EXCEPÇÃO DILATÓRIA INOMINADA
CONHECIMENTO OFICIOSO DA EXCEPÇÃO
PERSI
Sumário

1 - A regra do conhecimento oficioso das exceções dilatórias é uma manifestação do princípio constitucional da legalidade do conteúdo da decisão e significa que o juiz não está sujeito às alegações das partes no que respeita à indagação, interpretação e aplicação da norma de direito (seja ela de direito substantivo, seja de direito processual); logo, a violação de norma que determina o pressuposto processual é oficiosamente cognoscível pelo que, independentemente de a parte a invocar, a falta de pressuposto processual é constatada pelo julgador que dela retira a consequência devida.
2 - Resultando dos autos que foi comunicado à devedora a sua integração no PERSI bem como a sua extinção e as razões para a extinção daquele procedimento extrajudicial, estando, assim, demonstrado que a credora/autora podia recorrer à via judicial para satisfação do crédito que reclama nos autos, não tinha o tribunal de se pronunciar sobre uma exceção dilatória que não foi invocada perante ele e que os autos revelam não se verificar.
(Sumário da Relatora)

Texto Integral

Apelação n.º 51820/22.3YIPRT.E1
(2.ª Secção)
Relatora: Cristina Dá Mesquita
Adjuntos: Maria Domingas Simões
Rui Manuel Machado e Moura

Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Évora:

I. RELATÓRIO
I.1.
(…), ré na ação especial para cumprimento de obrigações pecuniárias que lhe foi movida pela (…), IJDF, interpôs recurso da sentença proferida pelo Juízo Local de Setúbal, Juiz 2, do Tribunal Judicial da Comarca de Setúbal, o qual julgou a ação parcialmente procedente e, em conformidade, condenou a ré a pagar à autora a quantia de € 10.782,66, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4%, vencidos desde 07/10/2019, e dos vincendos desde então e até efetivo e integral pagamento.

Na ação, que se iniciou como injunção e foi posteriormente convolada para ação especial para cumprimento de obrigações pecuniárias, a requerente pediu a condenação da ré a pagar-lhe a quantia de € 10.782,66, a título de capital, € 1.137,94 a título de juros e € 450,00 a título de «outras quantias». Para tal desiderato alegou, em síntese, que através do contrato n.º (…) relativo à utilização de cartão de crédito ajustado entre a Ré e a (…), o mesmo ficou com o valor em dívida de € 11.920,60 sendo que o referido crédito veio a ser cedido à Autora através de contrato de cessão de créditos devidamente comunicado à Ré.
Na sua oposição ao requerimento de injunção a requerida sustentou, em síntese, que o acordo originário foi celebrado com o … (tendo essa denominação sido alterada posteriormente) e que toda a perturbação contratual teve início quando, em Janeiro de 2019, o credor deixou de remeter o extrato em formato papel, tendo perdido o acesso aos extratos bancários, sendo que nunca recebeu qualquer interpelação para pagamento da (…), nem foi notificada do incumprimento definitivo do contrato. Aduziu que os seus dados foram partilhados/cedidos sem a sua autorização a uma empresa externa à relação contratual que a passou a contactar telefonicamente e através de sms’s, diariamente, inclusive ao fins de semana, de forma reiterada e sucessiva, agindo em nome da (…), já com a indicação do montante, não das prestações que se encontravam vencidas, mas pelo valor total do contrato, assim atuando de forma ilícita, pois a cobrança de créditos extrajudicial é um ato próprio dos advogados e solicitadores, praticando crime de procuradoria ilícita; em 14/04/2020, tendo verificado que o código referência sempre utilizado para pagamento estava ativo, procedeu ao pagamento de € 75,00 euros em 17/06/2020, momento a partir do qual a Autora passou a invocar a qualidade de cessionária, utilizando a denominação social de (…), sendo que a Ré não recebeu qualquer informação sobre a cessão e sobre a denominação social de quem detinha a posição de cessionário. Concluiu, dizendo que tentou fazer cessar a mora contratual em agosto/setembro de 2020, sem sucesso, por oposição tácita da (…), pelo que não pode ser gerador de responsabilidade da devedora no que concerne a juros e outras cominações contratuais, desde essa data, por não lhe ser imputável.
Houve convite ao aperfeiçoamento ao qual a Autora correspondeu e tomou posição quanto à matéria de exceção suscitada, defendendo a sua improcedência.
A Ré tomou posição quanto à petição aperfeiçoada, concluindo como na oposição inicial.
Procedeu-se à realização de audiência de discussão e julgamento, após o que foi proferida a sentença objeto do presente recurso.

