PROCESSO JUDICIAL DE PROMOÇÃO E PROTECÇÃO DE MENOR EM PERIGO
MEDIDAS DE PROMOÇÃO E PROTEÇÃO
NULIDADE DA SENTENÇA
ALIENAÇÃO PARENTAL
MEDIDA DE APOIO JUNTO DOS PAIS
Sumário

da exclusiva responsabilidade da Relatora – art.º 663.º, n.º 7, do CPC)
I – Do art.º 37.º da LPCJP resulta que o Tribunal pode (e deve) pronunciar-se sobre a aplicação de uma medida de promoção e proteção, ainda que a título cautelar, quando considere que já dispõe de elementos probatórios que, muito embora num juízo perfunctório, revelam a necessidade da mesma. No entanto, fora dos casos previstos no art.º 92.º da LPCJP (procedimentos judiciais urgentes), a aplicação de medidas cautelares apenas se justifica enquanto se procede ao diagnóstico da situação da criança e à definição do seu encaminhamento subsequente.
II – Declarada nula (no âmbito de recurso de apelação) a decisão (datada de 15-09-2023) que aplicou, a título cautelar, a medida de apoio junto dos pais (sem especificação dos fundamentos de facto), tendo sido proferida nova decisão (em 01-03-2024), que aplicou, ainda a título cautelar, a medida de apoio, não havia, nessa data, que rever a medida (aplicada por decisão nula), mas sim – e apenas – ponderar se, ante os factos então indiciariamente apurados, a mesma se justificava.
III – Assim, há que revogar a decisão recorrida na parte em que o Tribunal a quo, revendo a referida medida de promoção e proteção, a manteve por mais três meses, considerando erradamente que, mediante o aditamento de um tal elenco de factos, ficava suprida a nulidade da decisão de 15-09-2023 (isso seria se tivesse oportunamente cumprido o disposto no art.º 617.º, n.ºs 1 e 2, do CPC).
IV – Resultando da factualidade que foi considerada indiciada na Decisão recorrida um quadro vivencial efetivamente suscetível de afetar a estabilidade e integridade psíquica e emocional do Menor, em que está mesmo a ser já potenciada uma sensação de insegurança deste relativamente ao Progenitor com o risco de alienação parental, mostra-se justificada a aplicação, a título cautelar, da referida medida de apoio junto dos pais, pelo prazo de 6 meses, a rever no prazo de 3 meses, com integração do Menor no agregado familiar da Mãe e (efetivos) convívios supervisionados com o Progenitor.

Texto Integral

Acordam, na 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa, os Juízes Desembargadores abaixo identificados

I - RELATÓRIO

A … e B … interpuseram, cada um deles, recurso de apelação da Decisão, datada de 01-03-2024, proferida no apenso I, que, relativamente ao menor seu filho, C …, nascido em 17-03-2016, aplicou, a título provisório, a medida de promoção e proteção de apoio junto dos Progenitores, a executar junto da Mãe, e reviu a medida aplicada.

Em 24-02-2021, foi instaurado pelo Progenitor (por apenso ao processo principal de divórcio em que foi proferida sentença, datada de 12-03-2021, que decretou o seu divórcio por mútuo consentimento) processo de regulação das responsabilidades parentais (apenso A), que ainda se encontra pendente, tendo aí sido proferido, em 15-09-2023, despacho que determinou a suspensão da instância “enquanto se mantiver a medida aplicada no apenso I”.
De entre a tramitação desse processo, que inclui vários incidentes e recursos, importa destacar que:
- em 08-03-2021 foi realizada Conferência de pais, tendo sido dito pelo Progenitor que: Pretende a residência alternada do filho; É técnico de contabilidade auferindo 900,00€ mensais; O horário de trabalho é das 9:00 horas às 18:00 horas, mas com isenção de horário e atualmente em teletrabalho; Sempre foi um pai presente, disponível e responsável e quando a mãe trabalha aos fins de semana e fica com o filho; Pela Progenitora foi dito que: Pretende que lhe seja atribuída a residência do filho porque trabalha das 8:00 horas às 14:00 horas, tendo as tardes livres para ajudar o filho; Pensa que a residência alternada não é saudável para o filho; O pai poderá passar os fins de semana alternados e alargados com o filho; É técnica de radiologia no Hospital Amadora-Sintra auferindo 1.090,00€ mensais; O pai na maioria das vezes chega a casa depois das 20:00 horas, não tendo muito tempo durante o dia para o filho; O menor encontra-se no Colégio Pequenos e Divertidos em Odivelas; Para o próximo ano vai frequentar a pré-primária.
Nessa Conferência, foi homologado por sentença o acordo dos Progenitores quanto à regulação (parcial) do exercício das responsabilidades parentais relativamente ao filho menor de ambos, nos seguintes termos:
“1. As responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida do filho (nomeadamente, orientação religiosa, escolha do estabelecimento de ensino, viagens ao estrangeiro e intervenções cirúrgicas) são exercidas em comum por ambos os progenitores, salvo nos casos de urgência manifesta.
2. As despesas de saúde, na parte não comparticipada, as despesas extraordinárias escolares (livros e material escolar) e a mensalidade do infantário/escola, todas desde que devidamente documentadas (com fatura em nome e com o número fiscal de contribuinte do menor), são a repartir por ambos os progenitores na proporção de metade, a liquidar no prazo de 20 dias a contar da apresentação dos comprovativos da realização da despesa, pelo progenitor que a realizar ao progenitor que tiver de pagar metade ao outro.
3. Nas férias escolares do Natal, o menor passará com um dos progenitores, do primeiro dia de férias, até dia 25 de dezembro, entre as 11:00 horas e as 11:30 horas, passando com o outro progenitor, desde essa data e hora até ao último dia de férias. Este ano, passará o primeiro período com a mãe, alternando nos anos seguintes.
4. Nas férias escolares da Páscoa, o menor passará uma semana com cada dos progenitores, sendo que, este ano, a primeira semana será com a mãe, alternando nos anos seguintes.
5. Nas férias escolares de Verão a mãe passará com o menor a primeira quinzena de julho e a primeira quinzena de agosto, e o pai passará a segunda quinzena de julho e a segunda quinzena de agosto, salvo acordo em contrário.
6. No dia do pai e no dia de aniversário do pai, o menor passará o dia com este, sem prejuízo das atividades escolares.
7. No dia da mãe e no dia de aniversário da mãe, o menor passará o dia com esta, sem prejuízo das atividades escolares.
8. No dia de aniversário do menor, este tomará, com cada um dos progenitores, uma das principais refeições, alternando de ano para ano a refeição com cada um e sempre sem prejuízo das atividades escolares do menor. Sendo que no próximo aniversário do menor, o mesmo janta com o pai e almoça com a mãe.”
Em 12-03-2021, foi proferido despacho que fixou o regime provisório de exercício das responsabilidades parentais referente ao menor C …, quanto à residência nos seguintes termos:
“O menor fica a residir com o pai e com a mãe, em semanas alternadas, com mudança à sexta-feira ao final das atividades escolares, incumbindo ao progenitor com quem se encontre a residir em cada momento, o exercício das responsabilidades parentais relativa aos atos da vida corrente do filho.
Em aditamento ao regime provisório, determino que o progenitor com o menor não estiver, possa contactar o filho, diariamente, entre as 19 horas e as 19:15 horas, devendo o outro progenitor diligenciar para que o menor esteja contactável em tal período de tempo.”
Essa decisão foi confirmada por acórdão da Relação de Lisboa de 15-07-2021, em que se salientou que faltava «a determinação séria, por parte dos pais, de não utilizar o filho como “arma de arremesso” e, em nome do seu equilíbrio emocional e crescimento saudável, evitarem totalmente as discussões e os conflitos na sua presença.»
Em 05-04-2022, foi, ainda no apenso A, proferido despacho que determinou a realização, pelo INMLCF, de perícia à personalidade, às faculdades mentais e às capacidades parentais, abrangendo os Progenitores e o Menor, visando apurar o estado emocional do menor, as capacidades parentais dos Progenitores, as suas faculdades psíquicas e psicológicas que se possam repercutir no exercício salutar da parentalidade, e ainda em que medida a aceso conflito entre os Progenitores pode estar a afetar o bem-estar do menor e o estado psíquico e psicológico deste.
Em 01-06-2023, no âmbito de incidente de incumprimento do regime provisório, foram ouvidos os Progenitores, tendo sido dito pelo Pai que: Foi a mãe que entrou em incumprimento e não o pai; O C … não foi ao colégio por não estar em condições, o filho estava muito nervoso, manifestava um nível de ansiedade enorme, tendo o C … faltado três dias ao colégio; As notas do filho demonstram grande capacidade na matemática, mas revela dificuldade na leitura e estudo de meio; Segundo informação escolar o filho tem dificuldades de concentração, é irrequieto; Não sabe que marcas o filho teria no corpo; O C … foi visto pela médica que o acompanha e não tinha nenhum sinal além de nódoas negras normais numa criança; A guarda partilhada era inicialmente o regime que achava adequado se fixar para o filho, mas hoje para salvaguardar o filho pensa que fixar a residência da criança consigo será o melhor; O filho tem aprendido da mãe: mentiras, medo, chantagem, manipulação, sendo na sua perspetiva que o melhor é o filho ficar a morar só consigo; Foi a mãe que pediu para o filho vir a tribunal; Há dois anos que o filho anda a ser preparado e manipulado pela mãe, para vir perante o Juiz; O filho tem relatado acontecimentos da a chantagem emocional a que tem sido sujeito; Mudou a sua opinião quanto à fixação de residência da criança por causa da postura da mãe; A mãe do C … não quer dialogar; Avisou a mãe que o menino não iria comparecer no colégio; A mãe sempre foi avisada de tudo enquanto o filho está consigo, ao contrário da mãe que não informa. Pela Mãe foi dito que: Deseja a guarda total do C … porque sofreu durante treze aos de violência doméstica; O C … assistiu ainda quando os progenitores estavam juntos a alguns episódios, tendo sido ela que pediu o divórcio; O pai arrancava a porta de casa o pai consumia droga; O filho não tem acompanhamento psicológico; O filho é acompanhado em terapia da fala; O C … deveria ter ido no dia 5 para sua casa e nesse dia foi avisada pela professora que o menino não estava no colégio, tendo o filho ido para sua casa só no dia 19; Desde 28 abril até 19 maio o filho não esteve consigo; Disse ao filho que viria a tribunal e explicou de forma educativa através de banda desenhada, uso o livro “O C … vai a tribunal”. Recebeu um email do pai a informar que tinha entrado providencia tutelar, mas não que o filho não tinha ido ao colégio; A pediatra é de relações íntimas do pai do C …; A Dra. D … aconselhou que o C … fosse acompanhado, sugerindo que o acompanhamento fosse feito por uma amiga; Não concordou com a sugestão da Dra. D … porque pareceu-lhe imparcial; Considera que o C … irá precisar de acompanhamento e irá tratar do assunto; O pai teve vários comportamentos inadequados, por exemplo: a seguir à Páscoa o pai tentou incutir maus tratos ao filho mostrando-lhe uma fotografia; Pode enumerar alguns comportamentos impróprios do pai para o filho: o pai põe o filho de castigo, bate-lhe, veste o filho em cima de um fraldário, ao pequeno almoço pede ao menor para comer mais rápido todos os comportamentos estão relatados nos autos; No banho o filho disse que a marca que tinha foi o pai e dai foi ao hospital; Quase não teve contactou com o filho enquanto esteve com o pai, por dia em média falou com o filho uma vez por dia; No período de 5 a 19 terá falado 5 ou 6 vezes com o filho; O pai não a avisou que filho estava doente.
Mais foi ouvido o menor, C …, na presença do Procurador da República e da Psicóloga.
Em 26-05-2023, ainda no apenso A, foi proferido despacho com o seguinte teor:
«Resulta da informação hospitalar junta a 23/05/2023, que o menor compareceu nas urgências do hospital, com “lesões sugestivas de maus tratos” e “Mau Trato Físico Criança batida/espancada”, tendo a criança aí declarado, sem a presença da mãe, que o pai lhe bate.
Face à suspeita de que o menor C … pode ser vítima de agressões físicas por parte do pai e porque nesta jurisdição o Tribunal deve aplicar como critério supremo o superior interesse do menor, importa, mesmo em caso de dúvida, protegê-lo.
Assim, ao abrigo do disposto no artº 28º do Regime Geral do Processo Tutelar Cível, determino, a título provisório e cautelar, a suspensão imediata de todos os contactos e convívios do menor com pai, fixando a sua residência em exclusivo junto da mãe, a quem passa a caber o exercício em exclusivo das responsabilidades, enquanto se procede ao diagnóstico e ao melhor apuramento da situação.
Notifique, sendo os pais para, em 2 dias, se pronunciarem, querendo nos termos do artº 28º, nº 5, al. b) do Regime Geral do Processo Tutelar Cível. Comunique de imediato à escola (com a informação de que a criança só pode ser entregue à mãe ou aos avós maternos, sendo a estes apenas com a autorização da mãe, ficando pai proibido de contactar ou ir buscar o filho, até indicação em contrário do Tribunal), à CPCJ e ao posto policial da área de residência do menor.»
Dessa decisão foi interposto recurso pelo Progenitor, tendo sido admitido para subir com o primeiro recurso que houvesse de subir imediatamente (nesse processo tutelar cível) e efeito devolutivo, despacho esse (que reteve o recurso) mantido pela Relação de Lisboa mediante decisão proferida no apenso J de reclamação.
Em 17-07-2023 foi, ainda no apenso A, proferida decisão a respeito do Incidente de incumprimento deduzido a 08-05-2023 pela Progenitora (alegando esta que, no dia 5 de maio e nos dias subsequentes, o Pai, contrariamente ao regime fixado, não levou o Menor ao colégio, impedido o filho de passar com a Mãe o dia da mãe e a semana que se iniciou nessa sexta feira, levando a que o filho faltasse à escola), tendo o Tribunal julgado verificado o incumprimento por parte do Requerido, condenando-o na multa processual de 12 (doze) UC, considerando estar provado que:
«a) Na conferência de pais realizada a 08/03/2021, as partes acordaram (e foi homologado por sentença) que “no dia da mãe e no dia de aniversário da mãe, o menor passará o dia com esta, sem prejuízo das atividades escolares” (cfr. ponto 7 do referido acordo).
b) Não tendo havido acordo dos progenitores, quanto à residência do filho, os autos prosseguiram para apreciação e decisão desta questão, tendo sido proferido despacho, a 12/03/2021, a fixar o seguinte regime provisório:
- “O menor fica a residir com o pai e com a mãe, em semanas alternadas, com mudança à sexta-feira ao final das atividades escolares, incumbindo ao progenitor com quem se encontre a residir em cada momento, o exercício das responsabilidades parentais relativa aos atos da vida corrente do filho”.
c) O dia 7 de maio de 2023 foi dia da mãe (facto notório, do conhecimento geral).
d) No regime de residência referido em b), o menor passou a semana de 28 de abril de 2023 a 5 de maio de 2023 com o pai, cabendo passar com a mãe a semana de 5 a 12 de maio de 2023.
e) Na semana de 5 a 12 de maio de 2023, o pai não levou o filho à escola, levando a que este faltasse às atividades escolares e, assim, impedindo o menor de passar com essa semana com a mãe.»
Ainda nesse despacho, o Tribunal determinou, tendo em vista a possibilidade do estabelecimento de convívios supervisionados do Menor com o Pai, que se solicitasse à EMAT a indicação de CAFAP para servir de ponto de encontro familiar, e que informasse, juntamente com o relatório solicitado no âmbito do processo de promoção e proteção apenso, se estavam reunidas condições para a reposição de tais convívios. Mais determinando, para igual finalidade, que fosse junta aos autos a informação solicitada no âmbito do processo de promoção e proteção, a respeito do inquérito crime no qual se investiga a eventual suspeita de violência doméstica do Progenitor sobre o Menor.
Decidiu ainda da alteração provisória do regime de regulação das responsabilidades parentais nos seguintes termos:
«No que concerne aos requerimentos (anteriores ao despacho de 26/05/2023) do pai para suspensão do regime de residência alternada (com a fixação da residência exclusivamente junto do pai e suspensão da obrigatoriedade de entrega do menor à mãe) e da mãe do menor para alteração do regime de residência exclusivamente para junto de si, com a prolação do despacho de 26/05/2023, e pelos fundamentos que dele constam, fica prejudicada a apreciação de tais requerimentos, o que declaro.
Porém, com a alteração da residência do menor, de alternada) para exclusiva junto da mãe, torna-se necessário fixar, provisoriamente, pensão de alimentos a cargo do pai, para constituir o contributo deste para (metade) das despesas correntes do menor.
Para efeito importa considerar, o que já consta da cláusula 2, da ata de 8 de março de 2021, qual se mantém em vigor e com caráter de regime definitivo.
Nos termos de tal cláusula, “as despesas de saúde, na parte não comparticipada, as despesas extraordinárias escolares (livros e material escolar) e a mensalidade do infantário/escola, todas desde que devidamente documentadas (com fatura em nome e com o número fiscal de contribuinte do menor), são a repartir por ambos os progenitores na proporção de metade, a liquidar no prazo de 20 dias a contar da apresentação dos comprovativos da realização da despesa, pelo progenitor que a realizar ao progenitor que tiver de pagar metade ao outro.”.
Conforme declarados pelos próprios, em tal conferência de pais (de 8 de março de 2021), o pai “é técnico de contabilidade auferindo €900,00 (novecentos euros) mensais” e a mãe “é técnica de radiologia no Hospital Amadora-Sintra auferindo €1.090,00 (mil e noventa euros) mensais”.
Assim, na fixação do montante da pensão de alimentos tomando-se levando-se em conta não só as necessidades do menor, atenta a sua idade, no contexto socioeconómico em que se insere, mas também os rendimentos de ambos os progenitores, entendemos adequado e proporcional fixar em €150,00 (cento e cinquenta euros) mensais, o montante da pensão a pagar pelo pai à mãe do menor, a título de alimentos devidos a este, com atualização anual automática, em janeiro de cada ano, de acordo com a taxa de inflação publicada pelo INE e referente ao ano imediatamente anterior, ocorrendo a primeira atualização em janeiro de 2024.
Face ao exposto, visando salvaguardar o superior interesse do menor C …, ao abrigo disposto no artº 28º, nº 1 do Regime Geral do Processo Tutelar Cível, altero provisoriamente o regime de exercício das responsabilidades parentais referente a tal menor, aditando ao mesmo a seguinte cláusula:
“O pai do menor contribuirá mensalmente com a prestação de €150,00 (cento e cinquenta euros) para alimentos devidos ao filho, a depositar na (ou transferir para a) conta bancária da mãe (cujo NIB esta indicará no processo e do qual lhe será dado conhecimento), até ao dia 08 de cada mês, que será atualizada automática e anualmente, em janeiro, de acordo com a taxa de inflação do ano imediatamente anterior, publicada pelo INE, ocorrendo a primeira atualização em janeiro de 2024”.
Mantém a cláusula de repartição de despesas fixada na conferência de pais realizada a 8 de março de 2021.»

