ARBITRAGEM VOLUNTÁRIA
NOMEAÇÃO DE ÁRBITROS
RECURSO DE REVISTA
DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO
OBJETO DO RECURSO
OMISSÃO DE PRONÚNCIA
EXCESSO DE PRONÚNCIA
NULIDADE DE DESPACHO
PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO
Sumário


I – O art. 10º/7 da Lei de Arbitragem Voluntária (Lei nº 63/2011) afasta a recorribilidade das decisões de designação de árbitro(s) pelo tribunal estadual competente, isto é, das decisões de escolha, em si mesma, de árbitro(s), mas não das decisões que, alegadamente, ofendam os pressupostos dessa competência, designadamente, decisões de recusa por haver dúvidas sobre a obrigatoriedade do recurso à arbitragem.
II – Funcionando o tribunal da relação como tribunal de 1ª instância, no recurso de apelação interposto para o Supremo Tribunal de Justiça podem ser impugnadas decisões colegiais (acórdãos) ou, decisões singulares.
III – A omissão de pronúncia constitui uma nulidade da decisão judicial, prevista no art. 615°/1/d/1ª parte, do CPCivil, quando o tribunal deixe de se pronunciar sobre questões que deva apreciar.
IV – Não podendo o juiz conhecer de causas de pedir não invocadas, nem de exceções, não invocadas, que estejam na exclusiva disponibilidade das partes, é nula a sentença em que o faça (art. 615°/1/d/2ª parte).
V – Há excesso de pronúncia sempre que a causa do julgado não se identifique com a causa de pedir ou, o julgado não coincida com o pedido.
VI – O princípio do contraditório, que se reporta aos factos invocados e às posições assumidas pelas partes, é hoje entendido como um direito de participação efetiva das partes no desenvolvimento de todo litígio, mediante a possibilidade de influírem em todos os elementos que se encontrem em ligação com o objeto da causa e que em qualquer fase do processo apareçam como potencialmente relevantes para a decisão.
VII – Só há nulidade processual quando o vício respeita ao ato como trâmite, não ao ato como expressão de uma decisão do tribunal ou de uma posição da parte.
VIII – Para se impedir dilações na constituição do tribunal arbitral, o procedimento de nomeação de árbitro(s) previsto no art. 10º/4, da Lei de Arbitragem Voluntária, destina-se única e exclusivamente à designação do árbitro, devendo quaisquer outras questões ser suscitadas perante o tribunal arbitral.
IX – O processo de designação de árbitro(s) pelo tribunal estadual competente, destina-se exclusivamente à designação de árbitro(s) em falta, não cabendo, no seu âmbito, ao tribunal estadual, apreciar outras questões, nomeadamente, sobre a convenção de arbitragem, sua interpretação e redação, porquanto cabe ao tribunal arbitral aferir e decidir da sua competência para arbitrar o litígio.
X – Nos recursos devem ser conhecidas todas as questões que as partes tenham submetido à apreciação do Tribunal, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, o que se afere caso a caso.

Texto Integral

RECURSO DE APELAÇÃO1,2,313/24.7YRPRT.S1

APELANTE4M..., Hotel & Resorts,Lda.
APELADA5A... - Construções, Lda.


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SUMÁRIO6,7


I – O art. 10º/7 da Lei de Arbitragem Voluntária (Lei nº 63/2011) afasta a recorribilidade das decisões de designação de árbitro(s) pelo tribunal estadual competente, isto é, das decisões de escolha, em si mesma, de árbitro(s), mas não das decisões que, alegadamente, ofendam os pressupostos dessa competência, designadamente, decisões de recusa por haver dúvidas sobre a obrigatoriedade do recurso à arbitragem.

II – Funcionando o tribunal da relação como tribunal de 1ª instância, no recurso de apelação interposto para o Supremo Tribunal de Justiça podem ser impugnadas decisões colegiais (acórdãos) ou, decisões singulares.

III – A omissão de pronúncia constitui uma nulidade da decisão judicial, prevista no art. 615°/1/d/1ª parte, do CPCivil, quando o tribunal deixe de se pronunciar sobre questões que deva apreciar.

IV – Não podendo o juiz conhecer de causas de pedir não invocadas, nem de exceções, não invocadas, que estejam na exclusiva disponibilidade das partes, é nula a sentença em que o faça (art. 615°/1/d/2ª parte).

V – Há excesso de pronúncia sempre que a causa do julgado não se identifique com a causa de pedir ou, o julgado não coincida com o pedido.

VI – O princípio do contraditório, que se reporta aos factos invocados e às posições assumidas pelas partes, é hoje entendido como um direito de participação efetiva das partes no desenvolvimento de todo litígio, mediante a possibilidade de influírem em todos os elementos que se encontrem em ligação com o objeto da causa e que em qualquer fase do processo apareçam como potencialmente relevantes para a decisão.

VII – Só há nulidade processual quando o vício respeita ao ato como trâmite, não ao ato como expressão de uma decisão do tribunal ou de uma posição da parte.

VIII – Para se impedir dilações na constituição do tribunal arbitral, o procedimento de nomeação de árbitro(s) previsto no art. 10º/4, da Lei de Arbitragem Voluntária, destina-se única e exclusivamente à designação do árbitro, devendo quaisquer outras questões ser suscitadas perante o tribunal arbitral.

IX – O processo de designação de árbitro(s) pelo tribunal estadual competente, destina-se exclusivamente à designação de árbitro(s) em falta, não cabendo, no seu âmbito, ao tribunal estadual, apreciar outras questões, nomeadamente, sobre a convenção de arbitragem, sua interpretação e redação, porquanto cabe ao tribunal arbitral aferir e decidir da sua competência para arbitrar o litígio.

X – Nos recursos devem ser conhecidas todas as questões que as partes tenham submetido à apreciação do Tribunal, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, o que se afere caso a caso.



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ACÓRDÃO8



Acordam os juízes da 1ª secção (cível) do Supremo Tribunal de Justiça:

1. RELATÓRIO

M..., Hotel & Resorts,Lda., requereu junto do Tribunal da Relação do Porto a nomeação de árbitro, em substituição da sociedade, A... - Construções, Lda., a qual se recusou a proceder à designação de árbitro que lhe cabia escolher.

O Presidente do Tribunal da Relação do Porto, por ter dúvidas sobre a convenção de arbitragem, indeferiu a requerida nomeação de árbitro.

Inconformada, veio a requerente interpor recurso de apelação deste despacho, tendo extraído das alegações9,10 que apresentou as seguintes


CONCLUSÕES11:


A. O presente recurso tem por objeto a decisão sumária, proferida em primeira instância, pelo Exmo. Senhor Presidente do Tribunal da Relação, que julgou improcedente o pedido de nomeação de árbitro de parte, interposto pela aqui Recorrente ao abrigo do disposto no artigo 10.º, n.º 4, e 59.º, n.º 1, alínea a), e n.º 3 da Lei da Arbitragem Voluntaria (“LAV”).

B. O recurso é interposto como de apelação, por se referir a decisão proferida em 1.ª instância e é apresentado por mera cautela inerente ao dever de patrocínio, uma vez que o artigo 10.º da LAV não prevê, atualmente, o meio próprio de reação a uma situação inusitada e não prevista como a presente, como acontecia com o n.º 4 do artigo 12.º, n.º 4, da Lei n.º 31/86 de 29 de agosto, pelo que a Recorrente, não obstante ter apresentado, no passado dia 6 de fevereiro de 2020, reclamação para conferência, por entender ser o meio de reação adequado a uma decisão sumária, vem submeter as presentes alegações de recurso à apreciação deste Venerando Tribunal, acautelando, assim, uma eventual não admissão pela Relação do Porto da Reclamação submetida, por inadmissibilidade da mesma e o decurso do prazo de recurso da decisão sumária em crise.

C. Em 17 de novembro de 2023, a Recorrente enviou à Recorrida um requerimento de constituição de tribunal arbitral e convite para nomeação de árbitro de parte, tendo em vista a resolução do litígio relacionado com a execução do contrato de empreitada para a “Reabilitação e Ampliação de Estabelecimento Hoteleiro”, que aquela adjudicou a esta, na qualidade de Dona de Obra e Empreiteiro, respetivamente, nos termos do disposto nos artigos 10.º, n.º 1, e 33.º, n.º 1, da LAV e da convenção de arbitragem celebrada entre as Partes.

D. A convenção de arbitragem é a que consta da cláusula compromissória plasmada nas cláusulas 16.ªs do Contrato de Empreitada, sob a epígrafe “Litígios e Contencioso”, nos termos que a seguir se reproduzem: “1- A resolução de todas as divergências ou questões emergentes do contrato, sua interpretação e aplicação, procurarão ser resolvidas por ambas as outorgantes, através da livre negociação de boa-fé. 2- No caso de a faculdade prevista no artigo anterior não se revelar por si só suficiente para a resolução a contento das partes, os outorgantes podem ainda, se o entenderem, submeter todas as questões a um Tribunal Arbitral, que funcionará na sede da primeira outorgante”.

E. Em resposta, a Recorrida, por carta datada de 5 de dezembro de 2023, recusou-se, expressa e categoricamente, a efetuar a nomeação que lhe competia, assim incumprindo o disposto no artigo 10.º, n.º 1, da LAV e na convenção de arbitragem celebrada pelas partes e ínsita nas cláusulas 16.ª dos contratos outorgados.

F. Uma vez que a Recorrida se recusou a nomear árbitro e obstou ao prosseguimento da arbitragem promovida pela Recorrente, esta foi obrigada a solicitar ao Exmo. Senhor Presidente do Tribunal da Relação do Porto a nomeação de árbitro de parte, o que fez, em 20 de dezembro de 2023, nos termos e ao abrigo do procedimento previsto no artigo 10.º, n.º 4, e 59.º, n.º 1, alínea a) da LAV: a pretensão da Recorrente, nos presentes autos, limitava-se, por isso, à nomeação de árbitro pelo Exmo. Senhor Presidente do Tribunal da Relação do Porto, em lugar da ora Recorrida.

G. Em 29.01.2024, foi proferida decisão sumária pelo Exmo. Senhor Presidente do Tribunal da Relação do Porto; pode ler-se na referida decisão sumária: “Julgamos, portanto, que existem, pelo menos, dúvidas sobre a obrigatoriedade do recurso à arbitragem. O mais correto, a nosso ver, será permitir que, em sede judicial – note-se que o conflito foi já espoletado junto dos tribunais comuns -, se decida de tal questão, ou seja, se determine, ou não, da necessidade de constituição arbitral e, só depois se proceda à nomeação dos respetivos juízes árbitros”. “Reitere-se que, mal ou bem, uma ação judicial foi já interposta e corre seus termos”. “Além disso, a interpretação literal do acordo escrito induz uma leitura favorável à requerida na medida em que, na prática, pese embora a referência ao dirimir arbitral, certo é que a expressão “se assim entenderem” torna inócuo aquele compromisso”. “Donde, neste contexto, sem prejuízo do que, eventualmente, se venha a determinar, em sede jurisdicional, sobre a natureza do tribunal competente para dirimir os conflitos ora em apreço, decide-se: Indeferir a pretensão formulada” (sublinhado nosso).

H. Verifica-se assim, que a Decisão o Presidente do Tribunal da Relação: (i) se debruçou sobre o teor e a interpretação da convenção da arbitragem, no sentido de aferir a eventual competência ou incompetência de um Tribunal Arbitral para dirimir um conflito, e, em consequência, da necessidade ou desnecessidade de nomeação de árbitro, e (ii) “nesse contexto” indeferiu a pretensão formulada.

I. Com efeito, o Exmo. Senhor Presidente do Tribunal da Relação ignorou totalmente o pedido formulado pela Recorrente, anuiu a recusa da Recorrida em nomear o árbitro que lhe competia e desrespeitou o previsto no artigo 10.º da LAV.

