DECISÃO DE REJEIÇÃO DE ARTICULADO
EFEITO DO RECURSO
PAGAMENTO DE COMPLEMENTO DE TAXA DE JUSTIÇA
Sumário

I - Sendo admitido recurso de apelação de despacho que rejeitou a junção de articulado, sendo tal recurso a subir de imediato e em separado e sendo-lhe fixado efeito devolutivo, - não obstante ter sido pedida a fixação de efeito suspensivo nos termos do artigo 647º, número 2 do Código de Processo Civil -, não há que dar sem efeito a audiência de julgamento até que tal recurso seja definitivamente decidido, sob pena de se estar, na prática, a atribuir ao recurso o efeito suspensivo do processo a que alude o referido preceito, assim contrariando a decisão que fixou o efeito da apelação.
II - Se a decisão que altera o valor da ação determina expressamente que o mesmo deve ser apenas atendido na conta final e, transitada essa decisão a secretaria tampouco emite guias para pagamento de qualquer reforço ou complemento de taxa de justiça, é legítimo que as partes entendam não haver lugar a esse pagamento até ao momento da conta final.
III - Emitindo a secretaria guias para pagamento de complemento de taxa de justiça com base no novo valor fixado à ação e de multa nos termos do artigo 14º número 3 do Regulamento das Custas Processuais, apenas após a designação de data para audiência de julgamento e tendo a parte reclamado oportunamente e com a antecedência necessária desse ato da secção por pretender discutir a obrigação de pagamento dos referidos valores, deve tal reclamação ser decidida antes da data designada para audiência de julgamento.
IV - Não tendo tal decisão sido proferida atempadamente apesar de suscitada pela parte com a necessária antecedência, não pode o tribunal decidi-la apenas no início da audiência de julgamento e, nesse momento, impedir a parte de produzir prova por entender que era devido o pagamento do valor liquidado pela secção.

(da responsabilidade da relatora)

Texto Integral

Processo número 5940/20.8T8MTS-B.P1,
Juízo Local Cível de Matosinhos, Juiz 4.



Relatora: Ana Olívia Loureiro
Primeiro adjunto: Jorge Martins Ribeiro
Segunda adjunta: Maria de Fátima Almeida Andrade









Acordam no Tribunal da Relação do Porto:



I – Relatório:
1 – A 23-12-2020, AA propôs contra BB ação especial para prestação de contas pedindo que a Ré fosse condenada a apresentar contas relativamente ao período de exercício das funções de cabeça de casal da herança aberta por óbito de CC e de DD, que foram casados entre si e foram pais de Autora e Ré. A Autora deu à ação o valor de 5.001€ e comprovou a liquidação de taxa de justiça no valor de 102 € alegando pretender o pagamento da mesma em duas prestações.
2 – Citada, a Ré contestou alegando que a partilha por óbito do seu pai fora já efetuada e que já prestara contas da administração, que fez, da herança da sua mãe. Deduziu pedido reconvencional pedindo a condenação da Autora no pagamento de saldo de 19,07 € que disse ser-lhe devido e, ainda, como litigante de má-fé, em multa do valor de 1500 €. Comprovou o pagamento de 204 € de taxa de justiça.
3 – A Autora apresentou resposta pugnando pela inadmissibilidade da reconvenção.
4 – A 20-05-2021 a Autora pediu a intervenção provocada de EE, também filho de CC e de DD, o que foi admitido por despacho de 03-11-2021.
5 – A 19-01-2022 foi designada data para produção de prova e foi indeferida a dedução do pedido reconvencional por se ter reputado de desnecessário face ao fito do processo especial de prestação de contas, de apuramento do saldo final das receitas e despesas relativas à administração da herança em causa.
6 – Em 03-03-2022 foi produzida a prova arrolada e admitida.
7 – A 08-03-2022 foi proferida sentença pela qual se decidiu:
“a) Não julgar a BB obrigada a prestar contas à requerente AA pelo cabecelato de CC;
b) Julgar a requerida BB obrigada a prestar contas à requerente AA da gestão que fez, desde janeiro de 2013, das contas bancárias e dos produtos financeiros detidos por DD;
c) Ordenar a notificação da requerida BB, nos termos do artigo 942.º, n.º 5, do Código de Processo Civil, para que, no prazo de 20 (vinte) dias, apresente tais contas, com observância do disposto no artigo 944.º, do Código de Processo Civil, isto é, apresente as contas sob a forma de conta-corrente, com os documentos justificativos, e em duplicado;
d) Julgar improcedente por não provado o pedido de condenação da requerente AA como litigante de má fé, absolvendo-a do mesmo;
e) Condenar a requerida BB no pagamento das custas processuais deste incidente, fixando-se a taxa em 3UC – cf. os artigos 539.º, n.º 1 do Código de Processo Civil e 7.º, n.º 4 e Tabela II do Regulamento das Custas Processuais.”.
Ali foi ainda decidido o seguinte quanto ao valor da causa:
“A toda a causa deve ser atribuído um valor certo, que expresse a utilidade económica do pedido – artigo 296.º, n.º 1, e 2, do Código de Processo Civil.
Por ser o momento oportuno (artigo 306.º, n. os 1 e 2, in fine, do Código de Processo Civil), e atendendo ao critério vertido no artigo 298.º, n.º 4 do Código de Processo Civil, fixa-se o valor da causa em € 196.000,00 (cento e noventa e seis mil euros), por ser esse o montante indicado pela requerente como correspondendo às receitas brutas geridas pela requerida, não
transposto pelas despesas apontadas.
Isto, sem prejuízo do disposto no artigo 299.º, n.º 4 do Código de Processo Civil.
Corrija em local próprio e tenha em consideração em sede de conta final.”.
8 – Desta sentença recorreu a Ré tendo sido proferido Acórdão por este Tribunal, a 24-01-2023, que julgou a apelação improcedente e confirmou a decisão recorrida.
9 – Baixados os autos à primeira instância a Ré apresentou contas em forma de conta-corrente tendo arguido, como “questão prévia” que a sua mãe em janeiro de 2013 apenas era titular de três contas bancárias, que identificou, e não de todas que haviam sido dadas por provadas na sentença proferida a 08-03-2022.
10- A Autora veio contestar as contas apresentadas, em 29-03-2023, alegando que a Autora da herança era titular de outras contas bancárias para além das indicadas pela Ré, contas essas que identificou. Impugnou diversas despesas alegadas por não terem quaisquer comprovativos, alegou que quer a Ré quer o interveniente EE usaram dinheiro da sua mãe em benefício próprio e descreveu receitas e despesas distintas das apresentadas pela Ré tendo concluído pela existência de um saldo, que liquidou. Juntou documentos.
11- Em 17-04-2023 a Ré apresentou requerimento de resposta aos documentos juntos e tomou posição sobre os factos alegados pela Autora na contestação, que entendeu serem novos. Juntou documentos argumentando que os mesmos se destinavam à prova de que:
a) três das contas bancárias de que foi titular a autora da herança não apresentavam qualquer saldo a 01-01-2023;
b) o saldo de uma das contas bancárias de que eram titulares a sua mãe, mas, também, a Autora, foi penhorado a 17-11-2011, o que disse não ter comprovado antes por que se tratava de facto do conhecimento da Autora;
c) a autora da herança era a única titular de conta bancária no Banco 1... desde 04-09-2002, não tendo ela acesso à mesma;
d) não era verdade que a falecida autora da herança estivesse acamada e apenas reagisse através de estímulos e reações no olhar desde o início do ano de 2013, como tinha sido julgado provado no ponto 6 dos factos provados da sentença de 08-03-2022;
e) as despesas com obras em imóvel da propriedade da autora da herança reverteram a favor de todos os herdeiros, uma vez que tal imóvel foi vendido e que tais obras foram necessárias; e,
f) as despesas com consumo de água que apresentou se reportavam à casa de morada da autora da herança, muito embora viessem dirigidas à cooperativa de habitação em que tal habitação se inseria, por nunca ter sido alterada a titularidade do contador.
12 – A 17-05-2023 foi proferido despacho que ordenou o desentranhamento, por inadmissível, do articulado da Ré de 17-04-2023 e dos documentos a ele anexos e saneou os autos afirmando a validade e regularidade da instância e fixando o objeto do litígio e os temas da prova. Foi designada data para a audiência de julgamento, agendando-a para o dia 03-10-2023.
13 – A 15-06-2023 a Ré requereu que fosse alterada a decisão que ordenara o desentranhamento do seu articulado de 17-04-2023 e os documentos a ele anexos, alegando, nomeadamente, que o mesmo continha documentos essenciais para a boa decisão da causa.
14 – A 21-06-2023 a Ré recorreu do despacho de 17-05-2023 pedindo, nomeadamente, a revogação da decisão que ordenou o desentranhamento do seu requerimento de 17-04-2023 e dos documentos a ele juntos.
15 – A 05-09-2023, não tendo ainda sido proferido despacho relativamente ao seu requerimento de 15-06-2023, a Ré veio pedir a junção aos autos dos documentos que tinham sido desentranhados por decisão de 17-05-2023, pedindo a dispensa de qualquer sanção ou cominação com base na alegação de que já os havia juntado anteriormente, mas que tinha sido ordenado o seu desentranhamento.
16 – A 06-09-2023 a secretaria notificou a Ré para o pagamento de 2 041 € enviando liquidação e guia para pagamento com a seguinte discriminação: Multa – artigo 14º, nº 3 do RCP: 1.020 €; Taxa de Justiça Cível 1 €; Taxa de Justiça Cível (complemento) 1.020 €. Na mesma data notificou a Autora para o pagamento da mesma quantia com exceção feita à quantia de 1 € de taxa de justiça.
17 – A 18-09-2023 a Autora apresentou requerimento em que pugnou pela inadmissibilidade da junção dos documentos que haviam sido mandados desentranhar.
