EXECUÇÃO PARA PRESTAÇÃO DE FACTO
PRAZO CERTO
NOTIFICAÇÃO
Sumário

I - Quando, no âmbito da execução, o executado não realiza o facto a que está obrigado no prazo judicialmente estabelecido e ainda é realizável, segue-se o procedimento comum de execução para a prestação de facto com prazo certo, numa das tipologias possíveis, mas com duas especialidades: em primeiro lugar, o executado é notificado, e não citado, para deduzir oposição nos 20 dias posteriores; e, em segundo lugar, nessa oposição o executado pode invocar a ilegalidade do pedido da prestação do facto por outrem ou ainda alegar qualquer facto ocorrido posteriormente à citação para o incidente da fixação do prazo e que, nos termos gerais, seja motivo legítimo de oposição.
II - No caso presente, não tendo sido realizada aquela notificação, nem seguido o indicado procedimento, aquele que foi adotado, porque anómalo e suscetível de influir no direito de defesa da executada e na correta decisão da causa, deve ser anulado.

Texto Integral

Processo n.º 2725/16.0T8PRT-D.P1

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Sumário:
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Relator: João Diogo Rodrigues
Adjuntos: Artur Dionísio do Vale dos Santos Oliveira;
Maria Eiró.

Acordam no Tribunal da Relação do Porto,

I- Relatório
1- O Condomínio ..., ..., instaurou execução contra a sociedade, A..., Ldª, pedindo:
“A) que a Executada seja citada para efectuar a prestação do facto exequendo [ou seja, a conclusão de todos os trabalhos ajustados e convencionados no contrato de prestação de serviços entre ambos celebrado, conforme determinado na sentença exequenda], no prazo máximo de quarenta e cinco dias;
B) Seja arbitrada uma indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos pela não prestação a que o executado estava obrigado, no valor global de € 1500,00 (mil e quinhentos euros);
C) Caso a Executada não preste o facto a que está obrigada ou o faça de forma defeituosa, que a prestação do facto exequendo seja realizada por outrem, requerendo a nomeação de perito para avaliar o custo da prestação, bem como os custos dos demais trabalhos que se tornem necessários, devendo o mesmo descrever com precisão os trabalhos a executar, sua medição, respectivo custo e o mais que for necessário à execução dos trabalhos por terceiro, conforme previsto no número 1 do art.º 868º do C.P.C.;
D) Se proceda posteriormente á penhora de bens da Executada necessários ao pagamento da quantia que vier a ser apurada”.
2- Indeferido liminarmente o requerimento executivo, na parte respeitante à condenação da executada no pagamento de uma indemnização moratória no valor de 1.500,00€, prosseguiram os autos quanto ao mais.
3- Para além de outras vicissitudes ocorridas, sem interesse para este recurso, foi, por despacho proferido no dia 06/12/2020, decidido que, em razão da posição divergente das partes sobre o prazo necessário para a realização da prestação a que a Executada se encontra obrigada pela decisão que serve de base à execução, o Tribunal recorreria à colaboração de perito com vista à determinação desse prazo.
4- No dia 05/07/2021, o Perito nomeado juntou ao processo o respetivo relatório pericial, datado de 02/07/2021, concluindo que seriam necessárias 9 semanas (63 dias) para conclusão das obras, prazo esse que foi fixado por despacho datado de 21/09/2021.
5- No dia 21/01/2022, o Agente da Execução nomeado deu conhecimento nos autos que o Exequente o tinha informado que a Executada não tinha realizado, no prazo fixado, os trabalhos a que estava obrigado.
6- Posteriormente, no dia 03/03/2022, foi determinada a notificação do referido perito para, em complemento do relatório anteriormente elaborado, avaliar também o custo da prestação indicada nesse mesmo relatório.
