PROCESSO DE INSOLVÊNCIA
CASO JULGADO
DIREITO DE RETENÇÃO
Sumário

I - Tendo sido julgada extinta a impugnação apresentada pelo credor ao não reconhecimento do seu crédito nesta insolvência, por decisão transitada em julgado, não é possível substituir o despacho proferido nesse apenso por um outro que determinasse a sua notificação para nomear mandatário para defesa do seu crédito até decisão final, por a tal obstar a força do caso julgado.
II - Esgotando-se a defesa do crédito por decisão final transitada em julgado, crédito esse que tinha subjacente o direito de retenção invocado como justificação da ocupação da fração apreendida para a massa insolvente, tal decisão impõe-se com força de caso julgado, impedindo a invocação de tal motivo para a suspensão da entrega da fração.

Texto Integral

Processo n.º 635/10.3TYVNG-AE.P1- APELAÇÃO EM SEPARADO

**
Sumário (elaborado pela Relatora):
………………………………
………………………………
………………………………
**
I. RELATÓRIO
1. Banco 1..., SA requereu a insolvência de A..., SA em 5.08.2010.

2. Por sentença proferida em 6.06.2011, já transitada em julgado, foi decretada a Insolvência de A..., SA

3. Por sentença de 9.04.2013 foi aprovado o Plano de Insolvência.

4. O processo de insolvência foi declarado encerrado por decisão de 12.06.2013.

5. No apenso B- Reclamação de Créditos- foi apresentada em 15.05.2012 pelo Administrador de Insolvência a lista de créditos reconhecidos e não reconhecidos, não tendo reconhecido o crédito reclamado pelo aqui Apelante AA.

6. Nesse apenso B o aqui Apelante apresentou impugnação da lista apresentada pelo AI em 4.06.2012, tendo o seu mandatário renunciado ao mandato em 23.11.2013, renúncia essa que foi notificada ao aqui Apelante em 2.01.2014.

7. Ainda nesse apenso B veio a ser proferido despacho saneador em 18.10.2018, Ref. Citius 396576370 que no que diz respeito ao aqui Apelante decidiu o seguinte (transcrição):
“AA veio, na qualidade de credor, apresentar uma impugnação que consta de fls. 659 a 697.
Para o efeito, alegou, em síntese, que celebrou um contrato-promessa de várias fracções com a insolvente e que a título de sinal entregou o valor de €200.000,00, que aquela lhe deu quitação e com esta entregou-lhe a fracção prometida comprar.
Conclui que lhe deve ser reconhecido um crédito no montante de €400.000,00, devido pelo incumprimento definitivo imputável à insolvente.
Nos termos e para os efeitos previstos no art. 131º do CIRE, o Sr. AI veio responder à impugnação nos termos constantes a fls. 3283, no sentido do não reconhecimento do crédito.
O Ilustre Mandatário do Impugnante veio renunciar ao mandato e foi cumprido o disposto no art. 47º, nº1 e 2 do CPC, conforme resulta do aviso de recepção assinado e junto a fls. 3407, sendo que o embargante não constituiu mandatário, estando em discussão uma causa em que é obrigatória a constituição de advogado.
Ora, nos termos do art. 47º do CPC
1. A revogação e a renúncia do mandato devem ter lugar no próprio processo e são notificadas tanto ao mandatário ou ao mandante, como à parte contrária.
2. Os efeitos da revogação e da renúncia produzem-se a partir da notificação, sem prejuízo do disposto nos números seguintes; a renúncia é pessoalmente notificada ao mandante, com a advertência dos efeitos previstos no número seguinte.
3. Nos casos em que seja obrigatória a constituição de advogado, se a parte, depois de notificada da renúncia, não constituir novo mandatário no prazo de 20 dias:
d. Suspende-se a instância, se a falta for do autor ou do exequente;
e. O processo segue os seus termos, se a falta for do réu, do executado ou do requerido, aproveitando-se os atos anteriormente praticados.
f. Extingue-se o procedimento ou o incidente inserido na tramitação de qualquer ação, se a falta for do requerente, opoente ou embargante.
4. Sendo o patrocínio obrigatório, se o réu, o reconvindo, o executado ou o requerido não puderem ser notificados, é nomeado oficiosamente mandatário, nos termos do n.º 3 do artigo 51.º.
5. O advogado nomeado nos termos do número anterior tem direito a exame do processo, pelo prazo de 10 dias.
6. Se o réu tiver deduzido reconvenção, esta fica sem efeito quando for dele a falta a que se refere o n.º 3; sendo a falta do autor, segue só o pedido reconvencional, decorridos que sejam 10 dias sobre a suspensão da acção.
Com efeito, dispõe o art. 40º do CPC, o seguinte: 4. É obrigatória a constituição de advogado:
d. Nas causas de competência de tribunais com alçada, em que seja admissível recurso ordinário; e. Nas causas em que seja sempre admissível recurso, independentemente do valor;
f. Nos recursos e nas causas propostas nos tribunais superiores.
5. Ainda que seja obrigatória a constituição de advogado, os advogados estagiários, os solicitadores e as próprias partes podem fazer requerimentos em que se não levantem questões de direito.
6. Nas causas em que, não sendo obrigatória a constituição de advogado, as partes não tenham constituído mandatário judicial, a inquirição das testemunhas é efetuada pelo juiz, cabendo ainda a este adequar a tramitação processual às especificidades da
Ora, no caso em análise, atento o valor da impugnação, é admissível o recurso ordinário nos termos preceituados no art. 229º, nº1 do CPC.
Face ao exposto e estando em causa o segmento da norma constante do art. 47º, nº 3 al. c) do CPC, tendo sido o impugnante notificado para constituir novo mandatário no prazo de 20 dias, e não o tendo feito, determina-se a extinção do incidente/impugnação deduzida pelo alegado credor AA, por impossibilidade no prosseguimento da lide, ao abrigo do art. 277º, al. e) do CPC.
Custas do incidente a cargo do impugnante, fixando-se a taxa de justiça no mínimo legal.
Notifique.”
Este despacho foi notificado ao aqui Apelante em 23.10.2018 ( ref. Citius 397441624).

8. Em 26.11.2013 BB requereu a sua habilitação como cessionário do crédito reclamado pelo aqui Apelante, juntando escritura pública de cessão de créditos celebrada em 25.11.2013, que correu termos sob o apenso Q e no qual o aqui Apelante foi notificado, não tendo deduzido contestação.

