PROPRIEDADE INTELECTUAL
DIREITOS CONEXOS
VIDEOGRAMAS
EXECUÇÃO PÚBLICA
HOTEL
TELEVISÃO
Sumário

A execução de videogramas em televisões colocadas nos quartos e nos espaços comuns ou públicos de um hotel, constitui comunicação ao público e execução pública nos termos e para os efeitos dos artigos 178º nº 1 al a) e 184 nº 2 e 3 do CDADC.
As providências cautelares decretadas ao abrigo do art.º 210.º-G do CDADC, destinadas a impedir a continuação da violação dos direitos conexos, devem ser eficazes, dissuasoras e proporcionais.

Texto Integral

Acordam na Secção da Propriedade Intelectual, Concorrência, Regulação e Supervisão do Tribunal da Relação de Lisboa:

I. Relatório
A GEDIP - Associação para a Gestão de Direitos de Autor, Produtores e Editores intentou um procedimento cautelar contra a PeC, Lda requerendo que seja decretado o encerramento do estabelecimento por esta explorado, ou, subsidiaria e cumulativamente, a proibição da continuação da execução pública não autorizada de videogramas pela Requerida, a apreensão dos bens que se suspeite violarem os direitos conexos e dos instrumentos que sirvam para a prática do ilícito, nomeadamente aparelhos de televisão, aparelhos de reprodução de DVDs, cassetes ou aparelhos retransmissores de conteúdos videográficos, bem como suportes informáticos que contenham ficheiros audiovisuais e, caso se verifique a sua utilização para a execução pública de videogramas, computadores, notebooks, tablets ou ainda qualquer outro meio utilizado para esse fim; a obrigação de concessão de livre acesso ao estabelecimento explorado pela sociedade requerida, com o objectivo de visualizar e registar, através de meios de gravação para tanto aptos, os videogramas que aí são executados publicamente, com a possibilidade de recurso aos meios policiais para garantir tal acesso e a condenação no pagamento de sanção pecuniária compulsória por cada dia que decorra entre a data do trânsito do trânsito em julgado e a obtenção de licença.
Alegou em síntese, de acordo com o Relatório da sentença que veio a ser proferida,  que é uma associação de gestão coletiva sem fins lucrativos que se encontra devidamente constituída, registada (na IGAC) e mandatada para representar os produtores de videogramas em matérias relacionadas com a cobrança de direitos de autor e direitos conexos. Por outro lado, fruto da lei e de acordos firmados com a GDA - Cooperativa de Gestão dos Direitos dos Artistas, Intérpretes ou Executantes, CRL, entidade de gestão coletiva dos direitos dos artistas, a requerente está também mandatada para promover o licenciamento e cobrança aos artistas, intérpretes e executantes.
A atividade de licenciamento e cobrança das remunerações é desenvolvida pela requerente GEDIPE, em parceria com a referida GDA, procedendo assim ao licenciamento conjunto de direitos conexos dos artistas, intérpretes, executantes e produtores de videogramas. A execução pública de videogramas editados comercialmente, além de carecer de autorização dos respetivos produtores, confere a estes e aos artistas, intérpretes e executantes, o direito a receber uma remuneração equitativa. A remuneração cobrada pela GEDIPE é dividida entre produtores e artistas, sendo a parcela destinada a estes últimos entregue à parceira GDA.
No âmbito da referida atividade de licenciamento e cobrança de direitos conexos de produtores e artistas, seus associados, a Requerente representa o repertório nacional e estrangeiro.
A sociedade requerida explora o apartamento turístico “Hotel Anjos” registado sob o n.º 687 no Registo Nacional de Turismo (doravante “RNET”), sito em Vila Real de Santo António, que tem a classificação de 3 (três) estrelas, aberto ao público e a funcionar diariamente.
A Requerente tomou conhecimento que no referido estabelecimento, explorado pela Requerida, existem televisores nas unidades de alojamento e em espaços comuns, sendo publicitada no website Booking.com que a existência de televisores é uma das comodidades que oferecem aos seus hóspedes.
Alega ainda, a título exemplificativo, que no dia 13/08/2022 foram transmitidos pelos quatro principais canais generalistas portugueses os seguintes programas constantes do documento 9, para o qual se remete para os devidos efeitos, cujos produtores são representados pela ora Requerente.
A Requerida não procedeu ao licenciamento ou ao pagamento da remuneração devida pela exibição ou comunicação de videogramas, pese embora o ter efeito relativamente a outros estabelecimentos que explora.
A Requerida foi interpelada por carta de 22/11/2021 enviada pela Requerente, no sentido desta proceder ao licenciamento e pagar os montantes devidos pela utilização de videogramas.
Apesar de instada para o efeito, através de correspondência trocada, a requerida não fez à requerente qualquer pedido ou solicitação de licenciamento ou autorização e jamais pagou a remuneração equitativa devida, sendo que continua a exibir publicamente na referida unidade hoteleira videogramas explorados comercialmente ou reproduções dos mesmos.
Não foi deduzida oposição.
Foi proferida sentença julgando improcedente o procedimento cautelar e absolvendo a Requerida dos pedidos formulados.
