CONTRATO DE TRABALHO
DIREITOS INDISPONÍVEIS
PRINCÍPIO DO PEDIDO
NULIDADE DA SENTENÇA
PORTARIA DE EXTENSÃO
SUBSÍDIO DE REFEIÇÃO
Sumário


I – A indisponibilidade dos direitos de natureza pecuniária emergentes do contrato de trabalho apenas existe durante a sua vigência, pelo que findo o contrato pode o trabalhador renunciar (expressa ou tacitamente) a eles;
II – Assim, cessado o contrato de trabalho, e tendo a trabalhadora peticionado determinadas quantias a título de retribuição de férias, subsídio de férias e de subsídio de Natal, não pode o tribunal condenar em quantidade superior ao pedido;
III – É nula a sentença, nos termos do artigo 615.º, n.º 1, alínea e) do Código de Processo Civil, ex vi do artigo 1.º, n.º 2, alínea a) do Código de Processo do Trabalho, que, nessa parte, condena em quantidade superior ao pedido;
IV – Só é possível formular um pedido genérico nas situações taxativamente previstas no artigo 556.º do Código de Processo Civil, pelo que se o autor formula um pedido genérico que a lei não admite, tal erro não for sanado e comprometer o êxito da ação, esta terá de improceder;
V – Tendo em ação de reconhecimento da existência de contrato de trabalho sido declarado que entre as partes existia um contrato de trabalho e, subsequentemente, o trabalhador proposto contra a empregadora ação de processo comum, pedindo a condenação desta no pagamento de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal referente ao período de vigência desse contrato de trabalho, desde que não afronte normas imperativos ou decorrentes de instrumento de regulamento coletiva o valor desse pagamento deverá ser fixado em relação a cada ano pela média das prestações recebidas mensalmente nesse mesmo período pelo trabalhador;
VI – As portarias de condições de trabalho têm uma natureza residual, prevalecendo em relação às mesmas as portarias de extensão e, relativamente a estas, os instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho negociais;
VII – De acordo com a alínea b) do n.º 3 do artigo 1.º da portaria n.º 736/2006, de 26 de julho, a mesma não se aplica se o empregador exercer a atividade pela qual se possa filiar em associação de empregadores legalmente constituída à data da sua publicação;
VIII – Por consequência, não é de aplicar a referida portaria/regulamento se a empregadora alegou que, à data, considerando a atividade comercial desenvolvida, podia filiar-se na APCC - Associação Portuguesa de Contact Centers, nada mais resultando dos autos sobre a matéria.
IX – Já a partir de 08-08-2021, considerando que o registo da Associação em que a empregadora se podia filiar foi cancelado, é de aplicar, em matéria de subsídio de refeição, o disposto na portaria de condições de trabalho n.º 182/18, de 22 de junho, com as alterações posteriores.
(Sumário elaborado pelo relator)

Texto Integral


Proc. n.º 1131/23.2T8STR.E1

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora[1]:

I. Relatório
AA intentou, no ... de ... – Juiz ..., do Tribunal Judicial da ..., a presente ação declarativa, sob a forma comum, emergente de contrato individual de trabalho, contra “ALL2IT Infocomunicações, S.A, pedindo a condenação desta pagar-lhe as seguintes quantias:
«a. € 8.474,13 (oito mil quatrocentos e setenta e quatro euros e treze cêntimos), referente aos montantes de subsídio de férias não pagos desde 1 de julho de 2012 até 31 de maio de 2021;
b. € 8.474,13 (oito mil quatrocentos e setenta e quatro euros e treze cêntimos), referente aos montantes de subsídio de natal não pago desde 1 de julho de 2012 até 31 de maio de 2021;
c. € 8.474,13 (oito mil quatrocentos e setenta e quatro euros e treze cêntimos), referente aos montantes de férias vencidas e não pagas desde 1 de julho de 2012 até 31 de maio de 2021;
d. € 10.932,46 (dez mil novecentos e trinta e dois euros e setenta e quarenta e seis cêntimos), referente aos montantes de subsídio de alimentação não pagos desde 1 de julho de 2012 até 31 de maio de 2021;
2) Pagar à A. todas as quantias que a final se vier a apurar serem devidas a esta, nos termos disposto no art. 74 do C. P.Trabalho;
3) Pagar à A. juros sobre todas as quantias desde a data da citação».

Alegou, para o efeito e em síntese, que por sentença proferida em 14-06-2022, no ... de ... - J..., já transitada em julgado, foi reconhecida a existência de um contrato de trabalho, desde 1 de julho de 2012, entre a Autora e a Ré, sendo que até à data dessa sentença (a Autora) não tinha os seus direitos reconhecidos, enquanto trabalhadora por conta de outrem, sendo-lhe pago o trabalho prestado mediante emissão de “recibos verdes”, como se de uma prestadora de serviço se tratasse.
Assim, recebia uma quantia mensal variável, apenas por doze meses e nos dias em que prestasse o seu trabalho efetivo, não recebendo subsídio de férias, subsídio de natal, subsídio de alimentação, nem férias pagas ou quaisquer outras prestações; e, ao lhe ser reconhecida a existência de um contrato de trabalho tem direito a receber as quantias devidas a tais títulos desde o início desse contrato.

Tendo-se procedido à audiência de partes e não se tendo logrado obter o acordo das mesmas, contestou a Ré, alegando, também em síntese, que a contraprestação financeira acordada pelas partes calculada pelo resultado já compensava a totalidade da atividade desenvolvida pela Autora durante a vigência do referido contrato ou, ainda que assim se não entenda, que não poderá ser estabelecida uma «(…) equivalência entre os montantes pagos à Autora [como contrato de prestação de serviço] e a remuneração que a mesma deveria ter recebido [como contrato de trabalho]».
Em consequência, pugnou pela improcedência da ação.

No prosseguimento dos autos, procedeu-se a audiência final e, subsequentemente, foi proferida sentença, cuja parte decisória é do seguinte teor:
«Pelo exposto, em conformidade com as disposições legais e fundamentos citados, julga-se totalmente procedente a presente ação e, em consequência:
1. Condena-se a Ré ALL2IT INFOCOMUNICAÇÕES, S.A. a pagar à Autora AA a quantia total de € 73.996,26 (setenta e três mil, novecentos e noventa e seis euros e vinte e seis cêntimos), à qual acrescem juros de mora civis legais, à taxa legal de 4% ao ano, desde a data da citação da Ré e até efetivo e integral pagamento, correspondente ao somatório dos seguintes valores:
1.1. Férias: € 21.281,82;
1.2. Subsídios de férias: € 21.281,82;
1.3. Subsídios de natal: € 21.281,82;
1.4. Subsídios de refeição: € 10.150,80
(…)».

