MEDIAÇÃO
CLÁUSULA DE EXCLUSIVIDADE
REMUNERAÇÃO
Sumário

(elaborado nos termos do disposto no artigo 663º, nº 7, CPC):
 I – Por forma a salvaguardar os princípios da proibição da prática de atos inúteis e da economia processual, a impugnação da matéria de facto deve ser rejeitada quando se revele insuscetível de produzir qualquer efeito no âmbito da decisão da causa.
II – Nos termos do disposto no artigo 19º, nº 2 do Regime Jurídico da Atividade de Mediação Imobiliária (Lei nº 15/2013, de 8 de fevereiro, alterada pelo Decreto-Lei 102/2017, de 23 de agosto), é devida a remuneração acordada no âmbito do contrato de mediação imobiliária celebrado com cláusula de exclusividade sempre que o negócio não se concretize por causa imputável ao cliente proprietário ou arrendatário trespassante do bem imóvel.
III – Na situação em que o cliente da empresa mediadora aceitou reduzir o preço da venda desde que o contrato promessa fosse celebrado até determinado prazo, não lhe é imputável a não celebração do negócio pelo preço reduzido quando já se mostrava ultrapassado o prazo que justificou tal redução e, por esse motivo, inviabilizado outro negócio por si perspetivado.

Texto Integral

Acordam os juízes da 2ª secção cível do Tribunal da Relação de Lisboa que compõem este coletivo:

I - RELATÓRIO
1.1 -  A autora, ERA MOITA–Moitagere–Sociedade de Mediação Imobiliária, Lda,  identificada nos autos, instaurou em 12-01-2023 no Juízo Local Cível da Moita a presente ação declarativa comum contra os réus A. e B. solicitando a respetiva condenação no pagamento do montante de €8.364,00 (oito mil trezentos e sessenta e quatro euros), acrescido de juros de mora vencidos e vincendos à taxa legal, bem como no pagamento das custas.
Fundamentando tal pretensão, invocou a autora que no âmbito da sua atividade de mediação imobiliária celebrou com os réus, em 8 de abril de 2022, pelo prazo de seis meses e em regime de exclusividade, um contrato de mediação imobiliária que tinha por objeto a venda, pelo valor de €149.200,00 do imóvel sito na Rua …Moita, do qual os réus eram comproprietários. Mais alegou que no âmbito do referido acordo encontrou interessados na aquisição do imóvel, que propuseram a sua aquisição pelo montante de €136.000,00, proposta esta que foi aceite pelos réus. Subsequentemente, foi celebrado um “acordo de reserva” e a autora diligenciou pela reunião dos documentos necessários à outorga do contrato-promessa de compra e venda, o qual não se veio a realizar única e exclusivamente por culpa dos réus, que não compareceram na data agendada para a sua celebração.
Concluiu a autora considerando que, por ter cumprido as obrigações decorrentes do contrato de mediação imobiliária firmado, tem direito, nos termos acordados, à comissão de 5% sobre o preço acordado, acrescida de IVA, no valor de €8.364,00 (oito mil, trezentos e sessenta e quatro euros), acrescido de juros vencidos e vincendos até efetivo e integral pagamento, tendo contabilizado os primeiros na data da interposição da ação em €328,98 (trezentos e vinte e oito euros e noventa e oito cêntimos).

1.2 – Os réus deduziram contestação, pugnando pela improcedência do pedido, alegando, em síntese, que a autora foi informada que só aceitaram vender o seu imóvel reduzindo o valor para €136.000,00 porquanto lhes garantiu, em conformidade com o “acordo de reserva” celebrado em 27-05-2022, que o contrato-promessa de compra e venda e o pagamento do sinal seriam concretizados antes do decurso do prazo de 30 dias ali fixado, e que tal era essencial porquanto tinham em vista a aquisição de outro imóvel cuja assinatura do contrato-promessa de compra e venda estava dependente do recebimento do sinal. Porém, embora a autora tivesse conhecimento dessa essencialidade, o prazo fixado no acordo de reserva não foi cumprido, motivo pelo qual a ré não conseguiu adquirir o imóvel que tinha em vista, o que determinou a recusa da venda do imóvel objeto do contrato em causa nos autos pelo valor de €136.000,00.
Consideraram ainda os contestantes que a autora deduziu pretensão cuja falta de fundamento não podia nem devia ignorar, peticionando a sua condenação em multa e indemnização, como litigante de má-fé, em valor não inferior a €3.000,00.

1.3 – Exercendo contraditório sobre o pedido de condenação como litigante de má fé, considerou a autora não se verificarem os respetivos requisitos, pugnando pela sua improcedência.

1.4 - Realizada audiência prévia, foi elaborado despacho saneador, que afirmou a regularidade da instância e enunciou o objeto do litígio e os temas de prova (despacho proferido em ata 31-05-2023).

2 – Instruída a causa, foi realizada audiência de discussão e julgamento, após o que foi proferida sentença, julgando a ação improcedente e sendo o seguinte o teor do seu dispositivo:
“a) Absolve-se os Réus A. e B. do pedido.
b) Não se determina a condenação da Autora ERA MOITA – Moitagere – Sociedade de Mediação Imobiliária, Lda como litigante de má-fé.”

