ESCUTAS TELEFÓNICAS
TRÁFICO DE ESTUPEFACIENTES
Sumário

1–O recurso aos dados relativos a conversações ou comunicações telefónicas em tempo real não se confunde com o acesso aos dados conservados pelas operadoras por conversações ou comunicações telefónicas passadas, tratando-se de dois meios de prova distintos.

2–Nos crimes de tráfico de estupefacientes (que constituem um dos crimes de catálogo, conforme art. 187.º, n.º 1, al. b) do CPP) a interceção telefónica é indispensável para descoberta da verdade.
3–Como meio de obtenção de prova invasivo da privacidade, a admissibilidade das interceções telefónicas tem de ser apreciada à luz dos princípios da proporcionalidade,da adequação e da necessidade, devendo a sua imprescindibilidade ser conjugada com a existência de fortes indícios ou de indícios suficientes da prática de um crime de catálogo.

(Sumário da responsabilidade da relatora)

Texto Integral

Em conferência, acordam os Juízes na 5ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:

I–Relatório

1.–No processo comum coletivo n.º 2484/19.4T9ALM do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, Juízo Central Criminal de Almada – Juiz 5, em que são arguidos AA, BB e CC (e também DD, EE, FF, GG, HH), melhor identificados nos autos, foi proferido acórdão, em 17.11.2023, que decidiu, quanto aos mesmos, nos seguintes termos:
• Condenar AA, por um crime de tráfico de estupefacientes, previsto no artigo 21.º, n.º 1 do DL 15/93, de 22 de janeiro, na pena de 4 anos e 9 meses de prisão, efetiva;
• Condenar BB, por um crime de tráfico de estupefacientes, previsto no artigo 21.º, n.º 1 do DL 15/93, de 22 de janeiro, na pena de 5 anos de prisão, efetiva;
• Condenar CC, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, previsto no artigo 21º, nº1 do DL 15/93, de 23 de janeiro, na pena de 4 anos e 6 meses de prisão, efetiva.
2.–Os arguidos AA, BB e CC não se conformaram com as respetivas condenações e interpuseram recurso do acórdão.
2.1.-A arguida AA finalizou a motivação do recurso com as seguintes conclusões (transcrição):
I.–A arguida foi condenada como co-autora de um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. no art 21º, n.º 1, do Dec. Lei n.º 15/93, na pena de 4 anos e 9 meses de prisão, efectiva.
II.–A recorrente impugna os pontos 3, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 29, 30, 31, 33 e 55 da matéria de facto dada como provada pois não se produziu prova da mesma estando o douto acórdão ferido de nulidade prevista no art.º 410º, n.º al. a) do C.P.P.
III.–Não se produziu qualquer prova que a arguida se dedicava ao tráfico de produtos estupefacientes, com os restantes arguidos.
IV.–Assim como não se provou que, tenha feito entregas produto estupefaciente, a ausência de prova teria levar à absolvição da arguida por estes factos, que além de não se ter produzido qualquer prova e sem qualquer apreensão concluiu que seria produto estupefaciente sem saber se o era, nem que tipo de produto estupefaciente, nem as quantidades para poder condenar a cidadã como resulta da lei.
V.–Em primeiro interrogatório judicial a arguida não prestou declarações vindo a fazê-lo a seu pedido ainda em inquérito, esclarecendo que actuava sob ordem e comando do seu namorado II, onde vivia numa relação abusiva, com credibilidade e corroboradas pelo depoimento da testemunha agente da PSP declarações essas, que são susceptíveis de valoração pelo Tribunal, nos termos previstos no artigo 357.º, n.º 1, alínea b), e n.º 2, do Código de Processo Penal, porquanto, prestadas com observância das formalidades legais, designadamente a prevista no artigo 141.º, n.º 4, alínea b), do mesmo diploma.
VI.–Também ficou provado que a arguida estava a guardar para o seu namorado II, que tinha uma relação abusiva e a obrigava a ter condutas desadequadas, situação que a arguida nunca conseguiu cortar, a provar isto temos as declarações da arguida em sede de inquérito perante Magistrado Judicial e a corroborar as suas declarações temos o depoimento da testemunha JJ.
VII.–Contudo o Tribunal a quo nem faz referência ao depoimento da testemunha, JJ agente da PSP, ouvido na sessão de julgamento do dia 22 de Setembro de 2023, registado na gravação citius entre as 10:49 e as 11:51, em concreto aos 42:40 testemunha: “O conhecimento que tenho relativamente à AA, baseiam-se nas escutas.
Aos 43:10 continua “ Há aqui uma situação de exploração sexual da AA… o II utilizava a AA para actos sexuais em conjugação com outras pessoas….
A AA não queria nada disto, chateavam-se várias vezes, mas a AA cedia… e isso tinha a ver com o que a AA gostava do II… subjugada…com um controlo tão grande ao nível emocional, quando nem havia parte financeira, eu não sei se a AA tinha algum lucro com esta situação, penso que não …na busca à casa da AA foi só apreendido 57€ à mãe, à AA foi só apreendida droga… a AA era um mero utensílio do II em todos os aspectos, emocional, aspecto sexual, e no aspecto que lhe dava jeito ao nível do estupefaciente … estas são as ilações que retiro das escutas, da relação do II e da AA”
VIII.–Consequentemente deverão ser renovados os pontos da matéria de facto dada como provada aqui impugnada a saber 3, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 29, 30, 31, 33 e 55. E ainda ser declarado nulo o douto acórdão por omissão de pronúncia, nos termos do art.º 379º, n.º 1, al. c), do C. P. P..
IX.–Relativamente à busca domiciliária, referiu que a droga apreendida era do seu namorado II.
X.–Para além do haxixe nada mas apreendido que a relacionasse com o tráfico de produto estupefaciente, tais como balanças, cantos de sacos plásticos, dinheiro, ou evidências de sinais exteriores de riqueza, etc.
XI.–O Douto acórdão viola o princípio da inocência previsto no art. 32º da CRP.
XII.–Nulidade do douto Acórdão por falta de fundamentação, art.º 374º, n.º 2, do C. P.P.. Em momento algum, o douto Tribunal a quo consegue fundamentar a sua convicção através de prova concreta e objectiva, nomeadamente, a quem comprou o arguido KK droga? Que tipo de droga? Que Quantidade? Qual a apreensão? A quem vendeu? Que tipo de droga? E que Quantidade? Assim o arguido desconhece os fundamentos da sua condenação, uma vez que o Tribunal a quo não específica, como é sua obrigação, a sua motivação de forma concreta, concisa, objectiva, dos motivos de facto e de direito que levara à condenação do arguido bem como a indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do Tribunal e condenar o arguido nos termos do art. 374º, n.º 2, do C. P. P.
XIII.–Estamos, pois, longe de simples “dealers” de rua, em actuação isolada, sem qualquer suporte de organização ou logística mínima para uma actividade de tráfico, em ambiência concreta de actuação individual, sem relação com circuitos de distribuição.
XIV.–Pelo exposto é nula, toda a prova produzida nos autos resultante da recolha e conservação de dados móveis e metadados fornecidos pelas operadoras de comunicações, nos termos da disposto no acórdão n.º 26268/2022 do Tribunal Constitucional conjugado com os artigos 125º, à contrario; 126º, n.º 2 e 3 todos do Código de Processo Penal a qual é, desde já, arguida.
XV.–A recorrente tem apoio familiar e quando sair em liberdade já tem trabalho e nunca vendeu qualquer produto estupefaciente. Quanto às suas condições pessoais ficou provado do ponto 65 a 86:…Até aos 6 anos viveu em ... com ambos os progenitores, e, posteriormente, na sequência dos maus tratos infligidos pelo pai e a separação dos progenitores, passou a viver com a mãe e com os irmãos na ..., no bairro piscatório …um meio sócio habitacional marcado por diversos problemas de exclusão social e por dificuldades económicas…tendo deixado de estudar quando frequentava o 7º ano de escolaridade para ajudar a cuidar da mãe, após um grave acidente que aquela sofreu devido ao rebentamento de uma conduta de água. Não é consumidora de estupefacientes…a arguida verbaliza como perspetivas futuras, o seu regresso ao agregado de origem e sua integração laboral para poder ajudar a família a sair do bairro onde vivem, o qual considera ter um ambiente prejudicial.
Todavia, reconhece que mesmo naquele bairro poderá seguir um rumo de vida diferente, tendo como exemplo a sua irmã mais velha, que também ali vive com a família constituída e tem um modo de vida integrado, trabalha num restaurante e está a frequentar um curso superior de .... Esta irmã mostra-se disponível para ajudar a arguida no seu processo de ressocialização, constituindo-se assim para a arguida como um modelo de referência socialmente ajustado e que poderá ajudá-la a equacionar um projeto de vida diferente para o seu futuro.
AA reconhece a ilicitude de parte dos atos e o impacto dos mesmos para eventuais vítimas, pese embora, utilizando uma argumentação desculpabilizante, justificando os seus comportamentos com a pressão de terceiros.”
Em meio prisional, AA tem mantido um comportamento globalmente adaptado e relaciona-se de forma adequada com os serviços e os pares.
Mantém um contacto telefónico regular com a mãe e com os irmãos, e beneficia regularmente de visitas da mãe e da irmã mais velha.
AA apresenta um percurso de vida marcado por um contexto sociofamiliar desprovido de estabilidade, com uma dinâmica familiar disfuncional, que a par do precoce abandono escolar, a imaturidade e uma deficitária supervisão e controlo parental terá condicionado negativamente o seu processo de socialização.
Assim, o seu percurso de vida tem sido marcado pela falta de competências sociais, formativas e profissionais, bem assim, a dependência de apoios assistenciais, que, a par de uma vivência desregrada e ligada a um meio e pessoas com condutas pró-criminais a que se mostrou permeável, veio a culminar no seu contacto com o sistema da administração da justiça penal e prisional.
XVI.–Da factualidade considerada como provada, pelo Tribunal nunca configuraria o preenchimento do art. 21º, no máximo o art. 25º, o douto acórdão violou o preceituado nos artigos, 71º, 72º, do C. P. P.
XVII.–Não se produziu qualquer prova em audiência de julgamento que levasse a uma condenação. E como ficou demonstrado do certificado do registo criminal da arguida nada consta.
XVIII.–Para além do produto que foi apreendido que guardava para II, nada mais foi encontrado relacionados com o tráfico, nem dinheiro, nem quaisquer sinais exteriores de riqueza.
XIX.–Face ao exposto deverá a arguida ser absolvida do crime de tráfico de produto estupefaciente p. e p. no art. 21º, e condenada pelo art. 25º, do DL 15/93.
XX.–Deverá a pena ser suspensa na sua execução nos termos do art. 50º do Cód. Penal.
Violaram-se: os artigos, 32º da C.R.P. 21º, 25º, do Dec-Lei n.º 15/93, 40º, n.º 2, 50º, 70º, 71º e 72º, do C.P. e 410, n.º 2, 374º, n.º 2 do Cód. Proc. Penal.
Termos em que, e pelo mais que V. Ex.as mui doutamente
suprirão, deve ser concedido provimento ao presente recurso, e, em consequência, deverá a arguida ser absolvido da prática do crime de tráfico de estupefacientes. p. e p. no art. 21º e sim pelo art. 25º, do DL 15/93, e em qualquer caso a pena ser suspensa na sua execução, e , assim, se fará a devida
JUSTIÇA!
2.2.–O arguido BB finalizou a motivação do recurso com as seguintes conclusões, após despacho de convite ao aperfeiçoamento (transcrição):
A.–O presente recurso prende-se com diversas questões, entre elas: quer a acusação quer da decisão condenatória estão feridas de nulidades, de que ora se recorre, baseando-se na sua quase totalidade em imputações genéricas, que não são "factos" suscetíveis de sustentar uma condenação penal.
B.–O douto acórdão, baseia-se essencialmente no que concerne ao ora recorrente, nas escutas telefónicas. Porém, as escutas telefónicas são meio excecionais de obtenção de prova e por isso o MP que as requer deve ser adstrito a fundamentar claramente, porque motivo não pode ser feita a prova de outro modo, e o juiz que as decide deve fundamentar de igual forma, para que não valha um sistema em que meros pressupostos formais legitimam um meio tão intrusivo, que em relação a certo tipo de crimes acaba por se tornar a forma mais cómoda da investigação.
C.–O ora recorrente nunca foi investigado ao longo de aproximadamente 3 anos de investigação. Como tal nunca foi alvo de interceção de escutas telefónicas. Apesar de existir 3 ou 4 escutas telefónicas, em que indivíduos falam no seu nome. Assim, o ora recorrente considera nula a prova resultante da interceção das conversações telefónicas efetuadas, e respetivas transcrições, porque entendemos que viola os mais elementares princípios constitucionais, invocando a inconstitucionalidade da interpretação do art.º 187.º n.º 1 do CPP pelo Tribunal a quo, no sentido em que seja admissível uma escuta telefónica a um determinado indivíduo sem que esteja assegurada a sua necessidade comprovada nos autos, por violação dos arts.º 32.º n.º 8 e 34.º n.º 4 da Lei Fundamental.
D.–Nos presentes autos, estamos perante uma tremenda falha investigatória, para além do argumento legal, diz-nos o bom senso, que seriam necessários outros elementos de investigação criminal, que levassem o Tribunal recorrido a crer que aquelas escutas constituíam o último reduto para uma investigação bem-sucedida. Sendo isto o que a lei prescreve, e se reconheça que a escuta deve ser um meio subsidiário de prova e, como tal, a ela se deverá recorrer quando não seja possível alcançar a verdade através de outros meios de prova, quer isto dizer que, sendo possível alcançar a verdade através de outros meios de prova, não nos parece que as referidas escutas sejam legais, só pelo simples facto de terem sido autorizadas judicialmente, não obstante ter havido, um completo atropelo dos princípios constitucionais.
E.–Em nosso entender, para que a escuta se deva considerar válida, não basta que se mostrem preenchidos os requisitos formais, nem essa validade pode ser justificada à posteriori pelas “descobertas” assim realizadas, é que a justificação e suporte da autorização judicial têm de ser prévios, têm de sustentar-se em prova e indícios já existentes e que conduzam no sentido de complementá-los, e não como nos presentes autos, em meras “deduções” e “presunções” do OPC, que para além das escutas constantes nos autos referente a outros indivíduos, nenhuma outra diligência realizou relativamente ao ora recorrente.
F.–Sendo a regra constitucional a de que o sigilo dos meios de comunicação é inviolável e a de que é proibida toda a ingerência das autoridades públicas e privadas nas telecomunicações (art.º 32 n.º 4 da CRP)...salvo os casos previstos na lei em matéria de processo criminal, a regra é, pois, a de proibição de interferência nas comunicações, o que impõe uma avaliação, caso a caso, das situações legais que justifiquem a derrogação do princípio consagrado constitucionalmente, para tutela das liberdades e garantia dos cidadãos, é esta solução e entendimento que perfilhamos e que, em nosso entender se compaginam com a presunção de inocência.
G.–Daí que, os legisladores constitucional e ordinário, tenham um particular cuidado na regulamentação do seu âmbito de aplicação e das condições da sua realização para que assim se possa alcançar um equilíbrio entre, por um lado, as necessidades comunitárias de perseguir eficazmente os criminosos e, por outro, a tutela dos direitos dos visados. Por isso, o nosso legislador apenas admitiu a realização das escutas telefónicas quanto a certos crimes taxativamente enunciados no n.° 1 do art.° 187.° do C.P.P. e “se houver razões para crer que a diligência se revelará de grande interesse para a descoberta da verdade ou para a prova”, ora o estabelecimento um sistema de catálogo tem ínsita a necessidade de que, antes de se poder ordenar a realização de uma escuta telefónica, existam nos autos elementos que tornem verosímil a prática de um concreto crime incluído nesse elenco, não bastando a mera invocação da suspeita da sua prática por qualquer órgão de polícia criminal. Quer isto dizer que, esse juízo não pode assentar em meras deduções policiais, que com base em nenhuma diligência efetuada presumem e concluem. Por isso, não é legalmente possível ordenar a realização de uma escuta telefónica sem que primeiro tenham sido realizadas diligências de prova, de natureza diversa das interceções, que permitam asseverar o necessário grau de verosimilhança do suspeito.
H.–Ora, o procedimento adotado nestes autos, infringe, de forma clara, esta exigência legal, porque se atuou da forma descrita, também não se comprovou se a realização das interceções telefónicas era um meio de obtenção de prova necessário para o desenvolvimento da investigação e se o mesmo, podia ser substituído por outro menos lesivo para os meios individuais, tal como exige a parte final do n.° 1 do referido art.° 187.° do C.P.P. É o que resulta do princípio da subsidiariedade das escutas telefónicas.
I.–No que concerne à acusação deduzida contra o ora recorrente, sempre se dirá que, a mesma se mostra conclusiva, porquanto a mesma, não refere nem a quantidade ou qualidade de produto estupefaciente, que supostamente terá sido transacionado, nem a quem, nem por quanto, limitando-se a concluir que o arguido ora recorrente, terá, vendido não se sabe que tipo e/ou quantidade de produto, por montante que não se sabe, a indivíduos que não são identificáveis, socorrendo-se para o efeito se tanto, de 3 ou 4 escutas telefónicas a indivíduos, que falam no nome do ora recorrente, desacompanhado de vigilâncias e relatórios de vigilâncias, sendo certo que nunca viram o ora recorrente, a vender a comprar a ceder a partilhar qualquer tipo de produto estupefaciente.
J.–Como pode o ora recorrente, defender-se de uma acusação onde refere que “agiram em conjunção de esforços e vontades entre si, em execução de plano comum, destinado à venda de produto de estupefaciente, para obtenção de vantagem económica”, que em nosso entender é conclusiva, pois não apresentam os pressupostos fácticos.
K.–No presente caso, dúvidas não restam que os factos que determinaram a origem aos presentes autos, são suscetíveis de integrar o crime de tráfico de estupefacientes, logo, um dos crimes do catálogo, razão pela qual nada obsta à utilização das transcrições efetuadas para fundamentar a abertura do inquérito, destes autos nem, tão pouco, ao aproveitamento dessa prova. Tal tese é violadora dos mais elementares princípios constitucionais, pelo que, o ora recorrente invocam a inconstitucionalidade da interpretação do art.º 187.º n.º 1 do C.P.P pelo Tribunal a quo, no sentido em que seja admissível uma escuta telefónica a um determinado indivíduo, sem que esteja assegurada a sua necessidade comprovada nos autos, por violação dos arts.º 26.º n.º 1, 32.º n.º 8 e 34.º n.º 4 da Lei Fundamental.
L.–O recurso prende-se com a matéria de fato dada como provada, a qualificação jurídica dos fatos, a violação do princípio da livre apreciação da prova e a medida da pena aplicada, impugnando-se a matéria de fato dada como provada, relativamente ao ora recorrente, e faremos também referência à medida da pena aplicada ao ora recorrente. Assim, impugna-se os pontos dos fatos dados como provados: 2, 5, 14, 32, 52, 55, 57, 59, 61, atendendo à prova produzida em sede de Audiência de Discussão e Julgamento, tais factos, nunca poderiam ter sido dados como provados. E para esclarecimento da verdade material e para a boa decisão da causa, o ora recorrente entendeu prestar declarações em audiência de discussão e julgamento.
M.–A este propósito o Douto Acórdão condenatório deu como provado que “A esta atividade, aderiram, no segundo semestre de 2019, os arguidos DD (conhecido por “...” e “...”) e BB, aos quais competia realizar as vendas de produto estupefaciente a consumidores, recolhendo o respetivo pagamento”. O recorrente esclareceu em audiência de discussão e julgamento, que conhece várias pessoas, apesar de não haver amizades, apenas conhecimentos visuais, que tem pouco a dizer das pessoas. Que conhece várias pessoas da ..., nomeadamente o CC, a AA e a mãe D. EE, e que o II conhece, de vista da ... das lides da pesca, mas que não convivia com ele. Em parte alguma o Tribunal a quo, perguntou ao ora recorrente, se conhecia ou não, o arguido DD. Como também o ora recorrente, nunca referiu que conhecia esse co-arguido, (DD), ficando-se o Tribunal a quo, na dúvida se os arguidos se conheciam os não. Contudo, não existem nos autos escutas telefónicas, nem transcrições de conversas entre os co-arguidos (DD com o BB), nem vigilância ou relatórios de vigilâncias, nem prova testemunhal, que se conclua que os co-arguidos sejam conhecidos, amigos, ou que simplesmente convivam.
N.–Assim, o Tribunal a quo, não podia dar como provado, por inexistência de meios de prova, que os co-arguidos DD e BB, fossem conhecidos ou amigos, e que tenham aderido no segundo semestre de 2019 à atividade da venda de produtos estupefaciente. Atendendo que ao longo dos “suposto 3 anos de investigação” o recorrente, NUNCA foi alvo de qualquer investigação, não foi alvo de escutas telefónicas, não foi alvo de vigilâncias ou relatórios de vigilância, não foi alvo de apreensões, não há nos autos, compradores a declarem que compraram produto de estupefaciente ao recorrente, como tal, não poderia o Tribunal a quo, dar como provado que o ora recorrente no segundo semestre de 2019, dedicou-se à atividade de venda de produto estupefaciente a consumidores, e que recolhia o respetivo pagamento, se ao longo de todo o processo, o ora recorrente NUNCA foi alvo de investigação! E não existe nenhum meio de prova que o indicie nesse sentido.
O.–Refira-se que só após a busca domiciliária realizada no dia 29 de junho de 2022, à casa do co-arguido CC, casa essa, onde o recorrente residia temporariamente, tendo o recorrente colaborado com as buscas, dando acesso ao seu quarto, facilitando tudo aos Senhores Agentes de Investigação, onde os mesmos, disseram-lhe que nem o conheciam. Então pergunta-se se a busca foi realizada a 29/06/2022, e os agentes que investigação não conheciam o ora recorrente, como pode o Tribunal a quo, dar como provado o ponto o ponto 2?
P.– recorrente nunca foi alvo de investigação desde a fase de inquérito que durou sensivelmente 3 anos, a busca à residência do co-arguido CC realizou-se a 29/06/2022, porém, o recorrente só é constituído arguido, 4 meses depois a 22/10/2022. Também nessa fase o arguido/recorrente não foi investigado. Ou seja, NUNCA FOI INVESTIGADO! Ao longo deste processo o ora recorrente não foi investigado, aparecendo em 3 ou 4 escutas, onde indivíduos falam no nome do recorrente, fazendo o Tribunal a quo prova plena, condenando o ora recorrente numa pena de prisão efetiva de 5 anos, por um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. no artigo 21.º n.º 1 do D.L. 15/93, de 22 de janeiro.
Q.–Esclareça-se que após a busca domiciliária à residência do co-arguido CC, a 29/06/2022, e porque o ora recorrente encontrava-se a descansar e a residir num quarto temporariamente cedido naquela residência, e tendo sido apreendido no seu quarto, os seus pertences (dinheiro, ouro e telemóveis e um caderno da sua atividade piscatória), tendo o recorrente, sido constituído arguido pelo núcleo de investigação da esquadra da PSP do ...a 27 de outubro de 2022, ou seja, volvidos sensivelmente, 4 meses, após as buscas domiciliárias, o recorrente prestou declarações.
R.–Se, os presentes autos estiveram sob investigação aproximadamente 3 anos, e nunca o ora recorrente foi alvo de investigação, sendo o recorrente somente constituído arguido 4 meses após as buscas domiciliárias, pergunta-se que investigação foi realizada ao ora recorrente? Que meios de prova foram recolhidos, e que existem nos presentes autos, para condenar o recorrente por um crime de tráfico de estupefaciente, p. e p. no artigo 21.º n.º 1 do D.L. 15/93 de janeiro, na pena de 5 anos prisão efetiva?
S.–Atendendo à inexistente prova de investigação, a inexistência de escutas telefónicas efetuadas ao ora recorrente e respetivas transcrições, inexistente vigilância e respetivos relatórios, inexistentes apreensões, e inexistente prova testemunhal, que declarem que o ora recorrente e o arguido DD, venderam produto estupefaciente, face à inexistência prova indiciária produzida no processo e a produzida em audiência de discussão e julgamento, nunca poderia o Tribunal a quo condenar o ora recorrente.
T.–Nenhuma das testemunhas ouvidas em sede de audiência de julgamento, referiu em momento algum, que adquiriu ao recorrente, produto estupefaciente. Como também não se fez prova que o co-arguido, DD e o ora recorrente se conhecessem ou privassem. Como também não se fez prova que tenham aderido no segundo semestre de 2019, à atividade de venda de estupefaciente, recolhendo o respetivo pagamento. Nenhum depoimento das testemunhas, nenhuma declaração dos co-arguidos, nenhuma vigilância efetuada pelos OPC, nenhuma escuta telefónica constante nos autos, permite dar como provado, conforme fez o Douto Tribunal a quo, que o recorrente realizava as vendas de produto estupefaciente a consumidores, recolhendo o respetivo pagamento. Como tal não poderia o Douto Coletivo, só com base na interpretação que a polícia fez das escutas, dar como provados este facto. Ora ao dar-se como provado este facto, com base nas meras suposições do OPC, sem que nenhuma testemunha o tivesse presenciado, e sem o suporte de qualquer outro elemento probatório, cometeu o Tribunal a quo, os vícios constantes do art.º 410.º n.º als. a) e c) do CPP, pois nada existe sequer nas escutas, que permita aferir que o ora recorrente, se estivesse a referir-se a produto estupefaciente ou a algo ilícito.
U.–Padecendo o Tribunal a quo, de "erro notório na apreciação da prova", que se impõe ao conhecimento oficioso do Tribunal ad quem, porém, não tem a ver com a divergência pessoal do recorrente em relação às conclusões firmadas pelo Tribunal perante as provas produzidas; o vício resulta sim, dos próprios termos da decisão, e é aí imediatamente revelado, sem o auxílio de quaisquer elementos estranhos à decisão.
V.–Ou seja, na relação entre os contactos “provados” e a “entrega”, nunca verificada, bem como a ausência de verificação da prova de detenção para venda a terceiros, não existe uma continuidade lógica, que permita fazer decorrer dos factos conhecidos (a conversa/mensagem), que permita concluir que houve qualquer entrega, quando é que esta se realizou, e se a entrega foi de produto estupefaciente. Perante tais circunstâncias, e a ordem da razoabilidade das perceções permitidas pelas regras da experiência, é inaceitável a conclusão formada pelo Tribunal a quo, sobre os factos dados como provados. Existe assim, elementos retirados da própria decisão que indiciam ter existido erro, concretamente erro notório, na apreciação da prova. Art.º 410.º n.º 2 al. c) do CPP.
W.–Resulta também do douto acórdão, uma inexistência ou insuficiência da fundamentação da matéria de facto dada como provada, essa insuficiência resulta do confronto que é permitido pelos termos da decisão, entre os factos que foram considerados provados e a integração, plena, dos elementos dos crimes que a decisão considerou, quer, estes sejam elementos da descrição, quer respeitem à definição dos limites e da medida da ilicitude, ou sejam estritamente necessários à determinação da medida da culpa.
X.–Sendo certo que nada foi visto, e nada foi apreendido, nada consta dos autos, conforme decorre do próprio Acórdão, estes factos têm unicamente como suporte a interpretação que um agente da polícia fez das escutas telefónicas, impugnando-se para os devidos efeitos. Tal meio de prova, isoladamente, não permite ao Tribunal fazer um Juízo de valor como o que foi efetuado e concluir que o ora recorrente cometeu o crime de tráfico agravado p. e p. 21º, n° 1, e 24.º al. b) do Decreto-Lei n° 15/93, de 22 de Janeiro. Pois não se sabe, porque não se investigou, se de facto o recorrente, vendeu algum tipo de produto estupefaciente. Desconhecendo-se ainda, caso se considerasse que efetivamente o recorrente tivesse procedido à venda, quando, onde, o quê, a quem e por quanto.
As quantidades e a qualidade de produtos estupefacientes que “supostamente alegadamente” foram vendidas pelo recorrente e/ou destinadas à venda, são relevantes para a integração diferencial dos vários tipos de tráfico e para a determinação do nível de ilicitude e da medida da pena. A ausência de referência direta a determinadas quantidades, não satisfaz as exigências pressupostas à integração do tipo e aos restantes elementos: a matéria de facto não pode, pois, nesta perspetiva, ser considerada suficiente, tendo o Tribunal interpretado erradamente e inconstitucionalmente o art.º 127.º do CPP e incorrendo nos vícios p. e p. no art.º 410.º n.º 2 al a) e c) do CPP.. Devendo assim este ponto, ser impugnado e ser dado como não provado, devendo a decisão recorrida ser alterada e substituída, por outra que absolva o arguido pela prática do referido crime, tendo em conta que se respeita os termos do art.º 412.º do CPP, ou caso assim não se entenda, deve o Acórdão ser anulado e o processo remetido para novo julgamento, art.º 426.º do C.P.P.,
Y.–Mais deu como provado o Tribunal a quo, que “Os arguidos realizavam a descrita atividade na zona do ..., na ..., local onde acorrem diariamente indivíduos toxicodependentes, com o objetivo de adquirir substâncias estupefacientes para consumo.” Como pode o Tribunal a quo, dar como provado tal fato referente ao ora recorrente, uma vez que não existem nos autos, nem foi produzida prova em audiência de discussão e julgamento referente ao ora recorrente, que o mesmo realizava a atividade de venda de produto de estupefaciente na zona do ..., na ....
Z.–Atendendo a ausência de investigação, a inexistência ou insuficiência das escutas telefónicas ao ora recorrente e respetivas transcrições, inexistentes vigilâncias e respetivos relatórios, inexistentes apreensões, e inexistente prova testemunhal, que declarem que o ora recorrente, vendeu produto estupefaciente, face à insuficiente ou total ausência de prova indiciária nos autos e produção de prova em audiência de discussão e julgamento, havendo apenas 3 ou 4 escutas, onde indivíduos, referem o nome do recorrente, nunca poderia o Tribunal a quo, condená-lo numa pena de prisão efetiva de 5 anos.
AA.–Nenhuma das testemunhas ouvidas em sede de audiência de julgamento, ou algum co-arguido, referiu em momento algum, que adquiriu ao ora recorrente, produto estupefaciente. Bem como nenhuma vigilância efetuada pelos OPC, nenhuma escuta telefónica constante nos autos, permite dar como provado, conforme fez o Douto Tribunal a quo, que o ora recorrente realizava a sua atividade na zona do ..., na .... O Tribunal a quo, por lapso certamente, esquece de referir que o ora recorrente cresceu no ..., e que vive no ..., que tem lá família, tios, primos e a sua ex mulher e os seus três filhos, e que o ... é frequentado não só por toxicodependentes, mas também por cidadãos honestos e trabalhadores, fazendo crer o Tribunal a quo, que aquele bairro é somente um centro de abastecimento de drogas!!!
BB.–Como tal não poderia o douto coletivo, só com base na interpretação que um polícia fez das escutas, dar como provado este facto em relação ao ora recorrente. Ora ao dar-se como provado este facto, com base nas meras suposições do OPC, sem que nenhuma testemunha o tivesse presenciado, e sem o suporte de qualquer outro elemento probatório, cometeu o Tribunal a quo, os vícios constantes do art.º 410.º n.º als. a) e c) do CPP, pois nada existe sequer nas escutas, que permita aferir que o ora recorrente, realizava atividade de venda de produto de estupefaciente na zona do ....
CC.–Mais, padeceu o Tribunal a quo, no "erro notório na apreciação da prova", como vício na apreciação da matéria de facto, o vício resulta dos próprios termos da decisão e é aí imediatamente revelado, sem o auxílio de quaisquer elementos estranhos à decisão. Pois, pode aqui aferir-se que, pela perspetiva própria de uma razoável compreensão das regras da vida e da experiência comum das coisas, que o Tribunal não dispôs de prova testemunhal (meio de prova produzido contraditoriamente em audiência) que permitisse estabelecer uma relação de confirmação sequencial das indicações adquiridas através da utilização de um meio instrumental para a obtenção da prova. Na relação entre os contactos “provados” e a “entrega”, nunca verificada, bem como a ausência de verificação da prova de detenção para venda a terceiros, não existe uma continuidade lógica, que permita fazer decorrer dos factos conhecidos (a conversa/mensagem), que permita concluir que houve qualquer entrega, quando é que esta se realizou e se a entrega foi de produto estupefaciente. Perante tais circunstâncias, e a ordem da razoabilidade das perceções permitidas pelas regras da experiência, é inaceitável a conclusão formada pelo Tribunal a quo, sobre os factos dados como provados. Existe assim, elementos retirados da própria decisão que indiciam ter existido erro, concretamente erro notório, na apreciação da prova. Art.º 410.º n.º 2 al. c) do CPP.