Inconformada com o assim decidido, a Ré veio interpor recurso para este tribunal, tendo nas alegações apresentadas formulado as seguintes conclusões:
«A. O Tribunal a quo, por Sentença, julgou totalmente procedente o pedido da Autora, condenando a Ré no pagamento ao autor da quantia de € 73.996,26 (setenta e três mil novecentos e noventa e seis euros e vinte e seis cêntimos):
• € 21.281,82 (vinte e um mil duzentos e oitenta e um euros e oitenta e dois cêntimos), referente aos montantes de férias não gozadas desde 1 de julho de 2012 até 31 de maio de 2022;
• € 21.281,82 (vinte e um mil duzentos e oitenta e um euros e oitenta e dois cêntimos), referente aos montantes de subsídios de férias não pagos desde 1 de julho de 2012 até 31 de maio de 2022;
• € 21.281,82 (vinte e um mil duzentos e oitenta e um euros e oitenta e dois cêntimos), referente aos montantes de subsídios de Natal não pagos desde 1 de julho de 2012 até 31 de maio de 2022;
• € 10.150,80 (dez mil cento e cinquenta euros e oitenta cêntimos), referente aos montantes de subsídio de alimentação não pagos desde 1 de julho de 2012 até 31 de maio de 2022”.
B. Não se conformando com o teor da sentença proferida vem a Ré, ora Recorrente, da mesma interpor o presente Recurso, incindindo o mesmo sobre a matéria de direito, tendo ainda por objeto a arguição da nulidade da sentença prevista no artigo 615.º, n.º 1, al. e) do Código de Processo Civil.
C. A presente ação declarativa sobre a forma comum foi interposta pela Recorrida contra a aqui Recorrente na sequência da sentença proferida no processo n.º 348/22.... do ... de ... – Juiz ..., que reconheceu a existência de um contrato de trabalho entre as partes desde 1 de julho de 2012.
D. Na presente ação Judicial, a Recorrida formulou o seguinte pedido:
“1. Pagar à A. as seguintes quantias:
a. € 8.474,13 (oito mil quatrocentos e setenta e quatro euros e treze cêntimos), referente aos montantes de subsídio de férias não pagos desde 1 de julho de 2012 até 31 de maio de 2021;
b. € 8.474,13 (oito mil quatrocentos e setenta e quatro euros e treze cêntimos), referente aos montantes de subsídio de natal não pago desde 1 de julho de 2012 até 31 de maio de 2021;
c. € 8.474,13 (oito mil quatrocentos e setenta e quatro euros e treze cêntimos), referente aos montantes de férias vencidas e não pagas desde 1 de julho de 2012 até 31 de maio de 2021;
d. € 10.932,46 (dez mil novecentos e trinta e dois euros e setenta e quarenta e seis cêntimos), referente aos montantes de subsídio de alimentação não pagos desde 1 de julho de 2012 até 31 de maio de 2021”.
2. Pagar à A. todas as quantias que a final se vier a apurar serem devidas a esta, nos termos disposto no art. 74 do C. P. Trabalho.
3. Pagar à A. juros sobre todas as quantias desde a data da citação”.
E. Conforme facilmente se constata, na sua Sentença, o Tribunal a quo condenou a Recorrente numa quantia que é superior ao dobro da quantia peticionada pela Recorrida na sua Petição Inicial.
F. Dispõe o artigo 615.º, n.º 1, alínea e) do Código do Processo Civil que é nula a sentença quando o juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.
G. Para justificar a referida condenação, o Tribunal a quo refere na sua sentença que não se encontra vedado ao montante do pedido quando resulta de preceitos legais irrevogáveis, bem como pelo facto de a Recorrida ter requerido no ponto 2 do seu pedido a condenação em todas as verbas que fossem devidas nos termos do artigo 74.º do CPT.
H. Apesar de a Recorrente não ignorar o disposto no artigo 74.º do CPT, entende que tal normativo não é aplicável no caso em concreto porquanto, conforme vem sendo defendido de forma quase unanime pela doutrina e jurisprudência portuguesa, a condenação ex vel ultra petitum apenas é aplicável quanto a preceitos inderrogáveis, entendendo-se estes como direitos absolutos, o que não sucede no caso concreto já que o contrato que foi celebrado entre as partes cessou, por denúncia da Recorrida, ainda antes da interposição da presente ação, pelo que, com a cessação do contrato, os direitos em causa perderam a natureza de direitos absolutos, sendo suscetíveis de serem renunciados.
I. Deste modo, tendo a Recorrida circunscrito o seu pedido às quantias por si identificadas, o Tribunal a quo encontrava-se vinculado ao mesmo por força do dever de observância do princípio do dispositivo, sendo, em consequência, a Sentença recorrida nula em observância do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea e) do Código do Processo Civil.
J. E não se aceita, igualmente, a explicação facultada pelo Tribunal a quo, quando procurou sustentar a condenação além do pedido nos termos do ponto 2) do pedido formulado pela Recorrida porquanto a mesma requer que a Recorrente fosse condenada a pagar à A. todas as quantias que a final se vier a apurar serem devidas a esta, nos termos disposto no art. 74 do C. P. Trabalho.
K. Com efeito, além de tal pedido vir assente numa normal processual inaplicável ao caso concreto, o mesmo consubstanciaria um pedido genérico que não preenche qualquer uma das condições previstas no artigo 556.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, pelo que nunca seria admissível.
L. Nestes termos, e sendo declarada nula a Sentença, deverá a mesma ser substituída por outra que supra a nulidade identificada.
M. Além da nulidade da Sentença recorrida, entende a Recorrente que o Tribunal a quo fez também uma errada interpretação e aplicação do direito aplicável.
N. Conforme resultou da matéria de facto dada como provada, em concreto o ponto 2 que remete para o ponto 108 da sentença proferida no processo n.º 348/22...., a Recorrida “não aufere a mesma quantia em todos os meses, sendo pago pela ré por ato executado, de acordo com a tabela junta ao documento designado “contrato de prestação de serviços”.
O. Também no ponto 5 da matéria de facto dada como provada se verifica uma enorme variação entre os montantes recebidos, os quais, em conjugação ao ponto 2 acima citado, resultavam da variação do número de atos realizados pela Recorrida em cada mês.
P. Considerando que o objeto da ação visava determinar os montantes que seriam eventualmente devidos à Recorrida a título de férias não gozadas, subsídios de férias e subsídios de Natal não pagos e ainda dos eventuais montantes que fossem devidos a título de subsídio de refeição, era imperativo, antes de mais, determinar qual o valor de remuneração atendível para o cálculo dos referidos montantes.
Q. Na Petição Inicial a Recorrida veio defender que para o cálculo dos montantes devidos para cada prestação, em cada ano, o Tribunal a quo deveria considerar o valor médio de honorários recebidos pela Recorrida no ano do seu vencimento.
R. Na sua contestação, a Ré veio refutar tal argumento, justificando, em suma, que as partes não haviam fixado uma remuneração, mas sim uma contrapartida financeira por cada ato executado no âmbito do contrato de prestação de serviços celebrado e que esse valor visava compensar a totalidade da atividade desenvolvida pela Recorrida.
S. Ora, foi a própria sentença que reconheceu a existência de um contrato de trabalho que confirma que as partes não haviam acordado uma retribuição, sendo apenas pago o valor acordado por cada ato executado, tanto mais que o tribunal não fundou o reconhecimento da existência de um contrato de trabalho no montante auferido pela Recorrida, mas sim em outros indícios que considerou relevantes.
T. Considerando o acima exposto, a Recorrente começou por explicar que, ao contrário do que foi acordado pelas partes como contraprestação financeira do contrato que havia sido celebrado e executado, a retribuição dos trabalhadores visa primordialmente o pagamento da disponibilidade dos trabalhadores.
U. Ora, entre a contraprestação financeira acordada pelas partes e a retribuição paga aos trabalhadores existe, desde logo, uma distinção. Enquanto que a retribuição num contrato de trabalho tem como fim primordial a remuneração do tempo de disponibilidade do trabalhador para prestar a atividade contratada, no contrato de prestação de serviços, a contraprestação financeira visa pagar um concreto resultado (o pagamento à peça ou à tarefa).
V. A relevância do tempo de trabalho na compreensão da remuneração é evidente na regulação do trabalho dependente, podendo confirmar-se, a título de mero exemplo, pela não violação do princípio da irredutibilidade da retribuição quando a mesma seja operada proporcionalmente à redução do tempo de trabalho pelo disposto no artigo 271.º do Código do Trabalho quanto à possibilidade de cálculo da retribuição horária.
W. A ligação da retribuição ao tempo de trabalho ocorre, precisamente, pela natureza da retribuição, dado que esta visa pagar o tempo de disponibilidade do trabalhador
X. Ora, na Sentença recorrida, o Tribunal a quo começa por reconhecer que se encontra “assente que as partes não acordaram entre si um valor certo a título de retribuição mensal como contrapartida do trabalho prestado pela Autora”, no entanto, acaba por concluir que as partes acordaram uma retribuição variável, recusando, em consequência, determinar o montante da retribuição nos termos previstos no artigo 272.º do Código do Trabalho.
Y. Ora, conforme a Recorrente teve oportunidade de explicar na sua contestação, muito embora se tenha reconhecido a existência de uma relação laboral entre a Recorrida e a Recorrente, aquando da fixação da contraprestação financeira acordada no momento da celebração do contrato, as partes não determinaram uma retribuição.
Z. Num contrato de prestação de serviços a contraprestação visa compensar, além da mera prestação, outros fatores que não são relevantes num contrato de trabalho, como o risco assumido pelo Prestador com a não produção do resultado ou com as despesas que o mesmo tenha com a atividade.
AA. Do mesmo modo, quando é acordada a contraprestação financeira num contrato de prestação de serviços, o prestador apenas aceita um preço que lhe permita compensar financeiramente de forma integral a atividade desenvolvida.
BB. Pelo contrário, num contrato de trabalho a retribuição não visa compensar nem o risco com a produção do resultado, nem as despesas que o mesmo tenha com a prestação da atividade já que estas correm por conta do empregador, visando, isso sim, compensar a disponibilidade do trabalhador para o desenvolvimento da atividade laboral e o tempo despendido.
CC. Num contrato de trabalho o Trabalhador, além da remuneração acordada, sabe igualmente que beneficiará dos subsídios de férias e de natal, bem como de férias retribuídas, pelo que o valor de remuneração mensal aceite para o tempo de disponibilidade contratado é, em princípio, menor, sendo a mesma compensada com a totalidade das prestações a que terá direito por força da aplicação da lei e do contrato.
DD. É assim claro que a contraprestação financeira acordada pelas partes não tinha a natureza de retribuição nem visava compensar a mera prestação de trabalho, visando, isso sim, pagar toda a atividade desenvolvida pela Recorrida.
EE. E tanto assim é que bastará confrontar os valores de honorários recebidos pela Recorrida e as remunerações pagas aos trabalhadores da Recorrente para se perceber que os valores são substancialmente mais elevados no primeiro caso, o que demonstra que o valor acordado entre as partes visava compensar toda a atividade desenvolvida pela Recorrida e ainda o risco da atividade e as despesas incorridas com a mesma.
FF. Assim, ainda que no processo 348/22.... o Tribunal possa ter reconhecido a existência de uma relação de trabalho, não reconheceu a existência de um acordo quanto à retribuição devida pela prestação de trabalho subordinado, tanto mais que ressaltou que a Recorrente se limitava a pagar os atos executados segundo a tabela anexa ao contrato.
GG. É assim evidente que as partes não estabeleceram entre si qualquer retribuição devida pela prestação de trabalho subordinado, cabendo ao Tribunal a quo fixá-la nos termos do artigo 272.º do Código do Trabalho, conforme a Recorrente oportunamente requereu.
HH. Ora, é o próprio Tribunal a quo que refere que não é possível “comparar a retribuição da Autora com a retribuição paga pela Ré a outros trabalhadores, designadamente quando estes, nos contratos celebrados com a Ré, acordaram uma retribuição certa contra a prestação de funções inerentes a determinada categoria”.
II. Sucede que, não tivesse o contrato cessado por iniciativa da Recorrida, a mesma, por força do reconhecimento da existência de um contrato de trabalho, encontrar-se-ia precisamente na mesma situação dos demais trabalhadores da Ré, pelo que a Recorrida teria de receber uma remuneração que fosse contrapartida do tempo de trabalho e da disponibilidade para o trabalho, não tendo, conforme se explicou, a contraprestação acordada pelas partes, essa finalidade.