3 – Não se conformando com tal decisão, a ré da mesma interpôs recurso, autuado neste Tribunal da Relação de Lisboa em 22-04-2024, pugnando pela sua parcial revogação, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões, que se transcrevem:
“A) Na sentença que ora se submete à apreciação de V. Exªs, foi julgado improcedente o pedido deduzido pela apelante com o seguinte teor:
- os Réus sejam condenados a pagar à Autora a quantia de €8.364,00 (oito mil trezentos e sessenta e quatro euros), correspondente à remuneração devida, no âmbito de contrato de mediação imobiliária celebrado em regime de exclusividade, por motivos única e exclusivamente a si imputável, importância esta, ao qual acresce, os respetivos juros de mora contabilizados à taxa legal de 8,00% (oito porcento) ao ano, contabilizados desde o dia 05/07/2022, até à presente data, no montante de € 328,98 (trezentos e vinte e oito euros e noventa e oito cêntimos), bem como, dos juros de mora vincendos, até à data em que venha a ocorrer o pagamento integral do valor em divida;
B) Salvo o devido respeito, por um lado, considera-se que a sentença ora recorrida não faz uma interpretação literal e correta dos documentos juntos aos presentes autos e também não procedeu a uma correlação entre os mesmos e, por outro lado, não teve em consideração o depoimento de determinadas testemunhas, motivo pelo qual, deverá proceder-se a uma reapreciação da matéria de facto e/ou alteração/anulação do julgamento da matéria de facto, nos termos e ao abrigo do disposto nos artigos 640º nº 1 a), b) e c) e 662º nºs 1 e 2 do CPC;
C) De facto, a sentença ora recorrida peca por uma insustentabilidade atroz, dado que, por um lado, não faz uma interpretação literal e correta dos documentos juntos aos presentes autos e não procedeu a uma correlação entre os mesmos e, por outro lado, não teve em consideração o depoimento de determinadas testemunhas, que eram manifestamente determinantes para o apuramento da verdade nos presentes autos;
D) Efetivamente, salvo o devido respeito, a ora apelante considera que se deverá proceder à alteração da resposta dada ao facto provado nº 22 passando o mesmo a ter o seguinte teor: “A Autora sabia que a Ré A. tinha pressa em vender o imóvel.”, pois tal resulta claro, do depoimento prestado pela testemunha C. (Gravação do dia 19/09/2023, das 10H58 às 11H39, minuto 06:17 ao minuto 13:35);
E) Também deverá ser alterada a resposta dada ao facto provado nº 27 para não provado, pois tal resulta claro, do depoimento prestado pela testemunha C (Gravação do dia 19/09/2023, das 10H58 às 11H39, minuto 06:17 ao minuto 13:35), não servindo o depoimento de parte da Ré para, por si só, provar tal fato;
F) Entende-se, ainda que, deverão V. Exas alterar a resposta dada ao facto provado nº 32 passando o mesmo a ter o seguinte teor: “O Réu B. não foi informado do andamento do processo pela Autora.”, porquanto resulta do depoimento de parte prestado pelo Réu que teve conhecimento do que se passava com o processo de venda e assinou o acordo de reserva.
G) E, por outro lado, entende a apelante que se deverá aditar aos factos considerados como provados, a seguinte factualidade, pois resulta claro do depoimento prestado pela testemunha C (Gravação do dia 19/09/2023, das 10H58 às 11H39, minuto 06:17 ao minuto 13:35):
1- Houve um atraso no processo de financiamento bancário dos interessados, o que foi transmitido aos Réus, sendo estabelecidos contatos telefónicos com a Ré A semanalmente.
2- A Ré A sempre foi informada pela Autora sobre o andamento do processo de financiamento bancário.
3- A Autora deu conhecimento à Ré A da minuta do contrato promessa de compra e venda.
H) Isto porque, em face da prova documental e testemunhal produzida nos presentes autos, salvo o devido respeito, não deveriam existir quaisquer dúvidas, no sentido de se provar que os Réus incumpriram o contrato de mediação imobiliária celebrado com a apelante;
I) No que respeita à prova testemunhal, deverá atender-se ao depoimento prestado por C, a qual, de forma clara, isenta e totalmente congruente, explicou os contatos estabelecidos com a Ré A, a data dos mesmos, para realização da avaliação ao imóvel, bem como, para assinatura do contrato promessa de compra e venda;
J) Para prova dos referidos factos, deverá igualmente ter-se em consideração a prova documental junta aos presentes autos, mais concretamente:
a. Os documentos juntos aos autos com a petição inicial, mais concretamente, as cópias dos contratos de mediação imobiliária e do acordo de reserva;
b. Os documentos juntos com a petição inicial e em sede de audiência de discussão e julgamento, mais concretamente, as cópias dos emails trocados entre a apelante e os Réus.
K) Acresce que, da prova por depoimento de parte, ambos os RR. foram unânimes em declarar que aceitaram vender o imóvel pelo montante de €136.000,00.
L) Finalmente, não podemos deixar de referir que, o facto de os Réus não terem assinado o contrato promessa de compra e venda, deve-se única e exclusivamente a factos imputáveis aos mesmos, não podendo, igualmente, deixar de se ter em consideração os factos já dados como provados na presente ação, bem como determinados documentos que não foram tidos em consideração.
M) E, em relação a esta matéria, não podemos deixar de se ter em consideração, não só, os factos já dados como provados na presente ação, como também, determinados documentos, em relação aos quais não foi feita a devida análise;
N) Mais concretamente, não foi tido em consideração, que a Ré A foi informada da data de assinatura do contrato promessa de compra e venda, nem tão-pouco, que só depois decidiu não assinar o mesmo;
O) Efetivamente, através dos referidos documentos é possível aferir que os Réus decidiram não assinar o contrato promessa de compra e venda, pois decidiram, unilateralmente, alterar o valor de venda do mesmo;
P) Tais documentos deveriam ter sido conjugados com os factos provados nº 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 21, 23, 24, 25, 26, 29, 30 e 31 da sentença recorrida, pois através da conjugação dos referidos meios de prova, resulta inequivocamente que:
I. Os Réus celebraram um contrato de mediação imobiliária com a apelante para vender o imóvel do qual eram proprietários;
II. A apelante desenvolveu diligências para encontrar um comprador e obteve uma proposta para aquisição do imóvel, propriedade dos Réus;
III. Os Réus aceitaram a proposta apresentada pelo interessado que a apelante encontrou, vender o imóvel do qual eram proprietários pelo preço de €136.000,00;
IV. Nessa sequência, foi assinado um acordo de reserva pelos Réus e pelos promitentes compradores;
V. O acordo de reserva assinado pelos Réus previa a assinatura do contrato promessa de compra e venda no prazo de 30 dias;
VI. Contudo, no dia seguinte ao termo de tal prazo de 30 dias, os Réus permitiram que fosse realizada uma avaliação ao imóvel para instruir o processo de financiamento dos promitentes compradores;
VII. De seguida, a apelante informou a data de assinatura do contrato promessa de compra e venda à Ré A;
VIII. Os Réus não comparecerem para assinar o contrato promessa de compra e venda;
IX. Contrariamente ao alegado pela Ré A, só no início de julho de 2022, ou seja, após a data indicada para assinatura do contrato promessa de compra e venda, a mesma informou a apelante que já não pretendia vender o imóvel pelo valor que constava do contrato de mediação assinado, mas sim por €200.000,00.
Q) E, por conseguinte, é por demais evidente que, se o contrato promessa de compra e venda do imóvel não foi assinado, tal ocorreu por motivos totalmente imputáveis aos Réus.
R) Em face do exposto, a apelante fez prova dos seguintes factos constitutivos do seu direito [artigos 342.º, n.º 1, do Cód. Civil e 19.º, n.º 2, da Lei n.º 15/2013, de 8/2]
 (i) que angariou e apresentou ao cliente um interessado real e genuíno na compra do imóvel;
(ii) que o negócio visado não se concretizou por causa imputável ao cliente, proprietário do bem imóvel.
S) O que de essencial se discute nos autos, ab initio, é apenas se a apelante pode exigir dos Réus o pagamento da remuneração prevista no contrato, muito embora não tenha sido celebrado o contrato de compra e venda visado pela mediação por a cliente ter, entretanto, decidido não vender o imóvel, rectius, por ter desistido da venda.
T) Sobre a matéria da remuneração do mediador dispõe o artigo 19.º da Lei n.º 15/2013, de 8 de fevereiro, na parte que aqui interessa, o seguinte:
“1 - A remuneração da empresa é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação ou, se tiver sido celebrado contrato-promessa e no contrato de mediação imobiliária estiver prevista uma remuneração à empresa nessa fase, é a mesma devida logo que tal celebração ocorra.
2 - É igualmente devida à empresa a remuneração acordada nos casos em que o negócio visado no contrato de mediação tenha sido celebrado em regime de exclusividade e não se concretize por causa imputável ao cliente proprietário ou arrendatário trespassante do bem imóvel.”.
U) Tendo sido estipulada cláusula de exclusividade (cf. cláusula 5ª e 8ª do contrato de mediação imobiliária junto aos autos com a petição inicial), a questão que se coloca é a de saber se os Réus podiam desistir do mesmo.
V) Assim, o contrato de mediação exclusivo não pode, portanto, ser posto termo unilateralmente e sem causa justificativa.
W) Ora, no caso em apreço, a apelante alegou, e provou, que obteve e apresentou aos Réus um real interessado na aquisição do imóvel, e também logrou demonstrar que o negócio só não se concretizou por causa imputável aos Réus.
X) E que o facto de os Réus se recusarem a venda depois de lhes ter sido apresentado um comprador para o imóvel, pelo valor de €136.000,00, depois de terem aceite o mesmo, não configura justa causa que os exima da obrigação de pagamento da remuneração devida à apelante, nos termos do n.º 2 do artigo 19.º da Lei n.º 15/2013, de 8 de Fevereiro (RJAMI).
Y) Importa referir que se encontra provada a factualidade com base na qual a apelante estriba a sua pretensão, designadamente que os Réus recusaram a venda do imóvel e puseram fim ao contrato depois de lhe ter sido angariado pela apelante um interessado na aquisição do imóvel e de ter aceitado a proposta que este lhe dirigiu.
Z) Em suma, a apelante logrou demonstrar que, na vigência do contrato, angariou um interessado, genuinamente interessado na compra do imóvel, e que o contrato promessa de compra e venda só não foi assinado por culpa imputável aos Réus.
AA) Em face do exposto, considera-se que, ao caso sub judice, deverá ser alterada a sentença recorrida, julgando procedente a ação e condenando os Réus no pedido”.