I.2.
A recorrente formula alegações que culminam com as seguintes conclusões:
«A. A ora Recorrente interpõe Recurso de Apelação para o Tribunal da Relação de Évora, o que faz nos termos e ao abrigo do artigo 629.º, 637.º, 645.º, n.º 1, alínea a) e 647.º, n.º 3, alínea f), todos do Código de Processo Civil.
B. O presente recurso vem interposto da Douta Sentença proferida a fls. (…) que julgou parcialmente procedente o procedimento de injunção peticionado contra a ora apelante, pela empresa (…), ali autora.
C. A Recorrente não pode conformar-se com a sentença proferida pela 1.ª instância uma vez que o Tribunal a quo, violou os preceitos normativos das alíneas c) e d) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, pelo que se peticiona a nulidade da sentença.
D. A matéria de facto provada e não provada considerada com interesse para a causa, é a que ficou a constar da douta sentença ora recorrida.
E. NULIDADE DA SENTENÇA POR CONTRADIÇÃO ENTRE FUNDAMENTOS E A DECISÃO FINAL OU EM AMBIGUIDADE E/OU OBSCURIDADE QUE A TORNA ININTELIGÍVEL.
F. Como refere a douta sentença, numa ação como a que está em apreciação, cabe ao Autor demonstrar a verificação dos pressupostos da existência do contrato que alega e os termos do mesmo, para que se possa reconhecer a responsabilidade contratual, sendo exigido ao réu alegar e provar as causas extintivas, impeditivas ou modificativas do peticionado.
G. Ora, se por um lado, a apelante, reuniu documentos necessários e suficientes para que a decisão do tribunal a quo fosse diferente, bem demonstrando na sua oposição e em posteriores requerimentos, o que alegava, ou seja, a falta de legitimidade da (…) para assumir a posição de autora na injunção que apresentou.
H. Por outro lado, em momento algum a Autora demonstrou a verificação dos pressupostos da existência de um contrato de cessão de créditos relativo ao contrato de crédito que a ré detinha com a (…).
Senão vejamos,
I. A Autora, instada para aperfeiçoar a sua petição inicial, apresenta como Documento 1 um contrato-quadro de cessão de créditos, celebrado em 18 de julho de 2019, entre a (…) Bank e a (…), Unipessoal, Lda..
J. Ademais refere ter sido junto aos autos um ficheiro eletrónico encriptado e protegido com dados relativos aos contratos cedidos.
Contudo,
K. Certo é que, compulsados os documentos e analisado o ficheiro eletrónico, em parte alguma consta o contrato de crédito de que a Ré é titular.
L. Adensando ainda mais o facto de o documento 3 apresentado referir expressamente que foi celebrado um contrato de cessão em 23 de junho de 2020.
M. Todos os factos foram contestados ao longo do processo, tendo a Ré, tanto na sua oposição inicial, como nos requerimentos-resposta, quer nas suas alegações, onde se apontou as incongruências de datas, a utilização de várias denominações sociais e a inexistência de identificação do contrato de crédito na eventual cessão de créditos invocada.
N. Mas convém esclarecer, foi o meu crédito cedido alguma vez? Mais do que uma vez? Há um documento de cessão-quadro, uma missiva de comunicação e duas datas distantes entre si, que nos deixa onde?
O. Era o que se impunha ao tribunal esclarecer!
P. O Tribunal a quo parece ter seguido a mesma esteira da “confusão” e, mantendo-a, parece ter decidido dar como assente a existência de duas cessões de crédito, quando no ponto 9 da matéria dada como provada, considera que “Por contrato de cessão de créditos, celebrado em 18 de julho de 2019, a Autora adquiriu junto do (…) Bank, S.A., o contrato aludido em 1)”.
Q. E, no ponto 15, considera provado que, em 26/06/2020, foi remetida uma missiva à ré, onde, textualmente, se refere que a cessão de créditos foi celebrada em 23 de junho de 2020.
R. O Tribunal não pode “fugir” a tomar uma posição clara sobre os aspetos de natureza jurídica que suportam um pedido como o que aqui está em apreço, sob pena de manter-se o imbróglio que nos trouxe aqui, aferir da legitimidade para a presente ação.
S. Fica por saber se existiu realmente um contrato de cessão válido, aplicável ao crédito da Ré.
T. Se o contrato-quadro apresentado, com o ficheiro eletrónico, abrange o crédito da Ré, e é válido e eficaz quanto a si, uma vez que em parte alguma a Autora refere a sua comunicação à Ré, o que era imprescindível para que operasse inter partes.
U. Ou, considerando os elementos da missiva alegadamente remetida à ré, qual é o contrato celebrado em 23 de junho de 2020 e em que moldes foi celebrado, uma vez que a Autora não o apresentou, apesar de instada pelo Tribunal a fazê-lo?
V. Estão, por isso, em franca contradição, pelo que torna os factos ali vertidos e dados como provados padecem de um vício de valoração que, pela sua ambiguidade torna a sentença proferida ininteligível.
Será nesta medida, VENERANDOS DESEMBARGADORES, que
W. Em virtude, e por força do preceito do artigo 615.º, n.º 1, alínea c), considera-se estar perante um vício de nulidade de sentença, que levamos à apreciação de V. Exas., que melhor reconhecerão.
Caso assim não se entenda, sem conceder, sempre se dirá da,
X. NULIDADE DA SENTENÇA POR OMISSÃO DE PRONÚNCIA
Y. Não pode a Apelante conformar-se com a decisão proferida, porquanto considera que a sentença omitiu pronúncia sobre 2 factos com relevância para a decisão de mérito: A inclusão no processo PERSI e a ilegitimidade da Autora por utilização diversa da denominação social utilizada no contrato de cessão, onde consta – Cessionário–(…), Unipessoal, Lda. e a apresentada a juízo – (…), IJDF.
Z. Com a oposição à injunção, a ré alegou no 6.º do seu articulado, não ter sido interpelada para pagamento pela (…), apenas tendo recebido uma notificação da inclusão no processo PERSI.
AA. A sentença tem que se pronunciar sobre todas as matérias relevantes para a decisão da causa, sendo a omissão de pronúncia um vício que ocorre quando o Tribunal não se pronúncia sobre essas questões com relevância para a decisão de mérito.
BB. O tribunal a quo desvalorizou a imperatividade do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25 de outubro, em que a integração no procedimento teria caráter obrigatório, o que impediria a apresentação da presente ação.
CC. E, mesmo considerando-se, o que não se reconhece, a legitimidade da (…) por via de uma eventual cessão de crédito (se, qual e quando é o que convém apurar), a mesma estaria vinculada à aplicação desse diploma, o que não ocorreu.
DD. A vinculação temática do tribunal a quo, obrigado a pronunciar-se sobre todas as questões suscitadas e que importem o apuramento dos factos e a boa decisão da ação, tendo aqui sido omitida, porquanto não tendo recaído a posição/ visão do senhor Juiz sobre essa questão de relevo, conduz-nos, irremediavelmente, a uma omissão de pronúncia, com todas as suas consequências legais.
EE. Da omissão de pronúncia quanto à ilegitimidade da Autora para a ação.
FF. A apelante, invocou e demonstrou, durante a sua oposição ao processo, as diversas denominações sociais utilizadas pela Autora, nos múltiplos contactos que efetuou com a ré, na condição de “cobrador de fraque”.
GG. Adiante, e com a junção ao processo do alegado contrato de cessão que assumiu o crédito da Ré, pode verificar que, também ali, a empresa que assume a posição de cessionário não tem a mesma denominação social da que se apresenta como requerente na injunção.
HH. Tal situação é passível de determinar a ilegitimidade do sujeito ativo da relação contratual, por não estar determinada ou estar mal identificada na ação que se intenta face aos documentos que se oferecem como probatórios.
