EMBARGOS DE EXECUTADO
AVAL
ABUSO DO DIREITO
Sumário

I - O aval, traduzindo-se num negócio jurídico unilateral através do qual o avalista assume a obrigação de garantir o pagamento do respectivo título cambiário, emerge uma obrigação de garantia, que se distingue da obrigação principal (resultante do aceite), mas que se associa à obrigação do avalizado.
II - - O abuso de direito é um limite normativamente imanente ou interno dos direitos subjectivos, pelo que no comportamento abusivo são os próprios limites normativos-jurídicos do direito particular que são ultrapassados.
III - Uma das restrições ao exercício de direitos subjectivos é justamente imposta pela necessidade de salvaguarda da boa fé da parte contrária, estando vedado o exercício do direito cujo titular exceda manifestamente os limites da boa fé.
IV - - São quatro os pressupostos de protecção da confiança ao abrigo da figura “venire contra factum proprium”:
a) Uma situação de confiança, traduzida na boa-fé própria da pessoa que acredite numa conduta alheia (no factum proprium);
b) Uma justificação para essa confiança, ou seja, sem desacerto dos deveres de indagação razoáveis;
c) Um investimento de confiança, traduzido no facto de ter havido por parte do confiante o desenvolvimento de uma actividade na base do, factum proprium, de tal modo que a destruição dessa actividade (pelo venire) e o regresso à situação anterior se traduzam numa injustiça clara;
d) Uma imputação da confiança à pessoa atingida pela protecção dada ao confiante, ou seja, que essa confiança (no factum proprium) lhe seja de algum modo recondutível.
V - Uma outra modalidade do instituto do abuso de direito consiste no designado supressio.
VI - O que a distingue do venire contra factum proprium é a ausência de factum (conduta anterior), bastando o decurso de um período de tempo significativo susceptível de criar à contraparte a fundada expectativa de que o direito não mais será exercido.
VII – É desnecessária a ocorrência de culpa por parte do titular do direito, bastando a situação objectiva criada a partir da sua inércia, geradora de justificada confiança da pessoa contra quem o direito se dirigia

Texto Integral

Processo n.º 2609/22.2T8AGD-A.P1
Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro
Juízo de Execução de Águeda

Acordam no Tribunal da Relação do Porto:

I. RELATÓRIO.

AA deduziu embargos de executado contra Banco 1..., S.A. invocando, para tanto e em síntese:

- a falta ou insuficiência do título executivo, porquanto as livranças dadas à execução foram abusivamente preenchidas, em desconformidade com o pacto de preenchimento. O pacto de preenchimento não se encontra junto aos autos, pelo que não se encontram reunidos os requisitos indispensáveis à configuração e validade das aludidas livranças;

- para além de terem sido preenchidas em desconformidade com o pacto de preenchimento, foram-no à revelia do embargante, seja quanto ao montante, tempo de emissão, vencimento, local de pagamento, etc, tendo a exequente violado os deveres de informação e lealdade associados à normalidade e usualidade duma correta prática bancária;

- o abuso de direito, por parte da exequente, ao preencher as livranças dadas à execução;

- a nulidade do aval prestado, por não ser determinado nem poder ser determinável o respectivo montante através do acordo de preenchimento celebrado com o ora embargante, nos termos previstos nos artigos 10 da LULL e 280/ do Código Civil; para além disso, o ora embargante nunca contribuiu para a sua determinabilidade e para o incumprimento das responsabilidades da subscritora dos títulos a sociedade A..., Lda.

- por impugnação, alega que desde a constituição da sociedade subscritora das livranças, a gerência da mesma era exercida pelo opoente e pelos sócios BB, CC, DD e EE.

Por deliberação de 16.04.2018, o opoente foi destituído da gerência, que foi anulada por sentença proferida na acção n.º 1826/18.4T8AVR do Juízo de Comércio de Aveiro - Juiz 1 e confirmada pelo douto Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 05 de Março de 2020, transitado em julgado.

Após ter sido destituído da gerência da sociedade, os sócios DD e EE constituíram, cada um deles com as respectivas mulheres, uma sociedade comercial por quotas, com actividade concorrente com a da sociedade subscritora das livranças, o que levou a que esta deixasse de desempenhar qualquer actividade e capaz de gerar lucros e rendimentos.

Na sequência da dita acção judicial, o ora opoente tentou assumir o cargo de gerente da sociedade subscritora, tendo os demais sócios gerentes promovido a sua destituição, na sequência da deliberação tomada na assembleia geral realizada em 10.12.2020.

O ora embargante intentou nova acção de condenação contra a sociedade subscritora, que corre termos no Juízo Central Cível de Aveiro - Juiz 1, sob o n.º 1722/22.0T8AVR.

Ali pede uma indemnização quanto aos danos patrimoniais sofridos com a destituição ilícita da gerência anulada pela sentença proferida na acção n.º 1826/18.4T8AVR do Juízo do Comércio de Aveiro – Juiz 1, entendendo que a decisão ali a proferir tem interesse para a presente execução.

Pediu a suspensão da instância até ser proferida a sentença naquela acção declarativa, ao abrigo do disposto no artigo 272/1 do Código de Processo Civil.

Mais alega que a exequente não lhe concedeu acesso e disponibilidade às contas bancárias da sociedade subscritora, quando era gerente da mesma, não tendo atualizado os intervenientes, na conta à ordem da mesma, como solicitado em 30.10.2020.

A essa data, os financiamentos junto da exequente não registavam incumprimento.

Em Dezembro de 2020, os demais sócios gerentes promoveram a destituição do embargante como gerente da sociedade subscritora e em 22.01.2021, a exequente não lhe permitiu o acesso às contas bancárias da subscritora, por força da sua destituição e cessação de funções.

Em 23.07.2021, solicitou ao gestor da B... – Polo Negocial Empresas .... da exequente que informasse se existia incumprimento das responsabilidades da sociedade ou algum acordo associado e em 18.08.2021, pediu nova informação acerca dos valores em dívida.

Em 19.08.2021, a exequente informa dos saldos devedores da sociedade.

Os valores em dívida não resultam do exercício da funções de gerente do ora embargante, mas da gestão danosa dos demais executados e sócios gerentes da sociedade subscritora da livrança, pelo que os valores em dívida não tiveram origem em negócios do seu interesse, verificando-se abuso de direito da exequente no preenchimento das livranças.

Admitidos liminarmente os embargos de executado, foi notificada a exequente para deduzir contestação, o que fez.

Alegou, em síntese, que as livranças dadas à execução são títulos executivos válidos, cumprindo os requisitos decorrentes do artigo 75 da LULL.

As livranças foram preenchidas de acordo com o pacto de preenchimento inserido nos contratos celebrados entre a Banco 1..., SA e a sociedade subscritora das livranças.

Não se verifica qualquer nulidade por indeterminabilidade do aval e da quantificação da dívida, já que a mesma era determinável de acordo com as cláusulas dos contratos subjacentes aos títulos executivos.

No que toca à defesa por impugnação, a mesma é ineficaz perante a exequente e para a procedência dos embargos: o embargante não nega a existência do incumprimento, da dívida e do seu não pagamento, mas imputa a factores a si exógenos o acionamento judicial da sua cobrança.

O relacionamento societário não é relevante para a obrigação a que se vinculou.

Defendeu não haver fundamento para a suspensão dos autos.

Foi proferido despacho a indeferir a requerida suspensão da instância, nos termos pretendidos pelo embargante.

Considerando que as questões a decidir são de direito, foram as partes notificadas para se pronunciarem quanto à dispensa da realização da audiência prévia e do conhecimento do mérito da causa em saneador sentença.

O embargante, não se opondo à dispensa da realização da audiência prévia, defendeu a necessidade da realização da audiência de julgamento para o conhecimento das questões por si suscitadas nos autos.

Considerando que o tribunal já se havia pronunciado quanto à desnecessidade da realização da audiência de julgamento, uma vez que as questões a decidir são de direito, e tendo em conta que o embargante não se opôs à dispensa da realização da audiência prévia, foi proferido saneador sentença que julgou improcedentes os embargos de executado e determinou o prosseguimento da acção executiva.

Não se resignando com o decidido, o embargante interpôs recurso de apelação para esta Relação, formulando com as suas alegações as seguintes conclusões:

“1.º O oponente aqui recorrente na sua oposição impugnou a exigibilidade da obrigação exequenda, requerendo nos termos da al. c) do n.º 1 do artigo 733.º do CPC, que o presente recurso seja admitido com efeito suspensivo, sem prestação de caução, tanto mais que a executada está insolvente, tem e possui registado na sua titularidade e património bem imóvel de valor suficiente para o pagamento da dívida exequenda e pode ser objecto de venda judicial cujo produto garante a satisfação do crédito da exequente.

2.º Sendo que a exequente Banco 1... é já reconhecido como credor nos autos de insolvência pessoa coletiva (Apresentação) n.º 1887/23.4T8AVR do Juízo de Comércio de Lisboa - Juiz 4, conforme é do conhecimento publico e consultável no portal da Justiça Cittius.

3.º O oponente aqui recorrente opôs-se à execução, peticionando que a mesma fosse julgada procedente, por provada e a excepção deduzida de nulidade de falta ou insuficiência de título executivo, assim se rejeitando a execução no que ao aqui oponente respeita, absolvendo-se o executado, tudo com as legais consequências.

4.º Através do despacho saneador-sentença, que aqui se põe em crise, o Tribunal a quo julgou a ação improcedente e proferiu a seguinte decisão:

“Pelo exposto, julgo improcedentes os presentes embargos de executado deduzidos por AA contra Banco 1..., SA determinando o prosseguimento da execução”.

5.º O recorrente não se conforma com tal decisão, pois que a mesma não é consentânea com o Direito, com os factos alegados e com a matéria dada como provada na ação precedente.

