INEPTIDÃO DA PETIÇÃO INICIAL
Sumário

I - A ineptidão da petição inicial determina a nulidade de todo o processo, cfr. art.º 186.º, n.º 1, do C.P.Civil. Esta nulidade é de conhecimento oficioso, nos termos do art.º 196.º do atual C.P.Civil. E nos termos do art.º 200.º n.º 2, do C.P.Civil, só pode ser apreciada no saneador, se o juiz a não tiver apreciado antes ou, não havendo lugar a despacho saneador, pode o juiz dela conhecer até à sentença final.
II - A falta de causa de pedir significa a ausência de alegação de factos que fundem o pedido, ou seja, que constituam o direito feito valer através do pedido.
III -A insuficiência da causa de pedir pressupõe a alegação de factos atinentes ao direito feito valer embora não constem alegados todos os factos necessários à procedência do pedido.
IV -Enquanto a falta de causa de pedir constitui vício formal, insuprível, que conduz à anulação de todo o processo e, em sede de saneamento do processo, à absolvição do réu da instância, já a insuficiência da causa de pedir pode ser suprida e, se o não for, conduzirá, em sede de apreciação do mérito, à improcedência, total ou parcial, do pedido.

Texto Integral

Apelação
Processo n.º 4670/22.0 T8VNG.P1
Tribunal Judicial da Comarca do Porto – Juízo Local Cível de Vila Nova de Gaia - Juiz 4


Recorrente – A..., Ld.ª
Recorridos – B... SA
C..., Ld.ª



Relatora – Anabela Dias da Silva
Adjuntos – Desemb. João Proença
Desemb. Rodrigues Pires



Acordam no Tribunal da Relação do Porto (1.ªsecção cível)

I A..., Ld.ª, com sede em Zona Industrial ..., ... Águeda intentou no Tribunal Judicial da Comarca do Porto – Juízo Local Cível de Vila Nova de Gaia apresente ação com processo comum contra B... SA e C..., Ld.ª, ambas com sede em ..., pedindo a condenação das rés a:
-Entregar à autora os dossiers dos dois projetos de investimentos (inovação n.º 19632 e Internacionalização n.º 20043), materializados quer em suporte digital, quer em suporte físico, devidamente organizados e cumprindo todas as exigências do Regulamento Específico de Competitividade e Internacionalização, com todos os elementos e documentos de suporte dos mesmos;
-Indemnizar a autora de todos os prejuízos que causarem, a liquidar em execução de sentença.
Para tanto, alegou, em síntese, que se dedica ao fabrico de peças para a indústria, tornearia automática de mecânica, comercialização de matérias primas e produtos para a metalomecânica e afins, prestação de serviços na área da metalomecânica, e no âmbito dos Sistemas de Incentivos às Empresas, Inovação Empresarial, foi celebrado em 25.10.2016, entre a autora e a Comissão Diretiva doo Programa Operacional Regional do Centro, um contrato que tem por objeto a concessão de um incentivo financeiro para aplicação na execução, pelo beneficiário, ora autora, do projeto de investimento n.º 019632, com um montante de investimento elegível global de €1.177.210,00, sob o acompanhamento do IAPMEI – Agência para a Competitividade e Inovação I.P. – Organismo Intermédio que acompanha a realização do investimento, nos termos em que foi aprovado e se considera parte integrante do contrato.
E também no âmbito dos Sistemas de Incentivos às Empresas, Internacionalização das PME, foi celebrado em 19.12.2016, entre a autora e a Comissão Diretiva do Programa Operacional Regional do Centro, um contrato que tem por objeto a concessão de um incentivo financeiro para aplicação na execução, pelo beneficiário, ora autora, do projeto de investimento n.º 020043, sob o acompanhamento da Agência para a AICEP -Agência para o investimento e Comércio Externo de Portugal, E.P.E., – Organismo Intermédio que acompanha a realização do investimento.
Porque as rés, tendo ambas por objeto, entre outros, a consultoria, realização de estudos e gestão de projetos; prestação de serviços nas áreas de gestão, finanças, contabilidade, fiscalidade, recursos humanos, formação, tecnologia de informação, informática, marketing, publicidade e atividades conexas e com vista à apresentação das candidaturas pela autora aos sobreditos projetos de Inovação e Internacionalização, seu acompanhamento até final e estudo final, a autora celebrou com elas, por escritos datados de 12.02.2016, 24.03.2016, 28.04.2016, 03.02.2017, 06.02.2017, 23.02.2016,
11.05.2016 e 16.05.2016, uma séria de contratos denominados de prestação de serviços de segurança, por via dos quais foi entregando às rés todos os documentos e elementos
necessários, quer à apresentação dos sobreditos projetos, quer à sua implementação, acompanhamento e estudo até final.
A autora tem sido notificada no âmbito dos sobreditos projetos pelas entidades
que acompanham a realização dos respetivos investimentos, concretamente, pelo IAPMEI –Agência para a Competitividade e Inovação I.P. – Organismo Intermédio do projeto de Inovação n.º 019632, e pela AICEP - Agência para o investimento e Comércio Externo de Portugal, E.P.E., – Organismo Intermédio que acompanha o projeto de Internacionalização n.º 020043, para proceder à entrega de uma série de elementos e/ou documentos que se encontram em tais dossiers que, por sua vez, se encontram na posse das rés, quer em suporte digital, quer em suporte físico. Tais dossiers e elementos e/ou documentos solicitados pelos organismos que acompanham os sobreditos projetos, são essenciais à comprovação de que os investimentos foram realizados e os objetivos foram alcançados nos termos dos contratos, sem os quais a autora poderá vir a perder e ter de devolver parte dos incentivos que recebeu no âmbito dos sobreditos projetos, sendo que a autora não detém os dossiers daqueles dois projetos de investimentos, materializados quer em suporte digital, quer em suporte físico.
Acontece que, findos os contratos de prestação de serviços celebrados entre a autora e as rés, estas, interpeladas pela autora para que procedessem à entrega dos dossiers daqueles dois projetos, recusam-se a entregá-los não os tendo restituído à autora até á presente data.

Citadas as rés, estas vieram deduzir contestação pedindo a improcedência da ação.
Para tanto, excecionaram o erro na forma do processo, a ineptidão da p. inicial, a falta de interesse da autora e no mais impugnaram a generalidade dos factos alegados pela autora.

