FACTOS DA SENTENÇA
AMPLIAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
RESPONSABILIDADE BANCÁRIA
DECLARAÇÃO TÁCITA
ABUSO DO DIREITO
BOA FÉ CONTRATUAL
Sumário

I - O critério para a destrinça entre os “factos materiais” relevantes para a decisão que devem constar da sentença e os “factos jurídicos” que não devem constar do elenco factual da mesma parte assenta no objeto do litígio.
II - Numa ação em que é objeto da decisão aferir se ocorreu declaração negocial de aceitação e em que está alegado que essa declaração resultou de comportamentos concludentes da declarante não se pode transportar para o elenco dos factos relevantes a ocorrência ou não de aceitação, julgando-a provada ou não provada. A aceitação não tem aqui um significado corrente que permita o seu tratamento como questão de facto, antes sendo uma conclusão, de direito, a retirar de comportamentos que devem estar descritos na factualidade selecionada.
III - Não deve ser anulada a decisão da primeira instância com vista à ampliação da matéria de facto caso a Relação tenha ao seu dispor os elementos necessários a proceder ela mesma a tal ampliação, o que sucede, nomeadamente, quando os factos essenciais a aditar foram admitidos em sede de articulados e/ou resultam de documentos cujo teor não foi impugnado.
IV - Se, ao pretender exercer a compensação de crédito decorrente de mútuo bancário por via da cobrança de quantias depositadas pela mutuária em conta de depósito à ordem, o Banco mutuante debitar montantes a que não tinha direito, incorre em responsabilidade perante a depositária por violação da obrigação decorrente do contrato de depósito à ordem – de manter a quantia depositada disponível a todo o tempo -, dada a falta de causa para a cobrança efetuada.
V - Não se podendo, à luz do artigo 217º, número 2 do Código Civil, qualificar os comportamentos de alguém como de declaração tácita de aceitação de uma condição negocial por estar tal declaração sujeita à forma escrita e não terem os comportamentos concludentes revestido a mesma forma não pode, para efeitos de qualificação da sua conduta como não permitida à luz do abuso do direito, vir, afinal, a afirmar que os referidos comportamentos são reveladores de aceitação dessas condições negociais e de renúncia tácita ao exercício do direito correspetivo.
VI - O caráter excecional que deve ter o recurso ao instituto do abuso do direito obriga a que se distinga o mesmo, na modalidade de supressio, do fenómeno das declarações negociais tácitas por forma a não atribuir, por essa via, eficácia vinculativa a comportamentos que não pudessem ser considerados como declarativos à luz do artigo 217º do Código Civil.
VII - O preenchimento do conceito indeterminado de boa-fé no âmbito de negociação de um contrato deve ter em conta os interesses em confronto, a situação relativa de cada uma das partes e a própria natureza do negócio sendo de esperar, no âmbito do comércio jurídico, que cada parte atue de forma a obter vantagens e a alcançar as melhores contrapartidas negociais.
VIII - Durante a vigência do contrato de mútuo, nas negociações de prorrogações do vencimento da obrigação de restituição do capital mutuado é de considerar adequado que ambas as partes façam mútuas e recíprocas concessões ou abdiquem, nesse momento de exigir quantias a que entendam ter direito.
IX - Já quando está definitivamente frustrado o acordo que as negociações visavam alcançar se afigura exigível, de acordo com os ditames da boa-fé, que ambas as partes anunciem aquilo a que entendam ter direito, não omitindo/ocultando à contraparte que se julgam credoras de valores que mais tarde poderão vir a peticionar, pois o conhecimento de tal pretensão é relevante para que esta tome a sua decisão negocial relativamente à liquidação do mútuo e aos valores a cobrar nesse momento.

(da responsabilidade da Relatora)

Texto Integral

Processo número 11135/20.3T8PRT.P1 Juízo Central Cível de Penafiel, Juiz 2


Relatora: Ana Olívia Loureiro
Primeiro adjunto: Carlos Gil
Segunda adjunta: Ana Paula Amorim




Acordam no Tribunal da Relação do Porto:

I – Relatório:

1. Em 07-07-2020, A..., SA (adiante apenas A..., SA)  propôs ação a seguir a forma de processo comum contra Banco 1..., SA e Banco 2..., SA (doravante Banco 1... e Banco 2..., respetivamente), pedindo a sua condenação solidária no pagamento de 668 738, 12 € para ressarcimento de danos decorrentes do que configurou como incumprimento contratual, bem como no pagamento de indemnização, a liquidar posteriormente, para ressarcimento de danos alegadamente decorrentes do atraso na construção de edifícios que imputa ao comportamento negocial dos Réus.

Subsidiariamente pediu a condenação de cada um deles nas diversas parcelas em que se baseara o anterior pedido de condenação solidária, calculando e descrevendo a sua diferente medida de responsabilidade.

A sustentar a sua pretensão descreveu um contrato, denominado pelas partes como de mútuo, celebrado com ambos os Réus e pelo qual estes lhe emprestaram quantia monetária com obrigação de a Autora lha devolver, indicando as condições a que esse empréstimo ficou sujeito bem como as sucessivas alterações que sofreu, quer por acordo das partes quer, segundo alega, as unilateralmente impostas pelos Réus.

Sustentou que por causa das referidas alterações contratuais teve prejuízo patrimonial decorrente de vários acontecimentos que assim se podem sumariar: (i) alterações unilaterais, por banda dos Réus, da percentagem de spread acordada; (ii) cobrança indevida de comissões pelos Réus; (iii) violação, por estes, de acordo que já haviam aceitado, com vista à prorrogação do prazo para pagamento do capital mutuado; (iv) coação moral que sobre si exerceram e que levou à aceitação de condições contratuais com que não concordou; (v) indevida e antecipada cobrança de juros; (vii) indevida e antecipada cobrança de capital com retirada de fundos das contas da Autora.

2. Citados, ambos os Bancos Réus contestaram.

A) O Réu Banco 2...:

excecionando a incompetência por violação da cláusula contratual de fixação da competência territorial na Comarca de Lisboa;

invocando a sua ilegitimidade passiva relativamente aos atos praticados antes de 3 de agosto de 2014 (data a constituição do Banco 2...), dado o teor da deliberação do Banco de Portugal que, no âmbito da transferência do Banco 3... para o Banco 2..., excetuou as responsabilidades ou contingências do primeiro. Defendeu, ainda, que, sendo todos os demais factos alegados pela Autora decorrentes de obrigações do Banco 3... contraídas antes da data de constituição do Banco 2..., este também não pode ser responsabilizado pelo ressarcimento dos danos decorrentes de vicissitudes posteriores do contrato onde tais obrigações foram assumidas;

excecionando a ineptidão da petição inicial;

invocando a prescrição da sua responsabilidade enquanto intermediário financeiro;

excecionando o abuso do direito decorrente da alegação de que a Autora sempre teve conhecimento das quantias que pagou mensalmente aos Réus, nomeadamente na decorrência das alterações à percentagem cobrada a título de spread e nunca antes reclamou a sua devolução ou questionou ser devedora dessas quantias, que pagou durante vários anos, assim criando nos Réus a convicção de que continuaria a comportar-se da mesma forma no futuro;

sustentando a falta de fundamento legal para a condenação solidária dos Réus já que cada um deles assumiu obrigações perante a Autora e que esta imputa diferentes comportamentos a cada um delas; e, finalmente,

impugnando grande parte dos factos alegados pela Autora em fundamentação do pedido, mediante a apresentação de diferente versão das vicissitudes contratuais, nomeadamente na medida em que imputou àquela diversos incumprimentos e pedidos de alteração/prorrogação do contrato que foram, segundo aduziu, causa das alterações da percentagem de spread por que agora quer ser ressarcida.

B) A Ré Banco 1...:

excecionando a incompetência do tribunal por violação do pacto que fixou contratualmente a competência na comarca de Lisboa;

excecionando a prescrição do direito da Autora por terem passado mais de dois anos sobre os factos de que alegadamente terá decorrido a sua responsabilidade enquanto intermediária financeira;

invocando o abuso do direito da Autora por ter sido sempre conhecedora das diversas condições contratuais e as ter aceitado e, até certa altura, cumprido;

excecionando a ineptidão da petição inicial por ininteligibilidade do pedido de condenação solidária;

impugnando os factos alegados em sustentação dos pedidos mediante a enunciação de diferente versão das relações entre as partes desde a celebração do contrato de mútuo, nomeadamente descrevendo os vários acordos de alteração/prorrogação do mesmo como tendo sido celebrados no interesse e a pedido da Autora, com o seu acordo e mediante aceitação das contrapartidas que lhe propôs como condição de aceitação desses pedidos.

3. A 11-11-2020 foi proferido despacho que facultou à Autora prazo de 15 dias para exercer o contraditório em relação a toda a matéria excetiva.

4. A 16-11-2020 a Autora exerceu tal contraditório pugnando pela improcedência de todas as exceções;

5. A 11-01-2021 foi proferido novo despacho a facultar o contraditório, agora relativamente à pretensão do Tribunal de vir a conhecer da incompetência territorial.

6. A Autora defendeu (por requerimento de 15-012-2021), a competência territorial da comarca do Porto ou, assim não se entendendo, a da comarca de Porto Este e o Réu Banco 2... reiterou o seu entendimento sobre a competência da Comarca de Lisboa, por ter sido contratualmente acordada;

7. A 21-04-2021 o Tribunal (Juízo Central Cível do Porto) julgou-se incompetente e foi ordenada a remessa dos autos ao Juízo Central Cível de Porto Este, com o que todas as partes se conformaram.

8. A 10-06-2021 foi proferido despacho a dispensar a audiência prévia, tendo-se ali conhecido, pela sua improcedência, da exceção dilatória de ilegitimidade do Banco 2... e conhecido parcialmente do mérito por via da absolvição desse Réu do pedido na parte respeitante às quantias reclamadas decorrentes de factos ocorridos até 03-08-2014, decisão de que a Autora recorreu e que foi confirmada por acórdão proferido no apenso A (de apelação em separado).

Ainda no mesmo despacho foi a Autora convidada a destrinçar as quantias pedidas em decorrência de atuações do Banco 2... antes e depois da referida data de 03-08-2014. Foi, ainda, conhecida a exceção de prescrição, pela sua improcedência, e foi declarado que não se verificava a nulidade da petição inicial por ineptidão.

Foram fixados o objeto do litígio e selecionados os factos assentes e os temas da prova.

Admitidos os requerimentos de prova foi facultado contraditório sobre a pertinência e o possível objeto da prova pericial requerida pela Autora.

9. A Banco 1... reclamou da seleção da matéria de facto dada por assente e concordou com a realização de perícia.

10. O Banco 2... também reclamou da seleção da matéria de facto, mas discordou da utilidade da perícia.

11. Sem prejuízo da apelação que interpôs em separado, a Autora veio apresentar, em 23-06-2021, articulado em que se propôs discriminar os valores peticionados ao Banco 2... antes e depois de 03-08-2008, o que motivou impugnação desse Réu, expressa na sua resposta de 05-07-2021.

12. A 07-09-2021, novamente sem marcação de audiência prévia, foram julgadas improcedentes as reclamações apresentadas à seleção dos factos assentes e foi deferida a realização da perícia, cujo objeto foi fixado por despacho de 27-09-202. O consequente relatório pericial foi junto aos autos em 22-09-2022 (referência 8203631).

13. A perícia feita motivou pedidos de esclarecimento da Autora e da Banco 1..., o que foi deferido por despacho de 02-11-2022, sendo, todavia, ordenado que tais esclarecimentos fossem prestados em audiência de julgamento, para a qual foram, então, designadas datas.

14. A audiência de julgamento realizou-se ao longo de cinco sessões, com produção da prova admitida e debates orais.

15. A 06-09-2023 foi proferida sentença em que se decidiu:

Tudo visto, julgo a acção parcialmente procedente por provada e, em consequência, condeno a Ré Banco 1... a restituir/satisfazer à A. a quantia de 7.906,96 EUR, acrescida da diferença a mais de juros moratórios e remuneratórios calculados e cobrados sobre o capital de 1.485.400 EUR, à data de 01.08.2018, quando devia tê-lo sido sobre o capital de 1.480.791,99 EUR, ambas as quantias acrescidas de juros à taxa legal das obrigações da titularidade de empresas comerciais, desde a citação e até integral pagamento.

Absolvo os RR do mais que vem pedido, na sua totalidade (a título principal, cumulativo e subsidiário).”

II - O recurso:

É desta sentença que recorrem a Autora e a Ré Banco 1... pretendendo ambas a alteração parcial do julgamento da matéria de facto e a sua revogação parcial

Para tanto, alegam o que sumariam da seguinte forma em sede de conclusões de recurso:

A Autora:

(…)

A Ré Banco 1...:

(…)

A Autora contra-alegou sustentando a falta de fundamento para o recurso da Banco 1....

Tal como esta contra-alegou pugnando pela improcedência da apelação da Autora para o que indicou, também ela, meios de prova destinados a contrariar parte da impugnação da matéria de facto pretendida pela mesma, transcrevendo, para o efeito partes de depoimentos que entende relevarem para a sua pretensão.

Também o recorrido Banco 2... contra-alegou tendo defendido a confirmação da sentença quer por via da improcedência da impugnação da matéria de facto pretendida pela Autora – para o que também analisa e transcreve partes de depoimentos que entende conduzirem a tal conclusão -, quer pela afirmação de que inexiste qualquer fundamento de facto e de direito para a sua condenação bem como não há arrimo para a sua condenação solidária com a Banco 1..., como defendido pela Apelante.

III – Questões a resolver:

Em face das conclusões dos Recorrentes nas suas alegações – que fixam o objeto do recurso nos termos do previsto nos artigos 635º, números 4 e 5 e 639º, números 1 e 2, do Código de Processo Civil -, são as seguintes as questões a resolver:

Aferir se deve ser alterada a matéria de facto em função das pretensões de ambas as apelantes:

Da A..., SA, que pede, por esta ordem a alteração das alíneas OOO), ZZZ), 13), HHHH), IIII), JJJJ), 10, 11, 12, V), W), KK) e LLLL) dos factos selecionados em sentença;

DA Banco 1..., que pede a alteração da alínea BBBB) dos factos provados.

Ampliar a matéria de facto por não constarem do elenco de factos provados e não provados factos essenciais que foram alegados nos articulados;

Aferir qual o reflexo das alterações feitas ao elenco dos factos provados/não provados na decisão de direito;

Ainda que improceda a impugnação da matéria de facto defendida pela apelante A..., SA, apurar:

Se há fundamento para a condenação de ambos os bancos na devolução de todas as comissões cobradas à Autora;

Se não podia ter sido exigido à Autora o pagamento de despesas com distrates de hipotecas e com avaliações de imóveis;

Se há fundamento para a condenação de ambos os Bancos no pagamento de valores decorrentes da diferença entre as percentagens de spread acordadas e as cobradas e, havendo-o, se é abusivo o exercício pela Autora do direito de exigir tal pagamento.

Se a Banco 1... aceitou, em maio de 2017, a prorrogação do prazo de vencimento do mútuo por cinco anos; assim não se entendendo,

Se a Banco 1... violou a boa-fé rompendo as negociações com a Autora com vista à prorrogação do mútuo por cinco anos, mediante alteração unilateral das condições antes aceites para a sua prorrogação, e, assim, frustrou expetativa jurídica da mesma que seja merecedora de tutela.

Se foi ilícita a recusa dos Réus em reduzir as hipotecas;

Se o referido nas alíneas c) a f) e a cobrança pelos Réus de valores depositados na conta da Autora provocou limitação na sua atividade comercial e determinou o atraso da construção de alguns edifícios;

Se, a existir, a responsabilidade de algum dos Réus pelo pagamento de qualquer das quantias peticionadas, tal obrigação é solidária.

4 - Ainda que improceda a impugnação da matéria de facto defendida pela apelante Banco 1..., apurar se há fundamento para absolver do pagamento da quantia de 7 906, 96 €.

IV – Fundamentação:

Foram os seguintes os factos selecionados pelo tribunal recorrido como relevantes para a decisão da causa (corrigem-se já, nos termos do artigo 614º, número 1 do Código de Processo Civil, os manifestos lapsos: - de escrita da alínea LL) no trecho em que consta “25% em 2010” quando se pretendia dizer “25% em 2020” como resulta do documento número 22 da petição inicial para que tal alínea remete; e,- de cálculo, na alínea FFF) uma vez que as parcelas ali identificadas sob o ponto 1) não somam o valor de  6 238, 08 € ali mencionado).

“Factos provados:

A) A sociedade autora - doravante A..., SA - é uma sociedade anónima que tem por objeto social “a promoção, construção, comercialização e gestão de parques empresariais ou industriais, a promoção imobiliária, a cedendo o seu uso a terceiros e prestando serviços conexos, a compra e venda de prédios rústicos e urbanos e a revenda dos adquiridos para esse fim”.

B) A A. adquiriu o património imobiliário da massa insolvente de B..., LDA (conhecida por C...) para aí implementar o parque empresarial de AMARANTE (denominado D...) e de VILA POUCA DE AGUIAR.

C) Os RR são duas instituições de crédito que exercem a atividade bancária em regime de exclusividade.

D) O Réu Banco 2..., SA foi constituído por deliberação do Conselho de Administração do Banco de Portugal (CA BdP) tomada em reunião extraordinária de 3 de Agosto de 2014, nos termos do n° 5 do artigo 145°-G do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (ao diante RGICSF), aprovado pelo Decreto-Lei 298/92, de 31 de Dezembro.

E) A A., com vista à aquisição do património imobiliário da massa insolvente de B..., LDA, contraiu, em 14.02.2002, um mútuo de €7.481.968,00 (cada R. mutuou €3.740.984,00), por 10 anos, junto da Ré e do Banco 3..., tendo o Banco 3... e a Banco 1... mutuado a importância de €3.740.984,00, conforme DOC 2 junto com a petição inicial e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

F) Aquele contrato foi alterado por aditamentos escritos de 02.09.2003 (DOC 2B), 11.01.2005 (DOC 3), 05.02.2015 (DOC 4) e 08.10.2015 (DOC5), todos juntos com a petição inicial e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

G) O prazo de vigência inicial do contrato foi de 10 anos, reembolsável “em 16 semestralidades iguais e sucessivas, vencendo-se a primeira 30 meses após a assinatura do presente contrato” - clªs 2ª e 5ª, nº 2 do DOC 2.

H) Cada mutuante inicialmente entregou a importância de €:3.067.607,00, no total de €6.135.214,00, mediante crédito nas contas à ordem da A., sediadas nas agências de Amarante de cada banco, fazendo-se a utilização do remanescente capital mutuado no prazo de 24 meses, salvo o condicionalismo previsto no nº 4 da cláusula 3ª - clª 3ª nº 1, 2, 3 e 4 do DOC 2.

I) Para remunerar o capital mutuado foi convencionada a taxa de juro Euribor a 6 meses (E6M) acrescida de um spread de 1,25%; os juros eram pagos postecipadamente, no final de cada período de 6 meses, iniciando-se a contagem dos juros a partir da data de assinatura do contrato 22- clª 4ª nº 1 e 2 do DOC 2.

J) Em caso de mora no pagamento de qualquer prestação, a taxa de juro convencionada seria “acrescida de uma sobretaxa permitida pela lei” - clª 4ª nº 4 do DOC 2.

K) “No caso de alterações supervenientes do mercado devidamente justificadas, o Banco 3... e a Banco 1... poderão modificar a taxa de juro, assistindo à mutuária o direito de resolver o presente contrato” - clª 4ª nº 5 do DOC 2.

L) Mais se convencionou que: “Sobre este empréstimo não será devida qualquer comissão” - clª 6ª do DOC 2.

M) Em garantia do bom cumprimento do empréstimo, a A. deu em 1ª hipoteca aos RR, em plena igualdade, os imóveis adquiridos com o capital mutuado e subscreveu e entregou uma livrança caução em branco a cada um dos bancos - clª 7ª nº 1 e 8ª nº 1 do DOC 2 e escritura de compra e venda e hipoteca dos imóveis junta como DOC 2 A com a petição, cujo teor aqui se reproduz.

N) A primeira prestação de capital venceu-se em 12.09.2004 pelo que se considerou como data de perfeição do mútuo a data de 12.03.2002.

O) A conta da Banco 1.../Amarante tem o nº ...03 e a do Banco 2.../Amarante tem o nº ...07....

P) Estabeleceu-se bem assim no contrato que: “Qualquer alteração ao presente contrato terá de ser acordada por escrito entre todos os contraentes” - clª 9ª do DOC 2.

Q) E ainda que: os RR têm o direito a declarar o “vencimento antecipado das obrigações”, designadamente: (i) em caso de mora ou incumprimento definitivo de qualquer obrigação por parte da A. (ii) diminuição das garantias prestadas pela A. (iii) arresto, penhora, oneração das garantias prestadas (exceto arrendamentos desde que comunicados e não impliquem desvalorização significativa dos imóveis hipotecados), instauração de processo especial de recuperação ou insolvência pela A. (iv) ocorrência de incidentes bancários por parte da A. - clª 11ª nº 1, alíneas b),c), d), e), f) do DOC 2.

R) “ A declaração de vencimento…faz-se por carta registada com aviso de receção enviada para o domicílio da mutuária, da qual constará não só o fundamento mas também as quantias devidas ao Banco 3... e à Banco 1...” e “produz efeitos no terceiro dia posterior ao envio da carta…tendo a mutuária o prazo de 5 dias úteis para proceder ao pagamento das quantias nela referidas” - clª 11ª, nºs 2 e 3 do DOC 2. .

S) “As partes acordam que, para efeitos de citação judicial, incluindo por via postal prevista no Código de Processo Civil, serão utilizados os domicílios indicados no ponto 2 desta cláusula” “Banco 3... - Departamento de Municípios e Institucionais, ... Porto; Banco 1... - Gabinete de Empresas e Soluções, Praça ..., ..., ... Penafiel; A..., SA - ..., ... Amarante” - clª 13ª nº 1 e 2 do DOC 2.

U) Nos termos da alteração sob o DOC 3, contratualizou-se um aumento do capital mutuado em €:667.000,00 (€:333.500,00, cada banco), destinado a “financiar parte das infra-estruturas a executar no imóvel a cuja aquisição o contrato ora em aditamento se destinou” - clª 1ª do DOC 3 - confessando-se então a A devedora da importância €:7.458.968,00 - clª 3ª do DOC 3 - mantendo-se “na íntegra, em vigor, todas as demais cláusulas do contrato de mútuo…” - clª 4ª do DOC 3.

V) O aditamento de 05.02.2015 (DOC 4 com a petição) prorrogou o prazo de vencimento do mútuo para 12.03.2015, como resulta da conjugação das clªs 3ª, 4ª e 10ª do DOC 4 -; a A confessou-se devedora da importância de €.3.256.050,00 (€.1.569.076,00 à Banco 1... e €:1.686.974,00 ao Banco 2...) - clª 5ª do DOC 4; o spread alterou-se para 5,5%23 - clª 6ª do DOC 4.

W) O aditamento de 08.10.2015 (DOC 5), que teve efeitos retroativos a 12.03.2015 - clª 11ª do DOC 5 -, prorrogou o prazo de vencimento do mútuo para 12.03.2017 - clªs 1ª, 3ª e 4ª do DOC 5 -; a A confessou-se devedora da importância de €.3.218.950,02 (€.1.550.526,00 à Banco 1... e €:1.668.424,02 ao Banco 2...) - clª 5ª do DOC 5 -; o spread alterou-se para 3,5% - clª 6ª do DOC 5.

X) Os juros venciam-se de 6 em 6 meses, aos dias 12 de setembro e 12 de março.

Y) A Banco 1... cobrou o spread como segue: de 1,25% para 2% no período de 24 de março de 2009 a 30 de setembro de 2009, mantendo-o em 2% até 30 de março de 2011, momento em que o aumentou para 3,5%, mantendo-o assim até 25 de setembro de 2014; no período de 12 de setembro de 2014 a 12 de março de 2015 fez novo aumento, agora para 5,5%; em 12 de março de 2015 reduziu novamente para 3,5% até 27 de setembro de 2015, valor que manteve inalterado até à extinção do mútuo em agosto de 2018.

Z) O Banco 3... cobrou o spread como segue: no período de 28 de setembro de 2010 a 11 de março de 2011 aumentou de 1,25% para 2,5%, mantendo-o em 2,5% até 11 de setembro de 2011; no período de 11 de setembro de 2011 a 11 de abril de 2012 fez novo aumento para 4,5%; de 11 de abril de 2012 a 12 de outubro de 2012 aumenta para 5,5%, mantendo-se em 5,5% de 12 de outubro de 2012 a 12 de abril de 2013 e nos semestres de 12 de abril 2013 a 12 de outubro de 2013, de 12 de outubro de 2013 a 12 de abril de 2014, de 12 de abril de 2014 a 03 de Agosto de 2014 e, após, até 12 de outubro de 2014, de 12 de outubro de 2014 a 12 de março de 2015; no período de 12 de março de 2015 a 11 de setembro de 2015 foi reduzido para 3,5%, até à extinção do mútuo em agosto de 2018.

AA) Os RR consideraram o crédito vencido, com comunicação de incumprimento à Centralização de Responsabilidades de Crédito do BANCO DE PORTUGAL (BP).

BB) A A. teve absoluto, imediato e integral conhecimento das quantias que mensalmente pagava aos RR. em consequência da celebração do contrato e aditamentos juntos com a p.i., tendo a A conhecimento das taxas de juro que eram aplicadas e o montante que a título de juros lhe era mensalmente cobrado bem como o de outros encargos cobrados.

CC) O Banco 3... comunicou à A. as alterações do spread que efetuou, designadamente através das missivas juntas com a p.i. sob os nºs 7 e 8, cujo teor integral aqui se dá por inteiramente reproduzido, quer no que concerne à possibilidade de resolução do contrato, quer à fundamentação da alteração comunicada.

DD) Em 12.03.2017, a Banco 1... e o Banco 2... cobraram os juros do mútuo, conforme nota de lançamento e extratos de conta, juntos como DOC 11, 11 A, 12 e 13 com a petição inicial, cujo teor aqui se reproduz, sem qualquer acréscimo de taxa moratória.

EE) Por sua vez, a Banco 1... cobrou a comissão de prorrogação do prazo contratual - €:175,00, mais imposto de selo €:7,00 (DOC 14 com a petição, cujo teor aqui se reproduz).

FF) Em 06.09.2017, a Ré Banco 1... enviou um mail, solicitando: (i) pacto social atualizado da A. (ii) relação e informação dos bens sobre os quais detinha hipoteca, com identificação dos prédios arrendados e valor das rendas auferidas (iii) fotocópia com valor informativo das descrições prediais dos imóveis, cadernetas prediais, plantas dos imóveis, comprovativos dos seguros (iv) declarações de não dívida ao Estado (v) elementos contabilísticos dos últimos 3 anos, conforme DOC 15 coma petição inicial.

GG) Em 25.09.2017, enviou novo mail (DOC 16) a solicitar mais elementos: (i) relatório e contas de 2016 e CLC da A..., SA (ii) elementos contabilísticos das sociedades E... e F... (iii) esclarecimentos sobre a propriedade de vários prédios adquiridos por  CLC - certificação legal de contas; (iv) esclarecimentos sobre a diferença entre arrendado e cedido.

HH) Todos os esclarecimentos e documentação foram prestados à Banco 1....

II) Em 08.09.2017, a Banco 1... transferiu para si mesma os dinheiros da conta nº ...03 da A. junto da agência de Amarante, até colocar o saldo a 0 (zero), para se pagar dos juros do mútuo (que se venceriam em 12.09.2017) - €:24.204,59 -, imposto de selo - €:968,18 -, pagamento parcial de capital - €:1.130,49 + €.499,48 -, comissão de processamento - €.4,00 -, imposto de selo - €: 0,16 -, tudo conforme extrato de conta (DOC 17 com a petição) e aviso de lançamento emitido no dia 11.09.2017 (DOC 18 com a petição).

JJ) Em 20.12.2017, a Banco 1... transmitiu à A. que aceitava prorrogar o mútuo por 5 anos, nas seguintes novas condições: (i) pagamento do capital: 30% nos anos 2018 e 2019, 20% no ano de 2020 e 10% nos anos de 2021 e 2022 (ii) distrate das hipotecas dos imóveis vendidos de forma casuística, isto é, sem ser de acordo com o mapa de valores de distrates de hipotecas por fração, conforme DOC 21 que se junta (ver parte do DOC 21 com a PI, que refere “proposta Banco 1... de 20 de Dezembro”).

KK) Através do DOC 21 junto com a petição inicial, parte final, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, foi apresentada, a 22.12.2017, uma “contraproposta da A..., SA”, como segue: (i) seria desejável não existir uma grelha mínima anual de amortização e que a existir ela deveria ser igual (20%) em cada ano, sendo que todas as vendas implicam o cancelamento de hipoteca (o que implica amortizações de capital antecipadas); (ii) no caso das amortizações antecipadas ultrapassarem o limite previsto, deverão refletir-se no 3º ano e atingido este no 5º ano; (iii) fixação prévia do valor de amortização em caso de cancelamento de hipoteca, propondo a solução do Banco 2... de amortização de 50% do valor comercial de cada fração com base na avaliação existente; (iv) pedido de desoneração do património hipotecado à medida da amortização da dívida, por forma a permitir encontrar fontes de financiamento alternativo para permitir acelerar o processo de recuperação/construção de novos espaços empresariais.

LL) Em 01.02.2018, a Banco 1... informou as suas novas condições, que se transcrevem: (i) Prorrogação por 5 anos (até 12.03.2022), com obrigatoriedade de amortização anual da dívida nos seguintes termos: 20% em 2018 e 2019; 25% em 2020, 20% em 2021 e 15% em 2022; (ii) Spread-5%; (iii) Juros: pagamento mensal em vez de semestral; (iv) Consignação de receitas (das rendas de prédios), tudo conforme DOC 22 com a petição, cujo teor aqui se dá por reproduzido.

MM) Por mail de 27.3.2018, informou a A. que aceitava a proposta de 01.02.2018, conforme DOC 23 com a petição, posição que deu a conhecer ao Banco 2....

NN) Por mail de 25.06.2018, a Banco 1... enviou à A. as minutas dos contratos, cujo texto fora “já consertada[s] entre a Banco 1... e o Banco 2...”, conforme consta do DOC 24 junto com a PI, sendo que acompanharam o mail, a que se refere o DOC 24, as minutas  juntas à petição como DOC 25 e 26, cujo teor aqui se tem por reproduzido, para serem assinadas pela A.

OO) Adenda ao mútuo (DOC 25):

O contrato é prorrogado por 5 anos, com efeitos a 11.03.2017, terminando em 11.03.2022, data em que toda a dívida deverá estar paga - clª 2ª nº1 e 2;

 Juros: 5% + E3M quando esta for positiva - clª 4ª nº 1 e 5;

Juros: faculdade dos RR definirem um novo regime de taxa de juro, como condição de eventual prorrogação do contrato - clª 4ª, nº 4;

 Juros: passam a ser pagos mensalmente - clª 5ª, nº 2;

Amortização do capital: 20% em 31.12.2018 e 31.12.2019; 25%, em 31.12.2020; 20%, em 31.12.2021 e 15%, em 31.12.2022 - clª 5ª, nº 3;

 Até à concorrência das percentagens definidas anteriormente a A fica obrigada a entregar integralmente o preço a receber da alienação de imóveis hipotecados aos RR - clª 5ª, nº 4;

Comissões: o contrato fica isento do pagamento de qualquer comissão, com exceção: a) do direito à cobrança dos custos e encargos associados à contratação do financiamento, incluindo “despesas similares”; b) comissão de recuperação de valores em dívida e c) comissão de avaliação dos imóveis, com uma periocidade não inferior a 1 ano - clª 6ª;

Faculdade de compensar créditos com toda e qualquer conta da A. junto dos RR - clª 17ª;

Consignação de rendimentos: todos os rendimentos que tenha direito a receber dos prédios hipotecados ficam consignados a favor dos RR - clª 4ª;

Cessão de créditos: a A concede antecipadamente, de forma definitiva e irrevogável, autorização aos RR para cederem total ou parcialmente, uma ou mais vezes, os seus créditos a terceira ou terceiras entidades, dispensando de sigilo bancário os RR e conferindo, desde já, poderes a esse (s) terceiro (s) adquirente (s) para preencher as livranças em branco entregues aos RR - clª 5ª nº 1, 2 e 3;

Dispensa de sigilo bancário: os RR podem transmitir toda a informação que tenham da A a todas as entidades que integram os GRUPOS Banco 1... e Banco 2..., incluindo filiais e outros bancos participados por cada um dos RR sediados fora do território nacional - clª 6ª;

PP) Contrato de consignação de rendimentos (DOC26): A A propôs-se consignar a favor dos bancos…os rendimentos provenientes dos imóveis de que é proprietária - considerando III: (xiii) Em garantia de todas as obrigações que sejam devidas e das que venham a ser devidas aos RR, a título de juros e capital (sendo que os juros se fixam em 11,45% + 3%), a A consigna a favor dos RR todos os rendimentos que aufere e venha a auferir dos prédios dados de hipoteca a favor dos RR, sendo que os bancos os podem utilizar mensalmente para pagar os juros, despesas e outros encargos do mútuo - clª 2ª, nº 1 e 2; (xiv) As rendas a pagar pelos arrendatários dos prédios passam a ser feitas para uma conta da Banco 1.../Banco 2..., vinculando-se a A a comunicar aos arrendatários a obrigação de passarem a pagar para a conta que os RR venham a indicar, de acordo com a minuta imposta pelos RR - clª 2ª, nº 4 e novamente 4 e 5; (xv) Não pode sublocar ou praticar qualquer ato de administração sem autorização dos RR- clª 2ª, nº 8, alínea e); (xvi) A cessação, por qualquer motivo, de contratos de arrendamento constitui causa de vencimento e exigibilidade antecipada das obrigações garantidas - clª 2ª, nº 9; (xvii) A celebração de contratos-promessa constitui causa de vencimento e exigibilidade antecipada das obrigações garantidas - clª 2ª, nº 9; (xviii) Quaisquer outros rendimentos gerados pelos prédios que não resultem de rendas de arrendamentos ficam igualmente consignados em garantia das obrigações - clª 2ª, nº 10; (xix) O contrato de consignação só se extinguirá com o cumprimento integral das responsabilidades garantidas - clª 2ª, nº 12.

QQ) A A. recusou a renovação consubstanciada nas alíneas anteriores.

RR) No dia 1 de Agosto de 2018, a A. procedeu ao pagamento do saldo em dívida do mútuo - €:1.530.695,55 à Banco 1..., conforme DOC 27 e €:1.709.507,75 ao Banco 2..., conforme DOC 28, ambos juntos com a petição inicial, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

SS) Os RR comunicaram à Central de Responsabilidades de Crédito do BP que o crédito relativo ao mútuo se encontrava em situação regular até Julho de 2017, conforme DOC 29 a 33 juntos com a petição, que aqui se dão por reproduzidos.

TT) Em Agosto de 2017 aparece a referência de que o crédito (€1.631.958,00) no Banco 2... estava vencido, com a “duração de incumprimento” “até 1 mês”, conforme DOC 34 junto com a petição inicial.

UU) O Banco 2... manteve sempre essa informação - crédito vencido, com a “duração de incumprimento” “até 1 mês” de 31.08.2017 a 31.07.2018, conforme DOC 34 a 45 com a petição inicial.

VV) Por sua vez, a Banco 1..., só fez a primeira comunicação de incumprimento, à Central de Responsabilidades de Crédito do BP, em Outubro de 2017, declarando que o crédito (€.1.479.162,00) estava vencido, com a “duração de incumprimento” “mais de 1 até 2 meses” - ver DOC 36 com a petição inicial.

WW) Com data de 19.09.2017, a Banco 1... enviou aviso de incumprimento à A e dele consta que o capital se venceu em 08.09.2017, conforme DOC 46 com a petição inicial, cujo teor aqui se reproduz.

XX) Em Novembro de 2017, a Banco 1... manteve a mesma informação à CENTRAL DE RESPONSABILIDADES DE CRÉDITO do BP - ver DOC 37 com a petição inicial.

YY) Em 28.12.2017 a Banco 1... fez movimentos na conta da A. e, simultaneamente, comunicou à CENTRAL DE RESPONSABILIDADES DE CRÉDITO do BP, que considerou regular o empréstimo à A desde dezembro de 2017 até fevereiro 2018.

ZZ) Para o efeito, a Banco 1... cobrou €:3.564,96 a título de “imposto de selo s/capital” mais uma comissão de “alteração contratual” (€:175,00) e imposto de selo (€:7,00), no valor total de €.3.746,96 e, de seguida, anulou na conta à ordem todos esses movimentos que perfazem €.3.746,96, conforme DOC 47 e 48 com a petição inicial.

AAA) Nos meses de dezembro de 2017, janeiro de 2018 e fevereiro de 2018, a Banco 1... considerou o crédito da A como “regular”, nos termos que resultam dos DOC 38 a 40 juntos com a petição.

BBB) De Março de 2018 a Maio de 2018 tornou a comunicar à CENTRAL DE RESPONSABILIDADES DE CRÉDITO do BANCO DE PORTUGAL que o crédito da A. estava vencido/incumprimento, sendo que a primeira comunicação refere “mais de 1 até 2 meses”, a segunda “mais de 2 até 3 meses” e a terceira “mais de 3 até 6 meses”, conforme se alcança dos DOC 41 a 43 com a petição inicial.

CCC) Novamente em Junho e Julho de 2018 a Banco 1... considerou o crédito da A como regularizado, conforme DOC 44 e 45.

DDD) Em 08.09.2017 a Banco 1... cobrou os juros do mútuo, €: 24.204,59 (ver DOC 18 com a petição inicial), sem acréscimo da sobretaxa moratória prevista na clª 4ª nº 4 do DOC 262, e os juros vencidos em março de 2018 cobrou-os em agosto 2018.

EEE) O Banco 2... cobrou os juros vencidos em setembro de 2017 e Março de 2018, sem cobrança da sobretaxa moratória - o Banco 2... cativou os montantes depositados para pagamento das prestações de juros, não as debitando em conta, só o tendo feito em 01.08.2018, aquando do pagamento do capital em dívida (ver DOC 28 com a petição inicial).

FFF) Pela Banco 1... foram retirados fundos da conta à ordem nº ...03 da A.: 1) para pagamento/amortização antecipada de capital as seguintes quantias: €:1.130,49 + €.499,48 + €:2.896,04 + €:1.779,20 + €:63,54 + €:11.550,37 + €.123,00 + €:128,14 + €:984,00 + €:1.660,50), conforme extratos bancários e documentos “Excel” juntos como doc. 48-A e doc. 48-B com a petição inicial; 2) e ainda de outros valores, como segue: (i) €:18.494,65 - juros de mora; (ii) €:739,80 - Imposto de selo sobre os juros de mora; (iii) €7.418,85 - Comissão recuperação valor em divida; (iv) €:296,75 - Imposto de selo sobre comissão de recuperação; (v) €2.080,00 – Comissão de avaliação e imposto de selo; (vi) €7.129,92 - imposto sobre alteração de prazo extratos; (vii) €364,00 - Comissão de alteração de prazo e imposto de selo, tudo conforme extratos bancários e documentos “Excel” juntos como doc. 48- A e doc. 48-B com a petição.

GGG) Aquando da liquidação da operação, a Ré Banco 1... informou a Autora Parques do EDT da quantia em dívida e cujo pagamento permitia a liquidação da totalidade das responsabilidades.

HHH) Em resposta, a Autora Parques do EDT informou por email que “somos a confirmar que vamos mandar emitir cheque para liquidação do financiamento conforme v/ apuramento" – cfr. documento n.º 7, junto com a contestação da Ré Banco 1..., cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

III) Os movimentos que medeiam 02.2018 e 07.2018 na conta da A. na Banco 1... foram anulados – cfr. documento n.º 5 com a contestação da Ré.

JJJ) Caso se mantivesse estável o spread de 1,25% até 12.03.2015, o valor a título de juros e imposto de selo a cobrar pela Banco 1... ascendia a 257.363,52 EUR e foram efectivamente cobrados a tal título 456.545,43, ou seja, mais 198.181,91 EUR.