7- As partes (Exequente e Executada), no apenso de embargos de executado, vieram Depois de terem dirigido um requerimento semelhante ao Agente de Execução, que foi indeferido., então, no dia 17/03/2022, expor e requerer o seguinte:
“1. Exequente e Executada, entenderam, aquando do conhecimento do teor do despacho, que veio a autorizar a realização dos trabalhos e a fixar prazo, não estarem reunidas as condições para a execução da obra, alvo da prestação de facto, em virtude de o referido despacho ter sido proferido já no período de Outono. Sendo que, a fase do ano mais adequada à realização deste tipo de trabalhos corresponde ao período da Primavera e do Verão.
2. Nesta medida, após reunião no local da obra, as partes decidiram que, a fim de evitar problemas no futuro, os trabalhos deveriam ser realizados em “tempo seco” de forma a garantir a boa execução da prestação de facto peticionada nos autos.
3. Pelo que, tendo em conta o supra exposto, as partes acordaram realizar a prestação de facto objecto destes autos no decurso do mês de Maio de 2022.
4. Caso a prestação de facto não seja realizada até ao dia 31.05.2022, por facto imputável à Executada, fica esta obrigada no pagamento à Exequente do valor da avaliação do custo da prestação que vier a ser fixado pelo Sr. Perito, conforme despacho proferido nos presentes autos com a ref. 433893133.
Pelo exposto, REQUER-SE a V.Ex.ª que seja admitido o presente acordo e autorizado o deferimento do prazo para a realização dos trabalhos, alvo da presente execução, até ao dia 31.05.2022.
Mais REQUER que, apenas após o dia 31.05.2022, caso haja incumprimento da realização da prestação, a execução prossiga, qualificada como execução para pagamento de quantia certa, pelo valor que vier a ser apurado em sede de perícia judicial.”.
8- Sobre este pedido recaiu, no apenso de embargos de executado, a seguinte sentença, proferida no dia 28/03/2022:
“Nos presentes autos de embargos de executado, atenta a qualidade dos intervenientes, e o objecto do litígio, homologo por sentença, a transacção que antecede, prosseguindo a execução nos exactos e precisos termos acordados (art.ºs 283.º, 284.º, 289.º, 290.º , 287.º al. d) do C.P.C).
(…)”.
9- No dia 22/08/2022, veio o Perito nomeado apresentar o complemento ao seu relatório anterior, estimando o custo das obras a realizar pela executada em 30.400,00€.
11- Notificada esta estimativa às partes, veio o Exequente, no dia 11/09/2022, alegar que a Executada, apesar de ter dado início aos trabalhos não os concluiu.
Por isso, requereu o prosseguimento dos autos, como execução para pagamento de quantia certa, pelo valor apurado em sede da perícia judicial realizada.
12- No dia seguinte, 12/09/2022, a Executada requereu esclarecimentos sobre o relatório pericial apresentado, esclarecimentos que foram prestados no dia 21/11/2022 e transmitidos às partes por ofício eletrónico expedido no mesmo dia.
11- Subsequentemente, no dia 14/12/2022, foi proferido o seguinte despacho:
“Na sequência da transação homologada no apenso de embargos de executado, e do relatório efectuado pelo SR Perito, 30.400,00€) (trinta mil e quatrocentos euros) incluindo o IVA à taxa em vigor, o custo da prestação exequenda constante no relatório pericial.
(…)”.
13- Este despacho foi notificado às partes por ofício eletrónico expedido no dia 15/12/2022.
14- Entretanto, no dia 19/01/2023, o Agente de Execução expediu a seguinte notificação para a Executada:
“Fica V.ª Exa., na qualidade de mandatária da executada, notificada do teor do requerimento apresentado pela exequente em que foi requerida a conversão da execução para pagamento de quantia certa pelo incumprimento da obrigação assumida na transação alcançada e homologada por sentença proferida no apenso A, datada de 28/03/2022, pretendendo o prosseguimento com a realização de diligências de penhora.
Assim, se no prazo de 10 DIAS não for comprovado, através de qualquer meio idóneo, o cumprimento integral da obrigação, fica desde já advertida que a execução prosseguirá com as diligências de penhora para recuperação da quantia de Euros: 30.400,00, fixada por despacho judicial com a ref.ª 443190601, datado de 14/12/2022”.