II. Não se entende a necessidade da utilização de tão diversas denominações sociais, mas não podemos ser redutores a ponto de desvalorizar essa necessidade da Autora e as implicações contratuais que tem quando em litígio, em que as partes, salvo raras exceções, são fixadas ab initio.
JJ. Mas foi isso que se veio a verificar, quando o juiz do processo não tomou posição face a esse segmento em específico, que poderia ter cominações, desde logo, afastando a legitimidade da Autora.
KK. Pelo que deve a ilegitimidade da Autora, por utilização diversa da denominação social utilizada no contrato de cessão, onde consta – Cessionário-(…), Unipessoal, Lda. e a apresentada a juízo – (…), IJDF, ser reconhecida, devendo o juiz do processo fazer recair decisão fundamentada sobre este este facto em concreto.
LL. Também aqui, a vinculação temática do tribunal a quo, obrigado a pronunciar-se sobre todas as questões suscitadas e que importem o apuramento dos factos e a boa decisão da ação, tendo sido omitida, conduz-nos, irremediavelmente, a uma omissão de pronúncia, com todas as suas necessárias e devidas consequências legais.
MM. Pelo que, por força do preceito do artigo 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC, ora se suscita competente nulidade da sentença proferida que, uma vez assim declarada, com probidade, venha a dar lugar a nova decisão.
Caso não se entenda existir nulidade da sentença proferida,
NN. DA ERRÓNEA APRECIAÇÃO DOS FACTOS AO DIREITO
OO. A fundamentação da decisão proferida, sem reflexo nos documentos apresentados encerra uma errónea aplicação do direito aos factos, pelo que se impunha decisão diversa da que foi proferida.
PP. A autora, no requerimento apresentado em 19.1.2023, com a referência n.º 44455787, admite como possível que a ré não tenha tido conhecimento da cessão e só tomado conhecimento dela com a citação.
QQ. E o Tribunal considera que a Ré tomou conhecimento da cessão com a citação para a presente ação, aceitando a invocada posição de cessionária da Autora nos autos.
RR. Ora, como já se deixou supra, e pelos argumentos ali vertidos, a qualidade da Autora não foi demonstrada, pelo que não pode resultar provada.
SS. Até porque consistiria num contrassenso face aos factos provados dos pontos:
. 10, onde se dá conta da posição contratual da (…) face à ré, em 16 de setembro de 2019;
. 11 e 13, que dá como demonstrado a comunicação da Autora à ré da “devolução do procedimento de cobrança à (…), em 22/10/2019 e 14.04.2020, respetivamente.
.12, onde se demonstrou privado a existência de um terceiro “(…) Ibéria” que em 14.04.2020, detinha a mesma posição contratual qua a (…) – nenhuma, apenas intervindo como recuperador de crédito da (…).
TT. Nos termos precedentes, sempre será de sublinhar, ser de difícil entendimento, uma empresa intervir como recuperador de crédito e “cobrador de fraque”, sendo já detentor de uma posição contratual privilegiada - alegada cessão de créditos, como defende a sentença proferida.
UU. Embora de tal esteja o tribunal a quo ciente quando refere:
“ …como bem aponta a ré, chegam a ser confusas e contraditórias as informações que lhe foram sendo prestadas, já que a cessão de créditos ocorreu em 18 de julho de 2019, mas depois disso e apesar de a autora interpelar a ré para liquidar o valor devido, comunicou-lhe numa das ocasiões que “iria devolver o procedimento de cobrança ao (…) Bank, SA (factos 10 e 12), procedimento que foi igualmente tomado por uma terceira empresa (facto 11) (…)”
VV. A clareza e a segurança jurídica na interpretação e aplicação das leis assumem maior importância, tanto quanto mais estiverem em causa assuntos sensíveis, como o facto de saber em cada momento, quem tem a posição de credor numa relação contratual como a dos presentes autos.
WW. Não se tornou líquido na apreciação jurídica e análise crítica da prova, nem encontra reflexo na sentença proferida, pelo que se mantém a indefinição.
XX. Por essa razão, e por todas as outras já supra invocadas, não se pode a apelante conformar com a decisão proferida, recorrendo à apreciação de V. Exas., Venerandos Senhores Juízes Desembargadores.
YY. Devendo, em consequência, a decisão ser substituída por outra, que se mostre conforme aos princípios de direito.
Nestes termos e, sempre, nos melhores de Direito que V. Exas. mui doutamente suprirão, deverá ser dado provimento ao presente recurso, devendo, em consequência:
- Ser proferida decisão a reconhecer a nulidade da sentença proferida pelo Tribunal de 1.º Instância, quer quanto ao segmento da contradição entre fundamentos e a decisão final ou em ambiguidade e/ou obscuridade que a torna ininteligível; quer quanto à omissão de pronúncia apontada, com as necessárias e devidas cominações.
Ou, caso assim não se entenda, que seja proferida nova decisão que substitua, uma vez analisados e aplicados os factos ao direito, o que se requer, assim se fazendo Direito e Justiça».
I.3.
A resposta às alegações de recurso culminam com as seguintes conclusões:
«1. A sentença recorrida não merece reparo, nomeadamente quanto à notificação da cessão de créditos bem como ao contrato de cessão de créditos celebrado entre cedente e cessionário (… Portugal).
2. No que diz respeito à prova da cessão de créditos sempre se dirá que a ora Recorrida perfilha o entendimento que tem vindo a ser adotado pela jurisprudência e pela doutrina no sentido de entender que a notificação da cessão, até ao cumprimento, poderá ser realizada, por qualquer via, ao devedor, nomeadamente através da citação no processo em que é reclamado o pagamento da dívida cedida.
3. Ainda que assim não se entendesse e ao abrigo do princípio da livre apreciação da prova, sempre se dirá que o Tribunal a quo procedeu a uma cuidadosa e rigorosa análise de toda a prova produzida, recorrendo a critérios racionais e objetivos, assim como a juízos de ilações e conclusões razoáveis, baseada nos meios de prova disponíveis.
4. Quanto ao cumprimento do PERSI, não foi um facto controvertido entre as partes, uma vez que a R. assumiu na douta oposição, “…A ora requerida nunca rececionou qualquer interpelação para pagamento, tendo, ao invés, recebido uma notificação da inclusão processo PERSI, nos termos do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25 de outubro.”
5. E ainda que assim não fosse, bem andou o Tribunal a quo ao dar este facto como assente, pois a Recorrida não é uma instituição bancária, tendo como objeto social: Outras atividades de consultoria para os negócios e a gestão. Pelo que, não teria a Recorrida essa obrigatoriedade / vínculo / responsabilidade como quer fazer crer a Recorrente.
6. E ainda, pese embora a A. não tenha mencionado datas respeitantes à resolução do acordo com a Ré. A verdade é que, não tinha de o fazer para reclamar a integralidade do valor utilizado já que as partes clausularam que a Ré se obrigava a efetuar, ao final de cada período mensal de utilização do cartão, o pagamento mínimo da quantia de 3% do valor utilizado ou €75,00 (consoante o que for superior),
7. Pelo que, dar-se-ia automaticamente como resolvido o contrato em caso de incumprimento por parte daquela.
8. Nestes termos e nos mais de direito, deve manter-se a sentença recorrida que está conforme os preceitos legais e a prova produzida.
Ao julgardes assim, Venerandos Juízes Desembargadores, estareis uma vez mais a fazer
JUSTIÇA!».

