REGULAÇÃO DO EXERCÍCIO DAS RESPONSABILIDADES PARENTAIS
PROCESSO DE JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA
ADMISSIBILIDADE DE RECURSO
RECURSO DE REVISTA
CRITÉRIOS DE CONVENIÊNCIA E OPORTUNIDADE
PROCESSO TUTELAR
INTERESSE SUPERIOR DA CRIANÇA
REGIME PROVISÓRIO
RESIDÊNCIAS ALTERNADAS
MATÉRIA DE FACTO
OPOSIÇÃO DE ACÓRDÃOS
PRESSUPOSTOS
IRRECORRIBILIDADE
RECLAMAÇÃO PARA A CONFERÊNCIA
Sumário


I. O processo tutelar comum, é um processo de jurisdição voluntária, nele se impondo como limite recursório o Tribunal da Relação, sem prejuízo de admissibilidade do recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, desde que estejam verificados os pressupostos gerais de recorribilidade da decisão do Tribunal da Relação e estejam em causa questões de legalidade estrita.
II. Como casos típicos de decisões tomadas de acordo com critérios de conveniência ou de oportunidade são apontadas aquelas em que sejam ou devam ser ponderadas as circunstâncias concretas da vida de um menor ou da vida dos seus progenitores para que seja tomada uma decisão relativamente à guarda, ao regime de visitas e à pensão de alimentos, pois que nesse aspecto não há regras de determinação legal vinculativa moldando-se a decisão a proferir sobre princípios de ampla disponibilidade.
III. Nessa senda, estando em causa apenas aferir se é do superior interesse do menor manter-se o regime provisório anteriormente fixado ou se a alteração a tal regime provisório, efectivada com a fixação de residência alternada salvaguarda os superiores interesses da criança, a revista não é admissível, pouco importando trazer à colação normas constitucionais, artigos da Convenção Europeia sobre o Exercício dos Direitos da Criança, ou outras, por não se estar a aferir da sua eventual violação.

Texto Integral

Acordam em Conferência no Supremo Tribunal de Justiça, Segunda Secção Cível


I – RELATÓRIO

Notificada da decisão do relator que não admitiu a revista, vem a Recorrente AA, ao abrigo do disposto no artigo 652º, nº3 do Código de Processo Civil, requerer que sobre a matéria recaia um acórdão.

Na sua alegação, após justificar a ora interposta reclamação para a conferência, alega, em suma que o acórdão recorrido:

- Viola “determinadas normas constitucionais, de artigos da Convenção Europeia sobre o Exercício dos Direitos da Criança, de normas específicas do Código Civil e do Código do Processo Civil e do Regime Geral do Processo Tutelar Cível.”

- “Viola o Dever de Fundamentação (artº 205º, nº1 da C. R. P., o artigo 154º e 988º do CPC e os artigos 12º, 27º, nº. 2, 28º, nº. 1 do RGPTC).”.

- Está em contradição com acórdãos da relação, que identifica (ut artº 629º, nº2, al. d) do CPC).

Não houve resposta.


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Foi esta a decisão do Exmº Sr. Conselheiro Relator:

« III. DA INADMISSIBILIDADE DA REVISTA

Não questionamos que, no que tange à legitimidade, alçada, sucumbência, se não vislumbre impedimento ao presente recurso de revista.

Porém, a revista não é admissível, atento o estatuído no artº 988º, nº2 do CPC, que reza:

“Das resoluções proferidas segundo critérios de conveniência ou oportunidade não é admissível recurso para o Supremo Tribunal de Justiça”.

Efectivamente, em causa está uma acção tutelar comum, na qual, por decisão de 06/07/2023, foi alterado o regime provisório, anteriormente estabelecido (em 12/12/2022), fixando o regime de residência alternada de 2 em 2 dias, com cada um dos progenitores.

Portanto, em suma, temos uma decisão relativa ao exercício das responsabilidades parentais relativas a menor.

O processo tutelar comum, como o destes autos – alteração do exercício das responsabilidades parentais – é um processo de jurisdição voluntária (ut artigo 12º do RGPTC) cujas regras gerais se encontram nos artigos 986º a 988º do CPC. E sendo-o, resulta daquele artº 988º, nº2 do CPC a imposição como limite recursório o Tribunal da Relação, sem prejuízo de admissibilidade do recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, desde que estejam verificados os pressupostos gerais de recorribilidade da decisão do Tribunal da Relação e estejam em causa questões de legalidade estrita.

Assim, portanto, o Supremo Tribunal de Justiça, enquanto tribunal vocacionado para salvaguardar a aplicação da lei, substantiva ou adjectiva - art.º 674º do Código de Processo Civil - está impedido de, nos recursos interpostos em processos de jurisdição voluntária, conhecer das medidas tomadas de acordo com critérios de conveniência e oportunidade – cit. art.º 988º n.º 2 do Código de Processo Civil. É que, “a escolha das soluções mais convenientes está intimamente ligada à apreciação da situação de facto em que os interessados se encontram; não tendo o Supremo Tribunal de Justiça o poder de controlar a decisão sobre tal situação (...) a lei restringiu a admissibilidade de recurso até à Relação”1.