6.º O Tribunal a quo não conheceu os factos que foram submetidos à sua apreciação, não tendo sido objecto de prova tudo o alegado nos artigos 54.º, 55.º, 66.º a 104.º da oposição, entre outros, que carece da produção de prova e que se mostra essencial à boa decisão de mérito, o que enferma o saneador-sentença de nulidade, o que se invoca com as devidas e legais consequências.

7.º O recorrente pretende reagir contra o deficiente uso pelo Tribunal a quo dos poderes que lhe estão cometidos em matéria de aplicação do direito, pretendendo o recorrente reagir contra o deficiente uso pelo Tribunal dos poderes que lhe estão confiados relativos à aplicação do direito, designadamente no que toca à aplicação dos art.º 334.º do Código Civil.

8.º A sentença recorrida faz errada interpretação e aplicação do artigo art.º 334.º do Código Civil, violando o Tribunal a quo a lei substantiva por errada interpretação da norma aplicável, pois que se verificam factos consubstanciadores do abuso de direito que impõe a aplicação do artigo 334.º do Código Civil.

9.º O Tribunal a quo ao julgar improcedentes os presentes embargos de executado deduzidos pelo recorrente contra a exequente Banco 1..., SA determinando o prosseguimento da execução desprezou o peticionado pelo recorrente nomeadamente no que toca ao abuso do direito.

10.º Não fazendo sentido que um sócio que foi ilicitamente afastado da gerência e se desvinculou da vida societária deva ficar indefinidamente ligado a responsabilidades que possam derivar de actuações, da sociedade e de gerentes, contra a sua vontade e posteriores à sua saída da gerência, não tendo qualquer controlo sobre a respectiva gestão e endividamento.

11.º A verdade é que a exigência de aval por parte dos sócios, da sociedade, ocorre porque as instituições financeiras pretendem comprometer, aqueles, com uma gestão e um comportamento, da sua sociedade, favoráveis ao cumprimento do contrato de financiamento, ou seja, é sempre tido em conta a qualidade de sócios e gerentes.

12.º E o ora Recorrente informou o banco que emitiu a livrança em causa que tinha sido ilicitamente afastado da sociedade e actuou sempre com a diligência que lhe era exigível, procurando garantir por todos os meios ao seu alcance que não tinha quaisquer responsabilidades e de que a exequente que emitiu a livrança tinha sido avisada da sua desvinculação ilícita da gerência da sociedade.

13.º Sobre o abuso de direito na modalidade de venire contra factum proprium, é de referir que a exequente acciona as livranças já muito tempo depois de este ter sido ilicitamente afastado da gerência da sociedade subscritora.

14.º Além disso e sobre a desproporcionalidade de meios, note-se que nos encontramos num cenário em que está em causa uma instituição bancária e um particular, contexto em que os recursos humanos e os meios económicos de que as partes dispõem são extremamente desiguais, devendo, por isso, a boa fé e os deveres de cuidado ser mais intensamente observados no âmbito da sua relação.

15.º Os valores em dívida nas operações em que o aqui oponente intervém como avalista não ocorreram em virtude e no exercício das funções de gerente do aqui oponente, mas antes tiveram origem na clara gestão danosa dos também executados e sócios gerentes DD e EE.

16.º E os executados e sócios gerentes DD e EE mantiveram-se sempre a retirar rendimentos da sociedade executada até que nada restasse, totalmente indiferentes ao incumprimento para com a exequente e aos valores em divida nas operações em que o aqui oponente intervém como avalista.

17.º E a verdade é que as livranças foram emitidas com a finalidade da prossecução do interesse da sociedade executada subscritora e os valores em divida não o foram no interesse da sociedade executada subscritora, pelo que, o preenchimento das livranças e execução das mesmas contra o aqui oponente, configura, quanto ao aqui opoente, um claro abuso do direito.

18.º Além disso, a exequente ao impedir o exercício dos direitos do aqui oponente enquanto gerente da sociedade subscritora, age e agiu em abuso de direito no que ao aqui oponente respeita, rompendo o princípio da confiança mútua bem sabendo que o aqui oponente foi gerente e foi ilicitamente destituído conforme decretado judicialmente, quando os demais gerentes intencionalmente encerraram a actividade da executada, motivando o incumprimento e responsabilidades junto da exequente.

19.º E a exequente sabia perfeitamente que o recorrente já não era gerente da sociedade devedora e mesmo assim preencheu as livranças e executou o aqui recorrente, que atempadamente informou a exequente que não tinha acesso às contas da empresa, que os sócios gerentes DD e EE estavam a delapidar o património da empresa, e que foi afastado da gerência, criando a expectativa legítima de que o direito não iria ser exercido.

20.º Por tudo o exposto, é incontornável que a exequente actuou em abuso do direito havendo assim a necessidade de revogar a decisão recorrida, substituindo-a por outra que julgue a presente oposição ser julgada procedente, por provada e a excepção deduzida de nulidade de falta ou insuficiência de título executivo.

21.º Assim, se determinando a extinção da acção executiva quanto ao aqui executado ora recorrente.

A apelada não apresentou contra-alegações.

Colhidos os vistos, cumpre apreciar.

II. OBJECTO DO RECURSO

A. Sendo o objecto do recurso definido pelas conclusões das alegações, impõe-se conhecer das questões colocadas pelos recorrentes e as que forem de conhecimento oficioso, sem prejuízo daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras, importando destacar, todavia, que o tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito.

B. Considerando, deste modo, a delimitação que decorre das conclusões formuladas pelos recorrentes, no caso dos autos cumprirá apreciar:

- Se a decisão recorrida enferma de nulidade;

- Se o exequente actuou com abuso de direito.

III - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.

III.1. Considerou o tribunal de primeira instância provados os seguintes factos:

A) Foram dadas à execução as livranças cujos originais se encontram juntos aos autos principais.

B) A livrança ...85 tem como local de emissão ..., data de emissão 17.09.2015, data de vencimento 20.10.2022, o valor de 50.106,28€ e no campo referente à assinatura do subscritor encontra-se o carimbo da sociedade A..., Lda., e assinatura do seu legal representante.

C) No verso da livrança, e a seguir às expressões “Bom para avalo ao subscritor” encontra-se a assinatura do ora embargante.

D) Subjacente a tal livrança está o contrato de abertura de crédito em conta-corrente (de utilização simples) celebrado em 31.08.2015 entre a A..., AA, EE e cônjuge FF e DD e a Banco 1..., SA, através do qual concedeu um crédito até ao montante de 40.000,00€, pelo período de 6 meses, prorrogado por períodos iguais e sucessivos.

E) A cláusula 14 do contrato, com a epígrafe “Capitalização de Juros”, prevê o seguinte:

“14. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS:

14.1. Em caso de incumprimento da obrigação de pagamento de juros remuneratórios, a Banco 1... terá a faculdade de, a todo o tempo, capitalizar os juros remuneratórios, desde que a capitalização abranja juros remuneratórios (vencidos e não pagos) correspondentes a período não inferior ao determinado pela lei em vigor no momento da capitalização, adicionando tais juros ao capital em dívida e passando aqueles a seguir todo o regime deste.

14.2. A capitalização de juros moratórios poderá ocorrer nos termos em cada momento autorizados pela lei.”

F) A cláusula 15 do contrato, denominada de “Incumprimento – Juros”, prevê o seguinte:

“15.1- Em caso de incumprimento da obrigação de pagamento de (i) capital, (ii) juros remuneratórios capitalizados, exceto na parte em que estes se tenham vencido sobre juros remuneratórios anteriormente capitalizados (que não vencem juros moratórios) e ou (iii) comissão pela recuperação de valores em dívida, na medida em que tiver acrescido ao capital, a Banco 1... poderá cobrar, dia a dia e por todo o período de duração do incumprimento, juros calculados à taxa estipulada nos termos da cláusula 8 (Taxa de Juro"), acrescida de uma sobretaxa até 3% ou outra que seja legalmente admitida.

15.2- Em caso de incumprimento da obrigação de pagamento de outras quantias, designadamente da comissão pela recuperação de valores em divida enquanto não for acrescida ao capital, outras comissões, despesas e encargos, a Banco 1... poderá cobrar, dia a dia e por todo o período de duração do incumprimento, juros calculados à taxa correspondente à taxa publicada na portaria aplicável nos termos do artigo 102.º do Código Comercial, acrescida da sobretaxa máxima permitida pelo artigo 1146.º do Código Civil”

G) A cláusula 16 do contrato, referente a “Despesas”, estipula que:

“16.1- Correrão por conta da CLIENTE e serão por ela pagas quaisquer despesas ou encargos, incluindo fiscais, relacionados com a celebração, segurança, execução e extinção deste contrato e respetivas garantias, e, bem assim, todas as despesas judiciais e extrajudiciais, incluindo honorários de advogados e de solicitadores, que a Banco 1... haja de fazer para garantia e cobrança do seu crédito.

16.2 – Se a CLIENTE não pagar atempadamente qualquer das mencionadas despesas, poderá a Banco 1... fazê-lo, se assim o entender, tendo, nesse caso, direito ao respetivo reembolso. No entanto, o direito ao reembolso de despesas fundadas namora da Cliente está limitado às despesas que, por conta desta, tenham sido suportadas pela Banco 1... perante terceiros, mediante apresentação da respetiva justificação documental.”

H) Na cláusula 20 do contrato, denominada de “Aval”, encontra-se previsto o seguinte:

Todas e quaisquer quantias que sejam ou venham a ser devidas à Banco 1... pela CLIENTE no âmbito do presente contrato, quer a título de capital, quer de juros, remuneratórios ou moratórios, comissões, despesas ou quaisquer outros encargos ficam garantidas pelo aval prestado na livrança prevista no n.º 23, caso a Banco 1... decida proceder ao seu preenchimento, de acordo com o pacto de preenchimento ali convencionado.”

