PROPRIEDADE INTELECTUAL
PATENTES
NULIDADE
LITISPENDÊNCIA
SUSPENSÃO DA INSTÂNCIA
Sumário

- Deve ser declarada a suspensão da instância se existirem duas ações suscetíveis de dar origem a decisões com resultados incompatíveis e/ou inconciliáveis;
- Ocorre motivo justificado para suspender a instância quando existe uma ação anterior onde se discute a validade da patente que, nesta ação, serve de fundamento ao pedido formulado pelos autores;
- A litispendência ocorre quando o pedido reconvencional admitido numa ação mais não é que a repetição da ação anteriormente interposta pela agora Reconvinte.

Texto Integral

Acordam na Secção da Propriedade Intelectual e da Concorrência, Regulação e Supervisão do Tribunal da Relação de Lisboa:
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I - Relatório
Bristol-Myers Squibb Holdings Ireland Unlimited Company, Swords Laboratories, Bristol-Myers instauraram ação declarativa, sob processo comum, contra Teva Pharma Produtos Farmacêuticos, Lda, tendo formulado os seguintes pedidos:
“a) abster-se, no território português ou com vista à comercialização nesse território, de explorar (por si própria e/ou permitindo que terceiros o façam ao abrigo das AIMs identificadas no artigo 69.º) a invenção protegida pela EP ‘415 e pelo CCP 456 e, nomeadamente, de importar, fabricar, armazenar, utilizar, colocar no mercado, vender e/ou oferecer, os Genéricos Apixabano identificados no artigo 69.º da Petição Inicial, enquanto a EP ‘415 e o CCP 456 estiverem em vigor;
b) abster-se, no território português ou com vista à comercialização nesse território, de explorar (por si própria e/ou permitindo que terceiros o façam ao abrigo de quaisquer AIMs para quaisquer medicamentos compreendendo apixabano como substância ativa) a invenção protegida pela EP ‘415 e pelo CCP 456 e, nomeadamente, de importar, fabricar, armazenar, utilizar, colocar no mercado, vender e/ou oferecer quaisquer produtos que compreendam apixabano como substância ativa, enquanto a EP ‘415 e o CCP 456 estiverem em vigor.
Requer-se ainda, nos termos do artigo 829.º-A do Código Civil, que a Ré seja condenada a pagar uma sanção pecuniária compulsória de valor não inferior a €133.000 (cento e trinta e três mil euros) por cada dia de atraso no cumprimento da condenação que vier a ser proferida, de acordo com o acima exposto.”
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A Ré deduziu contestação, apresentando defesa por impugnação e por exceção, formulou reconvenção e concluiu que:
a) Deve ser ordenada a suspensão da instância até que seja proferida decisão de mérito no processo pendente sob n.º 209/22.6YHLSB
b) Deverá ser ordenada a intervenção do Ministério Público
c)  Deve ser julgada procedente a exceção de falta de interesse em agir quanto ao pedido contido na alínea b) e a Ré deve ser absolvida da instância em conformidade
d) Os pedidos devem ser julgados improcedentes e a Ré absolvida em conformidade
e) O pedido reconvencional deve ser deferido por provado e, consequentemente, a EP’415 e o CCP 456 devem ser declarados nulos e revogados, com efeitos no território nacional;”
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As Autoras apresentaram réplica à matéria da reconvenção e resposta às exceções, pugnando pela sua improcedência nos seguintes termos:
“a) determinada a extinção da instância quanto aos pedidos formulados na parte referente à EP ‘415 por inutilidade superveniente da lide;
b) indeferido o pedido de suspensão da instância formulado pela Ré;
c) indeferido o pedido de intervenção do Ministério Público formulado pela Ré;
d) julgada improcedente a exceção de falta de jurisdição do Tribunal para decidir o pedido b) formulado na petição inicial;
e) julgada improcedente a exceção perentória de nulidade da EP ‘415 e do CCP 456;
f) julgada verificada a exceção de litispendência quanto ao pedido reconvencional deduzido pela Ré; e, caso assim não se entenda,
g) seja a ação julgada totalmente improcedente, na parte em que foi objeto de reconvenção,
concluindo-se como na petição inicial.”
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O Tribunal da Propriedade Intelectual proferiu a seguinte decisão:
Devem assim as Autoras ser, em conformidade, absolvidas da instância relativamente ao pedido reconvencional, julgando-se verificada a excepção de litispendência, nos termos dos artigos 580.º, n.º 1, 581.º, n.º 1 e 582.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil.

Pelo exposto, nos termos do artigo 272.º, n.º 1, in fine, do Código de Processo Civil, determino a suspensão da instância até à prolação de decisão final no processo 209/22.6YHLSB, que corre termos no Juiz 1, do Tribunal da Propriedade Intelectual.”
