CRIME DE CONDUÇÃO SOB O EFEITO DO ÁLCOOL
ALCOOLÍMETROS
VALIDADE
ADMOESTAÇÃO
NÃO TRANSCRIÇÃO NO REGISTO CRIMINAL
Sumário

I - Ao inserir o vocábulo "condenados" nas alíneas a) a h) do n.º1 do artigo 7.º o legislador esqueceu que no n.º1 afirmara que as exceções se reportavam tanto ao perdão como à amnistia e por isso não tomou em consideração que pretendia excluir também do benefício da amnistia algumas dos crimes enumerado naquelas alíneas os quais seriam amnistiáveis atento o disposto no artigo 4.°.
II - A legislação atualmente em vigor que regula o controlo metrológico dos métodos e instrumentos de medição em geral (DL n.º 29/2022, de 07-04, regulamentado pela Portaria n.º 211/2022, de 23-08), e dos alcoolímetros em concreto (Portaria 366/2023, de 15-11) permite, à semelhança dos diplomas que a antecederam, que um aparelho medidor alcoolímetro, ainda que ultrapassado e não renovado o prazo de dez anos de validade de aprovação do respectivo modelo ou de uso do modelo, se mantenha validamente em funcionamento, desde que conserve um desempenho positivo nas verificações periódicas ou extraordinárias que venham a ser realizadas.
III - À data da realização do exame – 13-08.22 –, não obstante estar ultrapassado o prazo de validade da aprovação de modelo do alcoolímetro Drager Alcotest 7110MKIII P – ARZL -0199 utilizado para o efeito, válido até 06-06-2017, esse equipamento em concreto estava totalmente apto à execução de tal função tendo em consideração que foi aprovado em primeira verificação em 16.12.2021, válida até 31-12-2022, atento o disposto nos arts. art. 7.º, n.º 7, e 8.º, n.ºs 1 e 3, do RGCMLMIM e 7.º, n.º 1, e 10.º do RCMA e art 28º do RGCMLMIM-D/L n º 29/22 de 07 de abril que permitem a utilização do equipamento, mesmo que ultrapassado o prazo de validade de aprovação de modelo, desde que exista certificação válida da primeira verificação ou outra do respetivo funcionamento, de acordo com todas as especificações legais, conforme consta dos autos.
IV - Os crimes rodoviários, aqui se inserindo a condução sob o efeito do álcool, devem garantir pela aplicação da pena, a reafirmação das expectativas comunitárias na validade das normas penais rodoviárias, o que não ocorreria no caso de aplicação da pena de admoestação, porque inexistem circunstâncias especiais que o justifiquem.
VI - Nos termos da Lei n º 37/2015 de 05.05 a não transcrição no registo criminal de condenações em “pena de prisão até 1 ano ou em pena não privativa da liberdade, se o arguido não tiver sofrido condenação anterior por crime da mesma natureza e sempre que das circunstâncias que acompanharam o crime não se puder induzir perigo de prática de novos crimes”, pode ser decidida após prolação da sentença em despacho posterior.

( da responsabilidade relator)

Texto Integral

Proc. nº 320/22.3GAMLD.P1
Tribunal de origem: Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro – Juízo de Competência Genérica de Mealhada





Relator Paulo Costa
Adjuntos Lígia Figueiredo
                Donas Botto

Acordam, em conferência, na 1.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto

I. Relatório

No âmbito do Processo Singular no processo identificado em epígrafe, a correr termos no Juízo supraidentificado, foi decidido (transcrição):
«A) Condenar a arguida AA na pena de 80 (oitenta) dias de multa, à taxa diária de € 5,50 (cinco euros e meio), pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punido pelo artigo 292.º, n.º 1, do Código Penal;

B) Condenar a arguida AA na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor de qualquer categoria pelo período de 5 (cinco) meses, nos termos do disposto no artigo 69.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, devendo a arguida entregar a respectiva carta/licença de condução, no prazo de 10 dias, após o trânsito em julgado da sentença, na secretaria deste tribunal ou em qualquer posto policial;

C) Condenar a arguida AA no pagamento das custas criminais do processo, sendo a taxa de justiça devida de 4 UC (quatro unidades de conta), nos termos do disposto nos artigos 513.º e 514.º, n.º 1, do Código de Processo Penal e 8.º, n.º 9, e tabela III, do Regulamento das Custas Processuais.


*

Após trânsito:

- remeta boletins à Direcção dos Serviços de Identificação Criminal – artigo 6.º, alínea a), da Lei n.º 37/2015, de 5 de Maio;

- comunique a presente decisão ao IMTT e à Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária – artigo 500.º do Código de Processo Penal.


*

Fica advertida a arguida de que, no prazo de 10 dias a contar do trânsito em julgado da presente sentença, deve proceder à entrega dos títulos de condução de que seja titular, neste tribunal ou em qualquer posto policial, nos termos dos artigos 69.º, n.º 3, do Código Penal e 500.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, a fim de cumprir a pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor em que foi condenada, sob pena de incorrer na prática de um crime de desobediência, sendo ainda advertida de que se conduzir no período em causa incorrerá na prática do crime de violação de imposições, proibições ou interdições.

*
Adverte-se ainda a arguida de que a medida de coacção Termo de Identidade e Residência prestado nestes autos e, consequentemente, os deveres daí decorrentes só se extinguem com a extinção da pena – artigo 214.º, n.º 1, alínea e), do Código de Processo Pena.»

*

Despacho interlocutório sobre a aplicação da Lei da amnistia.
“(…)

 Compulsados os autos, desde logo se constata que os factos integradores do ilícito penal praticado nestes autos ocorreram a 13.08.2022, sendo que a arguida nasceu a ../../1998, pelo que, à data dos factos, tinha menos de 30 anos, estando, pois, abrangida pelo regime em causa.

Sucede, porém, que o crime pelo qual a arguida vem acusada não beneficia do perdão de penas nem da amnistia previstos na Lei supra referida, por se encontrar expressamente excepcionado, em face do disposto no artigo 7.º, n.º 1, alínea d), ii), que prevê que não beneficiam do perdão de penas e da amnistia os condenados por “Crimes de condução perigosa de veículo rodoviário e de condução de veículo em estado de embriaguez ou sob a influência de estupefacientes ou substâncias psicotrópicas, previstos nos artigos 291.º e 292.º do Código Penal”.

Em face do exposto, sem necessidade de ulteriores considerações, concordando-se com a promoção que antecede, nada cumpre, nesta sede, determinar, devendo os autos manter-se a aguardar a audiência de julgamento agendada nos autos.

Notifique.”

Inconformada a arguida interpôs recurso da decisão sobre a aplicabilidade da lei da amnistia.

Concluindo:

“CONCLUSÕES

1) A Arguida recorre do despacho datado de 12.09.2023, que determinou a não aplicação da Amnistia prevista nos art.º 2.º e 6.º da Lei 34-A/2023, de 02.08, porquanto o Tribunal a quo, interpretou erradamente o direito, integrando a factualidade sub judice, na cláusula de excepção prevista no art.º 7.º, n.º 1, al. d), ii) do mesmo diploma;

2) No entendimento do tribunal a quo, o facto de a Recorrente vir acusada do tipo de ilícito de condução em estado de embriaguez, permite integrar: “Não beneficiam do perdão e da amnistia previstos na presente lei:”, al. d) “No âmbito dos crimes contra a vida em sociedade, os condenados por:”, iii) “crimes de condução perigosa de veículo rodoviário e de condução de veículo em estado de embriaguez ou sob a influência de estupefacientes ou substâncias psicotrópicas, previstos nos artigos 291.º e 292.º do Código Penal.”;

3) A Recorrente revela a violação de princípios basilares do Direito Penal, Processual Penal e Constitucional, nomeadamente, mas sem prejuízo de outros:

princípio da legalidade, no seu corolário da tipicidade e, princípio do tratamento mais favorável ao Arguido, bem como dos normativos art.º 1.º, 2.º, n.º 1, art.º 4.º da Lei n.º 38-A/2023 de 02.08, conjugado com o disposto art.º 1 e 2.º, n.º 4, e 127.º do Código Penal e 29.º, n.º 4, 32.º, n.º 1 e 2 CRP.

4) Nos artigo 2.º, n.º 1, da referida Lei n.º 38-A/2023, de 2 de Agosto, estabelece- se que “Estão abrangidas pela presente lei as sanções penais relativas aos ilícitos praticados até às 00:00 horas de 19 de junho de 2023, por pessoas que tenham entre 16 e 30 anos de idade à data da prática do facto, nos termos definidos nos artigos 3.º e 4.º”.

5) A arguida, nasceu a ../../1998, à data da prática dos factos constantes da acusação (13.08.2022); a Arguida tinha 23 anos de idade;

6) Dispõe no artigo 4.º da aludida Lei, que “São amnistiadas as infrações penais cuja pena aplicável não seja superior a 1 ano de prisão ou a 120 dias de multa.”

7) A Recorrente vem acusada, pela prática de um crime de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelo art.º 292.º, n.º 1 do Código Penal “(…) com pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias, (…)”.

8) Prescreve art. 7.º, sob epigrafe Exceções designadamente, no seu n.º 1 “Não beneficiam do perdão e da amnistia previstos na presente lei:”, al. d) “(…), os condenados por:”, ii) “crimes (…) de condução de veículo em estado de embriaguez (…), previstos nos artigos 291.º e 292.º do Código Penal.”

9) Atendendo-se à literalidade da norma, é requisito essencial para o funcionamento da cláusula de exceção a existência ou verificação da qualidade de condenado.

10) À data, os presentes autos, não se encontram conclusos, não é conhecida sentença, não foi dado início à audiência de discussão e julgamento e do Registo Criminal da Arguida, a fls…, tirado em 2022.08.15, “NADA CONSTA ACERCA DA PESSOA ACIMA IDENTIFICADA (NO CONVICTIONS)”

11) O mesmo significa que, a Recorrente, não reveste a qualidade de “condenada”, a qualquer título, quer por referência ao tipo de ilícito em apreciação ou outro.

12) Desta feita verifica-se, erro na interpretação do Direito, designadamente, do teor do art.º 7.º da Lei n.º 38-A/2023, devendo ser outra a interpretação preferível.

13) Não se encontrando a Arguida condenada pela prática de crime de condução de veículo em estado de embriaguez, entende-se excluída a integração da al. ii) do n.º 1 do art.º 7.º, devendo operar o disposto no art.º 1.º, 2.º, n.º 1, art.º 4.º da Lei n.º 38-A/2023 de 02.08, conjugado com o normativo 127.º do Código Penal e em consequência, determinar-se a Amnistia e declarar-se extinto o presente procedimento criminal.

Termos em que,

E nos melhores de direito, sempre com o Mui Douto Suprimento de V. Exas., deve a Relação, dar provimento ao presente recurso, substituindo a douta decisão recorrida, por outra que determine a AMNISTIA e consequente extinção do procedimento criminal, fazendo deste modo a acostumada, inteira e sã, JUSTIÇA!”

Inconformada, ainda, a arguida interpôs recurso principal.