J. Tendo o Exmo. Senhor Presidente do Tribunal Relação do Porto entendido que existiam “dúvidas sobre a obrigatoriedade do recurso à arbitragem” e, com tal fundamento, indeferido a pretensão da Requerente (aqui Recorrente), inquinou a decisão sumária recorrida de nulidades e erros de julgamento, os quais, em suma, constituem o objeto do presente recurso de apelação.

K. Determina o artigo 10.º, n.º, 4, da LAV que “se, no prazo de 30 dias a contar da receção do pedido que a outra parte lhe faça nesse sentido, uma parte não designar o árbitro ou árbitros que lhe cabe escolher (…), a designação do árbitro (…) em falta é feita, a pedido de qualquer das partes, pelo tribunal estadual competente”.

L. Assim, se uma Parte não nomear o co árbitro, essa responsabilidade passa para o tribunal estadual competente.

M. Acompanha-nos a doutrina e a jurisprudência e não se conhecem opiniões e decisões em sentido contrário.

N. Assiste ao Presidente do Tribunal da Relação competente o dever de (i) nomear o árbitro e (ii) fazer observar as diligências prévias que entender necessárias para cumprir aquele dever de nomeação.

O. Neste sentido, prescreve o n.º 6 do preceito que, “quando nomear um árbitro, o tribunal estadual competente tem em conta as qualificações exigidas pelo acordo das partes para o árbitro ou os árbitros a designar e tudo o que for relevante para garantir a nomeação de um árbitro independente e imparcial”.

P. O procedimento é, pois, muito simples: submetido um litigio a arbitragem e sendo a parte convidada a designar o árbitro de sua nomeação, esta dispõe de 30 dias para o fazer, sob pena de esse poder ser transferido para o tribunal estadual competente se a parte contrária solicitar essa nomeação, o qual, constatada a recusa da nomeação ou a ultrapassagem do prazo para o efeito, tem de promover a nomeação, em respeito pelo n.º 6 do artigo 10.º, podendo, caso assim o entenda, ouvir as partes sobre os requisitos a considerar em tal nomeação.

Q. Não é conferido ao tribunal estadual qualquer poder de apreciação dos motivos da recusa ou da ultrapassagem do prazo pela parte contrária, só lhe é transferida uma obrigação, um poder-dever, de nomeação.

R. A postura da Recorrida é, pois, claramente, dilatória e de obstrução à arbitragem, sendo certo que o argumento por si aduzido para justificar a não nomeação, poderia e deveria sempre ser suscitado na arbitragem promovida, e em curso, cabendo ao Tribunal Arbitral – e só a este, com preterição de qualquer outro – apreciar os fundamentos invocados a respeito de uma eventual incompetência do Tribunal Arbitral e decidir a questão (cf. artigos 5.º e 18.º da LAV).

S. A decisão de não nomeação configura, por isso, um caso evidente de omissão de pronúncia.

T. De acordo com o disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, é nula a sentença quando “o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar”.

U. Esta é claramente a situação do normativo da LAV: o artigo 10.º, n.º 4 prevê expressamente a nomeação pelo Tribunal Estadual; o referido normativo não prevê qualquer exceção ao dever de nomeação do tribunal estadual, não prevê qualquer juízo sobre o merecimento da pretensão ou determina qualquer outro caminho que possa ser seguido que não seja o da concretização da nomeação, apenas conferindo margem para diligenciar previamente no sentido de conseguir efetuar a nomeação pretendida.

V. A pretensão da Recorrente deveria, por isso, ter sido apreciada e deferida, e não o foi, em violação daquele n.º 4 do artigo 10.º da LAV – o que determina a nulidade da decisão, nos termos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea d) do CPC.

W. Assim, e em face do supra exposto, deve ser declarada a referida nulidade da Decisão e, em consequência, ser nomeado o árbitro em falta por este Venerando Tribunal.

X. Ademais, a Decisão Singular padece ainda de uma outra nulidade: a decisão proferida conheceu de questões de que não podia conhecer, ou seja, ocorre a nulidade geralmente designada por excesso de pronúncia.

Y. De acordo com o disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, é nula a sentença quando «o juiz [...] conheça de questões de que não podia tomar conhecimento». Trata-se de vício da sentença que resulta da inobservância, pelo tribunal, do disposto no n.º 2 do artigo 608.º e no n.º 1 do artigo 609.º do CPC, segundo os quais o juiz não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras, e não pode a sentença condenar em quantidade superior ou em objeto diverso do que se pedir.

Z. E como já se referiu abundantemente, o presente processo é somente um processo de nomeação de árbitro regulado no artigo 10.º, n.º 4, da LAV.

AA. Pela Recorrente foi solicitado ao Exmo. Senhor Presidente do Tribunal da Relação que nomeasse o árbitro de parte; a decisão de nomeação é vinculativa e não facultativa; trata-se de um poder-dever e não de um processo jurisdicional de apreciação da pretensão formulada.

BB. Este entendimento é o único compatível com o regime da competência da competência do tribunal arbitral consagrado na LAV (nos seus arts. 5.º e 18.º), segundo o qual o tribunal arbitral goza de prioridade na apreciação da sua competência.

CC. De acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 18.º da LAV, “o tribunal arbitral pode decidir sobre a sua própria competência”.

DD. Este preceito dá letra de lei a um princípio fundamental do processo arbitral: o princípio da competência-competência (kompetenz-kompetenze na nomenclatura alemã, de onde provém o conceito).

EE. Não podia o Tribunal Estadual ter-se debruçado sobre a convenção de arbitragem, sua interpretação e redação, nem podia ter decidido, como decidiu, porquanto cabe ao Tribunal Arbitral a competência, em primeira linha, para a ferir e decidir da sua competência para arbitrar o litígio entre as Partes – e não podia, porque, como vertido no artigo 19.º da LAV, “nas matérias reguladas pela presente lei, os tribunais estaduais só podem intervir nos casos em que esta o prevê”.

FF. Tendo conhecido de tal questão e nela se fundamentando, a decisão proferida padece de nulidade, nos termos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea d) do CPC; pelo que deve ser declarada a referida nulidade decisória e, em consequência, ser nomeado nos presentes autos o árbitro em falta por este Venerando Tribunal.

GG. A acrescer, a decisão de aplicação do regime legal relativo ao processo de suprimento ao pedido de nomeação de árbitro (por despacho de 11.01.2024, não notificado à ora Recorrente) levou o Exmo. Senhor Presidente do Tribunal da Relação a convidar a Recorrida a exercer o contraditório sobre “o pedido formulado”, o que não poderia, nem deveria ter sucedido, com a amplitude em que o foi.

HH. A finalidade e a formulação em termos normativos do princípio do contraditório implicam que, em caso de manifesta desnecessidade e naqueles em que, objetivamente as partes não podem alegar, de boa-fé, desconhecimento das questões de direito ou de facto a decidir pelo juiz e das suas consequências, a audição das partes será de dispensar [artigos 3.º do CPC, 20.º, n.º 4 da CRP e 30.º, alínea c) da LAV]).

II. Ora a factualidade carreada para os autos, em particular aquela posição da requerida de recusa expressa de nomeação do árbitro, bastava, por si só, para que, sem qualquer contraditório, o Exmo. Senhor Presidente do Tribunal da Relação tivesse nomeado o árbitro que lhe competia.

JJ. Quando muito, poderia ter ouvido a parte Requerida quanto aos pressupostos da designação pretendida, mas o que não deveria ter sucedido foi o convite à pronúncia da Recorrida nos termos em que o mesmo foi feito, i.e., com a amplitude que aquele despacho lhe conferiu ao convidá-la a pronunciar-se “sobre o pedido formulado”, ao invés de balizar o direito de audição ao que se impunha, nos termos do procedimento do artigo 10.º da LAV, em específico ao n.º 6 do preceito.

KK. Com efeito, o Exmo. Senhor Presidente da Relação, conhecendo a posição da Recorrida a respeito da nomeação que lhe competia, expressa em documento escrito e junto aos autos, decidiu, ainda assim, convidá-la a pronunciar-se “sobre o pedido formulado” pela Requerente, ora Recorrente, bem sabendo que a Requerida, ora Recorrida, se tinha frustrado à nomeação – tudo, conforme resulta inequivocamente da correspondência junta aos autos e impressivamente daquela comunicação de 05.12.2023.

LL. Daqui decorre que, conhecendo a posição da Recorrida quanto à designação do seu árbitro, se verificava a tal “manifesta desnecessidade” (cfr. artigo 3.º, n.º 3, do CPC) de nova audição da Requerida e Demandada no processo arbitral, para se pronunciar sobre a pretendida nomeação de árbitro, porquanto já dispunha de todos os elementos para decidir.

MM. Ora, foi exatamente este convite e com tal amplitude (repete-se, “sobre o pedido formulado”) e, evidentemente, a resposta da Recorrida, para lá do que é admissível, que levou o Exmo. Senhor Presidente do Tribunal da Relação do Porto a decidir não designar o árbitro cuja nomeação lhe foi requerida pela Recorrente ao abrigo do artigo 10.º, n.º 4 da LAV.

NN. Como bem se vê, a aplicação do regime legal de suprimentos e o convite ao contraditório naqueles termos, sabe-se agora, foi decisivo para a Decisão proferida e influiu, profunda e determinantemente, no exame e na decisão da causa, uma vez que negou à Recorrente o direito a ver nomeado o árbitro de Parte que a Recorrida não nomeou, de maneira a constituir-se o Tribunal Arbitral e a prosseguir a arbitragem – direito este que em caso algum poderia ser recusado pelo Presidente da Relação, ao qual somente cabe nomear o árbitro em falta, e nada mais.

OO. Deste modo, a referida nulidade processual implica, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 195.º do CPC, a anulação de todos os atos processuais praticados após a mesma, pelo que deve ser declarada e, em consequência anular-se todos os atos subsequentes e, dispensando-se o contraditório da Recorrida, nomear-se o árbitro em falta.

PP. A par das nulidades verificadas, a decisão sumária ora recorrida padece de vários erros de julgamento.

QQ. Primeiro, a anterior LAV, no seu artigo 12.º, sob a epigrafe “nomeação de árbitros pelo presidente do tribunal da Relação”, previa uma exceção à nomeação de árbitro pelo tribunal estadual: o caso da convenção de arbitragem manifestamente nula.

RR. Porém, a atual LAV, revogou essa disposição e somente prevê decisões de nomeação de árbitros, relegando a apreciação da validade da convenção de arbitragem para o próprio Tribunal Arbitral.

SS. Deixou, assim, o tribunal estadual de poder não nomear um árbitro quando a parte interessada tomar essa iniciativa, por recusa da parte contrária, mesmo em caso de manifesta nulidade da convenção de arbitragem.

TT. Efetivamente, qualquer questão que importe aferir e decidir sobre a convenção de arbitragem é deixada para o Tribunal Arbitral, que a resolverá, em 1.ª instância – decisão que, essa sim, poderá ser sindicada pelo Tribunal judicial.

UU. Por isso que, ao contrário do regime previsto no artigo 12.º, n.º 4, da LAV de 1986, o tribunal estadual não poderá agora, chamado a designar um ou mais árbitros em "falta", apreciar sequer a manifesta invalidade da convenção.

VV. O artigo 18.º da LAV, que estabelece a regra Kompetenz-Kompetenz, determina que o tribunal arbitral é competente para apreciar a sua própria competência.

WW. Consagrou-se, assim, o entendimento maioritário da doutrina e jurisprudência portuguesa.

XX. Comporta, assim, este princípio o efeito de impor à jurisdição pública o dever de se abster de pronunciar sobre as matérias cujo conhecimento a lei comete ao árbitro, em qualquer causa que lhe seja submetida e em que se discutam aquelas questões, antes que o árbitro tenha tido a oportunidade de o fazer.

YY. Bem se vê a opção do legislador por continuar a afastar as duas jurisdições, relegando a judicial para segunda instância e só no caso de uma ação ser proposta inicialmente num tribunal estadual e não no tribunal arbitral, como seria de esperar, é que o juiz estadual deverá verificar se a “convenção de arbitragem é manifestamente nula, é ou se tornou ineficaz ou é inexequível” (artigo 5.º, n.º 1 da LAV).