DD.–As quantidades e a qualidade de produtos estupefacientes que “supostamente e/ou alegadamente” foram vendidas pelo recorrente e/ou destinadas à venda, são relevantes para a integração diferencial dos vários tipos de tráfico e para a determinação do nível de ilicitude e da medida da pena. A ausência de referência direta a determinadas quantidades, não satisfaz as exigências pressupostas à integração do tipo e aos restantes elementos: a matéria de facto não pode, pois, nesta perspetiva, ser considerada suficiente, tendo o Tribunal interpretado erradamente e inconstitucionalmente o art.º 127.º do CPP e incorrendo nos vícios p. e p. no art.º 410.º n.º 2 al a) e c) do CPP, devendo a Decisão recorrida ser alterada e substituída por outra que absolva o arguido pela prática do referido crime, tendo em conta que se respeita os termos do art.º 412.º do CPP, ou caso assim não se entenda, deverá o processo ser remetido para novo julgamento. Cfr. art..º 426.º do CPP.
EE.–Também deu Tribunal a quo, como provado que “...no dia 04 de setembro de 2021, a arguida EE contactou a arguida AA, questionando-a sobre produto estupefaciente guardado, que se destinava a um cliente e estava a ser solicitado pelo arguido BB e por outro indivíduo, para realizar a venda.” Não pode o Tribunal a quo, dar como provado tal fato referente ao ora recorrente, o que desde já se impugna, uma vez que não existem nos autos, nem foi produzida prova em audiência de discussão e julgamento referente ao ora recorrente, que o mesmo terá questionado a Dona EE, que por sua vez, terá ligado à sua filha AA, questionando sobre produto de estupefaciente que estaria guardado e que se destinava a um cliente.
O recorrente foi confrontado com essa escuta e respetiva transcrição, onde falam na sua alcunha ... e de um tal Açoriano que não é arguido no processo, nem tão pouco foi arrolado como testemunha. O ora recorrente ao ser confrontado com essa escuta a falarem de si, esclareceu, que conhece esse açoriano da ..., e que quando se dirigia à casa da Dona EE, era para comprar ou red bulls, mortalhas, rebuçados ou gomas e até cigarros avulsos. Refira-se que ambas as arguidas AA e EE, (filha e mãe) estavam a serem investigadas nos presentes autos, e encontravam-se sob escutas telefónicas. Porém nessa escuta, falam no nome do recorrente, conhecido por ..., morador no mesmo bairro. A ser verdade, o que consta da escuta, então, porque razão os agentes de investigação, em tempo real, não interviram, e vigiaram por forma a identificar e a intersectar, os eventuais compradores? Por forma a corroborar essa escuta? Contudo os agentes de investigação, não juntaram aos autos nenhum outro(s) meio(s) de prova.
FF.–Não existindo vigilâncias nem relatórios de vigilância, não existe interceção, não existe identificação ao eventual comprador, não existindo apreensões, que investigação foi feita? A verdade é que os agentes de investigação, mais uma vez nada fizeram! Limitaram-se a ouvirem as escutas e a tirarem as suas conclusões. Não juntando ao processo outro(s) meio(s) de prova, para corroborar essa escuta telefónica. Assim, não pode o Tribunal a quo, dar tal facto como provado, que o ora recorrente solicitou um produto de estupefaciente às co-arguidas, e que tal produto se destinava a um cliente. Tal facto, alicerça-se unicamente na escuta telefónica, realizada a um dos telemóveis das arguidas. Pois se as escutas telefónicas são meros meios de obtenção de prova, que desacompanhadas de qualquer outro suporte probatório, não são suficientes, para se considerar tal facto como provado, e consequentemente condenar o recorrente.
GG.–O ora recorrente foi confrontado com outra escuta e respetiva transcrição, onde um indivíduo de nome II, fala no nome do recorrente, chamando-lhe de otário, desconhecendo o ora recorrente ao que ele se refere. Gostaria o recorrente que esse indivíduo esclarecesse o que o recorrente terá deixado na casa da EE.–Atendendo a ausência de prova na investigação, a inexistência ou insuficiência das escutas telefónicas ao ora recorrente e respetivas transcrições, inexistentes vigilâncias e respetivos relatórios, inexistentes apreensões, inexistente prova testemunhal que declarem que o ora recorrente vendeu produto estupefaciente, face à insuficiente ou ausência de prova indiciária nos autos e a falta de produção de prova em audiência de discussão e julgamento, nunca poderia o Tribunal a quo condená-lo.
HH.–Do que se recorda, o ora recorrente esclareceu o Tribunal, dizendo que tais conversas não tinham nada a ver com transações de qualquer tipo de produto estupefaciente, porque o ora recorrente nunca havia vendido ou comprado nenhum tipo de produto estupefaciente. Mais, esclareceu o ora recorrente, que não sabia a quê que essa escuta se referia, e que deveria ser esse indivíduo II a esclarecê-la.
II.–Apesar do agente LL, demonstrar um vasto conhecimento sobre a globalidade da investigação, cujo início situa em junho de 2019, sendo particularmente esclarecedor e exaustivo na narrativa dos fatos, confirmando mesmo, que não conhecia o ora recorrente e não sendo o mesmo alvo de investigação. Que passou a conhecê-lo a partir do dia das buscas a 29/06/2022, quando se encontrava a dormir num dos quartos na casa do co-arguido CC, sendo somente constituído arguido a 22/10/2022, volvidos 4 meses após as buscas, e ainda assim, os agentes da investigação, não investigaram o ora recorrente.
JJ.–Dando o Tribunal a quo, os fatos dados como provados, com base e apenas nas escutas telefónicas, corroborado com o testemunho de um agente de investigação LL, que alegava ter um “vasto” conhecimento, mas que não conhecia o recorrente da investigação, porém tirou as suas conclusões, comunicando ao Tribunal o seu testemunho, apesar de não ter realizado nenhuma investigação ao ora recorrente, e não juntando aos autos nenhum outro meio de prova para corroborar com as escutas em causa, formando as suas conclusões.
KK.–Dando o Tribunal a quo, como provado, tais declarações, apesar de desacompanhada qualquer outro meio de prova, violando, desta forma, o douto Tribunal o princípio da livre apreciação da prova e da presunção de inocência do recorrente, princípios estes com consagração Constitucional. Violando assim o Douto Tribunal, com este entendimento, não só o Princípio da livre apreciação da prova, bem como fez uma interpretação que não podia do art.º 130.º n.º 2 al. b) do CPP, pois não apurou factos que permitissem chegar a tal conclusão, cometendo assim os vícios do art.º 410.º n.º 2 als. a) e c) do CPP., pelo que deverá o Acórdão ser anulado, ou o processo remetido para novo Julgamento, art.º 426.º do CPP. Assim, o Tribunal a quo fundamentou a condenação do recorrente, apenas e unicamente na interpretação que os agentes do OPC fizeram das escutas que ouviram, devendo ser dados por não provado o ponto 14 do acórdão condenatório.
LL.–Violando o acórdão condenatório, o Princípio da Livre Apreciação da Prova, constante do artigo 127º do C.P.P. O Tribunal ao decidir como decidiu, sem que nada nos autos exista, cometeu erro notório na apreciação da prova, art.º 410.º n.º 2 al. c), devendo o Acórdão ser anulado. Com cerca de 3 anos a investigação, não existindo nos autos, qualquer apreensão ao recorrente de qualquer produto de estupefaciente, nem existe nenhum consumidor que tivesse declarado ter comprado ao ora recorrente, então, não se coaduna, com a conclusão assumida pelo Douto Acórdão, que permitiu condenar o ora recorrente BB, a 5 anos de prisão efetiva, pela prática do crime p. e p. nos art.º 21.º do DL 15/93 de 22/01.
MM.–O Legislador pretende com a estatuição do artigo 21, punir os traficantes no verdadeiro sentido do termo, pessoas que se dedicam em exclusivo a esta atividade com vista à obtenção de lucro fácil, num negócio ilícito de grande rentabilidade. Não é possível de modo algum integrar o ora recorrente nesta previsão, por ser completamente desadequada à realidade dos fatos. Assim parece-nos que, a douta decisão do Tribunal, violou flagrantemente os princípios da livre apreciação da prova e da presunção da inocência (art.ºs 127.º do CPP e 32.º n.º1 da CRP), ao dar como provados os factos supra referidos, sem que tivesse qualquer suporte probatório, pois fez um Juízo conclusivo, sem suporte probatório, firmando-se apenas na sua convicção de que o ora recorrente é culpado, devendo o julgamento ser anulado e o processo remetido para novo julgamento, art.º 426.º do CPP.
NN.–O Tribunal a quo deu como provado que “À data dos factos, o arguido BB estava a viver na residência do coarguido CC.” O ora recorrente foi interrogado pela Sra. Juiz, se o recorrente juntamente com o co-arguido CC e com a AA guardavam, vendiam, guardavam produto estupefaciente, na residência, em que o mesmo respondeu negativamente. Mais declarou que a casa onde se encontrava a dormir, era apenas do seu amigo CC, que devido à sua casa ter ardido, e se ter separado da sua mulher, e que pediu ao seu amigo, se podia ficar num quarto na casa dele, durante um período de tempo, até se organizar e construir a sua casa. Interrogado esclareceu que não sabia precisar o período de tempo em que viveu na casa do CC, nem quando começou lá a viver, não se recorda se foi em 2019 ou em 2020. Esclareceu, que não tem grandes ligações, com a AA. E que nunca vendeu produto de estupefaciente. O recorrente esclareceu que tem casa própria, e que atualmente já lá vive. Porém, como a sua casa tinha sido incendiada, não tinha condições de habitabilidade e como tal teve de arranjar onde pudesse dormir, até reconstruir a sua casa. Por tal motivo pediu ao seu amigo CC, se podia lá viver num dos quartos, até se organizar, ao que o co-arguido CC acedeu.
OO.–Conforme se pode verificar de acordo com as transcrições das declarações prestadas em audiência de discussão e julgamento, o fato dado como provado neste ponto, é diverso das declarações prestadas pelo recorrente, pois desconhecemos a que fatos o Tribunal a quo se refere, não concretizando. Atendendo que o ora recorrente não sabe indicar desde que data passou a viver na casa do co-arguido CC, impugna-se este fato dado por provado no douto Acórdão, onde consta que “à data dos fatos o arguido BB estava a viver na residência do co-arguido CC.” Mas quais fatos? Conforme declarações prestadas pelo recorrente e transcritas, o mesmo não soube precisar o período de tempo, em que foi viver para a casa do seu amigo CC, não sabendo se foi no ano de 2019 ou no ano de 2020, que terá passado a viver na residência do amigo. Impugnando-se este fato dado como provado, porque se desconhece a que fatos o Tribunal a quo, se refere, para dar como provado este ponto 30 do douto acórdão, atendendo que quer a acusação, quer o próprio acórdão são genéricos.
PP.–Quer a acusação quer o próprio acórdão são nulos, porquanto se mostram conclusivos, e porque não referem, dias e datas precisas dos fatos. Continuamos a entender que não são "factos" suscetíveis de sustentar uma condenação penal as imputações genéricas, em que não se indica a data em concreto, o lugar, nem o tempo, nem a motivação, nem o grau de participação, nem as circunstâncias relevantes, mas um conjunto fáctico não concretizado. As afirmações genéricas, contidas no elenco desses "factos" provados do acórdão recorrido, não são suscetíveis de contradita. Por isso, a aceitação dessas afirmações como "factos" inviabiliza o direito de defesa, constituindo uma grave ofensa aos direitos constitucionais previstos no art. 32º da Constituição. Considera-se que, nesta parte, o douto Acórdão comete um erro notório na apreciação da prova (art. 410º, nº. 2, al. c), ou, talvez mais corretamente, tem lugar um vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada (al. a), nº. 2, do art. 410º do C.P.P.), dado que da factualidade vertida na decisão se colhe faltarem elementos que, podendo e devendo ser indagados, são necessários para que se possa formular um juízo seguro de condenação. Ou seja, impõe-se uma renovação de prova. O Tribunal a quo, com a interpretação que tais remissões genéricas, violou o princípio do in dubio pro reo, traduzido pelo art..º 32º, da C.R.P.
QQ.–Estabelecidos que estão os factos pela primeira instância, resta ao Venerando Tribunal da Relação, constatar que não se provaram factos concretos contra o recorrente, relativos à venda de produtos estupefacientes que lhe é imputada, pois como tal não podem ser tomadas as afirmações genéricas que se declararam provadas no acórdão recorrido, pelo que, consequentemente, deverá ser absolvido da prática do crime de tráfico de estupefacientes, p.p. no art. 21º, nº. 1, do DL 15/93, de 22 de Janeiro. Assim deverá o ponto 30 ser impugnado e ser dado como não provado, devendo o arguido ser absolvido da prática destes factos, ou caso assim não se entenda, deve o Acórdão ser anulado e o processo remetido para novo julgamento, art.º 426.º do C.P.P..
RR.–Também, deu o Tribunal a quo, como provado que “Em fevereiro de 2021, os indivíduos que pretendiam adquirir produto estupefaciente a BB deslocavam-se, para esse efeito, à residência de CC, a diversas horas do dia e mesmo durante a madrugada.” Atendendo a toda a prova produzida, não podia o Tribunal a quo, dar como provado o ponto 32, uma vez que não existem nos autos, nem foi produzida prova em audiência de discussão e julgamento, que os indivíduos que pretendiam adquirir produto estupefaciente deslocavam-se para o efeito à residência do co-arguido CC, a diversas horas do dia e mesmo durante a madrugada.
SS.–O recorrente esclareceu que desconhece quem é a pessoa que lhe ligou, atendendo ao espaço temporal. Esclarecendo que poderão serem várias pessoas a procurá-lo, nomeadamente os seus filhos, que vivem no bairro, amigos ou até seus clientes do pescado. Declarando que nunca vendeu produto de estupefaciente. O que se estranha, não é o fato de pessoas procurarem o recorrente independentemente da hora. O que se estranha é um processo com sensivelmente 3 anos de investigação, não existirem vigilâncias nem relatórios de vigilância a corroborarem deste fato! Como também, não existirem apreensões aos alegados compradores, nem qualquer apreensão de produto de estupefaciente apreendido quer ao recorrente ou a qualquer cidadão lhe tenha comprado. Se não existem vigilâncias, nem consta dos autos relatórios de vigilâncias, não pode o Tribunal a quo dar como provado este fato!
TT.–Ora como o devido respeito, nenhuma prova foi feita, quem eram os indivíduos que foram à residência do co-arguido CC? Em que dias o procuraram? A que horas? E se foram, e o que compraram? Quanto pagaram? Também, não se provou se o recorrente residia/pernoitava em fevereiro de 2021, na residência do seu amigo CC? Então como pode o Douto Tribunal a quo dar por provado este facto, baseando-se tão somente numa escuta telefónica, que serviu para formar a convicção dos OPC? Desacompanhada de qualquer outro meio de prova? No nosso caso em concreto, o recorrente nem se recorda dessa conversa, e muito menos, quem era a pessoa que lhe ligou. Mais difícil se torna, esclarecer escutas telefónicas, quando se trata de indivíduos a falarem no nome do recorrente!
UU.–É inaceitável a conclusão formada pelo Tribunal a quo, sobre os factos ora impugnados, porque há elementos retirados da própria decisão que indiciam ter existido erro notório, na apreciação da prova. Art.º 410.º n.º 2 al. c) do CPP. O Tribunal ao decidir como decidiu, sem que nada nos autos exista que corrobore a sua conclusão, tendo o próprio arguido/recorrente declarado exatamente o contrário, e que poderiam ter sido os seus próprios filhos, nunca poderia ter dado como provado este fato, cometendo erro notório na apreciação da prova, art.º 410.º n.º 2 al. c), devendo o Acórdão ser anulado. A matéria de facto dado como provada, não pode, pois, nesta perspetiva, ser considerada suficiente, tendo o Tribunal interpretado erradamente e inconstitucionalmente o art.º 127.º do CPP e incorrendo nos vícios p. e p. no art.º 410.º n.º 2 al a) e c) do CPP, devendo a decisão recorrida ser alterada e substituída por outra que absolva o arguido pela prática do referido crime.
VV.–Entendemos que este fato não é suscetível de sustentar uma condenação penal com imputações genéricas, (desconhecendo-se em que período o recorrente começou a viver na residência do seu amigo CC), não se indicando o dia, o ano, nem o grau de participação, nem as circunstâncias relevantes, mas um conjunto fáctico não concretizado. As afirmações genéricas, contidas no elenco desses "factos" provados do acórdão recorrido, não são suscetíveis de contradita, pois não se sabe em que ano o ora recorrente foi viver para a casa do seu amigo CC. Por isso, a aceitação dessa afirmação como "factos" inviabiliza o direito de defesa que ao recorrente, constituindo uma grave ofensa aos direitos constitucionais previstos no art. 32º da Constituição. Considera-se que, nesta parte, o douto Acórdão comete um erro notório na apreciação da prova (art. 410º, nº. 2, al. c), ou, talvez mais corretamente, tem lugar um vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada (al. a), nº. 2, do art. 410 º do C.P.P.), dado que da factualidade vertida na decisão se colhe faltarem elementos que, podendo e devendo ser indagados, são necessários para que se possa formular um juízo seguro de condenação. Ou seja, impõe-se uma renovação de prova. O Tribunal a quo, criando a sua convicção através das remissões genéricas e dando como provado as mesmas viola o princípio do in dubio pro reo, traduzido pelo art..º 32º, da C.R.P. Restando ao Venerando Tribunal da Relação, constatar que não se provaram factos concretos contra o recorrente, relativos à data em que passou a viver na residência do co-arguido CC. Devendo o ponto aqui impugnado ser dado como não provado ou caso assim não se entenda, deve o Acórdão ser anulado e o processo remetido para novo julgamento, art.º 426.º do CPP.
WW.–Deu o Tribunal a quo também como provado, que “nessa mesma residência, no quarto temporariamente ocupado pelo arguido BB: a) no interior de um cofre embutido na parede, foi encontrada:- A quantia de 6 500,00 €; - Um anel e dois fios em metal amarelo. b) No mesmo local, junto à cama de BB, estava:- A quantia de 600,00 €, - Dois telemóveis Iphone e um telemóvel Samsung; - Um caderno com anotações referentes a valores em dívida da venda de produtos estupefacientes.” Atendendo a toda a prova produzida, não podia o Tribunal a quo, dar como provado este ponto referente ao ora recorrente, uma vez uma vez, que no dia das buscas 29/06/2022, foram apreendidos 3 anéis e não 1 anel, como consta no acórdão condenatório, logo não podia o Tribunal a quo dar como provado. Como também não podia o Tribunal a quo dar como provado, que o caderno com anotações referente a valores em dívidas, são da venda de produto de estupefaciente, sendo conhecida atividade profissional ao ora recorrente, e não sendo junta aos autos quaisquer outros meios de prova em contrário.
XX.–Atendendo a toda a prova produzida, não podia o Tribunal a quo, dar como provado este ponto 46, no que concerne ao ouro apreendido e ao caderno de apontamento, não existindo provas em contrário. Das declarações prestadas pelo recorrente ao agente de investigação, que a casa não era sua, mas sim de um amigo seu de nome CC, e que dormia naquele quarto, porque a sua casa tinha ardido, e que o caderno apreendido, onde constam nomes de indivíduos, com anotações de valores em dívida, diz respeito à sua atividade piscatória. Inquirido o agente de investigação em audiência de discussão e julgamento, o mesmo responde, ...se me perguntassem se são dívidas de droga? É óbvio que não consigo afirmar! Ou seja, o próprio agente de investigação, ao deparar-se com um caderno de apontamento, sem mais nenhum elemento de prova, declara que não podia afirmar que tais valores em dívida se reportam a dívidas de droga.
YY.–Mais, juntou aos autos, o ora recorrente, prova documental no dia 26 de setembro de 2023, comprovando que tem uma embarcação, juntando a fotocópia da ficha técnica da embarcação ..., apólice do seguro da embarcação, bem como contra-contra-ordenações emitidas pela DGRMS, em nome do recorrente, porém, o Tribunal a quo, não se pronunciou a respeito da junção de tais documentos, praticando assim, omissão de pronúncia. Como tal o Tribunal a quo, teria de dar como provado que o ora recorrente tem uma embarcação, e que da sua atividade piscatória, já foram levantados vários autos de contraordenação contra o ora recorrente, porém, o Tribunal a quo, nunca se pronunciou da junção de tais documentos.
ZZ.–Inquirido o agente de investigação MM, se tinha conhecimento se recorrente era alvo de escutas telefónicas e se estava a ser investigado no âmbito do presente processo, o mesmo respondeu que não tinha conhecimento e que desconhecia. Mais declarou que na apreensão no cofre encontrava-se 3 (três) anéis em ouro e não 1 (um) anel como o douto acórdão, que deu como provado, impugnando para os devidos efeitos legais. Mais, juntou o ora recorrente, no dia 26 de setembro de 2023, uma declaração do (...ourivesaria onde adquiriu o seu ouro. Contudo, o Tribunal a quo, entendeu que não servia como prova, porque o ora recorrente deveria ter junto aos autos, as faturas ou recibos de aquisição do seu ouro. Ora, se o recorrente tivesse tais documentos, teria juntos aos autos, por tal motivo, se dirigiu à ourivesaria onde os adquiriu, requerendo uma cópia ou segundas vias das faturas, mas não foi possível, atendendo que os artigos foram adquiridos entre os anos de 2014 e 2016, e que a ourivesaria, já não têm em arquivo, emitindo uma declaração de aquisição para os devidos efeitos. Perante tais circunstâncias, e a ordem da razoabilidade das perceções permitidas pelas regras da experiência, é inaceitável a conclusão formada pelo Tribunal a quo, sobre os factos ora impugnados relativos ao recorrente. Existe assim, elementos retirados da própria decisão que indiciam ter existido erro notório, na apreciação da prova. Art.º 410.º n.º 2 al. c) do CPP.
AAA.–Desconhece-se, porque não se apurou, não se investigou, se o dinheiro apreendido na busca ao recorrente, era proveniente da sua atividade piscatória com a sua embarcação. Como também não se apurou, se o ouro que o requerente adquiriu, da sua atividade profissional que é a pesca, bem como a aquisição dos 3 anéis e dos 2 fios, que constam no acórdão condenatório. Contudo no acórdão condenatório, apenas faz referência a um anel. Pergunta-se, onde estão os outros 2 (dois) anéis? Sendo certo que nada foi investigado a respeito da proveniência do dinheiro, do ouro, do caderno de anotações e dos telemóveis, conforme decorre do próprio Acórdão, fatos estes impugnados, bastando apenas apreensão dos bens, com o suporte nas escutas, onde indivíduos mencionam o nome do recorrente, aleado à interpretação que um agente da polícia faz das escutas telefónicas, para condenar o recorrente. Diga-se que tal meio de prova, isoladamente, não permite ao Tribunal a quo, fazer um Juízo de valor como o que foi efetuado e concluir que o ora recorrente cometeu o crime de tráfico p. e p. 21º, n° 1, do Decreto-Lei n° 15/93, de 22 de Janeiro.
BBB.–Tal meio de prova, isoladamente, não permite ao Tribunal a quo, fazer um Juízo de valor como o que foi efetuado e concluir que os bens apreendidos no quarto do ora recorrente são provenientes da venda de produto de estupefaciente. O Tribunal a quo, ao decidir como decidiu, sem que nada nos autos exista que corrobore, com a sua conclusão, tendo o próprio arguido dito exatamente o contrário, que os seus bens foram adquiridos através da sua atividade laboral, a pesca, e não existindo meios de prova que corroborem o contrário, nunca poderia ter dado como provado este fato, cometendo erro notório na apreciação da prova, art.º 410.º n.º 2 al. c), devendo o Acórdão ser anulado. A matéria de facto dado como provada, não pode, pois, nesta perspetiva, ser considerada suficiente, tendo o Tribunal interpretado erradamente e inconstitucionalmente o art.º 127.º do CPP e incorrendo nos vícios p. e p. no art.º 410.º n.º 2 al a) e c) do C.P.P..
CCC.–Considera-se que, nesta parte, o douto Acórdão comete um erro notório na apreciação da prova (art. 410º, nº. 2, al. c), ou, talvez mais corretamente, tem lugar um vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada (al. a), nº. 2, do art. 410º do C.P.P.), dado que da factualidade vertida na decisão se colhe faltarem elementos que, podendo e devendo ser indagados, são necessários para que se possa formular um juízo seguro de condenação. Ou seja, impõe-se uma renovação de prova. De igual modo, entendemos que foi violado o princípio do in dubio pro reo, traduzido pelo art..º 32º, da C.R.P. Devendo este ponto ser impugnado, e dado como não provado, sendo o Acórdão anulado e o processo remetido para novo julgamento, art.º 426.º do C.P.P..
DDD.–Deu o Tribunal a quo também como provado que “No mesmo dia, o indivíduo referido em 1 foi informado de que decorriam buscas domiciliárias e logo recomendou que tirassem tudo o que o arguido BB deixara na residência da arguida EE.” Refira-se que o recorrente ao longo do processo, não foi alvo de investigação, nem nunca o seu telemóvel foi intercetado e escutado. O que existe no processo é um indivíduo a falar no nome do ora recorrente. Pergunta-se, é meio de prova suficiente para se condenar um cidadão? Os Senhores agentes de investigação, ao ouvirem as escutas, que diligências realizaram para corroborarem a referida escuta telefónica? Investigaram o recorrente? NÃO! Vigiaram o recorrente? NÃO! Colocaram o telemóvel do recorrente sob escuta? NÃO! Então basta por si só alguém falar no nome do recorrente, e um agente da polícia de investigação com base nessa mesma escuta, tirar as suas conclusões, falando do recorrente na audiência de discussão e julgamento, sem ter investigado e sem ter obtido outros meios de prova, por forma a formular conscientemente um juízo razoável a respeito da escuta telefónica. Pergunta-se, é meio suficiente para o ora recorrente ser condenado numa pena de prisão efetiva?
EEE.–Impugnando-se o ponto 52 do douto acórdão condenatório, porquanto atendendo à prova produzida em sede de Audiência de Julgamento, este fato, nunca poderiam ter sido dados como provado. Nenhuma das pessoas referidas nesse facto, foram ouvidas em sede de audiência de julgamento, com exceção do ora recorrente. Os agentes do OPC, quanto a este facto nada viram, nada apreenderão! Não poderia o douto coletivo, só com base na interpretação que um polícia fez da escuta, dar como provado este facto, impugnado para os devidos efeitos. Ao dar-se como provado este facto, com base nas meras suposições do OPC, sem que nenhuma testemunha o tivesse presenciado, e sem o suporte de qualquer outro elemento probatório cometeu o Tribunal a quo, os vícios constantes do art.º 410.º n.º als. a) e c) do CPP.
FFF.–Mais uma vez desconhece-se o recorrente quem fala de si, e não se fezendo provada de tal fato. Nem tão pouco houve qualquer apreensão, a tentarem retirar o que quer que fosse, da casa da co-arguida EE. O Tribunal a quo, interpretou erradamente e inconstitucionalmente o art.º 127.º do CPP e incorrendo nos vícios p. e p. no art.º 410.º n.º 2 al a) e c) do CPP, devendo este ponto ser dado por não provado, ou a decisão recorrida ser alterada e substituída por outra que absolva o arguido pela prática do referido crime, tendo em conta que se respeita os termos do art.º 412.º do CPP, ou caso assim não se entenda, deverá o processo ser remetido para novo julgamento. Cfr. art.º 426.º do CPP.
GGG.–Também deu o Tribunal a quo como provado que “Os arguidos AA, EE, CC, BB, DD e FF agiram em conjugação de esforços e vontades entre si, em execução de plano comum, destinado à venda de produtos estupefacientes, para obtenção de vantagem económica.” Como pode o Tribunal a quo dar este fato como provado? Se o ora recorrente declarou que apenas conhecia o DD de vista do ... e nunca teve ou manteve qualquer diálogo com o mesmo. E que desconhecia a arguida FF. Impugna-se o presente ponto 55 do douto acórdão condenatório, porquanto atendendo à prova produzida em sede de Audiência de Julgamento, este fato, nunca poderiam ter sido dados como provado.
HHH.–Em declarações prestadas pelo agente de investigação JJ, declarou que participou em algumas fases do processo, foi um processo longo, de investigação ao crime de estupefacientes, teve uma duração de aproximadamente 3 anos, investigação com a qual teve algumas paragens, participou em algumas vigilâncias, neste caso a um dos suspeitos, que era o DD. Mais declarou ao Sr. Procurador, que teve várias participações no processo, nomeadamente vigilâncias. E quando interrogado pelo Sr. Procurador, como descreveria quanto à posição que cada uma das pessoas ocupa nesta estrutura, nesta organização, o Sr. agente declarou de imediato que no topo da pirâmide encontrava-se o II, que utilizava a AA para lhe guardar a droga, e que numa fase posterior, utilizava-se da FF numa situação muito similar à AA, referiu de seguida o CC, irmão da AA e por último o DD. Nunca o Sr. agente fez alusão ao ora recorrente, o que se presume que nem o conhecia.
III.–Refira-se que nem tão pouco existem escutas telefónicas, relatórios de vigilância ou testemunhas que declarem que o recorrente se relaciona ou fala com estes co-arguidos. Assim nunca poderia o Tribunal a quo dar como provado, este fato, que os arguidos AA, EE, CC, BB, DD e FF agiram em conjugação de esforços e vontades entre si, em execução de plano comum, destinado à venda de produtos estupefacientes, para obtenção de vantagem económica, impugnando-se para os devidos efeitos legais.
JJJ.–Atento o teor do depoimento da testemunha JJ, agente de investigação, nada mais existe nos autos que permita concluir tais factos dados como provados no acórdão condenatório. Existe uma completa ausência de prova, sendo certo que o depoimento, única prova desse facto, são contrários aos factos dados por provados pelo Tribunal a quo, sendo certo que nada, nem mesmo as escutas, permitem o Tribunal a quo, concluir como concluiu e dar como provados, que os arguidos AA, EE, CC, BB, DD e FF, agiram em conjugação de esforços e vontades entre si, em execução de plano comum, destinado à venda de produtos estupefacientes, para obtenção de vantagem económica, o Tribunal a quo, ao decidir como decidiu, sem que nada nos autos exista, cometeu erro notório na apreciação da prova, art.º 410.º n.º 2 al. c), devendo o Acórdão ser anulado.
KKK.–Este fato, tem unicamente como suporte a interpretação que os agentes da polícia fizeram das escutas telefónicas, que ora se impugna. Tal meio de prova, não permite ao Tribunal a quo, fazer um Juízo de valor como o que foi efetuado e concluir que o ora recorrente, praticou este facto. O Tribunal a quo, ao decidir como decidiu, sem que nada nos autos exista que corrobore a sua conclusão, cometeu erro notório na apreciação da prova, e insuficiência da matéria de facto provada para a decisão da prova, art.º 410.º n.º 2 al. b) e c), devendo o Acórdão ser anulado. Existindo uma insuficiência da matéria de facto provada e um grave erro de julgamento, art.º 410.º n.º 2, als. a), b) e c) CPP. Assim deverá este ponto ser impugnado e ser dado como não provado, devendo o arguido ser absolvido da prática destes factos, ou caso assim não se entenda, deve o Acórdão ser anulado e o processo remetido para novo julgamento, art.º 426.º do CPP.
LLL.–Deu o Tribunal a quo como provado que “As quantias apreendidas na posse dos arguidos são provenientes da venda de produto estupefacientes realizadas.” Impugna-se o presente ponto 57 do douto acórdão condenatório, porquanto atendendo à prova produzida em sede de Audiência de Julgamento, este fato, nunca poderiam ter sido dado como provado. O arguido declarou em audiência de discussão e julgamento, quanto às suas condições económicas e às atividades que exerce, de ... e também de .... Declarou que da sua atividade piscatória através da sua embarcação, há vários anos, que recebe ao dia entre 50 a 70 euros da faina. Como tal, não poderia o Tribunal a quo, fazer essa conclusão e dar como provado que as quantias apreendidas na posse do recorrente são provenientes da venda de produto de estupefaciente, o que desde já se impugna. Foi junto aos autos no dia 26 de setembro de 2023, o comprovativo do seguro da sua embarcação BUBU e LEO, bem como a informação técnica do registo da embarcação, e a respetiva declaração do registo de propriedade do contrato de compra e venda, bem como algumas contra-ordenações em nome do recorrente, referente ao exercício da atividade marítima. Contudo, o Tribunal a quo, não se pronunciou a respeito da junção de tais documentos, originando um vício de omissão de pronúncia.