Apresenta em apoio da sua posição as seguintes conclusões da sua motivação (transcrição):
« CONCLUSÕES:
1. Decorrida a audiência de julgamento veio a Mm.ª Juiz do Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro – Juízo de Competência Genérica da Mealhada a condenar a arguida AA pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. p. pelo art. 292.º do Código Penal.
2. A Recorrente por não concordar com a mesma dela interpôs recurso porquanto padece de (0) erro de escrita (Talão apresenta TAS de 1.57g/l, após dedução erro +/-0,08, a TAS seria 1,44g/L) (i) insuficiência da prova para a decisão da matéria de facto; (ii) errónea apreciação da prova produzida em sede de audiência de julgamento; (iii) errada interpretação da prova produzida em sede de audiência de julgamento; (iv) violação do princípio in dúbio pro reo; (v) errada aplicação do direito aos factos; (vi) e (xiii) erro na conta de custas – excesso tabela III, art.º 8.º, n.º 9 RCP
3. Como questões prévias a Recorrente dá como reproduzido o teor do recurso apresentado em separado, pugnando pela interpretação do direito nos termos ali exarados de que deve beneficiar da Amnistia e portanto, sem mais, ser declarado extinto o procedimento criminal;
4. A Mm.ª Juiz do Tribunal a quo, por despacho (Ref.ª 128938992), entendeu não poder a arguida beneficiar da amnistia prevista na Lei n.º 38-A/2023, de 2 de agosto, porquanto, muito embora esteja abrangida pelo limite etário imposto pelo artigo 2.º, n.º 1 do referido diploma, o crime em apreço está expressamente excecionado em face do disposto no artigo 7.º.
5. Ora, não pode a arguida, ora recorrente, discordar mais desta interpretação que, salvo o devido respeito, está errada. O artigo 7.º, n.º 1 d) ii) da Lei 38-A/2023, de 2 de agosto, não exclui do âmbito de aplicação da amnistia e do perdão o crime de condução de veículo em estado de embriaguez – dado estarem as condições previstas no artigo 4.º verificadas -; exclui, sim, a aplicação da amnistia e do perdão a quem haja já sido [previamente] condenado por esse crime.
6. Não é o caso, dado que a arguida, ora recorrente, não tem no seu Registo Criminal qualquer condenação pelo crime de condução em estado de embriaguez ou outro de qualquer natureza. Pelo que, devia, salvo melhor opinião, ter o Tribunal a quo absolvido a ora recorrente por aplicação da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de agosto.
7. a este facto acresce ser o tribunal a quo conhecedor de que não tem condições para efectuar sessões de julgamento porquanto não dispõem de meios para proceder à gravação e sabendo-o inibiu-se de transcrever para a ata as declarações da arguida e depoimentos das testemunhas – situação que MP e Juiz a quo atestam na resposta apresentada, e cuja averiguação e responsabilidade disciplinar, aqui incluída oficiais de justiça daquele juízo, não se prescindem.
8. nos termos do artigo 155.º, n.º 4 do Código de Processo Civil (aplicável por força do disposto no artigo 4.º do Código de Processo Penal) e artigo 363.º e 364.º, n.º 1 do CPP e para os efeitos dos artigos 118.º, n.º 1, 120.º, n.º 1 e 2, in fine, e 122.º, n.º 1 e 2 todos do CPP, deve assim ser determinada a nulidade da audiência de discussão e julgamento, porquanto, após ter, em 01.03.2024, requerido a disponibilização da gravação da mesma, ter esta sido disponibilizada no dia 04.03.2024, verificou a recorrente estar impercetível (Ref.ª 15869511).
9. Vício do qual o tribunal a quo era previamente conhecedor e optou conscientemente por ocultar à arguida, em seu prejuízo, sabemo-lo agora.
10. Nestes termos, deve ser desaplicada a interpretação rogada pelo Tribunal a quo, sendo interpretadas os conjugados artigos 155.º, n.º 4 do CPC (aplicável por força do disposto no artigo 4.º do CPP), 118.º, n.º 1, 120.º, 1 e 2, in fine, 122.º, n.º 1 e 2, 363.º, 364.º, n.º 1, todos do CPP, no sentido de cominar a nulidade da audiência de discussão e julgamento, com a consequente anulabilidade do processado subsequente e ordenado a sua repetição.
11. Quanto ao erro de escrita: Pode ler-se na sentença recorrida – facto provados:
“2) Nessa circunstância de tempo e lugar, a arguida foi submetida ao teste quantitativo de pesquisa de álcool no sangue através do aparelho DRAGER, modelo Alcotest 7110 MKIIIP, com o n.º de série ARAN – 0067, apresentando uma TAS de, pelo menos,1,58g/l álcool no sangue, a que corresponde uma TAS registada de 1,67 g/l de álcool no sangue.“
12. O talão a fls. apresenta 1,57 g/l e não 1, 67g/l; deduzida a margem de erro daria 1,44 g/l e não já 1,58g/l; tal influenciou negativamente a escolha da pena e sua medida, motivo pelo qual se requer corrigido, devolvendo-se a sentença à Mma. Juiz a quo, para correcção e reapreciação/confirmação da medida da pena.
13. Assim deverá passar a ler-se:
“2) Nessa circunstância de tempo e lugar, a arguida foi submetida ao teste quantitativo de pesquisa de álcool no sangue através do aparelho DRAGER, modelo Alcotest 7110 MKIIIP, com o n.º de série ARAN – 0067, apresentando uma TAS de, pelo menos, 1,44g/l álcool no sangue, a que corresponde uma TAS registada de 1,57 g/l de álcool no sangue. “
14. A convicção do Tribunal a quo assentou, no que à prova documental respeita, designadamente, no auto de notícia, no talão do alcoolímetro e respetivo certificado de verificação, porquanto entendeu que o mesmo estava apto para em primeira verificação a 16.12.2021, a qual caducaria em 31.12.2021, o mesmo poderia continuar a operar, porquanto os 15 dias de diferença entre a 1ª verificação e o final do ano em que foi verificado, não faria qualquer diferença no seu uso, que seria idêntico caso fosse verificado no dia 01.01.2023, ano em que a arguida foi utilizada.
15. Ora não é isto que decorre da Lei, e o tribunal a quo socorreu-se de um interpretação in Pejus para a arguida para forçar a condenação, a nosso ver ilegal por contrariar quer o espirito da norma quer o seu teor expresso!
16. O teste quantitativo para pesquisa de álcool no sangue pelo método do ar expirado foi realizado pelo equipamento DRAGER modelo 7110 MKIII P, aprovado pelo IPQ Desp. 211.07.07.3.06, de 24.05.2007 e pela ANSR n.º 19684/2009, de 25.06.2009, e introduzido junto das entidades fiscalizadoras há mais de 20 (vinte) anos, encontrando-se hoje não apto, por não aprovado e, seguramente, obsoleto.
17. Acresce que a aprovação concedida tem um PRAZO DE VALIDADE DE 10 ANOS, findo o qual caduca, não tendo sido concedida a respetiva renovação por o equipamento não reunir as condições técnicas regulamentares fixadas e extravasar em valores muito superiores as margens de erro legalmente admissíveis – OIML E126.
18. Assim, a aprovação do modelo deixou de ser válida a 07.06.2017.
19. Não sendo, portanto, possível utilizar ou tão pouco usar como meio de prova ao tribunal a quo o resultado obtido, por ilegal e não autorizado. - Processo n.º 89/07.1GTABF.E1 que, em Acórdão datado de 17.06.2010, proferiu: “Porque a certificação técnica já havia caducado, o resultado da medição feita não vale como meio de prova. (…) Não sendo admissível o resultado da prova obtida através da medição feita pelo alcoolímetro, por proibida (artº 125º/CPP), não se pode considerar o facto referido no ponto 3) da matéria de facto como relevante para a aplicação do direito ao caso dos autos, porquanto o mesmo foi obtido apenas através da referida medição, conforme resulta da fundamentação da matéria de facto.
20. O teste quantitativo para pesquisa de álcool no sangue pelo método do ar expirado foi realizado pelo equipamento DRAGER modelo 7110 MKIII P, ARAN 0067, aprovado pelo IPQ através do Despacho n.º 11037/2007, de 24 de Abril, para aprovação de modelo n.º 211.06.07.3.06 (D.R. 2.ª Séria, n.º 109, de 6 de Junho), com validade de 10 anos a contar da data de publicação no Diário da República. Assim, a aprovação de modelo deixou de ser válida a 07.06.2017.
21. Mais, ainda que se entendesse que o mesmo estava dentro dos condicionalismos legais para ser usado e que, ainda que ultrapassado e não renovado o prazo de 10 anos de validade de aprovação, não está, no caso dos autos, demonstrada a verificação do desempenho periódico do aparelho.
22. Resulta igualmente dos autos que o concreto alcoolímetro utilizado para realização do teste quantitativo de deteção de álcool no sangue foi sujeito a primeira verificação em 16.12.2021, sendo a entidade responsável o IPQ.
23. Tal data de verificação permite concluir que aquele específico aparelho, ainda que ultrapassado o prazo de dez anos de validade da aprovação do modelo respetivo, estava apto a funcionar até 31.12.2021. - arts. 7.º, n.º 7, e 8.º, n.ºs 1 e 3, do RGCMLMIM e 7.º, n.º 1, e 10.º do RCMA.
24. E este neste sentido que tem de ser interpretada a norma.
25. Assim, à data da realização do exame em apreço – 13.08.2022 – não obstante estar ultrapassado o prazo de validade da aprovação de modelo do alcoolímetro DRAGER Alcotest 7110MKIII P utilizado para o efeito, válido até 07.06.2017, esse equipamento em concreto não estava totalmente apto à execução de tal função tendo em consideração que foi aprovado em primeira verificação de 16.12.2021, válida até 31.12.2021.
26. E a arguida apenas foi fiscalizada em 13.08.2022, 8 meses após ter caducado a verificação IPQ e 5 cinco anos após ter caducado a aprovação.- Tribunal da Relação de Coimbra de 13-12-2011, Proc. n.º 89/11.7GCGRD.C1; Tribunal da Relação de Évora de 20-01-2015, Proc. n.º 314/13.0GFLLE.E1; Tribunal da Relação do Porto de 10-05-2017, Proc. n.º 315/16.6GCOVR.P1; Tribunal da Relação do Porto de 11-10-2017, Proc. n.º 28/17.1PDMAI.P1; Tribunal da Relação de Guimarães de 05-03-2018, Proc. n.º 122/17.9PFGMR.G1; Tribunal da Relação de Coimbra de 24-04-2108, Proc. n.º 320/17.5GBPMS.C1; Tribunal da Relação de Coimbra de 27-06-2018, Proc. n.º 1358/17.8PBCBR.C1; Tribunal da Relação de Guimarães de 10-09-2018, Proc. n.º 277/17.2GDGMR.G1; e Tribunal da Relação do Porto de 18-12-2018, Proc. n.º 294/18.5PFMTS.P1.
27. Motivo pelo qual, com recurso à fundamentação expendida pelos Doutíssimos Relatores do Tribunal da Relação do Porto, que se dá por integralmente reproduzida para todos os efeitos legais – cf. certidão requerida com código de acesso ..., – desde logo se impõem igual conclusão e consequente absolvição da aqui Arguida.: se concluiu: “Impõe-se, assim, concluir que não é válido o resultado obtido através do aparelho em questão, bem como o valor probatório respectivo.” - Acórdão datado de 19.12.2023, proferido nos autos de Processo n.º 216/23.1GBAND.P1, a rogo do M. Douto Exmo. Senhor Relator Dr. Paulo Costa, no qual foram adjuntos Dr. Pedro Afonso Lucas e Dr. Donas Botto, que correu termos na 1.ª Secção do Tribunal da Relação do Porto –
28. Com efeito, ali estava em causa Alcoolímetro verificado em Primeira verificação em 25-07-2022 e, por tanto, válido até 31.12.2022, sendo que o exame de ar expirado havia sido efectuado após a data de validade da verificação, ie. Em 03.06.2023. Motivo pelo qual se concluiu: “Impõe-se, assim, concluir que não é válido o resultado obtido através do aparelho em questão, bem como o valor probatório respectivo.
29. Com reporte ao nosso caso, em igualdade de circunstâncias, o Alcoolímetro utilizado – vd. a fls… “Certificado de Verificação de 28.12.2021”, foi verificado em Primeira verificação em 16-12-2021 e, por tanto, válido até 31.1 2.2021, sendo que o exame de ar expirado foi efectuado efectuado após a data de validade da verificação, ie. em 13.08.2022. – vd. doc. n.º 4 e 5 que se juntam e dão por reproduzidos para todos os efeitos legais.
30. Nestes termos e nos melhores de Direito, porquanto vem exposto, com o M. Douto Suprimento de V. Exa., Mma. Juiz de Direito, com recurso à fundamentação expendida pelos Doutíssimos Relatores do Tribunal da Relação do Porto, requer-se à prolação de sentença absolutória.
31. No que à prova testemunha respeita, a recorrente arguiu, perante a Mm.ª Juiz a quo, a nulidade da audiência de discussão e julgamento, porquanto a gravação das respetivas sessões está totalmente impercetível (Ref.ª 15869511);
32. Porém, vidando-se a impugnação da matéria de facto com base na reapreciação da prova produzida em audiência, referenciado as concretas passagens das declarações, e o mesmo não sendo possível, sempre importa notar o que foi declarado pela arguida e por cada testemunha e que contribuiu para formar a convicção do Tribunal.
33. Efectuado o cruzamento e reapreciação critica da prova importa dar como não provados os Ptos. 2, 3, 4 e 5 da Factualidade antes Provada que passam a versar, respectivamente como pontos 1, 2, 3, 4, do novo rol de factos Não provados e importa renumerar a factualidade dada como provada após a subtracção e aditar os novos pontos
34. Pelo que, conjugada a prova testemunhal com a prova documental junta aos autos, deverá ser alterado o rol de FACTOS PROVADOS e aditados FACTOS NÃO PROVADOS, aditando-se e corrigindo a matéria de facto produzida e provada:
FACTOS PROVADOS:
1) No dia 13 de Agosto de 2022, pelas 01h44, na Rua ..., em ..., na ..., na via pública, a arguida conduziu o veículo ligeiro de passageiros com a matrícula “...
50-TS”, após ter ingerido bebidas alcoólicas.
2) A arguida é estudante de mestrado, em engenharia alimentar, na Escola Superior ....
3) Trabalha em part time, auferindo uma média de € 250,00 mensais.
4) Para os estágios que efectua, desloca-se, em regra, de carro.
5) Vive com o pai e a mãe, sendo que estes auferem cerca de € 1.000,00 e de € 1.200,00 mensais, respectivamente.
6) A arguida não tem empréstimos contraídos.
7) É ajudada financeiramente pelos pais, sendo que a arguida paga parte das suas despesas, como seja a despesa inerente ao telemóvel, no valor de cerca de € 13,00 mensais.
8) Do seu certificado de registo criminal não constam quaisquer condenações.
9) A arguida é beneficente e ajuda no Banco Alimentar Contra a Fome.
10) A arguida necessita da carta de condução para acompanhar um primo a unidades hospitalares e fisioterapia, decorrente de um acidente de mota.
FACTOS NÃO PROVADOS:
1) Na circunstância de tempo e lugar descrita na acusação, a arguida foi submetida ao teste quantitativo de pesquisa de álcool no sangue através do aparelho DRAGER, modelo Alcotest 7110 MKIIIP, com o n.º de série ARAN – 0067, apresentando uma TAS de, pelo menos, 1,58g/l álcool no sangue, a que corresponde uma TAS registada de 1,67 g/l de álcool no sangue.
2) A arguida sabia que tinha ingerido bebidas alcoólicas em quantidade que lhe determinaria uma taxa de álcool no sangue superior a 1,20 g/l e conhecia as características da via e do veículo.
3) A arguida previu assim como quis conduzir o referido veículo ligeiro de passageiros na via pública após ter ingerido bebidas alcoólicas em excesso, sabendo que conduzia com uma taxa de álcool superior à permitida por lei, e, mesmo assim não se absteve de o fazer.
4) A arguida agiu de forma livre, deliberada, voluntária e conscientemente, bem sabendo que as descritas condutas eram proibidas e punidas por lei penal e que incorria em responsabilidade criminal.
35. Do cruzamento da matéria testemunhal com a prova documental já junta aos autos, resultam alterações à matéria de facto que sempre haveria o Tribunal a quo de ter dado como provada e como não provada.
36. Constitui elemento objetivo do ilícito em apreço a condução de veículo com ou sem motor, em via pública ou equiparada, com uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 1,20g/l: do ponto de vista subjetivo, este crime pode ser cometido com dolo ou por negligência.
37. Muito embora a arguida confesse o circunstancialismo de tempo, modo e lugar da condução, o elemento objetivo do tipo de ilícito não se encontra preenchido, porquanto, não está aprovado, que a recorrente exercesse a condução com TAS superior ao mínimo legal de 1,20g/l. - cfr. factos não provados.
38. Apesar de a arguida ter ingerido bebidas alcoólicas precedentes à condução, não ingeriu, seguramente, em quantidade suficiente a provocar a T.A.S. alegadamente apurada, pelo que também não se encontra preenchido o elemento subjetivo do ilícito em causa, porquanto a nenhum homem medio comum diligente em situação idêntica teria suspeitado que não deveria adoptar a referida conduta.
39. A arguida não sabia nem quis cometer qualquer infracção.
40. Concluímos pelo não preenchimento dos elementos objetivo e subjetivo do crime, pelo que deve a arguida, ora recorrente, ser ABSOLVIDA!
41. Sem ignorar a nulidade da acusação, o que se retira da douta sentença é que o Tribunal a quo, não levando em conta o depoimento credível da arguida, nem tendo esclarecido a exata taxa de álcool ingerido por esta, limitou-se a fazer uma dedução com base em ténues provas, reduzindo-o ao teor do que se presume álcool, sem ter em conta em particular do depoimento dos Senhores Militares da GNR, que realizaram a fiscalização e elaboraram o Auto e o depoimento das testemunhas arroladas pela arguida, que estiveram com ela não referida noite, tendo todos atestado que a mesma estava em plenas condições.
42. De toda a matéria produzida em audiência de julgamento, não havia, em nossa opinião, elementos que permitissem sem mais pensar, muito menos provar, que a arguida conduziu o veículo com taxa de álcool superior à permitida por lei.
43. Verificou-se, assim, um erro de interpretação na subsunção dos factos, salvo melhor opinião, nulos, por irregularidade na sua obtenção (aparelho Drager Alcotest 7110 MKIII P, não aprovado e não verificado) ao direito, já que não se mostram preenchidos os requisitos objetivos e subjetivos do respetivo normativo, tendo a Mm.ª Juiz violado a interpretação destes.
44. Mesmo que não se considerasse a prova nos termos em que se alega, isto é, ainda que não se aceite que a prova produzida impunha decisão diversa, não podemos deixar de considerar que a mesma cria fortes e insolúveis dúvidas, pelo que deveria o Tribunal a quo ter-se socorrido, desde logo, do princípio in dúbio pro reo.
45. À margem de todas as certezas serem em sentido contrário, note-se serem os elementos da GNR que confirmaram e atestaram o bom estado da recorrente, sem que exalasse qualquer odor a álcool, ou se permitisse sequer suspeitar, visualmente e/ou no seu diálogo qualquer indício de que a mesma se encontrava impedida do exercício da condução, o que foi surpresa para todos.
46. Assim, do supra alegado, resulta que a arguida não poderia ter sido condenada pela prática do crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punido pelo art.º 292.° do Código Penal.
47. À Cautela, e caso não seja este o entendimento dos Venerandos Senhores Desembargadores, face ao que dispõe a Lei Penal, ao que ficou provado nos autos e, acima de tudo, o que não ficou provado, e ainda à falta de prova complementar segura, não era possível à Mm.ª Juiz do Tribunal a quo, salvo o devido respeito, retirar as conclusões que sintetizam a condenação da arguida, quando tudo fazia prever o contrário, ou seja, a aplicação de pena de ADMOESTAÇÃO ou, quanto muito, a aplicação de uma pena no mínimo legal.
48. E se, por um lado, concordam a Mm.ª Juiz, a Digna Procuradora e a arguida ser a pena de prisão desajustada e excessiva face à bagatela penal em apreciação, já discordamos ser a pena de multa, face à politica criminal assumida, perante o caso judicando, a mais adequada e eficaz.
49. Vejamos: À arguida, face à moldura penal prevista para o crime em apreciação nunca poderia ser aplicada uma pena de multa superior a 120 dias – art.º 292.º, n.º 1 e 60.º, n.º 1, ambos do CP; O que veio confirmar a sentença recorrida, que condenou a arguida em 80 (oitenta) dias de multa, não podendo a mesma ser modificada na sua espécie ou medida – art.º 409.º, n.º 1 do CPP; A arguida não tem antecedentes criminais – art.º 60.º, n.º 3 do CP; Não há danos reportados; Não se verifica a necessidade de prevenção geral; É inexistente a necessidade de prevenção especial: uma vez que do momento dos factos em diante não há qualquer risco de repetição; E mesmo a sentir-se essa necessidade, atendendo à idade da arguida, à sua postura em tribunal, sempre seria mais conselhável uma solene censura oral, com a devida explicação do tipo de ilicito em apreciação; do direito especial tutelado com a incriminação; as condutas que provavelmente o possam integrar e que por esse mesmo motivo devam ser evitadas; Algo que uma mera pecunia, ainda que ajustada, no caso mal, na sua medida, nunca logrará alcançar!
50. A pena a que a arguida foi sujeita é na opinião da mesma, e salvo o devido respeito por interpretação diversa, infundada e injusta, quer quanto à pena de multa aplicada (80) dias, quer quanto à pena acessória de proibição de conduzir (5 meses), e custas processuais (4UCs), que se impõem revogadas.
51. A pena aplicada à recorrente não foi a melhor opção em termos de política de aplicação de penas, mostrando-se injusta, inibindo-se a Mm.ª Juiz a quo, inclusive, de ponderar todas as opções legislativas que ao caso poderiam ser aplicáveis, como o facto de a arguida ter atuado em ERRO SOBRE A ILICITUDE.
52. A arguida, muito embora conheça o circunstancialismo da sua atuação, não representou, de maneira alguma, o carácter ilícito da sua conduta: a arguida conduziu com uma T.A.S. superior a 1,2g/l, com conhecimento de que conduzir assim constitui crime, porém, na sua convicção, o mesmo não acontecia - art.º 71.º, conjugado com o art.º 17.º, n.º2 do CP.
53. Devendo ainda ter-se em especial atenção - al. d) do art.º 72.º do CP -, o decurso se muito tempo entre a prática do crime 13.08.2022, ie. volvidos práticamente 2 (dois) anos, mantendo a recorrente em todo este período boa conduta, sem que lhe seja conhecida qualquer outra prática desta ou de qualquer outra natureza, ainda que meramente indiciária.
54. Assim, face à factualidade do caso e à atenuação especial da pena a que sempre haverá lugar (-1/3) – artigos 72.º, n.º 2 al. c) e 73.º, n.º 1 al. c) – nunca será de admitir a aplicação de uma pena superior a 53 (cinquenta e três) dias de multa, à taxa diária de €5,00 (cinco euros); nem tão pouco, mais de 3 (três) meses de pena acessória de inibição de conduzir.
55. Reitera-se, por estrita cautela de patrocínio, o que não se aceita, a ter sucedido, sempre se tratou de um caso isolado, sem quaisquer antecedente e sem que haja notícia da sua repetição.
56. A recorrente necessita da carta de condução no seu dia a dia, quer seja para se deslocar à faculdade, quer seja para prestar apoio à família, nomeadamente a um ao seu primo que sofreu um acidente de mota e precisa de receber tratamentos e frequentar consultas.
57. Assim, reduzindo-se no seu máximo 1/3 e seguindo-se o critério adotado pela Mm.ª Juiz a quo para determinar a aplicação à arguida, sempre seria de aplicar proporcionalmente a referida diminuição e fixar a pena de multa em montante não superior a 53 (cinquenta e três) dias.
58. Pelo que deverão V. Exas. Digníssimos Desembargadores dar provimento ao recurso, absolvendo a recorrente, ou, em alternativa, optar pela admoestação.
59. Caso ainda assim não se entenda, sempre haverá de ter lugar a atenuação especial da pena, reduzindo-a, no máximo, 53 (cinquenta e três) dias de multa à taxa diária de €5,00 (cinco euros).
60. Tudo isto e para o caso de assim não se entender, não ignora a recorrente a desproporcionalidade das penas que lhe foram aplicadas, tanto mais quando na mesma Comarca de Aveiro, para casos semelhantes e TAS superiores vêm a ser aplicadas penas mais leves, confirmadas pela Relação.
61. Ou seja, precisamente as mesmas premissas que nos trazem, todavia, entre aqueles com taxas superiores (2,11g/l; 1,62g/l; 1,98g/l; 1,71g/l), houve lugar à aplicação e confirmação de penas mais leves, quer quanto à sanção acessória, quer quanto aos dias de multa a aplicar: Processo n.º 385/21.5GBAND, T.A.S. de 1,79g/l, aplicada a pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor pelo período de 3 (três) meses e 15 (quinze) dias; aplicada pena de multa de 70 (setenta) dias, Processo n.º 189/22.9GBAND, T.A.S. de 2,11g/l, deduzido o erro máximo admissível, e foi-lhe aplicada a pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor pelo período de 4 quatro) meses aplicada pena de multa de 75 (setenta e cinco) dias; Processo n.º 82/22.4GABND, T.A.S. de 1,62g/l, deduzido o erro máximo admissível, e foi-lhe aplicada a pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor pelo período de 4 (quatro) meses; lhe aplicada pena de multa de 70 (setenta) dias Processo n.º 247/22.9GBAND, T.A.S. de 1,98g/l, deduzido o erro máximo admissível, e foi-lhe aplicada a pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor pelo período de 4 (quatro) meses e 10 (dez) dias; Processo n.º 278/23.1GAVLC, T.A.S. de 1,71g/l, deduzido o erro máximo admissível, e foi-lhe aplicada a pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor pelo período de 4 (quatro) meses e 15 (quinze) dias.
62. Ou seja, em todos estes casos: (2,11g/l; 1,62g/l; 1,98g/l; 1,71g/l), temos: Penas de multa a variar entre os: 70/75 dias; Sanção acessória de inibição de conduzir a variar entre: 3 (três) meses e 15 (quinze) dias e 4 (quatro) meses e 10 (dez) dias.
63. Fácil é de compreender no nosso caso 5 meses de inibição de conduzir e 80 dias de multa para uma TAS de1, 44g/l (1,57g/l antes de deduzida a margem de erro) – cfr. talão a fls. é abusivo e excessivo face ao direito comparado e aplicado pelos tribunais da mesma comarca quer em primeira instância quer em sede de recurso.
64. Motivo pelo qual se requer, no limite, e sem prejuízo da sua absolvição ou admoestação, seja diminuída a pena aplicada à arguida a: 3 meses e quinze dias; 70 dias de multa.
65. DA CONTA DE CUSTAS, também neste ponto, nos merece breve reparo e censura a sentença recorrida, pois que sem que fundamente nenhum acréscimo especial veio a condenar-se a arguida no pagamento de 4 UC’s, quando dos autos consta um única audiência de discussão e julgamento, breve, inferior a duas horas das 13h30 as 15h45m, - cfr. ata da 19.02.2024 – sem que o tempo da prova é inferior a 01h10m; acrescendo tempo de alegações e leitura sumária em sessão separada.
66. Rogando à simplicidade dos autos, dos factos em apreciação, testemunhos e elementos de prova em número diminuto, salvo o devido respeito a fixação em 4 UC’s para este arguida é EXCESSIVA.
67. Quando o Art.º 8.º RCP 9 - Nos restantes casos a taxa de justiça é paga a final, sendo fixada pelo juiz tendo em vista a complexidade da causa, dentro dos limites fixados pela tabela iii, que fixa o seu máximo em 6 UC’s.
68. Ora 4 UC’s sempre seria exagerado porquanto nenhuma complexidade reveste o presente caso, nem ter o Arguida/Recorrente, dado lugar a qualquer atividade excepcional, antes em bom rigor apenas foi realizada, uma sessão de audiência de discussão e julgamento, reduzida a 01h30m.
69. No RCP a tabela III o processo comum fixa-se entre 2 a 6 UC’s, a fixar face à compelxidade dos autos, dos factos, dos meios de prova e do número de sessões.
70. Desta feita parece-nos ser de diminuir as custas totais do processo ao seu mínimo legal i.e. 2UC’s.
71. Pelo que deverão V. Exas. Digníssimos Desembargadores dar provimento ao recurso, amnistiando/absolvendo a recorrente, ou, em alternativa, optar pela admoestação.
72. Caso ainda assim não se entenda, sempre haverá de ter lugar a proporcional e equitativa redução comparativa às decisões tiradas na mesma comarca e a atenuação especial da pena, reduzindo-a, no máximo, 53 (cinquenta e três) dias de multa à taxa diária de €5,00 (cinco euros) e a sanção acessória de inibição de conduzir ao seu mínimo legal, ie. 3 meses.
73. Pelo exposto, tudo visto e ponderado, deverão V. Exas. Venerandos Desembargadores do Tribunal da Relação do Porto, revogar a sentença recorrida, absolvendo a arguida, ou caso ainda assim não se entenda, substituir a douta decisão recorrida, tirada em primeira instância, por uma que aplique pena de Admoestação ou, quando muito, pena especialmente atenuada.
74. Sem custas.
75. Sem prejuízo por estrita cautela de patrocínio, a arguida ora recorrente havia em sede de contestação requerido a não transcrição da eventual sentença condenatória tirada em juízo para o certificado de registo criminal, nos termos do art.º 13º da Lei n.º 37/2015, de 05 de Maio; porquanto se encontra a entrar no mercado de trabalho publico qualificado.
76. A sentença a quo é omissão neste ponto e sendo que a falta de pronúncia provoca a nulidade da sentença, – art.º 97.º, n.º 5, 118.º, 119.º, 120.º, n.º 1, 374.º, n.º 3, al. b) , 379.º, n.º 1, al. c) e n.º 2, 414.º, n.º 4, todos do CPP – requer-se a supressão do vício quer por via do reenvio para a instância a quo, quer por via do Douto Suprimento por V. Exas. Venerandos Desembargadores do Tribunal da Relação do Porto, determinando a não transcrição da pena que houver de aplicar.
Face ao exposto, e à interpretação dada pelo Tribunal a quo, consideram-se desde logo violadas, salvo melhor opinião, e entre outras, as normas seguintes:
- Artigos 17.º, n.º 2, 40.º, 60.º, n.º 1 e 3, 71.º, n.º 1 e 2, 72.º, al. d) ,73.º e 292.° do Código Penal;
- 125.º, 409.º, n.º 1 do CPP
- Artigo 32.º da Constituição da República Portuguesa;
- Artigo 82.º, nºs 1 a 6, 153.º, n.º 1 do Código da Estrada.
- art. 4.º 7.º, n.º 7, e 8.º, n.ºs 1 e 3, do RGCMLMIM e 7.º, n.º 1, e 10.º do RCMA - Artigo VIII da Convenção OIML, a que Portugal aderiu pelo Decreto do Governo n.º 34/84, publicado no Diário da República n.º 159, I Série, em 11.07.1984 - artigo 7.º, n.º 1 d) ii) da Lei 38-A/2023, de 2 de agosto.
- 118.º, n.º 1 do CPC
- Art.º 8.º RCP
- e, consequentemente, os basilares princípios de matriz constitucional do "in dúbio pro reo", da legalidade, de tipicidade e da culpa e “do tratamento mais favorável aa arguida”.
INDICA-SE, por mera facilidade de pesquisa, (i) lista dos equipamentos aprovados para uso na fiscalização do trânsito (ANSR e IPQ); (ii) Despacho IPQ nº 743/2016 de 15.01.2016; e (iii) Despacho ANSR nº 2960/2016 de 26.02.2016.
Termos em que, E nos melhores de Direito, sempre com o mui douto suprimento de V. Exas., deve a Relação dar provimento ao presente recurso, substituindo a douta decisão recorrida, tirada em primeira instância.
Assim decidindo, farão V. Exas. Inteira JUSTIÇA!!.»


*

A Digna Magistrada do Ministério Público junto do Tribunal recorrido respondeu ao recurso interlocutório, considerando que o mesmo não merece provimento e que a decisão recorrida deve ser mantida, rematando a usa argumentação com as seguintes conclusões:

“CONCLUSÕES:

1. Por douto despacho nestes autos exarado proferido em 12 de setembro de 2023, sob referência citius 128938992 foi decidido não aplicar o regime da amnistia previsto na Lei n.º 38 -A/2023, de 2 de agosto.

2. De tal despacho interpôs recurso a Arguida referindo que o Tribunal a quo, interpretou erradamente o direito, integrando a factualidade sub judice, na cláusula de excepção prevista no art.º 7.º, n.º 1, al. d), ii) do mesmo diploma.

3. Conclui dizendo que, como o crime – condução de veículo em estado de embriaguez - pelo qual a arguida se encontra acusada é punível com pena de prisão até um ano ou pena de multa até 120 dias, a arguida à data da prática dos factos teria menos de 30 anos e, bem assim, os factos ocorreram antes do dia 19 de junho de 2023, pelo que deverá ser determinada a extinção do procedimento criminal por amnistia.

4. Lê-se na Exposição dos Motivos constante da Proposta de Lei n.º 97/XV/ que estabelece o perdão de penas e amnistia de infrações praticadas por jovens que «A Jornada Mundial da Juventude (JMJ) é um evento marcante a nível mundial, instituído pelo Papa João Paulo II, em 20 de dezembro de 1985, que congrega católicos de todo o mundo. Com enfoque na vertente cultural, na presença e na unidade entre inúmeras nações e culturas diferentes, a JMJ tem como principais protagonistas os jovens (…) Nestes termos, a presente lei estabelece um perdão de um ano de prisão a todas as penas de prisão até oito anos, excluindo a criminalidade muito grave do seu âmbito de aplicação (sublinhado nosso).

5. Deste modo, afigura-se-nos que foi intenção do legislador, não obstante a redação dada ao artigo, essencialmente formulado para o perdão de penas, que quis excluir do âmbito de aplicação da lei todos os agentes dos crimes previstos no regime de exceção ali previsto no art. 7.º.

6. De outro modo, criar-se-ia uma discrepância, não querida pelo legislador, de não perdoar penas em que o agente praticou o crime de condução de veículo em estado de embriaguez, e, por outro lado, conceder amnistia a todos aqueles que, tendo embora praticado o crime, não tendo ainda sido condenados, beneficiariam da medida de graça.

7. Conforme refere o Tribunal a quo, posição que subscrevemos «ora, da leitura do diploma legal em apreço, e em particular da norma ora citada resulta evidente que o legislador usa aqui o termo “condenados” não em sentido estrito mas sim referindo-se, genericamente, a agente/autor do crime» (…) Aliás, um olhar, ainda que breve sobre os crimes constantes do citado artigo 7.º, facilmente nos leva a constatar que não foi intenção do legislador amnistia-los ou perdoá-los, fosse no caso em que os respetivos agentes não tenham (ainda) sido condenados ou em qualquer outro».

8. Por outro lado, o art. 7.º, n.º 3 daquela Lei prevê expressamente que «a exclusão do perdão e da amnistia previstos nos números anteriores não prejudica a aplicação do perdão previsto no artigo 3.º e da amnistia prevista no artigo 4.º relativamente a outros crimes cometidos», querendo o legislador, com tal normativo, querer dizer, além do mais, que as excepções do art. 7.º se aplicam igualmente à amnistia de infrações, sendo que a amnistia pressupõe, necessariamente que ainda não exista pena, e como tal «condenação».

9. O entendimento sufragado pelo Tribunal a quo, ao considerar que, em caso de amnistia o art. 7.º abrange os «agentes do crime» não comporta interpretação que exceda o espírito da lei e o que, com a mesma, pretendeu o legislador acautelar.

10. O legislador pretendeu excluir do elenco das medidas de graça os agentes dos crimes a que se refere o art. 7.º - veja-se a referida proposta de lei.

11. A interpretação dada aquela norma pelo Tribunal a quo visou, tão só, “resgatar o pensamento legislativo” e a intenção que presidiu à redação da lei – conforme Acórdão citado « A interpretação extensiva (única em tese admissível, neste tipo de situações) acaba por ser, retomando o horizonte doutrinal de Pires de Lima e Antunes Varela, um resgatar do pensamento legislativo, porque as palavras concretamente usadas na lei haviam “atraiçoado” a sua intenção, ao formular a norma».

12. Interpretação diferente conduziria, sim, a desconformidades constitucionais, como sendo, não aplicar o perdão da pena a um jovem condenado pelo crime de condução de veículo em estado de embriaguez e outro, porquanto ainda não condenado, poder beneficiar daquela medida de graça que é a amnistia.

13. Pelo exposto supra e com os fundamentos carreados entende-se que bem andou o Tribunal a quo, inexistindo, neste ensejo, qualquer vício a apontar à decisão sub judice, nem qualquer violação de qualquer princípio ou dispositivo legal ou constitucional.

14. Não violou o Tribunal a quo qualquer norma ou princípios jurídico penais ou constitucionais.

Termos em que Vossas Excelências farão a habitual JUSTIÇA!”

A Digna Magistrada do Ministério Público junto do Tribunal recorrido respondeu ainda ao recurso principal, considerando que o mesmo não merece provimento e que a decisão recorrida deve ser mantida, rematando a usa argumentação com as seguintes conclusões:

« CONCLUSÕES:

1. Por douta Sentença nestes autos exarada foi a Arguida AA condenada na pena de 80 (oitenta) dias de multa, à taxa diária de € 5,50 (cinco euros e cinquenta cêntimos), pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punido pelo artigo 292.º, n.º 1, do Código Penal e na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor de qualquer categoria pelo período de 5 (cinco) meses, nos termos do disposto no artigo 69.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal.

2. Não obstante a idade da arguida, inferior a 30 anos à data da prática dos factos, não beneficia da amnistia prevista na Lei n.º 38-A/2023, de 2 de agosto, sendo que sobre tal questão a ora Recorrente interpôs já competente recurso a ser apreciado em conjunto com o ora apresentado, tendo o Ministério Público apresentado a sua resposta a qual consta sob ref.ª citius 15182410 que, nesta matéria, aqui se dá por reproduzida e onde se entende, em suma, que o legislador pretendeu excluir do elenco das medidas de graça os agentes dos crimes a que se refere o art. 7.º da Lei 38-A/2023, de 2 de agosto.

3. A alegada deficiência na gravação não foi arguida no prazo geral de 10 dias, pelo que a mesma, eventualmente a verificar-se, sempre se deveria considerar sanada – veja-se, neste sentido o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, proferido no Processo 81/20.0GBAGD.P1, datado de 09.12.2020, disponível em www.dgsi.pt.

4. No dia 01.03.2024 foi requerida a cópia da gravação da audiência, a qual foi disponibilizada no dia 04.03.2024. Por requerimento datado de 12.03.2024 veio a arguida arguir a nulidade do julgamento, por deficiente gravação da audiência.