A autora respondeu à matéria das exceções pugnando pela sua improcedência.

Realizou-se audiência prévia,

Em 18.04.2023 foi proferido o seguinte despacho: “A autora alega ter celebrado com as rés um conjunto de contratos de prestação de serviços, no âmbito dos quais lhes entregou um conjunto de documentos e elementos, que diz lhe pertencerem.
Notificada para vir concretizar que documentos e elementos são esses, veio a autora responder conforme termos do requerimento de 23/02/2023 enunciando uma série longa de documentos e outros elementos, ficando-se na dúvida sobre se se tratam apenas dos documentos que a autora terá fornecido aos réus e se nessa descrição não está igualmente o resultado dos serviços prestados pelas rés, além de não se perceber a que ré é que a autora terá entregue cada um daqueles documentos/elementos e que deveria devolver-lhes, razão pela qual se decidir notificar a autora para em dez dias o vir concretizar”.

A autora respondeu dizendo: “…os documentos cuja entrega é peticionada nos presentes autos estão na posse de ambas as RR, considerando para o efeito que, aquando da sua entrega, ambas exerciam a sua atividade em conjunto, partilhando as mesmas instalações à AV. ..., em ..., conforme, aliás se infere da morada das mesmas indicada nos contratos juntos aos autos com a P.I.
Mais vem esclarecer que, todos os documentos e/ou elementos entregues pela A. Foram organizados pelas RR em 2 dossiers - um do projeto de inovação n.º 19632 e outro do projeto Internacionalização n.º 20043, materializados quer em suporte digital, quer em suporte físico, cumprindo as exigências do Regulamento Específico de Competitividade e Internacionalização, sendo essenciais à comprovação de que os investimentos foram realizados e os objetivos foram alcançados. Assim, considerando que tais dossiers foram organizados pelas RR., de forma a assegurar que possuem todas as evidências técnicas, contabilísticas e financeiras, que comprovem a realização dos projetos, não se trata apenas dos elementos e documentos que foram entregues àquelas, mas antes dos dossiers onde os mesmos estarão, devidamente organizados de acordo com a estrutura que se indicou no requerimento apresentado em 23.02.2023”

Foi depois proferida a seguinte decisão no âmbito da qual se julgou improcedente o invocado erro na forma do processo, assim como a alegada falta de interesse em agir por parte da autora e a ilegitimidade passiva da ré C..., Ld.ª.
E, no mais, consta: “(…) Invocou a ré C..., Ld.ª, que a petição inicial é inepta por, em síntese, não descrever os contratos que celebrou com as rés.
A autora defendeu que a petição inicial não é inepta.
Vejamos.
Nos termos do disposto no artigo 186.º, 2, do CPC, a petição é inepta quando falte ou seja ininteligível a indicação do pedido ou da causa de pedir, quando o pedido esteja em contradição com a causa de pedir ou quando se cumulem causas de pedir ou pedidos substancialmente incompatíveis.
Deriva da simples leitura do artigo 552.º, 1, d), do CPC, que, como antecedente lógico da pretensão formulada, o autor deve expor os factos e as razões de direito que servem de fundamento à ação.
Assim, não basta a invocação de um determinado direito subjetivo e a formulação da vontade de obter do Tribunal determinada forma de tutela jurisdicional. Tão importante quanto isso é a alegação da relação material de onde o autor faz derivar o correspondente direito e, dentro dessa relação material, a alegação dos factos constitutivos do direito.
Funcionando no sistema jurídico o princípio do dispositivo e de acordo com as regras gerais da repartição do ónus da prova (artigo 342.º do Código Civil) é sobre o autor, que invoca a titularidade de um direito, que cabe fazer a alegação dos factos de cuja prova seja possível concluir pela existência desse direito (artigo 5.º, 1 do CPC), sem prejuízo do Tribunal poder conhecer de factos instrumentais, complementares ou concretizadores dos que as partes hajam alegado e resultem da instrução da causa e de factos notórios (artigo 5.º, 2, do CPC).
Nos artigos 552.º, 1, d) e 582.º, 4, do CPC, o legislador fez uma opção entre dois sistemas possíveis: o da individualização ou o da substanciação da causa de pedir.
(…)
Foi esta última a opção a que aderiu o legislador e, assim, o preenchimento da causa de pedir, independentemente da qualificação jurídica apresentada, supõe a alegação do conjunto de factos essenciais que se inserem na previsão abstrata da norma ou normas jurídicas definidoras do direito cuja tutela jurisdicional se busca através do processo civil
(…).
Na indicação da causa de pedir exige-se, pois, que o autor, mais do que meramente individualizar a relação controvertida, substancie a sua pretensão ou o seu direito pela indicação do facto constitutivo do mesmo (…).
Por outro lado, a necessidade de invocação da materialidade não pode deixar de escorar-se igualmente no respeito do princípio do contraditório, como condição do efetivo exercício do direito de defesa, impondo-se que ao réu seja dado conhecimento dos factos fundamentadores da pretensão.
Estas são algumas das razões que justificam e creditam a imposição ao autor do ónus de invocar na petição os factos integradores/essenciais da causa de pedir.
No caso concreto, a autora alega ter celebrado com as rés oito contratos de prestação de serviços, cujos documentos juntou, no âmbito do quais lhes entregou documentos e elementos necessários para concessão de incentivos financeiros que negociou com a Comissão Diretiva do Programa Operacional Regional do Centro, carecendo da devolução de tais documentos, pretendendo ainda a condenação das rés pelos prejuízos que vier a ter em indemnização a liquidar.
Notificada para vir concretizar que documentos e elementos são esses, veio a autora responder conforme termos do requerimento de 23.02.2023 enunciando uma série longa de documentos e outros elementos.
Todavia, essa descrição não só não é concretizada quanto aos documentos que a autora terá fornecido às rés, sendo quase todos referidos de forma genérica como faturas, anexos, guias de transporte extratos do banco, extratos de fornecedor, etc, como sobretudo não distingue que documentos é que terá entregue a cada uma das rés e que agora pretende que cada uma lhe restitua, além de se perceber que a autora neles inclui não só os documentos que diz ter entregue às rés como também o resultado dos serviços prestados pelas rés, o que não parece ter relação com a causa de pedir.
Em face disso, não só não consegue o tribunal perceber que documentos é que a autora entregou a cada ré que cada uma destas lhe tem de restituir, como não se consegue descortinar como poderia ainda cada uma das rés vir a ser condenada em indemnizar a autora pelos prejuízos que esta viesse a ter por não lhe terem sido restituídos os documentos que entregou.
Verifica-se assim que a petição inicial é inepta. A ineptidão da petição equivale a uma inexistência do objeto do processo e constitui uma nulidade insanável, conduzindo a que se abstenha de conhecer do pedido e se absolva a ré da instância.
Em face do exposto, decide-se nos termos do disposto nos artigos 186.º, 2, a), 196.º, 200.º, 2, 278.º, 1, b) e 595.º, 1, a), todos do CPC, declarar que a petição inicial é inepta por falta de causa de pedir e, em consequência, absolvem-se as rés da instância.
As custas correm pela autora (artigos 527.º, 1, do CPC)
Notifique.”.


