REVISÃO DA INCAPACIDADE
INCAPACIDADE PERMANENTE ABSOLUTA PARA O TRABALHO HABITUAL
ACTUALIZAÇÃO DE PENSÃO
Sumário


I- No incidente de revisão da incapacidade, deverá o Juiz ponderar e valorar, segundo o seu prudente juízo, todos os elementos constantes dos autos que permitam determinar se houve um agravamento do quadro sequelar e de qual a incapacidade de que é portador o sinistrado.
II- Se o concreto exame por junta médica constitui uma prova débil quanto a uma parte dos factos sobre os quais importa decidir, por os peritos não terem respondido de forma direta, precisa e esclarecedora a determinados quesitos relacionados com tais factos, mas existem outros meios probatórios idóneos e consistentes que suportam a decisão a proferir, não há necessidade de anular a decisão recorrida para mandar repetir o exame por junta médica.
III- Um quadro doloroso pode constituir uma sequela de um acidente de trabalho, com atribuição de um coeficiente de desvalorização à luz da TNI.
IV- Se no âmbito do incidente de revisão fica demonstrado que o sinistrado, em consequência do acidente de trabalho, sofre dores em todos os segmentos da coluna vertebral principalmente a nível cervical e lombar; dor referida à mobilização da coluna lombar; parestesias das mãos e das coxas, com exibição de tremor dos membros (principalmente dos membros superiores), sequelas que não existiam aquando da anterior avaliação da incapacidade, justifica-se que, causando o quadro doloroso prejuízo funcional, se enquadre este novo dano na TNI.
V- Encontra-se em situação de IPATH o sinistrado que, devido às “novas” sequelas decorrentes do acidente, está totalmente incapaz de retomar o seu posto de trabalho.
VI- Para efeitos de cálculo de uma pensão decorrente de incidente de revisão utilizam-se os mesmos critérios que foram utilizados para o cálculo da pensão inicial, fixando-se a nova pensão como se fosse devida à data da alta.
VII- Se a pensão revista for atualizável, devem-se aplicar os coeficientes de atualização que estiveram em vigor até à data em que foi apresentado o pedido de revisão, sendo a pensão resultante dessas sucessivas atualizações aquela que será devida ao sinistrado a partir do pedido de revisão.
VIII- A partir do pedido de revisão, a pensão será atualizada anualmente, de forma automática e imediata, nos termos previstos pelas disposições conjugadas dos artigos 77.º, alínea d) da LAT e artigo 8.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 142/99, de 30 de abril.
(Sumário elaborado pela relatora)

Texto Integral


Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora

I. Relatório
Em 27-05-2022, o sinistrado, AA, veio, nos termos do disposto no artigo 145.º do Código de Processo do Trabalho, requerer a revisão da incapacidade anteriormente fixada, com fundamento no agravamento das lesões/sequelas de que é portador.
O incidente de revisão seguiu a tramitação que resulta dos autos e para a qual remetemos.
Em 12-1-2024 foi proferida decisão final com o seguinte dispositivo:
«Em face do exposto julgo improcedente o presente incidente de revisão de incapacidade, mantendo inalterado o grau de incapacidade que afeta o Sinistrado AA e a pensão que lhe foi atribuída nestes autos, não condenando a Entidade Responsável no pagamento de qualquer quantia ao Sinistrado.
Custas pelo Sinistrado.
Registe e notifique».

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O sinistrado interpôs recurso desta decisão, rematando as suas alegações com as conclusões que, seguidamente, se transcrevem:
«1. O presente Recurso tem por objeto, a revogação da decisão recorrida já que na mesma, com o devido respeito que é muito, é feita uma errada interpretação da prova constante do processo e é feita uma errada aplicação do direito.
2. A sentença proferida pelo douto tribunal a quo, violou por erro de interpretação o disposto nos artº.(s) 496º, 562º, 564º e 566º todos do Código Civil.
3. Tendo em conta toda a prova junta aos autos, como de seguida tentaremos demonstrar, é manifesto o agravamento das lesões/sequelas de que é portador o sinistrado, decorrentes do acidente de trabalho por si sofrido a 22.02.2018,
4. Dado o tipo de tarefas concretas (consideradas como Factos Provados pelo tribunal a quo), que o trabalho habitual do sinistrado envolve, conjugado com as regras da experiência comum, a decisão final proferida pelo douto tribunal a quo, com o devido respeito que é muito, deveria ter determinado:
- Que o sinistrado, ora Apelante, devido ao agravamento das sequelas decorrentes do acidente de trabalho havido a 22.02.2018, se encontra incapacitado de poder desempenhar a generalidade das funções essenciais do seu posto de trabalho;
- Que o sinistrado se encontra afetado de Incapacidade Permanente Absoluta para o Trabalho Habitual (doravante IPATH), porquanto comprovadamente, não é, nem foi reconvertível em relação ao posto de trabalho que ocupava à data do acidente.
- Que ao sinistrado, deve ser atribuída uma incapacidade permanente parcial, resultante do agravamento das sequelas decorrentes do acidente de trabalho havido a 22.02.2018, que deve ser fixada em 19,63x1,5= 29,445%.
5. A sentença proferida pelo douto tribunal a quo, com o devido respeito que é muito, na rejeição do agravamento das sequelas decorrentes do acidente de trabalho ocorrido a 22.02.2018 e, na rejeição da atribuição de IPATH ao sinistrado:
A) Valorou de forma acrítica a apreciação meramente aritmética e de carácter médico, não fundamentada, constante no parecer emitido pela Junta Médica;
B) Desvalorou, o relatório do GML do exame singular de Perícia Médica, que “permitia admitir o agravamento das sequelas decorrentes do acidente de trabalho ocorrido a 22.02.2018, determinando uma incapacidade de 29,445%” (Relatório junto aos autos);
C) Desvalorou o relatório do Médico Neurocirurgião, para quem “não se pode excluir a possibilidade da exacerbação clínica ter correlação e nexo de causalidade com o acidente referido por agravamento de doença pré-existente”. (Doc. 02, junto com a PI);
D) Desvalorou o relatório do Médico Especialista em Ortopedia e Traumatologia, para quem “existe nexo causal com o acidente anterior por agravamento de patologia pré-existente.” (Doc. 03, junto com a PI);
E) Descurou, desvalorou e rejeitou por completo a apreciação de carácter socioprofissional e a repercussão do dano sofrido na funcionalidade do sinistrado, que de acordo com:
i.O relatório do Médico de Medicina do Trabalho – Ficha de Aptidão para o Trabalho (vide, doc. 05, junto aos autos pelo A.);
ii.O parecer emitido pelo IEFP (junto aos autos);
iii.O depoimento da testemunha BB, colega de trabalho do sinistrado.
Todos estes outros meios de prova, em uníssono, consideraram o agravamento das sequelas que o sinistrado agora apresenta, decorrentes do acidente de trabalho ocorrido a 22.02.2018, impossibilitando-o de realizar o núcleo essencial das tarefas compreendidas na sua função de técnico de refrigeração e climatização (técnico AVAC).
6. De seguida passaremos a enumerar os Factos que o douto tribunal a quo deveria ter considerado como Provados, tendo em conta a prova constante nos autos.
7. O douto tribunal a quo deveria ter dado como Facto Provado que:
a) O sinistrado desde 2021 que sofreu um agravamento das sequelas decorrentes do acidente de trabalho ocorrido a 22.02.2018.
b) A incapacidade permanente parcial resultante do acidente de trabalho, tendo em conta as sequelas supras referidas é agora de 19,63x1,5= 29,445%.
8. A este respeito:
O douto tribunal a quo não obstante, constar no “Relatório” da decisão final a referência ao relatório do perito singular não consignou nos Factos Provados (e, com o mais elevado respeito pensamos que, o deveria ter feito) o resultado do relatório final da perícia médica do INML no qual o Sr. Perito Singular, depois de ter ordenado que o sinistrado previamente fosse submetido a um exame complementar de diagnóstico (Electroneuromiografia), concluiu do seguinte modo:
(…) 1. Apesar das alterações observadas em alguns resultados de exames complementares de diagnóstico facultados e transcritos no nosso relatório nº 1, serem fundamentalmente degenerativas, não se pode excluir a possibilidade de agravamento de patologia pré-existente.
Como tal, os elementos disponíveis, dos quais se destacam o exame físico, e o resultado do exame complementar de diagnóstico realizado, permitem admitir agravamento das sequelas decorrentes do acidente de trabalho ocorrido em 22/02/2018, desde a data do pedido de revisão.
2. A incapacidade permanente parcial resultante do acidente atual, tendo em conta as sequelas atrás descritas e a consulta da Tabela Nacional de Incapacidades para Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais (Anexo I, Dec. Lei nº 352/07 de 23 de Outubro), é de 19,63x1,5= 29,445%.
9. Além do mais e no mesmo sentido da opinião do Sr. Perito Singular do GML, resulta Provado (Vide, Facto Provado 21.) que: (…)”21. A 14 de Março de 2022, não aguentando as dores, o sinistrado consultou um Médico Especialista em Neurocirurgia, o qual, para além de lhe prescrever medicamentos para as dores, redigiu o relatório constante de fls. 91, do qual consta, além do mais, o seguinte: … Apesar das alterações observada em RM serem fundamentalmente degenerativas, não se pode excluir a possibilidade da exacerbação clínica (uma vez que não existiam queixas raquídeas prévias ao sinistro) ter correlação e nexo de causalidade com o acidente referido por agravamento de doença pré-existente. (…)
10. Ainda no mesmo sentido da opinião do Sr. Perito Singular do INML, resulta Provado (Vide, Facto Provado 22.) que: (…)”22. A 9 de Abril de 2022, não aguentando as dores, o sinistrado consultou um Médico Especialista em Ortopedia e Traumatologia o qual, para além de lhe prescrever medicamentos para as dores, redigiu o relatório constante de fls. 91v, do qual consta, além do mais, o seguinte:(…) Refere desde o acidente lombalgias recorrentes, com irradiação para os membros inferiores, que lhe condicionam a sua vida diária. Fez exames complementares que revelaram hérnia discal posteromediana L3-L4 com discreta lateralização direita e migração inferior com possível compromisso radicular. Alterações degenerativas discovertebrais L4-L5 e procidência discal postero-mediana. Protusão difusa L5-S1.