9. Nesse apenso Q, que ficou suspenso a aguardar o desfecho do apenso B, veio a ser proferida sentença em 18.09.2021, Ref. Citius 427137935, transitada em julgado, com o seguinte teor:
“Relatório:
BB veio deduzir o presente incidente de habilitação de cessionário pedindo para ser habilitado no lugar de AA.
Por despacho de 7/7/2021 determinou-se a notificação das partes para as partes para se pronunciarem quanto ao indeferimento da pretensão do requerente.
O requerente veio aos autos, em 21/7/2021, dizer que é completamente falso que a mandatária subscritora desse requerimento alguma vez representou nestes autos de processo o Sr. AA, tendo existido um lapso na elaboração do Requerimento de Habilitação em que estão trocados os nomes de quem se estava a Habilitar (em vez de colocar o nome do Cessionário/ BB colocou o nome do Cedente / AA).
Existiu, assim, um erro processual que deve que ser ratificado e que deve produzir efeitos a partir da data em que o Requerimento de Habilitação deu entrada em Tribunal e o Requerente ser considerado Habilitado na reclamação de créditos e todos os actos praticados na reclamação ser considerados nulos e sem qualquer efeito e o Requerente assumir a posição processual que o Cedente detinha na reclamação à data da Habilitação.
Requer ainda que todos os actos praticados na reclamação após a cedência do referido crédito sejam declarados nulos e sem qualquer efeito, e os autos de reclamação prosseguirem até final.
* * * * *
* * * * *
O Tribunal é o competente em razão da nacionalidade, da matéria e da hierarquia.
O processo é o próprio e não enferma de nulidade que de todo o invalide.
As partes são dotadas de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas.
Não há outras nulidades, exceções, questões prévias ou incidentais que obstem ao conhecimento do mérito.
* * * * *
Fundamentação de Facto:
Compulsados os autos verificamos que:
- em 26/11/2013 foi apresentado requerimento inicial de habilitação de cessionário no qual consta que “AA vem deduzir habilitação do adquirente cessionário, BB” constando do mesmo que é pedido que o indicado adquirente ou cessionário BB seja habilitado como adquirente, assumindo todos os direitos e obrigações na Reclamação e Impugnação.
- por despacho de 3/12/2013 determinou-se a notificação da Massa Insolvente de A..., S.A., na pessoa do(a) Sr.(a) Administrador(a) de Insolvência e de BB. para, no prazo de 10 dias, contestarem, querendo, a habilitação (artºs. 356º, nº 1, alª a), e 293º, do C.P.C.).
- por despacho de 20/3/2014 foi determinado que os presentes autos de habilitação aguardassem o trânsito em julgado da decisão a proferir no apenso de reclamação de créditos, atentos os seus inerentes reflexos nesta sede, assim se evitando a prática de atos processuais inúteis.
- a Ilustre Mandatária do requerente requereu, em 24/5/2018, que fosse inserida nos autos de processo e na plataforma CITIUS nessa qualidade.
- em 14/12/2018 o requerente solicitou que fosse informado sobre se já encontrava devidamente habilitado, fazendo constar do seu requerimento que solicitava essa informação atendendo ao despacho proferido em 20/3/2014, transcrevendo esse despacho.
- por despacho de 18/12/2018 determinou-se que fosse o requerente informado que ainda não foi proferida sentença no incidente de reclamação, verificação e graduação de créditos.
- tal despacho foi notificado ao requerente em 28/12/2018
- em 18/9/2019 a Il. Mandatária do requerente apresentou um requerimento dizendo que, por consulta à plataforma Citius, verificou que figura na capa do apenso na qualidade de mandatária também de AA, mas nunca foi nem mesmo se encontra qualquer procuração forense junta a estes autos. Dada a surpresa a aqui mandatária analisou detalhadamente todo o processo e aí constatou que no Requerimento de Habilitação de Cessionário, por mero lapso trocou o Habilitante pelo Habilitado. Assim sendo requereu que lhe fosse dada a oportunidade de rectificar o processado”.
- por despacho de 16/10/2019 determinou-se que fosse retificada a petição inicial por forma a que como requerente passe a constar BB e como requerido passe a constar AA e a citação de AA nos termos determinados a fls. 16.
- tal despacho foi notificado ao requerente.
- em 28/10/2019 o requerente apresentou petição inicial retificada.
- em 21/11/2019 foi AA notificado para, querendo, contestar o incidente de habilitação.
- em 27/1/2020 determinou-se que os presentes autos aguardassem o trânsito em julgado da decisão a proferir no apenso de reclamação de créditos.
- no apenso de reclamação de créditos o Il. Mandatário do impugnante AA renunciou ao mandato.
- o Impugnante AA foi notificado dessa renúncia ao mandato, não tendo constituído novo mandatário.
- por essa razão, no despacho saneador proferido no apenso de reclamação de créditos foi proferida decisão de extinção do incidente/impugnação deduzida pelo alegado credor AA, por impossibilidade no prosseguimento da lide, ao abrigo do art. 277º, al. e) do CPC.
* * * * *
Fundamentação de direito:
Resulta da factualidade acima elencada que o requerente BB veio deduzir o presente incidente de habilitação de cessionário pedindo para ser habilitado no lugar de AA, sendo certo que na petição inicial existiu um lapso na identificação das partes, que veio a ser corrigido posteriormente.
Este tribunal, em 20/3/2014, determinou que os presentes autos de habilitação aguardassem o trânsito em julgado da decisão a proferir no apenso de reclamação de créditos, atentos os seus inerentes reflexos nesta sede, assim se evitando a prática de atos processuais inúteis, sendo certo que o requerente teve conhecimento desse despacho em data anterior a 14/12/2018 já que nesta data veio apresentar um requerimento transcrevendo o despacho proferido em 20/3/2014, despacho esse que determinava que a presente habilitação aguardasse o trânsito em julgado da decisão a proferir no apenso de reclamação de créditos.
Como é evidente o requerente apenas poderia ser habilitado neste processo no lugar de AA caso a este último viesse a ser reconhecido algum crédito sobre a insolvente.
A verdade é que, analisado o apenso de reclamação de créditos, verificamos que o referido AA veio apresentar uma impugnação à lista de credores reconhecidos pedindo que lhe fosse reconhecido um crédito no montante de €400.000,00 sobre a insolvente, à qual respondeu o Sr. administrador da insolvência.
O Ilustre Mandatário do impugnante AA renunciou nesse processo ao mandato sendo que o impugnante não constituiu mandatário.
Por essa razão, por decisão proferida em 18/10/2018 determinou-se a extinção do incidente/impugnação deduzida pelo alegado credor AA, por impossibilidade no prosseguimento da lide, ao abrigo do art. 277º, al. e) do Código de Processo Civil, sendo que essa decisão foi notificada ao impugnante AA em 23/10/2018.
O requerente BB vem a estes autos requer que todos os atos praticados na reclamação após a cedência do referido crédito sejam declarados nulos e sem qualquer efeito, e os autos de reclamação prosseguirem até final.
Considerando que o requerente invocou igualmente no apenso de reclamação de créditos tal nulidade a mesma será apreciada no apenso de reclamação de créditos.
Por outro lado, considerando que no apenso de reclamação de créditos foi já proferida decisão, transitada em julgado, que julgou extinta a impugnação apresentada por AA e, em consequência, não foi reconhecido ao mesmo qualquer crédito sobre a insolvente, não poderá o requerente BB ser habilitado no lugar desse impugnante, havendo que julgar improcedente a sua pretensão.
Com efeito, o mesmo não poderá ser habilitado no lugar de um credor quando a este não foi reconhecido qualquer crédito, sendo certo que, pelas razões que aduzimos no despacho proferido no apenso de reclamação de créditos na data de hoje, não se verifica a existência de qualquer nulidade nesse processo pelo facto de o, aqui, requerente não ter sido notificado de qualquer decisão nesses autos.
* * * * *
Decisão:
Pelo exposto, decide-se que a apreciação da nulidade dos atos praticados na reclamação de créditos será feita no apenso de reclamação de créditos considerando que o requerente arguiu a aludida nulidade nesse apenso.
Mais decide-se julgar improcedente o presente incidente de habilitação de cessionário porquanto se constata que ao requerido AA não foi reconhecido qualquer crédito sobre a insolvente, pelo que não pode o requerente ser habilitado no lugar desse impugnante.
Custas pelo autor.
Notifique e registe.”

10. No apenso AC- Liquidação- por despacho de 7.03.2023 o aqui Apelante foi notificado para proceder à entrega da fração AJ ao Administrador de Insolvência.

11. Nesse mesmo apenso o aqui Apelante veio requerer a sua manutenção na fração AJ por constituir casa morada de família, através de requerimento de 26.03.2023 (Ref. Citius 35186334), cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