4. Os réus apresentaram contra-alegações, pugnando pela manutenção do decidido, quer de facto, quer direito, formulando as seguintes conclusões:
1. - A Autora, ora Recorrente, veio interpor o presente recurso da douta sentença que julgou improcedente o seu pedido.
2. – O Tribunal a quo fez boa e correta apreciação da prova e aplicação do direito, não merecendo a sentença qualquer censura, pelo que o presente recurso não poderá ter provimento.
3. – Como se pode constatar na sentença, na fundamentação da matéria de facto, a matéria dada como provada assenta na análise critica de todos os depoimentos prestados, não apenas num depoimento isolado, e em documentos.
4. – A Recorrente pretende alterações à matéria de facto, como se deixou demonstrado, para as quais, além de não ter fundamento ainda são, entre si, as alterações que pretende, contraditórias.
5. – Ao contrário do que a Recorrente alega, a sentença está bem sustentada e faz uma correta interpretação dos documentos e dos depoimentos prestados, no seu conjunto.
6. – A Recorrente é que parece desconhecer a data aposta no acordo de reserva para a celebração do contrato de promessa, que é bem clara, 30 dias após a assinatura do mesmo, que terminava em 27 de Junho de 2022, e de má fé e depois de saber que os RR. já não tinham interesse na venda pelo montante constante nesse acordo de reserva, enviam-lhe a minuta de um contrato de promessa.
7. – E quer, à força e de má fé, dizer que os RR. não assinam o contrato, mas não refere as datas dos mesmos que ela, Recorrente, é que incumpriu.
8. – Como se referiu, não há qualquer fundamento para qualquer das alterações pretendidas quanto à matéria de facto.
9. - Aliás, as alterações pretendidas são contraditórias entre si.
10.– Nem há, como ficou demonstrado, fundamento sequer para o recurso.
11. – A Recorrente transcreve a legislação que diz que a imobiliária tem direito à indemnização se encontrar um comprador e os vendedores se recusarem, sem mais, a assinar o contrato de promessa
 12.– Mas não diz que, no caso em análise, os vendedores só aceitaram vender por preço inferior ao constante no contrato celebrado com a imobiliária, se lhes fosse entregue o sinal em determinado prazo, o constante no acordo de reserva, como a Recorrente bem sabia,
13. – E o acordo de reserva não foi cumprido pela Recorrente.
14. – Logo, do que a Recorrente faz prova é que angariou e apresentou ao cliente (Réus) um interessado na compra do imóvel – mas por preço inferior ao estipulado para a venda no contrato de mediação, e que foi celebrado um acordo de reserva cujo prazo não foi cumprido e por isso esse acordo deixou de ter validade e isso não ficou a dever-se a qualquer ato dos RR. mas simplesmente à Recorrente pois era na disponibilidade desta que estavam o cumprimento dos prazos acordados.
15.– O contrato com a imobiliária manteve-se até ao seu termo, os RR. mantiveram interesse em vender o imóvel, não houve qualquer desistência dos mesmos, nem qualquer incumprimento.
16.– A sentença em recurso não violou, assim, o disposto no artigo 342º do Código Civil, nem as normas constantes nos artigos 607º nº 4 e 615º, nº 1, al. d) do Código de Processo Civil, nem o art.º 19º da Lei nº 15/2013 de 8 de fevereiro.”

5. Foi admitido o recurso interposto, como apelação, com subida imediata e nos próprios autos e efeito meramente devolutivo.

6. Remetidos os autos a este tribunal, inscrito o recurso em tabela, foram colhidos os vistos legais, cumprindo apreciar e decidir.

II – QUESTÕES A DECIDIR
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação, ressalvadas as matérias de conhecimento oficioso pelo tribunal, bem como as questões suscitadas em ampliação do âmbito do recurso a requerimento do recorrido, nos termos do disposto nos artigos 608, nº 2, parte final, ex vi artigo 663º, nº 2, 635º, nº 4, 636º e 639º, nº 1, CPC.
Consequentemente, nos presentes autos, inexistindo questões de conhecimento oficioso a apreciar, as questões a decidir, são as seguintes:
- Impugnação da matéria de facto;
- Pressupostos da condenação no pedido deduzido pela autora (direito do mediador à remuneração prevista no contrato de mediação imobiliária).

III – FUNDAMENTAÇÃO

A – Impugnação da matéria de facto
Sob a epígrafe “Modificabilidade da decisão de facto” estabelece o nº 1 do artigo 662º do Código de Processo Civil:
“1 - A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.”
Já do nº 2 daquela norma resulta que:
“2- A Relação deve ainda, mesmo oficiosamente:
a) Ordenar a renovação da produção da prova quando houver dúvidas sérias sobre a credibilidade do depoente ou sobre o sentido do seu depoimento;
b) Ordenar em caso de dúvida fundada sobre a prova realizada, a produção de novos meios de prova;
c) Anular a decisão proferida na 1.ª instância, quando, não constando do processo todos os elementos que, nos termos do número anterior, permitam a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto, repute deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto, ou quando considere indispensável a ampliação desta;
d) Determinar que, não estando devidamente fundamentada a decisão proferida sobre algum facto essencial para o julgamento da causa, o tribunal de 1.ª instância a fundamente, tendo em conta os depoimentos gravados ou registados”.
Por outro lado, a reapreciação da matéria de facto pelo tribunal de recurso implica que o recorrente, nas alegações em que impugna a decisão relativa à matéria de facto, cumpra os ónus que o legislador estabeleceu a seu cargo, enunciados no artigo 640º CPC, com a seguinte redação:
“1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
3 - O disposto nos n.ºs 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º”.
Constituem ónus do recorrente que impugna a matéria de facto a identificação dos concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados  (640º, nº 1, alínea a), CPC), dos meios probatórios que impunham decisão diversa (640º, nº 1, alínea b), CPC) e a decisão que, na sua perspetiva, deve ser proferida quanto aos factos impugnados (640º, nº 1, alínea c), CPC).
Como referido no acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 30-11-2017[1]: “I- Quando o Tribunal da Relação é chamado a pronunciar-se sobre a reapreciação da prova, no caso de se mostrarem gravados os depoimentos ou estando em causa a análise de meios prova reduzidos a escrito e constantes do processo, deve o mesmo considerar os meios de prova indicados pela partes e confrontá-los com outros meios de prova que se mostrem acessíveis, a fim de verificar se foi cometido ou não erro de apreciação que deva ser corrigido, seja no sentido de decidir em sentido oposto ou, num plano intermédio, alterar a decisão no sentido restritivo ou explicativo;
II- Importa, porém, não esquecer que se mantêm em vigor os princípios de imediação, da oralidade e da livre apreciação da prova, pelo que o uso, pela Relação, dos poderes de alteração da decisão da 1ª instância sobre a matéria de facto só deve ser usado quando seja possível, com a necessária segurança, concluir pela existência de erro de apreciação relativamente a concretos pontos de facto impugnados (…)”.
A este propósito, refere Abrantes Geraldes[2]: “(…) o exercício dos poderes da Relação no que respeita à decisão da matéria de facto não pode limitar-se à enunciação de argumentos marginais de pendor abstrato, impondo sempre a reapreciação dos meios de prova oralmente produzidos, desde que o recorrente tenha cumprido o ónus de alegação consagrado no artigo 640º (…)” devendo “(…) a Relação (…) alterar a decisão da matéria de facto sempre que, no seu juízo autónomo, os elementos de prova que se mostrem acessíveis determinem uma solução diversa, designadamente em resultado da reponderação dos documentos, depoimentos e relatórios periciais, complementados ou não pelas regras da experiência”.
Compulsadas as respetivas alegações, verifica-se que na motivação do recurso a autora/recorrente indicou quais os pontos da matéria de facto que considera incorretamente julgados, bem como os meios de prova que impunham solução diversa e qual a redação que considera dever ser atribuída aos pontos impugnados. Nada obsta, pois, que se proceda à sua apreciação.