LLL) A Banco 1... cobrou valores com base no spread de 3,5% na prestação com data de início de 12.03.2015 e vencimento em 14.09.2015 e entre o período de 12.03.2015 e 08.10.2015 a Banco 1... sempre aplicou a taxa com o spread de 3,5%.

MMM) Caso se mantivesse estável o spread de 1,25% até 11.03.2015, o valor a título de juros e imposto de selo a cobrar pelo Banco 3... ascendia a 212 814,70 EUR e foram efectivamente cobrados a tal título 523.781,93 EUR, ou seja, mais 311.118, 49 EUR.

NNN) Na prestação que decorreu entre 12.10.2014 a 04.02.2015, o Banco 3.../Banco 2... cobrou o spread de 5,5% no fim do último período semestral e para o período seguinte (12.03.2015 e 11.09.2015) cobrou o spread de 3,5%.

OOO) A A. várias vezes manifestou verbalmente o seu descontentamento pela cobrança das taxas e comissões referidas, junto da Banco 1..., nas pessoas de AA e BB e do Banco 3.../Banco 2..., na pessoa de CC.

PPP) Em 12.03.2017 vencia-se o contrato de mútuo, tendo a A iniciado, cerca de 5 meses antes do vencimento, negociações com os RR com vista à prorrogação do prazo de vencimento do mútuo, por um período de 3 anos.

QQQ) O custo de oportunidade decorrente dos acréscimos do Spread na Banco 1... ascende a 19.605,13 EUR e relativamente ao Banco 3... de 35.276,58 EUR.

RRR) A Ré Banco 1... cobrou as comissões melhor caracterizadas no mapa de páginas 45 a 49 do relatório pericial constante dos autos e com a natureza ali indicada, aqui dando como reproduzido o seu teor, no valor global de 13.130,61 EUR, sendo o IS decorrente de juros de 58.857,57 EUR, acrescido de 24.446,91 EUR correspondente ao imposto de selo devido pela utilização do capital. Acresce mais 25.566,84 EUR de IS relativo a outras verbas e IVA cobrado.

SSS) Também o Banco 3.../Banco 2... cobrou comissões, ao menos de avaliação, distrates e cancelamentos de registos, em montantes/valores não apurados.

TTT) Ao menos em 26.01.2017 a A propôs aos bancos uma prorrogação do prazo de pagamento “final” do mútuo.

UUU) Ao menos por mail de 12.05.2017, o Banco 2... comunicou à Autora a aceitação da prorrogação por 5 anos e manutenção das condições contratuais, com uma condição ajustada, conforme DOC 10 junto com a petição inicial, cujo teor se dá por integralmente reproduzido: (i) Montante: €:1.631.958,01; (ii) 11.03.2022 (alargamento por 5 anos a contar de 11.03.2017); (iii) Amortização do financiamento em 50% do valor comercial de cada fração com base na última avaliação existente; (iv) Manutenção das restantes condições; (v) A aprovação fica condicionada à aprovação da prorrogação pela Banco 1..., nas mesmas condições.

VVV) A 29 de Agosto de 2017, numa reunião na Direção de Acompanhamento de Empresas da Banco 1... a Ré Banco 1... deu nota à Autora que não considerava autorizada a prorrogação do vencimento do mútuo.

XXX) Durante o período de conversações que se arrastou entre Setembro de 2017 e Abril de 2018, a A, por mais do que uma vez, solicitou à Banco 1... e ao Banco 2... autorização para libertar alguns imóveis hipotecados a fim de os poder usar em garantia de financiamento a solicitar noutro ou noutros bancos, mas os pedidos não foram aceites ao menos pela Banco 1....

ZZZ) As hipotecas constituídas sobre imóveis da A, em garantia do mútuo, suplantavam a dívida, conforme avaliação da Banco 1...

AAAA) À A. nunca foi enviada por qualquer dos RR qualquer carta registada com AR, dando nota da consideração do vencimento do crédito e dos valores em dívida a cada banco.

BBBB) A Banco 1... cobrou na data da extinção do mútuo (01.08.2018), a mais, juros moratórios e remuneratórios sobre o montante de 4.608,11 EUR de capital, liquidado em 15.09.2017; sendo, pois, que o capital em dívida à data daquela liquidação (01.08.2018) era o de 1.480.791,99 EUR (que não o de 1.485.400). Mais cobrou duplamente taxa de alteração contratual, no montante de 3.746,96 EUR e comissão flat, finex, no montante de 4.160 EUR (IS incluído).

CCCC) A A. tinha programado o início da construção do Edifício 1... no último trimestre de 2017 e o Edifício 2... no primeiro trimestre de 2018, no seguimento da conclusão do EDIFÍCIO 3..., ficando as obras a cargo do mesmo empreiteiro e pelo mesmo preço (do EDIFÍCIO 3...).

DDDD) No ano de 2009 a Autora Parques do EDT solicitou à Ré Banco 1..., S.A. uma suspensão do pagamento do capital das duas prestações previstas para o ano de 2009 correspondendo a € 234.000,00, cada.

EEEE) A primeira situação de alteração do spread de 1,25% para 2% ocorreu no seguimento desse pedido da Autora para prescindir da amortização da quantia aproximada de € 468.000,00 relativa ao ano de 2009, a qual foi autorizada pela Ré Banco 1..., S.A.

FFFF) Novamente, no ano de 2010, a Autora Parques do EDT voltou a solicitar uma carência do pagamento de prestações na componente de capital durante o ano de 2010 – cfr. documento n.º 3, com a contestação da Ré Banco 1....

GGGG) A segunda alteração do spread de 2% para 3,5% ocorreu no seguimento do pedido da Autora Parques do EDT para prescindir da amortização de capital de € 154.210,00 relativa ao segundo semestre do ano de 2010, o que também veio a ser aprovado pela Ré Banco 1..., S.A.

HHHH) Todas as alterações de condições, incluindo taxas de juros, spreads ou comissões foram comunicadas à Autora Parques do EDT.

IIII) Após a pretensão de prorrogação do prazo do mútuo pela A, a Ré Banco 1..., S.A. efetuou uma prorrogação intercalar do prazo do empréstimo por 6 meses (até 12 de setembro de 2017), a fim de permitir concluir as negociações tecidas com a Autora Parques do EDT.

JJJJ) Foi o que justificou a cobrança de uma comissão de prorrogação do prazo do empréstimo e o facto de o mesmo não se ter vencido, de forma imediata, em 12 de março de 2017.

LLLL) As quantias descontadas pela Banco 1... em setembro de 2017, antes da data do vencimento, tais cobranças foram anuladas e as respetivas quantias devolvidas à cliente, ressalvado ou sem prejuízo do provado sob BBBB).

MMMM) A Ré Banco 1... decidiu prorrogar o crédito desde a sua maturidade, em dezembro/2017, decidindo a prorrogação da operação por 60 dias, para efeitos de dar seguimento ao processo negocial, tendo sido nessa altura cobradas as quantias referidas em ZZ) com a respetiva data valor do seu vencimento em 2017.09.08, considerando que eram procedimento necessário para a prorrogação informática da operação.

NNNN) A Ré Banco 1... voltou a prorrogar a operação, em 08.02.2018. Também os movimentos ocorridos em consequência e até julho de 2018 foram anulados/devolvidos ao devedor – cfr. documento n.º 5, junto com a contestação da ré Banco 1..., sem prejuízo também do provado sob BBBB).

OOOO) Em Maio 2018, a Ré Banco 1... efetuou nova prorrogação intercalar do crédito de fevereiro de 2018 a julho de 2018.

PPPP) A cobrança de comissão de prorrogação do empréstimo, sem prejuízo de BBBB) e a cobrança de juros sem taxas moratórias, foi-o na medida em que foram sendo autorizadas várias prorrogações por curtos períodos de tempo face ao processo negocial em curso.

QQQQ) Por diversas vezes foi promovido o alargamento de prazo do financiamento, considerando que a proposta de reestruturação estaria em vias de ser aprovada e por forma a prosseguir com a negociação com a devedora, sendo esses períodos de prorrogação informática do crédito que estão espelhados nos reportes das responsabilidades da A. junto do Bdp.

RRRR) Os períodos de prorrogação ocorridos entre março de 2017 e julho de 2018 foram autorizados internamente e foram tidos como prorrogações informáticas de forma a permitir a continuidade do processo negocial da reestruturação.

SSSS) Sem prejuízo do assente em RRR), os custos cobrados como “comissões” pelo Banco 3... e Banco 2... relativos às avaliações e emissão dos títulos de distrate que respeitam aos montantes reclamados pela A, são o preço devido pelos serviços prestados pelos Réus à A. a esse título.

2. Factos não provados:

1. Houve outros valores ou diferenças entre os juros contratados e cobrados pelo Banco 3.../Banco 2... e Banco 1..., a mais ou para além dos provados sob JJJ) e NNN), a ascender ao valor global de 510.300,41 EUR;

2. A Autora, a mais de manifestações verbais, como assente em OOO) manifestou por outra forma a sua discordância pela cobrança das taxas e comissões junto da Banco 1....

3. Ainda antes da proposta formal ou já na sequência da proposta pela Autora conforme TTT), as partes acabaram por acordar numa prorrogação do prazo, não por 3 anos (como pretendia inicialmente a A), mas por 5 anos, mantendo-se inalteradas, no essencial, as demais condições contratuais.

4. Acordada a prorrogação do prazo de pagamento por mais 5 anos, com manutenção no essencial das condições vigentes, foi solicitado à A. que formalizasse, por escrito, a proposta, sendo essa a causa da comunicação assente em TTT)

5. Alguns dias antes do vencimento do mútuo (12.03.2017), o Banco 2..., na pessoa do Sr. Dr. DD, telefonou ao representante legal da A., Dr. EE, e comunicou que face às mudanças entretanto ocorridas no Banco 2... (possibilidade de venda a novo acionista), só poderiam assegurar a prorrogação do prazo por 6 meses, por necessidade de apresentação de todo o negócio ao “novo acionista”.

6. Ressalvando, no entanto, que o mesmo iria ser apresentado internamente (no Banco 2...) a breve trecho e que estava convicto de que a decisão anterior (de aceitação da prorrogação com manutenção das condições) se iria manter.

7. A A. deu conhecimento deste (novo) posicionamento do Banco 2... à Banco 1..., na pessoa do Sr. FF, gerente da agência da Banco 1... de Amarante.

8. A Banco 1... assegurou à A. que a sua posição não sofria alteração e ficou combinado aguardar-se pela reapreciação do Banco 2....

9. Em 5 de Maio de 2017, o Banco 2..., na pessoa do Sr. Dr DD, comunicou o resultado da reapreciação da proposta de prorrogação do prazo de pagamento, reiterando a aceitação da proposta nas condições iniciais.

10. No dia 12.05.2017 o gerente da agência de Amarante da Banco 1... confirmou à Autora, na pessoa do seu administrador e aos representantes do Banco 2... que a Banco 1... acompanhava a proposta do Banco 2..., cujas condições a Banco 1... havia já aprovado anteriormente, aquando da aprovação da prorrogação do mútuo por 5 anos, tendo ficado assente que a Banco 1... elaboraria o aditamento de prorrogação do prazo com as condições transcritas em UUU).

11. Por mais do que uma vez, a A e o próprio Banco 2..., solicitaram à Banco 1..., na pessoa do Sr FF, o envio do aditamento que ficara de elaborar, cujo atraso era justificado com a doença do seu diretor, Dr GG - que, mais tarde, veio a falecer - e com o seu processo de substituição.

12. A A. só tomou conhecimento do facto sob TT) em Novembro de 2017, porque o Banco 2... nunca lho comunicou.

13. A diferença assente em ZZZ), após 12.03.2017, era de quatro vezes mais o valor dos imóveis hipotecados que a dívida.

14. A conduta da Banco 1... conforme YY) e ZZ) foi-o para contornar as imposições do BP em matéria de constituição de provisões contabilísticas, mediante reclassificação do capital contabilisticamente, simulando perante o BP que o crédito estava regular.

5. Para além ou a mais do provado sob BBBB) a Banco 1... cobrou na data da extinção do mútuo (01.08.2018) a mais €:18.519,85 - diferença entre €:39.778,45 (relativamente a juros de mora, imposto de selo sobre juros de mora, comissão de recuperação, imposto de selo sobre comissão de recuperação, comissão de avaliação, imposto de selo sobre avaliação, comissão de alteração de prazo, imposto de selo sobre comissão de alteração de prazo, comissão de processamento, imposto de selo sobre comissão de processamento e juros) e €.21.258,60 (referente a diversos valores creditados na conta da A, em 01.08.2018, que deveriam corresponder a €.39.778,45).

6. Foi por ter ficado sem liquidez – por força do comportamento das Rés – que o procedimento relativo à construção dos edifícios programada pela A., conforme CCCC) teve de ser interrompido.

17. A prorrogação do prazo do mútuo em discussão nos autos por mais 5 anos teria permitido libertar meios financeiros para prosseguir obras que estavam praticamente paradas particularmente os EDIFICIOS 1... e 2....

18. A violação do acordo de prorrogação do mútuo pelos RR alterou o plano de investimentos, obrigando a canalizar o esforço financeiro para o pagamento do mútuo aos RR.

19.O que atrasou o início da construção dos EDIFICIOS 1... e 2..., com consequências no aumento do custo das empreitadas, face ao aumento do custo de mão de obra e materiais.

20. Todo este atraso desmotivou também o empreiteiro do EDIFÍCIO 3... que perdeu o interesse na construção dos edifícios 1... e 2....

21. Se os RR tivessem cumprido com o acordo de prorrogação do mútuo por mais 5 anos, a A teria começado as obras nos EDIFICIOS 1... e 2... dentro dos prazos previstos, a um custo de construção abaixo do custo que tem de suportar a preços de 2020.

22. Se as empreitadas dos EDIFICIOS 1... e 2... se tivessem iniciado nas datas previstas o seu custo ascendia a €: 554.385,54 + IVA para o Edifício 1..., conforme DOC. 54 e €: 554.385,54 + IVA, para o Edifício 2..., conforme DOC 54 A, ao passo que a preços atuais (2020) o seu custo ascende a €: 624.563,04 +IVA para o Edifício 1..., conforme DOC.55, sendo o preço do Edifício 2... o mesmo, atentas as caraterísticas da construção.

23. A Autora nunca reclamou junto dos RR as quantias cobradas/debitadas, durante dez anos.

24. A A. incumpriu repetidamente as obrigações emergentes do contrato junto com a p.i. sob o nº 2, alterado nos termos constantes dos documentos também ali juntos sob o s nºs 3 a 5.

25. A mais ou para além do provado sob DDDD) a GGGG) a Autora beneficiou de várias prorrogações do prazo de pagamento das prestações na componente de capital, tendo aceite a alteração do spread.

26. As minutas com as condições de reestruturação apenas chegaram à consideração da devedora Banco 1... em junho de 2018, uma vez que a reestruturação só foi aceite pela Autora no final de março de 2018.”.

1 – Da impugnação da matéria de facto:

Ambos os Apelantes indicaram os meios de prova que entendem sustentar as pretendidas alterações da matéria de facto, tendo identificado passagens da gravação dos depoimentos que têm por relevantes, bem como transcreveram parte deles.

Mais explicaram as razões pelas quais entendem que cada um desses meios de prova deve conduzir a decisão diferente da adotada pelo Tribunal a quo.

Também os Bancos Recorridos Banco 1... e Banco 2... indicaram os meios de prova que, defendem, conduzirão à improcedência da impugnação da matéria de facto pedida pela Apelante A..., SA.

Estão, assim, reunidos os ónus a que estão sujeitos os recorrentes que pretendem a alteração da matéria de facto, tal como previstos no artigo 640º do Código de Processo Civil.

Seguir-se-á a ordem escolhida pelas apelantes quer na enunciação das questões de facto que querem ver decididas, quer na apreciação crítica da prova que indicam em sustentação de cada uma dessas pretensões.


*

1. a) As alterações à matéria de facto pedidas pela A..., SA:

Alínea OOO) dos factos provados:

A referida alínea tem a seguinte redação: “A A. várias vezes manifestou verbalmente o seu descontentamento pela cobrança das taxas e comissões referidas, junto da Banco 1..., nas pessoas de AA e BB e do Banco 3.../Banco 2..., na pessoa de CC.”.

A Apelante quer vê-la alterada para: “A A várias vezes manifestou verbalmente a sua discordância pela cobrança de spreads acima do convencionado e comissões referidas, junto da Banco 1..., nas pessoas de AA e BB e do Banco 3.../Banco 2..., na pessoa de CC” (sublinharam-se os trechos objeto da pretensão de alteração).

Segundo a Apelante a substituição da palavra “descontentamento” por “discordância” decorre da interpretação que faz da primeira a que atribui o significado de “aceitação resignada”. Quanto à segunda parte da pretendida alteração, sublinha que o que estava em causa era a não aceitação pela Autora dos aumentos do spread e não a “cobrança de taxas”.

Entende a Recorrente que a não prova do facto constante da alínea 25) contradiz a prova de uma mera “aceitação resignada” ao aumento do spread e à cobrança de comissões, pois por via dessa alínea julgou-se não provado que tenha aceitado a alteração do spread.

A redação da alínea 25) dos factos não provados é a seguinte: “A mais ou para além do provado sob DDDD) a GGGG) a Autora beneficiou de várias prorrogações do prazo de pagamento das prestações na componente de capital, tendo aceite a alteração do spread.”

A Recorrida Banco 1... defende que a redação da alínea OOO) deve permanecer inalterada porque – segundo prova que indica –, a Autora apenas manifestou descontentamento, mas aceitou sempre as alterações da taxa que foram sendo feitas e sustentou que não faz qualquer sentido que se insira no texto da alínea a expressão “acima do convencionado”, como ora sugerido pela Recorrente, a não ser que a redação passe a ser: “acima do convencionado no contrato inicial”.

O recorrido Banco 2... sublinha a inexistência de qualquer documento que sustente a versão da Autora (de não aceitação dos aumentos de spread), e indica, transcrevendo-os em parte, os depoimentos que, a seu ver, conduzem à improcedência da pretensão de alteração.

Cumpre apreciar.

Antes de mais há que afirmar que a não prova – resultante da alínea 25 do elenco de factos -, de que a Autora tenha aceitado as alterações de spread, não implicaria nunca que se tivesse de considerar provado que as não aceitou, que é o que a Autora pretende ver julgado provado.

A não prova de um facto – no caso a aceitação de uma nova percentagem de spread -, não corresponde necessariamente à prova do facto contrário.[1]

Desde logo o tribunal pode perante duas versões da mesma factualidade não ficar convencido de nenhuma delas, sendo em face da não sua prova que operam, posteriormente e já em sede de fundamentação de direito, as regras de distribuição do ónus da prova que sejam cabíveis.

Donde, nunca se poderia concluir que da não prova de que a Autora aceitou todas as alterações ao spread (assim genericamente referidas na alínea 25 dos factos não provados), resulta que tenha que se dar por provado que as não aceitou e, menos ainda, que manifestou essa não aceitação.

Acresce que a referida alínea 25) contém conclusão de direito, pelo que também nessa parte deve ser corrigida.

A questão da aceitação enquanto declaração negocial é, no âmbito desta ação, uma questão de direito e não de facto.

Nos termos do previsto no artigo 217º do Código Civil “A declaração negocial pode ser expressa ou tácita: é expressa quando feita por palavras, escrito ou outro meio direto de manifestação da vontade, e tácita quando se deduz de factos que, com toda a probabilidade a revelam”.

Uma das questões a resolver na ação (e neste recurs), é exatamente a de saber se houve ou não aceitação pela Autora de determinadas condições contratuais solicitadas/impostas pelos Réus, no caso as relativas à taxa de spread.

Os aumentos das taxas de spread pelos bancos Réus foram por eles justificados como consequência e contrapartida dos sucessivos pedidos de prorrogação dos prazos de vencimento das obrigações de amortização de capital que Autora fez e lhe foram deferidos. Os Bancos alegaram, ainda, que a devedora aceitou esses aumentos porquanto os seus subsequentes comportamentos e, sobretudo, a sua inércia em manifestar oposição aos mesmos, foram reveladores de aceitação dessas contrapartidas. Subsidiariamente ambos alegaram que sempre o comportamento da Autora nesta ação, ao pedir a restituição das quantias resultantes do aumento do spread, seria abusivo por contrário a um comportamento que lhes criou a convicção de que a mesma não se opunha a tais aumentos.

Sublinhe-se que nenhum dos Réus alega que a Autora tenha declarado aceitar as alterações ao spread, antes sustentando que foram os seus comportamentos – nomeadamente omissivos -, que revelaram essa aceitação.

Nas palavras de Abrantes Geraldes[2], um dos vícios da decisão da matéria de facto “pode traduzir-se na integração na sentença, na parte em que se enuncia a matéria de facto provada (e não provada) de pura matéria de direito e que nem sequer em termos aproximados se possa qualificar como decisão de facto”. Em face da forma como devem ser delimitados os temas da prova, admite este Autor que mesmo em sede de sentença possam hoje ser admitidas com “mais naturalidade” asserções que possam não ser “puras questões de facto” desde que também não correspondam, “no contexto da concreta ação” a “puras questões de direito”.

De acordo. A questão há de ser assim resolvida em função do que seja o objeto de cada concreta ação.

Ora, se, em determinadas situações em que a questão da declaração negocial não é objeto de discussão se pode permitir, por inócua, a utilização da expressão “aceitação” como é usada na linguagem comum, já o mesmo não sucede num caso, como o que nos ocupa, em que tenha exatamente de se decidir se houve ou não declaração negocial, ainda que tácita, de aceitação da Autora em relação às alterações do spread  acordado, ou seja, se pode ou não considerar-se que ocorreu a alteração por acordo da cláusula do contrato de mútuo que fixava a respetiva taxa.

Lançando mão da dicotomia entre os conceitos de “facto material” e “facto jurídico” Alberto dos Reis[3], dando inúmeros exemplos de factos jurídicos que não deviam integrar o questionário, punha, também ele, sempre a tónica no objeto do processo como critério aferidor entre factos e direito. Entendemos transponível para o elenco de factos que deve constar da sentença o que tal autor afirmava então a propósito da seleção dos mesmos em sede de questionário: “Força é confessar que a organização dum questionário perfeito é tarefa que desafia a inteligência mais experimentada”. Admitida essa dificuldade não pode, contudo, a mesma ser ultrapassada senão pela cuidadosa destrinça, em cada litígio, do que constitui facto material e do que constitui asserção que contenha já raciocínio ou significado jurídico. Ter no horizonte o objeto do litígio ajuda nessa sempre difícil tarefa de navegação entre factos e direito. Ora a Mmª Juíza a quo fixou, e bem, como primeira alínea do objeto do litígio a “alteração unilateral” da taxa de spread. Donde se impõe concluir pela essencialidade da questão, de direito, que lhe contrapuseram os Réus – a de que tal alteração não foi unilateral, porque foi aceite pela Autora, o que se revelou pelos comportamentos que descreveram e querem ver interpretados como de manifestação negocial de aceitação.

Sendo a aceitação de uma proposta negocial também ela uma declaração negocial que se impõe – salvo dos casos previstos no artigo 234º do Código Civil, em que se dispensa tal declaração -, a mesma pode, como vimos, ser expressa ou tácita e, no caso, os Bancos Réus alegam factos de que querem fazer decorrer a aceitação tácita dos aumentos da taxa de spread anteriores a 5 de fevereiro de 2015 (data em que foi estipulado, por acordo escrito, um aumento da mesma e a partir da qual apenas ocorreu uma outra alteração do spread, também por acordo reduzido a escrito).

No caso dos autos a aceitação dos aumentos da percentagem de spread a que nos vimos referindo é, pois, um “facto jurídico” (usando a terminologia de Alberto dos Reis) e não um facto material pelo que não pode constar da alínea 25) dos factos não provados. Os Réus não alegam expressamente que a Autora tenha declarado aceitar[4] o aumento de spread (senão em 5 de fevereiro e em 8 de outubro de 2015), pelo que não pode constar nenhuma menção a tal aceitação no elenco dos factos, que, assim se eliminará da alínea 25.

Quanto à pretendia substituição, na alínea OOO) da palavra taxas por “spread acima de 1, 25%” o que o Tribunal deu por provado foi que a Autora manifestou o seu descontentamento pela cobrança das “taxas e comissões referidas”. Face à posterioridade da afirmação desse facto em relação aos que constam das alíneas JJJ) a NNN), as taxas ali “referidas” serão obviamente as que constam destas alíneas (que imediatamente a antecedem), ou seja, as cobradas a título de spread (e imposto de selo). Não se afigura que possa suscitar dúvida a remissão implícita para as alíneas anteriores, mas aceita-se que a redação da alínea OOO) ficará mais clara com a alteração da redação consistente na sugerida substituição da expressão “das taxas” pela expressão “ do spread acima de 1, 25 %”.

Já a introdução da expressão proposta pela Recorrente, “acima do convencionado” é que não pode aceitar-se, pois encerra uma conclusão relativa a uma das questões discutida (e essencial) nos autos que é a da existência, ou não, de acordo entre as partes relativamente à cobrança de taxas de spread superiores a 1, 25 %.

Esta é, aliás, a questão essencial que a Autora levanta quanto à alínea OOO) dos factos provados, que quer ver alterada: a de que nunca foram convencionados entre as partes os aumentos de spread, tendo sido impostos unilateralmente pelas Rés.

Quanto a essa questão, tenha-se presente aquilo que se conseguiu descortinar na fundamentação da matéria de facto como tendo relação com o ponto em análise:

Quanto agora às comunicações, rectius, conhecimento sob HHHH) e aos protestos verbais ou manifestações de desagrado pelo legal representante da Autora, ausente já prova documental de comunicação escrita destas pelos RR, ressalva uma única pelo 2º Réu, foi, decisivamente, o depoimento de parte do Dr. HH que serviu a demonstração do conhecimento imediato, fundado e ao cêntimo pela Autora das alterações de spread em causa, pelo acompanhamento rigoroso, meticuloso do departamento financeiro da Autora e pela direcção/implicação pessoal neste do legal representante mais directamente interveniente no processo de financiamento em causa, Dr. EE. Este acompanhamento, mediante a colocação imediata de questões aos interlocutores nas instituições bancárias quanto a movimentos a débito, respectivo significado e origem, fundamento e (in)admissibilidade ou falta de verificação dos pressupostos, “em cima do acontecimento” e com a exigência de apresentação de justificação foi bem assim corroborado pela totalidade dos funcionários bancários que nessa qualidade e por causa justamente do processo de crédito em causa lidaram com a A., na pessoa daquele seu legal representante. A personalidade deste e o domínio dos encargos financeiros ficaram bem patentes ademais no seu depoimento, em termos de ser manifesto que, ainda quando não comunicada por escrito a alteração do spread (admitindo-se que, como atestado, outras comunicações tenham sido entregues em mão, tal o modo privilegiado de relacionamento entre a A. e as entidades bancárias interlocutoras, a deslocação do legal representante aos locais físicos dos diversos departamentos que geriram o processo), esta foi imediatamente do conhecimento da Autora, gerando da sua parte a manifestação de um descontentamento, a exigir “explicações” pelos RR. É ainda o que as regras da experiência comum indiciam, quando se tenha presente já o significado ou montante dos valores pagos ou satisfeitos em função daquelas alterações.”

Deve ter-se ainda presente que a Apelante, quer na ação quer agora, em sede de recurso, várias vezes descreve como de “bullying” a atitude negocial da Banco 1... e afirma que foi moralmente coagida, bem como que se encontrava em situação de dependência económica, com todo o seu património hipotecado em favor das mutuantes, tendo sido nesse quadro que se viu obrigada a negociar com as Rés. Versão que perpassou ao longo de todo o depoimento do seu legal representante EE, e com que pretendeu, também, explicar a não reação da sua representada às variações da taxa de spread.

Ou seja, a Apelante A..., SA descreve um quadro factual que poderia mesmo ter enquadramento no quadro legal previsto nos artigos 255º (coação moral, mencionada na nota de rodapé número 33 da petição inicial) ou 282º (usura por exploração do estado de necessidade da devedora) do Código Civil. O que teria cabimento apenas no pressuposto de que a Autora exprimiu, de facto uma determinada vontade negocial – neste caso de aceitação do aumento do spread -, mas que sua vontade foi viciada por via de coação ou exploração da sua situação de necessidade.

O que é coisa diferente de afirmar que não aceitou esse aumento da taxa aplicável.

Nas conclusões do recurso a Apelante afirma mesmo que “Uma reação “mais musculada” esbarrava com a impossibilidade conjuntural de arranjar um banco que substituísse a Banco 1... e o Banco 3.../Banco 2..., mas A..., SA nunca aceitou os aumentos de spread – que ultrapassaram os 400% (de 1,25% chegaram a 5,5%, em abril de 2012 - vejam-se os aumentos de spread levados a cabo pelo Banco 3.../Banco 2... no facto assente Z).” assim visando explicar a inexistência de qualquer manifestação escrita de discordância contra os aumentos do spread e a cobrança de comissões – vejam-se as conclusões 11 a 13 do recurso -, mas que também pretende que justifique que não tenha, de facto, manifestado a discordância (a que quer ver julgada provada), apesar do desagrado que, naturalmente, o aumento da percentagem do spread lhe suscitou (que ficou provado).

Tendo presentes estas considerações iniciais, foram ouvidos na sua integralidade os depoimentos indicados por Recorrente e Recorridos a propósito da matéria em questão, para sua cabal compreensão e também porque quase todos esses depoimentos foram indicados, embora noutras passagens, como necessários à reapreciação de outros factos que a Recorrente quer atacar. Pelo que se tornou imperativo que os mesmos fossem integralmente ouvidos ao abrigo dos poderes de investigação oficiosa deste Tribunal, tais como referidos no artigo 640º, número 2, alínea a) do Código de Processo Civil.

Ora, da análise de toda a prova (por depoimento de parte, testemunhal e documental) indicada pela Autora/Apelante não resulta, de todo, que a mesma, através dos seus administradores, tenha transmitido a qualquer das Rés que não aceitava a cobrança do spread acima dos 1, 25 % inicialmente acordados ou de quaisquer comissões que lhe foram sendo cobradas e que pagou.

Mesmo as declarações de parte de EE, administrador da Autora começaram da seguinte forma, a respeito dessa questão: “quem está sujeito a um contrato e vê alteradas as condições e nomeadamente os valores, naturalmente reage primeiro com estupefação, com surpresa e vai reagindo no sentido de alertar que é excessivo.” Ou seja, nem este depoente afirmou que tenha comunicado a sua não aceitação a essas cobranças, afirmando apenas que foi alertando os Réus para o facto de que entendia esses aumentos de spread como excessivos (e não, como agora defende, como inadmissíveis em função do acordado no contrato de mútuo, independentemente da dimensão/grandeza dos mesmos). Disse, ainda, que a Autora não reagiu por escrito a tais aumentos de spread por que havia um trato pessoal instituído com ambos os Réus e que “ninguém poderá vir aqui dizer que eu não reclamava”. Do seu depoimento resultou que, de facto, lhe desagradava o aumento do spread (o que era de supor, aliás, de acordo com as regras da experiência comum), mas, também, que nunca afirmou que o não aceitava ou entendia que os Réus não podiam fazê-lo.

Foi diretamente questionado sobre a razão pela qual, pelo menos no momento de liquidação do mútuo, em 2018, não elaborou e entregou às Rés qualquer declaração de que não aceitava dever a totalidade do valor que lhe foi cobrado nesse momento e aceitou pagar, ou de que entendia ser credor das quantias que diz terem sido indevidamente cobradas ao longo da execução do contrato. Respondeu que “não era tradição” essa forma de comunicação escrita e que a relação com o Banco 2... era muito boa e que, nessa altura, a relação com a Banco 1... já era quase totalmente inexistente. O que, desde logo, justificaria que pelo menos quanto à Banco 1... a Autora tivesse comunicado por escrito a sua oposição ao aumento do spread e a salvaguarda de que se sentia no direito de pedir o seu reembolso. É que se a justificação para não comunicação por escrito é a relação de proximidade com o Banco 2... e, nessa mesma altura a relação com a Banco 1... era praticamente inexistente (leia-se relação com contactos pessoais) então, no caso desta mutuante nada desaconselhava, sobretudo no momento em que já se encontrava a liquidar o mútuo, a comunicação por escrito de um desacordo muito relevante, como foi o dos aumentos do spread (vejam-se as diferenças de valores cobrados que resultam das alíneas JJJ) e MMM).

Como também, em boa verdade, ocorria com o Banco 2..., já que a pergunta que lhe foi feita se referia a um momento temporal em que as partes acordavam já quanto às condições de liquidação do mútuo, tendo formalizado a mesma após negociação da fixação da quantia em dívida a cada mutuante.

Reportando-se aos factos que a Autora descreve na petição inicial como consubstanciadores de “coação moral” disse o seu legal representante EE que tendo o património todo hipotecado era impossível obter financiamento junto de outros bancos, pelo que tinha a Autora que ter alguma cautela porque “o mercado não estava com grande abertura”. Todavia, foi exatamente com recurso a outro financiamento pela banca que a Autora logrou liquidar o mútuo em discussão, tendo o seu Revisor Oficial de Contas, a dado momento do seu depoimento, como infra se verá, afirmado espontânea e categoricamente que a mesma “não teve grande dificuldade” em obter tal empréstimo junto da Banco 4....

Perguntado sobre a forma de comunicação dos vários pedidos de suspensão de pagamentos de capital feitos pela Autora à Banco 1..., afirmou que eram feitos verbalmente e depois formalizados por documento por ele entregue em mão, não sabendo dizer se da parte da Banco 1... as comunicações das respostas a esses pedidos lhe foram também entregues em mão. Ou seja, ele mesmo admitiu que pudessem ter sido entregues as repostas a esses pedidos, mediante declarações escritas.

Disse que a primeira alteração ao spread foi anterior ao termo dos 10 anos iniciais previstos para o mútuo, mas admitiu que já antes tinha havido pedidos da parte da Autora com vista a alterações aos prazos de pagamento de capital previstos no contrato, entendendo o depoente, todavia, que tais pedidos eram “compensados” porque, disse, nalgumas alturas amortizavam montante superior ao previsto a título de amortizações semestrais (o que não está demonstrado como infra melhor se detalhará).

HH, também legal representante da Autora pouco sabia das vicissitudes contratuais do mútuo, além do que lhe foi sendo transmitido pelo anterior depoente. Todavia, perguntado se o Revisor Oficial de Contas da Autora lhes tinha recomendado que não reagissem por escrito aos aumentos de spread, confirmou que aquele lhe transmitiu, em 2009/2010 que estava a ser comum essa prática pelos bancos e que os advertiu para o facto de todo o património da Autora estar hipotecado em garantia daquele mútuo, aconselhando-os a ir falando com os Réus, negociando com eles, sem escrever nada e sem tomar uma posição firme. Ou seja, admitiu que o conselho do seu ROC foi no sentido de não manifestar a não aceitação das condições que iam sendo postas pelos Réus. Este depoente relatou, ainda, sumariamente, o pedido de prorrogação do prazo de vencimento feito em 2015. E admitiu que, nessa altura, os Réus acordaram em reduzir o spread que vinham praticando para 3, 5% o que é demonstrativo de que, afinal, essa era uma questão negociável em que os Bancos Réus não assumiram sempre uma posição irredutível a que a Autora tinha que ceder inelutavelmente. Tal redução de spread foi expressamente acordada em 8 de outubro de 2015 quando, depois de outra alteração contratual também celebrada por escrito em fevereiro do mesmo ano e que fixara o spread em 5, 5% veio a reduzi-lo para 3, 5%.

Estas duas alterações, escritas, ao contrato objeto dos autos, que constituem os documentos números 4 e 5 da petição inicial são já demonstrativas da falta de razão da Apelante quando afirma que nunca aceitou alterações ao spread, o que, nessas duas ocasiões sucedeu e está demonstrado por documento por si subscrito.

A testemunha CC foi funcionário do Banco 2..., estando já reformado e disse ter acompanhado a relação com a Autora até 31 de dezembro de 2015, data em que o departamento em que trabalhava foi extinto tendo, então, o “processo” respetivo sido transferido para o Centro de empresas de Guimarães. O facto de ter tido esta proximidade de acompanhamento do mútuo durante cerca de treze anos e a circunstância de já não ter qualquer relação profissional com o Réu Banco 2... tornaram o seu depoimento particularmente relevante e credível.

Perguntado pela Mmª Juíza se a Autora alguma vez lhe tinha transmitido indignação pelo aumento do spread disse, seguramente, que não. Explicou que estando o mútuo previsto para 10 anos, até 2012, a Autora não fez amortizações “de rotina”, como previsto, semestralmente, mas foi havendo algumas amortizações “intercalares” e que foi a Autora, com quem disse manter boas relações, quem solicitou que não fossem feitas as amortizações semestrais de capital, por não ter disponibilidade de tesouraria. Descreveu que o Banco 3... e, depois, o Banco 2..., foram aceitando esses pedidos de suspensão de pagamentos de capital e que foram, por isso, sendo feitas algumas alterações de spread, a partir de um determinado momento. O que, disse, foi feito por quatro ou cinco vezes apesar das muitas mais propostas de suspensão/prorrogação dos prazos das amortizações (que disse terem sido vinte e quatro no total) que a Autora solicitou e foram aceites. Afirmou que os aumentos de spread a partir de 2009 decorreram das condições de mercado (com redução das taxas euribor para valores negativos e dificuldades financeiras da Banca) e das maiores exigências da supervisão a partir de 2010, bem como foram consequência de negociação com a Autora, num contexto de dificuldades económicas desta, também resultantes da crise do mercado imobiliário, sendo a esta área de atividade que se dedicava a mutuária que pedira o empréstimo exatamente para a construção.

A contextualização que fez dos aumentos de spread em relação ao período económico, de mercado e financeiro que se atravessava, coincidiu com o que consta do relatório pericial, a fls. 7 e é, aliás, do conhecimento comum.

Admitiu alguma insatisfação do legal representante da Autora quando lhe era contraposto o aumento de spread, mas foi muito seguro em reafirmar que nunca houve qualquer indignação ou reação de recusa da Autora. Foi perentório na asseveração que os representantes desta foram sempre pessoalmente avisados de que o spread seria aumentado em virtude dos pedidos de suspensão que o determinaram (pedidos esses que diz que eram sempre verbalmente propostos e negociados/aceites antes de comunicados por escrito) e que era o departamento onde trabalhava que fixava esses aumentos, cliente a cliente.

Acrescentou que os representantes da Autora não reagiram aos aumentos de spread de forma distinta da dos demais clientes a quem também comunicaram idênticos acréscimos na mesma altura e admitiu, a pergunta do Ilustre mandatário da Autora (embora esclarecendo que não se  recordava desse facto em concreto), que o Dr. EE possa ter sido mais veemente na expressão do seu desagrado nalguma ocasião em que lhe comunicou os aumentos de spread, mas que noutras, pelo menos, recordava com certeza que não ocorreu, de todo, essa reação.

Disse, em sintonia com o que resulta do contrato junto aos autos como documento número 2 da petição inicial, que o mútuo tinha dois anos de carência após o que devia ter sido feita uma amortização de capital decorridos seis meses a que se seguiam outras, sempre semestrais, o que, todavia não sucedeu, reiterando que as amortizações regulares de capital tal como foram previstas nunca foram feitas, sendo, todavia, amortizado capital mutuado quando a Autora efetuava vendas e os consequentes distrates das hipotecas sobre os imóveis vendidos. Acrescentou que já inicialmente, contudo, estava prevista esta forma de amortização (extraordinária) em simultâneo com a semestral. O que, mais uma vez, resulta da cláusula 5ª, alíneas 2 e 3 do contrato de mútuo a que infra melhor nos referiremos.

Não se recordava da razão pela qual em determinada altura o spread, que estava acima dos 5% baixou de novo para 3, 5%, dizendo desconhecer se tal se deveu a pressão do Dr. EE, legal representante da Autora. Diga-se, desde já, que a ser verdadeira essa explicação, resultante de pergunta do Ilustre mandatário da Autora, sempre a mesma indiciaria que esta, afinal, tinha (e teve) poder negocial junto do Banco 2... quanto à taxa de spread. O que a testemunha, aliás, muito bem descreveu, afirmando que ao longo de treze anos de relação contratual que acompanhou houve momentos de crise imobiliária e também de problemas dos próprios bancos, nomeadamente decorrentes da resolução do Banco 3..., divergindo, ao longo dos anos, a capacidade negocial da Autora e sendo nesse contexto, de maior ou menor poder de negociação e de pagamento pela devedora e, também, de dificuldades da Banca,  que enquadrou as alterações que a mesma pediu, bem como as que aceitou, em contrapartida.