JJ. Ora, tendo a contraprestação acordada visado, conforme se explicou, remunerar toda a atividade desenvolvida pela Recorrida, a condenação, mais de 12 anos depois do início da relação contratual entre as partes, no pagamento de subsídios de férias, de natal e de férias remuneradas, bem como de despesas relacionadas com a alimentação da Recorrida representaria um verdadeiro enriquecimento sem causa, pelo que deveria o Tribunal a quo reconhecer que, além dos montantes que foram pagos pela Recorrente à Recorrida, nada mais era devido.
KK. No entanto, caso assim não se entenda, o que apenas por dever de raciocínio se concebe, uma vez que não foi acordada uma retribuição entre as partes pela prestação de trabalho subordinado, caberia ao Tribunal a quo dar cumprimento ao disposto no artigo 272.º do Código do Trabalho tendo em conta a prática da empresa e os usos ou locais, quando a mesma não resulte de regulamentação coletiva de trabalho aplicável.
LL. Conforme consta dos pontos 7 e 8 da matéria de facto dada como provada, a prática da Empresa é pagar a remuneração mensal mínima obrigatória aos seus trabalhadores subordinados, sendo essa igualmente a prática do mercado para o exercício de funções de back-office.
MM. Sendo a remuneração da Autora fixada no montante correspondente à remuneração mínima mensal garantida, e conforme se explicou em sede de contestação, a Recorrida seria apenas credora da Recorrente do montante de € 113,47.
NN. Caso assim não o entendesse, não se compreende porque o Tribunal a quo não recorreu ao mesmo instrumentação de regulamentação coletiva de trabalho que utilizou a propósito da condenação do subsídio de refeição – cuja aplicabilidade contestaremos adiante - para fixar a retribuição da Recorrida.
OO. Com efeito, caso por mera hipótese de raciocínio, fosse aplicável a portaria das condições de trabalho para os trabalhadores administrativos e a Recorrida devesse ser classificada como “Documentalista”, verificamos que a remuneração da Recorrida, por aplicação da referida portaria, deveria ser fixada nos seguintes termos:
• Portaria n.º 210/2012 (01/07/2012 a 30/09/2015) - € 679,00;
• Portaria n.º 382/2015 (01/10/2015 a 31/05/2018) - € 609,00;
• Portaria n.º 182/2018 (01/06/2018 a 30/06/2019) - € 705,00,
• Portaria n.º 411-A/2019 (01/07/2019 a 30/11/2020) - € 730,00;
• Portaria n.º 275/2020 (01/12/2020 a 30/09/2021) - € 742,00;
• Portaria n.º 292/2021 (01/10/2021 a 31/03/2022) - € 752,00;
• Portaria n.º 218/2022 (01/04/2022 a 31/05/2022) - € 812,00.
PP. No entanto, não obstante o Tribunal a quo tenha referido que a Recorrida não se encontrava numa situação comparável à dos restantes trabalhadores subordinados da Recorrente – muito embora, caso o seu contrato de trabalho não tivesse cessado, passaria a estar nas mesmíssimas condições que os trabalhadores em causa – recusou fixar a retribuição a Recorrida em termos idênticos, o que considera a Recorrente resultar de uma errada aplicação do direito aplicável.
QQ. Pelo contrário, e para efeitos da determinação da retribuição da Autora, o Tribunal a quo fez uma errada aplicação da norma prevista no artigo 261.º, n.º 3 do Código do Trabalho.
RR. Ora, a referida norma tem como pressuposto a existência de uma retribuição (variável) acordada, algo que, conforme acima se explicou, nunca ocorreu.
SS. Por outro lado, a norma em causa não visa a determinação do montante da retribuição, mas tão só o valor a considerar quando não se possa calcular pelos critérios que foram acordados com vista à sua determinação.
TT. Assim, deverá a Sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que determine a retribuição devida à Arguida sobre a qual deverão ser calculados os montantes devidos a título de férias não gozadas, subsídios de férias e subsídios de Natal.
UU. Além de o Tribunal a quo ter, na opinião da Recorrente, feito uma errada aplicação do direito na determinação da remuneração da Recorrida, fê-lo também quanto ao cálculo dos montantes devidos a título de férias, subsídios de férias e subsídios de Natal.
VV. Com efeito, tanto nos termos do artigo 263.º, como no artigo 264.º, ambos do Código do Trabalho, o valor devido título de subsídios de férias e de subsídios de Natal corresponde a um mês de retribuição base, ainda que no caso do subsídio de férias se preveja a inclusão de outras prestações retributivas.
WW. Assim, caberia ao Tribunal, determinar o valor da retribuição devida em cada momento para, depois, calcular os montantes que putativamente seriam anualmente devidos a este título.
XX. Ora, não só o Tribunal a quo não procedeu à determinação da remuneração devida em cada momento, como, fazendo uso de uma norma inaplicável para a determinação da retribuição, o artigo 261.º, n.º 3 do Código do Trabalho, acabou por aplicá-la de forma incorreta também para apuramento de cada uma das verbas peticionadas pela Recorrida.
YY. Na verdade, com o reconhecimento da existência de um contrato de trabalho, as férias, os subsídios de férias e os subsídios de natal durante toda a relação contratual não se venceram na data em que tal relação laboral foi reconhecida, mas sim na data que efetivamente se venceriam sendo uma relação de trabalho.
ZZ. Destarte, ou o Tribunal a quo reconhecia que as quantias acordadas pelas partes já visavam compensar toda a atividade desempenhada pela Recorrida e, por isso mesmo, tais montantes já se encontravam pagos, conforme defendeu a Recorrente ou considerava que não tendo sido acordada uma remuneração, deveria, nos termos do disposto no artigo 272.º do Código do Trabalho, determinar a remuneração aplicável em cada ano de duração e, sobre o valor da remuneração aplicável em cada ano, quantificar o valor devido a título de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal em cada ano, conforme peticionou a Recorrida.
AAA. Porém, ao arrepio das duas hipóteses acima assinaladas, também aqui o Tribunal a quo fez uma errada aplicação das normas previstas nos artigos 263.º, 264.º e 261, n.º 3 do Código do Trabalho.
BBB. Em primeiro lugar, o Tribunal a quo errou ao quantificar o montante recebido nos últimos 12 (doze) meses em que vigorou o contrato de trabalho, tendo, isso sim, contabilizado os últimos 26 (vinte e seis) meses, o que resultou no apuramento errado de um valor global de € 25.752,84 (vinte e cinco mil setecentos e cinquenta e dois euros e oitenta e quatro cêntimos) ao invés dos € 13.174,06 (treze mil cento e setenta e quatro euros e seis cêntimos) que a Recorrida efetivamente recebeu nesse período e que, em consequência, resultou num calculo de um valor médio errado de € 2.146,07 (dois mil cento e quarenta e seis euros e sete cêntimos) ao invés do valor de € 1.097,84 (mil e noventa e sete euros e oitenta e quatro cêntimos).
CCC. Contudo, ainda que o Tribunal a quo não pretendesse, ou considerasse não ser necessário, determinar o valor da retribuição nos termos do disposto no artigo 272.º do Código do Trabalho – o que mais uma vez não se concede – então, quanto muito deveria ter aplicado o disposto no artigo 261.º, n.º 3 em cada ano em que se venceriam subsídios de férias, férias e subsídios de natal, conforme, de resto, foi até peticionado pela Recorrida.
DDD. Contudo, uma vez mais erradamente, o Tribunal a quo limitou-se a determinar o valor aplicável do cálculo dos montantes auferidos nos últimos 12 meses da relação contratual (também este incorreto, conforme se explicou) para proceder ao cálculo das férias, dos subsídios de férias e dos subsídios de Natal que se foram vencendo ao longo dos vários anos da relação contratual existente entre as partes e cujos montantes, nos 12 meses anteriores ao seu vencimento, foram muito inferiores, conforme resulta do ponto 5 da matéria de facto dada como provada.
EEE. Por todo o exposto, e porque caso o tribunal tivesse feito uma correta interpretação do direito aplicável e, em consequência, tivesse considerado que a contraprestação financeira acordada pelas partes já compensava toda a atividade desenvolvida pela Recorrida, nenhum montante seria devido pela Recorrente, deverá a Sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que absolva a Recorrente desta parte do pedido.
FFF. Caso assim não se entenda, então, procedendo à determinação do montante de retribuição nos termos do artigo 272.º, n.º 1 do Código do Trabalho, caberia ao Tribunal a quo ter procedido ao cálculo do montante devido anualmente a título de férias, de subsídio de férias e de subsídio de Natal, o que seria, conforme se explicou, muito inferior ao montante objeto de condenação, pelo que também segundo esta interpretação deverá a Sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que absolva a Recorrente desta parte do pedido.
GGG. Por fim, ainda que se entenda que as partes haviam acordado uma retribuição variável – o que, reitera-se, não se concede -, então deveria o tribunal a quo ter procedido ao cálculo da média dos montantes auferidos nos 12 meses anteriores ao vencimento de cada prestação e não ao mero calculo de tais prestações sobre o montante devido nos últimos 12 meses da relação contratual, pelo que também segundo esta interpretação deverá a Sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que absolva a Recorrente desta parte do pedido.
HHH. Além dos montantes relativos às férias, subsídios de férias e subsídios de Natal, o Tribunal a quo condenou ainda a Recorrente a pagar à Recorrida o montante de € 10.150,82 (dez mil cento e cinquenta euros e oitenta e dois cêntimos) a título de subsídios de refeição.
III. Para o efeito, e sem que a Recorrida o tivesse sequer alegado, justificou tal condenação com a aplicação da Portaria de Condições de Trabalho para os Trabalhadores Administrativos à relação de trabalho em apreço, condenando a Recorrente no montante resultante do cálculo do valor mínimo do subsídio de refeição diário de cada ano multiplicado por 242 dias anuais.
JJJ. Sucede que, nos termos do disposto no artigo 1.º, n.º 2, al. a) da Portaria das Condições do Trabalho dos Trabalhadores Administrativos, a referida portaria não é aplicável às relações de trabalho em sejam parte empregadores que exerçam atividade pela qual se possam filiar em associação de empregadores legalmente constituída.
KKK. Ora, considerando a atividade comercial desenvolvida pela Recorrente, a mesma poderia filiar-se na APCC - Associação Portuguesa de Contact Centers, a qual encontrou-se legalmente registada como associação de empregadores desde 27 de abril de 2005 até ao passado dia 8 de agosto de 2021, data em que tal registo foi cancelado, conforme Boletim do Trabalho e do Emprego n.º 29, de 8 de agosto de 2021.
LLL. Em face do exposto, pelo menos até à referida data, as Portarias que subsequentemente foram aplicadas pelo Tribunal a quo para determinação do montante devido à Recorrida a título de subsídio de refeição não lhes eram aplicáveis.
MMM. Assim, e porque inexistia base legal que obrigasse a Recorrente ao pagamento do subsídio de refeição à Recorrida, o Tribunal a quo fez uma errada interpretação do direito aplicável.
NNN. Do mesmo modo, fosse considerado todo o período de relação contratual entre a Recorrente e a Recorrida ou, por força do acima exposto, apenas o período entre os dias 9 de agosto de 2021 e o dia 31 de maio de 2022, nunca o Tribunal a quo poderia condenar a Recorrente no pagamento do subsídio de refeição conforme o fez na medida em que, não sendo o subsídio de refeição uma componente retributiva – visando apenas a comparticipação das despesas com a refeição tomada fora do domicilio do trabalhador por força da prestação de trabalho - o mesmo apenas é pago em dias de trabalho efetivo dos trabalhadores, não sendo pago em dias de férias ou de ausência dos mesmos.
OOO. Ora, ainda que o Tribunal a quo considerasse que tal montante, em abstrato, era devido, apenas poderia proceder ao pagamento de tal montante pelo número de dias em que a Recorrida tivesse efetivamente desempenhado as suas funções, porém nem a Recorrida os alegou nem os demonstrou, pelo que, ao abrigo do principio do dispositivo, não poderia o Tribunal a quo limitar-se a presumir essa prestação para, assim, condenar a Recorrente no pagamento de uma quantia que não tem qualquer suporte na matéria de facto que foi colocada à sua apreciação.
PPP. Nestes termos, requer-se a V. Exas., também com este fundamento, que a Sentença recorrida seja revogada, substituindo-se a mesma por outra que absolva a Recorrente desta parte do pedido.
ASSIM, VENERANDOS DESEMBARGADORES, CONCEDENDO INTEGRAL PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO E, EM CONSEQUÊNCIA, REVOGANDO A SENTENÇA RECORRIDA, FARÃO V. EXAS. A TÃO ESPERADA E COSTUMADA JUSTIÇA».