15- A Executada veio, então, no dia 31/01/2023, informar que “os trabalhos alvo do presente processo, foram realizados, mas não se encontram concluídos a 100%, na presente data ou na estimada, sendo que, em falta, estará uma percentagem reduzida de trabalhos”.
16- O Exequente, porém, veio, no dia 14/02/2023, informar, para além do mais, que “nenhuma das intervenções nos 2 terraços foi concluída ou sequer se encontra perto disso”, “[s]endo que, num dos terraços nem sequer se encontra colocada a tela asfáltica impermeabilizante”.
Requer, por isso, o prosseguimento dos autos.
17- A Executada, replicou, no dia 15/03/2023, informando que:
“1. Da globalidade dos trabalhos está em falta a colocação de lajetas nos terraços, que poderão ser disponibilizadas no local, para instalação a partir de dia 20 de Março de 2023.
2. Mais se informa, conforme solicitado, que tais trabalhos em falta correspondem a 10% dos trabalhos globais”.
18- Posteriormente, no dia 27/06/2023, veio o Exequente requerer a notificação do “Sr. Agente de Execução para prosseguir com os presentes autos (conforme já anteriormente requerido em 10.09.2022), através da conversão dos presentes autos executivos em acção executiva para pagamento de quantia certa prevista nos art.ºs 867 e 869, ambos do C.P.C., através da penhora de bens e/ou rendimentos à Executada no montante de 30400,00 €, conforme avaliação do Sr. Perito nomeado nos autos”.
19- Este requerimento foi notificado, na mesma data (27/06/2023), por via eletrónica à Mandatária da Executada.
20- Entretanto, no dia 04/07/2023, foram penhorados dois saldos bancários.
21- Após tomar conhecimento destas penhoras, intitulando o seu requerimento de reclamação de ato, veio a Executada, no dia 11/07/2023, expor e requerer o seguinte:
“1. Após apresentação por parte do Autor/Exequente, do Requerimento com a referência CITIUS n.º 36057360 [junto aos autos no dia 27/06/2023], o AE não deu cumprimento ao contraditório.
2. O certo é que, a Ré deu entrada de vários requerimentos dando conta que a obra estaria praticamente concluída, ainda que “fora” do prazo concedido para o efeito, o que por si deveria ter motivado a supra referida notificação.
3. Sendo que, em consequência do supra exposto e do já alegado nos requerimentos precedentes pela Ré, o custo da prestação, será, na presente data, com toda a certeza, diverso e inferior ao “materializado” no relatório pericial, que serviu de base e amparo ao despacho que homologou o acordo nestes autos.
4. Nos termos do artigo 867.º do Código de Processo Civil, caso haja lugar a liquidação de dano sofrido ou quando não haja sido entregue coisa ou prestado o facto, terá de ser realizada a competente liquidação da obrigação, a fim de, de futuro, se proceder à penhora de bens ou rendimentos de montante necessário ao pagamento do custo, que essa prestação de facto vier a sofrer.
5. Em cumprimento do supra referido artigo, refira-se que deveria ser dada à executada a possibilidade de exercício do contraditório, no âmbito do regular exercício do direito à nova liquidação da obrigação – da prestação de facto – a que o Exequente estava obrigado, nos termos do artigo 867.º, 358.º, 360.º e 716.º todos do Código de Processo Civil.
6. Assim sendo, todos os actos praticados, que não sejam atinentes à prestação de facto e que não tenham sido efectivados ao abrigo e em consequência de uma válida e eficaz convolação de execução em execução para cobrança de quanta certa, deverão ser considerados nulos e de nenhum efeito, atenta a violação e a omissão clara do cumprimento do direito ao contraditório, bem como atenta a violação do dever de lavrar decisão de prosseguimento dos autos no âmbito de convolação operada.
Pelo exposto, requer a V.Ex.ª se digne os actos de penhora praticados sejam considerados como nulos e de nenhum efeito, e ainda, que o Sr. Agente de Execução proceda à notificação da executada para exercício do contraditório, bem como à regularização da decisão de prosseguimento em falta.
