CONTRATO-PROMESSA DE COMPRA E VENDA
CUMPRIMENTO DO CONTRATO
RESOLUÇÃO DO CONTRATO
Sumário

Não tendo resultado provado o prévio cumprimento por parte dos promitentes-compradores (Apelados), de cláusula acordada com os promitentes-vendedores (Apelantes), inserida no contrato-promessa outorgado entre ambos, que impunha aos Apelados a realização de uma determinada interpelação aos Apelantes com vista a estes diligenciarem em determinado prazo pela prática de actos previamente necessários à outorga do contrato prometido com a advertência de que não o fazendo incorreriam então em incumprimento do contrato-promessa, não pode relevar a declaração de resolução contratual fundada em incumprimento definitivo do contrato-promessa comunicada aos Apelantes pelos Apelados.
(Sumário do Relator)

Texto Integral

Proc. n.º 682/21.0T8VRS.E1
Tribunal Judicial da Comarca de Faro
Juízo de Competência Genérica de Vila Real de Santo António – Juiz 2
Apelantes: (…) e (…)
Apelados: (…) e (…)
Apelantes: (…) e (…)
Apelados: (…) e (…)
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Sumário do Acórdão
(Da exclusiva responsabilidade do relator – artigo 663.º , n.º 7, do CPC)
(…)
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Acordam os Juízes na 1ª Secção do Tribunal da Relação de Évora no seguinte:
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I – Relatório
(…), solteiro e (…), divorciada, ambos residentes na Av. de (…), n.º 195, Monte Gordo, propuseram a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum contra (…), residente no Sítio do (…), n.º 2, (…), Castro Marim, (…), residente no Sítio do (…), Caixa Postal (…), Castro Marim e (…), residente na Rue 1 (…), França, pedindo que seja declarado resolvido o contrato-promessa celebrado entre si e as Rés por incumprimento definitivo destas, bem como a condenação das Rés no pagamento da quantia de € 30.991,20 (trinta mil e novecentos e noventa e um euros e vinte cêntimos), por força do incumprimento contratual, acrescido de juros de mora vencidos e vincendos desde a data da citação até efetivo e integral pagamento.
Para tanto alegaram, em síntese, ter celebrado com as Rés um contrato promessa de compra e venda no dia 17 de fevereiro de 2021, o qual tem por objeto o prédio urbano em propriedade total, sito em (…), freguesia e concelho de (…), inscrito na respetiva matriz sob o artigo (…), da mesma freguesia, e descrito na Conservatória do Registo Predial de (…) sob o n.º (…), acrescentando que no âmbito do identificado contrato obrigaram-se a efetuar o pagamento inicial do montante de € 15.000,00, a título de sinal e princípio de pagamento, o que foi efetivamente liquidado.
Mais disseram que tendo ambas as partes acordado, na cláusula quarta do CPCV, que a escritura pública ou o documento particular autenticado de compra e venda seria celebrado no prazo de 90 (noventa) dias, ou seja, até ao dia 6 de maio de 2021 desde logo encetaram todas as diligências com vista à obtenção dos créditos bancários necessários para financiar a compra do imóvel supra identificado e para a realização de obras, tendo os mesmos sido definitivamente aprovados em 18.05.2021, e cobradas as respetivas despesas comissão e imposto de selo.
Referiram, ainda, que para a concretização do dito contrato era necessário, da parte das Rés, entre o mais que ficou resolvido, proceder à retificação na caderneta predial da quota-parte respeitante a cada uma das herdeiras, atualização no Registo Predial e na Caderneta predial no que respeita às áreas do imóvel e à menção da existência do pátio, alteração da certidão da Câmara Municipal sobre a isenção de licença de utilização de forma que na mesma não se fizesse menção às áreas e à existência de pátio, além da correcção do registo de aquisição a favor das Rés, que se encontrava provisória.
Alegaram, também, que, apesar de informadas da necessidade destas diligências, as Rés nunca efetuaram as correções necessárias, tendo inclusive a Ré (…) se recusado a assinar a escritura pública para o efeito, marcada e preparada pela Autora (…), pelo que enviaram carta registada a cada uma das Rés, através do seu Mandatário, informando que se encontrava em falta a entrega de documentos necessários à realização da compra e venda, e que por essa razão se verificava incumprimento definitivo do contrato, considerando-se o mesmo resolvido por justa causa, entendendo ter direito a receber a quantia de € 30.000,00 (trinta mil euros), a título de indemnização pelo incumprimento definitivo imputável às Rés, correspondente ao dobro do sinal que pagaram aos Réus acrescido de diversos prejuízos que sofreram em função da conduta dos Réus, designadamente a quantia total de € 499,20 (quatrocentos e noventa e nove euros e vinte cêntimos), com custos do empréstimo, perdidos, em virtude da caducidade do processo de empréstimo e a quantia de € 492,00 (quatrocentos e noventa e dois euros) a título de honorários pelos serviços prestados por advogada.
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Citadas as Rés (…) e (…) contestaram a acção, invocando excepção dilatória de ilegitimidade passiva, fundada no facto de (…), casado com a Ré (…) em regime de comunhão de bens, também deter a qualidade de promitente vendedor e a presente acção não ter sido intentada contra o mesmo, concluindo que a falta de qualquer dos promitentes ocasiona a ilegitimidade das Rés, nos termos do artigo 33.º do CPC, com a consequente absolvição das mesmas da instância, ao abrigo do disposto no artigo 577.º, alínea e), do CPC.
Mais impugnaram parte da factualidade apresentada pelos Autores, negando que tivessem incumprido o contrato promessa celebrado com estes, terminando a pugnar pela sua absolvição do pedido.
Citada a Ré (…) contestou a acção começando por invocar excepção de ilegitimidade passiva, por não se mostrar demandado o seu marido (…), requerendo a sua absolvição da instância por preterição de litisconsórcio necessário, impugnando, ainda, parte da factualidade alegada pelos Autores.
Deduziu, outrossim, pedido reconvencional, no qual requereu que se julgue o contrato promessa incumprido por culpa exclusiva dos Autores, com a consequente perda a favor das Rés da quantia paga a título de sinal (cfr. artigo 442.º do Código Civil).
Os Autores replicaram invocando a extemporaneidade da contestação e da reconvenção apresentada pela Ré (…), pedindo o seu desentranhamento, mais impugnando a matéria da reconvenção, pedindo a respectiva absolvição do pedido formulado nesta última.
Suscitaram ainda o incidente de intervenção principal provocada do marido da co-Ré (…).
Por despacho datado de 10.05.2022 foi indeferida a excepção de extemporaneidade da contestação da Ré (…) invocada pelos Autores e determinada a notificação das Rés para se pronunciarem quanto ao incidente de intervenção principal provocada suscitada.
Por articulado superveniente vieram os AA. requerer a ampliação do pedido, peticionando a condenação das Rés no pagamento de uma indemnização por danos não patrimoniais sofridos com o incumprimento contratual causados por estas, no valor não inferior a € 2.000,00 (dois mil euros), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos até efetivo e integral pagamento, tendo o dito articulado sido admitido, nos termos do artigo 265.º, n.º 2 e artigo 588.º, n.º 1, 2, 3, alínea a) e 4, do CPC, por despacho datado de 23.06.2022, pelo qual também foi admitido o incidente de intervenção principal provocada suscitado pelos Autores, tendo-se determinado a citação do Chamado (…), nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 319.º, n.º 1, n.º 2 e n.º 3, do CPC.
Foi proferido despacho saneador no qual se admitiu a reconvenção deduzida pela co-Ré (…), fixou-se o valor da causa, dispensou-se a audiência prévia, identificou-se o objecto do litígio, enunciaram-se os temas da prova e admitiram-se os requerimentos de prova.
Realizou-se a audiência final, a que se seguiu o proferimento de sentença, que contém o seguinte dispositivo:
“V – DECISÃO
Pelo exposto e de acordo com os fundamentos legais invocados, julgo a presente acção parcialmente procedente e consequentemente:
a) Declarar a resolução do contrato-promessa de compra e venda, datado de 05.02.2021, celebrado entre os Autores (…) e (…) e as Rés (…), (…), (…) e (…), relativo à promessa de compra e venda do prédio urbano em propriedade total, sito em (…), freguesia e concelho de (…), inscrito na respetiva matriz sob o art.º (…) da mesma freguesia, descrito na Conservatória do Registo Predial de (…) sob o n.º (…).
b) Condenar, solidariamente, os Réus (…), (…), (…) e (…) a pagar aos Autores (…) e (…) a quantia de € 30.000,00 (trinta mil euros), correspondentes ao dobro do sinal que estes prestaram, quantia à qual acrescem juros moratórios, vencidos e vincendos, à taxa anual legal de 4%, contabilizados desde a data da citação até efectivo e integral pagamento.
c) Condenar, solidariamente, as Rés (…), (…), (…) e (…) a pagar aos Autores (…) e (…) a quantia de € 991,20 (novecentos e noventa e um euros e vinte cêntimos), a titulo de indemnização por danos patrimoniais, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, às sucessivas taxas de juro civis legalmente aplicáveis, até integral pagamento, a contar da data da sentença.
d) Condenar, solidariamente, as Rés (…), (…), (…) e (…) a pagar aos Autores (…) e (…) a quantia de € 500,00 (quinhentos euros), a titulo de indemnização por danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, às sucessivas taxas de juro civis legalmente aplicáveis, até integral pagamento, a contar da data da sentença.
Julgo a acção reconvencional totalmente improcedente, por não provado e, consequentemente, absolvo os Autores (…) e (…) do pedido reconvencional.
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Custas da acção principal pelos Autores e pelos Réus, na proporção do decaimento, que representa 5% para os primeiros e 95% para os segundos (cfr. artigo 527.º do CPC).
Custas da acção reconvencional pelos Réus (cfr. artigo 527.º do CPC).”
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Inconformados com a sentença recorreram todos os Réus para este Tribunal da Relação de Évora.
Os co-Réus (…) e (…) alinharam no recurso independente que dirigiram a este Tribunal conclusões do seguinte teor:
CONCLUSÕES:
1. Deve revogar-se a decisão da matéria de facto nos termos seguintes:
Dar-se como provado:
a) O teor do contrato promessa de compra e venda, especialmente o vertido nas cláusulas segunda, quarta, nona, décima e décima primeira, transcrevendo-se na decisão a sua redacção.
b) Que a única comunicação escrita dirigida às RR. (e não também ao R. …) é a que consta das cartas datadas de 1 de outubro de 2021, juntas como doc. 8 da petição inicial, nas quais os AA. resolviam o contrato promessa e pediam a devolução do sinal em dobro.
c) Que os RR. nunca foram interpelados pelos AA. para “no prazo de 10 dias a contar da interpelação (…) para tal, (…) repor a situação objecto da queixa sob pena de se considerar em incumprimento.”
d) Que os RR. não se recusaram a outorgar a escritura pública de compra e venda do prédio prometido vender.
e) Que os AA. não marcaram, como era sua obrigação, “no prazo de 90 dias a contar da data de assinatura” do contrato-promessa de compra e venda, a escritura pública respectiva.
Dar-se como não provados os pontos 36 e 43 dos factos provados.
2. Feitas as correcções supra, que se impõem face à prova produzida, mormente os depoimentos nos trechos transcritos, deve revogar-se a decisão da matéria de direito, julgando improcedente a acção e procedente o pedido reconvencional.
3. Sendo aplicável in casu o ensinamento seguinte:
“I – A resolução do contrato-promessa apenas se pode fundar no incumprimento definitivo, que não na simples mora, sendo que o incumprimento definitivo resulta da não realização da prestação dentro do prazo que razoavelmente foi fixado pelo credor, ou da perda do interesse que o credor tinha na prestação, interesse esse que tem que ser apreciado objectivamente.
II – O credor, para converter a mora em incumprimento definitivo, tem de interpelar o devedor, intimando-o a cumprir a prestação, dentro do prazo razoável, fixado de acordo com as circunstâncias concretas do contrato a celebrar, com a advertência, muito clara, de que a falta da prestação, no prazo estabelecido, o fará incorrer em incumprimento definitivo da obrigação.
III – A interpelação admonitória exige o preenchimento de três pressupostos: a existência de uma intimação para cumprimento, a consagração de um prazo peremptório, suplementar, razoável e exacto para cumprir, e a declaração cominatória de que findo o prazo fixado, sem que ocorra a execução do contrato, se considera este definitivamente incumprido. (…)” (Ac. STJ de 10.12.2019, in www.dgsi.pt).
4. Os AA. não interpelaram as RR. intimando-as ao cumprimento do contrato, nos termos do previsto no artigo 808.º do Código Civil.
5. Razão pela qual, se outra faltasse, as RR. não incorreram no incumprimento definitivo do contrato-promessa sub judice.
6. Sendo assim infundada a declarada resolução do contrato promessa vertida na carta que os AA. dirigiram às RR. (e não ao R., ora apelante).
7. Por outro lado, os AA. não cumpriram o contrato promessa.
8. Não marcaram, como era sua obrigação, a escritura pública de compra e venda dentro do prazo convencionado (vide n.º 1 da cláusula quarta do CPCV).
9. Não interpelaram os RR. para suprir qualquer falta que lhes fosse imputável e que impedisse a realização de tal escritura no prazo convencionado.
10. E manifestaram expressamente, com a presente acção e com a carta que enviaram às RR., a intenção de não cumprirem o contrato sub judice.
11. Razão pela qual deve julgar-se o mesmo incumprido por culpa exclusiva dos AA.
12. Com a consequente perda a favor dos RR. da quantia paga a título de sinal (cfr. artigo 442.º do Código Civil).
Assim se fazendo JUSTIÇA.”

As co-Rés (…) e (…) apresentaram extensas conclusões recursivas tendo, por isso, sido convidadas por despacho do relator proferido neste Tribunal da Relação a aperfeiçoarem tal segmento do recurso, a que anuíram, apresentando conclusões recursivas mais reduzidas do teor que se passam a transcrever:
“CONCLUSÕES
1.ª A Sentença recorrida 18SET2023 (ref.ª 129087824) padece de:
A) – Erro de julgamento: Impugnação da matéria de facto.
B) – Erro na aplicação das normas dos artigos 268.º, 405.º, 406.º, 437.º, 777.º, 779.º, 805.º, 808.º e 814.º do Código Civil;
C) – Erro na aplicação do artigo 442.º, n.º 4. do Código Civil;
D) – Erro na aplicação dos artigos 527.º e 583.º CPC no respeitante às custas subjacentes à Reconvenção.
A) – Erro de julgamento: Impugnação da matéria de facto
2.ª Deviam ter sido dados como provados os factos 17, 18, 19, 20, 21 e 48 da Contestação das RR/Apelantes, o que resulta do doc. 1 junto com a PI.
3.ª A celebração do CPCV foi outorgado voluntária e conscientemente pelas partes em 05 Fev. 2021, aí tendo ficado fixadas as condições e obrigações de cada uma delas.
4.ª Neste sentido, também concorrem:
a) depoimento de parte da A. (…), acta de 31 Jan. 2023, ref.ª 127122063, gravação digital de 11:34:23 a 12:30:12, ficheiro de origem 20230131113423_4242728_2870884, com particular destaque para 00:20:48 a 00:23:34 (supra transcrito);
b) depoimento de parte do A. (…), acta de 31 Jan. 2023, ref.ª 127131711, gravação digital de 15:30:37 a 15:43:41, ficheiro de origem 20230131153036_4242728_2870884, com particular destaque 00:00:16 a 00:00:26 (supra transcrito).
5.ª Os AA/Apelados não marcaram a escritura do contrato prometido no prazo contratualizado e não comunicaram às RR/Apelantes qualquer data ou local para a realização da mesma, como também não interpelaram as RR/Apelantes para qualquer questão.
6.ª A escritura do contrato prometido não foi realizada por motivos que contendem exclusivamente com os AA/Apelados (não obtenção de financiamento, o qual nem sequer estava previsto no CPCV, e não é oponível às AA/Apelantes).
7.ª Impõe-se dar como provados os factos 22, 24, 25, 26, 27, 28, 29, 30, 31, 37, 39, 45, 46 e 47 da Contestação das RR/Apelantes.
Neste sentido concorrem:
a) Depoimento de parte da A. acta de 31 Jan. 2023, ref.ª 127122063, gravação digital de 11:34:23 a 12:30:12, ficheiro de origem 20230131113423_4242728_2870884, com particular destaque para (supra transcritos): 00:10:08 a 00:10:56; 00:14:05 a 00:14:08; 00:15:53 a 00:17:48; 00:38:28 a 00:39:44; 00:40:08 a 00:42:05.
b) Depoimento de parte da A. acta de 31 Jan. 2023, ref.ª 127122063, gravação digital de 14:25:30 a 15:21:48, ficheiro de origem 20230131142528_4242728_2870884, com particular destaque para (supra transcritos): 00:04:28 a 00:05:48; 00:17:47 a 00:19:38; 00:30:01 a 00:32:23.
c) Depoimento de parte do A., acta de 31-01-2023, ref.ª 127131711, gravação digital de 15:30:37 a 15:43:41, ficheiro de origem 20230131153036_4242728_2870884, com particular destaque para (supra transcrito): 00:02:10 a 00:03:10; 00:03:54 a 00:05:05; 00:08:45 a 00:09:28.
d) Depoimento de parte do A., em audiência de julgamento, acta de 11-05-2023, ref.ª 128291710, gravação digital de 09:52:50 a 10:49:16, ficheiro de origem 20230511095250_4242728_2870884, com particular destaque para: 00:24:12 a 00:27:59.
9.ª Os AA./Apelados nunca consideraram nem tiveram em conta as RR/Apelantes, preferindo tratar apenas com a R. (…), com toda a informalidade que acharam adequada, em desprezo do contratado no CPCV.