I.4.
O recurso foi recebido pelo tribunal recorrido.
Corridos os vistos em conformidade com o disposto no artigo 657.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, cumpre decidir.

II. FUNDAMENTAÇÃO
II.1.
As conclusões das alegações de recurso (cfr. supra I.2) delimitam o respetivo objeto de acordo com o disposto nas disposições conjugadas dos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, ambos do CPC, sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha (artigo 608.º, n.º 2 e artigo 663.º, n.º 2, ambos do CPC), não havendo lugar à apreciação de questões cuja análise se torne irrelevante por força do tratamento empreendido no acórdão (artigos 608.º, n.º 2 e 663.º, n.º 2, do CPC).

II.2.
As questões que importa decidir são as seguintes:
1) Nulidade da sentença.
2) Reapreciação do mérito da decisão.

II.3.
FACTOS
II.3.1.
Factos provados
O tribunal de primeira instância julgou provada a seguinte factualidade:
«1. Em 15-10-2008, o Banco (…) e a Ré ajustaram um acordo pelo qual o primeiro emitiu a favor da Ré e a seu pedido, um cartão de crédito designado de (…), com vista a proceder ao levantamento de dinheiro e à aquisição de bens e serviços junto de terceiros, tendo a Ré aceite todas as condições de utilização do cartão, responsabilizando-se pelo pagamento das dívidas resultantes dessa utilização, sendo que o limite de crédito era até € 1.500,00.
2. A Ré obrigou-se a efetuar, ao final de cada período mensal de utilização do cartão, o pagamento mínimo da quantia de 3% do valor utilizado ou € 75,00 (consoante o que for superior).
3. Ajustaram que se a quantia mensal devida fosse integralmente paga, a Ré não pagaria os juros estipulados, sobre os débitos registados nesse período e caso a Ré não procedesse ao pagamento nos termos mencionados em 2, o Banco (…)poderia exigir o pagamento do valor total do saldo da conta, incluindo juros.
4. De posse e com a utilização do cartão, a Ré procedeu à aquisição de bens e serviços junto de terceiros.
5. Nos termos do acordo de utilização do cartão de crédito, o Banco (...) procedeu ao pagamento integral dessas importâncias.
6. Em data não apurada, mas anterior a 16 de julho de 2017, o limite de crédito mencionado em 1, foi ajustado para € 11.195,00.
7. Em data não concretamente apurada, mas anterior a 16 de julho de 2017, os créditos titulados pelo Banco (…) foram adquiridos pelo (…) Bank, SA, o que foi devidamente comunicado à Ré.
8. Em 16 de julho de 2019, o (…) Bank, SA emitiu e remeteu à Ré, o extrato mensal de utilização do cartão de crédito, nele indicando que no agregado de utilização do mencionado cartão, a conta apresentava o seguinte figurino:
(…)
9. Por contrato de cessão de créditos, celebrado em 18 de julho de 2019, a Autora adquiriu junto do Wizink Bank S.A., o contrato aludido em 1).
10. Em 16 de Setembro de 2019, o (…) Bank, SA emitiu e remeteu à Ré, o extrato mensal de utilização do cartão de crédito, nele indicando que no agregado de utilização do mencionado cartão, a conta apresentava o seguinte figurino:
(…)
11. Por missiva de 22/10/2019, a Autora comunicou à Ré que não tendo liquidado voluntariamente o valor vencido de € 12.466,58, iria devolver o procedimento de cobrança ao (…) Bank, SA.
12. Por missiva de 10/03/2020, a “(…) Ibéria” comunicou à Ré que não tendo liquidado voluntariamente o valor vencido de € 12.466,58, iria devolver o procedimento de cobrança ao (…) Bank, SA.
13. Por comunicação de 14/04/2020, a Autora comunicou à Ré que não tendo liquidado voluntariamente o valor vencido de € 12.466,58, iria devolver o procedimento de cobrança ao (…) Bank, SA.
14. Em 16/06/2020, a Ré pagou à (…) Bank, SA o valor de € 75,00.
15. Em 26/06/2020, a Autora expediu para o endereço da Ré uma missiva com o seguinte teor:
(…)
16. Em 16/07/2020, a (…) Bank, SA emitiu novo extrato de utilização da conta, reclamando o valor agregado em dívida de € 12.466,58, após dedução do montante aludido em 13.
17. Em 22/09/2020, a Ré comunicou à Autora que não lhe reconhecia legitimidade para atuar no âmbito do acordo ajustado com a (…) Bank, SA, por desconhecer qualquer cessão de créditos e solicitou esclarecimentos sobre a legitimidade e qualidade em que a Autora atuava, mediante comprovação documental.
18. Em 29/09/2020, a Autora comunicou à Ré, que recebeu, a seguinte informação:
Certamente tomou conhecimento da nossa comunicação anterior, na qual informámos que a sua dívida passou a pertencer ao Grupo (…).
É de extrema importância um contacto urgente com os nossos serviços para confirmar se já efetuou o pagamento ou para assegurar que irá fazê-lo num curto espaço de tempo.
É inegável que o valor nos é devido, atualmente ascende a € 12.705,28, e a sua situação tende a agravar-se com o acréscimo diário de Juros de Mora e Custos de Cobrança.
Reiteramos a N/disponibilidade para um entendimento, no entanto, deverá entrar em contacto com o Gestor do Seu Processo, com a máxima urgência, através do telefone (…).
Caso não exista uma ação concreta da sua parte com vista ao pagamento integral ou a apresentação de uma proposta de pagamento, este processo poderá ser enviado para Contencioso, em virtude da falta de colaboração, e nesse caso todos os encargos correm por sua conta.
Aguardando a sua iniciativa de resolução, apresentamos os nossos melhores cumprimentos.”
19. Em 20/11/2020, a Autora comunicou à Ré, que recebeu, a seguinte informação:
Concordará certamente que tem sido notório o esforço desenvolvido pelos nossos serviços no sentido de alcançar um acordo amigável para liquidação da S/dívida para com a (…) – (…).
No entanto, verifica-se que não foi alcançado qualquer entendimento amigável, pelo que não nos resta outra solução que avançarmos para a Execução da dívida, Capital, Juros e restantes encargos, o que implicará transtornos a curto prazo.
Valor em dívida: € 12.766,87 – acrescido de juros de mora e custos de cobrança
Pagamento Multibanco:
Entidade: (…)
Referência: (…)».

II.3.2.
Factos não provados
O tribunal de primeira instância julgou não provada a seguinte factualidade:
a) A Autora tentou fazer cessar a mora contratual, em agosto / setembro de 2020, sem sucesso, por oposição tácita da (…).

II.4.
Apreciação do objeto do recurso
II.4.1.
Nulidade da sentença
Neste segmento do seu recurso a apelante defende que a sentença é nula por omissão de pronúncia e por contradição entre fundamentos e a decisão final ou ambiguidade e/ou obscuridade que a torna ininteligível.
Previamente se dirá que os vícios de sentença previstos no artigo 615.º do Código de Processo Civil traduzem-se numa desconformidade entre a forma como o ato processual foi executado e a disposição reguladora da forma de realização desse ato processual; por outras palavras, referem-se a situações em que o ato processual executado é formalmente diferente do legalmente previsto, não se discutindo aqui se a questão foi, ou não, bem julgada.
Dito isto, vejamos se assiste razão à apelante.
A. Nulidade de sentença prevista no artigo 615.º/1, alínea c), do CPC
De acordo com o disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea c), do CPC a sentença é nula quando «os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que a torne ininteligível».
A nulidade prevista no primeiro segmento daquela norma legal ocorre «quando existe incompatibilidade entre os fundamentos de direito e a decisão, ou seja, quando a fundamentação aponta num sentido que contradiz o resultado. Situação que, sendo violadora do chamado silogismo judiciário, em que as premissas devem condizer com a conclusão, também não se confunde com um eventual erro de julgamento, que se verifica quando o juiz decide contrariamente aos factos apurados ou contra norma jurídica que lhe impõe uma solução jurídica diferente» – António Santos Abrantes Geraldes/Paulo Pimenta/Luís Filipe Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, Volume I, 3.ª Edição, Almedina, pág. 794.
Ainda a propósito deste vício de sentença escreveu-se no Ac. RL de 04.10.2011, processo n.º 107/2001.L1-7, consultável em www.gsi.pt., o seguinte: «(…) a oposição entre os fundamentos e a decisão só releva como vício formal, para os efeitos da nulidade cominada na alínea c) do n.º 1 do artigo 668.º do CPC, quando se traduzir numa contradição nos seus próprios termos, num dizer e desdizer desprovido de qualquer nexo lógico positivo ou negativo, que não permita sequer ajuizar sobre o seu mérito da causa. Se a relação entre a fundamentação e a decisão for apenas de mera inconcludência, estar-se-á perante uma questão de mérito, reconduzida a erro de julgamento e, por isso, determinativa da improcedência da ação».
Quanto ao vício previsto no segundo segmento do preceito legal – “ininteligibilidade” – ele decorre de uma “ambiguidade” e/ou “obscuridade” as quais, por sua vez, devem ser afirmadas quando se mostra impossível compreender o sentido e/ou o alcance do segmento decisório da sentença, por este ser suscetível de mais do que uma interpretação (ambiguidade) e/ou não se apresentar claramente expresso (obscuridade). Nas palavras de Lebre de Freitas e Isabel Alexandre[1], «[…] a obscuridade ou ambiguidade, limitada à parte decisória, só releva quando gera ininteligibilidade, isto é, quando um declaratário normal, nos termos do artigo 236.º, n.º 1 e do artigo 238.º, n.º 1, ambos do Código Civil, não possa retirar da decisão um sentido unívoco, mesmo depois de recorrer à fundamentação para a interpretar».
No caso concreto a apelante sustenta, a propósito, que decorre dos pontos de facto provados n.ºs 9 e 15 que o tribunal a quo «parece ter decidido dar como assente a existência de duas cessões de crédito, (…)» e que aqueles factos «estão, (…) em franca contradição, pelo que torna os factos ali vertidos e dados como provados padecem de um vício de valoração que, pela sua ambiguidade, torna a sentença proferida ininteligível».
Sucede que eventuais vícios da decisão da matéria de facto previstos no artigo 662.º, n.º 2, alíneas c) e d), do CPC, como a contradição entre factos, não constituem causa de nulidade da sentença, mas sim irregularidade suprível, mesmo oficiosamente, nos termos do disposto no artigo 662.º, n.º 2, alíneas c) e d), do Código de Processo Civil. Assim, ainda que houvesse uma contradição entre os pontos de facto provados n.ºs 9 e 15 – que, aliás, não há[2] – a mesma não integraria o vício de sentença previsto no artigo 615.º, n.º 1, alínea c), do CPC.
Tão pouco existe qualquer contradição entre os fundamentos da sentença e o seu segmento decisório, ou qualquer ambiguidade na sentença na medida em que o tribunal considerou válida e oponível à ré a cessão de créditos operada por contrato celebrado em 18 de julho de 2019 por via da qual a aqui apelada adquiriu o direito de crédito reclamado nos autos, condenando assim a ré a pagar à autora o capital por esta peticionado nos autos, acrescido de juros moratórios até integral e efetivo pagamento.
Improcede, assim, a invocação da nulidade de sentença aqui em causa.