(…)”.
22- O Exequente respondeu, no dia 04/10/2023, concluindo que “atento o acordado entre as partes, o declarado (pelo Exequente) e confessado (pela Executada) incumprimento da obrigação, o valor que se encontra fixado, a ausência de pedido de avaliação do cumprimento parcial da sua obrigação, deverá a arguição de nulidade ser julgada improcedente, devendo ser ordenado o prosseguimento dos presentes autos”.
23- A Executada replicou requerendo que se ordene “que os atos de penhora praticados sejam considerados como nulos e de nenhum efeito, e ainda, que o agente de execução proceda à notificação da executada para exercício do contraditório, bem como à regularização da decisão de prosseguimento em falta com recurso à liquidação e desconto dos valores adstritos ao trabalho já executado, se assim entender”.
24- Seguidamente, no dia 30/10/2023, foi proferido despacho que termina nestes termos:
“Pelo exposto, por falta de fundamento legal, indefere-se a reclamação do acto/ nulidade apresentada pela executada em 11.7.2023, pois que todos os actos praticados pelo SR AE respeitaram o processado, e os termos da transacção homologada.
Mantem-se pois as penhoras promovidas pelo SR AE, não se impondo a prolação de qualquer despacho prévio para efeitos de conversão da execução para pagamento de quantia certa, ante o teor da transacção, o teor do relatório pericial, com data posterior ao incumprimento, e o despacho o proferido a 14.12.2022 transitado em julgado.
(…)”.
25- Inconformada com este despacho, dele interpôs recurso a Executada, rematando-o com as seguintes conclusões:
“A) Exequente e Executada discordaram do valor da prestação.
B) Foi requerida perícia, que se realizou, fixou prazo de realização dos trabalhos em 9 semanas e custo da prestação em 30,400,00euros.
C) O exequente, em 20/01/2022, informou os autos as partes se encontravam em conversações acerca de fixação da data de início dos trabalhos
D) Exequente e Executada transigiram, em 11/03/2022
E) Ficou estipulado, no acordo, que a obra seria concluída, até ao dia 31 de Maio de 2022, sob pena de a execução prosseguir pelo valor da avaliação que viesse a ser fixada no relatório pericial.
F) A consequência do incumprimento para a Executada seria a conversão dos autos em pagamento de quantia certa, para cobrança do valor que viesse a ser apurado em sede de perícia.
G) Não ficou estipulada qualquer penalidade e/ou consequência para cumprimento parcial.
H) No dia 28/03/2022, a transação foi homologada nos autos, por despacho com referência citius n.º 434925865 no apenso A.
I) Em 11/03/2022, Exequente e Executada transigiram;
J) Em 28/03/2022, o Tribunal a quo homologou a transação;
K) Em 22/08/2022, o Sr. Perito juntou aos autos o relatório pericial complementar.
L) A Executada deu resposta, dentro do prazo que dispunha para o efeito, ao requerimento apresentado pela Exequente em 11/09/2022, com a referência citius n.º 33216018, porquanto, o Sr. Agente de Execução, em 19/01/2023, notificou a Executada (referência citius n.º 34486680), do requerimento da Exequente, ao qual, a Executada deu resposta (referência citius n.º 34604741).
M) Em 14/12/2022, o Tribunal a quo proferiu despacho, fixando o custo da prestação em 30.400,00€ (trinta mil e quatrocentos euros).
N) Quando foi realizada a perícia os trabalhos que pendem sobre a Executada ainda não tinham iniciado.
O) A Exequente autorizou a Executada a realizar as obras fora do prazo fixado para o efeito.
P) Na data em que foi proferido despacho de fixação do custo da prestação, a Executada, jamais poderia reagir ou recorrer do mesmo, porquanto, não havia, ainda, quase nenhum trabalhado realizado pela Executada e havia transigido comprometendo-se a aceitar o teor/valor da perícia.