ZZ. Não é este de todo o caso dos autos; é bem diferente, aliás: primeiro, porque os presentes autos estão no domínio e sob a alçada do artigo 10.º da LAV, que preceitua apenas um processo de nomeação de árbitro; depois, porque o processo arbitral teve início em 20 de novembro de 2023, há mais de dois meses, portanto. Isso mesmo determina o n.º 1 do artigo 33.º da LAV: o processo arbitral relativo a determinado litígio tem início na data em que o pedido de submissão desse litígio a arbitragem é recebido pelo demandado; depois ainda, porque o anunciado processo judicial que corre termos nos tribunais comuns e ao qual a Decisão sumária faz referência foi proposto no passado dia 25 de janeiro de 2023, ou seja posteriormente ao início do processo arbitral (e não passou, bem se vê, de um subterfúgio da Recorrida – infelizmente acolhido pelo TRP).

AAA. Bem se vê, a decisão sumária escapa completamente ao procedimento que lhe é aplicável e mal andou o tribunal estadual ao indeferir a pretensão de nomeação, com esse fundamento, que contraria frontal e inequivocamente o n.º 4 do artigo 10.º da LAV (e os artigos 5.º e 18.º da LAV) e a boa jurisprudência seguida nos nossos Tribunais. A única decisão legal que poderia ter sido proferida era, pois, a de nomeação de árbitro e mais nenhuma.

BBB. Assim sendo, como acima detalhadamente se sustentou, não podia o Presidente do Tribunal da Relação ter convidado a Recorrida a exercer o contraditório nos termos referidos, nem se ter debruçado sobre o teor da convenção de arbitragem e a sua interpretação, em específico sobre a competência do Tribunal Arbitral.

CCC. Ao tê-lo feito, apreciou, conheceu e decidiu de questões que não podia conhecer e deixou de decidir o que lhe foi pedido, violando os princípios do pedido e do dispositivo.

DDD. Nos termos dos artigos supra citado, é causa de anulação da sentença o facto de o tribunal condenar em objeto diverso do pedido, como se explicou supra, pelo que incorreu em erro de julgamento a decisão recorrida, ao ter julgado improcedente a ação de nomeação de arbitro, devendo por isso ser revogada e substituída por outra que anule o decisão singular e a substituta por outra, de nomeação do árbitro em falta.

EE. De resto, sempre se diga que interpretação diferente do artigo 10.º, n.ºs 4 a 7, do artigo 5.º e do artigo 18.º da LAV seria inconstitucional, por manifesta violação do princípio da igualdade, do acesso ao direito e a uma tutela jurisdicional efetiva, a qual vai para todos os efeitos arguida.

A requerida contra-alegou, pugnando pela improcedência da apelação e a manutenção do despacho recorrido.

Colhidos os vistos12, cumpre decidir.

OBJETO DO RECURSO13,14

Emerge das conclusões de recurso apresentadas por M..., Hotel & Resorts,Lda., ora apelante, que o seu objeto está circunscrito às seguintes questões:

1.) Saber se é admissível recurso do despacho proferido pelo Presidente do Tribunal da Relação do Porto que indeferiu a nomeação de árbitro não designado pela parte para tribunal arbitral.

2.) Saber se é admissível recurso de apelação para o Supremo Tribunal de Justiça do despacho proferido pelo Presidente do Tribunal da Relação do Porto que recusou designar árbitro não designado pela parte para tribunal arbitral.

3.) Saber se é nulo o despacho proferido pelo Presidente do Tribunal da Relação do Porto por omissão de pronúncia.

4.) Saber se é nulo o despacho proferido pelo Presidente do Tribunal da Relação do Porto por excesso de pronúncia.

5.) Saber se foi cometida uma nulidade processual ao ser a requerida notificada para exercer o direito ao contraditório.

6.) Saber se foi lícita a recusa pelo Presidente do Tribunal da Relação do Porto ao não designar árbitro não indicado pela parte para tribunal arbitral.

7.) Saber se uma interpretação diferente dos artigos 5º, 10º/4/5/6/7 e, 18º, da Lei da Arbitragem Voluntária, seria inconstitucional, por violação dos princípios da igualdade, do acesso ao direito e a uma tutela jurisdicional efetiva.

2. FUNDAMENTAÇÃO

2.1. FACTOS

1.) Entre “M..., Hotel & Resorts,Lda.”, na qualidade de dona de obra, e “A... - Construções, Lda.”, na qualidade de empreiteiro, em 2020-01-02, foi celebrado um contrato de empreitada, que tinha por objeto a “Reabilitação e Ampliação de Estabelecimento Hoteleiro”.

2.) No âmbito do contrato foi clausulado que “os outorgantes podem ainda, se assim o entenderem, submeter todas as questões a Tribunal Arbitral, que funcionará na sede da primeira outorgante” (cláusula 17ª/2).

3.) “M..., Hotel & Resorts,Lda.” propôs a “A... - Construções, Lda.” que a arbitragem a instaurar pudesse decorrer no Instituto de Arbitragem Comercial ..., com sede no ..., na Rua ..., segundo o Regulamento de Arbitragem desse Instituto, sendo o Tribunal Arbitral composto por três árbitros, cada um nomeado por cada uma das partes, e o terceiro, que presidirá, pelos árbitros nomeados.

4.) “A... - Construções, Lda.”, informou que não aceitava a intervenção de um Tribunal Arbitral.

5.) “M..., Hotel & Resorts,Lda.” notificou a “A... - Construções, Lda.”, da intenção de instauração do litígio no tribunal arbitral e convidou-a a designar o seu respetivo árbitro.

6.) “A... - Construções, Lda.”, comunicou que a “não concorda com a intervenção de um Tribunal Arbitral” e, recusou-se a proceder à designação de árbitro que lhe cabia.

7.) “M..., Hotel & Resorts,Lda., nos termos do art. 10º/4, da LAV, requereu junto do Tribunal da Relação do Porto, a nomeação de árbitro em substituição da “A... - Construções, Lda.”.

8.) O Presidente do Tribunal da Relação do Porto, por despacho de 2024-01-29, indeferiu a nomeação de árbitro não designado pela parte para constituição de tribunal arbitral15.

2.2. O DIREITO

Importa conhecer o objeto do recurso, circunscrito pelas respetivas conclusões, salvas as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e as que sejam de conhecimento oficioso16 (não havendo questões de conhecimento oficioso são as conclusões de recurso que delimitam o seu objeto).

1.) SABER SE É ADMISSÍVEL RECURSO DO DESPACHO PROFERIDO PELO PRESIDENTE DA RELAÇÃO QUE INDEFERIU A NOMEAÇÃO DE ÁRBITRO NÃO DESIGNADO PELA PARTE PARA TRIBUNAL ARBITRAL.

A apelada, A... - Construções, Lda., alegou que “o nº 7, do artº 10º, da Lei da Arbitragem Voluntária (LAV), estabelece expressamente que “Não cabe recurso das decisões proferidas pelo tribunal estadual competente ao abrigo dos números anteriores”, incluindo no elenco de decisões as referentes à nomeação de árbitro a pedido de uma parte por a outra, solicitada para o efeito, por o não ter nomeado no prazo previsto”.

Assim, concluiu que “a admitir-se a impugnação da decisão singular do Presidente do Tribunal da Relação de não nomear o árbitro, o meio processual adequado seria a reclamação para a conferência, ao abrigo do disposto no artº 652, nº 3, ex vi artº 679, do CPC”.

Vejamos a questão.

Salvo estipulação em contrário, se, no prazo de 30 dias a contar da receção do pedido que a outra parte lhe faça nesse sentido, uma parte não designar o árbitro ou árbitros que lhe cabe escolher ou se os árbitros designados pelas partes não acordarem na escolha do árbitro presidente no prazo de 30 dias a contar da designação do último deles, a designação do árbitro ou árbitros em falta é feita, a pedido de qualquer das partes, pelo tribunal estadual competente – art. 10º/4, da Lei da Arbitragem Voluntária, aprovada pela Lei n.º 63/2011, de 14-12 (LAV).

Não cabe recurso das decisões proferidas pelo tribunal estadual competente ao abrigo dos números anteriores do presente artigo – art. 10º/7, da LAV.

Relativamente a litígios compreendidos na esfera de jurisdição dos tribunais judiciais, o Tribunal da Relação em cujo distrito se situe o lugar da arbitragem, é competente para decidir sobre a nomeação de árbitros que não tenham sido nomeados pelas partes – art. 59º/1/a, da LAV.

A nomeação de árbitros referida na alínea a) do n.º 1 do presente artigo cabe, consoante a natureza do litígio, ao presidente do Tribunal da Relação ou ao presidente do tribunal central administrativo que for territorialmente competente – art. 59º/3, da LAV.

Salvo quando na presente lei se preceitue que a decisão do tribunal estadual competente é insuscetível de recurso, das decisões proferidas pelos tribunais referidos nos números anteriores deste artigo, de acordo com o que neles se dispõe, cabe recurso para o tribunal ou tribunais hierarquicamente superiores, sempre que tal recurso seja admissível segundo as normas aplicáveis à recorribilidade das decisões em causa – art. 59º/8, da LAV.

A intenção da norma (art. 10.º/4, da LAV) é, pois, obviar que o processo de arbitragem fique “bloqueado se alguma delas – logicamente a demandada – não tiver interesse na arbitragem e, daí, omitir a designação ou a colaboração que lhe caiba17.

Assim, se uma parte não nomear o co árbitro, essa responsabilidade pela nomeação de um árbitro ou de árbitros passa para o Presidente do Tribunal da Relação18.

Ora, decorre do art. 10º/7, da LAV, que apenas se pretende ter como definitiva uma decisão do Presidente do Tribunal da Relação que proceda à nomeação de um árbitro, tendo por objetivo subtrair a recurso a opção sobre a individualidade concretamente escolhida para árbitro.

Assim, o que se dispõe no nº 7, é que são irrecorríveis as decisões proferidas pelo tribunal estadual competente quanto ao mérito das designações feitas – não a sua falta – que aí se recusa poder ser apreciado em recurso19.

Se o tribunal arbitral não se constituir por causa de uma recusa de intervenção do tribunal estadual, num caso em que lhe tenha sido requerida a designação ou do árbitro único ou dos árbitros de parte ou do árbitro presidente, tal recusa torna-se definitiva, contém a resolução final de uma situação legalmente carente de decisão judicial, e deveria portanto, de acordo até com os princípios gerais da tutela judicial efetiva do art. 20º da CRP, ser passível de recurso20.

Concluindo, a irrecorribilidade expressa no art. 10º/7 da LAV, circunscreve-se às decisões de escolha, em si mesma, de árbitros, e não às decisões que infrinjam os pressupostos do exercício de tal competência, designadamente – como é o caso dos autos – de recusa de nomeação por “haver dúvidas sobre a obrigatoriedade do recurso à arbitragem”21,22,23.

Acresce dizer, que caso “existam dúvidas sobre a obrigatoriedade do recurso à arbitragem”, será o tribunal arbitral a “decidir sobre a sua própria competência, mesmo que para esse fim seja necessário apreciar a existência, a validade ou a eficácia da convenção de arbitragem ou do contrato em que ela se insira, ou a aplicabilidade da referida convenção” (art. 18º/1, da LAV).

Assim, tal decisão sobre a competência do tribunal arbitral, está excluída do âmbito das funções do Presidente do Tribunal da Relação, pois essa competência será do próprio tribunal.

Destarte, são recorríveis as decisões do Presidente do Tribunal da Relação que não procedem à designação de árbitro para tribunal arbitral em substituição da parte que não o designou.

2.) SABER SE É ADMISSÍVEL RECURSO DE APELAÇÃO PARA O SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DESPACHO PROFERIDO PELO PRESIDENTE DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO QUE RECUSOU DESIGNAR ÁRBITRO NÃO DESIGNADO PELA PARTE PARA TRIBUNAL ARBITRAL.