5. Ora, no caso dos autos tendo a sessão de julgamento decorrido no dia 15 de fevereiro de 2024, cuja gravação se encontra disponível no sistema citius, a alegada deficiência da gravação deveria ter sido arguida até ao dia 25 de fevereiro de 2024 acrescida do prazo que mediou entre o requerimento de cópia da gravação e a efetiva satisfação desse pedido. Quando foi requerida uma cópia da gravação já havia decorrido o prazo de 10 dias. Não obstante, a audiência de julgamento não padece de nulidade.

6. Verificado o talão de alcoolímetro, afigura-se-nos, salvo melhor opinião, que ali consta 1,67 e não 1,57, o que se extrai igualmente da sua confirmação em suporte de papel, do teor do auto de notícia e da notificação efetuada à arguida nos termos do disposto no art. 153.º, n.º 2 do Código da Estrada.

7. O aparelho DRAGER modelo 7110MKIIP foi aprovado por despacho do IPQ 211.06.07.3.06, cuja publicação consta no DR de 06.06.2007 e de onde consta que «A validade desta aprovação de modelo é de 10 anos a contar da data de publicação no Diário da República». Assim, inexistindo indicação em contrário no despacho de aprovação do modelo a sua verificação é anual.

8. Decorreram já mais de dez anos desde a aprovação do modelo, contudo tal não inviabiliza a validade da prova recolhida, pois que uma coisa é a aprovação do modelo, outra é a sua verificação ulterior. Os aparelhos cujo prazo de aprovação deixou de estar válido podem continuar em funcionamento desde que estejam em bom estado de conservação e aquando da verificação não incorram em erros.

9. Com efeito, e, a propósito refere o art. 7.º, n.º 7 do Decreto-Lei n.º 29/2022, de 7 de abril quando refere «Os instrumentos de medição em utilização, cuja aprovação de modelo não seja renovada ou tenha sido revogada, podem permanecer em utilização desde que satisfaçam as operações de verificação metrológica aplicáveis» - sendo certo que o aparelho em causa foi verificado em 16.12.2021.

10. Não é a aprovação do modelo do alcoolímetro, mas, antes, a sua submissão a operações de verificação que atesta a fiabilidade do resultado obtido, não obstante já ter decorrido os 10 anos sobre a data de aprovação.

11. Com efeito, o aparelho DRAGER modelo 7110MKIIP foi aprovado por despacho do IPQ 211.06.07.3.06, cuja publicação consta no DR de 06.06.2007 e de onde consta que «A validade desta aprovação de modelo é de 10 anos a contar da data de publicação no Diário da República».

12. Assim, inexistindo indicação em contrário no despacho de aprovação do modelo a sua verificação é anual, não tornando inválida a prova obtida.

13. O regime geral em matéria de alcoolímetros consta do Decreto-Lei n.º 291/90, de 20 de Setembro, alterado pelo Decreto-Lei n.º 29/2022, de 7 de abril, e a respetiva regulamentação consta da Portaria n.º 1556/2007, de 10 de Dezembro, que aprova o Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros.

14. Se o DL 29/2022 de 7 de abril é de aplicação geral aos aparelhos de medição já a Portaria 1556/2007 se refere expressamente aos alcoolímetros.

15. Como tal, refere o art. 7.º desta Portaria que «1 - A primeira verificação é efectuada antes da colocação do instrumento no mercado, após a sua reparação e sempre que ocorra violação do sistema de selagem, dispensando-se a verificação periódica nesse ano. 2 - A verificação periódica é anual, salvo indicação em contrário no despacho de aprovação de modelo. 3 - A verificação extraordinária compreende os ensaios da verificação periódica e tem a mesma validade.».

16. No despacho de aprovação do modelo nada consta em contrário à periodicidade da verificação, pelo que a mesma será anual.

17. Determina o art. 8.º, n.º 3 do Decreto-Lei n.º 29/2022(RGCMLMIM) que «A primeira verificação é válida pelo prazo constante na regulamentação específica aplicável”, sendo que, por sua vez, a Portaria n.º 1556/2007 (RCMA), refere no art. 7.º, n.º 1 que «A primeira verificação é efetuada antes da colocação do instrumento no mercado, após a sua reparação e sempre que ocorra violação do sistema de selagem, dispensando-se a verificação periódica nesse ano» e o n.º 2 que «A verificação periódica é anual, salvo indicação em contrário no despacho de aprovação de modelo».

18. Assim, de acordo com a Portaria 1556/2007 ocorrendo primeira verificação dispensa-se a verificação periódica nesse ano, devendo a mesma ser anual, salvo disposição em contrário do despacho de aprovação (que, como se viu, o despacho que aprovou o Drager MKIIIP não faz referência).

19. Assim, de acordo com a Portaria 1556/2007 ocorrendo primeira verificação dispensa-se a verificação periódica nesse ano, devendo a mesma ser anual, salvo disposição em contrário do despacho de aprovação (que, como se viu, o despacho que aprovou o Drager MKIIIP não faz referência).

20. Como tal e, revertendo ao caso dos autos, tendo o alcoolímetro sido verificado no dia 16.12.2021, consta-se que, nesse ano de 2021, estaria dispensada de verificação periódica, sendo tal verificação válida pelo período de um ano, ou seja, até ao ano civil seguinte, 31.12.2022, conforme consta do certificado do IPQ junto aos autos.

Devendo o alcoolímetro ser sujeito a verificação periódica uma vez em cada ano só teria de ser verificado no ano de 2022.

21. Assim, tendo o alcoolímetro sido verificado a 16.12.2021 estava dispensada, nesse ano de 2021, a verificação periódica (cfr. art. 7.º, n.º 1 da Portaria 1556/2007), tendo de ser objeto de subsequente verificação periódica durante o ano de 2022. E isto porque a Portaria não impõe a obrigatoriedade de uma primeira verificação anual dos alcoolímetros (ou seja, que todos os anos ocorra uma primeira verificação), mas apenas quando se verificam os requisitos da primeira verificação - o conjunto de operações destinadas a constatar a conformidade da qualidade metrológica dos instrumentos de medição, novos ou reparados, com a dos respetivos modelos aprovados e com as disposições regulamentares aplicáveis, devendo ser requerida, para os instrumentos novos, pelo fabricante ou mandatário, e pelo utilizador, para os instrumentos reparados – ou seja, quando ocorre a existência de um novo aparelho ou a sua reparação.

22. Todas as outras verificações são periódicas, (à excepção da primeira verificação e a não ser que ocorra uma extraordinária uma vez verificados os requisitos). E, se todas as outras verificações são periódicas, importa então convocar o que dispõe o art. 7.º, n. 2 da Portaria 1556/2007 - A verificação periódica é anual, salvo indicação em contrário no despacho de aprovação de modelo e ainda que se encontra dispensada no ano da primeira verificação.

23. Ora, se a verificação periódica é anual, teria de ser feita durante o ano de 2022, estando dispensada de realização durante o ano de 2021, pelo que a prova obtida através do aparelho em causa nos autos é válida.

24. Resulta efetivamente da prova produzida que quando abordada pelos militares da GNR a Recorrente não cambaleava, nem apresentou comportamento que fizesse prever que a mesma fosse portadora de álcool no sangue.

25. Se é verdade que a arguida mesmo quando no momento da fiscalização não demonstrava indícios de embriaguez não significa que a mesma não apresentasse a taxa de álcool no sangue apresentada e que não soubesse que a quantidade de bebidas alcoólicas ingeridas fosse suficiente para acusar uma taxa de álcool no sangue.

26. Aliás, a própria arguida confirma ter conduzido e previamente ingerido bebidas alcoólicas, pelo que, mesmo que não tivesse conhecimento da precisão da taxa de álcool no sangue, sabia ser portadora de uma taxa de álcool no sangue.

27. Deste modo, a arguida ao confessar que tinha ingerido bebidas alcoólicas antes de iniciar a condução do veículo, reconhece que sabia ser portadora de álcool no sangue, mesmo que não tivesse consciência da concreta taxa, pelo que nesta parte, deverá igualmente improceder o recurso.

28. A arguida conduzia com uma taxa de álcool no sangue de 1,58g/l, o que é, já, elevado, tendo, sobretudo em consideração a quantidade de acidentes rodoviários que ocorrem no nosso país, decorrentes de condutores que apresentam álcool no sangue.

29. A aplicação de penas e medidas de segurança visa a proteção de bens jurídicos, numa verdadeira aceção de natureza preventiva, assim como a consequente reintegração do agente na sociedade.

30. A determinação da medida concreta da pena, sendo feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção foi devidamente considerada atentos os fatores relativos à personalidade do agente e fatores relativos à sua conduta anterior e posterior ao crime.

31. A punição em 80 dias de multa ficou aquém do limite máximo da pena de multa que é de 120 dias, o que se considera justo e adequado, considerando, não só as finalidades de prevenção geral como especial no cotejo com a taxa de álcool no sangue apresentada pela arguida que era já elevada e com o facto de a arguida não averbar qualquer condenação no seu certificado do registo criminal.

32. A pena de 80 dias de multa mostra-se justa e adequada, considerando a taxa de álcool no sangue que a arguida era portadora aquando da prática dos factos, mostra-se justa e adequada.

33. E quanto ao quantitativo diário considerando que a arguida é estudante, reside em casa dos pais, não tem despesas, não tem empréstimos, é ajudada financeiramente pelos pais, aufere mensalmente cerca de 250,00€ e não possui despesas sociais relevantes, a mesma afigura-se igualmente justa, proporcional e adequada.

34. A pena acessória de proibição de conduzir pelo período de cinco meses mostra-se adequada e ajustada às finalidades da punição, tendo em consideração o caso concreto.

35. Assim, no que concerne à medida concreta da pena acessória de inibição de conduzir, igualmente nenhum reparo é, salvo melhor e avalizado entendimento, de tecer quanto à decisão recorrida.

36. No que concerne à conta de custas, não obstante a audiência de julgamento ter decorrido numa única sessão, sendo designada outra sessão para leitura da sentença, atendendo à complexidade das questões levantadas parece-nos que a condenação terá sido adequada.

37. Não violou o Tribunal a quo qualquer norma ou princípios jurídicos.

38. Entende-se que bem andou o Tribunal a quo, inexistindo, neste ensejo, qualquer nulidade da audiência de julgamento, vício a apontar à prova produzida, nem à medida da pena de multa e à taxa aplicada, nem à medida da pena acessória aplicada, nem qualquer violação de qualquer princípio ou dispositivo legal, designadamente o art. 71.º do Código Penal.

Termos em que Vossas Excelências farão a habitual JUSTIÇA!.»


*

Neste Tribunal da Relação do Porto, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer onde acompanhou a posição do Ministério Público nas respostas aos recursos, pugnando igualmente pelas respetivas improcedências.

*

Notificado nos termos do disposto no art. 417.º, n.º 2, do CPPenal, a recorrente apresentou resposta, reafirmando as suas motivações anteriores.

*

Realizado o exame preliminar, e colhidos os vistos legais, foram os autos submetidos à conferência, nada obstando ao conhecimento do recurso.

*

II. Apreciando e decidindo:

Questões a decidir no recurso

É pelas conclusões que a recorrente extrai da motivação que apresenta que se delimita o objecto do recurso, devendo a análise a realizar pelo Tribunal ad quem circunscrever-se às questões aí suscitadas, sem prejuízo do dever de se pronunciar sobre aquelas que são de conhecimento oficioso[1].

As questões que a recorrente coloca à apreciação deste Tribunal de recurso são as seguintes:

Recurso interlocutório

- Aplicabilidade da lei da amnistia e do perdão de penas.

Recurso principal

- Erro/lapso de escrita do talão alcoolímetro e sua incidência sobre a medida da pena.

- Nulidade da audiência de julgamento por impercetibilidade da gravação.

- Erro de julgamento em sede de matéria de facto, com recurso a prova proibida relacionada com a aprovação e verificação de desempenho periódico do aparelho de medição do álcool.

- Impugnação da matéria de facto relativamente aos pontos provados em 2,3,4 e 5.

- Violação do princípio in dubio pro reo;

- Erro sobre a ilicitude;

- Erro de julgamento em sede de direito quanto à qualificação jurídica dos factos.

- Escolha e determinação da medida concreta da pena principal e acessória.

- Atenuação especial da pena.

- Taxa diária da multa.

- Omissão de pronúncia sobre pedido de não transcrição da sentença.

- Valor das custas.


*

Para análise da questão da aplicabilidade da lei da amnistia releva:

Despacho judicial de 12.09.23.

 No dia 01.09.2023, entrou em vigor a Lei n.º 38-A/2023, de 2 de Agosto, que estabelece um perdão de penas e uma amnistia de infracções, por ocasião da realização, em Portugal, da Jornada Mundial da Juventude, razão pela qual importa aferir da sua eventual aplicação ao aqui arguido.

No artigo 2.º, n.º 1, da referida Lei n.º 38-A/2023, de 2 de Agosto, estabelece-se que “Estão abrangidas pela presente lei as sanções penais relativas aos ilícitos praticados até às 00:00 horas de 19 de junho de 2023, por pessoas que tenham entre 16 e 30 anos de idade à data da prática do facto, nos termos definidos nos artigos 3.º e 4.º”.

No caso dos autos, não foi ainda proferida sentença, pelo que importa atender ao disposto no artigo 4.º da aludida Lei, que estatui que “São amnistiadas as infrações penais cuja pena aplicável não seja superior a 1 ano de prisão ou a 120 dias de multa.”

Vejamos.

Compulsados os autos, desde logo se constata que os factos integradores do ilícito penal praticado nestes autos ocorreram a 13.08.2022, sendo que a arguida nasceu a ../../1998, pelo que, à data dos factos, tinha menos de 30 anos, estando, pois, abrangida pelo regime em causa.

Sucede, porém, que o crime pelo qual a arguida vem acusada não beneficia do perdão de penas nem da amnistia previstos na Lei supra referida, por se encontrar expressamente excepcionado, em face do disposto no artigo 7.º, n.º 1, alínea d), ii), que prevê que não beneficiam do perdão de penas e da amnistia os condenados por “Crimes de condução perigosa de veículo rodoviário e de condução de veículo em estado de embriaguez ou sob a influência de estupefacientes ou substâncias psicotrópicas, previstos nos artigos 291.º e 292.º do Código Penal”.

Em face do exposto, sem necessidade de ulteriores considerações, concordando-se com a promoção que antecede, nada cumpre, nesta sede, determinar, devendo os autos manter-se a aguardar a audiência de julgamento agendada nos autos.

Notifique.”

Despacho judicial datado de 02.10.2023.

 “Veio a arguida pedir que o despacho que antecede (de 12.09.2023) seja revogado, “substituindo-se por outro que determine a AMNISTIA e consequente extinção do procedimento criminal”, alegando para tanto, e em síntese, que, não se encontrando a arguida condenada (mas apenas acusada, uma vez que ainda não se realizou a audiência de julgamento) pela prática de crime de condução de veículo em estado de embriaguez, não podem aplicar- se-lhe as excepções previstas no artigo 7.º da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de Agosto, nos termos da qual “Não beneficiam do perdão e da amnistia previstos na presente lei (…) os condenados por (…) Crimes (…) de condução de veículo em estado de embriaguez”.

O Ministério Público mantém a promoção que antecede, no sentido de que a arguida se encontra abrangida pelas excepções previstas no referido artigo 7.º, não beneficiando, por isso, de perdão ou de amnistia.

Vejamos.

O artigo 7.º da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de Agosto, sob a epígrafe “Exceções”, estatui que:

“1 - Não beneficiam do perdão e da amnistia previstos na presente lei:

a) No âmbito dos crimes contra as pessoas, os condenados por:

i) Crimes de homicídio e infanticídio, previstos nos artigos 131.º a 133.º e 136.º do Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de setembro;

ii) Crimes de violência doméstica e de maus-tratos, previstos nos artigos 152.º e 152.º-A do Código Penal;

iii) Crimes de ofensa à integridade física grave, de mutilação genital feminina, de tráfico de órgãos humanos e de ofensa à integridade física qualificada, previstos nos artigos 144.º, 144.º-A, 144.º-B e na alínea c) do n.º 1 do artigo 145.º do Código Penal;

iv) Crimes de coação, perseguição, casamento forçado, sequestro, escravidão, tráfico de pessoas, rapto e tomada de reféns, previstos nos artigos 154.º a 154.º-B e 158.º a 162.º do Código Penal;

v) Crimes contra a liberdade e a autodeterminação sexual, previstos nos artigos 163.º a 176.º-B do Código Penal;

b) No âmbito dos crimes contra o património, os condenados:

i) Por crimes de abuso de confiança ou burla, nos termos dos artigos 205.º, 217.º e 218.º do Código Penal, quando cometidos através de falsificação de documentos, nos termos dos artigos 256.º a 258.º do Código Penal, e por roubo, previsto no n.º 2 do artigo 210.º do Código Penal;

ii) Por crime de extorsão, previsto no artigo 223.º do Código Penal;

c) No âmbito dos crimes contra a identidade cultural e integridade pessoal, os condenados por crimes de discriminação e incitamento ao ódio e à violência e de tortura e outros tratamentos cruéis, degradantes ou desumanos, incluindo na forma grave, previstos nos artigos 240.º, 243.º e 244.º do Código Penal;

d) No âmbito dos crimes contra a vida em sociedade, os condenados por:

i) Crimes de incêndios, explosões e outras condutas especialmente perigosas, de incêndio florestal, danos contra a natureza e de poluição, previstos nos artigos 272.º, 274.º, 278.º e 279.º do Código Penal;

ii) Crimes de condução perigosa de veículo rodoviário e de condução de veículo em estado de embriaguez ou sob a influência de estupefacientes ou substâncias psicotrópicas, previstos nos artigos 291.º e 292.º do Código Penal;

iii) Crime de associação criminosa, previsto no artigo 299.º do Código Penal;

e) No âmbito dos crimes contra o Estado, os condenados por:

i) Crimes contra a soberania nacional e contra a realização do Estado de direito, previstos nas secções i e ii do capítulo i do título v do livro ii do Código Penal, incluindo o crime de tráfico de influência, previsto no artigo 335.º do Código Penal;

ii) Crimes de evasão e de motim de presos, previstos nos artigos 352.º e 354.º do Código Penal;

iii) Crime de branqueamento, previsto no artigo 368.º-A do Código Penal;

iv) Crimes de corrupção, previstos nos artigos 372.º a 374.º do Código Penal;

v) Crimes de peculato e de participação económica em negócio, previstos nos artigos 375.º e 377.º do Código Penal;

f) No âmbito dos crimes previstos em legislação avulsa, os condenados por:

i) Crimes de terrorismo, previstos na lei de combate ao terrorismo, aprovada pela Lei n.º 52/2003, de 22 de agosto;

ii) Crimes previstos nos artigos 7.º, 8.º e 9.º da Lei n.º 20/2008, de 21 de abril, que cria o novo regime penal de corrupção no comércio internacional e no setor privado, dando cumprimento à Decisão Quadro 2003/568/JAI do Conselho, de 22 de julho de 2003;

iii) Crimes previstos nos artigos 8.º, 9.º, 10.º, 10.º-A, 11.º e 12.º da Lei n.º 50/2007, de 31 de agosto, que estabelece um novo regime de responsabilidade penal por comportamentos suscetíveis de afetar a verdade, a lealdade e a correção da competição e do seu resultado na atividade desportiva;

iv) Crimes de fraude na obtenção de subsídio ou subvenção, de desvio de subvenção, subsídio ou crédito bonificado e de fraude na obtenção de crédito, previstos nos artigos 36.º, 37.º e 38.º do Decreto-Lei n.º 28/84, de 20 de janeiro, que altera o regime em vigor em matéria de infrações antieconómicas e contra a saúde pública;

v) Crimes previstos nos artigos 36.º e 37.º do Código de Justiça Militar, aprovado em anexo à Lei n.º 100/2003, de 15 de novembro;

vi) Crime de tráfico e mediação de armas, previsto no artigo 87.º da Lei n.º 5/2006, de 23 de fevereiro, que aprova o regime jurídico das armas e suas munições;

vii) Crimes previstos na Lei n.º 109/2009, de 15 de setembro, que aprova a Lei do Cibercrime;

viii) Crime de auxílio à imigração ilegal, previsto no artigo 183.º da Lei n.º 23/2007, de 4 de julho, que aprova o regime jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional;

ix) Crimes de tráfico de estupefacientes, previstos nos artigos 21.º, 22.º e 28.º do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro, que aprova o regime jurídico aplicável ao tráfico e consumo de estupefacientes e substâncias psicotrópicas;

x) Crimes previstos nos artigos 27.º a 34.º da Lei n.º 39/2009, de 30 de julho, que estabelece o regime jurídico do combate à violência, ao racismo, à xenofobia e à intolerância nos espetáculos desportivos, de forma a possibilitar a realização dos mesmos com segurança;

g) Os condenados por crimes praticados contra crianças, jovens e vítimas especialmente vulneráveis, nos termos do artigo 67.º-A do Código de Processo Penal, aprovado em anexo ao Decreto-Lei n.º 78/87, de 17 de fevereiro;

h) Os condenados por crimes praticados enquanto titular de cargo político ou de alto cargo público, magistrado judicial ou do Ministério Público, no exercício de funções ou por causa delas, designadamente aqueles previstos na Lei n.º 34/87, de 16 de julho, que determina os crimes de responsabilidade que titulares de cargos políticos cometam no exercício das suas funções;

i) Os condenados em pena relativamente indeterminada;

j) Os reincidentes;

k) Os membros das forças policiais e de segurança, das forças armadas e funcionários relativamente à prática, no exercício das suas funções, de infrações que constituam violação de direitos, liberdades e garantias pessoais dos cidadãos, independentemente da pena;

l) Os autores das contraordenações praticadas sob influência de álcool ou de estupefacientes, substâncias psicotrópicas ou produtos com efeito análogo.

2 - As medidas previstas na presente lei não se aplicam a condenados por crimes cometidos contra membro das forças policiais e de segurança, das forças armadas e funcionários, no exercício das respetivas funções.

3 - A exclusão do perdão e da amnistia previstos nos números anteriores não prejudica a aplicação do perdão previsto no artigo 3.º e da amnistia prevista no artigo 4.º relativamente a outros crimes cometidos.”

Ora, da leitura do diploma legal em apreço, e em particular da norma ora citada, resulta evidente que o legislador usa aqui o termo “condenados” não em sentido estrito, mas sim referindo-se, genericamente, a agente/autor do crime.

Veja-se, a título de exemplo, in “Notas práticas referentes à Lei n.º 38-A/20023, de 2 de agosto, que estabelece um perdão de penas e uma amnistia de infrações por ocasião da realização em Portugal da Jornada Mundial da Juventude” (Pedro José Esteves de Brito, in revista JULGAR online, Agosto de 2023), o seguinte excerto da anotação ao artigo 7.º:

“O elenco das exceções é feito em função dos crimes em causa, tendo em conta o bem jurídico protegido e os elementos constitutivos (cfr. n.º 1, als. a) a f)) ou, independentemente dos concretos crimes, das respetivas vítimas (cfr. n.º 1, al. g), e n.º 2) de determinadas qualidades ou características do agente (cfr. n.º 1, als. h), k) e l)), da pena aplicada (cfr. n.º 1, al. i)) ou da verificação de determinada agravante geral (cfr. n.º 1, al. j)).

Deste modo, o facto de um crime não constar no elenco daqueles que, por si só, determinam a exclusão das medidas estabelecidas na Lei em análise, não impede que o respetivo agente possa, ainda assim, não beneficiar destas por força das demais exceções igualmente previstas. (…)”. (Sublinhado e destacado nossos.)

Aliás, um olhar, ainda que breve, sobre os crimes constantes do citado artigo 7.º, facilmente nos leva a constatar que não foi intenção do legislador amnistiá-los ou perdoá- los, fosse no caso em que os respectivos agentes não tenham (ainda) sido condenados ou em qualquer outro.

Assim sendo, e sem necessidade de ulteriores considerações, indefere-se o requerido, mantendo-se o despacho que antecede (de 12.09.2023), no sentido de que a arguida, em face do crime de condução em estado de embriaguez pelo qual vem acusada, não beneficia nem de perdão, nem de amnistia.


***

(…)”

Para análise das questões suscitadas no recurso principal que importa apreciar releva desde logo a factualidade subjacente e razões da sua fixação, bem como os fundamentos da escolha e determinação das penas, sendo do seguinte teor o elenco dos factos provados e não provados e respectiva motivação constantes da sentença recorrida e análise jurídica relativa às sanções aplicadas (transcrição):


« II.1 Resultaram provados os seguintes factos:

Da acusação

1) No dia 13 de Agosto de 2022, pelas 01h44, na Rua ..., em ..., na ..., na via pública, a arguida conduziu o veículo ligeiro de passageiros com a matrícula “..-..-TS”, após ter ingerido bebidas alcoólicas.

2) Nessa circunstância de tempo e lugar, a arguida foi submetida ao teste quantitativo de pesquisa de álcool no sangue através do aparelho DRAGER, modelo Alcotest 7110 MKIIIP, com o n.º de série ARAN – 0067, apresentando uma TAS de, pelo menos, 1,58g/l álcool no sangue, a que corresponde uma TAS registada de 1,67 g/l de álcool no sangue.

3) A arguida sabia que tinha ingerido bebidas alcoólicas em quantidade que lhe determinaria uma taxa de álcool no sangue superior a 1,20 g/l e conhecia as características da via e do veículo.

