PROPRIEDADE HORIZONTAL
INFILTRAÇÃO DE ÁGUAS
DANOS
PAVIMENTO DE VARANDA
RESPONSABILIDADE DO CONDOMÍNIO
MARQUISE
Sumário

1. A placa de pavimento de uma varanda constitui a sua estrutura de sustentação; logo, integra a estrutura (de parte) do prédio (a varanda), para os efeitos previstos no art.º 1421.º, n.º 1, al. a), do Cód. Civil.
2. O condomínio é, em regra, responsável pela realização de uma obra na fachada do prédio constituído em propriedade horizontal destinada a eliminar a causa de infiltração de águas pluviais para o seu interior.
3. No entanto, a obrigação de realização de obras impermeabilização inexiste, quando a divisão afetada é uma marquise executada através do fechamento de uma varanda – por um condómino –, se a causa da infiltração for a normal e regulamentar menor capacidade de isolamento dos elementos da varanda – pavimento e guarda‑corpos –, como tal inapropriados à transformação deste espaço num compartimento fechado.

Texto Integral

Acordam na 7.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa

A. Relatório
A.A. Identificação das partes e indicação do objeto do litígio
CONDÓMINA 1 instaurou a presente ação declarativa, com processo comum, contra o Condomínio do prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial da Amadora na ficha n.º …/Cidadela, CONDÓMINO 2 (esposo) e CONDÓMINA 2 (esposa) (para além de uma outra corré já absolvida da instância), pedindo para:
a) os réus serem condenados a procederem à realização de todas as obras de construção civil necessárias para a supressão das causas das infiltrações que ocorrem e ocorreram na fração autónoma da autora, a nível da varanda da fração do 2.º andar direito.
b) bem como procederem à reparação das anomalias assinaladas na fração autónoma da autora e/ou que se venham a verificar aquando das obras de reparação, tudo em prazo razoável fixado por douta sentença,
c) caso não executem estas obras na sua fração, no prazo que lhes for determinado por sentença, que a autora possa mandar executar as mesmas, de acordo com o orçamento apresentado e que é de 1150 euros, que poderá sofrer ajustes caso decorra muito tempo sobre o mesmo.
d) que os réus sejam condenados a pagar à autora a importância de 1.503 euros gasta por esta em limpezas e estudos/peritagens
e) finalmente que os réus sejam condenados a pagar à autora, a título de danos não patrimoniais, uma indemnização não inferir a 10.000 euros.
Para tanto, alegou que é proprietária de uma fração autónoma no prédio do qual o primeiro réu é o condomínio, sendo os dois outros réus proprietários da fração situada imediatamente por cima da sua. A fração autónoma da autora sofre de infiltrações provenientes da área da varanda que serve a fração superior. Apesar de instado para o efeito, o condomínio não realizou as obras de conservação necessárias à reposição do isolamento do edifício contra infiltrações, não permitindo os restantes réus o acesso à varanda que serve a sua fração autónoma.
Citadas as contrapartes, ofereceu o condomínio a sua contestação, alegando que sempre atuou diligentemente na tentativa de resolução das patologias denunciadas pela autora.
Os demais réus contestaram, atribuindo à construção de uma marquise pela autora a causa dos sinais de humidade existente no interior da fração desta.
Após realização da audiência final, o tribunal a quo julgou a ação parcialmente procedente, concluindo nos seguintes termos:
(…) decide-se:
a) Condenar os réus CONDÓMINA 2 (esposa) e PMM, na qualidade de sucessores de CONDÓMINO 2 (esposo), e CONDÓMINA 2 (esposa), a executar, no prazo máximo de cinco meses, os trabalhos que se mostrem necessários à reparação e impermeabilização do piso da varanda da fração autónoma identificada em 3 dos factos provados;
b) Condenar o réu condomínio (…) a executar, no prazo máximo de cinco meses, os trabalhos que se mostrem necessários à reparação e impermeabilização das paredes de fachada do prédio identificado (…), de forma a fazer cessar as infiltrações de águas na fração autónoma da autora;
c) Condenar solidariamente os réus a efetuar, após a conclusão das obras atrás mencionadas ou decorrido o prazo ali fixado, e no prazo máximo de três meses, a execução das obras de reparação dos danos verificados no interior da fração da autora, identificados em 5 dos factos provados;
d) Condenar solidariamente os réus no pagamento à autora da quantia de €1.503,00 a título de danos patrimoniais;
e) Condenar solidariamente os réus no pagamento à autora da quantia de €3.500,00, a título de danos não patrimoniais.
f) Absolver os réus do demais peticionado.
Inconformado, o réu condomínio apelou desta decisão, concluindo, no essencial:
A) O objeto do recurso concerne à sentença proferida no tribunal a quo, pretendendo a recorrente invocar a sua nulidade, nos termos do disposto no art.º 615.º, n.º 1, alínea c).
B) Considerando que a sentença (…) ao dar como provado que a causa das infiltrações [na fração da] autora se deve à existência de infiltrações na varanda do 2.º andar, que o condomínio sempre acompanhou e se preocupou com a situação, e que só não a resolveu porque os condóminos do 2.º andar nunca lhe facultaram acesso aquela fração, não poderia depois vir a condenar o condomínio ao pagamento de danos patrimoniais e não patrimoniais. (…)