Inconformada com tal decisão, dela veio a autora recorrer de apelação, pedindo a sua revogação e a substituição por outra que julgue totalmente improcedente e exceção da ineptidão da petição inicial.
A apelante juntou aos autos as suas alegações que terminam com as seguintes conclusões:
a) O presente recurso vem interposto da douta sentença, que julgou a petição inicial apresentada pela autora, aqui recorrente, inepta por falta de causa de pedir, nos termos do disposto nos artigos 186.º, 2, a), 196.º, 200.º, 2, 278.º, 1, b) e 595.º, 1, a), todos do CPC, e, em consequência, absolveu as rés da instância.
b) Os fundamentos do presente recurso de apelação são os seguintes: A decisão objeto do presente recurso viola a norma jurídica contida no artigo 186.º, 2, a), do CPC que foi nos presentes autos erroneamente interpretada e aplicada pelo meritíssimo Juiz a quo;
c) A causa de pedir que serve de fundamento ao pedido de entrega de documentos e ao pedido indemnizatório e respetivo nexo causal constam de forma inteligível dos artigos 6.º, 7.º, 8.º, 9.º, 10.º, 11.º, 12.º, 13.º, 14.º, 15.º, 16..º, 17º, e 18.º da P.I. que se passam a transcrever: 6.º Por sua vez, as RR. São também sociedades comerciais por quotas, cujo capital social pertence aos mesmos sócios, tendo ambas por objeto, entre outros, a consultoria, realização de estudos e gestão de projetos; Prestação de serviços nas áreas de gestão, finanças, contabilidade, fiscalidade, recursos humanos, formação, tecnologia de informação, informática, marketing, publicidade e atividades conexas; 7º Com vista à apresentação das candidaturas pela A. aos sobreditos projetos de Inovação e Internacionalização, seu acompanhamento até final e estudo final, a A. celebrou com as RR., por escritos datados de 12.02.2016, 24.03.2016, 28.04.2016, 03.02.2017, 06.02.2017, 23.02.2016, 11.05.2016 e 16.05.2016, uma séria de contratos denominados de prestação de serviços de segurança, cujas cópias ora se juntam como doc. n.ºs 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11 e 12; 8º Por via dos quais a A. foi entregando às RR. todos os documentos e elementos necessários, quer à apresentação dos sobreditos projetos, quer ao sua implementação, acompanhamento e estudo até final; 8º Estando na posse das RR. os dossiers daqueles dois projetos de investimentos ( novação n.º 19632 e Internacionalização n.º 20043), materializados quer em suporte digital, quer em suporte físico, devidamente organizados e cumprindo todas as exigências do Regulamento Específico de Competitividade e Internacionalização, dos quais constam todos os elementos e documentos de suporte dos mesmos, como por exemplo faturas, respetivos pagamentos, extratos contabilísticos e evidência físicas de cada um dos comprovativos, dossiers esse que obedecem a uma estrutura especifica. 9º Acontece que, a A. tem sido notificada no âmbito dos sobreditos projetos pelas entidades que acompanham a realização dos respetivos investimentos, concretamente pelo IAPMEI – Agência para a Competitividade e Inovação I.P. – Organismo Intermédio do projeto de Inovação n.º 019632-, e pela AICEP - Agência para o investimento e Comércio Externo de Portugal, E.P.E., – Organismo Intermédio que acompanha o projeto de Internacionalização n.º 020043, para proceder à entrega de uma série de elementos e/ou documentos que se encontram em tais dossiers que, por sua vez, se encontram na posse das RR., quer em suporte digital, quer em suporte físico, conforme se infere das comunicações que a titulo de exemplo ora se junta como doc. n.ºs 13 e 14.10º Tais dossiers e elementos e/ ou documentos solicitados pelos organismos que acompanham os sobreditos projetos, são essenciais à comprovação de que os investimentos foram realizados e os objetivos foram alcançados nos termos dos contratos juntos como doc.s n.ºs 2 e 3, 11º Sem os quais a A. poderá vir a perder e ter de devolver parte dos incentivos que recebeu nos âmbito dos sobreditos projetos, sendo que 12º A A. não detém os dossiers daqueles dois projetos de investimentos ( novação n.º 19632 e Internacionalização n.º 20043), materializados quer em suporte digital, quer em suporte físico, devidamente organizados e cumprindo todas as exigências do Regulamento Específico de Competitividade e Internacionalização, dos quais constam todos os elementos e documentos de suporte dos mesmos, como por exemplo faturas, respetivos pagamentos, extratos contabilísticos e evidência físicas de cada um dos comprovativos, estando os mesmos na posse das RR. 13º Tais dossiers e elementos e/ ou documentos que os compõem são pertença da A. 14º Acontece que, findos os contratos de prestação de serviços celebrados entre a A. e as RR., interpeladas pela A. para que procedessem à entrega dos dossiers daqueles dois projetos de investimentos (Inovação n.º 19632 e Internacionalização n.º 20043), materializados quer em suporte digital, quer em suporte físico, devidamente organizados e cumprindo todas as exigências do Regulamento Específico de Competitividade e Internacionalização, com todos os elementos e documentos de suporte, nos termos constantes do e-mail enviado pela A. em 16.07.2021 e da carta registada com aviso de receção que remeteu à primeira Ré em 10.02.2022 e recebida a 11.02.2022, cujas cópias do email e da carta, talão do registo dos CTT e aviso de receção se junta como doc. n.ºs 15 e 16 e se dão por integralmente reproduzido para todos os devidos e legais efeitos, 15º Aquelas recusam-se a entregá-los não o tendo os mesmos sido restituídos à A. até á presente data. 16º Ao atuar como vem de referir, as RR. tinham como têm consciência de que estão a lesar os direitos da A.17º A qual poderá vir a perder e ter de devolver parte dos incentivos que recebeu no âmbito dos sobreditos projetos, caso não apresente os dossiers e ou elementos e documentos constantes dos mesmos;
d) Sendo que a concretização dos documentos e elementos peticionados consta, além do mais do requerimento apresentado pela autora, aqui recorrente, em 23.02.2023, a que corresponde a referência n.º 34840749 no qual se precisou que: Conforme se infere da P.I., a autora peticionou a condenação das rés a entregaram-lhe os dossiers dos dois projetos de investimento (inovação n.º 19632 e Internacionalização n.º 20043), materializados quer em suporte digital, quer em suporte físico, devidamente organizados e cumprindo todas as exigências do Regulamento Específico de Competitividade e Internacionalização, com todos os elementos e documentos de suporte dos mesmos, essenciais à comprovação de que os investimentos foram realizados e os objetivos foram alcançados. Estes dossiers estão organizados de acordo com a estrutura infra, por forma a assegurar que possuem todas as evidências técnicas, contabilísticas e financeiras, que comprovem a realização dos projetos. Assim, os dossiers cuja entrega é peticionada pela A, são compostos por um lado, por um conjunto de pastas físicas e, por outro lado, por um conjunto de pastas digitais. Quer nas pastas físicas, quer nas pastas digitais estão arquivados todos os documentos que materializam cada um dos separadores referidos. Precisando, cada um dos separadores contém diversos documentos, designadamente:
 Candidatura:
o elementos contabilísticos de suporte ao estudo e elaboração da candidatura;
o orçamentos de suporte à elaboração da candidatura;
o demais elementos de suporte à candidatura (declarações de compromisso, declarações oficiais, pesquisas de mercado, etc);
