ACÇÃO DE ALTERAÇÃO DAS RESPONSABILIDADES PARENTAIS
NULIDADE DE DECISÃO
ESGOTAMENTO DO PODER JURISDICIONAL
LITIGÂNCIA DE MÁ FÉ
OMISSÃO DE FACTOS
Sumário


I - A violação da regra do esgotamento do poder jurisdicional não se traduz no conhecimento de questão que o tribunal não podia conhecer e, portanto, não integra a nulidade a que se se refere a 2ª parte da alínea d) do n.º 1 do art.º 615º do CPC, antes corresponde a uma realidade de natureza diversa e com consequência própria – a ineficácia da segunda decisão.
II – Relativamente ao “momento” de conhecimento da litigância de má fé, há que distinguir três situações:
a) Se a questão da litigância de má fé tiver sido suscitada por uma das partes (ou por ambas) no decurso do processo, a questão deve ser apreciada pelo juiz na sentença, não a podendo relegar para qualquer momento ulterior; se não o fizer, a sentença será nula por omissão de pronúncia; neste circunstancialismo, o juiz não pode, de motu próprio e a posteriori, conhecer da questão, sob pena de violar a regra do esgotamento do poder jurisdicional; só o poderá fazer se a sentença admitir recurso, o mesmo for interposto e nele for invocada a citada nulidade, situação em que a pode suprir - art.ºs 613º, n.º 2 e 617º, n.ºs 1 e 2 -, ou, não admitindo recurso, a parte interessada “reclamar” da omissão, o qual poderá, então, ser suprida.
b) Se a questão não tiver sido suscitada por nenhuma das partes e o tribunal, na sentença, não a suscitar, também já não o poderá fazer a posteriori por estar esgotado o seu poder jurisdicional.
Se a questão não tiver sido suscitada por nenhuma das partes, mas o tribunal, no final da sentença, a suscita, convidando a parte visada a exercer o contraditório, a decisão quanto à litigância de má fé poderá ser proferida em momento posterior à decisão final, não havendo violação da regra do esgotamento do poder jurisdicional, por que tal questão não foi suscitada nem conhecida e é autonomizável do conhecimento do mérito.
III – O n.º 2 do art.º 542º do CPC contempla elementos subjectivos (o dolo e a negligência grave) e elementos objectivos (as condutas identificadas nas várias alíneas do n.º 2, as quais traduzem o conjunto de deveres processuais que radicam no dever processual geral, imposto a todas as partes, de agir de boa-fé e que constituem, afinal, o fundamento da condenação por litigância de má fé: a violação de deveres processuais).
IV - As condutas tipificadas nas alíneas a) e b) do n.º 2 do art.º 542º do CPC, tendem a ser aplicadas cumulativamente porque a parte tende a alterar ou omitir factos para, partindo da realidade tal como ela é apresentada, deduzir pretensão ou oposição infundada.
V – Para que a parte incorra em litigância de má fé à luz da alínea b), é necessário que a parte altere ou omita “factos relevantes para a decisão da causa”, pelo que a alteração ou omissão de factos só é censurável à luz de tal alínea, se e na medida em que tiverem sido considerados provados factos contrários aos alegados ou factos omitidos e uns e/ou outros forem determinantes, tiveram tido influência decisiva no desfecho da causa.
VI - A litigância de má é um instituto que tem em vista as ocorrências num processo em concreto e não as ocorrências em outro processo.

Texto Integral


Acordam na 1ª secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães

1. Relatório

Por apenso ao Processo de Homologação do Acordo Extrajudicial de Regulação do Exercício das Responsabilidades Parentais, AA deduziu Acção de Alteração das Responsabilidades Parentais contra BB, pedindo a alteração dos alimentos por si devidos aos menores, no valor de € 135,00 para cada um deles, para o valor mensal de € 80,00, e que no mês das férias de verão, em que os menores permanecem a seu cargo durante um período ininterrupto de 15 dias, o montante devido a título de alimentos, por cada um dos menores, fosse reduzido a metade.

Alegou para tanto que: requerente e requerido são pais dos menores CC e DD; por decisão proferida a 12/09/2013 no Processo de Homologação de Acordo Extrajudicial de Regulação do Exercício das Responsabilidades Parentais n.º 1949/13.... foi homologado o acordo relativamente ao menor CC; e por decisão proferida 22/11/2016, no âmbito do Processo de Homologação de Acordo Extrajudicial de Regulação do Exercício das Responsabilidades Parentais n.º 3650/16...., de que os presentes são apenso, foi homologado o acordo quanto ao menor DD, tendo o requerente ficado obrigado a pagar a quantia de € 135,00 mensais a título de alimentos; no apenso B do processo n.º 3650/16...., a 31/10/2016, foi actualizado o montante dos alimentos para o menor CC, tendo o requerente ficado obrigado a pagar a quantia de € 135,00 mensais.

Mais alegou que: em Abril de 2019 mudou-se para o ..., onde passou a residir, de favor, em casa dos pais da sua actual companheira, sem pagar renda ou outra prestação; em maio de 2022 comprou a fracção autónoma que identifica, sita em ..., ..., onde passou a residir em junho de 2022; para a aquisição da dita fracção recorreu ao crédito bancário, suportando mensalmente por conta desse empréstimo o montante de € 404,52, acrescido do montante de cerca de € 51,25 por mês a título de seguros (vida e imóvel); o requerente continua a exercer a sua actividade profissional  em ..., para onde se desloca em automóvel próprio, despendendo por mês € 557,48; em dois sábados em cada mês, quando os menores se encontram consigo, o requerente tem de se deslocar a ... para aqueles participarem nos treinos e jogos de futebol, no que despende € 77,00; o requerente tem despesas de electricidade, água gás, televisão, internet e telemóvel, vestuário, alimentação e higiene, que indica, no total de € 346,00; aquando da regulação das responsabilidades dos menores ficou estabelecido que o requerente pagaria metade das despesas escolares e de saúde dos mesmos, mediante a apresentação de comprovativos por parte da progenitora; indica as quantias que pagou a título de despesas extra; o requerente aufere o salário base ilíquido de € 705,00, a que acresce subsídio de alimentação de €4,77; o requerente suporta despesas médicas e medicamentosas dos menores de € 70,00 em média; as despesas totais, incluindo os alimentos devidos aos menores, ascendem a € 1706,25.

A requerida citada, apresentou alegações, dizendo, em síntese, que: se, eventualmente, o Requerente viu a sua situação económica substancialmente diminuída, foi ele que se colocou nessa circunstância, já que continua a efetuar alterações à sua vida pessoal, sem ter qualquer preocupação com os seus filhos; o Requerente omitiu deliberadamente que adquiriu habitação com a atual companheira em ..., querendo fazer crer que liquida sozinho todas as despesas da casa de morada de família, o que é falso; e no último artigo das suas alegações afirma: o ”requerente litiga de má fé, o que expressamente se invoca para todos os efeitos legais.”

O Ministério Público promoveu “se julgue infundado o pedido de alteração, ordenando-se o arquivamento dos autos – art. 42.º n.º 4 RGPTC.”

Foi designada data para conferência de interessados, a qual se realizou, tendo sido proferida decisão com o seguinte teor:
“Determinamos o arquivamento dos autos (art. 42º, n.º 4 RGPTC).”

O requerente interpôs recurso da referida decisão.

Nesta RG foi proferida decisão sumária que julgou “procedente o recurso de apelação, nos termos expostos, revogando-se a decisão recorrida, devendo os autos prosseguir nos termos do art.º 42º n.º 5 do RGPTC.”

Devolvidos os autos ao tribunal a quo, foi designada data para inquirição de testemunhas, a qual teve lugar.

A 26/07/2023 foi proferida sentença com o seguinte decisório:
“Consideramos improcedente a pretensão de AA
Custas pelo progenitor. Notifique a fim de poder pronunciar-se sobre eventual litigância de má fé.”

O requerente pronunciou-se dizendo, em síntese, que: a notificação para se pronunciar sobre a eventual litigância de má fé, contra si arguida pela requerida em sede de alegações, foi realizada depois de ter sido proferida e notificada a sentença; essa sentença é omissa quanto ao pedido de condenação do requerente como litigante de má fé; após a prolação da sentença já não é lícito ao tribunal conhecer da alegada litigância de má fé, por estar esgotado o poder jurisdicional; quando a parte, na pendência da causa, assume uma conduta processual susceptível de ser subsumida ao disposto no art.º 542º, n.º 1 do CPC, é na sentença que põe termo ao processo que o juiz deve fazer essa apreciação, o que é corroborado pelo n.º 3 do art.º 543º do CPC; caso venha a ser proferida decisão que condene o requerente como litigante de má fé, tal decisão enfermará de nulidade por excesso de pronúncia; o requerente não age de má fé; o facto de não ter conseguido provar o que alegou, não é fundamento para condenar o requerente como litigante de má fé; o requerente não actuou com intenção ou consciência de deduzir uma pretensão absurda ou infundada, cuja falta de fundamento não ignorava ou não devia ignorar; nunca teve intenção de ocultar a compra da fracção autónoma em ... em conjunto com a sua companheira, nem a venda do apartamento em ...; vivendo em casal, as despesas são asseguradas por ambos, nunca tendo sido intenção do requerente alegar o contrário; não existe qualquer facto provado que evidencie a má fé do requerente; não se vislumbra como é que se poderá considerar a actuação do requerente como dolosa.

A 20/09/2023 foi proferida a seguinte decisão:
AA veio – contra BB – pedir a redução da mensalidade relativa a alimentos para os dois filhos.

