MMMM refere que está a fazer os seus descontos... diz que não sabe se AA pode, se lhe desse mais uma ajudinha, já fica bem. AA diz que é isso que está disponível para fazer... acha é que tem de fazer um contrato. (…) AA diz que então falam disso, pergunta quanto é que MMMM quer. MMMM diz que isso é AA que sabe. AA questiona quanto é que MMMM ganha lá. MMMM responde que com o subsídio de refeição, limpos, recebe cerca de 1.000 euros, conforme os dias úteis do mês. AA diz que então o melhor seria AA dar-lhe o mesmo. MMMM diz que assim ficava óptima. AA diz que vão fazer isso. MMMM agradece... AA diz que não é obrigado, diz que eles têm os destinos cruzados.” Às 18:58 AA pergunta se aquilo eram "2"... MMMM não percebe. AA diz que "aquilo que UU ficou de entregar". MMMM confirma. AA diz que vai mandar um envelope.(…)  NNNN  é amiga pessoal de AA, tendo durante alguns anos auferido rendimentos pelo exercício de funções em gabinetes ministeriais. Mostra-se com relevância para os presentes autos, por ser destinatária de verbas em numerário de AA, a título de ajuda financeira, para aquisição de "bens de consumo" que os intervenientes designam como "garrafas" de vinho ou azeite.  KKKK é uma pessoa próxima de AA, à qual presta apoio financeiro frequentemente, sendo o motorista UU quem, normalmente, procede à entrega do numerário àquela. LLLL  nascida a 4 Outubro de 1976, em ..., de ascendência ..., reside, actualmente, na ... com o seu filho menor. Desloca-se com alguma frequência a Portugal, onde reside a sua mãe, para se encontrar com AA, através de viagens que BB providência e paga. LLLL contacta frequentemente AA e BB a solicitar ajuda financeira, que BB, com evidente conhecimento de AA, faz chegar à ..., por transferências bancárias a partir de uma conta titulada por BB.) é a mesma pessoa que necessita que a anterior gerente da conta da CGD venha a ser testemunha das parcas quantias que dispõe na sua conta bancária. Veja-se: Alvo Produto Nº Tipo Dia início Hora inicial Duração Auto Transc. Nome do Destinatário Nome A chamar ...75 Voz 09-01-2014 17:15:37 00:12:00 092 AA, destino, (CGD) PPPP diz que vai deixar a Agência ... e vai assumir funções de gerência noutra Agência da Caixa… diz que queria apresentar a nova gerente… AA diz que fica contente pela promoção de PPPP, agradece o que PPPP fez por ele… PPPP diz que teve ontem a notícia e já começa na segunda-feira... PPPP diz que quem a substitui é HHHH. AA pede a PPPP para dar o contacto dele e o de MMMM e pedir para HHHH ligar... PPPP diz que HHHH é muito boa profissional, muito simpática e competente... AA diz que o advogado dele indicou o nome de PPPP como testemunha, que um dia ela será chamada a tribunal para testemunhar as misérias da conta dele... o enriquecimento... diz que com 56 anos é uma vergonha ter tão pouco para deixar aos filhos. PPPP diz que não tem problema nenhum... foi ela que acompanhou naquela fase. AA questiona desde quando PPPP é sua gerente de conta.”
O arguido BB tinha como gestora das suas contas no BES a colaboradora desse Banco identificada como XXX  a qual acompanhava as contas do arguido, que era considerado cliente Private no BES, pelo menos desde o ano de 2007, mantendo, os dois, reuniões regulares, com uma periodicidade mensal.
Por deferência com o cliente, no decurso dessas reuniões, que ocorriam nas instalações da sede do BES, na Rua ..., em ..., a gestora de conta XXX, a solicitação do arguido BB, acedia a que fossem feitos naquela ocasião, levantamentos em numerário, na ordem de €10.000,00, os quais fazia processar de imediato no balcão da sede do Banco, entregando-lhe o arguido para o efeito, um cheque previamente preenchido e assinado por si.
Às vezes o mesmo acontecia com o seu assessor, QQQQ.
Por razões ligadas à sua própria defesa e enquanto funcionários do BES, deixaram de fazer os levantamentos a pedido do arguido BB a partir de 27.03.2013.
No interrogatório que se pode ler no Apenso DS vol 15, pag 4572” é dito pela “Questionada sobre os movimentos de tesouraria que BB precisava e se BB solicitava esse apoio ou conselho, XXX diz que BB muito excepcionalmente quando estavam em reunião pediu ajuda, pedindo um cheque e o assistente na altura preenchia impressos e ia à sala, e nessas alturas pedia ao assistente para ir ao balcão levantar dinheiro porque BB estaria com pressa. Diz que um dia o assistente RRRR disse que não podiam fazer isso, pois o nome que ficava lá como sendo a pessoa a levantar o dinheiro e deixaram de fazer isso. Diz que isso era uma prática de deferência em relação a alguns clientes, mas que agora o que faz é acompanhar o cliente lá baixo e é feito com alguma descrição. Diz que nunca lhe foi feita alguma questão e diz que a certa altura começou a ver muitos levantamentos de caixa, quer na sede, quer no balcão em ... e não era avisada pelos balcões que são quem tem que identificar as pessoas. Diz que um dia alertou BB, mas que BB admitiu, mas não adiantou mais nada.(…) Referindo-se aos cheques que eram levantados, XXX diz que sempre eram levantados na altura e era entregue ao cliente á frente dela na sala e o balcão era no balcão no piso de baixo.Confrontada com um cheque, identificou a data que terá sido efectuado o levantamento. Falam de compensação que vem mencionado no documento e XXX Diz que essa compensação na SIBS tanto quanto sabe, pois não tem prática de caixa. Diz que o cheque é pago à boca de caixa, mas que o tratamento físico do cheque deve ir à SIBS conjuntamente com os outros, mas não sabe explicar. XXX diz que BB tinha sempre saldos altos. Diz que às vezes eram pedidas cópias de cheques aos balcões e nunca o compliance lhe fez questões, mas que por iniciativa fez algumas comunicações à direcção dela, A Dr. SSSS que eram esses que depois interagiam com o compliance.”
Noutras situações, que eram a esmagadora maioria, o arguido BB dava instruções a colaboradores das suas sociedades, directamente ou através da arguida TT ou do arguido NN, para que se deslocassem a uma agência do BES a fim de procederem ao levantamento de quantias em numerário, mediante a apresentação ao balcão de cheque ao portador, que para o efeito lhes era entregue.
O arguido BB, perante um qualquer pedido formulado pelo arguido AA, desencadeava, no imediato, todo o inerente processo destinado a satisfazê-lo o mais rapidamente possível.
Quando, por circunstâncias anómalas ou por esquecimento, designadamente dos demais arguidos que colaboravam nas entregas, havia o risco iminente de ser atrasada ou não ser feita a entrega na data solicitada pelo arguido AA, o arguido BB tentava arranjar desculpas e ficava sempre muito irritado com a iminência de não ser cumprido o pedido formulado (alvo 6456904004, sessão 23, de 04.04.2014; alvo 64569040, sessão 24, de 04.04.2014 e alvo 60090040, sessão 7592, de 31.10.2013).
 O mesmo acontecia com o arguido AA, que ficava muito irritado quando o arguido UU, mesmo em razão de outros compromissos que lhe eram impostos, se atrasava em ir buscar o dinheiro para lhe entregar (alvo 60085040, sessão 762, de 20.09.2013).
 Muitas das quantias entregues ao arguido AA eram parcialmente destinadas a ser distribuídas por pessoas próximas deste, a quem o mesmo prestava regularmente ajuda financeira, sendo o arguido UU quem usualmente ficava incumbido de lhas fazer chegar.
 Foram igualmente beneficiários dessas entregas alguns familiares do arguido AA, o caso de sua mãe YYY, os seus filhos DDDD e QQQ, bem como a sua ex-mulher, a arguida MM, o companheiro desta, TTTT, ou mesmo várias pessoas do seu círculo de amizade, como NNNN, ou LLLL, a quem prestava ajuda financeira com regularidade, ou ainda, a sua colaboradora MMMM, sua secretária desde o ano de 2011, a quem pagava o salário com estas quantias.
 O arguido AA prestava também ajuda monetária mensal a KKKK no montante de cerca de €400,00, desde abril de 2012, na sequência de encontro que tiveram e no qual esta informou que tinha deixado de estudar por falta de disponibilidade financeira.
O arguido NN, prestou serviços a diversas empresas integradas no universo societário da pertença do arguido BB, sendo um dos seus colaboradores de confiança,
Tendo em vista essa prestação de serviços, o arguido NN decidiu constituir a RMF CONSULTING – GESTÃO E CONSULTORIA ESTRATÉGICA, LDA, empresa com sede no seu domicílio fiscal e onde iria fazer reflectir na respectiva contabilidade, os encargos com serviços prestados às sociedades da esfera do arguido BB, incluindo quanto à tomada formal de posições sociais em sociedades deste último arguido e no exclusivo interesse do mesmo.
O arguido NN foi também um dos colaboradores de que BB se socorreu para efectuar as aquisições em massa do livro “...”, apresentado como sendo da autoria do arguido AA,
 O arguido NN disponibilizou também as contas bancárias em que era autorizado, quer a título particular, quer como gerente da referida sociedade RMF CONSULTING Lda., para a realização de operações, incluindo de levantamento de numerário, no interesse e em benefício de AA ou de terceiros a quem este último arguido pretendia atribuir uma remuneração.
NN disponibilizou, para a realização de levantamentos em numerário, as contas bancárias com os números ...6-8, ...7-6 e ...3-4, todas domiciliadas na CAIXA ECONOMICA MONTEPIO GERAL (doravante MG). – conforme Aba 19, 19A e 19B.
Quando o arguido BB não tinha possibilidade de utilização das contas do BES ou do BARCLAYS BANK pedia à arguida TT, sua companheira, para retirar quantias em numerário de uma conta bancária da mesma, conta n.º ...41, junto do MG ou contava, mesmo, com a utilização de contas bancárias da titularidade do arguido LL, seu colaborador, conta deste junto do BES, com o n.º...18 – conforme apensos bancários 15-D e 33-B, respectivamente
 Também estas contas eram compensadas de tais débitos mediante créditos realizados a partir da supra referida conta do BES n.º...06, da titularidade do arguido BB.
Esta actuação dos arguidos ocorreu entre 17.12.2010 e 16.11.2014, período em que a conta bancária do BES com o n.º...06 passou a registar intensa movimentação a débito através de levantamento de cheques de caixa, de quantias em numerário, o que até àquela primeira data não tinha acontecido.
Como atrás mencionado, os débitos bancários nas contas destes três arguidos, TT, LL e NN, realizados para permitir operações no interesse do arguido AA, foram compensados, pelo arguido BB, através de verbas transferidas para a esfera daqueles três arguidos, com origem na conta do BES, n.º ...06.
Pode ler-se no ponto 3.3.02.02.02 - Breve Análise à Conta Bancária N° ...06, do BES, Titulada por BB (Apenso Bancário 1).
Pela análise aos movimentos bancários desta conta verifica-se, e conforme quadro infra, que durante o período de 2004 a 2008, apenas foram realizados 11 levantamentos em caixas multibanco, no montante máximo de 150,00€ por operação.

Descrição                                                    ageValor
17-01-2004LEVANT. MULTIB. ...52/0040,00 C
23-04-2004LEVANT. MULTIB, ...52/0140,00 C


emeiDaemenieberi 15-11-2004Descrição                                                Ab.Valor
LEVANT. MULTIB. ...52/02150,00 C
24-11-2004LEVANT. MULTIB. ...52/0340,00 C
08-04-2005LEVANT. MULTIB. ...52/0420,00€
13-04-2005LEVANT. MULTIB. ...52/05150,00 C
15-04-2005LEVANT. MULTIB. ...52/0620,00 €
21-07-2006LEVANTAMENTO MB CARTÃO ...201100,00 €
03-08-2006LEVANTAMENTO MB CARTÃO ...201150,00 C
09-12-2006LEVANTAMENTO MB CARTÃO ...20140,00 C
01-08-2008Levantamento MB Cartão **** **** ...74*100,00 C
Durante o período de Agosto de 2008 a meados de Dezembro de 2010, não se verificaram quaisquer levantamentos. Precisamente a 17/12/2010 ocorre o primeiro de 127 levantamentos em numerário de quantias avultadas efectuados ao balcão do BES, e que se enquadram nos factos versados nos autos que abaixo se detalham, num montante total de 993.200,00€.
Verificaram-se ainda outros levantamentos efectuados em contas veículo, tituladas por TT (Aba 15-D), LL (Aba 33-B) e de várias contas do NN (Aba 19, Aba 19-A, Aba 19-C), que foram compensados através de verbas creditadas nas suas contas, com origem na conta BES n° ...06 (Aba 1).
Pela análise aos referidos cheques, constata-se que os levantamentos foram operacionalizados por diversos intervenientes, que serão de seguida identificados e aclarada a sua relação com o arguido BB, tendo por base inquirições e interrogatórios juntos aos presentes autos.
Este primeiro levantamento, de 17/12/2010, ocorre precisamente na mesma semana em que as verbas que se encontravam na ..., junto da UBS, foram transferidas para o BESI (13/12/2010), no âmbito do repatriamento dos capitais aderidos ao RERT II e posteriormente desta para a conta do Apenso Bancário 1-C.
Pela análise da conta do arguido BB junto do BES, referente ao Apenso Bancário 1, é possível verificar que esta é reiteradamente "alimentada" com verbas oriundas da outra conta por si titulada junto do BES do Apenso Bancário 1-C.
Enquanto o arguido AA exerceu funções de Primeiro-Ministro, o estratagema de realizar levantamentos e entregas de numerário apenas foi concretizado por três vezes, dado que atentas as funções públicas desenvolvidas, ambos os arguidos, AA e BB, sabiam que existia um particular escrutínio sobre a sua vida pública, bem como, sobre as suas contas pessoais, pelo que as entregas só ocorreram em situações muito pontuais.
Uma vez cessadas as funções de Primeiro-Ministro do arguido AA, o que veio a ocorrer em ../../2011, as entregas de numerário ao mesmo arguido começaram a ter uma maior cadência e regularidade em função da necessidade de procurar salvaguardar a liquidez da sua conta bancária junto da CGD e como forma de responder ao aumento gradual das suas despesas correntes com a cessação de funções governativas.
A partir de Julho de 2011 iniciou-se um processo de levantamento e entrega de quantias em numerário ao arguido AA, com caráter de regularidade, mas com curtas interrupções nos períodos em o arguido dispunha de confortável liquidez na sua conta junto da CGD, tendo-se transformado o ritmo das operações numa cadência constante, a partir de abril de 2012, com entregas de quantias na ordem dos €5.000,00 e €10.000,00.
No período compreendido entre 16.10.2010 e 11.03.2011, começaram a ser transferidos das contas abertas na ..., em nome das entidades EMP36... e EMP20... para a conta aberta junto do BESI, em nome de BB, os ativos em valores mobiliários e dinheiro que se encontravam nessas contas na ..., tendo a primeira transferência sido feita em 16.10.2010, no valor de €118.560,00, a que seguiram mais quatro transferências, na data de 07.12.2010.
Em 15.12.2010 o arguido BB procedeu à transferência do BESI da conta n.º ...95 para a conta n.º...07 junto do BES da sua titularidade (Aba 1-C), da quantia de €1.150.000,00 ao que se seguiram outras transferências, até perfazer o montante total transferido de €17.550.000,00 tendo a última das transferências ocorrido em 11.07.2012 (cf. Aba 1-C, fls. 314).
Uma vez iniciada a repatriação das quantias da ... e uma vez desencadeada a transferência dessas quantias para a conta BES n.º...07, de onde passariam a poder sair fundos para a conta n.º...06 também do BES, os arguidos combinaram que era altura de começar a ser disponibilizadas ao arguido AA, de forma gradual e em numerário, as quantias que lhe pertenciam, mas que estavam, formalmente, em nome do arguido BB.
O arguido AA não fazia qualquer controlo dos seus gastos, realizava compras de vestuário no montante de vários milhares de euros, bem como, outras compras que associadas àquelas, tinham determinado tal situação de descoberto na conta, tendo ficado muito surpreendido com essa informação porque não tinha ideia de ter gasto tais montantes (alvo 60085040, sessão 1681, 27.09.2013 – 12.21h e alvo 60085040, sessão 1684, 27.09.2013 – 12.26h).
Quanto ao livro:
No decurso do ano de 2013, o arguido AA, decidiu editar um livro ao qual foi dado o título “...”,
O arguido encetou contactos com a Editora ... que  decidiu editar o livro da autoria deste arguido.
Em algumas das reuniões realizadas com QQQ (editor) o arguido AA esteve acompanhado por UUUU que era uma pessoa da sua confiança pessoal.
Também participou em algumas das reuniões iniciais, uma empresa de comunicação que, por decisão do arguido AA, iria acompanhar a divulgação da obra e dos eventos com ela relacionados (v.g. apresentações da obra e entrevistas), pois no entender daquele arguido “a Editora não sabia tratar com a imprensa”.
A empresa de comunicação escolhida foi a EMP37..., a qual participou na elaboração da capa, acompanhou os lançamentos e apresentação do livro em ... e no ..., nomeadamente no domínio da produção de materiais, de exposição e disposição da sala, sempre em conjunto com as pessoas da Editora, em particular com VVVV que foi a pessoa designada para fazer a “promoção do livro”.
 A intervenção da empresa EMP37... não foi contratualizada pela Editora ..., dado esta atravessar à época um período de dificuldades financeiras, a qual entendeu que seria dispensável a contratualização de um serviço que podia prestar e que lhes acarretaria custos que não podiam suportar.
Os custos dos serviços prestados pela EMP37... rondaram os €10.000,00 e foram custeados pelo arguido AA.
Logo que atingiu o primeiro lugar no TOP de vendas na ... o arguido AA fez questão que essa situação fosse publicitada na comunicação social e que fosse divulgada a informação de “que o livro era inédito no mundo editorial e que atingiu o TOP 10 em 3 dias”, o que comunicou a VVVV ( funcionária da Editora) nos contactos telefónicos que então manteve com esta (alvo 60085040, sessão 6610, 05.11.2013 – 19,14h).
O arguido pretendia que o livro fosse um sucesso de vendas e para isso concebeu um plano que passava pela utilização de pessoas da sua confiança, que procederiam à aquisição de vários exemplares do seu livro em diversos pontos do território nacional. O arguido BB aderiu ao referido plano, tendo então sido acordado entre ambos que este último assumiria a coordenação de todas as operações que viessem a ser levadas a efeito no terreno.
Os custos dessa aquisição de livros por pessoas de confiança seriam suportados pelos fundos que  se encontravam depositados nas contas tituladas pelo arguido BB, designadamente nas contas BES n.º ...06 e n.º ...07.
Entre as pessoas que aceitaram realizar aquisições de favor, suportadas por fundos geridos pelo arguido BB, encontravam-se as seguintes: – UUUU (UUUU); – NNNN (NNNN); – O arguido LL; – A arguida TT; – WWWW; – O arguido UU; – XXXX (XXXX), seus familiares e pessoas das suas relações pessoais; – O arguido NN; – YYYY (YYYY); – ZZZZ; – KKKK.
São inúmeras as conversas telefónicas tidas entre os arguidos e os “colaboradores” donde decorre que o objectivo da operação montada era “entupir” (palavras do arguido AA).
O “Monte ...”
O arguido AA deu instruções ao arguido BB para disponibilizar os fundos necessários com vista a concretizar a aquisição de um imóvel, que ficaria em nome da arguida MM.
No ano de 2011, os arguidos AA, BB e MM combinaram que o imóvel escolhido – o “Monte ...”, localizado em ... – seria adquirido através de dois financiamentos bancários, que o arguido BB se encarregaria de viabilizar, os quais eram assumidos formalmente pela arguida MM, mas garantidos por fundos na disponibilidade do arguido BB.
O contrato promessa do referido imóvel, com pagamento do sinal feito com fundos disponibilizados por TTTT (companheiro de MM), o qual foi, mais tarde, reembolsado na sequência de “empréstimo particular pecuniário”, no valor de €100.000,00 concedido pelo arguido BB à arguida MM, em 31.05.2012, através do cheque n.º...72, sacado sobre a conta n.º ...06 do BES.
O arguido BB disponibilizou-se, igualmente, a figurar como avalista de uma livrança num pedido de empréstimo que a arguida MM apresentou na agência da ... do BES, no valor de 150.000,00 com vista a reforçar o sinal do imóvel, tendo o financiamento ficado condicionado, igualmente, à constituição de um colateral – depósito a prazo no valor de €150.000,00 – associado à conta n.º ...06, do BES, da titularidade do arguido BB.
A escritura pública do imóvel foi celebrada em 03.02.2010 e só foi possível porque a agência do BES autorizou um empréstimo à arguida MM, no valor de €760.000,00, na sequência de várias garantias exigidas pelo Banco, que o arguido BB aceitou prestar.
O penhor sobre o depósito a prazo de €760,000,00 – colateral para garantir o valor mutuado – foi realizado pelo arguido BB através de transferência de quantias da conta n.º ...07 para a conta n.º ...06, ambas do BES, em nome deste arguido, como era habitual.
AQUISIÇÃO DE OBRAS DE ARTE
Os arguidos AA e BB haviam iniciado, na data de 16.10.2010, a realização de transferências de fundos existentes nas contas na ... para a conta BESI n.º ...95, titulada pelo arguido BB.
Simultaneamente, entre Junho e Dezembro de 2010, o arguido BB fez transferir para a sua conta junto do BES com o n.º ...06 o montante total de € 800.000,00 com origem na sociedade XLM.
A partir de Dezembro de 2010, o arguido AA sabia que o seu património financeiro se encontrava misturado com o do arguido BB  e portanto, os meios financeiros do arguido AA podiam ser mobilizados, sem que essa utilização pudesse suscitar suspeita ou implicar a associação ao seu nome.
O arguido AA resolveu realizar a aquisição de obras de arte, fazendo mobilizar fundos para a aquisição de quadros de pintores com boa cotação no mercado da arte, escolhendo obras que facilmente valorizariam, dada a reputação dos respectivos autores enquanto artistas com reconhecimento internacional.
O arguido AA era, pelo menos desde 1997, cliente da GALERIA ..., pertença da sociedade EMP38..., LD.ª, cujo objeto é a comercialização de peças de arte, designadamente, de obras de pintura da autoria de artistas nacionais e estrangeiros (Abu 26 – anexos 01, 02, 03, 04, 06).
O arguido AA não pretendia que a sua identificação ficasse ligada a tais aquisições, uma vez que não possuía nenhuma fonte de rendimento conhecida que lhe permitisse tais investimentos sem suscitar suspeitas. Teve, mais uma vez, a intervenção de BB. Através deste, comprou: a) Pintura de Uwe Lindau – o/s/a, pelo preço de €12.000,00; b) Pintura de Uwe Lindau – o/s/a, pelo preço de €12.000,00; c) Pintura de Batarda – g/s/p desenho, pelo preço de €25.000,00.
Para o pagamento desta fatura o arguido BB fez emitir o cheque n.º...35, com data de 08.02.2011, sacado sobre a conta n.º ...06 do BES.
Por volta de Junho de 2011, o arguido AA resolveu proceder a nova à aquisição de pinturas, na mesma galeria, voltando a pedir a colaboração do arguido BB.
O arguido AA selecionou e adquiriu, através do arguido BB, a) Almada Negreiros – desenho/”Nau Catrineta”, pelo preço de €12.500,00; b) António Ramalho – óleo/”Arbusto”, pelo preço de €6.500,00; c) Escada – óleo, pelo preço de €29.000,00. Para o pagamento o arguido BB emitiu o cheque n.º...22 no mesmo montante, com data de 13.06.2011, sacado sobre a conta n.º ...06 do BES.
 Em meados do mês de Outubro de 2011, mais uma vez, o arguido AA faz uma aquisição à GALERIA ..., – Júlio Pomar – óleo/”Salomé”, pelo preço de €50.000,00. O arguido BB pagou através do cheque n.º...32, sacado sobre a conta BES n.º ...06.
Entre Outubro e Dezembro de 2011, o arguido AA procedeu à aquisição, ainda na mesma galeria, a) Jorge Martins – óleo/”Joana à espera”, pelo preço de €30.000,00; b) Manuel Amado – óleo/”A estrada do pinhal”, pelo preço de €15.000,00; c) Silva Porto – desenho/”Cabeça de menino”, pelo preço de €5.000,00. O pagamento foi efectuado através do cheque n.º...41sacado sobre a mesma conta do BES.
XX, economista, é autor do blogue, criado em Setembro de 2005, com a designação inicial de “...”, mais tarde alterada para “...”, no qual escrevia sob o pseudónimo de AAAAA. Pelo menos a partir do ano de 2012, XX passou a prestar colaboração ao arguido AA, com o envio de mapas de audiências do programa “...”, na RTP 1, com o apoio na revisão do livro “...”, com a publicação de textos no referido blogue, e com o envio de notícias sobre a atualidade, designadamente política.
A colaboração prestada por XX, ao arguido AA, teve como contrapartida o pagamento do montante global de €79.502,50, o que ocorreu ao longo dos anos de 2012 a 2014.
Este pagamento foi realizado em nome da sociedade RMF CONSULTING LDA com fundos com origem na sociedade XLM SOCIEDADE DE ESTUDOS E PROJETOS LDA.
O arguido BB pediu ao arguido NN, que em nome da sociedade RMF CONSULTING LDA fosse celebrado um contrato de prestação de serviços com XX, que permitisse que este viesse a auferir um rendimento mensal de cerca de €3.500,00.
BBBBB foi Secretário de Estado Adjunto do arguido AA, quando este exerceu o cargo de Primeiro - Ministro, no XVII Governo Constitucional, nos anos de 2005 a 2009.
VV, por sua vez, entre abril de 2005 e abril de 2008 exerceu as funções de adjunto do Gabinete do Secretário de Estado Adjunto do Primeiro Ministro, BBBBB.
No decurso do ano de 2012, o arguido AA, através de BBBBB, estabeleceu novamente contacto com VV, no sentido de este lhe prestar colaboração na redação, sistematização e revisão da tese de mestrado a apresentar como conclusão do mestrado em ..., pelo Institut ....
VV aceitou prestar tal colaboração ao arguido a troco de uma contrapartida, no valor de €4.000,00 mensais.
O arguido BB resolveu então utilizar a sociedade RMF CONSULTING, fazendo com que os fundos necessários ali fossem feitos chegar e obtendo a colaboração do arguido NN para o efeito.
O arguido NN apresentou a VV uma minuta de contrato de prestação de serviços, celebrado entre este e a sociedade RMF CONSULTING LDA. – ver ficheiro criado pelo arguido NN  referente a contrato de prestação de serviços celebrado entre a sociedade RMF CONSULTING LDA, por si representada, e VV, em que foi aposta a data de 1 de janeiro de 2013 (Anexo 3.2.02-138, ao relatório final do OPC).
No mês de Outubro de 2013, o arguido AA entrou novamente em contacto com VV, no sentido de este voltar a colaborar consigo no que dizia ser “…um projeto para o futuro” (Alvo 60085040, sessão 5254).
O arguido AA pensava fazer um Doutoramento, iniciando o trabalho de redação da tese de Doutoramento, por volta do Verão de 2014 (Alvo 60085040, Sessão 6489). Como VV pensava em passar a trabalahar, em exclusividade  para a Faculdade de Direito da Universidade ..., o contrato foi feito em nome da sua mulher - WW.
Entre Janeiro de 2013 e Outubro de 2014, pela RMF CONSULTING LDA, foram efectuados pagamentos no valor global de €83.900,00, a favor de VV.
Os contratos e os pagamentos a favor de XX e VV, em nome da sociedade RMF CONSULTING LDA foram efetuados a pedido do arguido BB, e no interesse do arguido AA.
Partindo deste indício de que o valor existente na ... se encontra em nome do arguido BB, mas, efectivamente, pertence ao arguido AA, continua a seguir-se a linha do dinheiro.
A este valor repratiado pelo RERT junta-se o montante de 1.097.500,00€ pago pela LEC SA à XLM até Agosto de 2011, o montante de 2.220.999,93€ pago pela LEC SA à XLM entre Dezembro de 2012 a finais de 2014, o montante de 73.500,00€ pago entre 26-4-2014 a 5-11-2014 pela EMP39... SA ao arguido AA.
No Apenso Bancário 1, relativa à conta do BES com o nº ...06, titulada por BB, verifica-se que a mesma é alimentada em grande medida pela conta do Apenso Bancário 1-C, também esta titulada por BB no BES, mas com o nº ...07.
 De tal modo que, daquela relação, se pode aferir que entre ambas existe o que poderemos chamar de conta-corrente, em que à medida que a conta 1 vai procedendo a movimentos com determinadas contas terceiras, esta é provida de verbas com origem na conta 1-C e, excepcionalmente, pela conta do Apenso Bancário 1-G (relativa à conta titulada por BB junto do BESI que foi a receptora dos montantes repatriados da ... ao abrigo do RERT II). E os movimentos com aquelas determinadas contas terceiras, correspondem, na sua quase totalidade, ao valor do imóvel adquirido em ..., bem como o respectivo mobiliário, obras de beneficiação e administrador de condomínio, que implicou um encargo de 3.491.064,98€; - imóveis "adquiridos" a YYY, que no período após recepção do valor repatriado da ..., perfaz 731.250,00€ entregue à mãe de AA; - levantamentos em numerário para posterior entrega a AA, no valor de 1.169.700,00€; - emissão de cheques depositados na conta de UU, no valor total de 87.500,00€, em proveito de AA,  - transferências para LLLL, na ..., das relações de AA, que naquele período pós-repatriamento, acumula até hoje o valor de 82.867,36€ (despesas bancárias incluídas); - viagens e estadias no valor total de 80.435,36€; - transferências relacionadas com os negócios, em que intervém a EMP26... e EMP40..., associados a ZZZ; - transferências para MM, ex-mulher de AA, no valor de 351.092,75€; - Donativo de 10 mil euros a CCCCC, a propósito de uma campanha política; - pagamentos a lojas relacionadas com obras de arte, no valor de 197 mil euros.
Do valor global que existia na esfera do arguido BB, de forma directa ou indirecta, através das entregas em numerário, pagamento de despesas e aquisição de imóveis chegaram ao arguido AA cerca de 8 milhões de euros ( o valor constante do gráfico infra acrescido do montante utilizado com a aquisiçâo da casa de ...).
DescritivoValor
Montante total em levantamentos1.169.700,00€
Pagamentos a LLLL, entre os anos de 2008 e 2014106.528,27€
Pagamento de viagens pelo arguido BB373.292,82€
Montantes movimentados pelo arguido UU150.044,68€
Compra de livros113.981,60€
Monte ...760.000,00€
Obras de arte197.000,00€
Viagens pagas através do arguido UU com fundos do arguido BB42.392,57€
Pagamento à sociedade EMP41...29.520,00€
Pagamento à sociedade EMP42...29.520,00€
Pagamentos à EMP43..., Soc. Advogados413.895,00€
Despesas relacionadas com a viatura ..-JQ-.. 47.179,45€
Pagamentos à arguida MM pela sociedade Argª  XLM333.000,00€
Pagamentos pela Soc. Arguida XLM, relativos a despesas de viagens e alojamento da arguida MM, filho e DDDDD, filho de BBBB58.229,41€
Pagamento pela Soc. Arguida XLM a OO98.000,00€
Pagamento pela Soc. Arguida XLM à Sociedade  Arguida RMF840.927,50€
TOTAL4.733.691,30€
Como é possível ao arguido AA proceder ao pagamento destas despesas supra referidas de milhões de euros?
Usando o dinheiro que, embora formalmente estivesse em contas tituladas pelo arguido BB, lhe pertencia.
Esta conclusão retira-se com facilidade dos factos que relatámos supra, sendo certo que, de acordo com as regras da experiência, não nos é possível chegar a outra conclusão.
Ninguém gasta MILHÕES que não lhe pertençam.
Além da inúmera prova documental, vejamos alguns depoimentos e declarações
O arguido UU, nos interrogatórios a que foi sujeito em 21-11-2014 e 15-12-2014, sendo notória a tentativa de eximir-se a qualquer responsabilidade e, sobretudo, tendo a preocupação em demonstrar que não fez sua nenhuma das quantias que lhe foram entregues,  faz afirmações deste jaez: “é empregado de AA desde 2011, no qual ele o ia incumbindo de fazer determinados pagamentos, com algumas somas de dinheiro que iam entrando na sua conta e de que  nunca soube a proveniência, mas era sempre destinada a fazer pagamentos de despesas. Questionado sobre como chegava esse dinheiro à sua conta, refere que às vezes era numerário que depositava, outras vezes era através do que pensava ser transferências, pensava que o dinheiro ia para a sua conta, mas não sabia quem fazia a transferência, a proveniência. Sabe é que quando o dinheiro entrava na sua conta era para fazer pagamentos de despesas de AA, que antes lhe comunicava que havia para pagar. Quando lhe é solicitado para dar exemplos de despesas que costumava pagar, refere-se a condomínio, arranjo do carro de AA, revisões, selo. Diz que às vezes também pagava despesas de saúde, refeições. Conta que ia buscar as refeições para AA e adiantava o dinheiro. Questionado se tinha consciência que isto eram uns bons milhares de euros, UU diz que sim. Questionado se andou nas livrarias a comprar livros, diz que sim, e admite que possam ter sido uns 50 a pedido de AA, mas gradualmente. Acrescenta que seriam ofertas que ele quisesse fazer. Questionado se recebia dinheiro de BB diz que não, que o dinheiro que recebia era de AA.  Questionado se fazia pagamentos de viagens (…) acrescenta que pagava à agência através de dinheiro que AA lhe fazia chegar. Confrontado com o valor de 40 mil euros que lhe foram depositados na sua conta e que foram usados para pagar despesas de funeral e médicas, UU diz que esse dinheiro saiu todo e ficou tudo discriminado e justificado a AA (…) Acrescenta que tinha que efectuar esses pagamentos que era o que o mandaram fazer, que a proveniência não sabia.--------------(…) Confrontado com uma intercepção telefónica onde UU usou a expressão “mala cheia da guita”, UU diz que mala foi uma forma de dizer porque ele não tem dinheiro um dia antes e no outro dia aparece com dinheiro, que ele não dá valor ao dinheiro, que o dinheiro que gasta, não tem noção dos gastos que eventualmente tem e que lhe custa ele ter esses gastos, mas que mala de dinheiro nunca viu nenhuma. Questionado sobre quem era “o outro” que dizia que tinha lá estado, responde que era o amigo dele, BB. Mas não viu dinheiro, não vi mala, não vi rigorosamente nada nesse aspecto.
Diz que AA não se desloca ao multibanco e para num dia não ter dinheiro e no outro já ter, presumiu que fosse BB a levar-lhe.
Confrontado com uma conversa em que UU diz que vai trocar a nota e AA lhe pede para não falar nisso ao telefone, UU explica que foi levar 500€ à mãe de AA para ela ir ao cabeleireiro, que não tinha troco e então foi meter combustível para trocar a nota. Questionado se é costume nesses anos lá ir levar dinheiro, diz que não, às vezes vai lá levar é um “envelopezinho”, mas não sabe o que tem dentro. Diz que é um funcionário e se limita a cumprir ordens.
Confrontado com documentos referentes à sua conta na CGD, nomeadamente cheques emitidos, como é o exemplo de um emitido à EMP44... no montante de 27.315,73 euros de 18/10/2011 seguido de outros, UU diz que daqueles 40 mil saiu tudo. Diz que o cheque para a EMP44... foi para pagar o funeral do irmão de AA. Em relação ao cheque de 9.800,00, diz que foi para a ..., diz que não sabe o que se tratava, mas eram umas despesas relacionadas com o funeral, do encaminhar ao hospital....Diz que AA depositava-lhe o dinheiro e depois UU fazia o pagamento das despesas. Questionado sobre se não era mais fácil AA passar os cheques directamente, UU diz que acha que ele não tem cheques.
Diz que não pode dizer se o dinheiro depositado na conta era de BB, só sabe que entrou para fazer o pagamento das despesas. (…)
Confrontado com o facto de receber dinheiro na conta e de fazer pagamentos a seguir, e questionado se é rendimento e se não o declarou às Finanças, UU diz que não o declarou porque não usufruiu dele, que nunca o usou para fins pessoais.
Questionado se então recebia na conta dinheiro e não sabia de quem, UU diz que se tentou salvaguardar tirando cópia de alguns documentos, alguns dos quais apreendidos, como cópias de facturas para comprovar que esse dinheiro entrou na conta, mas que não ficou na sua posse. Acrescenta que foi para fazer pagamentos que o patrão precisava e lhe mandava. – (…)
UU confrontado com o facto de no dia 10 de Maio de 2012, receber o cheque de 15.000,00€ emitido por BB que já lhe tinha sido mostrado e a seguir emite um cheque em 14 de Maio, no mesmo valor, que se apresenta creditado na conta da CGD de AA, diz não querer prestar declarações sobre isso por não se lembrar. --------
(…) Confrontado com o facto de quem tratar da papelada ser alguém dos escritórios de BB, UU diz que desconhecia isso. Só agora que fizeram um contrato novo e que há um senhor que está a tomar conta disso. Achava que era um contabilista, mas não sabia que era da parte de BB. Questionado sobre quem lhe entregava as declarações anuais para efeitos de IRS, UU diz que era AA que lhe entregava num envelope, mas que não sabe quem fazia a declaração.
(…) Sobre se este procedimento de ficar com numerário para as despesas do dia-a-dia do Eng.o AA foi acordado entre eles, ou seja, se o Eng.o AA lhe disse que não queria saber dessas coisas do dia-a-dia, “pagas tu e a gente acerta contas”, UU diz que não era “pagas tu” porque ele tinha que lhe dar dinheiro para pagar pois não ia dispor do seu próprio dinheiro. Chegou a adiantar dinheiro, do ordenado mensal, para pagar por exemplo algumas refeições, enquanto ele possivelmente não tinha e não lhe dava fundo de maneiro e depois quando ele lhe dava, retirava o que tinha adiantado. Exemplifica com duas refeições, um almoço e um jantar, que são 100 euros, 120 ou 140 euros em que UU dispunha do próprio dinheiro e que para o Eng.o AA podia não ser nada mas para UU era muito dinheiro.
UU refere que fazia o controlo das despesas, inclusivamente o dinheiro que ficava de fundo de maneio e apresentava sempre os talões de despesas. Se tinha, por exemplo, trezentos euros de fundo de maneio, juntava os talões todos para perfazer os trezentos euros e mostrava-lhe, dizendo que precisava outra vez de dinheiro para as despesas. (…) pensava que o Dr. BB era contabilista e que a sua relação com BB se baseava num bom dia e boa tarde; ele era o amigo do Eng.o AA e UU, que ficava no hall da entrada da casa do Eng.o, quando o senhor BB passava para ir visitar o senhor Eng.o dizia “bom dia senhor BB” “boa tarde senhor BB”. Acrescenta que desde que começou a trabalhar lá, o senhor BB era frequentador da casa do Eng.o AA; ele era amigo dele e ia lá várias vezes.
O patrão pedia-lhe para fazer pagamentos e UU nunca contestou, achou normal, ainda para mais vindo daquela pessoa que era um ex-primeiro-ministro. Quanto ao facto do Eng.o AA ter dinheiro, refere que a própria mãe do Eng.o AA lhe dizia que eles tinham dinheiro de família e nunca achou nada do outro mundo ele lhe dar dinheiro para pagar as coisas dele. Refere que o Eng.o AA tinha pagamentos que iam directos à conta dele e quanto a estes apenas tem arquivado. (….) refere que nunca o questionou, limitou-se a obedecer; acrescenta que nem dava para questionar pois o Eng.o AA não era uma pessoa de fácil acesso nem de bom trato. Esse contacto com a senhora da ... terá ocorrido num primeiro pagamento que lá foi fazer e ficou a conhecer a gestora de contas das viagens dele, que se chamava D. GGGG. Chegou a ficar com o contacto e ela com o dele, tanto que ela telefonava a UU; chegou a um ponto em que disse à D. GGGG para ela ligar directamente para o senhor Eng.o a pedir dinheiro para pagar à agência de viagens. Refere que ele viajava muito e quando foi para ... todos os fins-de-semana estava cá (era ele, os filhos, a ex-mulher que ia lá estar lá com ele); em meia dúzia de viagens esgotava aquele plafond que eles estipulavam e a D. GGGG telefonava a UU a pedir para UU ver com o Eng.o AA determinado pagamento, UU avisava o Eng.o AA e ele dizia que ia tratar disso. Por fim ela já não lhe ligava, porque UU lhe dizia para ela ligar directamente, pois era-lhe extremamente difícil pedir o dinheiro ao Eng.o AA pois ele começava a ralhar; já quando era para os gastos dele era muito difícil ele dar-lhe o dinheiro porque o Eng.o AA não é de bom trato.
Perguntado se desde Novembro de 2011, quando ocorre o primeiro pagamento,  todos os pagamentos à ... foram feitos através da conta de UU, UU refere  . que possivelmente durante bastante tempo. Questionado se tem consciência que muitos pagamentos foram feitos pelo Eng.o AA que fazia a transferência para a ..., UU refere que agora até acredita que fizesse, mas inicialmente e durante bastante tempo era UU que fazia com os próprios cheques.
Refere que acontecia o mesmo com o condomínio do edifício. Havia despesas que era UU que tinha que as pagar e que estava encarregue de lembrar que o Eng.o AA tinha que pagar e o condomínio era outra delas. O condomínio enviava a carta com um ou dois meses para pagar e quando UU visse que estava a chegar ao fim do prazo, avisava o Eng.o AA. Juntava várias coisas (por exemplo, o condomínio, um conjunto de pneus, como foi agora por fim) e dizia ao Eng.o AA que precisava de determinado montante para pagar essas despesas, sendo que o Eng.o AA lhe dizia que ia tratar disso, dizendo-lhe depois que tinha feito a transferência ou então, eventualmente, dava-me dinheiro para UU depois depositar e fazer esses pagamentos.
Quanto ao pagamento do condomínio refere que era feito directamente por ele; UU ia directo à administração do condomínio, na Av.a da República, passava lá o cheque e eles emitiam-lhe o recibo de pagamento, que era o comprovativo de que tinha feito o pagamento e que era arquivado naquelas pastas que foram apreendidas.
Quanto ao pagamento do montante de 3.300 euros de condomínio em Março de 2012 e que nas vésperas disso há uma entrada em dinheiro de 3.500 euros, ocorrendo outras situações idênticas, é-lhe perguntado quem lhe entregava o dinheiro, tendo UU referido que seria numerário que o Eng.o AA lhe dava. É-lhe dito que isto foi depositado em numerário, na sua conta, tendo UU dito que não sabe precisar se depositou. Sendo-lhe descrita a situação de um depósito em numerário na sua conta ocorrido em 21 de Março de 2012 de 3.500 euros e que no dia 26 de Março, ou seja, cinco dias depois, há um débito de um cheque do Edifício ..., Condomínio ... de 2.126 euros e há outro débito de outro cheque de 1.263 euros (o que dá um total de 3.389 euros) e perguntado neste caso em concreto ou noutros que acontecesse a mesma situação, quem é que lhe dava o dinheiro, UU refere que era o Eng.o AA é que lhe dava o dinheiro, em notas, para fazer o depósito. UU admite que fazia depósitos em numerário na sua conta e depois pagava com um cheque dos dele.
Sendo-lhe colocado outro exemplo de, em Maio de 2012, ter havido um depósito de 7.500 euros e, no mesmo dia ter ocorrido o pagamento de guias do Tribunal, no montante de 7.344 euros, UU refere que teve que pagar as custas de tribunal relativas a um processo do Eng.o AA, mas não sabe qual era o processo. Refere que não tem ideia de ter feito um depósito desse valor. Sendo-lhe apresentado um documento, confirma que a assinatura é dele (UU). Confirma que nesse mesmo dia pagou umas guias do Tribunal e que o dinheiro que foi depositado lhe foi dado pelo Eng.o AA para UU depositar e fazer o pagamento, para não ir lá com 7.500 euros; deu-lhe isso para fazer dessa forma. ------
Refere que nunca recebeu dinheiro que depositou em numerário directamente do BB. Acrescenta que não recebia dinheiro, recebia envelopes de BB. Questionado se UU sabia, ao receber esses envelopes, que eles tinham notas, UU refere que não, que qualquer envelope que recebesse ia ao Eng.o AA; mesmo quando ele estava em ... ele andava cá e lá e não se recorda de alguma situação de o Eng.o AA estar ausente, haver uma data limite para fazer um pagamento e ele lhe dizer para ir buscar, abrir o envelope, depositar e fazer os pagamentos. Ele estava cá sistematicamente, pelo que não está a ver maneira de ele fazer isso.
Recorda-se de a seguir a essa data ter ido a um tribunal pagar umas custas e de ter passado um cheque. Não sabe se era esse valor e se terá sido em dois cheques. É-lhe dito que é no valor de 7.344 euros e que, logo no dia a seguir há um depósito da mesma quantia e confrontado com um documento refere que repara na data e repara que não foi ele, UU, que depositou; acrescenta que se entrou lá, possivelmente entrou para fazer algum pagamento que ele lhe pediu para fazer, que não sabe precisar qual foi. Refere que passou o cheque com o qual foi confrontado e que não tinha acesso a saber quem fazia depósitos; sabe que o dinheiro aparecia lá, o Eng.o AA dizia que lhe ia fazer uma transferência para a conta, UU via lá o dinheiro, tinha o pagamento para fazer e efectuava o pagamento
Sobre a possibilidade de o Eng.o AA lhe ter dito que não tinha dinheiro na conta ou que precisava de pagar por cheque mas não tinha cheques e tenha pedido a UU para lhe passar um cheque porque ele recebeu dinheiro na conta e o UU ter lhe ter entregue um cheque, UU refere que não se lembra mas possivelmente até podia se ter dado o caso de ter feito se calhar uma transferência até para a conta dele, ter entrado na conta de UU e UU transferir para a conta do Eng.o AA. Refere que nunca emitiu cheques ao Eng.o AA que os cheques que UU emitia eram entregues às respectivas contabilidades. Sobre se levou um cheque dos dele à gestora de conta de AA na Caixa Geral de Depósitos, UU diz que isso nunca aconteceu. Admite ter feito uma transferência daquelas que são feitas até no Multibanco da sua conta para a conta do Eng.o. AA mas não sabe precisar em que circunstâncias é que isso sucedeu e refere que não foi um empréstimo, que o Eng.o AA nunca lhe pediu dinheiro emprestado. Pode ter acontecido ter entrado dinheiro na conta de UU e UU ter transferido para a conta dele; mas se aconteceu terá sido uma vez.
Sobre se o Eng.o AA tinha dificuldades em lidar no multibanco, de não conseguir fazer transferências por multibanco conta a conta, UU refere que não sabe se ele tinha dificuldades porque o Eng.o AA não se dirigia a multibancos; pensa que o cartão que ele tinha fosse só para pagar algumas estadias onde ele estivesse ou refeições.
Lembra-se de lhe ter tentado explicar como se faziam transferências, conta a conta, no multibanco, relativamente ao primeiro ordenado, do mês de Setembro, porque UU estava aflito (refere que organizava dinheiro de maneira a dar até ao outro mês, porque não iria receber mais nada; tinha o dinheiro todo calculado até Agosto, pensando que em Agosto ele lhe fosse pagar outra vez o ano todo, quando isso não aconteceu; logo no primeiro mês que ele paga mensalmente atrasou-se com o pagamento e UU não tinha dinheiro na conta). UU refere que lhe pediu para ele lhe transferir o ordenado por multibanco mas ele nem sequer foi lá, falou para o boneco.
Sobre se se recorda de ter feito em 29 de Maio de 2014 um depósito em numerário no montante de 1.220 euros e de em 30 de Maio de 2014 ter feito um pagamento na EMP45... refere que a EMP45... é a EMP46...; o ... é do senhor Eng.o e pagou, como sempre, uma despesa do senhor Eng.o; quem lhe deu o dinheiro foi o Eng.o AA mas não sabe se depositou ou se pagou em dinheiro. Admite que tenha depositado este montante de 1.220 euros e que normalmente era o que se pagava mais ou menos da revisão do carro. -----
Sendo-lhe dito que em Junho de 2014, na conta bancária de UU há um débito de um cheque que UU passou à EMP47..., de 6.050 euros, UU refere que se recorda desta situação, passou um cheque, foi lá levar à EMP47... e trouxe o respectivo recibo de pagamento para apresentar ao Eng.o. Refere que a despesa era do Eng.o AA. Acha que ele lhe deu o dinheiro em numerário para UU fazer o depósito e depois pagar à EMP47..., para não ir com aquele dinheiro todo. Refere que o Eng.o AA lhe disse “para não ires com este dinheiro todo, depositas”. Sendo-lhe dito que na conta de UU ocorrem três depósitos em numerário (três dias antes tem um depósito de 3.000 euros, no dia seguinte, 2.500 euros e depois no mesmo dia 550 euros), que perfazem o montante de 6.050 euros e que estes depósitos correspondem a este pagamento por cheque emitido à EMP47..., UU refere que sim e que se trata de dinheiro que o Eng.o AA lhe entregou. Confrontado com um documento refere que se trata do cheque que emitiu à EMP47....
Confrontado com dois depósitos efectuados no mesmo dia na conta de UU ocorridos a 8 de Julho de 2014, em numerário, nos montantes de 600 euros e 1400 euros, tendo depois ocorrido nesse mesmo dia uma transferência para a conta do senhor AA de 2.000 euros, UU refere que não se lembra; até pode ter acontecido mas não se lembra dessa situação em concreto. Refere que se há transferência da conta dele para o AA possivelmente foi UU mas não sabe precisar se foi nesse dia ou quando é que foi pois são muitos movimentos. Não era normal passar dinheiro para a conta do Eng.o AA, o normal era ele passar para a conta de UU. Não se recorda desta situação e nem tinha que saber pois, no limite tinha que fazer o que o Eng.o AA lhe dizia.
É-lhe dito que isto ocorreu no dia em que UU foi levar o Eng.o AA ao aeroporto para ele ir para ... com a senhora FFFF, tendo UU referido que sabia que ele foi apanhar o avião mas nem sabia para onde é que ele ia. Não está a conseguir identificar isso, apesar de ser recente; ele teve várias saídas com a Dra. FFFF mas não se lembra (sendo-lhe dito que esta foi a última, que foram quinze dias que UU teve de férias extra, UU disse que tinha cá a mãe, tinha os filhos e tinha a ex-mulher). UU refere que possivelmente aconteceu (a transferência) mas não tem ideia de ter feito isso. Sobre se não há mais ninguém autorizado a movimentar a sua conta a débito, UU refere que não.
Sobre situações em que o senhor UU ia à Caixa Geral de Depósitos e fazia levantamentos de dinheiro sobre a sua conta, como por exemplo no montante de 2.980 euros, conforme documento com o qual é confrontado e que isso não teria que ver com a sua gestão do dia-a-dia, do seu dinheiro, mas seria por conta do senhor Eng.o, UU refere que possivelmente e acrescenta que não tem despesas desse valor. Sobre o que é que se seguia a levantamentos desse tipo, se entregava quantias em dinheiro ao Eng.o AA ou se ficava com isso no tal argent de poche, UU refere que até chegou a ficar, contra vontade, pois nem gostava de andar com este dinheiro assim no bolso, mas nunca sabia o que é que ele ia gastar naquele dia; inicialmente aconteceu de andar com 2 mil euros ou 2.500 euros no bolso; ficava receoso de andar com aquele dinheiro mas também ficava receoso de o Eng.o AA saber que ele tinha 2.500 e que se precisasse dos 2.500 ele não os tinha com ele, pelo que chegou a andar com 2.500 euros no bolso.
Sobre se quando o Eng.o AA o mandava comprar uma coisa qualquer (por exemplos uns computadores, uns livros, uma coisa qualquer) se ele dava alguma instrução para pagar necessariamente aquilo a dinheiro, UU refere que não. Questionado se, por exemplo, o mandasse comprar um computador, se UU já tinha o dinheiro previamente provisionado na sua conta para o comprar, porque é que o UU não chegava lá e pagava com o seu multibanco, pagava a numerário, levantava primeiro numerário e depois chegava lá e pagava numerário, UU refere que nunca foi pessoa de ter muito dinheiro mas nunca teve a conta a zeros. Se entrava por exemplo 5 mil euros do senhor Eng.o e ia gastar 4.800, UU levantava os 200 euros que sobravam para não estar misturado com o dinheiro dele e ficaria com ele em numerário, para os gastos dele. Levantava-o gradualmente, nem que fosse 200 ou 300 euros de cada vez, ou seja, fazia vários levantamentos até ter conseguido ter aquele dinheiro fora da conta; aquele dinheiro era dele, era para gastar com as coisas dele e não queria misturas.
Quanto a outras operações em que são recebidos dinheiros na conta e da gestão que UU fazia dos dinheiros que lhe eram entregues pelo Eng.o AA, UU refere que esses levantamentos injustificados seriam o seu fundo de caixa que ficaria com ele e confirma que tinha consciência que esse dinheiro não pertencia a si mas ao Eng.o AA.
Refere que chegou a andar com dinheiro dele num bolso e com o dinheiro do Eng.o AA no outro bolso para não misturar.
Quanto à questão das recolhas de dinheiro que o senhor UU fazia e sobre se tem ideia de quando é que isso começou a acontecer, ou seja, quando é que foi a primeira vez que lhe pediram para se deslocar a algum lado, ao tal senhor que UU disse que julgava que era contabilista, que era o BB e foi lá buscar um envelope, UU refere que só fez recolha de envelopes e que nunca fez recolha de dinheiros. Não tinha noção de que aquilo que lá estava era dinheiro; aquilo vinha agrafado. Confirma que se apercebeu várias vezes de que o Eng.o AA estava com dificuldades, que depois aparecia o envelope do senhor BB e, de repente, ele pedia-lhe para fazer outras entregas a outras pessoas.
Perguntado se não deduziu por várias vezes que o homem ia lá fazer entregas de dinheiro e que a partir do momento em que ele aparecia o envelope do BB, aparecia dinheiro, UU refere que presumiu que assim fosse, mas não sabe se era dinheiro que estava lá; o que é certo é que quando aparecia o BB (não quer dizer que era sempre, pois o BB ia imensas vezes à casa dele e não era sempre isso que ele fazia), UU chegava a estar à espera dois ou três dias de fundo de maneio (refere que precisava de estar lá dois ou três dias a dizer que precisava de dinheiro para as despesas)  depois ele chamava- o lá acima, e que era porque já tinha chegado dinheiro. Sobre se isso coincidia ou era depois de uma dessas idas do BB lá, UU refere que sim.
Sobre se a primeira vez que foi buscar um envelope desses ao BB foi ainda em 2011, antes de ele começar a ir para ..., UU refere que não consegue precisar se foi logo no início. Não terá sido antes do Eng.o AA ter ido para ... porque aí estava cá o Eng.o e o BB poderia ir à casa dele quando quisesse. Sendo-lhe perguntado se isso aconteceu em 2011 antes de ele ir para ..., que ele foi para ... estudar em princípios de 2012, ou seja, se, pelo menos nesse período de Agosto a Dezembro de 2011 (em que já se falou ter havido pagamentos da conta de UU) se também foi lá ter com o senhor BB buscar envelopes, UU refere que não tem ideia nenhuma, que não consegue precisar. Durante o período em que ele esteve em ..., também não se justificava UU ir lá porque o Eng.o AA nem sequer estava cá. Admite que foi lá buscar, mas não consegue identificar as datas.
Refere que nunca foi buscar envelopes ao BB para entregar à mãe do Eng.o AA. Ia buscar envelope dentro de uma pasta fininha mas de cartão grosso, que UU não tinha acesso, e que se tratava de um envelope agrafado, que entregava ao Eng.o; depois do Eng.o é que podia meter dentro de um envelope e mandar entregar à mãe. Chegava à mãe do Eng.o em envelopes mais pequenos, que estavam fechados. (….)
Questionado se o Eng.o AA nunca abria os envelopes que UU trazia de BB à sua frente, UU refere que nunca. Sobre o facto de ele receber o envelope, mandar descer UU e pouco depois voltava a chamá-lo, UU refere que não quer dizer que fosse pouco depois, que às vezes podia ser no outro dia. Havia situações que o Eng.o AA o chamava, nem que fosse ao fim da tarde e havia situações que chamava no outro dia. Questionado se quando o chamava outra vez era para fazer entregas de dinheiro ou de outros envelopes, UU refere que era para fazer entregas de envelopes e que ele dizia “UU está aqui este envelope fechado” para levar a determinada pessoa; UU chegava lá ou telefonava para a pessoa a perguntar se a pessoa estava e avisando que estava lá a passar para entregar um documento; levava o envelope sempre fechado.
Sobre se, por exemplo, não tinha noção, mesmo pelas conversas que tinha com a MMMM, que aquilo era o complemento de vencimento da MMMM, UU refere que o complemento de vencimento da MMMM sabia porque chegou a levar em dinheiro. A maior parte do pagamento da MMMM era dado em dinheiro. O Eng.o AA dava mil euros para entregar à MMMM, em dinheiro; umas vezes metia num envelope para não ir com aquilo na mão ou então o próprio UU tinha o cuidado de meter num envelope.
Pensa que MMMM tinha sido secretária dele durante muito tempo; sabia que era dinheiro porque ele lhe dava em dinheiro e refere que ela estava sempre a pedir a UU para pedir ao Eng.o AA. Quanto aos locais onde fazia a recolha dos envelopes ao senhor BB, UU refere que não se lembra de ter ido ao ... mas possivelmente foi lá; se BB estivesse lá era lá que ia. Refere que chegou a ir ter com BB a um restaurante em ... e ele veio à porta entregar-lhe. Acrescenta ainda que foi a um largo, que pensa que será ao pé do escritório (que desconhece que o escritório dele seja ali); esse largo fica perto da casa do Sr. BB (quem sai no ..., passa em frente ao ..., é obrigado a vir cá abaixo àquela rotunda, porque precisa de ir para o lado esquerdo, dá a volta e vira-se logo ali na primeira à direita, volta na primeira à esquerda e no fundo tem um largo); é-lhe dito que é precisamente o largo em frente ao escritório do senhor Eng.° BB; UU refere que ia aí, esperava, ele vinha ter com ele, dava-lhe o envelope e UU vinha-se embora para o senhor Eng.o. Refere que chegou a ir às ..., que eles chamam ....
Chegou a receber da D. TT no mesmo sítio e também do Dr. LL no mesmo sítio (refere que nem sabia quem era o senhor LL). Questionado se não se recorda se um senhor NN, UU refere que não; sendo-lhe dito que se chama NN, UU diz que não conhece; questionado se não teve essa pessoa a entregar-lhe, além do LL e da TT e que terá acontecido uma única vez, UU refere que não sabe quem é. Sobre se não houve uma pessoa além do LL e da TT, uma outra terceira pessoa que UU nem saiba o nome, UU refere que não; é-lhe dito que UU ligou para ele, combinaram e foi lá recolher, UU refere que não se recorda.
Questionado se no Natal do ano passado adquiriu quatro IPhones, UU refere que sim, a pedido do Eng.o AA, que lhe deu dinheiro para os comprar. Sendo-lhe dito que numa intercepção telefónica do dia 23 de Dezembro de 2013 UU diz ao filho que lhe ia ligar para saber o preço dos IPhones 5, que tem que ir comprar três ou quatro, mas agora já sabe, que o filho diz que parece que estão a falar de pares de meias, que UU diz que ele quer comprar, que deve ser um para cada filho, um para a ex-mulher e que teve que ir às ... buscar a “guita” e agora se enfiou na segunda circular, que está em trânsito, mas está para ir para casa, UU diz que se lembra perfeitamente dessa ocasião, que também ficou surpreendido em ir comprar esses telefone, mas que ele lhe deu o dinheiro pessoalmente, em casa dele. Refere que “guita” é o dinheiro que ele lhe deu para comprar os telefones. Perguntado se foi às ... buscar a “guita”, UU diz .que não foi; sobre se o Eng.o AA estava nas ... para entregar a “guita”, UU refere que nem ele estava lá nem UU foi lá buscar guitas nenhumas. Questionado se foi lá buscar um envelope e a seguir aparece a “guita”, UU diz que sim; sobre se foi às ... buscar o envelope tendo-o entregue ao Eng.o AA, UU refere que não se lembra de ter ido lá buscar dinheiro e que se ele lhe dá dinheiro para ir comprar os telefones é porque já teria dinheiro; quando é que foi lá não sabe. --
Sendo-lhe dito que esta chamada com o filho é às 17:21 de 23 de Dezembro de 2013 e que às 17:08 (quinze minutos antes), BB ligou a UU que lhe diz que não chegou porque está muito trânsito, que ainda está em ..., que deve demorar mais quinze minutos, tendo BB pedido a UU para ir ter com ele ao Hotel ... para ser rápido, tendo UU dito que ia ter às ... que são mais dez minutos; é-lhe dito que quinze minutos antes UU diz que vai ter às ... para ir ter com o senhor BB e quinze minutos depois fala com o seu filho a dizer que foi à ... buscar a “guita” para ir comprar os Iphones, UU refere que presumia que era dinheiro devido ao facto de lhe aparecer dinheiro depois, mas de resto fazia ideia que aquilo era dinheiro. Sendo-lhe dito que assume em várias conversas, tendo algumas algum exagero da parte de UU que fala em “que foi lá deixar uma malas com dinheiro”, que embora não visse tinha a noção que aquilo era dinheiro, apesar de estar num envelope, mas por várias coisas que aconteciam de seguida, como a disponibilidade para pagar a várias pessoas e a UU, UU refere que foi só por essa razão. (…)-
Quanto à ligação entre esse LL e o BB refere que era empregado de BB; refere que não sabia que era advogado, pensava que era empregado do senhor BB, que foi assim que lhe transmitiram. Acrescenta que quanto disse ao senhor Eng.o que precisava de um recibo ele disse para deixar estar que falava com o BB e depois o BB disse para ir ter com um empregado dele; deu-lhe o contacto do empregado dele ou foi o empregado dele que ligou a UU.
UU diz que não, que  isso era relativo, que muitas vezes estava a ir para casa e tinha que voltar para trás porque o Eng.o lembrava-se que precisava de um maço de tabaco. (…)
UU refere que houve alturas em que estava a necessitar de dinheiro para as coisas dele, de estar dois dias à espera e ele não lhe dar ou dizer que não tinha e depois de uma chegada do Dr. BB lá a casa, ele lhe dar, pelo que deduziu que fosse dinheiro. Agora, aquilo que transportava eram envelopes A4s, dentro de uma capa encartonada, que não tinha forma. Refere que não ia escarafunchar. Sendo-lhe dito que às vezes basta apalpação por fora do envelope para perceber que são notas UU refere que não ia fazer isso pois .havia “montes de sigilos ali” e nem tinha nada que estar a desconfiar do que é que andava a transportar.
Perguntado o que significa a frase que disse nessa conversa de “que é dinheiro escondido, vem do esconderijo, não é de um Banco”, UU diz que são conversas de treta, que é sinal que o homem gastava muito dinheiro e que de repente aparecia dinheiro na mão dele. Sobre se não era de um Banco, UU refere que pelos vistos não pois se ele não se dirigia a um Banco não era o Banco que se dirigia a ele!
É-lhe ainda dito que numa conversa telefónica do dia 28 de Julho de 2014, UU diz que não sabe se vai levar AA ao ... naquele dia, que ele está em casa com o tipo que lhe costuma trazer o dinheiro e não sai de lá, e perguntado quem é o tipo que costuma trazer dinheiro que estava nessa tarde lá, UU refere que deduzia que fosse o BB. Refere que disse “costuma” porque chegou a essa conclusão devido ao dinheiro que era entregue a UU para as despesas, mas nunca viu.
Refere que o Eng.o AA era um homem que se dizia cheio de dinheiro, que a mãe dele era possuidora de uma fortuna, pelo que nada havia de suspeito.
Sobre se conhece a mãe de AA e de ele ter fortuna, UU diz que conhece e que ela própria lhe dizia que sim, que vendeu muitas casas e os pais ganharam muito dinheiro. Eram desabafos que a D. YYY tinha quando iam para ..., onde iam muitas vezes; ela dizia que tinha vendido imóveis e que tinha uma herança.
Questionado porque é que então aparece BB a trazer dinheiro ou se era a mãe que trazia dinheiro, UU refere esse BB para já era a pessoa que estava lá sempre em casa, e quando, de um momento para o outro, quando o Eng.o AA não tem, aparece dinheiro para as minhas despesas pensa que fosse ele que lhe desse o dinheiro. Refere que pensava que BB fosse o contabilista do Eng.o ou melhor, não pensava que ele fosse contabilista do Eng.o, pensava que fosse contabilista e só sabia que o Sr. BB era amigo do Eng.o; deduziu que a profissão dele fosse  contabilista. Sobre se BB poderia ter uma .relação profissional como contabilista com o Eng.o AA ou com a mãe do Eng.o AA ou com os dois refere que desconhece; sobre se deduziu que BB e o Eng.o AA trabalhavam juntos refere que nunca conciliou as duas coisas, que trabalhassem juntos ou qualquer coisa do género, só os conhecia como amigos de longa data, que iam almoçar, passar férias juntos. Refere que para ele essa era a relação deles, agora se eles tinham mais alguma coisa não sabe e o que veio a saber depois pelo jornal e foi uma surpresa saber que ele era Eng.o pois tratava-o por Dr.; pelo sim pelo não, tratava todos por Dr..
Quanto às entregas de dinheiro a terceiros, UU refere que eram entregas de envelopes. Quanto a MMMM confirma que era dinheiro e que era um complemento do vencimento. Questionado onde é que UU se dirigia para entregar os envelopes à MMMM, UU refere que ia à casa dela; refere que nunca lhe foi entregar ao Partido ..., chegou a ir lá ter com ela mas acha que foi mais por causa de livros que ela tinha lá de algumas pessoas de lá de dentro, que era para ele assinar que era mais acessível para ela e ela dava-os a UU. Confirma que levava à casa dela que era em ....
Refere que levava envelopes à D. NNNN e que os levava à casa dela que ficava na esquina da Artilharia 1; parava num semáforo que antes era a Rua .... Falava previamente com ela para saber se ela estava em casa, deslocava-se lá e ela ia ter com ele. Não passava da entrada daqueles prédios. Aliás UU nem saia do carro; telefonava, esperava no carro e ela ia ter com ele.
UU refere que entregar pessoalmente e sair do carro só mesmo à MMMM. As entregas à NNNN e à MMMM eram mais ou menos com a mesma frequência de uma vez por mês. -
Acrescenta que também entregava a uma senhora que conhecia por EEEEE, que morava na ... e era o mesmo sistema, ou seja, telefonava, ela dirigia-se cá abaixo, mesmo na Rua ..., UU estava dentro do carro, dava-lhe o envelope e vinha embora.
Não sabe se essa senhora será KKKK. Na altura não identificou essa pessoa, porque não tinha conhecido como KKKK; para ele só conhecia como EEEEE e estava identificada no telefone como “FFFFF” porque era o sítio onde ela morava. Pensa que era mais nova que a NNNN e os contactos dela foram-lhe dados pelo Eng.o AA.
Era o Eng.o AA que lhe dizia especificamente o destino a dar aos envelopes dizendo vai levar estes documentos à EEEEE, vai levar estes documentos à NNNN.
Sendo-lhe dito que a 6 de Agosto de 2014 UU ligou a EEEEE, às 14:28 tendo-lhe dito que estava com dificuldade em comunicação e perguntado onde é que a podia encontrar para lhe entregar “isto” e que EEEEE lhe disse que foi à praia, mas que já ia apanhar o autocarro para casa e que às 15:30 estaria lá, tendo UU terá dito que estava bem pois tinha um voo para apanhar e que mais tarde seria complicado. É-lhe ainda referido que UU, numa conversa ocorrida às 14:30 diz que vai agora do trabalho para férias e que ainda ia entregar “dinheiro a uma mula que está na praia” e que ainda tinha esperar pelas 15:30 e que depois ia embora. (…) Sobre se fez entregas a mais alguém, além destas três senhoras a MMMM, a NNNN e a EEEEE, UU refere que eram só essas pessoas. Acrescenta que chegou a entregar documentos também ou levar envelopes a outras pessoas, que às vezes ele tinha o comentário ao domingo, que ele gostava de falar do comentário com outras pessoas, saber a opinião de outras pessoas que lhe iam enviando por bilhetes para ele depois ler. Refere que os fixos seriam esses mensais. Chegou também a ir buscar envelopes que UU sabia que eram livros, porque depois de abertos estavam assinados e ele aí via que eram livros que era para ele assinar e devolver; quem abria os envelopes era o Eng.o AA.
Questionado sobre duas ou três entregas de envelopes feitas por TT, UU refere que foram pelo menos duas vezes, que se lembra mas não sabe quantas vezes foram. Sobre se alguma vez associa a essa circunstância dessa entrega de envelopes pela TT e o facto de Eng.o AA lhe dar dinheiro para UU depositar na própria conta, em numerário, UU refere que sim, que era o normal ele dar dinheiro para depositar na conta. Sobre o Eng.o AA lhe dava esse dinheiro logo a seguir a receber os envelopes, UU refere que não quer dizer que fosse a seguir, podia ser passado dois dias ou um dia, dependia da urgência que UU tivesse nos pagamentos que tinha para fazer; se o Eng.o AA lhe pedia para ir buscar o almoço e UU dizia que não tinha dinheiro e que não despendia do dele, ele aí tinha que eventualmente dar mais rápido e se recebesse eventualmente nesse dia daria nesse dia, senão dava-lhe quando ele entendesse; UU é que ia insistindo.
Questionado se algum desse dinheiro que lhe era dado era dado em notas de grande valor, UU refere que era um bocado de tudo; tirando notas muito pequenas era tudo à base de 100 euros e 50 euros. É-lhe dito que há algumas conversas em que UU fala das dificuldades de destrocar a nota e perguntado se de vez em quando apareciam notas de elevado valor, UU refere que nesse caso foi dinheiro que levou pessoalmente à mãe do Eng.o AA e que a senhora teve dificuldade em trocar o dinheiro, mas por norma não era assim. Refere que foi ele próprio trocar a nota e que esse aí ele deu-lhe mesmo em dinheiro para dar à mãe (três notas de 500); levou a senhora ao cabeleireiro só que o cabeleireiro não tinha troco. Refere que por norma não eram notas de 500, eram mais notas de 100 e de 50, raramente notas de 200, algumas notas de 20, 10 e de 5 praticamente não; notas de 200 e de 500 era mais esporádico. Relativamente ao pagamento de outras despesas de AA, designadamente por exemplo a aquisição do computador e perguntado se se lembra de como é que foi feita a aquisição e instalação do computador, UU refere que foi comprar o computador e mandou a pessoa lá a casa instalar. Foi-lhe dito para comprar um determinado computador e para ver quanto é que custava, o mesmo que tinha acontecido com os telefones; soube quanto é que era o computador, mandou vir o computador, instalaram e pagou logo à empresa. Foi a uma loja uma loja de rua da ... mas tiveram que encomendar porque não tinham aquilo em stock; encomendou e depois foram lá entregar. Sobre se arranjou alguém para lhe dar uma ajuda para instalar o computador, UU refere que as pessoas da loja tinham mesmo pessoas para instalar. Para efectuar o pagamento recebeu dinheiro e pagou em numerário. Quanto ao valor do computador refere que não sabe, que mil e tal; corrige dizendo que mil e tal euros foi o um computador portátil e que acha que o computador fixo foram dois mil seiscentos ou dois mil e setecentos euros; refere que lhe comprou um portátil e depois um fixo lá para casa.
Quanto à questão da compra do livro do Eng.o AA e questionado se ele lhe deu alguma indicação para comprar exemplares daquele livro, UU diz que comprou 50 a 60 exemplares daquele livro a pedido dele, que era para ele assinar e oferecer a amigos dele.
Sobre se fez as compras pessoalmente ou se alguém fez isso por UU, UU refere que foi pessoalmente às lojas. Afirma que a companheira, GGGGG, não fez compras do livro, mas UU usava o cartão dela para depois ter descontos nos livros por exemplo para o filho.
Quanto aos sítios onde foi comprar os livros refere que que foi à ... no ..., em ..., foi a uma ... num centro comercial, na ... que fica no ... (que era onde lhe comprava praticamente todos os livros de ... que ele lhe ia pedindo e que lhe ia enviando para lá), pensa que também comprou no ..., assim como no ...; no ... não tem ideia. Procurou e onde houvesse ia comprar.---
Sendo-lhe dito que foram 134 exemplares, UU refere que acha muito, que o que lhe foi pedido foi 60 livros. É-lhe dito que o cartão da GGGGG comprou 134 exemplares só na ... e UU confirma dizendo “se calhar”. Refere que, por exemplo, na garagem ainda tem lá uns 30 livros, que comprou e acabaram por ficar dentro do carro, depois chegou a um ponto que os tirou.
Perguntado se comprava os livros do seu bolso, UU refere que comprou em dinheiro e que era o Eng.o AA que lhe dava o dinheiro vivo para UU lhe ir comprar, dizendo “UU, vai-me comprar dez livros da minha edição”
Sendo-lhe dito que 134 livros a 17 euros são dois mil duzentos e tal euros, UU refere  que comprou bastantes livros e confirma que alguns ficaram esquecidos no carro.  Questionado se tem ideia se havia outras pessoas também a comprar livros ou se o Eng.o AA lhe perguntou se ele arranjava alguém que quisesse comprar, UU diz que não, que soubesse era só ele.
Sobre se UUUU era uma pessoa que também continuava a ir ali frequentemente a casa do Eng.o AA, UU refere que é amigo do Eng.o e acompanhava-o no lançamento do livro, esteve sempre presente. Questionado se o chegou a acompanhar e levar junto às instalações do BB refere que não, que desconhece que tenham algum tipo de relação e que nunca os viu a falar.
Questionado se no âmbito da sua actividade acompanhando o Eng.o AA alguma vez se deslocou com ele a umas instalações na ..., onde ele trabalhava, da tal EMP35..., refere que sim, que se deslocou mas não sabe precisar qual foi a primeira vez em que lá foi com ele; foi muito depois de ele vir de .... Não sabe precisar ao certo mas que ele deve ter estado um ano ou um ano e meio em ... e que terá lá ido no início de 2013 ou fim de 2012. Pensa que eram reuniões pontuais pois não ia lá diariamente; seriam pontuais e esperava depois por ele, cá em baixo na garagem enquanto ele estava lá em reunião. Sobre se chegou a ir lá com ele e com outras pessoas, designadamente com o BB, refere que não, que nunca o levou na viatura do senhor Eng.o nem nunca viu o senhor BB lá no escritório.
Refere que chegou a conhecer o motorista do administrador, que era o senhor HHHHH, porque ficavam os dois na garagem à espera que a reunião acabasse. Chegou a levar o Eng.o AA à Quinta ..., no ... e que acha que nessa altura já estavam a trabalhar juntos; terá levado lá o Eng.o AA duas vezes (lembra-se que foi porque ficou sem jantar até quase à uma da manhã e o Eng.o AA estava a jantar com o Dr.).
Sobre se conheceu uma senhora de nome LLLL, que é uma moça ainda nova que vivia na ..., UU refere que desconhece essa senhora completamente; nunca a viu, nem conhece e nunca contactou com essa pessoa.
Quanto a NNNN, refere que de vez em quando aparecia na casa do senhor Eng.o. Sobre se a NNNN nunca foi acompanhada por ninguém, das vezes que UU a viu, refere que não, que NNNN entrava sozinha, ficava lá um bocado e depois vinha-se embora; refere que até ficava lá a noite e depois ia-se embora. Sobre se a viu entrar acompanhada por alguém, UU refere que só conhece essa senhora NNNN.
Questionado se conheceu um senhor que está ligado à Câmara Municipal ... e que era também amigo do Eng.o AA, refere que ia lá muitas vezes, havia umas pessoas que não conhecia. Refere que deve ser o senhor BB que era uma pessoa muito atenciosa para com ele, que lhe perguntava se estava a correr bem no trabalho e para UU ter paciência pois o Eng.o tem um feitio difícil. Não têm muita aproximação só que ele foi mais atencioso com UU desde a altura do funeral do pai de AA, quando UU estava plantado e esquecido e ele foi perguntar ao Eng.o se UU podia ir jantar, etc. Desde aí ele diz para UU ter paciência e telefona a UU para saber como é que ele se estava a dar com o feitio do senhor Eng.o. Confirma que era o senhor XXXX e que ele lhe ligava para saber como estava o relacionamento, se estava a aguentar trabalhar com ele. (…)
Sendo-lhe dito que em 15 de Fevereiro de 2014 UU refere que “quando não recebem logo, recebem depois de saírem do Governo, que a maior parte vão cobrar favores que fizeram a multinacionais que favoreceram e vão para gestores de multinacionais sem perceber nada daquilo e sem lá pôr os pés; e que têm um ordenado dali, porque quando foram do Governo facilitaram “certas e determinadas coisas”, e perguntado, tendo em conta o comentário de UU, como é que obtém essa informação, UU refere que isso é público, que é um comentário com alguém a falar de uma coisa que é pública, que ao fim ao cabo é o que todos os políticos fazem e que não é sobre este político em questão; refere-se em geral ninguém governa ninguém vão-se governar para quando saírem. Refere que mesmo que não fosse uma conversa essa é a opinião sobre a classe política no geral. (…) Sendo-lhe dito que na busca efectuada à casa de UU tinha lá uma série de facturas de viagens, confirma que são facturas que pagou, seja porque foi entregar os meios de pagamento à agência de viagens, seja porque as pagou emitindo um cheque seu à agência.
UU refere que se tratam das facturas iniciais e sendo-lhe dito que são facturas de 2011, 2012, 2013, 2014 (sendo a última factura que estava na sua posse datada de 1 de Outubro de 2014), UU explica que começou a tirar essas cópias por causa da transferência dos 40 mil, para o caso de algum pagamento não bater certo ficava com um comprovativo de como pagou. Tirava fotocópias para se salvaguardar. Sendo-lhe dito que algumas são originais, UU refere que são fotocopiadas de originais, que tirava cópia e entregava as facturas ao Eng.o AA. Exemplifica que quando pagava o condomínio, eles emitiam-lhe um recibo e UU tinha cópia desse recibo que entregava ou arquivava e ficava com cópia para ele.
Sendo-lhe dito que a maior parte das viagens, ficava com os papéis na mão e perguntado se UU se apercebia que eram viagens não só do senhor Eng.o como também de familiares dele, o arguido refere que nesse caso via pois tinha acesso a essas facturas, uma vez que era ele que as pagava. O mesmo se passava com outro tipo de facturas que lhe competia a ele pagar, o que não estava em débito directo; ficava com elas e via. Acrescenta que tinha que fazer a soma para ver quanto é que havia e quanto é que lhe tinha que pedir.
Algumas eram dos filhos que andaram lá com ele e outras seriam da mulher. Admite que pode ter havido algumas facturas que também pagou e que não chegou a fotocopiar.
Sendo-lhe dito que UU tinha originais das facturas arquivadas, refere que são coisas diferentes, que pensava que se estavam a referir a uma pasta com cópias que ele tinha em casa. Acrescenta que é claro que tem tudo, por exemplo telefones, água, etc. Essas facturas vêm com dois meses de antecedência e UU tem arquivadas as facturas que são para pagar; depois de serem pagas, arquiva-as no sítio das facturas pagas. Tratam-se de avisos de pagamento ; se ele fazia a viagem, passados quinze dias ou um mês emitiam uma factura que .mandavam, UU abria a correspondência da ..., que estava encarregue de pagar ou de lhe dizer a ele que tinha de ser pago. A correspondência ia para a casa dele na ...; UU via, arquivava as que eram por pagar num sítio e arquivava as que estavam pagas noutro. À medida que iam caindo, UU fazia a soma e dizia ao Eng.o AA quais as facturas que estavam a vencer para pagar. Quando as facturas eram pagas, tirava as facturas que estavam pagas, juntava com recibo que a empresa lhe enviava e arquivavas na parte “pagas”. Confirma que os documentos com os quais é confrontado se tratam de originais que iam para o Eng.o AA, mas que estava incumbido de tratar desses pagamentos.
Mesmo as facturas que estavam a ser pagas por débito directo eram arquivadas e divididas  por UU; eram débitos directos dele, mas era correspondência que tinha que lhe dar e que arquivava nos dossiers que ficaram apreendidos; estava tudo arquivado e separado em micas (por exemplo, electricidade, água).
Confrontado com uma pasta e perguntado se era esse tipo de pastas a que se refere, UU refere que nesse caso essa pasta seria a pasta que teria com o que estava a pagamento, documentos do carro, tudo o que tivesse a ver com o carro e pagamentos do carro. As outras pastas seriam, por exemplo, na parte da ... o que já estava pago saia de um dossier e iria para outro relativo ao que já estava pago.
Confirma que a partir de uma determinada altura, até porque já não tinha dinheiro para pagar ou não tinha dinheiro para fazer estes pagamentos, mandava a D. GGGG da ... contactar directamente com o Sr. Eng.o. Antes D. GGGG falava com ele, ele dava o recado ao Eng.o AA que dizia que ia tratar, passado uma semana ela ligava outra vez a UU e cada vez que lhe tocava no assunto o Eng.o AA chegava a um ponto de gritava com ele a dizer “Está bem, eu vou tratar disso”. Já estava a ficar farto daquela situação pois já tinha que lhe pedir para as despesas diárias, pelo que pediu para a D. GGGG para pedir directamente com o Eng.o AA (assim como disse à MMMM para lhe pedir directamente a ele). A partir daí a D. GGGG deixou de entrar em contacto com UU e ela só entrava em contacto para o avisar a que horas é que ele chegava, pois houve uma vez ou outra que ele se esqueceu de o avisar quando vinha (chegou ao aeroporto e UU não estar presente); assim, para salvaguardar essa situação a D. GGGG ligava a UU só para lhe dizer o dia em que o Eng.o AA chegava ou o dia em que ele ia viajar porque ele fazia a marcação directamente com ela e às vezes até se esquecia de dizer a UU que só sabia só em cima da hora.  (……)
Refere que enquanto o Eng.o AA esteve em ... era motorista da mãe. Quem lhe dava as ordens era a D. YYY. Acrescenta que ele às vezes chegava-lhe a telefonar de ..., a dizer precisava de um livro, dizia o nome do livro e quando ele chegava (por exemplo na sexta-feira, porque ele normalmente vinha todas as semanas) na sexta-feira, UU já tinha um ou dois livros que ele lhe tinha pedido. Depois, de resto, estava a dar assistência à mãe. Nessa altura ela ainda não estava a viver em ...; depois o Eng.o AA pediu-lhe uma especial atenção quando a mãe foi para ... porque estaria mais longe dele.
Quanto ao motivo da saída da mãe do Eng.o AA dali, refere que não faz a mínima ideia. O que a senhora lhe dizia é que gostava mais de ... porque ela já lá tinha morado e que gostava mais dos ares de ... (ali era uma poluição, que não podia ter uma janela aberta, que ficavam os cortinados todos pretos); acrescenta que acha que ela já tinha tido lá Quanto às entregas de dinheiro ou envelopes, confirma que chegou a levar envelopes à ex-mulher do Eng.o AA; não era uma coisa de sistema, como seria as outras que era mensal, mas chegou a lá ir. Refere que eram envelopes que foi buscar ao Eng.o AA, era ele que lhe dava envelopes para entregar à MM. Questionado se era na mesma sequência, isto é, envelopes que ele lhe fazia para entregar, depois de receber o envelope do BB, UU refere que era depois ou no dia a seguir ou dois dias seguintes, mas vinha da mão dele Eng.o AA
Sobre se não teve a percepção de que até podia estar toda a gente desesperada à espera que chegasse o dinheiro e no dia que chegasse o envelope do senhor Eng.° BB a situação se resolvia, refere que UU teve uma “sangria” em Setembro, assim como  houve uma “sangria” da secretária porque atrasava-se sempre com os pagamentos. Sobre se isso não era desbloqueado quando chegavam envelopes, UU diz que não associa a isso. Uma vez por outra coincidiu  com o recolher do envelope do BB, mas não quer dizer que seja sistema. É-lhe dito que acontecia isso todos os meses, que eram as viagens, as necessidades do carro, a oficina que tinha uns pagamentos em atraso.
Sobre se chegou alguma vez a levar desses envelopes que foi recolhidos junto do BB ao senhor Eng.o AA, ao ..., ao empreendimento ... (...), UU refere que se o fez, não o fez só com o envelope, teria que ir lá fazer outra coisa qualquer e não sabe precisar se levava o envelope. Acrescenta que foi lá muitas vezes, pois as férias dele eram uma desgraçada, passava sistematicamente os dias a vir para cima e para baixo. Não consegue identificar que tenha levado um envelope lá para ele. Sobre se não se recorda de ir lá de propósito levar um envelope, UU refere que não. Sobre se não se recorda de uma ocasião em que levou o envelope para o ..., trouxe os tais envelopes para distribuir pelo caminho, e quando veio para cima, começou a distribui-los e como o primeiro que vem do ..., é ..., até foi logo primeiro levar um a ... e depois veio aqui a ... distribuir o resto, UU refere que não consegue precisar se isso aconteceu, mas possivelmente até poderia ter acontecido de o Eng.o AA lhe ter dado os envelopes e ter ido lá baixo mas eu não se lembro de tal situação. Admite a situação de sair da casa dele e fazer essas entregas, mas não tem ideia de ter vindo do ... e ter feito essas entregas. Acrescenta que seria normal, mas não se lembra.
Perguntado se não consegue associar situações em que tenha ido buscar o envelope ao BB e depois tenha ido para baixo, não só levando o envelope, foi para levar outras coisas, UU diz que não; sendo-lhe dado o exemplo de ter levado uns calções, UU refere que eram calções, ténis e que as férias dele eram a minha desgraça, passava o tempo a ir para baixo e para cima.
Sendo-lhe dito que UU fez uma viagem para o ... para levar uns calções ao senhor Eng.o e que nessa manhã, antes de ir levar os calções, passou no escritório do senhor BB e que foi ter com a senhora D. TT, é-lhe perguntado se era ela que tinha os calções tendo UU dito que não; questionado o que é que foi buscar à D. TT UU diz que não se lembra, sabe que foi à D. TT, não sabe se foi propriamente nesse dia que foi para o .... Sendo-lhe confirmado que foi no mesmo dia que foi para o ..., UU refere que chegou a ir buscar à D. TT, mas não sabe dizer se foi nesse dia que foi ao ...; refere que ele lhe pediu uns calções e umas t-shirts mas não se lembra de ter .levado um envelope. É-lhe dito  que à vinda para cima UU foi entregar dinheiro à MMMM, a ..., e UU refere que não sabe precisar; confirma que entregava dinheiro à MMMM (dinheiro ou envelope) mas não sabe precisar se quando veio do ... foi lá levar isso.
Sendo-lhe dito que foi no dia 5 de Junho de 2014, UU refere que não vai dizer que não é nesse dia mas não pode confirmar que é nesse dia. Assume que chegou a levar dinheiro à MMMM e envelopes à MMMM, mas não se lembra de ter ido ao ... levar um envelope, ter vindo para cima e distribuir envelopes. Sendo-lhe dito que é um desvio da rotina de UU, que em vez de fazer a distribuição aqui em ..., teve que ir lá a baixo ao ..., UU refere que seria normal fixar se fosse lá de propósito ao ... e levar um envelope que o BB lhe tinha dado ou que a não sei quantos lhe deu.
Refere que se lembra de ir ao ... levar uns calções mas não se lembra de ir buscar o envelope para levar juntamente com os calções; lembra-se de ter ido outras vezes buscar envelopes mas essa não se lembro de ter ido lá buscar.
Refere que o montante que entregava à MMMM era sempre 1.000 euros. Perguntado se foi sempre 1.000 euros desde 2011, durante o tempo que esteve a trabalhar para o Eng.o AA, UU refere que acha que diminuiu, que acha que ela inicialmente recebia mais algum dinheiro. Sobre se ela chegou a estar em exclusivo para o Eng.o AA,
UU diz que acha que não, que esteve em exclusivo quando ele trabalhava com ela; perguntado se esteve em exclusivo no período após a saída do Eng.o AA do governo,  Quanto ao ordenado de UU, UU confirma que quando o ordenado passou a ser pago por mês deixou de poder adiantar do próprio dinheiro, dinheiro para uma refeição, que o Eng.o AA depois lhe pagava. Quando ele lhe pagava anualmente, o Eng.o AA sabia que UU tinha dinheiro pelo que quando lhe ia buscar uma refeição e tinha acabado o plafond, UU pagava com dinheiro próprio; a determinada altura tinha que meter uma pausa naquilo e dizer que já não tinha dinheiro que era para ele lhe pagar esse dinheiro que UU já tinha adiantado, que era do seu ordenado. Agora com o ordenado mensal UU não poderia estar a pagar uma refeição de 40 ou 50 euros (que é a refeição dele, pois ele não come por 5 euros, sendo por 25 euros o mínimo) pelo que teve que deixar de o fazer e enfrentá-lo mais vezes, porque precisava do dinheiro para as coisas dele, que era o que lhe fazia ver.
Questionado se quando ia buscar as refeições ao “...” pagava ou se tinha avença, UU refere que pagava cada vez que ia lá. Sendo-lhe dito que a relação de UU com o Eng.o AA era uma espécie de amor-ódio, UU refere que amor não houve nenhum, que não tinha relações pessoais com ele porque ele era muito distante e durante o primeiro mês ele nem sequer sabia o nome dele. Era mais um dever e uma obrigação que eu tinha.
“Confrontado com uma intercepção telefónica onde UU usou a expressão “mala cheia da guita”, UU diz que mala foi uma forma de dizer porque ele não tem dinheiro um dia antes e no outro dia aparece com dinheiro, que ele não dá valor ao dinheiro, que o dinheiro que gasta, não tem noção dos gastos que eventualmente tem e que lhe custa ele ter esses gastos, mas que mala de dinheiro nunca viu nenhuma. Questionado sobre quem era “o outro” que dizia que tinha lá estado, responde que era o amigo dele, BB. Mas não viu dinheiro, não vi mala, não vi rigorosamente nada nesse aspecto.
Confrontado com documentos referentes à sua conta na CGD, nomeadamente cheques emitidos, como é o exemplo de um emitido à EMP44... no montante de 27.315,73 euros de 18/10/2011 seguido de outros, UU diz que daqueles 40 mil saiu tudo. Diz que o cheque para a EMP44... foi para pagar o funeral do irmão de AA. Em relação ao cheque de 9.800,00, diz que foi para a ..., diz que não sabe o que se tratava, mas eram umas despesas relacionadas com o funeral, do encaminhar ao hospital....Diz que AA depositava-lhe o dinheiro e depois UU fazia o pagamento das despesas. Questionado sobre se não era mais fácil AA passar os cheques directamente, UU diz que acha que ele não tem cheques. “-
As declarações do arguido UU que entendemos por bem transcrever, quase na sua integralidade,  são suficientemente esclarecedoras, não só para concluir relativamente à propriedade do dinheiro, mas também, para dar uma visão pormenorizada dos esquemas utilizados pelo arguido AA e pelo arguido BB como forma do primeiro ter acesso ao dinheiro que, formalmente, pertencia ao segundo.
Ouvindo as declarações do arguido UU e tendo todas as cautelas que implica usar, como prova, declarações de co-arguidos,  não se concebe  como, dali, possa ser retirada qualquer outra conclusão.
Aliás, e já avançando, note-se o cuidado do arguido AA em “apagar” o rasto do dinheiro que tem na sua origem a conta titulada por BB.
As despesas do arguido AA  são  pagas pelo arguido UU, com dinheiro entregue pelo primeiro, em mão, sendo que os pagamentos são, na grande maioria, igualmente efectuados em dinheiro.
As declarações prestadas pelo arguido AA negam todas estas, evidentes, conclusões.
O arguido tem uma postura em tribunal coincidente com a de alguém que conforma a sua vida segundo a sua própria vontade e visão.
O arguido faz um relato da sua vida desajustado da realidade.
Faz afirmações sem o mínimo de credibilidade, razoabilidade…. mas de um modo tal que parece colocar em causa a inteligência de quem o inquire.  Diz ter um conhecimento vago da actividade profissional e financeira de BB, apesar de ser amigo de infância dele.
Acrescenta que “o amigo é um homem de posses e ele é um pobre provinciano que andou na política durante uns anos”.
Relativamente às entregas de numerário, AA diz que este é o ponto em que tem mais dificuldade em responder a todos os pormenores, mas pode falar genericamente. Volta a referir a sua condição financeira de poucas posses. Diz que contesta que o BB lhe tenha entregado, através de outras pessoas, as quantias apresentadas, porque são exageradíssimas. Diz que é verdade, que o BB ,de onde em onde, lhe emprestava dinheiro, porque tem pouco, e sabe que ele é um homem de posses e de vez em quando pedia-lhe dinheiro. Questionado se lhe devolveu esse dinheiro, diz que ainda não devolveu nada, diz que sabe que tem para com ele uma divida que procurará pagar.
Perguntado se conseguia quantificar uma vez que estavam a falar de um milhão e meio de euros, que abatendo o valor que foi apreendido num cofre de LL, daria um milhão e cem mil euros, AA diz que esse valor é uma ficção.
AA diz que teve conversas pessoais com o Eng.o BB, que lhe deu conta das suas dificuldades, que as explicou, em que lhe disse como é que estava a pensar resolver no futuro o problema e lhe pediu ajuda. Dá como exemplo o facto de BB ter pago o funeral do seu irmão, mas diz que, como estava em ..., achou que era mais fácil assim, mas não foi com intenção de ocultar nada, senão não colocava o motorista a pagar
Voltando ao assunto UU e questionado sobre se alguma vez utilizou a conta deste para receber dinheiro do senhor BB e depois o UU fazer transferências para a sua conta para evitar que a esta recebesse directamente dinheiro de BB, AA diz que não foi para evitar nada, nem para ocultar nada. A maior parte das vezes isso destinou-se a ser mais eficiente, mais eficaz, mais rápido, como por exemplo, no caso do funeral do seu irmão.
Quando lhe é dito que isso não tem a ver com despesas, mas sim transferências, que BB emite um cheque que é depositado na conta do UU, o UU emite um cheque que é depositado na sua conta da CGD e que isso não tem rapidez nenhuma, AA diz que não se lembra desses casos. Questionado porque faz essa passagem, diz que alguma razão razoável haverá, mas não é com o intuito de ocultar nada. Confrontado com alguns documentos referentes à conta de UU, AA diz que a maior parte das vezes que pediu dinheiro ao BB e lhe que pediu para transferir para UU deveu-se a razões de maior eficiência porque o UU pagava-lhe muitas das contas e lamenta que isso lhe tenha causado um problema. Acrescenta que a intenção não era omitir coisa nenhuma.
As declarações do arguido BB têm um registo diferente.
Embora negando, sempre, que o dinheiro pertencesse ao arguido AA, o certo é que não se “esforça” muito para dar uma explicação plausível quanto às sucessivas entregas de dinheiro que efectuava.
Diz que os rendimentos que obteve provindos do Grupo Lena não tinham a ver com comissões, mas  com muito trabalho de engenharia, porque nos estádios fizeram projectos completos para poder fazer as propostas. Sobre se este ganho era em termos pessoais ou em termos de projectos feitos por estas suas sociedades, BB refere que era dele, em termos pessoais, da sua actividade. Sobre se estão facturados à LENA ou se são comissões pagas pela LENA fora desse tipo de facturação, o arguido refere que não serão comissões, são pagamentos; se calhar prémio seja o termo mais adequado; recebeu prémios e esses prémios foram parar à .... Estes prémios do Grupo LENA não ascendem aos 23 milhões de euros que foram repatriados. O bolo que estava na ... resultou do Grupo LENA na ordem dos 14 a 15 milhões e o resto resultou de outro negócio que fez. Sobre se não entregou fundos, a partir desta conta 407, destinados a suportar despesas do senhor engenheiro AA, refere que houve uma altura, em que entendeu que tinha condições financeiras para ajudar o Eng.o AA, devido à posição que o Eng. tinha tido e ia ter no futuro e pela relação de amizade que tinha com ele (está entre os dez melhores amigos), ajudá-lo a ter um estatuto, porque ele não tinha esses meios. BB refere que lhe sugeriu e entregou a título de empréstimo, algumas quantias; às vezes era BB que se oferecia para lhas entregar dizendo “Vê lá se precisas de alguma coisa” e às vezes era o Eng.o AA que solicitava. Refere que ele ainda não lhe devolveu nada.
Questionado se tem algum apontamento sobre esses empréstimos particulares que fez ao Eng.o AA, BB refere que tem uns apontamentos que vai tomando e rasgando; refere que a última vez que tinha isto estava na ordem dos 510 mil euros ou um pouco mais. Já destruiu esses apontamentos. Sobre o período em que ocorreram esses empréstimos refere que teve a conversa em 2012, depois de ele sair do governo. Sobre se facultar ao senhor engenheiro AA um padrão de vida melhor seria em razão de alguns contactos que ele lhe pudesse vir a disponibilizar no futuro refere que não, que era mesmo por amizade, porque achava que ele teria uma estatuto e queria-lhe proporcionar as condições para ele continuar a fazer a sua vida de diplomata e fazer face a alguns compromissos que sabia que ele tinha porque ele era seu amigo, designadamente, com a subsistência da mãe. Referindo que é um homem desprendido e com generosidade, conta a história de como vai ajudar o seu companheiro de cela (IIIII) com 5 mil euros mensais e como não baixou salários ou despediu nenhum dos cerca de 100 colaboradores apesar da crise e de ter pessoas que não precisa.
Sobre como é que facultava esses dinheiros ao Eng.o AA, se era por transferências bancárias ou entregas em numerário, refere que facultava em numerário. Às vezes ia ter com ele. Questionado se ele lhe dizia “precisava que me emprestasses 5 mil, 10 mil” ou se bastavam umas palavras mais ou menos codificadas que BB sabia, designadamente, “alguma coisa”, “qualquer coisa”, “do mesmo”, “da mesma coisa”, “daquilo que tu sabes que eu gosto”, o arguido ri-se e diz que sim, que é verdade. Entendia que ele precisava de dinheiro e às vezes ele próprio tomava essa iniciativa, tendo em conta a relação de amizade. Confirma que, quando não podia, ia lá a D. TT, tendo chegado a pedir ao LL que fizesse entregas também do envelope numa situação qualquer pontual.
Perguntado porque é que sendo uma coisa tão normal e de amizade tinha necessidade de usar expressões equívocas BB refere que percebia. -
Perguntado se algumas destas utilizações estão ligadas com a aquisição do livro do senhor Eng.o e se houve uma campanha montada para comprar exemplares do livro, BB ri-se e refere que comprou bastantes. Sobre se os comprou a pedido do próprio Eng.o AA refere que também foi por vontade própria pois também gostava. Naturalmente, o Eng.o AA queria, por razões de manutenção do tal “status”, que o livro tivesse uma boa aceitação e alavancou as vendas do livro.
 Acrescenta que fez um esforço grande nessa altura; deu dinheiro a bastante gente para fazer essas compras.
Sobre se conhece NNNN, que era secretária em gabinetes refere que não conhece.
Confirma que além destas entregas directas de dinheiro, havia situações em que o ajudou a despesas concretas fazendo chegar cheques à conta do senhor UU. Sobre 40 mil euros que vão pagar o funeral do JJJJJ e o internamento do JJJJJ na ... refere que sim. Questionado o porquê de fazer isto por via do senhor UU e não tratar directamente com os familiares, por exemplo, do JJJJJ para pagar as coisas, refere que não tem a certeza; naturalmente combinou com o Eng.o AA que ele não estaria cá e o UU é que ficou de tratar das coisas do pagamento do funeral, que só pode ter essa explicação, porque não ia combinar essas coisas com o UU.
 Questionado se BB sabe que ajuda o Eng.o AA a manter um padrão de vida, no espírito que são grandes amigos e depois ele agarra no dinheiro e ajuda outras pessoas também a manter o padrão de vida delas, refere que as conversas que ele tem com as outras pessoas não sabe.
Sendo referido que ainda em Outubro 2011, há outro cheque de BB, de 25 mil euros, que é utilizado para pagar despesas de viagens, à ... e à ... e condomínio da Rua ..., BB refere que AA lhe pediu para habilitar o UU, mas aí nem soube se era para pagar viagens; sabia que eram naturalmente despesas da esfera pessoal do Eng.o AA.
Estas explicações avançadas pelos dois arguidos – AA e BB – relativamente à existência de um empréstimo, de um valor que o primeiro não consegue concretizar e que o segundo aponta como ultrapassando os 500 mil euros, resultam como a única tentativa possível de procurar conciliar a vida do primeiro arguido e os seus gastos, excessivos, com o saldo (manifestamente insuficiente) da sua conta bancária.
Da prova documental existente nos autos e das declarações referidas, parece-nos evidente - o montante de  € 33 972 500   pertence ao arguido AA.
Retira-se facilmente dos autos que esta é  uma afirmação a que os arguidos fogem.
Porquê?
Qual o motivo que justifica que a verdadeira propriedade do dinheiro não possa ser revelada e que leve à utilização de várias manobras de branqueamento referidas na acusação?
Esta pergunta só pode ter uma única resposta – o dinheiro não tem uma origem lícita.
Se fosse um empréstimo do co-arguido BB, não haveria qualquer problema em assumi-lo, não havendo motivo algum para que, esse dinheiro, não passasse directamente para a conta do arguido AA.
O mesmo acontecia se se fosse uma doação do amigo.
Não existe um crime de empréstimo de dinheiro entre amigos, tal como ironiza o arguido AA. Como o mesmo sabe, não foi o alegado empréstimo a conduta criminalizada.
Os valores em causa, a sua ocorrência sucessiva, a disponibilidade do arguido BB, a actuação de “dominus” que o arguido AA demonstrou e quis passar para o tribunal como algo de natural e comum, fazendo afirmações de espanto quando confrontado com tais factos, facilitam a conclusão que é retirada na acusação.
Os indícios de que não se trata de qualquer empréstimo, mas de uma camuflagem da verdadeira titularidade do dinheiro – só necessária atenta a origem ilícita do mesmo – parecem-nos incontornáveis.
Em face da prova, interpretada de outra forma, entendemos que não há dúvidas relativamente à existência de fortes indícios no que toca à participação do arguido AA e BB conforme relatado na acusação, afastando-se deste modo o entendimento do Sr. Juiz no que toca à falta destes e que levou à não pronúncia dos arguidos pelos crimes de corrupção.
De facto, são os actos levados a cabo pelos arguidos no sentido de conseguir que o dinheiro passasse para  o domínio do arguido AA,  de forma camuflada, que vêm reforçar os indícios de que, não só dinheiro lhe pertence, como tem uma origem que não pode ser revelada.
Que indícios existem nos autos relativamente à origem de tal dinheiro?
Aqui entram em análise as situações nas quais esteve envolvido o arguido AA e que determinaram que conseguisse obter aquele valor monetário.
Assim, há que analisar  a origem desse valor, aquele  que na acusação é apontando como resultado da prática de crimes de corrupção.
Segundo a acusação, o dinheiro – suborno -  pertencente ao arguido AA proveio de várias acções centralizadas em 3 grandes grupos: Grupo Lena, Vale do Lobo e GES.

1.3.5.1 GRUPO LENA
A Decisão Instrutória afasta a existência de indícios relativamente à primeira parte da acusação relacionada com o Grupo Lena  com os seguintes argumentos – cfr fls. 681ss da decisão instrutória.
De acordo com os números respeitantes aos valores de facturação do Grupo Lena anteriores ao início de funções como Primeiro Ministro  e a momentos posteriores – depois de Março de 20005, 2002 a 2009 e o número relativo aos contrtaos públicos adjudicados ao Grupo Lena -  2009 a 2015 -  não é possível concluir que houve um favorecimento do Grupo no que esrepita ao mercado nacional e aos contractos públicos adjucicados.
A acusação, para além do concurso relativo ao “Projecto Ferroviário de Alta Velocidade” (artigo 1676), não identifica um único concurso ou uma adjudicação feita ao Grupo Lena em que a mesma tenha sido conseguida mediante a intervenção do arguido AA, enquanto Primeiro-Ministro, ou que tenham sido violadas as regras legais relativas à contratação pública, como não identifica uma única empresa que tenha sido preterida nesses concursos em favor do Grupo Lena.
. Como se vê, da prova testemunhal, em particular do depoimento das testemunhas KKKKK e LLLLL, Ministros das Obras Públicas Transportes e Comunicações, com a tutela sectorial da RAVE e REFER e MMMMM, Ministro das Finanças, com a tutela financeira, todos eles, Ministros no Governo liderado pelo arguido AA, nada resulta que este arguido, fazendo uso dos seus poderes de direcção da actividade do Governo os tenha instrumentalizando e determinado à condução do procedimento concursal da Concessão Poceirão-Caia em moldes orientados à satisfação dos interesses do Grupo Lena e dos seus parceiros no consórcio ELOS. Na verdade, nenhuma das testemunhas em causa referiu ter recebido ordens, orientações ou instruções do Primeiro-Ministro quanto aos termos do procedimento concursal.
O mesmo se diga quanto aos Secretários de Estado com a tutela sectorial, NNNNN, OOOOO e PPPPP.
O arguido AA negou os factos que lhe são imputados -  determinou a condução do procedimento concursal da Concessão RAV – Poceirão-Caia - em moldes orientados à satisfação dos interesses do Grupo Lena e respectivos parceiros comerciais  e conseguiu a inclusão de uma alínea do contrato de concessão, a cláusula 102.3 do contrato, por forma a dar uma vantagem indevida ao consórcio ELOS.
Das testemunhas QQQQQ, RRRRR, SSSSS e TTTTT, membros do júri do concurso, nada resulta que o arguido AA, na qualidade de Primeiro-Ministro, os tenha contactado ou lhes tenha feito chegar, de forma directa ou indirecta, qualquer orientação quanto aos termos do concurso
O único contacto que se mostra indiciado é o contacto entre o arguido AA e o Presidente do júri do Concurso, UUUUU. Esta testemunha admitiu esse contacto e o próprio arguido AA, em sede de interrogatório perante o MP e em sede instrução admitiu-o também. Porém, a testemunha diz que o contacto com o Primeiro-Ministro resumiu-se a esclarecê-lo acerca dos riscos de recusa de visto, num momento anterior à decisão de adjudicação.
O júri era composto por cinco pessoas, ou seja, era um órgão colegial e em momento algum é dito na acusação que a testemunha UUUUU, na sequência da reunião mantida com o Primeiro-Ministro, tenha procurado determinar a vontade dos demais membros do júri.
A fls. 7-A a fls. 7-K do Anexo ao Apenso de Busca 162, consta a nota jurídica elaborada a 20 de Novembro de 2009, pela sociedade de advogados EMP48... para a RAVE SA, relativamente ao despacho de adjudicação da PPP1. Nessa nota é afirmado que a decisão de adjudicação tomada contra a recomendação legalmente obrigatória, formulada pelo júri, de exclusão de todas as propostas, tem fundamento jurídico.
A fls. 7-L a 7-V do Anexo ao Apenso de Busca 162, consta a nota de fundamentação elaborada a 26-11-2009 pela RAVE na sequência do solicitado pelo Secretário de Estado dos Transportes. Nessa nota, subscrita pelo vogal do Conselho de Administração, RRRRR, consta a sustentação técnica, financeira e jurídica da eventual decisão de adjudicação da Concessão da RAV Poceirão-Caia ao concorrente melhor classificado (agrupamento ELOS).
O arguido AA diz que não teve conhecimento de qualquer preocupação por parte do consórcio ELOS quanto a uma eventual decisão de não adjudicação do concurso. Não teve conhecimento da decisão de ajustamentos ao contrato, bem como da execução material do mesmo.
Resulta indiciado que a decisão de adjudicação, proferida no dia 10 de Dezembro de 2009, através do despacho conjunto dos Ministros de Estado e das Finanças, MMMMM, e das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, LLLLL, foi tomada mediante prévia elaboração da nota de fundamentação técnica, financeira e jurídica.
Não resulta que a nota jurídica e de fundamentação, elaboradas após o relatório final do júri na segunda fase, tenham sido a pedido do arguido AA.
 Por falta de razoabilidade nunca poderia ter-se como indiciada a intervenção do arguido AA perante o júri do concurso e perante a decisão de adjudicação.
A testemunha VVVVV, Presidente do Conselho de Administração da REFER em 2005, não relatou a existência de qualquer interferência do Primeiro-Ministro no procedimento relativo ao concurso. Foi a própria testemunha quem assinou a decisão de desistência do procedimento do visto, não sabendo explicar a coincidência de data com a de uma decisão de recusa de visto.
Tendo em conta os termos e o modo como as testemunhas prestaram o seu depoimento, quer em sede de inquérito, quer as testemunhas ouvidas em sede de instrução, permitem concluir que não houve qualquer ingerência nem na substância, nem na materialidade do depoimento prestado. Quanto aos depoimentos prestados em sede de instrução, tendo em conta o modo como as testemunhas se comportaram, apreciação apenas sindicável através da imediação, não permite desvalorizar os seus depoimentos com fundamento em falsidade ou instrumentalização. Cumpre referir, por fim, que houve um consenso nas respostas relativas ao modo como decorreu o procedimento concursal e à não ingerência do arguido AA nesse procedimento.  
No que diz respeito à inserção da cláusula 102.3, tal como sugerida pelo Consórcio ELOS, cumpre referir, conforme resulta do depoimento das testemunhas UUUUU e RRRRR, que o júri do concurso, depois de numa primeira fase ter considerado a proposta de redacção da cláusula como inaceitável (sessão 9 de 8 de Abril de 2009, fls. 51 do Apenso de Busca 162), aceitou a sua integração no contrato, na convicção de que a mesma não contrariava em nada a Lei de Organização e Processo do Tribunal de Contas.
O júri do concurso confiou na legalidade da cláusula proposta pelo ELOS, uma vez que cláusula semelhante a esta constava do contrato de subconcessão do Baixo-Tejo, contrato que o Tribunal de Contas concedeu visto sem levantar qualquer reparo quanto à sua legalidade.
Daqui decorre, de forma muito clara, que o arguido AA, na qualidade de Primeiro-Ministro, nenhuma intervenção teve quanto à redacção, admissão e inserção da cláusula 102.3 no contrato de concessão, a sua intervenção, quanto a este aspecto, apenas se deu aquando da aprovação, em Conselho de Ministros, do diploma que aprovou as bases da concessão. A testemunha UUUUU, em sede de instrução, esclareceu, que a posição do júri em aceitar a proposta de redacção fundou-se nos necessários esclarecimentos jurídicos que foram solicitados para o efeito.  por entenderem que a cláusula em causa não era mais do que uma densificação da norma prevista na Lei do tribunal de contas.
Resulta demonstrado que o diploma que aprovou as bases da concessão e a resolução do Conselho de Ministros que aprovou a minuta do contrato de concessão foram preparados pela mesma equipa jurídica que prestou apoio jurídico ao júri do concurso. Deste modo, mostra-se indiciado que a única intervenção do arguido AA, enquanto Primeiro-Ministro, foi a de presidir ao Conselho de Ministros onde foram aprovados os diplomas em causa.                   
A falta de rigor da acusação revela-se, também, no modo como imputa as condutas ao arguido AA. Dado  o seu carácter vago e meramente conclusivo, não se alcança que acto ou actos foram praticados pelo arguido AA, na qualidade de Primeiro-Ministro, no âmbito do procedimento concursal relativo ao projecto Alta Velocidade Lisboa/Madrid.
Os únicos factos concretos imputados ao arguido AA, no que concerne ao concurso Poceirão-Caia, são os que se mostram descritos no artigo 1965, 1962, 1968, 1986 e 2004 da acusação, mas nenhuma prova, directa ou indiciária, consta dos autos que nos permita sustentar, ainda que em termos meramente indiciários, o alegado pela acusação.
A reforçar a conclusão de que não existiu qualquer interferência do arguido AA sobre o júri do concurso, temos o teor do relatório final do júri, constante de fls. 145ss do Doc. 16.12 do Apenso de Busca 163, e aquilo que é dito pela própria acusação no artigo 1976. - a decisão do júri foi alcançada de uma forma independente e fundada apenas em critérios de ordem técnica devidamente fundamentados
A própria acusação contradiz-se quanto ao aspecto da instrumentalização dos decisores. Por um lado, é referido que o arguido AA, enquanto Primeiro-Ministro, instrumentalizou titulares do Ministério das Obras Públicas, administradores da RAVE e REFER e membros do júri no que concerne ao procedimento concursal relativo à Concessão Poceirão-Caia. Por outro, conforme resulta dos artigos 1869, 1870 e 1871, o arguido AA já não conseguiu impor a sua vontade perante o Administrador da RAVE, RRRRR, e perante o Presidente do Conselho de Administração da REFER, VVVVV, com vista a antecipar a data de lançamento do concurso para Março de 2008. Nos referidos artigos, a acusação afirma, de forma bem clara, que RRRRR opôs-se à pretensão do Primeiro-Ministro e que VVVVV não cedeu quanto à referida pretensão.
Daqui resulta que a própria acusação admite que os membros da RAVE e REFER não foram instrumentalizados pelo Primeiro-Ministro e que este, afinal, não possuía essa capacidade.
As testemunhas RRRRR e VVVVV inquiridas em sede de inquérito a fls. 37453 e 37831, respectivamente, afirmaram isso mesmo, o que demonstra que o arguido AA, apesar de exercer o cargo de Primeiro-Ministro, não instrumentalizou as pessoas ligadas à RAVE e à REFER.
A única intervenção do arguido AA quanto ao concurso relativo à Concessão RAV Poceirão-Caia que se mostra indiciada é a sua presença na cerimónia de lançamento do concurso e na aprovação, em Conselho de Ministros, do Decreto-Lei que aprovou as bases da concessão e da Resolução que aprovou a minuta do contrato, bem como a reunião mantida com o Ministro KKKKK e o presidente do júri UUUUU.
Por sua vez, da acta nº 27, de 8 de Maio de 2009, fls. 117, DOC. 17.2 Apenso de Busca 163, resulta que a aceitação por parte do júri da redacção da cláusula 102.3 teve lugar em data anterior à referida reunião, o que faz com que nenhuma relação possa ser estabelecida, por falta de sequência cronológica, entre a decisão do júri de 8 de Maio de 2009 e a reunião realizada após 15 de Outubro de 2009. 
A decisão do Tribunal Arbitral, proferida em 5 Julho de 2016 no Proc. Arbitral 18.20..., junta ao Apenso CD, transitada em julgado, considerou que a inclusão da cláusula 102.3 no contrato é da exclusiva responsabilidade do júri do concurso, foi aceite de boa-fé, sustentada em pareceres jurídicos que a consideravam conforme com a lei e com o interesse público.
O acórdão do Tribunal Arbitral considerou, ainda, que a cláusula não só é legal, como é justa e que resultou de uma negociação informada, racional e vantajosa para ambas as partes.
Como é evidente, destes dados objectivos não podemos inferir, dado que não existe nenhuma regra da lógica ou da experiência que nos habilite a isso, que a intervenção do arguido AA, na qualidade de Primeiro-Ministro, tenha sido no sentido de conformar o procedimento do concurso e o clausulado do contrato de concessão de forma a permitir ao consórcio ELOS ver reconhecido o direito a uma reparação por parte do Estado.
Não existe qualquer prova, para além do facto de os arguidos BB e AA serem amigos entre si, que índicie que estes arguidos, na sequência das conclusões mencionadas no relatório preliminar da 2ª fase, juntamente com o arguido GG, tenham desenvolvido diligências para conseguirem suportar uma decisão de adjudicação da concessão ao consórcio ELOS.
É certo que o arguido BB, conforme resulta da análise feita ao contrato de prestação de serviços celebrado no dia 1-6-2008, entre a LMI e a EMP23... Lda. (junto a fls. 206-210 Apenso de Busca 2, DOC.11) tinha conhecimento e participação do concurso PPP1. Com efeito, resulta desse contrato que o seu objecto era a prestação de serviços de consultoria referente à preparação das propostas para os concursos públicos relativos aos dois troços do eixo Lisboa-Madrid. Porém, esta participação do arguido BB não nos permite concluir, sem mais, pela existência de um acordo entre os arguidos AA e GG, intermediada pelo arguido BB, com vista a que o procedimento concursal fosse adaptado aos interesses do Grupo Lena.   
Por último, do correio electrónico trocado entre o arguido RRR, WWWWW da LMI e XXXXX da EMP49..., no dia 14-8-2007 e 10-9-2007 e do documento anexo a esse correio (Programa de Conquista do TGV) – junto ao Apenso de Busca 170 – nenhum valor probatório podemos extrair quanto ao arguido AA. Na verdade, não existe nenhuma prova que ligue o arguido AA a esse documento, o documento, apesar de falar em relações político-estratégicas, nenhuma referência faz ao arguido AA e ao seu Governo.
Cumpre referir que esse documento – Programa Conquista do TGV – foi elaborado em 18 de Julho de 2007, conforme resulta do documento junto ao Apenso de Busca 56, fls. 1-8, sendo que o modelo de negócio relativo ao Lote Poceirão-Caia foi lançado em 21-6-2007, ou seja, em data anterior a 18 de Julho de 2007, o que inviabiliza qualquer juízo de suspeição quanto ao momento em que os interessados tiveram acesso a informação relativa ao Programa TGV.
não é possível concluir, ainda que em termos indiciários, que existiu um acordo entre os arguidos BB e GG para fazer repercutir na EMP49... e na EMP50..., os pagamentos feitos a QQ através da EMP51....
Com efeito, o documento em causa diz respeito a um email de 30-1-2013 remetido por TTT a BB e a GG em que anexa um quadro com as facturas emitidas ao cliente e prestadores de serviços afectos ao TGV, no qual é referido a EMP51....
Nesse quadro consta uma nota escrita à mão, sem autoria identificada, em que é referido o seguinte: «deste custo 53,812,5 foi pago pelo EMP18... e/a EMP50... existiu acordo, mas nunca foi efectuado o contrato». Desta nota, embora se possa indiciar a existência de pagamentos da EMP18... à Lena, já não nos permite concluir que esses pagamentos tiveram por base um acordo entre os arguidos BB e GG com vista a remunerar QQ por informações privilegiadas sobre o procedimento do concurso TGV.
Ainda a propósito das alegadas informações «privilegiadas» detidas pelo Consórcio ELOS, obtidas através da alegada intervenção dos arguidos BB e GG, cumpre referir que do documento constante de fls. 488, Pasta 4, Apenso de Busca 115 nada se extrai a esse propósito. Com efeito, o documento em causa diz respeito a um email, datado de 13-5-2008, assunto Alta Velocidade, remetido por YYYYY para ZZZZZ, com conhecimento, entre outros, a ... e PP, no qual refere o seguinte: «Acreditamos também que temos um avanço nos estudos e em acções estratégicas em relação aos demais grupos, o qual não gostaríamos de colocá-los em causa».
O documento 30 de fls. 173 do Apenso de Busca 31 (busca ao escritório de advogado “EMP52... - Sociedade de Advogados, RL”, também designado “G-ADVOGADOS”), diz respeito a um documento denominado Proposta, Alta Velocidade/Consultoria. Da análise feita ao documento verifica-se que se trata de uma proposta de consultoria a qual não se mostra datada, nem assinada e da mesma não se extrai a quem é dirigida. Verifica-se, ainda, que em nenhum do momento do texto é feita qualquer referência quanto a repartição de custos entre a Lena, EMP18... e EMP50... relacionados com informações obtidas pelo Grupo Lena, como nenhuma referência é feita ao arguido QQ. Deste modo, o valor probatório do mesmo, no sentido em que lhe é dado pela acusação, é manifestamente infundado.  
Cumpre referir, ainda, tal como referido na acusação, que, pelo menos desde Dezembro de 2005, era público o Projecto RAV relativo à alta velocidade.
Durante a investigação nenhuma pessoa ligada ao Conselho de Administração do Consórcio ELOS foi ouvida como testemunha, sendo que o seu depoimento seria relevante para apurar como decorreu o processo de negociação relativo ao concurso em causa, bem como para aferir qual o grau de participação e conhecimento dos arguidos BB e GG quanto aos termos do concurso.
  Vejamos a tramitação do concurso
De fls. 272 do DOC 17.3 Apenso de Busca 163 (acta nº 50) consta que em 18 de Janeiro de 2011, foi apresentado pelo júri do concurso o relatório final de avaliação das propostas da segunda fase, do qual se destaca o seguinte:
A proposta final do concorrente n.º 1 foi classificada com 16,90;
A proposta final do concorrente n.º 4 foi classificada com 14,82.
Por Resolução do Conselho de Ministros nº 10/2011, de 28 de Janeiro foi aprovada a minuta do instrumento de reforma do contrato de concessão designado por concessão RAV Poceirão-Caia, celebrado entre o Estado Português, representado pelos membros do Governo responsáveis pela área das finanças e pelo sector dos transportes, e a Elos - Ligações de Alta Velocidade, S. A., nos termos constantes do anexo à presente resolução, da qual faz parte integrante.
Por ofício de 11-2-2011, o Presidente do Conselho de Administração da REFER, VVVVV, remeteu ao Tribunal de Contas, em sede de procedimento de fiscalização prévia, o processo relativo ao contrato de concessão Rav Poceirão-Caia. Cfr. 2, DOC 38 Apenso Temático DU, 6º Volume.
No dia 11 de Março de 2011, foi anunciado pelo Primeiro-Ministro do XVIII Governo Constitucional o PEC IV;
Em 23 de Março de 2011, a Assembleia da República rejeitou o Programa de Estabilidade e Crescimento para 2011-2014;
No mesmo dia o Primeiro-Ministro AA anuncia ao país a sua demissão.
No dia 6 de Abril de 2011, o Primeiro-Ministro demissionário anuncia ao país que Portugal pedirá ajuda externa;
No dia 21-06-2011, toma posse o XIX Governo Constitucional;   
No dia 10-11-2011 foi publicado em DR, 1ª série, o Plano Estratégico dos Transportes, Horizonte 2011-2015, tendo sido consignado no ponto 7.3 o abandono do Projecto de Alta Velocidade por parte do XIX Governo Constitucional. 
Por acórdão nº 9/12, de 21 de Março de 2012, o Tribunal de Contas recusou o visto com fundamento no facto de o processo não ter sido instruído com uma declaração de cabimentação orçamental e por não estar, assim demonstrada a possibilidade financeira do Estado em suportar a despesa que o contrato de concessão implicava, bem como com fundamento, entre outras causas de ilegalidade, que a cláusula 102.3 do contrato de concessão continha uma invalidade, consubstanciada na violação do preceituado no nº 3 do artigo 45º da Lei da Organização e Processo do Tribunal de Contas, uma vez que estabelecia uma compensação de custos que esta norma não abrange. Cfr. Fls. Doc. 55, fls. 162 Apenso Temático DU, 7º Volume.
Por despacho do Secretário de Estado das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, AAAAAA, proferido no dia 8 de Abril de 2012, foi decidido, com base na informação nº 11/2012/TEF, pela não interposição de recurso do acórdão do Tribunal de Contas no âmbito de fiscalização prévia do contrato de concessão celebrado entre o Estado Português e a sociedade ELOS relativa ao troço Poceirão-Caia. (cfr. Despacho junto a fls. 435 e 436 do Anexo ao Apenso de Busca 162). 
Por acórdão de 5 de Julho de 2016, proferido pelo Tribunal Arbitral, o Estado Português foi condenado a pagar ao Consórcio ELOS, ao abrigo da cláusula 102.3 do Contrato de Concessão, a quantia global de 149.649.219,58€. Cfr. Acórdão junto ao Apenso CD.
De fls. 2-13 Do Apenso Temático DU, 2º Volume, resulta que por despacho conjunto dos Ministros de Estado e das Finanças e das Obras Públicas Transportes e Comunicações, comunicado em 16-9-2009, foi decidido não adjudicar o concurso público internacional para a concessão do projecto, construção, financiamento, manutenção e disponibilização do Troço Lisboa/Poceirão, com a consequente revogação da decisão de contratar constante do Despacho Conjunto datado de 29 de Março de 2009.
Do despacho conjunto em causa consta como fundamento para a decisão de revogação do despacho de 27 de Março de 2009, a significativa e progressiva degradação da conjuntura económica e financeira de Portugal, decorrente da crise financeira mundial, que culminou na alteração do rating do Estado Português.
De fls. 573 do 2º Volume do Apenso Temático FC, resulta que no dia 27 de Abril de 2018, o consórcio Elos – Ligações de Alta Velocidade, SA, intentou, junto do Tribunal Administrativo de Círculo ..., contra o Estado Português, uma acção executiva para pagamento de quantia certa, na qual pede o pagamento da quantia exequenda de 192.064.381.57€ invocando como título executivo o acórdão de 5 de Julho de 2017 proferido pelo Tribunal Arbitral.
Da prova produzida em sede de inquérito, em particular do depoimento das testemunhas acima identificadas, bem como da tramitação do concurso, decorre que existem alguns aspectos do procedimento, aliás já identificados pelo acórdão do Tribunal de Contas, que não se mostram correctos e indiciam algumas irregularidades. Por outro lado, da prova produzida, em particular do depoimento dos membros do júri do concurso, resulta, ainda, que o arguido AA não teve qualquer participação, directa ou indirecta, no procedimento e na definição das cláusulas do contrato de concessão.
Verifica-se que o arguido AA não teve qualquer intervenção na fase de negociação pré-adjudicatória das propostas apresentadas pelos dois concorrentes, cujas propostas foram ordenadas nos dois primeiros lugares, no âmbito do procedimento de adjudicação.
Verifica-se, também, que o arguido AA não teve qualquer intervenção na decisão de adjudicação. Essa decisão foi tomada pelos Ministros de Estado e das Finanças e Obras Públicas, Transportes e Comunicações no dia 10-12-2009 (cfr. fls. 234 do DOC. 16.12 Apenso de Busca 163) e traduziu-se no encerramento de uma fase na qual a Administração identificou a proposta que melhor servia o interesse público, obrigando-se a contratar com o consórcio ELOS.
A intervenção do arguido AA, na qualidade de Primeiro-Ministro, só se verificou no momento da aprovação, em Conselho de Ministros, do Decreto-Lei 33-A/2010 de 14 de Abril.   
O artigo 45.º da LOPTC, proíbe, de forma clara, que se façam quaisquer pagamentos por força de contratos sujeitos a visto prévio antes do visto do Tribunal de Contas. Por sua vez, o nº3 do citado preceito, permite que, no caso de ocorrer uma recusa desse visto, os trabalhos realizados ou os bens ou serviços adquiridos após a celebração do contrato e até à data da notificação da recusa possam ser pagos após essa notificação, desde que o respectivo valor não ultrapasse a programação contratualmente estabelecida para o mesmo período.
Assim, a recusa de visto do Tribunal de Contas, em caso de visto prévio obrigatório, faz com que o contrato não tenha eficácia e não seja susceptível de gerar despesa pública. Exceptua-se apenas os efeitos e as despesas permitidas nos termos do citado artigo 45.º n.º 3, da LOPTC.
Deste modo, segundo o entendimento do Tribunal de Contas, a norma em causa não regula qualquer situação de incumprimento contratual por parte do contraente público nem qualquer indemnização pela não execução do contrato não estando, por isso, essa matéria no âmbito da disponibilidade contratual das partes.
A cláiusula 102.3 inserida no contrtao, reproduz o ponto 3 da Base XCVIII das Bases da Concessão, que integram o anexo ao Decreto-Lei nº 33-A/2010, de 14 de Abril.
Da leitura da cláusula em causa, verifica-se que a mesma regula as consequências patrimoniais da recusa de visto prévio pelo Tribunal de Contas ao contrato de concessão, fazendo constituir na esfera do concedente a obrigação de compensar a concessionária por todos os custos e despesas em que tenha incorrido por causa da celebração do contrato.
Tendo em conta o teor da presente cláusula e o disposto no citado artigo 45º da LOPTC, verifica-se que a mesma contempla, em caso de recusa de visto, a compensação de custos não abrangidos pela norma imperativa consagrada no nº3 do artigo 45º. De acordo com a cláusula em causa, mesmo que o visto fosse recusado com base na sua ilegalidade, sempre poderia ser aplicada na relação contratual entre as partes, no âmbito de determinação da indemnização devida, ou seja, sempre seria susceptível de gerar despesa pública.
Em face do exposto, uma vez que a cláusula 102.3 do contrato de concessão indicia estar em desrespeito com o artigo 45º da LOPTC, faz com que a mesma padeça, à primeira vista, de ilegalidade por violação de norma imperativa, conforme entendimento do Tribunal de Contas.
Cumpre referir que o próprio júri do concurso, conforme resulta da acta da sessão nº 9, começou por recusar a cláusula em causa, acabando no final por admitir a sua inserção.
Cumpre referir, ainda, conforme entendido pelo Tribunal de Contas, que a circunstância de a cláusula 102.3 do Contrato de concessão reproduzir o ponto 3 da Base ponto 3 da Base XCVIII das Base da Concessão, que integram o anexo ao Decreto-Lei nº 33-A/2010, de 4 de Abril, não faz da mesma uma cláusula válida, dado que o ponto 3 do citado Decreto-Lei, por limitar a competência do Tribunal de Contas, poderá integrar um vício de inconstitucionalidade orgânica por violação do disposto no artigo 165º nº 1 alínea p) da CRP.
Apesar do entendimento do Tribunal de Contas, constante no acórdão nº 9/12, de 21 de Março de 2012, cumpre dizer que o mesmo não vincula este tribunal, no que concerne à interpretação da norma adoptada no DL que fixou as bases da concessão. Na verdade, estamos perante a ausência de caso julgado preclusivo do poder jurisdicional deste tribunal para apreciar e conhecer da questão da validade da cláusula 102.3 do contrato de concessão.
Cumpre referir, em primeiro lugar, que a disposição contratual colocada em crise no acórdão do Tribunal de Contas (cláusula 102.3 do contrato de concessão), reproduz, ipsis verbis, a norma constante do nº3 da Base XCVIII das Bases da Concessão aprovada pelo DL nº 33-A/2010 de 14 de Abril. O contrato de concessão foi assinado no dia 8 de Maio de 2010.
Deste modo, a inclusão da cláusula 102.3 não parece contrariar o artigo 45º da LOPTC, nem era violadora do princípio da prossecução do interesse público, fazendo com que deste dado objectivo nada se possa inferir, em particular como concluiu a acusação nos artigos 1676, 1851, 2091, 2092, 2093 e 2094.
Não se mostra indiciado que a inserção da cláusula 102.3 do contrato tenha resultado de qualquer impulso político, nomeadamente do arguido AA.
Apesar destes vícios do procedimento que se mostram indiciados, o certo é que a partir deles não podemos fazer qualquer juízo de inferência quanto ao arguido AA, uma vez que se mostra indiciado que o mesmo não teve qualquer intervenção, directa ou indirecta, no procedimento concursal, como não podemos inferir, também, que os mesmos vícios foram praticados de forma voluntária e consciente pelos intervenientes no procedimento com intuito de favorecer o consórcio ELOS.
Mostra-se indiciado que a proposta final da adjudicatária contém aspectos que não foram aceites pelo júri na fase de negociação, como contém alterações a aspectos que não foram submetidos à concorrência, mas isso não chega para concluirmos, mesmo em termos de um juízo meramente indiciário, que essas alterações foram motivadas e, muito menos, impostas pelo arguido AA com o intuito de favorecer o Grupo Lena.
Deste modo, também por aqui fica afastada a existência de qualquer indício.
Por último, cumpre referir que a contratação em causa constitui a contratação de uma parceria público-privada, o que faz com que, por força do disposto nos artigos 4.º 6.º e 8.º do RJPPP (Decreto-Lei n.º 86/2003, de 26 de Abril, na redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 141/2006, de 27 de Julho) a mesma exija a viabilidade financeira do projecto, a obtenção de eficiência na afectação dos recursos públicos e o alcance de vantagens para o parceiro público relativamente a formas de alcançar os mesmos fins, avaliadas de acordo com o disposto no artigo 19.º, n.º 2, da Lei de Enquadramento Orçamental.
No caso em apreço, mostra-se indiciado que, antes do lançamento da parceria, foram efectuados estudos prévios onde foram invocados os benefícios económicos em face dos custos identificados.
Mostra-se indiciado, também, que todos esses estudos prévios foram feitos tendo como pressuposto a concessão do troço Poceirão-Caia como parte integrante do eixo de alta velocidade entre Lisboa e Madrid no qual se incluía, também, a terceira travessia sobre o Tejo.
Deste modo, com as alterações entretanto verificadas e que consistiram no abandono do troço Lisboa-Poceirão, incluindo a travessia do Tejo (TTT), a sustentabilidade financeira do projecto Poceirão-Caia ficou seriamente comprometida, na medida em que os estudos desenvolvidos nunca consideraram apenas esse troço, mas sim um todo.
Assim, com vista ao cumprimento das normas supra-referidas relativas ao regime das PPP, deveria o Governo, salvo melhor entendimento, ter equacionado uma revisão do enquadramento do projecto e aferir se se justificaria a sua manutenção.
Em todo o caso, trata-se de uma opção política e como tal não sindicável nesta sede, sob pena de violação do princípio da separação de poderes consagrado no artigo 111º da CRP, sendo que esta opção, por si só, não nos permite inferir, dado que não existe qualquer regra da experiência que a sustente, que teve como objectivo o favorecimento do Grupo Lena ou que foi motivada pelo facto do consórcio ELOS não ter sido seleccionado para a fase das negociações no âmbito do procedimento concursal relativo à Concessão Lisboa-Poceirão.
Cumpre relembrar que essa opção foi uma decisão do Governo, portanto colegial, e não apenas do arguido AA, não se tratou de um abandono do projecto, mas sim de um adiamento e foi uma decisão motivada pela conjuntura económica e financeira que se vivia em 2009.
Supomos que só com o recurso a uma visão fantasiosa se poderia concluir pela indiciação de o júri do concurso, composto por 5 elementos, ter sido instigado ou instrumentalizado, de forma directa ou indirecta, pelo arguido AA para fazer constar de um contrato, com a dimensão e a visibilidade do concurso público internacional em causa, uma cláusula que sabiam ser ilegal. Em primeiro lugar, mostra-se indiciado que o júri do concurso agiu de forma totalmente autónoma face aos decisores políticos. Em segundo lugar, o júri esteve assessorado por juristas. Por fim, a cláusula 102.3 só foi aceite depois de várias reuniões de negociações e, em sede de Tribunal Arbitral, foi julgada válida.
Verifica-se que o arguido AA não teve qualquer intervenção na fase de negociação pré-adjudicatória das propostas apresentadas pelos dois concorrentes, cujas propostas foram ordenadas nos dois primeiros lugares, no âmbito do procedimento de adjudicação.”