o Estudo de Diagnóstico;
o Estudo de Viabilidade;
o Formulário de candidatura;
o Anexos ao Formulário de candidatura.
 Comprovativos de Condições de Elegibilidade
 Termo de aceitação:
o Documentação de notificação de decisão e análise;
o Termo de aceitação e seus anexos
 Execução Pedidos de Pagamento:
o formulários
o comprovantes onde cada um dos comprovantes tem de ter toda a documentação exigida (cada comprovante pode ter especificidades), designadamente:
 fatura;
 documentos de pagamento;
 Extratos do banco;
 extratos de fornecedor;
 guias de transporte;
 evidência física;
 consultas de mercado (orçamento adjudicado + pelo menos dois orçamentos alternativos);
 contratos de prestação de serviço/compra;
 proposta;
 prova da adjudicação.
o Anexos associados ao pedido
 Encerramento do Investimento - Pedido Final:
o formulários
o comprovantes onde cada um dos comprovantes tem de ter toda a documentação exigida (cada comprovante pode ter especificidades), designadamente:
 fatura;
 documentos de pagamento;
 Extratos do banco;
 extratos de fornecedor;
 guias de transporte;
 evidência física;
 consultas de mercado (orçamento adjudicado + pelo menos dois orçamentos alternativos);
 contratos de prestação de serviço/compra;
 proposta;
 prova da adjudicação;
o Mapa de Financiamento
o Comprovantes das fontes de financiamento
o Comprovantes de licenciamento
o Comprovantes de Quadro de Pessoal
o Demais Anexos associados ao pedido (em função do que está referido no formulário associado)
 Encerramento do Projeto, designadamente:
1. Mapa de Verificação Física com identificação dos bens adquiridos no âmbito do projeto e evidências fotográficas e vídeos que comprovam que os mesmos se encontram no estabelecimento do projeto e em condições de operacionalidade e funcionamento.
Quanto às evidências fotográficas e vídeos comprovativas da realização do investimento, deverão atender ainda ao seguinte:
- para cada bem de investimento devem ser apresentadas três fotografias do bem, uma do equipamento, outra da chapa identificativa do mesmo, na qual seja possível identificar o ano de fabrico, a marca, o modelo e o número de série, e outra que permita aferir do seu enquadramento no estabelecimento do beneficiário em condições de operacionalização.
Tratando-se de obras, deverão ser apresentadas fotografias ou vídeos que permitam verificar, de forma clara, a execução das mesmas e solicita-se também:
- Licenciamento da Obra;
- Planta respetiva da área alvo do investimento do projeto (com áreas em m2 e discriminação da utilização de cada área, nomeadamente áreas produtivas, sociais, etc… e sua dimensão em m2);
- Autos de medição devidamente assinados;
Para além do Mapa da Verificação Física, deverão identificar eventuais alterações introduzidas ao projeto e confirmar se as mesmas, carecendo de aprovação, já se encontram aprovadas.
No caso de Software, solicita-se a licença.
2. Disponibilização dos extratos contabilísticos com o registo do incentivo.
3. Disponibilização de balancete atualizado que evidencie a existência de um sistema de contabilidade separada para todas as transações referentes à operação, por exemplo, através da criação de contas específicas para o projeto ou da utilização ou da utilização de um sistema de contabilidade analítica bem como detalhe da conta de terceiros.
4. Balancete Analítico (ano de conclusão investimento).
5. De acordo com o Mapa de Financiamento apresentado, as Fontes de Financiamento utilizadas foram: Prestações Suplementares de Capital, Dívidas a Instituições de Crédito e Incentivo. Para isso é necessária a documentação inerente:
6. IES
7. Comprovativos referentes ao Licenciamento das instalações e da atividade desenvolvida.
Comprovar que possui as condições legais para a execução dos investimentos, sendo que para tal, deverá instruir o pedido de alterações ao licenciamento para as alterações decorrentes do projeto e obter o licenciamento até ao encerramento do projeto, ou (quando aplicável), comprometer-se a demonstrar que o projeto não implica alterações que careçam de licenciamento.
8. Documento referente à Avaliação da Integração da Perspetiva da Igualdade entre Homens e Mulheres e Igualdade de Oportunidades e da Não Discriminação. E documento referente à Avaliação do Cumprimento da Legislação Ambiental.
9. Comprovativo de criação de postos de trabalho de emprego qualificado, conforme contratualizado. Documentos de registo no portal da Segurança Social, último extrato de contribuições de Segurança Social.
10. Disponibilização das consultas efetuadas ao mercado e os critérios de seleção dos fornecedores.
11. Para o comprovante n.º 3 e 13, deverá o beneficiário evidenciar informação complementar que permita aferir da razoabilidade das despesas envolvidas, tendo em consideração os preços médios de mercado. Para além disso, deverá apresentar a proposta da empresa «D..., Lda.»,
bem como, a disponibilização de link (versão mode) da Plataforma para visualização da mesma e suas funcionalidades, por forma a permitir aferir da comprovação física da realização dos serviços em questão e das funcionalidades implementadas.
 Comprovantes do Investimento: nos termos impostos pelo regulamento.
e) De igual forma, a inteligibilidade da causa de pedir resulta do requerimento apresentado pela autora, aqui recorrente, em 26.05.2023, a que corresponde a referência n.º35752968 no qual se alegou que: “Os documentos cuja entrega é peticionada nos presentes autos estão na posse de ambas as RR, considerando para o efeito que, aquando da sua entrega, ambas exerciam a sua atividade em conjunto, partilhando as mesmas instalações à AV. ..., em ..., conforme, aliás se infere da morada das mesmas indicada nos contratos juntos aos autos com a P.I. Mais vem esclarecer que, todos os documentos e/ou elementos entregues pela A. foram organizados pelas RR em 2 dossiers - um do projeto de inovação n.º 19632 e outro do projeto Internacionalização n.º 20043, materializados quer em suporte digital, quer em suporte físico, cumprindo as exigências do Regulamento Específico de Competitividade e Internacionalização, sendo essenciais à comprovação de que os investimentos foram realizados e os objetivos foram alcançados. Assim, considerando que tais dossiers foram organizados pelas RR., de forma a assegurar que possuem todas as evidências técnicas, contabilísticas e financeiras, que comprovem a realização dos projetos, não se trata apenas dos elementos e documentos que foram entregues àquelas, mas antes dos dossiers onde os mesmos estarão, devidamente organizados de acordo com a estrutura que se indicou no requerimento apresentado em 23.02.2023.”;
f) Sendo que de tal resposta e requerimentos apresentados pela autora, aqui recorrente, resulta que na petição inicial só não foi feita a distinção dos documentos entregues a cada uma das rés, pela simples razão de ambas as rés partilharem à data o mesmo espaço físico, e/ ou trabalhadores e órgãos de gestão, conforme aliás resulta da morada indicada nos contratos de prestação de serviços juntos à petição inicial;
g) Donde tudo resulta que também andou mal o Tribunal a quo quando entendeu que a petição inicial é inepta por não concretizar os documentos que a autora terá fornecido às rés e por não distinguir que documentos é que terá entregue a cada uma das rés;
h) Mostra-se, pois violado o art.º 186.º, n.º 2, al. a) do Código de Processo Civil, impondo-se a revogação da douta sentença recorrida.