12. Sobre esse requerimento recaiu decisão em 19.04.2023, Ref. Citius 447515144, na qual, no que diz respeito ao aqui Apelante, se decidiu o seguinte (transcrição):
“3) Por despacho de 7/3/2023 determinou-se que fosse notificado o reclamante AA – pessoalmente e na pessoa do seu Il. Mandatário – para que, em 10 dias, comprovar que procedeu à entrega ao Sr. administrador da insolvência da Verba 31 - Fração AJ, comprovando nos autos essa entrega, com a advertência que não o fazendo será determinada a sua entrega coerciva através de arrombamento e com recurso à utilização de força pública da autoridade policial competente.
Após a notificação desse despacho, veio, em 26/3/2023, esse reclamante informar que essa fração é a sua casa morada de família, da qual já pagou 200.000€ à Insolvente e a está a habitar muito antes da entrada em Tribunal do processo de insolvência, pois tem a posse desde 2008, altura em que para lá foi viver com os seus dois filhos.
Mais alega que o Requerente tem 68 anos, vive na sua casa morada de família, que pagou desde novembro de 2008, e não se conforma, com tamanha agressividade do Tribunal, 10 dias para provar a desocupação do imóvel, entendendo que estamos perante uma situação, que mais parece consubstanciar a conduta de abuso de direito, como consignado no art. 334 do C.C.
Alega ainda que o Requerente foi notificado do teor do despacho, através do qual só agora tomou conhecimento que tinha de abandonar a sua casa morada de família, e fração AJ, da qual habita desde 2008, com uma posse titulada, por contrato promessa, e pelo uso pois ele e os seus filhos, sempre habitaram, na fracção AJ, comprovando com os gastos dos contratos em seu nome de luz, internet e telefone, pelo que tendo o Requerente tomado conhecimento agora da situação jurídica, do seu imóvel ( casa morada de família ), vai agora deitar mão do seu direito de crédito, que não lhe foi dado, oportunidade até agora, com vista a salvaguardar os seus direitos, até porque é credor da massa insolvente.
O Requerente, inteirou-se agora de toda a sua situação, pelo que irá lutar, processualmente, com todos os meios ao seu dispor, razão pela qual requer desde já a este douto tribunal, que autorize a sua permanência e uso da fração AJ, até final.
Se assim não se entender, sempre este tribunal se deveria socorrer, das regras, do processo civil, nomeadamente no âmbito da acção executiva, devendo atender a que o legislador não procedeu à revogação ou alteração do regime processual excecional, e transitório aprovado, pela Lei nº1-A/ 2020 de 19 de Março, alterado pela Lei nº 13-B/ 2021 de 5 de Abril, cujo art.6º-E, nº7, al. b) suspendeu os actos a realizar em sede de processo executivo relacionados, com a concretização de diligências de entrega da casa morada de família.
* * * * *
O Banco 1..., S.A., Sucursal em Portugal, credor hipotecário, veio pronunciar-se no sentido de ser indeferido o requerido pelo mencionado AA.
Para tanto alegou que o despacho saneador proferido em 18 de outubro de 2018, no apenso B) dos presentes autos, decidiu julgar improcedente a impugnação ao não reconhecimento de crédito, apresentada pelo Requerente AA, sendo que tal despacho que não obteve qualquer reação tempestiva do referido requerente, pelo que há muito que transitou em julgado. Assim, o requerente não provou, em sede própria, a existência de um crédito que alegou ser detentor sobre a insolvente.
Por outro lado, já anteriormente, no apenso B, mais concretamente em 17 de março de 2019, através de requerimento com a referência citius 21905692, e em 29 de abril de 2019, através de requerimento com a referência citius 22334380, alegava, a essa altura, já não ser credor por ter alegadamente cedido o crédito a terceiro, tentando com isso, repristinar um direito de impugnação a um não reconhecimento, há muito extinto. Sobre tais situações este tribunal já há muito se pronunciou, nomeadamente através de despacho de 17.12.2019, com a referência citius 410377763.
Após ter sabido ter sido declarada como totalmente improcedente a reclamação do crédito que alegava ter, o requerente deveria, voluntariamente, ter entregado à massa insolvente o imóvel que ilegitimamente ocupava. Outro facto indesmentível, é que o requerente ocupa há 15 anos a fracção “AJ”, que pertence à massa insolvente da A..., e que por isso, na sua qualidade de proprietária tem, ao longo deste tempo todo, assumido o pagamento de IMI, condomínio e segurança, no valor de muitos milhares de euros.
* * * * *
Apreciando.
Compulsados os autos de reclamação de créditos verificamos que AA impugnou a lista de credores apresentada pelo Sr. administrador da insolvência.
Nesse apenso de reclamação de créditos foi, em 18 de outubro de 2018 proferido uma decisão com o seguinte teor:
“AA veio, na qualidade de credor, apresentar uma impugnação que consta de fls. 659 a 697.
Para o efeito, alegou, em síntese, que celebrou um contrato-promessa de várias fracções com a insolvente e que a título de sinal entregou o valor de €200.000,00, que aquela lhe deu quitação e com esta entregou-lhe a fracção prometida comprar.
Conclui que lhe deve ser reconhecido um crédito no montante de €400.000,00, devido pelo incumprimento definitivo imputável à insolvente.
Nos termos e para os efeitos previstos no art. 131º do CIRE, o Sr. AI veio responder à impugnação nos termos constantes a fls. 3283, no sentido do não reconhecimento do crédito.
O Ilustre Mandatário do Impugnante veio renunciar ao mandato e foi cumprido o disposto no art. 47º, nº1 e 2 do CPC, conforme resulta do aviso de recepção assinado e junto a fls. 3407, sendo que o embargante não constituiu mandatário, estando em discussão uma causa em que é obrigatória a constituição de advogado.
Ora, nos termos do art. 47º do CPC
1. A revogação e a renúncia do mandato devem ter lugar no próprio processo e são notificadas tanto ao mandatário ou ao mandante, como à parte contrária.
2. Os efeitos da revogação e da renúncia produzem-se a partir da notificação, sem prejuízo do disposto nos números seguintes; a renúncia é pessoalmente notificada ao mandante, com a advertência dos efeitos previstos no número seguinte.
3. Nos casos em que seja obrigatória a constituição de advogado, se a parte, depois de notificada da renúncia, não constituir novo mandatário no prazo de 20 dias:
d. Suspende-se a instância, se a falta for do autor ou do exequente;
e. O processo segue os seus termos, se a falta for do réu, do executado ou do requerido, aproveitando-se os atos anteriormente praticados.
f. Extingue-se o procedimento ou o incidente inserido na tramitação de qualquer ação, se a falta for do requerente, opoente ou embargante.
4. Sendo o patrocínio obrigatório, se o réu, o reconvindo, o executado ou o requerido não puderem ser notificados, é nomeado oficiosamente mandatário, nos termos do n.º 3 do artigo 51.º.
5. O advogado nomeado nos termos do número anterior tem direito a exame do processo, pelo prazo de 10 dias.
6. Se o réu tiver deduzido reconvenção, esta fica sem efeito quando for dele a falta a que se refere o n.º 3; sendo a falta do autor, segue só o pedido reconvencional, decorridos que sejam 10 dias sobre a suspensão da acção.
Com efeito, dispõe o art. 40º do CPC, o seguinte: 4. É obrigatória a constituição de advogado:
d. Nas causas de competência de tribunais com alçada, em que seja admissível recurso ordinário; e. Nas causas em que seja sempre admissível recurso, independentemente do valor;
f. Nos recursos e nas causas propostas nos tribunais superiores.
5. Ainda que seja obrigatória a constituição de advogado, os advogados estagiários, os solicitadores e as próprias partes podem fazer requerimentos em que se não levantem questões de direito.
6. Nas causas em que, não sendo obrigatória a constituição de advogado, as partes não tenham constituído mandatário judicial, a inquirição das testemunhas é efetuada pelo juiz, cabendo ainda a este adequar a tramitação processual às especificidades da
Ora, no caso em análise, atento o valor da impugnação, é admissível o recurso ordinário nos termos preceituados no art. 229º, nº1 do CPC.
Face ao exposto e estando em causa o segmento da norma constante do art. 47º, nº 3 al. c) do CPC, tendo sido o impugnante notificado para constituir novo mandatário no prazo de 20 dias, e não o tendo feito, determina-se a extinção do incidente/impugnação deduzida pelo alegado credor AA, por impossibilidade no prosseguimento da lide, ao abrigo do art. 277º, al. e) do CPC.
Custas do incidente a cargo do impugnante, fixando-se a taxa de justiça no mínimo legal.
Notifique.”
Esse despacho foi notificado ao reclamante em 23/10/2018, tendo transitado em julgado.
Antes o exposto, é inquestionável que nos presentes autos, por decisão transitada em julgado, foi declarada extinta a impugnação apresentada por AA.
Assim, ao mesmo não foi reconhecido qualquer crédito sobre a insolvente.
Por outro lado, é inquestionável que o requerente tem obrigação de saber que não tem qualquer título que legitime a sua posse sobre um imóvel apreendido para a massa insolvente.
Assim sendo, já há muitos anos que o requerente deveria ter entregue o imóvel que está ilegitimamente a ocupar porquanto, como dissemos, não dispõe de qualquer título que legitime essa posse.
Pede o requerente que este autorize a sua permanência e uso da fração AJ até final dizendo que irá lutar, processualmente, com todos os meios ao seu dispor.
Ora, o meio processual adequado ao reconhecimento de qualquer crédito do requerente sobre a insolvente era a reclamação de créditos e, como acima dissemos, na reclamação de créditos foi já proferida decisão transitada em julgado que julgou extinta a impugnação apresentada pelo mesmo, pelo que ao requerente não foi reconhecido qualquer crédito sobre a insolvente.
Assim, não existe qualquer fundamento para se autorizar a permanência do requerente na fração por si detida, devendo ser indeferido o requerido, a título principal, pelo mesmo.
O requerente pede, ainda, que este tribunal se socorra das regras, do processo civil, nomeadamente no âmbito da ação executiva, devendo atender a que o legislador não procedeu à revogação ou alteração do regime processual excecional, e transitório aprovado, pela Lei nº1-A/ 2020 de 19 de Março, alterado pela Lei nº 13-B/ 2021 de 5 de Abril, cujo art.6º-E, nº7, al. b) suspendeu os actos a realizar em sede de processo executivo relacionados, com a concretização de diligências de entrega da casa morada de família.
Quanto a esse pedido este tribunal adere na íntegra ao entendimento que foi defendido no acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 7/2/2023, processo 2397/12.0TBMAI-A.P1, disponível em www.dgsi.pt
Com efeito, tal como mencionado no aludido acórdão “A Lei nº 1-A/2020, de 19.3. [que estabelece medidas excecionais e temporárias de resposta à situação epidemiológica provocada pelo coronavírus SARS-CoV-2 e da doença COVID-19], na sua redação original no art. 7º veio consagrar, além do mais, a suspensão dos processos para a entrega de coisa imóvel arrendada [nº 11] até à cessação daquela situação excecional.
No nº 2 deste mesmo art. 7º previa-se expressamente que o regime deste artigo cessaria em data a definir por decreto-lei, no qual se declarasse o termo da situação excecional.
Porém, este art. 7º foi revogado pela Lei nº 16/2020, de 19.5[1], que aditou à Lei nº 1-A/2020 o art. 6º-A onde sob a epígrafe «regime processual transitório e excecional» se estatuiu o seguinte:
«1 - No decurso da situação excecional de prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infeção epidemiológica por SARS-CoV-2 e da doença COVID-19, as diligências a realizar no âmbito dos processos e procedimentos que corram termos nos tribunais judiciais, tribunais administrativos e fiscais, Tribunal Constitucional, Tribunal de Contas e demais órgãos jurisdicionais, tribunais arbitrais, Ministério Público, julgados de paz, entidades de resolução alternativa de litígios e órgãos de execução fiscal regem-se pelo regime excecional e transitório previsto no presente artigo.
(…)
6. Ficam suspensos no decurso do período de vigência do regime excecional e transitório: (…)
b) Os atos a realizar em sede de processo executivo ou de insolvência relacionados com a concretização de diligências de entrega judicial da casa de morada de família; (…)
7 - Nos casos em que os atos a realizar em sede de processo executivo ou de insolvência referentes a vendas e entregas judiciais de imóveis sejam suscetíveis de causar prejuízo à subsistência do executado ou do declarado insolvente, este pode requerer a suspensão da sua prática, desde que essa suspensão não cause prejuízo grave à subsistência do exequente ou um prejuízo irreparável, devendo o tribunal decidir o incidente no prazo de 10 dias, ouvidas as partes.»
Constata-se, pois, que o segmento normativo onde se previa que o regime transitório cessaria em data a definir por decreto-lei logo que se declarasse o termo da situação excecional foi expressamente revogado pela Lei nº 16/2020, de 19.5., daí resultando que a vigência do regime processual transitório e excecional previsto no art. 6º-A – da Lei nº 1-A/2020 - se manteria enquanto perdurasse a situação excecional de prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infeção epidemiológica por SARS-CoV-2 e da doença COVID-19.
Assim, ao invés do que sucedia na redação inicial da Lei nº 1-A/2020 em que o termo do regime excecional seria expressamente definido por decreto-lei, com a Lei nº 16/2020 este regime excecional passou a ter uma vigência temporária balizada pela manutenção da situação excecional de prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infeção epidemiológica por SARS-CoV-2 e da doença COVID-19.
Sucede que o regime processual transitório e excecional previsto na Lei nº 1-A/2020 foi depois alterado pela Lei nº 4-B/2021, de 1.2. e ainda pela Lei nº 13-B/2021, de 5.4, tendo passado a figurar neste último diploma no novo art. 6º-E com a seguinte redação na parte para aqui relevante:
«1 - No decurso da situação excecional de prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infeção epidemiológica por SARS-CoV-2 e da doença COVID-19, as diligências a realizar no âmbito dos processos e procedimentos que corram termos nos tribunais judiciais, tribunais administrativos e fiscais, Tribunal Constitucional, Tribunal de Contas e demais órgãos jurisdicionais, tribunais arbitrais, Ministério Público, julgados de paz, entidades de resolução alternativa de litígios e órgãos de execução fiscal regem-se pelo regime excecional e transitório previsto no presente artigo. (…)
7 - Ficam suspensos no decurso do período de vigência do regime excecional e transitório previsto no presente artigo: (…)
b) Os atos a realizar em sede de processo executivo ou de insolvência relacionados com a concretização de diligências de entrega judicial da casa de morada de família; (…)
8 - Nos casos em que os atos a realizar em sede de processo executivo ou de insolvência referentes a vendas e entregas judiciais de imóveis sejam suscetíveis de causar prejuízo à subsistência do executado ou do declarado insolvente, este pode requerer a suspensão da sua prática, desde que essa suspensão não cause prejuízo grave à subsistência do exequente ou dos credores do insolvente, ou um prejuízo irreparável, devendo o tribunal decidir o incidente no prazo de 10 dias, ouvida a parte contrária.»
É esta norma que se encontra ainda em vigor, sendo certo que a sua vigência se deverá manter apenas no decurso da situação excecional de prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infeção epidemiológica por SARS-CoV-2 e da doença COVID-19.
Ora, através da Resolução do Conselho de Ministros nº 73-A/2022, de 26.8 foi renovada a declaração da situação de alerta, no âmbito da pandemia da doença COVID-19, em todo o território nacional continental, até às 23:59 h do dia 30.9.2022.
Mas uma vez chegada esta data nenhuma decisão governamental prorrogou a situação de alerta, o que significa que desde as 00:00h do dia 1.10.2022 não vigora qualquer situação de alerta, de contingência, de calamidade ou de emergência relacionada com o quadro pandémico da doença COVID-19.
Aliás, no próprio Dec. Lei nº 66-A/2022, de 30.9., que determinou a cessação de vigência de decretos-leis publicados, no âmbito da pandemia da doença COVID-19, se consignou no respetivo preâmbulo que “face ao desenvolvimento da situação epidemiológica num sentido positivo, observado nos últimos meses, assistiu-se à redução da necessidade de aprovação de novas medidas e de renovação das já aprovadas.”
3. Neste contexto, deverá considerar-se, face à não renovação da situação de alerta pelo Governo a partir do dia 1.10.2022, que a Lei nº 1-A/2020, e consequentemente o regime processual excecional e transitório consagrado no seu art. 6º-E, cessou por caducidade.
Na verdade, desde que a revogação deixou de ser a forma prevista para a Lei nº 1-A/2020 deixar de vigorar nada impede que a cessação da sua vigência possa ocorrer por caducidade, o que se prende com o carácter temporário desta lei. (…)
4. Sucede que a Lei nº 1-A/2020 é um exemplo claro de lei temporária, uma vez que a sua vigência se encontra dependente da manutenção da situação excecional de pandemia. Se a situação de alerta, por decisão governamental, deixou de existir às 23:59h do dia 30.9.2022 entendemos, salvo melhor entendimento e de acordo com o que temos vindo a expor, que ocorre caducidade deste diploma.”
Este tribunal adere, como dissemos, na íntegra ao entendimento defendido nesse acórdão, considerando que cessou, por caducidade, a vigência da Lei nº 1-A/2020 e consequentemente do seu art. 6º-E.
Assim sendo, não existe qualquer fundamento para deferir o requerido pelo requerente. Tal como acima dissemos, o requerente está há anos a ocupar um imóvel apreendido para a massa insolvente, sabendo que não tem qualquer título que legitime essa posse e prejudicando, com essa atuação a massa e, em consequência, os seus credores.
Face e todo o exposto, indefere-se o requerido, determinando-se que o requerente seja novamente notificado – pessoalmente e na pessoa da sua Il. Mandatária – para, em 10 dias, proceder à entrega voluntária ao Sr. administrador da insolvência do imóvel que está a ocupar, comprovando nos autos essa entrega, com a advertência que não o fazendo será determinada a sua entrega coerciva através de arrombamento e com recurso à utilização de força pública da autoridade policial competente.
Notifique.”