Os autos de promoção e proteção (apenso I) tiveram início em 14-07-2023, por iniciativa do Ministério Público, alegando no Requerimento inicial, que:
1. O C … é filho de B …, residente na (…) e de A …, residente na (…).
2. Os progenitores encontram-se separados e mostram-se, provisoriamente, reguladas as responsabilidades parentais, com a residência alternada com o pai e com a mãe.
3. O C … foi sinalizado à CPCJ, em fevereiro de 2023, na sequência de participação por parte da PSP dando conta de que os progenitores “usam a criança como arma em processo  de separação; a progenitora teme que as atitudes do progenitor prejudiquem o seu filho, uma vez  que o mesmo se encontra várias vezes a tentar influenciar psicologicamente o mesmo”.
4. A 08/05/2023 a mãe compareceu na CPCJ e informou que o pai não entregou o  filho no dia estipulado, referindo ter efetuado queixa junto das autoridades policiais. A 09/05/2023,  a mãe informou que mantinha o desconhecimento acerca do paradeiro do C …, que o mesmo não  foi ao colégio.
5. A mãe disse que a RERP ainda se mantém provisória devido às acusações do pai  contra si, que a acusa de “ser uma mãe psicologicamente afetada”, “de estar a fazer alienação  parental”.
6. A mãe referiu que o filho está em perigo com o pai, pelo facto de este fazer  consumos regulares de álcool e de drogas. Disse que o pai desde sempre consumiu haxixe e está  integrado num grupo de amigos em que todos consomem, inclusive o padrinho de casamento do  pai do C … já esteve preso por tráfico de drogas.
7. Disse que o C … lhe confidenciou que o pai lhe bate, dando como exemplo uma  situação em que, o filho estava a brincar com uma bola saltitona e o pai lhe bateu; que o C … caiu  de um fraldário, local onde ainda se veste; disse ainda que a criança não toma banho em casa do  pai e já aconteceu ter ficado com o rabo assado.
8. Acerca da relação do casal contou que estiveram juntos durante 13 anos e que foi  agredida logo no primeiro ano de namoro e que, desde essa altura, foi agredida muitas vezes tendo o C … assistido a muitas das ocorrências.
9. Por seu turno o progenitor esclareceu que não permitiu que o C … voltasse a  casa da mãe, por esta não estar em condições emocionais para dele cuidar e confirmou que o  C … não estava a ir à escola tendo informado a direção da escola. Disse ter dado entrado de uma  providencia cautelar junto do TFM contra a mãe, para proteção do C …. Contou que no dia em que esteve marcada a audiência, a 02/05/2023 a mãe tentou "arrancar literalmente o C … dos  seus braços”.
10. Reiterou que tem receio do que possa acontecer ao C … quando está com a mãe.  Referiu que a mãe do C … mantém uma relação com um homem casado, que faz ameaças de  morte à mãe do C ….
11. O pai referiu que está separado da mãe desde o ano de 2021 e, desde então, não mantêm contactos.
12. Segundo o pai, os comportamentos da mãe foram-se agravando desde o  nascimento do C …. A mãe iniciou acompanhamento em psicologia, mas na quarta sessão deixou  de ir.
13. Disse que a mãe tem manipulado o filho contra o pai.
14. O pai negou quaisquer agressões da sua parte à mãe, dizendo que é  “precisamente ao contrário, partiu-me o nariz duas vezes.”
15. Negou consumos de drogas. Negou consumos de álcool, quer da sua parte, quer  da parte do avô paterno.
16. No âmbito do processo de RERP acima mencionado, a 26.05.2023, o TFM  suspendeu, cautelarmente, todos os contactos e convívios do menor com o pai fixando a sua  residência em exclusivo junto da mãe, por suspeita de que o C … pudesse ser vitima de agressões  físicas por parte do pai.
17. Face à gravidade da situação e à especial relação da criança com quem provocou  a situação de perigo, a CPCJ entendeu não ser a sua intervenção a mais adequada, mas sim  remeter o processo aos serviços do MºPº a fim de solicitar a intervenção judicial – artº 11º,  nº2 da LPCJP – com o que se concorda.
18. Em síntese, destacam-se como fatores de risco/perigo: a manifesta  conflitualidade entre os progenitores, que se manifesta na presença da criança, materializada em  ausência de diálogo e ou, “em ataques” mútuos acusando-se se serem maus pais, apresentação de várias queixas um contra o outro; progenitora com alegada instabilidade emocional; alegados comportamentos de alienação parental; alegados consumos de álcool e estupefacientes por parte do progenitor.
19. Os factos acima mencionados dão conta de relações familiares entre  progenitores instáveis e conflituosas, na presença da criança, causando-lhe sofrimento,  instabilidade e ansiedade impedindo-a de ter um bom desenvolvimento integral, sendo os  progenitores incapazes de lhes por termo; os pais não parecem reconhecer o impacto negativo que o seu conflito tem no bem-estar do C ….
20. Estas situações de violência doméstica e ou intenso conflito parental, com a  respectiva tensão presenciada pelos menores é susceptível de causar perturbação e  destabilização às crianças, desde a sua tenra idade até ao seu desenvolvimento. Ou seja, os  menores expostos a situações de conflitos parentais entre os seus progenitores são também eles,  consequentemente vitimas de violência doméstica psicológica por parte destes.
21. A intervenção judicial tem lugar, além do mais, quando, “atendendo à gravidade  da situação de perigo, à especial relação da criança ou do jovem com quem a provocou ou ao conhecimento de anterior incumprimento reiterado de medida de promoção e proteção por quem  deva prestar consentimento, o Ministério Público, oficiosamente ou sob proposta da comissão,  entenda, de forma justificada, que, no caso concreto, não se mostra adequada a intervenção da  comissão de proteção.”
22. Termos em que consideramos que o C … não recebe todos os cuidados  necessários à sua idade e situação pessoal, permanecendo exposto a comportamentos com  reflexos negativos na sua estabilidade emocional e desenvolvimento equilibrado, encontrando-se  em perigo a sua formação, segurança e bem-estar físico e psicológico, pelo que urge por termo a  tal situação com a aplicação de uma das medidas de promoção e protecção previstas no artigo  35.º da LPCJP.
23. A aplicação de uma medida de promoção e protecção legitimará a intervenção  junto desta criança e agregado familiar com vista à remoção do perigo e à possibilidade de  reorganização da dinâmica familiar.
24. Pelo exposto, o Ministério Público requer que seja aplicada a C … a medida de promoção e protecção se venha a revelar mais adequada.
O Progenitor veio requerer a realização de diligências instrutórias e juntar documentos (requerimento de 31-07-2023).
Também a Requerida requereu diligências instrutórias (requerimento de 01-08-2023), designadamente arrolando testemunhas.
Foi elaborado pelo Núcleo de Infância de Juventude de Sintra (da Santa Casa de Misericórdia de Lisboa) o Relatório social junto aos autos a 16-08-2023, em que foi proposta a aplicação de medida de promoção e proteção de apoio junto dos pais.
Foi realizada Conferência e audição dos Progenitores (a 17-08-2023) visando a aplicação por acordo de medida de promoção e proteção, o que se frustrou por discordância da mãe.
Em 18-08-2023, foi proferida Promoção com o seguinte teor:
“Requerimento do progenitor de 31-07-2023: p. se indefira a realização de Prova Pericial, visto que no processo de RERP (Apenso A) já foram realizados exames psicológicos aos progenitores e ao menino C ….
P. se indefira a solicitação das gravações que instruíram o Inq.º …/…, visto que como se refere na promoção de 19-05-2023 no Apenso A, tal matéria deverá ser apreciada no processo-crime, não revestindo interesse para os autos.
P. se indefira a solicitação ao Hospital Fernando da Fonseca das fotografias tiradas ao menor no dia 19-05-2023, visto que tal pedido já foi indeferido por douto despacho proferido em 17-07-2023 no Apenso A.
P. se indefira o acompanhamento psicológico ao menino a realizar por Psicóloga da confiança da Dra. D …, visto que a progenitora declarou da Audição realizada em 17-08-2023 já ter providenciado pelo acompanhamento psicológico ao C …, pela Psicóloga Dra. E …, o qual se iniciará em 28-08-2023.
P. se indefira a junção da gravação da audição do menino, realizada em 01-06-2023, visto que os ilustres advogados dos progenitores poderão aceder a tal gravação no âmbito do Apenso A.
P. se indefira a junção dos requerimentos constantes do Apenso A, dado que tal se revela desnecessário.
P. se indefira a audição das testemunhas indicadas, visto que não é o momento oportuno para tal diligência.
*
Requerimento da progenitora de 01-08-2023: a mãe do menor foi ouvida na Audição realizada em 17¬08-2023.
P. se indefira a audição das testemunhas apresentadas, visto que não é o momento oportuno para tal diligência.
*
R.S. do NIJ de Sintra de 16-08-2023: conforme bem refere o ISS, o menino se encontra em situação de risco, estando sujeito ao aceso conflito entre os progenitores e privado do convívio com o pai.
Por outro lado, os progenitores não subscreveram o APP.
Assim, p. seja aplicada a favor da criança a medida cautelar de apoio junto da mãe, pelo prazo de seis meses, com os deveres para os progenitores indicados no R.S. (art.ºs 35/1-a) e 37/1 e 3, ambos da LPCJP).
*
Visto que foram suspensos os contactos entre o progenitor e o menor no âmbito do Apenso A, p. se determine a reposição dos convívios entre o pai e o menino, supervisionados pelo CAFAP Associação Passo a Passo, nos moldes sugeridos pelo NIJ.
*
No decurso da audição realizada em 17-08-2023, apurou-se que muito provavelmente não chegou a ser instaurado processo-crime pelos supostos maus tratos físicos infligidos pelo progenitor ao menino. Logo, p. se extaria certidão do e-mail do Hospital Fernando da Fonseca de 23-05-2023, do requerimento da progenitora de 26-05-2023 e do douto despacho de 26-05-2023, constantes do Apenso A, desta promoção e do despacho que sobre ela recair, e se remeta ao DIAP, com vista à instauração de Inquérito por tal matéria.”
As partes vieram exercer o contraditório sobre esse parecer. A Progenitora fê-lo em 24-08-2023, defendendo, em síntese, que o menor não se encontra em situação de perigo ou risco, qualificando a promoção do Ministério Público como dissonante com o próprio relatório social; e o Progenitor a 04-09-2023, discordando da promoção e requerendo diligências probatórias.
Em 15-09-2023, foi proferida Decisão no sentido da aplicação, a título provisório, a favor do menor C … da medida provisória de apoio junto da mãe, com integração no agregado familiar desta, convívios supervisionados com o pai a definir a realizar pela Associação a Passo a Passo (conforme indicado nos autos de regulação das responsabilidades parentais), com a duração de seis meses e revisão em três meses, com a sujeição dos progenitores aos seguintes deveres (…)” (os indicados na promoção do MP).
Ambos os Progenitores interpuseram recurso dessa decisão, tendo sido proferida pelo Tribunal da Relação de Lisboa, em 21-12-2023, Decisão Sumária cujo segmento decisório tem o seguinte teor:
“Pelo exposto, decide-se conceder provimento ao recurso e, em consequência, declarar nula a decisão recorrida e determinar, em consequência, que os autos baixem à 1.ª instância, a fim de que o Tribunal recorrido profira nova decisão da qual constem os respetivos fundamentos de facto nos termos acima expostos.”
Em 05-01-2024 foi junto aos autos Relatório social de acompanhamento elaborado pelo Núcleo de Infância e Juventude de Sintra (SIATT), do qual consta designadamente que:
«(…) Das narrativas trazidas por cada um dos pais reiteram-se os sentimentos de afeto pela criança e a discordância quanto ao papel de cada um na vida da mesma, traduzida na agudização da conflituosidade intrafamiliar, intensificação da disputa parental e cristalização da rutura diádica pai-filho. Nos relatos dos pais, mantêm-se as afirmações depreciativas entre si, sugestivas de uma interação parental instável e conflituosa, com verbalizações assentes em acusações mútuas ao outro pai, tendo também como referência alegadas verbalizações da própria criança a cada um dos pais sobre situações eventualmente ocorridas junto do outro pai.
(…) Sobre a relação com a família alargada importa ressalvar que, a par da ausência de convívios com o pai, a criança não se encontra a ter convívios com a restante família paterna (avós e tia), figuras anteriormente percecionadas como de referência afetiva atendendo à proximidade à antiga morada de família e que, segundo a mãe, este núcleo “é negativo (..) não defenderam o C … face aos maus-tratos do pai (..) eles sabiam” (sic). Sobre os avós maternos, não residentes em Lisboa, A … referiu manterem-se como apoiantes na gestão da vida familiar.