A apelante, M..., Hotel & Resorts,Lda., alegou que “O recurso é interposto como de apelação, por se referir a decisão proferida em 1.ª instância e é apresentado por mera cautela inerente ao dever de patrocínio, uma vez que o artigo 10.º da LAV não prevê, atualmente, o meio próprio de reação a uma situação inusitada e não prevista como a presente, como acontecia com o n.º 4 do artigo 12.º, n.º 4, da Lei n.º 31/86 de 29 de agosto”.

Vejamos a questão.

No Supremo Tribunal de Justiça há a seguinte espécie: Apelação – art. 215º, do CPCivil24,25.

Cabe recurso de apelação da decisão, proferida em 1.ª instância, que ponha termo à causa ou a procedimento cautelar ou incidente processado autonomamente, ou, do despacho saneador que, sem pôr termo ao processo, decida do mérito da causa ou absolva da instância o réu ou algum dos réus quanto a algum ou alguns dos pedidos – art. 644º/1/a/b, do CPCivil.

Cabe ainda recurso de apelação das seguintes decisões do tribunal de 1.ª instância da decisão que aprecie o impedimento do juiz; da decisão que aprecie a competência absoluta do tribunal; da decisão que decrete a suspensão da instância; do despacho de admissão ou rejeição de algum articulado ou meio de prova; da decisão que condene em multa ou comine outra sanção processual; da decisão que ordene o cancelamento de qualquer registo; de decisão proferida depois da decisão final; das decisões cuja impugnação com o recurso da decisão final seria absolutamente inútil e, nos demais casos especialmente previstos na lei – art. 644º/2/a/b/c/d/e/f/g/h/i, do CPCivil.

A Relação e o Supremo podem funcionar como tribunais de 1ª e 2ª instância (respetivamente) naquelas contadas situações em que determinadas ações têm, por força da lei, de ser propostas diretamente nesses tribunais superiores26.

No caso, como o tribunal da relação funcionou como tribunal de 1ª instância27,28, no recurso de apelação interposto para este Supremo Tribunal de Justiça poderiam ser impugnadas decisões colegiais (acórdãos) ou, decisões singulares29.

Ora, a decisão do Presidente do Tribunal da Relação ao não proceder à designação de árbitro para tribunal arbitral em substituição da parte que não o designou, contém uma resolução final, pondo termo à causa, porquanto, deste modo, inviabiliza a constituição de tal tribunal30,31,32,33.

Sendo uma decisão que põe termo à causa, inviabilizando a formação do tribunal arbitral, impede o desenvolvimento da lide arbitral, admitindo, por isso, que seja impugnada através de recurso de apelação.

Concluindo, como no caso o tribunal da relação funcionou como tribunal de 1ª instância, é admissível recurso de apelação do despacho do respetivo Presidente que não designou árbitro não indicado pela parte para tribunal arbitral.

3.) SABER SE É NULO O DESPACHO PROFERIDO PELO PRESIDENTE DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO POR OMISSÃO DE PRONÚNCIA.

A apelante, M..., Hotel & Resorts,Lda., alegou que “assiste ao Presidente do Tribunal da Relação competente o dever de (i) nomear o árbitro e (ii) fazer observar as diligências prévias que entender necessárias para cumprir aquele dever de nomeação”.

Mais alegou que “não é conferido ao tribunal estadual qualquer poder de apreciação dos motivos da recusa ou da ultrapassagem do prazo pela parte contrária, só lhe é transferida uma obrigação, um poder-dever, de nomeação”.

Alegou ainda que “a decisão de não nomeação configura, por isso, um caso evidente de omissão de pronúncia”.

Assim, concluiu que “devendo a sua pretensão ter sido apreciada e deferida, e não o sendo, em violação daquele n.º 4 do artigo 10.º da LAV – o que determina a nulidade da decisão, nos termos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea d) do CPC”.

Vejamos a questão.

O disposto nos números anteriores, bem como nos artigos subsequentes, aplica-se, com as necessárias adaptações aos despachos – art. 613º/3, do CPCivil.

É nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento – art. 615º/1/d ex vi do art. 666º/1, ambos do CPCivil.

A omissão de pronúncia constitui uma nulidade da decisão judicial prevista no art. 615°/1/d, do CPCivil, quando o juiz deixe de se pronunciar sobre questões que deva apreciar (incumprimento do dever prescrito no art. 608°/2, do CPCivil)34,35,36,37,38.

A omissão de pronúncia está relacionada com o comando contido no art. 608º/2, do CPCivil, exigindo ao juiz que resolva todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, “excetuadas aquelas cujas decisões estejam prejudicadas pela solução dada a outras” 39, 40, 41,42,43,44.

São coisas diferentes deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzido pela parte45,46,47,48.

No entanto, importa não confundir questões colocadas pelas partes, com os argumentos ou razões, que estas esgrimem em ordem à decisão dessas questões neste ou naquele sentido. As questões submetidas à apreciação do tribunal identificam-se com os pedidos formulados, com a causa de pedir ou com as exceções invocadas, desde que não prejudicadas pela solução de mérito encontrada para o litígio49.

Diferente das questões a dirimir/decidir são os argumentos, as razões jurídicas alegadas pelas partes em defesa dos seus pontos de vista, que não constituem questões no sentido do art. 608.º/2, do CPCivil50.

In casu, a apelante solicitou ao tribunal a quo “a nomeação de árbitro de parte, nos termos e ao abrigo do procedimento previsto no artigo 10.º, n.º 4, e 59.º, n.º 1, alínea a) da LAV”.

Ora, o tribunal a quo pronunciou-se sobre tal questão “não nomeando um árbitro, por entender existirem dúvidas sobre a obrigatoriedade do recurso à arbitragem”.

Temos, pois, que o tribunal a quo ao conhecer da questão suscitada pela apelante (nomeação de árbitro de parte), a decisão não padece da nulidade prevista no art. 615°/1/d,1ª parte ex vi do art. 666º/1, ambos do CPCivil (questão diversa é saber se a motivação é incompleta, deficiente ou errada).

Concluindo, a omissão de pronúncia, referida no art. 615º/1/d, do CPCivil, só acontece quando o julgador deixe por resolver questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cujas decisões estejam prejudicadas pela solução dada a outras.

Nestes termos, é manifesto que o despacho recorrido não padece da nulidade prevista no art. 615°/1/d,1ª ex vi do art.666º/1, ambos do CPCivil51,52,53.

Destarte, improcedem, nesta parte, as conclusões A) a W) do recurso de apelação.

4.) SABER SE É NUL0 O DESPACHO PROFERIDO PELO PRESIDENTE DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO POR EXCESSO DE PRONÚNCIA.

A apelante, M..., Hotel & Resorts,Lda., alegou que “não podia o Tribunal Estadual ter-se debruçado sobre a convenção de arbitragem, sua interpretação e redação, nem podia ter decidido, como decidiu, porquanto cabe ao Tribunal Arbitral a competência, em primeira linha, para a ferir e decidir da sua competência para arbitrar o litígio entre as partes”.

Assim, concluiu que “tendo conhecido de tal questão, a decisão proferida padece de nulidade, nos termos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea d) do CPC”.

Vejamos a questão.

O disposto nos números anteriores, bem como nos artigos subsequentes, aplica-se, com as necessárias adaptações aos despachos – art. 613º/3, do CPCivil.

É nula a sentença quando o juiz (…) conheça de questões de que não podia tomar conhecimentoart. 615º/1/d, do CPCivil.

Não podendo o juiz conhecer de causas de pedir não invocadas, nem de exceções, não invocadas, que estejam na exclusiva disponibilidade das partes (art. 608º-2), é nula a sentença em que o faça54.

Encontra-se vedado ao juiz conhecer de causas de pedir não invocadas ou de exceções que não sejam do seu conhecimento oficioso (art. 608º, nº 2, 2º segmento)55.

excesso de pronúncia sempre que a causa do julgado não se identifique com a causa de pedir ou o julgado não coincida com o pedido56.

Limitado pelos pedidos das partes, o juiz não pode, na sentença, deles extravasar: a decisão, seja condenatória, seja absolutória, não pode pronunciar-se sobre mais do que o que foi pedido ou sobre coisa diversa daquela que foi pedida57.

O objeto da sentença deve, pois, coincidir com o objeto do processo, tal como ele foi configurado pelas partes nos articulados normais ou nos articulados supervenientes58.

Quando a lei se refere a questões está a querer dizer que o conhecimento do juiz deve abarcar todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir invocadas e todas as exceções suscitadas, o que significa que o juiz só cometerá a nulidade de excesso de pronúncia se conhecer de causa de pedir não invocada.

Trata-se de nulidade relacionada com o art. 608º/2/2ª parte, onde se proíbe ao juiz de ocupar-se de questões que as partes não tenham suscitado, a menos que a lei lho permita ou lhe imponha o conhecimento oficioso.

In casu, a apelante solicitou ao tribunal a quo “a nomeação de árbitro de parte, nos termos e ao abrigo do procedimento previsto no artigo 10.º, n.º 4, e 59.º, n.º 1, alínea a) da LAV”.

Assim, perante tal pedido, o tribunal a quo conheceu da questão e decidiu “não nomear um árbitro, por existirem dúvidas sobre a obrigatoriedade do recurso à arbitragem”.

Temos, pois, que estando formulado tal pedido, dele não estava o tribunal a quo impedido de se pronunciar sobre o mesmo, seja qual for a sua decisão59.

Nestes termos, é manifesto que o despacho proferido pelo tribunal a quo não padece da nulidade prevista no art. 615°/1/d/1ª parte ex vi do art.666º/1, ambos do CPCivil.

Donde que o recurso improcede, nesta parte, quanto à imputação à decisão sob recurso da nulidade prevista no art. 615º/1/d/2ª parte, do CPCivil (excesso de pronúncia/pronúncia indevida).

Destarte, improcedem, nesta parte, as conclusões X) a FF) do recurso de apelação.

5.) SABER SE FOI COMETIDA UMA NULIDADE PROCESSUAL AO SER A REQUERIDA NOTIFICADA PARA EXERCER O DIREITO AO CONTRADITÓRIO.

A apelante, A... - Construções, Lda., alegou que “foi decido aplicar ao pedido de nomeação apresentado pela Recorrente “o regime legal relativo ao processo de suprimento” e notificada a Recorrida “para que se pronunci[ass]e sobre o pedido formulado ao Presidente do Tribunal da Relação do Porto”.

Mais alegou que “a decisão de aplicação do regime legal relativo ao processo de suprimento ao pedido de nomeação de árbitro levou o Exmo. Senhor Presidente do Tribunal da Relação a convidar a Requerida (ora Recorrida) a exercer o contraditório sobre “o pedido formulado”, o que não poderia, nem deveria ter sucedido, com a amplitude em que o foi”.

Alegou ainda que “foi exatamente este convite e com tal amplitude (repete-se, “sobre o pedido formulado”) e, evidentemente, a resposta da Recorrida, para lá do que é admissível, que levou o Exmo. Senhor Presidente do Tribunal da Relação do Porto a decidir não designar o árbitro cuja nomeação lhe foi requerida pela Recorrente ao abrigo do artigo 10.º, n.º 4 da LAV”.

Assim, concluiu que “tendo sido cometida uma nulidade processual, por ter sido praticado um ato que a lei não admite, implica, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 195.º do CPC, a anulação de todos os atos processuais praticados após a mesma”.

Vejamos a questão.

O juiz deve observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem – art. 3º/3, do CPCivil.

A prática de um ato que a lei não admita, bem como a omissão de um ato ou de uma formalidade que a lei prescreva, só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa – art. 195º/1, do CPCivil.

A nomeação de árbitros referida na alínea a) do n.º 1 do presente artigo cabe, consoante a natureza do litígio, ao presidente do Tribunal da Relação ou ao presidente do tribunal central administrativo que for territorialmente competente – art. 59º/3, da Lei da Arbitragem Voluntária, aprovada pela Lei n.º 63/2011, de 14-12 (LAV).