MMM.–Conforme o supra exposto, o ora recorrente não foi alvo de investigação, durante os aproximadamente 3 anos, aparecendo apenas o ora recorrente no dia das buscas domiciliarias a 29/06/2022, porque se encontrava a dormir no quarto cedido na casa do seu amigo, co-arguido CC. Tendo sido o recorrente constituído arguido no dia 22/10/2022, ou seja, volvidos aproximadamente 4 meses após as buscas.
Não sendo o recorrente investigado nem antes, nem após a sua constituição como arguido. Consta do relatório social, e o ora recorrente declarou em audiência de discussão e julgamento que tem uma embarcação, e que vai ao mar em duas campanhas, auferindo um rendimento diário entre 50 a 70 euros ao dia, não existindo nos autos, investigação ao recorrente, não existindo escutas telefónicas ao recorrente, não existindo vigilâncias nem relatórios de vigilância, não existindo testemunhas a declararem que compraram produto de estupefaciente ao recorrente, não existindo apreensões, nunca o Tribunal a quo, poderia dar como provado, que as quantias apreendidas na posse do arguido são provenientes da venda de produto de estupefaciente, impugnando-se este fato para os devidos efeitos.
NNN.–Ao dar-se como provado este facto, com base nas meras suposições do OPC, sem que nenhuma testemunha o tivesse presenciado, e sem o suporte de qualquer outro elemento probatório cometeu o Tribunal os vícios constantes do art.º 410.º n.º als. a) e c) do CPP, pois não se investigou e por conseguinte não se provou que as quantias apreendidas, ao ora arguido, fossem proveniente da venda de produto de estupefaciente ou a algo ilícito. Na relação entre os contactos “provados” e a “entrega”, nunca verificada, bem como a ausência de verificação da prova de detenção para venda a terceiros, não existe uma continuidade lógica, que permita fazer decorrer dos factos conhecidos (a conversa/mensagem), que permita concluir que houve qualquer entrega, quando é que esta se realizou, e se a entrega foi de produto estupefaciente. Perante tais circunstâncias, e a ordem da razoabilidade das perceções permitidas pelas regras da experiência, é inaceitável a conclusão formada pelo Tribunal a quo, sobre os factos ora impugnados relativos ao recorrente.
OOO.–Existe assim, elementos retirados da própria decisão que indiciam ter existido erro, concretamente erro notório, na apreciação da prova. Art.º 410.º n.º 2 al. c) do CPP. Sendo certo que nada foi visto, e nada foi apreendido, conforme decorre do próprio Acórdão, este facto ora impugnado, têm unicamente como suporte a interpretação que os agentes da polícia fizeram das escutas telefónicas, quanto a este ponto que ora se impugna. Tal meio de prova, isoladamente, não permite ao Tribunal fazer um Juízo de valor como o que foi efetuado e concluir que o ora recorrente cometeu o crime de tráfico p. e p. 21º, n° 1, do Decreto-Lei n° 15/93, de 22 de Janeiro.
PPP.–No que concerne às quantias apreendidas ao ora recorrente no dia das buscas 29/06/2022, à casa do co- arguido CC, onde no quarto que o ora recorrente ocupava, foi apreendido dinheiro, que segundo as declarações do ora recorrente são provenientes da sua atividade piscatória, e existindo prova documental junto aos autos da sua embarcação e do exercício da sua atividade, nomeadamente contra-ordenações emitas pela DGRMS (Direção Geral de Recursos Naturais, Segurança e Serviços Marítimos), emitidas em nome do recorrente, e não existindo investigação onde comprove, atos de venda de produto de estupefaciente, apreensões, e testemunhas a declararem que compraram produto de estupefaciente ao recorrente , não poderia o Tribunal a quo, dar como provada este fato, tendo o Tribunal interpretado erradamente e inconstitucionalmente o art.º 127.º do CPP e incorrendo nos vícios p. e p. no art.º 410.º n.º 2 al a) e c) do CPP, devendo a Decisão recorrida ser alterada e substituída por outra que absolva o arguido pela prática do referido crime, tendo em conta que se respeita os termos do art.º 412.º do CPP, ou caso assim não se entenda, deverá o processo ser remetido para novo julgamento. Cfr. art.º 426.º do CPP.
QQQ.–O Tribunal a quo também dá como provado que “Os telemóveis eram utilizados para os contactos dos arguidos entre si e com os indivíduos que pretendiam adquirir produto estupefaciente, para acordarem as vendas, transporte e guarda do produto estupefaciente e das quantias obtidas nessas transações.” O ora recorrente nunca foi alvo de escutas telefónicas, impugnando-se o ponto 59 do douto acórdão condenatório, atendendo à prova produzida em sede de Audiência de Julgamento e toda a prova junto aos autos, este fato, nunca poderiam ter sido dados como provado. Na busca domiciliária no dia 29/06/2022, realizada à casa onde o recorrente ocupava um quarto, foram apreendidos 2 aparelhos de telemóveis, um completamente danificado e outro desligado. Na verdade, não existe nos autos qualquer documento que faça prova da titularidade desses telemóveis que o douto acórdão imputou ao recorrente, não existe informações das operadoras indicando que os IMEIS apreendidos desses dois telemóveis, estariam em nome do ora recorrente e que lhe pertenciam, como tal, não poderia o Tribunal ter-se contentado com uma qualquer presunção de propriedade aparente e dar como provados, que dos 2 telemóveis eram propriedade do recorrente. Ao longo dos autos, o recorrente nunca foi alvo de escutas telefónicas, nem o seu número de telemóvel consta dos autos ou foi intercetado. Não existe nos presentes autos, conversas telefónicas ou trocas de mensagens entre o recorrente e/ou qualquer outro co-arguido, ou com outro cidadão, como tal nunca o Tribunal a quo poderia dar como provado tal fato, o que desde já se impugna para os devidos efeitos.
RRR.–O acórdão está ferido de inconstitucionalidade material, de acordo com o artigo 127.º C.P.P., se for interpretado no sentido de o julgador poder livremente dar como provados, além do mais, factos delituosos a que ninguém assistiu ou diz ter assistido ou que não tenham sido discutidos ou ventilados em audiência. Nem sequer neste caso em concreto alicerçados nas escutas telefónicas. Termos em que, com o devido respeito, deverá o acórdão recorrido ser modificado por insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, em manifesta e inequívoca violação do art.º 32.ºn.º 2, da C.R.P. e art.º 410.º, n.º 2, alínea a) do C.P.P., e consequentemente, deverá ser modificada nesta parte decisão que ora se recorre, (art.º 431.º, alínea b)º do C.P.P.).
SSS.–O recorrente nunca foi investigado, o por conseguinte o seu telemóvel nunca foi alvo de interceção por parte os agentes do OPC, e não existe nos autos, NENHUMA chamada ou mensagem do recorrente a enviar para qualquer co-arguido, ou qualquer outro individuo para vender, transportar, guardar produto estupefaciente. Como tal o Tribunal a quo, a dar como provado, que o recorrente utilizava o seu telemóvel para fazer esses contactos, sem que exista, no processo, esses meios de prova, nomeadamente, saber-se a qual co-arguido o ora recorrente ligava, quando ligava, o que vendia, a quem vendia, a quantidade que vendia, porque preço vendia, o Tribunal a quo, a dar como provado este facto, com base nas meras suposições do OPC, sem que nenhuma testemunha o tivesse presenciado, sem haver apreensões, e sem o suporte de qualquer outro elemento probatório, cometeu o Tribunal a quo, os vícios constantes do art.º 410.º n.º als. a) e c) do CPP, pois não se investigou e por conseguinte não se provou que o recorrente utilizasse o seu telemóvel para contactar com co-arguidos ou com quaisquer indivíduos.
TTT.–Violando ainda o Acórdão Condenatório, o Princípio da Livre Apreciação da Prova, constante do artigo 127º do C.P.P., que se baseia nas regras da lógica e da experiência para a apreciação da prova cujo valor probatório não esteja determinado pela lei substantiva, cometendo o Tribunal a quo, um "erro notório na apreciação da prova", como vício ainda referido à apreciação da matéria de facto.. Perante tais circunstâncias, e a ordem da razoabilidade das perceções permitidas pelas regras da experiência, é inaceitável a conclusão formada pelo Tribunal a quo, sobre os factos ora impugnados ao recorrente.
UUU.–Sendo certo que nada foi visto, e nada foi apreendido, conforme decorre do próprio Acórdão, este facto ora impugnado, têm unicamente como suporte a interpretação que os agentes da polícia fizeram das escutas telefónicas, tal meio de prova, isoladamente, não permite ao Tribunal fazer um Juízo de valor como o que foi efetuado e concluir que o ora recorrente cometeu o crime de tráfico p. e p. 21º, n° 1, do Decreto-Lei n° 15/93, de 22 de Janeiro. Não poderia assim, o Tribunal a quo, dar como provado este fato, tendo o Tribunal interpretado erradamente e inconstitucionalmente o art.º 127.º do CPP e incorrendo nos vícios p. e p. no art.º 410.º n.º 2 al a) e c) do CPP, devendo a decisão recorrida ser alterada e substituída por outra que absolva o arguido pela prática do referido crime, tendo em conta que se respeita os termos do art.º 412.º do C.P.P.
VVV.–Termos em que, com o devido respeito, deverá o acórdão recorrido ser declarado nulo por insuficiência de fundamentação, em manifesta e inequívoca violação dos art.º 32.º n.º 2 e 205.º n.º 1, da C.R.P. e art.ºs 97.º, n.º 4 e 374.º, n.º 2, todos do C.P.P., e, consequentemente, deverá ser determinada a repetição do julgamento (art.ºs 379.º, n.º1, alínea a), 410.º, n.sº 2 a) e 3, e 426.º, do C.P.P.). Desta forma e face a tudo quanto ficou exposto, o Tribunal a quo, violou gravemente o Princípio in dubio pro reo, segundo o qual, tendo o Tribunal a quo, dúvidas sobre a verificação ou não de determinado facto, sempre hão-de decidir de acordo com o que se mostrar mais favorável ao arguido, o que não sucedeu no caso em apreço.
WWW.–Mais deu como provado no acórdão condenatório, o certificado do registo criminal e o relatório social do recorrente. Contudo o Tribunal a quo, certamente por lapso, não deu como provado que o ora recorrente no decurso das várias sessões de audiência de discussão e julgamento, foi pai pela terceira vez, omitindo e não fazendo constar tal fato no douto acórdão.
XXX.–Em nosso entender, a decisão do Tribunal a quo, reflete uma errada precessão da realidade, uma vez e de acordo com a insuficiência para não dizer total ausência dos meios de prova carreados para os autos referentes ao recorrente, mais a parca prova produzida em audiência de discussão e julgamento, o Tribunal a quo, deveria ter tido outra leitura dos fatos, dando-os como não provados, os pontos 2, 5, 14, 30, 32, 52, 55, 57, 5 do douto acórdão que se recorre.
YYY.–De acordo com o que consta no acórdão, o recorrente ficou com a perceção, que para o Tribunal a quo, os arguidos por viverem no mesmo bairro, sabem todos da vida uns dos outros, o que não corresponde à verdade, nem é sinónimo que todos os arguidos façam o mesmo, ou que se dediquem às mesmas atividades. O ora recorrente, por ser amigo do co-arguido CC, não é sinónimo que o ora recorrente concorde ou que pratique os mesmos fatos, ou que tenha de denunciar os comportamentos de terceiros. Até porque o ora recorrente tem plena consciência das implicações da prática de atos ilícitos, pois apesar de já os ter praticado, quando era mais novo, e de já ter pago, o que devia à sociedade, entende que não pode, nem deve ser julgado ou condenado, por fatos que não praticou, e que em nada lhe dizem respeito.
ZZZ.–Mais deu como provado o Douto Acórdão que “A esta atividade, aderiram, no segundo semestre de 2019, os arguidos DD (conhecido por “...” e “...”) e BB, aos quais competia realizar as vendas de produto estupefaciente a consumidores, recolhendo o respetivo pagamento”. Apesar do supra exposto, impugnando tais fatos, não se percebe como o Tribunal a quo, deu este fato como provado, se o ora recorrente, nunca foi alvo de investigação na fase de inquérito, nem em qualquer outra fase processual, tendo apenas o recorrente aparecido no processo no dia das buscas à residência do co-arguido CC, a 29/06/2022, desconhecendo os OPC, quem era o recorrente, e o que fazia naquela residência, constituindo-o arguido a 22/10/2022, sensivelmente 4 meses após a busca domiciliária. Contudo, o douto acórdão recorrido não se dignou explicar, porque razão concluiu da forma supra descrita, não tendo sequer remetido tal conclusão para a matéria de facto que considerou provada, optando por não fundamentar a conclusão a que chegou, verificando-se um vício, que se reflete na omissão de pronúncia.
AAAA.–Na eventualidade de o Venerando Tribunal ad quem, não partilhar da posição que se deixou exposta no fundamento do presente recurso, não poderá deixar de considerar desproporcional, desadequada e injusta a aplicação de uma pena de 5 anos de prisão efetiva, por um crime de estupefaciente, p. e p. no artigo 21.° n.° 1 do D. L. 15/93, de 22 de Janeiro, face às parcas meios de prova carreados para os autos.
BBBB.–E ainda assi, não se entende, nem se conforma, porque razão o Tribunal a quo, não aplicou uma pena suspensa na sua execução ao ora recorrente, fase à insuficiência para não dizer total ausência de meios de prova, o que nos leva a crer que o ora recorrente foi condenado, pelo fato de se encontrar a residir na casa do co-arguido CC e devido ao seu registo criminal.
Consta também no acórdão condenatório, que o Tribunal a quo, considera precárias as atividades laborais do recorrente, o que desde já se impugna. O recorrente tem trabalho, ou melhor tem mais de um trabalho, e ambos remunerados. Está inserido social, familiar e economicamente, basta ler-se o relatório social do recorrente. O que de fato não abona, é o seu registo criminal, apesar de o recorrente já nada dever à sociedade por cumprimento das penas, a verdade é que é precisamente o seu registo criminal que o persegue, e que o está a condenar, atendendo ao sítio onde o ora recorrente viveu provisoriamente e foi realizada a busca.
CCCC.–Face a tudo quanto ficou exposto, certezas não existem, e face à insuficiência ou praticamente ausência de meios de prova que não foram carreados para os autos. E existindo dúvidas, deveria o Tribunal a quo, aplicar o Princípio in dubio pro reo, uma vez existindo dúvidas sobre a verificação ou não de determinados factos, o Tribunal a quo, deveria decidir de acordo com o que se mostrar mais favorável ao arguido/recorrente ABSOLVENDO, o que não sucedeu no caso em apreço.
Assim parece-nos que a pena efetiva de 5 anos de prisão, aplicada ao recorrente BB, por um crime de tráfico de estupefaciente, p. e p. no artigo 21.° n.° 1 do D. L. 15/93 de 22 de janeiro, é injusta, desproporcional e desadequada, tendo o Tribunal a quo, decidido em desconformidade com o disposto no art.° 32.° n.° 2, da C.R.P. e art.°s 40.°, 50.° n.° 1, 71.°, 374.° n.° 2 e 379.° al. a), 410.°, n.° 2, alíneas a) b) e c) todos do C.P.P..
NORMAS JURIDICAS VIOLADAS:
- 18.° n.° 3 da Constituição da República Portuguesa;
- 26 n.° 1 da Constituição da República Portuguesa;
- 32.° da Constituição da República Portuguesa;
- 32.° n.° 2, 5 e 8 da Constituição da República Portuguesa;
- 34.° n.° 4 da Constituição da República Portuguesa;
- 127.° da Constituição da República Portuguesa;
- 40.° do Código Processo Penal;
- 50.° n.° 1 do Código Processo Penal;
- 71.° do Código Processo Penal;
- 130.° n.° 2 al) b) do Código Processo Penal;
- 187.° n.° 1 do Código Processo Penal;
- 374.° n.° 2 do Código Processo Penal;
- 379.° al) a) do Código Processo Penal;
- 410.° n.° 2 al) a) b) e c) do Código Processo Penal;
- 412.° do Código Processo Penal;
- 426.° do Código Processo Penal;
Nestes termos e sem prescindir do douto suprimento de V. Exas., deve o presente recurso, merecer provimento e, em consequência, ser o julgamento repetido ou ser o arguido/recorrente BB, absolvido.
Mas caso assim não se entenda, deverá, ser alterada a qualificação jurídica, aplicando-se ao arguido uma pena não superior a três anos, suspensa na sua execução, ou caso se mantenha os 5 anos, que seja suspensa na sua execução, sujeito a regime de prova.
2.3.–O arguido CC finalizou a motivação do recurso com as seguintes conclusões, após despacho de convite ao aperfeiçoamento (transcrição):
A.–O presente recurso prende-se com diversas questões, entre elas: quer a acusação quer da decisão condenatória estão feridas de nulidades, baseando-se na sua quase totalidade em imputações genéricas, que não são "factos" suscetíveis de sustentar uma condenação penal.
B.–As imputações genéricas, em que não se indica o lugar, nem o tempo, nem a motivação, nem o grau de participação, nem as circunstâncias relevantes, mas um conjunto fáctico não concretizado, não são suscetíveis de contradita, pois não se sabe em que locais o arguido ora recorrente, vendeu os estupefacientes, quando o fez, a quem o fez, o que foi efetivamente vendido, que substância foi vendida (haxixe, cocaína, heroína etc), não se sabendo sequer se algo foi efetivamente vendido. Por isso, a aceitação dessas afirmações como "factos" inviabiliza o direito de defesa que ao recorrente assiste e, assim, constitui uma grave ofensa aos direitos constitucionais previstos no art. 32º da Constituição.
C.–Prende-se também, o presente recurso, com a impugnação da matéria de facto dada por provada, com a qualificação jurídica dos factos, com a violação do princípio da livre apreciação da prova e com a medida da pena aplicada ao ora recorrente.
D.–O douto acórdão, baseia-se essencialmente no que concerne ao ora recorrente CC, nas escutas telefónicas. Porém, as escutas telefónicas são meio excecionais de obtenção de prova e por isso o MP que as requer deve ser adstrito a fundamentar claramente, porque motivo não pode ser feita a prova de outro modo, e o juiz que as decide deve fundamentar de igual forma, para que não valha um sistema em que meros pressupostos formais legitimam um meio tão intrusivo, que em relação a certo tipo de crimes acaba por se tornar a forma mais cómoda da investigação.
E.–Ao longo de aproximadamente 3 anos de investigação, o ora recorrente nunca foi investigado, nem nunca foi alvo de interceção de escutas telefónicas. Apesar de existir 3 ou 4 escutas telefónicas em que indivíduos falam no seu nome, o ora recorrente considera nula a prova resultante da interceção das conversações telefónicas efetuadas, e respetivas transcrições, por várias razões.
F.–Entendemos que a acórdão, viola os mais elementares princípios constitucionais, previstos no art.º 187.º n.º 1 do CPP pelo tribunal a quo, no sentido em que seja admissível uma escuta telefónica a um determinado indivíduo sem que esteja assegurada a sua necessidade comprovada nos autos, por violação dos arts.º 32.º n.º 8 e 34.º n.º 4 da Lei Fundamental.
G.–No processo em causa, estamos perante uma tremenda falha investigatória, para além do argumento legal, diz-nos o bom senso, que seriam necessários outros elementos de investigação criminal que levassem o Tribunal recorrido a crer que aquelas escutas constituíam o último reduto para uma investigação bem-sucedida. Sendo isto o que a lei prescreve, e se reconheça que a escuta deve ser um meio subsidiário de prova e, como tal, a ela se deverá recorrer quando não seja possível alcançar a verdade através de outros meios de prova, quer isto dizer que, sendo possível alcançar a verdade através de outros meios de prova, não nos parece que as referidas escutas sejam legais, só pelo simples facto de terem sido autorizadas judicialmente, não obstante ter havido, um completo atropelo dos princípios constitucionais.
H.–Em nosso entender, para que a escuta se deva considerar válida, não basta que se mostrem preenchidos os requisitos formais, nem essa validade pode ser justificada à posteriori pelas “descobertas” assim realizadas, é que a justificação e suporte da autorização judicial têm de ser prévios, têm de sustentar-se em prova e indícios já existentes e que conduzam no sentido de complementá-los, e não como nos presentes autos, em meras “deduções” e “presunções” do OPC (de um agente), que para além das escutas constantes nos autos referente a outros indivíduos, nenhuma outra diligência realizou relativamente ao ora recorrente.
I.–Sendo a regra constitucional a de que o sigilo dos meios de comunicação é inviolável e a de que é proibida toda a ingerência das autoridades públicas e privadas nas telecomunicações (art.º 32 n.º 4 da CRP)...salvo os casos previstos na lei em matéria de processo criminal, a regra é, a da proibição de interferência nas comunicações, o que impõe uma avaliação, caso a caso, das situações legais que justifiquem a derrogação do princípio consagrado constitucionalmente, para tutela das liberdades e garantia dos cidadãos, é esta solução e entendimento que perfilhamos e que, em nosso entender se compaginam com a presunção de inocência.
J.–Daí que, os legisladores constitucional e ordinário, tenham um particular cuidado na regulamentação do seu âmbito de aplicação e das condições da sua realização para que assim se possa alcançar um equilíbrio entre, por um lado, as necessidades comunitárias de perseguir eficazmente os criminosos e, por outro, a tutela dos direitos dos visados. Por isso, o nosso legislador apenas admitiu a realização das escutas telefónicas quanto a certos crimes taxativamente enunciados no n.º 1 do art.º 187.º do C.P.P. e “se houver razões para crer que a diligência se revelará de grande interesse para a descoberta da verdade ou para a prova”, ora, o estabelecimento de um sistema de catálogo tem ínsita a necessidade de que, antes de se poder ordenar a realização de uma escuta telefónica, existam nos autos elementos que tornem verosímil a prática de um concreto crime incluído nesse elenco, não bastando a mera invocação da suspeita da sua prática por qualquer órgão de polícia criminal. Quer isto dizer que, esse juízo não pode assentar em meras deduções policiais, que com base em nenhuma diligência efetuada presumem e concluem. Por isso, não é legalmente possível ordenar a realização de uma escuta telefónica sem que primeiro tenham sido realizadas diligências de prova, de natureza diversa das interceções, que permitam asseverar o necessário grau de verosimilhança do suspeito.
K.–Ora, o procedimento adotado nestes autos, infringe, de forma clara, esta exigência legal, porque se atuou da forma descrita, também não se comprovou se a realização das interceções telefónicas era um meio de obtenção de prova necessário para o desenvolvimento da investigação e se o mesmo, podia ser substituído por outro menos lesivo para os meios individuais, tal como exige a parte final do n.º 1 do referido art.º 187.º do CPP. É o que resulta do princípio da subsidiariedade das escutas telefónicas.
L.–No que concerne à acusação deduzida contra o ora recorrente, sempre se dirá que, a mesma se mostra conclusiva, porquanto a mesma, não refere nem a quantidade ou qualidade de produto estupefaciente que supostamente terá sido transacionado, nem a quem, nem por quanto, limitando-se a concluir que o ora recorrente, terá, vendido não se sabe que tipo e/ou quantidade de produto, por montante que não se sabe, a indivíduos que não são identificáveis, socorrendo-se para o efeito, se tanto, de 3 ou 4 escutas telefónicas de indivíduos, que falam no nome do recorrente, não existindo vigilâncias nem relatórios de vigilâncias, sendo certo que nunca viram o recorrente, a vender a comprar a ceder a partilhar qualquer tipo de produto estupefaciente.
M.–Como pode o arguido/recorrente, defender-se de uma acusação onde refere que “agiram em conjunção de esforços e vontades entre si, em execução de plano comum, destinado à venda de produto de estupefaciente, para obtenção de vantagem económica”, em nosso entender esta afirmação é conclusiva, pois não apresentam os pressupostos fácticos.
N.–No presente caso, dúvidas não restam que os factos que determinaram os presentes autos são suscetíveis de integrar o crime de tráfico de estupefacientes, logo, um dos crimes do catálogo, razão pela qual nada obsta à utilização das transcrições efetuadas para fundamentar a abertura do inquérito destes autos, nem tão pouco, ao aproveitamento dessa prova. Tal tese é violadora dos mais elementares princípios constitucionais, pelo que, o ora recorrente, invoca a inconstitucionalidade da interpretação do art.º 187.º n.º 1 do C.P.P pelo tribunal a quo, no sentido em que seja admissível uma escuta telefónica a um determinado indivíduo, sem que esteja assegurada a sua necessidade comprovada nos autos, por violação dos arts.º 26.º n.º 1, 32.º n.º 8 e 34.º n.º 4 da Lei Fundamental.
O.–Há que estabelecer bem a diferença entre indício e presunção: - indício é toda circunstância conhecida e provada a partir da qual, mediante o emprego de raciocínio lógico, chega-se à conclusão da existência do facto principal. - presunção, é o ato de tomar um facto como verdadeiro, sem a necessidade de prová-lo ou sem o conhecimento de qualquer circunstância. É certo que a presunção judicial é admissível em processo penal, e traduz-se em o Tribunal partindo de um facto certo, inferir, por dedução lógica um facto desconhecido. No caso, os factos conhecidos – as conversações telefónicas só por si, não possibilitam o salto no desconhecido, ou numa linguagem mais plástica, no escuro, pretendido pela decisão do Tribunal de que ora se recorre. Não há qualquer ligação lógica entre as conversas e os factos dados por provados, existindo sim uma flagrante lacuna, pois existem as conversas e depois não existe mais nada.
P.–O agente da Polícia de investigação JJ, afirmou que não podiam andar atrás dos arguidos 24 horas por dia, e que era muito difícil andar atrás deles, que não foi possível, constatar no tempo, não tínhamos meios operacionais nem tempo suficiente para montar a vigilância. A nossa área também operacional, tínhamos alguma dificuldade em alguns momentos do processo, não conseguimos conciliar as coisas! A nível logístico, não é fácil, infelizmente! Porém, o Tribunal deveria saber, que o instinto policial não chega. A investigação e a prova têm de ser consistentes, que não é o que sucedeu no caso em concreto.
Q.–O ora recorrente é surdo-mudo, e não prestou declarações em audiência de discussão e julgamento.
R.–O Douto Acórdão condenatório, deu como provado que “Aderiram ainda ao mesmo plano a arguida AA, no final de 2019, e o seu irmão CC, no final de 2020, bem como a mãe destes, a arguida EE, em data anterior a setembro de 2021, competindo-lhes a guarda de produto estupefaciente em residências na sua disponibilidade”. Contudo, não se provou nos autos, que o ora recorrente, tenha “aderido ao mesmo plano” no final de 2019 ou até mesmo em 2020. Até porque, o que se encontra dado como provado no acórdão condenatório, referente ao recorrente, apenas se reportam as 4 situações (escutas telefónicas) todas elas referentes ao ano de 2021. Assim nunca poderia o Tribunal a quo, dar como provado o ponto 3 do douto acórdão condenatório, quanto ao fato de o ora corrente ter aderido ao plano em finais de 2020, uma vez, que os fatos dados como provados no âmbito da investigação, reportam-se ao ano de 2021, impugnando-se para os devidos efeitos.
S.–Ao longo de 3 anos de investigação, o recorrente foi “alvo de escutas telefónicas” com respetivas transcrições, porém, é de estranhar, que o ora recorrente a ser investigado, nunca os agentes OPC tivessem, apreendido, o que quer que fosse ao ora recorrente. Nem em audiência de discussão e julgamento, nunca houve uma única testemunha que tenha declarado ter comprado produto de estupefaciente ao ora recorrente, nenhuma declaração dos co-arguidos, nenhum relatório de vigilância efetuada pelos OPC, nenhuma escuta telefónica constante nos autos, permite dar como provado, conforme fez o Douto Tribunal a quo, que o ora recorrente tenha aderido a este plano no final de 2020, impugnando para os devidos efeitos legais.
T.–Ora ao dar-se como provado este facto, que o ora recorrente tenha aderido ao plano nos finais de 2020, existindo meios de prova nos autos, que reportam ao ano de 2021, o Tribunal a quo, julgou mal, quando deveria ter dados tais fatos como não provados, cometendo o Tribunal a quo, os vícios constantes do art.º 410.º n.º als. a) e c) do CPP.
U.–O Tribunal a quo, padeceu de "erro notório na apreciação da prova", como vício ainda referido à apreciação da matéria de facto, que se impõe ao conhecimento oficioso do Tribunal ad quem, não tem a ver com a divergência pessoal do recorrente em relação às conclusões firmadas pelo Tribunal perante as provas produzidas; o vício resulta sim, dos próprios termos da decisão e é aí imediatamente revelado, sem o auxílio de quaisquer elementos estranhos à decisão. Pois, pode aqui aferir-se que, pela perspetiva própria de uma razoável compreensão das regras da vida e da experiência comum das coisas, que o Tribunal não dispôs de prova testemunhal (meio de prova produzido contraditoriamente em audiência) que permitisse estabelecer uma relação de confirmação sequencial das indicações adquiridas através da utilização de um meio instrumental para a obtenção da prova.
V.–Na relação entre os contactos “provados” e a “entrega”, nunca verificada, bem como a ausência de verificação da prova de detenção para venda a terceiros, não existe uma continuidade lógica, que permita fazer decorrer dos factos conhecidos (a conversa/mensagem), que permita concluir que houve qualquer entrega, quando é que esta se realizou, e se a entrega foi de produto estupefaciente. Perante tais circunstâncias, e a ordem da razoabilidade das perceções permitidas pelas regras da experiência, é inaceitável a conclusão formada pelo Tribunal a quo, sobre o facto dado como provado. Existe assim, elementos retirados da própria decisão que indiciam ter existido erro, concretamente erro notório, na apreciação da prova. Art.º 410.º n.º 2 al. c) do CPP.
W.–Resulta também do douto acórdão, uma inexistência ou insuficiência da matéria de facto dada como provada, essa insuficiência resulta do confronto que é permitido pelos termos da decisão, entre os factos que foram considerados provados e a integração, plena, dos elementos dos crimes que a decisão considerou, quer, estes sejam elementos da descrição, quer respeitem à definição dos limites e da medida da ilicitude, ou sejam estritamente necessários à determinação da medida da culpa.
X.–Os factos dados como provados, em relação ao ora recorrente, não são suficientes para considerar integrados os elementos do crime previsto no artigo 21º, n° 1, e 24.º al. b) do Decreto-Lei n° 15/93, de 22 de Janeiro. Pois não se sabe, nem se provou, se de facto o recorrente, vendeu algum tipo de produto estupefaciente. Desconhecendo-se ainda, caso se considerasse que efetivamente o recorrente tivesse procedido à venda, quando, onde, o quê, a quem e por quanto? Sendo certo que nada foi visto, nada foi apreendido, (com exceção no dia da busca), nada consta dos autos, conforme decorre do próprio Acórdão, estes factos têm unicamente como suporte a interpretação que um agente da polícia, fez das escutas telefónicas, impugnando-se este ponto. Tal meio de prova, isoladamente, não permite ao Tribunal a quo, fazer um Juízo de valor como o que foi efetuado e concluir que o ora recorrente cometeu o crime de tráfico agravado p. e p. 21º, n° 1, e 24.º al. b) do Decreto-Lei n° 15/93, de 22 de Janeiro.