Tal limitação do Supremo não implica, como dito, a total exclusão da intervenção do Supremo, mas confina-a à apreciação dos critérios normativos de estrita legalidade subjacentes à decisão, nomeadamente, quanto à apreciação dos pressupostos, processuais ou substantivos, do poder de escolher a medida a adoptar e do respeito do fim com que esse poder foi atribuído2.

Como casos típicos de decisões tomadas de acordo com critérios de conveniência ou de oportunidade são apontadas aquelas em que sejam ou devam ser ponderadas as circunstâncias concretas da vida de um menor ou da vida dos seus progenitores para que seja tomada uma decisão relativamente à guarda, ao regime de visitas e à pensão de alimentos, pois que nesse aspecto não há regras de determinação legal vinculativa moldando-se a decisão a proferir dobre princípios de ampla disponibilidade3.

Ou, como se diz no Ac. do STJ de 30.05.20194, “na esfera da tutela de jurisdição voluntária, em que se protegem interesses de raiz privada mas, além disso, com relevo social e alcance de interesse público, são, por isso, conferidos ao tribunal poderes amplos de investigação de factos e de provas (art.º 986.º, n.º 2, do CPC), bem como maior latitude na determinação da medida adequada ao caso (art.º 987.º do CPC), em derrogação das barreiras limitativas do ónus alegatório e da vinculação temática ao efeito jurídico especificamente formulado, estabelecidas no âmbito dos processos de natureza contenciosa nos termos dos artigos 5.º, n.º 1, 260.º (quanto ao pedido e causa de pedir) e 609.º, n.º 1, do CPC.

É, pois, tal predomínio de oficiosidade do juiz sobre a atividade dispositiva das partes, norteado por critérios de conveniência e oportunidade em função das especificidades de cada caso, sobrepondo-se aos critérios de legalidade estrita, que justifica a supressão de recurso para o tribunal de revista, vocacionado como está, essencialmente, para a sindicância da violação da lei substantiva ou processual, nos termos do artigo 674.º do CPC.”.

Como igualmente se dispõe no Acórdão do STJ de 04-07-20175, “Nos processos de jurisdição voluntária só é admissível recurso para o Supremo quando as resoluções proferidas, excedendo critérios de mera conveniência ou oportunidade, emirjam de critérios de estrita legalidade, nestes se baseando exclusivamente, não bastando, consequentemente que o acórdão impugnado tenha interpretado normas jurídicas.”.

Neste acórdão, foi entendido que não é admissível recurso para o STJ do acórdão da Relação que, proferido em processo de regulação de responsabilidades parentais relativamente a três menores, pese embora ter feito alusão a uma norma legal – no caso, o art. 1906.º do CC –, tomou a resolução adaptada ao caso concreto, “recorrendo-se, nas suas próprias palavras, à razoabilidade, bom senso, prudência e moderação.”.

Posição esta que, ao que sabemos, se tem consolidado na Jurisprudência do supremo Tribunal de Justiça, como se pode ver, v.g., nos Acs. de Acórdãos de 11.11.2021 (proc. nº 1629/15.8T8FIG-D.C1.S1), 18-02-2020 (proc. n.º 29241/16.7T8LSB-A.L1.S1), de 07-11-2019 (proc. n.º 1971/12.0TBCSC.L2.S1), de 03-10-2019 (proc. n.º 784/18.0T8FAF-B.G1.S1), de 27-06-2019 (proc. n.º 8003/15.4T8GMR-B.G1.S1), de 06-06-2019 (proc. n.º 2215/12.0TMLSB-B.L1.S1), de 30-05-2019 (proc. n.º 5189/17.7T8GMR.G1.S1), de 29-01-2019 (proc. n.º 4505/11.0TBPTM.E1.S2), de 31-01-2019 (proc. n.º 3064/17.4T8CSC-A.L1.S1), de 17-05-2018 (proc. n.º 1729/15.4T8BRR.L1.S1) e de 05-12-2017 (proc. n.º 1530/14.2TMPRT-A.P1.S2).


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Ora, no presente caso, não se está a aferir da eventual violação de determinadas normas constitucionais, de artigos da Convenção Europeia sobre o Exercício dos Direitos da Criança, de normas específicas do Código Civil ou do Regime Geral do Processo Tutelar Cível, etc..

O que está em causa é, sim e apenas, aferir se é do superior interesse do menor manter-se o regime provisório anteriormente fixado ou se a alteração a tal regime provisório, efectivada com a fixação de residência alternada – decisão com a qual a recorrente discorda, pretendendo, por via deste recurso, que seja ver revogada – salvaguarda os superiores interesses da criança.

O que implica a análise e ponderação da factualidade apurada.

Ora, foi precisamente com sustento na análise e ponderação dos factos assentes que foi proferida a decisão da primeira instância, corroborada pela Relação e de que a progenitora recorre.

Justifica a decisão recorrida que “a alteração da anterior medida provisória não foi arbitrária, antes fundou-se na superveniência de circunstâncias que vieram revelar a possibilidade de uma maior aproximação da criança ao pai e maior participação deste na vida do filho, o que vai de encontro aos superiores interesses da criança que devem presidir a qualquer regulação das responsabilidades parentais ou à sua alteração, ainda que de decisões provisórias se tratem.”.

