OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO
FUNDAMENTOS
CONSTITUCIONALIDADE
Sumário

1. Não é inconstitucional a norma do artigo 729.º, alínea g), do Código de Processo Civil ao estabelecer que oposição só pode ter por fundamento facto extintivo ou modificativo da obrigação, desde que seja posterior ao encerramento da discussão no processo de declaração e se prove por documento.
2. Norma que decorre do princípio da concentração da defesa na contestação estabelecido no artigo 573.º, n.º 1, do CPC e tem a sua justificação no respeito pela força do caso julgado que se formou sobre a sentença exequenda.
3. A garantia constitucional de acesso ao direito, não é incompatível com a existência de regras no exercício do direito, antes as reclama, sob pena de o excesso de defesa duma parte poder geral uma desproteção desproporcionada da outra parte.
4. A preclusão de invocação dos factos modificativos ou extintivos da obrigação anteriores ao encerramento da discussão da causa em 1ª instância, nada tem de inconstitucional, designadamente, por não violar o artigo 20.º da CRP, não retirando nem limitando o direito de acesso ao direito e aos tribunais.
(Sumário da Relatora)

Texto Integral

Apelação n.º 2797/22.8T8LLE-A.E1
2ª Secção

Acordam no Tribunal da Relação de Évora:


I

Por apenso à Execução de sentença que contra si foi instaurada por AA e BB, veio CC deduzir os presentes embargos de executado, pedindo que se declare que a Embargante / executada não tem qualquer obrigação de pagamento da quantia exequenda, devendo, por isso, ser declarada extinta a execução e os Executados condenados no pagamento de uma multa / indemnização a favor da Embargante em valor nunca inferior a € 6.000,00 por litigância de má-fé.

Foi proferido saneador-sentença que decidiu:
a) Julgar totalmente improcedentes, por não provados, os presentes embargos de executado e, consequentemente, a execução deverá prosseguir os seus trâmites normais, o que se determina;
b) Condenar a Embargante/executada CC no pagamento das custas e demais encargos com o processo, sem prejuízo da proteção jurídica que lhe foi concedida;

c) Absolver os Embargados/exequentes AA e BB, do pedido de condenação como litigantes de má-fé contra eles deduzido pela Embargante/executada.