Y.–O legislador teve o propósito de não meter no mesmo saco todos os traficantes, distinguindo entre os casos graves (art. 21º), os muito graves (art. 24º), os pouco graves (art. 25º), e os de gravidade reduzida (art. 26º)” ... “Pois bem: a jurisprudência esvaziou quase completamente os art. 25º e 26º, remetendo para o art. 21º a generalidade das situações. Para tanto, faz uma interpretação contra legem do art. 25º”... “O crime do art. 25º é para o pequeno tráfico, para o pequeno retalhista de rua.” Ou seja, as quantidades e a qualidade de produtos estupefacientes que “supostamente alegadamente” foram vendidas pelo recorrente e/ou destinadas à venda, são relevantes para a integração diferencial dos vários tipos de tráfico e para a determinação do nível de ilicitude e da medida da pena. A ausência de referência direta a determinadas quantidades, não satisfaz as exigências pressupostas à integração do tipo e aos restantes elementos: a matéria de facto não pode, pois, nesta perspetiva, ser considerada suficiente, tendo o Tribunal interpretado erradamente e inconstitucionalmente o art.º 127.º do CPP e incorrendo nos vícios p. e p. no art.º 410.º n.º 2 al a) e c) do CPP, devendo a Decisão recorrida ser alterada e substituída por outra que absolva o arguido pela prática do referido crime, tendo em conta que se respeita os termos do art.º 412.º do CPP, ou caso assim não se entenda, deverá o processo ser remetido para novo julgamento. Cfr. art..º 426.º do CPP. Assim, o Tribunal a quo, com a prova carreada para os autos, nunca poderia ter dado este fato como provado, uma vez que existindo meios de prova, que indiciam fatos praticado no ano de 2021, deveria ser dado por não provado este ponto do acórdão condenatório.
Assim este ponto deverá ser impugnado e ser dados como não provado, ou caso assim não se entenda, deve o Acórdão ser anulado e o processo remetido para novo julgamento, art.º 426.º do CPP.
Z.–Mais, deu como provado o Tribunal a quo, que “Os arguidos realizavam a descrita atividade na zona do ..., na ..., local onde acorrem diariamente indivíduos toxicodependentes, com o objetivo de adquirir substâncias estupefacientes para consumo.” Como pode o Tribunal a quo, dar como provado tal fato referente ao ora recorrente, uma vez que não existem nos autos, nem foi produzida prova em audiência de discussão e julgamento referente ao ora recorrente, que o mesmo realizava a atividade de venda de produto de estupefaciente na zona do ..., na ....
AA.–Atendendo a ausência de prova na investigação, a inexistência ou insuficiência das escutas telefónicas ao ora recorrente e respetivas transcrições, inexistentes vigilâncias, inexistentes apreensões (com exceção o que o recorrente tinha no seu quarto no dia da busca), e inexistente prova testemunhal, que declarem que o ora recorrente vendeu/comprou produto estupefaciente, face à insuficiente ou inexistência de prova indiciária nos autos e produção de prova em audiência de discussão e julgamento, nunca poderia o Tribunal a quo, condená-lo numa pena de prisão efetiva de 4 anos e 6 meses.
BB.–Ao dar-se como provado esse facto, com base nas meras suposições de um agente, sem que nenhuma testemunha o tivesse presenciado, sem qualquer apreensão do ato de aquisição de produto de estupefaciente, e sem suporte de qualquer outro elemento probatório, cometeu o Tribunal a quo, de que ora se recorre os vícios constantes do art.º 410.º n.º als. a) e c) do CPP, pois nada existe sequer nas escutas, que permita aferir que ora recorrente, realizava atividade de venda de produto de estupefaciente na zona do .... Assim este ponto deverá ser impugnado e ser dados como não provado, devendo o arguido ser absolvido da prática deste facto, ou caso assim não se entenda, deve o Acórdão ser anulado e o processo remetido para novo julgamento, art.º 426.º do CPP.
CC.–Também deu Tribunal a quo, como provado que “Pelo menos desde dezembro de 2020, CC passou a colaborar com a sua irmã AA e com o arguido BB, ..., guardando produto estupefaciente em residência na sua disponibilidade.” Não ficou provados nos autos, que o ora recorrente, tenha “aderido ao mesmo plano” no final de 2020, impugnando-se para os devidos, o ponto 31 do acórdão condenatório. Quando de fato, e com base nos meios de prova junto aos autos, pela polícia de investigação, reportam-se ao ano de 2021, assim nunca poderia o Tribunal a quo, dar como provado o ponto 31 do douto acórdão condenatório. Não poderia o Tribunal a quo, dar como provado que o recorrente em final de 2020, passou a colaborar com a sua irmã AA e com o arguido BB, vendendo, guardando produto estupefaciente em residência na sua disponibilidade. Se ao longo de 3 anos de investigação, o recorrente foi alvo de escutas telefónicas e respetivas transcrições, e investigação, é de estranhar que nunca os agentes da polícia de investigação tivessem, apreendido, o que quer que fosse ao ora recorrente, ou quem quer que fosse comprar ao ora recorrente. Nem em sede de audiência de discussão e julgamento, nunca houve uma única testemunha que tenha declarado ter comprado produto de estupefaciente ao ora recorrente. Nenhum depoimento das testemunhas, ou dos agentes de investigação, nenhuma declaração dos co-arguidos, nenhum relatório de vigilância efetuada pelos OPC, nenhuma escuta telefónica constante nos autos, e nenhuma apreensão, permite dar como provado, conforme fez o Douto Tribunal a quo, de que ora se recorre, que o ora recorrente tenha aderido a este plano no final de 2020, o que desde já se impugna para os devidos efeitos legais.
DD.–Ao dar-se como provado este facto, que o recorrente tenha aderido ao plano nos finais de 2020, e existindo meios de prova nos autos, que reportam ao ano de 2021, o Tribunal a quo, julgou mal, quando deveria ter dados tais fatos como não provados, cometendo o Tribunal a quo, os vícios constantes do art.º 410.º n.º als. a) e c) do CPP, pois nada existe sequer nas escutas, que permita aferir que o ora recorrente se estivesse a referir-se a produto estupefaciente ou a algo ilícito. Porém, os factos dados como provados, em relação ao ora recorrente, não são suficientes para considerar integrados os elementos do crime previsto no artigo 21º, n° 1, e 24.º al. b) do Decreto-Lei n° 15/93, de 22 de Janeiro. Pois não se provou, que de facto o recorrente, vendeu algum tipo de produto estupefaciente. Desconhecendo-se ainda, caso se considerasse que efetivamente o recorrente tivesse procedido à venda, quando, onde, o quê, a quem e por quanto? Sendo certo que nada foi visto, e nada foi apreendido, nada consta dos autos, conforme decorre do próprio Acórdão. Estes factos têm unicamente como suporte a interpretação que um agente da polícia, fez das escutas telefónicas, impugnando-se para os devidos efeitos. A matéria de facto não pode, pois, nesta perspetiva, ser considerada suficiente, tendo o Tribunal interpretado erradamente e inconstitucionalmente o art.º 127.º do CPP e incorrendo nos vícios p. e p. no art.º 410.º n.º 2 al a) e c) do CPP, devendo a Decisão recorrida ser alterada e substituída por outra que absolva o arguido pela prática do referido crime.
EE.–Violando flagrantemente desta forma o acórdão condenatório, o Princípio da Livre Apreciação da Prova e da presunção de inocência, constante do artigo 127º do CPP e 32.º n.º 1 da CRP, sem que tivesse qualquer suporte probatório. Pois fez um Juízo conclusivo, sem suporte probatório, firmando-se apenas na sua convicção de que o ora recorrente é culpado, devendo o julgamento ser anulado e o processo remetido para novo julgamento, art.º 426.º do CPP. Assim este ponto deverá ser impugnado e ser dados como não provado, ou caso assim não se entenda, deve o Acórdão ser anulado e o processo remetido para novo julgamento, art.º 426.º do CPP.
FF.–Deu o Tribunal a quo, como provado que “Em fevereiro de 2021, os indivíduos que pretendiam adquirir produto estupefaciente a BB deslocavam-se, para esse efeito, à residência de CC, a diversas horas do dia e mesmo durante a madrugada.” Atendendo a toda a prova produzida, não podia o Tribunal a quo, dar como provado este ponto referente ao ora recorrente, uma vez que não existem nos autos, nem foi produzida prova em audiência de discussão e julgamento, que os indivíduos que pretendiam adquirir produto estupefaciente, deslocavam-se para o efeito à residência do recorrente, a diversas horas do dia e mesmo durante a madrugada. O que se estranha, sendo um processo com sensivelmente 3 anos de investigação, não existirem vigilâncias nem relatórios de vigilância a corroborarem este fato! Bem como não existirem apreensões aos alegados compradores, nem qualquer apreensão de produto de estupefaciente apreendido quer ao recorrente ou a um qualquer cidadão lhe tenha comprado. Se não existem vigilâncias, nem consta dos autos relatórios de vigilâncias, não podia o Tribunal a quo dar como provado este fato! Ora como o devido respeito, nenhuma prova foi feita! Quem eram os indivíduos que foram à residência do recorrente? Quem eram os sujeitos que alegadamente procuravam o recorrente? A que dias foram? A que horas? O que compraram? E se compraram’ O que é que compraram? E quanto pagaram? Não podendo o Douto Tribunal a quo dar por provado este facto, baseando-se tão somente numa escuta telefónica que serviu para formar a sua convicção, sem existência de qualquer outro meio de prova? Por muito forte que seja o valor indiciário das escutas telefónicas realizadas, entendemos que não é possível, sem outro contributo probatório, estabelecer apenas com base nas escutas, que o ora recorrente se dedicava à venda de produto estupefaciente e que os indivíduos se que deslocavam à sua residência a diversas horas do dia e mesmo durante a madrugada era para comprar produto estupefaciente. Então porque os agentes de investigação nunca interviram nem intercetaram nenhum dos indivíduos? Não poderá o Tribunal a quo, dar como provados que esses indivíduos procuravam o recorrente para adquirirem produto de estupefaciente! Até porque procurar alguém a qualquer hora, não é crime em parte alguma.
GG.–Não podendo o Tribunal a quo, dar como provado este facto, com base nas meras suposições do OPC, sem que nenhuma testemunha o tivesse presenciado, e sem o suporte de qualquer outro elemento probatório, sem qualquer apreensão dos “alegados” compradores, cometendo assim o Tribunal a quo, os vícios constantes do art.º 410.º n.º als. a) e c) do C.P.P., um erro notório na apreciação da prova (art. 410º, nº. 2, al. c), ou, talvez mais corretamente, tem lugar um vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada (al. a), nº. 2, do art. 410º do C.P.P.), dado que da factualidade vertida na decisão se colhe faltarem elementos que, podendo e devendo ser indagados, são necessários para que se possa formular um juízo seguro de condenação. Ou seja, impõe-se uma renovação de prova. De igual modo, com a interpretação que tais remissões genéricas para o recorrente violou-se o princípio do in dubio pro reo, traduzido pelo art..º 32º, da C.R.P. Por isso, estabelecidos que estão os factos pela primeira instância, resta ao Venerando Tribunal da Relação, constatar que não se provaram factos concretos contra o recorrente, relativos à venda de produtos estupefacientes que lhe é imputada, pois como tal não podem ser tomadas as afirmações genéricas que se declararam provadas no acórdão recorrido, pelo que, consequentemente, deverá o ponto aqui impugnado ser dado como não provado, devendo o arguido ser absolvido da prática destes factos, ou caso assim não se entenda, deve o Acórdão ser anulado e o processo remetido para novo julgamento, art.º 426.º do C.P.P..
HH.–Deu o Tribunal a quo como provado, que “Os arguidos AA, EE, CC, BB, DD e FF agiram em conjugação de esforços e vontades entre si, em execução de plano comum, destinado à venda de produtos estupefacientes, para obtenção de vantagem económica.” Não pode o Tribunal a quo dar como provado que o recorrente e os co-arguidos agiram em conjunção de esforços e vontades entre si, em execução de plano comum, destinado à venda de produtos estupefacientes, para obtenção de vantagem económica, porquanto, o ora recorrente não prestou declarações em audiência de discussão e julgamento, reservando-se ao silêncio, bem como os restantes co-arguidos, com exceção do co-arguido BB. As únicas certezas que temos é que o ora recorrente conhecia quer o co-arguido BB, uma vez que moraram juntos, e o mesmo confirmou esse fato em audiência de discussão e julgamento, e que conhecia a sua mãe EE, a sua irmã AA. Quanto aos restantes co-arguidos, DD e FF, desconhecemos se o ora recorrente os conhece. Porém, não existem nos autos meios de provas, nomeadamente escutas telefónicas, vigilâncias, relatórios de vigilâncias ou apreensões, que indiciem que o ora recorrente os conhecesse, ou que mantivesse com eles alguma relação. Impugna-se o presente ponto 55 do douto acórdão condenatório, atendendo à inexistência de prova produzida em sede de Audiência de Julgamento, este fato, nunca poderiam ter sido dado como provado.
II.–Inquirido pelo Sr. Procurador, o Sr. agente de investigação JJ, declarou que teve várias participações no processo, nomeadamente vigilâncias, e que foi um processo longo de investigação aproximadamente 3 anos, existindo algumas paragens na investigação. Quando interrogado pelo Sr. Procurador, como descreveria quanto à posição que cada uma das pessoas ocuparia nesta estrutura, nesta organização, o Sr. agente declarou de imediato que no topo da pirâmide encontrava-se o II, que utilizava a AA para lhe guardar a droga, e que numa fase posterior, utilizava-se da FF numa situação muito similar à AA, referiu de seguida o CC, irmão da AA e por último o DD. Refira-se que não existem escutas telefónicas, relatórios de vigilância ou testemunhas que declarem que o recorrente se relaciona ou fale quer com a FF, e com o DD, também co-arguidos. Assim nunca poderia o Tribunal a quo dar como provado, este fato, que o ora recorrente e os arguidos DD e FF agiram em conjugação de esforços e vontades entre si, em execução de plano comum, destinado à venda de produtos estupefacientes, para obtenção de vantagem económica, impugnando-se para os devidos efeitos legais.
JJ.–Do depoimento deste agente de investigação, concluiu que no topo da pirâmide, encontrava-se o Sr. II, de seguida a AA, onde o Tribunal a quo, condena a 4 anos e 9 meses de prisão efetiva, à FF o Tribunal a quo, condena a 4 anos e 6 meses de prisão suspensa na sua execução, ao ora recorrente CC, o Tribunal a quo, condena a 4 anos e 6 mês de prisão efetiva e ao DD, o Tribunal a quo, condena a 3 anos e 2 meses de prisão suspensa na sua execução. Pergunta-se qual foi o critério que o Tribunal a quo, aplicou para condenar o ora recorrente a 4 anos e 6 meses de prisão efetiva, e não suspendendo a sua execução, ainda que o sujeitasse a um regime de prova? Atendendo que no registo criminal do recorrente, apenas consta uma condução de um crime de condução sem habilitação legal, sendo ora recorrente primário, quanto a este tipo de crime.
KK.–Não se entende, nem se aceita a medida da pena aplicada ao ora recorrente, pois é injusta, desproporcional de desadequada, em comparação com as medidas da pena aplicadas aos restantes co-arguidos. Não existindo nos autos, outros meios de prova que, provem que o ora recorrente conhecia ou mantinha alguma ligação ou relação quer com DD quer com FF, para que o Tribunal a quo, pudesse concluir e dar esse fato como provado. Sendo certo que nada, nem mesmo as escutas, permitem o Tribunal a quo, concluir como concluiu e dar como provados, que o ora recorrente e os arguidos DD e FF, agiram em conjugação de esforços e vontades entre si, em execução de plano comum, destinado à venda de produtos estupefacientes, para obtenção de vantagem económica, o Tribunal ao decidir como decidiu, sem que nada nos autos exista, cometeu erro notório na apreciação da prova, art.º 410.º n.º 2 al. c), devendo o Acórdão ser anulado.
LL.–Deu o Tribunal a quo como provado que “As quantias apreendidas na posse dos arguidos são provenientes da venda de produto estupefacientes realizadas.” Impugna-se o presente ponto 57 do douto acórdão condenatório, porquanto atendendo à prova produzida em sede de Audiência de Julgamento, este fato, nunca poderiam ter sido dados como provados. O ora recorrente não prestou declarações em audiência de discussão e julgamento, a não ser quanto às suas condições pessoais. Porém o douto acórdão condenatório, faz referência ao relatório social e no seu ponto 145.º, 146.º e 150.º consta que “(...) acabou por abandonar a frequência do curso e com cerca de 17 anos de idade passou a dedicar-se à pesca com alguns amigos e conhecidos da área de residência”. Como é sabido, a atividade piscatória é dura, porém, é rentável se o recorrente trabalhar diariamente. O recorrente é jovem, sem filhos e sem despesas aparentes como o pagamento de uma renda e respetivos consumos de uma casa, e declarando que ganha entre € 20/25 euros ao dia, sem encargos de maior, levará o recorrente uma vidinha tranquila. Com o devido respeito que é muito, mais uma vez, não poderia o Tribunal a quo fazer essa conclusão e dar como provado que a quantia apreendida no quarto do recorrente no montante de € 220,00 (duzentos e vinte euros), são provenientes da venda de produto de estupefaciente, o que desde já se impugna.
MM.–Ora se o recorrente foi alvo de investigação, porém, não existindo relatórios de vigilância, nada foi apreendido ao ora recorrente (com exceção no seu quarto no dia da busca), nem a indivíduos que “alegadamente” com ele contactassem, bem como nenhuma testemunha declarou em audiência de discussão e julgamento, que tivesse comprado o que quer que fosse ao ora recorrente, nunca o Tribunal a quo, poderia dar como provado, que a quantia apreendida no quarto do recorrente € 220,00, era dinheiro provenientes da venda de produto de estupefaciente, impugnando-se este fato para os devidos efeitos. Constituindo um "erro notório na apreciação da prova", como vício que resulta dos próprios termos da decisão e é aí imediatamente revelado, sem o auxílio de quaisquer elementos estranhos à decisão. Na relação entre os contactos “provados” e a “entrega”, nunca verificada, bem como a ausência de verificação da prova de detenção para venda a terceiros, não existe uma continuidade lógica, que permita fazer decorrer dos factos conhecidos (a conversa/mensagem), que permita concluir que houve qualquer entrega, quando é que esta se realizou, e se a entrega foi de produto estupefaciente. Perante tais circunstâncias, e a ordem da razoabilidade das perceções permitidas pelas regras da experiência, é inaceitável a conclusão formada pelo Tribunal a quo, sobre o facto ora impugnado. Existe assim, elementos retirados da própria decisão que indiciam ter existido erro, concretamente erro notório, na apreciação da prova. Art.º 410.º n.º 2 al. c) do CPP.
NN.–Existindo também insuficiência da matéria de facto provada, e a insuficiência resulta também do confronto que é permitido pelos termos da decisão, entre os factos que foram considerados provados e a integração, plena, dos elementos dos crimes que a decisão considerou, quer, estes sejam elementos da descrição, quer respeitem à definição dos limites e da medida da ilicitude, ou sejam estritamente necessários à determinação da medida da culpa. Sendo certo que nada foi visto, e nada foi apreendido (com exceção no dia da busca), conforme decorre do próprio Acórdão, este facto ora impugnado, têm unicamente como suporte a interpretação que os agentes da polícia fizeram das escutas telefónicas, quanto a este ponto que ora se impugna.
OO.–Tal meio de prova, isoladamente, não permite ao Tribunal fazer um Juízo de valor como o que foi efetuado e concluir que o ora recorrente cometeu o crime de tráfico p. e p. 21º, n° 1, do Decreto-Lei n° 15/93, de 22 de Janeiro.
PP.–Perante tais circunstâncias, e a ordem da razoabilidade das perceções permitidas pelas regras da experiência, é inaceitável a conclusão formada pelo Tribunal a quo, sobre os factos ora impugnados relativos ao recorrente. Existe elementos retirados da própria decisão que indiciam ter existido erro, concretamente erro notório, na apreciação da prova. Art.º 410.º n.º 2 al. c) do CPP. Pois não se sabe, porque não se apurou, não se investigou, se o dinheiro apreendido no quarto do recorrente no dia da busca 29/06/2022, se não era proveniente da sua atividade piscatória. Sendo certo que nada foi investigado a respeito da proveniência do dinheiro, conforme decorre do próprio Acórdão, fato este impugnado, bastando apenas apreensão dos bens, com o suporte nas escutas, aleado à interpretação que um agente da polícia de investigação fez das escutas telefónicas. Diga-se que tal meio de prova, isoladamente, não permite ao Tribunal a quo, fazer um Juízo de valor como o que foi efetuado e concluir que o ora recorrente cometeu o crime de tráfico p. e p. 21º, n° 1, do Decreto-Lei n° 15/93, de 22de Janeiro. De igual modo, entendemos que foi violado o denominado princípio do in dubio pro reo, traduzido pelo art..º 32º, da C.R.P.
QQ.–O artigo 127º estará até ferido de inconstitucionalidade material se for interpretado no sentido de o julgador poder livremente dar como provados, além do mais, factos delituosos a que ninguém assistiu ou dizer ter assistido ou que não tenham sido discutidos ou ventilados em audiência. Nem sequer neste caso em concreto alicerçados nas escutas telefónicas. Termos em que, com o devido respeito, deverá o acórdão recorrido ser modificado por insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, em manifesta e inequívoca violação do art.º 32.º n.º 2, da C.R.P. e art.º 410.º, n.º 2, alínea a) do C.P.P., e consequentemente, deverá ser modificada nesta parte decisão que ora se recorre, (art.º 431.º, alínea b)º, do C.P.P.).
RR.– Violou ainda o Acórdão Condenatório, o Princípio da Livre Apreciação da Prova, constante do artigo 127º do C.P.P., que se baseia nas regras da lógica e da experiência para a apreciação da prova cujo valor probatório não esteja determinado pela lei substantiva, como por exemplo, na prova testemunhal (artigo 396º do Código Civil). Sendo certo que nada foi visto, nada foi apreendido, conforme decorre do próprio Acórdão, este facto ora impugnado, têm unicamente como suporte a interpretação que os agentes da polícia fizeram das escutas telefónicas, quanto a este ponto que ora se impugna. Assim deverá este ponto ser dado como não provado, devendo o arguido ser absolvido da prática destes factos, ou caso assim não se entenda, deve o Acórdão ser anulado e o processo remetido para novo julgamento, art.º 426.º do CPP. Termos em que, com o devido respeito deverá o acórdão recorrido ser declarado nulo por insuficiência de fundamentação, em manifesta e inequívoca violação dos art.º 32.º n.º 2 e 205.º n.º 1, da C.R.P. e art.ºs 97.º, n.º 4 e 374.º, n.º 2, todos do C.P.P., e, consequentemente, deverá ser determinada a repetição do julgamento (art.ºs 379.º, n.º1, alínea a), 410.º, n.sº 2 a) e 3, e 426.º, do C.P.P.).
SS.–Desta forma e face a tudo quanto ficou exposto, o Tribunal a quo, violou gravemente o Princípio in dubio pro reo, segundo o qual, tendo o Tribunal a quo, dúvidas sobre a verificação ou não de determinado facto, sempre hão-de decidir de acordo com o que se mostrar mais favorável ao arguido, o que não sucedeu no caso em apreço.
TT.–Mais deu como provado o acórdão condenatório, o certificado do registo criminal do recorrente, onde consta uma condenação por crime de condução sem habilitação legal, numa pena de multa. Bem como também deu como provado o relatório social do recorrente.
UU.–Em nosso entender, tal conclusão do Tribunal a quo, reflete uma errada precessão da realidade, uma vez e de acordo com a insuficiência para não dizer total ausência dos meios de prova carreados para os autos, conjugada com inexistência de prova produzida em audiência de discussão e julgamento, o Tribunal a quo, deveria ter tido outra leitura dos fatos, dando-os como não provados, os pontos 3, 5, 31, 55, 57, do douto acórdão que se recorre. Só assim poderá o competente Tribunal proceder a “uma exposição tanto quanto possível completa (...), dos motivos de facto e de direito, que fundamentam a decisão”, à indicação – em conexão com cada facto provado, ou, não provado - de todas as provas que se socorreu e sobretudo, ao exame critico das provas que serviram para formar a sua convicção.
VV.–Na eventualidade de o Venerando Tribunal ad quem não partilhar da posição que se deixou exposta no fundamento do presente recurso, não poderá deixar de considerar desproporcional, desadequada e injusta a aplicação de uma pena de 4 anos e 6 meses de prisão efetiva ao recorrente, sendo primário.
WW.–Não se entendendo nem se aceitando, porque razão o Tribunal a quo, não aplicou uma pena suspensa na sua execução ao ora recorrente, sujeitando-o a regime de prova.
XX.–Assim parece-nos excessiva a pena efetiva de 4 anos e 6 meses de prisão, aplicada ao arguido ora recorrente por um crime de tráfico de estupefaciente, p. e p. no artigo 21.° n.° 1 do D. L. 15/93 de 22 de janeiro considerando injusta, desproporcional e desadequada, tendo o Tribunal a quo, decidido em desconformidade com o disposto no art.° 32.° n.° 2, da C.R.P. e art.°s 40.°, 50.° n.° 1, 71.°, 374 n.° 2 e 379, al. a), 410.°, n.° 2, alíneas a) b) e c) todos do C.P.P..
NORMAS JURIDICAS VIOLADAS:
- 18.° n.° 3 da Constituição da República Portuguesa;
- 26 n.° 1 da Constituição da República Portuguesa;
- 32.° da Constituição da República Portuguesa;
- 32.° n.° 2, 5 e 8 da Constituição da República Portuguesa;
- 34.° n.° 4 da Constituição da República Portuguesa;
- 127.° da Constituição da República Portuguesa;
- 40.° do Código Processo Penal;
- 50.° n.° 1 do Código Processo Penal;
- 71.° do Código Processo Penal;
- 130.° n.° 2 al) b) do Código Processo Penal;
- 187.° n.° 1 do Código Processo Penal;
- 374.° n.° 2 do Código Processo Penal;
- 379.° al) a) do Código Processo Penal;
- 410.° n.° 2 al) a) b) e c) do Código Processo Penal;
- 412.° do Código Processo Penal;
- 426.° do Código Processo Penal;
Nestes termos e sem prescindir do douto suprimento de V. Exas., deve o presente recurso, merecer provimento e, em consequência, ser aplicado ao arguido CC:
a repetição do julgamento ou caso assim não se entenda;
ser alterada a qualificação jurídica dos fatos, condenado numa pena nunca superior a três anos de prisão, suspensa na sua execução, sujeita ao regime de prova ou caso assim não se entenda;
os 4 anos e 6 meses de prisão, suspensa a sua execução, sujeita a regime de prova.
3.–O Magistrado do Ministério Público junto da 1ª instância apresentou resposta aos recursos interpostos pelos arguidos, no sentido de que o acórdão não merece censura, concluindo, quanto a cada um deles, nos seguintes termos (transcrição):
• Arguida AA:
A.–Quanto à invocada nulidade do acórdão, por falta de fundamentação, embora o recorrente não esclareça, afigura-se salvo melhor opinião que, da leitura atenta da extensa fundamentação do acórdão recorrido, não se suscitam quaisquer dúvidas quanto ao raciocínio lógico-indutivo percorrido pelo Mm.º Tribunal a quo, raciocínio esse que cumpriu integralmente, a nosso ver, o dever de fundamentação e de exame crítico previsto no artigo 374.º, n.º 2, do CPP.
B.–E ao contrário do alegado pela recorrente, é perfeitamente claro que o produto estupefaciente vendido era haxixe, heroína e cocaína (cf. ponto 1 da matéria de facto) e que era vendido na zona do ..., na ..., diariamente aos indivíduos toxicodependentes que ali se dirigiam (cf. ponto 5).
C.–Já quanto aos preços e respectivas quantidades, naturalmente que foram variando ao longo do tempo e em função de cada transacção, comprador e ... concreto, como se pode ler na própria matéria de facto, por exemplo, no ponto 6: [“ (...) oscilando o preço do quilograma de haxixe entre os €1100,00 e os €965,00 e das “placas”, dependendo da qualidade do produto, entre €350,00 e €120,00”], o ponto 12 [Em 18 de outubro de 2019, a arguida AA comunicou ao indivíduo referido que um comprador pretendia 2K recebendo instruções para não vender mais do que 1.5, indicando o preço total de 1 650,00 €”, o ponto 24, (“recebendo a quantia de €10,00”], e ainda os pontos 25, 26, 28, 35, 36 e 39.
D.–Assim, afigura-se salvo melhor entendimento que o Mm.º Tribunal a quo cumpriu escrupulosamente as exigências previstas no artigo 374.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, não se verificando pois a nulidade prevista no artigo 379.º, n.º 1, al. a), do mesmo diploma, pelo que deverá improceder, também nesta parte, o recurso interposto.
E.–Quanto à alegada “nulidade de toda a prova produzida nos autos resultante da recolha e conservação de dados móveis e metadados fornecidos pelas operadoras de comunicações”, não vislumbramos a que “metadados” e dados de tráfego e de localização valorados no acórdão recorrido é que a recorrente se refere.
F.–Sem prejuízo, na eventualidade de a recorrente se reportar ao conteúdo de intercepções telefónicas, reitere-se que, quanto a estas, não está em causa a aplicação da Lei n.º 32/2008, de 17.08, estando tais intercepções sujeitas tão-só ao regime processual penal previsto nos artigos 187.º e segs. do Código de Processo Penal, nada tendo que ver com os dados de tráfego e “metadados” regulamentados pela Lei n.º 32/2008, de 17.07, e, por conseguinte, com o exposto e decidido no âmbito do Acórdão n.º 268/2022, do Tribunal Constitucional, invocado pela recorrente.
G.–Assim, não se vislumbra a existência de qualquer nulidade que afecte a prova produzida nos autos, nos termos expostos pela recorrente, pugnando-se pela improcedência do recurso, também nesta parte.
H.–Quanto à impugnação sobre a matéria de facto, a título prévio, não podemos deixar de evidenciar a contradição insanável da recorrente, ao por um lado confirmar que a arguida acabava por ceder aos pedidos de II, e por outro lado negar qualquer dedicação ao tráfico de estupefacientes.
I.–Em todo o caso, não se afigura que assista qualquer razão à recorrente quanto a qualquer dos pontos de facto impugnados, porquanto, em nosso entender, o acórdão recorrido efectuou uma correcta apreciação da prova constante dos autos e daquela produzida em audiência, e uma rigorosa subsunção da factualidade provada ao Direito aplicável, como resulta dos excertos acima citados.
J.–Da leitura atenta da fundamentação do acórdão recorrido (em especial da parte citada supra), não se suscitam quaisquer dúvidas quanto ao raciocínio lógico-indutivo percorrido pelo Mm.º Tribunal a quo, raciocínio esse que cumpriu integralmente o disposto nos artigos 127.º e 374.º, n.º 2, do Código de Processo Penal.
K.–O Mm.º Tribunal a quo analisou crítica e devidamente todos os elementos de prova relevantes, designadamente as declarações da arguida, explanando a sua convicção quanto à falta de credibilidade da sua versão em cada ponto de facto em discussão, com apelo a regras da experiência comum e segundo critérios objectivos e atendíveis.
L.–Mais confrontou tal versão com os demais elementos probatórios, em especial as citadas sessões de escutas telefónicas, de forma a alicerçar tal convicção, sempre com recurso a padrões lógicos e atendíveis de raciocínio dedutivo.
M.–Suscita-se-nos ainda alguma estranheza que a recorrente negue qualquer prática de crime de tráfico de estupefacientes, quando a própria arguida confirma que II lhe entregava regularmente haxixe para guardar, sendo dois quilos de cada vez.
N.–De resto, fazemos nossas as palavras do Mm.º Tribunal a quo quando evidencia a total ausência de credibilidade das declarações da arguida, quer ao não conseguir explicar o teor das conversações telefónicas quer ao negar a sua ocorrência, quer nas várias contradições em que a mesma incorreu durante as suas próprias declarações.
O.–Em suma e em face do exposto, não nos merece qualquer censura a decisão recorrida quanto à matéria de facto dada como provada, pelo que deverá improceder, também nesta parte, o recurso interposto.
P.–Não nos merece qualquer crítica a qualificação jurídica efectuada no acórdão recorrido, ao subsumir os factos ao tipo de crime previsto no artigo 21.º, n.º 1, do DL 14/93, de 22 de janeiro, ao invés de ao tipo de crime previsto no artigo 25.º, porquanto não estamos perante uma reduzida complexidade de modus operandi, nem uma actuação isolada, nem uma venda de haxixe/canábis (mas também cocaína, heroína e MDMA – manifestamente revestidas de maior danosidade individual e social), nem um tráfico em pequena escala que se possa caracterizar de rudimentar ou típico do tráfico de menor gravidade.
Q.–Por último, sublinhe-se que, em bom rigor, consideramos discutível a decisão quanto à suspensão ou não, afigurando-se defensáveis ambos os posicionamentos.
R.–Com efeito, por um lado, os agentes LL e JJ, que de todas as testemunhas se revelaram aqueles com maior conhecimento da investigação e dos factos, referiram o ascendente que II tinha sobre esta arguida, levando-a a sujeitar-se a situações profundamente degradantes para si própria. Ora, este contexto, não desresponsabilizando a arguida pelas suas próprias acções, deverá em nosso entender ser tido em conta como atenuante da culpa.
