AUTORIDADE DE CASO JULGADO
APROVEITAMENTO DE PROVA DOUTRO PROCESSO
DOCUMENTOS NA POSSE DE PARTE CONTRÁRIA
CONSERVAÇÃO DE DOCUMENTOS
TRABALHO SUPLEMENTAR
Sumário


O caso julgado material é delimitado através dos elementos que identificam a relação jurídica apreciada - (as partes, o pedido e a causa de pedir – artigos 580º e 581ª). É a concreta relação assim delimitada que se impõe e a que é atribuída autoridade do caso julgado.
A autoridade do caso julgado, tem a ver com a existência de prejudicialidade entre objetos processuais, implicando o acatamento da decisão proferida em ação anterior cujo objeto se inscreve, como pressuposto, no objeto da posterior ação, visando impedir que a relação jurídica definida naqueles autos, venha a ser apreciada de novo e de forma diversa.
Não tem aquela autoridade, a decisão que reconhece um determinado vencimento a um trabalhador, em situação alegadamente semelhante à do autor.
O aproveitamento de prova produzido noutro processo, mas já não a convicção do julgador naquele, podem ser invocados, no momento e pelo meio próprio, para ser apreciada com a restante prova produzida, nos termos do artigo 421º do CPC. Esta norma não abrange a confissão ficta.
O empregador, logo que tenha conhecimento do intento de trabalhador em solicitar a satisfação de determinados direitos em tribunal, ou deva, de acordo com as regras da experiência e a normalidade das coisas, contar com tal demanda, deve providenciar pela conservação da documentação pertinente que tenha em sua posse, independentemente de outras obrigações legais de conservação.
O comportamento da parte que destrói elementos de prova, sabendo que iam ser necessários, ainda que não ilícita, pode ser ponderada ao nível da apreciação das provas, e, podendo não implicar a inversão do ónus de prova, pode justificar um rebaixamento do standard normal da prova.
A cláusula 61º do CCTV do setor dos transportes rodoviários de mercadorias, BTE 34/2018, apenas afasta o pagamento de trabalho suplementar em dia útil, e pressupõe o respeito pelos limites temporais da clausula 21ª, além desses limites, se prestado, deve o trabalho suplementar ser pago.

Texto Integral


Acordam na Secção Social da Relação de Guimarães

AA, idf. nos autos, instaurou a presente ação declarativa sob a forma de processo comum laboral contra, EMP01... – Transportes e Alugueres, S.A, idf. nos autos, Pedindo;
1. Se declare nulo o termo oposto no contrato de trabalho celebrado entre autor e ré e em decorrência se julgue o mesmo celebrado por tempo indeterminado e,
 condenada a ré condenada a pagar ao autor “todos os danos patrimoniais tidos que se cifram nas retribuições deixadas de auferir desde o despedimento, bem assim a reintegrar o A. no seu local de trabalho e nas suas funções caso o mesmo não opte nos termos do disposto no art.º 391.º pela indemnização em substituição da reintegração até ao final da audiência de julgamento e a qual atento a conduta da Ré deverá ser fixada em 45 dias de retribuição e, no minino de três ou seja, no montante de € 6075,00”;
2. Seja reconhecido que o vencimento do autor era de €1.350,00, acrescido do respetivo subsídio de risco; cláusula 61.º; ajudas de custos; trabalho suplementar; trabalho noturno/subsídio, noturno; complemento salarial e, em resultado disso condenada a ré a pagar-lhe €27.450,09;
3. Se condene a ré a pagar-lhe a indemnização de €1.000,00, a título de danos não patrimoniais, acrescidos de juros de mora desde a citação até efetivo e integral pagamento;
4. Condene a ré em incidente ulterior à sentença no pagamento do valor que for devido ao autor da diferença entre o que irá receber de subsídio de desemprego e o que teria direito se tivessem sido feitos todos os descontos que eram devidos, bem como o prejuízo que essa situação lhe causar na sua reforma.
5. A titulo subsidiário e, caso improceda o pedido 2) a condenação da ré no pagamento ao autor de € 7.073,68 a titulo de créditos salariais calculados de acordo com o vencimento base de € 700,00 e demais componentes retributivas, acrescida de juros de mora desde o vencimento de cada prestação até efetivo e integral pagamento, a saber:
 5.1 – Retribuição do período de férias e de subsídios férias e de Natal de valor correspondente à sua retribuição base, integrada pelas verbas que a ré designava como “retribuição base” e como “Ajudas de custo”
5.1.1 - €870,57 a titulo de férias (ano 2019);
5.1.2 – €847,97 de subsídio de férias (ano 2019);
5.1.3 - €778,8 de subsídio de Natal (ano 2019) e
5.1.4 - Ano 2020: €337,50*3= € 1012,50.
(…) total €3.509,84
 5.2 - às cláusulas 52.º e 53.º do CCT (ano 2019)
5.2.1 - Subsídio de férias = €27,00 (Complemento Salarial);
5.2.2 - €135,00 (Subsídio de trabalho noturno);
5.2.3 - €110,00 (ajuda de custo TIR);
5.2.4 - € 639,15 (cláusula 61.º);
(…) = €911,15
5.2.5 - Subsídio de natal €27,00 (Complemento Salarial);
 5.3 - Cláusulas 52.º e 53.º do CCT (ano 2020):
5.3.1 - Subsídio de férias = €27,00 (Complemento Salarial);
5.3.2 - €135,00 (Subsídio de trabalho noturno);
5.3.3 - €110,00 (ajuda de custo TIR);
5.3.4 - € 639,15 (cláusula 61.º), proporcionais aos meses trabalhados = €227,78;
5.3.5 - Subsídio de natal = €6,75 (Complemento Salarial);
(…) = €1172,68
 5.4 - €7.575,12 título de trabalho extraordinário (cláusula 49.º do CCCTV); 5.4.1- Subsidiariamente (cláusula 61.º) €3.516,54;
 5.5 - €813,00 a título de subsídio noturno, desde setembro de 2019 e até ../../2020:
5.5.1 - €741,00 - ano de 2019 (€135,00*12 (vencimento de €1.350,00) = €1.350,00-€609,00;
5.5.2 - €72,00 - ano 2020: €135,00-€63,00 (valor ilíquido pago)
 5.6 - €540,00 pelos fins de semana trabalhados e não pagos (Ano 2019: €1.350,00/30 = €45,00 (valor dia calculado de acordo com o CCT);
 5.7 - €270,00 pelo trabalho prestado em 3 feriados no ano 2019 (€45,00*3 feriados*2);
 5.8 €135,00 no ano 2019 por 3 dias de descanso compensatório não gozado (€45,00*3dias);
 5.9 -€1.936,00 a título de ajudas de custo 5.9.1 - €1.600,00 - ano 2019: de fevereiro a setembro - €8,00*5dias*4semanas*10meses
5.9.2 – € 336,00 ano 2020: janeiro e fevereiro - €8,40*5dias*4semanas*2meses;
 6 - €1.330,00
6.1- €1.100,00 Ano 2019: janeiro a dezembro: €110,00*10meses;
6.2- €230,00 Ano 2020: janeiro e fevereiro: €115,00*2;
 6.3 - €4.217,79 a titulo de cláusula 61.º do CCTV;
 6.4 - €178,16 a titulo de complemento salarial até ../../2019;
 6.5 - €1.321,92 a titulo de complemento salarial após ../../2019;
 6.6 - €540,00 a título de compensação (a recibo de março de 2020);
 6.7 - Subsidiariamente (não se provando que o autor auferia o salário de € 1350,00, mas apenas de 700,00€);
6.7.1- € 872,54, a titulo de fecho de contas processado, mas não pago;
6.7.2 - € 7.073,68 trabalho suplementar, trabalho noturno; dias de descanso trabalhados e feriados e bem assim, descansos complementares;
 6.8 - € 58,00 de duodécimo do subsídio de natal (baixa médica de agosto de 2018);
 6.9 – condenada a ré a pagar ao autor juros de mora à taxa legal, vencidos e vincendos, sobre as referidas quantias.