(…) Em termos de saúde, C … mantém o acompanhamento primário no Centro de Saúde de Odivelas, sem médico de família atribuído. A par disso, tem acompanhamento complementar especializado em pediatria com a Dra. D … (PediClin), em terapia da fala com a Dra. F … (MIMED) e, desde final de agosto do corrente ano, em psicologia com a Dra. E …. Da articulação com a psicóloga, pese embora não tenha sido rececionado o parecer por escrito solicitado, foi possível aferir que o estado emocional e interações mantidas de C … se mantém reservado, com indicadores de ansiedade, e pouco disponível para a interação técnica ainda que gradualmente a colaborar. De acordo com a Dra. E …, o C … precisará de mais tempo para restabelecer a ligação com o pai.
A díade pai-filho esteve a ser alvo de intervenção no que respeita a convívios supervisionados por parte da Associação Passo a Passo, no período compreendido de outubro a dezembro de 2023. Segundo informação prestada pela respetiva entidade, a intervenção foi acima de tudo condicionada pela recusa do C … em integrar o espaço disponibilizado para o efeito, conforme consta da informação remetida aos autos pela referida Associação, não tendo sido concretizado nenhum convívio.
(…) C … é uma criança de sete anos de idade, com alguns marcadores positivos e outros a merecerem especial atenção no seu desenvolvimento integral. A realidade familiar de C …, decorrente da dissolução da relação conjugal dos pais, persiste com dificuldades no exercício de uma coparentalidade positiva, centrada nas necessidades efetivas da criança, que carecem de monitorização técnica.
Em conformidade com a avaliação diagnóstica efetuada pelo NIJ apurou-se que os pais, apesar de manifestarem preocupação pelo bem-estar integral do filho, em alguns momentos, revelam dificuldades em priorizar as necessidades emocionais do mesmo expondo-o, a situações de conflituosidade, animosidade e disputa parental. Da reavaliação efetuada, corrobora-se que ambos os pais demonstram ter conhecimento das necessidades do filho, procurando dar resposta às mesmas, apresentando preocupação pelo seu bem-estar e segurança. Não obstante a reiterada animosidade latente entre o casal parental, com a estabilidade de C … a parecer ficar comprometida por conflitos entre os adultos, mantém-se a perceção técnica que os pais, embora com opiniões divergentes, desejam o bem-estar integral do filho. Ambos revelam disponibilidade emocional para com o C …, tecendo características positivas a favor do mesmo, bem como manifestações de carinho e apreço. No que respeita à satisfação das necessidades emocionais e afetivas reitera-se ser perceção técnica que o casal parental apresenta dificuldades em adotar estratégias parentais adaptativas e centradas nos assuntos do filho, que confiram ao mesmo relações securizantes e estáveis sendo posta em causa a estabilidade e segurança emocional deste, pelo conflito interparental que tem vindo a ser exposto. Tanto a mãe, como o pai assumem que, desde a separação conjugal, têm apresentado dificuldades em manter uma comunicação harmoniosa e centrada nos assuntos de vida do filho, o que tem vindo a dificultar o exercício da coparentalidade positiva, imperando muitas vezes o conflito. Desta forma, as vulnerabilidades identificadas poderão estar correlacionadas com um possível conflito de lealdade em que C …, de forma inconsciente, eventualmente terá medo de trair e defraudar as expetativas de cada um dos pais, dificultando desta forma uma avaliação assertiva da sua situação vivencial, no geral, e da relação afetiva com cada um dos pais, em particular.
Com vista a dar cumprimento ao disposto por esse Douto Tribunal, no que à reposição dos convívios pai-filho diz respeito, segundo informação prestada pela Associação Passo a Passo, e pese embora entendamos o processo de supervisão de convívios como evolutivo e transitório, não parecem estar reunidas as condições para a reposição de tais convívios nos mesmos moldes até então (i.e., assegurados pela mãe) pelo que se propõe que a mãe identifique outro familiar ou pessoa idónea que possa garantir a  presença do C … na referida Associação. Sendo que, na inexistência, dever-se-á ponderar a possibilidade de os convívios serem assegurados pelas autoridades competentes (PSP).
Importa ainda salientar que manter prolongado no tempo convívios com supervisão poderá validar, junto da mãe e da criança, uma perigosidade que, a não se verificar no contexto paterno, terá impacto negativo na relação entre pai e filho, promovendo uma cristalização da rutura diádica.
Finda a reavaliação, reitera-se como matéria de perigo e de proteção a seguinte conjuntura vivencial:
(…) Ao persistirem os pais na senda do conflito que tanto pode prejudicar o equilíbrio e desenvolvimento do C …, persiste a necessidade de uma intervenção próxima que os ajude a alterar alguns comportamentos e a relacionar-se, enquanto casal parental, de forma positiva. Ademais, das cláusulas propostas no despacho de aplicação de medida provisória, importa frisar que ainda não foram cumpridas, por parte de ambos os pais, o “Ativar o seu acompanhamento psicoterapêutico, com a colaboração do NIJ, comprometendo-se a cumprir a todas as sessões agendadas, bem como às orientações técnicas” pese embora o pai verbalize ter acompanhamento psiquiátrico. A par disso, importa a esta equipa voltar a ouvir o          C …, quando for oportuno, considerando já haver resultado do acompanhamento psicológico a que está a ser sujeito.
Por último, e salvo melhor entendimento, parece a esta equipa importante que se solicitem esclarecimentos junto da psicóloga (Dra. E …) que acompanha o C … nomeadamente no que respeita à frequência, adesão terapêutica, avaliação diagnóstica e demais informações consideradas relevantes para o bem-estar da criança. Adicionalmente, deverá a referida profissional indicar de que forma ambos os pais estão envolvidos no processo terapêutico do filho, tendo em conta todo o sistema familiar da criança e a necessidade de se evitar, como suprarreferido, uma cristalização da díade pai-filho.
7. Proposta
Face ao exposto, e após reavaliação da situação vivencial (familiar, social, económica, escolar e de saúde) da criança, considera o NIJ de Sintra que, pese embora se encontrem assegurados os cuidados básicos à criança, a exposição ao conflito e desavença parental constitui-se como um fator de perigo para o adequado desenvolvimento de C …, pelo que a intervenção judicial não pareceu surtir ainda um efeito positivo na alteração deste contexto familiar com vista a reverter o padrão relacional mantido até então.
Deste modo, salvo melhor entendimento, cumpre-nos pronunciar pela manutenção da medida de promoção e proteção de apoio junto dos pais com integração das cláusulas previamente propostas e notificação dos pais para cumprimento da cláusula em falta
Em 05-01-2024, o Ministério Público promoveu o seguinte:
“Se proceda à revisão da MPP aplicada nos autos a favor do menor, com a manutenção a mesma, nos termos sugeridos pelo ISS, com especial advertência à progenitora que os encontros menor e progenitor deverão ocorrer efetivamente, ficando aquela obrigada facilitá-los ou, pelo menos a não dificultar os mesmos.
Se solicite ao CAFAP que evidencie esforços e/ou, diligências, no sentido de os encontros do menor com o pai, virem a ocorrer de forma efectiva e gratificante para ambos, pese embora todas as contrariedades, e obstáculos que os autos evidenciam;
Se solicitem esclarecimentos junto da psicóloga (Dra. E …) que acompanha o menor, no que diz respeito à frequência, adesão terapêutica, avaliação diagnóstica e demais informações consideradas relevantes para o bem-estar daquele, e defesa do seu superior interesse;
Se insista pela indicação de vaga, nos termos já realizados nos autos, na possibilidade de a MPP aplicada, ter de vir a ser substituída por outra, que melhor acautele a defesa do superior interesse do menor, caso se mantenham as dificuldades a obstáculos que os autos evidenciam até ao presente momento, e não venha a verificar-se qualquer alteração na postura dos progenitores, com especial relevância para aquela que tem sido assumida pela progenitora, que claramente tem vindo a criar todos os obstáculos à aplicação da MPP nos termos determinados.”
Em 10-01-2024, foi proferido despacho com o seguinte teor:
“Notifique:
- os progenitores nos termos e para os efeitos previstos no art.º 85º, nº 1 da LPCJP.
- aos progenitores o relatório social junto a 05/01/2024;
Em seguida, aguarde o prazo previsto no art.º 149º, nº 1 do Código de Processo Civil.
Conforme sugerido no relatório social de 05/01/2024:
- remetendo cópia do referido relatório, solicite à senhora psicóloga que acompanha o menor que, no prazo de 10 dias, preste as informações referidas/solicitadas em tal relatório.
- notifique a progenitora para, em 10 dias, indicar familiar que possa levar o menor aos convívios supervisionados com o pai, sob pena de não o fazendo, ser ponderada seriamente a sugestão do NIJ no sentido de o menor passar a ser conduzido a tais convívios pela PSP.
Juntas as informações e decorridos os prazos acima referidos, conclua para procederemos à revisão da medida em execução, que por ora se mantém, nos seus precisos termos, até ser revista.”
Em 23-01-2024, a Progenitora apresentou Requerimento em que se pronunciou sobre o referido relatório social e sobre a informação escolar, bem como quanto à indicação de familiar que possa levar o menor aos convívios supervisionados com o pai, alegando, quanto a este último aspeto, que:
“15 – Com o devido respeito, uma vez mais, não se compreende muito bem, nem se aceita, tal alteração proposta pelo NIJ, antes, parece poder consubstanciar uma verdade sanção, em primeiro lugar, ao seu filho menor C … e, à si própria, dado não poder haver absolutamente nada que, assim, e exija ou se justifique!
16 – Seria antes, digamos, entendido pela criança e pela mãe um castigo/pena para ambos que não merecem e, quiçá um prémio para o pai, depois de tudo o que se tem passado, diríamos beneficiando o infrator.
17 – Não se admite e, pede-se respeito pela criança e pela mãe!
18 – E, muito menos que, o seu filho seja conduzido a tais convívios pela PSP (Polícia de Segurança Pública).
19 – É completamente absurda e inqualificável tal hipótese!
20 – Seria altamente nocivo e mesmo traumatizante para uma criança com 8 anos de idade ser levado pela polícia para ter convívios com o pai e força policial.
21 – Terminantemente, se rejeita e se repudia tal ideia descabida, atentatória a sua própria dignidade. Ao que chegamos!
22 – Em prole do seu filho, à cautela, precavendo eventual outro entendimento, o que não se concebe, em limite, os avós maternos, disponibilizam-se:
- G … e,
-  H …, para individual ou, conjuntamente acompanhar e, levar o seu filho/neto C … aos convívios supervisionados com o pai.”
O Progenitor também se pronunciou, conforme consta do requerimento apresentado em 25-01-2024, requerendo, em síntese, que o Tribunal decidisse (i) revogar a medida de promoção e proteção junto dos pais, na pessoa da mãe; (ii) ordenar a inclusão dos factos que são imputados pelo Requerido à Requerida, e que integram igualmente os fatores de risco/perigo enumerados pelo Ministério Público no seu requerimento inicial, tais como “progenitora com alegada instabilidade; alegados comportamentos de alienação parental”; (iii) oficiar a Dra. E … para vir esclarecer o fundamento para, no seu relatório, a afirmar que o menor não está preparado para retomar os convívios com o progenitor, e daí aferir uma relação consequencial com o facto de o menor se manter reservado, com indicadores de ansiedade, e porque é que não contactou o pai; (iv) designar psicólogo isento dentro da área geográfica do Tribunal ou indicado por lista do NIJS, para substituição do acompanhamento psicológico do menor pela Dra. E …; (v) oficiar as técnicas da Associação Passo a Passo, para prova do alegado no ponto 15. do presente requerimento, quanto aos comportamentos da Requerida para obstaculizar a entrada do menor na Associação Passo a Passo para realizar o convívio supervisionado; (vi) a avaliação da interação do menor com o progenitores sob a tutela do NIJS; (vii) realização de perícia psiquiátrica à Requerida.
Na sequência da baixa dos autos após prolação da Decisão Sumária do TRL, veio o Ministério Público promover o seguinte: “Renovo a promoção antecedente, no que a MPP diz respeito”.
O Tribunal recorrido proferiu, em 01-03-2024, a Decisão (recorrida), em que refere “reproduzir o despacho de 15/09/2023, com inserção, nos locais próprios, dos seus fundamentos de facto, que se verificavam à data da sua prolação”, tendo o segmento decisório o seguinte teor:
«Pelo exposto, e ao abrigo das citadas disposições legais, aplica a favor do menor C …, a medida provisória de apoio junto da mãe, com integração no agregado familiar desta, convívios supervisionados com o pai a definir a realizar pela Associação a Passo a Passo (conforme indicado nos autos de regulação das responsabilidades parentais), com a duração de seis meses e revisão em três meses, com a sujeição dos progenitores aos seguintes deveres:
a) A cargo da mãe:
“- Assegurar a satisfação de todas as necessidades básicas de C …, no que respeita ao afeto, saúde, conforto, higiene, alimentação, vestuário, educação e segurança;
- Assegurar o direito à informação do pai no que respeita aos eixos de desenvolvimento do C …, nomeadamente saúde, educação e demais atividades pertinentes;
- Garantir a existência de um ambiente familiar estável e harmonioso, sem exposição ou envolvimento de C … em dinâmicas de conflito, abstendo-se de comentários depreciativos sobre o outro progenitor;
- Dar cumprimento ao que vier a ser definido no âmbito da Regulação do Exercício das Responsabilidades Parentais, com vista ao Superior interesse da jovem;
- Cumprir com o que vier a ser acordado no âmbito dos convívios supervisionados;
- Assegurar o acompanhamento médico de C …, assegurando o cumprimento das consultas agendadas e das possíveis terapêuticas prescritas, assim como do seu Plano de Vacinação;
- Colaborar com a equipa do NIJ, no sentido de ativar um acompanhamento psicológico clínico para C …, garantindo a frequência assídua da criança ao mesmo, cumprido, de igual forma, com todas as orientações técnicas ou terapêuticas;
- Ativar o seu acompanhamento psicoterapêutico, com a colaboração do NIJ, comprometendo-se a cumprir a todas as sessões agendadas, bem como às orientações técnicas;
- Comunicar às equipas intervenientes qualquer alteração do agregado familiar bem como de qualquer ocorrência que exponha o filho a situações de perigo;
- Colaborar com as orientações dadas pelas técnicas do NIJ de Sintra, bem como, por outro Serviço Interveniente que vier a mostrar-se necessário e permitindo visitas domiciliárias, sempre que se justifique.”
b) A cargo do pai:
“- Dar cumprimento ao que vier a ser definido no âmbito da Regulação do Exercício das Responsabilidades Parentais, com vista ao Superior interesse da jovem;
- Cumprir com o que vier a ser acordado no âmbito dos convívios supervisionados, garantindo a existência de um ambiente estável e harmonioso, sem exposição ou envolvimento de C … em dinâmicas de conflito, abstendo-se de comentários depreciativos sobre o outro progenitor;
- Ativar o seu acompanhamento psicoterapêutico, com a colaboração do NIJ, comprometendo-se a cumprir a todas as sessões agendadas, bem como às orientações técnicas;
- Comunicar às equipas intervenientes qualquer alteração do agregado familiar bem como de qualquer ocorrência que exponha o filho a situações de perigo;
- Colaborar com as orientações dadas pelas técnicas do NIJ de Sintra, bem como, por outro Serviço Interveniente que vier a mostrar-se necessário e permitindo visitas domiciliárias, sempre que se justifique.”
Notifique.»
Mais constando da Decisão recorrida o seguinte:
“A) Revisão da medida provisória:
Por inalterados os pressupostos de facto (uma vez que o aceso conflito parental se mantém, com prejuízo para o bem-estar e tranquilidade do menor, os pais continuam a carecer de aconselhamento parental e os convívios entre pai e filho ainda não estão a decorrer com normalidade, nem a relação entre o pai e o filho foi refeita, conforme documento o mais recente relatório social junto aos autos) e de direito em que se baseou a decisão de aplicação, a favor do menor C … da medida provisória de apoio junta mãe, com convívios supervisionados entre pai e filho, visando refazer a relação entre estes, e a sujeição dos progenitores aos deveres enunciados no despacho que aplicou a medida, decido manter, por mais três meses, a referida medida de promoção e proteção, nos precisos termos definidos no despacho (de 15/09/2023) que aplicou esta medida.
Notifique, sendo a progenitora com a expressa advertência constante do primeiro parágrafo da douta promoção de 05/01/2024.
Comunique à Segurança Social (solicitando a remessa de relatório de acompanhamento da execução da medida dentre de 2 meses, com definição do projeto de vida do menor e proposta concreta de intervenção) e ao CAFAP, sendo este também, nos e para os efeitos previsto no 2º parágrafo da douta promoção de 05/01/2023.”
Inconformada com esta decisão, veio a Progenitora interpor o presente recurso de apelação, formulando na sua alegação as seguintes conclusões:
1ª) O menor C … encontra-se fora de perigo ou de risco; antes, estão implementadas e em curso, medidas cautelares, para a sua segurança e bem-estar.
2ª) Investigue-se, quem terá necessidade de terapia e, quem, não cumpre, nem aceita, os deveres estatuídos pelo art.º 1918º do Código Civil.
3ª) A mãe não necessita de apoio para criar, educar e se relacionar com o seu filho e, com o próprio pai deste.
4ª) Esta, é a sua opinião, séria e sensível, de mãe e, também; do seu patrono; que,
5ª) Além de profissional do foro há 40 anos, foi durante 20 anos professor do 1º ciclo especializado em ciência e pedagogia, para lecionar com jovens com necessidades educativas especiais; bem assim, é pai e avó, com muito orgulho e, que deseja, o melhor para o C …! Mas não, a qualquer promoção ou relatório social, com todo o respeito.
6ª) O recurso, com o devido suprimento que se invoca, deverá merecer provimento e, a decisão, ora posta em crise, revogada e substituída por acórdão a determinar arquivamento do processo, conforme o disposto no art.º 111º da Lei nº 147/99, de 01/10.
7ª) E, não para uma intromissão e avaliação sobre a conduta de uma mãe, que cumpre com os seus deveres e poderes, integralmente.
8ª) M.R. seja emitida certidão, para instruir o recurso, com todas as peças necessárias, úteis, pertinentes e adequadas ao conhecimento da 2ª instância, dos factos e circunstâncias, como das decisões proferidas e documentos juntos; em particular:
a) -Da decisão posta em crise;
b) -Da decisão proferida no processo principal de tutela cível, quanto às medidas cautelares decididas e implementadas.
E,
9ª) Sejam ainda, lidos, interpretados e analisados de forma crítica e refletiva, com o acompanhamento do processo da regulação da execução das responsabilidades parentais e, do incumprimento do pai do menor.
Foi apresentada alegação de resposta pelo Progenitor, defendendo, em síntese, que “as alegações da Recorrente não passam senão do que uma tentativa da Recorrente de desvirtuar todo o processo de promoção e proteção, revelando-se inteiramente improcedentes”, pugnando pela improcedência do recurso interposto pela Recorrente.
Também o Progenitor interpôs recurso de apelação, formulando na sua alegação, no que ora importa, as seguintes conclusões:
DO OBJETO DO PRESENTE RECURSO
D. O presente recurso vem interposto do despacho de 01/03/2024, proferido pelo Tribunal a quo, em cumprimento da douta decisão singular do Tribunal da Relação de Lisboa e que mais determinou “manter, por mais três meses, a referida medida de promoção e proteção, nos precisos termos definidos no despacho (de 15/09/2023) que aplicou esta medida”.
E. O Recorrente tem a mais absoluta convicção de que a decisão de que ora se recorre contém uma má e manifestamente errada decisão, apresentando o despacho sub judice diversos vícios do ponto de vista processual e substantivo.
F. Quer porque subsiste a falta de fundamento e pressupostos para a aplicação da medida de promoção e protecção, quer porque a manutenção da medida de promoção e proteção excede o prazo legalmente previsto para a sua vigência, quer porque a decisão de manter em execução a medida se limita a uma fundamentação insuficiente não admissível nos termos do direito, quer ainda porque o Tribunal recorrido não atendeu aos mais recentes factos que resultam da instrução dos presentes autos, que implicavam decisão diversa.
DO OBJECTO DO LITIÍGIO E DA APLICAÇÃO DA MEDIDA DE PROMOÇÃO E PROTECÇÃO
G. Desde o início do processo de regulação das responsabilidades parentais até ao presente, que a Recorrida demonstrou a sua vontade em alienar o menor do progenitor, pretendendo obter desde sempre a sua guarda exclusiva.
H. Para obter os seus intentos, a Recorrida tem adoptado uma estratégia insidiosa, a qual, no mês de maio de 2023 levou a que o Tribunal recorrido determinasse pela aplicação da medida cautelar de suspensão das responsabilidades parentais do progenitor no âmbito do processo de regulação, na sequência de uma informação hospitalar, da qual consta que a progenitora levou o menor ao Hospital Fernando da Fonseca no dia 19/05/2022 (onde trabalha) por maus-tratos e que o menor havia dito à médica que o pai lhe batia.
I. Em 17/07/2023, tiverem início os presentes autos, por requerimento do Ministério Público, ( após denuncia de factos graves que envolvem o menor no âmbito de providencia cautelar movida pelo Recorrente e consequentemente a resposta da Recorrida ) tendo o processo prosseguido os seus trâmites normais, e em 15/09/2023 ( 2 meses depois), o Tribunal a quo proferiu despacho que determinava a aplicação de medida cautelar de apoio junto dos pais, na pessoa da progenitora, com a duração de seis meses e revisão em três meses, desprezando a medida cautelar que já se encontrava em vigor desde 26 de Maio,
J. O Recorrente recorreu desse despacho, tendo sido proferida decisão do Tribunal da Relação de Lisboa que declarou nula a decisão do Tribunal a quo, de 15/09/2023 e determinou que os autos descessem à primeira instância para que o Tribunal proferisse nova decisão de onde constassem os fundamentos de facto que serviram de base à aplicação de medida de promoção e protecção.
K. Porém, e apesar de o Tribunal a quo ter feito agora (1 de Março de 2024 - 2 meses e 10 dias apos a decisão do tribunal da Relação) constar do despacho inicialmente proferido uma série de “factos fortemente indiciados”, nem por isso tal justificava a medida de promoção e protecção, persistindo o vício de falta de fundamento e pressupostos para a respectiva aplicação.
DA AUSÊNCIA DE FUNDAMENTO E PRESUPOSTOS PARA A APLICAÇÃO DA MEDIDA
L. A decisão que aplicou a medida de promoção e proteção em causa incorre numa errada apreciação e valoração dos elementos constantes dos autos.
M. Carecendo de qualquer fundamento válido, uma vez que não se encontravam preenchidos os pressupostos de aplicação de uma medida de apoio junto da mãe.
N. O requerimento inicial do Ministério Público que originou a abertura dos presentes autos destacou como fatores de perigo i) a manifesta conflitualidade entre os progenitores; ii) alegada instabilidade emocional da progenitora; iii) alegados comportamentos de alienação parental da progenitora; iv) alegados consumos de álcool e estupefacientes por parte do progenitor.
O. No que concerne ao primeiro ponto da “factualidade fortemente indiciada” que vem agora enumerada pelo Tribunal recorrido, o fator de risco identificado é a acesa conflitualidade e ataques mútuos entre ambos os progenitores, não podendo o mesmo servir de causa justificativa para a aplicação de uma medida a favor da Recorrida, em detrimento do progenitor.
P. O mesmo se dirá quanto ao segundo facto que o Tribunal a quo dá como fortemente indiciado, embora se deva esclarecer que os comportamentos de ambos os progenitores se materializavam primacialmente em trocas de e-mails e/ou mensagens e litigância processual e NUNCA, desde a separação em “ataques” na presença do menor C …, até porque não se encontravam.
Q. Dito isto, o Tribunal a quo parece depois querer fazer assentar a sua decisão na alegada factualidade que determinou a aplicação da medida cautelar em sede dos autos de regulação das responsabilidades parentais, que suspendeu os convívios do menor com o pai em Maio de 2023 (vide, a este respeito, os factos dados como fortemente indiciados “3.”, “4.” e “5.”), por decorrência da informação hospitalar remetida ao processo, em Maio de 2023, sobre alegadas agressões do Recorrente ao menor.
R. A única diligência que o Tribunal a quo realizou com vista a apurar esta situação foi a audição do menor, ainda no âmbito daqueles autos, da qual ficou bastante claro e provado que não só o pai não bate no menor, como muito menos lhe incute maus-tratos, sejam eles físicos ou psicológicos, embora o mesmo não se possa dizer quanto à relação entre a Recorrida e o menor.
S. Não obstante, não só o Tribunal recorrido deu como fortemente indiciados tais factos sustentando-se exclusivamente num relatório de urgência (informação hospitalar remetida aos autos de regulação das responsabilidades parentais) e sem considerar o que foi dito pelo menor em sede de audição,
T. Como decidiu indeferir todas as diligências instrutórias requeridas nos presentes autos pelo Recorrente que serviriam para sustentar a inexistência de maus-tratos ao menor pelo progenitor.