4) A arguida previu assim como quis conduzir o referido veículo ligeiro de passageiros na via pública após ter ingerido bebidas alcoólicas em excesso, sabendo que conduzia com uma taxa de álcool superior à permitida por lei, e, mesmo assim não se absteve de o fazer.

5) A arguida agiu de forma livre, deliberada, voluntária e conscientemente, bem sabendo que as descritas condutas eram proibidas e punidas por lei penal e que incorria em responsabilidade criminal.

Mais se provou

6) A arguida é estudante de mestrado, em engenharia alimentar, na Escola Superior ....

7) Trabalha em part time, auferindo uma média de € 250,00 mensais.

8) Para os estágios que efectua, desloca-se, em regra, de carro.

9) Vive com o pai e a mãe, sendo que estes auferem cerca de € 1.000,00 e de € 1.200,00 mensais, respectivamente.

10) A arguida não tem empréstimos contraídos.

11) É ajudada financeiramente pelos pais, sendo que a arguida paga parte das suas despesas, como seja a despesa inerente ao telemóvel, no valor de cerca de € 13,00 mensais.

12) Do seu certificado de registo criminal não constam quaisquer condenações.


*

II.2. Factos não provados

Inexistem.


*

II.3. Motivação

Desde logo, a convicção do tribunal assentou, quanto aos pontos 1) e 2), na globalidade da prova produzida, designadamente a prova documental junta aos autos, como seja o auto de notícia, junto a fls. 2 e 3, o talão do alcoolímetro e respectivo certificado de verificação, juntos a fls. 4 e 5, e a prova por declarações e testemunhal, produzida em sede de audiência de julgamento nos termos que infra passamos a expor.

A arguida prestou declarações e confessou as circunstâncias de tempo e lugar referidas na acusação pública, tendo confirmado que bebeu e que, após, conduziu (circunstanciando os termos em que o fez), não se conformando, apenas, com a concreta taxa de álcool que lhe vem imputada e, em consequência, com os elementos subjectivos do crime, nos termos em que vêm formulados, em sede de acusação pública.

Não se tratou de uma confissão integral e sem reservas, mas, ainda assim, necessariamente contribuiu para a formação da convicção de tribunal.

Mostrando-se sempre muito comprometida com um desfecho da causa que lhe fosse favorável, a arguida concretamente relatou que, na noite ora em apreço, teve um jantar com amigos, seguido de uma festa (imediatamente antes da fiscalização a que foi sujeita), afirmando que bebeu, ao jantar, duas cervejas (mini) e uma taça de champagne e, após, na festa, outra cerveja (fino).

Mais afirmou, reiterando-o, sempre, que entende que se encontrava em perfeitas condições para conduzir e que, por isso, ficou surpreendida com o resultado do teste a que foi submetida.

No mais, as testemunhas BB e CC, militares da GNR, prestaram depoimentos isentos e credíveis e confirmaram as circunstâncias de tempo e lugar referidas em 1), tendo a testemunha BB confirmado o teor do auto de notícia (por si assinado), bem como que a arguido se submeteu ao teste referido em 2), tendo as testemunhas, aliás, de qualquer modo, afirmado ainda que a própria arguida admitiu que tinha ingerido bebidas alcoólicas.

A solicitação da defesa, confirmaram que a arguida aparentava encontrar-se bem e consciente.

Neste momento, antes de passar à motivação dos elementos subjectivos, cremos que importa proceder a uma ressalva.

Indeferida a nulidade invocada quanto à prova pericial obtida através do alcoolímetro, nenhuma outra questão se levanta quanto ao resultado obtido no teste a que a arguida foi sujeita, o qual, deduzida a competente margem de erro admissível, se tem por absolutamente certo (desde logo, na medida em que se trata de prova pericial).

Não obstante o que vem de dizer-se, pela arguida foi assumida a estratégia de defesa de fazer crer ao tribunal que se estava na presença de um caso excepcional, em que a condutora do veículo, não obstante ter bebido álcool, estava num estado irrepreensível, em que, ao contrário da generalidade dos condutores que cometem o crime em apreço, não havia o mínimo de alterações de consciência e/ou reflexos (que consabidamente a ingestão de bebidas alcoólicas provoca) e que, até, por isso, a arguida não terá podido perceber que estava sob o efeito do álcool.

Ora, veja-se que, “a arguida, ao confessar que ingeriu bebidas alcoólicas pouco antes de iniciar a condução, reconhece que não desconhecia ser portador de álcool no sangue, em valores não permitidos, mesmo que não tivesse consciência da precisão numérica da taxa de álcool no sangue.”4

4 Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 17.03.2005, processo n.º 182/13.1 GTEVR.E1, disponível em www.dgsi.pt.

Assente o que vem de dizer-se, prossigamos, então.

No que tange à prova dos elementos subjectivos – pontos 3) a 5) –, isto é, dos factos relativos ao juízo formulado com que a arguida agiu e ao conhecimento e vontade com que actuou, bem como quanto à consciência da ilicitude da conduta em causa, tal juízo foi extraído dos factos objectivos, analisados à luz das regras da experiência comum e das regras da lógica e do normal acontecer, atentas as circunstâncias do caso concreto.

É consabido que tal factualidade, que é de ordem psicológica – ainda que também normativa –, se afigura de difícil objectivação, em termos de racionalidade do processo de apreensão da realidade. Todavia, a convicção alcançada resulta de uma análise global das condutas levadas a cabo pela arguida, tendo em conta as regras da normalidade do acontecer, sendo certo, aliás, que tais condutas – condução sob o efeito do álcool – são comummente tidas como penalmente proibidas, tanto mais que estamos no domínio do chamado “direito penal de justiça” (ou primário), que, no caso concreto, ademais, toca à protecção de bens jurídicos cuja consciência se encontra perfeitamente solidificada na comunidade.

Os pontos 6) a 11), relativos às condições pessoais da arguida, resultaram provados em face das declarações prestadas pela própria, as quais se nos afiguraram credíveis.

Quanto ao ponto 12), relativo à ausência de antecedentes criminais da arguida, o tribunal tomou em consideração o teor do certificado de registo criminal, junto sob a referência 15079587.


As testemunhas DD e EE (ouvidas nos termos do disposto no artigo 128.º, n.º 2, do Código de Processo Penal), amigas da arguida, não apresentaram conhecimento directo dos factos constantes da acusação, tendo, não obstante, confirmado que estiveram com arguida na festa que antecedeu a fiscalização referida em nos factos provados e que aquela se encontrava bem, tendo estas testemunhas afirmado ainda, e em síntese, que a arguida é uma boa amiga, que é educada e que não é conflituosa. (…)
 A ESCOLHA E DETERMINAÇÃO DA MEDIDA DA PENA

(…) Vejamos o nosso caso.

A condução de veículos em estado de embriaguez tem contribuído decisivamente para o aumento da sinistralidade estradal, sendo de todos conhecido o lugar cimeiro que Portugal ocupa nesta matéria.

Assim, atenta a cada vez maior insegurança na circulação rodoviária, apesar das sucessivas campanhas de prevenção, temos que as exigências de prevenção geral continuam a ser elevadíssimas, importando restaurar o respeito comunitário pelo bem jurídico atingido, por meio de punições dissuasoras de tais práticas.

Quanto às exigências de prevenção especial, vejamos.

A arguida não tem antecedentes criminais.

Encontra-se inserida familiar e profissionalmente.

A arguida não confessou os factos – não integralmente –, sendo que tal postura assumida em sede de audiência de julgamento, numa atitude de auto-desculpabilização, revela que não tem interiorizada a censura subjacente à sua conduta e, por isso, resulta em seu claro desfavor.

Por este motivo, são, pois, medianas as exigências de prevenção especial.

Tudo visto e ponderado, o tribunal entende que a aplicação à arguida de uma pena de multa – dado o constrangimento económico que implica e que não deixará de repercutir-se na sua vida – garante de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, satisfazendo as exigências de reprovação e prevenção requeridas no caso concreto.


*

Passemos à determinação da pena concreta a aplicar.

Nos termos do artigo 71.º, n.º 1, do Código Penal, a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção.

Assim, na fixação da pena concreta, temos que a culpa constitui o pressuposto e o fundamento da validade da pena e estabelece o limite máximo da pena concreta, como dispõe o artigo 40.º, n.º 2, do Código Penal, e temos também de atender às exigências de prevenção geral e especial, tendo em conta todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo, deponham a favor ou contra o agente, considerando nomeadamente as alíneas do artigo 71.º, n.º 2, do Código Penal.


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Atentemos ao caso em apreço.

Antes de mais, quanto às exigências de prevenção geral e especial que se fazem sentir in casu, dão-se aqui por reproduzidas as considerações supra expendidas a propósito da escolha da pena.

A ilicitude dos factos é mediana, atenta a TAS com que a arguida conduzia (1,58 g/l).

O dolo é directo.

Situando-se a moldura penal abstracta da pena de multa deste crime entre 10 e 120 dias, nos termos dos artigos 47.º, n.º 1, e 292.º, n.º 1, ambos do Código Penal, o tribunal decide aplicar à arguida a pena de 80 (oitenta) dias de multa.


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Quanto à taxa diária da multa, decorre do disposto no artigo 47.º, n.º 2, do Código Penal que esta é fixada entre € 5,00 e € 500,00 e em função da situação económica e financeira do condenado, bem como dos seus encargos pessoais, sendo certo que “a pena de multa, se não quer ser um andrajoso simulacro de punição, tem de ter como efeito o causar, pelo menos, algum desconforto, se não, mesmo, um sacrifício económico palpável”5, apenas sendo de . equacionar a aplicação do seu liminar mínimo em “situações muito excepcionais de fraquíssima capacidade económica (quase absoluta indigência 6.

5 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 03.06.2004, relator: Pereira Madeira, processo n.º 04P1266.

6 Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 01.02.2007, relator: Jorge Dias, processo n.º 1/05.2FDCBR.C1.

Ora, para o que aqui importa, resultou provado que:

• A arguida é estudante de mestrado, em engenharia alimentar, na Escola Superior ....

• Trabalha em part time, auferindo uma média de € 250,00 mensais.

• Para os estágios que efectua, desloca-se, em regra, de carro.

• Vive com o pai e a mãe, sendo que estes auferem cerca de € 1.000,00 e de € 1.200,00 mensais, respectivamente.

• A arguida não tem empréstimos contraídos.

• É ajudada financeiramente pelos pais, sendo que a arguida paga parte das suas despesas, como seja a despesa inerente ao telemóvel, no valor de cerca de € 13,00 mensais.

Pelo exposto, julga-se ser de fixar o quantitativo diário da pena de multa em € 5,50 (cinco euros e meio).


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IV.2 Da pena acessória

Dispõe o artigo 69.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, que é condenado na proibição de conduzir veículos com motor, por um período fixado entre três meses e três anos, quem for punido por crime previsto nos artigos 291.º e 292.º. do Código Penal.

No caso, devendo a arguida ser punida pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, cumpre ponderar a aplicação desta pena acessória.

Ora, atentando nas considerações tecidas supra, a propósito das exigências de prevenção geral e especial que in casu se fazem sentir – e que aqui se dão por reproduzidas –, julga-se adequado fixar o período de proibição de conduzir veículos com motor de qualquer categoria em 5 (cinco) meses


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Vejamos.

Recurso interlocutório.

Da aplicabilidade da lei da Amnistia e perdão ( Lei n º 38-A/2023 de 2 de Agosto).

Por despacho nestes autos exarado proferido em 12 de setembro de 2023, sob referência citius 128938992 foi decidido não aplicar o regime da amnistia previsto na Lei n.º 38 -A/2023, de 2 de agosto.

De tal despacho interpôs recurso a Arguida referindo que o Tribunal a quo, interpretou erradamente o direito, integrando a factualidade sub judice, na cláusula de exceção prevista no art.º 7.º, n.º 1, al. d), ii) do mesmo diploma.

Conclui dizendo que, como o crime – condução de veículo em estado de embriaguez - pelo qual a arguida se encontra acusada é punível com pena de prisão até um ano ou pena de multa até 120 dias, a arguida à data da prática dos factos teria menos de 30 anos e, bem assim, os factos ocorreram antes do dia 19 de junho de 2023, pelo que deverá ser determinada a extinção do procedimento criminal por amnistia.

Não tem razão a recorrente.

O artigo 7.º da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de Agosto, sob a epígrafe “Exceções”, estatui que:

“1 - Não beneficiam do perdão e da amnistia previstos na presente lei:

a) No âmbito dos crimes contra as pessoas, os condenados por:

i) Crimes de homicídio e infanticídio, previstos nos artigos 131.º a 133.º e 136.º do Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de setembro;

ii) Crimes de violência doméstica e de maus-tratos, previstos nos artigos 152.º e 152.º-A do Código Penal;

iii) Crimes de ofensa à integridade física grave, de mutilação genital feminina, de tráfico de órgãos humanos e de ofensa à integridade física qualificada, previstos nos artigos 144.º, 144.º-A, 144.º-B e na alínea c) do n.º 1 do artigo 145.º do Código Penal;

iv) Crimes de coação, perseguição, casamento forçado, sequestro, escravidão, tráfico de pessoas, rapto e tomada de reféns, previstos nos artigos 154.º a 154.º-B e 158.º a 162.º do Código Penal;

v) Crimes contra a liberdade e a autodeterminação sexual, previstos nos artigos 163.º a 176.º-B do Código Penal;

b) No âmbito dos crimes contra o património, os condenados:

i) Por crimes de abuso de confiança ou burla, nos termos dos artigos 205.º, 217.º e 218.º do Código Penal, quando cometidos através de falsificação de documentos, nos termos dos artigos 256.º a 258.º do Código Penal, e por roubo, previsto no n.º 2 do artigo 210.º do Código Penal;

ii) Por crime de extorsão, previsto no artigo 223.º do Código Penal;

c) No âmbito dos crimes contra a identidade cultural e integridade pessoal, os condenados por crimes de discriminação e incitamento ao ódio e à violência e de tortura e outros tratamentos cruéis, degradantes ou desumanos, incluindo na forma grave, previstos nos artigos 240.º, 243.º e 244.º do Código Penal;

d) No âmbito dos crimes contra a vida em sociedade, os condenados por:

i) Crimes de incêndios, explosões e outras condutas especialmente perigosas, de incêndio florestal, danos contra a natureza e de poluição, previstos nos artigos 272.º, 274.º, 278.º e 279.º do Código Penal;

ii) Crimes de condução perigosa de veículo rodoviário e de condução de veículo em estado de embriaguez ou sob a influência de estupefacientes ou substâncias psicotrópicas, previstos nos artigos 291.º e 292.º do Código Penal;

iii) Crime de associação criminosa, previsto no artigo 299.º do Código Penal;

e) No âmbito dos crimes contra o Estado, os condenados por:

i) Crimes contra a soberania nacional e contra a realização do Estado de direito, previstos nas secções i e ii do capítulo i do título v do livro ii do Código Penal, incluindo o crime de tráfico de influência, previsto no artigo 335.º do Código Penal;

ii) Crimes de evasão e de motim de presos, previstos nos artigos 352.º e 354.º do Código Penal;

iii) Crime de branqueamento, previsto no artigo 368.º-A do Código Penal;

iv) Crimes de corrupção, previstos nos artigos 372.º a 374.º do Código Penal;

v) Crimes de peculato e de participação económica em negócio, previstos nos artigos 375.º e 377.º do Código Penal;

f) No âmbito dos crimes previstos em legislação avulsa, os condenados por:

i) Crimes de terrorismo, previstos na lei de combate ao terrorismo, aprovada pela Lei n.º 52/2003, de 22 de agosto;

ii) Crimes previstos nos artigos 7.º, 8.º e 9.º da Lei n.º 20/2008, de 21 de abril, que cria o novo regime penal de corrupção no comércio internacional e no setor privado, dando cumprimento à Decisão Quadro 2003/568/JAI do Conselho, de 22 de julho de 2003;

iii) Crimes previstos nos artigos 8.º, 9.º, 10.º, 10.º-A, 11.º e 12.º da Lei n.º 50/2007, de 31 de agosto, que estabelece um novo regime de responsabilidade penal por comportamentos suscetíveis de afetar a verdade, a lealdade e a correção da competição e do seu resultado na atividade desportiva;

iv) Crimes de fraude na obtenção de subsídio ou subvenção, de desvio de subvenção, subsídio ou crédito bonificado e de fraude na obtenção de crédito, previstos nos artigos 36.º, 37.º e 38.º do Decreto-Lei n.º 28/84, de 20 de janeiro, que altera o regime em vigor em matéria de infrações antieconómicas e contra a saúde pública;

v) Crimes previstos nos artigos 36.º e 37.º do Código de Justiça Militar, aprovado em anexo à Lei n.º 100/2003, de 15 de novembro;

vi) Crime de tráfico e mediação de armas, previsto no artigo 87.º da Lei n.º 5/2006, de 23 de fevereiro, que aprova o regime jurídico das armas e suas munições;

vii) Crimes previstos na Lei n.º 109/2009, de 15 de setembro, que aprova a Lei do Cibercrime;

viii) Crime de auxílio à imigração ilegal, previsto no artigo 183.º da Lei n.º 23/2007, de 4 de julho, que aprova o regime jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional;

ix) Crimes de tráfico de estupefacientes, previstos nos artigos 21.º, 22.º e 28.º do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro, que aprova o regime jurídico aplicável ao tráfico e consumo de estupefacientes e substâncias psicotrópicas;

x) Crimes previstos nos artigos 27.º a 34.º da Lei n.º 39/2009, de 30 de julho, que estabelece o regime jurídico do combate à violência, ao racismo, à xenofobia e à intolerância nos espetáculos desportivos, de forma a possibilitar a realização dos mesmos com segurança;

g) Os condenados por crimes praticados contra crianças, jovens e vítimas especialmente vulneráveis, nos termos do artigo 67.º-A do Código de Processo Penal, aprovado em anexo ao Decreto-Lei n.º 78/87, de 17 de fevereiro;

h) Os condenados por crimes praticados enquanto titular de cargo político ou de alto cargo público, magistrado judicial ou do Ministério Público, no exercício de funções ou por causa delas, designadamente aqueles previstos na Lei n.º 34/87, de 16 de julho, que determina os crimes de responsabilidade que titulares de cargos políticos cometam no exercício das suas funções;

i) Os condenados em pena relativamente indeterminada;

j) Os reincidentes;

k) Os membros das forças policiais e de segurança, das forças armadas e funcionários relativamente à prática, no exercício das suas funções, de infrações que constituam violação de direitos, liberdades e garantias pessoais dos cidadãos, independentemente da pena;

l) Os autores das contraordenações praticadas sob influência de álcool ou de estupefacientes, substâncias psicotrópicas ou produtos com efeito análogo.

2 - As medidas previstas na presente lei não se aplicam a condenados por crimes cometidos contra membro das forças policiais e de segurança, das forças armadas e funcionários, no exercício das respetivas funções.

3 - A exclusão do perdão e da amnistia previstos nos números anteriores não prejudica a aplicação do perdão previsto no artigo 3.º e da amnistia prevista no artigo 4.º relativamente a outros crimes cometidos.”

Ora, da leitura do diploma legal em apreço, e em particular da norma ora citada, resulta evidente que o legislador usa aqui o termo “condenados” não em sentido estrito, mas sim referindo-se, genericamente, a agente/autor do crime.

Veja-se, a título de exemplo, in “Notas práticas referentes à Lei n.º 38-A/20023, de 2 de agosto, que estabelece um perdão de penas e uma amnistia de infrações por ocasião da realização em Portugal da Jornada Mundial da Juventude” (Pedro José Esteves de Brito, in revista JULGAR online, Agosto de 2023), o seguinte excerto da anotação ao artigo 7.º:

“O elenco das exceções é feito em função dos crimes em causa, tendo em conta o bem jurídico protegido e os elementos constitutivos (cfr. n.º 1, als. a) a f)) ou, independentemente dos concretos crimes, das respetivas vítimas (cfr. n.º 1, al. g), e n.º 2) de determinadas qualidades ou características do agente (cfr. n.º 1, als. h), k) e l)), da pena aplicada (cfr. n.º 1, al. i)) ou da verificação de determinada agravante geral (cfr. n.º 1, al. j)).

Deste modo, o facto de um crime não constar no elenco daqueles que, por si só, determinam a exclusão das medidas estabelecidas na Lei em análise, não impede que o respetivo agente possa, ainda assim, não beneficiar destas por força das demais exceções igualmente previstas. (…)”. (Sublinhado e destacado nossos.)

Um olhar, ainda que breve, sobre os crimes constantes do citado artigo 7.º, facilmente nos leva a constatar que não foi intenção do legislador amnistiá-los ou perdoá- los, fosse no caso em que os respetivos agentes não tenham (ainda) sido condenados ou em qualquer outro.

 Assim decidiu o tribunal a quo e bem.

Como bem refere o M:P: a quo “Lê-se na Exposição dos Motivos constante da Proposta de Lei n.º 97/XV/ que estabelece o perdão de penas e amnistia de infrações praticadas por jovens que «A Jornada Mundial da Juventude (JMJ) é um evento marcante a nível mundial, instituído pelo Papa João Paulo II, em 20 de dezembro de 1985, que congrega católicos de todo o mundo. Com enfoque na vertente cultural, na presença e na unidade entre inúmeras nações e culturas diferentes, a JMJ tem como principais protagonistas os jovens (…) Nestes termos, a presente lei estabelece um perdão de um ano de prisão a todas as penas de prisão até oito anos, excluindo a criminalidade muito grave do seu âmbito de aplicação (sublinhado nosso).

Deste modo, afigura-se-nos que foi intenção do legislador, não obstante a redação dada ao artigo, essencialmente formulado para o perdão de penas, que quis excluir do âmbito de aplicação da lei todos os agentes dos crimes previstos no regime de exceção ali previsto no art. 7.º.

De outro modo, criar-se-ia uma discrepância, não querida pelo legislador, de não perdoar penas em que o agente praticou o crime de condução de veículo em estado de embriaguez, e, por outro lado, conceder amnistia a todos aqueles que, tendo embora praticado o crime, não tendo ainda sido condenados, beneficiariam da medida de graça.

Conforme refere o Tribunal a quo, posição que subscrevemos «ora, da leitura do diploma legal em apreço, e em particular da norma ora citada resulta evidente que o legislador usa aqui o termo “condenados” não em sentido estrito mas sim referindo-se, genericamente, a agente/autor do crime» (…) Aliás, um olhar, ainda que breve sobre os crimes constantes do citado artigo 7.º, facilmente nos leva a constatar que não foi intenção do legislador amnistia-los ou perdoá-los, fosse no caso em que os respetivos agentes não tenham (ainda) sido condenados ou em qualquer outro».

Por outro lado, o art. 7.º, n.º 3 daquela Lei prevê expressamente que «a exclusão do perdão e da amnistia previstos nos números anteriores não prejudica a aplicação do perdão previsto no artigo 3.º e da amnistia prevista no artigo 4.º relativamente a outros crimes cometidos», querendo o legislador, com tal normativo, querer dizer, além do mais, que as excepções do art. 7.º se aplicam igualmente à amnistia de infrações, sendo que a amnistia pressupõe, necessariamente que ainda não exista pena, e como tal «condenação».

O entendimento sufragado pelo Tribunal a quo, ao considerar que, em caso de amnistia o art. 7.º abrange os «agentes do crime» não comporta interpretação que exceda o espírito da lei e o que, com a mesma, pretendeu o legislador acautelar.

O legislador pretendeu excluir do elenco das medidas de graça os agentes dos crimes a que se refere o art. 7.º - veja-se a referida proposta de lei.

A interpretação dada aquela norma pelo Tribunal a quo visou, tão só, “resgatar o pensamento legislativo” e a intenção que presidiu à redação da lei – conforme Acórdão citado « A interpretação extensiva (única em tese admissível, neste tipo de situações) acaba por ser, retomando o horizonte doutrinal de Pires de Lima e Antunes Varela, um resgatar do pensamento legislativo, porque as palavras concretamente usadas na lei haviam “atraiçoado” a sua intenção, ao formular a norma».

Interpretação diferente conduziria, sim, a desconformidades constitucionais, como sendo, não aplicar o perdão da pena a um jovem condenado pelo crime de condução de veículo em estado de embriaguez e outro, porquanto ainda não condenado, poder beneficiar daquela medida de graça que é a amnistia.

 Pelo exposto supra e com os fundamentos carreados entende-se que bem andou o Tribunal a quo, inexistindo, neste ensejo, qualquer vício a apontar à decisão sub judice, nem qualquer violação de qualquer princípio ou dispositivo legal ou constitucional.

Não violou o Tribunal a quo qualquer norma ou princípios jurídico penais ou constitucionais.”