Foram estes superiores interesses da criança que a Relação (secundando a 1ª instância) ponderou e tomou como determinantes para a prolação da decisão.

Interesses que também procurou não descurar na abordagem da questão da amamentação do menor, a que tanto se agarra a recorrente.

A propósito, escreve-se no acórdão recorrido:

”Entende a recorrente que a amamentação de uma criança até aos dois anos de idade é fundamental para o seu cabal desenvolvimento, invocando, que tal privação impedirá a possibilidade de uma criança poder viver num contexto de residência alternada na medida em que ela não poderá pernoitar na casa do pai (…). Porém, … não nos podemos abstrai do caso concreto e da necessidade de implementar um regime que favoreça o contacto mais próximo da criança com ambos os progenitores, demonstrando ambos capacidades para prover às necessidades do filho.

Por outro lado, não há um afastamento da criança da mãe, o que há é uma redução do tempo que a criança passa com a mãe, que é partilhado com o progenitor, e, por outro, está demonstrado que a criança já não necessita da amamentação como refeição, não estando dependente dela.

É certo que a criança, à data, tinha apenas 16 meses de idade, e que a amamentação representa um momento de maior ligação à mãe, mas tal benefício tem que ser temperado com os benefícios que se colhem com uma maior envolvência do pai na vida do filho, e não se nos afigura que o prolongar da amamentação, nestas circunstâncias, possa constituir entrave à criação de um vínculo de maior proximidade e afecto entre pai e filho.

E, no caso concreto, como resulta dos factos provados, estamos em presença de um pai presente, que revela grande proximidade com o filho e capacidade para lhe prestar, tal como a mãe, os cuidados de que este necessita.”.

Da mesma forma, não deixou a Relação de atender ao alegado clima de conflitualidade entre os progenitores como obstáculo à fixação da residência alternada, anotando que tal conflitualidade não deverá ser invocada como impedimento ao estabelecimento do regime de residência alternada, devendo, antes, o Tribunal adoptar as medidas necessárias à mediação dos conflitos, com vista à implementação da medida que julgue mais adequada à defesa do superior interesse da criança. Tendo concluído que “o regime de residência alternada da criança, com o pai e a mãe, poderá até contribuir para uma diminuição da conflitualidade parental, ao colocar os progenitores em pé de igualdade, estimulando o restabelecimento do diálogo, para bem da criança.”.

Portanto, parece evidente que, in casu, a decisão recorrida lavrou no domínio da oportunidade, sem se ater a critérios de legalidade estrita, sempre focada no que considerava melhor para o menor, nas circunstâncias concretas que os factos ostentam.

Foi nessa senda que reafirmou que “se deverá entender que a solução mais ajustada será aquela que, no caso concreto, melhores garantias dê de assegurar e valorizar o desenvolvimento físico e psíquico do menor, do seu bem-estar, a sua segurança e a formação da sua personalidade, sendo certo e sabido que o conteúdo das responsabilidades parentais se consubstancia no conjunto de poderes/deveres ou poderes funcionais atribuídos legalmente aos progenitores no interesse dos filhos e para a prossecução dos interesses pessoais e patrimoniais destes, com vista a assegurar convenientemente o seu desenvolvimento integral e harmonioso”.

Como referimos supra, está excluído do recurso para o Supremo, quer a valoração das provas, quer a apreciação dos critérios de conveniência ou oportunidade subjacentes ao decidido6.

Ou seja, o recurso para o Supremo é circunscrito à apreciação de matéria normativa, assente em critérios de legalidade estrita, não cabendo, como tal, ao Supremo sindicar o decidido quanto à matéria de facto pelas instâncias – incluindo a substância das presunções judiciais utilizadas pelo julgador, de modo a, em consonância com as regras e «máximas de experiência», extrair ilações razoáveis dos factos «atomisticamente» provados em audiência, articulando-os, nomeadamente, com as ocorrências e vicissitudes documentadas pelo processo e com a plausibilidade das situações da vida – ou com a avaliação prudencial, casuística e fundada em juízos de oportunidade, conveniência e equidade da matéria litigiosa.

A decisão recorrida não se “preocupou” em fazer uma subsunção normativa, antes procurou fazer uma análise psicológica, humana, fortemente subjectiva, da realidade factual que se lhe depara, de forma a aferir o que era melhor para a criança (continuar com a mãe, ou passar a viver, alternadamente, com ambos os progenitores?).


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Atento todo o explanado, não se almeja que a revista deva ser admitida, face ao estatuído no citado normativo do CPC (988º, nº2).

Neste sentido, também ABRANTES GERALDES, PAULO PIMENTA e LUÍS FILIPE de SOUSA7, ali dando, precisamente, como exemplo de inadmissibilidade da revista o caso em que o acórdão da Relação “fixe o regime da residência de menor, entre duas alternativas permitidas no quadro legal, ponderando qual a que melhor prossiga os interesses do menor, tendo em conta a sua situação concreta (STJ 23-4-15, 1986/11)”8, ou em que, “fazendo alusão ao artº 1906º e em processo de regulação de responsabilidades parentais, toma a resolução adaptada ao caso concreto, recorrendo à razoabilidade, bom senso, prudência e moderação (STJ 4-7-17, 996/16)”.