A testemunha II, Revisor Oficial de Contas da Autora, disse que soube de todo histórico do contrato em causa, celebrado, segundo ele, aquando da constituição da sociedade, embora só tenha começado a acompanhar a contabilidade da mesma desde 2011. Disse que o Banco 2... comunicou os aumentos de spread por escrito à Autora, por uma ou duas vezes, não tendo registo de comunicações idênticas da Banco 1..., mas sem afirmar que não tenham de facto ocorrido, nomeadamente por entrega em mão, como o legal representante da Autora admitiu, aliás, ser forma corrente de comunicação entre as partes.

Perguntado se os aumentos de spread foram coincidentes ou subsequentes a pedidos de suspensão de amortização de capital não respondeu diretamente. Encetou uma explicação em que afirmou que as amortizações ao capital mutuado foram sempre feitas apenas aquando das vendas de imóveis e do distrate de hipotecas. O que disse que resultou de alteração contratual, que datou em 2006, que, segundo ele, transformou o mútuo inicial num contrato que apelidou de “conta corrente de financiamento à construção” dizendo que se tratava, de facto, desde a sua génese, de um financiamento de um projeto para 30 anos.  Afirmação que não está suportada pelo texto do contrato de mútuo ou de qualquer das suas alterações.

Todavia, mais adiante, confrontado com o documento que titula a alteração contratual celebrada em 5 fevereiro de 2015 (e não em 2006), disse que era a esta alteração que estava a referir-se [5]. Mais reiterou que, a seu ver, este documento traduz a real natureza do contrato – de “financiamento, em conta corrente à construção” pelo que, concluiu, os pedidos de suspensão de amortização do capital nunca configuraram incumprimento do contrato, pois estavam a ser feitas amortizações extraordinárias.

A imputação das amortizações extraordinárias nas prestações semestrais subsequentes foi, de facto, prevista na primeira alteração do contrato inicial, a 2 de setembro de 2003 (cerca de dezoito meses após a sua celebração), mantendo-se, contudo, a obrigação de pagamento de amortizações ao capital de seis em seis meses, como resulta do documento número 2 B junto com a petição inicial.  

Sublinhe-se, todavia, a este propósito que as amortizações extraordinárias foram especialmente previstas na cláusula 5ª do contrato de mútuo (documento número 2 da petição inicial) ali se prevendo, nas suas alíneas 2 e 3, que a amortização extraordinária de qualquer quantia seria imputada apenas na última ou nas últimas prestações do empréstimo. Ou seja, as partes expressamente afastaram que o pagamento de qualquer quantia do capital em dívida em data não prevista dispensasse o pagamento da prestação semestral seguinte, apenas podendo ser imputada na última ou nas últimas amortizações. A alteração ao contrato celebrada a 2 de setembro de 2003 pela qual passaram as amortizações parciais a ser imputadas a todas as prestações vincendas, consubstancia, aliás, a primeira alteração contratual em favor da Autora, sendo ela a clara beneficiária de tal alteração.

Perguntado se teve conhecimento dos sucessivos pedidos de suspensão de amortizações, mais uma vez o ROC da Autora não respondeu diretamente, antes afirmando ter conhecimento de negociações e acompanhamento permanente pelos bancos, referindo-se a “negociações normais” em função da situação da empresa e do investimento e das expetativas de ambas as partes.

O que reforça a convicção de que as alterações aos prazos de vencimento pedidas pela Autora e do seu interesse eram objeto de negociação, sendo que esta significa exatamente o ato ou efeito de negociar, contratar, ajustar. Ou seja, não colhe a versão da Autora na afirmação de que as alterações ao spread que os bancos Réus cobraram foram aleatórias e unilaterais, sem qualquer contexto negocial ou de contrapartida não lhe tendo sido, sequer comunicadas. Se assim tivesse sido, aliás, é manifesto que a Autora mais cedo e mais clara e perentoriamente teria reagido.

É manifesto que caso a Autora estivesse a cumprir o acordado no mútuo como inicialmente acordado, estaria em posição de reagir e não aceitar a cobrança unilateral (e alegadamente também não comunicada) de uma taxa que chegou a ser mais de quatro vezes superior à inicialmente acordada. A versão da Apelante de que as amortizações do capital estavam, quanto aos seus valores, a ser feitas em conformidade com o acordado não se compagina com a não reação da mesma contra o pagamento de taxas de spread superiores, durante cerca de sete anos.

Já faz todo o sentido essa falta de reação mediante a contextualização desses aumentos do spread como contrapartida da relevante e constante alteração das obrigações de amortização do capital pela mutuária, sempre por esta pedidos e deferidos no seu interesse. Motivo pelo qual a explicação ensaiada no depoimento que vem de se analisar não mereceu credibilidade.

BB, funcionário da Banco 1... que foi interlocutor da Autora a partir de 2004 disse ter recebido a primeira carta de pedido de prorrogação da amortização do capital após a moratória inicial de dois anos prevista no contrato, que foi feita a pedido do Dr. EE, que lhe terá dado conta da dificuldade da Autora em proceder a tal liquidação. O que ocorreu numa altura em que estava já em vigor a primeira alteração contratual (de 2 de setembro de 2003 e que está titulada pelo documento número 2 B junto à petição inicial), pela qual as amortizações extraordinárias passaram a ser imputadas na prestação semestral seguinte (quando antes estava previsto que apenas teriam reflexo na(s) última(s)). Do que se pode concluir que as referidas amortizações extraordinárias não só não ultrapassaram como nem chegaram a atingir o valor das amortizações semestrais regulares, como afirma a Autora.

Se assim fosse, aliás, não havia que suspender/prorrogar o prazo destas uma vez que já estariam saldados os respetivos valores por via de pagamentos extraordinários, como previsto na cláusula primeira da alteração contratual de 2 de setembro de 2003.

A referida testemunha referiu também idêntico pedido de prorrogação do vencimento da obrigação de amortização de capital em 2009, afirmando que estes pedidos eram decididos superiormente, apesar de lhe serem comunicados pessoalmente pelos legais representantes da Autora, dada a relação amistosa que se manteve sempre com estes. Afirmou que a aceitação desses pedidos também se prendeu com o conhecimento pela Banco 1... de que o projeto da Autora tinha a especificidade de se dirigir à venda de imóveis, pelo que o Banco compreendia a necessidade da Autora de proceder a tais vendas para ter capacidade de pagamento.

Atribuiu as dificuldades de tesouraria da Autora que justificaram os pedidos de prorrogação ao investimento que, em simultâneo, estava a fazer noutro empreendimento imobiliário e ao facto de a mesma ter uma expetativa inicial de venda que falhou e que se agravou com a crise do setor imobiliário.

Admitiu que foram feitos pela Autora pagamentos de capital nos momentos em que eram celebradas vendas de imóveis e os consequentes distrates parciais da hipoteca. Disse não se recordar se foram feitas reavaliações das garantias a propósito destes pedidos de prorrogação, mas ser comum essa prática. Recordou que, em 2009, foi exigido o reforço do spread para 2 %, o que disse ter sido comunicado ao cliente, como contrapartida da prorrogação. Em resposta a pergunta assim formulada, afirmou que idêntica exigência não fora feita em 2004 por se tratar, nessa data do primeiro pedido de prorrogação. Já em 2009, explicou, se estava mais próximo do fim do contrato (previsto para 2012) o que levou a uma perceção pela Banco 1... do aumento do risco de incumprimento. Bem como, disse, já se tinha espoletado a crise financeira e, sobretudo a crise do mercado imobiliário que impunha mais cautela na apreciação dos créditos para construção.

Foi seguro em afirmar que a comunicação da contrapartida de agravamento ao spread foi comunicada por si mesmo ao legal representante da Autora mediante entrega de uma carta escrita, para além da explicação e comunicação verbal das razões dessa condição para a prorrogação. Tal carta não se encontra, contudo, junta aos autos.

Admitiu que não tinha a preocupação de pedir uma declaração escrita de recebimento e aceitação das comunicações entregues em mão, o que disse poder ser explicado pelo tipo de relacionamento que tinham com a Autora e porque era, para a Banco 1..., absolutamente normal o pedido de alteração de spread em função do pedido de prorrogação, bem como porque a cliente nunca manifestou desacordo que aconselhasse a cautela de colher a sua aceitação por escrito. Espontaneamente disse que o legal representante da Autora EE percebeu “perfeitamente” e aceitou essa contrapartida, não tendo objetado à mesma. O que os acordos de alteração ao contrato, escritos, datados de 5 de fevereiro e 8 de outubro de 2015 revelam ter sucedido pelo menos nessas duas ocasiões.

Disse que ele próprio foi contactando com um colega do Banco 2... sobre a evolução do mútuo e as alterações contratuais, mas ter sentido sempre da parte do legal representante da Autora alguma resistência a esses contactos diretos entre os dois bancos e vontade de que as negociações fossem separadas com cada um deles (o que a testemunha JJ, funcionária da Banco 1..., também transmitiu no seu depoimento). Desconhecia porque é que o Banco 2... (então Banco 3...) apenas aumentou o spread em 2010, explicando que apenas falava com o seu colega desse Banco para as suspensões/prorrogações das amortizações do capital serem simultâneas e idênticas quanto ao prazo, embora as contrapartidas pudessem ser diferentes num banco e noutro, por serem negociadas pela Autora com cada um deles e porque essas decisões dependiam da avaliação do risco deita por cada banco.

KK, funcionário da Banco 1..., disse que teve conhecimento do contrato objeto dos autos após ter assumido funções no Gabinete de Empresas de Penafiel em 2005, referiu que a Autora sempre teve dificuldades em liquidar as prestações semestrais e, por isso, foi pedindo a dilação do seu pagamento e ia amortizando capital apenas quando vendia imóveis e distratava as correspondentes hipotecas.

Precisou que o cliente falava presencialmente quando transmitia a sua pretensão de prorrogação de prazos de vencimento e entregava, depois, uma carta em mãos. Recordava-se de pelo menos três pedidos de prorrogação/suspensão de pagamentos nos anos de 2008, 2009 e 2010, alegando não se recordar com rigor dessas datas. E afirmou que teve intervenção em duas dessas situações sendo que na primeira não houve aumento de spread, mas que, nas seguintes foi acordado um aumento do mesmo, tendo sido essa condição posta pela Banco 1... para aceitar a prorrogação, o que era comunicado também por carta, entregue em mão, ao legal representante da Autora. Disse, ainda, que eram sempre pessoalmente explicadas a este a condição e a razão do aumento, prendendo-se esta com o aumento do risco do mercado em consequência da crise imobiliária e com a alteração do contrato por interesse e a pedido da Autora, bem como com a dilação da amortização do capital, o que aumentava o risco de incumprimento do mútuo.

Disse que eram exatamente as dificuldades do mercado que a Autora invocava como causa para a impossibilidade de pagamento das prestações semestrais. Recordava-se de um aumento da percentagem do spread para 2% em concreto. O facto de não se recordar da outra conversa relativa a aumentos de spread não faz crer, como pretende a Autora em sede de alegações, que não é plausível recordar-se da primeira e que esta não tenha, de facto ocorrido. Pelo contrário, a testemunha mereceu credibilidade por ter procurado responder apenas ao que se recordava em concreto, sendo de esperar que não se lembrasse de todas as conversas e negociações com o legal representante da Autora.

Também não se vê – como diz ver a Autora -, que a “relação de confiança” referida pela testemunha contrarie a declaração da mesma de que era entregue uma carta a comunicar o deferimento da suspensão e o aumento do spread.

A testemunha explicou essa prática pelo facto de também terem recebido uma carta, entregue também em mão, do cliente a solicitar a suspensão do pagamento e por uma questão de deferência para com o cliente.

Disse, ainda, que o cliente “obviamente” não ficou contente com o aumento de spread, mas que compreendeu a explicação e a condição percebendo que caso a mesma não fosse aceite poderia ter de cumprir as amortizações semestrais previstas ou teria de se renegociar a alteração noutros termos que reunissem o acordo de ambas as partes. Nesta afirmação a testemunha não transmitiu, portanto, qualquer posição de intransigência da Banco 1... perante a cliente (nomeadamente no sentido de que a não aceitação do aumento do spread poderia levar à resolução do contrato como insinua a Autora) e salientou que a Banco 1... não fez qualquer alteração unilateral dos contratos sendo estas sempre motivadas por pedidos da Autora, no seu interesse, tendo a mesma visto prorrogado, em muitos anos, a liquidação do capital. Bem como afirmou que o legal representante da Autora não transmitiu, de qualquer forma, que não aceitaria a condição proposta, caso em que procurariam renegociar as condições e os termos da prorrogação de prazo pedida.

Confrontado com a previsão numa cláusula do contrato de mútuo de que todas as alterações tinham que ser formalizadas por escrito, disse desconhecer a mesma.

Perguntado sobre se havia uma diferença grande entre o valor devido nos pagamentos semestrais e o que era pago em consequência da venda dos imóveis afirmou que sim, que muitas vezes os valores de capital liquidado em cada semestre ficavam muito aquém do que estava previsto semestralmente, desde logo afirmando que se as vendas feitas pela Autora correspondessem ou ultrapassassem os valores previstos para as amortizações semestrais não haveria motivo para que fosse por várias vezes pedida pela Autora a suspensão dessas prestações. O que se afigura lógico. Aliás, evidente.

Referiu ter consigo um pedido escrito da Autora a pedir a suspensão da amortização do capital em 2008 (além dos que constam dos autos).

LL, funcionário da Banco 1... há 20 anos, disse ter acompanhado a Autora como gestor comercial no gabinete de Penafiel desde março de 2010 até março de 2012 e que, em abril desse ano, a Autora passou a ser acompanhada em agência de Amarante.

Recordava um pedido da Autora, idêntico a outros anteriores, em que a mesma solicitava por carta, entregue em mão, a prorrogação do pagamento de parte do capital que deveria ser pago nessa data, por não conseguir o pagamento da prestação prevista para o segundo semestre de 2010, o que foi aceite. A Banco 1..., disse, aprovou essa prorrogação com um acréscimo da percentagem de spread, o que, disse, não foi formalizado em contrato escrito, mas terá sido comunicado por escrito ao cliente, por email ou carta, podendo esta ter sido entregue em mão.

Admitiu, depois, contudo, não se recordar em concreto qual a forma usada na comunicação escrita da Banco 1... à Autora do deferimento do pedido de prorrogação de amortização do capital no segundo semestre de 2010 (se por email ou por carta entregue em mão). Disse, ainda assim, estar convicto de que a dita resposta foi comunicada por escrito ao cliente por ser essa a forma habitual de serem entregues as comunicações mútuas, por escrito, em mãos ou por troca de emails. Descreveu uma boa relação com a cliente, na pessoa do legal representante EE.

Explicou que a decisão quanto à prorrogação de prazos de vencimento era tomada, na Banco 1..., superiormente (pela direção central depois de passar por três graus hierárquicos acima do seu), e que era igualmente articulada com o Banco 3..., mediante contacto entre ele e o colega homólogo do Banco 3.... Tal acordo entre a Banco 1... e o Banco 3... era, segundo disse, no sentido de aceitarem, ou não, os pedidos de prorrogação das liquidações parciais ou totais, mas não necessariamente quanto ao spread, que, todavia, tem ideia de ter sido igualmente aumentado pelo Banco 3..., embora nessa parte cada banco pudesse, segundo ele, decidir e negociar com o cliente autonomamente.

Recordava-se do pedido de prorrogação da prestação semestral da Autora feito no final do primeiro semestre de 2010 e de que a decisão sobre ele foi tomada em novembro desse ano. Segundo disse, a Autora justificou tal pedido com a alegação de que não tinha capital disponível e de que apenas tinha uma fração para venda até ao final daquele ano e, por isso, não podia pagar a segunda prestação semestral do capital.

Não se recordava do legal representante da Autora ter ficado “desagradado”, com a condição proposta para o deferimento, mas admitiu que possa ter ficado. Lembrou, contudo, que já antes, por altura de um pedido de prorrogação do prazo semestral de amortização, já tinha sido feito, segundo o depoente com aceitação da cliente, pelo menos, um aumento do spread. Disse que a razão do aumento se prendia com a avaliação do risco, com a crise do mercado imobiliário e a necessidade de o Banco também ter de “se colocar no mercado” sempre que reestrutura uma dívida de médio ou longo prazo por forma a financiar essa dívida, sendo que nessa altura as condições de mercado eram mais gravosas para os Bancos se financiarem.

Descreveu a Autora como uma cliente rigorosa e atenta no acompanhamento da relação contratual, recordando-se de pedidos de informação/esclarecimento, normalmente por telefone, quando algum extrato lhes suscitava dúvida. Não se lembrava, contudo, que a Autora alguma vez tenha pedido qualquer esclarecimento quanto à percentagem do spread cobrado.

Admitiu que o aumento de spread em consequência do pedido de prorrogação da amortização de capital do segundo semestre de 2010 possa só ter tido efeito a partir de 2011, sendo normal que cada decisão de aumento de spread tivesse efeito apenas a partir do período seguinte. O que explica o aparente desfasamento temporal que a Autora pretendeu salientar por forma a descredibilizar a versão das Rés de que os aumentos do spread decorriam dos pedidos de prorrogação dos prazos para amortização do capital.

Da conjugação destes meios de prova, indicados pela Recorrente A..., SA, resulta assim que, com exceção da clarificação da redação já acima referida, não há por que alterar a alínea OOO) dos factos provados, na medida em que foi correta e perfeitamente sustentada na prova, a convicção do Tribunal a quo  de que a Autora manifestou descontentamento, mas não discordância em relação aos vários aumentos de spread  porque agora pretende ser reembolsada.

A redação da alínea OOO) será, pois, alterada para:

A Autora várias vezes manifestou verbalmente o seu descontentamento pela cobrança do do spread acima de 1, 25 % e comissões referidas, junto da Banco 1..., nas pessoas de AA e BB e do Banco 3.../Banco 2..., na pessoa de CC.

A já anunciada alteração à alínea 25 dos factos provados será feita mais adiante porque a mesma necessitará, além da eliminação da expressão “aceitação” de ampliação decorrente de aditamento oficioso de um novo facto provado.


*

Alíneas ZZZ) e 13) da matéria de facto:

Está provado, sob a alínea que ZZZ) “As hipotecas constituídas sobre imóveis da A, em garantia do mútuo, suplantavam a dívida, conforme avaliação da Banco 1... mesma.”.

Sob a alínea 13), deu-se como não provado que “A diferença assente em ZZZ), após 12.03.2017, era de quatro vezes mais o valor dos imóveis hipotecados que a dívida”.

Pretende a Apelante A..., SA que se elimine a alínea 13 dos factos não provados passando, em consequência, a alínea ZZZ) a ter a seguinte redação:

“As hipotecas constituídas sobre os imóveis da A, em garantia do mútuo, com referência a 31.03.2017 e 31.01.2018, suplantavam a dívida global (que ascendia a €: 3.117.358,00 – DOC 29, 38 e 39 da pi) em cerca de 3,75 vezes, conforme avaliações da Banco 1... de 06.10.2017 (DOC 19 da pi) e de 21.02.2018 (DOC 20 da pi)”.

A primeira questão que a pretensão da Apelante suscita é a da relevância da pretendida alteração para a decisão do objeto do recurso.

A Recorrente justifica a relevância da sua pretensão afirmando que este facto enquadra a “estratégia de bullying levada a cabo pela Banco 1... após a reunião de 29-08-2017”. Acrescenta que o comportamento dessa Ré é violador do artigo 625º, número 2 do Código Civil e configura abuso do direito porque “a recusa de libertar bens imóveis tem de ser enquadrada com a declaração de vencimento antecipada (ilícita) do mútuo, a imediata compensação (ilícita) de créditos e a comunicação de incumprimento (ilícita) ao Banco de Portugal.”.

Quanto ao alegado interesse do facto em apreço para um “enquadramento” da conduta da Ré Banco 1... como de “bullying” cumpre salientar que esta não fez qualquer pedido decorrente de eventual declaração de vício de vontade (como a coação moral de que diz ter sido vítima).

A matéria de facto que deve constar da sentença é aquela que, tendo sido alegada pelas partes, nos termos do previsto nos artigos 5º, número 1 e 552º, número 1 d) do Código de Processo Civil, seja relevante para a solução jurídica das pretensões das partes que tenha de conhecer.

Quer o artigo 5º, número 1, quer a alínea d) do número 1 do artigo 552º referem a obrigação das partes de alegarem os factos essenciais que constituem a causa de pedir ou o suporte para as exceções que invocam.

O número 2 do referido artigo 5º, todavia, obriga a que se considerem ainda outros factos, não articulados pelas partes, sendo eles:

“a) Os factos instrumentais que resultem da instrução da causa;

b) Os factos que sejam complemento ou concretização dos que as partes hajam alegado e resultem da instrução da causa, desde que sobre eles tenham tido a possibilidade de se pronunciar;

c) Os factos notórios e aqueles de que o tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das suas funções.

Afirma Teixeira de Sousa[6] que “os factos essenciais são aqueles que permitem individualizar a situação jurídica alegada na ação ou na exceção; - os factos complementares são aqueles que são indispensáveis à procedência dessa ação ou exceção, mas não integram o núcleo essencial da situação jurídica alegada pela parte”. Quanto aos primeiros afirma o referido Autor que “(…) são necessários à identificação da situação jurídica invocada pela parte e, por isso, relevam, desde logo, na viabilidade da ação ou da exceção: se os factos alegados pela parte não forem suficientes para perceber qual a situação que ela faz valer em juízo (…), existe um vício que afeta a viabilidade da ação ou da exceção. É por isso que, quando respeitante ao autor, a falta de alegação dos factos essenciais se traduz na ineptidão da petição inicial por inexistência de causa de pedir (…) e que a ausência de um facto complementar não implica qualquer inviabilidade ou ineptidão, mas importa a improcedência da ação”. Já “Os factos complementares (ou concretizadores) são os factos que, não integrando a causa de pedir (porque não são necessários para individualizar o direito ou o interesse alegado pela parte), pertencem ao Tatbestand da regra que atribui esse direito ou interesse ou são circunstanciais em relação ao facto constitutivo desse direito ou interesse.” Finalmente, quanto aos factos instrumentais o mesmo Autor entende que se destinam“(…) a ser utilizados numa função probatória dos factos essenciais ou complementares(…)” e “(…) são utilizados para realizar a prova indiciária dos factos principais, isto é, esses factos são aqueles de cuja prova se pode inferir a demonstração dos correspondentes factos principais.”

E, na motivação da sua convicção, deve o julgador indicar “as ilações tiradas dos factos instrumentais”, como resulta do número 4 do artigo 607º do Código de Processo Civil.

Assim, a seleção dos factos provados e não provados a constar da sentença deve conter os que sejam essenciais às pretensões das partes, sendo os factos instrumentais (que tenham sido alegados, resultem da instrução ou tenham sido oficiosamente averiguados) úteis para a prova dos primeiros e não em si mesmos (salvo se deles resultar a aplicabilidade de presunção legal).

O que são os factos essenciais a cada pedido/exceção é questão que sempre tem de ser resolvida no confronto das pretensões das partes e o direito substantivo que pode suportar as mesmas.[7]

Em resumo: os factos essenciais devem ser alegados pelas partes, apenas sendo lícito ao juiz considerar outros, não alegados, se forem complementares, concretizadores, instrumentais, notórios ou que sejam do seu conhecimento por virtude do exercício das suas funções.

Estes últimos não têm obrigatoriamente de ser selecionados no elenco dos factos provados e não provados constantes da sentença (salvo se deles resultar a aplicabilidade de uma presunção legal), sendo, todavia, exigível referi-los na motivação da mesma, como previsto no número 4 do artigo 607º do Código de Processo Civil.

Tendo presente estas considerações que visam o enquadramento da questão a resolver, resulta da seleção quer dos temas da prova em sede de saneamento quer dos factos provados e não provados em sede de sentença, que o Tribunal a quo optou por selecionar e por se pronunciar expressamente sobre a matéria de facto essencial, mas também, nalguns casos, sobre a meramente instrumental que fora alegada pelas partes.

No que refere à grandeza relativa dos valores dos bens hipotecados na comparação com a dívida por eles garantida a Autora não formulou qualquer pretensão diretamente decorrente desta alegação que afirma, senão da de pretender ilustrar a situação de desvantagem negocial que alegadamente a levou a aceitar uma série de vicissitudes contratuais sendo os seus pedidos, contudo, todos baseados em alegados incumprimentos do contrato de mútuo pelas mutuantes e na violação de acordo de prorrogação do mesmo pela Banco 1... e não em qualquer vício da sua vontade.

A grandeza dos valores dos imóveis hipotecados em comparação com a do crédito garantido conjugada com a alegada recusa de redução da hipoteca pela credora é, todavia, necessária à versão apresentada pela Autora com vista a sustentar que a Ré Banco 1...  a colocou numa posição de grande dependência durante a negociação de pedido de prorrogação do mútuo por cinco anos, dada, nomeadamente, a indisponibilidade dos imóveis dados em garantia, pois pretende que se conclua que ocorreu violação da boa-fé na negociação de tal pedido.

Em conclusão, a questão da relação entre os valores dos bens hipotecados e o do crédito garantido pelas hipotecas visou, assim, concretizar a posição de supremacia da credora na negociação com a Autora, negociação de que esta faz decorrer responsabilidade pré-contratual da Ré Banco 1... por violação da obrigação de “proceder segundo as regras da boa-fé”(cfr. artigo 227º, número1 do Código Civil).

Daí decorre a essencialidade desse facto para a versão da Autora.

Não havendo dúvidas que a garantia constituída pela devedora suplantava o valor da dívida, não ficou provado, contudo, como alegado pela Autora na petição inicial (cfr. artigo 155 da mesma), que era mais de quatro vezes superior.

A Autora quer agora, por referência ao que entende ter resultado do documento número 20 junto com a petição inicial, que sejam discriminados os valores das avaliações pela Banco 1... dos imóveis dados em garantia e que deles seja retirada a conclusão de que a dívida em março de 2017 e janeiro de 2018 era 3, 75 vezes inferior ao valor dos bens sobre que incidia a hipoteca que a garantia.

Contrapõe a apelada Banco 1... que nem todos os imóveis hipotecados foram objeto de avaliação pelo que “não é possível estabelecer uma medida ou uma percentagem dos valores dos bens hipotecados relativamente ao valor da dívida”. Tal, contudo, não impede que se prove, pelo menos, que os bens efetivamente avaliados tinham o valor “x” ou “y” valor esse que pode, depois, ser cotejado com o valor do crédito em dívida.

Ora, o documento número 20 da petição inicial foi emitido pela Banco 1..., consubstanciando avaliação feita a seu pedido e no seu interesse dos bens imóveis da Autora sobre os quais incidia hipoteca para garantia do crédito em apreço. Dele resulta que em 21-02-2018 estava constituída hipoteca sobre imóveis da mutuária que tinham o valor de, pelo menos, 7 316 142 € (e não de 11 640 410 € como indevidamente somou a Autora a fls. 12 das suas alegações).

A comparação desse valor com o que estava em dívida aos credores hipotecários é uma mera conclusão, que, por tal, não tem de constar dos factos provados, sendo certo que se desconhece de onde retirou a Apelante a afirmação de que a dívida era de 3 117 358 € e a que data se refere quando afirma tal valor. A comparação que pretende, entre o valor em dívida e a garantia do crédito só faz sentido se reportada à mesma data, ou, pelo menos a data aproximada.

Ora, está apenas assente, na alínea RR) dos factos provados, que em “(…) 1 de agosto de 2018 a Autora procedeu ao pagamento do saldo em dívida do mútuo - €:1.530.695,55 à Banco 1..., conforme DOC 27 e €:1.709.507,75 ao Banco 2..., conforme DOC 28, ambos juntos com a petição inicial, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.”.

É, assim, possível a pretendida comparação dos valores a partir da avaliação dos imóveis pela Banco 1... em fevereiro de 2018 e as quantias e dívida que as partes fixaram em agosto do mesmo ano. Tal comparação, contudo, não permite a pretendida conclusão de que é 3, 75 vezes maior o valor dos imóveis hipotecados em relação ao da dívida. Nem tem essa comparação, sequer, que ser feita em sede de seleção de factos pois se trata do resultado de operação aritmética, que, se se tiver por relevante, pode e deve ser feita em sede de apreciação do mérito.

Donde, não há qualquer fundamento para a eliminação da alínea 13) dos factos não provados e deve a alínea ZZZ) passar a ter a seguinte redação:

As hipotecas constituídas sobre imóveis da A, em garantia do mútuo, suplantavam a dívida, incidindo, em 21-02-2018, sobre imóveis que valiam, pelo menos, 7 316 142 €.


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Alínea HHHH) dos factos provados:

Está assente sob essa alínea que: “Todas as alterações de condições, incluindo taxas de juros, spreads ou comissões foram comunicadas à Autora Parques do EDT.”.

A Apelante quer que, pelo contrário, se julgue provado o facto negativo, ou seja, que “Todas as alterações de condições, incluindo taxas de juro, spreads ou comissões não foram comunicadas à A A..., SA, com exceção das cartas do Banco 3... a que se referem os DOC

7 e 8 da petição inicial.”.

Tal facto, todavia, não foi alegado.

Em momento nenhum da petição inicial a Autora invoca a falta de comunicação das alterações da percentagem de spread por qualquer dos Bancos Réus. Refere por várias vezes, de forma conclusiva, os aumentos “ilícitos” do spread, qualifica sempre essas alterações como unilaterais e dá conta, nas alíneas 81 e 82 das duas comunicações do Banco 2... com invocação de alteração de circunstâncias. Todavia, em momento nenhum afirmou a Autora (nem na resposta que ofereceu às contestações), que os Réus não lhe tenham comunicado os aumentos do spread. O que é questão diferente da que alegou, realmente, e já acima se apreciou, relativa à falta de acordo da sua parte para as referidas alterações.

O que foi alegado a propósito das comunicações das alterações do spread resulta dos artigos 108. da contestação do Banco 2... e 52. da contestação da Banco 1....

Foram, de facto, os Bancos Réus que vieram alegar que sempre comunicaram tais alterações (bem como alegaram que colheram o acordo da Autora para as mesmas).

Remetendo-se para o que acima se deixou exarado sobre a obrigação das partes alegarem os factos essenciais à procedência das suas pretensões, que resulta dos artigos 5º, número 1 e (para quem propõe a ação) 552º número 1 d) do Código de Processo Civil e sobre o poder/dever do juiz se pronunciar, ainda, sobre os complementares e os instrumentais que resultem da instrução da causa há que aferir se a versão negativa que a apelante A..., SA quer ver provada constitui facto meramente instrumental da sua pretensão que pudesse ser julgado provado, apesar de não alegado.

Ora não se afigura que assim possa entender-se. De facto, no quadro em que a Autora constrói o seu argumento – de incumprimento do contrato de mútuo pelas mutuantes, nomeadamente, e no que aqui importa convocar, mediante cobrança de taxa não acordada -,  e tendo em vista o pedido e a causa de pedir, a alegação da falta de comunicação pelas Rés dos aumentos da percentagem de spread e de cobrança de comissões, está entre o conjunto dos factos essenciais à sua pretensão. Como tal, tratando-se de facto essencial que não foi alegado, não pode por este tribunal ser considerado.

Todavia, não podendo, embora ser dada por provada a versão proposta pela Autora – por ela não alegada – de que todas as alterações de condições “não foram comunicadas” -, deve ter-se presente que, subjacente a este pedido da Recorrente se revela o pedido (implícito) de que seja julgado como não provado o facto positivo (que as Rés comunicaram as alterações das condições resultantes das taxas de juros, spreads ou comissões) que o tribunal verteu na alínea HHHH).

Esta pretensão – que apesar de não expressamente vertida, é claramente ambicionada -, deve, pois, ser conhecida, com reapreciação da prova indicada.

Ora, neste contexto, a Recorrente não alega qualquer meio de prova a reapreciar além do depoimento de parte do seu legal representante e remete para os mesmos meios de prova que fundaram a também pretendida alteração da alínea OOO).

Dão-se, assim, aqui por reproduzidas a análise crítica e a súmula dos meios de prova que se reapreciaram já a propósito dessa alínea.

Delas resultou a convicção de que à Autora foram, não só comunicadas, como também explicadas todas as exigências que os bancos mutuários foram fazendo quanto a aumentos da percentagem de spread, que se enquadraram no âmbito da negociação de alterações pedidas pela Autora e destinadas a prorrogar prazos de vencimento das obrigações de amortização de capital.

Da análise acima feita desses meios de prova não resulta, como se viu, fundamento bastante para que se altere o que foi dado por provado na alínea HHHH), que, por tal, deve permanecer inalterada.


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Os factos IIII) e JJJJ):

Sob estas alíneas ficou provado que:

“IIII) Após a pretensão de prorrogação do prazo do mútuo pela A, a Ré Banco 1..., S.A. efetuou uma prorrogação intercalar do prazo do empréstimo por 6 meses (até 12 de setembro de 2017), a fim de permitir concluir as negociações tecidas com a Autora Parques do EDT.

JJJJ) Foi o que justificou a cobrança de uma comissão de prorrogação do prazo do empréstimo e o facto de o mesmo não se ter vencido, de forma imediata, em 12 de março de 2017.”.

A Recorrente A..., SA pretende a eliminação da segunda alínea e a alteração da redação da primeira para a seguinte:

“Após a pretensão de prorrogação do prazo do mútuo pela A, a Ré Banco 1..., S.A. efetuou uma prorrogação intercalar do prazo do empréstimo por 6 meses (até 12 de setembro de 2017).”.

Segundo defende, a leitura destas alíneas em conjunto com o que ficou também provado na alínea TTT) (“Ao menos em 26.01.2017 a A propôs aos bancos uma prorrogação do prazo de pagamento “final” do mútuo.”) leva a que se conclua que a Banco 1... dera o seu assentimento a tal pedido tendo, depois, voltado atrás nessa decisão e passado a exigir à Autora condições que a mesma qualifica de abusivas, para permitir a pretendida prorrogação. 

Acrescenta que não resulta dos factos provados qualquer negociação entre a Autora e Banco 1... após a data, provada, do pedido de prorrogação, caindo assim por terra a afirmação de que a prorrogação por seis meses fora concedida pela mutuante com o fito de permitir essa negociação. Afirma, ainda, que a Banco 1... nunca a informou de que concedera uma prorrogação por seis meses ao vencimento do mútuo, tendo essa versão dos factos sido posteriormente criada pela Ré para justificar a cobrança da comissão de prorrogação. Finalmente sustenta que, a ser verdadeira esta prorrogação por seis meses com vista a permitir a continuidade das negociações, não faz sentido a consideração pela credora de que a dívida estava já vencida antes do termo dos referidos seis meses (no dia 08/09/2017 e não a 12/09/2017).

Comecemos pelo fim:

A versão da Banco 1... de que tinha prorrogado o prazo de vencimento do contrato de mútuo por seis meses (dada a pendência de negociações decorrentes do pedido da Autora de o prorrogar por mais cinco anos) é contrariada pelos factos provados nas alíneas II) e WW)?

Da alínea II) resulta:

“Em 08.09.2017, a Banco 1... transferiu para si mesma os dinheiros da conta nº ...03 da A. junto da agência de Amarante, até colocar o saldo a 0 (zero), para se pagar dos juros do mútuo (que se venceriam em 12.09.2017) - €:24.204,59 -, imposto de selo - €:968,18 -, pagamento parcial de capital - €:1.130,49 + €.499,48 -, comissão de processamento - €.4,00 -, imposto de selo - €: 0,16 -, tudo conforme extrato de conta (DOC 17 com a petição) e aviso de lançamento emitido no dia 11.09.2017 (DOC 18 com a petição).”.

E a alínea WW) tem o seguinte teor:

“Com data de 19.09.2017, a Banco 1... enviou aviso de incumprimento à A e dele consta que o capital se venceu em 08.09.2017, conforme DOC 46 com a petição inicial, cujo teor aqui se reproduz.”.

Segundo a Autora, a Banco 1... considerou o crédito vencido antes do decurso da prorrogação por seis meses que alegadamente lhe concedeu, o que a leva a concluir que, afinal, a prorrogação aceite pela Banco 1... fora a pedida pela Autora, por cinco anos, tendo a mutuante, contudo e já depois de a aceitar, a passar a impor condições que a Autora, por sua vez, também não aceitou.

O que a Autora pretende sustentar é que, de facto, estava já aceite a prorrogação por cinco anos tendo, todavia, a Banco 1... voltado atrás nessa decisão pelo que, para explicar a cobrança de valores devidos pela prorrogação e a não consideração do vencimento do débito em março de 2017, a credora veio argumentar que, afinal, concedera uma prorrogação do termo do mútuo por apenas seis meses.

Vejamos se tal resulta da prova feita: o pedido de prorrogação do mútuo pela Autora foi comunicado às Rés em 26-01-2017, como está provado na alínea TTT); está, também, assente que já antes a Autora iniciara negociações com ambas as Rés com vista a uma prorrogação por três anos do prazo de vencimento (cfr. alínea PPP)); sucede que a Banco 1... considerou o mútuo vencido em 08-09-2017, como comunicou à Autora a 19 do mesmo mês e como fez refletir na cobrança, no referido dia 8, de “(…) juros do mútuo (que se venceriam em 12.09.2017) - €:24.204,59 -, imposto de selo - €968,18 -, pagamento parcial de capital - €:1.130,49 + €499,48 -, comissão de processamento - €.4,00 -, imposto de selo - €: 0,16”.

Estas comunicações e cobrança impedem que se julgue provado que a Banco 1... considerou prorrogado por seis meses o vencimento do mútuo apenas com vista a permitir a continuidade das negociações da pretendida prorrogação por cinco anos?

Em primeiro lugar cumpre assinalar que nem a Recorrente pretende a não prova dessa prorrogação por seis meses, pois propõe que a redação da alínea III) se mantenha nessa parte. Apenas quer discutir que o intuito da mesma tenha sido o de permitir a continuidade das negociações e que se elimine a afirmação que foi essa prorrogação que justificou a cobrança de uma comissão pela Banco 1... e que esta não tenha tido por vencido o crédito logo a 12 de março.

É manifesto que se a Banco 1... considerava que o vencimento do mútuo estava prorrogado por seis meses não podia, quatro dias antes dessa data ter cobrado as quantias acima referidas.

Resta saber se, de facto, a cobrança das mesmas ocorreu, do ponto de vista da credora, com quatro dias de antecipação.

O que a Ré Banco 1... comunicou pela carta dada por reproduzida na alínea WWW) foi o vencimento da 31ª prestação semestral do mútuo, como consta do documento em causa (e resulta assinalado no relatório pericial).

As prestações semestrais (de juros e de amortização do capital) previstas inicialmente tinham, recorde-se, vencimento semestral e estava estipulado que a primeira se venceria 30 meses após a data de assinatura do contrato (cláusula 5ª número 1 do mesmo).

Assim nos termos do artigo 279º, c) do Código Civil ex vi artigo 296º do mesmo diploma o prazo de 30 meses devia julgar-se findo no último dia do mês que corresponda ao último dos referidos 30 meses, ou seja a 30 de setembro de 2004. Claramente, contudo, as partes entenderam que tal prazo de 30 meses terminava a 12 de setembro de 2004, pois data desse mês a primeira aceitação por ambos os Réus da prorrogação do prazo de vencimento do capital a pedido da Autora, como demonstrado pelos documentos número 16 junto com a contestação do Banco 2... e número 1 da contestação da Banco 1....

A alteração do contrato titulada pelo documento número 4 da petição inicial, celebrada a 05 de fevereiro de 2015, previu novo período de carência e uma alteração do plano de reembolso do capital remanescente (veja-se o considerando número 5 desse contrato).

Da conjugação das cláusulas primeira e terceira desse acordo (referido na alínea U) dos factos provados) resulta que o reinício da amortização do capital após o novo período de carência seria após 102 meses de período de carência iniciado a 12-09-2006.

A 8 de outubro de 2015, as partes celebraram ainda novo contrato de alteração do mútuo, com alguns efeitos retroativos a partir de março de 2015, em que fixaram novo período de carência, agora de 126 meses, e contado, de novo, desde 12-09-2006, ou seja, até março de 2017.