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Trouxe como argumentação:
10.- Em Abril de 2019 mudou-se para o ..., onde passou a viver em casa dos pais daa actual companheira, sem pagar renda ou outra prestação.
11.- … manteve-se aí a residir até … Maio de 2022.
12.- 13.- E em Junho de 2022 passou para ..., após aí comprar um andar.
14.- Recorreu ao crédito … suportando mensalmente por conta desse empréstimo … €404,52 acrescido de €51,25 de seguros (doc 5 e 6 que indicam tais valores como os totais a pagar).
15.- … tem ainda as seguintes despesas mensais fixas, luz (€37) água (€20) gás (€34) tv, internet, telemóvel (€25).
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A matéria comprovada nos presentes:
6-8, 11, 18, 19- Por escritura de Maio de 2022 o A e companheira compraram andar em ... (...). (12) E aí passou a habitar no mês seguinte. (13) O A recorreu para tanto a crédito, correspondendo a prestação a €404,52 e o seguro correspondente, a €51,25 por mês. (14) O A tem despesas com electricidade, água, gás, tv, internet, telefone. (23) Ele e a companheira compraram andar em .... (c19) E com esta divide o pagamento do empréstimo e seguro correspondente e das despesas com os abastecimentos domésticos (água, electricidade, gás, tv …).
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A invocada gratuitidade quanto a casa (no ...) fornecida pelo pai da companheira é desmentida pelo próprio AA (e pela companheira também) no alegado em anterior processo de alteração (ap. E). Recorda-se o que articulou então (Outubro de 2019):
23º…deixou ...…passou a residir com companheira no ...…24º actualmente tem de comparticipar nas despesas mensais do seu agregado…37º suporta renda de € 350…
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Apesar do exposto por AA (ausência de verdadeiro dolo e de qualquer facto que evidencie má-fé) constata-se clara divergência entre o alegado e a realidade comprovada (as despesas com a casa e o empréstimo não lhe cabem na íntegra, antes são partilhados com a companheira) e entre alegações em alterações distintas (2022 e 2019) e entre casa de graça e comparticipação efectiva em gastos com habitação. A disparidade não pode deixar de se considerar consciente, tal como a finalidade de adequar a sua visão (distorcida) da realidade à finalidade proposta: redução das responsabilidades subsequente a debilitação da situação económica. A conduta adequa-se à previsão da al. a) do n.1 do artigo 542º CPC e exige condenação em multa, em montante humilde (art. 27º RCJ).
*
Interpelado AA, veio manifestar-se pela extemporaneidade da apreciação da má-fé após a decisão relativa à pedida alteração das responsabilidades. É manifesto que a decisão tem de ser posterior à identificação dos factos e à possibilidade de as partes se pronunciarem. O esgotamento do poder jurisdicional refere-se apenas à matéria da causa, a alteração do regime de regulação, mantendo-se a decisão e fundamentos imutáveis com a apreciação posterior da conduta processual exageradamente inapropriada e censurável da parte.
A aceitar-se a leitura do A, a vigência da norma (art. 542º) ficaria dependente do consentimento do mesmo. Se o tribunal lhe garantisse o contraditório, o acesso ao direito e à defesa, resvalaria para a incapacidade/esgotamento para apreciação da constatada conduta nefasta na lide; se decidisse sobre a má-fé de imediato, sem facultar a hipótese de prévia pronúncia, cairia em vício de omissão do contraditório, no desrespeito da lei fundamental e na promoção da proibição da indefesa.
Tem-se como correcta a leitura do ac. R.C. de 16-03-2021 (F. Ramos) proc. 2504/20.0T8CBR, in dgsi.pt: … não podia de imediato proferir decisão condenatória quanto à litigância de má-fé, por carecer de garantir o contraditório (3º n.3) sob pena de nulidade … infundada a argumentação de que aquando da prolação da decisão … o poder jurisdicional se encontrava esgotado.
E também a do ac. SJT de 11-09-2012 (Fonseca Ramos) proc. 2326/11.09TBLLE, in dgsi.pt: Nas suas contra-alegações requer a R.da a condenação do recorrente como litigante … por deduzir oposição e agora interpor recurso cuja falta de fundamento não podia ignorar. O recorrente nada disse, apesar de notificado pela R.da … Parece que … foi observado o contraditório e a decisão de condenação não emerge, destarte, como decisão-surpresa. Dissentimos. A pretensão teria que ser apreciada pelo Tribunal …que … para não incorrer numa condenação surpresa, teria ele mesmo … de notificar a parte para, ante a possibilidade de ser condenado como litigante de má-fé, se pronunciar antes da decisão, tendo a oportunidade de refutar, querendo … a possibilidade de defesa tem de ser efectiva e só pode cumprir-se … se o putativo condenado conhecer os comportamentos pelos quais poderá … condenado … Ao não ter sido dada ao … prévia oportunidade de se pronunciar sobre a intenção dos julgadores o sancionarem como litigante de má-fé … cometeu-se uma nulidade … omissão de formalidade relacionada com o direito de defesa, sendo ilegal a proibição da indefesa … a condenação … sem a sua prévia audição, violaria os princípios constitucionais de acesso ao direito, do contraditório e da proibição da indefesa, consagrados na lei fundamental.
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Condenamos o A (AA) como litigante de má-fé (art. 542º CPC) na multa correspondente a quatro uc. Notifique.

O requerente interpôs recurso desta decisão, pedindo a revogação da decisão recorrida, tendo terminado as suas alegações com as seguintes conclusões:

I. O presente recurso vem interposto do douto despacho, datado de 20.09.2023 que condenou o Recorrente como litigante de má-fé, em multa do montante equivalente a 4 unidades de conta [nos termos e para os efeitos do previsto no disposto no nº 2 do art. 644º, nº 4, al. g) do CPC, conjugado com os arts 32º e 33º, ambos do RGPTC],
II. O conhecimento da questão da litigância de má-fé é matéria cuja apreciação não podia ter sido efetuada no momento em que o foi, por parte do tribunal recorrido, uma vez que, tal decisão desrespeitou o disposto no art.º 613º do CPC (sendo certo que, por outro lado, não se verificam os seus pressupostos e fundamentos, como infra se explanará).
III. Tal como é pacífico na nossa melhor Jurisprudência, sendo proferida sentença ou despacho a colocar fim ao processo, deve fazer-se aí, se não se fez antes, a apreciação da conduta processual assumida pelas partes que seja suscetível de configurar a litigância de má-fé.
IV. É inerente à natureza/essência do processo que proferida a sentença final fique imediatamente esgotado o poder jurisdicional do juiz quanto à matéria da causa (artº 613.º, nº 1, CPC), o que significa que, com a prolação da sentença fica precludida a possibilidade de o Juiz conhecer de qualquer questão (relativa ao antes processado nos autos), excetuado o que no nº 2 do mesmo artigo se dispõe em matéria de retificação de erros materiais, suprimento de nulidades e reforma da sentença e, por outro lado, o que – em caso de recurso – seja determinado pelo tribunal superior que proceda à anulação da decisão.
V. A sentença foi proferida em 26.07.2023 sendo que, na mesma, foi o Recorrente notificado para se pronunciar quanto à sua condenação como litigante de má-fé, o que este fez, alegando este princípio. Por sua vez, a questão da má-fé foi decidida através de despacho proferido pelo tribunal em 20.09.2023 e, portanto, em momento posterior à prolação da sentença.
VI. No caso sub iudice, o Tribunal recorrido ao não ter conhecido da questão da litigância de má-fé, com base em circunstâncias e fundamentos que já constavam do processo e que se verificavam já à data da prolação da sentença, conhecendo desta questão apenas depois de proferida a sentença final, infringiu o princípio da extinção do poder jurisdicional.
VII. Caso pretendesse condenar o Recorrente como litigante de má-fé o Tribunal recorrido haveria sempre de, previamente à prolação da sentença proferida, ter notificado o Recorrente para que se pronunciasse sobre tal questão - o que não fez.
VIII. Considerando que, na data em que foi proferido o douto despacho de que ora se recorre, já se encontrava esgotado o poder jurisdicional do meritíssimo juiz, que assim conheceu de questão de que já não podia tomar conhecimento - tendo praticado ato que a lei não admite - sempre tal despacho enferma do vício da nulidade por excesso de pronúncia [nos termos do previsto nos artigos 613º, nº 3, 615º, nº 1, alínea d), 2ª parte e 195º nº 1 todos do CPC], a qual expressamente se argui para todos os efeitos legais.
IX. A par disso, no caso sub iudice não se verifica nenhum motivo para condenar o Recorrente como litigante de má-fé, designadamente, com base na alínea a) do nº 2 do artigo 542º do CPC, pelo que, não pode o mesmo acolher o entendimento expresso no douto despacho recorrido.
X. Em primeiro lugar importa dizer que, para que o Recorrente pudesse ser condenado como litigante de má-fé, tinham que ter sido dados como provados, factos de onde se retirasse que agiu com essa intenção, no caso, que agiu dolosa e intencionalmente com vista a deduzir pretensão cuja falta de fundamento não podia ignorar.
XI. Sucede que, da factualidade dada como provada pelo tribunal “a quo” nesse despacho, não resultam provados factos que permitam sustentar a má-fé do Recorrente. Na verdade, apenas com a leitura desses factos, dificilmente se consegue perceber como é que se chega à conclusão, e fundamentação, da condenação do Recorrente nesse sentido.
XII. O douto despacho recorrido sempre será, por isso, nulo por falta de fundamentação.
XIII. Em segundo lugar evidencie-se que, o Recorrente não atuou com intenção ou consciência de deduzir uma pretensão absurda ou infundada, cuja falta de fundamento não ignorava ou não devia ignorar. O Recorrente não age (nem nunca agiu) de má-fé.
XIV. O mero facto de não se ter conseguido provar aquilo que se alegou, não constitui fundamento para se condenar o Recorrente nesse sentido. O que significa é - tão só - que não se fez prova suficiente, não se tendo convencido o Tribunal que essa factualidade existe. Foi o entendimento que o Tribunal retirou da prova produzida, e com o qual - sempre com o merecido respeito - não se concorda mas esse entendimento divergente não é, por si só, suficiente para fundamentar a condenação do Recorrente.
XV. Qualquer pessoa que visse as suas possibilidades económicas diminuídas, e em face da impossibilidade de cumprir com o pagamento da pensão de alimentos que outrora lhe foi determinada (em circunstâncias económicas mais favoráveis), teria exatamente a mesma atitude que o Recorrente adotou solicitando ao Tribunal que reduzisse o montante dessa pensão.
XVI. Aliás, na pendência do processo a situação económica do Recorrente veio a agravar-se ainda mais, não só por conta do aumento exponencial da prestação a pagar ao banco para amortização do empréstimo contraído para aquisição de habitação em ... (que passou a estar próxima dos € 800,00, fora seguros obrigatórios associados, como foi dito pela testemunha EE e também pelo Recorrente em sede de declarações de parte), mas também com o nascimento de um outro filho, o FF, fruto da relação do Recorrente com a sua atual companheira [facto que, apesar de inicialmente não ter sido alegado por não se verificar aquando da apresentação da petição inicial, veio a resultar da instrução a que se procedeu nos autos].
XVII. De evidenciar também que, o Recorrente nunca teve intenção de ocultar a compra da fração autónoma em ... em conjunto com a sua companheira. E tanto assim é que juntou aos autos a respetiva escritura de compra e venda, onde bem se identificam os contraentes, concretamente os respetivos compradores e demais termos do negócio.
XVIII. Assim como nunca teve intenção de ocultar a venda do apartamento em .... Note-se que, a informação relativa à venda desse imóvel encontra-se plasmada na declaração de rendimentos relativa ao exercício de 2021, que o Recorrente juntou à sua petição inicial, concretamente como doc. nº ...0 (vide pág. 10 do doc. nº ...0 junto a petição inicial), Sendo que, se o Recorrente quisesse, de facto, ocular essa informação não teria por certo junto esse documento aos autos.
XIX. A aludida venda apenas não foi expressamente alegada porque, na verdade, não veio beneficiar em nada a situação económica do Recorrente já que o produto dessa venda foi investido como “entrada” para aquisição da sua nova casa, o que teve como efeito uma diminuição do valor do financiamento requerido junto do Banco e, concomitantemente, da prestação mensal a pagar para amortização desse crédito não tendo, pois, tido qualquer consequência a nível da sua liquidez imediata. Em bom rigor, esse montante não se pode qualificar como receita/rendimento de que o mesmo pudesse dispor, designadamente afetando-o ao pagamento da pensão de alimentos.
XX. A par disso, diga-se também que, naturalmente que vivendo em casal, as despesas são asseguradas por ambos, nunca tendo sido intenção do Recorrente alegar o contrário. Porém, como resultou demostrado, quer pelas declarações da testemunha EE, quer pelas declarações de parte do Recorrente, umas despesas ficavam a cargo do Recorrente e outras ficavam a cargo da sua companheira (a qual, como também resultou da instrução a que se procedeu, tem ainda outra menor a seu cargo – sua filha -, não recebendo qualquer ajuda por parte do respetivo progenitor, dai que tenha uma menor disponibilidade financeira considerando que pouco mais aufere que o salário mínimo nacional).
XXI. Ao alegar quais as despesas que tinha de suportar com o rendimento que auferia, o Recorrente considerou a repartição que havia sido acordada entre o casal, desconsiderando muitas outras que existiam – e existem – mas que vêm sendo suportadas pela sua companheira.
XXII. A má-fé a que se alude no artigo 542º do Cód. de Processo civil exige-se a existência de um verdadeiro dolo, não bastando a simples culpa, ou seja, a litigância de má-fé tem como pressuposto o dolo, isto é, a consciência de se não ter razão, o que não se verifica no caso concreto. Analisando o caso sub judicie não se vislumbra como é que se poderá considerar a atuação do Recorrente como dolosa e grave de modo a que se possa justificar a sua condenação nos termos em apreço.
XXIII. Por conseguinte, não estão reunidos, in casu, os pressupostos da litigância de má-fé por parte do Recorrente, pelo que, nunca poderia o mesmo ter sido condenado nesse sentido.
XXIV. Decidindo pela condenação do Apelante como litigante de má-fé, fez o Mmo Juiz a quo errada interpretação e aplicação da norma constante do artigo 542º do CPC, pelo que deve o douto despacho recorrido, ser substituído por decisão que o absolva dessa condenação.
XXV. A considerar-se ter o Recorrente litigado de má-fé [o que não se aceita e apenas se equaciona por mera cautela de patrocínio], afigura-se mais adequado, proporcional e equilibrado, em face das circunstâncias do caso em apreço, a afixação de uma multa pelo mínimo legal previsto no nº 1 do art. 27º do Reg. das Custas Processuais - o que, em alternativa, se requer.
XXVI. O douto despacho recorrido, ao decidir como decidiu, violou, por errada ou má interpretação o disposto nos artigos 542º, 543º, 608º nº 2 e 613º todos do Código de Processo Civil e ainda do artigo 27º do Regulamento das Custas Processuais.