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Inconformadas com tal decisão, vieram as AA. (…) interpor recurso de apelação, apresentando as seguintes conclusões:
 “A. ENQUADRAMENTO/OBJETO DO RECURSO:
O presente recurso vem interposto doDespacho do Tribunal a quo, por meio da qual, entre omais, ordenou a suspensão do presente processo até à prolação de uma decisão de primeira instância na Ação de Nulidade que corre termos sob o n.º 209/22.6YHLSB com fundamento (i) na pendência da referida Ação de Nulidade e (ii) no facto de a suspensão não poder prejudicar a posição processual das Autoras, na medida em que, enquanto o CCP 456 estivesse em vigor – e consequentemente, na pendência da suspensão –, ser-lhe-ia garantido o exclusivo da exploração da invenção.
B. QUESTÃO PRÉVIA – O LANÇAMENTO DOS MEDICAMENTOS GENÉRICOS APIXABANO (…) NO MERCADO:
Antes de mais, cumpre chamar à atenção deste Tribunal que, depois de ordenada a suspensão da instância pelo Tribunal a quo, a (…) colocou no mercado/iniciou a comercialização dos seus medicamentos genéricos Apixabano (…).
C. Em concreto, a (…) encontra-se a oferecer os seus medicamentos genéricos Apixabano (…) junto de farmácias de oficina e médicos, indicando que os seus produtos já se encontram disponíveis, apresentando folhetos informativos referentes aos mesmos e aceitando encomendas, tendo inclusivamente já estabelecido parcerias com grupos de farmácias (nomeadamente, com o grupo “SOMOS Farmácia”), oferecendo e promovendo descontos acrescidos para o caso de as farmácias encomendarem os medicamentos genéricos Apixabano (…) em, pelo menos, metade das quantidades que normalmente encomendam de ELIQUIS®, i.e. metade da quota de mercado do ELI-QUIS®.
D. A Teva decidiu, assim, lançar os seus medicamentos genéricos no mercado no mês imediatamente subsequente à determinação da suspensão da instância, num cenário em que não se vislumbra que uma decisão seja proferida nos próximos meses, considerando que foi determinada a suspensão até à prolação de decisão de 1.ª instância na Ação de Nulidade, a qual não tem ainda sequer a audiência prévia agendada.
E. A suspensão da presente instância facilitou o lançamento ilegal de medicamentos genéricos no mercado, o que é manifestamente atentatório dos mais básicos princípios de justiça e não pode ser de modo algum aceite na ordem jurídica.
F. OS ARGUMENTOS DO TRIBUNAL A QUO – A PROLAÇÃO DE DECISÃO DE 1.ª INSTÂNCIA NA AÇÃO DE NULIDADE QUE CORRE TERMOS SOB O N.º 209/22.6YHLSB:
Não existe fundamento (ou “motivo justificado”) para ordenar a suspensão dos presentes autos nos termos em que o foi, uma vez que os direitos em que a presente ação se funda, depois de terem passado pelo crivo da Administração competente para os conceder, gozam de uma presunção de validade nos termos do artigo 4.º, n.º 2, do CPI.
G. Porsuavez,oartigo35.º do CPI, apesar de aceitar a eficácia retroativa de uma decisão de nulidade, estabelece que os efeitos já produzidos com o trânsito em julgado não ficam prejudicados, o que revela a clara intenção do legislador português no sentido de pretender que uma ação de nulidade não obstaculize o conhecimento e decisão de uma causa em que se peça que um terceiro seja condenado a respeitar os direitos exclusivos emergentes de uma patente/CCP concedidos e ainda não caducados.
H. Acresce que sempre haveria uma total perversão do regime de litigância preventiva estabelecido pela Lei 62/2011 – portanto, com imperativos de prevenção – caso se considerasse que bastaria uma empresa de genéricos intentar uma ação de nulidade, por mais infundada que fosse, para suspender e inviabilizar a tutela das empresas de medicamentos originadores, sobretudo num cenário de violação atual, como é o presente caso.
I. Adicionalmente, cumpre enfatizar que os direitos de propriedade industrial em causa nos presentes autos são direitos temporários, o que significa que, caso sejam violados (como estão a ser), o seu titular nunca poderá ser ressarcido mediante a reposição do seu monopólio pelo período de tempo em que foram infringidos.
J. Neste sentido, o Tribunal, caso não ordene o prosseguimento dos presentes autos, estará a vedar às Recorrentes o exercício do seu direito de impedir eficazmente a (continuação da) comercialização do produto protegido pelo CCP 456 e a remetê-las para uma situação cautelar ou mesmo indemnizatória, que têm, naturalmente, caráter subsidiário, tornando esta solução dotada de total antijurisdicidade.
K. Mais se diga ainda que essa antijurisdicidade é bem notória na decisão do Tribunal de ordenar a manutenção da suspensão até à prolação de uma decisão de primeira instância. É que, caso a Ação de Nulidade seja improcedente, a (…) pode interpor recurso dessa decisão e, logo, a instância não está definitivamente estabilizada, o que, seguindo o raciocínio do Tribunal a quo, o impediria de proferir uma decisão por razões de conveniência e economia processual. Por sua vez, caso a Ação de Nulidade seja julgada procedente, não se pode aceitar que os pedidos das ora Recorrentes fossem decair integralmente, uma vez que, não tendo a decisão transitado em julgado, os direitos se mantêm plenamente válidos e em vigor na ordem jurídica.