Inconformada com a sentença dela veio apelar a GEDIP - Associação para a Gestão de Direitos de Autor, Produtores e Editores, formulando as seguintes conclusões:
A. Por sentença proferida em 11/01/2024, veio a Mma. Juiz a quo julgar improcedente o procedimento cautelar e, em consequência, absolveu a Recorrida dos pedidos formulados pela Recorrente;
B. A Recorrida não deduziu oposição ao procedimento cautelar.
C. Nos termos do disposto nos artigos 366.º, n.º 5 e 567, n.º 1, ambos do CPC, veio a Mmª. Juiz a quo determinar que a falta de oposição da requerida importa a confissão dos factos alegados pela requerente.
D. Consequentemente, não houve lugar à marcação da audiência de discussão e julgamento em que é produzida prova.
E. Porém, apesar de determinar que se consideram confessados os factos alegados pela Recorrente, no requerimento inicial, a Mma. Juiz a quo decidiu no sentido de considerar improcedente o procedimento cautelar instaurado pela Recorrente.
F. Para tanto, invocou que «a alegação genérica de que naquele hotel se procede de forma habitual, continuada e reiterada, à execução pública de videogramas e que, em qualquer desses dias constantes da referida grelha de programação, procede à execução pública de videogramas do repertório entregue à gestão da ora Requerente, não é suficiente para concluir pela violação do seu direito, pela Requerida, pois não se mostra concretizada essa violação, assentando a mesma numa mera presunção com base no anúncio da existência de televisores no site booking e na listagem dos programas que naqueles dias foram transmitidos pelos canais da televisão. Assim, fundamentando-se a presente providência na violação efetiva do seu direito, não se mostrando alegados factos concretos dessa violação, não pode o Tribunal considerar confessados factos que não foram alegados.».
G. Ora, em resultado da falta de oposição da Requerida e do disposto nos artigos 366.º, 5 e 567.º, n.º 1, ambos do CPC, em suma, foram dados como provados os seguintes factos alegados pela Requerente:
a) a Requerente é uma associação de gestão colectiva sem fins lucrativos que se encontra devidamente constituída, registada (no IGAC) e mandatada para representar os produtores de videogramas em matérias relacionadas com a cobrança de direitos de autor e direitos conexos, encontrando-se igualmente mandatada para promover o licenciamento e cobrança aos artistas, intérpretes e executantes;
b) A Recorrida explora o empreendimento turístico “Hotel Anjos” registado sob o n.º 687 no Registo Nacional de Turismo, que tem a classificação de 3 (três) estrelas, aberto ao público e a funcionar diariamente, existem televisores, nas unidades de alojamento e em espaços comuns, que coloca à disposição dos seus hóspedes.
c) A Recorrida não procedeu ao licenciamento ou ao pagamento da remuneração devida pela exibição ou comunicação de videogramas, pelo que, tem vindo a executar comunicação pública de videogramas não autorizada.
H. Por sua vez, tem sido entendimento unânime da nossa jurisprudência que a comunicação pública de videogramas através das televisões existentes nos quartos de um estabelecimento turístico tem natureza pública, para efeitos do artigo 178º, n.º 1, alínea a) e 184º, n.º 1, alínea c) e n.º 3 do C.D.A.D.C, em conformidade com a legislação e jurisprudência europeias.
I. É entendimento consolidado na jurisprudência comunitária que, embora a mera disponibilização de meios materiais não constitua, por si só, uma comunicação na acepção da Directiva 2011/29/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de Maio de 2001, relativa à harmonização de certos aspectos do direito de autor e dos direitos conexos na sociedade da informação, a distribuição de um sinal através de aparelhos de televisão por um hotel aos clientes instalados nos quartos deste estabelecimento, qualquer que seja a técnica de transmissão do sinal utilizado, constitui um acto de comunicação ao público na acepção do artigo 3.º n.º 1, da Directiva 2011/29/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de Maio de 2001, nos termos do qual, os Estados-Membros devem prever a favor dos autores o direito exclusivo de autorizar ou proibir qualquer comunicação ao público das suas obras, por fio ou sem fio, incluindo a sua colocação à disposição do público por forma a torná-las acessíveis a qualquer pessoa a partir do local e no momento por ela escolhido, existindo a mesma previsão no n.º 2, aplicável aos produtores de videogramas.
J. Posteriormente, reproduzindo esta orientação, o Despacho do Tribunal de Justiça (Sétima Secção) de 18-03-2010, proferido no processo C-136/09 (pedido de decisão prejudicial do órgão jurisdicional de reenvio grego, Areios Pagos), que tinha por objecto o conceito de «comunicação ao público» e as obras difundidas através de aparelhos de televisão instalados nos quartos de hotel e ligados a uma antena central do hotel sem outra intervenção da parte do proprietário para a recepção do sinal pelos clientes, formulou o seguinte dispositivo: «Ao instalar aparelhos de televisão nos quartos de hotel do seu estabelecimento e ao ligá-los à antena central do referido estabelecimento, o proprietário pratica, por esse simples facto, um acto de comunicação ao público na acepção do artigo 3º, nº 1, da Directiva 2001/29/CE do Parlamento europeu e do Conselho, de 22 de Maio de 2001, relativa à harmonização de certos aspectos do direito de autor e dos direitos conexos na sociedade da informação.» (vd. também o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, processo n.º 248/12.5YHLSB.L1-1, de 05/03/2013; Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, processo 197/14.2YHLSB.L1.S2).