10.ª Para o efeito, concorre também:
a) Depoimento da testemunha (…), acta de 11-05-2023, ref.ª 128291710, gravação digital de 10:50:23 a 12:03:42, ficheiro de origem 20230511105022_4242728_2870884, com particular destaque para: 00:34:30 a 00:40:16.
b) Depoimento da testemunha (…), acta de 11-05-I2023, ref.ª 128291710, gravação digital de 12:05:42 a 12:26:23, ficheiro de origem 20230511120541_4242728_2870884, com particular destaque para (supra transcrito): 00:04:56; 00:11:52 a 00:12:26; 00:18:58 a 00:19:32.
c) Email de 06-07-2021, constante da pág. 13 do documento 1 junto pelos AA. com o Requerimento de 16-05-2023; ref.ª 11295687.
d) Depoimento da testemunha (…), acta de 26-06-2023, ref.ª 128853941, gravação digital de 09:44:54 a 10:15:05, ficheiro de origem 20230626094447_4242728_2870884, com particular destaque para (supra transcrito): 00:02:16 a 00:03:14; 00:11:08 a 00:12:19; 00:13:03 a 00:13:53.
e) Depoimento da testemunha (…), acta de 26-06-2023, ref.ª 128853941, gravação digital de 10:15:49 a 11:36:07, ficheiro de origem 20230626101548_4242728_2870884, com particular destaque para (supra transcrito): 00:31:55; 00:41:52 a 00:44:00; 00:50:01 a 00:52:28.
f) Doc. 1, pág. 14, junto pelos AA com o Requerimento de 19-05-2023, ref.ª 11295687;
g) Pág. 55 do Documento ref.ª 128862063, junto pelos AA na sessão de julgamento de 26JUN2023, acta ref.ª 128853941.
h) Depoimento da testemunha Dra. (…), notária, acta de 26-06-2023, ref.ª 128853941, gravação digital de 11:43:00 a 12:36:45, ficheiro de origem 20230626114259_4242728_2870884 com particular destaque para: 00:06:55 a 00:09:57; 00:23:08 a 00:26:57; 00:28:45 a 00:30:36.
11.ª Deveria, por outro lado, ter sido dado como não provado os factos que o Tribunal a quo deu como provados nos pontos 26, 38, 43, 46 e 47.
12.ª A questão suscitada pelo Tribunal a quo sobre a alegada actuação de (…) como procurador das RR/Apelantes não tem suporte nos factos provados.
13.ª Não é o facto de o referido senhor ser filho de uma das RR, e sobrinho das demais, que faz dele procurador nem sequer gestor de negócios, sendo que o CPCV não prevê a possibilidade de actuação de (…) como procurador daquelas.
14.ª A única circunstância que o Tribunal pode lograr alcançar é a R. (…) passou procuração a (…) apenas e tão-só os concretos poderes para que este outorgasse a escritura pública do imóvel identificado no CPCV – vide teor da última página do doc. junto pelas RR/Apelantes com o Requerimento de 22-05-2023 (ref.ª Citius 11316618).

B) – Erro na aplicação das normas dos artigos 268.º, 405.º, 406.º, 437.º, 777.º, 779.º, 805.º, 808.º e 814.º do Código Civil
15.ª A Sentença recorrida peca por errada aplicação das normas dos artigos 268.º, 405.º, 406.º, 437.º, 777.º, 779.º, 805.º, 808.º e 814.º, todos do Código Civil.
16.ª A escritura pública não se realizou por exclusiva responsabilidade dos AA/Apelados que i)não respeitaram o CPCV que outorgaram,(ii) não interpelaram as RR/Apelantes para que suprirem qualquer deficiência no prazo de 10 dias, (iii) quiseram motu próprio e à revelia do estipulado no CPCV condicionar o CPCV ao crédito bancário que, entretanto, quiserem obter (facto inoponível às RR), (iv) não marcaram a escritura no prazo de 90 dias, delegando essa responsabilidade contratual no banco que contrataram, (v) não informaram as RR/Apelantes com 3 dias de antecedência sobre qualquer data para realização para escritura pública.
17.ª Sendo certo que, ficou provado que a escritura podia ter sido feita no cartório notarial da Dra. (…), em (…) ou também no Casa Pronta, por exemplo.
18.ª O CPCV fixou que os AA teriam de interpelar as RR caso verificassem alguma omissão das condições de venda (cláusula 10.ª, n.º 2, do CPCV), o que não sucedeu.
19.ª Assim, nos termos dos artigos 777.º, 779.º e 805.º do CC, as RR não se constituíram em mora.

C) – Erro na aplicação do artigo 442.º, n.º 4, do Código Civil.
20.ª A Sentença recorrida viola o artigo 442.º, n.º 4, do CC: não há lugar a qualquer indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais a atribuir aos AA/Apelados.
21.ª O CPCV dos autos não se encontra condicionado a qualquer mútuo bancário que os AA/Apelados tivessem de obter, pelo que, a relação dos AA com qualquer entidade bancária é negócio jurídico totalmente alheio e inoponível às RR/Apelantes.
22.ª Quaisquer custos que resultem dessa relação entre os AA/Apelados com terceiros (no caso, o Banco no qual pretenderam contrair crédito bancário, como os do aconselhamento jurídico com advogada) não podem ser assacados às RR/Apelantes.
23.ª Sendo que o CPCV celebrado estipulou sinal (cláusula 3ª do CPCV) e não prevê quaisquer outras indemnizações (cláusula 9ª do CPCV apenas consigna a restituição do sinal em dobro ou a perda do sinal em caso de incumprimento das RR ou dos AA, respectivamente).

D) – Erro na aplicação dos artigos 527.º e 583.º CPC no respeitante às custas subjacentes à Reconvenção.
24.ª O Tribunal a quo sentenciou, no final, que “tendo o Tribunal indeferido totalmente o pedido reconvencional formulado pelos Réus, devem estes ser condenados no pagamento das custas da acção reconvencional”.
25.ª Mas as aqui RR/Apelantes não formularam qualquer reconvenção.
26.ª Fica patente a violação do disposto nos artigos 527.º e 583.º do CPC.
Pelo exposto e com a junção dos presentes aos autos,
Pede e aguarda deferimento de Vossa Exa., Venerando Desembargador.”
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Os Apelados (Autores na acção), responderam à motivação de recurso dos Réus-Apelantes alinhando as seguintes Conclusões:
“IV – Conclusões:
1. A douta e irrepreensível sentença proferida, não merece qualquer reparo ou censura, tendo o tribunal a quo feito uma correta aplicação do direito à factologia assente.
2. Para efeitos das presentes conclusões e respetiva concretização, dão-se por reproduzidos todos os depoimentos supracitados.
3. A posição de todas as Recorrentes, firmada nas alegações de recurso apresentadas, é um desacordo quanto à valoração da prova produzida e, consequentemente, à solução jurídica apresentada pelo Tribunal a quo.
– Do recurso das Rés (…) e (…)
4. A garantia do duplo grau de jurisdição da matéria de facto não subverte o princípio da livre apreciação da prova, na medida em que o juiz aprecia livremente as provas, decidindo segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto, que está deferido ao tribunal da 1ª instância, pois que a valoração de um depoimento é algo absolutamente impercetível na gravação/transcrição.
5. A decisão do julgador, devidamente fundamentada, se for uma das soluções plausíveis, segundo as regras da experiência, ela será inatacável, visto ser proferida em obediência à lei que impõe o julgamento segundo a livre convicção.
6. Conforme orientação jurisprudencial prevalecente o controle da Relação sobre a convicção alcançada pelo tribunal da 1ª instância deve restringir-se aos casos de flagrante desconformidade entre os elementos de prova e a decisão.
7. Vide, a título de exemplo, o defendido no douto Acórdão da Relação de Coimbra de 10/7/2018, proc.º n.º 1445/16.0T8FIG.C1, relatado por Luiz José Falcão de Magalhães, onde se refere citando o Acórdão da mesma Relação de 04/04/2017, processo n.º 516/12.6TBPCV.C1), relatado por Jorge Arcanjo: «… o controle da Relação sobre a convicção alcançada pelo tribunal da 1ª instância, embora exija uma avaliação da prova (e não apenas uma mera sindicância do raciocínio lógico) deve, no entanto, restringir-se aos casos de flagrante desconformidade entre os elementos de prova e a decisão, sendo certo que a prova testemunhal ou por depoimento de parte é, notoriamente, mais falível do que qualquer outra, e, na avaliação da respectiva credibilidade, tem que reconhecer que o tribunal a quo, está em melhor posição.
Por isso, se entende não bastar qualquer divergência de apreciação e valoração da prova, impondo-se a ocorrência de erro de julgamento (cfr., por ex., o Ac. do STJ de 15/9/2010 (proc. n.º 241/05), de 1/7/2014 (proc. n.º 1825/09), em www.dgsi.pt, tanto mais que o nosso sistema é predominantemente de reponderação (…)».
8. Assim, para que a decisão da 1ª instância seja alterada haverá que averiguar se algo de “anormal” se passou na formação dessa apontada “convicção”, ou seja, ter-se-á que demonstrar que na formação da convicção do julgador de 1ª instância, retratada nas respostas que se deram aos factos, foram violadas regras que lhe deviam ter estado subjacentes, nomeadamente face às regras da experiência, da ciência e da lógica, da sua conformidade com os meios probatórios produzidos, ou com outros factos que deu como assentes.
9. As Recorrentes alegam que o tribunal a quo deveria ter considerado como provados os pontos 17 a 31, 37, 39, 46 a 48 da contestação da Recorrentes (…) e (…).
10. Os factos constantes nos referidos pontos alegados pelas Recorrentes (conclusão 19ª), mais concretamente nos pontos 17 a 21, 23 e 28, já constam da matéria de facto julgada provada pelo Tribunal a quo (pontos 1, 8 e 10 da matéria julgada provada), pelo que não existe necessidade de quaisquer outras considerações sobre os mesmos.
11. Os factos constantes dos pontos 22, 24, 27, 29, 30 e 31 da matéria que as Recorrentes entendem que deve ser julgada provada, mais não são do que conclusões pontuais retiradas da simples leitura das cláusulas do contrato, que não têm em consideração toda a matéria de facto julgada provada (designadamente os factos provados n.ºs 15 a 34), a qual afasta por completo o sentido pretendido pelas Recorrentes, como douta e irrepreensivelmente consta na Sentença proferida.
12. A prova tem de ser analisada em conjunto, contrariamente ao que as Recorrentes fazem nas suas alegações.
13. Por essa razão, não se vislumbra qualquer interesse para a causa que os referidos pontos alegados pelas Recorrentes sejam julgados como provados.
14. Quanto ao ponto 25 da matéria que as Recorrentes entendem que deve ser julgada provada, não resulta qualquer prova, seja ela documental, seja ela testemunhal, da alegada urgência da outorga da escritura pública. Não se vislumbrando qual o sentido querido pelas Recorrentes quanto a esse alegado facto, o qual não tem qualquer interesse para os presentes autos.
15. Quanto ao ponto 37 da matéria que as Recorrentes entendem que deve ser julgada provada, carecem as mesmas de razão, porquanto o sinal foi pago, não existindo qualquer incumprimento na obrigação da sua constituição, como é confirmado através das declarações de parte dos Autores, do Depoimento de Parte da Ré (…) e do depoimento da testemunha (…), e do conteúdo dos documentos juntos aos autos com as referências 128862063 e 128862078.
16. Quanto ao ponto 39 da matéria que as Recorrentes entendem que deve ser julgada provada, carecem as mesmas de razão, porquanto os Autores nunca receberam as chaves no imóvel, nem nunca nele efetuaram quaisquer obras, não existindo qualquer prova desses factos, como doutamente conclui o aresto.
17. Quanto ao ponto 46 da matéria que as Recorrentes entendem que deve ser julgada provada, carecem igualmente as mesmas de razão, uma vez que o registo de aquisição a favor das Rés estava provisório por dúvidas, tudo conforme ficou julgado provado nos pontos 2 e 3 da matéria julgada provada na sentença.
18. É a própria Conservatória do Registo Predial, entidade pública responsável pela realização dos registos de aquisição de imóveis, que declara expressa e oficialmente, através de despacho da Digna Conservadora, que o registo efetuado contém irregularidades.
19. Quanto ao ponto 48 da matéria que as Recorrentes entendem que deve ser julgada provada, não existe prova que permita retirar tal conclusão, pois tendo o contrato promessa sido outorgado em fevereiro de 2021 (facto provado 1), em junho de 2021 o Cartório Notarial de (…), tomou conhecimento da existência de um testamento público realizado em Espanha (facto provado 15), o qual altera por completo a situação jurídica do imóvel objeto do referido contrato promessa.
20. A Recorrente não fundamenta nas suas alegações quais os concretos meios de prova que deverá o Tribunal ad quem atender para que deve ser considerado como não provados os factos constantes dos pontos 26, 38, 43, 46 e 47 da matéria de facto julgada provada pelo Tribunal.
21. Está amplamente demonstrado na prova produzida e na fundamentação da Sentença as razões para que os pontos 26, 38, 43, 46 e 47 tenham sido julgados como provados.
22. Não merece qualquer repreensão a sentença proferida no que à matéria julgada provada e não provada, mantendo-se a mesma inalterável.
23. O Tribunal a quo fundamenta, e bem, a sua decisão de considerar (…) procurador das Recorrentes (facto provado 21), com base em email enviado pelo próprio em 14/06/2021 (documentos juntos aos autos com as referências 128862063 e 128862078).
24. O Tribunal a quo nunca remeteu a sua convicção para o contrato promessa outorgado, conforme erroneamente alegam as Recorrentes.
25. Neste concreto ponto, não merece igualmente qualquer censura a sentença proferida no que à fundamentação diz respeito, devendo a mesma manter-se na íntegra, devendo improceder os pontos 21 a 29 das conclusões de recurso.
26. Não obstante os prazos terem sido ultrapassados, a mora na marcação da escritura pública de compra e venda é imputável às Rés.
27. As Recorrentes, apesar de terem tido conhecimento das necessidade de realizar certas diligências, a saber: 1) rectificação da caderneta predial no que respeita às quotas partes respeitantes a cada uma das herdeiras de (…) e (…), em consonância com o disposto em testamento deixado por esta; 2) actualização no registo predial e na caderneta predial das áreas do imóvel e menção da existência de um pátio; 3) solicitação à Câmara Municipal de uma certidão que comprove que, com a construção do pátio, não foi necessário emitir uma licença de utilização; até à presente data, nada fizeram, por si ou por alguém que as representasse, não diligenciando pela sua obtenção.
28. A existência de mora na marcação da escritura pública de compra e venda, não é imputável aos Recorridos, mas sim às Recorrentes, que sabendo das exigências documentais apresentadas pelo (…) Banco e pelo Cartório Notarial de (…), onde seria marcada a dita escritura pública (por decisão dos Autores, conforme contratualmente previsto), nada diligenciaram até à presente data para a sua obtenção.
29. A Douta Sentença referiu que “Nota-se que a mora (ou situação equiparável) pode derivar do incumprimento de obrigações secundárias ou mesmo deveres acessórios, pois a sua violação é ainda uma violação do contrato (cfr. artigo 798.º do Código Civil), correspondendo a um cumprimento parcial (ou defeituoso). Violação do contrato que, no caso, equivale à obtenção da documentação exigida pelo Cartório Notarial de (…) – mormente a rectificação da partilha no que respeita às quotas partes respeitantes a cada uma das herdeiras de (…) e (…) – que se mostrava condicionante da realização da prestação principal: sem aquela documentação não podia ser realizada a prometida compra e venda.”
30. Incorreram, pois, as Rés, aqui Recorrentes em mora (ainda que derivada de uma obrigação secundária), nos termos do citado artigo 805.º, n.º 2, alínea a), do Código Civil.
31. Não existindo qualquer erro na Douta Sentença recorrida, a qual fez uma correta apreciação das disposições legais aplicáveis.
- Do recurso da Ré (…)
32. Dá-se aqui por integralmente reproduzido tudo quanto ficou alegado supra no que ao princípio da livre apreciação da prova diz respeito, o que se faz ao abrigo do princípio da economia processual.
33. A Recorrente alega que o tribunal a quo deveria ter considerado como provados os factos constantes nas alíneas a) a e) da conclusão 1, embora sem fundamento.
34. A Recorrente (…) alega que existem diversos factos constantes na alínea a) que já constam da matéria de facto julgada provada pelo Tribunal a quo (facto provado 1), na qual se refere “cujo conteúdo se dá integralmente por reproduzido”, pelo que não existe necessidade de quaisquer outras considerações sobre os mesmos.
35. Os factos constantes nas alíneas b) a e) da matéria que a Recorrente entende que deve ser julgada provada, mais não são do que conclusões pontuais, umas retiradas da simples leitura das cláusulas do contrato, outras que, salvo o devido respeito, não têm qualquer suporte documental, ou testemunhal, sendo que umas e outras não têm em consideração toda a matéria de facto julgada provada (designadamente os factos provados n.ºs 15 a 34), e que afasta por completo o sentido pretendido pelas Recorrentes, como douta e irrepreensivelmente consta na Sentença proferida, e melhor se explicitou supra, dando-se aqui por integralmente reproduzido a alegação efetuada.
36. A Recorrente alega que o tribunal a quo deveria ter considerado como não provados os factos constantes dos pontos 36 e 43 da matéria de facto julgada provada pelo Tribunal.
37. Quanto ao ponto 36, em contradição com o alegado, e conforme resulta da Douta Sentença, resulta da prova produzida, mais concretamente das declarações da Recorrente (…) e do depoimento da testemunha (…), notária a exercer funções no Cartório Notarial de (…).