Entendemos que existe nexo causal com o acidente anterior, pelo agravamento de patologia pré-existente, devendo ser reaberto o processo para continuação dos cuidados médicos.
11. Pelo que, deve constar nos Factos Provados que de acordo com a posição do Sr. Perito singular do GML, de acordo com a posição do Médico Especialista em Neurocirurgia e ainda, de acordo com a posição do Médico Especialista em Ortopedia e Traumatologia :
i. Apesar das alterações observadas em alguns resultados de exames complementares de diagnóstico, serem fundamentalmente degenerativas, não se pode excluir a possibilidade de agravamento de patologia pré-existente. Como tal, os elementos disponíveis, dos quais se destacam o exame físico, e o resultado do exame complementar de diagnóstico realizado, permitem admitir o agravamento das sequelas do sinistrado decorrentes do acidente de trabalho ocorrido em 22.02.2018.
ii. A incapacidade permanente parcial resultante do acidente atual, tendo em conta as sequelas atrás descritas e a consulta da Tabela Nacional de Incapacidades para Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais (Anexo I, Dec. Lei nº 352/07 de 23 de Outubro), é de 19,63x1,5= 29,445%.
12. O douto tribunal a quo considerou com Provado (art.º 18.) que “Desde setembro de 2021, o Autor passou a ter dores muito intensas na coluna, que irradiam para membros inferiores e superiores e que tornam muito difícil o desempenho de funções mencionadas em 8 a 16”.
13. Contudo, o douto tribunal a quo, também deveria ter dado como Facto Provado que as dores muito intensas na coluna que o sinistrado passou a ter a partir de setembro de 2021, que irradiam para os membros superiores e inferiores, passaram a ser permanentes, incapacitando-o totalmente para poder desempenhar a generalidade das funções que desempenhava antes do acidente.
14. Nesse sentido,
Vide o depoimento da testemunha BB, colega de trabalho do sinistrado, ora apelante: (o douto tribunal a quo, considerou que: …” a testemunha, sendo trabalhador na mesma empresa, aludiu de forma credível…”)
Vide, gravação áudio citius: 00 :16:50
.Testemunha: “(o sinistrado) Quando ele veio, quando teve alta, ele começou a tentar (trabalhar), é lógico que nós como colegas facilitávamos, se tínhamos que pegar numa máquina pesada, ele pagaria sempre na parte mais leve.
De qualquer forma ele ia-se queixando, mas ia fazendo.
Há volta de talvez 2 anos para cá ele começou a queixar-se com dores muito fortes… e a partir daí era uma correria…era fisioterapia…era médicos.
.Advogado do A. :Mas dores muito fortes, onde?
.Testemunha: Especialmente na coluna, não é.
Vide, gravação áudio citius: 00 :18:53
.Advogado do A. : … Ele (o sinistrado) há 2 anos para cá começou a manifestar-se com dores.
Mas eram dores suportáveis, intensas?
.Testemunha: Ele não conseguia fazer o trabalho.
.Advogado do A. : Então eram incapacitantes?
.Testemunha: Exatamente. Ele tentava fazer as coisas, ai… ai…ai… ai… e tinha que se retirar, não conseguia (trabalhar).
Vide, gravação áudio citius: 00:19:48
.Advogado do A.: E sabe se depois dessas sessões de fisioterapia que o Sr. referiu, ele (o sinistrado) regressava e o que é que acontecia?
.Testemunha: Voltava ao mesmo.
.Advogado do A.: Não conseguia (trabalhar)?
.Testemunha: Não. Não.
Ele umas coisitas leves ele ia fazendo, com dificuldade ía fazendo, mas as coisas agravavam-se.
. Advogado do A.: Mas, coisas leves… o que é que está a dizer?
.Testemunha: Limpezas.
Vide, gravação áudio citius: 00:20:22
. Advogado do A.: Mesmo com a ajuda de outra pessoa ele conseguia ou não desempenhar essas funções (funções anteriores ao acidente)?
. Testemunha: Ele não conseguia porque vai a pegar no peso e não consegue, teve que se retirar.
15. Ainda no mesmo sentido, vide as conclusões do Parecer Técnico elaborado pelo IEFP- Instituto de Emprego e Formação Profissional: (…) “4 . Considerando as exigências físicas requeridas para o desempenho das tarefas essenciais do posto de trabalho de técnico AVAC, de forma profissional e produtiva, entendemos que estas são incompatíveis com as incapacidades que o Sr. AA aparenta atualmente, tendo ainda em consideração motivos de segurança no trabalho e saúde ocupacional.”
16. Ainda a este respeito, o douto tribunal a quo, deu como Factos Provados, que o sinistrado, ora Alegante, desempenhava todas as funções melhor identificadas no Parecer Técnico emitido pelo IEFP (vide, Factos provados, 09 a 16).
17. Ora, com o devido respeito, contrariamente ao laudo, não fundamentado, da Junta Médica que se limita a responder SIM/NÃO a cada um dos quesitos solicitados, o Parecer Técnico do IEFP é meticuloso na análise que faz ao posto de trabalho do sinistrado.
18. O Parecer Técnico, do IEFP, escalpelizando cada uma das funções que o douto tribunal a quo deu como Provadas, analisando em concreto as exigências necessárias para desempenhar o posto de trabalho em causa, quanto à capacidade de mobilização e força dinâmica da coluna dorso-lombar e quanto à capacidade sensitiva e motora dos membros, concluiu estar o sinistrado, incapacitado para o trabalho habitual, porquanto: (vide, Parecer Técnico do IEFP - Pág. 6/7) (…)”3. Das principais tarefas … destacam-se as seguintes por considerarmos serem as mais relevantes para a avaliação da incapacidade para o trabalho habitual:
. É requerido a persistente mobilização da coluna exigindo frequentes flexões frontais e torções laterais do tronco, flexão, torsão e extensão do pescoço, bem como a trabalhar com os braços estendidos em frente e acima dos ombros (reparar e montar equipamentos, máquinas diversas de ar condicionado, ventilação, solar termodinâmicos, bombas de calor, acessórios, etc.)
. É também exigido de forma persistente força dinâmica ao nível de ambos os membros superiores, inferiores e tronco que permitam manipular, levantar, baixar e transferir pesos até 30/40 Kg (máquinas de ar condicionado, painéis fotovoltaicos, tubagens, bombas de calor, caixa de ferramentas, etc.) e empurrar/puxar pesos em suspensão acima dos 200Kg.
.É necessário, de forma frequente, subir e descer escadas verticais e escadotes e trabalhar em equilíbrio instável, em altura, em cima de andaimes e plataformas elevatórias.”
E conclui:
“4. Considerando as exigências físicas requeridas para o desempenho das tarefas essenciais do posto de trabalho de técnico de AVAC (que o douto tribunal a quo deu como Factos Provados)… entendemos que estas são incompatíveis, com as incapacidades que o Sr. AA (sinistrado) aparenta atualmente, tendo em consideração motivos de segurança no trabalho e saúde ocupacional. …
6. Concluindo, somos de parecer da impossibilidade de reconversão do Sr. AA em relação ao posto de trabalho que ocupava à data do acidente.“(…)
19. Na decisão a tomar sobre as capacidades do sinistrado para desempenhar, ou não, as funções do seu posto de trabalho habitual, pensamos revelarem-se de extrema importância:
i.Quer, os motivos de segurança no trabalho e saúde ocupacional, invocados pelo IEFP.
ii.Quer, a posição do Médico Especialista em Medicina do Trabalho.
20. Com o devido respeito que é muito, o douto tribunal a quo na sua decisão final, certamente por não se ter apercebido do segundo relatório junto aos autos, não teve em linha de conta a posição do Médico de Medicina do Trabalho porquanto, não menciona em parte alguma o teor do Relatório do Médico da Medicina no Trabalho (vide, doc. 05, junto aos autos pelo A.) que refere expressamente o seguinte:
(…) “ RECOMENDAÇÕES – Correção de condições de trabalho:
NÃO DEVE EXECUTAR TAREFAS QUE IMPLIQUEM;
- SUBIR E DESCER ESCADOTES/ESCADAS;
-PERMANENCIA PROLONGADA EM PÉ (MAIS DE 30 MIN);
-CARGA MANUAL COM PESO SUPERIOR A 5 KG;
-MOVIMENTOS REPITITIVOS COM OS MEMBROS SUPERIORES;
-POSIÇÕES INCORRETAS SOBRE A COLUNA LOMBAR.” (…)
21. Além do mais e não menos importante, o douto tribunal a quo deu como Facto Provado (Facto Provado 19.) o seguinte:
(…) “ O Autor limita-se a ajudar os colegas de trabalho na limpeza dos espaços com utilização de vassoura, pá e aspirador.”
22. Pelo que, deve ser eliminada a decisão final do douto tribunal quanto aos Factos Não Provados, tendo em conta:
a)O depoimento da única testemunha, colega de trabalho do sinistrado, cujo depoimento o douto tribunal a quo, considerou credível;
b)O parecer Técnico do IEFP;
c)O Relatório do Médico Especialista em Medicina do Trabalho - Ficha de Aptidão para o Trabalho (vide, Doc. 05, junto pelo A.)
23. Pelo exposto, deve ser eliminada a decisão final do douto tribunal quanto aos Factos Não Provados e, deve passar a constar como Facto Provado o seguinte:
Em virtude das lesões decorrentes do acidente reportado nos autos, o sinistrado, ora Apelante, por motivos de segurança no trabalho e saúde ocupacional, encontra-se com Incapacidade Permanente Absoluta para o Trabalho Habitual (IPATH) enquanto técnico de refrigeração e climatização (técnico AVAC), dado que, apenas consegue, agora, ajudar os colegas de trabalho na limpeza dos espaços, com utilização de vassoura, pá e aspirador.
