PROCESSO DE EXPROPRIAÇÃO
DESPACHO DE ADJUDICAÇÃO
DECISÃO ARBITRAL
Sumário

I - O processo expropriativo tem natureza especial, encontrando a sua regulamentação sucessivamente, nas suas próprias normas, mas também nos princípios gerais reguladores do processo civil e nas disposições gerais e comuns e nas regras do processo ordinário - artigo 549º do CPCivil.
II - O processo expropriativo tem uma primeira fase administrativa e depois uma fase judicial.
III - O presente processo de expropriação ainda não está na dita fase judicial, que só se inicia se e quando existir recurso do acórdão arbitral, não significando a remessa do processo ao tribunal para os fins previstos no artigo 51.º do CE, o início da instância de uma acção declarativa.
IV - A notificação do artigo 51.º, n.º 5, do CE, é, do ponto de vista material, uma citação, sendo feita na pessoa do expropriado, destina-se a dar conhecimento ao expropriado da adjudicação e, simultaneamente, informar que pode recorrer dessa decisão, impugnando uma pretensão e dando origem a um processo judicial, tudo se passando como na citação.
V - O despacho de adjudicação e a decisão arbitral não são cindíveis, tratando-os a lei como mesmo acto para efeitos de notificação e funcionando a prolação daquele despacho como um pressuposto para a notificação e subsequente interposição de recurso da decisão arbitral.

Texto Integral

Processo nº 470/23.9T8OBR .P1

Origem: Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro, Juízo de Competência Genérica de Oliveira do Bairro Juiz 2

Relatora: Ana Vieira

1º Adjunto Juiz Desembargador Dr. Aristides Rodrigues de Almeida 

2º Adjunto Juiz Desembargadora Dra. Judite Pires


*

Sumário

………………………………

………………………………

………………………………


*

Acordam no Tribunal da Relação do Porto:

I- RELATÓRIO

Os presentes autos tiveram início com a junção do seguinte requerimento inicial: «… Município ..., entidade expropriante no procedimento de expropriação total do prédio inscrito na matriz predial urbana da União de Freguesias ..., ... e ..., do Município ..., sob o artigo matricial n.º ... e descrito no Registro Predial de Oliveira do Bairro sob a descrição n.º ..., cuja declaração de utilidade pública e urgência resultada do Despacho do Secretário de Estado da Administração Local e Ordenamento do Território datado de 28 de Abril de 2022, que foi tornado público pela Declaração n.º 83/2022, publicada em Diário da República, 2.ª série, n.º 93, de 13 de maio de 2022 [cfr. doc. 1 e doc. 2], em que figuram enquanto entidades expropriadas a Massa Insolvente da A..., S.A e Sociedade de Promoção Social – B..., Instituição Particular de Solidariedade Social, vem, mui respeitosamente, ao abrigo do n.º 5 do art. 20.º do Código das Expropriações e, bem assim, com as devidas adaptações, ao abrigo dos arts. 906.º e seguintes do CPC, expor e requer a V. Ex.ª o seguinte:

- Questão prévia –

1.º

O Código das Expropriações, diploma que é muito detalhado em alguns aspetos e muito parco em tantos outros, com as alterações introduzidas à redação do seu art. 20.º pelas Leis n.º 67- A/2007 e 56/2008, passou a prever no n.º 5 a possibilidade de substituição do depósito bancário efetuado para efeitos da efetivação da posse administrativa do bem expropriado por  “caução prestada por qualquer das formas legalmente admissíveis” – sublinhados e negritos nosso.

2.º

Sucede, porém, que o legislador olvidou-se de definir o procedimento legal que deverá ser seguido para que possa haver lugar a essa substituição.

3.º

Assim sendo, a doutrina e a jurisprudência, de molde a colmatar esta lacuna procedimental, têm entendido que se deverá mobilizar, com as devidas adaptações, o processo especial para prestação de caução previsto nos artigos 906.º e ss do Código do Processo Civil – cfr. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto datado de 13.04.2010 e tirado no processo n.º 1404/05.8TBMAI.P1 e, bem assim, ANA ISABEL PACHECO/LUÍS ALVAREZ BARBOSA, in Código das Expropriações Anotado e Comentado, Almedina, 2022, pp. 89.º e ss e FRANCISCO CALVÃO/FERNANDO JORGE SILVA, Código das Expropriações Anotações e Jurisprudência, Anotações adaptadas ao Novo Código de Processo Civil, Coimbra Editora, 2013, pp. 159-160.

4.º

Por conseguinte, é a tramitação deste processo especial, com as devidas adaptações, que aqui seguimos, pelo que apresentamos o presente requerimento para prestação de garantia bancária autónoma ao abrigo do disposto no art. 906.º do Código do Processo Civil.

Destarte:

- do mérito -

5.º

O objeto dos presentes autos de expropriação recai sobre um recinto escolar onde funcionava o antigo A..., pertencendo o solo à expropriada Sociedade de Promoção Social – B..., Instituição Particular de Solidariedade Social - , e as seis estruturas que se encontram edificadas no solo e que são dedicadas à atividade escolar à expropriada Massa Insolvente da A..., S.A cfr. doc. 1 e doc. 2 já juntos.

6.º

Instituto este onde, desde 7 de agosto 2018, ao abrigo de um contrato de arrendamento e no seguimento da anuência do Ministério da Educação, já funcionava a Escola Básica ... – extensão B... – cfr. doc. 2 já junto.

7.º

Sucede, todavia, que por carta data de 22 de julho de 2021, tal contrato de arrendamento foi denunciado pela expropriada Sociedade de Promoção Social – B..., com efeitos a Julho de 2022 – cfr. doc. 2 já junto

8.º

Assim sendo, e uma vez que o Município ..., ora entidade expropriante, não tinha quaisquer instalações que pudessem acolher a oferta formativa e educativa a ser prestada na zona poente do Município, decidiu avançar com a resolução de requerer a declaração de utilidade pública da expropriação, a qual, não tendo sido possível a aquisição pela via do direito privado, foi acolhida pelo despacho do Secretário de Estado da Administração Local e Ordenamento do Território datado de 28 de abril de 2022, que declarou a sua utilidade pública urgente – cfr. doc. 1 já junto.

9.º

Pois, bem, tendo necessidade de ser rapidamente investido na posse dos bens a expropriar – mormente por necessidade de assegurar um normal funcionamento do período letivo de 2022/2023 – o Município, no dia 22 de agosto de 2022, tomou posse administrativa dos bens a expropriar, tendo, para o efeito, lavrado o respetivo auto, nos termos do art. 22.º do Código das Expropriações - cfr. doc 3.

10.º

Assim sendo, conforme previsto na al. b) do n.º 1 do art. 20.º do Código das Expropriações, sem prejuízo da dispensa prevista na al a) do n.º 6 do mesmo preceito legal por efeito da atribuição de caracter urgente ao processo expropriativo referido em epigrafe, procedeu ao depósito prévio do montante que foi apurado por efeito do relatório de avaliação elaborado ao abrigo do n.º 4 do art. 10.º do Código das Expropriações – cfr. doc. 4, 5 e 6.

11.º

Avaliação e relatório este que concluiu que o valor da expropriação se deveria fixar em 1.846.198,13€ [um milhão oitocentos e quarenta e seis mil cento e noventa e oito euros e treze cêntimos] - cfr. doc. 4 já junto

12.º

pelo que o Município, na qualidade de entidade expropriante, procedeu ao depósito dos respetivos montantes junto da instituição bancária Banco 1..., S.A - cfr. doc. 5 e 6 já juntos.

13.º

295.698,00€ (duzentos e noventa e cinco mil e seiscentos e noventa e oito euros), correspondente ao valor do solo, a favor da expropriada Sociedade de Promoção Social – B..., Instituição Particular de Solidariedade Social – cfr. doc. 5 já junto.

14.º

1.550.500,13€ (um milhão quinhentos e cinquenta mil e quinhentos euros e treze cêntimos), correspondentes ao valor das seis estruturas que se encontram edificadas no solo e que são dedicadas à atividade escolar, a favor da expropriada Massa Insolvente da A..., S.A – cfr. doc. 6 já junto.

15.º

Acontece, todavia, que, como resulta dos doc. 5 e 6 já juntos, a totalidade do valor depositado pela entidade expropriante ascende aos rigorosos 1.846.198,13€, o que, como bem se compreenderá, representa uma fatia muito relevante da operação financeira do Município, cuja falta é devidamente sentida.

16.º

Por conseguinte, pretende esta entidade expropriante mobilizar a faculdade prevista no n.º 5 do art. 20.º do Código das Expropriações, substituindo os depósitos que efetuou por garantias bancárias autónomas.

17.º

Garantias bancárias autónomas estas que serão subscritas junto da instituição bancária Banco 1..., S.A, nos termos das minutas contratuais que ora se anexam sob a designação de doc. 7 e doc. 8, que já se encontram pré-aprovadas pela referida instituição bancária, na modalidade de prestação à primeira solicitação ou on first demand, de forma a salvaguardar todos os interesses e direitos das expropriadas, mormente o constante dos nrs.º 3 e 4 do art. 52.º do Código das Expropriações.

18.º

Destarte, a substituição que ora se requer, em nada prejudica a posição jurídica das expropriadas, que mantêm todos os direitos que lhe são reconhecidos pelo Código das Expropriações.

19.º

E mais se diga que dúvidas não há de que a subscrição da garantia bancária autónoma de que tratamos é legal, podendo livremente ser subscrita pela entidade expropriante.

20.º

Efetivamente, face ao disposto na al a) do n.º 7 do art. 49.º do Regime Financeiro das Autarquias Locais e Entidades Intermunicipais, poderíamos ser tentados a entender que o Município se encontraria vedado de conceder garantias pessoas e reais.

21.º

Acontece, todavia, que a faculdade prevista no n.º 5 do art. 20.º do Código das Expropriações configura, justamente, um dos casos em que tal proibição de subscrição/concessão de garantia não tem aplicação, sendo isso perfeitamente reconhecido pelo dito art. 7.º quando prescreve que: “é vedado aos municípios, salvo nos casos expressamente permitidos por lei” – sublinhados e negritos nossos.

22.º

Aliás, isto mesmo já foi expressamente reconhecido pelo Conselho Consultivo da Procuradoria- Geral da Républica que, no seu Parecer n.º 6/99 – publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 57, de 8 de Março de 2003 -, a propósito do antigo Código das Expropriações no qual não existia – ao contrário do que sucede hodiernamente – norma legal expressa que o permitisse, determinou que: “as autarquias locais podem, nos termos gerais de direito, contratar garantias bancárias autónomas, designadamente no âmbito das expropriações por utilidade pública urgentes previstas no Código das Expropriações, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 438/91, de 9 de novembro”.

23.º

Assim sendo, dúvidas não há de que a entidade expropriante pode livremente subscrever a garantia bancárias autónomas de que tratamos e cujas minutas já foram pré-aprovadas pela respetiva entidade bancária, Banco 1..., S.A - cfr. doc. 7 e 8 já juntos

Termos em que, se requer a V. Ex.ª que, ao abrigo do previsto no n.º 5 do art. 20.º do Código das Expropriações, digne admitir a substituição dos depósitos bancários que foram efetuados pela entidade expropriante abrigo do disposto na al. a) do n.º 1 do mesmo preceito legal, pelas garantias bancárias autónomas cujas minutas ora se anexam, com todas as consequências legais. Prova: A. Documental: os 8 (oito) documentos que ora se juntam…». A requerente com esse requerimento inicial juntou vários documentos: declaração de utilidade pública, proposta de declaração de utilidade publica, , auto de posse administrativa, , auto de vistoria« Ad perputuam rei memoriam», caderneta predial urbana, registo predial,  respostas aos quesitos, relatório de estimativa de avaliação imobiliária,, guia de deposito obrigatório- caução, e garantia autónoma.

Após a junção desse requerimento o tribunal proferiu o seguinte despacho: « Na presente acção de expropriação em que é Expropriante o Município ... e Expropriadas Sociedade de Promoção Social – B..., I.P.S.S. e Massa Insolvente do A..., S.A., foi declarada, por despacho do Secretário de Estado da Administração Local e Ordenamento do Territórito, de 28/04/2022, a expropriação, com carácter urgente, do prédio urbano, inscrito na matriz da União de Freguesias ..., ... e ..., sob o artigo ... e descrito na Conservatória do registo predial sob o n.º..., com destino à criação/instalação de um estabelecimento de educação – Escola Básica, de tipologia de 2º e 3º CEB – na zona poente do Município ... – União de Freguesias ..., ... e ..., com os fundamentos de facto e de direito expostos na Informação Técnica n.º..., de 20 de Abril de 2022, da Direcção –Geral das Autarquias Locais, e tem em consideração os documentos constantes do Processo n.º13.011.22/DAJ, daquela Direcção Geral.


*

Realizou-se a competente arbitragem.

*

A entidade expropriante tomou posse administrativa da parcela expropriada a 22/08/2022, conforme resulta do respectivo Auto de Posse.

*

Encontra-se demonstrado o depósito da indemnização arbitrada - €295.698,00 + 1.550.500,13 – doc.5 e 6 da Ref.14803317 – de €1.846.198,13 (um milhão oitocentos e quarenta e seis mil cento e noventa e oito euros e treze cêntimos) – nº 1 do art. 51º do Cód. das Expropriações.

*

O Tribunal é competente.

Inexistem quaisquer questões prévias de que cumpra conhecer, realçando-se que o pedido de substituição do depósito por garantia bancária será decidido após contraditório.


*

Assim, atento o disposto no nº 5 do art. 51º do Cód. das Expropriações, encontrando-se o processo devidamente instruído e efectuado o depósito da quantia arbitrada, adjudico ao Município ... a propriedade do prédio urbano, inscrito na matriz da União de Freguesias ..., ... e ..., sob o artigo ... e descrito na Conservatória do registo predial sob o n.º....

*

Notifique expropriante, expropriadas nos termos previstos na 2ª parte do nº 5 do art. 51º do Código das Expropriações.

Notifique ainda as Expropriadas para, no prazo de dez dias, se pronunciarem quanto ao pedido de substituição do depósito por garantia bancária, já prestada pela Banco 1..., nos termos requeridos pela Expropriante.


*

Comunique à Conservatória do Registo Predial competente nos termos previstos no nº 6 do mesmo preceito legal…»(sic).

*

Seguidamente foi junto aos autos o seguinte requerimento: «.. Sociedade de Promoção Social – B..., com sede em Rua ..., ... ..., pessoa coletiva n.º ..., contribuinte da Segurança Social n.º ..., doravante designada apenas por expropriada, notificada da faculdade de interpor recurso da decisão arbitral ao abrigo do artigo 52º do Código das Expropriações, tendo para o efeito o prazo de 20 dias, vem, nos termos e para os efeitos constantes do disposto no artigo 52.º e 58.º do Código das Expropriações expor com os seguintes

Fundamentos:

I – QUESTÃO PRÉVIA

1.

A expropriada Sociedade de Promoção Social – B... foi notificada da faculdade de interpor recurso da decisão arbitral ao abrigo do artigo 52º do Código das Expropriações.

2.

Do despacho judicial consta a menção de que se realizou a competente arbitragem.

3.

Mau grado todos os esforços desenvolvidos para o efeito, nomeadamente junto do tribunal, a verdade é que a nenhuma das notificações enviadas pelo tribunal, foi anexada cópia de qualquer decisão arbitral.

4.

Pelo que, a expropriada não tem condições de se pronunciar acerca de um documento do qual não lhe foi dado conhecimento.

5.

Por outro lado, na petição inicial não é feita qualquer referência à existência da referida decisão arbitral, mas apenas se faz menção a uma avaliação efetuada a pedido da expropriante.