I) [Os meios de prova produzidos] impõem necessariamente que o ponto 7. da matéria de facto seja dado como não provado, e que no ponto 6. seja dado como provado que a única causa das infiltrações se deveu à deficiente impermeabilização da varanda do 2.º andar.
A apelada contra-alegou, pugnando pela manutenção de decisão do tribunal a quo recorrida.
A.B. Questões que ao tribunal cumpre solucionar
A primeira questão a enfrentar é a da arguida nulidade da sentença.
As questões de facto a decidir prendem-se com o julgamento dos pontos 6 e 7 dos fundamentos de facto da sentença.
As questões de direito a tratar – em torno da responsabilidade do apelante – serão mais desenvolvidamente enunciadas no início do capítulo dedicado à análise dos factos e à aplicação da lei.
*
B. Fundamentação
B.A. Factos provados
1. Relação real
1 – Encontra-se inscrita no registo predial, mediante a AP n.º 15 de 31-03-1970, a constituição em propriedade horizontal do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial da Amadora sob o n.º …, da freguesia da Cidadela.
2 – Encontra-se inscrita no Registo Predial a favor da autora, mediante a AP n.º 28 de 13-07-2001, a aquisição, por compra, da fração autónoma designada pela letra E, correspondente ao 1.º andar direito do prédio referido no ponto 1.
3 – Encontra-se inscrita no registo predial a favor dos réus CONDÓMINO 2 (esposo) e CONDÓMINA 2 (esposa), mediante a AP n.º 7 de 28-04-1970, a aquisição, por compra, da fração autónoma designada pela letra G e correspondente ao 2.º andar direito do prédio referido no ponto 1.
2. Patologias existentes
4 – Desde março de 2009, a fração referida no ponto 2 tem sofrido infiltrações de águas pluviais e humidades no teto e paredes dos quartos norte e sul, virados à fachada principal, bem como no teto e paredes da marquise.
5 – Como consequência direta dessas infiltrações e humidades, verificam-se as seguintes ocorrências na fração referida no ponto 2:
a) Empolamento da pintura, sobre a janela do quarto norte, pelo interior;
b) Empolamento da pintura, fissura perpendicular à parede e eflorescências de sais no
c) teto do quarto norte;
d) Fissura no revestimento em estuque no quarto norte;
e) Eflorescências no teto do cunhal norte do quarto sul;
f) Eflorescências e manchas sobre a janela no quarto sul;
g) Encharcamento da estrutura do teto da marquise com escorrências pela parede.
6 – As infiltrações das águas pluviais referidas no ponto 4 derivam, a título principal, de deficiente impermeabilização do pavimento da varanda da fração referida no ponto 3.
7 – As infiltrações referidas no ponto 4 derivam, também, de deficiente impermeabilização das paredes de fachada do prédio referido no ponto 1.
8 – A autora, em consequência da situação referida nos pontos 4 e 5, despendeu os seguintes valores:
a) €150,00, para limpeza da marquise;
b) €405,90, para inspeção e elaboração de estudo preliminar sobre as anomalias existentes na fração, relacionadas com infiltrações;
c) €947,10, para inspeção e elaboração de estudo preliminar sobre as anomalias existentes na sua fração, relacionadas com infiltrações.
3. Danos sofridos
9 – A situação referida nos pontos 4 e 5 causou desgosto, angústia, indignação e preocupação à autora.
10 – Desde o início de 2012 que o réu condomínio se mostrou disponível para resolver o problema das infiltrações na fração da autora, através da efetuação de reparações no piso da varanda da fração referida no ponto 3.
11 – O acesso à varanda da fração referida no ponto 3 é feito exclusivamente através desta fração.
12 – O réu condomínio não conseguiu concretizar as reparações referidas no ponto 10 por os réus CONDÓMINO 2 (esposo) e CONDÓMINA 2 (esposa) impedirem o acesso à fração referida no ponto 3.
13 – A autora reside na fração autónoma referida no ponto 2.
14 – Um dos quartos afetado pelas infiltrações é utilizado pela autora para pernoitar.
B.B. Arguição de nulidades (vícios processuais)
Alega a apelante que a sentença encerra uma contradição entre a fundamentação e a decisão, nestes termos:
B) Considerando que a sentença (…) ao dar como provado que a causa das infiltrações [na fração da] autora se deve à existência de infiltrações na varanda do 2.º andar, que o condomínio sempre acompanhou e se preocupou com a situação, e que só não a resolveu porque os condóminos do 2.º andar nunca lhe facultaram acesso aquela fração, não poderia depois vir a condenar o condomínio ao pagamento de danos patrimoniais e não patrimoniais. (…)