24. Com o devido respeito, que é muito, o douto tribunal a quo:
i.Alicerçou única e exclusivamente a sua convicção no Auto de Exame por Junta Médica o qual considerou de forma abstrata e conclusiva que o agravamento do comprovado quadro sequelar não tinha relação com o evento traumático e como tal, não reconheceu a existência de IPATH.
ii.Rejeitou por completo e desvalorizou em absoluto, todos os outros meios de prova existentes nos autos, tais como:
A) A perícia singular médica do INML, na qual o Sr. Perito considerou que:
i. Não se poder excluir a possibilidade de agravamento de patologia pré-existente. Como tal, dos elementos disponíveis, dos quais destacou o exame físico e o resultado do exame complementar de diagnóstico realizado, permitiram-lhe admitir o agravamento das sequelas do sinistrado decorrentes do acidente de trabalho ocorrido em 22.02.2018.
ii. A incapacidade permanente parcial resultante do acidente atual, tendo em conta as sequelas atrás descritas dever ser fixada em 19,63x1,5=29,445%.
B) O Parecer Técnico, do IEFP, (junto aos autos) que identificou cada uma das funções essenciais do posto de trabalho do sinistrado, que o douto tribunal a quo deu como Provadas (vide, Factos Provados 09. a 17.), analisando em concreto as exigências necessárias para desempenhar o posto de trabalho em causa, quanto à capacidade de mobilização e força dinâmica da coluna dorso-lombar e quanto à capacidade sensitiva e motora dos membros, entendendo, invocando motivos de segurança no trabalho e saúde ocupacional, serem essas tarefas incompatíveis com as incapacidades do sinistrado e concluindo estar o sinistrado, incapacitado para o trabalho habitual.
C) O Parecer do Médico de Medicina do Trabalho (vide, Relatório do Médico da Medicina no Trabalho - doc. 05, junto aos autos pelo A.) que recomenda que o sinistrado não deve executar tarefas que impliquem subir e descer escadotes/escadas, permanência prolongada em pé (mais de 30 min), carga manual com peso superior a 5 kg, movimentos repetitivos com os membros superiores e, posições incorretas sobre a coluna lombar.
Ou seja, o Parecer do Médico de Medicina do Trabalho recomenda expressamente que o sinistrado não execute em concreto cada uma das funções essenciais do seu posto de trabalho, que o próprio douto tribunal deu com Factos Provados. (vide, Factos Provados 09. a 16.)
D) De notar que, de entre as funções essenciais identificadas pelo IEFP e dadas como assentes, o próprio douto tribunal considerou como Facto Provado que o sinistrado, atualmente, de forma residual se limita a ajudar os colegas de trabalho na limpeza dos espaços com utilização de vassoura, pá e aspirador. (vide, Facto Provado 19.)
F) O depoimento da única testemunha do processo, BB, colega de trabalho do sinistrado, (cujo depoimento o próprio douto tribunal considerou credível) que de forma isenta, credível e expressa considerou que o sinistrado desde 2021, depois do acidente de trabalho e de ter alta e de regressar ao trabalho passou, com o tempo, a ter dores intensas na coluna, que se tornaram incapacitantes e que o impediam de pegar em pesos e por conseguinte o impediam de pegar nos vários tipos de aparelhos que montavam, não obstante o recurso a várias sessões de fisioterapia e de períodos de baixa médica, só conseguindo ajudar na limpeza dos espaços intervencionados.
G) O parecer clínico do Médico Especialista em Neurocirurgia, que considerou não se poder excluir a possibilidade da exacerbação clínica (uma vez que não existiam queixas raquídeas prévias ao sinistro) ter correlação e nexo de causalidade com o acidente referido por agravamento de doença pré-existente. (vide, Facto Provado 21.)
H) O Parecer clínico do Médico Especialista em Ortopedia e Traumatologia que considerou existir nexo causal com o acidente de trabalho pelo agravamento de patologia pré-existente.(vide, Facto Provado 22.)
25. Sufragando os doutos entendimentos jurisprudenciais, melhor identificados nas nossas Motivações, resulta que:
i.O laudo pericial, seja do exame médico singular, seja do exame por junta médica, seja esta por maioria ou unanimidade, não tem força vinculativa obrigatória.
ii. No Incidente de Revisão da Incapacidade, deverá o Juiz ponderar e valorar, segundo o seu prudente juízo, todos os elementos constantes dos autos que permitam determinar se houve um agravamento do quadro sequelar e de qual a incapacidade de que é portador o sinistrado.
26. Tendo em conta o circunstancialismo dos presentes autos e neste caso concreto, a Perícia singular médica do GML, o Parecer Técnico do IEFP, o Parecer do Médico de Medicina do Trabalho, o depoimento da única testemunha do processo (BB), o Parecer Clínico do Médico Especialista em Neurocirurgia e o Parecer Clínico do Médico Especialista em Ortopedia e Traumatologia , pensamos deverem ser considerados como Factos Provados, que:
i. O sinistrado, depois do acidente de trabalho (ocorrido a 22.02.2018) e desde 2021, depois de ter alta e de regressar ao trabalho passou, com o tempo, a ter dores intensas na coluna, que se tornaram incapacitantes e que, atualmente o impedem de pegar em pesos com mais de 5Kg e por conseguinte, o impedem de realizar as tarefas necessárias que lhe permitam pegar, transportar e montar os vários tipos de aparelhos que a profissão de técnico AVAC, diariamente exige.
ii. Os elementos clínicos disponíveis, sustentados pelos Pareceres Médicos de várias especialidades médicas, (supra referidas em 24.) e pelo resultado do exame complementar de diagnóstico realizado (Electroneuromiografia), junto aos autos, permitem admitir o agravamento das sequelas do sinistrado decorrentes do acidente de trabalho, ocorrido em 22.02.2018.
iii. A incapacidade permanente parcial resultante do agravamento das sequelas supra referidas, deverá ser fixada em 19,63x1,5= 29,445%.
iv. As tarefas/funções que constituem o núcleo essencial da atividade desenvolvida pelo sinistrado e que se encontram devidamente descritas no Parecer do IEFP, foram na ua totalidade consideradas com Provadas pelo douto tribunal a quo (vide, Factos Provados 9. a 17.).
v. Decorrente das sequelas que comprovadamente ficou atualmente portador, o sinistrado, não se encontra em condições de desempenhar as tarefas/funções supra referidas, porquanto, na apreciação de carácter socioprofissional e da repercussão do dano sofrido na funcionalidade do sinistrado, em uníssono, o Parecer Técnico do IEFP, o Parecer do Médico de Medicina do Trabalho e o depoimento da única testemunha do processo (BB) consideram que o sinistrado não pode executar tarefas que impliquem subir e descer escadotes/escadas, permanência prolongada em pé (mais de 30 min), carga manual com peso superior a 5 kg, movimentos repetitivos com os membros superiores e, posições incorretas sobre a coluna lombar e ainda, invocando motivos de segurança no trabalho e saúde ocupacional, consideram ser essas tarefas/funções incompatíveis com as incapacidades do sinistrado e concluem estar o sinistrado perante a existência de IPATH.
vi. Decorrente das sequelas de que o sinistrado ficou portador, o próprio douto tribunal considerou que atualmente o Autor no desempenho das suas tarefas/funções, muito residualmente, “limita-se a ajudar os colegas de trabalho na limpeza dos espaços com utilização de vassoura, pá e aspirador.”(vide Facto Provado 19.)
Nestes termos e nos melhores de direito, se requer a V.Exa.(s) VENERANDOS JUÍZES DESEMBARGADORES que deva ser revogada a decisão final em crise, devendo ser substituída por outra que julgue a ora pretensão do Apelante totalmente procedente, dando como provado que o sinistrado sofreu um agravamento do quadro sequelar decorrente do acidente de trabalho ocorrido a 22.02.2018, devendo, por causa das comprovadas sequelas supra referidas, ser fixada uma incapacidade permanente parcial de 19,63x1,5=29.445%, tal como consta no relatório de Perícia Médica Singular do GML, nos autos melhor identificado.
Deve ainda ser dado como provado, que por motivos de segurança no trabalho e saúde ocupacional, que as tarefas/funções do sinistrado são incompatíveis com o quadro sequelar atual do mesmo, sendo que no desempenho atual das suas tarefas/funções, de forma muito residual, o sinistrado limita-se a ajudar os colegas de trabalho na limpeza dos espaços com utilização de vassoura, pá e aspirador, devendo por isso ser considerado estar o sinistrado perante a existência de IPATH.
A Ré deve ser condenada a pagar ao sinistrado a pensão anual, vitalícia e atualizável no montante mínimo de € 7.824,36, bem como, a pagar ao sinistrado o respetivo subsídio por situação de elevada incapacidade permanente, somando-se os juros devidos, realizando-se desta forma a costumada JUSTIÇA.».
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Não foram apresentadas contra-alegações.
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A 1.ª instância admitiu o recurso como apelação, com subida imediata, nos próprios autos, e com efeito meramente devolutivo.
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O processo subiu à Relação e foi observado o estatuído no n.º 3 do artigo 87.º do Código de Processo do Trabalho.
O Ministério Público emitiu parecer favorável à manutenção da decisão recorrida.
Não foi oferecida resposta.
O recurso foi mantido e, após elaboração do projeto de acórdão, foram colhidos os vistos legais.
Cumpre agora, em conferência, apreciar e decidir.
*
II. Objeto do Recurso
É consabido que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação da recorrente, com a ressalva da matéria de conhecimento oficioso (artigos 635.º n.º 4 e 639.º n.º 1 do Código de Processo Civil, aplicáveis por remissão do artigo 87.º n.º 1 do Código de Processo do Trabalho).
Em função destas premissas, importa analisar e decidir se resultou demonstrado que o sinistrado sofreu agravamento das lesões/sequelas decorrentes do acidente de trabalho e extrair as devidas consequências jurídicas do que se vier a decidir.