S.–Acresce que a arguida não tem antecedentes criminais e tinha, essencialmente a função de guarda do estupefaciente, e apenas durante uma primeira fase do período de actuação criminosa, o que permitiria, a nosso ver, sustentar a eventual suspensão da execução da pena de prisão.
T.–Por outro lado, importa não olvidar a postura desculpabilizante da arguida, ao justificar o seu comportamento com a pressão de terceiros, dificilmente se podendo considerar a existência de um verdadeiro arrependimento, o que agrava as preocupações de reincidência.
U.–Assim, afigura-se salvo melhor opinião perfeitamente justificada a posição do Mm.º Tribunal a quo, que não nos merece, também nesta parte, qualquer censura, não se verificando pois qualquer violação do disposto nos artigos 50.º, n.ºs 1 e 2, e 40.º, n.º 1, do Código Penal.
V.–Não nos merece, assim, o douto Acórdão recorrido, qualquer censura ou reparo.
W.–Por tudo o acima exposto, não deve ser dado provimento ao recurso, devendo pois ser mantida, na íntegra, a decisão sub judice.
• Arguido BB:
A.–As conclusões do recurso interposto não cumprem, salvo melhor entendimento, o requisito previsto no artigo 412.º, n.º 1, in fine, do Código de Processo Penal, considerando a sua extensão, a repetição frequente, desnecessária, excessiva e inútil das mesmas frases completas e dos mesmos argumentos, para além da citação de doutrina ao longo das conclusões de recurso, em clara contrariedade à exigência de sintetização.
B.–Por conseguinte, o Ministério Público pugna pelo convite ao aperfeiçoamento nos termos acima descritos e, não sendo cumprido em conformidade, pela não admissão do recurso, por falta de conclusões, ao abrigo do disposto no artigo 414.º, n.º 2, do Código de Processo Penal.
C.–Quanto à invocada nulidade da acusação pelo seu alegado carácter inconclusivo, resulta dos artigos 283.º, n.º 3, e 119.º a contrario que tal nulidade é sanável, pelo que, tendo o recorrente há muito sido notificado da acusação, qualquer eventual nulidade sempre estaria sanada, nos termos dos artigos 120.º e 121.º do Código de Processo Penal.
D.–Quanto à invocada nulidade do acórdão, pelo seu alegado carácter inconclusivo, embora o recorrente não esclareça, afigura-se salvo melhor opinião que a sua invocação se enquadra nos artigos 374.º, n.º 2, 379.º, n.º 1, al. a), e 410.º, n.º 2, al. a), todos do Código de Processo Penal.
E.–Ao contrário do que alega o recorrente, da leitura atenta da matéria de facto dada como provada, é possível encontrar toda a factualidade suficiente e apta a integrar todos os pressupostos do crime de tráfico, por que o arguido foi condenado.
F.–Designadamente, afigura-se-nos perfeitamente claro que o produto estupefaciente vendido era haxixe, heroína e cocaína (cf. ponto 1 da matéria de facto) e que era vendido na zona do ..., na ..., diariamente aos indivíduos toxicodependentes que ali se dirigiam (cf. ponto 5).
G.–Já quanto ao preço das várias transacções, mostra-se frequentemente indicado nas concretas vendas apuradas (só não o sendo quando não tenha sido apurado, sendo certo que não se revela estritamente necessário à integração do tipo de crime), embora – como é evidente – os preços fossem oscilando (como resulta de toda a factualidade dada como provada e, designadamente, do ponto 6 da matéria de facto).
H.–Assim, afigura-se-nos inexistir qualquer violação do disposto nos artigos 374.º, n.º 2, 379.º, n.º 1, al. a), e 410.º, n.º 2, al. a), todos do Código de Processo Penal, e em concreto, qualquer insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, pelo que deverá improceder, também nesta parte, o recurso interposto.
I.–Quanto à invocada nulidade do acórdão, por insuficiência de fundamentação, da leitura atenta da extensa fundamentação do acórdão recorrido, não se nos suscitam quaisquer dúvidas quanto ao raciocínio lógico-indutivo percorrido pelo Mm.º Tribunal a quo, raciocínio esse que cumpriu integralmente, a nosso ver, o dever de fundamentação e de exame crítico previsto no artigo 374.º, n.º 2, do CPP.
J.–Ao contrário do que sustenta o recorrente, resulta de forma clara da fundamentação o Mm.º Tribunal a quo por que razão deu como assente o ponto 2 da matéria de facto, a saber: “A esta atividade, aderiram, no segundo semestre de 2019, os arguidos DD (conhecido por “...” e “...”) e BB, aos quais competia realizar as vendas de produto estupefaciente a consumidores, recolhendo o respetivo pagamento”.
K.–Questão diferente é a eventual discordância quanto ao raciocínio devidamente explanado, a qual corresponderá, não a eventual insuficiência de fundamentação, mas a impugnação sobre a matéria de facto.
L.–Não se verifica pois, em nosso entender, a nulidade prevista no artigo 379.º, n.º 1, al. a), do mesmo diploma, pelo que deverá improceder, também nesta parte, o recurso interposto.
M.–Quanto à invocada nulidade do acórdão, por nulidade da prova resultante das escutas telefónicas, verifica-se que as promoções, e os despachos judiciais que autorizaram as intercepções telefónicas realizadas nos autos, sustentaram a sua conclusão quanto à necessidade, no caso vertente, da sua realização, nos termos legalmente previstos (conclusão essa com a qual concordamos, pelas razões ali expostas e para a qual remetemos).
N.–Não se compreende, pois, a invocada inconstitucionalidade numa interpretação que, manifestamente, não foi efectuada nestes autos.
O.–Mais se verifica que, à data, existiam suspeitas fundadas da prática de crime, bem como elementos que sustentaram a suspeição sobre os visados em tais intercepções telefónicas.
P.–Por outro lado, não existiam alternativas menos lesivas e igualmente adequadas, como aliás é sobejamente comum nos casos de tráfico de estupefaciente, e como aliás resulta da circunstância de o recorrente, embora afirme que tal meio de obtenção de prova não se revelava necessário e que poderia ter sido substituído por outros meios, não adiantar quais esses outros meios.
Q.–Em suma, afigura-se salvo melhor opinião que as intercepções telefónicas realizadas nos autos se mostraram devidamente fundamentadas quanto à sua necessidade, proporcionalidade e adequação, tendo cumprido escrupulosamente os requisitos formais e materiais previstos no artigo 187.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, inexistindo pois a nulidade invocada, pelo que deverá, também nesta parte, improceder o recurso interposto.
R.–Quanto à invocada nulidade do acórdão, por “insuficiência de prova para a decisão de facto proferida”, afigura-se que, com o devido respeito, o recorrente incorre num equívoco, pois a insuficiência para a decisão da matéria de facto provada nada tem a ver com a eventual insuficiência da prova para a decisão de facto proferida, essa sim parecendo-nos ser a verdadeira intenção do recorrente, e que será abordada infra.
S.–Já no que concerne a uma eventual insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, limitamo-nos a remeter para o já explanado supra, no sentido de que se afigura que a matéria de facto dada como provada permite integrar todos os pressupostos do crime de tráfico, por que o arguido foi condenado, inexistindo pois a nulidade prevista no artigo 410.º, n.º 2, al. a), do Código de Processo Penal, pelo que deverá improceder, também nesta parte, o recurso interposto.
T.–Quanto à invocada nulidade do acórdão, por erro notório na apreciação da prova, quer-nos parecer, mais uma vez, salvo o devido respeito, que o recorrente alega a existência de erro notório na apreciação da prova quando, na verdade, o que pretendia impugnar – e impugnou efectivamente a dado passo do seu recurso – era matéria de facto.
U.–Por outro lado, da leitura atenta da fundamentação do Mm.º Tribunal a quo - conforme melhor explanaremos infra, não detectamos qualquer violação grave das regras da experiência comum ou apreciação ilógica ou arbitrária da prova – muito pelo contrário.
V.–De resto, não se descortina em parte alguma do teor do recurso ou do acórdão recorrido qualquer passagem que sequer se assemelhe e se subsuma ao erro previsto no artigo 410.º, n.º 2, al. c), do Código de Processo Penal, pelo que deverá improceder, também nesta parte, o recurso interposto.
W.–Também não se afigura que assista qualquer razão ao recorrente quanto a qualquer dos pontos de facto impugnados, porquanto, em nosso entender, o acórdão recorrido efectuou uma correcta apreciação da prova constante dos autos e daquela produzida em audiência, e uma rigorosa subsunção da factualidade provada ao Direito aplicável.
X.–Da leitura atenta da fundamentação do acórdão recorrido (em especial da parte citada supra), não se suscitam quaisquer dúvidas quanto ao raciocínio lógico-indutivo percorrido pelo Mm.º Tribunal a quo, raciocínio esse que cumpriu integralmente o disposto nos artigos 127.º e 374.º, n.º 2, do Código de Processo Penal.
Y.–O Mm.º Tribunal a quo analisou crítica e devidamente todos os elementos de prova relevantes, designadamente as declarações do arguido, explanando a sua convicção quanto à falta de credibilidade da sua versão em cada ponto de facto em discussão, com apelo a regras da experiência comum e segundo critérios objectivos e atendíveis.
Z.–Mais confrontou tal versão com os demais elementos probatórios, em especial as citadas sessões de escutas telefónicas, de forma a alicerçar tal convicção, sempre com recurso a padrões lógicos e atendíveis de raciocínio dedutivo.
AA.–Assim, não nos merece qualquer censura o acórdão recorrido, quanto a toda a fundamentação e decisão sobre a matéria de facto.
BB.Ao contrário do que afirma o recorrente, o arguido foi questionado se conhecia os co-arguidos, e foi ouvido em todas as suas declarações – aquilo que aconteceu foi que as suas declarações, por não justificarem com razões minimamente atendíveis os elementos probatórios conhecidos nos autos, não revestiram a credibilidade que o mesmo pretendia.
CC.–O recorrente persiste na versão de que o arguido, “(...) quando se dirigia à casa da Dona EE, era para comprar ou red bulls, mortalhas, rebuçados ou gomas e até cigarros avulso (...)”, apesar do carácter quase ridículo de tal hipótese, quando conjugadas as diversas escutas, e bem assim depois de ouvidas as declarações do arguido em sede de julgamento nesta parte.
DD.–Como bem explanado pelo Mm.º Tribunal a quo, não conseguiu esclarecer de forma minimamente cabal por que razão tais indivíduos se deslocavam à sua residência, permanecendo a única conclusão lógica e evidente, na análise global da prova, de que tais deslocações se destinavam à aquisição de estupefaciente.
EE.–No que diz respeito ao caderno com anotações, a apreciação da prova deve ser globalmente conjugada com todos os elementos probatórios, designadamente as escutas telefónicas com intervenção do arguido e em que o arguido é mencionado, bem como as manifestamente incongruentes declarações do arguido quanto a tais elementos, além da clara similitude de tais anotações com os típicos casos de tráfico de estupefaciente. Tudo sopesado, salvo melhor opinião, a única conclusão plausível é aquela extraída pelo Mm.º Tribunal a quo.
FF.–Em suma e em face do supra exposto, não nos merece qualquer censura a decisão recorrida quanto à matéria de facto dada como provada, pelo que deverá improceder, também nesta parte, o recurso interposto.
GG.–Por último, não alcançamos se o recorrente se insurge apenas quanto à suspensão da execução da pena, ou também quanto à medida da pena.
HH.–Salvaguardando tal possibilidade, refira-se que não consideramos que a medida da pena aplicada seja é excessiva, injusta ou desproporcional, em especial face às elevadas exigências de prevenção especial que se fazem sentir, tendo em especial consideração que se trata da terceira condenação transitada em julgado pela prática de crime de tráfico de estupefacientes, tendo numa delas já sido aplicada pena de prisão efectiva, o que não impediu o arguido de voltar a praticar o mesmo crime.
II.–Por conseguinte, o Ministério Público pugna pela manutenção da pena concretamente aplicada e pela improcedência do recurso, também nesta parte.
JJ.– Concordamos inteiramente com a decisão do Mm.º Tribunal a quo de não suspender a execução da pena de prisão, tendo em consideração i) o grau elevado, e o período prolongado, de intervenção nos factos pelo arguido; ii) a total ausência de arrependimento ou de reconhecimento do desvalor da conduta; iii) a ausência de integração familiar, social ou profissional estável; e iv) que, numa das duas anteriores condenações transitadas em julgado pela prática do mesmo tipo de crime, foi aplicada ao arguido uma pena de prisão suspensa, o que não o impediu de voltar a praticar o mesmo crime.
KK.– Ora, ao nível das exigências de prevenção especial, não se compreenderia que se repetisse uma tentativa já malograda de suspensão da execução, impondo-se nos termos do artigo 70.º do Código Penal, em face da ausência de alternativa, a aplicação de pena privativa da liberdade.
LL.–Pelo exposto, entendemos s.m.o. que o Acórdão recorrido não merece qualquer censura, porquanto todo o circunstancialismo acima exposto inculca com evidência que não é possível efectuar o juízo de prognose favorável subjacente à suspensão da execução da pena de prisão, revelando-se assim a pena de prisão efectiva a única que se mostra adequada e suficiente às finalidades da punição, não se verificando pois qualquer violação do disposto nos artigos 50.º, n.ºs 1 e 2, e 40.º, n.º 1, do Código Penal.
MM.–Não nos merece, assim, o douto Acórdão recorrido, qualquer censura ou reparo.
NN.–Por tudo o acima exposto, não deve ser dado provimento ao recurso, devendo pois ser mantida, na íntegra, a decisão sub judice.
• Arguido CC:
A.–As conclusões do recurso interposto não cumprem, salvo melhor entendimento, o requisito previsto no artigo 412.º, n.º 1, in fine, do Código de Processo Penal, considerando a sua extensão, a repetição frequente, desnecessária, excessiva e inútil das mesmas frases completas e dos mesmos argumentos, para além da citação de doutrina ao longo das conclusões de recurso, em clara contrariedade à exigência de sintetização.
B.–Por conseguinte, o Ministério Público pugna pelo convite ao aperfeiçoamento nos termos acima descritos e, não sendo cumprido em conformidade, pela não admissão do recurso, por falta de conclusões, ao abrigo do disposto no artigo 414.º, n.º 2, do Código de Processo Penal.
C.–Quanto à invocada nulidade da acusação pelo seu alegado carácter inconclusivo, resulta dos artigos 283.º, n.º 3, e 119.º a contrario que tal nulidade é sanável, pelo que, tendo o recorrente há muito sido notificado da acusação, qualquer eventual nulidade sempre estaria sanada, nos termos dos artigos 120.º e 121.º do Código de Processo Penal.
D.–Quanto à invocada nulidade do acórdão, pelo seu alegado carácter inconclusivo, embora o recorrente não esclareça, afigura-se salvo melhor opinião que a sua invocação se enquadra nos artigos 374.º, n.º 2, 379.º, n.º 1, al. a), e 410.º, n.º 2, al. a), todos do Código de Processo Penal.
E.–Ao contrário do que alega o recorrente, da leitura atenta da matéria de facto dada como provada, é possível encontrar toda a factualidade suficiente e apta a integrar todos os pressupostos do crime de tráfico, por que o arguido foi condenado.
F.–Designadamente, afigura-se-nos perfeitamente claro que o produto estupefaciente vendido era haxixe, heroína e cocaína (cf. ponto 1 da matéria de facto) e que era vendido na zona do ..., na ..., diariamente aos indivíduos toxicodependentes que ali se dirigiam (cf. ponto 5).
G.–Já quanto ao preço das várias transacções, mostra-se frequentemente indicado nas concretas vendas apuradas (só não o sendo quando não tenha sido apurado, sendo certo que não se revela estritamente necessário à integração do tipo de crime), embora – como é evidente – os preços fossem oscilando (como resulta de toda a factualidade dada como provada e, designadamente, do ponto 6 da matéria de facto).
H.–Assim, afigura-se-nos inexistir qualquer violação do disposto nos artigos 374.º, n.º 2, 379.º, n.º 1, al. a), e 410.º, n.º 2, al. a), todos do Código de Processo Penal, e em concreto, qualquer insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, pelo que deverá improceder, também nesta parte, o recurso interposto.
I.–Quanto à invocada nulidade do acórdão, por insuficiência de fundamentação, da leitura atenta da extensa fundamentação do acórdão recorrido, não se nos suscitam quaisquer dúvidas quanto ao raciocínio lógico-indutivo percorrido pelo Mm.º Tribunal a quo, raciocínio esse que cumpriu integralmente, a nosso ver, o dever de fundamentação e de exame crítico previsto no artigo 374.º, n.º 2, do CPP.
J.–Questão diferente é a eventual discordância quanto ao raciocínio devidamente explanado, a qual corresponderá, não a eventual insuficiência de fundamentação, mas a impugnação sobre a matéria de facto.
K.–Não se verifica pois, em nosso entender, a nulidade prevista no artigo 379.º, n.º 1, al. a), do mesmo diploma, pelo que deverá improceder, também nesta parte, o recurso interposto.
L.–Quanto à invocada nulidade do acórdão, por nulidade da prova resultante das escutas telefónicas, verifica-se que as promoções, e os despachos judiciais que autorizaram as intercepções telefónicas realizadas nos autos, sustentaram a sua conclusão quanto à necessidade, no caso vertente, da sua realização, nos termos legalmente previstos (conclusão essa com a qual concordamos, pelas razões ali expostas e para a qual remetemos).
M.–Não se compreende, pois, a invocada inconstitucionalidade numa interpretação que, manifestamente, não foi efectuada nestes autos.
N.–Mais se verifica que, à data, existiam suspeitas fundadas da prática de crime, bem como elementos que sustentaram a suspeição sobre os visados em tais intercepções telefónicas.
O.–Por outro lado, não existiam alternativas menos lesivas e igualmente adequadas, como aliás é sobejamente comum nos casos de tráfico de estupefaciente, e como aliás resulta da circunstância de o recorrente, embora afirme que tal meio de obtenção de prova não se revelava necessário e que poderia ter sido substituído por outros meios, não adiantar quais esses outros meios.
P.–Em suma, afigura-se salvo melhor opinião que as intercepções telefónicas realizadas nos autos se mostraram devidamente fundamentadas quanto à sua necessidade, proporcionalidade e adequação, tendo cumprido escrupulosamente os requisitos formais e materiais previstos no artigo 187.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, inexistindo pois a nulidade invocada, pelo que deverá, também nesta parte, improceder o recurso interposto.
Q.–Quanto à invocada nulidade do acórdão, por alegada insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, afigura-se que, com o devido respeito, o recorrente incorre num equívoco, pois a insuficiência para a decisão da matéria de facto provada nada tem a ver com a eventual insuficiência da prova para a decisão de facto proferida, essa sim parecendo-nos ser a verdadeira intenção do recorrente, e que será abordada infra.
R.–Já no que concerne a uma eventual insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, limitamo-nos a remeter para o já explanado supra, no sentido de que se afigura que a matéria de facto dada como provada permite integrar todos os pressupostos do crime de tráfico, por que o arguido foi condenado, inexistindo pois a nulidade prevista no artigo 410.º, n.º 2, al. a), do Código de Processo Penal, pelo que deverá improceder, também nesta parte, o recurso interposto.
S.–Quanto à invocada nulidade do acórdão, por erro notório na apreciação da prova, quer-nos parecer, mais uma vez, salvo o devido respeito, que o recorrente alega a existência de erro notório na apreciação da prova quando, na verdade, o que pretendia impugnar – e impugnou efectivamente a dado passo do seu recurso – era matéria de facto.
T.–Por outro lado, da leitura atenta da fundamentação do Mm.º Tribunal a quo - conforme melhor explanaremos infra, não detectamos qualquer violação grave das regras da experiência comum ou apreciação ilógica ou arbitrária da prova – muito pelo contrário.
U.–De resto, não se descortina em parte alguma do teor do recurso ou do acórdão recorrido qualquer passagem que sequer se assemelhe e se subsuma ao erro previsto no artigo 410.º, n.º 2, al. c), do Código de Processo Penal, pelo que deverá improceder, também nesta parte, o recurso interposto.
V.–Também não se afigura que assista qualquer razão ao recorrente quanto a qualquer dos pontos de facto impugnados, porquanto, em nosso entender, o acórdão recorrido efectuou uma correcta apreciação da prova constante dos autos e daquela produzida em audiência, e uma rigorosa subsunção da factualidade provada ao Direito aplicável.
W.–Da leitura atenta da fundamentação do acórdão recorrido (em especial da parte citada supra), não se suscitam quaisquer dúvidas quanto ao raciocínio lógico-indutivo percorrido pelo Mm.º Tribunal a quo, raciocínio esse que cumpriu integralmente o disposto nos artigos 127.º e 374.º, n.º 2, do Código de Processo Penal.
X.–O Mm.º Tribunal a quo analisou crítica e devidamente todos os elementos de prova relevantes, designadamente as declarações do arguido, explanando a sua convicção quanto à falta de credibilidade da sua versão em cada ponto de facto em discussão, com apelo a regras da experiência comum e segundo critérios objectivos e atendíveis.
Y.–Mais confrontou tal versão com os demais elementos probatórios, em especial as citadas sessões de escutas telefónicas, de forma a alicerçar tal convicção, sempre com recurso a padrões lógicos e atendíveis de raciocínio dedutivo.
Z.–Ao contrário do que afirma o recorrente, a prova globalmente conjugada de todos os elementos probatórios permite concluir, com a segurança exigida no processo penal, que o arguido aderiu ao plano dos demais arguidos no final de 2020.
AA.–Já no que diz respeito ao motivo das deslocações dos indivíduos à referida residência, se é certo que o arguido CC decidiu não prestar declarações e tal não pode ser valorado em seu desfavor, também não é menos certo que o arguido BB, que consigo residia, decidiu prestá-las. E quanto a essas declarações, como bem explanado pelo Mm.º Tribunal a quo, BB não conseguiu esclarecer de forma minimamente cabal por que razão tais indivíduos se deslocavam à sua residência a qualquer hora do dia, permanecendo a única conclusão lógica e evidente, na análise global da prova, em especial das escutas acima citadas, e de acordo com as regras da experiência comum, de que tais deslocações se destinavam à aquisição de estupefaciente.
BB.–Por último, em face do acima exposto, dúvidas também não se nos suscitam de que as quantias apreendidas correspondem às obtidas pela venda do referido estupefaciente, conforme bem explanado pelo Mm.º Tribunal a quo.
CC.–Em suma e em face do supra exposto, não nos merece qualquer censura a decisão recorrida quanto à matéria de facto dada como provada, pelo que deverá improceder, também nesta parte, o recurso interposto.
DD.–Por último, não alcançamos se o recorrente se insurge apenas quanto à suspensão da execução da pena, ou também quanto à medida da pena.
EE.–Salvaguardando tal possibilidade, refira-se que não consideramos que a medida da pena aplicada seja é excessiva, injusta ou desproporcional, em especial face às elevadas exigências de prevenção especial que se fazem sentir, tendo em consideração a intensidade da ilicitude e do dolo, a ausência de arrependimento e de reconhecimento do desvalor da sua conduta, a ausência de inserção familiar, laboral ou social estável, e os antecedentes criminais, sem que exista outro fundamento atendível de atenuação da culpa, que de resto o recorrente não contesta no seu recurso.
FF.–Por conseguinte, o Ministério Público pugna pela manutenção da pena concretamente aplicada e pela improcedência do recurso, também nesta parte.
GG.–Concordamos inteiramente com a decisão do Mm.º Tribunal a quo de não suspender a execução da pena de prisão, tendo em consideração se i) o grau elevado, e o período prolongado, de intervenção nos factos pelo arguido; ii) a total ausência de arrependimento ou de reconhecimento do desvalor da conduta; iii) a ausência de integração familiar, social ou profissional estável; e iv) a existência de antecedentes criminais.
HH.–Tudo sopesado, na esteira da doutrina e jurisprudência, afigura-se salvo melhor entendimento que as exigências de prevenção geral e especial não se coadunariam com a suspensão da execução da pena de prisão.
II.–Pelo exposto, entendemos s.m.o. que o Acórdão recorrido não merece qualquer censura, porquanto todo o circunstancialismo acima exposto inculca com evidência que não é possível efectuar o juízo de prognose favorável subjacente à suspensão da execução da pena de prisão, revelando-se assim a pena de prisão efectiva a única que se mostra adequada e suficiente às finalidades da punição, não se verificando pois qualquer violação do disposto nos artigos 50.º, n.ºs 1 e 2, e 40.º, n.º 1, do Código Penal.
JJ.–Não nos merece, assim, o douto Acórdão recorrido, qualquer censura ou reparo.
KK.–Por tudo o acima exposto, não deve ser dado provimento ao recurso, devendo pois ser mantida, na íntegra, a decisão sub judice.
4.–Parecer
Nesta Relação, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer no sentido do não provimento dos recursos, acompanhando integralmente o teor das respostas aos recursos apresentadas pelo Ministério Público na 1.ª instância, mas aditando o seguinte (transcrição parcial):
Quanto aos recursos de BB e CC:
Por sua vez, pretendem os recorrentes impugnar a decisão sobre a matéria de facto quanto aos pontos dos factos provados que indicam.
No entanto, não deram cumprimento ao disposto no art. 412.º, n.ºs 3 e 4, do CPP, e não o fizeram quer na motivação quer nas conclusões.
A ser assim, s.m.o., não se mostra possível, nesta parte, o convite ao aperfeiçoamento das conclusões, pois que deste resultaria uma alteração na motivação e um decorrente alargamento do prazo de recurso.
De resto, afigura-se-nos que os recorrentes confundiram impugnação da decisão sobre a matéria de facto com a verificação dos vícios que atribuíram ao acórdão, olvidando que estes decorrem tão só do próprio texto da decisão e nunca de elementos externos a ele.
Afigura-se-nos, por isso, que não cumprindo a impugnação da decisão sobre a matéria de facto com o disposto no art. 412.º, n.ºs 3 e 4, do CPP, deve a matéria de facto ter-se como assente e os recursos, nesta parte, ser rejeitados.
Quanto ao recurso de AA:
Ora, a matéria de facto está assente e é do texto da decisão, e não de elementos externos a ele, como a recorrente pretende, que se deteta a existência daqueles vícios.
Neste contexto, como o nosso Colega na 1.ª instância evidenciou, o que nos eximimos de repetir, não se deteta a existência de qualquer um dos vícios apontados.
Quanto à integração dos factos no crime de tráfico de menor gravidade:
No enquadramento de uma determinada conduta nos tipos previstos nos arts. 21.º e 25.º do SL. 15/93, “haverá que proceder à valorização global do episódio, não se mostrando suficiente que um dos factores interdependentes indicados na lei seja idóneo em abstracto para qualificar o facto como menos grave ou leve, devendo valorar-se complexivamente todas as circunstâncias. O critério a seguir será a avaliação do conjunto da acção tendo em conta o grau de lesividade ou de perigo de lesão (o crime de tráfico é um crime de perigo abstracto) do bem jurídico protegido (saúde pública)” [acórdão do STJ de 30/04/2008, proferido no Proc. n.º 07P4723].
Sucede que a recorrente, que não é consumidora de estupefacientes [ponto 78], desenvolveu a atividade de traficar substâncias estupefacientes, como haxixe, durante cerca de 2 anos e meio, utilizando a residência para guardar o produto, sempre em quantidades de cerca de 2 kg de haxixe, e para o vender [pontos 9., 10, 11, 12, 14, 15, 29, 33] e, em 29/06/2022, detinha em seu poder dezanove embalagens de haxixe, com o peso líquido de 1 826,118 gramas, com grau de pureza de 27,3 %, permitindo a composição de 9972 doses [pontos 40, 41.], e uma embalagem de haxixe com o peso de 95,966 gramas, com o grau de pureza de 26, 2%, suficiente para 504 doses [ponto 42.].
A conduta da recorrente, em face deste circunstancialismo, em especial o período em que se desenvolveu e as quantidades detidas, apenas se pode integrar no crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo art. 21.°, n.° 1, do Decreto-Lei n.° 15/93, de 22 de janeiro, tal como o fez o Tribunal a quo.
Quanto à suspensão da execução da pena.
A recorrente não tem hábitos de trabalho, tem um modo de vida ocioso e despreocupado, depende de apoios sociais, assume uma atitude desculpabilizante, fazendo recair sobre terceiros a responsabilidade por ter atuado como atuou, não tem uma família ou apoios estruturados [a mãe e o irmão são coarguidos] e é permeável à influência de terceiros [pontos 69, 70, 71, 72, 73, 75, 76, 78, 82, 85 e 86].
Praticou os factos durante um período alargado sem nunca desistir e sem interiorizar o desvalor da ação, não revelando arrependimento sincero.
Não se nos afigura, pois, possível formular um juízo de prognose favorável que permita à recorrente beneficiar da suspensão da execução da pena, nem que a ameaça da prisão realize de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
5.–Cumprido o disposto no art. 417.º, n.º 2 do Código de Processo Penal (doravante designado CPP), nenhuma resposta foi apresentada.
6.–Colhidos os vistos, foram os autos à conferência.
Cumpre apreciar e decidir.
II–Fundamentação
1.–Objeto do recurso
De acordo com o estatuído no art. 412.º do CPP e com a jurisprudência fixada pelo Acórdão do Plenário da Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça n.º 7/95, de 19 de outubro de 1995, o âmbito do recurso é definido pelas conclusões que o recorrente extrai da respetiva motivação, que delimitam as questões que o tribunal ad quem deve apreciar, sem prejuízo das que sejam de conhecimento oficioso, mormente os vícios enunciados no art. 410.º n.º 2 CPP.
No caso concreto, conforme as conclusões das respetivas motivações, cumpre apreciar as seguintes questões:
Recurso interposto pela arguida AA:
• nulidade do acórdão, por falta de fundamentação (art. 374.º, n.º 2 do CPP);
• nulidade de toda a prova produzida nos autos resultante da recolha e conservação de dados móveis e metadados fornecidos pelas operadoras de comunicações (acórdão n.º 268/2022 do Tribunal Constitucional conjugado com os arts. 125.º, a contrario, e 126.º, n.ºs 2 e 3, ambos do CPP);
• impugnação da matéria de facto: pontos 3, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 29, 30, 31, 33 e 55 da matéria de facto dada como provada e vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada (art. 410.º, n.º 2, al a) do CPP);
• impugnação da matéria direito: qualificação jurídica (subsunção jurídica dos factos que, a manterem-se, devem ser integrados no crime de tráfico de menor gravidade) e suspensão da execução da pena de prisão.
Recurso interposto pelo arguido BB:
• nulidade da acusação e do acórdão (carácter inconclusivo dos mesmos);
• nulidade da prova resultante das escutas telefónicas, por terem tido lugar sem fundamentação da sua necessidade;
• nulidade do acórdão, por insuficiência de fundamentação;
• impugnação da matéria de facto: pontos 2, 5, 14, 30, 32, 46, 52, 55, 57, 59 e 61 da matéria de facto dada como provada e vícios de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e de erro notório na apreciação da prova (art. 410.º, n.º 2, als. a) e c), do CPP);
• impugnação matéria de direito: quantum da pena de prisão e respetiva suspensão.
Recurso interposto pelo arguido CC:
• nulidade da acusação e do acórdão (carácter inconclusivo dos mesmos);
• nulidade da prova resultante das escutas telefónicas, por terem tido lugar sem fundamentação da sua necessidade;
• nulidade do acórdão, por insuficiência de fundamentação;
• impugnação da matéria de facto: pontos 3, 5, 31, 32, 55 e 57 da matéria de facto dada como provada e vícios de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e de erro notório na apreciação da prova (art. 410.º, n.º 2, als. a) e c), do CPP);
• impugnação matéria de direito: quantum da pena de prisão e respetiva suspensão.
2.–Do acórdão recorrido
2.1.–Para o que importa, o Tribunal a quo deu como provada e não provada a seguinte factualidade (transcrição):
Factos provados:
1.–Em data situada na primeira metade do ano de 2019, um indivíduo delineou um plano para a realização de vendas de haxixe, heroína e cocaína a consumidores destas substâncias, com vista à obtenção de lucro.
2.–A esta atividade, aderiram, no segundo semestre de 2019, os arguidos DD (conhecido por “...” e “...”) e BB, aos quais competia realizar as vendas de produto estupefaciente a consumidores, recolhendo o respetivo pagamento.