B. Nulidade por omissão de pronúncia
No que respeita a este particular vício a apelante sustenta que a sentença omitiu pronúncia sobre «dois factos com relevância para a decisão de mérito», a saber, a “inclusão no processo PERSI” e a ilegitimidade da Autora por utilização diversa de denominação social utilizada no contrato de cessão onde consta “Cessionário – (…), Unipessoal, Lda.” e a apresentada em juízo – (…), IJDF”.
Este particular vício de sentença – omissão de pronúncia - está previsto na primeira parte da alínea d) do artigo 615.º, n.º 1, do CPC de acordo com o qual é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar.
Preceito que tem de ser concatenado com o artigo 608.º/2, do mesmo diploma normativo de acordo com o qual o juiz deve conhecer de todos os pedidos deduzidos, de todas as causas de pedir e exceções invocadas e, ainda, de todas as exceções de conhecimento oficioso, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.
Anselmo de Castro[3] ensinava que «a palavra questões deve ser tomada aqui em sentido amplo: envolverá tudo quanto diga respeito à concludência ou inconcludência das exceções e da causa de pedir (melhor, à fundabilidade ou infundabilidade dumas e doutras) e às controvérsias que as partes sobre elas suscitem. (…)» (negritos nossos).
Volvendo ao caso em apreço, e começando por apreciar a argumentação respeitante à questão da “inclusão no Persi”.
Não é controvertido que o contrato em causa nos autos é um contrato de crédito ao consumidor; por conseguinte, um contrato ao qual é aplicável o D/L n.º 227/2012, de 25.10 [artigo 2.º, alínea c), do referido diploma legal], uma vez que nada nos autos aponta no sentido de que aquele contrato não estivesse em curso à data da entrada em vigor daquele diploma legal (artigos 39.º e 40.º do D/L n.º 227/2012, de 25.10).
O D/L n.º 227/2012 de 25.10 criou o chamado procedimento extrajudicial de regularização de situações de do qual as instituições bancárias, no cumprimento dos deveres de diligência incumprimento (PERSI) através e lealdade que sobre elas impendem (artigo 4.º) e num quadro de adequada tutela dos interesses dos consumidores em situação de incumprimento, incluem o cliente bancário que esteja em situação de mora naquele procedimento; no âmbito de tal procedimento, aquelas instituições devem aferir da natureza pontual ou duradoura do incumprimento registado, avaliar a capacidade financeira do consumidor e, sempre que tal seja viável, apresentar propostas de regularização adequadas à situação financeira, objetivos e necessidades do seu cliente [artigos 1.º/1, alínea b), 5.º/2 e 12.º a 21.º].
Uma das garantias que o cliente bancário/consumidor beneficia durante o período compreendido entre a data da sua integração no Persi e a extinção deste procedimento é o facto de o Banco credor estar impedido de intentar ações judiciais para obter a satisfação do crédito (durante aquele período).
Resulta da conjugação do artigo 18.º/1, alínea b), com o disposto no artigo 14.º/1, ambos do D/L n.º 227/2012, de 25.10 – o qual prescreve a obrigatoriedade de integração do cliente bancário no Persi quando verificados os pressupostos para tal efeito – que a prévia observância das disposições injuntivas do regime do PERSI constitui uma condição de ação, isto é, uma condição de que depende o conhecimento do mérito ou da resolução da causa.
A lei processual refere-se às “condições de ação” sob a forma negativa, isto é, sob a designação de “exceções dilatórias”, as quais, se verificadas, obstam a que o tribunal conheça do mérito da causa, dando lugar à absolvição da instância ou à remessa do processo para outro tribunal (artigo 576.º/2, do CPC).
A falta de cumprimento das disposições injuntivas do regime do PERSI constitui uma exceção dilatória inominada e de conhecimento oficioso.
A regra do conhecimento oficioso das exceções dilatórias é uma manifestação do princípio constitucional da legalidade do conteúdo da decisão e significa que o juiz não está sujeito às alegações das partes no que respeita à indagação, interpretação e aplicação da norma de direito (seja ela de direito substantivo, seja de direito processual); logo, a violação de norma que determina o pressuposto processual é oficiosamente cognoscível pelo que, independentemente de a parte a invocar, a falta de pressuposto processual é constatada pelo julgador que dela retira a consequência devida (a absolvição da instância ou, no caso da incompetência relativa de conhecimento oficioso, a da remessa do processo ao tribunal competente)[4]. Note-se, porém, que o conhecimento oficioso da exceção dilatória não se confunde com o conhecimento oficioso dos factos em que ela se baseia, os quais têm de ser alegados pelas partes, salvo se se tratar de factos que não carecem de alegação ou de prova, ou seja, de factos notórios. Em síntese, «o tribunal deve conhecer das exceções dilatórias mas apenas a partir dos factos alegados pelas partes ou do que resultar objetivamente do processo, não lhe cabendo, nesta específica sede, uma investigação oficiosa, sem prejuízo de, para efeitos de demonstração de factos que hajam sido alegados ou daquilo que conste do processo, seja acionado o princípio da oficiosidade que se traduz na recolha dos meios de prova ou na formulação de convite dirigido a qualquer das partes no sentido de esclarecer a situação ou de apresentar meios de prova que esteja na sua disponibilidade ou ao seu alcance» – assim, Ac. RE de 12.01.2023, processo n.º 620/20.7T8ELV.E1, consultável em www.dgsi.pt.
Dito isto e volvendo ao caso sub judice é a própria requerida que, no seu articulado de oposição à injunção, reconhece que «recebeu uma notificação de inclusão no processo PERSI, nos termos do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25 de outubro» (cfr. artigo 6.º daquele articulado). Logo, em face de tal confissão (artigos 352.º e 355.º e 356.º, todos do Código Civil) não tinha o tribunal de se pronunciar expressamente sobre a verificação daquela condição de ação.
Acresce que a requerida/apelante tão pouco pôs em causa a extinção daquele procedimento e não alegou quaisquer factos dos quais pudesse resultar que a extinção do PERSI não lhe foi comunicada. De qualquer forma sempre se dirá que resulta dos autos que foi comunicado à devedora a extinção do PERSI e as razões para a extinção daquele procedimento extrajudicial. Senão vejamos.
Em face do disposto no artigo 17.º/3, do D/L n.º 227/2012, de 25.10 a instituição de crédito informa o cliente bancário, através de comunicação em suporte duradouro, da extinção do Persi, descrevendo o fundamento legal para essa extinção e as razões pelas quais considera inviável a manutenção deste procedimento. Também o Aviso do Banco de Portugal n.º 17/2012 (publicado no DR, 2.ª Série, parte E, n.º 243, de 17.12.2012) no seu artigo 8.º determina o seguinte: «A comunicação pela qual a instituição de crédito informa o cliente bancário da extinção do PERSI deve conter, em termos claros, rigorosos e facilmente legíveis, as seguintes informações: a) Descrição dos factos que determinam a extinção do PERSI ou que justificam a decisão da instituição de crédito de pôr termo ao referido procedimento, com indicação do respetivo fundamento legal; b) Consequências da extinção do PERSI, nos casos em que não tenha sido alcançado um acordo entre as partes, designadamente a possibilidade de resolução do contrato e de execução judicial dos créditos; c) Quando esteja em causa um contrato de crédito à habitação, informação acerca do regime constante do Decreto-Lei n.º 349/98, de 11 de novembro, na redação da Lei n.º 59/2012, de 9 de novembro, relativamente à resolução e ao direito à retoma do contrato de crédito; d) No caso de o cliente bancário estar abrangido pelo regime extraordinário de regularização do incumprimento de contratos de crédito à habitação, referência, quando tal decorra do referido diploma legal, ao direito do cliente bancário à aplicação de medidas substitutivas, bem como aos termos em que poderá solicitar a sua aplicação; e) Identificação das situações em que o cliente bancário pode solicitar a intervenção do Mediador do Crédito mantendo as garantias associadas ao PERSI; f) Indicação dos elementos de contacto da instituição de crédito através dos quais o cliente bancário pode obter informações adicionais ou negociar soluções para a regularização da situação de incumprimento».
Por sua vez, o artigo 17.º do D/L n.º 227/2012, de 25.10 enuncia os fundamentos de extinção do PERSI, aqueles que operam ope legis (n.º 1) e aqueles que a instituição bancária pode invocar (n.º 2). Assim, nos termos do artigo 17.º/1, o Persi extingue-se:
a) Com o pagamento integral dos montantes em mora ou com a extinção, por qualquer outra causa legalmente prevista, da obrigação em causa;
b) Com a obtenção de um acordo entre as partes com vista à regularização integral da situação de incumprimento;
c) No 91.º dia subsequente à data de integração do cliente bancário neste procedimento, salvo se as partes acordarem, por escrito, na respetiva prorrogação; ou
d) Com a declaração de insolvência do cliente bancário.
E nos termos do n.º 2, a instituição de crédito pode, por sua iniciativa, extinguir o PERSI, sempre que: a) Seja realizada penhora ou decretado arresto a favor de terceiros sobre bens do devedor; b) Seja proferido despacho de nomeação de administrador judicial provisório, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea a) do n.º 3 do artigo 17.º-C do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas; c) A instituição de crédito conclua, em resultado da avaliação desenvolvida nos termos do artigo 15.º, que o cliente bancário não dispõe de capacidade financeira para regularizar a situação de incumprimento, designadamente pela existência de ações executivas ou processos de execução fiscal instaurados contra o cliente bancário que afetem comprovada e significativamente a sua capacidade financeira e tornem inexigível a manutenção do PERSI; d) O cliente bancário não colabore com a instituição de crédito, nomeadamente no que respeita à prestação de informações ou à disponibilização de documentos solicitados pela instituição de crédito ao abrigo do disposto no artigo 15.º, nos prazos que aí se estabelecem, bem como na resposta atempada às propostas que lhe sejam apresentadas, nos termos definidos no artigo anterior; e) O cliente bancário pratique atos suscetíveis de pôr em causa os direitos ou as garantias da instituição de crédito; f) O cliente bancário recuse a proposta apresentada, sem prejuízo do disposto no n.º 1 do artigo anterior; ou g) A instituição de crédito recuse as alterações sugeridas pelo cliente bancário a proposta anteriormente apresentada, sem prejuízo do disposto no n.º 2 do artigo anterior.
In casu, o tribunal de primeira instância julgou provada a seguinte factualidade:
(i) Em 29/09/2020, a autora comunicou à ré o seguinte:
«Certamente tomou conhecimento da nossa comunicação anterior, na qual informámos que a sua dívida passou a pertencer ao Grupo (…).
É de extrema importância um contacto urgente com os nossos serviços para confirmar se já efetuou o pagamento ou para assegurar que irá fazê-lo num curto espaço de tempo.
É inegável que o valor nos é devido, atualmente ascende a € 12.705,28, e a sua situação tende a agravar-se com o acréscimo diário de Juros de Mora e Custos de Cobrança.
Reiteramos a N/disponibilidade para um entendimento, no entanto, deverá entrar em contacto com o Gestor do Seu Processo, com a máxima urgência, através do telefone (…).
Caso não exista uma ação concreta da sua parte com vista ao pagamento integral ou a apresentação de uma proposta de pagamento, este processo poderá ser enviado para Contencioso, em virtude da falta de colaboração, e nesse caso todos os encargos correm por sua conta.
Aguardando a sua iniciativa de resolução, apresentamos os nossos melhores cumprimentos» (cfr. supra II.3.1).
(ii) Em 20/11/2020, a Autora comunicou à Ré o seguinte:
«Concordará certamente que tem sido notório o esforço desenvolvido pelos nossos serviços no sentido de alcançar um acordo amigável para liquidação da S/dívida para com a (…) – (…).
No entanto, verifica-se que não foi alcançado qualquer entendimento amigável, pelo que não nos resta outra solução que avançarmos para a Execução da dívida, Capital, Juros e restantes encargos, o que implicará transtornos a curto prazo.
Valor em dívida: € 12.766,87 – acrescido de juros de mora e custos de cobrança
Pagamento Multibanco:
Entidade: (…)
Referência: (…)» (cfr. supra II.3.1).
(iii) A ré recebeu ambas as comunicações acima descritas.