Reza a primeira parte da norma enunciada na al. c) do n.º 1 art.º 615.º do Cód. Proc. Civil que “[é] nula a sentença quando (…) [o]s fundamentos estejam em oposição com a decisão”. Sobre esta norma, o Supremo Tribunal de Justiça tem entendido que “a contradição geradora de nulidade ocorre quando os fundamentos invocados pelo juiz conduziriam logicamente não ao resultado expresso na decisão, mas a resultado oposto ou, pelo menos, de sentido diferente” – cfr. o Ac. do STJ de 14-04-2021 (3167/17.5T8LSB.L1.S1). A nulidade em causa decorre, pois, de “um erro de raciocínio lógico, consistente em a decisão emitida ser contrária à que seria imposta pelos fundamentos de facto ou de direito de que o juiz se serviu ao proferi-la: a contradição geradora de nulidade ocorre quando os fundamentos invocados pelo juiz conduziriam logicamente não ao resultado expresso na decisão, mas a resultado oposto ou, pelo menos, de sentido diferente” – idem, cfr., ainda, entre muitos outros, os Acs. do STJ de 20-05-2021 (69/11.2TBPPS.C1.S1), de 09-03-2022 (4345/12.9TCLRS-A.L1.S1), de 26-01-2021 (2350/17.8T8PRT.P1.S2), de 27-04-2023 (374/22.2T8LRA.C1.S1), de 10-01-2023 (508/20.1T8AGH.L1.S1), de 12-01-2021 (1801/19.1T8CSC.L1-B.A.S1), de 22-02-2022 (3282/17.5T8STB.E2.S1) e de 29-04-2021 (704/12.5TVLSB.L3.S1).
Desenvolvendo e subscrevendo este entendimento, podemos assentar que a “oposição” referida na al. c) do n.º 1 art.º 615.º do Cód. Proc. Civil é uma falha no silogismo judicial, tal como se encontra enunciado na sentença – cfr., neste sentido, o Ac. do STJ de 03-03-2021 (3157/17.8T8VFX.L1.S1). Neste silogismo falhado, o tribunal identifica uma premissa maior, isto é, tipicamente, uma determinada norma legal, compreendendo a sua fatispécie e a sua estatuição. Seguidamente, identifica uma concreta factualidade – ou uma realidade extraprocessual, ou circunstâncias processuais –, que afirma preencher a hipótese legal da premissa maior, constituindo-se ela como a premissa menor. Por último, sem apresentar nenhuma outra etapa no seu raciocínio, conclui com a não aplicação da estatuição ao caso concreto. Por exemplo: todos os culpados são condenados; o réu é culpado; o réu não é condenado.
A “decisão” referida al. c) do n.º 1 art.º 615.º do Cód. Proc. Civil é, assim, tipicamente a decisão referida na parte final do n.º 3 do art.º 607.º do Cód. Proc. Civil, ou seja, é o dispositivo da sentença. O mesmo é dizer que a típica nulidade por contradição entre os fundamentos e a decisão refere-se ao silogismo que tem por premissa maior o regime legal aplicado ao caso e por premissa menor o facto já julgado provado.
Trata-se, pois, de um vício intrínseco, independente da validade das premissas, e que qualquer leitor pode constatar – ainda que desconheça a regra afirmada (premissa maior), isto é, o acerto da sua seleção, ou ignore a bondade do acolhimento da premissa menor. Para sua deteção, não é necessário o conhecimento de elementos extrínsecos à decisão, por exemplo, nem da prova produzida, nem da lei aplicável (cuja fatispécie abranja o caso concreto). Sejam, ou não, acertadas as premissas apresentadas (isto é, os fundamentos), a conclusão (isto é, a decisão) não corresponde ao resultado da sua articulação. Essencial é que na sentença sejam enunciadas, ainda que imperfeitamente, as duas premissas do silogismo, pois é da sua articulação que resulta necessária uma conclusão (decisão), revelando-se a nulidade na não afirmação desta.
À luz destas considerações, temos de concluir que o suposto vício formal identificado pelo apelante não é uma contradição entre a fundamentação e o dispositivo na sentença, mas sim uma putativa falha (incoerência) na argumentação desenvolvida pelo tribunal a quo. A sentença proferida apresenta uma articulação coerente entre as suas premissas de facto e de direito: afirma-se na fundamentação a existência de uma responsabilidade pela ocorrência de danos e condena-se o réu, em conformidade, no seu ressarcimento. Nada há apontar ao ato decisório em matéria de congruência. A sentença não enferma da nulidade agora enfrentada.
B.C. Impugnação da decisão sobre a matéria de facto
1. Matéria de facto dada por não provada
Tal como referimos na enunciação das questões a resolver, o apelante pretende que sejam alteradas as respostas dadas aos seguintes factos:
6 – As infiltrações das águas pluviais (…) derivam, a título principal, de deficiente impermeabilização do pavimento da varanda da fração referida em 3.
7 – As infiltrações (…) derivam, também, de deficiente impermeabilização das paredes de fachada do prédio (…).
No essencial, considerando, em especial, que o tribunal a quo não o condenou na realização de obras no pavimento da varanda (tida como parte não comum), pretende o condomínio réu que seja negada a existência de uma fonte (causa) das infiltrações a partir da fachada do edifício (parte comum).
2. Motivação da convicção apresentada pelo tribunal ‘a quo’
O tribunal a quo motivou a sua convicção, no que respeita às causas das infiltrações de águas pluviais, nos seguintes termos:
Os factos 6 e 7 resultaram provados do relatório pericial junto aos autos a fls. 151 e ss., segundo o qual as anomalias existentes na fração da autora estão relacionadas com a deficiente impermeabilização do pavimento da varanda do 2.º andar direito, a título principal, mas também com a deficiente impermeabilização das paredes de fachada do prédio, o que permite que a água se infiltre.