Nos casos em que se pretenda que o tribunal estadual competente profira uma decisão ao abrigo de qualquer das alíneas a) a d) do n.º 1 do artigo 59.º, deve o interessado indicar no seu requerimento os factos que justificam o seu pedido, nele incluindo a informação que considere relevante para o efeito – art. 60º/1, da LAV.

Recebido o requerimento previsto no número anterior, são notificadas as demais partes na arbitragem e, se for caso disso, o tribunal arbitral para, no prazo de 10 dias, dizerem o que se lhes ofereça sobre o conteúdo do mesmo – art. 60º/2, da LAV.

Antes de proferir decisão, o tribunal pode, se entender necessário, colher ou solicitar as informações convenientes para a prolação da sua decisão – art. 60º/3, da LAV.

O princípio do contraditório, enquanto princípio estruturante do processo civil, exige que se dê a cada uma das partes a possibilidade de “deduzir as suas razões (de facto e de direito)”, de “oferecer as suas provas”, de “controlar as provas do adversário” e, de “discretear sobre o valor e resultados de umas e outras”60,61,62.

Cada uma das partes há de, pois, poder expor as suas razões perante o tribunal (princípio do contraditório). E deve poder fazê-lo em condições que a não desfavoreçam em confronto com a parte contrária (princípio da igualdade de armas)63.

O processo reveste a forma de um debate ou discussão entre as partes, muito embora se admita que as deficiências e os transvios ou abusos da atividade dos pleiteantes sejam supridos ou corrigidos pelo juiz. Cada uma das partes é chamada a deduzir as suas provas (de facto e de direito), a oferecer as suas provas, a controlar as provas do adversário e a discretear sobre o valor e resultados de umas e outras64.

É ainda uma aplicação do princípio dispositivo na parte em que este configura o pleito como um duelo entre os litigantes65.

De harmonia com o princípio do contraditório, a lei oferece a cada parte a possibilidade de contestar e controlar a atividade da outra ao longo de todo o processo – e não apenas na fase inicial. Vale isto dizer que não podem ser tomadas quaisquer providências contra uma pessoa (seja ela parte ou terceiro) sem que ela seja previamente ouvida; e que o juiz não pode decidir quaisquer questões de facto ou de direito, sem que as partes tenham tido a possibilidade de se pronunciarem sobre tais questões66.

Por outro lado, o princípio do contraditório, envolve a proibição da prolação de decisões surpresa, não sendo lícito aos tribunais decidir questões de facto ou de direito, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que previamente haja sido facultada às partes a possibilidade de sobre elas se pronunciarem67,68.

Ora, no caso, a apelante/requerente solicitou ao tribunal a quo “a nomeação de árbitro de parte”, tendo a apelada/requerida sido notificada para se “pronunciar sobre o pedido”.

O tribunal pode colher ou solicitar as informações convenientes para a prolação da sua decisão (art. 60º/2/3, da LAV), pelo que, para tal, deve notificar as partes na arbitragem para dizerem o que se lhes ofereça.

Assim, o tribunal a quo antes de decidir sobre a questão suscitada, ouviu previamente a apelada/requerida, observando, deste modo, além, do mais, o princípio do contraditório, para ter elementos suficientes para decidir.

E, com esta notificação para a apelada/requerida exercer o princípio do contraditório, foi cometida pelo tribunal a quo uma nulidade processual?

Pensamos que não.

Do disposto no art. 195.º/1, CPC decorre que se verifica uma nulidade processual quando seja praticado um ato não previsto na tramitação legal ou judicialmente definida ou quando seja omitido um ato que é imposto por essa tramitação. Só há nulidade processual quando o vício respeita ao ato como trâmite, não ao ato como expressão de uma decisão do tribunal ou de uma posição da parte69.

Ora, a observância do princípio do contraditório, é um ato previsto na tramitação legal, tanto na legislação processual (art. 3º/3, do CPCivil), como na legislação da arbitragem (art. 60º/2, da LAV), de modo que a parte possa expor as suas razões perante o tribunal sobre a questão suscitada.

Por outro lado, como o tribunal pode colher ou solicitar as informações julgadas convenientes para prolação da sua decisão, sempre poderia ouvir previamente a apelada/requerida.

Logo, estando o ato previsto na tramitação legal, como o vício não respeita ao ato como trâmite, não há uma nulidade processual, pois esta só ocorreria se a observância do princípio do contraditório ou não estivesse previsto na tramitação processual.

Deste modo, quando o Presidente do Tribunal da Relação do Porto decide não designar o árbitro cuja nomeação lhe foi requerida, não comete qualquer nulidade processual, pois o vício, a haver, não respeita ao ato como trâmite.

Isto é, se o Presidente do Tribunal da Relação do Porto ao decidir o pedido, extravasa o que lhe foi solicitado, o vício como não respeita ao ato como trâmite, não constitui nulidade processual.

Assim, o Presidente do Tribunal da Relação do Porto até pode ter extravasado o que lhe foi solicitado, mas como o vicio não respeita ao ato em si, não pode gerar a sua nulidade, pois a observância do princípio do contraditório está prevista na tramitação legal, não sendo pois um ato que a lei não admita.

Destarte, não tendo sido cometida nenhuma nulidade processual, não há que anular quaisquer atos processuais praticados após a apelada/requerida ser notificada para se pronunciar sobre o pedido solicitado pelo apelante/requerente.

Destarte, improcedem, nesta parte, as conclusões GG) a OO) do recurso de apelação.

6.) SABER SE FOI LÍCITA A RECUSA PELO PRESIDENTE DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO AO NÃO DESIGNAR ÁRBITRO NÃO INDICADO PELA PARTE PARA TRIBUNAL ARBITRAL.

A apelante, M..., Hotel & Resorts,Lda., alegou que “a anterior LAV, no seu artigo 12.º, sob a epigrafe “nomeação de árbitros pelo presidente do tribunal da Relação”, previa uma exceção à nomeação de árbitro pelo tribunal estadual: o caso da convenção de arbitragem manifestamente nula”.

Mais alegou que “a atual LAV, revogou essa disposição e somente prevê decisões de nomeação de árbitros, relegando a apreciação da validade da convenção de arbitragem para o próprio Tribunal Arbitral, deixando, assim, o tribunal estadual de poder não nomear um árbitro quando a parte interessada tomar essa iniciativa, por recusa da parte contrária, mesmo em caso de manifesta nulidade da convenção de arbitragem”.

Alegou ainda que “qualquer questão que importe aferir e decidir sobre a convenção de arbitragem é deixada para o Tribunal Arbitral, que a resolverá, em 1.ª instância – decisão que, essa sim, poderá ser sindicada pelo Tribunal judicial”.

Assim, concluiu que “mal andou o tribunal estadual ao indeferir a pretensão de nomeação, com esse fundamento, que contraria frontal e inequivocamente o n.º 4 do artigo 10.º da LAV (e os artigos 5.º e 18.º da LAV) e a boa jurisprudência seguida nos nossos Tribunais, pois a única decisão legal que poderia ter sido proferida era a de nomeação de árbitro”.

O Presidente do Tribunal da Relação do Porto indeferiu a nomeação de árbitro não designado pela parte para constituição de tribunal arbitral, por entender que “existiam dúvidas sobre a obrigatoriedade do recurso à arbitragem”.

Vejamos a questão.

Salvo estipulação em contrário, se, no prazo de 30 dias a contar da receção do pedido que a outra parte lhe faça nesse sentido, uma parte não designar o árbitro ou árbitros que lhe cabe escolher ou se os árbitros designados pelas partes não acordarem na escolha do árbitro presidente no prazo de 30 dias a contar da designação do último deles, a designação do árbitro ou árbitros em falta é feita, a pedido de qualquer das partes, pelo tribunal estadual competente – art. 10º/4, da Lei da Arbitragem Voluntária, aprovada pela Lei n.º 63/2011, de 14-12 (LAV).

O tribunal arbitral pode decidir sobre a sua própria competência, mesmo que para esse fim seja necessário apreciar a existência, a validade ou a eficácia da convenção de arbitragem ou do contrato em que ela se insira, ou a aplicabilidade da referida convenção – art. 18º/1, da LAV.

Ao ser solicitado ao tribunal estadual a designação de árbitro em falta pela parte que lhe cabia escolher, visa-se, garantir a integral composição do tribunal arbitral de modo para permitir o seu funcionamento, que de outro modo, não ocorreria.

Nestes casos, a intervenção do tribunal da relação deve ser mínima, limitando-se tão só à nomeação do árbitro em falta, não podendo ser suscitadas quaisquer questões relativas à competência do tribunal arbitral70,71,72,73.

Isto porque, o art. 10º/4, da LAV, visa, tão-só, garantir a plena composição do tribunal arbitral, através da designação do árbitro ou árbitros em falta.

E, sendo apenas este o objetivo da norma, é, portanto, exclusivamente esta a competência do «tribunal estadual competente»74,75.

Assim, se o pedido de nomeação de árbitro em falta tem por objetivo garantir o funcionamento do tribunal arbitral, não cabe ao tribunal estadual analisar ou decidir sobre quaisquer outras questões, v.g., a obrigatoriedade do litígio a esse tribunal.

Será, pois, nestas situações, o próprio tribunal arbitral a decidir sobre a sua competência, podendo, para tal, apreciar a existência, a validade ou a eficácia da convenção de arbitragem ou do contrato em que ela se insira.

Se o pode fazer o tribunal arbitral, não poderá porém, o tribunal estadual fazê-lo, analisando para tal, a validade ou a eficácia da convenção de arbitragem, por tal estar subtraída à sua competência.

Deste modo, como a “decisão sobre a sua competência” seria do próprio tribunal arbitral, e não do tribunal estadual, o Presidente do Tribunal da Relação do Porto estava legalmente impedido de emitir pronúncia quanto à validade ou a eficácia da convenção de arbitragem76.

Nos autos, o Presidente do Tribunal da Relação do Porto ao entender que “existiam dúvidas sobre a obrigatoriedade do recurso à arbitragem”, analisou o teor e a interpretação da convenção da arbitragem, no sentido de aferir da eventual competência ou incompetência de um tribunal arbitral e, em consequência, da necessidade ou desnecessidade de nomeação de árbitro em falta.

Assim, não podia o Presidente do Tribunal da Relação do Porto ter-se debruçado sobre a convenção de arbitragem, sua interpretação e redação, pois tal questão é da competência do tribunal arbitral, decisão essa, sim, que poderá ser sindicada por um tribunal judicial77.

Concluindo, o processo para designação de árbitro pelo tribunal estadual, previsto nos arts. 10º/4, 59º/1/a e, 60º da LAV, tem como único e exclusivo objetivo o procedimento de escolha do árbitro em falta, não cabendo, no seu âmbito, apreciar outras questões, v.g., a competência do tribunal arbitral para o julgamento do litígio – questões que devem ser colocadas perante e decididas por este tribunal.

Destarte, não podendo o Presidente do Tribunal da Relação do Porto ter indeferido a nomeação do árbitro em falta, deverá ser revogado o seu despacho e substituído por outro que designe o árbitro em falta.

7.) SABER SE UMA INTERPRETAÇÃO DIFERENTE DO ARTIGOS 5º, 10º/4/5/6/7, E 18º DA LEI DA ARBITRAGEM VOLUNTÁRIA, SERIA INCONSTITUCIONAL, POR VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA IGUALDADE, DO ACESSO AO DIREITO E A UMA TUTELA JURISDICIONAL EFETIVA.

A apelante, M..., Hotel & Resorts,Lda., alegou que “uma interpretação diferente do artigo 10.º, n.ºs 4 a 7, do artigo 5.º e do artigo 18.º da LAV seria inconstitucional, por manifesta violação do princípio da igualdade, do acesso ao direito e a uma tutela jurisdicional efetiva, a qual vai para todos os efeitos arguida”.

Vejamos a questão

O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras – art. 608º/2, ex vi, do art. 663º/2, ambos do CPCivil.

Do princípio de que a sentença deve resolver todas as questões suscitadas pelas partes excetuam-se «aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras».

