I — O n.º 2 do artigo 6.º e o n.º 2 do artigo 7.º do Regulamento das Custas Processuais devem aplicar-se aos recursos das decisões tipificadas no n.º 4 do artigo 7.º e na tabela II-A do Regulamento das Custas Processuais.
II — O n.º 9 do artigo 14.º do Regulamento das Custas Processuais, na redacção da Lei n.º 27/2019, de 28 de Março, deve aplicar-se aos casos em que haja uma condenação parcial do responsável pelo impulso processual.
III — Em caso de condenação parcial, as partes só estão obrigadas pagamento de uma parte proporcional do remanescente da taxa de justiça.
Recorrido: Ministério Público
I. — RELATÓRIO
1. Banco Comercial Português, S.A., intentou a presente acção executiva contra Roche Sistemas de Diagnóstico - Sociedade Unipessoal, Lda.
2. Roche Sistemas de Diagnóstico - Sociedade Unipessoal, Lda., opôs-se à execução, deduzindo embargos de executado.
3. A Executada / Embargante Roche Sistemas de Diagnóstico - Sociedade Unipessoal, Lda., ao deduzir embargos de executado, pagou taxa de justiça no valor de 612,00 euros.
4. A Exequente / Embargada Banco Comercial Português, S.A., ao contestar os embargos de executado deduzidos, pagou taxa de justiça no valor de 2.448,00 euros.
5. Em despacho saneador, fixou-se à causa o valor de 3.224.373,03 euros.
6. A sentença proferida pelo Tribunal de 1.º instância julgou parcialmente procedentes os presentes embargos deduzidos pela embargante contra o embargado e, em consequência, reduziu-se a quantia exequenda para o valor de 3.077.404,01 euros, acrescido dos juros vincendos calculados à taxa contratada, até ao efectivo e integral pagamento.
7. Inconformada, a Executada / Embargante Roche Sistemas de Diagnóstico - Sociedade Unipessoal, Lda., interpôs recurso de apelação.
8. Em acórdão de 3 de Março de 2022, o Tribunal da Relação de Lisboa julgou improcedente o recurso.
9. Inconformada, a Executada / Embargante Roche Sistemas de Diagnóstico - Sociedade Unipessoal, Lda., interpôs recurso de revista.
10. Em acórdão de 6 de Dezembro de 2022, o Supremo Tribunal de Justiça julgou improcedente o recurso.
11. A secretaria do Tribunal de 1.ª instância, calculou as custas devidas:
I. — aplicando ao processo e aos incidentes a tabela II-A do do Regulamento das Custas Processuais;
II. — aplicando aos recursos a tabela I-B do Regulamento das Custas Processuais; e
III. — considerando o valor tributável de 3.224.373,03 euros.
12. As partes reclamaram das contas respectivas, alegando:
I. — que devia aplicar-se aos recursos a tabela I-A do do Regulamento das Custas Processuais;
II. — que não devia aplicar-se ao presente processo o disposto no n.º 7 do artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais;
III. — que não devia aplicar-se ao presente processo o disposto no n.º 2 do artigo 7.º do Regulamento das Custas Processuais.
13. A Exequente / Embargada alegou ainda que o valor de referência para o cálculo da taxa de justiça deveria ser o valor do bem alienado na execução — 806.881,20 euros.
14. Em despacho de 2 de Maio de 2023, o Tribunal de 1.ª instância julgou parcialmente procedentes as reclamações, nos seguintes termos:
Face ao exposto, jugo parcialmente procedentes as reclamações e em conformidade determino a correção das contas nos seguintes termos:
— valor da causa €3.077.404,01;
— taxa de justiça devida pelo processo e incidentes a calcular por reporte à Tabela II A do RCP tal como decorre do nº.1 do artº. 7º do mesmo diploma;
— taxa de justiça devida pelos recursos a calcular por reporte à Tabela I B do RCP tal como decorre dos nºs. 2 dos artºs. 6º e 7º do mesmo diploma; e
— sem exigência da taxa de justiça adicional porque o valor referência para o seu cálculo é o que encontramos na Tabela II A do RCP.
15. O Ministério Público interpôs recurso principal do despacho de 2 de Maio de 2023, pedindo:
I. — que aos recursos fosse aplicada a Tabela I-B do Regulamento das Custas Processuais;
II. — que, aplicando-se a Tabela I-B do Regulamento das Custas Processuais, fosse revogado o despacho de 2 de Maio de 2023 no segmento em que se diz “sem exigência da taxa de justiça adicional porque o valor referência para o seu cálculo é o que encontramos na Tabela II A do RCP”.
16. A Executada / Embargante Roche Sistemas de Diagnóstico - Sociedade Unipessoal, Lda., interpôs recurso subordinado do despacho de 2 de Maio de 2023, pedindo:
I. — a título principal, que que o valor de referência para o cálculo da taxa de justiça fosse o valor do bem alienado na execução — 806.881,20 euros;
II. — a título subsidiário, que fosse concedida a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça ou, em todo o caso, uma “redução substancial” do valor do remanescente da taxa de justiça.
17. O Tribunal da Relação:
I. — julgou totalmente procedente o recurso principal interposto pelo Ministério Público;
II. — julgou totalmente improcedente o recurso subordinado interposto pela Executada / Embargante Roche Sistemas de Diagnóstico - Sociedade Unipessoal, Lda.
18. O dispositivo do acórdão recorrido é do seguinte teor:
Pelo exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar procedente o recurso principal e improcedente o recurso subordinado, revogando a sentença recorrida na parte em que determinou a não exigência da "taxa de justiça adicional" e mantendo no mais a sentença recorrida.
Custas do recurso principal a meias por embargante e embargada e custas do recurso subordinado pela embargante,
19. Inconformadas, a Exequente / Embargada Banco Comercial Português, S.A., e a Executada / Embargante Roche Sistemas de Diagnóstico - Sociedade Unipessoal, Lda., interpuseram recurso de revista.
20. A Exequente / Embargada Banco Comercial Português, S.A., finalizou a sua alegação com as seguintes conclusões:
A. O presente recurso tem como leit motiv a interpretação do artigo 14.º, n.º 9 do Regulamento das Custas Processuais, i.e., a aplicação de taxa de justiça remanescente.
B. Na primeira instância, o Tribunal decidiu, quanto às custas, condenar embargante e embargado na proporção de 95% e 5% respetivamente, e em despacho posterior não exigir às partes o pagamento da taxa de justiça adicional.