As missivas supra descritas cumprem os requisitos legais de comunicação da extinção do PERSI.
Com efeito, pese embora não haja na missiva de 20.11.2020 uma menção expressa ao “Persi” e à sua extinção, a devedora foi previamente informada da sua inclusão no Persi «de acordo com o disposto no artigo D/L n.º 227/2012, de 25.10»; por conseguinte, estava a mesma ciente do contexto em que surgem aquelas duas comunicações, na última das quais é-lhe transmitido, de forma clara, que a credora «vai avançar para a execução da dívida por não ter sido alcançado qualquer entendimento amigável». Para “um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário” (artigo 236.º/1, do Código Civil), in casu, a devedora que, por sinal, até é advogada, litigando em “causa própria” (cfr. requerimento de proteção judiciária anexo às alegações de recurso), a referência à “execução da dívida” só podia ser interpretado como estando a credora a pôr termo ao procedimento extrajudicial de regularização da situação de incumprimento do contrato em causa nos autos. E da conjugação do teor de ambas as missivas resulta também claro que a razão da “passagem” à fase judicial resulta da “inexistência de uma ação concreta da parte da devedora com vista ao pagamento integral ou a apresentação de uma proposta de pagamento”; ou seja, foram comunicados à devedora de forma percetível os factos conducentes à decisão de por termo ao procedimento extrajudicial de resolução da situação de incumprimento por banda da devedora.
Em síntese e concluindo: resultando dos autos que foi comunicado à devedora a sua integração no PERSI bem como a sua extinção e as razões para a extinção daquele procedimento extrajudicial, estando, assim, demonstrado que a credora/autora podia recorrer à via judicial para satisfação do crédito que reclama nos autos, não tinha o tribunal de se pronunciar sobre uma exceção dilatória que não foi invocada perante ele e que os autos revelam não se verificar.
Pelo que, em face do exposto supra, se conclui que a decisão sob recurso não padece da nulidade que lhe é imputada, a saber, a omissão de pronúncia sobre a integração da devedora no PERSI.

