PROCESSO DE PROMOÇÃO E PROTEÇÃO
CONFIANÇA COM VISTA A FUTURA ADOÇÃO
Sumário

I - O processo judicial de promoção e proteção da criança e do jovem em risco é um processo de jurisdição voluntária, tal como decorre do artigo 100º da LPCJP.
E, enquanto tal, regem-se estes processos não por critérios de estrita legalidade, mas antes por juízos de equidade e oportunidade com vista à tutela dos interesses que visam salvaguardar (vide artigo 987º do CPC) – in casu o “interesse superior da criança e do jovem”, devendo a intervenção “atender prioritariamente aos interesses e direitos da criança e do jovem, nomeadamente à continuidade de relações de afeto de qualidade e significativas, sem prejuízo da consideração que for devida a outros interesses legítimos no âmbito da pluralidade dos interesses no caso concreto” [artigo 4º al. a) da LPCJP].
II - Nos termos do artigo 1978º nº 1 al. d) do C.C. e atendendo prioritariamente aos direitos e interesses da criança (vide nº 2 do mesmo artigo) pode o tribunal confiar a criança com vista a futura adoção quando não existam ou se encontrem seriamente comprometidos os vínculos afetivos próprios da filiação. E quando, cumulativamente os pais por ação ou omissão ponham em perigo grave a segurança, saúde, formação, educação e desenvolvimento da criança.
III - A inexistência ou sério comprometimento dos vínculos afetivos próprios da filiação é requisito autónomo da verificação objetiva dos circunstancialismos descritos nas diversas alíneas do nº 1 de que há de fazer-se prova e aferida em ambos os sentidos, ou seja, tanto dos progenitores para a criança, como desta para aqueles.

Texto Integral

Processo nº. 324/20.0T8SJM.P1
3ª Secção Cível

Relatora – M. Fátima Andrade
Adjunta – Ana Paula Amorim
Adjunto – José Eusébio Almeida


Tribunal de Origem do Recurso - Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro – Jz. de Família e Menores de ...
Apelante/AA




Sumário (artigo 663º nº 7 do CPC):
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Acordam no Tribunal da Relação do Porto

I- Relatório

A) Sob promoção do Ministério Público, foi instaurado a 13/06/2020 o presente processo de promoção e proteção a favor dos menores:

- BB, nascido a ../../2014 e

- CC, nascido a ../../2015.

Como fundamento para a indicada necessidade de acompanhamento da situação dos menores através da aplicação de uma medida de proteção e consequente pedido de abertura de instrução nos termos dos artigos 100º e segs. da Lei 147/99 de 01/09 [Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo (LPCJP)] foi pelo MºPº alegado:

- as crianças foram acompanhadas pela CPCJP competente desde abril de 2017, no seguimento de acolhimento da progenitora e filhos no Lar ... em Ílhavo, por iniciativa desta, no seguimento de desentendimento com o pai das crianças;

- diagnosticada manifesta falta de higiene das crianças e desorganização na gestão dos recursos económicos do agregado familiar, foi aplicada a medida de promoção e proteção de Apoio Junto dos Pais, tendo os progenitores assinado em 25/07/2018 o respetivo acordo de promoção e proteção;

- em reunião de 22/02/2019, foi deliberado pela CPCJ prorrogar a medida aplicada por mais seis meses, porquanto e não obstante o acompanhamento por parte dos técnicos da CPCJ de Oliveira de Azeméis (atenta a residência do agregado familiar), os progenitores não haviam conseguido suprir as lacunas existentes ao nível da prestação dos cuidados básicos de higiene e alimentação das crianças (tendo as crianças contraído sarna);

- em setembro de 2019, verificou-se não existir melhoria significativa nas dinâmicas familiares e na organização do quotidiano, acentuaram-se as dificuldades dos progenitores em gerir as despesas familiares e as dificuldades na aquisição e manutenção de competência que assegurem a prestação dos cuidados básicos de higiene e alimentação das crianças, com repercussões na integração social e na aquisição de conhecimento por parte das mesmas, de modo mais significativo, no BB;

- pelo que a medida a medida de promoção e proteção Apoio Junto dos Pais foi revista e prorrogada por mais três meses, com mudança do técnico gestor do caso;

- em 13/12/2019 a CPCJ efetua nova avaliação da situação das crianças, apurando-se:

- os progenitores tinham em atraso as mensalidades da escola das crianças e da renda da casa, ficaram sem fornecimento de água e eletricidade em casa e as crianças deixaram de frequentar o estabelecimento de ensino;

- o progenitor procedeu ao pagamento da quantia de € 150,00 para que as crianças regressassem à escola, mas quando tal sucedeu, as crianças apresentavam claro retrocesso a nível comportamental, de aprendizagem e, mais uma vez, falta de higiene.

- a progenitora deixou de colaborar com os técnicos que a acompanhavam no sentido da melhoria das suas competências parentais, designadamente, a nível da organização e higiene da casa e da confeção de refeições.

- os progenitores apresentam mau relacionamento entre si, assumem manter outros relacionamentos, circunstâncias que se repercutem na estabilidade emocional das crianças.

Face ao que a CPCJ deliberou em 17/01/2020, aplicar à criança BB a medida de Apoio Junto de Outro Familiar, na pessoa dos avós paternos, pelo que, em 21.01.2020 foi assinado o respetivo acordo de promoção e proteção pelos pais e pelos avós paternos da criança;

- em 03/06/2020, a progenitora comunicou à CPCJ de Oliveira de Azeméis a retirada do consentimento para a respetiva intervenção em sede de promoção e proteção relativamente a ambas as crianças, o que determinou a remessa dos autos ao Ministério Público para requerer intervenção em sede judicial, nos termos do disposto no artigo 11.º, n.º 1, al. c) e 73.º n.º 1, al. b), da LPPCJ.

- Em face do exposto “analisada a concreta situação da situação das crianças, a idade das mesmas, e bem assim, a incerteza quanto às condições de cada um dos progenitores para assumirem os cuidados do BB e do CC, entendemos existir necessidade de intervenção por forma a garantir que as crianças beneficiem de estabilidade psicológica e da prestação dos cuidados básicos de higiene, alimentação, saúde, segurança e bem-estar, solicitando-se ao ISS, IP a avaliação da diagnóstica das crianças e do agregado familiar em que se encontram, equacionando a necessidade e possibilidade de ambas as crianças ser acolhidas em instituição, juntamente com a progenitora.”

Pelo que, a fim de “remover a situação de perigo para a integridade psicológica e física das crianças, face à instabilidade emocional dos progenitores e à exposição das mesmas a ambientes instáveis e confusos e à consequente falta de prestação dos adequados cuidados básicos de que as crianças careçam.”

Requereu o MºPº a abertura de instrução, com cumprimento do disposto nos artigos 107º e segs. da LPCJP.

B) Após solicitado o habitual relatório social, foi agendada conferência, com a presença dos avós paternos.

Tendo previamente à sua realização sido junto Relatório Social de Avaliação Diagnóstica datado de 12/11/2020, bem como informação intercalar pela SS / ATT datada de 26/11/2020, a qual motivou decisão de 27/11/2020, cujo teor aqui se reproduz:

“Pelos motivos e fundamentos constantes da douta antecedente Promoção, estribados no Relatório Social de Avaliação Diagnóstica junto aos autos de 12/11/2020, refª…830, e antecedente Informação Social Intercalar, cujos teores, para os quais se remete, e que por razões de brevidade se dão aqui por integralmente reproduzidos, porque as crianças CC e BB se encontram em situação de perigo atual para a sua saúde, bem estar, são desenvolvimento e segurança, designadamente, em termos da prestação de cuidados básicos de higiene, alimentação e são desenvolvimento, tal como proposto e promovido, aplico-lhes, de imediato, a título provisório e cautelar, a medida de promoção e proteção de acolhimento residencial, para já de “curta duração”, pelo prazo de 6 (seis) meses, eventualmente prorrogável, com revisão trimestral, devendo o ISS de Aveiro providenciar pelo seu acolhimento em instituição adequada, o que ora se determina ao abrigo do disposto nos artºs 35º, nº 1, al. f), 37º, nºs 1 e 3, 49º, 50º, nºs 1 e 2, al. a), 51º, nºs 4 e 5, 91º e 92º, nº 1, todos da L.P.C.J.P., em anexo à Lei nº 147/99, de 01/09.”

C) Em 02/12/2020 foi obtido acordo para aplicação “às crianças BB e CC da medida de promoção e proteção de " Acolhimento residencial", prevista nos artºs. 35º, nº 1, al. f) e 50º, nºs. 1, 2 e 3, todos do LPCJP, em anexo à Lei nº 147/99, de 1/09, ficando os mesmos acolhidos no CAR - Santa Casa da Misericórdia ..., onde já se encontram.

A presente medida terá a duração de seis meses, eventualmente prorrogável, com revisão semestral, sendo a situação das crianças acompanhadas pelo ISS de Aveiro mediante relatório a elaborar e a enviar ao processo com vista àquela revisão.”

Acordo homologado na mesma data, nos seguintes termos:

“Considerando o interesse das crianças e o seu contexto familiar, o acordo na aplicação da medida de promoção e proteção de acolhimento residencial, e a não oposição do Ministério Público, homologo tal acordo, nos termos do art.º 113º, nº 2 da LPCJP, em anexo à Lei 147/99 de 1 de setembro, aplicando às crianças BB e CC, a medida de promoção e proteção de "acolhimento residencial", continuando as crianças acolhidas no CAR - Santa Casa da Misericórdia ..., condenando os progenitores a cumpri-lo nos seus precisos termos, o qual será revisto semestralmente.

Notifique e comunique ao ISS de Aveiro, com cópia desta ata, solicitando o acompanhamento da situação”

D) Em 14/06/2021 foi junto Relatório de Acolhimento Residencial relativo aos menores BB e CC.

E) Por decisão de 29/07/2021, pelos motivos nela expostos, que em parte aqui se reproduz:

“No caso sub judice, atento o teor do relatório social que antecede, que aqui se dá por integralmente reproduzido, verificam-se os pressupostos de facto e de direito que determinaram a aplicação da medida de promoção e proteção de “acolhimento residencial”.

No relatório social da SS que antecede, resulta que a família nuclear continua a não representar alternativa adequada ao desenvolvimento dos menores, não demonstrando os pais capacidade de juízo crítico relativamente à ausência de relação afetiva próxima dos filhos com os mesmos, apresentando limitações pessoais e parentais; por outro lado, os menores sentem-se seguros e protegidos no contexto residencial e estão bem integrados nos contextos escolares que passaram a frequentar desde a concretização da medida de colocação residencial.

Assim sendo, atento o teor do relatório social, e uma vez que não houve qualquer alteração dos pressupostos de facto e de direito que motivaram a aplicação aos menores BB e CC da medida de promoção e proteção de “acolhimento residencial”, foi decidido manter-se, de acordo com a regra contida no artº 62º, nº 3, al. c), da citada Lei a medida de promoção e proteção de “acolhimento residencial” por mais seis meses.

F) Em 03/08/2021 foi junto Relatório de Perícia Médico Legal – Psicologia – relativo à progenitora AA datado de 27/07/2021; e em 25/03/2022 foi junto o relatório de Avaliação Psicológica relativo ao progenitor DD.

Do relatório relativo à progenitora consta nas conclusões (entre o  mais)

“Da entrevista efetuada, da avaliação instrumental, da informação recolhida na entrevista e da análise de fatores risco/fatores de proteção, somos de parecer que a examinanda apresenta atualmente dificuldades no desempenho das tarefas inerentes ao papel parental.

Caso o tribunal venha a decidir pela entrega das crianças aos cuidados da mãe, necessitará esta de apoio, orientação e supervisão institucional de forma a desenvolver as competências que lhe permitam responder adequadamente às tarefas inerentes ao seu papel”.

G) Em 26/07/2022 foi junto Relatório de Acompanhamento da Execução da Medida, após o que em 02/08/2022 foi proferida decisão:

“no sentido da prorrogação, a título cautelar, da medida de promoção e proteção de acolhimento residencial, prevista no artigo 35º/1/f) da Lei n.º 147/99, de 1/09, cuja execução se processará nos precisos moldes definidos nos autos.

NESTES TERMOS:

· A título cautelar, enquanto se procede ao diagnóstico da situação e à definição do encaminhamento subsequente das crianças (decurso do prazo para efeitos do disposto no artigo 85º da Lei n.º 147/99, de 1/09), como permitido pelo artigo 37º/1 da Lei n.º 147/99, de 1/09), prorrogo, no seu superior interesse, a medida de promoção e proteção de acolhimento residencial, prevista no artigo 35º/1/f) do citado diploma legal.

· A execução desta medida cautelar processar-se-á nos precisos moldes definidos nos autos.

· Fixo à medida cautelar a duração de trinta dias, sem prejuízo da declaração prévia da sua cessação, caso a situação das crianças o permita e aconselhe.”

H) Em 22/06/2023 foram juntos novos relatórios – Relatório Social de Acompanhamento da Execução da Medida datado de 21/06/23 e Relatório de Acolhimento Residencial de 09/09/2022.

Dos mesmos tendo sido notificados os progenitores nos termos do artigo 85º da LPCJP (pessoalmente).

I) Ordenada a nomeação de patrono aos menores e a cada um dos pais, foi agendada audição aos pais (vide despacho de 07/07/23).

J) Na data agendada para a audição dos pais [cfr. ATA de 05/09/2023] e tendo sido nomeados patronos:

“Dra. EE, da criança CC, Dr. FF, da criança BB, Dra. GG, do progenitor, e Dra. HH, da progenitora.”[1]

Estiveram presentes:

“Todas as pessoas para o ato convocadas, faltando as Exmas. patronas da criança CC, do progenitor e da progenitora, todas devidamente notificadas.”

Nesta ata foram ouvidos:

“(...)os pais, pelos mesmos foi dito que não dão o seu consentimento para a adoção dos filhos CC e BB, entendendo o pai que reúne agora condições para os ter à sua guarda e cuidados, entendimento que a mãe também tem relativamente à sua pessoa.”