13. O aqui Apelante voltou a apresentar pedido de suspensão de entrega da fração por requerimento de 8.05.2023, informando ter sido declarado insolvente por sentença de 28.11.2013.

14. Sobre tal requerimento veio a ser proferida decisão em 26.05.2023, Ref. Citius 448674507, na qual, no que diz respeito ao aqui Apelante, se decidiu o seguinte (transcrição):
Por despacho de 19/4/2023 determinando-se a notificação de AA – pessoalmente e na pessoa da sua Il. Mandatária – para, em 10 dias, proceder à entrega voluntária ao Sr. administrador da insolvência do imóvel que está a ocupar, comprovando nos autos essa entrega, com a advertência que não o fazendo será determinada a sua entrega coerciva através de arrombamento e com recurso à utilização de força pública da autoridade policial competente.
Esse despacho foi notificado a ambos em 20/4/2023.
Em 2/5/2023 esse requerente veio aos autos dizer que era sua intenção interpor recurso dessa decisão.
Em 3/5/2023 a sua Il. Mandatária apresentou substabelecimento.
Em 8/5/2023 veio AA requerer que continue a residir na casa de morada de família a qual foi autorizada em 2008, e à qual nunca ninguém se opôs até decisão final e requerer que se digne declarar a nulidade do despacho que determinou a extinção do incidente/impugnação deduzida pelo alegado credor AA, por impossibilidade no prosseguimento da lide, ao abrigo do art. º 277. e) do CPC., substituindo por um outro, e notificado o credor AA, a fim de constituir mandatário no Apenso – B e a Reclamação e Impugnação seguir os seus trâmites até decisão final.
Para tanto alegou que só agora tomou conhecimento que ao fim e ao final o crédito que cedeu por escritura pública e que correu os seus termos pelo Apenso - Q destes autos foi indeferido, motivo pelo qual só agora é que ficou devidamente inteirada de todos os contornos do crédito que reclamou e impugnou em devido tempo, mas que cedeu.
De facto, no ano de 2018 o Requerido foi notificado para constituir novo mandatário, no âmbito da Impugnação Apenso -B destes autos de processo, não o fez, mas informou estes autos que havido cedido o seu crédito a terceiro.
Apesar de notificado do supra referido despacho para constituir novo mandatário, encontrava-se impedido de o fazer dado que tinha apresentado a sua insolvência pessoal e veio a ser declarado insolvente, por Sentença proferida no dia 28.11.2013 pelo Tribunal Judicial de Vila Nova de Gaia -1.º Juízo Cível, que correu os seus termos sob o Proc.º n.º 9710/13.1 TBVNG.
O Requerido não constitui novo mandatário porque por via da sua insolvência Singular, este apenas, podia ser representado através da massa insolvente e o então administrador de insolvência é que tinha poderes para constituir mandatário e ao mesmo tempo defender o crédito, por isso comunicou á data ao Dr. CC, que comunicou com o Exmo. Sr. Administrador da Insolvência da A..., Dr. DD, no entanto desconhece o teor das comunicações entre os dois Administradores.
Portanto a notificação no Apenso -B, apenso de reclamação de créditos de 18 de Outubro de 2018, para o Requerido constituir novo mandatário é nula e sem qualquer efeito, nulidade que desde já fica arguida.
Devendo, para o efeito, este douto Tribunal substituir esse despacho por um outro, através do qual o agora Requerido seja notificado para a constituição de mandatário no Apenso -B com vista à defesa da sua Impugnação de créditos.
O Banco 1..., S.A., Sucursal em Portugal, credor hipotecário veio dizer que o requerente, já no requerimento que apresentou no apenso B dos presentes autos (reclamação de créditos), em 17 de Março de 2019, com o n.º de registo citius 21905692, veio juntar certidão de escritura de cessão de créditos, a favor de BB.
Perante a cessão de titularidade do alegado crédito por escritura já junta ao processo no seu apenso B, não assiste ao Requerente qualquer legitimidade processual com vista ao efeito pretendido porque, mesmo que o crédito existisse, o que nos presentes autos foi dado como não provado, o mesmo já não seria da titularidade do Requerente.
Apreciando.
Tal como este tribunal já referiu no despacho de 19/4/2023 compulsados os autos de reclamação de créditos verificamos que AA impugnou a lista de credores apresentada pelo Sr. administrador da insolvência.
Nesse apenso de reclamação de créditos foi, em 18 de outubro de 2018 proferido uma decisão com o seguinte teor:
“AA veio, na qualidade de credor, apresentar uma impugnação que consta de fls. 659 a 697.
Para o efeito, alegou, em síntese, que celebrou um contrato-promessa de várias fracções com a insolvente e que a título de sinal entregou o valor de €200.000,00, que aquela lhe deu quitação e com esta entregou-lhe a fracção prometida comprar.
Conclui que lhe deve ser reconhecido um crédito no montante de €400.000,00, devido pelo incumprimento definitivo imputável à insolvente.
Nos termos e para os efeitos previstos no art. 131º do CIRE, o Sr. AI veio responder à impugnação nos termos constantes a fls. 3283, no sentido do não reconhecimento do crédito.
O Ilustre Mandatário do Impugnante veio renunciar ao mandato e foi cumprido o disposto no art. 47º, nº1 e 2 do CPC, conforme resulta do aviso de recepção assinado e junto a fls. 3407, sendo que o embargante não constituiu mandatário, estando em discussão uma causa em que é obrigatória a constituição de advogado.
Ora, nos termos do art. 47º do Código de Processo Civil
1. A revogação e a renúncia do mandato devem ter lugar no próprio processo e são notificadas tanto ao mandatário ou ao mandante, como à parte contrária.
2. Os efeitos da revogação e da renúncia produzem-se a partir da notificação, sem prejuízo do disposto nos números seguintes; a renúncia é pessoalmente notificada ao mandante, com a advertência dos efeitos previstos no número seguinte.
3. Nos casos em que seja obrigatória a constituição de advogado, se a parte, depois de notificada da renúncia, não constituir novo mandatário no prazo de 20 dias:
d. Suspende-se a instância, se a falta for do autor ou do exequente;
e. O processo segue os seus termos, se a falta for do réu, do executado ou do requerido, aproveitando-se os atos anteriormente praticados.
f. Extingue-se o procedimento ou o incidente inserido na tramitação de qualquer ação, se a falta for do requerente, opoente ou embargante.
4. Sendo o patrocínio obrigatório, se o réu, o reconvindo, o executado ou o requerido não puderem ser notificados, é nomeado oficiosamente mandatário, nos termos do n.º 3 do artigo 51.º.
5. O advogado nomeado nos termos do número anterior tem direito a exame do processo, pelo prazo de 10 dias.
6. Se o réu tiver deduzido reconvenção, esta fica sem efeito quando for dele a falta a que se refere o n.º 3; sendo a falta do autor, segue só o pedido reconvencional, decorridos que sejam 10 dias sobre a suspensão da acção.
Com efeito, dispõe o art. 40º do CPC, o seguinte:
4. É obrigatória a constituição de advogado:
d. Nas causas de competência de tribunais com alçada, em que seja admissível recurso ordinário;
e. Nas causas em que seja sempre admissível recurso, independentemente do valor; f. Nos recursos e nas causas propostas nos tribunais superiores.
5. Ainda que seja obrigatória a constituição de advogado, os advogados estagiários, os solicitadores e as próprias partes podem fazer requerimentos em que se não levantem questões de direito.
6. Nas causas em que, não sendo obrigatória a constituição de advogado, as partes não tenham constituído mandatário judicial, a inquirição das testemunhas é efetuada pelo juiz, cabendo ainda a este adequar a tramitação processual às especificidades da
Ora, no caso em análise, atento o valor da impugnação, é admissível o recurso ordinário nos termos preceituados no art. 229º, nº1 do CPC.
Face ao exposto e estando em causa o segmento da norma constante do art. 47º, nº 3 al. c) do CPC, tendo sido o impugnante notificado para constituir novo mandatário no prazo de 20 dias, e não o tendo feito, determina-se a extinção do incidente/impugnação deduzida pelo alegado credor AA, por impossibilidade no prosseguimento da lide, ao abrigo do art. 277º, al. e) do CPC.
Custas do incidente a cargo do impugnante, fixando-se a taxa de justiça no mínimo legal.
Notifique.”
Esse despacho foi notificado ao reclamante em 23/10/2018.
O requerente vem agora a estes autos peticionar que seja declarada a nulidade do despacho que determinou a extinção do incidente/impugnação deduzida por si, por impossibilidade no prosseguimento da lide, ao abrigo do art. º 277. e) do CPC., substituindo por um outro, e notificado o credor AA, a fim de constituir mandatário no Apenso – B e a Reclamação e Impugnação seguir os seus trâmites até decisão final alegando que só agora teve conhecimento ao fim e ao final que o crédito que reclamou e que cedeu a terceiro foi indeferido e que, não obstante ter sido notificado para constituir novo Mandatário, não o poderia fazer porque havia sido anteriormente declarado insolvente, pelo que só o Sr. administrador da insolvência nomeado no seu processo de insolvência tinha poderes para constituir mandatário.
Ora, o requerente foi notificado no apenso de reclamação de créditos da renúncia ao mandato apresentada pelo seu mandatário para constituir novo mandatário, sendo advertido das consequências legais da não constituição de novo mandatário.
No prazo que lhe foi concedido para constituir novo mandatário não veio aos autos dar conta que havia sido declarado insolvente.
Posteriormente, em 23/10/2018 foi notificado da decisão que determinou a extinção do incidente/impugnação por si deduzida por impossibilidade no prosseguimento da lide, ao abrigo do art. 277º, al. e) do CPC.
Tendo o requerente sido notificado dessa decisão em 23/10/2018, a verdade é que não veio aos autos, no prazo de 10 dias, invocar a nulidade dessa decisão pelo facto de não poder constituir Mandatário por já anteriormente ter sido declarado insolvente.
Ora, nos termos do art. 199.º do Código de Processo Civil o prazo para a arguição da nulidade conta-se do dia em que a parte tiver sido notificada de qualquer termo do processo.
Assim sendo, a arguição neste momento dessa nulidade é totalmente extemporânea, pelo que se indefere a mesma.
Acresce que tal como refere o credor hipotecário, o requerente, em 17 de Março de 2019, veio ao apenso de reclamação de créditos juntar certidão de escritura de cessão de créditos, a favor de BB.
Assim sendo, tendo o mesmo cedido o crédito que havia reclamado nos autos, não lhe assiste qualquer legitimidade processual quanto ao requerido.
Quanto ao pedido de autorização para continuar a residir na casa de morada de família tal pedido foi já apreciado por despacho proferido em 19/4/2023 pelo que se esgotou o poder jurisdicional do tribunal quanto ao mesmo.
Notifique, sendo o requerente novamente notificado para, em 10 dias, proceder à entrega voluntária ao Sr. administrador da insolvência do imóvel que está a ocupar, comprovando nos autos essa entrega, com a advertência que não o fazendo será determinada a sua entrega coerciva através de arrombamento e com recurso à utilização de força pública da autoridade policial competente.”