Q) O despacho de que se recorre padece de lapso de análise ao afirmar “ (…) sendo que em 31.1.2023, a exequente veio informar que cumpriu os trabalhos a 100%. E posteriormente, veio ainda informar que da globalidade dos trabalhos está em falta a colocação de lajetas nos terraços, que poderão ser disponibilizadas no local, para instalação a partir de dia 20 de Março de 2023.Mais se informa, conforme solicitado, que tais trabalhos em falta correspondem a 10% dos trabalhos globais.”
R) Atente-se comunicação da Executada de 31/01/2023 – comunicação essa que é realizada na sequência da notificação do Sr. Agente de Execução do requerimento apresentado pela Exequente que o Tribunal a quo afirma que não foi dada resposta no prazo que dispunha para o efeito – informa os autos “(…) que os trabalhos alvo do presente processo, foram realizados, mas não se encontram concluídos a 100%, na presente data ou na estimada, sendo que, em falta, estará uma percentagem reduzida de trabalhos.”
S) Notificada da comunicação da Exequente (referência CITIUS n.º 34925524), a Executada informa, em 15/03/2023, os autos que está em falta a colocação das lajetas, que iam ser instaladas a partir de dia 20 de Março de 2023 e que os trabalhos em falta correspondem a 10% dos trabalhos globais.
T) O Tribunal a quo fez uma interpretação errada dos requerimentos apresentados pela Executada, afirmando que a mesma diz que cumpriu os trabalhos.
U) Em 27/06/2023, a Exequente requereu o prosseguimento dos autos através da conversão “em acção executiva para pagamento de quantia certa prevista nos art.ºs 867 e 869.
V) O Sr. Agente de Execução não deu cumprimento ao contraditório e realizou actos de penhora de bens/rendimentos da Executada.
W) O Tribunal a quo, no despacho objeto de recurso, afirma que a Executada não respondeu ao requerimento apresentado pela Exequente em 27/06/2023 no prazo em 10 dias.
X) A Executada respondeu, com o requerimento com a referência citius n.º 36193038, datado de 11/07/2023.
Y) Ainda dentro desse prazo de 10 dias, foi notificada para deduzir oposição à penhora.
Z) A Executada deduziu oposição à penhora, que foi ordenada ser apreciada no âmbito do presente processo principal.
AA) A Executada, em 11/07/2023, realizou reclamação de ato, dando conta que o Sr. Agente de Execução, porquanto não deu cumprimento ao contraditório e que, na medida em que a Executada, executou os trabalhos, o custo da prestação seria diverso e inferior ao “materializado” no relatório pericial complementar, sendo que, em cumprimento do artigo 867.º do CPC, deveria ter sido dada a “possibilidade de exercício do contraditório, no âmbito do regular exercício do direito à nova liquidação da obrigação – da prestação de facto – a que o Exequente estava obrigado, nos termos do artigo 867.º, 358.º, 360.º e 716.º todos do Código de Processo Civil.”
BB) O despacho de que se recorre afirma decide que “E se cumpriu coma prestação de facto, tal como invoca, o que não está comprovado nos autos, pois que em 31.1.2023, a exequente veio informar que cumpriu os trabalhos a 100%, mas afinal e posteriormente, veio ainda informar que da globalidade dos trabalhos está em falta a colocação de lajetas nos terraços, que poderão ser disponibilizadas no local, para instalação a partir de dia 20 de Março de 2023. Mais se informa, conforme solicitado, que tais trabalhos em falta correspondem a 10% dos trabalhos globais, o certo é que não o fez até 31.5.2022, nem num prazo razoável posterior, o que determina o incumprimento do acordado, e a consequente conversão da execução para pagamento de quantia certa, o que também face ao lei e ao acordado não necessita de despacho para esse efeito.”
CC) Nesta parte, o Tribunal a quo laborou em lapso, porquanto, a Executada jamais invocou que tinha cumprido os trabalhos a 100% e, posteriormente, informa que os trabalhos em falta correspondem a 10% (cfr. comunicações com referência citius n.ºs 34604741 e 35076061).
