PROVA PERICIAL
SEGUNDA PERÍCIA
FUNDAMENTOS
Sumário


I. É de indeferir o pedido de realização de segunda perícia, quando os requerentes da mesma não invocam fundamentos sérios que sustentem qualquer inexactidão do relatório pericial, que pudesse justificar a realização de uma segunda perícia, nem explicitam em que medida o por si invocado seria apto a obter um resultado pericial diferente, ou ainda qual a sua influência no resultado final.

Texto Integral


Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães

I. Relatório.

Na presente acção declarativa com processo comum que AA, viúvo, residente na Rua ..., ..., ..., intentou contra BB e mulher CC, casados, residentes na Rua ..., Quinta ..., ..., herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de DD, neste acto representada pelos respectivos herdeiros, que na presenta acção intervêm por si e na qualidade de herdeiros; EE, que neste acto intervém por si próprio e na qualidade de herdeiro e cabeça de casal da supra referida herança, viúvo, residente na Praça ..., ...; EE, que neste acto intervém na qualidade de herdeiro, casado, residente na Avenida ..., ... ..., ...; FF, que neste acto intervém na qualidade de herdeiro, solteiro, maior de idade, residente em .... 1, ..., ..., ...03, ...; DD, que neste acto intervém na qualidade de herdeiro, solteira, maior de idade, residente na Rua ... esquerdo, ...; e GG, que neste acto intervém na qualidade de herdeiro, solteira, maior, residente em ..., ..., ..., foi proferido o seguinte despacho:
“Ref.ª ...06 de 12.07.2023:
Vieram os Réus BB e CC requerer a realização de uma segunda perícia, ao que o Autor se opôs.
O pedido dos Réus funda-se no facto de os Srs. Peritos do Tribunal e do Autor, por um lado, terem sido coniventes na posição que tomaram, apresentando conclusões idênticas, e, por outro lado, terem dado respostas inconclusivas em relação a alguns quesitos e terem-nas omitido em relação a outros.
O n.º 3 do artigo 487.º do C.P.C. estabelece que “[a] segunda perícia tem por objeto a averiguação dos mesmos factos sobre que incidiu a primeira e destina-se a corrigir a eventual inexatidão dos resultados desta”.
A discordância dos Réus relativamente ao relatório pericial apresentado pelos Srs. Peritos do Tribunal e do Autor assenta em argumentos que não procedem.
É absolutamente normal que numa perícia colegial haja posições diferentes entre os peritos, não sendo obrigatória a unanimidade total nem parcial.
A metodologia seguida pelos Srs. Peritos do Tribunal e do Autor na elaboração do seu relatório, sob o ponto de vista da forma e da substância, insere-se no campo da sua autonomia técnica, sendo inócuo que tenham respondido primeiro aos quesitos de uma parte em vez de outra e normal que haja decalque nas respostas dada a evidente convergência de posições daqueles.
A conivência imputada pelos Réus é grave se tiver o sentido pejorativo que parece ter, porque atingem a idoneidade e seriedade dos Srs. Peritos. E tem de ser demonstrada para daí serem retiradas consequências, o que não é o caso.
Não fundamentam minimamente a realização de uma segunda perícia as razões aduzidas pelos Réus, de conluio ou discordância com a posição dos Srs. Peritos do Tribunal e do Autor, pois que nada é apontado às respostas e conclusões do Sr. Perito dos Réus, membro do colégio, que serão valoradas pelo Tribunal da mesma forma.
Não há inexactidão de resultados da perícia, pois que os Peritos manifestaram as suas posições, dando as respostas e apresentando as conclusões da forma que entenderam, uns de forma mais parcimoniosa e lacónica, outro de modo mais fundamentado e incisivo, mas respondendo todos no essencial ao objecto da perícia.
A apontada contradição das respostas daqueles com as respostas dadas pelo Sr. Perito dos Réus decorre da referida discordância.
Quanto a insuficiências e/ou obscuridades que encontrem, além de as mesmas estarem, pelos vistos, sanadas pelas respostas do seu Perito, poderão os Réus confrontar os Srs. Peritos do Tribunal e do Autor em sede de audiência de julgamento, solicitando os esclarecimentos que entenderem, já que os mesmos foram convocados para comparecer.
A realização de uma segunda perícia justifica-se por inexactidões de resultados. Não é o caso, porquanto estamos perante uma perícia colegial em que há duas posições divergentes, não sendo obviamente uma situação de vencimento da maioria, disso poderão os Réus ter a certeza.
O Tribunal, sendo o Perito dos peritos, não deixará de avaliar, na forma e no conteúdo, as conclusões vertidas no relatório pericial por uns e por outros, em conjugação com os esclarecimentos que vierem a ser prestados em audiência de julgamento e, naturalmente, com a demais prova.
Agora, não se encontram razões que justificam a realização de uma segunda perícia, tendo até em conta o objecto fixado, e o n.º 2 do artigo 487.º do C.P.C. prevê que o Tribunal só ordena a realização de segunda perícia “desde que a julgue necessária ao apuramento da verdade”, o que não é o caso.
Pelo exposto, indefiro à realização de uma segunda perícia requerida pelos Réus BB e CC.”.

*
Inconformados com esta decisão, dela interpuseram recurso os réus BB e CC, que a terminar as respectivas alegações, formularam as seguintes conclusões (que se transcrevem):
“CONCLUSÕES
***
I - O presente recurso vem interposto da decisão da MMª juíza “a quo” por não ter admitido a realização de segunda perícia requerida pelos réus BB e CC.
II Fundamenta a MMª Juíza “a quo” que o relatório, objeto da perícia colegial realizada, não apresenta inexatidão e que, passamos a citar, “respondendo todos no essencial ao objeto da perícia”
III -Com o devido respeito, não podemos concordar com essa conclusão da MMª Juíza “a quo”, ou senão vejamos,
IV - No pedido de segunda perícia por parte do Réus, junto aos autos a fls... e com Ref. ...06 de 12/07/2023, vêm aí descritos todos os pontos que apresentam, ao nosso ver, falhas graves nas respostas dadas ou a ausências delas.
V - Relembramos que todos os peritos estiveram no local (mais que uma vez), que todos tiveram acesso a toda à documentação juntas aos autos, devendo a mesma ser analisada de forma a poder-se pronunciar sobre todos os quesitos formulados;
VI - Quesitos que só podiam ser respondidos com os conhecimentos técnicos dos peritos nomeados, razão pela qual foi solicitada a perícia colegial.
VII - Esperando-se, por parte dos mesmos, umas respostas fundamentadas, precisas e com referência ao suporte no qual as respostas dadas se possam justificar, apesar de poderem existir posições diferentes sobre as mesmas.
1. Citaremos o Ac. do Tribunal da Relação de Guimarães, Proc. nº 2258/14.9T8BRG-G1, de 14/04/2016, in www.dgsi.pt:
“I) - Para requerer a realização de segunda perícia, nos termos do artº. 487º do NCPC, o requerente, em primeiro lugar, deve especificar os pontos sobre que discorda do relatório da primeira perícia, por forma a delimitar o objecto da segunda; em seguida, deve indicar os motivos pelos quais discorda.
II) - Atento o actual quadro legal – designadamente o disposto no artº. 487º do NCPC – constitui condição de deferimento do pedido de realização de segunda perícia a alegação fundamentada das razões de discordância relativamente aos resultados da primeira perícia, sendo tal alegação especificada o único requisito legal do requerimento em causa a formular, nos termos da supra citada disposição legal.
III) - Saber se os fundamentos e razões invocados pelo requerente da segunda perícia têm razão de ser, é assunto que só depois da realização da nova perícia se pode colocar.
VIII -Ora, da análise feita às respostas apresentadas pelos peritos do Tribunal e do Autor, esse rigor, precisão e estudo técnico são lacónicas, incompletas, inexistentes e com poucos ou nenhum elemento de prova que as suporte,
IX-Sendo certo que essas falhas graves e atendendo às questões técnicas complexas levantadas, que exigem conhecimentos específicos sobre cada quesito, leva a que um simples esclarecimento dado às respostas ou conclusões que poderão advir no dia do julgamento, não será suficiente para uma boa decisão da causa;
X-Citaremos o Ac. do Tribunal da Relação de Guimarães, Proc. nº 559/14.5TJVNF.G1, de 12/07/2016, in www.dgsi.pt: 3-“Tal alegação consiste na invocação, clara e explícita, de sérias razões de discordância da parte, não porque o resultado alcançado contraria ou não satisfaz os seus interesses, mas por, nele e no relatório em que assenta, existir inexactidão (insuficiência, incoerência e incorrecção) dos respectivos termos, maxime quanto à forma como operaram os conhecimentos especiais requeridos sobre os factos inspeccionados e ilações daí extraídas, de modo a convencer que, podendo haver lugar à sua correcção técnica, esta implicará resultado susceptível de diversa e útil valoração para a boa decisão da causa.” (...)
6 – “No caso em apreço, embora a conclusão do relatório pericial aparente ser objectiva e implicitamente afastar qualquer outra hipótese explicativa de qualquer das causas de certo defeito alegadas pelas partes, é na consideração, explicação ou justificação cabal e clara das razões por que rejeita estas que também poderá radicar a confiança, credibilidade, capacidade de convencer e exactidão do relatório e até o próprio tribunal encontrar pontos de referência que ajudem à formação de mais sólida convicção (livre) em ordem ao apuramento da verdade, pois sem as despistar e refugiando-se na secura da resposta dada, deixa-se em aberto um espaço de dúvida, sempre de evitar e esclarecer até onde seja possível, nesta tarefa se devendo dar prevalência aos objectivos contraditórios da ré.”
XI - Nem o Tribunal, com todo o devido respeito, terá os conhecimentos técnicos e específicos necessários para as questões levantadas e que fazem objeto de análise esperado pelas partes.
XII - Neste sentido, citaremos o Ac. do Tribunal da Relação do Porto, Proc. nº 1357/12.6TBMAI – A P1, de 10/06/2013, in www.dgsi.pt:
I - Nos termos do art.º 587º, do CPC, a segunda perícia só terá lugar se o requerente alegar fundadamente as razões da sua discordância relativamente ao relatório pericial apresentado.
II - A parte deverá indicar os pontos de discordância (as inexactidões a corrigir, na terminologia do art.º 589º, n.º 3, in fine, do CPC) e justificar a possibilidade de uma distinta apreciação técnica.
III - Não cabe ao Tribunal aprofundar o bem (ou mal) fundado da argumentação apresentada, embora já possa indeferir o requerimento com fundamento no carácter impertinente ou dilatório da segunda perícia. sublinhado nosso
IV – (...) a segunda perícia é o meio de reacção contra inexactidão do resultado da primeira e procura que outros peritos confirmem essa inexactidão e a corrijam (art.º 589º, n.º 3, do CPC). sublinhado nosso
Com referências aos antigos códigos do CPC em vigor na data do Acordão
***
XIII -Como se pode verificar no relatório pericial junto aos autos a fls..., para além da forma como foi elaborado (na fase preambular com as comunicações feitas entre peritos e estrutura das respostas aos quesitos) que iremos adiante referir, importa salientar os seguintes pontos:
XIV -Das respostas dadas pelos peritos do Tribunal e do Autor, existem afirmações dadas SEM QUALQUER PRECISÃO OU SUPORTE DOCUMENTAL/TÉCNICO que se exige, FALTA DE RESPOSTA, CONTRADIÇÕES NAS PRÓPRIAS RESPOSTAS, DESCONHECIMENTO (tendo eles estado no local e tido acesso a toda a documentação junta aos autos).
XV - Nos termos do disposto no artigo 487 do CPC, qualquer das partes pode requerer se proceda a segunda perícia, alegando fundadamente as razões da sua discordância relativamente ao relatório apresentado.
XVI - Para que seja deferida uma segunda perícia, a parte tem de alegar, fundadamente as razões da sua discordância quanto ao relatório pericial
XVII – O que os recorrentes fizeram, alegando pormenorizada e exaustivamente as razões da discordância quanto ao relatório pericial cuja segunda perícia se requereu, como consta dos pontos 15 e seguintes destas Alegações, os quais, por razões de economia processual e a fim de se evitarem desnecessárias e fastidiosas repetições, aqui se dão por integralmente reproduzidas.
XVIII - Conforme Ac. do TRP de 11/10/2013 , proc. 1357/12.6TBMAI-A.P1, :
“ I- Nos termos do artigo 587º do CPC, a segunda perícia só terá lugar se o requerente alegar fundadamente as razões da sua discordância relativamente ao relatório pericial apresentado II - A parte deverá indicar os pontos de discordância ( as inexatidões a corrigir , na terminologia do artigo 589-3 do CPC) , e justificar a possibilidade de uma distinta apreciação técnica. III – Não cabe ao Tribunal aprofundar o bem ( ou mal) fundado da argumentação apresentada, embora já possa indeferir o requerimento com fundamento no carácter impertinente ou dilatório da segunda perícia
( o que, diremos, não sucedeu no douto despacho ora em recurso)
II “…” a segunda perícia é o meio de reacção contra inexatidão do resultado da primeira e procura que outros peritos confirmem essa inexatidão e a corrijam ( artigo 589º-3 do CPC
XIX – Cfr, também , Ac. TRC de 26/02/2019, processo 789/11.8TBCVL-A.C1 ( www.gde.mj.pt/jtrc)
(“…”) 10 – Para requerer a realização da segunda perícia, nos termos do artigo 487 do NCPC, o requerente, em primeiro lugar, deve especificar os pontos sobre que discorda da primeira perícia, por forma a delimitar o objecto da segunda; em seguida deve indicar os motivos pelos quais discorda ( o que, diga-se, os recorrentes fizeram no seu requerimento de segunda perícia)
11 – Atento o actual quadro legal, designadamente o disposto no artigo 487º do NCPC, constitui condição do deferimento do pedido de realização de segunda perícia a alegação fundamentada das razões de discordância relativamente aos resultados da primeira perícia, sendo tal razão especificada o único requisito legal do requerimento em causa a formular, nos termos da supracitada disposição legal.
XX – Em face de tudo o exposto, verificam-se os pressuposto previstos no artigo 487º do CPC para realização de uma segunda perícia sobre o objeto factual dos presentes autos, tal como requerido no requerimento dos ora recorrentes, dando-se aqui por reproduzidos, por razões de economia processual, como se disse, todos os pontos de discordância relativamente à perícia efetuada e que se alegam discriminadamente no corpo destas alegações.
XXI - Ao indeferir a requerida segunda perícia, através do douto despacho ora em recurso, o Tribunal, e com todo o respeito, violou e/ou fez errada interpretação do disposto no artigo 487º do CPC, já que o deveria ter interpretado no sentido de admitir a requerida segunda perícia.
Nestes termos e nos melhores de Direito que V. exas., doutamente suprirão, deve conceder-se provimento ao presente recurso, julgando-o procedente e, em consequência, deve ser revogado o despacho recorrido, substituindo-o por outra decisão que admita a realização de segunda perícia,
POIS SÓ ASSIM SE REALIZA JUSTIÇA E SE FAZ CUMPRIR A LEI.”.
*
O autor contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso e terminando com as seguintes conclusões (que igualmente se transcrevem):