Alega, em síntese, que foi contratado pela ré em 12/03/2019, para sob a autoridade e direção desta exercer as funções de funções de motorista de pesados, tendo sido acordado verbalmente o pagamento da retribuição mensal de €1.350,00 líquidos, apesar do que consta no contrato e nos recibos de vencimento, acrescida de subsídio de risco, cláusula 61.º e complemento salarial, contrato esse celebrado pelo prazo de seis meses.
Mais alega que o contrato não contém a mínima justificação para a sua celebração a termo, motivo pelo qual deve ser considerado sem termo, o que torna ilícita a comunicação que a ré lhe dirigiu em 11.02.2020 de que o contrato de trabalho não se renovaria e por isso terminaria, no dia 12/03/2020, data em que o seu contrato de trabalho cessava todos os seus efeitos Pede a condenação da ré no pagamento de todos os danos patrimoniais tidos que se cifram nas retribuições deixadas de auferir desde o despedimento, bem assim, a reintegrar o Autor no seu local de trabalho e nas suas funções caso o mesmo não opte nos termos do disposto no artigo 391.º pela indemnização em substituição da reintegração.
Mais alega não lhe terem sido pagos os créditos laborais de harmonia com a retribuição base fixada, nem o trabalho suplementar efetuado, para além de uma série de outros créditos laborais que reclama, e supra cabalmente descriminados.

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Regularmente notificada para o efeito, a ré contestou. Admite a existência do contrato de trabalho, mas impugna a alegada nulidade do termo aposto no contrato dizendo terem sido comunicados ao autor os factos que justificavam a sua celebração a termo e, do mesmo modo a existência do alegado acordo verbal quanto à fixação da retribuição base. Entende, por isso, que a comunicação de caducidade é legal e não existe qualquer despedimento ilícito. Alega que todas as quantias devidas ao autor estão pagas, nada mais havendo a pagar.
Termina pedindo a improcedência da ação e a sua absolvição do pedido.
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- Por requerimento de 27-12-2022 o autor pede a junção aos autos do acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto o “qual apesar do o A. não ser parte é parte a Ré e, outro trabalhador sendo que, aí eram discutidas as mesmas questões que nos presentes autos. Nomeadamente a questão da retribuição”. Refere que “decisão ali proferida pode para este caso resultar num verdadeiro ocorrência de efeito de autoridade de caso julgado pois que, no que respeita à retribuição dos trabalhadores mostra-se esse facto provado.”
Por requerimento e 23-2-2023 pede a junção da decisão de primeira instância relativa ao mesmo processo.
- Tal junção foi indeferida por decisão de 18-8-2023 (prévia à sentença final), constando designadamente da fundamentação:
“não concebemos como possa aquela decisão impor-se “como pressuposto indiscutível da sentença a proferir nestes autos”, sendo manifesta a inexistência de relação de prejudicialidade entre os respetivos objetos, o objeto do processo 1477/20.... do Juízo do Trabalho da ... não constitui (nem pode constituir) questão prejudicial nestes autos, como pressuposto necessário da decisão de mérito que nesta há de ser proferida (art.º 581º do CPC). Percebe-se o interesse processual subjacente ao requerimento do autor, no entanto os argumentos que aduz não merecem acolhimento.
Adicionalmente, deixamos escrito que analisada a sentença e o acórdão objeto do requerimento em apreço, destacamos na sentença a parte atinente à motivação relativa à prova dos factos elencados sob as letras d) , g) , i) e j), os quais determinaram ou fundamentaram a procedência dos dois pedidos principais deduzidos nesses autos, quais sejam, o valor da retribuição base acordada entre as partes e em decorrência, o de pagamento ao autor das peticionadas diferenças salariais apuradas com base no mesmo. Ora, lida a sentença verifica-se que os factos d), g), i) e j), foram julgados confessados por ter sido admitido o depoimento de parte quanto a estes e o legal representante da ré, apesar de regulamente notificado para o prestar faltou à audiência de julgamento. Escreveu-se na sentença proferida pelo Tribunal de Trabalho da ... que “O Legal Representante da Ré não compareceu em Juízo, nada disse ao Tribunal no dia da audiência final, nem o seu Ilustre Mandatário sabia do seu paradeiro, o que significa que nem sequer alegou justo impedimento para comparecer em Juízo, muito menos provou o justo impedimento.
Acresce que nem sequer cuidou de justificar a sua falta nos termos do artigo 603.º, n.º 3 do Código de Processo Civil “A falta de qualquer pessoa que deva comparecer é justificada na própria audiência ou nos cinco dias imediatos”. A conduta adotada pelo Legal Representante da Ré é a de que o Tribunal nem sequer existe, aliás, nem o seu Ilustre Mandatário existe, pois nem este sabe o que aconteceu ao Legal Representante da Ré. Esta conduta só pode demonstrar que os factos alegados pelo Autor são verdadeiros e, por essa razão não compareceu em Juízo e nada disse, pois nada havia a dizer e, declarar o contrário seria cometer o crime de falsidade de depoimento” - …
No recurso de apelação interposto pela ré da sentença que julgou parcialmente procedente a ação, pugna a ré, entre o mais, pela alteração de tal decisão, designadamente, no sentido de se julgar não provados os factos referidos objeto do depoimento de parte, no entendimento de que o autor não ficou impossibilitado de fazer a prova que lhe competia quanto ao trabalho suplementar e valor da retribuição base. Contudo os fundamentos invocados não foram concretamente apreciados porque o recurso não foi admitido por extemporâneo…”
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Realizado julgamento foi proferida a seguinte decisão:
Assim e nos termos expostos, julgo a ação parcialmente procedente por provada e, consequentemente:
A) - declaro que o contrato de trabalho a termo certo celebrado entre o autor AA e a ré EMP01... – Transportes e Alugueres, S.A se converteu em contrato por tempo indeterminado por falta de indicação do motivo justificativo com a indicação expressa dos factos que o integram;
B) - declaro ilícita a cessação do contrato operada pela ré através de carta dirigida ao autor em 11.02.2020;
C) - condeno a ré a pagar ao autor as seguintes quantias:
1.1 - As retribuições devidas entre 09.05.2020 (30 dias antes da propositura da presente ação), até ao trânsito em julgado da presente sentença, deduzidas desde já as quantias indicadas nas als. b) e c) do nº 2 do art. 391º do CT e
1.2- €2.061,10 a título de indemnização em substituição da reintegração.
1.3 - As quantias referidas em 1.1 e 1.2, são acrescidas de juros de mora, à taxa legal, contados o trânsito em julgado desta decisão, até integral pagamento;
C - Condeno, ainda, a ré no pagamento ao autor a quantia de €452,54 a titulo de fecho de contas, acrescida de juros de mora, contados desde o trânsito em julgado da sentença até efetivo pagamento.
D - Do mais contra si peticionado pelo autor se absolve a ré - pedidos elencados no relatório sob os nºs 2, 3, 4, 5 e 6 - nºs 6 a 6.7 e 6.7.2 a 6.8…”
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Inconformado o autor interpôs recurso apresentado em síntese as seguintes conclusões:
- Não se concorda com o despacho de não admissão dos documentos juntos com os requerimentos de 27-12-2022 e 23-2-2023.
-  deveriam ter sido considerados os documentos apresentados pelo autor com a PI, nºs 45 a 54 e 60, e valoradas as declarações pelas testemunhas arroladas pelo recorrente.
