AÇÃO ESPECIAL DE IMPUGNAÇÃO DA REGULARIDADE E LICITUDE DO DESPEDIMENTO
PLURALIDADE DE EMPREGADORES
ADMISSIBILIDADE DO INCIDENTE DE INTERVENÇÃO PRINCIPAL PROVOCADA
ADEQUAÇÃO FORMAL
Sumário

I – A posição a tomar no sentido da admissibilidade ou inadmissibilidade de partes plurais na ação especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento, não o pode ser em tese geral, mas sempre por apelo e análise das situações concretas que se prefigurem a decidir, em face, como é evidente, dos regimes específicos de direito substantivo que estejam em causa.
II – Nessa decorrência, não pode ser seguida uma visão absolutamente rígida da tramitação processual prevista para a ação especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento, havendo situações que exigem que se ultrapassem as dificuldades interpretativas, de molde a permitir a pluralidade de réus e concretamente a admissibilidade do incidente de intervenção principal provocada, se necessário com apelo direto à adequação formal prevista no artigo 547.º do CPC.
III - Nos casos de alegação de pluralidade de empregadores (artigo 101.º do CT) - em que estamos em presença de um único vínculo laboral e um só despedimento – e/ou invocação de uma situação de solidariedade de garantia (artigo 334.º do CT) – em que estamos sempre dentro do mesmo pedido relacionado com o(s) crédito(s) laborais do trabalhador sobre o empregador que, se julgado procedente, implica a condenação dos sujeitos sobre os quais a lei faz recair tal responsabilidade -, considera-se que é de admitir a pluralidade de réus, e máxime a dedução de incidente de intervenção principal provocada, no âmbito da própria ação especial da regularidade e licitude do despedimento, sem necessidade de convolar a ação especial para uma ação comum, sendo que a adequação formal que se torne necessária ocorrerá dentro dessa ação especial em obediência ao regime previsto no artigo 547.º do CPC e com o devido respeito pelo contraditório
IV – Nas situações referenciadas em III, existindo uma declaração formal de despedimento e tendo em conta o regime jurídico resultante do artigo 387.º do Código do Trabalho, impõe-se ao trabalhador, como única via processual admitida, a propositura da ação especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento nos termos dos artigos 98.º-B e seguintes do CPT, pelo que não se verifica erro na forma de processo.

[elaborado pela sua relatora nos termos do artigo 663.º, n.º 7, do Código de Processo Civil (cfr. artigo 87.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho)]

Texto Integral

Apelação/Processo nº 7754/23.4T8PRT-A.P1
Origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto – Juízo do Trabalho do Porto, Juiz 3



Relatora: Germana Ferreira Lopes
1ª Adjunta: Rita Romeira
2º Adjunto: Nelson Nunes Fernandes




Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:


I – Relatório
Por requerimento (início de processo) de 23-04-2023, refª 3545087 (45377241), AA (Autor) apresentou formulário para impulsionar ação especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento operado com invocação de extinção do posto de trabalho contra A..., SA (Ré), manifestando oposição ao seu despedimento, juntando decisão escrita do alegado despedimento que refere ter ocorrido em 31-03-2023 [consigna-se que se designa o trabalhador por Autor, tendo em conta que é o mesmo que impulsiona o processo apresentando o formulário com vista a ver declarada a ilicitude ou irregularidade do seu despedimento e, por sua vez, designa-se a entidade empregadora por Ré, uma vez que a mesma, ainda que apresentando o primeiro articulado, contesta o impulso tendente à sobredita declaração].

Frustrada a tentativa de conciliação que teve lugar na audiência de partes, a Ré apresentou articulado a motivar o despedimento e juntou o procedimento de extinção do posto de trabalho (refªs citius 35738217, 3578218 e 3578219 de 24-05-2023). Nesse mesmo articulado a Ré deduziu pedido reconvencional.
A Ré conclui o respetivo articulado nos seguintes termos:
- Deverá ser considerado válido e lícito o despedimento do Autor e, em consequência, julgada improcedente a ação;
- O pedido reconvencional apresentado pela Ré deve ser admitido e julgado procedente, por provado, devendo, em consequência, ser judicialmente reconhecido que o Autor deve à Ré a quantia de € 4.290,46, acrescida dos juros de mora vencidos vincendos até efectivo e integral pagamento, com a sua consequente condenação no pagamento de tal importância à Ré;
- Subsidiariamente, e para o caso de a presente acção vir a proceder, deverá o mencionado montante de € 4.290,46, acrescido de juros, ser deduzido ao valor que a Ré venha a ser condenada a pagar ao Autor, em razão da eventual declaração judicial de ilicitude do seu despedimento.
Defende, em substância, que se encontram preenchidos todos os requisitos, positivos e negativos, materiais e formais, de que depende o válido recurso ao despedimento por extinção do posto de trabalho.
Alega, em síntese, que: a A..., SA Portugal, Lda. integra o Grupo Económico Internacional denominado por B..., o qual opera no segmento do turismo; a verificação de circunstâncias adversas no referido mercado conduziu o Grupo B... a rever a sua estratégia e modelo de negócio e a desenvolver as suas áreas de negócio de uma forma diferente e com estruturas distintas das que anteriormente existiam, o que, por sua vez, levou à decisão de implementação de um processo de reorganização internacional, com impacto nas diversas empresas do Grupo; também no que concerne à situação da B..., não obstante a sociedade desenvolver a sua actividade em Portugal desde 2016, a verdade é que, por se encontrar integrada no Grupo Economico B..., se encontra obrigada a cumprir os objetivos definidos pelo mesmo; em face da situação de progressão negativa que se antevê, e por decisão do Grupo em que se encontra incluída, mostrava-se imperiosa a reestruturação e racionalização dos recursos da B..., com o objectivo de reduzir a sua estrutura de custos, mantendo os níveis normais e satisfatórios de actividade; por decisão do Grupo em que a B... se encontra inserida, as funções comerciais desenvolvidas nas empresas do Grupo foram centralizadas em Espanha, no decurso do primeiro semestre de 2019, sendo que as atividades e iniciativas que eram até então desenhadas a partir da área comercial em Portugal, passaram a ser geridas pela equipa sediada em Espanha, acrescendo às actividades normais do responsável pela àrea Comercial em Espanha; adicionalmente, no fim do ano de 2019, o Grupo B... alterou significativamente a sua visão de negócio, focando-se em novas áreas, como sejam a aviação, com a marca WORLD 2 FLY e a tour operação, B... TRAVEL, com as marcas NEWBLUE e ICARION, mantendo a área comercial centralizada em Espanha; no final de 2020 foram criadas duas novas empresas em Portugal, sendo uma companhia aérea e um tour operador, em que estas passaram a oferecer pacotes turísticos para o mercado português; em consequência, a direcção comercial manteve-se centralizada em Espanha, e a responsabilidade comercial das multimarcas do Grupo B..., com representação em Portugal, nomeadamente para efeitos de coordenação, foram assumidas pelo responsável do Grupo em Portugal, o Diretor-Geral, que, cumulativamente, assume a parte comercial da B... PRO; no contexto acima descrito, e tendo-se procedido à avaliação da actual estrutura de pessoal da área de Vendas, foi decidida a supressão do posto de trabalho de Diretor de Serviços/Diretor Comercial em Portugal, que vinha sendo ocupado pelo A., não se justificando a manutenção desta posição intermédia como núcleo funcional autónomo; o posto de trabalho de Diretor de Serviços/Diretor Comercial em Portugal que vinha sendo ocupado pelo A. envolvia, essencialmente, as seguintes funções: a) Definição dos preços a praticar pela empresa na linha de negócio B... PRO; b) Organização das equipas, orçamentos, procedimentos e plano de comunicação da linha de negócio da empresa em Portugal; c) Definição da estratégia comercial da empresa e dos diferentes escalões de comissão, por cliente; d) Captação de potenciais clientes e desenvolvimento de negócio; e) Desenvolvimento de novas oportunidades de negócio; f) Planeamento, orçamentação e identificação de áreas tendo em vista receitas, margens e recursos necessários; g) Coordenação de áreas chave da empresa e definição de procedimentos e posições relativamente a: performances de Clientes, integração de XML, Suporte a Vendas, CRM, supervisão das actividades de contabilidade e da área jurídica; h) Apresentar as necessidades de produtos no que respeita a bens e fornecedores, na perspectiva da área de vendas; acontece que, no que respeita às funções de definição dos preços, em Julho 2019 o Grupo centralizou na B... Espanha estas funções, que agora são executadas pelo Departamento Comercial, em Málaga, que integra a linha de negócio B... PRO, já indicada; verifica-se, pois, não ser mais necessário proceder à análise local dos preços, nem aos procedimentos relacionados, como sejam as tarefas de análise de mercado, da posição da B... no mercado e competitividade, margens de lucro, definição preços, entre outros, trabalho que agora é desenvolvido de forma centralizada em Espanha e supervisionadas pelo Senior Manager responsável na sede (PRO business lines Diretor); por seu turno, o Grupo decidiu, ainda, que a atividade de apoio a vendas passasse a ser desenvolvida e trabalhada pela equipa da sede da B... em Palma de Maiorca; por este motivo, as decisões nesta área, que anteriormente eram tomadas em Portugal, são agora desenvolvidas na sede e supervisionadas pelo Senior Manager responsável; desde Julho de 2019 que as tarefas inerentes à captação de novos e potenciais clientes e ao desenvolvimento de novas oportunidades de negócio estão a ser desenvolvidas pelos dois Business Development Managers, em Lisboa e no Porto, enquanto o Country Manager/Diretor Geral em Portugal assegura, directamente, o desenvolvimento dos clientes com maior relevo; no que respeita à gestão da parte de recebimentos, na área de PRO business line, esta passa a ser gerida directamente pelo Departamento Financeiro e Administrativo; assim, as funções e tarefas elencadas supra, que integravam o posto de trabalho que o Autor vinha ocupando sofreram efetivamente uma redução acentuada e não justificam a manutenção do mesmo, enquanto núcleo funcional autónomo, tendo as respetivas atribuições sido absorvidas pelos dois Business Development Managers, que integram actualmente esta estrutura e que reportam diretamente ao Country Manager/Diretor Geral da empresa em Portugal, que detém e centraliza as responsabilidades de direção comercial; a supressão do posto de trabalho que vinha sendo ocupado pelo Autor permitirá, através da optimização de sinergias, reduzir os custos suportados com esta unidade.
Conclui que, seguindo as directrizes do Grupo, a B... viu-se forçada a uma reorganização da respetiva estrutura de recursos humanos, tendo-se mostrado necessário extinguir em Portugal o posto de trabalho de “Diretor de Serviços / Diretor Comercial”.