38. Quanto ao ponto 43, basta atentar às declarações dos Autores, e aos documentos juntos aos autos com a ref.ª 128862078, para se concluir que a Recorrente carece de razão.
39. Fica demonstrado que os pontos 36 e 43 foram corretamente julgados provados pela douta Sentença.
40. Uma vez mais, e por razões de economia processual, dá-se aqui por integralmente reproduzido tudo quanto ficou alegado no capítulo respeitante às Recorrentes (…) e (…).
41. As Recorrentes nunca, nenhuma delas, quer pessoalmente, quer através de terceira pessoa, alguma vez impugnaram a existência dos alegados empréstimos bancários ou interpelaram os Autores para o cumprimento do vertido na cláusula quarta do contrato promessa, ou seja, para a marcação imediata da escritura pública de compra e venda, dentro ou fora dos 90 dias estipulados, sob pena de incumprimento definitivo.
42. A verdade é que, não obstante os prazos terem sido ultrapassados, e conforme referido a mora na marcação da escritura pública de compra e venda é imputável às Rés.
43. Esta mora pressupõe, nos termos do artigo 804.º, n.º 2, do Código Civil, que o atraso seja imputável às Recorrentes, o que se mostra objetivamente patente, já que lhes incumbia realizar diretamente a prestação em causa, rectius a correção da documentação.
44. De outra banda, e de um ponto de vista subjetivo, sempre valeria no caso a presunção de culpa das Rés assente no artigo 799.º, n.º 1, do Código Civil.
45. Não existindo qualquer erro na Douta Sentença recorrida, a qual fez uma correta apreciação das disposições legais aplicáveis, devendo a mesma manter-se inalterada.
46. Deve ainda entender-se que o julgador se pronunciou cabalmente sobre todas as questões que exigiam a sua pronúncia, nomeadamente sobre os factos que originaram a mora das Recorrentes, enquanto promitentes vendedoras – veja-se o já exposto supra a esse propósito.
47. A sentença em recurso cumpre integralmente toda a legislação substantiva e processual aplicável, não se encontrando violados quaisquer dos normativos invocados pelos Recorrentes.
48. Por tudo o exposto – leia-se, suficiência da factualidade dada como provada, irrepreensível valorização da prova produzida, inexistência de vícios que enfermem a sentença e cumprimento de toda a legislação em vigor – carecem de todo e qualquer fundamento as alegações dos Recorrentes.
Nestes termos, e nos melhores de Direito, deve o presente recurso ser julgado totalmente improcedente.
Assim será cumprido o Direito e feita JUSTIÇA!”
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Não foi apresentada resposta à peça processual de aperfeiçoamento das conclusões das co-Rés (…) e (…).
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Ambos os recursos foram admitidos na 1ª Instância como apelação, a subir de imediato nos próprios autos e com efeito devolutivo, nada havendo a corrigir a esse propósito.
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Colhidos os Vistos legais cumpre, então, decidir.
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II – OBJECTO DO RECURSO
Nos termos do disposto no artigo 635.º, n.º 4, conjugado com o artigo 639.º, n.º 1, ambos do Código de Processo Civil (doravante apenas CPC), o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões do recurso, salvo no que respeita à indagação, interpretação e aplicação das normas jurídicas ao caso concreto e quando se trate de matérias de conhecimento oficioso que, no âmbito de recurso interposto pela parte vencida, possam ser decididas com base em elementos constantes do processo, pelo que as questões a apreciar e decidir traduzem-se no seguinte:
A - Quanto ao recurso independente interposto pelas co-Rés (…) e (…):
1- Impugnação da decisão relativa à matéria de facto;
2- Reapreciação de mérito, dependendo do resultado da impugnação relativa à matéria de facto.
B - Quanto ao recurso independente interposto pelos Co-Réus (…) e (…):
1- Impugnação da decisão relativa à matéria de facto.
2- Reapreciação de mérito, dependendo do resultado da impugnação relativa à matéria de facto.
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III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
Decorre da sentença recorrida a seguinte matéria de facto:
A) Factos provados:
1. Por escrito particular datado de 5 de Fevereiro de 2021, denominado “Contrato-Promessa de Compra e Venda”, junto com a ref.ª 9588907, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido, os Autores prometeram comprar e as Rés prometeram vender, livre de ónus e encargos, pelo preço de € 83.000,00 (oitenta e três mil euros), o prédio urbano em propriedade total, sito em (…), freguesia e concelho de (…), inscrito na respetiva matriz sob o artº (…), da mesma freguesia, descrito na Conservatória do Registo Predial de (…) sob o n.º (…).
2. Pela Ap. (…), de (…), foi registada, provisória por dúvidas, a aquisição por partilha de herança de (…) e (…), a favor das Rés (…), (…) e (…), na proporção de 1/3 cada, do imóvel descrito em 1.
3. Segundo Declaração emitida pelo Conservador do Registo Predial de (…), datada de 28.06.2012, o título submetido a registo pelas Rés, na Ap. (…), de (…), ou seja, a escritura de partilha lavrada em 30.03.2009, exarada a fls. 72 e seguintes do Livro 2-A, do Cartório Notarial de (…), a cargo da Notária (…), foi objecto de rectificação por escritura de 20.04.2009, do mesmo Cartório, no sentido de passar a constar que o património partilhado pertencia ao casal dos pais das Rés, e que tendo em consideração que os falecidos dispuseram das respectivas quotas disponíveis, tal como se refere nas respectivas habilitações, não se mostram rectificadas as contas da partilha, com as inerentes consequências jurídicas e fiscais, razão pela qual o registo foi lavrado como provisório por dúvidas nos termos dos artigos 68.º, 70.º e 72.º, Código do Registo Predial.
4. O negócio de compra e venda do imóvel objecto do contrato-promessa de compra e venda referido em 1) foi intermediado pela mediadora imobiliária “Century 21 – (…) Mediação Imobiliária, SA”, com quem as Rés celebraram o contrato de mediação imobiliária n.º (…), no dia 08.02.2021, junto aos autos com a ref.ª 128862078, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido.
5. Consta da cláusula 2.ª, n.º 3, do contrato referido em 1 que “os segundos contraentes [Autores] expressamente manifestam e declaram que previamente à celebração do presente contrato: a) Procederam à vistoria do imóvel objecto do presente contrato; b) Analisaram a documentação a ele relativa; c) Têm conhecimento integral do seu estado físico e das respectivas áreas, confrontações e condições jurídicas actuais (de trato administrativo, matriciais e registais)”.
6. De acordo com a cláusula terceira n.º 1, alínea a) do contrato referido em 1, os Autores obrigaram-se a pagar às Rés a quantia de € 15.000,00 (quinze mil euros), a título de sinal e princípio de pagamento, na data da assinatura do referido contrato, por meio de transferência bancária para conta bancária a designar por aquelas, tendo as Rés declarado ter recebido naquela data tal quantia e dela ter dado quitação.
7. Os Autores apenas procederam ao pagamento da quantia de € 15.000,00 referida em 6 no dia 23.04.2021, por meio de transferência bancária para conta bancária titulada pela empresa Century 21 – (…) Mediação Imobiliária, SA, que posteriormente a fazer sua a quantia relativa à comissão contratada com as Rés no contrato de mediação imobiliária, entregou, em 20.05.2021, a cada uma delas a quantia de € 2.950,00 (dois mil e novecentos e cinquenta euros).
8. As partes acordaram, na cláusula quarta do contrato referido em 1 que a escritura pública relativa à compra e venda, ou o documento particular autenticado equiparado, seria outorgada no prazo de 90 dias, a contar da data da assinatura do contrato promessa, em dia, hora e local a fixar pelos Autores, mediante acordo com as Rés, comprometendo-se aqueles a informar estas acerca da data, hora e local com uma antecedência mínima de 3 dias em relação à sua realização.
9. Acordaram, também, na cláusula sétima do contrato referido em 1 que “As partes expressamente declaram que, na presente data, não se opera a tradição do Imóvel, situação que apenas ocorrerá com a outorga da escritura pública de compra e venda do Imóvel e o pagamento integral do preço”.
10. As partes acordaram, na cláusula nona do contrato referido em 1, o seguinte: “1. Caso o título definitivo de compra e venda, não seja celebrado até ao termo do prazo previsto no numero um da cláusula quarta do presente contrato promessa de compra e venda, por causa imputável a qualquer das partes, poderá, desde logo, a parte não faltosa invocar o seu incumprimento definitivo, aceitando, os outorgantes o mero decurso desse lapso de tempo como necessário e suficiente para extrair tal consequência. 2. O incumprimento definitivo por parte dos primeiros contraentes confere aos segundos contraentes, o direito de resolver o presente contrato-promessa de compra e venda e de exigir daquele a restituição em dobro de todas as importâncias entregues a titulo de sinal. 3. Se o incumprimento definitivo do presente contrato, for por causa imputável aos segundos contraentes, os primeiros contratantes farão suas as quantias até aí recebidas, não podendo os segundos contratantes, no entanto, exigir qualquer indemnização pelas obras eventualmente efectuadas no imóvel”.
11. Acordaram, ainda, as partes na cláusula 10.ª, n.º 2, do contrato referido em 1 que “a não verificação ou omissão de qualquer condição de venda ou garantia acima acordadas por parte dos primeiros contraentes na data da outorga do contrato prometido obriga estes a, num prazo de 10 dias a contar da interpelação dos segundos contraentes para tal, a repor a situação objecto da queixa sob pena de se considerar em incumprimento”.
12. Para pagamento de parte do preço acordado e referido em 1 – no qual se incluía a quantia a título de sinal aludida em 6 –, bem como para financiar a realização de obras no imóvel, os Autores solicitaram, em data não concretamente apurada mas seguramente anterior a 19.03.2021, dois empréstimos bancários, um crédito à habitação, no valor de € 68.000,00 (sessenta e oito mil euros) e um crédito para obras, no valor de € 10.500,00 (dez mil e quinhentos euros), junto do (…) Banco.
13. Tendo os mesmos sido definitivamente aprovados em 18.05.2021 e cobradas as respectivas despesas de comissão e imposto de selo.
14. Desses empréstimos foi fiadora a Ré (…).
15. Em junho de 2021, o Cartório Notarial de (…) – entidade escolhida pelo (…) Banco para a realização da escritura pública de compra e venda prometida – tomou conhecimento, pela consulta da escritura pública de habilitação de herdeiros da falecida (…) datada de 30.03.2009, da existência de um testamento público, realizado por esta no estrangeiro, em (…), província de (…), Espanha, no dia 17.09.1999, no Cartório Notarial a cargo da Notária (…).
16. Nesse referido testamento, a falecida (…) dispôs de um legado e instituiu herdeira da quota disponível de todos os seus bens a sua filha, aqui Ré, (…).
17. (…), do Departamento de Crédito a Particulares – Crédito Habitação, do (…) Banco, remeteu a (…), da Direcção Regional do Algarve, em 07.06.2021, um email, tendo por assunto «(…)» e o seguinte conteúdo: “Boa tarde. Adicionalmente ao anteriormente indicado: Regime de casamento dos fiadores; (…) – será obrigatório o assento de casamento e respectivo código de acesso, caso não pretendam remeter o documento em falta devem os clientes dirigirem-se à conservatória para efectuarem a devida actualização; Verificamos ainda que após a analise da documentação enviada e tendo em conta que a autora da herança deixou testamento elaborado no estrangeiro terá que ser feito o registo prévio da Habilitação de Herdeiros. Verificamos que: - deverão remeter assentos de nascimento das herdeiras (…) e (…) e será ainda necessário o assento de casamento da herdeira (…) com (…). – a quota parte das herdeiras na Caderneta Predial Urbana não se encontra em conformidade, pelo que se solicita rectificação. – O imóvel tem de ser actualizado na Certidão de Registo Predial e matriz, e a certidão para dispensa de Licença de Utilização deixar de constar tal menção, sob pena de não ser possível registar definitivamente a aquisição e hipoteca, porque tem sido entendimento corrente das conservatórias que ter ou não área descoberta altera a identidade do prédio. Por último solicitamos que nos informem se existe algum grau de parentesco entre a compradora e os vendedores.
18. Este email foi reenviado para a empresa Century 21 – (…) Mediação Imobiliária, SA, na pessoa de (…) em data não concretamente apurada mas entre 07.06.2021 e 14.06.2021.
19. Em 14.06.2021, (…) reenvia o email referido em 17 a (…), com o conhecimento de (…), gestores do processo venda, com a seguinte informação: “Bom dia (…). Volto a solicitar estes documentos por parte do banco…é importante, sem isto não há escritura”.
20. O email referido em 17 foi reenviado pela empresa Century 21 – (…) Mediação Imobiliária, SA, na pessoa de (…), a (…), em 14.06.2021, filho da Ré (…) e sobrinho das restantes Rés.
21. (…) enviou, no dia 14.06.2021, um email à empresa Century 21 – (…) Mediação Imobiliária, S.A., com o seguinte teor: “Exmos. Senhores, boa noite. Em primeiro lugar gostaria de me apresentar. Chamo-me (…), filho de uma das proprietárias (…) e com procuração de outra das proprietárias (…). Agradeço que reencaminhem este email para o banco ou para a notária que está a tratar do processo, uma vez que ainda não percebi quem está por trás de toda esta incompetência. Gostaria de dizer que achamos lamentável a forma como o banco/notário está a tratar do processo. Revela uma incompetência nunca vista, e que terá consequências uma vez que apresentaremos queixa ao gerente do banco ou à Ordem dos Notários, conforme as explicações que nos forem dadas ao presente email. Os senhores têm de apresentar habilitação de herdeiros e comprovativo de pagamento de imposto de selo, que também remetemos. Hoje recebo comunicação da Century 21 a informar-me que o banco tinha solicitado novos documentos…Esta situação revela uma falta de profissionalismo do banco ou do notário, que é inaceitável. Então mas que análise do dossier foi feita? Levam 3 meses pedindo novos documentos, a espaços? E o profissionalismo? Alguém terá de responder pelas consequências de uma situação destas! O contrato promessa de compra e venda tem prazos! E se forem ultrapassados, de quem é a responsabilidade? Não têm noção da dificuldade de funcionamento dos serviços públicos? (…)”.
22. A este email, respondeu a empresa Century 21 – (…) Mediação Imobiliária, SA, na pessoa de (…), em 15.06.2021, da seguinte forma: “Bom dia (…). Como pode ver no email que deve ter recebido há minutos, já demos seguimento ao seu email para o banco. Temos feito tudo o que está ao nosso alcance e solicitado os documentos no tempo em que nos são solicitados a nós, mas também notamos uma descoordenação entre os proprietários levando isso a um delay entre o pedido e o momento em que a documentação chega até nós. Nós não temos a documentação há mais de três meses como referiu no email. Há três meses temos a documentação do imóvel e documentos de identificação das partes. Vendedoras, não tínhamos habilitação de herdeiros e muito menos procuração que esperamos há semanas, que teria que ser previamente validade nos moldes do banco em causa. Operamos nos ramos imobiliário há anos e o nosso foco e objectivo sempre foi satisfazer os nossos clientes. Portanto, agradeço a vossa colaboração para terminarmos este processo. Estamos quase no fim do processo!”.
23. Por email datado de 17.6.2021, foi a empresa Century 21 – (…) Mediação Imobiliária, SA, na pessoa de (…), uma das gestoras do processo de venda, informada por (…), notária do Cartório Notarial de (…), da necessidade das Rés procederem às seguintes diligências:
a documentação há mais de três meses. Depois de analisarem solicitaram alguns documentos que remetemos com brevidade. Posteriormente voltaram a pedir documentos que voltamos a remeter. Por fim disseram-nos que teríamos de
- rectificação da caderneta predial no que respeita às quotas partes respeitantes a cada uma das herdeiras de (…) e (…), em consonância com o disposto em testamento deixado por esta;
- actualização no registo predial e na caderneta predial das áreas do imóvel e menção da existência de um pátio;
- solicitação à Câmara Municipal de uma certidão que comprove que, com a construção do pátio, não foi necessário emitir uma licença de utilização.
24. Por email datado de 17.06.2021, a empresa Century 21 – (…) Mediação Imobiliária, SA, na pessoa de (…), comunicou a (…) a informação que recebeu do Cartório Notarial de (…) aludida em 23, da seguinte forma: “Boa tarde (…). Solicito a sua maior atenção para o email abaixo. O que lhe foi solicitado por email e por telefone, por parte do banco, consta no mesmo pedido por parte do Cartório Notarial de (…). É uma questão que nós não conseguimos ultrapassar e só depende única e exclusivamente das proprietárias. Pedimos mais uma vez, a vossa colaboração para ultrapassar esta questão e façamos finalmente a escritura.”
25. A mesma informação foi transmitida pela Autora (…) e pelo gerente da agência do (…) Banco de Vila Real de Santo António à Ré (…), em data não concretamente apurada.
26. Até à presente data, nenhuma das Rés ou alguém por si mandatado, procedeu às diligencias referidas em 23).
27. A empresa Century 21 – (…) Mediação Imobiliária, SA, na pessoa de (…), remeteu a (…), Notária no Cartório Notarial em (…), sito na (…), um email, datado de 18.06.2021, com o seguinte teor: “Bom dia. A pedido do procurador de uma das proprietárias deste processo, o (…), e após ter tido uma conversa consigo, segue toda a documentação para que possam analisar a possibilidade de se realizar a escritura deste imóvel. Aguardo resposta da vossa parte”. 28. A este email, respondeu (…), em 22.06.2021, a (…) da seguinte forma: “Boa tarde. Relativamente à escritura mencionada em epígrafe, após analisar a documentação, venho informar que a mesma está em condições de se fazer, apenas sendo necessário: - a habilitação de herdeiros de (…); - o cancelamento do registo provisório correspondente à Ap. (…), de (…), o que será simples que eu mesma posso fazer, atento que o mesmo já se encontra caducado”.