*
III. Matéria de Facto
Na decisão recorrida constam como provados os seguintes factos:
1. O Autor/sinistrado AA nasceu no dia ../../1964;
2. No dia 22 de fevereiro de 2018, pelas 9h00, em ..., Lisboa, ao indicar a um cliente onde iria instalar um ar condicionado, o Autor tropeçou e caiu num vão de escadas, do que resultou traumatismo da coluna e hemotórax direito;
3. Nessas circunstâncias, o Autor trabalhava como gerente da empresa “L... - Técnicas de Energia Lda.”, com sede na Rua ..., ..., em ...;
4. Auferia a retribuição de 1000€ x 14 meses, ou seja, o total anual de 14.0000€;
5. A entidade empregadora tinha a responsabilidade civil emergente de acidentes laborais totalmente transferida para a seguradora Caravela - Companhia de Seguros S.A., pela apólice ...67;
6. Em consequência do evento referido em 2, o Autor ficou portador das sequelas descritas no relatório do GML de fls. 74 a 76v, tidas por consolidadas em 16 de agosto de 2018, data da alta clínica, a saber:
(…)
Tórax: Cicatriz infra-axilar direita de dreno torácico com 2cm, dolorosa à palpação. Dor à compressão lateral do tórax. Simetria na expansão torácica.
Ráquis: rigidez moderada da coluna lombar. Dor à palpação das apófises espinhosas na transição dorso-lombar. Dor lombar na flexão da anca com joelho em extensão. Sem défice de força muscular.
Reflexos presentes e simétricos. Contratura para vertebral direita.
(…)
7. A que corresponde a incapacidade permanente parcial (IPP) de 16,05%;
8. Na sequência de acordo exarado nos atos e homologado judicialmente, na fase conciliatória do processo, em 28 de maio de 2019, a Ré seguradora pagou ao Autor o capital de remição de uma pensão anual de 1.572,90€, devida desde o dia imediato ao da alta, no valor global de 20.026,16€;
9. No dia a dia, enquanto técnico de refrigeração e climatização, o Autor desempenhava as seguintes funções:
i. Montagem de equipamentos de ar condicionado, designadamente carga e descarga dos equipamentos, unidade exterior (+- 40kg) e unidade interior (+-15kg), trabalho esse feito em equipa conjuntamente com pelo menos mais um trabalhador;
ii. Montagem e equipamentos de Bombas de calor, designadamente carga e descarga de equipamentos, unidade exterior (+- 50Kg) e unidade interior (+- 20Kg), trabalho esse feito em equipa conjuntamente com pelo menos mais um trabalhador;
iii. Montagem de equipamentos solar térmicos, designadamente carga e descarga de equipamentos, coletor solar (+-30kg) e depósito (+-100kg), trabalho esse feito em equipa conjuntamente com pelo menos mais um trabalhador;
iv. Montagem de equipamentos solar termodinâmicos, designadamente carga e descarga de equipamentos, painel solar (+-15kg) e bloco (+-25kg), trabalho esse feito em equipa conjuntamente com pelo menos mais um trabalhador;
v. Montagem de equipamentos de ventilação, designadamente carga e descarga de equipamentos (+-30Kg), trabalho esse feito em equipa conjuntamente com pelo menos mais um trabalhador;
vi. Montagem de recuperadores de calor, designadamente carga e descarga de equipamento (+-200kg), trabalho esse feito em equipa conjuntamente com pelo menos mais um trabalhador;
vii. Montagem de equipamentos fotovoltaicos, designadamente carga e descarga de painéis (+-20kg cada painel).
10. Na montagem dos equipamentos o sinistrado tem que efetuar movimentos de pegar, levantar e carregar aos ombros os equipamentos, subir andaimes, escadas ou escadotes com cerca de 2 metros de altura, a fim de serem afixados em suportes próprios, trabalho esse feito em equipa conjuntamente com pelo menos mais um trabalhador;
11. Mais procedia à aplicação de suportes para instalação dos equipamentos, nos tetos e/ou nas paredes, utilizando para o efeito um berbequim, tendo para tanto que subir andaimes, escadas e escadotes, com cerca de 2 a 3 metros de altura, trabalho esse feito em equipa conjuntamente com pelo menos mais um trabalhador;
12. Procedia à abertura de roços no solo, nas paredes e tetos, com utilização de martelo de escopro, tendo por vezes que subir andaimes, escadas e escadotes, com cerca de 2 a 3 metros de altura, trabalho esse feito em equipa conjuntamente com pelo menos mais um trabalhador;
13. Efetuava soldadura da tubagem de cobre, com a utilização de grupo de soldadura e maçarico, tendo para tanto por vezes que subir andaimes, escadas e escadotes, com cerca de 2 a 3 metros de altura;
14. Efetuava ligações mecânicas e elétricas, tando para tanto, por vezes, que subir andaimes, escadas e escadotes, com cerca de 2 a 3 metros de altura;
15. Efetuava ligações mecânicas e elétricas, tendo para tanto, por vezes, que subir andaimes, escadas e escadotes, com cerca de 2 a 3 metros de altura;
16. Efetuava a desidratação do circuito e vácuo, com utilização de botija de fluido frigorigéneo, bomba de vácuo e manómetros;
17. Procedia à limpeza dos espaços, com utilização de vassoura, pá e aspirador;
18. Desde setembro de 2021 o Autor passou a ter dores muito intensas na coluna, que irradiam para membros inferiores e superiores e que tornam muito difícil o desempenho de funções mencionadas em 8 a 16; (redação alterada pelos motivos que infra se indicam)
19. O Autor limita-se a ajudar os colegas de trabalho na limpeza dos espaços com utilização de vassoura, pá e aspirador;
20. A 7 de outubro de 2021, o sinistrado depois de se queixar do agravamento do seu estado de saúde à seguradora, realizou por ordem desta uma Ressonância Magnética;
21. A 14 de março de 2022, não aguentando as dores, o sinistrado consultou um Médico Especialista em Neurocirurgia, o qual, para além de lhe prescrever medicamentos para as dores, redigiu o relatório constante de fls. 91, do qual consta, além do mais, o seguinte:
«RM da coluna lombar de 7 de outubro de 2021 revela alterações degenerativas discovertebrais L3L4 com redução da altura discal e do hipersinal T2 e procidência discal difusa, coexistindo hérnia discal postero-mediana com discreta lateralização direita e migração inferior com possível compromisso radicular.
Alterações degenerativas disco-vertebrais L4L5 e procidência difusa de maior expressão focal na vertente postero-mediana
Protusão difusa L5S1
Apesar das alterações observada em RM serem fundamentalmente degenerativas, não se pode excluir a possibilidade da exacerbação clínica (uma vez que não existiam queixas raquídeas prévias ao sinistro) ter correlação e nexo de causalidade com o acidente referido por agravamento de doença pré-existente.
(…)
22. A 9 de abril de 2022, não aguentando as dores, o sinistrado consultou um Médico Especialista em Ortopedia e Traumatologia o qual, para além de lhe prescrever medicamentos para as dores, redigiu o relatório constante de fls. 91v, do qual consta, além do mais, o seguinte:
(…)
Refere desde o acidente lombalgias recorrentes, com irradiação para os membros inferiores, que lhe condicionam a sua vida diária.
Fez exames complementares que revelaram hérnia discal postero-mediana L3-L4 com discreta lateralização direita e migração inferior com possível compromisso radicular. Alterações degenerativas disco-vertebrais L4-L5 e procidência discal postero-mediana. Protusão difusa L5-S1.
Entendemos que existe nexo causal com o acidente anterior, pelo agravamento de patologia pré-existente, devendo ser reaberto o processo para continuação dos cuidados médicos.
(…)
23. A 25 de maio de 2022 o sinistrado teve uma consulta com o Médico de Medicina do Trabalho onde foi feita uma análise do posto de trabalho, bem como uma identificação de fatores de risco profissional, tendo sido consignado na Ficha de Aptidão para o trabalho constante de fls. 92, o seguinte, além do mais que aqui se dá por reproduzido:
Deve se reabrir o processo da sinistralidade por incapacidade adaptativa ao trabalho.
24. Mediante requerimento datado de 27 de maio de 2022, o Autor veio requer a revisão da sua situação alegando agravamento do seu estado clínico e IPATH;
25. Atualmente o Autor não apresenta agravamento do quadro saquelar, mantendo-se a IPP anteriormente atribuída (ponto 7), apresentando as seguintes alterações [descritas no auto de exame singular (fls. 95v) e no auto de junta médica (fls. 123)]:
Ráquis: contratura da musculatura paravertebral dorso-lombar bilateralmente, mais acentuada à esquerda; referência a dor à palpação dos processos espinhosos dorsolombares; limitação da extensão e inclinação laterais e rotações mais evidentes para a esquerda; ligeiro défice de força muscular grau 4+bilateral; Lasegue e Bragard aparentemente negativos.
Tórax: referência a dor á compressão laterolateral do tórax.
(…)
… o examinando referiu dores em todos os segmentos da coluna vertebral, principalmente a nível cervical e lombar; dor referida à mobilização da coluna lombar; refere parestesias das mãos e das coxas, exibindo tremor dos membros (principalmente dos membros superiores); Laségue e Bragard negativos bilateralmente.
(…)
… Revela compromisso ligeiro da raiz de S1 direita, sem relação com o evento traumático, uma vez que existe inadequação entre a sede do traumatismo/da lesão e o quadro sequelar atual. (redação alterada pelos motivos que infra se indicam)
*
IV. Reapreciação da prova
Em 27-05-2022, o sinistrado veio, nos termos do disposto no artigo 145.º do Código de Processo do Trabalho, requerer a revisão da incapacidade anteriormente fixada, com fundamento no agravamento das lesões/sequelas de que é portador.
Juntou prova documental.
Iniciou-se então a instrução do incidente de revisão.
Nesta fase processual foram produzidos diversos meios probatórios.
Tendo a 1.ª instância apreciado e valorado os mesmos, concluiu que o que se provou foi que o sinistrado não apresenta agravamento do quadro sequelar, mantendo-se a IPP anteriormente atribuída (16,05%), apresentando as seguintes alterações:
«Ráquis: contratura da musculatura paravertebral dorso-lombar bilateralmente, mais acentuada à esquerda; referência a dor à palpação dos processos espinhosos dorsolombares; limitação da extensão e inclinação laterais e rotações mais evidentes para a esquerda; ligeiro défice de força muscular grau 4+bilateral; Lasegue e Bragard aparentemente negativos.