Em 9-06-2022 (refª citius 35895920), o Autor apresentou contestação ao articulado de motivação do despedimento, no âmbito do qual requereu a intervenção principal provocada da sociedade de C..., SL (Espanha), NIPC ...77, com sede na Calle ... Palma de Maiorca.
Para tanto, alegou, o seguinte: foi contratado e trabalhou para Ré debaixo de uma coordenação internacional por parte da B..., C... SL, com sede em Calle ... Palma de Maiorca; a Ré B...- Portugal, Lda. e a C..., SL (Espanha) fazem parte do mesmo projeto empresarial, que tem estrutura acionista comum internacional o Grupo D...; a Ré B...- Portugal, Lda., conforme consta da Certidão Permanente com o Código de Acesso ...01, é detida a 100% pela C..., SL (Espanha); entre as referidas sociedades B...-Portugal, Lda. e C..., SL (Espanha) e o Autor foi celebrado, em 2 de novembro de 2016, contrato de trabalho; o Autor foi contratado para desempenhar as funções de “Head of B... Pro Portugal”, Director da B... Pro Portugal, conforme consta da Job Offer – Head of B... PRO Portugal, que integra o referido Contrato de trabalho; foi recrutado por BB, CCO da B...; tendo desempenhado as suas funções sob ordens, direção e fiscalização da B..., SL Espanha.
Concluiu que existe uma relação de pluriemprego do Autor com a Ré B...- Portugal, Lda. e a C..., SL (Espanha).
No articulado em referência e a propósito da temática da alegada ilicitude do despedimento, alega ainda o Autor o seguinte: desempenhava as suas funções sob ordens, direção e fiscalização direta de Espanha, respondendo ao CCO da C..., SL, cargo que estava adstrito a BB e posteriormente ao Director Pro em Espanha CC porque a Direção Comercial da B... sempre esteve centralizada em Espanha, é por isto que o Autor reportava a Espanha, logo não houve alteração em 2019; estando o Autor numa relação de pluriemprego, e em que é alegada “uma alteração da visão do negócio do Grupo como sendo a origem de uma reestruturação nas empresas do Grupo”, cumpria escrutinar se o Grupo não dispunha em toda a sua estrutura organizativa de outro posto de trabalho compatível com a categoria e experiência profissional do Autor, o que não foi feito; consta da decisão de despedimento que foi uma alegada decisão da sociedade C..., que impactou à 1ª Ré e conduziu ao despedimento do Autor; o Autor esteve sempre em subordinação em relação à B... Espanha, o que se retira do facto de: a proposta de trabalho ter sido feita ao Autor pela B... Espanha, tendo sido o Director da B... Pro Espanha e a Directora de Recursos Humanos da B... Espanha que reuniram com o Autor em 11 de junho de 2019, para lhe comunicar a “suspensão do Contrato de Trabalho para ponderar os termos da respectiva cessação”, era para a Directora de Recursos Humanos da B... Espanha que o Autor enviava as justificações para as suas faltas, era Espanha que lhe fixava os objetivos e era a Espanha que o Autor reportava toda a sua atividade.
Defende que a impossibilidade prática de subsistência da relação de trabalho do Autor deveria ter sido aferida no âmbito do Grupo, ou seja, da 1ª e da 2ª Ré (referindo-se neste caso à chamada), o que não foi feito, e assim se traduz também na ilicitude do despedimento do Autor. Mais defende que o Autor pode exercer o seu direito à reintegração contra ambas as Rés, o que requer.
O Autor conclui o respetivo articulado, pugnando pela procedência da ação e peticionando o seguinte:
a) Condenar na reintegração nas Rés do Autor, sem prejuízo da respetiva antiguidade;
b) No pagamento das retribuições deixadas de auferir, desde 31/03/2023 e até ao trânsito em julgado da decisão da presente ação, deduzidas do subsídio de desemprego que no entretanto lhe tenha sido atribuído, cujo valor a empregadora deverá entregar à Segurança Social
c) Condenar as Rés a reconhecer que a remuneração de base/estrutura remuneratória do Autor compreendia, além do valor pecuniário de EUR: 5.142,86, parcelas em espécie, como o valor do uso total e irrestrito de veículo automóvel não inferior a € 308,00 mensais e plafond de combustível ilimitado em média €50 mensais, Via verde (portagens e estacionamento) €20 mensais, subsidio de refeição € 167,86 mensais, tarifário de telemóvel com valor mensal de € 25, benefício do Seguro de Saúde com valor não inferior a € 120 mensais , o que ascendia a salário real mensal ilíquido a valor não inferior a €5833,91;
d) Condenar as Rés a pagar ao Autor o valor de € 6546,34 relativo aos subsídios de refeição que deixou de auferir em 2019, 2020, 2021, 2022, e a 1ª Ré processou nos recibos e ainda pela violação culposa do dever de ocupação efetiva por parte das Rés, e do direito de igualdade em relação aos outros trabalhadores durantes a aplicação a todos das medidas Covd-19 acrescido de € 302,13 de juros vencidos até à presente data e juros vincendos até efetivo e integral pagamento;
e) Condenar as Rés a reconhecer ao Autor o direito correspondente ao crédito proveniente dos prémios anuais relativos aos anos de 2018 a 2023 de acordo com o Anexo II do seu contrato de trabalho, quantia a ser liquidada em posterior incidente.
f) Condenar as Rés a pagar ao Autor o valor de €81,000,03 relativo à violação do direito a férias do Autor dos anos de 2018 a 2022 e proporcionais de 20233, acrescido de €3085,71 de juros vencidos até à presente data e juros vincendos até efetivo e integral pagamento.
g) Serem as Rés condenada a pagar ao Autor a título de créditos de formação profissional em virtude da cessação do contrato, nos termos do art.º 134 do CT a quantia de €6646,80 acrescida de juros vincendos, desde a citação até efectivo e integral pagamento.
h) Condenar as Rés a reconhecer ao Autor o direito de receber os montantes, a liquidar em execução de Sentença, que corresponderem à diferença dos valores que foram processados a título de Medidas de Apoio Covid 19, e o montante da sua retribuição base, desde a data em que os restantes trabalhadores deixaram de estar abrangidos, por estas Medidas e ainda o no consequente acerto junto da Segurança Social.
i) Condenar as Rés a pagar ao Autor, a título de indemnização por danos não patrimoniais pelo assédio moral a que o vetou, consubstanciado na violação do dever de ocupação efectiva, na violação dos direitos retributivos do Autor, na discriminação do Autor em relação aos demais trabalhadores da 1ª Ré mantendo sob a aplicação das Medidas Extraordinárias Covid 19, em quantia não inferior a € 35.000,00 e juros vincendos até efetivo e integral pagamento.
À cautela e sem prescindir:
j) Condenar as Rés a pagar ao Autor, a título de retribuição corresponde a férias não gozadas a quantia de €27,000,01 dos anos de 2018 a 2022 e proporcionais de 2023, nos termos do artigo 245º alínea a) e b) do Código de trabalho, acrescido de €1028,55 acrescido de € 1296 de juros vencidos até à presente data e juros vincendos desde a citação até efetivo e integral pagamento.

A Ré apresentou articulado de resposta em 9-06-2023 (refª citius 35895920), concluindo o mesmo no sentido de dever:
“a) Ser confirmada a licitude do despedimento do A.;
b) Ser determinada a absolvição da R. da instância relativamente ao pedido do A., de reconhecimento da existência de uma situação de pluralidade de empregadores, com a consequente remessa do A. para a acção de processo comum e o indeferimento do pedido de intervenção principal provocada da sociedade C..., SL;
c) Ser julgada procedente, por provada, a excepção de caducidade dos direitos do A. em matéria de formação profissional vencidos em 2017;
d) Ser julgado improcedente, por não provado, o pedido reconvencional deduzido pelo A., com as legais consequências; e
e) Ser indeferido o Requerimento Probatório, nos termos peticionados pelo A..”.
Nesse articulado, a Ré pronunciou-se no que respeita ao pedido de intervenção principal provocada, sustentando que, à luz dos normativos legais vigentes, não se afigura admissível a intervenção principal provocada no contexto de uma acção de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento.
Argumenta que: o âmbito de aplicação desta acção especial pressupõe que se mostre inequívoca a existência de um vínculo laboral e as respectivas partes, pelo que esta forma de processo é insusceptível de aplicação quando haja dúvidas quanto aos sujeitos que são parte na relação laboral; subjacente a esta ação especial estão os princípios da simplicidade, urgência e celeridade processual, razão pela qual, atenta a sua própria natureza, esta forma de processo não se mostra adequada às situações em que se discute a existência ou não de uma situação de pluralidade de empregadores; nesta forma de processo, o direito de defesa da Ré está fortemente limitado, na medida em que apenas lhe é permitido invocar, no articulado motivador do despedimento, factos que constem da decisão escrita de cessação do vínculo; limitação esta que é bem demonstrativa da inadequação da presente forma de processo a situações em que, aparentemente, o Autor pretende discutir a existência de uma relação jurídica de pluriemprego; a forma de processo especial prevista no CPT só é aplicável aos processos em que inexistam dúvidas sobre quem é o efetivo empregador do trabalhador.
Conclui que, a forma de processo adequada a apreciar os factos que constituem a causa de pedir da invocada existência de uma relação jurídica de pluriemprego é a forma de processo comum, pelo que se verifica um erro na forma do processo, o que configura uma excepção dilatória que importa a absolvição da Ré da instância, nos termos dos artigos 576.º e 577.º do Cód. de Processo Civil.
Defende que, uma vez que a esta pretensão do Autor é aplicável outra forma de processo, deverá o Tribunal, como resulta do comando ínsito no n.º 3 do art.º 98.º-I do CPT, abster-se de conhecer de tal pedido, devendo absolver a Ré da instância e remeter o Autor para a acção de processo comum, o que se requer. Mais defende que, ocorrendo erro na forma de processo, não é admissível, na presente acção de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, a dedução de incidente de intervenção principal provocada da sociedade C..., SL, pugnando pelo respetivo indeferimento.
Para a hipótese de não se decidir pela existência de erro na forma de processo, a Ré pronunciou-se sobre a questão invocada pelo Autor de existência de uma relação jurídica de pluriemprego, sustentando que, ainda que a apreciação e decisão do referido pedido do Autor nos presentes autos se afigurasse processualmente admissível, sempre se teria de concluir que, quer pela inexistência de contrato escrito de pluriemprego, quer pela ausência de alegação e prova de elementos aptos a demonstrar a existência de subordinação jurídica do A. perante a C..., SL, pelo que não é possível considerar que nos deparamos perante uma situação de pluralidade de empregadores, nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 101.º do Código do Trabalho.

Com data de 6-09-2023 (refª citius 451298893), foi proferida a seguinte decisão (transcrição):
«- Do incidente de intervenção de terceiros.
Na presente acção declarativa que segue os termos do processo especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento, veio o autor AA requerer a intervenção principal provocada de C..., SL (Espanha), NIPC ...77, com sede na Calle ... Palma de Maiorca, alegando que a ré A..., SA. é detida a 100% pela mencionada C... (B...) e que o contrato de trabalho foi celebrado com ambas, tendo sempre desempenhado as suas funções sob as ordens, direcção e fiscalização da B..., o que configura uma situação de pluriemprego.
Contra tal pretensão pronunciou-se a ré, invocando desde logo erro na forma do processo, porquanto se o autor pretende discutir a existência de uma relação jurídica de pluriemprego, então a forma processual adequada é a da acção comum, não sendo esta forma especial de processo compatível com a existência de dúvidas sobre quem é o efectivo empregador.
Além disso, o autor limita-se a alegar conclusivamente que desempenhou as suas funções sob as ordens, direcção e fiscalização da B..., não havendo ainda quaisquer evidências de que o contrato de trabalho alegado tenha sido reduzido a escrito, o que configura uma nulidade.