O réu/apelado juntou aos autos as suas contra-alegações onde pugna pela confirmação da decisão recorrida.


II – Os factos relevantes para a decisão do presente recurso são os que estão enunciados no supra elaborado relatório, pelo que, por razões de economia processual, nos dispensamos de aqui os reproduzir.


III – Como é sabido o objeto do recurso é definido pelas conclusões do recorrente (art.ºs 5.º, 635.º n.º3 e 639.º n.ºs 1 e 3, do C.P.Civil), para além do que é de conhecimento oficioso, e porque os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, ele é delimitado pelo conteúdo da decisão recorrida.
*
Ora, visto o teor das alegações do autor/apelante é questão a apreciar no presente recurso:
- Da alegada não verificação de ineptidão da p. inicial.

Como é sabido, preceitua o n.º2 do art.º 2 .º do C.P.Civil que: “A todo o direito, exceto quando a lei determine o contrário, corresponde a ação adequada a fazê-lo reconhecer em juízo, a prevenir ou a reparar a violação dele e a realizá-lo coercivamente, bem como os procedimentos necessários para cautelar o efeito útil da ação”.
In casu” a autora/apelante arroga a um direito que diz ter sido violado pelas rés/apeladas e, por isso recorreu a juízo por via da presente ação afim de ver esse alegado direito reconhecido e reparado.
Como se viu, a 1.ª instância, em sede de despacho saneador, julgou a p. inicial inepta, por falta de causa de pedir.
A ineptidão da petição inicial determina a nulidade de todo o processo, cfr. art.º 186.º, n.º 1, do C.P.Civil, correspondente ao art.º 193.º do C.P.Civil de 1961. Esta nulidade é de conhecimento oficioso, nos termos do art.º 196.º do atual C.P.Civil. E nos termos do art.º 200.º n.º 2, do C.P.Civil, só pode ser apreciada no saneador, se o juiz a não tiver apreciado antes ou, não havendo lugar a despacho saneador, pode o juiz dela conhecer até à sentença final.
A ineptidão da petição inicial é também uma exceção dilatória, pois a sua verificação determina a nulidade de todo o processo, cfr. art.º 577.º, al. b), do C.P.Civil, o que determina a absolvição do réu da instância, nos termos do art.º 278.º, n.º 1, al. b), do C.P.Civil. É precisamente no despacho saneador que, se não antes, cumpre conhecer da nulidade ineptidão da petição inicial, como resulta do art.º 595.º, n.º 1, al. a), do C.P.Civil.
Preceitua o n.º 2 do art.º 186.º do C.P.Civil que: “Diz-se inepta a petição:
a) Quando falte ou seja ininteligível a indicação do pedido ou da causa de pedir;
b) Quando o pedido esteja em contradição com a causa de pedir;
c) Quando se cumulem causas de pedir ou pedidos substancialmente incompatíveis”
E para o que releva no caso em apreço nos autos, a falta de causa de pedir significa a ausência de alegação de factos que fundem o pedido, ou seja, que constituam o direito feito valer através do pedido, já a insuficiência da causa de pedir pressupõe a alegação de factos atinentes ao direito feito valer embora não constem alegados todos os factos necessários à procedência do pedido. E enquanto a falta de causa de pedir constitui vício formal, insuprível, que conduz à anulação de todo o processo e, em sede de saneamento do processo, à absolvição do réu da instância, já a insuficiência da causa de pedir pode ser suprida e, se o não for, conduzirá, em sede de apreciação do mérito, à improcedência, total ou parcial, do pedido
No que concerne à ininteligibilidade da causa de pedir e/ou do pedido, situando-nos ainda no âmbito formal da peça processual, pode dizer-se que, em regra, a causa de pedir e/ou o pedido enferma de ininteligibilidade quando é obscura, ou seja, de sentido indeterminada (o) ou indeterminável ou ambígua (o), ou seja, se apresenta vários sentidos possíveis.
Como refere o Prof. Alberto dos Reis, in “Comentário ao CPC”, vol. II, pág. 371, há o vício de ininteligibilidade da causa de pedir quando o autor expõe os factos fonte do pedido em termos de tal modo confusos, ambíguos ou ininteligíveis que não seja possível apreender com segurança a causa de pedir.
A causa de pedir é o facto jurídico de que emerge a pretensão do autor, cfr. n.º 4 do art.º 581.º do C.P.Civil. No mesmo sentido preceitua a al. d) do n.º 1 do art.º 552.º do C.P.Civil, ou seja, “Na petição, com que propõe a ação, deve o autor: Expor os factos essenciais que constituem a causa de pedir e as razões de direitos que servem de fundamento à ação”. Portanto, há falta de causa de pedir quando não se aleguem os factos em que se funda a pretensão do autor.
A nossa lei processual civil consagrou a teoria da substanciação, segundo a qual não basta a indicação genérica do direito que se pretende tornar efetivo, sendo necessária a indicação específica do facto constitutivo desse direito.