3.–Aderiram ainda ao mesmo plano a arguida AA, no final de 2019, e o seu irmão CC, no final de 2020, bem como a mãe destes, a arguida EE, em data anterior a setembro de 2021, competindo-lhes a guarda de produto estupefaciente em residências na sua disponibilidade.
4.–Ao mesmo plano aderiu ainda, em data anterior a setembro de 2021, FF, competindo-lhe essencialmente a guarda de quantias monetárias provenientes das vendas de produto estupefaciente realizadas por estes arguidos.
5.–Os arguidos realizavam a descrita atividade na zona do ..., na ..., local onde acorrem diariamente indivíduos toxicodependentes, com o objetivo de adquirir substâncias estupefacientes para consumo.
6.–Assim, o indivíduo referido em 1 encarregava-se da obtenção dos produtos estupefacientes e realizava, com o auxílio dos seus colaboradores, vendas de produto estupefaciente a consumidores que o contactavam para o efeito, oscilando o preço do quilograma de haxixe entre os €1100,00 e os €965,00 e das “placas”, dependendo da qualidade do produto, entre €350,00 e €120,00.
7.–Para tal, era contactado por indivíduos que pretendiam adquirir essas substâncias, entre os quais os utilizadores dos números de telemóvel ...; ... (NN); ... (OO) ...; ...; ...; ...; ...; ...; ...; ...; ... (PP) e ..., referindo-se ao produto pretendido como “bilhetes”; e solicitando uma “placa”.
8.–Nos contactos mantidos com compradores e revendedores, aludiam também à quantidade de produto e valores com as expressões “vinte minutos”; “20 paus”; “2 Km” e à qualidade do produto com a indicação “Marca Y”; “só como deve de ser” e “continua igual”.
9.–O referido indivíduo referido contava com a colaboração da arguida AA, que guardava produto estupefaciente destinado à venda na sua residência e na residência de sua mãe, EE, podendo ascender a dois quilogramas de haxixe de cada vez.
10.–E a arguida AA avisava o referido indivíduo da presença de compradores, recebendo dele instruções para lhes entregar determinada quantidade de haxixe, o que ocorreu em 06/10/2019 e em 19/10/2019, referindo-se a essas substancias como “quadrados” e “ameijoa”, indicando-lhe ainda o preço a receber, mantendo o referido indivíduo controlo sobre as quantidades guardadas pela arguida AA.
11.–Deste modo, em 06 de outubro de 2019, a arguida AA alertou o referido indivíduo para a presença de um comprador, a quem se refere como o “cigano de ...”, recebendo instruções para lhe dizer que o preço era 1100,00€.
12.–Em 18 de outubro de 2019, a arguida AA comunicou ao indivíduo referido que um comprador pretendia 2K recebendo instruções para não vender mais do que 1.5, indicando o preço total de 1 650,00 €.
13.–Também a arguida EE, mãe dos arguidos AA e CC, participava na descrita guarda de produto estupefaciente.
14.–Assim, no dia 04 de setembro de 2021, a arguida EE contactou a arguida AA, questionando-a sobre produto estupefaciente guardado, que se destinava a um cliente e estava a ser solicitado pelo arguido BB e por outro indivíduo, para realizar a venda.
15.–Também o arguido DD era contactado por indivíduos que pretendiam adquirir haxixe e cocaína, facto que este comunicava ao indivíduo referido em 1, que por seu turno diligenciava junto dos seus colaboradores que guardavam o produto, em particular junto da arguida AA, pela entrega a este ....
16.–Noutras ocasiões, como ocorreu em 15 de maio de 2020, com o utilizador do número de telemóvel ..., o indivíduo referido em 1, estando indisponível para realizar a venda de estupefaciente, encaminhava o comprador para o arguido DD.
17.–DD era ainda contactado diretamente por compradores que pretendiam adquirir-lhe tais produtos, entre os quais os utilizadores dos números de telemóvel ...; ...; ...; ...; ...; ...; ...; ... e ....
18.–Em tais contactos, aludiam ao sobredito produto e quantidades pretendidas com as expressões “traz uma cena para mim”; um ou dois quilos de peixe”; “bolota do Alentejo”; “40 paus”; “bacalhau à posta”; “pedra mágica”; “peixinhos”; barra de chocolate”; “aquele normal”; “picas” e “ganza” e ao preço como “três cinquenta”; “isso é trezentos e tal”; “200”.
19.–Assim, em 31 de dezembro de 2019, o arguido DD vendeu uma dose de cocaína ao indivíduo utilizador do número de telemóvel ...,
20.–No dia 08 de janeiro de 2020, pelas 16h15, na Av. , na ..., numa das barracas aí existentes, o indivíduo referido em 1 entregou ao arguido DD uma embalagem contendo produto estupefaciente do bolso, para entregar ao DD, saindo pelas 16h45, com dinheiro na mão, que guardou no bolso do casaco.
21.–No dia 29 de janeiro de 2020, pelas 15h55, no mesmo local, estando consigo quatro pessoas, o arguido DD aguardava o indivíduo referido em 1 e, chegado este, a fim de lhe fornecer produto estupefaciente para venda, entraram ambos numa barraca, saindo cinco minutos depois.
22.–Logo depois, o arguido DD entregou a dois dos indivíduos que ali permaneciam pedaços (“línguas”) de haxixe, recebendo em troca quantia monetária.
23.–Em seguida, o arguido DD dirigiu-se à mesma barraca, onde entraram, sucessivamente, três indivíduos que pretendiam adquirir haxixe.
24.–Pelas 17h20, o arguido DD, no exterior da barraca vendeu a QQ, um pedaço de cannabis (resina), com o peso líquido de 2,089 gramas, com grau de pureza de 19 %, suficiente para 7 doses recebendo a quantia de €10,00.
25.–O arguido DD vendeu uma dose de haxixe à utilizadora do número de telemóvel ..., no dia 01 de fevereiro de 2020, pelo preço de 10,00€.
26.–No dia 06 de outubro de 2020, pelas 17h25, no mesmo local, DD vendeu a RR um pedaço cannabis (resina), com peso líquido de 3,208 gramas, com grau de pureza de 24%, suficiente para 15 doses individuais, pelo preço de €10,00.
27.–Persistindo na execução do sobredito plano, no dia 14 de outubro de 2020, pelas 18h45, no aglomerado de barracas da Av. …, DD vendeu a SS um pedaço de cannabis (resina), com peso líquido de 1,227 gramas, com grau de pureza de 20,5 %, suficiente para cinco doses.
28.–Em 05 de novembro de 2020, pelas 16h35, no mesmo local, o indivíduo referido em 1 vendeu a TT um pedaço de cannabis (resina),com peso líquido de 3,974 gramas, com grau de pureza de 20 %, suficiente para 15 doses, pelo preço de €40,00.
29.–No dia 24 de novembro de 2020, pelas 21h40, a arguida AA foi ao encontro do indivíduo referido em 1, entregando-lhe produto estupefaciente, que este em seguida entregou a um dos indivíduos que abastecia.
30.–À data dos factos, o arguido BB estava a viver na residência do coarguido CC.
31.–Pelo menos desde dezembro de 2020, CC passou a colaborar com a sua irmã AA e com o arguido BB, ..., guardando produto estupefaciente em residência na sua disponibilidade,
32.–Em fevereiro de 2021, os indivíduos que pretendiam adquirir produto estupefaciente a BB deslocavam-se, para esse efeito, à residência de CC, a diversas horas do dia e mesmo durante a madrugada.
33.–No dia 03.03.2021, pelas 17h45, o indivíduo referido em 1 chegou à zona de barracas sita na Av. … no veículo automóvel de matrícula ..-..-GX e aí a arguida AA, através da janela, entregou-lhe um saco de plástico, contendo produto estupefaciente.
34.–No dia 31 de maio de 2021, pelas 21h35, no aglomerado de barracas de pesca na Av. …, PP estacionou o veículo automóvel de matrícula ..-..-GC no pontão do lado direito e 20 minutos depois chegou ao mesmo local o indivíduo referido em 1, fazendo-se transportar no veículo de matrícula ..., estacionando no mesmo pontão, do lado esquerdo.
35.–O indivíduo referido em 1 entregou a PP cannabis (resina), com peso líquido de 21,204 gramas, com grau de pureza de 26 %, suficiente para 10 doses haxixe, recebendo deste, em troca, a quantia de € 65,00.
36.–No dia ........2021, pelas 17h50, nas barracas de apoio à pesca na ..., o indivíduo referido em 1 vendeu a UU cannabis (resina), com peso líquido de 2,587 gramas, com grau de pureza de 27,3 %, suficiente para 14 doses, pelo preço de €20,00.
37.–No dia 15.09.2021, pelas 10h05, no aglomerado de barracas na Av. , o indivíduo referido em 1 vendeu a VV duas embalagens contendo cannabis (resina), com peso líquido total de 12,270 gramas, com grau de pureza de 30,7 %, suficiente para 75 doses.
38.–Nesse mesmo dia e nos dias seguintes o indivíduo referido em 1 contactou FF, pretendendo entregar-lhe as quantias monetárias provenientes das vendas de produto estupefaciente, para que esta as guardasse na sua residência.
39.–No dia 17 de abril de 2022, a arguida FF tinha consigo quantia monetária entregue pelo indivíduo referido em 1 no montante de, pelo menos 8 600,00 €.
40.–No dia 29 de junho de 2022, pelas 07h00, a arguida AA encontrava-se na residência de sua mãe, EE, sita na ..., onde pernoitava, apercebendo-se da presença de agentes policiais, atirou pela janela do quarto um saco de plástico com a inscrição “Foot Locker” que tinha consigo.
41.–O referido saco continha dezanove embalagens de haxixe, com o peso líquido de 1826,118 gramas, com grau de pureza de 27,3 %, permitindo a composição de 9972 doses, apresentando a imagem gráfica de um queijo.
42.–Na mesma ocasião, no seu quarto, a arguida AA tinha ainda, em cima da cama:
a.-Uma embalagem de haxixe com o peso de 95,966 gramas, com o grau de pureza de 26,2%, suficiente para 504 doses, com a mesma imagem de um queijo;
b.-um telemóvel de marca Samsung, com IMEI ....
43.–Ainda na mesma residência, no quarto da arguida EE, no interior do roupeiro foi encontrada:
a.-uma embalagem (“sabonete”) de haxixe com peso líquido de 72,911 gramas, com grau de pureza de 24,9%, suficiente para 364 doses;
b.-A quantia de 57,00 €.
44.–Noutro quarto da referida habitação, foi encontrada uma arma de alarme, de marca Magnum Research.
45.–Na mesma data, na residência do arguido CC, também habitada pelo arguido BB, sita na ..., foi encontrado, no quarto do arguido CC:
a.-dentro de uma caixa em latão:
-Treze embalagens de cocaína, com o peso de 2,519 gramas, com grau de pureza de 28,1 %, suficiente para 137 doses;
-Um pedaço de cocaína (cloridrato), com peso líquido de 0,491 gramas, com grau de pureza de 47,7 %, correspondente a uma dose
-Cocaína (cloridrato éster met.) com peso líquido de 4,164 gramas, com grau de pureza de 57,6 %, suficiente para 49 doses
-Uma balança de precisão;
b.-num copo com a inscrição Galaxy Series:
- A quantia de €220,00.
c.-sobre a cómoda:
- Um telemóvel Alcatel.
46.–Nessa mesma residência, no quarto temporariamente ocupado pelo arguido BB:
a.- no interior de um cofre embutido na parede, foi encontrada:
- A quantia de 6 500,00 €;
- Um anel e dois fios em metal amarelo.
b.- No mesmo local, junto à cama de BB, estava:
- A quantia de 600,00 €,
- Dois telemóveis Iphone e um telemóvel Samsung;
- Um caderno com anotações referentes a valores em dívida da
venda de produtos estupefacientes.
47.–Na mesma data, numa arrecadação em construção junto da residência dos pais do indivíduo referido em 1, na ..., foi encontrada uma mochila de cor preta contendo:
a.-10 embalagens de cannabis (resina) com o peso de 1 034,252 gramas, grau de pureza de 25,4 %, suficiente para 5254 doses
b.-11 embalagens contendo cannabis (resina) com o peso líquido de 987,876 gramas, grau de pureza de 26,9 %, suficiente para 5260 doses (2 012,128 gramas no total), com logótipo idêntico a uma das embalagens encontradas na residência das arguidas AA e EE
c.- 40 munições de calibre .32 SW.
48.–No mesmo dia 29 de junho de 2022, pelas 07h00, numa barraca de apoio à pesca sita, no pontão da ..., utilizada por DD, onde este se encontrava, o arguido guardava:
- Uma embalagem contendo cannabis (resina), com peso líquido de 36,304 gramas, grau de pureza de 23%, suficiente para 166 doses;
- Uma embalagem contendo uma substância não identificada, com peso bruto aproximado de 22,88 gramas;
- Uma balança de precisão;
- Uma arma de ar comprimido, modelo Gamo P23;
- A quantia de 40,00 €, dividida em duas notas.
49.–Na mesma data, numa outra barraca de apoio à pesca utilizada por DD, este tinha uma soqueira, boxer, sem marca ou modelo definidos, de cor preta, com 12 centímetros de comprimento, sem marca, em razoável estado de conservação e uso.
*
50.–Em data situada em maio de 2022, GG e HH passaram a residir na habitação sita na ... e acordaram proceder à guarda, preparação, embalamento e venda de produtos estupefacientes nesse local.
51.–No dia 29 de junho de 2022, pelas 07h00, os arguidos GG e HH guardavam na residência comum, sita na ...:
a.-No quarto onde GG pernoitava, oculto no compartimento dos estores:
-Vinte e duas embalagens contendo heroína com peso líquido de
8,464 gramas, com grau de pureza de 3,8%, suficiente para duas
doses individuais;
-Oitenta e três embalagens contendo cocaína (éster met.), com
peso líquido total de 12,386 gramas, com grau de pureza de 39,3
%, suficiente para 162 doses individuais.
b.-na mesa de cabeceira:
- Uma embalagem de MDMA, com peso líquido de 0,435 gramas, com grau de pureza de 78,9 €, suficiente para 3 doses
- Uma balança de precisão.
c.-na bolsa que o arguido GG trazia à cintura:
- A quantia de 600,00€, dividida em 6 notas com valor facial de
€100,00 cada.
d.- no quarto onde HH pernoitava:
- No interior de uma mochila:
trinta e sete embalagens contendo heroína, com peso líquido total de 23,387 gramas, com grau de pureza de 4,7 %, suficiente para 10 doses;
Cinquenta e seis embalagens contendo cocaína (éster met.), com peso líquido total de 10,203 gramas, com grau de pureza de 44,2 %, suficiente para 150 doses
- No interior de uma mala de viagem:
Três embalagens contendo quatro pedaços de cocaína (éster met.), com o peso líquido de 14,649 gramas, com grau de pureza de 28,1 %, suficiente para 137 doses.
- Na mesa de cabeceira:
uma tesoura e vários retalhos de plástico cortados de forma circular, para embalar produto estupefaciente.
52.–No mesmo dia, o indivíduo referido em 1 foi informado de que decorriam buscas domiciliárias e logo recomendou que tirassem tudo o que o arguido BB deixara na residência da arguida EE.
53.–O referido indivíduo foi alertado também sobre a ação policial pela arguida FF, que lhe recomendou que desligasse o telefone e tirasse a bateria.
54.–Todos os arguidos conheciam a natureza e características estupefacientes dos produtos que comercializaram e que detinham, destinando-os à cedência a terceiros mediante contrapartida económica.
55.–Os arguidos AA, EE, CC, BB, DD e FF agiram em conjugação de esforços e vontades entre si, em execução de plano comum, destinado à venda de produtos estupefacientes, para obtenção de vantagem económica.
56.–Os arguidos GG e HH agiram em conjugação de esforços e vontades entre si, em execução de plano comum, destinado à venda de produtos estupefacientes, para obtenção de vantagem económica.
57.–As quantias apreendidas na posse dos arguidos são provenientes da venda de produto estupefacientes realizadas.
58.–As balanças de precisão, tesoura e recortes de sacos de plástico destinavam-se à pesagem, divisão e embalamento de produto estupefaciente, para elaboração de doses individuais destinadas à venda a consumidores.
59.–Os telemóveis eram utilizados para os contactos dos arguidos entre si e com os indivíduos que pretendiam adquirir produto estupefaciente, para acordarem as vendas, transporte e guarda do produto estupefaciente e das quantias obtidas nessas transações.
60.–O arguido DD conhecia as características e perigosidade da soqueira que guardava em espaço da sua disponibilidade, sabendo tal instrumento se destinava a ser empunhado para potenciar lesões físicas em terceiros, sendo esse o exclusivo fim a que o destinava.
61.–Agiram todos os arguidos agiram livre, voluntária e conscientemente, bem sabendo que as suas condutas são proibidas e punidas por lei.
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(Dos certificados de registo criminal):
62.–Dos certificados de registo criminal dos arguidos AA, DD, EE, FF, GG e HH não constam condenações.
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63.–Do certificado de registo criminal de BB consta condenação:
a.-Por Acórdão de 17/03/2009, transitado em julgado em 13/04/2009, processo 1621/05.0TABRR, 1º juízo criminal da extinta comarca do ..., crimes de detenção de arma proibida e tráfico de estupefacientes, praticados em 18/07/2004, na pena unitária de 5 anos e 4 meses de prisão, com concessão da liberdade condicional por decisão transitada em julgado em 21/03/2012, pena extinta em 30/06/2020.
b.-Por sentença de 20/02/2015, transitada em julgado em 23/03/2015, processo 412/12.7GDALM, juízo local criminal de Almada, juiz 1, por um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, praticado em 19/06/2012, na pena de 3 anos de prisão suspensa na sua execução, com regime de prova, extinta em 09/06/2020.
c.-Por sentença de 22/11/2022, transitada em julgado em 04/01/2023, processo 38/20.1SULSB, juízo local criminal de Lisboa, juiz 5, por um crime de detenção de arma proibida e um crime de dano com violência, praticados em 21/05/2020, nas penas de 2 anos e 6 meses de prisão suspensa na sua execução por 4 anos, com regime de prova e 200 dias de multa à taxa diária de 5,00 €, esta última extinta em 25/01/2023.
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64.–Do certificado de registo criminal de CC consta condenação, por sentença de 23/03/2022, transitada em julgado em 02/05/2022, processo 151/22.0GDALM, juízo local criminal de Almada, juiz 2, por um crime de condução sem habilitação legal, praticado em 15/05/2022, pena de 70 dias de multa à taxa diária de 5,00 €.
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(Dos relatórios sociais)
65.–AA faz parte de uma fratria de seis irmãos, em que os dois mais velhos e a mais nova, são irmãos uterinos.
66.–Até aos 6 anos viveu em ... com ambos os progenitores, e, posteriormente, na sequência dos maus tratos infligidos pelo pai e a separação dos progenitores, passou a viver com a mãe e com os irmãos na ..., no bairro piscatório do ..., local onde cresceu, um meio sócio habitacional marcado por diversos problemas de exclusão social e por dificuldades económicas.
67.–A mãe deixou de trabalhar após o nascimento da irmã mais nova da arguida, e o então companheiro daquela também passou a fazer parte do agregado.
68.–O percurso escolar da arguida foi regular até aos 12 anos, tendo deixado de estudar quando frequentava o 7º ano de escolaridade para ajudar a cuidar da mãe, após um grave acidente que aquela sofreu devido ao rebentamento de uma conduta de água.
69.–Mais tarde ainda tentou retomar os estudos através de um curso de índole profissionalizante, mas acabou por desistir, por desmotivação e acomodação a um modo de vida marcado pelo ócio, postura que o modelo de supervisão parental, demasiado permissivo, parece ter sido pouco capaz de contrariar.
70.–Neste contexto, desocupada e sem rotinas estruturadas, adotou um modo de vida centrado no imediato e em que privilegiava o convivo com pares com idêntica postura.
71.–No plano laboral, teve apenas duas experiências pontuais, durante um mês numa loja … e como ... num … durante alguns dias, do qual foi despedida.
72.–À data da sua reclusão, AA vivia com a mãe, com o padrasto e com a irmã mais nova, que tem 13 anos.
73.–Mantinha-se desocupada e sem perspetivas de um projeto de vida estruturado para o seu futuro.
74.–A família tem-se mantido a viver numa habitação de gênese ilegal, tal como a maior parte das casas que constituem o bairro onde vivem, encontrando-se em curso um processo gradual de demolição do mesmo, pelo que, a família aguarda um futuro realojamento numa habitação camarária.
75.–A mãe e o padrasto da arguida estão desempregados há vários anos, subsistido de apoios sociais, tal como acontecia com a arguida à data da sua reclusão.
76.–Os irmãos mais velhos também vivem no mesmo bairro e estão inseridos em termos laborais. A mãe (EE) e um dos irmãos (CC) também são coarguidos de AA no presente processo.
77.–No plano afetivo, AA mantinha um relacionamento afetivo com II.
78.–Não é consumidora de estupefacientes.
79.–Ainda que de forma pouco consistente, a arguida verbaliza como perspetivas futuras, o seu regresso ao agregado de origem e sua integração laboral para poder ajudar a família a sair do bairro onde vivem, o qual considera ter um ambiente prejudicial.
80.–Todavia, reconhece que mesmo naquele bairro poderá seguir um rumo de vida diferente, tendo como exemplo a sua irmã mais velha, que também ali vive com a família constituída e tem um modo de vida integrado, trabalha num … e está a frequentar um curso superior de ....
81.–Esta irmã mostra-se disponível para ajudar a arguida no seu processo de ressocialização, constituindo-se assim para a arguida como um modelo de referência socialmente ajustado e que poderá ajudá-la a equacionar um projeto de vida diferente para o seu futuro.
82.–AA reconhece a ilicitude de parte dos atos e o impacto dos mesmos para eventuais vítimas, pese embora, utilizando uma argumentação desculpabilizante, justificando os seus comportamentos com a pressão de terceiros.
83.–Em meio prisional, AA tem mantido um comportamento globalmente adaptado e relaciona-se de forma adequada com os serviços e os pares.
84.–Mantém um contacto telefónico regular com a mãe e com os irmãos, e beneficia regularmente de visitas da mãe e da irmã mais velha.
85.–AA apresenta um percurso de vida marcado por um contexto sociofamiliar desprovido de estabilidade, com uma dinâmica familiar disfuncional, que a par do precoce abandono escolar, a imaturidade e uma deficitária supervisão e controlo parental terá condicionado negativamente o seu processo de socialização.
86.–Assim, o seu percurso de vida tem sido marcado pela falta de competências sociais, formativas e profissionais, bem assim, a dependência de apoios assistenciais, que, a par de uma vivência desregrada e ligada a um meio e pessoas com condutas pró-criminais a que se mostrou permeável, veio a culminar no seu contacto com o sistema da administração da justiça penal e prisional.
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(…)
*
119.–BB, natural de …, é oriundo duma família de fracos recursos económicos, tendo ocorrido o falecimento do progenitor, quando tinha apenas quatro meses de idade.
120.– O arguido constituiu agregado com a progenitora, até cerca dos nove anos de idade, e na sequência de esta não conseguir controlar os seus comportamentos disruptivos, passou a residir com os seus tios maternos, os quais assumiram o seu desenvolvimento.
121.–Junto dos tios, o arguido residiu no ..., na ..., numa habitação autoconstruída situada num bairro clandestino, localizada em zona conotada com um elevado índice de criminalidade.
122.–Foi neste contexto, inserido em grupo de pares problemáticos, que iniciou o consumo de estupefacientes, tendo sido poli-consumidor: (canabinóides, opiáceos, ácidos e anfetaminas) desde os oito anos até aos dezoito anos de idade, quando sofreu um Acidente Cardiovascular, do qual permanece com sequelas de arritmias e taquicardias, passando desde então a consumir apenas canabinóides, de forma esporádica.
123.BB cessou os consumos de substâncias aditivas (haxixe) desde fevereiro de 2015, mantendo-se abstinente até à presente data.
124.–Em termos escolares, o arguido frequentou a ..., apresentando um percurso de desinvestimento e elevado grau de abstinência, apenas concluindo o 5º ano de escolaridade.
125.–Obteve a equivalência ao 11º ano de escolaridade, quando se encontrava no Estabelecimento Prisional de ..., em cumprimento de pena, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes.
126.–BB, foi alvo de condenação anterior em pena de prisão efetiva que cumpriu até março de 2012, data em que foi colocado em liberdade.
127.–No retorno ao meio livre o arguido regressou ao agregado dos seus tios maternos, retomando as atividades de pesca, junto do seu primo.
128.–No âmbito do processo nº 412/12.7GDALM, do Juízo Local Criminal de Almada, o arguido foi condenado, por sentença transitada em julgado em 23.03.2015, pela prática de um crime de tráfico de menor gravidade na pena de três anos de prisão, suspensa na sua execução por igual período, com regime de prova, cujo termo ocorreu em 23.03.2018, tendo cumprido as obrigações a que se encontrava vinculado.
129.–À data dos alegados factos, (2022) BB residia em casa do coarguido CC, por se encontrar a sua própria casa inabitável, após a deflagração de um incêndio em 2018 e por ter ocorrido a separação da sua companheira em 2019, não tendo outro local onde residir.
130.–A nível laboral, BB menciona dedicar-se, atualmente, à atividade da pesca, com carater regular, numa embarcação de sua propriedade, referindo ter a colaboração de pescadores, auferindo cerca de 1500 € mensais.
131.–BB manteve um relacionamento afetivo durante cerca de cinco anos, contudo, na sequência de vários conflitos, no decurso do ano de 2019, ocorreu a separação.
132.– Desta relação o arguido tem dois filhos, de nove e oito anos de idade, com os quais refere manter uma relação de proximidade, contribuindo com cerca de 300€ mensais para o sustento deles.
133.–Tem atualmente, uma relação adequada e próxima com a sua ex-companheira, mãe dos seus filhos.
134.–Em termos individuais, BB aparenta ser uma pessoa com capacidade de comunicação e capacidade para avaliar as situações sociais em que se envolve.
135.–A presente situação jurídico-penal não apresentou, até ao momento, impacto negativo na vida do arguido mantendo este o enquadramento que já detinha.
136.–BB verbaliza juízo critico quanto aos comportamentos de risco que tem adotado ao longo do seu percurso de vida, demonstrando intenção de exercer atividade laboral com caracter regular e acompanhar o processo de crescimento dos filhos.
137.–O arguido mantém acompanhamento nesta Equipa da DGRSP à ordem do processo 38/20.1SULSB do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, Juízo Local Criminal de Lisboa, Juiz 5, no qual foi condenado numa pena de dois (2) anos e seis (6) meses de prisão suspensa na execução por quatro (4) anos, com regime de prova, cujo termo está previsto para 04-01-2027.
138.–No âmbito da execução desta medida probatória o arguido tem assumido uma atitude de colaboração os serviços da DGRSP, acatando as orientações que lhe são facultadas, comparecendo regularmente às entrevistas e apresentando uma postura participativa durante as mesmas.
*
139.– CC nasceu em ..., cidade onde à data residiam os seus pais, sendo que fruto deste relacionamento afetivo/marital nasceram mais cinco filhos.
140.– Os progenitores detinham um negócio próprio, tipo roulotte de venda de hamburgers, mas face ao numeroso agregado, as condições de vida revelavam-se precárias.
141.– Esta situação foi ainda adensada por contexto de violência doméstica por parte do pai para com a mãe e filhos, conjuntura que lhes causava grande sofrimento e em muito afetou o desenvolvimento de CC, em si deficitário, decorrente do facto de ser portador de surdez.
142.–Teria cerca de 6 anos de idade quando a mãe decidiu abandonar o lar, fazer-se acompanhar dos filhos e deslocar-se para o concelho de …, instalando-se primeiramente em casa de familiares, transitando em seguida para o bairro do ..., na ..., em casa abarracada de génese clandestina, na qual residem desde então.
143.–Neste decurso, o processo de desenvolvimento do arguido prosseguiu em condições de significativa vulnerabilidade, quer pelo padrão social do bairro, associado a certa marginalidade, quer pela deficitária condição económica, subsistindo o agregado mediante apoios da Segurança Social, nomeadamente RSI e abonos de família atribuídos à fratria.
144.–Ainda assim a escolarização revelou-se facilitada, tendo o arguido usufruído de resposta educativa em função da sua incapacidade, na medida em que integrou a Unidade para surdos do ..., na ..., sendo recolhido e entregue em casa, em transporte próprio.
145.–Ao concluir o 6º ano ainda foi integrado no ..., da ..., mas acabou por abandonar a frequência do curso e com cerca de 17 anos de idade passou a dedicar-se à pesca com alguns amigos e conhecidos da área de residência.
146.–Por altura dos factos (2020/2021) o arguido apresentava análogo enquadramento sociofamiliar e laboral, na medida em que mantinha residência no bairro do ..., coabitando com a mãe, com a irmã AA, também coarguida nos autos, e continuava a dedicar-se à atividade piscatória, ao serviço de II.
147.–Deste modo, as rotinas do arguido passavam pela convivialidade no bairro, na doca pesca após chegada do barco ou ainda na própria habitação com alguns amigos que frequentavam a casa, aludindo o mesmo a que tais dinâmicas têm integrado alguns consumos de haxixe.
148.–Após instauração dos presentes autos CC decidiu sair da zona, tendo estado emigrado durante uns meses, em ... junto de um familiar, onde trabalhou na construção civil, obtendo também a carta de condução.
149.–Porém, regressou à zona de origem após terminar a obra.
150.–No presente, o arguido tem 26 anos de idade e continua a trabalhar na pesca, sem enquadramento contratual ou contributivo, referindo ser ressarcido ao dia, numa média de 20/25€.
151.–Afastou-se de determinadas pessoas e de ambientes suscetíveis de o colocar em novas situações de risco, não pretendendo voltar a estar associado a outras ocorrências ilícitas, referindo direcionar o seu tempo livre em função de uma relação de namoro que iniciou há uns meses.
152.–Em abstrato, o arguido aparenta capacidade de entendimento, mas limitações em reconhecer os bens jurídicos em causa na alegada ilicitude, revelando afastamento em relação ao enquadramento descrito e consequente externalização de responsabilidades.
153.–Neste contexto, ainda que CC demonstre alguma preocupação em relação ao desfecho da presente situação jurídico-penal, não se depreende que constitua uma questão impactante em termos pessoais.
154.–O processo de desenvolvimento do arguido caracterizou-se por um contexto/dinâmica disfuncional, quer pelas condições económicas precárias, quer pelas vivências intrafamiliares complexas, com recorrentes episódios de violência doméstica do seu pai com todos os elementos do agregado.
(…)
*
Factos não provados:
Não se provou:
1.–Anteriormente a 29 de janeiro de 2020, QQ já adquirira doses de haxixe a DD, pelos menos cinco a sete vezes.
2.–Nas conversas telefónicas, CC usava a expressão camisola do Benfica para se referir a produto estupefaciente.
3.–II entregava à arguida FF as quantias monetárias que ela lhe guardava, sempre em parcelas de 500,00 €.
2.2.–O tribunal recorrido fundamentou a sua convicção nos seguintes termos (transcrição parcial):
(…)
As testemunhas LL, WW, JJ, XX, YY, ZZ, AAA, BBB, CCC e DDD, agentes da PSP intervenientes nas várias fases da investigação, por isso com conhecimento direto, descreveram as diligências de prova em que intervieram, confirmando as ações de detenção, busca, apreensão e vigilância realizadas, destacando-se, com louvor, o depoimento do agente LL, que demonstrou vasto conhecimento sobre a globalidade da investigação, cujo início situa em junho de 2019, sendo particularmente esclarecedor e exaustivo na narrativa dos factos, confirmando mesmo, ao pormenor, datas e horas dos factos observados em ações de vigilância, marcas e matrículas de veículos e até as páginas dos autos em que tais ações se encontram documentadas, descrevendo, assertivamente, o dia-a-dia de cada um dos arguidos, na medida do conhecimentos adquirido e, muito especialmente, o tipo de participação de cada um deles na prática dos factos e a dinâmica da ação, pelo que resulta abalada a credibilidade das testemunhas que, não obstante terem sido observadas em sede de vigilância, e seguidas sem serem perdidas de vista até serem abordadas, sendo objeto de apreensão as doses de estupefacientes que tinham consigo, negaram a aquisição aos arguidos ou a II.
*
Está imputada, relativamente ao crime de tráfico de estupefacientes, aos arguidos AA, DD, BB, CC, EE e FF, com o indivíduo referido em 1 dos factos provados, coautoria.