A recorrente impugnou a matéria constante do artigo 22º dos factos provados, ao qual foi conferida a seguinte redação:
22) A Autora sabia ser importante para os Réus que o contrato de promessa de compra e venda estivesse celebrado e o sinal pago até ao dia 27.06.2022, como convencionado no acordo de reserva”.
A redação proposta pela recorrente é a seguinte:
“A Autora sabia que a Ré A tinha pressa em vender o imóvel”.
Considerou a recorrente que a redação por si proposta resulta do depoimento prestado pela testemunha C (Gravação do dia 19/09/2023, das 10H58 às 11H39, minuto 06:17 ao minuto 13:35).
De tal depoimento, a cuja audição integral se procedeu, resultou que a testemunha em questão, colaboradora da autora desde 2017, teve contacto com a questão em debate nos autos apenas em junho de 2022, data posterior à da celebração do “acordo de reserva”, celebrado em 27-05-2022 (minuto 2.30 a 5.00 do seu depoimento). Ora, afigura-se que é tal documento que evidencia a essencialidade para os réus da celebração do contrato promessa até ao dia 27-06-2022, tanto mais que, quando subscreveram tal reserva, aceitaram a redução do preço do negócio para €136.000,00. Assim, resultando do depoimento da testemunha C que desconhecia o concreto contexto subjacente à celebração do “acordo de reserva” e ao concreto prazo ali estipulado, não pode considerar-se que se trate de testemunha que tenha acompanhado todo o processo negocial entre a autora e os réus e, consequentemente, que assuma relevância significativa nessa matéria.
 A depoente referiu ter desenvolvido diligências com vista ao financiamento bancário dos clientes compradores, e à avaliação do imóvel (6.20 a 7.25). Depois de ter sido comunicado o relatório da avaliação, foi-lhe transmitido que a ré não tinha interesse em fazer a venda “(…) porque tinham passado uns diazinhos do contrato promessa de compra e venda” (minutos 10.15 a 11.00). De seguida (16.40 a 19.00) reafirmou saber que a ré tinha urgência na celebração do contrato promessa de venda da sua fração, dado que pretendia efetuar um outro negócio, mas que nunca referiu uma data específica. Relativizando tal urgência, acabou por referir: “Tal e qual com todos os nossos vendedores, toda a gente tem urgência em fazer a venda do imóvel” (41.00 a 41.47)
Em síntese, é inequívoco que o depoimento da testemunha em questão evidencia que, pelo menos, “a ré tinha pressa”, como pretende a requerente que fique exarado no artigo 22º dos factos provados.
Porém, verifica-se que o tribunal recorrido concretizou tal matéria, consignando que era pretensão da ré que “(…) o contrato promessa de compra e venda estivesse celebrado e o sinal pago até ao dia 27-06-2022, como convencionado no acordo de reserva”.
A tal propósito foi a seguinte a motivação do tribunal:
Para apuramento da factualidade vertida em 22) atentou-se nas declarações de parte da Ré A, que a confirmou de forma consistente e segura, tendo referido que as colaboradoras da Autora tinham tal conhecimento, o que justificou a aceitação da redução do preço da venda do imóvel e a celebração do acordo do reserva no qual ficou acordado que o contrato-promessa de compra e venda deveria ser celebrado no prazo de trinta dias a contar da data da assinatura da reserva, mediante o pagamento da quantia de treze mil e seiscentos euros a título de sinal.
E tais declarações saem reforçadas, por um lado, das declarações do Réu B, que referiu que só aceitou reduzir o valor da venda do imóvel porque a Ré A estava com pressa de adquirir uma casa, quer do depoimento da testemunha D, que como supra referido, explicou ter anuído na cessação do contrato de mediação que tinha em vigor com os Réus em virtude da Ré A o ter informado que estava em processo de separação e que tinha urgência em vender o imóvel que tinha em comum com o Réu a fim de poder adquirir um outro que tinha em vista e cujo pagamento do sinal estava dependente do recebimento do sinal referente ao imóvel que tinha em comum com o Réu.
De igual modo, a testemunha F, referiu ter presenciado contactos telefónicos havidos entre a Ré e colaboradores da Autora e que a Ré informava que tinha pressa em vender o imóvel.
Por outro lado, inquirida a testemunha C, colaboradora da Autora desde 2007, referiu ter tido intervenção na mediação da venda do imóvel em apreço nos autos após a assinatura da reserva e que desde então que tem conhecimento que a R A tinha urgência na celebração do contrato-promessa de compra e venda porque tinha outro negócio em vista.
Inquirida a testemunha G, diretora comercial da Autora desde 2020, igualmente referiu que em data que não soube concretizar, mas já após a realização da avaliação ao imóvel, esteve presente numa reunião com a Ré em que esta a informou que continuava interessada em vender o imóvel, mas já não pelos €136.000,00 uma vez que já tinha perdido o negócio que tinha em vista.
De igual modo, inquirida a testemunha H, consultora da Autora que referiu ter sido a angariadora do imóvel em apreço nos autos, referiu saber que a Ré A tinha pressa em vender o imóvel porque não queria partilhá-lo com o Réu, de quem estava a separar-se. Assim, conjugando a prova produzida nos termos supra expostos, cumpre considerar provada a referida factualidade”.
Compulsados todos os elementos de prova referidos, verifica-se que, efetivamente, a matéria em questão mereceu corroboração nas declarações de parte do réu B, que referiu expressamente ter anuído na redução do preço de venda da fração para €136.000,00 apenas porque sabia da importância para a ré da realização da venda até à data constante do acordo de reserva (minutos 2.20 a 2.40).
Tal matéria também resultou das declarações de parte da ré, produzidas de forma racional e segura, esclarecendo que apenas aceitou baixar o preço do negócio para € 136.000,00 na condição da celebração do contrato-promessa no prazo de 30 dias a contar de 27-05-2022. Efetivamente, segundo referiu aceitou tal valor de €136.000,00 por ter “em vista” a aquisição de uma outra habitação, carecendo de disponibilidade financeira para concretizar este negócio, que esperava obter com a celebração do contrato promessa da sua fração. Com o atraso na celebração do contrato promessa, a ré perdeu a possibilidade de celebrar o negócio de aquisição de outra habitação, mantendo o propósito de vender a sua fração mas pelo montante inicial, sem qualquer redução, o que transmitiu à autora (minutos 11.40 a 12.15). Por esse motivo, permitiu a avaliação mesmo depois de decorrido o prazo de 30 dias que constava do acordo de reserva (minutos 13.00 a 14.00), tendo comunicado, no momento do seu agendamento, que já não vendia pelo preço reduzido, dado que já tinha perdido a possibilidade de realização do outro negócio que justificou a redução do preço (minuto 25.23 a 27.14).
 Ao depoimento da testemunha G, colaboradora da ERA, não pode ser atribuída relevância significativa pois teve intervenção nas negociações em data posterior à da celebração do “acordo de reserva”, agendando com a ré uma reunião na qual esta lhe explicou que não avançava com a venda pelos €136.000,00 porque tinha perdido o negócio que tinha em vista (minuto 19.00 a 19.42).
A testemunha F. colega de profissão da ré, com ela partilhando o gabinete, de forma convincente e segura esclareceu, que na sequência da rutura do respetivo relacionamento, os réus tentaram vender a casa que possuíam, e que a A tinha urgência nesse negócio dado pretender adquirir outra habitação, carecendo do valor do sinal para o concretizar, dispondo de prazo para o efeito (minutos 2.55 a 3.46; 5.00 a 6.00).
Porém, julgamos que decisivo nesta matéria é o teor do “acordo de reserva” datado de 27-05-2022, junto com a petição inicial do qual consta, além do mais: “(…) o valor de compra e venda do indicado imóvel é de 136.000€ (cento e trinta e seis mil euros). O contrato promessa de compra e venda deverá ser celebrado no prazo de 30 dias a contar da data de assinatura desta reserva com um sinal no valor de 13.600,00€ (…)”.
Conjugando toda a prova produzida, verifica-se que a celebração do contrato promessa até 27-06-2022 (e o recebimento do respetivo sinal) constituía pressuposto essencial, na ótica da ré, para a celebração da venda pelo valor reduzido de €136.000,00, num contexto de rutura do relacionamento que mantinha com o réu e de necessidade de adquirir outra habitação, em negócio que teria que ser celebrado naquele prazo.
Consequentemente, não merece qualquer censura a decisão do tribunal ao consignar nos factos provados que o contrato promessa deveria estar celebrado até 27-06-2022, improcedendo, nesta parte, a impugnação da matéria de facto.