Se o tribunal, v.g., se declara incompetente para conhecer do pedido, em razão da matéria ou da hierarquia, não faria sentido que na sentença se pronunciasse ainda sobre as questões levantadas pelas partes quanto ao mérito da causa78.

Assim, com a revogação do despacho do Presidente do Tribunal da Relação do Porto e, determinando-se que seja substituído por outro que designe o árbitro em falta, o conhecimento da questão suscitada (inconstitucionalidade das normas da LAV), mostra-se prejudicada79,80,81,82,83,84,85,86.

3. DISPOSITIVO

3.1. DECISÃO

Pelo exposto, acordam os juízes desta secção cível (1ª) do Supremo Tribunal de Justiça em julgar procedente a apelação e, consequentemente, em revogar-se o despacho de 2024-01-29 do Presidente do Tribunal da Relação do Porto, determinando-se que seja substituído por outro que, deferindo o requerido, designe o árbitro em falta, nos termos do art. 10º/4, da Lei da Arbitragem Voluntária.

3.2. REGIME DE CUSTAS

Custas pela apelada/recorrida (na vertente de custas de parte, por outras não haver87), porquanto a elas deu causa por ter ficado vencida88.

Lisboa, 2024-04-1089,90

(Nelson Borges Carneiro) – Relator

(Jorge Arcanjo) – 1º adjunto

(Manuel Aguiar Pereira) – 2º adjunto

_____________________________________________

1. As decisões judiciais podem ser impugnadas por meio de recursos – art. 627º/1, do CPCivil.↩︎

2. Os recursos são ordinários ou extraordinários, sendo ordinários os recursos de apelação e de revista e extraordinários o recurso para uniformização de jurisprudência e a revisão – art. 627º/2, do CPCivil.↩︎

3. No Supremo Tribunal de Justiça há a seguinte espécie: Apelação – art. 215º, do CPCivil↩︎

4. Aquele que interpõe o recurso – FERREIRA DE ALMEIDA, Direito Processual Civil, volume II, 2ª edição, p. 477.↩︎

5. Aquele contra quem se interpõe o recurso – FERREIRA DE ALMEIDA, Direito Processual Civil, volume II, 2ª edição, p. 477.↩︎

6. O juiz que lavrar o acórdão deve sumariá-lo – art. 663º/7, do CPCivil.↩︎

7. O sumário não faz parte da decisão, consistindo tão só numa síntese daquilo que fundamentalmente foi apreciado com mero valor de divulgação jurisprudencial. Por tais motivos, o sumário deve ser destacado do próprio acórdão, sendo da exclusiva responsabilidade do relator – ABRANTES GERALDES, Recursos em Processo Civil, Novo Regime, p. 301.↩︎

8. O acórdão principia pelo relatório, em que se enunciam sucintamente as questões a decidir no recurso, expõe de seguida os fundamentos e conclui pela decisão, observando-se, na parte aplicável, o preceituado nos artigos 607.º a 612.º – art. 663º/2, do CPCivil.↩︎

9. Para além do dever de apresentar a sua alegação, impende sobre o recorrente o ónus de nela concluir, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão – ónus de formular conclusões (art. 639º/1) – FERREIRA DE ALMEIDA, Direito Processual Civil, volume II, 2ª edição, p. 503.↩︎

10. As conclusões exercem ainda a importante função de delimitação do objeto do recurso, como clara e inequivocamente resulta do art. 639º/3. Conforme ocorre com o pedido formulado na petição inicial, as conclusões devem corresponder à identificação clara e rigorosa daquilo que o recorrente pretende obter do tribunal superior, em contraposição com aquilo que foi decidido pelo tribunal a quo – ABRANTES GERALDES – PAULO PIMENTA – PIRES DE SOUSA, Código de Processo Civil Anotado, volume 1º, 2ª ed., p. 795.↩︎

11. O recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão. Versando o recurso sobre matéria de direito, as conclusões devem indicar, as normas jurídicas violadas; o sentido com que, no entender do recorrente, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas, e invocando-se erro na determinação da norma aplicável, a norma jurídica que, no entendimento do recorrente, devia ter sido aplicada – art. 639º/1/2 ex vi do art. 679º, ambos do CPCivil.↩︎

12. Na sessão anterior ao julgamento do recurso, o processo, acompanhado com o projeto de acórdão, vai com vista simultânea, por meios eletrónicos, aos dois juízes-adjuntos, pelo prazo de cinco dias, ou, quando tal não for tecnicamente possível, o relator ordena a extração de cópias do projeto de acórdão e das peças processuais relevantes para a apreciação do objeto da apelação – art. 657º/2 ex vi do art. 679º, ambos do CPCivil.↩︎

13. Todas as questões de mérito que tenham sido objeto de julgamento na sentença recorrida e que não sejam abordadas nas conclusões do recorrente, mostrando-se objetiva e materialmente excluídas dessas conclusões, têm de se considerar decididas, não podendo de elas conhecer o tribunal de recurso.↩︎

14. Vem sendo entendido que o vocábulo “questões” não abrange os argumentos, motivos ou razões jurídicas invocadas pelas partes, antes se reportando às pretensões deduzidas ou aos elementos integradores do pedido e da causa de pedir, ou seja, entendendo-se por “questões” as concretas controvérsias centrais a dirimir.↩︎

15. “Julgamos, portanto, que existem, pelo menos, dúvidas sobre a obrigatoriedade do recurso à arbitragem. O mais correto, a nosso ver, será permitir que, em sede judicial – note-se que o conflito foi já espoletado junto dos tribunais comuns -, se decida de tal questão, ou seja, se determine, ou não, da necessidade de constituição arbitral e, só depois se proceda à nomeação dos respetivos juízes árbitros. Reitere-se que, mal ou bem, uma ação judicial foi já interposta e corre seus termos; além disso, a interpretação literal do acordo escrito induz uma leitura favorável à requerida na medida em que, na prática, pese embora a referência ao dirimir arbitral, certo é que a expressão “se assim entenderem” torna inócuo aquele compromisso. Donde, neste contexto, sem prejuízo do que, eventualmente, se venha a determinar, em sede jurisdicional, sobre a natureza do tribunal competente para dirimir os conflitos ora em apreço, decide-se: Indeferir a pretensão formulada. Custas pela requerente” – Despacho proferido pelo Presidente do Tribunal da Relação do Porto.↩︎

16. Relativamente a questões de conhecimento oficioso e que, por isso mesmo, não foram suscitadas anteriormente, deve ser assegurado o contraditório, nos termos do art. 3º/3, do CPCivil.↩︎

17. ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO, Tratado da Arbitragem – Comentário à Lei 63/2011 de 14 de dezembro, 2016, p. 142.↩︎

18. Em Tribunal Arbitral Voluntário, compete ao Presidente do Tribunal da Relação analisar toda a documentação que lhe é remetida pela parte interessada e, subsequentemente, decidir pela nomeação de um árbitro ou de árbitros – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2011-10-11, Relator: PAULO SÁ, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

19. Lei da Arbitragem Voluntária, Coordenação de Mário Esteves de Oliveira, Almedina, 2014, p. 168.↩︎

20. Lei da Arbitragem Voluntária, Coordenação de Mário Esteves de Oliveira, Almedina, 2014, p. 168.↩︎

21. Se configurarmos a referida escolha como correspondendo a uma atividade administrativa, a um ato administrativo (de um órgão do Poder Judicial) – que nos parece ser a hipótese menos verosímil -, então a norma contida neste nº 7 do art. 10º da LAV, sobre a inadmissibilidade de recurso das decisões proferidas pelos Presidentes das Relações ou dos Tribunais Centrais Administrativos no exercício da competência para a nomeação de árbitros que aí se lhes comete, é materialmente inconstitucional, por violação do art. 268º/4 da Constituição. Ainda que (por em alguns aspetos ela ser de carácter discricionário) se aceitasse que não caberia recurso quanto à escolha feita, em si mesma – parecendo-nos, porém, que se deveria admiti-lo sempre com fundamento (pelo menos) em erro grosseiro sobre as qualidades da pessoa nomeada -, o que se repudia seguramente é que esse recurso possa ser constitucionalmente denegado quando a nomeação de árbitros pelo presidente dos referidos tribunais se faça sem que se verifiquem os pressupostos da respetiva competência. Não há alternativa possível: o art. 268º/4 da CRP, que institui a garantia fundamental do recurso contencioso de “quaisquer atos administrativos” – ainda que materialmente administrativos, claro -, seria de aplicação direta a tal caso, arredando a aplicação da norma (pelo menos, parcialmente) inconstitucional do nº 7 do art. 10º da LAV. Por outro lado, a qualificar-se tal atividade como sendo de jurisdição voluntária, entende-se que da respetiva decisão caberá à mesma recurso, por se cingir então a irrecorribilidade com que a lei a impregna à escolha feita pelo presidente do tribunal, isto é, se cingir ela à adequação de pessoa escolhida ao desempenho do cargo de árbitro. Já não porém quanto à inexistência dos pressupostos da sua intervenção. Em tais circunstâncias, recusar ao interessado a possibilidade de recurso corresponderia a uma violação do princípio de tutela dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos. Em qualquer dos casos, portanto, estaríamos perante a inconstitucionalidade material da referida regra deste nº 7 do art. 10º – Lei da Arbitragem Voluntária, Coordenação de Mário Esteves de Oliveira, Almedina, 2014, pp. 165/66.↩︎

22. O nº 7 do art. 10º da Lei de Arbitragem Voluntária (Lei 63/2011) afasta a recorribilidade das decisões de designação de árbitro(s) pelo tribunal estadual competente, isto é, das decisões de escolha, em si mesma, de árbitro(s), mas não das decisões que, alegadamente, ofendam os pressupostos dessa competência, designadamente, decisões de recusa – alegadamente ilegal – de nomeação de árbitro(s), assim impedindo a constituição do tribunal arbitral – Ac. Supremo Tribunal Administrativo de 2020-11-19, Relator: ADRIANO CUNHA, https://www.dgsi.pt/jsta.↩︎

23. Não obstante o disposto no nº 7 do artigo 10º - de que de tais decisões de nomeação de árbitros "não cabe recurso"-, elas devem considerar-se passíveis de recurso quando feridas de ilegalidade, por força da aplicação das garantias fundamentais do artº 268º/4 ou do artº 20º/1 da Constituição – Lei da Arbitragem Voluntária, Coordenação de Mário Esteves de Oliveira, Almedina, 2014, pp.693/94.↩︎

24. O supremo julga em apelação o recurso das decisões proferidas pela relação em 1ª instância (art. 644-1) – LEBRE DE FREITAS – ISABEL ALEXANDRE, Código de Processo Civil Anotado, volume 1º, 4ª ed., p. 426.↩︎

25. A alusão às apelações tem em vista os recursos de acórdãos em processos em que a Relação intervém em primeira instância – ABRANTES GERALDES – PAULO PIMENTA – PIRES DE SOUSA, Código de Processo Civil Anotado, volume 1º, 2ª ed., p. 262.↩︎

26. FERREIRA DE ALMEIDA, Direito Processual Civil, volume II, 2ª edição, p. 517.↩︎

27. As Relações só é dado conhecer das questões e decisões arbitrais especificamente enumeradas no art. 59º/1 (ou noutro preceito da LAV); aquelas que não venham aí nominadas são da competência dos tribunais judiciais de 1ª instância, como o dispõe o subsequente nº 4, sendo estes portanto quem detém a competência regra (mesmo se porventura, residual) na matéria – Lei da Arbitragem Voluntária, Coordenação de Mário Esteves de Oliveira, Almedina, 2014, p. 689.↩︎

28. Incluem-se então na sua competência ratione materiae, de acordo com a sua alínea a), decidir sobre a nomeação do árbitro único, dos árbitros "de parte" e do árbitro presidente, se as partes (singulares ou plurais) - ou terceiro a quem coubesse a sua designação - não o fizerem nos prazos convencional ou legalmente fixados para o efeito – Lei da Arbitragem Voluntária, Coordenação de Mário Esteves de Oliveira, Almedina, 2014, p. 690/91.↩︎