Esse indivíduo está obviamente identificado, é II, e, embora já não sendo arguido nestes autos, poderá obviamente ser mencionado nesta sede, como já se determinou em audiência de julgamento, sendo certo que isso em nada prejudica os direitos do mesmo na qualidade de arguido em processo distinto, uma vez que a factualidade declarada assente neste acórdão não constituirá caso julgado relativamente ao mesmo.
Está igualmente imputada coautoria relativamente quanto à ação dos arguidos GG e HH.
Relativamente ao primeiro bloco de arguidos, a ação conjunta/colaboração entre todos eles, assumindo II um papel central resulta do conjunto da prova produzida, mormente das conversações telefónicas intercetadas e transcritas nos autos (anexos A a E), confirmadas pelos agentes da PSP.
Assim, frequentemente, o II dá ordens e instruções à arguida AA, referindo-se, exemplificativamente, a sessão 82, a folhas 4 do Apenso D, de 06/10/2019, dizendo ela que alguém pretende adquirir, perguntando ele se a AA lhe indicou o preço, ao que ela responde afirmativamente, dizendo então o II: se ele quer é dois quadrados (..) cada quadrado tem cinco (...) não mais do que isso (...) senão eu fico sem nada;
A sessão 989, folhas 7, Apenso D, de 19/10/2019, onde o II dá indicação à AA sobre o preço a cobrar: 120.cada.
As sessões 530 e 797, a folhas 10 e 11 do Apenso D, o, de 03 e 09 de novembro de 2020, onde o II questiona insistentemente a AA sobre se está lá o ..., que os agentes da PSP intervenientes não tiveram dúvidas em afirmar que se trata do arguido DD, sendo que na sessão 6993, folhas 24 do Apenso B, de 23/02/2021, o II envia mensagem à AA, perguntando se o anão deixou alguma coisa.
Nas sessões 1118, 1119, 1121, 1125, 1127, 1137 e 1142, folhas 32 a 40 do Apenso D, datadas de 13/04/21, o II ordena várias à AA: tras isso, e perante a recusa dela, chega a ameaça-la: (...) n te armes em esperta nem me faças perder dinheiro (...) tas arranjar maneira de te bater (...) vá não te estiques.
Na sessão 820, folhas 45 do Apenso D, de 04/09/2021, a arguida EE, mãe da AA, questiona esta sobre os rebuçados que lhe deu a guardar, referindo que está ali o ... à espera, (sendo este o arguido BB, como o próprio admitiu e os agentes da PSP afirmaram) tratando-se claramente de um aviso para que ela se despache a chegar para entregar substância estupefaciente, dizendo mesmo a arguida EE: o recado está dado.
Na sessão 3487, folhas 3 do Apenso E, o arguido CC liga ao arguido BB, passando o telefone a um individuo de nome RR, que o questiona sobre aquele mambo, respondendo o BB: podes vir quando quiseres.
Na sessão 2551, folhas 26 do Anexo A, de 01/11/2019, o arguido DD liga ao II, pedindo um quilo ou dois aí de peixe (...) una ceninha bacana.
Na sessão 53473, folhas 139 do Anexo A, em 15/09/2021, o II envia uma mensagem à FF: era pa te dar a guita ao guardares esqueci me.
Assim, analisadas estas conversações, sendo o elenco apenas exemplificativo, só pode o Tribunal concluir pela interação entre todos estes os arguidos, mesmo que nem todos contactassem entre si, mas todos colaboravam na prossecução do objetivo comum de transporte, guarda e venda de produto estupefaciente e guarda das quantias monetárias provenientes dessa atividade, tendo todos em comum a ligação ao II.
Também não se suscitam ao Tribunal dúvidas sobre a colaboração entre os arguidos GG e HH, que partilhavam a mesma casa, não habitando aí mais ninguém à data dos factos, sendo que obviamente não têm qualquer relação com os demais arguidos, tendo sido encontrados e referenciados pelos agentes da PSP no âmbito de uma investigação mais vasta relativamente a um individuo de nome EEE, associado à residência sita na ....
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A arguida AA não prestou declarações em sede de audiência, mas fê-lo no decurso do inquérito, perante magistrado do Ministério Público, transcritas no auto de folhas 3426 a 3430, de 21/10/2022, referindo que conhece o II do Bairro do ..., há três anos e meio, mantendo com ele relacionamento de natureza sexual ocasional, porém, mais à frente, afirma que tinham uma relação de namoro e que ele controlava as suas saídas, os contactos e as roupas que usava.
Confirma a apreensão de haxixe na sua residência, o que resulta do teor dos autos de apreensão e reportagem fotográfica de folhas 2810 e seguintes, que os agentes da PSP intervenientes sustentaram.
Afirmou que o haxixe pertencia ao II, e que o guardou só essa vez, porque este lhe pediu, ameaçando-a e à sua família se não o fizesse, o que não se demonstrou, pois, não obstante o ascendente claro do II, certo é que a arguida mantinha com ele uma relação amorosa e, embora se admita a existência de alguma dependência emocional por parte dela, com muitos momentos de cansaço e desgaste da relação, que resultam de diversas conversas telefónicas mantidas, não há dúvida de que a arguida aceitou guardar esse estupefaciente e não só uma vez, atento o número de vezes que o referido indivíduo a contacta, o que a transcrição das conversações telefónicas espelha claramente, solicitando que lhe leve quantidades desse produto, que foram, aliás observadas pelos agentes da PSP, o que resulta do relatório de vigilância de 24 e 30 de novembro de 2020. Aliás, na sequência das suas declarações, afirmou que o II já lhe tinha feito esse pedido anteriormente e ela recusara, o que contradiz a afirmação de que era obrigada a fazê-lo sob ameaça e a própria arguida, mais à frente, refere que o II lhe entregava regularmente haxixe para guardar, sendo dois quilos de cada vez, reforçando essa contradição.
Não explica nem confirma o teor das aludidas conversações telefónicas, chegando a negar a sua ocorrência, sem qualquer credibilidade, atento a clareza das mesmas.
Também reforça o seu grau de participação e de compromisso na pratica dos factos a iniciativa de arremessar pela janela o saco contendo haxixe que foi objeto de apreensão, ficando sobre a sua cama uma barra do mesmo produto, que pertencia certamente ao mesmo lote, apresentado o mesmo logotipo gráfico.
Refere que não conhece o arguido DD, conhecido por ... e ..., perdendo, também nesta parte, credibilidade as suas declarações, atento o teor das conversações telefónicas transcritas supra mencionadas, reveladoras de que, por diversas vezes, o II lhe pergunta por ele e, mais à frente refere que ... é a alcunha do arguido BB, versão que o conjunto da prova infirma claramente, sendo que a própria arguida, mais adiante, diz que a pessoa conhecida pela alcunha ... é o BB, o que ficou efetivamente demonstrado.
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Relativamente à arguida EE, mãe da AA, relevam igualmente os autos de apreensão e a reportagem fotográfica de folhas 2810 e seguintes, sendo certo ainda que parte do estupefaciente apreendido foi encontrado no quarto desta arguida.
A sua participação nos factos é, assim, clara e resulta, além do mais, da sessão 820, folhas 45 do Apenso D, de 04/09/2021, referida acima, onde a arguida questiona a filha AA sobre os rebuçados que lhe deu a guardar, referindo que está ali o ... à espera tratando-se claramente de um aviso para que ela se despache a chegar para entregar substância estupefaciente, dizendo mesmo a arguida EE: o recado está dado.
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Quanto ao arguido DD, a sua relação com o II e a sua participação nos factos, concretamente a realização de atos concretos de venda, resultam da conjugação das vigilâncias, concretamente de 08 de janeiro de 2020, 29 de janeiro de 2020 (venda de uma dose de haxixe a QQ), 06 de outubro de 2020 (venda de uma dose de haxixe a RR), 14 de outubro de 2020 (venda de uma quantidade de haxixe a SS), com as transcrições de conversações telefónicas, concretamente a sessão 270, a folha 1 do Anexo C, de 24/11/2019, em que alguém lhe pede para trazer uma cena, a sessão 372, folhas 2 do Anexo C, de 27/11/2019, onde um indivíduo que, significativamente, o trata por ..., lhe pergunta por novidades, combinando ir ao seu encontro; a sessão 1037, folhas 4 do anexo C, de 14/12/2019, onde alguém lhe pede bolota do Alentejo, indicando ele o preço de 50; a sessão 1038, de folhas 5 do Anexo C, onde alguém lhe pede para lhe arranjar 40 paus, porque é todo o dinheiro que tem consigo, e o arguido diz-lhe que é melhor não falarem ao telefone, pedindo-lhe para passar lá; a sessão 1173, de folhas 7 do Anexo C, de 17/12/2019, onde alguém lhe diz que a FF quer qualquer coisinha e lhe pergunta se pode passar lá, ao que ele responde afirmativamente; A sessão 1198, a folhas 8 do Anexo C, de 18/12/2019, onde um indivíduo que se identifica como FFF lhe pede bacalhau à posta daquela boa, bacana e ele responde que pode arranjar um bocado; A sessão 1752, folha 9 do anexo C, de 31/12/2019, totalmente explícita, em que o arguido contacta pessoa a quem vendeu anteriormente cocaína, pedindo-lhe que não consuma sem verificar primeiro se se trata dessa substância, pois é possível que lhe tenha entregado tranquilizante para elefantes, (certamente Quetamina); A sessão 1859, folhas 10 do Anexo C, de 04/01/2020, em que alguém que se identifica como o puto do talho lhe pergunta: tens peixinho?, respondendo ele afirmativamente; A sessão 1862, folhas 11 do Anexo C, de 04/01/2020, em que o arguido diz a alguém: já tenho um bocado daquilo que tu queres, combinando um encontro; A sessão 2329, de folhas 12 do Anexo C, de 13/01/2020, em que alguém lhe pergunta: como está isso de peixinho? e ele responde: mais ou menos, referindo o preço: três cinquenta, respondendo o outro que acha caro e vai pensar; A sessão 2400, folhas 13 do Anexo C, de 15/01/2020, em que o FFF lhe pede uma barra de chocolate, perguntando o preço, respondendo o arguido: é cá que a gente fala, mas acrescentando: é trezentos e tal, também muito explícita; A sessão 2439, folhas 14 do anexo C, de 16/01/2020, em que alguém que se identifica como GGG lhe pede duas para amanhã; A sessão 2941, folhas 16 do Anexo C, de 22/01/2020, em que alguém lhe pergunta o preço de uma normal, respondendo o arguido: duzentos; A sessão 3365, folhas 18 do anexo C, de 01/02/2020, também particularmente explícita, confirmando que o arguido realizou uma venda de haxixe a uma HHH, que lhe telefona para reclamar da quantidade, dizendo que é bué da poucochinho, alertando-a ele de que não devem falar sobre isso ao telefone; a sessão 3452, folhas 19 do Anexo C, de 03/12/2020, em que um indivíduo lhe pede: dois e o arguido diz-lhe para ir ao seu encontro; e a sessão 3869, de folhas 20 do anexo C, de 16/02/2020, igualmente explícita, em que alguém lhe pede picas e ganza, dizendo-lhe o arguido que não podem falar sobre isso ao telefone.
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Relativamente aos arguidos CC e BB, relevam os autos de apreensão e reportagem fotográfica de folhas 2832 e seguintes, abrangendo também, quanto ao BB, um caderno com anotações de nomes e quantias, que o arguido não explicou cabalmente e que permite concluir, à luz das regras de experiência comum, e à similitude com situações idênticas apreciadas noutros processos respeitantes a crimes da mesma natureza.
O arguido BB prestou declarações em audiência de julgamento, afirmando conhecer apenas vagamente os coarguidos, vivendo temporariamente na casa do CC a titulo de favor, porque a sua própria casa ficou destruída num incêndio, negando qualquer ligação ao II e negando a prática dos factos imputados.
Afirmou que os objetos em metal amarelo encontrados no cofre existente no quarto que ocupava eram de sua propriedade e a quantia monetária era proveniente da venda de marisco e a quantia de 600,00 € era uma poupança sua, guardada num mealheiro.
Confrontado com a sessão 5642, a folhas 7 do Apenso E, de 20/03/2021, em que alguém pede ao CC para lhe dizer a ele, BB (Tchmi) para não sair de casa, pois vão passar por lá para coiso (...) aquele mambo, esclarecendo logo o CC que ele não tem nada; e com a sessão 820, folhas 45 do Apenso D, de 04/09/2021, em que a arguida EE, mãe da AA, questiona esta sobre os rebuçados que lhe deu a guardar, referindo que está ali o ... à espera, não logrou esclarecer, tentando, no entanto, fazê-lo, dizendo que, nesta última conversa, falavam efetivamente de rebuçados, gomas e doces, que a arguida EE vendia habitualmente e que ele apreciava particularmente e que o ajudavam nos treinos no ginásio, explicação que não se aceita, desde logo à luz das regras de experiência comum, não fazendo qualquer sentido, que o arguido estivesse ansiosamente à espera que a arguida AA trouxesse rebuçados, produto que se pode comprar basicamente em qualquer lugar e que esse tema merecesse um recado tão assertivo dirigido pela arguida EE à sua filha AA.
Releva ainda a sessão 3408, de folhas 2 do Anexo E, de 12/02/2021, onde alguém, utilizando o telemóvel do CC, liga ao arguido BB para o questionar sobre uma cena, respondendo ele que está lá naquele frasquinho branco, perguntando a pessoa quanto é que é vinte, respondendo o arguido que é cinco.
Os agentes da PSP inquiridos referiram-se à residência dos arguidos CC e BB como supermercado de droga, para melhor descreverem a constante afluência de consumidores de estupefacientes que aí se dirigiam para adquirir essas substâncias, o que resulta também da sessão 4092, de folhas 7 do Anexo E, de 20/02/2021, em que um indivíduo do sexo feminino telefona ao BB e diz-lhe: mano, eu estou farta destes miúdos, pá (...) É às dez da manhã, é às nove da manhã, é às horas que eles querem vir bater à porta como eles querem, uma pessoa está a dormir, não pode dormir atão (...) é de manhã, é de tarde, é à noite, é às duas da manhã, então meu. E, perante a indiferença de BB, diz: eu vou começar a tratar mal os teus clientes e amigos tu vais ver, vou mandar todos para o caralho, sendo que, perante a referência a clientes, o arguido reage: (...) tás-te aa esticar já nas conversas ao telefone, tá bem, querida (...) clientes tens tu que os recebes tu de perna aberta.
O arguido BB, confrontado com esta conversação, referiu apenas que se tratava de uma mulher que exercia a prostituição no local, não logrando explicar a inequívoca afluência de indivíduos à sua residência, sendo certo que, ponderando as regras de experiência comum, não se tratava de comércio de peixe ou marisco, pois este tem locais ou, pelo menos, horários determinados.
E, relativamente ao arguido CC, releva ainda a sessão 3487, folhas 3 do Apenso E, em que ele liga ao arguido BB, passando o telefone a um individuo de nome RR, que o questiona sobre aquele mambo, respondendo o BB: podes vir quando quiseres.
Não se atende, porém, à conversação respeitante a uma camisola branca do Benfica, não tanto porque o arguido CC a exibiu e juntou fotos da mesma a folhas 4594, mas porque, do contexto da conversa, não resulta inequivocamente que se trate de referência a produto estupefaciente.
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Relativamente à arguida FF, releva essencialmente a análise das transcrições das conversações telefónicas:
Na sessão 53473, folhas 139 do Anexo A, em 15/09/2021, o II envia uma mensagem à FF: era pa te dar a guita ao guardares esqueci me.
Na sessão 55358, folhas 141 do Anexo A, em 23/09/2021, o II envia mensagem à arguida FF, perguntando: o que tens aí acento (tratando-se obviamente de erro de escrita, pretendendo ele saber o que a arguida tinha assente, anotado.
Na sessão 55360, folhas 142 do Anexo A, em 23/09/2021, a arguida responde: so n acentei a última.
Na sessão 55362, folhas 143 do Anexo A, em 23/09/2021, II pergunta à arguida: tirando isso é o que.
Na sessão 55363, folhas 144 do Anexo A, em 23/09/2021, a arguida FF responde: 3,5.
Na sessão 56045, folhas 145 do Anexo A, em 28/09/2021, o II anuncia à arguida FF: vou passar aí.
Na sessão 56746, folhas 146 do Anexo A, em 28/09/2021, a arguida FF pergunta-lhe: para levares?
Na sessão 56047, folhas 147 do Anexo A, em 28/09/2021, o II responde negativamente.
Mas, na sessão 56049, folhas 148 do Anexo A, em 23/09/2021, II acrescente: mas tras pra confirmar.
Na sessão 56483, folhas 149 do Anexo A, em 01/10/2021, II envia mensagem à arguida FF, com o seguinte teor: empresta me aquilo.
E na sessão 56484, folhas 150 do Anexo A, em 01/10/2021, a arguida FF pergunta: os “pescadores” todos, ao que ele responde: sim, na sessão 26488, folhas 151 do Apenso A, da mesma data.
Na sessão 57473, folhas 152 do Anexo A, em 01/10/2021, II pergunta à arguida FF: podes emprestar.
Na sessão 60983, folhas 153 do Anexo A, em 21/11/2021, II diz à arguida FF: vou passar aí a porta agr pode ser. E, logo a seguir, pergunta-lhe: guardas, na sessão 60985, folhas 154 do Anexo A, em 02/10/2021.
Na sessão 61400, folhas 156 do Anexo A, em 07/11/2021, FF envia ao II mensagem com o seguinte teor: precisas de mim.
Na sessão 63499, folhas 157 do Anexo A, em 23/11/2021, II pergunta à arguida FF: tens isso em mão e ela responde: sai agr de casa, na sessão 63500, folhas 158 do Anexo A, da mesma data.
Seguem-se diversas mensagens de teor muito semelhante, com pedidos: emprestas? guardas? que o II dirige à arguida FF, a que ela responde afirmativamente.
Na sessão 79473, folhas 168 do Anexo A, em 12/02/2022, o II pergunta à FF: queres que passe aí logo ou preferes que mande alguém da minha confiança pegar, ao que ela respondeu: se quiseres deixar aqui por mim é na boa, mas se te incomoda podes apanhar, na sessão 79474, folhas 169 do Anexo A, na mesma data.
Na sessão 81576, folhas 172 do Anexo A, em 26/02/2022, II envia uma mensagem à arguida FF, com o seguinte teor: depois quando chegares dz pa dares aquiko.
Na sessão 87637, folhas 184 do Anexo A, em 16/04/2022, II envia a seguinte mensagem à arguida FF: n confirmas te nada ne.
Na sessão 87651, folhas 185 do Anexo A, em .../.../2022, a FF responde, dizendo: 8590, que corrige logo depois, dizendo: 8600***, na sessão 87652, folhas 186 do Anexo A, em .../.../2022, questionando-a o II: so, na sessão 87659, folhas 187 do Anexo A, na mesma data, acrescentando depois: eu dei tudo certo n pode tar 100 a mais, na sessão 8766, folhas 188 do Anexo A, na mesma data.
Na mesma data, na sessão 87664, folhas 191 do Anexo A, a arguida FF pergunta: era suposto tar aqi 9 mil?
Na sessão 87671, folhas 195 do Anexo A, na mesma data, II diz à arguida FF: ent 8500 mais 1000 era suposto tar 9.500, após o que anuncia: eu vou me vestir já passo aí pa contar, na sessão 87677, folhas 191, Anexo A, na mesma data.
Na sessão 89498, folhas 197 do Anexo A, em 05/05/2022, II envia a seguinte mensagem à arguida FF: das me um beijo e emprestas me.
Esta última mensagem revela claramente que o II tinha uma relação íntima com a arguida FF, assim como tinha com a arguida AA, sendo razoável concluir que aproveitava esse envolvimento e a dependência daí resultante para convencer essas mulheres a guardar o seu produto estupefaciente e o dinheiro.
Relativamente à arguida FF, algumas das mensagens transcritas parecem sugerir que guardava também substâncias estupefacientes, porém, sem a certeza exigível, que se verifica no caso da arguida AA. Porém, inequivocamente, a arguida FF guardava as quantias monetárias provenientes da atividade de venda desses produtos, o que ela não podia ignorar, o que resulta, desde logo, das regras de experiência comum, e das conversações telefónicas, concretamente as sessões 99334 e 99337, a folhas 207 e 208 do Anexo A, de 29/06/2022, em que a arguida descreve ao II a evolução da ação policial e, sobretudo, a sessão 99338, de folhas 209 do Apenso A, da mesma data, em que a arguida aconselha o II: se calhar é melhor desligares o telemóvel e tirar a bateria, e alguém te emprestar o telefone, porque teu telemóvel está a ser monitorizado, que eles sabiam o meu nome, o meu número e os números dos prédios.
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O arguido HH prestou declarações em sede de audiência, negando a prática dos factos, negando o conhecimento da existência e a posse dos produtos estupefacientes apreendidos na sua residência, conforme auto de apreensão e reportagem fotográfica de folhas 2787 e seguintes, confirmando, porém, que a mochila era sua.
E o arguido GG prestou declarações no final da audiência de julgamento, afirmando que um dos agentes da PSP intervenientes na busca à sua residência o aconselhou a dizer que o estupefaciente e os restantes objetos eram seus, pois, dessa forma, não seria preso, afirmação que não merece qualquer credibilidade, até porque, questionado, o arguido não identificou esse agente, sendo que todos eles foram inquiridos na qualidade de testemunhas, acabando por referir, de forma titubeante, que seria um outro, que não esteve presente no julgamento.
Não foram encontradas naquela residência quaisquer outras pessoas, além dos arguidos.
Foi encontrado produto estupefaciente no quarto de cada um dos arguidos, nomeadamente na mesa de cabeceira do GG, onde também foi encontrada uma balança de precisão e no interior da mochila que o HH admitiu que lhe pertencia. Mais, o GG tinha consigo, numa bolsa que trazia à cintura, a quantia de 600,00 €, elevada, incompatível com a modesta situação financeira que descreveu, trabalhando há pouco tempo e tendo-se mudado para aquela casa para reduzir a despesa da renda, dividindo-a com o seu amigo HH; e este tinha, na mesa de cabeceira uma tesoura e vários círculos de plástico, que, ponderando as regras de experiência comum, não servem para outra coisa senão para embalar doses individuais de produto estupefaciente.
Assim, não se suscitam ao tribunal dúvidas sobre a prática, por estes arguidos, dos factos dados como assentes.
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Justifica-se uma pequena análise dos termos e expressões utilizados pelos arguidos nas conversações telefónicas, além do mais, à luz das regras de experiência comum.
Assim, algumas delas são totalmente explícitas, sendo que numa situação, numa conversa do arguido DD, este refere claramente a venda de cocaína e numa outra conversa, um cliente refere picas e ganza, pelo que é inequívoca a referência a produtos estupefacientes, assim como a expressão barra de chocolate, possivelmente uma das expressões mais utilizadas para designar haxixe.
Também relativamente à expressão rebuçados, não se suscitam quaisquer dúvidas, como ficou exposto acima.
E uma normal, pelo preço de duzentos, não pode ser outra coisa senão produto estupefaciente, caso contrário, teria sido explicitada, assim como uma cena, que estaria guardada num frasquinho branco, por idênticas razões.
E uma posta de bacalhau daquela boa, que aparece numa conversação do arguido DD, também não pode ser outra coisa senão uma barra de haxixe, até porque não existe bacalhau na costa portuguesa, sendo certo ainda que os agentes da PSP referiram que nunca viram aquele arguido trabalhar na pesca.
E peixinho, ao preço de três cinquenta, que um comprador, numa conversa com o DD, achou caro, só podia ser estupefaciente, sendo o preço 350,00 €, porque se fosse peixe, a 3,50 €, obviamente não seria caro.
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Relativamente às quantias monetárias apreendidas, não se suscitam dúvidas ao tribunal sobre a sua proveniência da atividade de venda de produtos estupefacientes, atentas as elevadas quantidades transacionadas, conclusão que se retira, desde logo, das quantidades efetivamente apreendidas e dos montantes que o II entregava regularmente à arguida FF para guardar, sem esquecer ainda a quantia, também elevada, apreendida na posse do arguido BB, no interior de um cofre, no seu quarto e numa lata, que, obviamente, não era proveniente da atividade da pesca, certo que foi o próprio arguido que descreveu o bairro do ..., ..., como um local habitado por pessoas pobres, sem recursos e sem apoio das instituições sociais, onde nem conseguiam ganhar o suficiente para fazer reparações num telhado. Então, obviamente, a atividade piscatória não lhe podia proporcionar tais rendimentos, o que resulta também das regras de experiência comum.
Relativamente às peças em metal amarelo, que o arguido identificou como ouro, afirmou que lhe pertencem e juntou, a folhas 4298, uma declaração emitida por ..., da qual consta apenas que o arguido adquiriu esses objetos naquele estabelecimento entre 2014 e 2016, documento que, desacompanhado de faturas/recibos ou registos contabilísticos, é insuficiente para afastar a presunção de que se trata de produto da atividade de venda de estupefacientes.
Por maioria de razão, conclui-se que as balanças de precisão, tesouras, recortes de saco plástico, bolsas, embalagens, sacos, mochilas e os telemóveis foram utilizados pelos arguidos na atividade de venda de substâncias estupefacientes.
Especificamente quanto aos arguidos GG e HH, tendo vindo o primeiro alegadamente para Portugal para estudar, embora tal não esteja demonstrado, identificando-se como ..., realizando trabalhos esporádicos na construção civil e não tendo o segundo comprovado qualquer vínculo laboral na área que referiu, da construção civil, mostra-se tal situação pessoal manifestamente inconciliável com a detenção das quantias monetárias que lhes foram apreendidas, pelo que não se suscitam dúvidas sobre a associação das mesmas à transação de produtos estupefacientes.
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A natureza estupefaciente e as quantidades das substâncias apreendidas na posse dos arguidos e outros resultam da prova pericial consubstanciada nos relatórios do Laboratório de Polícia Científica da Polícia Judiciária juntos a folhas 3580, com o número 202205761-BTX (na posse de GG, HH, CC, AA, EE e II), folhas 2277, com o número 202113084-BTX (VV) folhas 1350, número 202015493-BTX (RR), folhas 1352, número 2020116067-BTX (SS), folhas 1339, número 2020117343-BTX (TT), folhas 2509, número 202107892-BTX (PP), folhas 1962, número 2021112533-BTX (UU) e folhas 3559, número 202205745-BTX (DD).
Resultam também de prova pericial, consubstanciada no relatório de exame de folhas 3133, as características da soqueira (boxer) apreendida na posse do arguido DD.
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Atendeu-se aos certificados de registo criminal juntos, relativamente às condenações anteriores dos arguidos BB e CC (folhas 4129 a 4132 e 4134) e à inexistência das mesmas relativamente aos arguidos AA (folhas 4126, verso), DD (folhas 4127, verso), EE (folhas 4135, verso), FF (folhas 4136, verso), GG (folhas 4137) e III (folhas 4138).
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A factualidade assente relativamente às condições pessoais resulta do teor dos relatórios sociais juntos aos autos a folhas 3986 a 3988 (arguida AA), folhas 4049 e seguintes (HH), folhas 4084 a 4086 (DD), 4105 a 4109 (arguido BB), folhas 4154 a 4156 (arguida EE), folhas 4159 a 4161 (arguido CC) e folhas 4310 a 4313 (arguida FF) e das declarações do arguido III prestadas em sede de primeiro interrogatório judicial apenas obre essa matéria.
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Relativamente aos demais factos não provados, as testemunhas inquiridas não os confirmaram com a certeza e a segurança exigíveis e não se produziu outra prova sobre os mesmos.
Os meios de prova que não foram especificados nesta motivação, não assumiram, em nosso entender, relevância para a descoberta da verdade.
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O tribunal não atendeu ao teor da acusação nos segmentos não relevantes para a decisão, nos segmentos redundantes, nos que consubstanciam conclusões fáticas e de direito ou referências a meios de prova e alterou a redação/sistematização da factualidade descrita, no exercício da liberdade do relator.
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3.–Apreciando
Nos termos do estatuído no art. 368.º aplicável ex vi art. 424.º n.º 2, ambos do CPP, o Tribunal da Relação deve conhecer em primeiro lugar das questões que obstem ao conhecimento do mérito da decisão. Após, das que a este respeitem, começando pelas relativas à matéria de facto, e, dentro destas, pela impugnação alargada, se tiver sido suscitada e depois dos vícios previstos no art. 410.º n.º 2 do Código do Processo Penal. Finalmente, debruçar-se-á sobre as questões atinentes à matéria de Direito.
Nessa medida, independentemente da sequência pela qual os recorrentes suscitam as questões, na sua apreciação o tribunal de recurso deve seguir uma ordem de precedência lógica que atende ao efeito do conhecimento de umas em relação às outras, tendo por referência a ordem indicada na disposição legal citada.
3.1.-Da nulidade do acórdão por falta de fundamentação
Olhando ao que se deixou transcrito, cumpre, antes de mais, debruçarmo-nos sobre esta primeira questão suscitada pelos três arguidos recorrentes.
Por força do disposto no art. 374.º, n.º 2 do CPP, sobre os requisitos da sentença, “ao relatório segue-se a fundamentação, que consta da enumeração dos factos provados e não provados, bem como de uma exposição tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal.”
Como é sabido, fundamentar é justificar, apresentar as razões, de forma coerente e objetiva, que determinaram a decisão naquele sentido e não noutro. E esta fundamentação abarca quer a decisão incidente sobre os factos quer a solução jurídica encontrada e aplicada.
Em suma, implica tornar possível sindicar a bondade da decisão recorrida.
Porém, fundamentar não significa autonomizar exaustivamente, o que decorre, desde logo, da leitura do preceito em análise por referência à expressão “concisa” aí contemplada.
Dito de outra forma, apenas a absoluta falta de fundamentação constitui nulidade.
Ora, analisada por nós a fundamentação exarada pela primeira instância afigura-se-nos não assistir razão a nenhum dos recorrentes, sendo a mesma tudo menos insuficiente, não suscitando quaisquer dúvidas quanto ao raciocínio percorrido.
Assim, e pese embora os recorrentes não o considerem, certo é que o tribunal a quo analisou criticamente todos os elementos de prova relevantes, explanando a sua convicção quanto à credibilidade daquilo que lhe foi dado a julgar e que de facto importa.
Com efeito, resulta da respetiva fundamentação de que forma foi obtido o raciocínio quanto à atividade concertada dos arguidos, local de vendas, valores, quantidades e qualidade dos produtos estupefacientes transacionados, concretamente, por interpretação conjugada dos autos de apreensão, dos depoimentos das testemunhas das várias escutas telefónicas valoradas e prova pericial (exames toxicológicos) obtida nos autos.
Ou seja, resulta da fundamentação em análise que o tribunal a quo cumpriu escrupulosamente as exigências previstas no artigo 374.º, n.º 2, do CPP, o que não equivale a ter conformado a sua valoração de acordo com os argumentos aduzidos pelos recorrentes, mas antes de acordo com a factualidade tida como assente que bem explicita e pormenorizada está.
Questão diferente, como bem refere o Ministério Público na primeira instância, “é a eventual discordância quanto ao raciocínio devidamente explanado, a qual corresponderá, não a eventual insuficiência de fundamentação, mas a impugnação sobre a matéria de facto”.
Nessa medida, julgamos não verificada a nulidade prevista no artigo 379.º, n.º 1, al. a) do CPP, improcedendo os recursos nesta parte.
3.2.–Da nulidade de toda a prova produzida nos autos resultante da recolha e conservação de dados móveis e metadados fornecidos pelas operadoras de comunicações
A nulidade em causa foi suscitada pela recorrente AA.
Porém, e conforme observado pelo Ministério Público em resposta correspondente, também nós não observamos em que medida é que a mesma tem aplicação no caso dos autos, porquanto, da nossa análise apenas verificamos o reporte ao conteúdo de interceções telefónicas, sendo que quanto a estas não está em causa aplicação da Lei n.º 32/2008, de 17.08.
É que o acórdão n.º 268/22 do Tribunal Constitucional “não buliu em mínima medida sequer com o regime processual penal das interceções telefónicas”.