No mesmo sentido estudo realizado por Cruz Bucho datado de 01.03.24 sobre o assunto em causa que se transcreve por se subscrever in totum ““12. Excepções (artigo 7.°)

12.1 Crime de condução de veículo em estado de embriaguez, ou sob a influência de estupefacientes ou substâncias psicotrópicas p.e p. pelo artigo 292.º, n.º 1 do Código Penal

-Ac da Relação de Coimbra de 24-1-2024, proc. n. 477/22.3GAPMS.C1, rel. Alexandra Guiné: "I- Não obstante no artigo 7.º n.º 1 da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de agosto, o Legislador ter usado o vocábulo «condenado», a letra da Lei terá de ser interpretada de forma coerente com o processo legislativo, com o elemento histórico e com a unidade do sistema jurídico. II- Não se encontra amnistiado o crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punível pelo artigo 292.º, n.º 1 do Código Penal, relativamente ao qual o agente não foi ainda julgado".

Excerto: «Numa interpretação puramente literal, pareceria que a exclusão da amnistia, relativamente ao crime de condução de crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p.p. nos termos do art. 291.º n.º 1 do Código Penal, suporia que o arguido tivesse sido condenado (por sentença transitada em julgado).

Foi este o entendimento do Tribunal recorrido.

 (...)

E é pela natureza excecional de tais normas que é pacífico o entendimento jurisprudencial e doutrinal de que se encontra afastada a analogia, e mesmo a interpretação extensiva (não pode concluir-se que o legislador disse menos do que o que queria) ou restritiva (entendendo-se que o legislador disse mais do que o que queria).

 (...)

«Atendendo à excecionalidade que caracteriza as leis de amnistia e de perdão, a interpretação das mesmas deverá, pura e simplesmente, conter -se no texto da respetiva lei, adotando-se uma interpretação declarativa em que "não se faz mais do que declarar o sentido linguístico coincidente com o pensar legislativo»

Não esqueçamos, contudo, que, toda a fonte necessita de interpretação que desvele a regra que encerra.

Ora, em sede de interpretação de normas há que ter em conta o que se dispõe no artigo 9.º do Código Civil:

Portanto, além do teor verbal hão-de ser considerados a coerência interna do preceito, o lugar em que se encontra e as suas relações com outros preceitos (ou seja, a interpretação lógico-sistemática), assim como a situação que se verificava anteriormente à lei e toda a evolução histórica», bem assim a história da génese do preceito», que resulta particularmente dos trabalhos preparatórios, e finalmente o «fim particular da lei ou do preceito em singular (ou seja, a interpretação teleológica) - cf. Karl Engisch, Introdução ao Pensamento Jurídico, 3.ª ed., p. 111».

Tal como salienta o recorrente, pode ler-se na exposição de motivos da Proposta de Lei n.º 97/XV/1.", in DAR II série A n.º 245, 2023.06.19, que esteve na origem da Lei n.º 38-A/2023, de 2.8:

(…)

E, foi no artigo 7.º da referida Lei que o Legislador elencou os crimes que considerou incluídos na criminalidade muito grave.

Entre eles encontra-se o crime de condução de veículo em estado de embriaguez ou sob a influência de estupefacientes ou substâncias psicotrópicas, previsto no artigo 292.º do Código Penal (cf. art. 7.º n.º 1 al. d) ii).

Ademais, tal como se escreve na motivação do recurso: não poderemos deixar de fazer a referência de que o artigo 7.º parece ser decalcado da anterior Lei n.º 9/2020, de 10.04 que fixou o regime excecional de flexibilização da execução das penas e das medidas de graça, no âmbito da pandemia da doença COVID-19-, a qual apenas visou a aplicação de perdão, e não de amnistia, não tendo o Legislador tido o devido cuidado - e não intenção de alterar o vocábulo que usou nesta Lei quando fez a 'transferência para a Lei n.º 38-A/2023, de 02 de Agosto.

Aliás, o que seria claramente violador do princípio da igualdade seria amnistiar os crimes de condução de veículo em estado de embriaguez ou sob a influência de estupefacientes ou substâncias psicotrópicas que ainda não foram julgados, ou cujas sentenças ainda não transitaram em julgado, e não amnistiar, nem perdoar as penas dos crimes de condução de veículo em estado de embriaguez ou sob a influência de estupefacientes ou substâncias psicotrópicas já julgados e, portanto já têm sentença, e dos que já têm sentença transitada em julgado».

Não podemos ainda deixar de concordar com o recorrente ao ressaltar que esta interpretação também encontra assento na leitura da 'Informação de Redação Final do projeto de Decreto, no âmbito do processo legislativo da Lei n.º 38-A/2023, de 02 de Agosto disponível em (...) onde se escreveu: «Até ao termo da sessão legislativa, considerando o número de textos que se encontram em fase de redação final, a complexidade e extensão de alguns deles e, ainda, a exiguidade do prazo para a sua elaboração, informamos que remeteremos apenas o texto do projeto de decreto AR com as respetivas sugestões de aperfeiçoamento devidamente realçadas, que, na maioria dos casos, se cingem à confirmação de remissões e referências legislativas, e à correção de lapsos que foi possível detetar (...)

Destacamos as seguintes sugestões: Artigo 7.º Alinea 1) do n.º 1 Considerando que as restantes alíneas do presente número referem sujeitos (condenados, reincidentes, funcionários, membros das forças armadas, das forças policiais e de segurança): Onde se lê: «1) No âmbito das contraordenações, as que forem praticadas sob influência de álcool (...)» Sugerese: «1) Os responsáveis pelas", denota que não ocorreu, atrevemo- nos a dizer, a devida cautela na escolha dos termos a usar.

Ou seja, desta leitura extraímos que a única preocupação nessa data, na redação da Lei e no uso dos vocábulos a incluir no referido artigo, foi a de que o artigo 7.º falasse de sujeitos. E daí decorre, inclusive a alteração à alínea 1). Pelo que, por esta via, entendemos que nem o argumento de que o Legislador pretendeu distinguir arguido e condenado pois usou nessa alínea o termo responsável pode ser tida em linha de interpretação quanto à sua concreta intenção».

Não faria, aliás, qualquer sentido que, nos termos da al. 1) do n.º 1 do art.º 7.º da referida Lei, não beneficiassem da amnistia «Os autores das contraordenações praticadas sob influência de álcool ou de estupefacientes, substâncias psicotrópicas ou produtos com efeito análogo, mas que no âmbito dos crimes contra a vida em sociedade (al. d) do n.º 1 do art. 7.°), entre os quais se encontram os crimes de condução de veículo em estado de embriaguez (ii) se exigisse a condenação (transitada em julgado).

Enfim.

Não obstante no artigo 7.º n.º 1 da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de agosto, o Legislador ter usado o vocábulo «condenado», a letra da Lei terá de ser interpretada de forma coerente com o processo legislativo, com o elemento histórico e com a unidade do sistema jurídico.

Não beneficia de amnistia quem tiver praticado crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p.p. no art. 292. n.º 1 do Código Penal, podendo, portanto, vir a ser condenado.

Concluímos, assim, que não se encontra amnistiado o crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punível pelos artigos 14.º, n.º 1, 26.º, 69.º, n.º 1, al. a) e 292.º, n.º 1 do Código Penal, de cuja prática o arguido AA se encontra acusado».

Sobre a problemática subjacente a este douto acórdão afigura-se-nos útil tecer algumas considerações.

O parecer do CSMP parece ter interpretado a norma correspondente da Proposta de Lei, na parte em que se referia a "condenados" (artigo 5.°) como limitado à amnistia imprópria e ao perdão, porquanto sustentou que "O artigo 5.º do diploma restringe a possibilidade de aplicação da amnistia e do perdão e não apenas deste último em razão de uma condenação anterior pela prática de determinados tipos de crimes contra pessoas determinadas e por pessoas determinadas".

O parecer do CSM parece ter ignorado o problema já que nem sequer o refere, não obstante ter sido previamente alertado para o efeito.

Com efeito, logo em 28 de Junho de 2023 a Desembargadora Ausenda Gonçalves nos seus "Comentários e sugestões de alterações à proposta de Lei n.º 97/XV/1.", que aquele parecer do CSM chegou a citar, fizera notar que no art. 5.º em vez da expressão "condenados por crimes" deverá utilizar-se a expressão agentes de crimes'. Na verdade, se o perdão de penas se aplica a condenados já a amnistia se aplica também a agentes ainda não condenados».

Deve salientar-se que para além do crime de condução de veículo em estado de embriaguez, ou sob a influência de estupefacientes ou substâncias psicotrópicas p.e p. pelo artigo 292.º, n.º 1 do Código Penal, muitos outros crimes constantes das alíneas a) a h) do n.º 1 do artigo 7.º são puníveis com pena não superior a 1 ano de prisão e que por isso seriam, em principio, amnistiáveis.

Encontram-se nesta situação, relativamente à alínea a)-v, o crime de fraude sexual (artigo 167.º, n.°1), de importunação sexual (artigo 170.°), de abuso sexual de menor dependente ou em situação particularmente vulnerável (artigo 172.º, n.°2) e de aliciamento de menores para fins sexuais (artigo 176.°-A, n.º 1), relativamente à alínea d)-i, o crime de dano contra a natureza (artigo 278.º, n.ºs 3 e 6), relativamente à alínea e)-i os crimes de ultraje de símbolos estrangeiros (artigo 323.°), ultraje de símbolos regionais (artigo 333, n.°2) e de perturbação do exercicio de funções de membro de órgão de governo próprio das Regiões Autónomas (artigo 334.°, al. b) in fine), relativamente à alínea f)-vii o crime de acesso ilegítimo (artigo 6.º, n.º1 e 2 da Lei n.º 109/2009), relativamente à alínea f)-x o crime de participação em rixa no âmbito de espetáculo desportivo ou em acontecimento relacionado com o fenómeno desportivo (artigo 30.º, n.ºl da Lei n.º 39/2009 e, por último, relativamente à alínea h) os seguintes crimes previstos na Lei n.º 34/97, de 16 de Julho: crime de desacatamento ou recusa de execução de decisão de tribunal previsto no artigo 13.º, crime de violação de normas de execução orçamental, previsto no artigo 14.º, crimes de participação económica em negócio previstos no artigo 23.º n.ºs 2 e 3 e crime de recusa de cooperação previsto no artigo 25.º.

Na defesa de que estes crimes também não são amnistiáveis não dispomos do elemento sistemático constante da alínea 1) do n.º 1 do artigo 7.º a que recorreu o Acórdão da Relação de Coimbra de 24-1-2024.

Mas, podem igualmente invocar-se os mencionados elementos gramatical, histórico e lógico.

Quanto ao elemento histórico pode, ainda, acrescentar-se que no âmbito das anteriores Leis de amnistia sempre se considerou que o crime de condução de veículo em estado de embriaguez não se encontrava amnistiado (cfr v.g., os Ac. do STJ de Fixação de Jurisprudência n.º 3/94, de 21 de Setembro de 1994 e n.º 4/97, de 19-12-1996, os Ac. do STJ de 15-5-1997, proc. n.º 36/97, in SASTJ, de 21-11-1998 in Col. de Jur.-Acs. do S.T.J., ano VI, tomo 1, pág. 173).

E também pode recorrer-se a um outro elemento sistemático, o constante do n.º2 do artigo 7.° segundo o qual" As medidas previstas na presente Lei não se aplicam a condenados por crimes cometidos contra membro das forças policiais e de segurança, das forças armas e funcionários, no exercício das respectivas funções".

Ora, as medidas previstas na presente Lei são a amnistia e o perdão de penas.

E quanto à amnistia, a que aludem os artigos 4.0, 6.º e 7.º, n.º 1, o legislador não faz qualquer distinção entre amnistia própria e imprópria.

Acresce que aquela n.º2 do artigo 7.º constitui, praticamente, a transcrição do n.º 2 da anterior Lei 9/2020 que apenas acrescentava "e guardas prisionais".

Sucede, porém, que entre as diversas medidas estabelecidas pela Lei 9/2020 não se contou a amnistia, o que também reforça a ideia, já avançada no acórdão da Relação de Coimbra, de que o artigo 7.º parece ser decalcado' da anterior Lei n.º 9/2020, de 10.04 (...) não tendo o Legislador tido o devido cuidado e não intenção de alterar o vocábulo que usou nesta Lei quando fez a 'transferência para a Lei n.º 38-A/2023, de 02 de Agosto.

Por outro lado, não faz sentido que a lei declare que as penas aplicadas pelos aludidos crimes não beneficiem do perdão no caso de ter havido condenação e, por outro lado, da mesma lei resulte que deva ser declarado extinto, por amnistia, o respectivo procedimento criminal.

Tudo indica, pois, que ao inserir o vocábulo "condenados" nas alíneas a) a h) do n.º1 do artigo 7.º o legislador esqueceu que logo no n.º1 afirmara que as excepções se reportavam tanto ao perdão como à amnistia e por isso não tomou em consideração que pretendia excluir também do benefício da amnistia algumas dos crimes enumerado naquelas alíneas os quais seriam amnistiáveis atento o disposto no artigo 4.°.

Mais uma trapalhada legislativa que, a confirmar-se, afronta o mandamento contante do n.º 3 do artigo 9.º do Código Civil.”

No mesmo sentido - Ac. da Relação de Coimbra de 7-2-2024, proc.º n.º 1180/20.4T9GRD-B.C1, rel. Ana Carolina Cardoso: “As exceções previstas no art. 7.º da Lei da Amnistia aplicam-se às condutas ainda não julgadas ou transitadas em julgado” (sumário elaborado pela relatora).

Assim, bem decidiu a Senhora Juíza a quo ao considerar que a Lei nº 38-A/2023 não se aplicava ao caso em apreço em virtude de o crime imputado “se encontrar expressamente excepcionado, em face do disposto no artigo 7.º, n.º 1, alínea d), ii)”, daquela lei.

Improcede o recurso intercalar.

Do recurso principal

Irregularidade consubstanciada na deficiente gravação da prova na sessão de audiência do dia 15/02/2024.

Pergunta-se que irregularidade?

Alega a Recorrente a nulidade da audiência de discussão e julgamento consubstanciada na deficiente gravação da prova, o que terá como consequência a nulidade da sentença, devendo ser ordenado a repetição do julgamento.

Desde já se refira que se procedeu à audição da gravação da audiência de julgamento do dia 15/02/2024, disponível no sistema citius e pode dizer-se que muito embora a gravação não seja das melhores é entendível e percetível o que ali se diz. A invocada nulidade só tem sentido nas situações de total ou parcial impercetibilidade ou ausência de qualquer gravação, o que não é manifestamente o caso.

Caso tal se verificasse estaríamos perante uma nulidade sanável do art. 120º, n º 1, 3, al. a) do CPP.

Por sua vez, a alegada deficiência da gravação prevista no artigo 363.º do Código de Processo Penal não foi arguida no prazo geral de 10 dias, pelo que a mesma, eventualmente, a verificar-se, que não é o caso, sempre se deveria considerar sanada – veja-se, neste sentido o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, proferido no Processo 81/20.0GBAGD.P1, datado de 09.12.2020, disponível em www.dgsi.pt.

É que no dia 01.03.2024 foi requerida a cópia da gravação da audiência, a qual foi disponibilizada no dia 04.03.2024. Por requerimento datado de 12.03.2024 veio a arguida arguir a nulidade do julgamento, por deficiente gravação da audiência.

O Acórdão de Uniformização de Jurisprudência n.º 13/2014, publicado no DR – I Série, de 23.09.2014 refere que «A nulidade prevista no artigo 363.º do Código de Processo Penal deve ser arguida perante o tribunal da 1.ª instância, em requerimento autónomo, no prazo geral de 10 dias, a contar da data da sessão da audiência em que tiver ocorrido a omissão da documentação ou a deficiente documentação das declarações orais, acrescido do período de tempo que mediar entre o requerimento da cópia da gravação, acompanhado do necessário suporte técnico, e a efectiva satisfação desse pedido pelo funcionário, nos termos do n.º 3 do artigo 101.º do mesmo diploma, sob pena de dever considerar-se sanada».

Ora, tendo a audiência de julgamento decorrido no dia 15.02.2024, a leitura de sentença decorreu no dia 21.02.2024, tendo sido disponibilizada a gravação no dia 04.03.2024 em face de requerimento de 01.03.24, verifica-se que decorreram mais de dez dias, quando foi invocada a deficiência da gravação, em 12.03.2024.

No caso dos autos tendo a sessão de julgamento decorrido no dia 15 de fevereiro de 2024, a alegada deficiência da gravação deveria ter sido arguida até ao dia 25 de fevereiro de 2024 acrescida do prazo que mediou entre o requerimento de cópia da gravação e a efetiva satisfação desse pedido. Quando foi requerida uma cópia da gravação já havia decorrido o prazo de 10 dias.

Não obstante, entende-se que, desde logo, não ocorreu qualquer nulidade da audiência de julgamento, cuja gravação, a cuja audição procedemos, se encontra disponível e audível no sistema citius aconselhando-se, todavia, o tribunal a quo a assegurar uma gravação sem ruídos de fundo e com maior volume, por forma a que seja audível sem esforço.

Improcede, pois, a alegada nulidade.

Erro de escrita.

Refere a Recorrente, no ponto 12 das conclusões de recurso que «[o] talão a fls. apresenta 1,57 g/l e não 1,67g/l; deduzida a margem de erro daria 1,44g/l e não já 1,58g/l; tal influenciou negativamente a escolha da pena e sua medida, motivo pelo qual se requer corrigido, devolvendo-se a sentença à Mma Juiz a quo, para correção e reapreciação/confirmação da medida da pena».

Consta dos factos provados (ponto 2) que «nessa circunstância de tempo e lugar a arguida foi submetida ao teste quantitativo de pesquisa de álcool no sangue através do aparelho DRAGER, modelo Alcoteste 7110 MKIIP, com o n.º de série ARAN – 0067, apresentando uma TAS de, pelo menos, 1,58g/l álcool no sangue, a que corresponde uma TAS registada de 1,67g/l de álcool no sangue».

Verificado o talão de alcoolímetro (em papel), afigura-se-nos que ali consta, é sem margem para dúvidas 1,67 e não 1,57, o que se extrai igualmente do teor do auto de notícia e da notificação efetuada à arguida nos termos do disposto no art. 153.º, n.º 2 do Código da Estrada.
Como bem refere o tribunal a quo “Ora, compulsados os autos, e concretamente o aludido talão – quer digitalizado, no Citius (junto sob a referência 13372684), quer, sobretudo, em papel, no processo físico (junto a fls. 5) –, é absolutamente evidente que, deste documento consta “1,67” e não “1,57” (o que é tanto mais inequívoco quando se compara este número com o algarismo 5, que consta no topo esquerdo deste talão).”
Uma ampliação do talão constata isso mesmo, sendo incompreensível o alegado a respeito como se pode verificar:



Improcede a argumentação aduzida a propósito.

 Nulidade da prova pericial obtida através do aparelho Drager MKIIIP-ARAN 0067

Erro de julgamento em sede de matéria de facto, com recurso a prova proibida e violação do princípio in dubio pro reo

Nulidade da prova pericial obtida através do aparelho Drager MKIIIP-ARAN 0067.

Argumenta que a prova baseada no aparelho alcoolímetro Drager 7110MK IIIP constitui prova proibida, sendo a sua valoração igualmente proibida para afeitos de fiscalização rodoviária.

É pacífico o entendimento de que quanto à impugnação da matéria de facto podem os recorrentes seguir um de dois caminhos: ou invocam os vícios de lógica da sentença previstos no art. 410.º, n.º 2, do CPPenal, devendo, neste caso, ater-se apenas ao texto da decisão e às incoerências que aí possam ser encontradas, ou apresentam uma impugnação alargada, que lhes permite analisar a prova produzida em julgamento, extrapolando o espaço limitado do texto da decisão recorrida.

Em qualquer das opções impõe-se aos recorrentes o cumprimento de regras para que o recurso possa ser apreciado.

E no caso da impugnação ampla da matéria de facto resulta do texto do art. 412.º, n.º 3, do CPPenal que não é uma qualquer divergência que pode levar o Tribunal ad quem a decidir pela alteração do julgado em sede de matéria de facto.

As provas que a recorrente invoque e a apreciação que sobre as mesmas faça recair, em confronto com a valoração que o Tribunal a quo efectuou, devem revelar que os factos foram incorrectamente julgados e que se impunha decisão diversa da recorrida em sede do elenco dos factos provados e não provados.

Ou seja, para alcançar sucesso na sua pretensão, não basta estar demonstrada pela recorrente a possibilidade de existir uma solução, em termos de matéria de facto, alternativa à fixada pelo Tribunal a quo. Na verdade, é raro o julgamento onde não estão em confronto duas, ou mais, versões dos factos (arguido/assistente ou arguido/Ministério Público ou mesma arguida/arguido), qualquer delas sustentada, em abstracto, em prova produzida, seja com base em declarações dos arguidos, seja com fundamento em prova testemunhal, seja alicerçada em outros elementos probatórios.

Por isso, haver prova produzida em sentido contrário, ou diverso, ao acolhido e considerado relevante pelo Tribunal a quo não só é vulgar como é insuficiente para, só por si, alterar a decisão em sede de matéria de facto.

É necessário que a recorrente demonstre que a prova produzida no julgamento só poderia ter conduzido à solução por si pugnada em sede de elenco de matéria de facto provada e não provada e não à consignada pelo Tribunal.

E na análise da prova que apresenta na sua impugnação da matéria de facto (alargada) tem a recorrente de argumentar fazendo uso do mesmo raciocínio lógico e exame crítico que se impõe ao Tribunal na fundamentação das suas decisões, com respeito pelos princípios da imediação e da livre apreciação da prova.

Esta ideia sobressai do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 23-11-2017, onde se afirmou[2]:

«I - Há uma dimensão inalienável consubstanciada no princípio da livre apreciação da prova consagrado no art. 127.º, do CPP. A partir de um raciocínio lógico feito com base na prova produzida afigura-se, de modo objectivável, ter por certo que a arguida praticou determinados factos. Exige-se não uma certeza absoluta mas apenas e só o grau de certeza que afaste a dúvida razoável, a dúvida suscitada por razões adequadas. O que há-de ser feito mediante uma «valoração racional e crítica de acordo com as regras comuns da lógica, da razão e das máximas da experiência comum».

II - Percorrido este caminho na fundamentação, a impugnação dos factos há-de ser feita com a indicação das concretas provas que imponham decisão diversa da recorrida sob pena de tal impugnação redundar em mera discordância acerca da apreciação da prova desses mesmos factos, respeitável decerto, mas sem consequências de índole processual.»

E esta posição está igualmente associada à ideia – que é preciso não perder de vista – de que o reexame da matéria de facto não de destina a realizar um segundo julgamento pelo Tribunal da Relação, mas tão-somente a corrigir erros de julgamento em que possa ter incorrido a 1.ª Instância.

Neste sentido, que é pacífico, decidiu-se no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 20-09-2017[3]:

«I - O reexame da matéria de facto pelo tribunal de recurso não constitui, salvo os casos de renovação da prova, uma nova ou uma suplementar audiência, de e para produção e apreciação de prova, sendo antes uma actividade de fiscalização e de controlo da decisão proferida sobre a matéria de facto, rigorosamente delimitada pela lei aos pontos de facto que a recorrente entende erradamente julgados e ao reexame das provas que sustentam esse entendimento – art. 412.º, n.º 2, als. a) e b), do CPP.

II - O recurso da matéria de facto não visa a prolação de uma segunda decisão de facto, antes e tão só a sindicação da já proferida

Contextualizado, de forma sumária, o quadro legal e jurisprudencial em que assenta o reexame da matéria de facto pelos Tribunais da Relação, passemos à análise em concreto da impugnação ampla da matéria de facto apresentada pela recorrente.

O primeiro argumento fundamenta-se na ideia de que a medição resultante do aparelho alcoolímetro Drager 7110MK IIIP é de valoração proibida, pois a própria utilização de um tal mecanismo constitui prova proibida, já que «foi aprovado – pela DGV em 06.08.1998 e subsequentemente pelo IPQ Desp. 211.06.07.3.06, de 24.05.2007 e pela ANSR n.º 19684/2009, de 25.06.2009 - e introduzido junto das entidades fiscalizadoras há mais de 20 (vinte) anos, encontrando-se hoje, não apto, por não aprovado, e seguramente, obsoleto».

A recorrente acrescenta ainda que pode ler-se na douta sentença recorrida“- O aparelho de marca “Drager modelo 7110 MKIII P”, foi aprovado por Despacho do IPQ n.º 11037/2007, de 24/04, publicado no DR II, série n.º 109, de 06.06.2007, correspondendo-lhe o n.º 211.06.07.3.06. deste despacho resulta que a validade desta aprovação de modelo é de 10 anos a contar da data de publicação no Diário da República (…).” – O QUE É FALSO!!!, como se verá abaixo e pode ler-se em Diário da República – tais despachos e publicações dizem respeito ao aparelho DRAGER 9510, que veio substituir o caduco e obsoleto DRAGER 7110!!!!!!!!!!».

Mais invoca que o aparelho, por ter sido aferido de acordo com a OIML 98, não se encontra verificado regularmente com a actual e vigente OIML R126 2012.

Esta questão já havia sido suscitada e o Tribunal a quo apreciou-a na sentença recorrida nos seguintes termos:
«(…)Por ofício junto aos autos em 26.06.2023, o Instituto Português da Qualidade, I.P. (doravante, IPQ) apresentou a seguinte resposta:

“A aprovação dos modelos de alcoolímetros quantitativos, ou evidenciais, tem por base a Recomendação Internacional R 126, da Organização Internacional de Metrologia Legal (OIML). Nesta, encontram-se enumerados os requisitos mínimos metrológicos e os ensaios aplicáveis à aprovação de modelos de alcoolímetros evidenciais, bem como orientações para a definição das especificações metrológicas a ser aplicadas em verificações iniciais e subsequentes.