Bem como foi ouvida “(...) a Exmª. técnica do ISS coordenadora do caso, pela mesma foi dito que a situação socioeconómica e habitacional dos pais está já reproduzida e demonstrada nos relatórios e informações constantes dos autos, sendo que o divórcio dos avós paternos e a saída do avô paterno da casa onde atualmente reside o pai juntamente com a sua companheira, a qual padece de epilepsia tal como aqui referido pelo progenitor e a avó paterna, a qual foi condenada juntamente com o avô pelo crime de maus tratos na pessoa das crianças, não é de molde a sustentar como projeto de vida destas crianças o seu regresso ao seio familiar natural, reiterando assim o seu parecer já expresso que o melhor projeto de vida para estas crianças passará pelo seu encaminhamento para adoção, circunstância que sai reforçada pela inexistência de vinculação segura entre as crianças e os progenitores e a avó, não obstante as visitas que vem sendo realizadas em ambiente institucional.”

Foi ainda decidido agendar data para audição aos menores.

K) Os Exmos. Patronos nomeados e faltosos foram notificados do teor das declarações com cópia da ata (notificação de 06/09/2023).

Com data e hora de 11/09/23 20.28 – mas no histórico eletrónico dos autos com data de entrada a 12/09 - a Exma. Patrona nomeada à progenitora enviou aos autos atestado médico, datado de 11/09/23, comunicando a sua incapacidade para a sua atividade profissional pelo período de 5 dias. Assim requerendo justificação para a sua ausência na diligência marcada para 12/09/23.

L) Na data agendada – 12/09/23 - estando presentes: “as crianças acompanhadas da psicóloga do CAT, Dra. II, os distintos patronos das crianças e a Exmª. técnica do ISS”, cujas declarações ficaram gravadas, foi determinado o cumprimento do disposto no artigo 114º nº 1 da LPCJP. Do que ficaram notificados os presentes.

M) Foram ainda notificados, em 13/09/2023, para alegar nos termos do artigo 114º e no prazo de 10 dias, os Exmos. Patronos dos progenitores.

N) Apresentaram alegações o MºPº e os Exmos. Patronos nomeados aos menores BB e CC.

O) Agendado Debate Judicial a realizar em Tribunal Coletivo Misto, com a participação de dois juízes sociais para 23/09/2023 – após reagendado 05/12/23 - foram notificados para estar presentes o Ministério Público, os pais, os respetivos patronos destes e das crianças, bem como as testemunhas elencadas pelo Ministério Público nas suas alegações.

P) No dia agendado – 05/12/2023 -  estando presentes:

“Todos os convocados para o ato, com a exceção da Ilustre Patrona Dra. HH, devidamente notificada (após várias tentativas de contacto telefónico com a Ilustre Advogada para os números ...16 e ...62, não se mostrou possível tal contacto, tendo sido comunicado de imediato ao Mmº. Juiz).”

Foi determinado:

“Atenta a falta da ilustre Patrona da progenitora Dra. HH, a qual não comunicou aos autos que não iria estar presente, pelo Mm.º Juiz de Direito, quando eram cerca de 10h20, foi ordenada a nomeação de novo Patrono à aludida progenitora (art.º 330.º, 1, do CPP), tendo sido efetuado de imediato através da Delegação da Ordem dos Advogados de Lisboa, sendo nomeada a Dra. JJ, a qual se prontificou a deslocar para este Tribunal.


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Quando eram 10 horas e 56 minutos (e não antes em virtude das diligências efetuadas para nomeação da Patrona, aguardando-se a presença da mesma, e consulta da PI e Alegações do Debate Judicial do Ministério Público e conversação com a progenitora), pela ilustre Patrona nomeada foi pedido ao Mmº Juiz de Direito a concessão do prazo de 10 dias para preparar o debate, o que o Mmº Juiz indeferiu, considerando que o debate judicial é inadiável.

De seguida, pelo Mm. º Juiz de Direito foi explicado à mãe o motivo para a substituição da sua primitiva advogada, através de nova nomeação oficiosa.


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Após e observadas as formalidades legais, pelo Mmº Juiz foi aberto debate e passou-se à produção da prova com a tomada de declarações aos progenitores e inquirição das testemunhas (...)”

A final, foi dada a palavra para alegações aos ilustre patronos e MºPº.

Tendo a ilustre patrona da progenitora requerido:

“(...) Requer a concessão de um prazo de 10 dias para apresentar as suas alegações por escrito, munidas de todas as informações necessárias para o efeito nos termos do disposto nº. art. 114, nº. 3 da Lei de Proteção de Crianças e Jovens em risco.”

O que foi indeferido nos seguintes termos:

“Indefere-se o ora requerido pela Distinta Patrona da mãe, na medida em que a Distinta anterior Patrona foi notificada para alegações, todos os prazos foram devidamente cumpridos, incluindo os próprios pais foram notificados de toda a documentação junta aos autos, razão pela qual e sendo o Debate Judicial inadiável, por falta da advogado Patrono nomeado teve de se proceder como se procedeu, devendo conceder-se apenas o tempo estritamente indispensável para a Distinta Patrona ter tomado conhecimento das alegações do Ministério Público, como teve a oportunidade no inicio da audiência.

Pelo exposto, indefere-se o douto requerimento.”

Q) Foi proferido Acórdão - lido por súmula na data agendada para o efeito, 14/12/23 - decidindo:

“Nestes termos e sem mais, ao abrigo das disposições conjugadas dos artºs 3º, nºs 1 e 2, al. a), c) e), 4º, al. a), e), e g), 34º, 35º, nº 1, al. g), 38º-A, al. b), 62º, nºs 1 e 3, al. b), todos da Lei de Promoção e Proteção de Crianças e Jovens em Perigo, 1974º e 1978º, ambos do C. Civil, e 36º, nº 6 da C. R. Portuguesa, em sede de revisão da medida, acordam os Juízes que compõem este Tribunal Coletivo Misto, em decidir:

A) - confiar as crianças BB e CC, ao ISS de Aveiro, com vista à sua futura adoção.


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B) -Nos termos do disposto no art.º 1978º-A do C. Civil, ficam os pais desde já inibidos de exercer as responsabilidades parentais relativamente a estes filhos.

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C) – Também não mais haverá visitas às crianças por parte dos pais e demais família natural, sejam eles quem forem – art.º 62º-A, nº 6 da L.P.C.J.P.

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D) – Nos termos do disposto no art.º 62º-A nºs 3 e 5 da LPCJP nomeia-se como Curador Provisório às crianças a Exmª Sr.ª Diretora do CAT – Centro de Acolhimento Temporário “...”, da Santa Casa da Misericórdia ..., ou a pessoa pela mesma indicada que tenha um contacto mais direto com aquelas.”

R) Na pendência dos autos e nomeadamente após a decisão de acolhimento residencial dos menores, a progenitora dirigiu ao tribunal requerimentos:

- em 17/12/2020, solicitando autorização para os filhos passarem consigo e seu companheiro o natal – dias 24 e 25 de dezembro. O que foi indeferido, atentos os pareceres técnicos desfavoráveis (decisão de 23/12/2020[2]);

- em 06/01/2021, solicitando a entrega dos filhos por não conseguir “ficar assim só a vê-los de semana a semana”, tendo uma casa e comer, mesmo sem estar a trabalhar – o que foi indeferido em 26/01/2021, atendendo ao informado pelo CAT em 21/01/2021 de que “até ao dia de hoje, a mãe fez quatro visitas aos meninos. As visitas da mãe são intercaladas com as visitas dos avós. O pai nunca os visitou. Nestas visitas com a mãe é observável o grande distanciamento afetivo e relacional existente entre eles. Os meninos não manifestam qualquer reação quando veem a mãe, nem quando se despedem. Falam muito pouco com ela. Não conversam espontaneamente, limitam-se a responder ao que a mãe lhes pergunta. O BB responde com palavras, o CC, fá-lo essencialmente por acenos de cabeça.”

- em 08/07/2022, solicitando a saída dos menores para fazer uma festa de aniversário ao BB, por este lho ter pedido. O que foi indeferido em 11/08/2022, atendendo ao informado pelo ISS e CAT, bem como às conclusões da perícia de avaliação psicológica da progenitora, por se afigurar que “inexistem condições atualmente para a mesma conviver com os menores em contexto exterior à instituição de acolhimento.”;

- em 08/08/2022 a pedir a guarda dos filhos, afirmando ter condições para tanto, tendo trabalho num restaurante.

Atento o pedido foi solicitada a elaboração de novo relatório.

Em 22/06/2023 é junto relatório pelo ISS/ATT, onde se reitera a não alteração da situação dos progenitores.

Bem como relatório do CAR onde é afirmado que “Ao longo dos quase dois anos de acolhimento, não foi observável qualquer comportamento dos pais que indiciasse capacidade para exercer as funções parentais. O desinvestimento afetivo e a passividade face ao acolhimento são tão notórios, que impede a equipa técnica de assumir a possibilidade de que o BB e o CC possam, alguma vez, voltar a viver com os pais, independentemente das suas condições habitacionais e profissionais que possam vir a ter.”

Face ao informado tendo prosseguido os autos com as vicissitudes processuais relatadas em H) a Q);

- em 30/06/23 a progenitora enviou ainda aos autos requerimento a contestar as conclusões do relatório, a pedir para passar um fim de semana com os menores e em 05/07/2023 a reiterar a oposição à adoção dos menores.


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Inconformada com a decisão proferida e mencionada em Q), dela interpôs recurso a progenitora AA, oferecendo alegações e formulando, a final, as seguintes

Conclusões:

“I- Da preterição de formalidade essencial que afeta a validade da decisão

1. Como ponto prévio, face à violação das normas legais ínsitas nos artigos 85.º, 103.º, 104.º e 114.º da LPCJP e bem assim, o disposto nos artigos 20.º, n.º 4 e 36.º, n.º 6 ambos da Constituição da República Portuguesa, teve lugar a preterição de uma formalidade essencial/nulidade relativa à defesa dos interesses da progenitora, que se argui, por inobservância do princípio do contraditório, que não foi assegurado em toda a sua extensão à aqui recorrente, prejudicando a defesa dos seus interesses e, por inerência, dos interesses dos seus filhos, devendo a mesma ser declarada quanto a toda a decisão a quo, o que se requer.

2. Conjugadas aquelas normas legais, à progenitora deveria ter sido assegurado patrocínio judiciário, de modo a poder preparar adequadamente a sua defesa, apresentando alegações e indicando os meios de prova reputados necessários, previamente ao debate judicial, mas por circunstâncias totalmente alheias à sua vontade, o seu patrocínio apenas foi assegurado no debate judicial.

3. O Acórdão n.º 193/2016 do Tribunal Constitucional (Diário da República n.º 86/2016, Série II de 2016-05-04 74344836) “julg[ou] inconstitucional a norma extraída do artigo 103.º, na sua redação originária, da Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo, aprovada pela Lei n.º 147/99, de 1 de Setembro, segundo a qual, em processo de promoção e proteção de crianças e jovens em que esteja em causa a aplicação de medida de confiança a pessoa selecionada para adoção ou a instituição com vista a futura adoção prevista no respetivo artigo 35.º, n.º 1, alínea g), com a redação dada pela Lei n.º 31/2003, de 22 de agosto, não é obrigatória a constituição de advogado aos progenitores das crianças ou jovens em causa a partir da designação do dia para o debate judicial a que se refere o artigo 114.º, n.º 3, do mesmo normativo, igualmente com a redação dada pela citada Lei n.º 31/2003”.

4. Não obstante o juízo de inconstitucionalidade constante do referido aresto jurisprudencial incidir sobre a norma extraída do artigo 103.º, na sua redação originária, da LPCJP, aprovada pela Lei n.º 147/99, de 1 de Setembro, tendo a mesma sido objeto de alteração pela Lei n.º 142/2015, de 08/09, aplicada ao caso vertente, importa, s.m.e., considerar que tal juízo postula a obrigatoriedade de constituição de advogado aos progenitores das crianças ou jovens em causa a partir da designação do dia para o debate judicial, o que não ocorreu efetivamente.

5. A norma do n.º 4 do artigo 114º da Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo, prevê que no debate judicial é obrigatória a constituição de advogado ou a nomeação de patrono aos pais quando esteja em causa a aplicação da medida prevista na alínea g) do n.º 1 do artigo 35.º e, em qualquer caso, à criança ou jovem, deve ser interpretada no sentido de que a constituição de mandatário e, na sua falta, a nomeação de patrono aos pais, é devida a partir da designação do dia para o debate judicial, e não apenas no próprio debate.

6. É crucial a assistência dos progenitores por advogado, não só no debate judicial, mas também na fase que antecede a sua realização, no sentido de se assegurar a efetiva participação dos pais no desenvolvimento do processo.

7. Para os progenitores, o processo que antecede a decisão representa a única via para defenderem o seu direito a conviverem com os seus filhos.

8. A nomeação oficiosa de patrono, a ser efetuada caso não seja constituído advogado, não pode, pois, perspetivar-se como meramente formal, deve, antes, traduzir-se numa efetiva nomeação,

9. De modo a assegurar que o patrocinado disponha da necessária assistência jurídica para, nos termos do artigo 114º da Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo, poder pronunciar-se sobre as alegações e prova oferecidas pelo Ministério Público, apresentar as suas alegações e oferecer provas, bem como preparar o debate judicial.

10. O não exercício do direito à defesa e ao contraditório na fase que precedeu o debate judicial afeta a validade da decisão final tomada no processo, correspondendo a um princípio geral com relevância substantiva.

11. No debate judicial podem ser apresentadas alegações escritas e é assegurado o contraditório, nos termos do disposto no artigo 114.º, n.º 2 da LPCJP.

12. O debate judicial inicia-se com a produção da prova e audição das pessoas presentes, ordenando o juiz as diligências necessárias para que compareçam os não presentes na data que designar para o seu prosseguimento (artigo 116.º, n.º 2 do supracitado diploma).

13. Para a formação da convicção do tribunal e para a fundamentação da decisão só podem ser consideradas as provas que puderem ter sido contraditadas durante o debate judicial (artigo 117.º da LPCJP).

14. Produzida a prova, o juiz concede a palavra ao Ministério Público e aos advogados para alegações, por trinta minutos cada um, nos termos do disposto no artigo 119.º da LPCJP. 15. Este regime evidencia não só a centralidade do debate judicial para efeitos do exercício do contraditório, como também algumas desvantagens significativas relativamente ao exercício de tal direito, para os interessados que não se encontrem representados por advogado.