K. Mais recentemente, decidiu o Tribunal da Relação de Lisboa, no seu Acórdão proferido no âmbito do processo n.º 457/19.6YHLSB.L1, e considerando o sentido atribuído pelo TJUE ao conceito de comunicação pública em matéria de direitos conexos e a interpretação do direito nacional em conformidade com o direito da União Europeia, a existência de aparelhos de televisão nos quartos do seu estabelecimento hoteleiro (e, por maioria de razão, nos seus espaços comuns ou públicos), os quais executam videogramas, consubstancia comunicação ao público e execução pública. E que «para a procedência de uma acção intentada por uma entidade gestora, em matéria de cobrança de direitos de autor e direitos conexos é suficiente a prova pela Autora de que a Ré (entidade que explora um hotel) transmite publicamente (via TV) sem a necessária autorização, não sendo exigida a prova pela Autora de quais as obras transmitidas e quais os concretos produtores que representa».
L. Vide também neste sentido o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, processo 197/14.2YHLSB.L1.S2.
M. Assim, a jurisprudência tem sido unânime em considerar que a existência de televisores nos quartos ou nos espaços comuns de um determinado estabelecimento hoteleiro implica a disponibilização de videogramas, consubstancia comunicação ao público e execução pública de obras legalmente protegidas, sem que seja necessário que a Recorrente invoque quais as obras dos seus associados que foram em concreto transmitidas.
N. Por outro lado, a Mmª. a quo veio sustentar a improcedência do procedimento cautelar no seguinte: a existência do [pressuposto do] fundado receio de lesão grave e dificilmente reparável desses direitos não se mostra factualmente alegado, existindo apenas uma alegação genérica de que “vem causando graves prejuízos patrimoniais e não patrimoniais à Requerente”.
O. A este propósito dir-se-á que resultado do artigo 210º-G, n.º 1, alínea b) do C.D.A.D.C que, sempre que haja violação (ou fundamento receio de que outrem cause lesão grave e dificilmente reparável) do direito de autor ou dos direitos conexos, pode o tribunal, a pedido do requerente, decretar as providências adequadas a proibir a continuação da violação.
P. No referido preceito estão previstas duas situações distintas, uma referente à violação de direitos de autor ou de direitos conexos e outra respeitante a fundado receio de ocorrência de lesão grave e dificilmente reparável desses direitos.
Q. Assim, no que se refere à situação de violação de direitos, em que a lesão do direito conexo ocorreu ou está em curso, o decretamento da providência cautelar não depende da apreciação da sua gravidade ou da dificuldade da sua reparação (vd. Acórdão do Tribunal da Relação de Évora – processo n.º 1264/09.TBFAR.E1 e Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa – processo n.º 2974/2008.4TVLSB.L1-7).
R. Permitir-se a comunicação pública de videogramas legalmente protegidos sem a devida autorização legal, seria compactuar com uma conduta ilícita, censurada por lei.
S. Tendo o Tribunal a quo considerados provados os factos alegados pela Requerente, e não tendo sido indeferido liminarmente o requerimento inicial apresentado pela Requerente, a decisão final da Mmª. Juiz carece de fundamento para julgar improcedente o procedimento cautelar.
Não foram apresentadas contra-alegações.
Recebido o recurso e colhidos os vistos, cabe apreciar e decidir.
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III. Fundamentação
III.1. Os factos
Da sentença consta o seguinte sobre a matéria de facto provada:
Nos termos do disposto nos artigos 366.º, n.º 5, e 567.º, n.º 1, ambos do CPC, a falta de oposição da requerida importa a confissão dos factos alegados pela requerente.
Dão-se, assim, por reproduzidos os factos articulados pela requerente, considerados confessados ou demonstrados pelos documentos juntos pela mesma, os quais, no essencial, constam do relatório supra enunciado.
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III.2. Do mérito do recurso
A sentença julgou improcedente o procedimento cautelar com a seguinte fundamentação:
No caso sub judice, mostra-se provado que a requerente desenvolve, em parceria com GDA - Cooperativa de Gestão dos Direitos dos Artistas, Intérpretes ou Executantes, CRL, o licenciamento conjunto de direitos conexos dos artistas, intérpretes, executantes e produtores de videogramas, cabendo-lhe o licenciamento e representando aqueles.
A sua intervenção constitui, pois, uma forma de garantir maior celeridade, eficácia e distribuição equitativa dos valores devido pela reprodução de videogramas.
No caso sub judice mostra-se admitido por falta de contestação e também perante os documentos juntos, que a Requerida explora o estabelecimento comercial em causa o qual está equipado com televisores. De igual modo se dá por confessado que a mesma não dispõe de licenciamento para exibir videogramas.