APRECIANDO
Esta fase do processo, como é referido pelo Sr. Juiz de instrução, não consubstancia um novo inquérito, mas apenas um momento processual de comprovação, que termina com um despacho judicial pronunciando, ou não, o arguido, pelos factos que lhe são imputados.
Com efeito, realizadas as diligências tidas por convenientes em ordem ao apuramento da verdade material, conforme dispõe do art. 308º, nº 1, “se, até ao encerramento da instrução, tiverem sido recolhidos indícios suficientes de se terem verificado os pressupostos de que depende a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança, o juiz, por despacho, pronuncia o arguido pelos factos respectivos; caso contrário, profere despacho de não pronúncia”.
A instrução está assim “estruturada com uma dupla finalidade: obter a comprovação jurisdicional dos pressupostos jurídico-factuais da acusação, por uma parte, e a fiscalização judicial da decisão processual do Ministério Público de acusar ou arquivar o inquérito, por outra” - GERMANO MARQUES DA SILVA – Processo Penal, Tomo III, p. 130.
Assim, o juiz verifica se, com as provas recolhidas no inquérito e na instrução, o arguido deverá ou não ser submetido a julgamento pelos factos da acusação, para o que poderá investigar autonomamente os factos.
Começamos por dizer que nos causa alguma estranheza que o Sr. Juiz de instrução, no final da prova que produziu tenha conseguido afirmar que “ o arguido AA não teve qualquer intervenção na fase de negociação pré-adjudicatória (…)
O Sr. Juiz de instrução não ficou com dúvidas relativamente à intervenção do arguido.
Não concluiu que, em face da prova produzida, os indícios não eram suficientes para afirmar a intervenção do arguido.
Não.
 Peremptoriamente, afirmou que o arguido não teve qualquer intervenção nos actos em causa.
Ora, lendo o registo da prova produzida na instrução e que o Sr. Juiz transcreveu na decisão instrutória, muitas questões se nos colocam:
Como pode o Sr. Juiz de instrução ter chegado à conclusão supra referida, relativa aos indícios, quando sustenta a sua decisão quase só nas declarações dos arguidos (salvo os casos de confissão, os arguidos, por regra, negam os factos que lhes são imputados)?
Como entender que  cite a testemunha KKKKK a propósito da RAVE, que teve um depoimento no inquérito não coincidente com o que disse na instrução (sem que tenha sido confrontado com essa dissonância)?
Em inquérito diz “Classifica o empenhamento do Primeiro-Ministro no projecto da RAVE como "grande", o mesmo sucedendo com o seu próprio empenho em tal projecto, o que implicava que o mesmo se fosse inteirando das matérias respectivas junto de si. Classifica de anómalo qualquer contacto do Primeiro-Ministro com membros dos Conselhos de Administração de empresas sob a tutela do MOP e com competências em tal matéria. Nega ter participado em qualquer reunião havida com o Primeiro-Ministro e com o presidente do júri da PPP1, Engenheiro UUUUU, referindo que saiu do Governo em Outubro de 2009, sendo substituído por LLLLL, tendo sido o mesmo quem assinou o despacho de adjudicação à ELOS.
Mas em instrução afirma que “Uma vez que iria sair do Governo, em Outubro de 2009, fez questão de reunir-se com o Primeiro-Ministro para o colocar a par dos vários assuntos pendentes no Ministério das Obras Públicas, entre eles a alta velocidade. Sendo a rede de alta velocidade um dos projectos mais complexos, resolveu solicitar a presença do presidente do júri, UUUUU, na reunião com o Primeiro-Ministro para que pudessem ser prestados esclarecimentos sobre aspectos do procedimento. Que pediu à Secretária de Estado NNNNN que transmitisse ao presidente do júri para estar presente na reunião com o Primeiro-Ministro. Quem propôs a reunião com o Primeiro-Ministro foi o depoente e quem decidiu em fazer-se acompanhar do presidente do júri foi também o depoente. Que informou previamente o Primeiro-Ministro dessa situação e pediu à Secretária de Estado NNNNN para transmitir a UUUUU qual era o objectivo da reunião com o Primeiro-Ministro.
Que esta foi a única reunião que manteve com o Primeiro-Ministro quanto ao concurso Poceirão-Caia, que o Primeiro-Ministro nunca lhe deu ordens, sugestões ou orientações e nem nunca lhe pediu informações quanto ao procedimento do concurso e nem tem conhecimento que isso tenha acontecido com a Secretária de Estado, com o presidente da Refer ou com membros do júri do concurso.”
- que cite a a testemunha LLLLL que afirmou em inquérito que “Quanto ao acompanhamento dado ao procedimento por parte do Primeiro-Ministro referiu que era um acompanhamento realizado, no essencial, através de vários pedidos de actualização acerca do estado do procedimento concursal, empenho que considera normal uma vez que se tratava de matéria de extrema importância política para o Governo, nomeadamente num contexto de crescente oposição política.
Declarou não ter memória de qualquer reunião havida com o Primeiro-Ministro e com o Presidente do Júri. Uma vez confrontado com o teor das declarações da testemunha UUUUU, refere que, se o mesmo afirmou ter estado presente em tal reunião, é porque a mesma pode ter ocorrido, apesar de não ter qualquer memória de tal reunião. A ter ocorrido tal reunião a mesma só pode ter tido lugar após a elaboração do relatório final, uma vez que considera que não seria procedimento regular a manutenção de uma reunião em momento anterior. Quanto ao teor do primeiro relatório final do júri, com o qual foi confrontado, refere que não se recorda de qualquer desconforto jurídico sentido pelo júri quanto à solução aí proposta como alternativa à não adjudicação, não tendo memória de qualquer questão especial suscitada por tal relatório pelas pessoas encarregadas de lhe prestar apoio técnico. Reafirmou que a adjudicação foi feita de acordo com o relatório final do Júri.
Não se recorda da matéria atinente à cláusula 102.3 do contrato, e à sua admissibilidade após uma prévia recusa por parte do júri, nem de qualquer discussão jurídica em torno da mesma e das suas consequências financeiras, referindo que atento o seu impacto ao nível dos pagamentos devidos pelo Estado, a mesma deve ter sido objecto de especial análise ao nível do Ministério das Finanças ou da prévia discussão pelos Secretários de Estado, anterior ao Conselho de Ministros que aprovou as bases da concessão e, em particular, pela Comissão Técnica, Financeira e Jurídica que acompanhou todo o processo ao nível da RAVE.
No que respeita à recusa de visto refere que a encarou com alguma surpresa uma vez que havia mantido diversas reuniões com o Presidente do Tribunal de Contas, BBBBBB, o qual lhe ia dando um “feed back” positivo da marcha do procedimento. Confrontado com o facto da desistência do processo de visto e a decisão de reforma de procedimento, esclareceu que tal procedimento foi adoptado na sequência de uma recomendação do próprio Presidente do Tribunal de Contas. Confirma, igualmente, que no mesmo período houve outras situações de recusa de visto em matéria de parcerias rodoviárias.
Confrontado com o contexto temporal de inserção da cláusula 102.3 - a qual pretendia precisamente acautelar uma situação de recusa de visto - reitera desconhecer o contexto da inserção de tal cláusula no contrato já na fase de negociação das propostas e após uma primeira recusa por parte do júri. Mais uma vez, remeteu para o acompanhamento técnico, financeiro e jurídico de que o procedimento foi alvo. Quanto à solução da desistência da PPP2 no mesmo contexto temporal da decisão de reforma de procedimento da PPP1, refere que tal foi uma decisão política fundada em razões de natureza financeira e com vários problemas conexos com a terceira travessia do Tejo (TTT). A manutenção da PPP1 funda-se na importância estratégica da ferroviária com Espanha, e da ratificação, ao nível da Assembleia da República, em votação, de tal projecto. “
- que a mesma testemunha diga em instrução que “Manteve uma reunião com o Primeiro-Ministro logo após ter iniciado funções onde foram abordados vários assuntos, entre os quais o projecto Alta Velocidade. Que o Primeiro-Ministro estava muito empenhado no projecto alta velocidade, dado que era um projecto emblemático para o país e para a própria rede europeia de transportes. O lançamento do concurso contou com a presença do Presidente da Comissão Europeia, CCCCCC, o que evidencia a importância do projecto.(….) e que quanto ao visto do Tribunal de Contas diga “Quanto à desistência do pedido de visto junto do Tribunal de Contas, referiu ter sido contactado pelo Presidente do Tribunal de Contas onde este referiu que o visto não iria ser concedido e sugeriu que a questão poderia ser ultrapassada mediante a reforma do procedimento concursal. Que na sequência disso foi decidido desistir do pedido de visto, sendo que esta decisão foi analisada em conjunto com o Primeiro-Ministro, com o Ministro das Finanças e pelo depoente. Que a decisão em causa foi tomada com o objectivo de serem levantados os obstáculos à continuação do projecto.
- que não atenda ao que disse a testemunha PPPPP, ouvida em instrução “Quanto ao projecto Poceirão-Caia, o PM apenas mostrava preocupação quanto aos prazos. Referiu que existiu um pedido de reunião por pate do PM com o Ministro LLLLL e que este resolveu levar o presidente do júri, UUUUU, com o objectivo de discutir o relatório preliminar. Segundo o que lhe foi reportado pelo Ministro LLLLL, o que o PM pretendia era ser informado sobre as várias opções que estavam em cima da mesa, face às opções que constavam do relatório preliminar. Referiu que o relatório levantava a possibilidade de o concurso cair ou prosseguir dentro um determinado contexto. Que o Ministro LLLLL tinha a percepção que o visto do Tribunal de Contas não seria conseguido e por isso desistiram do pedido de visto e reformaram o processo. (…)Quanto à cláusula 102.3, referiu que a ideia de inserir a referida cláusula foi de AAAAAA, administrador financeiro do consórcio ELOS e que esta cláusula era igual a uma que constava do concurso do Hospital ..., mas não tem conhecimento se o PM sabia da inserção da cláusula.
- que não tenha valorizado o depoimento de VVVVV (…) O modelo financeiro escolhido foi patrocinado pelo engenheiro RRRRR, modelo este com grande acolhimento no estrangeiro, e que acabou por enquadrar as soluções que vieram a ser acolhidas no desenvolvimento do projecto da RAV. Nomeou um Director-Geral para a RAVE (DDDDDD) mas, passado pouco tempo, o mesmo foi designado pelo Conselho de Ministros para a PARQUE ESCOLAR, passando o Engenheiro RRRRR a ocupar 95% do seu tempo com a RAVE, enquanto a testemunha e os dois restantes membros do Conselho de Administração se ocupavam primacialmente da REFER. (…)Questionado quanto às funções do Arquitecto QQ na RAVE, declarou que o mesmo era oriundo da EMP53... e tinha sido admitido pela anterior administração da RAVE, ao que julga, a convite do Engenheiro PP, também ele maçon como o arquitecto QQ. QQ era Director do Planeamento, tratando de orçamentação e de planos de investimento (…) O QQ tinha domínio da informação, em modo transversal, além de que participava na comissão técnica de acompanhamento que prestava apoio ao Júri.
- que não tivesse em conta o depoimento da testemunha UUUUUEsclarece que todas as reuniões de negociação de carácter geral eram feitas com a presença de todos os membros do júri. No que respeita à cláusula 102.3 julga que a mesma integrava a proposta da adjudicatária. Questionada a testemunha acerca de qual a razão que terá fundado o pedido formal de esclarecimento à REFER da interpretação a dar a tal cláusula e, bem assim, da razão pela qual tal resposta demorou cerca de 5 meses a ser dada à adjudicatária, designadamente em vésperas da demissão pública do Primeiro-Ministro, respondeu a testemunha que não tem explicação para tal facto, tendo sido o próprio quem assinou a resposta, embora não tenha sido o mesmo quem preparou tecnicamente a mesma, não se recordando desta tramitação, referindo que o teor da resposta, tanto quanto se recorda, tinha como preocupação proteger o interesse público, mediante o cumprimento dos prazos contratuais no caso de retoma da sua execução.
Questionado se o Primeiro-Ministro AA teve intervenção pessoal no âmbito do procedimento concursal, declarou que, num dado momento acompanhou o Ministro KKKKK, ao gabinete do Primeiro-Ministro o qual pretendia ser pessoalmente inteirado do estado do procedimento, na sequência da elaboração de um relatório subsequente à avaliação das propostas, o qual havia concluído pela rejeição das mesmas, considerando, no entanto, que mediante determinadas alterações, a proposta da ELOS poderia ser considerada para efeitos de adjudicação. (…)Que no dia 12.10.2009, recebeu um telefonema da Secretária de Estado, NNNNN, dizendo que o Ministro KKKKK iria ter uma reunião com o Primeiro-Ministro, que o assunto PPP1 poderia estar na agenda e que por isso o Ministro pretendia a sua presença nessa reunião para esclarecer sobre situação do concurso.
- o depoimento da testemunha OOOOO “Declarou não ter tido conhecimento de qualquer reunião havida entre o Presidente do Júri e o Primeiro-Ministro a propósito do relatório, confirmando que se encontrava delegado no Secretário de Estado dos Transportes a tutela da RAVE e da REFER, achando “estranhíssima” tal reunião, a ter existido
- o depoimento da testemunha EEEEEENo que respeita à decisão de desistência do procedimento do visto e à decisão de proceder à reforma do procedimento concursal, com reabertura da fase negocial, declarou não ter sido consultado quanto a tal decisão jurídica, a qual presume uma previsão sobre o sentido do voto do Tribunal de Contas. Refere ter achado estranha a coincidência de a desistência ter ocorrido exactamente na data em que iria ser proferida a decisão de recusa de visto. (…) Que no quadro das negociações, o júri, num primeiro momento, em 8 de Abril de 2009, diz que a redacção da cláusula 102.3 é inaceitável e que depois disso, na sequência de uma reflexão e do apoio jurídico prestado, fez com que este acabasse por aceitar, em 8 de Maio de 2009, a cláusula 102.3. Que a ideia da cláusula 102.3 partiu dos assessores jurídicos do consórcio ELOS. 
- o depoimento da testemunha FFFFFF “ Quanto ao Arquitecto QQ declarou que o mesmo era Director de Contratação e Planeamento da RAVE, e que, aquando do início das funções da testemunha na RAVE, o mesmo tinha como função gerir, do ponto de vista técnico, todos os contratos de estudos em execução (cerca de 300). (…)Atenta a multiplicidade e complexidade de estudos em curso, apenas uma fuga de informação por parte de quem dominava o conjunto dos estudos poderia constituir um risco ao nível concorrencial.
- o depoimento da testemunha RRRRRQuestionado acerca de tal comportamento ser, ou não, normal, declarou que, excepto na situação de uma outra concessão - a SCUT do Grande Porto - não teve experiência de uma outra situação paralela de reunião do Primeiro-Ministro com Presidentes do Júri.”
- o depoimento da testemunha SSSSS “A matéria da cláusula 102.3. A mesma foi inicialmente rejeitada porquanto violava o caderno de encargos, tendo-se consignado em acta tal rejeição. (…) Admite que lhe tenha sido solicitado pela tutela que a matéria da cláusula e das outras sujeitas a negociação fossem melhor analisadas dada a importância do contrato em causa. Declarou ter memória de o Presidente do Júri, UUUUU, ter tido uma reunião com o Primeiro-Ministro, não tendo julgado tal reunião estranha, considerando a magnitude do projecto em causa, tratando-se de um «projecto de regime», estando o Primeiro-Ministro presente, por exemplo, na cerimónia inaugural. Não tem memória de ter resultado de tal reunião quaisquer orientações ao nível do procedimento.
- o depoimento da testemunha TTTTTAquando da leitura do texto do contrato, recorda-se de lhe ter suscitado apreensão vários aspectos do mesmo, nomeadamente, a matéria constante da clausula que estipulava as consequências da recusa de visto, bem como a matéria atinente a alterações do perfil de risco. A leitura de tais clausulas, fez-lhe antever o risco serio de recusa de visto pelo TC, tendo expressado tal opinião numa reunião do júri e, ante a indiferença dos mesmos, optado por reportar tais apreensões ao Gabinete do Secretário do Estado das Finanças, Dr. GGGGGG, tendo, na sequência de tal reporte, ido com o respectivo Chefe de Gabinete a Secretaria de Estado dos Transportes onde reuniu com o respectivo/a Chefe de Gabinete. Na ocasião foi-lhe transmitido que as questões que o depoente suscitava já se encontravam devidamente acauteladas através de contactos informais com o TC.”
- o depoimento da testemunha ZZZZZ “  (…)Recorda-se que a cláusula 102.3 foi inserida na fase de negociações, tratando-se de um tema muito polémico.
- o depoimento testemunha HHHHHH “ Questionada a testemunha se se recorda de uma empresa com a firma EMP51..., declarou a mesma não se recordar, apesar de ter uma ideia do nome do arquitecto QQ a propósito da concessão do TGV, identificando-o como um individuo que trabalharia para a RAVE (…)Em momento posterior do depoimento, a testemunha esclareceu que, afinal, não sabia que QQ era da RAVE.
Quanto à reunião do arguido AA com o presidente do júri (sendo certo que os testemunhos são díspares ), o Sr. Juiz não valorou os depoimentos que afirmaram a sua existência, a classificaram de  “estranha” e “anómala”,  assim como não valorou os depoimentos relativos à inclusão da cláusula 102.3 – “pedra de toque” no contrato e que tanto beneficiou o Grupo.
Além disso, o Sr. Juiz não explicou o motivo pelo qual não deu credibilidade àqueles depoimentos.
Diz o Sr. Juiz de instrução “ Há que dizer, por fim, que o simples facto de terem existido obras adjudicadas ao Grupo Lena pela Parque-Escolar, ainda que fossem em número superior a outras as empresas, não constitui, por si só, indício do quer que seja.“
Aqui temos que concordar com o Sr. Juiz quando diz que a acusação não é clara.
Lendo tal peça, parece-nos que o aumento do número de obras adjudicadas ao Grupo Lena, designadamente no exterior do país e que as obras efectuadas no âmbito do designado Parque Escolar, tiveram a intervenção do arguido AA.
Porém, com excepção do episódio relativo às casas de ... e ao TGV, não obstante ser indicado o número de obras adjudicadas, quer a nível internacional, quer a nível nacional, designadamente no âmbito do Parque Escolar, ao Grupo Lena, não é dito de que forma o arguido AA teve intervenção.
É objectivo que nos anos de governação do arguido AA, em que ocorreu uma das maiores crises no sector da construção civil e obras públicas, o GRUPO LENA conseguiu não só aumentar a sua facturação, neste sector, como ver serem-lhe adjudicados contratos públicos que representam cerca de 83% do seu volume de adjudicações. Porém, não está estabelecida a ligação entre o facto e o arguido.
Parece-nos que o MP intuiu que essa intervenção existiu, mas depois não conseguiu passar da intuição.
O próprio recorrente diz :”A acusação em relação às obras adjudicadas ao GRUPO LENA, no âmbito da PARQUE ESCOLAR, apesar de lhe consagrar um subcapítulo autónomo não conseguiu demonstrar que essa mesma adjudicação tenha ocorrido como consequência de uma intervenção do arguido AA, nesse sentido. Razão pela qual não a imputa a tal intervenção. Tal já não sucede em relação quer ao projecto ferroviário português de alta velocidade, quer à construção de casas de habitação, na ..., que são obras adjudicadas ao GRUPO LENA em relação às quais o Ministério Público entende terem sido recolhidos elementos (…)que permitem concluir por uma intervenção do arguido AA de favorecimento dos interesses deste GRUPO, contra os deveres inerentes ao cargo por si exercido”.
Disse ainda o Sr. Juiz que “ o mesmo movimento bancário, ou seja, o mesmo montante com origem na Lena Engenharia e Construções é qualificado pela acusação como suborno quanto ao Contrato de Concessão RAV Poceirão-Caia e como suborno pela intervenção do arguido AA no âmbito da diplomacia económica”
Na decisão instrutória o Sr. Juiz considerou que “ a quantia de 1.468.425,00€ que circulou, ao abrigo do contrato celebrado entre a LEC SA e a XLM, entre 25-11-2009 e 29-3-2011, da esfera do Grupo Lena para esfera da empresa do arguido BB, por não se tratar de peita a ser entregue ao arguido AA, não pode ser qualificada como produto da prática de um crime de corrupção passiva de titular de cargo político”
O Sr. Juiz refere: “Da leitura do artigo 1993 e da conjugação feita com fls. 5 do Apenso Bancário 9, factura nº ...01 e documentos bancários juntos ao Apenso de Busca 16, DOC. 98, fls. 192 e 201-206, verifica-se que o pagamento feito pela Lena Engenharia e Construções à XLM, no dia 25-11-2009, é de 291.000,00€ ;  Da leitura do artigo 2007 e da sua conjugação com fls. 8 do Apenso Bancário 9, factura nº ...02 e documentos bancários juntos ao Apenso de Busca 16, DOC. 98 fls. 207-209, verifica-se que no dia 7 de Janeiro de 2010 (e não 2009 como diz a acusação) foi feito pela Lena Engenharia e Construções à XLM, um pagamento no valor de 291.000,00€. Da leitura do artigo 2027 e da sua conjugação com fls. 14 do Apenso Bancário 9, factura nº ...001 e documentos bancários juntos a Apenso de Busca 14 fls. 286-287, verifica-se que no dia 28 de Maio de 2010 foi feito pela Lena Engenharia e Construções à XLM, um pagamento no valor de 291.000,00€. Da leitura do artigo 2050 e da sua conjugação com fls. 30 do Apenso Bancário 9, factura nº ...03 e documentos bancários juntos a Apenso de Busca 14 fls. 77-78, verifica-se que no dia 16 de Novembro 2010 (e não 26-11-2010 como diz a acusação) foi feito pela Lena Engenharia e Construções à XLM, um pagamento no valor de 293.425,00€.  Da leitura do artigo 2075 e da sua conjugação com fls. 42 do Apenso Bancário 9, factura nº ...04 e documentos bancários juntos a Apenso de Busca 14 A fls. 352, verifica-se que no dia 29 de Março de 2011 foi feito pela Lena Engenharia e Construções à XLM, um pagamento no valor de 302.000,00€
O recorrente explica a diferença de valores, relacionadas com  a contabilização do IVA, ou não.
No que respeita aos valores que circularam ao abrigo do contrato celebrado entre a LEC SA e a XLM, entre 25-11-2009 e 29-3-2011, da esfera do Grupo Lena para esfera da empresa do arguido BB, os mesmos correspondem à soma exacta das facturas em causa.
Entendeu o Sr. Juiz que não havia qualquer indício de que as quantias movimentadas se destinassem a compensar o arguido AA pela sua intervenção, na qualidade de Primeiro-Ministro, em favor do Grupo Lena (Consórcio ELOS) no âmbito do procedimento relativo à Concessão RAV Poceirão-Caia.
Diz que partindo das datas relativas aos alegados pagamentos não é possível fazer, só por si, qualquer ligação lógica ou cronológica, entre as operações bancárias e a tramitação do concurso
Diz o recorrente, com quem concordamos nesta parte, que as facturas em causa e o contrato com data aposta de 31 de Julho de 2009, celebrado em nome das sociedades LEC SA e XLM LIDA, foram elaborados com o único propósito de criar um justificativo para a circulação de fundos da esfera do GRUPO LENA para a esfera formal do arguido BB.
Mais diz: “não pode assim fazer-se, como faz o Senhor JI, um raciocínio de querer imputar à força determinados pagamentos de determinadas facturas a determinados actos até porque o Ministério Público acusou os arguidos AA, BB e GG de um único crime de corrupção em relação a todas as condutas de favorecimento do GRUPO LENA, bem como de um único crime de branqueamento relativamente à utilização da sociedade XLM LIDA, nos anos de 2009 a 2015, para a colocação de fundos destinados ao arguido AA e sua utilização no seu interesse, através do pagamento directo de despesas, ou através da distribuição de dividendos para contas tituladas pelo arguido BB.
O valor do suborno pago, pelo GRUPO LENA, com directo esforço financeiro seu, ao arguido AA, pela sua actuação no favorecimento dos interesses desse mesmo grupo, cifra-se na quantia total de €5.829.925,00, a que acresce, integrada nesse mesmo acordo, a circulação de valores com outras origens, por contas do arguido GG, na ..., e por contas de sociedades do GRUPO LENA, em Portugal.
O Sr. Juiz de instrução justifica a falta de indícios, relativamente à existência dos ditos pagamentos,  nas declarações do arguido AA e na interpretação que o mesmo fez dos documentos relativos às viagens à ....
O Sr. Juiz apresenta como outro argumento para afastar a existência de indícios, os esclarecimentos  prestados pelo arguido BB “de forma clara, rigorosa e convincente; a inexistência de algum documento onde se refira o interesse do então Primeiro Ministro por este projecto.”
Confessamos que estas ilações do Sr. Juiz denotam uma certa “candura/ingenuidade “ na apreciação dos indícios, pois é desde logo evidente que, tratando-se de actos ilícitos, os mesmos não vêm escritos em documentos e, de forma usual, as testemunhas indicadas pelos arguidos não vêm trazer uma versão diferente da destes.
O Juiz tem que apreciar a prova na sua globalidade.
Neste processo, essa exigência é ainda maior porque os meandros e os caminhos traçados pelos arguidos, na vertente da acusação, não são lineares, mas tortuosos, cheios de manobras de diversão.
Não pode afastar-se a existência de indícios só porque a testemunha (por acaso ligada aos arguidos ) nega a versão da acusação.
Não conseguimos compreender esta análise dos indícios efectuada pelo Sr. Juiz.
Na verdade, com o andar dos anos e de acordo com as regras da experiência, o julgador sabe que as coincidências são muito raras, ou nem existem.
- é coincidência a entrada em 2007 (a convite de IIIIII), do arguido PP para o Grupo Lena?
- é coincidência o arguido PP ter desempenhado funções na própria RAVE, exercendo o cargo de vogal do conselho de administração, entre 24 de Setembro de 2004 e Novembro de 2005, altura que se começa a discutir quais os traçados e qual o ordenamento do território onde eventualmente poderia vir a passar o comboio (como o mesmo reconhece no seu interrogatório) ?
-é coincidência o arguido PP ter convidado o arguido QQ para a Rave?
´- é coincidência que ao arguido QQ, enquanto Director da área de Planeamento da Rave, coubesse realizar a calendarização e orçamentação do projecto da RAV, tendo organizado um mapa de rubricas, criando uma matriz de preços unitários a ser utilizada pelos projectistas, com vista à definição de uma estimativa do preço base...”?
-é coincidência que o arguido QQ seja das poucas pessoas na RAVE que eram titulares de “passwords” que lhe davam acesso a uma «Plataforma Colaborativa» onde era carregada toda a informação colhida em sede dos estudos prévios e relativa ao modelo de negócio...”?
- é coincidência que o arguido QQ, já no âmbito do procedimento concursal, tenha integrado a comissão técnica da RAVE encarregada de prestar apoio ao júri nas fases de avaliação e de negociação das propostas, contribuindo para a actividade de avaliação respectiva, designadamente em matéria de credibilidade do cronograma de trabalhos apresentados, sua orçamentação e risco associado à lista de preços unitários, tendo participado na notação técnica da proposta da ELOS, em tal domínio?
- é coincidência que o arguido QQ seja sócio gerente da sociedade EMP51... e que existam entre 30 de Dezembro de 2008 e 01 de Outubro de 2009 facturas emitidas por esta e dirigidas à LMI SA, no valor global de €87.500,00, a que acresceu IVA, no valor de €17.500,00, num total de €105.000,00 , correspondendo, na contabilidade da LMI a uma avença mensal de €5.000,00 que era paga ( sem documentação) ao arguido QQ ( veja-se declarações do arguido PP) – testemunha  HHHHHH  da EMP49... considerou esta relação como “promíscua”?
- é coincidência que no mesmo período o arguido PP  tenha recebido rendimentos no valor total de €17.500,00 pagos pela EMP51... (sendo certo que o mesmo não sabe que trabalhos efectuou para a EMP51...)?
- é coincidência que o concorrente ELOS (onde se insere o grupo Lena) tenha vencido o concurso?
- é coincidência que EEEEEE se referisse às funções do arguido QQ como “contactos variados com o mesmo uma vez que a construção jurídica dependia de “inputs” técnicos para os quais contou com a colaboração de vários técnicos da RAVE, nomeadamente de QQ (...) QQ integrou uma equipa de assessoria que acompanhou o concurso ... QQ coordenava a assessoria técnica. Cada um destes assessores produziu relatórios aquando da preparação do concurso, da avaliação das propostas e das negociações ... haver uma plataforma informática num site na Internet (criados ainda antes do lançamento do concurso) para os quais se fazia o upload dos referidos relatórios e demais documentação ... o acesso era realizado através da atribuição de passwords, admitindo que houvesse?
Como pode dizer-se que o documento de fls. fls. 488, Doc. 13, do Apenso de Busca 115 – mail enviado, a 13 de Maio de 2008, por YYYYY, da EMP49..., para ZZZZZ, da EMP50..., “...com conhecimento a todos os representantes do consórcio ELOS...” (palavras do Senhor JI), incluindo ao arguido PP -, em que se pode ler: “... Caro ZZZZZ, Embora tenhamos conseguido dar algum impulso aos trabalhos de construção, tem-nos preocupado vencer a inércia na definição dos acordo de consórcio, montagem das equipes e início dos trabalhos do agrupamento ao nível da concessionária. Temos acompanhado a evolução da concorrência onde temos notado movimentações. Achamos que poderíamos contribuir mais eficazmente a partir de uma estrutura implementada. Acreditamos também que temos um avanço nos estudos e em acções estratégicas em relação aos demais grupos, o qual não gostaríamos de colocá-lo em causa. Confiamos estar na sua agenda, como co-líder do consórcio, estas mesmas preocupações e neste sentido agradecemos a convocação de uma reunião para que possamos nos actualizar e dar seguimento a consolidação do consórcio e das equipes de trabalho' Um forte abraço, YYYYY ...”. não é um indício forte da existência de informação privilegiada fornecida pelo arguido QQ?
Parece-nos não existirem dúvidas de que actos praticados por QQ a favor do GRUPO LENA, com intermediação das sociedades LMI SA e EMP51..., são inerentes aos deveres do cargo que o mesmo exercia na RAVE, pertencendo os mesmos às suas específicas atribuições ou competências e encontrando-se numa relação funcional imediata com o desempenho desse mesmo cargo, e que o arguido QQ decidiu agir como agiu, com violação desses mesmos deveres face à promessa (concretizada) de entrega de vantagem, neste caso, patrimonial, pela prática desses mesmos actos.
- É coincidência a nomeação de UUUUU (conhece o arguido AA desde os tempos do Ministério do Ambiente) para Presidente do Júri da PPP1?
- É coincidência o arguido AA pretendesse antecipar a data do lançamento do concurso da PP1 para Março (quem beneficiaria)?
As “coincidências “ não ficam por aqui, mas cremos que estas bastam para sustentar a existência de indícios.
Parece-nos evidente o que é dito pelo recorrente relativamente ao papel do arguido AA” O arguido AA exercia o cargo de PM, presidia ao Governo. Não precisava de chegar ao ponto de dar ordens directas, bastava-lhe dar a conhecer a sua posição, manifestar o seu entendimento acerca de determinado assunto.”
O Sr. Juiz assume a existência de irregularidades no concurso – desde logo, foram admitidas alterações, por parte da Elos, de natureza substancial, a cláusulas contratuais atinente a matéria não livremente disponível, apesar das limitações que resultavam dos art. 2º e 4º do programa de Procedimento.
Houve ajustes numa fase negocial em que já só havia um concorrente – o consórcio Elos.
No dia 01 de Outubro de 2010, o Tribunal de Contas notificou a REFER (por fax) que o contrato não poderia produzir qualquer dos efeitos financeiros nele previstos, estando vedada a realização de pagamentos por parte do Estado à concessionária.
A verdade é que mesmo não tendo sido proferida decisão relativa ao visto do TdC, o contrato de concessão manteve-se, na prática, em execução material, continuando assim a gerar despesa pública.
A 09 de Novembro de 2010  a ELOS, apesar de ter sido sua a iniciativa de incluir tal cláusula, pediu à REFER que esclarecesse o seu significado, no sentido de apurar se se encontrava desonerada de continuar a cumprir o contrato, tendo obtido resposta apenas no dia 15 de Março de 2011, cujo teor viria a justificar, por parte da ELOS, em sede de processo arbitral, a alegação de boa-fé na continuação da execução material do contrato (geradora de despesa pública), apesar da verificação do termo suspensivo dos prazos contratuais – Vide Apenso Temático CD, Docs. 24, e 153 a 155, juntos à Petição do processo Arbitral.
ZZZZZ, da EMP50..., quando questionado, em sede de inquérito, acerca da matéria de suspensão dos prazos dos contratos e dos propósitos do consórcio ao enviar tal pedido de esclarecimento, referiu que: “... a intenção era forçar uma tomada de posição por parte da RAVE ... Tal tomada de atitude adveio da circunstância de, ao nível das equipas técnicas da RAVE, haver uma conduta de incentivo à continuação dos trabalhos, nomeadamente em sede de reuniões de técnicos. Refere que apenas com a resposta à carta da concessionária - meses depois da sua remessa - é que deixaram de receber elementos entregues pela concessionária em execução do contrato. Tal circunstância veio a determinar uma desmobilização das equipas”
No dia 21 de Março de 2012, por decisão do Tribunal de Contas foi recusado o visto ao instrumento de reforma do contrato Poceirão-Caia, considerando-se, no Acórdão proferido, com o número 09/2012, verificada a ocorrência de diversas ilegalidades no procedimento concursal, elencadas nos artigos 2081 a 2088 da acusação, e 
- Alteração de cláusulas contratuais definidas como não negociáveis nas regras do concurso, o que deveria ter resultado na exclusão da proposta;
- Violação da Lei e dos princípios de concorrência e igualdade por terem sido alteradas regras do concurso e o caderno de encargos durante o procedimento;
- Existência de uma cláusula ilegal ao sobrepor-se à LOPTC, por prever que em caso de recusa de visto o concorrente tinha direito a ser indemnizado por despesas incorridas para além do disposto na Lei.
Na verdade e no que respeita à cláusula 102.3, o Tribunal de Contas entendeu que a mesma era ilegal já que decorria de um diploma do Governo (Bases de Concessão), o qual não poderia densificar um diploma da Assembleia da República (LOPTC), matéria de reserva absoluta deste órgão de soberania, bem como que a mesma pretendia permitir pagar mais do que os trabalhos realizados, ou os bens e serviços adquiridos, após a celebração do contrato e até à data de notificação da recusa de visto e ainda que era contrária ao requisito de, para poderem ser pagos, os bens ou serviços adquiridos, terem que se enquadrar dentro da programação contratualmente estabelecida.
No entanto, e durante todo o hiato temporal que decorreu entre a verificação do termo inicial do prazo de suspensão dos prazos contratuais e a notificação de recusa do visto, e mesmo após tal notificação, foi gerada despesa pública, conforme decorre dos custos reclamados em sede de processo arbitral, máxime despesas com os contratos financeiros e conexos, celebrados pela ELOS em execução do contrato de concessão.
No dia 26 de Abril de 2013, a ELOS SA, na sequência de acordo arbitral firmado com o Estado a 22 de Janeiro de 2013, instaurou acção arbitral contra o Estado, na qual peticionou o pagamento de uma indemnização no valor global de €168.783.248,00, dos quais 102 milhões correspondem a custos de desenvolvimento e de estrutura para um período de apenas dois anos.
Não obstante a Lei de Organização e Processo do Tribunal de Contas  (LOPTC) expressamente dizer que: Artigo 2.º Âmbito de competência : Estão sujeitas à jurisdição e aos poderes de controlo financeiro do Tribunal de Contas as seguintes entidades: a) O Estado e seus serviços; b) As regiões autónomas e seus serviços; c) As autarquias locais, suas associações ou federações e seus serviços, bem como as áreas metropolitanas; d) Os institutos públicos; e) As instituições de segurança social. 2. Também estão sujeitas à jurisdição e aos poderes de controlo financeiro do Tribunal as seguintes entidades: 3 a) As associações públicas, associações de entidades públicas ou associações de entidades públicas e privadas que sejam financiadas maioritariamente por entidades públicas ou sujeitas ao seu controlo de gestão; b) As empresas públicas, incluindo as entidades públicas empresariais;(…)  E no artº 5 Competência material essencial 1. Compete, em especial, ao Tribunal de Contas: a) Dar parecer sobre a Conta Geral do Estado, incluindo a da segurança social, bem como sobre a conta da Assembleia da República; b) Dar parecer sobre as contas das regiões autónomas, bem como sobre as contas das respetivas Assembleias Legislativas;11 c) Fiscalizar previamente a legalidade e o cabimento orçamental dos atos e contratos de qualquer natureza que sejam geradores de despesa ou representativos de quaisquer encargos e responsabilidades, diretos ou indiretos, para as entidades referidas no n.º 1 e nas alíneas a), b) e c) do n.º 2 do artigo 2.º, bem como para as entidades, de qualquer natureza, criadas pelo Estado ou por quaisquer outras entidades públicas para desempenhar funções administrativas originariamente a cargo da Administração Pública, com encargos suportados por financiamento direto ou indireto, incluindo a constituição de garantias, da entidade que os criou; d) Verificar as contas dos organismos, serviços ou entidades sujeitos à sua prestação; e) Julgar a efetivação de responsabilidades financeiras de quem gere e utiliza dinheiros públicos, independentemente da natureza da entidade a que pertença, nos termos da presente lei (…)  Artigo 8.º Decisões 1. Os juízes do Tribunal de Contas decidem segundo a Constituição e a lei e não estão sujeitos a ordens ou instruções. 2. As decisões jurisdicionais do Tribunal de Contas são obrigatórias para todas as entidades públicas e privadas. Artigo 44.º Finalidade do visto. Fundamentos da recusa do visto 1. A fiscalização prévia tem por fim verificar se os atos, contratos ou outros instrumentos geradores de despesa ou representativos de responsabilidades financeiras diretas ou indiretas estão conformes às leis em vigor e se os respetivos encargos têm cabimento em verba orçamental própria.    31 2. Nos instrumentos geradores de dívida pública, a fiscalização prévia tem por fim verificar, designadamente, a observância dos limites e sublimites de endividamento e as respetivas finalidades, estabelecidas pela Assembleia da República. 3. Constitui fundamento da recusa do visto a desconformidade dos atos, contratos e demais instrumentos referidos com as leis em vigor que implique: a) Nulidade; b) Encargos sem cabimento em verba orçamental própria ou violação direta de normas financeiras; c) Ilegalidade que altere ou possa alterar o respetivo resultado financeiro. 4. Nos casos previstos na alínea c) do número anterior, o Tribunal, em decisão fundamentada, pode conceder o visto e fazer recomendações aos serviços e organismos no sentido de suprir ou evitar no futuro tais ilegalidades.
Artigo 45.º Efeitos do visto 1. Os atos, contratos e demais instrumentos sujeitos à fiscalização prévia do Tribunal de Contas podem produzir todos os seus efeitos antes do visto ou da declaração de conformidade, exceto quanto aos pagamentos a que derem causa e sem prejuízo do disposto nos números seguintes. 2. Nos casos previstos no número anterior, a recusa do visto implica apenas ineficácia jurídica dos respetivos atos, contratos e demais instrumentos após a data da notificação da respetiva decisão aos serviços ou organismos interessados. 3. Os trabalhos realizados ou os bens ou serviços adquiridos após a celebração do contrato e até à data da notificação da recusa do visto podem ser pagos após esta notificação, desde que o respetivo valor não ultrapasse a programação contratualmente estabelecida para o mesmo período. 4. Os atos, contratos e demais instrumentos sujeitos à fiscalização prévia do Tribunal de Contas cujo valor seja superior a € 950 000 não produzem quaisquer efeitos antes do visto ou declaração de conformidade.41 5. O disposto no número anterior não é aplicável aos contratos celebrados na sequência de procedimento de ajuste direto por motivos de urgência imperiosa resultante de acontecimentos imprevisíveis pela entidade adjudicante, que não lhe sejam em caso algum imputáveis, e não possam ser cumpridos os prazos inerentes aos demais procedimentos previstos na lei.
O Tribunal de Contas é o Órgão supremo de fiscalização da legalidade das despesas públicas. Ver a título de exemplo, Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, 26.06.2008 “O Tribunal de Contas, enquanto órgão supremo de fiscalização da legalidade das despesas públicas, ao conceder ou recusar o visto, fá-lo ao abrigo de uma competência jurisdicional própria, sendo as suas decisões obrigatórias para todas as entidades publicas e privadas.”
O Sr. Juiz entendeu que Apesar do entendimento do Tribunal de Contas, constante no acórdão nº 9/12, de 21 de Março de 2012, cumpre dizer que o mesmo não vincula este tribunal, no que concerne à interpretação da norma adoptada no DL que fixou as bases da concessão. Na verdade, estamos perante a ausência de caso julgado preclusivo do poder jurisdicional deste tribunal para apreciar e conhecer da questão da validade da cláusula 102.3 do contrato de concessão.  Cumpre referir, em primeiro lugar, que a disposição contratual colocada em crise no acórdão do Tribunal de Contas (cláusula 102.3 do contrato de concessão), reproduz, ipsis verbis, a norma constante do nº3 da Base XCVIII das Bases da Concessão aprovada pelo DL nº 33-A/2010 de 14 de Abril. O contrato de concessão foi assinado no dia 8 de Maio de 2010.  Deste modo, o contrato de concessão, quanto à cláusula 102.3, reproduz uma norma legal aprovada pelo referido Decreto-Lei, fazendo com que não se verifique uma ilegalidade da citada cláusula.”
 O Sr. Juiz decidiu conhecer da validade da cláusula 102.3 do contrato de concessão, afirmando que o entendimento do Tribunal de Contas não vincula aquele tribunal.
Parece-nos que a questão não se resolve com a interpretação da referida cláusula efectuada pelo Sr. Juiz  .
Ao Sr. Juiz competia analisar a prova partindo dos dados objectivos que eram do conhecimento dos intervenientes à  data dos factos, sendo irrelevante a posição tomada quanto à validade, ou não, da citada cláusula.
A decisão e a análise das actuações dos arguidos tem que ter presente o entendimento do Tribunal de Contas, que, por sua vez, determinou e condicionou o comportamento seguinte.
O Sr. Juiz entendeu que a cláusula 102.3 não contrariava o artigo 45º da LOPTC, nem era violadora do princípio da prossecução do interesse público, fazendo com que, deste dado objectivo nada se possa inferir.
O Acórdão nº 105/2017 do Tribunal Constitucional, tirado no processo Processo n.º 651/2016, não se pronunciou relativamente à constitucionalidade invocada pelo Estado Português relativamente à norma ínsita na Base XCVIII, ponto 3, das Bases da Concessão do Troço Poceirão-Caia da Rede Ferroviária de Alta Velocidade, aprovadas pelo Decreto-Lei n.º 33-A/2010, de 4 de Abril” , pois, mesmo que viesse a ser considerada contrária à Constituição, a decisão arbitral manter-se-ia. Isto porque a decisão arbitral – ao invés do voto de vencido, subscrito pelo Exmo Senhor Professor Doutor Paulo Otero - se fundou apenas na cláusula contratual que regula os efeitos da decisão de recusa de visto. Se bem ou mal, é questão que se supõe ser exclusivamente sindicável por via de recurso ordinário, ao qual as Partes renunciaram.».
O certo é que o júri rejeitou a proposta com a inclusão da referida cláusula e, não obstante, como é pacífico, a mesma foi incluída e permitiu que o consórcio Elos recebesse uma indemnização de €168.783.248,00
*
No âmbito dos mercados internacionais, assumiu papel de destaque a ..., decorrente da adjudicação, ao GRUPO LENA, de obra no âmbito do projecto ..., que contribuiu de forma decisiva para a sustentabilidade financeira deste mesmo grupo, chegando a representar 81% do volume de negócios da LEC SA e consequentemente 42% do volume de negócios do grupo (art.°s 1608, 1615, 1616, 1617).
A actuação do arguido AA, nos anos em que ocupou o cargo de Primeiro-Ministro, foi determinante na negociação e adjudicação desta obra, ao GRUPO LENA (art.° 1618).
Quanto a esta parte o Sr. Juiz descreve, de forma pormenorizada, todos os actos (elencando-os por ordem cronológica) desde o primeiro contacto com a ... até à concretização do acordo relativo à construção das casas.
Além disso, descreve a prova documental e testemunhal que teve em conta para formar a sua convicção.
Parece esquecer-se, tal como já referimos, que não haverá testemunha alguma (pelo menos não houve até esta data) que venha relatar e confirmar, de forma directa, os factos  que constam da acusação. Não haverá, igualmente, nenhum documento de onde resulte essa assunção dos factos.
A análise da prova, mais uma vez, tem que ser global.
A circunstância do Sr. Juiz querer afastar a existência de indícios pelo facto de haver transferências de dinheiro efectuadas com destino a BB ( e subsequentemente, a AA, conforme supra explicámos) que são anteriores à data do início do projecto das casas da ..., traduz uma interpretação dos factos demasiado linear. Ora, este processo nada tem de linear.
Voltamos a referir a expressão do recorrente com a qual concordamos - O arguido AA exercia o cargo de PM, presidia ao governo. Não precisava de chegar ao ponto de dar ordens directas, bastava-lhe dar a conhecer a sua posição, manifestar o seu entendimento acerca de determinado assunto.
Chamamos a atenção para a “diligência” de JJJJJJ e KKKKKK  relativamente à actuação necessária para a formalização do contrato e que se prolongou.  Mesmo após a sua saída do governo estes dois assessores do Primeiro-Ministro continuaram a usar a sua rede de contactos em favor do GRUPO LENA através da marcação de reuniões ou outro tipo de diligências, acabando por assinar contratos de prestação de serviços com a XMI e a EMP23....
Por outro lado, não obstante alguns dos resultados do investimento financeiro do Grupo Lena, na ..., só serem visíveis em datas posteriores à saída do arguido AA do governo, é  facilmente perceptível que a origem destes rendimentos provém de um tempo mais longínquo em que o arguido AA exercia aquele cargo político.
Não podemos deixar de  referir que após 2011 não há, como é óbvio, um novo acordo celebrado entre o arguido AA e os arguidos BB e GG.  Nessa altura o arguido AA já não exercia o cargo de Primeiro-Ministro, nem qualquer outro cargo político, pelo que afastada estaria a prática de qualquer crime que exigisse aquela qualidade.
Isto não significa que não tenha havido intervenção do arguido AA numa época pós governo, designadamente no que diz respeito ao relacionamento comercial do Grupo Lena com a ....
Essa intervenção consta da acusação, não para sustentar, em si mesma, a prática de um crime, mas para corroborar e fortalecer toda a narrativa relativa à intervenção do arguido AA quando era Primeiro Ministro.
Não podemos deixar de referir que o Sr. Juiz, dando-lhe uma outra “roupagem”, é certo, afastou completamente a existência de empréstimo por parte do arguido BB ao arguido AA. Afastou a tese avançada de que a mãe do arguido AA era dona de uma grande fortuna, concluindo que o arguido AA cometeu um crime de corrupção.
Assim:
“Quanto às entregas em dinheiro feitas pelo arguido BB ao arguido AA, bem como quanto ao pagamento de algumas despesas, ambos os arguidos referiram, em sede de instrução, que as quantias em causa traduziram-se em empréstimos realizados pelo arguido BB e por iniciativa deste face às necessidades financeiras do arguido AA. De acordo com ambos os arguidos, esses empréstimos atingiram o valor global de 567.500,00€ e que deste montante o arguido AA já liquidou 250.000,00€. Quanto a esta explicação, tendo em conta os montantes envolvidos, a forma como eram realizadas as entregas e o destino que era dado às mesmas, suscitam-se dúvidas quanto à realidade do alegado pelos arguidos em causa.
Com efeito, as entregas feitas pelo arguido BB ao arguido AA eram em numerário e, em regra, com a interposição de terceiros, o que contraria, em termos da normalidade, a realização de um verdadeiro empréstimo. Na verdade, nada impedia que o arguido BB, atenta a relação de amizade que mantinha com o arguido AA e à disponibilidade financeira que detinha realizasse empréstimos a este arguido. Também é normal, em nome dessa amizade e dessa proximidade, que o fizesse de forma informal e sem exigir qualquer garantia ou retribuição a título de juros.
O que não pode ser qualificado como normal à luz dos critérios da razoabilidade e de experiência comum é que esses empréstimos tenham sido realizados, sobretudo pelos montantes envolvidos, na forma como o foram. Nada impedia que os mesmos tivessem tido lugar por transferência bancária, tanto mais que ambos os arguidos são titulares de contas bancárias e até, como resulta do extracto bancário de fls. 37, Apenso Bancário 11, já tinham recorrido a essa modalidade aquando da transferência bancária no valor de 7.500,00€ realizada no dia 2-9-2010 da conta do arguido BB para a conta do arguido AA.
Há que ter em conta que durante grande parte do período em que ocorreram os alegados empréstimos, o arguido AA residia em ... o que também imponha, por razões de facilidade e comodidade, que esses alegados empréstimos tivessem ocorrido por transferência bancária.
Da análise feita às conversas telefónicas mantidas entre os arguidos BB e AA denota-se um cuidado, traduzido no recurso a uma linguagem codificada, mantido entre os mesmos quando falam sobre entregas de quantias em numerário, o que indicia, também, um conteúdo ilícito subjacente a essas entregas. Com efeito, os arguidos, por forma a evitar a utilização da palavra dinheiro, recorrem à utilização de palavras como “documentos”, “fotocópias” e “livros”, conforme resulta, a título de exemplo, das sessões telefónicas 255523, 28626, Alvo 60090040, 30198, 33316, 38758, Alvo 60085040.
Esse mesmo cuidado por parte do arguido AA mostra-se ainda mais evidente se tivermos em atenção o conteúdo da conversa telefónica mantida entre este arguido e o arguido UU, no dia 11-7-2014, sessão 31617, Alvo 60504040, através da qual o arguido AA repreende o segundo arguido na sequência do contacto telefónico feito por este para a testemunha FFFF, no dia 11-7-2014, sessão 31591, Alvo 60504040, onde refere já ter os “documentos”. 
Acresce que muitas das entregas em numerário feitas pelo arguido BB ao arguido AA tiveram como destino terceiros, como é o caso das entregas feitas às testemunhas KKKK, MMMM e NNNN, o que contraria o argumento avançado pelo arguido AA de que esses empréstimos estavam relacionados com as suas necessidades económicas decorrentes da sua deslocação para ... enquanto estudante.
Em face do exposto, indicia-se que as quantias em causa não correspondem a um empréstimo, mas sim a entregas relacionadas com as funções de Primeiro-Ministro exercidas pelo arguido AA e como contrapartida pela disponibilidade por este manifestada perante o arguido BB.
Mostra-se indiciado que existem entregas de dinheiro por parte do arguido BB ao arguido AA, bem como pagamentos feitos por aquele arguido a favor deste, no montante global de 1.727.398,56€.
No entanto mostra-se indiciado, como acabamos de referir, a existência de entregas em numerário e pagamentos feitos pelo arguido BB ao arguido AA que, quer pela forma como foram entregues, quer pelos montantes envolvidos e perante a ausência de elementos de prova que sustentem a versão do alegado empréstimo por parte do arguido BB, indiciam uma aceitação de vantagem patrimonial por parte do arguido AA, na qualidade de Primeiro-Ministro, por parte do arguido BB.
O modo como a entregas em numerário, bem como os pagamentos, foram realizadas, o modo como foram usufruídas, nomeadamente com a interposição de terceiros, e o facto do arguido BB exercer funções no domínio da angariação de obras, projectos e solução de dificuldades do Grupo Lena junto de clientes, levam-nos a presumir que as entregas em numerário tinham como objectivo criar um clima geral de simpatia ou de permeabilidade por parte do Primeiro-Ministro, ou aquilo a que o Ministério Público designou em sede de debate instrutório, de “compra da personalidade”.
Quanto aos contratos entre a RMF Consulting e pessoas da esfera do arguido AA, a acusação identifica os contratos entre a RMF e YY e XX, através da qual a RMF pagou, entre Setembro de 2012 e Outubro de 2014 79.502,50€ e os contratos entre a RMF e VV e WW, através da qual a RMF pagou, entre Janeiro de 2013 e Outubro de 2014, 83.900,00€ (artigos 12599 e 12640).
Mostra-se indiciado, conforme análise da prova feita no capítulo relativo ao arguido NN, que estes contratos e estes valores pagos tiveram lugar no interesse do arguido AA.
Assim sendo, do montante global de 840.927,50€ que circulou da XLM para a RMF, que segundo a acusação pertencem ao arguido AA, apenas se mostra indiciado que 163.402,50€ foram utilizados no interesse deste arguido, ou seja, os montantes pagos às testemunhas VV, WW, YY e XX.
Tendo em conta estes elementos de prova, indicia-se que o arguido AA fez pagamentos em numerário ao arguido UU, a título de salário, no valor global de 24.450,00€.
Uma vez que na conta bancária do arguido AA, Apenso Bancário 11, não existem levantamentos em numerário compatíveis com os valores entregues ao arguido UU, isso indicia que os valores entregues a este arguido tiveram origem nas entregas em numerário feitas pelo arguido BB ao arguido AA.
A sessão telefónica 1465, de 19-10-2013, do Alvo 60504040, conversa mantida entre o arguido UU e uma pessoa identificada como LLLLLL, indicia que os pagamentos feitos ao arguido UU não têm origem no arguido AA, na medida em que o próprio arguido UU refere, embora sem identificar a origem, que o dinheiro “Aquilo não veio de bancos, não veio de nada, aquilo vem do esconderijo, pronto”.
As únicas operações bancárias efectuadas na conta do arguido AA relativas a pagamentos ao arguido UU são as ocorridas em 30-9-2014 e 6-11-2014.
Os arguidos BB e AA admitiram a realização destas entregas em numerário que qualificaram como sendo um empréstimo do arguido BB ao segundo arguido.
Assim sendo, mostra-se indiciado que o valor pago ao arguido UU, no montante de 24.450,00€, tem origem nas quantias entregues em numerário ao arguido AA pelo arguido BB e nos levantamentos realizados por este na conta BES ...06 (1.169.700,00€) (Apenso Bancário 1).
Para além destes valores, mostra-se indiciado que o arguido BB procedeu ao pagamento das contribuições para a segurança social relativas ao arguido UU enquanto trabalhador do arguido AA, no valor de 4.472,84€. Com efeito, do depoimento da testemunha MMMMMM e da análise feita ao Apenso Bancário 140 (conta titulada pela testemunha MMMMMM), resulta que esta exerceu funções para as empresas do arguido BB e que realizou pagamentos à Segurança Social relativos ao arguido UU. 
Da análise feita aos movimentos a débito na conta em causa, verifica-se que o arguido AA, nos períodos relativos às férias em ... (28-12-2008 a 2-1-2009), ... (11-6 a 14-06 de 2009) em ... (1-8-2009 e 14-8-2009), em ... (26-12-2009 a 2-1-2010), ... (21-4 a 24-4-2010), ... (6-8-2011 e 20-8-2011), ... (11-7 a 26-7-2012), ... (31-12-2012 e 3-1-2013) ... ( 23- a 27-08-2013) ... (28-12-2013 e 3-1-2014), ... (8-7-2014 e 19-7-2014) e ... (5-8 a 17-8-2014), não realizou movimentos na sua conta e nem no período anterior existem operações de levantamento em numerário. Cfr. Fls. 29, 30, 37, 41, 42, 49, 51, 59, 62, 68 do Apenso Bancário 11.
Estes elementos indiciam que o arguido AA não procedeu ao pagamento de despesas relacionadas com as suas férias com dinheiro proveniente da sua conta bancária e nem utilizou os cartões de crédito para realizar pagamentos durante os períodos em causa. Confrontado, em sede de instrução, com este facto, o arguido explicou que costumava viajar com quantias em numerário que lhe eram dadas pela sua mãe.
A explicação avançada pelo arguido AA, quanto a este aspecto, não se mostra coerente se tivermos em conta as regras da experiência comum. Com efeito, não se mostra razoável, sobretudo nos tempos actuais, que alguém viaje com grandes quantias em numerário, 10.000,00€, como chegou a admitir o próprio arguido, e que todos os pagamentos sejam realizados em numerário. Para além disso, não se mostra indiciado que nas contas bancárias de YYY, mãe do arguido AA, existam operações de levantamento em numerário compatíveis com os valores alegados pelo arguido e com os períodos que antecederam as férias.
Do depoimento de YYY não resulta qualquer referência, apesar de ter referido que dava dinheiro ao arguido AA consoante o que este pedia, a entregas em numerário. As únicas referências que fez foram as entregas através da CGD aquando da venda do imóvel na ....
Há que referir, ainda, conforme resulta dos extractos bancários da conta titulada por YYY, Apenso Bancário 2, que o único rendimento com carácter regular é a pensão paga pelo Instituto da segurança Social no valor de 278,19€, o que contraria a versão do arguido quanto à disponibilidade financeira da sua mãe.
Das intercepções telefónicas, em particular das conversas mantidas entre o arguido AA e YYY, sessões 306, 456, 453, 6607 do Alvo 60085040 resulta que esta, em alguns momentos, indicia dificuldades financeiras e que o arguido AA, através de meios financeiros com origem no arguido BB, fez chegar, por intermédio do arguido UU, quantias em numerário a sua mãe (cfr. Sessões 523, 524, 525, 541 Alvo 60090040, sessão 722 do Alvo 60085040 e sessão 2541 do Alvo 60504040).
A conversa telefónica mantida entre o arguido AA e YYY nos dias 12 e 14-3-2014, sessões 17986, 18136 e 18199 do Alvo 60085040 reforça a conclusão quanto à ausência de meios financeiros por parte da mãe do arguido. Com efeito, o conteúdo da conversa em causa indicia que a mãe do arguido estaria em dificuldades financeiras e que pede ajuda ao arguido AA e que este arguido, através do arguido UU, procedeu à entrega a YYY de uma quantia em numerário.
A testemunha YYY admitiu ter pedido dinheiro ao seu filho AA e que este lhe fez chegar quantias em numerário através do arguido UU. Quanto ao motivo desses pedidos, explicou que era por não gostar de se deslocar ao banco.
Do conteúdo da conversa telefónica não transparece que o motivo para os pedidos em numerário seja o invocado pela testemunha quando inquirida em sede de inquérito.
O mesmo se verifica no dia 19-8-2014 com a entrega de 4.000,00€ em numerário, através da empregada NNNNNN, conforme resulta do conteúdo das conversas telefónicas mantidas entre o arguido AA e a sua mãe através das sessões 80657 e 81229 do Alvo 60085040.
Para além disso, das declarações do arguido UU prestadas perante o MP, resulta que este procedeu, a pedido do arguido AA, à entrega de envelopes contendo dinheiro a YYY, mãe do arguido AA. Estas declarações foram corroboradas pelo depoimento de YYY.
Deste modo, esta situação contraria a versão apresentada pelo arguido AA, em sede de instrução, no sentido que a sua mãe disponha de quantias em numerário em casa e que gozava de grande capacidade financeira fruto de heranças.  
Da conjugação destes elementos de prova, indicia-se que todas as despesas relativas às férias acima referidas foram pagas pelo arguido BB.
Assim sendo, mostra-se indiciado que entre 1-8-2008 e 5-8-2014 o arguido BB pagou ao arguido AA o montante de 210.055,51€ relativo a despesas de férias.
Dos elementos de prova constantes do Apenso Bancário 1 e 16, contas dos arguidos BB e UU, mostra-se indiciado que este arguido procedeu ao pagamento, após ter recebido valores com origem no arguido BB, de despesas relativas a viagens do arguido AA emitidas pela agência ..., entre 2011-2013, no valor de 42.392,57€.
Deste modo, mostra-se indiciado que a quantia de 42.392,57€ paga através da conta bancária do arguido UU foi realizada no interesse do arguido AA e que a mesma tem origem no arguido BB.
Quanto às entregas em dinheiro feitas pelo arguido BB ao arguido AA, bem como quanto ao pagamento de algumas despesas, ambos os arguidos referiram, em sede de instrução, que as quantias em causa traduziram-se em empréstimos realizados pelo arguido BB e por iniciativa deste face às necessidades financeiras do arguido AA.
De acordo com ambos os arguidos, esses empréstimos atingiram o valor global de 567.500,00€ e que deste montante o arguido AA já liquidou 250.000,00€.
Quanto a esta explicação, tendo em conta os montantes envolvidos, a forma como eram realizadas as entregas e o destino que era dado às mesmas, suscitam-se dúvidas quanto à realidade do alegado pelos arguidos em causa.
Em face do exposto, indicia-se que as quantias em causa não correspondem a um empréstimo, mas sim a entregas relacionadas com as funções de Primeiro-Ministro exercidas pelo arguido AA e como contrapartida pela disponibilidade por este manifestada perante o arguido BB.
Com efeito, apesar da relação de amizade que existia entre os arguidos BB e AA, as entregas em numerário, pelas razões referidas no parágrafo precedente, não podem ser concebidas no contexto da pessoalidade, mas apenas no âmbito da funcionalidade. Foi o facto de o arguido AA ser Primeiro-Ministro que conduziu àquelas entregas. “
*
Por fim e relativamente à Decisão Instrutória, notamos que houve da parte do Sr. Juiz uma preocupação em efectuar uma análise exaustiva da prova, parecendo-nos, porém, que a certa altura se afastou do objectivo da instrução e realizou diligências típicas de um verdadeiro julgamento, com a diferença (essencialíssima) que a totalidade da prova não foi produzida perante o mesmo Sr. Juiz.
Há indícios muito fortes relativamente à intervenção dos arguidos supra referidos, impondo-se, por isso, a pronúncia de
UM CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA DE TITULAR DE CARGO POLÍTICO, praticado pelo arguido AA em co-autoria com o arguido BB, com referência a actos praticados no interesse do Grupo LENA entre 2005 e 2011, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.º 1.°, 2.°, 3.°, n.º 1, alínea d), 16.°, n.º 1 da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n.º 108/2001, de 28 de Novembro
Um CRIME DE CORRUPÇÃO ACTIVA DE TITULAR DE CARGO POLÌTICO,  praticado por GG relativamente a pessoa do arguido AA, este com mediação do arguido BB e em benefício do Grupo LENA, com referências aos anos de 2005 a 2011, crime p. e p. pelos arts. 2°, 3°, n.º 1, alínea d) e 18°, n.º 1 da Lei 34/87, de 16 de Julho, com a redacção introduzida pela Lei n° 108/2001
Um CRIME DE CORRUPÇÃO ACTIVA, praticado por BB em co-autoria com os arguidos GG e PP, relativamente ao funcionário QQ, nos anos de 2007 a 2009, crime p. e p. pelo art.º 374. °, n.º l do Código Penal;
Um CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA,praticado por QQ relativamente aos pagamentos recebidos enquanto Director da RAVE, no âmbito da PPP, mediante acordo celebrado com a XMI crime p. e p. pelo art.º 372. °, n.º 1 do Código Penal, com referência ao art.º 386. °, n.ºs 1 e 2 do mesmo diploma legal.
1.3.5.2 GRUPO GES
Estão aqui em causa os seguintes crimes:
UM CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA PARA ACTO ILÍCITO DE TITULAR DE CARGO POLÍTICO, praticado por AA, com referência a actos praticados no interesse do arguido CC, relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.º lº, 2.°, 3.°, n.º 1, alínea d), 16.° da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n° 108/2001, de 28 de Novembro(Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos).
Um CRIME DE CORRUPÇÃO ACTIVA  PARA ACTO ILÍCITO DE TITULAR DE CARGO Político, praticado por  CC relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES no que concerne aos pagamentos efectuados ao arguido AA, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. l°, 2°, 3°, n.º 1, alínea d), 18°, n.º 1 da Lei 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n° 108/2001, de 28 de Novembro- Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos.
Um CRIME DE CORRUPÇÃO ACTIVA praticado por CC, relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES no que concerne aos pagamentos efectuados ao arguido RR, crime p. e p. pelo arts. 374°, n.º 1 do Cód. Penal, com referência ao 386°, n.º 2 do mesmo diploma legal;
Um CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA, praticado por RR relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES no que concerne aos pagamentos recebidos do arguido CC com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, crime p, e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 372°, n.º l e com referência  386°, n.º 2, todos do Código Penal;
*
 Um CRIME DE CORRUPÇÃO ACTIVA praticado por CC relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES no que concerne aos pagamentos efectuados ao arguido SS, crime p. e p. pelos arts. 374°, n.º 1 do Cód. Penal, com referência aos art . 386°, n.º 2 do mesmo diploma legal;
Um CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA praticado por SS, relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES no que concerne aos pagamentos recebidos do arguido CC com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts.372°, n.º l e com referência ao art. 386°, n.º 2, todos do Código Penal;
Quanto ao crime de corrupção que tem como corruptor o arguido CC e como corrompido o arguido AA, afigura-nos que existem indícios  mais do que suficientes para concluir pela pronúncia dos arguidos.
Obviamente que não vamos encontrar prova directa dos factos – não  se percebe o espanto do Sr. Juiz de instrução quando diz que nada consta nos extractos bancários do arguido AA.
Os indícios vêm da análise de outras provas.
Vejamos.
Os recebimentos de dinheiro, pelo arguido AA,  dos pagamentos efectuados pelo arguido CC, parecem-nos evidentes
Há todo um esquema montado que permite que o dinheiro saído da esfera do arguido CC chegue à disponibilidade do arguido AA.
O dinheiro passa por vários caminhos, variando de acordo com a  quantidade e o momento em que é efectuado, chegando a pessoas próximas do arguido AA que, sem que o dinheiro entre na conta bancária deste ( a ter entrado havia transparência) fazem-no chegar ao destinatário.
A posição do arguido CC à data dos factos contantes da acusação está bem relatada nesta peça.
Desde 1991 que o arguido tem nas suas mãos o grupo BES, que gere de acordo com a sua vontade. Isto,  não obstante a tomada de decisões pelo Grupo estar formalmente atribuída aos seus órgãos sociais e a outros administradores e quadros.
O BES detinha, igualmente, uma participação directa no capital da PORTUGAL TELECOM SGPS, que, no final de 2005, era de cerca 8,3%.
Conseguiu o arguido CC, igualmente, dominar a PT através da  colocação de pessoas da sua confiança em lugares cimeiros do GRUPO PORTUGAL TELECOM, executivos da sua confiança pessoal por dele terem dependido em termos profissionais ou com ele terem proximidade pessoal.
Entre 2002 e 2006, o cargo de Presidente Executivo da PORTUGAL TELECOM foi ocupado por FF, que, entre 1990 e 1995, tinha sido Administrador do BES e do BESI, banco este a que regressou em 2006, logo após ter saído da PT, desta vez para ocupar O cargo de Vice-presidente do Conselho de Administração (Apenso CL, 3.° volume, fls. 76-80).
Em Março de 2006, o arguido SS foi designado para a presidência da administração da PT SGPS por indicação do arguido CC.
A estratégia do arguido CC, para o domínio da gestão do GRUPO PORTUGAL TELECOM em beneficio dos interesses do BES, passou também pelo financiamento da compra de ações por estrutura societária em que o GRUPO ESPÍRITO SANTO, de forma oculta, tinha participação.
Foi o que ocorreu em 20 e 21 de Dezembro de 2001 com a tomada de posição qualificada no capital social da PT SGPS através da compra de 23 milhões de acções pela sociedade EMP54... com financiamento do BES no valor de 137 milhões de euros (Aba 141, fls. 3).
Utilizando o BES para financiar a aquisição de ações por veículo societário em que empresa do universo GES tinha participação, o arguido CC conseguiu contornar os Estatutos da PT SGPS que limitavam a 10% os direitos de voto de cada acionista e logrou ainda ver indicado, para o Conselho de Administração, administrador conivente com os seus interesses, o empresário OOOOOO.
Com a OPA da EMP55... o que aconteceu?
O arguido CC viu o monopólio que geria há tantos anos ser ameaçado.
Daí as diligências tomadas por este, como forma a garantir que, na Assembleia Geral, a OPA fosse rejeitada, o que implicava,  desde logo, que  o grupo EMP55... não conseguisse a desblindagem dos estatutos da PT que não permitiam a nenhum accionista direito a voto superior a 10 % do capital social, mesmo que dispusesse de mais.
Esta forma de dividir a PT por vários accionistas, não permitindo a congregação, num único, de uma percentagem que lhe conferisse maioria,  foi durante todos estes anos favorável aos interesses do arguido CC.
Tinha, pois, que garantir que os estatutos não eram desblindados, o que, implicitamente, significava a rejeição da OPA da EMP55....
A acusação refere o que foi feito pelo arguido CC junto de terceiros – ... e a Fundação ... - para conseguir novos accionistas da PT, financiados pelo BES -  que fossem compondo o número necessário de votos desfavoráveis à referida alteração dos estatutos.
PPPPPP, um dos maiores empresários de telecomunicações a nível mundial, accionista maioritário da sociedade ... EMP56..., S.A. (EMP56...), representou a aquisição de acções da PT em plena pendência da OPA como uma boa oportunidade para realizar mais-valias (Apenso CL, 7.º volume, fls. 10-13).
Parece-nos evidente que o arguido CC, atento o que estava em jogo – perder a maior financiadora do BES – tenha agido em todas as frentes.
Note-se que tinha sido celebrado um “Acordo de Parceria Estratégica no âmbito da "Nova Economia", cobrindo as áreas das novas tecnologias, comunicações, conteúdos e comércio electrónico nos termos do qual, a CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS e o GRUPO BANCO ESPÍRITO SANTO comprometeram-se a considerar o GRUPO PORTUGAL TELECOM como seu fornecedor preferencial de serviços de telecomunicações, e a PORTUGAL TELECOM passou a considerar aqueles dois grupos como seus fornecedores preferenciais de produtos e serviços financeiros. Além disso, em 31 de Dezembro de 2005, a PORTUGAL TELECOM detinha, direta e indiretamente, uma participação no capital social do BANCO ESPÍRITO SANTO de 4,04%.
Aquando da OPA, o arguido CC não se limitou a conseguir que o arguido AA se dispusesse, caso necessário, a usar da sua influência /poder, junto da CGD e no uso da Golden Share.
A actuação junto do arguido AA não dependia do resultado.
Explicando: o arguido AA comprometeu-se a usar a sua influência, designadamente junto da CGD, com total desrespeito e violação dos deveres próprios desse mesmo cargo. Não é uma conduta que se esgote, ou que se possa esgotar num só acto, é uma conduta reiterada ao longo do tempo em que tal situação – exercício do cargo em causa – se manteve.
O comportamento do arguido AA, conforme descrito na acusação é contrário ao princípio da livre concorrência e ao princípio da igualdade, que está obrigatoriamente subjacente ao exercício de cargo político.
Lembremos que as funções do Primeiro Ministro são vastas e descritas no art. 183º da CRP.
Como já defendemos supra, atenta a abrangência das actividades inerentes a este cargo político específico, o conceito de “deveres do cargo” deve acompanhar essa dimensão
Na verdade, como resulta claro dos autos, a CGD votou contra a alteração dos Estatutos. As testemunhas ouvidas referem que esta decisão não teve qualquer intervenção do arguido AA.
Temos para nós, que tal facto acaba por ser indiferente, dado que o arguido concordou com a “missão” que lhe foi pedida, tendo recebido por isso, como se poderá comprovar pela rota do dinheiro que analisaremos mais à frente.
É verdade que o voto contra da CGD não permitia, por si só, impedir a alteração dos estatutos da PT. Se a CGD tivesse sido de apoio à OPA esta teria sido igualmente chumbada.
No entanto, todos os meios possíveis de “contaminação” da votação tinham que estar operacionais, pressupondo que, na falha de um deles, funcionaria outro.
Na verdade, o arguido CC, conseguiu os seus objectivos – não foi permitida a alteração dos estatutos.
Desta forma, a OPA da EMP55... estaria votada ao insucesso dada a existência da dita regra relativamente ao valor máximo de votos, independentemente do número de  acções – 10%.
Quanto ao sentido de voto do Estado, o depoimento de QQQQQQ (representante do Estado) é claro: “A testemunha recorda que a sua primeira intervenção, em sede de representação do Estado, em sede de AG da PT, ocorreu para a Assembleia designada para 21/04/2006, tendo nessa ocasião, na véspera da data designada para a Assembleia, reunido com o Ministro KKKKK e com os Secretários de Estado, GGGGGG, do Tesouro e Finanças e PPPPP, Adjunto do Ministro das Obras Públicas, no sentido de precisar as instruções que iria receber para o sentido de voto na referida Assembleia (…)tem ideia de que nessa altura constariam da agenda apresentada pelo CA da PT algumas questões que haviam sido consideradas como medidas anti OPA por parte da CMVM, tais como a aquisição de acções próprias ou a emissão de obrigações convertíveis em acções, tanto quanto nesta data consegue recordar. Recorda que a instrução recebida era no sentido de que caso as referidas questões ainda permanecessem em agenda para a referida AG, o representante do Estado deveria sugerir ao CA da PT a retirada dessas questões da agenda da Assembleia e que, caso tal não fosse feito, votaria contra as mesmas. Ainda segundo recorda, as referidas questões controversas, já não constariam da agenda da Assembleia, quando a mesma se iniciou. Recorda-se que para essa Assembleia o depoente era não só o representante das acções de Classe A, detidas pelo Estado, como ainda era o representante das acções detidas pela PARPUBLICA e pelo FUNDO DE CAPITALIZAÇÃO DA SEGURANÇA SOCIAL. (…) Por via dos mesmos colegas que recebeu, por via verbal, as indicações necessárias para o sentido de voto que deveria manifestar na referida AG. Tais instruções eram no sentido de se abster no que diz respeito à votação sobre a alteração de estatutos da PT, que implicava a designada desblindagem, eliminando o limite de votos fixado em 10%, mesmo que o accionista tivesse uma participação social superior (…).Confrontado com a existência de diversos pontos na agenda, para além do relativo à desblindagem dos estatutos, que seria o ponto 3 da agenda da referida AG, conforme acta e convocatória, nesta ocasião exibidos e perguntado sobre quais as instruções de voto quanto a essas outras questões, em particular quanto ao ponto 4 da agenda, caso viesse a ser aprovada a desblindagem dos estatutos, esclareceu que não se recorda das instruções recebidas quanto a essas outras questões, sendo certo que o ponto fulcral para deliberação na referida AG era o relativo à desblindagem dos estatutos. Recorda-se que para a referida AG, lhe terão sido disponibilizados contactos telefónicos de um Ministro que pensa que era o Eng.º KKKKK, e de um Secretário de Estado, que admite ser o Dr. GGGGGG, pelo que, caso fosse necessário obter novas indicações por parte dos titulares do Governo, poderia realizar o contacto telefónico para obter indicações de sentido de voto. Admite que tal contacto telefónico fosse recurso previsto para casos em que fosse imprevisivelmente a deliberação de qualquer questão relevante, uma vez que nunca se sabe se no decurso da Assembleia, se suscitam questões surpresa, que acabam por ser sujeitas a votação. Perguntado se, caso viesse a ser colocada a votação, a questão do ponto 4 da agenda da AG, que dizia respeito à aquisição pelo Grupo EMP55... de mais de 10% do capital social, qual seria o seu sentido de voto, o depoente reafirma não se recordar da instrução recebida quanto a esse ponto, sendo certo que o mesmo não chegou a ser sujeito a votação, uma vez que não foi aprovada a alteração dos estatutos, admitindo que caso necessário, poderia fazer os contactos com os responsáveis do poder político, por via telefónica como acima já referido. O depoente acrescenta ainda que na sua ideia, o sentido de voto quanto a esse quarto ponto da agenda, pensa que seria também no sentido da abstenção, por coerência com a posição assumida quanto à questão do ponto 3”.
Está junto aos autos o Despacho Conjunto efectuado pelo Ministro das Finanças e da Administração Pública, Obras Públicas, Transportes e Comunicações com o seguinte teor”  É nomeado representante do accionista Estado na Assembleia Geral da Portugal Telecom, SGPS, SA, a realizar em 2 de Março de 2007, pelas 15 horas, no ..., sito na Praça ..., em ..., o Professor QQQQQQ, a quem são conferidos todos os poderes necessários para nela intervir, deliberar e votar todos os pontos da respectiva ordem de trabalhos, praticando tudo quanto necessário ou conveniente se mostre à defesa dos interesses do Estado, que assim lhe é cometida. ..., 27 de Fevereiro de 2007
Diz o Sr. Juiz:
- O que resulta dos autos – das escutas e de todos os meios de prova pertinentes (depoimentos dos arguidos, depoimentos testemunhais, agendas) – e que é público e notório, é que AA não é nem nunca foi próximo de CC.
- Que durante o período em que foi primeiro ministro nunca o visitou no seu gabinete, nunca foi a sua casa, nunca ligou para o seu telemóvel particular, que aliás desconhecia, nem nunca recebeu nenhuma chamada deste.
- Desde que saiu do governo AA nunca mais falou, pessoalmente ou por telefone, com o Dr. CC até Julho de 2014, altura em que o Dr. CC lhe ligou por engano.
Estas afirmações são negadas pelo teor das conversas telefónicas entre os dois arguidos – AA E CC.
Este último trata o primeiro por “AA...” e combinam um jantar na casa do arguido CC.
O arguido AA manda cumprimentos para a mulher do arguido CC que foi sempre muito gentil com ele. Cfr. sessões 06853, 25118, 68410, 103600, 109096, Alvo 60085040.
Diz ainda o Sr. Juiz que na agenda física do Primeiro Ministro, que determinou fosse junta aos autos, não existem marcações de contactos entre este e o arguido CC em data próxima da Assembleia Geral.
Tendo em consideração o crime imputado aos arguidos, analisar as agendas da altura em que o arguido AA era Primeiro Ministro para concluir, quando e quantas vezes, houve encontro entre os dois arguidos é risível.
A corrupção não costuma ter hora marcada.  Parece-nos óbvio que os actos de corrupção não costumam estar marcados em agenda.
Diz-se da Decisão Instrutória “O que ficou evidente nesta instrução é que houve pressões sobre o Governo  – mas elas vieram da EMP55.... Do depoimento do arguido AA resulta que nunca da parte nem de SS, nem de RR  nem de CC, nem de qualquer outro accionista da PT foi feita qualquer pressão para que o estado de desviasse da sua posição de abstenção.
Mas houve da parte da EMP55...: o seu presidente, RRRRRR, ligou-lhe uns dias antes da assembleia geral para lhe pedir que  interviesse no sentido de dar uma orientação à caixa para que esta votasse a favor, violando assim a posição de neutralidade do estado. “
Esta pressão da EMP55..., dizemos nós,  não tinha como contrapartida o pagamento de qualquer quantia ao arguido AA.
A EMP55... pressinou o Governo para que permitisse o mercado funcionar e isso só aconteceria com a alteração dos estatutos.
A Venda da EMP57... e a parceria com EMP58...
Diz o Sr. Juiz que os factos demonstram  que a utilização da Golden Share foi feita contra os interesses dos principais accionistas que aprovaram a operação em AG, designadamente do GES, contra a opinião da administração da PT e contra a opinião de CC.
A acusação fala num “acordo” entre o arguido AA e CC, tendo este manifestado uma posição contrária à venda apenas como forma de não ser visível a sintonia de interesses daqueles dois.
Existindo ou não um “teatro” entre o arguido AA e CC no que toca à venda da EMP57..., o certo é que, no final, o arguido CC conseguiu o que queria – a manutenção da PT no ..., com a fusão da EMP59.../EMP58... e o afastamento da Telefónica (apoiante da Opa da EMP55...)
No que respeita aos arguidos RR E SS, resulta dos autos que estes, relativamente à questão da OPA, actuaram sempre da forma que melhor salvaguardava os interesses do BES, em detrimento dos interesses da PT.
Estes estiveram envolvidos na  formação de uma minoria de bloqueio da Oferta, ficando, no entanto, a sua eficácia dependente do número de accionistas que comparecessem na Assembleia-Geral e, destes, aqueles que não se abstivessem.
Não se diga que o facto dos arguidos SS e RR terem desenvolvido estudos, consultas, roadshows para cativar investidores e toda uma estratégia de reacção à OPA é uma demonstração de que não era certo o apoio do Governo. Como dissemos supra, todos os meios tinham que estar  operacionais, sendo  que, mesmo com o voto da CGD em sentido negativo, tal não significava a vitória da manutenção dos estatutos da PT
Um dado indesmentível é a circunstância de, com as promessas efectuadas aos accionistas que votaram contra a OPA, a execução desse pacote de accionistas ter representado cerca de metade do valor da empresa em bolsa.
Após a OPA o número de acções que constituíam o capital social da PT SGPS (1.128.856.500) e a cotação de 10,28 euros de cada acção em bolsa a 20 de Fevereiro de 2007, data da apresentação da contraproposta do Conselho de Administração da PT SGPS, executada nos termos acima expostos, o custo de 5,8 mil milhões de euros de execução do pacote accionista prometido representou cerca de metade do valor da empresa em bolsa, isto é, 11,6 mil milhões de euros (Apenso CL, 6.º volume, fls. 326-355).
Temos como certo, voltando ao início, que o arguido AA aceitou a oferta que lhe foi efectuada pelo ARGUIDO CC, iniciando-se aí o percurso do dinheiro, como é bem retratado nos diagramas supra.
O mesmo aconteceu relativamente aos arguidos RR E SS - o arguido SS foi informado pelo arguido CC de que iria receber essas transferências e, após ter sido informado, pelos agentes ..., de que o segundo montante havia sido creditado na sua conta, confirmou ao arguido CC, por mensagem enviada do seu telemóvel no dia 17 de Janeiro de 2012, pelas 15h13, que já havia recebido o pagamento na ... – conforme sessão 1207, do alvo 49232M.
Em 20 de Dezembro de 2011, após ser informado por CC de telefonema de SSSSSS que estaria aflitíssimo e por isso lhe solicitou os bons ofícios para desbloquear a negociação entre a EMP60... e a PT, RR acatou a ordem de CC para que avançasse para fechar o negócio (cf. sessões 354 e 389 do alvo 49232M, transcritas no Apenso de transcrição 38, fls. 21 a 26).
Também nesse telefonema, quando CC, após referir que a OPWAY, holding do GES que agregava empresas das áreas da construção, imobiliário e indústria, estava a concorrer a concurso lançado para a construção do data center da PT na ..., lhe solicitou que visse se podia fazer alguma coisa, RR respondeu-lhe que assim o faria, vindo a OPWAY a ser escolhida para a construção do edifício (cf. sessão 389 do alvo 49232M, transcrita no Apenso de transcrição 38, fls. 23 a 26, e documentos a fls. 177 a 181 do 8.º volume do apenso CL).
Apesar da PT ter pouco interesse, acabou por aceitar a outorga do contrato pelo valor de 1 milhão de euros durante 10 anos, tendo informado o arguido CC, uma vez que tal decisão era importante para o BES. (cf. sessões 1848, 1864 a 1870, 1872 a 1875 e 1878 a 1879 do alvo 49232M, transcritas no Apenso de transcrição 38, fls. 75 a 85 e ainda documentos a fls. 1 a 29 do 8.º volume do apenso CL).
A dada altura, na leitura do processo, é necessário um esforço no sentido de ter presente  que os arguidos RR e SS são funcionários da  PT. Com a sua conduta parecem depender do BES.
Relativamente à SPIN OFF, a mesma foi imposta pelas condições da OPA, pela AdC, pela Anacom e, consequentemmte, pelo Governo, a quem era exigida uma alteração das condições da concorrência no sentido de ver melhoradas as condições de concorrência no sector das comunicações.
Porém, para o arguido CC, a spin off foi completamente indiferente. A PT só era importante para o arguido CC na medida em que “servia”  os interesses do Bes e essa qualidade mantinha-se, não obstante a spin off.
Como diz o Sr. Juiz de Instrução “(…) todas as ações distribuídas aos acionistas da PT no processo de Spin Off, já eram, por via indireta, deles, pois uma vez que todas as ações eram da PT, os seus acionistas detinham indiretamente as ações da PT Multimédia. Com o Spin Off cada accionista passou a deter diretamente o que já detinha indiretamente.”
Regressemos à análise do “caminho do dinheiro”, conforme tínhamos anunciado.
É dito na acusação que o arguido AA recebeu, entre 2006 e 2010, a quantia global de 29.000.000,00€ com origem nos fundos do GES por determinação do arguido CC, como contrapartida pelos actos praticados no interesse deste arguido e do GES, relativamente a negócios do Grupo Portugal Telecom e GES  da seguinte forma:
6 milhões de euros no dia 19 de Maio de 2006;
3 milhões de euros no dia 30 de Julho de 2007;
2 milhões de euros no dia 28 de Abril de 2008;
2 milhões de euros no dia 27 de Junho de 2008;
2 milhões de euros no dia 10 de Setembro de 2008;
2 milhões de euros no dia 24 de Outubro de 2008;
2,5 milhões de euros no dia 25 de Maio de 2009;
1,5 milhões de euros no dia 27 de Maio de 2009;
8 milhões de euros no dia 29 de Dezembro de 2010.
AS CONTAS
De acordo com a informação bancária constante de fls. 1-2 do Apenso Bancário 11, a conta ...30, titulada pelo arguido AA foi aberta no dia 11-1-1996.
De acordo com a informação bancária constante de fls. 1-6 do Apenso Bancário 20-E, a conta ...29 UBS titulada pela EMP61..., foi aberta no dia 10-6-2005 e tem como beneficiário o arguido HH.
De acordo com a informação bancária constante de fls. 9-19 do Apenso Bancário 20-P, a conta Credit Suisse ...24 titulada pela EMP04... Limited, foi aberta no dia 20-9-2010 e tem como beneficiário o arguido HH.
De acordo com a informação bancária constante de fls. 1-6 do Apenso Bancário 20-F, a conta UBS ...02 titulada pela EMP62..., foi aberta no dia 9-2-2007 e tem como beneficiário o arguido HH.
De acordo com a informação bancária de fls. 1-4L do Apenso Bancário 62, 1º Volume, resulta que a conta ...71 UBS titulada pela EMP63... foi aberta no dia 15-9-2005 e tem como beneficiário o arguido II.
De acordo com a informação bancária constante de fls. 1-5 do Apenso Bancário 89, a conta Santander ...31..., titulada pelo arguido II, foi aberta no dia 25-1-1982.
De acordo com a informação bancária de fls. 1-6 do Apenso Bancário 66-F a conta bancária ...17 UBS titulada pela EMP64... Lda. foi aberta em 17-6-2005 e tem como beneficiário TTTTTT.
De acordo com a informação bancária de fls. 1-29 do Apenso Bancário 66-G a conta bancária ...470 UBS titulada pela EMP65... Ltd. foi aberta em 13-1-2006 e tem como beneficiário TTTTTT.
De acordo com a informação bancária de fls. 11-26 do Apenso Bancário 96 a conta bancária ...35 UBS titulada pela EMP66... foi aberta em 15-9-2005 e tem como beneficiário II.
De acordo com a informação bancária de fls. 1-6 do Apenso Bancário 59 a conta bancária ...112 UBS é titulada pelo EMP67... foi aberta em 4-1-2007 e tem como beneficiário o arguido BB.
De acordo com a informação bancária de fls. 1-2 do Apenso Bancário 57 a conta bancária ...77 UBS é titulada pelo EMP36... foi aberta em 15-2-2008 e tem como beneficiário o arguido BB.
De acordo com a informação bancária de fls. 27, 28 do Apenso Bancário 57, o arguido BB, no dia 19-6-2009, celebrou um contrato de locação de cofre associado à conta titulada pela EMP36....
De acordo com a informação bancária de fls. 1-2 do Apenso Bancário 56 a conta bancária ...00 UBS é titulada pelo EMP20... foi aberta em 28-3-2008 e tem como beneficiário o arguido BB.
De acordo com a informação bancária de fls. 1-6 do Apenso Bancário 58 a conta bancária ...23 UBS é titulada pela EMP68... foi aberta em 18-12-2006 e tem como beneficiário o arguido BB.
De acordo com o Apenso N, fls. 45´000, a conta bancária da EMP68... foi encerrada no dia 25 de Junho de 2008.
De fls. 1-4, Apenso Bancário 58, resulta que no dia 26-7-2007 o arguido BB celebrou um contrato de locação de cofre e atribuiu uma procuração ao arguido II na qual autoriza que este aceda ao cofre em causa. A locação do cofre cessou no dia 19 de Junho de 2009.
De acordo com a informação bancária de fls. 34-44 do Apenso Bancário 74 a conta bancária ...20, titulada pelo BESA – Banco Espírito Santo Angola, junto do Banco Santander foi aberta em 17-1-2006 e tendo como representantes UUUUUU, VVVVVV e WWWWWW.
De acordo com a informação bancária de fls. 321 Apenso Bancário 62, XXXXXX é titular da conta bancária nº ...21... junto do BPN.
De acordo com a informação bancária de fls. 1 a 4 do Apenso Bancário 121, a ES Enterprises é titular da conta bancária nº ...43 junto do Banque Privée, na ....- CONTA OFF SHORE DO GRUPO BES, sendo que a partir de Março de 2004 YYYYYY passou a figurar como gerente (designado manager) da ES ENTERPRISES, assumindo as funções operacionais da sociedade, onde se incluía a autorização para movimentar as contas bancárias da sociedade, segundo indicações e com reporte direto ao arguido CC. A EMP69... era uma sociedade anónima ... que integrava o GES e cujo capital social era detido em 100% pela EMP70....
De acordo com a informação bancária de fls. 1-2 do Apenso Bancário 43-E a conta bancária ...86 UBS é titulada pelo arguido GG e foi aberta no dia 6-12-2007.
De acordo com a informação bancária de fls. 1-2 do Apenso Bancário 43-F a conta bancária ...80 UBS é titulada pelo arguido GG e foi aberta no dia 15-1-2007.
De acordo com a informação bancária do Apenso Bancário 43-G a conta bancária ...98 UBS é titulada pelo arguido GG e foi aberta no dia 3-11-2011.
De acordo com a informação bancária de fls. 1-13 do Apenso Bancário 1-G a conta bancária ...95 BES Investment é titulada pelo arguido BB e foi aberta no dia 13-10-2009.
De acordo com a informação bancária de fls. 6 do Apenso Bancário 28-J a conta bancária ...2/930 CGD é titulada pela arguida Lena Engenharia Construção SGPS SA.
Diz o Sr. Juiz que “quanto a este segmento de factos, em particular da prova documental relativa às operações bancárias, apenas é possível concluir quanto aos montantes envolvidos, o percurso do dinheiro, a origem e o destino do mesmo e a data das operações.
Quanto ao destino dos 6 milhões de euros ser para fazer chegar ao arguido AA como compensação paga pelo arguido CC, a título de suborno, pela intervenção daquele, enquanto Primeiro-Ministro, em favor do GES no âmbito da OPA da EMP55..., já não é possível extrair dos elementos bancários e dos fluxos financeiros acima referidos qualquer elemento indiciário. Com efeito, não existe qualquer prova que indicie a ligação do arguido AA aos montantes em causa, sendo que o facto objectivo de ser primo do arguido II é manifestamente insuficiente para que se possa, com recurso às regras da experiência, fazer qualquer inferência nesse sentido. “
Dizemos nós - no caso dos arguidos RR e SS foi possível demonstrar, directamente, que as contas onde eram recepcionadas as verbas eram geridas pelos próprios, que constavam como beneficiários finais das mesmas.
No caso do arguido AA tal não se verificou. Porém, existem indícios fortes de que  os pagamentos efectuados, neste caso com origem no GES, foram para remunerar serviços prestados por aquele arguido e não pelos indivíduos que constam como beneficiários dessas contas.
No caso do arguido AA, o papel de fiduciário foi inicialmente desempenhado por II, primo daquele. Este,  depois de envolvido na polémica do processo ..., transferiu o que restava do património de AA para o novo fiduciário BB.
É possível constatar a existência de  vários movimentos que têm percursos diferentes, mas terminam sempre no mesmo beneficiário.
Os movimentos ocorridos entre Abril de 2006 e Agosto de 2008 são decorrentes de uma entrada de 6 milhões de euros na esfera do arguido II, colocada à disposição daquele arguido pelo GES,tendo actuado como fiduciário aquele arguido II. O valor auferido foi  disponibilizado ao seu beneficiário final por diversas vias, nomeadamente pela utilização dos serviços de XXXXXX, para disponibilizar numerário em Portugal, ou pela transferência para a esfera do arguido BB, o fiduciário que sucedeu a II, que por sua vez integrou o que restava destes capitais em Portugal, via RERT. Verificou-se a utilização de contas bancárias em diversas jurisdições (..., ... e Portugal) e a intervenção de diversos intermediários, nomeadamente os arguidos HH, e II e TTTTTT.
O testemunho deste último, TTTTTT, é esclarecedor.
Confrontado com as notas de ZZZZZZ sobre as operações da EMP64... e EMP61..., TTTTTT referiu que nunca fez nenhum negócio de salinas, nem em 2006 havia salinas. . Foi referido a TTTTTT que a parceria que consta no documento é a deste transferir 3,5 milhões de euros das suas contas para a EMP61... para adquirir 50% de umas salinas e que depois um valor de 6 milhões foi transferido para uma conta de II. TTTTTT referiu que, independentemente do que está escrito, não tinha uma parceria com a EMP61... ou com o HH para comprar nenhumas salinas. Mais referiu que essas notas aparecem porque ZZZZZZ tinha que justificar a operação ao departamento de compliance do Banco. Não era impossível que o HH lhe tivesse pedido uma coisa desse género, que precisava que o ajudasse pois tinha alguma coisa que tinha que justificar e que o depoente lhe tivesse dito que sim. Sobre se tem ideia de o HH, nessa altura estar interessado numas salinas, TTTTTT refere que não se lembra e que em 2006 não tem. Pode ser que o HH lhe tenha pedido pois já teria feito o investimento e precisava de receber o dinheiro, mas não tem ideia que fossem umas salinas. Refere que tem que tentar, não sabe como, descobrir mas afirma que não foi sócio dele em salinas nem em compra nenhuma, mas admite que ele lhe possa ter feito o pedido referido. Anexo 2.1.03-067
Quanto ao arguido HH, as declarações não foram idênticas no decurso dos autos.
Relativamente às transferências recebidas em 2008 e 2009, nas contas das suas entidades EMP61... e EMP62..., esclareceu que as mesmas resultaram de uma conversa que manteve com o Dr. CC, na qual este último lhe pediu para receber nessas contas determinadas quantias, que teriam origem na ES ENTERPRISES, e que se destinavam a ser transferidas segundo indicações que iria receber do Eng.º BB.
Este esclarecimento, ou se quisermos, esta versão, é aquela que mais se coaduna com a verdade objectiva resultante das transferências bancárias.
Procurando justificar o afastamento de indícios de corrupção, diz o Sr. Juiz que “a corrupção, a um nível como o descrito na acusação, não só pelos valores em causa, mas, sobretudo, pelo envolvimento do Primeiro-Ministro, pressupõe, em termos de regras da experiência, uma confiança e uma descontracção que apenas é conseguida após o decurso de algum período temporal no exercício do cargo e não apenas em escassos quatro meses. ( isto tendo em conta que a EMP63... Limited foi constituída em 4 de Agosto de 2005, ou seja, cerca de 5 meses após o arguido AA ter iniciado funções como Primeiro-Ministro, e a abertura da conta teve lugar no dia 13-09-2005.
Ora, relativamente a este aspecto, diremos, apenas, que o arguido AA iniciou funções como Primeiro Ministro em 2005, mas teve, anteriormente, cargos políticos importantes durante vários anos que lhe permitiram conseguir a confiança e descontracção referida pelo Sr. Juiz.
A história do empréstimo concedido pelo arguido HH, relatada pelo arguido II, não tem qualquer sustentação, não só pelas declarações do arguido HH, mas sobretudo pelo depoimento de TTTTTT, supra referido, que nega a existência de negócio de salinas.
Quanto ao pagamento de  3 milhões de euros.
A fls. 45 e 320 do Apenso Bancário 20-E, consta que, no dia 30-7-2007, foi efectuada uma transferência de 3 milhões de euros para a conta titulada pela EMP63... Ltd. por ordem do arguido HH. Este valor foi creditado, conforme resulta de fls. 350 do Apenso Bancário 62, 1º volume, na conta titulada pela EMP63....
A fls. 8, 9 e 182 do Apenso Bancário 121 e fls. 45 do Apenso Bancário 20-E, consta que no dia 9-7-2007 foi efectuada uma transferência de 7 milhões de euros da conta titulada pela ES Enterprises para a conta titulada pela EMP61....
A fls. 9 do Apenso Bancário 121 consta a ordem de transferência a qual se mostra assinada, no dia 4-7-2007, pelo cliente, embora não seja perceptível quem assinou a referida ordem.
A fls. 45 e 198 do Apenso Bancário 20-E, verifica-se que no dia 11-7-2007 foi realizada um movimento a débito da conta da EMP61..., no valor de 6.587.000,00€, a favor de EMP71... e no dia 10-7-2007 a favor da EMP63... no valor de 434.000,00€.
A fls. 45 e 192 do Apenso Bancário 20-E verifica-se que a conta da EMP61... registou, no dia 27-7-2007, um movimento a crédito no valor de 3.049.939.85€. 
De fls. 351 do Apenso Bancário 62, 2º volume resulta que no dia 31-07-2007, foi efectuada uma transferência de 964.000,00€, assinada por II, para a conta da EMP66....
De fls. 353 do Apenso Bancário 62, 2º volume e fls. 7 do Apenso Bancário 59 resulta que, no dia 31-07-2007, foi efectuada uma transferência de 2.000,000,00€, assinada por II, para a conta da EMP67... Limited.
De fls. 7 do Apenso Bancário 59 resulta que no mesmo dia 31-7-2007 o montante de 2 milhões de euros foi transferido para a conta titulada pela EMP68....
O montante de 3 milhões de euros, conforme resulta do extracto bancário constante de fls. 45 do Apenso Bancário 20-E, tem origem nos seguintes movimentos a crédito: 3.049.939.86€ no dia 27-7-2007, dado que no dia 26-7-2007 a conta em causa apresentava um saldo de 47.208,01€.
Logo a após a entrada do crédito de 7 milhões de euros com origem na ES Enterprises na conta da EMP61..., foi realizada uma transferência no valor de 6.587.000,00€ no dia 11-07-2007.
Cumpre dizer que existem outras ordens de transferência da conta da ES Enterprises para a conta da EMP61..., conforme resulta do Apenso Bancário 121 a fls. 25 (5.000.000,00€ 8-4-2008), fls. 31 (5.000.000,00€ no dia 8-7-2008), fls. 40 (5.000.000,00€ 6-5-2009).
A propósito da ordem de transferência constante de fls. 9 do Apenso Bancário 121 (7 milhões da conta da ES Enterprises para a conta da EMP61...), o Sr. Juiz começou por dizer que a assinatura não era perceptível. Porém, acabou por concluir que tudo indicia que tal ordem tenha sido assinada por YYYYYY por ordem do arguido CC.
Com efeito, o arguido CC, em sede de instrução, referiu, a propósito das ordens de transferência feitas na mesma conta bancária a favor do arguido RR, o seguinte: que para firmar o acordo com o RR pediu ao YYYYYY para fazer uma transferência para aquele, dentro do referido intervalo, e informou-o que esse dinheiro era para ser restituído à Enterprises e com juros. Que o YYYYYY fez a transferência dentro do referido intervalo e fez inscrever esse valor na contabilidade da empresa.  
Quem fazia a contabilidade da ESPÍRITO SANTO ENTERPRISES, entre outras off-shore, era o YYYYYY.
Parece inquestionável que o YYYYYY trabalhava para o Grupo Espírito Santo, estava ligado à ES Entreprises, tinha poderes para movimentar a conta bancária e que existia uma ligação próxima entre o arguido CC e o referido YYYYYY.
O documento junto aos autos no anexo 2.1.03-067 é de extrema importância.
 YYYYYY registou os pagamentos efetuados em 2011 pelas contas da ES ENTERPRISES, designadamente, (i) a transferência de €10.000.000,00 para o arguido RR; (ii) a transferência de €8.000.000,00 para a conta do arguido SS no banco PICTET; e (iii) a transferência de €4.000.000,00 para a sociedade EMP03... do arguido CC.C) Verbas atribuídas em 2012: a decomposição das verbas atribuídas pela ES ENTERPRISES foi efetuada por ano, sendo os pagamentos de 2010 efetuados para a EMP04... e para a EMP72... designados, respectivamente, por “HH” e “RR”
Nesse documento, designadamente, identificou os €10.000.000,00 destinados ao arguido RR, a enviar para conta sediada em ..., referindo-a essa conta através da expressão “...”, e os €15.000.000,00 destinados ao arguido HH (2x7,5M€), não estando as restantes verbas desagregadas.
A entidade EMP72... INC., foi constituída no dia 15 de Junho de 2005, com sede nas ... e tem como beneficiário final RR.
A movimentação dos fundos recebidos do arguido CC, com vista à ocultação da sua origem, recebimento e motivos subjacentes a tais pagamentos, o arguido RR utilizou as seguintes contas bancárias: TITULAR NÚMERO DE CONTA DATA DE ABERTURARR UBS ...199801 --EMP72... INC UBS ...14... eurosUBS ...314... USD(Aba 124-G) 25.07.2005
No Anexo 2.1.03-036 em ficheiro auxiliar da contabilidade que denominou ..., YYYYYY agregou todos valores que saíram no ano de 2007 das contas da ES ENTERPRISES, sob duas diferentes perspectivas:– €13.617.929,50 (agrupados sob a designação PT-...), que incluíam €6.700.000,00 transferidos para RR e os valores de €467.907,00 e de €6.000.000,00 transferidos para SS, para além de um montante de €450.000,00, transferido para a entidade ..., que se reporta a um angariador de negócios em ..., identificado como AAAAAAA, acrescidos de despesas bancárias (sendo certo que para o Banco PICTET foram apenas as transferências destinadas a SS e à entidade ...);– €13.000.000,00 (agrupados sob a designação PT+EMP01...), que incluíam os mesmos €6.000.000,00 transferidos para a esfera patrimonial de SS (verba comum às duas perspetivas) e €7.000.000,00 transferidos para a EMP61... de HH e destinados ao arguido AA
Em ficheiro que designou por “20091” YYYYYY alinhou numa mesma coluna os valores pagos em 2007 pela ES ENTERPRISES relacionados com a PT, identificando os €7.000.000,00 transferidos para a sociedade de HH, EMP61..., com a designação “...” e os €13.617.929,50 transferidos para RR, SS e a entidade ... pela designação “PT”- Anexo 2.1.03-037 Busca 125 - Folha de dados informáticos 1 .001
A Decisão Instrutória em várias páginas, relata pormenores, a título de exemplo, a nota constante de fls. 262, apenso 62 e o depoimento da testemunha ZZZZZZ ( o autor da nota), pretendendo  concluir que a acusação faz interpretações díspares relativamente ao mesmo elemento de prova, que tem contradições e que as transferências referidas naquela peça processual não têm o sentido que lhes é dado, nem delas se pode inferir a participação final do arguido AA.
Diz o Sr. Juiz “Fazer derivar da transferência de 6 milhões de euros, ainda mesmo que essa transferência tenha tido lugar para uma conta bancária da qual é beneficiário um familiar do arguido AA, a presunção de que este arguido, na qualidade de Primeiro-Ministro, condicionou o voto da CGD, da Segurança Social e da PARPÚBLICA na AG da PT e que determinou, caso fosse necessário, a utilização do exercício do veto por parte do Estado, seria um exercício meramente especulativo e incompatível com as exigências de motivação das decisões judicias. (…)  O mesmo se diga em relação ao montante de 3 milhões de euros transferidos para a conta da EMP63... no dia 27-7-2007 e creditados no dia 30-7-2007. Com efeito, não existe qualquer elemento de prova que indicie a existência de contactos entre o arguido CC e AA no período compreendido entre o dia 2-3-2007 e 30 de Julho de 2007, data do alegado acordo com vista ao comprometimento deste com a estratégia de reestruturação da PT e de investimento no .... (..) Da análise feita ao Apenso Bancário 89, conta do arguido II junto do Santander, não se mostra identificada qualquer operação bancária a favor do arguido AA. Para além disso, desse mesmo apenso bancário resulta que no período compreendido entre 1-6-2006 a 31-12-2007, data em que ocorreram os movimentos identificados no artigo 4518 da acusação (transferências da conta UBS titulada pela EMP63... para a conta BPN IFI de XXXXXX) são feitos vários depósitos em numerário na conta Santander do arguido II, no valor global de 70.587,00€, o que indicia existir uma relação entre este valor e as operações realizadas através de XXXXXX. Da análise feita ao Apenso Bancário 89-C, conta do arguido II junto do BES, não se mostra identificada, também, qualquer operação bancária a favor do arguido AA. Do mesmo apenso resulta, ainda, que no período compreendido até 1-9-2006 não existem movimentos a crédito em numerário. Por sua vez, no período compreendido entre 1-9-2006 (fls. 43-123 do Apenso Bancário 89-C) e 1-1-2009 são realizados depósitos em numerário na conta BES do arguido II, no valor global de 71.700,00€, o que indicia, também, uma relação entre este valor e as operações realizadas através de XXXXXX. Do Apenso Bancário 63-A – conta BPI ...28... em nome de BBBBBBB, irmão do arguido AA – resulta que foram feitos depósitos em numerário em 2006 e 2007, no valor global de 51.410,00€ e em 2008 e 2009, no valor global de 42.350,00€, sendo o primeiro no dia 17-8-2006. Tendo em conta a data do primeiro depósito, 17-8-2006, mostra-se compatível, em termos cronológicos, a ligação entre estes depósitos e o levantamento em numerário feito pelo arguido II no dia 4-8-2006. Para além disso, da análise feita aos extractos bancários do Apenso Bancário 63-A, verifica-se que as transferências a crédito não ultrapassam o valor unitário de 750,00€ o que indicia ser uma pessoa com poucos recursos económicos. (…)  Do Apenso Bancário 2-A – conta BPI ...041... em nome YYY, mãe do arguido AA – resulta que entre 2006 a 2008 foram feitos vários depósitos em numerário, no valor global de 91.850.00€. Da análise feita aos extractos desta conta bancária, fls. 12 a 16, verifica-se que entre o dia 19-10-2005 a 11-7-2006 foram feitos depósitos em numerário no valor de 28.500,00€. Tendo em conta a data destes depósitos (anteriores a 4-8-2006), nenhuma relação poderá ser estabelecida com o levantamento feito pelo arguido II na conta UBS no dia 4-8-2006. Para além disso, verifica-se que, mesmo em data anterior à alegada transferência de 19 de Maio de 2006 do arguido CC para o arguido AA, via contas bancárias dos arguidos HH e II, já existiam depósitos em numerário, pelo menos desde 19-10-2005, na conta bancária de YYY.”
As contradições e faltas de rigor da acusação não impediram este tribunal de concluir pela  existência de indícios, sendo que nada impede que (aquelas falhas) não possam ser concretizadas, se for caso disso, em julgamento.
Concordamos, igualmente, que há falta de rigor no que toca à data do acordo entre os arguidos AA, BB, GG e II no que toca à a transferência formal da titularidade da entidade EMP73... LIMITED para o arguido GG.
Porém,  o conteúdo dos extractos bancários relativos as contas bancárias tituladas pela EMP63..., EMP68..., EMP67..., EMP36... e EMP20... constantes dos Apensos bancários 56, 57, 58, 59 e 62 não deixam dúvidas.
No dia 31-07-2007 foi efectuada uma transferência no valor de 2 milhões de euros da conta da EMP63..., titulada pelo arguido II, para a conta da EMP67... do arguido BB. De fls. 278 do mesmo apenso, verifica-se que no dia 21-2-2008 foram realizadas duas transferências para a EMP67... no valor de 2.450.000.00€ e 1.018.000,00€ (cfr. Fls. 10 Apenso 59).
De fls. 7 do Apenso Bancário 59 e fls. 24 do Apenso Bancário 58, verifica-se que no dia 31-7-2007 foi efectuada uma transferência no valor de 2 milhões de euros a favor da EMP68... do arguido BB com origem na conta da EMP67....
De fls. 10 do Apenso Bancário 59 e fls. 33 do Apenso Bancário 58, verifica-se que no dia 21-2-2008 foi efectuada uma transferência da conta da EMP67... para a conta da EMP68... no valor de 2.450.000,00€, 1.000.000,00€ e 1.018.000,00€.
De fls. 36 e 37 do Apenso Bancário 58 e fls. 20 e 21 do Apenso Bancário 56, verifica-se que da conta bancária da EMP68... foram realizadas as seguintes transferências bancárias para a conta da EMP20... também titulada pelo arguido BB: 14-4-2008 1.921.220,00€, 1.172.378,46€, 1.280.813,33€, 17-4-2008 2.480.775,00€ e 21-4-2008 1.636.073,60€.
De fls. 147 do Apenso Bancário 56 resulta que no dia 13-12-2010 foi realizada uma transferência no valor de 10.800.000,00€ da conta da EMP20... para o BESI, no dia 15-4-2011, 11.339,31€, no dia 29-12-2010 22.779,81€, no dia 28-12-2010 65.154,92€.
Pagamentos relativos ao terceiro acordo.
Do Apenso Bancário 20-E fls. 54 e fls. 40 do Apenso Bancário 20 F, resulta que no dia 4 de Abril de 2008 foi transferido o valor de 1.200.000,00€ da conta da EMP61... para a conta da EMP62....
Do Apenso Bancário 20-E fls. 54, conta titulada pela EMP61... junto da UBS, resulta que no dia 8 de Abril de 2008 foi creditado o valor de 5 milhões de euros com origem na Espirito Santo Enterprises SA (fls. 25-28 e 200 do Apenso Bancário 121, conta titulada pela ES Enterprises junto do Banco Privée).
Do Apenso Bancário 20-E fls. 57 e fls. 40 do Apenso Bancário 20 F, resulta que no dia 16 de Maio de 2008, foi transferido o valor de 2.144.980,06€ da conta da EMP61... para a conta da EMP62....
Fls. 206 Apenso 121, resulta que foi feita uma transferência bancária, no dia 10-7-2008, a favor da EMP61... no valor de 5 milhões de euros com origem na ES Enterprises SA.   
De fls. 15 e 177 do Apenso Bancário 20-E, resulta que no dia 7-5-2009 foi creditado na EMP61... o valor de 5 milhões de euros com origem na Espírito Santo Enterprises SA (fls. 40-42 e 223 do Apenso Bancário 121, conta titulada pela ES Enterprises junto do Banco Privée).
Este valor de 5 milhões de euros foi, nesse mesmo dia, transferido para a conta titulada pela EMP62... Ltd. (fls. 31 do Apenso Bancário 20-F e fls. 177 do Apenso Bancário 20-E).
Assim, entre 8 de Abril de 2008 e 7 de Maio de 2009, a conta bancária titulada pela EMP61... foi creditada com 15 milhões de euros com origem na conta titulada pela ES Enterprises SA.
De fls. 54 do Apenso 20-E e fls. 5 31 do Apenso Bancário 43-E, resulta que no dia 28-4-2008 foi feita uma transferência da conta da EMP61... para a conta titulada por GG no valor de 2 milhões de euros.
Do Apenso Bancário 20-F, fls. 44 (conta titulada pela EMP62...) resulta que no dia 14-7-2008 foi creditado o valor de 5 milhões de euros com origem na Espírito Santo Enterprises S.A.
Do Apenso Bancário 20-F fls. 42, 104 e 105 e fls. 7 e 37 do Apenso Bancário 43F, resulta que no dia 27-6-2008 foi feita uma transferência bancária da conta EMP62... para a conta titulada por GG junto da UBS, no valor de 2 milhões de euros.
Do Apenso Bancário 20-F fls. 48, 124 e 125 e fls. 7 e 43 do Apenso Bancário 43F, resulta que no dia 10-9-2008 foi feita uma transferência bancária da conta EMP62... para a conta titulada por GG junto da UBS, no valor de 2 milhões de euros.
Do Apenso Bancário 20-F fls. 58, 136 e 137 e fls. 8 e 50/51 do Apenso Bancário 43E, resulta que no dia 24-10-2008 foi feita uma transferência bancária da conta EMP62... para a conta titulada por GG junto da UBS, no valor de 2 milhões de euros.
Do Apenso Bancário 20-F fls. 32, 184 e 187 e fls. 25, 73 e 74 do Apenso Bancário 43F, resulta que no dia 25-5-2009 foi feita uma transferência bancária da conta EMP62... para a conta titulada por GG junto da UBS, no valor de 2.500.000,00€.
Do Apenso Bancário 20-F fls. 32, 186 e 187 e fls. 25, 75 e 76 do Apenso Bancário 43F, resulta que no dia 27-5-2009 foi feita uma transferência bancária da conta EMP62... para a conta titulada por GG junto da UBS, no valor de 1.500.000,00€.
Das ordens de transferência constantes de fls. 184, 189 do Apenso 20F, verifica-se que as mesmas estão assinadas pelo arguido HH, tal como o próprio reconheceu em sede de interrogatório perante o MP, e contêm o nome do destinatário, GG.
Entre 28-4-2008 e 27-5-2009 foi transferido o valor global de 12.000.000,00€ da EMP61... e EMP62... para a conta titulada pelo arguido GG.
Diz o Sr. Juiz que “Estes dados objectivos, acompanhados da falta de corroboração na parte relativa ao alegado pedido feito pelo arguido CC, fragilizam as declarações do arguido HH e impossibilitam que a partir das mesmas se possa fundamentar uma convicção no sentido de que os 12 milhões de euros que circularam para a conta do arguido BB foram feitos a pedido do arguido CC e que tinham como destinatário o arguido AA.
É certo que não se mostra justificada a razão de ser para existência de operações bancárias entre HH e GG e é certo, também, que existem contornos obscuros, sobretudo pela forma como foram realizados, que levantam suspeitas quanto à razão de ser dos movimentos bancários em causa. 
Em todo o caso, estas suspeitas e a ausência de justificação lógica para os fluxos financeiros verificados, são insuficientes para que se possa concluir, de forma suficiente, que os 12 milhões de euros destinavam-se a retribuir o arguido AA pela sua intervenção, enquanto Primeiro-Ministro, em favor do BES no âmbito dos negócios da Portugal Telecom.
A ausência de explicação lógica para um determinado facto ou a ausência de prova, não poderá funcionar como um meio de prova, ou como um indício, a utilizar em desfavor do próprio arguido.
Tendo em conta os elementos de prova acima referidos, se os arguidos em causa forem submetidos a julgamento que prognóstico é possível fazer? Será de considerar altamente provável a sua futura condenação, ou, pelo menos, será mais provável a condenação do que a absolvição?
Como vimos, os elementos de prova existentes não permitem ter como certo a condenação dos arguidos. Mas ainda que assim não fosse, estaríamos sempre colocados perante a dúvida se efectivamente a versão dos arguidos BB e AA é verdadeira, dúvida, essa, inultrapassável que teria de ser decidida, como é evidente, em favor dos mesmos, em obediência ao princípio do in dúbio pro reo.
Assim, perante a ausência de prova directa, nomeadamente declarações dos arguidos, depoimentos testemunhais, intercepções telefónicas, correio electrónico e documentos, cumpre saber se é possível, com recurso a elementos de prova indirecta ou indiciária, inferir que o montante de 12 milhões de euros com origem no arguido CC, passagem pelas contas dos arguidos HH e GG e destino final o arguido BB, destinava-se a realizar um pagamento ao arguido AA pela sua intervenção, na qualidade de Primeiro-Ministro, a favor dos interesses do GES nos negócios relativos à Portugal Telecom.
Vejamos, então, os factos que se mostram demonstrados por prova directa:
O arguido AA exerceu o cargo de Primeiro-Ministro entre 12 de Março de 2005 e 21 de Junho de 2011;
Desde 1991 até Julho de 2014 a gestão do GES esteve sempre centralizada no arguido CC;
Pelo menos desde 2006, o BES detinha uma posição relevante no capital da Portugal Telecom, cerca de 8,3%;
Os arguidos BB e AA são amigos entre si desde os anos 90 e existia uma grande confiança entre os mesmos;
Existia uma relação de amizade e confiança entre os arguidos BB e GG desde os anos 80;
O arguido GG deslocou-se à ..., juntamente com o arguido BB, onde abriu uma conta bancária no banco UBS;
O arguido GG conhece o arguido HH, pelo menos desde finais de 2010, tendo-lhe sido apresentado pelo arguido HH;
Os arguidos BB e HH conhecem-se entre si;
O arguido BB, assim como o arguido HH, era titular de contas bancárias na ...;
Entre 8 de Abril de 2008 e 7 de Maio de 2009, a conta bancária titulada pela EMP61..., controlada pelo arguido HH, foi creditada com 15 milhões de euros com origem na conta titulada pela ES Enterprises SA;
Entre 28-4-2008 e 27-5-2009 foi transferido o valor global de 12.000.000,00€ da EMP61... e EMP62... para a conta titulada pelo arguido GG;
Entre 27-6-2008 e 22-6-2009 foi transferido o montante global de 12.500.000,00€ da conta do arguido GG para a conta da EMP36... cujo beneficiário é o arguido BB;
Em Dezembro de 2010 o arguido BB, no âmbito de adesão ao RERT II, transferiu para Portugal, para as contas junto do BES, os montantes pecuniários que se encontravam na sua conta junto da UBS.
Entre 17-12-2010 e 11-11-2014 foram realizados levantamentos em numerário nas contas tituladas pelo arguido BB no montante global de 1.169.700,00€ (doc. Identificados no artigo 6956);
Ao arguido AA, entre 2011 e 2014, foram disponibilizadas pelo arguido BB quantias monetárias, através do arguido UU, no montante global de 150.044,68€;
No período compreendido entre 19-10-2013 a 11-6-2014 o arguido BB despendeu o montante de 113.981,60€ na compra de exemplares do livro, A confiança do Mundo da autoria do arguido AA;
O arguido UU procedeu ao pagamento de viagens do arguido AA, com fundos com origem no arguido BB, no valor de 42.392,57€;
O arguido BB procedeu ao pagamento de viagens e férias, entre 2008 e 2014, nas quais se inclui o arguido AA e família, no valor global de 373.292,82€;
No dia 3-2-2012 o arguido BB deu como garantia em favor da arguida MM, Ex mulher do arguido AA, o penhor sobre o depósito a prazo de €760,000,00 - colateral para garantir o valor mutuado - através de transferência de quantias da conta n.º ...07 para a conta n.º ...06, ambas do BES, em nome deste arguido, com vista à aquisição do imóvel Monte ... pela arguida MM;
No dia 31-8-2012 o arguido BB adquiriu, pelo valor de 2.600.000,00€, um imóvel sito na Av. ..., em .... Este montante tem origem nos fundos existentes na conta Bancária BES ...06, titulada pelo arguido BB;
Entre Setembro de 2012 e Julho de 2013 o arguido AA viveu em ..., no imóvel acima referido, não tendo pago qualquer valor a título de renda;
No dia 25-09-2012 o arguido BB comprou a YYY, mãe do arguido AA, o imóvel sito na Rua ..., em ... pelo valor de 600.000,00€ com fundos provenientes da conta BES ...06;
Entre Junho e Dezembro de 2012, YYY, após ter recebido na sua conta o valor pago pelo arguido BB, transferiu para a conta do arguido AA o valor de 480.000,00€.
Uma vez identificados os factos que se mostram indiciados por prova directa cumpre saber se, apelando às regras da experiência, da ciência ou da lógica, é possível presumir que os 12 milhões de euros que circularam da esfera do arguido CC para a esfera do arguido BB, através das contas dos arguidos HH e GG, dizem respeito a um pagamento feito ao arguido AA pela intervenção deste, na qualidade de Primeiro-Ministro, em favor do BES nos negócios relativos à Portugal Telecom. Existe alguma regra da experiência ou da lógica que nos permita fazer essa conclusão?
A resposta, à partida, terá que ser negativa.
Com efeito, o facto do arguido AA ser amigo do arguido BB e o facto deste arguido ter recebido nas suas contas na ... o montante de 12 milhões com origem no arguido CC, não nos permite presumir que esse dinheiro se destinava ao arguido AA, uma vez que não existe nenhuma regra da experiência que nos permita concluir nesse sentido.
O facto de se mostrarem indiciadas entregas de dinheiro em numerário ao arguido AA por parte do arguido BB, mesmo desacompanhadas de uma explicação convincente por parte dos arguidos, não nos permite presumir que todo o dinheiro existente nas contas do arguido BB era propriedade do arguido AA e que tinha origem a prática de crimes de corrupção passiva cometidos por este arguido.
A discrepância em termos de valores entregues ao arguido AA e os valores existentes nas contas do arguido BB na ... é de tal ordem que inviabiliza a possibilidade de presumir que todo o dinheiro existente nas contas na ... pertencia ou estava destinado ao arguido AA e que o arguido BB era um mero fiduciário.
Podemos especular e até mesmo intuir, mas tendo em conta as exigências de motivação que devem presidir a uma decisão de facto, não é possível fundamentar uma conclusão no sentido dado pela acusação””
Não podemos concordar com o Sr. Juiz.
Este entende que, em face do montante elevadíssimo que foi feito chegar à conta do arguido BB, a circunstância de o arguido AA ter usufruído de uma parte – cerca de 6 milhões, em números redondos ( fazendo as contas com os dados objectivos assim considerados pelo Sr. Juiz.), constitui um valor tão ”pequeno”, que inviabiliza a conclusão de que todo o dinheiro existente nas contas da ... pertencia ou estava destinado ao arguido AA.
Os gastos do arguido AA são de alguém que sabe que, depois daquele valor, virá outro.
De facto, os valores em causa nestes autos são de uma ordem de grandeza tal, que qualquer regra da experiência que fosse chamada à colação era considerada desajustada.
Relativamente ao arguido HH já supra escrevemos quanto à versão que mais se coaduna com os dados objectivos.
Não compreendemos a afirmação do Sr. Juiz ao dizer que “razão extrínseca que também fragiliza as declarações do arguido HH: a circunstância de o arguido declarante não estar sujeito a juramento e ao constrangimento para falar verdade inerente à ameaça penal para as falsas declarações.”
Pergunta-se: tal não acontece relativamente  a todos os arguidos? Há algum arguido sujeito a juramento?
Pagamento de 8 milhões de euros
Do Apenso Bancário 121 resulta que a conta ...43 junto do Banque Privée, na ..., é titulada pela ES Enterprises.
Do extracto bancário de fls. 67 do Apenso bancário 121 resulta que a conta da ES Enterprises foi creditada, no dia 29-10-2010 com 17 milhões de euros com origem na Espírito Santo International (BVI) SA.
De fls. 19-42 do Apenso Bancário 20-P resulta que a conta ...24 no Credit Suisse foi aberta no dia 20-9-2010, é titulada pela EMP04... do qual é beneficiário o arguido HH.
Do Apenso Bancário 121, fls. 69-70, consta uma ordem de transferência, no dia 8-11-2010, feita a favor de EMP04... Lda. no valor de 7.500.000,00€ com origem na conta da ES Enterprises SA junto do Banco Privée. (Fls. 104 do Apenso Bancário 20-P).   
Do Apenso Bancário 121, fls. 77-78, consta uma ordem de transferência, no dia 18-11-2010, feita a favor de EMP04... Lda. no valor de 7.500.000,00€ com origem na conta da ES Enterprises SA junto do Banco Privée. (Fls. 104 do Apenso Bancário 20-P).
Esta conclusão resulta, também, da análise feita ao documento constante do Apenso de Busca 125, onde estão narrados, de acordo com YYYYYY, os valores saídos da ES Enterprises para a ... 1 e 2, no total de 15 milhões de euros no ano de 2010.
A fls. 369 do Apenso AI consta o documento entregue pelo arguido HH, no dia 12-2-2015, na Comissão Parlamentar de Inquérito à Gestão do BES e do Grupo Espírito Santo.
O documento refere-se a um acordo entre a Espírito Santo Enterprises, SA e o arguido HH, com a data de 31-10-2005, no qual se prevê na cláusula 2 o pagamento do montante de 7.500.000,00€ pelos serviços contratados a que acresce um valor, a título de sucess fee, entre 2.500.000,00€ a 10.000.000,00€ pelos serviços identificados na cláusula primeira.
Do extracto de fls. 104 a 108 do Apenso Bancário 20-P resulta que o montante de 15 milhões de euros creditado na conta da EMP04... (8 e 18 de Novembro) tem o seguinte destino:
Dia 9-11-2010, 1.500.000,00€ para a EMP03...;
10-11-2010, 100.000,00€ para a EMP63...;
10-11-2010, 2.600.000,00€ a favor da EMP74... Limited (fls.174 Apenso 20-P para a conta ...0-12);
17-11-2010, 200.000,00€ a favor de TTTTTT;
18-11-2010 uma aplicação financeira no valor de 10.520.000,00€;
19-11-2010, 1.250.000,00€ a favor da EMP03...;
13-12-2010, 275.000,00€ a favor da EMP62... Ltd;
13-12-2010, 500.000,00€ a favor do arguido HH;
3-1-2011, 4.000.000,00€ a favor da EMP75... Limited;
12-1-2011, 1.000,000,00€ a favor da EMP62... Ltd;
12-1-2011, 3.000.000,00€ a favor da EMP74... Limited (fls. 190 Apenso 122-P) para a conta ...0-12
De fls. 1 a 7 do Apenso Bancário 20-F conta ...02 UBS é titulada pela EMP62... Ltd, foi aberta em 9-2-2007 do qual é beneficiário o arguido HH.
De fls. 24 do Apenso bancário 20-J resulta que a conta ...11 junto do Credit Suisse foi aberta no dia 17-6-2010, é titulada pela EMP74... Limited com sede das ... do qual é beneficiário o arguido HH.
Das ordens de transferência de fls. 174 e 190 do Apenso Bancário 20-P, resulta que nos dias 9-11-2010 e 12-1-2011 foi dada uma ordem de transferência no montante de 2.600.000,00€ e 3.000.000,00€, respectivamente, da conta da EMP04... para a conta titulada pela EMP74... ...0-12.
Estes montantes, tal como resulta dos extractos de fls. 94 e 95 do Apenso Bancário 20-J, não deram entrada na conta titulada pela EMP74... ...11.
Tendo em conta as operações bancárias acima referidas verifica-se que o crédito de 15 milhões com origem da ES Enterprises e, por sua vez, com origem na Espírito Santo International (BVI) SA, teve como destino 2.750.000,00€ para a EMP03...,10.875.000,00€ para as entidades EMP74..., EMP75... e EMP62... e 800.000,00€ para TTTTTT, HH e EMP63..., o que perfaz o montante global de 14.425.000,00€.
Relativamente a este montante diz o Sr. Juiz que dos fluxos financeiros acima referidas, ou fazendo o percurso do dinheiro em causa, “follow the money como dito por UUU e VVV”, não é possível fazer uma ligação entre os 15 milhões de euros transferidos da conta da ES Enterprises para a conta da EMP04... e os 8 milhões de euros transferidos para a conta da Lena Engenharia e Construções SGPS, junto da CGD, no dia 29-12-2010.
Do Apenso Bancário 28-J, fls. 25 e 51 e Do Doc. 84 – Apenso de Busca 114 – ordem de pagamento recebida, emitida pela CGD - consta um movimento a crédito, realizado no dia 29-12-2010, na conta da Lena Engenharia Construções SGPS, junto da CGD, no valor de 8 milhões de euros com origem na EMP19... SA, em ..., sendo o banco ordenador o BES S.A.
Doc. 96 do Apenso Busca 114 – consta a factura emitida pela XLM – Sociedade de Estudos e Projectos Lda. com a data de 31-01-2011 a favor de EMP02..., SA, no valor de 3 milhões de euros relativa à prestação de serviços de prospecção comercial/intermediação no processo de venda do prédio urbano sito na Rua ... em ..., actual Rua ... – contrato de prestação de serviços datado de 31-12-2010. 
Do Apenso Bancário 9 (fls. 1 e 2) resulta que a conta BES ...79 foi aberta no dia 28-7-2009 e é titulada pela XLM – Sociedade de Estudos e Projectos Lda. representada pelo arguido BB.
De fls. 36 e 170 do mesmo apenso bancário 9, resulta que no dia 21-01-2011 foi efectuada uma transferência da conta titulada pela Lena Engenharia e Construção, junto do Banco Bilbao Vizcaya Argentaria, no valor de 3 milhões de euros.
Do Apenso Temático AT, fls. 1, indicia-se que existe um documento, denominado de contrato-promessa de compra e venda, na qual foi aposta a data de Dezembro de 2010, no qual a sociedade EMP02... SA promete vender à sociedade EMP19... SA e esta declara que promete comprar, pelo valor de 35 milhões de euros, o prédio denominado ..., o qual se mostra assinado pelo arguido GG e por pessoa não identificada ligada à EMP19....
Do Apenso Temático AT, fls. 12 e 13, consta uma carta com origem na EMP19... SA, em ..., com a data de 13 de Março de 2011, dirigida à EMP02..., na qual informa que até ao dia 5 de Abril de 2011 irá proceder ao pagamento integral do reforço do sinal. Esta carta mostra-se assinada por CCCCCCC e consta como sendo elaborada em ....
Do mesmo Apenso AT, fls. 17-19, consta o acordo de revogação de contrato promessa de compra e venda, entre a EMP19... e a EMP02... SA, com a data de 28-6-2011, o qual se mostra assinada, pela EMP19..., por CCCCCCC.
Diz o Sr. Juiz que “Dos elementos de prova constantes dos autos, nada se extrai ou indicia quanto à existência de contactos ou encontros entre os arguidos AA e CC no período compreendido entre finais de Outubro de 2010 e 8 de Novembro de 2010, razão pela qual não é possível concluir, ainda que em termos indiciários, pela existência de um acordo entre estes dois arguidos com vista ao pagamento do montante de 8 milhões de euros através das contas bancárias do arguido HH.
Quanto à ligação do arguido AA ao contrato-promessa de compra e venda do imóvel denominado ..., cumpre referir que nenhuma prova foi produzida nesse sentido. Na verdade, nenhum dos arguidos em causa, ou seja, HH, BB e GG, referiu que era do conhecimento do arguido AA a existência do contrato em causa, nenhum documento relativo a essa situação foi encontrado na posse do arguido AA, nenhuma correspondência electrónica existe relativa ao assunto em causa envolvendo o arguido AA e nenhuma conversa telefónica mantida pelo arguido AA existe quanto ao aludido negócio ....
Mostra-se indiciada a ligação do arguido HH à sociedade EMP19..., assim como ao alegado contrato promessa de compra e venda, bem como com o negócio relativo à venda feita ao BESA. Porém, a ligação deste arguido ao referido contrato não nos permite dar como indiciada a ligação ao arguido AA, dada  a ausência de elementos de prova, quer directa quer indirecta, nesse sentido.”
A “ligeireza” na resolução do contrato-promessa, relativo ao  negócio ..., que determinou a perda do sinal de 8 milhões de euros é, desde logo e, no mínimo, muito suspeita, tanto mais que a negociação do imóvel continuou.
Suspeito é ainda o contrato de  prestação de serviços celebrado entre a LEC SA e a EMP41... no qual esta se compromete a prestar à primeira, serviços de consultoria e apoio multidisciplinar nas áreas de gestão comercial e estratégia de sistema de informação e que, na sequência desse contrato, foram realizados pagamentos no valor global de €29.520,00.
Mais resulta que a favor da EMP42... LDA foram feitos pagamentos, com a mesma justificação, no valor global de 24.000,00€, a que acresceu IVA no valor de € 5.520,00€, o que perfaz o montante de 29.520,00€.- cfr.  doc. 2 Apenso de Busca 117 e facturas juntas ao DOC 87 Apenso de Busca 114 e Apenso Bancário 28.          
DDDDDDD, filho de um amigo pessoal do arguido AA, representava a sociedade EMP41..., tendo celebrado um contrato de prestação de serviços em regime de avença com  a sociedade Lena Engenharia e Construções. A quantia total de €32.000,00, correspondente ao montante total das facturas, deduzido o IVA respectivo, foi disponibilizada pelo GRUPO LENA, para ser utilizada no interesse do arguido AA, através dos pagamentos realizados através das sociedades EMP41... LDA e EMP42... LDA.
Diz o Sr. Juiz “indicia-se que os serviços referidos no contrato não foram realizados e que os pagamentos concretizados não correspondem a uma contrapartida por trabalho prestado.  Com efeito, o contrato tem a data de 1-02-2011, quando a empresa EMP41... apenas foi criada no dia 25-2-2011 (conforme resulta da certidão permanente de fls. 28693).”
 Quanto aos pagamentos feitos à Sociedade de advogados EMP43...
Da análise feita à factura constante de fls. 1-5 do DOC 91 do Apenso de Busca 114, indicia-se que a Lena Ambiente –Gestão de Resíduos SA pagou à sociedade de advogados EMP43..., no dia 18-1-2011, 307.500,00€ relativo a estudo jurídico do mercado do Leste no enquadramento dos recursos da energia e ambiente.
Da análise feita à factura constante de fls. 19-23 do DOC 89 do Apenso de Busca 114, indicia-se que a Lena SGPS, SA pagou à sociedade de advogados EMP43..., no dia 9-10-2012, 73,800,00€ relativo a prestação de serviço jurídico.
Da análise feita à factura constante de fls. 24-29 do DOC 89 do Apenso de Busca 114, indicia-se que a Lena SGPS, SA pagou à sociedade de advogados EMP43..., no dia 20-5-2013, 32.595,00,00€ relativo a prestação de serviço jurídico.
Segundo a acusação, estes valores dizem respeito a serviços jurídicos solicitados pelo arguido BB, realizados no seu interesse e pagos por sociedades do Grupo Lena, por determinação do arguido GG, em função do acordo celebrado entre os arguidos BB e AA relativo aos 8 milhões de euros entregues pelo arguido CC. As operações bancárias relativas à circulação de 29 milhões de euros com origem nas contas controladas pelo arguido CC, tendo em conta a factualidade indiciada e não indiciada, não se enquadram dentro daquilo a que poderemos chamar suborno.”
Discordamos frontalmente do Sr. Juiz.
Para o Sr. Juiz é suficiente para afastar a existência de indícios a circunstância de, apesar de não serem conhecidos quaisquer serviços prestados pela sociedade de Advogados, esta, anteriormente ao alegado pagamento de 8 milhões de euros (29-12-2010), ter recebido pagamentos efectuados pela Lena SGPS?
Tal como temos vindo a defender, o caminho do dinheiro leva-nos ao arguido AA.
A circunstância do montante a que este teve acesso não corresponder – estar aquém – do valor titulado por BB, não faz afastar essa conclusão.
O modo como o arguido AA dispunha do dinheiro é um indício  fortíssimo de que, além daquele, existiria mais.
Quem despende, por várias vezes, mais de €10.000 numa única compra de vestuário, sabe que depois deste valor, virá outro e outros.
O Sr. Juiz considerou que, tendo em conta os elementos de prova acima referidos, se os arguidos em causa forem submetidos a julgamento não era certa a sua condenação. Haveria sempre uma dúvida, inultrapassável, que teria de ser decidida, como é evidente, em favor dos mesmos, em obediência ao princípio do in dúbio pro reo.
Será assim?
 Das transferências da conta de GG para as contas de BB.
Do Apenso Bancário 43-E, fls. 6 e Apenso Bancário 57, fls. 6, resulta que no dia 27-6-2008 foi feita uma transferência da conta titulada pelo arguido GG para a conta titulada pela EMP36... no valor de 2 milhões de euros. Este movimento bancário teve origem na transferência de 2 milhões de euros, realizada no dia 27-6-2008, da conta da EMP62... para a conta de GG (fls. 6 Apenso 43-E). No dia 2-7-2008 é feita uma transferência da EMP36..., no valor de 2 milhões de euros para a conta da EMP20... Ltd (fls. 7 Apenso 57).
Do Apenso Bancário 43-E, fls. 7 e 46 e Apenso Bancário 57, fls. 7, resulta que no dia 26-9-2008 foi feita uma transferência da conta titulada pelo arguido GG para a conta titulada pela EMP36... no valor de 4.500.000,00€. Este movimento bancário teve origem na transferência, no valor de 2 milhões de euros, realizada no dia 10-9-2008, da conta da EMP62... para a conta de GG (fls. 7 Apenso 43-E) e no crédito de 2.025.128,07€ realizado no dia 26-9-2008 na mesma conta de GG (fls. 7 Apenso 43 E).
No dia 26-9-2008 é feita uma transferência da EMP36..., no valor de 4.500.000,00€ € para a conta da EMP20... Ltd (fls. 7 Apenso 57).
Do Apenso Bancário 43-F, fls. 78-80 e Apenso Bancário 57, fls. 26, resulta que no dia 19-6-2009 foi feita uma transferência da conta titulada pelo arguido GG para a conta titulada pela EMP36... no valor de 4.000.000,00€. Este movimento bancário teve origem na transferência, no valor de 2.500.000,00€, realizada no dia 25-5-2009 e 1.500.000,00€ realizada no dia ../../2009 da conta da EMP62... para a conta de GG (fls. 25 Apenso 43-F).
Este crédito de 4 milhões de euros tem origem nos 5 milhões de euros da EMP61... (fls. 31 Apenso 20F), que circularam no dia 11-5-2009 para a conta da EMP76.... LTD e no retorno à conta da EMP62..., no dia 25-5-2009 (fls. 32 Apenso 20F) no valor de 4 milhões de euros. Por sua vez, a transferência com origem na EMP61..., no valor de 5 milhões do dia 7-5-2009 (fls. 15 Apenso 20-E), tem origem no crédito de 5 milhões do dia 7-5-2009 com origem na Espírito Santo Enterprises SA. (fls. 223 Apenso Bancário 121).
Do Apenso Bancário 43-E, fls. 10 e 53 e Apenso Bancário 57, fls. 11,35, 38 a 39 resulta que no dia 22-6-2009 foi feita uma transferência da conta titulada pelo arguido GG para a conta titulada pela EMP36... no valor de 2.000.000,00€. Este movimento bancário teve origem no crédito de 2.000.021,67€, realizado no dia 22-6-2009 (fls. 10 Apenso Bancário 43-E) denominado fiduciary repayment cal.
Assim sendo, entre 27-6-2008 e 22-6-2009 foi transferido o montante global de 12.500,000,00€ da conta do arguido GG para a conta da EMP36... cujo beneficiário é o arguido BB.
Da conta da EMP36..., conforme resulta do Apenso Bancário 56 e do Apenso Bancário 57, foi transferido o montante global de 11.500.000,00€ para a conta da EMP20....
Este montante foi por ordem do arguido BB, emitida no dia 16-11-2010, transferido para a conta bancária junto do BES Investimento SA, conforme resulta do documento junto ao Apenso Bancário 57 a fls. 145-157 e fls. 52 do Apenso Bancário 1-G.
Assim, no dia 13-12-2010 foi creditado o valor de 10.800.000,00€ na conta BES Investimento SA, titulada pelo arguido BB, com origem na conta UBS titulada pela EMP20.... (declaração emitida pelo BESI, no dia 28-12-2010 junto ao Apenso B, fls. 74 e a fls. 80 e 81 do Apenso de Busca 19). 
De acordo com os documentos juntos ao Apenso B (adesão ao RERT II de BB), o montante em causa foi incluído na Declaração de regularização tributária submetida pelo arguido BB, no dia 15-12-2010 junto do Banco de Portugal.
Deste modo, segundo a acusação, entre 28-4-2008 e 27-05-2009, circulou pelas contas bancárias tituladas pelo arguido GG a quantia global de 12 milhões euros destinados ao arguido AA com origem no arguido CC.
Diz o Sr. Juiz que verifica-se que não existe nenhuma prova directa que indicie uma ligação das operações bancárias relativas aos 12 milhões de euros e o arguido AA, bem como uma ligação deste montante com actos relacionados com a Portugal Telecom.
Assim, perante a ausência de prova directa, nomeadamente declarações dos arguidos, depoimentos testemunhais, intercepções telefónicas, correio electrónico e documentos, cumpre saber se é possível, com recurso a elementos de prova indirecta ou indiciária, inferir que o montante de 12 milhões de euros com origem no arguido CC, passagem pelas contas dos arguidos HH e GG e destino final o arguido BB, destinava-se a realizar um pagamento ao arguido AA pela sua intervenção, na qualidade de Primeiro-Ministro, a favor dos interesses do GES nos negócios relativos à Portugal Telecom.
Reiteramos a afirmação supra” A “ligeireza” na resolução do contrato-promessa, relativo ao  negócio ..., que determinou a perda do sinal de 8 milhões de euros é, desde logo e, no mínimo, muito suspeita, tanto mais que a negociação do imóvel continuou.
Resulta dos autos, sem discussão, que o ... é um terreno adquirido ainda pela empresa EMP77... em 2006, antes de ser adquirida pelo Grupo LENA, vindo esse activo para o Grupo com a compra da empresa.
O Grupo LENA enfrentava em 2010 enormes dificuldades financeiras (já desde 2007), aliás conhecidas no meio e por isso o Grupo decidiu vender um dos seus activos – o terreno referido supra.
As declarações e depoimentos divergem, mas, no essencial, podemos dizer que, perante o GRUPO, o arguido BB seria um intermediário para chegar a HH que trataria de venda.
É indiferente, para este efeito, a postura, não verdadeira, do arguido HH, afirmando nada ter a ver com a EMP19....
O que sabemos é que houve incumprimento de algumas prestações e, não obstante as negociações continuarem com vista à concretização do negócio, houve um acordo de rescisão e o Grupo Lena assegurou que os 8 milhões de sinal ficariam para si!!!!
Digno de espanto é o valor que o legal representante do Grupo diz ter entregue a BB –  3 milhões dos 8 milhões de sinal!!!! – transferidos para a conta da XLM.
Mais admirável é considerar que as negociações relativas ao terreno se desenvolveram de uma forma “habitual”.
Como se explica que, no meio de negociações que se mantêm, o promitente vendedor receba (ficando para si) o sinal, que, “por caso” era só de 8 milhões de euros???
Se juntarmos o valor pago à EMP41..., à sociedade EMP42..., à Sociedade de Advogados, o pagamento relativo à viatura e o montante transferido para a XLM à conta de um  contrato de prestação de serviços, começamos a ter as ditas provas que o Sr. Juiz não conseguia encontrar.
Terminamos esta parte da mesma forma como iniciamos a análise dos indícios.
Obviamente que nenhuma destas operações - negócios e transferências bancárias-  tem o nome do arguido AA.
Porém, tendo em conta os crimes em investigação, estranho era que tivesse.
Assim, por tudo quanto expusemos, parece-nos estar fortemente indicada a prática dos crimes de corrupção constantes da acusação e, como tal, serão pronunciados:
UM CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA PARA ACTO ILÍCITO DE TITULAR DE CARGO POLÍTICO, praticado por AA, com referência a actos praticados no interesse do arguido CC, relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.º lº, 2.°, 3.°, n.º 1, alínea d), 16.° da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n° 108/2001, de 28 de Novembro(Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos).
 Um CRIME DE CORRUPÇÃO ACTIVA  PARA ACTO ILÍCITO DE TITULAR DE CARGO Político, praticado por  CC relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES no que concerne aos pagamentos efectuados ao arguido AA, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. l°, 2°, 3°, n.º 1, alínea d), 18°, n.º 1 da Lei 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n° 108/2001, de 28 de Novembro- Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos.
Um CRIME DE CORRUPÇÃO ACTIVA praticado por CC, relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES no que concerne aos pagamentos efectuados ao arguido RR, crime p. e p. pelo arts. 374°, n.º 1 do Cód. Penal, com referência ao 386°, n.º 2 do mesmo diploma legal;
Um CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA, praticado por RR relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES no que concerne aos pagamentos recebidos do arguido CC com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, crime p, e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 372°, n.º l e com referência  386°, n.º 2, todos do Código Penal;
Um CRIME DE CORRUPÇÃO ACTIVA praticado por CC relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES no que concerne aos pagamentos efectuados ao arguido SS, crime p. e p. pelos arts. 374°, n.º 1 do Cód. Penal, com referência aos art . 386°, n.º 2 do mesmo diploma legal;
Um CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA praticado por SS, relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES no que concerne aos pagamentos recebidos do arguido CC com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts.372°, n.º l e com referência ao art. 386°, n.º 2, todos do Código Penal;