U. Não obstante, a verdade é que a informação hospitalar remetida aos autos de regulação das responsabilidades parentais não poderia, de forma alguma, justificar o afastamento do menor do pai seja em que sede for, importando atender que tal informação foi obtida na sequência de uma ida às urgências da mãe com o menor, em 19/05/2023, ao hospital onde trabalha (Fernando da Fonseca), alegando ter visto nódoas negras antigas no menor, depois de este ter estado em casa do progenitor.
V. Quando “nódoas negras” são reflexo das vivências de uma criança de 7 anos que brinca, joga à bola, frequenta Judo, vai ao parque infantil, etc
W. E que a própria Recorrida confessou ter pedido “uma observação médica para avaliar a saúde do C … e, se possível, o médico conversar com o C … e apurar efetivamente os maus tratos”, com o fito de lhe serem dirigidas questões direcionadas às respostas que pretendia obter, pois já tinha instrumentalizado o menor previamente (negrito acrescentado), conforme o mesmo confidenciou ao Recorrente e ao seu tio paterno, que disse à Mãe que o pai não lhe bateu e a Mãe dizia que sim e que ele tinha de contar ao médico, rematando porque o fez respondeu o menor que a Mãe era a crescida...
X. O Tribunal a quo, foi informado de todo estes factos por diversos requerimentos, sem que qualquer um dos meios probatório requeridos tenha sido admitido até ao momento,
Y. Mais em momento algum, o tribunal a quo poderia ter tomado a decisão de aplicação daquela medida cautelar em sede do processo de promoção e protecção sem considerar todo o longo historial e a intencionalidade demonstrada desde o início do processo de responsabilidades parentais a este respeito pela Recorrida, que este bem conhece!
Z. E, mais, sem considerar que o menor havia estado em consulta de pediatria no dia 16/05/2023, 3 (três) dias antes de a progenitora o recolher na escola e levar à urgência por alegados maus tratos do pai; consulta esta que estava prevista há mais de 5 (cinco) meses, e que foi adiada por impossibilidade da médica e de cujo relatório resulta que o menor “não apresentava qualquer sinal de maus tratos, apenas algumas equimoses ligeiras nas pernas, próprias de uma criança de uma criança de 7 [sete] anos de idade que brinca no recreio” (negrito acrescentado).
AA. Por outro lado, o Tribunal recorrido não podia ter ignorado as manifestas insuficiências/incongruências do relatório médico remetido pelo Hospital ao Tribunal a quo, e que o mesmo foi elaborado no pressuposto da existência de “Antecedentes de violência doméstica do pai para com a mãe - processo em tribunal”, o que é, desde logo, um fator que não pode deixar de condicionar a avaliação.
BB. Quando tal processo de alegada violência doméstica foi arquivado e quando corria também em Tribunal à data um processo por violência doméstica contra a mãe, informação que a Recorrida naturalmente escolheu omitir e que, por isso, não consta nem no relatório, nem no protocolo.
CC. Analisados todos estes factos inabaláveis por comprovados por relatórios, pelo menor, pela médica pediatra do menor, por técnicas do NIJ e por testemunhas (nunca aceites pelo tribunal para serem inquiridas), o menor não está como nunca esteve em perigo com o progenitor,
DD. É bem evidente a falsidade das acusações de maus-tratos por parte da Recorrida com o único intuito de alienação parental que decorre com a conivência do tribunal a quo ao longo dos últimos de 10 meses de coartados os contactos entre pai e filho.
EE. O Tribunal a quo parece pretender ainda sustentar-se no relatório médico da Dra. D …, no que concerne à necessidade de acompanhamento em consulta de psicologia por parte do menor (vide, facto “6.”).
FF. Acompanhamento esse que apesar de se reportar a Dezembro de 2021, foi o próprio progenitor que sempre fomentou e que até requereu, em 04/03/2022, ainda que sem sucesso, o suprimento de autorização da progenitora para esse mesmo efeito; pelo que nem por isso tal facto pode servir para sustentar a aplicação da medida de promoção e protecção sub judice, tendo em conta que, mais uma vez, o que está em causa é uma situação causada apenas pela progenitora.
GG. O Tribunal a quo faz ainda referência ao Relatório Social elaborado pelo Núcleo de Infância e Juventude de Sintra, da Santa Casa da Misericórdia, junto aos autos a 16/08/2023 (quase 3 meses após aplicação da medida cautelar nos autos de regulação, encontrando-se ao menor e Recorrente vedados qualquer contacto, o que se mantém até ao dia de hoje!) (vide facto indiciado “7.”).
HH. Apesar de não se conseguir alcançar em que termos o trecho transcrito pelo Tribunal possa de alguma forma justificar a medida aplicada, desse relatório resulta igualmente, no que concerne às condições habitacionais, situação socioenómica e relação do menor com a família alargada, que ambos os progenitores se encontram em igualdade de condições e que ambos os pais demonstram ter conhecimento das necessidades do filho, procurando dar respostas às mesmas, apresentando preocupação pelo seu bem-estar e segurança.
II. Sobretudo, resulta que o menor se sente gratificado na companhia de ambos os progenitores, e queixa-se de saudades do pai – cujos contactos e convívios se encontram suspensos desde Maio de 2023.
JJ. A final, as técnicas que elaboraram o sobredito relatório social sugerem que seja aplicada uma medida de promoção e proteção junto dos pais, não sendo possível alcançar qualquer fundamento, onde o tribunal a quo retirou que a medida de promoção e proteção de apoio juntos dos pais devesse ser aplicada junto da Recorrida.
KK. Por último invoca o Tribunal a quo que a aplicação (a título definitivo) da medida de promoção e proteção proposta em sede de conferência não reuniu o consenso dos progenitores, o que se deveu única e exclusivamente à Recorrida, que rejeitou a psicoterapia sugerida pelo Tribunal em sede da referida diligência.
LL. Mesmo sendo advertida que a rejeição da psicoterapia lhe podia custar a guarda do menor, o Tribunal a quo decidiu pela aplicação da medida junto da mãe...
MM. A aplicação da medida de apoio junto dos pais, deve ter em conta i) a situação de perigo que determinou a sua aplicação bem como ii) o nível das competências parentais de ambos os progenitores.
NN. Relativamente ao nível das competências parentais, do relatório social junto aos autos, resulta que ambos os pais gozam destas competências e de condições para exercer as responsabilidades do menor.
OO. E no que concerne à situação de perigo identificada, esta reconduz-se às supostas – mas nunca comprovadas – agressões do pai ao menor; sendo de fácil conclusão que tal matéria resulta de falsas imputações e acusações de maus-tratos da progenitora em relação ao Recorrente e que, por isso, nunca poderia servir como fundamento à aplicação de medida de que ora se recorre.
DA REVISÃO DA MEDIDA DE PROMOÇÃO E PROTECÇÃO
DA VIOLAÇÃO DO PRAZO MÁXIMO PREVISTO PARA A APLICAÇÃO DA MEDIDA PROVISÓRIA E DO PRAZO MÁXIMO PARA A INSTRUÇÃO
PP. A medida de promoção e protecção provisória foi aplicada nos autos em 15/09/2023 e apenas foi revista em Março do presente ano 2024, por despacho de 01/03/2024, cerca de 5 meses e meio da prolação do despacho que a aplicou, ab initio, tendo decidido pela sua manutenção por um prazo de mais 3 meses, em violação do disposto no artigo 37.º n.º 3 da LPCJP.
QQ. O Tribunal recorrido não só procedeu à revisão da medida muito depois dos 3 meses inicialmente decretados para a sua revisão, como manteve a medida inicialmente aplicada, protelando-a por um prazo superior ao legalmente previsto e admissível.
RR. Não obstante a medida de promoção e protecção aplicada nos autos em setembro de 2023 tenha sido declarada nula pelo Tribunal da Relação de Lisboa, por decisão sumária datada de 21/12/2023, tal medida esteve sempre em vigor, uma vez que o recurso interposto pelo Recorrente não foi admitido com efeito suspensivo, não se justificando, também por isso, que o Tribunal a quo não tenha procedido à revisão da medida dentro do prazo, em 15/12/2023.
SS. Por outro lado, o Tribunal a quo não fundamenta em momento algum uma qualquer suposta necessidade de prorrogação do sobredito prazo, e mantém a fase instrutória, em violação do disposto no artigo 109.º da LPCJP, por um prazo muito superior ao legalmente previsto, perpetuando esta fase e nela fazendo permanecer uma medida cautelar muito para além do prazo de duração máxima legalmente prevista.
DA FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO DO DESPACHO QUE PROCEDEU À REVISÃO DA MEDIDA
TT. O Tribunal a quo limita-se a sumariar, de forma vaga e genérica, os pressupostos de facto que, no seu entender justificam a manutenção da medida, não discriminando minimamente os fundamentos de direito em se apoiou para decidir sobre a manutenção da medida de apoio junto dos pais, na pessoa da Recorrida.
UU. O despacho de revisão da medida não exara, sequer remotamente, um raciocínio logico-dedutivo apoiado em elementos concretos que sirvam para fundamentar o entendimento sob o qual os pressupostos de facto, no seu entender, se mantêm inalterados, embora tenham já sidos juntos aos autos outros tantos elementos e documentos oficiais que sugerem a retoma à guarda partilha e implicam uma decisão diferente daquela de que se recorre.
VV. A decisão sub judice incorre numa violação do dever de fundamentação previsto no artigo 62.º, n.º 4 da LPCJP e consagrado no artigo 205.º da Constituição da República Portuguesa, implicando a respectiva nulidade, nos termos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea b) do CPC.
DA OMISSÃO DA PONDERAÇÃO DE FACTOS SUPERVENIENTES AO DESPACHO QUE APLICOU AB INITIO A MEDIDA DE PROMOÇÃO E PROTECÇÃO
WW. O Tribunal a quo decidiu pela manutenção da medida sem atender e ponderar os novos factos mais recente dos autos que permitem concluir que a medida vigente não se encontra a surtir efeito e que é contrária ao superior interesse do menor.
XX. O Tribunal recorrido limita-se a referir que parte dos pressupostos que entende terem justificado a aplicação da medida ab initio se mantêm inalterados, alheando-se fundamentalmente de todo o circunstancialismo recente que conforma os autos.
YY. Cabia ao Tribunal a quo ter ponderado que todos os convívios entre o pai e o menor têm sido obstaculizados pela Recorrida, sem que a intervenção das entidades que coadjuvam o Tribunal esteja a surtir qualquer efeito. (de todos os convívios agendados o Recorrente nunca esteve com o menor à exceção do dia 22 de Dezembro que inverteu o horário da chegada ao local do convívio e teve seu filhos nos braços dizendo-lhe que tinha muitas saudades dele)
ZZ. E que, o restabelecimento da relação entre o pai e o filho era precisamente um dos objectivos dos presentes autos, estando a potenciar precisamente o contrário com o prolongamento da medida.
AAA. Ainda, os restantes (e parcos) pressupostos de facto a que o Tribunal a quo parece basear-se para justificar a manutenção da medida como sendo o “aceso conflito parental (...), com prejuízo para o bem-estar e tranquilidade do menor” e que os “pais continuam a carecer de aconselhamento parental”, não podem servir de fundamento a uma medida que coloca em causa a relação primordial entre pai e filho.
BBB. Afigurando-se gravemente prejudicial para o superior interesse do menor a manutenção de uma medida que perpetue o afastamento entre o menor e o Recorrente, unicamente em consequência da conflitualidade existente entre ambos os progenitores, conforme se pode comprovar no relatório das técnicas datado de 16/08/2023.
 Terminou o Apelante requerendo, além da atribuição de efeito suspensivo ao recurso (o que não foi atendido), que seja “julgado procedente o presente recurso, e consequentemente a revogada a medida de promoção e protecção aplicada ab initio nos autos; caso assim não se entenda, que se faça cessar a medida de promoção e protecção uma vez que quer o prazo máximo de 6 meses de vigência da medida, quer o prazo máximo de 4 meses para a fase de instrucção já se encontram manifestamente ultrapassados; caso assim não se entenda, que seja determinada a nulidade do despacho que decide manter a medida de promoção e proteção, por violação do dever de fundamentação e determinada a revogação do despacho que decide pela manutenção da medida de promoção e proteção de apoio junto dos pais na pessoa da Progenitora.”
Não foram apresentadas contra-alegações pela Progenitora.
O Ministério Público apresentou alegação de resposta, em que defendeu que ambos os recursos devem ser julgados improcedentes, concluindo nos seguintes termos: “o tribunal a quo fez correcta interpretação dos factos de que os autos por ora dispõem, referentes à realidade de C …, tendo decidido pela manutenção da medida de promoção e protecção aplicada a favor daquele, acautelando o seu superior interesse, e visando por cobro à situação de perigo que os autos espelham à saciedade, pese embora os pais neguem a sua existência, nada havendo a apontar, a nosso ver, à sobredita decisão, que entendemos dever ser mantida nos seus precisos termos.”
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