15. Inconformado com aqueles dois despachos, AA interpôs recurso de apelação, formulando as seguintes
CONCLUSÕES
1 – Vem o presente recurso interposto da 3.ª Parte do Despacho a fls…, despacho de, com a Referência: ... que indefere a nulidade arguida do despacho de 23/10/2018 nos termos ali exarados e do despacho Referencia :448674507 que ordena a desocupação do imóvel onde vive há 15 anos e – casa de morada de família.
2 - O Recorrente não se conforma com o douto despacho ora em recurso proferido pelo Meritíssimo Juiz a quo, este andou muito mal, ao indeferir a nulidade do despacho de 18 de outubro de 2018, notificado ao Recorrente no dia 23/10/2018,
3 – O Recorrente foi declarado insolvente por sentença proferida, no dia 28.11.2013. no proc.º n.º 9710/13. 1TBVNG, a correr os seus termos pelo Tribunal Judicial de Vila Nova de Gaia, 1º Juízo Cível, conforme Doc.1 e 2, que ora se juntam e se dão por integralmente reproduzidos para os devidos e legais efeitos (Sentença de Insolvência e certidão de nascimento no qual consta o averbamentos).
4 - É nulo o despacho da extinção do incidente por impossibilidade superveniente da lide ao abrigo do artigo 277, al. e) não só porque está indevidamente fundamentado, mas também porque o Recorrente carecia de legitimidade para arguir a nulidade desse despacho, não basta conhecer tem que poder.
5 - O referido mandato caducou por via da sua insolvência pessoal á qual foi dada publicidade e averbada no seu assento de nascimento, “Declarado insolvente, nos termos da sentença proferida em 28 de Novembro de 2013”, pelo que a renúncia não tem qualquer efeito, quem deveria ter constituído novo mandatário e notificado para o efeito era o então Administrador de Insolvência. Doc. 1
6 - O Recorrente não tinha poderes para constituir mandatário, nem legitimidade para invocar a nulidade de qualquer despacho, é obrigatório a constituição de mandatário e ser parte legitima e neste caso seria a administrador de insolvência.
7 - O Recorrente sempre informou que tinha cedido o seu crédito, por isso sempre que notificado por este douto Tribunal, informou sempre que cedeu o crédito mais é do conhecimento deste douto Tribunal dado que correu os seus termos pelo Apenso – Q. conforme consta do documento n.º 3 , inclusive comunicou ao processo crime que o absolveu.
8 - O Recorrente só agora tomou conhecimento que o Incidente de Habilitação foi indeferido e que o crédito sempre esteve em seu nome. Decisão deste douto Tribunal.
9 - O crédito continua na titularidade do Recorrente, e só agora tomou conhecimento dos contornos processuais quanto á titularidade do crédito, que apesar de devidamente solicitada a substituição processual pelo cessionário não ocorreu.
10 – Tem o Recorrente o direito de assumir legalmente a sua posição processual como parte legitima, porque o crédito não foi apreendido á ordem da massa insolvente pessoal e o Incidente de habilitação de cessionário foi indeferido.
11 -Até porque o Contrato Promessa de Compra e venda foi declarado válido o seu crédito apesar de reclamado e impugnado ainda passou pelo crivo de um processo crime, no qual foi absolvido, que correu os seus termos pelo Tribunal Judicial da comarca do Porto – Juízo Central Criminal de Vila Nova de Gaia – Juiz 1 - CERTIDÃO que agora se junta e se dá reproduzida para os devidos e legais efeitos .Doc. 2
12 - O Recorrente desde o ano 2008 data assinatura do contrato promessa de compra e venda e pagamento do sinal que foi autorizado aí habitar com os seus filhos menores, passando a ser a casa de morada de família. Conforme ficou provado no acórdão proferido cuja certidão junta no documento, n.º 2
13 - Nunca o Recorrente foi interpelado por quem quer que fosse para abandonar a sua habitação, inclusive o Sr. Administrador de Insolvência da A... que sempre teve conhecimento.
14 – O Recorrente reúne os requisitos processuais exigidos por Lei , dado que, deixou de estar insolvente e foi-llhe concedida a exoneração do passivo restante, conforme conta da certidão de nascimento já junta como Doc.1 e não vai prescindir de exercer o seu direito e defender ao seu crédito, neste Apenso- B
15 - É parte legitimidade nestes autos de processo e arguiu a nulidade do despacho nestes autos, proferido em 18 de Outubro de 2018, em tempo, pelo confia que este mais Alto Tribunal venha declarar a arguida nula e revogar o despacho de extinção da instância e ordenar que seja substituído por um outro com vista a que o aqui Recorrente finalize a defesa do seu crédito porque o CONTRATO PROMESSA DE COMPRA E VENDA é válido.
16 - Ao Recorrente também não lhe pode ser assacada qualquer responsabilidade, pela falta de comunicação aos presentes autos que foi declarado insolvente, pois o Administrador que foi nomeado que tinha conhecimento da situação do crédito.
17 - Quando foi notificado no apenso de reclamação de créditos em 18 de outubro de 2018 limitou-se a responder e fê-lo conforme o previsto na Lei, apenas o que lhe era estritamente permitido, por razões legais, porque lhe estava vedado por Lei constituir novo mandatário para defesa do crédito, apesar de ter sido por si reclamado e impugnado, pois não tinha legitimidade para o fazer, mas também não pode ser prejudicado.
18 - Apenas se limitou a informar estes autos que tinha cedido o seu crédito e tinha conhecimento que tinha dado entrada em Tribunal o Incidente de Habilitação e juntou a escritura Pública conforme exarado na escritura pública de cessão de créditos.
19 – O Recorrente no seu requerimento apenas e só informou este douto, Tribunal do que consta do contrato de cessão de créditos e tão só.
20 - Pois outra posição não podia adoptar o Recorrente senão a de transmitir a estes autos de processo o que havia já efectuado anteriormente na escritura pública de Cessão de Créditos.
21- Razão pela qual Recorrente convicto que quem deviria figurar no Apenso de reclamação de créditos Apenso -B, destes autos sempre seria o Cessionário até porque consta da escritura e tinha conhecimento que o cessionário tinha dado entrada do incidente de habilitação. Doc. 3 Referência: 403 329 441 de 16.04.2019 e respectivo despacho que ora se junta e dá por integralmente reproduzido para os devidos e legais efeitos.
22 - Foi, pois, este douto Tribunal que obstaculizou a vontade do Recorrente que consta da escritura pública de cessão de créditos, mas para melhor enquadramento e entendimento deste mais ALTO TRIBUNAL de toda esta situação, desde já se requer que seja emitida certidão integral do Apenso – Q para instruir estas alegações de recurso.
23 -Presentemente o Recorrente encontra-se neste enredo jurídico processual.
24 - Neste momento pretende que lhe seja dada a oportunidade de defender o seu crédito que reclamou e impugnou em devido tempo e viu o seu nome devassado num julgamento em processo crime que correu os seus termos pelo Tribunal Judicial da Comarca do Porto – Juízo Central Criminal de Vila Nova de Gaia – Juiz 1, sob o n.º 8545/11.11.0TAVNG, transitado em julgado no dia 18.12.2017, certidão que foi enviada para estes autos de +processo no dia 21-12-2018.
25 – O Recorrente no supra-referido acórdão veio a ser absolvido bem com o seu co- arguido por consequência CONTRATO PROMESSA DE COMPRA E VENDA VÁLIDO.
26 - O Recorrente nunca receou, da veracidade, relativamente ao negócio que celebrou no ano de 2008, (contrato promessa de compra e venda) que sinalizou e que de imediato, começou habitar devidamente autorizado, passando esta a ser a sua casa morada família e á data dos seus dois filhos menores, até á presente data.
27 - Das razões esplanadas neste articulado de alegações de recurso deve o despacho que determinou a extinção da instância quanto ao sujeito/Recorrente e credor AA, anulado e ser proferido novo despacho para constituir mandatário no Apenso – B e a Reclamação e Impugnação seguir os seus trâmites até decisão final.
28 - Está na posse do imóvel desde 2008 autorizada e nunca foi perturbada e do Exmo. Sr. Administrador de Insolvência 15 (quinze) anos.
28 - O Tribunal não pode ordenar que o Recorrente desocupe a sua habitação, porque bem sabe que está a prejudicar a Massa Insolvente, não é precisa está afirmação no despacho, até porque foi vendida ao Recorrente e pagou o sinal de €200.000,00 (duzentos mil euros). . Contrato promessa válido.
29 - O Recorrente no dia 20 de Novembro do ano de 2008, comprou por contrato promessa de compra e venda – já junto aos presentes autos e pagou o sinal de 200.000,00 (duzentos mil euros) da fracção autónoma designada pela letra AJ – E02 correspondente a uma habitação tipo T4, no piso=, com entrada pelo n.º ..., compreendendo uma garagem individual no piso menos UM , assinalada pela respectiva letra, com entrada pelos n.º ...... e ......, ambas integradas no projecto imobiliário habitacional, em regime de condomínio fechado, denominado “QUINTA ...” em ..., Vila nova de Gaia, o qual é composto por seis blocos designados B, C, D, E, e G, descrito na Conservatória sob o n.º ... e inscrito na matriz sob o n.º .... Doc.1(reclamação de créditos apresentada no dia 03/08/2011 e impugnação no dia 04 de junho de 2012 e respectivos documentos juntos aos presentes autos com os respectivos articulados).
30 - O projecto imobiliário não se encontrava à data totalmente construído, mas a fracção prometida comprar pelo Recorrente, já se encontrava concluída, pelo que o Recorrente desde a data de celebração do referido contrato promessa, foi autorizado a habitar com os seus dois filhos menores, passando a usufruir da fracção prometida comprar, a pernoitar, tomando as suas refeições, recebendo seus familiares e amigos e convivendo com as pessoas que residem e trabalham nas imediações.
31 – Nessa altura o Recorrente que, em seu nome contratou o fornecimento dos serviços como electricidade, TV Cabo e gás tudo ainda no ano de 2008.
32 - E apenas e só no dia 07/03/2023 decorridos que foram todos estes anos nunca foi por qualquer meio interpelado para desocupar o imóvel/casa de morada de família,
33 – O Exmo. Sr. Administrador de Insolvência nunca o interpelou, para desocupar o imóvel, nunca lhe foi comunicado que o mesmo se encontrava apreendido à ordem da MASSA INSOLVENTE DA A....
34 - O Exmo. Sr. Administrador de Insolvência sempre teve conhecimento que o Recorrente habitava o imóvel, e nunca se opôs a tal, conforme se retira do acórdão proferido pelo Tribunal Judicial da Comarca do Porto – Juízo Central Criminal de Vila Nova de Gaia – Juiz 1, sob o processo n.º 8545/11.0TAVNG. Doc.2
35 - O Recorrente que tem a idade de 68 anos e que se encontra reformado, e recebe um valor líquido mensal de cerca de €1.250,00 (mil duzentos e cinquenta euros), desde Novembro de 2008 que habita o imóvel com autorização, portanto de boa-fé, á vista de toda á gente e com o conhecimento do Exmo. Sr. Administrador de Insolvência e á qual nunca se opôs.
36 - Ao longo destes anos o Recorrente nunca foi perturbado na posse do imóvel/casa de morada de família.
37 - O despacho que indefere que ao Recorrente a permanência na habitação/ casa de morada de família é de nulo aceita ser despejado conforme despacho de este douto Tribunal com recurso àforça policial, este despacho constitui um abuso de direito e viola aos basilares princípios constitucionais do direito á habitação a todos os cidadãos, sem excepção.
38 - Emerge da lei e é do entendimento da jurisprudência que tem vindo a ser adoptado pelos tribunais superiores que, pelo facto da Lei nº1-A/2020, introduzido pela Leinº 13-B/2021 de 05 de abril que ainda e encontra em vigor que visa a protecção à habitação, nomeadamente da casa de morada de família.
39 - A fracção que o Recorrente habita/comprou por contrato promessa de compra e venda e pagou o sinal no valor de €200.000,00 (duzentos mil euros) de imediato começou a habitar a fracção com os seus filhos à data menores, até à presente que é a sua casada de morada de família há cerca de 15 (quinze) anos.
40 - Mesmo que o Recorrente não estivesse protegido pela supra referida Lei, no despacho é não acautelado o direito há habitação e dar cumprimento ás disposições legais em vigor para o efeito e não ignorou-as sem mais não deu cumprimento ás disposições legais contidas no n.º 5 do art.º 150 do CIRE que remete para disposto no artigo 862 do CPC e segts,
41 - O Recorrente ao abrigo da supra referida Lei que está em vigor tem o direito de solicitar a suspensão da desocupação até decisão final na reclamação de créditos a correr os seus termos no Apenso -B destes autos.
42 - Por consequência o Recorrente almeja veemente a reposição da legalidade com a anulação deste despacho de desocupação do imóvel de forma voluntária ou através de recurso á força policial, por violação das normas contidas na Lei – Lei nº 1-A/2020, introduzido pela Lei nº 13-B/2021 de 05 de abril e também por do art.º 150 , n.º 5 do CIRE e Art.ºs 862, 863 e 866 todos do C.P.C.
43 - Devendo para tanto ser suspensa a entrega da casa de morada de família, até decisão final na defesa do seu crédito por violação das normas legais supra referidas.
44 - O despacho de 23/10/2018 que determinou a extinção da instância por falta de constituição de novo mandatário, é nulo porque viola os princípios gerais do contraditório art.º 3 do C.P.C., -
Concluiu, pedindo que se revogue os referidos despachos por violação das normais legais supra referidas e se ordene a sua substituição por um outro que determine a notificação do Recorrente para nomear mandatário no Apenso – B para defesa do seu crédito até decisão final e suspensa entrega da Fracção AJ casa de morada de família.