16. Tais desvantagens agravam-se, e muito, no caso dos pais, quando esteja em causa – como sucede in casu – a aplicação da medida de promoção e proteção de confiança da criança ou jovem a pessoa selecionada para a adoção ou a instituição com vista a futura adoção, prevista no artigo 35.º, n.º 1, alínea g), da LPCJP.

17. A aplicação desta medida é da competência exclusiva dos tribunais (artigo 38.º, 2.ª parte) para as situações em que se verifique alguma das situações previstas no artigo 1978.º do Código Civil (confiança com vista a futura adoção).

18. Tal implica a inibição definitiva do exercício das responsabilidades parentais em relação à criança confiada e, consequentemente, a impossibilidade de conviver com ela e, inclusivamente, de a visitar ou de com ela estabelecer outros contactos.

19. Isto posto, compreende-se a necessidade da existência de cuidados adicionais, quanto ao contraditório, previstos quer na própria lei, quer na sua aplicação.

20. Assim, o legislador estatuiu a obrigação de o Ministério Público «alegar por escrito e apresentar provas sempre que considerar que a medida a aplicar é a prevista na alínea g) do n.º 1 do artigo 35.º» (artigo 114.º, n.º 2).

21. Na jurisprudência, tem sido salientada a diferença qualitativa da medida de promoção e proteção de confiança da criança ou jovem a pessoa selecionada para a adoção ou a instituição com vista a futura adoção face às demais, sendo que não está em causa a simples «limitação do poder paternal», mas antes a «privação quer do exercício, quer da titularidade» do mesmo poder.

22. Quando «num processo de promoção e proteção se altera qualquer medida para a de confiança a pessoa ou a instituição para futura adoção opera-se uma modificação objetiva da instância, o que obriga a um chamamento ao processo dos pais e familiares como se fosse o primeiro» (cfr. o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 19 de abril de 2005, Processo n.º 1021/05).

23. A extinção das responsabilidades parentais, mesmo que para tutela de um interesse fundamental que, em concreto deva prevalecer, não deixa de representar, também, sobretudo quando alicerçada numa alegada violação de deveres fundamentais associados às mesmas responsabilidades, a resolução de uma controvérsia, materialmente muito próxima da jurisdição contenciosa.

24. Estão em causa direitos fundamentais tanto dos pais como dos filhos, previsto no disposto no artigo 36.º, n.º 6, da Constituição, e bem assim, um importante dever estadual de proteção relativamente às crianças e jovens, nos termos do disposto no artigo 69.º, n.ºs 1 e 2 da mesma Lei Fundamental.

25. Tais disposições reclamam um exercício efetivo do contraditório, de modo a assegurar uma decisão imparcial porque informada, ponderada, fundamentada e, em última análise, ajustada a todos os interesses em causa e, como tal, justa.

26. O princípio da participação efetiva no desenvolvimento do processo, que é um corolário do princípio do contraditório, entendido em sentido material e amplo, exige a assistência do interessado, isto é, do titular da posição jurídica subjetiva fundamental ameaçada, por advogado.

27. Em suma, é crucial a assistência dos progenitores por advogado, não só no debate judicial, mas também na fase que antecede a realização deste, por forma a assegurar a participação efetiva e informada dos pais no desenvolvimento do processo.

28. No caso dos presentes autos, a nomeação da ora subscritora para o debate judicial, traduziu-se numa nomeação meramente formal e não numa efetiva nomeação,

29. Que permitisse assegurar que a patrocinada dispusesse da necessária assistência jurídica para, nos termos do artigo 114.º da Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo, se poder pronunciar sobre as alegações e prova oferecidas pelo Ministério Público, apresentar as suas alegações e oferecer provas,

30. Violando-se, inclusivamente, do disposto nos artigos 8.º, n.º 1 e 72.º, n.º 1 do E.O.A.

Sem prescindir,

II- Do Direito

31. Entende a ora Recorrente que não se verificam os pressupostos para que possa ser decretada a medida em causa, sendo que a decisão recorrida não demonstra que a mesma tenha revelado manifesto desinteresse pelos filhos, em termos de comprometer seriamente a qualidade e a continuidade dos vínculos afetivos próprios da filiação.

32. Não tendo havido uma avaliação/peritagem psicológica dos menores torna- se difícil apreciar questões como afetividade, vinculação e que tipo de vinculação existe entre a recorrente e os menores, pois tal é um juízo técnico apenas possível de realizar por uma pessoa especializada.

33. Pese embora as dificuldades da Recorrente, existe uma ligação psicológica significante que deve ser preservada.

34. A progenitora, ora recorrente, nunca quebrou o contacto com os menores, sendo assídua e pontual nas visitas, através da instituição, após a sua institucionalização.

35. A situação do agregado da Recorrente é minimamente estável (tendo atualmente um companheiro bem integrado socialmente, tido como pessoa séria, honesta e trabalhadora, com condições habitacionais), possuindo atualmente a progenitora condições de vida que possibilitam a integração dos menores junto de si.

36. Neste contexto, não se vê como se pode lançar os menores BB e CC, que têm uma progenitora que sabe que os tem, que os reconhece como tal, que demonstra querê-los e amá-los como tal, para a solução incerta da adoção.

37. A adoção é, pois, incerta porque a esmagadora maioria dos candidatos a adotantes pretende adotar crianças com menos de três anos de idade, tendo, neste momento, as crianças nove e oito anos, respetivamente.

38. Esta medida contém um elevado grau de abstração, dada a imprevisibilidade significativa da existência de candidatos com as condições e motivações adequadas para adotar determinada criança, atendendo às suas características pessoais, como a sua idade.

39. Além do mais, no caso, privilegiou-se a ligação entre os dois irmãos, partindo-se do princípio altamente incerto de adoção conjunta.

40. A adoção constitui uma medida irreversível e de última ratio.

41. A adoção só pode surgir depois de esgotadas as possibilidades de integração na família biológica e mesmo depois da tentativa de integração da família alargada.

42. No caso concreto, não se mostram esgotadas as possibilidades de integração na família biológica e/ou alargada.

43. Não há qualquer razão para que os menores não sejam reintegrados no seio da sua família biológica, mais concretamente junto da mãe, ora Recorrente.

44. A família natural, mau grado as suas carências – que poderão, assim, justificar o apoio da sociedade – constitui ainda o meio natural para o crescimento e o bem-estar de todos os seus membros e, em especial, as crianças – cf. art.º 36.º n.º 6 da CRP.

45. Há, assim, que apoiar as famílias disfuncionais, com apoios de natureza psicopedagógica, social ou económico, para que encontrem o seu equilíbrio.

46. Toda a intervenção deve regular-se pelo superior interesse da criança, consagrada no art.º 3.º n.º 1 da Convenção sobre os direitos da Criança e em nosso entender, é interesse destas crianças que a sociedade use de todos os meios ao seu alcance na recuperação desta família, cujas falhas não são inultrapassáveis se houver coerência nos métodos de ajuda.

47. Com uma intervenção ajustada ao caso concreto, poderão ser respeitados os princípios da responsabilidade parental e da prevalência da família.

48. No que concerne às competências parentais, atente-se para o Acórdão do TRE de 22.09.2016, nos termos do qual, “(…) compete ao Estado, através das suas técnicas trabalhar com os pais (…) prestando-lhes a ajuda necessária, para que estes assumam a sua função parental e afastem a situação de risco (…) e lhes proporcionem condições adequadas ao seu desenvolvimento normal e promover a sua segurança, saúde, educação e bem-estar. Devendo ser potenciados os aspetos positivos da família, suas competências e capacidades, por forma a incentivar a sua autoestima e uma imagem positiva”.

49. O vínculo sanguíneo, pelo seu cunho elementarmente natural, deverá ser procurado preservar, apenas devendo ser quebrado em situações-limite, particularmente graves e perigosas para a saúde e bem-estar das crianças.

50. Pelo exposto, não se pode afirmar, relativamente à progenitora dos menores BB e CC, que se encontram seriamente comprometidos os vínculos afetivos próprios da filiação, pelo que não há que os confiar a instituição com vista a adoção, por não se verificar o requisito a que alude o corpo do n.º 1, do art.º 1978º, do C.Civil e não terem sido respeitados os princípios da intervenção mínima, da proporcionalidade e da prevalência da família (cfr. os art.ºs 35.º, n.º 1, al. g) e 38º-A, da LPCJP e art.º 4.º da Lei nº 147/99, alterada pela Lei n.º 142/2015, de 08/09, na sua redação atual).

51. Por outro lado, a preterição da formalidade essencial/nulidade, designadamente a falta do patrocínio na fase que precedeu o debate judicial, sendo a nomeação ocorrida meramente formal, afeta a validade da decisão final tomada no processo. (negrito nosso)

52. A assim não se entender, o que só por mera hipótese académica se concede, antes se propugna pela aplicação da medida de apoio junto da mãe, a quem os menores devem ser entregues, eventualmente após um período de adaptação e de vigilância.

NESTES TERMOS E NOS MELHORES DE DIREITO e com o sempre Mui Douto Suprimento de V. Ex.ªs, Deve ser proferido douto acórdão que dê provimento ao presente recurso e, assim, revogue o acórdão recorrido, considerando-se procedente a preterição de formalidade essencial/nulidade invocada, o que afeta a validade da decisão, com as demais consequências legais e/ou a assim não se entender, em lugar da medida de confiança a instituição com vista a futura adoção, se determine a aplicação da medida de apoio junto da mãe, a quem aos menores devem ser entregues, eventualmente após um período de adaptação e de vigilância, com o que farão, como sempre, JUSTIÇA”


*

Foram apresentadas contra-alegações:

- Pelo MºPº, tendo em suma pugnado pela improcedência do recurso interposto pela progenitora, face ao bem decidido pelo tribunal a quo.

Defendendo ainda a improcedência da arguida nulidade.


*

O recurso foi admitido como de apelação, com subida nos próprios autos e efeito suspensivo.

Sobre a arguida nulidade, pronunciou-se o tribunal a quo no sentido da sua não verificação.


*

Foram dispensados os vistos legais.

***


II - Âmbito do recurso.

Delimitado como está o recurso pelas conclusões das alegações, sem prejuízo de e em relação às mesmas não estar o tribunal sujeito à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito, nem limitado ao conhecimento das questões de que cumpra oficiosamente conhecer – vide artigos 5º n.º 3, 608º n.º 2, 635º n.ºs 3 e 4 e 639º n.ºs 1 e 3 do CPC [Código de Processo Civil] – resulta das formuladas pela apelante serem questões a apreciar:

- se ocorre a arguida nulidade da decisão;

- se ocorre errada aplicação do direito em função da factualidade apurada [esta não questionada].


***

III- Fundamentação

O tribunal a quo julgou provados os seguintes factos:

“Instruída e discutida a causa, resultaram provados os seguintes factos com interesse para a boa decisão da mesma:

1 – As crianças BB e CC, nasceram, respetivamente a ../../2014 e ../../2015, e são filhos de DD e AA.

2 - Foram sinalizadas ao Sistema de promoção e proteção no mês de abril de 2017, aquando a verificação de grave desentendimento entre os seus progenitores, o qual implicou o acolhimento das crianças e da sua progenitora em instituição vocacionada para o acolhimento de mães com filhos. Contudo, pouco tempo depois do acolhimento acontece a reconciliação dos progenitores do CC e do BB e por conta da identificação de fatores de risco/perigo na situação pessoal e familiar das crianças, designadamente porque se encontravam com manifesta falta de higiene e havia uma desorganização na gestão dos recursos económicos do seu agregado familiar, foi definido, pela CPCJ de Santa Maria da Feira, a aplicação da medida de promoção e proteção de “Apoio junto dos pais” e acompanhamento da situação familiar, sendo que no final do primeiro semestre do ano civil de 2018 o agregado familiar passa a residir no concelho de Oliveira de Azeméis, tendo os Processos de Promoção e Proteção instaurados a favor dos irmãos CC e BB sido transferidos para a CPCJ de Oliveira de Azeméis, a qual mantém a medida de promoção e proteção de “Apoio junto dos pais” até janeiro do ano 2020.

3 - Na sequência da aplicação, por acordo, da medida de “apoio junto dos pais”, verificou-se que os progenitores do BB e do CC não conseguiram suprir as lacunas existentes ao nível da prestação dos cuidados básicos de higiene e alimentação das crianças, tendo até as crianças contraído sarna após a aplicação da medida.

4 - Tendo sido prorrogada aquela medida de “apoio junto dos pais”, constatou-se que não existia qualquer melhoria relevante nas dinâmicas familiares do agregado familiar das crianças e na organização do quotidiano, tendo-se até acentuado as dificuldades dos progenitores em gerir as despesas familiares, bem como as dificuldades na aquisição e manutenção de competências que assegurassem a prestação dos cuidados básicos de higiene e alimentação das crianças, com repercussões na integração social e na aquisição de conhecimento por parte das mesmas, de modo mais significativo, no BB.

5 - Ao fazer uma nova avaliação da situação em 13 de dezembro de 2019, a CPCJ de Oliveira de Azeméis apurou, então, que: os progenitores tinham em atraso as mensalidades da escola das crianças e da renda da casa (tendo o agregado familiar ficado sem fornecimento de água e eletricidade em casa e tendo as crianças BB e CC deixado de frequentar o estabelecimento de ensino); o progenitor havia procedido ao pagamento da quantia de € 150,00 para que as crianças regressassem à escola e que, quando tal sucedeu, estas apresentavam um claro retrocesso a nível comportamental, de aprendizagem e, novamente, falta de higiene; a progenitora deixou de colaborar com os técnicos que a acompanhavam no sentido da melhoria das suas competências parentais, nomeadamente, a nível da organização e higiene da casa e da coinfecção de refeições; os progenitores apresentavam mau relacionamento entre si e assumiam manter outros relacionamentos, circunstâncias que se repercutiam na estabilidade emocional das crianças.