Das conclusões apresentadas pela Recorrente pode ver-se que o objecto do recurso não se centra exclusivamente num processo de interpretação e aplicação da lei. Bem pelo contrário, a Recorrente faz apelo à ponderação das circunstâncias concretas da vivência da criança (maxime a questão da sua amamentação) e da conduta dos seus progenitores para concluir pela inexistência de razões que justifiquem a alteração da decisão relativa à guarda da mãe e sua substituição pelo regime de residência alternada. Ou seja, põe em causa – portanto, discordando – a apreciação casuística da situação levada a cabo pela Relação. Estamos, pois, perante questões de valoração puramente factual e não de valoração jurídica (conclusão esta que, obviamente, não é afastada pelo facto de se chamar à colação normas jurídicas, nomeadamente de Convenções internacionais ou da Constituição da República Portuguesa).

A Recorrente não põe em causa, afinal, que o tribunal se tenha afastado da prossecução do superior interesse da criança, mas apenas que na prossecução desse fim fez uma errónea apreciação e concretização desse interesse.

Ora, desde que a decisão prolatada tenha por fim a prossecução do superior interesse da criança, o concreto conteúdo dessa mesma decisão situa-se já no campo da melhor satisfação e maior adequação a esse interesse, ou seja, da conveniência e oportunidade9.


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É claro que, atento o exposto, não apenas não há lugar a revista normal, como não há lugar a revista excepcional.

Com efeito, tratando-se – como é o caso (ut artº 671º, nº3 CPC) – de uma situação de dupla conforme e não tendo a decisão assentado em critérios de legalidade (antes em critérios de conveniência – saber qual é melhor modo de proteger o interesse da criança não é uma questão de legalidade), não há lugar a revista excepcional, pois esta só seria possível se o único impedimento da revista (normal) fosse, precisamente, a dupla conforme (que, como visto, não é, antes é a própria lei, em norma expressa, a não admitir, na concreta situação, o recurso ao Supremo Tribunal).

Assim, portanto, não sendo admissível revista normal, também o não é a revista excepcional.


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IV. DECISÃO

Termos em que não se toma conhecimento do recurso.»


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III. APRECIANDO

No acórdão recorrido estava sob apreciação aferir da manutenção, ou não, do regime da residência alternada fixado pela 1ª instância por despacho de 6 de Julho de 2023, pelo qual o menor passaria a estar dois dias com um progenitor e dois dias com outro, assim sucessivamente, dessa forma alterando a decisão de regime provisório das responsabilidades parentais que havia sido tomada na conferência de pais de 12/12/2022

A progenitora interpusera recurso de apelação por discordar do regime provisório assim implementado, que alterou o regime provisório anteriormente fixado, no qual se havia decidido que a criança residia com a mãe e o pai tinha-a consigo todos os sábados e todas as quartas feiras, indo buscá-lo pelas 09:30 horas e entregá-lo pelas 18:00 horas, em casa da mãe (cf. acta da conferência de pais de 12/12/2022).

No essencial, invocava a progenitora que não houve incumprimento do regime provisório anterior nem se verificou qualquer alteração das circunstâncias que sustentaram aquele regime, e que a residência alternada não deveria ser fixada porque põe em causa a possibilidade de a criança continuar a ser amamentada e viola os superiores interesses da criança.

Era isto, e apenas isto, que estava sob apreciação no recurso de apelação e que a Relação apreciou e decidiu, mantendo o decidido em 1ª instância.

Para proferir a sua decisão, a Relação analisou a situação factual de forma a ponderar devidamente qual seria o regime de responsabilidades parentais que melhor defendesse os superiores interesses da criança. Assim, a Relação abordou a suscitada (pela recorrente) questão da essencialidade, para o desenvolvimento da criança, da manutenção da sua amamentação, procurando justificar a aplicada residência alternada. Sobre isso, disse a Relação: “não podemos deixar de referir que não nos podemos abstrai do caso concreto e da necessidade de implementar um regime que favoreça o contacto mais próximo da criança com ambos os progenitores, demonstrando ambos capacidades para prover às necessidades do filho.

Por outro lado, não há um afastamento da criança da mãe, o que há é uma redução do tempo que a criança passa com a mãe, que é partilhado com o progenitor, e, por outro, está demonstrado que a criança já não necessita da amamentação como refeição, não estando dependente dela”. “E, no caso concreto, como resulta dos factos provados, estamos em presença de um pai presente, que revela grande proximidade com o filho e capacidade para lhe prestar, tal como a mãe, os cuidados de que este necessita.”.

No mais, invocava a recorrente o “clima de conflitualidade entre os progenitores como obstáculo à fixação da residência alternada”. Ao que a Relação respondeu que tal “tal conflitualidade não deverá ser invocada como impedimento ao estabelecimento do regime de residência alternada, devendo, antes, o Tribunal adoptar as medidas necessárias à mediação dos conflitos, com vista à implementação da medida que julgue mais adequada à defesa do superior interesse da criança.