Ficou ali acordado, contudo, que os juros, durante o período de interrupção, se venceriam semestralmente, “nos termos da cláusula quarta” do contrato inicial.

Ora, esta cláusula previa o seu vencimento a cada seis meses, contando-se a partir da data da assinatura do contrato. Transpondo essa cláusula para a alteração subscrita pelas partes de 8 de outubro de 2015, o vencimento semestral dos juros passou, aparentemente, a ser considerado pela Banco 1... como ocorrendo no dia 8 (data da assinatura da alteração) e não no dia 12.

Nos termos do já citado artigo 279º c) do Código Civil já vimos ser outro o cômputo do termo que a lei determina, pelo que deveriam as partes ter, novamente, considerado que o prazo (fixado em meses) de carência, terminava no último dia do último mês do período de carência.

Já se viu, todavia, que Autora e Rés sempre contaram os prazos de meses fixados no contrato não nos termos que a lei prevê, mas considerando sucessivos períodos de 30 dias desde a data fixada como de início do prazo, sempre por remissão para a data de assinatura do contrato. O que torna plausível que a Banco 1... tivesse a interpretação de que o termo do prazo da última prorrogação ocorreria no dia 8 de setembro e não no dia 12 (como no contrato inicial, por referência à data da sua assinatura) e nem no dia 30 como decorre da lei.

A data de vencimento a 08-09-2017 é, aliás, a que foi considerada pelo Sr. Perito, a fls. 51 do relatório quando afirma que as cobranças feitas em 08/09/2017 “não podem considerar-se “antecipadas” porque nessa altura a data de liquidação da operação estava prorrogada para 2017/09/08”.

Acresce que as cobranças das prestações de juros que resultam dos extratos bancários juntos pela Banco 1... revelam diferentes dias de cobrança dos mesmos ao longo da execução do contrato, o que o próprio legal representante da Autora EE referiu no seu depoimento quando afirmou que foi dando conta, ao ver os extratos da conta, de diferentes dias de cobrança de juros. Tal está, também, refletido no relatório pericial a páginas 9 e 10. Relembra-se que nunca ocorreram amortizações semestrais do capital como previsto pelo que não há termo de comparação de datas relativamente às mesmas.

Do que resulta que a consideração do vencimento do crédito pela Banco 1... no dia 8 de setembro (em vez de no dia 12) pode ter resultado apenas de diferente interpretação das sucessivas alterações ao contrato relativamente às datas de cobrança, que se revelou, aliás, noutros meses e não ser, assim demonstrativa, como pretende a Autora, que a Banco 1... não tinha, de  facto, prorrogado por seis meses o vencimento do mútuo com vista a permitir a continuidade das negociações [8], explicação que apenas criou para justificar uma cobrança de despesas de prorrogação e a não comunicação do vencimento do crédito ao Banco de Portugal.

Assim, em conclusão, não pode retirar-se da cobrança pela Banco 1... em 08-09-2017 dos valores referidos em II) (juros e legais acréscimos, comissões e 1 130, 49 € de capital (31ª prestação)) a conclusão de que a mesma não prorrogara, de facto, o prazo de vencimento por seis meses, podendo a diferença de quatro dias na cobrança da amortização do capital ter resultado apenas de diferente interpretação das datas de vencimento resultantes das sucessivas alterações contratuais.

Esgotado este argumento da Apelante, analisemos, então, os depoimentos indicados pela Recorrente em sustentação da mesma pretensão:

DD, funcionário do Banco 2..., ao contrário do que afirma a mesma, não admitiu em momento algum que a Banco 1... tivesse já dado o seu acordo à prorrogação por cinco anos em março de 2017 e explicitou que a decisão dessa prorrogação não dependia dos interlocutores diretos da Autora em cada Banco, tendo de ser superiormente aprovada. Explicitou que mesmo no Banco 2... a primeira resposta ao pedido de prorrogação que a Autora formulou em 2017 foi no sentido do deferimento apenas por seis meses após o que teria sido a Banco 1... a primeira a admitir a possibilidade de prorrogação por cinco anos, o que passou, então, a ser negociado com os dois bancos.

Disse, contudo, não se recordar quem o tinha informado de que a Banco 1... aprovaria a prorrogação por cinco anos, admitindo que possa ter sido a própria Autora. Quando se referiu à possível aceitação dessa prorrogação pela Banco 1... disse, expressamente e espontaneamente que o que lhe foi transmitido que esta “estaria em condições de aceitar a prorrogação em determinadas condições”, ou seja, do seu depoimento resultou claramente que o que a Banco 1... aceitou foi a negociação dessa prorrogação por cinco anos. “em determinadas condições”, ao contrário do que o Banco 2... fez inicialmente, que foi informar que só seria deferida por seis meses.

Explicitou que só contactou diretamente com a Banco 1... a propósito deste pedido de prorrogação por cinco anos já depois da resposta do Banco 2... a dar conta da aprovação do mesmo pedido, tendo esta resposta do seu banco, contudo, uma validade limitada no tempo, a partir de cujo termo poderia já não aceitar as mesmas condições. Disse, ainda, que foi em reunião de maio de 2017, entre as três partes, que ficou decidido que a Banco 1... estaria em condições para avançar para o acordo de prorrogação, ficando-se então a aguardar pela resposta da mesma.

Explicou mesmo que foi a informação que lhe foi transmitida pelo legal representante da Autora de que a Banco 1... ponderava aprovar a prorrogação por cinco anos, desde que o Banco 2... fizesse o mesmo, que levou a que este fizesse nova proposta nesse pressuposto, ficando a Banco 1... de, depois, reapreciar o pedido da Autora e as contrapartidas ao mesmo. Ora, o Banco 2..., apenas em 12-05-2017 comunicou à Autora a aceitação da prorrogação por cinco anos, com as condições e nos termos dados por provados na alínea UUU).

Assim, não decorre deste depoimento o pretendido pela Autora, sobretudo tendo em conta a sua conjugação com o teor da comunicação referida nesta alínea (que constitui o documento número 10 da petição inicial), que expressamente menciona que a aprovação “fica condicionada à aprovação pela Banco 1... (…) nas mesmas condições” e que faz constar como “validade da proposta” a data de 11-06-2017.

MM trabalhou desde fevereiro de 2017 com o processo da Autora, data coincidente com a da criação do seu departamento, para onde passou o “processo” relativo a este mútuo, vindo de Guimarães. Nessa altura disse ter recebido a informação de que fora prorrogado por seis meses o prazo para a amortização, com a nota de que deveria ser renegociado com a cliente um plano de pagamento. Afirmou que foi já o seu departamento a comunicar à Autora, em março de 2017, o deferimento da prorrogação por seis meses, condicionada à aceitação da mesma pela Banco 1..., tendo sido o cliente (e apenas este) a comunicar-lhe que esta deferira a mesma prorrogação, mas por cinco anos, condicionada a igual aprovação pelo Banco 2.... O que, disse, foi deferido, posteriormente, sob condição de pagamento de 50% do valor de venda de frações, condição que disse que a cliente também entendia dever ser aplicada.

Ou seja, mais uma vez resulta deste depoimento a ideia de que apenas o legal representante da Autora transmitiu ao Banco 2... que a Banco 1... estaria disposta a aceitar a prorrogação por cinco anos,

Admitiu que o prazo de vencimento do mútuo já fora ultrapassado quando, em abril/maio de 2017, o Banco 2... fez a proposta de prorrogação por cinco anos e indicou as respetivas condições.

Por isso, disse, havendo a expetativa de que a Banco 1... e o Banco 2... chegariam a um acordo de prorrogação por cinco anos com a Autora, qualificaram o contrato como suspenso, para não o considerar vencido, sem qualquer exigência ou contrapartida embora tenha admitido que combinaram com a cliente que esta continuaria a pagar os juros remuneratórios.

Das conversas/negociações diretas com a Banco 1... após a aceitação condicional do Banco 2... de cinco anos de prorrogação disse recordar-se de que a mesma estava a pedir à Autora e a analisar ao detalhe vários documentos e informações e de ter até comentado com alguém que eles (referindo-se ao Banco 2...), não tinham sido tão detalhados na análise do pedido. Disse ter ideia de ter recebido, por email, comunicação da Banco 1... dando conta da aprovação da prorrogação, mas com condições diferentes e mais exigentes, na ótica do cliente, do que as pedidas pelo Banco 2.... [9]

Entretanto, disse, tiveram que dar por cessada a “suspensão” do contrato, que não podiam manter sem reportar o vencimento ao Banco de Portugal, pois o contrato estava, de facto incumprido, comunicação que fizeram.

Após, todavia, voltaram a recorrer ao mesmo meio, de “suspensão do contrato”, por forma a disponibilizar ao cliente a movimentação da conta e permitir a continuidade das negociações.

Recordava que após a não aceitação, inicial, pela Autora, das condições da Banco 1..., foi renegociada entre ambas outra versão, que o cliente aceitou tendo, contudo, depois, recusado a minuta enviada pela Banco 1..., por alegada divergência com a redação do clausulado.

Descreveu quer a preocupação do Banco 2... quer da cliente com a demora da Banco 1... em responder ao pedido de prorrogação, dando, uma vez mais, a entender que não se tratava de uma espera pela formalização da prorrogação, mas pela decisão em si mesma, que estava a ser negociada.

Perguntado diretamente se soube que havia uma aprovação prévia do pedido de prorrogação por cinco anos por banda da Banco 1..., disse que nunca teve conhecimento de tal aprovação antes da resposta escrita da mesma, resposta essa que a Autora não aceitou.

JJ, funcionária da Banco 1... com funções na área de acompanhamento de empresas com necessidade de reestruturação dos crédito disse que teve conhecimento do contrato de mútuo celebrado com a Autora em agosto de 2017, por via de DD que foi o colega que lhe transmitiu as informações sobre as vicissitudes e estado desse contrato quando o processo foi remetido ao departamento onde a testemunha desempenhava funções.

Afirmou que desde março de 2017 estava vencido o prazo de pagamento do mútuo à Autora. Perguntada se nessa data já tinha sido pedido de prorrogação do prazo de vencimento respondeu que, nessa altura estava já, de facto, pendente um pedido de “reestruturação” ou prorrogação do prazo de vencimento do pagamento de capital.

Quando passou a acompanhar o processo da Autora disse ter-lhe sido transmitido que a Banco 1... estaria disponível para a pretendida prorrogação, mas que o Banco 2... não aceitara a proposta da Autora, pelo que teriam que continuar as negociações.

Este depoimento está, pois, em perfeita conformidade com o das anteriores testemunhas DD e MM.

Disse, ainda, ter sabido pelo legal representante da Autora EE que o Banco 2... tinha rejeitado a proposta de prorrogação do vencimento do crédito por cinco anos. Também a testemunha NN, do Banco 2..., confirmou que, de facto, a resposta inicial desse Banco foi de rejeição de prorrogação (mesmo por prazo inferior), embora tenha dito que, em abril de 2017, já havia da parte do Banco 2... uma aceitação de prorrogação por cinco anos mediante condições.

Segundo disse a testemunha JJ, o administrador da Autora EE transmitiu-lhe estar ciente de que não havia ainda qualquer aceitação da prorrogação, estando tal proposta ainda em negociação/apreciação havendo abertura da parte de ambos os bancos e uma probabilidade grande de ser feito um acordo dada essa abertura. Bem como disse que a Autora estava ciente que a decisão final não era das suas interlocutoras diretas (OO e ela própria), mas tinha que ser tomada a um nível hierárquico superior

Confrontada com a aceitação da prorrogação pelo Banco 2... condicionada a idêntica resposta da Banco 1..., documentada por comunicação de 12-05-2017, e posta a hipótese de um ou ambos os bancos estarem “baralhados” afirmou que “se calhar era o cliente que nos estava a baralhar”. Mais adiante, afirmou que a proposta da Autora, de janeiro de 2017, de prorrogação por cinco anos, “não deve ter sido” aceite pela Banco 1... antes de o processo chegar às suas mãos, pois caso tivesse sido o processo não teria sido reencaminhado para o seu gabinete com competência, exatamente, para a negociação que essa prorrogação demandava.

Deu conta de um apontamento interno seu (que tinha perante si no momento em que depunha e cuja consulta lhe foi permitida), de uma reunião que teve com a Autora, representada pelo administrador EE, em que este lhe deu conta de que o Banco 2... não acompanhara o pedido de prorrogação por cinco anos.

Diretamente perguntada se a Banco 1..., nessa altura, já aceitara a prorrogação por cinco anos, respondeu claramente que não, mas que era essa a pretensão do cliente que lhes pediu esse prazo, o que a Banco 1... ponderou tendo, quando soube da resposta negativa do Banco 2... à cliente, prorrogado por seis meses o período de negociação, para permitir a continuação da negociação.

Afirmou que quando tomou conhecimento e começou a acompanhar o processo o crédito já tivera várias prorrogações, estava vencido e com uma negociação ainda em curso para uma nova dilação, desta feita de cinco anos, que foi, então, negociada mediante contrapartidas que são, disse, as normalmente propostas pela área comercial. Disse que, nessa negociação, não havendo acordo com a Autora, partiram do zero.

Nesse contexto, disse, que a Autora “não estava a colaborar” e que foi preciso renegociar pelo que aceitaram uma prorrogação por seis meses, como fizera o Banco 2..., para permitir que se alcançasse um acordo.

Perguntada como trataram “formalmente” a referida prorrogação por seis meses do prazo de vencimento, nomeadamente em termos de comunicação ao Banco de Portugal, admitiu que a comunicação ao Banco de Portugal possa ter ocorrido automaticamente na data do vencimento, após o que, face à suspensão por seis meses, poderia ter ficado regularizada.

Confrontada com uma alegada data da comunicação de incumprimento ao Banco de Portugal pela Banco 1... como tendo sido feita apenas em 2018 e com o facto de, a ser tal comunicação automática, teria  que ter sido feita antes, explicou que a resposta que dera anteriormente resultara de hipótese que colocou como a única possível explicação para a referida comunicação ao Banco de Portugal, em face da pergunta do tribunal sobre porque foi comunicado o incumprimento, já que, de facto, não se recordava dessa comunicação ter ou não sido de facto feita, desde logo por ser automática.

Todavia, está assente nos autos – alíneas VV e WW dos factos provados -, que a Banco 1... “(…)só fez a primeira comunicação de incumprimento, à Central de Responsabilidades de Crédito do BP, em Outubro de 2017, declarando que o crédito (€.1.479.162,00) estava vencido, com a “duração de incumprimento” “mais de 1 até 2 meses” - ver DOC 36 com a petição inicial.” Assim, a pergunta feita à testemunha introduziu dado errado - a de que a comunicação de incumprimento pela Banco 1... fora apenas feita em 2018.

A comunicação feita ao Banco de Portugal pela Banco 1... que está assente nos autos e que foi antecedida por comunicação à Autora, é, assim, consentânea com o depoimento de JJ já que, estando o crédito vencido desde março de 2017, mas tendo a Banco 1... prorrogado o mesmo por seis meses com vista a permitir a negociação do alargamento do prazo por cinco anos antes pedido pela Autora, era lógico concluir que apenas decorridos esses seis meses, em setembro de 2017, portanto, a Banco 1... julgasse vencido e em incumprimento o crédito, estando obrigada a comunicá-lo ao Banco de Portugal no mês seguinte, o que fez.

Disse desconhecer/não se recordar da cativação de valores depositados em contas da Autora afirmando mesmo que, estando em negociações com esta, não faria sentido que houvesse essa cativação, pois a Banco 1... não teria interesse em descapitalizar o cliente, pelo contrário.

Mais adiante, todavia, disse que poderiam ter cativado as verbas da conta da Autora, mas não por forma a amortizar qualquer quantia em dívida à Banco 1... e sim os juros e legais acréscimos e outras despesas como comissões. A propósito desta afirmação recordou, afinal, que tais movimentos foram anulados posteriormente (o que, contudo, documentalmente está demonstrado ter sido apenas parcialmente feito) explicando que a cobrança do crédito vencido foi automaticamente feita por ser esse o procedimento previsto no sistema informático. Disse, contudo, que, exatamente para permitir levar a bom porto as negociações, anularam essa cobrança.

Confrontada com um email de 6 de setembro de 2017 (documento número 15 da petição inicial) enviado por si ao legal representante da Ré e perguntada se nesta data a Banco 1... já considerava a dívida vencida, afirmou que não, mas que, entretanto, informática e automaticamente terá sido emitido aviso de incumprimento para a cliente.

Confrontada com o email de 25 de setembro de 2017 (documento número 16 da petição inicial, em que responde à Autora sobre o débito de 3 746, 96 € da sua conta, confirmou de novo, que o saldo da conta não ficou cativo, tendo havido, sim, uma cobrança automática da quantia ali existente por força do vencimento da dívida.

Depois disso, sublinhe-se, tal quantia foi parcialmente reposta a 28-12-2017 - como resulta do relatório pericial, a fls. 52 -, em conformidade com o que declarou JJ.

A testemunha revelou irritabilidade em vários momentos do seu depoimento, exacerbada quando instada pelo Ilustre Mandatário da Autora, o que, contudo, não retirou credibilidade ao seu depoimento desde logo porque tal atitude foi em grande medida provocada pelo tom das perguntas feitas (o Ilustre Advogado da Autora chegou mesmo a perguntar-lhe se a mesma sabia os meses do ano) e porque se revelou decorrente do facto de estar a ser continuamente questionada sobre factos anteriores ao momento em que teve conhecimento do mútuo celebrado com a Autora e suas vicissitudes, não sendo reveladora qualquer animosidade ou pré-juízo em relação à Autora ou ao objeto da lide.

Explicou a demora da Banco 1... na resposta ao pedido de prorrogação em apreço pela dificuldade na avaliação dos imóveis, desde logo porque, disse, a Autora mostrou resistência a essa avaliação quando, segundo a testemunha, se tratava um procedimento normal em sede de reestruturação do crédito, sendo aliás perfeitamente percetível que a credora pretendesse verificar as garantias e avaliar as mesmas num contexto de nova prorrogação do mútuo, desta feita por cinco anos.

Também referiu que a minuta da Banco 1... ficou pronta em junho, mas que demorou, depois, alguns meses até haver resposta do Banco 2... e da Autora. Ora, os emails de 01-02-2018 da Banco 1... e a resposta da Autora de 27-03-2018 confirmam uma demora de cerca de dois meses na aceitação pela Autora das condições de prorrogação então propostas pela Banco 1... após o que decorreram mais três meses até ao envio pela Banco 1... das minutas concertadas com o Banco 2... para o acordo de prorrogação.

NN funcionário do Banco 2... e, antes da sua criação, do ..., trabalhou em departamento do Banco que acompanhava esta cliente como outros que tinham dificuldades no cumprimento dos créditos concedidos. Disse ter passado a acompanhar o processo em março de 2017.

O pedido de prorrogação por cinco anos formulado em janeiro de 2017 já evidenciava, segundo ele, a impossibilidade/dificuldade de pagamento da Autora na data e vencimento o que era reforçado pelo facto de, antes, terem já sido pedidas e deferidas muitas outras prorrogações de prazos de vencimento.

Segundo disse, antes do processo do cliente ter passado para o seu departamento, já o gabinete de Guimarães tinha feito uma proposta de aprovação da prorrogação por um prazo inferior ao pedido o que, contudo, foi hierarquicamente indeferido.

O seu departamento fez, então, nova proposta com várias contrapartidas, dado que o prazo inicial do mútuo era de 10 anos e com a nova prorrogação seria aumentado para o dobro. O que, disse, depois de uma alteração das condições, acabou por ser aprovado pela sua hierarquia em abril de 2017, já depois do vencimento do crédito.

O seu depoimento corroborou nesta parte o de JJ quando transmitiu que teve conhecimento de uma rejeição inicial pelo Banco 2... da proposta de prorrogação por cinco anos.

Não sendo ele quem contactava com a Banco 1..., disse que o seu gestor, que era quem contactava a Banco 1..., lhe transmitia que esta estava alinhada com as mesmas propostas do Banco 2... embora essa informação provinda da Banco 1... fosse também, nesta altura, “ao nível do balcão”. O que reiterou mais adiante, quando precisou que a proposta aprovada pelo Banco 2... não fora, então, ainda submetida na Banco 1... à apreciação hierárquica e quando afirmou que os interlocutores da Autora na Banco 1... até essa data, no balcão de Amarante, não tinham poder de decisão.

Segundo o depoente, o Banco 2... suspendeu, com vista à negociação com a Autora, por duas vezes o prazo de vencimento da dívida (60 + 60 dias), após o que, em agosto de 2017, frustrada a celebração do acordo, considerou o crédito vencido.

Admitiu que não foi enviada comunicação escrita à Autora pelo Banco 2... dando conta de que tinha considerado suspenso o prazo de vencimento nem, por igual, que acabara ou acabaria tal suspensão. Pois, disse, a cliente sabia que o vencimento ocorrera em março de 2017, bem sabendo que, nessa data, não tinha sido ainda aprovada a proposta de reestruturação da sua dívida que apenas apresentara em janeiro do mesmo ano e que o Banco 2... estava apenas a prorrogar a consideração do vencimento com vista a permitir negociar essa proposta.

Também esta testemunha confirmou que a comunicação ao Banco de Portugal é automática em caso de vencimento da dívida, apenas não tendo seguido logo depois de março dada a suspensão interna que o Banco fez com vista a permitir a continuidade da negociação e para proteção da própria cliente.

Foi muito assertivo na afirmação que da parte da Banco 1... não se esperava apenas que minutasse o acordo, mas se aguardava, efetivamente, pela aprovação da proposta de prorrogação em si mesma.

Referiu que a Autora deixou de cumprir as condições iniciais pouco tempo depois da celebração do mútuo, afirmando que o crédito concedido tinha sido completamente desadequado ao empreendimento a que se destinava, o que levou a “correções” constantes das condições o que, todavia, não exclui a afirmação que fez e reiterou, que a Autora incumpriu desde cedo as condições iniciais bem como incumpriu outras, posteriormente acordadas, referindo nomeadamente e também o atraso no cumprimento da obrigação de pagamento de juros. Enumerou de forma suportada e detalhada vários atrasos e pagamentos parcelares de juros devidos pela Autora, mesmo a partir de março de 2017 e até, pelo menos setembro desse mesmo ano, numa altura em que a mesma estava a tentar renegociar o prazo de vencimento do mútuo.

PP (cujo depoimento está gravado sem identificação e na sequência do depoimento da testemunha LL) funcionário (diretor do centro de empresas) do Banco 2... em Braga, disse ter acompanhado a Autora enquanto funcionário do Banco 3... quando trabalhou em Guimarães, por poucos meses, em data que não pôde precisar, mas que coincidiu com a altura em que a Autora propôs o que chamou de “reestruturação de crédito” quer no Banco 2... quer junto da Banco 1... que, disse recordar, tinha uma resposta muito lenta, também em consequência de alterações na estrutura de organização da própria Banco 1....

Recordava-se que a Autora anunciou pretender o diferimento do termo do contrato com alguns meses de antecedência em relação à ocorrência do mesmo, o que recordava que o Banco 2... deferiu, segundo ele apenas por dois anos, embora tenham comunicado ao cliente que a sua decisão estaria condicionada ao deferimento pela Banco 1..., que, disse, demorou muito a responder e que, ao que sabe, não respondeu em tempo oportuno, ou seja, antes do termo do mútuo, em março de 2017. Disse ter comunicado ao legal representante da Autora EE a decisão do Banco 2..., tomada por estrutura hierárquica superior, sendo que ele próprio apenas tinha elaborado um parecer, cujo teor já não recorda com precisão, mas que sabia que foi favorável ao pedido de prorrogação por tempo superior, mas que não foi aprovado, tendo sido apenas concedida uma prorrogação por um prazo inferior ao por si mesmo proposto. Conjugando-se este depoimento com os anteriormente sumariados, conclui-se que esta testemunha terá sido quem elaborou uma proposta de prorrogação por cinco anos para aprovação hierárquica no Banco 2..., que não foi aceite e que levou à elaboração de uma segunda, que foi a aprovada em abril de 2017.

Entretanto, disse, o processo da Autora passou a ser acompanhado noutro departamento do Banco 2..., chefiado por DD e MM, pelo que ele deixou de ter conhecimento das vicissitudes contratuais.

Sobre a negociação antes feita com a Autora disse que não havia quaisquer reclamações da Autora sobre cobrança indevida de comissões ou de spread, bem como que a pretensão de prorrogação por cinco anos decorreu da crise imobiliária e do impacto que a mesma teve na atividade daquela e importou grande atraso nas vendas das frações construídas.

Disse que a avaliação inicial desse pedido feita pelo Banco 2... foi favorável à prorrogação (por prazo inferior ao pedido, todavia), mediante o que chamou de “uma monotorização mais próxima da atividade da Autora” e que foi antecedida de um estudo da situação da empresa, desde logo porque a Autora, quando fez o pedido, anunciou a vontade de fazer novos investimentos, o que também a deixaria com menos disponibilidade de capital para pagar o valor mutuado ainda em dívida.

Descreveu a comunicação com a Autora como muito fluida e sem “nada a apontar”.

Os depoimentos de EE e QQ, legais representantes da Autora não lograram afastar o teor dos meios de prova supra analisados.

O primeiro explicou que, em dezembro de 2016, dado que o mútuo se vencia em março de 2017, começou a negociar a prorrogação do mútuo com os dois Réus, tendo em conta o estado dos empreendimentos e das vendas/arrendamentos dos imóveis, pois entendeu que a Autora poderia, em três anos, pagar o montante em falta, prazo que, segundo ele era o pretendido pela mesma.

Disse que houve abertura de ambos os bancos para a “renovação” e que partiu deles a sugestão de que se pedisse já a prorrogação por cinco anos, em vez de três, para evitar, caso houvesse novo atraso, novo pedido e novas negociações. O que é infirmado pelos depoimentos dos funcionários do Banco 2... acima referidos que, todos, disseram que este, inicialmente, apenas transmitiu, por seu intermédio, que aceitaria uma prorrogação por prazo inferior (seis meses ou, segundo a testemunha PP, dois anos).

Afirmou que durante estas negociações apresentava sempre as informações que lhe pediam ambos os Réus sobre o estado do empreendimento e sobre a situação económica e financeira da Autora. Formalizou, então, o pedido de prorrogação, em janeiro de 2017, por 5 anos. Segundo o depoente, o seu interlocutor junto do Banco 2..., DD, comunicou-lhe poucos dias antes do vencimento que estavam em processo de venda do Banco pelo que era conveniente esperar algum tempo pela decisão da renovação, mas transmitiu-lhe que estivesse descansado, pois seria aprovada, como veio a ser.

Disse que só depois foi formalmente aceite o pedido de prorrogação pelo Banco 2... e foi proposto novo clausulado do contrato, com uma modificação da percentagem de capital que deviam amortizar com os distrates da hipoteca que passou de 35% a 50%. A Banco 1..., em reunião posterior, disse que acompanhava a posição do Banco 2... e formalizaria a adenda ao contrato, o que, todavia, não fez e levou o depoente a ir perguntar a razão do atraso tendo-lhe sido dito que a demora se prendia com doença grave do superior hierárquico responsável pela decisão em causa. Esta afirmação de que a Banco 1... estava apenas a proceder à redação do acordo de alteração, foi, contudo, totalmente contrariada pelos depoimentos acima analisados. O próprio depoente, aliás, disse a dado momento que “entendeu” que a prorrogação estava aprovada pois a Banco 1... cobrou uma taxa de renovação e eles continuaram a fazer pagamentos de juros na convicção de que apenas havia um atraso na formalização.

Não pode deixar de se assinalar uma contradição visível na posição da Autora quando, em relação aos aumentos de spread defende que não tendo sido formalizados os respetivos acordos não podem ser-lhe exigíveis, mas pode exigir da parte da Banco 1... que fique vinculada a uma prorrogação de vencimento do mútuo por cinco anos apesar de não haver qualquer suporte escrito de qualquer aceitação ou sequer princípio de aceitação da mesma.

Como já acima assinalado, o legal representante da Autora HH pouco mais sabia do que o lhe foi sendo transmitido pelo anterior depoente.

Quanto à explicação que diz que a Autora recebeu da Banco 1... para o atraso da formalização da adenda de prorrogação – a doença de um diretor da agência -, não soube explicar em que medida é que esse diretor era relevante para a referida formalização que como o próprio depoente admitiu estava dependente do departamento jurídico da Banco 1.... Afirmou mesmo que essa pudesse ter sido uma desculpa que lhes foi dada pela Banco 1... para a referida demora. Certo é, contudo, que se a prorrogação pedida já estivesse aceite pela Banco 1..., bem como as respetivas contrapartidas, e apenas carecesse de formalização a doença de um diretor de agência não impediria que o acordo, alegadamente já firmado, fosse minutado pelo departamento jurídico da Banco 1.... A referida doença, todavia, já poderia explicar atraso na negociação do acordo de prorrogação propriamente dito, para a que tal diretor tinha, de facto competência. O que, uma vez mais, confirma que tal acordo não chegou nunca a ser alcançado com a Banco 1....

Em consequência do exposto, improcede a pretensão de alteração da alínea IIII) e de eliminação da JJJJ).


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Factos não provados 10) e 11):

Sob tais alíneas o Tribunal a quo declarou não provado que:

“10. No dia 12.05.2017 o gerente da agência de Amarante da Banco 1... confirmou à Autora, na pessoa do seu administrador e aos representantes do Banco 2... que a Banco 1... acompanhava a proposta do Banco 2..., cujas condições a Banco 1... havia já aprovado anteriormente, aquando da aprovação da prorrogação do mútuo por 5 anos, tendo ficado assente que a Banco 1... elaboraria o aditamento de prorrogação do prazo com as condições transcritas em UUU).

11. Por mais do que uma vez, a A e o próprio Banco 2..., solicitaram à Banco 1..., na pessoa do Sr FF, o envio do aditamento que ficara de elaborar, cujo atraso era justificado com a doença do seu diretor, Dr GG - que, mais tarde, veio a falecer - e com o seu processo de substituição.”.

A Autora pretende ver os mesmos julgados provados com a seguinte redação:

“10. No dia 12.05.2017 o gerente da agência de Amarante da Banco 1... confirmou à A, na pessoa do seu administrador e ao representante do Banco 2..., Dr. DD, que a Banco 1... acompanhava a proposta do Banco 2..., tendo ficado assente que a Banco 1... elaboraria o aditamento de prorrogação do prazo com as condições transcritas em UUU); e

11. Por mais do que uma vez, a A e o próprio Banco 2..., solicitaram à Banco 1..., na pessoa do Sr. FF, o envio do aditamento que ficara de elaborar, cujo atraso era justificado com a doença do seu diretor, Dr GG – que, mais tarde, veio a falecer.”.

A pretensão de alteração destes factos para provados tem por base argumentação semelhante à que sustentava a pretendida alteração das alíneas IIII) e JJJJ) e é estribada pela Recorrente nos depoimentos de EE e HH, seus legais representantes bem como de DD que, como acima assinalado, não conduzem à pretendida conclusão de que a Banco 1... aceitou a prorrogação do vencimento do mútuo por cinco anos em maio de 2017 ficando de a formalizar, ou que tenha justificado a demora da mesma com a doença de um seu diretor. Tampouco resultou dos meios de prova já acima analisados criticamente que a Autora ou o Banco 2... tenham insistido junto da Banco 1... pela “formalização” do acordo, mas, antes, pela sua decisão relativamente à pretensão de prorrogação formulada pela Autora, cujos termos foram negociados ao longo de vários meses.

Assim, sem necessidade de diversa fundamentação, conclui-se pela improcedência da pretensão da Apelante de ver esses factos julgados como provados.


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Facto não provado número 12):

Sob a alínea 12 do elenco dos factos não provados consta o seguinte:

“A A. só tomou conhecimento do facto sob TT) em Novembro de 2017, porque o Banco 2... nunca lho comunicou.”.

A alínea TT), por sua vez, tem o seguinte teor:

“Em Agosto de 2017 aparece a referência de que o crédito (€1.631.958,00) no Banco 2... estava vencido, com a “duração de incumprimento” “até 1 mês”, conforme DOC 34 junto com a petição inicial.”

A Apelante pretende que o teor da alínea 12 passe a provado o que apenas fundamenta no depoimento de parte do seu legal representante EE quando o mesmo afirmou que, apesar de a relação com o Banco 2... se ter mantido “boa” e de tal Banco não ter cativado montantes da conta à ordem, o mesmo comunicou o vencimento ao Banco de Portugal sem ter informado a Autora.

Ora, a mera confirmação deste facto, alegado pela Autora, pelo seu legal representante não é suficiente à prova da falta de comunicação do vencimento da dívida pelo Banco 2..., desde logo dado o seu comprometimento com a posição da parte que representa.

Da demais prova já reapreciada a propósito das anteriores pretensões da Recorrente resulta que a testemunha NN, funcionário do Banco 2... que acompanhou as negociações com a Autora desde março de 2017, admitiu que não foi enviada comunicação escrita à Autora pelo Banco 2... dando conta de que este tinha considerado suspenso o prazo de vencimento nem, por igual, de que acabara ou acabaria tal suspensão. Pois, disse, a cliente sabia que o vencimento ocorrera em março de 2017, bem sabendo que, nessa data, não tinha sido ainda aprovada a proposta de reestruturação da sua dívida que apenas apresentara em janeiro do mesmo ano, bem como, disse, sabia que o Banco 2... estava a “prorrogar a consideração do vencimento” com vista a permitir negociar essa proposta.

Assim, ainda que considerado este depoimento, não há prova bastante para que se conclua que a Autora só em novembro teve conhecimento de que o Banco 2... considerara o crédito vencido em julho de 2017 (comunicando esse incumprimento ao Banco de Portugal em agosto subsequente). Tal versão revela-se desde logo implausível, no contexto de grande proximidade negocial que então estava a ocorrer entre as partes – que repetidamente foi descrito como sendo de bom relacionamento e constantes contactos pessoais -, e dado o perfil do seu legal representante EE que resultou de todos os depoimentos (que o descreveram como atento e minucioso no acompanhamento das negociações e das informações bancárias que a Autora recebia, nomeadamente os extratos).

Assim, improcede a pretendida alteração da alínea 12) dos factos não provados.


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Alteração das alíneas V) e W).

A Apelante quer que as alíneas V) e WW) vejam a sua redação alterada.

Quanto à alínea V, cuja redação constante da sentença é: “O aditamento de 05.02.2015 (DOC 4 com a petição) prorrogou o prazo de vencimento do mútuo para 12.03.2015, como resulta da conjugação das clªs 3ª, 4ª e 10ª do DOC 4 -; a A confessou-se devedora da importância de €.3.256.050,00 (€.1.569.076,00 à Banco 1... e €:1.686.974,00 ao Banco 2...) - clª 5ª do DOC 4; o spread alterou-se para 5,5%23 - clª 6ª do DOC 4.”, a Autora quer ver-lhe aditado o seguinte trecho:

Com efeitos retroativos a 12.09.2006, deixando de vigorar um plano de pagamentos semestrais. A amortização do capital passou a realizar-se mediante a entrega aos mutuantes de 30% a 35% do preço de venda de cada bem imóvel hipotecado, contra a entrega de distrate de hipoteca pelos bancos, sem prejuízo de um termo final de pagamento do saldo em dívida do mútuo, que passou a ser 12.03.2015”.

A alínea W) dos factos provados tem a seguinte redação: “O aditamento de 08.10.2015 (DOC 5), que teve efeitos retroativos a 12.03.2015 - clª 11ª do DOC 5 -, prorrogou o prazo de vencimento do mútuo para 12.03.2017 - clªs 1ª, 3ª e 4ª do DOC 5 -; a A confessou-se devedora da importância de €.3.218.950,02 (€.1.550.526,00 à Banco 1... e €:1.668.424,02 ao Banco 2...) - clª 5ª do DOC 5 -; o spread alterou-se para 3,5% - clª 6ª do DOC 5.” a que a Apelante quer que seja aditado o seguinte:

“Com efeitos retroativos a 12.09.2006, deixando de vigorar um plano de pagamentos semestrais. A amortização do capital passou a realizar-se mediante a entrega aos mutuantes de 30% a 35% do preço de venda de cada bem imóvel hipotecado, contra a entrega de distrate de hipoteca pelos bancos, sem prejuízo de um termo final de pagamento do saldo em dívida do mútuo, que passou a ser 12.03.2017.”.

O teor dos acordos de alteração do mútuo celebrados em 05-02-2015 e 05-10-2015 está integralmente dado por reproduzido na alínea F) dos factos provados.

Ao contrário do afirmado pela Recorrente, não é verdade que “muito antes do início dos aumentos de spread a forma de pagamento acordada deixara já de ser a semestral e passara a ser, em função das vendas, de acordo com um mapa elaborado pelos Bancos.”

Ocorreu, de facto, durante vários anos, a constante prorrogação dos prazos de pagamento semestral inicialmente acordados que, como a prova acima analisada criticamente abundantemente indica, foram feitos mediante sucessivos pedidos de prorrogação pela Autora, como, aliás, a sua versão dos factos também confirma. O que sucedeu, em 2015 e resulta de dois documentos cujo teor está já dado por reproduzido na alínea F), foi uma estipulação de nova forma de pagamento das amortizações do capital a que foi aplicada eficácia retroativa. Retroatividade que, todavia, não “apaga” o passado, que foi de sucessivos pedidos de prorrogação de pagamento de prestações de capital que, até 2015 eram, de facto, devidas em face do contrato escrito em vigor. O estabelecimento, por qualquer via, de retroatividade a uma disposição (legal ou contratual) visa conferir efeitos pretéritos a atos antes praticados[10], mas não decorre da mesma uma desaparição desse passado.

Assim, não só não se vê qualquer razão para transcrever nas alíneas V) e W) condições contratuais que estão já dadas por reproduzidas na alínea F) como, menos ainda, as conclusões que a Autora pretende retirar da retroatividade estabelecida nesses acordos têm lugar nesta sede de reapreciação da matéria de facto.

De todo o modo, afirma-se desde já que o que ficou estipulado no acordo referido na alínea V) quanto a retroatividade do seu clausulado foi apenas que: “no que se refere à interrupção do período de amortização do capital” produziria efeitos desde 12-09-2006 como resulta da sua cláusula 10ª, número 1.

Como é óbvio, a retroatividade da fixação de uma interrupção do prazo de amortização do capital não determinou a retroatividade do novo plano de pagamentos, que, pela própria natureza das coisas, só desde o acordo sobre o mesmo podia passar a aplicar-se como resulta do número 2 da cláusula 10ª da alteração de 5 de fevereiro de 2015.

Diga-se, ainda, que nem se percebe bem a defesa, pela Autora, de uma interpretação da cláusula de retroatividade tão ampla como a que propõe. É que se todas as modificações do contrato estabelecidas em 2015 forem de julgar como como aplicáveis desde 2006, também a cláusula que estabelece que o spread é de 5, 5%, como acordado em fevereiro de 2015, é de aplicar desde a mesma data. Não pode a Autora pretender a retroatividade dos acordos de 2015 apenas para o que lhe é favorável.

Assim, porque absolutamente inútil, não se reproduzirão as pretendidas estipulações contratuais nas alíneas V) e W) (que estão já consideradas assentes e dadas por reproduzidas na alínea F) dos factos provados).


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A pretendida alteração da alínea KK):

A referida alínea dos factos provados tem a seguinte redação: “Através do DOC 21 junto com a petição inicial, parte final, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, foi apresentada, a 22.12.2017, uma “contraproposta da A..., SA”, como segue: (i) seria desejável não existir uma grelha mínima anual de amortização e que a existir ela deveria ser igual (20%) em cada ano, sendo que todas as vendas implicam o cancelamento de hipoteca (o que implica amortizações de capital antecipadas); (ii) no caso das amortizações antecipadas ultrapassarem o limite previsto, deverão refletir-se no 3º ano e atingido este no 5º ano; (iii) fixação prévia do valor de amortização em caso de cancelamento de hipoteca, propondo a solução do Banco 2... de amortização de 50% do valor comercial de cada fração com base na avaliação existente; (iv) pedido de desoneração do património hipotecado à medida da amortização da dívida, por forma a permitir encontrar fontes de financiamento alternativo para permitir acelerar o processo de recuperação/construção de novos espaços empresariais.”.