Indica a Requerente uma série de programas que foram exibidos pelos canais generalistas e alega que “naquele hotel procede-se, de forma habitual, continuada e reiterada, à execução pública de videogramas sem a competente licença e autorização para o efeito. Sendo certo que, em qualquer desses dias constantes da referida grelha de programação, procede à execução pública de videogramas do repertório entregue à gestão da ora Requerente. A comunicação (sob a forma de execução pública) é feita de forma reiterada e sucessiva para os clientes do Hotel, que sucedem rapidamente e em número relevante.”
Ora, os termos em que a Requerente alega a violação por parte da Requerida do seu direito, é feita de forma genérica e sem concretização dos factos violadores. A alegação genérica de que naquele hotel se procede de forma habitual, continuada e reiterada, à execução pública de videogramas e que, em qualquer desses dias constantes da referida grelha de programação, procede à execução pública de videogramas do repertório entregue à gestão da ora Requerente, não é suficiente para concluir pela violação do seu direito, pela Requerida, pois não se mostra concretizada essa violação, assentando a mesma numa mera presunção com base no anúncio da existência de televisores no site booking e na listagem dos programas que naqueles dias foram transmitidos pelos canais da televisão.
A isto acresce o facto de não terem sido alegados factos concretos relativos à efetiva utilização dos referidos quartos e à existência de hóspedes pois, quanto a esta matéria, apenas refere de forma conclusiva que “a comunicação (sob a forma de execução pública) é feita de forma reiterada e sucessiva para os clientes do Hotel, que sucedem rapidamente e em número relevante”.
Assim, fundamentando-se a presente providência na violação efetiva do seu direito, não se mostrando alegados factos concretos dessa violação, não pode o Tribunal considerar confessados factos que não foram alegados. Acresce que mesmo que se entenda que a mesma tem ainda por base o fundado receio de lesão grave e dificilmente reparável desses direitos, também este pressuposto não se mostra factualmente alegado, existindo apenas uma alegação genérica de que “vem causando graves prejuízos patrimoniais e não patrimoniais à Requerente”.
Em síntese, entendeu-se que não foram alegados factos concretos demonstrativos da violação, cuja invocação assentou numa presunção baseada no anúncio do Booking de que existem televisores e na listagem dos programas transmitidos pelos canais da televisão, sem que tenha sido alegada a efectiva ocupação dos quartos do hotel.
Afigura-se que a referência à “presunção baseada no anúncio do Booking” é contraditória com o referido no início da fundamentação reproduzida, de que “no caso sub judice mostra-se admitido por falta de contestação e também perante os documentos juntos, que a Requerida explora o estabelecimento comercial em causa o qual está equipado com televisores”. Quanto aos “factos concretos relativos à efectiva utilização dos referidos quartos e à existência de hóspedes” que se considerou não terem sido alegados, os mesmos mostram-se suficientemente alegados nos arts. 9.º, 30.º e 31.º da p.i.
Impõe-se assim, e antes de mais, fixar os concretos factos provados que a sentença entendeu dar por reproduzidos (considerados provados nos termos dos arts. 366.º, n.º 5, 567.º, n.º 1, e 568.º, al. d) à contrario, todos do CPC):
1. A GEDIP - Associação para a Gestão de Direitos de Autor, Produtores e Editores é uma associação sem fins lucrativos, constituída a 16.01.1998, com a finalidade da defesa dos direitos conexos e de outros direitos e interesses dos autores, produtores e editores de conteúdos de audiovisuais, cabendo-lhe, assim, entre outros, a defesa, cobrança, gestão e distribuição dos referidos direitos dos seus associados, conforme resulta dos seus respectivos Estatutos – art.º 1.º da p.i. e doc. 1, que aqui se dá por reproduzido;
2. Encontra-se registada na Inspecção-Geral das Actividades Culturais – art.º 2.º da p.i. e doc. 2;
3. Fruto de acordos firmados com a GDA – Cooperativa de Gestão dos Direitos dos Artistas, Intérpretes ou Executantes, CRL (entidade de gestão colectiva dos direitos dos artistas, a GEDIPE também está mandatada para promover o licenciamento e cobrança das remunerações devidas aos artistas, intérpretes e executantes - art.º 5.º da p.i. e docs. 3 e 4, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
4. No âmbito da sua actividade de licenciamento e cobrança de direitos conexos de produtores, seus associados, a Requerente representa o repertório nacional e estrangeiro – art.º 7.º da p.i.;
5. Entre a Requerente e a Associação Internacional de Gestão Colectiva de obras audiovisuais ou AGICOA, da qual a GEDIPE e a grande maioria das suas congéneres estrangeiras são membros, foi celebrado o Contrato de Cooperação e respectiva adenda juntos como docs. 5 e 6 e cujo teor se dá por reproduzido – art.º 9.º da p.i.;
6. A GEDIPE licencia a utilização, por parte dos eventuais interessados, da quase totalidade do repertório de obras audiovisuais para operadores de televisão, nacionais ou estrangeiros, comercializados e difundidas em Portugal – art.º 11.º da p.i.;
7. A sociedade PeC, Lda explora o estabelecimento hoteleiro “Hotel Anjos” registado sob o n.º 687 no Registo Nacional de Turismo, com a classificação de 3 estrelas, aberto ao público e a funcionar diariamente – arts. 23.º e 36.º da p.i. e doc. 7;