O Ministério Público contra-alegou pugnando pela manutenção da decisão recorrida.

O recurso foi admitido, sem que o tribunal a quo se tivesse pronunciado quanto à invocada nulidade.

2. Questões a apreciar

O objecto do recurso é balizado pelo teor do requerimento de interposição (artº 635º nº 2 do CPC), pelas conclusões (art.ºs 608º n.º 2, 609º, 635º n.º 4, 637º n.º 2 e 639º n.ºs 1 e 2 do CPC), pelas questões suscitadas pelo recorrido nas contra-alegações em oposição àquelas, ou por ampliação (art.º 636º CPC), sem embargo de eventual recurso subordinado (art.º 633º CPC) e ainda pelas questões de conhecimento oficioso, cuja apreciação ainda não se mostre precludida.

O Tribunal ad quem não pode conhecer de questões novas (isto é, questões que não tenham sido objecto de apreciação na decisão recorrida), uma vez que “os recursos constituem mecanismo destinados a reapreciar decisões proferidas, e não a analisar questões novas, salvo quando… estas sejam do conhecimento oficioso e, além disso, o processo contenha elementos imprescindíveis” (cfr. António Abrantes Geraldes, in Recursos em Processo Civil, 7ª edição, Almedina, p. 139).

Pela sua própria natureza, os recursos destinam-se à reapreciação de decisões judiciais prévias e à consequente alteração e/ou revogação, pelo não é lícito invocar nos recursos questões que não tenham sido objeto de apreciação da decisão recorrida.

Muito embora nos recursos também vigore o princípio do dispositivo, não está abrangido no mesmo a ordem por que as questões colocadas do mesmo devem ser apreciadas, ou seja, as mesmas não são apreciadas pela ordem indicada pelas partes, mas de acordo com a sua precedência lógico-jurídica, o que resulta quer do disposto na 1ª parte do n.º 2 do art. 608º, nº 2, aplicável ex vi art. 663º, n.º 2, ambos do CPC, dispondo aquele que o “juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras”, quer do princípio da utilidade processual, plasmado no art.º 130º do CPC .

Assim e sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, as questões que cumpre apreciar, de acordo com a sua ordem lógica, são:
- a decisão recorrida é nula por falta de fundamentação?
- a decisão é nula por ter conhecido de questão que não podia conhecer (estando aqui implicada a questão de saber se a violação da regra do esgotamento do poder jurisdicional integra tal nulidade)?
- ocorreu erro de julgamento por não estarem preenchidos os pressupostos necessários para a condenação do requerente como litigante de má fé?
- a multa aplicada é excessiva, devendo ser reduzida ao mínimo legalmente previsto?

3. Nulidade da decisão recorrida
3.1. Enquadramento jurídico

Dispõe o art.º 615º do CPC:
1. É nula a sentença quando:
(…)
b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
(…)
d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
(…)”

Este normativo é aplicável aos despachos como decorre do disposto no art.º 613º n.º 3 do CPC.

A sentença pode ser vista como trâmite ou como acto: no primeiro caso, atende-se à sentença no quadro da tramitação da causa; no segundo, considera-se o conteúdo admissível ou necessário da sentença.

As nulidades da sentença e dos acórdãos referem-se ao conteúdo destes actos, ou seja, estas decisões não têm o conteúdo que deviam ter ou têm um conteúdo que não podiam ter (cfr. Miguel Teixeira de Sousa, in O que é uma nulidade processual? in Blog do IPPC, 18-04-2018, disponível em https://blogippc.blogspot.com/search?q=nulidade+processual.

A alínea b) está correlacionada com o disposto:
- no art.º 205º n.º 1 da CRP, que dispõe que as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei;
 - no art.º 154º do CPC, que dispõe, no n.º 1, que as decisões proferidas sobre qualquer pedido controvertido ou sobre alguma dúvida suscitada no processo são sempre fundamentadas e no n.º 2 que a justificação não pode consistir na simples adesão aos fundamentos alegados no requerimento ou na oposição, salvo, quando, tratando-se de despacho interlocutório, a contraparte não tenha apresentado oposição ao pedido e o caso seja de manifesta simplicidade;

- e especificamente, no que respeita à sentença, com o disposto no art.º 607º do CPC, cujo n.º 3 dispõe que nos fundamentos, deve o juiz discriminar os factos que considera provados e indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes;

- e ainda com o disposto no n.º 4, o qual dispõe que na fundamentação da sentença, o juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção; o juiz toma ainda em consideração os factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras de experiência.

Este n.º 4 tem em vista a fundamentação da decisão de facto, que tem de ser incluída na sentença e tem em vista possibilitar o controlo da decisão, dada a possibilidade que as partes têm de recorrer da matéria de facto, cumpridos que sejam os requisitos do art.º 640º do Código de Processo Civil.

Como referem Lebre de Freitas e Isabel Alexandre in Código de Processo Civil Anotado”, vol. 2º, 3ª edição, pág. 707 “A fundamentação [da decisão de facto] passou a exercer, pois, a dupla função de facilitar o reexame da causa pelo tribunal superior e de reforçar o autocontrolo do julgador, sendo um elemento fundamental na transparência da Justiça, inerente ao ato jurisdicional”.

Coloca-se a questão de saber se, quando a alínea em referência alude a “…fundamentos de facto…” abrange apenas a ausência dos factos fundantes da decisão ou, também, a falta de motivação da decisão de facto, ou seja, a indicação dos meios de prova decisivos e a análise crítica da prova a que alude o art.º 607º n.º 4 do CPC.

Rui Pinto, Manual do Recurso Civil, 2020, pág. 80, responde no segundo sentido, com base no disposto no n.º 4 do art.º 607º, na necessidade de respeitar a unidade sistemática dos dois normativos – 607º e 615º - e com o argumento de que a ausência da análise crítica das provas ou uma fundamentação da decisão da matéria de facto que seja genérica, sem especificação da prova que foi decisiva é, funcionalmente, uma falta de fundamentação indirecta da parte dispositiva, que não respeita o art.º 205º n.º 1 da CRP e, finalmente, ponderando que, actualmente, a motivação da decisão da matéria de facto passou a constar da sentença.

Diversamente Lebre de Freitas e Isabel Alexandre in ob. cit. pág. 736 entendem que à eventual falta de fundamentação da matéria de facto é aplicável o regime do art.º 662, n.ºs 2, alínea d) e 3.

Tendo em consideração que o art.º 9º n.º 1 do CPC manda ter em conta na interpretação das normas a unidade do sistema, que o art.º 607º n.º 4 determina que a motivação da decisão da matéria de facto seja incluída na sentença e a importância da referida motivação da decisão da matéria de facto para controlo da mesma, o art.º 615º n.º 1 alínea b), ao referir-se aos fundamentos de facto que justificam a decisão, também abrange a motivação da decisão de facto.

Destarte, este normativo impõe que o tribunal proceda, não apenas ao elenco dos meios de prova produzidos utilizados para formar a sua convicção, mas que, essencialmente, explicite a relevância atribuída a cada um desses meios de prova, ou seja, que expresse a «análise crítica da prova» que lhe cabe fazer (art. 607.º, n.º 4, do CPC.

Como referia Alberto dos Reis, in Comentário ao Código de Processo Civil, vol. II, Coimbra Editora, p. 172/173 “A exigência de motivação é perfeitamente compreensível. Importa que a parte vencida conheça as razões por que o foi, para que possa atacá-las no recurso que interpuser. Mesmo no caso de não ser admissível recurso da decisão o tribunal tem de justificá-la, pela razão simples de que a decisão vale, sob o ponto de vista doutrinal, o que valerem os seus fundamentos. Claro que a força obrigatória da sentença ou despacho está na decisão; mas mal vai a força quando se não apoia na justiça e os fundamentos destinam-se precisamente a convencer de que decisão é conforme à justiça. A função própria do juiz é interpretar a lei e aplicá-la aos factos em causa; por isso, deixa de cumprir o dever funcional o juiz que se limita a decidir, sem dizer como interpretou e aplicou a lei ao caso concreto. A decisão é um resultado, é a conclusão dum raciocínio; não se compreende que se enuncie unicamente o resultado ou a conclusão, omitindo-se as premissas de que ela emerge”.

Mas a situação prevista nesta alínea b) só se verifica quando exista uma falta absoluta de fundamentação, não quando se trate de:
a) fundamentação deficiente, no sentido de não estar devidamente fundamentada a decisão proferida sobre algum facto essencial para o julgamento da causa, situação que segue o regime do art.º 662º n.º 2, alínea d) do CPC;
b) ou fundamentação medíocre, insuficiente, incompleta, não convincente ou contrária à lei, em que poderá haver erro de julgamento de facto, a constituir, por isso, objecto de recurso de impugnação da matéria de facto, salvo as situações em que esteja pura e simplesmente em causa a aplicação de normas de direito probatório material (cfr. Abrantes Geraldes, Recursos em processo civil, Almedina, 6ª edição, pág. 333-334).

Ainda a propósito da especificação dos fundamentos de facto e de direito na decisão e utilizando a locução “motivação” no sentido de “fundamentos de facto e de direito”, locução que restringimos à justificação da decisão da matéria de facto, afirmava Alberto dos Reis, in CPC Anotado, V, 140: “Há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação, da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade. Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto. Se a sentença especificar os fundamentos de direito, mas não especificar os fundamentos de facto, ou vice-versa, verifica-se a nulidade”.

Na jurisprudência e a título meramente exemplificativo, o Ac. do STJ de 02/03/2021,  processo 835/15.0T8LRA.C3.S1, consultável in www.dgsi.pt/jstj - “Só a absoluta falta de fundamentação - e não a errada, incompleta ou insuficiente fundamentação - integra a previsão da nulidade do artigo 615.º, n.º 1, al. b), do Código de Processo Civil”.

A alínea d) contempla duas situações: a) quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar (omissão de pronúncia) ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento (excesso de pronúncia).