6.

Da consulta do processo na plataforma Citius, também não consta a existência de qualquer decisão arbitral.

7.

E assim, por mera precaução se alega que a expropriada não tomou conhecimento, nem foi notificada da decisão Arbitral para dela poder reclamar,

8.

Tal omissão obsta que a expropriada tenha sido ouvida antes da decisão – se tal decisão arbitral existiu – como deveria ter ocorrido nos termos do artigo 49.º do Código das Expropriações e do art.º 3º do Código de Processo Civil, o que consubstancia a violação de um preceito legal que determina a anulação do processado por estar afetada a decisão da causa (cfr. artigos 191º, 195º, e 201º do Código de Processo Civil.

9.

Conhecida tal nulidade deve ser declarada a nulidade do despacho de adjudicação, remetendo-se o processo à entidade expropriante para notificar a ora Expropriada da Decisão Arbitral,

10.

Seguindo-se então os demais trâmites do processo administrativo.

11.

O que desde já se requer.

II - RECLAMAÇÃO – ARTIGO 54º CE

Da delimitação física da parcela a expropriar

12.

Foi efetuada vistoria ad perpetuam rei memoriam tendo a ora expropriada apresentado os seus quesitos quanto aos limites da parcela a expropriar.

13.

No âmbito da vistoria ad perpetuam rei memoriam, por requerimento datado de 15.07.2022 a Expropriada formulou quesitos que dirigiu à senhora perita designada, quanto aos limites da parcela a expropriar, nos termos seguintes (documento n.º 3 junto com a petição inicial): “Assunto: Expropriação total – Vistoria ad perpetuam rei memoriam –15.07.2022

Quesitos que a Sociedade de Promoção Social B... apresenta à Senhora Perita termos do disposto no n.º 3 do artigo 21.º do CE, no âmbito da vistoria ad perpetuam rei memoriam

Exma Senhora Perita:

A definição das características, da área e dos limites da parcela a expropriar é de manifesto interesse para a ora interessada, porquanto tem uma parcela confinante, e porque urge fixar os limites de ambas as parcelas.

Na verdade, a delimitação do levantamento topográfico feito pela Câmara, relativamente aos limites da propriedade, excedeu os limites da parcela a expropriar entrando numa parcela da ora interessada, não estando em conformidade com a realidade.

Veja-se a propósito que o Termo de Responsabilidade do Topógrafo da Câmara Municipal ..., AA, refere que "o levantamento topográfico se encontra delimitado conforme foi indicado pelo proprietário no local".

Tal declaração não corresponde à realidade, é falsa, dado que ninguém da Sociedade de Promoção Social B... esteve presente. O que se quererá, provavelmente referir, será ao espaço então alugado à Autarquia, que era todo o artigo ... e uma pequena parte do ... separada por uma rede divisória para que não houvesse trânsito de veículos e das crianças entre os dois estabelecimentos. Daqui que tenha havido deficiente interpretação do topógrafo quando se refere aos limites.

A propósito deixa-se consignado o seguinte:

Quando foi efectuado o registo do artigo urbano n.º ... (parcela a expropriar na Conservatória do Registo Predial, este ficou a pertencer à freguesia ..., enquanto a parcela confinante de que a ora interessada é proprietária – artigo urbano n.º ... (que comporta os blocos 7 e 8 do infantário, primária e arrumos) ficou a pertencer à freguesia ....

Ambos resultantes da congregação de vários pequenos artigos.

Estes limites foram assim definidos por uma linha de água, já existente, que separava as freguesias de ... e ....

Tanto mais que o artigo urbano ... diz confrontar a nascente com a vala pública.

Por outro lado o extinto artigo rustico ..., que proveio do artigo rustico ... e que se integrou no artigo urbano ... atual, dizia confrontar a poente com vala.

A propósito, anexa-se o levantamento efectuado com os limites correctos e definição da linha de água.

Pelo exposto, queira a Senhora Perita pronunciar-se:

(1) acerca dos limites e dos acidentes geográficos que delimitam a parcela a expropriar, tendo por referência os esclarecimentos da ora interessada, enquanto entidade expropriada mas também entidade com prédios confinantes,

(2) tendo também por base as certidões de teor matricial e ambos os prédios (a expropriar e confinante) e dos prédios rústicos que os antecederam.

Anexa: (1) Levantamento topográfico do prédio urbano ...

(2) Levantamento topográfico onde se identifica a linha de água

(3) Cópia de certidão de teor do anterior artigo matricial rustico 9, da atual matriz urbana ... e ...

(4) Procuração forense.”

14.

Em resposta a senhora perita veio responder nos termos seguintes:

“Alegam que a área total a expropriar é de 31.120,40 m2 e não a área das certidões 34.973,86 m2, nem a área indicada na DUP de 34.788 m2.

Uma vez que o atual artigo matricial resulta da anexação de diversos artigos, alegam que o limite desta parcela expropriada a poente seria delimitado pelo limite da freguesia e pela linha de água.

Esta situação poderá estar correta, mas a perita não dispõe de meios que permitam confirmar esta questão.”

15.

A planta que delimitada a parcela a expropriar e que acompanhou a publicação em Diário Diário da República da declaração de utilidade pública da expropriação – documento n.º 1 junto com a petição inicial – foi elaborada a uma escala de 1:1000 que dificultava e dificulta ainda hoje a definição dos limites fisicos.

16. Também a imagem Googlemaps, 25.01.2022 que ilustra a localização da parcela a expropiar e que consta do documento n.º 4 junto com a petição inicial (Estimativa do presumível valor de mercado) refere expressamente que a localização é indicativa e aproximada das instalações escolares B... e da zona onde se pretende intervir (da área de intervenção…).

17.

O referido documento n.º 4 junto com a petição inicial, que é uma avaliação feita a pedido da Expropriante, esclarece que “o prédio integra cerca de 34.788 m2 [área aferida por levantamento topográfico

18.

… Juntando apenas 2 fotografias (!!!) que não indicam qualquer limite…

19.

… indicando-se a página 4/17 do relatório de avaliação àreas totais aproximadas...

20.

… mas não se identificando as àreas das parcelas sobrantes, ao contrário do que ali se alega…

21.

Por outro lado, o topógrafo AA, da Câmara Municipal .../entidade expropriante,e elaborou o levantamento topográfico com delimitações sem a participação da expropriante.

22.

Ora, o prédio expropriado inscrito na matriz predial urbana da freguesia ..., ... e ... sob o artigo ... tem a delimitação física constante do levantamento topográfico elaborado por topógrafo com declaração de responsabilidade que ora se anexa – documento n.º 1,2 e 3.

23.

A Expropriada entende que a confusão quanto aos limites físicos do artigo matricial expropriado resulta do limite que foi desenhado na planta anexa ao contrato de arrendamento e que incluía parte do prédio urbano inscrito sob o Art.º ... da União de Freguesias ..., ... e ..., Concelho de Oliveira do Bairro, concelho de Oliveira do Bairro, separada por uma rede divisória para que não houvesse trânsito de veículos e de crianças entre os dois estabelecimentos, o da Expropriante e o da Expropriada (blocos 7 e 8 do Infantário, Primária e Arrumos),

24.

Planta essa que terá motivao a deficiente interpretação do topógrafo AA, topógrafo da expropriante, quanto aos limites do prédio a expropriar.

25.

Planta da qual consta uma linha de água que dividia as extintas freguesias de ... e do ..., definindo-se uma linha de ribeira a céu aberto e uma linha de ribeira subterrânea devidamente encanada.

26.

Conforme é de fácil percepção o artigo matricial urbano com o n.º ... pertencia originariamente à extinta freguesia de ..., enquanto o artigo matricial urbano com o n.º ... (blocos 7 e 8 do Infantário, Primária e Arrumos) pertencia à extinta freguesia ..., ambos resultantes da congregação de vários artigos matriciais de área diminuta.

27.

Desde tempos remotos, as linhas divisórias relativamente a ambos os prédios não sofreram alterações na sua configuração e dimensões.

28.

E assim sendo o limite entre os supra referidos artigos deve seguir o trajeto da linha de água.

29.

Delimitação entre ambas as freguesias que foram definidos pela mesma linha de água existente no local, que separava as extintas freguesias de ... e ....

30.

Pelo que, a parcela expropriada não é parcialmente atravessada por uma linha de água,

31.

Devendo constar que a parcela expropriada é delimitada por uma linha de água.

32.

Acresce que todos os prédios rústicos que deram origem ao artigo urbano ... confrontavam todos com VALA – cfr. certidão de teor matricial dos mesmos cuja junção aos autos por parte do serviço de finanças de Oliveira do Bairro se requer – Doc. n.º 4

33.

E também os prédios que deram origem ao artigo urbano ... (artigos ..., ..., ..., ... e ...) confrontavam com VALA PÚBLICA - cfr. certidão de teor matricial dos mesmos cuja junção aos autos por parte do serviço de finanças de Oliveira do Bairro se requer - Doc. n.º 5.

34.

Assim sendo, atenta a NOTÓRIA deficiência do auto da vistoria ad perpetuam rei memoriam, por não indicar os limites concretos, nomeadamente fotografias da área envolvente ao prédio expropriado e dos seus limites físicos, a existência de vedações do prédio, as características das parcelas exteriores e sobrantes e nomeadamente o estado de conservação dos pavimentos exteriores, a existência das inúmeras árvores delimitativas que permitam suprir as deficiências da descrição do relatório pericial,

35.

Tendo sido concluído com a declaração da senhora perita segundo a qual, “não dispunha de meios que permitam confirmar esta questão”,

36.

E porque tal relatório pericial deveria ter uma descrição de forma a tornar mais real a descrição dos limites do bem vistoriado, questão que foi levantada em devido tempo pela Expropriada,

37.

Não resta outra alternativa do que solicitar ao tribunal que no âmbito das suas atribuições defina os limites físicos do prédio a expropriar, correspondendo ao Art.º ... da União de Freguesias ..., ... e ..., Concelho de Oliveira do Bairro descrito no Conservatório do Registo Predial de Oliveira do Bairro sob o n.º ....

38.

Por outro lado o processo administrativo deveria ter sido remetido ao tribunal judicial para resolução da reclamação em tempos efetuada, quanto aos limites da parcela a expropriar, nomeadamente por “indefinição dos limites da parcela” e consequente alteração da planta parcelar – artigo 54º, n.º 1 do Código das Expropriações.

39.

Para que o tribunal se pronunciasse e fossem definidos corretamente os limites das parcelas a expropriar,

40.

O que desde já se requer.

41.

Para o efeito, a final, será requerida a produção de prova testemunhal, de prova pericial e de deslocação ao local, para determinação dos limites do prédio expropriado.

III – DA LEGITIMIDADE

Dúvidas acerca da titularidade dos bens – artigo 53º/CE

42.

Consagrando o princípio da legitimidade aparente, no n.º 3 do artigo 9º do Código das Expropriações propugna-se a intervenção no processo de todos aqueles que no registo predial, na matriz ou em títulos bastantes de prova exibam figurarem como titulares do direito de propriedade ou de qualquer direito real ou ónus sobre o bem a expropriar.

43.

A Expropriada aceita e considera reproduzidos na íntegra os fundamentos e fatos constantes dos números 32. a 51. do documento 2 junto com a petição inicial e que reproduzem os fundamentos da causa de utilidade pública a prosseguir.

44.

Contudo, a Expropriada impugna, por não corresponder totalmente à verdade a factualidade vertida no artigo 5.º da petição inicial.

45.

Ou seja, a Expropriada não aceita, só de per si, os efeitos jurídicos da afirmação segundo a qual o solo do artigo matricial urbano n.º ... da União de Freguesias ..., ... e ... pertencem à Expropriada Sociedade de Promoção Social – B...,

46.

E de que as seis estruturas que se encontram edificadas no solo e que são dedicadas à atividade escolar pertencem à Expropriada Massa Insolvente do A..., S.A..

47.

Na verdade, dos documentos n.º 1 e 2 juntos com a petição inicial não é possível tal conclusão motivo pelo qual se impugna o vertido no artigo 5º e os referidos documentos nesse aspeto e por esse motivo.

48.

A páginas 10/13 do documento n.º 2 junto com a petição inicial é apenas referido o seguinte:

“53. Proprietários: Sociedade de Promoção Social – B..., Instituição Particular de Solidariedade Social (…)” remetendo-se para o anexo IX que consta de certidão permanente do registo predial e da caderneta predial urbana que identifica a ora Expropriada como titular do direito de propriedade plena sobre o solo e sobre todas as construções aí existentes.

“54. Interessados:

a) Massa Insolvente de A..., S.A.,” remetendo-se para o anexo X que é uma certidão judicial que ora se junta como documento n.º 1.

49.

Dos referidos documentos não é possível extrair a conclusão simplista que a interessada Massa Insolvente de A..., S.A., seja dona as seis estruturas que se encontram edificadas no solo e que são dedicadas à atividade escolar.

Urge por isso prestar os seguintes esclarecimentos.

50.

Correram termos pelo Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro, Juízo Central Cível de Aveiro - Juiz 3, sob o n.º 1841/19.0T8AVR, uns autos de processo comum, em que era Autora a Massa Insolvente de A..., S.A., e Ré a Expropriada Sociedade de Promoção Social – B..., Instituição Particular de Solidariedade Social.

51.

Nos referidos autos de processo comum em que era autora/reconvinda a Massa Insolvente de A..., S. A., e ré/reconvinte Sociedade de Promoção Social – B... I.P.S.S. que deram entrada em juízo em 08.09.2021, foi em 14.09.2021 homologada a transação entrada em juízo a 08 de Setembro de 2021 e constante de fls. 559 e ss, por ser válida pelo seu objeto, forma e qualidade dos intervenientes, condenando-se as partes a cumpri-la nos seus precisos termos (art.s 283º n.º 2, 284º, 289º n.º 1 e 290º do Código de Processo Civil, tendo a mesma transitado em julgado em 20.10.2021 – Doc. n.º 6

52.

A supra referida transacção, homologada judicialmente, teve o seguinte teor:1. A primeira e a segunda outorgante assumem, respetivamente, a qualidade de autora- reconvinda e ré-reconvinte no processo de ação comum nº.1841/19.0T8AVR que corre termos no Juízo Central Cível, Juiz 3, Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro (e onde estão melhor identificadas).

2. Ambas as outorgantes aceitam, reconhecem e confessam, reciprocamente, a veracidade dos factos constantes da petição inicial, de 6º, inclusive, a 19º, inclusive.

3. Ambas as outorgantes aceitam, reconhecem e confessam que os prédios/solo onde estão incorporadas as edificações e construções pertencentes à Massa Insolvente correspondem ao Art.º ... da União de Freguesias ..., ... e ..., Concelho de Oliveira do Bairro descrito no Conservatório o Registo Predial de Oliveira do Bairro sob o n.º ....

4. No prédio, construções e edificações que correspondem ao supra mencionado artigo ... está instalado e funciona uma Escola que publicamente era conhecida como “Colégio ...”.

5. A autora aceita, reconhece e confessa que os prédios/solo onde estão incorporadas as edificações e construções pertencentes à Ré Sociedade de Promoção Social B... correspondem ao Art.... da União de Freguesias ..., ... e ... descrito no Conservatório do Registo Predial de Oliveira do Bairro sob o n.º ..., se encontra excluído desta ação judicial e das pretensões da Massa Insolvente, por ser propriedade exclusiva da ora segunda outorgante, facto que reconhece expressamente.