Tórax: referência a dor á compressão laterolateral do tórax.
(…)
… o examinando referiu dores em todos os segmentos da coluna vertebral, principalmente a nível cervical e lombar; dor referida à mobilização da coluna lombar; refere parestesias das mãos e das coxas, exibindo tremor dos membros (principalmente dos membros superiores); Laségue e Bragard negativos bilateralmente.
(…)
… Revela compromisso ligeiro da raiz de S1 direita, sem relação com o evento traumático, uma vez que existe inadequação entre a sede do traumatismo/da lesão e o quadro sequelar atual.» - cf. ponto 25 do elenco dos factos provados.
No recurso que interpôs, o sinistrado impugna esta decisão, invocando que se verificou uma errada interpretação da prova constante do processo e que deveria ter sido julgado como provado que:
- O sinistrado, depois do acidente de trabalho (ocorrido a 22.02.2018) e desde 2021, depois de ter alta e de regressar ao trabalho passou, com o tempo, a ter dores intensas na coluna, que se tornaram incapacitantes e que, atualmente o impedem de pegar em pesos com mais de 5Kg e por conseguinte, o impedem de realizar as tarefas necessárias que lhe permitam pegar, transportar e montar os vários tipos de aparelhos que a profissão de técnico AVAC, diariamente exige.
- O sinistrado sofreu agravamento das sequelas do sinistrado decorrentes do acidente de trabalho, ocorrido em 22.02.2018.
- A incapacidade permanente parcial resultante do agravamento das sequelas supra referidas é de 19,63% x1,5= 29,445%.
- O sinistrado, não se encontra em condições de desempenhar as tarefas/funções que constituem o núcleo essencial do seu posto de trabalho, designadamente não pode executar tarefas que impliquem subir e descer escadotes/escadas, permanência prolongada em pé (mais de 30 min), carga manual com peso superior a 5 kg, movimentos repetitivos com os membros superiores e, posições incorretas sobre a coluna lombar e que, por motivos de segurança no trabalho e saúde ocupacional, está afetado de IPATH.
Embora os elementos que o sinistrado pretende que fiquem a constar do elenco dos factos provados contenham factos, juízos conclusivos e até matéria de direito, iremos reapreciar a prova produzida nos autos focando-nos apenas nos aspetos fácticos e, se for caso disso, alteraremos a decisão da matéria de facto, mas não integraremos na mesma todas os juízos conclusivos e matéria de direito mencionada pelo recorrente.
Eis os meios probatórios carreados para os autos e a menção do que de relevante resulta dos mesmos:
A) Meios de prova documental juntos com o requerimento inicial:
· Relatório de ressonância magnética da coluna lombar, datado de 07-10-2021.
Resulta deste documento que se verificam alterações degenerativas na coluna lombar e uma hérnia discal póstero-mediana com discreta lateralização direita e migração inferior.
· Relatório emitido por médico especialista em neurocirurgia, com data de 14-03-2022.
Neste documento foi escrito:
«Refere, desde o sinistro, queixas de lombalgias com agravamentos frequentes e irradiação para os membros inferiores, limitantes das atividades da vida diária.
Sem défices motores grosseiros mas com limitação dolorosa da mobilidade da charneira lombo-sagrada.
(…)
Apesar das alterações observadas em RM [ressonância magnética] serem fundamentalmente degenerativas, não se pode excluir a possibilidade da exacerbação clínica (uma vez que não existiam queixas raquídeas prévias ao sinistro) ter correlação e nexo de causalidade com o acidente referido por agravamento de doença pré-existente».
· Relatório emitido por médico especialista em ortopedia-traumatologia, com data de 09-04-2022.
Menciona-se no documento:
«Refere desde o acidente lombalgias recorrentes, com irradiação para os membros inferiores, que lhe condicionam a sua vida diária.
(…)
Entendemos que existe nexo causal com o acidente anterior, pelo agravamento de patologia pré-existente (…)».
· Ficha de aptidão para o trabalho, datada de 25-05-2022.
Infere-se desta ficha que o sinistrado foi considerado temporariamente inapto para o exercício da sua função atual (Técnico AVAC), por incapacidade adaptativa ao trabalho.
B) Exame médico singular realizado no Gabinete Médico-Legal e Forense do Médio Tejo (GML):
Após a realização de uma solicitada eletromiografia dos membros inferiores, o perito pronunciou-se assim:
«Apesar das alterações observadas em alguns resultados de exames complementares de diagnóstico (…) serem fundamentalmente degenerativas, não se pode excluir a possibilidade de agravamento de patologia pré-existente. Como tal, os elementos disponíveis, dos quais se destacam o exame físico, e o resultado do exame complementar de diagnóstico realizado, permitem admitir agravamento das sequelas decorrentes do acidente de trabalho ocorrido em 22/02/2018, desde a data do pedido de revisão».
Tendo em conta as sequelas verificadas, o parecer do perito foi no sentido de o sinistrado se encontrar afetado de uma incapacidade permanente parcial (IPP) de 29,445% (19,63% X 1,5).
C) Parecer técnico elaborado pelo Instituto do Emprego e Formação Profissional, datado de 11-04-2023 e complementado pelos esclarecimentos e correções apresentados em 30-05-2023:
No âmbito deste parecer técnico procedeu-se a uma detalhada descrição das tarefas inerentes ao posto de trabalho que o sinistrado ocupa.
Descreveram-se igualmente as exigências físicas (e outras) que o referido posto de trabalho implica.
Aí se escreveu:
«Quanto às exigências físicas, nomeadamente quanto à postura de trabalho a função exige que o trabalhador adote, na maior parte do tempo a postura de bipedestação. No entanto, é exigido adotar também outras posturas, como curvado, agachado e de joelhos no decurso das suas tarefas profissionais. No desenvolvimento da atividade o trabalhador está sujeito a frequentes flexões frontais e torções laterais do tronco, torsão, flexão e extensão do pescoço (levantar as condutas e fixá-las na estrutura, efetuar os furos no betão e aparafusar a estrutura de suporte, manipular e instalar as máquinas), bem como a trabalhar em simultâneo com ambos os braços estendidos acima do nível dos ombros.
(…)
No que diz respeito ao tipo e intensidade do esforço, o desenvolvimento da atividade exige ao trabalhador a transferência, elevação e manipulação manual de pesos que podem ascender aos 30/40 Kg (…), e empurrar/puxar em suspensão com auxiliares de transporte (porta paletes; guinchos) pesos que podem ser superiores a 200 kg. Na operação de carga/descarga de material e equipamento, pode ter de manusear, elevar e transportar pesos na ordem dos 30/40 Kg. A elevação dos pesos, o aparafusamento de porcas e parafusos e a utilização do berbequim e martelo elétrico, exigem do trabalhador a utilização da força dinâmica ao nível dos braços, tronco, pernas e pés.».
De seguida, após se concluir que a capacidade e mobilização da força dinâmica da coluna dorso-lombar do sinistrado apresenta relevantes limitações, assim como a capacidade sensitiva e motora do membro inferior direito, entendeu-se que as exigências físicas que o posto de trabalho requer são incompatíveis com as incapacidades que o sinistrado aparenta atualmente, tendo ainda em consideração motivos de segurança no trabalho e saúde ocupacional.
Acabando por se pronunciar no sentido de que as efetivas possibilidades de reintegração profissional do sinistrado circunscrever-se-iam a «atividades de formador ou funções de tipo administrativo de apoio técnico, desde que não exijam esforço físico persistente ao nível da bipedestação, locomoção, subida e descida de escadas, transferência de cargas e condução persistente de veículos automóveis», conclui-se, a final, ser impossível a reconversão do sinistrado em relação ao posto de trabalho que ocupava à data do acidente.
D) Ficha de aptidão para o trabalho, com data de 18-02-2023:
Resulta deste documento que o médico do trabalho considerou o sinistrado temporariamente inapto para a função habitual e que recomendou a correção das condições de trabalho e, ainda, a não execução, pelo sinistrado, das seguintes tarefas e movimentos: subir/descer escadotes/escadas; permanência prolongada em pé (mais de 30 minutos); suportar carga manual com peso superior a 5 Kg; movimentos repetitivos com os membros superiores; e assunção de posições incorretas sobre a acoluna lombar.
E) Relatório de exame por junta médica, datado de 29-09-2023:
Considerando as respostas aos quesitos e o laudo final, retira-se deste meio de prova que os peritos que intervieram na junta médica, por unanimidade, entenderam que não existe agravamento do quadro sequelar decorrente do acidente e que o sinistrado mantém a IPP de 16,05% que lhe foi anteriormente atribuída.
F) Depoimento da testemunha arrolada pelo sinistrado, ouvida em 28-11-2023:
A testemunha ouvida, BB, colega de trabalho do sinistrado desde 2008, prestou um depoimento que se nos afigurou sincero, espontâneo e credível. Esta testemunha esclareceu as funções que o posto de trabalho ocupado pelo sinistrado acarreta (coincidentes com as que foram indicadas no parecer técnico do IEFP) e foi muito clara ao afirmar que, desde 2021, o sinistrado nunca mais esteve bem e que não consegue desempenhar as tarefas que diariamente têm de fazer, como subir escadotes e escadas, pegar em pesos, realizar cargas e descargas de material e equipamento, estar em pé durante quase todo o tempo diário de trabalho e que atualmente só consegue varrer e limpar, originando, inclusive, que a empregadora se visse obrigada a contratar outro trabalhador para realizar as funções que o sinistrado não consegue.

Estes são, assim, todos os meios probatórios constantes dos autos.
Decidamos.
O quadro doloroso sofrido desde 2021 já consta provado no ponto 18 dos factos provados.
Todavia, aí é referido que tais dores apenas tornam muito difícil o desempenho das funções mencionadas em 8 a 16.