Ademais, a testemunha JG foi bastante esclarecedora quanto a este respeito, salientando que as infiltrações, atendendo às manifestações físicas que observou nas paredes e tetos do interior da fração da A., advêm, a título principal, da varanda do 2.º andar direito.
Acrescentou ainda que a deficiente impermeabilização da parede de fachada do prédio tem um contributo residual para os estragos que se verificam no interior da fração da autora.
Saliente-se que os estudos sobre o diagnóstico das anomalias em causa nos autos, juntos a fls. 21 a 42, bem como a informação da Zurich, a fls. 65, apontam também como causa das infiltrações a deficiente impermeabilização do piso da varanda da fração referida em 3 dos factos provados (o que, realce-se, não impede que existam outras, o que desde logo é confirmado pelo vertido pelo Sr. Perito no relatório pericial).
3. Análise da prova processualmente adquirida
Ouvidos os registos áudio da prova produzida, não podemos deixar de confirmar a decisão de facto impugnada. Se os meios de prova invocados pelo tribunal a quo sustentam a decisão vertida na sentença, já os depoimentos invocados e transcritos pelo réu não permitem, minimamente, considerar a matéria em causa como não provada.
Começamos por notar que os depoimentos invocados na sustentação da impugnação da decisão de facto, não só não infirmam o julgamento efetuado, como são inidóneos à prova da factualidade em causa, dado que esta envolve o apuramento (causas) e apreciação de factos que requerem conhecimentos técnicos especializados que os julgadores e as testemunhas, por regra, não possuem. Aliás, por assim ser, foi produzida sobre eles prova pericial.
No que à impugnação que nos ocupa diz respeito, são os seguintes as mais relevantes respostas vertidas no relatório pericial:
A) Autor
1) A fração da autora apresenta os seguintes danos? • Empolamento de pintura, sobre a janela do quarto Norte, pelo interior; • Empolamento de pintura, fissura perpendicular à parede e eflorescências de sais no teto do quarto norte; • Fissura no revestimento em estuque no quarto Norte; • Eflorescência e manchas sobre a janela no quarto Sul; • Indícios de encharcamento da estrutura do teto em escorrências pela parede da marquise (varanda da autora).
Resposta: confirmo a existência na fração do autor de todos os danos descritos
2) Estas anomalias estão relacionadas com humidade excessiva nos dois quartos da autora virados à fachada principal?
Resposta: Não, as anomalias existentes na fração da autora estão relacionadas principalmente com a deficiente impermeabilização do pavimento da varanda do 2.º Dt e das paredes de fachada do prédio que permitem que a água se infiltre.
3) As anomalias verificadas no 1.º andar direito do prédio dos autos tem como causa as águas e humidades provenientes do exterior que se estão a infiltrar através das paredes da fachada da varanda e dos remates do vão do piso superior. (2.º. andar direito)?
Resposta: Sim e também com a deficiente impermeabilização do pavimento da varanda do 2.º Dt.
B) Réu
1) Origem das infiltrações de água/humidade na fração autónima da autora;
Resposta: As anomalias existentes na fração do Autor estão relacionadas principalmente com a deficiente impermeabilização da varanda do 2.º Dt que deixa a água infiltrar-se e escorrer para o piso abaixo e também com a deficiente impermeabilização das paredes de fachada do prédio. (…)
4) Se as ditas infiltrações não terão origem do desgaste, através do tempo, por degradação dos materiais e da ação do tempo, entretanto decorrido, desde a construção do prédio;
Resposta: A deficiente impermeabilização das paredes de fachada e da varanda do 2.º Dt, está associada à falta de conservação do revestimento do pavimento das varandas e das paredes da fachada do prédio.
5) Infiltrações com origem da parte inferior da varanda do 2.º Dt;
Resposta: A maior parte dos danos existentes na fração da autora tem como origem a deficiente impermeabilização do pavimento dá varanda do 2.º Dt e das paredes de fachada.
É, pois, cristalino o parecer do perito designado: “as anomalias existentes na fração da autora estão relacionadas principalmente com a deficiente impermeabilização do pavimento da varanda do 2.º direito e das paredes de fachada do prédio que permitem que a água se infiltre”. A impugnação da decisão sobre a matéria de facto é, pois, manifestamente improcedente, mantendo-se o julgamento do tribunal a quo.
B.D. Análise dos factos e aplicação da lei
São as seguintes as questões de direito parcelares a abordar:
1. Estatuto real da varanda de um prédio constituído em propriedade horizontal
1.1. Comunhão imperativa da placa de pavimento da varanda exterior
1.1.1. Função estrutural da placa de pavimento da varanda
1.1.2. Função defensiva (isolamento) da placa de pavimento da varanda
1.1.3. Natureza privada da varanda
1.2. Presunção de comunhão da placa de pavimento da varanda
1.3. Conclusão
2. Limite da obrigação do condomínio réu
2.1. Proibição da ‘reformatio in pejus’
2.2. Responsabilidade pelos danos na fração autónoma
2.2.1. Afirmação da responsabilidade
2.2.2. Limites da responsabilidade
3. Responsabilidade pelas custas