29. A empresa Century 21 – (…) Mediação Imobiliária, SA, na pessoa de (…), remeteu à notária (…) novo email em 29.6.2021, com o seguinte teor: “Bom dia Dra. (…). Reenvio o documento solicitado, penso que o tenha, mas para que fique registado. Agradeço que me confirme, se sempre está disponível para realizar a escritura, após confirmação de todos os documentos já enviados, para que possa informar o banco da cliente compradora, e solicitar ao mesmo que aceite esta situação, tendo em conta tudo o que já aconteceu”.
30. A este email respondeu a Notária (…) por email datado de 30.06.2021, da seguinte forma: “Boa tarde, (…). Apesar de essa escritura de habilitação ter sido feita por mim, foi-o quando estive em funções no Cartório em (…), cujo arquivo lá ficou. Portanto, não tenho acesso a ele. A certidão que me envia, agora completa com o testamento, é o documento que faltava para a outorga da escritura. Fico a aguardar a marcação por parte do banco, uma vez que este terá que articular com o respectivo procurador.”
31. A empresa Century 21 – (…) Mediação Imobiliária, SA, na pessoa de (…) remeteu à notária (…), em 30.06.2021, novo email com o seguinte teor: “Boa tarde. Vou informar o banco da sua posição, e solicitar autorização para que seja feita a escritura convosco”.
32. O (…) Banco, na pessoa do gerente da agência de Vila Real de Santo António, (…), enviou em 06.07.2021, um email à empresa Century 21 – (…) Mediação Imobiliária, SA, na pessoa de (…), com o seguinte conteúdo: “Bom dia D. (…). Estou agora a responder porque só há pouco obtive a resposta da parte do Banco quanto a passagem do processo para Notário. Assim, o Banco não autoriza a realização da escritura em notário. No limite poder-se-ia tentar junto da Casa Pronta mas infelizmente julgo que ainda não estão a fazer escrituras. Julgo que o caminho será regularizar as duas situações e assim conseguiríamos resolver o problema. Desde já agradeço a V. atenção e colaboração”.
33. As Rés outorgaram, no dia 30.03.2009, uma escritura pública de partilha da herança aberta por óbito de (…), da qual faz parte, entre outros, o imóvel descrito em 1, nos termos da qual lhes foi adjudicado um terço indiviso do mesmo prédio.
34. A escritura pública de partilha referida em 33 foi objecto de rectificação pela escritura pública outorgada pelas Rés em 20.04.2009, na qual fizeram constar que procediam à partilha da herança ilíquida e indivisa aberta por óbito do dissolvido casal de seus pais, (…) e (…), e que o primeiro fez testamento público pelo qual instituiu herdeira da quota disponível de seus bens a sua referida mulher, (…).
35. Pela Autora (…) foi solicitada no Cartório Notarial de (…), sito na Urbanização (…), a preparação e marcação de escritura pública de rectificação de partilha, doação e compra e venda, com mútuo e hipoteca, tendo como finalidade proceder à rectificação da caderneta predial do imóvel descrito em 1 no que respeita às quotas partes respeitantes a cada uma das herdeiras de (…) e (…) e posterior compra e venda do mesmo.
36. A escritura pública referida em 35 foi marcada pelo Cartório Notarial de (…) para o dia 18.08.2021, tendo comparecido para outorga da mesma a Autora (…) e a Ré (…).
37. A Ré (…) recusou-se a outorgar a escritura pública referida em 35 por discordar dos seus termos, no que diz respeito à rectificação da partilha anteriormente efectuada entre as Rés e aludida em 33.
38. Por declaração passada pela Notária (…), do Cartório Notarial de (…), em 6.10.2021, foi por esta atestado que a escritura pública referida em 35 não foi celebrada por falta de acordo dos interessados nos termos da partilha.
39. Os Autores remeteram a cada uma das Rés, uma carta registada com aviso de recepção, juntas como doc. n.º 8 com a petição inicial, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, datadas de 01.10.2021, com o seguinte assunto: “Resolução contrato promessa de compra e venda celebrado entre (…) / (…) / (…) e (…) / (…)”, da qual se retira, entre o mais, o seguinte teor: “(…) Apesar de ter ficado agendada a celebração da escritura publica de compra e venda no prazo de 90 dias, sucede que a mesma não foi outorgada, até ao presente, por facto imputável aos promitentes vendedores. Pois que, nos termos da cláusula oitava do referido contrato, os promitentes vendedores estavam obrigados a entregar toda a documentação necessária para a realização da escritura, o que não sucedeu, uma vez que existem desconformidades nas informações constantes na certidão permanente do Registo Predial e na caderneta predial das finanças. Assim, e nos termos do disposto no n.º 1, da cláusula nona do contrato promessa de compra e venda, dúvidas não restam de que estamos perante um incumprimento definitivo do contrato por factos imputáveis aos promitentes vendedores. Nestes termos, os promitentes compradores resolvem o contrato promessa de compra e venda celebrado com (…), (…) e (…), no dia 5 de fevereiro de 2021, e exigem o pagamento do montante total de € 30.000,00 (trinta mil euros), respeitante ao dobro do valor pago a título de sinal, no prazo máximo de 8 (oito) dias após a recepção da presente missiva, sob pena de serem acionados no imediato os competentes meios judiciais com vista ao pagamento desse valor, acrescidos de juros de mora”.
40. As cartas referidas em 39) foram redigidas e assinadas pelo Dr. (…), a quem os AA. haviam conferido, por procuração passada a 24.09.2021, “os mais amplos poderes forenses por lei permitidos, bem como os especiais para transigir e para os representar para efeitos de resolução do contrato promessa de compra e venda celebrado no dia 05.02.2021”.
41. As cartas referidas em 39 foram recepcionadas pelas Rés, que não responderam às mesmas.
42. Os financiamentos solicitados pelos Autores e supra aludidos em 12 extinguiram-se, por caducidade dos processos.
43. Por essa altura, os Autores perderam interesse na aquisição do imóvel.
44. Os Autores suportaram a quantia total de € 499,20 (quatrocentos e noventa e nove euros e vinte cêntimos), a título de despesas com a concessão dos empréstimos bancários referidos em 12, mais concretamente:
- a quantia de € 320,00 (trezentos e vinte euros), a título de comissão pelo crédito relativo à aquisição do imóvel;
- a quantia de € 12,80 (doze euros e oitenta cêntimos), a título de imposto de selo pelo crédito relativo à aquisição do imóvel;
- a quantia de € 160,00 (cento e sessenta euros), a título de comissão pelo crédito relativo às obras;
- a quantia de € 6,40 (seis euros e quarenta cêntimos), a título de imposto de selo pelo crédito relativo às obras.
45. Com vista à regularização das desconformidades referidas em 23, os Autores contrataram os serviços de uma advogada, a qual cobrou a quantia de € 492,00 (quatrocentos e noventa e dois euros), a título de honorários, a qual foi paga.
46. A aquisição do imóvel descrito em 1 tornou-se parte essencial do projecto de vida dos Autores, que nele pretendiam habitar permanentemente.
47. Na sequência das Rés não terem procedido às diligencias referidas em 23 e da recusa da Rés (…) referida em 35, a Autora (…) viu o seu projecto de vida paralisado, voltando à estaca zero após vários meses de diligências tendentes à aquisição do imóvel descrito em 1.
48. A 17.12.2021, a Autora (…) iniciou consultas de psiquiatria no Grupo (…) Saúde, com o Dr. (…), que mediante atestado médico, datado de 20.12.2021, atestou que tais consultas se iniciaram devido a episódio depressivo com componente de grande ansiedade reativo ao problema de não conclusão da celebração do contrato prometido de compra e venda.
49. Nesse relatório, atesta ainda o dito médico psiquiatra que na Autora observou sentimentos penosos, associados a perda de vitalidade, sensação de desalento, acompanhados de explosões emocionais, como crimes de raiva, impaciência, dificuldades cognitivas de concentração e memória, marcadas por esquecimentos e desorientação; grande sofrimento psicológico e desespero, situação que afectou a sua vida profissional e a dinâmica familiar.
50. O estado depressivo descrito em 48, teve consequências na vida social da Autora (…), que passou a refugiar-se em casa, quando antes ia com regularidade ao café e a casa de amigos e familiares.
51. Tendo-se também reflectido em distúrbios do sono, com diagnostico de insónia inicial e intermédia.
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B) Factos não provados:
a) Que Autores e Rés tivessem acordado que o pagamento da quantia a título de honorários, referida em 45 seria dividido em partes iguais.
b) Que, à revelia das Rés, os Autores ocuparam o imóvel, em data que se desconhece após a celebração do contrato promessa, e nele realizaram diversas obras de demolição no seu interior, nomeadamente destruíram todas as paredes interiores, a cozinha e a casa de banho, removeram o pavimento, tornando o imóvel absolutamente inútil para o fim a que se destina que é a habitação.
c) Tendo-o abandonado, mais tarde.
d) Que os danos causados pelos Autores no imóvel desvalorizaram-no em pelo menos a quantia de € 50.000,00 (cinquenta mil euros).
e) Que o imóvel se encontrava em bom estado de conservação.
f) Que para além da inscrição do prédio urbano descrito em 1) a favor das três Rés, não fosse necessária qualquer outra formalidade para a venda do mesmo aos Autores.
g) Que os Autores, antes da celebração do contrato promessa referido em 1), conhecessem a exacta situação jurídica do prédio urbano objecto do mesmo.
h) Que a empresa Century 21 – (…) Mediação Imobiliária, SA recebeu, na data da outorga do contrato promessa de compra e venda referido em 1, na íntegra, a sua comissão.
i) Que a Ré (…) entregou à empresa Century 21 – (…) Mediação Imobiliária, SA toda a documentação que lhe foi solicitada.
j) Que a Ré (…) estava convicta que a escritura pública referida em 18 era apenas de compra e venda do imóvel objecto do contrato promessa.”
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IV- Fundamentação de Direito
A-1 e B-1 Impugnação da decisão relativa à matéria de facto
Abordaremos de seguida a questão relativa a impugnação da decisão relativa à matéria de facto, comum a ambos os recursos independentes interpostos para este Tribunal Superior.
Resulta do artigo 640.º do CPC, que se debruça sobre o ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto, o seguinte:
1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2 - No caso previsto na alínea b), do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respectiva parte, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
[…]”.
A este propósito sustenta o Conselheiro António Abrantes Geraldes (“Recursos no Novo Código de Processo Civil“, Almedina, 5ª ed., a págs. 168-169), que a rejeição total ou parcial respeitante à impugnação da decisão da matéria de facto deve ser feita nas seguintes situações:
“a) Falta de conclusões sobre a impugnação da decisão da matéria de facto (artigos 635.º, n.º 4 e 641.º, n.º 2, alínea b));
b) Falta de especificação, nas conclusões, dos concretos pontos de facto que o recorrente considera incorretamente julgados (artigo 640.º, n.º 1, alínea a));
c) Falta de especificação, na motivação, dos concretos meios probatórios constantes do processo ou nele registados (v.g. documentos, relatórios periciais, registo escrito, etc.);
d) Falta de indicação exata, na motivação, das passagens da gravação em que o recorrente se funda;
e) Falta de posição expressa, na motivação, sobre o resultado pretendido relativamente a cada segmento da impugnação, esclarecendo, ainda, que a apreciação do cumprimento de qualquer uma das exigências legais quanto ao ónus de prova prevenidas no mencionado n.º 1 e 2, alínea a), do artigo 640.º do CPC, deve ser feita “à luz de um critério de rigor”.
Decorre, por seu turno, do artigo 662.º do CPC, o seguinte:
1-A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”.
Refere a propósito deste normativo o Conselheiro António Abrantes Geraldes (obra acima identificada, pág. 287), que:
“O actual artigo 662.º representa uma clara evolução no sentido que já antes se anunciava […] , através dos nºs 1 e 2 , als. a) e b), fica claro que a Relação tem autonomia decisória, competindo-lhe formar e formular a sua própria convicção, mediante a reapreciação dos meios de prova indicados pelas partes ou daqueles que se mostrem acessíveis e com observância do principio do dispositivo no que concerne à identificação dos pontos de discórdia”.
Diz-nos também sobre este preceito o Conselheiro Fernando Pereira Rodrigues (“Noções Fundamentais de Processo Civil”, Almedina, 2ª edição atualizada, 2019, págs. 463-464), o seguinte:
“A redação do preceito [662.º, n.º 1] não parece ter sido muito feliz quando manda tomar em consideração os “factos assentes” para proferir decisão diversa, que só pode ser daqueles mesmos factos considerados assentes, porque o que está em causa é modificar a decisão em matéria de facto proferida pela primeira instância.
[…]
A leitura que se sugere como mais adequada do preceito, salvaguardada melhor opinião, é que ele pretende dizer que a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, “confrontados” com a prova produzida ou com um documento superveniente impuserem decisão diversa”.
Nesta sede importa ainda recordar o teor dos n.ºs 4 e 5 do artigo 607.º do CPC, relativo à “Sentença”, que se traduz no seguinte:
4- Na fundamentação da sentença, o juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção; o juiz toma ainda em consideração os factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras de experiência”.
5- O juiz aprecia livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto; a livre apreciação não abrange os factos para cuja prova a lei exija formalidade especial, nem aqueles que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados, quer por documentos, quer por acordo ou confissão das partes”.
Argumentam, a este propósito, José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre (“Código de Processo Civil Anotado”, Volume 2º, Almedina, 4ª edição, 2019, pág. 709), o seguinte:
“O princípio da livre apreciação da prova situa-se na linha lógica dos princípios da imediação, oralidade e concentração […]: é porque há imediação, oralidade e concentração que ao julgador cabe, depois da prova produzida, tirar as suas conclusões, em conformidade com as impressões recém-colhidas e com a convicção que, através delas, se foi gerando no seu espírito, de acordo com as máximas de experiências aplicáveis”.
Assim, a prova submetida à livre apreciação do julgador não significa prova sujeita ao livre arbítrio do mesmo, como aliás bem se depreende da leitura do n.º 4 do supra referido artigo 607.º do CPC, que na sua primeira parte impõe ao juiz que analise “criticamente” as provas, indique as “ilações tiradas dos factos instrumentais” e especifique os “demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção”.
Neste domínio referem, outrossim, António Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe de Sousa (“Código de Processo Civil Anotado, Vol. I”, Almedina, 2ª edição, 2020, pág. 745), o seguinte:
“O juiz deve, pois, expor a análise crítica das provas que foram produzidas, quer quando se trate de prova vinculada, em que a margem de liberdade é inexistente, quer quando se trate de provas submetidas à sua livre apreciação, envolvendo os motivos que o determinaram a formular o juízo probatório relativamente aos factos considerados provados e não provados.”
Aqui chegados urge baixar aos contornos do caso concreto:
- Impugnação da decisão relativa à matéria de facto apresentada pelos Apelantes (…) e (…).
Sustentam os Apelantes (…) e (…) dever considerar-se como provado, transcrevendo-se a sua redacção, o “vertido nas cláusulas segunda, quarta, nona, décima e décima primeira” do teor do contrato-promessa de compra e venda em causa nesta acção.
Os Apelados entendem que tal transcrição se afigura desnecessária em face do teor do facto discriminado sob o ponto 1 do sub-segmento da sentença recorrida relativo aos factos provados.
E têm razão os Apelados!
Na verdade, consta descrito sob o ponto 1 dos factos considerados como provados que:
“1. Por escrito particular datado de 5 de Fevereiro de 2021, denominado ‘Contrato-Promessa de Compra e Venda’, junto com a ref.ª 9588907, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido, os Autores prometeram comprar e as Rés prometeram vender, livre de ónus e encargos, pelo preço de € 83.000,00 (oitenta e três mil euros), o prédio urbano em propriedade total, sito em (…), freguesia e concelho de (…), inscrito na respetiva matriz sob o art.º (…) da mesma freguesia, descrito na Conservatória do Registo Predial de (…) sob o n.º (…)” (itálico nosso).
Ora, feita a referência expressa no aludido ponto de facto a “cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido” afigura-se inexistir necessidade de transcrever o teor integral das cláusulas contratuais mencionadas pelos Apelantes em causa, ou de quaisquer outras.
De todo o modo sempre se acrescentará que nos pontos 5, 8, 9, 10 e 11 do elenco dos factos considerados como provados na sentença recorrida, o Tribunal a quo destacou aspectos do clausulado no contrato-promessa, atinentes, designada e respectivamente, às cláusulas segunda, quarta, sétima, nona e décima de tal contrato.
Nas respectivas conclusões recursivas referem ainda os Apelantes em causa, (…) e (…), dever dar-se como provado que:
b) «A única comunicação escrita dirigida às R.R. (e não também ao R. …) é a que consta das cartas datadas de 1 de Outubro de 2021 juntas como doc. 8 da petição inicial, nas quais os A.A. resolviam o contrato-promessa e pediam a devolução do sinal em dobro».
c) «Os R.R. nunca foram interpelados pelos A.A. para “no prazo de 10 dias a contar da interpelação (…) para tal (…) repor a situação objecto da queixa sob pena de se considerar em incumprimento”».
d) «Os R.R. não se recusaram a outorgar a escritura pública de compra e venda do prédio prometido vender.»
e) «Os A.A. não marcaram, como era sua obrigação, “no prazo de 90 dias a contar da data da assinatura” do contrato-promessa de compra e venda, a escritura pública respectiva».
Os Apelados insurgiram-se igualmente contra esta pretensão dos Apelantes em causa, sustentando não ter a mesma razão de ser.
Vejamos.