A primeira situação está relacionada com a 1ª parte do n.º 2 do art.º 608º do CPC, onde se dispõe: “O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras;…”

O normativo tem em vista as questões essenciais, ou seja, o juiz deve conhecer todos os pedidos, todas as causas de pedir e todas as excepções invocadas e as que lhe cabe conhecer oficiosamente (desde que existam elementos de facto que as suportem), sob pena da sentença ser nula por omissão de pronúncia.

As questões essenciais não se confundem com os argumentos invocados pelas partes nos seus articulados.
O que a lei impõe, sob pena de nulidade, é que o juiz conheça as questões essenciais e não os argumentos invocados pelas partes (sendo abundante a jurisprudência em que esta questão é suscitada, a título meramente exemplificativo o Ac. do STJ de 21/01/2014, proc. 9897/99.4TVLSB.L1.S1, consultável in www.dgsi.pt/jst).

Não podem confundir-se “as questões que os litigantes submetem à apreciação e decisão do tribunal com as razões (de facto ou de direito), os argumentos, os pressupostos em que a parte funda a sua posição na questão” (Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Volume V, Coimbra Editora, Limitada, pág. 143).

A segunda situação contemplada na alínea d) do n.º 1 do art.º 615º, tem em vista a 2ª parte do n.º 2 o art.º 608º onde se dispõe que o juiz “não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.”

Esta nulidade funda-se quer no princípio do dispositivo (que atribui às partes a iniciativa e o impulso processual), quer no princípio do contraditório, com isso significando que - em sede de processo civil, onde se discutem e dirimem conflitos de natureza privada, e não pública - o tribunal não pode resolver o conflito de interesses sem que a resolução lhe seja pedido por uma das partes, e sem que a outra seja devidamente chamada para deduzir oposição.

Como deixámos referido no ponto 2, está implicada nesta questão, em face do alegado pelo recorrente, a de saber se a violação da regra do esgotamento do poder jurisdicional se traduz no conhecimento de questão que o tribunal não podia conhecer e, portanto, é nula nos termos do disposto na alínea que temos vindo a analisar.

Para tal importa saber em que consiste o esgotamento do poder jurisdicional

Dispõe o art.º 613º n.º 1 do CPC que proferida a sentença, fica imediatamente esgotado o poder jurisdicional do juiz quanto à matéria da causa.

Mas o n.º 2 dispõe que é lícito, porém, ao juiz retificar erros materiais, suprir nulidades e reformar a sentença, nos termos dos artigos seguintes.

Como decorre do n.º 3, o disposto nos números anteriores, bem como nos artigos subsequentes, aplica-se, com as necessárias adaptações aos despachos.

Afirmava Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil Anotado, Vol. V, 1984, pág. 126 que o alcance do princípio constante do preceito citado é o seguinte: “O juiz não pode, por sua iniciativa, alterar a decisão que proferiu; nem a decisão nem os fundamentos em que ela se apoia e que constituem com ela um todo incindível.
Ainda que, logo a seguir ou passado algum tempo, o juiz se arrependa, por adquirir a convicção que errou, não pode emendar o suposto erro. Para ele a decisão fica sendo intangível.”

Esta regra assenta em razões de certeza e segurança jurídica ou, como refere Rui Pinto, in CPC Anotado, Volume II, pág. 174, é “uma regra de proibição do livre arbítrio e discricionariedade na estabilidade das decisões judiciais.” e, mais adiante “[g]raças a esta regra, antes mesmo do trânsito em julgado, uma decisão adquire com o seu proferimento um primeiro nível de estabilidade interna ou restrita, perante o próprio autor da decisão.”
 
Interpretando a expressão “quanto à matéria da causa” referia Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil Anotado, Vol. V, 1984, pág.126:
“Convém atentar nas palavras «quanto à matéria da causa». Estas palavras marcam o sentido do princípio referido. Relativamente à questão ou questões sobre que incidiu a sentença ou despacho, o poder jurisdicional do seu signatário extinguiu-se. Mas isso não obsta, é claro, a que o juiz continue a exercer no processo o seu poder jurisdicional para tudo o que não tenda a alterar ou modificar a decisão proferida.”

Precise-se que o esgotamento do poder jurisdicional também se verifica, ainda que limitadamente, relativamente a questões que o tribunal devia ter apreciado e não apreciou.

Quer com isto significar-se que, se o tribunal deixou de conhecer uma questão que devia ter apreciado, já não pode, espontaneamente, de motu proprio conhecer dessa questão e, assim, modificar a sentença.

Só se a decisão admitir recurso e neste for invocada a nulidade por omissão de pronúncia, o tribunal que proferiu a decisão pode conhecer da questão que não conheceu – art.ºs 613º, n.º 2 e 617º, n.ºs 1 e 2.

E se a decisão não admitir recurso, a parte interessada pode invocar a referida nulidade junto do tribunal que proferiu a decisão – art.º 615º, n.º 4 - mediante “reclamação” (expressão utilizada no art.º 628º do CPC, o qual dispõe que “A decisão considera-se transitada em julgado logo que não seja suscetível de recurso ordinário ou de reclamação”), o qual poderá, então, supri-la.

Ambas as situações constituem excepções ao esgotamento do poder jurisdicional.

Antunes Varela in Manual de Processo Civil, 2ª edição, pág. 684 escrevia:
“O esgotamento do poder jurisdicional do juiz quanto à matéria da causa significa que lavrada e incorporada nos autos a sentença, o juiz já não pode alterar a decisão da causa, nem modificar os fundamentos dela.
Respeitado, porém, este núcleo fundamental do pronunciamento do tribunal sobre as pretensões das partes, o juiz mantém ainda o exercício do poder jurisdicional para a resolução de algumas questões marginais, acessórias ou secundárias que a sentença pode suscitar entre as partes.”

E, como se refere no Ac. da RC de 17/04/2012, processo 116/11.8T2VGS.C1, consultável in www.dgsi./jtrc, “da extinção do poder jurisdicional consequente ao proferimento da decisão, decorre um efeito negativo, que é a insusceptibilidade de o próprio tribunal que proferiu a decisão tomar a iniciativa de a modificar ou revogar, e um efeito positivo, que é a vinculação desse mesmo tribunal à decisão por ele proferida.”

Colocando agora em confronto as duas situações – conhecimento de questão de que o tribunal não podia conhecer/nulidade por excesso de pronúncia // prolação de uma decisão que altera ou revoga uma decisão anterior/violação da regra do esgotamento do poder jurisdicional – pode afirmar-se que são realidades distintas, quer quanto à sua natureza, quer quanto ao “momento” em que se verificam.

Na primeira o tribunal conhece de questão (causa de pedir, pedido ou excepção) que não foi invocada por nenhuma das partes e não é de conhecimento oficioso (art.º 608º, n.º 2, 2ª parte, do CPC). Esta situação é intrínseca à decisão proferida.

Na segunda o tribunal proferiu uma decisão e, em momento posterior, profere uma nova decisão que altera ou revoga a primeira decisão (art.º 613º, n.º 1 do CPC). Esta situação coloca em confronto duas decisões sucessivas.

Destarte e face ao exposto, considerar que a violação da regra do esgotamento do poder jurisdicional se traduz no conhecimento de questão que o tribunal não podia conhecer, não capta a essência (e gravidade) daquela situação.

E isto é assim quando se considera a consequência da violação da regra do esgotamento do poder jurisdicional.

Assim e desde logo Paulo Cunha, in Da Marcha do Processo: Processo Comum de Declaração, II, 2.ª ed., Braga, 1944, pp. 358-359, considerava que a decisão proferida em violação do esgotamento do poder jurisdicional é inexistente.

O Professor Alberto dos Reis estudou a questão dos vícios da sentença, no seu Código de Processo Civil Anotado, Volume V, pág. 115 e segs., ali assinalando três situações: a sentença inexistente, a sentença nula, a sentença injusta.

Quanto à última, aqui irrelevante, é a sentença viciada por erro de julgamento.

Quanto à sentença inexistente, assinalava que a lei de então não a referia (o mesmo sucedendo hoje) e abarcava as situações em que o acto produzido não tinha o mínimo de requisitos essenciais para que possa ter a eficácia jurídica própria duma sentença, integrando em tal qualificação as seguintes situações (aut. e ob. cit. pág. 119 e segs): a) é produzido um acto com a forma externa de sentença, mas por alguém que não está investido do poder jurisdicional, seja pelo Estado, seja pelas partes, no domínio da arbitragem; b) a sentença tem como partes pessoas imaginárias; c) não há decisão, no sentido de que não há comando (em sentido idêntico Antunes Varela, in Manual de Processo Civil, 2ª edição, pág. 686, nota (3)).

Todas as situações em que a sentença reúne os elementos essenciais, mas está inquinada por vícios de formação, deveriam cair na nulidade absoluta.

Alberto dos Reis não referia em parte alguma e nomeadamente na anotação ao então art.º 666º, hoje art.º 613º, o vício da decisão proferida depois de esgotado o poder jurisdicional.
           
João de Castro Mendes, Direito Processual Civil, II, AAFDL, 1987, pág. 796-797 entendia que se tratava de um caso de ineficácia, por aplicação (analógica) do art. 675/2 do CPC de 1961, que corresponde, no actual CPC, ao art. 625º.

Rui Pinto, in Manual do Recurso Civil, I, pág. 88 considera que a decisão proferida em violação do esgotamento do poder jurisdicional integra a nulidade a que se refere a 2ª parte da alínea d) do n.º 1 do art.º 615º.

A jurisprudência divide-se (a recolha não é, certamente, exaustiva):
- no sentido de que a decisão proferida em violação do esgotamento do poder jurisdicional integra o vício da inexistência: o Ac. da RC de 20/02/2024, proc. 377/22.7T8MGR.C1, consultável in www.dgsi.pt/jtrc; o Ac. desta RG de 02/03/2023, proc. 120724/15.0YIPRT.1.G1-A; Ac. da RL de 23/02/2023, proc. 10693/14.6T8LSB.L1-8, consultável in www.dgsi.pt/jtrl; Ac. da RE de 27/10/2022, proc. 312/19.0T8PTG-B.E1, consultável in www.dgsi.pt/jtre; da RP de 24/09/2020, proc. 650/14.8TYVNG-G.P2, consultável in www.dgsi.pt/jtrp; desta RG de 22/05/2014, proc. 7231/08.3YIPRT-B.G1, consultável in www.dgsi.pt/jtrg; Ac. da RP de 15/12/2010, proc. 2006/09.5TTPRT.P1, consultável in www.dgsi.pt/jtrp;o Ac. do STJ de 06/05/2010, processo 4670/2000.S1, consultável in www.dgsi.pt/jstsj;
- no sentido de que tal situação integra a nulidade a que se refere a 2ª parte da alínea d) do n.º 1 do art.º 615º: Ac. da RP de 27/02/2023, proc. 19346/20.5T8PRT-A.P1, consultável in www.dgsi.pt/jtrp; o Ac. da RE de 07/04/2022, proc. 1373/21.7T8STR-A.E1, consultável in www.dgsi.pt/jtre; o Ac. desta RG de 24/03/2022, proc. 7105/19.2T8GMR-A.G1, consultável in www.dgsi.pt/jtrg (como os seguintes desta RG); Ac. da RC de 08/09/2020, proc. 197/17.0T8TND.C2, consultável in www.dgsi.pt/jtrc; Ac. desta RG de 17/10/2019, proc. 1218/12.9TJVNF-G.G1; desta RG de 27/06/2019, proc. 4117/17.4T8VNF-A.G1; desta RG de 16/05/2019, proc. 838/12.6TBGMR-F.G1; desta RG de 02/06/2016., proc. 128/12.4TBVLN.G2;
- no sentido de que é ineficaz – o Ac. desta RG de 15/02/2024 proc. 548/22.6T8VNF.G1, consultável in www.dgsi.pt/jtrg; o Ac. desta RG de 14/09/2023, proc. 120/16.0T8MGD.G2  e também desta RG 02/03/2023, proc. 5468/19.9T8VNF-AJ.G1 (nos dois últimos é relator o signatário), consultável in www.dgsi.pt/jtrg; da RC de 24/04/2018, proc. 3639/09.5TJCBR-A.C1, consultável in www.dgsi.pt; o Ac. da RC de 20/05/2015, proc. 231514/11.3YIPRT.C1, consultável in www.dgis.pt/jtrc.