6. A segunda outorgante declara que outorgou um contrato de arrendamento com a CM de Oliveira do Bairro que tem por objecto instalações/edificações do prédio identificado no artigo 3. desta transacção que a primeira outorgante reclama como seus, e que se compromete a denunciar o referido contrato para que a denúncia produza efeitos em Agosto de 2022 e para que, em consequência dessa denúncia, os imóveis fiquem libertos de todos os ónus e assim livres de todos os ónus possam ser vendidos.

7. A segunda outorgante aceita e autoriza que seja a Massa Insolvente a proceder à venda do prédio identificado no artigo 3º deste requerimento no âmbito da execução universal que constitui a insolvência e que essa venda se processe por leilão público, por leilão eletrónico, por negociação particular ou qualquer outra modalidade que venha a entender melhor com vista a lograr obter o melhor preço possível e ambas as outorgantes acordam entre si que o valor base para a venda do solo deste artigo matricial e das construções e edificações ali existentes será de €2.867.050,00 (dois milhões e oitocentos e sessenta e sete mil e cinquenta euros).

8. Ambas as outorgantes aceitam que os ativos que constituem o prédio identificado no artigo 3º deste requerimento (o do artigo matricial n.º ...) serão vendidos em conjunto, constituindo uma só unidade económica, não podendo ser separados para venda e que o produto desta venda seja repartido na proporção de 70% para a outorgante “Massa Insolvente” e de 30% para a outorgante “B...”.

9. Ativos que constituem o prédio identificado no artigo 3º deste requerimento (o do artigo matricial n. º ...) serão vendidos em conjunto, constituindo uma só unidade económica, não podendo ser separados para venda e que o produto desta venda seja repartido na proporção de 70% para a outorgante “Massa Insolvente” e de 30% para a outorgante “B...”.

10. O pagamento desse valor à outorgante “B...”, equivalente a 30% do produto da venda, será efetuado por transferência bancária para o IBAN  ..., de forma imediata à disponibilidade dessa quantia de preço na conta da massa e com envio por correio eletrónico do respetivo comprovativo para o Ilmo. Mandatário que representa a “B...” nesta ação judicial.

11. Após recebida a respetiva percentagem relativa ao montante recebido a título de preço por esta venda, ambas as outorgantes declaram que se encontram integralmente ressarcidas no que toca a todas as pretensões que possam ter uma da outra, reciprocamente, quer as que estão alegadas nesta ação judicial em sede de pedido e reconvenção, quer ainda quaisquer outras que possam existir e ali não contempladas.

53.

A transacção outorgada entre a Massa Insolvente do A.... e a ora recorrente/expropriante, teve por objeto o mesmo prédio em discussão na presente expropriação.

54.

Da referida transacção judicial, homologada judicialmente, nada consta que permita extrair a conclusão de que as construções existentes no prédio expropriado, pertencem à Massa Insolvente de A..., S. A.,

55.

Nomeadamente que seja dona das seis estruturas que se encontram edificadas no solo e que são dedicadas à atividade escolar.

56.

Ora, a Massa Insolvente de A..., S. A., apenas tem uma expectativa jurídica de vir a receber 70% da venda dos activos que constituem o prédio identificado no artigo matricial n. º ... …

57.

… que serão vendidos em conjunto, constituindo uma só unidade económica, não podendo ser separados para venda e que o produto desta venda seja repartido na proporção de 70% para a outorgante “Massa Insolvente” e de 30% para a outorgante “B...”.

58.

Pelo exposto, a ora Expropriada é a única dona e proprietária do objeto expropriado identificado no artigo matricial n. º ....

59.

Ora, para além da ora recorrente, a entidade expropriante identificou como entidade interessada a Massa Insolvente do A...., identificando-a como proprietária das construções, o que não corresponde à verdade.

60.

Muito embora, a ora expropriada não discuta e entenda que a Massa Insolvente é também interessada nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 3 do artigo 9.º do Código das Expropriações.

61.

Contudo, a legitimidade da Massa Insolvente do A.... para intervir nos presentes autos resulta de uma transacção judicial que celebrou com a ora recorrente no âmbito do processo.

62.

A ora recorrente/expropriada apenas celebrou tal transacção com a referida Massa Insolvente do A...., mediante as seguintes condições, essenciais, que resultaram de aturada negociação, por economia processual e a fim de evitar as delongas próprias de uma ação judicial daquela jaez.

63.

De tal transação resultou o acordo de venda do prédio objeto de expropriação, pelo preço mínimo de venda de €2.867.050,00 (dois milhões e oitocentos e sessenta e sete mil e cinquenta euros).

64.

Mais ficou acordado que de tal valor a ora recorrente e expropriada receberia pelo menos 30% do preço da venda,

65.

Pelo que, em resultado de tal transacção a ora recorrente/expropriada receberia pelo menos a quantia de € 860.115,00 (oitocentos e sessenta mil, cento e quinze euros).

66.

Condição relativa à percentagem e valor a receber sem a qual a ora recorrente/expropriada não teria acordado na referida transação, nem teria acordado na assunção líquida da propriedade das construções a favor da Massa Insolvente do A.....

67.

E teria discutido nos autos o direito de propriedade que naqueles autos era reclamado pela Massa Insolvente do A.....

68.

A homologação judicial de tal transação condenou as partes ao seu cumprimento integral nos seus precisos termos – cfr. artigo 283.º, 284.º e 290.º do Código de Processo Civil.

69.

Existindo expropriação por utilidade pública de um prédio sobre o qual incide a transacção relatada, as cláusulas daquela transacção, que definem o preço e a percentagem da repartição do preço pelas partes, mantêm-se plenamente em vigor e vinculam as partes contratantes.

70.

Pelo que, a repartição do valor da indemnização a considerar na avaliação efetuada pela Expropriante, valor que se impugna e não se aceita, deveria ter sido ser efectuada tendo por base a percentagem acordada na referida transacção nos seus precisos termos.

71.

Atribuindo-se à ora recorrente/expropriada Sociedade de Promoção Social B..., Instituição Particular de Solidariedade Social, uma indemnização calculada com base em 30% do valor da avaliação (1.846.198,13*30%), ou seja, a quantia de €553.859,44 (quinhentos e cinquenta e três mil, oitocentos e cinquenta e nove euros e quarenta e quatro cêntimos).

72.

E, porque se impugna a avaliação efetuada por entender que deve ser de montante superior à fixada, a final, deve ser paga à Expropriada uma indemnização que reflita a referida percentagem de 30% do valor a fixar a final pelo tribunal.

73.

Contudo, se o tribunal vier a entender que por via do ato expropriativo, a transação homologada judicialmente tem a sua validade e eficácia jurídicas comprometidas, deve ser declarado que a Massa Insolvente de A..., S. A., não tem a qualidade de interessada nos presentes autos e por isso não tem legitimidade para que lhe seja atribuída qualquer indemnização.

IV – DO VALOR DA INDEMNIZAÇÃO

74.

Tal como referido a expropriante não foi notificada de qualquer decisão arbitral, pelo que, a alegação a que ora se procede ocorre por mera acautela.

75.

E por isso, por mera cautela, não resta outra alternativa à Expropriada do que impugnar os fundamentos da avaliação efetuada a pedido da Expropriante por entender que deve ser atribuída uma indemnização de montante superior à fixada, designadamente por divergir dos critérios de avaliação que aquela tomou em consideração.

76.

A Expropriada não aceita o teor do fundamento constante do ponto 56. do documento n.º 2 junto com a petição inicial, nomeadamente o valor da indemnização a suportar com a expropriação.

77.

O prédio objeto da expropriação, cuja delimitação física deve ser efetuada no local e pelo tribunal, é o seguinte:

Prédio urbano em propriedade total, sem andares nem divisões susceptíveis de utilização independente, com 88 divisões, sito na Rua ..., ..., ..., descrito na Conservatória do Registo Predial de Oliveira do Bairro sob o n.º ... e inscrito na matriz predial urbana da freguesia ..., ... e ... sob o artigo ..., concelho de Oliveira do Bairro, com a área de 34.973,86 metros quadrados.

78.

O referido prédio proveio do extinto artigo matricial urbano n.º ... da extinta freguesia ..., concelho de Oliveira do Bairro, prédio este

79.

Que resultou da anexação dos n.ºs ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ... e ....

80.

Existe uma diferença entre a área da Declaração de Utilidade Pública – 34.788,00 metros quadrados – e da certidão de teor matricial - 34.973,86 metros quadrados – de 185,86 metros quadrados.

81.

Abrange uma área de implantação do edifício de 7.071,48 metros quadrados,

82.

Uma área bruta de construção de 12.552,57 metros quadrados, com 12.273,93 metros quadrados de área bruta privativa e 278,64 metros quadrados de área bruta dependente.

83.

A parcela a expropriar é composta por seis edificações destinadas a atividade escolar, campos desportivos, recreios, jardins e estacionamentos.

84.

Sendo certo que das plantas que constam do processo de expropriação a delimitação do prédio urbano a expropriar inclui uma área que pertence a um outro prédio urbano com o artigo ... da União de Freguesias ..., ... e ..., concelho de Oliveira do Bairro.

85.

Durante décadas, funcionou nos imóveis expropriados uma escola particular e cooperativa, com dezenas de salas de aula, refeitório, pavilhões desportivos, instalações sanitárias, onde funcionavam dezenas de turmas do 1º, 2º, 3º ciclos de escolaridade bem como do ensino secundário, com largas centenas de alunos, satisfazendo as necessidades educativas do concelho de Oliveira do Bairro, cujo financiamento era garantido pelo Ministério da Educação, ao abrigo de um contrato de associação, que nos últimos anos efetuava transferências anuais para pagamento de salários e custos de manutenção do imobilizado.

86.

Todas com instalações elétricas e de fornecimento de água e esgotos em pleno e bom estado de funcionamento.

87.

Cujo custo de construção e reposição é de muitos milhares de euros, que a entidade expropriante sempre teria de gastar e pagar se tivesse de construir imóveis e afectar construções de raiz à educação da população estudantil.

88.

E assim sendo, “o conceito constitucional e civil da indemnização em expropriações não se pode restringir ao conceito de valor de mercado, identificando-se sobretudo com o “valor de substituição”, portanto aquele que permite ao expropriado repor a sua situação patrimonial original, incluindo-se, portanto, todos os prejuízos decorrentes da expropriação”.

89.

Por decisão do Ministério da Educação o contrato de associação não foi renovado.

90.

O que determinou a insolvência da entidade proprietária do estabelecimento de ensino.

91.

Não obstante tal fato, nem o Ministério da Educação, nem a entidade expropriante, acautelaram a necessidade de terem instalações para albergarem os alunos que frequentavam tal estabelecimento de ensino, que muito embora fosse de iniciativa privada, estava integrado na rede pública de ensino.

92.

Motivo pelo qual, trataram de assinar um contrato de arrendamento que lhes permitisse aceder no imediato, sem convulsões públicas, garantir uma resposta adequada às respostas educativas do concelho de Oliveira do Bairro.

93.

Ou seja, onde antes funcionava uma escola de iniciativa privada que garantia o normal funcionamento das necessidades educativas públicas, passou a funcionar uma escola pública para albergar as mesmas crianças.

94.

Sem que, para além do valor da renda, o Estado Português/Ministério da Educação tivesse gasto qualquer quantia para a construção de uma escola nova.

95.

As negociações mantidas com a entidade expropriante, tendo em vista a aquisição do património imobiliário da expropriada afeto às necessidades educativas do concelho de Oliveira do Bairro vieram a manifestar-se inconclusivas.

96.

Ocorre todavia, que a ora expropriada entendeu proceder à venda de todo aquele património imobiliário, pelo valor mínimo de €2.867.050,00, dadas as suas necessidades financeiras para manter as restantes respostas sociais, e os custos inerentes à manutenção e reabilitação constantes do vasto património que ora foi expropriado,

97.

Para além do custo anual com o pagamento do Imposto Municipal de Imóveis no valor de €14.686,75.

98.

Intenção de proceder à venda do referido património que culminou no acordo celebrado nos autos de processo número, que correu seus termos pelo Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro, e objeto de sentença homologatória.

99.

E para o efeito procedeu à denúncia do contrato de arrendamento celebrado com a entidade expropriante com efeitos a 31.08.2022.

100.

Ora, a denúncia do contrato de arrendamento foi a mola impulsionadora do ato expropriativo por parte da Câmara Municipal ..., que em consonância com o Ministério da Educação, reconhecendo a mais-valia do património imobiliário a expropriar, nomeadamente dos terrenos e das construções, percebeu que era mais rápido expropriar do que construir ex novo,

101.

Quer porque tais instalações, vedações, campos de jogos, jardins terrenos estavam prontos a utilizar como sempre estiveram nos últimos 40 anos, e devem ser objeto de avaliação e não foram!

102.

E que era mais barato expropriar, porque no uso do seu ius imperium poderiam impor a fixação unilateral de um valor muito abaixo do preço de mercado, como fizeram.

103.

Sem que fosse introduzido qualquer hiato no decurso dos anos escolares imediatos e subsequentes, para os quais o Município não tinha instalações escolares!

104.

O que a entidade expropriante agora pretende, é garantir uma resposta educativa integral, para a chamada Criação (que não o é!) mas sim instalação da Escola Básica de tipologia de 2º e 3º Ciclo de Ensino Básico (CEB), na zona poente do Município ... – União de Freguesias ..., ... e ..., mediante a expropriação de um património que demorou décadas as construir, mas por um valor irrisório como é fácil de compreender.

105.

Garantindo a utilização imediata e sem sobressaltos de instalações sem qualquer custo imediato,

106.

Enquanto a expropriada deixa de ter a disponibilidade imediata do seu património imobiliário,

107.

E não recebe qualquer quantia indemnizatória no mesmo e adequado tempo.

108.

Nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 23º do Código das Expropriações A justa indemnização visa ressarcir o prejuízo que para o expropriado advém da expropriação, correspondendo ao valor real e corrente do bem de acordo com o seu destino efetivo ou possível numa utilização económica normal, à data da publicação da declaração de utilidade pública, tendo em conta as circunstâncias de fato existentes na data.

109.

Nos termos do n.º 5 do mesmo artigo 23º do Código das Expropriações “Para além dos critérios referenciais constantes do artigo 26º do Código das Expropriações, o valor dos bens deve corresponder ao valor real e corrente dos mesmos, numa situação normal de mercado, podendo o expropriado requerer, ou o tribunal decidir oficiosamente, que na avaliação sejam atendidos outros critérios para alcançar aquele valor.

110.

Ora, tal qual se refere J.A. Santos (Código das Expropriações, DisLivro, 2000) a reconstrução impõe o ressarcimento de outros prejuízos patrimoniais causados pelo ato expropriativo os quais mesmo que existissem numa situação normal de mercado tinham sido resultado da vontade do proprietário e não fruto de uma imposição administrativa.

111.

A esse propósito, a jurisprudência mais recente vem subscrevendo a opinião de que “A indemnização justa deverá proporcionar ao expropriado um valor monetário que o coloque em condições de adquirir outro bem de igual natureza e valor” Ac. TRL 2246/2006-.

112.

Uma das formas de fixar o valor da indemnização, de uma forma justa e adequada, será o de considerar o valor patrimonial resultante da avaliação efetuada pela Autoridade Tributária.

113.

O valor da referida avaliação respeita a áreas total do terreno, a área de implantação dos edifícios e a área bruta de construção, bem como a área sobrante de terreno, considerou o coeficiente de localização, o coeficiente de afetação como serviços e o seu destino – instituição dedicada ao ensino-, o coeficiente de qualidade e de conforto, o coeficiente de vetustez (referente ao número de anos da construção), o valor da área de construção autorizada ou prevista, a localização geográfica e a área não ocupada por futuras construções.

114.