Se a ação se destina a fazer valer um direito de obrigação, não basta apontar o objeto dela ou o direito que se quer fazer valer, mas é indispensável especificar o facto ou os factos constitutivos do direito Nas ações obrigacionais, a causa de pedir é o facto jurídico de que nasceu o direito de crédito (o empréstimo, a compra e venda, a prestação de serviço, etc.). O pedido é o efeito jurídico que se pretende obter na ação, cfr. n.º3 do art.º 581.º do C.P.Civil. E como refere o Prof Alberto dos Reis, in obra citada, o pedido deve ser o corolário ou a consequência lógica da causa de pedir ou dos fundamentos em que assenta a pretensão do autor, do mesmo modo que, num silogismo, a conclusão deve ser a emanação lógica das premissas.
Não se pode ignorar que uma das traves mestras do nosso ordenamento jurídico, no que ao ramo do direito processual civil respeita, continua a ser o princípio do dispositivo. E assim sendo, ás partes, designadamente ao autor, compete apresentar ao tribunal uma pretensão devidamente clarificada e estruturada, municiada de todos os elementos necessários à procedência do peticionado. E o Juiz confia na bondade do que vem articulado e na suficiência da prova oferecida, nomeadamente nos documentos apresentados, tanto mais que se deve exigir do autor que é “normalmente patrocinado por profissional do foro, apetrechado com os necessários conhecimentos técnicos que saiba identificar os fundamentos fácticos da sua pretensão, de acordo com os preceitos que são aplicáveis, e transpor para o articulado inicial, através da verbalização adequada, a realidade histórica que subjaz ao litígio”, cfr. Abrantes Geraldes, in “Temas da Reforma do Processo Civil”, vol. II, pág. 81.

Depois destas linhas gerais vejamos o caso dos autos.
Por via da presente ação pede a autora/apelante que: “Deve a presente ação ser julgada procedente e provada e as RR. condenadas a:
-Entregar à A. os dossiers dos dois projetos de investimentos (inovação n.º 19632 e Internacionalização n.º 20043), materializados quer em suporte digital, quer em suporte físico, devidamente organizados e cumprindo todas as exigências do Regulamento Específico de Competitividade e Internacionalização, com todos os elementos e documentos de suporte dos mesmos;
-Indemnizar a A. de todos os prejuízos que causarem, a liquidar em execução de sentença”.
Para tanto, alegou, em sede de p. inicial, que: “Com vista à apresentação das candidaturas pela A. aos sobreditos projetos de Inovação e Internacionalização, seu acompanhamento até final e estudo final, a A. celebrou com as RR., por escritos datados de 12.02.2016, 24.03.2016, 28.04.2016, 03.02.2017, 06.02.2017, 23.02.2016, 11.05.2016 e 16.05.2016, uma séria de contratos denominados de prestação de serviços de segurança, cujas cópias ora se juntam como doc. n.ºs 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11 e 12.
Por via dos quais a A. foi entregando às RR. todos os documentos e elementos necessários, quer à apresentação dos sobreditos projetos, quer ao sua implementação, acompanhamento e estudo até final.
Estando na posse das RR. os dossiers daqueles dois projetos de investimentos (…) materializados quer em suporte digital, quer em suporte físico, devidamente organizados e cumprindo todas as exigências do Regulamento Específico de Competitividade e Internacionalização, dos quais constam todos os elementos e documentos de suporte dos mesmos, como por exemplo faturas, respetivos pagamentos, extratos contabilísticos e evidência físicas de cada um dos comprovativos, dossiers esse que obedecem a uma estrutura especifica.
A A. tem sido notificada no âmbito dos sobreditos projetos pelas entidades que acompanham a realização dos respetivos investimentos, (…) para proceder à entrega de uma série de elementos e/ou documentos que se encontram em tais dossiers que, por sua vez, se encontram na posse das RR., quer em suporte digital, quer em suporte físico, conforme se infere das comunicações que a titulo de exemplo ora se junta como doc. n.ºs 13 e 14.
Tais dossiers e elementos e/ou documentos solicitados pelos organismos que acompanham os sobreditos projetos, são essenciais à comprovação de que os investimentos foram realizados e os objetivos foram alcançados nos termos dos contratos juntos como doc.s n.ºs 2 e 3. Sem os quais a A. poderá vir a perder e ter de devolver parte dos incentivos que recebeu nos âmbito dos sobreditos projetos, sendo que a A. não detém os dossiers daqueles dois projetos de investimentos (…) estando os mesmos na posse das RR.
Tais dossiers e elementos e/ou documentos que os compõem são pertença da A.
Acontece que, findos os contratos de prestação de serviços celebrados entre a A. e as RR., interpeladas pela A. para que procedessem à entrega dos dossiers daqueles dois projetos de investimentos (…) recusam-se a entregá-los não o tendo os mesmos sido restituídos à A. até á presente data”.