1. Estatuto real da varanda de um prédio constituído em propriedade horizontal

O tribunal a quo discorre judiciosamente sobre o estatuto real das varandas abertas (ainda que cobertas) adjacentes a fachadas de prédios constituídos em propriedade horizontal, acessíveis através de apenas uma fração autónoma. Com base nas suas considerações dogmáticas, conclui que o pavimento da varanda dos segundos réus integra a sua fração autónoma, não sendo uma parte comum. Já o guarda-corpos que a rodeia por três lados será uma parte comum.
Começaremos por questionar esta posição dogmática, para que não se possa concluir da improcedência que a decisão do caso e da apelação nela assenta.

1.1. Comunhão imperativa da placa de pavimento da varanda exterior

1.1.1. Função estrutural da placa de pavimento da varanda

A afirmação de que a placa de pavimento de uma varanda não integra a estrutura do prédio, a pretexto de não afetar a substância (existência ou segurança) do restante edifício, encerra um vício de raciocínio, pois assenta no pressuposto errado de que a varanda é coisa distinta do prédio (edifício). Não é assim. A varanda é uma parte do prédio. E se a varanda integra o prédio, a estrutura daquela integra, logicamente, a estrutura deste.
A esta parte do edificado devem aplicados os mesmos critérios de qualificação (como comum ou privada) aplicáveis às suas restantes partes – genericamente previstos no art.º 1421.º do Cód. Civil. Para boa compreensão desta questão, importa distinguir as duas principais partes componentes da varanda – a laje ou placa de pavimento e o guarda-corpos (constituído por um parapeito, por uma grade, por balaústres encimados por um pousa-mãos ou por placas de vidro, designadamente). Para o caso, interessa-nos, em especial, o estatuto real da laje ou placa de pavimento.
Tal como já adiantámos, figura-se-nos apodítico que a placa de pavimento de uma varanda integra a sua estrutura. Se esta placa for removida, todo o edificado e área correspondentes desaparecem. Não se confunde, pois, este edificado com uma parede interior, cuja destruição não altera nem os limites, nem a área da fração autónoma – nem altera os limites, área ou volumetria de toda a construção (prédio).
A placa de pavimento integra a estrutura da varanda – sendo condição da existência desta e, por maioria de razão, da sua segurança construtiva –; logo, integra a estrutura (de uma parte) do prédio. Sem ela, aquela parte do prédio não existe – em condições de segurança e de viabilidade de utilização, ainda que os guarda-corpos, suspensos, se mantenham chumbados à fachada –, não podendo ser ocupada ou usada.
Afigura-se-nos incontroverso que a circunstância de uma determinada parte do edificado se projetar para além do plano vertical da sua implantação no solo, ficando parcialmente suspensa, em nada pode alterar a sua qualificação como parte comum, ou não. Tome-se como exemplo o cunhal do icónico Wohnhaus Schlesisches Tor (Bonjour Tristesse), de Álvaro Siza e Peter Brinkert. Esta esquina do edifício está suspensa sobre o passeio público – sendo o pilar que a pontua falso, não desempenhando uma função estrutural. No entanto, ninguém ousará afirmar que às lajes (e seus elementos, como vigotas ou betão armado maciço) que efetivamente sustentam a projeção dos diferentes pisos (andares) para o exterior nesta esquina não são estruturais, a pretexto, por exemplo, de a ruína resultante da sua degradação se circunscrever, apenas, por hipótese, a essa esquina do prédio.
Em suma, a estrutura de sustentação de uma parte do prédio (também definidora dos seus limites, área ou volumetria) integra a estrutura deste.

1.1.2. Função defensiva (isolamento) da placa de pavimento da varanda

Desenvolvendo uma argumentação subsidiária, devemos ir mais além e compreender que a área de inserção da varanda no corpo do edifício tende a representar uma solução de continuidade (interrupção) do isolamento adotado na fachada do edifício – por exemplo, cobertura betuminosa, cimentícia, asfáltica ou cerâmica, ou de aplicação de argamassas, resinas, membranas ou ETICS (External Thermal Insulation Composite System). Significa isto que não é indiferente para os restantes condóminos o modo como a varanda é executada, designadamente, o modo como é revestido (isolado) o seu pavimento. Se o pavimento da varanda não for minimamente isolado – designadamente, com lajes ou material cerâmico –, corre-se o risco de encharcamento da placa, em função da sua porosidade, e, por esta via, de transmissão de humidade à fachada adjacente, acabando por se transmitir à fração inferior e, por capilaridade, à fração que serve (ou que integra).
Neste sentido, isto é, considerando que este edificado deve garantir o isolamento da fachada adjacente, a varanda serve todos os condóminos, assim como a parte de uma fachada que dá para uma fração autónoma a todos serve, e não apenas o proprietário desta fração. O mesmo é dizer, por exemplo, que o pavimento da varanda, constituindo-se como o revestimento exterior do edifício, não pode ser alterado pelo condómino da fração por ela servida.
Ilustrando com um exemplo esta asserção – isto é, este estatuto real –, é absurdo considerar que, se o pavimento de uma varanda ruir, por causa não imputável a um sujeito, cabe ao condómino da fração que integra o direito e o dever de promover sua reconstrução – e, no limite, que este pode optar por não reconstruir o pavimento da varanda. Dito de outro modo, a placa de pavimento de uma varanda não pode ser livremente destruída – designadamente, por um condómino –, não (apenas) por prejudicar a linha arquitetónica ou o arranjo estético do edifício (art.º 1422.º, n.º 2, al. a), do Cód. Civil) – podendo, de resto, a varanda dar para um saguão sem vistas –, mas sim porque tal destruição deixa desprotegida (sem revestimento) a fachada na área de inserção da placa de pavimento da varanda.                          
Em suma, a placa de pavimento da varanda, também porque reveste a parte da fachada que lhe é adjacente, na zona em que se balança para fora do perímetro do edifício, é comum – sobre a natureza jurídica das fachadas, cfr. o Ac. do STJ de 19-02-2008 (07A4756).

