PROCEDIMENTO EXTRAJUDICIAL DE REGULARIZAÇÃO DA SITUAÇÃO DE INCUMPRIMENTO (PERSI)
COBERTURA
Sumário

I - O regime legal do PERSI - Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento - não obriga a instituição bancária a enviar as comunicações dele decorrentes através de correio registado.
II - Se a intenção do legislador fosse a de sujeitar as partes do procedimento a comunicar através de correio registado, tê-lo-ia consagrado expressamente.
III - Apresentando a instituição bancária cópia das cartas simples enviadas aos executados no âmbito do PERSI, estas constituem princípio de prova do envio da comunicação, pelo que o juiz não pode oficiosamente concluir pela não recepção de tais cartas.
IV - Compete à executada, através dos meios processuais ao seu alcance, efectuar essa alegação, caso em que a exequente oferece a prova, inclusive testemunhal, apta a demonstrar o efectivo recebimento da correspondência.
V - Trata-se de matéria controvertida que deverá ser alvo de prova, pelo que o processo deverá prosseguir para discussão e prova dessa factualidade alegada e de outra que venha a ser tida por relevante, para ampliação da decisão de facto em ordem a constituir base suficiente para a decisão de direito.

Texto Integral

Recurso de Apelação - 3ª Secção
ECLI:PT:TRP:2024:6753/23.0T8PRT-A.P1

Acordam no Tribunal da Relação do Porto

1. Relatório
Por apenso à execução em que é actualmente exequente A..., S.A., com sede na Alameda ..., ..., Piso ..., ... Lisboa, por virtude da cessão de créditos do Banco 1..., S.A., veio a executada, AA, residente na Rua ..., ..., ... ..., Matosinhos, deduzir embargos de executado, onde concluiu pedindo a sua procedência com a consequente extinção da execução.
Invocou, além do mais, a excepção dilatória do incumprimento do regime previsto no Decreto-Lei nº 227/2012, de 25-10 (PERSI), argumentando que a exequente não o cumpriu.

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Notificada, a exequente apresentou contestação, pugnando pela improcedência dos embargos, asseverando, designadamente, ter integrado a embargante no sistema PERSI.
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Foi proferido despacho saneador sentença que julgou procedentes os embargos de executado e determinou a absolvição da aqui embargante AA da instância executiva e, por força da mesma, a extinção da execução.
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Não se conformando com a decisão proferida, a recorrente A..., S.A., veio interpor recurso de apelação, em cujas alegações conclui da seguinte forma:

I.A Apelante não se conforma com a Sentença proferida pelo Tribunal de 1ª instância, pelo que dela decorre, já que face aos factos alegados e bem assim à prova produzida nos autos, teria que necessariamente conduzir à improcedência dos embargos de executado apresentados.

II. O Tribunal de 1ª instância fez diversas interpretações erradas da lei, nomeadamente, do disposto nos artigos 14º, n.º 4 e 17º, n.º 3 do DL 227/2012, de 25/10.

III. Fundamentou o Tribunal a quo a sua decisão no entendimento de que a Exequente, ora Apelante, apenas demonstrou o envio de uma carta simples a comunicar a integração de AA no PERSI, e posteriormente a extinção do PERSI por regularização da dívida, enviou uma missiva simples dos 15 dias posteriores, comunicando afinal a extinção do PERSI por insolvência do co-mutuário.

IV. Entendeu, contudo, o douto tribunal a quo, que não ficou demonstrado que tal missiva tenha sido efetivamente recebida pela embargante, defendendo que a citada lei constante no DL n.º 227/2012 de 25/10, exige o envio de suporte duradouro, o que implica a prova de que tal missiva tenha sido efetivamente recebida pela embargante.

V. A alegada falta de integração do PERSI não se verifica, já que este procedimento foi empreendido de forma clara e inequívoca pelo Recorrente, em estrito cumprimento das obrigações legais a que está adstrito.

VI. A Recorrente sempre pautou a sua conduta de forma diligente, dando sempre primazia à resolução extrajudicial, o que é, desde logo, facilmente comprovado pelas sucessivas tentativas de resolução amigável encetadas, embora sem sucesso.