(…) VI. Os arts.187 a 189, do CPP, regulam o recurso aos dados relativos a conversações ou comunicações telefónicas em tempo real, enquanto o acesso aos dados conservados pelas operadoras por conversações ou comunicações telefónicas passadas é regulado pela Lei n.º 32/2008, de 17 Julho; o n.º 1, do art.187 citado, delimita o objeto dessa regulação como “a interceção e a gravação de conversações ou comunicações telefónicas”, o que representa comunicações a ocorrer, conversações ou comunicações telefónicas em tempo real. Já se o que interessa processualmente são comunicações passadas, localizadas no tempo e no espaço, chama-se à colação a Lei nº 32/2008, de 17 de Julho,
VII. São, pois, dois meios de prova diferentes, um as escutas telefónicas, outro a conservação e transmissão dos dados. O primeiro regulado nos arts 187 a 190 do CPP. O segundo previsto nos artigos 4º, 6º e 9º da L. 32/2008, agora declarados inconstitucionais nos termos do acórdão nº 268 do Tribunal Constitucional”. (cf. Ac. STJ de 6.09.2022, Proc. 618/16.0SMPRT-B.S1, 3ª secção, disponível em http://www.dgsi.pt).
Por conseguinte, não se vislumbra a existência de qualquer nulidade que afete a prova produzida nos autos, nos termos expostos pela recorrente, concluindo-se pela improcedência do recurso, também nesta parte.
3.3.– Da nulidade da acusação e do acórdão (carácter inconclusivo dos mesmos)
Os recorrentes BB e CC pugnam pela nulidade da acusação, por a considerarem inconclusiva e baseada na quase totalidade em imputações genéricas.
Porém, olhando nós a essa peça processual verificamos que a mesma contém todos os elementos enunciados no artigo 283.º, n.º 3 do CPP, o que decorre da sua simples leitura, pelo que não enferma de qualquer nulidade.
Não obstante, e conforme referido pelo Ministério Público em resposta a esta mesma questão, “a nulidade consagrada neste preceito é sanável, porquanto não se encontra prevista no artigo 119.º do Código de Processo Penal nem é cominada noutro preceito legal.
Assim, tendo o recorrente há muito sido notificado da acusação, a arguição de nulidades da acusação em sede de recurso é manifestamente extemporânea e a eventual nulidade sempre estaria sanada, nos termos dos artigos 120.º e 121.º do Código de Processo Penal”.
Quanto à invocada nulidade do acórdão, pelo seu caráter inconclusivo, dá-se aqui por reproduzido aquilo que “supra” se consignou a propósito da improcedência da nulidade do acórdão por falta de fundamentação, que tem aqui plena aplicação, sendo evidente que os recorrentes, de forma prolixa, confundem ainda a dita questão com a invocação do vício a que se refere o art. 410.º, n.º 2, al. a) do CPP.
Tanto se tratará em sede de própria, ou seja, a propósito da impugnação da matéria de facto.
Assim considerando, julgamos não verificada nenhuma das nulidades invocadas (acusação e acórdão).
3.4.–Da nulidade da prova resultante das escutas telefónicas, por terem tido lugar sem fundamentação da sua necessidade
A nulidade em apreciação foi invocada pelos arguidos BB e CC, alegando que não se comprovou se a realização das interceções telefónicas era um meio de obtenção de prova necessário para o desenvolvimento da investigação e se o mesmo, podia ser substituído por outro menos lesivo para os meios individuais, tal como exige a parte final do n.º 1 do referido art.º 187.º do CPP.
De igual modo consideram que não havia “razões para crer que a diligência se revelará de grande interesse para a descoberta da verdade ou para a prova”, tendo tal juízo assentado na “(…) invocação da suspeita da sua prática por um OPC” e “em meras deduções policiais, que com base em nenhuma diligência efetuada presumem e concluem”.
Mais invocam a “inconstitucionalidade da interpretação do 187.º/1 Código de Processo Penal no sentido de que seja admissível escuta telefónica a indivíduo sem que esteja assegurada a sua necessidade comprovada nos autos, por violação dos arts.º 32.º n.º 8 e 34.º n.º 4 da Lei Fundamental”.
Ora, para além de se considerar que a pretendida nulidade, porque dependente de arguição, a ser suscitada deveria tê-lo sido até cinco dias após a notificação da acusação (art. 120.º, n.º 3, al. c) do CPP), estando há muito esgotado o respetivo prazo legal para o efeito, sempre se dirá, e desde já, que semelhante arguição teria, como terá, necessariamente que improceder.
De facto, a consequência da verificação da nulidade invocada seria uma alegada proibição de prova, logo, um vício do modo de formação da convicção do tribunal.
Ora, resultando do disposto do art. 187.º, n.º 1 do CPP que a interceção e gravação só podem ser ordenadas judicialmente se “houver razões para crer que a diligência é indispensável para a descoberta da verdade ou que a prova seria, de outra forma, impossível ou muito difícil de obter”, naturalmente que essas razões haverão de ser conjugadas com a existência de fortes indícios ou de indícios suficientes da prática de um crime de catálogo.
Por seu turno, como meio de obtenção de prova invasivo da privacidade, a admissibilidade das interceções telefónicas também tem de ser apreciada à luz dos princípios da proporcionalidade, da adequação e da necessidade.
É por demais evidente que nos crimes de tráfico de estupefacientes (que constituem um dos crimes de catálogo, conforme art. 187.º, n.º 1, al. b) do CPP) a interceção telefónica é indispensável para descoberta da verdade.
São, pois, pontos assentes.
Neste enquadramento, e revertendo para a situação dos autos, e sendo ainda claro que nenhum dos recorrentes adianta quais outras formas de investigação menos lesivas que poderiam ter sido adotadas, somos a entender que as promoções e despachos judiciais que autorizaram as interceções telefónicas realizadas nos autos se mostram devidamente justificados, o que resulta ab initio daquele que logo é proferido no dia 11.07.2019, sob promoção do Ministério Público datada de 09.07.2019, e de todos os subsequentes.
Igualmente, no momento em que foram ordenadas nos autos, mostrava-se preenchido o requisito formal da existência de fortes indícios, não se duvidando, e antes se acompanhando, que, à época, os elementos existentes justificavam que se concluísse pela existência de suspeitas fundadas da prática de crime, bem como elementos que sustentavam a suspeição sobre os visados em tais interceções telefónicas. Mostravam-se, pois, também na nossa perspetiva, as interceções telefónicas adequadas e proporcionais à obtenção de mais e melhores meios de prova.
Desta feita, considera este tribunal de recurso que as autorizações postas em crise se encontram devidamente fundamentadas, quer quanto à necessidade quer quanto à imprescindibilidade, refletindo, ao contrário do que se pretende, a aplicação dos princípios da proporcionalidade, adequação e da necessidade face aos elementos de prova que os autos apresentavam àquela data.
Ou seja, não se vislumbra interpretação desconforme à norma contida no art. 187.º, n.º 1 do CPP, por violação dos arts. 32.º n.º 8 e 34.º n.º 4 da Lei Fundamental.
Termos em que, a decisão recorrida, quanto à nulidade da prova resultante das escutas telefónicas, por terem tido lugar sem fundamentação da sua necessidade, não enferma de qualquer vício, assim se mantendo na íntegra, improcedendo nesta parte o recurso.
3.5.–Da impugnação da matéria de facto
Conforme resulta do art. 428.º, n.º 1, do CPP “as relações conhecem de facto e de direito”.
A decisão sobre a matéria de facto pode ser impugnada por duas vias:
- com fundamento no próprio texto da decisão, por ocorrência dos vícios a que alude o art. 410.º, n.º 2 do CPP (impugnação em sentido estrito, no que se denomina de «revista alargada»);
- ou mediante a impugnação ampla da matéria de facto, a que se refere o artigo 412.º, n.ºs 3, 4 e 6, do CPP (impugnação em sentido lato).
Quanto aos vícios (impugnação em sentido estrito) - insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão e o erro notório na apreciação da prova -, sendo de conhecimento oficioso, devem resultar do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência, sem recurso a quaisquer provas documentadas, limitando-se a atuação do tribunal de recurso à sua verificação na sentença e, não podendo saná-los, à determinação do reenvio, total ou parcial, do processo para novo julgamento (art. 426.º, n.º 1 do CPP).
Quanto à segunda modalidade (impugnação em sentido lato), impõe-se, conforme resulta da análise do normativo correspondente (n.ºs 3 e 4 do art. 412.º do CPP), que o recorrente enumere/especifique os pontos de facto que considera incorretamente julgados, bem como que indique as provas que, no seu entendimento, impõem decisão diversa da recorrida, e não apenas a permitam, assim como que especifique, com referência aos suportes técnicos, a prova gravada.
Tal delimitação decorre da circunstância de a reapreciação da matéria de facto não se traduzir num novo julgamento, mas antes num “remédio jurídico”, destinado a suprir eventuais erros. Por conseguinte, se a decisão proferida for uma das soluções plausíveis, a mesma será inatacável.
*
Assim considerando, analisaremos de que modo cada um dos recorrentes manifesta a sua discordância relativamente à decisão sobre a matéria de facto.
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a)- Arguida AA
A recorrente impugna os pontos 3, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 29, 30, 31, 33 e 55 da matéria de facto dada como provada, pois que, segundo ela, “não se produziu prova da mesma estando o douto acórdão ferido de nulidade prevista no art.º 410º, n.º al. a) do C.P.P.”
Ou seja, e conforme assinalado pela Exma. Procuradora-Geral Adjunta no parecer emitido nos autos, “a recorrente confunde os vícios de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e de erro notório na apreciação da prova com a impugnação de decisão sobre a matéria de facto, pois que pretende que esta Relação altere a matéria de facto e dê como não provados os pontos 3, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 29, 30, 31, 33 e 55 da matéria de facto”.
Pretende sindicar a valorização dos meios de prova realizada pelo tribunal a quo.
Porém, não dá cumprimento ao disposto nos nºs 3 e 4 do art. 412.º do CPP, na medida em que não indica qualquer prova produzida que tenha a virtualidade de impor, claramente, decisão diversa em relação aos factos do acórdão recorrido que considera incorretamente julgados.
Ao invés, aquilo que verdadeiramente resulta das conclusões do recurso é a divergência entre a convicção pessoal da recorrente sobre a prova produzida em audiência e aquela que o tribunal fixou sobre os factos, o que se prende com a apreciação da prova em conexão com o princípio da livre apreciação da mesma consagrado no artigo 127.º do CPP.
Pese embora, da análise da peça processual colocada em crise e prova reanalisada neste recurso, em confronto com a fundamentação de facto da decisão, que acima se deixou integralmente transcrita, não se vislumbra a ocorrência de qualquer erro de julgamento.
Na verdade, o que a arguida pretende é impor a sua visão da prova, valorizando as suas próprias declarações, que se diga confessórias quanto à prática do crime em questão, cuja realização pretende justificar no quadro de um relacionamento abusivo, que considera corroborado nos termos do depoimento da testemunha JJ.
Ou seja, pretende fazer vingar a sua visão da prova e impor a seu favor o uso do princípio in dubio pro reo.
Contudo, e ao contrário do pretendido pela recorrente, constatamos ter o tribunal recorrido formado a sua convicção em correspondência com a prova produzida e segundo critérios lógicos, objetivos e em obediência às regras da experiência comum, pelo que o resultado do processo probatório levaria, sem qualquer margem para dúvidas, às conclusões obtidas.
Por conseguinte, o juízo probatório positivo alcançado pelo tribunal recorrido quanto à verificação dos factos que a arguida recorrente pretende ver como não provados é logicamente correto, com indicação e exame critico das provas que serviram para formar a sua convicção (art. 374.º, n.º 2 do CPP).
Desse modo, não merece qualquer censura, não encontrando nós qualquer “espaço” para a aplicação do princípio in dubio pro reo e muito menos para a verificação de qualquer nulidade por omissão de pronúncia, nos termos em que a recorrente ainda invoca, ou seja, por referência ao disposto no art. 379.º, n.º 1, al. c), do CPP.
Sem prejuízo, pretende a recorrente padecer o acórdão “da nulidade vertida no art. 410.º, n.º 2, al. a), do C.P.P.”, concretamente, de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, ignorando a circunstância de se encontrar assente a matéria de facto, sendo do texto da decisão e não de elementos externos a ele, como a recorrente pretende, que se deteta a existência daqueles vícios.
Ora, independentemente daquilo que já se consignou, certo é que o vício em questão se traduz numa “lacuna no apuramento da matéria de facto indispensável para a decisão do de direito, isto é, quando se chega à conclusão de que com os factos dados como provados não era possível atingir-se a decisão de direito a que se chegou, havendo assim um hiato nessa matéria que é preciso preencher ” (Manuel Simas Santos e Manuel Leal-Henriques, “Recursos Penais”, 9.ª ed. 2020, Editora Rei dos Livros, p. 75).
Da nossa parte, não encontramos no texto da decisão recorrida qualquer lacuna no apuramento da matéria de facto indispensável para a decisão do de direito. Ao invés, antes se nos afigura que aquilo que o recorrente efetivamente discorda é da subsunção jurídica dos factos ao direito penal, que confunde com o vício da al. a) do n.º 2 do art. 410.º do CPP, que tem a ver com a matéria de facto em si mesma considerada ser ou não suficiente para a decisão de direito que foi alcançada pelo tribunal recorrido, independentemente da valia desta.
Nesta medida, nenhum vício julgamos verificado.
Concluindo, improcede totalmente a impugnação da matéria de facto.
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b)- Arguidos BB e CC
Fundamentalmente, pretende o arguido BB impugnar os factos assentes em 2, 5, 14, 30, 32, 46, 52, 55, 57, 59 e 61, que, atendendo à prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, nunca poderiam, segundo ele, ter sido dados como provados.
Na mesma linha, pretende o arguido CC impugnar os factos provados em 3, 5, 31, 32, 55 e 57.
Para tanto, convocam os vícios constantes do art. 410.º n.º 2 als. a) e c) do CPP, confundindo, notoriamente, impugnação ampla da matéria de facto com impugnação em sentido estrito, olvidando que esta última apenas tem fundamento no próprio texto da decisão.
Propõem-se, todavia, discutir elementos externos ao próprio texto da decisão, não indicando qualquer prova produzida que tenha a virtualidade de impor, claramente, decisão diversa em relação aos factos do acórdão recorrido que consideram incorretamente julgados, relembrando-se que não basta indicar provas que permitam decisão diversa da recorrida, mas antes que a imponham (n.ºs 3 e 4 do art. 412.º do CPP).
Ou seja, em bom rigor, deveriam ambos os recursos ser rejeitados nesta parte, conforme pugnado pela Exma. Procuradora-Geral Adjunta no parecer emitido nos autos junto desta Relação.
Com efeito, aquilo que efetivamente resulta das conclusões do recurso é a divergência entre a convicção pessoal dos recorrentes sobre a prova produzida em audiência e aquela que o tribunal a quo fixou sobre os factos, o que se prende com a apreciação da prova em conexão com o princípio da livre apreciação da mesma consagrado no artigo 127.º do CPP.
Contudo, consideram ainda que o princípio em causa se mostra violado.
Naturalmente que o tribunal deve pautar a sua convicção pessoal por uma valoração racional e crítica de acordo com as regras da lógica e das máximas de experiência comum e dos conhecimentos científicos.
Nessa medida, para aferir da racionalidade e da não arbitrariedade da convicção sobre os factos, nos termos apontados pelos recorrentes, importa apreciar a fundamentação de facto da decisão posta em crise, de modo a captar as motivações objetivas e subjetivas inerentes.
Ora, da análise da peça processual em causa e prova reanalisada neste recurso, em confronto com a fundamentação de facto da decisão, que acima se deixou integralmente transcrita, não se vislumbra a ocorrência de qualquer erro de julgamento.
Ao invés, constatamos ter o tribunal recorrido formado a sua convicção em correspondência com a prova produzida e segundo critérios lógicos, objetivos e em obediência às regras da experiência comum, não obstante os recorrentes procurem que assim não o seja.
O juízo probatório positivo alcançado pelo tribunal recorrido quanto à verificação dos factos que os arguidos BB e CC pretendem ver como não provados é logicamente correto, com indicação e exame critico das provas que serviram para formar a sua convicção (art. 374.º, n.º 2 do CPP).
Não merece qualquer censura e não permite a aplicação do princípio in dubio pro reo, desde logo porque nenhuma dúvida suscitou no julgador.
Por sua vez, não é de molde a concluir pela verificação de qualquer nulidade por omissão de pronúncia, nos termos do art. 379.º, n.º 1, al. c), do CPP, porquanto a atividade de julgar compreende a decisão de questões e não a pronúncia detalhada e circunstanciada sobre os argumentos invocados para suporte da decisão que reclamam ou sobre todos os documentos que estão nos autos.
Não obstante sempre se dirá, quanto aos invocados vícios, que não encontramos no texto da decisão recorrida qualquer lacuna no apuramento da matéria de facto indispensável para a decisão do de direito (art. 410.º, n.º 2, al. a) do CPP).
Ao invés, e à semelhança daquilo que “supra” se consignou quanto à impugnação de facto relativa à arguida AA, antes se nos afigura que aquilo que os recorrentes efetivamente discordam é da subsunção jurídica dos factos ao direito penal, que confundem com o vício da al. a) do n.º 2 do art. 410.º do CPP, que tem a ver com a matéria de facto em si mesma considerada ser ou não suficiente para a decisão de direito que foi alcançada pelo tribunal recorrido, independentemente da valia desta.
Por outro lado, não assinalamos nenhuma contradição ou sequer qualquer erro notório na apreciação da prova (art. 410.º, n.º 2, als. b) e c) do CPP).
Em suma, não assiste razão aos recorrentes, improcedendo totalmente a impugnação da matéria de facto.
Porém, sem prejuízo do que acima ficou exposto, um ponto existe na matéria de facto em que se verifica um manifesto lapso, perfeitamente percetível da leitura do auto de busca e apreensão de fls. 2832 a 2835, ou seja, aquele em que é visado o arguido BB.
Com efeito, não consta desse documento a apreensão de apenas 1 (um) anel em ouro, mas antes de 3 (três) anéis em ouro.
Tal lapso é, pois, manifesto, podendo, assim, ser objeto de correção, nos termos do disposto no art. 380.º do CPP, e designadamente o disposto na al. b) do n.º 1 do citado preceito, já que não importa modificação essencial e pode ser feita pelo tribunal de recurso.
Em face do exposto, ao abrigo do citado art. 380.º, n.º 1, al. b) e nº 2 do CPP, corrige-se o ponto 46, al. a) dos factos provados do acórdão sob recurso, passando a ler-se:
46.-Nessa mesma residência, no quarto temporariamente ocupado pelo arguido BB:
a.-no interior de um cofre embutido na parede, foi encontrada:
- A quantia de 6 500,00 €;
- Três anéis e dois fios em metal amarelo.
*
3.6.-Do enquadramento jurídico-penal
Mostram-se os três arguidos condenados pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, previsto no artigo 21º, nº1 do DL 15/93, de 23 de janeiro.
Subsidiariamente contestou a arguida AA a qualificação jurídica a que procedeu o tribunal a quo, de modo a ver alterada a sua condenação para o tipo privilegiado do art. 25.º do DL n.º 15/93, de 22.01.
Não o fizeram de forma clara os recorrentes BB e CC. De qualquer forma, e para que dúvidas não se suscitem, não o deixaremos de apreciar também quanto aos mesmos.
Estatui o tipo base, ínsito no artigo 21.º do decreto-lei em causa, do seguinte modo: «quem, sem para tal se encontrar autorizado, cultivar, produzir, fabricar, extrair, preparar, oferecer, puser à venda, vender, distribuir, comprar, ceder ou por qualquer título receber, proporcionar a outrem, transportar, importar, exportar, fizer transitar ou ilicitamente detiver, fora dos casos previstos no artigo 40º, plantas, substâncias ou preparações compreendidas nas tabelas I a III é punido com pena de prisão de 4 a 12 anos».
A norma que se citou define o tipo fundamental do crime de tráfico de estupefacientes, no qual se punem diversas atividades ilícitas, cada uma delas dotada, por si só, de capacidade bastante para integrar o elemento objetivo do ilícito.
Porém, é sabido que na estrutura do DL n.º 15/93, de 22 de janeiro, as situações de tráfico podem revestir outras modalidades, designadamente, o tráfico de menor gravidade, tipo de ilícito privilegiado, previsto no art. 25.º.
Dispõe o art. 25.º al. a) do diploma citado nos seguintes termos: «se, nos casos dos arts. 21.º e 22.º, a ilicitude do facto se mostrar consideravelmente diminuída, tendo em conta nomeadamente os meios utilizados, a modalidade ou as circunstâncias da ação, a qualidade ou a quantidade das plantas, substâncias ou preparações, a pena é de prisão de 1 a 5 anos, se se tratar de plantas, substâncias ou preparações compreendidas nas tabelas I a III, V e VI».
A ilicitude diminuída a que se refere o preceito pode ser indiciada quer pela “quantidade” ou “qualidade” da droga, quer pelos “meios” utilizados, a “modalidade” ou as circunstâncias da ação, isto sem esquecer que estamos perante um “tipo aberto”, expresso no vocábulo “nomeadamente”, e que, portanto, para o preenchimento do tipo, apenas se torna necessário que determinada circunstância, típica ou atípica, diminua consideravelmente a ilicitude do facto.
No caso da arguida AA, devendo (como o foi) a respetiva responsabilidade ser encontrada numa lógica de atuação concertada, as apreensões efetuadas, em conjugação com o conjunto da prova, corroboram de facto a amplitude da sua participação descrita nos factos assentes.
Estamos perante 1826,118 gramas de haxixe, suficiente para 9972 doses e mais 95,966 gramas de haxixe, suficiente para 504 doses pelo que o ilícito reveste intensidade significativa.
No caso do arguido BB, e conforme salientado pelo tribunal a quo, “as apreensões efetuadas não espelham toda a amplitude da participação do mesmo na atividade descrita nos factos assente.
Com efeito, foi encontrada na sua posse, além do mais, a quantia de 6 500,00 €, guardada num cofre, um anel (serão 3, conforme correção a que procedemos) e dois fios em metal amarelo e ainda a quantia de 600,00 €, e um caderno com anotações referentes a valores em dívida da venda de produtos estupefacientes.
Está também assente que, diariamente, número elevado de consumidores dirigia-se à sua residência para adquirir estupefacientes e, bem assim, a ligação próxima aos arguidos DD e AA e ao II.
Das regras da experiência comum, com suporte na jurisprudência, resulta que a detenção de quantias monetárias de montante elevado reflete, objetivamente, as vendas de produtos estupefacientes realizadas, mesmo que não tenham sido encontradas tais substâncias (na normalidade dos casos, quando há estupefaciente, ainda não há dinheiro e quando existe dinheiro, já não há produto estupefaciente).
Esta conclusão é inteiramente aplicável à atividade do BB, sempre sem perder de vista que se enquadra no âmbito de uma coautoria, assumindo a ilicitude elevada intensidade.”
Por seu turno, e quanto ao arguido CC, consignou-se o seguinte:
“As apreensões efetuadas corroboram, em conjugação com o conjunto da prova, a amplitude da participação deste arguido na atividade descrita nos factos assentes, sendo que, considerando apenas essas quantidades apreendidas, estamos perante 2, 519 gramas de cocaína (ester met.), suficiente para 137 doses, um pedaço de cocaína (cloridrato), com peso líquido de 0,491 gramas (uma dose) e cocaína (cloridrato) com peso líquido de 4,164 gramas, suficiente para 49 doses, pelo que, considerando, não só a quantidade elevada, mas também a natureza da substância, que integra o conceito corrente das drogas duras, com efeitos mais rápidos e devastadores na saúde humana, o ilícito reveste elevada intensidade.”
Desta feita, tudo analisado, nenhum reparo cumpre apontar ao enquadramento efetuado pelo tribunal a quo, porquanto também nós consideramos que estão verificados, relativamente aos três arguidos, os elementos essenciais constitutivos do crime de tráfico de estupefacientes, previsto no artigo 21.º, n.º 1 do DL 14/93, de 22 de janeiro, punível com pena de prisão de 4 a 12 anos.
Em consequência, concluímos pelo afastamento da aplicação do art. 25.º do DL n.º 15/93, de 22 de janeiro.
3.7.–Do quantum das penas
Os arguidos BB e CC mostram-se condenados, respetivamente, numa pena de 5 (cinco) anos de prisão e numa pena de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão.
Pugnaram, cada um deles, pela redução das penas, concretamente, por uma pena não superior a três anos.
Tendo presente ser essa a questão que importa decidir, cumpre registar, no seguimento do acórdão do STJ de 19.05.2021 (Proc. 10/18.1PELRA.S1., disponível em http://www.dgsi.pt), que «no que respeita à decisão sobre a pena, mormente à sua medida, começa por lembrar-se que os recursos não são re-julgamentos da causa, mas tão só remédios jurídicos. Assim, também em matéria de pena o recurso mantém o arquétipo de remédio jurídico.
Daqui resulta que o tribunal de recurso intervém na pena, alterando-a, quando detecta incorrecções ou distorções no processo aplicativo desenvolvido em primeira instância, na interpretação e aplicação das normas legais e constitucionais que regem a pena. Não decide como se o fizesse ex novo, como se inexistisse uma decisão de primeira instância. O recurso não visa, não pretende e não pode eliminar alguma margem de actuação, de apreciação livre, reconhecida ao tribunal de primeira instância enquanto componente individual do acto de julgar.»
Assim sendo, só em caso de desproporcionalidade manifesta na sua fixação ou necessidade de correção dos critérios de determinação da pena concreta, deverá intervir o tribunal de recurso alterando o respetivo quantum.
Como é sabido as finalidades de aplicação de uma pena decorrem essencialmente da necessidade de tutela dos bens jurídicos e da preocupação em se atingir a reinserção do agente na comunidade - artigos 40.º e 71.º, ambos do Código Penal. Posto que, se terá de atender ao art. 71.º do Código Penal, que dispõe, no seu n.º 1, que a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, far-se-á em função da culpa do agente, tendo ainda em conta as exigências de prevenção.
No que respeita ao relacionamento entre aqueles dois critérios, defende Figueiredo Dias (in Direito Penal Português - As Consequências Jurídicas do Crime, Aequitas, Editorial Notícias, 1993, pág. 215), que à culpa compete fornecer o limite máximo da pena que ao caso deve ser aplicada, sendo em função de considerações de prevenção geral de integração e especial socialização, que deve ser determinada abaixo daquele máximo, a medida da pena.
Segundo o art. 71.º, n.º 2 do Código Penal, “na determinação concreta da pena, o tribunal atende a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele (...)”. Com efeito, os princípios da proibição da dupla valoração e do ne bis in idem implicam que não sejam de novo apreciadas, em sede de medida concreta da pena, as circunstâncias que outrora foram consideradas a propósito do tipo de crime.
Olhando à perspetiva do tribunal a quo, verificamos que foram salientados os seguintes aspetos:
Arguido BB:
“O dolo atenta a reflexão necessária ao empreendimento da ação, assume também elevada intensidade.
Não resulta da factualidade assente outro fundamento atendível de atenuação da culpa. Não assumiu comportamento demonstrativo de autocensura ou arrependimento.
Não beneficia de inserção familiar consistente ou estável, estando aparentemente inserido no plano laboral, embora não se admita a verificação de estabilidade, uma vez que o arguido afirmou exercer simultaneamente as atividades de ... e ....
Sofreu diversas condenações anteriores, sendo pelo menos duas por crimes de idêntica natureza, em penas de prisão, uma delas efetiva, pelo que as exigências de prevenção especial revestem elevada intensidade.”
Arguido CC:
“O dolo atenta a reflexão necessária ao empreendimento da ação, assume também elevada intensidade.
Não resulta da factualidade assente outro fundamento atendível de atenuação da culpa.
Não assumiu comportamento demonstrativo de autocensura ou arrependimento.
Não beneficia de inserção familiar ou laboral consistente, funcional e estável.
Sofreu uma única condenação anterior, por crime de condução sem habilitação legal, numa pena de multa.”
Ganham ainda especial relevância as finalidades de reprovação e prevenção de futuros crimes (prevenção geral ou positiva), na medida em que o tráfico de estupefacientes trata-se de um crime que visa essencialmente a proteção da saúde pública e da saúde dos próprios consumidores, impondo-se igualmente, com acuidade, as necessidades de prevenção especial, relativas à reinserção dos agentes e à necessidade de evitar a prática de futuros crimes.
Tudo conjugado, afigura-se-nos ter o tribunal a quo ponderado de forma equitativa, o grau de ilicitude dos factos, a intensidade do dolo, a conduta posterior aos factos, salientando a circunstância de os arguidos não assumirem comportamento demonstrativo de autocensura ou arrependimento.
Destarte, as penas fixadas pelo tribunal a quo, numa moldura de punição entre 4 (quatro) e 12 (doze) anos de prisão, mostram-se justas, adequadas às finalidades de prevenção, e proporcionais à culpa e personalidades de ambos os arguidos, pelo que mantemos as mesmas.
Deste modo, improcede esta questão
3.8.–Da suspensão da execução das penas de prisão
Os três arguidos recorrentes pugnam pela suspensão da execução das penas de prisão em que se mostram condenados.
De acordo com o disposto no artigo 50.º n.º 1 do Código Penal, o tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça de prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
E, segundo o n.º 5 da mesma disposição legal, o período de suspensão é fixado entre um e cinco anos.
Perante este regime qualquer uma das penas, por não ultrapassar 5 (cinco) anos de prisão, é suscetível de suspensão.
Não obstante, assim não o considerou o tribunal a quo, o que fundamentou nos seguintes termos:
“Relativamente aos arguidos AA, BB e CC, o grau de ilícito e de culpa, as condenações anteriores no caso de BB, o grau de participação na ação, as elevadas exigências de prevenção especial e a ausência de autocensura, permitem concluir pela falta de preparação dos arguidos para manter conduta lícita, pelo que resultam inverificados os pressupostos estabelecidos no artigo 50º do Código Penal, mostrando-se a execução da prisão necessária à realização adequada das finalidades da punição.”
Subscrevendo nós a argumentação expendida pelo tribunal a quo de modo a concluir pela não suspensão das penas de prisão, somos particularmente atentos à circunstância de não se identificar nos arguidos qualquer juízo de autocensura, o que, por si só, é incompatível com qualquer juízo de prognose favorável.
Nessa medida, e quanto a todos eles, não se pode dizer que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
De qualquer forma, quanto à arguida AA, que de facto não conta com qualquer condenação anterior, não deixamos de salientar as observações a esse propósito tecidas pela Exma. Procuradora-Geral Adjunta no parecer emitido nos autos, a saber,
“A recorrente não tem hábitos de trabalho, tem um modo de vida ocioso e despreocupado, depende de apoios sociais, assume uma atitude desculpabilizante, fazendo recair sobre terceiros a responsabilidade por ter atuado como atuou, não tem uma família ou apoios estruturados [a mãe e o irmão são coarguidos] e é permeável à influência de terceiros [pontos 69, 70, 71, 72, 73, 75, 76, 78, 82, 85 e 86].
Praticou os factos durante um período alargado sem nunca desistir e sem interiorizar o desvalor da ação, não revelando arrependimento sincero.
Não se nos afigura, pois, possível formular um juízo de prognose favorável que permita à recorrente beneficiar da suspensão da execução da pena, nem que a ameaça da prisão realize de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.”
Assim considerando, julgamos que a execução da prisão é exigida quanto a todos os recorrentes, pela necessidade de prevenir o cometimento de futuros crimes, nada havendo a alterar ao decidido pelo tribunal a quo.
Em suma, improcedem totalmente os recursos.
III–Decisão
Pelo exposto, acordam os Juízes desta Relação em:
A)-Corrigir o lapso constante do ponto 46, al. a) da matéria de facto provada do acórdão recorrido, nos termos do disposto no artigo 380.º, n.º 1, al. b) do CPP, passando nele a ler-se:
46.- Nessa mesma residência, no quarto temporariamente ocupado pelo arguido BB:
a.- no interior de um cofre embutido na parede, foi encontrada:
- A quantia de 6 500,00 €;
- Três anéis e dois fios em metal amarelo.
B)-Julgar improcedentes os recursos interpostos pelos arguidos AA, BB e CC, confirmando o acórdão recorrido.
Custas pelos recorrentes, fixando-se a taxa de justiça individual em 4 UC´s.
Notifique.
*
Comunique-se de imediato à 1ª instância, com cópia.
*

Lisboa, 7 de maio de 2024

(texto processado e integralmente revisto pela relatora – artigo 94.º, n.º 2 do Código de Processo Penal)

Ester Pacheco dos Santos
Manuel Advínculo Sequeira
Sandra Ferreira