L. E nem se diga que o levantamento da suspensão instância aqui peticionado beliscaria os direitos de defesa da (…), atendendo a que a EP ‘415 foi validada no território português há 14 anos, o que significa que a (…) poderia (e deveria) ter proposto a sua Ação de Nulidade em momento muito anterior, assim garantindo que quando quisesse lançar os seus medicamentos genéricos no mercado já existia uma decisão na ordem jurídica que tivesse sindicado a validade dos direitos ora invocados e que aquela crê serem inválidos.
M. OS ARGUMENTOS DO TRIBUNAL A QUO –PREJUÍZO PARA A POSIÇÃO PROCESSUAL DAS AUTORAS, ORA RECORRENTES:
Apesar de o Tribunal a quo ter entendido que a presente suspensão não pode prejudicar a posição processual das Autoras, tal não corresponde à verdade, como inclusivamente os factos subsequentes – rectius, o lançamento no mercado dos medicamentos genéricos Apixabano (…) – o vieram comprovar.
N. Os direitos que, em geral, emergem de uma patente/CCP não são suscetíveis, naturalmente, de ser exercidos diretamente pelos seus titulares porque estes não podem, pelas suas próprias mãos, impedir terceiros de praticarem os atos proibidos, sendo o recurso à ação direta verdadeiramente excecional.
O. O facto de um direito estar previsto na lei substantiva é a premissa básica para que o seu titular possa iniciar uma ação judicial – e não, com o Tribunal a quo sugere, um motivo para adiar a prolação de uma sentença que o reconheça e o efetive.
P. É, pois, necessário, que seja proferida uma decisão que reconheça o direito em causa, que reconheça que os medicamentos genéricos objeto das AIMs que espoletaram os presentes autos caem no escopo de proteção dos direitos invocados, que a sua exploração consubstancia uma violação desses direitos e que ordene a Recorrida a abster-se de praticar atos que os violem, constituindo tal decisão um título executivo com efeito dissuasor muito intenso, que propicia segurança jurídica ao titular.
Q. Tudo isto num cenário, recorde-se, em que a (…) já lançou os seus medicamentos genéricos no mercado, ainda que seja indisputável (inclusivamente para a própria) que o CCP 456 se encontra em vigor e plenamente eficaz na ordem jurídica portuguesa.”
Concluíram:
“… deve o Despacho proferido pelo Tribunal a quo ser revogado e substituído por decisão que ordene o imediato prosseguimento dos autos”.
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Na sua resposta, a R. Teva Pharma Produtos Farmacêuticos, Lda, pede a improcedência do recurso sem ter apresentado conclusões.
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Por sua vez, a R. Teva Pharma Produtos Farmacêuticos, Lda, não se conformando com a decisão proferida pelo Tribunal a quo, interpôs recurso subordinado, apresentando as seguintes conclusões:
 “A. A Recorrente intentou uma ação no dia 18de maio de 2022, tendo em vista a declaração de nulidade e revogação da EP’415 e CCP456. Quatro meses depois, as Recorridas intentaram uma ação contra a Recorrente nos termos da qual invocaram os direitos decorrentes daqueles direitos de propriedade industrial.
B. Em sede de defesa por contestação nos presentes autos, a Recorrente invocou a nulidade da EP’415 e CCP456 a título de exceção e, ainda, deduziu um pedido reconvencional para declaração de nulidade da EP’415 e CCP456.
C. O Tribunal a quo decidiu julgar procedente a exceção de litispendência e absolveu as Recorridas da instância.
D. O regime imposto pela Lei n.º 62/2011 prevê uma ação especial. Portanto apenas restam duas alternativas processuais: i) ou a decisão a proferir no processo n.º 209/22.6YHLSB não vincula este Douto Tribunal. Caso em que a litispendência não poderá proceder; ou ii) o processo n.º 209/22.6YHLSB constitui uma causa prejudicial aos presentes autos. Caso em que deverá ser ordenada a suspensão da instância até que seja proferida decisão naqueles autos.
E. A Recorrente não poderá ser impedida do direito a uma defesa condigna.
F. Caso seja julgada procedente a exceção de litispendência e absolvição das Recorrentes do pedido reconvencional, poder-se-ia gerar a situação inaceitável do Réu ser automaticamente condenado sem qualquer defesa, com base na violação de patentes e CCPs nulos e ineficazes, quando os seus argumentos de defesa residem apenas na invalidade dessas mesmas patentes.
G. Ao criar a Lei n.º 62/2011, o legislador não quis reduzir ou denegar os meios de defesa das empresas de medicamentos genéricos, e impossibilitar a entrada no mercado dos medicamentos genéricos cuja defesa assente na invalidade dos direitos de propriedade industrial.
H. Não existe qualquer referência na Lei n.º 62/2011 a uma proibição de dedução de pedidos reconvencionais. O artigo 3º da Lei n.º 62/2011 prevê no número 1 desse artigo o prazo para a propositura da ação e no número 2 os efeitos (específicos) da falta de contestação.
I. No artigo 29º, n.º 1 al. d) do CPI está, precisamente, previsto o averbamento quer das ações para declaração de nulidade e anulação, como, também, de pedidos reconvencionais com a mesma finalidade.