C. A impulso do Ministério Público, foi interposto recurso da decisão tomada no despacho que não exige às partes o pagamento da taxa de justiça adicional, e a 2.ª instância, revogando a decisão de primeira instância e dando provimento ao recurso do MP, decidiu, inter alia, quanto ao embargado, que “A dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça quando o responsável pelo impulso processual não é condenado a final resulta da lei. Na 1.ª instância, a embargada foi condenada nas custas da oposição à execução por embargos na proporção de 5%. Tal condenação não foi alterada nempela Relação nem peloSTJ, sendo de salientar que a condenação em custas na Relação diz respeito apenas ao recurso de apelação e a condenação em custas no STJ diz respeito apenas ao recurso de revista. Assim, ao contrário do defendido pela embargada, não beneficia esta da dispensa legal do pagamento do remanescente da taxa de justiça.” (sublinhado nosso)
D. A Recorrente não se conforma com essa interpretação, por a mesma estar em oposição direta com o acórdão proferido no Tribunal da Relação de Lisboa, processo n.º 939/16.1T8LSB-H.L1-2, de 24.11.2022 disponível in www.dgsi.pt, cuja cópia é junta às presentes alegações, e que decidiu, inter alia, que “o art. 14/9 do RCP (na redação da Lei 27/2019) aplica-se mesmo nos casos de condenaçõesparciais. A aplicação faz-se, nesses casos, na proporção do decaimento. Isto é, nestes casos, a conta final de cada uma das partes, tem de incluir as percentagens da taxa de justiça remanescente de cada uma das partes apuradas de acordo com a regra do decaimento.”
E. Recentemente, o Tribunal Constitucional, no Acórdão do TC n.º 69/2024, processo 1223/2022, Relator Conselheiro José António Teles Pereira pronunciou-se decidindo que a exigência de pagamento a quem não só não impulsionou a ação como nela obteve total vencimento traduz-se num ónus injustificado, que comprime desproporcionalmente o direito consagrado no artigo 20.º, n.º 1, da Constituição.
F. Analisando a proporcionalidade stricto sensu desta solução legislativa, o tribunal sublinha não dever ignorar-se as especificidades que caracterizam a situação do réu que, no final do processo, vem a ser absolvido do pedido. A sua posição é diferente da assumida pelo autor da ação.
G. Compreende-se que se exija a quem recorre à justiça (i. e., ao autor) que garanta o pagamento da taxa de justiça ainda em dívida, com o ónus de subsequentemente reaver tal quantia do réu, a título de custas de parte. Idêntica justificação já não é possível, porém, utilizar no que respeita a quem é acionado, sobretudo quando tem ganho final de causa.
H. O réu é chamado à demanda, ficando designadamente sob o ónus de apresentação da contestação indispensável a prevenir a condenação no pedido. Se o réu que apenas dá resposta ao impulso processual do autor, meramente defendendo-se, obtém a absolvição a final relativamente à totalidade do pedido - o que significa o desmerecimento da causa que o levou aos tribunais -, não se pode sustentar que tenha causado custos significativos à administração da Justiça. Ora, quando se exige a quem não recorreu à justiça - nem dela procurou retirar qualquer benefício -, tendo sido absolvido da pretensão do autor, o pagamento de parte substancial dos seus custos, surge um problema de justificação ao nível do custo-benefício. Numa tal ponderação a desproporção torna-se evidente na exigência do pagamento da taxa na dimensão que excede a taxa de justiça inicialmente paga -cujo pagamento é sempre legalmente exigido por necessariamente corresponder a uma ideia do custo básico inerente a uma litigância normal.
I. Por identidade de razão, e seguindo agora o acórdão fundamento: a interpretação da norma (artigo 14/9 do RCP) no sentido de que a norma só se aplica para o caso de o responsável pelo impulso processual não ter sido condenado em nada (i.e., vencimento / decaimento total), levaria a uma óbvia inconstitucionalidade, por violação do princípio da igualdade: para um caso em que a parte vence totalmente, a imputação da parte remanescente da sua taxa de justiça fica a cargo da [outra] parte, vencida, mas num caso em que a parte vence 99%, a parte remanescente da sua taxa de justiça fica totalmente a seu cargo. Se fosse assim, a alteração legal não faria sentido: para quê alterar a norma apenas para resolver os casos em que há um vencimento total, e não para todos os outros casos em que há um vencimento parcial, que poderá ser um vencimento quase total? Qual a diferença substancial, entre um e outro caso, que justificaria a diferença de tratamento?
J. Ora, para evitar este resultado e inconstitucionalidade, é possível fazer uma outra interpretação da norma que não tem dificuldade nenhuma. A norma rege para todos os casos em que uma das partes não seja a única condenada. Se for condenada em algo, a dispensa é para a parte proporcional em que não foi condenado.
K. Ou seja, a norma deve ser lida como se dissesse: “Nas situações em que deva ser pago o remanescente nos termos do n.º 7 do artigo 6.º, o responsável pelo impulso processual que não seja [único] condenado a final fica dispensado do referido pagamento [na parte proporcional ao seu vencimento], o qual é imputado à parte vencida e considerado na conta a final.”
L. Indo ao caso concreto, a presente ação executiva deu entrada em20.06.2019noTribunal Judicial da Comarca dos Açores, Juízo Central Cível e Criminal de ..., Juiz 2, sendo a quantia exequenda € 3.224.373,03
M. Foram deduzidos embargos de executado e, nesse âmbito, proferida a seguinte sentença: “Em face do exposto, julgo parcialmente procedentes os presentes embargos deduzidos pela embargante Roche Sistemas de Diagnóstico – Sociedade Unipessoal, Lda. contra o embargado Banco Comercial Português, S.A., e, em consequência: reduzo a quantia exequenda para o valor de € 3.077.404,01 (três milhões setenta e sete mil quatrocentos e quatro euros e um cêntimo), valor a que se devem acrescentar os juros vincendos calculados à taxa contratada, até efetivo e integral pagamento; no mais absolvendo o embargado Banco Comercial Português, S.A. Custas pela embargante e embargado na proporção de 95% e 5% respetivamente.”
N. Note-se que a redução da quantia exequenda se dá por efeito da redução do pedido em € 146.969,02, pelo embargado, em razão de ter recebido esse valor da venda do prédio hipotecado a seu favor, o 515, no âmbito do rateio parcial levado por diante no processo de insolvência da sociedade W..., Lda, facto que consta da sentença proferida em primeira instância.
O. Isto posto, a situação dos autos é em todo semelhante à descrita no acórdão cuja fundamentação se transcreveu, com a devida vénia.
P. Pelo que, havendo taxa de justiça remanescente a pagar pelo embargado, o cálculo da mesma sempre terá de ser feito em proporção, de acordo com a percentagem do seu decaimento (5%).
Q. Assim, mal andou o Tribunal da Relação ao decidir, tout court, que a embargada não beneficia da dispensa legal do pagamento do remanescente da taxa de justiça.
R. Por outro lado, as decisões de 2.ª instância e do Supremo Tribunal de Justiça, quanto a custas devidas pelos recursos, são as seguintes:
a) Na Relação de Lisboa: “Por todo o exposto, Acorda-se em julgar improcedente o recurso de apelação interposto pelo embargante, mantendo-se a decisão recorrida nos seus precisos termos. Custas pelo apelante.”
b) No Supremo Tribunal deJustiça: “Assim, em face do exposto, acorda-se em julgar improcedente o recurso (de revista), confirmando-se o acórdão recorrido. Custas pela embargante / recorrente (art.º 527.º, n.ºs 1 e 2, do CPC)”.