Salvo o devido respeito por diverso entendimento, mas a violação da regra do esgotamento do poder jurisdicional, não pode determinar a sua inexistência, porquanto a mesma não está afectada de nenhum dos vícios que a doutrina (maxime Alberto dos Reis e Antunes Varela) consideram como integrando aquela, ou seja, a mesma reúne os requisitos mínimos de uma decisão judicial.

Também não pode integrar a nulidade da sentença a que se refere a 2ª parte da alínea d) do n.º 1 do art.º 615º, quer porque são realidades de diversa natureza, como se deixou referido, quer porque as razões que estão na base da regra do esgotamento do poder jurisdicional - de certeza e segurança jurídica, de “proibição do livre arbítrio e discricionariedade na estabilidade das decisões judiciais” - são incompatíveis com a regra de que as situações referidas no art.º 615º n.º 1 alíneas b) a e), não são de conhecimento oficioso (quanto a esta última asserção o Ac. desta RG de 17/05/2018, processo 2056/14.0TBGMR-A.G1, consultável in www.dgsi.pt/jtrg e Ac. do STJ de 30/11/2021, processo 1854/13.6TVLSB.L1.S1, consultável in www.dgsi.pt/jstj), carecendo de ser invocadas por quem nisso revelar interesse e, nessa medida, estão próximas da anulabilidade.

Como se refere no Ac. desta RG de 15/02/2024 proc. 548/22.6T8VNF.G1, consultável in www.dgsi.pt/jtrg, a necessidade de arguição das nulidades a que se referem as alíneas b) a e) do n.º 1 do art.º 615º “não se coaduna nem com a gravidade do vício [esgotamento do poder jurisdicional ] e o seu potencial de lesão para o sistema de administração da justiça nem com a letra do art. 613/1 que, através do advérbio de tempo “imediatamente”, vinca bem a relevância do princípio.”

Assim, a prolação de uma decisão em violação da regra do esgotamento do poder jurisdicional, tem como consequência a ineficácia de tal decisão, à semelhança do que decorre do n.º 1 do art.º 625º do CPC.

Nos termos do n.º 1 do art.º 625º do CPC havendo duas decisões contraditórias sobre a mesma pretensão, cumpre-se a que passou em julgado em primeiro lugar.

Decorre deste normativo, que a decisão proferida sobre objecto já coberto pelo caso julgado é ineficaz (Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, in CPC Anotado, 2º Volume, 3ª edição, pág. 731 (anotação ao art.º 613º) e 766 (anotação ao art.º 625º)).

A violação da regra do esgotamento do poder jurisdicional está muito mais próxima da prolação de duas decisões contraditórias sobre a mesma questão, na medida em que também há duas decisões sucessivas e também a segunda “contradiz” a primeira, na medida em que a altera ou revoga mesmo.

No sentido do exposto, o Ac. da RC de 24/04/2018, proc. 3639/09.5TJCBR-A.C1, consultável in www.dgsi.pt, onde se escreveu: “se a lei determina a ineficácia entre duas decisões contraditórias sobre a mesma pretensão, no referido art. 625º do NCPC, paralisando a que transitou em segundo lugar, afigura-se-nos que semelhante raciocínio e consequência jurídica, pode ser feito e há-de ser tirada em relação à situação processual imediatamente antecedente, isto é, quando embora ainda não haja trânsito em julgado de nenhuma das decisões, tivessem sido proferidas duas, de seguida, de sinal contrário. Ou seja, perante a intangibilidade da primeira decisão a defesa da sua eficácia faz-se a montante, num momento anterior, em vez de se esperar que tal ineficácia se produza a jusante, num momento posterior.”

Destarte e em face do exposto, a violação da regra do esgotamento do poder jurisdicional não se traduz no conhecimento de questão que o tribunal não podia conhecer e, portanto, não integra a nulidade a que se se refere a 2ª parte da alínea d) do n.º 1 do art.º 615º do CPC, antes corresponde a uma realidade de natureza diversa e com consequência própria – ineficácia da segunda decisão.

3.2. Em concreto – nulidade por falta de fundamentação
O recorrente invoca que para poder ser condenado como litigante de má fé, tinham de ser dados como provados factos de onde se retirasse que quis deduzir pretensão cuja falta de fundamento não podia ignorar; da factualidade provada pelo tribunal a quo, não resultam provados factos que permitam sustentar a má fé do recorrente.

Como decorre da mera leitura da decisão recorrida, verifica-se que a mesma contém fundamentação de facto, pelo que não estamos perante a nulidade invocada.

O invocado pelo recorrente – saber se os factos provados são, ou não, suficientes para sustentar a sua condenação como litigante de má fé - reconduz-se a um eventual erro de julgamento.

Improcede, assim, a invocada nulidade da decisão recorrida à luz da alínea b) do n.º 1 do art.º 615º do CPC.

3.3. Em concreto – esgotamento do poder jurisdicional
A decisão recorrida tem por objecto a condenação do recorrente como litigante de má fé.
           
Uma vez que a questão da litigância de má fé pode ser conhecida  oficiosamente, como decorre do n.º 1 do art.º 542º do CPC, em princípio não pode haver excesso de pronúncia, pois a 2ª parte do n.º 2 do art.º 608º, a que a 2ª parte da alínea d) do n.º 1 do art.º 615º do CPC está intimamente ligada, prevê que o tribunal se ocupe das questões de conhecimento oficioso.

Mas o recorrente invoca que tendo o tribunal a quo proferido a decisão recorrida depois de proferida a sentença sobre o mérito do incidente, já não o podia ter feito, por se mostrar esgotado o poder jurisdicional e, assim, entende que o tribunal conheceu de questão que não podia conhecer, o que integra a nulidade prevista na 2ª parte da alínea d) do n.º 1 do art.º 615º do CPC.

Começando pelo fim, já vimos que a violação da regra do esgotamento do poder jurisdicional não integra a nulidade prevista na 2ª parte da alínea d) do n.º 1 do art.º 615º do CPC, antes tendo natureza e consequência próprias.

Resta então a questão de saber se, tendo o tribunal a quo proferido a decisão recorrida depois de proferida a sentença sobre o mérito do incidente, já não o podia ter feito, por se mostrar esgotado o poder jurisdicional.

E que passa por saber em que “momento” deve ser proferida a decisão quanto à litigância de má fé.

A matéria da litigância de má fé consta dos artigos 542º a 545º do CPC.

Nenhum dos citados normativos dá resposta à questão em referência.

A doutrina é, cremos, unânime quanto à resposta a dar.

Assim e desde logo Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil Anotado, II volume, 3ª edição, 1981, pág. 281, referia:
“A apreciação da má fé e a condenação em multa e indemnização não pode o juiz relegá-las para depois da sentença; é nesta que há-de decidir se o litigante procedeu de má-fé; é aí que, em caso afirmativo, há-de condená-lo como tal em multa e indemnização; o que pode e deve deixar para depois da sentença é a fixação do quantitativo da indemnização, caso o processo, na altura da sentença, o não habilite a determiná-lo.”

No mesmo sentido, Abrantes Geraldes, in Temas Judiciários, I Volume, 1998, pág. 333 refere:
“O momento processual adequado a inserir a pronúncia judicial quanto à questão da litigância de má fé oficiosamente apreciada ou sob solicitação de uma das partes, será a sentença final ou qualquer outra decisão que ponha termo ao processo, como sucede com o despacho saneador-sentença.
É a solução que indirectamente se extrai do disposto no art. 457.º, n.º 2 [actualmente, 543º], além de que não se justifica a inserção de uma autónoma decisão em momento diverso, atenta a necessidade de se fazer uma apreciação global dos comportamentos, para efeitos da sua integração nos elementos objectivos e subjectivos das normas sancionadoras e de graduação da multa e quantificação dos prejuízos que devem ser indemnizados.
Dentro da sentença, o local apropriado será parte final, precisamente antes de o juiz exarar a conclusão quanto à apreciação do mérito da causa.”

Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, vol. 2º, 3ª edição., 2017, pág. 463 referem:
“A condenação tem lugar, as mais das vezes, na sentença final; mas, tratando-se de má-fé instrumental (ver o n.º 4 da anotação ao art. 542), ocorrida em incidente da ação, o lugar mais adequado para a proferir é o da decisão desse incidente”.

Mas in ob. cit., pág. 731, em anotação ao art.º 613º, referem:
“Não constitui alteração do decidido o proferimento, subsequente à decisão de mérito, de decisão sobre matéria diversa. Assim, não há violação do princípio do esgotamento do poder jurisdicional, quando, posteriormente, à sentença, o juiz condena o autor como litigante de má fé (ac. do TRC de 2.2.16., Jorge Arcanjo, www.dgsi.pt, proc. 115/12).”

Finalmente Paula Costa e Silva in Responsabilidade por Conduta Processual – Litigância de má fé e Tipos Especiais, 2002, pág. 588-589 refere:
“Neste preceito [543º, n.º 2], a lei aponta o acto em que deve ser conhecida a má fé: este acto é a sentença. (…)
No fundo, o que está em causa é concentrar o conhecimento da má fé e a condenação nos respectivos efeitos no acto terminal da instância em que essa má fé se verificou. (…)
(…) Mas é somente esta questão [fixação do quantitativo da indemnização] que pode, ainda, ser decidida depois de proferida a sentença, não a relativa à verificação de um comportamento processual ilícito e culposo da parte. A extensão do poder jurisdicional restringe-se à liquidação. “

Já a jurisprudência divide-se (a recolha não é, certamente, exaustiva):
-  no sentido de que a decisão quanto à litigância de má fé tem de ser proferida na decisão final e, caso seja proferida em decisão complementar, há violação da regra de que está esgotado o poder jurisdicional o Ac. desta RG de 18/01/2024, processo 18/21.0T8AMR.G1, consultável in www.dgsi.pt/jtrg; Ac. da RP de 27/06/2023, processo 58145/22.2YIPRT-A.P1, consultável in www.dgsi.pt/jtrp; Ac. da RP de 27/02/2023., proc. 19346/20.5T8PRT-A.P1, consultável in www.dgsi.pt/jtrp; Ac. da RE de 07/04/2022, proc. 1373/21.7T8STR-A.E1, consultável in www.dgsi.pt/jtre; o Ac. da RG de 24/03/2022, proc. 7105/19.2T8GMR-A.G1 (com voto de vencido do Exmº Sr. Juiz Desembargador Alcides Rodrigues, defendendo a posição contrária), consultável in www.dgsi.pt/jtrg; o Ac. da RP de 15/12/2021, proc. 1211/14.7TBMTS.P1, consultável in www.dgsi.pt/jtrp; Ac. da RC, de 08/09/2020, Fonte Ramos, proc. 197/17.0T8TND.C2, consultável in www.dgsi.pt/jtrc; o Ac da RG de 19/03/2020, proc. 6760/19.8T8GMR-A.G1, consultável in www.dgsi.pt/jtrg; o Ac. da RG de 02/06/2016, processo 128/12.4TBVLN.G2, consultável in www.dgsi.pt/jtrg;