*
Cumpre decidir.
Do alegado erro na forma do processo.
O artigo 98.º-C, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho restringe a aplicação do processo especial aqui em apreço aos casos de comunicação por escrito ao trabalhador de uma decisão de despedimento individual, numa de três situações: por facto imputável ao trabalhador, por extinção do posto de trabalho e por inadaptação.
Atendendo a que estamos perante um despedimento efectivado por escrito, com fundamento em extinção do posto de trabalho, o autor teria sempre de ter manifestado, como fez, a sua oposição mediante a apresentação de requerimento em formulário próprio, nos termos do artigo 387.º, n.º 2, do Código do Trabalho.
Não existe ainda qualquer dúvida alegada relativamente a quem assumia a qualidade de empregadora e, bem assim, quanto à entidade que procedeu à cessação do contrato de trabalho.
Por assim se entender, julgamos que não se verifica o apontado erro na forma do processo.
Da intervenção de terceiros.
O incidente da intervenção principal provocada constitui uma das excepções ao princípio da estabilidade subjectiva da instância, consagrado no artigo 260.º, do Código de Processo Civil.
Com a intervenção principal provocada visa-se, nomeadamente, assegurar a legitimidade das partes intervenientes em juízo, estendendo-se o seu âmbito de aplicação ainda às situações de litisconsórcio voluntário (artigo 316.º, n.º 2, do Código de Processo Civil).
Deste modo, a intervenção principal (passiva) serve para chamar à acção alguém que é titular da relação material controvertida, de modo a que possa (também) ser condenado no pedido formulado pelo autor.
Ora, a alegação do autor – deixadas de parte as considerações sobre pluriemprego, que ora não importa cuidar, por dependerem de prova a produzir e contenderem com o mérito da causa – é susceptível de ser subsumível à previsão do artigo 334.º, do Código do Trabalho, segundo o qual: “Por crédito emergente de contrato de trabalho, ou da sua violação ou cessação, vencido há mais de três meses, respondem solidariamente o empregador e sociedade que com este se encontre em relação de participações recíprocas, de domínio ou de grupo, nos termos previstos nos artigos 481.º e segs. do Código das Sociedades Comerciais”, na medida em que o autor alega que as sociedades se encontram entre si numa situação de grupo, o que poderá determinar a eventual responsabilidade solidária da sociedade espanhola coligada com a sociedade ré, empregadora.
Perante tal factualidade, não restam dúvidas quanto à legitimidade da sociedade que se quer fazer intervir nos autos, na medida em que a interveniente será responsável solidariamente pelo pagamento dos créditos salarias por si reclamados.
A tal não obsta a circunstância de a interveniente ter sede fora do território nacional, devendo para tanto atentar-se no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 272/2021, in DR-I, de 06/07/2021, que declarou a inconstitucionalidade com força obrigatória geral “… da interpretação conjugada das normas contidas no artigo 334.º do Código do Trabalho e no artigo 481.º, n.º 2, proémio, do Código das Sociedades Comerciais, na parte em que impede a responsabilidade solidária da sociedade com sede fora de território nacional, em relação de participações recíprocas, de domínio ou de grupo com uma sociedade portuguesa, pelos créditos emergentes da relação de trabalho subordinado estabelecida com esta, ou da sua rutura, por violação do princípio da igualdade, consagrado no artigo 13.º da Constituição”.
A questão que poderá levantar-se no presente caso será processual e prende-se com a admissibilidade em abstracto da intervenção de terceiros nesta forma de processo especial. Com efeito, a forma processual consagrada pelo legislador parece resumir-se a uma relação entre trabalhador e empregador, à qual não poderiam ser chamadas terceiras pessoas.
Em sentido divergente quanto a esta questão podem encontrar-se na jurisprudência, entre outros, os acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa de 29/1/2014 e de 30/5/2012, disponíveis em www.dgsi.pt, com os n.os de processo, respectivamente, 681/13.5TTLSB.L1-4 e 190/11.7TTFUN.L1-4. Na doutrina também existe divergência de posições: Fraústo da Silva (“Efectivação da responsabilidade solidária por créditos laborais no âmbito do novo processo especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento”, in Revista do Ministério Público, n.º 130, Abril/Junho de 2012, págs. 293 e segs.) defende a inadmissibilidade de demanda solidária de terceiros; Diogo Ravara e Viriato Reis (“A Acção Especial de Impugnação da Regularidade e da Licitude do Despedimento – Aspectos Práticos”, in Prontuário do Direito do Trabalho, n.os 91/92, Janeiro-Abril/Maia-Agosto de 2012, Centro de Estudos Judiciários, Coimbra Editora, págs. 212 a 215), pelo contrário, consideram admissível tal demanda conjunta. Igualmente Joana Vasconcelos (“Direito Processual do Trabalho”, 2.ª ed., Universidade Católica Editora, 2022, pág. 136 a 138) propugna que “pode ser efectivada por meio desta acção especial a solidariedade das sociedades coligadas com a sociedade empregadora, prevista no artigo 334.º do Código do Trabalho”, referindo expressamente que “Quando, pelos créditos laborais que o trabalhador pretende efectivar contra o empregador na acção de impugnação da regularidade e licitude do despedimento, respondam solidariamente outros sujeitos, temos entendido que podem, também estes, ser nela demandados para tal efeito.
Antes de mais, por ser esta a solução que impõe diante da opção legal de permitir ao trabalhador, neste processo especial, resolver também todas as questões patrimoniais que com o empregador tenha pendentes. Com efeito, o benefício que o n.º 3 do artigo 98.º-L do Código de Processo do Trabalho atribui ao trabalhador só o será verdadeiramente se se lhe possibilitar efectivar os seus créditos laborais nos exactos termos em que o poderia fazer em processo declarativo comum. Donde, se por tais créditos respondem solidariamente outros sujeitos além do empregador, o trabalhador terá de poder fazê-los intervir neste processo especial, para que fiquem abrangidos pela decisão nele proferida”.
Ponderando todos os argumentos adiantados por cada uma das posições acima referidas, não vislumbramos qualquer impedimento à dedução de incidente de intervenção de terceiros nesta forma processual quando o trabalhador alegue a existência de uma responsabilidade solidária pelos créditos que reclama. Como bem notam Diogo Ravara e Viriato Reis, solução contrária traduzir-se-ia na prática em obrigar o trabalhador a instaurar duas acções com o mesmo objecto (uma para impugnar o despedimento e outra para obter a responsabilização solidária da sociedade terceira), consequência que até à entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 295/2009, de 13 de Outubro não se colocaria, pois só poderia o trabalhador recorrer ao processo comum laboral, no qual não se levantariam dúvidas quanto à admissibilidade do incidente. Seria totalmente contrário à intenção legislativa de consagração de uma forma de processo mais célere e garantística dos direitos do trabalhador que agora se obrigasse o trabalhador àquela dupla demanda, totalmente contrária ao princípio da economia processual. Assim, entendemos ser admissível o incidente deduzido.

Nestes termos, e pelo exposto:
A) Julgo improcedente a excepção dilatória de erro na forma do processo.
B) Admito a intervenção nestes autos de C..., SL (Espanha), NIPC ...77, com sede na Calle ... Palma de Maiorca.
*
Cite a interveniente – artigo 319.º do Código de Processo Civil.
*
Custas do incidente pela ré/requerida – artigo 539.º, n.º 1, in fine do Código de Processo Civil.
*
Notifique. (…)».
Inconformada com esta decisão a Ré interpôs recurso de apelação (refª citius 36781151), formulando as seguintes CONCLUSÕES [que se transcrevem]:
«A. Nos presentes autos o Autor apresentou Contestação com pedido reconvencional, na qual requereu ainda a intervenção principal provocada passiva da sociedade de direito espanhol denominada por C..., SL, alegando que manteve uma relação de pluriemprego com esta última e com a aqui Recorrente.
B. A natureza especial dos presentes autos de impugnação de despedimento e, bem assim, o facto de os mesmos deterem carácter urgente não admite a intervenção desnecessária e impertinente de terceiros, cuja participação servirá apenas para criar entropias processuais perfeitamente evitáveis.
C. A forma de processo adequada para a invocação da existência de uma relação jurídica de pluriemprego é o processo comum, uma vez que a forma de processo especial de impugnação de despedimento, prevista no art.º 98.º-B e seguintes do Código de Processo do Trabalho, só é aplicável aos processos em que inexistam dúvidas sobre quem é o efectivo empregador do trabalhador.
D. Impõe-se, pois, concluir que nos deparamos perante um erro na forma de processo, dado que não é admissível, no âmbito da presente acção de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, a admissão da dedução de incidente de intervenção principal provocada da sociedade C..., SL, pelo que a decisão tomada pelo Tribunal a quo se revela digna de censura, por violar o n.º 3 do art.º 98.º-I do Código de Processo do Trabalho, bem como os artigos 576.º e 577.º do Código de Processo Civil.
E. A intervenção principal provocada assente, material e exclusivamente, no artigo 334.º do Código do Trabalho, não tem qualquer efeito jurídico útil a não ser o de contender com a celeridade e urgência que caracterizam a acção de impugnação da regularidade e licitude do despedimento, porquanto a pessoa colectiva C..., SL sempre será, em abstracto, solidariamente responsável perante uma eventual declaração judicial de ilicitude do procedimento de despedimento por extinção de posto de trabalho impugnado.
F. Como bem foi decidido por este Venerando Tribunal ad quem, no seu acórdão de 24 de Janeiro de 20183, proferido no proc. n.º 1158/17.5T8MTS-A.P1:
“a natureza urgente e a tramitação específica da ação especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento, pressupõem, em princípio que esteja claramente identificada a entidade patronal.
Tal ação destina-se, como ficou dito, tão a aferir a regularidade e licitude do despedimento, sem que o trabalhador necessite de fazer prova do despedimento. Daí a fundamentação consignada na decisão proferida no proc. n.º 468/11.0TTBRG do Juízo do Tribunal do Trabalho de Braga, publicada in Revista do Ministério Público, n.º 130, Abril/Junho 2012, pág. 293 e segs., no sentido de não caber na mesma, outro tipo de despedimentos ou a apreciação de causas de pedir complexas que passem pela caraterização da relação contratual ou pela identificação da entidade empregadora, pois estasquestõesdeverão estarclarificadasface ao teor da decisão estrita de despedimento.
Concordamos também em tese geral, com a conclusão, consignada em tal decisão, de que o sujeito passivo da ação de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento não pode ser distinto da pessoa jurídica que profere a respetiva decisão escrita, não sendo por isso admissível a intervenção de terceiros a título principal.
Posição defendida também por D…, no texto sobre a “Efectivação da responsabilidade solidária por créditos laborais no âmbito do novo processo especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento”, publicado na mesma Revista do Ministério Público.
Isto porque se trata de um processo especial, que se mostra vocacionado à impugnação do despedimento individual assumido formalmente enquanto tal pelo empregador.
Na verdade, tem de haver uma inequívoca decisão de despedimento e como tal, refira-se uma vez mais, regra geral que se encontre perfeitamente identificada a entidade patronal que a proferiu”. (sublinhados nossos)
G. Impõe-se, pois, concluir que, ao decidir como decidiu, o Tribunal a quo admitiu a dedução de um incidente processual legalmente inadmissível, o que configura uma excepção dilatória que importa a absolvição da Ré da instância, tendo a decisão recorrida, ao decidir como decidiu, violado o disposto n.º 3 do art.º 98.º-I do Código de Processo do Trabalho, bem como os artigos 576.º e 577.º do Código de Processo Civil, devendo a mesma ser revogada pelo Tribunal de Segunda Instância e substituída por outra que não admita, nos presentes autos de impugnação da licitude e regularidade do despedimento do A., a intervenção principal provocada da C..., SL.».
Terminou, pugnando pela procedência do recurso e, em consequência, pela revogação da decisão de 6-09-2023 e sua substituição por outra que não admita a intervenção principal provocada de terceiros nos presentes autos.

O Recorrido/Autor contra-alegou (refª citius 36838770), finalizando com as seguintes conclusões, que se transcrevem:
«1. Na sequência da apresentação do articulado motivador do despedimento por parte da Ré/ Recorrente, o Autor/Recorrido deduziu Contestação com pedido reconvencional, na qual requereu igualmente a intervenção principal provocada passiva da sociedade de direito espanhol denominada por C..., SL, alegando que manteve uma relação de pluriemprego com esta última e com a aqui Recorrente, e que as sociedades se encontram numa relação de grupo.
2. Na Resposta à Reconvenção, a Ré/Recorrente opôs-se à dedução do supramencionado incidente pelo Autor/Recorrido, sustentando que a natureza especial dos autos e, bem assim, o facto de os mesmos deterem carácter urgente, não admite a intervenção desnecessária e impertinente de terceiros cuja participação servirá apenas para criar entropias processuais perfeitamente evitáveis.
3. O Tribunal a quo, andou bem e proferiu despacho em que deferiu o incidente de intervenção principal provocada passiva deduzido pelo Autor/Recorrido.
4. Ao contrário do que defende a Ré /Recorrente, entendemos que alegada como foi pelo Autor/Recorrido uma situação caracterizadora de um esquema societário grupal e, ao mesmo tempo, uma situação de pluriemprego, andou bem o Tribunal a quo ao considerar que é admissível, no âmbito da ação especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento, o chamamento por intervenção principal provocada, da sociedade relativamente à qual se invoca a solidariedade quanto aos créditos e quanto aos factos.
5. Ao contrário do que defende a Ré/Recorrente, a jurisprudência tem evoluído a intervenção de terceiros nesta forma de processo, vejam-se os acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa de 29/1/2014 e de 30/5/2012, disponíveis em www.dgsi.pt, com os n.os de processo, respectivamente, 681/13.5TTLSB.L1-4 e 190/11.7TTFUN.L1-4, Relação Lisboa de 30/05/2002, Proc.º 190/11.7TTFUN e 1/09/2016, Proc.º 3584/15.5T8CSC e da Relação do Porto de 24/05/2018, Proc.º 1158/17.5T8MS-Ap 1 e Ac. de 30/05/2012 e 1/09/2016, reportando-se a situações de sociedades em relação de grupo e a pluralidade de empregadores que defende ser admissível a pluralidade de réus.
6. E na doutrina tambémexistemposições que defendema admissibilidade talintervençãonesta forma especial de processo veja-se JOANA VASCONCELOS (in “Direito Processual do Trabalho”, 2.ª ed., Universidade Católica Editora, 2022, pág. 136 a 138) onde propugna que “pode ser efectivada por meio desta acção especial a solidariedade das sociedades coligadas com a sociedade empregadora, prevista no artigo 334.º do Código do Trabalho”, referindo expressamente que “Quando, pelos créditos laborais que o trabalhador pretende efectivar contra o empregador na acção de impugnação da regularidade e licitude do despedimento, respondam solidariamente outros sujeitos, temos entendido que podem, também estes, ser nela demandados para tal efeito. Antes de mais, por ser esta a solução que impõe diante da opção legal de permitir ao trabalhador, neste processo especial, resolver também todas as questões patrimoniais que com o empregador tenha pendentes. Com efeito, o benefício que o n.º 3 do artigo 98.º-L do Código de Processo do Trabalho atribui ao trabalhador só o será verdadeiramente se se lhe possibilitar efectivar os seus créditos laborais nos exactos termos em que o poderia fazer em processo declarativo comum”.
7. Assim, ao contrário do que defende a Ré/Recorrida, não existe razão plausível para impor ao Trabalhador, ora Autor/Recorrido o encargo de deduzir nova ação com processo comum.
8. Pelo que Requer o Autor / Recorrente a V.Exas que “o Despacho do Tribunal a quo de 6 de Setembro de 2023 seja mantido prosseguindo a ação especial os seus termos.
À cautela e sem prescindir e, por mero exercício de raciocínio,
9. Requer-se em obediência ao princípio da adequação formal que rompe com o regime apertado do princípio da legalidade das formas processuais, que caso V.EXAS não concordem com a posição do douto Despacho, que ao abrigo do artigo 547° do CPC, seja a presente acção especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento convolada para acção com processo comum, permitindo a intervenção da sociedade C... SL, e não ser o Autor/Recorrido obrigado a interpor nova ação.