***

II - FUNDAMENTAÇÃO

Como é consabido, as conclusões da alegação do recorrente delimitam o objeto do recurso, ressalvadas as questões que sejam do conhecimento oficioso do tribunal, bem como as questões suscitadas em ampliação do âmbito do recurso a requerimento do recorrido (artigos 608.º, n.º 2, parte final, ex vi 663.º, n.º 2, 635.º, n.º 4, 636.º e 639.º, n.º 1, do CPC).
Identificamos as seguintes questões a decidir:
Recurso da Progenitora:
Se o menor não se encontra numa situação de perigo que justifique a aplicação, a título cautelar, da medida de apoio junto dos pais;
Recurso do Progenitor
1.ª) Se inexiste fundamento para aplicação, a título cautelar, da medida de apoio junto dos pais;
2.ª) Se a decisão que reviu a medida aplicada é nula, por falta de fundamentação, e ilegal, por inobservância do prazo máximo de duração.

Dos Fundamentos de Facto

Na decisão recorrida foram considerados indiciariamente provados os seguintes factos:
1. Existe uma acesa conflitualidade entre os progenitores, que se manifesta na presença da criança, materializada “em ataques” mútuos acusando-se de serem maus pais, apresentação de várias queixas um contra o outro, nomeadamente o pai acusa a mãe de instabilidade emocional e a mãe acusa o pai de consumos de álcool e estupefacientes.
2. Os comportamentos referidos no ponto anterior, na presença da criança, causam-lhe sofrimento, instabilidade e ansiedade impedindo-a de ter um bom desenvolvimento integral, sendo os progenitores incapazes de lhes por termo e de reconhecer o impacto negativo que o seu conflito tem no bem-estar do C ….
3. Na sentença proferida a 17-07-2023, no âmbito do apenso A, que decidiu incidente de incumprimento, foi dado como provado que, “na semana de 5 a 12 de maio de 2023, o pai não levou o filho à escola, levando a que este faltasse às atividades escolares e, assim, impedindo o menor de passar essa semana com a mãe”.
4. Resulta da informação hospitalar junta a 23-05-2023 ao apenso A, que o menor compareceu nas urgências do hospital, com “lesões sugestivas de maus tratos” e “Mau Trato Físico Criança batida/espancada”, tendo a criança aí declarado, sem a presença da mãe, que o pai lhe bate.
5. Consta ainda da referida ficha hospitalar, que o menor “não frequenta o colégio desde 5/5/2023 até 16/5/2023 tendo ficado neste período entregue ao pai, aparentemente não cumprindo o acordo judicial, quando deveria ter sido entregue à mãe a 5/5/2023”. “Após ordem judicial, a mãe foi buscá-lo ao colégio, e após banho reparou em algumas lesões no corpo do C …”. “Segundo o C …, em conversa sem a presença da mãe, refere que o pai não o levou à escola de 5/5 a 15/5, por se ter encontrado " sem trabalhar" (sic), e ter ficado apenas com o pai em casa durante este período”. “O C …, diz ainda na ausência da mãe, que a lesão que apresenta a nível lombar se deverá a agressão com a mão por parte do pai, por ele não estar a comer depressa (segundo o próprio é habitual, não se despachar a comer)”.
6. A médica pediatra do C …, em relatório médico datado de 30-05-2023 (junto aos autos a 16/08/2023) pronunciou-se no sentido da “necessidade de um acompanhamento em consulta de psicologia atendendo a que apesar de não apresentar problemas de aprendizagem tem um comportamento muito agitado, pouco concentrado, que necessita de avaliação”.
7. O relatório social junto aos autos a 16-08-2023 concluiu que:
- “Os pais apresentaram pouco reconhecimento das dificuldades de comunicação para com o outro, não se coibindo de evidenciar hostilidade comunicacional do outro para consigo. Não obstante, mostraram-se disponíveis para beneficiar de acompanhamento adequado, aparentando necessitarem de uma intervenção próxima que os ajude a alterar alguns comportamentos e a relacionar-se, enquanto casal parental, de forma positiva. Na atualidade, pese embora se encontrem assegurados os cuidados básicos à criança, a exposição ao conflito e desavença parental constitui-se como um fator de perigo para o adequado desenvolvimento de C …, pelo que a intervenção judicial poderá surtir um efeito positivo na alteração deste contexto familiar com vista a reverter o padrão relacional mantido até então”.
- “Em conformidade com a avaliação diagnóstica efetuada pelo NIJ, apurou-se que os pais, apesar de manifestarem preocupação pelo bem-estar integral do filho, em alguns momentos, revelam dificuldades em priorizar as necessidades emocionais do mesmo, expondo-o, a situações de conflituosidade, animosidade e disputa parental. Pese embora a complexidade da situação, a intervenção técnica dever-se-á realizar com base na proporcionalidade e atualidade, bem como adequada à situação de perigo em que a criança se encontra no momento. A presente situação incide sobretudo em questões a serem trabalhadas, nomeadamente ao nível da comunicação e da confiança parental”.
-“Atendendo a que a situação familiar poderá agravar-se caso não seja mantido um acompanhamento técnico, salvo melhor entendimento, sugere-se aplicar, em sede judicial, uma medida de promoção e proteção a favor da criança junto dos pais, de forma a clarificar o papel, atual e futuro, de cada um na vida do filho. Mais se considera que deva ser dado especial enfoque na avaliação dos alegados consumos de substâncias da parte do progenitor e na avaliação da alegada instabilidade emocional atribuída à progenitora”.
8. A aplicação (a título definitivo) da medida de promoção e proteção proposta pelo relatório que antecede (nem qualquer outro) não reuniu o consenso dos progenitores, expresso na conferência realizada no presente apenso, a 17-08-2023.