- Não deveria ter sido dado como provado o que consta de E) (na medida de não ser retribuição base), W) e V).
- Deveria considerar-se provado o que consta de 2, 3, 14, 15, 16, 18, 19, 21, 22, 23, 24, 25, 26 e 27 da factualidade não provada.
- Foi acordado o vencimento base de 1.350 € acrescido dos montantes previstos no CCTV aplicável.
- A partir de agosto de 2019 o vencimento foi substancialmente reduzido, advinda da redução da verba paga a titulo de ajudas de custo, sem que tivesse ocorrido alteração do horário de trabalho. Deduzem, por decorrência da participação e apoio à greve.
- Aquela verba era manipulada até atingir os valores pretendidos. Só com a soma de verbas adicionais é que era possível alcançar o montante que a recorrida havia prometido aos trabalhadores, já que a retribuição base que constava nos recibos era inferior ao valor acordado.
- Exerceu com carater regular um horário aproximadamente de 10 horas diárias, ultrapassando as 40 horas semanais, realizando igualmente trabalho noturno, não pagos.
- Não foi pago trabalho prestado em dia de descanso, sábados.
- Andou mal o tribunal na apreciação dos seguintes pontos; autoridade do caso julgado; inversão do ónus de prova e os registos dos tempos de trabalho desempenhados; sistema retributivo aplicável; a (não) aplicação do Reg. Comunitátrio nº 561/2006; a cláusula 61 do CCTV em vigor e o conceito de retribuição.
- A sentença deve ser revogada no que respeita à questão da retribuição base e ao pagamento dos créditos salarias por violação, além do mais, do disposto nos artigos 258 e 262 do CT; clausulas 34, 43, 52 e 51 da CCTV e artigo 344 do CC.
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Sem contra-alegações.
Neste tribunal, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso, sustentando inexistência de caso julgado e dos pressupostos para inversão do ónus da prova.
Colhidos os vistos dos Ex.mos Srs. Adjuntos há que conhecer do recurso.
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Factualidade:
A. A Ré exerce, entre outras, a atividade de Transportes rodoviários de mercadorias e combustível de âmbito nacional e internacional, aluguer de veículos automóveis com ou sem condutor e aluguer de máquinas e equipamentos com e sem operador;
B. Mostra-se junto aos autos com a petição inicial um documento com o nº ..., assinado por autor e ré na qualidade de segundo e primeiro contraentes, respetivamente, intitulado “Contrato de trabalho a termo resolutivo” com a data de 12.03.2019, onde constam as clausulas seguintes:
 1ª - “O presente contrato é celebrado pelo período de seis meses, automaticamente renovável nos termos dos Art. os 148º, 149º e 140º, nº. 1 e nº 2, alínea f), do Código do Trabalho e destina-se a satisfazer uma necessidade excecional e temporária da atividade da empresa, resultante de responder de forma eficaz ao contrato de transporte celebrado com o cliente EMP02..., SGPS, S.A., cuja duração não se prevê que seja superior a esse período e cuja adjudicação à primeira contraente exige um aumento global do número de motoristas, nas quais esta contratação se enquadra”.
 2ª - “O segundo contratante compromete-se a exercer por conta e sob a autoridade e direção da primeira as funções Inerentes à categoria de motorista, possuindo as habilitações exigidas por lei, tem a seu cargo a condução de veículos automóveis ligeiros ou pesados (…);
 2ª, nº 2 - “O segundo contraente desempenhará, ainda, funções de carga e descarga no âmbito dos serviços de transporte de matérias perigosas”.
 3ª - “Aquando das deslocações que, por ordem da primeira contraente, efetuar, o segundo contraente terá a seu cargo a condução de veículos automóveis pesados, com ou sem atrelado”. (…)
 8ª - “O local de prestação de serviço situa-se na sede, ou noutro local onde a primeira contraente desenvolva a sua atividade ou nos locais abrangidos pelo título de licenciamento das viaturas que lhe forem confiadas, que poderá incluir todo o território continental português e também estrangeiro, num período normal de trabalho de quarenta horas semanais, prestado em regime de horário flexível e móvel”.
 8ª, nº 2 - A entidade patronal poderá unilateralmente e em qualquer caso alterar o local de trabalho do segundo contraente; (…)
 9ª – “A primeira contraente pagará ao segundo a retribuição mensal ilíquida de € 630,00 (seiscentos e trinta euros), correspondente à sua categoria de motorista de pesados. (…)
 10ª, nº 1 - Para além da retribuição, receberá ainda, de acordo com a prática da empresa, um montante, discriminado no recibo a título de ajudas de custo que se destina a compensar os valores devidos pelo trabalho suplementar prestado e alimentação e não incluído na cláusula 61ª do CCT aplicável, que não sejam expressamente discriminados no recibo a outros títulos.
 10ª, nº 2 - Desde já, o segundo contraente aceita tal forma de pagamento substitutivo das cláusulas do CCTV referidas no número anterior, reconhecendo tal sistema como mais favorável e que os montantes devidos a esse título se encontram incluídos no esquema acordado entre as partes, nada mais tendo a exigir pelos mesmos.
 10ª, nº 3 - O esquema especial de ajudas de custo em prática na empresa, do qual o segundo contraente declara que tomou conhecimento no momento da celebração deste contrato, é substitutivo, por acordo de ambas as partes, do pagamento discriminado dos direitos previstos no CCTV.
 11ª - A primeira contraente pagará ainda ao segundo: um subsídio de férias e férias remuneradas nos termos da lei; um subsídio de natal correspondente ao período de trabalho (…).”
 “14ª Este contrato caduca, nos termos do Art. 344º do Código do Trabalho, através de comunicação escrita efetuada pela primeira contraente ao segundo, do termo do mesmo, com a antecedência mínima de quinze dias”.
 18ª - O presente contrato é feito e assinado em duplicado por ambos os contraentes, ficando cada um com um exemplar, sendo o original selado pela primeira contraente e uma cópia para o segundo”.
C. Mostra-se junta aos autos com a petição inicial como documento nº ..., uma carta enviada pela ré ao autor, que a recebeu, com o teor seguinte:
“Data 11.02.2020, com assunto “caducidade do contrato de trabalho a termo certo”;
“Serve a presente para comunicar a V. Exa. de que esta empresa não irá proceder à renovação do contrato de trabalho entre nós celebrado em ../../2019. Assim, a partir do próximo dia 11 de março de 2020 ocorrerá a caducidade do mesmo, nos termos dos arts.  343º, alínea a) e 344º, nº. 1, ambos do Código do Trabalho, com a consequente cessação da relação. Mais informamos V. Exa. de que, em virtude dessa cessação, será colocada à sua disposição a respetiva compensação legal. A partir desta data e até à data da cessação do contrato de trabalho determina-se a V. Exa o gozo de período de férias, nos termos do Art. 241º, nº. 5 do Código do Trabalho”.
D. O autor no âmbito da execução do contrato referido em B), desempenhou as funções de motorista de veículos pesados de transporte de combustíveis pelas rotas determinadas pela ré;
E.  Alterado (…) aquando da contratação do autor foi verbalmente acordado que o autor auferiria o rendimento mensal liquido de €1.350,00;
F. (…) nos recibos de vencimento juntos aos autos como documentos ...2 a ...2, ...5 e ...7 consta a retribuição base de €630,00 e a partir de janeiro de 2020 o valor de €700,00, ao qual acrescem os valores do subsídio de risco, ajudas de custo, cláusula 61.º complemento salarial e ajudas de custo).