Terminou, pugnando pela manutenção da decisão do Tribunal a quo que admitiu a intervenção principal de terceiros nos presentes autos, prosseguindo os autos os respetivos termos. À cautela e sem prescindir, caso assim não se entenda, ser a decisão substituída por outra que ordene a convolação do processo para a forma comum, admitindo a intervenção principal provocada de terceiros nos termos requeridos.

Foi proferido despacho de admissão do recurso de apelação pelo Tribunal a quo (refª citius 453152764, datado de 26-10-2023), com efeito meramente devolutivo e subida em separado. Nessa mesma decisão consignou-se ainda que se fixava “ao incidente de intervenção de terceiros o valor da acção, nos termos do artigo 304.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.”.

Da consulta dos autos principais no sistema citius, constata-se ainda o seguinte:
- Na sequência da decisão de admissão do incidente de intervenção de terceiros, foi citada a chamada, conforme se alcança do A/R constante da refª citius 37449091 de 30-11-2023;
- A chamada C... SL, interveio nos autos, apresentando o requerimento datado de 17-12-2023 (refª citius 37595372) com o seguinte teor:
C... SL, citada para intervir nos autos à margem identificados, vem declarar que faz seus todos articulados apresentados em juízo pela Ré, a sociedade A..., SA Portugal Lda., parte a Chamada expressamente se associa.”
Com tal requerimento juntou procuração forense datada de 7-11-2023.

O Exmº Srº Procurador-Geral-Adjunto, neste Tribunal da Relação, teve vista do processo, exarando posição no sentido de estar vedado ao Ministério Público a possibilidade de emitir parecer, por inaplicabilidade do artigo 87.º, n.º 3, do Código de Processo do Trabalho.

Tendo-se constatado que não estava desde logo fixado o valor da causa (pese embora o consignado no despacho de admissão do recurso quanto à fixação ao incidente do valor da ação, o certo é que o valor da ação não tinha ainda sido fixado), no uso dos poderes previstos nas alíneas b) e d) do artigo 652.º do Código de Processo Civil, foi determinada a devolução/baixa do processo ao Tribunal a quo para tal efeito – refª citius 17606560.

Nessa sequência, o Tribunal a quo proferiu o despacho refª citius 455726201, com o seguinte teor:
Efectivamente, por lapso de que nos penitenciamos, não atentamos na circunstância de ainda não ter sido fixado o valor da acção, tanto mais que ainda não foi proferido despacho saneador.
Nessa medida e, por ora, o valor da acção fixa-se em €2.000,00, nos termos do artigo 98.º-P, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho, sem prejuízo da sua alteração a final, de acordo com o n.º 2 do mesmo preceito.
Notifique.
Após, subam os autos ao Venerando Tribunal da Relação do Porto”.
Tal despacho foi notificado às partes e não mereceu oposição.

Procedeu-se a exame preliminar, foram colhidos os vistos, após o que o processo foi submetido à conferência.
*

II – Objeto do recurso
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, que não tenham sido apreciadas com trânsito em julgado e das que se não encontrem prejudicadas pela solução dada a outras [artigos 635.º, n.º 4, 637.º n.º 2, 1ª parte, 639.º, n.ºs 1 e 2, 608.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, aplicáveis por força do artigo 87.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho].
Assim, no caso, impõe-se apreciar e decidir se é admissível a intervenção principal provocada no âmbito da ação especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento, quando é alegada pelo trabalhador uma situação caraterizadora de um esquema societário grupal e, ao mesmo tempo, uma situação de pluriemprego.
***