J. Qualquer interpretação no sentido de que a Lei n.º 62/2011 impede a dedução de pedido reconvencional para a declaração de nulidade de uma patente tornaria o disposto no artigo 29º do CPI letra morta.
K. Ao absolver as Recorridas da instância, o Tribunal a quo está, na verdade, a impedir o exercício ao contraditório daquelas, obstruindo a sua defesa.
L. Ao absolver as Recorridas da instância, o Tribunal está a fazer tábua rasa do princípio da concentração segundo o qual a Recorrente deveria incluir na sua contestação todos os seus argumentos de defesa.
M. O Tribunal a quo ignorou igualmente o princípio da igualdade das partes. O princípio da igualdade de armas impõe o equilíbrio entre as partes ao longo de todo o processo, na perspetiva dos meios processuais de que dispõem para apresentar e fazer vingar as respetivas teses.
N. Ao impedir a Recorrente de apresentar os seus meios de defesa, através de um pedido reconvencional, o Tribunal a quo está a tratar de forma desigual as Partes.
O. Por decorrência do princípio geral da descoberta da verdade material, que sobressai do disposto nos artigos 411º e 436º, do CPC, constitui um poder/dever ao Juiz realizar ou ordenar, mesmo oficiosamente, todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio, quanto aos factos de que lhe é lícito conhecer, e designadamente, ordenar a junção de documentos ao processo, que repute de relevante utilidade para esse efeito.
P. A interpretação do Tribunal a quo é contrária ao disposto no artigo 266º, n.º 6 do CPC, artigo 3º da Lei n.º 62/2011, no artigo 29º, n.º 1 al. d) do CPI e nos artigos 3º, 4º, 411º, 413º e 573º (a contrario) do CPC.
Q. Nos presentes autos o princípio de acesso ao direito e tutela jurisdicional efetiva deverá ser apreciado na sua vertente de garantia de um processo equitativo porquanto assume uma das dimensões em que a tutela jurisdicional efetiva foi violada pela posição do Tribunal a quo.
R. A invocação da nulidade das patentes constitui, assim, o exercício de um direito à defesa previsto usado em todo o mundo, previsto e protegido pelo artigo 20º, n.º 4 da Constituição da República Portuguesa.
S. Face ao acima exposto, a decisão do Tribunal a quo que absolveu as Recorridas da instância é inconstitucional por violação do princípio da proibição de indefesa previsto no artigo 20º, em conjugação com o artigo 18º, n.º 2 ambos da Constituição da República Portuguesa, devendo a sentença ser revogada e substituído por despacho que ordene o prosseguimento dos autos para apreciação do pedido reconvencional deduzido pela Recorrente.
T. Caso contrário, deverá ser ordenado o prosseguimento dos autos para apreciação da nulidade da EP’415 e CCP456 a título de exceção, tal como oportunamente alegado em sede de contestação.”
Concluiu:
“a. Ser revogada a sentença na parte em que absolveu as Recorridas da instância; ou
b. Ser ordenado o prosseguimento da nulidade da EP 415 e CCP 456 a título de exceção.”
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Na resposta, as AA. Bristol-Myers Squibb Holdings Ireland Unlimited Company, Swords Laboratories, Bristol-Myers Squibb Farmacêutica Portuguesa, S.A., pedem a improcedência do recurso subordinado, mantendo-se a absolvição da BMS da instância quanto ao pedido reconvencional deduzido pela Teva com fundamento na existência de litispendência face à Ação de Nulidade, sem ter apresentado conclusões.
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Os autos foram à conferência.
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II - Questões a decidir
O objeto do recurso é balizado pelas conclusões do apelante, sem prejuízo das questões que sejam de conhecimento oficioso e daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras, não estando o tribunal obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista; não conhece questões novas, isto é, questões que não tenham sido apreciadas pelo Tribunal recorrido, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito, conforme resulta dos artigos 5.º, n.º 3, 635.º, n.ºs 3 e 4, 639.º, n.º 1, e 608.º, todos do CPC.
Assim, importa, no caso, apreciar e decidir:
- se o despacho proferido pelo Tribunal a quo, que determinou a suspensão da instância, deve ser revogado e substituído por decisão que ordene o imediato prosseguimento dos autos;
- se deve ser revogado o despacho que absolveu as Recorridas da instância, pela verificação da exceção da litispendência, ou;
- se deve ser ordenado o prosseguimento da nulidade da EP 415 e CCP 456 a título de exceção.
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II - Fundamentação.
O Tribunal a quo fundamentou as decisões referidas supra, nos seguintes termos:
“Da admissibilidade do pedido reconvencional:
Vieram as Autoras intentar acção declarativa de condenação na qual peticionaram que a Ré deverá ser condenada a: a) abster-se, no território português ou com vista à comercialização nesse território, de explorar (por si própria e/ou permitindo que terceiros o façam ao abrigo das AIMs identificadas no artigo 69.º) a invenção protegida pela EP ‘415 e pelo CCP 456 e, nomeadamente, de importar, fabricar, armazenar, utilizar, colocar no mercado, vender e/ou oferecer, os Genéricos Apixabano identificados no artigo 69.º da Petição Inicial, enquanto a EP ‘415 e o CCP 456 estiverem em vigor; b) abster-se, no território português ou com vista à comercialização nesse território, de explorar (por si própria e/ou permitindo que terceiros o façam ao abrigo de quaisquer AIMs para quaisquer medicamentos compreendendo apixabano como substância ativa) a invenção protegida pela EP ‘415 e pelo CCP 456 e, nomeadamente, de importar, fabricar, armazenar, utilizar, colocar no mercado, vender e/ou oferecer quaisquer produtos que compreendam apixabano como substância ativa, enquanto a EP ‘415 e o CCP 456 estiverem em vigor.