Inconformada, veio a Embargante recorrer tendo extraído das alegações que apresentou as seguintes
Conclusões:
1 – O presente recurso vem suscitar duas questões, a saber:
A admissibilidade, por confissão dos exequentes, do facto de terem recebido da executada a quantia de € 18.100,00.
A inconstitucionalidade da alínea g) do artigo 729.º do CPC:
Fundando-se a execução em sentença, a oposição só pode ter algum dos fundamentos seguintes: g) Qualquer facto extintivo ou modificativo da obrigação, desde que seja posterior ao encerramento da discussão no processo de declaração e se prove por documento; a prescrição do direito ou da obrigação pode ser provada por qualquer meio.
2 – Quanto à primeira questão, a admissão do recebimento da quantia de € 18.100,00, pelos exequentes, provavelmente por lapso, a sentença recorrida não teve em consideração esta confissão, para proceder à respetiva dedução do valor da execução, o que desde já se requer.
3 – Foi fixado pela sentença recorrida o valor da execução de € 46.840,00, sendo que após a confissão/admissão de recebimento pela parte dos exequentes, do valor de € 18.100,00, deverá ser corrigido o valor da execução e fixado esse valor em € 28.740,00.
4 – Termos em que se requer o valor da execução, nos termos supra referidos.
5 – Na verdade dispõe o artigo 729.º do CPC quais os fundamentos que podem existir na execução com base em sentença, nomeadamente, o da alínea g).
6 – Ora, entende a recorrente que o legislador quis neste caso concreto salvaguardar os direitos e garantias do cidadão, nomeadamente, se tiver ocorrido facto extintivo ou modificativo da obrigação, neste caso o pagamento.
7 – Não faz qualquer sentido, desde que seja posterior ao encerramento da discussão no processo de declaração uma vez que podem existir documentos comprovativos do pagamento da obrigação anteriores ao encerramento da discussão no processo de declaração e os mesmos têm de ser considerados, não podendo a lei restringir os direitos da executada.
8 – No caso concreto existe caso julgado, sem a presença da executada que na altura na pode apresentar os documentos bancários comprovativos dos cumprimentos da obrigação, nem apresentar a sua defesa, porém, como no caso julgado, não pode a executada fazer mais nada, encontrando-se de pés e mãos atadas.
9 – Mas, não é obrigada a proceder duas vezes ao mesmo pagamento da mesma quantia, razão pela qual se invoca a inconstitucionalidade desta alínea, violando o disposto no artigo 18.º, n.º 1 a 3, da CRP.
10 – Trata-se de uma lei restritiva dos direitos da executada que é apresentar os documentos comprovativos da modificação da obrigação.
11 – Entende a recorrente ver a inconstitucionalidade desta alínea por não respeitar a acumulação dos requisitos de carater geral e abstrato previstos no artigo 18.º da CRP.
12 – A norma do artigo 729.º, al. g), do CPC, na medida em que limita injustificadamente os fundamentos de oposição à execução, padece de vício de inconstitucionalidade por violação do “princípio da proibição da indefesa” enquanto aceção do direito de acesso ao direito e aos tribunais.
13 – Sob a epígrafe “Acesso ao Direito e Tutela Jurisdicional Efetiva” o referido artigo 20.º prevê no seu n.º 1 que «1. A todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos».
14 – O artigo 729.º, alínea g), do CPC, ao limitar a possibilidade de defesa da Executada, violando o plasmado no artigo 20.º, n.º 1, e também o artigo 18.º, ambos da CRP, ao impedir desproporcionalmente a possibilidade de defesa da executada.
15 – Impõe o artigo 18.º, n.º 2, da CRP que “2. A lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos.”
16 – Acompanhamos a argumentação do Acórdão 437/12 que remete para o Ac. 468/12 ambos do TC, citados no Ac. 529/2012, do Relator Conselheiro Vítor Gomes, citamos o seguinte trecho que, com a devida vénia fazemos também nosso.
17 – Nos termos do artigo 18.º, n.º 2, da Constituição, se uma limitação interfere com um direito, restringindo-o, necessário se torna encontrar na própria Constituição fundamentação para a limitação do direito em causa como que esta se limite “ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos” – não podendo, por outro lado, nos termos do n.º 3 do mesmo artigo “diminuir a extensão e alcance do conteúdo essencial dos preceitos”.
Verifica-se, assim, erro de interpretação, aplicação e determinação da norma cuja inconstitucionalidade se invoca e aplicável aos presentes autos, devendo a sentença recorrida ser declarada nula e revogada.
Deverá ser corrigido o valor da execução em conformidade com os artigos 296.º, 297.º, 299.º, n.º 1, 304.º, n.º 1 e 306.º, n.º 1, todos do CPC.
Termos em que deve a sentença recorrida ser revogada, por violação das normas constantes dos artigos 296.º, 297.º, 299.º, n.º 1, 304.º, n.º 1 e 306.º, n.º 1, todos do CPC.

Não foram apresentadas contra-alegações.

II


Do objeto do recurso:

Considerando a delimitação que decorre das conclusões das alegações (artigos 635.º, 3 e 639.º, 1 e 2, do CPC), sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (artigo 608.º, in fine), importa apreciar:

- Da confissão dos exequentes, do facto de terem recebido da executada a quantia de € 18.100,00, para efeitos de processado e de valor da ação.
- Da inconstitucionalidade da alínea g) do artigo 729.º do CPC.