IV – CONCLUSÕES:
1.º Vieram os Réus, Recorrentes, recorrer do despacho de indeferiu o pedido de realização de uma segunda perícia por si formulado, alegando que o Tribunal a quo, «violou e/ou fez errada interpretação do disposto no artigo 487.º do Código de Processo civil, já que o deveria ter interpretado no sentido de admitir a requerida segunda perícia».
2.º Como fundamento de tal erro de julgamento, sustentam os Recorrentes que as respostas dos Senhores Peritos nomeados pelo Tribunal e pelo recorrido, «são lacónicas, incompletas, inexistentes e com poucos ou nenhum elemento de prova que as suporte» (negrito e sublinhado nossos).
3.º E que os esclarecimentos a prestar em sede de julgamento não será suficiente para a boa decisão da causa.
4.º Sucede que, os fundamentos de facto mas, sobretudo, os fundamentos de direito trazidos pelos Recorrentes nesta sede de recurso não são precisamente os mesmos que suportaram o seu requerimento de pedido de realização de segunda perícia.
5.º No seu pedido, os Recorrentes alegaram sucessiva e reiteradamente, tão-só, que o relatório apresentava «deficiência, obscuridade e contradições» e, no final do seu articulado, reconhecem que as respostas dadas pelos Senhores Peritos podem ser alvo de esclarecimentos na audiência de discussão e julgamento, tanto mais que requerem que, mesmo que a segunda perícia seja deferida, os mesmos possam estar presentes na audiência de discussão e julgamento, para prestar esclarecimentos.
6.º Admitindo assim que os esclarecimentos poderão ser prestados e serão úteis para a boa decisão da causa, não havendo nenhuma «impossibilidade em razão dos conhecimentos técnicos necessários» como agora, inovadoramente vêm alegar.
7.º Assim, ao alegar como alegam nesta sede, os Recorrentes desvirtuam o objeto do pedido apreciado pelo Tribunal e tentam «emendar a mão» relativamente à formulação do seu pedido junto do Tribunal a quo.
8.º Os Recorrentes apenas alegam tal impossibilidade neste momento para dar resposta àquela que é a Jurisprudência que citam.
9.º Nunca haverá impossibilidade de prestar esclarecimentos na medida em que o domínio técnico é o mesmo e, segundo os próprios Recorrentes, todas as questões são respondidas de forma adequada e fundamentada pelo Perito por si nomeado, ao qual não apontam qualquer falha ou falta.
10.º E é precisamente isto que conclui o Tribunal a quo, sem mácula que se lhe aponte.
11.º Por outro lado, note-se que – fundados em factos coincidentes (e não exatamente nos mesmos) – os Recorrentes, em primeira instância, imputaram ao relatório, ou obscuridades, contradições e deficiências, vícios que justificam apenas a reclamação contra o relatório e nunca o pedido de segunda perícia.
12.º Note-se que, como bem entendeu o TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA de 03/08/2017 proferido no âmbito do processo n.º 468/15.0T8PDL-B.L1-6, disponível em www.dgsi.pt:
«Realizada uma perícia e apresentado o respectivo relatório médico-legal, as partes, em caso de discordância com o seu teor, têm duas possibilidades de reacção: - a reclamação prevista no artº 485 do C.P.C., se entenderem que há qualquer deficiência, obscuridade ou contradição no relatório pericial, ou que as conclusões não se mostram devidamente fundamentadas; - a solicitação de realização de 2ª perícia, nos termos do artº 487 do C.P.C., alegando fundadamente as razões da sua discordância relativamente ao relatório pericial apresentado. II. A reclamação prevista no artº 485 do C.P.C. e a segunda perícia prevista no artº 487 do C.P.C., têm objectivos diversos, visando a primeira que o(s) perito(s) que a elaborou(raram) a corrijam ou completem e a segunda que outros peritos corrijam a eventual inexactidão de que enferma o relatório pericial.»
(negrito e sublinhado nosso).
13.º Até o próprio Acórdão do Tribunal da Relação do Porto citado pelos Recorrentes (proferido no âmbito do processo n.º 1357/12.6TBMAI-A.P1 de 10/06/2023) explica precisamente isso, na parte do sumário que os Recorrentes propositadamente omitiram na citação transposta para o recurso.
14.º Na verdade, o ponto IV do citado acórdão diz o seguinte: «A reclamação contra o relatório e o requerimento de segunda perícia têm objectivos diversos. A reclamação é o meio de reacção contra qualquer deficiência, obscuridade ou contradição detectadas no relatório e visa levar o(s) perito(s) que o elaborou(raram) a completá-lo, esclarecê-lo ou dar-lhe coerência (art.º 587º, do CPC); a segunda perícia é o meio de reacção contra inexactidão do resultado da primeira e procura que outros peritos confirmem essa inexactidão e a corrijam (art.º 589º, n.º 3, do CPC).»
15.º Sem prescindir do supra alegado, a verdade é que o pedido apreciado pelo Tribunal a quo não suporta nem fundamenta a realização de uma segunda perícia que se destina unicamente a corrigir inexatidão do resultado da primeira, o que não acontece neste caso, nem tal foi alegado pelos Recorrentes.
16.º Como bem sintetiza o Tribunal da Relação do Porto proferido a 27/01/2020 no âmbito do processo n.º 5818/17.2T8VNG-A.P1 disponível em www.dgsi.pt, com a consagração da possibilidade de realização de segunda perícia, visou o legislador tão só possibilitar a dissipação de concretas dúvidas sérias que possam decorrer da primeira perícia, relativas a específicas questões suscetíveis de levar a um resultado distinto daquele que foi alcançado na primeira perícia, para que possam não pairar na perceção de factos relevantes para a decisão de mérito.
17.º Dúvidas estas que não foram alegadas pelos Recorrentes nem no requerimento que apresentaram ao Tribunal de 1.ª instância e que foi indeferido, nem neste Recurso onde tentam «emendar a mão» e compor a evidente falta de fundamento e erro jurídico do seu pedido.
18.º (…) não sendo lícito realizar no processo atos inúteis (art. 130º, do CPC), impõe-se que sejam densificadas, com fundamentos sérios, as razões da discordância relativamente ao relatório pericial apresentado, ficando a admissibilidade da segunda perícia dependente dessa fundada alegação, em requerimento tempestivamente apresentado (nº1, do art. 487º, do CPC), sem que o requerente tenha, contudo, de provar essas razões, pois que tal resultado apenas seria a alcançar com a realização da diligência requerida.
19.º Concluindo, e muito bem, que é impertinente ou dilatória a perícia que não respeita a factos condicionantes da decisão final ou que, embora a eles respeitando, o respetivo apuramento não dependa de prova pericial, por não estarem em causa os conhecimentos especiais (cfr. art. 388º, do Código Civil) que aquela pressupõe, sendo que o que se pretende do perito é que realize uma observação técnica - objetiva -, do objeto da perícia e relate, no relatório final apresentado, o resultado dessa observação, não podendo integrar o seu objeto qualificações, questões jurídicas, opiniões e avaliações subjetivas, suscetíveis de influenciar a livre convicção do julgador. (…)»
20.º E menos ainda foi alegado que a dissipação de tais dúvidas possa levar a um resultado diferente.
21.º Pelo que é inelutável a inadmissibilidade da realização de uma segunda perícia neste caso.
22.º Note-se que os vícios apontados pelos Recorrentes às respostas dadas pelos Senhores Peritos nomeados pelo Recorrido e pelo tribunal, não passam de meras considerações metodológicas sem qualquer expressão substantiva.
23.º Além de os acusar de não as fazer reportar a concretos documentos, ou de apenas responder sinteticamente um «sim ou não», sendo que a este propósito bem andou o Tribunal a quo quando esclareceu que: «A metodologia seguida pelos Srs. Peritos do Tribunal e do Autor na elaboração do seu relatório, sob o ponto de vista da forma e da substância, insere-se no campo da sua autonomia técnica, sendo inócuo que tenham respondido primeiro aos quesitos de uma parte em vez de outra e normal que haja decalque nas respostas dada a evidente convergência de posições daqueles.» (negrito e sublinhado nossos).
24.º Ou seja, o que se pretende do perito é que realize uma observação técnica - objetiva -, do objeto da perícia e relate, no relatório final apresentado, o resultado dessa observação, não podendo integrar o seu objeto qualificações, questões jurídicas, opiniões e avaliações subjetivas, suscetíveis de influenciar a livre convicção do julgador.» (Cfr. Acórdão citado em 10).
25.º É ao Tribunal que cabe concluir sobre a validade e credibilidade das provas, valorando-as livremente, tal como ao resultado da perícia, e não aos Senhores Peritos que a isso não foram chamados a fazer.
26.º Os Recorrentes chegam ao ridículo de dizer que os Senhores Peritos deram determinada resposta (alínea b) do ponto 14 das alegações de recurso) mas: «tinham de ressalvar o facto de não ser usado (…)», ou que concluem que o terreno é de sequeiro «porque não consideraram a existência de vegetação».
27.º Ora, nem os Recorrentes nem o tribunal podem impor determinada resposta, mas sim, entenderem conveniente, podem perguntar aos Senhores Peritos em sede de esclarecimentos se consideraram, na sua resposta, a existência da referida vegetação, e aguardar a resposta.
28.º Os Recorrentes também se insurgem contra o facto de os Senhores Peritos «desconhecerem» certas matérias, sendo exemplo disso mesmo o transcrito na alínea i) do ponto 15 das alegações.
29.º Mas ao ler-se o quesito claramente se percebe que não pode haver outra resposta na medida em que os mesmos se reportam às seguintes questões:
«Desde sempre, desde tempos imemoriais que (…)»
«Desde há algum tempo, mais concretamente aquando da plantação (…)».
(negrito e sublinhado nossos).
30.º Ora, os peritos não conhecem, nem têm de conhecer, os terrenos em referência nos autos desde tempos imemoriais, sendo que para prova de tais factos existirá outro meio de prova a ser produzida e valorada.
31.º Ou seja, os Peritos responderam da forma que consideraram mais adequada tendo em consideração os quesitos apresentados e sem obrigação de facere em sentido diverso, sendo precisamente isto que o Tribunal a quo entendeu:
«Não há inexactidão de resultados da perícia, pois que os Peritos manifestaram as suas posições, dando as respostas e apresentando as conclusões da forma que entenderam, uns de forma mais parcimoniosa e lacónica, outro de modo mais fundamentado e incisivo, mas respondendo todos no essencial ao objecto da perícia.»
32.º Também não existe qualquer contradição no âmbito do relatório e em tudo quanto alegaram os Recorrentes, na medida e que, como bem andou o Tribunal a quo na decisão recorrida:
«A apontada contradição das respostas daqueles com as respostas dadas pelo Sr. Perito dos Réus decorre da referida discordância.», prosseguindo para concluir que «É absolutamente normal que numa perícia colegial haja posições diferentes entre os peritos, não sendo obrigatória a unanimidade total nem parcial.»
33.º Sendo que a coincidência de respostas também não significa nem pode significar qualquer conluio ou conivência, na medida em que é o resultado normal deste meio de prova.
34.º Os próprios recorrentes acabam por admitir, no ponto 17 das suas alegações, que as acusações de conivência nas quais fundaram e alicerçaram o seu pedido de realização de segunda perícia, não passam de «indícios».
35.º Pelo que, daqui resulta que o pedido formulado além de legalmente inadmissível, não tem qualquer fundamento de facto, sendo mais um dos expedientes meramente dilatórios dos recorrentes para protelar uma ação judicial que conta já com 8 (oito) anos e sem chegar, se quer, a realizar-se audiência de julgamento!