G. A ré pagou ao autor o subsídio de natal calculado sobre o vencimento base, primeiro € 630,00 depois €700,00;
H. O horário de trabalho fixado na cláusula 8.ª, in fine, do contrato de trabalho referido em B), é de cinco dias por semana, num total de 40 horas semanais, prestado em regime de horário flexível e móvel, em função dos serviços distribuídos pelos responsáveis da ré ao autor.
I. O autor apoiou os colegas que fizeram greve de uma semana em agosto de 2019, de âmbito nacional, do setor de transporte de matérias perigosas. Entre o mais, era revindicação dos trabalhadores que o processamento de salários descriminasse o trabalho suplementar, trabalho noturno e ajudas de custo e acordo com as CCT aplicáveis ao sector;
J. (…) à data da greve o autor encontrava-se de baixa devido a um acidente;
K. Após a greve (referida em I), a ré alterou o modo de processamento dos salários;
L. (…) essa alteração implicou uma diminuição do valor liquido da retribuição paga aos trabalhadores, nestes se incluindo o autor.
M. A celebração o contrato de transporte entre a ré e o cliente EMP02..., SGPS, S.A. (cfr. 1ª clausula do contrato referido em B), ocasionou um acréscimo da atividade e de necessidade de mão de obra da ré;
N. (…) em 11.02.2020, data da não renovação do contrato de trabalho dos autos, a ré mantinha as necessidades de mão de obra existentes à data da contratação do autor;
O. (…) incluindo os fornecimentos para a cliente “EMP02..., SGPS, S.A”, rotas e as cargas efetuadas pelo autor;
P. (…) a “EMP02..., SGPS, S.A” e a ré fazem parte do EMP02..., e os serviços de transporte de combustíveis efetuados pelo autor tinham como destino, além desta, outras empresas.
Q. A contração do autor satisfez uma necessidade permanente de trabalhadores da ré.
R. No ano de 2019 a ré pagou ao autor os valores líquidos de €502,03 a título de subsídio de férias;
€571,92 a título de subsídio de natal e €479,43 a título de férias. (art. 65º da petição inicial)
S. O autor não recebeu da ré os valores referidos no recibo de vencimento de março de 2020 (documento nº ...7), no total de €872,54, descriminado pelas rubricas; vencimento base €256,67 (relativo ao mês da demissão), complemento salarial, cláusula 61, subsidio de risco, subsidio operação cisterna (…), ajudas de custo (€78,50); segurança social, IRS (…) e Natal duodécimos 100%: €19,51; compensação pecuniária por cessação €420,00.
T. O autor desempenhou as funções de motorista de transporte combustíveis de âmbito nacional (sem pernoita fora do território nacional).
U. O horário de trabalho do autor referido em H) era móvel (artigo 82.º da contestação);
V. (…) autor executou em média de 40 horas semanais, sem que estivessem definidos os dias fixos de descanso semanal, sendo que os mesmos resultavam dos limites dos períodos de condução e de repouso semanal;
W. (…) nem sempre os dias de descanso coincidam com o sábado e com o domingo.
Aditado:
- O autor trabalhou nos dias indicados no doc. ...5 junto com a petição inicial, com os períodos de início e fim ali referenciados.
- Do cartão do trabalhador, e tendo em conta os dados registados tal como introduzidos por este, resultam os tempos de condução, descanso, e tempo de serviço referenciados no doc. ...5 junto com a petição inicial cujos dizeres se dão por reproduzidos, resultando designadamente os seguintes tempos de serviço:
13-mar 10:37 / 14-mar 12:14 / 15-mar 8:58 / 18-mar 12:32 / 20-mar 4:14 / 21-mar 10:54 / 22-mar 10:03 / 23-mar 5:45 / 25-mar 11:08 / 26-mar 10:44 / 01-abr 6:48 / 02-abr 8:06 / 03-abr 9:49 / 04-abr 8:16 / 05-abr 11:09 / 08-abr 6:33 / 09-abr 10:17 / 10-abr 8:41 / 11-abr 10:54 / 12-abr 11:29 / 13-abr 8:47 / 27-abr 6:41 / 07-mai 9:07 / 08-mai 8:38 / 09-mai 10:06 / 10-mai 9:42 / 13-mai 9:13 / 14-mai 10:17 / 15-mai 11:02 / 16-mai 9:22 / 17-mai 11:34 / 18-mai 5:54 / 21-mai 9:28 / 22-mai 10:04 / 23-mai 9:20 / 24-mai 9:14 / 27-mai 10:37 / 28-mai 7:22 / 29-mai 6:17 / 30-mai 9:53 / 31-mai 7:45 / 03-jun 8:55 / 04-jun 10:12 / 05-jun 8:41 / 06-jun 6:49 / 10-jun 6:23 / 11-jun 8:03 / 12-jun 10:55 / 13-jun 11:01 / 14-jun 10:58 / 17-jun 9:48 / 18-jun 9:04 / 19-jun 10:56 / 20-jun 7:50 / 21-jun 7:41 / 22- jun 3:13 / 24-jun 4:15 / 25-jun 05:00 8:08 / 26-jun 12:13 / 27-jun 9:03 / 28-jun 9:46 / 01-jul 8:34 / 02-jul 9:43 / 03-jul 8:31 / 04-jul 10:45 / 05-jul 10:22 / 08-jul 9:58 / 09-jul 10:23 / 10-jul 9:59 / 12-jul 9:38 / 13-jul 9:54 / 15-jul 10:19 / 16-jul 9:28 / 17-jul 10:25 / 18-jul 8:43 / 19-jul 10:49 /… 29-jul 9:05 / 30-jul 11:02 / 31-jul 10:57 / 01-ago 8:23 / 02-ago 11:21 / 03-ago 8:23 / 02-set 9:01 / 03-set 10:32 / 04-set 10:07 / 05-set 9:11 / 06-set 9:28 / 09-set 8:08 / 10-set 11:08 / 11-set 8:36 / 12-set 11:35 / 13-set 10:22 / 16-set 8:31 / 17-set 9:27 / 18-set 11:49 / 19-set 9:59 / 20-set 8:27 / 21-set 4:59 / 23-set 9:38 / 24-set 7:55 / 25-set 9:34 / 26-set 8:21 / 27-set 8:27 / 30-set 8:25 / 01-out 9:52 / 02 e 3 -out 33:40 / 04-out 8:03 / 07-out 10:37 / 08-out 8:04  / 09-out 10:06 / 10-out 11:09 / 11-out 8:13 / 14-out 11:14 / 15-out 10:08 / 16-out 8:39 / 17-out 10:14 / 18-out 9:46 / 21-out 8:47 / 22-out 7:13 / 23-out 7:48 / 24-out 7:06 / 25-26 out 9:25 / 28-out 7:50 / 29-out 8:31 / 30-out 8:07 / 31-out 8:03 / 18-nov 7:06 / 19-nov  9:03 / 20-nov 9:24 / 21-nov 9:24 / 22-nov 8:10 / 25-nov 8:14 / 26-nov 10:04 / 27-nov 10:25 / 28-nov 6:17 / 29-nov 8:35 / 02-dez 8:25 / 03-dez 7:56 / 04-dez 9:31 / 05-dez 8:46 / 06-dez 8:33 / 09-dez 6:31 / 12-dez 7:20 / 13-dez 7:52 / 16-dez 9:32 / 17-dez 10:31 / 18-dez 9:31 / 19-dez 10:32 / 20-dez 10:32 / 23-dez 8:54 / 24-dez 4:57 / 26-dez 9:43 / 27-dez 6:08 / 30-dez 8:43 / 31-dez 8:53.