III
Fundamentação de facto
O tribunal a quo deu como provada a seguinte factualidade.
1. Factos provados:
1. AA e BB, intentaram em 06/10/2022 a execução contra a executada CC, apresentando como título executivo a sentença proferida nos autos n.º 865/19...., em que são Autores AA e BB e Ré, CC, datada de 19/10/2020, em sujo segmento decisório consta “IV- Decisão: Pelo exposto, ao abrigo das citadas disposições legais, decido julgar a ação parcialmente procedente, por provada, e em consequência: - declaro resolvidos os contratos de arrendamento celebrados com a ré tendo por objeto as frações autónomas identificadas nos pontos 1 e 4 dos factos provados; - condeno a ré a entregar aos autores as referidas frações autónomas, livres de pessoas e bens; - condeno a ré a pagar aos autores o valor das rendas vencidas até ao presente e que se cifram em € 43.330,00 e desde esta data e até ao trânsito em julgado da decisão no montante mensal de € 1.170,00; - absolvo a ré do demais peticionado (…)”;
2. Na sentença apresentada como título executivo, consta, além do mais “A ré foi citada editalmente, não apresentou contestação e encontra-se representada em juízo pelo Ministério Público (...)
Segundo resulta apurado, a ré não procedeu ao pagamento das respetivas rendas acordadas, na totalidade ou parcialmente. Concretamente, em relação à loja ..., a ré não liquidou as rendas referentes aos meses de janeiro a dezembro de 2016 e 2017 (24 meses x € 470), 8 meses de rendas nos anos de 2018 e 2019 (16 x € 470) e no ano de 2020 não liquidou 9 rendas (9 x € 470), num total em dívida de € 23.030,00. E em relação à loja ..., a ré não liquidou metade do valor das rendas referentes aos meses de janeiro a dezembro de 2016 e 2107 (24 meses x € 350), metade do valor de 8 meses de rendas dos anos de 2018 e 2019 (16 x € 350) e no ano de 2020 não liquidou 9 rendas (9 x € 700), num total em dívida de € 20.300,00.
Tal será bastante para, à luz do citado artigo 1083.º, n.º 3, do Código Civil, considerar que opera o fundamento de despejo invocado.
Deve, pois, proceder o pedido de declaração da resolução do contrato de arrendamento em vigor.
O mesmo sucede em relação ao pedido de entrega do imóvel, na medida em que, validamente resolvido o contrato de arrendamento, não tendo as frações autónomas sido entregues voluntariamente aos autores, assiste-lhes o direito de exigi-lo – artigo 1081.º, n.º 1, do Código Civil.
Pelo que procede a pretensão de condenação da ré na entrega do locado, livre de pessoas e bens.
Passando ao pedido de pagamento das rendas em falta. Mostra-se provado que a ré não realizou o respetivo pagamento, nos termos assinalados e por referência a um menor número de rendas que havia indicado (factos indicados em 8). Assim, haverá de saber quais as consequências desse incumprimento (...) Donde, concluindo, os autores têm direito ao pagamento das rendas vencidas e não pagas, no total de € 43.330,00, e as que se vencerem até trânsito em julgado da decisão, à razão mensal de € 1.100,00. Acresce que, tratando-se de obrigação com prazo certo, não tendo a prestação sido efetuada no tempo devido, o devedor constitui-se em mora, sendo devidos juros a contar do dia da sua constituição, nos termos dos artigos 804.º, n.ºs 1 e 2, 805.º, n.º 2, alínea a) e 806.º, n.º 1, do Código Civil. Porém, pese embora seja devida dessa essa data, os autores apenas peticionam a condenação da ré nas rendas em falta, pelo que, atento o princípio do pedido plasmado no artigo 609.º do Código de Processo Civil, não será de considerar a mora e respetivos juros. Haverá, ainda, que dizer que não se demonstra (nem os autores alegam, sendo que a ré foi citada editalmente) que esta tivesse procedido ao pagamento das rendas, com a indemnização prevista no artigo 1041.º do Código Civil, situação que obstaria à resolução do contrato – cfr. artigo 1048.º do mesmo diploma (...)”;
3. A ré e ora Embargante/executada CC interpôs recurso de revisão da sentença proferida nos autos n.º 865/19.... e que serve de base à execução de que estes embargos de executado constituem apenso, o qual foi rejeitado, por extemporâneo, por decisão de 29/10/2021;
4. A ré e ora Embargante/executada CC não se conformou com a decisão referida em 3 e da mesma apresentou recurso para o Venerando Tribunal da Relação de Évora, o qual foi julgado improcedente por douto acórdão datado de 10/02/2022;
5. A ré e ora Embargante/executada CC não se conformou com a decisão referida em 4 e da mesma apresentou recurso de revisão para o Colendo Supremo Tribunal de Justiça, sendo proferida decisão de não admissão do recurso de revista, datada de 09/06/2022;
6. A ré e ora Embargante/executada CC notificada da decisão referida em 5, interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, o qual não foi admitido por decisão datada de 25/09/2022;
7. A Embargante/executada entregou as chaves das lojas aos exequentes em 18/01/2021.
*
2. Factos não provados:
Inexistem quaisquer factos não provados, porquanto provaram-se todos os factos alegados pelas partes e com interesse para a decisão.
Quanto ao mais alegado pelas partes, tratam-se de factos sem relevância para a decisão a proferir neste apenso, ou de matéria conclusiva e/ou de direito.
*