VII. Conforme consta da douta sentença recorrida, a integração no sistema PERSI, pela exequente relativamente à executada primitiva, enquanto incumpridora, é obrigatória, sendo que apenas quando está demonstrado que foi feita a introdução no PERSI e foi extinto tal procedimento extrajudicial, é que o credor bancário poderá instaurar a execução.

VIII. Dos factos provados nestes autos, é possível aferir que o banco credor enviou cartas simples à executada, aqui Recorrida, informando-a da sua integração e posterior extinção do Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI), regulado no Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25 de Outubro, talqualmente previsto.

IX. Nos termos do disposto nos artigos 14º, n.º 4 e 17º, n.º 3 do DL 227/2012, de 25/10, as comunicações de integração dos executados no PERSI e respetiva extinção do procedimento têm de ser feitas num suporte duradouro (que inclui uma carta ou um e-mail), não se exigindo, porém, que as mesmas sejam acompanhadas de registo ou aviso de receção.

X. Nos termos do nº 4 da referida norma, a aqui Recorrente tinha efetivamente o dever de informar a executada da sua integração/extinção no PERSI através de comunicação em suporte duradouro, entendendo-se como tal, nos termos do artigo 3º, al. h), qualquer instrumento que permita armazenar informações durante um período de tempo adequado aos fins a que as informações se destinam e que possibilite a reprodução integral e inalterada das informações armazenadas.

XI. Conclui-se assim que se tem por cumprida tal condição de precedência da ação, com a junção aos autos deste procedimento em suporte que se considera duradouro, na medida em que documenta a sua instauração e a sua extinção, com as atinentes missivas enviadas à cliente, e que aqui foram provadas.

XII. Este tem sido também o entendimento acolhido pela maioria da nossa jurisprudência, nomeadamente por esta Relação, de que são exemplo vários acórdãos que concluem que se a intenção do legislador fosse a de sujeitar as partes do procedimento extrajudicial de regularização das situações de incumprimento a comunicar através de carta registada com aviso de receção, tê-la-ia consagrado expressamente.

XIII. Ficou cabalmente demonstrado que a Recorrente juntou aos autos cópias das cartas enviadas à Executada, provando, ter-lhes comunicado “em suporte duradouro” tanto a integração em PERSI, como a extinção do procedimento.

XIV. Concluindo-se assim que a instituição bancária não está, nem pode estar obrigada a utilizar correio registado ou aviso de recepção para cumprir a obrigação legal sub judice, já que a lei não o prevê nem consagra expressamente.

XV. A exigibilidade e formalismo estabelecido para este procedimento, nos termos das decisões jurisprudenciais que têm vindo a ser proferidas, não se coaduna com o que a lei estabelece, sendo certo que a procedência desta exceção inominada, apenas privilegiaria a posição da Embargante que com isto se escuda ao cumprimento das suas obrigações e inerentes dívidas que geram, em claro detrimento e prejuízo do credor.