16. Foi apresentada resposta quer pelo credor Banco 1..., SA, Sucursal em Portugal, quer pelo Magistrado Ministério Público, pugnando pela manutenção do julgado.

17. Por despacho de 22.02.2024, Ref. Citius 457218719 não foi admitido o recurso interposto quanto ao despacho de 19.04.2023 por ser extemporâneo, apenas tendo sido admitido o recurso do despacho proferido em 26.05.2023 (referência 448674507).

18. Foram observados os vistos legais.
*
II. DELIMITAÇÃO do OBJECTO do RECURSO:
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso - cfr. artigos 635º, nº 3, e 639º, n.ºs 1 e 2, do CPC.
Por outro lado, ainda, sem prejuízo das matérias de conhecimento oficioso, o tribunal de recurso não pode conhecer de questões não antes suscitadas pelas partes perante o Tribunal de 1ª instância, sendo que a instância recursiva, tal como configurada no nosso sistema de recursos, não se destina à prolação de novas decisões, mas à reapreciação pela instância hierarquicamente superior das decisões proferidas pelas instâncias. [1]
*
As questões a decidir são as seguintes:
1ª Questão- Se pode ser declarado nulo o despacho proferido a 18.10.2018 no apenso B;
2ª Questão- Se pode ser suspensa a entrega da fração AJ.
**
III. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Para a decisão a proferir relevam os factos inerentes à tramitação processual e respectivas peças processuais constantes do relatório acima elaborado, tendo-se procedido à consulta integral dos autos principais e respectivos apensos disponíveis para consulta, para prolação da presente Decisão.

**
IV. FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA.
Impõe-se desde logo balizar o objecto do presente recurso, porquanto as alegações de recurso foram apresentadas contendo as razões de discordância do Apelante relativamente a dois despachos distintos proferidos no apenso AC- o despacho com a Ref. Citius 448874507 (despacho proferido a 26.05.2023) e o despacho com a Ref. Citius 447705700 (despacho proferido a 19.04.2023)- porém, por despacho proferido a 22.02.2024 ( Ref. Citius 457218719) apenas foi admitido o recurso interposto do despacho proferido a 26.05.2023, sem que tenha sido deduzida reclamação pela não admissão do recurso que recaiu sobre o despacho de 19.04.2023, pelo que apenas sobre aquele primeiro recairá pronúncia, considerando-se para todos os efeitos legais transitado em julgado o despacho de 19.04.2023.
Como veremos de seguida, o trânsito em julgado do referido despacho prolatado em 19.04.2023 assume inexoráveis consequências nos presentes autos, assumindo força de caso julgado tudo quanto ali ficou definitivamente decidido, não podendo o mesmo ser contrariado ou revertido através do conhecimento do recurso que nos cumpre apreciar pois que para tal teria de ter sido interposto atempadamente recurso do mesmo, o que não aconteceu conforme decidido pelo tribunal recorrido.
Convém salientar que o objectivo pretendido pelo Apelante, nos termos em que foi apresentado o pedido recursivo, é que seja revogado o despacho recorrido e seja substituído por um outro que determine a sua notificação para nomear mandatário no Apenso B para defesa do seu crédito até decisão final e que seja suspensa a entrega da fração AJ que constitui a casa morada de família.
Porém, adiantamos desde já que nenhuma dessas pretensões recursivas poderá proceder e que a defesa das mesmas deixou de ter fundamento válido com o trânsito em julgado do aludido despacho de 19.04.2023, uma vez que o que nele ficou definitivamente decidido impede a procedência de qualquer uma daquelas pretensões sob pena de violação do caso julgado, o qual se impõe não só às partes como a este Tribunal.
Senão vejamos.
 O Apenso B a que se refere o Apelante é o apenso de reclamação de créditos, no âmbito do qual esteve em apreciação, entre outras, a impugnação apresentada pelo Apelante (credor reclamante) da lista de créditos apresentada pelo Administrador de Insolvência, que não reconhecera o crédito por si reclamado.
Apesar da transcrição exaustiva feita no relatório deste Acórdão, convém salientar, por uma questão de facilidade de exposição que naquele apenso B, em 18.10.2018 foi proferido despacho saneador, que para o que aqui importa, decidiu o seguinte:

“AA veio, na qualidade de credor, apresentar uma impugnação que consta de fls. 659 a 697.