- no sentido de que a decisão quanto à litigância de má fé pode ser proferida em momento posterior à decisão final e em decisão complementar, não havendo violação da regra do esgotamento do poder jurisdicional, o Ac. desta RG, de 11/05/2023, proc. 2925/21.0T8BCL.G1, consultável in www.dgsi.pt/jtrg;  o Ac da RP de 27/09/2022, proc. 772/19.9T8AVR.P1, consultável in www.dgsi.pt/jtrp; o Ac. desta RG de 22/05/2022, processo 1665/14.1T8BRG-L.G1, consultável in www.dgsi.pt/jtrg; Ac. da RC de 16/03/2021, processo 250/20.0T8CBR.C1, consultável in www.dgsi.pt/jtrc; o Ac. da RG de 31/10/2019, processo 587/18.1T8PTL-A.G1, consultável in www.dgsi.pt/jtrg; o     Ac. da RC de 02/02/2016, proc. 115/12.2TBPNC.C2, consultável in www.dgsi.pt/jtrc; o Ac. da RE de 18/10/2012, proc. 765/08.1TBEVR-B.E2, consultável in www.dgsi.pt/jtre; o      Ac. da RL de 12/07/2012, proc. 205/06.0TCSNT.L1-2, consultável in www.dgsi.pt/jtrl; Ac da RP de 22/02/2007, proc. 0730581, consultável in www.dgsi.pt/jtrp.

Os argumentos essenciais da primeira posição são os de que: a actuação que dá lugar à condenação como litigante de má fé, é anterior à prolação da sentença; nos termos do art.º 608º, n.º 2 do CPC, o juiz deve, na sentença, resolver todas as questões sejam colocadas pelas partes ou de conhecimento oficioso; a questão da litigância de má fé substancial, não pode ser autonomizada do objecto da causa, não podendo deixar de ser decididas conjuntamente; a lei – art.º 543º, n.º 2, do CPC, interpretado à contrario sensu – apenas permite seja relegada para momento posterior a determinação do montante da indemnização.

Os argumentos essenciais da segunda posição traduzem-se no seguinte: se durante o processo alguma das partes suscitar a questão da litigância de má-fé da contraparte, em princípio, o juiz tem de a conhecer na sentença, sob pena de nulidade desta por omissão de pronúncia; mas a questão pode não ter sido suscitada pelas partes e a constatação de que a parte litigou de má fé pode surgir, apenas, aquando da prolação da sentença, à luz dos factos provados e não provados; o tribunal não está, nesse momento, em condições de proferir imediatamente decisão quanto à litigância de má fé, porquanto, nos termos do art.º 3º, n.º 3 do CPC, é-lhe imposto que assegure o cumprimento do contraditório; não faz sentido sobrestar na prolação da decisão quanto ao mérito da causa, para cumprimento desse contraditório, porque a apreciação do mérito da causa e a apreciação da conduta da parte para efeitos de litigância de má fé são questões autonomizáveis; destarte, o poder jurisdicional que se esgota com a prolação da sentença, é o relativo ao mérito da causa e apenas quanto às questões ali decididas; o tribunal pode conhecer, a posteriori, de questão que não tenha influência ou se repercuta na sentença proferida, que não a altere ou modifique, como é o caso da litigância de má fé; admitir que, com a prolação da sentença, fica esgotado o poder jurisdicional quanto ao conhecimento da litigância de má fé, seria introduzir uma limitação ao conhecimento oficioso da mesma que não se encontra em parte alguma da lei, como seria pactuar com actuações que, à luz da lei, – art.º 542º - são censuráveis.

Relativamente à segunda posição, colhe-se no Ac. desta RG, de 11.05.2023, proc. 2925/21.0T8BCL.G1:
“Não pode separar-se o princípio do esgotamento do poder jurisdicional do seu sentido e objetivos. Tal redunda numa sacralização do momento, o da prolação da sentença, só porque sim, desligada de fundamentos e carecida de sentido, circunstância que deve ser alheia a um direito que pretende a justiça material e a resolução dos litígios de acordo com o direito.
A impossibilidade de apreciar a questão da má-fé após a decisão entende-se, num quadro em que na sentença nada foi referido quanto a tal matéria. Em tal circunstância o poder jurisdicional encontra-se esgotado. Não pode o juiz “reabrir” o processo para apreciação da questão da má-fé. É que a sede natural de apreciação desta é a decisão, como flui do artigo 543º do CPC. Se o julgador nada diz, tal representa, para as partes, que não viu motivo ou base para considerar existir má-fé. Não pode reapreciar posteriormente a questão.
Diferente é o caso de em sede de sentença a questão ser abordada, “abrindo-se “aí o incidente, relegando-se a sua apreciação para momento posterior. Falar em esgotamento do poder jurisdicional em tal caso é forçar o comando do artigo 613º além do que com ele se pretende proteger, sacralizando-o.
A parte, notificada para se pronunciar sobre a questão e avisada de que será proferida sobre o incidente uma decisão, nenhuma expetativa pode ter no sentido de que a questão “foi apreciada” e não será reapreciada, já que é este o fundamento central do esgotamento do poder jurisdicional.
E já vimos que o esgotamento ocorre na medida em que a apreciação existe, pois a não existir, devendo, o tribunal apreciará a questão depois da sentença em suprimento da nulidade. O poder esgota-se com o seu exercício, sendo que a norma refere “quanto à matéria da causa”, que como vimos, tem que ser apreciada, no limite em suprimento de nulidade. O poder esgota-se, no sentido de que, decidido está decidido, não pode alterar-se o que foi dito.
Saliente-se que, se a questão da má-fé tiver sido levantada pelas partes, já a apreciação após a sentença pode ocorrer, caso não haja pronúncia, e nos termos do nº 2 do artigo 613º. Parece-nos incongruente que, havendo tal possibilidade, não possa o juiz oficiosamente “abrir” o incidente na sentença, determinando o contraditório para posteriormente se pronunciar.”

Há que distinguir três situações.

Se a questão da litigância de má fé tiver sido suscitada por uma das partes (ou por ambas) no decurso do processo, a questão deve ser apreciada pelo juiz na sentença, não a podendo relegar para qualquer momento ulterior; se não o fizer, a sentença será nula por omissão de pronúncia; neste circunstancialismo, o juiz não pode, de motu próprio e à posteriori, conhecer da questão, sob pena de violar a regra do esgotamento do poder jurisdicional; só o poderá fazer se a sentença admitir recurso, o mesmo for interposto e nele for invocada a citada nulidade, situação em que a pode suprir - art.ºs 613º, n.º 2 e 617º, n.ºs 1 e 2 -, ou, não admitindo recurso, a parte interessada “reclamar” da omissão, a qual poderá, então, ser suprida.

Se a questão não tiver sido suscitada por nenhuma das partes e o tribunal, na sentença, não a suscitar, também já não o poderá fazer à posteriori por estar esgotado o seu poder jurisdicional.

Se a questão não tiver sido suscitada por nenhuma das partes, mas o tribunal, no final da sentença, a suscita, convidando a parte visada a exercer o contraditório, a decisão quanto à litigância de má fé poderá ser proferida em momento posterior à decisão final, não havendo violação da regra do esgotamento do poder jurisdicional, por que tal questão não foi suscitada nem conhecida e é autonomizável do conhecimento do mérito, pelo que acompanhamos a segunda posição acima referida, pelos argumentos também já referidos, que aqui nos dispensamos de repetir.

Vejamos a situação dos autos.

A questão não foi suscitada pelas partes durante o processo.

É certo que, como referido no Relatório, a requerida, na sequência da sua citação, veio apresentar alegações em que afirmou: o ”requerente litiga de má fé, o que expressamente se invoca para todos os efeitos legais.”

Porém, a requerida limitou-se à referida afirmação, não tendo substanciado, minimamente, a mesma, ou seja, não explicou porque é que, em que medida ou de que forma é que o requerente litigava de má fé.

Destarte, não se pode dizer que a questão da eventual litigância de má fé por parte do requerido, agora recorrente, tenha sido efectivamente invocada, por lhe faltar conteúdo.

Note-se que nem no Relatório da sentença de 26/07/2023, nem na decisão recorrida, é feita qualquer referência ao facto de a requerida ter produzido a referida afirmação.
Neste contexto, o tribunal, ao decidir, na sentença de 26/07/2023 (sublinhado nosso) “Consideramos improcedente a pretensão de AA.  Custas pelo progenitor. Notifique a fim de poder pronunciar-se sobre eventual litigância de má fé.”, pretendia suscitar, oficiosamente, a questão da eventual litigância de má fé do requerido e, assim, dar cumprimento do principio do contraditório, previsto no art.º 3º, n.º 3.

Poder-se-á questionar se assim foi efectivamente, na medida em que a ordem de notificação do requerido para se pronunciar sobre eventual litigância de má fé, não contem qualquer densificação das razões de direito e de facto para a mesma, o que nos remete para o modo de cumprimento do princípio do contraditório (e apenas para o modo).

A CRPortuguesa, no seu art.º 20º n.º 1, garante a todos «o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos (…)».

Mas não é suficiente a consagração legal do direito de acção e defesa, sendo necessário que seja assegurada uma tutela jurisdicional efectiva, princípio contido no art.º 20º da CRPortuguesa, o qual se desdobra em vários direitos, sendo um deles o direito ao processo e a um processo equitativo, como consagra o n.º 4 do art.º 20º da mesma CRP.

O direito a um processo equitativo impõe normas processuais que proporcionem aos interessados meios efectivos de defesa dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos e paridade entre as partes na dialéctica que elas protagonizam no processo. Um processo equitativo postula, por isso, a efectividade do direito de defesa no processo, bem como dos princípios do contraditório e da igualdade de armas ((Rui Medeiros, CRP Anotada, Universidade Católica Editora, Volume I, anotação ao art.º 20º, pág. 321). pág. 322-323).

O princípio do contraditório era tradicionalmente entendido como impondo que: a) formulado um pedido ou tomada uma posição por uma parte, devia à outra ser dada oportunidade de se pronunciar antes de qualquer decisão; b) oferecida uma prova por uma parte, a parte contrária devia ser chamada a controlá-la e ambas sobre ela tinham o direito de se pronunciar.
A esta noção substitui-se uma mais lata, com origem na garantia constitucional do rectliches Gehör germânico, entendida como garantia da participação efectiva das partes no desenvolvimento de todo o litígio, mediante a possibilidade de, em plena igualdade, influírem em todos os elementos (factos, provas, questões de direito) que se encontrem em ligação com o objecto da causa e que em qualquer fase do processo apareçam como potencialmente relevantes para a decisão (cfr. Lebre de Freitas, in Introdução ao Processo Civil, Coimbra Editora, 3ª edição, pág.124-125).

Decorre do exposto, além do mais, que o cumprimento do contraditório não deve ser encarado como uma mera formalidade que se cumpre por mera imposição da lei.