ATENTO O SUPRA EXPOSTO, E NOS MAIS QUE VENHA A SER SUPRIDO POR V. EXAS, DEVE SER NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO, E EM CONSEQUÊNCIA DEVE SER MANTIDA A DOUTA SENTENÇA RECORRIDA ASSIM SE FAZENDO, JUSTIÇA!”.
*
O recurso foi admitido como de apelação, a subir imediatamente, em separado, e com efeito meramente devolutivo.
*
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
*
II. Questões a decidir.

Sendo o âmbito dos recursos delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente – artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil (doravante, abreviadamente, designado por CPC) –, ressalvadas as questões do conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado, a única questão que se coloca à apreciação deste Tribunal, consiste em saber se é de admitir a realização da requerida segunda perícia.
*
III. Fundamentação de facto.

Os factos relevantes para a decisão a proferir são os que constam do relatório supra.

Da tramitação electrónica dos autos, há ainda a considerar o seguinte:

O requerimento apresentado pelos réus/apelantes para realização da segunda perícia, tem o seguinte teor:
“BB e CC, réus, melhores identificados nos presentes autos, notificados do relatório pericial vêm, nos termos e ao abrigo do art.º 487, nº 1 do CPC requerer segunda perícia, nos termos e com os seguintes fundamentos:
1. Nos presentes autos foi requerido a perícia colegial, indicando os quesitos sobre os quais os peritos nomeados se deveriam pronunciar.
2. Acontece que, e após analise dos relatórios periciais juntos aos autos, existem sérios indícios que o relatório apresentado pelo perito nomeado pelo Tribunal, Eng. HH e pelo perito nomeado pelo autor, Eng. II, apresenta deficiência, obscuridade e contradições.
3. Mas antes de mais considerações, alerta-se pelo facto que as respostas aos quesitos dos peritos nomeados pelo Tribunal e pelo Autor coincidem no seu todo,
4. Formulando as mesmas respostas, usando os mesmos meios de suporte (embora parcos), como se pode verificar no referido relatório.
5. Deixando entender que houve, por parte dos mesmos, uma conivência ou entendimento prévio total nas respostas a apresentar ou no limite um único a responder e outro somente a subscrever.
6 Estranha-se também a forma de desenvolvimento do referido relatório, dado que o mesmo inicia por apresentar respostas aos quesitos do autor e posteriormente, apenas na página 14 apresenta as respostas aos quesitos apresentados pelos réus,
7 Quando, é sabido, a peritagem foi solicitada pelos réus, devendo estes ser os primeiros quesitos a avaliar, da peritagem requerida.
8 Refere-se ainda que aquando da apresentação das respostas aos quesitos do autor, as que são subscritas pelo perito nomeado pelo tribunal, Eng. HH e pelo perito nomeado pelo autor, Eng. II, vêm em primeiro lugar e separadas daquelas que o perito nomeado pelos réus, Eng. JJ, apenas apresentadas 14 páginas depois, como se disse.
9 Porém, na apresentação das respostas aos quesitos apresentados pelos réus, as mesmas vêm intercaladas entre aquelas que são apresentadas pelos peritos Eng. HH e II com as que são apresentadas pelo perito Eng. JJ.
Ou seja, a respetiva estrutura assenta:
a) descrição do quesito a analisar
b) respostas apresentadas pelos peritos Eng. HH e Eng. II
c) Respostas dadas pelo perito Eng. JJ
assim permitindo a imediata e simultânea apreciação pelo tribunal de ambas as respostas ao mesmo quesito (a dada pelos peritos Eng HH e Eng. II e a dada pelo Eng. JJ)
Enquanto que, e como também já se disse, nas respostas aos quesitos do autor não é seguida esta metodologia e assim não permitindo ao Tribunal a simultânea apreensão e compreensão de ambas as respostas a cada quesito e respectiva fundamenação, nomeadamente com referencia aos documentos em que os peritos se basearam e apresentam como suporte das respetivas respostas.
10 Da diferente estrutura apresentada ao longo do relatório que o perito nomeado pelo tribunal terá compilado e da constatação referida nos pontos anteriores, subsiste a dúvida se foram realmente realizados três relatórios distintos, em simultâneo e compilados à posteriori num só (conforme terá sido estabelecido entre peritos),
11 Ou se somente foi desenvolvido o relatório subscrito pelo perito nomeado pelo tribunal, Eng. HH e pelo perito nomeado pelo autor, Eng. II, na sequência do relatório apresentado pelo perito nomeado pelos réus, (e solicitado em formato editável - word - pelo perito nomeado pelo tribunal, Eng. HH, conforme se verifica na troca de mensagens eletrónicas a que se teve acesso) onde, em jeito de resposta e com objetivo único de aparente contradição se lançaram as “respostas” dos restantes peritos.
12 Verifica-se do relatório subscrito pelo perito nomeado pelo tribunal, Eng. HH e pelo perito nomeado pelo autor, Eng. II a apresentação tendencial de respostas lacónicas, incompletas e com poucos ou nenhuns elementos de prova que as suporte.
Pelo contrario, verifica-se do relatório apresentado pelo perito nomeado pelos réus um cuidado na resposta apresentada a cada quesito, com explicação e fundamentação detalhada e factual do seu entendimento sobre cada questão, demonstrando o cuidado na consulta da generalidade das peças existentes nos autos e disponibilizadas pelo tribunal para desenvolvimento da peritagem, bem como na recolha de novos elementos de prova que suportam as respostas apresentadas.
14 Salienta-se e em síntese, que as respostas dadas aos quesitos neste relatório pelos Engs. HH e II são, na sua totalidade, absolutamente unânimes, não havendo quaisquer divergências nas respetivas respostas na forma, no conteúdo e nos documentos de suporte, tudo se passando e aparentando como se de um só relatório, redigido por uma única só pessoa, se tratasse.
Mais,
15 Como referido no requerimento junto aos presentes autos, em 3 de Julho de 2023, com referencia ...71, pelo perito nomeado pelos réus, Eng. JJ, o seu relatório foi enviado ao perito nomeado pelo Tribunal, Eng. HH, sendo que este, sem qualquer justificação ou autorização enviou, por sua vez, ao perito nomeado pelo autor, Eng. II,
16 não tendo o perito Eng. JJ, tido acesso previamente ao relatório do perito nomeado pelo autor, nem alguma vez lhe foi dado acesso, apesar do mesmo ter sido solicitado por escrito (conforme se comprova dos documentos anexos 1 e 2, referenciados no requerimento do Eng. JJ acima referido)
Dito isto,
17 Da análise feita ao relatório pericial apresentado, faremos as seguintes considerações e reclamações:
18 Das respostas dadas aos quesitos pelos peritos nomeado pelo Tribunal e nomeado pelo autor, existem, larga maioria de respostas que apresentam deficiências, obscuridade e contradições:
19 Do relatório pericial, as respostas apresentadas aos quesitos pelos peritos Eng. HH e Eng. II (na sua generalidade vagas, lacónicas sem qualquer fundamentação, até não respostas, ou alegando desconhecimento apesar de terem em sua posse elementos constantes nos autos e outros verificáveis in situ nas duas deslocações que fizeram ao local) verificam-se na grande maioria total contradição com as respostas dadas pelo perito Eng. JJ, apesar de os três peritos terem tido acesso aso mesmos documentos existentes nos autos e pelos elementos físicos e factuais existentes no local, o que, no entender dos réus é suscetível de gerar duvidas sérias e relevantes na apreciação que o tribunal fará do mesmo relatório.
20 No ponto 2.1 - quesito 3) a), os peritos fundamentam as suas respostas dando a entender que os mesmos tenham procedido à medição dos terrenos artigos matriciais ...31 e ...33 recorrendo ao Google Earth, tendo obtido e passo a citar “um valor muito próximo do referido levantamento” sem indicar, como lhes competia, o valor apurado;
21 Procurando justificar a medição apresentada nos autos, realizada por um aparelho topográfico (cujas características e precisão se desconhecem), com uma medição realizada, não se sabendo por quem, através de uma ferramenta aberta, on-line, sobre uma fotografia aérea desfocada, sem qualquer precisão, não se conseguindo identificar em que lugar “clicam” com o cursor, se pela face interior dos muros ou se pela face exterior…
22 Sem descriminarem entre os muros que são pertença dos prédios que procuram medir, daqueles muros que são pertença de outros prédios.
23 Sem se referirem se a medição é efetuada no plano horizontal ou se no plano vertical e da variação que possa daí advir nas medições a realizar,
24 Todas estas imprecisões são suscetíveis de gerar duvidas quer quanto às respostas dadas quer quanto perceção que o tribunal venha a ter das mesmas.
25 No ponto 2,1 – quesito 3) e), os peritos nomeados pelo Tribunal e pelo autor, declaram perentoriamente que os terrenos 1031 e ...33 são terrenos de sequeiro por não ter observado qualquer tipo de rega, ou seja, chegam a esta conclusão sem mais considerações
26 quando, tinham que ressalvar o facto de não ser usado qualquer sistema de rega, apesar de existir aproveitamento de água nestes dois terrenos, como afirmam no ponto 3) f);
27 No ponto 2.1 – quesito 3) f) e g), os mesmos peritos não fazem referência à existência de vegetação à volta da charca, como se pode confirmar nas fotografias juntas aos autos – Anexo IX das fotografias juntas pelo perito dos réus;
28 No ponto 2.1 – quesito 3) h), os mesmos peritos não justificam nem fundamentam como chegaram à conclusão que se trata de “um solo muito pouco profundo com muita limitada camada arável e muitos elementos rochosos à superfície”. Pergunta-se: o que foi feito no local por estes dois peritos, para concluírem de tal forma: cavaram a terra? Se sim, então em que local? E quando? Dado que não existe qualquer evidência em nenhum dos relatórios que essa escavação possa ter sido efetuada.
29 No ponto 2.1 – quesito 4) a), os mesmos peritos não justificam de forma cabal que os terrenos ...95, ...73 e ...75 têm autonomia própria, não apresentando qualquer elemento, nem qualquer fundamentação factual concreta que justifique tal resposta.
30 Aponta-se ainda a falta de resposta e respetiva fundamentação factual por parte dos mesmos peritos nas respostas aos seguintes quesitos:
Ponto 2.1 – quesito 6 art.º 123º: não se pronunciam quanto à reconstrução das paredes exteriores envolventes, que notoriamente estavam caídas, conforme fotografias apensas ao processo.
Confirmam unicamente a aplicação de chapas de zinco sobre de madeira existente. Ora, se a madeira se encontra assente sobre as paredes exteriores e como se verifica nas fotografias, as paredes estavam caídas era impossível a existência da referida estrutura de madeira, desta forma revelando um erro demasiadamente grosseiro por ambos os peritos, que, até são Engenheiros Civis.
Ponto 2.1 art. 124º: concluem que não encontram vestígios de quaisquer trabalhos realizados no interior do prédio artigo matricial ...14, quando existem as fotografias juntas aos autos e às quais tiveram acesso (onde se vê o local antes e depois da intervenção dos réus), nas quais são notoriamente visíveis os vestígios que alegam “que não encontram” (sic).
Ponto 2.1 art. 125º: não esclarecem nem fundamentam onde e como se basearam para apresentar os cálculos constantes na resposta ao quesito, deixando entender que o raciocínio apresentado não passa de uma forma de contrariar os quesitos dos réus, procurando baralhar o entendimento de quem vai ler e apreciar o relatório.
Sendo os peritos Engenheiros Civis, poderiam e deveriam ter apresentado o raciocínio de custo das tarefas, dos materiais, dos equipamentos e da mão-de-obra, listando as tarefas necessárias para a plantação de uma vinha (desmatação, saibramento, despedrega, regularização de solo), para a instalação de uma rede de rega gota a gota que confirmam existir (tubagem, gotejadores, suportes), listando os materiais que a constituem (postes, arames, esticadores, videiras) obtendo preços unitários (facilmente recolhidos através de internet ou de casas comerciais da zona),indagando dos custos de licença de plantação de vinhas, dos custos dos serviços de engenheiros agrónomos que fazem esses projetos e somando tudo verificariam que o valor será sobejamente diferente daquele que procuram justificar e abaixo do valor que procuram contrariar…