1.1.3. Natureza privada da varanda

Em nada embarga o raciocínio expendido a circunstância de uma varanda poder ser uma parte privada do prédio constituído em propriedade horizontal, isto é, uma parte integrante de uma fração autónoma. É que a esta parte do edificado, repisa-se, devem aplicados os mesmos critérios de qualificação aplicáveis às suas restantes partes.
É incontroverso que uma fração autónoma pode ser totalmente delimitada por estruturas que constituem partes comuns – até imperativamente comuns –, como sejam fachadas, paredes mestras ou placas de cobertura. Esta delimitação em nada afeta a propriedade privada individual do volume interno da fração, incluindo dos revestimentos de pavimento, parede e tetos, e da porta de acesso à fração, bem como dos sistemas interiores de distribuição de água e eletricidade, por exemplo.
Conforme sustenta a doutrina mais qualificada, o objeto do direito de propriedade (singular) do titular da fração autónoma é essencialmente constituído por um espaço geométrico (um volume) e tudo o que se contenha no seu interior (que não seja considerado comum), espaço este considerado por lei como objeto autónomo de direitos – cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Volume III, com a colaboração de Henrique Mesquita, Coimbra, Coimbra Editora, 1987, pp. 416 e 417. O mesmo é dizer  que a propriedade individual da varanda (quando exista) tem essencialmente por objeto o volume delimitado pela superfície da placa de pavimento, guarda-corpos, fachada e portadas de acesso, até à altura da fração que integra, bem como por todos os elementos que, eventualmente, se contenham no seu interiorv.g., uma pérgula ou uma churrasqueira em alvenaria .
Assim como a laje ou placa de pavimento interior de uma fração autónoma pode ser uma parte comum, sem que a fração perca a sua natureza (propriedade individual), também a laje ou placa de pavimento de uma varanda exterior pode ser uma parte comum, sem que a varanda perca a sua natureza privada atribuída pelo título constitutivo da propriedade horizontal. Assim se faz a síntese entre as posições que defendem que a varanda é ou pode ser de propriedade individual – considerando a sua disposição física e o seu uso exclusivo –, integrando uma fração, e as que sustentam que um ou todos os seus elementos identitários – laje de pavimento e guarda-corpos – são partes comuns, considerando a sua função (de sustentação) e utilidade reflexa para todos os condóminos.
Neste sentido, deve aceitar-se que o “chão” de uma varanda pode ser objeto de propriedade privada individual (por a varanda integrar a fração autónoma que serve), mas apenas na medida em que o “chão” da fração (no interior) também é uma parte privativa: o seu revestimento (v.g., cerâmico, vinílico ou outro) é incontroversamente privativo do titular da fração, mas a placa de pavimento que o sustenta não o é (necessariamente). Do mesmo modo, pode aceitar-se que a cobertura do pavimento da varanda (“chão”), quando não seja defensivo contra a infiltração de águas pluviais, integra a propriedade da fração autónoma adjacente, mas já não a estrutura que o sustenta (a placa de pavimento), sendo esta uma parte comum – sobre a questão, cfr. os Acs. do TRL de 27-10-2020 (12847/18.7T8SNT.L1-7) e do TRC de 24‑10‑2023 (96/18.9T8FIG.C1), bem como a doutrina nos mesmos citada.
Em conclusão, assim como não se pode retirar da circunstância de uma parede mestra integrar apenas a estrutura de uma das prumadas do edifício, em resultado da técnica construtiva adotada, que tal parede não integra a estrutura do edifício (no seu todo), também não se pode retirar da circunstância de um elemento estrutural apenas sustentar uma sua parte projetada para o exterior do plano vertical de implantação no solo – como uma varanda ou uma sacada que se prolonga por vários andares – que a mesma não é uma estrutura do prédio.
A placa de pavimento de uma varanda é uma parte da estrutura do prédio, para os efeitos previstos no art.º 1421.º, n.º 1, al. a), do Cód. Civil.
1.2. Presunção de comunhão da placa de pavimento da varanda
Retomando o desenvolvimento de uma argumentação subsidiária, e ainda que não se entenda, como se deve entender, que a placa de pavimento de uma varanda é imperativamente comum (mesmo quando a varanda integra uma fração autónoma), sempre se deverá entender que se presume comum.
Reza a al. e) do n.º 2 do art.º 1421.º do Cód. Civil (partes comuns do prédio) que “[p]resumem-se ainda comuns (…) [e]m geral, as coisas que não sejam afetadas ao uso exclusivo de um dos condóminos. Sem dificuldade, enquadram-se nesta categoria, por exemplo, as paredes divisórias entre frações – mas já não as fachadas, como vimos acima, pois estas paredes perimetrais são imperativamente comuns (podendo, ainda, considerar-se imperativamente comuns as paredes internas não estruturais divisórias entre a fração e os espaços comuns ou que formam coretes nas quais são conduzidos tubos de queda de esgotos comuns). Tais paredes divisórias entre frações apenas não são consideradas imperativamente partes comuns – não estando, pois, referidas no n.º 1 do mesmo artigo – porque pode dar-se o caso de duas frações contíguas serem propriedade do mesmo condómino – podendo mesmo, neste caso, admitir-se o derrube da parede divisória entre ambas (desde que não seja mestra).
Afigura-se-nos, pois, incontroverso que a placa que separa duas frações situadas em andares (pisos) diferentes se presume comum. Já os elementos construtivos que não servem as duas frações (sobreposta e subposta) são privativos da fração que servem – por exemplo, tetos falsos ou revestimento do pavimento (“chão”).
Logo por aqui se deveria concluir que a placa de pavimento de uma varanda que também serve de placa de teto da varanda sob ela situada (ao menos) se presume comum. Esta placa oferece alguma proteção à varanda inferior (e às respetivas portadas de acesso) contra a chuva e a radiação solar, proporcionando, ainda, outros cómodos – por exemplo, não raramente, nesta cobertura da varanda inferior são instalados sistemas de iluminação ou estendais de roupa suspensos.
Ou seja, ainda que uma dada varanda seja, por força do título constitutivo da propriedade horizontal ou por natureza (considerando o seu acesso físico), parte integrante de uma fração autónoma, nem por isso a integralidade dos elementos que a compõem ou delimitam se pode dizer da propriedade exclusiva do condómino titular dessa fração. No caso em que o pavimento de uma varanda é também a cobertura de outra, a placa que se projeta para o exterior do edifício não deixa de ser uma placa que serve dois pisos (presumindo-se comum).