I) A cláusula 23 do contrato, denominada de “Livrança em Branco”, prevê que:

“23.1- Para titular e assegurar o pagamento de todas as responsabilidades decorrentes do empréstimo, a CLIENTE e os AVALISTAS atrás identificados para o efeito entregam à Banco 1..., neste ato, uma livrança com montante e vencimento em branco, devidamente datada, subscrita pela primeira e avalizada pelos segundos, e autorizam desde já a Banco 1... a preencher a sobredita livrança, quando tal se mostre necessário, a juízo da própria Banco 1..., tendo em conta, nomeadamente, o seguinte:

a) A data de vencimento será fixada pela Banco 1... quando, em caso de incumprimento pela CLIENTE das obrigações assumidas, a Banco 1... decida preencher a livrança;

b) A importância da livrança corresponderá ao total das responsabilidades decorrentes do presente empréstimo, nomeadamente em capital, juros remuneratórios e moratórios, comissões, despesas e encargos fiscais, incluindo os da própria livrança,

c) A Banco 1... poderá inserir cláusula sem protesto" e definir o local de pagamento.

23.2-A livrança não constitui novação do crédito, pelo que se mantém as condições do empréstimo, incluindo as garantias.

23.3- No caso de cessão, parcial ou total, da posição contratual da Banco 1.../Banco 1... no presente contrato ou de cessão, parcial ou total, dos créditos para si emergentes do presente contrato, poderá a mesma entregar a livrança ao cessionário da posição contratual ou do crédito, podendo o mesmo preenche-la nos termos constantes da presente cláusula.

23.4 – Em anexo: LIVRANÇA EM BRANCO.

J) A livrança ...25 tem como local de emissão ..., data de emissão 27.09.2016, data de vencimento 20.10.2022, o valor de 31.678,93€ e no campo referente à assinatura do subscritor encontra-se o carimbo da sociedade A..., Lda., e assinatura do seu legal representante.

K) No verso da livrança, e a seguir à expressão “Bom para avalo” encontra-se a assinatura do ora embargante.

L) Subjacente a tal livrança está o contrato de abertura de crédito (linha de crédito PME Crescimento 2015) celebrado em 27.09.2016 entre a A..., AA, EE e cônjuge FF e DD, a Banco 1..., SA e C..., SA, através do qual concedeu um crédito no montante de 200.000,00€, pelo período de 72 meses, a contar da data da perfeição do contrato.

M) A cláusula 8.A do contrato, referente à taxa de juro contratual, estipula que:

“8A.1-O capital em divida vence juros a uma taxa variável correspondente à média aritmética simples das taxas EURIBOR a seis meses, apurada com referência ao mês imediatamente anterior ao do início de cada período de contagem de juros (média essa designada por indexante), arredondada para a milésima de ponto percentual mais próxima, segundo a convenção (i) quando a 4.ª casa decimal for igual ou superior a cinco, o arredondamento será feito por excesso ou, (ii) quando a 4." casa decimal for inferior a cinco, o arredondamento será feito por defeito, e acrescida de um "spread" de 2%, sendo o valor do indexante de -0,189%, donde resulta, para o primeiro período de contagem de juros, a taxa de juro anual nominal (TAN) de 1,811%.

8A.2- Para efeitos do disposto no número anterior, considera-se a taxa EURIBOR na base de cálculo atual / trezentos e sessenta dias divulgada pela REUTERS, página EURIBOR zero um.

8A.3- Caso a taxa EURIBOR não seja divulgada, aplicar-se-á em sua substituição, igualmente convertida para a base de trezentos e sessenta dias a taxa EUROLIBOR para o mesmo prazo ou, na falta de divulgação desta, a taxa resultante da média das taxas oferecidas no mercado monetário do EURO às onze horas de Bruxelas, para o mesmo prazo, por quatro bancos escolhidos pela Banco 1... de entre o painel de bancos contribuidores da EURIBOR.”

N)

A cláusula 8B., denominada de Taxa de Juro no Caso de Caducidade da Bonificação da Comissão de Garantia prevê que:

“Em caso de caducidade da bonificação da comissão de garantia, nos termos previstos no respetivo contrato e sem prejuízo da faculdade atribuída à Banco 1... na cláusula 20, n.º 1, alínea h), será aplicada para os períodos supervenientes a taxa de juro determinada nos termos atrás previstos na cláusula 8A.1, acrescida de um "spread" de 5,25% (cinco virgula vinte e cinco por cento).”

O) Na cláusula 12, referente a Comissões, encontra-se previsto o seguinte:

“As operações ao abrigo da presente Linha ficarão isentas de comissões e taxas habitualmente praticadas pela Banco 1..., bem como de outras similares praticadas pelo Sistema de Garantia Mútua, sem prejuízo de serem suportados pela CLIENTE todos os custos e encargos, associados à contratação do financiamento, designadamente os associados a avaliação de imóveis, registos e escrituras, impostos ou taxas, e outras despesas similares. A Banco 1... poderá cobrar, ainda, uma comissão de estruturação e montagem da operação de 0,25% flat, acrescida dos respetivos impostos.”

P) A cláusula 15 do contrato, com a designação de “Capitalização Juros” prevê que:

“15.1-Em caso de incumprimento da obrigação de pagamento de juros remuneratórios, a Banco 1... terá a faculdade de, a todo o tempo, capitalizar os juros remuneratórios, desde que a capitalização abranja juros remuneratórios (vencidos e não pagos) correspondentes a período não inferior ao determinado pela lei em vigor no momento da capitalização, adicionando tais juros ao capital em dívida e passando aqueles a seguir todo o regime deste.

15.2- A capitalização de juros moratórios poderá ocorrer nos termos em cada momento autorizados pela lei”.

Q) A cláusula 16, com o título “Despesas”, estipula que:

“16.1- Correrão por conta da CLIENTE e serão por ela pagas quaisquer despesas ou encargos, incluindo fiscais, relacionados com a celebração, segurança, execução e extinção deste contrato e respetivas garantias.

16.2- Qualquer uma das partes inadimplente é responsável por todas as despesas judiciais e extrajudiciais, incluindo honorários de advogados e de solicitadores, devidamente documentadas, que a contraparte haja de fazer para garantia e cobrança do seu crédito, caso a mesma venha a ter vencimento de causa.

16.3- Se a CLIENTE não pagar atempadamente qualquer das mencionadas despesas, poderá a Banco 1... fazê-lo, se assim o entender, tendo, nesse caso, direito ao respetivo reembolso. No entanto, o direito ao reembolso de despesas fundadas na mora da CLIENTE está limitado às despesas que, por conta desta, tenham sido suportadas pela Banco 1... perante terceiros, mediante apresentação da respetiva justificação documental”.

L) Por seu turno, a cláusula 17 do contrato, referente ao “incumprimento – Juros”:

“17.1-. Em caso de incumprimento da obrigação de pagamento de (i) capital, (ii) juros remuneratórios capitalizados, exceto na parte em que estes se tenham vencido sobre juros remuneratórios anteriormente capitalizados (que não vencem juros moratórios) e ou iii) comissão pela recuperação de valores em dívida, na medida em que tiver acrescido ao capital a Banco 1... poderá cobrar, dia a dia e por todo o período de duração do incumprimento, juros calculados à taxa estipulada nos termos da cláusula8.A ou 8.B (Taxa de Juro"), acrescida de uma sobretaxa até 3% ou outra que seja legalmente admitida.

17.2- Em caso de incumprimento da obrigação de pagamento de outras quantias, designadamente da comissão pela recuperação de valores em divida enquanto não for acrescida ao capital, outras comissões, despesas e encargos, a Banco 1... poderá cobrar, dia a dia e por todo o período de duração do incumprimento, juros calculados à taxa correspondente à taxa publicada na portaria aplicável nos termos do artigo 102.º do Código de Comercial, acrescida da sobretaxa máxima permitida pelo artigo 1146.º do Código Civil.”

Q) A cláusula 21.B, com o título de “Outras Garantias – Aval”, estipula que:

“Todas e quaisquer quantias que sejam ou venham a ser devidas à Banco 1... pela CLIENTE no âmbito do presente contrato, quer a título de capital, quer de juros, remuneratórios ou moratórios, comissões, despesas ou quaisquer outros encargos ficam garantidas pelo aval prestado na livrança prevista no n.º 24, caso a Banco 1... decida proceder ao seu preenchimento, de acordo com o pacto de preenchimento ali convencionado”.

R) A cláusula 24 do contrato, denominada de “Livrança em Branco”, prevê que:

“24.1- Para titular e assegurar o pagamento de todas as responsabilidades decorrentes do empréstimo, a CLIENTE e os AVALISTAS atrás identificados para o efeito entregam à Banco 1..., neste ato, uma livrança com montante e vencimento em branco, devidamente datada, subscrita pela primeira e avalizada pelos segundos, e autorizam desde já a Banco 1... a preencher a sobredita livrança, quando tal se mostre necessário, a juízo da própria Banco 1..., tendo em conta, nomeadamente, o seguinte:

a) A data de vencimento será fixada pela Banco 1... quando, em caso de incumprimento pela CLIENTE das obrigações assumidas, a Banco 1... decida preencher a livrança;

b) A importância da livrança corresponderá ao total das responsabilidades decorrentes do presente empréstimo, nomeadamente em capital, juros remuneratórios e moratórios, comissões, despesas e encargos fiscais, incluindo os da própria livrança,

c) A Banco 1... poderá inserir cláusula sem protesto" e definir o local de pagamento.

24.2-A livrança não constitui novação do crédito, pelo que se mantém as condições do empréstimo, incluindo as garantias.

24.3- No caso de cessão, parcial ou total, da posição contratual da Banco 1.../Banco 1... no presente contrato ou de cessão, parcial ou total, dos créditos para si emergentes do presente contrato, poderá a mesma entregar a livrança ao cessionário da posição contratual ou do crédito, podendo o mesmo preenche-la nos termos constantes da presente cláusula.