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A recorrente impugnou ainda o facto provado sob o artigo 27º, considerando que o mesmo deveria ser considerado não provado.
A tal facto, o tribunal recorrido atribuiu a seguinte a redação:
27) A Ré perdeu a oportunidade de comprar o apartamento que tinha em vista, não conseguindo fazer o contrato-promessa de compra e venda quanto ao mesmo porquanto o contrato-promessa e pagamento do sinal constantes do acordo de reserva não se realizaram no prazo acordado
Considera a recorrente que a ponderação do depoimento da testemunha C (gravação do dia 19/09/2023, das 10H58 às 11H39, minuto 06:17 ao minuto 13:35), aliado ao facto de o depoimento parte da Ré, por si só, não comprovar tal realidade, determinará a alteração proposta.
Porém, não lhe assiste razão.
O depoimento da testemunha C, ao invés do defendido pela recorrente, nos termos já analisados, evidencia de forma clara que a ré invocou a circunstância de ter sido ultrapassado o prazo de celebração do contrato promessa (e de recebimento do sinal de que carecia para avançar para outro negócio) como fundamento para a recusa da venda da fração pelo preço de €136.000,00. Reiterando-se que este depoimento apresenta limitações (dado que a testemunha em questão apenas teve contacto com o processo da autora já depois de celebrado o acordo de reserva), possui o mérito de evidenciar que a ré invocou que a falta de pagamento do sinal no negócio mediado pela autora inviabilizou a celebração do negócio que tinha em vista.
O mesmo resulta também de forma clara das declarações de parte da ré, bem como do depoimento já analisado da testemunha F.
No mesmo sentido, o email enviado pela ré à autora em 4.-07-2022 do qual resulta expressamente: “(…) Certo, mas o documento assinado para a venda da casa não foi cumprido com as datas logo fica sem efeito esta venda.”
Dir-se-á ainda que tal realidade resulta, de forma clara e consistente, do depoimento da testemunha D, que exerce funções de “comercial” numa imobiliária à qual também havia sido entregue a angariação do apartamento dos réus. Esta angariação foi rescindida pela ré quando a ERA lhe comunicou que surgira um interessado na aquisição do imóvel, justificando que era urgente a celebração do negócio porque ela estava em situação de separação e o sinal que lhe seria pago permitiria sinalizar a aquisição da nova casa. Porém, o prazo de 30 dias previsto para a celebração do contrato promessa esgotou-se, não foi cumprido e a ré não conseguiu adquirir a casa que pretendia (minutos 4.40 a 8.50).
Assim, não merece qualquer censura a decisão do tribunal recorrido quanto ao apuramento do facto nº 27 que, aliás, motivou nos seguintes termos:
Para apuramento da factualidade vertida em 27) e 28) atentou-se nas declarações de parte da Ré A, que a confirmou de forma consistente e segura, em conjugação com a cópia do email de fls. 18 datado de 04.07.2022 e com o depoimento das testemunhas C e G, que referiram terem sido informadas pela Ré que o prazo acordado na reserva já se mostrava ultrapassado e que aquela já não queria vender o imóvel pelo valor de €136.000,00 porque já tinha perdido o negócio que tinha em vista”.
Os referidos meios de prova evidenciam de forma clara o apuramento da matéria constante do facto provado nº 27, pelo que, nesta parte, improcede a impugnação.
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A recorrente também impugnou o facto provado sob o nº 32.
A tal facto, o tribunal atribuiu a seguinte redação:
32) O Réu B nunca foi informado de nada pela Autora”
A recorrente propôs para o referido facto a seguinte redação:
O Réu B não foi informado do andamento do processo pela Autora.”, considerando resultar do depoimento de parte prestado pelo réu que teve conhecimento do que se passava com o processo de venda e assinou o acordo de reserva.
O tribunal motivou tal factualidade nos seguintes termos:
Para apuramento da factualidade vertida em 32) atentou-se nas declarações de parte do Réu B que a confirmou, tendo referido nunca ter sido contactado, nem telefonicamente nem por escrito pela Autora, nem pela mesma ter sido informado de nada. Mais se atentou no depoimento das testemunhas C e G, que referiram não conhecer o Réu, bem como no depoimento da testemunha H que referiu apenas ter contactado com o Réu aquando da angariação do imóvel em virtude do o ter abordado na rua para esse efeito”.
Ora, das declarações de parte produzidas pelo réu B, bem como dos demais meios de prova mencionados na motivação da decisão recorrida, resulta que, efetivamente, os representantes da autora não transmitiram qualquer informação ao réu. O réu referiu que todo o conhecimento acerca das vicissitudes do negócio lhe foi transmitido pela ré (minuto 1.00 ao minuto 3.30), nunca tendo recebido qualquer informação, ou sequer comunicação por parte da autora.
Aliás, não ter sido informado de nada ou do andamento do processo, afigura-se que, in casu, é equivalente, dado que inexistindo quaisquer outras relações entre o réu e a autora para além das relativas ao contrato de mediação em causa nos autos, apenas nesse âmbito poderiam ser transmitidas quaisquer informações ao réu.
Improcede, pois, neste aspeto a impugnação da matéria de facto.
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Por outro lado, entende a apelante que deverá aditar-se aos factos considerados como provados, a seguinte factualidade, (com base no depoimento prestado pela testemunha C-gravação do dia 19/09/2023, das 10H58 às 11H39, minuto 06:17 ao minuto 13:35):
1- Houve um atraso no processo de financiamento bancário dos interessados, o que foi transmitido aos Réus, sendo estabelecidos contatos telefónicos com a Ré A semanalmente.
2- A Ré A sempre foi informada pela Autora sobre o andamento do processo de financiamento bancário.
3- A Autora deu conhecimento à Ré A da minuta do contrato promessa de compra e venda”.
Porém, constitui facto determinante para a apreciação do mérito da causa o apuramento da essencialidade para a ré de um prazo para a celebração do contrato promessa e recebimento do respetivo sinal, com vista à viabilização de outro negócio. Já o atraso no financiamento bancário aos promitentes compradores, a transmissão de informação sobre tal financiamento à ré, ou da minuta do contrato promessa, não releva quanto ao apuramento do incumprimento do prazo previsto no contrato de reserva.
E a este propósito, veja-se o Acórdão da Relação de Coimbra de 15-09-2015[3], onde se refere: “Não há lugar à reapreciação da matéria de facto, quando o facto concreto objeto da impugnação for insuscetível de, face às circunstâncias próprias do caso em apreciação, ter relevância jurídica para a solução da causa ou mérito do recurso, sob pena de se levar a cabo uma atividade processual que se sabe, de antemão, ser inconsequente”.
Neste mesmo sentido, o Acórdão da Relação de Lisboa de 07-11-2023[4], onde se refere: “sempre que se verifique que a alteração sobre a matéria de facto pretendida pelo apelante, é manifestamente insuscetível de ter como efeito a alteração quanto ao fundamento da causa, deve concluir-se que a impugnação sobre a matéria de facto contraria os princípios de celeridade e economia processuais (artigos 2º, 137, 138º CPC) e constitui ato inútil e como tal proibido (artigo 130º, CPC), razão pela qual deve o Tribunal da Relação rejeitá-la”. E assim é, porquanto “a reapreciação da matéria de facto não constitui um fim em si mesma, mas um meios para atingir um determinado objetivo, que é a alteração da decisão da causa, pelo que sempre que se conclua que a reapreciação pretendida é inútil (… ) não deve ter lugar” – Acórdão da Relação de Lisboa de 11-05-2023[5]
Assim, revelando-se absolutamente irrelevantes para o desfecho da causa as circunstâncias de ter havido atraso no financiamento aos interessados e de ter sido dado conhecimento de tal atraso à ré (dado que se apurou que com o réu a autora não estabeleceu qualquer contacto) ou de lhe ter sido enviada a minuta do contrato promessa de compra e venda, rejeita-se, nessa parte, a apreciação da impugnação da matéria de facto.
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III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
Julgada improcedente a impugnação da matéria de facto, são os seguintes os FACTOS PROVADOS a ponderar:

1) A Autora é uma sociedade que tem por objeto o exercício da atividade de mediação imobiliária, intermediação de crédito e arrendamento de bens imobiliários.
2) Em 9 de fevereiro de 2022, foi celebrado entre a ora Autora e os Réus, um denominado “contrato de mediação imobiliária (contrato nº 5377/2022), o qual tinha por objeto o imóvel sito na Rua …Moita, do qual os Réus eram titulares.
3) No âmbito do referido acordo, a ora Autora obrigou-se a diligenciar no sentido de conseguir encontrar um interessado na compra do imóvel pelo preço de € 149.200,00 (cento e quarenta e nove mil e duzentos euros), desenvolvendo para o efeito, as necessárias ações de promoção e recolha de informações sobre o negócio pretendido e características do imóvel.
4) De acordo com as cláusulas sexta e sétima, o acordo foi celebrado em regime de não exclusividade e pelo prazo de 9 meses.
5) Em 8 de abril de 2022, foi celebrado entre a ora Autora e os Réus, um denominado “contrato de mediação imobiliária (contrato nº 5411/2022), o qual tinha por objeto o imóvel sito na Rua … Moita, do qual os Réus eram titulares.
6) No âmbito do acordo referido em 5), a ora Autora obrigou-se a diligenciar no sentido de conseguir encontrar um interessado na compra do imóvel pertencente aos Réus, pelo preço de €149.200,00 (cento e quarenta e nove mil e duzentos euros), desenvolvendo para o efeito, as necessárias ações de promoção e recolha de informações sobre o negócio pretendido e características do imóvel.
7) De acordo com as cláusulas sexta e sétima, o acordo foi celebrado em regime de exclusividade e pelo prazo de 6 meses.
8) De acordo com as cláusulas quinta e oitava do referido acordo, acordaram os outorgantes que os Réus se comprometiam proceder ao pagamento de uma comissão de 5% sobre o preço acordado, comissão essa nunca inferior ao montante de €6.000,00 (seis mil euros) acrescida de IVA, a liquidar na data da celebração do contrato-promessa de compra e venda.
9) Logo após a celebração do contrato de mediação, a ora Autora desenvolveu todas as diligências necessárias, nomeadamente, de promoção do referido bem imóvel, de contactos diretos com investidores e potenciais interessados, com vista a encontrar um comprador para o imóvel pertencente aos ora Réus.
10) Em 29.04.2022, Autora e Réus celebraram um denominado “aditamento ao contrato de mediação imobiliária”, pelo qual acordaram alterar o valor indicado na cláusula quarta do contrato de mediação imobiliária celebrado em 8 de abril de 2022 para o montante de €142.000,00 (cento e quarenta e dois mil euros) e que tal documento faria parte integrante do contrato de mediação imobiliária celebrado em 8 de Abril de 2022.
11) Na sequência das referidas diligências e contactos encetados pela Autora, esta encontrou como interessados na aquisição do referido bem imóvel, o Sr. I e Sra. J..
12) Os quais vieram propor a aquisição do referido imóvel pelo montante de €136.000,00 (cento e trinta e seis mil euros).
13) Proposta esta que foi aceite pelos Réus
14) Em 27 de maio de 2022, foi assinado pelos Réus e pelos interessados na aquisição do referido prédio urbano, o Sr. I. e Sra. J. um denominado “Acordo de Reserva”.
15) No âmbito do referido Acordo de Reserva, os interessados na aquisição do imóvel, o Sr. I. e J., entregaram à ora Autora a título de caução e reserva, a quantia de €400,00 (quatrocentos euros).
16) Mais ficou acordado no âmbito do referido Acordo de Reserva que o contrato promessa de compra e venda deveria ser celebrado no prazo de 30 (trinta) dias a contar da data da assinatura da reserva, mediante o pagamento da quantia de €13.600,00 (treze mil e seiscentos euros) a título de sinal e que a escritura de compra e venda deveria ser celebrada no prazo de 60 (sessenta dias).
17) Ficou igualmente acordado que os compradores se comprometiam a proceder à entrega de toda a documentação indispensável à instrução do seu processo de financiamento bancário no prazo máximo de 10 (dez) dias a contar da data da assinatura da reserva e que seriam da sua inteira responsabilidade todas as consequências que pudessem advir do respetivo atraso.
18) A Ré tinha visto um apartamento que era do seu interesse e que pretendia adquirir.
19) Para lograr adquiri-lo, a Ré necessitava de receber rapidamente o sinal da promessa de compra e venda da sua fração a fim de poder celebrar o contrato de promessa de compra e venda do apartamento que queria adquirir.
20) Foi por esse motivo que os Réus aceitaram baixar o valor da venda do seu imóvel para os €136.000,00.
21) Os Réus permitiram que a avaliação ao imóvel fosse realizada no dia 28 de junho de 2022, tendo o resultado da mesma sido conhecido em 30 de junho de 2022.
22) A Autora sabia ser importante para os Réus que o contrato de promessa de compra e venda estivesse celebrado e o sinal pago até ao dia 27.06.2022, como convencionado no acordo de reserva.
23) Em 01.07.2022 a Autora, na pessoa da colaborada C. enviou um email à Ré solicitando-lhe o envio de documentos e informando-a dos valores a pagar para obtenção da certidão de teor, direito de preferência da Câmara Municipal e licença de habitação
24) A Autora reuniu toda a documentação necessária para a celebração do contrato promessa de compra venda.
25) Mediante email datado de 04.07.2022 pelas 16:54 a Autora informou a Ré que se encontrava agendado o dia 05.07.2022 pelas 11h30m, no escritório da ora Autora para assinatura do contrato-promessa de compra e venda.
26) Mediante email datado de 04.07.2022, pelas 17:04 a Ré informou a Autora que não poderia comparecer no dia 05.07.2022 para assinar o contrato-promessa de compra e venda, em virtude de ambos os Réus trabalharem e necessitarem de ter conhecimento do dia e hora com antecedência, mais solicitando o envio dos anexos por não ter recebido nada.
27) A Ré perdeu a oportunidade de comprar o apartamento que tinha em vista, não conseguindo fazer o contrato-promessa de compra e venda quanto ao mesmo porquanto o contrato-promessa e pagamento do sinal constantes do acordo de reserva não se realizaram no prazo acordado.
28) Mediante email datado de 04.07.2022, pelas 18:08 a Ré informou a Autora que as datas constantes do acordo de reserva não haviam sido cumpridas e que a venda ficava sem efeito.
29) O referido contrato-promessa de compra e venda não veio a ser assinado pelos Réus, não tendo os mesmos comparecido na data e hora agendados.
30) Numa reunião ocorrida no início de Julho de 2022 na loja da Autora, a Ré informou que já não tinha interesse em vender o imóvel aos interessados, pelo valor de €136.000,00.
31) Mediante email datado de 06.07.2022 a Ré informou a Autora que a partir dessa data o valor de venda do seu imóvel seria de €200.000,00 e que o contrato de exclusividade com a Autora não seria renovado após o seu término no dia 08.09.2022.
32) O Réu B. nunca foi informado de nada pela Autora.
33) Os Réus são jovens, sem qualquer experiência em negócios de compra e venda de imóveis