Conforme já se percebeu do acima exposto nas conclusões recursivas o impugnante da matéria de facto tem de obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição, “os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados”, estando em causa o cumprimento de um ónus de impugnação primário de extrema relevância.
Sucede que, relativamente ao que foi discriminado pelos Apelantes sob as alíneas b) a e), acima transcritas, aqueles não lograram identificar nas suas conclusões recursivas, nem sequer no corpo das alegações, que pontos da matéria de facto considerada como não provada, ou mesmo provada, discriminados na sentença recorrida, pretenderam impugnar limitando-se a referir entenderem dever o teor daquelas alíneas constar também do sub-segmento respeitante aos factos considerados como provados, sem que se perceba se o fizeram por tal matéria ter sido alegada em algum articulado e qual, pois não o disseram.
Com efeito, limitaram-se a transcrever na motivação recursiva longas passagens das declarações de parte prestadas em audiência final pela Apelada … (cerca de 56 minutos), bem como do depoimento da testemunha (…), notária (cerca de 28 minutos), sem lograrem demonstrar através do competente juízo crítico e valorativo em que medida é que resultou de todas as respostas dadas pelas duas pessoas ouvidas o que pretenderam fosse aditado ao elenco dos factos provados.
Sucede, porém, que da leitura atenta das actas de audiência final relativas às sessões realizadas em 31/01/2023 no Tribunal a quo decorre assente a confissão dos ora Apelados no tocante aos factos contidos nos artigos 20 e 33 da contestação dos ora Apelantes (…) e (…), factos esses que no essencial respeitam ao que ora se identifica sob as alíneas c) e e) e se pretende aditar ao elenco dos factos considerados como provados na sentença recorrida.
Pelo que, sem necessidade de mais considerações, impõe-se rejeitar a impugnação no tocante ao conteúdo das alíneas b) e d) e deferir a mesma no tocante às alíneas c) e e), que passarão a integrar o sub-segmento da sentença recorrida respeitante aos factos considerados como provados com o seguinte teor:
“52. Os Autores nunca interpelaram por escrito ou verbalmente a Ré (…) para no prazo de 10 dias a contar da interpelação repor a situação objecto de queixa sob pena de se considerar em incumprimento, mas tão só falaram com esta para resolver a questão da documentação em falta para a venda;
53. Os Autores não marcaram a escritura publica de compra e venda no prazo de 90 dias a contar da data da assinatura do contrato promessa.”
Prosseguindo na análise desta impugnação dirigida contra a decisão relativa à matéria de facto verifica-se que os Apelantes (…) e (…) pretendem ainda que se considere como não provado o que ficou assente sob os pontos 36 e 43 do sub-segmento da sentença recorrida respeitantes aos factos provados.
Recordemos o conteúdo de tais pontos de facto:
“36. A escritura pública referida em 35 foi marcada pelo Cartório Notarial de (…) para o dia 18.08.2021, tendo comparecido para outorga da mesma a Autora (…) e a Ré (…).”
“43. Por essa altura, os Autores perderam interesse na aquisição do imóvel.”
Os meios probatórios que indicaram relativamente ao facto descrito sob o n.º 36 são os mesmos que indicaram para tentar convencer sobre a prova do conteúdo da matéria que discriminaram sob alíneas b) a e), a que acabámos de aludir supra, ou seja as declarações de parte da Apelada (…) e o depoimento prestado pela testemunha (…), impondo-se sublinhar do mesmo modo a patologia que também acima lhe apontámos, qual seja não demonstrarem em que medida é que as declarações e depoimento consubstanciados nas exaustivas passagens transcritas permite, neste caso, infirmar o que foi considerado como provado sob o ponto 36.
Estamos sem qualquer margem para rebuços a mover-nos no âmbito da prova não vinculada pois não é possível retirar das declarações da Apelada (…) qualquer confissão sobre a indemonstração do facto em apreço.
Recordemos o que ficou plasmado em sede de motivação na sentença recorrida a propósito deste facto.
[…]
No que respeita à prova dos factos descritos em 35, 36, 37 e 38 considerou-se, primeiramente, as declarações de parte da Autora (…), que confirmou ter levado, de boleia, a Ré (…), no dia 18.08.2021, até ao Cartório Notarial de (…), a fim desta e do procurador das restantes Rés, outorgarem uma escritura pública de rectificação da partilha, que iria possibilitar a celebração da escritura pública de compra e venda. Confirmou que ela própria não iria participar na escritura de rectificação mas foi para se assegurar que a Ré (…) a outorgava, o que não aconteceu, já que esta se recusou a assinar.
Considerou-se, também, as declarações de parte do Autor (…), que sobre esta matéria confirmou que a sua esposa solicitou a marcação no Cartório Notarial de (…) de uma escritura pública de rectificação de partilha e que avisou a Ré (…) desse facto. Mais confirmou que, no dia marcado, a sua esposa foi buscar a Ré (…) a casa e levou-a até ao Cartório Notarial para tratar do assunto.
Referiu, ainda, que nesse dia a Ré (…) se recusou a assinar a dita escritura de rectificação de partilha, alegando que não aceitava os termos da mesma.
Estes factos foram, no essencial, confirmados pela própria Ré (…), nas suas declarações de parte, embora alegue que estava convencida que ia assinar uma escritura pública de compra e venda e que só naquele momento é que se apercebeu que se tratava de uma escritura de rectificação de partilha. Confirmou que se recusou a assinar essa escritura porque entende que esse assunto já está tratado há muito tempo com as irmãs, para além de não concordar com os seus termos.
De absoluta relevância para a prova desta matéria foi o depoimento da testemunha (…), notária a exercer funções no Cartório Notarial de (…). Segundo esta testemunha, havia a necessidade prévia de fazer uma escritura de rectificação de partilhas antes de celebrar a escritura de compra e venda em causa. Explicou que esta situação acontece porque a aquisição deste imóvel pelas Rés foi registada, na proporção de 1/3 para cada uma, provisória por dúvidas.
Embora não estivesse segura, está convencida que esta escritura foi marcada pela Autora (…), com o conhecimento da Ré (…), as únicas que compareceram na data marcada pelo cartório. Confirmou que preparou a dita escritura de rectificação e que começou a trabalhar na escritura de compra e venda, mas que já sabia, por reuniões anteriores com a Ré (…) e o Procurador das restantes Rés, que a primeira destas escrituras não iria ser outorgada pela Ré (…) e que este último não iria comparecer.
Terminou referindo que sem esta escritura de rectificação da partilha, não seria possível celebrar a escritura de compra e venda, já que para vender este imóvel, o mesmo havia que estar desonerado de problemas, que no caso era o registo provisório de aquisição por parte das Rés.
No mais, considerou-se o teor da Declaração/Despacho de Qualificação da Conservatória do Registo Predial de (…), junta como doc. n.º 7 da petição inicial, com a ref.ª 9588907.”
Nenhuma razão temos para não considerar acertado o juízo de valoração de prova efectuado pelo Tribunal a quo e acabado de transcrever, improcedendo, como tal, a impugnação no tocante ao facto contido no ponto 36 do segmento da sentença recorrida relativo aos factos provados.
Finalmente quanto ao teor do ponto 43 do elenco dos factos considerados como provados na sentença recorrida defendem os Apelantes (…) e (…) que o mesmo é eminentemente conclusivo e como tal deve ser eliminado por virtude da perda de interesse ter de ser consubstanciada em factos objectivos, que inexistem.
Independentemente de se discutir neste momento se tais factos objectivos existem e podem retirar-se do elenco da matéria de facto considerada na sentença recorrida como provada, ou não, concordamos que a redacção conferida ao ponto 43 ora em apreciação é eminentemente conclusiva, pois não retrata factos concretos e naturalísticos, antes exprime um juízo abstracto e essencialmente conclusivo.
Como tal é de considerar como não escrito o ponto 43 contido na matéria de facto considerada como provada na sentença recorrida, eliminando-se o mesmo de tal sub-segmento.
Procede, assim, parcialmente a impugnação dirigida pelos Apelantes (…) e (…) à decisão relativa à matéria de facto, nos termos acima definidos.

- Impugnação relativa à matéria de facto apresentada pelas Apelantes (…) e (…).
Sustentam as Apelantes em apreço que o Tribunal a quo deveria ter considerados como provados os factos contidos nos pontos 17º a 21º e 48º da contestação que apresentaram nos autos, indicando como meios probatórios aptos a sustentarem a solução que defendem o “Doc. 1” junto com a petição inicial, o qual se consubstancia no “Contrato-Promessa de Compra e Venda”, datado de 05 de Fevereiro de 2021, outorgado entre Apelados e Apelantes., em discussão nestes autos e em passagens gravadas, que identificaram devidamente. das declarações de Parte prestadas em audiência final pelos Apelados (…) e (…).
Vejamos em que se traduzem tais factos:
“17. Na verdade, no contrato promessa trazido a juízo, na sua cláusula quarta, número um, as partes convencionaram que a escritura pública relativa à compra e venda a que se refere tal contrato será outorgada no prazo de noventa dias, a contar da data da sua assinatura.
18. Mais clausularam no mesmo dispositivo, que a dita escritura seria outorgada em dia hora e local a fixar pelos segundos outorgantes, ora AA, mediante acordo dos primeiros.
19. Os segundos contraentes, ora AA comprometeram-se no número dois da referida cláusula quarta a informar os primeiros do dia, hora e local da escritura, com a antecedência mínima de três dias em relação à sua realização.
20. O contrato promessa em causa foi celebrado no dia cinco de Fevereiro de 2021, como dele consta.
21. Assim, nos termos contratualizados entre as partes, os segundos contraentes, ora AA obrigaram-se a marcar a escritura do negócio prometido até ao dia sete de Maio de 2021 (nonagésimo dia posterior á celebração do contrato) e ainda a informar os promitentes vendedores do respectivo dia, hora e local, com três dias de antecedência ou seja até ao dia quatro de Maio de 2021.
48. Os AA conheciam, antes da celebração do contrato promessa, a exacta situação física e jurídica do prédio, por terem analisado toda a documentação a ele relativa, designadamente as condições do seu trato administrativo, condições matriciais e registrais, conforme, expressamente, declararam na cláusula 2ª, número 3, do contrato promessa em causa nestes autos, pelo que não podem vir agora invocar nem o desconhecimento, nem qualquer dificuldade jurídica relacionada com o prédio ou a sua documentação.”
Na respectiva resposta ao recurso os Apelados pugnaram pela improcedência da impugnação apresentada pelas Apelantes.
Vejamos.
Com a indicação expressa dos pontos de factos pretendidos aditar à matéria de facto considerada como provada e dos meios probatórios em que se estribam as Apelantes cumpriram satisfatoriamente os ónus de especificação obrigatória que sobre elas impendiam.
Porém, não têm razão no que sustentam.
Na verdade, relativamente ao teor do ponto 48.º da contestação verifica-se que o mesmo é notoriamente conclusivo, não espelhando qualquer facto concreto e naturalístico, apenas podendo, eventualmente, retirarem-se as ilações, ou parte de delas, contidas no dito ponto de facto de factos concretos que possam ter resultado demonstrados nos autos.
No tocante aos restantes factos articulados na contestação sob os pontos n.ºs 17 a 21 percebemos da sua leitura que se reconduzem ao teor de cláusulas insertas no dito “Contrato-Promessa de Compra e Venda” outorgado entre as Partes em 05/02/2021.
Ora decorre claramente e desde logo do facto contido no ponto 1 do sub-segmento respeitante aos factos considerados como provados na sentença recorrida que o conteúdo integral desse contrato foi considerado como reproduzido na sua totalidade nesse mesmo ponto de facto, o que, naturalmente, dispensa a transcrição de todo o seu clausulado no âmbito daquele sub-segmento destinado aos factos provados.
Em todo o caso, sempre se acrescenta que o aditamento factual pretendido atinente aos artigos 17 a 19 está contido no ponto 8 dos factos considerados como provados na sentença recorrida, enquanto o teor do facto articulado sob o ponto 20 integra o próprio ponto 1 dos factos considerados como provados.
Prosseguindo na análise da impugnação dirigida pelas Apelantes em causa contra a matéria de facto, verificamos que as Apelantes (…) e (…) sustentam que se considerem ainda como provados os factos contidos nos artigos 22, 24 a 31, 37, 39 e 45 a 47 da contestação que apresentaram nos autos, indicando como meios probatórios aptos a demonstrarem o que sustentam as declarações de Parte prestadas em audiência final pelos ora Apelados e bem assim os depoimentos prestados na mesma pelas testemunhas (…), (…), (…), (…) e (…), tendo indicado com precisão as passagens da gravação das respectivas declarações e depoimentos que entenderam como relevantes e ainda o teor de um e-mail junto pelos Apelados em 16/05/2023, como “Documento 1”, bem como outro junto pelos mesmos em 19/05/2023, igualmente como “Documento 1” e ainda um outro também junto pelos Apelantes na sessão de audiência final de 26/06/2023.
Impõe-se aferir no que se traduz o conteúdo de tais artigos:
“22. Ora, até ao referido dia quatro de Maio de 2021, os AA não marcaram a escritura do contrato prometido, nem comunicaram aos promitentes vendedores a respectiva data e local, sendo certo que o tinham de fazer até essa data e a escritura realizar-se até sete do mesmo mês de Maio de 2021.
24. Dentro do prazo estabelecido, contratualmente, para a marcação e realização da escritura, os promitentes-compradores, ora AA não levantaram qualquer questão, não marcaram a escritura, nem comunicaram a sua data aos promitentes vendedores.
25. O prazo de noventa dias para a celebração do contrato prometido com a fixação de que a sua conclusão nesse prazo era incumprimento definitivo deve-se à urgência na realização do negócio nos termos em que o foi.
26. Aliás, como os AA referem no artigo 4º da sua douta petição, quiseram pagar o preço com crédito bancário e encetaram diligências para o obter, mas, por razões que só aos AA dizem respeito a que as RR são completamente estranhas, os AA só obtiveram a aprovação do financiamento bancário necessário ao pagamento do preço no dia 18 de Maio de 2021, como, expressamente, o confessam no artigo 5º da sua douta petição e se aceita, para não poder ser retirado.
27. Os AA não marcaram a escritura do negócio prometido nem o comunicaram aos promitentes vendedores, dentro do prazo contratualmente estabelecido, porque, dentro desse prazo, não conseguiram obter financiamento que lhes permitisse pagar o preço do bem que prometeram adquirir.
28. Referem os AA que os promitentes vendedores estavam obrigados, nos termos da cláusula oitava do contrato, a entregar, antes da data da escritura de venda os documentos necessários à realização da mesma, nomeadamente a certidão da conservatória do registo predial, caderneta predial e alvará.
29. Porém, a escritura pública do negócio prometido nunca foi, efectivamente, marcada pelos AA, dentro do prazo estipulado contratualmente – 07-05-2021.
30. Assim, não se chegou a vencer a obrigação dos promitentes vendedores de entregar os documentos da cláusula oitava do contrato porque a escritura não foi marcada e, consequentemente, não foi verificado pelos AA então promitentes compradores, qualquer incumprimento dessa obrigação, dentro do prazo em que o poderia ser, ou seja noventa dias após a celebração do contrato promessa.
31. A escritura da prometida venda só não foi marcada a tempo porque o banco não aprovou o crédito de que os AA precisavam e isso levou-os, inexoravelmente, a não cumprir a obrigação de marcar a escritura do acto prometido no prazo contratualmente previsto e esse não cumprimento é-lhe imputável em absoluta e ocasiona incumprimento, pela sua parte do contrato, nos termos da cláusula nona número um, com o consequente direito dos promitentes vendedores de fazerem suas as quantias recebidas, conforme estipularam as partes no número três da dita cláusula nona.
37. Os AA não pagaram essa quantia no dia 5 de Fevereiro de 2021 e em 20-05-2021 foram transferidos pela agência imobiliária, para as suas contas, 2950€ a cada contestante, pelo que não cumpriram, pontualmente a obrigação de constituir sinal.
39. Porém, à revelia das contestantes, os AA ocuparam o imóvel, em data que se desconhece após a celebração do contrato promessa e destruíram todo o seu interior, nomeadamente todas paredes interiores, conforme se documenta pela fotografias que constituem o doc. n.º 1.
45. Impugna-se por se ignorar ou não ser verdadeira a matéria de facto vertida nos artigos 2º, 4º, 6º, 7º, 8º (deste só se aceita que foi enviado a … o mail que constitui o doc. n.º 6), 9º, 10º, 12º, 13º (só se aceita que as RR receberam a carta que constitui o doc. n.º 8, nos termos já acima explicitadas), 15º, 16º, 17º, 18º (o sinal foi prestado fora prazo e à Imobiliária), 19º, 20º, 21º, 22º, 23º, 24º, 25º e o que de matéria de facto se contém de 26º até final da mui douta petição.
46. O prédio estava na matriz predial e na Conservatória do Registo Predial em nome das três RR e não era necessária qualquer outra formalidade para a venda.
47. De qualquer modo, as contestantes sempre estiveram disponíveis para colaborar com os AA. “
De novo reconhecemos que perante a indicação expressa dos pontos de factos pretendidos aditar à matéria de facto considerada como provada e dos meios probatórios em que se escudam para defender a solução por que propugnam as Apelantes cumpriram satisfatoriamente os ónus de especificação obrigatória que sobre elas impendiam.
Vejamos, porém, se lhes assiste alguma razão.
Quanto ao teor dos artigos 26, 28 e 45 percebe-se, sem qualquer margem para rebuços, que pela forma como forma redigidos não descrevem qualquer facto objectivo que possa ou deva ser reconduzido à matéria de facto considerada como provada.
No tocante ao artigo 29 é mera repetição, em redacção abreviada, do artigo 22.