1.3. Conclusão

Resulta do exposto que é artificiosa a distinção entre as partes componentes da estrutura de uma varanda, considerando-se, por exemplo, privativa (propriedade singular) a placa de pavimento e comum o guarda-corpos. Podemos, pois concluir, no que para o caso releva, que, ainda que a área da varanda integre uma fração autónoma, a placa de pavimento que a sustenta é uma parte da estrutura do prédio (e que complementa, no ponto da sua inserção, a função isolante da fachada), para os efeitos previstos no art.º 1421.º, n.º 1, al. a), do Cód. Civil

2. Limite da obrigação do condomínio réu

2.1. Proibição da ‘reformatio in pejus’

Do raciocínio expendido resulta que o apelante é responsável pela realização das obras de impermeabilização da fachada indicadas na alínea b) do dispositivo da sentença apelada, incluindo no vão da portada de acesso à varanda (soleira, ombreiras e lintel) e nos frequentemente problemáticos pontos de fixação da caixilharia, mas excluindo  qualquer obra inovadora de impermeabilização do guarda-corpos da varanda – quer por esta obra não constar expressamente do dispositivo da sentença – não se podendo interpretar extensivamente o conceito de fachada, fazendo-o abranger o parapeito da varanda –, quer, como veremos, por a autora a ela não ter direito. Também resulta claro que o apelante poderia, em abstrato, ser responsabilizado pelas obras indicadas na alínea a) do dispositivo da sentença impugnada. No entanto, no caso concreto, já não o poderá ser. A tanto obsta a proibição da reformatio in peius.
Esta proibição encontra-se prevista no art.º 635.º, n.º 5, do Cód. Proc. Civil, assente, designadamente, no respeito pelo caso julgado formado sobre decisões não impugnadas, bem como no respeito pelo princípio dispositivo, imposto pelos arts.  609.º, n.º 1, e 615.º, n.º 1, al. e), do Cód. Proc. Civil, aplicáveis ao conhecimento da apelação por força dos arts. 663.º, n.º 2, e 666.º, n.º 1, do Cód. Proc. Civil. Destas normas retira-se, sem dificuldade, que a proibição que nos ocupa se dirige, quer ao caso em que a “parte dispositiva da sentença” é composta por diversos capítulos ou partes, compreendendo decisões autonomizáveis, quer ao caso em que a decisão é constituída por uma única parte, no que respeita à sua quantidade.
Em suma, não pode este tribunal, mesmo em coerência com o entendimento jurídico que adotou, condenar o apelante na realização de obras de conservação no pavimento da varanda do 2.º andar direito.

2.2. Responsabilidade pelos danos na fração autónoma

2.2.1. Afirmação da responsabilidade

Como vimos acima, a suposta contradição intrínseca da sentença não se verifica, podendo, eventualmente, afirmar-se a existência de um erro de enquadramento jurídico dos factos. Resta-nos, pois, verificar se o apelante pode ser responsabilizado pelos danos causados na fração da autora, considerando que resultou provado que, “desde o início de 2012 que o réu condomínio se mostrou disponível para resolver o problema das infiltrações na fração da autora” e que “não conseguiu concretizar as reparações (…) por os réus CONDÓMINO 2 (esposo) e CONDÓMINA 2 (esposa) impedirem o acesso à [sua] fração”.
Questão distinta da propriedade da varanda é a da responsabilidade pela realização de obras de reparação, a qual não decorre necessariamente do dever de comparticipação no pagamento destas obras. As reparações nas partes comuns apenas podem ser realizadas pelo condomínio (conjunto dos comproprietários dessa parte), atuando por meio do seu administrador, com a exceção prevista no art.º 1427.º do Cód. Civil. No entanto, ainda que uma parte seja comum – como é a fachada do edifício –, tal não significa que todos os condóminos, na proporção da sua permilagem, estejam obrigados a suportar os custos com a sua conservação – é o caso, por exemplo, do custo com a reparação dos ascensores (art.º 1424.º, n.º 3, do Cód. Civil). Veja-se, a propósito, o atual regime das despesas com a conservação de partes comuns de uso exclusivo, previsto no n.º 6 do art.º 1424.º do Cód. Civil.
No caso dos autos, sendo a fachada uma parte comum que a todos os condóminos aproveita, cabia ao condomínio apelante, por meio do seu administrador, realizar as obras necessárias a repor o seu isolamento, a expensas de todos os condóminos. Neste contexto, mostrar-se disponível não equivale a, efetivamente, atuar diligentemente. Se o condomínio não obtém a satisfação voluntária por parte de um condómino de uma dada obrigação, tem o dever de recorrer aos meios coercivos judiciais disponíveis, quer essa obrigação seja, por exemplo, o pagamento da comparticipação para as despesas comuns, quer seja a não ocupação das partes comuns com os pertences próprios, quer seja, finalmente, o franqueamento do acesso à sua fração para a realização de obras urgentes.
A circunstância de os segundos réus não consentirem o acesso à sua fração não representa uma causa de exclusão do dever do condomínio de realizar obras de conservação visando repor a impermeabilização da fachada, atuando por meio do seu administrador (art.º 1427.º do Cód. Civil). Improcede, pois, esta linha argumentativa do apelante.