Não tendo sido apresentadas contra-alegações, foi seguidamente o recurso admitido na 1.ª instância, como de apelação, com subida imediata, nos autos, e efeito devolutivo.
No mesmo despacho, a exma. julgadora a quo pronunciou-se sobre a arguida nulidade da sentença, a negar a mesma, reafirmando para tanto o que, a propósito, escreveu na sentença:
«Não descuramos que o referido valor, contido no mesmo objeto do litígio, é superior ao peticionado pela Autora. Mas tal não veda que o Tribunal condene a Ré no seu pagamento quando tal resulta de preceitos legais inderrogáveis, e quando, ademais, a Autora no pedido formulado também pediu a condenação da Ré no pagamento de todas as quantias que, a final, se vier a apurar serem-lhe devidas, relativamente ao qual a Ré teve oportunidade de se defender».

Subidos os autos a este tribunal, neles a exma. procuradora-geral adjunta emitiu douto parecer, que não foi objeto de resposta, no qual se pronunciou pela nulidade da sentença, na parte em que condenou a Ré alem do pedido, e, quanto ao restante, pela improcedência do recurso.

Colhidos os vistos legais e realizada a conferência, cumpre apreciar e decidir.

II. Objeto do recurso
É consabido que são as conclusões das alegações de recurso que delimitam o objeto deste (artigo 635.º, n.º 4 e artigo 639.º, n.º 1 e 2, ambos do Código de Processo Civil, ex vi do artigo 87.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho).
No caso, face às conclusões formuladas pela recorrente são as seguintes as questões a decidir:
1. Da nulidade da sentença, por condenação em quantidade superior ao pedido, a título de férias, subsídio de férias e de Natal (artigo 615.º, n.º 1, alínea e), do Código de Processo Civil):
2. se o montante pago pela aqui recorrente à recorrida, a título de contrato de prestação de serviço, já “compensa” toda a atividade por esta desenvolvida, ainda que agora com a qualificação jurídica de contrato de trabalho;
3. em caso negativo, se é possível estabelecer uma equivalência entre as prestações que a Autora recebeu da Ré, sob a denominação de “recibos verdes” e prestação de serviço, e o que deveria ser pago como contrato de trabalho e, em caso negativo, se deveria o tribunal ter determinado a retribuição “tendo em conta a prática da empresa e os usos do sector ou locais” (cfr. artigo 272.º do Código do Trabalho);
4. Se são devidas à Autora importâncias a título de subsídio de refeição.

III. Matéria de facto
Na 1.ª instância foi dada como provada a seguinte matéria de facto, que se aceita por não vir impugnada nem se vislumbrar fundamento para a sua alteração:
1. Por sentença proferida, em 14/06/2022 já transitada em julgado, no processo n.º 348/22...., do ... de ... – Juiz ..., foi reconhecido a existência de contrato de trabalho entre a A. e a R., desde 1 de julho de 2012.
2. Da referida sentença resulta, entre o mais, a seguinte factualidade aí considerada provada:
«[...]
1. A ré é uma sociedade por quotas, tendo como objeto social prestação de serviços de telecomunicações e do estabelecimento, gestão e exploração de redes de telecomunicações e infocomunicações. Desenvolvimento, distribuição e comercialização de software, hardware e consumíveis de informática.
2. No estabelecimento sito no Zona Industrial de ... em ... a ré desenvolve atividade de processamento de funcionalidades bancárias, em regime outsourcing, para o Banco Millenium BCP, seu único ou principal cliente.
[...]
97. No dia referido em 3, a partir do estabelecimento da ré ali mencionado, AA, de forma ininterrupta, pelo menos desde 1 de julho de 2012, executava para a ré atividades de arquivo e procedia à avaliação da conformidade de documentação técnica proveniente das sucursais do Banco Millennium BCP, constituindo basicamente as suas funções verificar se a mesma está devida e corretamente preenchida e assinada por quem de direito, devolvendo às respetivas sucursais a documentação que não for achada conforme, para as subsequentes correções, bem como preparar e separar toda a documentação oriunda de tais sucursais.
98. Para realizar tais tarefas AA utiliza instrumentos de trabalho e materiais que são pertença quer do Banco Millenium BCP, como leitor ótico de código de barras, digitalizador, um computador e “software”, quer da ré, como instalações, mesas, cadeiras, canetas, lápis, papel e outros.
99. AA pode trazer material de escritório a suas expensas para as instalações da ré.
100. Para o desempenho das suas tarefas, AA recebe ordens e orientações das trabalhadoras BB (coordenadora) e CC (supervisor), ambos trabalhadores dos quadros da ré.
101. AA tem que comunicar à sua coordenadora, BB e ao supervisor, CC, o seu período de férias, que a ré denomina de “ausências programadas” e as suas faltas ao trabalho, que não são remuneradas.
102. AA encontra-se sujeita aos regulamentos internos da ré, nomeadamente de sigilo bancário; participa nas reuniões de equipa para coordenação dos trabalhos a efetuar; tem um endereço de correio eletrónico, interno fornecido pelo Banco Millennium BCP; possui um cartão magnético que lhe permite a entrada nas instalações da ré; tem formação ministrada por esta, regista os seus tempos de trabalho no computador e é a ré quem responde pelos danos a terceiros e/ou deficiências do trabalho que aquela presta.
103. Tendo em conta a natureza e o sigilo bancário dos assuntos tratados por AA, o material informático utilizado tem que ser fornecido pelo Banco e não é possível que o serviço seja prestado de forma remota.
104. AA subscreveu com a ré um documento denominado “contrato de prestação de serviços” em 29/06/2012, para produzir efeitos em 01/07/2012.
105. AA cumpre horário de trabalho determinado e controlado pela ré, de segunda a sexta-feira e que decorre diariamente das 08h30m às 17h30m, com pausa para almoço e descanso aos sábados e domingos.
106. Como contrapartida da prestação da sua atividade AA auferia da ré, com periodicidade mensal, uma quantia que oscila entre cerca de 800,00 a 1000,00 euros, pagos por transferência bancária, emitindo o respetivo recibo eletrónico de prestação de serviços.
107. Este é o único rendimento que AA aufere.
108. AA não aufere a mesma quantia em todos os meses, sendo pago pela ré por ato executado, de acordo com a tabela junta ao documento designado “contrato de prestação de serviços”.
109. AA presta a sua atividade laboral em exclusivo à ré.
110. A exclusividade na prestação da atividade para a ré não é imposta por esta a AA. [...]» (sic).
3. Até à referida sentença a A. não tinha os seus direitos reconhecidos, enquanto trabalhadora por conta de outrem, sendo o seu vencimento pago mediante emissão de “recibos verdes”, como se tratasse de uma prestadora de serviços.
4. Recebendo uma quantia mensal variável, apenas por doze meses e nos dias em que prestasse o seu trabalho efetivo, não recebendo subsídio de férias, subsídio de natal, subsídio de alimentação e férias pagas ou quaisquer outras prestações.
5. Desde o mês de julho de 2012, até ao mês de maio de 2022 a A. emitiu “recibos verdes” à R., nos seguintes valores:

RECIBO
DATA EMISSÃO
        VALOR
14
10/07/2012
        € 1.009,88
15
08/08/2012
        € 943,44
16
31/08/2012
        € 944,05
17
09/10/2012
        € 356,63
18
13/11/2012
        € 1.135,58
19
07/12/2012
        € 755,10
20
09/01/2013
        € 1.075,55
21
07/02/2013
        € 970,71
22
05/03/2013
        € 965,88
23
02/04/2013
        € 942,14
24
07/05/2013
        € 1.167,19
25
11/06/2013
        € 1.143,54
26
12/07/2013
        € 709,31
27
09/08/2013
        € 1.170,41
28
05/09/2013
        € 743,09
29
        11/10/2013
€ 273,74
30
        01/11/2013
€ 542,53
31
        06/12/2013
€ 200,59
32
        06/01/2014
€ 712,18
33
        07/02/2014
€ 780,24
34
        07/03/2014
€ 726,60
35
        04/04/2014
€ 868,37
36
        13/05/2014
€ 789,39
37
        03/06/2014
€ 779,38
38
        27/06/2014
€ 867,26
39
        07/08/2014
€ 718,66
40
        04/09/2014
€ 864,85
41
        10/10/2014
€ 573,34
42
        12/11/2014
€ 978,03
43
        04/12/2014
€ 1.047,90
44
        13/01/2015
€ 836,25
45
        10/02/2015
€ 832,47
46
        13/03/2015
€ 1.000,58
47
        07/04/2015
€ 1.021,48
48
        11/05/2015
€ 933,34
49
        02/06/2015
€ 741,37
50
        09/07/2015
€ 873,69
51
        12/08/2015
€ 767,32
52
        04/09/2015
€ 583,84
53
        08/10/2015
€ 478,46
54
        06/11/2015
€ 1.002,66
55
        10/12/2015
€ 879,93
56
        08/01/2016
€ 953,36
57
        12/02/2016
€ 1.034,59
58
        10/03/2016
€ 1.066,92
59
        12/04/2016
€ 946,02
60
        11/05/2016
€ 922,30
61
        07/06/2016
€ 862,23
62
        08/07/2016
€ 859,98
63
        10/08/2016
€ 572,79
64
        01/09/2016
€ 756,59
65
        12/10/2016
€ 537,84
66
        11/11/2016
€ 743,25
67
        14/12/2016
€ 673,71
68
        11/01/2017
€ 685,51
69
        07/02/2017
€ 893,72
70
        13/03/2017
€ 709,70
71
        12/04/2017
€ 583,98
72
        10/05/2017
€ 754,99
73
        08/06/2017
€ 694,92
74
        07/07/2017
€ 747,58
76
        09/08/2017
€ 531,18
77
        13/09/2017
€ 609,98
78
        11/10/2017
€ 437,88
79
        10/11/2017
€ 751,77
80
        13/12/2017
€ 820,32
81
        12/01/2018
€ 695,67
82
        08/02/2018
€ 982,47
83
        08/03/2018
€ 954,57
84
        11/04/2018
€ 918,81
85
        08/05/2018
€ 873,64
86
        12/06/2018
€ 852,28
87
        02/07/2018
€ 735,85
88
        14/08/2018
€ 480,59
90
        13/09/2018
€ 999,29
91
        04/10/2018
€ 657,72
92
        09/11/2018
€ 894,78
93
        04/12/2018
€ 894,01
94
        08/01/2019
€ 716,28
95
        12/02/2019
€ 804.04
96
        13/03/2019
€ 1.001,04
97
        10/04/2019
€ 1.120,42
98
        13/05/2019
€ 842,16
99
        11/06/2019
€ 1.290,48
100
        02/07/2019
€ 803,12
101
        07/08/2019
€ 575,69
102
        03/09/2019
€ 1.180,40
103
        08/10/2019
€ 481,05
105
        08/11/2019
€ 870,52
106
        03/12/2019
€ 247,62
107
        09/01/2020
€ 729,76
108
        06/02/2020
€ 1.076,23
109
        06/03/2020
€ 850,47
110
        01/04/2020
€ 1.127,89
111
        05/05/2020
€ 606,15
112
        02/06/2020
€ 726,31
113
        02/07/2020
€ 811,58
114
        03/08/2020
€ 586,97
115
        01/09/2020
€ 910,83
116
        01/10/2020
€ 390,30
117
        04/11/2020
€ 696,01
118
        04/12/2020
€ 1.061,66
119
        04/01/2021
€ 858,51
120
        01/02/2021
€ 1.242,65
121
        02/03/2021
€ 940,23
122
        05/04/2021
€ 1.233,61
123
        03/05/2021
€ 1.289,77
124
        02/06/2019
€ 1.224,12
125
        02/07/2021
€ 727,81
127
        23/07/2019
€ 786,32
128
        01/09/2021
€ 942,30
129
        01/10/2021
€ 489,34
130
        03/11/2021
€ 1.257,27
131
        03/12/2021
€ 1.202,75
132
        03/01/2022
€ 1.489,73
133
        02/02/2022
€ 1.300,72
134
        02/03/2022
€ 1.247,77
135
        05/04/2022
€1.246,19
136
        10/05/2022
€1.218,92
137
        31/05-2022
€1.264,94
6. Por iniciativa da A., foi posto termo ao contrato de trabalho que a unia à R. em 31 de maio de 2022.
7. Por contrato de trabalho a termo certo celebrado entre a Ré e DD no dia 01/04/2002, contra a prestação de funções inerentes à categoria de operadora de registo de dados de 2.ª, num horário de 2.ª a 6.ª feira, das 8h30 às 12h30 e das 13h30 às 15h30, a Ré comprometeu-se a pagar à trabalhadora a retribuição mensal ilíquida de € 425,97, acrescida de subsídio de alimentação no valor de € 115,28, para além das quantias que tiver de despender no exercício da atividade, documentalmente comprovadas.
8. Por contrato de trabalho a termo certo celebrado entre a Ré e EE no dia 31/12/2004, contra a prestação de funções inerentes à categoria de operadora de registo de dados de 2.ª, num horário de 2.ª a 6.ª feira, das 8h30 às 12h30 e das 13h30 às 15h30, a Ré comprometeu-se a pagar à trabalhadora a retribuição mensal ilíquida de € 450,00, acrescida de subsídio de alimentação no valor de € 105,00, para além das quantias que tiver de despender no exercício da atividade, documentalmente comprovadas.

IV. Fundamentação
1. Da arguida nulidade da sentença
A este propósito, considera a recorrente que a sentença é nula por a ter condenado «(…) numa quantia que é superior ao dobro da quantia peticionada pela Recorrida na sua Petição Inicial».
Pronunciando-se sobre a referida condenação em valor superior ao pedido, a exma. julgadora a quo negou que se verifique a arguida nulidade da sentença, por, como já tinha deixado referido na sentença, estarem não só em causa preceitos legais inderrogáveis, como também por ter sido pedida a condenação da Ré no pagamento de todas as quantias que, «(…) a final, se vier a apurar serem-lhe devidas, relativamente ao qual a Ré teve oportunidade de se defender».
Vejamos.

É incontroverso que nos termos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea e), do Código de Processo Civil, aplicável ex vi do artigo 1.º, n.º 2, alínea a), do Código do Processo do Trabalho, é nula a sentença quando o juiz condene em quantidade superior do pedido, e no caso verificou-se tal condenação.
Porém, estipula o artigo 74.º, do Código de Processo do Trabalho, que o juiz deve condenar em quantidade superior ao pedido ou em objeto diverso dele quando isso resulte da aplicação à matéria provada, ou aos factos de que possa servir-se, nos termos do artigo 412.º, do Código de Processo Civil, de preceitos inderrogáveis de leis ou instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho.
Ora, pergunta-se: será essa situação no caso em apreço?
A nossa resposta, adiante-se já, é negativa.
Expliquemos porquê.