O prédio a expropriar foi sujeito a avaliação por parte da Autoridade Tributária no ano de 2022, tendo-lhe sido atribuído o valor patrimonial atual de €4.895.583,34 – certidão de teor – que é o seu valor patrimonial atual.

115.

O valor patrimonial resultante de avaliação por parte da Autoridade Tributária, e o valor do Imposto Municipal Sobre Imóveis pago ao longo dos últimos anos foi o seguinte:…

Ano VPT Taxa IMI IMI Pago

2018 €4.752.070,08 0,3% €14.256,21

2019 €4.847.112,22 0,3% €14.541,34

2020 €4.847.112,22 0,3% €14.541,34

2021 €4.847.112,22 0,3% €14.541,34

2022 €4.895.583,34 0,3% €14.686,75

116.

E assim sendo, entende a expropriada que a indemnização devida é num valor nunca inferior a €4.895.583,34 (quatro milhões, oitocentos e noventa e cinco mil, quinhentos e oitenta e três euros e trinta e quatro cêntimos).

117.

Por outro lado, mesmo considerando o valor refletido no relatório de avaliação efetuado, este contém erros técnicos assinaláveis, a par de omissões ou ideias pouco sustentadas e desadequadamente abstratas.

118.

Desde o seu início o relatório de avaliação denota uma enorme subjetividade para o qual o autor encaminhou o seu conteúdo, desde as características do PDM que menciona, “esquecendo” o artigo 73 do Regulamento do PDM do concelho de Oliveira do Bairro, na sua nova redacção de 2022: artigo 73 n.1…, nº2 A edificabilidade dos edifícios afetos a unidades de equipamentos de utilização cilectiva fica nestes solos condicionada ao cumprimento dos seguintes parâmetros de edificabilidade: a)… b) Indice de impermeabilização maimo da ata da parcela inserida nessa categoria de soo o.8….c)..d)… nº3 Nas situações de edificos associados a equipamentos de utilização colectiva existentes são admitidas obras de ampliação ou construção de edifícios de apoio, desde que entendidas como essenciais á viabilidade e funcionalidade dos respectivos equipamentos e seja assegurada a sua articulação á adequada inserção urbana com o território envolvente , assim como o cumprimento de parâmetros de edificabilidade com excepção da alínea d) do numero anterior.

119.

Ou deambulando sobre formas de obter índices até chegar, de forma forçada ao n.º 12 do art 26º do C.E., mais invocando uma linha de água classificada, é certo, mas perfeitamente estável e emanilhada, como muitas e muitas outras que se espalham por esse país fora, numa tentativa de minimizar o valor indemnizatório a determinar, tornando-se necessário escamotear e rebater o articulado exposto no dito documento, que enferma, notoriamente, de incorrecções.

120.

Por outro lado, não existe uma obrigatoriedade de não poder haver mais espaços aedificandi no artigo matricial a expropriar, sendo imperioso analisar a edificação existente e remover o Índice de Utilização, médio e abstrato, conveniente para um cálculo.

121.

Se é certo que não existe um mercado de “estabelecimentos de ensino”, não há dúvidas do valor do solo mesmo como equipamento, aqui sim, em abstrato.

122.

Enquadrando a avaliação no cumprimento do PDM em vigor, o instrumento possível para o terreno ser avaliado, por fugir um pouco às condicionantes usuais, será sempre apto a construção, regido pelo PDM em vigor, na sua interpretação plena, nomeadamente, com possibilidade de construção em ampliação.

123.

Passa por, em termos de classificação para efeitos de IMI (sabendo porém, de antemão que o terreno estará isento de impostos), segundo a Administração Tributária, o artigo matricial em questão teria um uso que se aproximaria de Serviços, pois este conceito, salvo melhor opinião, não molesta a classificação de espaço de uso especial: notar bem que o índice para este tipo de ocupação é de 0,65 enquanto que para fins habitacionais eleva-se para 0,85….

124.

A título de exemplo, e em exercício acima justificado, a simulação expedita e arredondada ao milhar traz para o valor do terreno o valor de €715.150,00, não esquecendo que este valor é com os metros quadrados que hoje ali se encontram, sem qualquer tipo de ampliação, que, como se justificou, não tem razão de não existir!

125.

Portanto, das considerações relativamente à aplicação do Método Comparativo, existem inúmeros fatores que o podem levar a um raciocínio claro sobre a ocupação do terreno, aliás comum quando há homogeneidade de propriedades ou ainda índices da Administração Tributária, que permitem simular o valor relativo dos terrenos, mormente os de uso especial que obrigatoriamente tem de ser enquadrados numa categoria própria de urbanismo.

126.

Depois, tal reflexão nada contraria a redação do art.º 73.º ou o art.º 26.º do Código das Expropriações, o que em exercício académico também, paralelamente, se poderá ensaiar.

Artigo 73 …

127.

Quando o relatório de avaliação discorre a fls 5/17 que “a estimativa do Presumível Valor de Mercado do solo considerou os principais factores determinantes de valor,… considerou apenas, o bem imóvel solo e as estruturas edificadas”, remete a avaliação para valores diletantes e que se passam a rebater e a justificar.

128.

O tratamento deste assunto como um assunto árido e espartilhado no sentido de poder aligeirar a verdadeira importância deste núcleo escolar, omitindo o que agora a B... vem relembrar, nomeadamente a Carta Educativa de 2006, a importância fulcral que esta escola teve e continua a ter (chegou a ter mais de metade dos alunos do ensino básico e secundário do concelho.

129.

A par do crescimento exponencial do combate à iliteracia, vidé quadro que reporta os anos de 2001, 2010 e 2020, no concelho de Oliveira do Bairro:…

130.

Ou seja, a avaliação do terreno tem de ter sempre um cunho de pesquisa no mercado e deve encarar-se com uma sensibilidade especial para o que se pretende avaliar, no melhor uso possível e tecnicamente exequível.

131.

O relatório da avaliação da entidade expropriante revela erros técnicos na aplicação dos índices de depreciação de Ross-Heideck do Método do Custo.

132.

E tal fato revela um total desconhecimento do estado interior dos diversos blocos edificados, equipamentos, etc., juntando-se para o efeito 10 documentos fotográficos - Doc. 7 a 16 - que ilustram o motivo pelo qual não se aceitam os coeficientes de Ross- Heideck aplicados no relatório da avaliação da Expropriante:

133.

A esse propósito, no ano de 2018 a entidade expropriante teve o cuidado de pedir uma vistoria para ficar ciente se o complexo educacional teria ou não algum problema de índole estrutural ou outro.

134.

O documento final referia que estruturalmente a segurança estava garantida em todos os edifícios, com a recomendação de ser revista a cobertura do Pavilhão Gimnodesportivo e nas paredes “viradas a sudeste” haver tintas e massas desagregadas em zonas perfeitamente delimitadas, não tendo qualquer influência na estabilidade e segurança do edifício vistoriado.

135.

Em conclusão, dos restantes espaços nada houve a apontar, o que aqui se recorda e se perspetiva, pois, este facto é minudente relativamente aos cerca de 9456 m2 construídos para além dos do Pavilhão.

136.

Não se aceita o que foi aposto no relatório, como F/G porque se há pouquíssimos reparos simples a fazer - nem se vislumbram quais, com a excepção apontada e já muito forçadamente a classificação G para a cobertura do Pavilhão, todos os outros blocos devem ser inseridos na classificação C – Regular, tantas foram as reclassificações que foram levadas a cabo ao longo dos tempos e o próprio tempo de construção, muitas delas relativamente recentes: o coeficiente k será 0,255, com a Vida útil, forçada também no documento 4 em 35%, quando há construções que estarão nos 25%, mais os preços metro quadrado verdadeiramente anacrónicos para o que é real, na actualidade.

137.

O quadro infra reproduzido justifica o cálculo do valor real de €3.278 363,00 (Três Milhões Duzentos e Setenta e Oito Mil Trezentos e Sessenta e Três Euros):…

138.

Considerando o valor do solo como sendo 17% o peso do terreno a aplicar ao valor encontrado para as estruturas edificadas, (fonte Administração Tributária) isto é o valor de €557.321,71, tem-se para a avaliação global do prédio ..., arredondado às dezenas, o valor de €3.835.684,71 (Três Milhões Oitocentos e Trinta e Cinco Mil Seiscentos e Noventa Euros).

139.

E assim sendo, o valor da indemnização a pagar pelo prédio urbano expropriado será de fixar pelo tribunal entre €4.895.583,34 (quatro milhões, oitocentos e noventa e cinco mil, quinhentos e oitenta e três euros e trinta e quatro cêntimos) da avaliação patrimonial ficada pela Administração Tributária e o valor de €3.835.684,71 (Três Milhões Oitocentos e Trinta e Cinco Mil Seiscentos e Noventa Euros).

140.

Não sendo despiciendo a consideração que as construções, edifícios e terrenos do insolvente A..., S.A. estavam registados contabilisticamente pelo valor de €4.569.512,17.

V

DA SUBSTITUIÇÃO POR GARANTIA BANCÁRIA DO DEPÓSITO-CAUÇÃO EFETUADO À ORDEM DA ORA EXPROPRIADA

141.

A entidade expropriante vem efectuar pedido de substituição do valor depositado por garantias bancárias autónomas, o que faz ao abrigo do n.º 5 do artigo 20.º do Código das Expropriações.

142.

Alegando que a quantia depositada representa uma fatia muito relevante da operação financeira do Município.

143.

Ocorre que para além de extemporâneo, o referido pedido é manifestamente infundado e extemporâneo devendo ser indeferido.

144.

A Expropriada foi desapossada do objeto da expropriação, tendo sido atribuído caráter de urgência à expropriação, e até à presente data não recebeu qualquer quantia indemnizatória.

145.

Por outro lado, a entidade expropriante procedeu ao depósito do montante global fixado em avaliação e relatório de avaliação elaborado ao abrigo do disposto do n.º 4 do artigo 10.º do Código das Expropriações, ou seja, para efeito de aquisição por via do direito privado, no valor de €1.846.198,13, em 1 de Setembro de 2022.

146.

O que fez nos termos alegados nos artigos 12.º a 15.º da petição inicial.

147.

Atribuído caráter urgente à expropriação, a entidade expropriante demorou mais de 90 dias após a data da publicação da declaração de utilidade pública – 28 de abril de 2022 (cfr. artigo 8º da petição inicial) – a efetuar o depósito, em violação do disposto na alínea a) do n.º 5 do artigo 20.º do Código das Expropriações.

148.

Por outro lado, a entidade expropriante efetuou o depósito na Banco 1..., à ordem da ora expropriada no valor de €295.698,00, nos termos e na proporção em que o entendeu fazer,

149.

Sem garantir que a Expropriada o pudesse movimentar ou tivesse acesso a tal quantia.

150.

E assim, a Expropriada ficou sem o prédio expropriado e sem movimentar tal quantia.

151.

Sem embargo, a entidade expropriante deveria ter procedido a depósito à ordem da Expropriada do valor de €553.859,44 (quinhentos e cinquenta e três mil, oitocentos e cinquenta e nove euros e quarenta e quatro cêntimos), pelos motivos alegados nesta petição de justiça.

152.

A ora interessada pretende que lhe seja entregue pelo menos parte da quantia a que tem direito por via da presente expropriação, não devendo ser dispensado o depósito prévio.

153.

Pelo exposto, deverá a entidade expropriante depositar à ordem da ora expropriada Sociedade de Promoção Social B..., Instituição Particular de Solidariedade Social a quantia no valor de €553.859,44 (quinhentos e cinquenta e três mil, oitocentos e cinquenta e nove euros e quarenta e quatro cêntimos),

154.

E a expropriada ser autorizada ao seu levantamento imediato.

155.

Ou quando assim se não entenda, que se autorize a expropriada ao levantamento da totalidade da quantia do valor de €1.846.198,13 (caso se entenda que a interessada Massa Insolvente do A..., S.A. não tem legitimidade para estar nos autos) ou da quantia de €295.698,00 que já está depositada à sua ordem, pois pelo menos ao pagamento deste valor esta sempre terá direito.

156.

O que desde já se requer.

157.

Na verdade, a expropriada já não está na posse do bem objeto da expropriação, e também não existe fundamento para que não tenha na sua disponibilidade, pelo menos parte da quantia que lhe cabe na referida expropriação.

158.

Devendo ser indeferido o pedido de substituição do depósito por garantia bancária formulado pela Expropriante.

159.

Para o caso de não se atender ao pedido de levantamento do depósito, fica desde já impugnado o valor da garantia bancária autónoma a prestar pela entidade expropriante a favor da expropriada, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 2 do artigo 907.º do Código de Processo Civil.

160.

Porquanto, quer o depósito a favor da ora interessada, quer a prestação da garantia bancária autónoma, devem ser efectuados pelo valor correto, ou seja, no valor de €553.859,44 (quinhentos e cinquenta e três mil, oitocentos e cinquenta e nove euros e quarenta e quatro cêntimos), pelos motivos supra alegados e que aqui se reproduzem,

161.

Até que se defina e aguarde o valor da indemnização constante da decisão arbitral, cuja junção aos autos deverá ser determinada de imediato pelo Tribunal.

162.

Porque apenas com o conhecimento do valor arbitrado pela Decisão Arbitral é possível decidir o presente incidente.

VI

DIREITO A JUROS MORATÓRIOS

163.

Tal como referido anteriormente, atribuído caráter urgente à expropriação, a entidade expropriante demorou mais de 90 dias após a data da publicação da declaração de utilidade pública – 28 de abril de 2022 (cfr. artigo 8º da petição inicial) – a efetuar o, depósito, em violação do disposto na alínea a) do n.º 5 do artigo 20.º do Código das Expropriações,

164.

E mais de 1 ano a enviar o processo para tribunal.

165.

Por força do disposto nos arts. 51.º, nº 1, e 70.º do Código das Expropriações a entidade expropriante está obrigada ao pagamento de juros moratórios em caso de atraso na remessa do processo ao Tribunal.

166.

Tais juros, são devidos pelo período correspondente a tal atraso, devem ser calculados sobre o montante definitivo da indemnização que venha a ser fixada pela expropriação.

167.

Devendo as cauções prestadas e os depósitos efetuados pela entidade expropriante responder pelo pagamento dos juros moratórios que forem fixados pelo tribunal.

168.

São devidos juros moratórios desde 28 de abril de 2022 à taxa de 4%, sobre o montante definitivo da indemnização que venha a ser fixada pela expropriação

Nestes termos e nos melhores de Direito,

(a) Deve ser declarada a nulidade do despacho de adjudicação, devendo a entidade expropriante notificar a expropriada da Decisão Arbitral;

(b) Em consequência deve ser renovado o despacho e o prazo para a expropriada usar da faculdade de interposição de recurso da decisão arbitral nos termos do artigo 52º do Código das Expropriações;

(c) Deve ser aceite a reclamação efetuada ao abrigo do artigo 54º do Código das Expropriações, e efetuada a prova devida, ser feita a correta delimitação da parcela expropriada;

(d) Ser aceite a legitimidade da expropriada e da interessada Massa Insolvente do A...., S.A nos termos constantes dos artigos 42.º a 73.º desta petição de justiça, com respeito pela validade e eficácia do acordo homologado judicialmente entre ambas e a final, determinando-se o pagamento da indemnização na medida da proporção acordada de 30% para a expropriada e de 70% para a interessada Massa Insolvente do A...., S.A.;

(e) Ser fixada a indemnização global pelo ato expropriativo no valor global a fixar entre €3.835.684,71 e €4.895.583,34;

(f) Ser julgado improcedente e indeferido o pedido de substituição dos depósitos bancários efetuados, no valor global de €1.846.198,13 por garantia bancária, e em consequência ser decidida a entrega à expropriada da quantia no valor de €553.859,44, e de €1.292.338,691 à interessada Massa Insolvente do A...., S.A.