Neste seguimento, veio a Ré deduzir pedido reconvencional onde pede que o mesmo deve ser deferido por provado e, consequentemente, a EP’415 e o CCP 456 devem ser declarados nulos e revogados, com efeitos no território nacional.
Cumpre apreciar e decidir.
Ora, diz-nos o artigo 266.º do Código de Processo Civil que: “1 - O réu pode, em reconvenção, deduzir pedidos contra o autor.
2 - A reconvenção é admissível nos seguintes casos:
a) Quando o pedido do réu emerge do facto jurídico que serve de fundamento à ação ou à defesa;
b) Quando o réu se propõe tornar efetivo o direito a benfeitorias ou despesas relativas à coisa cuja entrega lhe é pedida;
c) Quando o réu pretende o reconhecimento de um crédito, seja para obter a compensação seja para obter o pagamento do valor em que o crédito invocado excede o do autor;
d) Quando o pedido do réu tende a conseguir, em seu benefício, o mesmo efeito jurídico que o autor se propõe obter.”
Analisando o pedido reconvencional efectuado pela Ré verifica-se que o mesmo emerge dos factos jurídicos que servem de fundamento à defesa por excepção, a saber, a nulidade da EP 415 e do CCP 456.
Pelo exposto, decide-se admitir o pedido reconvencional deduzido pelas Rés.
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Porém, chegados a este ponto, é necessário decidir da excepção de litispendência quanto ao pedido reconvencional arguida pelas Autoras.
Vejamos, nos termos do artigo 580.º do Código de Processo Civil, a excepção da litispendência pressupõe a repetição de uma causa enquanto a anterior está ainda em curso e tem por fim evitar que o tribunal seja colocado na alternativa de contradizer ou de reproduzir uma decisão anterior. São requisitos da litispendência, nos termos do artigo 581.º do Código de Processo Civil: a repetição de uma causa ocorre quando se propõe uma acção idêntica a outra quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir. Há identidade de sujeitos quando as partes são as mesmas sob o ponto de vista da sua qualidade jurídica. Há identidade de pedido quando, numa e noutra causa, se pretende obter o mesmo efeito jurídico; Há identidade da causa de pedir quando a pretensão deduzida nas duas acções procede do mesmo facto jurídico.
Vejamos a situação do caso em apreço.
Nesta acção, são autoras, BRISTOL-MYERS SQUIBB HOLDINGS IRELAND UNLIMITED COMPANY, a SWORDS LABORATORIES e a BRISTOL-MYERS SQUIBB FARMACÊUTICA PORTUGUESA, S.A. e é Ré a TEVA PHARMA – PRODUTOS FARMACÊUTICOS, LDA. No processo 209/22.6YHLSB é Autora a TEVA PHARMA – PRODUTOS FARMACÊUTICOS, LDA. e são Rés a BRISTOL-MYERS SQUIBB HOLDINGS IRELAND UNLIMITED COMPANY, a SWORDS LABORATORIES e a BRISTOL-MYERS SQUIBB FARMACÊUTICA PORTUGUESA, S.A.
Verifica-se assim que em ambas as acções figuram as mesmas partes.
O pedido formulado no processo 209/22.6YHLSB é o seguinte: “Por conseguinte, esta ação legal deve ser considerada procedente como provada e, em consequência, a EP415 e o Certificado Complementar de Proteção n.º 456 devem ser declarados nulos e, bem assim, devem os respectivos registos ser cancelados nos registos oficiais.”. Assim, no referido processo o pedido é feito por referência à EP 1427415 e ao CCP n.º 456, tendo como causa de pedir a nulidade da patente e do certificado complementar de protecção.
Por sua vez, o pedido reconvencional formulado nos presentes autos pela Ré/Reconvinte contra as Autoras/Reconvindas é o seguinte: “O pedido reconvencional deve ser deferido por provado e, consequentemente, a EP’415 e o CCP 456 devem ser declarados nulos e revogados, com efeitos no território nacional.”
Assim, nos presentes autos o pedido reconvencional é igualmente feito por referência à EP 1427415 e ao CCP n.º 456, tendo como causa de pedir a nulidade da patente e do certificado complementar de protecção.
Ora, da análise feita, verifica-se, assim, existir identidade de partes, pedido e causa de pedir, face ao pedido reconvencional que a Ré formula contra as Autoras.
É do conhecimento funcional deste tribunal que as Rés (aqui Autoras) foram citadas no âmbito do processo 209/22.6YHLSB em 09.06.2022 e 12.07.2022, sendo que nos presentes autos a Ré foi citada a 07.09.2022.