6 - Por essa razão, atendendo à persistência dos fatores de risco/perigo e à não colaboração evidenciada pelos progenitores do CC e do BB na correção de fatores de risco/perigo, a CPCJ de Oliveira de Azeméis decidiu aplicar às crianças a medida de promoção e proteção de “apoio junto de outro familiar”, na pessoa dos avós paternos, KK e LL, tendo a aplicação sido feita por acordo de promoção e proteção assinado pelos pais e pelos avós paternos das crianças, no dia 21 de janeiro 2020.

7 - Imediatamente após o início do presente processo judicial, ainda na fase de instrução, verificou-se, porém, que os avós paternos das crianças não tinham tido uma evolução significativa a nível profissional, das dinâmicas familiares, na melhoria das condições habitacionais e da situação socioeconómica para garantir as condições essenciais para um crescimento físico e psicológico saudável dos seus netos.

8 - Sendo certo que veio mesmo a ser aplicada àqueles avós paternos, por despacho de 16/06/2021, uma suspensão provisória do processo por vinte meses no âmbito do processo- crime n.º 2474/20.4T9VFR, que corre termos na 2.ª Secção de Santa Maria da Feira do Departamento de Investigação e Ação Penal de Aveiro, por ali se ter concluído existirem indícios suficientes de que, designadamente, os avós paternos “motivados pela incapacidade em exercer de modo saudável as suas responsabilidades parentais e desprezo pelos netos, constantemente discutiam com as crianças, lhes desferiam palmadas, unhadas e sapatadas em várias partes dos seus corpos”, “não providenciavam por confecionar diariamente refeições para os menores, passando estes, por vezes, fome” e “não providenciavam pela higiene diária dos menores, estes não tomavam banho diariamente e envergavam a mesma roupa por vários dias, o que os fazia exalarem maus-cheiros”, e que a conduta dos avós paternos integrava a prática de dois crimes de dois “crimes de violência doméstica”, previstos e punidos pelo artigo 152.º n.ºs 1 alínea d) e n.º 2 a), 4 e 5 do Código Penal.

9 - Face à constatação da realidade supra mencionada em 7, por decisão datada de 27 de novembro de 2020 e entendendo-se que as crianças BB e CC se encontravam então numa situação de perigo para a sua saúde, bem-estar, são desenvolvimento e segurança, designadamente, em termos da prestação de cuidados básicos de higiene, alimentação e são desenvolvimento, foi aplicada nestes autos, em seu benefício, a título provisório e cautelar, a medida de promoção e proteção de “acolhimento residencial”, pelo prazo de seis meses, vindo as crianças a ser acolhidas no CAT – Centro de Acolhimento Temporário “...”, da Santa Casa da Misericórdia ....

10 - Tal medida tornou-se “definitiva” quando, por acordo, no dia 2 de dezembro de 2020, foi aplicada às crianças BB e ao CC a medida de promoção e proteção de “acolhimento residencial”, mantendo-se o seu acolhimento no CAT “...” da Santa Casa da Misericórdia ....

11 - Quando chegaram ao CAT “...” da Santa Casa da Misericórdia ..., onde se integraram com absoluta facilidade, as crianças exalavam forte odor a urina, apresentavam manchas vermelhas/arroxeadas no rabo, e fácies revelando profunda tristeza.

12 - O BB era uma criança com falta de estimulação e receio dos adultos, apresentava um ligeiro atraso de desenvolvimento e revelava timidez, vindo, porém, progressivamente, a melhorar as suas competências pessoais e sociais e a revelar-se mais comunicativo, sociável e brincalhão.

13 - Integrou-se muito bem na escola e, por causa das dificuldades de aprendizagem que revelou, com destaque para os seus défices de atenção e memória, foi sinalizado para ter medidas universais.

14 - O BB passou, também, a usufruir de sessões semanais de terapia da fala e terapia ocupacional e a ser acompanhado, a partir de junho de 2021, na especialidade de Pediatria do Desenvolvimento, para potenciar a sua capacidade de concentração.

15 - Com o passar do tempo, começou a falar espontaneamente e a interagir de forma saudável e descontraída com os adultos, tendo também uma boa relação com os seus pares, brincando com eles e manifestando a sua opinião, mesmo sendo contrária à dos outros.

16 – À semelhança do irmão, também à chegada à CAR “...” da Santa Casa da Misericórdia ..., o CC era uma criança pouco estimulada e tímida que, paulatinamente, foi melhorando as suas competências pessoais e sociais.

17 - Passou também a ser acompanhado na especialidade de Pediatria do Desenvolvimento, com sessões semanais de terapia da fala e terapia ocupacional.

18 - O BB e o CC sentem-se agora seguros e protegidos no contexto residencial e estão bem integrados nos contextos escolares que passaram a frequentar desde a concretização da medida acolhimento residencial.

19 - Ambos registaram uma melhoria dos resultados escolares e revelaram uma grande evolução no que diz respeito a competências pessoais e aquisições normativas.

20 - À data da entrada das crianças na CAR “...” da Santa Casa da Misericórdia ..., a progenitora do BB e do CC residia numa habitação arrendada sita na Vila ..., com um novo companheiro, do qual depende economicamente, pois nunca esteve inserida profissionalmente, apenas tendo trabalhado, pontualmente, ao todo, durante cerca de cinco meses.

21 – A mesma abandonou a frequência escolar antes de completar o 6º ano de escolaridade, é oriunda do distrito de Setúbal e tem história pessoal marcada por abandono parental precoce e integração prolongada em instituição (APPACDM de Setúbal).

22 - Conheceu o progenitor dos seus filhos BB e CC através da rede social Facebook e desde o assumir do relacionamento amoroso alterou morada para a região Norte, não obstante em períodos de rutura amorosa com o Sr. DD tenha regressado a Setúbal para junto de uma funcionária da instituição aonde cresceu, com quem tem estabelecida relação idêntica à filial.

23 - Aquando o contacto com a Dra. MM, do Serviço de Atendimento e Acompanhamento Social da Cruz Vermelha ..., a mesma esclareceu a Exmª Técnica do ISS Gestora do Processo de que a Sra. AA “apresenta limitações cognitivas” e que não obstante o apoio prestado pela equipa de apoio familiar daquela instituição enquanto o BB e o CC estavam aos cuidados da mãe/dos progenitores, a situação de risco/perigo era bastante significativa, ressaltando a falta de estabilidade familiar, de gestão económica do casal, de organização habitacional e a não salvaguarda da prestação dos cuidados básicos e necessidade desenvolvimentais para com os filhos.

24 -Efetivamente, no Relatório Psicológico do Serviço de Clínica e Patologia Forense do Gabinete Médico-Legal e Forense do Baixo Vouga, subscrito pela Dr.ª NN e datado de 27 de julho de 2021, indica-se, em relação à progenitora das crianças, que “Da avaliação instrumental, apurou-se um nível intelectual médio inferior (QI estimado)”.

25 - No mesmo relatório assinala-se, em relação à progenitora, que “Não é claro que evidencie competências em relação à prestação de cuidados”, mais se realçando que “O estilo parental parece ser maioritariamente autoritário”, que “Apresenta alguma dificuldade em distinguir práticas educativas adequadas de práticas educativas inadequadas” e, ainda, que ao nível de práticas parentais se verificou “o recurso a práticas indutivas na resolução dos vários tipos de problemas mas também a práticas educativas desadequadas ou mesmo punição física”.

26 - Ainda, naquele relatório, sublinha-se que a mãe das crianças “Demonstra parcos conhecimentos acerca do comportamento dos menores, suas capacidades e dificuldades” e identificam-se, além de outros, os seguintes fatores de risco: “relação caracterizado por distanciamento emocional com as crianças desde há dois anos; exposição das crianças a conflitos conjugais e episódios em que o pai se encontrava alcoolizado (dificuldade da família em exercer o seu papel de proteção face a este tipo de eventos); dificuldade em elencar áreas de acordo/desacordo com ex-companheiro relativamente à educação das crianças; dificuldade em distinguir práticas educativas adequadas e práticas educativas desadequadas; apresentar uma vinculação insegura, do tipo evitante; estilo educativo autoritário; interferência do fator desejabilidade social; nível intelectual médio inferior; reduzido conhecimento das necessidades atuais e características dos menores”, emitindo-se ali o “…parecer que a examinada apresenta atualmente dificuldades no desempenho das tarefas inerentes ao papel parental.”

27 - Depois do final de relacionamento com a mãe do BB e do CC, o progenitor esteve alguns dias a viver na rua, depois foi acolhido pela sua irmã, a Sra. OO, aonde permaneceu durante alguns meses (ressalvando-se que o Serviço do ISS de Aveiro conhece a irmã do progenitor do BB e do CC atendendo à instauração de Processos de promoção e proteção para os filhos da mesma no Juízo de Família e Menores de Santa Maria da Feira - Juiz 2, sendo que a filha mais velha encontra-se à guarda e cuidados de uma família idónea desde tenra idade e o mais novo desde há vários anos está acolhido numa instituição na Feira), posteriormente, e durante algumas noites, estiveram acolhidos em casa da Sra. AA e do companheiro desta, antes do arrendamento de espaço habitacional ao anterior senhorio, sendo que, atualmente, reside com a sua mãe e a sua atual companheira, que padece de epilepsia, na habitação dos seus pais, os quais entretanto, divorciaram-se.

28 - Abandonou precocemente a frequência escolar, sem completar o 6º ano de escolaridade.

29 - Encontra-se profissionalmente inserido, como montador de andaimes, trabalhando há mais de vinte anos por conta do mesmo patrão, laborando diariamente, incluindo nos dias de sábado, auferindo cerca de €900, 00 mensais líquidos.

30 - No relatório psicológico do Serviço de Clínica e Patologia Forense do Gabinete Médico-Legal e Forense de Entre o Douro e Vouga, subscrito pela Dr.ª PP e datado de 24 de março de 2022, refere-se, em relação ao progenitor das crianças, que aquele “aparentou um funcionamento cognitivo abaixo do esperado tendo em conta a sua faixa etária”, mais se realçando que “O seu perfil de personalidade é caraterizado por desejabilidade social dando respostas no sentido de passar uma imagem favorecida de si próprio”, e, ainda, que “Parece apresentar vulnerabilidade face a situações de stress o que remete para caraterísticas como pouca capacidade afirmativa, pouca tolerância à frustração e dificuldade em confrontar e resolver problemas, preocupação excessiva pelos problemas do dia a dia e marcada emocionalidade”.

31 - No mesmo relatório sublinha-se que “Relativamente à parentalidade e competências parentais, verificou-se que” o progenitor das crianças “não evidenciou ter conhecimento de regras e rotinas fundamentais para o bom desenvolvimento de uma criança”, indicando-se que “As entrevistas e a avaliação instrumental apontam para um estilo parental do tipo permissivo”.

32 - Por fim, no mesmo relatório conclui-se que o pai do BB e do CC “apresenta um perfil de personalidade caraterizado pela desejabilidade social e ausência de psicopatologia/mal-estar psicológico”, que “O estilo educativo parental apurado é do tipo permissivo, demonstrou afetividade quando fala dos filhos, bem como vontade em assumir os cuidados dos mesmos, ainda que admita que raramente visitou os filhos na instituição e não consiga descrever o que fizeram nas visitas que realizou. Mostrou ter limitações ao nível das competências parentais, não demonstrando conhecer regras e rotinas fundamentais para o bom desenvolvimento de uma criança. Mostrou ainda fragilidades no que diz respeito à capacidade de controlo, exigência no cumprimento de regras, diferenciação de papeis pais/filhos e na sobre proteção das crianças”.

33 - No Relatório de Acolhimento Residencial do CAT de 09/06/2021 consta que “No início as visitas revelam-se muito pouco interativas, os meninos falam muito pouco com a mãe ou com os avós. Os meninos verbalizaram na primeira visita com os avós que não gostavam do avô. Efetivamente, as primeiras visitas revelaram-se muito constrangedoras, pois as crianças não manifestavam qualquer reação quando os viam, revelavam mesmo receio em iniciar as visitas. Davam as mãos antes de entrarem na sala, mantinham-se muito próximos durante todo o tempo e não diziam nada durante toda a visita, respondendo a algumas questões apenas com aceno de cabeça, evitando o contacto ocular. Atualmente, eles já cumprimentam a mãe e avós e despedem-se no final da visita. Já falam algumas frases, mas nunca o fazem de forma espontânea, fazendo-o apenas por muita solicitação dos familiares ou da técnica que acompanha a visita. As visitas são passadas essencialmente com os irmãos a brincarem os dois, sempre muito próximos fisicamente.”

34 - Em tal Relatório consta que “o pai dos meninos nunca os visitou. Alega sempre que tem que trabalhar, mesmo quando lhe foi dada a oportunidade de realizar visitas ao sábado. Fez-lhes o primeiro telefonema no dia 17 de março de 2021 e claramente sobre pressão dos pais que, durante as visitas manifestaram surpresa de ele nunca ter contactado os filhos. Desde essa altura, o pai já fez alguns telefonemas, mas irregularmente. Nestes telefonemas com o pai, os meninos não revelam ter uma relação próxima com ele. Muitas vezes não querem falar, ou falam muito pouco. O pai também fala muito pouco, pergunta-lhes como corre a escola e manda-lhes beijinhos.

35 - Nesse Relatório consta o seguinte Parecer Técnico:

“A Equipa técnica considera que o BB e o CC se adaptaram muito bem ao acolhimento e que têm feito uma grande evolução em termos de capacidade de socialização e de competências pessoais. Quando chegaram eram crianças tristes, assustadas, sofridas, pouco disponíveis e recetivas ao toque. Atualmente são crianças que sorriem, abraçam e deixam-se ser abraçadas, brincam e fazem asneiras, como qualquer outra criança. As visitas com os familiares revelam uma total ausência de vínculos afetivos. As crianças não mostram qualquer reação de satisfação quando os veem, nem revelam qualquer resistência ao término das visitas, pelo contrário, quando é dito que a visita terminou, correm para fora da sala, na maioria das vezes sem se despedirem. O BB, numa das visitas com a mãe, chegou mesmo a pedir para sair mais cedo, que não queria continuar lá, tendo a mãe concordado sem utilizar qualquer argumento para tentar que o filho continuasse com ela. Os familiares não revelam qualquer preocupação e interesse pelo desenvolvimento das crianças. Para além das perguntas que fazem diretamente aos meninos sobre como correu a escola e o que comeram, não fazem qualquer questão de como é que eles estão, nem se tentam inteirar do seu desenvolvimento. Mesmo quando lhes é dito que eles foram ao médico, não perguntam porquê, nem como está o estado de saúde deles. O pai não revela qualquer relação afetiva, ou mesmo interesse pelos filhos. Fez-lhes o primeiro telefonema quase quatro meses após o acolhimento, nunca os visitou e os contactos são extremamente pobres e fugazes. Pela avaliação da interação das crianças com os pais e avós, a equipa técnica considera que nenhum elemento desta família revela ter capacidades parentais para poder assumir o cuidado do BB e do CC.”