*
Factos não provados
1. As funções de motorista de camiões de transporte de combustíveis referidas em D), desempenhadas pelo autor, tivessem sido primordialmente carregamentos em ... para entrega em Portugal;
2. Tenha sido verbalmente acordado entre autor e ré que a retribuição base do autor fosse de € 1.350,00 mensais líquidos;
3. O valor referido em E), fosse acrescido de subsídio de risco; cláusula 61.º; ajudas de custos; trabalho suplementar; trabalho noturno/subsídio, noturno e complemento salarial.
4. (…) o autor tenha recebido ao longo dos meses que trabalhou para a ré, com caracter regular e permanente, a retribuição base liquida de €1.350,00 acrescida de subsídio de risco, cláusula 61.º e complemento salarial;
5. Nos recibos de vencimento referidos em F) o valor global líquido da retribuição perfez o valor global líquido de €1.350,00;
6. (…) o valor de €1.350,00 tenha sido até ../../2019 garantido pela ré ao autor independentemente do tempo de trabalho efetivo;
7. (…) em decorrência também não se provou que tal valor “fixo” e “exato” fosse obtido através do valor da rubrica ajudas de custo e,
8. (…) que tal valor tenha sido pago ao autor até ../../2019;
9. Após ../../2019 a retribuição mensal paga pela ré ao autor tivesse passado a ser €1.050,00/€1.100,00;
10. (…) seja injustificado valor da retribuição mensal inferior a 1.350,00 auferida pelo autor;
11. A ré tenha imposto ao autor a assinatura do contrato referido em B);
12. A ré tenha unilateralmente decidido incluir o pagamento do valor das horas do trabalho suplementar e noturno na rubrica ajudas de custo;
13. (…) e imposto esse modo de processamento de tais rubricas ao autor;
14. (…) a ré tenha atuado com o propósito de confundir e impossibilitar o autor de exigir o pagamento do excesso de horas de trabalho suplementar que lhe viria a impor;
15. (…) e impedir, também, que o valor devido a titulo de trabalho suplementar e noturno integrassem o valor da retribuição e desta feita, não se refletissem no valor de calculo do subsídio de férias, de natal e retribuição de férias;
16. (…) independentemente das horas que o autor trabalhasse receberia sempre o mesmo valor de €1.350,00;
17. O contrato referido em B) esteja apenas assinado pelo autor;
18. A ré pagasse mensalmente ao autor ajudas de custo até perfazer, pelo menos, o valor da retribuição acordada de €1.350,00;
19. O horário praticado pelo autor, desde o inicio até ao termo do contrato dos autos, tivesse sido o seguinte (art. 24 da petição inicial):
Dia/Mês Entrada Saída Total
(…)
20. O autor tenha participado na greve referida em I).
21. A diminuição do valor liquido da retribuição paga ao autor referida em K) e L) tenha resultado da diminuição injustificada do montante pago a titulo de ajudas de custo;
22. (…) facto referido em L) tenha ocorrido apesar do autor ter trabalhando as mesmas horas;
23. (…) a diminuição da retribuição tenha sido retaliação da ré por o autor ter apoiado os seus colegas na greve de agosto de 2019.
24. O autor tenha prestado para a ré o trabalho extraordinário constante da tabela seguinte (art.71ºdo petição inicial):
(…)
25. O autor tenha trabalhado, no ano de 2019, nos dias de feriado seguintes (art. 86 da petição inicial): 19/04 (das 08:00 às 18:45), no dia 25/04 (das 05:00 às 14:00) e no dia 20/06 (das 05:00 às 15:30).
26. O autor tenha trabalhado em dias correspondentes a descanso semanal e descanso complementar (tabela art.84 da petição inicial), designadamente: 23/mar das 05:00 às 12:00; 20/abr das 04:30 às 16:00; 27/abr das 04:30 às 13:00;18/mai das 03:30 às 10:30;13/jul das 05:00 às 17:00 e 28/dez das 05:00 às 11:00
27. O autor tenha prestado trabalho suplementar (trabalho noturno; dias de descanso trabalhados e feriados e bem assim, descansos complementares) a seguir descritos (facto alegado no art.100º da petição inicial):
Trabalho suplementar (…)
28. Em resultado da execução do contrato de trabalho o autor tenha entrado em estado depressivo, de angústia e cansaço do qual ainda hoje não recuperou.
29. A contratação do autor se tenha destinado a satisfazer um acréscimo temporário da atividade da empresa, resultante da adjudicação de serviços de transporte contratados com o cliente EMP02..., SGPS, S.A.
30. O autor fizesse cargas e descargas em Portugal e ... (que fosse motorista ibérico).
31. A ré tenha pago ao autor o subsídio de férias calculado sobre o vencimento base, primeiro € 630,00 depois €700,00.
***
Conhecendo do recurso:

Nos termos dos artigos 635º, 4 e 639º do CPC, o âmbito do recurso encontra-se balizado pelas conclusões do recorrente.

Questões a apreciar:
- Recurso do despacho de não admissão de documentos (requerimentos de 27-12-2022 e 23-2-2023) – decisões de primeira instância e acórdão da relação do Porto - / Apreciação da questão da autoridade do caso julgado.
- Impugnação a decisão relativa à matéria de facto no que respeita aos pontos:
- Pretende o recorrente que não deveria ter sido dado como provado o que consta de E) (na medida de não ser retribuição base), W) e V).
- Deveria considerar-se provado o que consta de 2, 3, 14, 15, 16, 18, 19, 21, 22, 23, 24, 25, 26 e 27 da factualidade não provada.
- Valor do salário base e Créditos – trabalho suplementar, trabalho prestado em fins de semana.
- Questiona ainda as decisões quanto às seguintes questões:
“inversão do ónus de prova; registos dos tempos de trabalho desempenhados; sistema retributivo aplicável; a (não) aplicação do Reg. Comunitário nº 561/2006; a cláusula 61 do CCTV em vigor e o conceito de retribuição.
***
- Recurso do despacho de não admissão de documentos (requerimentos de 27-12-2022 e 23-2-2023) – decisões de primeira instância e acórdão da relação do Porto. Apreciação da questão da autoridade do caso julgado.
O recorrente requer a junção do documento, tendo em vista, nas suas palavras, “ trata-se de uma decisão cuja a junção se mostra essencial para a descoberta da verdade e, para a segurança jurídica nomeadamente, o prestígio dos tribunais... Acresce que, a decisão ali proferida pode para este caso resultar num verdadeiro ocorrência de efeito de autoridade de caso julgado pois que, no que respeita à retribuição dos trabalhadores mostra-se esse facto provado…deste modo, discutir-se novamente nesta ação a matéria que foi já julgada provada naquele outro processo, contraria a decisão ali proferida, o que, redundará, afigura-se-nos, numa violação de autoridade de caso julgado…”
Na decisão de indeferimento fundamentou-se referenciando que, “não concebemos como possa aquela decisão impor-se “como pressuposto indiscutível da sentença a proferir nestes autos”, sendo manifesta a inexistência de relação de prejudicialidade entre os respetivos objetos, o objeto do processo 1477/20.... do Juízo do Trabalho da ... não constitui (nem pode constituir) questão prejudicial nestes autos, como pressuposto necessário da decisão de mérito que nesta há de ser proferida (art.º 581º do CPC). Percebe-se o interesse processual subjacente ao requerimento do autor, no entanto os argumentos que aduz não merecem acolhimento.”
E conclui-se, “nenhum contributo traria à boa decisão a proferir nestes autos a junção ao processo da sentença proferida pelo Tribunal de Trabalho da ... e do acórdão do Tribunal do Porto que decidiu não admitir o recurso de apelação interposto da mesma pela ré por ser extemporâneo. Julgamos que o requerimento do autor é injustificado, carecido de fundamento jurídico e irregular ao andamento do processo (apresentado após o termo da audiência de discussão e julgamento)…”.