III – Fundamentação
Os factos relevantes para a decisão resultam do relatório supra.
A Apelante pugna pela inadmissibilidade do incidente de intervenção principal provocada, contrariamente ao decidido pelo Tribunal a quo, por considerar, em substância, que a legitimidade passiva se encontra legalmente limitada na ação especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento, restringindo-se necessariamente à relação laboral entre o Autor (trabalhador) e a Ré (entidade empregadora). Defende que a admissão do incidente de intervenção principal provocada passiva carece de sustentação jurídica, pelo que andou mal o Tribunal a quo ao admitir a intervenção principal provocada nos presentes autos da sociedade C..., SL, o que configura uma exceção dilatória que importa a absolvição da instância, nos termos dos artigos 576.º e 577.º do Código de Processo Civil, ex vi do artigo 1.º, n.º 2, alínea a) do Código do Processo do Trabalho, disposições legais que, juntamente com o n.º 3 do art.º 98.º-I do Código do Processo do Trabalho, resultaram violadas in casu.
Alega a Recorrente, que: “(…) subjacente a ação especial de impugnação da licitude e regularidade do despedimento estão os princípios da simplicidade, urgência e celeridade processual, razão pela qual, atenta a sua própria natureza, esta forma de processo não se mostra adequada às situações em que se discute a existência ou não de uma situação de pluralidade de empregadores”; “(…) a ação especial de impugnação de regularidade e licitude do despedimento foi gizada tendo em consideração as regras legais relativas à repartição do ónus de prova, que fazem impender sobre o empregador o ónus de demonstrar os factos que suportam o despedimento, e que justificam que os factos em apreciação e discussão nos autos constem do Articulado do Empregador, e não do documento (formulário) que dá início ao processo, concedendo-se ao trabalhador o direito de os impugnar na contestação”; “caso contrário, nesta forma de processo, o direito de defesa da Ré, aqui Recorrente, estaria fortemente limitado, na medida em que apenas lhe é permitido invocar, no articulado motivador do despedimento, factos que constem da decisão escrita de cessação do vínculo”; “limitação essa que é bem demonstrativa da inadequação da presente forma de processo a situações como aquelas com que ora nos confrontamos nos presentes autos, em que, aparentemente, o Autor pretende discutir a existência de uma relação jurídica de pluriemprego”;”por conseguinte, pretendendo o Autor invocar a causa de pedir da invocada existência de uma relação jurídica de pluriemprego, a forma de processo adequada para o efeito é a forma de processo comum, dado que a forma especial prevista no Código de Processo do Trabalho só é aplicável aos processos em que inexistam dúvidas sobre quem é o efetivo empregador do trabalhador”; “verifica-se, portanto, um erro na forma de processo (…)”; “(…) uma vez que a esta pretensão do Autor é aplicável outra forma de processo, deveria o Tribunal a quo, em conformidade com o estatuído no n.º 3 do art.º 98.º-I do Código de Processo do Trabalho, ter-se abstido de conhecer tal pedido, absolvendo a aqui Recorrente da instância e remetido o Autor para a acção com processo comum”; “(…) é pelo facto de as questões inerentes ao pluriemprego não terem sido alvo de comprovação judicial em sede processual própria que: (i) a legitimidade processual da pessoa colectiva C..., SL se demonstra sem qualquer fundamento jurídico; e (ii) o pedido do Autor de reconhecimento dessa situação foi apresentado por via da forma errada do processo”; “(…) a intervenção principal provocada assente – supervenientemente – como o Tribunal a quo pretende – no artigo 334.º do Código do Trabalho, redunda, apenas e tão só, num duplicar de esforços e recursos processuais, sem qualquer efeito útil a não ser o de contender com a celeridade e urgência que caraterizam a ação de impugnação a regularidade e licitude do despedimento”.
Contrapõe o Recorrido que: “(…) o incidente da intervenção principal provocada constitui uma das excepções ao princípio da estabilidade subjectiva da instância, consagrado no artigo 260.º, do Código de Processo Civil”; para além da alegada relação de pluriemprego que em devido tempo se provará – também fundamentou o Autor/Recorrido - o que foi atendido pelo Tribunal a quo, que o chamamento da C... SL é susceptível de ser subsumível à previsão do artigo 334.º, do Código do Trabalho (…)”; “(…) foi alegada pelo Autor/Recorrido que as sociedades A..., SA (…) e (…) C..., SL estão numa situação de grupo, conforme consta da certidão permanente (…) em está inscrito que a A..., SA é detida a 100% pela C..., SL” “e requerida a condenação em responsabilidade solidária da sociedade espanhola coligada com a sociedade ré, empregadora”; “(…) a Ré/Recorrente defende que a forma processual consagrada pelo legislador parece resumir-se a uma relação entre trabalhador e empregador, à qual não poderiam ser chamadas terceiras pessoas (…), todavia, existe em sentido diverso inúmera jurisprudência, que entende a admissibilidade da intervenção de terceiros nesta forma de processo (…) e na doutrina também existem posições que defendem tal intervenção”; “(…) andou bem – e não está sozinho – o Tribunal a quo, ao não vislumbrar qualquer impedimento à dedução de incidente de intervenção de terceiros nesta forma processual quando o trabalhador alegue a existência de uma responsabilidade solidária pelos créditos que reclama”. Sustenta que não existe razão plausível para impor ao trabalhador, ora Autor/Recorrido o encargo de deduzir nova ação com processo comum, pugnando pela manutenção da decisão prosseguindo a ação especial os seus termos. No final, e referindo que o faz por mero exercício de raciocínio e à cautela, requer que caso não se concorde com a posição do despacho seja então, ao abrigo do artigo 547.º do CPC, a presente ação convolada para ação com processo comum, permitindo a intervenção da sociedade em causa e não ser o Autor obrigado a interpor nova ação.
Vejamos.
A questão a resolver está longe de ser pacífica, identificando-se posições divergentes na doutrina e jurisprudência.
Assim, no sentido da inadmissibilidade da demanda ab initio dos responsáveis solidários para efeitos dos artigos 334.º, 335.º do Código do Trabalho e dos artigos 78.º, 79.º, 83.º e 481.º do Código das Sociedades Comerciais, na ação especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento, veja-se o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 29-01-2014 (processo n.º 681/13.5TTLSB-A.L1-4, Relator Duro Mateus Cardoso - acessível in www.dgsi.pt, site onde também se encontram disponíveis os restantes Acórdãos/Decisões infra a referenciar). Neste Acórdão considera-se, em substância, que embora estivesse em causa responsabilidade solidária, não estaríamos perante um potencial litisconsórcio voluntário mas perante uma potencial coligação uma vez que há uma pluralidade de partes e de pedidos (o pedido de reintegração não podia ser dirigido contra os responsáveis solidários até pela simples razão de não serem empregadores, podendo, todavia, tal pedido vir a ser substituído por indemnização). Mais se considera que para a dedução daqueles pedidos contra os responsáveis solidários por créditos dos trabalhadores, que não o empregador, não existe qualquer forma de processo especial prevista, aplicando-se o processo comum, sendo que para a impugnação do despedimento contra a entidade empregadora é aplicável o processo especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento. Argumenta-se que as duas formas processuais em causa, pelas suas especificidades e diferença de formalismo, são manifestamente incompatíveis quando se pretenda seguir de início a tramitação do processo especial. Nessa decorrência, sustenta-se que a solução será uma ação intentada simultaneamente contra a entidade empregadora e os outros responsáveis solidários, nos termos do processo comum, o que nesse Acórdão se prefigura como admissível à luz do atual artigo 37.º, n.º 2, do Código de Processo Civil (à data da decisão recorrida era aplicável o artigo 31.º, n.º 2, do anterior Código de Processo Civil, com a mesma redação). Contrapõe-se que a não se aceitar esta possibilidade, restaria «a opção, possível, a que nos leva a deficitária previsão do novo processo especial para impugnação do despedimento, de obrigar o trabalhador à propositura de duas ações diversas em simultâneo, em que um mesmo facto essencial tem de ser discutido (a ilicitude do despedimento), mas com todos os inconvenientes que daí advêm. Ou então esperar pela decisão da ação de impugnação da regularidade e licitude do despedimento para depois se intentar a relativa à resposabilidade solidária com o manifesto risco de ocorrência prescricional dos créditos».
Por sua vez, e no sentido da inadmissibilidade do incidente de chamamento de terceiro no âmbito da referida ação especial, numa situação de invocação de pluralidade de empregadores e formulação de pedido reconvencional contra a entidade empregadora que proferiu o seu despedimento e contra terceira/chamada, veja-se o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 21-02-2018 (processo n.º 10118/16.2T8VNG-A.P1, Relatora Fernanda Soares). Neste Acórdão, considerou-se que «(…) a especial tramitação da referida acção não se compadece com o chamamento de terceiros nem com a formulação de pedidos contra quem não figura, inicialmente, na acção, como é o caso dos autos [onde a Trabalhadora vem invocar na contestação a pluralidade de empregadores, pedir o chamamento de Terceira e formular pedidos contra a Empregadora, que proferiu o despedimento, e também contra a chamada]. Por isso, os pedidos formulados na contestação/reconvenção contra Terceira/chamada só poderiam ocorrer numa ação com processo comum [com apresentação de petição inicial pela Trabalhadora/Autora onde formularia pedidos contra a aqui Empregadora/Ré e a Chamada/Ré, a que se seguiriam as contestações de ambas as Rés, contestações onde poderiam ser deduzidos pedidos reconvencionais contra a Autora seguida de resposta da Autora]. O Mmº Juiz a quo assim o entendeu mas em vez de tratar a questão em sede de erro na forma do processo procedeu à adequação formal ordenando que o processo passasse a ser tramitado sob a forma de processo comum, julgando, deste modo, prejudicado o conhecimento do invocado erro na forma de processo.». Tal Acórdão revogou o despacho recorrido (que havia determinado que o processo passasse a seguir os termos do processo comum e que admitiu o chamamento da sociedade terceira) e julgou procedente a exceção de erro na forma de processo, absolvendo a apelante e a chamada da instância.
Refira-se que o identificado Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 21-02-2018 foi objeto de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça que decidiu por Acórdão de 26-09-2018 (processo n.º 10118/16.2T8VNG-A.P1.S.1, Relator Gonçalves Rocha), e concedeu a revista, represtinando o despacho de 1ª instância que determinou que o processo passasse a seguir os termos do processo comum e que admitiu o chamamento. Neste Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça expõe-se o seguinte: «Foi perante a impossibilidade do processo especial de impugnação judicial do despedimento da trabalhadora admitir a intervenção da chamada CC, que a 1ª instância convolou o processo para a forma comum escudando-se no princípio da adequação formal. A apelante empregadora invocou perante a Relação a impossibilidade desta convolação, argumentando para tanto o erro na forma de processo, tese a que aderiu a decisão impugnada. Não estamos porém, perante uma situação de erro na forma de processo, pois o processo seguiu desde o início a forma que o Código do Processo do Trabalho prevê para a impugnação da regularidade e licitude do despedimento da trabalhadora. E foi perante a impossibilidade legal desta acção especial admitir a intervenção dum terceiro que não consta da decisão de despedimento da trabalhadora que a 1ª instância convolou o processo para a forma comum, desde a dedução da reconvenção pela trabalhadora e do pedido de intervenção do terceiro, fazendo-o como forma de compatibilizar esta limitação processual com os interesses de economia processual, da necessidade de uma apreciação conjunta das pretensões e da realização da justiça do caso concreto. Por isso, e como já dito, a questão não é de erro na forma de processo, mas consiste em apreciar se foi legal esta convolação do processo especial para a forma comum, para assim ser possível admitir a intervenção da chamada CC de Avaliação, Lda. (…) Além disso, estando em causa um despedimento por extinção do posto de trabalho, a provar-se a tese da pluralidade de empregadores, os motivos invocados poderão ter que ser analisados tendo também em consideração a realidade das duas empresas, situação que só por si justifica plenamente a convolação efetuada, pois só desta forma se obterá uma justa apreciação e composição do litígio. Devendo prevalecer esta apreciação global do diferendo existente entre as partes, justifica-se perfeitamente a decisão de adequação que foi operada pela 1ª instância, pois a necessidade de realização da justiça material enquanto missão do Estado, deve prevalecer sobre a garantia conferida às partes pela forma de processo, sendo esta meramente instrumental face ao fim que visa – a Justiça do caso concreto. (…) Por isso e como o figurino legal da acção especial de impugnação do despedimento não admite a intervenção de terceiros que não tenham assinado a respectiva decisão, só convolando o processo e com a presença da chamada, como se fez, se pode obter uma apreciação global da causa e uma justa composição do litígio.».