31 Porem, nada disto fizeram, podendo e devendo te-lo feito por esta ser a forma mais objetiva de identificar os reais custos associados à instalação de uma vinha dotada das licenças e características que se observam pelas fotografias dos autos, documentos diversos de fornecedores bem como da verificação in loco aquando das visitas periciais. E dessa forma teriam dado uma resposta concreta e fundamentada à matéria do quesito.
32 No ponto 3. “Descrição dos quesitos propostos - Dr. KK”:
3.1.1 art.º 18º - na resposta dada pelos peritos do tribunal e do autor, os mesmos afirmam que o prédio ...33 confina com o prédio ...95 quando na resposta dada pelos mesmos, ao ponto 1. b), c), d) e e) referem “a existência de um muro em pedra solta, que faz a separação dos dois artigos ...33 e ...95”, entrando assim em contradição.
Suportam a sua resposta com base numa fotografia aérea actual, recolhida por drone operado pelo peritor nomeado pelo tribunal, fazendo "tábua-raza”, ignorando e desprezando todas as fotografias aéreas juntas aos autos e ás quais os peritos tiveram acesso, fotografias essas obtidas ao longo de décadas por entidades oficiais, facto que este que é bem salientado na resposta dada a esta questão pelo perito Eng. JJ.
art.º 19º - não respondem e remetem às respostas dadas no quesito 1. b), c) d) e e), nos quais não é referido o caminho pedonal a que se refere este quesito e que deveria ser respondido; nem se referem às referidas fotografias juntas aos autos, que tiveram oportunidade de analisar detalhadamente, tendo verificado que o perito dos réus se referiu a essas mesmas fotografias no relatório que desenvolveu e ao qual os peritos nomeados pelo tribunal e pelo autor tiveram acesso prévio e com tempo.
art.º(s) 23º, 24º e 25º - os mesmos peritos respondem a estes quesitos alegando desconhecer, apesar de terem elementos para responder ao mesmo quesito, uma vez que, como já se disse, tiveram acesso às já referidas fotografias aéreas de várias décadas, onde o caminho é bem visível, não se dignando sequer fazer referência à sua existência, devendo tê-lo feito, limitando-se a responder que desconhecem.
Recorde-se que no decurso do processo de peritagem foi solicitado a o tribunal pelos mesmos peritos a disponibilização dos originais das referidas fotografias aéreas acima identificadas.
Art.º 27º - limitam-se a dizer que remetem para a resposta dada aos quesitos do autor, não indicando quais concretamente?
art.º 32º e 33º – o mesmo se diga relativamente à matéria destes quesitos;
art.º 35º - não deixa de ser estranho e inconcebível que os peritos tenham respondido a este quesito, com o seu já habitual “desconhecem”, apesar de no quesito ponto 3. a) terem feito referência ao documento do IFAP (P3) – e também apenso como anexo VIII das fotografias juntas pelo perito JJ
art.º 35-A, 36º – os mesmos peritos não indicam nem referem a que quesito do autor se pretendem referir na sua resposta.
art.º 46º - Como podem os mesmos peritos responder desta forma ao quesito se, e como os próprios reconhecem, “não tenham promovido qualquer medição da charca" (sic)
art.º 49º e 50º- desconhece-se, por não ter sido referido e especificado pelos mesmos peritos, em que estudo ou explicação se baseia a resposta dada a este quesito. Compete aos peritos nomeados explicar e fundamentar porque, e como chegam a tal conclusão e não responder simplesmente “não”. Não se pronunciam quanto aos terrenos vizinhos que têm sistema de captação de água e por consequência sistema de rega e que são visíveis nas fotografias recolhidas aquando das duas visitas periciais e que são usadas no relatório do perito nomeado pelos réus, Eng. JJ e em algumas usadas pelos restantes peritos, Eng. HH e Eng. II.
Pelo contrário, o perito nomeado pelos réus apresenta uma resposta exaustiva e fundamentada com descrição e anexos e alusão a factos e espaços físicos existentes e constatáveis no local que foi objeto da perícia.
Art.º 62º, 62º-A, 62º-B, 62º-C - para responder a este quesito era necessário que os peritos verificassem as edificações que se encontravam em cada um dos prédios. Ora, os mesmos apenas e passo a citar, “confirmaram a existência dos artigos”. Assim, estranhamente, este quesito não obteve qualquer resposta por parte dos peritos podendo e devendo tê-la dado por se tratarem de factos relevantes, e constatáveis nos documentos existentes nos autos bem como no local objeto de peritagem.
art.º 65º - a resposta apresentada pelos mesmo peritos, sobre este quesito nada tem a ver com o seu conteúdo, não respondendo por isso ao quesito, podendo e devendo tê-lo feito.
art.º 66º, 67º, 68º - os mesmos peritos não respondem mais uma vez ao quesito, alegando que desconhecem. Ora, qualquer pessoa que tenha um mínimo de conhecimento das infraestruturas que compõe uma Quinta, pode tirar conclusões sobre o que é visto no local, podendo descrever os vestígios que se observam em cada uma das construções existentes ou nas fotografias que estão apensas aos autos.
Apesar disso os mesmos peritos nada dizem quanto à matéria do quesito.
Art.º 78 – os mesmos peritos respondem como já habitual “desconhecem”, no entanto era sua obrigação enquanto peritos fazer uma descrição física exaustiva do estado dos terrenos no sentido de, desta forma, permitir ao tribunal ajuizar sobre a veracidade do conteúdo e factos do quesito. Mas nada disso fizeram. mais se refere que os mesmos peritos ignoraram por completo os anexos apensos aos autos a que tiveram acesso onde se verifica a existência de fotografias recolhidas antes e depois dos trabalhos de desmatação das propriedades.
Art.º 120º, 123º e 124º – os peritos do tribunal e do autor reconheceram que as amendoeiras tinham sido podadas. Mais, com a análise das fotografias juntas aos autos, podiam os mesmos verificar em que estado se encontravam os prédios e os trabalhos que foram efetuados. Por isso entendesse como estranha e inconcebível a resposta “desconhecem” que deram ao quesito.
art.79º - estranha-se eta resposta uma vez que, sendo os peritos engenheiros civis, têm obrigação profissional de conhecer os trâmites que devem ser seguidos e as exigências das entidades em causa, e referidas no quesito, bem como os custos que acarreta qualquer atividade especializada, seja ela de desenvolvimento de projetos ou de uma peritagem de tribunal. Assim, a resposta dada demonstra absoluto desinteresse, falta de zelo e incúria por parte dos mesmos peritos.
3.1.2 da contestação e reconvenção
art.º 47º, 48º - mais uma vez, os mesmos peritos, não respondem concretamente à matéria do quesito limitando-se a referir “respondido anteriormente”, não especificando concretamente o que é o “anteriormente” que referem. Ou seja, mais uma vez não respondem ao quesito.
art.º 63º - Os peritos tinham o dever de analisar as certidões prediais juntas aos autos e as respetivas anotações, para dessa forma darem uma resposta concreta ao quesito, que não fizeram.
art.º 119º - os peritos não indicam quais são os quesitos a que fazem referência.
Deste modo,
33 Face ao supra alegado, os réus consideram que as respostas dadas aos quesitos pelos peritos do tribunal e do autor são insuficientes, vagas, sem fundamentação e concretização e mesmo respostas inexistentes em alguns dos quesitos, o que muito se estranha face aos conhecimentos técnicos que os mesmos peritos, enquanto Engenheiros Civis, têm obrigação de possuir;
34 Era por isso desejável e conveniente que os mesmos peritos tivessem respondido cabalmente aos quesitos de froma a colaborarem processualmente para a descoberta da verdade e boa decisão da causa.
35 Face às reclamações aí elencadas e face às atitudes dos peritos do tribunal e do autor, como supra se referiu e atendendo ao requerimento junta pelo perito dos réus, força é de acreditar existir opacidade na actuação e eventual conivência entre os mesmos, no conteúdo e até na forma em que estes apresentam as respostas aos quesitos.
Senão vejamos,
36 Em todos os quesitos apresentados, o Eng. LL e o Eng. II concordaram, justificando as suas respostas da mesma forma,
37 Mais, quando um não sabe o outro também não, não procurando individualmente, com os elementos juntos ao processo, ou com os possíveis de recolher no local, justificar as suas respostas.
38 Deixando assim sérias dúvidas quanto à transparência como foi elaborado este relatório por parte dos mesmos peritos.
Em face de tudo o atrás exposto quanto à matéria dos quesitos, e também por entenderem os réus que a descrita atitude dos peritos nomeado pelo tribunal Eng. HH e nomeado pelo autor, Eng. II, e pelas razões expostas, põe em causa a seriedade e credibilidade do relatório ora apresentado, requerem que seja realizada uma segunda perícia, nos termos e ao abrigo do art.º 487º do CPC.
Nos termos do artigo 488º n.1 do CPC, não podendo intervir na segunda perícia perito que tenha participado na primeira, indica-se desde já para a segunda perícia, e caso a mesma venha a ser deferida, o perito dos réus como sendo, MM, casado, Engenheiro Civil, com domicílio profissional na rua ..., ..., ..., ....
Ainda que o tribunal venha a deferir a realização da segunda perícia, e nos termos do disposto no artigo 486º, n.1 do CPC, requere que os três peritos da presente perícia, sejam notificados para comparecer em Audiência de Julgamento a fim de prestarem os esclarecimentos necessários relativamente à matéria da perícia e das respostas dadas aos quesitos da mesma.
PEDE DEFERIMENTO”.
A tal requerimento, o autor respondeu da seguinte forma:
“AA, Autor nos autos melhor identificados em epígrafe, notificado dos requerimentos apresentados pelos Réus a 12 de julho de 2022 nos quais requerem a realização de uma Segunda Perícia, vem, ao abrigo do princípio do contraditório disposto no artigo 3.º do Código de Processo Civil,
EXPOR E REQUERER A V. EXA. O SEGUINTE:
1.º O requerimento apresentado pelos Réus é apenas um conjunto de considerações absolutamente lamentáveis acerca da seriedade dos Senhores Peritos nomeados pelo Autor e pelo próprio Tribunal, com imputações graves totalmente desprovidas de sentido lógico e/ou jurídico, que servem apenas o fito dos Réus de conseguirem nestes autos (que já contam com 7 anos!) mais um expediente dilatório.
2.º Na verdade, as imputações que os Réus tecem acerca dos Senhores Engenheiros II e HH, bem que podem ser justamente tecidos em relação aos próprios Réus e ao Senhor Perito por si nomeado.
3.º Na medida em que os Réus sustentam parte do seu Requerimento em documentos alegadamente juntos aos autos por aquele Perito, que, na verdade, aquele nunca chegou a juntar e por isso alegam factos que ninguém – à exceção do próprio Eng. JJ – deveria conhecer.
4.º Além disso, os Réus imputam detalhadamente vícios de forma ao relatório que, na verdade, não se verificam, pelo que certamente lograram redigir o presente pedido de segunda perícia considerando um relatório preliminar – que os Peritos reconheceram ter existido – e que não foi aquele junto aos autos.
5.º Assim, é lamentável e chega a roçar a má-fé o Requerimento apresentado pelos Réus, que apesar de alegarem que o relatório pericial apresenta deficiências, obscuridades e contradições, não as identifica claramente, limitando-se a discorrer um conjunto de considerações a discordar daquela que foi a resposta dada pelos Senhores Peritos e a imputar-lhes falsas ausências de fundamentação.
6.º Mas mais do que não as identificar claramente, os Réus não solicitam um único esclarecimento, caso em que sempre se poderiam ver sanadas as deficiências ou contradições detetadas.
7.º Isto só demonstra que o que pretendem os Réus é que seja realizada uma nova perícia, que demorará mais 1 (um) ou 2 (dois) anos a ser concretizada, em claro prejuízo para o andamento destes autos e para o Autor que tem mais de 80 (oitenta) anos de idade e há mais de 7 (sete) que luta por uma decisão neste processo.
8.º Já para não falar de que não tem qualquer razão de facto ou de direito no que alegam os Réus.