São os seguintes os factos não apurados:
a) Os promitentes compradores iniciaram o processo de financiamento bancário junto do Banco no dia 3 de junho de 2022.
b) Houve um atraso no processo de financiamento bancário dos interessados, o que foi transmitido aos Réus, sendo estabelecidos contatos telefónicos com os mesmos semanalmente.
c) Os Réus sempre foram informados pela Autora sobre o andamento do processo de financiamento bancário.
d) Os Réus só aceitaram baixar o valor da venda em mais de €13.000,00 (treze mil euros) porque a Autora lhes garantiu que antes de 30 dias conseguiam receber o sinal, e assim a Ré realizar o negócio que tinha em vista.
e) A Ré A transmitiu à Autora, na pessoa da Sra. D. G, que só estava a vender por €136.000,00 para conseguir comprar outro imóvel que tinha visto, e que se não tivesse da sua posse o valor do sinal até à data estipulada, 27 de junho, para também poder fazer o contrato-promessa de compra e venda desse imóvel, deixava de ter interesse neste negócio.
f) A Autora, sempre na pessoa da Sra. D. G, insistiu em que fosse feita avaliação, dizendo que sempre teria que ser feita, ainda garantindo à R. que até ao final do mês estava tudo concluído.
g) Mediante email datado de 04.07.2022 a Autora deu conhecimento à Ré da minuta do contrato-promessa de compra e venda.
h) A Autora notificou todos os interessados para comparência na data agendada para a celebração do contrato-promessa de compra e venda.
i) O Réu pretendia adquirir conjuntamente com a Ré o apartamento referido em 18) dos factos provados.
j) O Réu B esteve presente na reunião referida em 30) dos factos provados.
l) A Autora deduziu pretensão cuja falta de fundamento não pode ignorar.
m) Os Réus nunca foram intervenientes em ações judiciais.
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IV - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