*
Quanto à questão da legitimidade da autora, o tribunal a quo conheceu expressamente da mesma, como resulta do seguinte trecho da sentença recorrida: «Opondo-se à pretensão deduzida na presente ação, a ré defendeu-se por ilegitimidade ativa conquanto o invocado contrato genético que serve de fundamento à presente ação foi ajustado com o Banco … (sucedido pela … Bank, SA) e não com a Autora desta ação, sendo que a eventual cessão de créditos invocada não foi regularmente comunicada, o que justifica a sua ilegitimidade (ativa) nesta demanda, o que impõe a sua absolvição da instância.
Exercendo o contraditório, a Autora defendeu-se e juntou, entre o mais, o contrato de cessão de créditos e uma missiva dirigida à Ré, alegando que a eficácia da (comunicação da) cessão teve lugar com a missiva que lhe dirigiu e não foi devolvida, a qual continha o nome da cedente, número do contrato e valor em dívida, tornando-a eficaz.
Como se viu, a Ré apresentou oposição sustentando não ter sido previamente notificada da cessão de créditos objeto nos autos, o que leva à ilegitimidade ativa e consequente absolvição da instância, o que é objetado pela Autora.
De acordo com o artigo 583.º, n.º 1, do CCiv., “a cessão produz efeitos em relação ao devedor desde que lhe seja notificada, ainda que extrajudicialmente, ou desde que ele a aceite.
A razão de ser da exigência do conhecimento da cessão, decorre da necessidade de proteção do interesse do devedor em saber, a cada momento, quem é o seu credor pois que, em princípio, a lei não admite a eficácia liberatória da prestação feita ao credor aparente (artigo 770.º do CCiv.), havendo, assim, que proteger a boa-fé do devedor que confia na aparência da estabilidade subjetiva do contrato, frustrada pela omissão de informação do primitivo credor cedente. Se, nesse caso, cumpre perante este, cumpre perante quem crê ser ainda seu credor, não devendo, por isso, ser prejudicado (cfr. artigo 583.º, n.º 2, do CCiv.).
Nesta medida, impõe-se fazer notar que a cessão de créditos dispensa o consentimento do devedor (cfr. n.º 1 do artigo 577.º do CCiv.), sendo-lhe oponível a partir da notificação.
A forma mais comum é a notificação extrajudicial, sendo que no caso, provou-se que a missiva que transmitia o teor dessa informação, foi expedida para o domicílio da Ré em 26/06/2020. Não se provou, contudo, que a Ré a tivesse recebido. Contudo, como vem sendo indicado de forma reiterada pela jurisprudência, se a notificação, enquanto comunicação do facto visa, tão só, a proteção do devedor de boa-fé (que deve manter-se a coberto dos riscos de um negócio a que foi alheio), esse “conhecimento” da transmissão é suscetível de se concretizar através da citação para a ação ou notificação (como aconteceu neste caso), ficando então o cedido ciente da existência da cessão e da impossibilidade de invocar o seu desconhecimento (artigo 583.º, n.º 2, do CCiv.).
Portanto, o efeito prático é que até à notificação, eram inoponíveis à Ré as cessões de crédito. Doravante, se a notificação ao devedor constitui simplesmente uma condição de eficácia da cessão perante si e se o efeito substancial que se pretende obter com tal notificação é o de tornar a cessão eficaz em relação ao devedor (dando-lhe a conhecer a identidade do cessionário e evitando que o cumprimento seja feito perante o primitivo credor), tal desiderato é perfeitamente assegurado com a citação para a ação, momento a partir do qual o devedor fica ciente da existência da cessão e inibido de invocar o seu desconhecimento, nos termos do artigo 583.º, n.º 2, do CCiv..
Tal comunicação é tão mais relevante que na situação dos autos, como bem aponta a Ré, chegam a ser confusas e contraditórias as informações que lhe foram sendo prestadas, já que a cessão de créditos ocorreu em 18 de Julho de 2019 (facto 9), mas depois disso e apesar de a Autora interpelar a Ré para liquidar o valor devido, comunicou-lhe, numa das ocasiões, que “iria devolver o procedimento de cobrança ao (…) Bank, SA” (factos 10 e 12), procedimento que foi igualmente tomado por uma terceira empresa (facto 11), ocorrendo ainda uma subsequente vicissitude, em que a Autora comunicou a cessão de créditos ocorrida, não a 18 de Julho de 2019 mas a 23 de Junho 2020 (facto 14) e, apesar disso, continuar a ser a (…) Bank, SA a reclamar o crédito junto da Ré (facto 15).
Todavia, conforme demos conta, o que importa para a eficácia da cessão em relação ao devedor é o esclarecimento em informar, a cada momento, quem é o seu credor. Nesse sentido, “se o devedor, antes da notificação ou aceitação, por ignorar a cessão de créditos, pagar ao cedente ou celebrar com ele algum negócio relativo ao crédito, quer o pagamento, quer o negócio têm efeitos sobre o crédito, podendo inclusivamente produzir a sua extinção, e esses efeitos são oponíveis ao cessionário, excepto se ele demonstrar que o devedor tinha conhecimento da cessão (artigo 583.º, n.º 2). A razão para esta restrição reside na má fé do devedor que, sabendo que ocorreu a cessão, decide pagar ao cedendo ou celebrar com ele qualquer negócio relativo ao crédito.”3
Pois bem, tal vicissitude (pagamentos no período de indefinição do credor) não ocorreu, sendo agora – pelo menos desde a citação para a presente ação – perfeitamente claro quem é o credor.
Portanto, em síntese, trata o caso da eventual inoponibilidade perante a Ré, inoponibilidade essa já afastada com a comunicação da cessão já feita no âmbito da presente ação.
Improcede assim a exceção de ilegitimidade ativa».
A apelante defende que o tribunal não se pronunciou sobre um argumento por si invocado e que põe em causa a legitimidade da autora, a saber, a circunstância de a autora se apresentar na presente ação com uma denominação social diferente daquela que consta do contrato de cessão de créditos junto aos autos.
Vejamos.
No seu articulado de oposição à injunção a requerida/apelante escreveu, a propósito, apenas o seguinte: «Certo é que a requerida nada deve à requerente que se apresenta na injunção como (…), IGDF» (artigo 27.º), «Nem à (…), (…) ou (…), Lda., nem ao grupo (…), denominações que constam nos diversos contactos recebidos» (artigo 28.º). E na resposta à petição inicial aperfeiçoada apresentada pela autora, a requerida alegou o seguinte: «(…) reitera-se o já deixado, porquanto a (…), mesmo com as suas variadíssimas denominações, que teima em usar, não está investida de legitimidade para ser autora na presente ação» (artigo 19.º), concluindo: «Resulta, assim, demonstrado que os efeitos pretendidos pela autora com a apresentação do requerimento de injunção não podem proceder, primeiro porque se alicerça num contrato de cessão que, a ter existido, não contempla a dívida do contrato correspondente ao cartão de crédito titulado pela ré, pelo que não a legitima a agir enquanto cessionário; segundo porque a ter-se como celebrada uma eventual cessão de créditos, a mesma não foi comunicada à ré, pelo que não pode produzir os efeitos pretendidos pela autora».
Resulta dos articulados subscritos pela requerida nos autos e supra referidos que esta pôs efetivamente em causa a legitimidade substantiva da autora, ou seja, a efetiva titularidade da relação material alegada pela autora, mas não com fundamento no facto de ela se apresentar com uma denominação distinta no contrato de cessão de créditos e no requerimento de injunção. O que a requerida questionou a propósito da legitimidade da autora foi a própria existência do contrato de cessão de créditos invocado na ação, e o facto de, a ter existido tal contrato, ele contemplar o contrato de crédito em causa nos autos; e questionou também a oponibilidade da cessão de créditos à requerida (por alegadamente, tal contrato não lhe ter sido comunicado). Ou seja, a requerida não alegou como fundamento da alegada falta de legitimidade da autora a diferente denominação da autora (constituída pelo nome da sociedade e pelo indicativo correspondente ao tipo legal de sociedade) no contrato de cessão de créditos e no requerimento de injunção, não pondo em causa, sequer, que sejam uma e a mesma sociedade, apesar da diferença que existe na denominação na parte relativa ao indicativo alusivo ao tipo legal de sociedade. Por conseguinte, não incorreu o tribunal a quo em omissão de pronúncia pelo facto de ao decidir da legitimidade da autora não se ter pronunciado sobre «as várias denominações que a autora apresenta».
Concluindo, não tem a apelante razão ao invocar a nulidade de sentença por alegada omissão de pronúncia quanto à exceção de ilegitimidade.
*
Improcede, assim, a arguição de nulidade da decisão recorrida por omissão de pronúncia.