Estando em causa questão de conhecimento oficioso, traduzindo-se o contraditório em garantir à parte a possibilidade de discutir as questões relevantes, de facto e de direito, não basta, para que se possa considerar cumprido aquele - e, assim, o direito a um processo justo e equitativo -, que o juiz se limite a comunicar às partes a sua intenção de conhecer uma dada questão, mediante uma pura e simples indicação genérica da mesma.
Impõe-se que o juiz concretize e densifique adequadamente (o que, naturalmente, só caso a caso é identificável) os contornos de facto e de direito da questão que pretende conhecer.

Na situação dos autos verifica-se que a referida ordem de notificação limita-se a indicar, de forma genérica, a questão sobre a qual o requerido deve ser ouvido – eventual litigância de má fé.

Como decorre do n.º 2 do art.º 542º, a litigância contempla elementos subjectivos (corpo do n.º 2) e elementos objectivos (as várias alíneas do n.º 2).

Sendo assim, o cabal cumprimento do contraditório, impunha que o tribunal tivesse indicado as razões de facto (as condutas que vislumbrava integrarem a litigância de má fé) e de direito (se a conduta era dolosa ou com culpa grave e qual ou quais alíneas do n.º 2 do art.º 542º do CPC que vislumbrava serem susceptíveis de estarem verificadas em virtude daquelas condutas), o que não se verificou.

Sucede que, não só o requerido, notificado, apresentou no tribunal a quo um extenso requerimento, em que invocou o conjunto de questões que agora invoca no recurso – tendo assim exercido, de forma plena e efectiva o seu direito ao contraditório -, como, nem então, nem agora, no recurso, coloca em causa o modo como o tribunal deu cumprimento àquele princípio.

Destarte e sem prejuízo de se deixar assinalada a questão, não há que extrair dela qualquer consequência.

Em síntese: não tendo sido suscitada pela requerida, de forma substanciada, a questão da litigância de má fé do requerido, tendo o tribunal proferido decisão de mérito e ordenado, no final, a notificação daquele para se pronunciar sobre a sua eventual litigância de má fé, ao pronunciar-se quanto à mesma na decisão posterior, ora recorrida, não violou a regra do esgotamento do poder jurisdicional, por que tal questão nunca foi conhecida pelo tribunal e é autonomizável do conhecimento do mérito.

Em face do exposto, improcede a invocada violação da regra do esgotamento do poder jurisdicional.

4. Fundamentação de facto
Consideram-se relevantes para a decisão do recurso:
a) As incidências fácticas indicadas no Relatório supra e que aqui se dá por reproduzido.
b) Na sentença proferida a 26/07/2023 o tribunal a quo considerou provada e não provada a seguinte factualidade:
1. CC e DD nasceram em ../../2012 e em ../../2015, respectivamente; são filhos de AA e de BB. (1)
2. Foram homologados os acordos de regulação, havendo sido estabelecidos os montantes relativos a alimentos a suportar pelo A, em Outubro e Novembro de 2016. (3, 4)
3. O A foi condenado a pagar €135 para cada filho e ½  de despesas de saúde e escolares. (7, 25)
4. Em Abril de 2019 o A mudou-se para o ... e aí residiu. (10, 11)
5. E continuando a trabalhar em .... (15)
6. Por escritura de Maio de 2022 o A comprou andar em ... (...). (12)
7. E aí passou a habitar no mês seguinte. (13)
8. O A recorreu para tanto a crédito, correspondendo a prestação a €404,52 e o seguro correspondente, a €51,25 por mês. (14)
9. O A tem gastos de combustível e portagens quando se desloca entre ... e ... e vice – versa. (19)
10. O A teve despesas em deslocações para o futebol dos filhos. (22)
11. O A tem despesas com electricidade, água, gás, tv,  internet, telefone, vestuário, alimentação e limpeza. (23)
12. Em 2022 o A pagou de  despesas extra dos menores:  €65,15 (Fevereiro) €72,50 (Março) e €23,40 (Maio). (27)
13. Relativamente a 2021 o A declarou €2.284,24 de gastos com cada filho no quadro das deduções à colecta. (28)
14. E relativamente a 2020 declarou €2.042,16 (cada filho) (29)
15. A A foi assistente operacional do município ..., declarando em Janeiro de 2022 o vencimento base de €705 e subsídio de refeição de €81,09. (31)
16. O A vendeu em 2021 o apartamento que havia adquirido em ... em 2020. (c17)
17. Declarando como valores de compra 93 mil e de venda 119 mil euros.
18. E ele e a companheira compraram andar em .... (c19)
19. E com esta divide o pagamento do empréstimo e seguro correspondente e das despesas com os abastecimentos domésticos (água, electricidade, gás, tv …).
20. Em 2022 o A deixou a CM de ... e passou a trabalhar em ginásios, em ... e ....
*
Não se comprovou
 De Abril de 2019 a Maio de 2022 o A tenha residido (continuamente) no ... e não tenha suportado qualquer despesa com habitação (10, 11).
 AA seja o único comprador e pagador do andar. (12, 14)
 AA se desloque regularmente para .... (15, 19, 21)
 O A desloca-se dois sábados a cada mês a ...  (...) para os menores treinarem (os treinos eram às Segundas e Quartas) e jogarem futebol,  no que gasta €77. (21, 22).
 O quantitativo dos gastos mensais com electricidade, vestuário …  (23)
 Enquanto foi trabalhador do município o A não tinha outro rendimento. (32

5. Fundamentação de direito
5.1. Enquadramento jurídico
Qualquer pessoa que se considere titular de um direito pode solicitar a intervenção judicial para o ver reconhecido ou para alcançar a sua realização coerciva - arts. 20° da Constituição da República Portuguesa e 2° do Cód. Proc. Civil -, assim como qualquer pessoa demandada pode usar os meios processuais existentes para se defender.

A ordem jurídica põe a tutela jurisdicional à disposição de todos os titulares de direitos, sendo indiferente que, no caso o concreto, o litigante tenha ou não razão: num e noutro caso gozam dos mesmos poderes processuais.

Mas uma realidade é o direito abstracto de acção ou de defesa; outra é o exercício concreto desse direito.
O primeiro não tem limites, é um direito inerente à personalidade humana.
O segundo sofre limitações impostas pela ordem jurídica.

Como refere Paula Costa e Silva, in Responsabilidade por conduta processual – litigância de má fé e tipos especiais, pág. 45 “o direito de acção, como qualquer outro direito subjectivo, não traduz uma liberdade absoluta: ainda que o direito a agir configure uma permissão normativa genérica, não pode significar uma possibilidade de actuação sem fronteiras de licitude. O direito de acção, como qualquer situação jurídica, está, desde logo, limitada pelos fins da sua atribuição.”

Uma dessas limitações traduz-se nesta exigência: as partes devem agir de boa-fé e observar os deveres de cooperação resultantes do preceituado no artigo 7º, como estabelece o art.º 8º do CPC, cuja epígrafe é “Dever de boa fé processual”.

Se a parte procedeu de boa fé, sinceramente convencida de que tinha razão, a conduta é perfeitamente lícita; se não tiver sucesso na sua pretensão, suporta unicamente o encargo das custas, como risco inerente à sua actuação.

Mas se a parte procedeu de má fé, determina o art. 542°, n°1 do Cód. Proc. Civil a sua condenação em multa e numa indemnização à parte contrária, se esta a pedir.

E o n.º 2 do art.º 542º do CPC dispõe:
2 - Diz-se litigante de má-fé quem, com dolo ou negligência grave:
a) Tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar;
b) Tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa;
c) Tiver praticado omissão grave do dever de cooperação;
d) Tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objetivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a ação da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão.

Decorre da conjugação do n.º 1 com o n.º 2, que a condenação por litigância de má fé exige a verificação de elementos subjectivos e elementos objectivos.

Quanto aos elementos subjectivos, a norma contempla quer o dolo, quer a negligência grave.
 
Mas nem sempre foi assim.

O art.º 465º do CPC de 1939 dispunha:
Deve considerar-se litigante de á fé não só o que tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não podia razoavelmente desconhecer, como também o que tiver conscientemente alterado a verdade dos factos ou omitido factos essenciais e o que tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objectivo ilegal ou de entorpecer a acção da justiça ou de impedir a descoberta da verdade.

A citada norma era interpretada como punindo, apenas, as actuações dolosas e não as actuações com culpa grave (neste sentido Alberto dos Reis, CPC Anotado, Vol. II, pág. 262).

O CPC alterado em 1961 estabelecia a litigância de má fé no art.º 456º de forma quase idêntica, dispondo:
2. Diz-se litigante de má fé não só o que tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não ignorava, como também o que tiver conscientemente alterado a verdade dos factos ou omitido factos essenciais e o que tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objectivo ilegal ou de entorpecer a acção da justiça ou de impedir a descoberta da verdade.

Destarte e quanto a esta norma mantinha-se válida a interpretação de Alberto dos Reis e que também era a de Manuel de Andrade, in Noções Elementares de Processo Civil, 1003, pág. 356.

Porém, o DL 329-A/95, de 12 de Dezembro veio mudou o paradigma,  passando a dispor no corpo do n.º 2.
2 - Diz-se litigante de má-fé quem, com dolo ou negligência grave:…

Esta norma corresponde hoje ao n.º 2 do art.º 542º.

Assim e actualmente, o elemento subjectivo tanto abrange o dolo, como a negligência grave.

O CPC não contém qualquer norma definidora do dolo ou negligência grave.

Alberto dos Reis, in CPC Anotado, II, pág. 262 distinguia quatro tipos de conduta processual, sendo que, no que releva face à norma actual, apenas os dois últimos interessam:
- lide temerária – a parte embora convencida da sua razão, incorreu em erro grosseiro ou culpa grave, ajuizando a acção com desconsideração de motivos ponderosos, de facto ou de direito, que comprometiam a sua pretensão – e que podemos hoje fazer corresponder à negligência grave;
- lide dolosa – a parte, apesar de estar ciente de que não tinha razão, litigou e deduziu pretensão ou oposição conscientemente infundada.

No domínio das obrigações e para efeitos de responsabilidade, Antunes Varela, in Das Obrigações em Geral, 6ª edição, vol. I, pág. 532-542 integra nas condutas dolosas:
- o dolo directo – o agente prefigura determinado efeito do seu comportamento e quer esse efeito como fim da sua actuação;
- o dolo necessário – o agente, não querendo directamente o facto ilícito, prevê-o como consequência necessária e segura da sua conduta;
- o dolo eventual – caracterizado pelo facto de o agente prever a produção do facto ilícito como consequência possível da sua conduta, conformando-se com o resultado.

Paula Costa e Silva, in Responsabilidade…, pág. 344, refere que o dolo “revela-se numa intencionalidade da parte quer na dedução de pretensão ou oposição infundada, quer na alteração ou omissão de factos, quer na violação do dever de cooperação, quer, por fim, na utilização maliciosa ou abusiva do processo ou dos meios processuais com vista a conseguir um objectivo ilegal ou de entorpecer a acção da justiça.
Assim e consoante os tipos, age dolosamente a parte que sabe que mão tem razão quando deduz determinada pretensão ou oposição, a parte que sabe que procede a uma descrição dos factos essenciais não coincidente com a realidade, a parte que viola intencionalmente o dever de cooperação bem como a parte que sabe estar a fazer um uso reprovável, porque disfuncional, dos meios processuais ou do processo.”

Quanto à negligência, em termos gerais, é a omissão da diligência devida num caso concreto.