Além disso, o regime de residência alternada da criança, com o pai e a mãe, poderá até contribuir para uma diminuição da conflitualidade parental, ao colocar os progenitores em pé de igualdade, estimulando o restabelecimento do diálogo, para bem da criança.”.

Em suma, a Relação teve em conta, na sua apreciação, os “superiores interesses da criança (…), pelo que se deverá entender que a solução mais ajustada será aquela que, no caso concreto, melhores garantias dê de assegurar e valorizar o desenvolvimento físico e psíquico do menor, do seu bem-estar, a sua segurança e a formação da sua personalidade”. E esclareceu que “o regime provisório agora implementado, de residência alternada de 2 em 2 dias, tem um horizonte temporal muito limitado, apontando a decisão para 2 meses, sem prejuízo de revisão em função da alteração das circunstâncias”.

E concluiu não ocorrer a violação dos princípios e normas invocados pela recorrente”, julgando, como tal, improcedente a apelação.

Era sobre a decisão assim configurada que este Supremo Tribunal de Justiça, em revista, se tinha de pronunciar. E são sobre outras questões (novas) que pudessem ser suscitadas.


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Entendeu-se na decisão singular do Relator que a decisão recorrida não era passível de revista, dado estarmos perante processo de jurisdição voluntária e que a questão que foi apreciada e decidida pela Relação – da necessidade/justificação de alteração do regime provisório existente de responsabilidades parentais, com subsequente estabelecimento provisório de residência alternada – , tinha a ver exclusivamente com critérios de oportunidade – visando aferir se tal residência alternada ia, in casu, de encontro ao superior interesse da criança – que não de legalidade. Donde não ter admitido a revista (ut artº 988º, nº2 do CPC).

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Vem, agora, em reclamação dessa decisão do Relator, a Recorrente invocar que Com o presente recurso, o que está em causa aferir é da eventual violação de determinadas normas constitucionais, de artigos da Convenção Europeia sobre o Exercício dos Direitos da Criança, de normas específicas do Código Civil e do Código do Processo Civil e do Regime Geral do Processo Tutelar Cível.”.

Assim, remata a reclamante que, como dito, o acórdão recorrido “Viola o Dever de Fundamentação” e “Viola o estatuído na Declaração Universal dos Direitos da Criança, Convenção Sobre os Direitos da Criança, os Princípios da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e Constituição da República Portuguesa” (para além de invocar a contradição, nos termos abaixo melhor abaixo).

Vejamos.

Diz a Recorrente que “não está em causa saber se a decisão que substituiu o regime vigente por um regime de residência alternada se encontra fundado num correto juízo. O que importa aferir é se com os elementos de factos constantes da sentença proferida pela Primeira Instância (e depois confirmada pela Segunda Instância), o Julgador podia, legalmente, alterar a decisão provisória por outra”. Assim, acrescenta que “com o presente recurso, pretende a Recorrente apreciar os critérios normativos de estrita legalidade subjacentes à decisão quanto a esta questão, nomeadamente quanto à apreciação dos pressupostos processuais, do poder de escolher a medida a adoptar e do respeito do fim com que esse poder foi atribuído”.

Com o devido respeito, não tem razão a reclamante.

Com efeito, como é referido na decisão singular do Relator, atento o teor do acórdão recorrido – e da decisão da primeira instância sobre a qual ele incidiu – , « no presente caso, não se está a aferir da eventual violação de determinadas normas constitucionais, de artigos da Convenção Europeia sobre o Exercício dos Direitos da Criança, de normas específicas do Código Civil ou do Regime Geral do Processo Tutelar Cível, etc.. O que está em causa é, sim e apenas, aferir se é do superior interesse do menor manter-se o regime provisório anteriormente fixado ou se a alteração a tal regime provisório, efectivada com a fixação de residência alternada – decisão com a qual a recorrente discorda pretendendo, por via deste recurso, que seja ver revogada – salvaguarda os superiores interesses da criança.

O que implica a análise e ponderação da factualidade apurada.».

E, como ali se esclareceu, saber se é do superior interesse do menor manter-se o regime provisório anteriormente fixado ou se a alteração a tal regime provisório, efectivada com a fixação de residência alternada, salvaguarda os superiores interesses da criança, tem a ver com juízo de oportunidade, o que foi levado a cabo pela decisão recorrida na ponderação dos factos assentes, tendo em conta que o tribunal tem neste tipo de processos (jurisdição voluntária) uma grande margem de actuação, sem vinculação ou amarra a normas estritas, antes procurando emitir um juízo, um tanto subjectivo é certo (que não, obviamente, arbitrário) mas sempre no fito de saber o que no concreto é melhor para o menor.

Sustenta a Recorrente que não podia ter lugar a decisão judicial de substituição da medida provisória anteriormente fixada por outra, uma vez que não se apuraram nem constam da sentença “factos dos quais decorra a necessidade de alteração da decisão provisória vigente”.