1.3.5.3 GRUPO VALE DE LOBO
Na acusação é imputado aos arguidos AA, DD, EE e FF o cometimento de:
UM CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA DE ACTO ILÍCITO DE TITULAR DE CARGO POLÍTICO, praticado por AA  em co-autoria com o arguido DD, com referencia a actos praticados no interesse dos arguidos EE e FF com utilização das sociedades do Grupo VALE DO LOBO, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.º 1º, 2.°, 3.°, n.º 1, alínea d), 16.° da Lei 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n° 108/2001, de 28 de Novembro- Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos.
Um CRIME DE CORRUPÇÃO ACTIVA DE TITULAR  DE ACTO ILÍCITO DE CARGO POLÍTICO, praticado por FF  em co-autoria com o arguido EE, com referência a actos praticados por AA e DD no interesse dos primeiros, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 2°, 3°, n.º 1, alínea d), 18°, n.º 1 e 30° da Lei 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n° 108/2001, de 28 de Novembro- Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos.
No que toca a estes crimes o Sr. Juiz considerou que o crime de corrupção passiva de titular de cargo político estava prescrito, solução que já afastámos.
Continua o Sr. Juiz, dizendo que, mesmo que tais crimes não estivessem prescritos, não haveria indícios relativamente à sua prática pelos arguidos.
Diz o Sr. Juiz que “Tendo em conta as quatro fases acima referidas, em particular a fase relacionada com a aprovação dos financiamentos por parte da CGD, a acusação não concretiza qual o acto ou actos praticados pelo arguido AA, enquanto Primeiro-Ministro, integrados no conteúdo funcional das competências do Primeiro-Ministro relativos à CGD e aos financiamentos em causa.  Cumpre ter em atenção que no regime vigente à data dos factos, anterior a 2 de Março de 2011, os artigos 16º e 17º da Lei 34/87, na redacção da Lei 108/2001, o crime de corrupção apenas abrangia os actos praticados pelo titular de cargo político no exercício das suas funções. Os actos descritos na acusação, relacionados com o financiamento a Vale do Lobo, descritos no Capítulo V da Acusação («O Grupo Vale do Lobo e os financiamentos concedidos pela CGD»), em concreto nos subcapítulos 11 e 12 (fls. 41992 a 42010), não se enquadram entre os actos atribuídos por lei ao Primeiro-Ministro, ou seja, não são actos que se possam enquadrar no exercício das suas funções.  Assim sendo, há que demonstrar o vínculo da vantagem à qualidade do titular de cargo político, dado que o crime em causa, proíbe o mercadejar do cargo e se não existir a relação da vantagem com o cargo do funcionário, neste caso, com o cargo de Primeiro-Ministro, a modalidade de corrupção em causa não se mostra verificada.”
Tal como já referimos, o crime em causa seria o de corrupção passiva pela prática de acto ilícito, não obstante o erro do acusador no que toca à indicação do artigo e subsequente “aceitação” dessa qualificação pelo Sr. Juiz.
Este, partindo dessa qualificação errada, afirma que “ Tendo em conta estas considerações a propósito do que deve entender-se por “acto contrário (ou não contrário) aos deveres do cargo”, não se pode deixar de concluir que não se verifica, quanto ao arguido AA, este elemento objectivo do tipo quanto ao imputado crime de corrupção passiva p e p pelo artigo 17º nº 1 da Lei 34/87, na versão dada pela Lei 108/2001, de 28 de Novembro, vigente à data dos factos.”
Entendeu o Sr. Juiz que “os actos que o arguido AA se propôs praticar - «seu conforto político enquanto Primeiro-Ministro e definidor dos interesses do accionista único da CGD, o Estado Português»; «o arguido AA aceitou vir a manifestar o seu apoio às decisões que viessem a ser proferidas no sentido de conceder os financiamentos pretendidos…»; «o arguido AA acedeu a subordinar a sua vontade, as suas iniciativas e as suas decisões pela peita prometida, manifestando a sua concordância com a concessão do financiamento e comprometendo-se, junto da administração da Caixa Geral de Depósitos, se e quando necessário, a suportar politicamente aquela decisão», não são actos correspondentes às específicas competências ou atribuições legais do mesmo enquanto Primeiro-Ministro e nem sequer decorrem da posição funcional do mesmo, isto é, não se encontram numa relação funcional imediata com o desempenho do cargo de chefe do executivo, ou seja, das possibilidades fácticas que apesar de exorbitarem o seu cargo, são propiciadas pelo cumprimento normal das suas atribuições legais.
Quando muito, os actos descritos na acusação relativos ao arguido AA e ao financiamento relativo a Vale do Lobo, poderiam ser qualificados, à luz do regime actual, como actos não no exercício das suas funções, mas por causa delas. Em todo o caso, como já vimos, não era este o regime vigente à data dos factos e por isso não pode ter aplicação ao caso concreto, em virtude da proibição consagrada no artigo 29º da CRP e 2º do Código Penal.
Os actos descritos na acusação em relação ao arguido AA, quando muito, seriam susceptíveis de preencher aquilo a que doutrina qualificou como “corrupção sem demonstração de acto concreto pretendido” previsto no artigo 17º nº 2 da Lei 34/87 na redacção da Lei 108/2001 de 28-11 que dispõe o seguinte: Na mesma pena incorre o titular de cargo político que por si, ou por interposta pessoa, com o seu consentimento ou ratificação, solicitar ou aceitar, para si ou para terceiro, sem que lhe seja devida, vantagem patrimonial de pessoa que perante ele tenha tido, tenha ou venha a ter qualquer pretensão dependente do exercício das suas funções”, ou um crime de recebimento indevido de vantagem p e p pelo artigo 16º da Lei 34/87 na redacção dada pela Lei 41/2010, de 3-09.”
Já dissemos supra o que entendíamos por “actos contrários ao dever do cargo” e “actos praticados no exercício de funções”, o sentido alargado que atribuímos ao conceito e que, pensámos nós, apenas passou para texto de lei com a alteração ocorrida em 2010 como forma de clarificar que, na interpretação a fazer-se do texto anterior,  também já cabia o conceito “por causa delas”.
Deste modo, não concordamos com o entendimento do Sr. Juiz, sendo certo que, no limite, a actuação do arguido AA caberia sempre no tipo legal do art 17º nº 2 da Lei 34/87 na redacção dada pela Lei 108/2001 – corrupção sem demonstração de acto concreto.
Antes de analisarmos os indícios propriamente ditos, há que atentar em alguns elementos objectivos importantes:
- A venda do Lote ... do empreendimento envolveu o pagamento de verbas "por fora", num total de 2,2 milhões de euros.
- Das contas do comprador KK foram transferidas verbas num total de 2 milhões de euros, entre Janeiro e Abril de 2008, para o intermediário GG.
- GG procedeu à transferência das verbas acumuladas na sua conta para a esfera dos arguidos BB e DD, no valor de 1.000.000€/cada, em Janeiro e Junho de 2008, respectivamente.
- KK transferiu ainda 200.000€ para a esfera de FF, em Agosto de 2009.
- Do valor recebido na sua conta da UBS na ..., FF transferiu 100.000€ para o arguido EE e ordenou a transferência dos 100.000€ que ficaram na sua esfera para uma conta em Portugal.
- O arguido DD, à data, administrador da CGD nomeado pelo Governo, para além do mencionado valor de 1.000.000E recebeu na sua conta diversos valores correspondentes a entregas em numerário por si efectuadas ao seu gestor da UBS, ZZZZZZ. Este gestor, quer através da utilização dos serviços de XXXXXX quer através de operações de compensação junto da UBS entre contas de clientes, fazia com que o numerário entregue em Portugal por aquele arguido se transformasse em transferências para a EMP07..., a sociedade offshore da qual DD era beneficiário, através da sua filha JJ.
- Também na conta da EMP63... titulada por II, deram entrada valores que pelas datas se podem associar à operação de aquisição de VALE DO LOBO. Essas verbas foram colocadas à sua disposição por HH, um dos sócios indirectos de VALE DO LOBO, que beneficiava directamente com a aprovação do financiamento da CGD para a referida aquisição – cfr. fls. 2018 do apenso 6 do relatório final.
- No mesmo período de tempo da conta da EMP63... foram efectuadas transferências para XXXXXX, que disponibilizava numerário em Portugal a troco de uma comissão de 1%. De referir que este é o movimento inverso ao que no mesmo período ocorria na conta da EMP07.... Cfr. idem
-Para a aquisição da participação de VALE DO LOBO, 5 investidores juntaram-se e constituíram a EMP78.... A contribuição de cada um deles para capital social e prestações suplementares foi de 1.200.000E, sendo que pelo menos 4 recorreram a empréstimos, em que foram dados colaterais ou no caso de EE foi necessário o aval dos restantes sócios.
-Os 6 milhões de euros que entraram na EMP78... serviram para subscrever 75% do capital da RESORTPART. Os restantes 25% correspondem a 2 milhões de euros subscritos pela WOLFPART, que na mesma data fez a entrega de 28 milhões de euros de suprimentos.
-A WOLFPART pertence ao grupo da CGD, instituição bancária que aprovou os dois financiamentos que em conjunto com as entradas já referidas, permitiram a aquisição de VALE DO LOBO. O financiamento aprovado em condições especiais foi de 194 milhões de euros e um adicional de 2 milhões de euros.
- o arguido DD era administrador da CGD, com o pelouro do crédito, nomeado pelo Governo liderado por AA e teve um papel interventivo na operação de financiamento e aquisição de VALE DO LOBO.
- A CGD financiou ainda em Setembro de 2007 a sociedade VALE DO LOBO para a aquisição da EMP79..., uma sociedade detentora de um terreno vizinho, na qual EE tinha uma participação indirecta.
- Quer DD quer EE utilizaram um circuito muito semelhante de passagem de dinheiro fornecido pela sociedade EMP80..., que envolvia sociedades em ... e no .... Ambos se socorreram de sociedades com sede na mesma morada na ..., das quais constavam como beneficiários finais.
- A utilização daquele circuito por DD iniciou-se em Dezembro de 2007 e até Setembro de 2009 fez circular 575.000€. No entanto, apesar de ter início em 2007 apenas em 2009 se vai materializar a utilização de parte do valor com a aquisição de um imóvel em Portugal – cfr. fls. 2019 do penso 6 do relatório final.
-EE fez circular 601.500€ em Março e Outubro de 2008, de forma a simular um pagamento a si próprio referente a uma venda de metade da sua participação na EMP78... a uma sociedade da qual é beneficiário. Ambas as situações geraram custos para os arguidos que aparentemente não são justificados pelos movimentos efectuados.
A EMP78... é detida em 60% pela sociedade de direito ... EMP81... B.V., (anteriormente denominada EMP82..., BV) (#Anexo 2.2.02-011#) e os restantes 40% são divididos em partes iguais entre os administradores de VALE DO LOBO, RTL, EE e FF.
Quanto àquela sociedade ..., a mesma é detida através de sociedades instrumentais do tipo offshore por HH, EEEEEEE e TTTTTT, em partes iguais (#Anexo 2.2.02¬012#).
Paassado cerca de 1 ano da compra do Grupo Vale do Lobo, EE procedeu à operação de transferência de 10% das acções da EMP78..., que eram por si detidas em seu nome pessoal, para a sociedade de direito ... EMP10... LIMITED (#Anexo 2.2.02-0134
Em 30-11-2006, a conta bancária da EMP78... n.° ...830, junto da CGD, foi munida de 6.000.000,00€ relativos à sua parte e necessários para a aquisição de Vale do Lobo, através dos seguintes movimentos:
- 1.200.000,00€ por transferência ordenada por FF, conforme Apenso Bancário 69H, folhas 19;
- 3.600.000,00€ por transferência ordenada pela entidade ... EMP82.... BV, onde se incluíam as participações de EEEEEEE, HH e TTTTTT, conforme Apenso Bancário 69H, folhas 19 e
- 1.200.000,00€ por depósito de cheque bancário emitido pelo BCP, cheque nº ...20, adquirido por EE a débito da sua conta no BCP com o n° ...220, conforme apenso bancário 83, folhas 136 e apenso bancário 69H, folhas 28 e 29.
Para fazer face à sua parte, EE constituiu um empréstimo junto do BCP, no montante de 1.300.000,00€, que liquidou parcialmente após a operação de venda de parte da sua participação na EMP78... à EMP10... LIMITED, em Abril de 2008, e ainda com a devolução de suprimentos e empréstimos pela sociedade PEPELAN, amortizando um total de 650.000,00€, conforme apenso Bancário 83, folhas 139 e 238 e 246.
A sociedade WOLFPART SGPS é uma sociedade anónima que tem por objecto a gestão de participações sociais noutras sociedades. A sua constituição está registada na Conservatória do Registo Comercial ... em 15/12/2006 e é detida na sua totalidade pela CGD, tendo um capital social de 50.000.000€, integralmente subscrito e realizado pela CGD.
Em 15/12/2006 foram creditados na conta n° ...630 junto da CGD, em nome da WOLFPART, os montantes de 50.000€ e de 30.000.000€, com origem na própria CGD, conforme apenso bancário 69-G, folhas 25.
Em 18/12/2006, data da finalização do contrato de compra e venda das participações no Grupo Vale do Lobo, a WOLFPART subscreveu, com uma entrada de 2.000.000€, o remanescente do aumento de capital da sociedade RESORTPART, que passou de 50.000€ para 8.000.000€, Apenso Bancário 69-H, folhas 32.
Por via desse aumento de capital, a WOLFPART passou a deter 25% do capital social da RESORTPART, correspondente ao montante de 2.000.000€ e subscreveu com a mesma um contrato de suprimentos, no montante de 28.000.000€.
No exercício de 2007, a WOLFPART aumentou o seu capital no montante de 1.250.000€, através da emissão de 250.000 novas acções com valor nominal unitário de 5,00€ cada, integralmente subscrito e realizado pela CGD.
No Relatório e Contas de 2008 é referido que em Setembro de 2007, em resultado da fusão por incorporação do património das sociedades RESORTPART, S. A. e VALE DO LOBO, SGPS, S. A. na sociedade VALE DO LOBO, RESORT TURÍSTICO DE LUXO, S. A., a WOLFPART, SGPS, S. A. passou a deter uma participação de 25% do capital desta última sociedade
Em 19/09/2007 ocorreu uma fusão, por incorporação, com transferência global do património activo e passivo da sociedade RESORTPART e da sociedade VALE DO LOBO, SGPS, S. A. para a sociedade VALE DO LOBO, RESORT TURÍSTICO DE LUXO, S. A.
A sociedade WOLFPART é detida 100% pela CGD.
A sociedade EMP78... é participada por via directa por EE e FF, e por via indirecta por TTTTTT, EEEEEEE e HH. EMP82.... BV, onde se incluíam as participações de EEEEEEE, HH e TTTTTT.
Não vamos recuar a 1962 e falar sobre a criação do Grupo Vale do Lobo.
Situemo-nos em 2005 quando se iniciaram os contactos entre o arguido EE e FFFFFFF, por intermédio de GGGGGGG, com vista à aquisição do Grupo Vale do Lobo.
A aquisição de Vale do Lobo veio a ocorrer em 21/11/2006 (#Anexo 2.2.02-006#).
A EMP83... vendeu a  EMP78..., pelo preço de 230.000.000€, incluindo prestações acessórias as sociedades ,VALE DO LOBO SGPS, VALE DO LOBO RTL, EMP84..., EMP85..., EMP86... e todas as suas subsidiárias.
Já depois de assumido aquele acordo de transmissão das participações no grupo Vale do Lobo, veio EE, solicitar à CGD um novo financiamento no montante de 2.000.000€.
Refere aquele, através de mail enviado a HHHHHHH e LLL, no dia 30/11/2006 (#Anexo 2.2.02-072#) que a concretização da operação, trará custos para a RESORTPART no dia de fecho da operação que, de acordo com os montantes previstos de financiamento, capital e suprimentos, não seriam suficientes para a sua liquidação.
Estes 2.000.000€ extra, vieram a ser efectivamente financiados e ao contrário das restantes operações em que para a concessão de financiamento se mostrou necessário haver uma proposta efectuada pela área comercial, a emissão de um parecer por parte da Direcção de Gestão de Risco, e a sujeição destes elementos à aprovação pelo conselho de crédito ou conselho alargado de crédito, consoante o montante envolvido, o financiamento destes 2.000.000€ foram aprovados apenas de acordo com o documento constante do (#Anexo 2.2.02-074#).
Este financiamento adicional, não representava um alargamento do montante do empréstimo já aprovado, mas sim um novo financiamento, com condições mais favoráveis para os mutuários que o primeiro, uma vez que não incluíam as garantias exigidas para essa operação já aprovada.
Esta operação de financiamento adicional de 2.000.000€ deu origem, após deduções fiscais, ao crédito do montante de 1.979.600€ na conta CGD n° ...3.930, titulada pela RESORTPART, apenso bancário 69-E, folhas 12.
Esta operação não foi colocada em causa em nenhuma fase do processo de financiamento, sugerindo que a mesma estaria implicitamente aprovada superiormente desde o início, deixando para posterior negociação apenas o acerto dos pormenores finais.
Não foi o facto de a operação de financiamento em causa ter gerado incumprimento por parte dos mutuários que nos permitiu inferir, sem mais, que a mesma foi aprovada com violação dos deveres do cargo por parte do arguido DD.
Na verdade, o fracasso da operação  apenas chamou a atenção para a actuação do arguido.
No decorrer do processo de financiamento houve por parte da CGD, uma abertura às pretensões de Vale do Lobo que não se pode considerar normal, que resultaram numa deterioração do nível de risco do negócio, consubstanciada no facto de que a CGD após a exigência inicial de capitais próprios,  entrou com esses capitais próprios, tendo os investidores particulares contribuído com apenas 2,6% do investimento total, para uma aquisição de uma participação de 75% do Grupo Vale do Lobo.
Nos termos finais e contratuais dos diversos financiamentos prevaleceram os interesses particulares sobre os da CGD, tendo esta libertado os avales e permitido que em termos de garantias se verificasse uma deterioração da sua qualidade/valor, iá no que à rentabilidade do negócio diz respeito, permitiu cedências nos spreads contratados e nos custos iniciais do mesmo.
Ocorreu, portanto, uma completa deterioração no rácio Risco/Rentabilidade deste negócio, o que se pode considerar contra natura num negócio envolvendo uma instituição bancária. as próprias proieccões em que a CGD se baseou para atribuir o financiamento, as quais haviam sido apresentadas por EE aquando do pedido de  financiamento, foram manifestamente optimistas e ficaram muito aquém dos valores que se vieram  efectivamente a registar.
Temos também como certo que DD foi nomeado pelo ex-Ministro das Finanças MMMMM para o conselho de administração da CGD no dia 01/08/2005, tendo tomado posse no dia 04/08/2005 e tendo renunciado em  28/12/2007.
Não vamos entrar pelo caminho da análise/comentário das “conversas” entre o arguido AA enquanto Primeiro Ministro e IIIIIII (ouvido também perante a Comissão Parlamentar de Inquérito à recapitalização da CGD), ex-ministro das Finanças a quem sucedeu MMMMM.
Vamos, mais uma vez, seguir o caminho do dinheiro.
Os valores em causa neste ponto têm origem em transferências efectuadas pelo cidadão ... KK, adquirente de um dos lotes de terreno para construção no empreendimento de Vale do Lobo, que ao ser escriturado a um preço inferior ao real, permitiu que ficassem disponíveis verbas que este transferiu directa ou indirectamente para os beneficiários das mesmas. Como beneficiários indirectos, através da utilização de GG como intermediário, vão surgir os arguidos BB, mais uma vez no papel de fiduciário do arguido AA bem como DD. Como beneficiário directo surge o arguido FF, que, por sua vez, actua também como intermediário para o arguido EE.
Nas suas declarações proferidas em inquirição de 21/05/2015, KK admitiu que lhe foi pedido pelo arguido EE um pagamento de 2 milhões de euros para uma conta na ... e que para ele era indiferente que o pagamento fosse efectuado para uma conta na ... ou para uma conta em Portugal. Referiu que estava convencido que esse pagamento era para VALE DO LOBO e que dividiu esse pagamento em três parcelas por questões de liquidez. Afirmou ainda que reteve algum do valor para que em VALE DO LOBO se encarregassem das infra-estruturas para o lote que adquiriu. Questionado porque efectuou os pagamentos não para uma conta titulada por uma sociedade mas para uma conta em nome individual — GG, referiu que pensava que por trás estaria uma sociedade ligada a Vale do Lobo e que efectuou as transferências para aquela conta porque lhe foi solicitado.
De acordo com o extracto bancário da conta n.° ...01, junto do GRAUBUENDNER KANTONALBANK, titulada por KK (Apenso Bancário 95), a 26/08/2009, foi efectuada uma transferência de 200.000€ para uma conta titulada por "JJJJJJJ".
Como documento de suporte desta transferência de 200.000€ (#Anexo 2.2.01-006#). apenas se encontra um aviso emitido pelo GRAUBUENDNER KANTONALBANK, em 26/08/2009, dirigido a KK e referente à sua conta "CK318.797.701/EUR", indicando como beneficiário JJJJJJJ" e como conta de destino o IBAN  ...60..., uma conta junto da UBS AG, em ....
De acordo com as informações recolhidas junto das autoridades ..., o IBAN  ...60... corresponde à conta numérica CQUE ...51, junto da UBS, cujo beneficiário final é o arguido FF, conforme Apenso Bancário 81-B.
Na inquirição de 28/10/2016, KK questionado sobre uma verba de 200.000€ que transferiu para uma conta do arguido FF referiu não se recordar da mesma e quando confrontado com o documento da transferência acima descrito é que referiu que deve ter sido um valor que ficou retido, para pressionar que os trabalhos de infra-estruturas avançassem. Com o pagamento de mais este valor, KK assumiu que o valor do lote adquirido em Vale do Lobo foi superior ao escriturado em 2,2 milhões de euros.
KK assumiu que o preço total da casa, o preço que pagou a VALE DO LOBO, tenha atingido 6,6 milhões, sendo certo que a escritura tenha sido feita por 4 milhões 385 mil euros, mas o preço não é só pelo lote mas sim pela liberdade de construir como entendesse nesse lote. Tendo comprado a 100% não se lembra se foi 2 milhões ou 2,2 milhões mas, de acordo com os documentos, foi 2,2 milhões. O que constou na imprensa ... foi muito por conta do que foi dito na imprensa portuguesa e que os 2,2 milhões foi o preço da liberdade de construir como pretendia. A primeira proposta que foi feita foi de 6,2 milhões, com a obrigação de construir com a VALE DO LOBO e isso terá sido em Setembro de 2007 e recusaram; o senhor EE disse que o preço seria 6,6 milhões ou 6,4 milhões, mas teria que pagar 2 milhões ou 2,2 milhões para a conta que ele indicou e que o que terá sido dito pelo EE é que tratavam da questão do notário com 4,3 milhões para a casa. A diferença terá sido pela liberdade de construir e para as infra-estruturas. Refere que no notário deveria ser mais do que 4,3 milhões, isso concorda, mas foi feito nesses moldes.
Na conta CQUE ...51, da esfera de FF, após a entrada de 200.000€ com origem na conta de KK (#Anexo 2.2.01-007#1, foram efectuadas duas transferências de igual montante para a conta da EMP87..., da esfera do arguido EE e para uma conta em território nacional titulada pelo arguido FF.
Pela análise da conta n° ...280..., junto da UBS, titulada pelo arguido GG, que constitui o Apenso Bancário 43-E, verifica-se que o primeiro crédito com origem em KK, no valor de 1.067.500,00€ ocorreu a 16/01/2008 e que no dia 29/01/2008 foi efectuada uma aplicação no valor de 1.067.000€. No dia 19/02/2008 esta aplicação foi resgatada parcialmente por 999.938,08€, ficando nessa data a conta à ordem com um saldo disponível de 1.000.613,87€.
Na data do resgate da aplicação - 19/02/2008 - foi efectuada uma transferência de 1.000.000,00€ da conta n° ...280..., do arguido GG, para a conta ...4112..., também junto da UBS, titulada pela EMP67... LIMITED, da qual consta como beneficiário final o arguido BB (Apenso Bancário 59).
Na conta da EMP67..., este valor foi creditado em 19/02/2008, o mesmo período temporal das transferências de 2.450.000,00€ e 1.018.000,00€, que aconteceram em 21/02/2008, ambas com origem na EMP63... LIMITED, mas provenientes do GES, via HH, analisadas nos pontos 2.1.01.02 e 2.1.01.03, respectivamente.
Este valor entrou na EMP67... a 19/02/2008 e a 21/02/2008 foi transferido para a conta principal do arguido BB, a EMP68....
Com a saída de 1 milhão de euros da esfera de GG para a EMP67..., o primeiro arguido ficou na sua conta com 67.500,00€ com origem em KK. A este valor juntaram-se as entradas de 240.000,00€ e 692.500,00€, de 26/03/2008 e 04/04/2008, o que totaliza o valor de 1.000.000,00E que corresponde à saída seguinte.
Na conta n° ...280..., junto da UBS, titulada pelo arguido GG (Apenso Bancário 43-E), a 16/06/2008, foi efectuado um resgate das aplicações financeiras, no valor de 988.938,00€ que juntamente com outros fundos que se encontravam à ordem perfez um saldo disponível de 1.000.448,83€.
Ainda a 16/06/2008 foi efectuada uma transferência, no valor de 1.000.000,00€, para a conta ...172..., titulada pela sociedade EMP07... INC, da qual foi indicada como beneficiária final a arguida JJ, filha do arguido DD, também autorizado a assinar individualmente naquela conta (Apenso Bancário 60).
O Sr Juiz relativamente à análise dos elementos de prova, reincide na concessão de enorme valor probatório às declarações, de negação dos factos, por parte dos arguidos AA e DD.
Contrariando o que é dito na acusação, refere o depoimento do então Ministro das Finanças, MMMMM, que assumiu a autoria da decisão de alteração da administração da CGD e da indicação do nome do arguido DD.
Quanto à circunstância da decisão do Governo ser colegial, diremos, apenas, que é difícil determinar e quantificar o contributo individual de cada elemento do Colégio.
Como dissemos, a  convicção a que chegou este tribunal de recurso segue, novamente, o entendimento de que se chega à verdade através do caminho do dinheiro.
A transferência no valor de 1M€ efectuada por GG, datada de 19/02/2008, para a conta da EMP67... de que é beneficiário, BB, tinha como destino a quantia global pertencente a AA.
Nenhum sentido faz a afirmação do arguido BB de que tal  quantia foi realizada por iniciativa do arguido GG e teve a ver com remunerações que lhe eram devidas pelos serviços prestados ao Grupo Lena. Note-se que essa quantia tem origem no cidadão KK que não conhece o arguido GG, não tem qualquer ligação, pessoal ou profissional com o mesmo, tendo efectuada a transferência para a conta deste a pedido do arguido EE.
Parece-nos completamente despicienda a  dúvida levantada relativamente aos depoimentos da testemunha KK, designadamente porque, na óptica dos arguidos, teve depoimentos contraditórios – O pagamento adicional no montante de € 2.000.000,00 (dois milhões de euros) destinava-se a garantir que KK poderia construir uma moradia sem recorrer aos serviços de construção de Vale do Lobo ou para a aquisição do lote de terreno ( nunca a testemunha se referiu à aquisição de um novo lote)..
O mesmo acontece com o valor de 200.000,00 que diz ter servido para poder exercer pressão sobre os responsáveis pelo empreendimento turístico Vale do Lobo para que fossem realizadas as infra-estruturas básicas que permitiriam a construção da sua casa.
O facto importante e que não é posto em causa, é que a testemunha KK procedeu à entrega de 2.000.000 (quer  fizessem parte do preço da compra do lote ou não) na sequência do negócio efectuado com o arguido EE ( e com o arguido FF, uma vez que a actuação destes é qualificada na acusação como co-autoria) e que a pedido deste procedeu ao depósito de tal quantia na conta do arguido GG.
Para estes autos é manifestamente irrelevante a origem dos fundos da testemunha KK. Importante é o destino que este, a pedido dos arguidos, deu ao dinheiro.
O próprio arguido GG afirmou, no interrogatório de 08.05.2015 que, quanto aos 2 milhões de Euros que entraram na sua conta na ..., os mesmos se destinavam ao BB e que permitiu a utilização da sua conta a pedido daquele e por ele lhe ter dito que um amigo lhe devia dinheiro. Que permitiu essa utilização em razão da amizade e confiança que tinha para com o BB.
Diz o Sr. Juiz “Da análise dos elementos bancários acima mencionados, indicia-se que o montante de 2.000.000,00€ com origem na conta titulada pelo cidadão KK tem um percurso que passa pela conta titulada pelo arguido GG e depois, juntamente com outros fundos, circula pelas contas tituladas pela EMP67..., EMP68... e EMP20..., todas tituladas por sociedades pertencentes ao arguido BB, terminando na conta BES titulada, igualmente, pelo arguido BB.”
Pergunta-se:
- qual o motivo da transferência efectuada pelo cidadão KK para o arguido GG, que aquele nem conhece?
- qual a necessidade deste dinheiro circular pelas várias contas tituladas pela EMP67..., EMP68... e EMP20..., sociedades pertencentes ao arguido BB para terminarem na conta do BES?
Diz o Sr. Juiz “Da leitura da acusação e das conclusões apresentadas pelo Ministério Público em sede de debate instrutório, ressalta a ideia que a justificação para a imputação do crime de corrupção passiva ao arguido AA quanto a Vale de Lobo reside na presunção de que todas as quantias monetárias existentes na ..., nas contas controladas pelo arguido BB, no valor global de 23.013.156,18€, pertencem ao arguido AA e a partir desse dado infere que a quantia de 1 milhão de euros, com origem no cidadão KK, transferida pelo arguido GG para a conta de BB, pertence ao arguido AA e a partir desta nova inferência infere que essa quantia se destinou a compensar o arguido AA pela sua intervenção no financiamento Vale do Lobo.
Verifica-se que a partir de uma presunção o Ministério Público deduz outras presunções e a partir destas novas presunções constrói um facto novo, sem que entre o facto base, aquele que se mostra indiciado por prova directa, e o facto produzido exista uma concordância. Com efeito, não se consegue alcançar, dado que não foi apresentada uma explicação lógica, para além da mera intuição pessoal, porque é que daquele facto indiciário se infere a prova do facto probando.
O Ministério Público presume que todo o dinheiro existente nas contas do arguido BB, na ..., pertence ao arguido AA e a partir daí presume que esse dinheiro é produto da prática de 3 crimes de corrupção passiva. Por sua vez, o Ministério Público presume que o arguido AA praticou os 3 crimes de corrupção passiva e a partir daí presume que o dinheiro em causa é o produto desses 3 crimes. “
Aqui temos de discordar mais uma vez do Sr. Juiz.
Não há uma presunção de que todo o dinheiro existente nas contas da ... da titularidade do  arguido BB pertença ao arguido AA.
Há indícios fortíssimos que apontam para essa realidade.
Não se diga que estamos, de alguma forma, a inverter o ónus da prova.
O ónus da prova da prática do ilícito compete ao Acusador.
Este deduziu a acusação e apresentou os meios de prova que, no seu entender, conduzem à conclusão da prática, pelos arguidos, dos ilícitos que lhe foram imputados.
Este Tribunal de recurso, a quem é pedido que verifique se existem indícios suficientemente fortes que determinem a sujeição dos arguidos a julgamento, analisou a prova, mas fê-lo de uma forma distinta do Sr. Juiz de instrução.
Este partiu da parte para o todo. Nós partimos do todo, para a parte.
Esta diferente forma de analisar os indícios prende-se com a circunstância de não estarmos perante um processo comum, com uma história comum .
Este processo é bem mais complexo. E não se diga que o juízo indiciário  assentou numa construção de presunções, assentes noutras presunções, até alcançar a conclusão pretendida.
O tribunal partiu do facto relativamente ao qual os indícios são fortíssimos – ou seja, a titularidade dos cerca de 34 milhões de euros -  concluindo que pertencem ao arguido AA.
Os indícios são de tal modo evidentes que não nos restou qualquer dúvida nessa afirmação. Com base neles, todas as restantes actuações são perceptíveis. Não é uma presunção.
Note-se que se chegou a esta conclusão pela prova, indiciária, constante dos autos, que não resulta das declarações dos arguidos.
Melhor explicando: a conclusão relativa à propriedade do dinheiro era atingida mesmo que os arguidos se remetessem ao silêncio, (direito com reconhecimento constitucional que lhes assiste) e do qual não é possível retirar nenhuma ilação, positiva ou negativa.
Acontece que os arguidos decidiram prestar declarações.
A partir do momento em que o fazem, o tribunal é livre de apreciar as afirmações que proferem e o relato do que entendem que aconteceu.
Ora, se não tínhamos dúvidas relativamente à titularidade do dinheiro, com as declarações do arguido AA, (“pobre provinciano que andou na política durante uns anos”, “foi a primeira vez que ouviu falar em offshores), confirmamos essa convicção.
Deste modo, o recurso será procedente nesta parte e os arguidos serão pronunciados pela prática de um crime de corrupção passivo e activo de titular de cargo político.
Não obstante o arguido DD, não ser titular de cargo político a acusação que se lhe faz ao abrigo desta lei, provém da actuação, em co-autoria, com o arguido AA.
Tem aqui sentido o art, 28º do CP ( de aplicação não isenta de dúvida, sabemos) que torna extensível ao autor mediato as qualidades especificas do autor imediato com o intuito de não deixar passar sem punição a prática de crimes que, de outro modo, não podiam ser punidos, tal como já escrevemos supra.
Quanto à questão levantada na Decisão Instrutória  relacionada com a narrativa da acusação de onde resulta que os  corruptores activos não conhecerem o arguido AA e deste ter sabido do acordo que o envolvia, após o pacto estabelecido entre o arguido DD e os arguidos FF e   EE, parece-nos que a letra dos artigos 16º e 18º da Lei 34/87, de 16 de Julho, com a redacção dada pela  Lei n.º 108/2001, de 28 de Novembro, aplicáveis à data, permitem que a actuação seja para terceiro e por terceiro, que depois a ratifica.
Artigo 16.º Corrupção passiva para acto ilícito:  “1 - O titular de cargo político que no exercício das suas funções, por si ou por interposta pessoa, com o seu consentimento ou ratificação, solicitar ou aceitar, para si ou para terceiro, sem que lhe seja devida, vantagem patrimonial ou não patrimonial, ou a sua promessa, para um qualquer acto ou omissão contrários aos deveres do cargo, ainda que anteriores àquela solicitação ou aceitação, é punido com pena de prisão de 2 a 8 anos.”
Artigo 18.º Corrupção activa “1 - Quem por si, ou por interposta pessoa, com o seu consentimento ou ratificação, der ou prometer a titular de cargo político, ou a terceiro com conhecimento daquele, vantagem patrimonial ou não patrimonial que ao titular de cargo político não seja devida, com o fim indicado no artigo 16.º, é punido com pena de prisão de 6 meses a 5 anos.
Deste modo, considera-se o recurso procedente nesta parte e em consequência  os arguidos AA E DD SERÃO PRONUNCIADOS PELA PRÁTICA, EM CO-AUTORIA, DE UM CRIME DE crime de corrupção passiva de titular de cargo político p. e p. pelo art. 16º da Lei Lei 34/87, DE 16 DE JULHO, com a redacção dada pela  Lei n.º 108/2001, de 28 de Novembro.
EM CONSONÂNCIA, OS ARGUIDOS EE e FF serão pronunciados pela prática de um  crime de corrupção activa de titular de cargo político e p. e p. pela  Lei 34/87, de 16 de Julho, com a redacção dada pela  Lei n.º 108/2001, de 28 de Novembro.
Por fim, mais uma palavra quanto à prova e à apreciação dos indícios.
Segundo refere o Ac. RL de 13.02.2014 [proc.º n.º 256/10.0GARMR.L1-3, relator Carlos Almeida, em www.dgsi.pt, o “cerne da prova penal assenta em juízos de probabilidade e a obtenção da verdade é, em rigor, um objectivo inalcançável, não tendo por isso o juiz fundamento racional para afirmar a certeza das suas convicções sobre os factos.  A decisão de considerar provado um facto depende do grau de confirmação que esses juízos de probabilidade propiciem.  Esta exigência de confirmação impõe a definição de um “standard” de prova de natureza objectiva, que seja controlável por terceiros e que respeite as valorações da sociedade quanto ao risco de erro judicial, ou seja, que satisfaça o princípio in dubio pro reo.”
Podemos, para o efeito, aceitar o critério definido por Ferrer Beltrán segundo o qual «para se considerar provada uma hipótese de culpabilidade devem encontrar-se preenchidas simultaneamente as seguintes condições:  1) A hipótese deve ser capaz de explicar os dados disponíveis, integrando-os de forma coerente, e as previsões de novos dados que a hipótese permita formular devem ter resultado confirmadas;  2) Devem ter-se refutado todas as demais hipóteses plausíveis explicativas desses mesmos dados que sejam compatíveis com a inocência do acusado, excluídas as meras hipóteses “ad hoc””.
Há situações em que o tribunal conclui não ter sido possível atingir nenhuma  verdade.
Noutras situações, os dados de facto demonstrados, são coincidentes com os elementos objectivos que constam descritos na acusação e são susceptíveis de ser explicados pela hipótese ali vertida.
O Ac. TC n.º 521/18 [Ac. TC proc.º n.º 321/18, em www.tribunalconstitucional.pt  deu como assente a conformidade constitucional da prova por presunções em processo penal. Aí se refere, além do mais, que “na prova por utilização de presunção judicial, a qual pode sempre ser infirmada por contraprova, na passagem do facto conhecido para a prova do facto desconhecido, intervêm juízos de avaliação através de procedimentos lógicos e intelectuais que permitem fundadamente afirmar, segundo as regras da normalidade, que determinado facto, que não está diretamente provado é a natural consequência, ou resulta com toda a probabilidade próxima da certeza, ou para além de toda a dúvida razoável, de um facto conhecido. Quando o valor da credibilidade do id quod e a consistência da conexão causal entre o que se conhece e o que não se apurou de uma forma direta atinge um determinado grau que permite ao julgador inferir este último elemento, com o grau de probabilidade exigível em processo penal, a presunção de inocência resulta ilidida por uma presunção de significado contrário, pelo que não é possível dizer que a utilização deste meio de prova atenta contra a presunção de inocência ou contra o princípio in dubio pro reo. (...) Refere-se ainda no aresto citado que “o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem já se pronunciou sobre a admissibilidade do recurso a prova indireta em processo penal, designadamente no caso John Murray v. Reino Unido, decidido por Acórdão de 08 de fevereiro de 1996. A formulação de juízos de inferência incriminatórios encontra-se, segundo o TEDH, condicionada à verificação de determinados pressupostos: (i) a acusação deverá estabelecer previamente, através de prova direta, as circunstâncias que permitem o juízo de inferência; (ii) estas deverão permitir que nelas se apoie a conclusão inferida; e (iii) a conclusão inferida (de que se encontram provados os elementos essenciais do crime) deverá ser estabelecida para além de dúvida razoável. A estes requisitos devem acrescer garantias processuais destinadas a assegurar que o juízo de inferência seja racionalmente exposto e sindicável por via de recurso. Onde tais exigências se mostrem cumpridas – como é o caso do ordenamento processual penal português −, a prova indireta é perfeitamente admissível à luz do artigo 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem”.
Como em todos os processos, o tribunal lida com a verdade que nos é trazida e, de facto, muitas vezes, longe da “real” (se assim lhe podemos chamar) verdade.
Para a formação da convicção, o tribunal socorre-se da prova produzida.
Perante uma dificuldade probatória, o tribunal procura “âncoras” de seriedade à volta das quais constrói a sua convicção. Neste processo, essas “âncoras” são toda a prova documental e a  actuação dos principais arguidos, salientando AA e CC.

1.3.6 DO CRIME DE PECULATO
A acusação imputa ao arguido SS a prática de um crime de peculato, relativamente aos pagamentos efectuados pela PT à EMP06..., no período compreendido entre 30 de Julho de 2007 e 9 de Julho de 2008, no valor total de €618.310,00, crime p. e p. pelo art. 375°, n.° 1 do Código Penal, com referência ao art.386° n.° 1 e 2 do mesmo diploma legal;

DECISÃO RECORRIDA
A Decisão recorrida concluiu não se mostrarem verificados os elementos constitutivos do crime de peculato, com os seguintes fundamentos: «Para além do não preenchimento do conceito de funcionário, verifica-se, também, não indiciada a existência de uma apropriação. O arguido, conforme resulta da ordem de serviço ...04... de 1-12-2005 (fls. 101 do Apenso EN), tinha a disponibilidade jurídica de realizar os pagamentos em causa, na medida em que os valores estavam dentro dos montantes que poderia autorizar sozinho. No entanto, esses pagamentos não foram autorizados pelo arguido SS, mas sim pela Comissão Executiva, sendo que a acusação não alegou factos dos quais se possa concluir que o arguido tivesse manipulado ou induzido em erro os restantes membros da Comissão Executiva.»

APRECIANDO
Sufragando a doutrina exposta no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 26.06.2013, Processo n.º 48/10.7TAVLP.P1,entendemos ser os seguintes os elementos típicos do crime de peculato:
 «- Que o agente seja um funcionário para efeitos do artigo 386º do CP e que este tenha a posse do bem (dinheiro) em razão das suas funções; Uma vez que a conduta punida consiste na apropriação ilegítima, que a apropriação, isto é, a intenção do agente (que tinha apenas a posse do dinheiro) em comportar-se como se fosse proprietário do dinheiro se revele por actos objectivamente idóneos e concludentes que traduzam a “inversão do título de posse ou detenção”; isto é, actos que revelem uma disposição do dinheiro de forma injustificada ou uma não restituição no tempo e sob a forma juridicamente devidos: - Que o agente tenha actuado com consciência de que se trata de bem alheio (dinheiro), de que tem a posse em razão das suas funções e que tenha consciência e vontade de fazer seu o bem para seu próprio benefício ou de terceiro.»
Já dissemos supra qual o entendimento que defendíamos relativamente ao conceito de funcionário.
Referimos que o arguido SS era funcionário nos termos do disposto no art. 386º nº 2 do CP, considerando não haver violação do princípio constitucional da legalidade previsto no art. 29 da CRP, nem da proibição do recurso à analogia. De facto, nem sequer estamos a recorrer a uma interpretação extensiva da norma, mas apenas a uma interpretação lata.
Da descrição dos factos da acusação não podemos concluir que o arguido se tenha apropriado do dinheiro, e muito menos que tenha havido apropriação (ilegítima) por parte de terceiro.
Não há na acusação factos que demonstrem a necessária inversão do título de posse apregoada pelo Recorrente e exigida pelo tipo legal.
Esta falta da demonstração da inversão do título afastaria, igualmente, a prática de um crime de abuso de confiança, que a pressupõe.
Se o pagamento se inseriu no âmbito da disponibilidade jurídica que era concedida ao arguido para efectuar/decidir esse mesmo pagamento,  não conseguimos determinar em que momento concreto, teria havido a necessária e invocada inversão do título.
Se, como diz o Sr. Juiz, a decisao partiu do Conselho executivo, a prova dessa inversão parece-nos impossível.
O arguido terá agido, alegadamente, contra os interesses da sociedade da qual é funcionário. Porém, esta actuação não permite concluir pela apropriação ilegítima para si e muito menos para terceiro.
Deste modo, impõe-se manter a decisão de não pronúncia quanto a este crime.
Não obstante a decisão, entendemos que os factos em causa, não servindo de suporte para a prática do crime de peculato, devem permanecer na acusação, para não “destruir” o todo que aquela peça representa.

1.3.7 DOS CRIMES DE ABUSO DE CONFIANÇA:

LISTA DOS CRIMES DE ABUSO DE CONFIANÇA OBJECTO DO RECURSO
1. Um crime de abuso de confiança praticado, em co-autoria, pelo arguido SS e outro (CC, já julgado e condenado em primeira instância, em processo separado, decisão condenatória mantida por Acórdão do Tribunal da Relação ..., processo número 9153/21...., datado de 24.05.2023, relatado por KKKKKKK, tanto quanto se saiba não publicado), relativamente à transferência de €3.967.611,00 (CHF 4.900.000,00), com origem em conta do banco PICTET, titulada pelo arguido SS, e com destino a conta do Banco LOMBARD ODIER, titulada pela sociedade em offshore EMP05..., controlada pelo arguido CC, em 22 de Novembro de 2011, crime p. e p. pelo art.º 205.°, n.ºs 1 e 4, alínea b), do Código Penal.
2. Um crime de abuso de Confiança praticado, em co-autoria, pelo arguido HH e outro (CC, já julgado e condenado em primeira instância, no processo número 9153/21...., nos exactos termos mencionados no crime 1), relativamente à transferência de 2.750.000,00€,  previsto e punido pelo artigo 205.º, n.ºs 1 e 4, alínea b), do CP.
1.3.7.1 Um crime de abuso de confiança praticado, em co-autoria, pelo arguido SS e outro (CC, julgado em  processo separado), relativamente à transferência de €3.967.611,00.

DECISÃO INSTRUTÓRIA
A Decisão recorrida (fls. 6043 a 6054, 6081, 4769 a 4858) fundou a decisão de não pronúncia do arguido SS nos seguintes fundamentos:
- Não se verificarem os elementos do tipo, quer os atinentes ao elemento objectivo, quer ao elemento subjectivo
- Inexistência de  indícios suficientes da prática do crime por parte deste concreto arguido;
- Por nulidade processual (art.º 120º, n.º 1, al. d), do CPP), decorrente de o arguido não ter sido submetido a interrogatório quanto a esta concreta factualidade, o que determinou a declaração de invalidade da acusação quanto aos artigos 3081 a 3097 e 3098 a 3131, 3135 a 3137 e 3187 a 3336, 13996 a 13998.
Considerou não indiciados os factos constantes dos artigos 13826 a 13830 da acusação quanto ao arguido em causa.

RECORRENTE
O Recorrente alega (artigos 2119, 2121, 2122 das Conclusões) que o arguido CC só conseguiu apropriar-se da quantia em causa porque SS lhe possibilitou aquelas transferências de dinheiro, com passagem pela sua conta, de modo a tornar difícil detectar-lhe a origem e o rasto, dificuldade de detecção que não existiria em caso de transferência directa do dinheiro da conta  da ES ENTERPRISES para a conta EMP05..., de CC.
Pede a revogação da decisão de não pronúncia e a pronúncia do arguido SS, nos termos da acusação. 
1.3.7.2 Um crime de abuso de confiança Praticado, em co-autoria, pelo arguido HH e outro (CC, já julgado em processo separado), relativamente à transferência de €2.750.000,00.

DECISÃO INSTRUTÓRIA
A Decisão instrutória (fls. 4249, 4259, 3835) fundou a não pronúncia do arguido HH nos seguintes fundamentos:
- Não se verificarem os elementos do tipo, quer os atinentes ao elemento objectivo, quer ao elemento subjectivo
- Inexistência de indícios suficientes da prática do crime por parte deste concreto arguido (fls. 4249 e 4259);
- Faltar o pressuposto processual de competência internacional da lei penal portuguesa, por os factos terem sido todos praticados na ... e não existir conexão relevante com o território português – art.ºs 4º, 5º e 7º, do CP.
Considerou não indiciados os factos constantes dos artigos 13820 a 13824 da acusação quanto ao arguido em causa.

RECORRENTE
O Recorrente limita-se a pedir, a fls. 1150 do recurso, a revogação da decisão de não pronúncia e a pronúncia do arguido HH, nos termos da acusação.

A NOSSA POSIÇÃO (referente aos dois crimes):

FACTOS RELEVANTES DA ACUSAÇÃO
Primeiro crime de abuso de confiança
3130.     O arguido CC aproveitou então o pretexto dessa operação para obter também para si próprio uma quantia por conta dos fundos colocados nas contas da ENTERPRISES, evitando figurar nos registos da mesma conta como beneficiário de operações para as quais não tinha justificação.
3131.     Assim, os arguidos CC e SS acordaram que seriam feitos dois pagamentos para a conta indicada por este último, num montante em francos ... equivalente a cerca de € 12.000.000,00 (doze milhões de euros), mas dos quais o arguido SS faria depois transferir uma parte para a esfera do próprio arguido CC.
3132. Assim, por indicação do arguido CC, na data de 7 de Outubro de 2011, foi transferido, entre contas da ENTERPRISES junto do BPES, o montante de 9.880.000 CHF, correspondente ao câmbio a taxa negociada da quantia de € 8.000.000,00 (oito milhões de euros), que foram creditados na conta BPES n.º ...43, da referida ENTERPRISES, para logo na data de 12 de Outubro ser transferido igual montante para a conta junto do banco Pictet que o arguido SS havia indicado.
3133. Conforme combinado, da mesma forma, a conta da ENTERPRISES n.º ...43, voltou a ser creditada com a quantia de  4.852.000 CHF, correspondente ao câmbio a taxa então negociada de € 4.000.000,00 (quatro milhões de euros), com data de 9 de Janeiro de 2012, para, logo no dia seguinte, ser feita nova transferência, do mesmo montante, para a conta junto do banco PICTET, indicada pelo arguido SS.
3134. O arguido SS foi informado pelo arguido CC de que iria receber essas transferências e, após ter sido informado, pelos agentes ..., de que o segundo montante havia sido creditado na sua conta, confirmou ao arguido CC, por mensagem enviada do seu telemóvel no dia 17 de Janeiro de 2012, pelas 15hl3, que já havia recebido o pagamento na ... - conforme sessão 1207, do alvo 49232M.
3135.     Em obediência ao solicitado pelo arguido CC, o arguido SS, tal como se havia comprometido, determinou, após recebimento daquela primeira transferência e quando recebeu as indicações para tal, a transferência da quantia de 4.900.000 CHF para a conta que lhe foi indicada pelo arguido CC.
3136. Tal operação veio a realizar-se na data de 22 de Novembro de 2011, com a transferência do montante de 4.900.000 CHF da conta do arguido SS junto do banco PICTET, conta n.°...13, para a conta titulada pela entidade EMP05..., junto do banco Lombard Odier, também na ..., de que era beneficiário o arguido CC, em conjunto com a sua esposa. (…)
13826.   Os arguidos CC e  SS ao determinarem, em conjugação de esforços e de intentos, a transferência de €3.967.611,00 de conta da ES ENTERPRISES para conta sediada no Banco PICTET, titulada por este último arguido, e a sua subsequente transferência para a esfera patrimonial do arguido CC através do crédito desses fundos em conta bancária da sociedade em offshore, EMP05..., controlada pelo mesmo arguido, sabiam que tais fundos pertenciam ao Grupo GES.
13827.   Mais sabiam que tais montantes pecuniários não eram devidos ao arguido CC e que este último não tinha direito a fazê-los seus.
13828.   Tinham, igualmente, plena consciência de que o arguido CC agia em oposição aos deveres profissionais conferidos pelos cargos que exercia no Grupo GES, nos termos dos quais tinha obrigação de zelar pelos interesses e integridade patrimonial desse grupo societário.
Segundo crime de abuso de confiança
5225.     Simultaneamente o arguido CC solicitou então que uma parte da quantia que o arguido HH viesse a receber, com origem nas sociedades do GES, lhe fosse também entregue para a sua esfera pessoal.
5226.     Os arguidos CC e HH chegaram assim ao entendimento de que este último arguido iria receber a quantia total de € 15.000.000,00, ficando com o encargo de fazer chegar o montante de € 2.750.000,00 à esfera de CC e de € 8.000.000,00 a esfera do arguido AA, da forma que viesse a combinar com o BB, ficando o restante para o próprio HH, por conta da colaboração até aí prestada. (…)
5247. A partir do recebimento da referida quantia de €15.000.000,00, creditada na conta aberta em nome da entidade EMP04... LTD., o arguido HH respeitou também o compromisso que havia assumido com o arguido CC, no sentido de lhe fazer chegar, em sede pessoal, o montante de € 2.750.000,00. (…)
5276.     Como referido, no dia 8 de Novembro de 2010, na conta com o numero ...24, aberta junto do CRÉDIT SUISSE, em nome da entidade EMP04... LTD., foi creditada a quantia de €7.500.000,00 - Aba 20-P, fls. 4U486.
5277.     Logo que recebida a referida quantia, conforme já havia combinado com o arguido CC, o arguido HH tratou de realizar a favor do mesmo uma primeira transferência, no montante de € 1.500.000,00, para a conta aberta em nome da entidade EMP03..., tal como aquele primeiro arguido lhe havia indicado.
5278.     Assim, HH elaborou e assinou um documento, com data aposta de 8 de Novembro de 2010, no qual se solicita que, a partir da conta bancária aberta, junto do CRÉDIT SUISSE, em nome da entidade EMP04... LTD., seja efectuada uma transferência, no valor de €1.500.000,00, a favor da conta com o numero ...33, aberta, junto do CRÉDIT SUISSE, em nome da entidade EMP03.... - Aba 20 - P, fls. 41 ’363.
5279.     A entidade EMP03...., constituída no dia 18 de Novembro de 2009, com sede no ..., tem como beneficiário final o arguido CC - Aba 131-B, fls. 67’037-68’048.
5280.     Em Dezembro de 2009, em nome da entidade EMP03...., o arguido CC fez abrir, junto do CRÉDIT SUISSE, a conta com o numero ...33, que tem como beneficiários finais e pessoas com poderes de movimentação o próprio arguido CC e a sua mulher LLLLLLL - Aba 131-B, fls. 67’001-67’004.
5281.     No dia 9 de Novembro de 2011, em conformidade com o documento acima referido, feito chegar pelo arguido HH ao seu gestor de conta, foi realizada uma transferência, a partir da conta bancária aberta, junto do CRÉDIT SUISSE, em nome da entidade EMP04... LTD., no montante de €1.500.000,00, a favor da conta com o numero ...33, aberta, junto do CRÉDIT SUISSE, em nome da entidade EMP03.... - Aba 20- P, fls. 4U486; Aba 131-B, fls. 67’121; Aba 131-B, fls. 67’176-67’177.
5282.     Em continuação do acordado entre os arguidos, no dia 18 de Novembro de 2010, o arguido CC fez transferir para a conta com o numero ...24, aberta junto do CRÉDIT SUISSE, em nome da entidade EMP04... LTD., nova quantia de €7.500.000,00. Aba 20-P, fls. 4U486
5283.     Da mesma forma que anteriormente, também o arguido HH, uma vez recebida esta nova quantia, fez transferir, no dia 19 de Novembro de 2010, a partir da mesma conta bancária em nome da EMP04..., uma segunda quantia, no montante de € 1.250.000,00, a favor da conta com o numero ...33, aberta, junto do CRÉDIT SUISSE, em nome da entidade EMP03...., onde foi creditado nesse mesmo dia - Aba 20-P, fls. 4U486; Aba 131-B, fls. 67’121; Aba 131-B, fls. 67’178-67’179.
5284.     Assim, nos dias 9 e 19 de Novembro de 2010, com origem nos fundos creditados na conta aberta em nome da entidade EMP04..., a partir de movimentos realizados a partir de conta aberta em nome da entidade EMP88... SA, foram realizados movimentos a favor da conta aberta em nome da entidade EMP03...., detida e controlada pelo arguido CC, no valor global de €2.750.000,00.
5285.     As quantias em causa, no valor global de €2.750.000,00 foram aplicadas em títulos, tendo permanecido na esfera do arguido CC, que delas se apropriou. Aba 131-B, fls. 67’12 
5396. Conforme já acima referido, em meados de Outubro de 2011, 0 arguido CC pretendia retirar fundos da conta da então EMP88... em seu próprio proveito, tendo em vista utilizar os fundos em negócios pessoais.  (…)
13820.   Os arguidos CC e HH, ao determinarem, em conjugação de esforços e de intentos, a transferência €2.750.000,00 com origem em conta da ES ENTERPRISES na ... para conta titulada pela sociedade EMP04... na ... e desta última para conta do CRÉDIT SUISSE, titulada pela sociedade em offshore EMP03..., sabiam que tais fundos pertenciam ao Grupo GES.
13821.   Mais sabiam que tais montantes pecuniários não eram devidos ao arguido CC e que este último não tinha direito a fazêlos seus.
13822.   Tinham, igualmente, plena consciência de que o arguido CC agia em oposição aos deveres profissionais conferidos pelos cargos que exercia no Grupo GES, nos termos dos quais tinha obrigação de zelar pelos interesses e integridade patrimonial desse.
13823.   Mesmo assim, decidiram, recorrendo ao uso de tais poderes que à data conferiam ao arguido CC acesso à movimentação das contas bancárias da ES ENTERPRISES e das restantes sociedades que integravam o Grupo GES, integrá-los no património deste último arguido e concretizaram os seus intentos.
13824.   Sabiam, igualmente, que, com a actuação referida, causavam ao Grupo GES uma perda patrimonial no valor de €2.750.000,00. 
13825.   Até à data, tal valor não foi restituído pelos arguidos.
Como é sabido, um dos elementos objectivos do tipo de abuso de confiança, p. e p. pelo art.º 205º, do CP, consiste na apropriação (ilegítima) de coisa móvel (que tenha sido entregue por título não translativo da propriedade).
Essa apropriação carece de ser manifesta - no sentido de ter de se evidenciar ou exteriorizar num dado comportamento objectivo que também revele o animus de apropriação - sendo essa apropriação e o momento em que a mesma ocorre, que determina o momento da consumação do crime.
A apropriação exigível no crime de abuso de confiança traduz-se numa inversão do título de posse ou de detenção da coisa, revelada por actos objectivos e concludentes da vontade de passar a usufrui-la com “uti dominus”, ou seja, de passar a comportar-se como “proprietário” da coisa.
Como refere Figueiredo Dias em “Comentário Conimbricense do Código Penal, parte especial, T. II, Coimbra Editora, 1999, pág. 104”, No abuso de confiança o agente terá de se apropriar da coisa para si (“se apropriar”, art. 205º-1). O que evidentemente sucede quando o agente dá a coisa a outra pessoa…também neste caso houve um momento, ao menos lógico, em que o agente se apropriou da coisa para si (…).
Está em causa, no  primeiro crime, uma ordem de transferência ordenada pelo arguido CC da quantia de €3.967.611,00€ (juntamente com outras quantias), património pertencente ao universo GES, com origem numa conta bancária da ES ENTERPRISES (...),  para uma conta bancária titulada por SS, sediada no Banco PICTET (...), e uma posterior transferência da referida quantia desta mesma conta para uma conta bancária titulada pela sociedade offshore EMP05..., sediada no Banco Lombard Odier, conta controlada pelo arguido CC.
No segundo crime estão em causa duas ordens de transferências ordenadas pelo arguido CC, no total global de €2.750.000,00€ (juntamente com outras quantias), com origem em conta bancária da ES ENTERPRISES (...), património pertencente ao universo GES, para uma conta titulada pela sociedade EMP04..., controlada por HH, e duas posteriores transferências destas mesma conta, que no seu somatório perfazem €2.750.000,00€, para uma conta bancária titulada pela sociedade EMP03..., controlada pelo arguido CC.
Os actos objectivos e concludentes da inversão do “título de detenção” por parte do arguido CC das quantias de €3.967.611,00€ (do crime 1) e de €2.750.000,00€ (do crime 2), pertencentes ao grupo GES, são as ordens de transferência daquelas cifras - não autorizadas e não destinadas à satisfação dos interesses do Grupo BES - da conta da sociedade da ES ENTERPRISES (na ...), sendo nesses precisos momentos que o arguido CC, num processo mental lógico e revelador de verdadeiro “animus uti dominus”, demonstra a vontade inequívoca de fazer desses dinheiros coisa sua, agindo como proprietário dos mesmos.
Dito de outro modo: ao transferir, sem conhecimento e autorização do dono, as quantias de €3.967.611,00€ e de €2.750.000,00€, primeiro e segundo crime, respectivamente, de conta bancária de sociedade do universo GES - cuja movimentação, em razão das suas funções profissionais, estava autorizado - para contas bancárias exteriores à titularidade do universo GES (que na verdade tanto podiam ser suas, como de pessoa das suas relações familiares próximas, como de terceiros, o que para o caso tanto importa),  o arguido CC inverteu o título de detenção dos dois mencionados montantes e actuou como dono exclusivo dos mesmos, ocorrendo aí os actos de apropriação, que não têm de ser materiais, e também a consumação dos crimes de abuso de confiança.
A entrega a terceiros (materializada no destino das transferências ordenadas pelo arguido CC) dessas quantias de €3.967.611,00€ e de €2.750.000,00€, respectivamente ao arguido SS e ao arguido HH (este por via de uma sociedade por si controlada – a EMP04...), com o acordo de regresso futuro a contas bancárias por si (CC) controladas e indicadas (com instrumentalização para o efeito das sociedades offshore EMP05... e EMP03...), nada acrescenta em matéria de consumação dos crimes de abuso de confiança, que já se haviam consumado antes mesmo da intervenções/intermediações destes terceiros.
O Ministério Público parece deslocar o  momento da apropriação ilícita da quantia de €3.967.611,00€ para a data em que o dinheiro é disponibilizado por SS a CC (aquando da transferência do dinheiro da conta daquele para a da sociedade EMP05...) e o  momento da apropriação ilícita da quantia de €2.750.000,00€ para a data em que o dinheiro é disponibilizado por HH a CC (aquando da transferência do dinheiro da EMP04... para a EMP03...), porém esse raciocínio não tem razão de ser, à luz dos elementos do tipo, pois que os actos de apropriação são anteriores à intervenção de SS e de HH.
Na verdade, o arguido CC não necessitou, nem beneficiou, de nenhuma contribuição, essencial ou meramente coadjuvante, destes arguidos na concretização dos referidos actos de apropriação (traduzidos, repete-se, nas ordens de transferência não autorizadas das mencionadas cifras, logicamente para seu benefício patrimonial, sendo essas ordens de transferências que vêm a desencadear as movimentações bancárias posteriores), estando a actuação dos arguidos SS e HH para além do tipo do crime de abuso de confiança que lhes é imputado na acusação.
Tem, assim, razão a decisão recorrida quando afirma: “Cumpre referir que a alegada apropriação, por parte do arguido CC, teve lugar em data anterior às operações de transferência bancária da EMP04... para a EMP03..., ou seja, aquando das operações bancárias da ES Enterprises para a EMP04... nos dias 8 e 18 de Novembro de 2010, com a transferência do valor global de 15.000.000,00€, pelo que não se pode dizer que a actividade que desempenhada pelo arguido HH,  ou seja,  as operações bancárias da EMP04... para a EMP03..., tenham sido essenciais à concretização da alegada pretensão do arguido CC.”
É também esse o entendimento expresso no já citado Acórdão do Tribunal da Relação ..., recurso número 9153/21...., referente à mesma materialidade aqui em análise e aos mesmos crimes, embora na perspectiva da participação concreta do arguido CC, dele constando a fls. 337, ora com relevo, que: “a apropriação como elemento do tipo do crime de abuso de confiança, é configurada na ordem ou ordens dadas pelo arguido CC, as quais desencadeiam toda a movimentação bancária descrita…”
Ora, se assim é, como nos parece, não pode ser imputada ao arguido SS a apropriação para si (nem para terceiro) da quantia de €3.967.611,00€, e ao arguido HH a apropriação para si (nem para terceiro) da quantia de €2.750.000,00€, não se mostrando, quanto aos mesmos, preenchidos desde logo os elementos objectivos do tipo, a começar pela apropriação.
Aliás, não se percebe a razão pela qual o Recorrente afirma, em sede de recurso, que o arguido CC “só conseguiu apropriar-se da quantia de €3.967.611,00€ porque o arguido SS lhe possibilitou aquelas transferências de dinheiro”, como se o primeiro não tivesse conseguido apropriar-se de outras quantias, mais concretamente de outros 4 milhões de euros, nas mesmas circunstâncias (isto é, com origem em conta da ES ENTERPRISES), sem recorrer para o efeito a intermediários, através de uma ordem de transferência directa deste montante para conta da sociedade EMP03..., por si controlada, crime pelo qual foi acusado, julgado e condenado, pelo menos em 1ª e 2ª instâncias.
Coisa distinta será afirmar, como faz o Ministério Público, que a actuação de SS, assim como o de HH - acrescentamos nós - tornou (e visava tornar) mais difícil a detecção da origem e rasto dos dinheiros, constatação que, em si mesma, em nada afecta a insignificância das suas intervenções no que concerne à evidência da prática e do momento da consumação dos dois concretos crimes de abuso de confiança por cuja autoria o arguido CC foi já julgado, relevando essas actuações apenas em sede de crimes de branqueamento de que estão acusados, a propósito da circulação destes capitais.
Em conclusão, é de manter a decisão recorrida de não pronúncia dos arguidos SS e HH pela prática, como co-autores materiais, cada qual de um crime de abuso de confiança, p. e p. pelo art.º 205°, n.ºs 1 e 4, alínea b), do Código Penal, desde logo por falta de verificação dos elementos objectivos do tipo, o que torna desnecessário o conhecimento das restantes questões elencadas relativamente a estes dois concretos ilícitos.
Termos em que se julga improcedente o recurso nestes segmentos.
Nesta sequência, no que concerne aos crimes de abuso de confiança, decide-se:
- Negar provimento ao recurso e manter a não pronúncia do arguido SS pela prática do CRIME 1: um crime de abuso de confiança, relativamente à transferência de €3.967.611,00 (CHF 4.900.000,00), com origem em conta do banco PICTET, titulada pelo arguido SS, e com destino a conta do Banco LOMBARD ODIER, titulada pela sociedade em offshore EMP05..., controlada pelo arguido CC, em 22 de Novembro de 2011, crime p. e p. pelo art.º 205. °, n.ºs 1 e 4, alínea b), do Código Penal.
JULGAR NÃO INDICIADOS: os factos constantes no artigo 13826, 13827, 13828, 13829, 13830, da acusação, na parte em que se refere ao arguido SS.  
- Negar provimento ao recurso e manter a não pronúncia do arguido HH pela prática do CRIME 2: um crime de abuso de confiança, relativamente à transferência de 2.750.000,00€,  previsto e punido pelo artigo 205.º, n.ºs 1 e 4, alínea b), do CP.
JULGAR NÃO INDICIADAS: as referências feitas ao arguido HH nos artigos 13820, 13821, 13822, 13823 e 13824 da acusação.

1.3.8 OS CRIMES DE BRANQUEAMENTO
LISTA DOS CRIMES DE BRANQUEAMENTO OBJECTO DO RECURSO.
1. Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, BB e GG, relativamente aos movimentos financeiros com origem no Grupo LENA, com passagem pelas contas da ... tituladas pelo arguido GG, realizados a partir de 2007, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.
2. Um crime de branqueamento  praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, BB, GG, a sociedade LEC SA e a sociedade XLM, relativamente à utilização da sociedade XLM, entre 2009 e 2015, para a colocação de fundos destinados ao arguido AA e utilização dos mesmos no seu interesse, através do pagamento de despesas e de distribuição de dividendos para contas tituladas pelo arguido BB, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do  Código Penal.
3. Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, CC, HH, BB e II, relativamente à utilização, entre 2006 e 2008, de contas na ... em que o arguido II era autorizado e operações financeiras realizadas a partir das mesmas, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.
4. Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, CC, HH, II e BB, relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados no ano de 2007 e até ao início de 2008, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal.
5. Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, CC, HH, BB e GG, relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados a partir de 2008, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, com intervenção das contas da ... do arguido GG, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal.
6. Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, CC, HH, BB, GG, as sociedades LEC SA, LEC SGPS, LENA SGPS e XLM, relativamente aos movimentos financeiros ocorridos a partir de 2010, abrangidos pela operação CEL_2010, justificados através de contrato promessa de compra e venda com perda de sinal referente ao imóvel ..., sito em ..., e introdução desses fundos no Grupo LENA, p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.
7. Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, BB, GG, DD, EE, FF e JJ, relativamente às transferências com origem em conta do cidadão ... KK, referentes aos financiamentos concedidos ao Grupo Vale do Lobo, com passagem por conta bancária da ... do arguido GG, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.
8. Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA e BB, relativamente à concentração dos fundos em novas contas bancárias da ..., tituladas por sociedades em offshore controladas por BB e sua transferência para contas tituladas por este último arguido em Portugal, ao abrigo do RERT II, previsto e punido pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.
9. Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA e BB,  relativamente à dissipação dos fundos por outras contas em Portugal, de que o arguido BB era titular e autorizado, e à confusão de patrimónios de AA e de BB nessas contas bancárias, p. e p. pelo art.º368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.
10. Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos GG, NN, as sociedades LEC SA, XLM e RMF CONSULTING e outros (AA e BB, foram pronunciados por este ilícito criminal) relativamente a utilização da sociedade RMF CONSULTING, entre 2010 e 2014, para a colocação de fundos destinados ao arguido AA e utilização dos mesmos no seu interesse através do pagamento de despesas suas e colocação de numerário à sua disposição, p. e p. pelo art.368°-A, n° 1, 2 e 3, do Código Penal.
11. Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, BB e LL, quanto a aquisição de imóveis em Portugal, com o retorno do preço pago para a esfera patrimonial do arguido AA, de forma justificada, factos ocorridos entre 2010 e 2012, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.
12. Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, BB e LL, relativamente à aquisição e subsequente arrendamento de um imóvel em ..., com intenção de ocultação da titularidade do activo, factos praticados entre 2012 e 2014, previsto e punido pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal. (a decisão recorrida imputa duas vezes ao arguido  AA o mesmo ilícito, sendo que da segunda vez, se quer referir a LL, o que aqui se rectifica).
Ver - Na parte tocante ao arguido LL verifica-se que, por evidente lapso material, a decisão recorrida imputa duas vezes ao mesmo arguido o mesmo ilícito, o que aqui se rectifica, considerando-se não escrita a segunda das imputações.
13. Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, BB e LL,  relativamente à entrega pelo arguido BB de quantias pertencentes ao arguido AA para depósito em contas bancárias do arguido LL e para guardar em cofre bancário e em contas tituladas pelo mesmo, de forma a ocultar a propriedade desses valores pelo arguido AA, factos ocorridos nos anos de 2012 e 2013, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.
14. Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, BB e MM,  relativamente à aquisição de um imóvel, designado “Monte ...”, com intenção de que passasse a integrar o património familiar do arguido AA, com registo em nome de terceiro e montagem de operação de financiamento entre 2011 e 2014, p. e p. pelo art.º 368.º, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.
15. Um crime de branqueamento praticado,  em co-autoria, pela arguida TT e outros (BB e AA, foram pronunciados por este ilícito), relativamente à disponibilização, por parte de TT, das suas contas bancárias junto do Montepio Geral para recepção de fundos provenientes do arguido BB para entrega ao arguido AA, ocultando a titularidade destas quantias por este último arguido, factos ocorridos nos anos de 2013 e 2014, p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.
16. Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelo arguido UU e outros (BB e AA, foram pronunciados por este ilícito), com referência aos factos relacionados com a utilização da conta bancária de  UU para a passagem de fundos pertencentes ao arguido AA, recebidos do arguido BB, e sua transferência subsequente para a conta do arguido AA, factos ocorridos nos anos de 2011 a 2014, p. e p. pelo art.368°-A, n° 1 e 2, do Código Penal.
17. Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos BB, GG, PP e QQ,  relativamente a utilização da sociedade XMI e sua contabilidade, para a colocação de fundos na esfera patrimonial do arguido QQ, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal  (a responsabilidade criminal da co-autora XMI foi julgada extinta).
18. Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos CC e RR,  relativamente aos pagamentos PT e CEL_2010, realizados entre 7 de Dezembro de 2007 e 20 de Setembro de 2011, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES (e com destino para as contas de que era beneficiário RR), p. e p. pelo art.º 368.°-A, n°s 1, 2 e 3, do Código Penal.
19. Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos CC e SS,  relativamente aos pagamentos PT e CEL_2010, realizados entre 9 de Julho de 2007 e 23 de Novembro de 2012, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES (e com destino para as contas de que era beneficiário SS), p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.°s 1, 2 e 3, do Código Penal.
20. Um crime de branqueamento praticado, a título de cumplicidade, pela arguida JJ (do qual é autor material o arguido DD, pronunciado nos termos da acusação por este ilícito criminal, tendo já sido julgado pelo mesmo em processo separado), relativamente à transferência de fundos para Portugal, com origem em contas tituladas pelas sociedades em offshore EMP07... e EMP08... na ..., com utilização da sociedade EMP09... LDA., p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.
21. Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos CC e SS, relativamente à transferência de €3.967.611,00 (CHF 4.900.000,00), com origem em conta do banco PICTET titulada por SS e com destino a conta do Banco LOMBARD ODIER titulada pela sociedade em offshore EMP05..., controlada pelo arguido CC, em 22 de Novembro de 2011, p. e p. pelo art.368°A, n.º 1, 2 e 3, do Código Penal.
22. Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos CC e HH, relativamente à transferência de €2.750.000,00, com origem em conta da ES Enterprises na ..., de conta titulada pela sociedade EMP04... na ..., controlada pelo arguido HH, para conta do Crédit Suisse, titulada pela sociedade em offshore EMP03..., controlada por CC, em Novembro de 2011, p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.
23. Um crime de branqueamento (da decisão recorrida, por lapso de escrita, vem indicado como “ um Crime de Fraude Fiscal Qualificada”, cuja rectificação já se determinou supra), praticado, em co-autoria, pelos arguidos EE e a sociedade “Pepelan - Consultoria e Gestão”, relativamente a justificativos criados para o recebimento de fundos através da alienação de imóvel cuja propriedade estava titulada pela sociedade “Pepelan - Consultoria e Gestão” e com utilização da sociedade em offshore EMP10... LIMITED, p. e p. pelo art.368°-A, nº 1, 2 e 3, do Código Penal.

1.3.8.1 DO TIPO LEGAL
Preceitua o art.º 368.º-A, do CP, na versão original, decorrente da Lei 11/2004, de 27.03, sob a epígrafe “Branqueamento”, ainda com  alusão à pequena (e insignificante  para o caso que nos ocupa) alteração introduzida pela Lei 59/2007, de 04.09, no n.º 5: “1. Para efeitos do disposto nos números seguintes, consideram-se vantagens os bens provenientes da prática, sob qualquer forma de comparticipação, dos factos ilícitos típicos de lenocínio, abuso sexual de crianças ou de menores dependentes, extorsão, tráfico de estupefacientes e substâncias psicotrópicas, tráfico de armas, tráfico de órgãos ou tecidos humanos, tráfico de espécies protegidas, fraude fiscal, tráfico de influência, corrupção e demais infracções referidas no n.º 1 do artigo 1.º da Lei n.º 36/94, de 29 de Setembro, e dos factos ilícitos típicos puníveis com pena de prisão de duração mínima superior a 6 meses ou de duração máxima superior a 5 anos, assim como os bens que com eles se obtenham. 2- Quem converter, transferir, auxiliar ou facilitar alguma operação de conversão ou transferência de vantagens, obtidas (inclusão feita em rectificação operada pela Declaração de Rectificação n.º 45/2004, publicada no Diário da República I Série - A, n.º 132, de 5 de Junho de 2004) por si ou por terceiro, directa ou indirectamente, com o fim de dissimular a sua origem ilícita, ou de evitar que o autor ou participante dessas infracções seja criminalmente perseguido ou submetido a uma reacção criminal, é punido com pena de prisão de 2 a 12 anos. 3.- Na mesma pena incorre quem ocultar ou dissimular a verdadeira natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou titularidade das vantagens, ou os direitos a ela relativos.  4. - A punição pelos crimes previstos nos números 2 e 3 tem lugar ainda que os factos que integram a infracção subjacente tenham sido praticados fora do território nacional, ou ainda que se ignore o local da prática do facto ou a identidade dos seus autores. 5 - O facto não é punível quando o procedimento criminal relativo aos factos ilícitos típicos de onde provêm as vantagens depender de queixa e a queixa não tenha sido tempestivamente apresentada, salvo se as vantagens forem provenientes dos factos ilícitos típicos previstos nos artigos 172.º e 173.º (alterada em 2007).   6- A pena prevista nos n.ºs 2 e 3 é agravada de um terço se o agente praticar as condutas de forma habitual. 7- Quando tiver lugar a reparação integral do dano causado ao ofendido pelo facto ilícito típico de cuja prática provêm as vantagens, sem dano ilegítimo de terceiro, até ao início da audiência de julgamento em 1.ª instância, a pena é especialmente atenuada.  8- Verificados os requisitos previstos no número anterior, a pena pode ser especialmente atenuada se a reparação for parcial. 9- A pena pode ser especialmente atenuada se o agente auxiliar concretamente na recolha das provas decisivas para a identificação ou a captura dos responsáveis pela prática dos factos ilícitos típicos de onde provêm as vantagens. 10.- A pena aplicada nos termos dos números anteriores não pode ser superior ao limite máximo da pena mais elevada de entre as previstas para os factos ilícitos típicos de onde provêm as vantagens.
Trata-se de um tipo de crime de extrema complexidade, composto por várias camadas, em que se colocam uma infinidade de questões, cuja análise não temos a pretensão de esgotar (nem em quantidade, nem em profundidade),  em razão de que nos centraremos nas “vexatae quaestiones” que relevam para a decisão do recurso.
Para uma extensa explanação, de cerca de 200 páginas, referente a este tipo legal de crime, quer em termos jurisprudenciais, quer doutrinais, remete-se para o Ac. do STJ, datado de 11.06.2014, processo 14/07.0TRLSB.S1, relatado por Raul Borges, disponível em DGSI.PT, onde se passa em revista uma grande panóplia de questões de modo profundo, nomeadamente a definição de branqueamento, a origem da terminologia, o crime à luz do direito comparado (mais próximo e mais distante), a consideração da globalização e da criminalidade organizada como fenómenos que estão na origem do branqueamento, a evolução histórica da criminalização do branqueamento no sistema jurídico português, a irrelevância da incompetência da lei penal portuguesa relativamente ao facto precedente, as fases do branqueamento, a controvérsia do bem jurídico tutelado, a  questão de saber se o próprio agente do crime subjacente pode ser incriminado como autor do crime de branqueamento (a criminalização do “own funds money laundering” ou do autobranqueamento), o pressuposto da existência do “predicated offence” ou do facto ilícito típico  que tenha produzido as vantagens a branquear, os elementos objectivos e subjectivos do crime, dentro destes a admissibilidade da comissão do crime a título de dolo eventual, apenas para citar alguns dos temas eximiamente desenvolvidos.
Poder-se-iam citar muitos outros diversos escritos que discorrem sobre o crime de branqueamento a que, pontualmente, faremos referência.

1.3.8.2 METODOLOGIA DO CONHECIMENTO DAS QUESTÕES COLOCADAS À APRECIAÇÃO DESTE TRIBUNAL.
 A Decisão recorrida não pronunciou os arguidos pelo cometimento de  vinte e três crimes de branqueamento acusados, p. e p. cada qual pelo art.º 368º-A, do CP, supra elencados.
Associada a cada não pronúncia foi considerado não indiciado e/ou expurgado um vasto leque da materialidade narrada na acusação.
O Recorrente pretende ver revertida a decisão de não pronúncia dos 23 crimes de branqueamento e a decisão de exclusão da peça acusatória dos artigos julgados não indiciados e expurgados.
A decisão de não pronúncia dos 23 crimes de branqueamento fundou-se em três grandes grupos de temas acima mencionados nas questões objecto do recurso e que importa recordar:

- NULIDADES E QUESTÃO PROCESSUAL DA FALTA DE COMPETÊNCIA INTERNACIONAL DOS TRIBUNAIS PORTUGUESES.

- PROBLEMÁTICAS RELACIONADAS COM OS ELEMENTOS OBJECTIVOS E SUBJECTIVOS DO TIPO

- AUSÊNCIA DE INDÍCIOS.
Iniciaremos a análise pelas nulidades declaradas e pelas problemáticas teórico-dogmáticas no necessário para o conhecimento das questões suscitadas em sede de recurso, reunindo, em cada uma, todos os crimes em que as mesmas querelas foram suscitadas, por economia de meios e para evitar repetir os mesmos argumentos.
A parte final ficará reservada à matéria dos indícios.     

1.3.8.3 DAS NULIDADES E DA QUESTÃO PROCESSUAL DA FALTA DE COMPETÊNCIA INTERNACIONAL DOS TRIBUNAIS PORTUGUESES                                      
1.3.8.3.1 Da nulidade processual por omissão de acto obrigatório no inquérito.
TEMA
Em causa está o facto de o arguido SS não ter  sido confrontado, na fase do inquérito, com os factos que vieram a integrar o crime de branqueamento 21: crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos CC e SS, relativamente à transferência de €3.967.611,00 (CHF 4.900.000,00), com origem em conta do banco PICTET titulada por SS e com destino a conta do Banco LOMBARD ODIER titulada pela sociedade em offshore EMP05..., controlada pelo arguido CC, em 22 de Novembro de 2011, p. e p. pelo art.368°A, n.º 1, 2 e 3, do Código Penal, uma vez que estes factos só foram indiciados após o seu primeiro interrogatório.

DECISÃO INSTRUTÓRIA                    
Lê-se na Decisão recorrida (fls. 4856 e 4857): Consubstancia a omissão de acto legalmente obrigatório (cf. artigo 270.º, n.º 1, do Código de Processo Penal) a falta de interrogatório do arguido quanto aos factos vertidos em 6.8. (cf. artigos 3081.º a 3097), 6.9. (cf. artigos 3098.º a 3131.º e 3135.º a 3137.º), e 7. (artigos 3187.º a 3336.º e 13996.º a 13998.º), do libelo acusatório, que determina a nulidade prevista no artigo 120.º, n.º 1, al. d), a qual foi tempestivamente arguida, cf. artigo 120.º, n.º 3, al. c), do Código de Processo Penal.
Pelo exposto, julga-se procedente a arguição da nulidade prevista no artigo 120.º, n.º 1, al. d) do Código de Processo Penal, por omissão de acto legalmente obrigatório, o que determina a invalidade parcial do despacho de acusação no que concerne à factualidade constante em 6.8. (cf. artigos 3081.º a 3097), 6.9. (cf. artigos 3098.º a 3131.º e 3135.º a 3137.º, e 7. (artigos 3187.º a 3336.º e 13996.º a 13998.º), dando azo à prolação de Despacho de Não Pronúncia, nos termos conjugados dos artigos 120.º, n.º 2, al. d), 122.º, n.º 1 e 308.º, n.º 3, todos do Código de Processo Penal, no que concerne à imputação ao arguido SS (…) de Um CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS, em co-autoria, relativamente a transferência de €3.967.611,00 (CHF 4.900.000,00), com origem em conta do banco PICTET titulada pelo arguido SS e com destino a conta do Banco LOMBARD ODIER, titulada pela sociedade em offshore EMP05..., controlada pelo arguido CC, em 22 de Novembro de 2011, crime p. e p. pelo art.º 368º-A, n.°s 1, 2 e 3 do Código Penal.

APRECIANDO
A temática foi já analisada na parte referente às “nulidades” – supra ponto 2.2.8.5. -  para onde se remete, tendo-se concluído que a falta de confrontação do arguido, devidamente constituído como tal, com factos indiciados no inquérito depois do primeiro interrogatório judicial não acarreta a nulidade por insuficiência do inquérito.
A ser assim, resta-nos concluir não ter acolhimento a decisão de não pronúncia do crime de branqueamento- crime 21-  fundada neste concreto argumento.
1.3.8.3.2 Da nulidade relativa à utilização dos documentos referentes ao(s) regime(s) excepcional(ais) de regularização tributária – RERT(s).
Esta nulidade serviu de fundamento à decisão de não pronúncia  do  crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA e BB, relativamente à concentração dos fundos em novas contas bancárias da ... – CRIME 8.
Esta matéria mostra-se supra tratada na parte referente às “nulidades” (ponto 2.2.2.) remetendo-se para o que aí se deixou exarado, onde se concluiu que a adesão voluntária ao(s) RERT(s) apenas amnistiou os crimes fiscais relacionados com o comportamento regularizado, não já eventuais outros crimes que lhes possam estar associados.
A ser assim, tomando em consideração que este concreto branqueamento exorbita o âmbito dos crimes fiscais, que a vulgarmente chamada amnistia fiscal prevista no regime excepcional de regularização tributária RERTII, instituída pela Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril, não excluiu a responsabilidade criminal por infracções de natureza não tributária, ainda que sejam conexas com os valores declarados para efeitos fiscais, resta-nos concluir não ter acolhimento a decisão de não pronúncia do crime de branqueamento supra elencado, fundada neste concreto argumento.
1.3.8.3.3 Da “falta do pressuposto processual de competência internacional da lei penal portuguesa”.
TEMA
Está em causa apreciar a bondade da Decisão Instrutória quando decidiu que a “falta do pressuposto processual de competência internacional da Lei Penal portuguesa” era  fundamento para a não pronúncia de três dos crimes de branqueamento:
- CRIME 12 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, BB e LL, relativamente à aquisição e subsequente arrendamento de um imóvel em ..., com intenção de ocultação da titularidade do activo, factos praticados entre 2012 e 2014, previsto e punido pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal;
- CRIME 19 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos CC e SS,  relativamente aos pagamentos PT e CEL_2010, realizados entre 9 de Julho de 2007 e 23 de Novembro de 2012, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES (e com destino para as contas de que era beneficiário SS), p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.°s 1, 2 e 3, do Código Penal; e
- CRIME 22 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos CC e HH, relativamente à transferência de €2.750.000,00, com origem em conta da ES Enterprises na ..., de conta titulada pela sociedade EMP04... na ..., controlada pelo arguido HH, para conta do Crédit Suisse, titulada pela sociedade em offshore EMP03..., controlada por CC, em Novembro de 2011, p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.

APRECIANDO
A nosso ver, a questão não é de “falta do pressuposto processual de competência internacional da lei penal portuguesa”. Está a montante desta, sendo, antes, de aplicação da lei penal portuguesa.
Se é verdade que a problemática da aplicação da lei penal no espaço tem repercussões em matéria de competência, nem por isso as duas questões devem ser confundidas.
A matéria da incompetência dos tribunais portugueses, para o conhecimento de um crime e dos seus efeitos, tem previsão expressa nos artigos 32º e 33º do CPP, em particular no número 4 deste último, que determina o arquivamento do processo em tais circunstâncias.
Não está prevista a  “absolvição da instância”, não sendo, por isso, de apelar à aplicação subsidiária dos normativos processuais civis (art.º 4, do CPP), por não existir lacuna que careça de preenchimento.
No que concerne à aplicação da lei penal no espaço, interessa-nos apenas a problemática referente ao lugar da prática dos factos atinente aos próprios crimes de branqueamento, não já a referente ao lugar da prática do crime subjacente, dado que esta outra está expressamente resolvida pelo n.º 4 do art.º 368º-A, do CP e nenhum relevo tem para o conhecimento do presente recurso na parte respeitante aos crimes de branqueamentos.
Conquanto o crime de branqueamento previsto no Código Penal tenha matriz e vocação internacional - no sentido de se assumir e interagir num ecossistema transnacional, aproveitando-se da globalização dos sistemas financeiros, de um concomitante forte sigilo bancário (em particular nalguns países, constituindo a ... o mais representativo), da mobilidade e do ciberespaço -  não restam dúvidas de que, em matéria de aplicação da lei no espaço, em si mesmo (se negligenciarmos o local da prática do crime precedente) o crime permanece irmanado ao “locus commissi delicti” tradicional, sendo necessário, em princípio, que a conduta branqueadora ocorra em território nacional.
Isso mesmo decorre do princípio da territorialidade ínsito no artigo 4.º, al. a),  do CP, que estabelece o princípio geral de aplicação da lei penal portuguesa a factos praticados “em território português, seja qual for a nacionalidade do agente”.
A regra da territorialidade é temperada, em prol da eficácia, por outros cinco princípios de aplicação subsidiária, concretamente os princípios da  nacionalidade - activa e passiva - da protecção dos interesses nacionais, da aplicação universal, da administração supletiva da lei nacional e da aplicação convencional da lei penal nacional (para uma explanação de cada um desses princípios subsidiários, vide, por exemplo, Paulo Pinto Albuquerque, em “Comentário do Código Penal”, 4.ª edição actualizada, 2021, págs. 101 a 104), todos previstos no art.º 5º, do CP (sem prejuízo de haver necessidade de atentar à redacção do artigo contemporânea da prática de cada um dos crimes de branqueamento), excepções à regra da territorialidade que também sofrem limitações, previstas no art.º 6º, do CP.
Dito isto, a controvérsia da aplicação do princípio da territorialidade esconde por detrás uma outra, cujos contornos podem complicar a anterior, que é a de saber qual é o lugar da prática do facto ou o que deve ser entendido pela prática de “ factos juridicamente relevantes” cometidos no território português, o que nos remete para o art.º 7º, do CP, onde se dispõe que: “1 - O facto considera-se praticado tanto no lugar em que, total ou parcialmente, e sob qualquer forma de comparticipação, o agente actuou, ou, no caso de omissão, devia ter actuado, como naquele em que o resultado típico ou o resultado não compreendido no tipo de crime se tiver produzido. 2 - No caso de tentativa, o facto considera-se igualmente praticado no lugar em que, de acordo com a representação do agente, o resultado se deveria ter produzido”.
A  determinação do lugar da prática do facto assenta num critério plural e maximalista, de natureza mista (teoria da ubiquidade, que congrega as doutrinas do local da execução e do local da verificação do evento), em resultado do qual o lugar da comissão do crime tanto será o lugar da acção, como o do resultado.
Partindo-se da acção como ponto relevante da conexão, bastará que se cometa uma qualquer parte, ainda que reduzida, da acção típica em território nacional, mesmo que apenas por um dos co-autores ou cúmplices, tanto bastando para que todo o crime se considere praticado em território nacional, o que ocorrerá, por exemplo, nos chamados “crimes de trânsito”, em que o objecto do crime atravessa diversos países durante a execução do crime, bastando que um dos países atravessados seja o nosso.
Partindo-se do resultado como ponto relevante da conexão, bastará que o resultado pretendido (seja ele típico ou mesmo não compreendido no tipo), ainda que não verificado, ocorra ou devesse ocorrer em Portugal, tanto bastando para que se imponha a aplicação da lei penal portuguesa.
A este propósito cita-se o Ac. do Tribunal da Relação de Guimarães de 04.12.2017,  disponível em DGSI, assim sumariado: “entendemos que, nos termos do disposto nos art.ºs 4º, al. a), e 7º, n.º 2, do Código Penal, a lei penal portuguesa é aplicável à apreciação de um crime de burla, em que os actos de execução em que se traduziu o prejuízo patrimonial do ofendido ocorreram todos no estrangeiro, mas em que o agente, actuando sempre sob o mesmo e único desígnio criminoso, praticou ainda, em território nacional, actos de execução com o propósito de aumentar o seu enriquecimento ilegítimo, mas relativamente aos quais não se chegou a verificar aquele resultado”.
Também, de acordo com o Ac. do STJ, de 06.10.2004, Proc. n.º 1875/04 - 3.ª Secção disponível em dgsi): “(…) X - O primeiro elemento de determinação da competência dos tribunais penais nacionais - e da aplicabilidade da lei penal portuguesa - decorre do princípio da territorialidade consagrado, como princípio geral, no artigo 4º do CP: a lei portuguesa é aplicável, e os tribunais portugueses são competentes relativamente a factos praticados em território português, seja qual for a nacionalidade do agente. XI- Deste modo, o primeiro critério é o do lugar da prática do facto, de acordo com as especificações definidas no artigo 7º do CP, disposição que consagra a solução plurilateral ou da ubiquidade: basta a existência de um qualquer elemento de conexão, com particular relevo nos crimes de vários actos, nos crimes de trânsito, nos crimes à distância, na tentativa e na comparticipação; quanto aos casos de comparticipação, trate-se de autor ou de simples cúmplice, considera-se como tendo lugar em Portugal a participação em infracções cometidas no estrangeiro.”
Feito este intróito, vejamos se, relativamente a cada um dos referidos três ilícitos, existe algum elemento de conexão relevante com o território português.
CRIME 12 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, BB e LL, relativamente à aquisição e subsequente arrendamento de um imóvel em ..., com intenção de ocultação da titularidade do activo, factos praticados entre 2012 e 2014, previsto e punido pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.
Diz-se na decisão recorrida (fls. 2234 e 2235, sob o ponto 16.1 – aquisição do apartamento em ...) que o contrato-promessa e a escritura de compra e venda do apartamento de ... foram tratados, formalizados e usados em ..., razão pela qual a Decisão instrutória considera esta parte da materialidade excluída da jurisdição dos tribunais portugueses.
A decisão sob censura procedeu apenas ao aproveitamento da parte da factualidade referente ao forjado (de acordo com a acusação) contrato de arrendamento do mesmo apartamento celebrado entre os arguidos BB e AA, relativamente ao qual não há nenhuma reserva sobre a competência dos tribunais portugueses para o seu julgamento.
Como já referimos, para situar a localização de um crime em território português basta a prática de uma qualquer parte da acção típica (por menor que seja, ainda que só praticada por um dos comparticipantes) em Portugal (art.º 7º, n.º 1, do CP).
Estando o crime configurado na acusação de um modo unitário, abrangendo todas as actuações e documentação referentes não só à compra (contrato-promessa e escritura) do apartamento, mas também ao seu arrendamento, não se nos afigura legítimo proceder ao desmembramento dos factos visados no crime em duas partes distintas, fazendo o aproveitamento apenas de uma delas.
O crime de branqueamento é composto por diversa materialidade, entre a qual a referente à formalização e uso de um contrato de arrendamento, cuja elaboração por advogado ... foi agilizada pelo arguido LL em Portugal (por ordem de BB, e este, por sua vez, a mando do arguido AA).
Nesse sentido, ver os artigos 6719 e seguintes da acusação, de onde resulta que entre 27.01.2014 e 05.02.2014 o arguido elaborou e enviou diversos emails a solicitar a um advogado ... a realização da minuta do contrato, enviou informações e a documentação necessária, recepcionou a respectiva minuta, após o que alterou a mesma.
Este elemento de conexão é mais do que suficiente para considerar todo o crime praticado em território português, estando, por aqui, assegurado o respeito do princípio geral que subjaz à competência internacional dos tribunais portugueses, que é o da aplicação da lei penal portuguesa a factos praticados “em território português”.
Nesta conformidade, não tem razão a decisão recorrida quando considera que parte da materialidade abrangida por este ilícito se encontra fora da jurisdição dos tribunais portugueses, dado que a parte por si destacada e desmembrada integra-se num todo unitário, no qual é possível identificar condutas típicas que ocorreram em território nacional.
CRIME 19 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos CC e SS,  relativamente aos pagamentos PT e CEL_2010, realizados entre 9 de Julho de 2007 e 23 de Novembro de 2012, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES (e com destino para as contas de que era beneficiário SS), p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.°s 1, 2 e 3, do Código Penal.
Em causa estão os actos de branqueamento de €20.000.00,00 (contas redondas), fundos que constituem vantagens indevidas pagas pelo arguido CC ao arguido SS, pela intervenção deste favorável ao Grupo “GES”, que decorrem da prática do crime de “CORRUPÇÃO PASSIVA praticado por SS, relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES, no que concerne aos pagamentos recebidos do arguido CC, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.ºs 373°, n.º 1, 374°- A, n.ºs 2 e 3, e com referência aos art.ºs 202°, al. b) e 386°, n.º 2, todos do Código Penal “  ao qual se associa o crime de “CORRUPÇÃO ACTIVA praticado por CC, relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES, no que concerne aos pagamentos efectuados ao arguido SS, crime p. e p. pelos art.ºs 374°, n.º 1 e 374°-A, n.ºs 2 e 3 do Cód. Penal, com referência aos arts.202°, al. b) e 386°, n.º 2 do mesmo diploma legal.”
É certo que todos os movimentos financeiros referentes a estes fundos tiveram lugar no estrangeiro, conforme se verifica do diagrama XIV referente a este concreto ilícito.
Sem prejuízo, as entregas, em si mesmas, realizadas por CC (usando como entidade instrumental a ES Enterprises) ao arguido SS consubstanciam actos de consumação (mais que não seja material) dos crimes de corrupção em que é agente corruptor o arguido CC e agente corrompido o arguido SS.
O crime subjacente que deu origem à entrega das vantagens alvo de branqueamento ocorreu no território português.
Ora, o crime de branqueamento exige, como primeiro elemento  objectivo do tipo, a verificação de um ilícito típico de “catálogo” de onde são oriundas as vantagens alvo das acções branqueadoras.
A ser assim, temos de concluir que a materialidade referente ao primeiro elemento do tipo objectivo do crime de branqueamento ocorreu em Portugal, o que tanto basta para se considerar que o crime ocorreu parcialmente em território nacional e, consequentemente, nos termos do já citado artigo 7º, n.º 1, do CP, se tenha por praticado no nosso país.
Conclui-se que a Decisão Recorrida não tem razão ao excluir este crime do âmbito da jurisdição dos tribunais portugueses.
CRIME 22 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos CC e HH, relativamente à transferência de €2.750.000,00, com origem em conta da ES Enterprises na ..., de conta titulada pela sociedade EMP04... na ..., controlada pelo arguido HH, para conta do Crédit Suisse, titulada pela sociedade em offshore EMP03..., controlada por CC, em Novembro de 2011, p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.
O crime subjacente é o de abuso de confiança da quantia de 2.750.000,00€,  cuja prática foi imputada ao arguido CC (já julgado e condenado em primeira e segunda instância, como mencionado supra), de onde são oriundas as vantagens branqueadas.
De acordo com a acusação - artigo 13580 - “o arguido CC veio a incluir o referido montante de € 2.750.000,00 na declaração de adesão ao RERTIII, a que aderiu, no ano de 2012, realizando o pagamento da quantia decorrente da aplicação da taxa especial, de 7,5%”.
 Essa adesão ao Regime Excepcional de Regularização Tributária realizada por um dos co-autores em Portugal constituiu mais um acto de branqueamento (no caso de integração) daqueles fundos obtidos de modo ilícito e foi praticada em território nacional por um dos co-autores acusados, o que é um elemento de conexão mais do que suficiente para, nos termos conjugados dos art.ºs 4º, al. a), e 7º, n.º 1, ambos do CP, se concluir que o crime considera-se praticado em território português.
Resulta, ainda, do artigo 14017  da acusação que “O arguido HH tinha combinado com o arguido CC, em Portugal, prestar a referida colaboração na circulação de fundos, bem sabendo que seria pago com quantias provenientes do próprio Grupo BES, por determinação deste último arguido, tendo actuado, nesse quadro, também em território nacional, pelo que deveria aqui manifestar o recebimento do pagamento pelos serviços prestados, tal como acontecia com os montantes que recebia da ESCOM”.
Este acordo ocorrido em Portugal, na versão da acusação -  que é a que importa para efeitos de aferição do pressuposto da competência -  é também mais um elemento de conexão deste concreto crime ao território português.
A Decisão recorrida de exclusão deste crime da jurisdição dos tribunais portugueses não merece acolhimento.