XVI. Fica assim demonstrado o desacerto da Sentença recorrida, tendo em conta os argumentos supra expendidos e que nesta sede se reproduzem, pelo que a interpretação e aplicação do direito pelo Tribunal a quo para fundamentar a douta sentença que julgou verificada a exceção dilatória inominada, não está em perfeição com as normas aplicáveis, pelo que, face à análise casuística da situação sub judice, é forçoso concluir que a decisão ora recorrida, violou o disposto nos artigos 14º, n.º 4 e 17º, n.º 3 do DL 227/2012, de 25/10.
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Foram apresentadas contra-alegações.
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Colhidos que se mostram os vistos legais e nada obstando ao conhecimento do recurso, cumpre decidir.
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2. Factos provados
O Tribunal a quo considerou assentes os seguintes factos:
1.No exercício da sua actividade o Banco 1... S.A., celebrou em 9.5.2018, lhes emprestou a quantia de € 225.000,00 com a Executada AA e com BB, um acordo, denominado “Mútuo com Hipoteca” que estes se comprometeram a reembolsar em 344 prestações mensais e sucessivas de capital e de juros, nos demais termos constantes do documento n.º 4 junto com o requerimento executivo – Escritura e documento complementar, cujo teor no mais, se dá aqui por reproduzido.
2. Para garantia do capital mutuado no contrato supra referido, respectivos juros e despesas, foi constituída sobre a fracção autónoma designada pela letra “X”, correspondente a habitação, no segundo andar, sito na Rua ..., com tudo o que a compõe, a qual faz parte do prédio urbano constituído em regime de propriedade horizontal, registada pela inscrição pela AP. ... de 2002/08/27, sito em ..., descrito na CRP de Matosinhos sob o n.º ... e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ... registada na Conservatória do Registo Predial sob a AP. ... de 2018/05/09.
3. Não foi paga a prestação que se venceu a 30/06/2022 nem as vencidas posteriormente.
4. Por Contrato de Cessão de Créditos, assinado em 14 de Outubro de 2022, o Banco 1..., S.A. cedeu os créditos identificados como: 70_1692028243_MLS, que detinha sobre a Executada e todas as garantias acessórias a eles inerentes, à A..., S.A., aqui Exequente, nos termos constantes do documento n.º 1 junto com o requerimento executivo, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
5. O co-mutuário BB foi declarado insolvente no âmbito do processo judicial n.º 2450/22.2T8STS, que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo de Comércio de Santo Tirso - J1.
6. O Banco credor, através de Carta simples 2.ª via datada de 29.8.2022, enviada por correio simples, à executada, informou-a que havia sido integrada no PERSI, nos termos constantes do documento junto aos autos em 18.9.2023, cujo teor se dá aqui por reproduzido.
7. O Banco credor, através de Carta datada de 21.10.2022, enviada por correio simples, à executada, informando-a que o PERSI se havia extinto, regularização dos valores em divida, nos termos constantes do documento junto aos autos em 18.9.2023, cujo teor se dá aqui por reproduzido.
8. Posteriormente, o Banco Credor através de Carta datada de 3.11.2022, enviada por correio simples, à executada, informou-a que o PERSI se havia extinto face à declaração de insolvência do co-executado BB.
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3. Delimitação do objecto do recurso; questões a apreciar:
Das conclusões formuladas pela recorrente as quais delimitam o objecto do recurso, tem-se que a questão a resolver no âmbito do presente recurso prende-se com saber se o Banco deu cumprimento ao PERSI, condição de exequibilidade da obrigação exequenda, face ao disposto na alínea b) do nº 1, e do nº 4 do artigo 18º do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25 de outubro.
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4. Conhecimento do mérito do recurso
Mostra-se pacífico nos autos que a situação sob apreciação assume integração no denominado PERSI, previsto no Decreto Lei n.º 227/2012, de 25.10, que estabelece os princípios e regras a observar pelas instituições de crédito na prevenção e na regularização das situações de incumprimento de contratos de crédito pelos clientes bancários e cria a rede extrajudicial de apoio a esses clientes bancários no âmbito da regularização dessas situações.
Tal diploma, conforme esclarece o seu preâmbulo, pretendeu “(…) estabelecer um conjunto de medidas que, refletindo as melhores práticas a nível internacional, promovam a prevenção do incumprimento e, bem assim, a regularização das situações de incumprimento de contratos celebrados com consumidores que se revelem incapazes de cumprir os compromissos financeiros assumidos perante instituições de crédito por factos de natureza diversa, em especial o desemprego e a quebra anómala dos rendimentos auferidos em conexão com as atuais dificuldades económicas.