18 – A 21-09-2023 a Ré veio pedir a anulação da guia para pagamento de 2 041 € que lhe fora enviada pela secção, alegando que a sentença de 08-03-2022 tinha fixado o valor da ação em 196.000€, mas que havia ordenado que tal valor fosse tido em conta em sede de conta final, pelo que entendeu que não teria de pagar qualquer complemento da taxa de justiça. Por igual defendeu que não deveria pagar a multa de igual montante que lhe foi liquidada e alegou desconhecer a razão de ser da liquidação de 1€ a título de taxa de justiça.
20- A 25-09-2023 foi proferido despacho que, no que aqui releva convocar, admitiu o recurso interposto a 21-06-2023, ordenando a sua subida em separado e decidiu admitir a junção de documentos efetuada pela Ré a 05-09-2023, condenando-a em multa de uma unidade de conta por intempestividade da junção, nos termos do artigo 423º do Código de Processo Civil. Foi, ainda, determinado que fosse a Ré ouvida sobre a eventual perda de interesse no recurso então admitido.
21 – A 25-09-2023 a Ré veio declarar manter interesse no recurso e pediu que se desse sem efeito a audiência de julgamento até que o mesmo estivesse decidido, por forma a evitar diligências inúteis.
22- A 27-09-2023 foi proferido despacho pelo qual se ordenou a instrução da apelação em separado e se manteve o agendamento da audiência de julgamento.
23 – No dia 03-10-2023, no início da audiência de julgamento e como consta da respetiva ata, foi proferido o seguinte despacho:
“Nestes autos de ação especial para prestação de contas veio a R., no dia 21 de setembro do presente ano, invocar que não era devedora da segunda prestação de taxa de justiça, alegando que a mesma só será devida a final.
Ora, a taxa de justiça é devida pelo impulso processual de cada interveniente, conforme resulta do disposto no art. 529.º, n.º 2, do CPC, e integra o conceito mais vasto de custas processuais definido no n.º 1 daquele normativo.
Sendo a taxa de justiça encontrada segundo os ditames do CPC e do RCP, há que observar o disposto no art. 6.º, n.º 1, do RCP, o qual dispõe que aquela é fixada de acordo com os valores constantes da tabela I-A, aplicando-se igual a mesma tabela aos processos especiais por previsão do art. 7.º, n.º 1, do RCP.
Prescreve, ainda, o art. 14.º do RCP:
«1 - O pagamento da primeira ou única prestação da taxa de justiça faz-se até ao momento da prática do acto processual a ela sujeito, devendo: […]
2 - A segunda prestação da taxa de justiça deve ser paga no prazo de 10 dias a contar da notificação para a audiência final, devendo o interessado entregar o documento comprovativo do pagamento ou comprovar a realização desse pagamento no mesmo prazo.
3 - Se, no momento definido no número anterior, o documento comprovativo do pagamento da segunda prestação da taxa de justiça ou da concessão do benefício de apoio judiciário não tiver sido junto ao processo, ou não tiver sido comprovada a realização do pagamento da segunda prestação da taxa de justiça, a secretaria notifica o interessado para, no prazo de 10 dias, efectuar o pagamento, acrescido de multa de igual montante, mas não inferior a 1 UC nem superior a 10 UC.
4 - Sem prejuízo do prazo adicional concedido no número anterior, se no dia da audiência final ou da realização de qualquer outra diligência probatória não tiver sido junto ao processo o documento comprovativo do pagamento da segunda prestação da taxa de justiça e da multa ou da concessão de benefício do apoio judiciário, ou não tiver sido comprovada a realização do pagamento da segunda prestação da taxa de justiça, o tribunal determina a impossibilidade de realização das diligências de prova que tenham sido ou venham a ser requeridas pela parte em falta.»
Resulta dos autos que a R. foi notificada (na pessoa da sua mandatária), no dia 11/09/2023, nos termos e para os efeitos constantes do art. 570.º n.º 3 do CPC, isto é, para pagamento da segunda prestação da taxa de justiça e respetiva multa.
Tal pagamento tinha como data limite o dia 21/09/2023 (cfr. guia a que alude a ref.ª n.º 451381847, de 06/09), em conformidade com o prazo legalmente previsto, não tendo o mesmo ocorrido até essa data, nem até ao momento presente.
Na situação aqui em causa, como já mencionado, a R. não liquidou a taxa de justiça subsequente após a notificação do despacho que designou data para julgamento, razão pela qual a secretaria o notificou para pagar tal taxa acrescida da multa a que alude o n.º 3 do supra-transcrito art. 14.º.
Razões pelas quais ficou precludido o direito de o vir a fazer posteriormente.
Note-se que o prazo em questão é um prazo perentório (durante o qual deverá ocorrer o pagamento), pelo que o seu decurso extingue o direito de praticar o acto – cfr. art. 139º n.º 1e
3 do CPC (não sendo aqui aplicável o disposto no n.º 5 desta norma por força do consignado no art. 40.º do RCP).
Face a tal omissão, e considerando o estatuído no n.º 4 do art. 14.º do RCP, a consequência a extrair é a de ficar a R. impedida de produzir prova em julgamento, o que se determina.
A tal não obsta que a R. tenha vindo arguir que tal valor não era devido, pois que lhe era exigível ter agido prudente e diligentemente, pagando o valor no prazo que lhe foi concedido,
caindo posteriormente na sua disponibilidade obter o reembolso por procedência do seu pedido, caso se verificasse que tal valor era, de facto, indevido.
No caso apenas seria indevido o valor de 1,00€, que por lapso foi integrado na guia de pagamento, sendo que seria manifestamente atentatório da ratio legis que subjaz à norma do art. 14.º tentar a R. escudar-se em tal lapso de valor insignificante.
Notifique.”
24 – Após a prolação desse despacho, tendo a Autora prescindido da produção de prova foi ordenado que os autos fossem conclusos para prolação de sentença e a mesma veio a ser proferida a 09-11-2023, estando pendente de recurso.
25 – A 13-10-2023 a Ré interpôs o presente recurso, destinado à revogação:
a) do despacho proferido em audiência de julgamento (de 03-10-2023) que a impediu de produzir prova e indeferiu o seu pedido de alteração da guia liquidada pela secção;
b) do despacho de 25-09-2023 que a condenou em multa pela junção tardia de documentos e que fixou efeito devolutivo ao recurso ali admitido;
c) do despacho de 27-09-2023 que indeferiu o seu pedido para que se desse sem efeito a audiência final;
26 – Chegados os autos a este tribunal, foi facultado às partes prazo para se pronunciarem sobre a inadmissibilidade do recurso na parte em que visa a alteração do efeito fixado a recurso de apelação admitido antes deste e sobre a possibilidade de a presente instância recursória ser suspensa, por causa prejudicial, até estar definitivamente decidida tal apelação prévia, nenhum delas tendo dado resposta.
27 – A 20-03-2023 foi determinada a suspensão da instância dada a prejudicialidade do apenso de apelação que correu termos sob a letra A, até que este fosse definitivamente decidido.
28- A 08-05-2023 foi junta a estes autos certidão da decisão singular proferida no apenso de apelação A com nota de trânsito em julgado, dali resultando, no que aqui releva convocar que foi decidido julgar aquela apelação parcialmente procedente, “(…) e nessa conformidade, revogar, em parte o despacho recorrido e determinar a junção aos autos do requerimento apresentado em 17 de abril de 2023, por conter o contraditório em relação ao documento junto pela autora com a contestação.”.