2.2.2. Limites da responsabilidade

Não se pode dar por adquirido que uma varanda está apta para receber a estrutura envidraçada que a transforma numa marquise. Para além do peso acrescido que tal estrutura importa, pode esta oferecer uma, anteriormente inexistente, maior resistência ao vento, podendo afetar as partes do prédio pré-existentes às quais se encontra fixada – v.g., as placas de pavimento das varandas inferior e superior –, provocando a sua degradação progressiva.
Neste contexto – de problematização da construção uma marquise –, devemos ter por apodítico que o guarda-corpo de uma varanda aberta não é uma parede exterior do imóvel, quer quando é constituído por uma grade ou por um vidro, quer quando é constituído por um murete em alvenaria. As características e exigências construtivas das fachadas exteriores – por exemplo, quer com a execução de fiada dupla de tijolo, quer com a adoção do sistema ETICS – não são iguais às exigências construtivas de uma guarda de varanda (destinada apenas a evitar a queda de pessoas ou objetos).
O mesmo é dizer que, sendo uma varanda transformada em marquise, não se pode esperar que o guarda-corpo se comporte como uma parede exterior original (fachada do prédio), quer, por exemplo, no que respeita ao isolamento térmico, quer quanto ao isolamento contra a entrada de humidade. O mesmo se poderá dizer, até certo ponto, do teto da marquise. Embora o pavimento da varanda (superior) deva ser impermeabilizado – para evitar o encharcamento da estrutura e, por esta via, a transmissão de humidade à fachada adjacente –, não foi ele concebido para ser uma placa de teto, pelo que nunca se poderá comportar como tal. Acresce que, para além das características distintas destes elementos – piso da varanda superior e guarda-corpos –, são eles concebidos contando com o arejamento e a exposição solar naturais.
Estes problemas tendem a ser menores quando todas as varandas de uma prumada são transformadas em marquise, logrando-se com o fechamento das varandas superiores prevenir o risco de infiltrações nos tetos das marquises inferiores. No entanto, nunca estaremos perante uma estrutura com um isolamento equivalente ao oferecido pela fachada e placa de cobertura originais do edifício.
Do exposto resulta que, ainda que se entenda que cabe ao condomínio realizar as obras de conservação de uma varanda, nunca se poderá afirmar que lhe cabe realizar as obras necessárias à transformação do guarda-corpos numa parede exterior – v.g., com recurso ao sistema ETICS – nem que é responsável pelos danos causados pela inapropriada impermeabilização desta estrutura.
No caso dos autos, é incontroverso que a autora tem o direito à realização de obras de conservação, de modo a que sejam debeladas as infiltrações (humidades) que os quartos apresentam, sobretudo nas zonas das sancas – para além de ter o direito à reparação dos estragos causados no seu interior. Todavia, como resulta do acima exposto, não tem direito à realização de intervenções destinadas a dotar a marquise de características (impermeabilização) que a construção originária não tinha (mesmo isenta de defeito).
No que toca às obras de que agora tratamos (as referidas na alínea c) do dispositivo da sentença) e ao pagamento das indemnizações objeto das alíneas d) e e) do mesmo dispositivo, poder-se-ia, pois, entender que o condomínio não é responsável pelas que dizem respeito aos danos verificados no interior da marquise. No entanto, só assim se poderia concluir se tivesse ficado provado que tais danos resultam da normal menor capacidade de isolamento do guarda-corpos da varanda da autora, designadamente. Ora, diferentemente, resultou provado nos pontos 5, al. g), 8 e 9 da fundamentação de facto que estes danos resultam das infiltrações provenientes do andar superior. O julgamento destes pontos da decisão sobre a matéria de facto não foi impugnado, não tendo esta tribunal encontrado justificação bastante para a sua alteração oficiosa. Conclui-se, pois, pela responsabilidade do apelante, nos termos afirmados pelo tribunal a quo.
3. Responsabilidade pelas custas
A decisão sobre custas da apelação, quando se mostrem previamente liquidadas as taxas de justiça que sejam devidas, tende a repercutir-se apenas na reclamação de custas de parte (art.º 25.º do Reg. Cus. Proc.).
A responsabilidade pelas custas (da causa e da apelação) cabe ao apelante, por ter ficado vencido (art.º 527.º do Cód. Proc. Civil).
C. Dispositivo
C.A. Do mérito do recurso
Em face do exposto, na improcedência da apelação, acorda-se em confirmar a decisão recorrida, tendo esta o âmbito acima esclarecido.
C.B. Das custas
Custas a cargo do apelado.
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Notifique.
Lisboa, 23-04-2024
Paulo Ramos de Faria
José Capacete
Luís Filipe Pires de Sousa