36 - No Relatório de Acolhimento Residencial do CAT em anexo ao Relatório do ISS de Aveiro de 22/06/2023, consta:

“No início do acolhimento, os meninos tinham visitas da mãe e dos avós paternos. O avô deixou de visitá-los quando lhe foi aplicada, a ele e à avó, a pena de violência doméstica para com os netos. A mãe e a avó mantêm as visitas que fazem alternadamente, sendo assíduas e pontuais. O pai visitou-os cinco vezes ao longo de todo o período de acolhimento.

Já não é observável qualquer medo ou receio das crianças na interação com a mãe, avó ou com o pai. A interação durante as visitas é muito inconstante. Há momentos em que os meninos interagem, mesmo que por curtos períodos, com os seus familiares, mas na maior parte do tempo brincam os dois ou recorrem a jogos ou livros existentes na sala de visitas. As crianças nunca fazem perguntas sobre a vida dos pais ou da avó, não revelam entusiasmo no início das visitas, nem revelam qualquer resistência quando estas terminam. As visitas com a mãe são mais tranquilas, seguindo sempre o mesmo padrão, a mãe pergunta-lhes o que têm comido, o que fazem na escola. As crianças brincam, pintam ou desenham, chegando a haver períodos de silêncio, por falta de tema para conversarem. Na última visita com a mãe, o BB perguntou quando é que iam a casa. Fez esta pergunta após a saída do seu melhor amigo, transferido para outra CAR. Quando a mãe o questionou se ele preferia ir para casa dela ou para junto do seu amigo, o BB disse que queria ir para junto do amigo. As visitas com a avó são muito agitadas, os meninos recorrem mais a brincadeiras físicas entre eles, correndo e gritando e a avó mostra-se totalmente incapaz de os controlar, tendo de ser sempre a técnica que acompanha a visita a restabelecer a normalidade. Nas raras visitas que o pai lhes fez foi observável que ele se tem mostrado mais brincalhão com os filhos, em particular com o mais novo, mas tal como a sua mãe, também se revela muito desorganizado e pouco orientador, exigindo sempre intervenção da equipa técnica. Das visitas com a avó é percetível a dificuldade do pai em organizar-se em termos habitacionais. Ora vive com os pais, ora é expulso de casa pelo pai e vai viver para quartos sem quaisquer condições. Atualmente parece estar a viver novamente em casa dos pais. Nas visitas, o pai apresenta-se sempre muito descuidado, tanto ao nível da roupa como de higiene pessoal. Nenhum dos elementos da família revela qualquer preocupação em questionar a equipa técnica sobre a saúde, escola, desenvolvimento ou sobre o futuro das crianças. Mãe e avó cumprem os horários das visitas, sem grandes preocupações, muito acomodadas e pacificadas com o acolhimento das crianças, certas de que outros cuidam deles.”

37 - Nesse Relatório consta o seguinte Parecer Técnico:

“A equipa técnica considera que o BB e o CC estão bem-adaptados ao acolhimento e fizeram uma grande evolução ao nível das suas competências pessoais e sociais. Atualmente são crianças com comportamentos iguais aos seus pares, já não é observável o olhar triste e sofrido com que entraram no acolhimento. Nos contactos com os familiares, apesar de já não ser observável o medo sentido inicialmente, as crianças também não revelam um vínculo afetivo forte e seguro com nenhum elemento. As interações são muito pobres, tanto em termos verbais como físicos, às vezes as crianças mostram mesmo aborrecimento durante as visitas e pedem para sair da sala. O BB e o CC nunca manifestaram qualquer resistência ao final de uma visita, mostrando sempre rapidez e por vezes alívio quando lhes é comunicado que a visita terminou. É quase sempre necessário lembrar-lhes para se despedirem dos familiares. Este comportamento não é alheio à negligência, falta de estimulação e cuidados de que estes dois irmãos foram alvo, desde a nascença e durante todo o período em que viveram com os pais, patente nas descrições que os mesmos fizeram durante as perícias médico legais a que foram sujeitos. Ao longo dos quase dois anos de acolhimento, não foi observável qualquer comportamento dos pais que indiciasse capacidade para exercer as funções parentais. O desinvestimento afetivo e a passividade face ao acolhimento são tão notórios, que impede a equipa técnica de assumir a possibilidade de que o BB e o CC possam, alguma vez, voltar a viver com os pais, independentemente das suas condições habitacionais e profissionais que possam vir a ter. A tentativa de entregar as crianças à família alargada, na figura dos avós paternos, também não se revelou benéfica para as crianças, inclusivamente, para além da negligência na prestação dos cuidados básicos foram também alvo de maus-tratos físicos. As crianças têm o direito de crescerem numa família que lhes garanta o afeto, proteção e estabilidade emocional que elas tanto precisam.

Dar mais uma oportunidade aos pais do BB e do CC será adiar, possivelmente de forma definitiva, o direito de eles crescerem e sentirem o que é viver e ser membro integrante de uma família e ser a sua prioridade. Pelo exposto, a equipa técnica considera que é de extrema importância que se defina, o mais brevemente possível um projeto de vida alternativo para os dois irmãos sob pena de estarmos a condicionar o seu crescimento/desenvolvimento a um projeto de vida que poderá passar por acolhimento de longa duração, com consequente comprometimento da sua saúde mental. Assim, salvo melhor opinião, a equipa técnica é do parecer que a medida de promoção e proteção de acolhimento residencial do BB e do CC seja substituída por confiança à instituição com vista à adoção.”

38 – Também a Segurança Social sustenta que o melhor projeto de vida destas crianças passará, sem qualquer margem para dúvidas, pelo seu encaminhamento para a adoção.

39 - Ouvidos no âmbito destes autos no dia 5 de setembro de 2023, os pais do BB e do CC, após terem sido sensibilizados para a situação dos seus filhos e para a sua própria situação, não deram o seu consentimento para a adoção das crianças e insistiram, ambos, que reúnem atualmente condições para as ter à sua guarda, sendo que os respetivos companheiros não conhecem sequer as crianças.

40 - A medida de promoção e proteção de “acolhimento residencial” referida supra em 9 e 10 foi sucessivamente prorrogada, por despachos datados de 29 de julho de 2021 e 2 de agosto de 2022.

41 – Não há na família alargada elementos capazes ou idóneos para acolher o BB e o CC, e de lhe dar os cuidados e proteção que efetivamente necessitam.

42 - Os progenitores mantêm inalteradas as fragilidades evidenciadas aquando da institucionalização das crianças, designadamente no que concerne às competências parentais, sendo que aquando da avaliação diagnóstica das necessidades de intervenção, a mãe verbalizou não considerar o acolhimento residencial da própria com os filhos.”


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O tribunal a quo declarou ainda

“Não resultaram provados quaisquer outros factos com interesse para a boa decisão da causa.”


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***


Conhecendo.

I - Da alegada nulidade.

Invoca a recorrente a nulidade da decisão proferida, por violação do disposto no artigo 103º nº 4 da LPCJP, na interpretação afirmada pelo Ac. do T. Constitucional nº 193/2016 de 04/04/2016 e publicado in DRE II S, de 04/05/2016, de acordo com o qual foi julgada inconstitucional “a norma extraída do artigo 103.º, na sua redação originária, da Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo, aprovada pela Lei n.º 147/99, de 1 de setembro, segundo a qual, em processo de promoção e proteção de crianças e jovens em que esteja em causa a aplicação de medida de confiança a pessoa selecionada para adoção ou a instituição com vista a futura adoção prevista no respetivo artigo 35.º, n.º 1, alínea g), com a redação dada pela Lei n.º 31/2003, de 22 de agosto, não é obrigatória a constituição de advogado aos progenitores das crianças ou jovens em causa a partir da designação do dia para o debate judicial a que se refere o artigo 114.º, n.º 3, do mesmo normativo, igualmente com a redação dada pela citada Lei n.º 31/2003”

Na redação introduzida pela Lei 142/2015 de 08/09 passou este normativo (103º nº 4) a prever a obrigatoriedade de “constituição de advogado ou a nomeação de patrono aos pais quando esteja em causa a aplicação da medida prevista na alínea g) do n.º 1 do artigo 35.º e, em qualquer caso, à criança ou jovem”.

Seguindo o juízo de inconstitucionalidade acima assinalado, tem-se entendido, e assim o defende a recorrente, que a nomeação de patrono aos pais quando em causa esteja a aplicação da medida prevista na al. g) do nº 1 do artigo 35º - confiança a pessoa selecionada para a adoção, a família de acolhimento ou a instituição com vista à adoção – deve ocorrer a partir da designação do dia para o debate judicial a que alude o artigo 114º nº 3 da mesma Lei no âmbito do processo judicial de promoção e proteção regulado nos artigos 100 e segs..

A alteração introduzida pela Lei 142/2015 a este artigo 103º nº 4, com a previsão obrigatória de constituição de advogado ou nomeação de patrono aos pais da criança no debate judicial, sempre que esteja em causa a aplicação da medida de confiança com vista a futura adoção – a que acresceu o efeito suspensivo ao recurso da decisão que aplicou tal medida (vide artigo 123º nº 3), com evidentes ganhos, designadamente, de segurança jurídica e estabilização do projeto de vida da criança beneficiária da intervenção, ou ainda a notificação da decisão tomada às pessoas indicadas no artigo 123º nº 2 (vide artigo 122ºA)  - visou o reforço de garantias dos intervenientes processuais, “há muito reclamado, inclusivamente pela jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem”[3].

Em causa – e incluído no âmbito de proteção normativa do artigo 20º da CRP - o direito a um processo justo, no qual se inclui o direito à defesa em prazos razoáveis de ação e de recurso, ou seja, “o direito da cada um a não ser privado da possibilidade de defesa perante os órgãos judiciais na discussão de questões que lhe digam respeito. Integrando, assim, a "proibição da indefesa" o núcleo essencial do "processo devido em Direito", constitucionalmente imposto, qualquer regime processual que o legislador ordinário venha a conformar - seja ele de natureza civil ou penal - estará desde logo vinculado a não obstaculizar, de forma desrazoável, o exercício do direito de cada um a ser ouvido em juízo"[4];

Este é o fundamento da nulidade arguida pela recorrente. Sem razão, em nossa opinião.

Sendo certa a argumentação jurídica expendida pela recorrente, não encontra a mesma suporte na realidade processual destes autos que o relatório supra espelha.

O tribunal a quo, aquando do agendamento de audição aos pais, em 07/07/23, logo ordenou a nomeação de patronos aos progenitores, bem como aos menores [vide ponto I) do relatório].

Tanto os progenitores como os respetivos patronos foram notificados da data para a audição destes; a que se seguiu a notificação do teor da ata de 05/09/23 aos patronos faltosos, incluindo o agendamento da audição das crianças; seguidamente foi determinado o cumprimento do disposto no artigo 114º nº 1 da LPCJP. De tal tendo sido notificados, nomeadamente, os patronos nomeados aos progenitores, os quais não alegaram. Não obstante o debate judicial ter tido lugar apenas em 05/12/2023 [o que se refere, atendendo à comunicação da Ilustre patrona da ora recorrente de 12/09/23 – vide als. J) e K) do relatório], nenhumas alegações foram apresentadas pelos progenitores.

Acresce terem os patronos nomeados – e concretamente a patrona nomeada à ora recorrente - sido notificados do agendamento do debate judicial, com menção de notificação para comparência do “Ministério Público, os pais, o(s) distinto(s) patrono(s) destes e da(s) criança(s), e as testemunhas elencadas pelo Ministério Público nas suas alegações”, com expressa indicação de observância do disposto no artigo 114º, nº 4 da LPCJP.

Valem estes considerandos para afastar a argumentação de que não foi observada a oportuna nomeação de patronos aos progenitores. Permitindo-lhes a efetiva intervenção no processo.

O motivo porque desde o momento posterior à nomeação dos patronos, os progenitores não tiveram uma intervenção mais ativa, quer apresentando alegações e aportando aos autos, no momento oportuno, prova que demonstrasse uma realidade diversa da apurada, quer arguindo quaisquer outras irregularidades, é matéria desconhecida para o tribunal.

Mas que essa intervenção lhes foi assegurada, por via da já referida nomeação de patronos no confronto com os elementos dos autos, é uma evidência processual que afasta a argumentação da recorrente [vide em concreto as als. I) a P) do relatório supra].

No dia agendado para a realização do debate judicial, faltando a patrona nomeada à progenitora (e que fora notificada para tal ato), diligenciou o tribunal pela nomeação de nova patrona à recorrente, para que no ato lhe fosse assegurada a defesa.

Decorridos os prazos processuais para a apresentação de alegações, ou arguição de irregularidades por referência às anteriores notificações efetuadas na pessoa de anterior patrona – precludiu-se o direito de posteriormente o fazer a nova patrona nomeada.

Tal como o tribunal a quo o decidiu em ata, no dia do debate judicial [vide al. P) do relatório].

Decisão que assim tão pouco merece censura.

Em suma, ao contrário do alegado pela recorrente, foi-lhe oportunamente nomeada patrona para defesa e proteção dos seus interesses.

Tendo-lhe por esta via sido assegurado o direito a uma participação ativa no processo. Nomeadamente com a concessão de prazo para a recorrente apresentar alegações e provas. O que não fez em devido tempo.

A alteração de patrono nomeado, no decurso da tramitação processual, não repristina prazos perentórios já esgotados, com a consequente extinção do direito em praticar o ato (vide artigo 139º nº 3 do CPC).

Em suma e perante o exposto, cumpre concluir pela improcedência da arguida nulidade.

II- Do alegado erro na aplicação do direito.