8. Nesse estabelecimento existem televisores nas unidades de alojamento (num total de 58) e em espaços comuns (como salas, halls, bares/restaurantes), que a Requerida disponibiliza aos seus hóspedes – arts. 25.º, 37.º e 38.º da p.i. e doc. 7;
9. Naquele hotel procede-se, de forma habitual, continuada e reiterada, à execução pública de videogramas sem a competente licença e autorização para o efeito – art.º 29.º da p.i.;
10. A título exemplificativo, no dia 13.08.2022 foram transmitidos pelos quatro principais canais generalistas portugueses os seguintes programas: – art.º 27.º da p.i. e doc. 9;






11. No dia constante da referida grelha de programação, a Requerida procedeu à execução pública de videogramas do repertório entregue à gestão da Requerente – art.º 30.º da p.i.;
12. A qual é feita de forma reiterada e sucessiva para os clientes do Hotel, que se sucedem rapidamente e em número relevante - art.º 31.º da p.i.;
13.  A Requerida não possuía, como não possui, qualquer autorização dos produtores de videogramas ou dos seus representantes, designadamente da Requerente, para proceder àquela execução ou comunicação pública, nos referidos estabelecimentos, de videogramas emitidos pelas televisões disponibilizadas – art.º 40.º da p.i.;
14. A Requerida jamais pagou a remuneração equitativa devida à Requerente em virtude da referida actividade de execução ou comunicação pública de videogramas – art.º 41.º da p.i.;
15. Na sequência de vários procedimentos, nomeadamente, troca de correspondência, foi enviada a 22/11/2021 pela Requerente e a 06/11/2023 pelos respectivos mandatários, carta a interpelar a Requerida no sentido de esta proceder ao licenciamento dos direitos conexos aqui em causa e pagar os montantes devidos pela utilização de videogramas na actividade do mencionado estabelecimento – art.º 42.º da p.i. e doc. 10;
16. Apesar de instada para o efeito, até à data a Requerida não concretizou um pedido de licenciamento ou autorização para comunicação de videogramas, estando, à data de hoje, o processo de licenciamento ainda pendente – art.º 43.º da p.i.;
17. A Requerida continua a exibir publicamente nas suas unidades hoteleiras videogramas produzidos por produtores representados pela Requerente nos quais participam artistas, intérpretes e executantes representados pela GDA – art.º 44.º da p.i.;
18. Foi assinado um Protocolo com a Confederação do Turismo Português (CTP), ao qual aderiram associações representativas do sector hoteleiro: AHP – Associação da Hotelaria de Portugal; ACISO - Associação Empresarial de Ourém/Fátima; AHETA – Associação dos Hotéis e Empreendimentos Turísticos do Algarve; AHRESP – Associação da Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal; APHORT – Associação Portuguesa de Hotelaria, Restauração e Turismo - arts. 49.º e 50.º da p.i. e doc. 11, cujo teor se dá aqui por reproduzido;
19. Tendo outras associações do sector celebrado outros Protocolos de idêntico teor com a Requerente como é o caso da AIHSA - Associação dos Industriais Hoteleiros e Similares do Algarve (tendo a ATA – Associação de Turismo do Algarve, aderido a este Protocolo) e da ACIF – Associação Comercial e Industrial do Funchal  - art.º 51.º e docs. 12 e 13, cujo teor se dá aqui por reproduzido.

Vejamos então.
Resultou provado que a Recorrente, entidade de gestão colectiva registada na IGAC, desenvolve, em parceria com GDA – Cooperativa de Gestão dos Direitos dos Artistas, Intérpretes ou Executantes, CRL, o licenciamento conjunto de direitos conexos dos artistas, intérpretes, executantes e produtores de videogramas, designadamente a utilização, por parte dos eventuais interessados, da quase totalidade do repertório de obras audiovisuais para operadores de televisão, nacionais ou estrangeiros, comercializados e difundidas em Portugal.
Constituindo um videograma o registo resultante da fixação, em suporte material, de imagens, acompanhadas ou não de sons, bem como a cópia de obras cinematográficas ou audiovisuais (art.º 176.º, n.º 5 do CDADC), ou seja, serve de suporte a obras intelectuais tais como filmes, séries ou novelas, nacionais ou estrangeiros, resultou provado que a Recorrida explora um estabelecimento hoteleiro aberto ao público, com 58 quartos e espaços comuns, nos quais existem televisores que a Requerida disponibiliza aos seus hóspedes de forma habitual, continuada e reiterada, procedendo à execução pública de videogramas sem a competente licença e autorização para o efeito. A título exemplificativo, no dia 13.08.2022, dos programas referidos na grelha de programação reproduzida no facto provado 10, repertório entregue à gestão da Recorrente. E sem que possua qualquer autorização dos produtores de videogramas ou dos seus representantes, designadamente da Recorrente, para proceder àquela execução ou comunicação pública, nunca tendo pago a remuneração equitativa devida pela execução ou comunicação pública de videogramas, nem depois de ter sido interpelada para o efeito pela Recorrente, não requerendo o licenciamento ou autorização para comunicação de videogramas e tendo prosseguido com a exibição publica de videogramas produzidos por produtores representados pela Recorrente e nos quais participam artistas, intérpretes e executantes representados pela GDA.