O Tribunal a quo motivou o assim decidido nos seguintes termos:
“A factualidade fortemente indiciada resulta do teor do relatório social junto aos autos a 16/08/2023, das declarações prestadas pelos progenitores em sede de conferência realizadas nestes autos, da documentação clínica e relatórios médicos juntos email do Hospital Fernando da Fonseca de 23/05/2023 e com o referido relatório social, e, quanto aos factos provados constantes do ponto 3, do teor da sentença proferida a 17/07/2023, no apenso A.
O referido relatório social, pelas suas fontes, metodologia, especial preparação para o efeito e isenção (por distanciamento e equidistância em relação às partes deste processo e ao litígio que lhe subjaz) de quem o elaborou, mereceu a credibilidade do Tribunal, quanto ao que apurou e relatou.
A documentação clínica referida, pela isenção e objetividade de quem a elaborou e, na parte médica, pelos conhecimentos especiais dos seus autores, mereceu igualmente a credibilidade do Tribunal.
Acresce que, só da simples leitura dos autos (seja deste apenso, seja de todos os demais apensos) resulta evidente a elevada conflitualidade entre os progenitores da criança e a dificuldade dos mesmos em protegerem o filho dessa conflitualidade.
Resulta não só dos referidos documentos e relatório, mas também das declarações dois pais em sede de conferência e a da informação escolar junta, que o menor faltou à escola, nos termos acima provados, quando estava aos cuidados do pai.
O facto provado constante do ponto 8. resulta do teor da ata de conferência realizada no presente apenso, a 17/08/2023, a qual, enquanto documento autêntico e judicialmente certificado, faz prova plena de tal facto. E também daí resulta a necessidade de aplicação de medida provisória para proteção do menor.
Por último, o ponto 3 dos factos provados, resulta da sentença proferida a 17/07/2023, no apenso A, a qual, enquanto documento autêntico e judicialmente certificado, faz prova plena do seu teor.
Não se provou qualquer outro facto com relevância para a decisão a proferir, porquanto, nenhuma prova se produziu a tal respeito.”

Dos fundamentos de direito

Da fundamentação de direito Decisão recorrida constam as seguintes considerações:
“Nos termos das disposições conjugadas dos arts 91º, 92º e 79º, nº 3, da L.P.C.J.P., este Tribunal é competente para a aplicação, a título provisório, de medida adequada a remover a situação de perigo em que a menor se encontra.
Face à factualidade apurada, dúvidas não restam de que o menor se encontra em situação de grave perigo para a sua saúde, segurança, integridade física e moral e educação, sendo que, a medida cautelar adequada a remover tal perigo é a medida de apoio junto da mãe, com a integração no agregado familiar desta, com convívios supervisionados com o pai, e a sujeição dos progenitores ao cumprimento dos deveres enunciados no relatório social junto aos autos (art.º 35º, nºs 1, al. b) e 2, da citada lei), pelas razões e fundamentos acima referidos e mais desenvolvidamente explanados no relatório social junto aos autos.”
Ambos os Progenitores discordam deste entendimento.
Apreciando.
Como é sabido, a intervenção protetiva tem como finalidade, a promoção dos direitos e a proteção das crianças e jovens em perigo - cf. art.º 1.º da Lei n.º 147/99, de 01-09 (LEI DE PROTECÇÃO DE CRIANÇAS E JOVENS EM PERIGO) -, sendo legítima apenas enquanto se mantiver uma situação de perigo, assumindo, quase por definição, natureza temporária.
A aplicação de uma medida de promoção e proteção deve ser norteada pelos princípios orientadores previstos na lei, incluindo os da intervenção mínima e da subsidiariedade - cf. art.º 4.º, alíneas d) e k), da LPCJ - sendo a finalidade das medidas de promoção e proteção (cf. art.º 34.º da LPCJP):
“a) Afastar o perigo em que estes se encontram;
b) Proporcionar-lhes as condições que permitam proteger e promover a sua segurança, saúde, formação, educação, bem-estar e desenvolvimento integral;
c) Garantir a recuperação física e psicológica das crianças e jovens vítimas de qualquer forma de exploração ou abuso”.
No tocante à intervenção judicial, é levada a cabo mediante um processo de promoção e proteção, que se trata de um processo de jurisdição voluntária (cf. art.º 100.º da LPCJP), o que significa, além do mais, que as decisões a tomar não se balizam por critérios de legalidade estrita (cf. art.º 987.º do CPC), devendo o tribunal adotar em cada caso a solução que julgue mais conveniente e oportuna, buscando, como critério material norteador da decisão, a prevalência dos superiores interesses das crianças e jovens em perigo, com a rejeição de soluções concretas menos vantajosas desse prisma, ainda que assentes numa legítima interpretação da lei.
Quanto ao elenco das medidas passíveis de serem aplicadas, preceitua o art.º 35.º da LPCJP, nos seus n.ºs 1 a 3, que:
“1 - As medidas de promoção e proteção são as seguintes:
a) Apoio junto dos pais;
b) Apoio junto de outro familiar;
c) Confiança a pessoa idónea;
d) Apoio para a autonomia de vida;
e) Acolhimento familiar;
f) Acolhimento residencial;
g) Confiança a pessoa selecionada para a adoção, a família de acolhimento ou a instituição com vista à adoção.
2 - As medidas de promoção e de proteção são executadas no meio natural de vida ou em regime de colocação, consoante a sua natureza, e podem ser decididas a título cautelar, com exceção da medida prevista na alínea g) do número anterior.
3 - Consideram-se medidas a executar no meio natural de vida as previstas nas alíneas a), b), c) e d) do n.º 1 e medidas de colocação as previstas nas alíneas e) e f); a medida prevista na alínea g) é considerada a executar no meio natural de vida no primeiro caso e de colocação, no segundo e terceiro casos.”
Por sua vez, estabelece o art.º 37.º da LPCJP, sob a epígrafe “Medidas cautelares”, que:
“1 - A título cautelar, o tribunal pode aplicar as medidas previstas nas alíneas a) a f) do n.º 1 do artigo 35.º, nos termos previstos no n.º 1 do artigo 92.º, ou enquanto se procede ao diagnóstico da situação da criança e à definição do seu encaminhamento subsequente.
(…) 3 - As medidas aplicadas nos termos dos números anteriores têm a duração máxima de seis meses e devem ser revistas no prazo máximo de três meses.”
No tocante à duração das medidas no meio natural de vida, dispõe o art.º 60.º da LPCJP que:
“1 - Sem prejuízo do disposto no número seguinte, as medidas previstas nas alíneas a), b), c) e d) do n.º 1 do artigo 35.º têm a duração estabelecida no acordo ou na decisão judicial.
2 - Sem prejuízo do disposto no número seguinte, cada uma das medidas referidas no número anterior não pode ter duração superior a um ano, podendo, todavia, ser prorrogadas até 18 meses se o interesse da criança ou do jovem o aconselhar e desde que se mantenham os consentimentos e os acordos legalmente exigidos.
3 - Excecionalmente, quando a defesa do superior interesse da criança ou do jovem o imponha, a medida prevista na alínea d) do n.º 1 do artigo 35.º pode ser prorrogada até que aqueles perfaçam os 25 anos de idade.”
Importa também atentar no que dispõe, sobre a revisão das medidas, o art.º 62.º da LPCJP:
“1 - Sem prejuízo do disposto no n.º 3 do artigo 37.º, as medidas aplicadas são obrigatoriamente revistas findo o prazo fixado no acordo ou na decisão judicial, e, em qualquer caso, decorridos períodos nunca superiores a seis meses, inclusive as medidas de acolhimento residencial e enquanto a criança aí permaneça.
2 - A revisão da medida pode ter lugar antes de decorrido o prazo fixado no acordo ou na decisão judicial, oficiosamente ou a pedido das pessoas referidas nos artigos 9.º e 10.º, desde que ocorram factos que a justifiquem.
3 - A decisão de revisão determina a verificação das condições de execução da medida e pode determinar, ainda:
a) A cessação da medida;
b) A substituição da medida por outra mais adequada;
c) A continuação ou a prorrogação da execução da medida;
d) (Revogada.)
e) (Revogada).
4 - Nos casos previstos no número anterior, a decisão de revisão deve ser fundamentada de facto e de direito, em coerência com o projeto de vida da criança ou jovem.
5 - É decidida a cessação da medida sempre que a sua continuação se mostre desnecessária.
6 - As decisões tomadas na revisão constituem parte integrante dos acordos de promoção e proteção ou da decisão judicial.”
A ter ainda em atenção, quanto à cessação das medidas, o disposto no art.º 63.º da referida lei, nos termos do qual:
“1 - As medidas cessam quando:
a) Decorra o respetivo prazo de duração ou eventual prorrogação;
b) A decisão de revisão lhes ponha termo;
c) Seja decretada a adoção, nos casos previstos no artigo 62.º-A;
d) O jovem atinja a maioridade ou, nos casos em que tenha solicitado a continuação da medida para além da maioridade, complete 21 anos;
e) Seja proferida decisão em procedimento cível que assegure o afastamento da criança ou do jovem da situação de perigo.
2 - Sem prejuízo do disposto na alínea d) do número anterior, podem manter-se até aos 25 anos de idade as medidas de promoção e proteção de apoio para autonomia de vida ou colocação, sempre que existam, e apenas enquanto durem, processos educativos ou de formação profissional, e desde que o jovem renove o pedido de manutenção.
3 - Aquando da cessação da medida aplicada, a comissão de proteção ou o tribunal efetuam as comunicações eventualmente necessárias junto das entidades referidas no artigo 7.º, tendo em vista o acompanhamento da criança, jovem e sua família, pelo período que se julgue adequado.”
Dos citados normativos legais, em particular do referido art.º 37.º, resulta, sem margem para dúvida, que o Tribunal pode (e deve) pronunciar-se sobre a aplicação de uma medida de promoção e proteção, ainda que a título cautelar, quando considere que já dispõe de elementos probatórios que, muito embora num juízo perfunctório, revelam a necessidade da mesma.
No entanto, fora dos casos previstos no art.º 92.º da LPCJP (procedimentos judiciais urgentes), a aplicação de medidas cautelares apenas se justifica enquanto se procede ao diagnóstico da situação da criança e à definição do seu encaminhamento subsequente.
A este respeito, pelas abundantes referências de doutrina e jurisprudência, veja-se o acórdão da Relação de Lisboa de 07-03-2024, proferido no proc. n.º 8079/18.2T8LRS-B.L1 (disponível em www.dgsi.pt), relatado pelo ora 1.º Desembargador-Adjunto, que, pelo seu interesse, passamos a citar, na parte em que enuncia os critérios ou diretrizes orientadores da decisão judicial:
“- as medidas de promoção e protecção provisórias ou cautelares são aplicadas quando se verifique a situação de urgência ou emergência enunciada no nº. 1, do art.º 91º, da LPCJP – existência de perigo atual ou iminente para a vida ou de grave comprometimento da integridade física ou psíquica da criança ou jovem -, ou enquanto se diagnostica a situação da criança ou jovem, com vista a definir o pertinente âmbito de intervenção;
- presentemente, resulta do nº. 3, do art.º 37º, da LPCJP, ser de seis meses o prazo máximo de duração de tais medidas, as quais devem ser revistas no prazo máximo de três meses;
-  findo tal prazo, sem que seja aplicada qualquer medida definitiva, a medida cautelar ou provisória deve ser, prima facie, declarada extinta por caducidade;
- o que só não sucederá, admitindo-se prorrogação para além daquele prazo máximo, caso a urgência de intervenção se mantenha e a cessação da medida cautelar aplicada faça colocar a criança ou jovem na antecedente situação de emergência, retornando à situação de perigo anteriormente vivenciada;
- situação em que tal juízo prorrogativo deve merecer uma acrescida fundamentação, justificativo da mesma e balizando um período mínimo necessário à aplicabilidade de uma medida definitiva;
- relativamente às medidas de promoção e protecção definitivas, aplicadas no meio natural de vida, com excepção da medida de apoio para a autonomia de vida (que pode ser prorrogada até que a criança ou jovem perfaça 21 anos de idade), cada uma das demais possui um período temporal máximo de um ano que, sob determinadas condições, pode ser prorrogado até aos 18 meses – o art.º 60º, da LPCJP;
- tal prazo de duração tem natureza peremptória, pelo que não pode nem deve ser excedido, donde, decorrido o respectivo prazo de duração, ou da sua eventual prorrogação, cessa, por caducidade, a medida aplicada – o art.º 63º, nº. 1, alín. a), da LPCJP;
- com efeito, a medida aplicada tem por desiderato dever permanecer apenas pelo tempo necessário a remover a situação de perigo que a justificou, e criar as condições necessárias à promoção da salvaguarda total da criança ou jovem, e não que se arraste por anos sem resultados positivos visíveis ou palpáveis;
- ou seja, as medidas de promoção e protecção têm claramente uma natureza excepcional, de provisoriedade, justificando-se num quadro de urgência, sendo assim de total pertinência o estabelecimento de um prazo peremptório para a sua duração/prorrogação;
- diferenciado entendimento conduziria a um arrastar incessante do processo, muitas vezes sem resultados práticos, inviabilizando que a situação devesse ser regulada ou definida no seu local processual próprio, ou seja, no âmbito das providências tutelares cíveis;
- com efeito, a ultrapassagem de tal prazo (e não a sua cessação), em nome de aludidos superiores interesses da criança ou jovem, é que seria desmerecer estes mesmos interesses, pois estar-se-ia a tutelar a manutenção de vigência de uma medida não adequada, por se revelar incapaz de ultrapassar ou mitigar a situação de perigo que justificou a sua aplicação;
- ou seja, caso se conclua que, decorrido aquele prazo máximo de duração da medida aplicada, a criança ou jovem permanece em situação de perigo, então urge considerar que a medida aplicada revelou-se inadequada, por sê-lo incapaz de remover, pelo que deveria ter sido substituída, por outra, durante o prazo de execução;
- donde, considerar o alargamento de tal prazo, ainda que de forma consensual, não garante qualquer êxito na prossecução daquele objectivo;
- efectivamente, a admissão de putativas prorrogações para além dos limites temporais legalmente definidos seria factor lesivo dos interesses da criança ou jovem, pois promoveria a manutenção de uma intervenção que se vinha revelando inadequada, ineficaz, impotente e tradutora de uma clara inércia ou ineficácia perante a situação de perigo a debelar;
- assim, decorrido o seu prazo de duração máxima, mantendo-se a situação de perigo que legitimou a sua aplicabilidade, impõe-se a reanálise de toda a situação e, caso a situação não possa ser dirimida ou ultrapassada em sede de providência tutelar cível, equacionar a aplicabilidade de outras medidas, com suficiente eficácia de salvaguarda dos interesses da criança ou jovem;
- admitindo-se, assim, que o período temporal máximo equacionado no art.º 60º, da LPCJP, se reporte a cada uma das medidas em separado, e não propriamente à soma dos períodos temporais de medidas de promoção e protecção diversas;
- resulta, ainda, do exposto que, tendo-se admitido que uma medida provisória e cautelar pudesse ser prorrogada, para além do seu prazo máximo de seis meses, caso a urgência da situação se mantivesse e a cessação da medida cautelar aplicada colocasse a criança ou jovem na antecedente situação de emergência, retornando à situação de perigo anteriormente vivenciada, consideramos, porém, que tal eventual prorrogação nunca poderá exceder o prazo máximo da mesma medida quando aplicada em termos definitivos.”
Revertendo ao caso sub judice, a decisão (de 15-09-2023) que aplicou a medida cautelar de apoio junto dos pais foi declarada nula, tendo sido proferida, em 01-03-2024, uma nova decisão (ora recorrida) que aplicou, a título cautelar, a medida de apoio, de modo algum se podendo entender (como parece ter sido perspetivado pelo Tribunal a quo) que estava a ser suprida a nulidade da anterior decisão (isso seria se tivesse oportunamente sido cumprido o disposto no art.º 617.º, n.ºs 1 e 2, do CPC). Logo, nessa data, não havia que rever a medida (aplicada por decisão nula), mas sim – e apenas – ponderar se, ante os factos então indiciariamente apurados, a mesma se justificava.  
Deste modo, entendemos que apenas se poderá considerar a fundamentação desenvolvida a respeito da revisão da medida como uma parte integrante da fundamentação, vendo que o Tribunal recorrido decidiu, agora com fundamentação de facto, aplicar - de novo a título cautelar - a medida de apoio, ponderando todos os elementos disponíveis nos autos. 
Assim, embora por fundamentação distinta da que o Apelante invocou, impõe-se revogar a decisão recorrida na parte atinente à revisão da referida medida de promoção e proteção, ficando prejudicado o conhecimento das demais questões suscitadas quanto a tal decisão.
Aquando da prolação da decisão recorrida, a aplicação de medida de apoio (a título cautelar ou, se o processo já estivesse nessa fase, a título definitivo) não era um imperativo, antes supunha, como não podia deixar de ser, que se mantivesse a situação de perigo justificativa da instauração do processo. Se assim não fosse, é evidente que o Tribunal recorrido deveria ter determinado o arquivamento do processo, como os Apelantes pretendem, mas, desde já o adiantamos, que sem razão.
Desde logo não colhe a argumentação do Apelante quando parece defender que a decisão em apreço não podia ter sido tomada sem que tivessem sido realizadas outras diligências instrutórias.
Efetivamente, o Tribunal a quo, na sequência da anulação da Decisão proferida em setembro de 2023, proferiu uma nova Decisão, da qual constam elencados os fundamentos de facto que teve em consideração. O Apelante teve oportunidade de impugnar essa decisão da matéria de facto, alegando que alguns desses factos concretos não deveriam ter sido considerados indiciariamente provados ou que outros deveriam ter sido tidos em consideração e aditados, indicando quais seriam, no seu entender, os meios de prova a considerar nesse sentido. Todavia, não o fez limitando-se, tal como a Progenitora, a tecer considerações genéricas que em nada contendem com os fundamentos de facto elencados, à luz dos quais importa decidir da necessidade de aplicação da medida de apoio.
Face aos elementos já carreados para os autos, com especial preponderância para o Relatório social que foi junto em 05-01-2024 (elaborado pelo Núcleo de Infância e Juventude de Sintra - SIATT), também tido em consideração na Decisão recorrida, é incontornável que se verificava e subsiste a situação de perigo para a saúde e o bem-estar psíquico da criança decorrente da extrema conflitualidade dos seus Progenitores, não tendo razão de ser as objeções suscitadas pelos Apelantes quanto à aplicação da medida de promoção e proteção, revelando mesmo uma incompreensão da finalidade dessa medida de apoio.
Isso é particularmente evidente quando o Apelante afirma que a situação de conflitualidade descrito não pode “servir de causa justificativa para a aplicação de uma medida a favor da Recorrida, em detrimento do progenitor”, nem para “justificar o afastamento do menor do pai seja em que sede for”. Na verdade, em parte alguma da Decisão recorrida se está a aplicar uma medida a favor da Progenitora em detrimento daquele, muito menos a determinar o afastamento do Progenitor do filho. Pelo contrário, é evidente que se pretendeu aplicar uma medida destinada a beneficiar a criança, promovendo o seu bem-estar físico e psíquico e um desenvolvimento saudável e harmonioso, bem como as condições para que os laços afetivos entre pai e filho se possam manter, o que tem estado a ser comprometido pela forma conflituosa como os Progenitores se (não) relacionam, mas se espera seja revertido, com a aplicação, a título cautelar, da medida de apoio, sem prejuízo do mais que se entenda adequado ao caso, seja neste processo, seja no processo de regulação das responsabilidades parentais, podendo neste último ser equacionado, por exemplo, o recurso à mediação familiar. Aliás, parece-nos importante que aí venha a ser proferida, a breve trecho, uma decisão final que fixe um regime de regulação das responsabilidades parentais adequado às circunstâncias do caso, ao invés de se manter uma indefinição regulatória que parece já estar a contribuir para agravar a situação de conflito latente entre os Progenitores, com evidente prejuízo para o bem-estar da criança.
Assim, resultando da factualidade que foi considerada indiciada na Decisão recorrida um quadro vivencial efetivamente suscetível de afetar a estabilidade e integridade psíquica e emocional do menor C …, potenciador de uma sensação de insegurança deste relativamente ao Progenitor com o risco de alienação parental, mostra-se justificada a aplicação, a título cautelar, da referida medida de apoio, pelo prazo de 6 meses, a rever no prazo máximo de 3 meses.
Queda claro que, não obstante os mecanismos que já foram acionados, ainda não foi possível afastar a situação de perigo que advém para a saúde física e psíquica da criança decorrente da extrema conflitualidade existente entre os Progenitores e da quebra de convivência pai-filho, parecendo-nos, de acordo com os elementos disponíveis nos autos, ser benéfica a aplicação de uma medida cautelar de apoio junto dos pais (de ambos os Progenitores), não apenas na pessoa da Mãe - aliás, a referência que é feita no segmento decisório da Decisão recorrida (“medida provisória de apoio junto da mãe”) parece ser devida a lapso, sendo incongruente com o teor do Relatório social em que se estriba e com a imposição de um conjunto de deveres ao Progenitor.
Não pode este Tribunal da Relação deixar de reconhecer que nada se apurou, entretanto, no sentido de confirmar ou reforçar o receio de que o Menor estivesse a ser vítima de agressões físicas por parte do Progenitor, conforme sugerido pelo teor da informação hospitalar datada de 23-05-2023.
Tendo o Tribunal a quo entendido, e nisto concordamos com a apreciação feita, que a situação de perigo subsistia, impondo-se a aplicação da aludida medida, parece-nos, contudo, não ter sido devidamente ponderada a necessidade de a ajustar de modo a responder a algumas circunstâncias observadas aquando da reavaliação da situação vivencial (familiar, social, económica, escolar e de saúde) da criança feita no Relatório social de 05-01-2024.
Efetivamente, além de aí se dar conta da exposição ao conflito e desavença parental, facto que se reputamos estar já suficientemente demonstrado e constituir, conforme acima referido, um fator de perigo para o adequado desenvolvimento do Menor, também se alerta para a circunstância de ainda não se ter verificado um efeito positivo na alteração do contexto familiar com vista a reverter o padrão relacional mantido até ao momento, mostrando-se necessária uma intervenção próxima junto de ambos Progenitores “que os ajude a alterar alguns comportamentos e a relacionar-se, enquanto casal parental, de forma positiva”.
Ademais, segundo informação prestada pela Associação Passo a Passo (conforme mencionado no referido relatório), os convívios do Menor com o Pai não estão a ter lugar, tendo a intervenção sido “condicionada pela recusa do C … em integrar o espaço disponibilizado para o efeito”, não parecendo  que estejam “reunidas as condições para a reposição de tais convívios nos mesmos moldes até então (i.e., assegurados pela mãe) pelo que se propõe que a mãe identifique outro familiar ou pessoa idónea que possa garantir a  presença do C … na referida Associação. Sendo que, na inexistência, dever-se-á ponderar a possibilidade de os convívios serem assegurados pelas autoridades competentes (PSP).”
A Progenitora, apesar de criticar esta análise, identificou para o efeito os avós maternos do C …, o que nos parece ser adequado, devendo ainda, na eventual impossibilidade destes, tal presença ser assegurada por outra pessoa idónea, a indicar pela mãe, ou até, caso isso seja necessário, por técnico da referida Associação ou funcionário público competente (incluindo da autoridade policial). Urge que sejam retomados os convívios entre pai e filho, sob pena de poder ficar comprometida a solidez do seu relacionamento afetivo, parecendo-nos que, numa primeira fase, será benéfico que sejam supervisionados, pelo seu carácter securizante.
Logo, tendo em atenção o superior interesse do Menor, considera-se acertada a aplicação da medida de promoção e proteção de apoio junto dos pais, pelo prazo de 6 meses (com início a 01-03-2024), cuja revisão deverá ter lugar no prazo legal de 3 meses, com integração no agregado familiar da Mãe, e convívios com o Pai supervisionados pela Associação a Passo a Passo, bem como a sujeição aos deveres fixados na decisão recorrida, devendo a presença do C … no(s) espaço(s) onde tais convívios decorram passar a ser assegurada por intermédio dos avós maternos – G … e H … (individual ou conjuntamente) - ou, não sendo isso possível, por outra pessoa idónea a indicar pela mãe, e, se necessário, pelos funcionários competentes, incluindo os agentes da autoridade policial.
De referir ainda, para que dúvidas não restem, que, findo esse prazo, se impõe proceder ao o encerramento da fase de instrução, nos termos do art.º 110.º da LPCJP, com a prolação de uma das decisões aí previstas.