29. A norma constante do nº 1 do art. 671º do CPC não deve interpretar-se no sentido de pretender excluir cabalmente o exercício do duplo grau de jurisdição nas causas em que a Relação haja excecionalmente atuado, não como tribunal de recurso, mas como órgão jurisdicional que, em 1ª instância, apreciou o objeto do litígio – como ocorre com as ações de anulação de sentença arbitral, necessariamente iniciadas perante esse Tribunal. Na verdade, numa interpretação funcionalmente adequada do sistema de recursos que nos rege, não se vê razão bastante para excluir o normal exercício pelo STJ do duplo grau de jurisdição sobre decisões finais proferidas pela Relação, em ações ou procedimentos que, nos termos da lei, se devam obrigatoriamente iniciar perante elas - podendo convocar-se relevantes lugares paralelos, em que o acesso ao STJ está assegurado, relativamente a decisões finais proferidas em causas apreciadas em 1ª instância pelas Relações, como ocorre com as ações especiais de indemnização contra magistrados ou com a revisão de sentença estrangeira – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2016-11-10, Relator: LOPES DO REGO, https://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

30. “Ao pedido formulado deveria aplicar-se o regime legal relativo ao processo de suprimento, com a natureza de processo de jurisdição voluntária; daí ter-se ordenado dever “ser observado o princípio do contraditório”, com audição da parte contrária. Contraditório cumprido, segue-se a decisão até porque não esteve em causa qualquer decisão substancial sobre o dissídio em apreço – apenas se entendeu sobrestar na nomeação de um árbitro até que um tribunal estadual, já acionado jurisdicionalmente, decida se o conflito deve, ou não, ser entregue à arbitragem voluntária. A demanda ia no sentido de nomear um árbitro por recusa de uma das partes em fazê-lo; está em causa um requerimento feita no contexto jurisdicional, a um tribunal – terá que aceitar-se que a este sempre caberia a possibilidade de proceder a tal nomeação ou não o fazer, conforme entendesse legalmente adequado. Essa possibilidade de não proceder a tal nomeação nunca seria descartável sobretudo num contexto em que se tramitou o pedido como fazendo parte de um processo de jurisdição e após ouvir, em cumprimento de um devido contraditório, a parte que já manifestara, noutra sede, opor-se a tal nomeação” – Despacho proferido pelo Presidente do Tribunal da Relação do Porto.↩︎

31. No caso, tendo sido seguido o regime legal relativo ao processo de suprimento, com natureza de processo de jurisdição voluntária, o despacho proferido pelo Presidente revestirá a natureza de jurisdicional e, não no âmbito de funções administrativas, pois para além de ter notificado a parte contrária para se pronunciar, apreciou do “mérito” da pretensão, indeferindo-a.↩︎

32. Estatuindo o art. 59º, da LAV, que o Tribunal da Relação é competente para decidir sobre a nomeação de árbitros que não tenham sido nomeados pelas partes, tal despacho terá que revestir a natureza de jurisdicional, e não de funções administrativas, por definir e garantir direitos às partes, exprimido o exercício de livre poder jurisdicional.↩︎

33. Mesmo que se entendesse que se tratava de um despacho proferido no âmbito de funções administrativas, o mesmo foi proferido ao abrigo de uma determinada norma legal, no caso, o art. 59º/3, da LAV. Ora, tendo-o sido proferido ao arrepio a essa norma legal, já o despacho será passível de recurso. Isto porque, se vier a revelar frustrado o direito dos litigantes ao desenvolvimento do processo dentro de um pré-determinado ritualismo legal, no caso, a não nomeação de um árbitro, daí resultará para as partes um prejuízo processual que as legitima a impugnar o respetivo ato por via de recurso. Assim, mesmo que se entendesse que o despacho foi proferido no âmbito de funções administrativas, o mesmo seria recorrível, por não ter sido observado o ritualismo legal, no caso, a nomeação de um árbitro.↩︎

34. A omissão de pronúncia implica, caso se verifique, de harmonia com o disposto no art. 615.º, n.º 1, al. d) do CPC, a nulidade do acórdão – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2021-01-12, Relatora: ANA PAULA BOULAROT, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

35. Se o acórdão recorrido conheceu das questões suscitadas na apelação – embora remetendo para a motivação da sentença e sem explicitar, formalmente, a improcedência dessa apelação –, não incorre em nulidade, por omissão de pronúncia – art. 615.º, n.º 1, al. d), do CPC – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2016-05-17, Relator: PINTO DE ALMEIDA, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

36. A nulidade do Acórdão pressupõe a verificação de alguma das hipóteses no artigo 615.º, n.º 1, do CPC. A nulidade por omissão de pronúncia advém da falta de resposta a questões que o Tribunal tenha o dever de responder – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2023-03-16, Relatora: CATARINA SERRA, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

37. O direito adjetivo civil enuncia, imperativamente, no n.º 1, do art.º 615º, aplicável ex vi artºs. 666º, 679º e 685º, todos do Código de Processo Civil, as causas de nulidade do acórdão. Os vícios da nulidade do acórdão correspondem aos casos de irregularidades que põem em causa, nomeadamente, a ininteligibilidade do discurso decisório, em razão do uso ilegítimo do poder jurisdicional em virtude de não tratar de questões de que deveria conhecer (omissão de pronúncia) – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2023-03-07, Relator: OLIVEIRA ABREU, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

38. O tribunal só tem que se pronunciar sobre questões (artigo 660, nº2 do CPC), entendendo-se como tal as concretas controvérsias centrais a dirimir e não os simples argumentos, opiniões, motivos, razões, pareceres, ou doutrinas expendidas pelas partes – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2004-05-13, Relator: FERREIRA GIRÃO, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

39. A nulidade por omissão de pronúncia apenas se verifica quando o tribunal deixe de conhecer questões temáticas centrais suscitadas pelos litigantes (ou de que se deva conhecer oficiosamente), cuja resolução não esteja prejudicada pela solução dada a outras, não se considerando como tal os argumentos, motivos ou razões jurídicas invocados, até porque o juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2023-03-08, Relator: MÁRIO BELO MORGADO, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

40. A nulidade das decisões judiciais por omissão de pronúncia, prevista no artigo 668.º, n.º 1, alínea d), primeira parte, do Código de Processo Civil "quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar" - aplicável aos acórdãos das Relações por força do artigo 716.º, n.º 1, e aos acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça por força do artigo 732.º, ambos do mesmo Código - constitui cominação ao incumprimento do disposto na primeira parte do n.º 2 do artigo 660.º do citado Código, segundo o qual "o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras" – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2002-10-16, Relator: MÁRIO TORRES, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

41. Verifica-se o vício da omissão de pronúncia, previsto no art. 615.º n.º 1 d), do C.P.C., gerador da nulidade da decisão, quando o tribunal deixe de conhecer qualquer questão colocada pelas partes ou que seja do conhecimento oficioso – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2022-06-01, Relator: PEDRO BRANQUINHO DIAS, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

42. Somente se poderá concluir pela verificação de uma omissão de pronúncia suscetível de integrar a nulidade prevista na alínea d) do n.º 1 do art. 615º do atual CPC, quando uma determinada questão (que não seja mero argumento, consideração ou razão de fundamento) que haja sido suscitada pelas partes, não tenha sido objeto de qualquer apreciação e/ou decisão por parte do juiz – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2020-10-28, Relator: JOSÉ FEITEIRA, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

43. Não integra omissão de pronúncia o facto de não se ter conhecido de questão cuja apreciação ficara prejudicada pela decisão dada a outra questão – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2002-04-17, Relator: MÁRIO TORRES, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

44. A nulidade do acórdão da Relação por omissão de pronúncia não deriva de omissão de análise de motivação ou argumentação fáctico-jurídica desenvolvida pelas partes, mas de omissão de apreciação de questões propriamente ditas, ou seja, de pontos essenciais de facto ou de direito em que aquelas centralizaram o litígio, incluindo as exceções – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2004-07-01, Relator: SALVADOR DA COSTA, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

45. É jurisprudência consensual dos tribunais portugueses que importa não confundir questões (cuja omissão de pronúncia desencadeia nulidade da decisão nos termos da alínea d) do nº 1 do artº 615º do atual CPC) com argumentos, razões ou motivos que são aduzidos pelas partes em defesa ou reforço das suas posições – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2014-11-20, Relator: ÁLVARO RODRIGUES, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

46. São, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. O que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão – ALBERTO DOS REIS, Código de Processo Civil, anotado, vol. 5º, p. 143.↩︎

47. Só existe o dever de o juiz conhecer e decidir questões; não existe tal dever quanto aos argumentos invocados pelas partes para fazer valer as suas pretensões – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2021-07-14, Relatora: CATARINA SERRA, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

48. A Nulidade de sentença/acórdão, por omissão de pronúncia, só ocorre quando o julgador deixe de resolver questões que tenham sido submetidas à sua apreciação pelas partes, a não ser que esse conhecimento fique prejudicado pela solução a outras questões antes apreciadas. O conceito de “questão”, deve ser aferido em função direta do pedido e da causa de pedir aduzidos pelas partes ou da matéria de exceção capaz de conduzir à inconcludência/improcedência da pretensão para a qual se visa obter tutela judicial, dele sendo excluídos os argumentos ou motivos de fundamentação jurídica esgrimidos/aduzidos pelas partes – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2022-10-11, Relator: ISAÍAS PÁDUA, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

49. Só há omissão de pronúncia, geradora da nulidade da alínea d) do nº1 do artigo 668º, se a decisão não aborda todas as questões que as partes submeteram à apreciação do tribunal, salvo as prejudicadas por solução dada a outras – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2006-10-31, Relator: SEBASTIÃO PÓVOAS, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

50. A omissão de pronúncia só é causa de nulidade da sentença quando o juiz não conhece questão que devia conhecer, e não quando apenas não tem em conta alguns dos argumentos aduzidos pela parte – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2023-02-01, Relator: JÚLIO GOMES, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

51. Não há omissão de pronúncia quando o Tribunal tenha respondido a todas as questões que podia e devia responder – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2023-06-22, Relatora: CATARINA SERRA, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

52. Se o Tribunal da Relação decide não conhecer da reapreciação da matéria de facto fixada na 1.ª instância, invocando o incumprimento das exigências de natureza formal decorrentes do artigo 640.º CPC, tal procedimento não configura uma situação de omissão de pronúncia – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2015-12-03, Relator: MELO LIMA, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

53. Não tendo sido claramente impugnada a decisão da matéria de facto, nomeadamente, com a indicação nas alegações do recurso de apelação dos pontos de facto que considera incorretamente julgados, não incorre em nulidade o acórdão da Relação que não conheceu da alteração da decisão da matéria de facto – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2006-06-08, Relator: JOÃO CAMILO, http://www. dgsi.pt/jstj.↩︎

54. LEBRE DE FREITAS, A Ação Declarativa Comum, À Luz do Código de Processo Civil de 2013, 4ª ed., p. 383.↩︎

55. FERREIRA DE ALMEIDA, Direito Processual Civil, volume II, 2ª edição, p. 437.↩︎

56. Ac. STJ de 1992-02-06, BMJ 414/413.↩︎

57. JOSÉ LEBRE DE FREITAS – A. MONTALVÃO MACHADO – RUI PINTO, Código de Processo Civil, Anotado, Artigos 381º a 675º, volume 2º, 2ª edição, Coimbra Editora, p. 681.↩︎

58. REMÉDIO MARQUES, Acão Declarativa à Luz do Código Revisto (pelo DL nº 303/2007, de 24 de agosto) Coimbra Editora, p. 426.↩︎

59. O erro de julgamento não se traduz em excesso ou omissão de pronúncia que implique a nulidade da sentença, pode é, ser tomado em consideração em sede de apreciação de mérito – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2021-02-09, Relator: JORGE DIAS, http://www. dgsi.pt/jstj.↩︎