Dispõe o art.º 184.º do CDADC sobre a autorização do produtor, que 1. Assiste ao produtor do fonograma ou do videograma o direito exclusivo de fazer ou autorizar, por si ou pelos seus representantes:
a) A reprodução, direta ou indireta, temporária ou permanente, por quaisquer meios e sob qualquer forma, no todo ou em parte, do fonograma ou do videograma;
b) A distribuição ao público de cópias dos fonogramas ou videogramas, a exibição cinematográfica de videogramas bem como a respetiva importação ou exportação;
c) A colocação à disposição do público, por fio ou sem fio, dos fonogramas ou dos videogramas para que sejam acessíveis a qualquer pessoa a partir do local e no momento por ela escolhido;
d) Qualquer utilização do fonograma ou videograma em obra diferente;
e) A comunicação ao público, de fonogramas e videogramas, incluindo a difusão por qualquer meio e a execução pública direta ou indireta, em local público, na aceção do n.º 3 do artigo 149.º
2 - (Revogado.)
3 - Quando um fonograma ou videograma editado comercialmente, ou uma reprodução dos mesmos, for utilizado por qualquer forma de comunicação pública, o utilizador tem de pagar, como contrapartida da autorização prevista na alínea e) do n.º 1, uma remuneração equitativa e única, a dividir entre o produtor e os artistas, intérpretes ou executantes em partes iguais, salvo acordo em contrário.
4 - A autorização para os atos de comunicação ao público de obras incorporadas em fonogramas ou videogramas editados comercialmente, previstos nos n.ºs 3 e 4 do artigo 205.º, pode ser objeto de gestão coletiva, com efeitos alargados, pelas entidades de gestão coletiva representativas dos produtores de fonogramas e de videogramas, aplicando-se para o efeito o disposto nos artigos 36.º-A e 36.º-B da Lei n.º 26/2015, de 14 de abril, na sua redação atual.
5 - Os produtores de fonogramas ou de videogramas têm a faculdade de fiscalização análoga à conferida nos n.ºs 1 e 2 do artigo 143.º
Na interpretação do conteúdo e alcance dos conceitos de execução pública ou de comunicação pública, para efeitos do citado artigo 184.º, há que atender à interpretação que o Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) tem vindo a fazer, essencialmente em sede de decisão de questões prejudiciais sobre o sentido do artigo 3.º, n.º 1 da Diretiva 2001/29/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de Maio de 2001, relativa à harmonização de certos aspetos do direito de autor e dos direitos conexos na sociedade da informação, quando se trata da utilização de aparelhos de televisão em hotéis.
Por acórdão de 7.12.2006, proferido no processo C-306/05, Sociedade General de Autores e Editores de España - SGAE/Rafael Hoteles, SA, o TJUE decidiu que “a distribuição de um sinal através de aparelhos de televisão por um hotel aos clientes instalados nos quartos deste estabelecimento, qualquer que seja a técnica de transmissão do sinal utilizado, constitui um acto de comunicação ao público na acepção do artigo 3°, n° 1, desta directiva”; e que “o carácter privado dos quartos de um hotel não se opõe a que a comunicação de uma obra neles operada através de aparelhos de televisão constitua um acto de comunicação ao público na acepção do artigo 3°, n° 1, da Directiva 2001/29”.
Posteriormente, reproduzindo esta orientação, o despacho do Tribunal de Justiça (Sétima Secção) de 18.03.2010, proferido no processo C-136/09 (pedido de decisão prejudicial do órgão jurisdicional de reenvio grego, Areios Pagos), que tinha por objecto o conceito de “comunicação ao público” e as obras difundidas através de aparelhos de televisão instalados nos quartos de hotel e ligados a uma antena central do hotel sem outra intervenção da parte do proprietário para a recepção do sinal pelos clientes, formulou o seguinte dispositivo: “Ao instalar aparelhos de televisão nos quartos de hotel do seu estabelecimento e ao ligá-los à antena central do referido estabelecimento, o proprietário pratica, por esse simples facto, um acto de comunicação ao público na acepção do artigo 3.º, n.º 1, da Directiva 2001/29/CE do Parlamento europeu e do Conselho, de 22 de Maio de 2001, relativa à harmonização de certos aspectos do direito de autor e dos direitos conexos na sociedade da informação.”
No acórdão de 15.03.2012, processo C-162/10, Phonographic Performance (Ireland) Limited/Irlanda y Attorney General, o TJUE declarou que “o operador de um estabelecimento hoteleiro que disponibiliza, nos quartos dos seus clientes, aparelhos de televisão e/ou de rádio, aos quais distribui um sinal radiodifundido, é um «utilizador» que pratica um ato de «comunicação ao público» de um fonograma radiodifundido, na aceção do artigo 8°, n° 2, da Diretiva 2006/115/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2006, relativa ao direito de aluguer, ao direito de comodato e a certos direitos conexos ao direito de autor em matéria de propriedade intelectual”; e que “o operador de um estabelecimento hoteleiro que disponibiliza, nos quartos dos seus clientes, aparelhos de televisão e/ ou de rádio, aos quais distribui um sinal radiodifundido, é obrigado a pagar uma remuneração equitativa, nos termos do artigo 8°, n° 2, da Diretiva 2006/115, pela difusão de um fonograma radiodifundido, que acresce à paga pelo organismo de radiodifusão”.