Na doutrina, pugnando pela impossibilidade de, nesta ação especial de impugnação do despedimento, o trabalhador poder reclamar de responsáveis solidários com o empregador (por exemplo por força dos artigos 101.º, n.º 3 – pluralidade de empregadores - e 334.º e 335.º do Código do Trabalho) os seus créditos emergentes do contrato de trabalho, ou da sua violação ou cessação, temos o Dr. Fraústo da Silva, em «Efetivação da responsabilidade solidária por créditos laborais no âmbito do novo processo especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento», Revista do Ministério Público, n.º 130, abril/junho 2012, págs. 293 e segs. Nesse artigo refere-se que «[u]ma vez que o modelo ou formulário de requerimento de impugnação da regularidade ou licitude do despedimento a apresentar pelo trabalhador como impulso processual inicial não lhe permite identificar – e por isso demandar desde logo – eventuais responsáveis solidários, é de questionar se o trabalhador pode provocar a intervenção dos eventuais responsáveis solidários em sede de reconvenção para contra eles dirigir também pedido que emirja do facto jurídico que serve de fundamento à ação ou à defesa e para peticionar créditos emergentes do contrato de trabalho», concluindo de seguida que a permissão de intervenção principal provocada a suscitar em sede de reconvenção não é admissível na ação especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento. Para alicerçar tal conclusão, alinha os seguintes argumentos: um argumento formal e de ordem sistemática – o artigo 98.º-L, n.º 3, do Código do Processo do Trabalho (adiante CPT) identifica taxativamente as situações em que o trabalhador pode deduzir reconvenção, incluindo por remissão para o n.º 2 do artigo 274.º (atual 266.º, n.º 2) do Código de Processo Civil (adiante CPC) e no n.º 5 do referido normativo do CPT o legislador determinou a aplicabilidade do n.º 6 do mesmo artigo 274.º (atual 266.º, n.º 6), omitindo qualquer referência aos n.ºs 4 e 5; daí retirando que a preocupação em consignar a remissão para os n.ºs 2 e 6 do artigo 266.º do CPC significa exclusão da aplicação nesta sede especial dos demais segmentos normativos do preceito e, bem assim, que «o legislador não quis, pois, na acção especial em análise, partes plurais, seja no início do processo (ou o formulário permitiria a sua identificação), seja por intervenção supervenientemente provocada pelo trabalhador; em termos de argumentos substantivos, aponta que a ação especial não se coadugna estruturalmente com a possibilidade de demandar eventuais responsáveis solidários por créditos laborais, uma vez que atenta a sua natureza urgente existe um objetivo claro de conseguir o seu rápido desfecho, o que apenas é alcançavel se a tramitação for simples e os incidentes reduzidos ao mínimo; refere que tal explica o facto de apenas se permitir o acesso à referida ação especial em situações de decisão de despedimento escrita. Claro está que, perante a referida posição no sentido da inadmissibilidade demanda dos responsáveis solidários, nem inicialmente, nem pela via do chamamento em reconvenção, na ação especial de impugnação, o Dr. Fraústo da Silva acaba por se questionar sobre qual o meio adequado para o trabalhador operar a demanda em causa. Nessa sede, equaciona as várias soluções, às quais vai apontando as inerentes dificuldades de exequibilidade, a saber: (i) recurso ulterior (após a condenação do empregador principal na ação especial) à ação de processo comum – questão do prazo prescricional; (ii) demanda em meio comum antes de finda a ação especial e de decorrido o prazo de prescrição – resolve o risco do prazo prescricional, mas obriga o trabalhador «igualmente a intentar duas ações separadas, contra duas ou mais entidades diferentes, para nelas ver discutidas, ao menos parcialmente, as mesmas questões, mobilizando testemunhas para uma e outra, e podendo suceder ou sendo até provável que suceda que na ação comum o tribunal opte por ordenar a suspensão da instância por considerar a acção especial prejudicial quanto à decisão da primeira (art. 279.º do Código de Processo Civil [atual artigo 272.º]), o que acarretará naturalmente as mesmas demoras excessivas que a primeira solução apresenta (a apensação das duas acções não é possível por força do artigo 275.º do Código de Processo do Trabalho [atual 267.º do Código de Processo Civil, sendo que a referência ao Código de Processo do Trabalho se deve a lapso material manifesto], já que se pressupõe, nesta configuração, a inadmissibilidade de litisconsórcio ou coligação passiva na acção especial de impugnação); (iii) o trabalhador recorrer ab initio, a uma ação comum contra empregador e eventuais responsáveis solidários e, nesta ação impugnar o despedimento e reclamar os créditos emergentes do seu contrato de trabalho – opção que refere ser delicada, atentas as consequências nefastas para o empregador (atenta a circunstância de não ver os salários de tramitação pelo atraso na decisão serem suportados pela Segurança Social e o processo não terá natureza urgente e representará um maior prejuízo em caso de condenação) e a significativa corrente jurisprudencial que sufraga o entendimento de que, quando estão preenchidos os respetivos pressupostos, o trabalhador é obrigado a recorrer à ação especial para impugnar o despedimento, sendo que «o recurso inopinado à ação comum sobretudo se intentada depois dos 60 dias contados da data do despedimento, poderia envolver riscos que nenhum trabalhador que se sinta irregular ou ilícitamente despedido quererá certamente correr»; (iv) por último, aponta um último caminho, que considera ser mais ajuizado, mas reconhece ser prejudicado se o trabalhador não constituir advogado antes da audiência de partes (como permite o artigo 98.º-B do CPT), que seria o de o trabalhador «dar início à acção impugnatória especial, identificando no formulário inicial o empregador de que procede a decisão escrita de despedimento e, na audiência de partes, quando apresentar a resposta (art. 98.º-I, n.º 2, do mesmo diploma) em que substancie a sua pretensão (n.º 3 do mesmo artigo) deve declarar desde logo que pretende, para além da impugnação do despedimento, efectivar a responsabilidade subsidiária de terceiros com um dos fundamentos do Código do Trabalho. Perante isso, e porque (ou na medida em que) considere a pluralidade de réus inadmissível na acção especial, deve então o juiz abster-se de conhecer do pedido, absolver da instância o empregador e informar o trabalhador do prazo para intentar a correspondente ação comum. Na sequência e ao abrigo deste despacho, o trabalhador (…) poderá intentar a acção comum contra todos os eventuais responsáveis, evitando ou, ao menos, minorando – mas sem segurança absoluta, já que esta decisão absolutória não é vinculativa para o outro tribunal a que a nova acção comum seja distribuída, sendo o caso – o risco de a acção vir a ser considerada extemporânea ou inadmissível por qualquer outra razão». Termina, reconhecendo que a solução proposta não é totalmente evidente e linear, advogando uma intervenção legislativa que clarifique a questão.
Em sentido divergente, admitindo na referida ação especial de impugnação a demanda ab initio dos responsáveis solidários para efeitos dos artigos 334.º e 335.º do Código do Trabalho e dos artigos 78.º, 79.º, 83.º e 481.º do Código das Sociedades Comerciais, na jurisprudência, veja-se o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 30-05-2012 (processo n.º 190/11.7TTFUN.L1-4, Relatora Maria João Romba). Neste Acórdão foi considerado que têm legitimidade passiva numa ação especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento, na qual são também pedidos outros créditos salariais vencidos há mais de três meses, as sociedades referenciadas pelo trabalhador como estando em relação de grupo com a empregadora, sendo demandadas como responsáveis solidárias, nos termos do artigo 334.º do Código de Trabalho. Mais foi entendido que também têm legitimidade passiva na mesma ação o sócio gerente da empregadora demandado como responsável solidário, nos termos do artigo 335.º do mesmo Código e 79.º, n.º 1, do Código das Sociedades Comerciais pelos danos diretamente causados no exercício de tais funções, mormente os danos emergentes do despedimento que o trabalhador reputava de ilícito e abusivo.
Por sua vez, e no sentido da admissibilidade da demanda ab initio de todas as entidades empregadoras numa situação de invocação de contrato de trabalho com uma pluralidade de empregadores, no quadro da ação de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento e, bem assim, de não se verificar erro na forma de processo, veja-se a decisão singular do Tribunal da Relação de Lisboa de 1-09-2016 (processo n.º 3584/15.5T8CSC.L1.4, Relator José Eduardo Sapateiro). Do respetivo sumário consta o seguinte: «I- Numa situação em que o trabalhador vem impugnar a licitude do despedimento por extinção do posto de trabalho que provocou a cessação do contrato de trabalho que o mesmo entende ter sido celebrado com uma pluralidade de empregadores, a ação de impunação judicial da regularidade licitude do despedimento prevista no número 2 do artigo 387.º do C.T./2009 e regulada nos artigos 98.º-B e seguintes do C.P.T. deve ser instaurada contra todas as entidades empregadoras (formais e materiais) da referida pluralidade. II- Num cenário como o descrito, de demanda de todas as entidades empregadoras, no quadro da ação de impugnação judicial da regularidade licitude do despedimento, não se verifica a nulidade principal de erro na forma de processo.». Argumenta-se nessa decisão que, «em casos de pluralidade de empregadores, em que estamos em presença de um único vínculo laboral, em que em um dos lados é ocupado pelo trabalhador e o outro por diversas entidades singulares e/ou coletivas, provocar a cisão entre a ação especial de apreciação da validade e licitude do despedimento formal que está na base da sua propositura e uma outra que tenha por réus as outras alegadas entidades empregadoras e os reflexos jurídicos que o dito despedimento e os créditos laborais diversos eventualmente devidos ao trabalhador despedido terão eventualmente sobre elas não faz sentido e é gerador de potenciais conflitos e contradições entre decisões judiciais que, no final, podem deixar o demandante com uma mão cheia de nada e outra de coisa nenhuma, ainda que os tribunais tenham considerado ilegal a cessação do contrato de trabalho em causa (basta pensar que, e ambas as ações, se entendeu que os efeitos jurídicos do despedimento ilícito devem recair sobre as entidades empregadoras que não são parte em cada uma delas).».
Quando é alegada pelo trabalhador uma situação caraterizadora de um esquema societário grupal e, ao mesmo tempo, uma situação de pluriemprego, no âmbito da ação especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento, ainda no sentido da admissibilidade, mas agora do chamamento por intervenção principal provocada da sociedade relativamente à qual se invoca solidariedade nos créditos, assente naqueles factos, veja-se o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 15-09-2021 (processo n.º 526/18.0T8FNC-B.L1.4, Relatora Manuela Fialho). Neste aresto argumenta-se inexistir razão plausível «para impor ao Trabalhador o encargo de deduzir duas ações, ou seja, uma AIRLD contra a empregadora que o despediu e uma ação com processo comum contra as demais, pois tal obriga o trabalhador a intentar várias ações para fazer valer em toda a sua plenitude os direitos emergentes de um despedimento ilícito numa situação em que, no direito processual laboral vigente até 31 de dezembro de 2009 era inequívoca a admissibilidade da demanda de todos os empregadores envolvidos. Ademais, sendo certo que no Artº 98º L não se previne a remissão para o Artº 266º/4, também o é que não se mostra expressamente excluída a possibilidade de o aplicar. Apelar à celeridade da ação especial revela-se, em casos como o presente, um equívoco, tanto mais que a complexidade desta ação é, desde sempre, impeditiva da celeridade almejada. Além disso, as atuais formas de contratação laboral não se compadecem com a estrutura simplificada (e tradicional) de uma ação deste cariz, tudo se devendo fazer para evitar a rigidez formal de que foi revestida. Nessa medida, deve tudo fazer-se para adaptar a sequência processual às especificidades da causa em presença, tendo como escopo a obtenção da solução justa e adequada. ».
Ainda na jurisprudência, importa referir a posição que foi seguida no Acórdão do Tribunal desta Relação do Porto de 24-01-2018 (processo n.º 1158/17.5T8MTS-A.P1, Relatora Teresa Sá Lopes), citado pela Recorrente. Neste aresto, defendeu-se que, atenta a tramitação específica e natureza urgente, em tese geral, o sujeito passivo da ação especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento não pode ser distinto da pessoa jurídica que profere a respetiva decisão escrita, não sendo admissível a intervenção de terceiros a título principal. No entanto, considerou-se constituir exceção à regra geral enunciada, nomeadamente, a hipótese em que ocorram dúvidas fundadas ao trabalhador, face às vicissitudes ocorridas no âmbito do processo disciplinar, sobre quem foi a entidade patronal que o despediu. Em tal contexto, de acordo com o princípio da adequação formal enunciado no artigo 547.º do Código de Processo Civil, entendeu tal Acórdão, a título subsidiário, ser admissível a intervenção de terceiros. Sublinhe-se que a posição que fez vencimento em tal Acórdão não considerou que se verificasse qualquer erro na forma de processo, tendo mantido a decisão recorrida que havia decidido inexistir qualquer situação de erro na forma de processo e admitir o incidente de intervenção com apelo ao princípio da adequação formal previsto no artigo 547.º do Código de Processo Civil. Ou seja, o incidente de intervenção em causa foi admitido no âmbito da referida ação especial de impugnação da regularidade ou licitude do despedimento sem que tivesse ocorrido qualquer convolação para a ação comum.
Na doutrina, Diogo Ravara e Viriato Reis posicionam-se no sentido de que, na ação especial de impugnação, é admissível em situações de pluralidade de empregadores a demanda inicial ou em incidente de intervenção provocada de todos os empregadores, bem como é possível a demanda de empresas que mantenham com a empregadora uma relação de participações recíprocas, de domínio ou de grupo nos termos do artigo 334.º do Código do Trabalho e/ou dos sócios, gerentes, administradores ou diretores nos termos do artigo 335.º do mesmo Código [No seu estudo «A Ação Especial de Impugnação da Regularidade e da Licitude do Despedimento – Aspetos Práticos», in em Prontuário do Direito do Trabalho n.ºs 91/92, janeiro-abril/maio-agosto de 2012, Centro de Estudos Judiciários, Coimbra Editora, a páginas 212 a 215, estudo esse que depois atualizaram e reformularam sob a designação “A ação especial de impugnação da regularidade e da licitude do despedimento: questões práticas no contexto do novo código de processo civil” (atenta a entrada em vigor do Código de Processo Civil aprovado pela Lei nº 41/2013 de 26 de junho e tendo em conta a doutrina e a jurisprudência que sobre a matéria foram sendo publicadas), para a publicação no E-book do CEJ denominado «A AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DA REGULARIDADE ELICITUDE DO DESPEDIMENTO” abril de 2015, mais precisamente a páginas 68 a 71 (do qual foi retirado o excerto infra reproduzido)].
Defendem o seguinte:
“10. A pluralidade de réus
Como é sabido, a grande maioria dos contratos individuais de trabalho envolve apenas duas partes, a saber um trabalhador e um empregador. Contudo, nem sempre assim sucede. Na verdade, para além de a lei laboral consagrar expressamente a possibilidade de o trabalhador outorgar contrato de trabalho com uma pluralidade de empregadores, seja no preceito que consagra a definição legal de contrato de trabalho (art. 11º do CT2009), seja em previsão específica sobre tal matéria (art. 101º do mesmo código), e de a doutrina apontar a possibilidade de elaboração de um conceito de pluralidade atípica de empregadores[98], em que a posição jurídica de empregador poderá ser atribuída a várias entidades em simultâneo, outras situações expressamente previstas na lei conduzem à possibilidade de terceiros serem chamados a responder pelo cumprimento de obrigações do empregador, e em situações de solidariedade: é o caso das empresas que mantenham com a empresa empregadora relações de participações recíprocas, domínio, ou grupo, nos termos previstos no art. 481º do Código das Sociedades Comerciais (art. 334º do CT2009); e do sócio, gerente, administrador ou diretor quando se verifiquem os pressupostos previstos nos arts. 335º do CT2009 e 78º, 79º e 83º do Código das Sociedades Comerciais.