A Recorrente quer ver-lhe aditado, a final, o seguinte trecho: “Em 26.01.2017, no seguimento de contactos realizados a A..., SA formalizou o pedido de prorrogação do financiamento por 5 anos, mantendo-se as demais condições em vigor. A Banco 1... comunicou verbalmente e por diversas vezes a aprovação do solicitado. Em 12.05.2017, o Banco 2... comunicou as suas condições, que constam do DOC 10 da pi, tendo ocorrido uma reunião, em maio de 2017, na agência da Banco 1... entre as três partes, tendo a Banco 1... declarado que dava o seu acordo às condições do Banco 2... e ficou de elaborar a adenda de acordo com as condições definidas no DOC 10 da pi.”.

Antes de mais é notório e deve ser desde já assinalado que, ainda que se considere que tal grupo de factos deve ser julgado provado jamais deveria integrar o teor da alínea KK), que se refere a um momento posterior aos dos factos que a Autora quer ver aditados, sob pena de se ficar com uma redação confusa e cronologicamente inversa.

Tal alínea refere uma data - 22-12-2017 -, ainda de negociação entre a Banco 1... e a Autora com vista a uma prorrogação, por cinco anos, do prazo de vencimento do mútuo (que já ocorrera em março desse ano) que as partes continuavam a tentar negociar e os factos que ora se sugerem aditar reportam-se:

 à anterior formalização do pedido de prorrogação, em 26-01-2017, na sequência de contactos já antes iniciados nesse sentido;

 à alegada comunicação verbal de aceitação desse pedido, por várias vezes, por banda da Banco 1...;

à comunicação escrita de aceitação dessa prorrogação pelo Banco 2... em 12-05-2017, com as condições constantes da mesma; e,

à ocorrência de uma reunião entre a Autora e os Bancos Réus em maio de 2017 em que a Banco 1... deu novamente o seu acordo à prorrogação com as condições propostas pelo Banco 2... e se obrigou a elaborar a adenda escrita com tais condições.

Vejamos, assim seccionada a pretensão de aditamento em apreço, que contém vários factos, se deve proceder a pretensão da Apelante.

Quanto à formalização pela Autora do pedido de prorrogação em 26-01-2017 na sequência de contactos já antes iniciados nesse sentido (1 e 2), a mesma resulta já do que está dado por provado nas alíneas PPP) e TTT) sendo absolutamente desnecessária a repetição dessa matéria na alínea KK).

O mesmo sucede relativamente à comunicação escrita de aceitação dessa prorrogação pelo Banco 2... em 12-05-2017 (3), com as condições constantes da mesma que já resulta provada da alínea UUU).

Quanto à alegada comunicação, verbal, de aceitação da prorrogação pela Banco 1..., por várias vezes, nomeadamente em reunião de maio de 2017 (4) a mesma resultou absolutamente infirmada dos depoimentos já acima analisados criticamente e devidamente sumariados quando se apreciou a censura da Recorrente ao teor das alíneas IIII) e JJJJ). O que se apurou desses depoimentos é que em março de 2017 a Banco 1... informou estar aberta à possibilidade de proceder a uma prorrogação por cinco anos do prazo de vencimento do mútuo, caso o Banco 2... acompanhasse a mesma e mediante condições e contrapartidas a negociar. Dispensamo-nos de repetir neste momento tal análise dos meios probatórios, aqui os dando por reproduzidos.

Os factos em que se teria traduzido por banda da Banco 1... a aceitação da prorrogação do mútuo por cinco anos, na versão que a Autora articula na petição inicial e que agora quer ver introduzidos na alínea KK), estão aliás, expressamente julgados não provados nas alíneas 3, 4 e 8 a 10, sobre os quais o Tribunal a quo  entendeu não se ter produzido prova bastante. O que, em face dos depoimentos, de sinal contrário que acima se sumariaram e analisaram criticamente, é de manter.

Aliás, uma vez mais quanto a esta alínea e sua pretendida alteração, a Autora sustenta a sua reclamação apenas no depoimento de parte de EE, legal representante da Autora que, quer porque comprometido com a parte que representa quer, sobretudo porque vasta e diretamente contrariado pelos de DD, MM, JJ, NN e PP (todos sumariados e analisados criticamente de fls. 60 a 68 deste acórdão), não serve como fundamento para a pretendida prova de aceitação pela Banco 1... da prorrogação por cinco anos do prazo de vencimento do mútuo a partir de março de 2017.

Improcede, assim, a pretensão de alteração da alínea KK)


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A alínea LLLL) dos factos provados:

A Recorrente quer ver alterada a sua redação, que é esta: “As quantias descontadas pela Banco 1... em setembro de 2017, antes da data do vencimento, foram anuladas e as respetivas quantias devolvidas à cliente, ressalvado o prejuízo do provado sob BBBB)”;

Propõe, em alternativa, a seguinte: “As quantias descontadas pela Banco 1... em setembro de 2017, antes da data do vencimento, foram anuladas e as respetivas quantias devolvidas à cliente, mais de 3 meses depois, isto é, em 31.12.2017, ressalvado o prejuízo do provado sob BBBB).”.

Mais uma vez estamos perante a pretensão de aditamento de um facto – a data do estorno à Autora de parte da quantia cobrada a 08-09-2017 -, que não foi alegado pela Autora.

Resulta, sim, da contestação da Banco 1... (pontos 83º e seguintes) a afirmação de que, em dezembro de 2017, num contexto de nova prorrogação, desta feita por 60 dias, do prazo de vencimento do mútuo com vista a permitir a continuidade das negociações, a mesma estornou (é esse o sentido do ali imperfeitamente declarado) as quantias a que se refere o artigo 144º da petição inicial e que são as que estão vertidas na alínea II) dos factos provados.

Na alínea LLLL), por sua vez, está provado que, sem prejuízo dos valores enumerados na alínea BBBB), os demais valores cobrados pela Banco 1... em setembro de 2017 foram estornados à cliente, sem indicação da respetiva data.

Tendo em conta que a Banco 1... alegou a devolução das quantias cobradas em 08-09-2017, é útil à Autora a precisão de que essa devolução ocorreu em data posterior, para suportar a sua alegação, essencial a uma das suas pretensões, de que ficou sem disponibilidade financeira durante um determinado lapso de tempo, o que não lhe permitiu avançar com projetos imobiliários em curso.

E, como tal, deve apurar-se que ou que quantias das cobradas (em setembro de 2017 pois é a esse mês que se refere a alínea LLLL) foram repostas pela Banco 1... e quando.

A data de devolução que a Autora sugere seja julgada provada não foi por si alegada, mas da contestação da Ré Banco 1... resulta a alegação de que a mesma ocorreu em dezembro, sem menção do dia.

O relatório pericial a que recorre a Apelante como fundamento da sua pretensão também não revela, a fls. 52, a devolução das quantias a 31 de dezembro do mesmo ano, como afirma a Apelante, mas, antes, a 28 de dezembro.

Do mesmo relatório resulta, ainda, que uma das quantias cobradas pela Banco 1... em setembro de 2017 (no dia 15 de setembro), a saber, a de 4 608, 11 € de capital, foi estornada apenas a 01 de agosto de 2018.

Estando alegada pela Ré Banco 1... a data da devolução das quantias que havia cobrado em setembro e resultando a mesma parcialmente confirmada e precisada (a 28 de dezembro em vez de “em dezembro”), por via da prova pericial – cfr. fls. 52 e 80 do relatório -, e, noutra parte, corrigida pela mesma prova (estorno a 01 de agosto de 2018 de 4608, 11 € cobrados a 15 de setembro), deve alterar-se a redação da alínea LLLL) de forma a que a mesma constitua uma resposta cabal (em parte restritiva e em parte explicativa) ao facto alegado pela Banco 1... no artigo 144º da sua contestação

Neste conspecto também se deve afirmar que não só não é feliz, por nada clara, como não é rigorosa a expressão “ressalvado ou sem prejuízo do provado sob BBBB).” que foi feita constar da alínea LLLL).

Aquela alínea BBBB) tem a seguinte redação: “A Banco 1... cobrou na data da extinção do mútuo (01.08.2018), a mais, juros moratórios e remuneratórios sobre o montante de 4.608,11 EUR de capital, liquidado em 15.09.2017; sendo, pois, que o capital em dívida à data daquela liquidação (01.08.2018) era o de 1.480.791,99 EUR (que não o de 1.485.400). Mais cobrou duplamente taxa de alteração contratual, no montante de 3.746,96 EUR e comissão flat, finex, no montante de 4.160 EUR (IS incluído).”

A primeira oração deste ponto da matéria de facto é, pois, referente a valores cobrados pela Banco 1... em 01-08-2018 e não aos valores cobrados em setembro de 2017 a que se refere a alínea LLLL). Já na segunda oração dessa alínea BBBB) se refere uma cobrança, ali qualificada como duplamente feita, de taxa de “alteração contratual” no valor de 3 746, 96 € e de “comissão flat finex” no valor de 4160 €. Quanto a estes dois valores não se referem, na alínea BBBB), as datas da sua cobrança.

Ora, referindo-se a alínea LLLL) apenas à devolução de valores cobrados em setembro de 2017, não faz qualquer sentido ressalvar do que dela consta os montantes referidos na alínea BBBB) como tendo sido cobrados “a mais” em 01-08-2018. Assim será eliminada tal “ressalva” por não fazer aqui sentido, antes constituindo elemento que introduz dificuldade de interpretação da alínea BBBB) dos factos provados.

Também a expressão “antes da data de vencimento” que consta na alínea LLLL) apela a um conceito de direito que não deve ter assento na matéria de facto. O vencimento de uma obrigação convoca, para que seja determinado e afirmado, conclusão, de direito que pode decorrer de determinados factos relevantes, nomeadamente, e no que aqui releva, a data acordada pelas partes para tal vencimento e que resultará da interpretação do contrato e suas modificações.

Assim, expurgando a alínea em apreço das menções que dela indevidamente constam e aditando as datas das cobranças ocorridas em setembro de 2017 e dos respetivos estornos apurados, a alínea LLLL) deve ter a seguinte redação:

As quantias descontadas pela Banco 1... em 8 de setembro de 2017 foram anuladas e devolvidas à cliente em 28-12-2017, e a quantia de 4 608,11 € descontada pela mesma Ré em 15 de setembro de 2017, foi estornada à Autora em 01 de agosto de 2018.


***

b) Apelação da Banco 1...:

Da apelação da Recorrente Banco 1... resulta a necessidade de aferir se deve ser alterada a alínea BBBB) dos factos provados.

A redação desta alínea é a seguinte: “A Banco 1... cobrou na data da extinção do mútuo (01.08.2018), a mais, juros moratórios e remuneratórios sobre o montante de 4.608,11 EUR de capital, liquidado em 15.09.2017; sendo, pois, que o capital em dívida à data daquela liquidação (01.08.2018) era o de 1.480.791,99 EUR (que não o de 1.485.400). Mais cobrou duplamente taxa de alteração contratual, no montante de 3.746,96 EUR e comissão flat, finex, no montante de 4.160 EUR (IS incluído).”.

A Apelante pretende a alteração da segunda oração desta alínea, propondo a seguinte, em alternativa: A Banco 1... cobrou a quantia de € 3.746,96 a título de imposto selo sobre a utilização de capital e prorrogação do prazo do empréstimo e a quantia de € 4.160,00 (IS incluído) a título de duas avaliações a dois bens imóveis distintos.”.

Analisaremos em separado, como fizeram Apelante e Apelada, as duas verbas referidas na segunda oração da alínea em apreço.

Quanto à quantia de 3 746, 96 €, entende a Recorrente Banco 1... que não se refere a uma taxa de alteração contratual, mas, antes, ao que imputa a: imposto de selo sobre a utilização do capital e prorrogação do prazo de crédito (3 564,96 €); comissão pela alteração contratual (175 €); e imposto de selo (7 €).

Argumenta que estando provado na alínea ZZ) que “(…) a Banco 1... cobrou €:3.564,96 a título de “imposto de selo s/capital” mais uma comissão de “alteração contratual” (€:175,00) e imposto de selo (€:7,00), no valor total de €.3.746,96 e, de seguida, anulou na conta à ordem todos esses movimentos que perfazem €.3.746,96, conforme DOC 47 e 48 com a petição inicial.”, não podia, do mesmo passo, dar-se como provada a dupla cobrança de taxa de alteração contratual.

Remete para o extrato da conta da Autora que juntou a 6 de outubro de 2022 de que resulta que a 28 de dezembro de 2017 lhe foi debitada a quantia de 175 € a título de comissão da alteração contratual e afirma que, em sede de esclarecimentos o Sr. perito confirmou isso mesmo.

Só assim, aliás, diz que se compreende que tenham sido cobradas por mais de que uma vez, ao longo do contrato, as quantias de 3.564,96€, relativas a imposto de selo sobre a utilização do capital, quantia a que, se somados os 175€ efetivamente devidos a título de comissão de alteração contratual, e o valor de 7 € de imposto de selo, passa a ser de 3 746, 96€.

A Apelada A..., SA contrapõe que o facto provado ZZ), em que se referem as várias parcelas em que se decompõe a quantia de 3 746, 96 €, remete para os documentos 47 e 48 da petição inicial decorrendo do primeiro a sua razão de ser: “alteração de prazo” e do segundo que as quantias ali estornadas (499, 48 € +1.130,49€ + 2.116,99€) não equivalem às parcelas que alegadamente comporiam a quantia de 3 746, 96 € segundo a própria Banco 1... e que seriam as de 3 564, 96 € + 175 € + 7 €. Afirma que o estorno das quantias acima elencadas se tratou de “habilidade contabilística” da Banco 1... de que a mesma não pode beneficiar.

Sublinha, ainda que os documentos em que se sustenta para qualificação da quantia de 3 746, 96 € foram emitidos pela própria Banco 1..., e tendo sido juntos na petição inicial não foram impugnados.

Apreciando:

Em face do que está provado na alínea ZZ) é manifesta a razão da Apelante Banco 1....

De facto, a referida alínea dá por provado que, em 28 de dezembro de 2018, “a Banco 1... cobrou €:3.564,96 a título de “imposto de selo s/capital” mais uma comissão de “alteração contratual” (€:175,00) e imposto de selo (€:7,00), no valor total de €.3.746,96 e, de seguida, anulou na conta à ordem todos esses movimentos que perfazem €.3.746,96, conforme DOC 47 e 48 com a petição inicial”. Tais documentos a que já acima nos referimos comprovam o estorno da totalidade da quantia de 3 746, 96 €. O mero facto de esse estorno ter sido feito mediante decomposição em três parcelas de valores diferentes das que a compunham não põe em causa a devolução desse valor que, portanto, não pode ter-se por duplamente cobrado. A soma dessas três parcelas corresponde, com exatidão (ao cêntimo) ao valor cobrado pelo que, não sendo de todo plausível que ocorresse uma coincidência com tal detalhe, é manifesto que foi estornada a referida quantia, na sua totalidade.

O que aliás, foi confirmado pelo Sr. Perito em sede de prestação de esclarecimentos em que deixou claro que a cobrança de imposto de selo é devida, em sede de mútuos bancários, também quando há uma prorrogação de um crédito já antes concedido, o que decorre da Tabela de Imposto de Selo.

Donde, concluindo, não pode julgar-se provado que a referida quantia foi cobrada duplamente, nem que se reportasse na sua totalidade a uma taxa de alteração contratual, devendo passar apenas a constar que tal quantia foi cobrada (uma vez) e que se referia a imposto de selo s/capital (3 564, 96 €) mais uma comissão de “alteração contratual” (€:175,00) e imposto de selo (€:7,00).


*

Relativamente à quantia de 4 160 € que na alínea BBBB) se afirma ter sido cobrada como “comissão flat, finex” diz a Apelante que a mesma resulta, de facto, da soma de duas avaliações a imóveis (de 2000 € cada) acrescidas de imposto de selo de 160 €.

Afirma que tal resulta do depoimento de JJ que, de facto, afirmou no seu depoimento que a referida quantia decorria da enunciada soma explicando a sua denominação como “comissão flat, finex” por, segundo ela se tratar de um encargo não identificado.

A Apelada A..., SA contra-alega afirmando que tal explicação não colhe, já que a própria Banco 1... usa a denominação “comissão de avaliação” no mesmo extrato em que cobra a referida quantia sob a denominação “flat, finex”, como resulta, a seu ver da página 17 do extrato junto a 6 de outubro de 2022.

É certo que a testemunha JJ explicou que a quantia de 2000€ respeitava ao valor das despesas com avaliação e que de toda a demais prova produzida e acima analisada resultou que a Banco 1... exigiu novas avaliações dos imóveis dados em garantia aquando da negociação da prorrogação do prazo do mútuo por mais cinco anos.

Essas avaliações, aliás, já acima foram referidas e constam do documento número 20 junto à petição inicial que a própria Apelante convocou nas alegações de recurso para efeito da pretendida alteração das alíneas ZZZ) e 13). Como referido na fundamentação da decisão relativa a tal pretensão, a Banco 1... efetuou nova avaliação dos imóveis a 21-02-2018, sendo essa a data de todos os relatórios de avaliação juntos com a petição inicial.

Como tal, a cobrança de 2000 € + 2000 € a esse título, a 15 de janeiro de 2018, não se revela como evidentemente reportada a uma avaliação concluída 36 dias depois.

E nem pode deduzir-se que o valor cobrado seja necessariamente decorrente da soma dessas duas parcelas e de imposto de selo.

Como bem salientado pela Recorrente a própria Banco 1... identifica, a 15-09-2017, o valor de uma quantia de 2000 € cobrada no mesmo extrato, como de “comissão de avaliação” (página 17 do documento por ela junto a  06-10-2022), não colhendo, assim, a explicação dada pela testemunha JJ para a nomeação da mesma quantia (2000 €) como de comissão flat/finex/outras a 15-01-2018 (cfr. fls. 21 do mesmo documento) por se tratar de um encargo não identificado.

É certo que as duas quantias ali cobradas a 15-01-2018 correspondem ao mesmo valor antes cobrado a título de “comissão de avaliação” a que acresce, como ali discriminado, imposto de selo (IS). Todavia, a quantia de 2000 € não revela, como sucedia com a de 3 746, 96 € antes analisada, uma coincidência de tal pormenor que possa considerar-se impossível que não se refira ao mesmo tipo de despesa. E, repetimos, não colheu o depoimento da testemunha JJ quanto à tentativa de explicação para o facto de uma “comissão de avaliação” estar a ser cobrada sob diferente designação.

Se não pode alterar-se a qualificação da causa de cobrança da quantia como pretendido pela Banco 1..., SA, já há que reconhecer razão a tal Apelante quando pretende, também, que quanto a esse valor não seja afirmado que foi duplamente debitado. Resulta, de facto, do relatório pericial que tal valor apenas foi cobrado em janeiro de 2018, não tendo sido diretamente retirado da conta, mas resultando a sua cobrança da diferença entre o valor de 11 5550, 37 € cobrado a 15-09-2017 e o valor, estornado em 01-08-2018, de 7 390, 37 €. Tal está totalmente explicitado e evidenciado a fls. 66 e 67 do relatório pericial.

Pelo que a redação da alínea BBBB) passará, assim a ser seguinte:

A Banco 1... cobrou na data da extinção do mútuo (01.08.2018), a mais, juros moratórios e remuneratórios sobre o montante de 4.608,11 EUR de capital, liquidado em 15.09.2017; sendo, pois, que o capital em dívida à data daquela liquidação (01.08.2018) era o de 1.480.791,99 EUR (que não o de 1.485.400). Mais cobrou a quantia de € 3.746,96 a título de imposto selo sobre a utilização de capital e prorrogação do prazo do empréstimo e cobrou uma comissão flat, finex, no montante de 4.160 EUR (IS incluído).


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2 – Da ampliação da matéria de facto:

Decididas as questões relativas à matéria de facto apurada suscitadas por ambas as Apelantes, conclui-se, em face da prova reapreciada e do teor das alíneas 46ª da contestação da Banco 1... e 98ª a 100ª da contestação do Banco 2..., que deve ser ampliada a matéria de facto à luz do previsto no artigo 662º, número 1 e número 2 c) do Código de Processo Civil.

Tal preceito prevê o dever de ampliação da matéria de facto que se considere indispensável, para o que deve anular-se a sentença quando não constem do processo todos os elementos que permitam a alteração.

Nas palavras de Abrantes Geraldes[11] “(…) a anulação do julgamento deve ser sempre uma medida de último recurso, apenas legítima quando de outro modo não for possível superar a situação, por forma a fixar com segurança a matéria de facto provada e não provada (…”)

Ora, perante as alegações de factos pelas Rés que constam das assinaladas alíneas das respetivas contestações, é de concluir que sentença em recurso sofre, nas palavras do mesmo Autor, da “patologia” consistente em falta de pronúncia sobre factos essenciais.

Por economia damos aqui por reproduzido o que acima se referiu sobre a natureza dos factos essenciais que as partes têm de alegar em sustentação da sua pretensão.

Uma das questões a resolver neste recurso prende-se com a alegada cobrança pelos Réus à Autora uma percentagem de spread acima do convencionado no contrato que intitularam como de mútuo.

Ora, entre outros argumentos, ambos os Réus alegam, e tal alegação constitui facto essencial à sua defesa, que as subidas das percentagens de spread decorreram e foram contrapartida de alterações contratuais pedidas pela própria Autora e consistentes em sucessivos pedidos de prorrogação dos prazos de amortização do capital.

Alegam, em concreto, além das que ficaram provadas nas alíneas DDDD) a GGGG), que a Autora lhes pediu e eles acederam a pedidos de prorrogação do prazo de vencimento da obrigação semestral de amortização de capital em setembro e dezembro de 2004 e em março de 2005.

O que demonstram pela junção dos documentos 15 e 16 da contestação do Banco 2... e 1 e 2 da contestação da Banco 1....

Tais documentos constituem troca de correspondência entre a Autora e os Bancos Réus e evidenciam que logo em setembro de 2004, mês em que se venceria a primeira prestação de amortização regular e semestral do capital prevista no contrato, a Autora pediu e viu ser-lhe deferida uma prorrogação desse vencimento para dezembro e, depois, pediu e viu ser-lhe deferida nova prorrogação para janeiro de 2015 dessa mesma prestação. Também em março de 2015 a Autora viu ser deferida por ambos os Bancos a sua pretensão de dispensa de pagamento das duas prestações semestrais de capital que se venciam nesse ano de 2015.

A Autora, no exercício do direito de responder às exceções que lhe foi facultado tomou posição expressa sobre estas alegações das Rés afirmando, no artigo 36º, que o argumento que as mesmas constroem sobre tais factos “cai por terra” já que, argumentou, na sequência desses pedidos não ocorreu qualquer aumento de spread. Não impugnou, assim, tais pedidos e concessões de prorrogação de prazos de vencimento, antes os aceitando e tentando contextualizar e nem impugnou o teor dos documentos juntos (que, como acima resulta da análise crítica da prova reapreciada, é inteiramente confirmado por todos os depoentes que se referiram a tal matéria e que unanimemente afirmaram que logo “desde o início” do contrato a Autora deixou de pagar as prestações semestrais de amortização do capital).

Estão, pois, abundantemente demonstrados os factos alegados pelas Rés acima sumariados devendo, em conformidade com o previsto no artigo 662º, número 1 e número 2º c) ampliar-se a matéria de facto já que constam do processo todos os elementos que, nos termos do número 1, permitem tal ampliação.

Será, assim, aditado o seguinte facto provado (que será acrescentado no final do elenco dos já existentes por facilidade e para evitar que desse aditamento resulte erro nas remissões que em várias alíneas se faz e que, com a eventual renumeração ficariam sem sentido):

TTTT) Além do referido em DDDD) e FFFF) a Autora também pediu às Rés e viu ser-lhe deferido pelas mesmas a prorrogação do prazo de vencimento da prestação de amortização de capital:

em setembro de 2004, que foi prorrogada para dezembro desse ano;

novamente em dezembro de 2004, tendo a mesma sido prorrogada para janeiro de 2005;

novamente em março de 2005, tendo nessa data sido deferida a dispensa de pagamento nas datas acordadas das duas prestações semestrais que se venceriam nesse ano.

Em face da prova deste facto tem de ser alterada parte da redação dada à alínea 25 dos factos não provados, sob pena de contradição da mesma com o novo facto provado.

Verifica-se, de facto, que além das prorrogações do prazo de pagamento das prestações na componente de capital referidas em DDDD) a GGGG) que são mencionadas na alínea 25, a Autora também beneficiou das ora provadas em TTTT) o que dela deve passar a constar para evitar contradição entre esse facto não provado e o ora aditado.

A redação da alínea 25) dos factos não provados passará então a ser (tendo também presente a acima anunciada eliminação da menção à aceitação que ali constava) a seguinte:

25. A mais ou para além do provado sob DDDD) a GGGG) e TTTT) a Autora beneficiou de várias prorrogações do prazo de pagamento das prestações na componente de capital.


***

3. Fixada a matéria de facto em resultado da censura que a ela dirigiam as Apelantes A..., SA e Banco 1... e do cumprimento do dever de ampliação e correção oficiosamente exercido, é o seguinte o elenco dos factos provados e não provados:

A) A sociedade autora é uma sociedade anónima que tem por objeto social “a promoção, construção, comercialização e gestão de parques empresariais ou industriais, a promoção imobiliária, a cedendo o seu uso a terceiros e prestando serviços conexos, a compra e venda de prédios rústicos e urbanos e a revenda dos adquiridos para esse fim”.

B) A A. adquiriu o património imobiliário da massa insolvente de B..., LDA (conhecida por C...) para aí implementar o parque empresarial de AMARANTE (denominado D...) e de VILA POUCA DE AGUIAR.

C) Os RR são duas instituições de crédito que exercem a atividade bancária em regime de exclusividade.

D) O Réu Banco 2..., SA foi constituído por deliberação do Conselho de Administração do Banco de Portugal (CA BdP) tomada em reunião extraordinária de 3 de agosto de 2014, nos termos do n° 5 do artigo 145°-G do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (ao diante RGICSF), aprovado pelo Decreto-Lei 298/92, de 31 de Dezembro.

E) A A., com vista à aquisição do património imobiliário da massa insolvente de B..., LDA, contraiu, em 14.02.2002, um mútuo de €7.481.968,00 (cada R. mutuou €3.740.984,00), por 10 anos, junto da Ré e do Banco 3..., tendo o Banco 3... e a Banco 1... mutuado a importância de €3.740.984,00, conforme DOC 2 junto com a petição inicial e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

F) Aquele contrato foi alterado por aditamentos escritos de 02.09.2003 (DOC 2B), 11.01.2005 (DOC 3), 05.02.2015 (DOC 4) e 08.10.2015 (DOC5), todos juntos com a petição inicial e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

G) O prazo de vigência inicial do contrato foi de 10 anos, reembolsável “em 16 semestralidades iguais e sucessivas, vencendo-se a primeira trinta meses após a assinatura do presente contrato” - clªs 2ª e 5ª, nº 2 do DOC 2.

H) Cada mutuante inicialmente entregou a importância de €3.067.607,00, no total de €6.135.214,00, mediante crédito nas contas à ordem da A., sediadas nas agências de Amarante de cada banco, fazendo-se a utilização do remanescente capital mutuado no prazo de 24 meses, salvo o condicionalismo previsto no nº 4 da cláusula 3ª - clª 3ª nº 1, 2, 3 e 4 do DOC 2.

I) Para remunerar o capital mutuado foi convencionada a taxa de juro Euribor a 6 meses (E6M) acrescida de um spread de 1,25%; os juros eram pagos postecipadamente, no final de cada período de 6 meses, iniciando-se a contagem dos juros a partir da data de assinatura do contrato 22- clª 4ª nº 1 e 2 do DOC 2.

J) Em caso de mora no pagamento de qualquer prestação, a taxa de juro convencionada seria “acrescida de uma sobretaxa permitida pela lei” - clª 4ª nº 4 do DOC 2.

K) “ No caso de alterações supervenientes do mercado devidamente justificadas, o Banco 3... e a Banco 1... poderão modificar a taxa de juro, assistindo à mutuária o direito de resolver o presente contrato” - clª 4ª nº 5 do DOC 2.

L) Mais se convencionou que: “Sobre este empréstimo não será devida qualquer comissão” - clª 6ª do DOC 2.

M) Em garantia do bom cumprimento do empréstimo, a A. deu em 1ª hipoteca aos RR, em plena igualdade, os imóveis adquiridos com o capital mutuado e subscreveu e entregou uma livrança caução em branco a cada um dos bancos - clª 7ª nº 1 e 8ª nº 1 do DOC 2 e escritura de compra e venda e hipoteca dos imóveis junta como DOC 2 A com a petição, cujo teor aqui se reproduz.

N) A primeira prestação de capital venceu-se em 12.09.2004 pelo que se considerou como data de perfeição do mútuo a data de 12.03.2002.

O) A conta da Banco 1.../Amarante tem o nº ...03 e a do Banco 2.../Amarante tem o nº ...07....

P) Estabeleceu-se bem assim no contrato que: “Qualquer alteração ao presente contrato terá de ser acordada por escrito entre todos os contraentes” - clª 9ª do DOC 2.

Q) E ainda que: os RR têm o direito a declarar o “vencimento antecipado das obrigações”, designadamente: (i) em caso de mora ou incumprimento definitivo de qualquer obrigação por parte da A. (ii) diminuição das garantias prestadas pela A. (iii) arresto, penhora, oneração das garantias prestadas (exceto arrendamentos desde que comunicados e não impliquem desvalorização significativa dos imóveis hipotecados), instauração de processo especial de recuperação ou insolvência pela A. (iv) ocorrência de incidentes bancários por parte da A. - clª 11ª nº 1, alíneas b),c), d), e), f) do DOC 2.

R) “ A declaração de vencimento…faz-se por carta registada com aviso de receção enviada para o domicílio da mutuária, da qual constará não só o fundamento mas também as quantias devidas ao Banco 3... e à Banco 1...” e “produz efeitos no terceiro dia posterior ao envio da carta…tendo a mutuária o prazo de 5 dias úteis para proceder ao pagamento das quantias nela referidas” - clª 11ª, nºs 2 e 3 do DOC 2. .

S) “As partes acordam que, para efeitos de citação judicial, incluindo por via postal prevista no Código de Processo Civil, serão utilizados os domicílios indicados no ponto 2 desta cláusula” “Banco 3... - Departamento de Municípios e Institucionais, ... Porto; Banco 1... - Gabinete de Empresas e Soluções, Praça ..., ..., ... Penafiel; A..., SA - ..., ... Amarante” - clª 13ª nº 1 e 2 do DOC 2.

U) Nos termos da alteração sob o DOC 3, contratualizou-se um aumento do capital mutuado em €:667.000,00 (€:333.500,00, cada banco), destinado a “financiar parte das infra estruturas a executar no imóvel a cuja aquisição o contrato ora em aditamento se destinou” - clª 1ª do DOC 3 - confessando-se então a A devedora da importância €:7.458.968,00 - clª 3ª do DOC 3 - mantendo-se “na íntegra, em vigor, todas as demais cláusulas do contrato de mútuo…” - clª 4ª do DOC 3.

V) O aditamento de 05.02.2015 (DOC 4 com a petição) prorrogou o prazo de vencimento do mútuo para 12.03.2015, como resulta da conjugação das clªs 3ª, 4ª e 10ª do DOC 4 -; a A confessou-se devedora da importância de €.3.256.050,00 (€.1.569.076,00 à Banco 1... e €:1.686.974,00 ao Banco 2...) - clª 5ª do DOC 4; o spread alterou-se para 5,5%23 - clª 6ª do DOC 4.

W) O aditamento de 08.10.2015 (DOC 5), que teve efeitos retroativos a 12.03.2015 - clª 11ª do DOC 5 -, prorrogou o prazo de vencimento do mútuo para 12.03.2017 - clªs 1ª, 3ª e 4ª do DOC 5 -; a A confessou-se devedora da importância de €.3.218.950,02 (€.1.550.526,00 à Banco 1... e €:1.668.424,02 ao Banco 2...) - clª 5ª do DOC 5 -; o spread alterou-se para 3,5% - clª 6ª do DOC 5.

X) Os juros venciam-se de 6 em 6 meses, aos dias 12 de setembro e 12 de março.

Y) A Banco 1... cobrou o spread como segue: de 1,25% para 2% no período de 24 de março de 2009 a 30 de setembro de 2009, mantendo-o em 2% até 30 de março de 2011, momento em que o aumentou para 3,5%, mantendo-o assim até 25 de setembro de 2014; no período de 12 de setembro de 2014 a 12 de março de 2015 fez novo aumento, agora para 5,5%; em 12 de março de 2015 reduziu novamente para 3,5% até 27 de setembro de 2015, valor que manteve inalterado até à extinção do mútuo em agosto de 2018.

Z) O Banco 3... cobrou o spread como segue: no período de 28 de setembro de 2010 a 11 de março de 2011 aumentou de 1,25% para 2,5%, mantendo-o em 2,5% até 11 de setembro de 2011; no período de 11 de setembro de 2011 a 11 de abril de 2012 fez novo aumento para 4,5%; de 11 de abril de 2012 a 12 de outubro de 2012 aumenta para 5,5%, mantendo-se em 5,5% de 12 de outubro de 2012 a 12 de abril de 2013 e nos semestres de 12 de abril 2013 a 12 de outubro de 2013, de 12 de outubro de 2013 a 12 de abril de 2014, de 12 de abril de 2014 a 03 de Agosto de 2014 e, após, até 12 de outubro de 2014, de 12 de outubro de 2014 a 12 de março de 2015; no período de 12 de março de 2015 a 11 de Setembro de 2015 foi reduzido para 3,5%, até à extinção do mútuo em Agosto de 2018.

AA) Os RR consideraram o crédito vencido, com comunicação de incumprimento à Centralização de Responsabilidades de Crédito do BANCO DE PORTUGAL (BP).

BB) A A. teve absoluto, imediato e integral conhecimento das quantias que mensalmente pagava aos RR. em consequência da celebração do contrato e aditamentos juntos com a petição inicial, tendo a A conhecimento das taxas de juro que eram aplicadas e o montante que a título de juros lhe era mensalmente cobrado bem como o de outros encargos cobrados.

CC) O Banco 3... comunicou à A. as alterações do spread que efetuou, designadamente através das missivas juntas com a petição inicial sob os nºs 7 e 8, cujo teor integral aqui se dá por inteiramente reproduzido, quer no que concerne à possibilidade de resolução do contrato, quer à fundamentação da alteração comunicada.

DD) Em 12.03.2017, a Banco 1... e o Banco 2... cobraram os juros do mútuo, conforme nota de lançamento e extratos de conta, juntos como DOC 11, 11 A, 12 e 13 com a petição inicial, cujo teor aqui se reproduz, sem qualquer acréscimo de taxa moratória.

EE) Por sua vez, a Banco 1... cobrou a comissão de prorrogação do prazo contratual - €175,00, mais imposto de selo €7,00 (DOC 14 com a petição, cujo teor aqui se reproduz).

FF) Em 06.09.2017, a Ré Banco 1... enviou um mail, solicitando: (i) pacto social atualizado da A. (ii) relação e informação dos bens sobre os quais detinha hipoteca, com identificação dos prédios arrendados e valor das rendas auferidas (iii) fotocópia com valor informativo das descrições prediais dos imóveis, cadernetas prediais, plantas dos imóveis, comprovativos dos seguros (iv) declarações de não dívida ao Estado (v) elementos contabilísticos dos últimos 3 anos, conforme DOC 15 com a petição inicial.

GG) Em 25.09.2017, enviou novo mail (DOC 16) a solicitar mais elementos: (i) relatório e contas de 2016 e CLC44 da A..., SA (ii) elementos contabilísticos das sociedades E... e F... (iii) esclarecimentos sobre a propriedade de vários prédios adquiridos por 44 CLC - certificação legal de contas; (iv) esclarecimentos sobre a diferença entre arrendado e cedido.

HH) Todos os esclarecimentos e documentação foram prestados à Banco 1....

II) Em 08.09.2017, a Banco 1... transferiu para si mesma os dinheiros da conta nº ...03 da A. junto da agência de Amarante, até colocar o saldo a 0 (zero), para se pagar dos juros do mútuo (que se venceriam em 12.09.2017) - €:24.204,59 -, imposto de selo - €968,18 -, pagamento parcial de capital - €1.130,49 + €499,48 -, comissão de processamento - €.4,00 -, imposto de selo - €:0,16 -, tudo conforme extrato de conta (DOC 17 com a petição) e aviso de lançamento emitido no dia 11.09.2017 (DOC 18 com a petição).

JJ) Em 20.12.2017, a Banco 1... transmitiu à A. que aceitava prorrogar o mútuo por 5 anos, nas seguintes novas condições: (i) pagamento do capital: 30% nos anos 2018 e 2019, 20% no ano de 2020 e 10% nos anos de 2021 e 2022 (ii) distrate das hipotecas dos imóveis vendidos de forma casuística, isto é, sem ser de acordo com o mapa de valores de distrates de hipotecas por fração, conforme DOC 21 que se junta (ver parte do DOC 21 com a PI, que refere “proposta Banco 1... de 20 de Dezembro”).

KK) Através do DOC 21 junto com a petição inicial, parte final, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, foi apresentada, a 22.12.2017, uma “contraproposta da A..., SA”, como segue: (i) seria desejável não existir uma grelha mínima anual de amortização e que a existir ela deveria ser igual (20%) em cada ano, sendo que todas as vendas implicam o cancelamento de hipoteca (o que implica amortizações de capital antecipadas); (ii) no caso das amortizações antecipadas ultrapassarem o limite previsto, deverão refletir-se no 3º ano e atingido este no 5º ano; (iii) fixação prévia do valor de amortização em caso de cancelamento de hipoteca, propondo a solução do Banco 2... de amortização de 50% do valor comercial de cada fração com base na avaliação existente; (iv) pedido de desoneração do património hipotecado à medida da amortização da dívida, por forma a permitir encontrar fontes de financiamento alternativo para permitir acelerar o processo de recuperação/construção de novos espaços empresariais.

LL) Em 01.02.2018, a Banco 1... informou as suas novas condições, que se transcrevem: (i) Prorrogação por 5 anos (até 12.03.2022), com obrigatoriedade de amortização anual da dívida nos seguintes termos: 20% em 2018 e 2019; 25% em 2020, 20% em 2021 e 15% em 2022; (ii) Spread-5%; (iii) Juros: pagamento mensal em vez de semestral; (iv) Consignação de receitas (das rendas de prédios), tudo conforme DOC 22 com a petição, cujo teor aqui se dá por reproduzido.

MM) Por mail de 27.3.2018, informou a A. que aceitava a proposta de 01.02.2018, conforme DOC 23 com a petição, posição que deu a conhecer ao Banco 2....

NN) Por mail de 25.06.2018, a Banco 1... enviou à A. as minutas dos contratos, cujo texto fora “já consertada[s] entre a Banco 1... e o Banco 2...”, conforme consta do DOC 24 junto com a PI, sendo que acompanharam o mail, a que se refere o DOC 24, as minutas juntas à petição como DOC 25 e 26, cujo teor aqui se tem por reproduzido, para serem assinadas pela A.