II - O recurso:
A recorrente alega o que verte da seguinte forma em sede de conclusões de recurso:
I - A Recorrente foi condenada a prestar contas por morte de sua Mãe no processo melhor identificado supra, por sentença transitada em julgado e datada de 08/03/2022.
II. Sentença essa que estipula no seu ponto II, e no que à fixação do valor da causa diz respeito, o valor de 196.000,00€.
III. É ainda enunciado pelo tribunal a quo, no referido ponto II, “Corrija em local próprio e tenha em consideração em sede de conta final”.
IV. A Recorrente prestou contas aos presentes autos, através de requerimento datado de 23/02/2023.
V. Em 06/09/2023, a Recorrente foi notificada para proceder ao pagamento da quantia total de 2.041,00€,
VI. Deste valor resulta, a aplicação de uma multa nos termos do artigo 14º, nº3 do Regulamento das Custas Processuais, no valor de 1.020,00€,
VII. E o complemento da taxa de justiça no montante de 1.020,00€,
VIII. E, estranhamente, ainda o montante de 1,00€ correspondente à taxa de justiça cível.
IX. Primeiramente, cumpre esclarecer que, para a interposição da presente ação (petição inicial datada de 23/12/2020), a Recorrida liquidou a taxa de justiça no valor de 1 UC, pese embora ter indicado naquela que o valor da mesma seria de 5.000,01€.
X. Já a Recorrente, em sede de contestação, liquidou, corretamente, a taxa de justiça correspondente a 2UCs.
XI. A Recorrida nunca procedeu ao acerto da taxa de justiça inicial.
XII. Não obstante, Recorrida e Recorrente foram notificadas para procederem ao pagamento da guia cível datada de 06/09/2023 em idêntico montante,
XIII. Com a agravante, de à Recorrente ter sido imputado um acréscimo de 1,00€ correspondente à taxa de justiça cível, sem qualquer justificação.
XIV. Apesar de a Recorrida ter liquidado uma taxa inferior e incorrecta ab initio , a mesma foi notificada para efetuar o complemento da taxa de justiça de igual montante ao da Recorrente.
XV. Assim, no dia 21/09/2023, a Recorrente requereu ao tribunal a quo, que diligenciasse pela anulação da referida guia, designadamente, à multa por indevida e ao complemento de taxa de justiça.
XVI. Uma vez que, tal guia se considerava extemporânea, atenta a decisão supra referida e datada de 08/03/2022, que determinou que o complemento da taxa de justiça devida, seria tido em conta em sede de conta final, que desde logo, a Recorrente liquidaria.
XVII. A Recorrente estava elucidada para a necessidade de liquidar o complemento de taxa de justiça paga ab initio,
XVIII. Não obstante, apenas o faria em sede de conta final conforme decidido na referida sentença.
XIX. Acresce ainda o facto de que, a referida guia cível, datada de 06/09/2023, conter o montante, inexplicado, de 1,00€ a título de “taxa de justiça cível”,
XX. Nesta senda, atente-se o decidido por este Douto Tribunal, em 23/05/2010, relator Ramos Lopes, Processo nº 65/09.0TBMTS-A.P1, disponível em www.dgsi.pt, referente à errónea data limite para efetuar o pagamento da taxa de justiça, esclarecendo que:
“Constando nas guias emitidas e enviadas aos réus o dia 23/04/2009 como data limite de pagamento da multa, impõe-se a emissão de novas guias, donde conste correctamente o termo final do prazo para o seu pagamento.” (negrito e sublinhado nossos).
XXI. Se no caso supra transcrito, a problemática se prendia com a data limite para efetuar o pagamento, não existindo qualquer lapso acerca das quantias discriminadas,
XXII. Atente-se na gravidade do sucedido nos presentes autos, em mera comparação com o prazo limite para liquidar a taxa de justiça,
XXIII. Que determinou a emissão de novas guias com a correta data limite para efetuar o pagamento.
XXIV. Sendo que no caso em apreço, a Recorrente interpelou o tribunal sobre a existência de uma multa que considerava e considera ser manifestamente indevida, perante a informação (contraditória) que o mesmo havia determinado na sentença já identificada, sobre o momento da liquidação do acerto da taxa de justiça,
XXV. E ainda o porquê e razão de ciência do euro que lhe foi adicionalmente peticionado.
XXVI. O tribunal a quo, relativamente a este último ponto, com notória leviandade, esclareceu apenas que “No caso apenas seria indevido o valor de 1,00€, que por lapso foi integrado na guia de pagamento, sendo que seria manifestamente atentatório da ratio legis que subjaz à norma do art. 14.º tentar a R. escudar-se em tal lapso de valor insignificante.”.
XXVII. E, quanto ao momento da liquidação do complemento da taxa de justiça e aplicação de multa, limitou-se a transcrever a lei, sem atender ás circunstâncias denunciadas legitimamente pela Recorrente (contradição entre a sentença e emissão da guia).
XXVIII. A Recorrente, jamais procurou escudar-se em tal alegado lapso, conforme afirmado pelo tribunal a quo, mas sim percecionar a razão pela qual constava a quantia de 1,00€, juntamente com o já supra mencionado desalinho com a sentença.
XXIX. Verdade é que, o tribunal a quo, perante a pertinência das questões colocadas pela Recorrente, deveria ter diligenciado pela correção da referida guia, e consequentemente ter procedido à emissão de uma nova ou relegar a sua emissão para a conta final, conforme sentenciado.
XXX. Porém, nada fez, esperando apenas que a aqui Recorrente aceita-se tal facto, e liquidasse a taxa de justiça correspondente a 20 UCs, acrescidas de 1,00€, quantia esta que, para além de avultada, se revela totalmente errónea e extemporânea.
XXXI. Termos em que se requer o estrito cumprimento da sentença datada de 08/03/2022, e, consequentemente, o referido complemento da taxa de justiça seja apenas tido em conta em sede de conta final.
XXXII. Ou, se assim não se entender, a emissão de uma nova guia cível sem a aplicação da multa e do complemento da taxa de justiça no valor de 1.00€.
Do Despacho datado de 25/09/2023 com referência CITIUS 451853496
XXXIII. No presente despacho, o tribunal a quo “decidiu pela inadmissibilidade do articulado e respetivos documentos.” apresentados pela Recorrente.
XXXIV. Dizendo que, “sobre a questão já se pronunciou o Tribunal, esgotando-se o nosso poder jurisdicional, não havendo fundamento legal para se dar o dito por não dito.”.
XXXV. Não obstante, e no mesmo despacho é referido que “Assim, pese embora desentranhados, porquanto juntos com articulado não admissível, por terem sido juntos nos termos do art. 423º nº 2 do Código de Processo Civil e por pertinentes para a boa decisão da causa, admito a junção dos documentos por parte da ré.”.
XXXVI. Culminando, “Condeno-a na multa de 1 UC pela junção tardia e injustificada, porquanto a sua justificação não colhe.”
XXXVII. Ora, com o devido respeito, a Recorrente ciente da bitola do Tribunal a quo pelo qual se pautou o desentranhamento do seu Requerimento, optou apenas por juntar os documentos, pois, caso contrário, correria o sério risco de a “justificação” que apresentasse fosse considerada um articulado legalmente inadmissível.
XXXVIII. A Recorrente é confrontada no referido despacho, com a manifesta insensibilidade jurídica e de gestão processual do Tribunal, que confrontado com a pertinência de documentos, juntos com articulado, que entendeu ser legalmente inadmissível, não ter tido a oficiosidade e capacidade de destrinçar o articulado dos documentos.
XXXIX. Para mais tarde e sob condenação em multa os relevar e admitir.
XL. Ademais, ainda no referido despacho pronuncia-se o tribunal a quo, sobre os efeitos do recurso apresentado em 21/06/2023 pela Recorrente quanto à inadmissibilidade do articulado desentranhado, entendendo que o mesmo tem efeito meramente devolutivo.
XLI. O tribunal a quo, entendeu que, o recurso interposto no dia 21/06/2023, pela Recorrente, possuía efeito meramente devolutivo, não obstante ter sido requerido pela Recorrente que o mesmo tivesse efeito suspensivo.
XLII. Uma vez que a Recorrente pretendia confrontar as testemunhas com a matéria do articulado desentranhado e em recurso.
XLIII. Atenta a complexidade e especificidade dos autos, nomeadamente 7 anos de prestação de contas por parte da Recorrente, a vasta prova carreada para os autos, impunha a prudência que o tribunal a quo lançasse mão da possibilidade de aplicação do artigo 272º, nº1, segunda parte CPC, “quando ocorrer outro motivo justificado”,
XLIV. A instância deveria então, ter sido suspensa, salvo melhor entendimento, até que fosse decidido o recurso.
XLV. Apela a Recorrente que este douto tribunal ponha cobro ao desnorte e inabilidade processual do tribunal a quo, cujos efeitos se têm feito sentir na pele da Recorrente e que culminou recentemente na impossibilidade de realização de prova por parte desta durante o seu julgamento.
XLVI. Termos em que se requer a revogação do despacho datado de 25/09/2023, na parte em que condena a Recorrente no pagamento da multa no valor de 1 UC pela junção tardia e injustificada dos documentos.
XLVII. Bem como na parte que fixa o efeito devolutivo ao recurso apresentado pela Recorrente.
Do Despacho datado de 27/09/2023 com a referência Citius 452129799
XLVIII. Perante a iminência da audiência de discussão e julgamento, agendada para o dia 03/10/2023,
XLIX. A Recorrente apresentou requerimento em 25/09/2023 para que se desse sem efeito a data designada para aquela.