MAS VEJAMOS EM PORMENOR,

I – DOS DOCUMENTOS ALEGADAMENTE JUNTOS PELO ENGENHEIRO JJ
9.º Conforme supra se disse, sustentam os Réus as suas imputações de «conivência» e «falta de transparência» dos Peritos nomeados pelo Autor e pelo Tribunal, em documentos que o Engenheiro JJ alegadamente teria junto aos autos.
10.º Sucede que o Engenheiro JJ nunca os juntou, e por isso quem demonstra falta de transparência são os Réus que acedem a informação a que os demais não têm acesso.
11.º Claro está que, apercebendo-se do lapso, os Réus tentaram emendar a mão e vieram solicitar que o Tribunal notifique o Senhor Perito para que os venha juntar.
12.º O que, mais uma vez, demonstra o intuito claramente dilatório dos Réus, uma vez que, se têm acesso aos documentos e/ou contacto com o Eng. JJ, bem que poderiam ter, desde logo, junto ou pedido que o referido Engenheiro JJ os juntasse aos autos.
13.º O que não fizeram para com isto protelar ainda mais o bom e célere andamento do processo.

II – DOS ALEGADOS VÍCIOS FORMAIS DO RELATÓRIO PERICIAL
14.º Não é só sobre os documentos que os Réus se engaram ao elaborar o Requerimento a que ora se responde.
15.º Os Réus também, teceram considerações formais sobre um relatório que não é aquele que está junto ao processo.
16.º No ponto 9 do seu articulado, os Réus referem que existiram duas formas de elaborar o Relatório, uma para a resposta aos quesitos do Autor e outra para a resposta aos quesitos dos Réus.
17.º Dizem os Réus que «na apresentação das respostas aos quesitos apresentados pelos Réus as mesmas {respostas} vêm intercaladas entre aquelas que são apresentadas pelos Eng. HH e II com as que são apresentadas pelo Eng. JJ (…) Enquanto que (…) nas respostas aos quesitos do autor não é seguida essa metodologia».
18.º Pois os Réus estão redondamente enganados sendo falso o que alegam!
19.º O Relatório junto aos autos é na verdade, composto por duas partes.
20.º Uma que respeita à resposta aos quesitos – formulados pelo Autor e pelos Réus – dos Engenheiros HH e II, e outra parte com a resposta aos quesitos – formulados pelos Réus e pelo Autor – do Engenheiro JJ.
21.º Estando os anexos juntos pelos Engenheiros HH e II seguidos às suas respostas, e os anexos juntos pelo Engenheiro JJ seguido às respostas por este apresentada.
22.º Inexistindo qualquer junção das respostas dadas pelos três Engenheiros seja na resposta aos quesitos dos Réus, seja na resposta aos quesitos do Autor.
23.º Pelo que, sem prejuízo do que a seguir se dirá sobre a Colegialidade do relatório – que era o pretendido – na verdade os Réus estão a imputar erros a um relatório que não é aquele que está juntos aos autos.
24.º O que fazem por um de dois motivos – ou pela total falta de integridade e transparência que fez com que recebessem previamente uma das versões preliminares do relatório que não aquela que foi junta aos autos e não tivessem tido em atenção aquilo que foi efetivamente junto, ou porque querem entorpecer este processo e a justiça, criando claras confusões que apenas levam ao arrastar no tempo este processo.
25.º Qualquer que seja o motivo, é lamentável e altamente censurável.