1.3.8.4 ELEMENTOS OBJECTIVOS E SUBJECTIVOS DO TIPO DE BRANQUEAMENTO QUE FUNDAMENTARAM  DECISÕES DE NÃO PRONÚNCIA.
Antes de entrarmos na análise concreta destas temáticas e do preenchimento (ou não) dos elementos do tipo impõe-se o tratamento de algumas questões teóricas que adiante serão convocadas.

1.3.8.4.1 TEMÁTICAS REFERENTES AO TIPO OBJECTIVO DO CRIME DE BRANQUEAMENTO.

1.3.8.4.1.1 DAS FASES DO BRANQUEAMENTO
O branqueamento visa dar nova vestimenta a vantagens ilícitas típicas, despindo esses bens/rendimentos da veste “suja” que lhe está na origem, dando-lhes a aparência de património limpo, através de uma nova roupagem.
Muda-se o que está à vista de terceiros (da Justiça, do Estado, da sociedade em geral), com o fito de enganar, estes mesmos terceiros, sobre a origem do património.
Por detrás desta ilusória simplicidade está, em regra, um processo complexo e global, além de dinâmico, onde são passíveis de identificação várias fases.
Associada a cada qual está uma panóplia de métodos usualmente utilizados e por isso cognoscíveis.
É comum a divisão desta “linha de montagem”, neste caso de “limpeza”, em 3 fases, a saber:
a)  A fase da colocação (placement), correspondente basicamente à conversão e colocação dos bens e rendimentos sujos nos circuitos legais, que tanto podem ser financeiros como não financeiros, através, por exemplo, de depósitos, outras quaisquer aplicações financeiras ou em cofres em instituições financeiras, não esquecendo o crescente uso da moeda digital (vulgo criptomoeda) para o efeito. O sector bancário e financeiro, acompanhado de estruturas montadas em paralelo para auxiliar ao processo (através da criação, implementação e gestão dessas operações), e mais recentemente o universo do mundo digital, são os ecossistemas onde florescem e se instalam boa parte destes esquemas de branqueamento.
b)   A fase da circulação ou camuflagem (layering), que visa distanciar, para tornar mais opaca, a origem criminosa das vantagens, procurando, através da criação de “camadas”, eliminar vestígios remanescentes quanto à proveniência e propriedade dos bens e rendimentos “sujos”. Como a própria palavra indica, a circulação aponta para métodos de rotatividade dos bens/rendimentos, quer quanto à sua localização, quer quanto ao seu titular aparente, de modo a que no fim de todo o processo a ligação entre a origem e forma de obtenção do dinheiro “sujo” e aquele a quem o mesmo se destina não possa ser estabelecida.  Nesta fase são conhecidos os métodos de criação de sociedades “fantasma” ou de “fachada”, muitas delas sediadas em paraísos fiscais, com regimes legais pouco propensos à colaboração com a justiça, justificados pela preservação do segredo bancário, com desconhecimento dos beneficiários das contas, tornando estas contas também “fantasma”. A criação e implementação destes verdadeiros carrosséis de sociedades e contas “fantasma” tem contado com o beneplácito, por vezes mesmo com a colaboração, do sector bancário e financeiro, em particular dos paraísos fiscais, e das referidas estruturas paralelas de gestão de fortunas, em que os funcionários são muitas vezes sócios de centenas ou milhares de sociedades, desde a empregada de limpeza, até aos patrões, de entre as quais ganhou especial notoriedade a “EMP89...”, escritório de advocacia sito no ..., dado à estampa pelo Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ, na sigla em inglês), na chamada operação “panamá papers”, estrutura que teve também intervenção na montagem de algumas operações financeiras descritas na acusação.
c)  Por fim, a fase de integração (integration), que visa fazer chegar os fundos, já” vestimentados” de “limpos” e reciclados (afastados da sua origem), a quem desde o início se destinavam, através da sua reintrodução nos circuitos económicos legítimos e a proveito do beneficiário, à vista de todos. Trata-se da fase da integração dos bens e/ou rendimentos na esfera patrimonial do criminoso a quem as vantagens são destinadas. Entre os métodos usados nesta fase podem ser citados, entre muitos outros, o uso do dinheiro na aquisição de bens e serviços, o depósito de pequenas parcelas em contas do beneficiário, o levantamento por terceiro de pequenas quantias e a sua entrega em mãos ao beneficiário.

1.3.8.4.1.2 O PREENCHIMENTO DO CRIME DE BRANQUEAMENTO- A (DES)NECESSIDADE DE VERIFICAÇÃO DE TODAS AS TRÊS ETAPAS.
È necessária a verificação de todas as três etapas para o preenchimento do crime de branqueamento?
A resposta é, para nós, claramente negativa, até porque, dada a extensão da “linha de purificação”, alguns autores/co-autores apenas têm intervenção numa determinada fase.
Neste sentido vide o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, datado de 18 de Março de 2020, Processo n.º 1551/19.9T9PRT.P1 (disponível em dgsi.pt), onde pode ler-se que:
“O crime de branqueamento de capitais p. e p. pelo art.º 386º-A do Código Penal tem vindo a sofrer diversas algumas alterações, não exigindo actualmente que uma determinada conduta abranja as denominadas três fases ou etapas que constituem as modalidades de acção de branqueamento, a saber, a colocação, a circulação e a integração, bastando-se com a prática de qualquer delas”.
Portanto, o crime ter-se-á por verificado mesmo quando a conduta do agente preencha apenas uma das fases do branqueamento.

1.3.8.4.1.3 UM CRIME DE BRANQUEAMENTO POR CADA ACÇÃO TÍPICA BRANQUEADORA (OU POR CADA FASE DA “LINHA DE LAVAGEM”)
Tema distinto é o de saber se a purificação dos mesmos fundos, quando passe pelas três fases, não raras vezes miscigenadas, ou mesmo que apenas por duas delas - quando os seus autores sejam os mesmos - poderá dar lugar à verificação de mais do que um crime de branqueamento, fazendo corresponder um crime de branqueamento a cada uma dessas fases, questão que, apesar de não ser objecto do recurso, por não ter sido invocada na decisão recorrida, nem suscitada em sede de recurso, poderá ter relevo significativo relativamente a alguns  dos crimes.
Propendemos para o entendimento de que o processo de lavagem ou purificação do mesmo dinheiro “sujo”, ainda que passe por diversas fases do branqueamento, dará lugar à prática de um único crime de branqueamento, que abrange as referidas 3 fases (se for o caso), sob pena de a lavagem do mesmo dinheiro, pelo mesmo autor, ser transformada, na prática, num processo de “três lavagens” sucessivas até chegar ao seu projectado destino.
Naturalmente que, quanto maior for o número de actos sucessivos praticados, mais grave será a ofensa ao bem jurídico, na medida em que cada um desses actos acrescenta  dificuldade à punição do seu autor, mas a ofensa, vista no seu conjunto, continua a ser única.
Vale dizer que, caso um arguido tenha sido já julgado pela lavagem de certo dinheiro referente a uma das fases do branqueamento, não poderá ser julgado pelo mesmo crime, referente a operações de branqueamento dos mesmos fundos que se situaram numa outra fase do processo de “purificação”.

1.3.8.4.2 DOS ELEMENTOS DO TIPO OBJECTIVO
A decisão recorrida alude amiudadamente à falta de preenchimento dos elementos do tipo do lado objectivo.
Vejamos, então, ainda que de forma sintética, quais são esses elementos.
O primeiro elemento do tipo objectivo é a existência de vantagens provenientes de um facto ilícito típico (dito crime subjacente, infracção principal, predicated offence, crime base, crime precedente, entre outras denominações).
No n.º 1, do art.º 368º-A, do CP, o legislador instituiu um critério misto de “catalogação” dos crimes subjacentes admissíveis, através de um concreto catálogo de crimes e de uma cláusula geral referida à gravidade da infracção subjacente, em função das penas abstractas aplicáveis - puníveis com pena mínima superior 6 meses de prisão ou máxima superior a 5 anos. 
Sendo o branqueamento um crime derivado ou de conexão, os fundos (no caso de branqueamento de capitais) passíveis de branqueamento são apenas os derivados de um (qualquer) ou de vários dos crimes referidos, estabelecendo-se por esta via a necessária ligação entre o crime sobrejacente e o crime subjacente ao nível do tipo objectivo.
O crime de branqueamento é, sob esta perspectiva, um pós-delito ou uma infracção secundária, por se tratar de uma criminalidade induzida por uma outra: a montante o “crime” subjacente, a jusante o branqueamento.
O facto precedente não tem, no entanto, que ser um crime em sentido técnico, por se dispensar a sua natureza culposa e punível, bastando que se trate de um ilícito típico.
Em razão desse facto, não exige a lei o conhecimento da identidade dos autores ou do local da sua prática (n.º 4, do art.º 368º-A, do CP, na versão transcrita) e muito menos a sua punição, que pode ser afastada por razões tão variadas como sejam, por exemplo, a inimputabilidade penal do autor, a morte deste, a prescrição, a amnistia, a falta de uma condição de procedimento.
A necessária existência deste facto ilícito típico é mesmo admitida por alguns autores como uma mera condição objectiva de punibilidade.
Propendemos para considerar que essa concreta origem de catálogo dos fundos pode ser alternativa ou mesmo cumulativa.
A este propósito elucida o senhor Juiz Conselheiro José António Henriques dos Santos Cabral (em “Branqueamento de capitais e prova indiciária”, na “Julgar Online, Março de 2020”):   
 “Uma outra questão que convoca a nossa atenção é a determinação alternativa do tipo que consubstancia o crime prévio. Efectivamente, pode admitir-se a determinação alternativa entre os vários tipos criminosos como excepção ao princípio in dubio pro reo, o que é determinado pela relação legal material entre eles. A admissibilidade de determinação alternativa do facto implica a condenação com base na comprovação de factos alternativos. Este instituto pode assumir grande relevância na demonstração do delito prévio, na medida em que não se determine com precisão qual o facto anterior, porquanto existem várias possibilidades, o que pode implicar uma determinação alternativa daquele delito. Para considerar que houve algum evento anterior criminalmente relevante, embora não se possa determinar com exactidão qual, o juiz poderá, assim, admitir a origem alternativa dentro daqueles tipos legais que são juridicamente concorrentes (v.g., tráfico de influência, corrupção). Como referem Hans-Heinrich Jescheck e Thomas Weigend, “existem casos em que a convicção do juiz está ciente de que o arguido não tendo cometido o crime cometido cometeu um outro cuja comprovação apenas pode ser realizada alternativamente. A questão é, portanto, de saber se ele pode ser condenado por esses factos”. A doutrina processual criminal alemã considera como possível a condenação em tal circunstância. Como qualquer regra permite excepções, a do in dubio pro reo também suporta como excepção a "determinação alternativa de facto" – “se a determinação alternativa entre diferentes tipos criminosos for permitida a título de excepção ao princípio in dubio pro reo é algo que é determinado pela relação legal-material existente entre eles. [...]. Nesses casos, aceita-se, por conseguinte, que, para evitar absolvições injustificadas e, em determinadas condições, seja condenado ao abrigo da lei mais favorável, com base na alternatividade fáctica (determinação alternativa). A determinação alternativa é, portanto, uma excepção, por razões políticas criminosas, ao princípio do in dubio pro reo nos casos em que as várias possibilidades não estão em uma relação gradual de mais ou menos, mas em uma relação de alternatividade. A "pura alternatividade factual representa um caso especial de determinação alternada: aqui não há dúvida sobre o direito penal aplicável, mas não se determina é mediante que acção foi violado pelo agente”. Na realidade, o desconhecimento das concretas circunstâncias em que se verificou o crime prévio e a própria complexidade das actuações ou decisões que, a um nível superior, originaram a vantagem ilícita tornam, muitas vezes, difícil descortinar, entre o conglomerado das dinâmicas envolvidas, quais as que se encontram numa relação de causa efeito com o branqueamento de capitais. Por mera hipótese, refira-se que o processo de decisão que originou os proveitos económicos de que deriva o branqueamento pode resultar dum complexo de infracções em que está presente, por exemplo, a corrupção e o tráfico de influência e, consequentemente, podermos falar, não dum crime, mas de vários crimes prévios em conexão. Neste último caso, e no núcleo central da actuação do agente, apenas existe a certeza de que um determinado montante teve uma origem ilícita, resultante da prática alternativa, ou cumulativa, de vários tipos legais de crime.  Igualmente poderá suceder que se demonstre que a montante do crime de branqueamento de capitais, e configurando o crime prévio subjacente, se encontra uma pluralidade de actos que consubstanciem o mesmo tipo legal (v.g., corrupção) sem que seja possível determinar quais os precisos limites de cada um dos mesmos actos.  Estamos em crer que nada obsta à afirmação duma tipificação alternativa, ou cumulativa, do crime prévio e que tal é imposto pela paridade jurídica entre os tipos legais abstractamente considerados, a qual se situa, não apenas no que respeita ao bem tutelado, mas, também, no que toca à forma como este é posto em perigo ou atingido.
Consequentemente, também aqui se entende que deve ser dada por adquirida a afirmação da existência do crime prévio que é essencial para a afirmação do crime de branqueamento de capitais.”

1.3.8.4.2.1 DA NECESSIDADE (OU NÃO) DE O ILÍCITO TÍPICO SUBJACENTE SE TER POR CONSUMADO.
Outra questão que tem sido alvo de discussão é a de saber se é de exigir que o facto ilícito precedente se tenha consumado em momento anterior à prática do branqueamento, ou se bastará um qualquer estádio de execução anterior à consumação. No limite, se o crime dito precedente pode mesmo consumar-se só após a prática do crime de branqueamento.
Dito de outro modo, se o “crime” subjacente tem necessariamente se ser cronologicamente anterior, em toda a sua dimensão, ao branqueamento, ou se pode ser contemporâneo ou posterior a este.
Temos para nós que o facto ilícito típico não tem necessariamente de ser consumado, na medida em que não se impõe a sua verificação em sentido técnico, bastando a prática de actos de execução, com intenção de praticar o crime, ou a mera tentativa.
O que não se pode dispensar é que esse facto ilícito típico subjacente (apesar da sua eventual não consumação) tenha já permitido a criação de vantagens, pela simples - mas também óbvia -  razão de que as vantagens (estas sim) terão de ser cronologicamente anteriores à actividade de branquear, não nos parecendo exequível uma actividade de branqueamento de vantagens futuras, e por isso sempre incertas, o que se traduziria numa actividade de lavagem de vantagens ilícitas típicas inexistentes (ainda que expectáveis), possibilidade que nos parece destituída de sentido.
É certo que esta problemática tem ganho especial acuidade  no que respeita aos crimes de branqueamento de vantagens decorrentes de crimes fiscais, dado o “tempus delicti” muito específico destes crimes, em especial no que concerne ao crime de fraude fiscal (art.ºs 103º e 5º, do RGIT).
Esta especificidade pode, em tese, ser encontrada no crime de branqueamento número 23 ( praticado, em co-autoria, pelos arguidos EE e a sociedade “Pepelan - Consultoria e Gestão” (relativamente a justificativos criados para o recebimento de fundos através da alienação de imóvel cuja propriedade estava titulada pela sociedade “Pepelan - Consultoria e Gestão” e com utilização da sociedade em offshore EMP10... LIMITED), único estribado, de acordo com o Recorrente, num ilícito típico de natureza fiscal.
Reservamos esta particularidade para a análise desse crime, se se revelar necessário.

1.3.8.4.2.2 O QUE DEVE SER ENTENDIDO POR “RECEBIMENTO” DAS VANTAGENS ILÍCITAS DE “CATÁLOGO”.
A propósito da densificação do conceito de “recebimento” recorremos aos ensinamentos do Professor Jorge de Figueiredo Dias, em “Comentário Conimbricense do Código Penal”, T II, Coimbra editora, pág. 100, onde o mesmo refere: deve “fazer-se equivaler ao recebimento de uma coisa (...) uma relação fática de domínio sobre ela”.
No mesmo sentido veja-se o Ac. TRG, número 85/08.1TAMCD.G2, datado de 27.05.2019, assim sumariado, na parte ora com relevo: “2 – O preenchimento do crime de branqueamento basta-se com a mera operação de transferência de vantagens de crimes de catálogo, não sendo necessária a existência de retorno de vantagens ao agente do crime pré-existente, bastando-se com o simples depósito bancário da vantagem deste crime, desde que o autor desse depósito saiba a origem dela e que aja com a vontade de a dissimular 3 – E à integração do crime de branqueamento pelo autor do crime pré-existente não se opõe o facto de os actos integradores da ocultação e dissimulação (branqueamento) aparentemente correspondem ao momento em que há apropriação de dinheiros públicos, por na lei penal, o conceito de apropriação se bastar com uma transferência simbólica para o domínio de facto de outrem, podendo o apossamento ser feito "sem apreensão manual ou mesmo sem o dispêndio de energias físicas pessoais." (Prof. Faria Costa, em anotação ao art.º 203º, no Comentário Conimbricense). 4 - Aquele depósito da vantagem do crime faz o dinheiro entrar no sistema bancário, sendo, à partida, retirado de qualquer relação com o crime, e se tal não se considerar, "...corria-se o risco de restringir excessivamente (contra a vontade do legislador) a área de tutela típica da incriminação por aquele crime.”
À semelhança desta doutrina e jurisprudência citadas, entendemos não serem as datas das efectivas (no sentido de materiais) entregas das vantagens ilícitas de “catálogo” ao seu beneficiário final que relevam para a fixação das datas das suas ocorrências, mas as datas a partir das quais o beneficiário tem o domínio sobre o destino e o modo de utilização desses fundos.
Assim,  se a mando e/ou com o acordo do beneficiário, as referidas vantagens, depois de disponibilizadas na origem, circulam e são depositadas em nome de terceiros, servindo-se, aquele, voluntariamente de terceiros para o efeito, o recebimento das vantagens tem-se por realizado desde a data da sua entrega na origem, havendo uma correspondência temporal entre a entrega e o recebimento.
O segundo e último elemento objectivo do tipo consiste na  acção típica de branqueamento da vantagem, a qual é legalmente configurada como "converter”, “transferir” “auxiliar a conversão ou a transferência”, “facilitar a conversão ou a transferência” (n.º 2 do art.º 368º-A, do CP) “ocultar” ou “dissimular” a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou titularidade das vantagens, ou os direitos a ela relativos (n.º 3 do art.º 368º-A, do CP).
Como se verifica, trata-se de um crime de execução vinculada, na medida em que a lei prevê os modos típicos da sua execução, apesar da grande variedade de acções proibidas consagradas.
A “conversão” abrange as operações de alteração da natureza  dos valores patrimoniais.
A “transferência” abrange operações de alteração física ou jurídica da coisa/fundos ou do seu detentor (o caso paradigmático será a movimentação de dinheiro de uma conta para outra, seja titulada pelo mesmo detentor formal, seja por outro).
A referência ao “auxílio” ou à “facilitação” da conversão ou da transferência tem a virtualidade de integrar, no tipo, condutas de menor grau de intensidade criminosa (que nos poderiam remeter para a ideia de cumplicidade), obrigando a considerar os seus agentes como autores (ao invés de cúmplices).
A “ocultação” e a “dissimulação” estão agora centradas nas específicas qualidades dos bens ou dos direitos a eles relativos e abrangem todo um largo espectro de acções de encobrimento, nelas se  incluindo, nas palavras do Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa, proferido no processo 405/14.0TELSB.L1-3 e datado de 30.10.2019, (disponível dgsi.pt), “os actos de adquirir, receber, usar, deter, guardar, seja a que título, os bens e/ou produtos em questão, desde que aptos a tornar menos perceptível ou mesmo a impossibilitar totalmente que se torne visível ou apreensível um conjunto de atributos e qualidades dos bens em causa, no que concerne à sua verdadeira origem, ou quanto à sua real localização, ou no que se refere à sua verdadeira disposição, movimentação ou titularidade.”
Para a verificação deste elemento do tipo objectivo basta a prática de uma das acções proibidas, podendo, no entanto, haver lugar à prática de acções típicas múltiplas, executadas, até, de modo sucessivo, caso em que cada acção proibida agravará progressivamente a ofensa do bem jurídico protegido.

1.3.8.4.2.3 CRIME DE BRANQUEAMENTO E CRIME(S) SUBJACENTE(S): UNIDADE OU PLURALIDADE.
Correlacionado com os mencionados dois elementos objectivos do tipo está outra “vexata quaestio” abordada na decisão recorrida - embora porventura com uma outra formulação - que é a de saber se entre o crime de branqueamento e os seus subjacentes, em particular quando se trate de um dos crimes de corrupção, há lugar a um concurso efectivo de crimes ou a um concurso meramente aparente.
 Para a sua análise teremos de versar previamente a temática do bem jurídico protegido e do princípio “ne bis in idem”.

1.3.8.4.2.4 DO BEM JURÍDICO DO CRIME DE BRANQUEAMENTO
As opiniões entre os juristas divergem.
Acentuam uns que o cerne do bem jurídico protegido pelo tipo legal é a administração da justiça, salientam outros que são os interesses económicos e financeiros e até a segurança geral da comunidade, atendendo ao forte impacto e à perversão da economia global provocada por este tipo de criminalidade, colocando em causa, em última instância, os regimes políticos democráticos.
É para nós claro que o Código Penal, ao inserir o tipo do branqueamento no Título V (dos crimes contra o Estado) e especificamente no Capítulo III (dos crimes contra a realização da Justiça), quis tomar posição expressa sobre esta matéria.
Isso mesmo resulta da “Exposição dos Motivos” da Proposta de Lei n.º 73/IX in DR II –A , de 5 de Julho de 2003, em que se baseou a Lei n.º 11/2004, de 27 de Novembro, onde pode ler-se que “a inserção sistemática escolhida fica a dever-se ao facto de o branqueamento ser, em primeira linha, um crime contra a administração da justiça, na medida em que a actividade do branqueador dificulta a actuação da investigação criminal relativamente a facto ilícito subjacente”.
Aliás, esta circunstância tem permitido uma maior uniformidade jurisprudencial e doutrinal sobre a temática, sendo hoje maioritário o entendimento de que o bem jurídico tutelado no delito de lavagem é a “administração da justiça”, dado que a actividade do branqueador dificulta a actuação da investigação criminal relativamente ao facto ilícito subjacente.
Nessa linha, o já citado Ac. do STJ, datado de 11.06.2014, processo 14/07.0TRLSB.S1, onde se lê: “Pela inserção sistemática, o bem jurídico protegido pela incriminação é a realização da justiça, na sua particular vertente da perseguição e do confisco pelos tribunais dos proventos da actividade criminosa. Para alguns Autores, trata-se de um crime pluriofensivo.”
Para Paulo Pinto Albuquerque, em “Comentário do Código Penal, 4.a edição actualizada, Universidade Católica Editora, 2021”, na nota prévia ao artigo 368.°A, n.° 1, pág. 1226: “o bem jurídico protegido pelo crime de branqueamento de capitais, nas suas diversas alíneas, é o da administração da justiça, na sua particular vertente da  perseguição e do confisco pelos tribunais dos proventos da actividade criminosa.”
Não obstante as diversas formulações que possam (e são) encontradas a este propósito, uma coisa é certa e incontornável - o bem jurídico protegido pelo crime de branqueamento é -  e será sempre -  distinto do dos crimes precedentes.
1.3.8.4.2.5 Do princípio “ne bis in idem”:
O repetidamente invocado (na Decisão recorrida) princípio clássico “ne bis in idem” tem consagração constitucional, no artigo 29.º, n.º 5, da CRP, onde se estabelece que “ninguém pode ser julgado mais do que uma vez pela prática do mesmo crime”.
Nas palavras de Gomes Canotilho e Vital Moreira (Constituição da República Portuguesa Anotada, vol. I, 4.ª ed., Coimbra, 2014, p. 467): “O n.º 5 dá dignidade constitucional ao clássico princípio non bis in idem. Também ele comporta duas dimensões: (a) como direito subjectivo fundamental, garante ao cidadão o direito de não ser julgado mais do que uma vez pelo mesmo facto, conferindo-lhe, ao mesmo tempo, a possibilidade de se defender contra actos estaduais violadores deste direito (direito de defesa negativo); (b) como princípio constitucional objectivo (dimensão objectiva do direito fundamental), obriga fundamentalmente o legislador à conformação do direito processual e à definição do caso julgado material, de modo a impedir a existência de vários julgamentos pelo mesmo facto.”
Este princípio deve ser entendido numa dupla vertente: a processual e a substantiva. A primeira a impedir a sujeição do mesmo agente a mais do que um julgamento por uma certa infracção e a segunda a proibir uma plural imposição de consequências jurídicas sancionatórias sobre a mesma infracção, que o mesmo é dizer, uma dupla valoração ou dupla penalização da mesma infracção.
De acordo com Ramon Garcia Albero («Non Bis In Idem» Material y Concurso de Leyes Penales, Barcelona, 1995, p. 24): “O non bis in idem tem uma vertente substantiva e outra processual. Do ponto de vista material, o princípio veta a imposição plural de consequências jurídicas relativamente a uma mesma infracção. Na perspectiva processual, o non bis in idem determina a impossibilidade de reiterar um novo processo e a sujeição a julgamento quanto ao facto sobre o qual incidiu sentença firme ou arquivamento definitivo. […] No caso do non bis in idem material, a hipótese reconduz-se à identidade da infracção e a sua consequência sanção punitiva. O non bis in idem processual tem, pelo contrário, como hipótese não o «crimen», mas sim o «factum», e como consequência evitar, cabalmente, o próprio processo.
Para maior desenvolvimento destas duas dimensões, remete-se para o Ac. do Tribunal Constitucional n.º 303/2005.
1.3.8.4.2.6 Do concurso efectivo (punição pela pluralidade de crimes) ou aparente (punição por um único crime) entre o crime de branqueamento e o(s) crime(s) subjacente(s), em particular quando cometidos pelo mesmo autor.
Este tópico encerra em si mesmo duas querelas que podem ser diferenciadas.
- Uma é saber se pode haver (ou se por princípio haverá) concurso efectivo entre o crime de branqueamento e o(s) crime(s) subjacente(s).
- Outra é saber se a solução será a mesma quando o branqueamento é praticado pelo mesmo autor do crime base - estamos, claro, a falar dos autobranqueadores.   
Trataremos delas em simultâneo, até porque a segunda é, na  verdade, a que particularmente nos interessa.
 De acordo com o n.º 1 do artigo 30º, do CP, "o número de crimes determina-se pelo número de tipos de crime efectivamente cometidos, ou pelo número de vezes que o mesmo tipo de crime for preenchido pela conduta do agente".
Este dispositivo equipara, para efeitos da punição, o concurso ideal (seja heterogéneo - em que uma única acção preenche uma pluralidade de tipos legais -, seja homogéneo - em que uma única acção preenche diversas vezes o mesmo tipo legal -) ao concurso real de crimes (seja heterogéneo – isto é,. uma pluralidade de acções preenche uma pluralidade de tipos legais, seja homogéneo, isto é,  uma pluralidade de acções preenche diversas vezes o mesmo tipo legal ).
O que releva é o número de tipos legais preenchidos pela conduta do agente ou o número de vezes que essa conduta preenche o mesmo tipo legal.
Esta construção assenta na ideia de que a função do Direito Penal se traduz na protecção de bens jurídicos-penais, fazendo-se corresponder ao número de crimes praticados o número de violações do ou dos bens jurídicos tutelados.
Nas palavras de Eduardo Correia, em "A Teoria do Concurso - Unidade e Pluralidade de Infracções", páginas 86/87: “O tipo legal de crime apresenta-se, não como uma entidade abstracta, mas, antes, como entidade concreta, portadora de um concreto juízo de censura, sendo, portanto, o interposto da valoração jurídico-criminal, ante o qual se acham colocados o tribunal e o intérprete.”
Ao concurso efectivo de crimes (seja ele real  ou ideal) opõe-se o concurso legal ou de normas (também chamado aparente ou impuro), em que o comportamento do agente preenche vários tipos de infracções, porém o conteúdo ou a substância criminosa é aqui tão esgotantemente abarcada pela aplicação ao caso de um só dos tipos violados que os restantes devem recuar, subordinando-se perante uma tal aplicação (cf. Eduardo Correia, "Direito Criminal", volume II, páginas 204/205).
O concurso legal de crimes não está especificamente previsto no CP, a não ser no termo “efectivamente” cometidos, constante do citado art.º 30º, n.º 1, por argumento “a contrario”.
São tradicionalmente apontadas como formas mais frequentes de concurso legal ou de normas: a  especialidade, a subsidiariedade e a consumpção.
Por reporte ao crime de branqueamento, qual a natureza do concurso entre este e o(s) crime(s) subjacentes(s), sobretudo quando ambos - o base e o pós-delitual - são praticados pelo mesmo autor?
É esta a questão especialmente relevante.
A decisão recorrida, acompanhada pelas defesas, considera que a materialidade acusada que suporta os crimes de branqueamento, alicerçados nos crimes de corrupção, representa ainda (e apenas) actos de execução material dos crimes de corrupção, não tendo autonomia punitiva, sob pena de inconstitucionalidade  por violação do princípio “ne bis in idem”.
Dito de outro modo, considera existir um mero concurso aparente entre o crime de branqueamento e o crime subjacente.
É francamente minoritária a tese da impunidade do crime de branqueamento quando cometido pelo mesmo autor do crime subjacente, nomeadamente quando este seja um crime de corrupção, parecendo, no entanto, ser esta a tese sufragada pela decisão recorrida, pelo menos no que concerne aos crimes de branqueamento que têm na base um crime de corrupção.
Posicionamo-nos na tese maioritária, quer em termos jurisprudenciais, quer doutrinais, que defende a existência de um concurso efectivo entre o crime de branqueamento e o crime base, mesmo quando o autor de ambos é o mesmo, por diversas razões, que passamos a elencar:
- Primeiro, porque os factos que suportam a punição do crime de branqueamento são necessariamente distintos dos que suportam os crimes subjacentes, supondo outras acções ou omissões que não fazem parte do crime subjacente e estão para além deste.
O preenchimento do crime de branqueamento implica actos de conversão, transferência, ocultação ou dissimulação de determinadas vantagens indevidas que derivem da prática de certos factos ilícitos (tipificados) e são estes processos que estão claramente para além do tipo do crime subjacente.
Qualquer outro entendimento esbarraria na incongruência de o legislador, por um lado, alicerçar o crime de branqueamento na lavagem de vantagens indevidas decorrentes da prática de certos e determinados factos ilícitos (à guisa de elemento objectivo do tipo, pelo menos a maioria assim o entende) e, por outro, entendesse que as manobras de  disfarce do recebimento dessas mesmas vantagens ainda fariam parte dos crimes subjacentes.
Tomemos por exemplo o recebimento de vantagens indevidas nos crimes de corrupção passiva: uma coisa é o recebimento da vantagem indevida por parte de funcionário, em troca da prática de acto, em violação ou não dos deveres do cargo,  outra será a conversão, transferência, dissimulação ou ocultação dessas vantagens indevidas.
O cidadão comum, sem especiais conhecimentos de direito penal, perceberá que não podem ser penalizados da mesma forma um agente corrompido que recebe directamente, sem ocultação e dissimulação, as vantagens indevidas recebidas (a que corresponde um recebimento ou uma utilização dita normal de tais vantagens),  e um agente corrompido que sujeita essas mesmas vantagens a um processo de laundering, visando com tal, para além do simples recebimento/aproveitamento das vantagens indevidas, que essas vantagens cheguem à sua pessoa “purificadas”, perseguindo essa lavagem um propósito maior, que é o de confundir as instâncias de controle e fiscalização no que respeita à autoria do crime subjacente, e com isso dificultar e prejudicar a sua investigação e criminalização.
Nesta segunda forma de actuar há claramente um “plus” , um “quid” suplementar  ou um “aliud” face ao singelo recebimento da vantagem indevida e é esse “plus” - perfeitamente autonomizável -  que é o alvo do crime de branqueamento.
- Em segundo lugar porque o bem jurídico protegido pelo crime de branqueamento é, como se disse, claramente distinto do bem jurídico tutelado pelos crimes subjacentes.
Dito de outro modo, o autor do facto precedente, que ofende o interesse protegido pela punição desse ilícito base, pode ofender de forma relevante o interesse protegido pela punição do branqueamento, sem que essa conduta deva considerar-se consumida pelo facto subjacente.
A ser assim, não há um mero concurso legal entre o crime de branqueamento e os crimes subjacentes (predicate offense), mormente os crimes de corrupção, porque os bens jurídicos ofendidos são distintos.
- Em terceiro lugar, o legislador quis conscientemente tomar posição expressa sobre a existência de um concurso efectivo entre o crime de branqueamento e o crime subjacente do qual advêm as vantagens indevidas branqueáveis, só isso explicando a expressão inserta no n.º 2, do transcrito art.º 368.º-A, do CP, vantagens  “obtidas por si”, o que inculca claramente que o crime de branqueamento pode ser cometido por qualquer pessoa, sendo por isso um crime comum, e de entre esse universo não estão excluídos os autores dos crimes subjacentes.
Poder-se-á questionar a bondade da opção legislativa, até quiçá à luz do direito comparado, mas uma coisa é certa, a opção existe, é clara e é explícita, não podendo ser ignorado o facto de o legislador português ter querido afastar a tese de que o branqueamento constitui ainda uma exaustão do crime  anteriormente praticado, sem autonomia punitiva, opção que não é legítimo ao aplicador do direito contrariar.
Resumindo, a posição maioritária jurisprudencial e doutrinal, na qual nos revemos, considera a existência de um concurso efectivo de crimes entre o crime de branqueamento e os crimes subjacentes, mesmo quando cometidos pelo mesmo autor, por os crimes serem estruturalmente autónomos, protegerem bens jurídicos distintos e porque a consideração dessa pluralidade de crimes é o que resulta dos princípios gerais.
Em abono desta tese o Supremo Tribunal de Justiça fixou jurisprudência obrigatória, concretamente no Ac. Uniformizador de Jurisprudência n.º 13/2007, de 22 de Março, onde se decidiu que  os autores do crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art.º 21º, nº 1, do DL 15/93, deviam ser condenados, em concurso real, pela autoria do crime de branqueamento, p. e p. pelo art.º 23º, nº 1, alínea a), do mesmo diploma, decisão que, na sua essência, mantém plena validade e actualidade  no que concerne ao crime de branqueamento tipificado no Código Penal e aos crimes precedentes mencionados nessa tipificação.
Ademais, ainda que possam subsistir posições jurídicas diferenciadas, não nos podemos esquecer que estamos em fase de instrução e que a decisão que desta advém deverá sempre salvaguardar as diversas posições de direito defensáveis.

1.3.8.4.2.7 ANÁLISE DOS FUNDAMENTOS DECISÓRIOS DE NÃO PRONÚNCIA DOS CRIMES DE BRANQUEAMENTO RELACIONADOS COM OS ELEMENTOS OBJECTIVOS DO TIPO.
A decisão recorrida, repetidamente, alude à falta de preenchimento dos elementos do tipo objectivo do crime de branqueamento, fundando a decisão de não pronúncia de 19 dos 23 crimes de branqueamento nessa mesma falta (excepção feita aos crimes 8, 9 e 22), em particular em três questões.
Vejamos cada uma “per se”.
1.3.8.4.2.8 o crime subjacente aos crimes de branqueamento – crimes 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7,11, 17,18,19, 23.
Este tópico relaciona-se com o já mencionado primeiro elemento objectivo do tipo.
Ora, resulta claro da acusação, vista no seu todo, quais são os crimes subjacentes a estes crimes de branqueamento, com excepção do branqueamento 23.
Assim:
CRIME 1 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, BB e GG, relativamente aos movimentos financeiros com origem no Grupo LENA, com passagem pelas contas da ... tituladas pelo arguido GG, realizados a partir de 2007, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal / crime subjacente - crime de corrupção passiva de titular de cargo político, praticado pelo arguido AA, em co-autoria com o arguido BB, com referência a actos praticados no interesse do Grupo LENA entre 2005 e 2011, a que se associa o crime de corrupção activa de titular de cargo político, praticado por GG, relativamente a pessoa do arguido AA, este com mediação do arguido BB, e em benefício do Grupo LENA, com referência aos anos de 2005 a 2011.
CRIME 2 - Um crime de branqueamento  praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, BB, GG, a sociedade LEC SA e a sociedade XLM, relativamente à utilização da sociedade XLM, entre 2009 e 2015, para a colocação de fundos destinados ao arguido AA e utilização dos mesmos no seu interesse, através do pagamento de despesas e de distribuição de dividendos para contas tituladas pelo arguido BB, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal /crime subjacente:  crime de corrupção passiva de titular de cargo político, praticado pelo arguido AA, em co-autoria com o arguido BB, com referência a actos praticados no interesse do Grupo LENA entre 2005 e 2011, a que se associa o crime de corrupção activa de titular de cargo político, praticado por GG, relativamente a pessoa do arguido AA, este com mediação do arguido BB, e em benefício do Grupo LENA, com referência aos anos de 2005 a 2011.
CRIME 3 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, CC, HH, BB e II, relativamente à utilização, entre 2006 e 2008, de contas na ... em que o arguido II era autorizado e operações financeiras realizadas a partir das mesmas, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.
CRIME 4 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, CC, HH, II e BB, relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados no ano de 2007 e até ao início de 2008, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal.
CRIME 5 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, CC, HH, BB e GG, relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados a partir de 2008, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, com intervenção das contas da ... do arguido GG, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal.
CRIME 6 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, CC, HH, BB, GG, as sociedades LEC SA, LEC SGPS, LENA SGPS e XLM, relativamente aos movimentos financeiros ocorridos a partir de 2010, abrangidos pela operação CEL_2010, justificados através de contrato promessa de compra e venda com perda de sinal referente ao imóvel ..., sito em ..., e introdução desses fundos no Grupo LENA, p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.
Estes quatro CRIMES - 3, 4, 5 e 6 -  têm como crime subjacente o crime de corrupção passiva de titular de cargo político, praticado por AA, com referência a actos praticados no interesse do arguido CC, relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES, a que se associa o crime de corrupção activa de titular de cargo político, praticado por  CC, relativamente a negócios do Grupo Portugal Telecom e GES, no que concerne aos pagamentos efectuados ao arguido AA.
CRIME 7 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, BB, GG, DD, EE, FF e JJ, relativamente às transferências com origem em conta do cidadão ... KK, referente aos financiamentos concedidos ao Grupo Vale do Lobo, com passagem por conta bancária da ... do arguido GG, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal /crime subjacente: um crime de corrupção passiva de titular de cargo político, praticado por AA,  em co-autoria com o arguido DD, com referencia a actos praticados no interesse dos arguidos EE e FF, com utilização das sociedades do Grupo VALE DO LOBO, a que se associa o crime de corrupção activa de titular de cargo político, praticado por FF  em co-autoria com o arguido EE, com referência a actos praticados por AA e DD no interesse dos primeiros.
CRIME 11 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, BB e LL, quanto a aquisição de imóveis em Portugal, com o retorno do preço pago para a esfera patrimonial do arguido AA, de forma justificada, factos ocorridos entre 2010 e 2012, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal  / crime subjacente: os três crimes de corrupção passiva de titular de cargo político praticados pelo arguido AA: (em co-autoria com o arguido BB) com referência a actos praticados no interesse do Grupo LENA; com referência a actos praticados no interesse do arguido CC, relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES; e (em co-autoria com o arguido DD), com referencia a actos praticados no interesse dos arguidos EE e FF, com utilização das sociedades do Grupo VALE DO LOBO.
A intervenção do arguido LL reporta-se aos fundos antes concentrados e que passaram por um primeiro processo de purificação, através da sua regularização fiscal por via do RERTII.
CRIME 17 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos BB, GG, PP e QQ,  relativamente a utilização da sociedade XMI e sua contabilidade, para a colocação de fundos na esfera patrimonial do arguido QQ, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal  /crime subjacente: crime de corrupção passiva praticado por QQ, relativamente aos pagamentos recebidos enquanto Director da RAVE, no âmbito da PPP, mediante acordo celebrado com a XMI, a que se associa o crime de corrupção activa, praticado por BB, em co-autoria com os arguidos GG e PP.
CRIME 18 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos CC e RR,  relativamente aos pagamentos PT e CEL_2010, realizados entre 7 de Dezembro de 2007 e 20 de Setembro de 2011, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES (e com destino para as contas de que era beneficiário RR), p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.°s 1, 2 e 3, do Código Penal  / crime subjacente:  um crime de corrupção passiva, praticado por RR, relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES, no que concerne aos pagamentos recebidos do arguido CC, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, a que se associa o crime de corrupção activa praticado por CC, relativamente a negócios do Grupo Portugal Telecom e GES, no que concerne aos pagamentos efectuados ao arguido RR.
CRIME 19 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos CC e SS,  relativamente aos pagamentos PT e CEL_2010, realizados entre 9 de Julho de 2007 e 23 de Novembro de 2012, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES (e com destino para as contas de que era beneficiário SS), p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.°s 1, 2 e 3, do Código Penal / crime subjacente:  um crime de corrupção passiva praticado por SS, relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES, no que concerne aos pagamentos recebidos do arguido CC, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, a que se associa o crime de corrupção activa praticado por CC, relativamente a negócios do Grupo Portugal Telecom e GES, no que concerne aos pagamentos efectuados ao arguido SS, crime p. e p. pelos art.ºs 374°, n.º 1, e 374°-A, n.ºs 2 e 3, do Cód. Penal, com referência aos arts.202°, al. b), e 386°, n.º 2, do mesmo diploma legal.
O crime de branqueamento 23 (praticado, em co-autoria, pelos arguidos EE e a sociedade “Pepelan - Consultoria e Gestão”, relativamente a justificativos criados para o recebimento de fundos através da alienação de imóvel cuja propriedade estava titulada pela sociedade “Pepelan - Consultoria e Gestão” e com utilização da sociedade em offshore EMP10... LIMITED, p. e p. pelo art.368°-A, nº 1, 2 e 3 do Código Penal) apresenta assinaláveis especificidades, em razão do que será analisado infra, na parte dedicada aos indícios, sem prejuízo de se poder afirmar ser  o único onde, de forma sustentada, é de questionar a ausência/indefinição do crime subjacente.
Da leitura global da acusação fácil se torna identificar, de entre os crimes subjacentes narrados e acusados, qual o (ou os) que suportam cada crime de branqueamento (com excepção do branqueamento 23).
Na verdade, não percepcionamos nenhuma dificuldade em estabelecer a ligação de qualquer um dos concretos crimes de branqueamento aos crimes subjacentes mencionados (sempre com excepção do crime 23), nem percebemos as dificuldades aludidas na Decisão recorrida.
Sem esquecer que o grau de conhecimento da prática de tal crime ou crimes (questão que abordaremos mais profundamente em sede de elementos subjectivos do tipo) é, para os autobranqueadores, à partida, total e perfeito, já que neles intervieram.
Para os agentes que não são autobranqueadores não se exige um conhecimento detalhado e pormenorizado desses crimes.
1.3.8.4.2.9 as “vantagens” ditas branqueadas só podem ser consideradas dinheiro “sujo” depois do seu recebimento pelo destinatário final?.
Na medida em que os acusados actos de branqueamento são anteriores a tais recebimentos por parte do beneficiário final, aqueles não recaíram sobre dinheiro que possa ser qualificado de “sujo” -  na perpectiva da Decisão instrutória
Estão em causa os seguintes crimes:
CRIME 3 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, CC, HH, BB e II, relativamente à utilização, entre 2006 e 2008, de contas na ... em que o arguido II era autorizado e operações financeiras realizadas a partir das mesmas, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.
CRIME 4 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, CC, HH, II e BB, relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados no ano de 2007 e até ao início de 2008, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal.
CRIME 5 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, CC, HH, BB e GG, relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados a partir de 2008, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, com intervenção das contas da ... do arguido GG, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal.
CRIME 6 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, CC, HH, BB, GG, as sociedades LEC SA, LEC SGPS, LENA SGPS e XLM, relativamente aos movimentos financeiros ocorridos a partir de 2010, abrangidos pela operação CEL_2010, justificados através de contrato promessa de compra e venda com perda de sinal referente ao imóvel ..., sito em ..., e introdução desses fundos no Grupo LENA, p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.
CRIME 7 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, BB, GG, DD, EE, FF e JJ, relativamente às transferências com origem em conta do cidadão ... KK, referente aos financiamentos concedidos ao Grupo Vale do Lobo, com passagem por conta bancária da ... do arguido GG, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.
CRIME 17 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos BB, GG, PP e QQ,  relativamente a utilização da sociedade XMI e sua contabilidade, para a colocação de fundos na esfera patrimonial do arguido QQ, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.
CRIME 18 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos CC e RR,  relativamente aos pagamentos PT e CEL_2010, realizados entre 7 de Dezembro de 2007 e 20 de Setembro de 2011, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES (e com destino para as contas de que era beneficiário RR), p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.°s 1, 2 e 3, do Código Penal.
CRIME 19 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos CC e SS,  relativamente aos pagamentos PT e CEL_2010, realizados entre 9 de Julho de 2007 e 23 de Novembro de 2012, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES (e com destino para as contas de que era beneficiário SS), p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.°s 1, 2 e 3, do Código Penal.
CRIME 23 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos EE e a sociedade “Pepelan - Consultoria e Gestão”, relativamente a justificativos criados para o recebimento de fundos através da alienação de imóvel cuja propriedade estava titulada pela sociedade “Pepelan - Consultoria e Gestão” e com utilização da sociedade em offshore EMP10... LIMITED, p. e p. pelo art.368°-A, nº 1, 2 e 3, do Código Penal.
A Decisão Recorrida faz diversas referências ao facto de as vantagens visadas em alguns dos crimes de branqueamento só ganharem ilicitude típica já após a sua purificação, por só terem sido recebidas pelo seu beneficiário em data posterior aos alegados actos de branqueamento. Nestes casos não se verificaria o preenchimento dos elementos do tipo objectivo, nomeadamente a pré-existência, à acção de branqueamento, de vantagens ilícitas de “catálogo”.
Essa afirmação está sustentada numa interpretação da factualidade descrita na acusação que desassocia o momento das “entregas” do momento dos “recebimentos” das vantagens, deslocando a consumação material dos crimes de corrupção para a data em que as vantagens indevidas teriam chegado materialmente ao seu destinatário final ou ao pagamento de despesas deste.
Como antes vimos, esta deslocação do momento da apropriação para a data em que o agente do crime subjacente entrou na “posse material” dos fundos já foi sufragada no crime de abuso de confiança.
Este raciocínio, nos termos em que é formulado pela decisão recorrida, carece de razão, porquanto em termos jurídicos a data dos recebimentos das vantagens é exactamente o mesmo da data das respectivas entregas, não havendo lugar à dissociação destes dois momentos.
Na verdade, à semelhança da doutrina e da jurisprudência citadas no tratamento teórico desta concreta questão, entendemos não serem as datas das efectivas entregas - no sentido de materiais - dessas vantagens indevidas ao seu beneficiário final que relevam para a fixação das datas das suas ocorrências (sendo que em relação à maior parte das vantagens essas entregas materiais ao destinatário final nem se chegaram a verificar), na medida em que as mesmas circularam e foram depositadas em nome de terceiros desde a data em que foram disponibilizadas na sua origem com o acordo do beneficiário.
O beneficiário teve o domínio do destino e da utilização dos fundos em datas muito anteriores, servindo-se, voluntariamente, de terceiros, para o efeito.
Tomemos por exemplo o crime de branqueamento 3: crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, CC, HH, BB e II, relativamente à utilização, entre 2006 e 2008, de contas na ... em que o arguido II era autorizado e operações financeiras realizadas a partir das mesmas, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.
A circulação dos fundos nos termos constantes do diagrama III foi (de acordo com a acusação) acordada entre os arguidos AA, CC, HH, BB e II (ver artigos 2546, 2549 da acusação).
Este acordo referente ao “caminho” deste dinheiro, pré-definido entre os 5 arguidos, em cujo esquema de circulação estiveram sempre comprometidos, parece ter sido desconsiderado na decisão recorrida, apesar do seu relevo capital.
Também resulta abundantemente da acusação que, quer o arguido II, quer o arguido BB, actuaram sempre como “testas de ferro”/parqueadores  das  vantagens indevidas pagas ao arguido AA, em razão do que, quando aqueles recebem os fundos, em particular, desde logo, o arguido II, fá-lo em nome e no interesse de AA, com conhecimento e a mando deste, o que igualmente já estava previsto e acordado entre os cinco arguidos.
Nesta medida, pelo menos num processo lógico mental, o destinatário dos fundos - arguido AA - tomou deles posse (no sentido de ter o seu destino nas suas mãos, de ter uma relação de domínio sobre os mesmos) a partir do momento em que foram disponibilizados na sua origem, dado que a circulação e depósito desses fundos em várias contas de terceiros decorreu da sua vontade e até a seu benefício.
Teremos, pois, de concluir que, para efeitos de fixação da data do recebimento das quantias branqueadas pelo arguido AA, os momentos relevantes são as datas da disponibilização das vantagens na sua origem.
O que se acaba de dizer, apesar de nos parecer claro, não foi tido em conta na Decisão recorrida, onde se dissociaram as datas dos recebimentos das vantagens das datas das suas entregas,  em razão do que a construção jurídica em que a decisão sob censura se baseou perde sustentação.
Posto a claro qual é o momento relevante para efeito de fixação da data do “recebimento das vantagens” por parte do arguido AA, cai por terra o argumento decisório de não pronúncia fundado na circunstância de os actos típicos do branqueamento do capital terem ocorrido em data anterior ao do seu “recebimento” (que, repete-se, não tem de ser material) por parte do beneficiário.
O raciocínio é válido para todos os restantes crimes de branqueamento que têm como crime-base um dos crimes de corrupção em que esta “linha” decisória é invocada e em que os fundos, com o acordo de todos os arguidos, nomeadamente da pessoa a quem eles se destinavam, transitaram e/ou estiveram parqueados formalmente em nome de terceiros e em que a decisão recorrida fixa a data do recebimento em momento ulterior ao da entrega.
Quanto aos crimes 18 e 19 (crime de branqueamento praticado em co-autoria pelos arguidos CC e RR  e  crime de branqueamento praticado em co-autoria pelos arguidos CC e SS), em que os fundos passaram directamente do corruptor (através da utilização de sociedades instrumentais) para o seu beneficiário (também com utilização de sociedades instrumentais), a tese da Decisão instrutória menos se percebe, na medida em que a entrega teve lugar directamente para o beneficiário, embora com uso de sociedades instrumentais.
Não faz sentido fazer apelo à violação do princípio “ne bis in idem”, dado que, ao contrário do defendido em sede de decisão recorrida, os actos de circulação que se seguem à disponibilização do capital na sua origem (com o objectivo de ocultação do dinheiro em si, da sua origem e do seu destino) não constituem em simultâneo actos materiais de execução material do crime de corrupção subjacente, estando para além da simples entrega das vantagens ilegítimas, constituindo antes acções típicas do crime de branqueamento, que acrescem àquela.
1.3.8.4.2.10 as “vantagens”, ditas branqueadas, sempre seriam actos de pagamento abrangidos pelo tipo dos crimes subjacentes, sem autonomia punitiva? A interpretação contrária é violadora do princípio clássico “ne bis in idem”?
Tal entronca com a questão da existência de um concurso efetivo (ou meramente aparente) entre o crime de branqueamento e o que lhe precede, em particular quanto aos autobranqueadores.
Aqui, os crimes em causa são:
CRIME 1 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, BB e GG, relativamente aos movimentos financeiros com origem no Grupo LENA, com passagem pelas contas da ... tituladas pelo arguido GG, realizados a partir de 2007, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.
CRIME 2 - Um crime de branqueamento  praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, BB, GG, a sociedade LEC SA e a sociedade XLM, relativamente à utilização da sociedade XLM, entre 2009 e 2015, para a colocação de fundos destinados ao arguido AA e utilização dos mesmos no seu interesse, através do pagamento de despesas e de distribuição de dividendos para contas tituladas pelo arguido BB, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do  Código Penal.
CRIME 3 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, CC, HH, BB e II, relativamente à utilização, entre 2006 e 2008, de contas na ... em que o arguido II era autorizado e operações financeiras realizadas a partir das mesmas, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.
CRIME 4 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, CC, HH, II e BB, relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados no ano de 2007 e até ao início de 2008, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal.
CRIME 5 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, CC, HH, BB e GG, relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados a partir de 2008, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, com intervenção das contas da ... do arguido GG, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal.
CRIME 6 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, CC, HH, BB, GG, as sociedades LEC SA, LEC SGPS, LENA SGPS e XLM, relativamente aos movimentos financeiros ocorridos a partir de 2010, abrangidos pela operação CEL_2010, justificados através de contrato promessa de compra e venda com perda de sinal referente ao imóvel ..., sito em ..., e introdução desses fundos no Grupo LENA, p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.
CRIME 7 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, BB, GG, DD, EE, FF e JJ, relativamente às transferências com origem em conta do cidadão ... KK, referente aos financiamentos concedidos ao Grupo Vale do Lobo, com passagem por conta bancária da ... do arguido GG, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.
CRIME 11 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, BB e LL, quanto a aquisição de imóveis em Portugal, com o retorno do preço pago para a esfera patrimonial do arguido AA, de forma justificada, factos ocorridos entre 2010 e 2012, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.
CRIME 17 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos BB, GG, PP e QQ,  relativamente a utilização da sociedade XMI e sua contabilidade, para a colocação de fundos na esfera patrimonial do arguido QQ, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.
CRIME 18 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos CC e RR,  relativamente aos pagamentos PT e CEL_2010, realizados entre 7 de Dezembro de 2007 e 20 de Setembro de 2011, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES (e com destino para as contas de que era beneficiário RR), p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.°s 1, 2 e 3, do Código Penal.
CRIME 19 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos CC e SS,  relativamente aos pagamentos PT e CEL_2010, realizados entre 9 de Julho de 2007 e 23 de Novembro de 2012, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES (e com destino para as contas de que era beneficiário SS), p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.°s 1, 2 e 3, do Código Penal.
CRIME 20 - Um crime de branqueamento praticado, a título de cumplicidade, pela arguida JJ (do qual é autor material o arguido DD, pronunciado nos termos da acusação por este ilícito criminal, tendo já sido julgado pelo mesmo em processo separado), relativamente à transferência de fundos para Portugal, com origem em contas tituladas pelas sociedades em offshore EMP07... e EMP08... na ..., com utilização da sociedade EMP09... LDA., p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.
CRIME 21 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos CC e SS, relativamente à transferência de €3.967.611,00 (CHF 4.900.000,00), com origem em conta do banco PICTET titulada por SS e com destino a conta do Banco LOMBARD ODIER titulada pela sociedade em offshore EMP05..., controlada pelo arguido CC, em 22 de Novembro de 2011, p. e p. pelo art.368°A, n.º 1, 2 e 3, do Código Penal.
Como se evidencia nos diagramas associados aos crimes, estão em causa repetidos actos de circulação de enormes volumes de fundos (de mais de três dezenas de milhões envolvendo o arguido AA na qualidade de agente corrompido, a que acrescem pelo menos cerca de 45 milhões envolvendo os arguidos RR e SS nessa mesma qualidade, só para mencionar os números mais relevantes).
A maior parte desses fundos circularam por contas sediadas em paraísos fiscais, que o mesmo é dizer à volta do mundo (a título de exemplo ..., ...).
Para o efeito foram criadas e/ou utilizadas sociedades offshore “fantasma” e contas bancárias sediadas nos referidos paraísos fiscais em “sistema de duplas associadas”, algumas sem identificação dos beneficiários e até alfanuméricas.
A circulação dos mesmos fundos ocorreu, não raramente, por vários titulares formais - pessoas singulares e colectivas - num processo de execução sucessiva.
Essa circulação de fundos foi planeada e exigiu a montagem de esquemas complexos, idealizados por estruturas de gestão de fortunas (que para isso foram contactadas e contratadas pelos arguidos), com a colaboração de bancos, em particular ..., com o que tal representará em termos de custos desses serviços prestados, cujos montantes globais não se mostram apurados.
A disponibilização dos fundos e a respectiva circulação foram, na maior parte das vezes, formalmente justificados por manobras contabilísticas (na origem dos pagamentos) e por contratos simulados de natureza diversa (relativamente aos  intermediários), especialmente de prestação de serviços, sem aderência à realidade, com o que isso representa mais uma vez em termos de assunção de custos, não só fiscais, com os IVAs, mas também com o pagamento dos serviços intermediação desses terceiros (e falamos de milhões de euros só para esta “rúbrica” – mais de 5 milhões para o arguido HH, cerca de 2.5 milhões para o arguido BB, só para falar dos valores mais significativos).
A densidade dessas operações, o número de pessoas singulares e sociedades nelas envolvidas, os muito significativos custos associados a tais esquemas (quer na parte referente à sua montagem, quer no pagamento dos serviços de intermediação, quer nas obrigações legais decorrentes da criação dos contratos justificativos, quer nas inúmeras viagens ao estrangeiro que foram realizadas por alguns dos arguidos por necessidades relacionadas com a montagem destas operações) só por excesso de vontade poderão ser consideradas uma simples forma de realizar pagamentos/recebimentos indevidos dos crimes subjacentes e considerar que tais modos de pagamento/recebimento representam uma forma “normal” ou “usual” de serem realizados, com ocultação, por ser “natural” que quem receba vantagens indevidas queira esconder a sua origem.
A aceitar a tese da decisão recorrida de que estes esquemas, apesar da sua dimensão e complexidade, constituem apenas modos de ocultar um pagamento/recebimento indevido, importa questionar que concretos casos poderão caber no crime de branqueamento de vantagens oriundas da prática de um crime de corrupção subjacente.
A perfilhar o entendimento da decisão recorrida, porque razão o legislador consagrou como vantagens ilícitas de “catálogo” do crime de branqueamento os advindos do crime de corrupção?
Não ficaria o crime de branqueamento, nesta vertente, esvaziado de conteúdo e, por isso, de razão de ser?
Por outro lado, o crime de branqueamento não visa, precisamente, ocultar a origem do recebimento das ditas vantagens indevidas advinda da prática do crime de corrupção? Parece-nos que a resposta não pode deixar de ser afirmativa.
Nesta medida, realizar pagamento de vantagens advindas da prática de um crime de corrupção de forma oculta não é, precisamente, branquear a existência e origem dessas vantagens? A resposta continua a ser, quanto a nós, afirmativa.
Como pode ler-se no Ac. da RG, datado de 02 Maio 2023, processo número 1391/20.2T9BRG.G1, disponível em jurisprudência. PT:
Com efeito, no artigo 368.º- A do Código Penal são punidos pelo crime de branqueamento os agentes que, através de uma qualquer operação de conversão, transferência ou outras, procurem dissimular a origem ou natureza ilícitas dos bens a branquear e/ou procurem evitar que o autor ou participante dos crimes subjacentes seja criminalmente perseguido ou submetido a uma reacção criminal.
Como já em 1992 bem acentuava o Prof. Faria Costa (“O branqueamento de capitais: algumas reflexões à luz do direito penal e da política criminal, Boletim da Faculdade de Direito LXVIII, 1992, págs. 59-86  reproduzido em Direito Penal Económico e Europeu: Textos Doutrinais, vol. II- Problemas Especiais, Coimbra, 1999, págs. 301-320) o fim visado com a prática do crime de branqueamento é sempre a dissimulação da origem ilícita dos bens a branquear, ou evitar que os autores ou participantes dos crimes-base sejam criminalmente perseguidos e submetidos a uma sanção penal.
O Prof. André Lamas Leite,  O crime de branqueamento na recção da lei n.º 83/2007, de 18/8: a importância de ver para além das aparências, cit., pág. 72-73,  esclarece também que “[o] que empecilha o funcionamento da administração da justiça é exactamente o conjunto de esquemas mais ou menos complexos em que o autor do ilícito antecedente ou um terceiro o que convoca , na primeira hipótese , o problema do chamado autobranqueamento), visa ‘apagar o rasto’ das vantagens ilícitas, usando jurisdições de sigilo, transferências entre contas bancárias, transmissões amiúde simuladas de bens, compra e venda de instrumentos financeiros de todo o tipo”.
Dito isto, não podemos, de todo, subscrever o entendimento vertido na decisão instrutória de que a circulação dos fundos dos crimes em apreço constituem apenas e tão só uma forma dita “normal” de realizar os pagamentos/recebimentos indevidos associados aos crimes subjacentes de corrupção e abuso de confiança (recebimentos que, repetimos, do ponto de vista jurídico já haviam ocorrido antes desses actos de branqueamento) e possam ser considerados apenas uma forma de ocultar os mesmos - como se ocultar os mesmos não fosse já branquear - fazendo, por isso, ainda parte da consumação material dos crimes subjacentes.
Entrando na temática da relação unitária ou plural entre o crime de branqueamento e o que lhe precede, em particular quanto aos autobranqueadores, como já deixámos expresso, não acolhermos, a par da grande maioria, a tese da impunidade do crime de branqueamento, mesmo quando cometido pelo mesmo autor do crime precedente de corrupção, existindo um concurso efectivo de crimes entre ambos, pelas razões já exaradas e que nos dispensamos de repetir.
Mostra-se igualmente afastada a consideração da violação do princípio constitucional  “ne bis in idem”, na vertente substantiva, por dupla valoração das manobras de circulação dos fundos - a um tempo enquanto modo de pagamento (dito com ocultação) das vantagens nos crimes subjacentes, fazendo ainda parte da consumação (mais que não seja material) dos crimes base, e a outro enquanto acções típicas dos crimes de branqueamento - não só porque os bens jurídicos ofendidos são distintos, como ainda porque, na realidade, tais manobras de circulação dos fundos ocorreram após o recebimento (em termos jurídicos) dos fundos pelo seu beneficiário, constituindo acções que estão para além da materialidade típica dos crimes base, mesmo levando em consideração a consumação material do crime de corrupção, ou seja, mesmo desvalorizando a circunstância de os crimes de corrupção poderem ser considerados consumados logo aquando da promessa/aceitação do pagamento da vantagem indevida.
No que concerne ao crime de BRANQUEAMENTO 1 (crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, BB e GG, relativamente aos movimentos financeiros com origem no Grupo LENA, com passagem pelas contas da ... tituladas pelo arguido GG, realizados a partir de 2007, p. e p. pelo art.º 368.°-a, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal) a Decisão recorrida invoca ainda uma outra (nova) violação do princípio “ne bis in idem”, assente na circunstância de as quantias alvo das acções de branqueamento acusadas terem sido objecto de novas acções de branqueamento, no chamado processo de “concentração” e repatriamento ao abrigo do RERT II - crime de branqueamento número 8 (crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA e BB, relativamente à concentração dos fundos em novas contas bancárias da ..., tituladas por sociedades em offshore controladas por BB e sua transferência para contas tituladas por este último arguido em portugal, ao abrigo do RERT II, previsto e punido pelo art.º 368.°-a, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal).
Os  mesmos fundos ter-se-iam constituído como substrato factual de dois crimes de branqueamento imputados aos mesmos arguidos AA e BB.
Esta problemática reconduz-se, na verdade, a uma outra já abordada nas questões teóricas e que é a de saber se a sujeição dos mesmos fundos ilícitos típicos de “catálogo” a mais do que uma acção branqueadora, num processo de actos sucessivos, preenche diversas vezes o mesmo tipo legal, por haver várias ofensas ao mesmo bem jurídico, ou se, pelo contrário, a ofensa é única, embora num processo contínuo de intensificação à medida em que forem recaindo novas acções branqueadoras sobre o mesmo capital levadas a cabo pelos mesmos agentes.
Como quer que seja, não faz o menor sentido a decisão recorrida suscitar a alegada violação do princípio “ne bis in idem” com os fundamentos mencionados no âmbito deste concreto crime de branqueamento 1, local onde, de acordo com a sua leitura, ocorre a chamada “primeira valoração” da factualidade dita duplamente valorada.
Na verdade, a existir dupla valoração da mesma factualidade, esta duplicidade valorativa teria de ser apreciada no crime onde a valoração é proibida, que é a segunda - só aí se tornando dupla - e não no crime onde se verifica a “primeira valoração”.
Revertendo para o caso dos autos, verifica-se que, de acordo com a própria decisão recorrida, a denominada segunda valoração do mesmo substrato factual não ocorreu no crime onde a questão é suscitada e valorada - crime de branqueamento 1 -, mas no crime de branqueamento 8, cujos novos actos de branqueamento são posteriores e recaem sobre fundos já objecto de anteriores acções de purificação.
A ser assim - como supomos ser - este argumento decisório não poderia ter obstado à pronúncia deste concreto crime de branqueamento 1, onde ocorre a chamada “primeira valoração” dos factos.
Na economia da própria decisão recorrida o apelo a esta linha decisória também peca por uma outra incoerência. É que o crime de branqueamento onde teria ocorrido a segunda valoração - crime 8 - até já tinha sido alvo de decisão de não pronúncia, por nulidade decorrente da utilização dos documentos referentes ao RERTII, o que tanto bastava para não poder existir a invocada dupla valoração juridicamente relevante.

1.3.8.4.3 TEMÁTICAS REFERENTES AO TIPO SUBJECTIVO DO CRIME DE BRANQUEAMENTO.
A decisão sob censura fundamenta a não pronúncia de diversos crimes de branqueamento na falta da alegação do dolo: ora do dolo do tipo, ora do dolo da culpa, ora do dolo específico.
Não entraremos na querela de saber se a falta da narração de todos os elementos subjectivos do tipo conduz à declaração de nulidade da acusação ou à improcedência da acusação, por ser inútil ao desfecho do recurso.
Vejamos, então, quais são os elementos do tipo subjectivo deste crime e as questões jurídicas com interesse para a decisão que são alvo de discussão na comunidade jurídica.
1.3.8.4.3.1 Considerações prévias
É sabido que qualquer ilícito criminal está assente numa construção bipartida: o tipo objectivo e o subjectivo.
Não há dúvida de que o tipo subjectivo, por conter em si mesmo, factos juridicamente relevantes para a existência do crime, a punibilidade e a determinação da pena ou medida de segurança aplicável (art.º 124º, do CPP), tem de ser preenchido por factos.
A sua natureza de factos interiores, que operam no pensamento do agente (em contraposição com factos exteriores reportados à acção) não os dispensa da necessária prova (com recurso a presunções naturais e/ou às regras da experiência comum) e, nessa medida, da necessária alegação em sede de acusação, desde logo por exigência do princípio do acusatório e, não menos importante, para garantia dos direitos de defesa do arguido.
Aliás, como é sabido, o Supremo Tribunal de Justiça, no acórdão n.º 1/2015, de 20.11.2014 (publicado no D.R. n.º 18, Série I, de 27.01.2015) fixou jurisprudência no sentido de a falta de descrição na acusação dos elementos subjectivos do crime (seja a falta absoluta, seja a falta relativa, por deficiente ou incompleta descrição) não poder ser integrada por recurso ao mecanismo previsto no art.º 358º, do CPP.
A dedução da acusação deverá, por isso, ser especialmente cuidadosa no que tange à alegação do tipo subjectivo, na medida em que esta não pode ser integrada nem completada posteriormente, redundando, uma acusação mal deduzida a esse nível, na impossibilidade de se concluir pela existência do crime.
Partilhamos o entendimento de que o dolo, tal qual a negligência, não podem ser presumidos (in re ipsa), possibilidade que se mostra expressamente afastada no referido Acórdão n.º1/2015, onde se afirma: “De forma alguma será admissível que os elementos dolo, quando não descritos na acusação, possam ser deduzidos por extrapolação dos factos objectivos, com recurso à lógica, à racionalidade e à normalidade dos comportamentos (…)
Tal equivaleria a conceptualizar o dolo como emanação da própria factualidade objectiva, ou como inerente a essa factualidade, um "dolus in re ipsa" (…)”.
Na verdade, o Direito Penal não é compatível com uma responsabilidade objectiva e a presunção do dolo (ou da negligência) remeter-nos-ia para algo dessa natureza.
Não obstante, entendemos:
  • Não se impor que a narração do tipo subjectivo esteja concentrada numa parte da acusação, sem prejuízo de o convir, por clareza e facilidade.
  • Não se impor que essa narração seja traduzida numa qualquer fórmula clássica e sacramental - do tipo agiu livre (com o significado de poder agir de modo distinto, em conformidade com o direito), voluntária ou deliberadamente (vertente da vontade de realização do facto) e conscientemente (com o significado de ter conhecimento ou de ter representado na sua consciência todas as circunstâncias do facto), sabendo que a sua conduta não era permitida (ter consciência da proibição ou da ilicitude), ou qualquer outra equivalente  - por tal nos remeter para exigências formalistas excessivas e contrárias, até, ao desiderato da procura da verdade material.  Ademais, tais fórmulas constituem, em si mesmas, juízos genéricos e abstractos, cujo preenchimento e fundamentação não dispensam a prova de materialidade dispersa na descrição objectiva da materialidade imputada ao arguido na acusação e que, coadjuvada por juízos probatórios de inferência, darão corpo a essas afirmações.
  • Por fim, a acusação deve ser lida e interpretada de modo global, e não de modo sectorial, em razão do que, na busca da narração do elemento subjectivo do tipo haverá que realizar esse exercício. Neste sentido, veja-se o teor do acórdão do STJ de 7 de Maio de 1997 (http://www.gde.mj.pt/jSTJ.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/031101a9e55f69a980256a8c003532cf?OpenDocument), onde se lê: “I - A acusação, à semelhança de qualquer outro texto, mesmo que não jurídico, não pode ser lida e interpretada sectorialmente e em função de frases isoladas, mas antes globalmente. II - É lícito ao tribunal explicar com pormenores os factos constantes do despacho acusatório e dar como assente matéria de facto que é mero desenvolvimento dos factos que dele constavam, desde que não saia do âmbito do seu conteúdo fáctico, nem com essa pormenorização agrave a posição processual do arguido”.
    É frequentemente possível perscrutar na acusação os elementos do tipo subjectivo de forma dispersa, sem recurso à fórmula sacramental concentrada normalmente na parte final da acusação, peça processual que terá de ser, além do mais, interpretada globalmente, sem cair, no entanto, na tentação de se presumir o dolo do agente.
    1.3.8.4.3.2 Do dolo genérico: dolo do tipo e dolo da culpa, ou basta o dolo do tipo.
    O crime de branqueamento é, no sistema penal português, um crime doloso, não admitindo a forma negligente. Nesta parte o consenso jurídico é total.
    É consensual que o CP não define o que deva entender-se por dolo, prevendo apenas as três variações possíveis, dentro do respectivo elemento volitivo do chamado dolo do tipo.
    A integração do conceito de dolo tem suscitado acérrimas divisões doutrinais e jurisprudenciais, entendendo uns que o dolo se resume ao “dolo do tipo” e outros que terá de se lhe acrescentar o “dolo da culpa”.
    Seguindo a doutrina de Eduardo Correia, mais tradicional, o dolo restringe-se ao dolo do facto ou do tipo e compreende dois elementos: o elemento intelectual ou cognitivo, traduzido na representação, previsão, consciência psicológica ou conhecimento da materialidade que preenche um ilícito típico, seja quanto aos elementos típicos descritivos, seja quanto aos elementos típicos normativos (de seguida abordaremos a temática do grau de conhecimento destes); O elemento volitivo, traduzido na vontade de realização daqueles elementos do ilícito-típico, vontade essa que pode assumir várias intensidades, nos termos definidos no art.º 14º, do CP: com intenção de realizar o facto típico (dolo directo), com aceitação da realização dos elementos do tipo objectivo como consequência necessária da conduta (dolo necessário), com conformação ou indiferença pela realização do resultado previsto como possível (dolo eventual).
    Para esta tese a culpa é um pressuposto da infracção, mas não integra o dolo.
    A culpa é uma questão puramente normativa, que tem a ver com as questões da imputabilidade (a “capacidade de culpa”, a que alude o termo habitual “agir livremente”), da consciência da ilicitude (traduzida na fórmula comum “bem sabia que a sua conduta era proibida e punida por lei” ou expressão sinónima) e da exigibilidade de conduta diversa.
    A “capacidade de culpa” é imanente à idade e encontra-se aferida legalmente pela negativa, no sentido de que, em condições de normalidade, ela só não é reconhecida aos menores de 16 anos, sem prejuízo de outras causas específicas de inimputabilidade (artigos 19º e 20º do CP), que têm de ser alegadas e provadas.
    A consciência da ilicitude é também presumida, em particular no Direito Penal clássico, nos chamados «crimes em si», sem prejuízo das excepções previstas  no art.º 17º, do CP, se existir erro sobre a ilicitude, que pode, ou não, excluir totalmente a culpa.
    Nesta medida, para esta tese, a “capacidade de culpa” e a “consciência da ilicitude”, não respeitam ao dolo, mas à culpa e, por este facto, não têm de ser alegadas na acusação, nem provadas, para o preenchimento do ilícito típico.
    Já de acordo com a doutrina de Figueiredo Dias ao dolo do tipo (composto pelos aludidos dois elementos intelectual e volitivo) haverá que acrescentar  um terceiro elemento, traduzido no “dolo da culpa”, sem cuja alegação e prova não se mostra preenchido o elemento subjectivo do tipo de ilícito, consubstanciando, assim, mais um pressuposto subjectivo da responsabilidade criminal.
    Trata-se do elemento emocional, traduzido na atitude de indiferença ou sobreposição da vontade do agente aos valores protegidos pela norma e fazendo parte do tipo de culpa doloso, elemento que é dado, em princípio, pela consciência da ilicitude (versando de forma desenvolvida sobre as duas posições doutrinais, veja-se, por exemplo, o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra datado de 13.09.2017, processo 146/16.3PCCBR.C1, disponível em www.dgsi.pt.)
    Esta relevante querela tem sofrido periódicos reacendimentos na jurisprudência, podendo ser citados em abono da primeira tese, a título meramente exemplificativo, os bem fundamentados:
    Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, processo n.º 251/15.3GESTB.E1, datado de 12.03.2019,  relatado por António João Latas (à semelhança de outros Ac. do mesmo relator no mesmo sentido), disponível em www.dgsi.pt, assim sumariado, na parte mais relevante: I - A jurisprudência fixada na AFJ nº 1/2015 do STJ não se reporta à exigência de articulação da “consciência da ilicitude” na acusação, pois o objecto daquela fixação de jurisprudência, ditado pela questão relativamente à qual se verificou oposição de julgados, centrou-se na inaplicabilidade do mecanismo previsto no art. 358º do CPP para a alteração não substancial de factos aos casos de falta de descrição, na acusação, [dos factos integradores] dos elementos subjectivos do crime - máxime o dolo –, não se afirmando explicitamente na fixação de jurisprudência que “a consciência da ilicitude” teria que ser autonomamente descrita na acusação e julgada provada na sentença, para que o arguido pudesse ser condenado pelo crime doloso respectivo. II - Assim, não tendo que constar da acusação e da sentença a locução “o arguido agiu com consciência da ilicitude” ou semelhante, não há sequer lugar ao cumprimento do disposto no art. 358º do CPP, pelo que se impõe proceder ao enquadramento jurídico-penal dos factos e à determinação concreta da pena a aplicar. (…)
    Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, processo n.º 82/22.4GCVFR-A.P1, de 21.06.2023, disponível em www.dgsi.pt, onde se escreve que “a consciência da ilicitude não é elemento constitutivo dos tipos criminais definidos pela lei penal por tal interpretação estar próxima do nosso código penal que contém elementos que suportam a teoria finalista da acção que separa a culpa da tipicidade, posição”, afirmação suportada essencialmente nos seguintes fundamentos: Em primeiro lugar, do artigo 14º do CP descortina-se que o elemento subjectivo do tipo é composto por dois elementos: o elemento intelectual ou cognitivo (conhecimento de realização do facto) e o elemento volitivo (vontade de realização do facto). Em segundo lugar, do artigo 14º do CP não se encontra qualquer menção à consciência da ilicitude porque precisamente a mesma se reporta à culpa e não ao dolo (diferentemente, a exclusão do dolo opera nas situações em que o agente se encontra em erro sobre as circunstâncias de facto, nos termos previsto no artigo 16º do CP).Em terceiro lugar, da conjugação dos artigos 20º nº 1 e 91º nº 1 resulta que pode haver prática de factos típicos (incluindo naturalmente o tipo objectivo e subjectivo) sem consciência da ilicitude ou capacidade de avaliação ou actuação de acordo com essa avaliação.
    Em quarto lugar, a falta de consciência da ilicitude encontra-se prevista autonomamente como causa de exclusão da culpa no artigo 17º, n.º 1 do CP. (que ao determinar que a falta de consciência da ilicitude exclui a culpa mas não o dolo, mostra que a culpa não faz parte do tipo subjectivo de ilícito).bEm quinto lugar, a consciência da ilicitude assume autonomia apenas nos casos em que se discuta a sua falta, ou seja, sempre que, atendendo à natureza do crime – não se incluindo este nos crimes de direito clássico nos quais a referida consciência está implícita no preenchimento dos elementos objectivos e subjectivos do tipo, em especial o dolo – se encontre controvertida a verificação de tal elemento enquanto causa de exclusão a culpa nos termos previstos no artigo 17º do CP. (…)         E mais à frente menciona:
    Não olvidamos que o acórdão do STJ n.º 1/2015, de 20.11.2014 (publicado no D.R. n.º 18, Série I, de 27.01.2015) fixou a seguinte jurisprudência uniformizadora: “A falta de descrição, na acusação, dos elementos subjectivos do crime, nomeadamente dos que se traduzem no conhecimento, representação ou previsão de todas as circunstâncias da factualidade típica, na livre determinação do agente e na vontade de praticar o facto com o sentido do correspondente desvalor, não pode ser integrada, em julgamento, por recurso ao mecanismo previsto no art.º 358.° do Código de Processo Penal.”. A propósito da consciência da ilicitude o referido acórdão uniformizador refere o seguinte (no ponto 10.2.3.1): “Quanto à consciência da ilicitude, é evidente que ela é uma exigência da actuação dolosa do agente na realização do ilícito típico. Porém, a sua compreensão dogmática coloca-se a um outro nível e tem a ver com a questão da relevância do erro sobre a ilicitude, contemplada no art.º 17.º do CP. O erro sobre a ilicitude não exclui o dolo, ao contrário do erro sobre a factualidade típica, na qual se pode incluir, em certas circunstâncias, como as já referidas, o conhecimento sobre proibições legais. Fica, porém, ressalvada, quanto a este tipo de erro, a punibilidade da negligência nos termos gerais (art.º 16.º). O erro sobre a ilicitude exclui a culpa, se o erro não for censurável ao agente (sendo uma causa de exclusão da culpa), mas faz persistir o dolo, no caso de o erro ser censurável. Daí que o facto praticado sem consciência da ilicitude seja equiparável ao praticado com essa consciência, desde que não possa afastar-se a censurabilidade de tal erro. Escreve FIGUEIREDO DIAS, cujas ideias básicas, muito pela rama, intentamos transpor para aqui, que a razão de ser da diferença entre o regime do erro sobre proibições, cujo conhecimento seja razoavelmente indispensável para o agente tomar conhecimento da ilicitude (art.º 16.º), conduzindo à exclusão do dolo do tipo, e o erro sobre o carácter ilícito do facto (art.º 17.º), fundamentador do dolo da culpa, está em que «neste último caso, o erro não radica ao nível da consciência psicológica (ou consciência intencional […]), mas ao nível da própria consciência ética (ou consciência dos valores (…), revelando a falta de sintonia com a ordem dos valores ou dos bens jurídicos que ao direito penal cumpre proteger», ao passo que, no primeiro caso, trata-se da «falta de conhecimento necessário a uma corretã orientação da consciência ética do agente para o desvalor do ilícito (Direito Penal, cit., pp. 356 e ss. e 531 e ss.). Diz ainda o mesmo Autor, noutra passagem da mesma obra, que o que se visa com a exigência do conhecimento, representação ou consciência (psicológica ou intencional) de todas as circunstâncias do facto realizador de um tipo de ilícito objectivo, é que o agente conheça tudo quanto é necessário a uma corretã orientação da sua consciência ética para o desvalor jurídico que concretamente se liga à acção intentada, para o seu carácter ilícito; porque tudo isso é indispensável para se poder afirmar que o agente detém, ao nível da sua consciência intencional ou psicológica, o conhecimento necessário para que a sua consciência ética, ou dos valores, se ponha e resolva correctamente o problema da ilicitude do comportamento [ob. cit., p. 351).”
    Sendo discutível se a jurisprudência fixada no referido acórdão  também se aplica ao conhecimento da ilicitude independentemente do tipo de crime, afigura-se-nos que, da leitura dos segmentos da fundamentação do referido acórdão uniformizador a jurisprudência fixada no acórdão, não se aplicará à omissão na acusação dos factos integradores do conhecimento da ilicitude pelo menos quando o relevo axiológico do crime em causa – por enraizado ou difundido na comunidade – decorre da própria natureza do facto típico e das circunstâncias da prática dos factos (neste sentido, entre outros, Ac. TRP de 13.06.2018 e 12.07.2017, Ac. do TRE de 06.02.2018, relatado por António João Latas, Ac. do TRE de 19.12.2019, e Ac. do TRE de 14.03.2023, , todos acessíveis em www.dgsi.pt).
     Também nós propendemos, pelo mesmo conjunto de razões, para a primeira das teses, que dispensa a necessidade de ser alegado e provado, no direito penal nuclear, a consciência da ilicitude, em virtude de esta se apresentar presumida, havendo antes que alegar e provar factos que a contrariem ou ilidam, se e quando for o caso, a tal não se opondo, na nossa leitura, o acórdão uniformizador n.º 1/2015.
    1.3.8.4.3.3 Da admissibilidade do dolo eventual no crime de branqueamento
    Como já se disse, o elemento volitivo do dolo do tipo pode assumir uma das três colorações previstas no art.º 14º, do CP: o dolo directo ou intencional (em que o agente prevê e quer, intencionalmente, a realização do facto típico), o dolo necessário (em que o agente sabe com segurança que, em consequência de uma sua conduta, preencherá um tipo legal de crime, aceitando este resultado, pois que não se abstém de empreender a conduta) e o dolo eventual (em que o agente sabe que como consequência possível ou provável da sua conduta preencherá um tipo legal de crime, conformando-se com esse facto).
    No dolo eventual há um enfraquecimento ou uma menor intensidade do dolo do tipo, não só porque esta modalidade do dolo se basta com a previsão da probabilidade da ocorrência (hipotética, portanto) da prática do crime, bastando a conformação  com o resultado, não sendo a prática do crime um objectivo do próprio agente.
    Para Maria Fernanda Palma, em “Da Tentativa Possível em Direito Penal”, Almedina, 2006, págs. 79 a 81, “na situação de dolo eventual o agente, ao aceitar o risco da verificação do resultado típico (“conformando-se” com ele, nos termos do n.º 3 do artigo 14º do Código Penal), preferindo-o aos custos da não realização da sua conduta, inclui essa aceitação nos fundamentos da sua decisão e opta pela lesão do bem jurídico. Na perspectiva do desvalor da acção, do ilícito, não há qualquer razão para diferenciar qualitativamente o dolo eventual”.
    No que concretamente respeita ao crime de branqueamento, antes da vigência do art.º 368.º-A, do CP,  a lei prescrevia “sabendo” que os bens são provenientes da prática dos crimes de (…), o que para muitos era interpretado no sentido de ser exigível o efectivo ou real conhecimento da origem ilícita de “catálogo”, circunstância que afastaria a prática do crime a título de dolo eventual.
    Face à redacção do art.º 368.º-A do CP, passou a ser maioritário o entendimento - que acompanhamos - de que o crime de branqueamento pode ser cometido a título de dolo eventual, quer no que respeita à origem de “catálogo” das vantagens, quer quanto à acção de branquear, bastando, desta forma, que o agente represente como possível aquela origem e, não obstante, transferir ou a converter as vantagens ilícitas de “catálogo”, conformando-se com tal possibilidade (origem ilícita de catálogo).
    Nas palavras de José António Henriques dos Santos Cabral (Juiz Conselheiro) em “Branqueamento de capitais e prova indiciária”, revista “Julgar online, Março de 2020”:  “Face à estrutura do tipo legal (….)  e à própria natureza daquele, o agente não tem de saber, ou representar como provável, que as vantagens provieram de um concreto ilícito típico ou de uma concreta categoria de factos ilícitos típicos. Por igual forma, também não lhe é exigível conhecimento quanto às circunstâncias de tempo, lugar e modo em que os crimes subjacentes foram praticados, ou a sua autoria, mas tão-somente terá de conhecer, ou admitir como provável, que os bens, que dissimula, ou branqueia, têm a sua origem em factos criminosos susceptíveis de integrar o catálogo legal.”.
    Também se afirma, no já referido Ac. do STJ, datado de 11.06.2014, processo 14/07.0TRLSB.S1, que: “A exigência do conhecimento por parte do agente da proveniência criminosa dos bens ou produtos sobre os quais, ou em relação aos quais actua, deve ser entendida como abarcando o dolo típico em todas as suas formas, incluído o dolo eventual. (Assim, Jorge Duarte, Luís Silva Pereira, Vitalino Canas, Victor Sá Pereira e Alexandre Lafayette, Miguez Garcia e Castela Rio. Contra, Faria Costa, Jorge Godinho).”
    Para um extenso desenvolvimento da posição de cada um dos autores, remete-se para a fundamentação deste concreto acórdão.
    Mais recentemente, veja-se o Ac. do TRG, processo n.º  393/15.5JABRG.G1, datado de 28.09.2020, disponível em www.dgsi.pt, assim sumariado, na parte ora em relevo: IV (…) Acompanhamos o entendimento perfilhado pela maioria dos autores e seguido na decisão recorrida, no sentido de que as condutas em causa no branqueamento de capitais podem ser preenchidas por qualquer uma das modalidades de dolo, sendo bastante para que o agente seja punido que represente como possível que os bens em questão estão relacionados com os crimes precedentes. Sendo maioritário este entendimento, o mesmo não é, no entanto, unânime. Em sentido contrário veja-se, por exemplo, Paulo Pinto de Albuquerque (em Comentário do Código Penal, Universidade Católica, 4ª edição actualizada, em anotação ao artigo 368º-A, pág. 1237), argumentando que “Quem quer esconder a origem ilícita da vantagem é porque sabe que essa vantagem tem proveniência ilícita”.
    Sendo maioritário este entendimento, o mesmo não é, no entanto, unânime. Em sentido contrário veja-se, por exemplo, Paulo Pinto de Albuquerque (em Comentário do Código Penal, Universidade Católica, 4ª edição actualizada, em anotação ao artigo 368º-A, pág. 1237), argumentando que “Quem quer esconder a origem ilícita da vantagem é porque sabe que essa vantagem tem proveniência ilícita”.
    Contra-argumentando: cremos que nada impede (e será hoje porventura até o mais frequente) que o autor do crime subjacente solicite a outrem a dissimulação da localização (ou outra acção típica) das vantagens ilícitas obtidas com a prática do crime base, não divulgando ao terceiro a concreta origem das mesmas, podendo o terceiro admitir como uma possibilidade a proveniência ilícita derivada de um crime grave catalogado no artigo 368º-A, n.º 1, e levar a cabo as condutas de branqueamento, conformando-se com essa possibilidade.
    Como quer que seja, sendo uma questão jurídica discutível, e porque a convolação do dolo directo em dolo eventual- in melius, portanto -  é processualmente possível, não deve, em sede de instrução, obstar-se ao prosseguimento de uma acusação para a fase de julgamento com base no argumento da falta de indícios do efectivo conhecimento (por parte de um agente branqueador que não participou no ilícito subjacente) da origem ilícita de “catálogo” das vantagens branqueadas quando do processo possam ser extraídos elementos que suportem uma eventual condenação a título de dolo eventual.
    1.3.8.4.3.4 Do grau de conhecimento da origem ilícita de “catálogo” das vantagens que é exigível ao agente.
    Tratando-se de um crime doloso, o dolo genérico do crime de branqueamento, para ser concordante com o tipo objectivo, terá de abarcar a proveniência ilícita “de catálogo” das vantagens, ficando por esta via estabelecida a ligação umbilical entre o crime sobrejacente e o crime subjacente ao nível do tipo subjectivo.
    A querela do grau de conhecimento dessa proveniência na realidade só se coloca quando o agente do crime de branqueamento não seja o mesmo do(s) crime(s) subjacente(s), pois que quanto aos autobranqueadores - como já alguém disse - é uma verdade de” La Palisse” que estes saibam a verdadeira origem das vantagens alvo do branqueamento.
    Assim, no dolo directo:
    O agente terá de representar (ao nível do elemento intelectual do tipo objectivo) que os fundos (no caso de capital) alvo das suas acções de conversão, transferência, ocultação ou dissipação derivam de um dos ilícitos de “catálogo”.
    Esse conhecimento da origem ilícita de “catálogo” das vantagens não tem de ser profundo ou sequer exacto, no sentido em que se basta com uma apreensão do significado social do elemento do tipo, sendo suficiente “uma valoração paralela na esfera do leigo”, chegando um conhecimento mínimo dessa origem, mesmo sem conhecer o concreto facto típico que esteve nessa origem, os autores ou o local da  sua prática, o qual pode até situar-se no estrangeiro.
    Ponto é que o agente saiba que a vantagem provém de, pelo menos um (qualquer), dos crimes previstos no n.º 1, do art.º 368º-A, do CP, na versão transcrita, admitindo-se até alternatividade relativamente a qual dos crimes de “catálogo” está na origem das vantagens.
    Nas palavras de Paulo Pinto de Albuquerque, em Comentário do Código Penal, Universidade Católica, 4ª edição actualizada (Agosto 2021), em anotação ao artigo 368º-A, página 1236: “Em qualquer caso, ao ponderar se os bens provêm de uma actividade criminosa e se a pessoa tinha conhecimento desse facto, há que ter em conta as circunstâncias específicas do caso, como “por exemplo o facto de o valor dos bens ser desproporcionado em relação aos rendimentos legítimos da pessoa acusada e de a actividade criminosa e a aquisição de bens terem ocorrido no mesmo período. A intenção e o conhecimento podem ser inferidos de circunstâncias objectivas e factuais (considerando 13.º da Directiva (EU) 2017/1673”.(…) o agente não tem de conhecer o concreto facto típico ilícito que esteve na origem da vantagem, nem o local onde foi praticado, nem os seus autores. Por outro lado é irrelevante o erro do agente no tocante ao concreto facto precedente. É suficiente que o agente saiba que a vantagem provém de um dos crimes pertencentes ao elenco do n.º 1 e que esse conhecimento seja contemporâneo da operação de branqueamento.”
    E nas de Pedro Caeiro em Direito Penal Económico e Europeu-Textos Doutrinários, volume III, 2009, Coimbra, pág. 412-417:
    “O dolo tem, portanto, de abranger a proveniência ilícita das vantagens, sc., o facto de estas provirem de um (ou vários) facto(s) constitutivo(s) dos ilícitos-típicos especificados ou puníveis com pena de prisão superior a 5 anos. Em qualquer dos casos, é suficiente a representação de que as vantagens provêm desses factos, não tendo o dolo de abarcar a identidade do agente nem a qualificação legal (o nomen jurídico) dos mesmos. No que diz respeito aos crimes designados através da cláusula geral de gravidade da pena aplicável, basta que o agente represente que as vantagens procedem de um facto que a lei efectivamente ameaça com pena superior ao limite indicado, sendo irrelevante, para efeitos de exclusão do dolo, o erro sobre as penas aplicáveis, já que só os factos precedentes, não as penas para eles cominadas, são elementos do tipo”.
    Dito de outro modo, o agente não tem de ter um conhecimento detalhado e pormenorizado do crime subjacente, sob pena de apenas umas poucas condutas serem abrangidas pelo tipo, sendo dispensável o conhecimento do tempo, do lugar, da forma de cometimento, do autor, da vítima do crime precedente, terá é de saber que as vantagens derivam de pelo menos de um dos crimes elencados no n.º 1, do artigo 368º-A e pretender, ainda assim, levar a cabo a conduta branqueadora típica das vantagens.
    Esse conhecimento terá de ser, obviamente, anterior ou contemporâneo à prática do facto, não podendo ser posterior.
    Já no dolo eventual, para quem o admita, como é o nosso caso: o agente terá de representar como possível que os bens alvo da acção de branqueamento são provenientes de pelo menos um dos crimes do n.º 1. Já não tem de representar como possível que o facto ilícito subjacente tenha sido praticado em certo momento e lugar, os seus autores e as suas vítimas, o seu concreto modo de execução ou o seu nomen iuris, bastando que configure a possibilidade de proveniência ilícita de um qualquer (ou de vários em simultâneo) ilícito típico de “catálogo”, ainda que sem saber o seu nome, e se conforme com o resultado.
    2.3.8.4.3.5. Do dolo específico no crime de branqueamento.
    O elemento subjectivo do crime de branqueamento exige, em certos casos, para além da verificação do dolo genérico nos termos mencionados, uma circunstância adicional,  a saber: um elemento subjectivo específico (denominado dolo específico) consistente na intenção ou na finalidade de “dissimular a origem ilícita, ou de evitar que o autor ou participante dessas infracções seja criminalmente perseguido ou submetido a uma reacção criminal”, que terá de presidir às acções de “converter”, “transferir”, “auxiliar ou facilitar a conversão ou a transferência”.
    Este elemento subjectivo específico, adicional ao dolo genérico, só é exigível no n.º 2, do artigo 368º-A, na redacção transcrita (correspondente ao n.º 3, da actual redacção), do CP, não já quando as acções típicas praticadas pelo agente correspondam às previstas no n.º 3 do dispositivo transcrito (previstas na redacção actual no n.º 4).
    Nesta medida, é frequente a afirmação de que o crime de branqueamento se basta, no n.º 3 do artigo 368º-A, na redacção transcrita (correspondente ao n.º 4, da actual redacção), com um dolo genérico que terá, naturalmente, de ser congruente com o tipo objectivo, por ter de se reportar ao conhecimento de todos, mas também apenas, os elementos objectivos do tipo.
    O n.º 2 do artigo na versão transcrita (correspondente ao n.º 3, da actual redacção)  exige, para além do dolo genérico, ainda uma específica intenção que lhe acresce, sendo, por isso, o dolo deste crime nesta variante incongruente com o tipo objectivo. Neste caso, dado que o fim prosseguido pelo agente não faz parte do tipo objectivo, bastará, para a consumação do crime, a intenção do agente.

    1.3.8.4.3.5 Análise dos fundamentos decisórios relacionados com o tipo subjectivo,  que estiveram na base de decisões de não pronúncia:
    •           Falta de descrição do dolo do tipo;
    •           Falta de descrição do dolo da culpa; 
    •           Falta de descrição do dolo específico.

    Vejamos cada uma delas.
    1.3.8.4.3.5.1 DA FALTA DO DOLO DO TIPO
    A decisão recorrida afirma estar em falta a descrição do dolo do tipo, quanto ao conhecimento da concreta origem ilícita de “catálogo” das vantagens branqueadas, nos seguintes crimes:
    • CRIME 3 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, CC, HH, BB e II, relativamente à utilização, entre 2006 e 2008, de contas na ... em que o arguido II era autorizado e operações financeiras realizadas a partir das mesmas, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal .
    • CRIME 4 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, CC, HH, II e BB, relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados no ano de 2007 e até ao início de 2008, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal.
    • CRIME 5 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, CC, HH, BB e GG, relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados a partir de 2008, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, com intervenção das contas da ... do arguido GG, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal.
    • CRIME 6 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, CC, HH, BB, GG, as sociedades LEC SA, LEC SGPS, LENA SGPS e XLM, relativamente aos movimentos financeiros ocorridos a partir de 2010, abrangidos pela operação CEL_2010, justificados através de contrato promessa de compra e venda com perda de sinal referente ao imóvel ..., sito em ..., e introdução desses fundos no Grupo LENA, p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.
    • CRIME 7 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, BB, GG, DD, EE, FF e JJ, relativamente às transferências com origem em conta do cidadão ... KK, referentes aos financiamentos concedidos ao Grupo Vale do Lobo, com passagem por conta bancária da ... do arguido GG, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal .
    • CRIME 10 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos GG, NN, as sociedades LEC SA, XLM e RMF CONSULTING e outros (AA e BB, foram pronunciados por este ilícito criminal em co-autoria) relativamente a utilização da sociedade RMF CONSULTING, entre 2010 e 2014, para a colocação de fundos destinados ao arguido AA e utilização dos mesmos no seu interesse através do pagamento de despesas suas e colocação de numerário à sua disposição, p. e p. pelo art.368°-A, n° 1, 2 e 3, do Código Penal.
    • CRIME 11 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, BB e LL, quanto a aquisição de imóveis em Portugal, com o retorno do preço pago para a esfera patrimonial do arguido AA, de forma justificada, factos ocorridos entre 2010 e 2012, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.
    • CRIME 12 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, BB e LL, relativamente à aquisição e subsequente arrendamento de um imóvel em ..., com intenção de ocultação da titularidade do activo, factos praticados entre 2012 e 2014, previsto e punido pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.
    • CRIME 13 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, BB e LL,  relativamente à entrega pelo arguido BB de quantias pertencentes ao arguido AA para depósito em contas bancárias do arguido LL e para guardar em cofre bancário e em contas tituladas pelo mesmo, de forma a ocultar a propriedade desses valores pelo arguido AA, factos ocorridos nos anos de 2012 e 2013, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.
    • CRIME 14 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, BB e MM, relativamente à aquisição de um imóvel, designado “Monte ...”, com intenção de que passasse a integrar o património familiar do arguido AA, com registo em nome de terceiro e montagem de operação de financiamento entre 2011 e 2014, p. e p. pelo art.º 368.º, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.
    • CRIME 15 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pela arguida TT e outros (BB e AA, foram pronunciados por este ilícito), relativamente à disponibilização, por parte de TT, das suas contas bancárias junto do Montepio Geral para recepção de fundos provenientes do arguido BB para entrega ao arguido AA, ocultando a titularidade destas quantias por este último arguido, factos ocorridos nos anos de 2013 e 2014, p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.
    • CRIME 16 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelo arguido UU e outros (BB e AA, foram pronunciados por este ilícito), com referência aos factos relacionados com a utilização da conta bancária de  UU para a passagem de fundos pertencentes ao arguido AA recebidos do arguido BB, e sua transferência subsequente para a conta do arguido AA, factos ocorridos nos anos de 2011 a 2014, p. e p. pelo art.368°-A, n° 1 e 2, do Código Penal.
    • CRIME 17 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos BB, GG, PP e QQ,  relativamente a utilização da sociedade XMI e sua contabilidade para a colocação de fundos na esfera patrimonial do arguido QQ, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal .
    • CRIME 18 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos CC e RR,  relativamente aos pagamentos PT e CEL_2010, realizados entre 7 de Dezembro de 2007 e 20 de Setembro de 2011, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES (e com destino para as contas de que era beneficiário RR), p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.°s 1, 2 e 3, do Código Penal.
    • CRIME 19 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos CC e SS,  relativamente aos pagamentos PT e CEL_2010, realizados entre 9 de Julho de 2007 e 23 de Novembro de 2012, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES (e com destino para as contas de que era beneficiário SS), p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.°s 1, 2 e 3 do Código Penal.
    • CRIME 20 - Um crime de branqueamento praticado, a título de cumplicidade, pela arguida JJ (do qual é autor material o arguido DD, pronunciado nos termos da acusação por este ilícito criminal, tendo já sido julgado pelo mesmo em processo separado), relativamente à transferência de fundos para Portugal com origem em contas tituladas pelas sociedades em offshore EMP07... e EMP08... na ..., com utilização da sociedade EMP09... LDA., p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.
    Entendemos que o dolo, na vertente do  elemento cognitivo ou intelectual,  está suficientemente narrado na acusação, sem prejuízo de se reconhecer que o acusador poderia e deveria ter sido mais claro.
    Na verdade, lida a acusação globalmente, qualquer pessoa concluirá (o que tanto é válido para nós, quanto para um cidadão  comum ou um homem médio colocado na posição desses arguidos, e portanto também para estes, com o que está assegurado o seu essencial direito de defesa) que a expressão “sabia” tratarem-se de “vantagens derivadas de crime” (ou outras equivalentes constantes da acusação) não pode ter interpretação distinta da que “sabiam”, à data da prática dos actos de branqueamento, tratarem-se de “vantagens derivadas de crime(s) ANTE(S) NARRADO(S)”, sendo esta é a ideia transmitida na acusação, facto que é para nós manifesto e, por isso, inequívoco.
    Não podemos ser demasiado formalistas e considerar que a falta explicita destas duas palavras “ante(s) narrado(s)” tem impacto significativo em matéria de descrição do elemento subjectivo do tipo, em particular do elemento intelectual do dolo do tipo.
    Relativamente ao conhecimento dos elementos normativos do tipo objectivo,  recorremos de novo ao Professor Figueiredo Dias (in “Direito Penal, Parte Geral”, T.I, Gestlegal, 3ª ed., páginas 407 e seguintes) para afirmar que o importante é que “o agente conheça tudo quanto é necessário para uma correcta orientação da sua consciência ética para o desvalor jurídico que concretamente se liga à acção intentada, para o seu carácter ilícito”.
    Para quem defenda a possibilidade de o crime de branqueamento ser cometido a título de dolo eventual - posição que já afirmámos sufragar, a par da maioria da doutrina e da jurisprudência -  bastará para o preenchimento deste elemento intelectual do dolo, nesta modalidade menos exigente, admitir como provável que os bens que estão a “lavar” têm a sua origem em factos criminosos susceptíveis de integrar um qualquer (mesmo em termos alternativos e até cumulativos) ilícito do “catálogo legal”.
    Não é demais realçar que dentro deste “catálogo legal” existe uma cláusula geral que confere tipicidade aos crimes subjacentes em função das penas que lhes são aplicáveis.
    O nível de conhecimento exigível da origem “suja” de “catálogo” terá de se traduzir, num patamar suficiente, na ideia de que os fundos movimentados derivam de uma infracção criminal grave (de entre as previstas no n.º 1, do artigo 368º-A, do CP), a que está associada uma pena de prisão elevada nos seus limites mínimos e/ou máximos.
    Vertido para os crimes de branqueamento aqui em causa, especialmente quando cometidos por agentes não intervenientes nos ilícitos subjacentes e, em particular, no dolo eventual, cremos que esse conhecimento da fonte criminosa de “catálogo”, numa valoração paralela da esfera do leigo (atendendo até à forma mista como os crimes subjacentes estão previstos no tipo objectivo), se bastará com a previsão de que os fundos movimentados derivam de uma infracção criminal grave, o que é aqui facilitado, desde logo, atendendo à dimensão das quantias movimentadas, sem esquecer que as cifras, já de si astronómicas, constantes na acusação, reportam-se algumas delas há já quase duas décadas e outras há cerca de uma década, valores que, atendendo à inflação acumulada nos anos decorridos, equivalem em valor de moeda actual a cerca de mais 1/3 do seu valor nominal descrito na acusação.

    2.3.8.4.3.5.2. DA FALTA DO DOLO DA CULPA
    Da falta de descrição do dolo da culpa, nos crimes de branqueamento 3, 4, 5, 6, 7, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17 e 22.
    • CRIME 3 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, CC, HH, BB e II, relativamente à utilização, entre 2006 e 2008, de contas na ... em que o arguido II era autorizado e operações financeiras realizadas a partir das mesmas, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal .
    • CRIME 4 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, CC, HH, II e BB, relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados no ano de 2007 e até ao início de 2008, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal.
    • CRIME 5 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, CC, HH, BB e GG, relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados a partir de 2008, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, com intervenção das contas da ... do arguido GG, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal.
    • CRIME 6 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, CC, HH, BB, GG, as sociedades LEC SA, LEC SGPS, LENA SGPS e XLM, relativamente aos movimentos financeiros ocorridos a partir de 2010, abrangidos pela operação CEL_2010, justificados através de contrato promessa de compra e venda com perda de sinal referente ao imóvel ..., sito em ..., e introdução desses fundos no Grupo LENA, p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.
    • CRIME 7 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, BB, GG, DD, EE, FF e JJ, relativamente às transferências com origem em conta do cidadão ... KK, referentes aos financiamentos concedidos ao Grupo Vale do Lobo, com passagem por conta bancária da ... do arguido GG, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal .
    • CRIME 10 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos GG, NN, as sociedades LEC SA, XLM e RMF CONSULTING e outros (AA e BB, foram pronunciados por este ilícito criminal em co-autoria) relativamente a utilização da sociedade RMF CONSULTING, entre 2010 e 2014, para a colocação de fundos destinados ao arguido AA e utilização dos mesmos no seu interesse através do pagamento de despesas suas e colocação de numerário à sua disposição, p. e p. pelo art.368°-A, n° 1, 2 e 3, do Código Penal.
    • CRIME 11 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, BB e LL, quanto a aquisição de imóveis em Portugal, com o retorno do preço pago para a esfera patrimonial do arguido AA, de forma justificada, factos ocorridos entre 2010 e 2012, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.
    • CRIME 12 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, BB e LL, relativamente à aquisição e subsequente arrendamento de um imóvel em ..., com intenção de ocultação da titularidade do activo, factos praticados entre 2012 e 2014, previsto e punido pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.
    • CRIME 13 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, BB e LL,  relativamente à entrega pelo arguido BB de quantias pertencentes ao arguido AA para depósito em contas bancárias do arguido LL e para guardar em cofre bancário e em contas tituladas pelo mesmo, de forma a ocultar a propriedade desses valores pelo arguido AA, factos ocorridos nos anos de 2012 e 2013, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.
    • CRIME 14 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, BB e MM, relativamente à aquisição de um imóvel, designado “Monte ...”, com intenção de que passasse a integrar o património familiar do arguido AA, com registo em nome de terceiro e montagem de operação de financiamento entre 2011 e 2014, p. e p. pelo art.º 368.º, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.
    • CRIME 15 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pela arguida TT e outros (BB e AA, foram pronunciados por este ilícito), relativamente à disponibilização, por parte de TT, das suas contas bancárias junto do Montepio Geral para recepção de fundos provenientes do arguido BB para entrega ao arguido AA, ocultando a titularidade destas quantias por este último arguido, factos ocorridos nos anos de 2013 e 2014, p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.
    • CRIME 16 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelo arguido UU e outros (BB e AA, foram pronunciados por este ilícito), com referência aos factos relacionados com a utilização da conta bancária de  UU para a passagem de fundos pertencentes ao arguido AA recebidos do arguido BB, e sua transferência subsequente para a conta do arguido AA, factos ocorridos nos anos de 2011 a 2014, p. e p. pelo art.368°-A, n° 1 e 2, do Código Penal.
    • CRIME 17 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos BB, GG, PP e QQ,  relativamente a utilização da sociedade XMI e sua contabilidade para a colocação de fundos na esfera patrimonial do arguido QQ, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal .
    • CRIME 22 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos CC e HH, relativamente à transferência de €2.750.000,00, com origem em conta da ES Enterprises na ..., de conta titulada pela sociedade EMP04... na ..., controlada pelo arguido HH, para conta do Crédit Suisse, titulada pela sociedade em offshore EMP03..., controlada por CC, em Novembro de 2011, p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.
    A decisão recorrida não pronunciou estes crimes por falta da alocução “bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei” ou outra semelhante.
    Concedemos, com facilidade, que a acusação peca por falta de coerência, na medida em que, como se refere na decisão recorrida, “Basta prestarmos atenção ao que vem descrito nos artigos 13661, 13675, 13679, 13683, 13901, 13947, 13955, 13975, 13993, 14005, 14037, 14055, 14061, 14071, 14079, 14084 para concluirmos que o Ministério Público reconhece (pareceria reconhecer, corrigimos nós) a necessidade e a importância da alegação factual da fórmula «os arguidos agiram livre e voluntariamente bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei», na medida em que os faz em relação a alguns dos arguidos, ou seja, AA, BB, GG, CC, RR, SS, EE e FF, DD e UU em relação a alguns segmentos de facto. Em face do exposto, não se compreende esta dualidade de critérios seguida pelo Ministério Público e nem o motivo que o levou a não descrever, quanto ao arguido II, os factos relativos ao dolo da culpa.”
    De facto, não se descortina nenhuma razão que possa explicar esta aparente duplicidade de entendimentos do acusador, nem o mesmo, na qualidade de Recorrente, a forneceu.
    Como quer que seja, a decisão recorrida de não pronúncia dos crimes de branqueamento supra referidos por falta da expressão “bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei”, ou outra semelhante, também não pode ser amparada, dado que partilhamos o entendimento de que é dispensável a alegação e prova, no direito penal nuclear, da consciência da ilicitude, em virtude de esta se apresentar presumida.
    A tal não se opõe, na nossa leitura, o Acórdão Uniformizador n.º 1/2015, sendo que qualquer cidadão médio, e neste universo encontram-se também os arguidos acusados, tem conhecimento de que a circulação de capitais oriundos da prática de um delito grave (dos tipificados no tipo) contribuirá para lhes conferir aparência final de legalidade, comportamento que, à luz do Direito Penal português, está criminalizado.
    Na verdade, qualquer uma das duas posições jurídicas é defensável, sendo uma matéria discutível e com bons argumentos jurídicos de parte a parte, pelo que, atenta a fase processual em que nos encontramos, não será de inviabilizar o prosseguimento do processo para a fase de julgamento assente numa tomada de posição jurídica que se nos afigura prematura, com menosprezo por uma outra que beneficia igualmente de suporte jurisprudencial e doutrinal e não é afastada pela letra da lei.

    1.3.8.4.3.5.2 DA FALTA DO DOLO ESPECÍFICO
    Da falta de descrição do dolo específico, nos crimes de branqueamento  3, 4, 5, 6, 7.
    CRIME 3 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, CC, HH, BB e II, relativamente à utilização, entre 2006 e 2008, de contas na ... em que o arguido II era autorizado e operações financeiras realizadas a partir das mesmas, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal .
    CRIME 4 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, CC, HH, II e BB, relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados no ano de 2007 e até ao início de 2008, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal.
    CRIME 5 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, CC, HH, BB e GG, relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados a partir de 2008, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, com intervenção das contas da ... do arguido GG, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal.
    CRIME 6 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, CC, HH, BB, GG, as sociedades LEC SA, LEC SGPS, LENA SGPS e XLM, relativamente aos movimentos financeiros ocorridos a partir de 2010, abrangidos pela operação CEL_2010, justificados através de contrato promessa de compra e venda com perda de sinal referente ao imóvel ..., sito em ..., e introdução desses fundos no Grupo LENA, p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.
    CRIME 7 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, BB, GG, DD, EE, FF e JJ, relativamente às transferências com origem em conta do cidadão ... KK, referentes aos financiamentos concedidos ao Grupo Vale do Lobo, com passagem por conta bancária da ... do arguido GG, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal .

    DECISÃO RECORRIDA
    Nesta decisão afirma não constar da acusação que os “agentes tenham agido com a específica intenção de ocultar ou dissimular a origem ilícita das vantagens” ou “de evitar que o autor ou participante dessas infracções seja criminalmente perseguido”, estando em falta o dolo específico previsto no artigo 368º-A, do CP, na versão aqui em causa.

    APRECIANDO
    A título exemplificativo:
    Crime 3 de branqueamento: praticado em co-autoria pelos arguidos AA, CC, HH, BB e II relativamente à utilização entre 2006 e 2008, de contas na ... em que o arguido II era autorizado e operações financeiras realizadas a partir das mesmas)
    Pode ler-se  nos artigos 13710 e 13711 da acusação: “ Mais sabiam que, ao actuar nos termos descritos, encobriam a verdadeira origem dos fundos, bem como a circunstância de constituírem produto do crime e o facto de pertencerem ao arguido AA e criavam barreiras à sua detecção, as quais sabiam que permitiam ocultar a prática dos ilícitos que estavam na sua origem e a reintrodução dos fundos na economia legítima, concretamente na esfera patrimonial do arguido AA. Mesmo assim, em conjugação de esforços e de intentos, acordaram entre si actuar da forma descrita e concretizaram os seus intentos.”
    Em todos os restantes crimes de branqueamento a narração deste dolo é feito de forma idêntica.
    Como já antes tivemos a oportunidade de deixar escrito, não é de exigir que na acusação conste o termo exacto agiram com a “intenção” finalística contida no tipo legal.
    Basta que se extraia de modo inequívoco da acusação a actuação com tal intenção, ainda que expresso por outras palavras.
    Cremos que os segmentos da acusação contidos no artigos transcritos traduzem de forma suficiente que os arguidos quiseram agir com o propósito ou a específica intenção de dissimular a origem ilícita dos fundos branqueados e, em simultâneo, evitar a perseguição criminal do seu autor, o que resulta expresso dos segmentos conjugados “sabiam que ao actuar nos termos descritos encobriam a verdadeira origem dos fundos… e criavam barreiras à sua detecção” “mesmo assim …acordaram em actuar da forma descrita e concretizar os seus intentos”.
    Sublinhe-se que este tribunal não está a presumir o dolo específico.
    O que está é a afirmar que o mesmo está suficientemente narrado na acusação, embora sem utilização da expressão legal “agir com intenção de”.
    Ademais, como se sabe, não é necessário que esse fim perseguido tenha sido alcançado, ou sequer levado a cabo (porque o mesmo não faz parte do tipo objectivo), mas tão só que na mente dos agentes essa intenção esteja presente, o que, na nossa perspectiva, está satisfatoriamente alegado na acusação.
    Como quer que seja, os arguidos vêm também acusados pelo número 3, do art.º 368º-A, do CP, na redacção transcrita, onde esse dolo específico adicional não é sequer exigível.
    Não podemos, pois, sufragar o entendimento de que está em falta a narração do dolo específico relativamente aos crimes de branqueamento acusados.
    Termos em se julga o recurso procedente em todos estes segmentos analisados relativos à falta do dolo do tipo, dolo da culpa e dolo específico.

    1.4 DOS INDÍCIOS

    1.4.1 DA NOÇÃO DE INDÍCIOS SUFICIENTES E DA RELEVÂNCIA DA PROVA INDICIÁRIA NO QUE RESPEITA À CRIMINALIDADE ECONÓMICA (em especial nos crimes de branqueamento).
    Vale relembrar, pela sua relevância, que em sede de instrução o critério de decisão para proferir uma pronúncia é o da existência de indícios suficientes, os tais que permitem fazer um juízo de prognose de possibilidade razoável  de aplicação de uma pena ou uma medida de segurança em sede de julgamento (art.ºs 308.º, n.ºs 1 e 2, e 283.º, n.º 2, ambos do CPP).
     É que a missão da fase de instrução não é a de alcançar a demonstração da realidade dos factos, mas tão só a de ajuizar se constam do processo os sinais da sua prática. Na fase de instrução não se julga a causa, só se verifica se as provas recolhidas justificam o seu julgamento. À fase de julgamento impõe-se um juízo de certeza (certeza processual para além de toda a dúvida razoável), à fase da instrução basta um juízo  de probabilidade (alta ou forte) de que em julgamento se alcançará aquele juízo de certeza, até porque o juiz de instrução profere decisão sem a oralidade, a imediação e o contraditório da prova produzida em inquérito, fazendo uma mera valoração indirecta, e por isso deficiente, dessa prova.
    Sem se pretender, com isto, desvalorizar a fase processual da instrução e também sem esquecer que a sujeição a um julgamento é, por si só,  sentida comunitariamente como motivo de desonra e de vergonha, devendo ser evitadas, sempre que possível, as submissões desnecessárias a julgamento.

    1.4.2 DA VALIDADE E RELEVÂNCIA DA PROVA INDICIÁRIA NO QUE RESPEITA À CRIMINALIDADE ECONÓMICA (EM ESPECIAL NOS CRIMES DE BRANQUEAMENTO).
    Vem, ainda, a propósito recordar que o juízo de indiciação suficiente que dá suporte a uma decisão de pronúncia pode basear-se em prova indirecta (dita indiciária), tal qual sucede com o juízo de certeza característico do julgamento.
    Reportando-se concretamente à criminalidade económica, e em particular ao crime de branqueamento, não podemos deixar de citar o Sr. Juiz Conselheiro José António Henriques dos Santos Cabral em “Branqueamento de capitais e prova indiciária”, na “Revista Julgar online, Março de 2020”.
    Refere o mesmo:  “o apelo à prova indiciária é imposto pelo combate a novos tipos de criminalidade, nos quais os sinais, ou indícios, são factores essenciais para descodificar situações complexas em que surgem formas de actuação criminosa duma dimensão superior.”
    A mesma prova assume um papel essencial nos novos domínios relativos a crimes graves e de difícil prova, como os que estão conexionados com a criminalidade económica e financeira. Falamos dum âmbito criminal que envolve a especificidade inerente a um universo multifacetado no qual o crime económico, bem como o crime organizado, se entrecruzam em organizações herméticas que recorrem a operações labirínticas, nas quais as práticas criminais surgem no seguimento de pactos de cumplicidade e auxílio mútuo”.
    “Efectivamente, o instrumento fundamental da prova indiciária é a presunção, que se consubstancia numa inferência feita pelo tribunal, o qual chega a uma conclusão sobre o facto a provar (o facto ignorado) com base num facto já conhecido ou comprovado (o facto conhecido), que serve de premissa para um raciocínio que, na esmagadora maioria dos casos, tem a sua génese nas regras da experiência.  As presunções devem ser graves, precisas e concordantes.”
    “O facto de estarmos em face dum critério elástico e vago, que foge a qualquer definição rigorosa, levou ao aparecimento de significados diferenciados relativos ao requisito em questão: para alguns estamos perante uma presunção grave unicamente quando a conclusão do facto a ser provado derive do «facto conhecido» de uma maneira certa e absoluta, isto é, quando esta seja a única, e necessária, consequência que pode ser obtida de facto conhecido; em sentido contrário, releva o entendimento de ser suficiente que a conclusão sobre o facto a provar derive do facto conhecido por meio de uma inferência capaz de atribuir um grau de probabilidade adequada (ou de "certeza razoável") sobre o facto provado.”
    “A primeira das duas orientações interpreta a gravidade da presunção de forma tão rigorosa que reduz a possibilidade de usar as presunções para muito poucas, e pouco importantes, hipóteses, uma vez que somente quando a inferência que fundamenta a presunção é formulada com base em leis absolutas (naturais ou científicas), e não em simples máximas de experiência, se poderá obter uma conclusão que constitua a única e necessária consequência duma premissa. Parece, portanto, que o único significado razoável de aferição da força da inferência é o que se refere à natureza probabilística, característica que é própria, na quase totalidade dos casos, de inferências presuntivas. Usando uma noção mais rigorosa, pode fazer-se apelo ao conceito de probabilidade predominante . Pode dizer-se que o conceito de gravidade das presunções é definido unicamente com base na natureza probabilística da inferência presuntiva e, portanto, apenas indica uma situação que atribui um grau de confirmação à hipótese sobre o facto para provar que a configura como a conclusão mais aceitável entre aquelas que podem ser hipoteticamente obtidas da mesma premissa (ou seja, do "facto conhecido”). A teoria dos indícios reduz-se, assim, à teoria das probabilidades e a prova indiciária resulta do concurso de vários factos que demonstram a existência de um terceiro, que é precisamente aquele que se pretende averiguar.”
    “A acessoriedade do branqueamento de capitais em relação ao crime prévio convoca a questão dos requisitos da prova quanto a este crime, conjugada com a natureza da relação existente entre os dois crimes.”
    “A condenação pelo crime de branqueamento exige segurança quanto à origem criminal dos activos maculados, ou seja, a prova de que derivam do crime prévio. É necessária uma identificação mínima para que se possa afirmar sem dúvida que a origem dos bens não é apenas uma actividade ilegal, mas uma catividade criminosa.”
    “Contribuem para a formação duma convicção nesse sentido em sede de prova indiciária”:
    - “a informação da existência de avultadas quantidades de dinheiro em relação às quais não é oferecida uma justificação”;
    - “o uso do dinheiro em operações que oferecem irregularidades ou estão fora da prática comum do mercado, como as aberturas de contas ou depósitos em entidades bancárias num país que não seja a residência de um titular, etc.”;
    - “a inexistência de actividades comerciais lícitas que justifiquem aumentos de capital, ou transmissões monetárias”;
    - “a falta de realidade das supostas operações invocadas como justificação de transferências”;
    - “o aumento incomum do património líquido”;
    - “operações monetárias manifestamente anómalas”;
    - “a ausência de actividades comerciais legais que justifiquem aumentos incomuns no património”;
    - “operações em bancos estrangeiros alheios às práticas comerciais comuns”;
    - “a posse de quantias incomuns de dinheiro em transferências monetárias ou anómalas de capital”;
    - “a vinculação de agentes a actividades ou grupos ilegais ou a pessoas relacionadas com estes”;
    - “o aumento incomum ou desproporcional de activos”;
    - “a ausência de justificativa legal do rendimento que permita realizar essas operações”;
    - “a existência de “empresas ecrã” ou de “testas de ferro”;
    - Indicia, ainda, a existência do crime base, a capacidade de decisão, nomeadamente, no exercício de funções públicas, quando associada a “decisões de favor” sem qualquer racionalidade política, económica ou financeira”.
    E mais à frente prossegue:
    “Em sede de indícios podemos, ainda, distinguir entre indícios que visam a realização de actos preparatórios (a constituição das empresas de fachada, a falsificação dos documentos utilizados), a relação material ou pessoal com a actividade criminosa que gera a necessidade de branquear, e indícios concomitantes, como é a posse de grandes quantias em dinheiro sem justificação de sua origem, os vínculos com outras pessoas ou empresas relacionados com actos de branqueamento, estruturas societárias complexas, utilização de “testas de ferro”, empresas offshore, cobrança de altas comissões, fraccionamento desnecessário de depósitos, declarações de resultados sobreavaliados. Acrescem os sinais subsequentes, como a incorrecta justificação (execução de operações económicas fictícias), obstrução ou entorpecimento da investigação (destruição de documentação), tentativa de suborno e mudança da situação económica (aumento de capital injustificado)”.
    Remata os raciocínios, dizendo:
    “Efectivamente, a dimensão dos valores envolvidos, aliada ao manuseio incomum de dinheiro e à existência de operações estranhas às práticas comerciais inerentes a negócios legítimos, constitui um indício de relevância especial para avaliar a concorrência de um crime de branqueamento e do crime-base inerente.”
     “A concordância de múltiplos, e convergentes, indícios é essencial, sendo certo que, existindo estes, a valoração do silêncio, ou da falta duma explicação razoável, não constituirá uma violação da presunção de inocência ou uma inversão do ónus da prova, porque, nesse caso, o crime de branqueamento foi validamente demonstrado e o silêncio, ou a falta duma explicação plausível, não substitui, mas reforça a inferência da responsabilidade do arguido.”
    Na análise que adiante se fará dos concretos crimes de branqueamento acusados e não pronunciados procuraremos verificar se estão presentes (ou não) estes e outros sinais, e valorar os mesmos no seu conjunto, sempre norteados pelo já mencionado critério fundamental que preside à decisão em sede de instrução.