S. Em suma, o Recorrente (embargado) não deu azo à ação que origina os custos judiciais em causa (embargos de executado).
T. O seu decaimento em 5%, na primeira instância, corresponde à redução da quantia exequenda, na ação executiva a que estavam apensos os embargos, por via de recebimento ocorrido no âmbito de processo de insolvência de um dos obrigados.
U. Em segunda instância e no Supremo Tribunal de Justiça o embargado, sempre recorrido, obteve vencimento total e não deu impulso aos recursos.
V. Pelo que, verificando-se a oposição dos acórdãos sub judice e do acórdão fundamento no sentido em que deve ser interpretada a norma do artigo 14/9 do RCP e revogando o acórdão sub judice far-se-á inteira e sã Justiça!
21. O Ministério Público respondeu ao recurso interposto pela Exequente / Embargada Banco Comercial Português, S.A..
22. Finalizou a sua resposta com as seguintes conclusões:
1. O legislador no artigo 31.º, n.º 6 do Regulamento de Custas Processuais Decreto-lei n.º 34/2008, de 26 de Fevereiro ao estabelecer que “da decisão do incidente de reclamação e da proferida sobre as dúvidas do funcionário judicial que tiver efectuado a conta cabe recurso em um grau, se o montante exceder o valor de 50 UC.”, pretendeu limitar o acesso ao recurso de revista.
2. Estando perante recurso interposto de Acórdão proferido sobre um recurso interposto de uma decisão da 1.ª instância sobre o incidente de reclamação da conta, o prazo para interpor o recurso de revista excepcional, é de 15 dias e não de 30 dias.
3. Uma vez que a reclamação de custas é um incidente que segue uma tramitação que se inscreve nos trâmites seguidos pela ação em que está integrado, por isso, carece de autonomia procedimental, ou seja estranho ao desenrolar da lide, da instância, não tendo por isso mesmo, características de incidente da instância, pelo que prazo de interposição de recurso, não é o de 30 dias previsto no artigo 644.º n.º 1, alínea a) do CPC, mas sim o de 15 dias previsto nos artigos 644.º, n.º 2, alínea g) e 638.º, n.º 1 do CPC.
4. Dado que as normas constantes nos artigos 629.º, n.º 2, alínea d) e 671.º, n.º 2, alínea a), do Código de Processo Civil não preveem outro prazo para a sua interposição e consequentemente mantem-se o prazo de recurso previsto no artigo 644.º, n.º 2, alínea g) e 638.º, n.º 1 do CPC.
5. O apelante, ora recorrente, foi notificado do acórdão proferido nestes autos a 25.01.2014, na pessoa da sua Mandatária, no dia 21 de janeiro de 2024, através de transmissão eletrónica de dados (ref citius n.º ......39), pelo considera-se notificada a 30.01.2024.
6. O prazo de 15 dias para interposição de recurso de revista daquele acórdão ocorreu no dia 13 de fevereiro de 2024, sendo que o presente recurso foi introduzido no sistema a 29.02.2024 (ref citius ....52- ......10), já o prazo se mostrava ultrapassado.
7. Pelo que o recurso interposto é extemporâneo, nos termos e em conformidade com o disposto no artigo 638.º, n.º 1, 2.ª parte, 641.º, n.º 1, alínea a) e 644.º, n.º 2, alínea g), todos do Código de Processo Civil e consequentemente não pode ser admitido.
Face ao exposto, e nos mais de Direito que V. Exas doutamente suprirão, deverá o recursoderevista interpostopela Recorrenteserrejeitadoporextemporâneo mantendo-se na íntegra o decidido no acórdão recorrido, com o que farão, V. Excelências, aliás como sempre, JUSTIÇA!
23. A Executada / Embargante Roche Sistemas de Diagnóstico - Sociedade Unipessoal, Lda..
24. Finalizou a sua alegação com as seguintes conclusões:
A. As presentes Alegações vêm apresentadas do Acórdão proferido pelo douto Tribunal Relação de Lisboa, no dia 25.01.2024, (Ref.ª21059586), por se discordar da tese vertida contrária à da 1.ª instância no sentido de se exigir o pagamento do remanescente de taxa de justiça pelas instâncias recursivas no âmbito do presente Processo.
B. O presente recurso de revista é admissível, por via do disposto nos artigos 629.º, n.º 2, alínea d) e 671.º, n.º 2, alínea a) do CPC, por haver “contradição de julgados” entre o Acórdão sob revista e o Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto, em 13.01.2020, e já transitado em julgado em 03.02.2020 cujos objetos se situam no domínio da mesma legislação (o DL n.º 34/2008, de 26 de Fevereiro – RCP) e tratam da mesma questão fundamental de direito (artigos 6.º, n.ºs 2 e 7 e 7.º, n.ºs 1 e 2, do RCP).
C. Enquanto no Acórdão Fundamento se decidiu que o nº 2 do artigo 7.º, não é aplicável aos recursos interpostos nos incidentes/processos especificados no n.º 4, do artigo 7.º, e Tabela II-A, não havendo lugar ao pagamento do remanescente da taxa de justiça pelo n. 7, do artigo 6.º, do RCP, no Acórdão sob revista entendeu-se precisamente o contrário.
D. Da leitura de tais decisões constata-se a clara “contradição entre julgados” em função da existência de i) identidade normativa, de ii) divergência na resolução da mesma questão fundamental de direito e de iii) essencialidade dessa divergência para o desfecho das decisões em confronto (cf. artigos 41.º, 42.º e 43.º, das presentes alegações).
E. Conforme se demonstrou em sede de motivação de recurso, a nossa Jurisprudência tem entendido que no âmbito dos Processos especiais previstos n.º 4, do artigo 7.º e tipificados na Tabela II-A, do RCP (como é o presente Processo de Execução), as custas processuais ao longo de todo o processo (incluindo instâncias recursivas), são calculadas de acordo com o disposto no n.º 1, do artigo 7.º e da Tabela II-A, do RCP, não havendo lugar ao pagamento do remanescente da taxa de justiça nos termos da Tabela I-B por remissão do n.º 2, do artigo 7.º, do RCP.
F. Servindo de exemplo o Ac. do TRP de 13.01.2020, Proc. 10526/19.7T8PRT-A.P1; o Ac. TRG, de 24.01.2019, Proc. 2589/17.6T8BRG-A.G1; o Ac. TRE de 09.11.2017, Proc. 2052/15.0T8FAR.E2, e o Ac. do TRG de 15.02.2024, Proc. 3870/20.2T8GMR.G1 (cf. artigos 35.º, 47.º, 48.º, e 49.º, das presentes alegações e Docs. 1, 2, 3, e 4, adiante juntos).
G. Com efeito, a tese contrária é passível de contrariar a unidade do sistema jurídico e da intenção do legislador no sentido de a taxa de justiça devida nas instâncias recursivas não ser superior à devida pelo impulso inicial de um Processo.