III – DA COLEGIALIDADE DO RELATÓRIO PERICIAL
26.º Censurável é igualmente o que alegam os Réus sobre os quesitos que são respondidos em primeiro lugar e sobre a unanimidade nas respostas aos quesitos dadas pelo Senhor Engenheiro HH e II.
27.º Em primeiro lugar, referem os Réus que a perícia foi por si requerida e que por isso deveria ser dada em primeiro lugar a resposta aos seus quesitos.
28.º Ora, não é verdade que a perícia tenha sido pedida exclusivamente pelos Réus na medida em que o Autor requereu a sua ampliação e repartiu, igualitariamente, os encargos antecipados da sua realização.
29.º Pelo que a perícia é, conforme resulta dos despachos anteriores, comum das partes.
30.º E nesse sentido, bem andaram os Senhores Peritos HH e II na resposta apresentada.
31.º Além disso, não se admite que os Réus estejam a pôr em causa a ordem a que os Peritos respondem ou não às questões, na medida em que, por um lado, tal ordem não oferece nenhuma relevância para a validade da prova e para a boa decisão da causa, nem essa ordem resulta da lei.
32.º Ao contrário do Engenheiro JJ, o Engenheiro II tem uma vasta e comprovada experiência profissional de muitos anos como Perito Oficial da Lista do Tribunal da Relação do Porto, sendo por isso lamentável tais comentários que, sem fundamento, colocam em causa a honra, a honestidade e dignidade profissional de um Perito com provas dadas.
33.º Por outro lado, no que respeita à unanimidade das respostas dos dois Peritos, estranho é para o Autor que o Engenheiro JJ não tenha aceite verter uma única resposta de comum acordo com os demais Peritos, tendo elaborado um relatório que enviou «para junção».
34.º O que se pretende de uma Perícia Colegial é que, tanto quanto possível, as respostas sejam uniformes, sendo que é permitida obviamente a discordância.
35.º Agora parece que o Engenheiro JJ optou por discordar de todas as respostas, mesmo naquelas em que, na verdade, respondeu de forma igual.
36.º É que podemos aceitar a resposta e discordar apenas na fundamentação mas nem isso o Engenheiro JJ parece ter querido fazer.
37.º A título de exemplo veja-se a resposta dada ao ponto 2 alínea d) dos quesitos do Autor; na verdade, todos os Peritos disseram que não podiam fazer essa confirmação, mas a resposta do Engenheiro JJ a seu pedido, como resulta do seu requerimento, é dada autonomamente.
38.º E como esse quesito existem vários em que a resposta é a mesma, por vezes com fundamentação diferente.
39.º Pelo que, a unanimidade das respostas não advém da falta de «transparência» ou da «conivência» dos Senhores Peritos, caso em que sempre se teria de concluir que também o Engenheiro JJ estava conivente sempre que respondeu, inevitavelmente, no mesmo sentido.
40.º A unanimidade vem da certeza clara da resposta que é dada, que é unidirecional não suscitando dúvidas aos Peritos que a ela respondem, nem na forna, nem na substância ou fundamentação.
41.º Devendo aliás ser essa a regra, e não a exceção.
42.º Pelo que as imputações relativas à falta de colegialidade do relatório só podem ser assacadas ao Perito nomeado pelos Réus, factos que o Tribunal sempre pode esclarecer ouvindo os Senhores Peritos em audiência de discussão e julgamento como infra se requererá.
43.º Sendo que, de todo o modo, considerando a forma como está redigido o documento, torna-se fácil e intuitivo para o Tribunal perceber quais as respostas dos dois peritos e a resposta do perito nomeado pelos Réus a cada um dos quesitos que estão devidamente identificados, pelo que o Relatório não obstante dividido é perfeitamente inteligível, apreensível e totalmente esclarecedor.

IV – DA INADMISSIBILIDADE DA SEGUNDA PERÍCIA
44.º Sem prejuízo do que infra se dirá sobre os alegados vícios apontados pelos Réus, a verdade é que os mesmos referem sucessivamente que o relatório apresenta obscuridades, contradições e deficiências.
45.º Retira-se de forma evidente, em cada quesito salientado pelos Réus e na maioria das vezes, que a sua reclamação se alicerça ou na discordância com a resposta ou na alegada falta de fundamentação.
46.º Chegando os Réus a referir que o Relatório tem respostas incompletas.
47.º Ora, incorrem num grave erro de raciocínio jurídico os Réus no requerimento que apresentam pois, ao invés de solicitar esclarecimentos a esses vícios que tão patentemente apontam e a composição das respostas que entendem incompletas, solicitam a realização de uma segunda perícia sem fundamentar tal pedido.
48.º Conforme resulta claro do artigo 485.º n.º 2 e 3 do Código de Processo Civil que: «2 - Se as partes entenderem que há qualquer deficiência, obscuridade ou contradição no relatório pericial, ou que as conclusões não se mostram devidamente fundamentadas, podem formular as suas reclamações.
3 - Se as reclamações forem atendidas, o juiz ordena que o perito complete, esclareça ou fundamente, por escrito, o relatório apresentado.»
49.º Ora, se existem deficiências contradições ou obscuridades no relatório – o que não se aceita nem se admite – sempre deveriam ter os Réus requerido que o Tribunal ordenasse aos Senhores Peritos que completassem ou esclarecessem o relatório.
50.º Inexistindo qualquer fundamento sério para a realização da segunda perícia que não seja uma estratégia meramente dilatória por parte dos Réus.
51.º Note-se que, como bem entendeu o TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA de 03/08/2017 proferido no âmbito do processo n.º 468/15.0T8PDL-B.L1-6, disponível em www.dgsi.pt:
«Realizada uma perícia e apresentado o respectivo relatório médico-legal, as partes, em caso de discordância com o seu teor, têm duas possibilidades de reacção: - a reclamação prevista no artº 485 do C.P.C., se entenderem que há qualquer deficiência, obscuridade ou contradição no relatório pericial, ou que as conclusões não se mostram devidamente fundamentadas; - a solicitação de realização de 2ª perícia, nos termos do artº 487 do C.P.C., alegando fundadamente as razões da sua discordância relativamente ao relatório pericial apresentado. II. A reclamação prevista no artº 485 do C.P.C. e a segunda perícia prevista no artº 487 do C.P.C., têm objectivos diversos, visando a primeira que o(s) perito(s) que a elaborou(raram) a corrijam ou completem e a segunda que outros peritos corrijam a eventual inexactidão de que enferma o relatório pericial.» (negrito e sublinhado nosso).
52.º «(…) II. A reclamação prevista no artº 485 do C.P.C. e a segunda perícia prevista no artº 487 do C.P.C., têm objectivos diversos, visando a primeira que o(s) perito(s) que a elaborou(raram) a corrijam ou completem e a segunda que outros peritos corrijam a eventual inexactidão de que enferma o relatório pericial. III. Daí que o legislador tivesse passado a exigir, como condição para o deferimento do pedido de realização de segunda perícia, a alegação fundamentada das razões de discordância do requerente em relação à primeira perícia (artº 589 nº1 do C.P.C.).» (negrito e sublinhado nosso)
53.º Quer isto dizer que, pressupondo cada um dos referidos mecanismos, fundamentos e regimes diferentes, não pode aceitar-se nem conceber-se que a alegação de obscuridade, contradição e deficiência possa fundamentar o pedido de realização da segunda perícia.
54.º A existir – que não se aceita como infra se verá – qualquer alegada contradição ou incompletude do relatório, seja por falta de fundamentação ou outro, cabe ao Tribunal ordenar os competentes esclarecimentos pelos Senhores Peritos, e não a realização de uma segunda perícia.
55.º Como muito bem já decidiu o TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES no Acórdão proferido a 19/05/2016 no âmbito do processo n.º 188/12.8TMBRG-F.G1, disponível em www.dgsi.pt, em situação similar, onde concluiu também que: «Embora o critério de decisão sobre a indicação e produção de meios de prova seja essencialmente o da própria parte, pode vedar-se a sua iniciativa no caso de impertinência, desnecessidade ou irrelevância ou da natureza meramente dilatória do oferecido ou requerido.»
56.º A indiferenciação do explanado no requerimento dos Réus só revela que estes não têm fundamentos sérios a sustentar qualquer inexatidão do relatório pericial que pudesse justificar a realização de uma segunda perícia.
57.º Olvidam assim os Réus que o fim último da Reclamação não é apenas reclamar – numa vertente de demonstrar discordância, como que, impugnando o relatório como fizeram, aproveitando para solicitar uma segunda perícia num intento claramente dilatório – mas sim permitir que os Senhores Peritos corrijam ou completem o seu relatório pericial se a isso houver lugar.
58.º Assim, inexiste qualquer questão séria na alegação dos Réus para suportar o seu pedido de realização de segunda perícia, que possa suscitar dúvida ao Tribunal a quo, e que fundamente o deferimento daquele pedido.
59.º Porquanto, os alegados vícios apontados a existirem – o que não se aceita nem se concebe – sempre levariam, em primeiro lugar e considerando o que se encontra alegado, a um esclarecimento a prestar pelos Senhores Peritos.
60.º «Isto porque o que a lei pretende com a realização da segunda perícia é que sejam dissipadas quaisquer dúvidas sérias que tenham ficado a subsistir da primeira perícia sobre a percepção ou apreciação dos factos investigados, que possam ter relevância na decisão sobre o mérito da causa.»
61.º E no caso vertente, não foram sequer colocadas quaisquer dúvidas que tenham subsistido, nem as mesmas foram devidamente alegadas e fundamentadas no requerimento apresentado, que mais não faz do que se limitar a discordar da resposta dada pelos Peritos e imputar-lhes falta de fundamentação.
62.º LEBRE DE FREITAS Código de Processo Civil Anotado, vol. 2.º, 2.ª edição, Coimbra Editora, 2008, p. 554-555 diz que: «não lhe basta [à parte] requerê-la: é-lhe exigido que explicite os pontos em que se manifesta a sua discordância do resultado atingido na primeira, com apresentação das razões por que entende que esse resultado devia ser diferente.» (parêntesis retos e sublinhado nossos)
63.º E isso mesmo é o entendimento jurisprudencial dos nossos Tribunais.
64.º Como se refere no acórdão do SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA  Acórdão proferido a 25/11/2004, no âmbito do processo nº. 04B3648 e disponível em www.dgsi.pt: «[A] expressão adverbial “fundadamente” significa precisamente que as razões da dissonância tenham de ser claramente explicitadas, não bastando a apresentação de um simples requerimento de segunda perícia. Trata-se, no fundo, de substanciar o requerimento com fundamentos sérios, que não uma solicitação de diligência com fins dilatórios ou de mera chicana processual. E isto porque a segunda perícia se destina, muito lógica e naturalmente, a corrigir ou suprir eventuais inexactidões ou deficiências de avaliação dos resultados a que chegou a primeira.» (negrito e parêntesis retos nossos).
65.º E daqui resulta que, ao contrário do que parece fazer crer os Réus:
«A lei é no entanto clara ao expressar que não se trata de uma faculdade discricionária, sendo condição essencial ao deferimento do requerimento de realização de segunda perícia a respetiva fundamentação, cabendo naturalmente ao requerente invocar, de modo fundamentado e concludente, as razões da sua discordância relativamente ao relatório apresentado.
III - É da apreciação da valia dos fundamentos invocados que dependerá o atendimento da pretensão formulada, ou antes o seu indeferimento, caso o juiz conclua pelo carácter impertinente ou dilatório da segunda perícia.» Acórdão do Tribunal da Relação de Évora proferido a 28/06/2017 no âmbito do processo n.º 590/13.8TBVRS-B.E1 disponível em www.dgsi.pt
66.º A segunda perícia só é assim realizada, no caso de se verificar essa fundamentação.
67.º Isso mesmo também decidiu o TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA Acórdão proferido a 28/06/2011 no âmbito do processo n.º 1/10.0TBSPS-A.C1, e disponível em www.dgsi.pt também citado pela Recorrida, esclarecendo que:
«1 - Nos termos do artigo 587.º do Código de Processo Civil a segunda perícia só terá lugar se o requerente alegar «fundadamente as razões da sua discordância relativamente ao relatório pericial apresentado». 2 – Esta exigência há-de cumprir critérios materiais que vão além da forma, pois se bastasse qualquer justificação, fosse ela qual fosse, então não se compreenderia a alteração da lei, pois no regime processual anterior o pedido de segunda perícia era livre. (…)»
68.º O que não acontece nestes autos.
69.º Pelo que, nem o relatório é obscuro, contraditório ou deficiente como alegam os Réus e infra se verá, nem a verificação dessa deficiência, obscuridade ou contradição – se fundamentada, o que também não ocorre – é suficiente para, sem mais, requerer e ordenar a realização de uma segunda perícia.
70.º Ainda mais quando não foram solicitados quaisquer esclarecimentos aos Senhores Peritos ou oportunidades para, a existirem – o que não se aceita nem se concede – possam completar as falhas.
71.º Pelo que terá inelutavelmente improceder o pedido formulado pelos Réus.