DD) Não poderia a Executada não reclamar/impugnar o despacho datado de 14/12/2022, uma vez que, nessa data, não havia realização de trabalhos e porque subscreveu transação previamente a comprometer-se a aceitar o valor da perícia.
EE) O despacho de que se recorre analisa, de forma errada o teor dos requerimentos apresentado
FF) A Executada requereu que o valor da sua responsabilidade fosse tornado proporcional ao seu cumprimento/incumprimento, em conformidade com o acordo celebrado, dado o incumprimento parcial.
GG) A Após termo de apensação, o Tribunal a quo incorporou o requerimento de oposição à penhora, realizada no apenso C.
HH) O Tribunal a quo, ainda, não se pronunciou sobre os requerimentos com referência citius n.º 451793494, 36734588, 36856113 e 36870505.
II) A Executada para reagir ao prosseguimento da execução para pagamento do valor de 30.400,00euros, subscreveu Oposição à Penhora (Req referência via citius 46399012), que foi incorporado nos autos principais em 18/09/2023, por ordem do Tribunal, e Requerimento de arguição de nulidade (Req referência via citius 46102478) datado de 11/07/2023.
JJ) O Tribunal a quo não deu cumprimento ao contraditório relativamente a ambos os requerimentos - Oposição à Penhora (Req referência via citius 46399012) e Requerimento de arguição de nulidade (Req referência via citius 46102478) datado de 11/07/2023.
KK) O Tribunal apenas faz recair despacho relativamente a um dos requerimentos da Recorrente – o de Requerimento de arguição de nulidade (Req referência via citius 46102478) datado de 11/07/2023.
LL) Por despacho de 21/09/2023 o Sr agente de execução de o Exequente são notificados para reagir/pronuncia acerca do teor do requerimento de nulidade subscrito pela Executada de11/07/2023, por lapso, com referência à cópia da oposição à Penhora (Req referência via citius 46399012).
MM) Sendo que, ambos se pronunciam acerca de requerimento diverso!
NN) O despacho de que se recorre apenas recai sobre o teor do requerimento de arguição de nulidade (Req referência via citius 46102478) datado de 11/07/2023, cuja cópia não foi contraditada pelo tribunal, e omite pronuncia sobre o teor de oposição à Penhora (Req referência via citius 46399012), incorporado no processo principal e transformado em requerimento de simples nulidade.
OO) Omitindo pronuncia acerca do pedido formulado correspondente ordenar que “atos de penhora praticados sejam considerados como nulos e de nenhum efeito, e ainda, que o agente de execução proceda à notificação da executada para exercício do contraditório, omitida, bem como à regularização da decisão de prosseguimento em falta com recurso à liquidação e desconto dos valores adstritos ao trabalho já executado, se assim entender.
PP) Deverá a decisão recorrida ser substituída por uma outra que decrete nos termos aqui expostos”.
26- Não consta que tivesse havido resposta.
27- Recebido o recurso nesta instância e considerando-o admissível nos termos em que foi admitido pelo Tribunal recorrido Fazendo, assim, uma interpretação restritiva do que se dispõe no artigo 723.º, n.º 1, al. c), do Código de Processo Civil, por estar em causa neste recurso atividade vinculada do Agente de Execução - Neste sentido, Rui Pinto, in A ação Executiva, AAFDL, 2018, pág. 122, António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, Vol. II, Almedina, pág. 63, Ac. RLX de 05/05/2020, Processo n.º 8073/11.4TBOER-D.L1-7 e Ac. RLx de 22/11/2022, Processo n.º 4634/09.0TBALM.L1-7, ambos consultáveis em www.dgsi.pt. , importa deliberar.
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II- Mérito do recurso
A- Definição do respetivo objeto
Esse objeto, como é sabido, é delimitado em regra e ressalvadas, designadamente, as questões de conhecimento oficioso, pelas conclusões das alegações do recorrente [artigos 608º, nº 2, “in fine”, 635º, nº 4, e 639º, nº 1, todos do Código de Processo Civil (CPC)]. Mas, não só. Também o delimitam o próprio teor da decisão recorrida e as questões que nela foram ou deveriam ter sido decididas.