OO) Adenda ao mútuo (DOC 25):

O contrato é prorrogado por 5 anos, com efeitos a 11.03.2017, terminando em 11.03.2022, data em que toda a dívida deverá estar paga - clª 2ª nº1 e 2;

 Juros: 5% + E3M quando esta for positiva - clª 4ª nº 1 e 5;

Juros: faculdade dos RR definirem um novo regime de taxa de juro, como condição de eventual prorrogação do contrato - clª 4ª, nº 4;

 Juros: passam a ser pagos mensalmente - clª 5ª, nº 2;

Amortização do capital: 20% em 31.12.2018 e 31.12.2019; 25%, em 31.12.2020; 20%, em 31.12.2021 e 15%, em 31.12.2022 - clª 5ª, nº 3;

 Até à concorrência das percentagens definidas anteriormente a A. fica obrigada a entregar integralmente o preço a receber da alienação de imóveis hipotecados aos RR - clª 5ª, nº 4;

Comissões: o contrato fica isento do pagamento de qualquer comissão, com exceção: a) do direito à cobrança dos custos e encargos associados à contratação do financiamento, incluindo “despesas similares”; b) comissão de recuperação de valores em dívida e c) comissão de avaliação dos imóveis, com uma periodicidade não inferior a 1 ano - clª 6ª;

Faculdade de compensar créditos com toda e qualquer conta da A. junto dos RR - clª 17ª;

Consignação de rendimentos: todos os rendimentos que tenha direito a receber dos prédios hipotecados ficam consignados a favor dos RR - clª 4ª;

Cessão de créditos: a A concede antecipadamente, de forma definitiva e irrevogável, autorização aos RR para cederem total ou parcialmente, uma ou mais vezes, os seus créditos a terceira ou terceiras entidades, dispensando de sigilo bancário os RR e conferindo, desde já, poderes a esse (s) terceiro (s) adquirente (s) para preencher as livranças em branco entregues aos RR - clª 5ª nº 1, 2 e 3;

Dispensa de sigilo bancário: os RR podem transmitir toda a informação que tenham da A. a todas as entidades que integram os GRUPOS Banco 1... e Banco 2..., incluindo filiais e outros bancos participados por cada um dos RR sediados fora do território nacional - clª 6ª;

PP) Contrato de consignação de rendimentos (DOC26): A A propôs-se consignar a favor dos bancos…os rendimentos provenientes dos imóveis de que é proprietária - considerando III: (xiii) Em garantia de todas as obrigações que sejam devidas e das que venham a ser devidas aos RR, a título de juros e capital (sendo que os juros se fixam em 11,45% + 3%), a A consigna a favor dos RR todos os rendimentos que aufere e venha a auferir dos prédios dados de hipoteca a favor dos RR, sendo que os bancos os podem utilizar mensalmente para pagar os juros, despesas e outros encargos do mútuo - clª 2ª, nº 1 e 2; (xiv) As rendas a pagar pelos arrendatários dos prédios passam a ser feitas para uma conta da Banco 1.../Banco 2..., vinculando-se a A a comunicar aos arrendatários a obrigação de passarem a pagar para a conta que os RR venham a indicar, de acordo com a minuta imposta pelos RR - clª 2ª, nº 4 e novamente 4 e 5; (xv) Não pode sublocar ou praticar qualquer ato de administração sem autorização dos RR- clª 2ª, nº 8, alínea e); (xvi) A cessação, por qualquer motivo, . de contratos de arrendamento constitui causa de vencimento e exigibilidade antecipada das obrigações garantidas - clª 2ª, nº 9; (xvii) A celebração de contratos-promessa constitui causa de vencimento e exigibilidade antecipada das obrigações garantidas - clª 2ª, nº 9; (xviii) Quaisquer outros rendimentos gerados pelos prédios que não resultem de rendas de arrendamentos ficam igualmente consignados em garantia das obrigações - clª 2ª, nº 10; (xix) O contrato de consignação só se extinguirá com o cumprimento integral das responsabilidades garantidas - clª 2ª, nº 12.

QQ) A A. recusou a renovação consubstanciada nas alíneas anteriores.

RR) No dia 1 de agosto de 2018, a A. procedeu ao pagamento do saldo em dívida do mútuo - €:1.530.695,55 à Banco 1..., conforme DOC 27 e €:1.709.507,75 ao Banco 2..., conforme DOC 28, ambos juntos com a petição inicial, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

SS) Os RR comunicaram à Central de Responsabilidades de Crédito do BP que o crédito relativo ao mútuo se encontrava em situação regular até julho de 2017, conforme DOC 29 a 33 juntos com a petição, que aqui se dão por reproduzidos.

TT) Em agosto de 2017 aparece a referência de que o crédito (€.1.631.958,00) no Banco 2... estava vencido, com a “duração de incumprimento” “até 1 mês”, conforme DOC 34 junto com a petição inicial.

UU) O Banco 2... manteve sempre essa informação - crédito vencido, com a “duração de incumprimento” “até 1 mês” de 31.08.2017 a 31.07.2018, conforme DOC 34 a 45 com a petição inicial.

VV) Por sua vez, a Banco 1..., só fez a primeira comunicação de incumprimento, à Central de Responsabilidades de Crédito do BP, em outubro de 2017, declarando que o crédito (€.1.479.162,00) estava vencido, com a “duração de incumprimento” “mais de 1 até 2 meses” - ver DOC 36 com a petição inicial.

WW) Com data de 19.09.2017, a Banco 1... enviou aviso de incumprimento à A e dele consta que o capital se venceu em 08.09.2017, conforme DOC 46 com a petição inicial, cujo teor aqui se reproduz.

XX) Em novembro de 2017, a Banco 1... manteve a mesma informação à CENTRAL DE RESPONSABILIDADES DE CRÉDITO do BP - ver DOC 37 com a petição inicial.

YY) Em 28.12.2017 a Banco 1... fez movimentos na conta da A. e, simultaneamente, comunicou à CENTRAL DE RESPONSABILIDADES DE CRÉDITO do BP, que considerou regular o empréstimo à A desde dezembro de 2017 até fevereiro 2018.

ZZ) Para o efeito, a Banco 1... cobrou €:3.564,96 a título de “imposto de selo s/capital” mais uma comissão de “alteração contratual” (€:175,00) e imposto de selo (€:7,00), no valor total de €.3.746,96 e, de seguida, anulou na conta à ordem todos esses movimentos que perfazem €.3.746,96, conforme DOC 47 e 48 com a petição inicial.

AAA) Nos meses de dezembro de 2017, janeiro de 2018 e fevereiro de 2018, a Banco 1... considerou o crédito da A como “regular”, nos termos que resultam dos DOC 38 a 40 juntos com a petição.

BBB) De Março de 2018 a Maio de 2018 tornou a comunicar à CENTRAL DE RESPONSABILIDADES DE CRÉDITO do BANCO DE PORTUGAL que o crédito da A. estava vencido/incumprimento, sendo que a primeira comunicação refere “mais de 1 até 2 meses”, a segunda “mais de 2 até 3 meses” e a terceira “mais de 3 até 6 meses”, conforme se alcança dos DOC 41 a 43 com a petição inicial.

CCC) Novamente em junho e julho de 2018 a Banco 1... considerou o crédito da A como regularizado, conforme DOC 44 e 45.

DDD) Em 08.09.2017 a Banco 1... cobrou os juros do mútuo, € 24.204,59 (ver DOC 18 com a petição inicial), sem acréscimo da sobretaxa moratória prevista na clª 4ª nº 4 do DOC 262, e os juros vencidos em março de 2018 cobrou-os em agosto 2018.

EEE) O Banco 2... cobrou os juros vencidos em setembro de 2017 e março de 2018, sem cobrança da sobretaxa moratória - o Banco 2... cativou os montantes depositados para pagamento das prestações de juros, não as debitando em conta, só o tendo feito em 01.08.2018, aquando do pagamento do capital em dívida (ver DOC 28 com a petição inicial).

FFF) Pela Banco 1... foram retirados fundos da conta à ordem nº ...03 da A.: 1) para pagamento/amortização antecipada de capital as seguintes quantias: €:1.130,49 + €.499,48 + €:2.896,04 + €:1.779,20 + €:63,54 + €:11.550,37 + €.123,00 + €:128,14 + €:984,00 + €:1.660,50), conforme extratos bancários e documentos “Excel” juntos como doc. 48-A e doc. 48-B com a petição inicial; 2) e ainda de outros valores, como segue: (i) €:18.494,65 - juros de mora; (ii) €:739,80 - Imposto de selo sobre os juros de mora; (iii) €:7.418,85 - Comissão recuperação valor em divida; (iv) €: 296,75 - Imposto de selo sobre comissão de recuperação; (v) €:2.080,00 – Comissão de avaliação e imposto de selo; (vi) €:7.129,92 - imposto sobre alteração de prazo extratos; (vii) €: 364,00 - Comissão de alteração de prazo e imposto de selo, tudo conforme extratos bancários e documentos “Excel” juntos como doc. 48- A e doc. 48-B com a petição.

GGG) Aquando da liquidação da operação, a Ré Banco 1... informou a Autora Parques do EDT da quantia em dívida e cujo pagamento permitia a liquidação da totalidade das responsabilidades.

HHH) Em resposta, a Autora Parques do EDT informou por email que “somos a confirmar que vamos mandar emitir cheque para liquidação do financiamento conforme v/ apuramento" – cfr. documento n.º 7, junto com a contestação da Ré Banco 1..., cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

III) Os movimentos que medeiam 02.2018 e 07.2018 na conta da A. na Banco 1... foram anulados – cfr. documento n.º 5 com a contestação da Ré.

JJJ) Caso se mantivesse estável o spread de 1,25% até 12.03.2015, o valor a título de juros e imposto de selo a cobrar pela Banco 1... ascendia a 257.363,52 EUR e foram efetivamente cobrados a tal título 456.545,43, ou seja, mais 198.181,91 EUR.

LLL) A Banco 1... cobrou valores com base no spread de 3,5% na prestação com data de início de 12.03.2015 e vencimento em 14.09.2015 e entre o período de 12.03.2015 e 08.10.2015 a Banco 1... sempre aplicou a taxa com o spread de 3,5/.

MMM) Caso se mantivesse estável o spread de 1,25% até 11.03.2015, o valor a título de juros e imposto de selo a cobrar pelo Banco 3... ascendia a 212 814,70 EUR e foram efetivamente cobrados a tal título 523.781,93 EUR, ou seja, mais 311.118, 49 EUR.

NNN) Na prestação que decorreu entre 12.10.2014 a 04.02.2015, o Banco 3.../Banco 2... cobrou o spread de 5,5% no fim do último período semestral e para o período seguinte (12.03.2015 e 11.09.2015) cobrou o spread de 3,5%.

OOO) A Autora várias vezes manifestou verbalmente o seu descontentamento pela cobrança do spread acima de 1, 25 % e comissões referidas, junto da Banco 1..., nas pessoas de AA e BB e do Banco 3.../Banco 2..., na pessoa de CC.

PPP) Em 12.03.2017 vencia-se o contrato de mútuo, tendo a A iniciado, cerca de 5 meses antes do vencimento, negociações com os RR com vista à prorrogação do prazo de vencimento do mútuo, por um período de 3 anos.

QQQ) O custo de oportunidade decorrente dos acréscimos do Spread na Banco 1... ascende a 19.605,13 EUR e relativamente ao Banco 3... de 35.276,58 EUR.

RRR) A Ré Banco 1... cobrou as comissões melhor caracterizadas no mapa de páginas 45 a 49 do relatório pericial constante dos autos e com a natureza ali indicada, aqui dando como reproduzido o seu teor, no valor global de 13.130,61 EUR, sendo o IS decorrente de juros de 58.857,57 EUR, acrescido de 24.446,91 EUR correspondente ao imposto de selo devido pela utilização do capital. Acresce mais 25.566,84 EUR de IS relativo a outras verbas e IVA cobrado.

SSS) Também o Banco 3.../Banco 2... cobrou comissões, ao menos de avaliação, distrates e cancelamentos de registos, em montantes/valores não apurados.

TTT) Ao menos em 26.01.2017 a A propôs aos bancos uma prorrogação do prazo de pagamento “final” do mútuo.

UUU) Ao menos por mail de 12.05.2017, o Banco 2... comunicou à Autora a aceitação da prorrogação por 5 anos e manutenção das condições contratuais, com uma condição ajustada, conforme DOC 10 junto com a petição inicial, cujo teor se dá por integralmente reproduzido: (i) Montante: €:1.631.958,01; (ii) 11.03.2022 (alargamento por 5 anos a contar de 11.03.2017); (iii) Amortização do financiamento em 50% do valor comercial de cada fração com base na última avaliação existente; (iv) Manutenção das restantes condições; (v) A aprovação fica condicionada à aprovação da prorrogação pela Banco 1..., nas mesmas condições.

VVV) A 29 de agosto de 2017, numa reunião na Direção de Acompanhamento de Empresas da Banco 1... a Ré Banco 1... deu nota à Autora que não considerava autorizada a prorrogação do vencimento do mútuo.

XXX) Durante o período de conversações que se arrastou entre setembro de 2017 e abril de 2018, a A, por mais do que uma vez, solicitou à Banco 1... e ao Banco 2... autorização para libertar alguns imóveis hipotecados a fim de os poder usar em garantia de financiamento a solicitar noutro ou noutros bancos, mas os pedidos não foram aceites ao menos pela Banco 1....

ZZZ) As hipotecas constituídas sobre imóveis da A, em garantia do mútuo, suplantavam a dívida, incidindo, em 21-02-2018, sobre imóveis que valiam, pelo menos, 7 316 142 €.

AAAA) À A. nunca foi enviada por qualquer dos RR qualquer carta registada com AR, dando nota da consideração do vencimento do crédito e dos valores em dívida a cada banco.

BBBB) A Banco 1... cobrou na data da extinção do mútuo (01.08.2018), a mais, juros moratórios e remuneratórios sobre o montante de 4.608,11 EUR de capital, liquidado em 15.09.2017; sendo, pois, que o capital em dívida à data daquela liquidação (01.08.2018) era o de 1.480.791,99 EUR (que não o de 1.485.400). Mais cobrou a quantia de € 3.746,96 a título de imposto selo sobre a utilização de capital e prorrogação do prazo do empréstimo e cobrou uma comissão flat, finex, no montante de 4.160 EUR (IS incluído).

CCCC) A A. tinha programado o início da construção do Edifício 1... no último trimestre de 2017 e o Edifício 2... no primeiro trimestre de 2018, no seguimento da conclusão do EDIFÍCIO 3..., ficando as obras a cargo do mesmo empreiteiro e pelo mesmo preço (do EDIFÍCIO 3...).

DDDD) No ano de 2009 a Autora Parques do EDT solicitou à Ré Banco 1..., S.A. uma suspensão do pagamento do capital das duas prestações previstas para o ano de 2009 correspondendo a € 234.000,00, cada.

EEEE) A primeira situação de alteração do spread de 1,25% para 2% ocorreu no seguimento desse pedido da Autora para prescindir da amortização da quantia aproximada de € 468.000,00 relativa ao ano de 2009, a qual foi autorizada pela Ré Banco 1..., S.A.

FFFF) Novamente, no ano de 2010, a Autora Parques do EDT voltou a solicitar uma carência do pagamento de prestações na componente de capital durante o ano de 2010 – cfr. documento n.º 3, com a contestação da Ré Banco 1....

GGGG) A segunda alteração do spread de 2% para 3,5% ocorreu no seguimento do pedido da Autora Parques do EDT para prescindir da amortização de capital de € 154.210,00 relativa ao segundo semestre do ano de 2010, o que também veio a ser aprovado pela Ré Banco 1..., S.A.

HHHH) Todas as alterações de condições, incluindo taxas de juros, spreads ou comissões foram comunicadas à Autora Parques do EDT.

IIII) Após a pretensão de prorrogação do prazo do mútuo pela A, a Ré Banco 1..., S.A. efetuou uma prorrogação intercalar do prazo do empréstimo por 6 meses (até 12 de setembro de 2017), a fim de permitir concluir as negociações tecidas com a Autora Parques do EDT.

JJJJ) Foi o que justificou a cobrança de uma comissão de prorrogação do prazo do empréstimo e o facto de o mesmo não se ter vencido, de forma imediata, em 12 de março de 2017.

LLLL) As quantias descontadas pela Banco 1... em 8 de setembro de 2017 foram anuladas e devolvidas à cliente em 28-12-2017, e a quantia de 4 608,11 € descontada pela mesma Ré em 15 de setembro de 2017, foi estornada à Autora em 01 de agosto de 2018.

MMMM) A Ré Banco 1... decidiu prorrogar o crédito desde a sua maturidade, em dezembro/2017, decidindo a prorrogação da operação por 60 dias, para efeitos de dar seguimento ao processo negocial, tendo sido nessa altura cobradas as quantias referidas em ZZ) com a respetiva data valor do seu vencimento em 2017.09.08, considerando que eram procedimento necessário para a prorrogação informática da operação.

NNNN) A Ré Banco 1... voltou a prorrogar a operação, em 08.02.2018. Também os movimentos ocorridos em consequência e até julho de 2018 foram anulados/devolvidos ao devedor – cfr. documento n.º 5, junto com a contestação da ré Banco 1..., sem prejuízo também do provado sob BBBB).

OOOO) Em maio 2018, a Ré Banco 1... efetuou nova prorrogação intercalar do crédito de fevereiro de 2018 a julho de 2018.

PPPP) A cobrança de comissão de prorrogação do empréstimo, sem prejuízo de BBBB) e a cobrança de juros sem taxas moratórias, foi-o na medida em que foram sendo autorizadas várias prorrogações por curtos períodos de tempo face ao processo negocial em curso.

QQQQ) Por diversas vezes foi promovido o alargamento de prazo do financiamento, considerando que a proposta de reestruturação estaria em vias de ser aprovada e por forma a prosseguir com a negociação com a devedora, sendo esses períodos de prorrogação informática do crédito que estão espelhados nos reportes das responsabilidades da A. junto do BDP.

RRRR) Os períodos de prorrogação ocorridos entre março de 2017 e julho de 2018 foram autorizados internamente e foram tidos como prorrogações informáticas de forma a permitir a continuidade do processo negocial da reestruturação.

SSSS) Sem prejuízo do assente em RRR), os custos cobrados como “comissões” pelo Banco 3... e Banco 2... relativos às avaliações e emissão dos títulos de distrate que respeitam aos montantes reclamados pela A, são o preço devido pelos serviços prestados pelos Réus à A. a esse título.

TTTT) Além do referido em DDDD) e FFFF) a Autora também pediu às Rés e viu ser-lhe deferido pelas mesmas a prorrogação do prazo de vencimento da prestação de amortização de capital:

em setembro de 2004, que foi prorrogada para dezembro desse ano;

novamente em dezembro de 2004, tendo a mesma sido prorrogada para janeiro de 2005;

novamente em março de 2005, tendo nessa data sido deferida a dispensa de pagamento nas datas acordadas das duas prestações semestrais que se venceriam nesse ano.

2. Factos não provados:

1. Houve outros valores ou diferenças entre os juros contratados e cobrados pelo Banco 3.../Banco 2... e Banco 1..., a mais ou para além dos provados sob JJJ) e NNN), a ascender ao valor global de 510.300,41 EUR;

2. A Autora, a mais de manifestações verbais, como assente em OOO) manifestou por outra forma a sua discordância pela cobrança das taxas e comissões junto da Banco 1....

3. Ainda antes da proposta formal ou já na sequência da proposta pela Autora conforme TTT), as partes acabaram por acordar numa prorrogação do prazo, não por 3 anos (como pretendia inicialmente a A), mas por 5 anos, mantendo-se inalteradas, no essencial, as demais condições contratuais.

4. Acordada a prorrogação do prazo de pagamento por mais 5 anos, com manutenção no essencial das condições vigentes, foi solicitado à A. que formalizasse, por escrito, a proposta, sendo essa a causa da comunicação assente em TTT)

5. Alguns dias antes do vencimento do mútuo (12.03.2017), o Banco 2..., na pessoa do Sr. Dr. DD, telefonou ao representante legal da A., Dr. EE, e comunicou que face às mudanças entretanto ocorridas no Banco 2... (possibilidade de venda a novo acionista), só poderiam assegurar a prorrogação do prazo por 6 meses, por necessidade de apresentação de todo o negócio ao “novo acionista”.

6. Ressalvando, no entanto, que o mesmo iria ser apresentado internamente (no Banco 2...) a breve trecho e que estava convicto de que a decisão anterior (de aceitação da prorrogação com manutenção das condições) se iria manter.

7. A A. deu conhecimento deste (novo) posicionamento do Banco 2... à Banco 1..., na pessoa do Sr. FF, gerente da agência da Banco 1... de Amarante.

8. A Banco 1... assegurou à A. que a sua posição não sofria alteração e ficou combinado aguardar-se pela reapreciação do Banco 2....

9. Em 5 de maio de 2017, o Banco 2..., na pessoa do Sr. Dr DD, comunicou o resultado da reapreciação da proposta de prorrogação do prazo de pagamento, reiterando a aceitação da proposta nas condições iniciais.

10. No dia 12.05.2017 o gerente da agência de Amarante da Banco 1... confirmou à Autora, na pessoa do seu administrador e aos representantes do Banco 2... que a Banco 1... acompanhava a proposta do Banco 2..., cujas condições a Banco 1... havia já aprovado anteriormente, aquando da aprovação da prorrogação do mútuo por 5 anos, tendo ficado assente que a Banco 1... elaboraria o aditamento de prorrogação do prazo com as condições transcritas em UUU).

11. Por mais do que uma vez, a A e o próprio Banco 2..., solicitaram à Banco 1..., na pessoa do Sr FF, o envio do aditamento que ficara de elaborar, cujo atraso era justificado com a doença do seu diretor, Dr GG - que, mais tarde, veio a falecer - e com o seu processo de substituição.

12. A A. só tomou conhecimento do facto sob TT) em novembro de 2017, porque o Banco 2... nunca lho comunicou.

13. A diferença assente em ZZZ), após 12.03.2017, era de quatro vezes mais o valor dos imóveis hipotecados que a dívida.

14. A conduta da Banco 1... conforme YY) e ZZ) foi-o para contornar as imposições do BDP em matéria de constituição de provisões contabilísticas, mediante reclassificação do capital contabilisticamente, simulando perante o BDP que o crédito estava regular.

5. Para além ou a mais do provado sob BBBB) a Banco 1... cobrou na data da extinção do mútuo (01.08.2018) a mais €:18.519,85 - diferença entre €:39.778,45 (relativamente a juros de mora, imposto de selo sobre juros de mora, comissão de recuperação, imposto de selo sobre comissão de recuperação, comissão de avaliação, imposto de selo sobre avaliação, comissão de alteração de prazo, imposto de selo sobre comissão de alteração de prazo, comissão de processamento, imposto de selo sobre comissão de processamento e juros) e €.21.258,60 (referente a diversos valores creditados na conta da A, em 01.08.2018, que deveriam corresponder a €.39.778,45).

6. Foi por ter ficado sem liquidez – por força do comportamento das Rés – que o procedimento relativo à construção dos edifícios programada pela A., conforme CCCC) teve de ser interrompido.

17. A prorrogação do prazo do mútuo em discussão nos autos por mais 5 anos teria permitido libertar meios financeiros para prosseguir obras que estavam praticamente paradas particularmente os EDIFICIOS 1... e 2....

18. A violação do acordo de prorrogação do mútuo pelos RR alterou o plano de investimentos, obrigando a canalizar o esforço financeiro para o pagamento do mútuo aos RR.

19.O que atrasou o início da construção dos EDIFICIOS 1... e 2..., com consequências no aumento do custo das empreitadas, face ao aumento do custo de mão de obra e materiais.

20. Todo este atraso desmotivou também o empreiteiro do EDIFÍCIO 3... que perdeu o interesse na construção dos edifícios 1... e 2....

21. Se os RR tivessem cumprido com o acordo de prorrogação do mútuo por mais 5 anos, a A teria começado as obras nos EDIFICIOS 1... e 2... dentro dos prazos previstos, a um custo de construção abaixo do custo que tem de suportar a preços de 2020.

22. Se as empreitadas dos EDIFICIOS 1... e 2... se tivessem iniciado nas datas previstas o seu custo ascendia a €: 554.385,54 + IVA para o Edifício 1..., conforme DOC. 54 e €: 554.385,54 + IVA, para o Edifício 2..., conforme DOC 54 A, ao passo que a preços atuais (2020) o seu custo ascende a €: 624.563,04 +IVA para o Edifício 1..., conforme DOC.55, sendo o preço do Edifício 2... o mesmo, atentas as caraterísticas da construção.

23. A Autora nunca reclamou junto dos RR as quantias cobradas/debitadas, durante dez anos.

24. A A. incumpriu repetidamente as obrigações emergentes do contrato junto com a p.i. sob o nº 2, alterado nos termos constantes dos documentos também ali juntos sob o s nºs 3 a 5.

25. A mais ou para além do provado sob DDDD) a GGGG) e TTTT) a Autora beneficiou de várias prorrogações do prazo de pagamento das prestações na componente de capital.

26. As minutas com as condições de reestruturação apenas chegaram à consideração da devedora Banco 1... em junho de 2018, uma vez que a reestruturação só foi aceite pela Autora no final de março de 2018.


***

Ambas as apelantes sustentavam, em parte, as respetivas pretensões de revogação da sentença na alteração da matéria de facto que pediam.

É, pois, por aí que se começarão a analisar os fundamentos de direito de ambos os recursos.


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Apelação da A..., SA

A mesma pugnou, por via dos pedidos de alteração das alíneas OOO), HHHH), IIII) e JJJ) pela consideração de que todas as quantias que pagou à Rés a título de “spread” em que se tenha considerado percentagem superior a 1, 25% têm que lhe ser devolvidas já que não lhe foram comunicadas (com exceção feita a duas comunicações, pelo Banco 3..., a que se referem os documentos 7 e 8 da petição inicial) e que sempre se lhes opôs.

Como se viu as referidas alíneas não mereceram a pretendida alteração pelo que, sem prejuízo de se vir ainda a conhecer da questão da falta de fundamento para os referidos aumentos com base nos factos já antes apurados, não há porque revogar a decisão em consequência das alterações à matéria de facto.

Quanto à alínea ZZZ) e ao facto não provado na alínea 13) a Apelante viu proceder parte da sua pretensão, tendo-se mantido como não provada esta última, mas tendo a primeira passado a incluir um valor que, pelo menos, teriam os imóveis hipotecados em 21-02-2018.

O reflexo da alegada diferença entre esse valor e o do crédito das Rés e a concatenação desse facto com o que se deu por provado na alínea XXX) (que a Autora, entre setembro de 2017 e abril de 2018 pediu várias vezes que fossem “libertadas” algumas dessas hipotecas e que tal lhe foi negado pelo menos pela Banco 1...), será também objeto de apreciação no conhecimento das questões a resolver, sendo certo que já se encontrava provado que o valor das hipotecas ultrapassava o do crédito garantido pelas mesmas pelo que não resulta da alteração da matéria de facto a necessidade de reapreciação do mérito quanto a essa questão.

Também a não alteração das alíneas 10) e 11) dos factos não provados e KK) dos provados não provados dispensa a análise da pretensão que a Apelante sustentava na redação que para as mesmas sugeriu.

A alínea 12) dos factos não provados também não mereceu alteração pelo que não há lugar à reapreciação das consequências eventuais desse facto, caso tivesse sido provado como queria a Apelante.

Quanto aos factos que a mesma queria ver aditados às alíneas V), W), como se disse e repete, estavam já dados por reproduzidos na alínea F) do elenco dos factos provados pelo que uma vez mais não se impõe uma reanálise da fundamentação da sentença em decorrência de qualquer alteração dos factos a esse propósito provados.

Finalmente quanto à alínea LLLL) a mesma foi alterada, embora não nos exatos termos pretendidos pela Recorrente, tendo sido precisados os valores e as datas dos estornos de quantias debitadas pela Banco 1... à Autora em setembro de 2017.

Estava já dado por provado que tal estorno tinha tido lugar e a questão da indisponibilidade dessas quantias e da duração dela terá de ser apreciada no âmbito do pedido de revogação da decisão de mérito na parte em que absolve as Rés do pedido de indemnização da Autora por danos alegadamente decorrentes da impossibilidade de prosseguir com a construção de alguns dos edifícios projetados.

Pelo que, em conclusão, nenhuma das alterações feitas à matéria de facto impõe, por si só, a revogação da sentença pretendida pela apelante A..., SA.


***

4. Cumpre apreciar, então, as pretensões da referida Recorrente quanto à revogação da sentença que não dependiam, segundo ela mesma, da procedência do recurso da matéria de facto.

Seguiremos a ordem das questões a resolver enunciadas nas diferentes alíneas do ponto 3.

4. a) Do fundamento para a condenação de ambos os Bancos na devolução de todas as comissões cobradas à Autora.

Relembremos o pedido de condenação das Rés que fora feito na petição inicial relativamente às comissões que a Autora entendia terem sido indevidamente cobradas:

- na alínea c) do petitório pedia-se a condenação das Rés no pagamento do montante de 2 500 € das comissões cobradas pelo Banco 2... à Autora.

- na alínea d), o pagamento do montante de 42 762, 05 € cobrados pela Banco 1... como “outros custos” que, por remissão dessa alínea do pedido para o artigo 201º da petição inicial terão incluído, a título de comissões as seguintes parcelas:  7 418, 85 € + 2080 € + 364 €. O que totaliza o montante de 9 862, 85 €.

Está assente, e resulta do que se dá por reproduzido na alínea F) dos factos provados, que o contrato de mútuo que as partes celebraram em 14-02-2002 (de acordo com a alínea E) do mesmo elenco de factos), foi alterado por escrito em 02 de setembro de 2003, em 11-01-2005, em 05-02-2015 e em 08-10-2015.

Está ainda assente o teor da escritura pública celebrada a 11 de março de 2002 - data da assinatura do contrato de mútuo -, cujo teor é dado por reproduzido na alínea M) dos factos assentes.

A liberdade contratual permite às partes, de acordo com o artigo 405º do Código Civil, fixar livremente o conteúdo dos contratos, celebrar contratos diferentes dos legalmente previstos e incluir neles as cláusulas que lhes aprouver bem como modificá-los (artigo 406º número 1 do mesmo Diploma). Quer o contrato – intitulado de mútuo -, celebrado em fevereiro de 2003 entre a Autora e as Rés, quer as demais modificações ao mesmo quer, finalmente a escritura pública outorgada em 11 de março de 2003 foram celebrados ao abrigo dessa liberdade contratual.

Desde já se afirmará, uma vez que a Autora levantou essa questão em sede de alegações, que nenhum desses contratos revela, nos seus termos ter sido unilateralmente redigido por qualquer das Rés de acordo com cláusulas tipificadas e que a Autora se tenha limitado a aceitar essa redação. Todos, desde logo o contrato de mútuo nos seus considerandos iniciais, revelam que se está perante contratos negociados entre as partes em função das especiais circunstâncias dos mesmos, nomeadamente os projetos e necessidades que a Autora apresentava aquando do pedido de empréstimo e que estão detalhadamente descritos nos considerandos 1 a 11 do contrato de mútuo.

Acresce que a Autora só em sede de alegações de recurso (na sua nota de rodapé número 17, para se ser mais preciso) vem alegar que parte das cláusulas do mútuo foram padronizadas e utilizadas pelos Bancos no mesmo sem negociação. Assim, não pode tal questão de facto ser conhecida estando este Tribunal limitado à reponderação das questões de direito que decorram de factos alegados pelas partes ou considerados pelo tribunal na sentença (artigo 608º do Código de Processo Civil) sob pena de nulidade do acórdão nos termos do previsto no artigo 615º, número 1, d) ex vi artigo 666º, número 1 do mesmo Diploma.

Olhando, no que ora importa atender, para as obrigações que de todos os contratos dos autos resultam (nesta classificação incluindo as várias modificações feitas ao contrato inicial por acordo das partes nos termos do artigo 406º, número 1 do Código Civil) sobre a questão da cobrança de comissões bancárias – é imperioso salientar que:

A cláusula 6ª do contrato de mútuo, sob a epígrafe “Encargos e Comissões” previa que “1 – Sobre este empréstimo não será devida qualquer comissão; 2 – A mutuária é responsável pelo pagamento dos encargos, nomeadamente os fiscais, resultantes da celebração do presente contrato”;

Sucede, porém, que na mesma data em que este acordo foi subscrito, as mutuantes e a mutuária também outorgaram a escritura pública pela qual, entre o mais, foi constituída hipoteca sobre todos os imóveis que no mesmo título a mutuária declarou adquirir, ali tendo expressamente feito constar que “Ficam da conta da hipotecante as despesas de qualquer avaliação que o Banco e Banco 1... (…) mandem efectuar aos imóveis hipotecados, bem como as despesas com a celebração deste contrato e seu distrate, com a segurança e cobrança dos seus créditos, com o registo da hipoteca e seus cancelamento ou renúncia.”;

E sucede, ainda, que em 5 de fevereiro de 2015, na alteração outorgada ao contrato inicial, foi estipulada uma cláusula, sob a epígrafe “despesas” em que as partes previram que “1- Correrão por conta da mutuária e serão por ela pagas quaisquer despesas ou encargos, incluindo fiscais, relacionados com a celebração, segurança, execução e extinção do contrato e respetivos aditamentos/alterações, e ainda das correspondentes garantias e, bem assim, despesas judiciais e extrajudiciais que os Bancos hajam de fazer para garantia e cobrança do seu crédito.”;

Desse mesmo clausulado consta, ainda, que “A presente alteração às condições constantes do contrato inicial (incluindo os seus anteriores aditamentos ou alterações) não constituem, para nenhum efeito, novação, mantendo-se integralmente válidas e inalteradas, na medida em que não se mostrem incompatíveis com as alterações ora introduzidas, todas as demais cláusulas, condições e garantias do crédito ao mesmo associadas, designadamente, portanto, as hipotecas constituídas a favor dos Bancos”.

Nenhuma destas cláusulas é tratada/referida na fundamentação da sentença sob recurso que, quanto ao pedido de pagamento de valores decorrentes de cobrança de comissões fundamenta assim a sua improcedência:

“Quanto agora à cobrança de comissões não contratualizadas. Desde logo, detecta-se uma confusão na alegação/pretensão… As comissões bancárias são o valor cobrado por uma instituição financeira pelos serviços que prestam e/ou produtos que disponibilizam, que, no fundo, se constituem como a contrapartida do banco. Não alegava a A. que os serviços cobrados a título de comissões não tivessem sido prestados. Sempre as comissões cobradas não integram qualquer daquelas que, à data da cobrança, se encontravam abrangidas por uma proibição legal ou regulamentar de cobrança. A questão única vem a ser a do sentido/interpretação da cláusula do contrato assente sob L). Desde logo, comissões de distrate de hipoteca ou de avaliação de imóveis, ainda quando em causa a garantia do empréstimo por hipoteca, não se prefiguram como “comissões sobre o empréstimo”. Estas reconduzem-se, na prática bancária, vista a menção no clausulado, apenas à incidência sobre o empréstimo, às comissões de abertura, formalização e processamento das prestações; com o que não resulta a cobrança de comissões indevidas”.

Salvo o devido respeito não se afigura que esta afirmação aborde todas as questões que o pedido em causa coloca e que as partes bem delimitaram.

Há que interpretar as cláusulas dos três diferentes acordos escritos celebrados entre as partes (um deles revestindo a forma de escritura pública), pois o que está em causa, segundo a Autora, é a cobrança de montantes que contratualmente foram afastados da sua responsabilidade.

O contrato inicial, intitulado de mútuo, previa que cada uma das Rés emprestasse à Autora a quantia de 3 740 984 € com a obrigação desta a devolver mediante amortizações de capital ali previstas e contra o pagamento de juros ali também previstos. Na sua cláusula sétima as partes estabeleceram que seria constituída hipoteca de imóveis da Autora a favor dos Bancos mutuantes para garantia do pagamento do capital, juros e de despesas judiciais e extrajudiciais que estes viessem a suportar com a cobrança dos seus créditos. E, chegados ao que aqui releva convocar, na cláusula sexta estabeleceram que “Sobre este empréstimo não será devida qualquer comissão”.

O Tribunal a quo entendeu que tal estipulação – dada por provada na alínea L) -, se referia apenas às comissões de abertura, formalização e cobrança das prestações, daí concluindo que não houve cobrança de comissões indevidas.

A interpretação das declarações negociais obedece aos critérios estipulados nos artigos 236º a 239º do Código Civil.

Nos termos do citado artigo 236.º, “A declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele”. Aqui se manifesta o princípio de que a interpretação se rege pela leitura que um declaratário normal, mas colocado na posição do real declaratário, dela faria.

Ou seja, apela-se à normalidade de entendimento, ao homem médio, mas, também, à situação real do declaratário quanto aos reais conhecimentos que tem, à verdadeira configuração da relação que antecedeu a declaração.

Mitiga-se, ainda, esta interpretação impressiva, baseada na “leitura” do que se declarou, dando prevalência à vontade real do declarante, quando o declaratário a conheça.

No caso nada foi alegado sobre a real vontade das partes quanto ao conteúdo e sentido desta cláusula.

A mesma está reduzida a escrito, pelo que tem aqui aplicação o previsto no artigo 238º do Código Civil quanto à interpretação de estipulações negociais em negócios formais: não pode a declaração valer com um sentido que não tenha um mínimo de correspondência no texto do respetivo documento, ainda que imperfeitamente expresso.

Ora, em face destes critérios interpretativos deve concluir-se que a redação da cláusula em análise conduziria qualquer declaratário colocado na posição da Autora à conclusão de que não teria de suportar quaisquer comissões bancárias decorrentes do empréstimo, ao longo de toda a sua vigência e execução.

A referência ao “empréstimo” na cláusula em apreço não pode ser considerada como relativa apenas ao momento da sua contratação ou à sua formalização.

Se as partes quisessem estipular apenas sobre o pagamento de quaisquer encargos decorrentes da celebração do contrato seria esta a expressão que teriam usado, clara e indubitável, não podendo entender-se a menção ao “empréstimo” senão como referente a toda a sua duração e a todas as vicissitudes da sua execução.

Assim, na falta de quaisquer factos que revelassem diferente vontade real dos outorgantes, conclui-se que um declaratário colocado na posição da Autora entenderia a estipulação contratual em apreço como destinada a isentá-la de pagamento de quaisquer comissões decorrentes da relação contratual estabelecida ali estabelecida, pela qual os Bancos ficaram obrigados a emprestar-lhe um determinado montante e ela a devolvê-lo, mediante o pagamento de prestações de capital e de juros ali previstas e que se prorrogariam pelo prazo de dez anos.

Ou seja, o que se quis foi isentar a mutuária de quaisquer comissões devidas pelo contrato em apreço ao longo de toda a sua duração.

A Apelante defende (conclusões 90ª a 95ª) que o contrato de mútuo previa que sobre ele não seria devida qualquer comissão e que qualquer alteração teria que ser acordada por escrito entre todos os contratantes, bem como sustenta que em face da alínea SSSS) o Tribunal teria que ter concluído que todos os valores cobrados pelas Rés a título de comissões não eram devidos.

Há, contudo, que averiguar se as comissões que se apurou terem sido cobradas pelos Réus foram decorrentes do empréstimo pois só estas, a terem sido cobradas, o foram em violação desta cláusula do contrato. É que os referidos valores foram debitados pelos Réus das contas de depósito à ordem que a Autora tinha abertas nos Bancos antes mesmo da celebração do mútuo e estes contratos, de depósito, podem ter estado na base no débito de comissões que em nada se relacionem com o mútuo. Não é, pois, de concluir, como faz a Apelante, que todas as quantias debitadas pelos Réus dessas contas à ordem se relacionam com o mútuo, sendo que era àquela que cabia o ónus de alegação e prova das cobranças relacionadas com o mútuo, à luz do disposto no artigo 342º, número 1 do Código Civil.

Acresce, como já acima assinalado, que no mesmo dia em que subscreveram o contrato de mútuo em apreço, as mesmas partes outorgaram escritura pública pela qual foi constituída hipoteca sobre todos os imóveis que no mesmo título a mutuária declarou adquirir, ali tendo expressamente feito constar que “Ficam da conta da hipotecante as despesas de qualquer avaliação que o Banco e Banco 1... (…) mandem efectuar aos imóveis hipotecados, bem como as despesas com a celebração deste contrato e seu distrate, com a segurança e cobrança dos seus créditos, com o registo da hipoteca e seus cancelamento ou renúncia.”.

Apelando às mesmas regras da hermenêutica negocial acima referidas conclui-se que mutuantes e mutuária estipularam expressamente que todas as despesas relativas à constituição da hipoteca acordada como garantia do mútuo, à avaliação dos imóveis hipotecados, aos registos, cancelamentos, renúncias e distrates a ela associados, seriam a suportar pela A..., SA.

Donde, todas as quantias cobradas pelas Rés que se apurem decorrer destas causas – relacionadas com a garantia hipotecária -, terão sido cobradas ao abrigo de cláusula contratual que as partes subscreveram no mesmo dia que a anteriormente analisada, sob a forma de escritura pública, e a que estão obrigadas, nos termos do artigo 406º, número 1 do Código Civil. Com o que fica desde já conhecida a questão a resolver enunciada sob a alínea 4, b).

Acresce, ainda, considerar que, exatamente à luz deste preceito - que prevê a possibilidade de as partes modificarem os contratos por mútuo consentimento -, mutuária e mutuantes alteraram, por escrito e por várias vezes, o contrato que temos vindo a apreciar.