Parece, porém, olvidar a Recorrente/Reclamante que: primeiro, sendo a decisão em causa meramente provisória, podia ser alterada a qualquer momento, desde que assim o entendesse o tribunal – justificando-o, obviamente. E mesmo que não fosse provisória, precisamente pela natureza do processo em causa, igualmente em qualquer momento podia o tribunal, com audição do Ministério Público, alterar a decisão, ajustando-a à situação actual da criança, precisamente, e sempre, no fito de melhor assegurar o que interessava à criança. Daí que a alegada ausência de factos “novos” que justificassem a alteração da decisão provisória, acaba por ser uma “falsa” questão, pois o tribunal pode sempre alterar a sua decisão, na reponderação dos mesmos factos apurados até então, desde que considere que nesse momento a melhor solução passa por alterar o anteriormente decidido.

Segundo, mesmo que assim se não entendesse, sempre se lembra à reclamante que a prolação da decisão provisória em causa também teve em consideração factos novos, como se dá conta noa cordão recorrido.

Escreveu-se ali:

«Efectivamente, entre a 1ª decisão provisória, tomada na conferência de pais de 12/12/2022, e a agora recorrida, de 06/07/2023, decorreram cerca de 7 meses, em que o menor, residindo com a mãe esteve com o pai 2 vezes por semana.

Conforme se apurou (cf. pontos 6 a 8 e 10 a 15 doa factos provados) : - O BB tem estado com o pai às quartas e sábados em conformidade com o regime provisório definido em 12 de Dezembro de 2022; - Essas transições ocorrem de modo pacifico e o BB não revela resistência nas entregas ao pai; - O BB é entregue em casa da mãe pelo pai de modo cuidado e com as necessidades básicas satisfeitas; - O BB não manifesta resistência em interagir com a avó paterna; - O BB é amamentado pela manhã e à noite por procurar a mama, e não como refeição; - O BB tem uma alimentação variada, não comendo neste momento somente marisco e morangos, por aconselhamento do médico pediatra; - O pai deslocou-se à creche para ver o BB com uma frequência de pelo menos duas vezes por semana, aí se cruzando por vezes com a requerida; - O pai telefona para o infantário pelo menos duas vezes por semana para saber como está o BB; e - O pai remete à mãe diversas mensagens quanto a orientações nos cuidados a prestar ao BB.

Tais factos, como bem refere o Ministério Público, são novos, em relação ao momento em que foi proferida a primeira decisão provisória, tendo sido revelados com a execução deste regime, e representam, por um lado, uma nova fase do relacionamento entre a criança e o pai e, por outro, evidenciam que a criança não precisa da amamentação como refeição, o que dificultava a implementação de um regime provisório que demandasse uma maior permanência com o progenitor (embora se saiba que existem formas de preservação do leite materno).

Por conseguinte, a alteração da anterior medida provisória não foi arbitrária, antes fundou-se na superveniência de circunstâncias que vieram revelar a possibilidade de uma maior aproximação da criança ao pai e maior participação deste na vida do filho, o que vai de encontro aos superiores interesses da criança que devem presidir a qualquer regulação das responsabilidades parentais ou à sua alteração, ainda que de decisões provisórias se tratem.».

Também se não vislumbra onde está a alegada omissão de pronúncia relativa à questão sobre se o Julgador, face aos factos indiciariamente provados, (…) tem legitimidade para impor às progenitoras que demonstram disponibilidade e vontade de amamentar os seus filhos, o desmame e se uma decisão desses não padece de inconstitucionalidade”.

A questão em causa na apelação consistia, como dito, em saber se se justificava alterar a decisão de regime provisório das responsabilidades parentais, fixando o regime de residência alternada.

E sobre ela se pronunciou a Relação, justificando devidamente a decisão.

Ou seja, não almejamos na decisão recorrida a invocada nulidade de omissão de pronúncia (nº. 1, al. d) do artigo 615º do CPC) – ou seja, que a Relação tenha omitido a apreciação de “questões sobre as quais se lhe impunha o dever de se pronunciar”, não se vislumbrando a pretensa “violação de normas constitucionais, maxime o artigo 20º da Constituição da República Portuguesa” – o que, a bem dizer, a Recorrente não explicita.


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Finalmente, invoca a Reclamante a contradição de acórdãos como fundamento da admissibilidade da revista.

Sem razão, porém.

Primeiro, como dito na decisão singular, a revista não é admissível, atento o estatuído no artº 988º, nº2 do CPC, que reza:

“Das resoluções proferidas segundo critérios de conveniência ou oportunidade não é admissível recurso para o Supremo Tribunal de Justiça”.

Veja-se que ao contrário do que ocorre, v.g., nas decisões proferidas em procedimentos cautelares, onde o artº 370º nº2 do CPC ressalva os “casos em que o recurso é sempre admissível” (ou seja, precisamente, as hipóteses ínsitas no artº 629º/2 do CPC), no citado artº 988º/2 CPC não se faz qualquer ressalva.

Segundo, nunca se verificaria a pretensa contradição de acórdãos.