Observando, pois, este critério, verifica-se que, no caso presente, o objeto do recurso em análise se resume, essencialmente, a saber se não foi facultado o exercício do direito ao contraditório à Executada/ora Apelante e se devem ser anulados os atos pela mesma indicados.
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B- Tendo em consideração os factos descritos no relatório supra exarado – que são os únicos relevantes para o efeito -, vejamos, então, como solucionar estas questões:
Estamos no âmbito de uma execução para prestação de facto O Exequente, como vimos, requereu também a condenação da Executada a pagar-lhe uma indemnização pelos danos não patrimoniais que sofreu devido à não realização da prestação judicialmente estabelecida, mas esse pedido foi liminarmente indeferido., destinada a forçar a Executada a realizar todos os trabalhos ajustados no contrato de prestação de serviços que celebrou com o Exequente, realização essa que devia e deve ter lugar nos exatos termos exarados na sentença exequenda.
Nessa sentença, porém, não se fixou prazo para tal realização e, por isso mesmo, a primeira parte da execução teve por fim, justamente, estabelecer esse prazo. Primeiro, em 9 semanas (63 dias) e, depois, por acordo das partes judicialmente homologado, até ao dia 31/05/2022.
Nesta última data, todavia, é pacífico entre as partes, a prestação a que a Executada estava obrigada não foi por ela voluntaria e totalmente cumprida. E, por isso mesmo, o Exequente veio, no dia 11/09/2022, requerer o “prosseguimento dos autos, como execução para pagamento de quantia certa, pelo valor apurado em sede da perícia judicial realizada”.
É a partir daqui, cremos nós, ou melhor, é a partir da notificação do Agente da Execução subsequente a esse requerimento, que o processo se desvia do formalismo legalmente prescrito.
Efetivamente, quando, no âmbito da execução, o executado não realiza o facto a que está obrigado no prazo judicialmente estabelecido e ainda é realizável, segue-se o procedimento comum de execução para a prestação de facto com prazo certo, numa das tipologias possíveis, mas com duas especialidades importantes: em primeiro lugar, o executado é notificado, e não citado, para deduzir oposição nos 20 dias posteriores; e, em segundo lugar, o executado nessa oposição pode invocar a ilegalidade do pedido da prestação do facto por outrem (por exemplo, por essa prestação ser infungível) ou ainda alegar qualquer facto ocorrido posteriormente à citação para o incidente da fixação do prazo e que, nos termos gerais, seja motivo legítimo de oposição. É o que decorre do disposto no artigo 875.º, n.º 2, do CPC Cfr. José Lebre de Freitas, A Ação Executiva à Luz do Código de Processo Civil de 2013, 7ª Edição, Gestlegal, pág. 464, e Rui Pinto, A Ação Executiva, 2018, AAFDL, pág. 1020., que dispõe: “Se o devedor não prestar o facto dentro do prazo, observa-se, sem prejuízo da segunda parte do n.º 1 do artigo anterior, o disposto nos artigos 868.º a 873.º, mas a citação prescrita no artigo 868.º é substituída por notificação e o executado só pode deduzir oposição à execução nos 20 dias posteriores, com fundamento na ilegalidade do pedido da prestação por outrem ou em qualquer facto ocorrido posteriormente à citação a que se refere o artigo anterior e que, nos termos dos artigos 729.º e seguintes, seja motivo legítimo de oposição”.
Ora, na situação em apreço, não foi este o procedimento seguido.
Embora o Exequente tivesse requerido, como vimos, o prosseguimento dos autos como execução para pagamento de quantia certa, tal como, aliás, já tinha sido determinado na sentença homologatória do acordo celebrado entre as partes a respeito do prazo para a realização voluntária da prestação pela Executada, esta nem foi notificada nos termos já assinalados, nem lhe foi facultado o direito de comprovar o cumprimento parcial pela mesma invocado. Pelo contrário, adotou-se um procedimento anómalo, notificando-a, num primeiro momento, para no prazo de dez dias, comprovar o cumprimento integral da obrigação, sob a cominação de que não sendo feita essa prova a execução prosseguiria “com as diligências de penhora para recuperação da quantia de Euros: 30.400,00, fixada por despacho judicial com a ref.ª 443190601, datado de 14/12/2022” e, não obstante se tivesse estabelecido posteriormente a controvérsia entre as partes sobre a quantidade e qualidade dos trabalhos já realizados pela Executada, partiu-se, por novo impulso do Exequente, para a penhora de bens.