24.4 – Em anexo: LIVRANÇA EM BRANCO.”

S) A sociedade A..., Lda. subscritora das livranças dadas à execução, é uma sociedade comercial por quotas, com sede registada na Rua ..., ... - R/ch, Quinta ..., Lt. 12 ..., Mealhada, constituída por escritura pública e registada na Conservatória do Registo Comercial de Coimbra sob o n.º ...75.

T) Tendo por objecto social indústrias transformadoras, montagem, manutenção e reparação de máquinas e equipamentos elétricos, eletrónicos e industriais. Atividades de serralharia e mecânica geral e bem assim construção civil.

U) Tendo sido constituída pelos sócios AA, e BB, com um capital social inicial de 30.000,00€, representada por uma quota pertencente a cada sócio no valor nominal de 10.000,00 euros e 20.000,00€.

V) Presentemente a dita sociedade tem cinco sócios e um capital social de 50.000,00€, por força de cessão de quotas entretanto efetuada a favor do novo sócio CC e do aumento de capital subscrito pelos novos sócios DD e EE.

W) Sendo a sociedade representada por uma quota pertencente a cada sócio no valor nominal de 10.000,00 euros cada, conforme igualmente se vê da respetiva certidão permanente da empresa.

X) A gerência desde a constituição da sociedade era exercida pelo aqui oponente e pelos sócios identificados no artigo anterior.

Y) A gerência desde a constituição da sociedade era exercida pelo aqui oponente e pelos sócios identificados no artigo anterior.

Z) Por deliberação de 16 de abril de 2018, tomada em assembleia-geral da sociedade o embargante foi destituído da gerência.

AA) Destituição que veio a ser anulada por deliberação de 16 de abril de 2018, tomada em assembleia-geral da sociedade por sentença proferida na ação nº1826/18.4T8AVR do Juízo de Comércio de Aveiro - Juiz 1 e confirmada pelo douto Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 05 de março de 2020, transitado em julgado.

AB) Após o oponente ter sido destituído da gerência da sociedade em 16 de abril de 2018, os referidos sócios gerentes DD e EE, constituíram cada um deles e com as suas respetivas esposas, uma sociedade comercial por quotas.

AC) O sócio gerente DD constituiu a sociedade D... LDA e o sócio gerente EE constituiu a sociedade E... LDA..

AD) Ambas as sociedades D... LDA e E... LDA. – LDA têm o mesmo objecto e começaram a exercer a mesma atividade que a sociedade subscritora exercia.

AE) Em consequência da dita ação nº 1826/18.4T8AVR, o embargante tentou assumir o cargo de gerente da sociedade subscritora, após 14 de outubro de 2020.

AF) Em 20.10.2020, a exequente respondia por e-mail ao embargante, ao pedido de ativação de acesso à conta A..., Lda., nos seguintes termos:

“Bom dia Sr. AA

Confirma-se pela certidão comercial atualizada que enviou hoje, que o Sr. AA já foi nomeado Gerente da sociedade.

Agora, precisa de ir à agência alterar a ficha de assinaturas e todos os seu dados pessoais, fazendo-se acompanhar pelo original do cartão de cidadão, levar um comprovativo de morada.

Esta alteração tem de ser presencial.

Só depois desta alteração feita na ficha de assinaturas é que pode ser alterado o contrato de Banco 1... direta.

Tratam-se de formalismos absolutamente necessários e exigidos pela regulamentação do BP

Assim, agradecemos que nos informe depois de ter ido à Agência efetuar esta alteração.”

AG) Por e-mail datado de 30.10.2020 enviado por GG - B... da exequente, foi o embargante informado do seguinte:

“No seguimento do contato telefónico mantido a 29-Out, informo das seguintes situações:

1- Os dois impressos que entregou para atualização da conta à ordem da sociedade, em função da sua recente observância [14-Out-2020; Insc 1-AV.3 como gerente da sociedade (certidão comercial em anexo) não estão totalmente em conformidade, carecendo de correções e preenchimento de alguns campos vazios. Todavia, estou em crer que essa situação é facilmente ultrapassável com a sua colaboração, e no início/meados da prox semana contaremos ter essa situação sanada.

2- No entanto, para ser possível proceder a atualização de intervenientes na conta à ordem da empresa conforme nos está a ser solicitado, é indispensável também atualizar dados de outros sócios e alguns simultaneamente gerentes da sociedade (beneficiários efetivos), tal como referi ontem telefonicamente. Sem que isso esteja efetuado, não é possível, em conformidade com a Regulamentação do Banco de Portugal e legislação em vigor, proceder à alteração dos acessos a conta à ordem, relembrando que a empresa mantém outros dois sócios gerentes.

3- Relativamente aos financiamentos Banco 1... contraídos pela empresa em que o Sr AA se constituiu com garante solidário do cumprimento das responsabilidades, a posição é a seguinte, e não registam incumprimento a esta data:

N° Operação             Produto                   Saldo de Capital

...92                          Conta Corrente         45.798,28

...91                         MLP Capitalizar       91.666,68

4- Por último, aproveito para reiterar, como desde o seu primeiro contato de 14-Out-2020 referi, que a Banco 1... não está disponível - nem com o Sr AA, nem com qualquer outro gerente da empresa ou garante do crédito – para participar numa escalada de conflituosidade que em nada auxiliará ao desenlace da situação existente. Assim, será de prevalecer o bom senso e comportamentos adequados (como até aqui da sua parte tem existido para com a Banco 1...), de modo a serem tratadas as responsabilidades existentes de forma serena e normal, que é o que se deseja.

Caso tal não aconteça, seremos forçados a atuar em conformidade, situação que desejamos que não ocorra, pois será prejudicial para todos.

Caso não existam desenvolvimentos antes, na tarde de 3-Novembro entrarei em contato para efetuar um ponto de situação da evolução da situação."

AH) Por deliberação de 10 de dezembro de 2020, tomada em assembleia-geral da sociedade subscritora, o embargante foi destituído da gerência da sociedade.

AI) Em 22.01.2021, o embargante recebeu comunicação da exequente com o seguinte teor:

“Assunto: Conta de depósitos à ordem de Empresa-

N/ Referência: ...947

S/ Referência: Livro de Reclamações Folha N° ...33, Agência ...:

RCO/2020/...94

Estimado Cliente,

Voltamos ao seu contacto na sequência dos contactos efetuados com a Banco 1..., através do Livro de Reclamações e Banco de Portugal, a propósito do tema em Assunto para informar que, não obstante poder vir a existir necessidade de a situação voltar a ser, apreciada juridicamente, por ora, tendo cessado funções, por destituição, pela deliberação do coletivo de sócios em 10-Dez-2020, não existem, atualmente, atualizações a promover na ficha de assinaturas, uma vez não dispor de legitimidade para representar a sociedade com todas as consequências dai decorrentes.

Sem mais de momento, apresentamos os melhores cumprimentos,

Direção de Organização e Qualidade”

AJ) O ora embargante responde a esta carta, nos seguintes termos:

“Reg. c/ AR

Mealhada, 03-02-2021

Assunto: Conta de deposito à ordem de Empresa (A... LDA)

V/referência: ……………947

Exmos senhores.

Em resposta a vossa última comunicação datada a 22-01-2021, e na sequência de falta resolução a minha reclamação, ou seja, ao pedido de acesso e envio do extrato bancário da conta da sociedade A... LDA.

As consequências dai decorrentes têm de ser apreciadas posteriormente.

À data do exercício dos direitos ilegitimamente limitados por Vossas. Exas., sem razão atendível, tinha legitimidade.

Presentemente a deliberação que determinou a cessação de funções da gerência da sociedade encontra-se impugnada judicialmente aguardando-se o seu desenvolvimento.

A informação pretendida que de novo se reclama deve ser prestada não só por força do exercício da gerência na data, mas também enquanto sócio e daí ter legitimidade.

Assim sendo, agradeço e solicito novamente, como foi desde 16-10-2020 o envio detalhado e mensal do extrato da conta bancaria da sociedade, daí que se deva considerar ter legitimidade para o pedido solicitado.

Com os melhores cumprimentos.”

AK) Em 23.07.2021, o embargante enviou e-mail ao Dr. HH, do B... da exequente, com o seguinte teor:

“(…)

Relativamente ao assunto exposto anteriormente e como avalista nas operações da sociedade A... LDA ..., do qual ainda sou sócio, questiono e tão quanto possível forneça Informação à situação atual relativamente aos financiamentos (n° ...92 e nº ...91) contraídos pela empresa à Banco 1..., ou seja, se existe à data incumprimento das responsabilidades pela empresa ou algum acordo associado.

Como transmitido anteriormente existe uma posição oficial minha junto da sociedade na compra do imóvel e consequente liquidação dos empréstimos junto de entidades bancárias, imóvel este bem da sociedade do qual a gerência não quer resolver.

(…)”

AL) Em 27.07.2021, a exequente respondeu ao embargante, por e-mail enviado por II, nos seguintes termos:

“(…)

Por ausência do colega HH, estamos a informar que a sociedade em assunto relativamente aos financiamentos que refere não regista crédito vencido nesta data.

Relativamente à outra questão que coloca, será analisada após o regresso do Gestor da conta desta empresa ocorrerá na próxima semana.

(…)”

AM) Em 19.08.2021, JJ, do B... da exequente, respondeu por e-mail ao embargante, dizendo o seguinte:

“(…)

Conforme solicitado informo infra os valores em divida nas operações onde intervém como avalista, sendo as mesmas tituladas pela empresa A... Lda:

- Conta Corrente n.º ...92 à data de hoje apresenta um saldo devedor em capital de €47.330,45;

- Linha PME Crescimento n. ...91 à data de hoje apresenta um saldo devedor em capital de €93.596,32.