Devem assim as Autoras ser, em conformidade, absolvidas da instância relativamente ao pedido reconvencional, julgando-se verificada a excepção de litispendência, nos termos dos artigos 580.º, n.º 1, 581.º, n.º 1 e 582.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil.
Notifique.
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“Da suspensão da instância:
Em sede de contestação, a Ré TEVA PHARMA – Produtos Farmacêuticos, Lda. requereu a suspensão da instância nos termos do disposto no artigo 272.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, alegando, em síntese, que se encontra pendente junto deste Tribunal da Propriedade Intelectual uma acção declarativa para a declaração de nulidade da patente EP415 e CCP456, que está a correr termos no Juiz 1 sob o processo n.º 209/22.6YHLSB.
As Autoras deduziram oposição, pugnando pela não suspensão da instância.
Cumpre apreciar e decidir.
Dispõe o artigo 272.º, nº 1, do Código de Processo Civil que “1. O tribunal pode ordenar a suspensão quando a decisão da causa estiver dependente do julgamento de outra já proposta ou quando ocorrer outro motivo justificado”.
Existe causa prejudicial quando esta tem por objecto uma pretensão que constitui pressuposto da formulada (cf. J. Lebre de Freitas, C. de processo Civil Anotado, vol. I, Coimbra Editora, 1999, p. 501).
No caso em apreço, é nosso entendimento que não está em causa uma causa prejudicial, na medida em que a pretensão formulada na acção n.º 209/22.6YHLSB não constitui um pressuposto da decisão da presente acção – atendendo a que a Patente invocada em sede de causa de pedir encontra-se em vigor e pode ser invocada erga omnes –, podendo apenas ter como efeito a eventual improcedência desta, caso se venha a decidir pela nulidade da patente, mediante decisão judicial transitada em julgado.
Em todo o caso, afigura-se-nos que existe motivo justificado para, ao abrigo da parte final do artigo 279.º, n.º 1, do Código de Processo Civil decretar a suspensão da instância até decisão final a proferir no processo nº 209/22.6YHLSB.
Com efeito, na referida acção, instaurada pela aqui Ré é peticionada a declaração de nulidade da Patente EP415 e do CCP456, alegando, em síntese, que esta não preenche os requisitos de patenteabilidade da CPE na medida em que:
1. O objecto da EP415 carece de actividade inventiva devido à falta de efeito técnico e de contribuição para o estado da técnica e devido ao carácter óbvio face a Du Pont;
2. O objecto da EP415 carece de falta de;
3. A EP415 não divulga a invenção de forma suficientemente clara e completa para que um perito na matéria a possa executar;
4. A matéria adicionada nas reivindicações 1 a 29 da EP 415 não estavam incluídas no pedido de patente internacional WO’652, sendo que a nulidade da patente afecta a validade do CCP 456 nos termos do parágrafo 15/1/c do Regulamento do CCP.
A referida acção encontra-se a aguardar a realização da audiência prévia.
A suspensão da presente acção até decisão em primeira instância daquele processo mostra-se justificada, conveniente e conforme ao princípio da economia processual, na medida em que, caso este venha a ser julgado procedente, os pedidos formulados pelas Autoras nos presentes autos decaem integralmente, sendo inútil a apreciação dos fundamentos da acção.
Não se afigura que a suspensão possa prejudicar a posição processual das Autoras, na medida em que, enquanto o CCP 456 estiver em vigor – e consequentemente, na pendência da suspensão –, é-lhe garantido o exclusivo da exploração da invenção.
Pelo exposto, nos termos do artigo 272.º, n.º 1, in fine, do Código de Processo Civil, determino a suspensão da instância até à prolação de decisão final no processo 209/22.6YHLSB, que corre termos no Juiz 1, do Tribunal da Propriedade Intelectual.
Notifique.”
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Vejamos, então.
Comecemos pelo recurso das AA.
Da suspensão da instância.
Dispõe o a artigo 269.º do CPC, sob a epígrafe “Causas”, que:
“1 – A instância suspende-se nos casos seguintes:

c) Quando o tribunal ordenar a suspensão ou houver acordo das partes;”
Por sua vez, estabelece o artigo 272.º do CPC, sob a epígrafe “Suspensão por determinação do juiz ou por acordo das partes”, que:
“1 - O tribunal pode ordenar a suspensão quando a decisão da causa estiver dependente do julgamento de outra já proposta ou quando ocorrer outro motivo justificado.
2 - Não obstante a pendência de causa prejudicial, não deve ser ordenada a suspensão se houver fundadas razões para crer que aquela foi intentada unicamente para se obter a suspensão ou se a causa dependente estiver tão adiantada que os prejuízos da suspensão superam as vantagens.
3 - Quando a suspensão não tenha por fundamento a pendência de causa prejudicial, fixa-se no despacho o prazo durante o qual estará suspensa a instância.
4 - As partes podem acordar na suspensão da instância por períodos que, na sua totalidade, não excedam três meses, desde que dela não resulte o adiamento da audiência final.”