    1.4.3 TIPOLOGIAS OU MÉTODOS DE BRANQUEAMENTO. COMO SE FAZ O BRANQUEAMENTO DE VANTAGENS PROCEDENTES DE CORRUPÇÃO?
    A essa interrogação responde o Financial Action Task Force - FATF/GAFI - no FATF Report – “Laundering the proceeds of Corruption” (gafi_doc_mt_branqueamento_en_0 PDF (www.bportugal.pt) - artigo em língua inglesa -  que sistematizou os diversos métodos de branqueamento internacionalmente identificados, associados à corrupção, a saber:
    1.         Use of Gatekeepers
    2.         Use of Corporate Vehicles and Trusts
    3.         Use of Offshore/Foreign Jurisdictions
    4.         Use of Nominees
    5.         Use of Cash
    6.         Use of Domestic Financial Institutions

    Podemos já afirmar que todos estes métodos foram usados nos esquemas de branqueamento em causa nos autos, nos quais não se identifica nenhuma originalidade, o que decorre de os esquemas de branqueamento serem gizados pelas mesmas estruturas de gestão de fortunas que operam a nível mundial, as quais reproduzem os mesmos modelos para todos os seus clientes.
    Vejamos em que consiste cada um desses procedimentos
    1. O método “Use of Gatekeepers” ou “uso de porteiros” ou “guarda-portas” (tradução nossa).
    A montagem de um esquema de branqueamento não está ao alcance de qualquer um, por exigir conhecimentos, competência e engenho.
    Os prestadores desses serviços (ditos “Gatekeepers” ou estruturas de gestão de fortunas) são profissionais especializados em matérias legais e financeiras.
    Estas estruturas procedem à criação de “veículos” corporativos, cuja única função é servir de fachada para o “transporte” de capitais de uma localização para outra e de um titular formal para outro, com vista a afastar esse capital da sua origem e proteger a identidade do seu titular efectivo.
    O principal serviço prestado pelo “Gatekeepers” é, portanto, o de zelar para que não seja estabelecida ligação entre as sociedades “fantasma” por si criadas, as suas contas bancárias e os beneficiários, minimizando o risco (com bastante sucesso) de qualquer pessoa ou sistema de justiça chegar à identidade dos verdadeiros beneficiários dos fundos “transportados”.
    Estes “porteiros” ou “guardiões” dos esquemas de branqueamento “filtram” as tentativas de se chegar ao beneficiário ou  afastam os que pretendem entrar “nas portas” dos sistemas financeiros.
    No processo que nos ocupa, grande parte dos arguidos (essencialmente os corruptores, os corrompidos e/ou testas de ferro, mas também os principais intermediários) procuraram e contrataram os serviços dos “Gatekeepers”, muitos a conselho das próprias entidade bancárias com quem mantinham relações privilegiadas - caso por exemplo da UBS-... - que recomendavam aos clientes específicas empresas de gestão de fortunas.
    Mostra-se, fortemente indiciada, a contratação por alguns dos arguidos acusados dos seguintes “Gatekeepers”:


    EMP80...Empresa sediada em ... que, por autoprotecção, recorria também aos serviços da “EMP92...”, em regime de subcontratação.
    A ela recorrerram os arguidos DD, CC, HH, II, BB, entre outros, para que lhes fossem criadas/disponibilizadas estruturas societárias internacionais que lhes possibilitasse a utilização de contas bancárias noutros paises.
    De mencionar que a UBS (banco com quem muitos dos arguidos mantinham relações privilegiadas, facilitadas pela existência de um departamento de gestão de contas associado à Península Ibérica – chamado departamento “IBERIA” – no qual trabalhavam os funcionários ZZZZZZ, MMMMMMM e NNNNNNN, os quais eram os gestores internos das contas associadas às referidas sociedades “fictícias”) era quem sugeria aos arguidos o contacto com a dita “EMP80...”.
    EMP90... LLC.Sociedade sediada em ....
    A esta entidade de gestão de fortunas recorreu, por exemplo, o arguido DD (no que concerne à sociedade EMP07...) também por indicação do Banco UBS, por intermédio do funcionário ZZZZZZ, o qual preferia indicar esta entidade por ser “mais barata” (ver auto de inquirição da testemunha).
    EMP89...Internacionalmente conhecida (por maus motivos, é certo), sediada no ..., cujos serviços foram contratados por CC, para proceder à elaboração de documentação relativa à utilização das sociedades ES ENTERPRISES e EMP01..., com o objetivo de, no relacionamento dessas sociedades com terceiros, não deixar rasto da sua relação ao Grupo GES.
    EMP91... S.ACriada em 2009 pelo arguido HH e os funcionários do departamento “Ibéria” da UBS quando esta União de Bancos encerrou a representação de Portugal, altura em que os fundos existentes nas contas das sociedades “fictícias” na UBS transitaram para novas contas abertas no CREDIT SUISSE.


    2 e 3. Os métodos de branqueamento “Use of Corporate Vehicles and Trusts” e “Use of Offshore/Foreign Jurisdictions” ou “uso de sociedades veículo e fiduciárias” e “uso de jurisdições offshore/estrangeiras” (tradução nossa).

    Um dos mais conhecidos esquemas de lavagem de capital montado pelos referidos “Gatekeepers” consiste na criação de “veículos” corporativos (quase sempre sociedades meramente “fictícias/fantasma” - com o significado de não terem qualquer actividade económica e  destinarem-se, exclusivamente, à circulação de capital, muitas delas, sem fins lucrativos), sem ligação visível ao seu beneficiário, em regra offshore e sediadas em diversas jurisdições, com preferência por aquelas que oferecem maiores garantias de confidencialidade e são menos exigentes em matéria de criação e de dissolução de sociedades. Por vezes, também disponibilizam ou “emprestam” o uso de certas sociedades já existentes, para a passagem pontual de determinadas quantias.
    A cada um desses “veículos” corporativos era associada a abertura de contas bancárias, por regra  espalhadas em jurisdições estrangeiras distintas da sede da sociedade. Por esta via, os seus beneficiários ficavam mais protegidos da perseguição da Justiça no seu país de origem,  dado que uma investigação que exija a colaboração de entidades estrangeiras, ademais protegidas por segredo bancário quase intransponível, reduzirá as probabilidades de sucesso dessa mesma investigação, para além de acrescer tempo à investigação.
    Os “Gatekeepers” figuravam como sócios das sociedades “fictícias” por si criadas, indicavam as suas sedes como sedes formais das mesmas, constituíam-se como gestores externos das respectivas contas bancárias, em razão do que recepcionavam toda a documentação referente às sociedades e às contas bancárias abertas.
    Por via destes procedimentos, em cada operação financeira aparecia apenas a identidade da sociedade offshore, cujo rasto conduzia ao “Gatekeeper”, o que permitia ocultar a identidade do beneficiário efectivo dos fundos e, consequentemente, dificultava o trabalho das autoridades reguladoras e/ou fiscalizadoras.
    A ligação entre os beneficiários reais das contas bancárias, tituladas formalmente por essas sociedades “fantasma,” era extremamente difícil de estabelecer, posto que o conhecimento dessa identidade estava reservado ao banco onde a conta estava sediada (onde era preenchido um “Form A” com essa identificação), informação, por sua vez, protegida pelo segredo bancário.
    A contraprestação destes serviços de criação e gestão externa de cada um desses “veículos” corporativos offshore importa custos significativos.
     A testemunha ZZZZZZ declarou, em sede de inquérito, que a EMP80... cobrava, ao tempo dos factos, €4.000,00 pela abertura de cada uma dessas contas e outro tanto de anualidade pela sua gestão externa.

    Estes dois métodos de branqueamento foram repetidamente usados pelos arguidos acusados.
    Por sugestão da UBS, as sociedades “fictícias” e as contas bancárias tituladas pelas mesmas eram usadas em sistema de “duplas associadas”, ou seja, uma certa sociedade offshore figurava como titular de uma conta bancária, dita de passagem, e outra sociedade offshore figurava como titular de uma conta bancária, dita final (ou underline company), as quais ficavam entre si ligadas.
    A entrada de capital era sempre feita pela conta de passagem (única que mantinha contactos com terceiros). Os activos transitavam, automaticamente, para a conta final, onde ficavam mais resguardados. Qualquer movimento a débito da conta final, com destino a terceiros, passava sempre previamente pela conta de passagem.
    A par destes dois métodos,  verificámos a utilização de outra técnica - uso de contas numéricas - que permitia a realização de transacções e circulação de capitais pelo circuito bancário sem identificação do seu autor, pois, em cada umas dessas transacções aparecia apenas um número, e a associação desse número à identidade do real beneficiário da conta era do conhecimento exclusivo do banco onde estava sediada a conta, informação protegida pelo sigilo bancário.
    Nos esquemas de branqueamento acusados foram usados mais de vinte (20) desses “veículos” corporativos offshore.
    Passamos a identificar, por arguido, os “veículos” corporativos mais relevantes usados e/ou algumas contas offshore nominativas e numéricas utilizadas.


    CC




































    ESPÍRITO SANTO ENTERPRISES SA (até 2002 sob a designação ESPÍRITO SANTO FINANCIAL (BVI) S.A e após 2010 sob a designação ENTERPRISES MANAGEMENT SERVICES LTD.)
    Constituída em 18 de Novembro de 1993, com recurso aos serviços prestados pela sociedade EMP93... LIMITED.
    Registada nas ....
    Com sede nos escritórios da sociedade EMP93... LIMITED, sitos na morada ..., ....
    Foram contratados os serviços da EMP89... para elaborar documentação referente a esta sociedade, nomeadamente relatórios e contas.
    Esta sociedade, apesar de associada ao universo GES, não estava oficializada no organograma do grupo, em razão do que estava fora da supervisão das entidades reguladoras, designadamente do Banco de Portugal.
    A sociedade era titular de contas bancárias no Banque Privée Espirito Santo (BPES), em … -..., controladas pelo arguido CC.
    EMP01... LIMITED
    Constituída em 2 de Janeiro de 2007.
    Com sede nas ....
    Capital social detido pela ES Enterprises.
    Contratados os serviços da EMP89... para elaborar documentação referente a esta sociedade, nomeadamente relatórios e contas.
    Esta sociedade, apesar de associada ao universo GES, não estava oficializada no organograma do grupo.
    Não chegou a figurar como titular de contas bancárias.
    EMP03....
    Constituída no ..., com data de 18 de Novembro de 2009, pela sociedade EMP94....
    Com domicílio em ..., ....
    Em 3 de Dezembro de 2009 passaram a figurar como Presidente e Secretário dessa sociedade, respetivamente, as sociedades EMP95... S.A. e EMP96... S.A., ambas domiciliadas nas ....
    Era titular formal de uma conta, aberta em 09.12.2009, junto do Crédit Suisse, na ..., de que o arguido CC era o beneficiário (juntamente com a mulher e uma filha).
    A gestão desta conta foi assessorada (externa-asset management) pela EMP91... S.A. MMMMMMM era o gestor responsável.
    Nos documentos de abertura de conta a EMP03... foi representada por OOOOOOO, que foi nomeado diretor da EMP96..., S.A. e que era também um dos representantes da EMP90....
    Foi aberta outra conta em nome da mesma sociedade, junto do Crédit Suisse, desta feita em ....
    EMP05... SA
    Constituída em 10 de Fevereiro de 2011, no ....
    Tem como agente registado a firma ..., com domicílio na Calle ..., morada também atribuída à EMP05... SA.
    Foram nomeados diretores PPPPPPP (Presidente), QQQQQQQ (Secretária) e RRRRRRR (Tesoureira).
    É titular formal de uma conta numérica, identificada internamente no Banco pela sigla ....
    Tal conta foi aberta em 8 de abril de 2011, junto do banco LOMBARD ODIER DARIER HENTSCH&CIE, na ....
    Foi indicada como beneficiária final LLLLLLL e como mandatários desta última o arguido CC e a filha de ambos, SSSSSSS.
    O arguido CC, através de procuração geral assinada em 28 de Junho de 2012, passou a ter poderes para movimentar individualmente a conta.
    IIEMP63... LTD
    Domiciliada nas ....
    Tinha como morada ..., ..., a sede era a dos escritórios da EMP92....
    TTTTTTT e UUUUUUU, funcionários desta última sociedade, foram designados diretores da EMP63....
    A correspondência da UBS relativa às contas da EMP63... era dirigida à EMP80..., S.A..
     Era titular formal de uma conta bancária nominativa sediada na UBS-....
    A abertura desta conta, iniciada a 13.09.2005 com a entrega dos documentos societários necessários, foi agilizada pelo departamento IBERIA, concretamente por ZZZZZZ, o qual ficou encarregado da sua gestão interna (dentro do banco), tendo posteriormente sido substituído nessa tarefa por NNNNNNN.
    Foram os designados diretores da sociedade que assinaram os documentos de abertura da conta, nomeadamente a autorização de assinaturas.
    Do Form A II ficou a constar como beneficiário final.
    Funcionou como conta de passagem da conta da EMP66....
    EMP66...
    Constituída como fundação de interesse privado em 7 de Setembro de 2005, no ....
    Com morada em Calle ..., ....
    Apresentava como Presidente VVVVVVV e como Secretário WWWWWWW, ambos funcionários da EMP80....
    Era titular formal de uma conta.
    No Form A II, de forma individual, foi indicado como beneficiário final da fundação.
    A correspondência relativa à conta da EMP66... era dirigida à EMP80..., S.A., com morada em Rue ..., ..., sociedade encarregada de proceder à gestão externa da conta.  
    A gestão interna da conta ficou a cargo de ZZZZZZ, depois substituído por NNNNNNN.
    A conta da EMP66... era final e apenas mantinha relação com a conta da EMP63... (que era a de passagem) ou com contas cujo beneficiário último fosse considerado o mesmo pela UBS.
    BBEMP68...
    Constituída no ..., por escritura de 15 de Dezembro de 2005, registada em 19 de Dezembro do mesmo ano, com sede na ..., ....
    Apresentava como administradores os cidadãos ... VVVVVVV e WWWWWWW, ambos funcionários da EMP80....
    No dia 7 Dezembro de 2006 II e BB deslocaram-se à UBS, em ..., na ... na companhia do funcionário da EMP80... VVVVVVV, para proceder à abertura da conta bancária da EMP68..., tendo essa conta sido aberta com data de 18 de Dezembro de 2006.
    A abertura da conta bancária teve intervenção do departamento de aconselhamento de clientes (Client Advisor) da UBS - KEY CLIENTS INTERNATIONAL IBERIA -, através dos seus colaboradores ZZZZZZ e do Diretor XXXXXXX, tendo o primeiro ficado encarregado da gestão deste cliente.
    Trata-se de uma conta nominativa, no form A ficou a constar como beneficiário final o arguido BB.
    A correspondência relativa à conta da EMP68..., de acordo com instruções do arguido BB e com vista a manter a confidencialidade desse património, deveria ser dirigida à EMP80..., S.A., com morada em Rue ..., ..., sociedade encarregada de gerir externamente a conta.
    Na ficha de cliente referente à conta EMP63..., ZZZZZZ fez contar que o cliente II se deslocara ao escritório da UBS em ..., com um amigo e com VVVVVVV da sociedade EMP80..., e haver referido que o amigo - BB - iria abrir uma fundação, da qual II seria o segundo beneficiário. Em caso de morte de BB II beneficiaria de 80% dos fundos existentes nessa conta, destinando-se os restantes 20% para a mulher e filha de BB, em partes iguais. Mais fez constar que fora aberta uma conta principal ou "underline company" em nome da EMP68....
    As contas da EMP68... e da EMP67... constituíam um grupo entre si, funcionando a primeira como conta principal (underline company) e a segunda como conta de passagem.
    No dia 26 de Julho de 2007, na UBS de ..., o arguido BB celebrou um contrato de locação de cofre associado a esta conta.
    Foi atribuida uma procuração a II que o autorizava a aceder ao cofre, sem necessidade da assinatura de BB.
    EMP67... LIMITED
    Constituída nas ....
    Com morada no apartado ..., ..., correspondente aos escritórios da EMP92....
    Apresentava como diretores os funcionários da EMP92... YYYYYYY e TTTTTTT.
    Era titular de conta bancária nominativa na UBS, aberta em 4 de Janeiro de 2007.
    A correspondência relativa à conta da EMP67... era dirigida à EMP80..., S.A., com morada em Rue ..., ..., sociedade encarregada de gerir externamente a conta.
    A abertura da conta bancária teve intervenção da KEY CLIENTS INTERNATIONAL IBERIA, através de ZZZZZZ e do Diretor XXXXXXX, tendo o primeiro ficado encarregado da sua gestão interna.
    No Form A BB ficou a constar como beneficiário final. 
    Trata-se de uma conta de passagem da conta da EMP68....
    EMP36... LTD
    Constituída nas ....
    Com morada no apartado ..., ..., correspondente aos escritórios da sociedade EMP92....
    Figuraram como seus diretores YYYYYYY e TTTTTTT.  
    A morada e os diretores desta sociedade coincidiam, entre outras já referidas, com os da entidade EMP67....
    Titular formal de conta nominativa, constituída no banco UBS em 28 de Fevereiro de 2008, tendo como beneficiário final BB.
    Este arguido celebrou um contrato de locação de um cofre associado à conta, a que só o próprio podia aceder.
    EMP20... LTD
    Domiciliada no apartado ..., ..., correspondente aos escritórios da EMP92....
    Apresentava como diretores YYYYYYY e TTTTTTT, de nacionalidade ....  
    A morada e os diretores da EMP20... eram os mesmos da EMP67... e da EMP36....
    Titular formal de uma conta nominativa, aberta no dia 28 de Março de 2008, na sucursal da UBS em ..., pelo arguido BB. Este arguido figurava como beneficiário final.
    A gestão externa desta conta estava atribuída à EMP80... S.A.
    A abertura da conta bancária teve intervenção do KEY CLIENTS INTERNATIONAL IBERIA - através de ZZZZZZ, NNNNNNN e ZZZZZZZ.
    O colaborador da UBS NNNNNNN era quem estava encarregado da gestão do cliente BB.  
    Conta nominativa o número ...99, aberta na UBS em 09.03.2011.
    No “Form A” consta como titular da mesma o arguido BB.
    Tal conta terá sido aberta para manter na UBS o cofre n.° ..., junto do balcão de ..., cujas despesas até àquela data haviam sido debitadas na conta da EMP36....
    HHEMP64... LIMITED, pese embora pertencesse a TTTTTT, era também utilizada por HH.
    EMP61... LIMITED
    Domiciliada nas ....
    Apresentava como morada (tal como a EMP63... e a EMP62...), ..., ..., correspondendo à morada dos escritórios da sociedade EMP92....
    Foram designados como diretores TTTTTTT (este também diretor da EMP63..., de II) e YYYYYYY, funcionários da EMP92....
    Foram abertas contas em nome desta sciedade na UBS.
    Foram aqueles diretores que assinaram os documentos de abertura de conta, nomeadamente a autorização de assinaturas, que foi atribuída, num primeiro momento, aos funcionários da EMP80..., VVVVVVV e WWWWWWW.
    A correspondência da UBS relativa às contas da EMP61... era dirigida à EMP80..., S.A., com morada em Rue ..., ....
    Com data de 10 de Junho de 2005, a autorização de assinatura foi atribuída a HH e a AAAAAAAA.
    No Form A o arguido HH foi indicado como beneficiário final.
    Em 27 de Novembro de 2008 foi aberta uma nova sub-conta em euros, n.° ...429..., que apenas foi utilizada para a passagem de fundos com origem na ES ENTERPRISES para a conta da UBS do arguido GG, fundos que após terem passado por contas da UBS controladas por BB, foram repatriados.
    A conta da EMP61... funcionava como conta de passagem da EMP76....
    EMP76... LIMITED
    Domiciliada nas ... (...).
    Apresentava como morada ..., ..., correspondente à dos escritórios da sociedade EMP92...
    A sociedade foi disponibilizada ao arguido HH pela sociedade EMP97... S.A..
    Dispunha de uma conta nominativa, o que significa que nos documentos de suporte das operações financeiras realizadas surgia o nome da sociedade titular.
    No Form A o arguido HH foi indicado como beneficiário final da sociedade, logo da conta.
    Era uma conta final e funcionava em associação com a conta da EMP61... (esta como de passagem).
    EMP62... LIMITED
    Constituida em 4 de Agosto de 2005, domiciliada nas ... (...) e apresentava como morada (tal como a EMP63... e a EMP61...), ..., ..., correspondente à dos escritórios da sociedade EMP92...
    Foram designados como diretores TTTTTTT e YYYYYYY, ambos funcionários da EMP92....
    Era titular de uma conta nominativa.
    Foram aqueles diretores que assinaram os documentos de abertura de conta, nomeadamente a autorização de assinaturas, que foi atribuída ao arguido HH de forma individual.
    A correspondência da UBS relativa às contas da EMP62... deveria ser dirigida à EMP80..., S.A., com morada em Rue ..., ..., sociedade encarregada de gerir a conta em representação do arguido HH, de acordo com as suas instruções.
    No Form A este arguido foi indicado como beneficiário final da sociedade.
    Com data de 3 de Novembro de 2009, HH concedeu autorização à advogada BBBBBBBB para transmitir instruções sobre a movimentação desta conta à UBS, por escrito ou por telefone.
    Funcionou como conta de passagem.
    EMP98...
    Domiciliada nas ....
    Apresentava como morada, ..., ....
    Era titular formal de uma conta nominativa.
    A autorização de assinaturas foi inicialmente atribuída a VVVVVVV e WWWWWWW da EMP80... e a partir de Março de 2006 passou a ser o arguido HH o único autorizado a movimentar.
    Do Form A fez-se constar que o arguido HH era o beneficiário final da sociedade EMP98....
    A partir de 1 de Dezembro de 2007 EEEEEEE passou a ser o beneficiário final desta sociedade.
    EMP04... LTD
    Com sede nas ..., tendo como beneficiário final o arguido HH.
    Era titular formal de conta nominativa no CRÉDIT SUISSE, controlada por HH.
    GGContas numéricas - n.° ...86 e n.° ...80 - abertas na UBS entre o final do ano de 2006 e o início do ano de 2007, em que figurava como titular.
    DDEMP07... INC
    Com registo no ....
    Foi disponibilizada pela entidade EMP90... LLC, através do Banco UBS, por aconselhamento do gestor de conta ZZZZZZ.
    Era titular formal de conta aberta em 11 de Novembro de 2005, na UBS, ....
    Tinha como beneficiária final a arguida JJ e como primeiro autorizado a movimentar a conta o arguido DD.
    No entanto, era o arguido DD quem obtinha e fazia chegar para depósito, através do gestor de conta ZZZZZZ (usando por vezes os serviços de XXXXXX em Portugal, aliás seu familiar), os valores que vieram a ser creditados na conta aberta na ... em nome da EMP07... a partir de Dezembro de 2005.
    EMP08... LTD
    Com registo nas ....
    Titular formal de conta aberta em 28 de Novembro de 2008, ainda junto da UBS, na ....
    JJ figura como beneficiária final.
    EMP09... LDA
    Cuja participação social DD detinha, através de uma sociedade fiduciária estrangeira que contratou para o efeito - a EMP99... LIMITED, com registo na ... -.
    Esta sociedade passou, em certa data, a ter sede em Portugal e conta bancária no BPI.
    RREMP72... INC
    Sediada na morada ..., nas ....
    Titular formal de contas bancárias na UBS, na ... e em ..., de que era beneficiário o arguido RR.
    SSEMP100... LTD INC
    Constituída em 14 de Março de 2005, no ....
    Tinha como representantes as sociedades EMP101... S.A., EMP102... S.A. e EMP103... S.A. e como beneficiário final o arguido SS.
    A partir de 29 de Março de 2005 passou a ser a titular formal de uma conta antes aberta no Banco Pictet, na ... (conta ...46), que havia sido constituída em 6 de Fevereiro de 1998, figurando como titular e autorizado o arguido SS, com procuração a favor do seu irmão CCCCCCCC, conferindo-lhe poderes para movimentar a conta individualmente.
    Conta PICTET ...13.
    Aberta no dia 16 de Novembro de 2010.
    SS era o autorizado e beneficiário final.
    Na mesma data foram concedidas procurações sobre esta conta por SS aos seus filhos DDDDDDDD e EEEEEEEE, para em conjunto poderem movimentar a mesma.
    Estas são as sociedades offshore e as contas bancárias mais relevantes utilizadas nos esquemas de branqueamento gizados, entre muitas outras mencionadas na acusação.
    Como se verifica, os arguidos usaram e abusaram dos “veículos” corporativos, criados e/ou disponibilizados pelos “Gatekeepers” antes identificados,  os quais figuraram como seus directores ou administradores, emprestaram a sua morada às sociedades “fictícias” e recepcionaram toda a correspondência das mesmas.
    Criaram contas bancárias tituladas, formalmente, por essas sociedades “fictícias”, mas em que os beneficiários finais eram os aqui arguidos, contas sediadas em outras jurisdições, geridas internamente por funcionários bancários especializados nestes esquemas, os quais mantinham relação de grande proximidade com as entidades externas gestoras das contas, ou seja, com as sociedades gestoras de fortunas que as tinham criado.
    A ligação dos arguidos a tais contas bancárias e sociedades só foi possível estabelecer com base na documentação recolhida no estrangeiro.
    Não foi inocente a preferência por sediar estas contas bancárias na ..., atendendo a que, nessa jurisdição, a protecção do sigilo bancário estava envolta numa blindagem legal dificilmente comparável, e era conhecida por isso mesmo, transmitindo uma segurança extra aos arguidos.
    4. O método “Use of Nominees” ou “uso de pessoas nomeadas” (tradução nossa), ditos “testas de ferro”/fiduciários.
    Segundo o FATF/GAFI este método é, também, comumente utilizado no branqueamento de capitais, em especial quando oriundo de corrupção levada a cabo pelos chamados PEP´s (pessoas politicamente expostas).
    Esses “nomeados” são, normalmente, pessoas da confiança dos beneficiários das vantagens indevidas – amigos, familiares, ex-mulheres – assumindo a missão de disfarçar a titularidade dos produtos da corrupção, tornando-se, por esta via, os principais ajudantes dos PEP´s.
    Os fiduciários conduzem os negócios a mando e a benefício dos PEP´s, realizando em seu nome as transacções e movendo os activos, mas em benefício dos PEP´s.
    Este método foi notoriamente usado nos esquemas de branqueamento em causa neste processo, tendo o arguido AA escolhido para seus principais “nomeados”, numa primeira fase, o primo II e, numa segunda fase, o amigo BB.
    Esta afirmação estriba-se nos indícios já demonstrados de que as vantagens indevidas, relacionadas com os crimes de corrupção em que figura como agente corrompido o arguido AA, são propriedade deste, embora tenham sido movimentadas por “nomeados”, como se voltará a referir na análise infra de alguns dos crimes de branqueamento.
    II, além da função de “intermediação” (em representação de AA) na transição dos fundos, teve ainda a tarefa de proceder ao repatriamento de cerca de €2.000.000,00 através de XXXXXX - conhecido por “XXXXXX” -  a troco de uma percentagem de 10% recebida por este, capital que foi levantado, entre 2006 e 2008, em pequenas quantias de dinheiro, através do seu funcionário FFFFFFFF.
    Após o conhecimento público do envolvimento de II no processo ..., BB tornou-se o principal “testa de ferro” do arguido AA.
    No exercício dessa incumbência, dedicava parte do seu tempo útil em inúmeros telefonemas, mensagens, emails, reuniões, encontros, realização de diligências relacionadas com diversos contratos e/ou outras questões burocráticas, deslocações no país e no estrangeiro, entregas de envelopes, entre outras tarefas.
    Foi este arguido que, entre o mais, tratou das questões referentes ao  imobiliário do arguido AA, procedeu ao arrendamento de apartamentos em ... para este, família directa e amigos, marcou viagens e/ou hotéis, disponibilizou fundos de maneio ao motorista UU. Às vezes recorria a terceiros - nomeadamente a funcionários das suas empresas, avençados e até à sua companheira TT - para satisfazer as pretensões do arguido AA.
    Esta realidade não é consonante com a tese simplista de que BB era, apenas, um “bom amigo” ou “o amigo rico da ...” - para utilizar as expressões usadas por alguns arguidos em sede de interrogatórios - que queria permitir a AA um modo de vida de acordo com a importância dos cargos desempenhados.
    Esta tese deixaria por explicar a razão pela qual foram, repetidamente, usados métodos de branqueamento comumente conhecidos  e que importaram custos muito significativos (nos serviços dos “Gatekeepers”, nos serviços das entidades bancárias onde as contas foram criadas, no pagamento dos serviços aos intermediários).
    5. O método  “Use of Cash”, ou “uso de dinheiro em numerário” (tradução nossa).
    A preferência por dinheiro em cash -  modo como as quantias eram feitas chegar ao arguido AA, transportadas por diversas pessoas (BB, motorista UU, TT, LL, entre muitas outras pessoas) - de preferência em pequenas parcelas, mas cujo somatório revela quantidades muito significativas de dinheiro, de fonte inexplicável (como dizia o motorista UU, reportando-se ao aparecimento de dinheiro: vem do “esconderijo”), é também um método habitualmente usado para não identificar a origem e o destinatário de tal capital.
    O arguido AA não usava cheques, não usava cartões, não sabia proceder ao levantamento de dinheiro nas caixas de multibanco (segundo o motorista UU). A razão para tal é que não precisava, pois dispunha de dinheiro em numerário, que lhe chegava a casa por envelope, entregue por diversas pessoas.
    Tudo isto está suficientemente indiciado, desde logo do interrogatório do arguido UU em sede de inquérito mas, também, do interrogatório do arguido BB, que assumiu entregas em dinheiro a AA, superiores a €500.000,00 (nem sabia exactamente quanto, nem tinha registo dessas entregas), embora as tenha justificado com empréstimos, o que não nos merece nenhuma credibilidade.
    6. Por fim o método “Use of Domestic”, ou “uso de esquemas de branqueamento domésticos” (tradução nossa).
    De acordo com o FATF/GAFI, a necessidade de os efectivos beneficiários das vantagens satisfazerem o seu nível de vida no país de origem motiva a utilização de esquemas de repatriamento de fundos ao longo do tempo e a montagem de esquemas de branqueamento que se desenrolam, exclusivamente, no país de origem.
    O uso deste método de branqueamento está indiciado nos autos.
    Na verdade, podem ser apontados como esquemas “domésticos”, com vista a um acesso mais imediato às vantagens por parte do arguido AA (para além do repatriamento pelo RERTII):
    - O repatriamento de €2.000.000,00 através de XXXXXX, com a posterior entrega de pequenas quantias entre 2006 e 2008;
    - O pagamento de despesas do arguido AA directamente pelas sociedades do Grupo “Lena”, que agiram como intermediárias e sociedades de “fachada” (isto é, sociedades com actividade económica mas aproveitadas para esquemas de branqueamento), como ocorreu com a quantia de cerca de €1.000.000,00 (que permitiu realizar os pagamentos à EMP43..., à EMP42.... LDA, à EMP41..., à “EMP104... SA”, nos anos de 2011, 2012, 2013);
    - A criação e uso da sociedade “fictícia” XLM, como “veículo” de recebimento de vantagens indevidas em território nacional; e
    - O pagamento de despesas, do arguido AA, realizado directamente pela XLM e a RMF (à EMP34..., outras viagens, hotéis e deslocações, a OO, a MM, a XX, a VV, …).
    Todos os métodos de branqueamento catalogados pela FATF/GAFI foram utilizados nos crimes de branqueamento objecto deste recurso, num pleno.
    Tal facto, a par do enorme volume das somas envolvidas, do modo de vida de alguns dos arguidos, que não encontra justificação em rendimentos legais conhecidos ou demonstrados, constituem, por si só, indícios mais do que suficientes, para sujeitar os arguidos em questão a julgamento.

    1.5 PERCORRENDO CADA UM DOS CRIMES DE BRANQUEAMENTO
    1.5.1 RAZÕES DA NÃO PRONÚNCIA

    CRIMES 3, 4, 5, 6, 7, 10, 11, 12, 13, 14, 20 e 22 – ausência de indícios.
    CRIMES 1 e 2 – é aludida a falta de indícios, ainda que não de forma directa – cfr. 1393 a 1422 e 1452 a 1459.
    CRIMES 8 e 9 em – faltas de rigor dos valores contabilizados na acusação que foram objecto de repatriamento pelo RERTII e depois disseminados por outras contas.
    CRIMES 15, 16, 17, 18, 19 e 21- questões formais.
    crime 23 - ausência de crime subjacente
    A fim de facilitar a leitura do texto que se segue,  esclarece-se que a análise seguirá a seguinte ordem:

    - IDENTIFICAÇÃO DO CRIME
    - POSIÇÃO DA DECISÃO RECORRIDA
    - POSIÇÃO DO RECORRENTE
    - BREVE DESCRIÇÃO DA MATERIALIDADE OBJECTIVA
    - A NOSSA POSIÇÃO
    - O CRIME SUBJACENTE
    - A FUNÇÃO DE CADA ARGUIDO NO ESQUEMA DE BRANQUEAMENTO
    - OS JUSTIFICATIVOS CRIADOS
    - O DOLO
    - A CO-AUTORIA
    - CONCLUSÃO

    1.5.2 BRANQUEAMENTOS ASSOCIADOS AO GRUPO “LENA”:

    CRIME DE BRANQUEAMENTO 1 
    €2.875.000,00 feitos circular entre GG e AA (este representado por fiduciário).
    Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, BB e GG, relativamente aos movimentos financeiros com origem no Grupo LENA, com passagem pelas contas da ... tituladas pelo arguido GG, realizados a partir de 2007, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.  
             
    DECISÃO RECORRIDA
    A não pronúncia (fls. 1393 a 1422 da decisão recorrida) fundou-se:
    - Na inexistência de crime precedente;
    - Na circunstância, subsidiária, de os actos de circulação continuarem a fazer parte da execução material do crime precedente e/ou na violação do princípio “ne bis in idem”,
    - Na falta de indiciação do acordo prévio, exigido na co-autoria.

    RECORRENTE
    Reafirma a indiciação da prática do crime precedente e a existência de acordo entre os arguidos, no sentido de montarem e utilizarem este esquema de branqueamento acusado.

    BREVE DESCRIÇÃO DA MATERIALIDADE OBJECTIVA
    Os movimentos financeiros estão demonstrados, de modo esquemático e simplificado, no diagrama I.
    Reporta-se a um conjunto de operações bancárias de circulação da quantia global de €2.875.000,00, liquidada em 2007 e 2008, em três parcelas de €1.250.000,00, €1.125.000,00 e €500.000,00, com origem no universo “Lena” (da esfera do arguido GG) e destino efectivo para o arguido AA.
    Essa circulação ocorreu, num primeiro momento,  entre as contas daquelas sociedades e as contas pessoais de GG (sediadas em Portugal e na ..., sucessivamente) e, num segundo momento, das contas deste para as contas das offshore EMP67... (em associação com a conta final, respectiva, da EMP68...) e EMP36... (em associação com a conta final, respectiva, da EMP20...), de BB.
    Tais fundos foram posteriormente repatriados, juntamente com outros, através da adesão ao RERTII, tendo sido, mais tarde, afectados à satisfação dos interesses de AA.
    Todas as operações financeiras de transferência das vantagens (sendo esta a acção típica) estão documentadas.

    A NOSSA POSIÇÃO
    O CRIME SUBJACENTE
    De acordo com a acusação, a quantia alvo de branqueamento tem origem em contrapartidas ilegais, pela intervenção favorável do arguido AA em benefício do Grupo “Lena”.
    Tais contrapartidas decorrem da prática do crime de corrupção de titular de cargo político, envolvendo do lado passivo os arguidos AA e BB, a que se associa, do lado activo, o arguido GG.
    Estes crimes mostram-se suficientemente indiciados, como resulta supra da sua análise, nada mais se impondo acrescentar.

    A FUNÇÃO DE CADA ARGUIDO NO ESQUEMA DE BRANQUEAMENTO
    AA
    É o “homem do fundo”, aquele para cujo benefício é montado o esquema de branqueamento e é, também, o real proprietário dos fundos branqueados (indiciação a que supra já se fez referência e para onde se remete), mas cujo nome nunca aparece, por se fazer representar por “nomeados”, até atendendo à sua posição de PEP - pessoa exposta politicamente.
    Estas afirmações estribam-se na indiciação (antes assumida) de que as vantagens alvo do RERTII pertencem a AA.
    BB
    É a pessoa “nomeada” pelo arguido AA, para agir em seu nome neste esquema de branqueamento (utilização do método “utilização de pessoas nomeadas”).
    A missão deste arguido é disfarçar a verdadeira titularidade do dinheiro e movimentar os produtos da corrupção, a mando e a benefício de quem o nomeou.
    Este arguido, com recurso aos métodos de branqueamento “Use of Gatekeepers“, “Use of Corporate Vehicles and Trusts” e “Use of Offshore/Foreign Jurisdictions”,  recepcionou os fundos em contas bancárias sediadas no estrangeiro, tituladas formalmente por sociedades “fictícias” offshore, criadas para esse efeito (EMP67.../EMP68..., EMP36.../EMP20...), sem associação à sua pessoa, funcionando as contas dessas sociedades em sistema de “dupla associada” (uma de passagem e outra final  ou underline).
    GG
    Para além de se constituir como o corruptor/pagador das vantagens indevidas, instrumentalizando para o efeito as sociedades do Grupo “Lena”, de cujas contas saíram os réditos (função com relevância especial nos crimes de corrupção aludidos), assume-se, igualmente, como intermediário no esquema de branqueamento por todos gizado (e é esta a função relevante no branqueamento), através do uso das contas bancárias de que era titular, em particular as numéricas que abriu na UBS-..., em razão do que, nos movimentos financeiros por si realizados, era “identificado” apenas por um número.

    OS JUSTIFICATIVOS CRIADOS
    Neste e em quase todos os esquemas de branqueamento, com maior ou menor detalhe, os arguidos procuraram conferir aparência legal às operações financeiras, a começar pelas saídas de capital das sociedades que formalmente liquidaram as vantagens branqueadas, mas também em relação a algumas transacções intermédias.
    Nos esquemas de branqueamento domésticos esse esforço justificativo é mais exuberante, devido ao facto de as transacções estarem mais expostas às autoridades de investigação nacionais.
    No branqueamento que nos ocupa, as saídas do capital da sua origem e a sua passagem para a esfera de GG foram justificadas, contabilisticamente, como pagamentos de suprimentos, encargos e obrigações acessórias por parte da sociedade ao seu sócio, esquema montado, quanto aos dois primeiros pagamentos, com a ajuda da C.G.D. (onde se encontrava à data, em posição de relevo, o arguido DD).
    A segunda transacção (referente a €1.125.000,00) entre os arguidos GG e BB foi justificada com a compra dos terrenos da “Quinta ...” por GG, em Maio de 2007, a II.
    Este justificativo nem seria necessário, atendendo a que apenas aparecia um número a titular a operação de transferência a montante - do lado de GG - dado o uso de conta numérica, mas, como quer que seja, foi realizado e teve a virtualidade de afastar o nome de II deste imóvel, o que se havia tornado necessário, dada a divulgação pública da sua ligação ao processo ....
    A história deste justificativo pode resumir-se da seguinte forma:
    A sociedade EMP105... (com sede nas ...) era a proprietária inicial dos terrenos da “Quinta ...”.
    A sociedade EMP73... (com sede nas ..., cujo capital social estava desde 2000 formalmente nas mãos de II), com o objectivo de adquirir esses terrenos, passou a deter a EMP105..., através da compra do capital social desta, tendo também passado a ser a sua gerente (que o mesmo é dizer II).
    Em Maio de 2007 – isto é, cerca de 1 mês antes da transferência dos €1.125.000,00 - GG adquiriu a totalidade do capital social da EMP73... (e por via desta, a EMP105... e a “Quinta ...”) a II.
    Porém, não há nenhuma evidência do pagamento do preço desta aquisição, nem mesmo nenhum valor associado.
    Por outro lado, esta alegada aquisição do capital social da EMP73... foi feita a II, e não a BB (pessoa que veio a recepcionar os fundos).
    A EMP73... (e por esta via a EMP105... e os terrenos da “Quinta ...”) acabou por passar formalmente para a esfera de BB em Abril de 2013, através de uma alegada compra do capital social por NN a GG, a pedido de BB.
    O arguido GG refere no seu interrogatório, em inquérito, que quem se apresentou a fazer o negócio do imóvel foi BB e que  nunca recebeu o preço da venda dessa participação social, o que faz sentido, posto que também não pagou a sua aquisição, ambas negociadas por BB.
    Através destes intrincados negócios a “Quinta ...”, que inicialmente estava formalmente na esfera de II, passou formalmente para a esfera de BB em Abril de 2013 (depois de ter estado na esfera de GG entre Maio de 2007 e Abril de 2013).
    É legítima a inferência, constante da acusação, de que todos estes negócios da “Quinta ...” foram realizados em representação de AA, através dos seus dois fiduciários sucessivamente nomeados, pois que, depois de voltas e voltas, sempre em nome formal de sociedades offshore, o imóvel acabou nas mãos dos representantes nomeados por este arguido.
     
    O DOLO
    Os três arguidos acusados por este crime de branqueamento são autobranqueadores, razão pela qual o conhecimento da origem ilícita de “catálogo” das vantagens branqueadas é obvio.
    Quanto ao dolo específico (de dissimular a origem ilícita dos fundos e evitar que os seus agentes sejam criminalmente perseguidos), a passagem dos fundos pela conta numérica titulada por GG, sediada na UBS-... e pelas contas das sociedades offshore EMP67.../EMP68..., EMP36.../EMP20... (de BB), não  teve outro propósito senão o de  quebrar a cadeia de ligação dos réditos à sua origem  e, por essa via, evitar a perseguição criminal dos agentes do crime de onde são oriundos.
     Só isso justifica o recurso aos serviços de uma agência de gestão de fortunas para a criação de tais sociedades “veículo”, o uso destes “veículos” corporativos no esquema de branqueamento, que foi gizado com o apoio e orientação do departamento “Ibéria” da UBS, cuja missão era, ao fim e ao cabo, agilizar esses procedimentos com a máxima discrição e eficiência.
    Sem esquecer os elevados custos que a montagem e uso deste esquema de branqueamento importou, custos que os branqueadores assumem como um “mal necessário” e, nessa medida, estão sempre dispostos a arcar com essas perdas.

    A CO-AUTORIA
    Em matéria de co-autoria, a materialidade objectiva permite suportar, mais que não seja através de juízos de inferência, que os arguidos actuaram acordados entre si em toda a linha de branqueamento - quer o acordo tenha sido expresso ou tácito, prévio ou sucessivo (tudo formas de acordo admitidas pelo artigo 26º, do CP).
     Só dessa forma foi possível montar e fazer funcionar o esquema de branqueamento, fortemente indiciado.
    Ademais, em sede de inquérito, o arguido GG referiu que a abertura das contas na ... teve o apoio de BB, a escolha do tipo de contas (no caso numéricas) foi dos funcionários do departamento “Ibéria” da UBS e as transferências foram realizadas para contas indicadas por BB.
    É certo ter GG justificado parte destas entregas com o pagamento a BB de serviços de “procurement”, realizados a favor do Grupo “Lena”, assumidos do seu próprio bolso, com conhecimento, apenas, do seu irmão.
    Porém, esta justificação não merece credibilidade, desde logo porque BB imputa a esses serviços de “procurement” todos os milhões que recebeu na ... e que transitaram pelo universo “Lena” e/ou por GG (por aqui se vendo a falta de coerência desta justificação) e, por outro lado, não se vê que uma pessoa individual assuma despesas sociais destes montantes, sem dar a conhecer às sociedades os seus pagamentos.

    CONCLUSÃO
    Não resta nenhuma dúvida de que os indícios da prática deste crime de branqueamento, pelos três arguidos acusados, são mais do que suficientes para os sujeitar a julgamento.

    Termos em se julga procedente o recurso quanto a este branqueamento 1, relativamente aos três arguidos AA, BB e GG.
    **
    1.5.2.1 CRIME DE BRANQUEAMENTO 2
    €2.955.925,00 feitos circular entre GG e AA (este representado por fiduciário).
    Um crime de branqueamento  praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, BB, GG, a sociedade LEC SA e a sociedade XLM, relativamente à utilização da sociedade XLM, entre 2009 e 2015, para a colocação de fundos destinados ao arguido AA e utilização dos mesmos no seu interesse, através do pagamento de despesas e de distribuição de dividendos para contas tituladas pelo arguido BB, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do  Código Penal.

    DECISÃO RECORRIDA
    A não pronúncia (fls. 1433 e seguintes da decisão recorrida) é baseada nos seguintes argumentos:
    - Na inexistência de crime precedente, sendo que uma parte do capital derivaria de uma actuação de AA já depois de o mesmo ter cessado as funções de Primeiro Ministro;
    - Na circunstância, subsidiária, de os actos de circulação continuarem a fazer parte da execução material do crime precedente e/ou na violação do princípio “ne bis in idem”.

    RECORRENTE
    Reafirma, no seu recurso, estar indiciada a prática do crime precedente e refere que os pagamentos realizados nos anos de 2012 a 2014 reportam-se, ainda, à actuação de AA aquando do exercício do cargo político de Primeiro Ministro.

    BREVE DESCRIÇÃO DA MATERIALIDADE OBJECTIVA
    Os movimentos financeiros estão esquematizados, de forma simplificada, nos diagramas II.1 e II.2.
    O branqueamento é referente a actos de circulação e de integração  de fundos entre 2009 e 2014, num total de cerca de €3.000.000,00 (mais concretamente €2.955.925,00, correspondente ao somatório das parcelas de €241.000,00 + €963.925,00 + €500.000,00 + €142.500,00 + €879.500,00 + €229.000,00 identificadas no quadro II.1), que acrescidos de IVA, no valor global de €650.000,00, somam €3.605.925,00.
    Tais fundos têm origem no universo Grupo “Lena”, nomeadamente na LEC-SA (da esfera do GG, portanto), e têm como destinatário final o arguido AA, embora representado pelo “testa de ferro” BB.
    A sociedade XLM,  controlada por BB, foi utilizada como sociedade “veículo” para o recebimento formal e circulação das quantias.
    A partir das contas da XLM foram realizados pagamentos de despesas do arguido AA e distribuídos capitais para contas tituladas por BB, nomeadamente a BES terminal 006.

    A NOSSA POSIÇÃO

    A RAZÃO DA CRIAÇÃO DE UM ESQUEMA DE BRANQUEAMENTO DOMÉSTICO.
    O facto de os arguidos terem tido necessidade de alterar o método de branqueamento quanto a estes fundos, arquitectando, desta vez, um esquema doméstico (temos aqui a utilização do método “Use of Domestic Financial Institutions”), intui-se com facilidade.
    Na verdade, só em 2011 é que as contas BES terminais 006 e 407 começaram a ser aprovisionadas com capital antes depositado em bancos estrangeiros (em contas das offshore sediadas na ...), uma vez que a sua entrada no sistema bancário português se operou através da conta BESI n.° ...95, de BB, sob a forma de aplicações financeiras “em trânsito”, pelo que, nesta fase, os capitais líquidos ainda não se encontravam disponíveis para serem utilizados.
    Por outro lado, já se haviam exaurido os fundos (advindos do Grupo BES) que o arguido AA, através do seu primo II, havia conseguido colocar em Portugal - reportamo-nos aos €2.000.000,00 que foram disponibilizados via XXXXXX, levantados e entregues entre 2006 e 2008 em pequenas parcelas, por FFFFFFFF.
    Portanto, entre 2009 e 2011 houve necessidade de criar um esquema de branqueamento distinto, que permitisse ao arguido AA, para sustentar o seu elevado modo de vida, usufruir das vantagens ilícitas que lhe foram destinadas.
    Daí a necessidade de montar um esquema localizado em Portugal.

    O CRIME SUBJACENTE
    Lê-se, na decisão recorrida, que os pagamentos ocorridos entre 2012 e 2014 representam contrapartidas de actos de influência do arguido AA, a favor do Grupo “Lena”, junto de decisores da ..., ... e ..., já após a cessação de funções de Primeiro Ministro.
    Assim, na perspectiva da decisão instrutória, tais contrapartidas não integram o crime de corrupção 1, nem são ilícitas e, como tal,  não são passiveis de serem branqueadas, por ausência do crime subjacente (ponto 2 do Cap. IV – folhas 978 e seguintes, em especial o ponto 2.4.5. -fls. 1257-, fls. 1452 e segs. e ponto 8F -fls. 1479 e seguintes).
    A decisão recorrida faz, portanto, uma clara divisão entre os fundos alvo de branqueamento decorrentes dos pagamentos realizados entre 2009 e Março de 2011, relativamente aos quais julgou não suficientemente indiciada a prática do “crime” subjacente, e os fundos sujeitos a operações de branqueamento cuja entrega pelo corruptor ocorreu entre 2012 e 2014, os quais representam, na sua leitura, contrapartidas da prática de actos atípicos levados a cabo pelo arguido AA neste período, na sequência de novo acordo, celebrado entre os arguidos no ano de 2012.
    Lê-se, a esse propósito, na decisão recorrida (fls. 1390 e 1391):            “Cumpre  referir, também, que os factos imputados relativos à denominada capacidade de influência do arguido AA entre 2012 e 2014, por estarem relacionados com um período temporal em que o arguido AA já não exercia funções de Primeiro-Ministro e não tinha, por isso mesmo, a qualidade de titular de cargo político, não relevam para o preenchimento do tipo de ilícito de corrupção uma vez que este crime, na modalidade imputada na acusação, exige que o agente corrompido detenha a qualidade de titular de cargo político e que os actos sejam praticados no exercício dessas mesmas funções. Como ficou demonstrado, o arguido AA cessou funções como Primeiro-Ministro no dia ../../2011, o que significa que a partir desse momento deixou de ter a qualidade de titular de cargo político prevista no artigo 3º da Lei 34/87, de 16 de Julho, razão pela qual os factos por ele cometidos a partir dessa data, por não se enquadrarem no exercício das funções de Primeiro-Ministro, são insusceptíveis de preencher o crime de corrupção passiva.  Do lado activo, uma vez que o alegado agente corrompido deixou, a partir de ../../2011, de ter a qualidade de titular de cargo político, faz com que os factos relativos ao período de 2012-2014 não possam ser qualificados como um crime de corrupção activa p e p pelo artigo 18º da Lei 34/87, de 16 de Julho.  Assim sendo, a conduta descrita na acusação relativa ao período de 2012/2014, por ser uma conduta atípica, a mesma não tem qualquer relevância criminal ao nível do crime de corrupção.”
    Importa relembrar que o arguido AA ocupou o cargo de Primeiro Ministro até ao dia ../../2011.
    Vejamos, então, cada um destes períodos temporais.
    Relativamente aos pagamentos realizados nos anos de 2009, 2010 e 2011, o respectivo montante global, sem IVA, é de €1.704.925,00 (€241.000,00 + €963.925,00 + €500.000,00), estando aqui incluída uma parcela de €125.000,00 que a decisão recorrida desconsiderou a fls. 1090 (apesar de a mesma estar referida no artigo 1993 da acusação mencionado nesse trecho decisório), bem como os pagamentos realizados em Junho e Agosto de 2011 (reportados às duas parcelas da 7ª factura do contrato I LEC-SA/XLM/1ª de 2011), não se percebendo a razão pela qual não foi incluído neste grupo o pagamento desta 7ª factura, local onde deveria estar, atenta a sua data.
    O ilícito subjacente de “catálogo” é, ainda, o de corrupção elencado em 1 (do lado passivo), referente à intervenção favorável do arguido AA a benefício do Grupo “Lena”, a que se associa, do lado activo, o crime de corrupção supra enumerado em 2.
    Tal crime já foi considerado suficientemente indiciado, razão pela qual  não colhe o fundamento decisório de falta de indiciação da tipicidade destas vantagens alvo de branqueamento.
    No que concerne aos pagamentos realizados nos anos de 2012, 2013 e 2014, no montante global, sem IVA, de €1.251.000,00 (€142.500,00 + €879.500,00 + €229.000,00), a decisão recorrida e o Recorrente têm entendimentos diferentes sobre o que motivou essas entregas, fazendo interpretações distintas da factualidade inserta na acusação a este propósito.
    Os factos relevantes para a apreciação desta questão estão, essencialmente, vertidos nos seguintes artigos da acusação:
    12757. Após o arguido AA ter cessado funções como Primeiro Ministro, em Junho de 2011, a LEC cessou, a partir de Agosto de 2011, os pagamentos que haviam sido estabelecidos realizar à XML, conforme acima narrado e que visavam atribuir uma compensação para a esfera daquele primeiro arguido, através do arguido BB e da XML.
    12758. No entanto, a partir do final do ano de 2012, o Grupo LENA encontrava-se em dificuldades para o recebimento de pagamentos relativos a trabalhos que tinha desenvolvido na ... e em ..., bem como pretendia obter novos trabalhos na ... e em ....
    12759. O arguido GG, por sugestão do arguido BB, visualizou então como útil recorrer aos conhecimentos do arguido AA, no que se refere aos responsáveis políticos dos referidos países, a fim de facilitar os contactos e obter decisões quanto aos pagamentos em atraso e quanto às propostas de novos trabalhos que pudessem ser atribuídos ao Grupo LENA.
    12760. O arguido AA, na sequência de contactos mantidos com o BB, acedeu em utilizar os seus conhecimentos e facilidades de contacto com os responsáveis políticos dos referidos países a fim de procurar conseguir marcar reuniões com os decisores locais e promover os interesses do Grupo LENA.
    12761. Para esse efeito, o arguido AA decidiu também utilizar os seus contactos e invocar a sua qualidade de ex-Primeiro Ministro junto de membros do corpo diplomático português e do Ministério dos Negócios Estrangeiros, a fim de, caso necessário, conseguir estabelecer os contactos e marcar as reuniões que se mostrassem necessárias com os responsáveis políticos dos referidos países, para promover os interesses do Grupo LENA, conforme lhe fosse solicitado.
    12762. O arguido AA, em acordo com o BB, visava, por essa via, evidenciar a sua utilidade para o grupo LENA, de forma a que os mesmos viessem a retomar os pagamentos a coberto do pretenso contrato de prestação de serviços firmado entre a LEC e a XLM, bem como de forma a que o Grupo LENA aceitasse vir a contratar serviços a empresas de GGGGGGGG e do Grupo EMP35..., para que o arguido pudesse ver reforçada a sua posição de prestador de serviços para estes últimos.
    A decisão recorrida, no que toca à matéria alegada nestes artigos da acusação,  retira a ilação de que, em 2012, teve lugar a celebração de um novo acordo entre os arguidos acusados, no sentido de o arguido AA iniciar uma nova fase de exercício de influência a favor do Grupo “Lena”, junto de decisores de países estrangeiros, concretamente  da ..., de ... e da ..., tirando partido, para o efeito, da sua qualidade de ex-Primeiro Ministro.
    Os pagamentos realizados via XLM, a partir de 2012, representariam remunerações  destes novos serviços prestados.
    O Recorrente entende que os pagamentos realizados a partir de 2012 são, ainda, contrapartidas da actuação de AA a favor do Grupo “Lena”, levados a cabo quando era Primeiro Ministro, não tendo havido nenhum segundo acordo referente a recompensas que não tivessem sido acordadas antes de Junho de 2011.
    A nosso ver, a factualidade narrada na acusação permite sustentar a interpretação do acusador/Recorrente.
    A redacção dos transcritos artigos não afasta esse entendimento, uma vez que os segmentos “a LEC cessou, a partir de Agosto de 2011, os pagamentos que haviam sido estabelecidos realizar à XML”  (…)  e “de forma a que os mesmos viessem a retomar os pagamentos a coberto do pretenso contrato de prestação de serviços firmado entre a LEC e a XLM”, inculcam a existência de pagamentos antes acordados realizar à XLM, o que nos remete para um acordo de pagamentos anterior, que a partir de Agosto de 2011 deixou de ser cumprido do lado do corruptor.
    A ser assim, impõe-se deduzir que o acordo de pagamento dos 3 milhões só poderá ser anterior ou, no máximo, contemporâneo da data da elaboração do contrato I LEC-SA/XLM, datado de 31.07.2009.
    Por outro lado, sempre de acordo com a acusação, o contrato I LEC-SA/XLM foi celebrado para justificar a entrega de 3 milhões de Euros, em doze (12) parcelas (12 facturas), com o valor trimestral de €250.000,00 + IVA, pelo que o contrato tinha a duração de 3 anos, o que nos remete para meados de 2012.
    Nesta data – meados de 2012 -  estava em falta o pagamento de cinco facturas (as facturas n.ºs 8 a 12), num total de €1.250.000,00 (+ IVA),  que corresponde, grosso modo, ao montante entregue nos anos de 2012 a 2014.
    Uma vez que a liquidação destes montantes estava acordada pelo menos desde a data da elaboração do contrato, tais pagamentos não podiam deixar de se referir à intervenção favorável ao Grupo “Lena”, levada a cabo pelo arguido AA, ainda na qualidade de Primeiro Ministro.
    Tal não significa que a actuação do arguido AA, junto dos decisores daqueles três países, a partir de 2012, não tenha cumprido com a função de reforçar a necessidade da retoma do cumprimento do acordado (acordo de pagamento de vantagens indevidas pré-estabelecido e que estaria em situação de incumprimento).
    Nesta perspectiva, não tem razão a decisão recorrida quando afirma que, para efeitos de preenchimento do tipo legal de branqueamento, estes fundos liquidados em 2012 a 2014 não constituem, de acordo com a acusação, vantagens indevidas típicas de “catálogo”, porquanto tratam-se ainda de vantagens indevidas associadas à prática do crime de corrupção de titular de cargo político, temporalmente balizado entre 2005 e meados 2011, envolvendo, do lado passivo, os arguidos AA e BB, a que se associa, do lado activo, o arguido GG.

    A FUNÇÃO DE CADA ARGUIDO NO ESQUEMA DE BRANQUEAMENTO
    AA
    Mantém a posição de “homem do fundo”, nos exactos termos mencionados no CRIME 1, para onde se remete.
    A indiciação da titularidade das vantagens alvo de branqueamento à pessoa de AA resulta ainda mais clara neste crime, posto que os fundos feitos circular serviram para realizar pagamentos de despesas referentes aos interesses de AA, como veremos de seguida.
    BB
    Assume a missão de pessoa “nomeada” pelo arguido AA, nos termos descritos no CRIME 1, para onde se remete.
    Porém, neste branqueamento doméstico, este arguido actua sob a “fachada” de uma sociedade por si mandada criar - a XLM - , desde o início por si controlada e da qual foi gerente até Janeiro de 2015.
    A XLM foi constituída em 07.07.2009, face à necessidade de serem recepcionados novos fundos disponibilizados pelo Grupo “Lena”.
    No fim desse mesmo mês foi aberta conta bancária no BES, titulada pela XLM - conta ...79 . A partir desta foram transferidos parte dos fundos para a conta BES n.° ...06 (conta de passagem, associada à conta final BES n.° ...07), titulada formalmente pelo arguido BB, cujos activos já demos como fortemente indiciado pertencerem, na quase totalidade, ao arguido AA.
    GG
    Surge como agente de circulação dos fundos pela XLM (actuando nesta parte como agente do branqueamento), apesar de saber que o proprietário/destinatário das quantias não era a XLM, nem a pessoa individual que a controlava (BB), mas era o arguido AA.
    GG é também pagador das vantagens indevidas, por via das sociedades do Grupo “Lena” - de cujas contas saíram formalmente os réditos - actuação cujo relevo típico é preponderante no crime de corrupção supra enumerado em 2.

    O CASO PARTICULAR DAS SOCIEDADES ARGUIDAS LEC-SA E “XLM-SOCIEDADE DE ESTUDOS E PROJECTOS LDA.”
    As suas intervenções mediaram entre 2009 e 2014.
    A factualidade objectiva que lhes é imputada tem lugar já após a alteração do art.º 11º, do CP, entrada em vigor em 15.09.2007 (por via da Lei 59/2007, de 04/09), que  consagrou a responsabilidade das pessoas colectivas no âmbito do Direito Penal nuclear, nomeadamente, de modo expresso, quanto ao crime de branqueamento (n.º 2 proémio do art.º 11º, do CP, na referida redacção), desde que os actos tenham sido praticados, no que para aqui importa, em seu nome e no interesse colectivo, por pessoas que nelas ocupem uma posição de liderança.
    Sob o ponto de vista de “quem” tem a capacidade de fazer actuar a responsabilidade colectiva, nenhuma questão aqui se levanta, posto que o arguido GG era Presidente do Conselho de Administração da LEC-SA e o arguido BB era o gerente da XLM.
    Porém, para que opere a responsabilidade criminal das pessoas colectivas de direito privado é ainda necessário, à luz da redacção do citado artigo 11º, que esse “quem” tenha agido não só em seu (da entidade colectiva) nome, mas também no seu (da entidade colectiva) interesse, ou seja, no interesse colectivo.
    Se a actuação do arguido GG a benefício do interesse colectivo da LEC-SA se percebe - posto que as entregas das vantagens a uma sociedade de “fachada” e a produção de falsos justificativos permitiu dificultar a ligação dos fundos entregues à prática do ilícito subjacente, o qual visou a satisfação de interesses económicos do Grupo “Lena” -, já não conseguimos alcançar em que medida é que o arguido BB possa ter actuado no interesse colectivo da XLM.
    Na verdade, na tese da acusação - que subscrevemos - a XLM foi formalmente criada com o único propósito de servir de “fachada” ao recebimento das vantagens indevidas e à sua entrega ao beneficiário final (através do seu fiduciário), a que lhes foi dada aparência legal, através da celebração de contratos simulados.”
    Ora, não tendo esta sociedade existência material - que o mesmo é dizer actividade económica real - trata-se de uma entidade colectiva puramente “fictícia”, cuja existência formal apenas visou satisfazer os interesses do seu sócio e da pessoa que este representa, o que, por si só, nos impede de considerar que o seu gerente, ao fazê-la aceitar assumir um papel de “fachada” no esquema de branqueamento montado, tenha actuado no seu (da sociedade) interesse colectivo.
    Aliás, a sociedade nem tem propriamente um interesse colectivo, dado não ter existência material.
    A realidade é que a XLM não prestou serviços a ninguém, assim como ninguém lhe prestou serviços, apesar do manancial de contratos elaborados para justificar recebimentos e pagamentos.
    A propósito da falta de actividade económica da XLM, o arguido NN refere, no seu interrogatório: Questionado sobre o que lhe diz XLM, NN diz que é uma empresa que é praticamente 100% do Eng. BB (…) entende que é uma empresa tipo instrumental para aquelas outras entidades que ele dissesse que a RMF podia participar, investimentos, ver novas coisas (…) não há nada que possa dizer que faça directamente para a XLM ou que vá directamente pela XLM (…)a XLM nunca teve funcionários, pelo que saiba, nem nunca teve actividade a partir de .... (…) a RMF actuava por pedido da XLM para o processo de fracturação ser assim. (…) Questionado se havia uma indicação para facturar à XLM, como se ela fosse uma central de custos, NN responde afirmativamente.
    Portanto, este arguido – que até era formalmente avençado da XLM, embora confessadamente não tenha prestado serviços a tal empresa – concluiu não ser conhecida à XLM actividade real, pois não tinha funcionários, não tinha sede efectiva (só legal), limitava-se a ser uma “central de custos”, que o mesmo é dizer uma entidade pagadora de facturas alheias, a pedido de BB.

    OS JUSTIFICATIVOS CRIADOS
    Como “central de custos” que era, a XLM teve necessidade de justificar as entradas de capital, que veio posteriormente a ser usado no pagamento das despesas/facturas indicadas por BB.
    Para o efeito, com data de 31.07.2009 foi formalizado um contrato - dito contrato de prestação de serviços I LEC-SA/XLM - que legitimou o recebimento pela XLM de €3.000.000,00, pagos pela LEC-SA em 12 prestações, de €250.000,00 cada, acrescidas de IVA.
    Os serviços a prestar pela XLM seriam o “acompanhamento, captação, desenvolvimento e a coordenação de projectos de management, construção, engenharia e arquitectura no mercado internacional, nomeadamente no mercado dos países do ..., ... e ...”.
    Porém, a XLM não prestou nenhum serviço à LEC-SA, nem há documentação de suporte de qualquer actividade, a não ser a emissão de facturas.
    Confrontados, em 2011, com um pedido da Direcção Geral de Contribuições e Impostos de envio de cópia de documentos emitidos pela XLM a propósito do contrato, GG e BB apressaram-se a mandar elaborar relatórios de actividades, mas com datas pretéritas.
    Para a realização desses relatórios, os serviços de BB tiveram necessidade de recolher informações, junto da LEC-SA, sobre os concursos internacionais em que a mesma tinha participado. Em 08.11.2011, por mail (junto aos autos), foi prestada tal informação.
    Portanto, ao fim de 20 dias da sua criação, a XLM já havia logrado angariar e celebrar um contrato de €3.000.000,00. Em fins de 2011 não havia nenhuma evidência, parca que fosse, de a XLM ter prestado quaisquer serviços à LEC-SA.. Quando foram confrontadas com a necessidade de fazer prova desses serviços efectivos, apressaram-se a realizar relatórios, com datas pretéritas, mas para cujo conteúdo a XLM precisou de saber o básico (face ao objecto do contrato), que era, pelo menos, ter uma noção dos concursos internacionais em que a LEC-SA tinha participado.
     Tudo isto são indícios, mais do que fortes, de que o contrato justificativo não tem qualquer substrato material e visou, apenas, dar aparência legal a saídas de dinheiro do Grupo “Lena” e às suas entradas na esfera da XLM, ou seja, de BB.

    OS PAGAMENTOS REALIZADOS A FAVOR DOS INTERESSES DE AA, COM BASE NA QUANTIA DE €3.000.000,00.
    Como se verifica do diagrama II.2, a quantia de €3.000.000,00 (juntamente com outras advindas de outros grupos e que também passaram pela XLM) foi depois dissipada em pagamentos directos, realizados pela XLM, de despesas do arguido AA.
    Podem ser dados os seguintes exemplos:
    - €58.229,41 pagos à EMP34..., referentes a despesas de alojamentos em ...;
    - €79.678,83  referentes a outras despesas com viagens;
    - €2.298.810,00 levados a crédito na conta bancária BES terminal 006, com a justificação de distribuição de dividendos ao arguido BB;
    - €333.000,00 referentes a pagamentos a MM;
    - €98.000,00 referentes a pagamentos a OO, mulher do ex-ministro BBBB;
    - €840.927,50 referentes a pagamentos à RMF, controlada pelo arguido NN, sendo que a partir desta sociedade foram pagas posteriormente outras despesas do arguido AA, como se verá no CRIME 10.
    Os pagamentos destas últimas três quantias foram justificados através da celebração de contratos de prestação de serviços, sem que haja evidência do seu fornecimento, portanto, sem conteúdo económico subjacente.
    No que respeita aos efectivos serviços prestados por OO, essa testemunha referiu, em sede de inquérito, que não fez um único relatório de serviços prestados, limitou-se a reunir esporadicamente com BB e, nesses encontros, fez-lhe “relatórios verbais”. BB não tirou notas. O seu serviço consistiu em realizar pesquisas online e obter informações de alguns “contactos” que tinha no terreno, o que, convenhamos, parece pouco ou nada para justificar recebimentos de €98.000,00 no decurso de cerca de um ano e meio (entre Abril de 2013 e Novembro de 2014).
    Relativamente aos efectivos serviços prestados por MM, a mesma referiu que os realizou, entregava os relatórios a BB em CD, mas não tinha os mesmos disponíveis porque o seu computador avariou. Nunca assinava esses trabalhos. As quantias que recebia da XLM permitiam-lhe pagar as prestações do empréstimo do “Monte ...”. Também aqui não há nenhuma evidência de efectivos trabalhos que esta arguida tenha realizado, no âmbito do contrato entre a própria e a XLM. A avaria do computador, a par da inexistência de qualquer suporte de papel ou digital, parecem demonstrar isso mesmo, pelo menos, em termos indiciários.
    Estes pagamentos aparentam ter sido uma forma de fazer chegar a esta arguida meios económicos disponibilizados pelo arguido AA, nomeadamente, a partir de 2012, para o pagamento da amortização bancária do mútuo celebrado para a compra do “Monte ...”, adquirido por €760.000,00, quando nem ela, nem o namorado/companheiro, tinham capacidade financeira para suportar esta compra, como a própria, facilmente, reconheceu.
    Parte destas operações situam-se já na terceira fase do branqueamento, fase de integração.

    O DOLO
    Os três arguidos acusados GG, AA e BB são autobranqueadores, sendo “lapalissiano” o seu conhecimento da origem ilícita de “catálogo” das vantagens branqueadas.
    Quanto ao dolo específico (de dissimular a origem ilícita das vantagens liquidadas entre 2009 a 2014  e evitar que os seus agentes sejam criminalmente perseguidos) o mesmo resulta de todas as referidas manobras - a criação de sociedade “fictícia” (a XLM), criação de simulados contratos de prestação de serviços e outros justificativos formais, as próprias operações financeiras.

    A CO-AUTORIA
    Voltamos a referir, à semelhança do que dissemos no CRIME 1, que a materialidade objectiva permite suportar, mais que não seja através de juízos de inferência, terem os arguidos actuado acordados entre si em toda a linha de branqueamento (quer o acordo tenha sido expresso ou tácito, prévio ou sucessivo, tudo formas de acordo admitidas pelo artigo 26º, do CP), pois só dessa forma foi possível montar e fazer funcionar o esquema de branqueamento fortemente indiciado.
    É certo que o arguido GG, em sede de inquérito, verbalizou desconhecimento relativamente aos pagamentos das suas sociedades à XLM. Porém, esta tese não nos merece nenhuma credibilidade, até atendendo ao volume de fundos que foram transferidos das contas das sociedades do Grupo “Lena” para a XLM (mais do que €7.000,000,00, sendo €3.000.000,00 neste crime e o remanescente no crime 6), montante que, obviamente, não lhe pode ter passado despercebido.

    CONCLUSÃO
    Não resta nenhuma dúvida de que os indícios da prática deste crime de branqueamento pelos arguidos GG, AA, BB e a sociedade LEC-SA, são mais do que suficientes para os sujeitar a julgamento.
    Já no que respeita à sociedade “XLM-Sociedade de Estudos e Projectos, Lda.”, o recurso terá de improceder, mantendo-se a decisão de não pronúncia da sociedade, em virtude de a mesma ser uma entidade “fictícia”, porque sem existência material, sem actividade económica, criada com o único fito de servir de “fachada” e de “veículo” a um esquema de branqueamento, o que é, em si mesmo, incompatível com a ideia de o seu gerente ter agido no interesse colectivo dessa sociedade.

    Termos em se julga procedente o recurso quanto a este branqueamento 2, relativamente aos arguidos AA, BB, GG e a sociedade LEC SA e improcedente quanto à sociedade “XLM-Sociedade de Estudos e Projectos, Lda.”

    1.5.3 CRIMES DE BRANQUEAMENTOS ASSOCIADOS AO GRUPO “GES”

    1.5.3.1 CRIME DE BRANQUEAMENTO 3
    €6.000.000,00 feitos circular entre CC e AA (este representado por fiduciário).
    um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, CC, HH, BB e II, relativamente à utilização, entre 2006 e 2008, de contas na ... em que o arguido II era autorizado e operações financeiras realizadas a partir das mesmas, p. e p. pelo art.º 368.°-a, n.ºs 1, 2 e 3, do código penal.

    DECISÃO RECORRIDA
    Assentou a não pronúncia:
    - Na falta de descrição do dolo do tipo e do dolo da culpa;
    - Na falta de indiciação do crime precedente;
    - Na circunstância, subsidiária, de os actos de circulação continuarem a fazer parte da execução material do crime precedente e/ou na violação do princípio “ne bis in idem” – os três fundamentos já foram conhecidos supra.
    - Na falta de indiciação da prática deste concreto branqueamento.

    RECORRENTE
    Manifesta-se no sentido de estar indiciada a prática do crime precedente e a prática do crime de branqueamento.

    BREVE DESCRIÇÃO DA MATERIALIDADE OBJECTIVA
    Os movimentos financeiros estão demonstrados no diagrama III, de onde é patente que os métodos de branqueamento utilizados se assemelham, em tudo, ao CRIME 1.
    O branqueamento reporta-se a um conjunto de operações bancárias de circulação da quantia global de € 6.000.000,00, ocorridas entre 2006 e 2008, com origem no universo “GES” (da esfera do arguido CC) e com destino para o arguido AA.
    Essa circulação ocorre, num primeiro momento, entre contas de várias sociedades associadas ao GES, num segundo momento, para contas do arguido HH (como intermediário) e, num terceiro momento, para contas do arguido II (como fiduciário de AA).  A partir daqui, uma parte seguiu para as contas do arguido BB (também como fiduciário de AA) e, outra parte, seguiu para uma conta sediada em ..., de XXXXXX, por via do qual chegou à disponibilidade efectiva de II e, deste, ao arguido AA.
    A essa quantia de €6.000.000,00 acresceu, ainda, €1.000.000,00, que, de acordo com a acusação, ficou na titularidade do arguido HH e visou proceder ao pagamento dos seus serviços de intermediação (correspondente a cerca de 17% do capital feito circular).
    É de referir que as operações financeiras de circulação dos €6.000.000.00 (sendo esta a acção típica) estão todas documentadas nos autos.

    A NOSSA POSIÇÃO
    O CRIME SUBJACENTE
    De acordo com a acusação, os fundos branqueados constituem contrapartidas ilegais, pela intervenção favorável do arguido AA a benefício do Grupo “GES”.
    Não há dúvidas de que o crime subjacente de corrupção é o elencado em 4 (do lado passivo, em que é agente corrompido AA), a que se associa o 5 (do lado activo, em que é agente corruptor CC), nem a decisão instrutória suscita reservas a este propósito.
    Este crime subjacente foi considerado suficientemente indiciado, razão pela qual este fundamento da não pronúncia não tem acolhimento.

    A FUNÇÃO DE CADA ARGUIDO NO ESQUEMA DE BRANQUEAMENTO
    AA
    Continua a assumir a função de “homem de trás”, em prol de quem foi gizado e executado mais este esquema de branqueamento, nos termos referidos no CRIME 1, para onde se remete.
    A ligação entre os €6.000.000.00, alvo de circulação, à pessoa deste arguido mostra-se fortemente indiciada.
    Na verdade, os €3.500.000,00 que circularam de II para BB  foram repatriados pelo RERTII e posteriormente creditados nas contas BES terminais 006 e 407. Já tivemos oportunidade de considerar indiciado que todo o património repatriado por essa via está inelutavelmente associado aos interesses do arguido AA, como o comprovam os levantamentos, entregas em numerário e pagamentos feitos a partir dessas contas, de que falaremos mais detalhadamente em certos crimes infra.
    A parcela dos €2.000.000,00, repatriada em momento anterior via XXXXXX, foi levantada em ..., em pequenas parcelas, por FFFFFFFF, funcionário de II.
    Acresce ter o arguido CC justificado a saída dos fundos na contabilidade real da ES Enterprises como “Pagamentos PT”, o que, por si só, denuncia a verdadeira razão subjacente a tais pagamentos.
    Na verdade, que se saiba, nem HH, nem II, nem BB, nem XXXXXX, tinham qualquer relação com a PT.
    O que constitui indício da justificação da entrega, mas, também, do seu beneficiário final.
    Verifica-se a existência de uma “perda” de €500,000,00 (correspondente a 12% do capital), que ficavam “retidos” em II.
    CC
    Surge (para além de pagador das vantagens, utilizando para o efeito  as sociedades da ESCOM - participadas pelo GES, em que HH figurava como Presidente da Administração - como “fachada” e as contas dessas entidades em ... e mesmo em Portugal, no Banco Totta & Açores, mas a origem última dos fundos advém do Grupo BES) como agente da circulação dos fundos por intermediários, posto que o mesmo sabia estar a proceder a entregas àqueles ( intermediários) que, por sua vez, seriam canalizadas para o fiduciário e, deste, para o beneficiário das vantagens.
    Do art.º 4498 da acusação consta um esquema detalhado desses movimentos financeiros entre CC/HH.
    [Imagem]
    HH
    É, a nosso ver, o intermediário de eleição na circulação das grandes quantias pagas a AA, assumindo um papel de branqueador quase profissional. Foi fortemente remunerado por essa tarefa, tendo auferido, no total, mais de €5.000.000,00.
    Este arguido estava perfeitamente entrosado com os esquemas de branqueamento, tendo até criado uma sociedade “Gatekeepers” - a Akoya -, dado o seu “know-how ”.
    Pela intermediação dos fundos alvo deste crime, recebeu a contrapartida de €1.000.000,00, que fez transitar para a offshore EMP98....
    Do art.º 4999 da acusação consta o esquema detalhado das complexas operações de branqueamento dos €6.000.000,00, na etapa HH/II.
    [Imagem]
    Assume relevo significativo o facto de o arguido HH ter admitido, em sede de inquérito, ter aceitado fazer circular dinheiros pelas suas contas, a pedido de CC.
    II
    É primo de AA.
    Foi o nomeado por este último para o papel de fiduciário (utilização do método “utilização de pessoas nomeadas”), só tendo deixado de cumprir com essa missão quando, publicamente, foi associado ao processo ....
    BB
    Foi o segundo fiduciário “nomeado” pelo arguido AA,  numa altura em que, por segurança, houve necessidade de substituir o primeiro fiduciário, assumindo a mesma tarefa já descrita no CRIME 1, para onde se remete.

    OS JUSTIFICATIVOS CRIADOS
    Centremo-nos, agora, nos justificativos criados para dar aparência legal às transacções.
    A contabilidade da ES Enterprises foi alvo de manobras fraudulentas.
    O arguido CC determinou que na contabilidade oficial da ES Enterprises ficasse a constar, associado à saída do capital, um “activo com saldo negativo”, em lugar de um “passivo”.
    Na contabilidade paralela da ES Enterprises, que é a real, mandou justificar a saída dos fundos como “Pagamentos PT”.
    O chamado “negócio das salinas” foi a justificação dada ao funcionário da UBS para as transferências das contas das offshore de HH (EMP61..., ligada à EMP76...) para as contas das offshore de II (EMP63..., ligada à EMP66...).
     Porém, este negócio não aparenta ter suporte real, posto que, como resulta do artigo 4686 da acusação, as únicas quantias recebidas pela família de II a propósito das salinas foram liquidadas em 2009, 2010, 2011 e 2013, ou seja, muito depois da circulação dos fundos ocorrida, neste crime, nesta etapa do branqueamento, cuja data é de Maio de 2006.
    Acresce, ter o arguido HH chegado a admitir em sede de inquérito ter aceitado fazer circular dinheiros pelas suas contas, a pedido de CC.
    Como já se deixou dito, a testemunha TTTTTT referiu que em 2006 não havia sequer salinas, o vendedor dessas salinas era o II, o que vive em ..., mas só depois de 2007. Mais acrescentou que essas notas aparecem porque ZZZZZZ tinha que justificar o “compliance”.
    Como se verifica, esta explicação, dada por HH à UBS para justificar a passagem de milhões das suas contas para as contas de II, carece de consistência.

    O DOLO
    Apenas os arguidos AA e CC são autobranqueadores.
    Os arguidos HH, II e BB (e os restantes arguidos acusados, por acordo nesse sentido) recorreram aos métodos de branqueamento  “Use of Gatekeepers “, “Use of Corporate Vehicles and Trusts” e “Use of Offshore/Foreign Jurisdictions”.
    Na verdade:
    - Contrataram empresas de gestão de fortunas para montar a “sua parte” no esquema de branqueamento;
    - Criaram e usaram sociedades “fictícias” sediadas em paraísos fiscais (HH a EMP61... e a EMP76..., II as EMP63... e EMP66..., BB as EMP67... e EMP68... - esta com uma cláusula testamentária onde se previa, em caso de morte de BB, que só 20% dos activos reverteriam a favor dos seus herdeiros, sendo 80% a favor do anterior fiduciário de AA, o que diz bem da titularidade desses activos aí concentrados - e as EMP36... e EMP20...), que serviram de meros “veículos” corporativos, sem ligação aparente às suas pessoas;
    - Fizeram abrir contas bancárias, sediadas no estrangeiro, em sistema de duplas associadas (uma de passagem e outra final, que tinham como titulares as sociedades “fictícias”),  também sem ligação aparente às suas pessoas.
    O recurso a tais métodos de branqueamento, com os custos inerentes, teve, certamente, o propósito de quebrar a cadeia de ligação dos fundos à sua origem e, por esta via, dissimular a origem ilícita dos fundos e evitar a perseguição criminal dos seus agentes.
    Por sua vez, tal constatação permite considerar indiciado o seu conhecimento directo (que é óbvio relativamente aos autobranqueadores) ou, pelo menos, a previsão de que tais fundos tinham origem na prática de delito grave (dos previstos no n.º 1, do art.º 368-A, do CP), tanto mais que, em troca de fazer circular esse capital, receberam contrapartidas.

    A CO-AUTORIA
    Quanto à co-autoria e ao acordo exigido pelo art.º 26º, do CP, remete-se, de novo, para o que se deixou escrito no CRIME 1, nesta matéria, devidamente adaptado a este ilícito, sendo até uma ingenuidade pensar que um esquema de branqueamento com esta complexidade poderia ter sido executado sem o acordo, pelo menos tácito e sucessivo, dos diferentes intervenientes no mesmo.

    CONCLUSÃO
    Não nos restam dúvidas de que os indícios da prática deste crime de branqueamento, pelos cinco arguidos acusados, ademais dois deles autobranqueadores, são mais do que suficientemente para os sujeitar a julgamento.
    Termos em se julga procedente o recurso quanto a este branqueamento 3, relativamente aos arguidos AA, CC, HH, BB e II.

    1.5.3.2 CRIME DE BRANQUEAMENTO 4.
    €3.000.000,00 feitos circular entre CC e AA (este representado por fiduciário). 
    Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, CC, HH, II e BB, relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados no ano de 2007 e até ao início de 2008, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal.  

    DECISÃO RECORRIDA
    Fundou a não pronúncia nos mesmos argumentos aludidos no CRIME 3, para onde se remete.

    RECORRENTE
    Manifesta-se no sentido de estar indiciada a prática do crime precedente e a prática do crime de branqueamento.

    BREVE DESCRIÇÃO DA MATERIALIDADE OBJECTIVA
    Os movimentos financeiros estão esquematizados no diagrama IV.
    Este crime assemelha-se, em tudo, ao CRIME 3, quanto aos métodos de branqueamento utilizados.
    O branqueamento reporta-se a um conjunto de operações bancárias de circulação da quantia global de € 3.000.000,00, ocorridas entre 2007 e 2008, com origem no universo “GES” e com destino efectivo para o arguido AA.
    Essa circulação ocorre, num primeiro momento, entre contas de várias sociedades associadas ao GES, num segundo momento, para contas do arguido HH (como intermediário), num terceiro momento,  para  contas do arguido II (como fiduciário de AA) e, num quarto momento, para contas do arguido BB (também como fiduciário de AA).
    Todos os movimentos financeiros estão documentados.

    A NOSSA POSIÇÃO
    O CRIME SUBJACENTE
    O crime subjacente continua a ser de corrupção de titular de cargo político  mencionado em 4 (do lado passivo, em que é agente corrompido AA), antes considerado suficientemente indiciado, a que se associa o 5 (do lado activo, em que é agente corruptor CC).

    A FUNÇÃO DE CADA ARGUIDO NO ESQUEMA DE BRANQUEAMENTO
    CC
    Surge, de novo, como agente da circulação dos fundos por intermediários (para além de pagador das vantagens, utilizando para o efeito  a sociedade offshore ES Enterprises, entre outras, com relevo essencial para o crime subjacente), posto que o mesmo sabia estar a proceder a entregas a intermediários do beneficiário final.
    AA
    Assume a função antes referida nos anteriores branqueamentos, para onde  se remete, agora relativamente aos €3.000.000.00 alvo de circulação, cuja ligação a este arguido resulta clara em virtude de esta quantia ter sido repatriada pelo RERTII e ter desaguado (depois de muito circular) nas contas do BES terminais 006 e 407.
    II
    Assume, de novo, o papel de “nomeado” por AA, para agir em seu nome, mas em representação deste, até ao momento em que publicamente foi implicado no processo ....
    BB
    Nada de novo se impõe aqui acrescentar, face ao que já se mencionou no crime anterior.
    HH 
    Mantém o papel de intermediário mor, escondido sob a “fachada” da sociedade offshore EMP61..., entre outras.

    OS JUSTIFICATIVOS CRIADOS
    A contabilidade da ES Enterprises sofreu novas manobras fraudulentas (melhor descritas nos artigos 4777 a 4789 da acusação), devidamente documentadas, com vista a ocultar o passivo decorrente da saída do capital.
    Não obstante, nos ficheiros extra-contabilísticos que eram realizados, e que traduzem com verdade o estado financeiro da sociedade, a entrega da quantia de €7.000.000,00 (que inclui a vantagem de €3.000.000,00) está inscrita como “.../EMP01...”, ou só “EMP01...”, sendo que estes pagamentos surgiam sempre associados aos “Pagamentos PT”, realizados em 2007 a favor dos arguidos RR e SS (por exemplo “PT+EMP01...”), o que indicia claramente a sua causa comum (anexos ao relatório final 2.1.03.036 e 037).
    As únicas particularidades deste crime, face ao anterior, residem, em primeiro lugar, no facto de estes pagamentos terem sido contabilizados na ES Enterprises como “Pagamentos EMP01...” (o que representou uma nova espécie de pagamentos dentro da contabilidade da ES) e, em segundo lugar, em matéria de contratos justificativos, com a criação de um contrato de prestação de serviços entre a sociedade EMP01... (criada em 2007) e a EMP61..., referente a uma alegada exploração petrolífera em ..., que nunca chegou a concretizar-se.
    Os contornos deste contrato foram definidos entre CC, TTTTTT e HH, em reunião havida entre os três, da qual resultaram as notas escritas por TTTTTT constantes do art.º 4838 da acusação.
    Foi definido o valor de €7.000.000,00, a pagar a título de “sucess free”, ou seja, de prémio de cumprimento.
    Os termos do contrato foram discutidos em Julho de 2007, mas no contrato foi aposta data de Janeiro de 2007.
    Quem procedeu à elaboração da minuta do contrato foi TTTTTT.
    Quanto a este contrato, é a própria testemunha TTTTTT que 30.01.2017, em sede de inquérito, refere: chegou aos 7 milhões porque da última vez lhe foi referido que o depoente tinha sido director da EMP01... e foi tentar perceber porque é que aparecia na EMP01..., o porquê deste trabalho e confirma que é nessa altura que está na ... que pela primeira vez, faz um contrato, que HH que lhe pede e combinam esses pormenores. (…)Refere que aquele documento a ser assinado, é naquela altura, não é em Janeiro. Confirma que é nessa altura que lhe dizem que era relevante em proveito do Grupo, relacionado com a PT e é nessa altura que o depoente, diria hoje, faz o contrato, ajuda a fazer o contrato de 2007 e o contrato de 2007 deve ser muito parecido ao contrato de 2008, em termos de formato do contrato. É-lhe dito que a diferença é que o contrato de 2007 é genérico, uma actividade ao nível do petrolífero, em ..., tendo o depoente referido que isso tinha a ver com o facto do HH nessa altura ter transmitido ao Dr. CC, que realmente ia ter acesso ao Bloco Onshore de .... Sendo questionado se as verbas eram para isso ou eram para os interesses da PT, o depoente confirma que a letra era uma coisa e o espírito era outro, não vê o Dr. CC a pagar 7 milhões ao HH, por causa de um Bloco, porque ainda o Bloco não existia, não havia urgência nenhuma em pagar pelo Bloco.
    Como se verifica, mostra-se claramente indiciado que tal contrato não passa de um justificativo formal da passagem de €7.000.000,00 da esfera do GES para a EMP61..., de HH.

    O DOLO
    Apenas os arguidos AA e CC são autobranqueadores.
    Os arguidos acusados recorreram aos mesmos métodos de branqueamento usados no CRIME 3, nos exactos termos aí descritos.
    O recurso a tais métodos de branqueamento teve as mesmas finalidades aludidas no crime anterior.
    Por sua vez, tal permite considerar indiciado o seu conhecimento directo (que é óbvio relativamente aos autobranqueadores) ou, pelo menos, que admitiram como possível a origem ilícita de “catálogo” dos fundos, pois, de outra forma, ficaria por explicar a razão pela qual, estes arguidos, decidiram fazer parte de um esquema de branqueamento desta dimensão, com os elevados custos associados.
    A intenção inerente à circulação dos fundos (dissimulação da origem ilícita dos fundos e/ou evitar a perseguição criminal dos seus agentes) decorre da prova produzida e das regras de experiência comum, como se disse no crime anterior, para onde se remete.

    A CO-AUTORIA
    Em particular quanto à indiciação do acordo exigido pelo art.º 26º, do CP,  damos, de novo, por reproduzido o que se disse no CRIME 1, devidamente adaptado a este ilícito.

    CONCLUSÃO
    Não nos restam dúvidas de que os indícios da prática deste crime de branqueamento, pelos cinco arguidos acusados, são também mais do que suficientes para os sujeitar a julgamento.
    Termos em se julga procedente o recurso quanto a este branqueamento 4, relativamente aos arguidos AA, CC, HH, BB e II.

    1.5.3.3 CRIME DE BRANQUEAMENTO 5 
    Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, CC, HH, BB e GG, relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados a partir de 2008, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, com intervenção das contas da ... do arguido GG, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal.  €12.000.000,00 feitos circular entre CC e AA (este representado por fiduciário).

    DECISÃO RECORRIDA
    Fundou não pronúncia nos mesmos argumentos aludidos no CRIME 3, para onde se remete.

    RECORRENTE
    Manifesta-se no sentido de estar indiciada a prática do crime precedente e a prática do crime de branqueamento.

    BREVE DESCRIÇÃO DA MATERIALIDADE OBJECTIVA
    Os movimentos financeiros estão sintetizados no diagrama V.
    O crime reporta-se a um conjunto de operações bancárias de circulação da quantia de €12.000.000,00 (integrados numa quantia global de €15.000.000,00), ocorridas entre 2008 e 2009, com origem na sociedade offshore ES Enterprises, do universo “GES” (da esfera do arguido CC), passagem pelas contas de várias sociedades offshore do arguido HH (como intermediário), destas para a conta numérica, sediada na ..., do arguido GG (também como puro intermediário) e, desta, para a conta offshore do arguido BB (na qualidade de fiduciário de AA, sendo este o efectivo destinatário do capital).
    À semelhança dos crimes anteriores, as operações financeiras de circulação dos €12.000.000.00 (sendo esta a acção típica) estão todas documentadas nos autos.
    Este crime é em tudo semelhante, quanto aos  métodos de branqueamento usados, aos anteriores (com excepção do 2).

    A NOSSA POSIÇÃO
    O CRIME SUBJACENTE
    Os €12.000.000,00 continuam a ser contrapartidas ilegais decorrente da prática do mesmo crime de corrupção de titular de cargo político, pelo que, o crime subjacente é ainda o de corrupção mencionado em 4 (do lado passivo, em que é agente corrompido AA), antes considerado suficientemente indiciado, a que se associa o 5 (do lado activo, em que é agente corruptor CC).

    A FUNÇÃO DE CADA ARGUIDO NO ESQUEMA DE BRANQUEAMENTO
    CC
    Assume a mesma função descrita no crime anterior, ou seja, a de agente de circulação dos fundos por intermediários (para além de pagador das vantagens, utilizando para o efeito  a sociedade offshore ES Enterprises, embora os justificativos contabilísticos dessa saída de capital sejam atribuídos à sociedade offshore EMP01..., criada em 2007).
    AA
    Mantém a mesma posição de “dominus” de todo o esquema de branqueamento, cujo nome é sempre omitido, para sua salvaguarda.
    A ligação dos €12.000.000.00 - repatriados pelo RETII  e que acabaram nas contas bancárias BES terminais 006 e 407 - à pessoa deste arguido, foi já dada como indiciada (remetendo-se para o que antes se disse nessa matéria).
    BB
    Continua a sua missão de fiduciário, por nomeação de AA, escondido sob a fachada da sua offshore EMP36..., também nada de novo se impondo acrescentar sobre a existência clara de indícios que suportam esta conclusão.
    HH 
    Mantém-se no mesmo papel de intermediário, passando a usar as sociedades offshore EMP61..., EMP62..., EMP76..., e as contas bancárias tituladas por estas, abertas na UBS.
    GG
    Surge neste crime como um novo intermediário, que acrescenta ao anterior.
    Aceita fazer passar os €12.000,000,00, que recepciona de HH, por contas bancárias da sua titularidade, abertas na UBS-... (contas numéricas, em que associado às transacções aparece apenas um número, dificultando por esta via a identificação do titular da conta). Tal permitiu afastar, um pouco mais, os fundos da sua origem.

    OS JUSTIFICATIVOS CRIADOS
    Com vista a conferir aparência legal às operações e para ocultar o passivo decorrente da saída do capital, a contabilidade da ES Enterprises sofreu, pela terceira vez, manobras fraudulentas (melhor descritas nos artigos 4819 a 4827 da acusação), devidamente documentadas.
    Não obstante, os movimentos reais saídos da ES Enterprises nos anos de 2008 e 2009, ao abrigo da rúbrica EMP01... (a qual respeita exclusivamente às vantagens referentes ao arguido AA), estão exarados no extracto constante do art.º 4821 da acusação (documentado no anexo 2.1.03.038 ao relatório final), onde se identificam perfeitamente os movimentos a débito em três tranches de €5.000.000,00 cada, sob a referência “...”, e com destino à sociedade EMP61... de HH.
    Em matéria de contratos justificativos há igualmente um contínuo “modus operandi”, posto que apenas foi criado um segundo contrato de prestação de serviços entre a sociedade EMP01... (como beneficiária dos serviços e pagadora) e a EMP61... (como prestadora de serviços e recebedora), com o valor definido de €15.000.000,00, referente a uma alegada exploração petrolífera em ....
    Os contornos desse segundo contrato EMP01... foram determinados pelos arguidos CC e HH e transmitidos a TTTTTT, que o redigiu decalcado do ficheiro onde tinha elaborado o primeiro, o que ocorreu em  03.04.2008 (uns dias antes da liquidação da primeira tranche), embora tenha sido aposta no contrato a data de 30.11.2007.
    Não obstante, não há a mínima evidência da prestação de tais serviços.
    A testemunha TTTTTT (na sua inquirição em sede de inquérito) deu nota de já nem se recordar, nem perceber a razão, de constar como director da sociedade EMP01....
    Como se verifica, mostra-se claramente indiciado que tal contrato é mais um justificativo - meramente formal - da passagem de €15.000.000,00 da esfera do GES para HH (através das suas sociedades offshore).

    O DOLO
    Apenas os arguidos AA e CC são autobranqueadores.
    Nos termos antes explicados, os arguidos acusados não primaram pela originalidade, antes socorreram-se dos banais catalogados métodos de branqueamento “Use of Gatekeepers”, “Use of Corporate Vehicles and Trusts” e “Use of Offshore/Foreign Jurisdictions”, cujo uso teve as finalidades antes aludidas.
    A inferência, pelos arguidos não branqueadores, pelo menos da possibilidade de os fundos alvo de circulação serem oriundos da prática de ilícito de “catálogo” decorre, desde logo, do facto de terem aceitado fazer passar pelas suas contas quantias exorbitantes de dinheiro e, no caso, do vasto conhecimento do arguido HH dos esquemas de branqueamento (razão pela qual  não podia desconhecer que estes esquemas são usados para lavagem de fundos advindos da prática de crimes graves, como são os de “catálogo”).
    Acresce o facto de o próprio GG ter tido intervenção num crime de corrupção, do lado activo, e conhecer os esquemas de branqueamento dos fundos por si pagos, o que, por si só, a par da utilização dos métodos de branqueamento descritos, é mais do que suficiente para considerar indiciado o conhecimento directo ou, pelo menos, a possibilidade de os fundos advirem de origem ilícita de “catálogo”.
    A intenção inerente à circulação do capital (dissimulação da sua origem ilícita e/ou evitar a perseguição criminal dos seus agentes)  resulta da prova produzida, associada a regras de experiência comum, como se disse nos crimes anteriores, para onde se remete.

    A CO-AUTORIA
    Damos também por reproduzido o que já de deixou escrito no CRIME 1, quanto à indiciação do acordo exigido na co-autoria, devidamente adaptado a este ilícito e aos arguidos nele intervenientes.
    Assume igualmente relevo, o facto de os arguidos HH e GG admitirem, nos interrogatórios, terem aceitado fazer circular dinheiros pelas suas contas, o primeiro a pedido de CC e o segundo, a pedido de BB.
    Entendemos, por fim, significativo o facto de GG ter-se encontrado com BB, no escritório deste ou no hotel ..., com o propósito de este lhe fazer chegar os números das contas, para onde deveria transferir os fundos recepcionados.

    CONCLUSÃO
    Não nos restam dúvidas da forte indiciação da prática deste crime de branqueamento pelos cinco arguidos acusados.
    Termos em se julga procedente o recurso quanto a este branqueamento 5,  relativamente aos arguidos AA, CC, HH, BB e II.

    1.5.3.4 CRIME DE BRANQUEAMENTO 6
    Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, CC, HH, BB, GG, as sociedades LEC SA, LEC SGPS, LENA SGPS e XLM, relativamente aos movimentos financeiros ocorridos a partir de 2010, abrangidos pela operação CEL_2010, justificados através de contrato promessa de compra e venda com perda de sinal referente ao imóvel ..., sito em ..., e introdução desses fundos no Grupo LENA, p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.  €8.000.000,00 feitos circular entre CC e AA (este representado por fiduciário).

    DECISÃO RECORRIDA
    Fundou-se a não pronúncia nos mesmos argumentos aludidos no CRIME 3,  ou seja:
    - Na falta de descrição do dolo do tipo e do dolo da culpa;
    - Na falta de indiciação do crime precedente;
    - Na circunstância, subsidiária, de os actos de circulação continuarem a fazer parte da execução material do crime precedente e/ou na violação do princípio “ne bis in idem- estes três temas já foram abordados anteriormente.
    - Na falta de indiciação da prática deste concreto branqueamento.

    RECORRENTE
    Manifesta-se no sentido de estar indiciada a prática do crime precedente e a prática do crime de branqueamento.

    BREVE DESCRIÇÃO DA MATERIALIDADE OBJECTIVA
    Os movimentos financeiros estão demonstrados no diagrama VI.

    É visível, fazendo a comparação com o diagrama VI, que o esquema de branqueamento aqui montado é, notoriamente, mais complexo, constituindo um misto entre o “modus operandi” verificado nos CRIMES 3, 4 e 5 (primeira parte da circulação até à recepção dos fundos nas contas das sociedades do Grupo “Lena”) e o verificado no CRIME 2 (segunda parte de esquema de branqueamento, a partir do ingresso dos fundos nas contas das sociedades do Grupo “Lena”, sendo, neste segmento, um crime doméstico).
    A quantia de €15.000.000,00, entregue por CC, teve a seguinte distribuição: cerca de €8.000.000,00 foram destinados aos interesses do arguido AA, tendo “seguido caminho” em direcção às contas das sociedades do Grupo “Lena”; €2.750.000,00 foram destinados ao próprio CC (esta parte está relacionada com o crime de abuso de confiança 2,  cuja análise já supra realizámos, e com o crime de branqueamento 22, que analisaremos adiante); e €4.250.000,00 representam a contrapartida de intermediação do arguido HH, tendo seguido da conta  da sua offshore EMP04...  para si próprio, via VVVVVV.
    Os fundos destinados a AA (que são os que aqui relevam) têm origem numa das sociedades offshore ligadas à ES Enterprises, do universo GES (mas oculta do organograma desse universo). Passaram pelas contas da sociedade offshore EMP04..., do arguido HH (como intermediário) e, destas, para contas das sociedades do Grupo “Lena” (aqui como meras intermediárias, feitas actuar pelo arguido GG). De seguida, uma parcela (cerca de €4.200.000,00) foi feita circular para a sociedade “fictícia” XLM (de BB) e, outra, um pouco menos de €1.000.000,00, foi destinada a pagamentos a terceiros de “despesas” do arguido AA, realizados directamente pela LEC-SA.
    Existe uma quantia que se “perde”, ficando “retida” na LEC-SA, resultante de um alegado encontro de contas entre GG e BB, na qualidade de fiduciário de AA.
    As operações financeiras encontram-se documentalmente comprovadas.

    A NOSSA POSIÇÃO

    A RAZÃO PELA QUAL UMA PARTE DO ESQUEMA DE BRANQUEAMENTO É LOCALIZADA EM TERRITÓRIO NACIONAL
    Atenta a data da entrega dos fundos (Novembro de 2010), estes não podiam ser repatriados pelo RERTII, uma vez que este regime apenas permitiu o repatriamento de capitais depositados no estrangeiro até finais do ano de 2009.
    Esta é a justificação para a localização da segunda parte do esquema – respeitante à integração do capital  – em Portugal.

    O CRIME SUBJACENTE
    Os €8.000.000,00 continuam a ser uma contrapartida da actuação de AA a favor do “GES”, ou seja, do crime de corrupção de titular de cargo político mencionado em 4 (em que é agente corrompido AA), dado como suficientemente indiciado, a que se associa o 5 (em que é agente corruptor CC).

    A FUNÇÃO DE CADA ARGUIDO NO ESQUEMA DE BRANQUEAMENTO
    CC
    Assume a mesma função descrita no crime anterior, isto é, de agente da circulação dos fundos (para além de pagador das vantagens) pelos intermediários HH e GG – este por via das sociedades do Grupo “Lena” - posto que o mesmo sabia estar a proceder a entrega de fundos a intermediários, que seriam posteriormente encaminhados (de uma forma ou de outra) para o fiduciário e/ou directamente para o beneficiário das vantagens.
    AA
    Continua a ser o “homem do fundo”, o que domina todo o esquema de branqueamento, em razão de cujos interesses o plano é montado, mas que se mantém na penumbra, actuando por via de “nomeados”.
    A ligação dos €8.000.000.00 à pessoa do arguido AA faz-se por duas vias: parte destes fundos circularam pela XLM (cerca de €4.200,000,00) e, pelo menos uma parcela desta quantia, acabou nas contas bancárias BES terminais 006 e 407 (cuja grande maioria dos activos está associada a este arguido); outra parte (cerca de €1.000.000,00) serviu para proceder ao pagamento directo de despesas de AA pela LEC-SA, como veremos infra.
    Se uma parcela dos fundos se destinou a pagar despesas de AA, é legítimo inferir que o mesmo é o titular dessa parcela, como ainda, de todo o restante capital branqueado.
    BB
    Assume, de novo, a missão de fiduciário, por nomeação de AA, desta feita sob a “fachada” da sociedade “fictícia” XLM, nos mesmos termos aludidos no CRIME 2, remetendo-se para o que antes se disse em matéria de indícios que suportam esta afirmação.
    HH 
    Mantém o papel de intermediário de grandes quantias monetárias, especialmente ligado à pessoa de CC, utilizando, desta feita, a sociedade offshore EMP04... (criada em Agosto de 2010) e uma outra entidade, a EMP19..., que não chegou a passar de um projecto societário (posto que a sociedade não foi formalmente criada), bem como as contas bancárias abertas na UBS.
    GG
    Apesar da entrega de €8.000.000,00 por CC a HH, transferidos por este para GG (via LEC SGPS), este arguido (através das LEC-SA, Lena SGPS e até Lena Ambiente) fez chegar a BB (como fiduciário de AA) apenas a quantia de cerca de €5.200.000,00, via XLM e através dos pagamentos das já referidas despesas, havendo aqui uma “perda” de €2.800.000,00, que ficaram retidos em GG, por conta de um suposto encontro de contas.
    Assim, dos €5.200.000,00 (€8.000.000,00 - €2.800.000,00), €3.000.000,00 foram entregues pela LEC-SA à XLM, justificados pelo contrato de intermediação EMP02.../XLM, €1.200.000,00 foram entregues pela LEC-SA à XLM, justificados pelo contrato IILEC-SA/XLM, e cerca de €1.000.000,00 - €919.074,45 - serviram para o pagamento, directamente pela LEC-SA, de facturas de despesas do arguido AA nos anos de 2011, 2012 e 2013, sempre sob a administração fiduciária de BB.
    Consequentemente, GG, por si e como representante das sociedades do Grupo “Lena”, assume neste crime duas funções:
    - Quanto à quantia de €4.200.000,00 (somatório dos €3.000.000,00 + €835.000,00 + €365.000,00) actua como puro intermediário das vantagens entregues por CC, posto que faz circular essa quantia pelas LEC-SGPS e LEC-SA e entregou-a à sociedade XLM, que o mesmo é dizer a BB, ou seja, ao fiduciário de AA;
    - Quanto ao montante de €919.074,45, actua como fiduciário do arguido AA (embora sempre por orientação directa de BB), posto que fez actuar a LEC-SA no sentido de esta proceder directamente ao pagamento - com os réditos antes recebidos - de despesas daquele arguido e a entregas a seu favor.

    SOCIEDADES LEC-SA, LEC-SGPS E LENA-SGPS:
    Remete-se para o que se deixou escrito no CRIME 2 a propósito da actuação do arguido GG, em nome (era Presidente do Conselho de Administração das três sociedades) e em benefício destas sociedades, cujo interesse colectivo foi sendo, ao longo do tempo, beneficiado, pelo menos de forma indirecta.

    SOCIEDADE “XLM-SOCIEDADE DE ESTUDOS E PROJECTOS, LDA.”
    Remete-se para o que se deixou dito no branqueamento 2, a propósito da falta evidente de actuação do arguido BB a benefício do interesse colectivo deste “veículo” corporativo e de “fachada”.

    OS JUSTIFICATIVOS CRIADOS
    Centremo-nos nos justificativos criados para dar suporte e aparência legal a esta circulação, os quais são mais exaustivos (no sentido de abarcarem todas as transferências de titularidade formal), certamente pela circunstância de uma parte significativa do esquema de branqueamento ter tido lugar em Portugal, razão pela qual as manobras de circulação ficaram mais expostas e houve necessidade de as rodear de maiores cuidados.
    A contabilidade da ES Enterprises sofreu novas manobras fraudulentas (descritas nos artigos 4790 a 4798 e 4894 a 4910 da acusação), devidamente documentadas, com vista a ocultar o passivo decorrente da saída do capital.
    Os movimentos a débito dos €15.000.000,00, da esfera da ES Enterprises, foram justificados na contabilidade numa nova rúbrica - dita CEL-2010 ou Bridge-2010 -, que consubstancia uma mera entidade contabilística.
    Na contabilidade paralela (real), tais movimentos aparecem associados a “pagamentos PT” (assim como os pagamentos dos mesmos anos realizados aos arguidos RR e SS) - ver documentos aludidos nos artigos 4894, 4899, 4901, 4902, 4905 da acusação - o que diz bem da razão subjacente à sua liquidação.
    Foi também encontrado na posse de HHHHHHHH, homem de confiança do arguido CC e administrador da PT, um apontamento manuscrito (ver artigo 4907 da acusação) com os dizeres: “55M€ PT - 2x7.5 -referente a HH- e 1x10”...” -referente a .../RR”.
    Tudo indícios fortes de que os €15.000.000,00 feitos chegar a HH - os tais “PT - 2x7.5” - têm a sua origem/justificação na PT e constituem vantagens indevidas.
    O contrato de prestação de serviços entre a ES Enterprises e o arguido HH (de implementação e desenvolvimento de investimentos nas áreas do petróleo, minério e imobiliário em ... e ...) visou conferir aparência legal à passagem dos €15.000.000,00 da ES Enterprises para HH, nele se prevendo o pagamento de €15.000.000,00 em duas (2) parcelas.
    Porém, na contabilidade real/paralela da ES Enterprises, não consta nenhum contrato de prestação de serviços como justificação da saída dos €15.000.000,00.
    Também não há evidência de efectivos serviços prestados por conta de tal contrato.
    Ademais, foi aposta data pretérita ao contrato, pois que o mesmo foi elaborado em 2010, mas datado de 2005.
    Indicia-se, consequentemente, a falta de adesão de tal contrato à realidade.
    Quanto ao contrato promessa de compra e venda do imóvel do ..., com perda de sinal, é também de considerar fortemente indiciado ter o mesmo visado justificar a passagem dos €8.000.000,00 de HH para GG (que se operou via LEC SGPS).
    Na verdade, o mesmo foi “assinado” na qualidade de promitente-comprador, por uma entidade sem existência legal ligada a HH, posto que a EMP19... não chegou a constituir-se como sociedade.
    Só este facto já é indiciador da natureza meramente formal do contrato, pois não se vê como é que uma sociedade do Grupo “Lena” iria celebrar um contrato, em que estava em causa apenas a título de sinal €8.000.000,00, com uma sociedade sem existência legal.
    Quanto à ligação da EMP19... a HH, a sua pré-criação está associada à sociedade EMP106..., detida por outras sociedades da esfera de HH, constando dos registos contabilísticos da EMP106... os custos inerentes às diligências encetadas para a formalização da EMP19... (certificado de admissibilidade, realização de estatutos, …).
    Também não se identificou à EMP19... outra actividade, para além da intervenção, formal, neste contrato.
    Acresce que o alegado pagamento do sinal (€8.000.000,00) foi realizado para uma sociedade distinta da promitente-vendedora, tendo sido creditado em conta da LEC SGPS (e não da EMP02...) e seguido, depois, para a LEC-SA.
    O contrato veio a ter, pelo menos, três versões, a última das quais alterada, em ficheiro informático, por NN em 05.07.2011, o que comprova a sua realização cerca de meio ano após a transferência dos €8.000.000,00 para as contas da LEC SGPS (artigos 11147 a 11168).
    No mesmo mês, o escritório da advogada de HH – EMP107... – criou e alterou quatro (4) ficheiros, em 22 e 27 de Julho de 2011, referentes às cartas de admissão do incumprimento do contrato promessa, elementos feitos chegar a BB e que foram apreendidos. As datas apostas nessas cartas não coincidem com as datas da sua redacção.
    O alegado “acordo de revogação do contrato” e as diligências que o precederam são, também, demonstrativas da falta de adesão do próprio contrato à realidade.
     Tais diligências mostram-se detalhadas nos artigos 11252 a 11273 da acusação, onde se dá conta, nos emails enviados a propósito da formalização dessa rescisão, que a versão disponível do contrato promessa nem se encontrava assinada e haveria que providenciar nesse sentido.
    Toda esta materialidade está documentada.
    Os justificativos das passagens de €4.200.000,00 do Grupo “Lena” para a XLM são os seguintes:
    - €3.000.000,00 com base no contrato de prestação de serviços de intermediação na venda do ..., entre a EMP02... (do Universo “Lena”) e a XLM, de BB; 
    -  €1.200.000,00 com base no contrato II LEC-SA/XLM.
    Em sede de inquérito o arguido GG não conseguiu justificar os pagamentos associados às facturas geradas por estes alegados negócios, tendo dito não saber a razão de tal facturação (e outras) e pagamentos realizados pelo Grupo “Lena” à XLM.
    Tanto bastaria para indiciar a inexistência de reais serviços prestados que pudessem ter justificado a emissão das facturas pela XLM e o respectivo pagamento pelas sociedades do Grupo “Lena”, cujo somatório perfaz, só neste crime, €4.200.000,00, não sendo propriamente um valor negligenciável que possa ter passado despercebido dentro da estrutura societária de GG e, muito menos, à sua pessoa.
    O contrato de prestação de serviços de intermediação na venda do ... pela EMP02... à EMP19... teve, pelo menos, três versões, a última realizada em ficheiro informático, por NN, em 15.07.2011.
    No entanto, foi aposta no contrato data pretérita (de 2010).
    Além disso, os €3.000.000,00, justificados pelo contrato, também saíram de conta bancária de sociedade distinta (da LEC-SA) da alegada beneficiária dos serviços (a EMP02...).
    Tudo isto indicia, fortemente, a natureza meramente formal ou justificativa, deste contrato.
    O contrato veio a ser revogado aquando da revogação do contrato promessa de venda do imóvel à EMP19....
    O imóvel ... acabou por ser vendido ao BESA (de CC), em Agosto de 2012, por 14.500.000,00 Dólares Americanos.

    O contrato II LEC-SA/XLM, que justificou a circulação de €1.200.000,00 da LEC-SA para a XLM, em 2014 e 2015.
    Este novo contrato surge pela circunstância de o contrato entre a EMP02... e a XLM (que havia servido de justificativo para as transferências) ter sido formalmente rescindido, por falta de objecto.  Tal determinou a necessidade de criação de um novo justificativo, para conferir aparência legal às transferências do Grupo Lena para a XLM que se encontravam em falta.
    BB pretendia que este contrato II LEC-SA/XLM suportasse o pagamento de €5.000.000,00.
    Porém, por força de diversos “descontos” considerados (referentes, por exemplo, ao pagamento pelas sociedades do Grupo “Lena” das facturas de despesas de AA), o valor final foi fixado em €2.700.000,00, a pagar em 10 facturas trimestrais, de €250.000,00 cada, mais IVA.
    A mando de BB, este segundo contrato de prestação de serviços LEC-SA/XLM foi elaborado por NN, decalcado do primeiro, e foi remetido a BB, tendo sido modificado, pela última vez, em 07.06.2013, embora nele conste aposta a data de 01.04.2013.
    Foram emitidas pela XLM, e pagas pela LEC-SA, quatro (4) das dez (10) facturas previstas, tendo entrado nas contas da XLM, por essa via, a quantia €1.200.000,00 (€835.000,00 em 2014 + €385.000,00 em 2015), sem IVA.
    Como já se disse, em sede de inquérito, GG nem soube justificar os pagamentos feitos pela LEC-SA à XLM.
     A XLM não prestou serviços à LEC-SA, nem a qualquer outra entidade, como também já se referiu.
    Face ao exposto, indicia-se fortemente que este contrato tem natureza meramente formal ou justificativa, à semelhança do contrato I-LEC-SA/XLM.

    OS PAGAMENTOS DE DESPESAS, DO ARGUIDO AA, DIRECTAMENTE PELA LEC-SA
    Como se demonstra no diagrama VI, nos anos de 2011, 2012 e 2013 as sociedades do Grupo “Lena” procederam ao pagamento de €919.074,45, em facturas, que foram emitidas em seu nome, mas que eram respeitantes a despesas do arguido AA.
    Os pagamentos feitos à EMP41... e à “EMP42...” destinaram-se à mesma pessoa física - DDDDDDD -, por alegados serviços prestados à LEC-SA.
    Tais pagamentos estão, formalmente, suportados em contratos de prestação de serviços em regime de avença, celebrados entre a LEC-SA e a EMP41... e a LEC-SA e a “EMP42.... Lda.”.
    A EMP41... é uma sociedade de DDDDDDD - filho de IIIIIIII, amigo pessoal de AA – criada já depois da celebração do primeiro contrato de avença, com o propósito de acomodar os pagamentos atribuídos ao cumprimento de tal contrato.
    A EMP42... é uma sociedade através da qual DDDDDDD fez facturar novos serviços, pois era amigo do representante da mesma e, segundo disse no seu depoimento, teve de deixar de utilizar a EMP41..., por razões pessoais.
    A propósito de tais alegados serviços, DDDDDDD prestou testemunho em sede de inquérito onde, apesar de referir, por exemplo, ter estado em diversas reuniões nas instalações da LEC, em ..., e conhecer o CEO TTT, não soube identificar essas instalações (nem a morada, nem a localização aproximada, nem uma simples descrição do edifício ou das salas onde disse ter mantido as reuniões), nunca produziu documentação na sequência desses alegados contratos e serviços, limitou-se, nas suas palavras, a fazer reportes verbais dos mesmos, nomeadamente ao referido CEO, e não forneceu nenhum equipamento ou programa informático à empresa.
    Porém, num mail datado de 18 de Agosto de 2011, por si subscrito e dirigido ao CEO TTT, refere: “tomo a liberdade de anexar para S/ conhecimento a factura com o no ...14, enviada para a morada habitual em 20-Julho-2011, com vencimento no início do corrente mês, conforme contrato de prestação de serviços. Aproveito a ocasião para reforçar que teria muito gosto em conhecê-lo pessoalmente, tendo em conta esta relação que tem sido cordata e frutuosa, e que gostaria de aprofundar esse relacionamento. Se for esse o entendimento do Sr. Dr. seria com apreço que receberia a indicação de como e quando o poderia visitar.”
    Do teor do email depreende-se que DDDDDDD, afinal, não conhecia o CEO e, consequentemente, nunca lhe tinha apresentado relatórios verbais (isto já depois do termo do 1º contrato LEC-SA/EMP41..., celebrado em Fevereiro de 2011, por 6 meses).
    Ouvida, como testemunha, a ex-mulher de DDDDDDD - JJJJJJJJ - referiu que “DDDDDDD teria tido esse contacto (com o Grupo “Lena”) através do pai e através do Eng.o AA, que, como toda a gente sabe, são amigos. Não foi DDDDDDD que lhe disse que o pai estava a tentar arranjar esse cliente mas sabia que havia conhecimento implícito do sogro na altura com o Eng.o AA e que estaria ligado a uma série de empresas; Não conhecia nem ouviu falar de ninguém em concreto do Grupo LENA com que DDDDDDD contactasse. Nunca ouviu falar de um nome concreto de administrador com quem ele falasse; Nunca ouviu falar em nenhum projecto específico a que ele tivesse dedicado.”
    Face a esta prova, considera-se estar suficientemente indiciada a afirmação - constante da acusação - de que a celebração dos contratos de prestação de serviços que motivaram os pagamentos à EMP41... e à EMP42..., e cujos réditos eram destinados a DDDDDDD, terão na base um pedido (vulgo “cunha”) de IIIIIIII a AA para o filho DDDDDDD, tendo o arguido BB dado satisfação a mais essa pretensão de AA, através de GG e da celebração de tais contratos.
    Aliás, na sociedade LEC-SA, esses pagamentos foram imputados a interesses do arguido BB (enquanto fiduciário de AA).
    Quanto aos pagamentos, em 2011, à sociedade de Advogados “EMP43...”, no montante de €307.500,00, motivados por um alegado estudo jurídico do mercado do Leste, os serviços foram facturados à “Lena Ambiente” e pagos por esta.
    Porém, KKKKKKKK, que era o seu administrador, nunca encomendou tal estudo, nem nunca viu qualquer estudo sobre essa matéria.
    Já o pagamento de 2012, com o descritivo “Estudos Jurídicos”, foi facturado à Lena SGPS, e o de 2013, com o descritivo “despesas e honorários”, foi facturado à Lena SGPS.
    Todos os três pagamentos realizados à “EMP43...” foram imputados, pelos serviços financeiros do Grupo “Lena,” no mapa de despesas atribuídas a BB, dado que não eram despesas do Grupo “Lena”.
    Os pagamentos realizados pelo Grupo “Lena” à EMP104... referem-se ao veículo do falecido irmão do arguido AA, cuja titularidade passou para a mãe deste, tendo tais despesas sido pagas com dinheiro trazido, em numerário, de ..., a mando de GG, e posteriormente depositado na EMP104....
    Quanto às entregas em cash e em cheques, no mapa de despesas do Grupo “Lena” imputados a BB constam, ainda, tais entregas, no total de €410.000,00 (artigo 13240 da acusação).

    O DOLO
    Os arguidos AA e CC são autobranqueadores, razão pela qual o conhecimento da origem ilícita de “catálogo” dos fundos branqueados é claro.
    O pagamento da contrapartida de €4.250.000,00 a HH, até pela sua grandeza, associado ao seu já demonstrado conhecimento dos esquemas de branqueamento, permite, por si só, a afirmação de que este arguido conhecia, ou pelo menos admitia como possível, a origem ilícita de “catálogo” dos fundos que ajudou a branquear.
    A circunstância de GG ter determinado as sociedades do Grupo “Lena” a realizar pagamentos de despesas do arguido AA permite afirmar, em termos indiciários, que o mesmo conhecia,  ou pelo menos admitia como possível, a origem ilícita de “catálogo” dos fundos que ajudou a branquear, desde logo, atendendo à dimensão dos fundos que foram transferidos para a LEC SGPS, e  desta para a LEC-SA.
    Este arguido esteve implicado, como corruptor, num outro crime, e tinha conhecimento das manobras usadas quanto a esses fundos, que são, em tudo, idênticas às utilizadas neste branqueamento.
    Os arguidos socorreram-se, mais uma vez, dos conhecidos métodos de branqueamento, “Use of Gatekeepers “, “Use of Corporate Vehicles and Trusts”, “Use of Offshore/Foreign Jurisdictions”, “Use of Nominees” e “Use of Domestic Financial Institutions”, com vista a quebrar a cadeia de ligação dos fundos à sua origem e a ocultar a identificação do seu destinatário.
    A intenção inerente à circulação dos fundos e ao uso destes métodos conhecidos de branqueamento (dissimulação da origem ilícita dos fundos e/ou evitar a perseguição criminal dos seus agentes) é facilmente alcançada, pois, só  mesmo esse objectivo poderá explicar o recurso massivo aos ditos métodos de branqueamento, com os custos associados já referidos.