V – DA ALEGADA OBSCURIDADE, CONTRADIÇÃO E DEFICIÊNCIA DO RELATÓRIO
72.º Conforme supra se deixou dito, no requerimento apresentado, os Réus limitam-se a discordar das respostas dadas pelos Senhores Peritos HH e II, mesmo quando essas respostas até são iguais àquela que foi dada pelo Engenheiro JJ, e a acusá-los de falta de fundamentação.
73.º Note-se que, no próprio requerimento apresentado, os Réus concluem que os Peritos em causa «Confirmam» determinado entendimento – vide ponto 30.º do articulado – ou «Concluem» neste ou noutro sentido – vide ponto 31.º do articulado.
74.º Ora, não é precisamente isso que é solicitado a um Perito? Que responda de forma objetiva e concludente às questões colocada pelas Partes e pelo Tribunal?
75.º O que fazem os Réus, na verdade, é imputar falsa falta de fundamentação às questões colocadas, querendo exigir dos Peritos aquilo que não lhes era exigível e que os mesmos também não exigiram do Perito por si nomeado.
76.º A título de exemplo veja-se o alegado paradigmaticamente pelos Réus no ponto 20.º e seguintes do seu articulado.
77.º Na verdade, a questão a responder era se a área do terreno era, conforme levantamento, de 2,78 hectares.
78.º Ora, os Peritos responderam que sim, considerando a existência do levantamento topográfico e declaração de compromisso do topógrafo que foi junta,
79.º Mas mais, para verificar se existiria algum erro grosseiro que indiciasse que aquele levantamento não era merecedor de credibilidade, os Senhores Peritos fizeram medição numa ferramenta que está disponível a qualquer um e concluíram pela credibilidade do levantamento.
80.º O que fizeram para lá daquilo que era a suficiência da resposta a dar.
81.º Ora, não era exigido aos Senhores Peritos que fizessem eles próprios o levantamento topográfico, na medida em que não são topógrafos, não têm instrumentos ou formação para tal nem era isso o pretendido no quesito apresentado.
82.º E os Réus também não exigiram que o Perito por si indicado o fizesse, na medida em que este também se limitou a dizer que, sendo no plano horizontal, o levantamento tinha a área indicada.
83.º Assim, mais não era exigível aos Peritos na resposta apresentada, não havendo aqui nenhuma falha ou falta de fundamentação, caso em que tal falta também se poderia sempre imputar ao Perito JJ.
84.º O mesmo se diga quanto ao alegado no artigo 28.º do seu articulado.
85.º A conclusão dos Peritos relativos ao solo advém dos seus conhecimentos formativos e empíricos, e é isso o esperado dos Peritos e da sua resposta – que contribuam para a descoberta da verdade material com os seus conhecimentos técnicos sobre determinada matéria.
86.º O Engenheiro JJ também não escavou o solo – tanto quanto resulta das respostas dadas – para concluir como concluiu nas suas afirmações, como esperavam os Réus que os Engenheiros HH e II fizessem.
87.º As respostas dos Peritos não têm de ser conjugadas obrigatoriamente com outros e novos elementos de prova, ela, a perícia, é uma prova em si mesma que é valorada livremente pelo Juiz como resulta do Código de Processo Civil.
88.º Pelo que imputar vícios ao relatório por não se ter baseado em «novos elementos de prova» é um raciocínio falacioso que não se compreende nem se pode aceitar.
89.º Querem os Réus – para poderem, na verdade, fundamentar uma segunda perícia – validar uma prova com outra prova dentro do mesmo elemento que é o relatório pericial.
90.º Se é certo que em algumas circunstâncias isso orienta os Peritos – como aconteceu a miúde neste caso e se pode verificar do teor do relatório como um todo –, a verdade é que quem tem de apreciar e conjugar as provas entre si é o Julgador e não o Perito, que está no processo para trazer os seus conhecimentos formativos, pedagógicos e empíricos e não para validar esta prova em detrimento da outra.
91.º Pelo que, tudo quanto está alegado pelos Réus no seu requerimento a propósito das concretas respostas aos quesitos são falsas questões, desprovidas de qualquer fundamento, que só servem para legitimar o infundado pedido de realização de uma segunda perícia.
92.º Porque se os Réus têm, como dizem ter, as questões que levantam, então deveriam reformulá-las e transformá-las em questões ou pedidos que os Senhores Peritos possam responder, aperfeiçoando, esclarecendo ou justificando o seu relatório.
93.º O que não fizeram pois o seu intento é apenas atrasar e arrastar ainda mais um processo moroso e trabalhoso como o presente, com vastos elementos de prova a serem valorados pelo Julgador e não pelas partes.
94.º Assim, considerando as necessidades de adequação formal e de celeridade a imprimir a este processo, que se impõem, deve o pedido dos Réus quanto à realização de uma segunda perícia ser indeferido, por meramente dilatório, impertinente e infundado.
95.º E devem os Senhores Peritos ser notificados para comparecerem na audiência de discussão e julgamento a marcar com a maior brevidade possível, para que possam prestados os esclarecimentos que as partes e o Tribunal entenderem por necessárias, nos termos do disposto no artigo 486.º do Código de Processo Civil.
E. R. D.”.
*
IV. Fundamentação de direito.

Delimitada que está, sob o n.º II, a questão essencial a decidir, é o momento de a apreciar.
As provas têm por função a demonstração da realidade dos factos (art.º 341º do Cód. Civil).
Resulta do disposto pelo art. 342º do Cód. Civil que a iniciativa da prova cabe, em princípio, à parte a quem aproveita o facto dela objecto - e não ao tribunal -, sob pena de não vir a obter uma decisão que lhe seja favorável.
Contudo, incumbe ao tribunal remover qualquer obstáculo que as partes aleguem estar a condicionar o seu ónus probatório (art. 7.º, n.º 4 do CPC), bem como realizar ou ordenar oficiosamente “todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio, quando aos factos de que é lícito conhecer”. (art. 411.º do CPC).