Mas face à norma em apreço só releva a culpa grave, que é a negligência grosseira, escandalosa, intolerável, em que só cai um homem anormal ou extraordinariamente descuidado – Nuno Manuel Pinto Oliveira, Princípios de direito dos contratos, pág. 434-435 (cfr. o conjunto de exemplos jurisprudenciais recenseados por Paula Costa e Silva, in Responsabilidade…, pág. 345).

A doutrina distingue ainda má fé, dolosa ou com culpa grave, substancial - deduz-se pretensão ou oposição cuja improcedência não poderia ser desconhecida, altera-se a verdade dos factos, omite-se um elemento essencial – da má fé instrumental - faz-se, dos meios e poderes processuais, um uso manifestamente reprovável.

Quanto aos elementos objectivos, são as condutas identificadas nas várias alíneas do n.º 2, as quais traduzem o conjunto de deveres processuais que radicam no dever processual geral, imposto a todas as partes, de agir de boa-fé e que constituem, afinal, o fundamento da condenação por litigância de má fé: a violação de deveres processuais.

Especificamente quanto às condutas tipificadas nas alíneas a) e b) assinala Paula Costa e Silva, in Responsabilidade…, pág. 353, que tendem a ser aplicadas cumulativamente porque “a parte tende a alterar ou omitir factos para, partindo da realidade tal como ela é apresentada, deduzir pretensão ou oposição infundada.”

Essencial é que a improcedência da pretensão radique em factos contrários aos alegados ou em factos omitidos.

Para que a parte incorra em litigância de má fé à luz da alínea b), é necessário que a parte altere ou omita “factos relevantes para a decisão da causa”.

Ou seja: a alteração ou omissão de factos só é censurável à luz da alínea b) do n.º 2 do art.º 542º, se e na medida em que tiverem sido considerados provados factos contrários aos alegados ou factos omitidos e uns e/ou outros forem determinantes, tiveram tido influência decisiva no desfecho da causa.

Finalmente importa ter em consideração que a litigância de má é um instituto que tem em vista as ocorrências num processo em concreto e não as ocorrências em outro processo.

5.2. Em concreto
O tribunal a quo considerou que o recorrente actuou de má fé, à luz da alínea a) do n.º 2 do art.º 542º, porque “constata-se clara divergência entre o alegado e a realidade comprovada (as despesas com a casa e o empréstimo não lhe cabem na íntegra, antes são partilhados com a companheira) e entre alegações em alterações distintas (2022 e 2019) e entre casa de graça e comparticipação efectiva em gastos com habitação. A disparidade não pode deixar de se considerar consciente, tal como a finalidade de adequar a sua visão (distorcida) da realidade à finalidade proposta: redução das responsabilidades subsequente a debilitação da situação económica. “

Vejamos

O requerente veio requerer a redução da sua prestação de alimentos aos filhos alegando que em Abril de 2019 mudou-se para o ..., onde passou a residir, de favor, em casa dos pais da sua actual companheira, sem pagar renda ou outra prestação.

Relativamente a esta factualidade apenas ficou provado que em Abril de 2019 o A. mudou-se para o ... e aí residiu (ponto 4 dos factos provados da sentença proferida a 26/07/2023) e não ficou provado que “De Abril de 2019 a Maio de 2022 o A tenha residido (continuamente) no ... e não tenha suportado qualquer despesa com habitação.”

O facto de não ter ficado provado que “De Abril de 2019 a Maio de 2022 o A tenha residido (continuamente) no ... e não tenha suportado qualquer despesa com habitação.”, é insusceptível de integrar qualquer “divergência entre o alegado e a realidade comprovada”, ou seja, qualquer alteração dos factos, pela simples razão de que quanto a esta matéria não ficou provada qualquer realidade alternativa (que nem sequer foi alegada).

Além disso e como se deixou referido em sede de enquadramento, não é relevante a actuação do requerente, mas apenas a sua actuação nos presentes autos.

Destarte, o até aqui referido é insusceptível de ser considerado como integrando a dedução de pretensão cuja falta de fundamento a parte não ignorava.

O requerente alegou também que em maio de 2022 comprou a fracção autónoma que identifica, sita em ..., ..., onde passou a residir em junho de 2022; para a aquisição da dita fracção recorreu ao crédito bancário, suportando mensalmente por conta desse empréstimo o montante de € 404,52, acrescido do montante de cerca de € 51,25 por mês a título de seguros (vida e imóvel), o que tudo perfaz o montante mensal de € 455,77;  o requerente tem as despesas de electricidade, água gás, televisão, internet e telemóvel.

Os termos em que o requerente invocou suportar aquelas despesas, sem qualquer menção ao facto de as partilhar com alguém, não admitem outro sentido que não seja o de que as suportava sozinho.

Porém, na sentença de 26/07/2023 ficou provado que o requerente adquiriu a fracção com a sua companheira (ponto 18 dos factos provados) e (ponto 19 dos factos provados) que divide todas aquelas despesas com a companheira.

Neste contexto, não é possível deixar de afirmar que o recorrente omitiu factos.

Mas pode afirmar-se que os factos omitidos, mas provados, foram relevantes para a decisão da causa?

Da fundamentação de direito da sentença proferida a 26/07/2023 extrai-se com relevo o seguinte:
“AA pretende reduzir a mensalidade dos alimentos para €80. E reduzir a mensalidade a metade no mês em que os filhos passem com ele uma quinzena de férias.
Quanto a este segundo segmento nada de superveniente invoca.
A regra é clara, um montante a cada mês, sem qualquer referência à parcela do tempo que os menores passem com o A. As férias com este não são novidade, foram pensadas e levadas à redacção do texto que veio a ser homologado. A explicação para mudança será ou o arrependimento ou falta de reflexão atempada. A subtracção das parcelas do tempo passado com o pai (com os encargos correspondentes) demandaria cronómetro e uma contabilidade exigente, a incluir os fins-de-semana, pernoitas a meio da semana, quadra de Natal, umas horas no aniversário, etc... Não se vislumbra a mínima utilidade na redução de alimentos em razão do tempo de estadia com o progenitor. Nem a mínima justificação, quando a mensalidade é estabelecida já em atenção àquelas estadias, contemporaneamente.
A redução da mensalidade vem sustentada em mudança para ..., com geração de despesas com a compra do andar em ... e com as despesas ao lar. E com o aumento de gastos para deslocação para o trabalho e para os filhos. Este desde há anos, por via da habitação de casa no ..., ainda que com um intervalo de tempo em que retornou a .... Que a habitação não implicasse qualquer despesa para o A não se confirmou.

Destarte, no que respeita à improcedência da redução da mensalidade a metade no mês em que os filhos passem com o requerente a quinzena de férias, é patente e manifesto que os factos omitidos e provados, não tiveram qualquer influência.

Quanto à redução da prestação mensal de alimentos para € 80,00, afirma-se na sentença proferida a 26/07/2023:
“Com evidente interesse para a causa, esqueceu o A de indicar compra e venda de andar em ..., aquisição do andar em ... em conjunto com a companheira e repartição com esta das despesas do lar.
Circunstâncias comprovadas e que reduzem necessariamente o montante de gastos que alega.
A exiguidade de rendimentos alegada não se comprova. Noutras tentativas de redução dos encargos com os filhos ficou a conhecer-se que além do emprego na CM... tinha actividade regular na promoção de desporto e vida saudável e que, ao menos em parte, era declarada fiscalmente.
Os gastos de 2016 não estão esclarecidos. Olhando à distância, seriam maiores,com deslocações quotidianas entre ... e .... Sucede que, desde o ano passado, o A passou a trabalhar em ginásios mais perto da nova residência, ... e .... Vencimento actual é ignorado, tal como gastos com as necessárias deslocações.
Conclui-se não ser possível um juízo seguro quanto a aumentos de despesas ou redução de rendimentos relativamente à ocasião da fixação da mensalidade, salvo que para recolha e entrega dos filhos ao fim-de-semana terá gastos com deslocações acima do que teria se tivesse continuado em .... “

Se a fundamentação da sentença terminasse aqui, seriamos levados a entender que os factos omitidos, mas provados foram decisivos para o desfecho da causa.

Porém, acrescentou-se na sentença proferida a 26/07/2023:
A mudança do A correspondeu a opção de vida, vendeu a casa dele em ... e conjuntamente com a companheira adquiriu andar em ....
Mantendo-se os menores em ..., distância, tempo e custos de deslocação aumentam. Daí não resulta que deva acolher-se a pretensão. As modificações supervenientes não são fatalmente de relevo, apenas as que tornem necessário impor a alteração (art. 42º n.1 RGPTC) e atendendo mais ao interesse dos filhos que do progenitor (art. 4º RGPTC e art. 4º a) LPCJP).
O distanciamento geográfico não advém de fatalidade imposta ao A. Escolheu mudar - se para .... Como adulto não podia ignorar as responsabilidades que sobre ele pendiam. Maiores sacrifícios e despesas com viagens eram previsíveis. Admitir a redução dos a limentos em atenção a uma mudança voluntária do devedor, seria atribuir-lhe o poder de definir unilateralmente a própria obrigação. Acresce que os deveres para com os filhos deverão situar-se no topo das prioridades, assumindo o respectivo cumprimento maior premência que a generalidade das obrigações, não devendo admitir-se a preferência do devedor por reduzir esta e não alguma outra (RL ac 24-05-2007, F. Alves, p. 1628/2007-2, dgsi.pt).
Não se encontra fundamento atendível para a visada redução.

Resulta deste último excerto que o cerne da improcedência da pretensão do requerente, o fundamento essencial, radicou na consideração de que a aquisição de uma habitação em ... e a consequente mudança para tal localidade, é fruto de uma opção do requerente, a qual não pode ser oposta aos filhos, como resulta claramente deste parágrafo:
Admitir a redução dos a limentos em atenção a uma mudança voluntária do devedor, seria atribuir-lhe o poder de definir unilateralmente a própria obrigação. Acresce que os deveres para com os filhos deverão situar-se no topo das prioridades, assumindo o respectivo cumprimento maior premência que a generalidade das obrigações, não devendo admitir-se a preferência do devedor por reduzir esta e não alguma outra.”

Em face do exposto, não tendo os factos omitidos, mas provados - o requerente adquiriu a fracção com a sua companheira (ponto 18 dos factos provados) e (ponto 19 dos factos provados) que divide todas aquelas despesas com a companheira – sido decisivos, determinantes para o desfecho do incidente, concretamente a sua improcedência, impõe-se concluir que os mesmos não foram “relevantes para a decisão da causa”.

E não tendo sido relevantes, não é possível concluir que o requerente deduziu pretensão cuja falta de fundamento não ignorava, pelo que não estão reunidos os pressupostos para a condenação do requerente como litigante de má fé.

Nestes termos a decisão recorrida não se pode manter, devendo ser revogada.

5.3. Custas
Dispõe o art.º 527º n.º 1 do CPC que a decisão que julgue a ação ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da ação, quem do processo tirou proveito.

E o n.º 2 dispõe que entende-se que dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção em que o for.

O recorrente obteve total provimento do recurso.

O Ministério Público contra-alegou, mas está isento de custas.

Destarte as custas da apelação ficam a cargo do recorrente de acordo com o critério do proveito.

6. Decisão
Termos em que acordam os juízes que compõem a 1ª Secção da Relação de Guimarães em julgar procedente a apelação e, em consequência revoga-se a decisão recorrida.

Custas da apelação pelo recorrente

Notifique-se
*
Guimarães, 04/04/2024

(O presente acórdão é assinado electronicamente)
 
Relator: José Carlos Pereira Duarte
Adjuntos: Rosália Cunha
Alexandra Maria Viana Parente Lopes