No recurso interposto o recorrente invoca que a não admissão do recurso importa “violação do instituto da autoridade do caso julgado”.  Refere existir decisão prévia relativamente ao mesmo objeto processual, que já transitou em julgado. Refere o artigo 619º, 1 do CPC.
Não tem razão.

Dispõe o artigo 619º, nº 1, do CPC:
“Transitada em julgado a sentença ou o despacho saneador que decida do mérito da causa, a decisão sobre a relação material controvertida fica a ter força obrigatória dentro do processo e fora dele nos limites fixados pelos artigos 580.º e 581.º, sem prejuízo do disposto nos artigos 696.º a 702.º”.
Pretende-se evitar que a “mesma relação material controvertida”, venha a ser definida em moldes diversos.
Refere Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, 1979, pág. 305, que o caso julgado material “consiste em a definição dada à relação controvertida se impor a todos os tribunais (e até a quaisquer outras autoridades) – quando lhes seja submetida a mesma relação, quer a título principal (repetição da causa em que foi proferida a decisão), quer a título prejudicial (ação destinada a fazer valer outro efeito dessa relação). Todos têm que acatá-la, julgando em conformidade, sem nova discussão”.
Nos termos do normativo, a força obrigatória da decisão, fora do processo, tem o âmbito a extensão fixadas artigos 580.º e 581.º, sem prejuízo do disposto nos artigos 696.º a 702.º
Assim, o caso julgado material é delimitado através dos elementos que identificam a relação jurídica apreciada - (as partes, o pedido e a causa de pedir – artigos 580º e 581ª). É a concreta relação assim delimitada que se impõe e a que é atribuída autoridade do caso julgado. É esta concreta relação que não pode ser discutida de novo, nem contrariada por qualquer outra decisão.
Assim, e como se refere no Ac. RC de 28-09-2010, processo nº 392/09.6 TBCVL.C1;
“A autoridade de caso julgado importa a aceitação de uma decisão proferida em ação anterior, que se insere, quanto ao seu objeto, no objeto da segunda, visando obstar a que a relação ou situação jurídica material definida por uma sentença possa ser validamente definida de modo diverso por outra sentença (razão de certeza ou segurança jurídica) …”
E mais adiante refere o mesmo:
“A propósito dos limites subjetivos do caso julgado, muito embora a regra seja a vinculação entre as partes (eficácia relativa), há casos em que a sentença se projeta na esfera jurídica de terceiros, vinculando-os. Daí que tanto a doutrina, como a jurisprudência, tenham vindo a acolher a distinção entre “eficácia direta” e “eficácia reflexa” do caso julgado.
Neste contexto, assumem eficácia reflexa ou ultra partes, por exemplo as sentenças de anulação ou declarativas da nulidade de negócios, as proferidas em questões de estado, as formadas sobre uma relação jurídica que surge como fundamento de pretensões em ações posteriores ( cf., por ex, António Cunha, Limites Subjetivos do Caso Julgado, pág. 14 e segs.).
Para Teixeira de Sousa ( Estudos Sobre o Novo Processo Civil, pág.588 e segs.), a eficácia reflexa vincula qualquer sujeito a aceitar aquilo que foi decidido entre todos os sujeitos com legitimidade processual, isto é, “ quando a ação decorreu entre todos os interessados diretos (quer ativos, quer passivos) e, portanto, esgotou os sujeitos com legitimidade para discutir a tutela judicial de uma situação jurídica, pelo que aquilo que ficou definido entre os legítimos contraditores ( na expressão do art.2503 § único , CC/1867) deve ser aceite por qualquer terceiro”.
Ora, é desde logo patente que a presente sentença não afeta a relação material entre a ré e aquele outro trabalhador, nem sobre a mesma se pronuncia. Por outro, aquela relação material não é relevante no presente processo, ainda que a título prejudicial. O “objeto previamente julgado”, não pode ser “perspetivado como verdadeira relação condicionante” da relação material controvertida na presente ação.
“A atribuição de valor de caso julgado com base numa relação de prejudicialidade supõe ou exige que o fundamento da decisão transitada condicione a apreciação do objeto de uma ação posterior” - Ac. RC de 26-02-2019, processo nº 1600/16.2T8FIG.C1.
O facto de naquele processo ter ficado definido o salário invocado pelo autor, em relação a um colega deste, não pode impor-se no caso presente.
Tal implicaria, não com a autoridade do caso julgado; - pois que em relação aquele autor o salário base reconhecido é de 1350 €, não é posto em causa pelo que aqui for decidido, sendo diversas as relações materiais em apreciação num e noutro processo -; implicaria sim com o aproveitamento, quanto ao invocado facto, da prova naqueles autos produzida e das vicissitudes processuais que determinaram a consideração de tal facto como provado naqueles autos.
Como se refere no despacho recorrido, “lida a sentença verifica-se que os factos d), g), i) e j), foram julgados confessados por ter sido admitido o depoimento de parte quanto a estes e o legal representante da ré, apesar de regulamente notificado para o prestar faltou à audiência de julgamento. Escreveu-se na sentença proferida pelo Tribunal de Trabalho da ... que “O Legal Representante da Ré não compareceu em Juízo, nada disse ao Tribunal no dia da audiência final, nem o seu Ilustre Mandatário sabia do seu paradeiro, o que significa que nem sequer alegou justo impedimento para comparecer em Juízo, muito menos provou o justo impedimento.
Acresce que nem sequer cuidou de justificar a sua falta nos termos do artigo 603.º, n.º 3 do Código de Processo Civil “A falta de qualquer pessoa que deva comparecer é justificada na própria audiência ou nos cinco dias imediatos”. A conduta adotada pelo Legal Representante da Ré é a de que o Tribunal nem sequer existe, aliás, nem o seu Ilustre Mandatário existe, pois nem este sabe o que aconteceu ao Legal Representante da Ré. Esta conduta só pode demonstrar que os factos alegados pelo Autor são verdadeiros e, por essa razão não compareceu em Juízo e nada disse, pois nada havia a dizer e, declarar o contrário seria cometer o crime de falsidade de depoimento”. O tribunal de primeira instância considerou aquela factualidade por confissão ficta. A relação não chegou a apreciar o recurso.
Sobre o valor extraprocessual das provas refere o artigo 421º do CPC:
1 - Os depoimentos e perícias produzidos num processo com audiência contraditória da parte podem ser invocados noutro processo contra a mesma parte, sem prejuízo do disposto no n.º 3 do artigo 355.º do Código Civil; se, porém, o regime de produção da prova do primeiro processo oferecer às partes garantias inferiores às do segundo, os depoimentos e perícias produzidos no primeiro só valem no segundo como princípio de prova.
2 - O disposto no número anterior não tem aplicação quando o primeiro processo tiver sido anulado, na parte relativa à produção da prova que se pretende invocar.
Ora, desde logo, a norma referida não abrange a confissão ficta, como é entendimento pacífico – Danilo Cândido Portero, Valor Extraprocessual das Provas, Dissertação, FDUL, https://repositorio.ul.pt/bitstream/10451/50576/1/ulfd0149634_tese.pdf, pág. 56, referindo Rui Pinto, Código de processo civil: anotado. Coimbra: Edições Almedina, 2018, v. 1, p. 635 e Paulo Cunha, Paulo. Processo comum de declaração: apontamentos, anot. Artur Costa, Jaime Lemos. - 2ª ed. - Braga: Tip. Augusto Costa, 1944., v. 2, p. 71.
Por outro, o aproveitamento da prova, é apenas isso, não implica o aproveitamento da convicção que sobre essa prova o julgador daqueles outros autos formou. Apenas a prova em si é aproveitada, sujeita ao crivo da apreciação do julgador do processo onde a mesma vai ser aproveitada, e apreciada no computo de toda a prova nesses autos produzida.