Em concreto, prevê-se que cada instituição de crédito crie um Plano de Acão para o Risco de Incumprimento (PARI), fixando, com base no presente diploma, procedimentos e medidas de acompanhamento da execução dos contratos de crédito que, por um lado, possibilitem a deteção precoce de indícios de risco de incumprimento e o acompanhamento dos consumidores que comuniquem dificuldades no cumprimento das obrigações decorrentes dos referidos contratos e que, por outro lado, promovam a adoção célere de medidas suscetíveis de prevenir o referido incumprimento.
Adicionalmente, define-se um Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI), no âmbito do qual as instituições de crédito devem aferir da natureza pontual ou duradoura do incumprimento registado, avaliar a capacidade financeira do consumidor e, sempre que tal seja viável, apresentar propostas de regularização adequadas à situação financeira, objetivos e necessidades do consumidor.”.
O PERSI caracteriza-se por comportar três fases essenciais: uma inicial, outra de avaliação e proposta e de negociação (artigos. 14.º, 15.º e 16.º, do DL n.º 227/2012), extinguindo-se, nos termos previstos no artigo 17.º, do referido diploma.
De acordo com o disposto nos artigos 14.º, n.º 4 e 17.º, n.º 3, do citado DL, a integração no PERSI e a extinção do procedimento, têm de ser comunicadas pela instituição de crédito ao cliente “através de comunicação em suporte duradouro”, sem prejuízo dos requisitos exigíveis quanto ao conteúdo dessas comunicações.
Ora, quer a comunicação de integração no PERSI, quer a de extinção do mesmo, constituem condição de admissibilidade da acção (declarativa ou executiva), consubstanciando a sua falta uma excepção dilatória insuprível, de conhecimento oficioso, que determina a extinção da instância (artigo 576, nº 2, do Código de Processo Civil).
No que se refere à concretização do conceito de comunicação em suporte duradouro, a alínea h) do artigo 3.º define-a como “qualquer instrumento que permita armazenar informações durante um período de tempo adequado aos fins a que as informações se destinam e que possibilite a reprodução integral e inalterada das informações armazenadas.”.
Ou seja, a lei exige uma determinada forma de levar ao conhecimento dos devedores que os mesmos foram integrados no PERSI e, também, que este foi declarado extinto. Com efeito, e nos termos do citado diploma legal, a comunicação - quer da integração do devedor no PERSI, quer a extinção deste - deve ser feita em “suporte duradouro”, isto é, através de «qualquer instrumento que permita armazenar informações durante um período de tempo adequado aos fins a que as informações se destinam e que possibilite a reprodução integral e inalterada das informações armazenadas» - cfr. artigo 3.º, alínea h), do citado D/L n.º 227/2012.
Tal «suporte duradouro» pode ser o papel mas também pode ser um meio electrónico, como um email ou um CD-ROM. E, assim sendo, como efectivamente o é, as comunicações em causa podem ser feitas através de carta. E até através de carta simples porquanto o D/L n.º 227/2012 impõe apenas que a comunicação seja feita em “suporte duradouro”.
Como se diz no Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 22-09-2021, proc. n.º 173/21.9T8ENT-A.E1, relator Manuel Bargado, consultável em www.dgsi.pt., «As comunicações de integração e de extinção do PERSI têm de ser feitas num suporte duradouro (que inclui uma carta ou um e-mail), conforme ressalta da leitura dos artigos 14.º, n.º 4 e 17.º, n.º 3, do DL 227/2012, de 25/10. Se a intenção do legislador fosse a de sujeitar as partes do procedimento extrajudicial de regularização das situações de incumprimento a comunicar através de carta registada com aviso de receção, tê-la-ia consagrado expressamente. Não está assim obrigada a instituição bancária a utilizar correio registado com aviso de receção para cumprir a referida obrigação legal».
Essencial, diremos nós, é que as declarações de integração dos devedores no PERSI e a extinção deste Plano, quando é o caso, ainda que formalizadas em carta simples (como sucedeu no caso presente) cheguem ao poder dos devedores ou se tornem deles conhecidas.
Ou seja, estamos, sem dúvida, perante comunicações que, para produzirem os efeitos respectivos, têm de chegar ao poder ou ser conhecidas pelo(s) cliente(s) bancário(s) que está(ão) em situação de incumprimento do(s) contrato(s) de crédito. Dito de outro modo, estamos perante declarações receptícias (artigo 224.º, n.º 1, do Código Civil), o que significa que tem de ser feita a prova não só da sua existência mas também do seu envio aos devedores e recepção por estes, cabendo o ónus da prova desses factos à instituição de crédito porquanto se trata de condição indispensável para o exercício do direito (de crédito) que pretende fazer valer – neste sentido, entre outros, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13-04-2021, proc. n.º 1311/19.7T8ENT-B.E1.S1, relatora Graça Amaral, que aqui seguimos de perto em diversos segmentos e Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 21-05-2020, proc. n.º 5585/15.4T8FNC-A.L2-2, relatora Laurinda Gemas, ambos consultáveis em www.dgsi.pt.