No quadro das suas atribuições legais, compete ao Instituto Português da Qualidade, 1. P. enquanto Instituição Nacional de Metrologia, proceder à aprovação de modelos de alcoolímetros quantitativos, ou evidenciais, e posteriores verificações, assegurando a rastreabilidade metrológica destes equipamentos e a validade dos resultados por eles produzidos, através da realização do controlo metrológico legal. Esta atividade está regulamentada pela Portaria n.º 1556/2007, de 10 de dezembro, onde se encontram estipulados os erros máximos admissíveis - EMA, a serem considerados nas diferentes operações de controlo metrológico a que estes instrumentos estão sujeitos e que foram fixados de acordo com a OIML R126 de 1998.

Embora tenham sido publicadas novas edições da referida recomendação da OIML, nomeadamente em 2012 e 2021, estas não alteraram significativamente os erros máximos definidos para as diferentes operações de controlo metrológico.

Relativamente à operação de controlo metrológico realizada, em 2021-12-16, ao alcoolímetro da marca Drager, modelo Alcotest 7110 MK IIIP, com o n.º de série ARAN-0067, cujo certificado de verificação consta do ofício enviado, os erros máximos considerados no intervalo de medição de O g/L a 4,6 g/L, em teor de álcool no sangue, são iguais aos indicados nas diferentes edições da recomendação R126, de 1998, 2012 e 2021, pelo que o resultado desta operação seria sempre o mesmo, isto é, o equipamento estaria sempre Aprovado para o fim a que se destina.

Mais se informa que a aprovação de novos modelos de alcoolímetros não invalida a utilização dos equipamentos de modelos previamente aprovados, uma vez que de acordo com o n.e 7 do artigo 7.º do Decreto-Lei n.e 29/2022, de 7 de abril, que aprova o regime geral do controlo metrológico legal dos métodos e dos instrumentos de medição, "Os instrumentos de medição em utilização, cuja aprovação de modelo não seja renovada ou tenha sido revogada, podem permanecer em utilização desde que satisfaçam as operações de verificação metrológica aplicáveis".” (Sublinhado nosso.)

Vejamos.

Para conhecimento da nulidade invocada há que ter em conta os seguintes factos (tendo em conta, designadamente, o certificado de verificação junto aos autos, a fls. 4, sob a referência 13372684):

- O teste quantitativo para pesquisa de álcool no sangue foi realizado no analisador quantitativo Drager Alcotest 7110 MKIII P, ARAN 0067, aprovado pelo IPQ através do Despacho n.º 11037/2007, de 24 de Abril, para aprovação de modelo n.º 211.06.07.3.06 (D.R. 2.ª Série, n.º 109, de 6 de Junho), com validade de 10 anos a contar da data de publicação no Diário da República, sendo que foi aprovado para fiscalização no trânsito pelo Despacho n.º 19684/2009, da ANSR, de 25 de Junho de 2009;

- O aparelho em foi verificado pelo IPQ em 16.12.2021 (aprovação do modelo - primeira verificação).

Cumpre analisar e decidir:

O artigo 292.º do Código Penal, que criminaliza a condução de veículo em estado de embriaguez ou sob a influência de estupefacientes ou substâncias psicotrópicas, não nos esclarece como é feita a determinação da taxa de alcoolemia ou de que alguém está sob a influência de estupefacientes, substâncias psicotrópicas ou produtos com efeito análogo, perturbadores da aptidão física, mental ou psicológica.

É no artigo 153.º do Código da Estrada que se determina que a pesquisa de álcool no sangue é realizada por autoridade ou agente de autoridade mediante a utilização de aparelho, aparelho que, por força do artigo 158.º do mesmo Código da Estrada, será fixado por Regulamento.

É assim que chegamos à Lei n.º 18/2007, de 17 de Maio, que aprovou o Regulamento de Fiscalização da Condução sob Influência do Álcool ou de Substâncias Psicotrópicas (RFCIASP, doravante), que logo no artigo 1.º estabelece que:

“1 - A presença de álcool no sangue é indiciada por meio de teste no ar expirado, efectuado em analisador qualitativo.

2 - A quantificação da taxa de álcool no sangue é feita por teste no ar expirado, efectuado em analisador quantitativo, ou por análise de sangue.

3 - A análise de sangue é efectuada quando não for possível realizar o teste em analisador quantitativo.”

O teste a que se refere este n.º 1 do artigo 1.º do RFCIASP não pode ser realizado por qualquer analisador, mas apenas por aqueles que tenham sido aprovados pela Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária (ANSR), precedida de homologação do modelo pelo IPQ, nos termos deste mesmo RFCIASP – cfr. artigo 14.º.

O Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros (RCMA, doravante), que consta da Portaria n.º 1556/2007, de 10 de Dezembro, dispõe no seu artigo 5.º (de harmonia com o que se dispunha no artigo 1.º, n.º 3, do entretanto revogado Decreto-Lei n.º 291/90, de 20 de Setembro) que:

“O controlo metrológico dos alcoolímetros é da competência do Instituto Português da Qualidade, I. P. - IPQ e compreende as seguintes operações:

a) Aprovação de modelo;

b) Primeira verificação;

c) Verificação periódica;

d) Verificação extraordinária”.

O artigo 6.º, n.º 3, deste RCMA, aprovado pela Portaria n.º 1556/2007, afirma que “A aprovação de modelo é válida por 10 anos, salvo disposição em contrário no despacho de aprovação de modelo.”

No seu artigo 7.º, n.º 1, este RCMA, aprovado pela Portaria n.º 1556/2007, estatui, por sua vez, que “A primeira verificação é efectuada antes da colocação do instrumento no mercado, após a sua reparação e sempre que ocorra violação do sistema de selagem, dispensando-se a verificação periódica nesse ano.”

Por seu turno, no seu artigo 10.º, este RCMA, aprovado pela Portaria n.º 1556/2007, determina que “Os alcoolímetros cujo modelo tenha sido objecto de autorização de uso, determinada ao abrigo da legislação anterior, poderão permanecer em utilização enquanto estiverem em bom estado de conservação e nos ensaios incorrerem em erros que não excedam os erros máximos admissíveis da verificação periódica.”

Vejamos agora o Decreto-Lei n.º 29/2022, de 7 de Abril, que aprova o Regime Geral do Controlo Metrológico Legal Dos Métodos e dos Instrumentos de Medição (RGCMLMIM), que entrou em vigor em 01.07.2022 e veio revogar o Decreto-Lei n.º 291/90, de 20 de Setembro.

De harmonia com a ora citada Portaria n.º 1556/2007 (RCMA), este Decreto-Lei n.º 29/2022 (RGCMLMIM) consagra, no seu artigo 5.º, que:

“1 — O controlo metrológico legal dos instrumentos de medição compreende as seguintes operações:

a) Aprovação de modelo;

b) Primeira verificação;

c) Verificação periódica;

d) Verificação extraordinária.

2 — As operações de controlo metrológico legal realizadas nos termos legalmente previstos são válidas em todo o território nacional”, sendo ainda que tais operações se encontram regulados nos artigos 8.º, 9.º e 10.º deste diploma legal (de harmonia com o que se dispunha nos artigos 1.º, n.º 3, 2.º, n.ºs 1 e 2, 3.º, 4.º e 5.º, todos do entretanto revogado Decreto-Lei n.º 291/90, de 20 de Setembro).

Em sintonia com os supra citados artigos 6.º, n.º 3, e 10.º da Portaria n.º 1556/2007, temos que, nos termos do artigo 7.º, n.ºs 1, 2 e 7, deste Decreto-Lei n.º 29/2022 (RGCMLMIM):

“1 - A aprovação de modelo é o ato que atesta a conformidade de um instrumento de medição ou de um dispositivo complementar com as especificações aplicáveis à sua categoria com vista à sua disponibilização no mercado.

2 - A aprovação de modelo é requerida pelo respetivo fabricante ou mandatário e é válida por um período de 10 anos findo o qual carece de renovação.

(…)

7 - Os instrumentos de medição em utilização, cuja aprovação de modelo não seja renovada ou tenha sido revogada, podem permanecer em utilização desde que satisfaçam as operações de verificação metrológica aplicáveis”, sendo este artigo 7.º, n.º 7, à semelhança do artigo 2.º, n.º 7, do entretanto revogado Decreto-Lei n.º 291/90, de 20 de Setembro.

Aqui chegados, importa deixar uma nota.

No passado dia 15.11.2023, foi publicada, no Diário da República n.º 221/2023, Série I, de 15.11.2023, a Portaria n.º 366/2023, de 15 de Novembro, que aprovou o novo RCMA, revogando a citada Portaria n.º 1556/2007, de 10 de Dezembro.

Esta Portaria n.º 366/2023 entrou em vigor no dia seguinte ao da sua publicação e a alteração em causa resultou da necessidade de adaptação do regime específico dos alcoolímetros ao novo RGCMLMIM, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 29/2022, de 7 de Abril (por sua vez regulamentado pela Portaria n.º 211/2022, de 23 de Agosto), a que infra se fará melhor referência.

Ora, como é evidente, a certificação do alcoolímetro que é analisada nos presentes autos não poderia ter em conta regulamentação que ainda não tinha entrado em vigor, designadamente à data dos factos.

Desde qualquer modo, e ainda que assim não fosse, faz-se notar que, à semelhança do que já resultava do mencionado regime geral (RGCMLMIM), o novo regime dos alcoolímetros (RCMA) não introduziu alterações susceptíveis de conflituar com o entendimento que vinha sendo seguindo (e que infra se exporá).

Se não, vejamos.

O novo RCMA, aprovado pela aludida Portaria n.º 366/2023, determina, no seu artigo 6.º, n.º 1, que “A aprovação de modelo deve obedecer aos requisitos previstos no artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 29/2022, de 7 de abril, e ao artigo 2.º do regulamento anexo à Portaria n.º 211/2022, de 23 de agosto”, sendo que o n.º 2 deste artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 29/2022, para o qual se remete, estatui que “A aprovação de modelo é requerida pelo respetivo fabricante ou mandatário e é válida por um período de 10 anos findo o qual carece de renovação”.

O novo RCMA, aprovado pela Portaria n.º 366/2023, mais dispõe, no seu artigo 7.º, n.º 1, que:

“A primeira verificação é efetuada antes da colocação do alcoolímetro em serviço, ou após a sua reparação e sempre que ocorra violação do sistema de selagem, dispensando-se a verificação periódica nesse ano, tendo o mesmo prazo de validade”, à semelhança do que já resultava do citado artigo 7.º, n.º 1, do RCMA aprovado pela Portaria n.º 1556/2007.

Acresce que o artigo 11.º do novo RCMA, aprovado pela Portaria n.º 366/2023, determina o seguinte:
“Os alcoolímetros em uso poderão permanecer em utilização enquanto estiverem em bom estado de conservação e nos ensaios de verificação metrológica incorrerem em erros que não excedam os erros máximos admissíveis”, tal como resultava do citado artigo 10.º do RCMA aprovado pela Portaria n.º 1556/2007.»

Resulta patente da argumentação da recorrente que este coloca em causa a validade do modelo de alcoolímetro que serviu para fazer o teste qualitativo de álcool no sangue através do método do ar expirado como enunciado no talão de fls. 05, de 1,67 g/l, sem desconto da margem de erro admissível, e que corresponde ao teste efetuado no alcoolímetro (quantitativo) de marca Drager Alcotest Modelo 7110MKIII P, ARAN-0067 e que deduzido erro máximo admissível EMA, acusou, pelo menos a taxa de 1,58g/l.

Neste perspetiva, importa, pois, perceber se o alcoolímetro Drager Alcotest 7110 MKIII P - ARAN-0067 estava dentro dos condicionalismos legais para ser usado.

A fls. 4 dos autos encontra-se o Certificado de Verificação do referido aparelho, emitido pelo Instituto Português da Qualidade (IPQ), dele resultando que quanto às características metrológicas que o modelo foi aprovado pelo Despacho 11 037/2007 (aprovação de modelo n.º 211.06.07.3.06), de 24-04, e que quanto à operação de verificação certificada foi realizada a Primeira Verificação, no dia 16-12-2021, com referência à Portaria n.º 1556/2007 de 10 de Dezembro/OIML R 126; 1998/ PT 7015103508-07, tendo o referido aparelho sido aprovado, mais se referindo que a operação associada ao Certificado de Verificação é válida até 31 de dezembro de 2022 com referência ao D/L 291/90 de 20 de setembro, revogado em 01.07.22.

Por consulta do Diário da República n.º 109/2007, Série II, de 06-06-2007, pode confirmar-se a aprovação do modelo n.º 211.06.07.3.06, correspondente ao alcoolímetro, marca DRAGER, modelo Alcotest 7110 MK IIIP, aí se definindo que a validade da aprovação de modelo é de 10 anos a contar da data de publicação no Diário da República, com termo no caso concreto no dia 06-06-2017.

Mais, pelo Despacho n.º 19684/2009, de 27-08, publicado no Diário da República n.º 166/2009, Série II, de 27-08-2009, o Ministério da Administração Interna, através da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, aprovou para utilização na fiscalização do trânsito o referido modelo de alcoolímetro.

Não tem, pois, razão a recorrente quando afirma, em maiúsculas e negrito, que é falso quando na sentença se diz que o Despacho 11 037/2007 (aprovação de modelo n.º 211.06.07.3.06) aprovou o alcoolímetro, marca DRAGER, modelo Alcotest 7110 MK IIIP por 10 anos.

E também não tem razão quando refere que (sic) «não era possível utilizar ou tão pouco usar como meio de prova ao tribunal a quo, o resultado obtido, por ilegal e não autorizado», com base na argumentação por si utilizada.

Esta posição não tem acolhimento na lei, pois basta-se com a análise das normas relativas à aprovação dos aparelhos de medição, em concreto dos alcoolímetros, ignorando o que demais é estabelecido na lei, designadamente sobre a sua utilização.

Nos termos do art. 153.º do Código da Estrada (CE), sob a epígrafe “Fiscalização da condução sob influência de álcool”, o exame de pesquisa de álcool no ar expirado é realizado por autoridade ou agente de autoridade mediante a utilização de aparelho aprovado para o efeito (n.º 1).

A Lei 18/2007, de 17-05, que aprovou o Regulamento de Fiscalização da Condução sob Influência do Álcool ou de Substâncias Psicotrópicas, determina no seu art. 1.º que a detecção de álcool no sangue é indiciada por meio de teste no ar expirado efectuado em analisador qualificativo (n.º 1) e a quantificação da taxa de álcool no sangue é igualmente efectuada por teste no ar expirado em analisador quantitativo (n.º 2) ou por análise de sangue quando não for possível realizar o teste em analisador quantitativo (n.ºs 2 e 3).

Estabelece ainda o art. 14.º do referido diploma legal que nos testes quantitativos de álcool no ar expirado só podem ser utilizados analisadores que obedeçam às características fixadas em regulamentação e cuja utilização seja aprovada por despacho do presidente da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária – ANSR (n.º 1), a qual é precedida de homologação de modelo a efectuar pelo Instituto Português da Qualidade (IPQ), nos termos do Regulamento do Controlo Metrológico de Alcoolímetros (n.º 2).

Este último regulamento, aprovado pela Portaria 1556/2007, de 10-12 (RCMA), determina no seu art. 5.º que o controlo metrológico dos alcoolímetros é da competência do Instituto Português da Qualidade, I. P. – IPQ e compreende as seguintes operações:

a) Aprovação de modelo;

b) Primeira verificação;

c) Verificação periódica;

d) Verificação extraordinária.

Na argumentação que fundamenta o recurso, a recorrente analisou apenas os pressupostos da primeira destas quatro operações (a), a aprovação de modelo, pois verificou que o prazo de validade de dez anos após a aprovação do modelo de alcoolímetro utilizado no 1.º exame quantitativo realizado nos autos havia sido ultrapassado e não renovado (o termo ocorreu em 2017) e concluiu que, por tal razão, aquele elemento de prova era nulo.

De facto, o art. 6.º, n.º 3, do RCMA fixa o prazo de validade de dez anos para a aprovação de modelo, salvo disposição em contrário no despacho de aprovação, o que não ocorreu, como se viu.

Esta disposição é idêntica a norma que constava do Regime Geral de Controlo Metrológico, aprovado pelo DL 291/90, de 20-09 (RGCM), entretanto revogado pelo D/L n º 29/2022 de 07 de abril, em vigor desde 1 de julho de 2022 e portanto aplicável ao caso dos autos, cuja regulamentação não foi afastada pelo regime especial de controlo metrológico de alcoolímetros em vigor desde 2007.

Pelo contrário, como resulta do disposto nos arts. 3.º, n.º 1, e 25.º do diploma ora em vigor, D/L n º 29/22, bem como do preâmbulo da Portaria n.º 1556/2007, de 10-12, esta última constitui-se como diploma regulamentar daquele regime geral destinado às especificações técnicas dos alcoolímetros, diploma este em vigor à data da prática destes factos, e entretanto revogado pela Portaria nº 366/23 de 15 de novembro em vigor desde 16 de novembro de 2023.

O DL 291/90, de 20-09, que foi, entretanto, revogado pelo DL 29/2022, de 07-04, publicado no Diário da República n.º 69/2022, Série I, de 07-04-2022, que aprovou o Regime Geral do Controlo Metrológico Legal dos Métodos e dos Instrumentos de Medição (RGCMLMIM), que já se encontrava em vigor à data da prática dos factos, mas, quanto ao que cabe nestes autos apreciar, nenhuma alteração de sentido introduzindo, mantendo-se e até se aperfeiçoando a harmonização e conjugação entre o regime geral do controlo metrológico e o regime específico dos alcoolímetros.

Regulamenta ainda este DL 29/2022 a Portaria n.º 211/2022, de 23-08, publicada no Diário da República n.º 162/2022, Série I, de 23-08-2022, que aprova o Regulamento Geral do Controlo Metrológico Legal dos Métodos e dos Instrumentos de Medição e ainda a Portaria nº 366/2023 de 15 de novembro que aprovou o Regulamento do Controlo Metrológico Legal dos Alcoolímetros, publicada no DR n º 221/23, Série I de 15.11.2023, a qual revogou a Portaria n º 1556/2007 de 10 de dezembro. Donde resulta que à data da prática dos factos destes autos ainda estava em vigor a Portaria n º 1556/07.

Ora, também de acordo com o art. 5.º do RGCMLMIM, à semelhança do art. 5.º do RCMLA, Portaria nº 1556/07, o controlo metrológico legal dos instrumentos de medição compreende as seguintes operações:

a) Aprovação de modelo;

b) Primeira verificação;

c) Verificação periódica;

d) Verificação extraordinária.

A aprovação do modelo é o acto que atesta a conformidade de um instrumento de medição ou de um dispositivo complementar com as especificações aplicáveis à sua categoria com vista à sua disponibilização no mercado (art. 7.º, n.º 1, do RGCMLMIM).

Ou seja, considerando a matéria que aqui nos ocupa, é o acto que atesta que determinado tipo de aparelho está apto à quantificação da taxa de álcool no sangue através de teste no ar expirado, garantindo a credibilidade e validade das leituras.

A aprovação de modelo não se destina à validação do funcionamento que em concreto cada aparelho realiza, mas apenas ao reconhecimento da aptidão que aquela espécie de modelo de aparelho tem para a finalidade para a qual é autorizado, no caso, funcionar como analisador quantitativo de álcool no sangue através do ar expirado na fiscalização do trânsito.

A validade da aprovação do modelo é de dez anos, findo o qual carece de renovação (art. 7.º, n.º 2, do RGCMLMIM).

Diferentemente, a verificação da boa funcionalidade dos equipamentos em concreto que correspondem àquele modelo, isto é, a verificação da manutenção da qualidade dos equipamentos após aprovação de modelo, tendo em conta a finalidade a que se destinam, atesta-se nas operações seguintes de primeira verificação (art. 8.º do RGCMLMIM), de verificação periódica (art. 9.º do RGCMLMIM) e, eventualmente, de verificação extraordinária (art. 10.º do RGCMLMIM).

O conteúdo dos referidos preceitos reproduz, aliás, o que dispunha o revogado DL 291/90, de 20-09, nos seus arts. 1.º, n.º 3, 2.º, n.ºs 1 e 2, 3.º, 4.º e 5.º.

Assim, um modelo pode ter sido aprovado no âmbito da primeira fase, aprovação que tem uma validade com a duração de dez anos, mas acontecer que num equipamento correspondente a tal modelo, antes de expirado esse prazo, por exemplo, ao fim de cinco anos, venha a ser detectada uma falha que demonstre que o mesmo – não o modelo aprovado – não mantém a qualidade metrológica dentro das tolerâncias admissíveis relativamente ao modelo respectivo. Neste caso, o equipamento estava dentro do prazo de validade da aprovação de modelo mas não obteria certificação válida na verificação periódica, sendo impróprio para fiscalizar a taxa de álcool no sangue por não cumprir os requisitos legais.

Mas o inverso também pode ocorrer. Assim, pode um equipamento ter ultrapassado o prazo de validade de aprovação de modelo, não tendo este sido renovado, mas continuar apto para a função que se destina a cumprir.

Esta situação vem expressamente prevista no art. 7.º, n.º 7, do RGCMLMIM (à semelhança do revogado art. 2.º, n.º 7, do DL 291/90 de 20-09), segundo o qual os instrumentos de medição em utilização, cuja aprovação de modelo não seja renovada ou tenha sido revogada, podem permanecer em utilização desde que satisfaçam as operações de verificação metrológicas aplicáveis».

Mas o próprio RCMA (Portaria n.º 1556/2007, de 10-12), no seu art. 10.º, também prevê uma norma semelhante, aí se consignando que os alcoolímetros cujo modelo tenha sido objecto de autorização de uso, determinada ao abrigo da legislação anterior, poderão permanecer em utilização enquanto estiverem em bom estado de conservação e nos ensaios incorrerem em erros que não excedam os erros máximos admissíveis da verificação periódica.

Significa isto que a legislação que regula o funcionamento dos instrumentos medidores em geral e dos alcoolímetros em concreto permite, ao contrário da posição expressa no recurso, que um aparelho medidor, ainda que ultrapassado e não renovado o prazo de dez anos de validade de aprovação do respectivo modelo ou de uso do modelo, se mantenha validamente em funcionamento, desde que conserve um desempenho positivo nas verificações periódicas ou extraordinárias que venham a ser realizadas.

 O recurso, não colhe por esta via.

Importa perceber, então, se no caso dos autos está demonstrada a verificação do desempenho positivo periódico do aparelho.

 Desde logo importa referir que no caso destes autos o aparelho em causa sofreu primeira verificação em 16.12.21, estando nessa altura em vigor o D/L nº 291/90 de 20 de setembro, o qual lhe certificava a validade até 31 de dezembro de 2022, tal como dispõe o seu art. 4º, n º 2.

O essencial do regime geral de controlo metrológico (RGCMLMIM), D/L n º 29/22  de 07 de abril, em vigor à da prática dos factos, no que às quatro referidas operações que o compõem (arts. 7.º a 10.º) respeita, mostra-se vertido no Regulamento do Controlo Metrológico de Alcoolímetros (RCMA), aprovado pela Portaria 1556/2007 de 10-12, conforme resulta do disposto nos seus arts. 5.º a 7.º.

A primeira verificação, a que importa no caso concreto, pois é a que está certificada no documento de fls. 4, compreende o conjunto de operações destinadas a constatar a conformidade da qualidade metrológica dos instrumentos de medição, novos ou reparados, com a dos respetivos modelos aprovados e com as disposições regulamentares aplicáveis, devendo ser requerida, para os instrumentos novos, pelo fabricante ou mandatário, e pelo utilizador, para os instrumentos reparados (art. 8.º, n.º 1, do RGCMLMIM) e, de acordo com o art. 7.º, n.º 1, do RCMA, é efectuada antes da colocação do instrumento no mercado, após a sua reparação e sempre que ocorra violação do sistema de selagem, dispensando-se a verificação periódica nesse ano.

Este segmento final é muito relevante, pois de acordo com o art. 8.º, n.º 3 do regime geral de controlo metrológico (RGCMLMIM), a primeira verificação é válida pelo prazo constante na regulamentação específica aplicável[4], isto é, o que se dispõe no citado art. 7.º, n.º 1, do RCMA.

Resulta do documento de fls. 4 (certificado de verificação do IPQ) que ali está certificada não a verificação periódica mas a certificação da primeira verificação do alcoolímetro Drager Alcotest 7110MKIII - ARAN-0067 que se encontra datada de 16-12-2021 e portanto ainda sujeita ao regime estabelecido no D/L 291/90 de 20 de setembro.

 Não obstante os factos serem datados de 13 de agosto de 2022, a verdade é que a validade do aparelho e sua verificação, ocorrida em 16.12.21, estava acolhida pelo D/L 291/90 de 20 de setembro, o qual só foi revogado em 01.07.22.