Ora, pelo teor dos vários documentos juntos aos autos pode concluir-se que a autora e a ré C..., Ld.ª celebraram no dia 12.02.2016 um contrato de prestação de serviços e que nos dias 24.03.2016, 28.04.2016, 11.05.2016, 16.05.2016, 3.02.2017, 6.02.2017 e 23.02.2017 a autora e a ré B... SA celebraram 7 contratos de prestação de serviços. Sendo que das alegações da autora não resulta, em concreto e, desde logo, qual seja o objeto de cada um desses contratos de prestação de serviços que celebrou com as rés, nem que documentos, originais ou cópias, entregou às rés e, a cada uma delas, e para efetivação da prestação desses serviços e, em suma, que constituem os alegados 2 dossiers dos dois projetos de investimentos. Pois que, como é sabido, é necessária a alegação concreta dos respetivos factos, já que os documentos apenas se destinam à prova desses factos.

Daí que foi a autora notificada pelo tribunal para “…em dez dias, precisar exatamente quais são os documentos, em suporte físico e digital, que fazem parte dos dossiers dos projetos de investimentos (inovação n.º 19632 e internacionalização n.º 20043) que pretende que as rés lhe entreguem”.
Em resposta (ou não resposta) a autora veio dizer, além do mais que: “Estes dossiers estão organizados de acordo com a estrutura infra, por forma a assegurar que possuem todas as evidências técnicas, contabilísticas e financeiras, que comprovem a realização dos projetos:
Estes dossiers estão organizados de acordo com a estrutura infra, por forma a assegurar que possuem todas as evidências técnicas, contabilísticas e financeiras, que comprovem a realização dos projetos:



Assim, os dossiers cuja entrega é peticionada pela A, são compostos por um lado, por um conjunto de pastas físicas e, por outro lado, por um conjunto de pastas digitais. Quer nas pastas físicas, quer nas pastas digitais estão arquivados todos os documentos que materializam cada um dos separadores referidos.
Precisando, cada um dos separadores contém diversos documentos, designadamente:
 Candidatura:
o elementos contabilísticos de suporte ao estudo e elaboração da candidatura;
o orçamentos de suporte à elaboração da candidatura;
o demais elementos de suporte à candidatura (declarações de compromisso,
declarações oficiais, pesquisas de mercado, etc);
o Estudo de Diagnóstico;
o Estudo de Viabilidade;
o Formulário de candidatura;
o Anexos ao Formulário de candidatura.
 Comprovativos de Condições de Elegibilidade
 Termo de aceitação:
o Documentação de notificação de decisão e análise;
o Termo de aceitação e seus anexos
 Execução Pedidos de Pagamento:
o formulários
o comprovantes onde cada um dos comprovantes tem de ter toda a documentação exigida (cada comprovante pode ter especificidades), designadamente:
 fatura;
 documentos de pagamento;
 Extratos do banco;
 extratos de fornecedor;
 guias de transporte;
 evidência física;
 consultas de mercado (orçamento adjudicado + pelo menos dois orçamentos alternativos);
 contratos de prestação de serviço/compra;
 proposta;
 prova da adjudicação.
o Anexos associados ao pedido
 Encerramento do Investimento - Pedido Final:
o formulários
o comprovantes onde cada um dos comprovantes tem de ter toda a documentação exigida (cada comprovante pode ter especificidades), designadamente:
 fatura;
 documentos de pagamento;
 Extratos do banco;
 extratos de fornecedor;
 guias de transporte;
 evidência física;
 consultas de mercado (orçamento adjudicado + pelo menos dois orçamentos alternativos);
 contratos de prestação de serviço/compra;
 proposta;
 prova da adjudicação;
o Mapa de Financiamento
o Comprovantes das fontes de financiamento
o Comprovantes de licenciamento
o Comprovantes de Quadro de Pessoal
o Demais Anexos associados ao pedido (em função do que está referido no formulário associado)
 Encerramento do Projeto, designadamente:
1. Mapa de Verificação Física com identificação dos bens adquiridos no âmbito do projeto e evidências fotográficas e vídeos que comprovam que os mesmos se encontram no estabelecimento do projeto e em condições de operacionalidade e funcionamento.
Quanto às evidências fotográficas e vídeos comprovativas da realização do investimento, deverão atender ainda ao seguinte:
- para cada bem de investimento devem ser apresentadas três fotografias do bem, uma do equipamento, outra da chapa identificativa do mesmo, na qual seja possível identificar o ano de fabrico, a marca, o modelo e o número de série, e outra que permita aferir do seu enquadramento no estabelecimento do beneficiário em condições de operacionalização.
Tratando-se de obras, deverão ser apresentadas fotografias ou vídeos que permitam verificar, de forma clara, a execução das mesmas e solicita-se também:
- Licenciamento da Obra;
- Planta respetiva da área alvo do investimento do projeto (com áreas em m2 e discriminação da utilização de cada área, nomeadamente áreas produtivas, sociais, etc… e sua dimensão em m2);
- Autos de medição devidamente assinados;
Para além do Mapa da Verificação Física, deverão identificar eventuais alterações introduzidas ao projeto e confirmar se as mesmas, carecendo de aprovação, já se encontram aprovadas.
No caso de Software, solicita-se a licença.
2. Disponibilização dos extratos contabilísticos com o registo do incentivo.
3. Disponibilização de balancete atualizado que evidencie a existência de um sistema de contabilidade separada para todas as transações referentes à operação, por exemplo, através da criação de contas específicas para o projeto ou da utilização ou da utilização de um sistema de contabilidade analítica bem como detalhe da conta de terceiros.
4. Balancete Analítico (ano de conclusão investimento).
5. De acordo com o Mapa de Financiamento apresentado, as Fontes de Financiamento utilizadas foram: Prestações Suplementares de Capital, Dívidas a Instituições de Crédito e Incentivo. Para isso é necessária a documentação inerente:
6. IES
7. Comprovativos referentes ao Licenciamento das instalações e da atividade desenvolvida. Comprovar que possui as condições legais para a execução dos investimentos, sendo que para tal, deverá instruir o pedido de alterações ao licenciamento para as alterações decorrentes do projeto e obter o licenciamento até ao encerramento do projeto, ou (quando aplicável), comprometer-se a demonstrar que o projeto não implica alterações que careçam de licenciamento.
8. Documento referente à Avaliação da Integração da Perspetiva da Igualdade entre Homens e Mulheres e Igualdade de Oportunidades e da Não Discriminação. E documento referente à Avaliação do Cumprimento da Legislação Ambiental.
9. Comprovativo de criação de postos de trabalho de emprego qualificado, conforme contratualizado. Documentos de registo no portal da Segurança Social, último extrato de contribuições de Segurança Social.
10. Disponibilização das consultas efetuadas ao mercado e os critérios de seleção dos fornecedores.
11. Para o comprovante n.º 3 e 13, deverá o beneficiário evidenciar informação complementar que permita aferir da razoabilidade das despesas envolvidas, tendo em consideração os preços médios de mercado. Para além disso, deverá apresentar a proposta da empresa «D..., Lda.», bem como, a disponibilização de link (versão mode) da Plataforma para visualização da mesma e suas funcionalidades,
por forma a permitir aferir da comprovação física da realização dos serviços em questão e das funcionalidades implementadas.
 Comprovantes do Investimento: nos termos impostos pelo regulamento”.