Apreciando.
IV
Fundamentação jurídica
Da primeira questão do recurso:
Importa apreciar se no decurso dos embargos ocorreu confissão dos exequentes de que receberam € 18.100,00 da Embargante, devendo tal confissão sido considerada na redução do montante da dívida e na alteração do valor da execução.
Colhe-se da contestação aos embargos a seguinte alegação:
“52 - Atentando na PI da ação de despejo, onde foi proferida a sentença exequenda, são os seguintes os valores de rendas vencidas no período de 1 de Julho de 2016 até 31 de março de 2018, período em que o exequente AA era senhorio único da loja ... e tinha direito a metade da renda da loja ... (470,00 euros + 350,00 euros = 820,00 euros):
21 meses x 820,00 euros – totaliza 17.220,00 euros
53 - E no período com início em 1 de Abril de 2018 até ../../2020, em que passa a ter direito às duas rendas por inteiro (470,00 euros + 700,00 euros = 1.170,00 euros):
30 meses x 1.170,00 euros – totaliza 35.100,00 euros
54 - Os dois valores somam 52.320,00 euros.
55 - A embargante entregou os seguintes valores:
Em 2016 – 2.100,00 euros;
Em 2017 – 9.500,00 euros;
Em 2028 – 3.000,00 euros;
Em 2019 – 3.500,00 euros,
O que totaliza 18.100,00 euros.
56 - Claramente não pagou as rendas em causa na execução, recordando que os pagamentos parciais acima recebidos ainda se reportavam a dívida acumulada desde antes do início dos contratos (especificamente da loja ...) , como se disse, dívida que ainda acumulou na vigência dos mesmos.”
Recorrendo às regras interpretativas da declaração judicial previstas nos artigos 236.º a 239.º do Código Civil, resulta fora de qualquer dúvida que o recebimento de € 18.100,00, confessado, se reporta a dívida não contemplada na execução. Logo, mal se entende a pretensão da embargante de que na execução não foi reduzida a dívida em conformidade.
Não foi nem tinha de ser porque tal pagamento se reportou a outra dívida.
Resultando prejudicada a questão de saber se, a ter ocorrido pagamento da quantia exequenda, o valor da execução deveria ser reduzido em conformidade.
Mesmo em tal caso o valor da execução obedece a critérios especiais como resulta do artigo 298.º, n.º 1, do CPC:
“1 - Nas ações de despejo, o valor é o da renda de dois anos e meio, acrescido do valor das rendas em dívida ou do valor da indemnização requerida, consoante o que for superior.
(…)”
E, esse valor fixado no momento em que a ação é proposta, mantem-se, por regra, imutável, conforme previsão do artigo 299.º, n.º 1, do mesmo CPC:
1 - Na determinação do valor da causa, deve atender-se ao momento em que a ação é proposta, exceto quando haja reconvenção ou intervenção principal.
(…)”.
Assim, não colhe provimento tal fundamento do recurso, que se julga improcedente.