Como resulta do preceito legal antes referido, para haver lugar à referida condenação é necessária a verificação cumulativa de dois pressupostos:
(i) que isso resulte da aplicação à matéria provada ou aos factos de que possa servir-se, mantendo-se, embora, a mesma causa de pedir;
(ii) que estejam em causa preceitos inderrogáveis de leis ou instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho.
Com a referida norma o legislador adotou uma orientação diferente da que vigora no direito processual civil, justificada, como escreve Leite Ferreira (Código de Processo do Trabalho Anotado, 4.ª Edição, Coimbra Editora, pág. 352; a anotação refere-se ao artigo 69.º do Código de Processo do Trabalho de 1981, que corresponde ao artigo 74.º do Código de Processo do Trabalho aqui aplicável), com a necessidade de «(…) protecção do trabalhador e a harmonia social dos factores de produção [que são] de interesse e ordem pública. Ao lado do interesse individual de determinado trabalhador na satisfação efectiva do seu direito, há ainda e também o interesse mais vasto, de natureza social, em que os direitos dos trabalhadores em geral obtenham, de facto, uma realização integral. Aquelas normas são, pois, imperativas e indisponíveis, e, como tais, não podem ser afastadas por livre determinação da vontade das partes».
Contudo, como se explicita no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13-05-1998 (Revista n.º 53/98 – 4.ª Secção), o regime excecional do art.º 69, do CPT de 1981 (a que corresponde o artigo 74.º do atual Código de Processo do Trabalho), que impõe ao juiz o dever de condenar em quantia superior ao pedido ou em objeto diverso dele, só tem cabimento nos casos de direitos de existência e exercício necessários, como é o direito a indemnização por acidente de trabalho (neste sentido, veja-se também o acórdão do mesmo tribunal de 31-10-2007, Recurso n.º 2091/07, disponível em www.dgsi.pt).
Perante um direito de existência necessária (que não pode ser afastado no plano jurídico, mas sim no plano prático da vontade das partes), como é o caso, por exemplo, do pagamento de diferenças retributivas após a cessação do contrato de trabalho, ou férias, subsídio de férias e de natal, ou subsídio de alimentação, não estando os mesmo contidos (parcial ou integralmente) nos pedidos, não se justifica a aplicação daquele preceito legal.
Como se escreveu no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27-04-2005 (Recurso n.º 4565/01 – 4.ª Secção) a indisponibilidade dos direitos de natureza pecuniária emergentes do contrato de trabalho apenas se mantém durante a vigência do contrato, a fim de obstar a que o estado de subordinação jurídica e económica relativamente à entidade empregadora possa afetar o exercício desses direitos pelo trabalhador. Mas aquela indisponibilidade deixa de vigorar após a cessação do contrato de trabalho, pois cessando igualmente aquele estado de subordinação não há qualquer impedimento legal a que o trabalhador disponha livremente do seu direito às retribuições.
De resto, a jurisprudência, ao que se conhece uniforme, do Supremo Tribunal de Justiça tem sido nesse mesmo sentido, ou seja, de que a indisponibilidade dos direitos de natureza pecuniária emergentes do contrato de trabalho apenas existe durante a sua vigência pelo que, findo o contrato, pode o trabalhador renunciar (expressa ou tacitamente) a eles [vide, entre outros, os acórdãos de 18-06-2003 (Recurso n.º 836/03), de 03-03-2005 (Recurso n.º 3154/04, e o já referido acórdão de 31-10-2007), de 19-12-2018 (Proc. n.º 620/16.1T8LMG.C1.S1) e, mais recentemente, o acórdão de 12-04-2024 (Proc. n.º 13358/20.6T8LSB.L1.S1), todos da 4.ª Secção e disponíveis em www.dgsi.pt].
Ora, volvendo ao caso em análise, constitui facto incontroverso que o contrato que vigorou entre as partes cessou em 31-05-2022 (facto n.º 6); por isso, face a tal cessação, quando a Autora intentou a ação (em 05-04-2023) podia dispor livremente dos direitos de natureza pecuniária emergentes do contrato de trabalho.
Por consequência, não é aqui aplicável o disposto no artigo 74.º do Código do Processo do Trabalho para fundamentar a condenação da Ré em quantidade superior ao pedido.

Mas para tal condenação o tribunal a quo ancorou-se também no entendimento de que a Autora pediu a condenação de todas as quantias que, «(…) a final, se vier a apurar serem-lhe devidas», intuindo-se daí que considerou que a Autora formulou um pedido genérico.
Porém, só é possível formular um pedido genérico nas situações taxativamente previstas no artigo 556.º do Código de Processo Civil, ou seja, quando o objeto mediato da ação seja uma universalidade, de facto ou de direito [n.º 1, alínea a)], quando não seja ainda possível determinar, de modo definitivo, as consequências do facto ilícito, ou o lesado pretenda usar da faculdade que lhe confere o artigo 569.º do Código Civil [n.º 1, alínea b)], ou quando a fixação do quantitativo esteja dependente da prestação de contas ou de outro ato que deva ser praticado pelo réu (n.º 1, alínea c)].
Manifestamente que no caso não está em causa qualquer das situações elencadas que permita a formulação de pedido genérico.
E , fora de tais situações, como já ensinava Alberto dos Reis (Comentário ao Código de Processo Civil, vol. 3.º, Coimbra Editora, a pág. 187; embora no domínio de anterior legislação, a doutrina é aqui aplicável), se o Autor formula um pedido genérico pratica um ato que a lei não admite , pelo que se o erro não for sanado e comprometer o êxito da ação, «(…) o juiz julgará esta improcedente, quando haja de conhecer do mérito da causa».
Tal significa, tendo em conta o caso em apreço, que o tribunal apenas poderia/á considerar os pedidos concretos que foram formulados pela Autora; já quanto ao pedido, genérico, de condenação de todas as quantias que, «(…) a final, se vier a apurar serem-lhe devidas», teria que desconsiderar o mesmo ou, noutra, perspetiva, julgá-lo improcedente.
Nesta sequência, jamais o tribunal a quo podia ancorar-se em tal pedido genérico para condenar a Ré em valor muito superior ao pedido.
Aqui chegados, é, pois, de concluir que inexistia fundamento legal para o tribunal a quo condenar em quantidade superior ao pedido quanto a retribuição de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal, pelo que, com tal fundamento, a sentença é nula nessa parte.
Face à regra de substituição ao tribunal recorrido, prevista no artigo 665.º do Código de Processo Civil, este tribunal conhecerá infra do objeto da apelação e suprirá a referida nulidade.
Procedem, pois, nesta parte, as conclusões das alegações de recurso.

2. Quanto a saber se o montante pago pela aqui recorrente à recorrida, a título de contrato de prestação de serviço, já “compensa” toda a atividade por esta desenvolvida, ainda que agora com a qualificação jurídica de contrato de trabalho
A este propósito a recorrente alegou, em síntese, que «(…) tendo a contraprestação acordada visado, conforme se explicou, remunerar toda a atividade desenvolvida pela Recorrida, a condenação, mais de 12 anos depois do início da relação contratual entre as partes, no pagamento de subsídios de férias, de natal e de férias remuneradas, bem como de despesas relacionadas com a alimentação da Recorrida representaria um verdadeiro enriquecimento sem causa, pelo que deveria o Tribunal a quo reconhecer que, além dos montantes que foram pagos pela Recorrente à Recorrida, nada mais era devido».
Não se anui a tal entendimento.

Tenha-se presente que o contrato de trabalho é aquele pelo qual uma pessoa se obriga, mediante retribuição, a prestar a sua atividade a outra ou outras pessoas, sob a autoridade e direção destas (artigo 11.º do Código do Trabalho e artigo 1152.º do Código Civil).
Avulta, pois, na definição de contrato de trabalho que a pessoa obriga-se a prestar a sua atividade a outra, mediante retribuição e sob a autoridade e direção dessa outra pessoa.
Por seu turno, contrato de prestação de serviços é aquele em que uma das partes se obriga a proporcionar a outra um certo resultado do seu trabalho intelectual ou manual, com ou sem retribuição (artigo 1154.º, do Código Civil).
Tendo em consideração que o contrato de trabalho é um negócio meramente consensual (artigo 110.º do Código do Trabalho), o que igualmente sucede com o contrato de prestação de serviço (artigo. 219.º do Código Civil), deverá alcançar-se a determinação da sua existência e dos seus contornos pelo comportamento das partes, pela análise da situação de facto, no que habitualmente é denominado “princípio da primazia da realidade”.
Ou seja, o que releva, para efeito de qualificação do contrato, não é a designação escolhida pelas partes nem os termos em que foi redigido, mas sim os termos em que o mesmo foi executado: no dizer de João Leal Amado (O contrato de trabalho entre a presunção legal de laboralidade e o presumível desacerto legislativo, in Temas Laborais 2, Coimbra, 2007, p. 12), “os contratos são o que são e não o que as partes dizem que são”.

Pois bem: no caso as partes celebraram um contrato, que denominaram de prestação de serviço, em que, como contrapartida do mesmo, a Autora auferia, com periodicidade mensal, uma quantia que oscilava entre € 800,00 e € 1.000,00 (n.º 2 dos factos provados).
Todavia, por decisão já transitada em julgado, o tribunal decidiu que esse contrato era(é) de qualificar como de trabalho.
Ora, se esse contrato era de trabalho haverá que retirar daí as consequências jurídicas, designadamente tendo em conta o pedido quanto a férias, subsídio de férias, subsídio de Natal e subsídio de alimentação.
Daí que, ressalvado o devido respeito pela argumentação da recorrente, não se alcança como pode afirmar-se que nos montantes pagos à Autora, com a qualificação de contrato de prestação de serviço, já estariam incluídos as quantias eventualmente devidas referentes aos pedidos formulados na ação: se as partes, pela qualificação que atribuíram ao contrato, não previram sequer que fosse devida qualquer quantia por férias, subsídio de férias e de Natal, é contraditório vir agora afirmar que pese embora o contrato ter sido de trabalho, as consequências/direitos daí decorrentes para a trabalhadora, maxime quanto às matérias em referência, já foram cumpridas nos pagamentos efetuados como contrato de prestação de serviço.
E nem se diga que configura enriquecimento sem causa a trabalhadora vir a receber valores para além dos que foram pagos como contrato de prestação de serviço, pois do que se trata é de cumprir o que se encontra estipulado na lei, rectius, no Código do Trabalho, quanto ao regime de férias (artigo 237.º e segts.), subsídio de férias (artigo 264.º) e subsídio de Natal (artigo 263.º), pelo que existe causa justificativa para o pagamento (cfr. artigo 473.º do Código Civil).
Improcedem, por consequência, nesta parte, as conclusões das alegações de recurso.