I - Requer a inquirição das seguintes testemunhas:

1. BB, inspector da Polícia Judiciária, aposentado, a notificar para a Rua ..., ... ....

2. CC, solteiro, padre, com domicílio na Rua ..., em Coimbra;

3. DD, solteiro, maior, técnico oficial de contas, com domicílio na Rua ..., em Coimbra;

4. EE, revisor oficial de contas, casado, a notificar na Rua ..., ... Coimbra;

5. FF, técnica oficial de contas, a notificar na Rua ..., ... ....

II - Prova Pericial:

Indica-se como perito o Senhor Engenheiro GG, a notificar na Rua ..., ..., 1º esquerdo, ... Coimbra.

III - Requer:

(1) Notificação da Construção Pública, E.P.E., ex-Parque Escolar, E.P.E., com sede na Av. ..., ... Lisboa, redenominação efetuada ao abrigo do Decreto-Lei n.º 42/2023, de 5 de junho, responsável pela Modernização do Parque Escolar Destinado ao Ensino Básico (Programa de Modernização) para informar os autos do valor de referência para a construção de uma escola tipologia 2º e 3º CEB, com 30 turmas.

(2) Nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 2 e 3 do artigo 26.º do Código das Expropriações requer-se a notificação dos serviços competentes do Ministério das Finanças para fornecer a lista das transacções e das avaliações fiscais que corrijam os valores declarados efetuados na zona e os respetivos valores.

(3) Notificação do serviço de finanças de Oliveira do Bairro para vir juntar aos autos cópia da certidão de teor matricial dos prédios que deram origem ao artigo matricial urbano n.º ... e do artigo matricial urbano n.º ..., ambos da União de Freguesias ..., ... e ... e das quais constem as respetivas confrontações.

IV - Inspeção judicial:

Requer a inspeção judicial ao local a qual se destina a fixar a delimitação física da parcela a expropriar.

V - Prova documental

1 a 3 - Levantamento topográfico do prédio expropriado;

4 – Certidão de teor matricial do artigo matricial urbano n.º ...;

5 – Certidão de teor matricial do artigo matricial urbano n.º ...;

6 – Certidão judicial de transação;

7 a 16 – Documentos fotográficos

VI - Requer a V.a Ex.a a gravação da audiência final.

Da isenção de custas: A Ré é uma instituição particular de solidariedade social que tem por fim principal a segurança social, mantendo dentro do possível, o apoio a crianças e jovens necessitados, acolhimento e regime de família a crianças abandonadas e apoio à família; e ainda a criação de escolas ou outros estabelecimentos de formação, educação e trabalho, actividades educativas e formativas em ordem à conveniente preparação do quadro de pessoal da instituição – Doc. anexo.

Requer que lhe seja reconhecida a isenção subjetiva prevista na alínea f) do n.º l do artigo 4.º do RCP dado que a Ré actua nos presentes autos em defesa do pagamento de uma indemnização de um património que estava afecto à sua atividade e da qual se viu desapossada por via de expropriação.

Junta: 17 documentos….».


*

Após foi proferido o seguinte despacho: «.. Requerimento com a refª 14878075: Antes de mais, oficie ao processo nº 2876/17.3T8AVR que corre termos pelo Juízo do Comércio de Aveiro e em que é insolvente o A..., SA, solicitando informação: . sobre o respectivo estado; . de qual o actual Administrador de Insolvência…»

E ulteriormente é proferido o seguinte despacho: «.. Proceda às notificações da Expropriada Massa Insolvente do A..., S.A., na pessoa da actual Administradora da Insolvência, Drª HH…»


*

A 17-10- 2023 é proferido o seguinte despacho:«…Verifica-se que a AI já foi notificada nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 51º, n.º5, do Código das Expropriações, a 12.07.2023 [... e ...].

No entanto, analisado a questão prévia do requerimento da Expropriada “Sociedade de Promoção Social – B..., I.P.S.S.” de 31.07.2023 e melhor compulsada a petição inicial, constata-se que o despacho de 10.07.2023 poderá ter sido prematuro, limitando-se o pedido da Expropriante à substituição do depósito prévio por prestação de garantia bancária.

Sucede que, no mesmo requerimento da Expropriada “Sociedade de Promoção Social – B..., I.P.S.S.”, suscitam-se dúvidas quanto à titularidade dos bens, que devem ser resolvidas por incidente, nos termos do disposto no artigo 53º, do Código das Expropriações e, ainda, quanto à delimitação dos limites do prédio expropriado.

Pelo exposto e para contraditório prévio, notifique a Expropriante, para, querendo e no prazo de dez dias, pronunciar-se quanto: à questão prévia; à alegada caducidade de pedido de substituição do depósito prévio por prestação de garantia bancária; assim como em relação às dúvidas quanto à titularidade dos bens e delimitação dos limites do prédio expropriado.

Do mesmo modo, notifique a Expropriada, “Massa Insolvente do A..., S.A.”, na pessoa da AI para,  querendo e no prazo de dez dias, pronunciar-se quanto à titularidade dos bens e delimitação dos limites do prédio expropriado…».


*

Nessa sequência o Municipio junta o seguinte requerimento: «… Município ..., entidade expropriante nos autos à margem referenciados e neles melhor identificado, vem, face à notificação que nos autos antecede o presente requerimento, expor e requerer a V. Ex.ª o seguinte:

1 - Mal ou bem já ocorreu a adjudicação, pelo que, salvo o devido respeito, não se afigura possível prolatar despacho de sentido oposto, considerando que o poder jurisdicional se esgotou.

2 - Esta posição processual (mais eficiente face ao sucedido) em nada prejudica os direitos dos expropriados, pois em sede de peritagem (que é um elemento instrutório obrigatório) o valor do prédio objeto dos autos será, naturalmente, apurado, sendo que para o efeito todas as partes procederão à nomeação dos respetivos peritos (cfr. artigo 62.º do CE),

3 - revelando-se outra posição processual, que não a que sustentamos e que já demos nota, prejudicial aos interesses do Município, pois que deixa de poder usufruir da titularidade, digamos assim, do bem, e, tanto quanto pensamos poder sustentar, dos expropriados que dilatam o recebimento definitivo da indemnização para momento posterior.

4 - Se assim for, como deve, o Município desiste (ou aceita expressamente a caducidade) do seu pedido de substituição do depósito prévio por caução, o que se afigura equilibrado e razoável, também tanto quanto pensamos poder sustentar, para os interesses materiais dos expropriados.

5 - Quanto ao dissenso entre os expropriados, verdadeiramente, esta é matéria que ao interesse público municipal, alheio que é a estas questões de direito privado, desinteressa – desde logo tendo em consideração o princípio da legitimidade aparente.

Termos em que, Se requer a V. Ex.ª que:

a) decidida provisoriamente a questão prejudicial, e

b) notifique a entidade expropriante do recurso interposto pela expropriada para efeito de apresentação de contra-alegações (ou, melhor, contestação) e a consequente tramitação do processo em termos regulares, mormente com a constituição da peritagem, com todas as consequências legais…»


*

Seguidamente a 3/1/2024, foi proferido o despacho recorrido nos seguintes termos:«…

NULIDADE DO DESPACHO DE ADJUDICAÇÃO

O Município ... apresentou requerimento a 05.07.2023, nos termos do qual requereu, “ao abrigo do previsto no n.º 5 do art. 20.º do Código das Expropriações, se digne admitir a substituição dos depósitos bancários que foram efectuados pela entidade expropriante abrigo do disposto na al. a) do n.º 1 do mesmo preceito legal, pelas garantias bancárias autónomas cujas minutas ora se anexam”.

Conforme já referido no despacho de 17.10.2023, de forma totalmente prematura, foi proferido, a 10.07.2023, despacho de adjudicação do prédio à Expropriante, fazendo referência a um relatório de arbitragem que não existe.

Notificada a 12.07.2023, veio a Expropriada Sociedade de Promoção Social – B..., a 31.07.2023, suscitar a nulidade da decisão de adjudicação, por não ter sido notificada do relatório de arbitragem.

Nesse mesmo requerimento, entre outras questões, invoca a extemporaneidade do pedido de substituição de depósito por caução, por a Expropriante ter procedido ao depósito mais de noventa dias após a data da publicação da declaração de utilidade pública.

Dado o contraditório, a Expropriante pugnou pela manutenção do despacho de adjudicação e confessou a caducidade do pedido de substituição de depósito por caução.

Aqui chegado, cumpre desde logo referir que a decisão de adjudicação não transitou em julgado, tendo sido suscitada a nulidade da mesma dentro do prazo de recurso.

Assim, ainda que não sejam pelos mesmos fundamentos indicados pela Expropriada, entende-se que, efectivamente, a decisão de adjudicação é nula, por prática de um acto que a lei não admite e omissão de uma formalidade prescrita por lei – artigo 195º, n.º1, do Código de Processo Civil.

Destarte, o processo não deu entrada para efeitos de recurso da decisão de arbitragem, não tendo sido dada a oportunidade às partes de resolverem a presente expropriação, de forma amigável.

Mais a mais, verifica-se que existem duas questões suscitadas pela Expropriada Sociedade de Promoção Social – B... que ainda se encontrarão por decidir e que poderão influenciar, tanto a arbitragem que ainda se encontra por realizar, como a titularidade do direito à indemnização.

Efectivamente, segundo a Expropriada Sociedade de Promoção Social – B..., já reclamou quanto à delimitação física da parcela a expropriar (artigo 54º do Código de Expropriações), assim como não concorda com a divisão da titularidade dos bens com a outra Expropriada (artigo 53º do Código de Expropriações).

Dito isto, não se poderá concordar com o Expropriante no sentido que a manutenção da decisão de adjudicação não prejudica a posição dos seus intervenientes, concluindo-se que a irregularidade cometida influiria com a decisão da causa.

Por todo o exposto e ao abrigo do citado normativo, julga-se nulo o despacho de adjudicação proferido a 10 de Julho de 2023.

Registe e notifique, incluindo a Conservatória do Registo Predial.

No que respeita ao pedido de substituição do depósito por caução, não obstante o Expropriante ter confessado a extemporaneidade invocada pela Expropriada Sociedade de Promoção Social – B..., tendo-o feito no pressuposto de ser mantida a decisão de adjudicação (no artigo 4º da resposta, o Expropriante diz “Se assim for, (…)”) entende-se que será de decidir o incidente, sem confissão (artigo 357º, n.º1, a contrário, do Código Civil).

INCIDENTE DE SUBSTITUIÇÃO DE DEPÓSITO POR CAUÇÃO

Por requerimento de 05.07.2023, veio o Município ... requerer, ao abrigo do previsto no n.º 5 do art. 20.º do Código das Expropriações, que seja admitida a substituição dos depósitos bancários que foram efectuados pela entidade expropriante pelas garantias bancárias autónomas já prestadas pela Banco 1..., juntas com o requerimento inicial.

Alega para o efeito, em suma, que a quantia depositada representa uma fatia muito relevante da operação financeira do Município.

Dado o contraditório, veio a Expropriada, Sociedade de Promoção Social – B... opor-se à referida substituição, alegando, desde logo, que para além de extemporâneo, o referido pedido é manifestamente infundado.

Segundo a Expropriada, o Expropriante demorou mais de 90 dias após a data da publicação da declaração de utilidade pública para proceder ao referido depósito e, por outro lado, efectuou o depósito, na Banco 1..., à sua ordem no valor de €295.698,00, nos termos e na proporção em que o entendeu fazer, sem garantir que a Expropriada o pudesse movimentar ou tivesse acesso a tal quantia. E assim, lamenta ter ficado sem o prédio expropriado e sem poder movimentar tal quantia. Finaliza defendendo que a entidade Expropriante deveria ter procedido a depósito à ordem da Expropriada do valor de €553.859,44 (quinhentos e cinquenta e três mil, oitocentos e cinquenta e nove euros e quarenta e quatro cêntimos), pelos fundamentos apresentados quanto à questão da proporção da titularidade do bem expropriado.

Notificada a Expropriada, Massa Insolvente do A..., S.A., na pessoa da Administradora de Insolvência, a mesma nada disse.

Aqui chegado, cumpre apreciar e decidir.

Para a decisão do presente incidente, cumpre ter em consideração os seguintes factos que resultam de cópias do processo administrativo remetido pelo Expropriante e que não foram postas em causa pela Expropriada, Sociedade de Promoção Social – B...:

1) Foi declarada, por despacho do Secretário de Estado da Administração Local e Ordenamento do Território, de 28/04/2022, a expropriação, com carácter urgente, do prédio urbano, inscrito na matriz da União de Freguesias ..., ... e ..., sob o artigo ... e descrito na Conservatória do registo predial sob o n.º..., com destino à criação/instalação de um estabelecimento de educação – Escola Básica, de tipologia de 2º e 3º CEB – na zona poente do Município ... – União de Freguesias ..., ... e ..., com os fundamentos de facto e de direito expostos na Informação Técnica n.º..., de 20 de Abril de 2022, da Direcção –Geral das Autarquias Locais (Doc 1 junto com o requerimento inicial – cópia da DUP publicada a 13.05.2022).

2) No dia 22 de Agosto de 2022, o Expropriante tomou posse administrativa dos bens a expropriar, tendo, para o efeito, lavrado o respectivo auto (doc. 3 do requerimento inicial – auto de posse administrativa).

3) A 1 de Setembro de 2022, o Expropriante procedeu ao depósito prévio do montante que foi apurado por efeito do relatório de avaliação elaborado ao abrigo do n.º 4 do art. 10.º do Código das Expropriações (doc.4 do requerimento inicial), no valor de: i) 295.698,00€ (duzentos e noventa e cinco mil e seiscentos e noventa e oito euros), correspondente ao valor do solo, a favor da expropriada Sociedade Promoção Social – B..., Instituição Particular de Solidariedade Social - (doc. 5 do requerimento inicial);

ii) 1.550.500,13€ (um milhão quinhentos e cinquenta mil e quinhentos euros e treze cêntimos), correspondentes ao valor das seis estruturas que se encontram edificadas no solo e que são dedicadas à actividade escolar, a favor da expropriada Massa Insolvente da A..., S.A.- (doc. 6 do requerimento inicial).

4) O Expropriante apresentou minutas pré-aprovadas pela Banco 1..., S.A. (docs. 7 e 8 do requerimento inicial).

Não existem factos, com relevância para o presente incidente, que não tenham sido dados como provados.

Nos termos do disposto no n.º1, do artigo 20º, do Código das Expropriações (redacção da Lei 56/2008, de 4 de Setembro), a investidura administrativa na posse dos bens não pode efectivar-se sem que previamente tenham sido:

a) Notificados os actos de declaração de utilidade pública e de autorização da posse administrativa;

b) Efectuado o depósito da quantia mencionada no n.º 4 do artigo 10.º em instituição bancária do lugar do domicílio ou sede da entidade expropriante, à ordem do expropriado e dos demais interessados, se aquele e estes forem conhecidos e não houver dúvidas sobre a titularidade dos direitos afectados;

c) Realizada vistoria ad perpetuam rei memoriam destinada a fixar os elementos de facto susceptíveis de desaparecerem e cujo conhecimento seja de interesse ao julgamento do processo.

No entanto, o depósito prévio é dispensado: (…) se a expropriação for urgente, devendo o mesmo ser efectuado no prazo de 10 dias, contados nos termos do artigo 279.º do Código Civil, a partir da data da investidura administrativa na posse dos bens – artigo 20º, n.º6, alínea a), do Código das Expropriações.