H. É uma tese que não só restringe e viola a lei expressa (designadamente, a exceção contemplada na 2.ª parte n.º 1 e o disposto no n.º 4, do artigo 7.º, do RCP), como é manifestamente inconstitucional (porquanto violadora do direito de acesso aos tribunais, conjugado com os Princípio de Estado de Direito, Proporcionalidade e Igualdade, consagrados nos artigos 20.º, 2.º, 18.º, n.º 2, 2.ª parte, 266.º, n.º 2, e 13.º, da CRP) (cf. artigos 80.º a 100.º, das presentes alegações).
I. De facto, e de harmonia com a nossa Lei Fundamental, o custo associado ao acesso aos Tribunais não pode ser tão elevado que da sua aplicação resulte uma verdadeira negação de Justiça aos cidadão, devendo existir uma correspondência mínima entre os serviços prestados e o custo razoável do sistema de justiça, sob pena de se colocar em causa o direito de propriedade relativamente às disponibilidades financeiras, em violação do direito de acesso aos tribunais, conjugado os Princípio de Estado de Direito, Proporcionalidade (cf. artigos 20.º, 2.º, 18.º, n.º 2, 2.ª parte, 266.º, n.º 2, da CRP).
J. Como se demonstrou o Tribunal Constitucional considera que a taxa de justiça configura uma verdadeira “taxa” e que os seus critérios devem respeitaras imposições constitucionais da proporcionalidade (artigo 18.º, n.º 2, segunda parte, da CRP) e da tutela do acesso ao direito e à justiça (artigo 20.º da CRP).
K. No caso em apreço, é evidente, que a aplicação da tabela I-B do RCP aos recursos do presente processo, resulta, do ponto de vista material e jurídico, no pagamento de uma taxa de justiça desproporcional, sem correspetividade entre a prestação pecuniária a pagar e a prestação concreta de um serviço pelo Estado ou por outra entidade pública, na utilização de um bem do domínio público ou na remoção de um obstáculo jurídico ao comportamento da Recorrente.
L. Efetivamente no presente caso, a aplicação da Tabela I-B às custas devidas pelos Recursos de Apelação e de Revista implicou que estas fossem cerca de 31 (trinta e uma) vezes superiores às custas devidas pelo julgamento da presente Ação perante o douto Tribunal de 1.ª instância, verificando-se, assim, uma restrição inadmissível do direito de Recurso das Partes, num claro excesso de tributação no âmbito do presente processo especial que pela sua natureza assume uma maior simplicidade e celeridade processual (cf. artigos 101.º a 116.º, das presentes alegações).
M. Consequentemente, ao aplicar-se uma taxa de justiça a um Recurso, no âmbito dos Processos especiais previstos no n.º 2, do artigo 7.º e na Tabela II, do RCP, exponencialmente superior ao da taxa de justiça fixada pelo Processo em 1.ª instância – como sucede no presente caso – traduz-se numa restrição inadmissível do direito de recurso das partes, o que implica necessariamente, uma inconstitucionalidade, por violação do disposto do princípio da proporcionalidade e do princípio da tutela jurisdicional efetiva.
N. Ademais, de harmonia com a nossa Lei Fundamental, a aplicação de taxas de justiça superiores em sede de Recurso às da 1.ª instância, nos Processos Especiais, também sempre seria passível de violar o Princípio da Igualdade consagrado no artigo 13.º, da CRP, por relação aos Processos Comuns sujeitos às regras gerias do artigo 6.º, do RCP, nos termos das quais as taxas de justiça devidas pelos Recursos são sempre inferiores às da 1.ª instância.
O. Termos em que, deve tal sistema normativo de direito ordinário ser arredado nos termos e para o s efeitos do disposto no artigo 204.º, da CRP, revogando-se o Acórdão sob revista, e mantendo-se a decisão de não exigência do pagamento do remanescente da taxa de justiça.
P. A titulo de 2.º erro de julgamento, demonstrou-se que as questões de facto e de direito dos Recursos da Recorrente se encontravam umbilicalmente ligadas ao prédio em causa, e não à dívida exequenda (designadamente, a questão sobre a ilegalidade da escritura de anexação e reforço de garantia, e, da ilegitimidade da ora Recorrente para figurar como Executada na presente Ação Executiva), motivo pelo qual o valor da sucumbência corresponderia ao valor do prédio determinado em sede de Auto de Penhora editável junto aos autos principais com a Ref.ª 3365511 (€ 806.881,20).
Q. Termos em que, a falta de indicação especifica do valor da sucumbência no presente caso sempre deve ser irrelevada, porquanto esse valor é facilmente determinável em função do próprio regime dos Embargos de Terceiro (cf. Ac. TRL de 17.01.2013, Proc. 3824/10.7TBVFX.L1-6;Ac. TRG de 26.03.2015, Proc. 1269/06.2TBBCL-B.G1, Ac. STJ de 28.03.2019, Proc. 413/14.0TBOAZ.P2.S2 e Ac. STJ de 02.03.223, Proc. 2209/14.0TBBRG-C.G1.S1).
R. Não obstante, e a ser aplicada a tributação pela Tabela I-B, então deve ser apreciado o pedido de dispensa e/ou redução substancial desse valor conforme requerido pela ora Recorrente, e isto, caso se julgue procedente, para efeitos de tributação, a limitação dos valores dos Recursos e respetivas Contra-Alegações nos termos do n.º 2, do artigo 12.º, do RCP (€ 806.881,20) ou o valor fixado para a dívida exequenda (€ 3.077.404,01).
S. Ou seja, na procedência de qualquer uma das referidas teses, o valor a apurar na sequência do estatuído no n.º 7, do artigo 6.º, do RCP, deve sempre corresponder à uma contrapartida monetária justa e proporcional pelo serviço público prestado na Administração da Justiça, sob pena de violação daqueles Princípios da Proporcionalidade e de Tutela Jurisdicional Efetiva.
T. E não se diga que tal pedido deve ser considerado extemporâneo porquanto deduzido apenas no prazo de reclamação da Conta, e não até ao trânsito em julgado do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça nos termos do AUJ n.º 1/2022, pois que, como é consabido, este não tem força obrigatória geral ou efeito vinculativo extra-processual, podendo vir a ser contrariado, como o foi com 6 (seis) votos de vencido.
U. Com efeito, e acompanhando-se o entendimento do voto de vencido do Venerando Desembargador Rijo Ferreira, e a nossa jurisprudência mais autorizada na matéria (v.g. Ac. TRE de 06.10.2016, Proc. 4774/10.2PTM-A.E1; TRL de 03.12.2013, Proc. 1586/08.7TCLRS-L2-7, e Ac. TCAN de 08.01.2016, Proc. 01155/10.1BEBRG), deve ser entendido que a Parte pode requerer a dispensa ou redução do pagamento do valor remanescente de taxa de justiça no prazo de 10 dias após a notificação da conta, pois que, só nesse altura (pós liquidação), é que as Partes ficam verdadeiramente conhecedoras desse valor e da inexistência de pronúncia oficiosa do Juiz quanto à dispensa.