Em anotação a estas disposições, no CPC Anotado de António Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Sousa, é referido que “A suspensão da instância tem como efeito a paralisação da tramitação processual, na medida em que, enquanto perdurar, apenas podem ser praticados os atos urgentes destinados a evitar dano irreparável, nos termos do art. 275.º, n.º 1.”
Mais é referido que “apenas podem motivar a suspensão com esse motivo ações que tenham sido instauradas anteriormente à ação em causa, a não ser que se verifique uma relação de prejudicialidade relativamente a um processo da competência dos tribunais criminais ou dos tribunais administrativos e fiscais (art. 92.º), em que o juiz pode decretar a suspensão, ou, como se diz nesse preceito, “sobrestar na decisão” até que o tribunal competente se pronuncie. Por outro lado, deve comprovar-se uma efetiva relação de dependência, de tal modo que a apreciação do litígio esteja efetivamente condicionada pelo que venha a decidir-se na ação prejudicial, a qual constitui, pois, um pressuposto da outra decisão (v.g. ação para cumprimento de um contrato e ação em que se invoque a nulidade do contrato).
O nexo de prejudicialidade define-se assim: estão pendentes duas ações e dá-se o caso de a decisão de uma poder afetar o julgamento a proferir noutra; a razão de ser da suspensão, por dependência de causa prejudicial é a economia e a coerência de julgamentos; uma causa é prejudicial em relação à outra quando a decisão da primeira possa destruir o fundamento ou a razão de ser da segunda …
Ainda que esses dois requisitos se verifiquem, o juiz deve negar a suspensão fundada na prejudicialidade quando se demonstrar que a ação foi intentada precisamente para se obter a suspensão da outra ou, independentemente disso, quando o estado da causa tornar gravemente inconveniente a suspensão. É que não pode ignorar-se que a suspensão obsta a que a instância prossiga naturalmente, o que pode revelar-se gravoso para os interesses que o autor procura acautelar. Daí que, nessas situações, cumpra apreciar na ação todas as questões que tenham sido suscitadas.

A suspensão da instância em geral pode encontrar outros motivos cuja justificação é sujeita a escrutínio do juiz, o qual, goza de uma larga margem de discricionariedade, devendo aquilatar se efetivamente se justifica tal medida.”(Vol. I, pág. 314 e 315).
No caso que nos ocupa, como disso deu conta o Tribunal a quo, não estamos perante uma causa prejudicial, na medida em que a pretensão formulada na ação 209/22, a que foi interposta em primeiro lugar, não constitui um pressuposto da decisão dos presentes autos.
Porém, apesar de não ser pressuposto, a verdade é que entre as duas ações existem pontos de contato objetivamente relevantes que importa acautelar.
Efetivamente, naquela ação está em causa um pedido de nulidade da patente, sendo que nesta ação, além de servir de fundamento ao pedido formulado pelas AA., mostra-se excecionada a respetiva nulidade.
Nessa medida, é indubitável que os pedidos formulados pelas partes aos tribunais, porque coincidentes na parte que diz respeito à validade da patente que nesta ação serve de fundamento às pretensões dos AA., podem despoletar decisões com resultados incompatíveis e/ ou inconciliáveis que, julgamos, importa acautelar.
Aliás, assim será se naquele processo tiver provimento o pedido de nulidade da patente e neste tiver provimento o pedido formulado pelos AA. que, pressupõe, como referido, a validade da mesma patente; assim, como, também ocorrerá se naquele processo for julgado improcedente o pedido de nulidade da patente e neste improcedente o pedido.
Em ambos os casos, sendo mais evidente no primeiro, estaríamos perante decisões inconciliáveis e, nessa medida, prejudiciais para as partes e para a Justiça.
Dito isto, recordando que não estando perante a pendência de causa prejudicial, em sentido estrito, pois que a decisão da presente causa não está dependente do julgamento de outra já proposta, a verdade é que os motivos que levam à sua suspensão são, genericamente, os mesmos, ou seja, a economia e a coerência de julgamentos.
Ainda assim, considerando as outras condicionantes que o legislador faz alusão na norma citada, também não podemos deixar de referir que não se mostram apuradas razões para crer que aquela (processo 209/22) foi intentada unicamente para se obter a suspensão desta, desde logo por ter sido interposta em primeiro lugar; assim como esta não se mostra tão adiantada que os prejuízos da suspensão superem as vantagens, como seria o caso de se ter iniciado a produção da prova.
Finalmente, ainda reportado aos prejuízos decorrente da demora que as AA. invocam, face à providência cautelar instaurada por apenso nestes autos, julgamos, pois, que também se mostram acautelados.
Por todo o exposto, aquilatando se efetivamente se justifica a suspensão da instância, conforme referem os citados autores, julgamos que a decisão do Tribunal a quo acautela os fins da norma e, por isso, merce a nossa concordância.
Uma última nota se impõe efetuar, pois que, em termos temporais, o Tribunal a quo refere que “a suspensão da presente acção até à decisão em primeira instância daquele processo mostra-se justificada, conveniente e conforme ao princípio da economia processual, na medida em que, caso este venha a ser julgado procedente, os pedidos formulados pelas Autoras nos presentes autos caem integralmente, sendo inútil a apreciação dos fundamentos da acção”, enquanto que parte final da decisão, refere “determino  a suspensão da instância até à prolação de decisão final no processo 209/22.6YHLSB, que corre termos no Juiz 1, do Tribunal da Propriedade Intelectual”.