Por fim, importa ainda ter em consideração o disposto no n.º5, do artigo 20º, do Código das Expropriações, nos termos do qual, o depósito a que se refere a alínea b) do n.º 1 pode ser substituído por caução prestada por qualquer das formas legalmente admissíveis.

Analisados estes normativos, verifica-se que, no presente caso, já não será aplicável o prazo de 90 dias a contar desde a data de declaração de utilidade pública da redacção anterior do Código das Expropriações, mas sim, o prazo de dez dias a partir da data de investidura administrativa na posse dos bens, para verificar a tempestividade da prestação de depósito exigido por lei.

Ora, calculado o prazo nos termos previstos no artigo 279º, do Código Civil, tendo o Expropriante tomado posse do prédio expropriado a 22 de Agosto de 2022, tinha até o dia 1 de Setembro de 2022 para proceder ao depósito do preço, o que cumpriu.

Assim, ao contrário do alegado pela Expropriada, Sociedade de Promoção Social – B..., Instituição Particular de Solidariedade Social, o Expropriante não prestou o depósito fora do prazo legal.

Por sua vez, o n.º5, do artigo 20º, do Código das Expropriações não prevê um prazo para o pedido de substituição do depósito por caução, pelo que, salvo melhor opinião, entende-se que a mesma pode ser requerida a qualquer altura.

Nos termos do disposto no artigo 623º, do Código Civil, (…) se alguém for obrigado ou autorizado por lei a prestar caução, sem se designar a espécie que ela deve revestir, pode a garantia ser prestada por meio de depósito de dinheiro, títulos de crédito, pedras ou metais preciosos, ou por penhor, hipoteca ou fiança bancária. (…) Se a caução não puder ser prestada por nenhum dos meios referidos, é lícita a prestação de outra espécie de fiança, desde que o fiador renuncie ao benefício da excussão. (…) Cabe ao tribunal apreciar a idoneidade da caução, sempre que não haja acordo dos interessados.

No presente caso, propõe-se o Expropriante a prestar caução por garantia bancária, emitida pela Banco 1..., tendo junto os respectivos comprovativos.

A oposição apresentada pela Expropriada, Sociedade de Promoção Social – B..., Instituição Particular de Solidariedade Social, não decorre da idoneidade propriamente dita da dita caução, mas sim do valor da mesma.

Não concordando com o valor depositado à sua ordem, por entender ser titular – em maior proporção – do direito de propriedade sobre o bem expropriado, entende a Expropriada, Sociedade de Promoção Social – B..., Instituição Particular de Solidariedade Social, que o depósito em seu nome deveria ser efectivado em €553.859,44 (quinhentos e cinquenta e três mil, oitocentos e cinquenta e nove euros e quarenta e quatro cêntimos).

Ora, exige a lei que o depósito, nesta fase, seja efectuado em função do valor da avaliação prevista no artigo 10º, n.º4, do Código das Expropriações. O que o Expropriante cumpriu.

A questão da titularidade dos bens e da proporção do direito à indemnização, das Expropriadas, deverá ser decidido em sede própria, cumprindo apenas aqui garantir que, fixado o valor da indemnização, o Expropriante tenha por onde pagar.

No presente caso, o Expropriante apresenta garantia idónea e válida para a prestação de caução e justifica o pedido, concluindo que o valor depositado representa uma fatia muito relevante da operação financeira do Município, cuja falta é devidamente sentida.

Ora, atendendo ao montante em causa, perto dos dois milhões de euros, na sua totalidade, não serão necessárias grandes considerações para concluir que tal montante será sempre elevado, ainda que esteja em causa uma autarquia local.

Mais a mais, será de referir que a Expropriada, beneficiária da maior proporção da indemnização (mesmo na perspectiva da Expropriada, Sociedade de Promoção Social – B..., Instituição Particular de Solidariedade Social), não se opôs ao requerido.

Por fim, sempre se dirá que, nos termos do disposto no artigo 626º do Código Civil, caso a caução prestada se torne insuficiente ou imprópria, por causa não imputável ao credor, tem este o direito de exigir que ela seja reforçada ou que seja prestada outra forma de caução.

Isto é, caso se verifique que a Expropriada, Sociedade de Promoção Social – B..., Instituição Particular de Solidariedade Social, tem direito a um valor superior, poderá ser ordenada a alteração da caução prestada, caso no entretanto, não seja de atribuir a indemnização, no todo ou em parte.

Por todo o exposto e ao abrigo do citado artigo 20º, n.º5, do Código das Expropriações, defere-se o pedido de substituição dos depósitos por prestação de caução, por garantias bancárias autónomas da Banco 1..., S.A..

Custas pela Expropriada, Sociedade de Promoção Social – B..., Instituição Particular de Solidariedade Social, fixando-se a taxa de justiça em 1UC, sem prejuízo da isenção prevista na alínea f), do n.º1, do artigo 4º, do Regulamento das Custas Processuais.

Registe e notifique….»


*

Inconformada com tal decisão, veio o Município ..., entidade expropriante interpor o presente recurso.

O recorrente com o requerimento de interposição do recurso apresentou alegações, formulando, a final, as seguintes conclusões: «… III - Conclusões

a) O «valor» da causa, para efeitos do previsto no n.º 2 do artigo 304.º do CPC, fixa-se em .846.198,13 (um milhão oitocentos e quarenta e seis mil cento e noventa e oito euros e treze cêntimos), pelo que não há qualquer limitação quanto à alçada dos diferentes tribunais, mormente quanto à alçada do Tribunal a quo.

b) O despacho que anulou a decisão de adjudicação do bem expropriado, fulminando-a com a nulidade, é ilegal na medida este despacho não era suscetível de ser atacado por nulidade, como o fez o expropriado, mas por recurso para o Tribunal da Relação, nos termos da al. e) do n.º 1 e do n.º 4, ambos do artigo 615.º do CPC.

c) Na verdade, estamos face a uma decisão final a uma verdadeira sentença, com impacto real na ordem jurídica, não face a um mero despacho, sendo assim que, transmitindo-se aquela ou outra (na versão da sentença) nulidade ao conteúdo da decisão, só se poderia admitir mesmo o recurso da mesma e não a arguição da sua nulidade. A este respeito e bem (sobre a transmissibilidade do erro processual à decisão, ademais e aqui, final) se pronunciou o Ac. da RC de 3/5/2021, proferida no proc. 1250/20.9T8VIS - temos pois como válida e aplicável a doutrina emergente do seguinte Ac. do STJ de 17/11/2020, proferido nos processo 1427/06.0TAVNF.P1.S1.

d) Quanto à circunstância do processo não ter “entrado” para efeitos de recurso de arbitragem, nada mais é adiantado a este respeito que não esta razão assim mesmo dita, por um lado, e, por outro, que não se deu oportunidade às partes para uma resolução amigável do recurso, temos que:

e) A circunstância de o processo ter dado entrada em juízo não faz que o processo especial em causa tenha outro fim, trata-se, cremos nós, de um incidente no âmbito de um processo principal. Ora se assim virmos a situação, neste decidir ultra petitum (custa-nos assim qualificar a situação porque a mesma não tem esta feição declarada na sentença e não estamos face a um processo de partes em que reina o dispositivo), a doutrina fundamental nesta matéria remanesce, ou seja, não se deveria ter invocado a nulidade, mas dever-se-ia sim usar o recurso jurisdicional, estando, fosse como fosse, o poder de decidir esgotado - cfr. n.º 1 do artigo 163.º e n.º 4 do artigo 165.º, ambos do CPC.

f) No que concerne à falta de possibilidade de as partes chegarem a um acordo, deve alegar-se primordialmente que, ao contrário do que em erro de julgamento vem referido na sentença, esse tramite não está, na fase em que se encontra o processo, previsto processualmente (não existe qualquer previsão legal para que se equacione a aquisição amigável), sendo pois que, podendo as partes sempre acordar no montante indemnizatório devido enquanto o processo durar (transacionado, portanto), não se vislumbra sequer um qualquer prejuízo para a parte (ou partes) ou pertinência da razão para se entender que a mesma sustenta a tese da nulidade que se lê no despacho recorrido. Aliás, a fase de acordo – prevista que está no artigo 11.º do C.E - já se esgotou procedimentalmente, tendo sido naturalmente cumprida.

g) Finalmente, quanto à circunstância de se estarem a discutir entre os expropriados questões de direito civil (cfr. artigos 54.º e 53.º do C.E.), o que, em rigor, expropriante desconhece, a verdade é que esta discussão não pode nem deve, ao contrário do que em erro de julgamento vai acertado, influir sobre a titularidade do bem (despacho de adjudicação), que é o que está em causa, mas apenas, tanto quanto se sabe e é dito na sentença recorrida, sobre as delimitações físicas entre privados expropriados do bem objeto da expropriação e sobre a distribuição entre  eles da indemnização; ora, por força do princípio da legitimidade aparente (cfr. artigos 9.º e 40.º do C.E), temos que o bem expropriado se delimita como a Administração o desenhou concretamente ou concretizou em planta e na realidade e para quem o desenhou.

h) A sentença recorrida violou, pois, o estatuído no n.º 1 do artigo 163.º e no n.º 4 do artigo 165.º, ambos do CPC.

Termos em que,

Deve o presente recurso ser julgado totalmente procedente, por provado, e, em consequência, ser revogada a douta sentença recorrida, com todas as consequências legais. Valor: 1.846.198,13 (um milhão oitocentos e quarenta e seis mil cento e noventa e oito euros e treze cêntimos)…»(sic).

Compulsadas as alegações de recurso da recorrente verifica-se que alega em resumo: «…. I - Questão prévia

O Tribunal a quo, na sentença ora recorrida, não atribuiu um valor à causa, tendo se limitado tão-somente a fixar, para efeito de custas, a taxa de justiça em 1UC, id est, 102,00€.

Pois bem, a verdade é que a toda a causa, de acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 296.º do CPC, tem de ser atribuído “um valor certo, expresso em moeda legal, o qual representa a utilidade económica imediata do pedido”,

Servindo justamente esse «valor» para “determinar a competência do tribunal, a forma do processo de execução comum e a relação da causa com a alçada do tribunal”.

Ora, uma vez que em causa está, como nos parece ser pacífico e já por nós foi adiantado no requerimento inicial, uma lacuna processual que deve ser preenchida com recurso, com as devidas adaptações, à tramitação prevista para o incidente prestação de caução que se encontra previsto nos artigos 906.º e seguintes do CPC, o seu «valor» deverá ser determinado nos termos do artigo 304.º do CPC, mais especificamente nos termos do seu n.º 2, que prescreve que “o valor do processo ou incidente de caução é determinado pela importância a caucionar”.

Por conseguinte, uma vez que o que se pretende substituir por garantia autónoma são os depósitos efetuados a favor das entidades expropriantes nos termos do previsto no n.º 4 do artigo 10.º e na al. b) do n.º 1 do artigo 20.º C.E, o valor da causa corresponderá ao valor dos mesmos, ou seja, a um total de 1.846.198,13 (um milhão oitocentos e quarenta e seis mil cento e noventa e oito euros e treze cêntimos).

Destarte, o «valor» da causa fixa-se em 1.846.198,13 (um milhão oitocentos e quarenta e seis mil cento e noventa e oito euros e treze cêntimos), pelo que não há qualquer limitação quanto à alçada dos diferentes tribunais, mormente quanto à alçada do Tribunal a quo.

II - Alegações

Não pode o Município ver-se, como que - pois a situação de fundo não é assim, é o que temos sustentado - despojado da propriedade do bem expropriado que havia sido decretada pelo Magistrado de cuja decisão se recorre (despacho de adjudicação de uma escola onde funcionam aulas para uma parte significativa da população do concelho), a coberto de que se trata, a final, de nulidade.

Admite-se, naturalmente, que a arbitragem não foi, como a lei prescreve, enviada a tribunal e que este, assim inopinadamente, adjudicou sem mais a propriedade do bem à Recorrente.

No entanto, deu-se nota que daqui não vinha mal ou mundo ou ocorreria diminuição séria das garantias dos expropriados, pois que, ao recorreram do despacho de adjudicação nos termos do Código das Expropriações (doravante C.E), iriam discutir com toda a abertura o valor real do bem nesse seu recurso.

Mas antes e previamente a esse recurso que interpôs (para efeitos dos artigos 52.º e 58.º, ambos do C.E), o expropriado veio arguir a nulidade do despacho apontando a maleita procedimental (distinção de direito administrativo entre procedimento e processo…) de que o despacho de adjudicação padecia - a falta de arbitragem.

Pois bem, nessa sequência foi prolatada a sentença de que se recorre agora, por efeito da qual se declarou nulo o despacho de adjudicação da escola ao Município.

Assim, vem a entidade expropriante recorrer de tal sentença, mormente no segmento em que declarou nulo o despacho de adjudicação da propriedade anteriormente prolatado.

O despacho de adjudicação da propriedade consolida - esta é a melhor posição possível de utilizar face ao que já sustentámos a este propósito no que concerne ao ato que efetivamente transmite a propriedade - a titularidade do bem na esfera jurídica do Estado.

Assim sendo, estamos face a uma decisão final, pois a propriedade nunca mais pode ser discutida - apenas o valor da mesma, como todos sabemos - se o não foi já, como não foi discutida em processo administrativo mediante a impugnação do ato de declaração de utilidade pública nos Tribunais administrativos.

O que sustentamos é, assim, que a prematuridade que nos refere a sentença, que resulta da prática de um ato que a lei não autoriza (a adjudicação teria de ter sido acompanhada pela arbitragem, que não foi), não é passível de ser afrontada com a arguição de nulidade, mas deveria sim ter sido objeto de recurso (que não foi).

Numa palavra, no entendimento que sustentamos, já se havia esgotado o poder jurisdicional, quando o magistrado veio, digamos as coisas como devem ser ditas, curar a ferida que infligiu no processo.

Na verdade, embora a ratio da nossa dissensão já tenha sido desvelada, estamos face a uma decisão final, a uma verdadeira sentença, com impacto real na ordem jurídica, não face a um mero despacho, sendo assim que, transmitindo-se aquela ou outra (na versão da sentença) nulidade ao conteúdo da decisão, só se poderia admitir mesmo o recurso da mesma e não a arguição da sua nulidade. A este respeito e bem (sobre a transmissibilidade do erro processual à decisão, ademais e aqui, final) se pronunciou o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra datado de 3/5/2021, proferido no processo n.º 1250/20.9T8VIS.C1.

Neste sentido, temos, pois, como válida e aplicável a doutrina emergente do seguinte Acórdão do STJ datado de 17/11/2020 e proferido no processo 1427/06.0TAVNF.P1.S1: “I - Como refere o Prof. Alberto dos Reis (Código de Processo Civil Anotado, Vol. V, Reimpressão, Coimbra, 1984, pág. 424), “dos despachos recorre-se, contra as nulidades reclama-se (…). A reclamação por nulidade tem cabimento quando as partes ou os funcionários judiciais praticam ou omitem atos que a lei não admite ou prescreve; mas se a nulidade é consequência de decisão judicial, se é o tribunal que profere despacho ou acórdão com infração de disposição da lei, a parte prejudicada não deve reagir mediante reclamação por nulidade, mas mediante interposição de recurso. É que, na hipótese, a nulidade está coberta por uma decisão judicial e o que importa é impugnar a decisão contrária à lei; ora as decisões impugnam-se por meio de recursos (art. 677.º do CPC) e não por meio de arguição de nulidade do processo”.