Quanto aos artigos 25, 30, 31 e 47 o respectivo conteúdo não descreve factos concretos e naturalísticos antes encerrando em si meras conclusões, algumas com conotação e implicação jurídica (vencer a obrigação, incumprimento definitivo da obrigação).
Quanto ao artigo 46 verifica-se que no tocante à sua primeira parte o seu teor está reconhecido na parte final do ponto 1 e no ponto 2 do sub-segmento dos factos considerados como provados na sentença recorrida enquanto a segunda parte se traduz num facto eminentemente conclusivo.
No que concerne ao artigo 39 verifica-se que tal facto foi incluído no sub-segmento dos factos considerados como não provados na sentença recorrida, sob a alínea b), pelo que teriam as Apelantes em causa que ter impugnado especificamente o mesmo, o que não lograram fazer.
Relativamente ao teor do artigo 37 verifica-se que a primeira parte consta como assente sob o ponto 7 do sub-segmento dos factos considerados como provados na sentença recorrida, sendo certo que a segunda parte que se estende desde “pelo que” até “constituir sinal”, ou seja até ao final, consubstancia um facto conclusivo com conotação eminentemente jurídica.
Já quanto ao teor dos artigos 22 desde “Ora” até “local”, 24 e 27 desde “Os AA” até “estabelecido”, verifica-se assistir razão às Apelantes (…) e (…), sendo certo que tal foi reconhecido em sede de apreciação da impugnação relativa à decisão sobre a matéria de facto apresentada pelos Apelantes (…) e (…), que teve como consequência o aditamento no segmento dos factos considerados como provados na sentença recorrida do ponto 53.
Impõe-se, contudo, acrescentar que no tocante à segunda parte do artigo 27, que se inicia em “porque” e se estende até “prometeram adquirir”, ou seja até ao final, desatende-se o pretendido uma vez que está em causa a expressão de um facto eminentemente conclusivo e não concreto, ou naturalístico, na certeza de que sob o ponto 13 do sub-segmento dos factos considerados como provados na sentença recorrida consta assente a data concreta em que os empréstimos bancários contraídos pelos Apelados foram definitivamente aprovados.
As Apelantes (…) e (…) impugnaram, por fim, o conteúdo dos pontos de facto n.ºs 26, 38, 43, 46 e 47 do sub-segmento dos factos considerados como não provados na sentença recorrida.
Também quanto a esta parte da impugnação se mantiveram discordantes os Apelados, pugnando pela improcedência.
Vejamos se assiste alguma razão às Apelantes em apreço.
Recordemos, desde já, o teor de tais pontos de facto:
“26. Até à presente data, nenhuma das Rés ou alguém por si mandatado, procedeu às diligencias referidas em 23.
38. Por declaração passada pela Notária (…), do Cartório Notarial de (…), em 6.10.2021, foi por esta atestado que a escritura pública referida em 35 não foi celebrada por falta de acordo dos interessados nos termos da partilha.
43. Por essa altura, os Autores perderam interesse na aquisição do imóvel.
46. A aquisição do imóvel descrito em 1 tornou-se parte essencial do projecto de vida dos Autores, que nele pretendiam habitar permanentemente.
47. Na sequência das Rés não terem procedido às diligencias referidas em 23 e da recusa da Rés (…) referida em 35, a Autora (…) viu o seu projecto de vida paralisado, voltando à estaca zero após vários meses de diligências tendentes à aquisição do imóvel descrito em 1”.
Adiantamos, de imediato, que o ponto 43 já foi apreciado, visto que também integrou o conteúdo da impugnação apresentada pelos Apelantes (…) e (…) tendo o mesmo sido declarado como não redigido e consequentemente eliminado devido à fórmula eminentemente conclusiva que continha em si.
Quanto aos restantes pontos de facto não resulta da leitura da motivação recursiva e menos ainda das conclusões recursivas quais os meios probatórios concretos que especificamente foram considerados e valorados pelos Apelantes com vista a infirmarem a decisão ou solução a que chegou o Tribunal a quo na sentença recorrida.
Na verdade, depois de ter identificado um conjunto de meios de prova assentes em declarações de Parte dos Apelados, depoimentos de várias testemunhas, um e-mail e mais dois documentos, mencionando as passagens da gravação e até transcrito no corpo das alegações vários excertos das sobreditas declarações e depoimentos, que entenderam como relevantes para a demonstração de vários artigos integrantes da sua contestação, matéria de que já nos ocupamos supra, as Apelantes (…) e (…) rematam a sua impugnação contra a matéria de facto dizendo que deve entender-se como não provados os pontos de facto ora em análise.
Contudo, fica-se sem saber relativamente a cada um desses quatro pontos de facto integrantes do elenco dos factos julgados como provados qual, ou quais, os concretos meios probatórios, dos variados que foram antes identificados, que se revelam especificamente relevantes para infirmar cada um dos ditos pontos impugnados e porque razão, o que demandaria uma análise crítica por parte das Apelantes também omitida pelas mesmas.
De resto, tal insuficiência não permite de todo, a nosso ver, abalar a correcção do juízo motivatório realizado pelo Tribunal a quo no tocante a tais pontos de facto, que passamos a transcrever de seguida:
“[…]
Os factos descritos em 25) e 26) resultaram assentes porque foram confirmados pela Autora (…) nas suas declarações de parte. Com efeito, a Autora referiu em julgamento que soube pelo gerente da agência do (…) Banco de VRSA do aparecimento de um testamento da falecida mãe das Rés, que alterava a quota parte de cada uma nas partilhas e que implicava uma rectificação das mesmas. Referiu que lhe foi dito pelo gerente do banco que sem essa alteração das partilhas, não seria possível marcar a data da escritura publica de compra e venda. E que, por essa razão, a Autora e o marido contrataram uma advogada para interpelar as Rés para proceder a essa rectificação, o que acredita ter sido feito. Refere ter tido sempre contacto directo com a Ré (…), única proprietária com quem tratou. No mais, confirmou que até hoje, nenhuma das Rés tratou da documentação solicitada pelo Cartório Notarial de (…).
Por outro lado, considerou-se as declarações de parte da Ré (…), que nas suas declarações de parte, admitiu saber, tanto pelo gerente do (…) Banco de VRSA com quem tratou algumas vezes e pelos próprios Autores, da exigência de documentação para celebrar a escritura pública de compra e venda. Referiu que, estava inclusive convencida que para além disso, fosse também uma exigência do banco para conceder o empréstimo de que era fiadora. Nas suas declarações, esta Ré afirmou mesmo que «tinha consciência que havia necessidade de rectificar as áreas do imóvel e de tratar de assuntos prévios à celebração do contrato definitivo». Estas informações foram-lhe chegando pelos Autores, com quem falava com frequência sobre os atrasos do banco. Mas também pessoalmente pelo «Director do (…) Banco de VRSA» que lhe disse que «faltavam papeis, como a rectificação das áreas do imóvel que não estavam conformes e a questão do pátio e que sem isso não podia conceder o empréstimo».
Quanto à questão da rectificação da partilha nega esta Ré que lhe tivesse sido interpelada. Contudo, admite que dela tomou bem consciência quando se deslocou em agosto de 2021 ao Cartório Notarial de (…) e lhe pediram para outorgar uma escritura de rectificação de partilha, que ela se recusou fazer, por não estar de acordo. Ou seja, ainda que se admitisse como certo que a referida Ré desconhecesse, por completo, da necessidade de proceder à rectificação da partilha, dela sempre teria que ter tomado conhecimento, pelo menos em agosto de 2021, quando lhe solicitaram a outorga de uma escritura pública para o efeito. Dúvidas não restam, pelas suas declarações, que nenhum destes assuntos foi por ela resolvido.
Ainda assim, esta última versão dos factos apresentada pela Ré (…), foi contrariada pelo depoimento da testemunha (…), gerente da agência do (…) Banco de VRSA, que de forma imparcial e desinteressada, que mereceu credibilidade, confirmou que, neste processo de financiamento, nunca foram entregues todos os documentos necessários para a sua finalização, pois que se assim tivesse acontecido, o dito processo teria sido regularizado e não foi. Confirmou que, após a aprovação do crédito, ou seja, em data cercana a 18.05.2021, se chegou a reunir com os Autores e com a Ré (…) na sua agência para resolver o problema causado pela descoberta do testamento da mãe das Rés, momento no qual a Ré (…) se mostrou disponível para resolver o mesmo no que fosse necessário, o que nunca aconteceu. Mais referiu que quando falou com a Ré (…) sobre as dificuldades de avançar com a marcação da escritura de compra e venda, esta entendeu o problema e disponibilizou-se para o resolver, já que «queria vender». Terminou esclarecendo que a não celebração da escritura de compra e venda se deveu exclusivamente à questão do testamento e da rectificação da partilha.
De salientar que, no seu depoimento, também a testemunha (…), notária no Cartório de (…), foi peremptória ao afirmar que até à presente data, pelo menos a questão da rectificação da partilha das heranças dos pais das Rés, que é aquela que lhe diz respeito atenta as suas funções, continua inalterada e por tratar, o que só não aconteceu por haver desacordo entre as Rés quanto à mesma.
Esta matéria é, ainda, fortemente corroborada pela leitura atenta da troca de correspondência (emails) junta aos autos em sede de audiência, com as referências 128862063 e 128862078.
[…]
No que respeita à prova dos factos descritos em 35, 36, 37 e 38 considerou-se, primeiramente, as declarações de parte da Autora (…), que confirmou ter levado, de boleia, a Ré (…), no dia 18.08.2021, até ao Cartório Notarial de (…), a fim desta e do procurador das restantes Rés, outorgarem uma escritura pública de rectificação da partilha, que iria possibilitar a celebração da escritura pública de compra e venda. Confirmou que ela própria não iria participar na escritura de rectificação mas foi para se assegurar que a Ré (…) a outorgava, o que não aconteceu, já que esta se recusou a assinar.
Considerou-se, também, as declarações de parte do Autor (…), que sobre esta matéria confirmou que a sua esposa solicitou a marcação no Cartório Notarial de (…) de uma escritura pública de rectificação de partilha e que avisou a Ré (…) desse facto. Mais confirmou que, no dia marcado, a sua esposa foi buscar a Ré (…) a casa e levou-a até ao Cartório Notarial para tratar do assunto.
Referiu, ainda, que nesse dia a Ré (…) se recusou a assinar a dita escritura de rectificação de partilha, alegando que não aceitava os termos da mesma.
Estes factos foram, no essencial, confirmados pela própria Ré (…), nas suas declarações de parte, embora alegue que estava convencida que ia assinar uma escritura pública de compra e venda e que só naquele momento é que se apercebeu que se tratava de uma escritura de rectificação de partilha. Confirmou que se recusou a assinar essa escritura porque entende que esse assunto já está tratado há muito tempo com as irmãs, para além de não concordar com os seus termos.
De absoluta relevância para a prova desta matéria foi o depoimento da testemunha (…), notária a exercer funções no Cartório Notarial de (…). Segundo esta testemunha, havia a necessidade prévia de fazer uma escritura de rectificação de partilhas antes de celebrar a escritura de compra e venda em causa. Explicou que esta situação acontece porque a aquisição deste imóvel pelas Rés foi registada, na proporção de 1/3 para cada uma, provisória por dúvidas.
Embora não estivesse segura, está convencida que esta escritura foi marcada pela Autora (…), com o conhecimento da Ré (…), as únicas que compareceram na data marcada pelo cartório. Confirmou que preparou a dita escritura de rectificação e que começou a trabalhar na escritura de compra e venda, mas que já sabia, por reuniões anteriores com a Ré (…) e o Procurador das restantes Rés, que a primeira destas escrituras não iria ser outorgada pela Ré (…) e que este último não iria comparecer.
Terminou referindo que sem esta escritura de rectificação da partilha, não seria possível celebrar a escritura de compra e venda, já que para vender este imóvel, o mesmo havia que estar desonerado de problemas, que no caso era o registo provisório de aquisição por parte das Rés.
No mais, considerou-se o teor da Declaração/Despacho de Qualificação da Conservatória do Registo Predial de (…), junta como doc. n.º 7 da petição inicial, com a ref.ª 9588907.
[…]
Por fim, a prova dos factos descritos em 46, 47, 48), 49), 50) e 51) resultou da análise do Relatório Médico Psiquiátrico junto com o articulado superveniente, com a ref.ª 10135157, que os comprovam. Considerou-se, também, as declarações de parte dos Autores (…) e (…), que confirmaram a importância da aquisição do imóvel objecto do contrato promessa para o seu projecto de vida e da frustração que a primeira sentiu ao ver gorada a sua aquisição em virtude da falta de entendimento das Rés, na regularização da documentação. Mais confirmaram o estado depressivo vivido pela Autora (…) depois de perceber que já não iria adquirir a casa das Rés.
Este estado depressivo e de frustração da Autora (…), bem como as consequências do mesmo, foi também confirmado pelas testemunhas (…), (…), (…), (…) e (…), pessoas próximas do circulo familiar e pessoal dos Autores, que tomaram conhecimento directo da matéria em causa sobre a qual depuseram e que mereceu credibilidade”.
Destarte, procede parcialmente a impugnação dirigida pelas Apelantes (…) e (…) contra a decisão relativa à matéria de facto.
Do exposto, decorre que a fundamentação de facto da sentença recorrida corresponde em definitivo ao seguinte:
A) Factos provados:
1. Por escrito particular de 5 de Fevereiro de 2021, denominado “Contrato-Promessa de Compra e Venda”, junto com a ref.ª 9588907, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido, os Autores prometeram comprar e as Rés prometeram vender, livre de ónus e encargos, pelo preço de € 83.000,00 (oitenta e três mil euros), o prédio urbano em propriedade total, sito em (…), freguesia e concelho de (…), inscrito na respetiva matriz sob o art.º (…) da mesma freguesia, descrito na Conservatória do Registo Predial de (…) sob o n.º (…).
2. Pela Ap. (…), de (…), foi registada, provisória por dúvidas, a aquisição por partilha de herança de (…) e (…), a favor das Rés (…), (…) e (…), na proporção de 1/3 cada, do imóvel descrito em 1.
3. Segundo Declaração emitida pelo Conservador do Registo Predial de (…), datada de 28.06.2012, o título submetido a registo pelas Rés, na Ap. (…), de (…), ou seja, a escritura de partilha lavrada em 30.03.2009, exarada a fls. 72 e seguintes do Livro 2-A, do Cartório Notarial de (…), a cargo da Notária (…), foi objecto de rectificação por escritura de 20.04.2009, do mesmo Cartório, no sentido de passar a constar que o património partilhado pertencia ao casal dos pais das Rés, e que tendo em consideração que os falecidos dispuseram das respectivas quotas disponíveis, tal como se refere nas respectivas habilitações, não se mostram rectificadas as contas da partilha, com as inerentes consequências jurídicas e fiscais, razão pela qual o registo foi lavrado como provisório por dúvidas nos termos dos artigos 68.º, 70.º e 72.º, todos do CRP.
4. O negócio de compra e venda do imóvel objecto do contrato-promessa de compra e venda referido em 1 foi intermediado pela mediadora imobiliária “Century 21 – (…) Mediação Imobiliária, SA”, com quem as Rés celebraram o contrato de mediação imobiliária n.º (…), no dia 08.02.2021, junto aos autos com a ref.ª 128862078, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido.
5. Consta da cláusula segunda n.º 3 do contrato referido em 1) que “os segundos contraentes [Autores] expressamente manifestam e declaram que previamente à celebração do presente contrato: a) Procederam à vistoria do imóvel objecto do presente contrato; b) Analisaram a documentação a ele relativa; c) Têm conhecimento integral do seu estado físico e das respectivas áreas, confrontações e condições jurídicas actuais (de trato administrativo, matriciais e registais)”.
6. De acordo com a cláusula terceira n.º 1, alínea a) do contrato referido em 1), os Autores obrigaram-se a pagar às Rés a quantia de € 15.000,00 (quinze mil euros), a título de sinal e principio de pagamento, na data da assinatura do referido contrato, por meio de transferência bancária para conta bancária a designar por aquelas, tendo as Rés declarado ter recebido naquela data tal quantia e dela ter dado quitação.
7. Os Autores apenas procederam ao pagamento da quantia de € 15.000,00 referida em 6 no dia 23.04.2021, por meio de transferência bancária para conta bancária titulada pela empresa Century 21 – (…) Mediação Imobiliária, SA, que posteriormente a fazer sua a quantia relativa à comissão contratada com as Rés no contrato de mediação imobiliária, entregou, em 20.05.2021, a cada uma delas a quantia de € 2.950,00 (dois mil e novecentos e cinquenta euros).
8. As partes acordaram, na cláusula quarta do contrato referido em 1 que a escritura pública relativa à compra e venda, ou o documento particular autenticado equiparado, seria outorgada no prazo de 90 dias, a contar da data da assinatura do contrato promessa, em dia, hora e local a fixar pelos Autores, mediante acordo com as Rés, comprometendo-se aqueles a informar estas acerca da data, hora e local com uma antecedência mínima de 3 dias em relação à sua realização.
9. Acordaram, também, na cláusula sétima do contrato referido em 1) que “As partes expressamente declaram que, na presente data, não se opera a tradição do imóvel, situação que apenas ocorrerá com a outorga da escritura pública de compra e venda do imóvel e o pagamento integral do preço”.