60. O princípio do contraditório (audiatur et altera pars), enquanto princípio reitor do processo civil, exige que se dê a cada uma das partes a possibilidade de “deduzir as suas razões (de facto e de direito)”, de “oferecer as suas provas”, de “controlar as provas do adversário” e de “discretear sobre o valor e resultados de umas e outras” – MANUEL DE ANDRADE, Noções Elementares de Processo Civil, 1956, p. 364.↩︎

61. Acórdão do Tribunal Constitucional nº 177/2000, DR, II série, de 27/10/2000.↩︎

62. O princípio do contraditório envolve que cada uma das partes seja admitida a deduzir os seus fundamentos de facto e de direito, a oferecer os pertinentes meios de prova, a controlar as provas apresentadas pela outra e a discorrer sobre o valor e o resultado de umas e de outras – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2006-06-22, Relator: SALVADOR DA COSTA, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

63. O princípio da igualdade de armas, tal como o do contraditório, constitui manifestação do princípio geral da igualdade das partes, que implica a paridade simétrica das posições das partes perante o tribunal – artigo 4.º CPC – Ac. Tribunal da Relação de Évora de 2021-02-11, Relator: JOSÉ MANUEL BARATA, http://www.dgsi.pt/jtre.↩︎

64. MANUEL DE ANDRADE, Noções Elementares de Processo Civil, p. 379.↩︎

65. RODRIGUES BASTOS, Notas ao Código de Processo Civil, Vol. I, 3ª. ed., p. 48.↩︎

66. REMÉDIO MARQUES, Acão Declarativa à Luz do Código Revisto, p. 153.↩︎

67. O princípio do contraditório, previsto no art. 3º, nº 3, do NCPC, consiste numa garantia de participação efetiva que é concedida à parte contrária para se pronunciar sobre o desenvolvimento de todo o litígio, permitindo-se o exercício do seu direito de defesa com a exposição das suas razões e a discussão acerca da matéria que considera relevante para se alcançar a justa composição do litígio e a efetivação em juízo dos seus direitos – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2017-02-22, Relatora: ANA LUÍSA GERALDES, http:// www.dgsi.pt/jstj.↩︎

68. Atualmente, o princípio do contraditório é um dos princípios estruturantes do processo civil e tem como finalidade dar a oportunidade às partes de influenciar a decisão judicial que vai ser tomada – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2020-09-20, Relator: JORGE DIAS, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

69. MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA, Blogue do IPPC, “O que é uma nulidade processual?”, post publicado em 2018-04-17.↩︎

70. A LAV [de 2011] vem alterar o regime anterior, criando uma tramitação expedita com audição de ambas as partes. O novo regime deve ser restritivamente interpretado para impedir dilações na constituição do tribunal arbitral. Repare-se, aliás, que a possibilidade de o tribunal estadual poder indeferir o pedido de nomeação do árbitro em falta com fundamento em manifesta nulidade da convenção arbitral foi eliminada pelo atual regime. O que deve ser interpretado no sentido de a intervenção do tribunal da relação ser mínima, limitando-se tão só à nomeação do árbitro em falta. Não há aqui lugar a levantar quaisquer objeções à competência do tribunal arbitral (o que equivale à eficácia em sentido amplo da convenção), à regularidade da constituição (até então) do tribunal ou qualquer outro problema que as partes, na sua infinita imaginação, quiserem opor à designação do árbitro. O procedimento destina-se única e exclusivamente à designação do árbitro, todos os restantes problemas devem ser colocados perante e decididos pelo tribunal arbitral – MARIANA FRANÇA GOUVEIA, Curso de Resolução Alternativa de Litígios, 3ª edição, p. 198.↩︎

71. Em todo o caso, conforme adverte Mariana França Gouveia, importa salientar que este novo regime previsto na LAV [de 2011] deve ser restritivamente interpretado, de forma a impedir dilações na constituição do tribunal arbitral. Com efeito, não podemos esquecer que a intervenção do tribunal estadual visa apenas, e tão só, proceder à nomeação dos árbitros em falta; consequentemente, o contraditório da parte contrária deverá limitar-se a tal nomeação. Quer dizer, “não há aqui lugar a levantar quaisquer objeções à competência do tribunal arbitral (o que equivale à eficácia em sentido amplo da convenção), à regularidade da constituição (até então) do tribunal ou qualquer outro problema que as partes, na sua infinita imaginação, quiserem opor à designação do árbitro” – o procedimento em causa (e o contraditório a ele subjacente) reporta-se apenas à designação do(s) árbitro(s), pelo que “todos os restantes problemas devem ser colocados perante e decididos pelo tribunal arbitral” (Mariana França Gouveia, “Curso de Resolução Alternativa de Litígios”, cit., p. 198). Em sentido próximo, veja-se Pedro Metello de Nápoles, in Dário Moura Vicente (Coordenador), “Lei da Arbitragem Voluntária Anotada”, cit., p. 182 – ANTÓNIO PEDRO PINTO MONTEIRO – ARTUR FLAMÍNIO DA SILVA – DANIELA MIRANTE, Manual de Arbitragem, 2020, p. 256, (nota 1111).↩︎

72. Este mecanismo de nomeação dos árbitros pelo tribunal estadual ou por terceiros, conforme seja acordado, previne situações de impasse bem como manobras dilatórias que visem impedir ou atrasar a constituição do tribunal – ELSA DIAS OLIVEIRA, Arbitragem Voluntária: Uma Introdução, 2020, p. 66.↩︎

73. O objetivo deste artigo foi o de regular, de uma forma muito simples, os trâmites do processo através do qual o tribunal estadual competente (Tribunal da Relação ou Tribunal Central Administrativo) deverá exercer os poderes que lhes são conferidos em matéria de arbitragem, mas apenas no que respeita aos procedimentos tratados nas alíneas a) a d) do nº 1 do artigo 59º (os outros processos são objeto de diferente regulamentação). O resultado é um processo que se pretende muito expedito. De notar que o processo de nomeação de árbitro, que até agora decorria à revelia da parte contrária, passou agora a prever expressamente a audição da mesma. A razão de ser da alteração foi a de que não se justificava negar nesse caso específico o princípio do contraditório, tanto mais que o tempo envolvido na audição da contraparte não acarretará delonga excessiva para o processo. Apesar de o propósito deste procedimento, no caso da alínea a) do nº 1 do artigo 59º, ser única e exclusivamente o de proceder à nomeação do árbitro, justifica-se que ambas as partes se possam pronunciar sobre o perfil do árbitro a designar – PEDRO METELLO DE NÁPOLES, Lei da Arbitragem Voluntária Anotada, Coordenação de Dário Moura Vicente, 4ª edição, pp. 205/06, em anotação ao art. 60º da LAV.↩︎

74. Ac. Supremo Tribunal Administrativo de 2020-11-19, Relator: ADRIANO CUNHA, https://www.dgsi.pt/jsta.↩︎

75. O procedimento destina-se única e exclusivamente à designação do árbitro, todos os restantes problemas devem ser colocados perante e decididos pelo tribunal arbitral – MARIANA FRANÇA GOUVEIA, Curso de Resolução Alternativa de Litígios, 3ª edição, p. 198.↩︎

76. No domínio da jurisdição voluntária, os tribunais podem investigar livremente os factos que entendam necessários à decisão (artigo 986º, n.º 2 do CPCivil), recolher as informações e as provas que entendam pertinentes, rejeitando as demais (mesmo 986º, nº 2), decidir segundo critérios de conveniência e de oportunidade (artigo 987º), e, na generalidade dos casos, adaptar a solução definida à eventual evolução da situação de facto (artigo 988º, nº 1). Ora, quanto ao conteúdo da decisão e à sua fundamentação os processos de jurisdição voluntária não estão sujeitos a critérios de legalidade estrita podendo alicerçar a sua decisão em razões de oportunidade ou de conveniência, adotando as medidas mais aptas à satisfação do interesse, mesmo que estas não estejam exaustivamente tipificadas na lei. Porém, a emissão da decisão não pode alhear-se da existência de normas de natureza imperativa que, nomeadamente fixam os pressupostos processuais ou substantivos da decisão, impõem a realização de determinados atos processuais ou balizam o leque de mediadas a adotar. Este tipo de questões dirime-se já segundo critérios de legalidade estrita – ABRANTES GERALDES – PAULO PIMENTA – PIRES DE SOUSA, Código de Processo Civil Anotado, volume 2º, p. 437.↩︎

77. Vigora, entre nós, o princípio lógico e jurídico da competência dos tribunais arbitrais para decidirem sobre a sua própria competência, designado em idioma germânico por Kompetenz-kompetenz e que, na sua aceção negativa, impõe a prioridade do tribunal arbitral no julgamento da sua própria competência, obrigando os tribunais estaduais a absterem-se de decidir sobre essa matéria antes da decisão do tribunal arbitral – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2011-01-20, Relator: ÁLVARO DORIGUES, https://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

78. ALBERTO DOS REIS, Código de Processo Civil Anotado, vol. 5º, p. 58.↩︎

79. O juiz deve conhecer de todas as questões suscitadas pelas partes, exceto aquelas cujo conhecimento está prejudicado pela solução dada a outras – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2003-11-13, Relator: LUÍS FONSECA, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

80. ALBERTO DOS REIS, Código de Processo Civil Anotado, vol. 5º, p. 58.↩︎

81. Nos recursos devem ser conhecidas todas as questões que as partes tenham submetido à apreciação do Tribunal, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, o que se afere caso a caso – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2020-10-13, Relator: PEDRO DE LIMA GONÇALVES, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

82. Não constitui omissão de pronúncia, produtora de nulidade, o não conhecimento de questão que se considerou prejudicada face à solução dada a questão anterior – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2009-12-10, Relator: MÁRIO CRUZ, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

83. A nulidade por omissão de pronúncia pressupõe que o tribunal deixe de apreciar alguma questão submetida pelas partes à sua apreciação e que não tenha ficado prejudicada pela solução dada a outras, pelo que não padece daquele vício o acórdão confirmatório da decisão de declaração de incompetência em razão da matéria, ficando prejudicado o conhecimento das restantes questões suscitadas – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2020-12-02, Relator: FERNANDO SAMÕES, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

84. Tendo o acórdão reclamado conhecido das questões que lhe competia apreciar, não incorre em nulidade por omissão de pronúncia por não ter respondido, um a um, a todos os argumentos da recorrida ou por não ter apreciado questões com conhecimento prejudicado pela solução dada à anterior questão – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2002-10-16, Relator: MÁRIO TORRES, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

85. Estando certa questão prejudicada por solução já dada pelo tribunal, deixa de ser obrigatória a pronúncia sobre tal questão – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2019-05-09, Relator: OLINDO GERALDES, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

86. A nulidade por omissão de pronúncia apenas se verifica quando o tribunal deixe de conhecer questões temáticas centrais suscitadas pelos litigantes (ou de que se deva conhecer oficiosamente), cuja resolução não esteja prejudicada pela solução dada a outras – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2023-03-08, Relator: MÁRIO BELO MORGADO, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

87. Como o conceito de custas stricto sensu é polissémico, porque é suscetível de envolver, nos termos do artigo 529º/1, além da taxa de justiça, que, em regra, não é objeto de condenação – os encargos e as custas de parte, importa que o juiz, ou o coletivo de juízes, nos segmentos condenatórios das partes no pagamento de custas, expressem as vertentes a que a condenação se reporta – SALVADOR DA COSTA, As Custas Processuais, Análise e Comentário, 7ª ed., p. 8.↩︎

88. A decisão que julgue a ação ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da ação, quem do processo tirou proveito – art. 527º/1, do CPCivil.↩︎

89. A assinatura eletrónica substitui e dispensa para todos os efeitos a assinatura autógrafa em suporte de papel dos atos processuais – art. 19º/2, da Portaria n.º 280/2013, de 26/08, com as alterações introduzidas pela Portaria n.º 267/2018, de 20/09.↩︎

90. Acórdão assinado digitalmente – certificados apostos no canto superior esquerdo da primeira página.↩︎