II - No caso, a decisão proferida de admitir o recurso e, implicitamente, a consideração da inutilidade da remessa dos autos à conferência para apreciação da reclamação, transitou em julgado. A forma adequada para impugnar aquela decisão era o recurso que não foi interposto, pelo que não se verifica qualquer nulidade. (…)”.

Ainda e sempre com o devido e sentido respeito, diz-se, erroneamente, na decisão recorrida, que a razão de pela qual foi decidida a nulidade do despacho de adjudicação, naturalmente decisão recorrida, tem a ver com a circunstância do processo não ter “entrado” para efeitos de recurso de arbitragem, nada mais é adiantado a este respeito que não esta razão assim mesmo dita, por um lado, e, por outro, que não se deu oportunidade às partes para uma resolução amigável do recurso. Vejamos:

Dúvidas inexistem em como estamos, mesmo na perspetiva do tribunal, no âmbito de um processo (especial) litigioso de expropriação, regulado pelo C.E., cujo ato ou decisão principal é a adjudicação da propriedade ao Estado e o, necessário e correlativo, pagamento da justa indemnização pela privação da propriedade - a qual está depositada nos termos do estatuído no artigo 10.º, n.º 4 e al. b) do n.º 1 do artigo 20.º, ambos do C.E, após e de acordo com uma avaliação, portanto já feita, do bem.

A circunstância de o processo ter dado entrada em juízo, nos termos do estatuído no artigo no n.º 5 do artigo 20.º do C.E., para efeitos de substituição do depósito por garantia (face ao não levantamento do montante depositado por parte dos expropriados), não faz que o processo especial em causa tenha outro fim, trata-se, cremos nós, de um incidente no âmbito de um processo principal.

Ora se assim virmos a situação, temos um paralelo que é, precisamente, uma decisão principal ser proferida num incidente e podemos pensar se, nesta situação processual, neste decidir ultra petitum (custa-nos assim qualificar a situação porque a mesma não tem esta feição declarada na sentença e não estamos face a um processo de partes em que reina o dispositivo), se se deveria invocar a nulidade perante o Tribunal a quo (que, portanto, proferiu a dita decisão principal) ou se, antes, ao abrigo da al. e) do n.º 1 e do n.º 4, ambos do artigo 615.º do CPC, deveria ter invocada a mesma em sede de recurso jurisdicional.

Não tendo nós dúvidas de que o que caberia é, para efeitos do convocado n.º 4 do artigo 615.º do CPC, o recurso jurisdicional, com o vimos, e não a arguição de nulidade, sustentamos assim que à sentença falece razão. Aliás, e neste sentido, sempre o poder jurisdicional do Juiz já se teria esgotado, ao abrigo do princípio da extinção do poder jurisdicional que está consagrado no n.º 1 do artigo 613.º do CPC.


***

No que concerne à falta de possibilidade de as partes chegarem a um acordo, deve alegar-se primordialmente que esse tramite não está, na fase em que se encontra o processo, previsto processualmente (não existe qualquer previsão legal para que se equacione a aquisição amigável), sendo pois que, podendo as partes sempre acordar no montante indemnizatório devido enquanto o processo durar (transacionando, portanto), não se vislumbra sequer um qualquer prejuízo para a parte (ou partes) ou pertinência da razão para se entender que a mesma sustenta a pretensa tese da nulidade que se lê no despacho recorrido.

Acresce que, como é sabido, o tramite que a lei das expropriações prevê a este respeito (abertura de um processo negocial de aquisição pela via do direito privado, nos termos do artigo 11.º do C.E.) já decorreu e sem êxito… tendo sido essa a razão pela qual se depositou a quantia indemnizatória e se pediu posteriormente a sua substituição por caução.


***

Alega-se finalmente que ocorre no processo incidente onde se discute o que é de quem e qual o conteúdo e limites da propriedade expropriada - desconhece-se este processo, não tendo a entidade expropriaste sido notificada do que se aí discute.

Ora, o que se sabe a este respeito é que isso são questões que não influenciam a tramitação da expropriação, mormente por força do princípio da legitimidade aparente (artigos 9.º e 40.º, ambos do C.E.), tantas vezes reafirmado pela nossa jurisprudência, pois o interesse público, o interesse de centenas de alunos que frequentam a escola, não pode nem deve ceder a estas questões de direito privado.

A respeito destes impactos de direitos de terceiros em matéria de expropriações já se decidiu o seguinte no STJ em Acórdão datado de 20/12/84 e tirado no processo n.º 072583: “I - O Código das Expropriações consagra o princípio da legitimidade aparente e, nesta conformidade, mesmo que algum interessado no processo de expropriação por utilidade publica não tenha sido convocado, ele passa a poder intervir no processo a qualquer momento, embora se não devam repetir quaisquer termos ou diligencias (n. 2 do artigo 47 do Código das Expropriações).

II - O disposto no n.º 2 do artigo 47.º do Código das Expropriações não ofende o princípio do contraditório, porque a lei manda observar medidas tendentes a que os interessados tenham conhecimento do processo de expropriação e nele possam intervir.

III - Se a sentença que fixar a indemnização e os actos subsequentes forem anulados devido ao vicio da omissão de pronuncia (artigo 668, n.º 1, alínea d), 1 parte, do Código de Processo Civil), não deve ser observado o regime, prescrito na parte final do n.º 2 do artigo 47.º do Código das Expropriações, de se não deverem repetir os termos e as diligencias já efectuadas.”

Ou seja, quanto à circunstância de se estarem a discutir entre os expropriados questões de direito civil (cfr. artigos 53.º e 54.º do C.E.), que a expropriante desconhece, a verdade é que esta discussão não pode nem deve influir sobre a titularidade do bem (despacho de adjudicação), que é o que está em causa, mas apenas, tanto quanto se sabe e é dito na sentença, sobre as delimitação física entre privados exprimidos do bem objeto da expropriação e sobre a distribuição entre eles da indemnização; ora, por força do princípio da legitimidade aparente, temos que o bem expropriado se delimita como a administração o desenhou concretamente ou concretizou em planta e na realidade e para quem o desenhou….»


*

Seguidamente foi proferido o seguinte despacho: «…

Os autos foram distribuídos como Processo Especial de Expropriação.

Constata-se porém que, muito embora da mesma Espécie, a 3ª prevista no art. 212º do Código de Processo Civil, se trata antes de Incidente de Prestação de Caução ao amparo do art. 20º, nº 5 do Código das Expropriações.

Corrija a autuação.


*

Valor do Incidente de prestação de caução: € 1 846 198,13 (arts. 296º, nº 1301º, e 304º, nº 1 in fine do Código de Processo Civil conjugado este com os arts. 906º e ss do mesmo Código e 20º, nº 5 do Código das Expropriações, tudo por força do art. 549º do Código de Processo Civil )

*

Satisfaça o solicitado pela Conservatória, dando conta de que foi interposto recurso e que a decisão não transitou em julgado, tendo sido prematura a remessa de certidão.

*

Verifica-se que a recorrida Sociedade de Promoção Social – B... não foi notificada da interposição de recurso.

Notifique para efeitos do disposto no art. 639º nº 5 do Código de Processo Civil…».


*

Seguidamente foi proferido o seguinte despacho: «..Admito o recurso interposto pela Expropriante, Município ..., por tempestivo e apresentado por quem tem legitimidade nos termos do disposto nos artigos 629º, nº 1, 631º, nº 1, 637º e 638º do Código de Processo Civil.

O mesmo é de apelação e tem efeito meramente devolutivo visto o disposto nos artigos 644º e 647º, nº 1 e 2, este a contrário sensu do Código de Processo Civil a subir de imediato (645º do Código falado)…»


*

Não foram juntas contra-alegações.

*

Após os vistos legais e nada obstando ao conhecimento do objecto do recurso, cumpre decidir.

II- DO MÉRITO DO RECURSO

1. Definição do objecto do recurso

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso – cfr. arts. 635º, nº 4, 637º, nº 2, 1ª parte e 639º, nºs 1 e 2, todos do Código de Processo Civil[1].

Porque assim, atendendo á estrutura das conclusões das alegações apresentadas pela apelante, resulta que o ponto a analisar consiste em determinar a manutenção ou não do despacho proferido pelo Tribunal que declarou a nulidade da decisão de adjudicação.

Cumpre consignar que a parte havia suscitado a questão prévia quanto ao valor da causa, sendo que a mesma está prejudicada, dado estar já fixado o valor da causa no despacho relativo á alteração da distribuição, o qual transitou em julgado.

Assim, face ás conclusões recursivas resulta que a única questão a analisar contende com a determinação sobre a manutenção ou não do despacho que decretou a nulidade do despacho de adjudicação.


***

III- FUNDAMENTOS DE FACTO

A tramitação processual relevante para a decisão do presente recurso é a constante do relatório acima referido.

Os factos que resultam do antecedente relatório mostram-se bastantes à apreciação do recurso, devendo ainda ter-se em conta a factualidade fixada na sentença recorrida: «1) Foi declarada, por despacho do Secretário de Estado da Administração Local e Ordenamento do Território, de 28/04/2022, a expropriação, com carácter urgente, do prédio urbano, inscrito na matriz da União de Freguesias ..., ... e ..., sob o artigo ... e descrito na Conservatória do registo predial sob o n.º..., com destino à criação/instalação de um estabelecimento de educação – Escola Básica, de tipologia de 2º e 3º CEB – na zona poente do Município ... – União de Freguesias ..., ... e ..., com os fundamentos de facto e de direito expostos na Informação Técnica n.º..., de 20 de Abril de 2022, da Direcção –Geral das Autarquias Locais (Doc 1 junto com o requerimento inicial – cópia da DUP publicada a 13.05.2022).

2) No dia 22 de Agosto de 2022, o Expropriante tomou posse administrativa dos bens a expropriar, tendo, para o efeito, lavrado o respectivo auto (doc. 3 do requerimento inicial – auto de posse administrativa).

3) A 1 de Setembro de 2022, o Expropriante procedeu ao depósito prévio do montante que foi apurado por efeito do relatório de avaliação elaborado ao abrigo do n.º 4 do art. 10.º do Código das Expropriações (doc.4 do requerimento inicial), no valor de: i) 295.698,00€ (duzentos e noventa e cinco mil e seiscentos e noventa e oito euros), correspondente ao valor do solo, a favor da expropriada Sociedade Promoção Social – B..., Instituição Particular de Solidariedade Social - (doc. 5 do requerimento inicial);

ii) 1.550.500,13€ (um milhão quinhentos e cinquenta mil e quinhentos euros e treze cêntimos), correspondentes ao valor das seis estruturas que se encontram edificadas no solo e que são dedicadas à actividade escolar, a favor da expropriada Massa Insolvente da A..., S.A.- (doc. 6 do requerimento inicial).

4) O Expropriante apresentou minutas pré-aprovadas pela Banco 1..., S.A. (docs. 7 e 8 do requerimento inicial)…».


*

IV - FUNDAMENTOS DE DIREITO

Compulsados os autos verifica-se que o presente processo iniciou como um incidente nos termos do artigo 20 nº5 do CE e que de forma prematura, e sem ter sido sequer peticionado, foi proferido despacho de adjudicação.

A expropriada suscitou a nulidade dessa decisão e foi proferida a decisão recorrida que decretou a nulidade do despacho de adjudicação.

Refere-se na decisão recorrida que o Município ... apresentou requerimento a 05.07.2023, nos termos do qual requereu, “ao abrigo do previsto no n.º 5 do art. 20.º do Código das Expropriações, se digne admitir a substituição dos depósitos bancários que foram efectuados pela entidade expropriante abrigo do disposto na al. a) do n.º 1 do mesmo preceito legal, pelas garantias bancárias autónomas cujas minutas ora se anexam”.

E conforme já referido no despacho de 17.10.2023, de forma totalmente prematura, foi proferido, a 10.07.2023, despacho de adjudicação do prédio à Expropriante, fazendo referência a um relatório de arbitragem que não existe.

Notificada a 12.07.2023, veio a Expropriada Sociedade de Promoção Social – B..., a 31.07.2023, suscitar a nulidade da decisão de adjudicação, por não ter sido notificada do relatório de arbitragem.

Entendeu a decisão recorrida que a decisão de adjudicação não transitou em julgado, tendo sido suscitada a nulidade da mesma dentro do prazo de recurso. E considerou que se entende que, efectivamente, a decisão de adjudicação é nula, por prática de um acto que a lei não admite e omissão de uma formalidade prescrita por lei – artigo 195º, n.º1, do Código de Processo Civil.

Destarte, o processo não deu entrada para efeitos de recurso da decisão de arbitragem, não tendo sido dada a oportunidade às partes de resolverem a presente expropriação, de forma amigável.

Inversamente, a recorrente entende que a expropriada não poderia invocar a nulidade da decisão, mas si teria de recorrer da mesma atento o teor do artigo 615 nº5 do CPCivil, e dado não ter recorrido da sentença de adjudicação, o recurso deveria proceder e manter-se a decisão de adjudicação.

Entendemos que assistir razão á expropriada ao invocar a existência de uma nulidade e não ao vir recorrer do despacho de adjudicação, isto porque os autos traduziam -se num incidente nos termos do artigo 20 nº5 do CE e o tribunal, sem existir qualquer pedido proferiu despacho de adjudicação.

A expropriada foi notificada e veio suscitar a nulidade dessa despacho por não existir nos autos avaliação arbitral.

O processo de expropriação é um processo especial que comporta a existência de decisão proferida por árbitros, sendo a arbitragem obrigatória, o laudo arbitral é remetido ao juiz que, como decorre do n.º 5º do artigo 51.º do CE/99 – Lei n.º 168/99, de 18.9 – “No prazo de 10 dias, adjudica à entidade expropriante a propriedade e posse, salvo, quanto a esta, se já houver posse administrativa, e ordena simultaneamente a notificação do seu despacho, da decisão arbitral e de todos os elementos apresentados pelos árbitros, à entidade expropriante e aos expropriados e demais interessados, com indicação, quanto a estes, do montante depositado e da faculdade de interposição de recurso a que se refere o artigo 52.º”.

Nos termos do artigo 52.º, n.º 1, do CE/99 – “O recurso da decisão arbitral deve ser interposto no prazo de 20 dias a contar da notificação realizada nos termos da parte final do n.º 5 do artigo anterior, sem prejuízo do disposto no Código de Processo Civil sobre interposição de recursos subordinados, salvo quanto ao prazo, que será de 20 dias”.

Assim, resulta que esta notificação nos termos do artigo 51 nº5 do CE realizada pelo tribunal ao chamar o expropriado a juízo tem paralelo com a citação dado que lhe dá conhecimento da adjudicação e informa-o que pode recorrer dessa decisão.

Dispõe o artigo 38.º, n.º 1, do CE que na falta de acordo entre expropriante e expropriado – artigos 33.º e 34.º – sobre o valor da indemnização é este fixado por arbitragem com recurso para os tribunais comuns. Do seu n.º 3 decorre que “da decisão arbitral cabe sempre recurso com efeito meramente devolutivo para o tribunal da situação dos bens ou da sua maior extensão”.

Verifica-se que nos autos não foi junto nem consta o acórdão arbitral previsto na fase pré-judicial do processo de expropriação não podendo a parte ser prejudicada por essa omissão e nessa medida estamos perante uma nulidade.

Nos termos do artigo 191.º do CPC “1 - Sem prejuízo do disposto no artigo 188.º, é nula a citação quando não hajam sido, na sua realização, observadas as formalidades prescritas na lei. 2 - O prazo para a arguição da nulidade é o que tiver sido indicado para a contestação (…). 4 - A arguição só é atendida se a falta cometida puder prejudicar a defesa do citado”.