V. A este propósito evidenciou-se que a ora Recorrente confiando no entendimento preconizado pela nossa Jurisprudência no sentido da inaplicabilidade do regime da Tabela I-B aos recursos interpostos no âmbito do presente processo especial, não perspetivou sequer que aquele viesse a ser aplicado, e que, por isso, devesse requerer a dispensa e/ou redução desse valor aquando da notificação do Acórdão sobre a sua Revista.
W. Termos em que deve ser considerado materialmente inconstitucional, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 204.º, da CRP, o regime decorrente do disposto no n.º 7, do artigo 6.º e 31.º, do RCP, no presente caso, porquanto as taxas de justiça das instâncias recursivas excedem de forma gritante e intolerável a proporção entre o serviço de justiça prestado pelo Estado e a contrapartida pecuniária dos sujeitos processuais, violando os Princípios da Proporcionalidade (ou de Proibição do Excesso), do Estado de Direito Democrático (cf. artigos 2.º e 18.º n.º 2, 2.ª parte, da CRP) e da Tutela do Direito de Acesso à Justiça (art.º 20.º da CRP) (v.g. Ac. TRL de 04.06.2020, Proc. 9677/15.1T8LSB-L1-2).
X. Sem prejuízo, deve o pedido de dispensa de pagamento do remanescente de taxa de justiça relativo às instâncias recursivas ser julgado procedente, por provado, dispensando-se a totalidade do pagamento do remanescente da taxa de justiça devida nos termos do artigo 6.º, n.º 7, do RCP, conforme requerido a final nas presentes alegações.
Y. Tal dispensa tem por fundamentos: a ponderação entre custo/utilidade do serviço efectivamente prestado às Partes pelo sistema público de Administração da Justiça; a simplicidade decisória dos autos, e a conduta positiva de cooperação das Partes em juízo, nos termos demonstrados em artigos 192.º a 198.º, destas alegações.
Termos em que,
Deve o presente Recurso de Revista ser admitido e julgado procedente, por provado, e, em consequência, deve o Acórdão sob revista proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa ser revogado, mantendo-se a decisão de não exigência do remanescente de taxa de justiça, nos termos e com os fundamentos supra expostos;
Ou caso assim não se entenda,
Deve o presente Recurso de Revista ser julgado parcialmente procedente, por provado, e, em consequência, serem reformadas as Contas de Custas no que às instâncias recursivas concerne, de acordo com o valor da sucumbência fixado e delimitado em sede de Recursos de Apelação e de Revista correspondente ao valor do prédio em causa, dispensando-se ou reduzindo-se substancial e proporcionalmente tal valor, nos termos e com os fundamentos supra expostos;
Ou caso assim não se entenda,
Deve o presente Recurso de Revista ser julgado parcialmente procedente, por provado, no que concerne ao pedido de dispensa ou redução substancial e proporcional do valor devido a titulo de remanescente da taxa de justiça pelas instâncias recursivas, nos termos e com os fundamentos supra expostos;
Mais deve ser deferido o pedido de dispensa do pagamento do remanescente de taxa de justiça devida na 1.ª e 2.ª instâncias, e/ou reduzido substancialmente o seu valor, nos termos e fundamentos supra invocados, conforme de requer,
Assim se fazendo a acostumada JUSTIÇA!
25. O Ministério Público respondeu ao recurso interposto pela Executada / Embargante Roche Sistemas de Diagnóstico - Sociedade Unipessoal, Lda.
26. Finalizou a sua resposta com as seguintes conclusões:
1. O legislador no artigo 31.º, n.º 6 do Regulamento de Custas Processuais Decreto-lei n.º 34/2008, de 26 de Fevereiro ao estabelecer que “da decisão do incidente de reclamação e da proferida sobre as dúvidas do funcionário judicial que tiver efectuado a conta cabe recurso em um grau, se o montante exceder o valor de 50 UC.”, pretendeu limitar o acesso ao recurso de revista.
2. Estando perante recurso interposto de Acórdão proferido sobre um recurso interposto de uma decisão da 1.ª instância sobre o incidente de reclamação da conta, o prazo para interpor o recurso de revista excepcional, é de 15 dias e não de 30 dias.
3. Uma vez que a reclamação de custas é um incidente que segue uma tramitação que se inscreve nos trâmites seguidos pela ação em que está integrado, por isso, carece de autonomia procedimental, ou seja estranho ao desenrolar da lide, da instância, não tendo por isso mesmo, características de incidente da instância, pelo que prazo de interposição de recurso, não é o de 30 dias previsto no artigo 644.º n.º 1, alínea a) do CPC, mas sim o de 15 dias previsto nos artigos 644.º, n.º 2, alínea g) e 638.º, n.º 1 do CPC.
4. Dado que as normas constantes nos artigos 629.º, n.º 2, alínea d) e 671.º, n.º 2, alínea a), do Código de Processo Civil não preveem outro prazo para a sua interposição e consequentemente mantem-se o prazo de recurso previsto no artigo 644.º, n.º 2, alínea g) e 638.º, n.º 1 do CPC.
5. A apelante, ora recorrente, foi notificada do acórdão proferido nestes autos a 25.01.2014, na pessoa da sua Mandatária, no dia 21 de janeiro de 2024, através de transmissão eletrónica de dados (ref citius n.º ......38), pelo considera-se notificada a 30.01.2024.
6. O prazo de 15 dias para interposição de recurso de revista daquele acórdão ocorreu no dia 13 de fevereiro de 2024, sendo que o presente recurso foi introduzido no sistema a 28.02.2024 (ref citius ....14- ......08), já o prazo se mostrava ultrapassado.
7. Pelo que o recurso interposto é extemporâneo, nos termos e em conformidade com o disposto no artigo 638.º, n.º 1, 2.ª parte, 641.º, n.º 1, alínea a) e 644.º, n.º 2, alínea g), todos do Código de Processo Civil e consequentemente não pode ser admitido.
Face ao exposto, e nos mais de Direito que V. Exas doutamente suprirão, deverá o recurso de revista interposto pela Recorrentese rejeitado por extemporâneo mantendo-se na íntegra o decidido no acórdão recorrido, com o que farão, V. Excelências, aliás como sempre, JUSTIÇA!