Uma diligência de prova só será impertinente (devendo, por tal, ser indeferida) se não for idónea para provar o facto que com ela se pretende demonstrar, se o facto se encontrar já provado por qualquer outra forma, ou se carecer de todo de relevância para a decisão da causa.
E, como ao longo de todo o processo, também aqui se deverá assegurar um estatuto de igualdade substancial das partes, designadamente no uso dos meios de defesa (art. 4.º do CPC) - emanação do princípio do contraditório (art. 3.º do CPC).
A prova pericial destina-se, como qualquer outra prova, a demonstrar a realidade dos enunciados de facto produzidos pelas partes.
Como afirmam Antunes Varela/Miguel Bezerra/Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2ª Edição, Coimbra Editora, p. 578: “É pressuposto essencial da realização de prova pericial que a percepção e/ou a apreciação de factos assente em conhecimentos especiais que os julgadores não possuem, por envolverem conhecimentos de natureza científica, técnica, artística, profissional ou de mera experiência não detidos por aqueles.”
Uma vez realizada a perícia, o seu resultado é expresso num relatório, no qual o perito se pronuncia fundamentadamente sobre o respectivo objecto (artigo 484.º do CPC).
Entendendo as partes que há qualquer deficiência, obscuridade ou contradição no mesmo, ou que as conclusões não se mostram devidamente fundamentadas, podem formular as suas reclamações (artigo 485.º do CPC).
A reclamação consiste, assim, em apontar a deficiência ao relatório apresentado e pedir que a resposta seja completada; em denunciar a obscuridade e solicitar que o ponto obscuro seja esclarecido; em notar a contradição e exprimir o desejo de que ela seja desfeita; ou em acusar a falta de fundamentação das conclusões e pedir que sejam motivadas.
Deferida a reclamação, pode o tribunal determinar que o perito supra as deficiências do relatório, por escrito, ou então que preste os esclarecimentos solicitados, oralmente, na audiência de julgamento (artº 486º do CPC)” (cfr. Ac. RP de 27.01.2020, relatora Eugénia Cunha, disponível in www.dgsi.pt).
Assim, haverá:
- deficiência, se o relatório não considerar todos os pontos que devia ou não os considera tão completamente como devia;
- obscuridade, se não se vislumbra o sentido de alguma passagem ou esta pode ter mais de um sentido;
- contradição entre os vários pontos focados ou entre as posições tomadas pelos peritos, sendo a perícia colegial;
- falta de fundamentação – as conclusões não estão devidamente fundamentadas (cfr. Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, in CPC Anotado, 2ª, 3ª edição, pág. 339).
Por seu lado, dispõe o artº 487.º do CPC, sob a epígrafe “Realização de segunda perícia” que “qualquer das partes pode requerer que se proceda a segunda perícia, no prazo de 10 dias a contar do conhecimento do resultado da primeira, alegando fundadamente as razões da sua discordância relativamente ao relatório pericial apresentado.
E dispõe o nº 3 do citado preceito que “a segunda perícia tem por objeto a averiguação dos mesmos factos sobre que incidiu a primeira e destina-se a corrigir a eventual inexatidão dos resultados desta”.
Resulta desta norma que a segunda perícia:
- tem por objecto os mesmos factos sobre que incidiu a primeira;
- pressupõe que sejam alegadas, fundadamente, razões de discordância quanto ao relatório da primeira perícia;
- destina-se a corrigir eventual inexactidão dos resultados da primeira perícia.
Assim, a segunda perícia não é uma nova perícia, antes visando, apenas, a correcção de eventual inexactidão dos resultados da primeira.
Como referem Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, in Código de Processo Civil Anotado, vol. II, 3.ª edição, Almedina, 2019, pág. 342, citados por Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Pires de Sousa, in Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, 2ª edição, Almedina, pág 567“A segunda perícia não constitui uma instância de recurso, visando somente, fornecer ao tribunal um novo elemento de prova quanto aos factos que foram objeto da primeira, depois de apreciados tecnicamente por outros peritos.”
À parte que requer a segunda perícia, cabe explicitar os pontos em que se manifesta a sua discordância face à primeira perícia, apresentando as razões por que entende que esse resultado devia ser diferente.
“A expressão fundadamente significa que as razões de discordância têm de ser claramente explicitadas, não bastando a apresentação de um simples requerimento de segunda perícia (STJ 25/11/2004, CJ ,T.III,p.124). A parte tem de indicar os pontos de discordância (as inexatidões a corrigir) e justificar a possibilidade de uma distinta apreciação técnica. (…) Embora o requerente não tenha de demonstrar a procedência da argumentação, os motivos de discordância terão de ser aptos, do ponto de vista objectivo e atentas as circunstâncias do caso concreto, a criar um estado de dúvida no julgador médio sobre se a perícia efectuada não padecerá dos vícios que o requerente lhe assaca e que, caso venham a ser demonstrados, levam a que seja alcançado um resultado distinto do da primeira (RG 4-10-2018, 3621/17)” (Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Sousa, ob e pág cit.).
Como se escreve no Ac. da Relação de Évora de 28.09.2023, disponível in www.dgsi.pt, a ratio legis de tal exigência, prende-se com a necessidade de evitar a realização de diligências meramente dilatórias. E as razões da discordância, devidamente fundamentadas, ou seja, os pontos de discordância e/ou as inexatidões a corrigir, têm de constar do requerimento onde se requer a realização da segunda perícia.
Assim, o requerente tem de indicar qual o motivo/razão por que entende que o resultado da perícia deveria ser diferente, o que afasta a admissão de simples requerimentos onde se pede a realização da segunda perícia (outrora admitidos).
Por outro lado, mesmo tenho sido o pedido fundamentado, o deferimento da segunda perícia deve permitir que o juiz conclua, em face das razões invocadas, que a diligência não tem caráter impertinente ou dilatório, por a fundamentação apresentada suscitar no seu espírito dúvidas sérias sobre a necessidade da mesma em ordem ao apuramento da verdade. Não sendo também essa a situação, impende sobre o juiz o dever de recusar (indeferir) o requerido (artigo 6.º, n.º 1, do CPC).
 “Tal alegação consiste na invocação, clara e explícita, de sérias razões de discordância da parte, não porque o resultado alcançado contraria ou não satisfaz os seus interesses, mas por nele e no relatório em que assenta existir inexactidão (insuficiência, incoerência e incorrecção) dos respetivos termos, maxime quanto à forma como operaram os conhecimentos especiais requeridos sobre os factos inspeccionados e ilações daí extraídas, de modo a convencer que, podendo haver lugar à sua correcção técnica, esta implicará resultado susceptível de diversa e útil valoração para a boa decisão da causa - trata-se no fundo de substanciar o requerimento com fundamentos sérios, que não uma solicitação de diligência com fins dilatórios ou de mera chicana processual, isto porque a segunda perícia se destina, muito lógica e naturalmente, a corrigir ou suprir eventuais inexatidões ou deficiências de avaliação dos resultados a que chegou a primeira” (cfr. Ac. da Relação de Coimbra de 30.05.2023, in www.dgsi.pt).
Também o acórdão da Relação do Porto de 27.01.2020, in www.dgsi.pt., considerou que:
“I - A segunda perícia que, regulada nos art.ºs 487º a 489º, do CPC, se destina a corrigir a eventual inexatidão dos resultados da primeira (nº 3, do art.º 487º, do CPC), não é uma nova e autónoma perícia, antes o seu objeto se tem de conter no âmbito da primeira perícia realizada, movendo-se dentro das questões de facto já, aí, averiguadas.
II - Com a consagração da possibilidade de realização de segunda perícia, visou o legislador tão só possibilitar a dissipação de concretas dúvidas sérias que possam decorrer da primeira perícia, relativas a específicas questões suscetíveis de levar a um resultado distinto daquele que foi alcançado na primeira perícia, para que possam não pairar na perceção de factos relevantes para a decisão de mérito.
III - Para tanto, e não sendo lícito realizar no processo atos inúteis (art.º 130º, do CPC), impõe-se que sejam densificadas, com fundamentos sérios, as razões da discordância relativamente ao relatório pericial apresentado, ficando a admissibilidade da segunda perícia dependente dessa fundada alegação, em requerimento tempestivamente apresentado (nº 1, do art.º 487º, do CPC), sem que o requerente tenha, contudo, de provar essas razões, pois que tal resultado apenas seria a alcançar com a realização da diligência requerida.
IV - Ao pronunciar-se sobre o meio de prova proposto, o tribunal tem, para além de analisar da efetiva afirmação de razões de dissonância (eventual inexatidão nos resultados da primeira que careçam de correção), de verificar se os motivos de discordância são, objetivamente, aptos a alcançar resultado distinto do da primeira perícia.” (cfr, no mesmo sentido, os acórdãos da Relação de Coimbra de 08.07.2021, e da Relação de Évora de 14.10.2021., ambos in www.dgsi.pt).
Assim, a segunda perícia destina-se a corrigir a eventual inexactidão do resultado da primeira, cabendo a quem a requerer, alegar fundadamente as razões da sua discordância relativamente ao relatório pericial apresentado, indicando, de forma concreta, as inexatidões, incoerências ou insuficiências em que incorre o relatório pericial, em que medida ou de que forma influenciam o resultado final e indicando também as correções a introduzir, seja no que respeita aos elementos de facto a considerar, seja no que respeita a uma distinta apreciação técnica.
Por outro lado, as referidas razões, consideradas objectivamente, terão de ser aptas a criar no julgador um estado de dúvida sobre se a perícia efectuada não padecerá dos vícios que o requerente lhe assaca e que, caso venham a ser demonstrados, levam a que seja alcançado um resultado distinto do da primeira.
Nesta medida, não é de admitir a realização de segunda perícia se, em face dos fundamentos apresentados, os mesmos evidenciam sobretudo uma discordância em relação aos resultados da primeira perícia, e não sérias dúvidas sobre a inexatidão dos resultados alcançados de modo a suscitar no julgador a necessidade da sua realização para o apuramento da verdade.
No caso dos autos, o que se verifica é que os apelantes, notificados do relatório pericial apresentado, invocando a existência de deficiências, obscuridades e contradições, requereram a realização de uma segunda perícia.
Sucede que, como bem refere o autor apelado, os fundamentos de facto mas, sobretudo, os fundamentos de direito trazidos pelos apelantes em sede de recurso não são precisamente os mesmos que suportaram o seu requerimento de pedido de realização de segunda perícia.
É que, no seu pedido, os apelantes alegaram sucessiva e reiteradamente, tão-só, como se disse já, que o relatório apresentava “deficiência, obscuridade e contradições” e, no final do seu articulado, reconhecem que as respostas dadas pelos Senhores Peritos podem ser alvo de esclarecimentos na audiência de discussão e julgamento, tanto mais que requerem que, mesmo que a segunda perícia seja deferida, os mesmos possam estar presentes na audiência de discussão e julgamento, para prestar esclarecimentos.
Já em sede de alegações, os apelantes invocam que as respostas dos Senhores Peritos nomeados pelo Tribunal e pelo recorrido, “são lacónicas, incompletas, inexistentes e com poucos ou nenhum elemento de prova que as suporte”, e que não são suficientes os esclarecimentos dos Srs. Peritos, por haver uma “impossibilidade em razão dos conhecimentos técnicos necessários”.
Ou seja, os apelantes alteram o por si antes invocado, e que foi objecto da decisão apelada.
Mas, como se deixou acima explanado, a existência de deficiências, obscuridades ou contradições, é fundamento para que sejam solicitados esclarecimentos aos Srs. Peritos que realizaram a primeira perícia, e já não fundamento para que seja requerida uma segunda perícia.
Com efeito, como resulta do acima exposto, a reclamação é o meio de reacção contra qualquer deficiência, obscuridade ou contradição detectadas no relatório e visa levar o(s) perito(s) que o elaborou(raram) a completá-lo, esclarecê-lo ou dar-lhe coerência; já a segunda perícia é o meio de reacção contra inexactidão do resultado da primeira e procura que outros peritos confirmem essa inexactidão e a corrijam.
Ora, lidos os quesitos postos em causa pelos apelantes, o que se verifica é que estes sustentam a sua reclamação ou na sua discordância (pessoal) com a resposta ou na alegada falta de fundamentação, ou na alegada incompletude das respostas ou em contradições entre as respostas dadas pelo Sr. Perito por eles indicado, e as respostas dadas pelos restantes dois Srs. Peritos.
A tal acresce que, em momento algum, invocam fundamentos sérios que sustentem qualquer inexactidão do relatório pericial, que pudesse justificar a realização de uma segunda perícia, nem explicitam em que medida o por si invocado seria apto a obter um resultado pericial diferente, ou ainda qual a sua influência no resultado final.
Com efeito, não alegaram os apelantes nem no requerimento que apresentaram ao tribunal a quo, nem no recurso apresentado, quaisquer concretas dúvidas sérias que possam decorrer da primeira perícia, relativas a específicas questões susceptíveis de levar a um resultado distinto daquele que foi alcançado na primeira perícia, para que possam pairar dúvidas na percepção de factos relevantes para a decisão de mérito.
Mais se diga que, o invocado pelos réus apelantes não traduz, isolada ou conjugadamente, a alegação concreta de qualquer inexactidão do relatório pericial e que mesmo que pudessem ser consideradas razões (nos termos do disposto no nº 1 do artº 487º do CPC), as mesmas objectivamente consideradas, não se mostram suficientes para criar no julgador médio um estado de dúvida sobre se a perícia efectuada não padecerá de inexactidões, incoerências ou insuficiências.
Nesta medida, não se mostram reunidos os pressupostos de realização de uma segunda perícia.
Improcede, pois, a apelação.
*
Sumário (ao abrigo do disposto no art. 663º, n.º 7 do CPC):
 I. É de indeferir o pedido de realização de segunda perícia, quando os requerentes da mesma não invocam fundamentos sérios que sustentem qualquer inexactidão do relatório pericial, que pudesse justificar a realização de uma segunda perícia, nem explicitam em que medida o por si invocado seria apto a obter um resultado pericial diferente, ou ainda qual a sua influência no resultado final.
*
V. Decisão.

Perante o exposto, acordam os Juízes desta 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães em julgar a apelação improcedente, em consequência do que confirmam a decisão apelada.
Custas pelos apelantes.
*
Guimarães, 12 de Junho de 2024



Assinado electronicamente por:
Fernanda Proença Fernandes
Jorge dos Santos
Conceição Sampaio
(O presente acórdão não segue na sua redacção as regras do novo acordo ortográfico, com excepção das citações/transcrições efectuadas que o sigam)