Para o efeito, alegou, em síntese, que celebrou um contrato-promessa de várias fracções com a insolvente e que a título de sinal entregou o valor de €200.000,00, que aquela lhe deu quitação e com esta entregou-lhe a fracção prometida comprar.

Conclui que lhe deve ser reconhecido um crédito no montante de €400.000,00, devido pelo incumprimento definitivo imputável à insolvente.

Nos termos e para os efeitos previstos no art. 131º do CIRE, o Sr. AI veio responder à impugnação nos termos constantes a fls. 3283, no sentido do não reconhecimento do crédito.

O Ilustre Mandatário do Impugnante veio renunciar ao mandato e foi cumprido o disposto no art. 47º, nº1 e 2 do CPC, conforme resulta do aviso de recepção assinado e junto a fls. 3407, sendo que o embargante não constituiu mandatário, estando em discussão uma causa em que é obrigatória a constituição de advogado.

(…)Ora, no caso em análise, atento o valor da impugnação, é admissível o recurso ordinário nos termos preceituados no art. 229º, nº1 do CPC.

Face ao exposto e estando em causa o segmento da norma constante do art. 47º, 3 al. c) do CPC, tendo sido o impugnante notificado para constituir novo mandatário no prazo de 20 dias, e não o tendo feito, determina-se a extinção do incidente/impugnação deduzida pelo alegado credor AA, por impossibilidade no prosseguimento da lide, ao abrigo do art. 277º, al. e) do CPC.

Custas do incidente a cargo do impugnante, fixando-se a taxa de justiça no mínimo legal.