27. Como o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões do recorrente (cfr. artigos 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1, do Código do Processo Civil), sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (cfr. artigos 608.º, n.º 2, ex vi do artigo 663.º, n.º 2, do Código do Processo Civil), as questões a decidir, in casu, consistiriam em determinar:
— se o n.º 2 do artigo 7.º do Regulamento das Custas Processuais deve aplicar-se aos recursos das decisões tipificadas no n.º 4 do artigo 7.º e na tabela II-A do Regulamento das Custas Processuais e, caso afirmativo, se as partes estão obrigadas ao pagamento do remanescente da taxa de justiça, por aplicação da tabela i-A, em ligação com o n.º 7 do artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais [conclusões A-Q do recurso interposto pela Executada / Embargante];
— se o artigo 14.º, n.º 9, do Regulamento das Custas Processuais deve aplicar-se aos casos em que haja uma condenação parcial do responsável pelo impulso processual e, caso afirmativo, se as partes só estão obrigadas pagamento de uma parte proporcional do remanescente da taxa de justiça [conclusões A-V do recurso interposto pelo Exequente / Embargado];
— se as partes podem requerer a dispensa do pagamento da taxa de justiça na reclamação da conta de custas [conclusões R-U do recurso interposto pela Executada / Embargante] e, caso afirmativo, se deve deferir-se o pedido da Executada / Embargante de dispensa do remanescente da taxa de justiça [conclusões V-Y do recurso interposto pela Executada / Embargante].
II. — FUNDAMENTAÇÃO
OS FACTOS
28. Os factos relevantes para a decisão constam do relatório precedente.
O DIREITO
29. O artigo 31.º, n.º 6, do Regulamento das Custas Processuais é do seguinte teor:
Da decisão do incidente de reclamação e da proferida sobre as dúvidas do funcionário judicial que tiver efectuado a conta cabe recurso em um grau, se o montante exceder o valor de 50 UC.
30. O artigo 31.º, n.º 6, do Regulamento das Custas Processuais circunscreve o acesso ao Supremo Tribunal de Justiça aos casos em que o recurso seja sempre admissível 1 2.
31. Entre os casos em que o recurso é sempre admissível está o caso do artigo 629.º, n.º 2, alínea d), do Código de Processo Civil:
Independentemente do valor da causa e da sucumbência, é sempre admissível recurso: […]
d) Do acórdão da Relação que esteja em contradição com outro, dessa ou de diferente Relação, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, e do qual não caiba recurso ordinário por motivo estranho à alçada do tribunal, salvo se tiver sido proferido acórdão de uniformização de jurisprudência com ele conforme.
32. O Ministério Público alega que os dois recursos são intempestivos, devendo aplicar-se ao recurso de revista o artigo 638.º, n.º 1, segunda parte, em ligação com o 644.º, n.º 1, alínea g), do Código de Processo Civil.
33. O artigo 638.º, n.º 1, segunda parte, determina que o prazo para a interposição de recurso se reduza para 15 dias nos processos urgentes e nos casos previstos no n.º 2 do artigo 644.º e no artigo 677.º.
34. Ora o caso sub judice coordenar-se-ia à alínea g) do n.º 2 do artigo 644.º:
2. — Cabe ainda recurso de apelação das seguintes decisões do tribunal de 1.ª instância:
g) De decisão proferida depois da decisão final.
35. Embora deva admitir-se que “[n]ão [há] razão para que o prazo seja diferente no recurso de apelação e no [recurso] de revista”, considera-se a aplicação do prazo de 15 dias do artigo 638.º, n.º 1, segunda parte, aos recursos de revista interpostos ao abrigo do artigo 629.º, n.º 2, alínea d), do Código de Processo Civil seria em concreto susceptível de comprometer o direito ao recurso da parte que houvesse confiado na aplicação literal da lei 3.
36. Esclarecida a questão da tempestividade dos recursos, deve entrar-se na apreciação das questões suscitadas pelas partes — pela Exequente e pela Executada.
37. Em relação às duas primeiras questões — se o n.º 2 do artigo 6.º e o n.º 2 do artigo 7.º do Regulamento das Custas Processuais devem aplicar-se aos recursos das decisões tipificadas no n.º 4 do artigo 7.º e na tabela II-A do Regulamento das Custas Processuais e, caso afirmativo, se as partes estão obrigadas ao pagamento do remanescente da taxa de justiça, por aplicação da tabela I-A, em ligação com o n.º 7 do artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais —, a Executada / Embargante Roche Sistemas de Diagnóstico alega que há uma contradição entre o acórdão recorrido e o acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 13 de Janeiro de 2020 — processo n.º 10526/19.7T8PRT-A.P1.
38. A questão de direito sobre a qual recairia a contradição relaciona-se com a interpretação dos n.ºs 1 e 2 do artigo 6.º e com os n.º 1, 2 e 4 do artigo 7.º do Regulamento das Custas Processuais:
Artigo 6.º — Regras gerais
1. — A taxa de justiça corresponde ao montante devido pelo impulso processual do interessado e é fixada em função do valor e complexidade da causa de acordo com o presente Regulamento, aplicando-se, na falta de disposição especial, os valores constantes da tabela I-A, que faz parte integrante do presente Regulamento.
2. — Nos recursos, a taxa de justiça é sempre fixada nos termos da tabela I-B, que faz parte integrante do presente Regulamento. […]
Artigo 7.º — Regras especiais
1. — A taxa de justiça nos processos especiais fixa-se nos termos da tabela I, salvo os casos expressamente referidos na tabela II, que fazem parte integrante do presente Regulamento.
2. — Nos recursos, a taxa de justiça é fixada nos termos da tabela I-B e é paga pelo recorrente com as alegações e pelo recorrido que contra-alegue, com a apresentação das contra-alegações. […]]
4. — A taxa de justiça devida pelos incidentes e procedimentos cautelares, pelos procedimentos de injunção, incluindo os procedimentos europeus de injunção de pagamento, pelos procedimentos anómalos e pelas execuções é determinada de acordo com a tabela ii, que faz parte integrante do presente Regulamento.
39. O acórdão recorrido considerou que a taxa de justiça aplicável à acção executiva e aos seus incidentes devia ser fixada nos termos da tabela II-A (artigo 7.º, n.ºs 1 e 4, do Regulamento das Custas Processuais) e que a taxa de justiça aplicável aos recursos devia ser fixada nos termos da tabela I-B (artigos 6.º, n.º 2, e 7.º, n.º 2, do Regulamento das Custas Processuais).
40. Em consequência, decidiu que devia aplicar-se aos recursos a regra de que, “[para além dos 275 000 euros, ao valor da taxa de justiça acresce, a final, por cada 25 000 euros ou fracção, 3 UC, no caso da col. A, 1,5 UC, no caso da col. B, e 4,5 UC, no caso da col. C”.
41. O acórdão fundamento considerou que a taxa de justiça aplicável à acção executiva e aos seus incidentes devia ser fixada nos termos da tabela II-A (artigo 7.º, n.ºs 1, in fine, e 4, do Regulamento das Custas Processuais) e que a taxa de justiça aplicável aos recursos devia ser fixada nos termos da tabela II-A, fazendo-se uma interpretação restritiva dos artigos 6.º, n.º 2, e 7.º, n.º 2, do Regulamento das Custas Processuais, para que não se apliquem aos casos previstos no artigo 7.º, n.ºs 1, in fine, e 4, do Regulamento das Custas Processuais.