II.4.2.
Reapreciação do mérito da decisão
A sentença recorrida julgou parcialmente a ação e condenou a requerida/apelante a pagar à autora a quantia de € 10.782,66, a título de capital, acrescida de juros de mora, calculados à taxa legal de 4%, vencidos e vincendos até integral e efetivo pagamento, com fundamento no incumprimento, por banda da requerida, de um contrato de mútuo oneroso e bancário, e do qual resultou um direito de crédito que foi transferido para a esfera jurídica da aqui autora, por via de um contrato de cessão de créditos.
Diz a apelante nas suas conclusões de recurso que o «tribunal considera que a ré tomou conhecimento da cessão com a citação para a presente ação, aceitando a invocada posição de cessionária da autora nos autos» mas que «a qualidade da autora não foi demonstrada, pelo que não pode resultar provada», concluindo que a fundamentação da sentença «encerra uma errónea aplicação do direito aos factos».
Apesar de alegar que a sentença «encerra uma errónea aplicação do direito aos factos», a recorrente não põe em causa que a comunicação da cessão de créditos ao devedor à qual alude o artigo 583.º, n.º 1, do Código Civil[5] pode ser feita por meio de citação para a ação declarativa intentada pelo cessionário, não contrapondo qualquer argumentação jurídica à fundamentação de direito contida na sentença no que respeita à oponibilidade, à ré (aqui apelante), da cessão de créditos em causa nos autos.
Na verdade, o que a motivação e as conclusões de recurso revelam é o inconformismo da apelante quanto ao segmento da sentença recorrida que julgou demonstrada a qualidade de cessionária da autora, invocando agora, e designadamente, que a autora se apresenta nos autos com uma diferente denominação social (…, IJDF) daquela que consta do contrato de cessão de créditos (…, Unipessoal, Lda.).
Porém, certo é que a recorrente não impugnou a decisão de facto (e, se o pretendia fazer, não cumpriu os ónus previstos no artigo 640.º do Código Processo Civil), designadamente a factualidade contida no ponto n.º 9 do elenco dos factos provados, onde consta que por contrato de cessão de créditos celebrado em 18 de julho de 2019 a autora «adquiriu junto do (…) Bank, SA o contrato celebrado em 15.10.2008», ou seja, o contrato mediante o qual o Banco (…) emitiu a favor da ré e a pedido desta um cartão designado de (…) com vista a proceder ao levantamento de dinheiro e à aquisição de bens e serviços junto de terceiros, responsabilizando-se a ré pelo pagamento das dívidas resultantes dessa utilização, sendo o limite de crédito € 1.500,00 (facto provado n.º 1).
Assim sendo, e considerando ainda que a requerida/apelante tão pouco pôs em causa a admissibilidade da cessão de créditos ocorrida (artigo 577.º do CC) ou contrapôs qualquer argumento jurídico à decisão do tribunal recorrido de considerar que a cessão de créditos foi validamente comunicada à devedora através de citação para a presente ação, tornando-se, por essa via, oponível à mesma, não pode proceder a presente apelação.

Sumário: (…)

III. DECISÃO
Em face do exposto, acordam em julgar a apelação improcedente, mantendo a sentença recorrida.
As custas na presente instância de recurso são da responsabilidade da apelante, sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficie.
Notifique.
DN.
Évora, 27 de junho de 2024
Cristina Dá Mesquita
Maria Domingas Simões (1ª Adjunta)
Rui Manuel Machado e Moura (2º Adjunto)



__________________________________________________
[1] Código de Processo Civil Anotado, Volume 2.º, 3.ªEdição, Almedina, pág. 735.
[2] O ponto de facto provado n.º 9 versa sobre o próprio contrato de cessão celebrado em 18 de julho de 2019 entre a aqui Autora e a (…) Bank, SA, ao passo que o ponto de facto provado n.º 15 reporta-se não a um contrato, mas a uma missiva enviada pela autora à ré, através da qual lhe comunica a celebração, em 23 de junho de 2020, de um contrato de cessão de crédito celebrado entre ela e a (…) Bank. E na sentença sob recurso o julgador a quo refere expressamente o seguinte: «(…) chegam a ser confusas e contraditórias as informações que lhe foram sendo prestadas, já que a cessão de créditos ocorreu em 18 de julho de 2019 (facto 9) (…)».
[3] Direito Processual Civil Declaratório, Volume III, Almedina, Coimbra, 1982, pág. 142.
[4] José Lebre de Freitas/Montalvão Machado/Rui Pinto, Código de Processo Civil Anotado, Volume 2.º, 2001, Coimbra Editora, pág. 312.
[5] De acordo com este preceito legal, a cessão só produz efeitos em relação ao devedor desde que lhe seja notificada, ainda que extrajudicialmente, ou desde que ele a aceite».