(…).”

AN) Em 19.01.2022, a exequente enviou carta ao embargante com o seguinte teor:

“ASSUNTO: SITUAÇÃO DE INCUMPRIMENTO

Exmo. Senhor,

Na qualidade de Avalista e principal pagador dos créditos listados em assunto e referente à empresa A... LDA, Informamos V. Exa. de que a Banco 1... decidiu recorrer à via judicial para cobrança do mesmo, face ao incumprimento que regista e insucesso da via negocial.

A ação executiva será intentada não só contra a empresa referida, mas também contra V. Exa, a menos que, no prazo de 8 dias, proceda à regularização ou ao(s) pagamento(s) em dívida, ficando assim devidamente interpelado, para esse efeito.

Com os melhores cumprimentos”.

AO) Em 03.11.2022, a exequente enviou carta ao embargante, dizendo o seguinte:

“(…)

Assunto: Denúncia do Contrato de Abertura de Crédito em Conta Corrente (Utilização simples)

Operação n.°  ...92

Exmo. Senhor,

Para conhecimento de V. Exa. na qualidade de avalista da operação em referência, juntamos cópia da correspondência que hoje dirigimos à devedora.

(…).”

AP) A carta enviada à sociedade subscritora das livranças tinha o seguinte teor:

“(…)

Assunto: Denúncia do Contrato de Abertura de Crédito em Conta Corrente (Utilização simples)

Operação n.°  ...92

Exmos Senhores

Relativamente ao Contrato de Abertura de Crédito em forma de conta corrente de utilização simples - operação nº  ...92 - considerado perfeito em 17 de setembro de 2015, vem a Banco 1... comunicar a V Exa que, de acordo com o previsto no n° 6.2 da cláusula 6 do Contrato referido em assunto, o mesmo não será renovado no final do prazo em curso.

Neste sentido solicitamos que a Conta Depósitos à Ordem nº ...30 seja devidamente provisionada de forma a que na data de vencimento da operação (17 de março de 2022) seja possível proceder à sua liquidação.

(…).”

AQ) Em 20.04.2022, a exequente enviou carta ao embargante, dizendo o seguinte:

“(…)

Assunto: Denúncia de contrato de Abertura de Crédito (Linha de Crédito P Crescimento 2015) n.°  ...91

Para conhecimento de V. Exa. na qualidade de avalista da operação em referência, juntam cópia da correspondência que hoje dirigimos à devedora.

Em conformidade com a mesma, solicitamos a V. Exa. a imediata regularização da dívida atendendo aos inconvenientes que podem advir do recurso à via executiva, nomeadamente penhora de bens ou rendimentos de que V. Exa. seja titular.

(…)”

AR) A carta enviada à sociedade subscritora das livranças tinha o seguinte teor:

“(…)

Assunto: Denúncia de contrato de Abertura de Crédito (Linha de Crédito PME Crescimento 2015) n.º  ...91

Ex.mos Senhores

Vimos nos termos de cláusula 20° (incumprimento/Exigibilidade Antecipada) do contrato acima referenciado, considerar antecipadamente vencida toda a dívida no montante de (a esta data) 94.036,52 euros, e exigir o seu imediato pagamento.

Com os melhores cumprimentos,

(…).”

AS) Em 25.08.2022, o embargante enviou carta registada com aviso de receção à ora exequente, com o seguinte teor:

 “(…)

Em resposta a vossa comunicação datada de 29-07-2022 e na sequência de falta regularização dos pagamentos das operações  ...92 e  ...91 da sociedade comercial A... LDA. venho informar V.ª Exa.s que pessoalmente em nada contribui para o incumprimento da referida sociedade cuja responsabilidade se deve única e exclusivamente à atuação dos seus gerentes DD e EE, por má gestão e cessação da sua atividade comercial, que desde logo me opus e para salvaguardar a sociedade e seus credores, inclusivamente essa Banco 1....

Efetivamente, como tem conhecimento a Banco 1... por minhas comunicações anteriores, tendo os referidos gerentes promovido a minha destituição da gerência, a mesma veio a ser anulada judicialmente tendo aqueles durante a sua gerência, cessado da atividade comercial e destruído o património da sociedade. E tendo posteriormente voltado à gerência da sociedade em consequência daquela anulação de deliberação de destituição, e procurado informar-me e tomar conhecimento da situação financeira da dita sociedade junto da Banco 1..., esta e seus funcionários impediram-me injustificadamente no aceso à informação bancária da referida sociedade, não permitindo assim à data confrontar aqueles identificados gerentes com a real situação financeira que criaram e gerou o aludido que agora a Banco 1... invoca e abusivamente me vem reclamar. Como referi, tudo fiz e no que estava ao meu alcance, nomeadamente perante a Banco 1..., para evitar o incumprimento da dita sociedade.

E à data do exercício dos direitos ilegitimamente limitados pela Banco 1..., sem razão atendível, tinha legitimidade para atempadamente saber e no seio da sociedade procurar solucionar a situação no sentido de serem antecipadamente liquidadas as dividas.

Na altura, estando em funções na gerência da sociedade, tentei a resolução do assunto, tendo-me sido negada a informação pretendida pelo Sr. Dr. HH (B... COIMBRA), não só por força do exercício da gerência na data, mas também enquanto sócio e daí ter legitimidade.

E diga-se mesmo que desde a data de 16 de outubro de 2020 que a Banco 1... e negou a informação e o extrato da conta bancária da dita sociedade a que se reporta às identificadas operações bancárias, como toda a informação solicitada quer via correio eletrónico, presencial ou mesmo por carta registada.

Vir agora a Banco 1... reclamar o cumprimento de obrigações bancárias da sociedade da qual sou sócio e avalista e consecutivamente negado a informação relevante, considero pois que incorre em manifesto abuso de direito, o que não deixarei naturalmente de invocar em sede própria, tanto mais que, apesar de ter todas as minhas responsabilidades pessoais regularizadas com a Banco 1..., invocam ainda injustificadamente o seu vencimento imediato, o que carece manifestamente de qualquer suporte contratual pois nunca foi essa e a vontade e base negocial.

(…).”

IV. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO.

1. Nulidade do despacho saneador.

A 14.04.2023, antes de proferida a decisão objecto de recurso, foi proferido o seguinte despacho: “Uma vez que os presentes autos prosseguem apenas nos termos e para o disposto no artigo 595/1 alínea b) do Código de Processo Civil - conhecer imediatamente do mérito da causa - notifique as partes para, em 10 dias, ao abrigo dos princípios da adequação formal e da agilização processual previstos nos artigos 6/1 e 547 d) e f) do Código de Processo Civil, querendo, se pronunciarem quanto à dispensa da realização da audiência prévia e à consequente prolação do despacho saneador sentença por escrito, entendendo-se que nada têm a opor, caso nada digam no referido prazo.

As questões a decidir são as seguintes:

1 – Da nulidade do aval prestado por indeterminabilidade do mesmo;

2 – Do abuso de preenchimento das livranças dadas à execução;

3 – Do abuso de direito da exequente ao preencher as livranças exequendas;

4 – Da oponibilidade à exequente da defesa deduzida por impugnação.

Notifique”.

Em resposta, o embargante apresentou requerimento no qual refere que “o alegado nos artigos 54.º, 55.º, 66.º a 104.º da oposição, entre outros, carece da produção de prova já requerida, por a mesma se mostrar essencial à boa decisão de mérito.

Com todo o devido respeito, os autos não permitem ainda, por insuficiência de matéria fáctica, conhecer plenamente do mérito da causa e das questões a decidir, designadamente, no que respeita à oponibilidade à exequente da defesa deduzida por impugnação, não devendo consequentemente ser proferido já despacho saneador sentença”.

Tendo sido proferido o saneador-sentença objecto de impugnação recursiva, veio o embargante/apelante, em sede de alegações de recurso, alegar que o “Tribunal a quo não conheceu os factos que foram submetidos à sua apreciação, não tendo sido objecto de prova tudo o alegado nos artigos 54.º, 55.º, 66.º a 104.º da oposição, entre outros, que carece da produção de prova e que se mostra essencial à boa decisão de mérito, o que enferma o saneador-sentença de nulidade, o que se invoca com as devidas e legais consequências”.

Dispõe o artigo 591.º do Código de Processo Civil:

1 - Concluídas as diligências resultantes do preceituado no n.º 2 do artigo anterior, se a elas houver lugar, é convocada audiência prévia, a realizar num dos 30 dias subsequentes, destinada a algum ou alguns dos fins seguintes:

[...];

c) Discutir as posições das partes, com vista à delimitação dos termos do litígio, e suprir as insuficiências ou imprecisões na exposição da matéria de facto que ainda subsistam ou se tornem patentes na sequência do debate;

d) Proferir despacho saneador, nos termos do n.º 1 do artigo 595.º;

e) Determinar, após debate, a adequação formal, a simplificação ou a agilização processual, nos termos previstos no n.º 1 do artigo 6.º e no artigo 547.º;

[...];

2 - O despacho que marque a audiência prévia indica o seu objeto e finalidade, mas não constitui caso julgado sobre a possibilidade de apreciação imediata do mérito da causa.

[...]”.

Da Exposição de Motivos da Proposta de Lei n.º 113/XII pode extrair-se: “A audiência prévia é, por princípio, obrigatória, porquanto só não se realizará nas ações não contestadas que tenham prosseguido em regime de revelia inoperante e nas ações que devam findar no despacho saneador pela procedência de uma exceção dilatória, desde que esta tenha sido debatida nos articulados.