Primeiro – e servindo-nos do desenvolvimento do Ac.S.T.J. 7/6/2018, pº 2877/11.5TBPDL-D.L2.S1 (Rosa Tching) – , a jurisprudência deste Supremo Tribunal vem afirmando que importa que a invocada oposição de acórdãos seja frontal e não apenas implícita ou pressuposta10

Segundo, não basta, para o efeito, uma qualquer contradição relativamente a questões laterais ou secundárias. A questão de direito deve apresentar-se com natureza essencial para o resultado que foi alcançado em ambas as decisões, sendo irrelevante a que respeitar apenas a alguns argumentos sem valor decisivo ou obiter dicta.

E essa oposição (na expressão do Ac. STJ 17/02/2009, pº 08A3761 - Salazar Casanova), “só é relevante quando se inscreva no plano das próprias decisões em confronto e não apenas entre uma decisão e a fundamentação de outra, ainda que as respetivas fundamentações sejam pertinentes para ajuizar sobre o alcance do julgado”.

Terceiro, que tal oposição incida sobre a mesma questão de direito fundamental, o que pressupõe que as decisões em confronto tenham subjacente um núcleo factual idêntico ou coincidente, na perspectiva das normas ali diversamente interpretadas e aplicadas11.

Vejamos.

Quanto ao invocado Acórdão da Relação de Lisboa a 06/02/2020 (Processo nº. 10849/15.4T8SNT-L.L1.L1-2), o que estava em causa e foi apreciado nada tem a ver com a questão que o Ac. recorrido apreciou e decidiu12.

Sem embargo de se anotar que a recorrente não identificou devidamente a contradição que invoca, limitando-se a dizer que há contradição:no que respeita à questão da fundamentação da decisão proferida pela primeira instância, o Acórdão da Relação de Évora está, nessa parte e em nosso ver, em contradição com o teor do Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa a 06/02/2020 (Processo nº. 10849/15.4T8SNT-L.L1.L1-2)”. O que, por si só, já seria bastante para rejeitar a pretensa “contradição” de arestos.

O mesmo se diga no que tange ao invocado Acórdão da Relação de Lisboa a 26/01/2023 (processo nº. 2863/22.0T8CSC-C.L1): por um lado, não se alega, sequer, e muito menos se demonstra, que o núcleo factual em ambos os arestos, no aspecto ora em apreciação, seja idêntico ou coincidente; por outro lado, como se refere no acórdão recorrido, nos autos “está demonstrado que a criança já não necessita da amamentação como refeição, não estando dependente dela”. Situação que se não alega, sequer, ocorrer no ac. da Relação que a recorrente entende estar em contradição com o recorrido.

Finalmente, no que respeita à questão do pretenso clima de conflitualidade existente entre os progenitores – como factor, eventualmente, impeditivo da aplicação de um regime de residência alternada (o que se alega estar em contradição com o decidido no Acórdão da Relação do Porto de 08/06/2022, processo nº. 2139/21.0T8MTS-B.P1) – , mais uma vez (e sem embargo de se anotar que se não alega, sequer, que o núcleo factual em ambos os arestos, neste segmento, seja idêntico ou coincidente) se não se vê nos factos provados nos presentes autos ostentada ou, sequer, indiciada, tal conflitualidade.


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Percute-se (como dito na decisão singular): não se está a aferir da eventual violação de determinadas normas constitucionais, de artigos da Convenção Europeia sobre o Exercício dos Direitos da Criança, de normas específicas do Código Civil ou do Regime Geral do Processo Tutelar Cível, etc..

“O que está em causa é, sim e apenas, aferir se é do superior interesse do menor manter-se o regime provisório anteriormente fixado ou se a alteração a tal regime provisório, efectivada com a fixação de residência alternada – decisão com a qual a Recorrente discorda, pretendendo, por via deste recurso, que seja ver revogada – salvaguarda os superiores interesses da criança.

O que implica a análise e ponderação da factualidade apurada.

(…)

A Recorrente não põe em causa, afinal, que o tribunal se tenha afastado da prossecução do superior interesse da criança, mas apenas que na prossecução desse fim fez uma errónea apreciação e concretização desse interesse.

Ora, desde que a decisão prolatada tenha por fim a prossecução do superior interesse da criança, o concreto conteúdo dessa mesma decisão situa-se já no campo da melhor satisfação e maior adequação a esse interesse, ou seja, da conveniência e oportunidade”.

Como tal, nos sobreditos termos, não há lugar à revista.


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Uma última nota para recordar que, mesmo que nulidades do acórdão recorrido houvesse, as mesmas não seriam apreciadas por este Supremo Tribunal.

Com efeito, como é sabido, e vem sendo repetidamente afirmado na jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, as nulidades previstas no n.º 1 do artigo 615.º do CPC só podem ser apreciadas pelo tribunal ad quem quando o recurso é admissível (e como fundamento acessório do recurso)13. Não sendo, como não é, admissível o recurso, só podem ser apreciadas pelo Tribunal a quo (cfr. artigo 615.º, n.º 4, do CPC)14.


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Face ao explanado, nenhuma censura merece a decisão do Exmo Relator.

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III. DECISÃO

Termos em que se indefere a reclamação deduzida, mantendo-se a decisão singular do Exmº Relator.

Custas pela Reclamante, fixando-se em três (3) Ucs a taxa de justiça.