No entanto, após ouvirmos o genuíno depoimento privilegiado do colega do sinistrado que afirmou que a partir de 2021 «era uma correria…era fisioterapia…era médicos»; «ele não conseguia fazer o trabalho»; «ele tentava fazer as coisas, ai… ai…ai… ai… e tinha que se retirar, não conseguia», afigura-se-nos ter resultado demonstrado, que as dores sentidas incapacitavam (e não apenas dificultavam) a execução das funções mencionadas nos pontos 8 a 16.
Assim sendo, não se justifica aditar qualquer ponto sobre o surgimento do quadro doloroso porque o mesmo já consta do elenco dos factos provados, mas impõe-se a alteração do ponto 18 que passará a ter a seguinte redação:
- Desde setembro de 2021 o Autor passou a ter dores muito intensas na coluna, que irradiam para membros inferiores e superiores e que o incapacitam do desempenho das funções mencionadas em 8 a 16.

Entende também o recorrente que deveria ter ficado provado que as sequelas decorrentes do acidente sofreram agravamento.
O tribunal a quo, no ponto 25 do elenco dos factos provados, deu por provado que atualmente o sinistrado não apresenta agravamento do quadro sequelar, que mantém a IPP atribuída, mas que apresenta alterações que estão descritas no exame singular realizado no GML e no auto de exame por junta médica e que são especificamente as seguintes:
- Ráquis: contratura da musculatura paravertebral dorso-lombar bilateralmente, mais acentuada à esquerda; referência a dor à palpação dos processos espinhosos dorsolombares; limitação da extensão e inclinação laterais e rotações mais evidentes para a esquerda; ligeiro défice de força muscular grau 4+bilateral; Lasegue e Bragard aparentemente negativos.
Tórax: referência a dor á compressão laterolateral do tórax.
(…)
… o examinando referiu dores em todos os segmentos da coluna vertebral, principalmente a nível cervical e lombar; dor referida à mobilização da coluna lombar; refere parestesias das mãos e das coxas, exibindo tremor dos membros (principalmente dos membros superiores); Laségue e Bragard negativos bilateralmente.
(…)
… Revela compromisso ligeiro da raiz de S1 direita, sem relação com o evento traumático, uma vez que existe inadequação entre a sede do traumatismo/da lesão e o quadro sequelar atual.
O conteúdo deste ponto contém uma amálgama de questões (jurídicas) decidendas e de factos concretos.
Urge corrigir tal situação.
Entendemos que tendo em consideração o que consta dos referidos exames periciais (perícia singular realizada no GML e junta médica), concordantes quanto à descrição das sequelas atuais, mas divergentes quanto ao nexo causal entre as alterações constatadas e o acidente, dever-se-á alterar o conteúdo do aludido ponto, por forma a que apenas conste do mesmo a descrição das sequelas/alterações que a prova com conhecimentos técnicos que o julgador não possui declarou como existentes. Nessa matéria, a prova pericial é harmoniosa e consistente.
Por conseguinte, o ponto 25 passará a ter a seguinte redação:
- Atualmente o Autor apresenta as seguintes sequelas/alterações [descritas no auto de exame singular (fls. 95v) e no auto de junta médica (fls. 123)]:
Ráquis: contratura da musculatura paravertebral dorso-lombar bilateralmente, mais acentuada à esquerda; referência a dor à palpação dos processos espinhosos dorsolombares; limitação da extensão e inclinação laterais e rotações mais evidentes para a esquerda; ligeiro défice de força muscular grau 4+bilateral; Lasegue e Bragard aparentemente negativos.
Tórax: referência a dor á compressão laterolateral do tórax.
(…)
… o examinando referiu dores em todos os segmentos da coluna vertebral, principalmente a nível cervical e lombar; dor referida à mobilização da coluna lombar; refere parestesias das mãos e das coxas, exibindo tremor dos membros (principalmente dos membros superiores); Laségue e Bragard negativos bilateralmente.
(…)
… Revela compromisso ligeiro da raiz de S1 direita.
Quanto à decisão sobre se o sinistrado mantém a IPP anteriormente atribuída ou se ocorreu agravamento, a mesma será apreciada na fundamentação de direito que apresentaremos mais adiante – cf. acórdão desta Secção Social de 16-12-2021 (Proc. n.º 59/20.4T8BJA.E1), acessível em www.dgsi.pt.

Reclama igualmente o sinistrado para que fique a constar no conjunto dos factos provados que não se encontra em condições de desempenhar as tarefas/funções que constituem o núcleo essencial do seu posto de trabalho, designadamente que não pode: executar tarefas que impliquem subir e descer escadotes/escadas, permanecer prolongadamente em pé (mais de 30 min), suportar carga manual com peso superior a 5 kg, realizar movimentos repetitivos com os membros superiores e assumir posições incorretas sobre a coluna lombar e que, por motivos de segurança no trabalho e saúde ocupacional, está afetado de IPATH.
Ora, atendendo aos meios probatórios produzidos, destaca-se o seguinte:
- A testemunha ouvida declarou que o sinistrado não consegue realizar as tarefas profissionais diárias habituais como subir e descer escadas/escadotes/andaimes, permanecer em pé mais durante o horário de trabalho, suportar os equipamentos e materiais que usam e que são pesados, usar o berbequim para furar paredes e por aí fora, tanto que teve de ser contratado outro trabalhador devido à incapacidade revelada pelo sinistrado para executar as tarefas do seu posto de trabalho. A única tarefa que ele consegue fazer, de acordo com a testemunha, é varrer e limpar.
- Na ficha de aptidão para o trabalho, datada de 18-02-2023, também é expressamente referido que o sinistrado não pode executar as seguintes tarefas e movimentos: subir/descer escadotes/escadas; permanecer prolongadamente em pé (mais de 30 minutos); suportar carga manual com peso superior a 5 Kg; realizar movimentos repetitivos com os membros superiores; e assumir posições incorretas sobre a coluna lombar.
- Por fim, no parecer técnico elaborado pelo IEFP entendeu-se que as exigências físicas que o posto de trabalho do sinistrado requer são incompatíveis com as incapacidades que o sinistrado aparenta atualmente, tendo ainda em consideração motivos de segurança no trabalho e saúde ocupacional. E concluiu-se que o mesmo não deve realizar atividades que «exijam esforço físico persistente ao nível da bipedestação, locomoção, subida e descida de escadas, transferência de cargas e condução persistente de veículos automóveis»-
É certo que no exame por junta médica, por unanimidade, os peritos divergiram do entendimento manifestado na prova anteriormente mencionada.
Vejamos os quesitos que relevam e as respostas dadas pela junta médica:
Quesito 4.º apresentado pelo sinistrado: O sinistrado de entre as suas funções habituais de técnico de refrigeração e climatização, se pode pegar, levantar e carregar aos ombros equipamentos de ar condicionado, bombas de calor, recuperadores de calor, solar térmicos e afins, com pesos superiores a 30 Kg, 40Kg, 50 Kg e até 100 Kg ?
Resposta: Sim.
Quesito 5.º apresentado pelo sinistrado: O sinistrado de entre as suas funções habituais de técnico de refrigeração e climatização, carregando aos ombros os equipamentos de ar condicionado e afins, acima referidos com pesos superiores a 30 Kg, 40Kg, 50 Kg e até 100 Kg, se pode subir andaimes, escadas e escadotes, com cerca de 2 a 3 metros de altura, a fim de fixar os braços, em suportes próprios, nas paredes os referidos equipamentos ?
Resposta: Compromisso ligeiro crónico da raiz de S1, à direita.
Quesito 6.º apresentado pelo sinistrado: O sinistrado de entre as suas funções habituais de técnico de refrigeração e climatização, se pode proceder à abertura de roços no solo, nas paredes e no tecto, com utilização de martelo e escopro, tendo para tanto que subir andaimes, escadas e escadotes, com cerca de 2 a 3 metros de altura ?
Resposta: Não existe agravamento do quadro sequelar (mantém IPP prévia).
Quesito 7.º apresentado pelo sinistrado: O sinistrado de entre as suas funções habituais de técnico de refrigeração e climatização, se pode efetuar a soldadura da tubagem de cobre, com a utilização de grupo de soldadura e maçarico tendo para tanto que subir andaimes, escadas e escadotes, com cerca de 2 a 3 metros de altura ?
Resposta: Mantém a IPP prévia.
Ora, do exposto resulta manifesto que as respostas dadas pelos peritos médicos em nada contribuem para o esclarecimento das questões que lhes foram colocadas, pois os peritos não só não respondem diretamente e de forma precisa ao que lhes é perguntado, como quando o fazem limitam-se a responder laconicamente “Sim”.
Deste modo, ponderando o peso das provas, o concreto exame por junta médica é um meio de prova muito débil para dar como provado ou não provado os aspetos fácticos que estão sob análise.
Para o efeito, entendemos, pois, que não releva este meio de prova.
Também não há fundamento para anular a decisão e mandar repetir o exame por junta médica, pois tal constituiria um ato inútil e, como tal, proibido por lei – cf. artigo 130.º do Código de Processo Civil, aqui aplicável subsidiariamente -, dado que existem meios probatórios suficientemente consistentes nos autos (os que acima referimos) para que se decida, em consciência, que resultou provado que devidos às sequelas de que é atualmente portador o sinistrado:
- não pode executar tarefas que impliquem subir e descer escadotes/escadas/andaimes;
- não pode permanecer em pé mais de 30 minutos;
- não pode suportar carga manual com peso superior a 5 Kg;
- não pode fazer movimentos repetitivos com os membros superiores;
- não pode assumir posições incorretas sobre a coluna lombar.
Destarte, adita-se ao elenco dos factos provados o ponto 26, com o seguinte teor:
- Devido às sequelas de que atualmente é portador, o sinistrado não pode executar tarefas que impliquem subir e descer escadotes/escadas/andaimes; não pode permanecer em pé mais de 30 minutos; não pode suportar carga manual com peso superior a 5 Kg; não pode fazer movimentos repetitivos com os membros superiores; não pode assumir posições incorretas sobre a coluna lombar.