10. As partes acordaram, na cláusula nona do contrato referido em 1), o seguinte: “1. Caso o título definitivo de compra e venda, não seja celebrado até ao termo do prazo previsto no numero um da cláusula quarta do presente contrato promessa de compra e venda, por causa imputável a qualquer das partes, poderá, desde logo, a parte não faltosa invocar o seu incumprimento definitivo, aceitando, os outorgantes o mero decurso desse lapso de tempo como necessário e suficiente para extrair tal consequência. 2. O incumprimento definitivo por parte dos primeiros contraentes confere aos segundos contraentes, o direito de resolver o presente contrato-promessa de compra e venda e de exigir daquele a restituição em dobro de todas as importâncias entregues a titulo de sinal. 3. Se o incumprimento definitivo do presente contrato, for por causa imputável aos segundos contraentes, os primeiros contratantes farão suas as quantias até aí recebidas, não podendo os segundos contratantes, no entanto, exigir qualquer indemnização pelas obras eventualmente efectuadas no imóvel”.
11. Acordaram, ainda, as partes na cláusula décima n.º 2 do contrato referido em 1) que “a não verificação ou omissão de qualquer condição de venda ou garantia acima acordadas por parte dos primeiros contraentes na data da outorga do contrato prometido obriga estes a, num prazo de 10 dias a contar da interpelação dos segundos contraentes para tal, a repor a situação objecto da queixa sob pena de se considerar em incumprimento”.
12. Para pagamento de parte do preço acordado e referido em 1) – no qual se incluía a quantia a título de sinal aludida em 6) –, bem como para financiar a realização de obras no imóvel, os Autores solicitaram, em data não concretamente apurada mas seguramente anterior a 19.03.2021, dois empréstimos bancários, um crédito à habitação, no valor de € 68.000,00 (sessenta e oito mil euros) e um crédito para obras, no valor de € 10.500,00 (dez mil e quinhentos euros), junto do (…) Banco.
13. Tendo os mesmos sido definitivamente aprovados em 18.05.2021 e cobradas as respectivas despesas de comissão e imposto de selo.
14. Desses empréstimos foi fiadora a Ré (…).
15. Em junho de 2021, o Cartório Notarial de (…) – entidade escolhida pelo (…) Banco para a realização da escritura pública de compra e venda prometida – tomou conhecimento, pela consulta da escritura pública de habilitação de herdeiros da falecida (…) datada de 30.03.2009, da existência de um testamento público, realizado por esta no estrangeiro, em (…), província de (…), Espanha, no dia 17.09.1999, no Cartório Notarial a cargo da Notária (…).
16. Nesse referido testamento, a falecida (…) dispôs de um legado e instituiu herdeira da quota disponível de todos os seus bens a sua filha, aqui Ré, (…).
17. (…), do Departamento de Crédito a Particulares – Crédito Habitação, do (…) Banco, remeteu a (…), da Direcção Regional do Algarve, em 07.06.2021, um email, tendo por assunto «(…)» e o seguinte conteúdo: “Boa tarde. Adicionalmente ao anteriormente indicado: Regime de casamento dos fiadores; (…) – será obrigatório o assento de casamento e respectivo código de acesso, caso não pretendam remeter o documento em falta devem os clientes dirigirem-se à conservatória para efectuarem a devida actualização; Verificamos ainda que após a análise da documentação enviada e tendo em conta que a autora da herança deixou testamento elaborado no estrangeiro terá que ser feito o registo prévio da Habilitação de Herdeiros. Verificamos que: - deverão remeter assentos de nascimento das herdeiras (…) e (…) e será ainda necessário o assento de casamento da herdeira (…) com (…). – a quota parte das herdeiras na Caderneta Predial Urbana não se encontra em conformidade, pelo que se solicita rectificação. – O imóvel tem de ser actualizado na Certidão de Registo Predial e matriz, e a certidão para dispensa de Licença de Utilização deixar de constar tal menção, sob pena de não ser possível registar definitivamente a aquisição e hipoteca, porque tem sido entendimento corrente das conservatórias que ter ou não área descoberta altera a identidade do prédio. Por último solicitamos que nos informem se existe algum grau de parentesco entre a compradora e os vendedores”.
18. Este email foi reenviado para a empresa Century 21 – (…) Mediação Imobiliária, SA, na pessoa de (…) em data não concretamente apurada mas entre 07.06.2021 e 14.06.2021.
19. Em 14.06.2021, (…) reenvia o email referido em 17) a (…), com o conhecimento de (…), gestores do processo venda, com a seguinte informação: “Bom dia (…). Volto a solicitar estes documentos por parte do banco…é importante, sem isto não há escritura”.
20. O email referido em 17 foi reenviado pela empresa Century 21 – (…) Mediação Imobiliária, SA, na pessoa de (…), a (…), em 14.06.2021, filho da Ré (…) e sobrinho das restantes Rés.
21. (…) enviou, no dia 14.06.2021, um email à empresa Century 21 – (…) Mediação Imobiliária, SA, com o seguinte teor: “Exmos. Senhores, boa noite. Em primeiro lugar gostaria de me apresentar. Chamo-me (…), filho de uma das proprietárias (…) e com procuração de outra das proprietárias (…). Agradeço que reencaminhem este email para o banco ou para a notária que está a tratar do processo, uma vez que ainda não percebi quem está por trás de toda esta incompetência. Gostaria de dizer que achamos lamentável a forma como o banco/notário está a tratar do processo. Revela uma incompetência nunca vista, e que terá consequências uma vez que apresentaremos queixa ao gerente do banco ou à Ordem dos Notários, conforme as explicações que nos forem dadas ao presente email. Os senhores têm de apresentar habilitação de herdeiros e comprovativo de pagamento de imposto de selo, que também remetemos. Hoje recebo comunicação da Century 21 a informar-me que o banco tinha solicitado novos documentos…Esta situação revela uma falta de profissionalismo do banco ou do notário, que é inaceitável. Então mas que análise do dossier foi feita? Levam 3 meses pedindo novos documentos, a espaços? E o profissionalismo? Alguém terá de responder pelas consequências de uma situação destas! O contrato promessa de compra e venda tem prazos! E se forem ultrapassados, de quem é a responsabilidade? Não têm noção da dificuldade de funcionamento dos serviços públicos? (…)”.
22. A este email, respondeu a empresa Century 21 – (…) Mediação Imobiliária, SA, na pessoa de (…), em 15.6.2021, da seguinte forma: “Bom dia (…). Como pode ver no email que deve ter recebido há minutos, já demos seguimento ao seu email para o banco. Temos feito tudo o que está ao nosso alcance e solicitado os documentos no tempo em que nos são solicitados a nós, mas também notamos uma descoordenação entre os proprietários levando isso a um delay entre o pedido e o momento em que a documentação chega até nós. Nós não temos a documentação há mais de três meses como referiu no email. Há três meses temos a documentação do imóvel e documentos de identificação das partes. Vendedoras, não tínhamos habilitação de herdeiros e muito menos procuração que esperamos há semanas, que teria que ser previamente validade nos moldes do banco em causa. Operamos nos ramos imobiliário há anos e o nosso foco e objectivo sempre foi satisfazer os nossos clientes. Portanto agradeço a vossa colaboração para terminarmos este processo. Estamos quase no fim do processo!”.
23. Por email datado de 17.6.2021, foi a empresa Century 21 – (…) Mediação Imobiliária, SA, na pessoa de (…), uma das gestoras do processo de venda, informada por (…), notária do Cartório Notarial de (…), da necessidade das Rés procederem às seguintes diligências:
a documentação há mais de três meses. Depois de analisarem solicitaram alguns documentos que remetemos com brevidade. Posteriormente voltaram a pedir documentos que voltamos a remeter. Por fim disseram-nos que teríamos de
- rectificação da caderneta predial no que respeita às quotas partes respeitantes a cada uma das herdeiras de (…) e (…), em consonância com o disposto em testamento deixado por esta;
- actualização no registo predial e na caderneta predial das áreas do imóvel e menção da existência de um pátio;
- solicitação à Câmara Municipal de uma certidão que comprove que, com a construção do pátio, não foi necessário emitir uma licença de utilização.
24. Por email datado de 17.06.2021, a empresa Century 21 – (…) Mediação Imobiliária, SA, na pessoa de (…), comunicou a (…), a informação que recebeu do Cartório Notarial de (…) aludida em 23, da seguinte forma: “Boa tarde (…). Solicito a sua maior atenção para o email abaixo. O que lhe foi solicitado por email e por telefone, por parte do banco, consta no mesmo pedido por parte do Cartório Notarial de (…). É uma questão que nós não conseguimos ultrapassar e só depende única e exclusivamente das proprietárias. Pedimos mais uma vez, a vossa colaboração para ultrapassar esta questão e façamos finalmente a escritura.”
25. A mesma informação foi transmitida pela Autora (…) e pelo gerente da agência do (…) Banco de Vila Real de Santo António à Ré (…), em data não concretamente apurada.
26. Até à presente data, nenhuma das Rés ou alguém por si mandatado, procedeu às diligencias referidas em 23.
27. A empresa Century 21 – (…) Mediação Imobiliária, SA, na pessoa de (…), remeteu a (…), Notária no Cartório Notarial de (…), sito na (…), um email, datado de 18.06.2021, com o seguinte teor: “Bom dia. A pedido do procurador de uma das proprietárias deste processo, o Alexandre, e após ter tido uma conversa consigo, segue toda a documentação para que possam analisar a possibilidade de se realizar a escritura deste imóvel. Aguardo resposta da vossa parte”. 28. A este email, respondeu (…), em 22.06.2021, a (…) da seguinte forma: “Boa tarde. Relativamente à escritura mencionada em epígrafe, após analisar a documentação, venho informar que a mesma está em condições de se fazer, apenas sendo necessário: - a habilitação de herdeiros de (…); - cancelamento do registo provisório correspondente à Ap. (…), de (…), o que será simples que eu mesma posso fazer, atento que o mesmo já se encontra caducado”.
29. A empresa Century 21 – (…) Mediação Imobiliária, SA, na pessoa de (…), remeteu à notária (…) novo email em 29.06.2021, com o seguinte teor: “Bom dia (…). Reenvio o documento solicitado, penso que o tenha, mas para que fique registado. Agradeço que me confirme, se sempre está disponível para realizar a escritura, após confirmação de todos os documentos já enviados, para que possa informar o banco da cliente compradora, e solicitar ao mesmo que aceite esta situação, tendo em conta tudo o que já aconteceu”.
30. A este email respondeu a Notária (…) por email datado de 30.06.2021, da seguinte forma: “Boa tarde, (…). Apesar de essa escritura de habilitação ter sido feita por mim, foi-o quando estive em funções no Cartório em (…), cujo arquivo lá ficou. Portanto, não tenho acesso a ele. A certidão que me envia, agora completa com o testamento, é o documento que faltava para a outorga da escritura. Fico a aguardar a marcação por parte do banco, uma vez que este terá que articular com o respectivo procurador.”
31. A empresa Century 21 – (…) Mediação Imobiliária, SA, na pessoa de (…) remeteu à notária (…), em 30.06.2021, novo email com o seguinte teor: “Boa tarde. Vou informar o banco da sua posição, e solicitar autorização para que seja feita a escritura convosco”.
32. O (…) Banco, na pessoa do gerente da agência de Vila Real de Santo António, (…), enviou em 06.07.2021, um email à empresa Century 21 – (…) Mediação Imobiliária, SA, na pessoa de (…), com o seguinte conteúdo: “Bom dia (…). Estou agora a responder porque só há pouco obtive a resposta da parte do Banco quanto a passagem do processo para Notário. Assim, o Banco não autoriza a realização da escritura em notário. No limite poder-se-ia tentar junto da Casa Pronta mas infelizmente julgo que ainda não estão a fazer escrituras. Julgo que o caminho será regularizar as duas situações e assim conseguiríamos resolver o problema. Desde já agradeço a V. atenção e colaboração”.
33. As Rés outorgaram, no dia 30.03.2009, uma escritura pública de partilha da herança aberta por óbito de (…), da qual faz parte, entre outros, o imóvel descrito em 1), nos termos da qual lhes foi adjudicado um terço indiviso do mesmo prédio.
34. A escritura pública de partilha referida em 33 foi objecto de rectificação pela escritura pública outorgada pelas Rés em 20.04.2009, na qual fizeram constar que procediam à partilha da herança ilíquida e indivisa aberta por óbito do dissolvido casal de seus pais, (…) e (…), e que o primeiro fez testamento público pelo qual instituiu herdeira da quota disponível de seus bens a sua referida mulher, (…).
35. Pela Autora (…) foi solicitada no Cartório Notarial de (…), sito na Urbanização (…), a preparação e marcação de escritura pública de rectificação de partilha, doação e compra e venda, com mútuo e hipoteca, tendo como finalidade proceder à rectificação da caderneta predial do imóvel descrito em 1 no que respeita às quotas partes respeitantes a cada uma das herdeiras de (…) e (…) e posterior compra e venda do mesmo.
36. A escritura pública referida em 35 foi marcada pelo Cartório Notarial de (…) para o dia 18.08.2021, tendo comparecido para outorga da mesma a Autora (…) e a Ré (…).
37. A Ré (…) recusou-se a outorgar a escritura pública referida em 35 por discordar dos seus termos, no que diz respeito à rectificação da partilha anteriormente efectuada entre as Rés e aludida em 33.
38. Por declaração passada pela Notária (…), do Cartório Notarial de (…), em 6.10.2021, foi por esta atestado que a escritura pública referida em 35 não foi celebrada por falta de acordo dos interessados nos termos da partilha.
39. Os Autores remeteram a cada uma das Rés, uma carta registada com aviso de recepção, juntas como doc. 8 com a petição inicial, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, datadas de 01.10.2021, com o seguinte assunto: “Resolução contrato promessa de compra e venda celebrado entre (…)/(…)/(…) e (…)/(…)”, da qual se retira, entre o mais, o seguinte teor: “(…) Apesar de ter ficado agendada a celebração da escritura publica de compra e venda no prazo de 90 dias, sucede que a mesma não foi outorgada, até ao presente, por facto imputável aos promitentes vendedores. Pois que, nos termos da cláusula oitava do referido contrato, os promitentes vendedores estavam obrigados a entregar toda a documentação necessária para a realização da escritura, o que não sucedeu, uma vez que existem desconformidades nas informações constantes na certidão permanente do Registo Predial e na caderneta predial das finanças. Assim, e nos termos do disposto no n.º 1, da cláusula nona do contrato promessa de compra e venda, dúvidas não restam de que estamos perante um incumprimento definitivo do contrato por factos imputáveis aos promitentes vendedores. Nestes termos, os promitentes compradores resolvem o contrato promessa de compra e venda celebrado com (…), (…) e (…), no dia 5 de fevereiro de 2021, e exigem o pagamento do montante total de € 30.000,00 (trinta mil euros), respeitante ao dobro do valor pago a título de sinal, no prazo máximo de 8 (oito) dias após a recepção da presente missiva, sob pena de serem acionados no imediato os competentes meios judiciais com vista ao pagamento desse valor, acrescidos de juros de mora”.
40. As cartas referidas em 39 foram redigidas e assinadas pelo Dr. (…), a quem os Autores haviam conferido, por procuração passada a 24.09.2021, “os mais amplos poderes forenses por lei permitidos, bem como os especiais para transigir e para os representar para efeitos de resolução do contrato promessa de compra e venda celebrado no dia 05.02.2021”.
41. As cartas referidas em 39 foram recepcionadas pelas Rés, que não responderam às mesmas.
42. Os financiamentos solicitados pelos Autores e supra aludidos em 12 extinguiram-se, por caducidade dos processos.
43. (Suprimido)
44. Os Autores suportaram a quantia total de € 499,20 (quatrocentos e noventa e nove euros e vinte cêntimos), a título de despesas com a concessão dos empréstimos bancários referidos em 12, mais concretamente:
- a quantia de € 320,00 (trezentos e vinte euros), a título de comissão pelo crédito relativo à aquisição do imóvel;
- a quantia de € 12,80 (doze euros e oitenta cêntimos), a título de imposto de selo pelo crédito relativo à aquisição do imóvel;
- a quantia de € 160,00 (cento e sessenta euros), a título de comissão pelo crédito relativo às obras;
- a quantia de € 6,40 (seis euros e quarenta cêntimos), a título de imposto de selo pelo crédito relativo às obras.
45. Com vista à regularização das desconformidades referidas em 23, os Autores contrataram os serviços de uma advogada, a qual cobrou a quantia de € 492,00 (quatrocentos e noventa e dois euros), a titulo de honorários, a qual foi paga.
46. A aquisição do imóvel descrito em 1 tornou-se parte essencial do projecto de vida dos Autores, que nele pretendiam habitar permanentemente.
47. Na sequência das Rés não terem procedido às diligencias referidas em 23 e da recusa da Rés (…) referida em 35, a Autora (…) viu o seu projecto de vida paralisado, voltando à estaca zero após vários meses de diligencias tendentes à aquisição do imóvel descrito em 1.
48. A 17.12.2021, a Autora (…) iniciou consultas de psiquiatria no Grupo (…) Saúde, com o Dr. (…), que mediante atestado médico, datado de 20.12.2021, atestou que tais consultas se iniciaram devido a episódio depressivo com componente de grande ansiedade reativo ao problema de não conclusão da celebração do contrato prometido de compra e venda.
49. Nesse relatório, atesta ainda o dito médico psiquiatra que na Autora observou sentimentos penosos, associados a perda de vitalidade, sensação de desalento, acompanhados de explosões emocionais, como crimes de raiva, impaciência, dificuldades cognitivas de concentração e memória, marcadas por esquecimentos e desorientação; grande sofrimento psicológico e desespero, situação que afectou a sua vida profissional e a dinâmica familiar.
50. O estado depressivo descrito em 48, teve consequências na vida social da Autora (…), que passou a refugiar-se em casa, quando antes ia com regularidade ao café e a casa de amigos e familiares.