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Para apreciação do objeto do recurso, cumpre em primeiro lugar recordar que o processo judicial de promoção e proteção da criança e do jovem em risco é um processo de jurisdição voluntária, tal como decorre do artigo 100º da LPCJP.

E, enquanto tal regem-se estes processos não por critérios de estrita legalidade, mas antes por juízos de equidade e oportunidade com vista à tutela dos interesses que visam salvaguardar (vide artigo 987º do CPC) – in casu o interesse a tutelar é como logo o indica a al. a) do artigo 4º da LPCJP o “interesse superior da criança e do jovem”, devendo a intervenção “atender prioritariamente aos interesses e direitos da criança e do jovem, nomeadamente à continuidade de relações de afeto de qualidade e significativas, sem prejuízo da consideração que for devida a outros interesses legítimos no âmbito da pluralidade dos interesses no caso concreto”.

Artigo 4º da LPCJP que na identificação dos princípios orientadores da intervenção elenca para além do superior interesse da criança ainda, entre outros: o princípio da intervenção mínima, indispensável à efetiva promoção dos direitos e à proteção da criança e jovem em perigo [al. d)]; o princípio da proporcionalidade e atualidade – balizando a intervenção  ao estritamente necessário e adequado à situação de perigo em que se encontra a criança ou jovem no momento em que a decisão é tomada [al. e)]; responsabilidade parental – devendo a intervenção “ser efetuada de modo a que os pais assumam os seus deveres para com a criança e o jovem” [al. f)]; primado da continuidade das relações“a intervenção deve respeitar o direito da criança à preservação das relações afetivas estruturantes de grande significado e de referência para o seu saudável e harmónico desenvolvimento, devendo prevalecer as medidas que garantam a continuidade de uma vinculação securizante” [al. g)] e prevalência da família – para tanto devendo “na promoção dos direitos e na proteção da criança e do jovem (…) ser dada prevalência às medidas que os integrem em família, quer na sua família biológica, quer promovendo a sua adoção ou outra forma de integração familiar estável” [al. h)].

Ao juiz incumbindo para tanto (artigo 986º nº 2) “investigar livremente os factos, coligir as provas, ordenar os inquéritos e recolher as informações convenientes”.


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Alega a recorrente em suma, sem deduzir qualquer impugnação à matéria de facto julgada apurada pelo tribunal a quo, ter ocorrido erro na subsunção jurídica dos factos ao direito.

Afirma em suma não ter ficado demonstrado que a recorrente revelou “manifesto desinteresse pelos filhos, em termos de comprometer seriamente a qualidade e a continuidade dos vínculos afetivos próprios da filiação”.

Questiona a não realização de uma “avaliação/peritagem psicológica dos menores” sem a qual se torna difícil “apreciar questões como a afetividade, vinculação e que tipo de vinculação existe entre a recorrente e os menores, pois tal é um juízo técnico apenas possível de realizar por uma pessoa especializada”.

Reclama a manutenção de uma ligação psicológica significante com os menores, com quem nunca quebrou o contacto, sendo assídua e pontual nas visitas através da instituição, após a sua institucionalização.

Invoca uma situação minimamente estável do seu agregado – tendo atualmente um companheiro bem integrado socialmente, tido como pessoa séria, honesta e trabalhadora.

Possuindo assim a recorrente, atualmente, condições de vida que possibilitam a integração dos menores junto de si.

Não esgotadas as possibilidades de integração dos menores na família biológica/alargada, mais concretamente junto da recorrente, mãe dos menores, deve ser revogado o decidido. Sendo antes aplicada a medida de apoio junto da mãe a quem os menores deverão ser entregues.


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É de referir em primeiro lugar que a recorrente, sem colocar em crise a verificação dos pressupostos de intervenção judicial para promoção dos direitos e proteção dos menores CC e BB, tanto que pugna agora pela aplicação de uma medida de apoio junto da mãe, insurge-se concretamente quanto à medida adotada pelo tribunal a quo de confiança a instituição com vista a futura adoção dos dois menores.

Quer a Constituição da República Portuguesa e legislação nacional que a recorrente convocou (parte acima já convocada), como também vários instrumentos internacionais, consagram o princípio da prevalência da família biológica.

Começando pela Convenção Europeia dos Direitos do Homem, temos consagrado no seu artigo 8º o “Direito ao respeito pela vida privada e familiar” nos seguintes termos:

1. Qualquer pessoa tem direito ao respeito da sua vida privada e familiar, do seu domicílio e da sua correspondência.

2. Não pode haver ingerência da autoridade pública no exercício deste direito senão quando esta ingerência estiver prevista na lei e constituir uma providência que, numa sociedade democrática, seja necessária para a segurança nacional, para a segurança pública, para o bem-estar económico do país, a defesa da ordem e a prevenção das infrações penais, a proteção da saúde ou da moral, ou a proteção dos direitos e das liberdades de terceiros.”

Tendo nesta mesma Convenção, Protocolo nº 7, artigo 5º, sido consagrado o direito de igualdade entre os cônjuges nos seguintes termos:

“Os cônjuges gozam de igualdade de direitos e de responsabilidades de carácter civil, entre si e nas relações com os seus filhos, em relação ao casamento, na constância do matrimónio e aquando da sua dissolução. O presente artigo não impede os Estados de tomarem as medidas necessárias no interesse dos filhos”.

De ambas estas disposições se extrai a previsão de uma ingerência pública em caso de necessidade de salvaguarda/proteção da saúde ou da moral ou dos direitos e liberdades de terceiros (artigo 8º) ou da necessidade de tomar medidas no interesse dos filhos (artigo 5º - Protocolo nº 7).

Em consonância com a intervenção assim prevista, estipula-se na “Convenção Sobre os Direitos das Crianças” no seu artigo 3º “1. Todas as decisões relativas a crianças, adotadas por instituições públicas ou privadas de proteção social, por tribunais, autoridades administrativas ou órgãos legislativos, terão primacialmente em conta o interesse superior da criança.

2. Os Estados Partes comprometem-se a garantir à criança a proteção e os cuidados necessários ao seu bem-estar, tendo em conta os direitos e deveres dos pais, representantes legais ou outras pessoas que a tenham legalmente a seu cargo e, para este efeito, tomam todas as medidas legislativas e administrativas adequadas.

3. Os Estados Partes garantem que o funcionamento de instituições, serviços e estabelecimentos que têm crianças a seu cargo e asseguram que a sua proteção seja conforme às normas fixadas pelas autoridades competentes, nomeadamente nos domínios da segurança e saúde, relativamente ao número e qualificação do seu pessoal, bem como quanto à existência de uma adequada fiscalização.”

E no seu artigo 9º ficou acordado que “1. Os Estados Partes garantem que a criança não é separada de seus pais contra a vontade destes, salvo se as autoridades competentes decidirem, sem prejuízo de revisão judicial e de harmonia com a legislação e o processo aplicáveis, que essa separação é necessária no interesse superior da criança. Tal decisão pode mostrar-se necessária no caso de, por exemplo, os pais maltratarem ou negligenciarem a criança ou no caso de os pais viverem separados e uma decisão sobre o lugar da residência da criança tiver de ser tomada.

2. Em todos os casos previstos no n.º 1 todas as partes interessadas devem ter a possibilidade de participar nas deliberações e de dar a conhecer os seus pontos de vista.

3. Os Estados Partes respeitam o direito da criança separada de um ou de ambos os seus pais de manter regularmente relações pessoais e contactos diretos com ambos, salvo se tal se mostrar contrário ao interesse superior da criança.”

Uma vez mais e no interesse superior da criança, funcionando como exceção à regra geral de não separação da criança dos seus pais, é prevista essa separação quando necessária no interesse superior da criança.

Nesses casos em que no interesse superior da criança não pode a mesma ser deixada no seu ambiente familiar, consta ainda da Convenção em menção que a criança – artigo 20º“ 1(…) tem direito à proteção e assistência especiais do Estado.

2. Os Estados Partes asseguram a tais crianças uma proteção alternativa, nos termos da sua legislação nacional.

3. A proteção alternativa pode incluir, entre outras, a forma de colocação familiar, a kafala do direito islâmico, a adoção ou, no caso de tal se mostrar necessário, a colocação em estabelecimentos adequados de assistência às crianças. Ao considerar tais soluções, importa atender devidamente à necessidade de assegurar continuidade à educação da criança, bem como à sua origem étnica, religiosa, cultural e linguística.”

Adoção que os Estados Partes que a reconhecem asseguram – artigo 20º al. a) “que o interesse superior da criança será a consideração primordial neste domínio e:

a) Garantem que a adoção de uma criança é autorizada unicamente pelas autoridades competentes, que, nos termos da lei e do processo aplicáveis e baseando-se em todas as informações credíveis relativas ao caso concreto, verificam que a adoção pode ter lugar face à situação da criança relativamente a seus pais, parentes e representantes legais e que, se necessário, as pessoas interessadas deram em consciência o seu consentimento à adoção, após se terem socorrido de todos os pareceres julgados necessários;”

Ainda do artigo 29 nº 1 resulta serem objetivos da educação da criança, para além do mais; a promoção “do desenvolvimento da personalidade da criança, dos seus dons e aptidões mentais e físicas, na medida das suas potencialidades”; inculcar na mesma o respeito pelos direitos do homem e liberdades fundamentais;  pelos pais, pela sua identidade, pela sua identidade cultural, língua e valores; preparar a criança para assumir responsabilidades da vida numa sociedade livre, num espírito de compreensão, paz, tolerância, igualdade entre os sexos e de amizade entre todos os povos  culturais, bem como pelas culturas e valores diferentes dos seus.

Extrai-se, portanto, das disposições vindas de citar a previsão da intervenção, nomeadamente dos tribunais, na medida em que tal se mostre necessário no interesse superior da criança.

O mesmo se extraindo da Convenção Europeia em Matéria de Adoção de Crianças, onde se estipula que “1 - A autoridade competente não decreta uma adoção sem adquirir a convicção de que a adoção assegura os interesses do menor.”

De todos estes instrumentos internacionais se extrai a preponderância do interesse do menor como critério de aferição e justificação da intervenção do tribunal, nomeadamente no que concerne ao afastamento do menor da sua família biológica.

No Direito Interno, a Constituição da República Portuguesa, bem como a Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo – LPCJP - aprovada pela Lei 147/99 são consentâneas com os instrumentos internacionais vindos de referir.

Assim dispõe o artigo 36º da CRP em matéria de Direitos Liberdades e Garantias (Título II Capítulo I):

“1. Todos têm o direito de constituir família e de contrair casamento em condições de plena igualdade.

(…)

5. Os pais têm o direito e o dever de educação e manutenção dos filhos.

6. Os filhos não podem ser separados dos pais, salvo quando estes não cumpram os seus deveres fundamentais para com eles e sempre mediante decisão judicial.

7. A adoção é regulada e protegida nos termos da lei, a qual deve estabelecer formas céleres para a respetiva tramitação.”

Deste normativo se realça o direito e dever de educação e manutenção dos filhos (nº 5); bem como a não separação dos filhos dos pais, salvo quando estes não cumpram os seus deveres fundamentais (nº 6).

A que acresce, em matéria de direitos e deveres sociais (Capítulo II) a proteção da paternidade e maternidade (artigo 68º) [1. Os pais e as mães têm direito à proteção da sociedade e do Estado na realização da sua insubstituível ação em relação aos filhos, nomeadamente quanto à sua educação, com garantia de realização profissional e de participação na vida cívica do país.
2. A maternidade e a paternidade constituem valores sociais eminentes] bem como da Infância (artigo 69º) fazendo recair sobre a sociedade e Estado a proteção da criança “1(…) com vista ao seu desenvolvimento integral, especialmente contra todas as formas de abandono, de discriminação e de opressão e contra o exercício abusivo da autoridade na família e nas demais instituições.

2. O Estado assegura especial proteção às crianças órfãs, abandonadas ou por qualquer forma privadas de um ambiente familiar normal.”

Finalmente, decorre do também convocado artigo 1978º do CC:

“1 - O tribunal, no âmbito de um processo de promoção e proteção, pode confiar a criança com vista a futura adoção quando não existam ou se encontrem seriamente comprometidos os vínculos afetivos próprios da filiação, pela verificação objetiva de qualquer das seguintes situações:

a) Se a criança for filha de pais incógnitos ou falecidos;

b) Se tiver havido consentimento prévio para a adoção;

c) Se os pais tiverem abandonado a criança;

d) Se os pais, por ação ou omissão, mesmo que por manifesta incapacidade devida a razões de doença mental, puserem em perigo grave a segurança, a saúde, a formação, a educação ou o desenvolvimento da criança;

e) Se os pais da criança acolhida por um particular, por uma instituição ou por família de acolhimento tiverem revelado manifesto desinteresse pelo filho, em termos de comprometer seriamente a qualidade e a continuidade daqueles vínculos, durante, pelo menos, os três meses que precederam o pedido de confiança.

2 - Na verificação das situações previstas no número anterior, o tribunal deve atender prioritariamente aos direitos e interesses da criança.

3 - Considera-se que a criança se encontra em perigo quando se verificar alguma das situações assim qualificadas pela legislação relativa à proteção e à promoção dos direitos das crianças.”

Devendo em função do assim previsto, o tribunal atender prioritariamente aos direitos e interesses da criança (vide nº 2 do mesmo artigo), neste pressuposto e medida podendo [nos termos da al. d) do nº 1] confiar a criança com vista a futura adoção quando não existam ou se encontrem seriamente comprometidos os vínculos afetivos próprios da filiação, pela verificação objetiva e de forma cumulativa de situação em que “os pais por ação ou omissão ponham em perigo grave a segurança, saúde, formação, educação e desenvolvimento da criança.”.

A inexistência ou sério comprometimento dos vínculos afetivos próprios da filiação é requisito autónomo da verificação objetiva dos circunstancialismos descritos nas diversas alíneas do nº 1 de que há de fazer-se prova[5] e aferida em ambos os sentidos, ou seja tanto dos progenitores para a criança, como desta para aqueles.

E com o assim previsto neste artigo se conjuga o disposto no artigo 4º da LPJCP acima já citado que identifica os critérios orientadores da intervenção para a promoção dos direitos e proteção da criança e jovem em perigo.