42. Em consequência, decidiu que não devia aplicar-se aos recursos a regra devia aplicar-se aos recursos a regra de que, “[para além dos 275 000 euros, ao valor da taxa de justiça acresce, a final, por cada 25 000 euros ou fracção, 3 UC, no caso da col. A, 1,5 UC, no caso da col. B, e 4,5 UC, no caso da col. C”.
43. Existindo uma contradição relevante para efeitos do artigo 629.º, n.º 2, alínea d), do Código de Processo Civil, deverá apreciar-se a questão suscitada pela Executada / Embargante.
44. O texto do artigo 6.º, n.º 2, do Regulamento das Custas Processuais, ao convocar o advérbio sempre, depõe no sentido de que a tabela I-B seja aplicável a todos os recursos 4.
45. O facto de a taxa de justiça aplicável à acção e aos incidentes e a taxa de justiça aplicável aos recurso serem fixadas de acordo com tabelas diferentes explica-se ou justifica-se atendendo às diferenças entre o regime dos processos cuja taxa de justiça em 1.º instância é fixada nos termos da tabela I e o o regime processos cuja taxa de justiça em 1.º instância é fixada nos termos da tabela II.
46. Os processos cuja taxa de justiça em 1.º instância é fixada nos termos da tabela II são quase sempre processos em que o recurso só é admissível em circunstâncias excepcionais, determinadas em termos restritivos — o legislador, através da distinção entre as taxas de justiça em 1.ª instância e as taxas de justiça em 2.ª e em 3.ª instâncias, terá pretendido reforçar a excepcionalidade das circunstâncias em que é admissível o recurso 5.
47. O perigo de as taxas de justiça em 2.ª e em 3.ª instância serem desproporcionadas ou excessivas é prevenido pelo n.º 7 do artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais:
“… o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento”.
48. Em consequência, a compressão do direito de acesso à justiça 6 resultante do Regulamento das Custas Processuais é compatível com os princípios e regras constitucionais — com o princípio da igualdade 7, por não causar nenhuma discriminação arbitrária ou injustificada, e com o princípio da proporcionalidade 8, por não causar nenhuma restrição desproporcionada ou excessiva de direitos fundamentais.
49. Em resposta à primeira e à segunda questões, dir-se-á que:
I. — o n.º 2 do artigo 6.º e o n.º 2 do artigo 7.º do Regulamento das Custas Processuais devem aplicar-se aos recursos das decisões tipificadas no n.º 4 do artigo 7.º e na tabela II-A do Regulamento das Custas Processuais
II. — em consequência, as partes estão obrigadas ao pagamento do remanescente da taxa de justiça, por aplicação da tabela I-A, em ligação com o n.º 7 do artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais.
50. Em relação à terceira e à quarta questões — se o artigo 14.º, n.º 9, do Regulamento das Custas Processuais deve aplicar-se aos casos em que haja uma condenação parcial do responsável pelo impulso processual e, caso afirmativo, se as partes só estão obrigadas pagamento de uma parte proporcional do remanescente da taxa de justiça —, o Exequente / Embargado alega que há uma contradição entre o acórdão recorrido e o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 24 de Novembro de 2022 — processo n.º 939/16.1T8LSB-H.L1-2.
51. A questão de direito sobre a qual recairia a contradição relaciona-se com n.º 9 do artigo 14.º do Regulamento das Custas Processuais:
9. — Nas situações em que deva ser pago o remanescente nos termos do n.º 7 do artigo 6.º, o responsável pelo impulso processual que não seja condenado a final fica dispensado do referido pagamento, o qual é imputado à parte vencida e considerado na conta a final.
52. O acórdão recorrido interpretou o n.º 9 do artigo 14.º no sentido de que só se aplica desde que o responsável pelo impulso processual não seja condenado a final.
53. Constatando que “a Embargada foi condenada nas custas da oposição à execução por embargos na proporção de 5%” e que a condenação da Embargada nas custas não foi alterada nem pela Relação, nem pelo Supremo, o acórdão recorrido concluiu que não devia aplicar-se o n.º 9 do artigo 14.º do Regulamento da Custas Processuais — a Exequente / Embargada teria sido condenada a final.
54. O acórdão fundamento interpretou o n.º 9 do artigo 14.º no sentido de que se aplica ainda que o responsável pelo impulso processual seja condenado a final, desde que o seja só parcialmente:
I. - O art. 14/9 do RCP (na redacção da Lei 27/2019) aplica-se mesmo nos casos de condenações parciais. A aplicação faz-se, nesses casos, na proporção do decaimento. Isto é, nestes casos, a conta final de cada uma das partes tem de incluir as percentagens da taxa de justiça remanescente de cada uma das partes, apuradas de acordo com a regra do decaimento.
II - A nova redacção do art. 14/9 do RCP aplica-se a todas as contas que tivessem de ser elaboradas depois de a Lei 27/2019 ter sido publicada, desde que a taxa de justiça remanescente não tivesse sido já paga.
55. Existindo uma contradição relevante para efeitos do artigo 629.º, n.º 2, alínea d), do Código de Processo Civil, deverá apreciar-se a questão suscitada pela Exequente / Embargada.
56. A antiga redacção do n.º 9 do artigo 14.º do Regulamento das Custas Processuais dizia que
Nas situações em que deva ser pago o remanescente nos termos do n.º 7 do artigo 6.º e o responsável pelo impulso processual não seja condenado a final, o mesmo deve ser notificado para efectuar o referido pagamento, no prazo de 10 dias a contar da notificação da decisão que ponha termo ao processo.
57. O acórdão do Tribunal Constitucional n.º 615/2018, de 21 de Novembro de 2018, decidiu julgar inconstitucional “a norma que impõe a obrigatoriedade de pagamento do remanescente da taxa de justiça ao réu que venceu totalmente o processo, obrigando-a a pedir o montante que pagou em sede de custas de parte, resultante do artigo 14.º, n.º 9, do RCP”.
58. O fundamento do juízo de inconstitucionalidade encontrava-se no princípio da proporcionalidade, na vertente de proporcionalidade em sentido estrito:
“A exigência do pagamento do remanescente da taxa de justiça ao réu que, por ser absolvido do pedido, venceu totalmente a acção civil e, por conseguinte, não é condenado em custas, obrigando-o a obter o montante que pagou em sede de custas de parte, revela-se […] uma solução inconstitucional porque comprime excessivamente o direito fundamental de acesso à justiça, previsto no artigo 20.º, n.º 1, da Constituição, impondo um ónus injustificado face ao interesse público em presença em violação do princípio da proporcionalidade decorrente do artigo 18.º, n.º 2º, da Constituição” 9.
59. A nova redacção do n.º 9.º do artigo 14.º do Regulamento das Custas Processuais, ao dizer que “o responsável pelo impulso processual que não seja condenado a final fica dispensado do […] pagamento [do remanescente da taxa de justiça]”, resolveu o problema, substituindo uma regra desproporcionada por uma regra proporcionada 10.
60. O contexto do n.º 9.º do artigo 14.º do Regulamento das Custas Processuais depõe no sentido de que o n.º 9 do artigo 14.º se aplique ainda que o responsável pelo impulso processual seja condenado a final, desde que o seja só parcialmente.