Conjugando o disposto nos arts. 8.º, n.º 3 do DL 29/2022 de 07-04, (RGCMLMIM) em vigor à da prática dos factos, com a legislação suprarreferida e tendo presente que àquela verificação se aplicou o art. 4º do D/L 291/90 de 20 de setembro em vigor à data da verificação, pode concluir-se o instrumento em causa estava dispensado de verificação periódica até 31 de dezembro de 2022.

Haverá que ter em conta o art. 28º do D/L n º 29/22 de 07 de abril em vigor à data da prática dos factos, que estipula uma norma transitória importante ao referir, não obstante ter revogado o D/L 291/90 de 20 de setembro:

1 — É permitida a comercialização e colocação em serviço dos instrumentos de medição das categorias abrangidas pelo presente decreto -lei, cuja aprovação de modelo tenha sido concedida ao abrigo do Decreto -Lei n.º 291/90, de 20 de setembro, até ao fim do respetivo prazo de validade.

2 — No caso de a aprovação de modelo ter validade indefinida, a permissão prevista no número anterior é válida por um período máximo de um ano a partir da data da entrada em vigor do presente decreto -lei.

O que significa que a validade do aparelho em questão sancionada pelo D/L revogado se manteria até 31 de dezembro de 2022.

A conclusão a que aqui se chega não contradiz aquela que foi invocada no Proc. 216/23.1GBAND.P1de 19.12.23. É que nesse processo, os factos eram datados de 03.06.23 e a primeira verificação ocorreu em 25-07-2022, pelo que já não estava em vigor o art. 4º do D/L 291/90 de 20 de setembro, revogado em 01.07.22, mas sim o D/L n º 29/22 de 07 de Abril que no seu art. 8º, n º 3 remetia a validade da primeira verificação para regulamentação específica aplicável, a qual estava estabelecida na Portaria nº 1556/2007 de 10 de dezembro, entretanto só revogada em 16.11.23 pela Portaria n º 366/2023 de 15 de novembro. Ou seja, a primeira verificação nesse processo já não estava abrangida pelo D/L 291/90 de 20 de setembro que estipulava expressamente que a validade da primeira verificação se estendia até 31 de dezembro do ano seguinte ao da sua primeira verificação, ao contrário do caso destes autos em que tal lhe é aplicável.

Pelo que se impõe concluir que o aparelho aqui em análise estava aprovado para utilização e plenamente válido até 31-12-2022.

Uma última nota para referir que, sendo correcto que o art. 4.º do RCMA e 3º da atual Portaria em vigor n º 366/2023 de 15 de novembro determina que os alcoolímetros deverão cumprir os requisitos metrológicos e técnicos, definidos pela Recomendação OIML R 126, e que o certificado de verificação menciona o OIML R 126; 1998 e não o documento actual de 2012, não está previsto em qualquer diploma legal que eventual desconformidade, que está longe de estar demonstrada, que possa resultar do não acompanhamento da OIML R 126 2012 se reflecte em algum tipo de invalidade, pois está em causa uma recomendação.

Como bem se assinalou no acórdão do Tribunal de Coimbra de 27-06-2018[5], «da assinatura da Convenção OIML não deriva a vinculação do Estado Português ou à sua aplicação imediata na ordem jurídica portuguesa. Desde logo pelo que consta do prefácio da recomendação — Os Estados Membros da OIML devem implementar estas Recomendações o mais possível — mas também porque tal decorre da vinculação apenas moral constante do art.º VIII da Convenção OIML invocada — As decisões são imediatamente comunicadas aos Estados membros para informação, estudo e recomendação. Os Estados membros tomam o compromisso moral de aplicar estas decisões, em toda a medida possível. Ou seja, nada obriga a uma transposição/aplicação imediata da revisão da recomendação, nem a mesma vigora sem mais na nossa ordem jurídica, sendo, pois, válida a verificação efectuada, já que está de acordo com os dispositivos legais aplicáveis.»

Na verdade, o artigo VIII da Convenção que instituiu a Organização Internacional de Metrologia Legal, assinada em Paris em 12 de Outubro de 1955, aprovada para adesão por Decreto do Governo n.º 34/84 de 11 de Julho, determina, para além de outros requisitos aí estabelecidos, que as decisões são imediatamente comunicadas aos Estados membros para informação, estudo e recomendação e que os Estados membros tomam o compromisso moral de aplicar estas decisões, em toda a medida possível.

Impõe-se, assim, concluir que é válido o resultado obtido através do aparelho em questão, bem como o valor probatório respectivo.

De todo o modo, deve ressalvar-se o entendimento de que a certificação que analisamos nestes autos jamais podia ter em consideração regulamentação que ainda não estava em vigor, nenhuma modificação tendo sido introduzida que torne aquela inválida.

Improcede, pois, o invocado recurso, embora com argumentação diferente, por prova proibida, art. 125º do CPP, inexistindo qualquer nulidade quanto ao exame quantitativo de álcool a que foi sujeita a recorrente.

Impugnação da matéria de facto relativamente aos pontos provados em 2,3,4 e 5.

Pelas razões suprarreferidas não podem ser questionados os factos provados 2 a 5.

Resta saber se as declarações prestadas e depoimentos ouvidos a que a recorrente faz menção são suscetíveis de impor versão distinta da encontrada pelo tribunal.

E este respeito importa frisar que a recorrente teria que ter indicado, cumprindo o disposto no art, 412º, n º 3 do CPP, as concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida, não bastando a menção generalizada daquilo que disseram testemunhas e arguida.

O julgamento da matéria de facto, em primeira instância, é efetuado segundo o princípio da imediação – possibilitando o contacto direto e pessoal entre o julgador e a prova, tangível ao (e próprio do) juiz a quo – sendo “(…) as provas apreciadas por quem assistiu à sua produção, sob a impressão viva colhida nesse momento e formada através de certos elementos ou coeficientes imponderáveis, mas altamente valiosos, que não podem conservar-se num relato escrito das mesmas provas” [Germano Marques da Silva, Direito Processual Penal Português – Do Procedimento, Univ. Católica Ed., pág. 212]. Além disso, o julgamento da matéria de facto far-se-á segundo o princípio da livre apreciação da prova, consagrado no art.º 127.º do C.P.P., interpretado, não num sentido que desonere o julgador de justificar o seu raciocínio e percurso interior para chegar à afirmação do facto ou à sua desconsideração – caso em que falaríamos de arbítrio - mas, apenas, no sentido de que o valor a atribuir a determinado meio de prova não é tarifado ou vinculado (salvo as exceções consignadas na lei), orientando-se o julgador de acordo com os ditames da lógica e da experiência, podendo, por exemplo, atribuir relevância a um depoimento em detrimento de vários e mais numerosos de sinal contrário, desde que o justifique, já que, na esteira do afirmado por Bacon, os depoimentos não se contam, pesam-se.

     A convicção do Tribunal é, reforça-se, formada livremente, de acordo com as regras da experiência, enquanto postulados decorrentes da observação social e dos conhecimentos da técnica e da ciência. A afirmação positiva dos factos deverá fazer-se, não por razões ou argumentos puramente subjetivos e insindicáveis, mas sim concluindo-se através de uma “(…) valoração racional e crítica, de acordo com as regras comuns da lógica, da razão, das máximas da experiência e dos conhecimentos científicos, permitindo “objetivar a apreciação” [Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, vol. II, Verbo 1993, pág. 111 a propósito da definição do conceito de livre apreciação da prova.].

   Pelo que, se a decisão do Tribunal recorrido se ancorar numa fundamentação compreensível, com as naturais opções próprias efetuadas com permissão da razão e das regras da experiência comum e a coberto da caraterizada livre apreciação, cumprir-se-á o necessário dever de fundamentação.

     

   Naturalmente, qualquer dos sujeitos processuais destinatários da decisão poderá discordar do juízo valorativo assim firmado. Ou porque entende que outro meio de prova se sobreporia, ou porque outro, que foi valorado, seria, para si, insuficiente ou de credibilidade questionável mas, lembre-se, o poder de valorar a prova e de se determinar de acordo com essa avaliação pertence ao ente imparcial e constitucionalmente designado para a função de julgar: - o Tribunal.

   A decisão da matéria de facto – com a qual a recorrente expressa forte dissídio – só pode ser sindicada, em sede de recurso, por duas vias distintas:

         - Por verificação dos vícios previstos no art.º 410.º, n.º 2, do C.P.P., a denominada revista alargada que, a proceder, deflui na realização de um novo julgamento, total ou parcial, apenas excecionalmente o podendo fazer o próprio tribunal superior (art.ºs 426.º, n.º 1, 430.º, n.º 1, e 431.º, als. a) e c), do C.P.P.);

         - Através da impugnação ampla, prevista no art.º 412.º, n.ºs 3, 4 e 6 do C.P.P., com eventual correção do decidido pelo tribunal superior (cfr. art.º 431.º, al. b), do C.P.P.).

         No primeiro caso, o substrato para a verificação do(s) vício(s) deverá colher-se no texto da própria decisão recorrida, por si só ou conjugado com as regras da experiência comum, sem recurso a elementos externos (designadamente probatórios) concretizando-se na (i) insuficiência dos factos provados para suportar a correlativa decisão de direito (o que não pode confundir-se com uma putativa insuficiência das provas para alicerçar a decisão de facto), na (ii) contradição insanável da fundamentação ou entre esta e a decisão (entre os factos provados e não provados, entre si ou uns com os outros, ou entre aqueles e a motivação, ou ainda nesta mesma) e (iii) o erro notório na apreciação da prova (ante o padrão do homem médio e evidente a partir do escrutínio do texto da decisão) (cfr. art.º 410.º, n.º 2, als. a), b) e c) do C.P.P.), vício que, neste contexto, não se verifica quando a fonte da discordância resultar, tão só, da não conformação com a versão acolhida pelo Tribunal que, aos olhos da recorrente, deveria ter sido distinta.

         No segundo caso e evidenciado no caso sub judice – impugnação ampla – a sindicância pode envolver o próprio processo e resultado da formação da convicção dos julgadores sobre a prova produzida, designadamente a suficiência ou insuficiência desta para a materialidade considerada, a capacidade e a segurança do convencimento que emerge dos meios de prova a valorar, seja à luz dos critérios legais da avaliação (art.º 127.º do C.P.P.), seja sob o espectro das disposições sobre prova vinculada.

Porém, ainda assim e nesta última hipótese, não se tratará, aqui, de um novo julgamento, sobreposto ao realizado em primeira instância e que usufruiu do aporte irrepetível oferecido pela oralidade e imediação. A impugnação, ainda que alargada, constitui, tão só, o remédio jurídico apropriado para a deteção de eventuais erros in judicando ou in procedendo, considerando o exame crítico da prova efetuado na primeira instância que está, naturalmente, vinculado a critérios objetivos, jurídicos e racionais e sustentado nas regras da lógica, da ciência e da experiência comum, sendo por isso mister que se demonstre a impossibilidade lógica e probatória da valoração seguida e a imperatividade de uma diferente convicção.

O juízo de apreciação e conformidade far-se-á de acordo com os limites fornecidos pela recorrente e decorrentes do cumprimento do ónus de especificação imposto pelos n.ºs 3 e 4 do art.º 412.º do C.P.P. Ou seja, sempre que qualquer recorrente vise impugnar a decisão proferida sobre a matéria de facto deve especificar (i) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; (ii) As concretas provas [ou falta delas] que impõem decisão diversa da recorrida; (iii) As provas que devem ser renovadas, ao que acresce que “Quando as provas tenham sido gravadas, as especificações previstas (…) fazem-se por referência ao consignado na ata (…) devendo o recorrente indicar concretamente as passagens em que se funda a impugnação. Em epítome e em tese geral, não bastará ao recorrente configurar hipóteses decisórias alternativas, da sua conveniência ou modo de ver, mais ou menos compagináveis com a prova produzida, sendo ainda necessário que a eventual insuficiência da prova para a decisão da matéria de facto que foi tomada, ou, na proposta de apreciação alternativa, a prova que foi produzida, imponham, como conclusão lógica, uma decisão distinta e, em concreto, aquela que na argumentação de recurso se defende.

Neste último aspeto referido importa reforçar que não basta a afirmação do dissídio, a apreciação crítica do decidido ou a asseveração de considerandos ou propostas de decisão alternativa. Se assim fosse, a sindicância, a este nível, traduzir-se-ia na realização de um novo julgamento, já que ver-se-ia a segunda instância na contingência de revisitar toda a prova produzida para, ante aquelas manifestações gerais de subjetividade, sobrepor ou não a sua. Por isso, antes se impõe ao recorrente um dever de fundamentação que torne evidente que as provas indicadas impõem decisão diferente, com o mesmo grau de argumentação e convencimento que é exigível ao julgador para fundamentar os factos provados e não provados, só assim se percebendo qual o raciocínio seguido para se poder afirmar que o mesmo impõe decisão diversa da recorrida [cfr., neste sentido, Paulo Pinto de Albuquerque in Comentário do Código de Processo Penal, Universidade Católica, 2ª Edição, fls. 1131, notas 7 a 9, em anotação ao artigo 412º, do Código de Processo Penal]. A propósito veja-se ac. desta Relação do Porto proc.º 277/19.8GBETR. P1.

Importa referir desde logo que não vislumbramos que tenha ocorrido algum vício no texto da sentença e nomeadamente, o disposto no art.º 410.º, n.º 2, al. c) “erro notório na apreciação da prova”, embora sem anterior desenvolvimento de sustento. Contudo, como começamos por referir, tal vício, ainda que seja de conhecimento oficioso, pressupõe que o mesmo se torne evidente a partir do texto da decisão recorrida, sem recurso a elementos externos (o que, no caso, não sucede, já que o pretenso erro não é evidente, de per se, mas resultaria da forma como o Tribunal, na ótica da recorrente, deveria ter interpretado a prova disponível, chamando à colação segmentos dos depoimentos prestados).

Ora, vista a fundamentação, do seu teor não se alcança, na evidência pressuposta, qualquer insuficiência, contradição ou erro.

Refere a Recorrente que «apesar de a arguida ter ingerido bebidas alcoólicas precedentes à condução, não ingeriu, seguramente, em quantidade suficiente a provocar a TAS alegadamente apurada, pelo que também não se encontra preenchido o elemento subjetivo do ilícito em causa, porquanto a nenhum homem médio comum diligente em situação idêntica teria suspeitado que não deveria adotar a referida conduta», aduzindo para tanto que «note-se serem os elementos da GNR que confirmaram e atestaram o bom estado da recorrente, sem que exalasse qualquer odor a álcool, ou se permitisse sequer suspeitar, visualmente e/ou no seu diálogo qualquer indício de que a mesma se encontrava impedida do exercício da condução o que foi surpresa para todos».

Resulta efetivamente da prova produzida que quando abordada pelos militares da GNR a Recorrente não cambaleava, nem apresentou comportamento que fizesse prever que a mesma fosse portadora de álcool no sangue.

Veja-se a propósito as declarações do militar BB, conforme gravação no sistema digital citius minutos 01:29 «estava numa situação de fiscalização, foi dada instrução à senhora para parar, a senhora parou, fez o teste, acusou», referindo ter feito teste quantitativo no Drager, no posto, não se recordando da taxa em concreto, sabendo que era crime. Questionado sobre a reação da arguida à taxa apresentada declarou «ela no local disse que tinha consumido pouco álcool», (2:20) «mostrou-se relativamente normal, era uma senhora simpática, acessível, esteve, seguiu sempre as nossas indicações, tudo normal».

Também a instâncias do Il. Mandatário referiu que a arguida foi disponível e colaborante, e questionado a minutos 7:25 se a arguida estava bem-disposta e cambaleava a testemunha referiu «nada, nada».

O militar CC, questionado se quando saiu o talão do alcoolímetro qual foi a reação da arguida disse «já não me recordo» e a partir de minuto 04:25 a instâncias do Il. Mandatário (05:57) questionado se a ordem de paragem foi acatada respondeu que «sim», confirmando que a arguida estaria aparentemente bem (06:07).

A testemunha DD confirmou ter estado com a arguida e a minutos 03:04 disse que a arguida estava «normal», questionada se cambaleava respondeu que não assim como respondeu com não quando perguntada se cambaleava ou se cheirava a álcool. Confirmou que a arguida bebeu uma mini «sim, bebeu uma mini connosco». EE inquirida sobre se tinha estado com a arguida respondeu que sim, numa festa, dizendo, quando questionada, que não cheirava a álcool.

De acordo com as declarações da arguida, conforme gravação no sistema citius, aos minutos 09:55 refere «sentia-me perfeitamente capaz» e aos minutos 23:32 diz que não teria conduzido «se não estivesse nas minhas capacidades para conduzir».

Se é verdade que a arguida mesmo quando no momento da fiscalização não demonstrava indícios de embriaguez não significa que a mesma não apresentasse a taxa de álcool no sangue apresentada e que não soubesse que a quantidade de bebidas alcoólicas ingeridas fosse suficiente para acusar uma taxa de álcool no sangue. Aliás, a própria arguida confirma ter conduzido e previamente ingerido bebidas alcoólicas, pelo que, mesmo que não tivesse conhecimento com precisão da taxa de álcool no sangue, sabia ser portadora de uma taxa de álcool no sangue. Na realidade quem ingere bebidas alcoólicas sabe que tem uma taxa de álcool no sangue.

Deste modo, a arguida ao confessar que tinha ingerido bebidas alcoólicas (duas cervejas, uma taça de champanhe e, após, numa festa, outro fino) antes de iniciar a condução do veículo, pretendendo percorrer cerca de quatro quilómetros, reconhece que sabia ser portadora de álcool no sangue, mesmo que não tivesse consciência da concreta taxa, pelo que nesta parte, deverá igualmente improceder o recurso.

No caso, não consideramos que a valoração sufragada pelo Tribunal seja desconforme ou à margem das preditas regras.

 Aliás, os acidentes estradais provocados por pessoas que ingerem álcool têm quase sempre por pressuposto a convicção do condutor de que se encontra bem e perfeitamente capaz de conduzir e embora o álcool possa não estar a ter reflexos de ordem física, eles existem no âmbito dos tempos de reação e de atenção para quem circula na estrada e que se agravam na proporção do aumento do nível de taxa de álcool no sangue, criando sério perigo para o próprio e terceiros com quem se cruze.

E com isto também se remata por improcedente a invocada exclusão da culpa por erro sobre a ilicitude do art. 17º do CPP.

Não é de crer que sendo a arguida, ainda para mais licenciada, não soubesse que consumindo álcool tal teria efeitos na sua capacidade de conduzir e que ignorasse que tal conduta, dependendo dos valores apurados, é perseguida quer a nível contraordenacional quer a nível criminal.

     

Da violação do princípio in dubio pro reo

           

O princípio in dubio pro reo é um princípio estruturante do processo penal, decorrência da presunção de inocência, consagrada constitucionalmente e que, na aplicação prática, constitui limite exógeno à liberdade de apreciação da prova.

         Com efeito, o princípio da presunção de inocência destina-se a proteger as pessoas que são objeto de uma acusação, garantindo que não serão condenadas enquanto não se demonstrarem os factos da imputação, através de uma atividade probatória inequívoca. Significa tal princípio constitucional que toda a decisão condenatória deve ser sempre precedida de uma mínima e suficiente atividade probatória, impedindo a condenação sem provas seguras.

         Sendo esse princípio uma norma diretamente vinculante e constituindo um direito fundamental dos cidadãos (cfr. art.ºs 32.º, n.º 2 e 18º, n.º 1 da C.R.P.), reconhecido no direito internacional (cfr. art.º 11º da Declaração Universal dos Direitos Humanos e art.º 6º, n.º 2 da Convenção Europeia dos Direitos Humanos), impõe-se, quando não for demonstrada e provada a culpabilidade do arguido, a sua absolvição.

         Embora frequente, a dúvida não pode obstar ao ato de julgar. Sendo proibido o non liquet fundado na insuficiência de provas, em caso de dúvida insanável o facto deve resolver-se em desfavor da acusação, porquanto o arguido se presume inocente. Se o Tribunal não lograr obter a certeza dos factos, permanecendo em dúvida razoável, deve absolver o arguido por falta de provas.

         Como bem sustentou Cavaleiro Ferreira, “Em processo penal, a justiça perante a impossibilidade de uma certeza, encontra-se na alternativa de aceitar, com base em uma probabilidade ou possibilidade, o risco de absolver um culpado e o risco de condenar um inocente. A solução jurídica e moral só pode ser uma: deve aceitar-se o risco de absolvição de um culpado e nunca o de condenação de um inocente” [Cfr. Curso de Processo Penal, Vol. I, Lisboa, 1986, pág. 216.].

         Concluindo e utilizando uma fórmula consagrada, da autoria do Professor Figueiredo Dias, pode dizer-se que “(...) um non liquet na questão da prova – não permitindo nunca ao juiz que omita a decisão (...) tem de ser sempre valorado a favor do arguido” [Cfr. Direito Processual Penal, Vol. I, Coimbra, 1974] – pois a dúvida sobre os factos resolve-se em função do princípio da presunção de inocência.
         Note-se, em todo o caso, que a dúvida que legitima a invocação do princípio in dubio pro reo deve ser, além do mais, insanável, pressupondo que houve, a montante, todo o empenho e diligência no esclarecimento dos factos, sem que tenha sido possível, a final, ultrapassar o estado de incerteza que funda a ativação do princípio.

         Revertendo ao caso em apreço.

         Efetivamente e lida a fundamentação exarada pelo Tribunal a quo, não foi a entidade decisora assaltada, no percurso, por qualquer dúvida e, muito menos, que esta fosse razoável ou insanável. O Tribunal obteve a certeza dos factos que afirmou, em raciocínio motivado, pelo que não subsistindo quaisquer dúvidas, inexistia, outrossim, qualquer razão, porque desprovida de objeto, para resolvê-las a favor da arguida. O que na prática se verifica é que a recorrente, em face da valoração que subjetivamente fez da prova, entende que, ante o seu próprio convencimento, o Tribunal deveria ter tido dúvidas. Mas não teve, nem se notaram supra razões para que se questionasse a valoração que efetuou.

         O princípio in dubio pro reo, decorrente da presunção de inocência, “parte da dúvida, supõe a dúvida e destina-se a permitir uma decisão judicial que veja ameaçada a concretização por carência de uma firme certeza do julgador.” [Cfr. Cristina Líbano Monteiro, In Dúbio Pro Reo, Coimbra, 1997], dúvida positiva que, in casu, não existe nem se aponta que, em face da argumentação utilizada, devesse ter existido.


*

Erro de julgamento em sede de direito quanto à qualificação jurídica dos factos.

     

Mantendo-se inalterados os factos dados por provados, não se vislumbra qualquer erro na respetiva qualificação jurídica efetuada pelo Tribunal a quo, mostrando-se preenchidos os elementos objetivo e subjetivo do crime de condução de veículo em estado de embriaguez do art. 292º do C.P. 

Escolha e determinação da medida concreta da pena principal e acessória.

Atenuação especial da pena.

Taxa diária da multa.

A arguida fundamenta, ainda, o seu recurso, além do mais, na violação pelo tribunal a quo do preceituado no art. 71.º do Código Penal, no que concerne à determinação da medida da pena de multa e, bem assim, da pena acessória.

Quanto à pena de multa e sua medida:

Alega, para o efeito, que a pena de multa aplicada é excessiva atendendo a que a arguida não tem antecedentes criminais, não há danos reportados, não se verifica necessidade de prevenção geral, é inexistente a necessidade de prevenção especial uma vez que do momento dos factos em diante não há qualquer risco de repetição.