Tal como assinalou ainda TJUE, no acórdão proferido em 15.03.2012 no processo C-135/10, Società Consortile Fonografici (SCF)/Marco Del Corso (que se debruçou sobre direitos conexos dos produtores de fonogramas, reconhecendo o regime jurídico português idênticos direitos aos produtores de videogramas), atendendo à natureza essencialmente económica do direito a uma remuneração equitativa, o conceito de comunicação ao público que a ele está inerente pressupõe igualmente um escopo de benefício ou vantagem, o que se verifica quando está em causa um estabelecimento hoteleiro.
Referindo-se ao acórdão SGAE (processo C-306/05), escreve-se naquele Acórdão que “o Tribunal de Justiça já decidiu que a intervenção efectuada pelo operador de um estabelecimento hoteleiro, destinada a dar aos seus clientes acesso a uma obra radiofundida, deve ser considerada uma prestação de serviço suplementar realizada com o fim de dela retirar um determinado benefício, na medida em que a oferta desse serviço tem influência na categoria do seu estabelecimento e, portanto, no preço dos quartos”.
Assim, o critério essencial para a configuração do sentido a dar ao conceito de comunicação pública quando estão em causa direitos conexos (no caso, dos artistas e produtores de videogramas), reside no escopo de benefício ou vantagem de raiz económica que está associado a essa comunicação, como é o caso da comunicação de videogramas levada a efeito através de televisores existentes em quartos de hotel, qualquer que seja a técnica de transmissão do sinal utilizado.
Também o Supremo Tribunal de Justiça decidiu reiteradamente a respeito. No acórdão de uniformização de jurisprudência nº 15/2013, de 13.11.2013, pronunciou-se no sentido de que “a aplicação, a um televisor, de aparelhos de ampliação do som, difundido por canal de televisão, em estabelecimento comercial, não configura uma nova utilização da obra transmitida, pelo que o seu uso não carece de autorização do autor da mesma, não integrando consequentemente essa prática o crime de usurpação, previsto e punido pelos artigos 149º, 195º e 197º do Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos.”
Em resposta à questão de saber se a mera recepção em local público envolve o dever de obter autorização por parte do autor da obra pressupõe que se opere a distinção entre recepção e comunicação, decidiu o Supremo Tribunal que: “A receção consiste na captação pelos equipamentos adequados dos sinais de sons e imagens difundidos pelo transmissor. A receção é o terminus do processo de transmissão e só ela o justifica: transmite-se (radiodifunde-se) para o recetor. Esta utilização das obras pelo recetor confere naturalmente aos autores o direito de a autorizarem (e o consequente direito à remuneração por essa utilização), nos termos do nº 1 do art.º 149º. Mas, uma vez autorizada, a receção é livre, ou seja, o recetor pode organizá-la como bem entender. Ponto é que se mantenha no âmbito da receção”.
O STJ firmou então jurisprudência no sentido de o dever de pagamento de uma compensação ao autor se restringir aos casos em que haja uma reutilização da obra, o que apenas sucederá se forem empregues meios técnicos que recriem de qualquer forma a sua difusão. Verificando-se uma mera recepção, ainda que difundida por quaisquer equipamentos, mas desde que estes tenham apenas a função de aperfeiçoar ou melhorar o sinal captado, não terá aplicação o disposto no nº 2 do artigo 149º do CDADC, sob pena de se verificar uma dupla cobrança de direitos sobre a mesma utilização da obra.
Pronunciando-se sobre tal questão, o Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) decidiu, no âmbito do processo n.º C -151/15, por Despacho de 14.07.2015, que “[o] conceito de «comunicação ao público», na aceção do artigo 3.°, n.º 1, deve ser interpretado no sentido de que abrange a transmissão, através de um aparelho de rádio ligado a colunas e/ou amplificadores, pelas pessoas que exploram um café-restaurante, de obras musicais e de obras musico-literárias difundidas por uma estação emissora de rádio aos clientes que se encontram presentes nesse estabelecimento”.
O TJUE reiterou o critério do "novo público", esclarecendo que a partir do momento em que a transmissão de uma obra radiodifundida se faz num lugar acessível ao público e se destina a um público suplementar, ao qual o detentor do aparelho de televisão permite a escuta ou a visualização da obra, tal intervenção deliberada deve ser considerada um ato pelo qual a obra em questão é comunicada a um público novo.
Em resumo, o Tribunal de Justiça declarou que, na medida em que o proprietário de um café restaurante procede, com fim lucrativo, à transmissão de obras radiodifundidas nesse estabelecimento, em que essa transmissão é suscetível de atrair clientes interessados pelas obras assim transmitidas e em que a referida transmissão se repercute, consequentemente, na frequência do estabelecimento e, in fine, nos seus resultados económicos, essa transmissão constitui uma comunicação ao público com carácter lucrativo.