Consequentemente é de confirmar a decisão recorrida.
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Impugnação a decisão relativa à matéria de facto no que respeita aos pontos:
Pretende a recorrente se considere não provados os factos:
E. (…) aquando da contratação do autor foi verbalmente acordado que o autor auferiria o rendimento mensal de €1.350,00.
Pretende se considere ter sido acordado tal valor como retribuição base, dando-se como provado o que consta de 2 e 3 dos factos não provados (aquando da contratação do autor foi verbalmente acordado entre autor e ré que a retribuição base do autor fosse de € 1.350,00 mensais líquidos; O valor referido em E), era acrescido de subsídio de risco; cláusula 61.º; ajudas de custos; trabalho suplementar; trabalho noturno/subsídio, noturno e complemento salarial.)
Invoca o recorrente o seu depoimento, os depoimentos de BB, CC.
No seu depoimento o autor refere que o DD lhe disse que eram 1350 euros mais o trabalho suplementar, “que era tudo remunerado”. O trabalho ao sábado era pago por fora mais o subsidio de risco. Os 1350 era só de vencimento.
O DD não confirma esta afirmação, aludindo a que os 1350 era com tudo. O BB deixa dúvidas quanto ao invocado salário como sendo o vencimento base. Embora referindo que era igual para todos, e que era o base, referiu que na entrevista “só nos falavam” nos 1350 “que nos davam”, “não falavam em mais nada, nem sábados por fora nem feriados, não falavam em nada, só falavam naquele dinheiro…”. Quanto ao acordado com o autor, referiu que não presenciou a conversa. O CC referiu igualmente que era 1350 euros, mais o resto. O Depoente, referiu que chegou a perguntar à menina do escritório, sobre valor e o que estava no recibo, e esta disse, “mas está a receber o que prometeram, está, o combinado”, continuando, “e ficamos assim”.  Resulta dos depoimentos das testemunhas, designadamente das referências a que era igual para todos, e que com os diversos valores se atingiam os 1350 euros, que se tratava de valor liquido. O BB, designadamente, referiu que faziam as contas todas para chegar a esse valor. O DD referiu que tudo contado rondaria mais ou menos aquele valor. Os depoentes referidos aludiram à diminuição desse valor liquido após a greve.
Resulta da conjugação dos depoimentos, o acerto do decidido quanto a esta matéria, no que se refere a não se tratar e vencimento base, até porque não se apresenta qualquer motivo para uma disparidade da ordem apresentada em relação ao base constante do CCT aplicável. O depoimento de DD vai nesse sentido, e do depoimento de BB depreende-se que o que a empresa transmitia que era o valor liquido que no final do mês levariam para casa, em média. A Depoente EE referiu que cumpriam o contrato coletivo. O teor dos contratos assinados aponta no mesmo sentido, bem como o modo como o contrato foi sendo executado, designadamente os recibos de pagamento.
É de manter o decidido, esclarecendo-se que tal valor seria liquido.
Assim altera-se o facto nos seguintes termos:
E. (…) aquando da contratação do autor foi verbalmente acordado que o autor auferiria o rendimento mensal liquido de €1.350,00.
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V. (…) autor executou em média de 40 horas semanais, sem que estivessem definidos os dias fixos de descanso semanal, sendo que os mesmos resultavam dos limites dos períodos de condução e de repouso semanal;
19. O horário praticado pelo autor, desde o inicio até ao termo do contrato dos autos, tivesse sido o seguinte (art. 24 da petição inicial): (…)
24. O autor tenha prestado para a ré o trabalho extraordinário constante da tabela seguinte (art.71ºdo petição inicial): (…)
Sustenta a recorrente que trabalhava 10 a 12 horas por dia tendo praticado o horário, as horas referenciadas nas tabelas constantes dos indicados artigos da PI.
Invoca a mesma prova, e os elementos documentais juntos, como docs. ...3 a ...6.
Refere-se na fundamentação:
“Relativamente às declarações de parte prestadas em sede de audiência final, refere-se, em síntese, que o autor AA…, também não soube dizer concretamente os dias em que prestou um e outro tipo de trabalho (afirmou que “nunca pediu uma concreta quantia, não fez as contas, não pediu nada”). À pergunta sobre o critério usado na construção das tabelas insertas na petição inicial (cfr. arts. 24, 86 e 100), responder não saber concretamente as datas em que trabalhou. Fez a “descarga” do cartão de condutor e entregou essa impressão, conjuntamente com a agenda onde fazia as anotações dos dias em que trabalhou, ao Sr. Advogado tendo sido este quem elaborou tais tabelas. À pergunta se fez a conferência, ou controlo, das datas e tempos aí referidos respondeu que não concluindo, nesta parte, que os tempos de trabalho “estão todos no tacógrafo” e gravados em alguns discos (porque alguns camiões não estavam equipados com tacógrafos)… a discordância com a ré que traz ao Tribunal assenta no facto das ajudas de custo terem assumido um valor variável e na medida do necessário para que a final do mês recebesse o valor acordado de €1.350,00, sendo esse procedimento um modo “encapotado” empregue pela ré para efetuar o pagamento de trabalho suplementar…
A testemunha BB… quanto ao horário de trabalho do autor, disse que desconhecer qual era e que a possibilidade de demonstrar o horário praticado era guardar cópias do CMR, porque este registo é preenchido pelo motorista, destinando-se a primeira folha do documento ao expedidor, tendo podido o autor ficar com esta, tal como a testemunha fez algumas vezes para provar as horas que trabalhou.
Os “discos” são alternativos ao tacógrafo, são registos diários que têm de ser preenchidos pelo motorista com indicação do local de onde arranca, identificação do condutor e destino, entre outra informação. Quanto ao “cartão de motorista” a ré fazia a descarga e os motoristas tinham a possibilidade de ficar com uma cópia para si. Essa descarga deve ser feita uma vez por mês, “a ré não estava em cima dos motoristas, às vezes avisava-os” … Embora tenha afirmado que o horário de trabalho do autor das 5:00 às 16:00 horas, conclui ante os esclarecimentos solicitados a esse respeito que a um tal período haveria de ser feita a dedução dos tempos de descanso de condução de 45 minutos por cada 4 horas de condução e da pausa para o almoço… Não soube dizer ao tribunal quantas horas extraordinárias nem em que sábados o autor trabalhou.
A testemunha CC…, O pagamento de “horas extras” nunca viu o autor a reclamar, mas ele dizia-lhe que reclamava… Quanto ao horário de trabalho do autor referiu que o descanso era ao domingo, mas que era raro o autor trabalhar ao sábado.
Em sede de esclarecimentos à afirmação de que o horário de entrada ao trabalho era para todos os motoristas da ré à data dos factos às 5 horas, admitiu que o autor não praticou esse horário nos dias 1 a 31.10.2019, que existiam exceções e horários de turnos (o que resultou da exibição do horário descrito no documento nº ...5), e concretamente que houve vários dias em que o autor não cumpriu horário, mas não sabendo dizer quando tal aconteceu…”
Os depoimentos indicados pelo recorrente referiram que havia hora de entrada, às 5, e não havia de saída, era quando acabasse serviço. O DD referiu que não era ordenado entrar às 5, mas sim às 7, pois para empresa era indiferente fazer o serviço entre as cinco e as quinze ou entre as sete e as 17 determinada hora. Na empresa pediram para pegarem às sete da manhã, eles faziam antes porque é mais fácil por causa do trânsito. A escala tanto se cumpre a pegar às 5 como às 7, referiu DD. Mais referiu que na altura “andava” na media de 11 horas dia, mas não era trabalho efetivamente prestado, havia refeições, períodos de descanso. Podia haver dias 12 ou 13 horas e outros de 6.