L. O qual o tribunal a quo decidiu indeferir nos seguintes termos: “De acordo com o nosso anterior despacho, o recurso em causa tem efeito meramente devolutivo. Razão pela qual não há fundamento legal para se dar sem efeito a audiência final”.
LI. Desde já, constata-se um largo lapso temporal (mais de 3 meses) entre a interposição do Recurso (21/06/2023) e a sua admissão (25/09/2023).
LII. Ademais, denote-se que foi a aqui Recorrente quem contactou o tribunal a quo, no sentido de apurar se a diligência supra mencionada se manteria, dado a pendencia do recurso.
LIII. Surpreendentemente, foi informada que o tribunal a quo não se tinha sequer apercebido da interposição do recurso datado de 21/06/2023.
LIV. Termos em que se requer, que seja revogado o despacho de 27/09/2023, na parte em que indefere o adiamento da audiência de discussão e julgamento, atentos os fundamentos que se vêm invocando no presente recurso, designadamente, quanto ao seu efeito.
Do Despacho de 03/10/2023 consagrado na Ata com referência Citius 452382450
LV. Aberta a audiência de discussão e julgamento, o tribunal a quo alega que só teve conhecimento do requerimento da Recorrente datado de 21/09/2023 – em que esta pede a anulação da guia cível de 06/09/2023 pelo conjunto de razões já supra expostas - momentos antes do início da audiência de discussão e julgamento,
LVI. E, não obstante tal alegação, leu um despacho extenso e previamente elaborado onde conclui que “Face a tal omissão, e considerando o estatuído no nº4 do art.14º do RCP, a consequência a extrair é a de ficar a R. impedida de produzir prova em julgamento, o que se determina.”, o que muito se estranha.
LVII. Note-se que, o tribunal a quo proferiu dois despachos posteriores ao requerimento apresentado pela Recorrente em 21/09/2023, nomeadamente o datado 25/09/2023, com a referência Citius 451853496, e o datado de 27/09/2023, com a referência Citius 452129799, que supra também se recorre.
LVIII. Despachos estes que recaíram sobre requerimentos da Recorrente também eles posteriores ao requerimento desta de 21/09/2023.
LIX. Em nenhum destes o tribunal a quo se pronuncia quanto ao requerido pela Recorrente no seu requerimento de 21/09/2023,
LX. Com o devido respeito, não colhe a alegação do tribunal a quo de que só momentos antes do início da audiência de discussão e julgamento detetou permita-se-nos, convenientemente, o requerimento de 21/09/2023 da Recorrente.
LXI. O requerimento estava nos autos, como estavam os posteriores que foram alvo de sucessivos despachos.
LXII. Em audiência de julgamento realizada no dia 03/10/2023, e com todas as testemunhas presentes e corretamente notificadas, o tribunal a quo, proferiu o despacho que aqui se recorre, enunciando que, não tinha sido liquidado o complemento da taxa de justiça devida.
LXIII. Ora, o artigo 6.º, n.º 1 do Código de Processo Civil (CPC, doravante) consagra expressamente o dever de gestão processual, no qual “Cumpre ao juiz, sem prejuízo do ónus de impulso especialmente imposto pela lei às partes, dirigir ativamente o processo e providenciar pelo seu andamento célere, promovendo oficiosamente as diligências necessárias ao normal prosseguimento da ação, recusando o que for impertinente ou meramente dilatório e, ouvidas as partes, adotando mecanismos de simplificação e agilização processual que garantam a justa composição do litígio em prazo razoável.”. (sublinhado e negrito nosso)
LXIV. Decidiu este douto tribunal no que a este assunto diz respeito em 24/02/2022, no processo nº 783/18.1T8STS-D.P1, relator Paulo Dias da Silva que “A gestão processual visa diminuir os custos, o tempo e a complexidade do procedimento, e pressupõe um juiz empenhado na resolução célere e justa da causa.”,
LXV. E “Na actividade gestionária, o apego à forma legal, isto é, à regra estrita preexistente deve ser substituído pela procura de soluções formais afeiçoadas ao caso concreto, sempre no respeito pelos princípios do processo civil.”, e em disponível em www.dgsi.pt
LXVI. Na mesma senda o Tribunal da Relação de Lisboa, a 17/12/2015, no processo nº 3799/10.2TBSXL-A.L1-2, relator Maria Teresa Albuquerque, decidiu que “A ideia que subjaz ao dever de gestão processual é a de garantir a «direcção activa e dinâmica do processo, tendo em vista, quer a rápida e justa resolução do litígio, quer a melhor organização do trabalho do
tribunal»”.
LXVII. Juntamente com o facto de não ser, “lícito realizar no processo actos inúteis para todos aqueles que nele têm algum tipo de iniciativa processual é, em última análise, ao juiz que cabe filtrar os actos úteis dos inúteis, impedindo a prática destes em nome da eficiência processual.”, e disponível em www.dgsi.pt
LXVIII. Sendo que, em tal requerimento datado de 21/09/2023, é peticionado ao tribunal a quo, um esclarecimento quanto ao valor do complemento da taxa de justiça e a sua temporalidade,
LXIX. Face à omissão de pronuncia do tribunal a quo, aquela determinou em última ratio a impossibilidade da realização das diligências probatórias da Recorrente.
LXX. Pois que, se tal conveniente omissão não tivesse ocorrido, disporia ainda a Recorrente da possibilidade de efetuar o pagamento da guia impugnada até ao início da audiência de julgamento, como diversa jurisprudência reconhece.
LXXI. Ao abrigo do princípio da gestão processual, o juiz deve adotar mecanismos de simplificação e agilização processual que garantam a justa composição do litígio em prazo razoável.
LXXII. E não, tal como fez, adotar um comportamento claramente violador de tal princípio,
LXXIII. Limitando-se a aplicar de forma literal a letra da lei, sem que atendesse e ponderasse de facto às circunstâncias do caso concreto, e diligenciar por uma solução que efetivamente evitasse o sucedido.
LXXIV. Estipula ainda o nº1 do art. 7º do CPC, sob a epígrafe “princípio da cooperação”, que “Na condução e intervenção no processo, devem os magistrados, os mandatários judiciais e as próprias partes cooperar entre si, concorrendo para se obter, com brevidade e eficácia, a justa composição do litígio.”.
LXXV. Mais, estipula o nº2 do mesmo preceito que, “O juiz pode, em qualquer altura do processo, ouvir as partes, seus representantes ou mandatários judiciais, convidando-os a fornecer os esclarecimentos sobre a matéria de facto ou de direito que se afigurem pertinentes e dando-se conhecimento à outra parte dos resultados da diligência.”
LXXVI. Decidiu assim este douto tribunal em 22/06/2020, no processo nº 110/18.8T8VLG-B.P1, relator Rita Romeira que “incumbe ao juiz o poder-dever de auxiliar qualquer das partes na remoção ou ultrapassagem de obstáculos que razoavelmente as impeçam de actuar eficazmente no processo, comprometendo o êxito da acção ou da defesa, e que não se possam imputar à parte por eles afectada.”, e disponível em www.dgsi.pt.
LXXVII. Por último, o dever de boa fé processual presente no artigo 8º do Código de Processo Civil estabelece que “As partes devem agir de boa fé e observar os deveres de cooperação”
LXXVIII. Quanto a isto, decidiu o Supremo Tribunal de Justiça a 10/09/2019, no processo 1410/17.0T8STR.E1.S1, relator Raimundo Queirós, que “Os princípios da boa fé e da cooperação determinam que as partes processuais adoptem uma conduta colaborante com o Tribunal no sentido da descoberta da verdade.”, e disponível em www.dgsi.pt.
LXXIX. Ora, a atuação do tribunal a quo claramente atentou contra as disposições legais supra expostas.
LXXX. À colação será inevitavelmente chamado o artigo 20º, nº1 da Constituição da República Portuguesa onde se refere que “A todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos.”.
LXXXI. Estamos assim perante uma clara denegação de acesso à justiça, e no caso em apreço na denegação e impossibilidade de realização de prova.
LXXXII. Porquanto veda desde logo à Recorrente uma tutela jurisdicional efetiva e exata, na medida que a inibe completamente de produzir prova de factos que alegou e sobre os quais prestou contas.
LXXXIII. Prova essa, indispensável para a boa decisão da causa, e descoberta da verdade material, atenta a complexidade processual e prova documental junta aos presentes autos.
LXXXIV. Assim, e consequentemente negou-se à Recorrente o direito de proteção efetiva dos seus direitos nos presentes autos.
LXXXV. E salvo melhor entendimento, considera a aqui Recorrente, totalmente insustentável e desproporcional o facto de se ver privada de exercer o seu direito, única e simplesmente por não ter liquidado o complemento de taxa de justiça,
LXXXVI. Complemento esse que a Recorrente foi devidamente notificada por sentença de que ocorreria em sede de conta final, tal como já supra descrito.
LXXXVII. Estando perante uma clara contradição do próprio tribunal a quo, que ora diz, quanto ao valor da causa, para se ter em consideração em sede conta final, ora condena em multa por não o ter feito nos 10 dias posteriores à marcação do julgamento.
LXXXVIII. Ora um juiz zeloso e consciente da realidade da vida, não podia ignorar o montante exorbitante da guia cível emitida, sempre se lhe impunha que analisasse o requerido pela Recorrente, em 21/09/2023, para que pelo menos verificasse da contradição alegada com a sentença.
LXXXIX. Termos em que se requer, que seja revogado o despacho de 03/10/2023, devendo ser substituído por outro que permita a produção de prova pela Recorrente.”