Neste caso, é manifesto que ao não ser enviada ao expropriado, nem ao não ser junta aos autos a decisão arbitral é manifesto que existe uma nulidade e o prazo da sua invocação é o do recurso.

É pois uma situação especial, em que o desvio do formalismo processual, em tudo idêntico à omissão de formalidades na citação, que pode ser passível de correcção oficiosa a todo o tempo nos termos do artigo 226.º, n.º 1, do CPC.

Assim, existe uma nulidade traduzida na inexistência nos autos da decisão arbitral (não foi cumprido o artigo 51 nº5 do CE) e nessa medida a sentença de adjudicação é nula.

Neste sentido, vide o Ac da RE Processo: 298/22.3T8EVR.E1, Relator: ELISABETE VALENTE 15-12-2022 Sumário: A notificação do artigo 51.º, n.º 5, do CE, é, do ponto de vista material, uma citação, sendo feita na pessoa do expropriado, e não de um seu representante, destina-se a dar conhecimento ao expropriado da adjudicação e, simultaneamente, informar que pode recorrer dessa decisão, impugnando uma pretensão e dando origem a um processo judicial, tudo se passando como na citação.

Mas mesmo que assim não seja entendido verifica-se que a expropriada ao invocar a nulidade do despacho de adjudicação (não tendo recorrido), deduziu o incidente adequado porque foi praticada uma nulidade na fase administrativa que implica a nulidade do despacho de adjudicação.

O presente processo por um lado não se traduz num processo de expropriação, mas apenas num incidente, e por outro lado, a  expropriação ainda não está na dita fase judicial, que só se inicia se e quando existir recurso do acórdão arbitral, não significando a remessa do processo ao tribunal para os fins previstos no artigo 51.º do CE, o início da instância de uma acção declarativa.

Por outros termos, não estamos perante um processo de expropriação, mas sim perante um incidente nos termos do artigo 20 nç5 do CE.

Acresce que mesmo que fosse um processo de expropriação (que não o é), o mesmo ainda não está na dita fase judicial, que só se inicia se e quando existir recurso do acórdão arbitral, não significando a remessa do processo ao tribunal para os fins previstos no artigo 51.º do CE, o início da instância de uma acção declarativa, mas tão-somente e ainda o cumprimento pela entidade expropriante do dever legal que sobre si impende, e só se transmutando esta em litigiosa caso os expropriados interponham recurso por discordarem do valor depositado.

O artigo 51 º do Código das Expropriações estabelece que:

“5 - Depois de devidamente instruído o processo e de efectuado o depósito nos termos dos números anteriores, o juiz, no prazo de 10 dias, adjudica à entidade expropriante a propriedade e a posse, salvo, quanto esta, se já houver posse administrativa, e ordena simultaneamente a notificação do seu despacho, da decisão arbitral e de todos os elementos apresentados pelos árbitros, à entidade expropriante e aos expropriados e demais interessados, com indicação, quanto a estes, do montante depositado e da faculdade de interposição de recurso a que se refere o artigo 52º.

6 – A adjudicação da propriedade é comunicada pelo tribunal ao conservador do registo predial competente para efeitos de registo oficioso”.

Realizada esta notificação, devem os expropriados interpor recurso no prazo de 20 dias a contar da mesma (artigo 52º).

O despacho de adjudicação visa controlar apenas com caracter formal, o procedimento expropriativo e, bem assim, adjudicar a propriedade e, sendo caso disso, a posse à entidade expropriante, quando esta não tiver já sido conferida administrativamente. Este despacho não aprecia a legalidade ou ilegalidade da expropriação ou os critérios que lhe estiveram subjacentes, (Alves Correia, in As Garantias do Particular na Expropriação por Utilidade Pública, Coimbra 1982, pág. 114).

Mas o despacho de adjudicação apresenta-se como um «elemento integrativo da eficácia» do acto de declaração de utilidade pública, na medida em que transfere a propriedade e porventura a posse dos bens para a entidade beneficiária da expropriação (a declaração de utilidade pública é o acto constitutivo da expropriação mas para produzir os seus efeitos de transferência da propriedade, carece de ser integrado por um despacho do tribunal comum).

O despacho de adjudicação e a decisão arbitral não são cindíveis, tratando-os a lei como mesmo acto para efeitos de notificação e funcionando a prolação daquele despacho como um pressuposto para a notificação e subsequente interposição de recurso da decisão arbitral.

No caso foi indevidamente proferido o despacho de adjudicação porque por um lado estávamos perante um mero incidente e não perante um processo expropriativo, e por outro lado,  não foi requerido qualquer pedido ou deduzido um processo expropriativo (não foi peticionada a adjudicação).

Por outro lado, como não consta dos autos o teor do acórdão arbitral é manifesto que os expropriados não foram notificados do mesmo, não tendo o despacho de adjudicação perfeição ou eficácia porque não foi notificado com esse acórdão.

Assim, consideramos que estamos perante uma nulidade a qual pode ser deduzida pela interessada nos autos e não tendo de a suscitar em sede de recurso de sentença de adjudicação.

As irregularidades cometidas na fase administrativa do processo de expropriação são arguidas autonomamente, nos termos e prazos previstos no art. 54º do CE. Nunca no recurso do acórdão arbitral, que tem por objecto a decisão dos árbitros, isto é, a fixação da justa indemnização.

Regra similar resulta do disposto nos artigos 149.º, n.º 1, e 195.º, n.º 1, do CPCivil dado que, em geral, o prazo de arguição de nulidades é de 10 dias.

O expropriado, a entidade expropriante nos casos em que lhe não seja imputável ou os demais interessados podem reclamar, no prazo de 10 dias a contar do seu conhecimento, contra qualquer irregularidade cometida no procedimento administrativo, nomeadamente na convocação ou na realização da vistoria ad perpetuam rei memoriam, bem como na constituição ou no funcionamento da arbitragem ou nos laudos ou acórdão dos árbitros, designadamente por falta de cumprimento dos prazos fixados na lei.

Neste sentido, vide o Ac da RC de Processo: 1790/04, Relator: DR. MONTEIRO CASIMIRO: 25-05-2004 Sumário:

I – Resulta do n.º 5 do art.º 51 do Código das Expropriações que a notificação do despacho de adjudicação, da decisão arbitral e de todos os elementos apresentados pelos árbitros deve ser efectuada no mesmo acto, conjuntamente, e não por fases, ou separadamente.

II - Constitui nulidade, com previsão no art. 201.º do C.P .Civil, a omissão da notificação da decisão arbitral, a qual deve ser arguida no prazo de 10 dias a contar do momento em que o expropriado é notificado apenas do despacho de adjudicação.

Igualmente vide o Ac do STJ Processo: 13/14.5TBMGD-B.G1.S1, Relator: FERNANDA ISABEL PEREIRA, Data do Acórdão:  21-04-2016, Sumário: «…II - O despacho de adjudicação a que se refere o art. 51.º, n.º 5, do CExp, tem por função controlar, ainda que com carácter meramente formal, o procedimento expropriativo e, bem assim, adjudicar a propriedade e, sendo caso disso, a posse à entidade expropriante, o que acontecerá quando esta não tiver já sido conferida administrativamente.

III - O despacho de adjudicação e a decisão arbitral não são cindíveis, tratando-os a lei como mesmo acto para efeitos de notificação e funcionando a prolação daquele despacho como um pressuposto para a notificação e subsequente interposição de recurso da decisão arbitral.

IV - A notificação a que alude o n.º 5 do art. 51.º do CExp pressupõe que tenha sido proferido um despacho de adjudicação consolidado e estabilizado, ainda que susceptível de correcção, posto que o esgotamento do poder jurisdicional não obsta a que, respeitado o núcleo fundamental de pronúncia jurisdicional, sejam, designadamente, rectificados erros materiais, como decorre do disposto nos arts. 613.º e 614.º do NCPC.

V - Sendo a notificação em causa um acto processual unitário, só ficou o mesmo perfeito com a subsequente notificação do despacho de adjudicação corrigido, tornando-se então apto a desencadear todos os efeitos, designadamente, o início do prazo para o recurso da decisão arbitral.

VI - O lapso da secretaria na notificação do despacho de rectificação jamais pode prejudicar as partes, devendo prevalecer, à luz do estatuído no art. 157.º, n.º 6, do NCPC, o prazo que lhes confira maiores garantias de recurso.».

E, vide o Ac da RP Processo: 3406/17.2T8VFR.P1, Relator: JOSÉ IGREJA MATOS 25-06-2019 Sumário: I – No âmbito de um processo de expropriação, em caso de violação de normas ou actos processuais cometidos aquando da vistoria e da arbitragem ou, em geral aquando do procedimento administrativo, deve reclamar-se no prazo de 10 dias a contar do conhecimento das mesmas, conforme decorre do disposto no artigo 54º do Código das Expropriações.

II – Caso tal reclamação não seja apresentada, não poderão tais irregularidades ser invocadas aquando do recurso da decisão arbitral.

III – Tal impossibilidade resulta de uma preclusão processual e não da falta de competência do tribunal para apreciar tais alegadas irregularidades.

E vide, o Ac da RL Processo: 156/1999.L1-2 Relator: JORGE LEAL, 03-02-2011 Sumário: …II – Antes de se proferir despacho de adjudicação da propriedade à entidade expropriante é aconselhável que se dê à entidade expropriada a possibilidade de, através da notificação da recepção do processo de expropriação no tribunal judicial, denunciar qualquer circunstância que no seu entender obste à adjudicação de propriedade.

III - Tal possibilidade (de notificação prévia da expropriada) torna-se imperativa quando, como ocorreu no caso sub judice, o próprio tribunal teve dúvidas que originaram a prestação de esclarecimentos por parte da entidade expropriante.

IV – A nulidade decorrente da omissão de tal notificação (art.º 201.º n.º 1 do CPC) sana-se nos termos do disposto nos artigos 205.º n.º 1 e 153.º n.º 1 do CPC.

V - A declaração de utilidade pública constitui o facto constitutivo da relação jurídica de expropriação, integrante da causa de pedir do processo expropriativo.

VI - A possibilidade de o expropriado requerer a expropriação total do prédio quando apenas uma parte tenha sido expropriada reporta-se, por definição, não a qualquer outro prédio com maior ou menor grau de proximidade ou relação com o prédio objecto da DUP, mas necessariamente ao mesmo prédio.

VII - A possibilidade de alargamento da expropriação, inicialmente parcial, à totalidade de um imóvel, tendo em vista o interesse particular do respectivo titular, sem necessidade de que quem de direito examine e declare o interesse público da expropriação, tem carácter excepcional, não admitindo, pois, aplicação por analogia.

VIII – De todo o modo, a aplicação analógica do art.º 3.º n.º 2 do CE 1991 implicaria que, perante a declaração da utilidade pública da expropriação de prédios propriedade da expropriada, fosse, no âmbito dos respectivos processos de expropriação, requerida a expropriação total, procedendo-se a uma avaliação global, atenta a invocada indivisibilidade económica entre os prédios abrangidos pela DUP e os que, não estando abrangidos pela mesma, também eram propriedade da expropriada.

IX – Não se mostrando verificado o circunstancialismo referido em VIII e não tendo sido declarada a DUP da expropriação do imóvel a que se refere o processo de expropriação, deve ser rejeitada a adjudicação ao Estado da propriedade desse imóvel, revogando-se o despacho de adjudicação da propriedade do imóvel ao Estado e anulando-se a sentença que fixou a indemnização pretensamente devida à expropriante.».

Para outros desenvolvimentos, vide o Ac da RG Processo: 3679/22.9T8BRG.G1, Relator: MARGARIDA PINTO GOMES, data 16-05-2024 Sumário: I. A notificação das partes para, querendo, comparecerem no acto da avaliação é imposição legal e tem de ser feita às partes, quando muito, na pessoa dos seus mandatários, o que nos autos não aconteceu.

II. Tal notificação não pode ser substituída pelos Srs Peritos.

III. Sendo uma notificação obrigatória e não tendo a mesma tido lugar nos autos, é a mesma cominada, nos termos do disposto no nº 1 do artº 195º do Código de Processo Civil, com a nulidade, uma vez que a irregularidade cometida pode influir no exame ou na decisão da causa.

Portanto, todas e quaisquer irregularidades ou nulidades praticadas na fase administrativa da expropriação são regidas pelo disposto no artigo 54º, do Código das Expropriações, o qual dispõe, peremptoriamente, no seu nº 1:

“O expropriado, a entidade expropriante nos casos em que lhe não seja imputável ou aos demais interessados podem reclamar, no prazo de 10 dias a contar do seu conhecimento, contra qualquer irregularidade cometida no procedimento administrativo, nomeadamente na convocação ou na realização da vistoria ad perpetuam in rei memoriam, bem como na constituição ou no funcionamento da arbitragem ou nos laudos ou acórdão dos árbitros, designadamente por falta de cumprimento dos prazos fixados na lei, oferecendo logo as provas que tiverem por convenientes e que não constem já do processo.”

Ou seja, em caso de violação de normas ou atos processuais cometidos aquando da vistoria e da arbitragem cabe reclamação, e não recurso, visto que o recurso em causa apenas visa a decisão arbitral, conforme prescreve o artigo 58º do Código das Expropriações (CE).

Por outro lado, resulta do nº 5 do artº 51º do C.E., de forma evidente que a notificação do despacho de adjudicação, da decisão arbitral e de todos os elementos apresentados pelos árbitros deve ser efectuada no mesmo acto, conjuntamente, e não por fases, ou separadamente. Por outras palavras, a notificação deve ser feita de forma unitária e não parcelarmente, ou em momentos distintos, notificando-se primeiro o despacho de adjudicação, depois a decisão arbitral e por fim os elementos apresentados pelos árbitros.

Se a notificação omitir qualquer desses aspectos, estamos perante uma irregularidade processual, sendo que essa irregularidade pode ter influência no exame e na decisão da causa, uma vez que a omissão da notificação pode ter como consequência que não seja interposto recurso da decisão arbitral, produz a nulidade prevista no artº 201º.

Essa nulidade não é de conhecimento oficioso, tendo de ser arguida pelo interessado na observância da formalidade (artº 202º).

No presente caso, não restam dúvidas que estamos perante uma nulidade com previsão no artº 201º, por ter sido omitida a notificação da decisão arbitral e dos elementos apresentados pelos árbitros.

A adjudicação á entidade expropriante da propriedade do aludido imóvel pressupunha, desde logo que se estivesse perante um processo de expropriação (e não apenas perante um incidente como é o caso dos autos dado estes autos terem a natureza de um incidente nos termos do artigo 20 nº5 do CE), e pressupunha a existência de uma decisão arbitral e a sua notificação conjunta com o despacho de adjudicação.

Tais pressupostos não existiam, nem existem (não estamos perante um processo de expropriação mas apenas perante um incidente, nem foi peticionada a adjudicação e não consta o relatório arbitral), pelo que nunca deveria ter sido proferido despacho de adjudicação.

O despacho de adjudicação proferido é totalmente ineficaz, padece de nulidade e nesta medida deverá ser revogado ou dado sem efeito.

Assim, verifica-se que o despacho de adjudicação proferido nestes autos é nulo dado que não foi feita a notificação da decisão arbitral, e porque não estamos perante um processo expropriativo mas apenas perante um incidente.

Pelo exposto, não merece censura o despacho recorrido, considerando-se o recurso improcedente, ficando prejudicada a análise das restantes questões suscitadas no recurso.


*
I- DECISÃO
Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar a apelação improcedente, confirmando-se a decisão recorrida.

Custas pela recorrente.


Porto, 10/7/2024
Ana Vieira
Aristides Rodrigues de Almeida
Judite Pires
_________________
[1] Diploma a atender sempre que se citar disposição legal sem menção de origem.