No que respeita aos seus fins, a audiência prévia tem como objeto: (i) a tentativa de conciliação das partes; (ii) o exercício de contraditório, sob o primado da oralidade, relativamente às matérias a decidir no despacho saneador que as partes não tenham tido a oportunidade de discutir nos articulados; (iii) o debate oral, destinado a suprir eventuais insuficiências ou imprecisões na factualidade alegada e que hajam passado o crivo do despacho pré-saneador; (iv) a prolação de despacho saneador, apreciando exceções dilatórias e conhecendo imediatamente, no todo ou em parte, do mérito da causa; (v) a prolação, após debate, de despacho destinado a identificar o objeto do litígio e a enunciar os temas da prova”.

Segundo o acórdão da Relação de Lisboa de 05.05.2015[1], “a convocação da audiência prévia para o fim previsto no art. 591º, nº 1, al. b) visa assegurar o respeito pelo princípio do contraditório, e, assim, evitar decisões-surpresa (art. 3º, nº 3), pelo que se nos afigura que o juiz só poderá dispensar, nestes casos, a audiência prévia, ao abrigo do disposto nos arts. 6º e 547º, se aquele conhecimento assentar em questão suficientemente debatida nos articulados”.

Como explica Lebre de Freitas[2], “quando se julgue habilitado a conhecer imediatamente do mérito da causa, mediante resposta, total ou parcial, ao pedido (ou pedidos) nela deduzido(s) (art. 595-1-b), o juiz deve convocar a audiência prévia para esse fim.

No CPC de 1961 posterior à revisão de 1995-1996, exceptuava-se o caso em que os fundamentos da decisão a proferir tivessem sido já discutidos pelas partes, não havendo insuficiências ou imprecisões na exposição da matéria de facto a corrigir e revestindo-se a apreciação da causa de manifesta simplicidade. No novo código esta excepção desaparece: o juiz não pode julgar de mérito no despacho saneador sem primeiro facultar a discussão, em audiência, às partes”.

Paulo Pimenta[3] explica desta forma a necessidade de ser convocada a audiência prévia: “Antes de mais, impede que as partes venham a ser confrontadas com uma decisão que, provavelmente, não esperariam fosse já proferida, isto é, evita-se uma decisão-surpresa (art.º 3º 3). Depois, são acautelados os casos em que a anunciada intenção de conhecimento imediato do mérito da causa derive de alguma precipitação do juiz, tanto mais que não é frequente a possibilidade de, sem a produção de prova, ser proferida já uma decisão final. Desse modo, a discussão entre as partes tanto poderá confirmar como infirmar a existência de condições para o tal conhecimento imediato do mérito (…).

Por outro lado, sabendo as partes que, no caso de o juiz pretender decidir o mérito da causa logo no despacho saneador, serão convocadas para uma discussão adequada, não terão de preocupar-se em utilizar os articulados para logo produzirem alegações completas sobre a vertente jurídica da questão. A solução consagrada permite, portanto, que os articulados mantenham a sua vocação essencial (exposição dos fundamentos da acção e da defesa), ao mesmo tempo que garante a discussão subsequente, se necessária, em diligência própria.”

O artigo 595.º, n.º 1 enumera os fins a que se destina o despacho saneador: a) conhecer das excepções dilatórias ou nulidades processuais que hajam sido suscitadas pelas partes, ou, que, face aos elementos constantes dos autos, deva apreciar oficiosamente; b) conhecer imediatamente do mérito da causa, sempre que o estado do processo permitir, sem necessidade de mais provas, a apreciação total ou parcial, do ou dos pedidos deduzidos ou de alguma excepção peremptória.

No caso dos autos, informadas as partes de que os autos prosseguem apenas nos termos e para o disposto no artigo 595/1 alínea b) do Código de Processo Civil - conhecer imediatamente do mérito da causa -, isto é, de que o processo continha já os elementos necessários para que, sem mais diligências instrutórias, pudesse ser conhecido o mérito da causa no despacho saneador, e esclarecidas expressamente sobre as questões que, debatidas nos articulados, importava a serem nele apreciadas, foram as mesmas notificadas para se pronunciarem quanto à dispensa da realização da audiência prévia e à consequente prolação do despacho saneador sentença por escrito, entendendo-se que nada têm a opor, caso nada digam no referido prazo.

Nenhuma delas se opôs à dispensa da audiência prévia, invocando apenas o embargado ser prematuro o conhecimento do mérito da causa no despacho saneador por existirem factos, nomeadamente, os alegados nos artigos 54.º, 55.º, 66.º a 104.º da oposição, a carecerem de produção de prova.

Em sede de recurso, o apelante retoma os mesmos argumentos anteriormente invocados na defesa da prematuridade do despacho saneador para conhecimento do mérito da causa, sustentando que a circunstância de não haver sido produzida prova sobre a indicada factualidade “...enferma o saneador-sentença de nulidade, o que se invoca com as devidas e legais consequências”.

Porque nenhuma nulidade processual é especificamente invocada, supõe-se que o recorrente queira referir-se ao vício de nulidade a que se refere o artigo 615.º do Código de Processo Civil.

Dispõe o n.º 1 do artigo 615.º do aludido diploma:

“ É nula a sentença quando:

a) Não contenha a assinatura do juiz;

b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;

c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;

d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;

e) O juiz condene em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido.

A nulidade da sentença - ou de despacho[4] - constitui vício intrínseco da decisão, desde que ocorra alguma das circunstâncias taxativamente previstas no artigo 615.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, que, pela sua gravidade, comprometem a sentença ou o despacho qua tale.

Como o n.º 1 do artigo 668.º do anterior diploma, também o n.º 1 do artigo 615.º do actual Código de Processo Civil contém uma enumeração taxativa das causas de nulidade da sentença[5], nelas não se inserindo o designado erro de julgamento, que apenas pode ser atacado por via de recurso, quando o mesmo for legalmente admissível[6].

Nenhuma das circunstâncias taxativamente fixadas no n.º 1 do artigo 615.º se configura, em concreto, não convocando, de resto, nenhuma delas o recorrente para fundamentar o vício que invoca.

No caso aqui em discussão, contendo os autos todos os elementos necessários para, sem necessidade de mais provas, se conhecer do mérito da causa, facultando a lei, nesta hipótese, que esse conhecimento tenha lugar no despacho saneador, e tendo sido rigorosamente acatadas todas as exigências legais, tendo, designadamente, o exercício do contraditório sido assegurado, o conhecimento do mérito da causa na referida fase processual não comprometeu minimamente o direito de defesa das partes, nem violou qualquer norma ou princípio constitucional, designadamente o artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa ou os princípios de acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva.

Refira-se, finalmente, que à matéria mencionada pelo recorrente, a carecer de ulterior actividade probatória, nenhuma relevância deve ser atribuída para efeitos da solução do litígio, pelo que não se justifica o uso do mecanismo facultado a esta instância de recurso pelo artigo 662.º, n.º 2, c) do Código de Processo Civil.

2. Do invocado abuso de direito.

O embargante foi judicialmente acionado pelo facto de ter dado aval às livranças exequendas.
O aval, traduzindo-se num negócio jurídico unilateral através do qual o avalista assume a obrigação de garantir o pagamento do respectivo título cambiário (letra ou livrança)[7], emerge uma obrigação de garantia, que se distingue da obrigação principal (resultante do aceite), mas que se associa à obrigação do avalizado.
Ou seja, o avalista "cauciona (…) o pagamento da letra, inserindo-se a sua obrigação de garantia na constelação que singulariza o lado passivo da relação jurídica cambiária"[8].
Como decorre do disposto no artigo 30.º da Lei Uniforme Relativa às Letras e Livranças, o pagamento de uma letra [e bem assim de uma livrança, por força do disposto no artigo 77.º do mesmo diploma legal] pode ser no todo ou em parte garantido por aval, acrescentando o artigo 32.º que o dador de aval é responsável da mesma maneira que a pessoa por ele afiançada, sendo que a sua obrigação se mantém, mesmo no caso de a obrigação que ele garantiu ser nula por qualquer razão que não seja um vício de forma.
Adverte Pinto Furtado[9] que “a expressão "responsável da mesma maneira que a pessoa afiançada” tem de ser entendida em termos hábeis. O subscritor avalizado, que esteja em relação imediata com o portador poderá opor-lhe todos os meios de defesa que se baseiem na relação fundamental, ao passo que o avalista, apesar de obrigado "da mesma maneira" da pessoa avalizada, não poderá invocar esses meios, porque não é sujeito de tal relação e não estará, assim, em relação imediata com o portador, pelo só facto de ser avalista de um obrigado mediato do portador.”
Escreveu-se no Acórdão Uniformizador de Jurisprudência n.º 4/2013[10]: “Poder-se-á [...] definir o aval como o negócio cambiário típico, por força do qual se oferece aos tomadores do título cambiário a garantia de uma pessoa, o avalista, formalmente dependente da de outro obrigado no título, o avalizado, mas configurada num plano substancial com carácter autónomo.
A garantia oferecida pelo avalista constitui-se ao mesmo tempo acessória e autónoma. Acessória porque se apoia, pelo menos formalmente, em outra obrigação cambiária, a do avalizado, autónoma porque é válida ainda que a obrigação garantida resulte nula por qualquer causa que não seja vício de forma e porque o avalista não poderá opor excepções pessoais ao beneficiário do aval.
[...]
Ao tratar-se de um acto cambiário a obrigação que nasce do aval é abstracta, isto é, prescinde da causa na sua relação circulatória. A qualificação da garantia pessoal fundamenta-se na adição (aglutinação) de um novo sujeito a uma ligação objectiva prévia e não ao nexo pessoal entre o avalista e o avalizado.
Efectivamente, o aval, qual garantia objectiva não se vincula com a pessoa nem com a obrigação avalizada, mas tão só porque, singelamente, é uma garantia de pagamento de uma obrigação que objectivamente emerge do título. De modo que a abstracção do aval é idêntica às demais obrigações cambiárias posto que esta dá vida justamente a uma relação cartular dessa qualidade, independente e diferente”.
E adianta o mesmo acórdão: “Como a lei requer que o aval esteja referido a uma obrigação formalmente existente tendem para que isso signifique uma acessoriedade formal que nada comunica, nos seus efeitos, à materialidade da obrigação que se torna cambiária e por fim independente. Trata-se, outrossim, de uma garantia objectiva para pagamento do título sem vinculação com a obrigação avalizada, excepto quanto à existência desta. Elimina-se, pois, o carácter subjectivo (este é a vinculação com a obrigação de uma determinada pessoa) do aval para se tornar objectivo (quer dizer uma obrigação abstracta, conforme a literalidade do documento).
Trata-se de uma garantia cambiária típica, dado que a obrigação do avalista se encontra desligada do avalizado; a obrigação deste torna-se abstracta e literal como direito autónomo para o portador do documento, se bem que existindo uma obrigação formal com o acto avalizado se considere como um nexo de posição, sem que se requeira uma substancial posição entre ambas as obrigações cambiárias. Em virtude disso, o avalista assume uma obrigação directa e pessoal, não com o do seu avalizado, e portanto responde, directa e pessoalmente, perante o credor cambiário, pelo pagamento do título e não pelo cumprimento deste. O avalista não assegura que o avalizado pagará, mas sim que o título será pago; não participa da obrigação de outros, mas, ao invés, fá-la própria (non alienae obligationi accedit sed alienam facit propriam); a designação da pessoa a favor a quem se presta o aval tem tão só a finalidade de fazer assumir ao avalista uma responsabilidade cambiária de igual grau que a do avalizado”.
A obrigação do avalista é, assim, uma obrigação autónoma, ainda que formalmente dependente da obrigação do avalizado, de tal modo que se mantém a primeira, mesmo que seja nula, por qualquer razão, a segunda, a menos que a nulidade decorra de vício de forma.
Por isso mesmo se tem entendido que o avalista, ao contrário do que acontece com o fiador (cfr. artigo 637.º n.º 1 do Código Civil) não pode defender-se com as excepções do avalizado, salvo as que importem a liberação ou extinção dessa obrigação.