No que respeita à visada colocação no acervo fáctico provado de que o sinistrado está afetado de incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual (IPATH), trata-se de matéria de direito, que será, mais adiante apreciada – cf. acórdão desta Secção Social de 25-05-2023 (Proc. n.º 2987/19.0T8STR-A.E1), consultável em www.dgsi.pt.

Concluindo, a impugnação da matéria de facto deduzida no recurso procede parcialmente.
*
V. Enquadramento jurídico
Pretende o recorrente/sinistrado que a incapacidade inicialmente fixada seja alterada em função do agravamento das sequelas decorrentes do acidente, designadamente requer que seja reconhecido que está afetado de uma IPP de 29,445% (19.63% x 1,5) com IPATH.
Vejamos.
O sinistrado sofreu um acidente de trabalho no dia 22-02-2018, que consistiu numa queda num vão de escadas, tendo sofrido traumatismo da coluna e hematórax direito.
Em consequência desse acidente foi-lhe atribuída uma IPP de 16,05%, desde 16-08-2018, em função das seguintes sequelas:
· Tórax: Cicatriz infra-axilar direita de dreno torácico com 2cm, dolorosa à palpação. Dor à compressão lateral do tórax. Simetria na expansão torácica.
· Ráquis: rigidez moderada da coluna lombar. Dor à palpação das apófises espinhosas na transição dorso-lombar. Dor lombar na flexão da anca com joelho em extensão. Sem défice de força muscular.
· Reflexos presentes e simétricos. Contratura para vertebral direita.
Desde setembro de 2021, o sinistrado passou a ter dores muito intensas na coluna, que irradiam para membros superiores e inferiores e que o incapacitam de desempenhar as funções/tarefas do seu posto de trabalho habitual, que se encontram descritas nos pontos 8 a 16 dos factos assentes.
Especificamente, o sinistrado deixou de conseguir realizar as seguintes tarefas:
i. Montagem de equipamentos de ar condicionado, designadamente carga e descarga dos equipamentos, unidade exterior (+- 40kg) e unidade interior (+-15kg), ainda que seja um trabalho de equipa realizado com pelo menos mais um trabalhador;
ii. Montagem e equipamentos de Bombas de calor, designadamente carga e descarga de equipamentos, unidade exterior (+- 50Kg) e unidade interior (+- 20Kg), ainda que seja um trabalho feito em equipa conjuntamente com pelo menos mais um trabalhador;
iii. Montagem de equipamentos solar térmicos, designadamente carga e descarga de equipamentos, coletor solar (+-30kg) e depósito (+-100kg), ainda que seja um trabalho feito em equipa conjuntamente com pelo menos mais um trabalhador;
iv. Montagem de equipamentos solar termodinâmicos, designadamente carga e descarga de equipamentos, painel solar (+-15kg) e bloco (+-25kg), ainda que seja um trabalho feito em equipa conjuntamente com pelo menos mais um trabalhador;
v. Montagem de equipamentos de ventilação, designadamente carga e descarga de equipamentos (+-30Kg), ainda que seja um trabalho feito em equipa conjuntamente com pelo menos mais um trabalhador;
vi. Montagem de recuperadores de calor, designadamente carga e descarga de equipamento (+-200kg), ainda que seja um trabalho feito em equipa conjuntamente com pelo menos mais um trabalhador;
vii. Montagem de equipamentos fotovoltaicos, designadamente carga e descarga de painéis (+-20kg cada painel).
viii. Pegar, levantar e carregar aos ombros os equipamentos, subir andaimes, escadas ou escadotes com cerca de 2 metros de altura, a fim de serem afixados em suportes próprios, ainda que seja um trabalho feito em equipa conjuntamente com pelo menos mais um trabalhador;
ix. Aplicar suportes para instalação dos equipamentos, nos tetos e/ou nas paredes, utilizando para o efeito um berbequim, o que implica a subida de andaimes, escadas e escadotes, com cerca de 2 a 3 metros de altura, ainda que seja um trabalho feito em equipa conjuntamente com pelo menos mais um trabalhador;
x. Proceder à abertura de roços no solo, nas paredes e tetos, com utilização de martelo de escopro, o que implica a subida de andaimes, escadas e escadotes, com cerca de 2 a 3 metros de altura, ainda que seja um trabalho feito em equipa conjuntamente com pelo menos mais um trabalhador;
xi. Efetuar soldadura da tubagem de cobre, com a utilização de grupo de soldadura e maçarico, o que implica, por vezes, ter de subir andaimes, escadas e escadotes, com cerca de 2 a 3 metros de altura;
xii. Efetuar ligações mecânicas e elétricas, o que implica, por vezes, ter que subir andaimes, escadas e escadotes, com cerca de 2 a 3 metros de altura;
xiii. Efetuar ligações mecânicas e elétricas, o que implica, por vezes, ter que subir andaimes, escadas e escadotes, com cerca de 2 a 3 metros de altura;
xiv. Efetuar a desidratação do circuito e vácuo, com utilização de botija de fluido frigorigéneo, bomba de vácuo e manómetros.
Do elenco de tarefas diárias que normalmente realizava, o sinistrado apenas se mostra capaz de realizar uma delas: a limpeza dos espaços com utilização de vassoura, pá e aspirador – cf. pontos 17 e 19 dos factos assentes.
Ora, exercendo o sinistrado as funções de técnico de refrigeração e climatização, manifestamente as tarefas de limpeza não se podem considerar que são as que caracterizam o concreto posto de trabalho.
As tarefas de limpeza são tarefas meramente secundárias ou subsidiárias e não integram, neste caso, a essencialidade da profissão.
Aliás, consultando o “Catálogo Nacional de Qualificações”, acessível em https://catalogo.anqep.gov.pt/, do mesmo resulta que o técnico de refrigeração e climatização é aquele que organiza, coordena e executa a instalação e manutenção de refrigeração, climatização, e outros sistemas técnicos de edifícios de acordo com as normas de higiene, segurança e ambiente.
Por outras palavras, a realização de limpezas dos espaços de trabalho não integra o conteúdo funcional da profissão.
As funções que integram o a profissão habitual do sinistrado são as que se mostram descritas nos pontos 8 a 16 e que o sinistrado não consegue realizar devido às sequelas que atualmente possui.
Tais sequelas são:
· Ráquis: contratura da musculatura paravertebral dorso-lombar bilateralmente, mais acentuada à esquerda; referência a dor à palpação dos processos espinhosos dorsolombares; limitação da extensão e inclinação laterais e rotações mais evidentes para a esquerda; ligeiro défice de força muscular grau 4+bilateral; Lasegue e Bragard aparentemente negativos.
· Tórax: referência a dor á compressão laterolateral do tórax.
· Dores em todos os segmentos da coluna vertebral, principalmente a nível cervical e lombar; dor referida à mobilização da coluna lombar; parestesias das mãos e das coxas, com exibição de tremor dos membros (principalmente dos membros superiores);
· Compromisso ligeiro da raiz de S1 direita.
Estas sequelas impedem o sinistrado de executar tarefas que impliquem subir e descer escadotes/escadas/andaimes; não pode permanecer em pé mais de 30 minutos; não pode suportar carga manual com peso superior a 5 Kg; não pode fazer movimentos repetitivos com os membros superiores; não pode assumir posições incorretas sobre a coluna lombar.
Enfim, o sinistrado, por virtude das sequelas descritas, não pode retomar o exercício das funções correspondentes ao concreto posto de trabalho habitual.
Acresce que não há qualquer elemento nos autos que impeça que se estabeleça o nexo causal entre o acidente e as sequelas.
Desde logo, as lesões resultantes da queda no vão de escadas localizaram-se na coluna e no hematórax direito.
As sequelas inicialmente identificadas situam-se também, na coluna e no tórax, especialmente do lado direito.
Finalmente, as sequelas atuais incidem sobre as mesmas zonas do corpo.
Consideramos assim estabelecido o nexo causal entre as sequelas e o acidente de trabalho, que, aliás, foi reconhecido pelo perito do GML, na sequência dos relatórios médicos e exames complementares de diagnóstico anteriormente realizados.
E encontrando-se o sinistrado, em virtude das mencionadas sequelas, totalmente incapaz de retomar o seu posto de trabalho, deve ser-lhe atribuída uma IPATH desde a apresentação do pedido de revisão.
Dito de outro modo, tendo ocorrido uma alteração da situação clínica que determina uma incapacidade permanente absoluta, isto é, total, para o exercício do trabalho habitual do sinistrado, a mesma tem de ser declarada no âmbito do presente incidente de revisão.
Analisemos agora se também ocorreu alteração da incapacidade residual para o exercício de outras profissões compatíveis.
Compulsados os laudos periciais que constam dos autos, constatamos que tanto o perito do GML como a junta médica enquadraram as sequelas no capítulo I, 1.14 b) e 2.3 b) da Tabela Nacional de Incapacidades (TNI), aprovada pelo Decreto-Lei n.º 352/2007, de 23 de outubro, atribuindo-lhe o mesmo grau de desvalorização.
No entanto, o perito do GML entendeu, ainda, que as referidas sequelas também devem ser enquadradas no capítulo III, 7, da TNI.
Ora, o capítulo III, 7, diz respeito às nevralgias e radiculalgias persistentes e segundo a localização e a impotência funcional, e podem conferir um coeficiente de desvalorização entre 0,10 e 020.
Pelo que conseguimos apurar a nevralgia é uma dor muito intensa que ocorre num ou mais nervos do corpo.[2]
O Dicionário Enciclopédico Koogan Larousse Seleções, Vol. 3, Capítulo Medicina, pág. 287, da editora “Seleções do Reader’s Digest”, 1981, define nevralgia como sendo uma dor, geralmente de origem mal determinada, com localização num nervo ou que se transmite ao longo de um nervo.
Relativamente à radiculalgia, o Dicionário on line da Porto Editora refere que é uma «dor surda e contínua, entrecortada de violentos paroxismos, devido a irritação ou inflamação das raízes dos nervos cranianos ou raquidianos» - cf. https://www.infopedia.pt/dicionarios/lingua-portuguesa/radiculalgia.