Lisboa, 18 de Abril de 2024

Fernando Baptista de Oliveira (Juiz Conselheiro Relator)

Emídio Santos (Juiz Conselheiro 1º adjunto)

Afonso Henriques (Juiz Conselheiro 2º Adjunto)

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1. Ac. do STJ de 20/01/2010, proferido no processo n.º 701/06.0TBETR.P1.S1 (Lopes do Rego).

2. Cf. os acórdãos do STJ de 20.01.2010, proc. 701/06.0TBETR.P1.S1, de 22.04.2015, proc. 17892/12.3T2SNT.L1.S1, e de 16.03.2017, proc. 1203/12.0TMPRT-B.P1.S1.

3. Cfr., designadamente, os acórdãos do STJ de 17.05.2018, proc. 1729/15.4T8BRR.L1.S1, de 06.06.2019, proc. 2215/12.0TMLSB-B.L1.S1, de 18.03.2021, proc. 4797/15.5T8BRG-E.G1.S1, e de 17.11.2021, proc. 1629/15.8T8FIG-C.C1.S1.

4. Proc. 5189/17 (Tomé Gomes).

5. Proc. n.º 996/16.0T8BCL-D.G1-A.S1 – destaque nosso.

6. Ainda o Ac. do STJ de 10/4/08, proferido no p. 07B3832.

7. Código de Processo Civil Anotado (2020 – reimpressão), vol. II, em anotação ao artº 988º.

8. Destaque nosso.

9. Cfr., inter alios, os acórdãos do STJ de 29.04.2021, proc. 4661/16.0T8VIS-R.C1.S1 e de 17.11.2021, proc. 1629/15.8T8FIG-C.C1.S1.

10. Cfr. Acs. STJ 20.07.2017, pº 755/13.2TVLSB.L1.S1-A, 25.05.2017, pº 1738/04.PTBO.P1.S1-A, 28.01.2016, pº 291/1995.L1.S1, 13.10.2016, pº 2276/10.6TVLSB.L1.S1-A, 26.05.2015, pº 227/07.OTBOFR.C2-S1-A, 20.3.2014, pº 1933/09.4TBPFR.P1.S1, e 4.07.2013, pº 2625/09.0TVLSB.L1.S1-A.

11. Cfr. AMÂNCIO FERREIRA, Manual dos Recursos, 9ª ed., pgs. 122 e 123 – DESTAQUE NJOSSO.

12. Atente-se nas questões ali apreciadas, que eram:

  “Se a decisão recorrida é nula, nos termos do artigo 615.º, n.º 1, al. b) do CPC”, porque “o
o Tribunal recorrido não conheceu do Relatório Social”;

  “Se a decisão recorrida violou o disposto no artigo 18.º, n.º 2, do RGPTC, por ter indeferido o pedido de nomeação de advogado para a criança (…)”

  “… saber se estando pendentes autos de alteração do regime das responsabilidades parentais e, se aí, ainda não foi proferida decisão “definitiva”, tem sentido a instauração de novos autos de alteração do regime das responsabilidades parentais, que, desse modo, correndo por apenso, suscitarão uma nova alteração das responsabilidades parentais ainda pendente?

  Na decisão recorrida, entendeu-se negativamente, considerando-se que a alteração provisória de decisão definitiva e, bem assim, a alteração de decisão provisória anterior, “tem de ser feita na ação de alteração que já se encontre pendente.”. Respondendo a Relação que “a nosso ver, tem inteiro cabimento o decidido”. Acrescentando que “Aqui apenas se imporia aferir se foram aduzidos elementos supervenientes que, em termos substantivos, determinariam o prosseguimento de novos autos de alteração da regulação das responsabilidades parentais, o que, de fato, tendo em conta os elementos aportados para os autos, inclusive o relatório social junto pela recorrente, não se vislumbra”.

13. Cfr., por todos, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 20.12.2017, Proc. 22388/13.3T2SNT-B.L1-A.S1 (disponível em dgsi.pt), onde se diz: “[a]pesar do artigo 674.º, n.º 1, alínea c), do CPC, estabelecer que a revista pode ter por fundamento as nulidades previstas nas alíneas b) a e) do artigo 615.º do CPC, aquela norma não pode deixar de ser conjugada com o preceituado no n.º 4 deste mesmo artigo, segundo o qual, tais nulidades só são arguíveis por via recursória quando da decisão reclamada caiba também recurso ordinário, ou seja, como fundamento acessório desse recurso”.

14. Cfr., por exemplo, neste sentido, o Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça de 22.02.2020, Proc. 1284/09.4TMPRT-B.P1.S1 (disponível em https://jurisprudencia.csm.org.pt/). Cfr. ainda Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, Coimbra, Almedina, 2020 (6.ª edição), p. 419 e pp. 460-462 (respectivamente em comentário ao artigo 671.º e ao artigo 674.º do CPC). Resulta do que diz o autor que se não for interposto ou não for admissível o recurso de revista as nulidades de acórdãos podem ser autonomamente arguidas– mas apenas perante a Relação, nos termos do artigo 615.º, n.º 4, do CPC.