Como resulta demonstrado, o Banco exequente é portador de duas livranças, as quais, no campo referente à assinatura do subscritor, têm aposto o carimbo da sociedade A..., Lda., e a assinatura do seu legal representante, tendo, no verso das mesmas, a assinatura do embargante, a seguir à expressão “Bom para avalo”.

Alega o recorrente que a “sentença recorrida faz errada interpretação e aplicação do artigo art.º 334.º do Código Civil, violando o Tribunal a quo a lei substantiva por errada interpretação da norma aplicável, pois que se verificam factos consubstanciadores do abuso de direito que impõe a aplicação do artigo 334.º do Código Civil”.

Refere, para tanto haver informado o Banco exequente que havia sido ilicitamente afastado da sociedade subscritora das livranças, tendo actuado sempre com a diligência que lhe era exigível, acrescentando que “as livranças foram emitidas com a finalidade da prossecução do interesse da sociedade executada subscritora e os valores em divida não o foram no interesse da sociedade executada subscritora, pelo que, o preenchimento das livranças e execução das mesmas contra o aqui oponente, configura, quanto ao aqui opoente, um claro abuso do direito.

Adianta ainda o recorrente que “a exequente ao impedir o exercício dos direitos do aqui oponente enquanto gerente da sociedade subscritora, age e agiu em abuso de direito no que ao aqui oponente respeita, rompendo o princípio da confiança mútua bem sabendo que o aqui oponente foi gerente e foi ilicitamente destituído conforme decretado judicialmente, quando os demais gerentes intencionalmente encerraram a actividade da executada, motivando o incumprimento e responsabilidades junto da exequente”, referindo, por último que “a exequente sabia perfeitamente que o recorrente já não era gerente da sociedade devedora e mesmo assim preencheu as livranças e executou o aqui recorrente, que atempadamente informou a exequente que não tinha acesso às contas da empresa, que os sócios gerentes DD e EE estavam a delapidar o património da empresa, e que foi afastado da gerência, criando a expectativa legítima de que o direito não iria ser exercido”.

Segundo o artigo 334.º do Código Civil, “é ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito”.

Para Pires de Lima e Antunes Varela[11], o referido normativo adoptou a concepção objectiva de abuso de direito, não sendo necessária a consciência de se atingir, com o seu exercício, a boa fé, os bons costumes ou o fim social ou económico do direito conferido, bastando que se excedam esses limites.

O normativo em causa traduz, assim, a ideia de que não basta ser titular de um direito para, sem limites, o mesmo poder ser exercido. O exercício de qualquer direito está sujeito a limitações e restrições.

Para Cunha e Sá[12] o abuso de direito constitui um fenómeno revelador de que o direito subjectivo não pode ser abstractamente encarado em termos meramente conceitualistas, pois que em certa e determinada situação, experimentalmente concreta, podemos descobrir concordância com a estrutura formal de um dado direito subjectivo e, simultaneamente, discordância, desvio, oposição, ao próprio valor jurídico que daquele comportamento faz um direito subjectivo, concluindo que “neste encobrir, consciente ou inconscientemente, a violação do fundamento axiológico de certo direito com o preenchimento da estrutura formal do mesmo direito é que reside o cerne, a essência do abuso de direito”.

Defende, a propósito, Castanheira Neves[13], que o abuso de direito é um limite normativamente imanente ou interno dos direitos subjectivos, pelo que no comportamento abusivo são os próprios limites normativos-jurídicos do direito particular que são ultrapassados.

Assim, uma das restrições ao exercício de direitos subjectivos é justamente imposta pela necessidade de salvaguarda da boa fé da parte contrária, estando vedado o exercício do direito cujo titular exceda manifestamente os limites da boa fé.

Não basta, todavia, a existência de uma qualquer atitude ou conduta contraditória para que se recaia na figura do abuso de direito.

Para que este possa ocorrer exige-se que aquele contra quem é invocado tenha criado uma situação objectiva de confiança, isto é, que haja adoptado um comportamento que “objectivamente considerado, é de molde a despertar noutrem a convicção de que ele também no futuro se comportará coerentemente, de determinada maneira (…). Para que a conduta em causa se possa considerar causal em relação à criação da confiança, é preciso que ela directa ou indirectamente revele a intenção do agente de se considerar vinculado a determinada atitude no futuro”[14].

Exige-se ainda que, com base nessa situação de confiança, a contraparte tome “disposições ou organize planos de vida de que lhe surgirão dúvidas, se a sua confiança legítima vier a ser frustrada”[15].

Finalmente, exige-se também a boa fé de que quem confiou.

Como se afirma no Acórdão da Relação de Coimbra de 16.11.2004[16], o “instituto do abuso de direito surge como uma forma de adaptação do direito à evolução da vida, servindo como válvula de escape a situações que os limites apertados da lei não contemplam por forma considerada justa pela consciência social em determinado momento histórico e a jurisprudência tem exigido que o exercício do direito se apresente em termos clamorosamente ofensivos da justiça. Há que afrontar o problema em sede da tutela da confiança e do venire contra factum proprium, como uma das manifestações do abuso de direito.

Esta variante do abuso de direito equivale a dar o dito por não dito e radica numa conduta contraditória da mesma pessoa, ao pressupor duas atitudes antagónicas, sendo a primeira (factum proprium) contrariada pela segunda atitude, com manifesta violação dos deveres de lealdade e dos limites impostos pelo princípio da boa fé”.

Como princípio geral moderador dominante na globalidade do sistema jurídico, o referido instituto apresenta-se como verdadeira «válvula de segurança» vocacionada para impedir ou paralisar situações de grave injustiça que o próprio legislador preveniria se as tivesse previsto, de tal forma que se reveste, ele mesmo, de uma forma de antijuridicidade cujas consequências devem ser as mesmas de qualquer ato ilícito.

Quando tal sucede, isto é, quando o direito que se exerce não passa de uma aparência de direito, desligado da satisfação dos interesses de que é instrumento, e se traduz «na negação de interesses sensíveis de outrem», haverá que afastar as normas que formalmente concedem ou legitimam o poder exercido.[17]

Para Baptista Machado[18], a ideia que subjaz à proibição do “venire contra factum proprium” é a do “dolus praesens”, que radica nos seguinte pressupostos:

a) - deve verificar-se uma situação objectiva de confiança - o ponto de partida é uma conduta anterior de um sujeito jurídico que, objectivamente considerada, é de molde a despertar noutrem a convicção de que ele também no futuro se comportará, coerentemente, de determinada maneira;

b) - o conflito de interesses e a necessidade de tutela jurídica apenas surgem quando a contraparte, com base na situação de confiança criada, toma disposições ou organiza planos de vida de que lhe surgirão danos, se a sua confiança legítima vier a ser frustrada, sendo necessário que se verifique uma situação de causalidade entre o facto gerador da confiança e o investimento dessa contraparte e que este haja sido feito com base na dita confiança, importando que o dano não seja irreversível, ou seja, que a conduta violadora da fides não seja removível através de outro meio jurídico capaz de conduzir a uma solução satisfatória;

c) - que haja boa-fé da contraparte que confiou, o que equivale a dizer que a confiança de terceiro ou da contraparte só merecerá protecção jurídica quando esta esteja de boa fé e tenha agido com cuidado e precauções usuais no tráfico jurídico.

Para Menezes Cordeiro[19] são quatro os pressupostos de protecção da confiança ao abrigo da figura “venire contra factum proprium”:

“(...) 1°- Uma situação de confiança, traduzida na boa-fé própria da pessoa que acredite numa conduta alheia (no factum proprium);

2.° Uma justificação para essa confiança, ou seja, que essa confiança na estabilidade do factum proprium seja plausível e, portanto, sem desacerto dos deveres de indagação razoáveis;

 3.° Um investimento de confiança, traduzido no facto de ter havido por parte do confiante o desenvolvimento de uma actividade na base do, factum proprium, de tal modo que a destruição dessa actividade (pelo venire) e o regresso à situação anterior se traduzam numa injustiça clara;

4.° Uma imputação da confiança à pessoa atingida pela protecção dada ao confiante, ou seja, que essa confiança (no factum proprium) lhe seja de algum modo recondutível”.