Da segunda questão de recurso:
Vem a apelante/embargante invocar a inconstitucionalidade da alínea g) do artigo 729.º do CPC que prevê que:
“Fundando-se a execução em sentença, a oposição só pode ter algum dos fundamentos seguintes:
(…)
g) Qualquer facto extintivo ou modificativo da obrigação, desde que seja posterior ao encerramento da discussão no processo de declaração e se prove por documento; a prescrição do direito ou da obrigação pode ser provada por qualquer meio.”
Refere que a exigência de que os factos sejam posteriores ao encerramento da discussão no processo de declaração, não faz qualquer sentido, uma vez que podem existir documentos comprovativos do pagamento da obrigação anteriores ao encerramento da discussão no processo de declaração e os mesmos têm de ser considerados, não podendo a lei restringir os direitos da executada.
E que, no caso concreto existe caso julgado, sem a presença da executada que na altura não pode apresentar os documentos bancários comprovativos dos cumprimentos da obrigação, nem apresentar a sua defesa, encontrando-se de pés e mãos atadas.
Vejamos.
Rege a Constituição da República Portuguesa que:
“Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei” – artigo 13.º, n.º 1.
“A todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos” – artigo 20.º, n.º 1.
“Todos têm direito, nos termos da lei, à informação e consulta jurídicas, ao patrocínio judiciário e a fazer-se acompanhar por advogado perante qualquer autoridade” – artigo 20.º, n.º 2.
“Todos têm direito a que uma causa em que intervenham seja objeto de decisão em prazo razoável e mediante processo equitativo” – artigo 20.º, n.º 4.
“São inconstitucionais as normas que infrinjam o disposto na Constituição ou os princípios nela consignados” – artigo 277.º.
Impõe-se confrontar tais normas e princípios constitucionais com a norma processual do artigo 729.º, alínea g) que decorre do princípio da concentração da defesa na contestação estabelecido no artigo 573.º, n.º 1, do CPC: “Toda a defesa deve ser deduzida na contestação, excetuados os incidentes que a lei mande deduzir em separado”.
A exigência de que o facto seja posterior ao encerramento da discussão no processo de declaração justifica-se pelo respeito pela força do caso julgado que se formou sobre a sentença exequenda, ónus que vale para todos os fundamentos da defesa, nomeadamente para as exceções perentórias, como é o caso do pagamento que tem como efeito “a extinção do facto jurídico articulado pelo autor” (artigo 576.º, n.º 3, do CPC).
Se a exceção perentória deduzida contra a execução podia ter sido invocada na ação declarativa, por já então se verificarem os respetivos pressupostos e não o foi, não pode ser invocada em sede de embargos, por efeito do princípio da preclusão.
O processo executivo não pode ser utilizado para destruir o caso julgado formado na ação declarativa.
Permitir a invocação a todo o tempo de meios de defesa assentes em factos anteriores ao encerramento da discussão no processo de declaração, violando o efeito de caso julgado formado pela sentença condenatória, tornaria impossível a formação de um título executivo, o que geraria uma insegurança permanente na definição do direito.
O princípio do processo equitativo (artigo 20.º, n.º 4, da CRP) tem subjacente o direito de defesa, o direito ao contraditório e o direito à prova, com igualdade de oportunidades para as partes e com regras pré-definidas.
A garantia constitucional de acesso ao direito, não é incompatível com a existência de regras no exercício do direito, antes as reclama, sob pena de o excesso de defesa duma parte poder geral uma desproteção desproporcionada da outra parte.
É certo que a apelante, na fase declarativa foi julgada à revelia, tendo sido representada pelo Ministério Público.
Contudo, não invocou a irregularidade da sua citação edital ou a irregularidade do processado subsequente, pelo que, a validade da sua citação edital e o prosseguimento dos autos à sua revelia, nunca foi posta em causa.
Por outro lado, a apelante usou do recurso de revisão, previsto nos artigos 696.º e segs., do CPC, único que permite de forma excecional rever um caso já transitado, em apelo ao princípio da justiça material, mas fê-lo intempestivamente.
Teve direito a procedimentos equitativos adequados à sua defesa, que não usou com oportunidade.
Única razão porque não pode agora afirmar argumentos que deveria ter afirmado no tempo próprio.
Assim, a preclusão de invocação dos factos modificativos ou extintivos da obrigação anteriores ao encerramento da discussão da causa em 1ª instância, nada tem de inconstitucional, designadamente, por não violar o artigo 20.º da CRP, não retirando nem limitando o direito de acesso ao direito e aos tribunais.
Julga-se, pois, improcedente a invocada exceção de inconstitucionalidade.
Improcedendo o recurso.

Em suma: (…)

V

Termos em que, acorda-se em julgar a apelação improcedente e confirmar a decisão recorrida.

Custas pela apelante.

Évora, 27 de junho de 2024

Anabela Luna de Carvalho (Relatora)

Cristina Dá Mesquita (1ª Adjunta)

Eduarda Branquinho (2ª Adjunta)