Pelo seu decaimento parcial, os Progenitores-Apelantes são responsáveis pelo pagamento das custas processuais dos respetivos recursos, na proporção de metade, atenta a isenção legal do Ministério Público (artigos 527.º e 529.º, ambos do CPC).

***

III - DECISÃO

Pelo exposto, decide-se conceder parcial provimento aos recursos interpostos pelos Progenitores:
- revogando-se parcialmente a Decisão recorrida, na parte em que o Tribunal a quo determinou que a medida de apoio aplicada tinha início a 15-09-2023 e procedeu à sua revisão;
- mantendo-se a Decisão recorrida no que concerne à aplicação em benefício do Menor C …, a título cautelar e provisório, da medida de apoio junto dos pais, pelo prazo de 6 meses (com início a 01-03-2024), a ser revista no prazo de 3 meses, nos demais termos e condições fixados na decisão recorrida,
a que acresce, quanto à efetivação dos convívios do Menor com o Pai, a obrigação por parte da Mãe de assegurar a presença do Menor por intermédio dos avós maternos, G … e H … (individual ou conjuntamente), ou por outra pessoa idónea a indicar por aquela, devendo, se necessário, as transições serem asseguradas pelos funcionários competentes, incluindo os agentes da autoridade policial.
Dias
Mais se decide condenar os Progenitores-Apelantes no pagamento das custas dos recursos que cada um deles interpôs, na proporção de metade.

D.N.

Lisboa, 20-06-2024
Laurinda Gemas
António Moreira
Arlindo Crua