Uma outra modalidade do abuso de direito, designada por supressio, funda-se também na confiança e na boa-fé.

Segundo Menezes Cordeiro[20], a supressio exige os seguintes requisitos: um não-exercício prolongado; uma situação de confiança, daí derivada; uma justificação para essa confiança; um investimento de confiança; a imputação da confiança ao não-exercente.

O que a distingue do venire contra factum proprium é a ausência de factum (conduta anterior), bastando o decurso de um período de tempo significativo susceptível de criar à contraparte a fundada expectativa de que o direito não mais será exercido.

É desnecessária a ocorrência de culpa por parte do titular do direito, bastando a situação objectiva criada a partir da sua inércia, geradora de justificada confiança da pessoa contra quem o direito se dirigia.

No entender da doutrina, a supressio (tal como outras modalidades do abuso de direito) constitui um remédio subsidiário para uma situação extraordinária e daí que sejam necessárias todas as cautelas na sua aplicação pelos tribunais.

Assim, o comportamento reiteradamente omissivo da parte que poderia exercer o direito, seguido, ao fim de largo tempo, de um acto comissivo com que a contraparte legitimamente já não contava, constitui abuso de direito na modalidade da supressio.

Mais do que sancionar a inércia do titular do direito, o objectivo da supressio é o de proteger a legítima confiança do terceiro que, ao fim de largo tempo, é surpreendido com uma demanda que já não esperava.

O tempo necessário para que a supressio possa operar depende muito das circunstâncias concretas que, combinadamente, contribuam para a formação desse estado de confiança[21]. Esse tempo deverá, no entanto, ser inferior ao prazo de prescrição ordinária, pois, de outro modo, esta perderia a sua utilidade e razão de ser, devendo, por outro lado, equivaler ao período necessário para convencer um homem comum, colocado na posição do real e perante as mesmas circunstâncias, de que não mais seria exercido o direito invocado.

No caso em apreço, como sobejamente dá conta a decisão recorrida, “Dos factos provados resulta que o embargante, por deliberação de 16 de abril de 2018, tomada em assembleia-geral foi destituído da gerência da sociedade subscritora das livranças, destituição essa que veio a ser anulada por sentença proferida na ação nº1826/18.4T8AVR do Juízo de Comércio de Aveiro - Juiz 1 e confirmada pelo douto Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 05 de março de 2020, transitado em julgado – factos Z) e AA).

Mais resulta provado que perante os pedidos de acesso à conta à ordem pelo embargante, a exequente respondeu nos termos constantes dos e-mails dos factos provados AF) e AG), em 20.10.2020 e em 30.10.2020.

Aliás, na comunicação da Banco 1... indicada em AG), foi-lhe dado a conhecer qual o saldo de capital de cada uma das operações subjacentes às livranças dadas à execução.

E quanto à reclamação que fez no livro de reclamações da exequente e junto do Banco de Portugal, a exequente respondeu em 22.01.2021, nos termos constantes em AI), já tendo em consideração a cessação de funções pela destituição operada pela deliberação da sociedade nesse sentido, tomada em 10.12.2020.

Na sequência de troca de comunicações entre o embargante e a exequente, quanto à situação financeira da sociedade subscritora das livranças, em 19.08.2021, foi-lhe dado conhecimento do seguinte:

- que a Conta Corrente n.º ...92, àquela data, apresentava um saldo devedor em capital de €47.330,45;

- e a Linha PME Crescimento n. ...91, àquela data, apresentava um saldo devedor em capital de €93.596,32.

E em 19.01.2022, a exequente deu conhecimento ao embargante da situação de incumprimento em que se encontrava a sociedade subscritora das livranças – vide factos provados AM e AN).

O embargante não alegou quais as diligências que encetou perante tais informações, para regularizar os saldos devedores junto da exequente e a situação de incumprimento que lhe foi reportada.

Nem se vê qual o nexo de causalidade entre a não regularização da situação de incumprimento e a alegada falta de informações por parte da exequente.

Dos factos provados resulta que a embargante foi informando o exequente da situação da sociedade, na medida do que lhe era possível, considerando a sua primeira destituição, a anulação da mesma e a necessidade, com a inerente demora, de atualização da ficha de assinatura. Mais informou dos saldos devedores que a sociedade apresentava e da situação de incumprimento.

E não foram alegados pelo embargante quaisquer factos concretos de onde resulte a impossibilidade de regularizar o incumprimento e os saldos devedores que a sociedade apresentava perante a exequente, designadamente, qual o plano ou planos que tinha para resolver a situação e em que medida não puderam ser executados por falta de informação relevante a prestar pela exequente.

Aliás, em momento algum o embargante alega qual a informação concreta que necessitava, e que não foi prestada, que tenha impedido a regularização da situação.

Quanto aos valores em dívida não resultarem do exercício, pelo embargante, das funções de gerente, mas da gestão danosa dos demais executados e sócios gerentes da sociedade subscritora da livrança, tal não justifica qualquer abuso de direito por parte da exequente em preencher as livranças e dá-las à execução.

Com efeito, e não obstante as destituições de que o embargante foi alvo, não só não alegou,  como tudo o que é por si alegado em sede de embargos de executado, demonstra que nunca teve qualquer intenção de se desvincular da sociedade, tanto assim sendo que intentou as ações declarativas supra referenciadas, como não deduziu qualquer pretensão, junto da exequente, de se desvincular do avales que prestou”.

Há que acrescentar, por último, que inexistem quaisquer factos que indiciem que a exequente actuou com abuso de direito na modalidade de supressio.

A ambas as livranças foi aposta a data de 20.10.2022, sendo que a identificada na alínea B) dos factos provados foi entregue em branco aquando da celebração do contrato referido no ponto C) – 31.08.2015, e a mencionada no ponto J) foi entregue, também em branco, aquando da celebração do contrato a que alude o ponto L), isto é, em 27.09.2016.

Conforme informação prestada, por email, pela exequente ao aqui embargante a 30.10.2020, nessa data não ocorria qualquer situação de incumprimento, conforme consta do ponto AG) dos factos provados, o qual a 27.07.2021 também ainda não existia – ponto AL) dos factos provados.

A 19.08.2021 existe registo de valores em dívida, disso informando a exequente o embargante – ponto AM).

Finalmente, a 19.01.2022 a exequente enviou ao embargante a carta cujo teor consta do ponto AN) dos factos provados, informando-a da situação de incumprimento das operações bancárias em que interveio como avalista, e do propósito de recorrer à via judicial para cobrança coerciva dos créditos, não só contra a empresa subscritora dos títulos, mas também contra o próprio embargante, caso no prazo de 8 dias não procedesse à regularização dos pagamentos em dívida, interpelando-o expressamente para o efeito.

Perante este quadro factual é sobejamente evidente a ausência de qualquer inércia ou conduta omissiva por parte da exequente, e, muito menos, que esta, pelo seu comportamento, haja gerado no embargante justificadas expectativas de que não iria exercer contra ele qualquer direito de que contra ele fosse titular.

É, pois, inquestionável a ausência, por parte do exequente/embargado, de qualquer situação de abuso de direito, seja em que modalidade for.

Improcede, consequentemente, o recurso, mantendo-se o decidido, que nenhum reparo merece.


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Síntese conclusiva:

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Pelo exposto, acordam os juízes desta Relação, julgando improcedente a apelação, em confirmar a decisão recorrida.

Custas – pelo apelante: artigo 527.º, n.º 1 do Código de Processo Civil.

Notifique.




Porto, 21.03.2024
Acórdão processado informaticamente e revisto pela 1.ª signatária.
Judite Pires
Francisca Mota Vieira
Ernesto Nascimento
___________________________
[1] Processo n.º 1386/13.2TBALQ.L1-“, www.dgsi.pt.
[2] ”A Acção Declarativa Comum à Luz do CPC de 2013, Coimbra Editora, 3ª ed., pág. 172.
[3] “Processo Civil Declarativo”, 2014, Almedina, págs.. 231, 232.
[4] Ex vi do n.º 3 do artigo 613.º do Código de Processo Civil.
[5] Cf. Alberto dos Reis, “Código de Processo Civil anotado”, vol. V, pág. 137.
[6] Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, “Manual de Processo Civil”, 2ª ed., pág. 686.
[7] Artigos 30º e 77º da LULL.
[8] Carolina Cunha, “Letras e Livranças, Paradigmas Actuais e Recompreensão de um Regime”, Almedina, 2012, págs. 106, 107.
[9] “Títulos de Crédito”, Almedina, págs. 152-3.
[10] Diário da República n.º 14, série I, de 21.01.2013.
[11] “Código Civil Anotado”, vol. I, 4ª ed., pág. 286.
[12] “Abuso de Direito”, pág. 456.
[13] “Questão de facto – Questão de direito”, nota 46, pág. 526.
[14] Baptista Machado, “Tutela da Confiança e Venire contra Factum Proprium”, RLJ, ano 118º, págs. 171, 172.
[15] Ibid.
[16] Processo nº 2463/04, www.dgsi.pt.
[17] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16.12.2010, proc. 1584/06.5TBPRD.P1.S1, in www.dgsi.pt, citando Coutinho de Abreu, Do Abuso de Direito, pág. 43.
[18] “Obra Dispersa”, I vol., págs. 415 e segs.
[19] Revista da Ordem dos Advogados, ano 58º, Julho de 1998, pág. 964.
[20] Litigância de Má-Fé, Abuso de Direito de Acção e Culpa In Agendo, página 58,
[21] Cfr. Baptista Machado, RLJ, Ano 118º, página 228.