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Não foram apresentadas contra-alegações.

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III – Questões a resolver:
Em face das conclusões do Recorrente nas suas alegações – que fixam o objeto do recurso nos termos do previsto nos artigos 635º, números 4 e 5 e 639º, números 1 e 2, do Código de Processo Civil -, são as seguintes as questões a resolver:
1 – admissibilidade do recurso na parte em que visa a alteração do efeito fixado à apelação que subiu sob o apenso A;
2 – indeferimento da pretensão da Ré/Apelante, de ver dada sem efeito a data designada para a audiência de julgamento por força da pendência do referido recurso de apelação, em separado;
3 – fundamento para a condenação da Recorrente em pagamento de multa por força da junção de documentos em 15-06-2023 (despacho de 25-09-2023);
4 - obrigação da Recorrente de pagamento de taxa de justiça complementar após notificação da designação de data para audiência de julgamento; e,
5 – caso se conclua pela existência dessa obrigação, cumprirá ainda apurar se a Ré podia ter sido impedida de produzir prova por falta de pagamento da taxa de justiça e da multa nos termos em que foram liquidados pela secretaria;


IV – Fundamentação:
Os factos relevantes para a decisão são os que constam do iter processual sumariado no relatório deste acórdão.
1 – Da admissibilidade do recurso na parte em que visa a alteração do efeito fixado à apelação que subiu sob o apenso A:
Como acima consta (ponto 26 do relatório), foi facultado às partes contraditório sobre da admissibilidade do recurso na parte em que visava a alteração do efeito fixado à apelação que subiu sob o apenso A, ali se adiantando que era nosso entendimento que se tratava de decisão irrecorrível, cabendo ao Tribunal de Recurso, no respetivo apenso de apelação, apreciar e decidir quanto ao efeito a fixar ao mesmo. – cfr artigos 641º, número 5 e 654º do Código de Processo Civil.
Assim é, de facto, sendo para nós manifesto, em face da redação desses preceitos, que a fixação do efeito do recurso pelo Tribunal recorrido não podia ser impugnada pela Recorrente e que apenas podia ser alterada pelo Tribunal de Recurso.
Não foi o caso tendo, entretanto, já sido decidida com trânsito em julgado a apelação a que a Recorrente queria ver atribuído efeito suspensivo – no apenso A -, pelo que ficou prejudicado o conhecimento da questão da admissibilidade do recurso nessa parte.
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2 – A segunda questão levantada pela apelante reporta-se ao indeferimento, a 27-09-2023, do seu pedido, de 25-09-2023, de que fosse dada sem efeito a data designada para audiência de julgamento até que estivesse decidida a apelação por ela interposta a 21-06-2023.
Tal recurso, já decidido com trânsito em julgado sob o apenso A, incidia sobre a questão da admissibilidade de apresentação de articulado e foi admitido, a 25-09-2023, com efeito meramente devolutivo.
No mesmo dia em que tal apelação foi admitida com tal efeito, a Apelante veio requerer que até que esse recurso fosse decidido se desse sem efeito a audiência de julgamento “com o intuito de evitar deslocações de pessoas e perdas de tempo desnecessárias e inúteis”.
Tal pretensão foi-lhe indeferida por despacho de 27-09-2023, com o argumento de que tendo sido fixado efeito devolutivo ao recurso não havia fundamento para que não se realizasse, na sua pendência, a audiência de julgamento.
Assim é de facto.
Nenhum sentido faria, aliás, que por via da efetiva suspensão dos trâmites processuais subsequentes à apelação, o Tribunal recorrido viesse a alterar, na prática, o efeito meramente devolutivo que fixara ao recurso então pendente.
A leitura conjugada dos artigos 644º número 2 d) e 647º, números 1 do Código de Processo Civil levou a que o Tribunal considerasse que o recurso da decisão que rejeitou um articulado da Ré tinha efeito meramente devolutivo.
O efeito suspensivo a que alude o artigo 647º número 2 do Código de Processo Civil reporta-se aos termos do processado (e não à decisão como nos casos previstos no número 3 do mesmo artigo).
Foi a fixação desse efeito suspensivo do processo que a Apelante requereu ao interpor recurso, referindo ali expressamente o número 2 do artigo 647º do Código de Processo Civil.
Tendo tal pretensão sido rejeitada, não havia qualquer outro fundamento legal para que o processado ficasse a aguardar a decisão da apelação – sob pena de por essa via se vir a reconhecer, na prática, um efeito suspensivo do processo ao recurso interposto.
Pelo que se mantém a decisão recorrida que indeferiu a desconvocação da audiência de julgamento dada a inexistência de qualquer fundamento legal para o seu adiamento.
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3 - Da multa em que a Recorrente foi condenada por força da junção de documentos em 15-06-2023 (despacho de 25-09-2023):
São os seguintes os factos relevantes para a decisão desta questão:
Em 17-04-2023 a Ré apresentou requerimento de resposta aos documentos juntos pela Autora com a contestação e tomou posição sobre os factos ali alegados, que entendeu serem novos. Juntou documentos destinados à prova de que:
g) três das contas bancárias de que foi titular a autora da herança não apresentavam qualquer saldo a 01-01-2023;
h) o saldo de uma das contas bancárias de que eram titulares a sua mãe, mas, também, a Autora, foi penhorado a 17-11-2011 o que disse não ter comprovado antes por que se tratava de facto do conhecimento da Autora;
i) a autora da herança era a única titular de conta bancária no Banco 1... desde 04-09-2002, não tendo ela acesso à mesma;
j) não era verdade que a falecida autora da herança estivesse acamada e apenas reagisse através de estímulos e reações no olhar desde o início do ano de 2013, como tinha sido julgado provado no ponto 6 dos factos provados da sentença de 08-03-2022;
k) as despesas com obras em imóvel da propriedade da autora da herança reverteram a favor de todos os herdeiros, uma vez que tal imóvel foi vendido e que tais obras foram necessárias; e,
l) as despesas com consumo de água que apresentou se reportavam à casa de morada da autora da herança, muito embora viessem dirigidas à cooperativa de habitação em que tal habitação se inseria, por nunca ter sido alterada a titularidade do contador.
A 17-05-2023 foi proferido despacho que ordenou o desentranhamento, por inadmissível, do articulado da Ré de 17-04-2023 bem como dos documentos a ele anexos.
A 15-06-2023 a Ré requereu que fosse alterada a decisão que ordenara o desentranhamento do seu articulado de 17-04-2023 alegando, nomeadamente, que o mesmo continha documentos essenciais para a boa decisão da causa.
A 05-09-2023, não tendo ainda sido proferido despacho relativamente ao seu requerimento de 15-06-2023 a Ré veio pedir a junção aos autos dos documentos que tinham sido desentranhados por decisão de 17-05-2023, pedindo a dispensa de qualquer sanção ou cominação.
A 25-09-2023 foi proferido despacho que decidiu admitir a junção de documentos efetuada pela Ré a 05-09-2023, condenando-a em multa de uma unidade de conta por intempestividade da junção nos termos do artigo 423º do Código de Processo Civil.
Subiu, entretanto, e em separado sob o apenso A, apelação do despacho de 17-05-2023 que ordenara o desentranhamento do articulado de 17-04-2023 e dos documentos a ele juntos.
Foi ponderada neste apenso a eventual prejudicialidade da decisão a proferir no apenso A nos seguintes termos:
“Assim, caso se considere que o articulado de resposta da Ré/Apelante era de admitir e não deveria ter sido desentranhado: a) a junção dos documentos anexos a tal articulado não poderá ter-se por intempestiva (tendo sido esse o fundamento da sua tributação no despacho de 25-09-2023), o que prejudica o conhecimento da primeira das questões enunciadas;”.
Notificadas deste despacho com vista a sobre ele exercerem contraditório, as partes não se pronunciaram.
Ora, a decisão proferida e já transitada no apenso A, revogou o despacho de 17-05-2023 tendo-se ali decidido que a Recorrente tinha o direito a apresentar tal articulado de resposta aos documentos juntos com a contestação.
Revogada que está a decisão ali recorrida – que ordenava o desentranhamento de articulado da Recorrente e de documentos a ele juntos, tais documentos devem manter-se nos autos desde a sua primitiva apresentação, em conjunto com o articulado de resposta a documentos em que se requer e justifica, facto a facto, a junção dos mesmos.
Estando revogada a decisão que ordenou o desentranhamento de tais documentos, não pode, por igual, manter-se o despacho de 25-09-2023, que decidiu admitir a nova junção dos mesmos documentos efetuada pela Ré a 05-09-2023, condenando-a em multa de uma unidade de conta por intempestividade da junção nesse momento, nos termos do artigo 423º do Código de Processo Civil.