Compulsada a petição inicial, verifica-se que a autora solicitou a condenação dos réus no pagamento do valor global de €8.364,00, correspondente à remuneração acordada como contrapartida pela celebração do contrato de mediação em causa nos autos.
Para tanto, considerou a autora ter cumprido a prestação para si emergente de tal contrato de mediação, dado que encontrou um comprador para o imóvel dos réus, não se tendo concretizado o negócio por causa a estes imputável.
Ora, in casu, não oferece controvérsia a celebração entre a autora e os réus de um contrato de mediação imobiliária, em regime de exclusividade, o qual é regulado quer pela específica disciplina contratual acordada, quer pelo disposto na Lei nº 15/2013, de 8 de fevereiro (Regime Jurídico da Atividade de Mediação Imobiliária - RJAMI), com as alterações que lhe foram operadas pelo Decreto-Lei 102/2017, de 23 de agosto.
Efetivamente, a celebração de tal contrato resulta dos factos provados enunciados sob os nºs 5, 6, 7, 8, 10, 12,13,14 e 16, evidenciadores da assunção de tal vínculo contratual em 08-04-2022, tendo por objeto o imóvel sito na Rua…Moita. Tal acordo foi celebrado em regime de exclusividade, gerando para a autora a obrigação de diligenciar por comprador da fração em causa e para os réus a obrigação de pagamento de uma comissão de 5%, sobre o preço acordado, nunca inferior a €6.000,00, acrescido de IVA. Inicialmente foi acordado o preço de €149.200,00, que veio a ser reduzido para €142.000,00 e, posteriormente, para €136.000,00.
Ora, apurado que o negócio não se concretizou, importa questionar se é devida a remuneração acordada para o mediador, como pretendido pela autora.
Na realidade, resulta do artigo 19º, nº 1, do RJAMI: “1 - A remuneração da empresa é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação ou, se tiver sido celebrado contrato-promessa e no contrato de mediação imobiliária estiver prevista uma remuneração à empresa nessa fase, é a mesma devida logo que tal celebração ocorra.
A norma enunciada estabelece, como regra relativa à remuneração da empresa de mediação imobiliária, que o seu pagamento é devido apenas com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação ou, se tal tiver sido expressamente estipulado, com a celebração do contrato-promessa. Consequentemente, a obrigação de pagamento de remuneração não é gerada pelo simples exercício da atividade de mediação, que consiste fundamentalmente, no desenvolvimento de diligências com vista: “(…) à procura, por parte das empresas, em nome dos seus clientes, de destinatários para a realização de negócios que visem a constituição ou aquisição de direitos reais sobre bens imóveis (…)” – cfr. artigo 1º, nº 1, RJAMI. Ao invés, a obrigação de pagamento de remuneração vence-se com a “conclusão e perfeição do negócio visado”.
 Porém, no nº 2 do referido artigo 19º do RJAMI mostra-se estabelecida uma exceção a tal regra que opera nos casos em que o contrato de mediação foi estabelecido em regime de exclusividade e o negócio não se concretize por causa imputável ao cliente.
Efetivamente, ali se refere: “2 - É igualmente devida à empresa a remuneração acordada nos casos em que o negócio visado no contrato de mediação tenha sido celebrado em regime de exclusividade e não se concretize por causa imputável ao cliente proprietário ou arrendatário trespassante do bem imóvel.”
Percorrendo os factos provados por forma a indagar se se verifica a previsão legal que gera a obrigação de pagamento da remuneração mesmo na ausência de concretização do negócio visado, interessa salientar:
- O contrato foi celebrado em regime de exclusividade (facto provado nº 7);
- Logo após a sua celebração, a autora desenvolveu diligências para encontrar comprador (facto provado nº 9);
- A autora encontrou interessados na aquisição da fração dos réus, pelo valor de €136.000,00, o que foi aceite pelos réus e originou a celebração de “acordo de reserva” (factos provados nºs 11, 12, 13, 14);
- Nesse acordo de reserva, celebrado em 27-05-2022 ficou estipulado que o contrato promessa deveria ser celebrado no prazo de 30 dias a contar da sua celebração, mediante o pagamento a título de sinal da quantia de €13.600,00 (facto provado nº 16);
- A ré tinha em vista um apartamento que pretendia adquirir, necessitando, para o efeito de receber o sinal da promessa de compra e venda da sua fração, o que esteve na origem da redução do valor da venda para €136.000,00 (factos provados sob os nºs 18, 19 e 20);
- A autora tinha conhecimento de que era importante para os réus que o contrato promessa de compra e venda estivesse celebrado e o sinal pago até 27-06-2022, como convencionado no acordo de reserva (facto provado sob o nº 22);
- Foi agendado o dia 05-07-2022 para a assinatura do contrato-promessa de compra e venda (facto provado nº 25);
- A ré informou a autora que a venda ficava sem efeito porque as datas constantes do acordo de reserva não haviam sido cumpridas (facto provado nº 28);
- A ré perdeu a oportunidade de comprar o apartamento que tinha em vista, não logrando fazer o contrato promessa relativamente ao mesmo, porquanto o contrato promessa e o pagamento do sinal constantes do acordo de reserva não se realizaram no prazo acordado (facto provado nº 27);
Assim, sendo inequívoco que foi convencionado o regime de exclusividade, a controvérsia radica no apuramento da causa da falta de concretização do negócio, designadamente se a mesma foi ou não imputável aos réus.
A propósito do regime consagrado no artigo 19º, nº 2, do RJAMI, que impõe o pagamento da remuneração à empresa mediadora quando o negócio não se concretiza por causa imputável ao proprietário, refere-se no Acórdão da Relação de Lisboa de 18-04-2024[6]:
Esta norma, que em substância vem dos dois regimes anteriores, introduz, portanto, na disciplina contratual uma diferença significativa relativamente ao regime geral do contrato de mediação, no qual a remuneração só é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação. No regime geral, não se celebrando o contrato visado, ainda que por causa imputável ao cliente, não nasce o direito à remuneração, pois o cliente mantém intacta a sua liberdade de contratar (balizada apenas, nos termos gerais, perante o terceiro, pelo dever de boa fé nas negociações). Tendo sido estipulada uma cláusula de exclusividade num contrato de mediação celebrado com o proprietário ou arrendatário trespassante, o panorama altera-se. Neste caso, a remuneração da mediadora não depende do evento futuro e incerto constituído pela celebração do contrato visado, quando este evento não se concretize por causa imputável ao cliente. Trata-se de uma característica de regime própria dos contratos de mediação com exclusividade, que se repete em vários pontos do globo (ob. cit.[7], nota 192, nas pp. 148-9). A remuneração da mediadora depende aqui quase unicamente do cumprimento da sua obrigação (diligenciar no sentido de encontrar interessado) e do sucesso desta (apresentação de interessado)”.
Porém, a exigibilidade da remuneração nos casos em que o negócio não se concretizou, nos termos do disposto no artigo 19º, nº 2, RJAMI sempre dependerá da prova da existência de interessado na celebração do negócio “nos moldes em que foi concebido no âmbito do contrato de mediação” – cfr. acórdão citado.
Ou seja, o direito a remuneração constitui-se na esfera jurídica da mediadora se o negócio estiver em condições de ser viabilizado nas condições definidas pelo vendedor, e apenas por facto a este imputável não se concretiza.
Contudo, temos como certo que a factualidade apurada evidencia que o negócio perspetivado não satisfazia as condições exigidas pelos vendedores.
Efetivamente, os vendedores aceitaram reduzir o preço da venda de €142.000,00 para €136.000,00 no pressuposto de o contrato promessa ser celebrado até 27-06-2022, com o pagamento do respetivo sinal, no valor de €13.600,00, que viabilizaria outro negócio visado pela ré, facto que era do conhecimento da autora (factos provados nºs 5, 6, 10, 12,13, 16, 18,19, 20, 22).
Perdida a oportunidade de celebração deste negócio pela ré, por ter decorrido o prazo para o efeito, afigura-se não poder concluir-se que o contrato visado não se concretizou por causa imputável aos réus. Efetivamente se num momento inicial o contrato visado envolvia o pagamento do preço de €142.000,00, em momento posterior tal contrato poderia ser realizado pelo valor de €136.000,00 mas teria que ocorrer até 27-06-2022. Apurado que foi ultrapassado esse prazo, não pode ser imputada aos réus a recusa de celebração da promessa por preço que foi reduzido em função da fixação de cláusula acessória (termo) que estabelecia um limite temporal para a sua celebração. Reconduzindo-se o termo a cláusula “(…) pela qual a existência ou a exercitabilidade dos efeitos de um negócio são postas na dependência de um acontecimento futuro mas certo, de tal modo que os efeitos só começam ou se tornam exercitáveis a partir de certo momento (termo suspensivo ou inicial) ou começam desde logo, mas cessam a partir de certo momento (termo resolutivo ou final)” – Mota Pinto[8].
E o certo é que a factualidade evidencia que o termo final fixado deve ser interpretado como essencial, dado que, na perspetiva da ré, a prestação deveria ser efetuada até à data pretendida (27-06-2022).
Afigura-se, pois, que não tendo os interessados que angariou reunido condições para a celebração do contrato promessa, e pagamento do sinal, no termo final previsto no contrato de mediação, a autora não tem direito à remuneração que peticiona, não podendo concluir-se pela existência de qualquer incumprimento imputável aos réus. Improcede, pois, o recurso.

Por terem ficado vencida, a autora/recorrente é responsável pelo pagamento das custas processuais – cfr. artigo 527º, CPC.

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III – DECISÃO

Pelo exposto, acordam os juízes desta 2ª secção cível em julgar improcedente o recurso, mantendo a decisão recorrida.
Custas do recurso pela autora – cfr. artigo 527º, CPC.

D.N.

Lisboa, 20 de junho de 2024
Rute Sobral
Paulo Fernandes da Silva
José Manuel Monteiro Correia
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[1] Proferido no processo nº 1426/15.0T8BGC-A.G1, disponível em www.dgsi.pt
[2] Recursos em Processo Civil, 7ª edição, pág.s 350 e 333.
[3] Proferido no processo nº 6871/14.6T8CBR.C1, disponível em www.dgsi.pt 
[4] Proferido no processo 3844/19.6T8LSB.L1-7, disponível em www.dgsi.pt
[5] Proferido no processo nº 8312/19.3T8ALM.L1-2, disponível em www.dgsi.pt
[6] Proferido no processo nº 730/20.0T8MFR.L1-2, disponível em www.dgsi.pt
[7] Higina Castelo, RJAMI Anotado, 2ª edição, Almedina
[8] Teoria Geral do Direito Civil, 3º edição, Coimbra editora, pág. 573.