Do exposto conclui-se que o capítulo III, 7, da TNI reconhece que o previsto quadro doloroso é uma sequela que diminui a capacidade geral de ganho do sinistrado.
Aliás, na TNI mostram-se previstas várias sequelas que correspondem a quadros dolorosos.
A título de exemplo:
Capítulo I: 2.2.b); 7.2.1. b); 8.2.3.; 8.5.1 a 8.5.5. (agravamento da incapacidade em face do quadro doloroso); 9.2.3 b); 15.2.3.;
Capítulo II: 1.4.6.; 1.5. a) e b);
Capítulo III: 1.2.2. nota 2;
Capítulo XII: 5.2.
Ora, retornando ao caso dos autos, se analisarmos as sequelas originais verificamos que o quadro doloroso ocorria essencialmente mediante palpação ou compressão, daí que não tenha sido atribuído nenhum coeficiente de desvalorização, pois não se considerou que existisse prejuízo funcional.
Todavia, ao analisarmos as atuais sequelas descritas, verificamos uma significativa alteração: dores em todos os segmentos da coluna vertebral principalmente a nível cervical e lombar; dor referida à mobilização da coluna lombar; parestesias das mãos e das coxas, com exibição de tremor dos membros (principalmente dos membros superiores).
E esta alteração/sequela (reconhecida pelo perito do GML e pela junta médica) por constituir um dano corporal que causa já prejuízo funcional deve ser enquadrada na TNI.
Acolhemos, assim, o enquadramento que o perito do GML fez da mesma no capítulo III, 7, da TNI.
Resumindo e concluindo, consideramos que o sinistrado está afetado de uma IPP de 29.445% (19,63% x 1,5).
A aplicação do fator de bonificação 1,5 decorre do disposto da instrução 5, alínea a) da TNI – cf. acórdão desta Secção Social de 16-03-2023 (Proc. n.º 5/19.8T8FAR.E1), publicado em www.dgsi.pt.
Concluindo, o sinistrado encontra-se afetado, desde a apresentação do incidente de revisão – cf. acórdão desta Secção Social de 02-03-2017 (Proc. n.º 809/09.0TTSTB.E1), acessível em www.dgsi.pt - de uma IPP de 29,445% com IPATH.
Aqui chegados, importa extrair, em função da incapacidade revista, a pensão que é devida ao sinistrado.
Para cálculo dessa pensão são ponderados exatamente os mesmos critérios que foram considerados aquando do cálculo da pensão inicial, isto é, o valor da pensão (revista) será o mesmo que seria obtido à data da alta para a incapacidade revista– cf. acórdão da Relação de Lisboa de 25-09-2019 (Proc. n.º 1306/04.5TTLSB.1-L1-4), consultável em www.dgsi.pt.
De acordo com esse cálculo obtém-se o valor de € 7.824,46, que resulta da seguinte fórmula: € 14.000 x (0,29445 x 0,20 + 0,50) = € 7.824,46.
Sucede, porém, que a pensão inicial foi obrigatoriamente remida e foi pago o respetivo capital de remição, pelo que, há que abater anualmente o montante da pensão já paga e que serviu de base ao cálculo do capital de remição, ou seja, o valor de € 1.572,90 – cf. acórdão desta Secção Social de 02-03-2017, anteriormente mencionado.
Por conseguinte, a pensão remanescente à data de apresentação do pedido de revisão é de € 6.251,56, valor obtido de acordo com a seguinte fórmula: € 7.824,46 - € 1.572,90 = € 6.251,56.
Sucede que ao valor obtido deverão ser aplicados os coeficientes de atualização como se a pensão estivesse a ser fixada desde o início, isto é, desde a data da alta.
Cita-se, pela relevância, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 03-03-2010 (Proc. n.º 14/05.4TTVIS.C2.S1), publicado na base de dados da dgsi:
«Acresce que a lei dos acidentes de trabalho, ao não estatuir acerca do modo como há-de ser calculada a pensão decorrente de incidente de revisão, remete-nos, inelutavelmente, para os critérios – ou fórmulas – que presidiram ao respetivo cálculo inicial, com exceção, naturalmente, do que emerja desse incidente quanto à capacidade de ganho do sinistrado. Vale o exposto por dizer que para efeitos do cálculo da pensão decorrente de incidente de revisão – quando do mesmo decorra, naturalmente, alteração da capacidade de ganho do sinistrado – são ponderados, exatamente, os mesmos critérios que o foram aquando do cálculo inicial, fixando-se a nova pensão (revista) tal-qual o fosse à data da alta- Cfr., Acórdãos do STJ de 25.03.1983 e de 17.06.1983, publicados, respetivamente, no BMJ n.º 325.º, pág. 499, e BMJ n.º 328.º, pág. 458.. E, por respeito ao princípio da unidade do sistema jurídico, constante do art. 9.º, do Código Civil, se a pensão revista deve ser calculada do mesmo modo que o foi a pensão inicial então os coeficientes de atualização devem sobre a mesma incidir como se estivesse a ser fixada desde o início, não obstante apenas ser devida desde a data da sua alteração.
Do entendimento diverso – isto é, do entendimento de acordo com o qual a atualização só deveria incidir sobre a pensão revista a partir do momento em que esta fosse devida – resultaria a incongruência de, após vários anos desde a data da fixação inicial da pensão, vir a ser fixada uma pensão revista que, na medida em que resultante do cálculo a que obedeceu a sua fixação inicial, não refletiria a desvalorização da moeda entretanto ocorrida. Aliás, de tal entendimento poderia mesmo resultar que, em casos de agravamento do estado do sinistrado com consequente atribuição de um coeficiente de desvalorização superior àquele que já era portador, lhe pudesse vir a ser fixada uma pensão inferior àquela que, até então, vinha percebendo (porque, entretanto, sujeita a atualizações), justamente em razão de o cálculo da pensão revista não refletir qualquer atualização dos fatores que para o efeito relevam.».
Posto isto, procedamos à atualização do valor da pensão calculada.
O sinistrado teve alta em 16-08-2018, logo a pensão (revista) estaria sujeita às seguintes atualizações:
- 1,60% em 2019 (Portaria n.º 23/2019, de 17 de janeiro, ou seja, a pensão atualizada em 2019 ascenderia ao valor de € 6.351,58 (€ 6.251,56 + € 100,02);
- 0.70% em 2020 (Portaria n.º 278/2020, de 4 de dezembro), ou seja, a pensão atualizada em 2020 alcançaria o valor de € 6.396,04 (€ 6.351,58 + € 44,46);
-em 2021 não foi publicada portaria de atualização.
- 1% em 2022 (Portaria n.º 6/2022, de 4 de janeiro), ou seja, a pensão atualizada seria no montante de € 6.460 (€ 6.396,04 + € 64,41).
Deste modo, à data do pedido de revisão (27-05-2022) o sinistrado, em função do agravamento da sua incapacidade, tem direito a receber uma pensão anual e vitalícia no valor de € 6.460.
Esta pensão remanescente deve ser atualizada anualmente, de forma automática e imediata, nos termos previstos pelas disposições conjugadas dos artigos 77.º, alínea d) da LAT e artigo 8.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 142/99, de 30 de abril.
Nos termos do disposto no artigo 67.º, n.ºs 3 e 5 da LAT, o sinistrado tem ainda direito a receber subsídio por situação de elevada incapacidade permanente, Este subsídio é fixado entre 70% e 90% de 12 vezes o valor de 1,1 IAS em vigor à data do acidente, tendo em conta a capacidade funcional residual para o exercício de outra profissão compatível.
Por conseguinte, o sinistrado tem direito a receber subsídio no valor de € 4.463,14, obtido de acordo com a seguinte fórmula: € 428,90[3] x 1.1 x 12 x ((0,29445 x 0,30 + 0,70) = € 4.463,14.
Sobre as quantias devidas ao sinistrado acrescem juros de mora, calculados à taxa legal, e devidos desde a data do pedido de revisão e até integral pagamento – cf., artigo 135.º do Código de Processo do Trabalho; acórdão desta Secção Social de 09-03-2016 (Proc. n.º 354/15.4T8BJA.E1) e acórdão da Relação de Coimbra de 12-04-2018 (Proc. n.º 135/16.8T9GRD.C1), ambos disponíveis em www.dgsi.pt.
-
Em jeito de conclusão, o recurso interposto deve proceder e a decisão recorrida terá de ser revogada.
As custas serão suportadas pela recorrida.
Nos termos previstos pelo artigo 120.º do Código de Processo do Trabalho, altera-se o valor da causa da causa para o montante de € 80.490,88 [(€ 6.460 x 11,769) + € 4.463,14)].
*
VI. Decisão
Nestes termos, acordam os juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora em julgar o recurso procedente e, em consequência, revogam a decisão recorrida, declarando em conformidade que o incidente de revisão procede e, como tal, determina-se que o sinistrado está afetado de uma IPP de 29,445% com IPATH, desde a apresentação do pedido de revisão, condenando-se a seguradora responsável no pagamento ao sinistrado:
a) de uma pensão anual e vitalícia no valor de € 6.460, que atualizará anualmente, de forma automática e imediata, nos termos do artigo 8.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 142/99, de 30 de abril;
b) do subsídio de elevada incapacidade permanente no valor de € 4.463,14;
c) de juros de mora sobre as mencionadas quantias, calculados à taxa legal em vigor e devidos desde a apresentação do pedido de revisão e até integral pagamento.
Custas pela recorrida.
Fixa-se o valor da ação em € 80.490,88.
Notifique.

Évora, 6 de junho de 2024
Paula do Paço
João Luís Nunes
Mário Branco Coelho
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[1] Relatora: Paula do Paço; 1.º Adjunto: João Luís Nunes; 2.º Adjunto: Mário Branco Coelho
[2] Consultámos, entre outros, os seguintes links: https://www.cuf.pt/saude-a-z/nevralgia; https://www.rededorsaoluiz.com.br/doencas/nevralgia; https://vidasaudavel.einstein.br/neuralgia-dor-de-origem-neurologica-afeta-a-qualidade-de-vida/.
[3] Valor do IAS à data do acidente (2018).