3. Quanto a saber se é possível estabelecer uma equivalência entre as prestações que a Autora recebeu da Ré, como existindo entre as partes uma prestação de serviço, e o que deveria ser pago como contrato de trabalho e, em caso negativo, se deveria o tribunal ter determinado a retribuição “tendo em conta a prática da empresa e os usos do sector ou locais” (cfr. artigo 272.º do Código do Trabalho)
A resposta a esta questão já resulta, ainda que implícita, da resposta à questão anterior.
É incontroverso que as importâncias que a Ré/recorrente pagou à Autora/recorrida, e cujos valores constam do facto n.º 5, o foram sob a qualificação do contrato existente entre as partes como de prestação de serviço.
Todavia, como se viu, o contrato era de qualificar – e veio a sê-lo – como de trabalho, e não de prestação de serviço.
Neste sentido, as importâncias pagas pela recorrente à recorrida, como de prestação de serviço, terão, face à alteração da qualificação do contrato, que ser consideradas retribuição, desde que, como se verifica, não violem normas legais imperativas, ou decorrentes de instrumentos de regulamentação coletiva.
Isto é, e dito de outro modo: no contrato celebrado, que as partes denominaram prestação de serviço, foi acordada uma contraprestação pela prestação da atividade; tendo o tribunal qualificado esse contrato como de trabalho, a contraprestação mantém-se, correspondendo à retribuição da trabalhadora: o que varia, pois, é apenas o nomen juris do contrato, com as consequências daí decorrentes em termos de objeto da ação.
Aliás, certamente por isso a Autora não peticionou na ação quais importâncias a título de retribuição, stricto sensu.
Assim, ao contrário do sustentado pela recorrente, em rigor não se trata de uma “equiparação” entre a contraprestação por uma prestação de serviço e perante o contrato de trabalho: do que se trata é que a Ré pagou à Autora determinadas importâncias pela atividade por esta prestada para aquela, que veio a ser qualificada pelo tribunal como contrato de trabalho, pelo que essas importâncias correspondem à retribuição.
Daí que não se possa falar em falta de acordo das partes quanto à retribuição e convocar o disposto no artigo 272.º do Código do Trabalho: o acordo foi o pagamento daquelas importâncias, independentemente do nomen juris do contrato.
Assim se compreende que a Autora não tenha peticionado o pagamento de qualquer estrita retribuição pela atividade, mas sim, considerando que entre as partes existiu um contrato de trabalho, que se extraiam daí as consequências legais, maxime no que às férias, subsídio de férias, subsídio de Natal e subsídio de refeição diz respeito.
Ou seja, e reafirmando o já exposto: uma vez que se está perante um contrato de trabalho, importa daí retirar as consequências legais quanto aos direitos da Autora/trabalhadora, na vigência daquele, no que respeita aos pedidos referentes a férias, subsídio de férias, subsídio de Natal e subsídio de alimentação.
Aliás, afigura-se que idêntica conclusão se alcançaria – quanto ao valor da retribuição da Autora – se, como sustenta a recorrente, houvesse lugar à aplicação do disposto no artigo 272.º do Código do Trabalho: se a prática da empresa era o pagamento ao “prestador de serviço” em função do resultado, este cumpria, conforme consta da ação de reconhecimento do contrato de trabalho, um horário de trabalho das 8.30h às 17.30h, com pausa para almoço e descanso aos sábados e domingos, as importâncias recebidas ao longo dos anos variaram entre € 800,00 e € 1.000,00 mensais, afigura-se por equilibrado que o valor da retribuição seja fixada, para os fins em vista, em relação a cada ano pela média das prestações recebidas mensalmente nesse ano pela trabalhadora.
Improcedem, por consequência, também nesta parte, as conclusões das alegações de recurso.

4. Quanto às importâncias devidas a título de férias, subsídio de férias e de Natal
Sobre esta matéria, haverá que ter presente que o trabalhador tem direito, em cada ano civil, a um período de férias retribuídas que se vence em 1 de janeiro, sendo que no ano da admissão tem direito a 2 dias úteis por cada mês de duração do contrato, até 20 dias (artigos 237.º e 239.º).
Tem também direito a um subsídio de férias, assim como tem direito a um subsídio de Natal, de valor igual ao da retribuição, sendo que no ano da admissão e da cessação do contrato o subsídio de Natal é proporcional ao tempo de serviço prestado (artigos 263.º e 264.º do compêndio legal em referência).
E como é consabido, numa ação em que pretende ver reconhecidos créditos salariais, deve o trabalhador alegar e provar os factos constitutivos do seu direito (n.º 1 do art.º 342.º do Código Civil), ou seja, a celebração e vigência do contrato de trabalho e a prestação de trabalho em determinado período (ou a sua suspensão sem perda de retribuição) relativamente ao qual formula o seu pedido de pagamento destes créditos.
Deve ainda alegar as retribuições/subsídios que efetivamente auferiu no período em causa, para possibilitar a quantificação das diferenças que lhe sejam devidas.
Uma vez demonstrada a vigência do contrato de trabalho (como facto jurídico genético de direitos e obrigações para as partes) e igualmente demonstrado que o trabalhador realizou a prestação a que se obrigou pelo mesmo (ou que, apesar de suspenso, mantém o direito à mesma), será de concluir que nasceu na sua esfera jurídica o direito à contraprestação.
Esta contraprestação consubstancia-se na obrigação retributiva que recai sobre a entidade empregadora por força do disposto nos artigos 11.º e 258.º e segts. do Código do Trabalho.
O cumprimento desta obrigação (pagamento das retribuições e subsídios) traduz-se, pois, num facto extintivo dos direitos que o trabalhador pretende fazer valer (cfr. os arts. 762º e segts. do Código Civil).
E, sendo o pagamento um facto extintivo do direito do credor, constitui o mesmo uma exceção de cariz perentório a invocar pelo eventual devedor, a quem incumbe o respetivo ónus probatório – vide, neste sentido, Manuel de Andrade, in “Noções Elementares de Processo Civil”, pp.132 e ss., e os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 18-06-2003 (Revistas nº 1198/03 e n.º 3707/02, da 4ª Secção), e de 30-01-2002 (Revista nº 1433/01 da 4ª Secção).
Pois bem: face á decisão judicial já transitada em julgado, constitui facto incontroverso que entre a apelante e a apelada vigorou um contrato de trabalho.
Esta veio peticionar o pagamento que entende ser-lhe devido a título de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal.
À apelante competia provar que procedeu a esse pagamento, o que, face à análise já efetuada, não fez, pelo que não pode deixar de ser condenada no mesmo.
Nesta sequência, impõe-se concluir que a Autora/recorrido tem direito a receber por férias, subsídio de subsídio de férias e subsídio de Natal.
Para o cálculo das importâncias devidas a esse título atender-se-á, como se concluiu supra, que estamos no âmbito de direitos disponíveis e tendo em conta as médias anuais auferidas pela trabalhadora em cada ano.

Vejamos agora as importâncias devidas à trabalhadora/recorrida.
(i) Em relação ao ano de 2012, considerando que a trabalhadora auferiu a média de remuneração de € 857,45, tem direito, a título de subsídio de férias, à quantia de € 428,72 (6/12 avos), e igual quantia a título de férias, bem como de subsídio de Natal;
(ii) em relação ao ano de 2013, considerando que a trabalhadora auferiu a média de remuneração de € 825,39, tem direito, a título de subsídio de férias, à quantia de € 825,39, e igual quantia a título de férias, bem como de subsídio de Natal;
(iii) em relação ao ano de 2014, considerando que a trabalhadora auferiu a média de remuneração de € 808,85, tem direito, a título de subsídio de férias, à quantia de € 808,85, e igual quantia a título de férias, bem como de subsídio de Natal;
(iv) em relação ao ano de 2015, considerando que a trabalhadora auferiu a média de remuneração de € 829,28, tem direito, a título de subsídio de férias, à quantia de € 829,28, e igual quantia a título de férias, bem como de subsídio de Natal;
(v) em relação ao ano de 2016, considerando que a trabalhadora auferiu a média de remuneração de € 828,97, tem direito, a título de subsídio de férias, à quantia de € 828,97, e igual quantia a título de férias, bem como de subsídio de Natal;
(vi) em relação ao ano de 2017, considerando que a trabalhadora auferiu a média de remuneração de € 685,12, tem direito, a título de subsídio de férias, à quantia de € 685,12, e igual quantia a título de férias, bem como de subsídio de Natal;
(vii) em relação ao ano de 2018, considerando que a trabalhadora auferiu a média de remuneração de € 828,31, tem direito, a título de subsídio de férias, à quantia de € 828,31, e igual quantia a título de férias, bem como de subsídio de Natal;
(viii) em relação ao ano de 2019, considerando que a trabalhadora auferiu a média de remuneração de € 827,74, tem direito, a título de subsídio de férias, à quantia de € 827,74, e igual quantia a título de férias, bem como de subsídio de Natal;
(ix) em relação ao ano de 2020, considerando que a trabalhadora auferiu a média de remuneração de € 747,83, tem direito, a título de subsídio de férias, à quantia de € 747,43, e igual quantia a título de férias, bem como de subsídio de Natal;
(x) em relação ao ano de 2021, considerando que a trabalhadora auferiu a média de remuneração de € 1.016,56, tem direito, a título de subsídio de férias, à quantia de € 1.016,56, e igual quantia a título de férias, bem como de subsídio de Natal;
(xi) relação ao ano de 2022, considerando que a trabalhadora auferiu a média de remuneração de € 1.553,66, tem direito, a título de subsídio de férias, à quantia de € 647,36 (5/12 avos, pois o contrato de trabalho cessou em 31 de maio de 2022), e igual quantia a título de férias, bem como de subsídio de Natal.
Assim, no total é devido à trabalhadora/recorrida a importância de € 8.474,13 a título de subsídio de férias, igual importância a título de férias, bem como igual importância a título de subsídio de Natal.
Procedem, por isso, nesta parte, parcialmente, as conclusões das alegações de recurso.

5. Quanto ao subsídio de alimentação (ou refeição)
Em relação a este, na petição inicial a Autora apurou a importância total de € 10.932,46, tendo a sentença recorrida condenado a Ré, a esse título, no pagamento de € 10.150,80.
Para tanto, o tribunal a quo ancorou-se no entendimento de que as condições de trabalho dos trabalhadores administrativos não abrangidos por regulamentação coletiva específica são reguladas pela Portaria n.º 736/2006, de 26 de julho, que aprovou o regulamento de condições mínimas, com alterações posteriores, e Portaria n.º 182/2018, de 22 de junho, também com alterações posteriores.
A recorrente rebela-se contra tal condenação, alegando que por força do disposto no artigo 1.º, n.º 2, al. a) da referida portaria 736/2006, a mesma não é aplicável às relações de trabalho em que sejam parte empregadores que exerçam atividade pela qual se possam filiar em associação de empregadores legalmente constituída, e que tendo em conta a atividade que exercia podia filiar-se na APCC - Associação Portuguesa de Contact Centers, a qual se encontrou legalmente registada como associação de empregadores desde 27 de abril de 2005 até ao passado dia 8 de agosto de 2021, data em que tal registo foi cancelado, conforme Boletim do Trabalho e do Emprego n.º 29, de 8 de agosto de 2021.
Assim, conclui a recorrente, até esta última data (08-08-2021) não lhe era aplicável a portaria em causa, com as alterações posteriores.
Analisemos.