O que, a nosso ver, como resulta do já exposto, não tem fundamento legal.
Mas não é apenas uma questão de falta de fundamento legal. O procedimento assim adotado interfere, e interferiu, diretamente com o direito de defesa da Executada e com a possibilidade que a lei lhe confere, como vimos, de alegar e provar qualquer facto ocorrido posteriormente à citação para o incidente da fixação do prazo, que, nos termos gerais, seja motivo legítimo de oposição.
De modo que não pode deixar de lhe ser reconhecida razão quando alega que foi violado o seu direito ao contraditório, enquanto possibilidade de invocar, no local próprio e pelo meio adequado, as pertinentes razões de facto e de direito que considerasse necessárias para a defesa da sua posição processual e de aí oferecer e produzir as suas próprias provas, bem como controlar aquelas que eventualmente viessem a ser apresentadas e produzidas pela parte contrária (artigo 20.º da CRP e artigos 3.º e 415.º, do CPC) Cfr. sobre estas dimensões do princípio do contraditório, José Lebre de Freitas, Introdução ao Processo Civil, Conceito e Princípios Gerais, 2ª Edição, Reimpressão, Coimbra Editora, págs108 a 114. .
Mas, mais: esse mesmo procedimento, além de ter omitido a notificação da Executada nos termos legalmente prescritos, acabou por consubstanciar um conjunto de irregularidades que, em razão do seu impacto no direito de defesa da Executada, não pode deixar de se ter como suscetível de influir na decisão da causa. Ou seja, é um procedimento que, como decorre da alegação atual e pretérita da Apelante, não pode deixar de ser anulado (artigo 195.º, n.º 1, do CPC).
Não se ignora com isto que, já depois de terminado o prazo para a Executada cumprir a prestação a que estava obrigada, foi por despacho judicial datado de 14/12/2022, fixado o valor do custo da prestação exequenda em 30.400,00€. Despacho que, apesar de notificado às partes, não foi por elas oportunamente impugnado, o que implica que se considere transitado em julgado (artigo 628.º, do CPC).
Todavia, esse despacho foi proferido na sequência de uma determinação anterior, datada de 03/03/2022, numa altura em que ainda estava a decorrer o prazo para a prestação exequenda ser realizada pela própria Executada. E é em relação à totalidade dessa prestação e não apenas a uma das partes que se deve ter por definido aquele valor.
Por conseguinte, não se considera haver obstáculo a que, em novo incidente e perante outro circunstancialismo, se conclua por um valor diverso.
Em suma, crê-se que o processado desencadeado a partir da notificação efetuada pelo Agente de Execução no dia 19/01/2023 deve ser anulado e, assim, procedendo o presente recurso, a decisão recorrida deve necessariamente ser revogada e determinado que doravante se observe o que se acha prescrito no já citado artigo 875.º, n.º 2, do CPC.
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III- Dispositivo
Pelas razões expostas, acorda-se em julgar procedente o presente recurso e, por consequência, revogando o despacho recorrido, anula-se o processado a partir da notificação efetuada pelo Agente de Execução no dia 19/01/2023, incluindo nesse processado as penhoras posteriormente realizadas, e determina-se que doravante se observe o regime que se acha prescrito no artigo 875.º, n.º 2, do CPC.
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- Em função deste resultado e da pretensão do Exequente/Apelado em prosseguir com a execução nos termos em que prosseguiu, suportará o mesmo as custas deste recurso- artigo 527.º, n.ºs 1 e 2, do CPC.

Porto, 5/3/2024
João Diogo Rodrigues
Artur Dionísio Oliveira
Maria Eiró