É que essa repetida junção deveu-se, apenas, ao anterior desentranhamento dos documentos em causa por virtude de despacho que ora foi revogado, com trânsito em julgado.
Deve, assim, na sequência da decisão da apelação que correu termos sob o apenso A, considerar-se que os referidos documentos foram juntos aos autos desde 17-04-2023 o que torna a decisão de 25-09-2023 absolutamente infundada, pelo que se revoga.
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4 – Da obrigação da Recorrente de pagamento de taxa de justiça complementar após a designação da audiência de julgamento
A Recorrente defende que não tinha que proceder ao pagamento de qualquer montante de reforço taxa de justiça na sequência da notificação da marcação da audiência de julgamento.
Cumpre relembrar os seguintes factos que, a esse propósito resultam do processado:
A Ré pagou, com a apresentação da contestação 204 € de taxa de justiça, quando os autos tinham o valor indicado pela Autora de 5.001€.
Em face do disposto no ponto 2 da Tabela I-A para que remete o artigo 6º, número 1 do Regulamento das Custas Processuais, a taxa de justiça devida em função do valor então dado à ação era de 2 Uc, ou seja, de 204 €.
A Ré pagou, assim, a totalidade da taxa de justiça devida aquando da apresentação da contestação.
Sucede que, posteriormente, o valor da ação foi alterado por virtude de decisão transitada em julgado.
Em 08-03-2022 foi proferida sentença que determinou a obrigação da Ré prestar contas e pela qual se decidiu o seguinte quanto ao valor da causa:
“A toda a causa deve ser atribuído um valor certo, que expresse a utilidade económica do pedido – artigo 296.º, n.º 1, e 2, do Código de Processo Civil.
Por ser o momento oportuno (artigo 306.º, n. os 1 e 2, in fine, do Código de Processo Civil), e atendendo ao critério vertido no artigo 298.º, n.º 4 do Código de Processo Civil, fixa-se o valor da causa em € 196.000,00 (cento e noventa e seis mil euros), por ser esse o montante indicado pela requerente como correspondendo às receitas brutas geridas pela requerida, não
transposto pelas despesas apontadas.
Isto, sem prejuízo do disposto no artigo 299.º, n.º 4 do Código de Processo Civil.
Corrija em local próprio e tenha em consideração em sede de conta final.” (sublinhado nosso).
A Recorrente argumenta que, quer por que tinha procedido ao pagamento da totalidade da taxa de justiça devida no momento em que apresentou a contestação, quer porque o despacho que alterou o valor da ação determinou expressamente que a correção desse valor pela secção apenas devia ser considerada em sede de conta final, entendeu que não havia lugar a qualquer pagamento de taxa de justiça após a notificação da marcação da audiência de julgamento.
Isso mesmo por ela foi argumentado quando, a 21-09-2023 pediu a anulação da guia para pagamento de 2 041 € que lhe fora enviada pela secção.
Nesse requerimento, por igual, defendeu que não deveria pagar a multa de igual montante que lhe foi liquidada e alegou desconhecer a razão de ser da liquidação de 1 € a título de taxa de justiça.
Tal requerimento não foi apreciado pelo Tribunal que, muito embora tenha proferido entretanto outros despachos, nos dias 25 e 27 do mesmo mês, apenas no início da audiência de julgamento, a 03-10-2023. veio a indeferir a requerida anulação da guia e decidiu que era devido pela Ré o pagamento da taxa de justiça e da multa liquidadas pela secção (em função do valor da ação fixado em 08-03-2022), impedindo-a de produzir prova.
São estes os factos a relevar para o conhecimento das questões que ainda estão por apreciar.
Estabelece o artigo 11º do Regulamento das Custas Processuais que a base tributável para efeitos de taxa de justiça corresponde ao valor da causa, com os acertos constantes da tabela I a ele anexa, e fixa-se de acordo com as regras previstas na lei do processo respetivo.
A regra geral quanto ao momento da determinação do valor do processo, nos termos do artigo 299º, número 1 do Código de Processo Civil, é a de que deve atender-se ao momento em que a ação é proposta.
Do número 3 do mesmo artigo resulta que o aumento do valor da ação decorrente de pedido formulado pelo réu ou por interveniente só produza efeitos quanto aos atos e termos posteriores à reconvenção ou intervenção.
Todavia, nos termos do número 4 desse preceito, “Nos processos de liquidação ou noutros em que, analogamente, a utilidade económica do pedido só se define na sequência da ação, o valor inicialmente aceite é corrigido logo que o processo forneça os elementos necessários.”.
A decisão que alterou o valor da ação ressalvou expressamente a possibilidade futura de nova alteração do valor da causa quando ali se exarou: “(…) sem prejuízo do disposto no artigo 299.º, n.º 4 do Código de Processo Civil”.
Na presente ação especial, de prestação de contas, prevê o artigo 298º, número 4 do Código de Processo Civil que o valor da ação será o da receita bruta ou da despesa apresentada se lhe for superior. Tendo em conta que, como sucedeu neste caso, os valores da receita e da despesa podem apenas ser apurados na sentença final, que, antes disso, como aqui sucedeu, pode discutir-se a própria existência da obrigação de prestar contas, e nada impondo que o autor que peça a prestação de contas pelo réu indique desde logo quais os valores de receitas e despesas (porque pode, mesmo, desconhecê-los), estamos perante um dos casos em que a utilidade económica do pedido só se define na sequência da ação e em que, portanto, o valor é corrigido logo que o processo forneça os elementos necessários.
No momento em que fixou o valor da ação, todavia, o Tribunal Recorrido não teve em conta a liquidação ulterior aos articulados de qualquer valor de receitas ou despesas – pois ainda não haviam sido prestadas as contas – antes sustentando a fixação que fez do valor da ação na seguinte a afirmação: “por ser esse o montante indicado pela requerente como correspondendo às receitas brutas geridas pela requerida, não transposto pelas despesas apontadas”.
Tal valor de receitas tido em conta pelo Tribunal resulta alegado pela Autora no artigo 34º do articulado de reposta à contestação.
Depois dessa fixação do valor em sede da decisão em que ordenou a prestação de contas, o Tribunal não ordenou o pagamento de qualquer reforço da taxa de justiça e nem a secção o liquidou. Pelo contrário, o despacho em causa ordenou, expressamente, à secção que tivesse o novo valor em consideração apenas “em sede de conta final”.
Independentemente da bondade desta decisão, que aqui não se discute e transitou em julgado, certo é que assiste inteira razão à Recorrente quando alega – e não o faz só agora já que o arguiu tempestivamente quando notificada da guia de liquidação da taxa de justiça e da multa -, que em face do decidido tinha a fundada convicção de que a alteração do valor da ação não teria quaisquer reflexos na taxa de justiça devida, já que foi expressamente ordenado que aquela alteração apenas fosse considerada na conta final.
O artigo 21º da Portaria 419-A/2009, prevê que:
“1 - O pagamento das custas e o pagamento antecipado de encargos, multas, taxa sancionatória excecional e outras penalidades é efetuado mediante a emissão de guia acompanhada do DUC, para além dos demais casos previstos na presente portaria, quando caiba à secretaria notificar a parte para o pagamento da taxa de justiça.
2 - A emissão da guia pelo tribunal é feita em duplicado, contendo os seguintes elementos:
a) Número sequencial;
b) Identificação do tribunal, juízo ou secção emitente e respectivos códigos;
c) Natureza, tipo e número do processo;
d) Nome do responsável pelo pagamento;
e) Discriminação dos descritivos e respectivos montantes;
f) Indicação do total a pagar;
g) Data limite de pagamento;
h) Data de emissão e assinatura.
3 - A guia é emitida a solicitação do responsável pelo pagamento ou, oficiosamente, sempre que se inicie o decurso de um prazo de pagamento de quantias pagáveis por guia, sem prejuízo no artigo 10.º da presente portaria, e poderá integrar no mesmo documento o DUC.
4 - Quando solicitada, a guia é imediatamente emitida e entregue ao responsável pelo pagamento ou enviada ao responsável que não estiver presente.”
Nenhuma norma legal impõe expressamente o imediato pagamento de qualquer reforço da taxa de justiça em função da alteração do valor da ação e, no caso, tal pagamento não só não foi ordenado pelo Tribunal como não foi liquidado de imediato pela secção de processos nos termos do transcrito preceito, desde logo porque a decisão remeteu para o momento da elaboração da conta final a atendibilidade da alteração do valor.
Certo é, contudo, que no momento em que foi designada a audiência de julgamento o valor da ação estava já fixado em 196 000 €.
Daí que tenha sido esse o valor tido em conta pela secção para efeito de cálculo da taxa de justiça que entendeu ser devida depois da designação da audiência de julgamento. Liquidou-a como “Taxa de Justiça Cível (complemento)”.