Relativamente à primeira situação enunciada, imagine-se a situação de um trabalhador que presta trabalho simultaneamente para várias sociedades comerciais, em circunstâncias que inequivocamente configuram uma situação de pluralidade de empregadores. A dado momento uma das sociedades move àquele trabalhador um procedimento disciplinar que culmina no despedimento com invocação de justa causa. O trabalhador considera que todas as empresas, que reputa serem suas empregadoras, devem ser responsabilizados pelo seu despedimento, que considera ilícito, e move contra todas elas uma AIRLD.
Para tanto argumenta que todas as rés têm o mesmo gerente, e que as empregadoras que não o despediram “aderiram” ao despedimento, visto que, após tal despedimento, nenhuma dessas empresas lhe voltou a dar trabalho.
Perante esta situação fáctica, a prática dos tribunais revelou já dois tipos de situações:
Num primeiro grupo de casos, o trabalhador intentou a ação contra todas as empresas empregadoras, identificando todas elas no formulário, e invocando sucintamente a situação de pluralidade de empregadores;
Noutro grupo de casos, o trabalhador intentou a ação apenas contra uma das empresas empregadoras e mais tarde, na contestação/reconvenção, deduziu incidente de intervenção principal, a fim de “chamar” ao processo as demais empregadoras.
Estes grupos de casos suscitam os seguintes problemas:
A primeira situação típica descrita debate-se com a rigidez do requerimento/formulário inicial, claramente pensado para situações em que a posição jurídica de empregador é exercida por uma só pessoa ou entidade;
A segunda situação típica propicia a dedução de exceções de caducidade por parte dos empregadores que não despediram, o que poderá suceder sempre que entre o despedimento e a data em que tais terceiros são citados para o processo decorram mais de 60 dias.
Pensamos, porém, que ambos os obstáculos podem ser facilmente transpostos.
Com efeito, não descortinamos na letra ou no espírito dos arts. 98º-B e 98º-C qualquer elemento que nos leve a concluir pela impossibilidade de o trabalhador intentar a ação especial contra todos aqueles que considera seus empregadores, nos termos referidos no primeiro grupo de casos acima descrito.
Por outro lado, afigura-se que no segundo grupo de situações a caducidade não se “decompõe” consoante os réus. Na verdade, em tais situações a ação foi tempestivamente intentada, e só não foi inicialmente intentada contra todos os réus porque nem todos subscreveram a decisão de despedimento.
Isto, obviamente, sem prejuízo de os réus que não foram inicialmente demandados poderem invocar a prescrição dos créditos decorrentes do contrato de trabalho e da sua violação ou cessação, nos termos gerais (art.º 337º nº 1 do CT).
Por outro lado, sempre que a final se reconheça a existência de uma situação de pluralidade de empregadores, mas porventura se conclua pela impossibilidade de responsabilizar todos eles pelas consequências do despedimento enquanto ato ilícito e culposo, sempre se terá de concluir pela responsabilidade solidária quanto ao pagamento das retribuições de tramitação, aos créditos emergentes da cessação do contrato de trabalho independentemente da causa desta [99], e outros créditos que porventura o trabalhador peticione (isto porque em todas as situações se verifica que após o despedimento nenhuma das empregadoras voltou a dar trabalho ao trabalhador).
Finalmente, afigura-se de todo em todo indesejável e desproporcional que, perante situações como as descritas, se imponha ao trabalhador o encargo de deduzir duas ações, ou seja, uma AIRLD contra a empregadora que o despediu e uma ação com processo comum contra as demais. Esta tese que sustentamos está longe de poder ser reputada de pacífica. Na verdade, muito recentemente, FILIPE FRAÚSTO DA SILVA100 defendeu a inadmissibilidade da dedução, pelo trabalhador, de incidente de intervenção principal, numa situação em tudo idêntica ao segundo grupo de casos que acima identificámos. Aliás, tal tese foi sustentada com êxito no âmbito de um processo concreto, motivando o indeferimento do incidente de intervenção principal deduzido pelo autor.
Salvo o devido respeito por tal posição, a solução que a mesma propugna não nos satisfaz, na medida em que obriga o trabalhador a intentar várias ações para fazer valer em toda a sua plenitude os direitos emergentes de um despedimento ilícito numa situação em que, no direito processual laboral vigente até 31 de dezembro de 2009 era inequívoca a admissibilidade da demanda de todos os empregadores envolvidos.
Quanto à possibilidade da demanda de empresas que mantenham com a empregadora uma relação de participações recíprocas, de domínio ou de grupo, nos termos previstos no art. 334º do CT2009 e/ou dos sócios, gerentes, administradores ou diretores, nos termos previstos no art. 335º do mesmo código já se pronunciou o Tribunal da Relação de Lisboa, em acórdão de 30-05-2012 [101]. No caso a que se reporta o referido aresto, o trabalhador intentou AIRLD contra oito sociedades comerciais e contra um empresário, sócio-gerente de quatro delas e administrador das outras quatro, sendo que a primeira demandada detinha uma participação maioritária nas demais sociedades rés. As rés que não detinham a posição de empregadora, e o réu empresário, invocaram a exceção de ilegitimidade passiva, sustentando não serem empregadoras do autor; porém o Tribunal considerou improcedente uma exceção de ilegitimidade passiva porquanto os arts. 334º e 335º do CT2009 consagram situações de responsabilidade solidária por créditos emergentes do contrato de trabalho, da sua violação ou cessação, entendendo o mesmo tribunal que tal como o autor configurou a relação material controvertida, todos os réus eram titulares de posições jurídicas a ela referentes.
Parece-nos pois que em todas as situações analisadas é de admitir a pluralidade de réus, seja em situações de litisconsórcio, seja em situações de coligação [102]. Não obstante, sempre se dirá que a diferente abordagem destes problemas resulta, a nosso ver de uma distinta filosofia face às dificuldades interpretativas que se colocam nos casos acima enunciados. Com efeito, é manifesto que tais dificuldades resultam da já mencionada rigidez da tramitação da AIRLD. Perante a mesma, o julgador pode seguir um de dois caminhos: encarar essa rigidez como um traço essencial desta forma processual, ou considerar que, em determinadas situações, a mesma deve ser ultrapassada, seja através de interpretações extensivas ou restritivas, seja com apelo direto ao princípio da adequação formal. Da nossa parte não temos dúvidas em seguir pelo último caminho.».
Por seu turno, Joana Vasconcelos [in Comentário aos artigos 98.º-B a 98.º -P do Código de Processo do Trabalho, Processo especial para impugnação da regularidade e licitude do despedimento, 2ª edição revista e atualizada, Universidade Católica Portuguesa, Editora, págs. 30 a 34 e 136 a 138], considera admissível a pluralidade de réus no âmbito da ação especial de impugnação de despedimento, quer nas situações de pluralidade de empregadores [seja nas formalmente assumidas como tal em contrato de trabalho celebrado com vários empregadores, seja nas meramente de facto (porque resultante da prestação de atividade em tais termos, mas fora das situações previstas no n.º 1 do artigo 101.º do Código do Trabalho e/ou sem observância da forma e das menções obrigatórias estabelecidas no n.º 2 do mesmo preceito)], quer nas situações em que pelos créditos laborais que o trabalhador pretende efectivar contra o empregador respondam solidariamente outros sujeitos. No entanto, considera que a responsabilidade por créditos laborais de outros sujeitos que não o empregador que ao trabalhador se permite fazer valer através deste processo especial limita-se à decorrente da chamada solidariedade de garantia ou patrimonial («fundada num nexo entre o empregador e os sujeitos à qual a lei associam objetivamente – i.e., à margem de qualquer atuação ilícita ou culposa da sua parte -, a respetiva adstrição, esta solidariedade visa intensificar a garantia dos créditos laborais do trabalhador, aumentando a probabilidade de este obter a respetiva satisfação mediante o acesso a outros patrimonios além do daquele»). Nesta decorrência, defende que pode ser efetivada por meio desta ação especial a solidariedade das sociedades coligadas com a sociedade empregadora, prevista no artigo 334.º do Código do Trabalho, mas considera que já não têm cabimento nessa ação especial as duas hipóteses de solidariedade previstas nos n.ºs 1 e 2 do artigo 335.º do Código do Trabalho. Justifica este entendimento no facto de nestas últimas hipóteses não estar em causa uma solidariedade de garantia, relevando, antes, da responsabilidade civil verdadeira e própria, a que ficarão tais sujeitos adstritos caso o trabalhador logre provar os respetivos pressupostos (ilicitude, culpa, dano, nexo de causalidade), tal como moldados nos artigos 83.º, 78.º e 79.º do Código das Sociedades Comerciais. Argumenta que, em qualquer uma das sobreditas situações de pluralidade de réus que considera admissíveis na ação especial de impugnação, alarga-se o número de demandados, mas não o objeto da ação, o que se mostra plenamente compatível com os desígnios de simplificação e de celeridade que norteiam o processo especial em causa [a pluralidade de empregadores, implica a apreciação de um, e só um despedimento, que extingue o contrato de trabalho com vários empregadores (e não tantos despedimentos quantos estes); as referidas situações de solidariedade de garantia implicam também a apreciação de um, e um só pedido relativo a um crédito laboral do trabalhador sobre o empregador, que, se julgado procedente, determina a condenação, além deste, e nos mesmos temos em que este o seja, dos sujeitos sobre os quais a lei faz recair tal responsabilidade, de modo a intensificar a garantia do pagamento (e não de outros pedidos quanto a tais sujeitos)]. Quanto ao momento processual adequado a fazer intervir os referidos responsáveis solidários de garantia considera que deverá coincidir com aquele em que ao trabalhador é permitido deduzir contra o empregador a pretensão relativa ao pagamento dos créditos laborais em causa, ou seja, o seu articulado (conforme expressamente prescrito no n.º 3 do artigo 98.º-L do CPT). Nas situações de pluridade de empregadores entende que a ação deverá ser originariamente proposta contra todos os empregadores, com ajustamentos ao formulário que, perante os contornos do caso, se mostrem adequados – tendo como único limite a necessidade de utilizar o respetivo “modelo próprio”.
Joana Vasconcelos, sustenta que à solução defendida quanto à admissibilidade de pluralidade de réus, não obstam, quer a ausência, nas normas adjetivas que conformam a ação especial de impugnação, de qualquer regra que contemple tal eventualidade, quer a inevitável constatação de que a respetiva tramitação foi moldada tendo em vista a hipótese em que a mesma é proposta pelo trabalhador contra um só empregador. «(…) Tais dados, só por si, nada permitem inferir acerca da incompatibilidade dessa tramitação com a pluralidade de réus e, menos ainda, quanto a uma decisão do legislador de a excluir deste processo especial – que, a ter sido tomada, haveria de resultar evidente da sua regulação, em particular da norma que delimita o seu âmbito de aplicação (o artigo 98.º-C do CPT), o que de modo algum sucede.» (citação reportada à pág. 137, mas também reconduzível à argumentação constante a pág. 31 com contéudo idêntico). «Longe, pois, de exprimir um indemonstrado propósito de estabelecer uma limitação adicional ao âmbito de aplicação da ação prevista e regulada nos artigos 98.º-B segs., do CPT, o que o silêncio do legislador em matéria de pluralidade de réus, bem mais prosaicamente exprime é a sua decisão de se ater, na correspondente disciplina, ao id quod plerumque accidit, traçando um conjunto de regras concebidas para a situação típica, porque mais commummente verificada, de o litígio envolver um trabalhador e um empregador, e deixando em aberto – ou seja, remetendo para a jurisprudência e para a doutrina – a sua necessária adaptação às situações que, ao abrigo de regimes específicos de direito substantiva, venham a surgir (…)» (citação reportada às págs. 137 e 138, mas também reconduzível à argumentação constante a págs. 31 e 32 com igual contéudo).
Isto posto, relembre-se a situação dos autos.
No caso em apreciação está em causa uma situação em que o Autor (trabalhador) invoca na contestação-reconvenção que se verifica uma relação de pluriemprego entre si, a A..., SA- Portugal, Lda. (Ré) e a empresa C..., SL (em relação à qual deduz no referido articulado incidente de intervenção principal provocada), alegando ainda que tais sociedades fazem parte do mesmo grupo e a sociedade Ré é detida a 100% pela empresa chamada. Atente-se que todos os pedidos formulados pelo Autor o são contra ambas as sociedades (Ré e Chamada), quer os pedidos de reintegração e de retribuições intercalares, quer os pedidos atinentes a créditos emergentes do contrato de trabalho, da sua violação ou cessação. Ou seja, em causa está a invocação de uma situação de pluralidade de empregadores – de cujo mérito, nesta fase, não cabe (nem, aliás, se pode) cuidar - para efeitos do artigo 101.º do Código do Trabalho e cujo regime não se confunde com o previsto no artigo 334.º do mesmo Código, muito embora este último possa ter com o primeiro uma relação de subsidiariedade (para o caso da empresa do grupo não vir a ser reconhecida como empregadora plural do trabalhador). De facto, ainda que não venha a proceder a pretendida verificação de uma situação de pluralidade de empregadores, a alegação do Autor é ainda suscetível de ser reconduzida à previsão do artigo 334.º do Código do Trabalho no que respeita à responsabilização da chamada nos termos prescritos nesse normativo [que estabelece, sob a epígrafe “Responsabilidade solidária de sociedade em relação de participações recíprocas, de domínio ou de grupo”, «por crédito emergente de contrato de trabalho, ou da sua violação ou cessação, vencido há mais de três meses, respondem solidariamente o empregador e sociedade que com este se encontre em relação de participações recíprocas, de domínio ou de grupo, nos termos prescritos nos artigos 481.º e seguintes do Código das Sociedades Comerciais»].