    A CO-AUTORIA
    Relativamente à indiciação do acordo exigido pelo art.º 26º, do CP, damos por reproduzido o que se disse no CRIME 1, a este propósito, devidamente adaptado a este ilícito.

    CONCLUSÃO
    Face a todo o exposto, não nos restam dúvidas da forte indiciação da prática deste crime de branqueamento pelos arguidos AA, CC, HH, GG, BB e as sociedades LEC SA, LEC SGPS, LENA SGPS.
    Quanto à sociedade “XLM-Sociedade de Estudos e Projectos, Lda.”, o recurso terá de improceder, mantendo-se a decisão de não pronúncia, em virtude de a XLM ser uma entidade “fictícia”, sem actividade económica e, por isso, sem existência material, criada com o único fito de servir de “fachada” e de “veículo” a um esquema de branqueamento, o que é, em si mesmo, incompatível com a ideia de o seu gerente ter agido no interesse colectivo dessa sociedade.
    Termos em se julga procedente o recurso quanto a este branqueamento 6, relativamente aos arguidos AA, CC, HH, BB, GG, as sociedades LEC SA, LEC SGPS e LENA SGPS.
    O recurso é improcedente quanto à sociedade XLM.

    1.5.4 CRIMES DE  BRANQUEAMENTOS ASSOCIADOS AO GRUPO “VALE DO LOBO”
    CRIME DE BRANQUEAMENTO 7
    €2.000.000,00 feitos circular entre EE e FF (empreendimento vale do lobo),  AA (este representado por fiduciário) e DD, em partes iguais.
    Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, BB, GG, DD, EE, FF e JJ, relativamente às transferências com origem em conta do cidadão ... KK, referente aos financiamentos concedidos ao Grupo Vale do Lobo, com passagem por conta bancária da ... do arguido GG, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.

    DECISÃO RECORRIDA
    Volta a fundamentar a não pronúncia:
    - Na falta de descrição dos dolos do tipo e da culpa, questões antes analisadas;
    -  Na falta de indiciação do crime precedente;
    - Na falta de indiciação da prática deste concreto crime de branqueamento;
    - Subsidiariamente, na linha decisória de que os actos de circulação fazem parte da execução material do crime precedente e que, interpretação contrária, viola o princípio “ne bis in idem”- estes quatro argumentos já foram abordados supra.
    Resta-nos a questão dos indícios.

    RECORRENTE
    Manifesta-se no sentido de estar indiciada a prática do crime precedente e a prática do crime de branqueamento.

    BREVE DESCRIÇÃO DA MATERIALIDADE OBJECTIVA
    Os movimentos financeiros estão demonstrados no diagrama VII.
    Está em causa um conjunto de operações bancárias de circulação da quantia global de €2.000.000,00, liquidada em 2008, com origem no empreendimento Vale do Lobo - de EE e de FF .
    Estes arguidos (e os restantes co-arguidos, por acordo) instrumentalizaram  um dos clientes desse empreendimento (concretamente da sociedade Oceano Clube)  - de seu nome  KK -,  que tinha uma dívida de €2.200.000,00 à Oceano Clube.
    Para pagamento parcial dessa dívida KK procedeu ao depósito (ou transferência) de €2.000.000,00 em conta que lhe foi indicada por EE, titulada por GG, sediada na UBS-....
    Tais fundos voltaram a circular, a partir de GG, para contas de sociedades offshore associadas, formalmente, a BB (EMP67... e outras contas da esfera deste arguido), como fiduciário de AA, e a DD (EMP07... – em 16.06.2008), em partes iguais.
    O milhão de DD veio a transitar da EMP07... para as contas da EMP08..., abertas em 28.11.2008 - entre Dezembro de 2008 e Janeiro de 2009 . Destas contas,  €400.000,00 (250 mil em 16.12.2008 e 150.000,00 em 30.09.2009 – art.º 3906 da acusação) circularam para contas das sociedades EMP108..., EMP109... e EMP99... (onde se reuniram outros fundos não relacionados com o milhão).  Seguidamente, €535.000,00 transitaram para a conta da EMP09..., sediada no BPI, entre Fevereiro e 09 de Outubro de 2009 (art.º 3912 da acusação).

    A NOSSA POSIÇÃO
    O CRIME SUBJACENTE
    A quantia de €2.000.000,00, de acordo com a acusação, constituiu contrapartida ilegal pela intervenção favorável dos arguidos AA e DD, a benefício dos arguidos EE e FF - ou seja, do empreendimento Vale do Lobo - decorrentes, portanto, da prática do crime de corrupção elencado em 6 (do lado passivo), antes considerado fortemente indiciado, a que se associa o 7 (do lado activo).

    A FUNÇÃO DE CADA ARGUIDO NO ESQUEMA DE BRANQUEAMENTO
    EE
    FF
    Surgem como agentes activos no esquema de circulação gizado por todos, ao mandar proceder à entrega das vantagens para conta numérica sediada na UBS-... de GG, pessoa que sabiam não ser delas destinatário (para além de assumirem a função de pagadores dos fundos alvo de branqueamento, instrumentalizando para o efeito um dos clientes do empreendimento “Vale do Lobo”, vertente cujo relevo típico essencial está centrado no crime de corrupção subjacente).
    A testemunha KK confirmou, em sede de inquérito, a liquidação dos dois milhões (cujas razões pouco relevo têm para este concreto crime) e o facto de a conta onde os depositou ter-lhe sido indicada, num papel, por EE.
    Vale salientar que cada um destes dois arguidos fez sua a quantia de €100.000,00, pertencente à sociedade Oceano Clube, montantes que a testemunha KK veio, posteriormente, a liquidar, para saldar o remanescente da sua dívida, decorrente da compra de um lote no empreendimento Vale do Lobo.
    AA
    Assume o mesmo papel de “homem do fundo”, agora partilhado com DD, em razão de cujos interesses foram realizadas as operações financeiras aqui em causa, para ocultação quer da sua origem, quer dos verdadeiros beneficiários.
    Está claramente indiciado que a quantia de €1.000.000,00, parqueada no final do esquema de branqueamento nas empresas offshore de BB, é propriedade do arguido AA, até porque essa quantia foi depois concentrada (juntamente com as restantes que também estavam parqueadas no estrangeiro)  e repatriada através do RERTII, tendo acabado nas contas BES terminais 006 e 407, cujos activos são indiciariamente pertença deste arguido, pelo menos na sua grande maioria.
    DD
    Surge como beneficiário de metade da quantia entregue e que foi alvo de circulação.
    Também não restam dúvidas de que a quantia de €1.000.000,00, parqueada no final do esquema de branqueamento nas sociedades offshore associadas a DD, era propriedade do mesmo.
    BB
    Está fortemente indiciado que o arguido BB, neste e noutros crimes de branqueamento antes analisados, foi a pessoa “nomeada” pelo arguido AA para realizar as transacções e mover os activos em seu próprio nome, mas a mando e em benefício do arguido AA, com o escopo de disfarçar a verdadeira titularidade dos produtos da corrupção.
    GG
    Surge como intermediário dos fundos, razão pela qual a sua missão se traduziu em permitir a circulação dos €2.000.000,00 por conta numérica sua, aberta na UBS-... (capital que chegou a usar em aplicações financeiras, depois por si desmobilizadas), e proceder à sua entrega ao fiduciário de AA e a DD, em partes iguais, para contas bancárias de sociedades offshore por estes controladas e que, certamente, lhe foram indicadas por aqueles.
    JJ
    A situação desta arguida será, de seguida, alvo de análise autónoma, juntamente com o CRIME 20.

    O JUSTIFICATIVO CRIADO
    Com vista a justificar o recebimento, por parte de GG dos €2.000.000,00, diz a acusação ter sido celebrado um alegado  contrato promessa referente à compra de um lote do empreendimento “Vale do Lobo”, pelo preço acordado de cerca de doze milhões, entre  GG (como promitente- comprador/pagador do sinal) e a sociedade Oceano (como promitente- vendedora/recebedora do sinal), com um sinal de €2.000.000,00, a prestar por GG, por via de uma garantia bancária, que nunca foi satisfeita.
    A ter sido celebrado (o contrato aparenta nem estar assinado), confessamos dificuldade em perceber em que medida esse contrato teria a potencialidade de conferir aparência legal à operação de circulação dos €2.000.000,00 desde a sua origem até à conta de GG.
    Na verdade, quando muito, o contrato poderia ter a potencialidade de justificar um fluxo financeiro em sentido inverso, ou seja, com origem em GG e destino na Oceano Clube.
    Por outro lado, também não percebemos a razão da sua existência, uma vez que, graças ao esquema engendrado, formalmente, a origem dos fundos não está ligada ao empreendimento Vale do Lobo e, por outro lado, tendo os fundos circulado em conta numérica de GG (por força do que só era identificado um número associado à realização da transacção), estava assegurada a confidencialidade da intervenção deste arguido no esquema de branqueamento montado.
    Fica a restar a proximidade das datas da alegada celebração do contrato - de 14 de Dezembro de 2007-  e das transferências dos fundos para a conta numérica de GG, a coincidência dos valores e o facto de nem o pagamento do sinal, nem a celebração do contrato definitivo, terem sido honrados, o que poderá, apesar de tudo, ser escasso para afirmar que o contrato foi celebrado com o escopo de dar aparência legal a esta fase do esquema de branqueamento.
    Como quer que seja, o relevo deste contrato é pouco expressivo razão pela qual  a fragilidade deste pormenor da acusação não coloca em causa a indiciação da prática do crime  pelos arguidos EE, FF, AA, DD, BB e GG, nem justifica que se operem alterações na factualidade acusada, na fase processual em que nos encontramos.

    O DOLO
    Os arguidos AA, DD, FF e EE são autobranqueadores, razão pela qual o seu conhecimento da origem ilícita de “catálogo” das vantagens branqueadas é óbvio.
    Os arguidos BB e GG (juntamente com AA, DD, FF e EE) recorreram, mais uma vez, aos métodos de branqueamento “Use of Gatekeepers”, “Use of Corporate Vehicles and Trusts” e “Use of Offshore/Foreign Jurisdictions”.
    Dos elementos de prova já analisados, podemos afirmar que GG conhecia  ou, pelo menos admitia como possível, a origem ilícita de “catálogo” dos fundos que aceitou fazer circular pela sua conta da UBS. Ele próprio esteve implicado na prática de um outro crime de corrupção, do lado activo, e conhecia os métodos de branqueamento antes utlizados na “lavagem” dessas outras vantagens por si pagas.
    Realçamos, repetindo, que o arguido GG admitiu, nos seus interrogatórios, ter acedido a um pedido de BB para fazer passar pela sua conta os fundos aqui em causa e transferi-los, posteriormente, para as contas EMP67... e EMP07....
    BB, por seu turno,  justificou a entrada de €1.000.000.00 na sua conta, titulada pela EMP67..., com pagamentos de serviços por si realizados.
    Torna-se visível a falta de racionalidade destas operações financeiras à luz de um qualquer negócio real, assim se indiciando, de novo, que estas operações só encontram justificação numa intenção de branquear fundos.
    A passagem dos fundos por conta numérica, sediada em jurisdição estrangeira, e a transferência dos montantes para outras sociedades offshore, só pode ter tido o propósito de quebrar a cadeia de ligação dos réditos à sua origem e ocultar a identidade dos beneficiários finais dos fundos.

    A CO-AUTORIA
    Quanto às exigências, de facto e de direito, necessárias à afirmação da comparticipação, na forma de co-autoria, damos por reproduzido o que se deixou atrás escrito nesta matéria, na análise do CRIME 1, devidamente adaptado a este ilícito.

    CONCLUSÃO
    O arguido DD foi já julgado e condenado (no processo 9152/21...., que deu origem ao recurso 9152/21...., do Tribunal da Relação ..., cujo acórdão mostra-se publicado em www.dgsi.pt) pelo CRIME 20, referente ao repatriamento e integração de uma parcela – pelo menos €400.000,00 - dos €1.000.000,00 que lhe foram destinados.
    Tendo havido essa condenação, coloca-se a questão referente à pluralidade ou unidade criminosa quando está em causa a prática de várias acções típicas de branqueamento, pelos mesmos autores,  relativamente aos mesmos fundos.
    Não obstante o que já dissemos relativamente a este tema, entendemos que a condenação do arguido DD, nesse outro processo, não impede a sua pronúncia nestes autos, relevando, em particular, a circunstância de,  naquele outro processo, ter sido apenas considerada uma parcela dos fundos que estão em causa nestes autos e neste crime.
    Concluindo: face à forte indiciação da prática deste crime de branqueamento por parte dos arguidos AA, DD, FF, EE, BB e GG, o recurso será, nesta parte, julgado procedente.

    1.5.4.1 CRIME DE BRANQUEAMENTO 7, na parte referente a JJ. CRIME DE BRANQUEAMENTO 20, na parte referente a JJ.

    7 . Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, BB, GG, DD, EE, FF e JJ, relativamente às transferências com origem em conta do cidadão ... KK, referente aos financiamentos concedidos ao Grupo Vale do Lobo, com passagem por conta bancária da ... do arguido GG, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal .
    20. Um crime de branqueamento praticado, a título de cumplicidade, pela arguida JJ (do qual é autor material o arguido DD, pronunciado nos termos da acusação por este ilícito criminal, tendo já sido julgado pelo mesmo em processo separado), relativamente à transferência de fundos para Portugal, com origem em contas tituladas pelas sociedades em offshore EMP07... e EMP08... na ..., com utilização da sociedade EMP09... LDA., p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.
    Serão alvo de apreciação conjunta, dadas as suas interligações.

    DECISÃO RECORRIDA
    No crime de branqueamento 7, a decisão de não pronúncia (fls. 4558 a 4640 da decisão recorrida)  da arguida JJ fundou-se na falta de indícios do conhecimento da origem ilícita de “catálogo” da quantia de €1.000.000,00, bem como, do conhecimento dos próprios movimentos típicos de circulação desses fundos.
    No crime de branqueamento 20, a decisão recorrida voltou a considerar não indiciado o conhecimento, por parte da arguida JJ, da origem dos fundos integrados, assim como qualquer intervenção na montagem ou execução do esquema de repatriamento e integração do capital.
    Nessa sequência, foram julgadas não indiciadas (fls. 4640) as referências feitas à arguida JJ nos artigos 338, 339, 3340, 342, 3844, 3846, 3853, 3916, 3918, 3921, 39324, 3931, 3945, 4101, 4103, 4128, 4200, bem como, quanto ao elemento subjectivo, nos artigos 13724, 13866, 13869, 14065, 14070, 14075 e 14078, todos da acusação.

    RECORRENTE
    Entende (nas conclusões 1298 a 1240) estar indiciado, pelo menos a título de dolo eventual, o conhecimento da origem ilícita de “catálogo” dos fundos, por parte da arguida JJ.
    Assenta esta conclusão na abertura, pela arguida, das contas offshore e na aceitação da realização do negócio da permuta e recompra do imóvel pela EMP09....

    BREVE DESCRIÇÃO DA MATERIALIDADE OBJECTIVA
    Os movimentos financeiros continuam demonstrados, esquematicamente, no diagrama VII.
    Já referimos, no crime de  branqueamento 7, que o milhão destinado ao arguido DD deu entrada nas contas da EMP07..., em 16.06.2008, e transitou (entre Dezembro de 2008 e Janeiro de 2009) para a conta da EMP08.... Desta, €400.000,00 (250 mil em 16.12.2008 e 150.000,00 em 30.09.2009 – art.º 3906 da acusação) seguiram para as contas das sociedades EMP108..., EMP109... e EMP99... (onde se reuniram outros fundos, não relacionados com o milhão). Por fim, a quantia de €400.000,00 (acrescida de outros valores, com outras origens, perfazendo o total de €535.000,00), transitou para a conta da EMP09..., sediada no BPI, entre Fevereiro e 09 de Outubro de 2009 (art.º 3912 da acusação).
    Relativamente ao crime de branqueamento 20, o mesmo reporta-se a um esquema de repatriamento e integração de parte daqueles fundos - a acusação alude a €535.000,00 - (via EMP09... LDA, através da conta bancária formalmente titulada por esta sociedade e aberta no BPI), com aproveitamento da circunstância de a arguida JJ estar interessada na compra de um imóvel (sito na Avenida ...) e na venda de um apartamento, do qual era proprietária (sito na Avenida ...).
    O negócio acabou por ser formalizado através de um contrato de permuta.
    Não obstante, a EMP09... procedeu à recompra do imóvel da Avenida ..., cujo preço foi liquidado com parte do €1.000.000,00 supra aludido.
    De acordo com a acusação, esta recompra - negociada juntamente com o contrato de permuta - foi essencial à celebração do contrato de permuta.

    A NOSSA POSIÇÃO
    O CRIME SUBJACENTE
    O crime de  corrupção elencado em 6, do lado passivo, antes dado como suficientemente indiciado (a que se associa o 7, do lado activo), é o crime subjacente dos dois branqueamentos 7 e 20, uma vez que os fundos são os mesmos, posto que as vantagens indevidas alvo do branqueamento 20 constituem uma parcela  das objecto do crime 7.

    A FUNÇÃO DA ARGUIDA JJ NOS DOIS ESQUEMAS DE BRANQUEAMENTO
    De acordo com a acusação, a arguida surge como fiduciária do seu pai, DD, no crime de branqueamento 7, no que respeita à recepção de €1.000.000,00, dado que esta quantia foi transferida para conta bancária de que era a última beneficiária final.
    No crime de branqueamento 20, a arguida surge como auxiliar ao esquema montado de repatriamento e integração de €535.000,00.

    O DOLO
    A arguida JJ não é autobranqueadora em nenhum dos dois crimes, impondo-se o conhecimento directo ou, pelo menos, a admissão da possibilidade (dolo eventual), de os fundos transferidos para contas bancárias das sociedades offshore EMP07... e EMP08... - contas constituídas em 2005 e em Novembro de 2008, respectivamente, das quais era, formalmente, a principal beneficiária final - advirem da prática de crime de “catálogo”, conhecimento, ou admissão de possibilidade, anterior ou contemporâneo da data das acções típicas branqueadoras que lhe são imputadas.
    Aderimos à posição da decisão recorrida no sentido da inexistência de provas que sustentem a indiciação desse conhecimento, sequer, na modalidade de dolo eventual, até à data do repatriamento e integração dos montantes através da recompra, pela EMP09..., do imóvel da Avenida ... dado em permuta, cuja escritura pública foi celebrada em 10.11.2009.
    Como resulta do elenco da prova mencionada na decisão recorrida a fls. 4569 e seguintes, não há, sequer, indiciação de que a arguida tenha tido conhecimento, até 10.11.2009, dos dinheiros que passaram pelas contas da EMP07... e da EMP08... - contas que eram geridas, exclusivamente, pelo arguido DD - e, por maioria de razão, que a arguida tenha tido conhecimento das contas terem servido para recepcionar, e fazer circular, fundos de origem ilícita de “catálogo”.
    Na verdade, a arguida não recebia a documentação das contas (que, como sabemos, era recepcionada nos “Gatekeepers” que prestaram o serviço de criação das sociedades EMP07... e EMP08...) e os funcionários da UBS não estabeleceram contacto com a mesma a propósito da movimentação, a crédito ou a débito, de tais contas (veja-se, neste sentido, o depoimento de ZZZZZZ).
    Não existe nenhuma referência testemunhal, ou dos arguidos, no sentido de terem contactado ou sido contactados ou, de alguma forma, terem tomado conhecimento de alguma actuação da arguida referente àquela quantia de €1.000.000,00, quer quanto à sua origem, quer quanto à sua recepção na conta da EMP07... (ocorrida em Junho de 2008), quer quanto à sua posterior circulação.
    Também não existem documentos de suporte nesse sentido, nem eles são indicados pelo Recorrente.
    A arguida referiu, em sede de inquérito, que em Dezembro de 2009 transferiu, a pedido do pai,  cerca de dois (2) milhões de Euros da conta da EMP08... para uma conta numérica, por si titulada, data em que tomou conhecimento da existência desse capital, na conta da EMP08....
    Porém, atenta a data desta transferência, impõe-se concluir que estes fundos, por si feitos transferir, não respeitam aos que foram repatriados pela EMP09... e integrados, por via do negócio da recompra do imóvel dado em permuta, posto que esta integração ocorreu até Novembro de 2009 (data da celebração da escritura da recompra do imóvel da Avenida ... pela EMP09...).
    Fica a restar o facto de, a pedido do pai, a arguida ter aceitado figurar, formalmente, como titular de duas contas bancárias atribuídas a duas sociedades offshore (a EMP07... INC, aberta em 11.11.2005, e a EMP08... LTD, aberta em 28.11.2008), que também podiam ser (e eram efectivamente) movimentadas pelo pai, o que é manifestamente insuficiente para dar por preenchido, desde logo, o conhecimento da circulação de fundos por essas contas e, consequentemente, da sua origem ilícita de “catálogo”.
    A relação familiar da arguida com o  arguido DD, à luz das regras da normalidade, permite justificar a anuência aos pedidos do pai no sentido de figurar nas duas contas (movimentadas pelo pai) como beneficiária final, sem associar a esses pedidos a existência de actuações do foro criminal.
    Se é assim, não tem suporte a tese de que a arguida acordou com o pai montar novo esquema de branqueamento, que se veio a concretizar entre os meses de Setembro e Novembro de 2009, no sentido de repatriar e/ou integrar parte daqueles fundos, sendo nisto que se traduz a conduta acusada no CRIME 20.
    Pode causar estranheza o facto de a arguida ter aceitado transferir para a pessoa do pai a negociação dos termos do contrato de transmissão da propriedade do apartamento da Avenida ... e da aquisição do imóvel da Avenida ... (que acabou por se operar através de uma permuta, formalizada em Setembro de 2009), com a singular recompra do imóvel da Avenida ... através da EMP09....
    O Recorrente, a este propósito, socorre-se do conteúdo das intercepções telefónicas aludidas a fls. 4611 de decisão recorrida para fundamentar o conhecimento, pela arguida, deste esquema de branqueamento acusado.
    Já a decisão recorrida socorre-se desse mesmo conteúdo, para afirmar a falta desse conhecimento.
    Passamos a transcrever o conteúdo das mesmas.
    Sessão 01105  SMS 40037M ( DD) 2009-08-31/11:33:54
    Era. Manda o papel ao LLLLLLLL senão não há permuta.
    Sessão 01258   alvo 40037M (DD) 2009-09-03/16:55:57
     Intervenientes: DD - Nome associado ao Número do Destinatário a seguir identificado por DD - JJ (filha de DD) - Nome associado ao Número a chamar a seguir identificado por JJ -
    Transcrição:
    DD – ‘Tou? -
    JJ – Sim, pai. ‘Tava ao telefone. -
    DD – O… Olha uma coisa: então, como é que ficou a história da escritura? -
    JJ – Uh… A história da escritura está para a próxima sexta, porque não… Porque afinal ‘tava-se aqui com dúvidas de cartórios e da Casa Pronta, era p’a ser no Cartório deles, só que depois a MMMMMMMM ligou a dizer que era melhor não ser, que era melhor ser no da CAIXA, no notário privado… Privativo e, portanto, muda…
    DD – Pois…
    JJ – Claro, com certeza. Há… Aliás, ela até me disse que até como era uma questão de permutas e não sei quê até se sentia mais confortável que fosse num sítio onde tinha a certeza absoluta que isso estava tudo bem, não é? Pronto. -
    DD – Pois, pois é.
    JJ – Exacto e ficou marcado p’a dia onze, de manhã, portanto de amanhã a oito e eu estou à espera que o NNNNNNNN me diga o que é que tenho que lhe pagar, registos e não sei quê, provisórias e tal…
    DD – Então, de amanhã a oito, então, não é?
    JJ – Dia onze. Quer dizer, não ‘tá ainda confirmado, ele disse-me que à partida não havia problema nenhum, não é? -
    DD – ‘Tá.
    JJ – ‘Tá? -
    DD – P’a eu tratar da outra parte. Ok.
    JJ – ‘Tá.
    DD – Vá, beijinhos.
    JJ – Beijinhos, até já. Até já.
    Fim de conversação
    00139 sessão alvo 40039M 2009-09-10/20:19:02
    Intervenientes: JJ (filha de DD) - Nome associado ao Número do Destinatário a seguir identificado por JJ - DD - Nome associado ao Número a chamar a seguir identificado por DD
    Transcrição:
     JJ – ‘Tá? -
    DD – Então, JJ? -
    JJ – Então, pai? -
    DD – Então, a que horas é isso amanhã?
    JJ – Onze e meia. -
    DD – Já ‘tá tudo feito do outro lado, hein? -
    JJ – Pois, viste as minhas mensagens?
    DD – Não, isso recebi tudo. Já ‘tava tudo feito, mas… (imperceptível) -
    JJ – Pois, mas é que eu… Sim?
    DD – Contrato-promessa de compra da outra já ‘tá feito também. -
    JJ – Eu sei. A MMMMMMMM falou-me há bocadinho, à tarde a dizer isso.
    DD – São um merdosos do pior! -
    JJ – Ai, é?
    DD – É. Vá. Enfim.
    JJ – Mas porquê? Tinham que fazer hoje, era?
    DD – Oh! Não! Tinham que fazer hoje, pois… Se não fizer… Quer dizer… O homem não podia fazer amanhã, não é? Que não ‘tava cá. -
    JJ – Hum? -
    DD – Nem pensar em fazer segunda! Senão não faziam a escritura! Vê lá!
    JJ – A sério? -
    DD – Enfim… Vá. Com medo que depois não se comprasse aquilo e… (imperceptível). Que gente do caraças! Já ‘tão a tratar… Pensam que são todos como eles! -
    JJ – Ah! Ah! Ah! Ah!
    DD – ‘Tá feito. -
    JJ – Enfim, sim. ‘Tá feito. ‘Tá bem. -
    DD – Depois manda-me uma mensagem a dizer que ‘tá feito, ‘tá bem?
    JJ – ‘Tá bem. ‘Tá bem.
    DD – Porque antecipamos uma coisa antes de acontecer a outra, não é?
    JJ – Sim. Sim. Sim.
    DD – De resto, tudo bem?
    JJ – Porque é que não se fez tudo ao mesmo tempo? Isso é que eu também não… Qual era o problema de fazer tudo ao mesmo tempo? -
    DD – Porque o homem que ia comprar não podia estar cá.
    JJ – Ah! Ok! -
    DD – Amanhã… Foi avisado ontem, não é?
    JJ – Sim. Não. Mas o NNNNNNNN disse-me que eles pediram p’a ser na segunda. E o NNNNNNNN ligou-me a perguntar se não me importava que fosse na segunda de manhã e eu disse “eu não, mas são eles que estão a pedir? De certeza?”. -
    DD – Pois…
    JJ – E o NNNNNNNN disse “não, não, são eles que estão a pedir p’a segunda” e eu “por mim, tudo bem”, eu disse “desde que seja de manhã, porque ‘tou um bocadinho em dúvida que… Se ‘tou cá segunda à tarde ou não” e ele “ah! ‘Tá bem, então, marcamos de manhã” e depois passado um bocadinho voltou-me a ligar a dizer que só podia, que o notário privativo acho que só podia assim tipo ao final da manhã e que eles preferiram manter a sexta.
    DD – Pois, ‘tá bem.
    JJ – E eu “tudo bem, pronto”.
    DD – Tudo ok, Bá. Ok, pronto. Já tens as contas todas feitas? Tudo direitinho? -
    JJ – Sim. Sim. Sim. Sim. Sim. Eu só vou receber o dinheiro amanhã, não é? O do empréstimo?
    DD – Sim, pois, não é no acto?
    JJ – Sim. Sim. Sim. Mas o NNNNNNNN disse-me que eles passavam… Eles é que passavam o cheque. -
    DD – Sim, claro. -
    JJ – Ah… Da última vez acho que não foi assim. Da última vez eles depositaram na conta e… E depois eu passava, não é? O meu… Um cheque meu. Desta vez ela diz que não, que é… Que é a CAIXA que passa directamente.
    DD – Sim, é melhor até.
    JJ – É. Por mim…
    DD – Pois, mas passa directamente quê? Da diferença toda? Ou só…
    JJ – Aaah… -
    DD – Só dos cinquenta mil?
    JJ – Da… Não. Não. Da diferença toda.
    DD – É melhor levares um cheque, pelo sim, pelo não.
    JJ – Não, com certeza! Levo os cheques todos, então! Claro que sim, não é? Mas o NNNNNNNN disse-me que passavam da diferença toda e que depois iam à minha conta buscar o resto. Pronto.
    DD – Ok. Tudo bem.
    JJ – Por mim, não é? -
    DD – Então, tu depois como é que é? Andas cá o fim-de-semana?
    JJ – Não, vou para o .... Tenho um casamento no ... no sábado. E venho só no domingo.
    DD – Então… (imperceptível) a mãe ‘tá cá?
    JJ – ‘Tá.
    DD – Que era p’ra ver aquele assunto do carro. -
    JJ – Sim. Sim. Uuuh… Pois… Ou… (imperceptível) domingo à noite. -
    DD – Sim. -
    JJ – Mas a mamã ‘tá cá, sim. -
    DD – Eu ainda lhe ligo, então. -
    JJ – ‘Tá bem. Olha, eu de qualquer das formas confirmei tudo com o NNNNNNNN, não é? Quer dizer, eu confio que aquilo esteja tudo bem, que todo o processo esteja bem, não é? -
    DD – Ah, sim. Sim. ‘Tá tudo.
    JJ – Não percebo nada daquilo, não é? De…
    DD – Com a CAIXA ‘tá tudo bem, não te preocupes.
    JJ – ‘Tá bem. Ok. -
    DD – É chegar lá e assinar. Ok.
    JJ – Muito bem. -
    DD – Então, vá, beijinhos.
    JJ – Então, vá, beijinhos. Beijinhos, até amanhã.
     Fim de conversação

    Extrai-se destas transcrições, na nossa leitura, que a arguida teve prévio conhecimento da opção pela celebração do contrato de permuta e, também, da recompra do seu imóvel da Avenida ..., dado em permuta. Admite-se que tenha tido conhecimento da intervenção da sociedade EMP09... nessa recompra, o que está mais de acordo com as regras de experiência comum, tanto mais que enviou documentos ao representante legal dessa sociedade, LLLLLLLL.
    Porém, não estando indiciado o conhecimento, por parte da arguida, dos fundos que transitaram pelas contas das offshore EMP07... e EMP08... até à data da celebração das escrituras de permuta e de recompra, não se consegue estabelecer nenhuma ligação entre o seu “contributo” nos negócios dos imóveis e o conhecimento (ou admissão de possibilidade) de que esses negócios iriam permitir o repatriamento e/ou a integração de fundos oriundos de ilícito de “catálogo”.

    CONCLUSÃO
    Face ao exposto, nega-se provimento ao recurso, mantendo-se a decisão de não pronúncia da arguida JJ pela prática, em co-autoria e cumplicidade,  respectivamente, dos crimes de branqueamento identificados sob os números 7 e 20.
    Em consequência, mantêm-se como não indiciadas, e por isso devem ser consideradas excluídas da acusação, as referências feitas à arguida JJ nos artigos 338, 339, 3340, 342, 3844, 3846, 3853, 3916, 3918, 3921, 39324, 3931, 3945, 4101, 4103, 4128, 4200, bem como, quanto ao elemento subjectivo, nos artigos 13724, 13866, 13869, 14065, 14070, 14075 e 14078, todos da acusação.

    1.5.5 BRANQUEAMENTOS REFERENTES AOS ACTOS DE CONCENTRAÇÃO E DISSIPAÇÃO.
    1.5.5.1 CRIME DE BRANQUEAMENTO 8 
    €23.013.156,18 - concentração e repatriamento pelo RERTII.
    Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA e BB, relativamente à concentração dos fundos em novas contas bancárias da ..., tituladas por sociedades em offshore controladas por BB e sua transferência para contas tituladas por este último arguido em Portugal, ao abrigo do RERT II, previsto e punido pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.

    DOS VALORES TOTAIS ENTREGUES PELOS AGENTES CORRUPTORES E DESTINADOS AO ARGUIDO AA E DOS VALORES, EFECTIVAMENTE, POR ESTE RECEBIDOS (DIRECTAMENTE E/OU ATRAVÉS DOS SEUS FIDUCIÁRIOS):
    A decisão recorrida e o Recorrente trocam argumentos a propósito das adições dos valores, destinados a AA, realizadas na acusação.
    Como base de trabalho, realizou-se um quadro com tais valores, que entendemos aqui fazer constar.


    Valores totais destinados ao arguido AA e recepcionados.
    Grupo Lena:
    20071.250.000,00branq. 1
    Diagrama I
    UBS EMP67... (BB)
    1.125.000,00UBS EMP67... (BB)
    2008    500.000,00UBS EMP36... (BB)
    2009    241.000,00branq. 2
    Diagrama II
    XLM
    2010    963.925,00XLM
    2011    500.000,00XLM
    2012    142.500,00XLM
    2013    879.500,00XLM
    2014    229.000,00XLM
    Subtotal€5.830.925,00 (+- 6 M)
    Sendo:
    - 2.875.000,00 (+- 3M) via ...; e
    - 2.955.925,00 (+- 3M) via XLM (destes transitaram para a RMF - NN - 840 mil – branq. 10 - Diagrama X)
    Grupo BES:
    20066 M   branq. 3
    Diagrama III
    UBS EMP63... (II) (desses, 2 M integrados através de XXXXXX, entre 2006 e 2008, e  0.5 M ficaram em II).
    20073 Mbranq.  4
    Diagrama IV
    UBS EMP63... (II)
    20088 Mbranq.  5
    Diagrama V
    UBS EMP36... (BB)
    20094 MUBS EMP36... (BB)
    2010
    20118 M (dos quais só chegaram a AA +- 5.2 M, distribuídos da seguinte forma:branq. 6
    Diagrama VI
    3 MXLM (via HH e depois “Lenas”)
    €789.571,93Em cash e facturas pagas a terceiros (via HH e depois pagamentos directos pelas “Lenas”)
    2012€92.907,52Em facturas pagas a terceiros (via HH e depois pagamentos directos pelas “Lenas”)
    2013€36.595,00Em facturas pagas a terceiros. (via HH e depois pagamentos directos pelas “Lenas”)
    2014€835.000,00XLM (via HH e depois “Lenas”)
    2015€365.000,00XLM (via HH e depois “Lenas”)
    SubtotalForam-lhe destinados e entregues na origem €29.000.000, tendo o destinatário final beneficiado de €26.119.074,45.
    Apura-se uma perda de €2.880.925,55 (€29.000.000,00 - €26.119.074,45)
    Sendo:
    - €21.000.000,00 via ....
    - €4.200.000,00 via XLM (vieram directo para Portugal)
    - €919.074,45 pagamentos realizados pelo G. “Lena” a favor de AA e cash.
    Tudo perfaz: €26.119.074,45
    Grupo Vale do Lobo 
    20081 Mbranq. 7
    Diagrama VIII
    UBS EMP67... (BB)
     Total  global (GES +  Lena + Vale do LOBO)
    -Total das entregas na origem €35.830.925,00.
    -Total chegados ao destinatário: €32.949.999,45
    + ganhos de capital são +- 1 M.
    NB - na acusação refere €1.194.716,19 de ganhos financeiros -  fls. 3663 – art.º 13010.
    = €34.144.715,64
    A acusação alude a um total de 34.143.715,64 Euros
    - €24.875.000,00 via ... (€21.000.000,00 BES+ €2.875.000,00  Lena + €1.000.000,00 Vale do lobo).
    - €7.155.925,00 via XLM (€4.200.000,00 GES + €2.955.925,00  Lena)
    -  €919.074,45 pagamentos realizados a partir das contas do G. Lena a favor de AA e cash.

    Atendendo aos diagramas I a VII, nas nossas contas, foram liquidados e destinados ao arguido AA, no somatório das vantagens indevidas dos três grupos “Lena, “GES” e “Vale do Lobo”, a quantia de €35.830.925,00, sendo €5.830.925,00 (€2.875.000,00 + 2.955.925,00) do “Grupo” Lena, €29.000.000,00 do Grupo “GES” e €1.000.000,00 do Grupo “Vale do Lobo”.
    Não obstante, ocorreram “perdas”. As mais significativas encontram-se mencionadas no branqueamento 6, resultantes de um encontro de contas realizado entre BB, como fiduciário, e GG.
    Em razão dessas perdas, das entregas de €35.830.925,00 que foram destinadas ao arguido AA, este veio efectivamente a receber, directamente e/ou através do seu fiduciário final, BB, a quantia de €32.949.999,45,  ou seja, contas redondas, cerca de €33.000.000,00.
    Por seu turno, os capitais depositados, em particular os que se encontravam na ..., geraram rendimentos, em resultado das aplicações financeiras constituídas, computados na acusação em €1.194.716,19 (art.º 13010 da acusação), o que, somado aos €32.949.999,45, perfaz  34.144.715,64, contas redondas cerca de 34 milhões .
    A acusação menciona a este título €34.143.715,64 (artigo 13010).
    Importa realçar que as adições constantes da acusação ora são efectuadas com IVA, ora sem IVA, o que dificulta o seu apuramento ao cêntimo, não sendo também significativo, nesta sede indiciária, o apuramento absolutamente rigoroso dos quantitativos, que, diga-se, não diferem significativamente.

    BREVE DESCRIÇÃO DA MATERIALIDADE OBJECTIVA
    Regressando ao CRIME 8, que nos ocupa, os movimentos financeiros acusados estão esquematizados no diagrama VIII.
    Em causa estão os fundos depositados nas sociedades offshore, de que eram titulares formais os fiduciários II e BB, e as aplicações financeiras com eles subscritas, as quais, para efeitos de repatriação através da adesão ao RERT II, foram valorizadas em €23.013.156,18, sendo este, portanto, o valor a ter aqui em consideração.
    Os movimentos financeiros “purificadores” correspondem às transferências dos fundos, a partir de 2008/2009, das contas das sociedades offshore EMP68..., EMP36... (de BB) e EMP66... (de II), para a conta da sociedade EMP20... (de BB) - tendo ainda restado um remanescente na EMP36..., de cerca de €1.000.000,00 - e o manifesto dos mesmos, em Portugal, em Novembro de 2010, na conta sediada no BESI (Banco Espirito Santo Investimento), titulada por BB,.
    Esse manifesto foi realizado com base em declarações escritas, emitidas pelo banco ..., que atestavam a ordem de transferência de aplicações financeiras constituídas com aqueles réditos.
    De referir que a conta BESI foi aberta em 28.10.2009, em ....
    BB fez abrir outra conta no BES, em 29.12.2009 - conta terminal 407- que passou a funcionar como conta final da BES 006.
    As contas BESI e BES terminal 407 passaram a estar associadas entre si.
    Em 15.12.2010, com base naquele manifesto, BB formalizou a declaração de regularização tributária RERTII da quantia de €23.013.156,18, tendo procedido ao pagamento da taxa de IRS de 5% (a que corresponderam €1.150.657,81), montante debitado na conta BES terminal 407.
    Entre 16.10.2010 e 15.04.2011 ocorre o repatriamento efectivo dos valores constantes do manifesto, na sequência de ordens de transferência dos títulos das aplicações financeiras das contas das sociedades EMP20... e EMP36... para a conta BESI.
    Toda a documentação destas operações foi guardada num cofre (n.º 1860), alugado para o efeito por BB, associado à conta BES terminal 006.
    Os movimentos financeiros, a adesão ao RERT II e o pagamento da taxa de IRS a débito da conta BES terminal 407, estão todos documentados.

    A NOSSA POSIÇÃO
    O crime subjacente
    Os fundos concentrados na ... na conta da EMP20..., feitos transferir para o BESI e repatriados pelo RERT II, têm origem nos Grupos “Lena”, “GES” e “Vale do Lobo”, ou seja, derivam dos crimes de corrupção de titular de cargo político elencados em 1, 4 e  6 do lado passivo, figurando em todos eles, como agente corrompido, o arguido AA (a que se associam, do lado activo, os crimes de corrupção identificados em 2, 5, 7).
    São estes os crimes subjacentes, anteriormente dados como suficientemente indiciados.
    A função de cada arguido no esquema de branqueamento
    AA
    Assume a posição de “dominus” de todos os branqueamentos em que é acusado, e este não é excepção.
    BB
    Prossegue a sua incumbência de realizar em seu nome as operações financeiras, mas sempre sob orientação e em representação de quem lhe conferiu a qualidade de fiduciário “nomeado”.
    Já se disse, e repetiu, estar suficientemente indiciada a  ligação a jusante da titularidade dos fundos repatriados, pela adesão ao RERTII, à pessoa do arguido AA, que acabaram por ser concentrados nas contas BES terminais 006 e 407.
    Como veremos de seguida, foram até movimentados a débito €6.763.690,97 da conta BES terminal 006 (alimentada pela 407) para pagamentos a favor do arguido AA e assunção de custos com as participações sociais adquiridas (como demonstrado no diagrama XI).
    A este propósito o arguido BB, em sede de inquérito, admitiu:
    - Ter feito entregas de dinheiro em numerário ao arguido AA, e por vezes solicitava a terceiros que o fizessem (ocorreu com o arguido LL, que procedia a levantamentos de cheques entregues por BB e fazia chegar o numerário a AA, como com outros arguidos, e até com um amigo de AA - UUUU);
    - Ter emitido cheques para entregar a UU, que eram depositados na conta deste, para satisfação posterior de necessidades pessoais de AA;
    - Ter procedido a pagamentos de despesas respeitantes a AA (despesas médicas, de funerais, pagamentos a uma tal de OOOOOOOO);
    - Ter pago os custos de diversas viagens, de férias e de fins de ano, a AA (só de alojamento numas férias em ... liquidou €16.000,00).
    Contabilizou entregas em mais €500.000,00. Considerou que se tratavam de ajudas/empréstimos.
    Acrescentou que AA nunca lhe pagou renda por conta da ocupação do apartamento de ..., nem após a celebração do contrato de arrendamento, contas que teria de acertar com ele.
    O certo é que os fundos tiveram só uma direcção, de BB para AA, directamente e/ou por via de terceiros, ou até para pagamentos directos de despesas deste (quer fosse o condomínio, compra massiva de livros, pagamentos a secretárias, liberalidades a alegadas amigas, caridade alheia, enfim, os fundos ditos “emprestados” serviam para todo o tipo de pagamentos).
    Como se verifica das intercepções telefónicas, BB e AA falavam em código - “alguma coisa”, “qualquer coisa”, “do mesmo”, “da mesma coisa”, “daquilo que tu sabes que eu gosto”, “fotocópias” - e era o arguido AA que pedia (em jeito de ordem) para que lhe fosse entregue mais “daquilo de que ele gostava”, pretensão sempre satisfeita e rapidamente.
    Só com estas entregas e pagamentos logrou AA manter o seu elevado modo de vida (a conta pessoal da C.G.D encontrava-se sempre desfalcada, apesar de serem identificadas, por exemplo, despesas com vestuário de 7, 6 e 5 mil Euros -ver quadros art.ºs 6174 e seguintes da acusação-, o que não é compatível com os rendimentos conhecidos e declarados deste arguido).
    Considerando os vários milhões em que se traduziram estas entregas e pagamentos, repete-se, numa única direcção, não nos merecem nenhuma credibilidade- como não mereceu ao Sr. Juiz -  as versões dos arguidos, quando justificam as outorgas por amizade ou por empréstimos, cujas contas tardam em fazer, e sem que AA tenha rendimentos lícitos conhecidos que lhe permita assegurar tamanha restituição.
    Portanto, em termos de indícios da materialidade acusada, temos de concluir que eles existem e são avassaladores.
    Esta materialidade permite-nos encaixar os movimentos financeiros em causa e a adesão ao RERTII na fase de branqueamento da integração, ainda que, na aparência, por referência à pessoa do fiduciário BB, representando, consequentemente, uma primeira fase de integração dos fundos antes depositados na ....

    O dolo
    Os arguidos AA e BB são autobranqueadores, razão pela qual o conhecimento da origem ilícita de “catálogo” das vantagens branqueadas é inelutável.
    A concentração dos fundos nas contas (UBS) da sociedade EMP20..., a sua passagem para as contas BESI  e o repatriamento pela adesão ao RERTII, teve o evidente propósito de assegurar a quebra da cadeia de ligação dos réditos à sua origem e ocultar a identidade do beneficiário final dos fundos.
    A específica intenção de dissimulação da origem ilícita dos fundos e/ou evitar a perseguição criminal dos seus agentes, infere-se de todo o comportamento dos arguidos, pois esta foi a intenção que presidiu a todos os branqueamentos anteriores dos mesmos fundos, constituindo este branqueamento apenas mais uma etapa de todos os processos precedentes, agora em vista da integração de capital antes acumulado.

    A CO-AUTORIA
    O acordo exigível decorre da própria relação entre os dois arguidos – o que nomeia e o que é nomeado fiduciário -.

    CONCLUSÃO
    Coloca-se aqui a questão jurídica,  antes abordada, de saber se a purificação dos mesmos fundos pelos mesmos agentes, quando passe por mais do que uma fase do processo de branqueamento,  poderá dar lugar à verificação de mais do que um crime de branqueamento - fazendo corresponder um branqueamento a cada uma dessas fases -, ou se essas operações de transferências e circulação, situadas nas etapas mais a jusante do processo, ainda estão contidas no mesmo crime.
    Já manifestámos o entendimento de que o processo de “purificação” do mesmo dinheiro “sujo”, ainda que passe por diversas fases do branqueamento, dará lugar à prática de um único crime de branqueamento, sob pena de a lavagem do mesmo dinheiro, pelo mesmo autor, ser transformada num processo de “três lavagens” sucessivas, até chegar ao seu projectado destino.
    Sem prejuízo, admitimos outras posições jurídicas nesta matéria, assentes na ideia da existência de várias resoluções criminosas, tomadas em momentos temporais diferenciados, o que até pode conduzir à temática do crime continuado.
    Nesta medida, sendo coerentes com a tomada de posição antes prefigurada, no sentido de que devem ser levadas em conta, em sede de instrução, as várias soluções plausíveis de direito e, ainda, considerando que este tema, em rigor não é objecto do processo (por não ter sido suscitado em sede de recurso, nem tão pouco em sede de decisão recorrida), consideramos que esta questão jurídica, nesta fase processual, não deve obstar à revogação da decisão de não pronúncia deste ilícito.
    Face a todo o exposto, impõe-se que os arguidos AA e BB sejam julgados por mais este crime.

    Termos em que se julga procedente o recurso quanto a este crime de branqueamento 8, relativamente aos arguidos AA e BB.

    1.5.5.2 CRIME DE BRANQUEAMENTO 9
    Dissipação de €28.538.056,72, a partir das contas BES terminais 006 e 407, para outras contas bancárias.

    Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA e BB,  relativamente à dissipação dos fundos por outras contas em Portugal, de que o arguido BB era titular e autorizado, e à confusão de patrimónios de AA e de BB nessas contas bancárias, p. e p. pelo art.º368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.

    DECISÃO RECORRIDA
    Apesar da não pronúncia, a decisão sob censura é muito parca no que toca aos argumentos que levaram àquela conclusão.
    Sem prejuízo, diremos algumas palavras.

    BREVE DESCRIÇÃO DA MATERIALIDADE
    Os movimentos financeiros estão esquematizados no diagrama IX.
    Em causa estão as transferências dos fundos (aplicações financeiras e/ou capitais resultantes das suas vendas) concentrados no BESI, e os oriundos da XLM, para diversas outras contas bancárias sediadas em território nacional e um fundo de activos financeiros, titulados formalmente por BB, especificamente:
    - €17.550.000,00 da conta BESI para a conta BES terminal 407 - criada em Fevereiro de 2009 para acumular o património do arguido AA - a qual passou a servir de conta final à BES terminal 006;
    - €4.200.000,00 da conta BESI para a conta BES terminal 006;
    - €2.798.810,00 da XLM para a conta BES terminal 006;
    - €787.347,05 da conta BESI para a conta BES terminal 273, criada em 2012, para acomodar moeda estrangeira; e
    - €458.284,08 da conta BESI para o “dossier ESAF” - fundo de activos financeiros.
    Entretanto, as aplicações financeiras foram gerando rendimentos e, em consequência, juntando o património advindo da ..., o oriundo da XLM e esses rendimentos do capital, ficaram disponíveis €28.538.056,72. 
    Com vista a continuar a ocultar a verdadeira titularidade dos fundos, a partir da conta BES terminal 006 (que funcionava em associação com a BES terminal 407) foram posteriormente realizadas as seguintes operações de dissipação, sempre no interesse do arguido AA:
    - €9.000.000,00 transitaram directamente a partir da conta BES terminal 006 para conta do BPI (conta n.º...58...), aberta em 05.09.2014, titulada por BB e TT, montante que veio a ser aplicado em produtos de fundos de investimento.
    - €1.102.450,00  transitaram directamente a partir da conta BES terminal 006 para a conta do Deutsche Bank (NIB terminal 980.39), que deu origem a aplicações financeiras.
    -  €500.000,00 transitaram directamente a partir da conta BES terminal 006 para a conta da CGD terminal 530, titulada por BB, que veio a ser objecto de aplicação financeira.
    - €735.000,00 passaram para contas bancárias sediadas no Barclays, tituladas por BB (Barclays terminal 572 e Barclays terminal 183, que funcionavam em associação, uma de passagem e outra final).
    Destes:
    . €100.000,00 seguiram para uma conta aberta no Barclays UK, em ... (IBAN terminal 688), titulada por BB, como fiduciário, aberta em meados de 2013.
    . €500.000,00 regressaram, mais tarde, à BES terminal 006.
    - €1.000.000,00 (juntamente com outro tanto, destinado a BB, como retribuição) transitaram para a conta de BB, Barclays terminal 183.
    A justificação dada ao banco para esta operação foi a realização de um investimento no ..., sendo que o próprio BB, em sede de inquérito, negou ter realizado este invocado investimento no ....
    Esta concreta quantia teve, posteriormente, o seguinte destino:
    - €400.000,00 transitaram para o Barclays UK, em ... (IBAN terminal 688), conta titulada por BB, como fiduciário.
    - €131.000,00 transitaram para a conta Barclays terminal 572, tendo sido realizada uma aplicação financeira com este montante.
    - €100.000,00 transitaram para conta no Deutsche Bank (NIB terminal 980.39, aberta em Abril de 2012 e titulada por BB), que deu origem a uma aplicação financeira.
    - O remanescente foi levantado, em numerário, ao longo de cerca de 2 meses (entre Outubro e Dezembro de 2013) e, pelo menos, €357.910,00 foram distribuídos por três (3) cofres bancários: um titulado formalmente em nome de BB, associado à conta BES terminal 407 (€100.000,00), outro titulado formalmente pelo mesmo arguido BB, associado à conta Barclays terminal 183 (€57.910,00), e um terceiro titulado formalmente pelo arguido LL, associado à sua conta pessoal no Millennium BCP (terminal 494), cofre onde foram apreendidos €200.000,00.
    A materialidade referente à contratação do aluguer e uso deste cofre pelo arguido LL é suporte do crime de branqueamento 13.
    - €42.000,00 destinaram-se ao pagamento de exemplares do livro “...”, do arguido AA, e de despesas de promoção do mesmo.
    Todas estas operações estão documentadas.
    Como veremos infra de forma mais detalhada, da conta BES terminal 006 (alimentada pela 407) foram movimentados a débito €6.763.690,97, com vista a realizar entregas e pagamentos a favor do arguido AA (diagramas XI).
    A conta BES terminal 006 serviu, por fim, para creditar quantias do próprio BB, que foram sendo posteriormente debitadas a seu benefício.
    Na verdade, para seu interesse pessoal, BB realizou operações a débito, daquela conta, em cerca de €5.000.000,00 (ver art.ºs 6132 a 6134 da acusação).
    Como contrapartida do seu serviço de fiduciário do arguido AA, foi-lhe atribuída a quantia de €2.500.000,00.
    Parte desta contrapartida, mais concretamente €725.000,00, transitou para uma conta bancária aberta no Montepio (terminal 491), titulada por BB e TT (companheira daquele), tendo depois servido, juntamente com fundos sacados directamente da BES terminal 006, para pagamento do preço do imóvel “Urbanização ...”, adquirido pelo casal, correspondente à morada fiscal da arguida TT. 
    Outra parte - €225.000,00 - transitou para uma outra conta bancária, aberta no Montepio (terminal 641), titulada por TT, tendo depois servido para pagamento do preço de aquisição de cinco (5 ) fracções de um prédio de escritórios (sito na Rua ... e cuja escritura de compra foi assinada por BB e TT em Junho de 2012), local onde vieram a ser instaladas as sedes de duas sociedades, assim como o escritório do arguido LL.
    Outra parte - €500.000,00 (integrada na “operação ...”) - transitou para uma conta bancária sediada no Barclays, aberta em nome de BB (terminal 572).  €250.000,00 serviram para a constituição de um depósito a prazo. Os outros €250.000,00 seguiram para uma conta no Barclays, titulada pela filha (terminal 136) e, posteriormente, para uma conta titulada por TT, sediada no Montepio Geral (terminal 094).
     O remanescente foi sacado sobre a conta BES terminal 006 (apesar de €500.000,00 terem passado previamente por uma das contas Barclays e regressado à conta BES terminal 006) e foi utilizado para as suas sociedades EMP23... e EMP24..., num total de €1.029.000,00 (art.º 6118 da acusação).
     O somatório destas parcelas perfaz €2.479.000,00.
    Todas estas operações estão documentadas.

    A NOSSA POSIÇÃO
    Crime subjacente
    Os fundos dissipados - antes concentrados no BESI, e repatriados pelo RERT II, e os oriundos da XLM - têm origem nos Grupos “Lena”, “GES” e “Vale do Lobo”, tratando-se de contrapartidas decorrentes dos crimes de corrupção de titular de cargo político elencados em 1, 4 e 6 do lado passivo, figurando em todos eles, como agente corrompido, o arguido AA, a que se associam, do lado activo, os crimes de corrupção identificados em 2, 5, 7.
    Tais crimes subjacentes foram, anteriormente, considerados suficientemente indiciados
    A função de cada arguido no esquema de branqueamento
    AA
    Assume a posição de “dominus” das operações de transferência, a seu benefício.
    Repetimos estar suficientemente indiciada a  ligação a jusante  dos fundos  à pessoa deste arguido, até por reporte às contas BES terminais 006 e 407.
    BB
    Mantém o “papel” de fiel fiduciário, por nomeação de AA.
    O dolo
    Ambos os arguidos são autobranqueadores, razão pela qual  conheciam a origem ilícita de catálogo dos fundos transferidos (no caso, com vista à sua dissipação).
    À transferência dos fundos do BESI e da XLM para as contas BES terminais 006 e 407, seguiram-se novas operações de transferência/circulação destes fundos (a maior parte das quais  impuseram-se devido à “queda” do BES e ao receio de perda dos activos aí estacionados) para diversas contas sediadas em outros bancos (Barclays, Deutsche Bank, BPI, C.G.D.), todas longe do universo GES e que, ou já estavam abertas e foram aproveitadas para o efeito, ou foram criadas, todas tituladas por BB ou  por este e a companheira, TT.
    Esses fundos passaram a estar depositados nestas outras contas, em aplicações financeiras ou fundos de investimento com eles subscritos.
    Essas mesmas contas, em particular a BES terminal 006 e a Barclays terminal 572, serviram, também, para creditar e debitar capitais pertencentes a BB, no seu exclusivo interesse.
    A circunstância de, nessas contas, terem sido realizados movimentos financeiros, a crédito e a débito, referentes aos interesses de duas pessoas, dificulta, de sobremaneira, a identificação do beneficiário final de cada movimento e da conta em si mesma, objectivo que era pretendido pelos dois arguidos acusados.
    A específica intenção de dissimulação da origem ilícita dos fundos e/ou evitar a perseguição criminal dos seus agentes infere-se, de novo, de todo o comportamento dos arguidos, nomeadamente do acabado de referir.
    A co-autoria
    Como mencionado no crime anterior, o acordo exigível na co-autoria decorre da própria relação entre os dois arguidos - o que nomeia e o que é nomeado fiduciário.

    CONCLUSÃO
    Os factos que suportam este crime representam uma segunda fase de circulação dos mesmos fundos em território português, ou seja, já depois da sua “lavagem” por referência à pessoa do fiduciário (alcançada através da adesão ao RERTII),  e permitem acrescentar dificuldade à identificação da sua origem e do seu efectivo destinatário. 
    Em termos de indícios da materialidade acusada, concluímos que eles existem e são fortes, sem prejuízo da questão jurídica aludida na parte final do CRIME 8, mas que, nesta fase processual e pelas razões ali adiantadas, não impede o prosseguimento deste crime para julgamento.
    Termos em que se julga procedente o recurso quanto a este branqueamento 9, relativamente aos arguidos AA e BB.
    1.5.6 Última  etapa de integração dos fundos destinados ao arguido AA, com intervenção de “facilitadores”
    1.5.6.1 CRIME DE BRANQUEAMENTO 10
    Pagamentos realizados pela RMF.
      Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos GG, NN, as sociedades LEC SA, XLM e RMF CONSULTING e outros (AA e BB, pronunciados por este ilícito criminal), relativamente a utilização da sociedade RMF CONSULTING, entre 2010 e 2014, para a colocação de fundos destinados ao arguido AA e utilização dos mesmos no seu interesse através do pagamento de despesas suas e colocação de numerário à sua disposição, p. e p. pelo art.368°-A, n° 1, 2 e 3, do Código Penal.

    DECISÃO RECORRIDA
    Baseou a não pronúncia do arguido NN:
    - Na nulidade da acusação, decorrente da falta de descrição do dolo do tipo e do dolo da culpa;
    - Considerou que NN não tinha conhecimento (nem forma de o ter) da origem ilícita de “catálogo “dos fundos que passaram pela RMF.

    RECORRENTE
    Sustenta a existência de indícios, recolhidos em sede de inquérito (conclusões 923 e seguintes).

    BREVE DESCRIÇÃO DA MATERIALIDADE OBJECTIVA
    Os movimentos financeiros de transferências da LEC-SA para a XLM e desta para a RMF, bem como os pagamentos realizados por esta, estão esquematizados no diagrama X  e estão todos documentados.
    Em causa estão as transferências de €840.927,50 (antes integrados nos fundos aludidos no CRIME 2 - ver diagramas II.1 e II.2 -) da LEC-SA (de GG) para a XLM (de BB) e, desta, para a RMF (de NN).
    Parte desses fundos foram destinados à liquidação das seguintes despesas:
    - €185.622,00 (já com IVA), ao pagamento da contrapartida a NN, por ter aceitado fazer actuar a RMF a favor dos interesses do arguido AA (através do seu fiduciário BB) e das despesas inerentes a essa intervenção;
    - Cerca de €175.000,00, ao pagamento de serviços prestados por XX e VV, relacionados com postagens favoráveis a AA num blogue e com as teses académicas de autoria atribuída a AA, referentes à sua redacção e revisão, serviços cuja retribuição é suportada por contratos de prestação de serviços, simuladamente destinados à sociedade RMF, dado que nenhum serviço foi prestado a esta sociedade e, por fim, a outros pequenos pagamentos; e
    - Mais de €80.000,00, em aquisição de participações sociais (dos quais €50.000,00 foram recuperados), adquiridas pela RMF (NN), a pedido de BB.

    A NOSSA POSIÇÃO
    Crime subjacente
    Os crimes subjacentes são os que motivaram a entrega da quantia de €840.927,50 que foi canalizada para a RMF, ou seja, principalmente o crime de corrupção de titular de cargo político elencado em 1 do lado passivo, considerado anteriormente suficientemente indiciado, a que se associa o crime de corrupção enumerado em 2, do lado activo.
    Parte significativa da quantia de €840.927,50, que transitou da XLM para a RMF, destinou-se, claramente, à assunção de despesas da esfera pessoal do arguido AA.
    Este facto é também elucidativo de que  os fundos que circularam e seguiram caminho para a XLM são pertença de AA, dado que, depois de tanto circularem e de passarem por diversos titulares formais, acabaram por ser, claramente, utilizados em benefício deste arguido.
    Na verdade, que se saiba, nem  GG, nem NN, nem as sociedades LEC SA, XLM e RMF CONSULTING, nem mesmo BB, teriam qualquer interesse em que fossem postados, no meio digital e redes sociais, comentários favoráveis à pessoa de AA, nem que fossem prestados apoios, no âmbito da feitura e revisão das teses académicas de AA.
    Muito menos será de supor que qualquer um destes arguidos estivesse disposto a pagar mais de €160.000,00 por esses serviços, nem mesmo a título de enorme amizade.
    A função de cada arguido no esquema de branqueamento
    GG E A LEC-SA
    Por si e em representação da sociedade LEC-SA, mantém as funções já aludidas no CRIME 2, para aí se remetendo, agora essencialmente centradas na parte do capital transferido da LEC-SA para a XLM.
    NN E A “RMF CONSULTING-GESTÃO E CONSULTADORIA ESTRATÉGICA LDA.”
    Extrai-se de toda a factualidade que este arguido, por si e como representante legal da RMF, aceitou actuar como “facilitador” na fase de integração de parte das vantagens indevidas que circularam através da XLM, tendo sido “aproveitado” - com o seu beneplácito - em razão do seu ofício, para ajudar num esquema de branqueamento doméstico, com vista a fazer chegar os fundos à economia real, a benefício do seu efectivo titular.
    Atentemos:
    O arguido iniciou a sua colaboração a tempo inteiro com BB, quando este se desligou formalmente do Grupo “Lena” e necessitou de estruturas societárias por via das quais continuasse a sua ligação ao mesmo Grupo, embora sob nome de terceiros, tendo NN sido um dos escolhidos para dar “rosto” a uma dessas sociedades.
    Nessa sequência, em Maio de 2009, NN constitui a “RMF CONSULTING -Gestão e Consultadoria Estratégica”, primeiro como “Unipessoal Lda.”.
    Logo em Dezembro do mesmo ano, a sociedade deixou de ser unipessoal, tendo a “EMP110... Lda.” (associada ao arguido LL) adquirido parte do capital social, por via de divisão da quota até ali única do arguido NN. A sociedade passou, então, a adoptar a denominação “RMF CONSULTING-Gestão e Consultadoria Estratégica Lda.”.
    O arguido figurou como seu gerente até 2016 e abriu conta em nome da sociedade, na Caixa Económica Montepio Geral.
    A quota de NN foi vendida em Março de 2016 a BB, data a partir da qual TT passou a figurar como gerente.
    Esta sociedade veio a ser utilizada no interesse de BB, como fiduciário de AA, mas também no interesse pessoal de NN.
    Este arguido, por si e como representante da RMF, aceitou receber €840.927,50 da XLM, justificados por contratos de prestação de serviços meramente formais.
    E com esses fundos, aceitou proceder ao pagamento de facturas  a benefício de terceiros, com base em outros contratos de prestação de serviços que sabia não corresponderem à verdade, posto que os beneficiários das quantias por si pagas nunca trabalharam para a RMF.
    Sempre a pedido de BB aceitou, por fim, figurar como adquirente de inúmeras participações sociais de outras sociedades.
    Por tal disponibilidade e actuação foi remunerado, em quase €200.000,00.
    Questionado sobre tais contratos em sede de interrogatórios prestados em inquérito, NN referiu: não fazer nada do objecto da XLM, e (…) os tais contratos não faz nada nessa área do procurement, dá algum apoio quando sai com o Eng. BB, há ou havia uma proximidade dele com o Grupo LENA, agora não há nada que possa dizer que faça directamente para a XLM ou que vá directamente pela XLM. Admitiu ter pagos diversas despesas (não só referentes a participações sociais, mas também a VV, aos XX e YY, a PPPPPPPP, a associações), sempre a pedido de BB. Elaborava os contratos entre entre a RMF e esses terceiros. A RMF procedia aos pagamentos. A RMF faturava esses valores à XLM (chamou-lhe subcontratações). Não sabe se tais pessoas prestaram efetivos serviços e a quem, embora na altura achasse que era a BB.
    Não há dúvida de que NN se deixou instrumentalizar e aceitou fazer actuar a RMF a benefício de terceiros, sempre a pedido de BB, como fiduciário, beneficiando de contrapartidas por essa actuação.

    A SOCIEDADE “XLM-SOCIEDADE DE ESTUDOS E PROJECTOS, LDA.”
    Remete-se para o que se deixou antes dito, a propósito da falta evidente da actuação do arguido BB a benefício do interesse colectivo deste “veículo” corporativo e de “fachada”.
    Os justificativos criados
    Para justificar a passagem de €840.927,50 da XLM para a RMF foram simulados diversos contratos de prestação de serviços entre a XLM (como beneficiária desses serviços e pagadora) e a RMF (como fornecedora dos serviços).
    Tais contratos motivaram a emissão de inúmeras facturas pela RMF, pagas pela XLM, por vezes até em duplicado e, outras vezes, sem justificativo contratual (conforme quadros constantes dos art.s 11843 e 11844 da acusação, para onde se remete).
    NN aceitou celebrar estes contratos de prestação de serviços, que ele próprio elaborou, apesar de saber que tais contratos não tinham nenhuma adesão à realidade.
    Este arguido aceitou, ainda, celebrar outros contratos de prestação de serviços entre a RMF (desta feita, como beneficiária desses serviços e pagadora)  e terceiros que lhe foram indicados por BB, proceder ao pagamento de facturas a benefício desses terceiros, apesar de saber que tais contratos não correspondiam à verdade, pois que os alegados prestadores de tais serviços nunca trabalharam para a RMF.
    O dolo
    GG é autobranqueador sendo, por isso, óbvio o seu conhecimento da origem ilícita de “catálogo” dos fundos “lavados”.
    NN não é autobranqueador. Daí a necessidade do conhecimento ou, pelo menos, a admissão da possibilidade da origem ilícita de “catálogo” dos fundos que ajudou a circular e a integrar. 
    Reconhecemos que o progressivo afastamento dos fundos da sua origem torna mais difícil a prova desse conhecimento.
    Porém, a intervenção deste arguido, neste crime, terá de ser contextualizada com todas as suas restantes actuações.
    Na verdade, o arguido NN, além da materialidade que suporta este ilícito, fez inúmeros levantamentos em numerário (mais de  €100.000,00) a pedido de BB, chegou a transferir dinheiro para MMMMMM para esta realizar o pagamento à Segurança Social das contribuições referentes ao motorista UU, teve intervenção na compra do livro “...” (para inflacionar os números das suas vendas).
    O arguido guardou na sua residência uma pasta com documentos de despesas de AA (aparentemente pagas pela funcionária MMMMMM), a qual continha, nomeadamente, pagamentos atinentes a UU, na qualidade de motorista, o contrato de MM, recibos de IMIs e  documentação da venda dos imóveis da mãe de AA a BB.
    É credível a versão do Ministério Público de que, a pedido do também arguido BB, terá ido buscar a pasta para proteger/esconder esses documentos.
    Ora, um trabalhador avençado (qualidade em que agora se escuda),  não guarda na sua casa documentos alheios que podem ser comprometedores, não compra livros alheios em barda para inflacionar as suas vendas, não celebra contratos por via dos quais a sua empresa recebe quase 1 milhão de Euros, sabendo que não prestaria tais serviços, não aceita que a sua sociedade celebre contratos com terceiros e proceda a pagamentos, sabendo que tais pessoas nenhum serviço iriam prestar à sua sociedade, não adquire participações sociais de “fachada” em inúmeras sociedades, sempre financiado por BB e, nessa medida, como “testa de ferro” deste nessas sociedades, nem faz levantamentos e entregas de mais de €100.000,00.
    Este arguido aceitou actuar como um “facilitador” nestes esquemas de branqueamento, em troco de contrapartidas monetárias recebidas, que atingiram o montante global de quase €200.000,00, admitindo-se, é certo,  que parte representem despesas com a circulação do dinheiro pela RMF.
    Na verdade, a sua actuação relacionada, quer  com BB e as suas empresas, quer com GG e as empresas do Grupo “Lena” (cuja mútua proximidade ou amizade conhecia), resume-se à facilitação da passagem, pela RMF, de capitais avultados, pagamentos a terceiros em nome da RMF (que sabia não fazerem sentido) e  recebimento de elevadas contrapartidas por estes serviços.
    Considerando os montantes (quase 1 milhão de Euros) em que NN interveio como “intermediário” - para usar um termo seu -  e, bem assim, os montantes que recebeu como contrapartida dessa disponibilidade (quase €200.000,00, o que representa cerca de 20% daquele valor), sem prestar serviços efectivos que os pudessem justificar, é legítimo inferir que este arguido terá, pelo menos, admitido como possível, a origem ilícita de “catálogo” dos fundos que ajudou a branquear.
    A finalidade da sua actuação (para além do recebimento das significativas contrapartidas - porventura móbil principal) só pode ter sido ajudar a esconder a identidade do verdadeiro titular dos fundos ilegais, que ajudou a circular e a integrar, e/ou evitar a perseguição criminal dos autores do crime subjacente.
    A co-autoria
    Remete-se para o que antes se deixou escrito nesta matéria, nomeadamente no CRIME 1, devidamente adaptado a este crime. 
    CONCLUSÃO
    A materialidade acusada, até porque documentada, está suficientemente indiciada.
    No que concerne a GG e à sociedade arguida LEC-SA, volta a colocar-se a questão jurídica aludida na parte final do CRIME 8 (de saber se as suas actuações preenchem mais do que uma vez o mesmo tipo legal de branqueamento, quando realizam diversas manobras de branqueamento dos mesmos fundos), problemática que, nesta fase processual e pelas razões ali adiantadas, não impede o prosseguimento destes arguidos para julgamento por este crime.
    Nesta conformidade, não subsistem razões que obstem ao prosseguimento deste crime para julgamento, relativamente aos arguidos GG, NN e às sociedades LEC-SA e RMF-CONSULTING.
    Relativamente à sociedade “XLM-Sociedade de Estudos e Projectos, Lda.”, o recurso improcede, mantendo-se a decisão de não pronúncia da sociedade, pelas razões antes adiantadas.
    Termos em que se julga procedente o recurso quanto a este branqueamento 10, relativamente aos arguidos GG, NN, as sociedades LEC SA e RMF CONSULTING e  improcedente quanto à sociedade XLM, mantendo-se, nesta parte, a decisão de não pronúncia.

    1.5.6.2 CRIME DE BRANQUEAMENTO 11
    Imóveis de YYY.
    Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, BB e LL, quanto a aquisição de imóveis em Portugal, com o retorno do preço pago para a esfera patrimonial do arguido AA, de forma justificada, factos ocorridos entre 2010 e 2012, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.

    DECISÃO RECORRIDA
    Baseou a não pronúncia:
    - Na nulidade da acusação, no que respeita ao arguido LL, decorrente da falta de descrição do dolo do tipo e do dolo da culpa;
    - Na falta de indiciação do crime precedente;
    - Subsidiariamente, no entendimento de que as transferências de capitais sempre seriam actos sem autonomia típica (ligados aos crimes de corrupção),
    Estes três temas já foram abordados anteriormente.
    - Na falta de indícios da prática do crime de branqueamento, em si mesmo, nomeadamente na falta de prova da intervenção do arguido AA no negócio da venda das três fracções referidas nos autos;
    - Na ausência de indícios do conhecimento da origem ilícita de “catálogo” dos fundos e do acordo exigido na co-autoria, na parte tocante ao arguido LL.

    RECORRENTE
    Sustenta a existência de indícios, recolhidos em sede de inquérito.

    BREVE DESCRIÇÃO DA MATERIALIDADE OBJECTIVA:
    Os movimentos financeiros que suportam este crime estão esquematizados numa parte do diagrama XI.3.
    Reporta-se, resumidamente, a três (3 ) negócios de compra de três (3) fracções (fracções ... e ... de um prédio sito em .../... e fracção ... do prédio ..., n.º ..., Rua ..., ...), por BB a YYY (mãe do arguido AA), pelo preço global de €775.000,00, com fundos advindos da XLM e da conta BES terminal 006, alimentada pela BES terminal 407, contas onde foram concentrados os fundos repatriados pelo RERTII.
    As escrituras das primeiras duas fracções foram antecedidas de contratos promessa, celebrados cerca de um (1 ) ano e meio antes das escrituras, no âmbito dos quais foram sendo pagos, em pequenas parcelas, 75% dos preços acordados, o que motivou a realização de adendas aos contratos.
    Do montante de €775.000,00, creditado nas contas de YYY a título de pagamento de sinais e dos preços escriturados, mais de 70% - concretamente €555.000,00 - foram transferidos para a conta pessoal do arguido AA.
    As burocracias referentes às escrituras públicas e despesas associadas à sua realização (nomeadamente fiscais) foram tratadas pelo arguido LL, que chegou a representar o comprador e a vendedora nas escrituras públicas, para o que a sua conta foi, previamente, creditadas com tais quantias.
    Tais fracções foram manifestadas para integrarem um fundo imobiliário fechado (a par do apartamento de ...), com titularidade formal de BB, diligências iniciadas por LL.
    O plano foi abortado, devido ao desenrolar deste processo.
    Todas estas operações estão documentadas.

    A NOSSA POSIÇÃO
    Crime subjacente
    Os €775.000,00 que serviram para o pagamento das fracções advêm da conta BES terminal 006 (alimentada pela BES terminal 407 e por fundos oriundos da XLM), dos quais mais de 70% ingressaram posteriormente na esfera formal do arguido AA.
    Os crimes subjacentes são os que motivaram a entrega das quantias que vieram a ser depositadas nas contas BES terminais 006 e 407, parte das quais repatriadas pelo RERTII, ou seja, os crimes de corrupção de titular de cargo político, elencados em 1, 4 e 6 do lado passivo (a que se associam, do lado activo, os elencados em 2, 5 e 7), anteriormente dados como suficientemente indiciados.
    A função de cada arguido no esquema de branqueamento
    AA
    Assume o mesmo papel de “homem do fundo”, para o qual todos os demais trabalham (e foram muitos, se atentarmos ao somatório dos esquemas de branqueamento), mas que se mantém sempre na penumbra.
    Trata-se da pessoa que, juntamente com os co-autores, engendrou o esquema de branqueamento, com envolvimento do nome e das contas bancárias da sua mãe.
    BB
    Mantém o seu papel de leal fiduciário daquele.
    No que concerne aos indícios da prática deste crime por estes dois arguidos AA e BB:
    De acordo com a acusação, os negócios descritos na materialidade objectiva não visaram a venda real das fracções, mas antes, um mero esquema de gerar liquidez, já devidamente purificada, para disponibilização de fundos na sempre desfalcada conta pessoal do arguido AA, sediada na C.G.D.. Os preços acordados foram liquidados com dinheiro pertença do próprio AA.
    A nossa leitura da factualidade objectiva está de acordo com a do Ministério Público.
    É possível identificar um conjunto de sinais que apontam para a criação e uso de mais um esquema de branqueamento, nomeadamente:
    - O elevado montante associado aos três (3)  negócios;
    - A origem dos fundos (contas BES terminais 006 e 407) que serviram para pagar os preços acordados formalmente, cuja titularidade já anteriormente atribuímos, indiciariamente, ao arguido AA;
    - A distância temporal entre a celebração dos dois (2) contratos promessa e das escrituras (cerca de um ano e meio);
    - A necessidade de realizar adendas sucessivas aos contratos promessa;
    - O pagamento de 75% do preço, antes da celebração das escrituras,  em pequenas fracções ao longo do tempo;
    - O destino final de mais de 2/3 desses fundos (o arguido AA ficou com 2/3 desses fundos, não obstante o irmão, já falecido, ter deixado herdeiros);
    - Parte significativa (mais de 2/3) da quantia de €775.000,00, que transitou da conta terminal BES 006 (alimentada pela BES terminal 407 e por fundos advindos da XLM) regressou à esfera formal do arguido AA;
    - A intervenção do arguido LL nas formalidades e a representação, por si, das duas partes contratuais;
    - A circunstância de as próprias despesas do condomínio da fracção ... do prédio ..., passarem a ser debitadas na conta BES terminal 006 (cheques de 30.11.2012 e 02.03.2013 referidos no quadro do art.º 6138 da ac.), conta onde foram - antes e depois - concentrados os débitos relativos aos interesses de AA;
    - A circunstância de tais fracções terem sido destinadas a integrar um opaco “fundo imobiliário fechado”, juntamente com o apartamento de ... (esse fundo tinha em vista, além do mais, concentrar e garantir a manutenção da verdadeira titularidade dos imóveis na pessoa de AA, sob fidúcia de BB).
    A decisão recorrida considera existirem “contra-indícios” da prática do crime pelo arguido AA.
    Refere que a conta BES terminal 006 foi também usada por BB, em seu benefício, no montante de quase 5 milhões de Euros, com movimentos a crédito e a débito de valores equivalentes.
    Porém, também resulta do quadro dessas operações, constante do artigo 6132 da acusação, que os movimentos a débito respeitam a operações relacionadas com as suas empresas, despesas associadas com comissões bancárias, seguros, despesas de aluguer de cofre, pagamentos ao Colégio ... (débitos directos), sendo possível, pelo menos em termos indiciários, circunscrever essa utilização, basicamente, à actividade das mencionadas sociedades.
    A decisão sob censura concluiu, da prova testemunhal e dos interrogatórios, que terá sido o irmão do arguido AA quem contactou com BB, a propósito da venda dos imóveis e dos pormenores dessas vendas, o que constituiria mais um “contra-indício” da prática do crime pelo arguido AA.
    Tal não permite, a nosso ver,  afastar a intervenção do arguido AA dos negócios da venda das 3 fracções.
    De acordo com a testemunha QQQQQQQQ (companheira e mãe de uma filha do falecido BBBBBBB, irmão de AA), o companheiro, com quem viveu em união de facto cerca de 10 anos, “ia à ... tratar de contas e bancos”, “ ia a ...”, “ia num dia voltava no outro”, “ele dizia que ia tratar de coisas do irmão, do AA e do RRRRRRRR”.
    Deste testemunho extrai-se que os irmãos eram próximos entre si e o falecido BBBBBBB tratava de muitas questões referentes a AA.
    Por outro lado, é impossível acreditar que, dada a proximidade entre AA e BB, o negócio dos imóveis pudesse ter sido feito à sua margem e sem o seu conhecimento.
    Podemos concluir, mais uma vez, que os fundos circularam, circularam, passaram por diversos titulares formais, mas acabaram, na sua grande maioria, na disponibilidade do arguido AA.
    LL
    O início da sua colaboração a tempo inteiro com BB, a convite do mesmo, teve lugar ao mesmo tempo que o arguido NN, isto é,  quando BB se desligou formalmente do Grupo “Lena” e precisou de estruturas societárias por via das quais continuasse a garantir a sua ligação ao mesmo Grupo, embora sob nome de terceiros.
    LL foi outro dos escolhidos para dar “rosto” e agir em nome dessas sociedades, a começar pela XLM, que criou como unipessoal em Julho de 2009, sob a denominação “Algo Excêntrico Unipessoal, Lda.”, tendo ainda assumido a qualidade de sócio de diversas outras sociedades (por força da aquisição de pequenas quotas, cujo custo foi sempre suportado por BB), com a EMP111..., a EMP24... e a EMP110....
    A sua intervenção tem de ser enquadrada com as suas outras actuações branqueadoras de que é acusado, extraindo-se da materialidade dos (3) crimes 11, 12 e 13, que essa actuação está muito acima da que é própria de um advogado e, bem assim, da que é própria de um simples funcionário, em cumprimento de ordens funcionais (tese defendida na decisão recorrida).
    Na verdade, cada uma das actuações, isoladamente, poderia encontrar alguma explicação plausível.
    Porém, quando vemos o comportamento do arguido no seu conjunto, temos que concluir que não são “tarefas”  próprias de  um advogado:
    - Um advogado não abre contas bancárias em ..., que movimenta, apenas, a benefício de esquemas de branqueamento;
    - Um advogado não faz 44 levantamentos e transferências da conta do “cliente”, em montante global superior a €400.000,00  (reportamo-nos à conta BES terminal 006 - verificar quadro dos movimentos a débito desta conta constante do art.º 6138 da acusação), ora através de cheque, nomeadamente cheque de caixa (número mais significativo de operações), ora por transferências;
    - Um advogado não permite o uso da sua conta pessoal para fazer passar fundos de um seu “cliente” a favor de terceiro, sem qualquer justificação para essa passagem;
    - Um advogado não figura como sócio de várias sociedades como “testa de ferro” de terceiro, cujas quotas sociais não pagou (sendo que o próprio arguido, no seu interrogatório, em sede de inquérito, já nem se recordava de ter participações em certas sociedades, e nada saber sobre elas, tendo acrescentado que quem tratava da parte das participações  sociais era NN, este, por sua vez, disse que quer ele, quer o arguido LL, eram financiados nessas participações por BB);
    - Um advogado não faz entregas de dinheiros em envelopes a um terceiro, inclusive no estrangeiro, a pedido do seu “cliente” (sendo o próprio arguido que admitiu, em sede de interrogatório no inquérito, ter entregue, por exemplo, um envelope com €10.000,00 ao motorista UU, assim como um envelope a MM, em ...);
    - Um advogado não compra 2374 exemplares do mesmo livro, a pedido do seu “cliente”, para garantir posição cimeira nas vendas desse livro (para o que lhe foram disponibilizados quase 38 mil Euros);
    - Um advogado não faz pagamentos a terceiros - reportamo-nos a LLLL - via Western Union, a pedido do seu “cliente”, sem que esses pagamentos encontrem justificativo em algum serviço prestado;
    - Um advogado não aceita guardar em cofre bancário (para isso alugado) e em cofre no seu escritório grandes quantias em numerário, pertença do seu “cliente”;
    - Um advogado não trata com agências de viagens para arranjar alojamento a amigos ou conhecidos dos seus clientes;
    - Um advogado não paga contas de água, luz e gás no estrangeiro de um seu “cliente” ….
    Por outro lado, também não está contido nas funções/deveres de um qualquer funcionário, por ordem de uma qualquer entidade patronal, permitir o uso de contas bancárias pessoais para fazer passar dinheiro do patrão, nem abrir contas destinadas ao mesmo efeito, nem alugar cofres bancários para guardar dinheiro do patrão.
    Este arguido é, aliás, uma peça chave da fase de integração dos fundos repatriados.
    Aceitou actuar como “facilitador” nestes esquemas de branqueamento, em troco de contrapartidas monetárias, que atingiram o montante global de €81.000,00, transferidas para contas por si tituladas (ver quadros constantes do art.º 123 da acusação).
    Foi “aproveitado” pelos co-arguidos em razão do seu ofício e da sua disponibilidade para actuar nos moldes aludidos.
    O seu papel no crime ora em apreço tem, portanto, de ser analisado à luz de todo o seu comportamento global, de efectiva ajuda e colaboração em diversos esquemas de branqueamento de fundos pertença, indiciariamente, ao arguido AA, mas geridos formalmente em nome de BB, não se tendo limitado a realizar minutas de contratos e a representar partes na formalização dos mesmos, como pretende fazer crer na sua defesa.
    Dito isto, LL foi o “rosto” das duas partes alegadamente contratantes nas escrituras públicas celebradas, cuja marcação e conteúdo tratou, tendo, ainda, pago os custos do notário e fiscais inerentes.
    À semelhança do que ocorreu com NN, também LL se deixou instrumentalizar a benefício do arguido AA, a pedido de BB, tendo beneficiado de substanciais contrapartidas por essa actuação.

    OS JUSTIFICATIVOS CRIADOS
    Começam por ser os dois contratos promessa e as suas adendas, prosseguem com as 3 escrituras públicas, que serviram unicamente para dar aparência legal à integração dos capitais, por reporte à pessoa de AA, posto que tais fundos até já se mostravam purificados face ao arguido BB, por via do seu repatriamento através do RERTII.

    O DOLO
    Os arguidos AA e BB, na qualidade de autobranqueadores, têm necessariamente conhecimento da origem dos fundos branqueados.
    Já LL, não sendo autobranqueador, impõe-se para o preenchimento do elemento subjectivo do tipo o conhecimento directo ou, pelo menos, a  admissão da possibilidade dessa origem ilícita de “catálogo”.
    Considerando a materialidade global da acusação que o implica, e bem assim os montantes que recebeu como contrapartida da sua disponibilidade nos esquemas em que interveio - cerca de €80.000,00 (quadros do artigo 123 da acusação), o que representa cerca de 20% do valor que levantou/transferiu/parte do qual entregou e outra parte guardou (já referidos pelo menos €400.000,00) - é legítimo concluir que este arguido terá, pelo menos, admitido a possibilidade da falsidade das alegadas vendas dos imóveis (encetou diligências para que estas fracções passassem a fazer parte de um Fundo Imobiliário Fechado, visando conferir opacidade ao seu beneficiário) e da origem ilícita de “catálogo” dos fundos que ajudou a branquear.
    Consideramos, pois, que esse conhecimento pode e deve, em termos indiciários, ser afirmado, pelo menos, a título de dolo eventual.
    A finalidade da actuação dos arguidos  foi a de “esconder” a origem e a identidade do verdadeiro titular dos fundos branqueados e/ou evitar a perseguição criminal dos autores dos crimes subjacentes, o que é extensível ao arguido LL (para além, como é óbvio, do recebimento das “suas” contrapartidas).

    A CO-AUTORIA
    A Decisão recorrida considera não estar indiciada a co-autoria quanto ao arguido LL, a qual pressuporia o conhecimento da origem ilícita de “catálogo” dos fundos alvo de branqueamento, o que, a seu ver, não está demonstrado.
    Entendemos que a indiciação desse conhecimento pode e deve ser afirmada, pelo menos a título de dolo eventual, pelos motivos já exarados.
    A existência do acordo exigido na co-autoria (expresso ou tácito, prévio ou sucessivo, formas admitidas pelo artigo 26º, do CP) também se alcança, mais que não seja através de juízos presuntivos ou de inferência, resultando essa indiciação, por exemplo, do estranho facto de o arguido ter representado ambas as partes nas escrituras, apesar de tanto a compradora como o vendedor viverem em Portugal, na cidade onde foram celebradas as escrituras, do facto de ter recebido substanciais contrapartidas por toda a sua actuação de “facilitador”, das elevadas cifras que levantou, movimentou e guardou, relacionadas com a conta BES 006.
    Remete-se, ainda, para o que nesta matéria se deixou escrito no CRIME 1, devidamente adaptado a este ilícito.

    CONCLUSÃO
    A materialidade acusada, até porque fundamentalmente documentada, está suficientemente indiciada (sem prejuízo de, quanto aos arguidos AA e BB, se voltar a colocar a questão jurídica de saber se, um mesmo agente, preenche mais do que uma vez o mesmo tipo legal de branqueamento, quando realize diversas manobras de branqueamento dos mesmos fundos, questão abordada na parte final do CRIME 8, para onde se remete, o que, não obstante, não impede o prosseguimento destes arguidos para julgamento - dada a fase processual em que nos encontramos e as demais razões ali adiantadas).
    Termos em que se julga procedente o recurso quanto a este branqueamento 11, relativamente aos arguidos AA, BB e LL.

    1.5.6.3 CRIME DE BRANQUEAMENTO 12
    O apartamento de ....
    Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, BB e LL, relativamente à aquisição e subsequente arrendamento de um imóvel em ..., com intenção de ocultação da titularidade do activo, factos praticados entre 2012 e 2014, previsto e punido pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.

    DECISÃO RECORRIDA
    Baseou a não pronúncia:
    - Em questões formais, designadamente, na “incompetência dos tribunais portugueses”, em virtude de o contrato promessa e a escritura pública terem sido celebrados em território estrangeiro.
    - Na nulidade da acusação, relativamente ao arguido LL, decorrente da falta de descrição do dolo do tipo e do dolo da culpa. Estes dois temas já foram abordados supra.
    - Subsidiariamente, na ausência de indícios da prática  do crime de branqueamento por parte dos três arguidos acusados, tema que cumpre, neste momento, analisar.

    RECORRENTE
    Sustenta a existência de indícios recolhidos em sede de inquérito.

    BREVE DESCRIÇÃO DA MATERIALIDADE OBJECTIVA
    Os movimentos financeiros que suportam este crime estão esquematizados numa parte do diagrama XI.4.
    Reporta-se, resumidamente, à celebração de um contrato promessa de compra e venda de um apartamento em ..., datado de 30.07.2012 e formalmente titulado por BB (na qualidade de promitente-comprador), com celebração da escritura de compra e venda em 31.08.2012 e, bem assim, à celebração de um contrato de arrendamento entre BB, na qualidade de senhorio, e AA, na qualidade de arrendatário, cuja minuta data de 04/05.02.2014, mas com data aposta de 30.12.2012, reportado ao período de Janeiro a Junho de 2013, para justificar a estadia deste último no apartamento, no período anterior às obras.
    O arguido LL foi encarregado por BB dos procedimentos necessários, nomeadamente da celebração dos contratos (para o que obteve apoios de profissionais ...), dos pagamentos relacionados com as burocracias às entidades francesas e aos colaboradores a quem solicitou serviços.
    Para o efeito usou uma conta por si titulada num banco ... (que abriu para o efeito) e utilizou uma conta pessoal, sediada no Montepio, contas que iam sendo creditadas no necessário à realização de tais pagamentos, por via de entregas de BB.
    Estão envolvidos 3.5 milhões de Euros - contas redondas - no âmbito dessas operações de compra do imóvel, obras, mobiliário e decoração, com origem na conta BES terminal 006,  conforme descriminado no diagrama XI.4, para onde se remete.
    O imóvel foi manifestado para integrar um fundo imobiliário fechado, que não chegou a ser formalizado, devido ao desenvolvimento deste processo.
    Todas estas operações (contratos, pagamentos, origem dos mesmos) estão documentadas.

    A NOSSA POSIÇÃO
    CRIME SUBJACENTE
    Os crimes subjacentes a este ilícito são os que motivaram o pagamento das quantias que alimentaram as contas BES terminais 006 e 407 (fundos, em grande parte, repatriadas pelo RERTII), de onde saíram os fundos para proceder ao pagamento dos cerca de 3.5 milhões de Euros usados nos negócios de aquisição, remodelação e decoração do apartamento de ..., ou seja, os crimes de corrupção de titular de cargo político elencados em 1, 4 e 6 do lado passivo, anteriormente dados como suficientemente indiciados, a que se associam, do lado activo, os elencados em 2, 5 e 7.

    A FUNÇÃO DE CADA ARGUIDO NO ESQUEMA DE BRANQUEAMENTO
    AA
    É o “homem do fundo”, o “dominus”, a mando e a benefício de quem  os esquemas de branqueamento são montados.
    BB
    É o leal fiduciário, sempre pronto a satisfazer quaisquer pedidos que lhe sejam dirigidos por quem o nomeou.
    De acordo com a acusação, quem efectivamente adquiriu o apartamento de ... foi o arguido AA, com fundos do próprio (antes depositados na ..., repatriados pelo RERTII, que circularam depois pelo BESI e voltaram a estacionar - desta feita no foro doméstico - nas contas BES terminais 407 e 006, que funcionavam em associação, contas tituladas formalmente por BB).
    A decisão recorrida considera que a materialidade objectiva acusada e documentada não permite retirar esta conclusão, sequer em termos próprios desta fase processual, isto é,  indiciação suficiente para sujeitar a julgamento.
    Já atrás se deixou referido (embora numa outra perspectiva, como apoio à indiciação da pertença a AA dos fundos parqueados nas contas BES terminais 006 e 407) que a materialidade objectiva referente ao “apartamento de ...” permite a inferência da compra do imóvel pelo arguido AA, com fundos do próprios, sob disfarce fiduciário do arguido BB, que titulou formalmente a compra.
    Retomamos esta questão, agora sob o ângulo da prática do crime de branqueamento que nos ocupa.
    Os sinais conjugam-se no sentido por nós acima defendido, e são muitos!
    Vejamos.
    - Era o arguido AA que necessitava de uma habitação em ..., posto que estava a viver em ..., juntamente com os filhos. É um facto circunstancial, mas que tem o seu interesse.
    - Logo que celebrada a escritura da compra, AA ocupou o apartamento, com os filhos, onde se manteve ininterruptamente durante um ano lectivo, mais concretamente entre Setembro de 2012 e Julho de 2013.
    - No dia 31.08.2012, data da celebração da escritura pública, o arguido AA comprou em ... €7.000,00 de objectos para o apartamento, liquidados com fundos da sua conta da CGD.
    - Nos 15 dias seguintes à celebração da escritura, apesar de o apartamento ter sido adquirido com mobiliário, AA procedeu à compra, em ..., de móveis, e contratou serviços de decoração, cujo custo importou €91.702,31 (nestes se incluindo o pagamento do condomínio), pagos através da conta BES terminal 006.
    - O início das obras de remodelação coincide com a data em que, transitoriamente, AA e os seus familiares não necessitavam de ocupar o espaço, por serem férias escolares.
    - Chegados a Setembro, porque as obras estavam atrasadas, AA e os filhos depararam-se com um problema de falta de alojamento, que não tinham antevisto, em razão do que houve necessidade de marcar estadia para a arguida MM e a prol, que se previa curta, em aparthotel, com custos diários.
    - A situação prolongou-se mais do que o esperado, face aos sucessivos e inesperados atrasos das obras, pelo que a permanência no aparthotel perdurou até ao início das férias escolares do Natal - Dezembro de 2013 -.
    - Em Novembro de 2013, face ao compromisso antes assumido por AA de disponibilizar alojamento em ... a CCCC, filho de OO, houve necessidade de providenciar por mais um alojamento para este jovem, em mais um quarto de aparthotel, tendo BB sido incumbido desta tarefa.
    - Por outro lado, as escutas telefónicas constantes dos autos não deixam margem para dúvida de que AA assume comportamentos típicos de proprietário - ao invés de um simples amigo do proprietário, que estava a ocupar o espaço por bondade e amizade, e porque o proprietário tinha em elevada consideração as suas opiniões a propósito das remodelações, quiçá por ter bom gosto (é o que o próprio refere no seu interrogatório em sede de inquérito).
    Na verdade, o arguido AA sempre demonstrou grande preocupação e proximidade (típica de um proprietário, e não de um amigo do proprietário, e muito menos de um inquilino) relativamente a todo o processo de remodelação do imóvel, o que era tema significativo nas conversas telefónicas interceptadas, sem prejuízo do uso de linguagem codificada.
     Nomeadamente, era o arguido AA quem falava e se encontrava com o arquitecto, quem reclamava fortemente do atraso das obras, quem transmitia ao arguido BB para fazer muita pressão pelo cumprimento dos prazos, quem pedia a este a sua presença em ....
    Também decorre, claramente, dos telefonemas que o arguido AA tomou decisões relevantes em matéria de acabamentos, mas também a propósito da própria profundidade das obras de remodelação.
    Veja-se, por exemplo, o teor das seguintes 3 chamadas interceptadas:
    - AA liga a BB e diz que la esteve... diz que era preciso decidir as portas. BB diz que ele (arquitecto) ia ver se recuperava. AA diz que é para substituir tudo, e também a janela da sala. BB diz que vai pedir a proposta. AA afirma que lhe parece e que não esta a ir com grande velocidade, mas que hoje tomaram umas decisões. BB diz que vai tratar disso com ele. AA diz que depois tomam lá umas decisões.
    - AA diz que esteve lá ontem... que e preciso acelerar aquilo. BB pergunta se o 15 não garante. AA diz que pode ser que garanta... e que não deram resposta por causa da janela da sala, que é para tirar e pôr outra. BB diz que isso era junto com as portas... que foi no mesmo mail. AA pede para ver isso. BB pergunta se o aspecto geral pareceu bem a AA. AA diz que não, que está muito atrasado. BB fala na qualidade. AA diz que não sabe... ficou um bocado frustrado por estar muito atrasado... a qualidade não sabe, que para já ainda não tem acabamento.
    - BB diz que "lá o senhor", daquela coisa que foi escolhida para o chão (do apartamento em ...), que devia ser mais clara, que o que AA escolheu e muito escuro, pergunta o que lhe diz. AA concorda, para fazer isso... mas rápido... BB diz que já lhe vai ligar, diz que ele já colocou a dúvida há 2 ou 3 dias e não tinha respondido... AA pede para responder já, diz que quer lá ir e... BB diz que vai dizer que se ele entende que é melhor a outra cor, para fazer isso. AA diz para fazer o que quer, mas que faça rápido... AA pergunta se é muito mais claro. BB diz que não, que tem uma foto disso...
    Foi o arguido AA quem decidiu substituir as portas, a janela da sala e escolheu a cor da madeira do chão.
    Foi o arguido AA que disse ter tomado, juntamente com o arquitecto, algumas decisões referentes às obras de remodelação.
    Era ele quem se encontrava com o arquitecto na obra, reclamava dos atrasos e se dizia frustrado com os mesmos (não o alegado proprietário).
    BB servia apenas de veículo de transmissão formal das escolhas e das reclamações de AA.
    Em meados de Dezembro de 2013 já era a arguida MM quem reclamava do atraso das obras, tendo feito pelo menos duas visitas ao apartamento nessa altura.
    Ao mesmo tempo, um dos filhos reclamava das condições em que se encontrava a viver e pedia ao pai para insistir com o empreiteiro, altura em que AA, em jeito de promessa, disse ao filho DDDD “Não, não, já te disse pá, que vocês vão para lá assim que aquilo estiver pronto pá. É pá, mas o que é que eu tenho que dizer mais pá?" (cf. alvo 60085040, sessão 9641)”.
    Seguem-se novas visitas de MM à obra, novas queixas desta e do filho DDDD - de andarem com “a casa às costas” (expressões da própria) -.
    Sempre que o filho ou MM reclamavam, AA telefonava de imediato para BB, chamadas telefónicas em que refere: tenho “a malta à beira de um ataque de nervos”, é preciso “apertar com o gajo”, “ser mais bruto com ele”, “tratá-lo com dureza”, “o gajo anda a aldrabar-nos”, “não está nada feito, nem sequer a cozinha”, “estou farto de ter lá a malta também com a tralha às costas”, “tou farto pá, foda-se pá”.
    Esta não é uma linguagem e conduta de um hospede que ocupa um espaço habitacional alheio por amizade do proprietário, nem mesmo a de um inquilino cuja renda nunca pagou, antes a de um proprietário, representado por esse mesmo terceiro, que formalmente titula a propriedade.
    AA e MM tinham a expectativa de poderem reocupar o apartamento nos primeiros dias de Janeiro de 2014 (pelo menos uma parte da casa), ou seja, aquando do reinício das aulas.
    Lograda essa expectativa, houve necessidade - literalmente de um dia para o outro - de providenciar por novo alojamento para MM e o filho DDDD.
    Cansada de “andar com a casa às costas” (expressões da própria), a arguida MM escreveu um SMS elucidativo ao arguido AA em 04.01.2014, pelas 22.44 horas, cujo teor é o seguinte:
    "Eu estou farta das tuas megalomanias! Eu vou amanhã com o DDDD e não temos sítio para ficar! E tu esqueceste-te de saber como isso estava!! Eu não sou tua criada! Quem devia ir eras tu que quiseste que o DDDD fosse para lá estudar! Eu pensei q estavam a tratar disso, mas não!! Simplesmente esqueceram-se! ! !
    Segue-se a resposta, pelas 23.02 horas (depois do arguido AA ter comunicado com o arguido BB), dando conta que, dada a urgência, iriam manter  a situação anterior por mais 15 dias.
    BB, com a mesma urgência, encaminhou o assunto para LL, tendo este respondido pelas 23.58 horas.
    A reactivação do serviço do aparthotel foi confirmada por LL no seguinte, pelas 12.00 horas.
    Chegada a ..., MM foi fiscalizar o avanço das obras, in loco.
    Até aos primeiros dias de Janeiro de 2014 a preocupação do arguido AA era a finalização das obras de remodelação e a reocupação do apartamento pelo filho DDDD, MM e o “hospede”, filho de OO.
    Enquanto isso, o arguido BB não revelava nenhum interesse pelo seu alegado “investimento imobiliário” (de acordo com a sua versão em sede de inquérito).
    O que sabia das obras era o que lhe era transmitido por AA, não visitava o apartamento, não decidia os materiais ou a profundidade da remodelação.
    Não tinha, sequer, as chaves do apartamento.
    Limitava-se a recepcionar as queixas dos atrasos, a remeter os assuntos relacionados e correlacionados (dos alojamentos substitutivos) para LL e a fazer pagamentos, a partir da conta BES terminal 006 ou da XLM (caso dos alojamentos), ou a mandar proceder a pagamentos ao co-arguido LL.
    Já depois de terminadas as obras, o arguido AA disponibilizou o apartamento a um amigo - JJJJ. Deu-lhe nota da morada do apartamento, que ficava “numa avenida porreiríssima” e de que estaria alguém à sua espera à porta do prédio (alvo 60085040, sessão 41586). Tal constitui mais um acto típico de proprietário (e não de um amigo do proprietário, e muito menos de um inquilino, que nem formalmente já o era).
    - Relativamente a uns impostos referentes ao imóvel que deveriam ter sido pagos ao Estado ... até Junho de 2013:
    Face ao seu não pagamento atempado e aos avisos sucessivos de liquidação com penalidades, foi de novo AA quem, em Novembro de 2013, insistiu com BB para efectuar esse pagamento.
    BB remeteu a questão para LL, que liquidou os impostos a partir da conta bancária por si aberta em ....
    Mais uma vez, o alegado proprietário não se mostrava preocupado com o pagamento dos impostos em atraso, mas AA demonstrava essa preocupação.
    - Os custos associados à compra do imóvel, às obras de remodelação e à compra de móveis foram pagos formalmente por BB, a partir da conta BES terminal 006, alimentada pela BES terminal 407 (ou a partir da conta de LL, previamente aprovisionada para o efeito, também a partir de fundos provenientes da BES 006).
    Tais contas foram as que recepcionaram os fundos repatriados pelo RERTII, cuja origem está, em grande medida, no “saco azul” da sociedade ES Enterprises, em cuja contabilidade real, estão contabilizados como “Pagamentos PT”, “EMP01...” e “Cel-2010”.
     São, também, as mesmas contas onde se identificam (pela respectiva movimentação a débito) inúmeros levantamentos, transferências e pagamentos associados aos interesses pessoais do arguido AA.
    - Aos olhos dos que estavam próximos de AA, este era o proprietário do apartamento de ....
    Veja-se, por exemplo, o teor do SMS enviado a AA por FFFF (ex-namorada daquele) em Setembro de 2013: "mas vais ver q ela volta para ti. não há assim tantos ex pm com massa e casa em ... …disponíveis”.
    Tudo quanto se acabou de referir está documentado.
    AA, e por inerência BB e MM, só mudaram os planos referentes à reocupação do imóvel quando foram confrontados com notícias jornalísticas, publicadas a 04.01.2014, sobre a compra das 3 fracções de YYY por BB, data a partir da qual tomaram diversas decisões, nomeadamente:
    - A desistência de AA de reocupar o apartamento, na sequência do que MM teve necessidade de arrendar um apartamento em ... para sair do hotel e dar conforto habitacional a quem com ela se encontrava naquela cidade, cujo custo AA passou a suportar a partir de conta bancária na C.G.D. em ....
    - A realização um contrato de arrendamento referente à ocupação do “apartamento de ...” por AA, no período de Janeiro a Junho de 2013 (que foi minutado por LL - depois de ter solicitado apoio jurídico a um colega ... – dele constando como data de realização 30.12.2012, o que não corresponde à verdade, posto que as minutas foram enviadas em Fevereiro de 2014), contrato em que fizeram constar a lista de móveis adquiridos com  a casa, mas já não os adquiridos por AA, apesar de o seu custo ter sido debitado na mesma conta BES terminal 006 e de também estes móveis estarem formalmente em nome de BB.
    Cumpre realçar, com relevo significativo, que as rendas em nenhum momento foram pagas, o que é admitido em sede de interrogatórios pelos dois arguidos BB e AA.
    O que se demonstra, em termos indiciários, é que a relação inquilino/senhorio nunca existiu, o contrato de arrendamento foi simulado e visou, exclusivamente, apresentar a posteriori uma justificação formal para a ocupação do imóvel por AA.
    - Proceder ao arrendamento ou à venda do apartamento de ..., o que não se veio a verificar, aparentemente porque o preço indicado para essa rentabilização era demasiado elevado.
    - Constituir um fundo de investimento imobiliário fechado, para garantir a opacidade da propriedade efectiva dos imóveis adquiridos formalmente por BB, em representação de AA.
    Em simultâneo, alteraram a estratégia de comunicação nos telefonemas, agora afirmando repetidamente que AA era apenas um inquilino, que BB era o senhorio, que este teria sido amigo e simpático ao permitir a ocupação do apartamento por AA. Até nestas explicações há falta coerência, posto que AA confunde a posição de senhorio com a de um amigo que lhe permite a ocupação do espaço a custo zero.
    Tratam-se de actos posteriores ao branqueamento, sem impacto na prática do crime, mas que constituem os “sinais subsequentes” de que fala o Ilustre Juiz Conselheiro Santos Cabral, os quais permitem reforçar, a posteriori, a indiciação da prática do crime.
    O que, também, se evidencia é que se BB tivesse adquirido o apartamento para investimento - como o próprio quer fazer crer -, ficaria por explicar a razão pela qual desde Setembro de 2012 nenhum destino deu ao imóvel com essa finalidade.
    Resumindo e finalizando este tópico: partilhamos com o Recorrente/acusador a leitura da existência de indícios fortes da existência destas operações de branqueamento, correspondentes a uma segunda fase de integração da quantia de €3.500.000,00, que circulou entre a conta BES terminal 006 e as entidades contraparte nos negócios associados ao apartamento de ..., por via do fiduciário BB (com a ajuda do arguido LL), o que permitiu a reintegração do dinheiro “sujo” na origem na economia real, a benefício do arguido AA, sem prejuízo da já referida questão jurídica aludida no CRIME 8 deste recurso, para onde se remete.
    LL
    Remetemos para o que se deixou escrito no CRIME 11 relativamente à sua actuação consciente como “facilitador”, que aqui é idêntica.
    Neste crime, para além dos actos que se poderiam considerar próprios de advogado ou até de funcionário - prestar apoio à realização de contratos -, este arguido abriu conta bancária em ..., movimentou a mesma a benefício de esquemas de branqueamento, com fundos advindos da conta BES terminal 006, fez pagamentos relacionados com as obras do apartamento, tratou de alojamentos, simulou um contrato de arrendamento, por nele ter incluído factos que não correspondem à verdade/vontade, acabou por se constituir como um elemento relevante à integração dos fundos aqui em causa.
    Aceitou actuar como um “facilitador” nestes esquemas de branqueamento, em troco de contrapartidas monetárias recebidas.

    OS JUSTIFICATIVOS CRIADOS
    São o  contrato promessa de compra do apartamento de ..., a escritura pública do negócio prometido e o contrato de arrendamento simulado.
    Os dois primeiros contratos, não sendo falsos em si mesmos, ou seja, representam a realidade que as partes quiseram que ficasse a constar do contrato, foram formalizados em nome de BB, criando a aparência legal de um titular da propriedade distinto do real.
    O terceiro contrato representou uma tentativa de atribuir aparência legal a uma ocupação do imóvel que, de outro modo, constituiria mais um forte indício da verdadeira titularidade da propriedade do apartamento.
    Não obstante o enquadramento jurídico que for dado a esta dessintonia entre a vontade real e a declarada, plasmada nos documentos, o certo é que estes (documentos) constituíram, como já escrevemos, uma tentativa de disfarçar a verdadeira titularidade do dinheiro.
    Porém, dizemos nós, sem êxito, pois constituem mais um meio de prova da integração dos fundos que serviram para a compra do apartamento, por reporte à pessoa de AA.

    O DOLO
    Como se disse no CRIME 11, os arguidos AA e BB, na qualidade de autobranqueadores, têm necessariamente conhecimento da origem dos fundos branqueados.
    Quanto a LL, não sendo autobranqueador, impõe-se, para o preenchimento do elemento subjectivo do crime, o conhecimento directo ou, pelo menos, a admissão da possibilidade, da origem ilícita de “catálogo” dos fundos que ajudou a branquear.
    Repetimos o que deixámos escrito no branqueamento 11, ou seja, considerando a materialidade global da acusação que implica este arguido e, bem assim, os montantes que recebeu como contrapartida da sua disponibilidade nos esquemas em que interveio - cerca de €80.000,00 (correspondente a 20% dos €400.000,00 que levantou/transferiu/parte do qual entregou e outra parte guardou) - é legítima a inferência indiciária de que sabia ou, pelo menos, admitiu como possível, que as manobras contratuais em que esteve envolvido, no valor de mais de três (3) milhões de euros, visavam a integração na economia real de dinheiro “sujo”, dos quais uma parte passou por conta bancária por si aberta e titulada, que era alimentada por BB a partir da conta BES terminal 006, conta que o mesmo conhecia, posto que havia procedido a levantamentos em numerário da BES 006 em datas anteriores (ver tabela de levantamentos da BES terminal 006 constante do art.º 6956 da acusação, identificando-se, pelo menos, um levantamento, pelo arguido, com base em cheque de caixa em 2011, no montante de €10.000,00).
    Note-se que este arguido chegou a encontrar-se com a arguida MM em ...,  encetou diligências para que o apartamento passasse a fazer parte de um “fundo imobiliário fechado”, visando conferir opacidade ao seu real proprietário, e realizou o contrato de arrendamento simulado, já depois de ter conhecimento que a imprensa andava a questionar a compra de imóveis, relacionados com AA, pelo fiduciário BB.
    A finalidade da actuação dos três arguidos foi a de ajudar a esconder a origem e o verdadeiro titular dos fundos branqueados, conforme já se referiu no CRIME 11, para onde se remete.

    A CO-AUTORIA
    Remete-se para o se deixou escrito, nomeadamente nos CRIMES 1 e 11, devidamente adaptado a este crime. 

    CONCLUSÃO
    Entendemos que a materialidade acusada mostra-se suficientemente indiciada (sem prejuízo de, quanto aos arguidos AA e BB, se colocar de novo a problemática jurídica de saber se os mesmos agentes preenchem mais do que uma vez o mesmo tipo legal de branqueamento quando realizem diversas manobras de branqueamento dos mesmos fundos, o que, não obstante, não impede o prosseguimento deste crime para julgamento pelas razões antes adiantadas).
    Termos em que se julga procedente o recurso quanto a este branqueamento 12, relativamente aos arguidos AA, BB e LL.

    1.5.6.4 CRIME DE BRANQUEAMENTO 13 
    LL como “depositário” de fundos.
      Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, BB e LL,  relativamente à entrega pelo arguido BB de quantias pertencentes ao arguido AA para depósito em contas bancárias do arguido LL e para guardar em cofre bancário e em contas tituladas pelo mesmo, de forma a ocultar a propriedade desses valores pelo arguido AA, factos ocorridos nos anos de 2012 e 2013, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.

    DECISÃO RECORRIDA
    Baseou a não pronúncia:
    - Na nulidade da acusação, decorrente da falta de descrição do dolo do tipo e do dolo da culpa, no que respeita ao arguido LL, questões apreciadas supra; e
    - Na inexistência indícios da prática do crime de branqueamento.

    RECORRENTE
    Sustenta a existência de indícios recolhidos em sede de inquérito.

    BREVE DESCRIÇÃO DA MATERIALIDADE OBJECTIVA
    Os movimentos financeiros que suportam este crime estão esquematizados em partes dos diagramas IX e XI.6.
    Está em causa:
    - A passagem, pelas contas pessoais do arguido LL, de quantias advindas (directa ou indirectamente) da conta BES terminal 006 (que ele bem conhecia, considerando os inúmeros levantamentos realizados a partir da mesma), a pedido de BB (agindo como fiduciário), com vista à posterior entrega a  AA (através de BB).
    Assim ocorreu com €20.000.00 (€15.000,00 + €5.000,00) em Maio de 2014, levantados das suas contas pessoais, nomeadamente sediadas no BES, depois compensados através da conta BES terminal 006 (art.ºs 6952 e quadro dos levantamentos em numerário constante no art.º 6956 da ac.).
     E com €40.000,00, transferidos por BB (a partir da conta BES terminal 006), para a conta do BES de LL, em 08.05.2014. Este procedeu ao levantamento de €15.000.00 em 13.05.2014 e €5.000,00 em 23.05.2014, os primeiros entregues a BB e, por sua vez, uma parte (€10.000,00) entregue a AA em 24.05.2014 (art.ºs 8312 e seguintes e quadro dos movimentos a débito constante no art.º 6138 da ac.)
    - O aluguer de um cofre bancário, associado à sua conta Millennium BCP,  para guardar/ocultar fundos advindos da conta BES terminal 006.
     Foram apreendidos nesse cofre €200.000,00.
    Esta quantia foi levantada em numerário por BB da conta Barclays terminal 183 (fundos que, por sua vez, têm origem na conta BES terminal 006) e foi entregue, por este arguido, a LL, para a guardar, o que este fez, no referido cofre bancário (ver diagrama IX).
    - A realização de levantamentos/saques de cheques sobre a conta BES terminal 006, para entrega posterior a AA  (ver art.ºs 7010 e seguintes, 8232 e seguintes, 8793 e seguintes, 8326 e seguintes e quadro dos levantamentos em numerário constante no art.º 6956, todos da acusação).      
    Assim ocorreu, por exemplo:
    -  Com um cheque de €10.000,00, que LL levantou em 04.11.2011, fez a entrega do numerário a BB, este, por sua vez, entregou-o a AA no dia seguinte, em ...;
    - Com dois cheques de €10.000,00 cada, nos dias 16 e 17.04.2014, cujo numerário entregou a BB (fundos que serviram, juntamente com outros, para financiar a compra do livro “...”);
    - Com dois cheques de €5.000.000,00 cada, que levantou  em 10.10.2014, entregou o numerário a BB, o qual, por sua vez, entregou-o a AA;
    - Um cheque de €10.000,00, no dia 26.05.2014, cujo numerário entregou a BB, e este a AA.

    NOTA
    No descritivo do crime fez-se constar, como período relevante da intervenção do arguido, os anos de 2012 e 2013, o que, certamente, se deverá a lapso de escrita, posto que, até em sede de recurso, o Ministério Público alude a movimentos centrados particularmente em 2014.
     De facto, o grosso da intervenção deste arguido em matéria de levantamentos ocorreu em 2014, bastando visualizar a tabela de levantamentos do artigo 6956 para assim se concluir.
    À mesma conclusão se chega através da análise dos movimentos da sua conta sediada no Novo Banco (art.ºs 8312 e seguintes e quadro dos movimentos a débito constante no art.º 6138 da ac.)

    A NOSSA POSIÇÃO
    CRIME SUBJACENTE
    Os crimes subjacentes a este ilícito são os crimes de corrupção de titular de cargo político elencados em 1,  4 e 6 do lado passivo, de onde advieram as vantagens repatriadas pelo RERT II, considerados - como se referiu supra –suficientemente indiciados, a que se associam, do lado activo, os enumerados em 2, 5 e 7.

    A FUNÇÃO DE CADA ARGUIDO NO ESQUEMA DE BRANQUEAMENTO
    AA
    Apresenta-se, de novo, e sempre, como o “dominus” dos esquemas de branqueamento criados a seu benefício pessoal, desta feita com o envolvimento do arguido LL.
    BB
    Permanece no papel de fiduciário daquele.
    LL
    Surge, pela terceira vez, como “facilitador” de algumas das operações que envolveram os fundos advindos da conta BES terminal 006.
    Os actos por si levados a cabo e que assumem especial relevância típica purificadora são as “passagens” de alguns fundos por uma nova titularidade formal, que o mesmo é dizer pelas suas contas bancárias e pelo cofre bancário por si alugado, associado a uma dessas contas, sendo estas operações que acrescentaram mais um titular formal a esses concretos capitais, os quais, por esta via, ficam um pouco mais afastados da sua origem “suja”, tornando mais complexa a investigação da sua origem.
    Como antes se disse, entendemos que a descrita actuação do arguido LL - com evidência documentada - não se compadece com actos de exercício regular de advogado, nem tão pouco com actos de exercício regular de um funcionário.
    A decisão recorrida (fls. 3770) faz apelo ao teor dos artigos 101º e 102º do Estatuto da Ordem dos Advogados para justificar a passagem dos referidos dinheiros por contas bancárias tituladas por LL.
    A nosso ver, sem razão.
    Primeiro, porque os dispositivos estatutários aludem à detenção de fundos para efectuar pagamentos de despesas do cliente, sendo visível dos factos acima descritos que não era o caso, antes visavam ser entregues a BB, como o foram.
    Por outro lado, esses normativos obrigam à separação dos fundos dos clientes, à criação de contas separadas, identificadas como “contas cliente”, com registos completos e precisos do uso de tais fundos, o que, obviamente, aqui não ocorreu.
    O que se extrai da materialidade objectiva é que o arguido LL aceitou, mais uma vez, actuar como um “facilitador” nestes esquemas de branqueamento, em troco de contrapartidas monetárias recebidas.

    O DOLO
    Os arguidos AA e BB têm conhecimento da origem dos fundos branqueados, posto que são autobranqueadores
    Quanto a LL, a análise conjunta de toda a sua actuação nos diversos esquemas de branqueamento em que participou, a par das contrapartidas recebidas e da expressividade dos montantes envolvidos, permite sustentar, em termos de indícios suficientes, a afirmação de que este arguido, pelo menos, admitiu como possível a origem ilícita de “catálogo” dos fundos que ajudou a branquear.
    A finalidade da actuação dos três arguidos só pode ter sido esconder a origem dos fundos e/ou o seu verdadeiro titular, conforme já se referiu no CRIME 11, para onde se remete.

    A CO-AUTORIA
    Remete-se, igualmente, para o que antes se deixou escrito, nomeadamente nos CRIMES 1 e 11, devidamente adaptado a este crime.   

    CONCLUSÃO
    Concluímos estar suficientemente indiciada a prática do crime pelos três arguidos, em co-autoria, o que justifica o seu julgamento, sem prejuízo da questão jurídica aludida  no CRIME 8 quanto aos arguidos BB e AA.
    Termos em que se julga procedente o recurso quanto a este branqueamento 13, relativamente aos arguidos AA, BB e LL.

    1.5.6.5 CRIME DE BRANQUEAMENTO 14.
    O “Monte ...”
    Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, BB e MM,  relativamente à aquisição de um imóvel, designado “Monte ...”, com intenção de que passasse a integrar o património familiar do arguido AA, com registo em nome de terceiro e montagem de operação de financiamento entre 2011 e 2014, p. e p. pelo art.º 368.º, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal. O “Monte ...”

    DECISÃO RECORRIDA
    Fundou a não pronúncia:
    - Na nulidade da acusação, decorrente da falta de descrição do dolo do tipo e do dolo da culpa, quanto à arguida MM,  cuja análise consta supra;
    - Na inexistência de indícios da prática do crime de branqueamento, em si mesmo, quanto aos três arguidos acusados.

    RECORRENTE
     Sustenta a existência de indícios, recolhidos em sede de inquérito (artigos 966 e seguintes das conclusões do recurso).

    BREVE DESCRIÇÃO DA MATERIALIDADE OBJECTIVA
    Os movimentos financeiros que suportam este crime estão esquematizados numa parte do diagrama XI.5.