Perigo aferido nos termos previstos no artigo 3º que assim dispõe:

1 - A intervenção para promoção dos direitos e proteção da criança e do jovem em perigo tem lugar quando os pais, o representante legal ou quem tenha a guarda de facto ponham em perigo a sua segurança, saúde, formação, educação ou desenvolvimento, ou quando esse perigo resulte de ação ou omissão de terceiros ou da própria criança ou do jovem a que aqueles não se oponham de modo adequado a removê-lo.

2 - Considera-se que a criança ou o jovem está em perigo quando, designadamente, se encontra numa das seguintes situações:

a) Está abandonada ou vive entregue a si própria;

b) Sofre maus tratos físicos ou psíquicos ou é vítima de abusos sexuais;

c) Não recebe os cuidados ou a afeição adequados à sua idade e situação pessoal;

d) Está aos cuidados de terceiros, durante período de tempo em que se observou o estabelecimento com estes de forte relação de vinculação e em simultâneo com o não exercício pelos pais das suas funções parentais;

e) É obrigada a atividades ou trabalhos excessivos ou inadequados à sua idade, dignidade e situação pessoal ou prejudiciais à sua formação ou desenvolvimento;

f) Está sujeita, de forma direta ou indireta, a comportamentos que afetem gravemente a sua segurança ou o seu equilíbrio emocional;

g) Assume comportamentos ou se entrega a atividades ou consumos que afetem gravemente a sua saúde, segurança, formação, educação ou desenvolvimento sem que os pais, o representante legal ou quem tenha a guarda de facto se lhes oponham de modo adequado a remover essa situação.

h) Tem nacionalidade estrangeira e está acolhida em instituição pública, cooperativa, social ou privada com acordo de cooperação com o Estado, sem autorização de residência em território nacional.”

Concluindo, de todos os instrumentos legais citados decorre sempre a afirmação e reconhecimento do superior interesse da criança, critério norteador de toda e qualquer intervenção, na qual se deve atender como afirmado na al. a) do citado artigo 4º da LPCJP “prioritariamente aos interesses e direitos da criança e do jovem, nomeadamente à continuidade de relações de afeto de qualidade e significativas”, sem prejuízo “da consideração que for devida a outros interesses legítimos no âmbito da pluralidade dos interesses presentes no caso concreto;”.

De entre esses direitos, está o direito da criança a crescer num ambiente seguro, que lhe proporcione condições de saúde, acesso a formação, educação e um são desenvolvimento.

Com prevalência pelo meio familiar e no seio da sua família biológica, junto dos seus progenitores por em princípio ser com quem manterá relações de afeto de qualidade e significativas, cuja continuidade deverá ser promovida, assim preservando tais relações afetivas estruturantes de grande significado e de referência para o seu saudável e harmónico desenvolvimento.

Assim o aconselham (vide artigo 4º da LPCJP, para além do referido interesse superior da criança (al. a); o princípio da intervenção mínima (al. d); o princípio da proporcionalidade e atualidade (al. e); o princípio da responsabilidade parental (al. f); o princípio do primado da continuidade das relações psicológicas profundas – devendo prevalecer as medidas que garantam a continuidade de uma vinculação securizante (al. g); e o princípio da prevalência da família – devendo na promoção dos direitos e proteção da criança e do jovem ser dada prevalência às medidas que os integrem em família, quer na sua família biológica quer promovendo a sua adoção ou outra forma de integração familiar estável (al. h).

A não prevalência da família biológica só ocorrerá quando e no que ora releva a progenitora (recorrente), por ação ou omissão, mesmo que por manifesta incapacidade devida a razões de doença mental, puser em perigo grave a segurança, a saúde, a formação, a educação ou o desenvolvimento da criança, demonstrando-se ainda que inexistem ou estão seriamente comprometidos os vínculos afetivos próprios da filiação [vide artigo 1978º nº 1 al. d) do CC]

Foi este o fundamento acolhido pelo tribunal a quo para fundamentar a medida adotada e contra a qual se insurge a recorrente.

Tal como consta na decisão recorrida:

da análise dos factos acima elencados resulta inequívoco a total incapacidade destes pais para criarem e educarem os filhos, além do seu manifesto desinteresse pelo seu futuro, votando-os entregues à instituição, sendo tais factos bem reveladores do estado de incapacidade, diríamos irreversível, dos mesmos para exercerem as suas funções parentais, além de que - forçoso é também dizê-lo - o seu comportamento colocou em sério perigo o desenvolvimento biopsicossocial das crianças, a sua segurança, saúde, formação, e o futuro das crianças em termos tais que, pela sua gravidade, comprometem seriamente os vínculos afetivos próprios da filiação, estando assim verificadas as situações referidas nas alíneas d) e e) do art.º 1978º do C. Civil.”

Alega a recorrente, como já referido, que as medidas de integração na família não se encontram esgotadas e que mantém vínculos afetivos com os menores.

Por tal invocando a violação do princípio da prevalência da família biológica e a manutenção de um vinculo de afetividade ente si e os menores, pugnando pela revogação da medida adotada pelo tribunal.

Não obstante e reconhecendo limitações, pugna pela entrega dos menores ao seu cuidado com a aplicação de uma medida de apoio junto de si /mãe.

As medidas de proteção e promoção da criança ou jovem em perigo visam:

“a) Afastar o perigo em que estes se encontram;

b) Proporcionar-lhes as condições que permitam proteger e promover a sua segurança, saúde, formação, educação, bem-estar e desenvolvimento integral;

c) Garantir a recuperação física e psicológica das crianças e jovens vítimas de qualquer forma de exploração ou abuso.” [artigo 34º da LPCJP] e estão elencadas no artigo 35º da mesma Lei:

“1 - As medidas de promoção e proteção são as seguintes:

a) Apoio junto dos pais;

b) Apoio junto de outro familiar;

c) Confiança a pessoa idónea;

d) Apoio para a autonomia de vida;

e) Acolhimento familiar;

f) Acolhimento residencial;

g) Confiança a pessoa selecionada para a adoção, a família de acolhimento ou a instituição com vista à adoção.

2 - As medidas de promoção e de proteção são executadas no meio natural de vida ou em regime de colocação, consoante a sua natureza, e podem ser decididas a título cautelar, com exceção da medida prevista na alínea g) do número anterior.

3 - Consideram-se medidas a executar no meio natural de vida as previstas nas alíneas a), b), c) e d) do n.º 1 e medidas de colocação as previstas nas alíneas e) e f); a medida prevista na alínea g) é considerada a executar no meio natural de vida no primeiro caso e de colocação, no segundo e terceiro casos.

4 - O regime de execução das medidas consta de legislação própria.”

A execução de tais medidas veio a ser regulamentada pelo DL 12/2008 de cujo preâmbulo se extrai que a “intervenção social do Estado e da comunidade nas situações em que as crianças e jovens se encontrem em perigo, tem por pressuposto essencial uma intervenção que permita assegurar às famílias condições para garantirem um desenvolvimento pleno das crianças e dos jovens no âmbito do exercício de uma parentalidade responsável.

Estando como tal a intervenção concebida por forma a potenciar o papel da família mediante o reforço e aquisição de competências dos pais (…) por forma a permitir a manutenção ou regresso desta à sua família natural e, por outro, a só admitir a separação da criança ou jovem dos pais contra a vontade destes, quando o tribunal a entender como necessária à salvaguarda e prossecução do superior interesse da criança.

Neste entendimento, as medidas de promoção e proteção previstas no artigo 35.º do anexo à Lei n.º 147/99, de 1 de setembro, são elencadas e classificadas como «medidas em meio natural de vida» e «medidas em regime de colocação», estabelecendo-se uma ordem de preferência.

(…)

A execução destas medidas, por terem por pressuposto essencial o direito da criança e do jovem a serem educados numa família, de preferência a sua, implica que sejam considerados os apoios a conceder àquela, bem como o suporte a proporcionar à família para que desempenhe o papel que lhe incumbe.

Neste quadro, a Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo consagra a tipologia dos apoios a prestar definindo apoios de natureza psicopedagógica, de natureza social e económica.

Dentro destas coordenadas a execução da medida de apoio junto dos pais é orientada no sentido da aquisição ou reforço, por parte destes, das competências necessárias ao exercício de uma parentalidade responsável e à adequada satisfação das necessidades de proteção da criança ou do jovem.”[6].

Tendo presente o enquadramento legal acima enunciado, bem como os pressupostos que justificam a intervenção para promoção dos direitos da criança e jovem em perigo (artigo 3º); os princípios orientadores de tal intervenção (artº 4º); a finalidade das medidas de proteção e a sua tipificação (artigos 34º e 35º) [estes todos da LCPJP] importa analisar a factualidade apurada e da mesma aferir se as críticas apontadas pela recorrente merecem acolhimento.


*

Da factualidade provada (a qual, relembra-se, não foi alvo de censura) realçam-se os seguintes pontos:

i- o acompanhamento dos menores por parte da CPCJP teve início já no ano de 2017, em abril.

Então por iniciativa da progenitora, tendo sido acolhida com os menores no Lar ... em Ílhavo, no seguimento de desentendimento com o progenitor.

À data os menores tinham 2 e 1 anos de idade [nascidos o BB em ../../2014 e o CC em ../../2015].

Atualmente têm 9 e 8 anos.

À data de 2017, após reconciliação entre os progenitores, foi aplicada a medida de apoio junto dos pais – a qual se manteve até janeiro do ano de 2020.

Ou seja durante quase 3 anos.

Justificação para tal medida – na situação pessoal e familiar dos menores, a manifesta falta de higiene e desorganização na gestão dos recursos económicos do agregado familiar. Lacunas que não foram supridas, mantendo-se ao nível da prestação dos cuidados básicos de higiene e alimentação das crianças, tendo até as crianças contraído sarna após a aplicação da medida (vide fp’s 1 a 3).

Prorrogada a medida de apoio junto dos pais, sem qualquer melhoria nas dinâmicas familiares, com as dificuldades dos progenitores na aquisição e manutenção de competências que assegurassem a prestação de cuidados básicos de higiene e alimentação, verificaram-se repercussões na integração social e na aquisição de conhecimento por parte dos menores, de modo mais significativo no BB (vide fp´s 4 e 5).

Perante a persistência de fatores de risco e a não colaboração dos progenitores na correção dos mesmos, a CPCJ decidiu aplicar aos menores a medida de promoção e proteção de “apoio junto de outro familiar”, in casu os avós paternos, em janeiro de 2020.

Verificou-se, no entanto, a incapacidade destes para garantir condições essenciais para um crescimento físico e psicológico saudável dos seus netos, tendo a sua atuação dado origem inclusive ao processo crime descrito em 8 dos fp’s (vide fp’s 6 a 8).

Face ao que em 27/11/2020 – atenta a situação em que os menores se encontravam (vide fp 9) - foi decidido aplicar a título provisório a medida de promoção e proteção de “acolhimento residencial”.

Medida esta que veio a tornar-se definitiva por acordo de 2/12/2020 (vide fp 10).

ii- À data em que chegaram ao CAT, as crianças exalavam forte odor a urina; manchas vermelhas/arroxeadas no rabo e revelavam profunda tristeza.

O BB apresentava ligeiro atraso de desenvolvimento, tendo evoluído nas suas competências pessoais e sociais. Usufruindo desde junho de 2021 de sessões semanais de terapia da fala e terapia ocupacional.

Melhorias de competências pessoais e sociais que também o CC evidenciou desde a chegada ao CAT.

Tendo ambas as crianças registado melhorias dos resultados escolares e revelado uma grande evolução no que diz respeito a competências pessoais e aquisições normativas. (vide fp´s 11 a 19).

iii- Por seu turno e no que em concreto à progenitora (ora recorrente) respeita, resulta provado (e não vem questionado) que

- À data da entrada das crianças na CAR, a mesma vivia numa habitação arrendada sita na Vila ..., com um novo companheiro, do qual depende economicamente, pois nunca esteve inserida profissionalmente, apenas tendo trabalhado, pontualmente, ao todo, durante cerca de cinco meses.

Companheiro que não conhece sequer os menores (vide fp’s 20 e 39);

- de acordo com o Relatório Psicológico do Serviço de Clínica e Patologia Forense do Gabinete Médico-Legal e Forense do Baixo Vouga, subscrito pela Dr.ª NN e datado de 27 de julho de 2021, indica-se, em relação à progenitora das crianças, que “Da avaliação instrumental, apurou-se um nível intelectual médio inferior (QI estimado)”; “Não é claro que evidencie competências em relação à prestação de cuidados”, mais se realçando que “O estilo parental parece ser maioritariamente autoritário”; “Apresenta alguma dificuldade em distinguir práticas educativas adequadas de práticas educativas inadequadas” e, ainda, que ao nível de práticas parentais se verificou “o recurso a práticas indutivas na resolução dos vários tipos de problemas mas também a práticas educativas desadequadas ou mesmo punição física”.

Mais se sublinha no mencionado relatório que a mãe das crianças “Demonstra parcos conhecimentos acerca do comportamento dos menores, suas capacidades e dificuldades” e identificam-se, além de outros, os seguintes fatores de risco: “relação caracterizado por distanciamento emocional com as crianças desde há dois anos; exposição das crianças a conflitos conjugais e episódios em que o pai se encontrava alcoolizado (dificuldade da família em exercer o seu papel de proteção face a este tipo de eventos); dificuldade em elencar áreas de acordo/desacordo com ex-companheiro relativamente à educação das crianças; dificuldade em distinguir práticas educativas adequadas e práticas educativas desadequadas; apresentar uma vinculação insegura, do tipo evitante; estilo educativo autoritário; interferência do fator desejabilidade social; nível intelectual médio inferior; reduzido conhecimento das necessidades atuais e características dos menores”, emitindo-se ali o “…parecer que a examinada apresenta atualmente dificuldades no desempenho das tarefas inerentes ao papel parental.” (vide fp´s 24 a 27);

- já em junho de 2021, de acordo com o Relatório de Acolhimento Residencial do CAT de 09/06/2021 consta que “No início as visitas revelam-se muito pouco interativas, os meninos falam muito pouco com a mãe ou com os avós. Os meninos verbalizaram na primeira visita com os avós que não gostavam do avô. Efetivamente, as primeiras visitas revelaram-se muito constrangedoras, pois as crianças não manifestavam qualquer reação quando os viam, revelavam mesmo receio em iniciar as visitas. Davam as mãos antes de entrarem na sala, mantinham-se muito próximos durante todo o tempo e não diziam nada durante toda a visita, respondendo a algumas questões apenas com aceno de cabeça, evitando o contacto ocular. Atualmente, eles já cumprimentam a mãe e avós e despedem-se no final da visita. Já falam algumas frases, mas nunca o fazem de forma espontânea, fazendo-o apenas por muita solicitação dos familiares ou da técnica que acompanha a visita. As visitas são passadas essencialmente com os irmãos a brincarem os dois, sempre muito próximos fisicamente.” (vide fp 33);

- nos subsequentes relatórios é dada nota de uma evolução no relacionamento dos menores com os familiares, já não sendo observável o medo sentido inicialmente, não revelando, contudo, as crianças um vínculo afetivo forte e seguro com nenhum elemento (vide fp´s 34  a 37);

iv- Finalmente e não menos relevante, vem provado que

“41 – Não há na família alargada elementos capazes ou idóneos para acolher o BB e o CC, e de lhe dar os cuidados e proteção que efetivamente necessitam.”