A decisão recorrida considerou não se verificar qualquer erro na forma de processo e inexistir impedimento à dedução do incidente de intervenção principal provocada em causa, admitindo a intervenção nos presentes autos de ação especial da sociedade C..., SL, com sede em Espanha.
Sublinhe-se que, como bem dá conta a decisão recorrida, o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 272/2021 (datado de 5-05-2021, processo n.º 1161/2019, Relatora Joana Fernandes Costa), publicado in DR-I de 6-07-2021, declarou a inscontitucionalidade com força obrigatória geral «(…) da interpretação conjugada das normas contidas no artigo 334.º do Código do Trabalho e no artigo 481.º, n.º 2, proémio, do Código das Sociedades Comerciais, na parte em que impede a responsabilidade solidária da sociedade com sede fora de território nacional, em relação de participações recíprocas, de domínio ou de grupo com uma sociedade portuguesa, pelos créditos emergentes da relação de trabalho subordinado estabelecida com esta, ou da sua rutura, por violação do princípio da igualdade, consagrado no artigo 13.º da Constituição.».
Importa, pois, decidir, se é admissível o incidente de intervenção principal provocada deduzido no âmbito da presente ação de impugnação da regularidade e licitude do despedimento, sendo que para tanto se mostra alegada pelo trabalhador uma situação caraterizadora de um esquema societário de grupo e, ao mesmo tempo, uma situação de pluriemprego.
Como decorre da controvérsia supra exposta, são inegáveis as dificuldades de análise e resolução da questão em referência.
O argumento suscitado no estudo da autoria do Dr. Filipe Fraústo da Silva no que respeita à omissão da referência no artigo 98.º-L, n.º 3, do CPT à aplicabilidade do artigo 274.º, n.º s 4 e 5 do CPC, atual artigo 266.º, n.ºs 4 e 5, não pode deixar de se considerar pertinente.
No entanto, e sempre ressalvando o devido respeito pela posição aí sufragada, entende-se que dessa omissão não pode concluir-se que o legislador não quis na ação especial de impugnação em referência partes plurais, seja no início do processo, seja por intervenção supervenientemente provocada pelo trabalhador.
Neste particular, alinha-se com a sobredita argumentação de Joana Vasconcelos quando refere que a decisão do legislador de excluir a pluralidade de réus nessa ação especial, a ter sido tomada, haveria de resultar evidente da sua regulação, em particular da norma que delimita o seu âmbito de aplicação (o artigo 98.º-C do CPT), o que de modo algum ocorre. E, bem assim, no sentido de que o silêncio do legislador em matéria de pluralidade de réus, traduzirá a sua decisão de se ater, na correspondente disciplina da ação prevista e regulada nos artigos 98.º-B e seguintes do CPT, àquilo que geralmente acontece, traçando um conjunto de regras concebidas para a situação típica, porque mais commummente verificada, de o litígio envolver um trabalhador e um empregador, e deixando em aberto – isto é, remetendo para a jurisprudência e a doutrina – a sua necessária adaptação às situações que, ao abrigo de regimes específicos de direito substantivo venham a surgir.
A verdade é que, se atentarmos nas posições acima enunciadas e particularmente na prática judiciária, verifica-se que esse tem sido o caminho seguido, sendo indiscutível que vêm sendo admitidas situações de pluralidade de réus, seja no início do processo, seja por intervenção supervenientemente provocada pelo trabalhador.
Nesta consonância, entende-se que a posição a tomar no sentido da admissibilidade ou inadmissibilidade de partes plurais na ação especial em referência, não o pode ser em tese geral, mas sempre por apelo e análise das situações concretas que se prefigurem a decidir, em face, como é evidente, dos regimes específicos de direito substantivo que estejam em causa.
Tendo em conta o antedito, concorda-se que não pode ser seguida uma visão absolutamente rígida da tramitação processual prevista para a ação especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento, havendo situações que exigem que se ultrapassem as dificuldades interpretativas, de molde a permitir a pluralidade de réus e concretamente a admissibilidade do incidente de intervenção principal provocada, se necessário com apelo direto à adequação formal prevista no artigo 547.º do CPC.
Dispõe este último normativo que “o juiz deve adotar a tramitação processual adequada às especificidades da causa e adaptar o conteúdo e a forma dos atos processuais ao fim que visam atingir, assegurando um processo equitativo”.
O dever de adequação tem por fundamento a necessidade de adotar a tramitação processual que melhor se ajusta à causa, tendo em conta os respetivos contornos específicos, visando em última instância alcançar o objetivo de assegurar um processo equitativo e que resolva definitivamente a situação.
Por outro lado, concorda-se com a linha argumentativa constante da citada decisão singular de 1-09-2016 do Tribunal da Relação de Lisboa, quando refere que a forma como está substantivamente prevista a ação especial em referência (artigo 387.º do Código do Trabalho) e depois regulada no Código de Processo do Trabalho (artigos 98.º -B e seguintes), não parece consentir «uma qualquer leitura minimalista ou redutora das questões que podem aí ser colocadas ao julgador e que se prendam, de forma direta ou indireta, ainda com o despedimento em discussão, assim como dos poderes do mesmo para apreciar e decidir de fundo tais questões, bastando-se, tão-somente, com a certeza ou, no mínimo, verosimilhança formal da existência de uma relação de trabalho entre as partes e de uma declaração escrita unilateral de despedimento por banda da entidade ou entidades empregadoras».
Atente-se que a figura da pluralidade de empregadores está expressamente reconhecida e regulada desde o Código do Trabalho de 2003 (artigos 92.º e 103.º, n.º 1, alínea f)), encontrando-se atualmente prevista no artigo 101.º do Código de Trabalho de 2009. A própria noção de contrato de trabalho prevista no artigo 11.º do Código do Trabalho fala, aliás, de prestação da atividade a outra ou outras pessoas.
Por outro lado, ainda, sublinhe-se que, pese embora a ação especial em questão vise, fundamentalmente, discutir da regularidade e licitude de um determinado despedimento, constitui facto incontornável que o artigo 98.º-L, n.º 3, do CPT alarga significativamente as fronteiras do conhecimento e julgamento dessa mesma ação.
Com efeito, na contestação, o trabalhador “pode deduzir reconvenção nos casos previstos no n.º 2 do artigo 266.º do Código de Processo Civil, bem como para peticionar créditos emergentes do contrato de trabalho, da sua violação ou da sua cessação, incluindo a indemnização prevista na alínea a) do artigo 389.º do Código do Trabalho, independentemente do valor da ação.”
Esta “reconvenção” tem, pois, um âmbito de aplicação significativamente mais amplo que o que resultaria do artigo 30.º do CPT, sendo certo que o n.º 1 desse artigo logo ressalva o singular regime do artigo 98.º-L, n.º 3, do mesmo Código.
Tal âmbito mais lato de dedução da “reconvenção” teve subjacente a finalidade de possibilitar ao trabalhador fazer valer neste processo especial, e sem ter que intentar outro para o efeito, todos os créditos laborais que detenha contra o empregador, qualquer que seja a sua causa.
Como tal, e ressalvando mais uma vez o devido respeito por distinta posição, não impressiona a argumentação que apela à natureza urgente do processo e ao desiderato da sua rápida resolução para concluir no sentido de que a ação especial não se coadugna estruturalmente e em absoluto com situações de pluralidade de réus, seja no início do processo, seja por intervenção supervenientemente provocada pelo trabalhador.
No caso dos autos, como se referiu, foi invocada uma situação que poderá ser reconduzível à situação de pluralidade de empregadores do artigo 101.º do Código de Trabalho e ainda que não venha a proceder a pretendida verificação dessa situação, a alegação do Autor é ainda suscetível de vir a ser reconduzida à previsão do artigo 334.º do Código do Trabalho no que respeita à responsabilização solidária da chamada nos termos prescritos nesse normativo.
A Recorrente instaurou o procedimento administrativo interno consubstanciador do despedimento por extinção do posto de trabalho do Autor, tendo emitido a final a correspondente decisão escrita da cessação da relação laboral, que, a concluir-se pela existência de uma situação de pluralidade de empregadores, terá produzido efeitos também relativamente à chamada, segundo a alegação do trabalhador e os pedidos formulados. Não se olvide também que a própria Recorrente no seu articulado motivador menciona a existência de um esquema societário grupal, referindo, para além do mais, que: por decisão do Grupo B... em que se encontra inserida, as funções comerciais desenvolvidas nas empresas do Grupo foram centralizadas em Espanha, no decurso do primeiro semestre de 2019, sendo que as atividades e iniciativas que eram até então desenhadas a partir da área comercial em Portugal, passaram a ser geridas pela equipa sediada em Espanha, acrescendo às actividades normais do responsável pela àrea Comercial em Espanha; seguindo as diretrizes do Grupo se viu forçada a uma reorganização da respetiva estrutura de recursos humanos, tendo-se mostrado necessário extinguir em Portugal o posto de trabalho do Autor – estas menções/alegações constam, aliás, do Anexo I – indicação dos motivos invocados para a extinção do posto de trabalho e que fazem parte da decisão de despedimento comunicada ao trabalhador.
Ora, na sequência da declaração formal de despedimento e do regime jurídico resultante do artigo 387.º do Código do Trabalho, impunha-se ao trabalhador, aqui Recorrido, como única via processual admitida, a propositura da presente ação de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento nos termos dos artigos 98.º-B e seguintes do CPT.
Daqui decorre que, tal como se entendeu na decisão recorrida, não se verifica o erro na forma de processo apontado pela Recorrente.
E, perante a sobredita alegação do Autor, inexistem dúvidas quanto à legitimidade processual da sociedade cuja intervenção requereu nos autos, seja sob o ponto de vista do instituto da pluralidade de empregadores para efeitos do artigo 101.º do Código do Trabalho, quer na perspetiva da responsabilização solidária nos termos e para os efeitos do artigo 334.º do mesmo diploma legal. A chamada é, pois, parte legítima (artigos 32.º, 33.º, 266.º, n.º 4, e 316.º, n.ºs 1 e 2, do CPC). Está em causa um caso de litisconsórcio, que é voluntário quanto à responsabilização solidária de garantia prevista no artigo 334.º do Código do Trabalho, mas que no que respeita à pluralidade de empregadores e quanto à impugnação do despedimento consubstanciará mesmo um litisconsórcio necessário. Isto porque nesta última situação estamos perante um contrato de trabalho único, sendo que a impugnação do despedimento envolve a apreciação do ato extintivo e, portanto, a subsistência da relação laboral, podendo culminar na condenação dos empregadores a reintegrar o trabalhador, o que constitui uma situação em que “pela própria natureza da relação jurídica submetida a juízo”, “a intervenção de todos os interessados” é “necessária para a decisão a obter produza o seu efeito útil normal” (artigo 33.º, n.º 2, do CPC).
Nos casos de alegação de pluralidade de empregadores - em que estamos em presença de um único vínculo laboral e um só despedimento – e/ou invocação de uma situação de solidariedade de garantia – em que estamos sempre dentro do mesmo pedido relacionado com o(s) crédito(s) laborais do trabalhador sobre o empregador que, se julgado procedente, implica a condenação dos sujeitos sobre os quais a lei faz recair tal responsabilidade -, considera-se que são inteiramente válidas as razões que vêm sendo apontadas pela doutrina e a jurisprudência acima citadas, às quais se adere, no sentido de admitir a pluralidade de réus no âmbito da própria ação especial da regularidade e licitude do despedimento, sem necessidade de convolar a ação especial para uma ação comum.
Nestas situações, se, por um lado, não tem qualquer sentido impor ao trabalhador o encargo de deduzir duas ações – uma ação especial e uma ação comum - por outro lado, não existem razões válidas para não permitir que a demanda de todos os réus se faça ainda no quadro da ação especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento.
De facto, se estamos perante um só despedimento assumido formalmente como tal e por escrito e se estamos ainda no quadro dos pedidos suscetíveis de serem formulados pelo trabalhador contra o empregador no âmbito da ação especial de impugnação de despedimento, não faz qualquer sentido negar ao trabalhador o recurso a essa ação especial, a que a lei atribui natureza urgente, sendo ainda certo que nas situações em referência a pluralidade de réus se mostra plenamente compatível com os desígnios de simplificação e de celeridade que norteiam o processo especial em causa.
Em conclusão, nos presentes autos, mais uma vez salvaguardando o devido respeito por posição divergente, entende-se que é de admitir no âmbito da própria ação especial da regularidade e licitude do despedimento a dedução do incidente de intervenção principal provocada, sem necessidade de convolar a ação especial para uma ação comum. Ou seja, a adequação formal que se torne necessária perante a admissão do incidente de intervenção principal provocada ocorrerá dentro da própria ação especial em obediência ao regime previsto no artigo 547.º do CPC, com o devido respeito pelo contraditório, como, aliás, ocorreu no presente caso conforme se alcança do relatório supra. Atente-se que a Recorrente teve oportunidade de se pronunciar no seu articulado de resposta sobre a invocada relação jurídica de pluriemprego e esquema societário grupal (matéria que contende com os pedidos formulados pelo trabalhador no respetivo articulado de contestação-reconvenção). Por sua vez, também decorre da análise do processo principal que, depois da admissão do incidente e citação da chamada, esta já interveio nos autos, constituindo Advogado e declarando fazer seus os articulados apresentados pela Ré.
Entende-se, pois, que a decisão recorrida não violou quaisquer normas, máxime não violou os artigos 98.º-I, n.º 3, do CPT, 576.º e 577.º do CPC.
Termos em que, resta concluir pela total improcedência do recurso e manutenção da decisão recorrida que julgou improcedente a exceção dilatória do erro na forma de processo e admitiu o incidente de intervenção nos presentes autos de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento.
As custas da apelação ficam a cargo da Recorrente (artigo 527.º do CPC).
*


IV – DECISÃO
Em face do exposto, acorda-se em julgar improcedente a apelação, mantendo-se a decisão recorrida.

Custas da apelação a cargo da Recorrente.

Notifique.


(texto processado e revisto pela relatora, assinado eletronicamente)



Porto, 4 de março de 2024
Germana Ferreira Lopes [Relatora]
Rita Romeira [1ª Adjunta]
Nelson Nunes Fernandes [2º Adjunto]