    Reporta-se à celebração de um contrato promessa de compra e venda do imóvel denominado “Monte ...”, entre a arguida MM (mãe dos filhos do arguido AA), na qualidade de promitente-compradora e os vendedores, datado de 05.07.2011, com o preço acordado de €760.000,00.
    No âmbito desse contrato foram liquidados, a título de sinal, €100.000,00, adiantados pelo companheiro de MM. O arguido BB procedeu, entretanto, à entrega dos referidos €100,000,00 a MM,  por cheque sacado da conta BES terminal 006, operação que foi justificada com um contrato de “empréstimo particular pecuniário”, porém esse montante nunca lhe foi restituído.
    Seguiu-se a celebração da escritura pública de compra e venda, em 03.02.2012, na qual figurou como compradora a arguida MM.
    Associado a essa escritura, foi celebrado um “crédito multi-negócios particulares” entre a arguida MM e o BES, pelo valor mutuado de €760.000,00,  a pagar em 384 prestações mensais de €4.488,15 cada, e um valor residual de €228.000,00. O arguido BB prestou plenas garantias de cumprimento desse contrato, nomeadamente (a acrescer à hipoteca) autorização de débito em conta própria em caso de incumprimento e ainda um penhor do valor total do empréstimo,  dependente da conta BES terminal 006, tendo tido necessidade, para o efeito, de desmobilizar aplicações financeiras.
    O pagamento das mensalidades foi realizado a partir de Março de 2012.
    As entregas mensais liquidadas à arguida MM pela XLM (de BB) ao abrigo do contrato de prestação de serviços XLM/MM, renovações e aditamentos, tiveram um acréscimo significativo no ano de 2012 face à retribuição base (de €5.000,00) acordada, algumas das quais sem correspondência nos recibos passados (ver quadro de pagamentos da XLM a MM e recibos emitidos por esta, constante do art.º 11957 da acusação – fls. 3412). Tal incremento de rendimentos, obtido via XLM, permitiu à arguida MM o pagamento mensal da amortização do empréstimo bancário.
    A NOSSA POSIÇÃO
    CRIME SUBJACENTE
    Os crimes subjacentes a este ilícito são os que originaram os fundos  depositados nas contas BES terminais 006 e 407 (que serviram para a liquidação do sinal a MM e a prestação de garantias para a concessão do empréstimo bancário concedido pelo BES, associado à compra do imóvel “Monte ...”) e os que circularam pela XLM (com base nos quais foram feitas chegar a MM quantias mensais que permitiram a liquidação das amortizações mensais do referido empréstimo),  isto é, de novo, os crimes de corrupção de titular de cargo político elencados em 1, 4 e 6 do lado passivo, que foram supra considerados suficientemente indiciados, a que se associam do lado activo os numerados em 2, 5 e 7.
    A FUNÇÃO DE CADA ARGUIDO NO ESQUEMA DE BRANQUEAMENTO
    AA
    Apresenta-se como o “homem de trás”, que juntamente com os co-arguidos, montou  as manobras branqueadoras, com vista a que o capital por si recebido fosse utilizado na economia real, desta feita em nome de terceira pessoa, concretamente da mãe dos filhos.
    BB
    Mantém a função de fiduciário daquele na movimentação dos dinheiros.
    MM
    À semelhança do que se referiu quanto a outros arguidos, cuja intervenção ocorre na fase final do processo de branqueamento, a sua actuação tem de ser contextualizada e interpretada no seu todo, levando em conta as suas diversas actuações descritas na acusação.
    Na verdade, na economia global da acusação, esta arguida não teve apenas intervenção neste negócio do “Monte ...” e no recebimento de €100.000,00 da conta BES 006 e de €333.000,00 da XLM, estes suportados por contratos de prestação de serviços indiciariamente simulados.
    A mesma também aceitou figurar como titular de conta bancária sediada em ..., alimentada com fundos pertencentes a AA, cuja titularidade foi estendida a este a partir da publicação de notícias jornalisticas respeitantes à compra dos imóveis.
    Angariou amigos e conhecidos para a aquisição de um elevado número de exemplares do livro "...", para inflacionar a sua venda.
    Foi beneficiária de muitas entregas, em numerário, de fundos saídos da conta BES terminal 006, diversas vezes a seu pedido e até do companheiro (por exemplo artigos 7802 a 7810, 7833 a 7836, 7896 da ac., entre muitos outros).
    Juntamente com o arguido AA, fez trabalho de acompanhamento e fiscalização das obras de remodelação do apartamento de ..., ciente de que o apartamento estava titulado por BB, mas era pertença do pai dos filhos.
    Quanto à efectiva prestação dos alegados serviços à XLM, de aconselhamento na área ambiental, remetemos para o que se deixou escrito nesta matéria na análise dos inícios do CRIME 2, onde se concluiu não haver nenhuma evidência da sua realização (nem um ficheiro, nem um papel, nem um qualquer outro comprovativo), e muito menos para justificar o recebimento de €333.000,00 num período temporal de 54 meses (entre Janeiro de 2010 a Junho de 2014), o que perfaz uma média mensal de €6.167,00, sem esquecer que se tratam de valores de há mais de 10 anos. Tanto mais que a XLM era uma sociedade sem actividade económica, conclusão a que também antes chegámos, não havendo conhecimento de nenhum processo ou estudo ou dossier levado a cabo por esta sociedade onde a arguida pudesse ter dado o seu contributo profissional.
    A arguida surge, pois, como uma “facilitadora” no processo de “lavagem de capitais”, deixou-se instrumentalizar pelos arguidos AA e BB, em troco de contrapartidas.
    Dito isto - embora sem relevo para o desfecho da decisão e por isso sem que se justifique operar alterações na factualidade acusada - não acompanhamos integralmente a leitura da materialidade que o Recorrente faz no que respeita à titularidade do imóvel ou a quem esta se destinava.
    Segundo o Ministério Público AA é o proprietário efectivo do “Monte ...” e a arguida MM é apenas a titular formal, tendo actuado a mando e em representação de AA.
    Funda esse entendimento, principalmente, no facto de os pagamentos associados à compra do imóvel terem origem na conta BES terminal 006 e na XLM, ambos controlados formalmente por BB, na qualidade de fiduciário.
    Não damos por certo (dentro do que é possível dar por certo nesta fase processual) que a titularidade efectiva do imóvel se destinasse ao arguido AA, podendo antes configurar uma doação do imóvel à mãe dos filhos, e por via desta aos próprios filhos.
    A própria acusação parece revelar algumas hesitações nesta matéria. Na verdade pode ler-se nos art.ºs 160 e 161 da peça processual que a arguida aceitou receber quantias pecuniárias destinadas ao seu sustento e ao dos seus filhos com AA, bem como à criação de um património de que os mesmos filhos pudessem beneficiar no futuro… Entre esse património aceitou figurar como adquirente de um imóvel designado "Monte ...", sito em ..., adquirido com um financiamento bancário garantido pelo arguido BB e para cujo pagamento das prestações passou a receber, direta e indiretamente, montantes oriundos de sociedades do mesmo BB a coberto de pretensos contratos de prestação de serviços, como adiante se especificará.
    Tanto mais que este imóvel nunca foi manifestado para ser integrado no fundo imobiliário fechado.
    Nem existem actuações por parte do arguido AA, referentes ao imóvel, que sejam típicas de um proprietário.
    Como quer que seja, o relevante para o branqueamento não é esta questão (i.e. se o imóvel se destinava a AA ou se este quis agraciar a ex-mulher com essa titularidade e, por via desta, os filhos), mas a reintegração na economia real das quantias com origem ilícita de “catálogo” pertença de AA, disponibilizadas por BB (como fiduciário) a MM, a pretexto da compra do “Monte ...”.
    A materialidade objectiva acima mencionada permite concluir, em termos indiciários, que foram reintroduzidos na economia real os fundos necessários para o pagamento do sinal e para o pagamento das mensalidades do crédito bancário associado à escritura de compra do imóvel.
    Tais montantes “sujos” na origem - oriundos da conta BES terminal 006 e da XLM e que entretanto já haviam circulado por contas e titulares formais distintos - acabaram por entrar num novo circuito bancário, justificado por contratos de mútuo, com obtenção, como contrapartida (pelo titular dos fundos ou pela ex-mulher, por opção daquele), de um imóvel, que não aparenta ter ligação a esses fundos “sujos”.
    Parece-nos claro que a arguida MM foi usada como “veículo” de integração desses fundos (com o seu beneplácito), dado que nem ela, nem o companheiro (baterista, sem rendimentos certos - segundo a própria referiu no seu interrogatório -, não tendo sequer figurado na compra do imóvel), tinham rendimentos que lhes permitisse serem proprietários de um monte alentejano avaliado em pelo menos €760.000,00, pois que os rendimentos conhecidos da família eram, basicamente, os que MM estava a receber da XLM, ou seja, cerca de €5.000,00 brutos mensais, contratualizados precariamente.
    Aliás, só foi possível convencer o banco a celebrar o contrato de mútuo do montante de €760.000,00 porque o reembolso do capital mutuado ficou mais do que garantido através de outro património (para além da hipoteca), cuja titularidade formal era de BB, mas que na verdade era pertença de AA (nomeadamente um penhor do total do empréstimo, associado conta BES terminal 006). 
    Por outro lado, a totalidade das quantias pagas por MM para a aquisição do imóvel tiveram origem na conta BES terminal 006 (alimentada pela 470) e nas entregas que lhe foram feitas pela XLM, i.e., advieram formalmente de BB, mas eram pertença de AA.
    Acresce que, por coincidência (e temos dificuldade em acreditar nelas), a XLM passou a retribuir o alegado serviço prestado por MM de forma mais generosa precisamente quando esta ficou com o encargo acrescido de pagar a dita mensalidade da amortização do empréstimo bancário, a qual rondaria entre 4 a 5 mil euros/mês, circunstância que veio a permitir a liquidação das amortizações mensais, pelo menos enquanto a XLM lhe foi pagando.
     Com o desenvolvimento destes autos e a prisão dos arguidos AA e BB, o pagamento de tais amortizações foi sendo realizado com base em transferências da conta pessoal de AA para a conta de MM (uma de €100.000,00 e outra de €10.000,00), pequenos depósitos em numerário (desconhecendo-se a sua origem), pequenos movimentos a crédito de aparentes familiares, sendo que a conta onde eram debitadas as amortizações frequentemente estava a zeros.
    E, em sede de interrogatório, referindo-se ao imóvel e à sua incapacidade financeira para assumir desde o início o seu pagamento, MM disse ter dado “um passo maior do que a perna” (expressão da própria), facto que não lhe era desconhecido aquando da celebração do contrato promessa e da escritura pública, atentos os seus rendimentos, de onde se terá de concluir que a arguida contava com apoios futuros para garantir tais pagamentos, os quais, certamente, lhe terão sido antes prometidos, só assim se justificando que tenha avançado para a compra do imóvel, apesar de saber da sua falta de capacidade económica para o efeito, até mesmo para liquidar o sinal.
     Aderimos, pois, à posição do Recorrente/acusador quando defende a existência de indícios suficientes de que a compra do imóvel (e o mais descrito que a envolveu) constituiu mais um esquema de branqueamento, por via do qual  foi possível fazer reingressar na economia real  dinheiro “sujo” na origem.
    Os justificativos criados
    Está aqui em causa, conforme já referimos, a entrega a MM de €100,000,00 (referentes ao sinal do contrato promessa da compra do Monte ...), sacados da conta BES terminal 006, operação que foi justificada com um contrato de “empréstimo particular pecuniário”, montante nunca foi restituído a BB.
    Associado à escritura do imóvel, foi celebrado um “crédito multi-negócios particulares” entre a arguida MM e o BES, pelo valor mutuado de €760.000,00,  a pagar em 384 prestações mensais, de €4.488,15 cada, e um valor residual de €228.000,00.
    O arguido BB prestou plenas garantias de cumprimento desse contrato, parte das quais na dependência da conta BES terminal 006, tendo tido necessidade, para o efeito, de desmobilizar aplicações financeiras.
    Pelo menos estes contratos de empréstimo (o particular e o bancário) permitiram conferir aparência legal à reintegração na economia real de quantias “sujas” na origem.
    Terminando, podemos afirmar que a totalidade das quantias recebidas pela arguida MM, e que lhe permitiram fazer os pagamentos referentes ao “Monte ...”, teve  origem na conta BES terminal 006 (alimentada pela 470) e nos pagamentos que lhe foram feitos pela XLM,  isto é, advieram formalmente de BB, mas eram pertença de AA, recebidas por este como contrapartidas da prática de crimes de corrupção passiva.
    O dolo
    Os arguidos AA e BB, na qualidade de autobranqueadores têm, necessariamente, conhecimento da origem dos fundos branqueados.
    Quanto à arguida MM, não sendo autobranqueadora, impõe-se, para o preenchimento do elemento subjectivo do  tipo, o conhecimento directo, ou, pelo menos, ter admitido a possibilidade da origem ilícita de “catálogo” dos fundos que ajudou a branquear.
    Esta inferência, tendo em conta a globalidade da intervenção, é de sufragar, por se mostrar suficientemente sustentada.
    Veja-se:
    - A sua intervenção plural e multifacetada como “facilitadora/ajudante” de AA, nomeadamente no que respeita ao apartamento de ...;
    - A abertura de conta bancária sediada em ..., onde eram depositados fundos pertencentes a AA;
    - A angarição de amigos e conhecidos para a aquisição de um elevado número de exemplares do livro "...", para inflacionar a sua venda;
    - As quantias em numerário de que foi beneficiária, com origem na conta BES terminal 006, diversas vezes a seu pedido e até do companheiro;
    - O recebimento de €333.000,00 num período temporal de 54 meses (entre Janeiro de 2010 a Junho de 2014), relativo a serviços de aconselhamento na área ambiental à XLM, que nunca prestou, tal como já exposto na análise do CRIME 2;
     - A aquisição de um imóvel, valorizado em €760.000,00, quando sabia não dispôr de capacidade económica para proceder ao seu pagamento, denunciando a existência de um qualquer prévio acordo de recebimento dos meios de pagamento, a disponibilizar por AA;
    - A aceitação da intervenção formal de BB, como pagador do sinal e garante no mútuo bancário, sabendo da sua qualidade de fiduciário do pai dos filhos (e não apenas “o amigo rico da ...” - palavras da própria);
    -  Não ter existido o pagamento do capital decorrente do  empréstimo particular e essa restituição nunca se ter constituído como uma preocupação para a arguida.
    Da prova produzida, podemos afirmar que a intenção da arguida MM, tal como a dos dois arguidos a quem se associou, foi a  de dissimular a origem dos fundos e evitar a perseguição criminal dos agentes dos crimes subjacentes.
    A co-autoria
    Quanto às exigências, de facto e de direito, necessárias à afirmação da comparticipação, na forma de co-autoria, damos por reproduzido o que se deixou atrás escrito nesta matéria, na análise do CRIME 1, devidamente adaptado a este ilícito.
    Acrescenta-se que a indiciação do acordo exigido na co-autoria resulta clara do facto de a arguida MM ter comprado um imóvel com rendimentos de terceiro, começando logo pelo próprio sinal, bem como da circunstância de ter começado a receber maiores quantias da XLM a partir da data em que teve de liquidar a amortização do empréstimo bancário.

    CONCLUSÃO
    A materialidade acusada mostra-se suficientemente indiciada, sem prejuízo da questão jurídica referida a propósito do CRIME 8 (para onde remetemos), relativamente aos arguidos AA e BB, mas que não impede o prosseguimento destes arguidos para julgamento, por este concreto crime.
    Termos em que se julga procedente o recurso quanto a este branqueamento 14, relativamente aos arguidos AA, BB e MM.

    1.5.6.6 BRANQUEAMENTOS 15 e 16
    TT e UU  como titulares formais e transitórios de fundos “sujos” na origem, pertença do arguido AA.
    15. Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pela arguida TT e outros (BB e AA, foram pronunciados por este ilícito), relativamente à disponibilização, por parte de TT, das suas contas bancárias junto do Montepio Geral para recepção de fundos provenientes do arguido BB para entrega ao arguido AA, ocultando a titularidade destas quantias por este último arguido, factos ocorridos nos anos de 2013 e 2014, p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal
    16. Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelo arguido UU e outros (BB e AA, foram pronunciados por este ilícito), com referência aos factos relacionados com a utilização da conta bancária de  UU para a passagem de fundos pertencentes ao arguido AA, recebidos do arguido BB, e sua transferência subsequente para a conta do arguido AA, factos ocorridos nos anos de 2011 a 2014, p. e p. pelo art.368°-A, n° 1 e 2, do Código Penal.
    Serão alvo de análise conjunta, dada a sua similitude.

    DECISÃO RECORRIDA
    Não pôs em causa a indiciação da prática dos crimes pelos co-autores TT e UU, tendo fundado a não pronúncia exclusivamente em questões formais, todas elas já analisadas.

    BREVE DESCRIÇÃO DA MATERIALIDADE OBJECTIVA
    Sempre diremos, sinteticamente, que os movimentos financeiros de suporte a  estes dois crimes estão esquematizados em partes dos diagramas XI.6 e XI.7, para onde se remete.
     No CRIME 15 está em causa o levantamento de fundos próprios de conta bancária titulada pela arguida TT, a pedido de BB (agindo como fiduciário), com vista à sua entrega, em numerário, ao arguido AA, e a compensação posterior desse valor com quantias advindas da conta BES terminal 006.
    No CRIME 16 está em causa a passagem por conta bancária titulada pelo  arguido UU de quantias advindas da conta BES terminal 006, a pedido de AA, parte significativa das quais serviu para proceder a pagamentos de despesas deste e, com relevo particularmente significativo, a transferência a partir desta conta da quantia de €15.000,00 para a conta bancária da C.G.D. titulada por AA.
    TT e UU surgem como “facilitadores” de algumas das operações que envolveram os fundos advindos da conta BES terminal 006 e que foram entregues ao arguido AA.
    Note-se que grande parte da actuação da arguida TT - figurar como sócia ou administradora de sociedades controladas por BB, algumas das quais serviram de “veículos” corporativos aos fundos do arguido AA (como por exemplo a XLM), o facto de ter procedido à aquisição de um elevado número de exemplares do livro "...” cuja autoria é atribuida a AA, com vista a inflacionar a sua venda, o facto de ter procedido à entrega de quantias em numerário ao arguido UU, com vista à sua disponibilização ao arguido AA, ou diretamente a este último, com quem se encontrava pessoalmente para o efeito – não está a ser valorada no âmbito do crime de branqueamento, por não constituirem transferências, nem formas de ocultação de vantagens “sujas” na sua origem, sem prejuízo do seu relevo instrumental.
    E o mesmo se diga, mutatis mutandis, relativamente ao arguido UU.
    As acções típicas são as “passagens” de alguns fundos pelas contas bancárias tituladas por estes dois arguidos, operações que acrescentam um titular formal à cadeia de transmissão, afastando, ainda mais,  os dinheiros da sua origem e, com isso, dificultando a sua investigação.
    Crime subjacente
    Os ilícitos subjacentes a estes dois branqueamentos são, ainda, os crimes de corrupção de titular de cargo político elencados em 1, 4 e 6 do lado passivo, de onde advieram as vantagens repatriadas pelo RERT II, antes dados como suficientemente indiciados,  a que se associam do lado ativo os elencados em 2, 5 e 7.

    A CONCLUSÃO
    Termos em que não subsistem razões para não sujeitar os co-autores  TT e UU a julgamento por estes crimes, nos termos acusados.
    Assim, julga-se procedente o recurso quanto à arguida TT, relativamente ao branqueamento 15, e ao arguido UU, relativamente ao crime 16.

    1.5.7 Branqueamentos de capitais não relacionados com o arguido AA.

    1.5.7.1 BRANQUEAMENTO 17  - Grupo “Lena”
    €87.500,00 (com IVA 105.000,00€) feitos circular entre a LMI/XMI (de GG, BB e PP) e QQ.
    Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos BB, GG, PP e QQ,  relativamente a utilização da sociedade XMI e sua contabilidade, para a colocação de fundos na esfera patrimonial do arguido QQ, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.

    DECISÃO RECORRIDA
    Funda a não pronúncia deste ilícito (fls. 3044  3061):
    - Na ausência do crime precedente;
    - Subsidiariamente, na circunstância de as entregas dos fundos não terem autonomia típica, por serem ainda actos de execução material do crime precedente, e essas entregas não podem ser consideradas, em simultâneo, actos de corrupção e de branqueamento, sob pena de dupla valoração dos mesmos factos; e
    - Na ausência de descrição do dolo do tipo e do dolo da culpa.
    Todas estas questões foram antes tratadas.
    Acrescenta, não se mostrar indiciado o elemento subjectivo, na parte do dolo específico.
    No mais, não é posta em causa a indiciação da prática do crime.

    BREVE DESCRIÇÃO DA MATERIALIDADE OBJECTIVA
    Os movimentos financeiros estão esquematizados no diagrama XII, para onde se remete.
    Em causa está a passagem das vantagens indevidas recebidas por QQ por “veículo” corporativo nacional,  em concreto pela EMP51....

    A NOSSA POSIÇÃO
    Crime subjacente
    Interpreta-se da acusação, lida no seu conjunto, que o  ilícito subjacente é o crime de corrupção  elencado em 8, do lado passivo (em que é agente corrompido QQ), já julgado suficientemente indiciado, a que se associa o 9 do lado activo (em que são agentes corruptores, em co-autoria, GG, BB, PP).
    A função de cada arguido no esquema de branqueamento
    QQ
    É o principal beneficiário do esquema de branqueamento montado, que lhe permitiu a “purificação” de dinheiros “sujos” na origem, por via da intermediação de entidade terceira (a EMP51...), que acrescentou um titular formal aos fundos e, com isso, afastou-os da sua origem.
    GG
    Surge como agente de circulação dos fundos pela sociedade intermediária EMP51..., apesar de saber que tal sociedade não era a destinatária e beneficiária das vantagens entregues.
    BB
    PP
    Para perceber a razão pela qual estão acusados deste crime os arguidos BB e PP (para além de GG e QQ), impõe-se recuar à criação da LMI e às suas participações sociais: a sociedade CONSTRUTORA DO LENA SGPS SA - 59,996%, BB - 20%, PP- 20%, GG-  0,002% e IIIIII - 0,002% do capital social (sendo que estas duas insignificantes participações acabaram por ser adquiridas pela primeira participante ainda em 2009 e no mesmo ano, em dezembro, esta participante vendeu a sua participação a duas sociedades).
     No entanto, quem procedeu ao efectivo pagamento das participações sociais dos arguidos BB e de PP foi GG, através da CONSTRUTORA DO LENA SGPS SA (artigo 1036 da acusação, de onde consta a emissão dos cheques).
    Entre 2007 e 2011 GG ocupou lugar no Conselho de Administração, como presidente. IIIIII, BB e PP eram vogais.
    Em Outubro de 2010 a LMI passou a denominar-se XMI — MANAGEMENT & INVESTMENTS SA.
    Posto isto, não restam dúvidas de que, à data dos factos, a LMI era uma empresa do universo “Lena”, cujo principal representante era GG, razão pela qual, a LMI/XMI foi, na altura, o “veículo” escolhido para, formalmente, proceder à entrega das vantagens indevidas decorrentes da prática do crime de corrupção.
    Por outro lado, essas vantagens não se destinavam à sociedade EMP51..., mas a QQ, pelo que, esta sociedade, serviu de intermediária aos pagamentos prometidos e pagos a QQ.
    Refere-se, mais uma vez, na decisão recorrida, que a intermediação destas entidades, em particular da EMP51..., não tem relevo ou autonomia típica como acto de branqueamento, porque constitui, ainda, a forma de pagamento das vantagens indevidas, embora de modo oculto ou dissimulado.
    Não podemos concordar com esse entendimento pelas razões já expostas supra.
    Pagar e receber vantagens indevidas de forma oculta ou dissimulada, usando para o efeito intermediários (e a EMP51... assume aqui claramente essa qualidade), criando justificativos contratuais para dar aparência legal a essas transferências, quebra a cadeia de ligação dos fundos à sua origem e oculta o real destinatário dos fundos, o que, por si só, acrescenta maior dificuldade à investigação do crime, ofendendo-se, deste modo, o bem jurídico protegido pelo crime de branqueamento.
    Não podemos, igualmente, concordar com a existência da dupla valoração dos mesmos factos, no crime subjacente e no crime de branqueamento.
    Na verdade,  no crime subjacente o que tem relevo típico de “per si” é o pagamento da vantagem do universo “Lena” a QQ.
    No crime de branqueamento o que releva é a circulação dos fundos por entidades terceiras, com o acordo também do seu destinatário (que teve, por isso, o domínio do trajecto do dinheiro, cuja entrega em termos jurídico se considera realizada na data em os fundos foram disponibilizados), com vista a dissimular a sua origem e/ou o destinatário final.
    O dolo
    Quanto ao dolo específico (de dissimular a origem ilícita de “catálogo” das vantagens branqueadas e/ou evitar a perseguição criminal do(s) agente(s) do(s) crime(s) subjacente(s)), que a decisão recorrida diz não se mostrar indiciado, diremos apenas não conseguirmos descortinar outra finalidade que possa dar sentido ao pagamento de uma vantagem indevida a uma sociedade, em lugar da opção, mais simples e lógica, da sua entrega directa ao beneficiário dos fundos.

    A CONCLUSÃO
    Não subsistem razões para não sujeitar estes arguidos a julgamento, nos termos acusados.
    Nestes termos, julga-se procedente o recurso quanto ao branqueamento 17, relativamente aos arguidos BB, GG, PP e QQ.

    1.5.7.2 BRANQUEAMENTO 18 
    €25.200.000,00 feitos circular entre CC e RR.
    Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos CC e RR,  relativamente aos pagamentos PT e CEL_2010, realizados entre 7 de Dezembro de 2007 e 20 de Setembro de 2011, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES (e com destino para as contas de que era beneficiário RR), p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.°s 1, 2 e 3, do Código Penal.

    DECISÃO RECORRIDA
    Assenta a não pronúncia, fundamentalmente, em questões formais e de dogmática penal (incompetência internacional, falta de descrição do dolo do tipo, existência de actos típicos de branqueamento relativamente a fundos que não eram “sujos”;  actos de branqueamento que eram, somente, mera execução material do crime de corrupção), antes apreciadas.
    A par, lê-se na decisão recorrida, que o crime subjacente, a ser o elencado em 11 (do lado passivo), não se mostra indiciado.
    No mais, não é posta em causa a indiciação da prática do crime.
    Sempre diremos, telegraficamente, o seguinte.

    BREVE DESCRIÇÃO DA MATERIALIDADE OBJECTIVA
    Os movimentos financeiros em causa estão esquematizados no diagrama XIII, para onde se remete.
    Em causa está a passagem das vantagens indevidas, recebidas por RR, por contas sediadas no estrangeiro, com especial relevo no que concerne aos €8.500.000,00 entregues em 19.01.2011 na conta da UBS Zurique, titulada pela sociedade offshore EMP72... INC (registada nas ...), em que foram usados os métodos de branqueamento “Use of Gatekeepers”, “Use of Corporate Vehicles and Trusts” e “Use of Offshore/Foreign Jurisdictions”.

    A NOSSA POSIÇÃO
    Crime subjacente
    Sendo a acusação interpretada globalmente, não podem restar quaisquer dúvidas de que o ilícito subjacente a este branqueamento é o crime de corrupção elencados em 11 do lado passivo- crime de corrupção passiva, praticado por RR, relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES, no que concerne aos pagamentos recebidos do arguido CC, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, p, e p. pelas disposições conjugadas dos art.ºs 373°, n.º l, 374. °- A, n.ºs 2 e 3, e com referência aos art.ºs 202°, al. b) e 386°, n.º 2, todos do Código Penal -, a que se associa o 10 do lado ativo, crimes anteriormente dados como fortemente indiciados.
    A função de cada arguido no esquema de branqueamento
    RR
    É o beneficiário do esquema de branqueamento, o que lhe permitiu a “purificação” de dinheiros “sujos” na origem, por via da intermediação de entidade terceira (a offshore EMP72...), que acrescentou um titular formal aos fundos transferidos para as contas dessa sociedade.
    CC
    Ao contrário do que se defende na decisão instrutória, não surge apenas como pagador das vantagens (através do “saco azul” ES Enterprises), mas também como agente da circulação dos fundos, pelo menos quanto à quantia de 8.5 milhões que fez passar pela offshore EMP72..., sabendo que não era a destinatária final.
    O dolo
    O objectivo desta circulação foi o de quebrar a cadeia de ligação dos fundos à sua origem e ocultar o seu real destinatário.

    A CONCLUSÃO
    Não subsistem razões para não sujeitar os  agentes  deste crime a julgamento, nos termos acusados.
    Assim, julga-se procedente o recurso quanto ao branqueamento 18, relativamente aos arguidos CC e RR.

    1.5.7.3 BRANQUEAMENTO 19
    €20.000.296,00 feitos circular entre CC e SS.
    Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos CC e SS,  relativamente aos pagamentos PT e CEL_2010, realizados entre 9 de Julho de 2007 e 23 de Novembro de 2012, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES (e com destino para as contas de que era beneficiário SS), p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.°s 1, 2 e 3, do Código Penal.

    DECISÃO RECORRIDA
    Assenta a não pronúncia exactamente nas mesmas questões formais e de dogmática penal aludidas no crime 18, que nos escusamos de repetir.
    Além disso, a decisão recorrida entende que,  se o crime subjacente for  o elencado em 13 (do lado passivo), não há indícios da sua prática.
    No mais, não é posta em causa a indiciação da prática do crime de branqueamento.

    BREVE DESCRIÇÃO DA MATERIALIDADE OBJECTIVA
    Os movimentos financeiros estão esquematizados no diagrama XIV, para onde se remete.
    Em causa está a passagem das vantagens indevidas, recebidas por SS, por contas bancárias sediadas no estrangeiro, parte das quais foram transferidas para a conta bancária da offshore EMP100... LTD INC.
     Pelo menos quanto a estes fundos intermediados por esta offshore, os arguidos recorreram aos métodos de branqueamento “Use of Gatekeepers “, “Use of Corporate Vehicles and Trusts” e “Use of Offshore/Foreign Jurisdictions”.

    A NOSSA POSIÇÃO
    Crime subjacente
    Interpretando a acusação como um todo, o ilícito subjacente não pode deixar de ser o de corrupção elencado em 13 do lado passivo - crime de corrupção passiva, praticado por SS, relativamente a negócios do Grupo PORTUGAL TELECOM e GES, no que concerne aos pagamentos recebidos do arguido CC, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts.373°, n.º l, 374°- A, n.ºs 2 e 3, e com referência aos art.ºs 202°, al. b) e 386°, n.º 2, todos do Código Penal - a que se associa o 12 do lado activo, crimes considerados suficientemente indiciados.
    A função de cada arguido no esquema de branqueamento
    SS
    É o beneficiário do esquema de branqueamento.
    Este arguido (e o co-autor) “purificou” parte os dinheiros “sujos” que lhe foram entregues, por via da intermediação da offshore EMP100... LTD INC, com o que acrescentou um titular formal aos fundos transferidos para as contas dessa sociedade.
    CC
    É, de novo, agente da circulação destes fundos (e não apenas pagador dos mesmos), pelo menos relativamente àqueles que fez passar pela offshore EMP100... LTD INC.
    O dolo
    Pelo menos quanto aos fundos que passaram pelas contas da offshore EMP100... LTD INC, os arguidos recorreram aos métodos de branqueamento “Use of Gatekeepers“, “Use of Corporate Vehicles and Trusts” e “Use of Offshore/Foreign Jurisdictions”, cuja finalidade foi quebrar a cadeia de ligação dos fundos à sua origem e ocultar o seu real destinatário.

    A CONCLUSÃO
    Não subsistem razões para não sujeitar os agentes deste crime a julgamento, nos termos acusados.
    Assim, julga-se procedente o recurso quanto ao branqueamento 19, relativamente aos arguidos CC e SS.

    1.5.7.4 BRANQUEAMENTO 21 
    €3.967.611,00 feitos circular por SS, com origem em CC e destino ao mesmo CC.
     UM CRIME DE BRANQUEAMENTO praticado, em co-autoria, pelos arguidos CC e SS, relativamente à transferência de €3.967.611,00 (CHF 4.900.000,00), com origem em conta do banco PICTET titulada por SS e com destino a conta do Banco LOMBARD ODIER titulada pela sociedade em offshore EMP05..., controlada pelo arguido CC, em 22 de Novembro de 2011, p. e p. pelo art.368°A, n.º 1, 2 e 3, do Código Penal.

    DECISÃO RECORRIDA
    Assenta a não pronúncia:
    - Na nulidade processual decorrente de o arguido SS não ter sido ouvido quanto a este ilícito em sede de inquérito;
    - No argumento de que os actos de branqueamento ainda fazem parte do crime subjacente de abuso de confiança, outra interpretação consubstancia a  violação do princípio “ne bis in idem”.
    Estas questões já foram analisadas.
    A fls. 6082 da decisão recorrida é afirmado, a propósito deste crime, “conclui-se pela não verificação de indícios suficientes nos autos para submeter o arguido a julgamento”, sem que, no entanto,  esta temática dos indícios seja desenvolvida.
    Sem prejuízo, de forma muito sucinta, entendemos dizer:

    BREVE DESCRIÇÃO DA MATERIALIDADE OBJECTIVA
    Os movimentos financeiros em causa integram-se numa parte do diagrama XIV, para onde se remete.

    A NOSSA POSIÇÃO
    Crime subjacente
    As vantagens alvo deste esquema de branqueamento resultam da prática do crime de  abuso de confiança supra elencado em 1, ilícito pelo qual o arguido CC foi já julgado e condenado (pelo menos em primeira instância e segunda instâncias - processo número 9153/21....), cuja análise antes realizámos no que concerne ao co-arguido SS.
    A função de cada arguido no esquema de branqueamento
    CC
    É o beneficiário do esquema de branqueamento.
    Assume a posição de agente de circulação dos €3.967.611,00.
    Tal quantia, por si ilegitimamente subtraída do universo “GES”,  foi feita transferir (integrada num bolo de €8.000.000,00) para a ...13 do banco PICTET, titulada por SS, sendo certo que o mesmo sabia estar a proceder à entrega dessa quantia a um intermediário, com indicação de reencaminhamento posterior para conta da offshore EMP05... S.A., da qual era beneficiário final.
    Esta sociedade EMP05... S.A. nenhuma relação tinha com a origem dos fundos, afastando, desta forma, a vantagem indevida da sua origem.
    SS
    O arguido SS foi acusado da co-autoria do crime subjacente de abuso de confiança, porém foi alvo de decisão de não pronúncia, supra mantida.
    Nesta sequência, o arguido CC é o único autobranqueador.
    Tal não impede a apreciação da intervenção de SS como agente branqueador, em co-autoria, embora não na qualidade de autobranqueador.
    SS assume, quanto a esta concreta quantia, o papel de intermediário neste esquema de branqueamento, ao ter permitido a utilização da sua conta para fazer circular aquele montante, e ao ter reencaminhado a quantia para uma sociedade offshore.
    O dolo
    O arguido CC é autobranqueador, pelo que o conhecimento da origem ilícita de “catálogo” dos €3.967.611,00  é evidente.
    Quanto ao arguido SS, não sendo autobranqueador, o preenchimento do tipo subjectivo supõe a indiciação do conhecimento directo ou, pelo menos,  a admissão da possibilidade (dolo eventual) de que os fundos feitos passar pela sua ...13 do banco PICTET (...) tinham origem na prática de crime de “catálogo”, conhecimento (e possibilidade) que terá de ser anterior ou contemporâneo da data das acções típicas branqueadoras.
    A conclusão  da existência do conhecimento directo ou, pelo  menos, que o arguido admitia como possível essa hipótese,  não é difícil de inferir.
     O arguido SS  acede a fazer esta “favor” ao arguido CC no preciso momento em que está a receber vantagens indevidas, decorrentes da prática  de um crime de corrupção em que figura como agente corrompido, sabendo-se (e ele sabe muito bem, atendendo aos esquemas em que foi interveniente nos autos, não só de corrupção, mas também de branqueamento) que só é necessário branquear capital  se o mesmo for oriundo da prática de crime grave de “catálogo”, tendo até em conta os custos inerentes.
    A escolha da jurisdição estrangeira – ... – também não é inócua, pois todos sabiam que, pelo menos ao tempo, era das mais protectoras em matéria de sigilo bancário.
    A intenção inerente à circulação dos fundos e ao uso do método de branqueamento “Use of Foreign Jurisdictions”  foi a dissimulação da origem ilícita dos fundos e/ou evitar a perseguição criminal do interveniente no crime subjacente, única finalidade que empresta sentido à actuação dos dois arguidos.

    A CONCLUSÃO
    Termos em que se julga procedente o recurso quanto ao branqueamento 21, relativamente aos arguidos CC e SS, embora este sem a qualidade de autobranqueador.

    1.5.7.5 CRIME DE BRANQUEAMENTO 22
    €2.750.000,00 feitos circular por HH, com origem em CC e destino no mesmo CC.
     um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos CC e HH, relativamente à transferência de €2.750.000,00, com origem em conta da es enterprises na ..., de conta titulada pela sociedade EMP04... na ..., controlada pelo arguido HH, para conta do crèdit suisse, titulada pela sociedade em offshore EMP03..., controlada por CC, em novembro de 2011, p. e p. pelo art.º 368.º-a, n.ºs 1, 2 e 3, do código penal.

    DECISÃO RECORRIDA
    Estribou (fls. 6113 e 6123)  a não pronúncia:
    - Na questão da “excepção dilatória da falta do pressuposto processual de competência internacional da lei penal portuguesa”; e
    - Na falta de descrição do dolo da culpa, quanto ao co-arguido HH.
     Tais questões foram antes analisadas.
    Baseou-se, ainda:
    - Na “falta de indícios suficientes”; e
    - Na “não verificação dos elementos constitutivos do crime de branqueamento” (fls. 4263), nesta parte, quanto a ambos os arguidos, sem que, no entanto, desenvolva estas últimas temáticas.
    Sem prejuízo, conheceremos dos indícios.

    RECORRENTE
    Manifesta-se no sentido da revogação da decisão de não pronúncia deste crime.

    BREVE DESCRIÇÃO DA MATERIALIDADE OBJECTIVA
    Os movimentos financeiros em causa constam do diagrama VI.
    Da quantia de €15.000.000,00 aludida no branqueamento 6, saída de conta bancária da ES Enterprises e que foi transferida para a conta titulada pela sociedade EMP04..., controlada pelo arguido HH, €2.750.000,00 foram transferidos para conta do Crèdit Suisse, titulada pela sociedade offshore EMP03..., controlada por CC.
    Pelo menos parte destes fundos foram repatriados por CC, através da adesão ao RERT III, em 2012, por via do que tais fundos foram integrados em Portugal.
    Tais operações encontram-se documentalmente comprovadas.

    A NOSSA POSIÇÃO
    Crime subjacente
    As vantagens alvo deste esquema de branqueamento resultam da prática do crime de  abuso de confiança, supra elencado em 2, antes analisado, ilícito pelo qual o arguido CC foi já julgado e condenado (menos em primeira e segunda instâncias, nos exactos termos aludidos no CRIME 21, para onde se remete).
    O arguido HH foi acusado da co-autoria deste crime de abuso de confiança. Porém, foi alvo de decisão de não pronúncia, supra mantida.
    Nesta sequência, o arguido CC é o único autobranqueador.
    Tal não impede a apreciação da intervenção de HH, como agente branqueador, em co-autoria, embora não na qualidade de autobranqueador.
    A função de cada arguido no esquema de branqueamento
    CC  
    Assume a posição de agente da circulação dos €2.750.000,00 (por si ilegitimamente subtraídos do universo “GES”) por HH, posto que o mesmo sabia estar a proceder à entrega dessa quantia a um intermediário, com indicação de reencaminhamento posterior para uma sociedade offshore, que nenhuma relação tinha com a sociedade  de onde saíram os fundos, afastando, desta forma, a vantagem indevida da sua origem.
    HH 
    Assume, de novo, o papel de intermediário neste esquema de branqueamento, utilizando para o efeito a sociedade “fictícia” e offshore EMP04....
    Os justificativos criados
    Para justificar a circulação do dinheiro, além das manobras contabilísticas fraudulentas mencionadas no CRIME 6, foi simulado um contrato de prestação de serviços entre a ES Enterprises e o arguido HH com vista a conferir aparência legal à passagem dos €15.000.000,00 da ES Enterprises para HH, remetendo-se para o que se deixou escrito supra a propósito da falta de adesão de  tal contrato à realidade.
    O dolo
    O arguido CC é autobranqueador, pelo que  o conhecimento da origem ilícita de “catálogo” dos €2.750.000,00 é óbvio.
    Relativamente ao arguido HH, não sendo autobranqueador, o preenchimento do tipo subjectivo supõe a indiciação do conhecimento directo ou, pelo menos, a admissão da possibilidade (dolo eventual) de que os fundos feitos passar pela sua offshore EMP04... tinham origem na prática de crime de “catálogo”, conhecimento que terá de ser anterior ou contemporâneo da data das acções típicas branqueadoras.
    Repetimos o que dissemos no CRIME 6 nesta matéria, onde concluímos ser de inferir, pelo menos, a previsão por parte deste arguido da possibilidade dessa origem ilícita de “catálogo”, ilação resultante, desde logo, da contrapartida de mais de €4.000.000,00 auferida para fazer passar pelas suas contas os €15.000.000,00.
    Além disso, o arguido já tinha demonstrado conhecimentos em matéria de esquemas de branqueamento (tendo chegado a criar uma estrutura “Gatekeeper” - a EMP91... S.A - em 2009, ou seja, antes dos factos aqui em causa), sabendo, como se sabe, que só é necessário branquear capital oriundo da prática de crime grave, considerando, até, os custos associados.
    Mais uma vez, a intenção inerente à circulação dos fundos e ao uso dos métodos de branqueamento “Use of Gatekeepers “, “Use of Corporate Vehicles and Trusts” e “Use of Offshore/Foreign Jurisdictions” só pode ter sido a  de dissimular a origem ilícita dos fundos e/ou evitar a perseguição criminal do autor do crime subjacente, pois só esta finalidade dá sentido e justifica a actuação dos dois arguidos.
    A co-autoria
    Relativamente à indiciação do acordo exigido pelo art.º 26º, do CP,  damos por reproduzido o que se disse no CRIME 1 a este propósito, devidamente adaptado a este ilícito, sendo que esse acordo, em consonância com a acusação, terá ocorrido em território nacional (sendo, portanto, prévio e expresso), o que joga com as regras de experiência comum, pois de outro modo nem se perceberiam os critérios subjacentes à distribuição do capital recepcionado, a qual não pode ter sido aleatória, nem decidida pelo arguido HH.

    CONCLUSÃO
    Face a todo o exposto, não nos restam dúvidas da forte indiciação da prática deste crime de branqueamento pelos arguidos CC, como autobranqueador e HH, embora sem aquela qualidade.
    Termos em que se julga procedente o recurso quanto ao branqueamento 22, relativamente aos arguidos CC e HH.

    1.5.7.6 CRIME DE BRANQUEAMENTO 23
     €400.000,00 – origem em SSSSSSSS e destino a EE.
     Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos EE e a sociedade “Pepelan - Consultoria e Gestão”, relativo a justificativos criados para o recebimento de fundos através da alienação de imóvel, cuja propriedade estava titulada pela sociedade “Pepelan - Consultoria e Gestão”,  e com utilização da sociedade em offshore EMP10... LIMITED, p. e p. pelo art.368°-A, nº 1, 2 e 3, do Código Penal.
    DECISÃO RECORRIDA
    Não pronunciou nenhum dos dois arguidos, por “ausência do objecto típico da acção”.
    Em síntese (fls. 4704 e seguintes), refere resultar dos factos acusados que o arguido EE desviou, para a sua esfera pessoal, a quantia de €400.000,00, provenientes da venda de um imóvel da Pepelan a SSSSSSSS, quantia que deveria ter sido entregue a esta sociedade, pelo que o ilícito subjacente seria um crime de abuso de confiança praticado pelo próprio arguido EE, consumado no dia 27.02.2008.
    Porém, o Ministério Público absteve-se de imputar ao arguido EE a prática de tal crime.
    Numa outra parte, a acusação considera que aquela quantia deverá ser integrada fiscalmente como uma atribuição da sociedade ao sócio, a título de adiantamento por conta de lucros, subvertendo a sua própria tese do desvio de fundos por parte do sócio, a título pessoal.
    Concluiu que o alegado crime de fraude fiscal relativo à omissão de declaração em sede de IRC, por parte da Pepelan, do valor de €400.000,00,  seria o único a poder configurar como crime subjacente.
    Afasta, no entanto, essa hipótese, em virtude de as manobras de branqueamento do capital serem anteriores à consumação do crime de fraude fiscal (ocorrida com a entrega da declaração de IRC no ano de 2009, reportada aos rendimentos do ano de 2008). Assim,  à data do branqueamento, as vantagens ditas “branqueadas” não teriam natureza típica de “catálogo”.
    A decisão instrutória determinou o expurgo dos artigos 3948 a 4016 e 13870 a 13873 da acusação, por se terem tornado inócuos  (fls. 4756).
    RECORRENTE
    Nas conclusões do recurso, refere o seguinte:
    1245. Admitimos que o sócio de uma sociedade pode cometer crime de abuso de confiança relativamente a activos da sociedade, em particular quando recebe quantias que são receita da sociedade e não as aporta nem reflecte nas contas da mesma, mas quando o sócio em causa tem a capacidade de definir a vontade da sociedade pode fazer com que a sociedade venha definir e justificar, ainda que a posteriori, a apropriação do bem ou da quantia pelo próprio sócio.
    1246. A imputação realizada pela acusação foi feita a título de co-autoria entre o sócio EE e a sociedade PEPELAN sendo concebida como uma forma de, em concordância entre o sócio e a sociedade, ser realizada uma atribuição patrimonial a favor do sócio sem o sujeitar a um encargo fiscal, realizada no caso através da ocultação de receitas por parte da sociedade com o desvio de ganhos para a esfera de uma entidade instrumental, a EMP87... LIMITED, registada no ..., pertença do sócio EE.
    1247. Entendemos assim, que o enquadramento jurídico correcto é o da prática de um crime de fraude fiscal qualificada, por via de um conluio entre a sociedade e o seu sócio, visando desviar directamente para a esfera do sócio, de forma oculta, ganhos que deveriam ter sido inscritos em sede da sociedade.
    1248. No caso dos autos, após a colocação da quantia em causa na conta da EMP87..., todos os actos de movimentação financeira, com a passagem por sucessivas contas no exterior, todas em nome de diferentes entidades instrumentais, até à colocação final na conta da entidade EMP10..., também pertença do arguido EE, e com a transferência desta para uma conta em Portugal, em nome pessoal do arguido, representam a prática de um crime de branqueamento de capitais, pelo qual o arguido deve ser pronunciado, admitimos apenas que sem a comparticipação de facto da PEPELAN.
    BREVE DESCRIÇÃO DA MATERIALIDADE OBJECTIVA
    Os movimentos financeiros constam do diagrama XV, para onde se remete.
    De acordo com a acusação, SSSSSSSS acordou em comprar à arguida Pepelan um imóvel, sito em ..., pelo preço de €1.900.000,00.
    No âmbito de um contrato promessa de compra e venda desse imóvel, foram liquidados €400.000,00 em numerário, a título de sinal, entregues por SSSSSSSS ao arguido EE em 27.02.2008, quantia que o mesmo, imediatamente, fez sua.
    O arguido EE depositou essa quantia no BCP, fez transferir a mesma, em 14.03.2008, para a conta sediada na ..., da sociedade “EMP87...” (entidade offshore por si criada e controlada), daí circulou, entre 14.03.2008 e 26.03.2008, pelas contas das sociedades “EMP108...”, “EMP112...”, “EMP10...”, sediadas no ..., e uma conta do próprio, sediada em Portugal.
    O branqueamento referir-se-ia a esta circulação de fundos e criação de justificativos das operações de circulação.
    A escritura de compra e venda do imóvel foi celebrada mais tarde, com o preço declarado de €1.500.000,00, ou seja, com simulação do preço.
    A sociedade Pepelan não declarou os €400.000,00 a título de rendimentos fiscais do ano de 2008, não tendo procedido ao pagamento do respectivo Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC), estando acusada, juntamente com o seu gerente EE, também por um crime de fraude fiscal, alegadamente consumado em 26.05.2009, data da apresentação da declaração de IRC por parte da Pepelan.
    Para maior clareza passamos a transcrever a factualidade objectiva constante da acusação atinente a este crime, narrada nos artigos 3948 a 4016 da acusação, sob o título “18. As operações desenvolvidas pelo arguido EE através da sociedade EMP10... Limited”, e a subjectiva nos artigos  13870 a 13873.
    Os mais relevantes:
    3963. Para o efeito, o arguido EE subscreveu, em nome da PEPELAN, um contrato de promessa de venda do mesmo imóvel com o referido SSSSSSSS, fazendo inscrever no mesmo contrato, com data de 27 de Fevereiro de 2008, que seria pago o preço de €1.900.000,00 (um milhão e novecentos mil euros) - contrato promessa constante de folhas 48 e seguintes do apenso bancário 83-B.
    3964. O arguido EE acordou porem, com o referido SSSSSSSS que, em sede da escritura de compra e venda a realizar, seria apenas feito constar o preço de €1.500.000,00 (um milhão e quinhentos mil euros).
    3965.Com efeito, conforme o acordado, na data do referido contrato promessa, 27 de Fevereiro de 2008, SSSSSSSS entregou ao arguido EE a quantia de €400.000,00 em numerário, da qual o mesmo arguido fez coisa sua, apesar de saber corresponder ao preço do imóvel prometido vender pela PEPELAN.  (…)
    3970 Relativamente ao montante de €400.000,00 que havia recebido em numerário, o arguido EE resolveu então montar um esquema de forma a, em primeiro lugar, ocultar o seu recebimento, mas depois, em segundo lugar, criar um justificativo para poder utilizar em seu próprio proveito.
    3971 Para o efeito, o arguido EE procedeu, na data de 27 de Fevereiro de 2008, a abertura de uma conta bancaria na ..., junto do Banque Prive BCP, em nome da entidade EMP87... LTD, com registo no ..., conta nº ...81, da qual o arguido e a sua esposa, TTTTTTTT, eram os accionistas e beneficiários finais (Aba 83-B, fls. 23, 24 e 40.
    3972 Assim, o arguido EE começou por fazer depositar, em início de Março de 2008, a referida quantia de €400.000,00, em numerário, junto do BCP, dando instrução para que a mesma fosse creditada na conta que o mesmo arguido controlava, aberta em nome da entidade EMP87..., junto do Banque Prive BCP, na ..., conta com o nº ...81 (Aba 83-B, fls. 68).
    3974. O arguido EE fez assim, creditar, através da entrega do referido montante de €400.000,00 em numerário, uma conta bancária no estrangeiro, por si pessoalmente controlada, apesar de saber estar em causa um montante que era devido a PEPELAN e que constituía uma receita da mesma.
    3975.O arguido EE determinou ainda a PEPELAN a não declarar, em sede fiscal, em Portugal, o referido montante de €400.000,00, que deveriam ter sido feitos constar da declaração Modelo 22 apresentada pela mesma PEPELAN em 2009.
    (…)
    3977. De seguida, o arguido EE implementou um novo esquema, de forma a fazer transferir os fundos da conta da EMP87... na ... com a criação de uma nova justificação contratual para o recebimento desses fundos em Portugal.
    (…)
    4014. Assim, o arguido EE recebeu na sua conta pessoal junto do BCP, acima referida, o montante total de €600.000,00, como se representasse o pagamento da venda de uma participação na EMP78... e direito a reembolso de suprimentos, quando, na realidade, o montante de €400.000,00 correspondia, a um pagamento que era devido a sociedade PEPELAN, que assim desviou para a sua esfera pessoal, e que se não encontrava manifestado em sede fiscal.
     (…)
    13870.O arguido EE sabia que os fundos com origem na alienação de imóvel cuja propriedade fez titular pela sociedade PEPELAN-CONSULTORIA E GESTÃO e que fez passar por contas tituladas por outras sociedades em offshore, nomeadamente, pela EMP10... LIMITED, tinham origem na prática de crime.
    13871 Tinha, igualmente, conhecimento de que ao concretizar tais transferências por intermédio de tais contas e ao criar justificativos sem correspondência com a realidade para tais operações financeiras, nos termos supra descritos, criava a aparência de que tais montantes pecuniários tinham origem em prestações contratuais lícitas, o que sabia não corresponder a verdade.
    3872. Mais sabia que, ao actuar nos termos descritos, encobria a verdadeira origem dos fundos, bem como a circunstância de constituírem produto do crime e criava barreiras a sua detecção, as quais permitiam ocultar a prática dos ilícitos que estavam na sua origem e a reintrodução dos fundos na economia legítima, concretamente, na sua esfera patrimonial.
    Ainda com importância:
    362. O arguido EE utilizou, igualmente, nos termos que adiante se vão narrar, a sociedade PEPELAN CONSULTORIA E GESTÃO LDA, NIF ...11, de que detinha o controlo, para concentrar ganhos gerados com negócios imobiliários, fazendo-os depois circular para a sua esfera pessoal, através da produção de falsos justificativos contratuais e com a criação de circuitos financeiros destinados a ocultar a sua pessoa e real origem dos fundos.
    (…)
    4060. Para não deixar evidência do recebimento da referida quantia de €400.000,00, o arguido EE fez converter a mesma em numerário e realizou o seu depósito numa conta bancária aberta no estrangeiro, em nome da sociedade EMP87... LTD, com registo no ..., e depois ainda por contas tituladas no estrangeiro pelas sociedades EMP10... LIMITED, EMP108... e EMP112..., conforme atrás narrado, sempre com o objetivo de não declarar, para efeitos fiscais o recebimento da referida soma e fazer justificar a sucessiva transferência dos fundos.
    4061. Mais determinou o arguido EE que a sociedade PEPELAN viesse a apresentar, em maio de 2009, perante a administração fiscal, uma declaração para efeito de IRC em que reporta uma matéria coletável total de €263.345,32, onde não fez incluir o montante recebido e não contabilizado de €400.000,00.
    (…)
    4064. No entanto, em face do montante que a PEPELAN deveria ter feito constar da declaração apresentada para efeito de IRC, ano de 2008, o imposto devido seria no montante de €126.077,17, incluindo derrama (não considerando juros compensatórios).
    (…)
    4067. Acresce que, tendo o arguido EE atribuído a si próprio o montante de €400.000,00 que pertenciam à PEPELAN, tal atribuição deve ser integrada, fiscalmente, como sendo um adiantamento por conta de lucros uma vez que era o próprio arguido EE quem determinava a vontade da sociedade — conforme art. 5.° n.° 2 h) do Cod. do IRS.

    A NOSSA POSIÇÃO
    O crime subjacente
    As operações financeiras ditas branqueadoras e os justificativos das mesmas constam do diagrama XV, para onde se remete.
    Como se disse, a decisão sob censura não pronunciou este crime de branqueamento 23 por “ausência do objecto típico da acção” (fls. 4711 e 4712), ou seja, por ausência de vantagens ilícitas de “catálogo” passíveis de branqueamento ou por ausência de crime subjacente.
    Esta solução merece-nos  total acolhimento.
    Senão vejamos.
    A posição do Ministério Público relativamente a este concreto ilícito típico, quer na qualidade de acusador, quer na de Recorrente, é titubeante
    Na verdade, logo na veste de Recorrente, o Ministério Público assume posições contraditórias relativamente à pronúncia da arguida Pepelan, ora dizendo “representam a prática de um crime de branqueamento de capitais, pelo qual o arguido deve ser pronunciado, admitimos apenas que sem a comparticipação de facto da PEPELAN”, ora pedindo a pronúncia da sociedade pelo crime nos termos acusados.
    Se bem entendemos, o Recorrente pretende a pronúncia da sociedade arguida, mas reconhece a ausência de comparticipação da mesma na prática desse mesmo crime!
    Também na qualidade de acusador o Ministério Público assume posições contraditórias.
    Efectivamente, como se verifica dos transcritos artigos da acusação, esta começa por narrar claramente uma inversão do título de posse por parte do arguido EE da quantia de €400.000,00, que constituía património da sociedade Pepelan, materialidade que - como bem se diz na decisão sob censura - configuraria um crime de abuso de confiança, pelo que, à partida, seria este o crime subjacente.
    No entanto, o Ministério Público absteve-se de acusar o arguido EE por tal crime.
    E não só não o fez, como acrescenta na mesma peça acusatória - embora na narração de um crime fiscal - que “tendo o arguido EE atribuído a si próprio o montante de €400.000,00 que pertenciam à PEPELAN, tal atribuição deve ser integrada, fiscalmente, como sendo um adiantamento por conta de lucros, acabando por dar, por esta via, uma aparência de legalidade à conduta levada a cabo pelo arguido EE.
    Perante estas duas versões constantes na acusação, fica tribunal sem perceber se o acusador entende ter o arguido (ao desviar para a sua esfera pessoal o montante de €400.000,00, que correspondia a um pagamento devido a sociedade Pepelan - expressões da própria acusação -) praticado, ou não,  um crime de abuso de confiança, pois a acusação ora o parece afirmar, ora o parece desmentir.
    O acusador podia ter esclarecido a sua posição em sede de recurso, mas apenas reforçou as já mencionadas inconsistências.
    A este propósito, refere nas suas conclusões de recurso: um “sócio de uma sociedade pode cometer crime de abuso de confiança relativamente a activos da sociedade, em particular quando recebe quantias que são receita da sociedade e não as aporta nem reflecte nas contas da mesma” (o que, revertido para o caso concreto, é afirmar a prática pelo arguido EE do aludido crime de abuso de confiança, não obstante o não tenha acusado) e prossegue “mas quando o sócio em causa tem a capacidade de definir a vontade da sociedade pode fazer com que a sociedade venha definir e justificar, ainda que a posteriori, a apropriação do bem ou da quantia pelo próprio sócio” (o que, revertido para a situação em apreço, significa que a Pepelan, a posteriori, por influência do sócio, teria voluntariamente justificado a apropriação ilegítima dos fundos pelo sócio, “branqueando” esse comportamento e dando-lhe uma qualquer aparência de legalidade).
    É uma tese rebuscada que, de todo o modo, não encontra o mínimo suporte nos factos descritos na acusação.
    Se a sociedade branqueou o abuso de confiança do sócio, de que forma o fez?
    De que forma foi formalizada a atribuição dos €400.000,00 ao sócio?
    O montante desviado foi, posteriormente, feito inscrever na contabilidade da sociedade?
    A acusação não dá resposta a tais perguntas.
    Antes, dá sempre a entender não ter existido registo contabilistico da entrada daquela quantia na sociedade, limitando-se a rematar que essa atribuição deverá ser entendida como um adiantamento, por conta de lucros futuros e incertos, apesar de em nenhum local afirmar que a Pepelan, ainda que através do seu sócio gerente, assim o tenha feito ou entendido.
    Na verdade, o que resulta da acusação é que os €400.000,00 nunca foram registados na contabilidade da sociedade e nunca chegaram a entrar no seu património.
    Mesmo nesta tese do Recorrente sempre ficaria por explicar porque razão o Ministério Público não acusou o sócio de fraude fiscal relativamente ao IRS não declarado desse rendimento por si auferido no ano de 2008 (inicialmente ilícito, mas posteriormente legalizado por vontade e acção da sociedade, embora determinadas pelo sócio prevaricador), já que defende ter a sociedade, ao fim e ao cabo, realizado uma atribuição da quantia ao sócio, embora não dizendo em que moldes e sem nenhuma evidência factual de suporte.
    Resumindo e concluíndo, não podemos considerar que o crime de abuso de confiança se constitua como ilícito típico subjacente do branqueamento porque, de acordo com a própria versão do acusador, não está claro que tal ilícito típico tenha sido cometido.
    Poderiamos explorar a hipótese de o crime subjacente ser, então, o de fraude fiscal acusado, referente ao IRC da “Pepelan - Consultoria e Gestão” quanto ao ano de 2008, crime praticado, de acordo com a acusação, em co-autoria pelos arguidos EE e a sociedade “Pepelan - Consultoria e Gestão”.
    Sucede que, na primeira versão da acusação (segundo a qual esta quantia de €400.000,00 nunca chegou a entrar no património da sociedade, por ter sido desviada logo no acto da entrega pelo seu sócio, nem foi registada como receita na contabilidade), não tendo a quantia sido recebida pela sociedade,  a mesma nem se chegou a constituir como rendimento da sociedade.
    Na segunda versão, resultante do recurso (segundo a qual a sociedade a posteriori “legalizou” o comportamento de desvio de fundos do sócio, tendo realizado uma qualquer atribuição ao sócio), como já se referiu, a acusação não faz eco desta tese alternativa, não passando, consequentemente, de uma simples conjectura ou especulação, sem suporte factual.
    A ser assim, também este crime acusado não pode consubstanciar o crime subjacente do branqueamento.
    De resto, uma qualquer imputação objetiva de factos a um arguido que não seja clara e inteligível, a ponto de criar sérias dúvidas interpretativas ao aplicador do direito, não permite ao arguido um efectivo contraditório, o que se reconduz a uma violação dos seus mais elementares direitos de defesa, constitucionalmente consagrados.
    Tanto basta para que, em face da confusão narrativa da factualidade que suporta este ilícito, este tribunal adira facilmente à decisão de não  pronúncia deste crime.

    CONCLUSÃO
    Termos em que se julga improcedente o recurso quanto ao branqueamento 23, mantendo-se a decisão recorrida, quer quanto à não pronúncia relativamente ao arguido EE e à sociedade “Pepelan - Consultoria e Gestão”, quer quanto à exclusão dos artigos da acusação que o suportam (artigos 3948 a 4016, 13870 a 13873).

    1.5.8 RESUMO FINAL RELATIVAMENTE A CADA UM DOS 23 CRIMES DE BRANQUEAMENTO, OBJECTO DO RECURSO.
    CRIME 1 - um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, BB e GG, relativamente aos movimentos financeiros com origem no Grupo LENA, com passagem pelas contas da ... tituladas pelo arguido GG, realizados a partir de 2007, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal -
    revogar a decisão de não pronúncia e pronunciar os arguidos AA, BB e GG, nos termos da acusação.
    CRIME 2 - Um crime de branqueamento  praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, BB, GG, a sociedade LEC SA e a sociedade XLM, relativamente à utilização da sociedade XLM, entre 2009 e 2015, para a colocação de fundos destinados ao arguido AA e utilização dos mesmos no seu interesse, através do pagamento de despesas e de distribuição de dividendos para contas tituladas pelo arguido BB, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do  Código Penal - decide-se:
    - Revogar a decisão de não pronúncia e pronunciar os arguidos AA, BB, GG e a sociedade LEC SA, nos termos da acusação;
    - Manter a decisão de não pronúncia da sociedade XLM.
    Com excepção das referências da sociedade XLM como arguida, associada à prática deste crime, manter-se-á a materialidade da acusação relacionada com a actuação desta sociedade, por ser relevante para o apuramento da actuação imputada aos arguidos ora pronunciados por este crime.
    CRIME 3 - um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, CC, HH, BB e II, relativamente à utilização, entre 2006 e 2008, de contas na ... em que o arguido II era autorizado e operações financeiras realizadas a partir das mesmas, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal -
    revogar a decisão de não pronúncia e pronunciar os arguidos AA, CC, HH, BB e II,  nos termos da acusação.
    CRIME 4 - um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, CC, HH, II e BB, relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados no ano de 2007 e até ao início de 2008, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal 
    revogar a decisão de não pronúncia e pronunciar os arguidos AA, CC, HH, BB e II, nos termos da acusação.
    CRIME 5 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, CC, HH, BB e GG, relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados a partir de 2008, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, com intervenção das contas da ... do arguido GG, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal
    revogar a decisão de não pronúncia e pronunciar os arguidos AA, CC, HH, BB e GG, nos termos da acusação.
    CRIME 6 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, CC, HH, BB, GG, as sociedades LEC SA, LEC SGPS, LENA SGPS e XLM, relativamente aos movimentos financeiros ocorridos a partir de 2010, abrangidos pela operação CEL_2010, justificados através de contrato promessa de compra e venda com perda de sinal referente ao imóvel ..., sito em ..., e introdução desses fundos no Grupo LENA, p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal -
    - Revogar a decisão de não pronúncia e pronunciar os arguidos AA, CC, HH, BB, GG e as sociedades LEC SA, LEC SGPS e LENA SGPS, nos termos da acusação; e
    - Negar provimento ao recurso e manter a decisão de não pronúncia da sociedade XLM.
    Com excepção das referências da sociedade XLM como arguida associada à prática deste crime, manter-se-á a materialidade da acusação relacionada com a actuação desta sociedade, por ser relevante para o apuramento da actuação imputada aos arguidos ora pronunciados por este crime.
    CRIME 7 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, BB, GG, DD, EE, FF e JJ, relativamente às transferências com origem em conta do cidadão ... KK, referente aos financiamentos concedidos ao Grupo Vale do Lobo, com passagem por conta bancária da ... do arguido GG, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal  -
    - Revogar a decisão de não pronúncia dos arguidos AA, BB, GG, DD, EE e FF, nos termos da acusação; e
    - Manter a decisão de não pronúncia da arguida JJ pela prática do mesmo CRIME 7.
    CRIME 8 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA e BB, relativamente à concentração dos fundos em novas contas bancárias da ..., tituladas por sociedades em offshore controladas por BB e sua transferência para contas tituladas por este último arguido em Portugal, ao abrigo do RERT II, previsto e punido pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal
    revogar a decisão de não pronúncia e pronunciar os arguidos AA e BB, nos termos da acusação.
    CRIME 9 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA e BB,  relativamente à dissipação dos fundos por outras contas em Portugal, de que o arguido BB era titular e autorizado, e à confusão de patrimónios de AA e de BB nessas contas bancárias, p. e p. pelo art.º368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal
    revogar a decisão de não pronúncia e pronunciar os arguidos AA e BB, nos termos da acusação.
    CRIME 10 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos GG, NN, as sociedades LEC SA, XLM e RMF CONSULTING e outros (AA e BB, pronunciados por este ilícito criminal), relativamente a utilização da sociedade RMF CONSULTING, entre 2010 e 2014, para a colocação de fundos destinados ao arguido AA e utilização dos mesmos no seu interesse através do pagamento de despesas suas e colocação de numerário à sua disposição, p. e p. pelo art.368°-A, n° 1, 2 e 3, do Código Penal - 
    - Revogar a decisão de não pronúncia e pronunciar os arguidos GG, NN e as sociedades LEC SA e RMF CONSULTING, nos termos da acusação; e
    - Negar provimento ao recurso e manter a decisão de não pronúncia da sociedade XLM.
    Com excepção das referências da sociedade XLM como arguida associada à prática deste crime, manter-se-á a materialidade da acusação relacionada com a actuação desta sociedade, por ser relevante para o apuramento da actuação imputada aos arguidos ora pronunciados por este crime.
    CRIME 11 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, BB e LL, quanto a aquisição de imóveis em Portugal, com o retorno do preço pago para a esfera patrimonial do arguido AA, de forma justificada, factos ocorridos entre 2010 e 2012, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal
    revogar a decisão de não pronúncia e pronunciar os arguidos AA, BB e LL, nos termos da acusação.
    CRIME 12 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, BB e LL, relativamente à aquisição e subsequente arrendamento de um imóvel em ..., com intenção de ocultação da titularidade do activo, factos praticados entre 2012 e 2014, previsto e punido pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal -
    revogar a decisão de não pronúncia e pronunciar os arguidos AA, BB e LL, nos termos da acusação.
    CRIME 13 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, BB e LL,  relativamente à entrega pelo arguido BB de quantias pertencentes ao arguido AA para depósito em contas bancárias do arguido LL e para guardar em cofre bancário e em contas tituladas pelo mesmo, de forma a ocultar a propriedade desses valores pelo arguido AA, factos ocorridos nos anos de 2012 e 2013, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal
    revogar a decisão de não pronúncia e pronunciar os arguidos AA, BB e LL, nos termos da acusação.
    CRIME 14 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos AA, BB e MM,  relativamente à aquisição de um imóvel, designado “Monte ...”, com intenção de que passasse a integrar o património familiar do arguido AA, com registo em nome de terceiro e montagem de operação de financiamento entre 2011 e 2014, p. e p. pelo art.º 368.º, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal -
    revogar a decisão de não pronúncia e pronunciar os arguidos AA, BB e MM, nos termos da acusação.
    CRIME 15 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pela arguida TT e outros (BB e AA, foram pronunciados por este ilícito), relativamente à disponibilização, por parte de TT, das suas contas bancárias junto do Montepio Geral para recepção de fundos provenientes do arguido BB para entrega ao arguido AA, ocultando a titularidade destas quantias por este último arguido, factos ocorridos nos anos de 2013 e 2014, p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal - 
    revogar a decisão de não pronúncia e pronunciar a arguida TT, nos termos da acusação.
    CRIME 16 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelo arguido UU e outros (BB e AA, foram pronunciados por este ilícito), com referência aos factos relacionados com a utilização da conta bancária de  UU para a passagem de fundos pertencentes ao arguido AA, recebidos do arguido BB, e sua transferência subsequente para a conta do arguido AA, factos ocorridos nos anos de 2011 a 2014, p. e p. pelo art.368°-A, n° 1 e 2, do Código Penal
    revogar a decisão de não pronúncia e pronunciar o arguido UU, nos termos da acusação.
    CRIME 17 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos BB, GG, PP e QQ,  relativamente a utilização da sociedade XMI e sua contabilidade, para a colocação de fundos na esfera patrimonial do arguido QQ, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal  -
    revogar a decisão de não pronúncia e pronunciar os arguidos BB, GG, PP e QQ, nos termos da acusação.
    CRIME 18 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos CC e RR,  relativamente aos pagamentos PT e CEL_2010, realizados entre 7 de Dezembro de 2007 e 20 de Setembro de 2011, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES (e com destino para as contas de que era beneficiário RR), p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.°s 1, 2 e 3, do Código Penal -
    revogar a decisão de não pronúncia e pronunciar os arguidos CC e RR, nos termos da acusação.
    CRIME 19 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos CC e SS,  relativamente aos pagamentos PT e CEL_2010, realizados entre 9 de Julho de 2007 e 23 de Novembro de 2012, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES (e com destino para as contas de que era beneficiário SS), p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.°s 1, 2 e 3, do Código Penal -
    revogar a decisão de não pronúncia e pronunciar os arguidos CC e SS, nos termos da acusação.
    CRIME 20 - Um crime de branqueamento praticado, a título de cumplicidade, pela arguida JJ (do qual é autor material o arguido DD, pronunciado nos termos da acusação por este ilícito criminal, tendo já sido julgado pelo mesmo em processo separado), relativamente à transferência de fundos para Portugal, com origem em contas tituladas pelas sociedades em offshore EMP07... e EMP08... na ..., com utilização da sociedade EMP09... LDA., p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal -
    manter a decisão de não pronúncia da arguida JJ.
    Em consequência, manter como não indiciadas, e por isso devem ser consideradas excluídas, as referências feitas à arguida JJ (que tenham interesse exclusivo quanto aos CRIMES 7 e 20, na parte da imputação destes crimes a esta arguida) nos artigos 338, 339, 3340, 342, 3844, 3846, 3853, 3916, 3918, 3921, 39324, 3931, 3945, 4101, 4103, 4128, 4200, bem como, quanto ao elemento subjectivo, nos artigos 13724, 13866, 13869, 14065, 14070, 14075 e 14078, todos da acusação.
    CRIME 21 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos CC e SS, relativamente à transferência de €3.967.611,00 (CHF 4.900.000,00), com origem em conta do banco PICTET titulada por SS e com destino a conta do Banco LOMBARD ODIER titulada pela sociedade em offshore EMP05..., controlada pelo arguido CC, em 22 de Novembro de 2011, p. e p. pelo art.368°A, n.º 1, 2 e 3, do Código Penal.
    revogar a decisão de não pronúncia e pronunciar os arguidos CC e SS, nos termos da acusação.
    CRIME 22 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos CC e HH, relativamente à transferência de €2.750.000,00, com origem em conta da ES Enterprises na ..., de conta titulada pela sociedade EMP04... na ..., controlada pelo arguido HH, para conta do Crèdit Suisse, titulada pela sociedade em offshore EMP03..., controlada por CC, em Novembro de 2011, p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal.
    revogar a decisão de não pronúncia e pronunciar os arguidos CC e HH, nos termos da acusação.
    CRIME 23 - Um crime de branqueamento praticado, em co-autoria, pelos arguidos EE e a sociedade “Pepelan - Consultoria e Gestão”, relativamente a justificativos criados para o recebimento de fundos através da alienação de imóvel cuja propriedade estava titulada pela sociedade “Pepelan - Consultoria e Gestão” e com utilização da sociedade em offshore EMP10... LIMITED, p. e p. pelo art.368°-A, nº 1, 2 e 3, do Código Penal.
    manter a decisão de não pronúncia de não pronúncia do arguido EE e da sociedade “Pepelan - Consultoria e Gestão”.branqueamento
    Manter a decisão de exclusão dos artigos 3948 a 4016, 13870 a 13873 da acusação que o suportam.

    1.5.9 DOS CRIMES DE FALSIFICAÇÃO:   
    *
    1.5.9.1 DOS CRIMES DE FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO
    Considerando o peticionado pelo Ministério Público em sede de recurso, estão aqui em causa os seguintes crimes de falsificação:
    1-Um crime de Falsificação de documento, praticado, em coautoria, pelos arguidos AA, BB e GG, relativamente ao primeiro contrato de prestação de serviços celebrado entre a LEC S.A. e a XLM, faturas e outra documentação produzida ao abrigo do mesmo, factos ocorridos a partir de 2009, p. e p. pelo art.º 256.º, n.º 1, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
    2- Um crime de falsificação de documento, praticado, em coautoria, pelo arguidos AA, BB e NN, com referência aos contratos de prestação de serviços celebrados entre as sociedades XLM e RMF Consulting, bem como faturas e outra documentação produzida ao abrigo dos mesmos, que serviram de suporte a circulação de quantias entre estas sociedades, com origem e destino no arguido AA, crime p. e p. pelo art.º 256. °, n.º l, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
    3- Um crime de Falsificação de documento, praticado, em coautoria, pelos arguidos AA, BB, CC, HH e GG, relativamente ao conjunto de documentos que incluem o contrato-promessa de compra e venda de imóvel em ..., denominado ..., contrato de intermediação EMP02... e XLM, cartas de admissão do seu incumprimento e perda de sinal e celebração de segundo contrato de prestação de serviços entre a LEC e a XLM, bem como faturas e outra documentação produzida ao abrigo destes contratos, factos ocorridos a partir de 2010, crime p. e p. pelo art.º 256.°, n.º l, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
    4- Um Crime de Falsificação de Documento, praticado, em coautoria, pelos arguidos AA, BB e MM, com referência aos contratos de prestação de serviços celebrados entra a XLM e a arguida MM, que serviram de suporte ao recebimento de quantias por esta última com origem no arguido AA, crime p. e p. pelo art.º 256. °, n.º l, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
    5- Um Crime de Falsificação de Documento, praticado, em coautoria, pelos arguidos AA e BB, com referência aos contratos de prestação de serviços celebrados entra a XLM e OO, bem como faturas e outra documentação produzida ao abrigo dos mesmos, que serviram de suporte ao recebimento de quantias por esta última com origem no arguido AA, crime p. e p. pelo art.º 256. °, n.º l, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
    6- Um Crime de Falsificação de Documento praticado, em coautoria, pelos arguidos CC e HH, relativamente à elaboração e uso de contrato justificativo dos pagamentos CEL_2010 realizados através das contas da ... de HH (“Justificativos dos pagamentos CEL_2010-HH”) cujo objeto se referia à prestação de serviços no ... e outros países ..., p. e p. pelo art.º 256.º, n.º 1, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
    7- Um Crime de Falsificação de Documento praticado, em coautoria, pelos arguidos CC e RR, relativamente a elaboração e uso de contrato justificativo dos pagamentos PT e CEL_2010 efetuados ao arguido RR, crime p. e p. pelo art.º 256. °, n.º 1, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
    8- Um Crime de Falsificação de Documento praticado, em coautoria, pelo arguido LL relativamente a produção e uso de documentação referente à aquisição e subsequente arrendamento do apartamento de ..., sito na Av. ..., crime p. e p. pelo art.º 256°, nº l, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
    9- Um Crime de Falsificação de Documento praticado, em coautoria, pelo arguido NN, com referência aos contratos de prestação de serviços celebrados entre a sociedade RMF Consulting e VV e WW, bem como faturas e outra documentação produzida ao abrigo dos mesmos, que serviram de suporte ao recebimento de quantias por estes últimos com origem no arguido AA, crime p. e p. pelo art.º 256°, nº 1 alíneas a), d) e e) do Código Penal;
    10- Um Crime de Falsificação de Documento, praticado, em coautoria, pelo arguido NN, com referência aos contratos de prestação de serviços celebrados entre a sociedade RMF Consulting e XX e YY, bem como faturas e outra documentação produzida ao abrigo dos mesmos, que serviram de suporte ao recebimento de quantias por estes últimos, com origem no arguido AA, crime p. e p. pelo art.º 256°, n.° l, alíneas a), d) e e) do Código Penal; e
    11- Um Crime de falsificação (identificado, por lapso, como crime de branqueamento) relativamente aos relatórios de atividades da XLM, praticado, em coautoria, pelos arguidos BB, GG e NN, relativos ao forjar e utilização da execução do primeiro contrato entre a LEC SA e a XLM, factos ocorridos entre 2011 e 2013, crime p. e p. pelo art.º 256°, nº l, alíneas a), d) e e) do Código Penal.
    No que ora releva, estabelece o artigo 256.º do Código Penal que:
    “1 - Quem, com intenção de causar prejuízo a outra pessoa ou ao Estado, de obter para si ou para outra pessoa benefício ilegítimo, ou de preparar, facilitar, executar ou encobrir outro crime:
    a) Fabricar ou elaborar documento falso, ou qualquer dos componentes destinados a corporizá-lo;
    (…)
    d) Fizer constar falsamente de documento ou de qualquer dos seus componentes facto juridicamente relevante;
    e) Usar documento a que se referem as alíneas anteriores; (…)
    é punido com pena de prisão até três anos ou com pena de multa.
    Conforme apontado por Helena Moniz e Nuno Brandão, cujos ensinamentos seguiremos de perto (in Comentário Conimbricense do Código Penal, Parte Especial, Tomo II, Volume II, 2.ª ed., 2022, pp. 26 a 31), a falsificação de documentos constitui, “não a falsificação do documento enquanto objeto que incorpora uma declaração, mas a falsificação da declaração enquanto documento”, podendo assumir a forma de falsificação  material ou falsificação ideológica. Na falsificação material o documento não é genuíno, aqui se inscrevendo, no que ora releva, a conduta definida na alínea a) do n.º 1 do supra identificado artigo. Na falsificação ideológica o documento é inverídico, “o teor da declaração documentado não espelha a verdade”, distinguindo-se, dentro desta categoria, a falsificação intelectual, que existirá quando a declaração documentada não corresponde à declaração prestada, e a falsidade em documento, que se verificará com a narração de um facto falso juridicamente relevante, aqui se inscrevendo a conduta descrita na alínea d) do n.º 1 do mesmo artigo.
    Considerando os tipos de falsificação documental e por relevar para a delimitação do respetivo campo de aplicação, importa distinguir entre documentos dispositivos e documentos narrativos. Os primeiros, porquanto apenas representam uma declaração de vontade do seu autor, só podem ser objeto de falsificação material, enquanto os documentos narrativos, consubstanciando a narração, atestação ou certificação de factos, admitem qualquer das duas modalidades de falsificação- material e ideológica.
    O bem jurídico protegido pelo crime de falsificação de documento é a segurança e credibilidade no tráfico jurídico-probatório, no que respeita à prova documental.
    No caso, considerando os factos acusados é de afastar o preenchimento da alínea a) do n.º 1 do artigo 256.º do Código Penal.
    Esta alínea criminaliza as “ações de contrafação de documento, aquelas através das quais seja forjado um novo documento-objeto contendo um novo documento-declaração” (ob. cit., p. 32).
    Um documento será genuíno se cumprir a sua função de garantia, isto é, se provir da pessoa que nele figura como seu autor, havendo coincidência entre o seu ator aparente e o seu autor real (e sem que o mesmo tenha sido posteriormente alterado).
    Assim, em regra, um documento fabricado ou elaborado não será falso no sentido acolhido pela referida alínea a) se, não obstante narrar factos desconformes com a realidade ou manifestar uma vontade desconforme com a vontade real, der a conhecer a real identidade do seu emitente.
    No caso, percorrendo os factos da acusação, em lado algum é alegada a existência de um qualquer desfasamento entre a real autoria da declaração e a pessoa que os documentos dão a perceber como sendo o seu emitente, o que tanto basta para concluir pelo não preenchimento do tipo objetivo de ilícito previsto na alínea a) do n.º 1 do artigo 256.º do Código Penal.
    Vejamos então se se mostra preenchida a alínea d) da referida disposição legal, que “criminaliza a falsidade ideológica, realizada por funcionários ou particulares, consubstanciada na emissão de uma declaração de conteúdo falso relativa a um facto juridicamente relevante, num documento genuíno” (ob cit., p. 42-43).
    A declaração relevante deverá referir-se a factos, e não a manifestações de vontade, pelo que só relevam para o preenchimento da alínea em análise os documentos narrativos, e não os documentos dispositivos. E tais factos deverão ser juridicamente relevantes, designadamente, por serem aptos a constituir, modificar ou extinguir uma relação jurídica.
    In casu, considerando a matéria em causa nos autos, cumpre salientar a diferença entre a falsificação ideológica de um documento e a simulação, não sendo esta última incriminada no nosso atual ordenamento jurídico-penal.
    Conforme bem aponta o Acórdão do Tribunal da Reação de Coimbra de 12.07.2006, Processo n.º 1923/06 [proferido antes da revisão do Código Penal de 2007, data em que a atual alínea d) correspondia à alínea b)]:
    «A simulação em negócio constitui realidade conceptual distinta da falsidade de documento.“A falsidade nada tem a ver com o negócio jurídico realizado, e supõe sempre, ou uma desarmonia entre a declaração e o que consta do documento (falsidade intelectual) ou uma suposição ou viciação do próprio documento (falsidade material), enquanto que a simulação (divergência entre vontade real e declarada) incide sobre o próprio acto jurídico; e é anterior cronológica e logicamente à manifestação de vontade. Pode, portanto, uma escritura falsa dizer respeito a um acto simulado e uma escritura não falsa conter acto simulado” - Pires de Lima/Antunes Varela, Noções Fundamentais de Direito Civil, Vol. I, Coimbra, 1961, p. 334, em conformidade com a doutrina dominante.A simulação constitui um vício interno dos actos jurídicos, contrariamente à falsificação, que é um vício externo do acto jurídico, pois verifica-se em relação ao próprio título escrito. A falsidade só se corporiza durante a feitura do documento enquanto a simulação, sendo um desencontro intencional entre a vontade declarada e a vontade real, existe antes da feitura ou outorga do documento.A simulação diz respeito à divergência entre a vontade real e a declarada, sendo o documento que a incorpora verdadeiro porque retrata a declaração em si. Não constitui uma declaração de facto falso, mas uma declaração de vontade falsa. Não diz respeito ao documento que titula o negócio, mas ao conteúdo do negócio. Podendo dizer-se que a simulação ofende a verdade moral mas não a fé pública, como sucede com a falsidade.»
    Assim também o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 11.09.2013, Processo n.º 5/07.0TELSB.L1-3: «A diferença e a incompatibilidade entre as duas figuras eram já apontadas por Cavaleiro de Ferreira [In «Depósito Bancário. Simulação. Falsificação. Burla.», in «Scientia Iuridica», Tomo XIX, 1970, p. 246 e seguintes] ainda na vigência do Código Penal de 1886, diploma que incriminava, enquanto crime patrimonial, a simulação [Ver artigo 455.º do Código Penal de 1886].
     Dizia este ilustre Professor que (…) «Documento narrativo é uma declaração de ciência, de verdade; documento dispositivo é uma declaração de vontade. O primeiro atesta ou certifica um “facto”, o segundo declara uma vontade. Ora, a falsidade ideológica traduz-se numa mentira, e mente-se quando se atesta ou certifica. Quando se declara inexactamente a própria vontade, simula-se. Nos documentos narrativos tem lugar a falsidade ideológica; nos documentos dispositivos, só a simulação, em que não há divergência entre a declaração e a verdade, mas entre a declaração e a vontade» [páginas 297 e 298].
    Este mesmo entendimento veio a ser sustentado, já no domínio do novo Código Penal, pelos Professores Figueiredo Dias e Costa Andrade que, logo no início da sua vigência, tiveram ocasião de esclarecer que a simulação, quer enquanto tal, quer enquanto modalidade da falsificação de documento, não era incriminada no nosso ordenamento jurídico [in «O legislador de 1982 optou pela descriminalização do crime patrimonial de simulação», Parecer publicado na Colectânea de Jurisprudência, Ano VIII – 1983, Tomo III, p. 19 a 25].»
    A mesma posição foi assumida também por Helena Moniz, na sua tese de mestrado, e tem sido seguida por numerosa jurisprudência.
    (…)
    Na simulação o que é falso não é o facto mas a vontade declarada. Esta é que é desconforme com a vontade real. Na falsidade em documento o que é falso é o facto que se certifica ou atesta.
    Sendo uma factura um documento em que se discriminam as coisas ou os serviços objecto de um negócio jurídico, a sua qualidade e quantidade e o respectivo preço, não se pode deixar de considerar que ela é um documento dispositivo, relativamente ao qual a falsidade em documento não pode existir.
    A vontade declarada nas facturas a que se referem estes autos era desconforme com a vontade real dos intervenientes nos respectivos negócios. Porém, cada uma dessas facturas documenta um contrato simulado, nuns casos uma simulação relativa, noutros casos uma simulação absoluta. Mas não constitui um documento falso no sentido técnico-jurídico do termo.»
    De igual modo,  conforme nos esclarecem Helena Moniz e Nuno Brandão, ob. cit., p. 51: “constituindo a falsidade em documento uma narração de facto falso (juridicamente relevante), é consensual entre nós que nela não se abrange a simulação, dado que lhe é alheia qualquer desconformidade entre o que foi declarado e o que está documentado (…). Na simulação ocorre uma declaração de vontade falsa, mas aquilo que consta do documento é exatamente o que as partes declararam. (…) De acordo com a atual redação do CP, não é possível integrar esta conduta em qualquer tipo legal de crime, pelo que apenas terá relevo ao nível do direito civil”.
    No caso em apreço e considerando os factos constantes da acusação no tocante aos contratos de prestação de serviços e demais declarações que os documentam, ao contrato-promessa de compra e venda de imóvel,  contrato de intermediação e cartas de admissão de incumprimento e perda de sinal, aos contratos justificativos de pagamentos, à compra e venda e subsequente arrendamento de imóvel, não podemos deixar de considerar que as declarações de vontade negocial corporizadas nos referidos escritos consubstanciam documentos dispositivos e, como tal, não admitem falsidade ideológica.
    Em todos estes casos não se verifica qualquer desconformidade entre o que foi declarado e o que está documentado, o que consta dos documentos foi aquilo que os envolvidos declararam; contudo, verifica-se uma divergência entre a vontade declarada e a vontade real, os arguidos quiseram criar uma aparência negocial por forma a justificar transferências monetárias, fingindo celebrar certos negócios jurídicos, quando efetivamente não os quiseram realizar, pelo que não pode haver falsidade ideológica, mas somente simulação.
    Sintomaticamente, repare-se que, em sede de Debate Instrutório, o Ministério Público refere “(…) a existência de um contrato simulado de prestação de alegados serviços, datado de 31 de Julho de 2009, com intervenção da sociedade arguida XLM LDA (…)  contrato simulado de promessa de compra e venda de um imóvel, sem qualquer correspondência com a realidade, com data de 2010 (…)  contrato simulado de prestação de alegados serviços de intermediação, com intervenção da sociedade arguida XLM LDA (…)  contratos de prestação de serviços simulados, celebrados em nome da LEC SA e outras entidades (…) contrato simulado de prestação de serviços, feito produzir, no ano de 2013, com intervenção das sociedades arguidas XLM LDA e LEC SA (…)”.
    Assim, neste particular, porquanto não há quaisquer declarações de facto falso, mas sim declarações de vontade falsas, respeitantes, não ao título escrito, mas ao conteúdo dos negócios e atos jurídicos, é de igual modo de afastar o preenchimento do tipo objetivo de ilícito previsto na alínea d) do n.º 1 do artigo 256.º do Código Penal.
    Consequentemente, mostra-se também afastada a alínea e) da mesma disposição legal, que incrimina o uso de documento “a que se referem as alíneas anteriores”.
    O mesmo não se pode dizer no tocante ao crime de falsificação referente aos relatórios de atividades da XLM, praticado, em coautoria, pelos arguidos BB, GG e NN, relativos ao forjar e utilização da execução do primeiro contrato entre a LEC SA e a XLM, factos ocorridos entre 2011 e 2013.
    Tais relatórios consubstanciam documentos narrativos [o arguido NN diz que esses relatórios eram feitos na decorrência de informações prestadas pelo arguido BB sobre a atividade (inexistente) da sociedade e surgiram por solicitação da AT].
    Contudo, considerando o tempo entretanto decorrido tal crime mostra-se prescrito.
    Com efeito, sendo o mesmo punível com pena de prisão até três anos ou com pena de multa, de acordo com o disposto no artigo 118.º, n.º 1, alínea c), do Código Penal, o prazo de prescrição do respetivo procedimento criminal é de cinco anos. Para além do curso da prescrição poder ser suspenso ou interrompido nas situações previstas, respetivamente, nos artigos 120.º e 121.º do Código Penal, importa ainda considerar o prazo máximo de prescrição do procedimento criminal - que corresponde ao prazo normal da prescrição acrescido de metade desse prazo -, ou seja, o prazo em que, desde o seu início, mas ressalvando o tempo de suspensão, a prescrição do procedimento criminal tem sempre lugar- cfr. n.º 3 do artigo 121.º do Código Penal.
    No caso, considerando como data da prática dos factos a mais tardia, ou seja, 03.07.2013, e ainda que o prazo de 5 anos não tenha decorrido, atendendo à causa de suspensão da prescrição prevista no artigo 120.º, n.º 1, alínea b), do Código Penal e os n.ºs 2 e 6 do mesmo artigo, e as causas de interrupção da prescrição previstas no artigo 121.º, n.º 1, alíneas a) e b), do referido diploma e o n.º 2 do mesmo artigo, mostra-se já decorrido o prazo máximo de prescrição a que alude o n.º 3 do artigo 121.º do mesmo diploma, isto é, o prazo prescricional normal -5 anos-, acrescido de metade -2 anos e 6 meses-, descontado o tempo de suspensão -3 anos-, nos termos do n.º 3 do artigo 120.º do Código Penal, o que se verificou no dia 03.01.2024.
    Mostra-se, assim, prejudicado o conhecimento de todas as questões suscitadas relativas aos crimes de falsificação de documento.

    CONCLUSÃO
    Mantém-se a decisão de não pronúncia relativamente aos crimes supra indicados, embora por outros motivos.
    Relativamente ao crime respeitante aos relatórios de actividades da XLM, cujo procedimento criminal  foi declarado prescrito , mantém-se a decisão de não pronúncia.
    Não obstante a não pronúncia, os factos serão mantidos nesta decisão porque relevantes para contextualizar a actuação dos arguidos, designadamente no que toca aos crimes de branqueamento.        
    *
    1.5.10 Dos crimes de fraude fiscal
    No que ora releva, recorde-se que foi deduzida acusação pelos seguintes crimes de fraude fiscal:
    - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS apurado quanto aos anos de 2006 a 2009, em co-autoria com o arguido BB, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alíneas a), b) e c) e 104°, n.º 1, alíneas d), e) e f) do RGIT;
    - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS apurado quanto aos anos de 2009 a 2012, em co-autoria com os arguidos GG, BB, Lena Engenharia e Construções, SA e XLM- Sociedade de Estudos e Projetos, Lda., p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alíneas a), b) e c) e 104°, n.º 1, alíneas d), e) e f) e n.° 2 do RGIT, atualmente n.° 2, alínea a), do artigo 104.° do RGIT;
    - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS apurado quanto aos anos de 2013 a 2015, em co-autoria com os arguidos GG, BB, Lena Engenharia e Construções, SA e XLM- Sociedade de Estudos e Projetos, Lda., p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alíneas a), b) e c) e 104°, n.º 1, alíneas d) e e), n.° 2, alínea a), e n.º 3 do RGIT;
    - Um crime de fraude fiscal, praticado e de que foi beneficiário BB, no que tange ao IRS apurado quanto aos anos de 2010 e 2011, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alíneas a) e b) do RGIT;
    - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário CC, no que tange ao IRS apurado quanto ao ano de 2011, em co-autoria com o arguido SS, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alíneas a), b) e c) e 104°, n.º 1, alíneas d), e) e f) do RGIT;
    - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário RR, no que tange ao IRS apurado quanto ao ano de 2007, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alíneas a), b) e c) e 104°, n.º 1, alíneas d), e) e f) do RGIT;
    - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário RR, no que tange ao IRS apurado quanto ao ano de 2011, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alíneas a), b) e c) e 104°, n.º 1, alíneas d), e) e f) do RGIT;
    - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário SS, no que tange ao IRS apurado quanto ao ano de 2007, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alíneas a), b) e c) e 104°, n.º 1, alíneas d), e) e f) do RGIT;
    - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário SS, no que tange ao IRS apurado quanto aos anos de 2010 a 2012, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alíneas a), b) e c) e 104°, n.º 1, alíneas d), e) e f) do RGIT;
    - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário DD, no que tange ao IRS apurado quanto aos anos de 2005 a 2008, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alíneas a) e b) e 104°, n.º 1, alíneas d) e f) do RGIT;
    - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário DD, no que tange ao IRS apurado quanto ao ano de 2008, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alíneas a) e b) e 104°, n.º 1, alíneas d) e f) do RGIT;
    - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário FF, no que tange ao IRS apurado quanto ao ano de 2009, em co-autoria com os arguidos Vale do Lobo Resort Turístico de Luxo, SA, e Oceano Clube Empreendimentos Turísticos do Algarve, SA, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alíneas a), b) e c) e 104°, n.º 1, alíneas d) e g) do RGIT;
    - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário EE, no que tange ao IRS apurado quanto ao ano de 2009, em co-autoria com os arguidos Vale do Lobo Resort Turístico de Luxo, SA, e Oceano Clube Empreendimentos Turísticos do Algarve, SA, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alíneas a), b) e c) e 104°, n.º 1, alíneas d) e g) do RGIT;
    - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário HH, no que tange ao IRS apurado quanto ao ano de 2006, em co-autoria com o arguido CC, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alíneas a), b) e c) e 104°, n.º 1, alíneas d), e), f) e g) do RGIT;
    - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário HH, no que tange ao IRS apurado quanto ao ano de 2010, em co-autoria com o arguido CC, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alíneas a), b) e c) e 104°, n.º 1, alíneas d), e), f) e g) do RGIT;
    - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiária Vale do Lobo Resort Turístico de Luxo, SA, no que tange ao IRC apurado quanto ao ano de 2007, em co-autoria com os arguidos Oceano Clube Empreendimentos Turísticos do Algarve, SA, EE e FF, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alíneas a), b) e c), 104°, n.º 1, alíneas d) e g), e 7º do RGIT;
    - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiária Pepelan- Consultoria e Gestão, SA, no que tange ao IRC apurado quanto ao ano de 2008, em co-autoria com o arguido EE, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alíneas a), b) e c) e 104°, n.º 1, alíneas d) e f) do RGIT.
    Na Decisão instrutória, o Sr. Juiz “a quo” procedeu a prévia alteração da qualificação jurídica dos factos descritos na acusação, considerando que tal factualidade é susceptível de preencher a prática dos seguintes crimes fraude fiscal:
    1) - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2006, em co-autoria com o arguido BB, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alíneas a), b) e c) e 104°, n.º 1, alíneas d), e) e f) do RGIT;
    2) - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2007, em co-autoria com o arguido BB, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alíneas a), b) e c) e 104°, n.º 1, alíneas d), e) e f) do RGIT;
    3) - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2008, em co-autoria com o arguido BB, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alíneas a), b) e c) e 104°, n.º 1, alíneas d), e) e f) do RGIT;
    4) - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2009, em co-autoria com os arguidos BB, GG, Lena Engenharia e Construções, SA e XLM- Sociedade de Estudos e Projetos, Lda., p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alíneas a), b) e c) e 104°, n.º 1, alíneas d), e) e f) do RGIT;
    5) - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2010, em co-autoria com os arguidos BB, GG, Lena Engenharia e Construções, SA e XLM- Sociedade de Estudos e Projetos, Lda., p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alíneas a), b) e c) e 104°, n.º 1, alíneas d), e) e f), e n.° 2 do RGIT;
    6) - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2011, em co-autoria com os arguidos BB, GG, Lena Engenharia e Construções, SA e XLM- Sociedade de Estudos e Projetos, Lda., p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alíneas a), b) e c) e 104°, n.º 1, alíneas d), e) e f), n.° 2, alínea a), e n.º 3 do RGIT;
    7) - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2012, em co-autoria com os arguidos BB, GG, Lena Engenharia e Construções, SA e XLM- Sociedade de Estudos e Projetos, Lda., p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alíneas a), b) e c) e 104°, n.º 1, alíneas d), e) e f), n.° 2, alínea a), e n.º 3 do RGIT;
    8) - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2013, em co-autoria com os arguidos BB, GG, Lena Engenharia e Construções, SA e XLM- Sociedade de Estudos e Projetos, Lda., p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alíneas a), b) e c) e 104°, n.º 1, alíneas d), e) e f), n.° 2, alínea a), e n.º 3 do RGIT;
    9) - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2014, em co-autoria com os arguidos BB, GG, Lena Engenharia e Construções, SA e XLM- Sociedade de Estudos e Projetos, Lda., p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alíneas a), b) e c) e 104°, n.º 1, alíneas d), e) e f), n.° 2, alínea a), e n.º 3 do RGIT;
    10) - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2015, em co-autoria com os arguidos BB, GG, Lena Engenharia e Construções, SA e XLM- Sociedade de Estudos e Projetos, Lda., p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alíneas a), b) e c) e 104°, n.º 1, alíneas d), e) e f), n.° 2, alínea a), e n.º 3 do RGIT;
    11) - Um crime de fraude fiscal, praticado e de que foi beneficiário BB, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2010, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alínea a), do RGIT;
    12) - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário BB, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2011, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alínea a), e 104.º, n.º 3, do RGIT;
    13) - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário CC, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2011, em co-autoria com o arguido SS, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alíneas a), b) e c) e 104°, n.º 1, alíneas d), e) e f), e n.º 3 do RGIT;
    14) - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário RR, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2007, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alíneas a), b) e c) e 104°, n.º 1, alíneas d), e) e f) do RGIT;
    15) - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário RR, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2011, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alíneas a), b) e c) e 104°, n.º 1, alíneas d), e) e f), e n.º 3 do RGIT;
    16) - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário SS, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2007, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alíneas a), b) e c) e 104°, n.º 1, alíneas d), e) e f) do RGIT;
    17) - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário SS, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2010, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alíneas a), b) e c) e 104°, n.º 1, alíneas d), e) e f) do RGIT;
    18) - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário SS, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2011, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alíneas a), b) e c) e 104°, n.º 1, alíneas d), e) e f), e n.º 3 do RGIT;
    19) - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário SS, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2012, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alíneas a), b) e c) e 104°, n.º 1, alíneas d), e) e f), e n.º 3 do RGIT;
    20) - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário DD, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2005, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alíneas a) e b) e 104°, n.º 1, alíneas d) e f) do RGIT;
    21) - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário DD, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2006, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alíneas a) e b) e 104°, n.º 1, alíneas d) e f) do RGIT;
    22) - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário DD, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2007, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alíneas a) e b) e 104°, n.º 1, alíneas d) e f) do RGIT;
    23) - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário DD, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2008, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alíneas a) e b) e 104°, n.º 1, alíneas d) e f) do RGIT;
    24) - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário FF, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2009, em coautoria com os arguidos Vale do Lobo Resort Turístico de Luxo, SA, e Oceano Clube Empreendimentos Turísticos do Algarve, SA, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alíneas a), b) e c) e 104°, n.º 1, alíneas d) e g) do RGIT;
    25) - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário EE, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2009, em coautoria com os arguidos Vale do Lobo Resort Turístico de Luxo, SA, e Oceano Clube Empreendimentos Turísticos do Algarve, SA, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alíneas a), b) e c) e 104°, n.º 1, alíneas d) e g) do RGIT;
    26) - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário HH, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2006, em coautoria com o arguido CC, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alíneas a), b) e c) e 104°, n.º 1, alíneas d), e), f) e g) do RGIT;
    27) - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário HH, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2010, em coautoria com o arguido CC, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alíneas a), b) e c) e 104°, n.º 1, alíneas d), e), f) e g) do RGIT;
    28) - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiária Vale do Lobo Resort Turístico de Luxo, SA, no que tange ao IRC relativo aos rendimentos do ano de 2007, em co-autoria com os arguidos Oceano Clube Empreendimentos Turísticos do Algarve, SA, EE e FF, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alíneas a), b) e c), 104°, n.º 1, alíneas d) e g), e 7º do RGIT;
    29) - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiária Pepelan- Consultoria e Gestão, SA, no que tange ao IRC relativo aos rendimentos do ano de 2008, em co-autoria com o arguido EE, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alíneas a), b) e c) e 104°, n.º 1, alíneas d) e f) do RGIT.
    Reitera-se que, por mero lapso material, não ficou a constar do dispositivo da decisão recorrida os crimes supra referidos sob os n.ºs 11 e 12, praticados e de que foi beneficiário BB, declarados não pronunciados a fls. 3237 dessa decisão.
    Relativamente a todos os referidos crimes foi proferida decisão de não pronúncia, com fundamento em sete grandes grupos de questões controvertidas, tendo em conta o objecto do recurso delimitado pelas conclusões extraídas pelo recorrente:

    DA UNIDADE OU PLURALIDADE DE INFRACÇÕES
    DA QUALIFICAÇÃO DOS CRIMES
    DA PRESCRIÇÃO DO PROCEDIMENTO CRIMINAL
    DO DEVER JURÍDICO-TRIBUTÁRIO DE DECLARAÇÃO DE RENDIMENTOS DE PROVENIÊNCIA ILÍCITA:
    DO PREENCHIMENTO DOS PRESSUPOSTOS CONTIDOS NAS NORMAS DE INCIDÊNCIA APLICÁVEIS AOS RENDIMENTOS EM CAUSA
    QUANTO AO ARGUIDO HH, DA OBTENÇÃO DOS RENDIMENTOS EM CAUSA EM TERRITÓRIO PORTUGUÊS
    DA (NÃO) VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO “NEMO TENETUR SE IPSUM ACCUSARE”
    DA RESPONSABILIDADE DAS PESSOAS COLECTIVAS
    DA CO-AUTORIA
    DOS INDÍCIOS
    Conforme já referido, por forma a evitar repetições desnecessárias, apreciar-se-ão as questões enunciadas, reunindo em cada uma todos os crimes em que as mesmas foram suscitadas.
    Cumpre aqui recordar que o Recorrente aceitou a decisão de extinção do procedimento criminal, por prescrição, relativamente ao arguido RR, pelo crime de fraude fiscal, de que foi beneficiário, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2007, e aos arguidos Vale do Lobo Resort Turístico de Luxo, SA, Oceano Clube Empreendimentos Turísticos do Algarve, SA, EE e FF, pelo crime de fraude fiscal, de que foi beneficiária a primeira arguida, no que tange ao IRC relativo aos rendimentos do ano de 2007, ambos p. e p. pelo artigo 103.º, n.º 1, alínea a), do RGIT.  
    Os artigos 103.º e 104.º do Regime Geral das Infracções Tributárias (doravante RGIT), aprovado pela Lei n.º 15/2001, de 05.06, na sua versão original, tinham a seguinte redacção:
    Artigo 103.º
    Fraude
    1 - Constituem fraude fiscal, punível com pena de prisão até três anos ou multa até 360 dias, as condutas ilegítimas tipificadas no presente artigo que visem a não liquidação, entrega ou pagamento da prestação tributária ou a obtenção indevida de benefícios fiscais, reembolsos ou outras vantagens patrimoniais susceptíveis de causarem diminuição das receitas tributárias. A fraude fiscal pode ter lugar por:
    a) Ocultação ou alteração de factos ou valores que devam constar dos livros de contabilidade ou escrituração, ou das declarações apresentadas ou prestadas a fim de que a administração fiscal especificamente fiscalize, determine, avalie ou controle a matéria colectável;
    b) Ocultação de factos ou valores não declarados e que devam ser revelados à administração tributária;
    c) Celebração de negócio simulado, quer quanto ao valor, quer quanto à natureza, quer por interposição, omissão ou substituição de pessoas.
    2 - Os factos previstos nos números anteriores não são puníveis se a vantagem patrimonial ilegítima for inferior a (euro) 7500.
    3 - Para efeitos do disposto nos números anteriores, os valores a considerar são os que, nos termos da legislação aplicável, devam constar de cada declaração a apresentar à administração tributária.
    Artigo 104.º
    Fraude qualificada
    1 - Os factos previstos no artigo anterior são puníveis com prisão de um a cinco anos para as pessoas singulares e multa de 240 a 1200 dias para as pessoas colectivas quando se verificar a acumulação de mais de uma das seguintes circunstâncias:
    a) O agente se tiver conluiado com terceiros que estejam sujeitos a obrigações acessórias para efeitos de fiscalização tributária;
    b) O agente for funcionário público e tiver abusado gravemente das suas funções;
    c) O agente se tiver socorrido do auxílio do funcionário público com grave abuso das suas funções;
    d) O agente falsificar ou viciar, ocultar, destruir, inutilizar ou recusar entregar, exibir ou apresentar livros, programas ou ficheiros informáticos e quaisquer outros documentos ou elementos probatórios exigidos pela lei tributária;
    e) O agente usar os livros ou quaisquer outros elementos referidos no número anterior sabendo-os falsificados ou viciados por terceiro;
    f) Tiver sido utilizada a interposição de pessoas singulares ou colectivas residentes fora do território português e aí submetidas a um regime fiscal claramente mais favorável;
    g) O agente se tiver conluiado com terceiros com os quais esteja em situação de relações especiais.
    2 - A mesma pena é aplicável quando a fraude tiver lugar mediante a utilização de facturas ou documentos equivalentes por operações inexistentes ou por valores diferentes ou ainda com a intervenção de pessoas ou entidades diversas das da operação subjacente.
    3 - Os factos previstos nas alíneas d) e e) do n.º 1 do presente preceito com o fim definido no n.º 1 do artigo 103.º não são puníveis autonomamente, salvo se pena mais grave lhes couber.
    Entretanto, tais preceitos sofreram as seguintes alterações, que presentemente se mostram em vigor:
    (i) No que se refere ao artigo 103.º, por virtude da Lei n.º 60-A/2005, de 30.12, o valor constante no seu nº 3 passou para 15.000 euros;
    (ii) E, no que concerne ao artigo 104.º, por virtude das alterações introduzidas pela Lei n.º 64-B/2011, de 30.12, que entrou em vigor em 01.01.2012, os seus n.ºs 2 e 3 passaram a ter a seguinte redacção (passando o n.º 3 a n.º 4):
    2 - A mesma pena é aplicável quando:
    a) A fraude tiver lugar mediante a utilização de facturas ou documentos equivalentes por operações inexistentes ou por valores diferentes ou ainda com a intervenção de pessoas ou entidades diversas das da operação subjacente; ou
    b) A vantagem patrimonial for de valor superior a (euro) 50 000.
    3 - Se a vantagem patrimonial for de valor superior a (euro) 200 000, a pena é a de prisão de 2 a 8 anos para as pessoas singulares e a de multa de 480 a 1920 dias para as pessoas colectivas.
    Bem sabendo que o crime de fraude fiscal levanta diversas questões de categorização, que levaram a uma multiplicidade de tomada de posições na doutrina e na jurisprudência e, não cabendo aqui levar a efeito um estudo aturado desta incriminação, cumpre tão-somente analisar os elementos típicos relevantes deste tipo legal de crime
    Partindo do entendimento consensual de que o dano não é elemento autónomo do tipo legal, acompanhamos a posição doutrinária e jurisprudencial que defende que o crime de fraude fiscal constitui um crime de perigo na modalidade de crime de aptidão (vd., entre outros, Susana Aires de Sousa, Os crimes Fiscais – Análise Dogmática e Reflexão sobre a Legitimidade do Discurso Criminalizador, Coimbra Editora, 2006, pp. 73 a 75; Rui Correia Marques, O Crime de Fraude Fiscal no Ordenamento Jurídico Português: 30 anos depois, Criminalia, 2022, pp. 29-30 e Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 17.04.2012, Processo n.º 76/05.41DFAR.E1).
    Situa-se numa zona intermédia entre os crimes de perigo abstracto e os crimes de perigo concreto, porquanto, para a consumação do crime, não basta um mero perigo abstracto de produção de um dano ao bem jurídico, mas também não se exige que o bem jurídico seja exposto a um perigo concreto.
    Da análise do tipo retira-se que o legislador, não exigindo a verificação concreta de uma situação de perigo, também não se limita a tipificar as condutas perigosas, antes acrescentando «à estrutura típica um quid adicional, uma necessidade de formulação de um juízo adicional de susceptibilidade/idoneidade/aptidão de tais condutas para perigar o conjunto das receitas fiscais». «No crime em apreço, o legislador antecipou a tutela penal ao momento em que as condutas ilegítimas tipificadas se podem considerar susceptíveis, idóneas ou aptas a causar o dano, sem que o tipo exija a materialização desse perigo»- Rui Correia Marques (ob. e pp. cit).
    O bem jurídico tutelado pela incriminação em causa é complexo, visando-se a protecção do património fiscal do Estado e, complementarmente, dos princípios de verdade e transparência fiscal. O bem jurídico será, assim, violado por via do incumprimento dos deveres de colaboração que recaem sobre os sujeitos passivos da relação jurídica-tributária susceptíveis de causar lesão ao património do Estado pela diminuição das receitas tributárias.
    Assim, e no que respeita ao tipo objectivo do crime de fraude fiscal, exige-se o preenchimento de uma das condutas previstas no tipo e a susceptibilidade de causar diminuição das receitas tributárias.
    Sob o ponto de vista subjectivo, trata-se de crime doloso, que pode ser cometido em qualquer das modalidades previstas no artigo 14.º do Código Penal.
    Nas diversas alíneas do n.º 1 do artigo 103.º do RGIT constam, taxativamente, as modalidades típicas da conduta criminosa, o que significa que o crime de fraude fiscal deve ser classificado como um crime execução vinculada.
    No caso, o Sr. Juiz “a quo” subsumiu a actuação dos arguidos na modalidade de ocultação referida na alínea a) do n.º 1 do artigo 103.º do RGIT (afastando as alíneas b) e c) indicadas na acusação), e também na alínea c) da mesma disposição legal quanto ao crime de que foi beneficiária Pepelan- Consultoria e Gestão, SA, (afastando a alínea b) indicada na acusação),  o que não foi posto em causa pelo recorrente e não suscita qualquer reparo por este Tribunal.
    É controversa a questão de saber se, estando em causa tal modalidade típica, a conduta reveste a forma de acção ou omissão. Para Germano Marques da Silva, «a ocultação de factos a que se refere a alínea a) do n.º 1 do art. 103.º não constitui uma conduta omissiva, mas uma acção.» (“Direito Penal Tributário”, 2.ª edição revista e ampliada, UCP, p. 232). Sentido divergente defende Susana Aires de Sousa, afirmando que a fraude por omissão tem lugar, não só na previsão da alínea b), mas também quando o agente oculta factos ou valores que devem constar dos livros de contabilidade ou escrituração, ou das declarações apresentadas ou prestadas à administração tributária- alínea a) (ob. cit., p. 82)
    Vejamos as questões suscitadas:

    1.5.10.1 DA UNIDADE OU PLURALIDADE DE INFRACÇÕES
    Esta questão tem relevância relativamente aos crimes de que foram beneficiários os arguidos AA, BB e SS. Quanto aos crimes de que foi beneficiário arguido DD, o Recorrente aceitou a alteração da qualificação jurídica dos factos levada a cabo pelo Sr. Juiz de Instrução, peticionando a pronúncia do referido arguido por quatro crimes.

    POSIÇÃO SUSTENTADA NA DECISÃO RECORRIDA
    Entendeu o Sr. Juiz “a quo” existirem tantos crimes quanto as condutas omissivas, ou seja, uma por cada ano fiscal, desdobrando, assim e no que ora releva, os crimes imputados na acusação aos arguidos AA, BB e SS. Para tanto, considerou que as condutas omissivas imputadas aos arguidos, traduzidas na ocultação de rendimentos que deveriam constar das declarações de IRS por eles apresentadas, são passíveis de ser enquadradas na alínea a) do n.º 1 do artigo 103.º do RGIT, e que, neste caso, o momento da consumação do crime corresponde à data da apresentação da declaração de IRS perante a AT com os valores omitidos.
    Assim, desdobrou os crimes de que foi beneficiário o arguido AA em dez (e não apenas três), no que tange ao IRS relativo aos rendimentos dos anos de 2006, 2007, 2008, 2009, 2010, 2011, 2012, 2013, 2014 e 2015; os crimes de que foi beneficiário o arguido BB em dois (e não apenas um), no que tange ao IRS relativo aos rendimentos dos anos de 2010 e 2011; e os crimes de que foi beneficiário o arguido SS em quatro (e não apenas dois), no que tange ao IRS relativo aos rendimentos dos anos de 2007, 2010, 2011 e 2012.

    POSIÇÃO SUSTENTADA PELO RECORRENTE
    Nas conclusões de recurso, a propósito deste tema, o Ministério Público defende o entendimento de que, dada a proveniência das importâncias não declaradas à administração fiscal - no caso do arguido AA, importâncias recebidas a título dos três crimes de corrupção passiva que lhe foram imputados; no caso do arguido BB, remuneração auferida pelos serviços prestados ao arguido AA, e no caso do arguido SS, remuneração auferida pela sua actuação no favorecimento dos interesses definidos pelo arguido CC para o Grupo Espírito Santo -  estamos perante uma unidade de desígnio e intenção criminosa em relação à não declaração à administração fiscal das importâncias em causa.

    APRECIANDO
    A regra é a de que, sendo o mesmo preceito objecto de plúrimas violações (ou sendo vários os preceitos violados), haja pluralidade de crimes- cf. artigo 30.º, n.º 1, do Código Penal. Esta pluralidade só fica afastada, no que ora releva, na forma de unificação de condutas como um único crime.
    Assim, à semelhança dos crimes comuns, no âmbito dos crimes fiscais, a regra será verificar-se uma pluralidade de crimes, correspondente a uma pluralidade de resoluções criminosas, tantas quantas as declarações entregues para efeitos de IRS,  com a omissão de parte dos valores recebidos, a não ser que a conduta do agente resulte de um só propósito volitivo inicial, que se mantém uniforme, não obstante a repetição da materialidade, caso em que se verifica um único crime.
    Assim e quanto aos crimes de que foi beneficiário o arguido AA, nada impedia que as várias omissões verificadas nas declarações de IRS apresentadas pelo referido arguido relativas a cada um dos anos, no período compreendido entre 2006 e 2015, tivessem sido presididas por três resoluções criminosas verificadas em função, segundo alega o Recorrente, de cada um dos três crimes de corrupção passiva imputados ao arguido, sendo, nos termos da acusação, um “com referência a actos praticados no interesse do Grupo Lena entre 2005 e 2011”, outro “com referência a actos praticados no interesse do arguido CC, relativamente a negócios do Grupo Portugal Telecom e GES” e o último “com referência a actos praticados no interesse dos arguidos EE e FF com utilização das sociedades do Grupo Vale do Lobo”.
    Contudo, se assim fosse, mostra-se ininteligível o agrupamento das condutas “no que tange ao IRS apurado quanto aos anos de 2006 a 2009” num único primeiro crime, as condutas “no que tange ao IRS apurado quanto aos anos de 2009 a 2012” num único segundo crime e as condutas “no que tange ao IRS apurado quanto aos anos de 2013 a 2015” num único terceiro crime.
    Com efeito, de acordo com a acusação, os pagamentos realizados ao arguido AA pelo Grupo Espírito Santo ocorreram nos anos de 2006, 2007, 2008, 2009, 2011, 2012, 2013, 2014 e 2015; pelo Grupo Lena verificaram-se em 2007, 2008, 2009, 2010, 2011, 2012, 2013 e 2014; e pelo Grupo Vale do Lobo em 2008 (cf. artigos 13.010 e 13.020 a 13.422 da acusação).  Tanto basta para se afastar a alegada correspondência entre a “proveniência das importâncias” e a “unidade de desígnio e intenção criminosa em relação à não declaração à administração fiscal das importâncias em causa” e a verificação de três crimes de fraude fiscal nos termos pretendidos pelo recorrente.
    De qualquer modo, e acima de tudo, não resulta da acusação, em especial dos n.ºs 13.874 a 13.947, que, relativamente a cada um dos três períodos (2006 a 2009, 2009 a 2012 e 2013 a 2015), tenha havido uma única resolução criminosa inicial, traduzindo cada uma das omissões de declaração para efeitos de IRS, relativas a cada ano fiscal em cada período em causa, «um mero explodir mais ou menos automático, de uma mesma carga volitiva integrada num único projecto volitivo, inicial, que se mantém uniforme, não obstante a repetição da materialidade» (cf. Eduardo Correia, Unidade e Pluralidade de Infracções, pp.96-97).
    O mesmo se diga no tocante aos crimes de que foram beneficiários os arguidos BB e SS. Também relativamente a estes arguidos não resulta da acusação, em especial dos n.ºs 13.948 a 13.955 e 13.956 a 13.975, que tenham actuado em execução de um único propósito criminoso quando procederam à entrega das declarações para efeitos de IRS em cada ano fiscal.
    Concluímos, assim, pela existência de uma pluralidade de resoluções autónomas, em que cada declaração fraudulenta apresentada para efeitos de IRS corresponde a uma manifestação de vontade dos arguidos em ocultar valores que deveriam revelar à administração tributária, visando o não pagamento do respectivo imposto, com a consequente diminuição das receitas tributárias.
    Assim, e relativamente a este ponto, julgando-se improcedente o recurso, nada há a censurar à qualificação jurídica efectuada na decisão recorrida, mantendo-se o desdobramento dos crimes de que foi beneficiário o arguido AA em dez (e não apenas três), no que tange ao IRS relativo aos rendimentos dos anos de 2006, 2007, 2008, 2009, 2010, 2011, 2012, 2013, 2014 e 2015; dos crimes de que foi beneficiário o arguido BB em dois (e não apenas um), no que tange ao IRS relativo aos rendimentos dos anos de 2010 e 2011; e dos crimes de que foi beneficiário o arguido SS em quatro (e não apenas dois), no que tange ao IRS relativo aos rendimentos dos anos de 2007, 2010, 2011 e 2012.

    1.5.10.2 DA QUALIFICAÇÃO DOS CRIMES
    Esta questão tem relevância no que respeita a todos os supra enunciados crimes ainda em causa, à excepção daqueles em que foi beneficiário o arguido BB.

    POSIÇÃO SUSTENTADA NA DECISÃO RECORRIDA
    Entendeu o Sr. Juiz “a quo” que, considerando a factualidade constante da acusação e a versão do artigo 104.º do RGIT à data dos factos, não se mostravam verificadas as seguintes circunstâncias qualificativas previstas no referido artigo 104.º, n.º 1:
    - no tocante aos crimes de que foi beneficiário o arguido AA, as alíneas d) e e) e ainda a alínea f) em relação às declarações de IRS relativas aos rendimentos dos anos de 2010, 2012, 2013, 2014 e 2015 (apenas se considerou verificada a alínea f) quanto às declarações de IRS relativas aos rendimentos dos anos de 2006, 2007, 2008, 2009 e 2011);
    - relativamente aos crimes de que foi beneficiário o arguido HH, as alíneas d), e) e g) (apenas se considerou verificada a alínea f) que lhe foi imputada)
    - quanto ao crime de que foi beneficiário o arguido RR, as alíneas d) e e) e ainda a alínea f) em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2011 no tocante ao montante de € 10.000.000,00, (apenas se considerou verificada a alínea f) relativamente à declaração de IRS referente ao rendimento de 2011 quanto ao montante de € 8.500.000,00);
    - em relação aos crimes de que foi beneficiário arguido SS, as alíneas d) e e) e ainda a alínea f) em relação às declarações de IRS relativas aos rendimentos dos anos de 2011  e 2012, quanto ao montante de € 10.000.000,00, (apenas se considerou verificada a alínea f) relativamente às declarações de IRS referentes aos rendimentos de 2007 e 2010 quanto ao montante de € 9.967.907,00);
    - no tocante aos crimes de que foi beneficiário  o arguido DD, a alínea d) (não se conheceu da alínea f) que lhe foi imputada); e
    - quanto aos crimes de que foram beneficiários os arguidos FF e EE, as alíneas d) e g) e quanto ao crime de que foi beneficiária Pepelan- Consultoria e Gestão, SA, a alínea d) (apenas se considerou verificada a alínea f) que lhe foi imputada).
     Assim, atendendo a que o n.º 1 do artigo 104.º do RGIT exige, para a qualificação da fraude fiscal, a acumulação de mais de uma das circunstâncias aí previstas, concluiu o tribunal a quo que os factos descritos na acusação são susceptíveis de preencher a prática de crimes de fraude fiscal, nos seguintes termos:
    - No tocante aos crimes de que foi beneficiário o arguido AA:
     1- Um crime de fraude fiscal p e p pelo artigo 103°, n° 1, alínea a), do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2006, consumado no dia 28.03.2007;
    2- Um crime de fraude fiscal p e p pelo artigo 103°, n° 1, a alínea a), do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2007, consumado no dia 11.04.2008;
    3- Um crime de fraude fiscal p e p pelo artigo 103°, n° 1, a alínea a), do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2008, consumado no dia 08.04.2009;
    4- Um crime de fraude fiscal p e p pelo artigo 103°, n° 1, a alínea a), do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2009, consumado no dia 13.04.2010;
    5- Um crime de fraude fiscal qualificada p e p pelos artigos 103°, n° 1, alínea a), e 104°, n° 2, do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2010, consumado no dia 12.04.2011;
    6- Um crime de fraude fiscal qualificada p e p pelos artigos 103°, n° 1, alínea a), e 104°, n° 2, alínea a), do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2011, consumado no dia 16.04.2012;
    7- Um crime de fraude fiscal qualificada p e p pelos artigos 103°, n° 1, alínea a), e 104°, n° 2, alínea a), e n° 3, do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2012, consumado no dia 08.01.2014;
    8- Um crime de fraude fiscal qualificada p e p pelos artigos 103°, n° 1, alínea a), e 104°, n° 2, alínea a), e n° 3, do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2013, consumado no dia 31.12.2014;
    9- Um crime de fraude fiscal qualificada p e p pelos artigos 103°, n° 1, alínea a), e 104°, n° 2, alínea a), e n° 3 do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2014, consumado no dia 08.09.2015; e
    10- Um crime de fraude fiscal qualificada p e p pelos artigos 103°, n° 1, alínea a), e 104°, n° 2, alínea a), e n° 3 do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2015, consumado em Abril de 2016.
    Na sequência do decidido, o Sr. Juiz declarou extinto o procedimento criminal, por prescrição, quanto aos primeiros quatro dos dez crimes que apontou- os crimes de fraude fiscal consumados em 2007, 2008, 2009 e 2010.
    - Relativamente aos crimes de que foi beneficiário HH:
    1- Um crime de fraude fiscal p e p pelo artigo 103°, n° 1, alínea a), do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2006, consumado no dia 25.05.2007; e
    2- Um crime de fraude fiscal p e p pelo artigo 103°, n° 1, alínea a), do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2010, consumado no dia 31.05.2011.
    Consequentemente, o Sr. Juiz declarou extinto, por prescrição, o procedimento criminal, quanto ao primeiro crime de fraude fiscal referido em relação ao arguido HH e quanto aos dois crimes de fraude fiscal em relação ao co-arguido CC.
    - Quanto aos crimes de que foi beneficiário RR:
    1- Um crime de fraude fiscal qualificada p e p pelos artigos 103°, n° 1, alínea a), e 104.º, n.º 3 do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2011, consumado no dia 26.04.2013.
    - Em relação aos crimes de que foi beneficiário SS:
    1- Um crime de fraude fiscal p e p pelo artigo 103°, n° 1, alínea a), do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2007, consumado no dia 17.03.2008;
    2- Um crime de fraude fiscal p e p pelo artigo 103°, n° 1, alínea a), do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2010, consumado no dia 19.04.2011;
    3- Um crime de fraude fiscal qualificada p e p pelos artigos 103°, n° 1, alínea a), e 104.º, n.º 3 do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2011, consumado no dia 26.04.2012; e
    4- Um crime de fraude fiscal qualificada p e p pelos artigos 103°, n° 1, alínea a), e 104.º, n.º 3 do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2012, consumado no dia 17.04.2013.
    Na sequência do decidido, o tribunal recorrido declarou extinto o procedimento criminal, por prescrição, quanto aos dois primeiros crimes (consumados em 2008 e 2011).
    Extraindo as mesmas consequências jurídicas quanto ao crime de que foi beneficiário o arguido CC, entendeu-se que os factos descritos na acusação eram susceptíveis de preencher a prática pelo referido arguido, em co-autoria com o arguido SS, de um crime de fraude fiscal qualificada p e p pelos artigos 103°, n° 1, alínea a), e 104.º, n.º 3 do RGIT, em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2011, consumado no dia 26.04.2012.
    No tocante aos crimes de que foi beneficiário DD:
    1- Um crime de fraude fiscal p e p pelo artigo 103°, n° 1, alínea a), do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2005, consumado no dia 31.03.2006;
    2- Um crime de fraude fiscal p e p pelo artigo 103°, n° 1, alínea a), do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2006, consumado no dia 15.04.2007;
    3- Um crime de fraude fiscal p e p pelo artigo 103°, n° 1, alínea a), do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2007, consumado no dia 22.12.2009; e
    4- Um crime de fraude fiscal p e p pelo artigo 103°, n° 1, alínea a), do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2008, consumado no dia 23.12.2009.
    Na sequência do decidido, o Sr. Juiz declarou extinto o procedimento criminal, por prescrição, quanto aos quatro crimes de fraude fiscal.
    Quanto aos crimes de que foram beneficiários FF, EE e Pepelan- Consultoria e Gestão, SA
    - Um crime de fraude fiscal de que foi beneficiário FF, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alínea a) do RGIT, em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2009, consumado em 28.05.2010;
    - Um crime de fraude fiscal de que foi beneficiário EE, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alínea a), do RGIT, em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2009, consumado em 07.04.2010; e
    - Um crime de fraude fiscal de que foi beneficiária Pepelan- Consultoria e Gestão, SA, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alíneas a) e c), do RGIT, em relação à declaração de IRC relativa aos rendimentos do ano de 2008, consumado em 26.05.2009.
    Na sequência do decidido, o Sr. Juiz declarou extinto o procedimento criminal, por prescrição, em relação aos identificados crimes.