E

“42 - Os progenitores mantêm inalteradas as fragilidades evidenciadas aquando da institucionalização das crianças, designadamente no que concerne às competências parentais, sendo que aquando da avaliação diagnóstica das necessidades de intervenção, a mãe verbalizou não considerar o acolhimento residencial da própria com os filhos.”


*

O que a factualidade acima enunciada evidencia é uma verificada incapacidade dos progenitores e no que ora releva da progenitora recorrente, para prestar os cuidados básicos de higiene e alimentação das crianças, desde 2017, com repercussões relevantes na integração social e na aquisição de conhecimentos por parte dos menores.

Face ao que e perante a situação de risco apurada foi aplicada a medida de apoio junto dos progenitores a qual se manteve até janeiro de 2020 sem alteração das dinâmicas familiares, e sem colaboração dos progenitores para correção dos seus comportamentos.

Entre janeiro de 2020 e novembro de 2020 tendo ainda sido tentada uma solução de apoio junto de outro familiar, uma vez mais sem sucesso.

O que justificou o acolhimento residencial dos menores, numa altura em que o BB apresentava já um ligeiro atraso no desenvolvimento e receio de adultos, ambos os irmãos sendo crianças pouco estimuladas e tímidos.

Tendo com o acolhimento residencial registado melhorias das suas competências pessoais e aquisições normativas, com o apoio que lhes foi proporcionado.

Desde 2020 e passados mais 3 anos, vem ainda provado que os progenitores e concretamente – no que ora releva - a progenitora recorrente mantém inalteradas as suas fragilidades evidenciadas aquando da institucionalização das crianças, designadamente no que concerne às suas competências parentais.

Dito isto e relembrando que[7]:

- as medidas de execução previstas no artigo 35º da LPCJP, entre as quais se inclui a medida de acolhimento residencial, têm como pressuposto uma intervenção que permita assegurar às famílias condições para para garantirem um desenvolvimento pleno das crianças e dos jovens no âmbito do exercício de uma parentalidade responsável;

- estando como tal a intervenção concebida por forma a potenciar o papel da família mediante o reforço e aquisição de competências dos pais, por forma a permitir a manutenção ou regresso desta à sua família natural e, por outro, a só admitir a separação da criança ou jovem dos pais contra a vontade destes, quando o tribunal a entender como necessária à salvaguarda e prossecução do superior interesse da criança;

Verifica-se que nada consta nos autos quanto à intervenção que junto da progenitora foi efetuada após a aplicação da dita medida de acolhimento residencial.

Que orientações, acompanhamento ou indicações lhe foram fornecidas ou facultadas para que à mesma fosse permitida a aquisição de competências parentais que a capacitassem para o exercício de uma parentalidade responsável e adequada à satisfação das necessidades dos menores, proporcionando aos mesmos um ambiente securizante, estável, organizado, onde pudessem crescer e desenvolver-se de forma equilibrada. Priorizando no seu dia-a-dia o bem estar dos menores, seus filhos[8].

Nomeadamente tendo em conta as conclusões do relatório psicológico elaborado em julho de 2021, onde se dá nota de todas as fragilidades e limitações da progenitora. Mas igualmente não se afasta a hipótese de entrega dos menores à mãe com apoio, orientação e supervisão para desenvolvimento das suas competências [vide ponto F) do relatório supra].

Paralelamente, dos relatórios de acompanhamento [CAT e ISS] resulta que no decurso do acolhimento residencial, após umas primeiras visitas muito pouco interativas e sem qualquer reação dos menores (vide fp 33)[9], em junho de 2023 (vide fp 36) é dada nota de uma evolução positiva nas interações entre menores e mãe. Sendo esta assídua e pontual nas visitas que faz.

Mãe que como resulta do relatório elaborado, formulou pedidos de contacto fora da instituição com os menores, invocando ter já condições para os receber, vivendo com um novo companheiro. Tendo visto as suas pretensões indeferidas.

Sendo certo que tais decisões não mereceram censura, evidenciam uma manifestação de interesse da progenitora em recuperar a proximidade com os menores. Verifica-se igualmente não constar dos autos qualquer visita ou apreciação deste novo agregado familiar para aferir da sua estabilidade e adequação a uma eventual aproximação e acolhimento dos menores. Tendo em especial consideração não só que o novo companheiro da mãe não conhece os menores como também a dependência económica em que a progenitora daquele se encontra.

Finalmente e não menos relevante, no contexto já assinalado, é pertinente a crítica da recorrente quanto à não realização de uma qualquer perícia médico-legal aos menores, no âmbito da pedopsiquiatria - que dos autos não consta - com vista a aferir o tipo de relação que estes mantêm com a progenitora; como vêm os mesmos na sua perspetiva a relação com a mesma; os vínculos afetivos que mantêm ou não com esta. Ainda a avaliação das competências dos menores e em que medida a prévia atuação da progenitora contribuiu para as suas limitações e em que medida uma aproximação à progenitora será para os mesmos favorável.

Com tal atuação se visando aferir se a pelo tribunal a quo afirmada desvinculação afetiva (ou comprometimento sério) dos menores em relação à progenitora é uma realidade.

Concluindo:

- decorrendo do artigo 1978º nº 1 al. d) do C.C. já acima citado que atendendo prioritariamente aos direitos e interesses da criança (vide nº 2 do mesmo artigo) pode o tribunal confiar a criança com vista a futura adoção quando não existam ou se encontrem seriamente comprometidos os vínculos afetivos próprios da filiação e

quando, cumulativamente os pais por ação ou omissão ponham em perigo grave a segurança, saúde, formação, educação e desenvolvimento da criança;

Entende-se necessário para aferir com a necessária segurança que a medida adotada impõe, que seja:

- apurado (junto das equipas que efetuaram o acompanhamento do processo) que orientações, acompanhamento ou indicações foram fornecidas ou facultadas à progenitora para que à mesma fosse permitida a aquisição de competências parentais que a capacitassem para o exercício de uma parentalidade responsável e adequada à satisfação das necessidades dos menores, proporcionando aos mesmos um ambiente securizante, estável, organizado, onde pudessem crescer e desenvolver-se de forma equilibrada, após a aplicação da dita medida de acolhimento residencial.

E atitude assumida pela progenitora em função de tais indicações, orientações e acompanhamento;

- apurada (por via da elaboração do competente relatório) a estabilidade do novo agregado familiar da progenitora e adequação a uma eventual aproximação e acolhimento dos menores no seu seio. Tendo em especial consideração não só que o novo companheiro da mãe não conhece os menores como também a dependência económica em que a progenitora daquele se encontra;

- seja ordenada a realização de uma perícia médico-legal aos menores, no âmbito da pedopsiquiatria - que dos autos não consta - com vista a aferir o tipo de relação que estes mantêm com a progenitora; como vêem os mesmos na sua perspetiva a relação com a mesma; os vínculos afetivos que mantêm ou não com esta. Ainda a avaliação das competências dos menores e em que medida a prévia atuação da progenitora contribuiu para as suas limitações e em que medida uma aproximação à progenitora será para os mesmos favorável.

Perícia esta a ser solicitada com caráter de urgência, atenta a natureza do processo.

Em função do que se vier a apurar, devendo então o tribunal a quo oportunamente reabrir a audiência para querendo as partes em função dos novos elementos probatórios aportados aos autos alegarem. Após proferindo nova decisão em conformidade, suprindo as lacunas anotadas por via da ampliação da decisão de facto.

Para o efeito se decidindo ao abrigo do disposto no artigo 662º nº 2 al. c) e nº 3 al. c) anular a decisão proferida para que o tribunal a quo determine com caráter de urgência a realização das diligências mencionadas.


***


IV. Decisão.

Pelo exposto, acordam os Juízes do Tribunal da Relação do Porto em anular a decisão recorrida, com vista a serem realizadas as diligências e exame médico-legal acima mencionado, oportunamente proferindo nova decisão nos termos supra determinados.

Sem custas, por não serem devidas [artigo 4º nº 2 al. f) do RCP].

Porto, 2024-03-04
Fátima Andrade
Ana Paula Amorim
José Eusébio Almeida
_______________________________
[1] Cfr. comunicações da OA de 10/07/2023.
[2] Do parecer técnico consta a informação de:
“Este Serviço, depois da receção do ofício n.º 114122133, no presente dia procedeu a contacto com a Dra. QQ e com a Dra. RR da CAR da Santa Casa da Misericórdia de ..., aonde se encontram acolhidos os irmãos BB e CC, desde o passado dia 27 de novembro.
Confrontadas as técnicas acima identificadas com o pedido formulado pela progenitora das crianças foi recolhida a informação de que não são de parecer favorável à possibilidade dos irmãos acima identificados passaram as próximas festividades de Natal no contexto familiar materno ou outro.
Mais esclareceram que até à data “os meninos tiveram uma visita da mãe e uma visita dos avós paternos….na visita com a mãe falaram muito pouco, não mostraram qualquer manifestação afetiva relativamente à mãe, nem qualquer resistência à separação…com os avós, os meninos também não reagiram à sua presença, não falavam, apenas acenavam com a cabeça e o BB manifestou grande apreensão, tensão física e rigidez corporal, tendo manifestado que não gostava do avô”(cit).
São da opinião de que “as crianças têm um passado de negligência e maus tratos que nos encontramos a avaliar e reparar e, não nos parece, de
todo benéfico que os meninos vão nesta altura passar o Natal com a mãe, com quem manifestaram um grande distanciamento afetivo, estando eles em processo de integração na CAR, onde se sentem seguros, tranquilos, onde falam e brincam livremente, apresentando um comportamento distinto do manifestado durante as visitas”(cit).
Paralelamente, e com base no Plano de Contingência elaborado pela Santa Casa da Misericórdia ... de acordo com as orientações da DGS, a CAR “está a evitar a saída de qualquer criança da Casa de Acolhimento durante o período das festividades de Natal e Ano Novo, uma vez que o risco de contágio numa unidade residencial maior”(cit).
Atenta às justificações apresentadas este Serviço é também de parecer desfavorável à saída do contexto institucional do BB e do CC (...)”.
[3] Vide exposição de motivos da Proposta de Lei nº 339/XII que deu lugar à alteração introduzida pela Lei 142/2015 de 08/09 a esta Lei.
[4] Cfr. o citado Ac. do T. Constit.
[5] Vide neste sentido Ac. TRL de 12/03/2019, nº de processo 1/16.7T1VFC.L1-7 in www.dgsi.pt; LPCJP anotada de Paulo Guerra, 3ª edição revista e aumentada de 2017, Almedina, em nota ao artigo 38ºA – nota 6, p. 116/117; LPCJP anotada de Tomé Ramião, 9ª edição em anotação ao artigo 38º A nota 3.1 
[6] O DL 164/2019 veio estabelecer o regime de execução do acolhimento residencial, medida de promoção dos direitos e de proteção das crianças e jovens em perigo, prevista na alínea f) do n.º 1 do artigo 35.º e nos artigos 49.º a 51.º da LPCJP
De cujo preâmbulo resulta a afirmação de que “Enquanto medida de colocação, o acolhimento residencial assenta no pressuposto do regresso da criança ou do jovem à sua família de origem ou ao seu meio natural de vida ou, atendendo à idade e grau de maturidade, à sua preparação para a autonomia de vida ou, sempre no seu superior interesse, a uma confiança com vista à adoção ou apadrinhamento civil.”
[7] Vide o afirmado no já citado preâmbulo do DL 12/2008.
[8] A necessidade de constatação de limitações do exercício da parentalidade e do potencial de alterações no exercício da parentalidade como pressuposto da reunificação unifamiliar são questões abordadas de forma clara quer na apresentação de Maria do Rosário Ataíde in e-book CEJ, Formação Contínua in cej.mj.pt “ A Criança em Perigo e a Promoção e Proteção do Seus Direitos – Multiplicidade na sua intervenção” – Julho de 2020  - “Medidas de proteção e projeto de vida da criança – do meio natural de vida ao regime de colocação” quer por Helena Lamas in “A CRIANÇA EM PERIGO E A PROMOÇÃO E PROTEÇÃO DOS SEUS DIREITOS – MULTIPLICIDADE NA INTERVENÇÃO” no mesmo e-book do CEJ.
Aqui mais se realçando:
- perfilando-se a “hipótese da aplicação da medida de proteção prevista na alínea g) do artigo 35.º da LPCJP, encontrando-se a criança acolhida por força de uma decisão cautelar: aquando da conferência, celebrando-se acordo de promoção e proteção, com aplicação da medida de acolhimento residencial, é imprescindível que os pais saibam quais as ações concretas que devem levar a cabo para recuperar a custódia dos filhos.”
- sendo útil neste tipo de situações introduzir “nos acordos de promoção e proteção a sujeição dos progenitores a avaliação psicológica das suas competências parentais, elemento importantíssimo para, conjuntamente com outros factos que resultem provados em sede de debate judicial, integrar a previsão do artigo 1978.º, n.º 1, do C.C., nomeadamente a sua alínea d).”
[9] Não será despiciendo ter também presente que os menores estiveram um período com os avós paternos, bem como o afastamento que a pandemia / covid 19 provocou nos relacionamentos interpessoais.