Ainda a solicitação do tribunal veio a autora esclarecer: “…que, todos os documentos e/ou elementos entregues pela A. foram organizados pelas RR em 2 dossiers - um do projeto de inovação n.º 19632 e outro do projeto Internacionalização n.º 20043, materializados quer em suporte digital, quer em suporte físico, cumprindo as exigências do Regulamento Específico de Competitividade e Internacionalização, sendo essenciais à comprovação de que os investimentos foram realizados e os objetivos foram alcançados. Assim, considerando que tais dossiers foram organizados pelas RR., de forma a assegurar que possuem todas as evidências técnicas, contabilísticas e financeiras, que comprovem a realização dos projetos, não se trata apenas dos elementos e documentos que foram entregues àquelas, mas antes dos dossiers onde os mesmos estarão, devidamente organizados de acordo com a estrutura que se indicou no requerimento apresentado em 23.02.2023”.

Como se viu a autora pede que as rés sejam condenadas a entregar-lhe os dossiers dos dois projetos de investimentos (inovação n.º 19632 e Internacionalização n.º 20043), materializados quer em suporte digital, quer em suporte físico, devidamente organizados e cumprindo todas as exigências do Regulamento Específico de Competitividade e Internacionalização, com todos os elementos e documentos de suporte dos mesmos.
E tendo alegado a autora que com vista à apresentação das candidaturas pela A. aos sobreditos projetos de Inovação e Internacionalização, seu acompanhamento até final e estudo final, a A. celebrou com as RR., por escritos datados de 12.02.2016, 24.03.2016, 28.04.2016, 03.02.2017, 06.02.2017, 23.02.2016, 11.05.2016 e 16.05.2016, uma séria de contratos denominados de prestação de serviços de segurança, parece que a autora pretende, em suma, que as rés lhes entregue o resultado dessa alegada prestação de serviços – os dossiers dos dois projetos de investimentos (inovação n.º 19632 e Internacionalização n.º 20043), materializados quer em suporte digital, quer em suporte físico, devidamente organizados e cumprindo todas as exigências do Regulamento Específico de Competitividade e Internacionalização, com todos os elementos e documentos de suporte dos mesmos, que por via dos mesmos, alegadamente terão sido elaborados - devidamente organizados de acordo com a estrutura que se indicou no requerimento apresentado em 23.02.2023 – e onde alegadamente estarão os elementos e documentos que foram entregues às rés.
Na verdade, e após tentarmos descortinar em que factos concretos a mesma funda o seu pedido, ou seja, o direito a que se arroga e pretende fazer valer através do pedido, temos de concluir que a alegação da autora/apelante, em termos de causa de pedir, é vaga e abstrata, e até confusa e assim ininteligível, não passando de uma amalgama de conclusões e afirmações incapazes de fundamentar o pedido deduzido – tanto no que concerne ao pedido de entrega dos dossiers, como relativamente ao pedido de condenação das rés pelos prejuízos que vier a ter em indemnização a liquidar.
O que se pode ver pelo teor dos documentos juntos aos autos – mas não pelo que é alegada em sede de p. inicial – a autora celebrou 7 contratos de prestação de serviços com uma das rés e 1 contrato dessa mesma natureza com a outra ré. Todos esses contratos têm objetos próprios e concretizados nos respetivos textos. Sendo que de nenhum deles decorre que documentos, originais ou cópias – teriam de ser entregues e, se o foram, pela autora a cada uma das rés, por via e, para a efetiva realização de cada um desses contratos. Mais, de nenhum desses contratos resulta a obrigação de elaboração, concreta, de dossiers dos dois projetos de investimentos (inovação n.º 19632 e Internacionalização n.º 20043), materializados quer em suporte digital, quer em suporte físico, devidamente organizados e cumprindo todas as exigências do Regulamento Específico de Competitividade e Internacionalização, com todos os elementos e documentos de suporte dos mesmos.
Em suma, face ao alegado pela autora/apelante, entendemos que é impossível a qualquer tribunal (assim como às contrapartes) perceber, com o mínimo de segurança, quais os factos concretos em que a autora/apelante funda os pedidos que dirige às rés.
Destarte e sem necessidade de outros considerandos, nenhuma censura nos merece a decisão de 1.ª instância que se confirma.
Improcedem as conclusões da apelante.


Sumário:
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IV – Pelo exposto acordam os Juízes desta secção cível em julgar as presentes apelação improcedente, confirmando-se a decisão recorrida.

Custas pela autora/apelante.





Porto, 2024.03.05
Anabela Dias da Silva
João Proença
Rodrigues Pires