    POSIÇÃO SUSTENTADA PELO RECORRENTE
    O Ministério Público discorda da interpretação feita pelo tribunal “a quo” da norma das alíneas d) e g) do n.º 1 do artigo 104.º do RGIT, defendendo, quanto à primeira, que a agravante em causa abrange todas as situações em que se gerou dolosamente a impossibilidade de reconstituição da situação tributária de um determinado sujeito passivo, integrando-se a omissão de produção de “elementos probatórios exigidos pela lei tributária” na expressão “recusar entregar, exibir ou apresentar”, como é o caso da não emissão pelos arguidos HH, RR, SS, FF e EE de qualquer documento pelo recebimento de todas as quantias em causa, e, quanto à alínea g), que a razão de ser da agravante se encontra na facilidade do cometimento do crime proporcionado pelas relações de domínio da vontade entre sujeitos passivos de imposto, nomeadamente em casos de co-autoria no cometimento do crime em que um dos agentes tem um ascendente sobre a formação de vontade do outro, como é o caso da relação CC/HH, e em especial no quadro do relacionamento entre pessoas físicas e as sociedades em que detém participação ou controlo de administração, como no caso dos arguidos EE e FF e as sociedades Vale do Lobo e Oceano Clube.
    Termina pela pronúncia:
    No tocante aos crimes praticados e de que foi beneficiário AA:
    - Um crime de fraude fiscal qualificada, em co-autoria com o arguido BB, no que tange ao IRS apurado quanto aos anos de 2006 a 2009, p e p pelos artigos 103°, n° 1, alínea a), e 104°, n° 1, alíneas d) e f), do RGIT, na redacção originária;
     - Um crime de fraude fiscal qualificada, em co-autoria com os arguidos GG, BB, Lena Engenharia e Construções, SA, e XLM- Sociedade de Estudos e Projectos, Lda., no que tange ao IRS apurado quanto aos anos de 2009 a 2012, p e p pelos artigos 103°, n° 1, alínea a), e 104°, n°s 1, alíneas d) e f), 2, alínea a), e 3 do RGIT, na sua actual redacção; e
    - Um crime de fraude fiscal qualificada, em co-autoria com os arguidos GG, BB, lena Engenharia e Construções, SA, e XLM- Sociedade de Estudos e Projectos, Lda., no que tange ao IRS apurado quanto aos anos de 2013 a 2015, p e p pelos artigos 103.°, n.° 1, alínea a), e 104.°, n.°s 2, alínea a), e 3 do RGIT, na sua actual redacção.
    Relativamente aos crimes de que foi beneficiário HH, dois crimes de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelos artigos 103.°, n.° 1, alínea a), e 104.°, n.° 1, alíneas d), f) e g), do RGIT.
    Quanto ao crime praticado e de que foi beneficiário RR, um crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelos artigos 103.°, n.° 1, alínea a), e 104.°, n.°s 1, alíneas d) e f), e 3 do RGIT, na sua actual redacção, relativo ao IRS do ano de 2011.
    Em relação aos crimes praticados e de que foi beneficiário o arguido SS:
    - Um crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelos artigos 103.°, n.° 1, alínea a), e 104.°, n.° 1, alíneas d) e f), do RGIT, na sua anterior redacção, relativo ao IRS do ano de 2007; e
    - Um crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelos artigos 103.°, n.° 1, alínea a), e 104.°, n.°s 1, alíneas d) e f), e 3 do RGIT, na sua actual redacção, quanto ao IRS dos anos de 2010 a 2012.
    Em relação ao crime praticado e de que foi beneficiário o arguido CC, um crime de fraude fiscal qualificado, em co-autoria com o arguido SS, p. e p. pelos artigos 103.°, n.º 1, alínea a), e 104.°, n.°s 1, alíneas d) e f), e 3 do RGIT, na sua actual redacção, relativo ao IRS do ano de 2011.
    No tocante aos crimes de que foi beneficiário DD, quatro crimes de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelos artigos 103.°, n.º 1, alínea a), e 104.°, n.° 1, alíneas d) e f), do RGIT.
    Relativamente ao crime de que foi beneficiário FF, um crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelos artigos 103.°, n.° 1, alínea a), e 104.°, n.° 1, alíneas d) e g), do RGIT, e de que foi beneficiário EE, um crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelos artigos 103.°, n.° 1, alínea a), e 104.°, n.° 1, alíneas d) e g), do RGIT,.
    Quanto ao crime de que foi beneficiária Pepelan- Consultoria e Gestão, SA, um crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alíneas a) e c), e 104.º, n.º 1, alíneas d), f) e g) (esta, alterando-se a qualificação jurídica do crime).

    APRECIANDO
    Considerando as conclusões do recurso, cumpre apenas apreciar do preenchimento das seguintes qualificativas do n.º 1 do artigo 104.º do RGIT:
    - no tocante aos crimes de que foi beneficiário o arguido AA, a alínea d) quanto aos crimes de fraude fiscal relativos às declarações de IRS referentes aos rendimentos dos anos de 2006, 2007, 2008 e 2009, que, a verificar-se, dado o preenchimento da alínea f) da mesma disposição legal, impõe a qualificação dos aludidos quatro crimes e a inverificação do decurso do respectivo prazo de prescrição do procedimento criminal;
    - relativamente aos crimes de que foi beneficiário o arguido HH, as alíneas d) e g) em relação aos dois crimes de fraude fiscal, referente às declaração de IRS relativa aos rendimentos dos anos de 2006 e 2010, que, a verificarem-se, considerando ainda o preenchimento da alínea f) da mesma disposição legal, impõe a qualificação dos aludidos dois crimes e a inverificação da prescrição do procedimento criminal declarada;
    - quanto aos crimes de que foi beneficiário o arguido RR, a alíneas d) quanto ao crime de fraude fiscal relativo à declaração de IRS referentes aos rendimentos do ano de 2011 (mostrando-se preenchida a alínea f) da mesma disposição legal);
    - em relação aos crimes de que foi beneficiário o arguido  SS, quanto aos crimes de fraude fiscal referentes às declarações de IRS relativa aos rendimentos dos anos de 2007 e 2010, a alínea d), que, a verificar-se, dado o preenchimento da alínea f) da mesma disposição legal, impõe a qualificação dos aludidos crimes e a inverificação do decurso do respectivo prazo de prescrição do procedimento criminal, e quanto aos crimes de fraude fiscal referentes às declarações de IRS relativa aos rendimentos dos anos de 2011 e 2012, as alíneas d) e f); e ainda quanto ao crime de que foi beneficiário o arguido CC, por ele praticado em co-autoria com SS, as alíneas d) e f);
    - no tocante aos crimes de que foi beneficiário o arguido DD, as alíneas d) e f);
    - quanto aos crimes de que foram beneficiários os arguidos FF e EE, as alíneas d) e g), e quanto ao crime de que foi beneficiária Pepelan- Consultoria e Gestão, SA, a alínea d), que, a verificar-se, dado o preenchimento da alínea f) da mesma disposição legal, impõe a qualificação do aludido crime e a inverificação do decurso do respectivo prazo de prescrição do procedimento criminal. Quanto à peticionada qualificativa prevista na alínea g) no que toca ao último crime referido, vale o que foi dito quanto à ilegitimidade processual por parte do recorrente para, em sede de instrução, requerer a alteração da qualificação jurídica por si realizada na acusação.
    Recorde-se a redacção das alíneas em causa, que não sofreu qualquer alteração legislativa:
    Artigo 104.º
    Fraude qualificada
    1 - Os factos previstos no artigo anterior são puníveis com prisão de um a cinco anos para as pessoas singulares e multa de 240 a 1200 dias para as pessoas colectivas quando se verificar a acumulação de mais de uma das seguintes circunstâncias:
    (…)
    d) O agente falsificar ou viciar, ocultar, destruir, inutilizar ou recusar entregar, exibir ou apresentar livros, programas ou ficheiros informáticos e quaisquer outros documentos ou elementos probatórios exigidos pela lei tributária;
    (…)
    f) Tiver sido utilizada a interposição de pessoas singulares ou colectivas residentes fora do território português e aí submetidas a um regime fiscal claramente mais favorável;
    g) O agente se tiver conluiado com terceiros com os quais esteja em situação de relações especiais. (…).
    Conforme resulta claramente do corpo do n.º 1 do artigo 104.º do RGIT, a qualificação do crime de fraude fiscal exige a “acumulação de mais de uma” das circunstâncias aí previstas, usando-se a chamada técnica de qualificação por adição ou acumulação.
    São circunstâncias qualificativas face ao crime matricial do artigo 103.º do mesmo diploma e que, por isso, fundamentam não só a agravação da punição, como conferem à norma do referido n.º 1 do artigo 104.º uma natureza de especialidade. Assim, a fraude qualificada verifica-se quando duas ou mais circunstâncias previstas no n.º 1 do artigo 104.º do RGIT acrescem às condutas ilegítimas tipificadas no artigo 103.º, n.º 1, do mesmo diploma (vd. Susana Aires de Sousa, ob. cit., pp. 114-115).
    Na previsão da alínea d) estão em causa as situações que consubstanciam crimes de falsificação, destruição ou ocultação de documentos com relevância fiscal, por parte do próprio agente (cf. artigos 255.º a 259.º do Código Penal).
    As condutas tipificadas na referida alínea podem ser anteriores, contemporâneas ou posteriores às declarações que contêm os factos ou valores ocultados ou alterados ou ao prazo do cumprimento da obrigação da sua apresentação à administração tributária; contudo, para a verificação do crime de fraude fiscal, devem ser preordenadas àquela ocultação ou alteração dos factos ou valores (vd. Tolda Pinto e Reis Bravo, Regime Geral das Infracções Tributárias Anotado, 2002, pp. 330-331).
    Ao contrário do defendido pelo Recorrente, entendemos, com o Sr. Juiz “a quo”, ser pressuposto desta alínea a existência de um documento fiscalmente relevante, que é falsificado, destruído ou ocultado. E, assim sendo, a omissão de declaração sobre uma realidade que ao agente cumpre documentar não pode consubstanciar uma falsificação, destruição ou ocultação de documentos, já que estas condutas pressupõem, obviamente, um documento e este, por sua vez, pressupõe a existência de uma declaração. A violação do dever de emitir recibos, nos casos em que a lei o exige, constitui a contra-ordenação prevista e punível pelo artigo 123.º, n.º 1, do RGIT. Concluímos, pois, estar excluído do âmbito da tutela criminal da norma em apreço o incumprimento da obrigação de emitir “documentos por pagamentos recebidos”.
    Para além disso, considerando o recorte normativo do crime qualificado, têm de se mostrar indiciados elementos que vão para além do tipo matricial do artigo 103.º, n.º 1, do RGIT, ou seja, que traduzam um “quid plus”, que, no que ora releva, exceda a «ocultação ou alteração de factos ou valores» previstas na alínea a) do referido artigo, verificando-se estas quando o agente esconde ou encobre, modifica ou vicia, na sua contabilidade ou nas declarações apresentadas, os factos ou valores que, considerando o concreto regime tributário em causa, sejam determinantes para o apuramento da prestação tributária.
    Volvendo ao caso dos autos e percorrendo os factos da acusação, em especial os n.ºs 13.020 a 13.131, 13.874 a 13.907 e 13.921 a 13.927, quanto aos crimes em causa de que foi beneficiário o arguido AA; os n.ºs 13.607 a 13.649 e 14.006 a 14.037, quanto aos crimes de que foi beneficiário o arguido HH; os n.ºs 13.537 a 13.569 e 13.976 a 13.993, quanto ao crime em causa de que foi beneficiário o arguido RR; os n.ºs 13.486 a 13.536 e 13.956 a 13.975, quanto aos crimes de que foi beneficiário o arguido  SS; os n.ºs 13.570 a 13.606 e 13.994 a 14.005, quanto  ao crime de que foi beneficiário o arguido CC; os n.ºs 14.062 a 14.079, quanto aos crimes de que foi beneficiário o arguido DD; os n.ºs 14.038 a 14.055, quanto aos crimes de que foram beneficiários os arguidos FF e EE; e os n.ºs 14.056 a 144.61, quanto ao crime de que foi beneficiária arguida Pepelan- Consultoria e Gestão, SA, em lado algum é dito que os arguidos tenham falsificado, ocultado, destruído, inutilizado ou recusado a entrega, exibição ou apresentação de quaisquer documentos tributários relevantes, ou seja, tenham adoptado quaisquer condutas que, de outro modo, configurariam um crime de falsificação, danificação ou subtracção de documento.
    Conforme referido supra, as invocadas “omissões de emissão de documentos por pagamentos recebidos” estão excluídas do âmbito de previsão da norma da alínea d) do n.º 1 do artigo 104.º do RGIT. E, por sua vez, as alegadas “adulterações/ausências dos registos contabilísticos” das sociedades, traduzindo um registo fictício ou um não registo da realidade, em violação das normas tributárias, em nada acrescentam à conduta ilegítima tipificada na alínea a) do n.º 1 do artigo 103.º do RGIT.
    Concluímos, pois, pelo não preenchimento da circunstância qualificativa prevista na alínea d) do n.º 1 do artigo 104.º do RGIT relativamente a cada um dos supra mencionados crimes em causa.
    Afastada a referida qualificativa e considerando que o n.º 1 do artigo 104.º do RGIT exige, para a qualificação da fraude fiscal, a acumulação de mais de uma das circunstâncias aí previstas, afastada fica, desde já, a qualificação dos crimes de que foi beneficiário o arguido AA, relativos às declarações de IRS referentes aos rendimentos dos anos de 2006, 2007, 2008 e 2009; dos crimes de que foi beneficiário o arguido SS, referentes às declarações de IRS relativa aos rendimentos dos anos de 2007 e 2010; dos crimes de que foi beneficiário arguido DD; e dos crimes de que foram beneficiários os arguidos FF, EE e a arguida Pepelan- Consultoria e Gestão, SA.
    Apreciemos agora do preenchimento da alínea g) do n.º 1 do artigo 104.º do RGIT, com relevância para os crimes de que foi beneficiário o arguido HH.
    O citado normativo não define o que deve entender-se por “relações especiais”. Conforme refere Susana Aires de Sousa (ob. cit., p. 177), «apenas se poderá fazer um juízo que delimita negativamente o âmbito deste preceito: não cabem nesta alínea situações abrangidas pelas alíneas anteriores, sob pena de uma dupla valoração proibida do mesmo facto».
    Percorrendo, contudo, a legislação tributária, verifica-se que o legislador fiscal, a propósito da possibilidade de a administração fiscal proceder às correcções necessárias para a determinação do lucro tributável, explicita o critério aferidor da existência de relações especiais entre duas entidades, concretizado nas “situações em que uma tem o poder de exercer, directa ou indirectamente, uma influência significativa nas decisões de gestão da outra”, descrevendo uma série de situações, não taxativas, denunciadoras dessa realidade – cf. artigo 63.º, n.º 4, do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas.
    Embora a determinação do sentido jurídico-normativo de um conceito tenha de ser feita no seio da norma aplicanda, sendo utilizada a expressão “relações especiais”, parece-nos ser possível concretizar o conceito em volta de uma relação de dependência ou subordinação.
    Mais uma vez, percorrendo os factos constantes da acusação, em particular os n.ºs 13.607 a 13.640 e 14.006 a 14.037, em lado algum se mostra factualizada a existência de uma “relação especialentre o arguido HH e o arguido CC. Segundo resulta da acusação, o arguido CC contactou o arguido HH, “que merecia a sua confiança e que era também conhecido do arguido AA e mesmo do arguido BB”, solicitando a sua colaboração nas operações de circulação de fundos. Nessa sequência, os arguidos CC e HH acordaram que este permitiria a passagem de fundos por contas bancárias por si controladas e procederia à sua transmissão subsequente para contas bancárias que lhe fossem indicadas, mediante o recebimento de uma compensação pecuniária por essa colaboração - o que foi feito -, não consubstanciando a relação entre os referidos arguidos uma “relação especial” no sentido indicado.
    Tanto basta para se concluir pelo não preenchimento da circunstância qualificativa prevista na alínea g) do n.º 1 do artigo 104.º do RGIT
     Assim, no tocante aos crimes de que foi beneficiário o arguido HH, não se mostrando verificado o preenchimento das qualificativas previstas nas alíneas d) e g) e, de igual modo, considerando o corpo do n.º 1 do artigo 104.º do RGIT, afastada fica a qualificação dos referidos crimes de fraude fiscal, relativos às declarações de IRS referentes aos rendimentos dos anos de 2006 e 2010.
    Concluindo, também neste segmento, julga-se improcedente o recurso.

    1.5.10.3 Da prescrição do procedimento criminal
    Afastada a qualificação dos crimes de fraude fiscal nos termos supra decididos, ao abrigo do disposto nos artigos 21.º, n.ºs 1 e 4, e 103.º, n.º 1, alínea a), ambos do RGIT e artigos 119.º, n.º 1, 120.º, n.ºs 1, alínea b), 2 e 6, e 121.º, n.ºs 1, alíneas a) e b), 2 e 3, todos do Código Penal, e considerando as vicissitudes processuais com relevo para a questão, merece acolhimento a decisão recorrida na parte relativa à prescrição do procedimento criminal - o que, aliás, nem foi posto em causa pelo Recorrente, no pressuposto de ser acertada a qualificação jurídica dos crimes como fraude fiscal simples, que, como vimos, se verificou.
    É, assim, de confirmar a declaração de extinção, por efeito da prescrição, do procedimento criminal relativamente aos seguintes arguidos e crimes:
    - Quanto aos arguidos AA e BB, três crimes de fraude fiscal, de que foi beneficiário o primeiro arguido, p e p pelo artigo 103°, n° 1, alínea a), do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2006, consumado no dia 28.03.2007; relativa aos rendimentos do ano de 2007, consumado no dia 11.04.2008; e relativa aos rendimentos do ano de 2008, consumado no dia 08.04.2009;
    - Quanto aos arguidos AA, BB, GG, Lena Engenharia e Construções, SA e XLM- Sociedade de Estudos e Projetos, Lda., um crime de fraude fiscal, de que foi beneficiário o primeiro arguido, p e p pelo artigo 103°, n° 1, alínea a), do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2009, consumado no dia 13.04.2010;
    - Quanto aos arguidos HH e CC, um crime de fraude fiscal, de que foi beneficiário o primeiro arguido, p e p pelo artigo 103°, n° 1, alínea a), do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2006, consumado no dia 25.05.2007;
    - Quanto ao arguido CC, um crime de fraude fiscal, de que foi beneficiário o arguido HH, p e p pelo artigo 103°, n° 1, alínea a), do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2010, consumado no dia 31.05.2011;
    - Quanto ao arguido SS, dois crimes de fraude fiscal, de que foi beneficiário, p e p pelo artigo 103°, n° 1, alínea a), do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2007, consumado no dia 17.03.2008; e relativa aos rendimentos do ano de 2010, consumado no dia 19.04.2011;
    - Quanto ao arguido DD, os quatro crimes de fraude fiscal, de que foi beneficiário, p e p pelo artigo 103°, n° 1, alínea a), do RGIT em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2005, consumado no dia 31.03.2006; relativa aos rendimentos do ano de 2006, consumado no dia 15.04.2997; relativa aos rendimentos do ano de 2007, consumado no dia 22.12.2009; e relativa aos rendimentos do ano de 2008, consumado no dia 23.12.2009;
    - Quanto aos arguidos FF, Vale do Lobo Resort Turístico de Luxo, SA, e Oceano Clube Empreendimentos Turísticos do Algarve, SA, um crime de fraude fiscal, de que foi beneficiário o primeiro arguido, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alínea a) do RGIT, em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2009, consumado em 28.05.2010;
    - Quanto aos arguidos EE, Vale do Lobo Resort Turístico de Luxo, SA, e Oceano Clube Empreendimentos Turísticos do Algarve, SA, um crime de fraude fiscal, de que foi beneficiário, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alínea a), do RGIT, , em relação à declaração de IRS relativa aos rendimentos do ano de 2009, consumado em 07.04.2010; e
    - Quanto aos arguidos Pepelan- Consultoria e Gestão, SA, e EE, um crime de fraude fiscal, de que foi beneficiária, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alíneas a) e c), do RGIT, em relação à declaração de IRC relativa aos rendimentos do ano de 2008, consumado em 26.05.2009.
    Considerando o tempo entretanto decorrido mostra-se ainda prescrito o crime de fraude fiscal praticado e de que foi beneficiário o arguido BB, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2010, e, bem assim, o crime de fraude fiscal praticado e de que foi beneficiário o arguido HH, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2010 (recorde-se que, quanto a este crime, foi confirmada a prescrição no tocante ao co-arguido CC), ambos previstos no artigo 103.º, n.º 1, alínea a), do RGIT.
    Com efeito, sendo tais crimes puníveis com pena de prisão até três anos ou multa até 360 dias, de acordo com o disposto no artigo 21.º, n.º 1, do RGIT o prazo de prescrição do respectivo procedimento criminal é de cinco anos.
    Para além do curso da prescrição poder ser suspenso ou interrompido nas situações previstas, respectivamente, nos artigos 120.º e 121.º do Código Penal, aplicáveis “ex vi” do referido artigo 21.º, n.º 4, do RGIT, importa ainda considerar o prazo máximo de prescrição do procedimento criminal - que corresponde ao prazo normal da prescrição acrescido de metade desse prazo -, ou seja, o prazo em que, desde o seu início, mas ressalvando o tempo de suspensão, a prescrição do procedimento criminal tem sempre lugar- cfr. n.º 3 do artigo 121.º do Código Penal.
    No caso, considerando, respectivamente, quanto ao arguido BB e HH, como data da prática dos factos 03.06.2011 e 31.05.2011, como data de constituição de arguido 21.11.2014 e 21.04.2016 e como data de notificação da acusação 11.10.2017 e 17.10.2017, verificamos que não decorreram 5 anos desde a data da prática dos factos, considerando a causa de suspensão da prescrição prevista no artigo 120.º, n.º 1, alínea b), do Código Penal e os n.ºs 2 e 6 do mesmo artigo, e as causas de interrupção da prescrição previstas no artigo 121.º, n.º 1, alíneas a) e b), do referido diploma e o n.º 2 do mesmo artigo.
    Contudo, mostra-se já decorrido o prazo máximo de prescrição a que alude o n.º 3 do artigo 121.º do Código Penal, isto é, o prazo prescricional normal -5 anos-, acrescido de metade -2 anos e 6 meses-, descontado o tempo de suspensão -3 anos-, nos termos do n.º 3 do artigo 120.º do Código Penal.
    Quanto ao arguido BB esse prazo máximo foi atingido em 03.12.2021 e quanto ao arguido HH em 30.11.2021.
    Pelo exposto, julga-se extinto, por efeito da prescrição, o procedimento criminal pelo crime de fraude fiscal praticado e de que foi beneficiário o arguido BB, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2010, e pelo crime de fraude fiscal praticado e de que foi beneficiário o arguido HH, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2010, ambos previstos no artigo 103.º, n.º 1, alínea a), do RGIT.
    Mostra-se, assim, prejudicado o conhecimento das demais questões referentes aos crimes prescritos, nomeadamente a de saber se, não sendo o arguido HH residente fiscal em Portugal, as quantias em causam podiam ser consideradas como “rendimentos obtidos em território português” para efeitos de tributação em sede de IRS.
    Consequentemente, subsistem os seguintes crimes:
    1- Um crime de fraude fiscal qualificada de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2010, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a) e 104°, n.° 2, do RGIT;
    2- Um crime de fraude fiscal qualificada de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2011, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a) e 104°, n.º 2, alínea a), do RGIT;
    3- Um crime de fraude fiscal qualificada de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2012, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a) e 104°, n.º 2, alínea a), e n.º 3, do RGIT;
    4 - Um crime de fraude fiscal qualificada de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2013, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a) e 104°, n.º 2, alínea a), e n.º 3, do RGIT;
    5 - Um crime de fraude fiscal qualificada de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2014, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a) e 104°, n.º 2, alínea a), e n.º 3, do RGIT;
    6- Um crime de fraude fiscal qualificada de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2015, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a) e 104°, n.º 2, alínea a), e n.º 3, do RGIT;
    7- Um crime de fraude fiscal qualificada de que foi beneficiário BB, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2011, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alínea a), e 104.º, n.º 3, do RGIT;
    8- Um crime de fraude fiscal qualificada de que foi beneficiário RR, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2011, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a) e 104°, n.º 3, do RGIT;
    9- Um crime de fraude fiscal qualificada de que foi beneficiário SS, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2011, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a) e 104°, n.º 3, do RGIT;
    10- Um crime de fraude fiscal qualificada de que foi beneficiário SS, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2012, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a) e 104°, n.º 3, do RGIT; e
    11- Um crime de fraude fiscal qualificada de que foi beneficiário CC, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2011, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alínea a) e 104°, n.º 3, do RGIT.

    1.5.10.4 Do dever jurídico-tributário de declaração de rendimentos de proveniência ilícita
    POSIÇÃO SUSTENTADA NA DECISÃO RECORRIDA
    Entendeu o Sr. Juiz “a quo” que, constando da acusação que os rendimentos que os arguidos omitiram nas suas declarações para efeito de IRS têm origem criminosa e não se integrando os montantes em causa em nenhuma das categorias de rendimentos prevista em sede de IRS, não impendia sobre eles «qualquer dever jurídico de os declarar à administração tributária, pelo que não se verifica qualquer ocultação susceptível de preencher o ilícito previsto no artigo 103.º n.º 1 al. a) do RGIT».
    Subsidiariamente, declarou a inconstitucionalidade da «norma resultante da interpretação do disposto no artigo 1.º do CIRS e do artigo 10.º da LGT», com o sentido de que as quantias provenientes da prática de um crime possam ser incluídas nas regras de incidência objectiva do imposto sobre o rendimento das pessoas singulares, «por violação do princípio da legalidade e da tipicidade tributária previsto no artigo 103.º da CRP» e, ainda a título subsidiário, a inconstitucionalidade da  «interpretação normativa do artigo 103º do RGIT e dos artigos 10º da LGT e artigo 1º nº 1 do CIRS», com o sentido de que os arguidos estavam obrigados a revelar à autoridade tributária as alegadas quantias provenientes da prática de crimes e a contribuir activamente para a sua própria incriminação, «por violação do princípio à não auto-incriminação consagrado nos artigos 1º, 8º, 16º e 32º nº 1 da CRP»

    POSIÇÃO SUSTENTADA PELO RECORRENTE
    A propósito deste segmento, defende o Ministério Público a tributação dos rendimentos ainda que ilícitos, tendo em conta o disposto nos artigos 10.º da Lei Geral Tributária e 1.° do Código do IRS, e, quanto à categoria em que o sujeito passivo deve enquadrar o produto da prática de um crime, aquando do preenchimento da declaração fiscal, «se outra não encontrar, designadamente nas Categorias A (rendimentos do trabalho – vg, art.° 2.°, n.° 3, al. g) do CIRS) ou B (rendimentos empresariais ou profissionais – vg. art.° 3.°, n.° 1, al. b) ou n.° 2, al. i), sempre lhe restaria a Categoria G, relativa aos acréscimos patrimoniais não justificados, prevista nos art.°s 1.°, n.° 1, e a que se referem a alínea d) do n.° 1 do art.° 9.° e o art.° 72.°, n.° 16, todos do CIRS», não vislumbrando qualquer violação da Lei Fundamental.
     
    APRECIANDO
    A legislação fiscal estipula, a par da «obrigação principal do sujeito passivo efectuar o pagamento da dívida tributária», obrigações acessórias ou instrumentais que visam acautelar e assegurar o bom cumprimento daquela obrigação e que surgem num contexto de delegação de tarefas do Estado para a esfera dos contribuintes ou de terceiros, «designadamente, as que visam possibilitar o apuramento da obrigação de imposto, nomeadamente a apresentação de declarações (…)» (artigo 31.º da LGT).
    Como vimos, mostra-se tipificado como crime de fraude fiscal determinadas condutas de não colaboração ou colaboração deficiente dos sujeitos passivos «que visem a não liquidação, entrega ou pagamento do imposto ou a obtenção indevida de benefícios fiscais, reembolsos ou outras vantagens patrimoniais susceptíveis de causarem diminuição das receitas tributárias» (artigo 103.°, n.° 1, do RGIT).
    Por sua vez o artigo 10.º da LGT prescreve que «o carácter ilícito da obtenção de rendimentos ou da aquisição, titularidade ou transmissão dos bens não obsta à sua tributação quando esses actos preencham os pressupostos das normas de incidência aplicáveis». Também os artigos 1.º do CIRS e do CIRC prescrevem que os impostos incidem sobre o rendimento, «mesmo quando provenientes de actos ilícitos».
    Independentemente da argumentação a favor ou contra a tributação dos rendimentos ilícitos, a verdade é que o legislador português optou inequivocamente por consagrar a solução da neutralidade tributária, o que significa que basta verificarem-se os pressupostos contidos na norma de incidência aplicável ao rendimento em causa para que o mesmo seja tributado, independentemente de o facto tributário consubstanciar ou não um acto lícito. À tributação é indiferente o carácter lícito ou ilícito da obtenção de rendimentos, apenas relevando o seu carácter económico na medida em que produz riqueza enquadrável na respectiva norma de incidência.
    Sempre se diga que esta é a opção que se coaduna com os princípios da igualdade fiscal e da coerência do sistema jurídico global. O primeiro, moldado pela ideia de que todos os cidadãos estão sujeitos ao dever de pagar impostos e na medida da sua capacidade contributiva, o segundo a solicitar a harmonização do sistema fiscal com o ordenamento jurídico na sua globalidade, incluindo o jurídico-penal, impedindo o “benefício do infractor”, ambos complementados por razões de política de dissuasão, prevenindo que quem pratica actos desaprovados pela ordem jurídica, obtenha uma vantagem advinda não só do comportamento ilícito, como da ausência de tributação.
    Assim, se o ganho proporcionado pelo crime está sujeito a tributação, desde que preenchidos os pressupostos da norma de incidência aplicável, impõe-se concluir pelo correlativo dever fiscal de o declarar, podendo a respectiva omissão subsumir-se na factualidade típica do crime de fraude fiscal.
    Argumentou o Sr. Juiz “a quo” que, estando identificada na acusação a origem criminal dos ganhos em causa, o tratamento jurídico a conferir-lhes seria o previsto no Código Penal relativo à perda de instrumentos, produtos ou vantagens (artigos 109.º a 112.º-A do referido diploma) ou no regime de perda de bens a favor do Estado, constante dos artigos 7.º e seguintes da Lei n.º 5/2002, de 11.01, e não a sua tributação em sede de IRS. Acrescentou ainda que a declaração de perda de vantagens do crime e o simultâneo pagamento relativo a IRS sobre essas mesmas vantagens implicaria um enriquecimento para o Estado, sem causa justificativa, para além da necessidade de se levar em conta, no tocante ao arguido AA, o pagamento da quantia de € 1.150.659,68, através da conta bancária BES titulada pelo arguido BB, correspondente à taxa de 5% paga sobre o valor global de € 23.350.161,89, repatriado para Portugal ao abrigo do RERT II, em cumprimento do acordado entre os arguidos AA e BB.
    Este entendimento coloca a questão a jusante, quando a mesma deve ser apreciada a montante, dado que a solução para a questão da tributação dos rendimentos resultantes de factos ilícitos deve ser a mesma, quer haja, ou não, condenação do sujeito passivo pelo crime que os gerou. Assim, por um lado, verificado o facto gerador do imposto deve haver tributação dos rendimentos, independentemente de, a jusante, ser proferida declaração da sua perda a favor do Estado, e, por outro, caso no momento da prolação dessa declaração tais rendimentos já tiverem sido tributados, o juiz da condenação deverá deduzir nessa declaração o montante do imposto entretanto entregue ao Estado.

    1.5.10.5 Do preenchimento dos pressupostos contidos nas normas de incidência aplicáveis
    Cumpre então aferir se, no caso, os actos em causa “preencham os pressupostos das normas de incidência aplicáveis”.
    Segundo a acusação e no que ora releva, as quantias que os arguidos AA, RR e SS omitiram nas suas declarações de rendimentos, para efeitos de IRS, são produto da prática de crimes de corrupção passiva e a quantia que o arguido BB omitiu corresponde a uma compensação pela prática de crimes de branqueamento.
    Entendemos, pois, defensável, face ao descrito na acusação, que os referidos montantes constituam, à luz do Direito Fiscal, o preço da prestação do serviço em que os ilícitos criminais se materializaram e, nessa medida, sejam tributáveis enquanto rendimentos da categoria B- Rendimentos empresariais e profissionais- cf. artigo 1.º, n.º 1, do Código de IRS (nesse sentido, André Teixeira dos Santos, “Rendimentos de proveniência ilícita e sua (in)susceptibilidade de serem objecto do crime de fraude fiscal”, in  Revista do Ministério Público 169, Janeiro-Março de 2022, pp. 143-144).
    Sendo o facto tributário perspectivado numa vertente jurídico-económica, tal resultado interpretativo é cabível na zona de abrangência da norma de incidência em causa, respeitando os limites da interpretação da lei fiscal decorrentes do princípio da tipicidade – corolário do princípio da legalidade tributária, consubstanciado na exigência de conformação, por parte da lei, dos elementos modeladores do tipo tributário, abrangendo, nomeadamente a incidência objectiva (cfr. artigo 103.º, n.º 2, da CRP) -, pelo que não lhe pode ser imputada a violação dos referidos princípios.
    A diferente conclusão chegamos no tocante ao arguido CC, resultando da acusação, no que ora releva, que a quantia que o referido arguido omitiu na sua declaração de rendimentos, para efeitos de IRS, tem origem na prática de um crime de abuso de confiança. Com efeito, não se destinando (ainda que parcialmente) a quantia ilegitimamente apropriada pelo arguido CC, e pertencente ao universo GES, à remuneração do cargo de membro dos órgãos sociais, tratada no Código de IRS por equiparação a trabalho dependente - vd., em especial, os n.ºs 13.814 a 13.818 e 13.826 a 13.830 da acusação -, não é tal quantia passível de constituir qualquer retribuição do trabalho, não podendo, por isso, ser reconduzível à categoria A- Rendimentos do trabalho dependente. Também não pode ser enquadrada em qualquer outra das categorias previstas no artigo 1.º, n.º 1, do Código de IRS, nomeadamente na categoria G- Incrementos patrimoniais, em particular como acréscimo patrimonial não justificado nos termos do artigo 9.º, n.º 1, alínea d), do mesmo diploma, identificada que está na acusação a proveniência do montante em causa.
    Temos, assim, que, relativamente aos arguidos AA, RR, SS e BB, sendo os respectivos rendimentos passíveis de tributação por preencheram norma de incidência, impendia sobre eles o dever de os declarar à Administração Tributária, ao contrário do verificado quanto ao arguido CC, por o respectivo facto originador de riqueza não preencher a fattispecie da incidência.
    Nesta conformidade, o recurso procede no que respeita aos crimes de que foram beneficiários os arguidos AA, RR, SS e BB e improcede no que respeita ao arguido CC, mantendo-se a decisão de não pronúncia relativamente ao crime de fraude fiscal qualificada de que foi beneficiário CC, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2011, em co-autoria com o arguido SS, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alínea a) e 104°, n.º 3, do RGIT.

    1.5.10.6 Do princípio“nemo tenetur se ipsum accusare”
    Questão diferente é a de saber se, sendo tributáveis as vantagens patrimoniais advindas da prática de um crime, o princípio de proibição da auto-incriminação ou, na formulação latina, o chamado “nemo tenetur se ipsum accusare” afasta o dever do sujeito passivo de colaborar com a administração fiscal na revelação da existência desse ganho- que não se confunde com o acto criminoso que o produziu.
    Não obstante não se encontrar expressamente previsto na Constituição da República Portuguesa, o princípio do “nemo tenetur” é entendido pela doutrina e pela jurisprudência, de forma unânime, como um direito fundamental.
    Quanto aos fundamentos constitucionais do princípio, surgiram duas correntes: uma que lhe atribui um fundamento material, assente directamente na dignidade da pessoa humana, proclamada pela nossa Constituição no seu artigo 1.º, e outra - a prevalecente na doutrina e jurisprudência portuguesas - que lhe atribui um fundamento processual, suportado nas garantias de defesa que o processo penal assegura ao arguido (artigo 32.º, n.º 1, da Constituição), não deixando, contudo, de reconhecer que o princípio protege igualmente, de forma mediata, a dignidade da pessoa humana e outros direitos fundamentais com ela conexos.
    Numa formulação ampla, o “nemo tenetur” pode ser definido como o direito a não ser obrigado a contribuir para a própria condenação, destinando-se a “garantir que qualquer contributo do arguido, que resulte em desfavor da sua posição, seja uma afirmação esclarecida e livre de auto-responsabilidade»- Manuel da Costa Andrade, Sobre as Proibições de Prova em Processo Penal, Coimbra Editora, 1992, p. 121.
    Ainda que o cumprimento dos deveres de colaboração que a lei impõe ao contribuinte convoque sobre si o perigo de responsabilização pela prática dos crimes que estiveram na origem dos rendimentos, temos entendido que o princípio “nemo tenetur” não exonera o contribuinte do cumprimento dos referidos deveres, cuja solvabilidade constitucional é fundamentada na satisfação das necessidades financeiras do Estado e na igualdade e justiça na repartição dos rendimentos e da riqueza (artigo 103.º, n.º 1, da Constituição), assim secundando a opinião de, entre outros, André Teixeira dos Santos, ob. cit., pp. 186 a 198 e Sandra Oliveira e Silva, “Nemo Tenetur se Ipsum Accusare e Direito Tributário: das (Iniludíveis) Antinomias à Harmonização (Possível)”, in Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor Manuel da Costa Andrade, Vol II, 2017, pp. 835 a 842.
    Em primeiro lugar, assumindo o princípio “nemo tenetur” natureza processual, o mesmo apenas opera no âmbito do processo penal - e, com as devidas adaptações, no âmbito dos demais processos sancionatórios - e não, a montante, na antecâmara da apresentação de declaração/documentos que impende sobre o contribuinte na sua relação com a administração tributária. Assim, no momento da apresentação da declaração de rendimentos, em que não se está sequer no âmbito dum processo de investigação de uma qualquer infracção, tal princípio ainda não é accionável. Invocar o “nemo tenetur” para isentar o contribuinte de declarar os rendimentos tributáveis, incluindo os provenientes da prática de um crime, seria antecipar o seu âmbito de validade normativo para um momento em que não existe sequer suspeita, nem processo crime.
    O ponto de tensão com o princípio em causa só se coloca, num segundo e ulterior momento, com a possibilidade, no âmbito do processo penal, de valoração das informações e documentos de sentido auto-incriminatório que o arguido, na veste de contribuinte, levou ao conhecimento da administração tributária no cumprimento dos seus deveres de colaboração, o que tem suscitado distintas soluções, problemática que não releva aqui cuidar.
    Concluímos, pois, que o princípio “nemo tenetur” não afasta o dever de declarar o rendimento por facto ilícito, consubstanciando a ocultação do mesmo nos termos taxativamente previstos no artigo 103.º, n.º 1, do RGIT, uma vez verificados os restantes pressupostos do tipo legal, a prática dum crime de fraude fiscal., sem que se mostre violado aquele ou qualquer outro princípio constitucional.
    Pelo exposto, neste particular, julga-se procedente o recurso.

    1.5.10.7 Da responsabilidade das pessoas COLECTIVAS
    POSIÇÃO SUSTENTADA NA DECISÃO RECORRIDA
    Entende o Sr. Juiz “a quo” que, relativamente às arguidas Lena, SA, e XLM, Lda., não estão reunidos os pressupostos do artigo 7.º do RGIT, não se mostrando verificado, nem alegado, que o facto tenha sido realizado em nome e no interesse das sociedades arguidas.
    POSIÇÃO SUSTENTADA PELO RECORRENTE:
    Diversamente entende o Recorrente que os pagamentos a AA tinham como contrapartida uma actuação deste em favorecimento dos interesses relacionados com os negócios do Grupo Lena e da XLM, pelo que se mostram verificados os pressupostos do artigo 7.º do RGIT.

    APRECIANDO
    Nos termos do artigo 7.º, n.º 1 do RGIT, as sociedades «são responsáveis pelas infracções previstas na presente lei quando cometidas pelos seus órgãos ou representantes, em seu nome e no interesse colectivo».
    Neste particular, remete-se para o que, a propósito dos crimes de branqueamento, se escreveu respeitante às sociedades do Grupo Lena e XLM, Lda.
    Se é possível integrar a actuação do arguido GG, em nome da sociedade arguida Lena, SA, no âmbito de um acordo em que se visava, entre o mais referido, a satisfação dos interesses económicos do Grupo Lena, em relação à actuação do arguido BB, em nome da sociedade arguida XLM, Lda., é evidente  que mesma não teve em vista o interesse colectivo, sendo esta sociedade uma entidade “fictícia”.
    Nesta conformidade, o recurso improcede no que respeita à sociedade XLM- Sociedade de Estudos e Projectos, Lda., mantendo-se a respectiva de decisão de não pronúncia, e procede no que respeita à sociedade Lena Engenharia e Construções, SA.

    1.5.10.8 Da co-autoria
    POSIÇÃO SUSTENTADA NA DECISÃO RECORRIDA
    Entende o Sr. Juiz a quo que, estando em causa a vertente de ocultação a que se refere a alínea a) do n.º 1 do artigo 103.º do RGIT, o crime de fraude fiscal é um crime específico, o que significa que só pode ser cometido por aquele sobre o qual recai o dever jurídico de levar a cabo a acção imposta, no caso, a pessoa sobre a qual recai o dever de declarar os valores em causa à administração tributária, o que faz com que não se possa falar numa conduta omissiva por parte de um arguido quanto às obrigações fiscais de um outro arguido. Acrescentou, no que ora releva, que os actos descritos na acusação e imputados aos arguidos BB, GG e Lena, SA, no tocante aos crimes de que foi beneficiário AA,  não constituem actos de execução do crime de fraude fiscal e que, embora possam ter favorecido a ocultação, tal é insuficiente para configurar uma situação de co-autoria, dada a falta de uma decisão conjunta e execução conjunta.
    Subsidiariamente, entende que  «a interpretação normativa do art. 103.º, n.º 1, alínea a), do R.G.I.T. tal como feita na acusação, no sentido de a acção típica consistir na prática de actos, por parte de pessoas que não o sujeito passivo da relação tributária, prévios à não-declaração de determinados valores que, como é o caso dos autos, não tinham que ser revelados à administração fiscal por inexistência de uma norma de incidência tributária que obrigue a declarar o produto da prática de um crime de corrupção, configura uma norma materialmente inconstitucional, por violação, designadamente, dos princípios da legalidade penal, da tipicidade e da necessidade do Direito Penal, consagrados nos arts. 2.º, 29.º, n.º 1, e 18º n.º 2, da Constituição da República Portuguesa» e que «a interpretação normativa do artigo 103.º, n.º 1, alínea a), do R.G.I.T. tal como feita na acusação, no sentido de o ilícito criminal aí previsto poder ser praticado, na modalidade de "ocultação", por qualquer pessoa ou entidade, e não apenas pelo sujeito passivo da relação tributária, isto é, pela pessoa ou entidade sobre a qual recai o dever fiscal de não ocultar da Administração Tributária determinados factos ou valores, redunda em interpretação materialmente inconstitucional, por violação dos princípios da legalidade, da tipicidade e da necessidade do Direito Penal, consagrados nos artigos 2.º, 18º nº 2 e 29.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa.»

    POSIÇÃO SUSTENTADA PELO RECORRENTE:
    Defende o recorrente que a conduta tipificada na alínea a) do n.º 1 do artigo 103.º do RGIT reveste a forma de acção, já que se consubstancia na entrega de uma declaração fraudulenta, constando da acusação vários actos que integram o cometimento, por comissão, dos crimes de fraude fiscal em causa.

    APRECIANDO
    Não procedendo a norma do artigo 103.º do RGIT a uma delimitação explicita do círculo de possíveis agentes activos do crime de fraude fiscal, surge a dúvida de saber se estamos perante um crime comum – que pode ser praticado por qualquer pessoa – ou um crime específico – que só pode ser praticado por quem detenha certas qualidades pessoais ou sobre quem recaia um dever especial, no caso, o sujeito passivo da relação jurídica tributária.
    Para alguns autores, como Isabel Marques da Silva (“Regime Geral das Infracções Tributárias”, 3.ª edição, 2010, p. 205) e Nuno Pombo (“A fraude fiscal – A norma incriminadora, a Simulação e Outras reflexões, Almedina, 2007, pp. 56 a 61), trata-se de um crime comum. Escreveu este último autor que: «Cremos, pois, que continua a ser um crime comum, já que qualquer pessoa o poderá perpetrar, não se tratando, em termos genéricos, de crime cuja ilicitude (crime específico próprio) ou grau de ilicitude (crime específico impróprio) dependa de certas qualidades ou relações especiais do agente”, embora exija “a intervenção, ainda que não necessariamente em comparticipação, de contribuintes, de sujeitos passivos de relações jurídicas de imposto. (…) Dada a natureza da infracção não revelará a titularidade de relações jurídicas, mas antes a materialização de determinados comportamentos típicos. (…) Não pode (…) advogar-se que o legislador visa com a incriminação sancionar a violação de deveres específicos que recaem apenas sobre determinadas pessoas, os contribuintes. Essa conclusão, neutraliza, em boa medida, as dimensões pedagógica e preventiva da norma incriminadora».
    Na jurisprudência, perfilhando o mesmo entendimento, vd., entre outros, Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 16.10.2019, processo n.º 4910/08.9TDLSB.L1-3-2ª Parte, e demais jurisprudência aí citada.
    Para outros autores, como André Teixeira dos Santos, (“O Crime de Fraude Fiscal: Um contributo para a configuração do tipo objectivo de ilícito a partir do bem jurídico”, Coimbra Editora, 2009, p. 257) e Rui Correia Marques (ob. cit., pp. 16 a 18), trata-se de um crime específico, tendo em conta que, consistindo o comportamento criminoso na violação dos deveres resultantes de uma relação jurídico-tributária, só quem está adstrito a tais deveres pode estar em condições de cometer o crime, por só ele detém o domínio da conduta ilícita.
    Por sua vez, Susana Aires de Sousa, defendendo uma posição ecléctica, afirma que: «a delimitação do círculo de autores se dá apenas na vertente de omissão prevista nas alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 103.º do RGIT. Quando realizada através de uma daquelas condutas a fraude fiscal é um crime específico porque só pode ser seu autor aquele que é atingido por uma obrigação ou dever especial de declaração». Diversamente quando a conduta típica se realiza por acção, o tipo pode ser preenchido por qualquer pessoa (ob. cit., p. 98).
    Também no sentido de que «só pode ser autor de um crime de fraude fiscal na modalidade de ocultação a que se refere a alínea a) aquele que é atingido por uma obrigação ou dever especial de declaração» vd. o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 18.07.2013, Processo n.º 1/05.2JFLSB.L1-3.
    Para além de, conforme já referido, entendermos que a decisão instrutória deve sempre salvaguardar as diversas posições de direito defensáveis, volvendo ao caso dos autos e percorrendo a acusação no que aos crimes de que foi beneficiário o arguido AA diz respeito, em especial os n.ºs 13.902 a 13.947, verificamos que, atenta a modalidade de execução dos referidos crimes, as condutas em causa não se reconduzem a uma pura omissão, já que as fraudes tiveram lugar “mediante a utilização de facturas ou documentos equivalentes por operações inexistentes” (cf. artigo 104.º, n.º 2, do RGIT, na redacção originária e n.º 2, alínea a), na redacção actual). Com efeito, resulta da acusação que os arguidos BB e GG, este agindo por si e na qualidade de representante da sociedade Lena, SA, mediante prévio acordo com o arguido AA, procederam à documentação de operações económicas que não existiram, assim ocultando a proveniência e o destino das quantias em causa, visando o não pagamento do imposto sobre o rendimento por parte do arguido AA, com a consequente diminuição das receitas tributárias. Mostra-se, assim, sustentada a co-autoria material nos crimes em causa.
    Sobre o alcance do artigo 26.º do Código Penal seguimos de perto o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27.09.1995 (CJIII, tomo 3, p. 197), onde se afirma: «São requisitos essenciais para que ocorra comparticipação criminosa, sob a forma de co-autoria, a existência de decisão e de execução conjunta. O acordo pode ser tácito, bastando-se com a consciência/vontade de colaboração dos vários agentes na realização de determinado crime. No que respeita à execução, não é indispensável que cada um dos agentes intervenha em todos os actos ou tarefas tendentes a atingir o resultado final, o que importa é que actuação da cada um, embora parcial, se integre no todo e conduza à produção do objectivo em vista.»
    Concluímos, pois, pela prática, em co-autoria, dos crimes de que foi beneficiário o arguido AA por este, BB, GG e Lena, SA.
    Por fim, entendemos que o cometimento do crime de fraude fiscal, nas modalidades em questão nos autos, por qualquer pessoa, e não apenas pelo sujeito passivo da relação tributária, não viola os princípios da legalidade e tipicidade, traduzidos, no essencial, em matéria incriminatória, em não poder existir crime que não resulte de lei prévia, certa e precisa, nem qualquer outro princípio constitucional.
    Termos em que, neste particular, se julga procedente o recurso.

    1.5.10.9 INDÍCIOS
    Pelas razões apontadas em 2.3.5. – indícios da prática dos crimes de corrupção e considerando as declarações em causa apresentadas à Administração Fiscal para efeitos de IRS e juntas aos autos, mostra-se indiciada a materialidade que sustenta os crimes pronunciados.
    Pelo exposto e concluindo, revoga-se a decisão recorrida, proferindo-se decisão de pronúncia no que respeita aos seguintes crimes de fraude fiscal:
    1) - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2010, em coautoria com os arguidos BB, GG e Lena Engenharia e Construções, SA, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a), e 104°, n.° 2, do RGIT;
    2) - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2011, em coautoria com os arguidos BB, GG e Lena Engenharia e Construções, SA, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a), e 104°, n.° 2, alínea a), do RGIT;
    3) - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2012, em coautoria com os arguidos BB, GG e Lena Engenharia e Construções, SA, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a), e 104°, n.° 2, alínea a), e n.º 3, do RGIT;
    4) - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2013, em coautoria com os arguidos BB, GG e Lena Engenharia e Construções, SA, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a), e 104°, n.° 2, alínea a), e n.º 3, do RGIT;
    5) - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2014, em coautoria com os arguidos BB, GG e Lena Engenharia e Construções, SA, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a), e 104°, n.° 2, alínea a), e n.º 3, do RGIT;
    6) - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2015, em coautoria com os arguidos BB, GG e Lena Engenharia e Construções, SA, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a), e 104°, n.° 2, alínea a), e n.º 3, do RGIT;
    7) - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário BB, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2011, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a), e 104.º, n.º 3, do RGIT;
    8) - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário RR, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2011, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a), e 104°, n.º 3, do RGIT;
    9) - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário SS, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2011, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a), e 104°, n.º 3, do RGIT;
    10) - Um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário SS, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2012, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a), e 104°, n.º 3, do RGIT.

    1.5.11 MATÉRIA EXPURGADA
    Na Decisão Instrutória o Sr. Juiz determinou a expurgação de vários factos constantes da acusação por se terem tornado inócuos ou irrelevantes ou por afirmar não terem relevância criminal ou mesmo por representarem mera descrição de elementos de prova que, em si mesmos, não constituem crime, nomeadamente:
    -Os factos dos artigos 89, 90, 91, 92, 93, 94, 1676, 1720, 1721, 1738, 1741, 1744, 1794, 1851, 1852, 1853, 1854, 1855, 1861, 1862, 1863, 1867, 1868, 1926, 1927, 1947, 1948, 1961, 1965, 1967, 1968, 1985, 1986, 1991, 1992, 1993, 1997, 2003, 2007, 2027, 2042, 2050, 2052, 2075, 2091, 2092, 2093, 2094, 2095, 10798, 10805, 10806, 10811, 10813, 10815, 10816, 10817, 10826, 13700, 13701, 13702, 13703.  porque tal matéria não se mostra indiciada.
    - factos dos artigos  1646 a 1661, relativos aos concursos ganhos pelo Grupo LENA no âmbito do programa Parque Escolar, por serem irrelevantes;
    - factos dos artigos  1724 da acusação, relativo a condenação sofrida no ... por UUUUUUUU, cuja sociedade integra o consórcio ELOS, por ser irrelevante;
    - factos dos artigos 1247 a 1289, pagamentos feitos pela XMI, por serem irrelevantes;
    - factos dos artigos 12757 a 12984, relativos ao auxílio por parte do arguido AA, já depois de cessar as funções de Primeiro-ministro, a negócios do Grupo LENA na ..., em ... e na ..., com o fundamento de não integrarem crime na data dos factos;
    - factos dos artigos  8989 a 9240, aspectos relativos aos pagamentos a LLLL, por serem considerados irrelevantes;
    - factos dos artigos  8989, 8994, 8996, 9001, 9004,9008, 9010, 9013 a 9015, 9020 a 9023, 9025 a 9235, relativos a contactos mantidos com referência a LLLL, por serem considerados inócuos e mera descrição meios de prova;
    - factos dos artigos  8552, 8577, 8584 a 8594, 8606, 8618 a 8625, 8627 a 8632, 8634 a 8638, 8647, 8667 e 8668, por narração conclusiva ou que reproduz meios de prova,
    - factos dos artigos  8690 a 8736 (movimentos na conta de AA, com despesas e conversas com a gestora e recibos às sociedades EMP35... e EMP39... e pedido de dinheiro no ponto 8726) 8744 a 8747 (divida de IRS de AA e financiamento para a pagar), 8750 a 8756 (conversas para contratualizar empréstimo), 8781 (conversa de AA com gestora), 8790 (linguagem código), 8824 a 8826 (conversas de AA com a gestora), 8828 a 8833 (conversas de AA com gestora e alerta sobre despesas fixas), 8836 (saldo entre despesas e receitas na conta de AA), 8838 a 8856 (gastos após AA sair do governo, pedido de dinheiro no ponto 8845 e 8849, projecto de viagem à ... com NNNN), 8859 a 8861(reserva viagem em numerário), 8871 a 8877 (pedidos de dinheiro de KKKK e MM a AA), 8882 a 8886 (conversa de AA com gestora), 8947 a 8963 (pedido de dinheiro por AA no ponto 8958 e conversa com a gestora);
    - factos  dos artigos 6886 a 6892, 6899 a 6893, 8001, 8059 a 8062, 8402 a 8404, 8441 a 8446, 8534 a 8541, 8544 a 8546, 8552 a 8577, 8584 a 8594 e 8606, 8618 a 8625, 8627 a 8632, 8634 a 8638, 8647, 8667, 8668, 8690 a 8736, 8744 a 8747, 8750 a 8756, 8789, 8781, 8790, 8824 a 8826, 8828 a 8833, 8836, 8838 a 8856, 8859 a 8861, 8871 a 8877, 8882 a 8886, 8947 a 8963, 8969, 8970, e novos pontos da acusação 8971 (conclusões sobre gestão da conta CGD de AA), 8981(somatório de entregas), 8983 (entradas a crédito na conta BES), 9328 a 9335 (desabafos de UU ao telefone), 9577 a 9590 (sobre a Editora ..., o top dos Livros e despesas de AA), 9603 (sobre a Editora ...), 9604 (instruções para a compra dos livros), 9606 a 9790 (livros comprados e colocados no lixo), 10088 (conversa de AA com a gestora conta e empréstimo na CGD).
    - factos dos artigos  11853 a 11958 (pagamentos XLM a MM) e 12048 a 12353 (aquisição Monte ...) – nulidade da acusação e insuficiência de factos indiciados
    - factos dos artigos 13570 a 13606 (Rendimentos CC 2010 e RERT), 13607 a 13649 (rendimentos HH) e 13994 a 14037 (montante de SS para CC) 5286 a 5290 (considerados inócuos a 4265 que é operação de HH para VVVVVV)
    -   todo o Capitulo V da acusação, pontos 3337 a 4128, referente ao GRUPO VALE DO LOBO e aos financiamentos concedidos pela CGD, na sequência de um conjunto de decisões que antecede, relativos a prescrição do procedimento, mas também a não indiciação e mesmo a pronúncia por alguns dos factos;
    - factos dos artigos  3773 a 3776 (acordo pagamento VALE DO LOBO a DD), 3779 a 3782 (pagamento VALE DO LOBO a DD), 3785 a 3842 (negócio com KK, pagamentos adicionais e passagem pela conta de GG), 3948 a 4051 (operações EE e EMP10...), 13870 a 13873 (dolo da circulação de fundos PEPELAN pela EMP10...) e 14038 a 14061(dolo das sociedades do Grupo VALE DO LOBO), todos aliás já abrangidos no expurgo do Capítulo V da acusação.
    - factos dos artigos 6886 a 6892, 6899 a 6893, 8001, 8059 a 8062, 8402 a 8404, 8441 a 8446, 8534 a 8541, 8544 a 8546, 8552 a 8577, 8584 a 8594 e 8606, 8618 a 8625, 8627 a 8632, 8634 a 8638, 8647, 8667, 8668, 8690 a 8736, 8744 a 8747, 8750 a 8756, 8789, 8781, 8790, 8824 a 8826, 8828 a 8833, 8836, 8838 a 8856, 8859 a 8861, 8871 a 8877, 8882 a 8886, 8947 a 8963, 8969, 8970, 8971, 8981, 8983, 9328 a 9335, 9577 a 9590, 9603, 9604, 9606 a 9790, 10088 por se tratar de matéria relativa a meios de prova, considerações meramente conclusivas e factos inócuos,
    - os factos alegados nos artigos 11853 a 11958 e os factos dos artigos 12048 a 12353.
    - os factos descritos na acusação sob os artigos 13570 a 13606, 13607 a 13649 e 13994 a 14037 por se terem tornado inócuos
    - os factos descritos na acusação sob os artigos 3773 a 3776, 3779 a 3782, 3785 a 3842, 3948 a 4051, 13870 a 13873 e 14038 a 14061 por se terem tornado inócuos.

    APRECIANDO
    Como se vê, o SR. Juiz determinou o “expurgo” de diversa matéria da acusação pelos mais variados motivos.
    Como podemos constatar, a decisão deste tribunal de recurso não seguiu a linha de raciocínio do Sr. Juiz.
    Atento o que já dissemos relativamente aos indícios existentes relativamente à prática, dos factos, pelos arguidos, parece-nos que, pese embora a acusação não ser uma peça sem mácula, os factos alegados, ainda que alguns sejam factos instrumentais,  cujo relevo não decorre directamente, permitem um enquadramento dos ilícitos.
    Deste modo, entendemos que os factos expurgados devem regressar à acusação e consequentemente à pronúncia, com excepção dos artigos 4128, 3948, 13870 a 13873  referidos supra uma vez que estes estão integrados nos factos contantes da acusação relativos à parte da não pronúncia dos arguidos SS, HH ( crimes de abuso de confiança), arguida JJ (crimes de branqueamento) e EE e Spciedade Pepelan (crime de bramqueamento).

    3. DECISÃO
    Face ao exposto, acordam as Juízes desta 9ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa em julgar parcialmente procedente o recurso interposto pelo Ministério Público, decidindo:
    I.
    1. Declarar que o Ministério Público não tem legitimidade para, em sede do presente recurso de decisão de não pronúncia, pedir a alteração da qualificação jurídica dos crimes por si acusados;
    2. Declarar que os Recorridos não têm legitimidade para, em sede de respostas ao recurso interposto, levantar questões novas;
    3. Declarar que os factos pronunciados, em processo separado,   relativamente aos arguidos  AA E BB, dos quais há recurso, não serão tidos em conta neste autos, indeferindo-se a pretensão do Recorrente.
    4.  Declarar que os despachos proferidos pelo Sr. Juiz aquando da validação da apreensão do correio electrónico constante dos apensos de busca, 54, 55, 64, 81, 117, 121, 126, 140, 146, 149, 149-A, 159, 3-A, 6, 6-A, 8, 10, 11, 12, 15, 16, 21, 23, 27, 28, 30, 31, 35, 53, 61, 62, 64, 66, 69, 71,72-A, 73, 80, 82, 87, 89, 92, 106, 107, 109, 113, 116, 120, 131, 132, 133, 134, 137, 138, 147, 164, 166, 175 cumprem, pelo mínimo, os ditames da lei;
    5. Determinar a rectificação do número do artigo indicado pelo acusador a propósito dos crimes de corrupção, sendo que, relativamente aos crimes de corrupção passiva para acto ilícito de titular de cargo politico, onde consta “17°, n.° 1 e 19°, n.°s 2 e 3 da lei 34/87, de 16 de Julho” passa a contar “art.16.° n.º 1 da lei n.º 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela lei n.º 108/2001, de 28 de Novembro “
    6. Determinar a rectificação do crime 12  de branqueamento no sentido de onde consta  “AA, BB E AA” passe a constar  “AA, BB E LL.”
    7. Determinar a rectificação do número do artigo indicado pelo acusador a propósito dos crimes de corrupção do código penal, sendo que, relativamente aos crimes de corrupção passiva para acto ilícito onde consta “art.º 373.º, n.º 1 do CÓDIGO PENAL” passe a contar “art. 372º  do CÓDIGO PENAL”.
    8. Determinar a rectificação da Decisão instrutória no sentido de, onde consta “crime de fraude fiscal qualificada” relativamente a justificativos criados para o recebimento de fundos através da alienação de imóvel cuja propriedade estava titulada pela sociedade “PEPELAN – consultoria e gestão” e com utilização da sociedade em offshore EMP10... LIMITED passe a  constar “ crime de branqueamento – crime 23 – uma vez que aquela denominação se deveu a lapso manifesto
    9. Determinar que no Decisório da não pronúncia passem a constar os  seguintes crimes, cuja ausência se deveu a lapso manifesto: 
    - um crime de fraude fiscal, praticado e de que foi beneficiário o arguido BB, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2010, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alínea a), do RGIT;
    - um crime de fraude fiscal qualificada, praticado e de que foi beneficiário o arguido BB, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2011, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alínea a), e 104.º, n.º 3, do RGIT;
    10. Determinar a rectificação ao crime que na Decisão instrutória vem referido como “crime de branqueamento” , passando ali a constar “  crime de  falsificação relativamente aos relatórios de actividades da XLM, praticado pelo arguido NN  em co-autoria com os arguidos BB E GG, relativos ao forjar e utilização da execução do primeiro contrato entre a LEC SA E A XLM, factos ocorridos entre 2011 e 2013, crime p. e p. pelo art.º 256°, nº l, alíneas a), d) e e) do código penal”;

    II. REVOGAR A DECISÃO INSTRUTÓRIA NOS SEGUINTES TERMOS
    11. Revogar a decisão recorrida na parte em que declarou a nulidade dos actos jurisdicionais praticados pelo JIC do TCIC, e subsequente prova carreada para o apenso 7406/14...., após a sua declaração de incompetência decretada em 18-12-2014, nomeadamente o despacho que ordenou a realização da busca às instalações da EMP11..., constante de fls. 57ss, o despacho que ordenou a apreensão de correspondência no âmbito da busca às instalações da PTSGPS, fls. 74, auto de busca e apreensão constante de fls. 87 relativo à busca às instalações da EMP11..., apreensão do correio electrónico efectuado no âmbito da busca às instalações da Portugal Telecom SGPS SA, constante do auto de apreensão de fls. 105ss, auto de abertura de correio electrónico constante de fls. 128, visualização de correio electrónico constante do despacho de fls. 131, despacho de fls. 161 relativo às gravações e transcrições recolhidas na busca à EMP11..., despachos de fls. 181, 198 e 206, mantendo a sua validade;
    12.  Revogar a decisão instrutória na parte em que declarou a nulidade dos despachos de 06.09.2013, a fls. 425 a 427 do Volume II dos autos principais; de 17.01.2014, a fls. 1643 a 1647, do Volume IV dos autos principais; de 11.02.2014, a fls. 1991 a 1993, do Volume V dos autos principais; de 16.01.2017, a fls. 33412 a 33413, do Volume 86 dos autos principais; e de 16.02.2017, a fls. 35033 a 35034, do Volume 89 dos autos principais, bem como das provas de: fls. 1724 a 1733 do Volume V dos autos principais, referente ao RERT I; documentação junta no Apenso Temático B referente aos RERT II e III do arguido BB; documentação junta no Apenso bancário 124, referente à adesão do arguido RR ao RERT III; documentação junta no Apenso bancário 131, referente à adesão do arguido CC ao RERT I; documentação junta no Apenso bancário 20-L, referente à adesão ao RERT I do arguido HH, e documentação junta no Apenso Bancário 81-C referente à adesão ao RERT I do arguido FF, mantendo a sua validade;
    13. Revogar o despacho do Sr. Juiz de instrução que julgou procedente a invocada proibição da prova obtida na sequência da quebra do sigilo fiscal no âmbito do procedimento de prevenção constante do Apenso A (Relatório de informação sobre o arguido BB) e determinou a sua eliminação, decidindo manter o mesmo nos autos;
    14. Revogar a decisão do Sr. Juiz que declarou inexistente o despacho proferido em 12.10.2016, a fls. 31266 e 31267 dos autos principais, e nulo o despacho proferido em 08.03.2017, a fls. 35838 a 35841, do 91.º Volume, dos autos principais, bem como nulas as provas de: certidão extraída do Processo 362/08.1JAAVR.P1, a fls. 32315, do 83.º Volume dos autos principais; Apenso BB, referente a certidão extraída do Processo 362/08.1JAAVR.P1; Apenso de Transcrição 32 - Alvo 40037M - Telemóvel ...- DD; Apenso de Transcrição 33 - Alvo 40039M - Telemóvel ...92- DD; Apenso de Transcrição 34 - Alvo 1X372M - Telemóvel ...60- DD, mantendo a sua validade;
    15. Revogar a decisão do Sr. Juiz de instrução que declara a nulidade do despacho proferido em 06.09.2013, a fls. 427 a 431 dos autos principais (2.º Volume), na parte respeitante ao varrimento electrónico, e de “todas as provas obtidas com tais medidas, e bem assim as subsequentes numa relação de causalidade com aquelas”;
    16.  Revogar a decisão do Sr. Juiz de instrução quando considerou nulo o despacho do Ministério Público de fls. 30124, datado de 21/06/2016, no qual determinou que a testemunha III procedesse à junção aos autos do disco externo contendo correio electrónico (apenso de Busca 140) e nula a apreensão de correio electrónico realizada no âmbito da busca 147, considerando válidos os elementos de prova em causa;
    17. Revogar o despacho de fls. 925, al. c) no qual o Sr. Juiz considerou nulos os despachos de fls. 13811, 16560, 18263, 28543, 28490, 38837, 29470, 31893, 39956, 37424, 25100, 25809, 6898, 25100, 6873, 6903, 6892, 8388, 8400, 8399, 8534, 8878, 13817, 15182, 15560, 19716, 15883, 18231, 18260, 18494, 18625, 18624, 23858, 25541, 28488, 29767, 30039, 31915, 38132, 38625;
    18. Revogar a decisão do Sr. Juiz de instrução que considerou nula a apreensão de correio electrónico realizada no âmbito das buscas 39, 40, 41, 51 e 119 e a referida no despacho de fls. 40589, mantendo a sua validade;
    19. Revogar a Decisão recorrida que declarou nulo o despacho do MP de fls. 39302, datado de 19.07.2017, no qual determinou a cópia e junção aos autos do correio electrónico proveniente de outros processos (Apensos de busca 179 a 188, 191 a 193 e 195), mantendo a sua validade;
    20. Revogar a decisão do Sr. Juiz de instrução, declarando a validade do despacho de acusação no que concerne à factualidade constante em 6.8. (cf. artigos 3081.º a 3097.º), 6.9. (cf. artigos 3098.º a 3131.º e 3135.º a 3137.º) e 7. (artigos 3187.º a 3336.º e 13996.º a 13998.º);
    21. Declarar que o procedimento criminal  relativamente a todos os crimes de corrupção constantes da acusação não está prescrito e revogar a decisão do Sr. Juiz decidindo que:
    21.1. O procedimento criminal relativo ao crime de  corrupção passiva para acto ilícito de titular de cargo político, cujo cometimento está imputado ao  arguido AA em co-autoria com o arguido BB, com referência a actos praticados no interesse do grupo Lena entre 2005 e 2011, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.º 1.°, 2.°, 3.°, n.º 1, alínea d), 16.°, n.º 1 da lei n.º 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela lei n.º 108/2001, de 28 de Novembro  não está prescrito.
    21.2. O procedimento criminal relativo ao crime de corrupção passiva para acto ilícito de titular de cargo político, imputado ao arguido  AA, com referência a actos praticados no interesse do arguido CC, relativamente a negócios do grupo PORTUGAL TELECOM E GES, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.º lº, 2.°, 3.°, n.º 1, alínea d), 16.° da lei n.º 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela lei n° 108/2001, de 28 de Novembro (lei dos crimes de responsabilidade dos titulares de cargos políticos) não está prescrito.
    21.3.      O procedimento criminal relativo ao crime de corrupção passiva de acto ilícito de        titular de cargo político , imputado ao arguido AA  em co-autoria com o arguido DD, com referencia a actos praticados no interesse dos arguidos EE E FF com utilização das sociedades do grupo VALE DO LOBO, crime p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.º 1º, 2.°, 3.°, n.º 1, alínea d), 16.° da lei 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela lei n° 108/2001, de 28 de Novembro- lei dos crimes de responsabilidade dos titulares de cargos políticos não está prescrito
    21.4.     O procedimento criminal relativo ao crime de corrupção passiva imputado ao arguido QQ relativamente aos pagamentos recebidos enquanto director da RAVE, no âmbito da PPP, mediante acordo celebrado com a XMI, crime p. e p. pelo art.º 372. °, n.º 1 do código penal, com referência ao art.º 386. °, n.ºs 1 e 2 do mesmo diploma legal não está prescrito
    22. Declarar extinto por prescrição o procedimento criminal pelo crime de fraude fiscal praticado e de que foi beneficiário o arguido BB, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2010, e pelo crime de fraude fiscal praticado e de que foi beneficiário o arguido HH, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2010, ambos previstos no artigo 103.º, n.º 1, alínea a), do RGIT
    23. Declarar extinto por prescrição o procedimento criminal pelo crime de falsificação, relativamente aos relatórios de atividades da XLM, praticado, em coautoria, pelos arguidos BB, GG e NN, relativos ao forjar e utilização da execução do primeiro contrato entre a LEC SA e a XLM, factos ocorridos entre 2011 e 2013, crime p. e p. pelo art.º 256°, nº l, alíneas a), d) e e) do Código Penal.

    III
    MANTER A DECISÃO INSTRUTÓRIA NA PARTE REFERENTE À NÃO PRONÚNCIA DOS SEGUINTES ARGUIDOS:
    a) AA, pela prática de:
    - Um crime de falsificação de documento, relativamente ao primeiro contrato de prestação de serviços celebrado entre a LEC S.A. e a XLM, faturas e outra documentação produzida ao abrigo do mesmo, factos ocorridos a partir de 2009, p. e p. pelo art.º 256.º, n.º 1, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
    - Um crime de falsificação de documento, com referência aos contratos de prestação de serviços celebrados entre as sociedades XLM e RMF Consulting, bem como facturas e outra documentação produzida ao abrigo dos mesmos, que serviram de suporte a circulação de quantias entre estas sociedades, com origem e destino no arguido AA, crime p. e p. pelo art.º 256. °, n.º l, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
    - Um crime de falsificação de documento, relativamente ao conjunto de documentos que incluem o contrato-promessa de compra e venda de imóvel em ..., denominado ..., contrato de intermediação EMP02... e XLM, cartas de admissão do seu incumprimento e perda de sinal e celebração de segundo contrato de prestação de serviços entre a LEC e a XLM, bem como faturas e outra documentação produzida ao abrigo destes contratos, factos ocorridos a partir de 2010, crime p. e p. pelo art.º 256.°, n.º l, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
    - Um crime de falsificação de documento, com referência aos contratos de prestação de serviços celebrados entra a XLM e a arguida MM, que serviram de suporte ao recebimento de quantias por esta última com origem no arguido AA, crime p. e p. pelo art.º 256. °, n.º l, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
    - Um crime de falsificação de documento, com referência aos contratos de prestação de serviços celebrados entra a XLM e OO, bem como faturas e outra documentação produzida ao abrigo dos mesmos, que serviram de suporte ao recebimento de quantias por esta última com origem no arguido AA, crime p. e p. pelo art.º 256. °, n.º l, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
    - Um crime de fraude fiscal, de que foi beneficiário, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2006, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alínea a), do RGIT;
    - Um crime de fraude fiscal, de que foi beneficiário, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2007, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alínea a), do RGIT;
    - Um crime de fraude fiscal, de que foi beneficiário, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2008, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alínea a), do RGIT; e
    - Um crime de fraude fiscal, de que foi beneficiário, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2009, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alínea a), do RGIT.
    b) BB, pela prática de:
    - Um crime de falsificação de documento, relativamente ao primeiro contrato de prestação de serviços celebrado entre a LEC S.A. e a XLM, faturas e outra documentação produzida ao abrigo do mesmo, factos ocorridos a partir de 2009, p. e p. pelo art.º 256.º, n.º 1, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
    - Um crime de falsificação de documento, com referência aos contratos de prestação de serviços celebrados entre as sociedades XLM e RMF Consulting, bem como facturas e outra documentação produzida ao abrigo dos mesmos, que serviram de suporte a circulação de quantias entre estas sociedades, com origem e destino no arguido AA, crime p. e p. pelo art.º 256. °, n.º l, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
    - Um crime de falsificação de documento, relativamente ao conjunto de documentos que incluem o contrato-promessa de compra e venda de imóvel em ..., denominado ..., contrato de intermediação EMP02... e XLM, cartas de admissão do seu incumprimento e perda de sinal e celebração de segundo contrato de prestação de serviços entre a LEC e a XLM, bem como faturas e outra documentação produzida ao abrigo destes contratos, factos ocorridos a partir de 2010, crime p. e p. pelo art.º 256.°, n.º l, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
    - Um crime de falsificação de documento, com referência aos contratos de prestação de serviços celebrados entra a XLM e a arguida MM, que serviram de suporte ao recebimento de quantias por esta última com origem no arguido AA, crime p. e p. pelo art.º 256. °, n.º l, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
    - Um crime de falsificação de documento, com referência aos contratos de prestação de serviços celebrados entra a XLM e OO, bem como faturas e outra documentação produzida ao abrigo dos mesmos, que serviram de suporte ao recebimento de quantias por esta última com origem no arguido AA, crime p. e p. pelo art.º 256. °, n.º l, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
    - Um crime de falsificação de documento, relativamente aos relatórios de atividades da XLM, relativos ao forjar e utilização da execução do primeiro contrato entre a LEC SA e a XLM, factos ocorridos entre 2011 e 2013, crime p. e p. pelo art.º 256°, nº l, alíneas a), d) e e) do Código Penal.
    - Um crime de fraude fiscal, de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2006, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alínea a), do RGIT;
    - Um crime de fraude fiscal, de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2007, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alínea a), do RGIT;
    - Um crime de fraude fiscal, de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2008, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alínea a), do RGIT;
    - Um crime de fraude fiscal, de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2009, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alínea a), do RGIT; e
    - Um crime de fraude fiscal, de que foi beneficiário, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2010, p. e p. pelo artigo 103.º, n.º 1, alínea a), do RGIT.
    c) GG, pela prática de:
    - Um crime de falsificação de documento, relativamente ao primeiro contrato de prestação de serviços celebrado entre a LEC S.A. e a XLM, faturas e outra documentação produzida ao abrigo do mesmo, factos ocorridos a partir de 2009, p. e p. pelo art.º 256.º, n.º 1, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
    - Um crime de falsificação de documento, relativamente ao conjunto de documentos que incluem o contrato-promessa de compra e venda de imóvel em ..., denominado ..., contrato de intermediação EMP02... e XLM, cartas de admissão do seu incumprimento e perda de sinal e celebração de segundo contrato de prestação de serviços entre a LEC e a XLM, bem como faturas e outra documentação produzida ao abrigo destes contratos, factos ocorridos a partir de 2010, crime p. e p. pelo art.º 256.°, n.º l, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
    - Um crime de falsificação de documento, relativamente aos relatórios de atividades da XLM, relativos ao forjar e utilização da execução do primeiro contrato entre a LEC SA e a XLM, factos ocorridos entre 2011 e 2013, crime p. e p. pelo art.º 256°, nº l, alíneas a), d) e e) do Código Penal.
    - Um crime de fraude fiscal, de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2009, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alínea a), do RGIT.
    d) CC, pela prática de:
    - Um crime de falsificação de documento, relativamente ao conjunto de documentos que incluem o contrato-promessa de compra e venda de imóvel em ..., denominado ..., contrato de intermediação EMP02... e XLM, cartas de admissão do seu incumprimento e perda de sinal e celebração de segundo contrato de prestação de serviços entre a LEC e a XLM, bem como faturas e outra documentação produzida ao abrigo destes contratos, factos ocorridos a partir de 2010, crime p. e p. pelo art.º 256.°, n.º l, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
    - Um crime de falsificação de documento, relativamente à elaboração e uso de contrato justificativo dos pagamentos CEL_2010 realizados através das contas da ... de HH (“Justificativos dos pagamentos CEL_2010-HH”) cujo objecto se referia à prestação de serviços no ... e outros países ..., p. e p. pelo art.º 256.º, n.º 1, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
    - Um crime de falsificação de documento, relativamente à elaboração e uso de contrato justificativo dos pagamentos PT e CEL_2010 efectuados ao arguido RR, crime p. e p. pelo art.º 256. °, n.º 1, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
    - Um crime de fraude fiscal qualificada, de que foi beneficiário, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2011, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a) e 104°, n.º 3 do RGIT;
    - Um crime de fraude fiscal, de que foi beneficiário HH, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2006, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alínea a), do RGIT; e
    - Um crime de fraude fiscal, de que foi beneficiário HH, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2010, p. e p. pelo artigo 103.º, n.º 1, alínea a), do RGIT.
    e) RR, pela prática de:
    - Um crime de falsificação de documento, relativamente à elaboração e uso de contrato justificativo dos pagamentos PT e CEL_2010 que  foram efectuados  ao arguido RR, crime p. e p. pelo art.º 256. °, n.º 1, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
    - Um crime de fraude fiscal, de que foi beneficiário, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2007, p. e p. pelo artigo 103.º, n.º 1, alínea a), do RGIT.
    f) SS, pela prática de:
    - Um crime de abuso de confiança, relativamente a transferência de €3.967.611,00 (CHF 4.900.000,00), com origem em conta do banco PICTET titulada pelo arguido e com destino a conta do Banco LOMBARD ODIER titulada pela sociedade em offshore EMP05..., controlada pelo arguido CC, em 22 de Novembro de 2011, p. e p. pelo art.º 205. °, n.ºs 1 e 4, alínea b), do Código Penal.
    - Um crime de peculato, relativamente aos pagamentos efectuados pela PT à EMP06..., no período compreendido entre 30 de Julho de 2007 e 9 de Julho de 2008, no valor total de €618.310,00, crime p. e p. pelo art.º 375.°, n.° 1, do Código Penal, com referência ao art.º 386.°, n.°s 1 e 2 do mesmo diploma legal;
    - Um crime de fraude fiscal, de que foi beneficiário, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2007, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alínea a), do RGIT;
    - Um crime de fraude fiscal, de que foi beneficiário, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2010, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alínea a), do RGIT; e
    - Um crime de fraude fiscal qualificada, de que foi beneficiário CC, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2011, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a) e 104°, n.º 3 do RGIT.
    g) DD, pela prática de:
    - Um crime de fraude fiscal, de que foi beneficiário, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2005, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alínea a), do RGIT;
    - Um crime de fraude fiscal, de que foi beneficiário, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2006, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alínea a), do RGIT;
    - Um crime de fraude fiscal, de que foi beneficiário, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2007, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alínea a), do RGIT; e
    - Um crime de fraude fiscal, de que foi beneficiário, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2008, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alínea a), do RGIT.
    h) JJ, pela prática de:
    - Um crime de branqueamento, relativamente às transferências com origem em conta do cidadão ... KK, referentes aos financiamentos concedidos ao Grupo Vale do Lobo, com passagem por conta bancária da ... do arguido GG, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs l, 2 e 3 do Código Penal; e
    - Um crime de branqueamento, a título de cumplicidade, e do qual é autor material o arguido DD, relativamente à transferência de fundos para Portugal com origem em contas tituladas pelas sociedades em offshore EMP07... e EMP08... na ... com utilização da sociedade EMP09... LDA., p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal.
    i) FF, pela prática de:
    - Um crime de fraude fiscal, de que foi beneficiário, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2009, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alínea a), do RGIT; e
    - Um crime de fraude fiscal, de que foi beneficiária Vale do Lobo, no que tange ao IRC relativo aos rendimentos do ano de 2007, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alínea a), do RGIT.
    j) EE, pela prática de:
    - Um crime de branqueamento, relativamente a justificativos criados para o recebimento de fundos através da alienação de imóvel cuja propriedade estava titulada pela sociedade “Pepelan -Consultoria e Gestão” e com utilização da sociedade em offshore EMP10... LIMITED, p e p. pelo art.º 368°-A, nº 1, 2 e 3 do Código Penal;
    - Um crime de fraude fiscal, de que foi beneficiário, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2009, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alínea a), do RGIT;
    - Um crime de fraude fiscal, de que foi beneficiária Vale do Lobo, no que tange ao IRC relativo aos rendimentos do ano de 2007, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alínea a), do RGIT; e
    - Um crime de fraude fiscal, de que foi beneficiária Pepelan, no que tange ao IRC relativo aos rendimentos do ano de 2008, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alíneas a) e c), do RGIT.
    k) K)HH, pela prática de:
    - Um crime de abuso de confiança, relativamente à transferência de 2.750.000,00€, previsto e punido pelo artigo 205.º, n.ºs 1 e 4, alínea b), do Código Penal,
    - Um crime de falsificação de documento, relativamente ao conjunto de documentos que incluem o contrato-promessa de compra e venda de imóvel em ..., denominado ..., contrato de intermediação EMP02... e XLM, cartas de admissão do seu incumprimento e perda de sinal e celebração de segundo contrato de prestação de serviços entre a LEC e a XLM, bem como faturas e outra documentação produzida ao abrigo destes contratos, factos ocorridos a partir de 2010, crime p. e p. pelo art.º 256.°, n.º l, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
     - Um crime de falsificação de documento, relativamente à elaboração e uso de contrato justificativo dos pagamentos CEL_2010 realizados através das suas contas da ... (“Justificativos dos pagamentos CEL_2010-HH”) cujo objecto se referia à prestação de serviços no ... e outros países ..., p. e p. pelo art.º 256.º, n.º 1, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
    - Um crime de fraude fiscal, de que foi beneficiário, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2006, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alínea a), do RGIT; e
    - Um crime de fraude fiscal, de que foi beneficiário, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2010, p. e p. pelo artigo 103.º, n.º 1, alínea a), do RGIT;
    l) LL, pela prática de:
    - Um crime de falsificação de documento, relativamente a produção e uso de documentação referente à aquisição e subsequente arrendamento do apartamento de ..., sito na Av. ..., crime p. e p. pelo art.º 256°, nº l, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
    m) MM, pela prática de:
    - Um crime de falsificação de documento, com referência aos contratos de prestação de serviços celebrados entra a XLM e a arguida MM, que serviram de suporte ao recebimento de quantias por esta última com origem no arguido AA, crime p. e p. pelo art.º 256. °, n.º l, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
    n) NN, pela prática de:
    - Um crime de falsificação de documento, com referência aos contratos de prestação de serviços celebrados entre as sociedades XLM e RMF Consulting, bem como facturas e outra documentação produzida ao abrigo dos mesmos, que serviram de suporte a circulação de quantias entre estas sociedades, com origem e destino no arguido AA, crime p. e p. pelo art.º 256. °, n.º l, alíneas a), d) e e) do Código Penal;
    - Um crime de falsificação de documento, com referência aos contratos de prestação de serviços celebrados entre a sociedade RMF Consulting e VV e WW, bem como facturas e outra documentação produzida ao abrigo dos mesmos, que serviram de suporte ao recebimento de quantias por estes últimos com origem no arguido AA, crime p. e p. pelo art.º 256°, nº 1 alíneas a), d) e e) do Código Penal;
    - Um crime de falsificação de documento, com referência aos contratos de prestação de serviços celebrados entre a sociedade RMF Consulting e XX e YY, bem como faturas e outra documentação produzida ao abrigo dos mesmos, que serviram de suporte ao recebimento de quantias por estes últimos, com origem no arguido AA, crime p. e p. pelo art.º 256°, n.° l, alíneas a), d) e e) do Código Penal; e
    - Um crime de falsificação de documento, relativamente aos relatórios de atividades da XLM, relativos ao forjar e utilização da execução do primeiro contrato entre a LEC SA e a XLM, factos ocorridos entre 2011 e 2013, crime p. e p. pelo art.º 256°, nº l, alíneas a), d) e e) do Código Penal.
    o) Lena Engenharia e Construções, SA, pela prática de:
    - Um crime de corrupção activa, relativamente aos factos imputados ao arguido AA, este em mediação com o arguido BB em benefício do Grupo Lena, com referência aos anos 2005-2011, p e p pelos artigos 374.º e 374.-A, n.º 2, do Código Penal, com referência aos artigos 11.º, n.º 2, e 202.º, alínea b), do mesmo diploma legal;
    - Um crime de fraude fiscal, de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2009, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alínea a), do RGIT.
    p) Lena Engenharia e Construções, SGPS, pela prática de:
    - Um crime de corrupção activa, relativamente aos factos imputados ao arguido AA, este em mediação com o arguido BB em benefício do Grupo Lena, com referência aos anos 2005-2011, p e p pelos artigos 374.º e 374.-A, n.º 2, do Código Penal, com referência aos artigos 11.º, n.º 2, e 202.º, alínea b), do mesmo diploma legal;
    q) Lena SGPS, pela prática de:
    - Um crime de corrupção activa, relativamente aos factos imputados ao arguido AA, este em mediação com o arguido BB em benefício do Grupo Lena, com referência aos anos 2005-2011, p e p pelos artigos 374.º e 374.-A, n.º 2, do Código Penal, com referência aos artigos 11.º, n.º 2, e 202.º, alínea b), do mesmo diploma legal;
    r) XLM- Sociedade de Estudos e Projetos, Lda., pela prática de:
    -  Um crime de branqueamento, relativamente à utilização da sociedade XLM, entre 2009 e 2015, para a colocação de fundos destinados ao arguido AA e utilização dos mesmos no seu interesse através do pagamento de despesas e de distribuição de dividendos para contas tituladas pelo arguido BB, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
    - Um crime de branqueamento, relativamente aos movimentos financeiros ocorridos a partir de 2010, abrangidos pela operação CEL_2010, justificados através de contrato promessa de compra e venda com perda de sinal referente ao imóvel ..., sito em ..., e introdução desses fundos no Grupo LENA, crime p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal.
    - Um crime de branqueamento, relativamente a utilização da sociedade RMF CONSULTING, entre 2010 e 2014, para a colocação de fundos destinados ao arguido AA e utilização dos mesmos no seu interesse através do pagamento de despesas suas e colocação de numerário à sua disposição, crime p. e p. pelo art.º 368°-A, n° 1, 2 e 3 do Código Penal.
    - Um crime de fraude fiscal, de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2009, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alínea a), do RGIT;
    - Um crime de fraude fiscal qualificada, de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2010, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a), e 104°, n.° 2, do RGIT;
    - Um crime de fraude fiscal qualificada, de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2011, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a), e 104°, n.º 2, do RGIT;
    - Um crime de fraude fiscal qualificada, de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2012, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a), e 104°, n.º 2, alínea a), e n.º 3, do RGIT;
    - Um crime de fraude fiscal qualificada, de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2013, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a), e 104°, n.º 2, alínea a), e n.º 3, do RGIT;
    - Um crime de fraude fiscal qualificada, de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2014, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a), e 104°, n.º 2, alínea a), e n.º 3, do RGIT; e
    - Um crime de fraude fiscal qualificada, de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2015, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a), e 104°, n.º 2, alínea a), e n.º 3, do RGIT.
    s) Oceano Clube Empreendimentos Turísticos do Algarve, SA, pela prática de:
    - Um crime de fraude fiscal, de que foi beneficiário FF, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2009, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alínea a), do RGIT;
    - Um crime de fraude fiscal, de que foi beneficiário EE, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2009, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alínea a), do RGIT; e
    - Um crime de fraude fiscal, de que foi beneficiária Vale do Lobo, no que tange ao IRC relativo aos rendimentos do ano de 2007, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alínea a), do RGIT.
    t) Vale do Lobo Resort Turístico de Luxo, SA, pela prática de:
    - Um crime de fraude fiscal, de que foi beneficiária, no que tange ao IRC relativo aos rendimentos do ano de 2007, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alínea a), do RGIT;
    - Um crime de fraude fiscal, de que foi beneficiário FF, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2009, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alínea a), do RGIT; e
    - Um crime de fraude fiscal, de que foi beneficiário EE, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2009, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alínea a), do RGIT;
    u) Pepelan- Consultoria e Gestão, SA, pela prática de:
    - Um crime de branqueamento, relativamente a justificativos criados para o recebimento de fundos através da alienação de imóvel cuja propriedade estava titulada pela sociedade arguida e com utilização da sociedade em offshore EMP10... LIMITED, p e p. pelo art.º 368°-A, nº 1, 2 e 3 do Código Penal;
    - Um crime de fraude fiscal, de que foi beneficiária, no que tange ao IRC relativo aos rendimentos do ano de 2008, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alíneas a) e c), do RGIT.
    Consequentemente eliminar da acusação os factos constantes dos artigos 13826, 13827, 13828, 13829, 13830, na parte em que se referem ao arguido SS e  as referências feitas ao arguido HH nos artigos 13820, 13821, 13822, 13823 e 13824 no que respeita aos crimes de abuso de confiança que lhes eram imputados; dos artigos 338, 339, 3340, 342, 3844, 3846, 3853, 3916, 3918, 3921, 39324, 3931, 3945, 4101, 4103, 4128, 4200, dos artigos 13724, 13866, 13869, 14065, 14070, 14075 e 14078, na parte respeitantes à não pronúncia dos crimes de branqueamento  7 e 20 imputados à arguida JJ; e dos artigos 3948 a 4016, 13870 a 13873 na parte respeitante à não pronúncia dos crimes de  branqueamento imputados aos arguidos EE e da sociedade “pepelan - consultoria e gestão.
    IV
    Revogar a decisão recorrida e pronunciar os arguidos infra identificados pela prática dos seguintes crimes:
    ARGUIDO AA
    Três (3) crimes de corrupção
    1. Um crime de corrupção passiva de titular de cargo político, para actos ilícitos, em co-autoria com o arguido BB, com referência a actos praticados no interesse do Grupo LENA entre 2005 e 2011, p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.ºs 1.°, 2.°, 3.°, n.º 1, alínea d), e 16.°, n.º 1, da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n.º 108/2001, de 28 de Novembro (Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos);
    2.  Um crime de corrupção passiva de titular de cargo político, para actos ilícitos, com referência a actos praticados no interesse do arguido CC, relativamente a negócios do grupo PORTUGAL TELECOM E GES, p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.ºs 1º, 2.°, 3.°, n.º 1, alínea d), e 16.° da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n° 108/2001, de 28 de Novembro (Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos);
    3. Um crime de corrupção passiva de titular de cargo político, para actos ilícitos, em co-autoria com o arguido DD, com referência a actos praticados no interesse dos arguidos EE e FF, com utilização das sociedades do Grupo Vale do Lobo, p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.ºs 1º, 2.°, 3.°, n.º 1, alínea d), e 16.° da Lei 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n.° 108/2001, de 28 de Novembro (Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos);
    Treze (13) crimes de branqueamento de capitais
    4. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos BB e GG, relativamente aos movimentos financeiros com origem no Grupo LENA e com passagem pelas contas da ... tituladas pelo arguido GG e realizados a partir de 2007, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal;
    5. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos BB, GG e sociedade LEC SA, relativamente à utilização da sociedade XLM, entre 2009 e 2015, para a colocação de fundos destinados ao arguido AA e utilização dos mesmos no seu interesse através do pagamento de despesas e de distribuição de dividendos para contas tituladas pelo arguido BB, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal;
    6. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos CC, BB, HH e II, relativamente à utilização entre 2006 e 2008, de contas na ... em que o arguido II era autorizado e operações financeiras realizadas a partir das mesmas, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
    7. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos CC, HH, II e BB, relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados no ano de 2007 e até ao início de 2008, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
    8. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos CC, HH, BB e GG, relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados a partir de 2008, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, e com intervenção das contas da ... do arguido GG, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
    9. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos CC, HH, BB, GG e as sociedades LEC SA, LEC SGPS e LENA SGPS,  relativamente aos movimentos financeiros ocorridos a partir de 2010, abrangidos pela operação CEL_2010, justificados através de contrato promessa de compra e venda com perda de sinal referente ao imóvel ..., sito em ..., e introdução desses fundos no Grupo LENA, crime p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
    10. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos BB, GG, DD, EE e FF, relativamente às transferências com origem em conta do cidadão ... KK, referentes aos financiamentos concedidos ao Grupo Vale do Lobo, com passagem por conta bancária da ... do arguido GG, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs l, 2 e 3 do Código Penal;
    11. Um crime de branqueamento, em co-autoria com o arguido BB, relativamente à concentração dos fundos em novas contas bancárias da ... tituladas por sociedades em offshore controladas por BB e sua transferência para contas tituladas por este último arguido em Portugal, ao abrigo do RERT II, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
    12. Um crime de branqueamento, em co-autoria com o arguido BB, relativamente à dissipação dos fundos por outras contas em Portugal, de que o arguido BB era titular e autorizado, e à confusão de patrimónios de AA e de BB nessas contas bancárias, p. e p. pelo art.º368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
    13. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos BB e LL, quanto a aquisição de imóveis em Portugal com o retorno do preço pago para a esfera patrimonial do arguido AA, de forma justificada, factos ocorridos entre 2010 e 2012, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
    14. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos BB e LL, relativamente à aquisição e subsequente arrendamento de um imóvel em ..., com intenção de ocultação da titularidade do ativo, factos praticados entre 2012 e 2014, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal.
    15. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos BB e LL, relativamente à entrega pelo arguido BB de quantias pertencentes ao arguido AA para depósito em contas bancárias do arguido LL e para guardar em cofre bancário e em contas tituladas pelo mesmo, de forma a ocultar a propriedade desses valores pelo arguido AA, factos ocorridos nos anos de 2012 e 2013, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2, 3 do Código Penal;
    16. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos BB e MM, relativamente à aquisição de um imóvel, designado “Monte ...”, com intenção de que passasse a integrar o património familiar do arguido AA, com registo em nome de terceiro e montagem de operação de financiamento entre 2011 e 2014, p. e p. pelo art.º 368.º, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal.
    Seis (6) crimes de fraude fiscal
    17. Um crime de fraude fiscal qualificada, de que foi beneficiário, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2010, em coautoria com os arguidos BB, GG e Lena Engenharia e Construções, SA, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a), e 104°, n.° 2, do RGIT;
    18. Um crime de fraude fiscal qualificada, de que foi beneficiário, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2011, em coautoria com os arguidos BB, GG e Lena Engenharia e Construções, SA, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a), e 104°, n.º 2 do RGIT;
    19. Um crime de fraude fiscal qualificada, de que foi beneficiário, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2012, em coautoria com os arguidos BB, GG e Lena Engenharia e Construções, SA, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a), e 104°, n.º 2, alínea a), e n.º 3, do RGIT;
    20. Um crime de fraude fiscal qualificada, de que foi beneficiário, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2013, em coautoria com os arguidos BB, GG e Lena Engenharia e Construções, SA, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a), e 104°, n.º 2, alínea a), e n.º 3, do RGIT;
    21. Um crime de fraude fiscal qualificada, de que foi beneficiário, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2014, em coautoria com os arguidos BB, GG e Lena Engenharia e Construções, SA, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a), e 104°, n.º 2, alínea a), e n.º 3, do RGIT; e
    22. Um crime de fraude fiscal qualificada, de que foi beneficiário, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2015, em coautoria com os arguidos BB, GG e Lena Engenharia e Construções, SA, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a), e 104°, n.º 2, alínea a), e n.º 3, do RGIT.
    ARGUIDO BB
    Dois (2) crimes de corrupção
    1. Um crime de corrupção passiva de titular de cargo político, para actos ilícitos, em co-autoria com o arguido AA, com referência a actos praticados no interesse do Grupo LENA entre 2005 e 2011, p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.ºs 1.°, 2.°, 3.°, n.º 1, alínea d), e 16.°, n.º 1, da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n.º 108/2001, de 28 de Novembro (Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos);
    2. Um crime de corrupção activa, para actos ilícitos, em co-autoria com os arguidos GG, PP e as sociedades LEC SA, LEC SGPS e LENA SGPS, relativamente à pessoa do arguido QQ, com referência a factos ocorridos nos anos de 2007 a 2009, p. e p. pelo art.º 374. °, n.º 1, do Código Penal;
    Quatorze (14) crimes de branqueamento
    3. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA e GG, relativamente aos movimentos financeiros com origem no Grupo LENA e com passagem pelas contas da ... tituladas pelo arguido GG e realizados a partir de 2007, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
    4. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, GG e sociedade LEC SA, relativamente à utilização da sociedade XLM, entre 2009 e 2015, para a colocação de fundos destinados ao arguido AA e utilização dos mesmos no seu interesse através do pagamento de despesas e de distribuição de dividendos para contas tituladas pelo arguido BB, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
    5. Um crime de branqueamento, , em co-autoria com os arguidos AA, CC, HH e II, relativamente à utilização, entre 2006 e 2008, das contas na ... em que este último era autorizado e operações financeiras realizadas a partir das mesmas, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
    6. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, CC, HH e II, relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados no ano de 2007 e até ao início de 2008, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
    7. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos CC, HH, AA e GG, relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados a partir de 2008, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, e com intervenção das contas da ... do arguido GG, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
    8. Um crime de branqueamento, , em co-autoria com os arguidos CC, HH, AA e GG e as sociedades LEC SA, LEC SGPS e LENA SGPS, relativamente aos movimentos financeiros ocorridos a partir de 2010, abrangidos pela operação CEL_2010, justificados através de contrato promessa de compra e venda com perda de sinal referente ao imóvel ..., sito em ..., e introdução desses fundos no Grupo LENA, p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
    9. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, GG, DD, EE e FF, relativamente às transferências com origem em conta do cidadão ... KK, referentes aos financiamentos concedidos ao Grupo Vale do Lobo, com passagem por conta bancária da ... do arguido GG, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs l, 2 e 3 do Código Penal;
    10. Um crime de branqueamento, em co-autoria com o arguido AA, relativamente à concentração dos fundos em novas contas bancárias da ... tituladas por sociedades em offshore controladas por BB e sua transferência para contas tituladas por este último arguido em Portugal, ao abrigo do RERT II, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
    11. Um crime de branqueamento, em co-autoria com o arguido AA, relativamente à dissipação dos fundos por outras contas em Portugal, de que o arguido BB era titular e autorizado, e à confusão de patrimónios de AA e de BB nessas contas bancárias, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
    12. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA e LL, quanto a aquisição de imóveis em Portugal com o retorno do preço pago para a esfera patrimonial do arguido AA, de forma justificada, factos ocorridos entre 2010 e 2012, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
    13. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA e LL, relativamente à aquisição e subsequente arrendamento de um imóvel em ..., com intenção de ocultação da titularidade do ativo, factos praticados entre 2012 e 2014, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
    14. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA e LL, relativamente à entrega pelo arguido BB de quantias pertencentes ao arguido AA para depósito em contas bancárias do arguido LL e para guardar em cofre bancário e em contas tituladas pelo mesmo, de forma a ocultar a propriedade desses valores pelo arguido AA, factos ocorridos nos anos de 2012 e 2013, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2, 3 do Código Penal;
    15. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA e MM, relativamente à aquisição de um imóvel, designado “Monte ...”, com intenção de que passasse a integrar o património familiar do arguido AA, com registo em nome de terceiro e montagem de operação de financiamento entre 2011 e 2014, p. e p. pelo art.º 368.º, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
    16. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos GG, PP e QQ, relativamente a utilização da sociedade XMI e sua contabilidade para a colocação de fundos na esfera patrimonial do arguido QQ, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
    Sete (7) crimes de fraude fiscal
    17. Um crime de fraude fiscal qualificada, de que foi beneficiário, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2011, p. e p. pelo artigo 103°, n.º 1, alínea a), e 104.º, n.º 3, do RGIT;
    18. Um crime de fraude fiscal qualificada, de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2010, em coautoria com os arguidos AA, GG e Lena Engenharia e Construções, SA, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a), e 104°, n.° 2, do RGIT;
    19. Um crime de fraude fiscal qualificada, de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2011, em coautoria com os arguidos AA, GG e Lena Engenharia e Construções, SA, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a), e 104°, n.º 2 do RGIT;
    20. Um crime de fraude fiscal qualificada, de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2012, em coautoria com os arguidos AA, GG e Lena Engenharia e Construções, SA, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a), e 104°, n.º 2, alínea a), e n.º 3, do RGIT;
    21. Um crime de fraude fiscal qualificada, de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2013, em coautoria com os arguidos AA, GG e Lena Engenharia e Construções, SA, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a), e 104°, n.º 2, alínea a), e n.º 3, do RGIT;
    22. Um crime de fraude fiscal qualificada, de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2014, em coautoria com os arguidos AA, GG e Lena Engenharia e Construções, SA, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a), e 104°, n.º 2, alínea a), e n.º 3, do RGIT; e
    23. Um crime de fraude fiscal qualificada, de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2015, em coautoria com os arguidos AA, GG e Lena Engenharia e Construções, SA, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a), e 104°, n.º 2, alínea a), e n.º 3, do RGIT.
    ARGUIDO GG
    Dois (2) crimes de corrupção
    1. Um crime de corrupção activa de titular de cargo político, para actos ilícitos, relativamente a pessoa do arguido AA, este com mediação do arguido BB e em benefício do Grupo LENA, com referência aos anos de 2005 a 2011, p. e p. pelos art.ºs 2°, 3°, n.º 1, alínea d), e 18°, n.º 1, da Lei 34/87, de 16 de Julho, com a redacção introduzida pela Lei n.° 108/2001;
    2. Um crime de corrupção activa, para actos ilícitos, em co-autoria com os arguidos BB, PP e as sociedades LEC SA, LEC SGPS e LENA SGPS, relativamente à pessoa do arguido QQ, com referência a factos ocorridos nos anos de 2007 a 2009, p. e p. pelo art.º 374. °, n.º 1, do Código Penal;
    Sete (7) crimes de branqueamento
    3. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA e BB, relativamente aos movimentos financeiros com origem no Grupo LENA e com passagem pelas contas da ... tituladas pelo arguido GG e realizados a partir de 2007, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
    4. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, BB e sociedade LEC SA, relativamente à utilização da sociedade XLM, entre 2009 e 2015, para a colocação de fundos destinados ao arguido AA e utilização dos mesmos no seu interesse através do pagamento de despesas e de distribuição de dividendos para contas tituladas pelo arguido BB, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
    5. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, BB, CC e HH, relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados a partir de 2008, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, e com intervenção das contas da ... do arguido GG, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
    6. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, BB, CC, HH e as sociedades LEC SA, LEC SGPS e LENA SGPS, relativamente aos movimentos financeiros ocorridos a partir de 2010, abrangidos pela operação CEL_2010, justificados através de contrato promessa de compra e venda com perda de sinal referente ao imóvel ..., sito em ..., e introdução desses fundos no Grupo LENA, p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
    7. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, BB, DD, EE e FF relativamente às transferências com origem em conta do cidadão ... KK, referentes aos financiamentos concedidos ao Grupo Vale do Lobo, com passagem por conta bancária da ... do arguido GG, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs l, 2 e 3 do Código Penal;
    8. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos NN, as sociedades LEC SA e RMF CONSULTING (e AA e BB- pronunciados), relativamente a utilização desta última sociedade, entre 2010 e 2014, para a colocação de fundos destinados ao arguido AA e utilização dos mesmos no seu interesse através do pagamento de despesas suas e colocação de numerário à sua disposição, p. e p. pelo art.º 368°-A, n° 1, 2 e 3 do Código Penal;
    9. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos BB, PP e QQ, relativamente a utilização da sociedade XMI e sua contabilidade para a colocação de fundos na esfera patrimonial do arguido QQ, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
    Seis (6) crimes de fraude fiscal
    10. Um crime de fraude fiscal qualificada, de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2010, em coautoria com os arguidos AA, BB e Lena Engenharia e Construções, SA, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a), e 104°, n.° 2, do RGIT;
    11. Um crime de fraude fiscal qualificada, de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2011, em coautoria com os arguidos AA, BB e Lena Engenharia e Construções, SA, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a), e 104°, n.º 2 do RGIT;
    12. Um crime de fraude fiscal qualificada, de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2012, em coautoria com os arguidos AA, BB e Lena Engenharia e Construções, SA, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a), e 104°, n.º 2, alínea a), e n.º 3, do RGIT;
    13. Um crime de fraude fiscal qualificada, de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2013, em coautoria com os arguidos AA, BB e Lena Engenharia e Construções, SA, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a), e 104°, n.º 2, alínea a), e n.º 3, do RGIT;
    14. Um crime de fraude fiscal qualificada, de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2014, em coautoria com os arguidos AA, BB e Lena Engenharia e Construções, SA, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a), e 104°, n.º 2, alínea a), e n.º 3, do RGIT; e
    15. Um crime de fraude fiscal qualificada, de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2015, em coautoria com os arguidos AA, BB e Lena Engenharia e Construções, SA, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a), e 104°, n.º 2, alínea a), e n.º 3, do RGIT.
    ARGUIDO PP
    Um (1) crime de corrupção
    1. Um crime de corrupção activa, para actos ilícitos, em co-autoria com os arguidos BB, GG e as sociedades LEC SA, LEC SGPS e LENA SGPS, relativamente à pessoa do arguido QQ, com referência a factos ocorridos nos anos de 2007 a 2009, p. e p. pelo art.º 374.º, n.º 1 do Código Penal; e
    Um (1) crime de branqueamento
    2. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos BB, GG e QQ, relativamente a utilização da sociedade XMI e sua contabilidade para a colocação de fundos na esfera patrimonial do arguido QQ, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal.
    arguido  QQ
    Um (1) crime de corrupção
    1. Um crime de corrupção passiva, para actos ilícitos, relativamente aos pagamentos recebidos enquanto director da RAVE, no âmbito da PPP1, mediante acordo celebrado com a XMI, p. e p. pelo art.º 372. °, n.º 1, do Código Penal, com referência ao art.º 386. °, n.ºs 1 e 2, do mesmo diploma legal, na redação introduzida pela Lei n.º 108/2001, de 28 de Novembro;
    Um (1) crime de branqueamento
    2. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos BB, GG e PP, relativamente a utilização da sociedade XMI e sua contabilidade para a colocação de fundos na esfera patrimonial do arguido QQ, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal.
    ARGUIDO CC
    Três (3) crimes de corrupção
    1. Um crime de corrupção activa de titular de cargo político, para actos ilícitos, relativamente a negócios do Grupo Portugal Telecom e GES, no que concerne aos pagamentos efectuados ao arguido AA, p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.ºs 1°, 2°, 3°, n.º 1, alínea d), e 18°, n.º 1, da Lei 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n.° 108/2001, de 28 de Novembro (Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos);
    2. Um crime de corrupção activa, para actos ilícitos, relativamente a negócios do Grupo Portugal Telecom e GES, no que concerne aos pagamentos efectuados ao arguido RR, p. e p. pelo art.ºs 374°, n.º 1, do Código Penal, com referência ao art.º 386°, n.º 2, do mesmo diploma legal;
    3. Um crime de corrupção activa, para actos ilícitos, relativamente a negócios do Grupo Portugal Telecom e GES, no que concerne aos pagamentos efectuados ao arguido SS, p. e p. pelo art.ºs 374°, n.º 1, do Código Penal, com referência ao art.º 386°, n.º 2, do mesmo diploma legal;
    Oito (8) crimes de branqueamento
    4. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, BB, HH e II, relativamente à utilização entre 2006 e 2008, de contas na ... em que o arguido II era autorizado e operações financeiras realizadas a partir das mesmas, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
    5. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, BB, HH e II, relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados no ano de 2007 e até ao início de 2008, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
    6. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, HH, BB e GG, relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados a partir de 2008, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, e com intervenção das contas da ... do arguido GG, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
    7. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, BB, HH, GG e as sociedades LEC SA, LEC SGPS e LENA SGPS, relativamente aos movimentos financeiros ocorridos a partir de 2010, abrangidos pela operação CEL_2010, justificados através de contrato promessa de compra e venda com perda de sinal referente ao imóvel ..., sito em ..., e introdução desses fundos no Grupo LENA, crime p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
    8. Um crime de branqueamento, em co-autoria com o arguido RR, relativamente aos pagamentos PT e CEL_2010, realizados entre 7 de Dezembro de 2007 e 20 de Setembro de 2011, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES (e com destino para as contas de que era beneficiário RR), crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.°s 1, 2 e 3 do Código Penal;
    9. Um crime de branqueamento, em co-autoria com o arguido SS, relativamente aos pagamentos PT e CEL_2010, realizados entre 9 de Julho de 2007 e 23 de Novembro de 2012, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES (e com destino para as contas de que era beneficiário SS), crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.°s 1, 2 e 3 do Código Penal;
    10. Um crime de branqueamento, em co-autoria com o arguido SS, relativamente à transferência de €3.967.611,00 (CHF 4.900.000,00), com origem em conta do banco PICTET titulada por SS e com destino a conta do Banco LOMBARD ODIER titulada pela sociedade em offshore EMP05..., controlada pelo arguido CC, em 22 de Novembro de 2011, crime p. e p. pelo art.368°A, n.º 1, 2 e 3 do Código Penal; e
    11. Um crime de branqueamento, em co-autoria com o arguido HH, relativamente à transferência de €2.750.000,00, com origem em conta da ES Enterprises na ..., de conta titulada pela sociedade EMP04... na ..., controlada pelo arguido HH, para conta do Crédit Suisse, titulada pela sociedade em offshore EMP03..., controlada por CC, em Novembro de 2011, crime p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal.
    ARGUIDO RR
    Um (1) crime de corrupção
    1. Um crime de corrupção passiva, para actos ilícitos, relativamente a negócios do Grupo Portugal Telecom e GES, no que concerne aos pagamentos recebidos do arguido CC, com origem em conta da ... da ES Enterprises, p. e p. pelo art.º 372°, n.º 1, com referência ao art.º 386°, n.º 2, ambos do Código Penal, na redação introduzida pela Lei n.º 108/2001, de 28 de Novembro;
    Um (1) crime de branqueamento
    2. Um crime de branqueamento, em co-autoria com o arguido CC, relativamente aos pagamentos PT e CEL_2010, realizados entre 7 de Dezembro de 2007 e 20 de Setembro de 2011, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES (e com destino para as contas de que era beneficiário RR), p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.°s 1, 2 e 3 do Código Penal; e
    Um (1) crime de fraude fiscal
    3. Um crime de fraude fiscal qualificada, de que foi beneficiário no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2011, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a), e 104°, n.º 3, do RGIT.
    ARGUIDO SS
    Um (1) crime de corrupção
    1. Um crime de corrupção passiva, para actos ilícitos, relativamente a negócios do Grupo Portugal Telecom e GES, no que concerne aos pagamentos recebidos do arguido CC, com origem em conta da ... da ES Enterprises, p. e p. pelo art.º 372°, n.º 1, com referência ao art.º 386°, n.º 2, ambos do Código Penal, na redação introduzida pela Lei n.º 108/2001, de 28 de Novembro;
    Dois (2) crimes de branqueamento
    2. Um crime de branqueamento, em co-autoria com o arguido CC, relativamente aos pagamentos PT e CEL_2010, realizados entre 9 de Julho de 2007 e 23 de Novembro de 2012, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES (e com destino para as contas de que era beneficiário SS), crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.°s 1, 2 e 3 do Código Penal;
    3. Um crime de branqueamento, em co-autoria com o arguido CC, relativamente à transferência de €3.967.611,00 (CHF 4.900.000,00), com origem em conta do banco PICTET titulada por SS e com destino a conta do Banco LOMBARD ODIER titulada pela sociedade em offshore EMP05..., controlada pelo arguido CC, em 22 de Novembro de 2011, crime p. e p. pelo art.368°A, n.º 1, 2 e 3 do Código Penal;
    Dois (2) crimes de fraude fiscal
    4. Um crime de fraude fiscal qualificada, de que foi beneficiário, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2011, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a), e 104°, n.º 3, do RGIT; e
    5. Um crime de fraude fiscal qualificada, de que foi beneficiário, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2012, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a), e 104°, n.º 3, do RGIT.
    ARGUIDO DD
    Um (1) crime de corrupção
    1. Um crime de corrupção passiva de titular de cargo político, para actos ilícitos, em co-autoria com o arguido AA, com referência a actos praticados no interesse dos arguidos EE e FF, com utilização das sociedades do Grupo Vale do Lobo, p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.ºs 1º, 2.°, 3.°, n.º 1, alínea d), e 16.° da Lei 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n.° 108/2001, de 28 de Novembro (Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos); e
    Um (1) crime de branqueamento de capitais
    2. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, BB, GG, EE e FF, relativamente às transferências com origem em conta do cidadão ... KK, referentes aos financiamentos concedidos ao Grupo Vale do Lobo, com passagem por conta bancária da ... do arguido GG, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs l, 2 e 3 do Código Penal.
    ARGUIDO EE
    Um (1) crime de corrupção
    1. Um crime de corrupção activa de titular de cargo político,  para actos ilícitos, em co-autoria com o arguido FF, com referência a actos praticados por AA e DD, no interesse dos primeiros, p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.ºs  2°, 3°, n.º 1, alínea d), 18°, n.º 1, e 30°, da Lei 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n.° 108/2001, de 28 de Novembro (Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos); e
    Um (1) crime de branqueamento de capitais
    2. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, BB, GG, DD e FF relativamente às transferências com origem em conta do cidadão ... KK, referentes aos financiamentos concedidos ao Grupo Vale do Lobo, com passagem por conta bancária da ... do arguido GG, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs l, 2 e 3 do Código Penal.
    ARGUIDO FF
    Um (1) crime de corrupção
    1. Um crime de corrupção activa de titular de cargo político,  para actos ilícitos, em co-autoria com o arguido EE, com referência a actos praticados por AA e DD, no interesse dos primeiros, p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.ºs  2°, 3°, n.º 1, alínea d), 18°, n.º 1, e 30°, da Lei 34/87, de 16 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n.° 108/2001, de 28 de Novembro (Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos); e
    Um (1) crime de branqueamento de capitais
    2. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, BB, GG, DD e EE, relativamente às transferências com origem em conta do cidadão ... KK, referentes aos financiamentos concedidos ao Grupo Vale do Lobo, com passagem por conta bancária da ... do arguido GG, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs l, 2 e 3 do Código Penal.
    ARGUIDO II
    Dois (2) crimes de branqueamento
    1. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, CC, BB e HH, relativamente à utilização entre 2006 e 2008, de contas na ... em que o arguido II era autorizado e operações financeiras realizadas a partir das mesmas, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal; e
    2. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, CC, BB e HH, relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados no ano de 2007 e até ao início de 2008, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal.
    HH
    Cinco (5) crimes de branqueamento
    1. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, CC, BB e II, relativamente à utilização entre 2006 e 2008, de contas na ... em que o arguido II era autorizado e operações financeiras realizadas a partir das mesmas, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
    2. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, CC, BB e II, relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados no ano de 2007 e até ao início de 2008, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
    3. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, CC, BB e GG, relativamente aos movimentos financeiros justificados pelos contratos EMP01..., realizados a partir de 2008, com origem em conta da ... da ES ENTERPRISES, e com intervenção das contas da ... do arguido GG, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
    4. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, CC, BB, GG e as sociedades LEC SA, LEC SGPS e LENA SGPS, relativamente aos movimentos financeiros ocorridos a partir de 2010, abrangidos pela operação CEL_2010, justificados através de contrato promessa de compra e venda com perda de sinal referente ao imóvel ..., sito em ..., e introdução desses fundos no Grupo LENA, crime p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal; e
    5. Um Crime de branqueamento, em co-autoria com o arguido CC, relativamente à transferência de €2.750.000,00, com origem em conta da ES Enterprises na ..., de conta titulada pela sociedade EMP04... na ..., controlada pelo arguido HH, para conta do Crédit Suisse, titulada pela sociedade em offshore EMP03..., controlada por CC, em Novembro de 2011, crime p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal.
    LL
    Três (3) crimes de branqueamento
    1. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA e BB, quanto a aquisição de imóveis em Portugal com o retorno do preço pago para a esfera patrimonial do arguido AA, de forma justificada, factos ocorridos entre 2010 e 2012, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
    2. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA e BB, relativamente à aquisição e subsequente arrendamento de um imóvel em ..., com intenção de ocultação da titularidade do ativo, factos praticados entre 2012 e 2014, previsto e punido pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal; e
    3. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA e BB, relativamente à entrega pelo arguido BB de quantias pertencentes ao arguido AA para depósito em contas bancárias do arguido LL e para guardar em cofre bancário e em contas tituladas pelo mesmo, de forma a ocultar a propriedade desses valores pelo arguido AA, factos ocorridos nos anos de 2012 e 2013, crime p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2, 3 do Código Penal.
    ARGUIDA TT
    Um (1) crime de branqueamento
    1. Um crime de branqueamento, em co-autoria com outros (AA e BB- pronunciados), relativamente à disponibilização, por parte de TT, das suas contas bancárias junto do Montepio Geral para receção de fundos provenientes do arguido BB para entrega ao arguido AA, ocultando a titularidade destas quantias por este último arguido, factos ocorridos nos anos de 2013 e 2014, p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal.
    ARGUIDO  UU
    Um (1) crime de branqueamento
    1Um crime de branqueamento, , em co-autoria com outros (AA BB- pronunciados) com referência aos factos relacionados com a utilização da conta bancária de  UU para a passagem de fundos pertencentes ao arguido AA recebidos do arguido BB, e sua transferência subsequente para a conta do arguido AA, factos ocorridos nos anos de 2011 a 2014, p. e p. pelo artigo 368°-A, n° 1 e 2 do Código Penal
    ARGUIDA MM
    Um (1) crime de branqueamento
    1. Um crime de branqueamento,  em co-autoria com os arguidos AA e BB, relativamente à aquisição de um imóvel, designado “Monte ...”, com intenção de que passasse a integrar o património familiar do arguido AA, com registo em nome de terceiro e montagem de operação de financiamento entre 2011 e 2014, p. e p. pelo art.º 368.º, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal.
    ARGUIDO NN
    Um (1) crime de branqueamento de capitais
    1. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos GG e sociedades LEC SA e RMF CONSULTING (e AA e BB- pronunciados), relativamente a utilização desta última sociedade, entre 2010 e 2014, para a colocação de fundos destinados ao arguido AA e utilização dos mesmos no seu interesse através do pagamento de despesas suas e colocação de numerário à sua disposição, p. e p. pelo art.º 368°-A, n° 1, 2 e 3 do Código Penal.
    ARGUIDA “LENA ENGENHARIA E CONSTRUÇÕES, S.A.” (LEC, S.A.)
    Um (1) crime de corrupção
    1. Um crime de corrupção activa, para actos ilícitos, em co-autoria com os arguidos BB, GG, PP e as sociedades LEC SGPS e LENA SGPS, relativamente à pessoa do arguido QQ, com referência a factos ocorridos nos anos de 2007 a 2009, p. e p. pelo art.º 374.°, n.º 1, do Código Penal;
    Três (3) crimes de branqueamento de capitais
    2. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, BB e GG, relativamente à utilização da sociedade XLM, entre 2009 e 2015, para a colocação de fundos destinados ao arguido AA e utilização dos mesmos no seu interesse através do pagamento de despesas e de distribuição de dividendos para contas tituladas pelo arguido BB, p. e p. pelo art.º 368.°-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal;
    3. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, BB, CC, HH, GG e as sociedades LEC SGPS e LENA SGPS, relativamente aos movimentos financeiros ocorridos a partir de 2010, abrangidos pela operação CEL_2010, justificados através de contrato promessa de compra e venda com perda de sinal referente ao imóvel ..., sito em ..., e introdução desses fundos no Grupo LENA, p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal; e
    4. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos GG, NN e sociedade RMF CONSULTING (e AA e BB- pronunciados), relativamente a utilização desta sociedade, entre 2010 e 2014, para a colocação de fundos destinados ao arguido AA e utilização dos mesmos no seu interesse através do pagamento de despesas suas e colocação de numerário à sua disposição. e p. pelo art.368°-A, n° 1, 2 e 3 do Código Penal.
    Seis (6) crimes de fraude fiscal
    5. Um crime de fraude fiscal qualificada, de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2010, em co-autoria com os arguidos AA, BB e GG, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a), e 104°, n.° 2, do RGIT;
    6. Um crime de fraude fiscal qualificada, de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2011, em co-autoria com os arguidos AA, BB e GG, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a), e 104°, n.º 2 do RGIT;
    7. Um crime de fraude fiscal qualificada, de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2012, em co-autoria com os arguidos AA, BB e GG, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a), e 104°, n.º 2, alínea a), e n.º 3, do RGIT;
    8. Um crime de fraude fiscal qualificada, de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2013, em co-autoria com os arguidos AA, BB e GG, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a), e 104°, n.º 2, alínea a), e n.º 3, do RGIT;
    9. Um crime de fraude fiscal qualificada, de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2014, em co-autoria com os arguidos AA, BB e GG, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a), e 104°, n.º 2, alínea a), e n.º 3, do RGIT;
    10. Um crime de fraude fiscal qualificada, de que foi beneficiário AA, no que tange ao IRS relativo aos rendimentos do ano de 2015, em co-autoria com os arguidos AA, BB e GG, p. e p. pelos artigos 103°, n.º 1, alínea a), e 104°, n.º 2, alínea a), e n.º 3, do RGIT.
    ARGUIDA “LENA ENGENHARIA E CONSTRUÇÃO SGPS” (LEC SGPS)
    Um (1) crime de corrupção
    1. Um crime de corrupção activa, para actos ilícitos, em co-autoria com os arguidos BB, GG, PP e as sociedades LEC SA e LENA SGPS, relativamente à pessoa do arguido QQ, com referência a factos ocorridos nos anos de 2007 a 2009, p. e p. pelo art.º 374. °, n.º 1, do Código Penal; e
    Um (1) crime de branqueamento
    2. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, BB, CC, HH, GG e as sociedades LEC SA e LENA SGPS,  relativamente aos movimentos financeiros ocorridos a partir de 2010, abrangidos pela operação CEL_2010, justificados através de contrato promessa de compra e venda com perda de sinal referente ao imóvel ..., sito em ..., e introdução desses fundos no Grupo LENA, p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal.
    ARGUIDA “LENA SGPS”
    Um (1) crime de corrupção
    1. Um crime de corrupção activa, para actos ilícitos, em co-autoria com os arguidos BB, GG, PP e as sociedades LEC SA e LEC SGPS, relativamente à pessoa do arguido QQ, com referência a factos ocorridos nos anos de 2007 a 2009, p. e p. pelo art.º 374. °, n.º 1, do Código Penal;
    Um (1) crime de branqueamento
    2. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos AA, BB, CC, HH, GG e as sociedades LEC SA e LEC SGPS,  relativamente aos movimentos financeiros ocorridos a partir de 2010, abrangidos pela operação CEL_2010, justificados através de contrato promessa de compra e venda com perda de sinal referente ao imóvel ..., sito em ..., e introdução desses fundos no Grupo LENA, crime p. e p. pelo art.º 368.º-A, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal.
    ARGUIDA “RMF- CONSULTING, GESTÃO E CONSULTORIA ESTRATÉGICA, LD.ª” (RMF OU RMF- CONSULTING)
    Um (1) crime de branqueamento
    1. Um crime de branqueamento, em co-autoria com os arguidos GG, NN e a sociedade LEC SA (e AA e BB- pronunciados),  relativamente à utilização da sociedade RMF CONSULTING, entre 2010 e 2014, para a colocação de fundos destinados ao arguido AA e utilização dos mesmos no seu interesse através do pagamento de despesas suas e colocação de numerário à sua disposição, crime p. e p. pelo art.º 368°-A, n° 1, 2 e 3 do Código Penal.
    PELOS FACTOS QUE CONSTAM DA ACUSAÇÃO, PEÇA PARA A QUAL SE REMETE, DANDO O SEU TEOR COMO INTEGRALMENTE REPRODUZIDO, INCLUINDO OS MEIOS DE PROVA ALI INDICADOS, com excepção dos factos constantes dos artigos 13826, 13827, 13828, 13829, 13830, na parte em que se referem ao arguido SS e  as referências feitas ao arguido HH nos artigos 13820, 13821, 13822, 13823 e 13824 no que respeita aos crimes de abuso de confiança que lhes eram imputados; dos artigos 338, 339, 3340, 342, 3844, 3846, 3853, 3916, 3918, 3921, 39324, 3931, 3945, 4101, 4103, 4128, 4200, dos artigos 13724, 13866, 13869, 14065, 14070, 14075 e 14078, na parte respeitantes à não pronúncia dos crimes de branqueamento  7 e 20 imputados à arguida JJ; e dos artigos 3948 a 4016, 13870 a 13873 na parte respeitante à não pronúncia dos crimes de  branqueamento imputados aos arguidos EE E DA SOCIEDADE “PEPELAN - CONSULTORIA E GESTÃO.
    Notifique.
    Sem custas por delas estar isento o recorrente – art. 522º nº 1 CPP

    Lisboa, 25 de Janeiro de 2024
    (Elaborado e revisto pela relatora, revisto pelos signatários e com assinatura digital de todos)
    Por expressa opção da relatora, não se segue o Acordo Ortográfico de 1990.

    Raquel Correia Lima
    Micaela Pires Rodrigues
    Madalena Caldeira