51. Tendo-se também reflectido em distúrbios do sono, com diagnostico de insónia inicial e intermédia.
52. Os Autores nunca interpelaram por escrito ou verbalmente a Ré (…) para no prazo de 10 dias a contar da interpelação repor a situação objecto de queixa sob pena de se considerar em incumprimento, mas tão só falaram com esta para resolver a questão da documentação em falta para a venda. (Aditado)
53. Os Autores não marcaram a escritura publica de compra e venda no prazo de 90 dias a contar da data da assinatura do contrato promessa.” (Aditado)
*
B) Factos não provados:
a) Que Autores e Rés tivessem acordado que o pagamento da quantia a título de honorários, referida em 45 seria dividido em partes iguais.
b) Que, à revelia das Rés, os Autores ocuparam o imóvel, em data que se desconhece após a celebração do contrato promessa, e nele realizaram diversas obras de demolição no seu interior, nomeadamente destruíram todas as paredes interiores, a cozinha e a casa de banho, removeram o pavimento, tornando o imóvel absolutamente inútil para o fim a que se destina que é a habitação.
c) Tendo-o abandonado, mais tarde.
d) Que os danos causados pelos Autores no imóvel desvalorizaram-no em pelo menos a quantia de € 50.000,00 (cinquenta mil euros).
e) Que o imóvel se encontrava em bom estado de conservação.
f) Que para além da inscrição do prédio urbano descrito em 1 a favor das três Rés, não fosse necessária qualquer outra formalidade para a venda do mesmo aos Autores.
g) Que os Autores, antes da celebração do contrato promessa referido em 1, conhecessem a exacta situação jurídica do prédio urbano objecto do mesmo.
h) Que a empresa Century 21 – (…) Mediação Imobiliária, SA recebeu, na data da outorga do contrato promessa de compra e venda referido em 1, na íntegra, a sua comissão.
i) Que a Ré (…) entregou à empresa Century 21 – (…) Mediação Imobiliária, SA toda a documentação que lhe foi solicitada.
j) Que a Ré (…) estava convicta que a escritura pública referida em 18) era apenas de compra e venda do imóvel objecto do contrato promessa.”
*
A-2- e B-2- Reapreciação de mérito do recurso das Apelantes (…) e (…) e do recurso dos Apelantes (…) e (…).
Dispõe o artigo 410.º, n.º 1, do Código Civil (doravante apenas CC), que:
1. À convenção pela qual alguém se obriga a celebrar certo contrato são aplicáveis as disposições legais relativas ao contrato prometido, excetuadas as relativas à forma e as que, por sua razão de ser, não se devam considerar extensivas ao contrato-promessa”.
Já o artigo 441.º do mesmo Código estatui que:
No contrato promessa e compra e venda presume-se que tem carácter de sinal toda a quantia entregue pelo promitente-comprador ao promitente-vendedor, ainda que a título de antecipação ou princípio de pagamento do preço”.
Por seu turno, decorre do artigo 442.º, ainda do mesmo diploma legal, o seguinte:
1. Quando haja sinal, a coisa entregue deve ser imputada na prestação devida, ou restituída quando a imputação não for possível.
2. Se quem constituir o sinal deixar de cumprir a obrigação por causa que lhe seja imputável, tem o outro contraente a faculdade de fazer sua a coisa entregue; se o não cumprimento do contrato for devido a este último, tem aquele a faculdade de exigir o dobro do que prestou, ou, se houve tradição da coisa a que se refere o contrato prometido, o seu valor, ou o do direito a transmitir ou a constituir sobre ela, determinado objetivamente, à data do não cumprimento da promessa, com dedução do preço convencionado, devendo ainda ser-lhe restituído o sinal e a parte do preço que tenha pago.
[…]
4. Na ausência de estipulação em contrário, não há lugar, pelo não cumprimento do contrato, a qualquer outra indemnização, nos casos de perda do sinal ou de pagamento do dobro deste, ou do aumento do valor da coisa ou do direito à data do não cumprimento”.
Em face das normas acabadas de transcrever e da factualidade considerada como provada nos autos, mormente nos pontos 1, 4, 6 e 7, vertidos no sub-segmento relativo aos factos considerados como provados na sentença recorrida, podemos concluir que entre Apelantes e Apelados foi outorgado em 05/02/2021 um Contrato-Promessa de Compra e Venda de um imóvel e que estes últimos na qualidade de promitentes-compradores se obrigaram a pagar aos primeiros na qualidade de promitentes-vendedores a quantia de € 15.000,00 (quinze mil euros), a título de sinal e principio de pagamento, pagamento a que procederam apenas em 23/04/2021, pese embora tenha ficado exarado no documento que formalizou o aludido contrato-promessa terem os promitentes-vendedores recebido a dita quantia na data da outorga do contrato-promessa e dela terem dado quitação.
O facto de a quantia relativa ao sinal prestado ter sido paga por meio de transferência bancária para conta bancária titulada pela empresa Century 21 – (…) Mediação Imobiliária, SA, que fez sua a quantia correspondente a comissão contratada com as Apelantes disponibilizando a cada uma delas a quantia de € 2.950,00 (dois mil novecentos e cinquenta euros), que apenas entregou em 20/05/2021, não importa um eventual incumprimento por parte dos Apelados, quanto é certo, por um lado. que os mesmos se obrigaram a proceder ao pagamento do sinal por transferência bancária para conta bancária designada pelas Apelantes e por outro que o negócio de compra e venda do imóvel objecto do contrato-promessa foi intermediado pela supra identificada empresa imobiliária com quem as Apelantes outorgaram em 08/02/2021 contrato de mediação imobiliária.
Por consequência e tal como decorre da sentença recorrida eventuais dissídios que possam existir relativos à cativação imediata pela empresa de mediação imobiliária de certa quantia relativa à comissão cobrada e disponibilização apenas da restante quantia às Apelantes volvidas quatro semanas após o pagamento não vinculam os Apelados, que não intervieram na outorga do contrato de mediação imobiliária, envolvendo a respectiva discussão unicamente as Apelantes e a Century – 21, não sendo, assim, tal matéria objecto de apreciação nos presentes autos.
Aqui chegados impõe-se abordar a primeira questão integrante da apreciação do mérito levantada pelas Apelantes (…) e (…) nas suas conclusões recursivas aperfeiçoadas, que respeita à actuação de (…) como procurador.
Dizem as Apelantes em apreço que resulta da procuração junta aos autos com o requerimento endereçado aos mesmos em 23/05/2023 terem sido conferidos por (…) a (…) apenas “poderes para que este outorgasse a escritura pública do imóvel identificado no CPCV”.
Porém, da leitura da dita procuração resulta que além desse poderes foram ainda concedidos “os poderes necessários para representar a mandante junto do Banco, para efetuar o depósito do cheque e respetiva transferência bancária […], e dum modo geral, requerer, praticar todos os actos e diligências e assinar tudo o que necessário for aos mencionados fins no que diz respeito à escritura de compra e venda do prédio urbano supra identificado. – (realce em itálico nosso).
Como tal mostra-se infundada a questão levantada entre as conclusões 12.º a 14.ª das conclusões recursivas aperfeiçoadas, sendo certo ainda que as Apelantes tão pouco retiraram do que alegaram quaisquer consequências jurídicas.
As Apelantes (…) e (…) invocaram ainda nas respectivas conclusões recursivas aperfeiçoadas não se terem constituído em mora no tocante ao cumprimento do contrato-promessa, tentando, (sem o dizerem expressamente nas ditas conclusões), fazer recair eventual mora sobre os Apelados com base no que referiram nos pontos 16.º a 18.º das ditas conclusões.
Do mesmo passo os Apelantes (…) e (…) sustentaram nas conclusões que alinharam no respectivo recurso existir incumprimento definitivo do contrato-promessa por parte dos Apelados.
Vejamos se a matéria factual considerada como provada em definitivo nos autos apoia, ou não, a sua versão.
Resulta do elenco dos factos assentes na sentença recorrida que o contrato prometido de compra e venda do imóvel deveria ter sido outorgado no prazo de 90 dias a contar do dia 05/02/2021, data da outorga do contrato-promessa , em dia, hora e local a fixar pelos Apelados “mediante acordo” com os Apelantes, devendo os primeiros informar os segundos sobre tais elementos com antecedência mínima de 3 dias em relação à sua realização (ponto 8 dos factos provados).
Tal não sucedeu.
Note-se, ainda, que por força do acordado entre as Partes no n.º 1 da cláusula nona do contrato-promessa em escrutínio nestes autos a circunstância de o contrato prometido não ser celebrado no aludido prazo de 90 dias, “por causa imputável a qualquer das partes”, possibilitava desde logo que a parte considerasse o contrato-promessa definitivamente incumprido “aceitando os outorgantes o mero decurso desse lapso de tempo como necessário e suficiente para extrair tal consequência” (ponto 10 dos factos provados).
Por outras palavras, os ora Apelantes e Apelados resolveram por acordo ultrapassar a necessidade de interpelação admonitória do faltoso, em caso de atraso no cumprimento do contrato-promessa, para satisfação da prestação em falta em prazo a fixar sob pena de então incorrer em incumprimento definitivo do mesmo, possibilitando desde logo ao não inadimplente a invocação perante o faltoso do incumprimento definitivo de tal contrato e consequente declaração de resolução contratual, de acordo com o n.º 2 da mencionada cláusula nona.
Resulta igualmente dos factos assentes nos autos que para pagamento de parte do preço do imóvel prometido adquirir, na qual se incluía a quantia a sinalizar, bem como para realização de obras no dito imóvel, os Apelados requereram junto do Novo Banco, em data anterior a 19/03/2021, dois empréstimos, consubstanciados em um crédito à habitação e um crédito para obras, os quais apenas vieram a ser definitivamente aprovados em 18/05/2021 (pontos 12 e 13 dos factos provados).
É certo que em 18/05/2021 já decorrera o prazo de 90 dias contabilizado desde a data da outorga do contrato-promessa entre Apelados e Apelantes.
Contudo, estando igualmente assente sob o ponto 14 dos factos provados que a Co-Apelante (…) interveio nos ditos empréstimos como fiadora não se mostra correcto afirmar de forma singela, como o fizeram as Apelantes nas suas conclusões recursivas, que os créditos bancários que os Apelados quiseram obter é “facto inoponível às RR”, consubstanciando-se, outrossim, em facto do conhecimento dos Apelantes.
E se é verdade que no clausulado do contrato-promessa não se encontra qualquer cláusula que condicionasse a outorga do contrato prometido ou definitivo à aprovação final e concessão dos ditos empréstimos, não é menos verdade que resultou assente que os Apelados iniciaram o processo com vista a obter aqueles mútuos com devida antecedência relativamente ao termo do prazo para outorga do contrato prometido (seguramente com pelo menos mês e meio de antecedência), não tendo resultado provadas quaisquer circunstâncias ou constrangimentos imputáveis aos Apelados passíveis de colocar entraves à aprovação dos empréstimos, ou aptos a obstaculizar a outorga do contrato definitivo dentro do prazo de noventa dias estabelecido entre as Partes contratantes.
De todo o modo sempre se acrescentará não ter resultado provada qualquer interpelação baseada em mora, ou evocativa de incumprimento definitivo, endereçada por qualquer dos Apelantes aos Apelados , em cumprimento do disposto na supra mencionada clausula nona, n.º 1, do contrato-promessa.
Dito isto, afigura-se não ser de considerar imputável aos Apelados o facto de não terem providenciado pela outorga da escritura de compra e venda do imóvel no aludido prazo de noventa dias, bem como de informar os Apelantes com a antecedência mínima prevista na cláusula quarta do contrato-promessa, o que afasta a aplicação do previsto na clausula nona, n.º 1, do dito contrato-promessa, de que resulta não poder considerarem-se os Apelados em situação de incumprimento definitivo, ou sequer mora, decorrido o tal prazo de noventa dias desde a outorga do contrato-promessa.
Em face do exposto naufraga, necessariamente, o pedido de condenação dos Apelados no pedido reconvencional deduzido pelos Apelantes (…) e (…) traduzido na perda a favor dos Apelantes do valor pago pelos Apelados a título de sinal.
E será que se pode considerar que os Apelantes incorreram em incumprimento definitivo do contrato-promessa como concluiu o Tribunal a quo?
Julgamos que em face da modificação da matéria de facto resultante da apreciação da impugnação apresentada pelos Recorrentes, mormente dos Apelantes (…) e (…), a resposta terá igualmente que ser negativa.
Com efeito decorre da clausula décima, n.º 2, do contrato-promessa outorgado por Apelantes e Apelados em 05/02/2021 (reproduzida no facto provado na sentença recorrida sob o ponto 12), que a não verificação ou omissão de qualquer condição de venda por parte dos primeiros contratantes (ora Apelantes), na data da outorga do contrato prometido obrigaria os mesmos a, num prazo de dez dias “a contar da interpelação dos segundos contratantes” (ora Apelados), reporem a situação objecto da queixa sob pena de se considerar em incumprimento.
Significa isto que as partes entenderam fazer depender o incumprimento definitivo do contrato-promessa caso sobreviessem à outorga do mesmo entraves à outorga do contrato definitivo de compra e venda, cuja resolução constituísse condição para tal outorga, traduzidos em actos a praticar por parte dos promitentes-vendedores, de uma interpelação a estes últimos, com vista a solucionarem/removerem os aludidos obstáculos à venda definitiva, a realizar pelos promitentes compradores.
Tais entraves que não sendo ultrapassados impedem a outorga do prometido contrato definitivo de compra e venda surgindo, como tal, como condição prévia para a dita outorga, traduzem-se essencialmente na rectificação, actualização e obtenção da documentação descrita no facto vertido sob o ponto 23 dos factos considerados como provados na sentença recorrida, estando igualmente assente que até à data nenhum dos Apelantes, ou alguém por si mandatado, efectuou as ditas diligências, tendo a Apelante (…) sido informada dessa necessidade (pontos 25, 26 e 52, parte final).
Flui da matéria de facto considerada como provada que foi contactado pela agência imobiliária intermediária na venda do imóvel, Century 21, um outro Cartório Notarial no Algarve, concretamente (…), que se dispunha a realizar a outorga da escritura do contrato prometido de compra e venda entre os Apelantes e os Apelados aparentemente sem os elementos sinalizados como necessários pelo Cartório Notarial de (…), discriminados no ponto 23 dos factos considerados como provados, situação que não deixa de se estranhar.
De todo o modo, resulta também assente nos autos (ponto 15 dos factos considerados como provados), que a outorga da escritura pública do contrato prometido de compra e venda entre os Apelantes e os Apelados deveria ter lugar no dito Cartório Notarial de (…), por ser a entidade já escolhida para a realização desse acto jurídico, razão pela qual se entende não ser de discorrer mais sobre esse aspecto.
Ora, se é certo que as diligências apontadas como prévias e necessárias, desse modo constituindo condição para a posterior marcação e realização da escritura pública da compra e venda prometida, chegaram ao conhecimento dos Apelantes e apesar de, outrossim, terem resultado assentes os factos descritos nos pontos 35 a 38 do sub-segmento dos factos considerados como provados na sentença recorrida, o certo é que os Apelados confessaram, quando foram ouvidos em declarações de parte na audiência final realizada no Tribunal a quo, que nunca interpelaram por escrito ou verbalmente a Ré (…) para no prazo de 10 dias a contar da interpelação repor a situação objecto de queixa sob pena de se considerar em incumprimento, mas tão só falaram com esta para resolver a questão da documentação em falta para a venda (ponto 52 dos factos provados).
Assim e apesar de na missiva que enviaram a cada uma das Apelantes invocando a resolução do contrato promessa com base em incumprimento definitivo os Apelados se escudarem na clausula nona do dito contrato, certo é que à situação factual concreta que temos vindo a analisar mostra-se previamente aplicável o que ficou estabelecido na clausula décima, pelo que não tendo resultado provado que até ao momento os Apelados tenham interpelado os Apelantes para num prazo de dez dias procederem às diligências descritas no ponto 23 dos factos considerados como provados com a advertência de não o fazendo incorrerem então em incumprimento definitivo do contrato-promessa não se poderá considerar o dito contrato como validamente resolvido.
E soçobrando essa pretensão dos Apelados naturalmente que não poderá proceder a pretensão de receberem o valor do sinal em dobro, nem a pretensão indemnizatória por danos patrimoniais e não patrimoniais posto que as mesmas se alicerçam na resolução contratual assente em incumprimento definitivo do contrato-promessa.
Por fim, impõe-se referir que as custas decorrentes da improcedência do pedido reconvencional de forma alguma poderiam recair sobre as Apelantes (…) e (…), que não o deduziram.
Procedem, em consequência, ambos os recursos independentes interpostos, sendo que o recurso interposto pelos Apelantes (…) e (…), apenas parcialmente, decaindo no tocante ao pedido reconvencional que deduziram contra os Apelados.
***
V- Decisão:
Termos em que, face ao exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar procedente o recurso independente interposto pelas Apelantes (…) e (…) e parcialmente procedente o recurso independente interposto pelos Apelantes (…) e (…), consequentemente decidir:
1- Revogar a sentença recorrida no tocante ao decidido nas alíneas a) a d) do respectivo dispositivo;
2- Julgar improcedentes os pedidos formulados pelos Apelados na petição inicial e bem assim o pedido ampliado no articulado superveniente de 22/05/2022 absolvendo-se todos os Apelantes dos mesmos;
3- Confirmar a sentença recorrida no tocante à improcedência do pedido reconvencional deduzido pelos Apelantes (…) e (…) contra os Apelados;
4- Condenar os Apelados e os Apelantes (…) e (…) nas custas devidas na proporção de 80% para os primeiros e de 20% para os segundos – artigo 527.º, n.ºs 1 e 2, do CPCivil.
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Notifique e registe.
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Évora, 27 de Junho de 2024
José António Moita (Relator)
Ana Pessoa (1ª Adjunta)
Maria Adelaide Domingos (2ª Adjunta)