Uma dessas alterações – a única que importa aqui convocar – foi a outorgada a 5 de fevereiro de 2015, em que, como acima já assinalado, se estipulou aditar ao contrato inicial uma cláusula, sob a epígrafe “despesas” em que as partes previram que “1- Correrão por conta da mutuária e serão por ela pagas quaisquer despesas ou encargos, incluindo fiscais, relacionados com a celebração, segurança, execução e extinção do contrato e respetivos aditamentos/alterações, e ainda das correspondentes garantias e, bem assim, despesas judiciais e extrajudiciais que os Bancos hajam de fazer para garantia e cobrança do seu crédito.”

Desse mesmo clausulado consta, na cláusula 8ª que “A presente alteração às condições constantes do contrato inicial (incluindo os seus anteriores aditamentos ou alterações) não constituem, para nenhum efeito, novação, mantendo-se integralmente válidas e inalteradas, na medida em que não se mostrem incompatíveis com as alterações ora introduzidas, todas as demais cláusulas, condições e garantias do crédito ao mesmo associadas, designadamente, portanto, as hipotecas constituídas a favor dos Bancos”.

Finalmente, a cláusula décima desse acordo estipulou que o mesmo produziria efeitos desde a sua celebração, com exceção feita à ali estipulada interrupção do período de amortização do capital e ao prazo global do empréstimo, para que foram fixadas datas retroativas de produção de efeitos.

Donde, há que apurar se, a partir de 5 de fevereiro de 2015 se manteve a cláusula 6ª do contrato inicial - a que estipulava que sobre o empréstimo não seriam devidas comissões inalterada -, ou se, pelo contrário, o aditamento a esse contrato da acima transcrita cláusula 15ª a modificou.

As comissões bancárias são as contrapartidas monetárias cobradas pelos Bancos por serviços prestados aos clientes e são estabelecidas por cada um de acordo com preçário que devem comunicar aos clientes nos termos do 77º, número 1 do artigo Regime Geral das Instituições Bancárias e Sociedades Financeiras (DL298/92 de 31-12).

Na decorrência dos diferentes contratos estabelecidos com os Bancos pode estabelecer-se um conjunto de obrigações dos mesmos perante os seus clientes destinadas à movimentação de quantias monetárias e outras tarefas a que comummente se chama de “giro bancário”. A propósito da análise deste conceito afirma Menezes Cordeiro[12] que “O cliente do banqueiro, ao abrir uma conta, tem acesso imediato a determinados produtos e, designadamente, às múltiplas transferências e receções de fundos, por via escritural. As operações que se desenrolam, a essa luz, não são negociadas caso a caso: de resto elas nem teriam um regime coerente, se não apelarmos para as regras gerais ligadas à abertura de conta e à conta corrente bancária. Todavia, elas não são uma decorrência automática dessas duas realidades ou de alguma delas. Há, pois, uma “convenção de giro”, implícita na abertura de conta, pela qual o banqueiro põe à disposição dos seus clientes esses produtos, mediante as competentes retribuições.”

Essa retribuição das tarefas/operações que o giro bancário impõe no âmbito de cada específica relação contratual é feita exatamente por via das denominadas comissões bancárias. Ou seja, as comissões visam suportar despesas e retribuir serviços prestados pelos Bancos na execução dos contratos bancários.

Ora, perante a alteração contratual celebrada em 5 de fevereiro de 2015, deve concluir-se que foi vontade das partes que, a partir dessa data, passassem a ser custeadas pela mutuária todas as despesas e encargos decorrentes da celebração e execução do contrato de mútuo e respetivos aditamentos e alterações, ou seja, dizendo de outra forma, que todas as comissões bancárias cobradas que visassem cobrir tais encargos e despesas relativas ao empréstimo e suas modificações, passassem a ser da responsabilidade da mutuária a partir de 5 de fevereiro de 2015. É essa a única interpretação que tem correspondência com o que foi clausulado por escrito nessa data.

Assim, também os valores cobrados nesse âmbito – do empréstimo em apreço e suas modificações -, a partir dessa data não podem ser julgados como indevidamente suportados pela Autora.

Resta, assim apurar quais os valores cobrados pelos Bancos Réus a título de comissões decorrentes do empréstimo desde a sua celebração até 5 de fevereiro de 2015, desde que não relacionados com a garantia hipotecária constituída (avaliações, registos, distrates, etc.).

Só esses montantes, a terem sido cobrados à Autora, o foram indevidamente, em violação do estipulado entre as partes.

As comissões cuja devolução é pedida pela Autora, em face do que alega nos artigos 74 e 201 da petição inicial (para que remetem as alíneas c) e d) do pedido principal), são:

 - 2 500 € cobrados pelo Banco 2... em data não indicada no referido artigo 74;

- 9 862, 85 € cobrados pela Banco 1... em datas também não identificadas no referido artigo 201 da petição inicial.

Na alínea SSS) que se refere à cobrança de comissões pelo Banco 3.../Banco 2... apenas se dá por provado que tal Réu “(…) cobrou comissões, ao menos de avaliação, distrates e cancelamentos de registos, em montantes/valores não apurados”.

Assim, quanto ao Banco 2... nada se apurou que permita a sua responsabilização por cobrança de comissões não devidas. Desconhece-se (desde logo sequer foi alegado) que concretos valores foram cobrados e em que data(s) e, quanto à causa da sua cobrança, apenas se sabe que pelo menos em parte se destinaram a custear avaliações, distrates e cancelamentos de registos (de hipotecas). Donde, não há qualquer facto de que possa concluir-se que o Banco 2... violou o disposto na cláusula 6ª do contrato de mútuo e se apropriou de quantias indevidas.

A alínea FFF) dos factos provados, que enumera as quantias retiradas pela Banco 1... da conta da Autora, também não especifica as datas em que ocorreram tais cobranças, remetendo para os documentos 48- A e B da petição inicial, tal como fez a Autora no artigo 201 B) da petição inicial em que refere a cobrança de três valores pela Banco 1..., a título de comissões, por remissão para documentos que juntou.

Também a alínea RRR) do mesmo elenco de factos não menciona a data ou datas da retirada do valor global de 13 130, 61 € a título de comissões pela Banco 1... remetendo, contudo e por sua vez, para o mapa, de cinco páginas, contante do relatório pericial (fls. 45 a 49 do relatório junto aos autos a 22-09-2022), de que resultam, de facto, as várias quantias debitadas pela Banco 1... a título de comissões e respetivas datas de cobrança.

Percorreu-se o caminho indicado pelas referidas remissões para documentos e para o relatório pericial para aferir a que datas de cobrança e a que comissões (cobradas pela GGD) se estão a referir as alíneas dos factos provados que as mencionam.

Importa distinguir, quanto a essas verbas ali devidamente discriminadas as que foram cobradas antes e depois da alteração contratual celebrada em fevereiro de 2015 e, dentro das primeiras, as que decorrem de despesas de constituição das hipotecas, seu distrate, avaliação de imóveis hipotecados e registos e cancelamentos das hipotecas, que não são de considerar pelas razões já acima expostas.

Ora, seguindo o quadro elaborado no relatório pericial para que remete a alínea RRR) dos factos provados (páginas 45 a 49 do relatório), dele resultam várias classificações de comissões sendo que da sua nomenclatura é manifesto concluir que muitas estão abrangidas pelo estipulado na escritura pública de constituição de hipoteca relativamente ao pagamento pela mutuária dos valores relativos e conexos com a mesma. Estão nesta categoria todas as identificadas como “avaliação”, “conversão de registo” e “cancelamento de registo” que manifestamente se relacionam com as despesas que, por escritura pública, as partes convencionaram que deveriam ser suportadas pela Autora.

As demais quantias cobradas entre 12-03-2002 de 5 de fevereiro de 2015 estão identificadas como: “comissão de processamento”; “comissão de falta de provisão”; “comissão de reembolso antecipado”; “comissão de recuperação do valor de dívida”; “comissão finex flat outras” ou “comissão de alteração contratual”.

Nenhuma das partes alegou e nem resulta dos factos provados a que serviços se destinava o pagamento de cada uma delas. Todavia, uma vez mais a sua nomenclatura é nalguns casos manifestamente clara. Pode concluir-se sem qualquer dúvida que as comissões de “reembolso antecipado” e de “recuperação do valor de dívida” se relacionam com o empréstimo.

Quanto às demais, nada apontando nesse sentido, desconhece-se a que título foram cobradas.

A simples abertura de conta (à ordem) da Autora constituiu um contrato entre esta e a Banco 1... suscetível de gerar o já referido “giro bancário” com a prestação de serviços (transferências, depósitos, pagamentos e outros) que podem não se relacionar de todo com o mútuo. Do contrato de mútuo resulta mesmo que a conta à ordem em causa estava já aberta no momento da sua celebração, sendo manifesto que a mesma não servia só para a movimentação das quantias decorrentes da execução desse contrato e que houve valores cobrados que não se relacionam com o empréstimo, como sejam as comissões de “falta de provisão”  (conforme movimento de 16-09-2002, anterior ao empréstimo)[13].

Como tal e em conclusão, das comissões para que remete a alínea RRR) dos factos provados apenas as de “reembolso antecipado” e de “recuperação de dívida” cobradas até 5 de fevereiro de 2015 podem considerar-se indevidamente cobradas porque manifestamente relacionadas com o empréstimo e apenas uma foi debitada, nesse intervalo temporal, a título de reembolso antecipado: em 01-04-2009, o valor de 233, 70 €.

Tal cobrança constitui, segundo a Autora incumprimento do estipulado no contrato, na sua cláusula 6ª, pela Banco 1.... A Autora sustenta que tal incumprimento contratual foi causa de dano por que quer ser ressarcida.

O que a Banco 1... fez foi uma cobrança (mediante movimentação de verbas depositadas na conta da Autora) de valor a que não tinha direito enquanto mutuante.

A movimentação da conta da Autora assim feita consubstanciará apropriação de um montante que aquela tem o direito de repetir?

A repetição do indevido, tal como prevista no artigo 476º, número 1 do Código Civil, tem como pressuposto que ocorra uma prestação na convicção de que se está a cumprir uma obrigação. Ali se lê: “Sem prejuízo do disposto acerca das obrigações naturais, o que for prestado com intenção de cumprir uma obrigação pode ser repetido, se esta não existia no momento da prestação.” Ora a Autora, que é quem pede aqui a “restituição” do valor cobrado em excesso não efetuou qualquer prestação. O que sucedeu foi que o Banco, depositário das quantias que a Autora tinha na sua conta à ordem, levantou quantias a que não tinha direito. A Banco 1... por se entender credora de determinadas quantias, operou a compensação do seu crédito com o crédito da A..., SA resultante de depósito à ordem.[14]

E é exatamente nesta afirmação de que o Banco se apropriou de quantia de que era depositário que radica a possibilidade de responsabilização do mesmo.

Como já acima assinalado, a Autora celebrara com os dois Bancos mutuantes, antes da outorga do mútuo, contratos de depósito mediante a abertura de duas “contas à ordem” que já estão identificadas no contrato subscrito a 11 de março de 2002.

O contrato de depósito está regulado nos artigos 1185 º e seguintes do Código Civil e é ali descrito como “(…) o contrato pelo qual uma das partes entrega à outra uma coisa, móvel ou imóvel, para que a guarde e restitua quando for exigida”. O artigo 1205º do mesmo Diploma qualifica como depósito irregular o que tenha por objeto coisas fungíveis e, por remissão legal ínsita no artigo 1206º, a este aplicam-se, na medida do possível, as normas relativas ao contrato de mútuo. Sendo, por força do previsto no artigo 207º do Código Civil, o dinheiro uma coisa fungível é manifesto que o contrato pelo qual a Autora depositou nos Bancos Réus quantias monetárias é de considerar um depósito irregular.

As modalidades de depósitos bancários estão previstas no DL 430/91 de 2 de novembro, ali figurando, entre outros o depósito à ordem que, de acordo com o número 2 do artigo 1º “são exigíveis a todo o tempo”.

Em face da natureza irregular do depósito em apreço e da aplicabilidade das regras do mútuo é mister concluir que os valores depositados pela Autora nos Bancos Réus se tornaram, pelo depósito, propriedade destes, nos termos do disposto no artigo 1144º, estando, contudo, estes obrigados a disponibilizar idênticas quantias, a todo o tempo, à Autora, depositante.

Ora foi exatamente esta obrigação, enquanto depositária, que a Banco 1... violou ao cobrar, sem causa, e assim deixar de disponibilizar à Autora, a todo o tempo, quantia que não tinha fundamento para lhe debitar, por não lhe ser devida à luz do contrato de mútuo em a mesma que fundou tal cobrança [15].

É, assim, na sua qualidade de depositária que radica o incumprimento contratual da Banco 1... que lhe pode ser imputado e que é o de não disponibilização, a todo o tempo das quantias depositadas em conta à ordem da Autora.

A já referida quantia de 233, 70 € que a Banco 1... cobrou como comissão decorrente do mútuo, apesar de contratualmente estabelecido que não era devida, foi, assim, debitada de conta à ordem da Autora em violação dos deveres da Banco 1... enquanto depositária por não haver causa para tal.

O que, desde logo permite que se afaste a pretendida condenação solidária do Banco 2... nesta obrigação.

A Autora sustentou, em sede de recurso, tal solidariedade passiva das obrigações de pagamento que peticiona na natureza comercial das obrigações “mercantis” dos Réus sustentando, singelamente, que, no caso, as referidas obrigações mercantis são “plurais”. A solidariedade das obrigações dos Réus foi afastada em sede de sentença após análise do contrato celebrado com a Autora que se entendeu incluir obrigações distintas para ambos os Réus. Ali se concluiu que, apesar de outorgados no mesmo título, foram celebrados pela autora dois distintos contratos de mútuo, com cada um dos Réus.

Ora, assentando o direito da Autora de pedir o pagamento de quantias que tinha depositadas na Banco 1...   - e que a mesma, enquanto depositária lhe devia ter disponibilizado, mas de que se apropriou sem causa -, no incumprimento das obrigações desta enquanto depositária é desnecessária a averiguação da natureza plural ou singular das obrigações assumidas no contrato intitulado de mútuo, pois não é nele que cabe o enquadramento legal que sustentará a eventual condenação da Banco 1... na entrega dessa quantia. Com o que fica desde já conhecida a questão enunciada sob a alínea 4 h).

E dizemos eventual porque foi alegado e importa aferir se há exercício abusivo pela Autora do direito a pedir o pagamento dessa quantia.

Questão que será tratada em conjunto com a do pedido de pagamento de quantias cobradas a título de taxas de spread não acordadas, por tal exceção perentória ter sido oposta por ambos os Réus a todos os pedidos de restituição de quantias que a Autora alegou terem sido indevidamente cobradas ao longo da duração do contrato de mútuo.


*

4. c) Cumpre, agora, apreciar se, como defende a Apelante, há fundamento para a condenação de ambos os Bancos no pagamento das quantias decorrentes de diferença entre as taxas de spread acordas e as cobradas à Autora tendo em consideração os argumentos que nesse sentido alinham ambas as partes e que são:

No caso da Autora:

 não ocorreu qualquer incumprimento pela Autora das obrigações resultantes do contrato de mútuo - por ter havido alteração do mesmo -, que justificasse as alterações do spread dadas por provadas;

a prorrogação do prazo de vencimento do mútuo não constituiu um aumento de risco para os Bancos e não justificava o aumento da percentagem de spread;

não podia ter ocorrido qualquer alteração do spread fixado no mútuo por não ter ocorrido alteração superveniente do mercado nem ter sido feita a comunicação dessa variação à Autora;

as alterações ao spread não foram formalizadas por acordo escrito das partes.

No caso dos Réus, os argumentos esgrimidos a propósito desta questão radicam na afirmação de que as alterações em causa foram justificadas e foram comunicadas à Autora e por ela aceites e que a exigência da restituição dessas quantias constitui abuso do direito.

A questão que logicamente deve ser apreciada em primeiro lugar é a suscitada pelos Réus que alegam ter havido aceitação dos aumentos de spread por banda da Autora.

Como acima se assinalou quando foi alterada, oficiosamente, a redação da alínea 25) dos factos não provados, os Réus alegaram factos de que pretendem retirar a conclusão de que a Autora aceitou tacitamente tais alterações contratuais.

Ora, se assim se vier a concluir é manifestamente inútil prosseguir na análise dos argumentos da Autora, pois se estará perante uma alteração contratual decorrente de acordo das partes (sem prejuízo de ter de se conhecer, de qualquer modo, da questão, que também suscita, da falta de redução dessa alteração a escrito, do que a sentença não tratou e que, como se verá, se concatena diretamente com a da admissibilidade de uma declaração negocial tácita).

São os seguintes os factos provados a que importa atender para aferir se a Autora aceitou, ainda que tacitamente, as alterações da percentagem do spread:

- No contrato celebrado por escrito em 11 de março de 2002 constam, nomeadamente as seguintes cláusulas:

“No caso de alterações supervenientes do mercado devidamente justificadas, o Banco 3... e a Banco 1... poderão modificar a taxa de juro, assistindo à mutuária o direito de resolver o presente contrato” - clª 4ª nº 5 do DOC 2; e

Qualquer alteração ao presente contrato terá de ser acordada por escrito entre todos os contraentes”;

- O Banco 3... cobrou à Autora o spread como segue: no período de 28 de setembro de 2010 a 11 de março de 2011 aumentou de 1,25% para 2,5%, mantendo-o em 2,5% até 11 de setembro de 2011; no período de 11 de setembro de 2011 a 11 de abril de 2012 fez novo aumento para 4,5%; de 11 de abril de 2012 a 12 de outubro de 2012 aumenta para 5,5%, mantendo-se em 5,5% de 12 de outubro de 2012 a 12 de abril de 2013 e nos semestres de 12 de abril 2013 a 12 de outubro de 2013, de 12 de outubro de 2013 a 12 de abril de 2014, de 12 de abril de 2014 a 03 de Agosto de 2014 e, após, até 12 de outubro de 2014, de 12 de outubro de 2014 a 12 de março de 2015; no período de 12 de março de 2015 a 11 de Setembro de 2015 foi reduzido para 3,5%, até à extinção do mútuo em agosto de 2018;

- O Banco 3... comunicou à A. alterações do spread que efetuou, designadamente através das missivas juntas com a p.i. sob os nºs 7 e 8, cujo teor integral se deu por reproduzido;

Dali consta, respetivamente:

Na comunicação de 9 de janeiro de 2011 que “O actual contexto que Portugal atravessa, nomeadamente as obrigações assumidas em resultado de acordo com o FMI, Comissão Europeia e BCE em termos de rácios de solvabilidade (9% até final de 2011 e de 10% até final de 2012) bem como os constrangimentos no acesso aos mercados financeiros internacionais tornam necessário proceder a um ajustamento das condições do seu financiamento. Assim informamos que passarão a vigorar as seguintes condições: Spread 2, 5 %.”;

Igual motivação consta da missiva de 15 de julho de 2011, pela qual foi comunicada a fixação da taxa de spread em 4, 5 %.

- A Banco 1... cobrou o spread como segue: de 1,25% para 2% no período de 24 de março de 2009 a 30 de setembro de 2009, mantendo-o em 2% até 30 de março de 2011, momento em que o aumentou para 3,5%, mantendo-o assim até 25 de setembro de 2014; no período de 12 de setembro de 2014 a 12 de março de 2015 fez novo aumento, agora para 5,5%; em 12 de março de 2015 reduziu novamente para 3,5% até 27 de setembro de 2015, valor que manteve inalterado até à extinção do mútuo em agosto de 2018;

- A Autora várias vezes manifestou verbalmente o seu descontentamento pela cobrança do “spread acima de 1, 25 %” e comissões referidas, junto da Banco 1..., nas pessoas de AA e BB e do Banco 3.../Banco 2..., na pessoa de CC;

- Por contratos escritos cujo teor é o dos documentos 4 e 5 da petição inicial as partes acordaram em alterar o contrato inicial nomeadamente ali clausulando, respetivamente, que o spread passaria a ser de 5, 5% (desde fevereiro de 2015) e de 3,5% (desde outubro do mesmo ano);

- A Autora teve absoluto, imediato e integral conhecimento das quantias que mensalmente pagava aos RR. em consequência da celebração do contrato e aditamentos juntos com a petição inicial, tendo a Autora conhecimento das taxas de juro que eram aplicadas e o montante que a título de juros lhe era mensalmente cobrado, bem como o de outros encargos cobrados;

- A primeira situação de alteração do spread pela Banco 1... de 1,25% para 2% ocorreu no seguimento de pedido da Autora para prescindir da amortização da quantia aproximada de € 468.000,00 relativa ao ano de 2009, a qual foi autorizada pela Ré Banco 1..., S.A.;

- Novamente, no ano de 2010, a A..., SA voltou a solicitar uma carência do pagamento de prestações na componente de capital durante o ano de 2010 – cfr. documento n.º 3, com a contestação da Ré Banco 1...;

- A segunda alteração do spread de 2% para 3,5% ocorreu no seguimento desse pedido da Autora Parques do EDT para prescindir da amortização de capital de € 154.210,00 relativa ao segundo semestre do ano de 2010, o que também veio a ser aprovado pela Ré Banco 1...;

- Antes disso a Autora também pedira às Rés e viu ser-lhe deferido pelas mesmas a prorrogação do prazo de vencimento da prestação de amortização de capital:

em setembro de 2004, que foi prorrogada para dezembro desse ano;

novamente em dezembro de 2004, tendo a mesma sido prorrogada para janeiro de 2005;

novamente em março de 2005, tendo nessa data sido deferida a dispensa de pagamento nas datas acordadas das duas prestações semestrais que se venceriam nesse ano;

- Todas as alterações de condições, incluindo taxas de juros, spreads ou comissões foram comunicadas à A..., SA.

Perante este conjunto de factos há que tratar de forma distinta os aumentos de spread operados por cada um dos Réus.

Em comum ocorreram duas alterações ao spread acordadas por escrito, mediante modificações contratuais outorgadas pelas partes a 5 de fevereiro e a 8 de outubro de 2015, que terão tratamento conjunto.

Quanto ao Banco 2... apenas cabe olhar para as taxas que cobrou desde a sua constituição já que em face da decisão proferida em sede de saneamento dos autos, em que se absolveu o Banco 2... dos pedidos relativos a quantias cobradas até 03-08-2014 - decisão essa transitada em julgado -, apenas se poderia equacionar a condenação desse Réu no pagamento de valores correspondentes a taxas indevidamente cobradas a partir de tal data e até 5 de fevereiro de 2015.

Está, assim e apenas, em causa aferir se foi ilícita, porque violadora de estipulação contratual, a cobrança pelo Banco 2... de taxa de spread à taxa de 5, 5% desde 3 de agosto de 2014 e até fevereiro de 2015.

As únicas comunicações feitas pelo Banco 2... à luz do previsto na cláusula 4ª número 5 do contrato de mútuo, com invocação das alterações supervenientes de mercado referem-se a momentos anteriores. Não consta dos factos provados que idêntica comunicação tenha sido feita para justificar a alteração da percentagem para 5, 5 % que foi cobrada no período em análise (de 3 de agosto de 2014 a 5 de fevereiro de 2015).

Quanto à Banco 1... nenhuma alteração foi comunicada com base em alterações supervenientes do mercado nos termos da referida cláusula.

Está, contudo, provado que todas as alterações de condições, incluindo taxas de juros, spreads ou comissões foram comunicadas à Autora por ambos os Réus e que a mesma delas teve imediato e absoluto conhecimento, bem como que várias vezes manifestou verbalmente o seu descontentamento pela cobrança do “spread acima de 1, 25 %” e comissões referidas, junto da Banco 1..., nas pessoas de AA e BB e do Banco 3.../Banco 2..., na pessoa de CC.

Pode, perante o comportamento da Autora, e como pretendem os Réus, afirmar-se que a mesma aceitou tais alterações?

O que ora nos ocupa, é, recordemo-lo, apenas a questão de uma eventual aceitação tácita da Autora, pois as alterações reduzidas a escrito a 5 de fevereiro e a 8 de outubro de 2015 merecem diferente tratamento e não está provada qualquer declaração da Autora de aceitação de outras alterações para além dessas.

Para tanto importa aferir se o facto de as partes terem convencionado, na cláusula 9º do contrato de mútuo que “Qualquer alteração ao presente contrato terá de ser acordada por escrito entre todos os contraentes” impede que se possa concluir que ocorreu uma aceitação tácita da alteração consistente no aumento da taxa de spread.

Prevê o artigo 223º, número 1 do Código Civil que “Podem as partes estipular uma forma especial para a declaração; presume-se, neste caso, que as partes não se querem vincular senão pela forma convencionada”. Aplicada esta presunção fica desde logo afastada a possibilidade de se considerar concludente um qualquer comportamento da Autora ainda que, em abstrato, se pudesse qualificar como revelador de aceitação tácita de uma modificação contratual?

A resposta terá de ser negativa, ao contrário do que pretende a Autora que entende que, não tendo sido reduzido a escrito um qualquer acordo nesse sentido, nunca poderia ter ocorrido um aumento das percentagens de spread.

Contudo, as presunções legais podem ser ilididas mediante prova em contrário exceto nos casos em que a lei o proibir, como prevê o artigo 350º, número 2 do Código Civil.

Acresce que, nos termos do artigo 217º, número 2 do Código Civil, “O caráter formal da declaração não impede que ela seja emitida tacitamente.”

Dos factos apurados a propósito dos sucessivos comportamentos da Autora relativamente aos aumentos de spread há, pois, que ver se pode concluir-se estar ilidida a presunção de que as partes apenas se quiseram vincular por escrito quanto às alterações futuras ao contrato e, caso contrário, se os comportamentos da Autora que eventualmente revelam tal aceitação tácita observam a forma, escrita, que convencionaram ser de exigir.

Ora, dos factos provados não só não resulta ilidida a presunção decorrente da cláusula 9ª do contrato de mútuo como a vontade das partes de apenas se vincularem por escrito no que tange a alterações contratuais está até amplamente confirmada por vários deles: a redução a escrito das alterações tituladas pelos documentos de 2 de setembro de 2003, 11 de janeiro de 2005, 5 de fevereiro e 8 de outubro de 2015 e a forma escrita adotada pelas partes para os pedidos e para as decisões de aceitação de prorrogação dos prazos de vencimento de prestações semestrais demonstram que havia uma consciência de que a referida cláusula apenas permitia alterações contratuais que se submetessem à forma escrita convencionada.

Todavia, não o esqueçamos, quanto a uma específica alteração contratual as partes previram uma forma de alteração que não dependia de forma escrita: a da modificação da taxa de juro que, ficou expressamente clausulado, podia ser feita pelos Bancos na decorrência de alterações supervenientes de mercado, assistindo neste caso à mutuária o direito de resolver o contrato.

Não está, contudo, provado, que as alterações que ora se analisam (entre março de 2009 e 5 de fevereiro de 2015 por banda da Banco 1... e entre 3 de agosto de 2014 e 5 de fevereiro de 2015 por parte do Banco 2...) decorreram de alterações de mercado, nada tendo nenhum dos Réus comunicado à Autora nesse sentido.

Contudo, como bem salientado na sentença, a prova feita é de molde a que se conclua que os aumentos de spread que os Bancos começaram a exigir unilateralmente cobrando tais valores da conta da Autora decorreram do aumento do risco de incumprimento que passou, aos olhos dos credores/mutuantes, a estar associado ao mútuo, decorridos que estavam sete anos sobre o seu início com sucessivas prorrogações do prazo de vencimento da obrigação de amortização de capital que a Autora pediu e que lhe foram concedidas, no seu interesse.

Essas prorrogações, a que se alude expressamente nos considerandos das alterações contratuais de 5 de fevereiro e de 8 de outubro de 2015, foram então aceites pelos Bancos, como ali se diz, mediante termos e condições que, contudo, já antes dessa data tinham sido aplicadas pelos credores  e foram comunicadas à Autora (o que se provou), mas não foram reduzidas a escrito.

Resta, então, saber se ocorreram factos concludentes de que se pudesse deduzir a declaração tácita da Autora de aceitação aos aumentos de spread e se tais factos foram eles próprios reduzidos a escrito, único caso em que o caráter formal da declaração não impede que a mesma seja emitida tacitamente face ao previsto no artigo 217º, número 2 do Código Civil.

Ora, não há nos factos provados qualquer comportamento da Autora que tenha revestido a forma escrita e que seja revelador de aceitação dos aumentos de spread que lhe foram comunicados. Ao contrário do que os Bancos Réus defendem e se afirma na sentença, não se vê no texto de nenhuma das alterações contratuais outorgadas em 5 de fevereiro e 8 de outubro de 2015 a “ratificação” das anteriores vicissitudes na execução do contrato, como afirmado pela A..., SA estando, aliás, ali estabelecido que tais alterações não constituem novação (o que ali expressamente se declarou nas cláusulas 8ª e 7ª) e, que com exceção das cláusulas a que expressamente atribuíram retroatividade, as demais modificações apenas produziriam efeitos desde a data da sua outorga. Entre estas últimas estão as alterações de spread ali previstas em cláusulas a que não foi fixado efeito retroativo.

Donde, não há fundamento de facto para que se possa julgar ter ocorrido qualquer declaração negocial tácita de aceitação das alterações do spread  de que vimos tratando, sobre as quais, aliás, se provou mesmo que a Autora revelou descontentamento (alínea OOO) dos factos provados).

Na falta de aceitação, ainda que tácita, desses aumentos por banda da Autora resta concluir que os mesmos consubstanciaram, da parte dos Réus, violação da cláusula 4ª número 1 do contrato de mútuo que fixava em 1, 25 % a percentagem de spread e que permaneceu inalterada até 05 de fevereiro de 2015.

Ocorreu, pois, cobrança pelos Bancos depositantes de quantias para que não tinham causa e que são as resultantes:

1) No caso da Banco 1...:

- da diferença entre 1, 25% e 2% cobrados entre 24 de março de 2009 e 30 de março de 2011; e

- da diferença entre 1, 25 % e 3, 5 % cobrados desde 30 de março de 2011 até 25 de setembro de 2014;

- da diferença entre 1, 25% e 5, 5% no período de 12 de setembro de 2014 a 5 de fevereiro de 2015;

2) No caso do Banco 2...:

- da diferença entre 1, 25% e 5, 5% desde 3 de agosto de 2014 e 5 de fevereiro de 2015.

Calculando o resultado de tais diferenças de taxa com recurso às operações aritméticas resultantes de fls. 25 do relatório pericial, a totalidade dos juros e respetivo imposto de selo que foram cobrados pela Banco 1... foi, nesse intervalo de tempo, de 456 545, 43 € quando, de acordo com o clausulado no mútuo, deveria ter sido de 257 363, 52 €, resultando numa diferença de 198 181, 91 €.

Quanto ao Banco 2..., o aumento da taxa de spread entre 3 de agosto de 2014 e 5 de fevereiro de 2015 resultou numa cobrança, nesse período, de uma quantia de 48 507, 45 € em dezembro de 2014 quando, à taxa de 1, 25% o montante total a cobrar pelos juros e imposto de selo seria de 13 959, 52 €. Ou seja, foi cobrada, além do que estava acordado, a quantia de 34 547, 93 €.

Uma vez mais o enquadramento legal da obrigação dos Réus radica no incumprimento das suas obrigações enquanto depositários, tendo os mesmos, ao debitar tais quantias das contas à ordem da Autora - 198 181, 91 € a Banco 1... e 34 547, 93 € o Banco 2..., violado o seu dever de disponibilizar as mesmas à depositante, a todo o tempo.

Reitera-se o que acima se deixou já afirmado quanto à indevida compensação, pelos Bancos depositários, de créditos a que se conclui que não tinham direito, sobre o crédito da Autora, depositante, que, assim deixou de ter, a todo o tempo a disponibilidade das quantias depositadas sem que para tal houvesse causa.

Donde, remetendo por economia para o que acima se afirmou a propósito da cobrança pela Banco 1... de valor relativo a comissão pelo empréstimo para que não tinha título/causa, não há fundamento de facto para que se trate tal obrigação de restituição como plural quanto aos sujeitos já que os contratos de depósito foram celebrados pela Autora com cada um dos bancos Réus e foram os deveres destes enquanto depositários que foram violados.

Não há, assim, nos factos provados, qualquer fundamento para a peticionada condenação solidária dos mesmos.


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Resta apurar se a Autora pode exercer a sua pretensão de se ver reembolsada dos valores que indevidamente lhe foram cobrados pelos depositários por ser abusivo o exercício desse direito, aqui se tratando em conjunto os valores da comissão cobrada pela Banco 1... acima tratada e os valores de spread acima dos acordados que foram debitados indevidamente por ambos os Réus e relativos, no caso do Banco 2... ao período situado entre 3 de agosto de 2014 e 5 de fevereiro de 2015 e, no caso da Banco 1..., entre março de 2009 e 5 de fevereiro de 2015.

Em ordem a ter em consideração todos os argumentos esgrimidos pelos Réus e pela Autora que relevam para aferir se se está perante um comportamento desta que “(…) exceda manifestamente os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico” do direito a pedir o pagamento dessas quantias, como exige o artigo 334º do Código Civil, analisaremos as vicissitudes contratuais relacionadas com a cobrança dessas quantias e as que se lhe seguiram dando resposta concreta aos diversos argumentos alinhados por Recorrente e Recorridos:

i) Começa a Apelante por sustentar que não ocorreu qualquer incumprimento das obrigações para si resultantes do contrato de mútuo - por ter havido alteração do mesmo -, que justificasse as alterações do spread dadas por provadas.

A mesma baseia essa conclusão na seguinte via de raciocínio: o contrato nunca teve a configuração de um mútuo, como clausulado tendo, antes, sido sempre executado como um contrato de financiamento à construção mediante a constituição de uma abertura de crédito. Donde, conclui, nunca ocorreu verdadeiro incumprimento do contrato pela sua parte pois sempre foi procedendo a algumas amortizações parciais do capital mutuado.

A Apelante A..., SA vem, em nota de rodapé (número 12) das suas alegações, afirmar que “o capital mutuado foi libertado por tranches e não de uma só vez, como é próprio do mútuo”, coisa que não só não alegara na petição inicial como, pelo contrário, está em grande medida infirmada no seu artigo 52 da mesma, em que verteu que cada mutuante lhe entregou inicialmente a importância de 3 967 607 €. O que, aliás, é o que resulta da cláusula 3ª, ponto 2 do contrato em apreço.

Tem-se por assente esta afirmação, tal como resulta do ponto H) dos factos provados. O que ficou estipulado foi apenas que o demais valor mutuado seria disponibilizado no prazo máximo de vinte e quatro meses mediante solicitação escrita da mutuária.

A nosso ver, perante esta factualidade, é inútil a ensaiada classificação do contrato em apreço como de abertura de crédito pelo que não se prosseguirá pela análise do contrato com vista ao seu enquadramento numa ou noutras das categorias (mútuo ou abertura de crédito) já que a questão levantada pela Recorrente é independente dessa classificação, que aqui não releva.

De todo o modo sempre se dirá que estão por provar quaisquer factos de que pudesse decorrer que vontade real das partes fosse a de celebração de um contrato de financiamento à construção mediante abertura de crédito, como agora alega a Autora.

Acresce que as partes outorgaram por escrito quatro alterações contratuais em que nunca introduziram qualquer modificação à natureza do mesmo, ali permanecendo sempre a menção das quantias mutuadas, do prazo previsto para a sua devolução e dos montantes remuneratórios devidos pelo depósito e respetivas datas de pagamento. Ou seja, todas as declarações negociais das partes que foram reduzidas a escrito manifestam vontade de emprestar por parte dos Bancos e a assunção da obrigação de restituir por banda da Autora, em perfeito preenchimento da noção legal do contrato de mútuo como resulta do artigo 1142º do Código Civil.

Para dar resposta aos argumentos da Apelante o que importa é aferir se a mesma cumpriu ou não as obrigações estipuladas no contrato quanto aos momentos em que devia proceder à amortização de capital (e é manifesto que o não fez), apenas e tão-só porque é nesse “não cumprimento” do inicialmente estipulado que os Bancos Réus fizeram assentar a razão de ser das alterações da percentagem de spread, para daí retirarem que a mesma está em sinalagma com as prorrogações das prestações semestrais de capital que foram feitas em favor da Autora.

Estava previsto, no contrato subscrito a 11 de março de 2002, o pagamento, a cada seis meses e a partir do trigésimo mês subsequente ao da sua celebração (ou seja, como já acima referido desde setembro de 2004) de prestações de amortização de capital. Estava, também, ali prevista expressamente a possibilidade de a mutuária amortizar extraordinária e parcialmente o capital em dívida estipulando-se que, nesse caso, o valor das amortizações extraordinárias seria imputado na(s) última(s) prestação(ões) regulares estipuladas (dezasseis no seu total).

A A..., SA recebeu, com obrigação de a devolver nessas condições e prazos, a quantia de 3 067 607 € de cada um dos Bancos Réus em 11 de março de 2002.

Poucos dias antes de terem decorrido 18 meses sobre tal data as partes outorgaram por escrito uma alteração a esse contrato pela qual estabeleceram que as amortizações extraordinárias de capital por banda da devedora seriam imputadas na prestação subsequente. Alteração claramente do interesse da devedora.

Da alínea TTTT) dos factos provados decorre que a Autora pediu às Rés e viu ser-lhe deferida pelas mesmas as prorrogações do prazo de vencimento das prestações de amortização de capital que se seguem:

em setembro de 2004, em que se vencia prestação que foi prorrogada para dezembro desse ano;

novamente em dezembro de 2004, em que tal prestação foi prorrogada para janeiro de 2005;

novamente em março de 2005, tendo nessa data sido deferida a dispensa de pagamento nas datas acordadas das duas prestações semestrais que se venceriam nesse ano.

Ou seja, logo a primeira prestação de amortização de capital não foi paga nos termos acordados no contrato porque a Autora assim solicitou, o mesmo sucedeu com a segunda, com a terceira e com a quarta prestações de amortização de capital.

Provou-se, ainda, que no ano de 2009 a Autora A..., SA solicitou à Ré Banco 1... uma suspensão do pagamento do capital das duas prestações previstas para o ano de 2009 correspondendo a € 234.000,00, cada. E a consequente alteração ao contrato outorgada em 8 de outubro de 2015 revela, ao fixar novo período de interrupção da obrigação de amortização do capital por 126 meses a contar desde 12-09-2006, que a Autora, de facto, nunca até essa data procedera a qualquer amortização regular e semestral do capital.

A primeira alteração do spread pela Banco 1..., de 1,25% para 2%, ocorreu exatamente no seguimento de um pedido da Autora para prescindir da amortização da quantia aproximada de € 468.000,00 relativa ao ano de 2009, a qual foi autorizada pela Ré Banco 1..., S.A.

Novamente no ano de 2010 a Autora Parques do EDT voltou a solicitar um prazo de carência do pagamento de prestações na componente de capital durante o ano de 2010 e a segunda alteração do spread de 2% para 3,5% ocorreu no seguimento do pedido da Autora Parques do EDT para prescindir da amortização de capital de € 154.210,00, relativa ao segundo semestre do ano de 2010, o que também veio a ser aprovado pela Ré Banco 1..., S.A.

No período de 12 de setembro de 2014 a 12 de março de 2015 a Banco 1... fez novo aumento do spread, agora para 5,5% e em 12 de março de 2015 reduziu-o novamente para 3,5% até 27 de setembro de 2015, valor que manteve inalterado até à extinção do mútuo em agosto de 2018.

Já o Banco 3.../Banco 2... cobrou o spread, no aqui releva convocar, à taxa de 5,5%, de 3 de agosto de 2014 até 12 de março de 2015 e, desde então, reduziu-o para 3,5%, até à extinção do mútuo em agosto de 2018.

Ora, a 5 de fevereiro e a 8 de outubro de 2015 as partes alteraram as taxas de spread por contrato escrito. Ao abrigo do poder de modificação do contrato previsto no artigo 406º, número 1 do Código Civil alteraram, no âmbito de mais uma prorrogação do prazo do mútuo, a percentagem de spread para 5, 5 % tendo-a reduzido para 3, 5% no mesmo ano, em nova alteração escrita ao contrato outorgada em 8 de outubro. Nesses contratos a Autora viu ser-lhe prorrogados os prazos de amortização parcial do capital e de duração total do mútuo.