61. A razão de ser da nova redacção do n.º 9 do artigo 14.º do Regulamento das Custas Processuais é o princípio da proporcionalidade, na vertente de proporcionalidade em sentido estrito — ora, na perspectiva do princípio da proporcionalidade, na vertente de proporcionalidade em sentido estrito, é indiferente a circunstância de o responsável pelo impulso processual ter vencido totalmente o processo ou de o ter vencido quase totalmente.
62. Em resposta à terceira e à quarta questões, dir-se-á que:
I. — o artigo 14.º, n.º 9, do Regulamento das Custas Processuais deve aplicar-se aos casos em que haja uma condenação parcial do responsável pelo impulso processual;
II. — em consequência, as partes só estão obrigadas ao pagamento de uma parte proporcional do remanescente da taxa de justiça:
a. — o Exequente / Embargado só está obrigado ao pagamento de 5% do remanescente da taxa de justiça;
b. — a Executada / Embargante só está obrigada ao pagamento de 95% do remanescente da taxa de justiça.
63. Em relação às duas últimas questões — se as partes podem requerer a dispensa do pagamento da taxa de justiça na reclamação da conta de custas e, caso afirmativo, se deve deferir-se o pedido da Executada / Embargante de dispensa do remanescente da taxa de justiça —, dir-se-á que o acórdão recorrido está conforme o acórdão de uniformização de jurisprudência n.º 1/2022, de 10 de Novembro de 2021 11, e que não se encontra nenhuma razão para um desvio relativamente à jurisprudência uniformizada.
64. O facto de o acórdão recorrido estar conforme o acórdão de uniformização de jurisprudência n.º 1/2022, de 10 de Novembro de 2021 obsta à admissão, nesta parte, do recurso e, ainda que não obstasse a admissão, sempre o facto de não se encontrar nenhuma razão suficiente para um desvio relativamente á jurisprudência uniformizada obstaria à sua procedência, nesta parte.
III. — DECISÃO
Face ao exposto,
I. — concede-se provimento à revista interposta pela Exequente / Embargada Banco Comercial Português, S.A.
II. — nega-se provimento à revista interposta pela Executada / Embargante Roche Sistemas de Diagnóstico - Sociedade Unipessoal, Lda.;
III. — revoga-se parcialmente o acórdão recorrido, determinando-se:
a. — que o valor da taxa de justiça adicional devida por cada uma das partes deve ser proporcional à percentagem em que cada uma foi condenada em custas;
e, em consequência, que
b. — o valor da taxa de justiça adicional devida pela Exequente / Embargada Banco Comercial Português, S.A., fica limitado a 5% do valor total;
c. — o valor da taxa de justiça adicional devida pela pela Executada / Embargante Roche Sistemas de Diagnóstico - Sociedade Unipessoal, Lda. fica limitada a 95% do valor total.
Pelo recurso interposto pela Exequente / Embargada Banco Comercial Português, S.A., não são devidas custas.
Pelo recurso interposto pela Executada / Embargante Roche Sistemas de Diagnóstico - Sociedade Unipessoal, Lda., são devidas custas — a cargo da Recorrente.
Lisboa, 28 de Maio de 2024
Nuno Manuel Pinto Oliveira
Maria de Deus Correia
Fátima Gomes (com declaração de voto)
DECLARAÇÃO DE VOTO
Não acompanho a posição adoptada na parte relativa a um dos pressupostos de admissibilidade do recurso, por entender que devia ter sido interposto em 15 dias.
Lisboa, 28 de Maio de 2024
Fátima Gomes
_______
1. Cf. designadamente o sumário do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13 de Julho de 2017 — processo n.º 669/10.8TBGRD-B.C1.S1 —: “Face à norma limitativa do artigo 31º, nº6, do RCP, das decisões proferidas no âmbito do incidente de reclamação da conta de custas apenas cabe um grau de recurso – admitindo-se, porém, o acesso ao Supremo Tribunal de Justiça nos casos em que o recurso é sempre admissível, nos termos do artigo 629º do CPC”.
2. Concordando com o critério enunciado no acórdão de 13 de Julho de 2017 — processo n.º 669/10.8TBGRD-B.C1.S1 —, vide, por último, os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 28 de Março de 2019 — processo n.º 413/14.0TBOAZ.P2.S2 —, de 9 de Julho de 2020 — processo n.º 942/06.0 TBCSC.L3.S1 — e de de 27 de Outubro de 2020 — processo n.º 565/13.7TBAMT-G.P3.S1.
3. Vide, para um caso comparável, José Lebre de Freitas / Armindo Ribeiro Mendes / Isabel Alexandre, anotação ao artigo 638.º, in: Código de Processo Civil anotado, vol. III — Artigos 627.º-877.º, 3.ª ed., Livraria Almedina, Coimbra, 2022, págs. 81-87 (82-83).
4. Vide, no mesmo sentido, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27 de Abril de 2023 — processo n.º 12144/21.0T8LSB.L1.S1 —, em cujo sumário se escreve: “II. — Em sede de recurso, tido pelo regulamento como processo autónomo, cuja tributação está estabelecida na tabela I-B, já a taxa de justiça depende do valor da causa seja qual for a decisão recorrida”.
5. Vide, no mesmo sentido, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27 de Abril de 2023 — processo n.º 12144/21.0T8LSB.L1.S1 —, em cuja fundamentação se escreve: “Relativamente a tais processos também as condições de admissibilidade de recurso são mais estritas pelo que terá o legislador pretendido reforçar, pela via da taxa de justiça, a especial excepcionalidade dos recursos nesse âmbito”.
6. Vide artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa.
7. Vide artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa.
8. Vide artigo 18.º da Constituição da República Portuguesa.
9. Os argumentos deduzidos no acórdão n.º 615/2018, de 21 de Novembro de 2018, foram retomados na fundamentação das decisões sumárias n.º 488/2019, n.º 742/2019, n.º 243/2021, n.º 438/2019, n.º 522/2019, n.º 13/2020 e n.º 210/2020 e na fundamentação do acórdão n.º 69/2024, de 23 de Janeiro de 2024, em que se decidiu “declarar a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma que impõe a obrigatoriedade de pagamento do remanescente da taxa de justiça ao réu que venceu totalmente o processo, obrigando-a a pedir o montante que pagou em sede de custas de parte, resultante do artigo 14.º, n.º 9, do Regulamento das Custas Processuais, na redação introduzida pela Lei n.º 7/2012, de 13 de Fevereiro, por violação do disposto nos artigos 20.º, n.º 1, e 18.º, n.º 2, da Constituição”.
10. Vide, no mesmo sentido, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29 de Março de 2022 — processo n.º 2309/16.2T8PTM.E1-A.S1.
11. Em cujo segmento uniformizador se diz que “[a] preclusão do direito de requerer a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, a que se reporta o n.º 7 do artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais, tem lugar com o trânsito em julgado da decisão final do processo”.