Julgamos, assim, que se trata de lapso que importa corrigir, sendo que a decisão final terá de ser a transitada em julgado, pois, só esta, é suscetível de acautelar os fins a que nos referimos supra.
Nessa medida, julgamos improcedente o recurso apresentado pelas AA., mantendo-se a decisão do Tribunal a quo que, suprimido o lapso, deve a suspensão subsistir até ao trânsito em julgado da decisão que for proferida no processo n.º 209/22.6YHLSB, que corre termos no Juiz 1, do Tribunal da Propriedade Intelectual.
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Da litispendência
A R., como vimos, formulou recurso subordinado onde suscita a revogação da decisão do Tribunal a quo que, reconhecida a exceção da litispendência, absolveu as aqui AA. do pedido reconvencional.
Antes de mais, importa referir que, apesar de ter sido negado provimento ao recurso principal, ou seja, o que foi apresentado pelas AA., face ao disposto no artigo 633.º do CPC, impõe-se a apreciação do mérito do recurso subordinado apresentado pela recorrente Teva.  
Vejamos, então.
Recorde-se que a decisão em crise admitiu o pedido reconvencional.
Nessa medida, apesar de parte da argumentação desenvolvida pela Recorrente visar a suposta rejeição do pedido reconvencional, como, aliás, decorre da afirmação de que se está assumir que existe uma proibição de dedução de pedidos reconvencionais ou quando se faz referência ao artigo 29.º, n.º 1, al. d), do CPI, julgamos ser desnecessário tecer outro tipo de considerações.
Dito isto, ou seja, assumindo a admissão do pedido reconvencional, importa aquilatar se se verifica a exceção da litispendência e, em caso afirmativo, as respetivas consequências para a presente ação.
Importa desde já adiantar que o Tribunal a quo identificou a temática e resolveu-a de forma adequada.
Vejamos, porquê.
Resulta dos artigos 580.º a 582.º do CPC que a exceção da litispendência pressupõe a repetição de uma causa, ficando as duas em curso.
O que manifestamente ocorre com a admissão da reconvenção, pois que esta mais não é que a repetição da ação anteriormente interposta pela agora Reconvinte.      
Efetivamente, naquela ação, como disso deu conta o Tribunal a quo, as partes são as mesmas, havendo, por isso, identidade de sujeitos; os pedidos também são os mesmos, pois que, num como noutro processo, pede-se a declaração de nulidade da “EP’415” e do “CCP 456”; e, finalmente, existe identidade da causa de pedir, pois que esta decorre, em ambas as ações, do mesmo facto jurídico, no caso, da ausência de requisitos de patenteabilidade, como seja a falta de atividade inventiva, de novidade e não conter dados reais sobre a utilidade médica dos compostos.
Perante esta constatação, dúvidas não existem que o Tribunal a quo, prosseguindo com o pedido reconvencional, seria colocado na alternativa de contradizer ou de reproduzir uma outra decisão, no caso a que se vier a proferir no processo 209/22.6YHLSB, o que contende de forma evidente com “o prestígio e a credibilidade da função judicial e os valores da segurança jurídica e da certeza do direito”. (obra citada, pág. 660)
Nessa medida, de forma a tutelar os referidos valores, o artigo 582.º do citado diploma legal, determina que se tem como repetida a ação proposta em segundo lugar, sendo, como vimos, a presente reconvenção.
Assim, conjugadas aquelas disposições legais com os artigos 576.º, n.ºs 1 e 2, e 577.º, al. i), ambos do mesmo diploma legal, impõe-se concordar com a decisão proferida pelo Tribunal a quo de absolver as aqui AA. da instância.
Finalmente, atenta a posição da Recorrente, impõe-se referir que a aplicação do presente instituto de forma alguma contende com o seu direito de defesa, seja por impugnação seja por exceção, como previsto no artigo 571.º do CPC, o que não permite, como vimos, é o seu conhecimento enquanto ação/ reconvenção.   
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Por todo o exposto, julgamos improcedentes os recursos apresentados pelas AA. e R., mantendo-se as decisões proferidas pelo Tribunal a quo.
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III - Decisão.
Pelo exposto, acordam os juízes deste Tribunal da Relação em julgar improcedentes os recursos apresentados pelas Bristol-Myers Squibb Holdings Ireland Unlimited Company, Swords Laboratories e Bristol-Myers e pela Teva Pharma Produtos Farmacêuticos, Lda, confirmando a decisão proferida pelo Tribunal de 1.ª instância que:
- absolveu as AA. da instância relativamente ao pedido reconvencional, julgando verificada a exceção da litispendência;
- suspendeu a instância até à prolação de decisão final no processo 209/22.6YHLSB, que corre termos no Juiz 1, do Tribunal da Propriedade Intelectual.
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Custas pelas Recorrentes (artigo 527.º do CPC).
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Lisboa, 20 de maio de 2024
Bernardino Tavares
Carlos M. G. de Melo Marinho
Eleonora Viegas