Como bem se concluiu na sentença recorrida, é manifesto que também as alterações de spread antes aplicadas foram consequência de alterações, muito relevantes, da data de vencimento das amortizações do capital que estavam previstas, alterações essas pedidas pela Autora, do seu interesse, e que começaram logo a ser solicitadas e deferidas no momento de vencimento da primeira dessas prestações.

A Autora nunca procedeu a qualquer pagamento de prestações regulares, semestrais, de amortização parcial do capital. O que é crucial para se enquadrar o seu comportamento à luz das obrigações de boa-fé a que estão obrigadas as partes outorgantes de um contrato, nos termos do previsto no artigo 762º, número 2 do Código Civil, quer no cumprimento das suas obrigações quer no exercício do direito correspondente.

Donde, não colhe e improcede a alegação pela Recorrente A..., SA de que não ocorreu da sua parte qualquer incumprimento (expressão aqui usada sem rigor jurídico e com o sentido que dela quer retirar a Apelante) que tenha justificado os aumentos de spread, pois se provou que estes foram consequência dos pedidos de prorrogação que alteraram de forma muito relevante a sua obrigação de devolução dos montantes mutuados. É manifesto que a Autora não cumpriu aquilo a que se obrigou no contrato quanto às amortizações do capital. O facto de ter procedido a amortizações parciais extraordinárias do capital não impede essa conclusão, pois, como se viu, o contrato sempre as previu e não se provou, como alegado, que as mesmas tenham atingido e até suplantado os valores das prestações semestrais que se lhe seguiram (caso em que nem teria a Autora que pedir a prorrogação do seu prazo de vencimento, pois em face da alteração contratual de 2 de setembro de 2003, a mesmas estariam saldadas, dado que ali ficou prevista a imputação das amortizações extraordinárias na prestação subsequente.)

É claro que, tendo o “não cumprimento” do estipulado sido decorrente de pedidos pontuais e sucessivos de alterações da cláusula que obrigava a Autora a amortizações semestrais parciais e regulares e tendo havido por banda dos Réus aceitação desses pedidos, não pode falar-se, com propriedade e rigor, em incumprimento contratual pois, de facto, o que ocorreu foi a modificação sucessiva, por acordo das partes dessa obrigação decorrente do contrato.

Não pode é escamotear-se, como faz a Autora, que as modificações sucessivas do contrato em seu favor tiveram, a partir de 2009, como contrapartida a modificação, também, das contrapartidas exigidas pelos Bancos.


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ii) Alega ainda a Apelante A..., SA que não podia ter ocorrido qualquer alteração do spread fixado no mútuo por não ter ocorrido alteração superveniente do mercado nem ter sido feita a comunicação dessa variação à Autora.

Quanto a esta questão entendeu o Tribunal a quo que não era aplicável aos factos apurados o instituto da alteração das circunstâncias que, nos termos do artigo 437º do Código Civil permitiria aos Bancos, no caso, a modificação do contrato.

Apenas o Banco 3... comunicou duas alterações ao abrigo da cláusula contratual que apela a esse conceito de “alterações supervenientes de mercado” previsto na cláusula 4ª número 5 do contrato de mútuo e tais comunicações destinavam-se a sustentar aumentos da taxa de spread pelo que o Banco 2... foi já absolvido em sede de saneamento dos autos pelo que perde interesse o conhecimento desta questão tal como enunciada na apelação, já que as alterações ao spread acima selecionadas como eventualmente relevantes não foram assim justificadas pelos Bancos.

ii) sustenta, ainda, a Apelante A..., SA que a prorrogação do prazo de vencimento do mútuo não constituiu um aumento de risco para os Bancos e não justificava o aumento da percentagem de spread.

Não tem razão.

De facto, o contrato firmado em março de 2002 não foi, nunca (!), integralmente cumprido pela mutuária nos termos ali previstos tendo sido alvo de diversas alterações que visaram conformá-lo aos interesses das partes, em especial os seus, já que as prorrogações de prazos de vencimento das obrigações de pagamento foram todas por si pedidas.

É manifesta, salvo o devido respeito, a falta de razão da Autora quando sustenta que os Bancos Réus têm a contrapartida dos mútuos consubstanciada apenas no pagamento de juros e que só ao pagamento destes – que serão tanto maiores quanto maior for a duração do mesmo -, releva atender enquanto contraprestação.

A obrigação principal dos mutuários é a de devolução do que lhes foi entregue - cfr. artigo 1142º do Código Civil. Se é certo que os mútuos remunerados têm, para quem empresta, o apelo económico que os juros remuneratórios comportam, também é certo que o mutuante tem, sempre, interesse na devolução do que entregou (e direito à mesma), pois até ao cumprimento da obrigação fica desapossado desse bem que, no caso, se trata de quantia monetária que disponibilizou à Autora.

Os valores mutuados pelos Bancos aos seus clientes obrigam, também, os mesmos a financiarem-se e determinam, perante a entidade reguladora, uma gestão e avaliação criteriosa de riscos de incumprimento e imparidades sob pena de, ainda que recebendo juros remuneratórios, ficarem descapitalizados e serem responsabilizados.

Dispensa demoradas considerações a afirmação de que a concessão de crédito bancário e as condições do mesmo dependem, em larga medida, de uma avaliação do risco de incumprimento. E nem se diga que estando tal risco coberto por garantia hipotecária o mesmo não existe. Desde logo há outras garantias legais, como os privilégios imobiliários, que podem, em concurso de credores, vir a determinar que outros créditos venham a ser graduados antes dos garantidos por hipoteca. Acresce que os Bancos não têm interesse, à partida, em cobrar coercivamente os seus créditos com penhora e venda de bens hipotecados, dada a demora, e incerteza de sucesso e de suficiência que tais cobranças comportam.

Donde, acompanha-se a sentença recorrida quando (na análise do que se qualificou como de ius variandi), ali se afirma que há uma clara relação entre as sucessivas alterações contratuais pedidas e concedidas a favor da Autora e consubstanciadas na prorrogação do prazo de vencimento da dívida e os aumentos da percentagem do spread  a partir de 2009, não se reconhecendo qualquer razão ao argumento da Autora de que as várias prorrogações dos prazos de vencimento da obrigação de pagamento de capital não comportaram aumento de risco ou prejuízo para os Bancos.

Tal ausência de aumento de risco é, também, sustentada pela Apelante na afirmação de que o valor dos bens hipotecados suplantava em larga medida o do crédito garantido.

Quanto à hipoteca e valores dos bens hipotecados, a Recorrente - como vimos a propósito do pedido da alteração da matéria constante da alínea ZZZ) -, justificava a relevância da sua pretensão afirmando que a não diminuição da hipoteca pelas credoras enquadrava a “estratégia de bullying levada a cabo pela Banco 1... após a reunião de 29-08-2017”. Acrescenta que o comportamento dessa Ré é violador do artigo 625º, número 2 do Código Civil e configura abuso do direito porque “a recusa de libertar bens imóveis tem de ser enquadrada com a declaração de vencimento antecipada (ilícita) do mútuo, a imediata compensação (ilícita) de créditos e a comunicação de incumprimento (ilícita) ao Banco de Portugal.”.

Salvo o devido respeito parece-nos que a Apelante confunde, nesta afirmação, as questões do vencimento do débito e das garantias do mesmo. A circunstância de uma determinada dívida estar garantida podendo o credor executar uma hipoteca que suplanta o valor do crédito não impede nem contraria a circunstância de, tendo prazo certo, tal dívida estar vencida. Aliás, só após o seu vencimento e o incumprimento da obrigação de pagamento é que nasce na esfera do credor o direito de cobrar o seu crédito e de, portanto, executar a garantia – conforme resulta do disposto nos artigos 601º, 686º , 730º, 798º e 817º do Código Civil preceitos de que decorrem as regras gerais quanto ao incumprimento das obrigações, ao direito do credor em exigir judicialmente o seu cumprimento, à garantia geral dos credores constituída pelo património do devedor e à garantia especial resultante da hipoteca.

Também não se antolha como pertinente a convocação pela Recorrente do disposto no artigo 625º, número 2 do Código Civil, relativo a outra garantia especial das obrigações: a caução.

A redução da hipoteca em função da diminuição do valor da dívida por ela garantida poderia, de facto, ter tido lugar voluntária ou judicialmente nos termos previstos nos artigos 718º a 720º do Código Civil prevendo este, ainda, a possibilidade de ser pedida a redução judicial da hipoteca no caso de aumento do valor do bem hipotecado (alínea b) do número 2 do artigo 720º). 

A Autora nunca a pediu judicialmente e nem resulta injustificada a recusa dos Bancos de a reduzirem a partir de setembro de 2017 (sendo que só a partir desta data é que se provou que a Autora pediu essa redução - cfr. alínea XXX) dos factos provados), data em que a Autora estava a tentar negociar a prorrogação do mútuo (cujo vencimento ocorrera em março do mesmo ano), por mais cinco anos. Mútuo esse que tinha a duração inicial prevista de 10 anos e que, em setembro de 2017 já vigorava há 15.

Neste contexto não se afigura que a não redução, por acordo, da garantia hipotecária conduza a desequilíbrio das obrigações recíprocas que as partes assumiram no mútuo, desde logo porque estava por cumprir, pela Autora/mutuária, a principal obrigação dele decorrente: a de restituição do valor mutuado.

Não se antolha, na apreciação das obrigações recíprocas das partes, e sobretudo, da concreta forma como o contrato foi sucessiva e constantemente alterado a pedido e no interesse da Autora até 2017, que possa julgar-se por desproporcional ou excessiva a exigência dos Réus de manterem a sua obrigação garantida pela hipoteca inicialmente constituída que já fora, na verdade, sendo reduzida à medida em que foram ocorrendo distrates parciais da mesma pela venda de bens hipotecados. Essa recusa não consubstancia violação de qualquer dever de boa-fé na execução do contrato ou na negociação da sua prorrogação.

Com o que fica conhecida a questão a resolver enunciada sob a alínea 4 f).

Assim, não obstante o crédito dos bancos estar garantido por hipoteca e a remuneração do mútuo ser feita mediante cobrança de juros não pode, em conclusão, considerar-se excessiva a contrapartida que os Bancos exigiram, a partir de março de 2009, pelas sucessivas prorrogações dos prazos de vencimento das obrigações de amortização parcial de capital, que até então (e desde então, por igual) foram sempre, todas, prorrogadas.

É neste conspecto que cumpre olhar, agora, para os argumentos esgrimidos pelos Bancos Recorridos para sustentar o abuso do direito da Autora.

Segundo eles todos os comportamentos omissivos da mesma ao longo da relação contratual, com falta de expressa declaração de não aceitação da cobrança de comissões e de taxas de spread,  criaram a convicção de que a Autora aceitava tais cobranças o que, se não antes, devia ter claramente contrariado aquando da celebração das alterações contratuais outorgadas em fevereiro e outubro de 2015 ou, pelo menos, na data da liquidação do mútuo.

Esta afirmação deve desdobrar-se em vários planos de análise.

O primeiro situa-se na apreciação dos comportamentos omissivos enquanto justificadores da aplicação da exceção de abuso do direito na modalidade de supressio.

A primeira cautela que a análise desses comportamentos exige é a da distinção da sua qualificação enquanto comportamentos concludentes com reflexo na consideração de que se está perante uma declaração negocial tácita – já acima afastada -, ou enquanto fundamento para a exceção de abuso do direito.

Sobre tal distinção se pronuncia Paulo Mota Pinto[16] afirmando que “A declaração de vontade tácita assume, deste modo, um papel de esquema de legitimação para, no desenrolar de uma relação, deixar entrar valorações correspondentes à boa fé”. Tal autor alerta mesmo para o tratamento, em várias decisões jurisprudenciais, como constituindo abusivo “venire contra factum proprium” de factos que consubstanciam, afinal, declarações negociais tácitas, nomeadamente de renúncia. Do mesmo modo, dá nota de que frequentemente “(…) uma ficcionada declaração tácita de vontade representou (…) apenas um esquema de legitimação para, afinal, dar aplicação às soluções recomendadas pela bona fides.”[17].

Afastada que foi a qualificação dos comportamentos omissivos da Autora como de aceitação tácita de declarações negociais dos Réus quando lhe comunicaram, como se provou terem feito, “todas as alterações de condições, incluindo taxas de juros, spreads ou comissões” não podem, agora, sem mais, valorar-se esses mesmos comportamentos omissivos como sendo reveladores da referida aceitação para efeito do seu enquadramento à luz do abuso do direito.  

Pode, todavia, aferir-se se tais comportamentos são impeditivos do exercício do direito de pedir a restituição de quantias debitadas pelos bancos depositários quanto conjugados: - com o sinalagma que acima se estabeleceu ter existido entre as cobranças de spread acima de 1, 25 % e as sucessivas prorrogações dos prazos de vencimento da obrigação de amortização de capital;

- com o teor dos acordos escritos de 2015 (de 5 de fevereiro e 8 de outubro); e,

- com o ocorrido no momento de liquidação dos mútuos.

O abuso do direito, enquanto exceção perentória, impeditiva do exercício de um direito, deve ser usado com a parcimónia que a redação do artigo 334º do Código Civil exige. Ali se estipula que para que se considere abusivo o exercício de um direito o mesmo deve exceder “manifestamente” os limites “impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social e económico desse direito”. Não é, assim, qualquer comportamento do credor que se revele desproporcional ou excessivo em face dos interesses em confronto que justifica o recurso a tal norma, de caráter excecional. Têm que ser manifestos essa desproporção ou esse excesso. O que, todavia, nem sempre é tido em conta na prática judiciária em que (como, aliás, sucede com a invocação do enriquecimento sem causa), à falta de melhor argumento muitas vezes se lança mão da invocação do abuso de direito de forma, também ela, abusiva (perdoando-se o pleonasmo).

O recurso ao conceito legal de abuso do direito em sede de responsabilidade contratual apenas pode ter lugar, assim, quando quem exerce um direito o faz de forma ostensivamente ofensiva da obrigação geral de exercício dos direitos correspondentes às obrigações emergentes do contrato de acordo com a boa-fé (cfr. artigo 762º, número 2 do Código Civil).

Para o que deve ter-se presente o equilíbrio das várias obrigações contratuais que emergem para ambas as partes aquando da celebração de um contrato e o ditame geral de que nos negócios bilaterais e, sobretudo nos onerosos, há que ter presente o fito de atingir o (possível) equilíbrio das prestações (expresso, nomeadamente, na regra interpretativa prevista no artigo 237º do Código Civil).

Remetemos aqui para o que acima se afirmou a propósito da correspondência que se estabeleceu, a partir da matéria de facto provada, entre os sucessivos pedidos de prorrogação de prazo de pagamento das prestações de amortização do capital pela Autora e os aumentos de spread, bem como para a afirmação de que aquelas prorrogações alteraram, para os mutuantes, a avaliação do risco de incumprimento do contrato pela mutuária. Reitera-se, ainda, que ao contrário do que defende demoradamente a Apelante, o interesse económico dos bancos ao mutuar dinheiro aos seus clientes não se resume ou reconduz apenas ao recebimento de juros remuneratórios, pois a devolução do capital não fica coberta por tal remuneração e nem o risco daquele não ser devolvido está totalmente coberto pelo lucro decorrente da remuneração do mútuo.

Assim, tendo presente o fim económico do contrato em causa – de mútuo – é manifesto afirmar que seria desproporcional e infundado o exercício pela Autora do direito a ser reembolsada de quantias que lhe foram debitadas enquanto contrapartida de prorrogações relevantes de uma obrigação sua, de devolução de capital, que muito a beneficiou ao longo de mais de dez anos (se considerarmos apenas o período compreendido entre a data de vencimento da primeira obrigação de amortização de capital em setembro de 2004 e a data da prorrogação outorgada em 5 de fevereiro de 2015). Aceitar tal solução conduziria a um manifesto desequilíbrio das prestações correspetivas do contrato dos autos, tal como foram sendo alteradas ao longo da sua execução.

Já não se concorda com a afirmação pelos Réus de que ao não ressalvar ou expressar, nas alterações contratuais de 2015 (outorgadas em 5 de fevereiro e 8 de outubro) a não aceitação da cobrança dos valores já então debitados e que agora pede aos Réus, a Autora tenha omitido dever geral de boa-fé na execução do contrato.

É a nosso ver justificado, nesse momento, que a Autora não tenha feito qualquer ressalva ou comunicação sobre o crédito que ora se arroga.

As partes encontravam-se, então, em processo de negociação de prorrogações do contrato e, nesse contexto, de negociação, como no que se lhe seguiu e decorreu entre janeiro de 2017 e a liquidação final do mútuo, é justificado que a mutuária/devedora, que se encontrava até disposta a pagar novas contrapartidas pelas prorrogações que então pedia e negociava, não viesse discutir alegados créditos sobre os mutantes/credores, não sendo a omissão de qualquer manifestação desse direito, por si só, reveladora de algum tipo de reserva ou má-fé.

Desde logo estando a negociar-se contrapartidas consubstanciadas no estabelecimento de obrigação de pagamento pela mutuária de quantias superiores às inicialmente acordadas não era exigível, de acordo com os ditames da boa-fé, que a Autora, nesse processo negocial viesse afirmar que, afinal, não obstante estar até disposta a aumentar as suas obrigações, se sentia no direito de vir a pedir a devolução de quantias já pagas.

As exigências de boa-fé na execução do contrato devem ser aferidas em função da relação negocial concreta sendo de aceitar, no comércio jurídico, um certo grau de reserva ou astúcia nas negociações comerciais.

Em sede de negócios onerosos e desenvolvidos no âmbito da atividade económica de ambas as partes é de esperar que estas procurem estabelecer para si mesmas as melhores condições e contrapartidas.

Exige-se, contudo, também no âmbito das negociações tendentes à formação dos contratos que as partes atuem de boa fé, como resulta da previsão legal de responsabilidade civil decorrente da culpa na formação dos contratos prevista no artigo 227º do Código Civil que impõe que quem negoceia um contrato proceda de acordo com as regras da boa-fé. Socorrendo-nos das palavras do Acórdão da Relação e Lisboa de 3 de junho de 2001: “A culpa in contrahendo desempenha hoje um papel de relevo, quer pelas necessidades que veio satisfazer, quer pelos interesses que veio contemplar.
E um dos papéis que a culpa in contrahendo veio desempenhar foi o estabelecimento de um dever de segurança nas negociações do contrato, para que ninguém saísse prejudicado com a sua não concretização. Para além deste dever de segurança, na fase pré-contratual, outros deveres se perfilam como tanto ou mais importantes: o dever de informação e o dever de lealdade pré-contratuais, traduzidos, um e outro, na obrigação de os pré-contratantes não agirem com reserva mental, deixando de prestar toda a informação necessária à concretização do negócio, ocultando elementos importantes para o encontro de vontades, ou adoptando comportamentos desviantes em relação ao resultado final, quer assumindo atitudes que possam induzir em erro ou dificultar a apreensão do sentido do negócio, em suma, que possam causar danos injustificados à outra parte. A actuação de ambas as partes nos preliminares do negócio deve ser segura, leal, informativa, confiante, atendendo às circunstâncias concretas do negócio e à qualidade dos seus intervenientes. A tal propósito, fala-se em "tutela da confiança" e "primazia da materialidade subjacente", para concluir que, na fase da preparação dos contratos "as partes não devem suscitar situações de confiança que depois venham a frustrar ou, fazendo apelo ao direito de negociar livremente, permitirem actuações concretas, pelas quais não se julgam responsáveis". Como escreve o Prof. Menezes Cordeiro(1), estudos que seguimos de perto, "a presença, através da boa fé, dos valores profundos do ordenamento, na fase negocial preparatória, faculta à culpa in contrahendo horizontes alargados, que apenas aos poucos têm vindo a ser isolados pela doutrina". In contrahendo, ocorre uma especial proximidade entre as partes, que as coloca à mercê uma da outra. Em tais condições, compreende-se que surjam deveres de segurança (física e patrimonial), de lealdade (incluindo o sigilo e a não concorrência) e de informação (completa e verídica)". A boa fé e o sistema a tanto conduzem.”
[18].

Como salientado na passagem transcrita, a concretização do conceito indeterminado da boa-fé no que se refere à formação dos contratos apela a um conceito de ética negocial que deve ter em conta a natureza dos negócios e os concretos contornos da negociação em análise não se podendo esquecer que, no âmbito do comércio, o escopo é o lucro e que as relações comerciais se regem por regras de competitividade.

A concretização dos deveres em que se consubstancia a boa-fé durante a negociação há de ser alcançada, assim, pela observação dos interesses de cada uma e dos seus comportamentos e omissões durante essa negociação, tendo sempre em vista que é de esperar que cada parte cuide, em primeiro plano, dos seus próprios interesses. Ou seja, não é de exigir a cada uma das partes que, durante uma negociação, dê primazia aos interesses da contraparte e atue de forma a acautelá-los mesmo que em prejuízo dos seus.

No caso quer a Autora quer os Réus negociaram o mútuo e, depois, as suas prorrogações, no exercício das suas atividades comerciais, sendo de esperar que cada uma delas buscasse as condições mais vantajosas para o negócio.

Nos momentos em que decorreram negociações de prorrogação do mútuo por acordo, a situação de dependência financeira da Autora – num momento em que não se apresentava capaz de cumprir o estipulado quanto às amortizações de capital e se dispunha a pagar mais juros com vista a obter a prorrogação dessa obrigação -, e o facto de a mesma estar, com as Rés, numa relação contratual que para todas representava avultado interesse económico são, a nosso, ver, suficientes para que se tenha por aceitável um comportamento negocial como o que a Autora assumiu, de não manifestação expressa de que se entendia titular de um qualquer direito de crédito sobre os Réus. Desde logo porque não se pode afirmar que tal omissão, nesse momento, tenha decorrido de deliberada reserva ou ardil sendo de aceitar que, ao tempo, a Autora não pretendesse, de facto vir, a repetir o que entendia ter-lhe sido indevidamente cobrado.

Do que decorre que da omissão de declaração de existência de alegado crédito da Autora, em 2015 e em 2017, no âmbito de negociações para a celebração de novos acordos de prorrogação, não se possa, por si só, retirar a qualificação do exercício, posterior, do direito a pedir essas quantias como manifestamente excessivo.

Era de esperar que nessas negociações cada uma das partes curasse dos seus interesses, ponderando, em face do acordo que visavam atingir, o que pretendiam e aquilo de que estavam dispostos a prescindir. A não referência expressa, nesse momento, de negociação, a um eventual direito da Autora a ser reembolsada de valores que ora pede, não se afigura como reprovável desconsideração do interesse da contraparte, nem se pode afirmar que constituiu (naquele momento) censurável reserva ou ocultação por banda da Autora.

É que, em face do que então pretendia – novas prorrogações do prazo de vencimento da obrigação de pagamento do capital – e do que estava disposta a prestar – pagamento de juros remuneratórios calculados com base em percentagem muito superior -, a Autora claramente não ponderava, nesse momento, vir a exigir a restituição do que agora afirma ter-lhe sido indevidamente cobrado.

Já o mesmo não sucede, porém, quanto ao momento de liquidação das obrigações decorrentes do mútuo, altura em que a Autora - tendo já obtido junto a um terceiro banco um financiamento destinado a liquidar os valores em débito e fazer cessar o contrato objeto dos autos -, não tinha qualquer razão justificativa para não afirmar logo a sua pretensão de ser reconhecida como credora das quantias que ora pede, desde logo exercendo ou procurando exercer a compensação desse seu crédito no momento da liquidação ou, pelo menos, ressalvando a sua pretensão de vir a exigir tais quantias.

A Autora liquidou as Réus os valores que estes lhe demandaram, deixando-os calcular os tais montantes sem afirmar desde logo que entendia ser credora de quantias indevidamente cobradas ao longo da relação contratual.

Se durante o processo negocial tendente a alcançar um acordo que fosse ao encontro dos interesses económicos de ambas as partes se pode julgar aceitável e, portanto, não violador da boa-fé, que a Autora, enquanto credora, não exigisse quantias que entendia serem-lhe devidas pois estava até disposta a pagar aos Réus valores superiores aos até então cobrados - com vista a alcançar o desejado acordo de prorrogação -, no momento em que os credores lhe solicitam o pagamento dos seus débitos já era exigível que a Autora viesse, também ela, manifestar a pretensão de exigir os seus por estar então definitivamente frustrada a possibilidade de se alcançar o acordo que poderia justificar que a Autora estivesse disposta a prescindir do seu crédito.

Assim é de concluir que se durante as negociações de prorrogações contratuais durante a vigência do contrato é de considerar adequado que ambas as partes fizessem mútuas e recíprocas concessões ou abdicassem de exigir nesse momento quantias a que achavam ter direito, frustrado o acordo que as negociações visavam alcançar já se afigura exigível, de acordo com os ditames da boa-fé, que ambas as partes viessem pedir aquilo a que entendiam ter direito.

Foi o que fizeram os Réus, mas não fez a Autora, pelo que aqueles apresentaram a esta a proposta de liquidação de certos e determinados montantes (que a mesma pagou), na convicção de que assim cessavam todas as obrigações emergentes do contrato, sem poderem ter em consideração ao liquidar tais quantias, pelo menos, que a Autora, afinal, entendia que era credora de valores pecuniários que lhes viria ainda a exigir.

Assim, quer porque o equilíbrio das prestações, sinalagmáticas, do contrato ficaria frustrado caso a Autora viesse a poder beneficiar de constantes prorrogações do prazo de amortização sem ter de suportar a contrapartida para tanto pretendida pelos Bancos, quer porque no momento da liquidação do mútuo a Autora omitiu totalmente qualquer manifestação de que se entendia credora de montantes que a seu ver tinham sido indevidamente cobrados, deve concluir-se ser manifestamente abusivo o exercício nessa ação do direito de peticionar a devolução de quantias que durante vários anos pagou sem manifestar desacordo e que visavam, no caso do aumento da percentagem do spread, equilibrar as prestações contratuais face à alteração de prazos de vencimento das suas obrigações de pagamento que sucessivamente pediu e de que beneficiou.

Pelo que serão os Réus absolvidos de todos os pedidos relativos a valores que cobraram à Autora a título de comissões e de juros.


***

4. d) Cabe agora apreciar se a Banco 1... aceitou, em maio de 2017, a prorrogação do prazo de vencimento do mútuo por cinco anos ou, assim não se entendendo, violou a boa-fé rompendo as negociações com a Autora com vista à prorrogação do mútuo por cinco anos, mediante alteração unilateral das condições antes aceites para a sua prorrogação, e, assim, frustrou expetativa jurídica da mesma que seja merecedora de tutela (ponto 4. e) das questões a resolver).

A resposta, negativa, a esta questão radica na ausência de factos provados que a suportem, ou seja, na manifesta insuficiência da matéria de facto alegada para sustentar tal conclusão.

Quanto à questão da alegada aceitação pela Banco 1... da prorrogação antes das trocas de emails dada por provada nas alíneas FF) a HH) e JJ) a QQ) não ficou de todo provada, tendo sido tal matéria objeto de reapreciação neste acórdão e não tendo a apelante A..., SA logrado a pretendida alteração da matéria de facto pertinente.

Acresce que a mera leitura desses emails  revela, à saciedade, que o acordo de prorrogação que então se negociava e redundaria em celebração de nova alteração do mútuo inicial, não estava concluído pois, como prevê o artigo 232º do Código Civil “O contrato não fica concluído enquanto as partes não houverem acordado em todas as cláusulas sobre as quais qualquer delas tenha julgado necessário o acordo.”.

Ora, o que os emails dados por provados nas alíneas FF) a HH) e JJ) a QQ revelam é que ocorreram sucessivas propostas e contrapropostas entre as partes até que a Autora, em 27-03-2018, comunicou aceitar uma proposta, genérica, que lhe foi enviada pela Banco 1... em 01-02-2018.

Como estipula o artigo 233º do Código Civil, até então as “aceitações” provadas “com aditamentos, limitações ou outras modificações” devem considerar-se equivalentes a novas propostas, por serem suficientemente precisas as alterações sugeridas – foi o que aconteceu, por exemplo, por via do email de 20-12-2017 em que, como resulta da alínea JJ): “(…) a Banco 1... transmitiu à A. que aceitava prorrogar o mútuo por 5 anos, nas seguintes novas condições: (i) pagamento do capital: 30% nos anos 2018 e 2019, 20% no ano de 2020 e 10% nos anos de 2021 e 2022 (ii) distrate das hipotecas dos imóveis vendidos de forma casuística, isto é, sem ser de acordo com o mapa de valores de distrates de hipotecas por fração (…)”. Foi o que aconteceu, também, a 20-12-2017, em que, como provado na alínea KK) a Autora fez uma contraproposta.

Afirma, ainda, a Autora, que a Banco 1... rompeu com as negociações de forma abrupta ao alterar unilateralmente condições que propusera e a Autora aceitara.

Ora, do cotejo entre a proposta da Banco 1... dada por provada na alínea LL) – única que a Autora aceitou sem lhe introduzir modificações ou condições -, e a minuta enviada a 27-03-2018, não se descortinam diferenças que permitam concluir que houve uma alteração abrupta e unilateral das condições já aceites. O que ocorreu foi uma concretização de condições antes propostas na generalidade – e nesses termos aceites.

Vertidas tais condições numa proposta de minuta do acordo escrito, agora com a redação mais concretizada do que antes se estabelecera genericamente, é manifesto que a redação proposta pela Banco 1... contém o que fora já proposto e aceite: “Prorrogação por 5 anos (até 12.03.2022), com obrigatoriedade de amortização anual da dívida nos seguintes termos: 20% em 2018 e 2019; 25% em 2020, 20% em 2021 e 15% em 2022; (ii) Spread-5%; (iii) Juros: pagamento mensal em vez de semestral; (iv) Consignação de receitas (das rendas de prédios)” e ainda outras cláusulas como a que a própria Autora já aceitara e manifestara expressamente acordar em face da proposta de 20-12-2017. Estava já assente, nomeadamente, a condição de que todas as vendas implicariam o cancelamento de hipoteca e a amortização antecipada do respetivo capital, bem como que a mutuária ficaria isenta do pagamento de qualquer comissão.

A cláusula que, na proposta de minuta estipulou a faculdade dos mutuantes compensarem os seus créditos com valores depositados em quaisquer contas à ordem da Autora não constitui também novidade estando tal possibilidade já prevista na cláusula 10º do contrato inicial.

Assim, apenas as cláusulas propostas em 25-06-2018 que prevêem a possibilidade de cessão de créditos a terceiros e a dispensa de sigilo bancário em relação a estes ou a outras empresas dos grupos empresariais a que pertencem os Bancos não resultam de nenhuma das propostas e contrapropostas que foram antes transmitidas por escrito entre as partes.

Deve ter-se presente, contudo, que a proposta da Banco 1... (de 01-02-2018) que a Autora aceitou em 27-03-2018 nos termos do email a que se refere a alínea LL), referia expressamente que as condições ali expressas eram “genericamente” enunciadas sem prejuízo de reunião que as partes tinham já agendada para 5 de fevereiro.

Ou seja, não pode, na comparação entre a proposta de minuta enviada a 25-06-2018 pela Banco 1..., já depois de concertação da mesma com o Banco 2..., e as condições que genericamente propusera à autora em 01 de fevereiro, concluir-se que aquelas contrariam ou modificaram substancial e abruptamente estas últimas.

Não resultando dos factos provados que tenha ocorrido uma rutura abrupta das negociações por via de uma alteração unilateral e abusiva das condições já aceites pela Autora não se vislumbra também, pelas razões já antes expressas e relativas à recusa de redução da garantia hipotecária e à análise do (des)equilíbrio das prestações contratuais em face das sucessivas prorrogações dos prazos de vencimento da obrigação de restituição do capital mutuado, qualquer violação por banda dos Réus, mormente da Banco 1..., de deveres de boa- fé na negociação que mantiveram com a Autora com vista a prorrogar o mútuo.

Pelo contrário, como salientado na sentença recorrida, os Bancos Réus mostraram abertura negocial, mantendo tal possibilidade de prorrogação em discussão meses depois de se ter, de facto, ultrapassado o prazo de vencimento do mútuo, e atrasaram, internamente, por curtos mas sucessivos períodos de tempo, a consideração desse vencimento, assim permitindo evitar a cobrança do capital mutuado e adiar as obrigatórias comunicações de incumprimento ao Banco de Portugal, que ocorreram, na verdade, muito depois do devido não fossem tais prorrogações.

Acresce afirmar que a qualificação da conduta da Banco 1... como violadora da boa-fé que a Autora pretendia visava fundamentar a sua responsabilização pela indemnização de danos que, tampouco, ficaram provados.

Assim, improcede, tal pretensão, e, na sua totalidade a ação, dado o que acima se decidiu a propósito dos demais pedidos e causas de pedir que eram objeto deste recurso.

A apelação da Banco 1...

Quer porque procedeu a censura dirigida pela apelante Banco 1... à matéria de facto com a consequente alteração da alínea BBBB), quer porque já acima se concluiu ser abusivo o exercício pela autora do direito a pedir a restituição das quantias que entende terem sido indevidamente cobradas, quer também, porque apenas se julgou não devido o pagamento pela mutuária de comissões relacionadas com o empréstimo (mas não com a constituição ou extinção da hipoteca e avaliação dos imóveis hipotecados) até 5 de fevereiro de 2015, é manifestamente de fazer proceder a apelação da Banco 1....

De facto, a condenação da mesma no pagamento de 7 906, 96 € decorria da alegada dupla cobrança de comissões de alteração contratual (3 746, 96 €) e flat finex (4 160 €). Ora, apurou-se que o valor de 3.746,96 foi cobrado a título de imposto de selo sobre a utilização de capital e que não ocorreu dupla cobrança de nenhum desses montantes.

Assim, remetendo para o que acima se afirmou quando se apreciou a pretensão da Autora de ver as Rés condenadas no pagamento de valores debitados a título de comissões bancárias, nenhum destes valores lhe deve ser devolvido. Não se tratam de comissões que se possam afirmar resultantes do empréstimo e nem foram cobradas antes de 5 de fevereiro de 2015.

Revoga-se, assim, a sentença, nesta parte, mantendo-se a condenação da Banco 1... apenas no restante segmento decisório relativo ao valor indevidamente cobrado em 01-08-2018 a título de juros vencidos.

V – Decisão:

Nestes termos, acorda-se em:

1 - Julgar improcedente a apelação da A..., SA;

2- Julgar procedente a apelação da Banco 1..., SA, e em consequência revogar a sentença, absolvendo a mesma do pagamento da quantia de 7 906, 96 € em que fora condenada, mantendo-se, no mais, o decidido.

Custas de ambas as apelações pela A..., SA, nos termos do previsto no artigo 527º, número 1 do Código de Processo Civil, sendo as custas da ação a suportar pela Autora e pela Ré Banco 1..., SA, na proporção dos seus decaimentos.





Porto, 18/3/2024.
Ana Olívia Loureiro
Carlos Gil
Ana Paula Amorim
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[1] Neste sentido e com relevante análise da (ir)relevância dos factos não provados em sede de sentença, se pronuncia o acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 10-01-2019 em cujo sumário se pode ler: “Da circunstância de um facto não se ter provado, não é legítimo retirar a prova do facto inverso, contrário ou menor, devendo a decisão ser proferida como se esse facto não tivesse sido sequer alegado, aplicando-lhe as regras do ónus da prova.”.
Disponível em:
https://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/b94bb4c6583917e1802583b50036a1a0?
[2] Recursos em Processo Civil, Almedina, 7ª edição, página 354.
[3] Código de Processo Civil Anotado, Coimbra Editora, 3ª edição, Volume III, páginas 210 a 218
[4] O que consubstanciaria, esta sim, a alegação de um facto material (em contraponto com aceitação, enquanto facto jurídico).
[5] Decorre da cláusula décima da alteração de 5 de fevereiro de 2015 que “1 - A presente alteração produz os seus efeitos:- desde 12-09-2016 no que se refere à interrupção do período de amortização do capital; - e desde 12-03-2012 no que se refere ao prazo global do empréstimo. 2 – As restantes alterações contratuais produzem efeitos desde a presente data”. Decorre, por sua vez, da cláusula décima primeira da alteração de 8 de outubro de 2015 que a mesma produz efeitos retroativos à data de 12-03-2015.
[6] Estudos Sobre o Novo Processo Civil, Lex, Páginas 70 a 72.
[7] Segundo Lopes do Rego (Comentários ao Código de Processo Civil, vol. I, 2004, Almedina, páginas 252 e 253), factos essenciais são os que concretizando, especificando e densificando os elementos da previsão normativa em que se funda a pretensão do autor ou do reconvinte, ou a exceção deduzida pelo réu como fundamento da sua defesa, se revelam imprescindíveis para a procedência da ação, da reconvenção ou da exceção; factos instrumentais são os que se destinam a realizar prova indiciária dos factos essenciais, já que através deles se poderá chegar, mediante presunção judicial, à demonstração dos factos essenciais correspondentes – assumindo, pois, em exclusivo uma função probatória e não uma função de preenchimento e substanciação jurídico-material das pretensões e da defesa.
[8] Que, diga-se desde já, continuaram de facto, como abundantemente resulta da matéria de facto tendo sido apenas dadas por findas já no ano seguinte por força da recusa da Autora em aceitar condições então propostas pelos Bancos ao minutarem o acordo a subscrever.
[9] Embora seja questão de direito parece-nos relevante convocar aqui o disposto no artigo 233º do Código Civil que estatui que “(…) a aceitação com aditamentos, limitações ou outras modificações constitui rejeição da proposta; mas, se a modificação for suficientemente precisa, equivale a nova proposta, conquanto outro sentido não resulte da declaração.”.
[10] Segundo Ana Prata (in Dicionário Jurídico, volume I, Almedina, 6ª edição) a retroatividade é a caraterística de um facto jurídico que produz efeitos quanto ao passado.
[11] Recursos em Processo Civil, Almedina, 7ª edição atualizada, página 358.
[12] Manual de Direito Bancário, Almedina, 3ª edição, página 432.
[13] Afirma Paula Ponces Camanho, em Do contrato de Depósito Bancário, Almedina, página 226, que “O banco pode ter créditos sobre o cliente, podendo a sua origem ser a mais diversa. Podem tais créditos resultar de um empréstimo contraído pelo cliente perante aquela instituição de crédito, ou de serviços que esta prestou, mas pelos quais o cliente não pagou a remuneração acordada”.
[14] Paula Ponces Camanho, op. cit, página 226, afirma: “Os requisitos de que a lei faz depender a compensação legal parecem verificar-se neste caso. Entre o banco e o cliente há uma reciprocidade de créditos: o banco é devedor do cliente em virtude do contrato de depósito bancário e é seu credor por causa de um empréstimo contraído (…); o crédito ativo é válido, exigível e exequível; o objeto das obrigações é fungível (dinheiro) e verifica-se ainda o requisito da existência e validade do crédito principal (depósito à ordem).”. O contrato dos autos previa expressamente, na sua cláusula 10ª tal possibilidade de compensação de créditos da mutuante por débito de quantias depositadas em qualquer conta da mutuária aberta nos Bancos credores.
[15] Nas palavras do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29-04-2004: “1.O contrato de depósito bancário consiste, fundamentalmente, na entrega de certa quantia a um banco para que ele o guarde e restitua mais tarde, podendo, entretanto, o banco, utilizar o montante entregue, usualmente remunerada com o pagamento de juros convencionados. 2. Todavia, a utilização pelo banco dos montantes depositados, legalmente permitida e constitutiva da própria noção do depósito bancário, deve pautar-se pelas normas de utilização dos depósitos e pelas respectivas normas estatutárias ou usos bancários a que alude o art. 407º do C. Comercial, não podendo o banco, sem expressa anuência do depositante, dar-lhe outro fim diferente daqueles. 3. As contas à ordem, também denominadas contas à vista, são aquelas em que os depósitos são exigíveis a todo o tempo, como determina o n. 1 do art. 1º do Dec.lei 430/91, de 2 de Novembro, pelo que a qualquer momento os seus titulares têm a faculdade de exigir do banco o pagamento, total ou parcial, do seu crédito, banco que, por sua vez, é obrigado a ter o montante respectivo à disposição do titular”.
Disponível em:
http://www.gde.mj.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/bc36ae12930616ec80256fea0027eab7?OpenDocument
[16] Declaração Tácita e Comportamento Concludente no Negócio Jurídico, Almedina, páginas 124 e 125.
[17] Op. cit, página 131.
[18] Disponível em: https://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/-/8396FC104A168A2580256B2700560629.