Nos termos do disposto no artigo 517.º, n.º 1, do Código do Trabalho, quando circunstâncias sociais e económicas o justifiquem, não exista associação sindical ou de empregadores nem seja possível a portaria de extensão, pode ser emitida portaria de condições de trabalho.
Assim, para a emissão de uma portaria de condições do trabalho é necessário:
(i) a existência de circunstâncias sociais e económicas que a justifiquem;
(ii) inexistência de associações de trabalhadores ou empregadores;
(iii) impossibilidade de recurso à portaria de extensão.
Como se assinalou no sumário do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29-09-2021 (proc. n.º 7814/18.3T8VNG.P1.S1, disponível em www.dgsi.pt):
«As portarias de condições do trabalho têm uma natureza residual prevalecendo relativamente a estas, as portarias de extensão e, relativamente a estas, os instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho negociais, como decorre do artigo 3.º, n. º 2 do Código do Trabalho.
II- O objetivo deste tipo de portarias é o de estabelecer a regulamentação laboral coletiva em áreas económicas ou setores de atividade vedados à contratação coletiva ou em situações em que podendo haver contratação coletiva, não há associações sindicais ou de empregadores».
De acordo com o artigo 1.º da portaria n.º 736/2006, de 26 de julho, invocada na sentença recorrida:
«1 - O presente regulamento é aplicável no continente a empregadores que tenham ao seu serviço trabalhadores cujas funções correspondam a profissões constantes do anexo I, bem com a estes trabalhadores.
2 - O presente regulamento é, designadamente, aplicável a empresas públicas e de capitais públicos, sem prejuízo do disposto no regime legal e nos estatutos respetivos, a cooperativas, fundações, associações sindicais e de empregadores e outras associações sem fim lucrativo.
3. São excluídos do âmbito do presente regulamento:
a) Os partidos políticos;
b) Os empregadores que exerçam atividade pela qual se possam filiar em associação de empregadores legalmente constituída à data da publicação do presente regulamento;
c) Às relações de trabalho abrangidas por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho publicado ou já apresentado para depósito à data da publicação do presente regulamento.
4. O presente regulamento é, no entanto, aplicável a relações de trabalho em que sejam parte os empregadores referidos na alínea b) do número anterior sempre que a associação de empregadores não proceda à eleição de órgãos sociais nos últimos seis anos, bem como às relações de trabalho referidas na alínea c) do mesmo número, depois do período mínimo de vigência da convenção coletiva, desde que esta não possa ser revista por causa da extinção de associação sindical ou de empregadores outorgante ou quando a segunda não proceda à eleição de órgãos sociais nos últimos seis anos».
Daqui decorre que a referida portaria não se aplica se o empregador exercer a atividade pela qual se possa filiar em associação de empregadores legalmente constituída à data da publicação daquela.
Ora, por um lado, a aqui recorrente alega que à data, considerando a atividade comercial desenvolvida, podia filiar-se na APCC - Associação Portuguesa de Contact Centers, e, por outro lado, nenhuns outros elementos fácticos relevantes resultam dos autos, sendo certo que, como facto constitutivo do direito ao referido subsídio, à Autora recorrida competia a alegação e prova dos mesmos (artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil).
Acresce que nada foi alegado e/ou provado ao longo dos autos sobre a possibilidade de aplicação da portaria, pelo que, à míngua de outros elementos, e tendo em conta que a dúvida sobre a realidade de um facto (no caso, a possibilidade de filiação da empregadora numa associação de empregadores) se decide contra a parte a quem o facto aproveita (artigo 414.º do Código de Processo Civil), entende-se não se mostrarem preenchidos os pressupostos de aplicação da referida portaria de condições de trabalho à relação de trabalho em apreço até 08-08-2021.

E a partir dessa data?
A recorrente aceita que as portarias convocadas na sentença recorrida, designadamente a portaria 182/2018, de 22 de junho, com as alterações posteriores, lhe sejam aplicáveis, no que ao subsídio de refeição diz respeito: todavia, nega que seja devida qualquer importância a tal título à recorrida, uma vez que não alegou os concretos dias em que trabalhou.
Não se sufraga este entendimento.
Atente-se, para tanto, no que consta do facto provado sob o n.º 2: «105. AA cumpre horário de trabalho determinado e controlado pela ré, de segunda a sexta-feira e que decorre diariamente das 08h30m às 17h30m, com pausa para almoço e descanso aos sábados e domingos».
Ou seja, de acordo com a factualidade provada a Autora trabalhava/trabalhou de segunda a sexta-feira: nada mais resulta dos autos a tal propósito.
Como facto impeditivo do direito, à empregadora competia provar que a trabalhadora não prestou atividade nos dias que tinha determinado (artigo 342.º, n.º 2, do Código Civil).
Por isso, não poderá deixar de ser condenada no pagamento de subsídio de refeição referente aos dias que trabalhou, de 9 de agosto de 2021 e 31 de maio de 2022, data em que cessou o contrato de trabalho.
Por força do disposto no artigo 11.º da portaria n.º 275/2020, de 4 de dezembro, aplicável a partir de 01-12-2020, o subsídio de refeição fixou-se em € 5,00 por cada dia completo de trabalho até 01-10-2021, pela portaria n.º 292/2021, de 13 de dezembro, fixou-se em € 5,20 a partir de 01-10-2021 e pela portaria n.º 218/2022, de 1 de setembro, fixou-se em € 5,45 a partir de 01-04-2022.
Todavia, no período em causa a Autora peticionou o pagamento do subsídio com base em valor diário inferior, ou seja, € 4,77 por cada dia de trabalho (desconhece-se o fundamento jurídico para tal), pelo que, por se inserir no âmbito de direito disponível, é com base neste que se deverá calcular a importância devida.
Assim, temos:
(i) no ano de 2021: 15 dias (agosto) x € 4,77 + 22 dias x 4 meses x € 4,77 = € 491,31;
(iii) no ano de 2022: 22 dias x 5 meses x € 4,77 = € 524,70.
Por consequência é devido à Autora, a título de subsídio de refeição e no período de 9 de agosto de 2021 a 31 de maio de 2022, a importância total de € 1.016,01 (€ 491,31 + € 524,70), a que acrescem juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento.
Procedem, pois, nesta parte, parcialmente, as conclusões das alegações de recurso.

6. Assim, em conclusão:
(i) é nula a sentença, por ter condenado em quantidade superior ao pedido, quanto a férias não gozadas, subsídio de férias e subsídio de Natal;
(ii) operando a regra da substituição ao tribunal recorrido, deverá a recorrente/Ré ser condenada a pagar à recorrida/Autora a quantia global de € 25.422,39 [vinte e cinco mil quatrocentos e vinte e dois euros e trinta e nove cêntimos (€ 8.474,13 X 3)], a título de férias não gozadas, subsídio de férias e subsídio de Natal, assim discriminada:
- a quantia de € 8.474,13 (oito mil quatrocentos e setenta e quatro euros e treze cêntimos) a título de subsídio de férias, referente ao período de 1 de julho de 2012 a 31 de maio de 2022;
- a quantia de € 8.474,13 (oito mil quatrocentos e setenta e quatro euros e treze cêntimos) a título de retribuição de férias vencidas e não pagas, referente ao período de 1 de julho de 2012 a 31 de maio de 2022;
- a quantia de € 8.474,13 (oito mil quatrocentos e setenta e quatro euros e treze cêntimos) a título de subsídio de Natal, referente ao período de 1 de julho de 2012 a 31 de maio de 2022.
- sobre tais quantias são devidos juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento;
(iii) julga-se parcialmente procedente o recurso, no que se refere à condenação no pagamento de subsídio de alimentação, substituindo-se a condenação da Ré a pagar à Autora a importância de € 10.150,80, pela condenação da Ré a pagar à Autora, a tal título, a importância de € 1.016,01 (mil e dezasseis euros e um cêntimo), acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento.

7. Tendo ambas as partes ficado vencidas, cada uma delas deverá suportar as custas na proporção do respetivo decaimento (artigo 527.º do Código de Processo Civil).
V. Decisão
Face ao exposto, acordam os juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora em conceder parcial provimento ao recurso e, em consequência:
1. Declara-se nula a sentença, por condenar em quantidade superior ao pedido, no que se refere à condenação por retribuição de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal;
2. operando a regra da substituição ao tribunal recorrido, condena-se a recorrente/Ré a pagar à recorrida/Autora a quantia global de € 25.422,39 (€ 8.474,13 X 3)], a título de retribuição de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal, a que acrescem juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento;
3. revoga-se a sentença recorrida na parte em que condenou a recorrente/Ré a pagar à recorrida/Autora a quantia de € 10.150,80, a título de subsídio de alimentação, que se substitui pela condenação da recorrente/Ré a pagar à recorrida/Autora, a tal título, a importância de € 1.016,01, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento.
Custas pela recorrente e pela recorrida, na proporção do decaimento.
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Évora, 23 de maio de 2024
João Luís Nunes (relator)
Paula do Paço
Emília Ramos Costa
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[1] Relator: João Nunes; Adjuntas: (1) Paula do Paço, (2) Emília Ramos Costa.