Notifique.”
Relativamente àquele despacho, ficou definitivamente decidido no despacho de 19.04.2023 o seguinte:
“Esse despacho foi notificado ao reclamante em 23/10/2018, tendo transitado em julgado.
Antes o exposto, é inquestionável que nos presentes autos, por decisão transitada em julgado, foi declarada extinta a impugnação apresentada por AA.
Assim, ao mesmo não foi reconhecido qualquer crédito sobre a insolvente.
(…) Pede o requerente que este autorize a sua permanência e uso da fração AJ até final dizendo que irá lutar, processualmente, com todos os meios ao seu dispor.
Ora, o meio processual adequado ao reconhecimento de qualquer crédito do requerente sobre a insolvente era a reclamação de créditos e, como acima dissemos, na reclamação de créditos foi já proferida decisão transitada em julgado que julgou extinta a impugnação apresentada pelo mesmo, pelo que ao requerente não foi reconhecido qualquer crédito sobre a insolvente. “
Voltamos a realçar que aquele despacho de 19.04.2023 também transitou em julgado porque não foi admitido o recurso que sobre ele recaiu e, assim sendo, tendo já sido julgada extinta a impugnação apresentada pelo aqui Apelante ao não reconhecimento do seu crédito nesta insolvência, por decisão transitada em julgado, tendo-se concluído naquele despacho que ao Apelante não foi reconhecido qualquer crédito sobre a insolvente, ainda que porventura pudesse ser revogado o despacho recorrido como pretende o Apelante (revogação essa que apenas poderia recair sobre o despacho datado de 26.05.2023) nunca seria possível substituir o despacho proferido a 18.10.2018 no Apenso B  por um outro que determinasse a sua notificação para nomear mandatário nesse Apenso B para defesa do seu crédito até decisão final por a tal obstar a força do caso julgado.
Sobre tal questão não podia o tribunal recorrido emitir nova pronúncia, fosse para proferir a mesma decisão, fosse para a proferir com conteúdo diferente, apenas lhe restava manter a primeira decisão proferida - principio da intangibilidade do caso julgado.
O art. 625º do CPC, precavendo a possibilidade de serem proferidas duas decisões contraditórias (neste caso com conteúdos diferentes), sobre a mesma pretensão ou que dentro do processo versem sobre a mesma questão concreta da relação processual, determina que cumpre-se a decisão que passou em julgado em primeiro lugar.
Já assim defendia A. Varela, porquanto “pressuposto essencial do caso julgado formal é que uma pretensão já decidida, em contexto meramente processual, e que não foi recorrida seja objecto de repetida decisão. Se assim for, a segunda decisão deve ser desconsiderada por violação do caso julgado formal assente na prévia decisão.
Se assim acontecer, para evitar repetições inúteis e o risco de decisões contraditórias, o Tribunal deve indeferir a segunda pretensão.
 Caso julgado é a alegação de que a mesma questão foi já deduzida num outro processo e nele julgada por decisão de mérito que não admite recurso ordinário.
É material o que assenta sobre decisão de mérito proferida em processo anterior; nele a decisão recai sobre a relação material ou substantiva litigada; é formal quando há decisão anterior proferida sobre a relação processual.
Ele pressupõe a repetição de qualquer questão sobre a relação processual dentro do mesmo processo (ob. cit., 308).
Ambos pressupõem o trânsito em julgado da decisão anterior”.[2]
Também nos ensina Manuel de Andrade, que “o caso julgado formal consiste na força obrigatória que os despachos e as sentenças possuem relativa unicamente à relação processual, dentro do processo, excepto se não for admissível o recurso de agravo (…) “consiste na preclusão dos recursos ordinários, na irrecorribilidade, na não impugnabilidade”.[3]
No mesmo sentido João Castro Mendes defende que o “caso julgado formal traduz a força obrigatória dentro do processo”, contrariamente ao caso julgado material, cuja força obrigatória se estende para fora do processo em que a decisão foi proferida.[4]
No caso em apreço, temos uma decisão proferida no processo que já tinha apreciado a questão da extinção da impugnação, decisão essa transitada em julgado e, que tendo sido de novo suscitada no mesmo processo não podia ser de novo apreciada- a tal se opunha a figura do caso julgado formal.
O art. 620º do CPC dispõe sobre o caso julgado formal, dele podendo ler-se:
1. As sentenças e os despachos que recaiam unicamente sobre a relação processual têm força obrigatória dentro do processo.
2. Excluem-se do disposto no número anterior os despachos previstos no artigo 630º.
Quanto ao alcance do caso julgado, Miguel Teixeira de Sousa é elucidativo quando escreve que “o caso julgado abrange a parte decisória do despacho, sentença ou acórdão, isto é, a conclusão extraída dos seus fundamentos (art. 659.°, n.º 2, in fine, e 713.° n.º 2) (…)”[5]
Em resumo, “o caso julgado consubstancia-se ‘na inadmissibilidade da substituição ou modificação da decisão por qualquer tribunal (incluindo aquele que a proferiu) em consequência da insusceptibilidade da sua impugnação por reclamação ou recurso ordinário’, tornando indiscutível o conteúdo da decisão.
O caso julgado aporta à decisão um segundo nível de estabilidade (de continuidade na emissão dos seus efeitos jurídicos) – constitui uma técnica de estabilização dos resultados do processo, que se integra numa linha gradual de estabilização: do esgotamento do poder jurisdicional (art. 613º do CPC), enquanto regra de proibição do livre arbítrio, resulta um primeiro nível de estabilidade da decisão judicial, ainda que interna ou restrita, relativa ao próprio autor da decisão; o trânsito em julgado permite à decisão alcançar um segundo nível de estabilidade alargada, vinculando o tribunal e as partes, dentro do processo (caso julgado formal - art. 602º do CPC), ou mesmo fora dele, perante outros tribunais (caso julgado material - art. 619º do CPC).”[6]
Ora, tendo ficado definitivamente arredada a possibilidade de se determinar a notificação do aqui Apelante para nomear mandatário naquele Apenso B para defesa do seu crédito até decisão final, por decisão entretanto transitada em julgado, é essa a decisão que prevalece no processo, que como tal se impõe neste processo de insolvência com força de caso julgado.
É certo que após aquele despacho de 19.04.2023 o aqui Apelante veio arguir perante o tribunal recorrido a nulidade do despacho que determinara a extinção do incidente de impugnação por si deduzido, mas embora assim a tenha apelidado-nulidade do despacho- certo é que não apontou qualquer nulidade ao conteúdo do despacho proferido em 18.10.2018, não se estando no âmbito das nulidades da sentença previstas no art. 615º do CPC, porquanto o que realmente o Apelante pretende é que se considere nulo o acto de notificação que precedeu aquele despacho, sustentando que a notificação para constituição de novo mandatário após a notificação da renúncia do seu mandatário não lhe devia ter sido feita a ele, porque estava insolvente, mas ao administrador de insolvência que lhe havia sido nomeado.
Essa nulidade arguida perante o tribunal de 1ª Instância apenas por requerimento de 8.05.2023 e, decidida no despacho de 26.05.2023, aqui sob apreciação, foi apreciada pelo tribunal a quo, e bem, à luz do regime previsto para as nulidades dos actos dos arts. 195º a 202º do CPC, e como no despacho sob recurso se decidiu, a arguida nulidade do acto há muito estava sanada pois que os factos que lhe servem de fundamento já eram do conhecimento do aqui Apelante desde há muito tempo.
O aqui Apelante apresentou impugnação da lista apresentada pelo AI em 4.06.2012, tendo o seu mandatário renunciado ao mandato em 23.11.2013, renúncia essa que foi notificada ao aqui Apelante em 2.01.2014.
Curiosamente já nessa altura estava declarado insolvente (sentença de declaração de insolvência é de 28.11.2013) mas não informou disso estes autos, mesmo estando expressamente advertido das consequências legais para a não constituição de novo mandatário.
Poucos dias antes de ser declarado insolvente cedeu tal crédito a terceiro- BB- por escritura pública de cessão de créditos celebrada em 25.11.2013 e, o cessionário requereu a sua habilitação como cessionário do crédito reclamado pelo aqui Apelante em 26.11.2013.
O aqui Apelante foi notificado no dia 23.10.2018 do despacho que julgou extinta a impugnação do crédito que apresentara, sem que alguma vez tenha invocado a nulidade que apenas veio a invocar no requerimento de 8.05.2023, sabendo, como sabia, que estava declarado insolvente desde 2013!
Sustentou o Apelante que apenas veio a tomar conhecimento recentemente que não havia sido admitida a habilitação de cessionário, mas esse desconhecimento é irrelevante para a tempestividade da arguição da nulidade do acto, porque a nulidade que aponta ao referido despacho afinal não é mais do que a alegada falta de notificação ao Administrador de Insolvência que lhe fora nomeado para constituir novo mandatário porque quando ele foi notificado para o efeito já não teria poderes para o constituir, nem legitimidade para invocar a nulidade do despacho, porém desconhecemos se em 2018 ainda se mantinha pendente algum processo de insolvência e mesmo que assim ocorresse nada impedia o aqui Apelante de comunicar aos autos que estava declarado insolvente e que a notificação para constituir novo mandatário devia ser dirigida ao AI, se não o fez naquele momento, como podia e devia, foi porque não agiu com a diligência que se lhe impunha.
 No limite, o Apelante pelo menos quando apresentou o requerimento de 26.03.2023, podia e devia ter suscitado a nulidade do acto que apenas veio a suscitar em 8.05.2023, pelo que a mesma tem de se considerar sanada como prevê o art. 199º nº 1 parte final do CPC.
Em suma, ao despacho proferido a 18.10.2018, que julgou extinta a impugnação do não reconhecimento do crédito do aqui Apelante, este não apontou qualquer nulidade do art. 615º do CPC, mas mesmo que se entenda que o fez, o seu conhecimento também não seria admissível neste recurso, cuja decisão a reapreciar é apenas a que foi proferida em 26.05.2023, assim como a nulidade do acto apontada pelo Apelante também não pode ser conhecida por se considerar sanada.
Tendo o despacho de 18.10.2018 transitado em julgado, impondo-se como tal, não existe mais a pretendida possibilidade de ser novamente notificado para nomear mandatário no Apenso B para defesa do seu crédito até decisão final.
Relativamente à pretensão recursiva de suspensão da entrega da fração AJ, como bem sabe o Apelante, desde o despacho proferido a 7.03.2023 que tem vindo a ser reiteradamente notificado para comprovar a entrega daquela fração que se mantém a ocupar, fração essa que foi apreendida para a massa insolvente (constituindo a verba 31), e se até ao despacho proferido a 19.04.2023 ainda se poderia, com alguma benevolência, conceder que ainda não haviam sido apreciados os argumentos por si apresentados para a não entrega da referida fração, uma vez que se insurgira contra o despacho que havia decidido julgar extinta a sua impugnação relativamente ao não reconhecimento do crédito que reclamara e que estava subjacente à alegada ocupação legítima do imóvel apreendido, com o trânsito em julgado do despacho de 19.04.2023 deixou de ter argumentos válidos que legitimem a manutenção dessa ocupação porque os mesmos foram definitivamente afastados pelo tribunal a quo, valendo com a força de caso julgado que tornou indiscutível o conteúdo daquela decisão.
Não estando em curso a reclamação de créditos apresentada pelo aqui Apelante, nem estando a entrega da fração dependente de qualquer decisão final ainda a proferir, mantendo-se a decisão que não reconheceu ao Apelante qualquer crédito não há fundamento para se suspender a “entrega da referida fração até decisão final na defesa do seu crédito” como peticionou.
A decisão que lhe ordena, repetidamente, que entregue a fração que ocupa sem título, não viola qualquer disposição legal, mormente as normas contidas na Lei nº 1-A/2020 como já ficou definitivamente decidido no despacho de 19.04.2023, transitado em julgado.
Vejamos o que a esse propósito ficou decidido no referido despacho de 19.04.2023:
“Por outro lado, é inquestionável que o requerente tem obrigação de saber que não tem qualquer título que legitime a sua posse sobre um imóvel apreendido para a massa insolvente.
Assim sendo, já há muitos anos que o requerente deveria ter entregue o imóvel que está ilegitimamente a ocupar porquanto, como dissemos, não dispõe de qualquer título que legitime essa posse.
Pede o requerente que este autorize a sua permanência e uso da fração AJ até final dizendo que irá lutar, processualmente, com todos os meios ao seu dispor.
Ora, o meio processual adequado ao reconhecimento de qualquer crédito do requerente sobre a insolvente era a reclamação de créditos e, como acima dissemos, na reclamação de créditos foi já proferida decisão transitada em julgado que julgou extinta a impugnação apresentada pelo mesmo, pelo que ao requerente não foi reconhecido qualquer crédito sobre a insolvente.
Assim, não existe qualquer fundamento para se autorizar a permanência do requerente na fração por si detida, devendo ser indeferido o requerido, a título principal, pelo mesmo.
O requerente pede, ainda, que este tribunal se socorra das regras, do processo civil, nomeadamente no âmbito da ação executiva, devendo atender a que o legislador não procedeu à revogação ou alteração do regime processual excecional, e transitório aprovado, pela Lei nº1-A/ 2020 de 19 de Março, alterado pela Lei nº 13-B/ 2021 de 5 de Abril, cujo art.6º-E, nº7, al. b) suspendeu os actos a realizar em sede de processo executivo relacionados, com a concretização de diligências de entrega da casa morada de família.
Quanto a esse pedido este tribunal adere na íntegra ao entendimento que foi defendido no acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 7/2/2023, processo 2397/12.0TBMAI-A.P1, disponível em www.dgsi.pt (…) considerando que cessou, por caducidade, a vigência da Lei nº 1-A/2020 e consequentemente do seu art. 6º-E.
Assim sendo, não existe qualquer fundamento para deferir o requerido pelo requerente. Tal como acima dissemos, o requerente está há anos a ocupar um imóvel apreendido para a massa insolvente, sabendo que não tem qualquer título que legitime essa posse e prejudicando, com essa atuação a massa e, em consequência, os seus credores.
Face e todo o exposto, indefere-se o requerido, determinando-se que o requerente seja novamente notificado – pessoalmente e na pessoa da sua Il. Mandatária – para, em 10 dias, proceder à entrega voluntária ao Sr. administrador da insolvência do imóvel que está a ocupar, comprovando nos autos essa entrega, com a advertência que não o fazendo será determinada a sua entrega coerciva através de arrombamento e com recurso à utilização de força pública da autoridade policial competente.”
O Apelante é interveniente nestes autos apenas e só como alegado credor de uma quantia em dinheiro (crédito que não lhe foi reconhecido), não assumindo a qualidade de arrendatário da fração que se recusa a entregar à massa insolvente, mas ainda que assim fosse, como vimos o regime extraordinário e transitório de proteção dos arrendatários que permitia a suspensão da entrega da fração que constituísse casa morada de família através do referido art. 6º E nº 7 al. b) da Lei nº 1-A/2020 de 19/3 cessou, sendo que também não pode lançar mão das disposições previstas no invocado art. 150º nº 5 do CIRE porque neste processo não é o insolvente.
Deste modo, não há qualquer fundamento ou procedimento legal que lhe possibilite beneficiar da suspensão da entrega da fração que recusa entregar à massa insolvente, estando como está finda a questão do não reconhecimento do seu crédito conforme reclamava neste processo de insolvência.
O Apelante pôde utilizar os meios ao seu dispor para ver apreciado o seu alegado direito à manutenção na fração até que fosse apreciada a sua reclamação de créditos sobre a insolvente, não sendo de todo abusivo o direito de o AI exigir a restituição do bem apreendido para a massa insolvente, nem tendo sido violado qualquer preceito constitucional, mormente o art. 65º da CRP,  porque a CRP não assegura o direito absoluto à habitação a todos os cidadãos à custa dos particulares que sejam proprietários dos imóveis, incumbindo ao Estado assegurar políticas de habitação que auxiliem todos os cidadãos ao acesso a uma habitação, designadamente as entidades locais competentes quando se suscitem sérias dificuldades no realojamento, como poderá ser o caso do Apelante e seu agregado familiar, situação que para além de não estar demonstrada nos autos, não nos incumbe decidir.
Por conseguinte, tendo ficado definitivamente arredada a possibilidade de o aqui Apelante ver suspensa a entrega da fração AJ porque já se esgotara a defesa do seu crédito por decisão final transitada em julgado (crédito esse que tinha subjacente o direito de retenção invocado como justificação da manutenção da ocupação da mesma), é essa a decisão que prevalece, que como tal se impõe neste processo de insolvência, com força de caso julgado.
Na decorrência da manifesta improcedência dos argumentos recursivos, nenhuma censura merece a decisão recorrida, a qual se mantém.

**
V. DECISÃO:
Em razão do antes exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação do Porto em julgar improcedente o recurso de apelação interposto pelo Apelante, mantendo-se a decisão recorrida.
Custas a cargo do Apelante.
Notifique.

Porto, 4 de Junho de 2024
Maria da Luz Seabra
Márcia Portela
João Diogo Rodrigues

(O presente acórdão não segue na sua redação o Novo Acordo Ortográfico)
_______________
[1] F. Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 8ª edição, pág. 147 e A. Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2ª edição, pág. 92-93.
[2] Antunes Varela, Manual de Processo Civil, 2ª ed. -307
[3] Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra Editora, 1979, pág. 304
[4] Direito Processual Civil, A.A.F.D.L, 1980, III vol. pág. 276
[5] Estudos sobre o Novo Processo Civil, pág. 578
[6] Ac RP de Proc. Nº 1320/14.2TMPRT.P1, www.dgsi.pt