Cumpre desde já referir, a fim de delimitar os poderes e modo de intervenção deste Tribunal, que a sindicância do decidido não se efetivará como se inexistisse decisão recorrida ou como se este Tribunal da Relação se predispusesse a aplicar a pena contestada pela primeira vez. Ademais, note-se que “(…) o tribunal de recurso deve intervir na alteração da pena concreta, apenas quando se justifique uma alteração minimamente substancial, isto é, quando se torne evidente que foi aplicada sem fundamento, com desvios aos citérios legalmente apontados” [cfr. acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 18.03.2015, proc. 109/14.3GATBU.C1, Rel. Inácio Monteiro, consultado em www.dgsi.pt, sublinhado nosso].
         Como se pode ler no acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 05.03.2018 [proc. n.º 827/17.4GAEPS.G1, Rel. Armando Azevedo, consultado em www.blook.pt], em alinhamento com a doutrina e jurisprudência aí citada, “(…) quanto aos limites de controlabilidade da determinação da pena em sede de recurso - entendemos ser de seguir o entendimento da doutrina e da jurisprudência no sentido de que é suscetível de revista a correção das operações de determinação ou do procedimento, a indicação de fatores que devam considerar-se irrelevantes ou inadmissíveis, a falta de indicação de fatores relevantes, o desconhecimento pelo tribunal ou a errada aplicação dos princípios gerais de determinação, mas a determinação do quantum exato de pena só pode ser objeto de alteração perante a violação das regras da experiência ou a desproporção da quantificação efetuada”.
         Efetivamente e tendo existido, a montante, um julgamento – com contraditório pleno, oralidade e imediação – e uma atividade jurisdicional de fixação concreta da pena no culminar daquela audiência, na dependência do Tribunal ad quem não estará a realização de nova e originária determinação da pena mas, tão só, no que o caso convoca, a sindicância do quantum da pena, seguindo e tendo por referencial os critérios de determinação utilizados pelo Tribunal a quo e respetiva motivação, escrutinando a eventual existência de falhas ou omissões, exercendo a sua função corretiva se o resultado da operação se revelar ilegal ou manifestamente desproporcionado.
         Do exposto resulta que a intervenção em segunda instância deverá ser sempre pautada pelo princípio da mínima intervenção, intercedendo se e quando o processo determinativo se revele insuficiente ou desajustado à luz dos critérios legais de determinação da pena, tendo por matriz os factos assentes.
         Na verdade, a individualização judiciária da pena não é imune a um grau controlado de discricionariedade, inexistindo uma pena concreta inquestionável ou uma sentença certa e ideal, mas, antes, uma gama de decisões que, numa faixa de razoabilidade e proporcionalidade, poderão ser adequadas, conquanto os tribunais, aplicando os mesmos critérios de determinação das penas concluam, em casos semelhantes, por penas aproximadas.
         Regressando ao caso em apreço, como é consabido e resulta expressamente do estatuído no art.º 40.º, n.º 1, do C.P., a aplicação de penas e de medidas de segurança visa a proteção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade. Em síntese e pela sua clareza, retenha-se o constante do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 23.09.2010 [proc. n.º 1687/04.0GDLLE.E1.S1, Rel. Pires da Graça, www.dgsi.pt]: - “1) Toda a pena serve finalidades exclusivas de prevenção, geral e especial. 2) A pena concreta é limitada, no seu máximo inultrapassável, pela medida da culpa. 3) dentro deste limite máximo ela é determinada no interior de uma moldura de prevenção geral de integração, cujo limite superior é oferecido pelo ponto ótimo de tutela dos bens jurídicos e cujo limite inferior é constituído pelas exigências mínimas de defesa do ordenamento jurídico. 4) Dentro desta moldura de prevenção geral de integração a medida da pena é encontrada em função de exigências de prevenção especial, em regra positiva ou de socialização, excecionalmente negativa ou de intimidação ou segurança individuais. A moldura de prevenção, comporta ainda abaixo do ponto ótimo ideal outros em que a pressuposta tutela dos bens jurídicos “é ainda efetiva e consistente e onde portanto a pena pode ainda situar-se sem que perca a sua função primordial de tutela de bens jurídicos. Até se alcançar um limiar mínimo – chamado de defesa do ordenamento jurídico – abaixo do qual já não é comunitariamente suportável a fixação da pena sem se pôr irremediavelmente em causa a sua função tutelar de bens jurídicos.” (idem, Temas Básicos…, p. 117, 121): Tal desiderato sobre as penas integra o programa político-criminal legitimado pelo artº 18º nº 2 da Constituição da República Portuguesa e que o legislador penal acolheu no artigo 40º do Código Penal, estabelecendo, contudo, o nº 2 que em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa”.
         Neste conspecto e atentas aquelas finalidades, o art.º 71.º do C.P. estabelece os critérios da determinação da medida concreta da pena, dispondo que a determinação desta, dentro dos limites definidos na moldura legal, efetua-se em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, valorando o Tribunal todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo, depuserem a favor ou contra o agente, tendo sempre por limite a culpa que, axiologicamente estranha a finalidades retributivas, estabelece o limite superior da pena que ainda seja concordante com as exigências de preservação da dignidade da pessoa humana.
No caso que nos ocupa, o Tribunal a quo individualizou a pena aplicada à recorrente em de 80 (oitenta) dias de multa, à taxa diária de € 5,50 (cinco euros e meio), pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punido pelo artigo 292.º, n.º 1, do Código Penal; e na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor de qualquer categoria pelo período de 5 (cinco) meses, nos termos do disposto no artigo 69.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal.

Importa, antes de mais, referir que à data dos factos a arguida conduzia com uma taxa de álcool no sangue, reduzido o erro máximo admissível, de 1,58g/l, taxa que se afigura de nível médio.

         O crime de condução de veículo em estado de embriaguez é punido com pena de prisão até um ano ou com pena de multa até 120 dias.

Conforme se verifica a punição em 80 dias de multa ficou aquém do limite máximo da pena de multa que é de 120 dias, mas acima da sua metade, o que se considera desproporcional tendo em vista a taxa apurada no sangue e a ausência de antecedentes criminais, considerando mais justo e adequado, considerando, não só as finalidades de prevenção geral como especial no cotejo com a taxa de álcool no sangue apresentada pela arguida e com o facto de a arguida não averbar qualquer condenação no seu certificado do registo criminal, não sendo de olvidar que a arguida não admitiu a taxa de álcool de que seria portadora, a multa de 60 dias.

Por outro lado, considerando, também, as condições sócio económicas da arguida, relatadas pela mesma – é estudante, não tem encargos, trabalha em part time auferindo cerca de 250,00€, vive com os pais por quem é ajudada financeiramente, não se afigura desadequado o quantitativo diário de 5,50€, muito próximo, aliás, do limite mínimo que é de cinco euros, sendo que «a jurisprudência vem considerando que os valores mais próximos do mínimo legal apenas devem ser adotados em situações de grande carência económica, a raiar a indigência.» - conforme Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, Proc. 56/23.8GDLRA.C1, datado de 25.10.2023., sem esquecer que a multa tem de expressar algum sacrifício de quem a vai pagar, sob pena de não cumprir com as finalidades da punição.

Nota para referir que no caso não é possível qualquer atenuação especial.

Primeiro porque como dissemos atrás não há qualquer erro sobre a ilicitude, para sequer ponderar um erro censurável que justificasse a atenuação especial da pena.

 E em segundo lugar para referir que o comportamento da arguida recorrente não revela qualquer circunstância donde se influa uma diminuição acentuada da ilicitude do facto, da culpa ou necessidade da pena. E isto porque a arguida provinha de uma atividade lúdica, foi divertir-se à noite com os amigos e decidiu beber sabendo que ia conduzir. Não consta que estivesse a conduzir por direito de necessidade ou estado de necessidade. E também não resulta que não tenha necessidade da pena, pois que não obstante ter ingerido mais do que uma bebida alcoólica, não foi capaz de tomar a decisão de não conduzir, arranjando uma alternativa para se deslocar para casa, mantendo e defendendo em sede de julgamento que se encontrava perfeitamente capaz de conduzir, o que revela fraca interiorização da gravidade da sua conduta.

Não se verifica o preenchimento de qualquer das alíneas do art. 72º do C.P.:

Artigo 72.º

Atenuação especial da pena

1 - O tribunal atenua especialmente a pena, para além dos casos expressamente previstos na lei, quando existirem circunstâncias anteriores ou posteriores ao crime, ou contemporâneas dele, que diminuam por forma acentuada a ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da pena.

2 - Para efeito do disposto no número anterior, são consideradas, entre outras, as circunstâncias seguintes:

a) Ter o agente actuado sob influência de ameaça grave ou sob ascendente de pessoa de quem dependa ou a quem deva obediência;

b) Ter sido a conduta do agente determinada por motivo honroso, por forte solicitação ou tentação da própria vítima ou por provocação injusta ou ofensa imerecida;

c) Ter havido actos demonstrativos de arrependimento sincero do agente, nomeadamente a reparação, até onde lhe era possível, dos danos causados;

d) Ter decorrido muito tempo sobre a prática do crime, mantendo o agente boa conduta.

3 - Só pode ser tomada em conta uma única vez a circunstância que, por si mesma ou conjuntamente com outras circunstâncias, der lugar simultaneamente a uma atenuação especialmente prevista na lei e à prevista neste artigo.

Mormente a invocada al.d).

Se é verdade que os factos ocorreram em 13 de agosto de 2022, a tramitação processual correu com normalidade como se pode constatar pela análise dos autos.

Decorreram entre a sua prática e a prolação da sentença cerca de 18 meses, sendo que pelo meio o processo esteve suspenso provisoriamente com o acordo da arguida reiniciando em 07.02.23 por incumprimento da mesma.

Para além do mais a recorrente solicitou na sua contestação prova documental ao IPQ a qual foi deferida em 30.05.23 e junta em 23 de junho de 2023, tendo sido nesse mesmo mês designado dia de julgamento para out de 2023, o qual foi dado sem efeito na sequência de reclamação apresentada pela arguida pela retenção do recurso que interpôs a propósito da aplicabilidade da lei da amnistia e depois novamente sem efeito na sequência de greve dos funcionários judiciais, realizando-se o julgamento em 15.02.24.

Donde não se pode concluir que tenha decorrido muito tempo ou prolongamento excessivo do processo sobre a prática do crime que possa justificar a referida atenuação.

Ainda.

Invoca a arguida a aplicação da pena de admoestação.

A admoestação é uma pena de substituição de uma pena concreta de multa.

A admoestação consiste numa advertência oral feita pelo tribunal ao condenado sobre o mal do crime (artigo 60º, n.º 4 do Código Penal). Ela tem lugar após o trânsito da sentença condenatória (artigo 497º do CPP.

A admoestação pode substituir a pena concreta de multa não superior a 240 dias.

Atenta a natureza dos bens jurídicos em causa e as necessidades preventivas gerais, não deve proceder-se a substituição da pena de multa por admoestação nos crimes rodoviários, seja por condução de veículo automóvel sem habilitação legal (acórdão do TRG, de 20.4.2009 processo 967/08.0GAEPS.G1, e acórdão do TRG, de 11.1.2010, processo 941/09.0GBBMRG1), seja por condução sob efeito de álcool (acórdão do TRP, de 29.1.2014, in CJ, 1, 210, e acórdão do TRE, de 29.5.2012, processo 917/10.4GDPTM.E1).

O critério de aplicação da admoestação é exclusivamente preventivo, isto é, o tribunal deve apurar se esta pena é adequada à satisfação das necessidades de prevenção de socialização ou a prevenção geral, que constituem "as finalidades da punição” ver a anotação ao artigo 40º, e FIGUEIREDO DIAS, 1993: 387, mas contra CAVALEIRO FERREIRA, 1989: 190, considerando decisivo o ponto de vista a "grande diminuição culpa verificável no caso concreto").

A pena de admoestação encontra-se prevista no artigo 60º do Código Penal com a seguinte redação:

Artigo 60.º

Admoestação

“1 – Se ao agente dever ser aplicada pena de multa em medida não superior a 240 dias, pode o tribunal limitar-se a proferir uma admoestação.

2 – A admoestação só tem lugar se o dano tiver sido reparado e o tribunal concluir que, por aquele meio, se realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.

3 – Em regra a admoestação não é aplicada se o agente, nos três anos anteriores ao facto, tiver sido condenado em qualquer pena, incluída a de admoestação.

4 – A admoestação consiste numa solene censura oral feita ao agente, em audiência, pelo tribunal.”

Como se referiu no Ac. da Rel. de Coimbra de 11-5-2005, proc.º n.º 945/05, rel. Oliveira Mendes, claramente tributário da lição de Figueiredo Dias (Direito Penal Português - As Consequências Jurídicas do cit., pág. 387, §605):

 “A pena de admoestação, a mais leve do nosso ordenamento jurídico, só pode ser cominada se o tribunal se convencer, através da emissão de um juízo de prognose favorável, que o delinquente alcançará por tal via a sua (re)socialização e que a sua aplicação não porá em causa os limiares mínimos das expectativas comunitárias ou de prevenção de integração, sob a forma de tutela do ordenamento jurídico, sem esquecer que a mesma só deve ser cominada para censura de factos de escassa gravidade, gravidade que deve ser aferida em função do bem ou do interesse jurídico tutelado e o grau e a intensidade da violação ou lesão nele produzida.»

No mesmo sentido Ac. R.G. de 11.01.10, proc. 941.09.0GBBMR, relator Cruz Bucho.

O mesmo relator escreve, extensível à condução sob o efeito do álcool, “Como muito recentemente tivemos oportunidade de salientar no acórdão desta Relação de Guimarães, de 28-9-2009 (proc.º n.º 34/09.OGTVCT.G1, rel. Cruz Bucho in www.dgsi.pt):

«A questão da aplicação da admoestação aos crimes de condução ilegal não é nova e tem sido até objecto de diversos acórdãos desta Relação (cfr. v.g. os Acs de 16-3-2009, proc.º n.º 419/08.9GTVC.G1, rel. Carlos Barreira, e de 20-4-2009, proc.º n.º 967/08GAEPS.G1, rel. Filipe Melo, ambos disponíveis in www.dgsi.pt) proferidos sobre processo oriundos do Tribunal Judicial de Esposende.»

«De forma que julgamos unânime se vem entendendo nesta e noutras Relações (cfr. v.g. o Acs da Rel do Porto de 25-9-2002, proc.º n.º 0141492, rel. Teixeira Pinto, in www.dgsi.pt e de Lisboa de 13-5-2004, proc.º n.º 7927/03-9ª, rel. Francisco Neves in www.pgdlisboa.pt) que no crime de condução de veículo sem habilitação legal, p. e p. pelo art.º 3º, n.º 2, do D.L. n.º 2/98, de 03.01, salvo em situações excepcionais, verificadas razões ponderosas, não se justifica a substituição da multa pela admoestação por o referido crime constituir uma grave violação das regras de trânsito, sendo de prática frequente, a tornar muito prementes as necessidades de prevenção geral.»

Posição que subscrevemos. Conduzir sob o efeito do álcool constitui uma grave violação das regras estradais.

Será que o caso dos autos configura uma situação excecional ou, o que é o mesmo, in casu verificam-se razões ponderosas que justificam a substituição da multa pela admoestação?

São os seguintes os pressupostos (a verificar no momento da decisão) de que a lei (art° 60° do Código Penal) faz depender a possibilidade (e obrigatoriedade) da aplicação ao arguido da pena de admoestação.

- um pressuposto formal) a saber, que a pena concreta aplicada seja de multa não superior a 120 dias;

- que haja reparação do dano:

- que decorrente de um favorável juízo de prognose, com a admoestação seja razoável concluir pela realização bastante das finalidades punitivas.

-inexistência, em princípio, de anterior condenação em qual pena.

Dúvidas não há que o pressuposto formal da medida da pena de multa se verifica e também não se questiona que a arguida seja primária.

E no caso em apreço não há lugar a reparação por não haver lesado direto.

Contudo, tendo em conta o valor dos bens que a norma procura proteger, pois que não estamos no âmbito das bagatelas penais, campo privilegiado para admoestação, somos a afirmar pela não verificação de outro pressuposto, a necessidade da realização das finalidades punitivas.

As exigências de prevenção geral são prementes.

Os crimes rodoviários, aqui se inserindo a condução sob o efeito do álcool, devem ser exemplarmente punidos (aqui no sentido de garantirem, pela aplicação da pena, a reafirmação das expectativas comunitárias na validade das normas penais rodoviárias), principalmente num país, como é o nosso, com os tristes números de sinistralidade nas estradas.

Tudo para se concluir não ser aqui caso de aplicação da pena de admoestação, porque inexistem circunstâncias especiais que o justifiquem, antes se devendo ficar pela pena de multa.

Da medida da pena acessória.

No que concerne à pena acessória de proibição de conduzir, urge, igualmente, não olvidar a taxa de álcool que a arguida era portadora aquando da condução do veículo, e que o fez no interior do perímetro urbano de uma via pública.

A moldura penal da pena acessória de inibição de conduzir situa-se entre um mínimo de três meses e o máximo de três anos.

Pelo que, assim sendo, nenhum reparo há, salvo melhor entendimento, a aduzir à decisão recorrida quanto à medida concreta da pena acessória de proibição de conduzir. A determinação da medida concreta da pena, foi feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, considerando que o dolo é direto e que as especiais exigências de prevenção geral (aqui considerada a elevada sinistralidade rodoviária no nosso país) resultante em larga medida da generalização de ilícitos como o que está aqui em causa.

Isto posto e ponderado, concluiu a sentença ora recorrida que a aplicação de uma pena acessória de proibição de conduzir de cinco meses, era adequada face às necessidades prementes de prevenção que o caso fazia sentir.

A pena aplicada afigura-se-nos justa e equilibrada, sendo o resultado da ponderação criteriosa de todas as circunstâncias do caso concreto.

Lê-se, ademais, no Acórdão do Tribunal da Relação de Évora datado de 24 de Setembro de 2009, Processo 47/09.1PFSTB.E1 que “Para que cumpra a sua finalidade preventiva a pena acessória de proibição de conduzir tem de importar um qualquer sacrifício para o condenado e uma censura suficiente dos factos. A pena acessória em concreto adequada tem de provocar efeito útil de dissuasão de comportamentos idênticos e, mormente, pacificamente estando reconhecidas as nocivas e importantes consequências que, na sociedade portuguesa, a condução em situações como aquela em que o recorrente incorreu têm desencadeado. Aos riscos inerentes à condução de veículos, têm de corresponder exigências cada vez maiores de censurar condutas que ponham em causa a civilidade que deve estar associada à forma como alguém se deve pautar quando conduz”, pelo que a pena acessória deve importar um sacrifício para o condenado e uma censura suficiente do facto.

Omissão de pronúncia sobre pedido de não transcrição da sentença.

A arguida requereu na sua contestação a não transcrição da eventual sentença condenatória tirada em juízo para o certificado de registo criminal, nos termos do art. 13º da Lei n.º 37/2015, de 05 de Maio, porquanto se encontra a entrar no mercado de trabalho publico qualificado.
Em sede de recurso, conclui que “A sentença a quo é omissão neste ponto e sendo que a falta de pronúncia provoca a nulidade da sentença, art.º 97.º, n.º 5, 118.º, 119.º, 120.º, n.º 1, 374.º, n.º 3, al. b), 379.º, n.º 1, al. c) e n.º 2, 414.º, n.º 4, todos do CPP – requer-se a supressão do vício quer por via do reenvio para a instância a quo, quer por via do Douto Suprimento por V. Exas. Venerandos Desembargadores do Tribunal da Relação do Porto, determinando a não transcrição da pena que houver de aplicar.”

Efetivamente constata-se que a sentença é omissa neste pedido, não se tendo o tribunal pronunciado sobre tal matéria e nessa medida poderia ser geradora de nulidade da sentença, conforme previsto no art. 379º, n º 1, al. c) do CPP.

 O tribunal tem de pronunciar-se sobre todas as questões relevantes para uma justa decisão quando lhe sejam colocadas pelos intervenientes. Tal exigência destina-se a permitir que a decisão demonstre que o tribunal considerou especificadamente toda a matéria que foi trazida à apreciação.

 

Coloca-se a questão de saber se deve este tribunal superior suprir a omissão ou se tal é da competência do tribunal recorrido.

Quando se trata de omissão de pronúncia diz a jurisprudência e doutrinas maioritárias, ver a este propósito Comentário do CPP, 3ª ed. De Paulo Pinto de Albuquerque em notas 12 e ss do art 379º do CPP que o tribunal de recurso não pode exercer esse poder de suprimento, pois esse exercício corresponderia à supressão de um grau de jurisdição.

Mas ter-se ia que anular a sentença a quo?

Cremos que não.

Dispõe o Artº 10º da Lei 37/2015 de 05.05.

«1. O certificado do registo criminal identifica a pessoa a quem se refere e certifica os antecedentes criminais vigentes no registo dessa pessoa, ou a sua ausência, de acordo com a finalidade a que se destina o certificado, a qual também é expressamente mencionada.

(…)

6. Os certificados do registo criminal requeridos por pessoas singulares para o exercício de qualquer profissão ou actividade para cujo exercício seja legalmente exigida a ausência, total ou parcial, de antecedentes criminais ou a avaliação da idoneidade da pessoa, ou que sejam requeridos para qualquer outra finalidade, contêm todas as decisões de tribunais portugueses vigentes, com excepção das decisões canceladas provisoriamente nos termos do artigo 12º ou que não devam ser transcritas nos termos do artigo 13º, bem como a revogação, a anulação ou a extinção da decisão de cancelamento, e ainda as decisões proferidas por tribunais de outro Estado membro ou de Estados terceiros, nas mesmas condições, devendo o requerente especificar a profissão ou actividade a exercer ou a outra finalidade para que o certificado é requerido.


(…)

Por sua vez, diz-nos o artº 13º nº 1:

«1. Sem prejuízo do disposto na Lei nº 113/2009, de 17 de Setembro, com respeito aos crimes previstos no artigo 152º, no artigo 152º-A e no capítulo V do título I do livro II do Código Penal, os tribunais que condenem pessoa singular em pena de prisão até 1 ano ou em pena não privativa da liberdade podem determinar na sentença ou em despacho posterior, se o arguido não tiver sofrido condenação anterior por crime da mesma natureza e sempre que das circunstâncias que acompanharam o crime não se puder induzir perigo de prática de novos crimes, a não transcrição da respectiva sentença nos certificados a que se referem os nº 5 e 6 do artigo 10º»

Nesta Lei n º 37/2015 de 05.05, o legislador permitiu que “os tribunais podem determinar na sentença ou em despacho posterior”, a não transcrição no registo criminal de condenações em “pena de prisão até 1 ano ou em pena não privativa da liberdade, se o arguido não tiver sofrido condenação anterior por crime da mesma natureza e sempre que das circunstâncias que acompanharam o crime não se puder induzir perigo de prática de novos crimes”, não fazendo qualquer distinção entre trânsito em julgado ou não, da respectiva condenação.

Sendo certo que não se impõe limite temporal no tocante ao despacho posterior, pelo que, é indiferente que seja antes ou depois do trânsito em julgado. O que se impõe são as demais condicionantes previstas na norma, mais concretamente que:

a) O(a) condenado(a) não tenha sofrido condenação anterior por crime da mesma natureza; e,

b) Sempre que das circunstâncias que acompanharam o crime não se puder induzir perigo de prática de novos crimes.

Tendo presente o ora exposto e a possibilidade de conhecimento da questão em despacho posterior à sentença, não é de anular a sentença a quo permitindo-se ainda ao tribunal a quo, independentemente do trânsito em julgado das demais questões ora conhecidas, tomar posição sobre esta concreta a questão, pois ainda em tempo para o fazer.

Custas excessivas.

No que concerne à conta de custas, não obstante a audiência de julgamento ter decorrido numa única sessão, sendo designada outra sessão para leitura da sentença, atendendo à complexidade das questões levantadas a condenação foi adequada.

De facto, para além das diligências probatórias requeridas, a arguida requereu a aplicação da lei da amnistia e do perdão, Lei n.º 38-A/2023, de 2 de Agosto, suscitando despacho judicial. Após solicitou a alteração daquela decisão, levando o tribunal a quo a proferir despacho com 11 páginas que incidiu novamente sobre a aplicabilidade da referida Lei, adiamento do julgamento e efeito a atribuir ao recurso e seu modo de subida.

A arguida apresentou ainda reclamação, a qual foi admitida e instruída e que determinou o adiamento da audiência.

Foi decidida a reclamação no sentido do não provimento.

A arguida suscitou a nulidade da prova pericial, determinando a prolação de decisão consubstanciada em 13 páginas no sentido do seu não provimento.

Em face do exposto, mostra-se correta a taxa de justiça fixada em 4 ucs.

***


III. Decisão:


Face ao exposto, acordam os Juízes desta 1.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto em conceder parcial provimento ao recurso principal e em alterar a pena de multa aplicada à recorrente fixando-a em 60 (sessenta) dias de multa, mantendo em tudo o mais o decidido pelo tribunal a quo.
Negar provimento ao recurso interlocutório, mantendo a decisão a quo.
Determinar que o tribunal a quo conheça do pedido de não transcrição de sentença formulado pela arguida na contestação junta aos autos.

Sem custas quanto ao recurso principal.

Custas pela arguida com taxa de justiça em 3ucs relativamente ao recurso interlocutório.




Porto, 03 de julho de 2024

(Texto elaborado e integralmente revisto pelo relator, sendo as assinaturas autógrafas substituídas pelas eletrónicas apostas no topo esquerdo da primeira página)

Paulo Costa

Lígia Figueiredo

Donas Botto


______________
[1] É o que resulta do disposto nos arts. 412.º e 417.º do CPPenal. Neste sentido, entre muitos outros, acórdãos do STJ de 29-01-2015, Proc. n.º 91/14.7YFLSB.S1 - 5.ª Secção, e de 30-06-2016, Proc. n.º 370/13.0PEVFX.L1.S1 - 5.ª Secção.
[2] Proc. n.º 146/14.8GTCSC.S1 - 5.ª Secção, acessível in www.stj.pt (Jurisprudência/Acórdãos/Sumários de Acórdãos).
[3] Proc. n.º 772/10.4PCLRS.L1.S1 – 3.ª Secção, acessível in www.stj.pt (Jurisprudência/Acórdãos/Sumários de Acórdãos).
[4] O DL 291/90, de 20-09, que foi revogado pelo DL 29/2022, de 07-04, determinava, no seu art. 4.º, n.º 2, que os instrumentos de medição são dispensados de verificação periódica até 31 de Dezembro do ano seguinte ao da sua primeira verificação, salvo regulamentação específica em contrário, acabando por assumir igual resultado, assimilando a solução já inscrita no art. 7.º, n.º 1, do RCMA.
[5] Relatado por Luís Teixeira no âmbito do Proc. n.º 1358/17.8PBCBR.C1, acessível in www.dgsi.pt.