Que a execução de videogramas através de aparelhos de televisão existentes nos quartos de um hotel consubstancia comunicação ao público, sendo irrelevante o carácter privado desses quartos, decidiu o STJ nos acórdãos de 23.04.2013, proc. n.º 250/12.7YHLSB.L1 e de 2.05.2013, proc. 7/13.8YHLSBA.L1-8. E, pelo acórdão de 15.03.2018, proc. n.º 197/14.2YHLSB.L1.S2, que, para a procedência de uma acção intentada por uma entidade gestora e representante de produtores de videogramas em matéria de cobrança de direitos de autor e direitos conexos é suficiente a prova que a ré, entidade que explora um hotel, transmite publicamente videogramas (via TV) sem a necessária autorização, não sendo exigida a prova pela autora de quais as obras transmitidas e quais os concretos produtores que representa.
Assim, há que concluir que a conduta da Requerida, ao manter aparelhos de televisão nos quartos dos seus estabelecimentos hoteleiros e, por maioria de razão, nos seus espaços comuns ou públicos, os quais executam videogramas, consubstancia comunicação ao público e execução pública, nos termos e para os efeitos do artigo 184.º, n.ºs 2 e 3 do CDADC.
O que no caso a Requerida faz, no seu Hotel Anjos, sem a necessária autorização dos produtores de videogramas ou dos seus representantes, não tendo procedido ao licenciamento dos direitos conexos aqui em causa e pagar os montantes devidos pela utilização de videogramas naquele estabelecimento.
Quanto às providências cujo decretamento vem pedido pela Recorrente, afigura-se bastante a proibição de continuação da violação do direito e a confirmação do direito da Recorrente a fiscalizar no estabelecimento a eventual divulgação das obras protegidas, acrescida de uma sanção pecuniária compulsória. Aliás, trata-se de um direito que já resulta da lei em situações paralelas (artigo 184.º n.º 5, 143.º n.º 1 e 86.º n.º 7, todos do CDADC).
A apreensão de bens e de equipamentos e, ainda mais, o encerramento do estabelecimento é, quanto a nós, manifestamente desproporcionado à protecção dos direitos em causa e não se mostra necessário neste momento para acautelar esses direitos (o princípio da proporcionalidade, nesta matéria, resulta desde logo da Directiva 2004/48/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de Abril, «Directiva Enforcement», que estabelece que os procedimentos devem ser eficazes, proporcionados e dissuasivos).
A eventual violação de providência cautelar constitui crime de desobediência qualificada (artigo 375.º do Código do Processo Civil), e se se verificar essa violação, poderá então ser decretada de imediato a apreensão dos objectos em causa por servirem a prática de crime (artigo 178.º do Código do Processo Penal). “Ainda assim, o princípio da proporcionalidade não deixa de marcar também os procedimentos em causa, devendo o juiz optar pelas medidas que, em concreto, se mostrem ajustadas a tutelar aqueles direitos, sem causar danos escusados na esfera da requerida” - António Santos Abrantes Geraldes, A Tutela Cautelar da Propriedade Intelectual, CEJ, p. 25).
Uma vez que a Requerida mesmo depois de interpelada continuou a reproduzir os videogramas sem obter o necessário licenciamento, justifica-se uma medida compulsória adicional, menos gravosa que as apreensões ou encerramento do estabelecimento.
Com efeito, prevê o artigo 210.º-G, n.º 4 do CDADC, que o Tribunal decrete, mesmo oficiosamente, uma sanção pecuniária compulsória com vista a assegurar a execução das providências previstas no n.º 1 do mesmo preceito legal. No caso, entendemos que se mostra adequada e suficientemente dissuasora a fixação de uma tal sanção no montante de €750,00 por cada dia de incumprimento das medidas cautelares decididas.
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IV. Decisão
Pelo exposto, acordam em julgar o recurso procedente e revogar a sentença recorrida, condenando a sociedade PeC, Lda a:
i. Abster-se de continuar a proceder à execução pública não autorizada de videogramas no estabelecimento hoteleiro por si explorado, denominado “Hotel Anjos”, registado sob o n.º 687 no Registo Nacional de Turismo;
ii. Na obrigação de conceder acesso à GEDIP - Associação para a Gestão de Direitos de Autor, Produtores e Editores ao estabelecimento hoteleiro referido em i., com o objectivo de aí visualizar e registar, através de meios de gravação para tanto aptos, os videogramas que aí são executados publicamente, enquanto não promover o respectivo licenciamento;
iii. Fixa-se uma sanção pecuniária compulsória, nos termos previstos no artigo 349.º, n.º 4, do CPI, no valor de €750,00 (setecentos e cinquenta euros) por cada dia de violação do ordenado em i. e ii. a partir do trânsito em julgado do presente acórdão.
iv. Indeferindo-se os demais pedidos formulados pela Recorrente.
Sem custas, por isenção da Recorrente (artigo 4.º n.º 1 alínea f) do RCP).
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Lisboa, 10.04.2024
Eleonora Viegas
Carlos M.G. de Melo Marinho
Paulo Registo