No caso em apreço, encontra-se assente que:
- O Banco credor, através de Carta simples 2.ª via datada de 29.8.2022, enviada por correio simples, à executada, informou-a que havia sido integrada no PERSI, nos termos constantes do documento junto aos autos em 18.9.2023, cujo teor se dá aqui por reproduzido.
- O Banco credor, através de Carta datada de 21.10.2022, enviada por correio simples, à executada, informando-a que o PERSI se havia extinto, regularização dos valores em divida, nos termos constantes do documento junto aos autos em 18.9.2023, cujo teor se dá aqui por reproduzido.
- Posteriormente, o Banco Credor através de Carta datada de 3.11.2022, enviada por correio simples, à executada, informou-a que o PERSI se havia extinto face à declaração de insolvência do co-executado BB.”.
Ou seja, encontra-se assente, sem oposição das partes, que a integração no PERSI foi enviada à executada/embargante através da carta referida no ponto 4 dos factos provados, datada de 02.01.2018, e, posteriormente, foi igualmente enviada a decisão de extinção da medida (carta mencionado no ponto 5 dos mesmos factos).
É certo que a existência das cartas e o seu envio não se confunde com a sua recepção, no entanto, além da prova documental, a Apelante arrolou uma testemunha.
Ou seja, parece-nos não ser controvertido que a existência das cartas não se confunde com o respectivo envio aos devedores e a sua recepção por estes últimos. Mas o facto é que o envio aos devedores e a recepção por estes das referidas declarações são imprescindíveis para que haja a “comunicação” imposta por lei. Consequentemente, a prova da concretização das comunicações em causa – quer a de inserção dos devedores no PERSI quer a de extinção do PERSI que possibilitam ao credor reclamar judicialmente a satisfação do seu crédito – implica não só a prova da sua existência, como ainda a prova do seu envio aos devedores e da respetiva recepção/conhecimento por estes últimos na medida em que, como supra assinalámos, se trata de declarações receptícias.
Com efeito, o envio das cartas simples não constitui, por si só, prova da consequente recepção/conhecimento das mesmas pela Executada.
De resto, ainda que o Tribunal a quo entendesse que a prova da recepção das comunicações não poderia fazer-se por testemunhas, teria pelo menos de admitir que a mesma poderia fazer-se por confissão expressa em sede de embargos de executado, pelo que ao julgar procedente a excepção, ainda para mais em sede de despacho saneador, coartaria a possibilidade de obtenção dessa confissão através, por exemplo, do depoimento de parte da executada/embargante em audiência de julgamento, depoimento esse que pode também ser determinado oficiosamente pelo juiz (cfr. arts. 452 e ss. do Código de Processo Civil).
Trata-se de matéria controvertida que deverá ser alvo de prova, pelo que o processo deverá prosseguir para discussão e prova dessa factualidade alegada e de outra que venha a ser tida por relevante, para ampliação da decisão de facto em ordem a constituir base suficiente para a decisão de direito.
Nesta conformidade, afigura-se-nos que, tendo em conta o exposto, o Tribunal Recorrido não podia, desde já, proferir a decisão aqui posta em crise.
Conclui-se, pois, que os presentes autos devem prosseguir os seus ulteriores termos processuais, sendo de admitir que, produzindo-se prova sobre essa factualidade, seja proferida uma decisão conscienciosa da questão de mérito, apreciando-se as demais questões suscitadas nos embargos, caso venha a ser julgada improcedente a referida excepção.
Impõe-se, por isso e ao abrigo do disposto no artigo 662.º, n.º 2, alínea c), anular o despacho saneador para ampliação da decisão de facto nos termos atrás referidos.

Sumariando, em jeito de síntese conclusiva:
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5. Decisão
Nestes termos, acorda-se neste Tribunal da Relação do Porto em anular o despacho saneador para ampliação da decisão de facto nos termos atrás referidos, devendo os autos prosseguir os seus termos.
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Custas a cargo da Apelada.
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Notifique.

Porto, 07 de Março de 2024
Os Juízes Desembargadores
Paulo Dias da Silva
João Venade
Paulo Duarte Teixeira

(a presente peça processual foi produzida com o uso de meios informáticos e tem assinaturas electrónicas e por opção exclusiva do relator, o presente texto não obedece às regras do novo acordo ortográfico, salvo quanto às transcrições/citações, que mantêm a ortografia de origem)