Fica, assim, a dúvida se o valor liquidado pela secção se referia à segunda prestação de taxa de justiça a que alude o artigo 14º número 2 ou a um reforço da taxa de justiça por virtude da alteração do valor da ação (sendo que neste caso não se compreenderia que só então tivesse sido liquidado e nem a aplicação da multa do artigo 14º, número 3 do Regulamento das Custas Processuais)
Cumpre, todavia, salientar que o pagamento da segunda prestação da taxa de justiça só é devido quando a mesma não foi integralmente paga com a petição inicial/contestação.
De facto, o artigo 14º do Regulamento das Custas Processuais prevê, no que aqui importa convocar, o seguinte:
“1- O pagamento da primeira ou única prestação da taxa de justiça faz-se até ao momento da prática do acto processual a ela sujeito, devendo:
a) Nas entregas eletrónicas, ser comprovado por verificação eletrónica, nos termos da portaria prevista no n.º 1 do artigo 132.º do Código de Processo Civil;
b) Nas entregas em suporte de papel, o interessado proceder à entrega do documento comprovativo do pagamento.
2 - A segunda prestação da taxa de justiça deve ser paga no prazo de 10 dias a contar da notificação para a audiência final, devendo o interessado entregar o documento comprovativo do pagamento ou comprovar a realização desse pagamento no mesmo prazo.
3 - Se, no momento definido no número anterior, o documento comprovativo do pagamento da segunda prestação da taxa de justiça ou da concessão do benefício de apoio judiciário não tiver sido junto ao processo, ou não tiver sido comprovada a realização do pagamento da segunda prestação da taxa de justiça, a secretaria notifica o interessado para, no prazo de 10 dias, efectuar o pagamento, acrescido de multa de igual montante, mas não inferior a 1 UC nem superior a 10 UC.
4 - Sem prejuízo do prazo adicional concedido no número anterior, se no dia da audiência final ou da realização de qualquer outra diligência probatória não tiver sido junto ao processo o documento comprovativo do pagamento da segunda prestação da taxa de justiça e da multa ou da concessão de benefício do apoio judiciário, ou não tiver sido comprovada a realização do pagamento da segunda prestação da taxa de justiça, o tribunal determina a impossibilidade de realização das diligências de prova que tenham sido ou venham a ser requeridas pela parte em falta.”.
Ora, ao contrário da Autora, a Ré, ora Recorrente, havia pago a taxa de justiça devida na sua totalidade no momento em que apresentou a contestação pelo que entendeu, e bem, não haver lugar ao pagamento de qualquer segunda prestação quando foi notificada da designação da audiência de julgamento.
Muito embora nessa data estivesse já alterado o valor da causa por virtude da sentença de 08-03-3022, a Ré entendeu, também com inteira razão para tal, não ser devido qualquer reforço da taxa de justiça em virtude do aumento desse valor porque a decisão expressamente remetia para a conta final a atendibilidade dessa alteração de valor.
Entendimento que além de suportado no teor literal do despacho acima transcrito era confirmado pelo facto de não ter sido pedido às partes qualquer reforço da taxa de justiça até esse momento. Seria, de facto, de esperar que se o Tribunal entendesse que a alteração do valor implicava o pagamento de reforço da taxa de justiça, o mesmo teria de ter ocorrido antes, em consequência da referida alteração do valor da causa e não apenas no momento destinado ao pagamento da segunda prestação da taxa de justiça, que a Ré entendia não ter que pagar, por ter procedido antes ao seu pagamento integral.
Esses mesmos argumentos esgrimiu a Ré, atempadamente, em 21-09-2023, quando notificada da guia que liquidava o valor de taxa de justiça subsequente em função do novo valor fixado à ação, multa de idêntico valor e ainda um montante de 1 € que se revelava, a seu ver, injustificado.
O Tribunal não conheceu desse pedido de anulação da guia atempadamente deduzido e apenas no início da audiência de julgamento, que teve lugar doze dias após a reclamação do ato da secção, veio a afirmar que era devido o pagamento da referida taxa de justiça subsequente sem, contudo, conhecer dos fundamentos do requerimento da Ré de 21-09-2023 – que logo argumentou não ter procedido a qualquer reforço do pagamento da taxa de justiça porque a sentença que alterou o valor da causa remeteu para a conta final a atendibilidade da referida alteração -, e declarando apenas que a Ré deveria, à cautela, ter procedido ao pagamento da taxa de justiça e da multa liquidadas e que a diferença de 1€ que resultava da guia era consequência de um lapso, sendo “(…) atentatório ratio legis que subjaz à norma do art. 14.º tentar a R. escudar-se em tal lapso de valor insignificante”.
Ora, a Ré reclamou, no prazo e nos termos adequados de um ato de secretaria – cfr. artigo 157º, número 5 do Código de Processo Civil. E sobre tal requerimento não incidiu despacho até ao início da audiência de julgamento quando houve tempo e ensejo para que tal decisão fosse proferida.
Donde, deve concluir-se que a Ré agiu com a devida cautela.
Acresce que, de acordo com o número 6 do referido artigo 157º: “Os erros e omissões dos atos praticados pela secretaria judicial não podem, em qualquer caso, prejudicar as partes”. Tendo sido emitida uma guia que – além de levantar a questão da exigibilidade da taxa de justiça e da multa em si mesmas –, sofria de um lapso, ainda que de valor irrisório, e tendo a parte reclamado atempadamente da mesma com vista à sua anulação, não é de lhe exigir que, na falta de resposta do tribunal a tal reclamação, a mesma pagasse o valor que entendia não ser devido e que, no tempo e na forma corretos viera impugnar.
Houve, assim, falha do tribunal quer na emissão da referida guia quer na falta de atempada decisão da reclamação que sobre a mesma foi apresentada, não podendo tal falha onerar a parte.
Em face do exposto, e estando transitada em julgado a sentença de 08-03-2022 que ao fixar o valor da ação em 196.000€ mandou que tal valor fosse tido em conta apenas em sede de conta final, não era de considerar devido o pagamento de taxa de justiça subsequente, calculado em função do novo valor da ação, no momento previsto no artigo 14º, número 2 do Regulamento das Custas Processuais.
Acresce que, ainda que o tribunal tivesse entendido que era devido o pagamento de um reforço da taxa de justiça aquando da designação da audiência de julgamento na decorrência da anterior alteração do valor da causa – o que o teor da decisão que fixou tal valor não nos parece permitir -, sempre seria de atender a reclamação da parte quando argumenta que não podia legitimamente contar com tal entendimento pelo que, pelo menos, não teria de pagar a multa que lhe foi liquidada por falta de pagamento atempado, já que este sempre teria decorrido de interpretação de um despacho que claramente assim podia ter sido lido e entendido.
Assiste, assim, inteira razão à Recorrente também nesta pretensão recursória, devendo ser revogada a decisão que julgou devido o pagamento da guia emitida a 06-09-2023, no valor de 2041 € e que, em consequência, tendo julgado incumprida essa obrigação, impediu a Ré/Recorrente de produção de prova, nos termos do disposto no artigo 14º número 4 do Código de Processo Civil.
Deve, em consequência, ser admitida a produção da prova admitida em audiência de julgamento, anulando-se os termos do processo subsequentes ao despacho revogado (proferido no início da audiência de julgamento), por forma a permitir tal produção de prova.
Fica prejudicado o conhecimento da quinta questão a resolver acima enunciada.

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Não tendo sido apresentadas contra-alegações e tendo a Recorrente decaído em duas das quatro pretensões que deduziu em sede de recurso, bem como tendo sido ela a beneficiar do mesmo na parte em que obteve vencimento, será a mesma a suportar as custas do recurso, nos termos do artigo 527º do Código de Processo Civil.





V – Decisão:
Nestes termos julga-se a apelação parcialmente procedente e, em consequência revogam-se as decisões:

1) de 25-09-2023 que condenou a Ré/Apelante no pagamento de multa de 1 Uc pela junção tardia de documentos;

2) de 03-10-2023 que indeferiu o requerimento da Ré/Apelante de 21-09-2023 e determinou que a mesma estava impedida de produzir prova em audiência de julgamento, devendo a mesma ser admitida a produzir tal prova.

Mantendo-se o mais decidido.

Custas, pela Recorrente, nos termos do previsto no artigo 527º, número 1 do Código de Processo Civil.

Transitado, remeta certidão ao recurso de apelação que corre termos neste Tribunal, sob o número 5940/20.8T8MTS.P2.








Porto, 2024/6/3.
Ana Olívia Loureiro
Jorge Martins Ribeiro
Fátima Andrade