 As tabelas indicadas pelo autor no artigo 24º e 71º não traduzem os tempos efetivos de serviço, não referenciando o tempo de refeições nem descansos.
A prova testemunhal relativa ao trabalho extra é genérica, referenciando os depoentes a prestação de tal trabalho, sem concretização, referindo que era quase todos os dias, e sem conhecimento especifico do caso particular do autor, a não ser por ele dizer, e que pedia à empresa para pagar. Referiram-se ao doc. ...5, disseram tratar-se de descarga do tacógrafo.
O alegado pelo autor quanto aos horários por si invocados como praticados, foi impugnado pela ré. Contudo não se vê que tenha sido posto em causa o doc. ...5 junto pelo autor. Quanto aos discos juntos, não foi produzida prova que dê credibilidade aos mesmos.
Os Docs 33 a 44 referem-se a boletins itinerários para efeitos de ajudas de custo, constando apenas hora de entrada e hora de saída. Dos mesmos, confrontados com o doc. ...5, não se depreendem os dias trabalhados, não há correspondência, não se percebendo, por outro, o critério subjacente à elaboração dos mesmos.
O doc. ...5, trata-se de uma descarga do cartão, como foi referenciado pelas testemunhas que sobre o mesmo se pronunciaram - (do sistema de descarga TachoSafe) -.
A ré, notificada para juntar aos autos, designadamente, “o horário de trabalho do A. e os registos de tacógrafos respetivos; documentos que devem respeitar ao período de duração do contrato ou seja, entre ../../2019 e ../../2020”; invocou não possuir horário, por se tratar de horário de trabalho móvel, e relativamente aos registos de tacógrafo referiu que, “considerando o período em causa, a R. já não possui os mesmos no seu arquivo. Nos termos do Regulamento Comunitário n.º 561/2006, o prazo de conservação dos registos de tacógrafo é de um ano, pelo que, após esse período não mantém a sua guarda, procedendo à sua destruição.”
Note-se que a ré teve conhecimento da ação em 23.6.2020, sendo que logo na petição inicial se requeria o seguinte; “D) requer-se que seja a Ré notificada para vir aos autos juntar as guias de transporte da mercadoria; o horário de trabalho do A. e os registos de tacógrafos respetivos; o mapa de férias do A. documentos que devem respeitar ao período de duração do contrato ou seja, entre ../../2019 e ../../2020.”
A ré, notificada para apresentar tais elementos, certificação Citius de 15-2-2022, veio responder:
“ 5. Relativamente aos registos de tacógrafo, considerando o período em causa, a R. já não possui os mesmos no seu arquivo.
6. Nos termos do Regulamento Comunitário n.º 561/2006, o prazo de conservação dos registos de tacógrafo é de um ano, pelo que, após esse período não mantém a sua guarda, procedendo à sua destruição. “
Não importa aqui, em fase de julgamento da matéria de facto, tomar posição sobre a inversão do ónus de prova, já que, tendo em conta o principio da aquisição processual, os factos ou estão provados ou não estão, de acordo com a convicção formada, sendo de chamar à colação as regras do ónus de prova apenas em sede de aplicação do direito e no caso de falta de prova relativamente a determinado facto.
Contudo importa referir que, ainda que o período de conservação fosse de um ano, como alegado pela ré, com base na norma do Regulamento (CE) Nº 561/2006 (alterado pelo Regulamento (UE) n. ° 165/2014) – a ré, ainda assim e relativamente aos registos de junho e até final, deveria ter providenciado pela sua manutenção.
Veja-se RG de 3-2-2022, processo nº 6173/20.9T8VNF-A.G1; “pelo menos a partir do momento que tomou conhecimento da existência da ação, a parte tem o dever de não destruir documentos ou provas que possam relevar para o pleito, ainda que lhe sejam desfavoráveis…
Pode mesmo configurar-se tal dever de conservação mesmo antes da entrada da ação, se a parte puder de acordo com as regras da experiência e a normalidade das coisas contar com ela. Será o caso designadamente de a contraparte já a ter inteirado dos seus intentos, se há contatos entre as partes em relação ao litigio, contactos entre advogados, etc… Desde que seja previsível o litigio o dever de conservação impõe-se nos termos do artigo 344º do CC e da boa-fé que deve reger a relação entre as partes. No caso não resultam por factos que demonstram que a ré deveria ter perspetivado a possibilidade de demanda quanto a esta matéria.”
Quanto ao prazo de conservação dos registos a ré não parece levar em linha de conta o disposto nas normas dos artigos 202º, nº 4 e 231º 8 do CT, e Portaria 7/2022 (anteriormente a portaria 983/2007).
O regulamento (CE) Nº 561/2006, refere; “a empresa deve conservar as folhas de registo e impressões, sempre que estas últimas tiverem sido feitas em cumprimento do n.º 1 do artigo 15.º , por ordem cronológica e de forma legível, durante um período de, pelo menos, um ano a partir da sua utilização” – No Regulamento (UE) N.º 165/2014 o nº 2 do artigo 33º. A conservação das folhas de registo e impressões extraídas dos registos digitais, não se confunde com a conservação dos registos que das mesmas resultam.
Por outro, o regulamento consagra um período mínimo, e tendo em vista o controlo policial relativo ao cumprimento das obrigações, “para a segurança rodoviária e para a condução racional do veículo” como resulta dos considerandos dos vários regulamentos que foram tratando de tal matéria.
De todo o modo, independentemente da posição sobre tal questão da inversão do ónus de prova; quando e se a mesma se impuser por falta de prova demonstração de determinado facto; a conduta da ré quanto ao oferecimento ou não de provas/colaboração, solicitadas, pode e deve ser livremente valorada em sede de apreciação da prova. O facto de ter destruído os elementos, a maioria dos solicitados, que sabia iam ser necessários, porque referenciados na PI, merece ponderação ao nível da apreciação das provas – incumprindo quiçá norma legal, conquanto não importe a esta sede uma tomada de posição sobre o período de obrigação de conservação dos registos
E fazemos esta referência, pois pode ocorrer que, referindo-se haver outros meios de prova pelos quais pode o trabalhador demonstrar o trabalho que prestou, e por tal razão não está impedido de demonstrar o facto, não sendo caso de inversão do ónus de prova;  depois não se valora positivamente a prova documental apresentada, porque impugnados pela ré, e julgada insuficiente em face da restante prova. Será normalmente difícil os colegas do autor constituírem prova cabal, já que normalmente referirão o que se passa consigo, apenas sabendo do que se passa com autor por dele ouvir dizer, ou por verificarem que assim era, mas sem possibilidade e concretização de dias e horas. Endentecendo-se não ocorrer uma “impossibilidade prática” de provar o facto, por causa imputável à outra parte, sempre importará uma menor exigência probatória (rebaixamento do standard).
A aplicação do Standard normal, em tais situações, implicará o aumento dos “falsos negativos”, seja, de não demonstração de realidades ocorridas (não consideração como provado trabalho efetivamente prestado), em prejuízo do trabalhador, com beneficio do empregador negligente ou infrator – Sobre o assunto -  Luís Filipe Pires de Sousa,  O Standard de Prova no Processo Civil e no Processo Penal, https://www.oa.pt/upl/%7B4b6f3e08-f2a4-47f2-950e-82552acc8b74%7D.pdf, pág, 2.
Lebre de Freitas refere um juízo de suficiente probabilidade ou verosimilhança – A livre apreciação da prova em processo civil”, in Scientia Iuridica, Jan-Abr 1984, Tomo XXXIII, nos. 187-188, p. 117.  Este juízo deve ser atingido, tendo em consideração as “exigências práticas da vida “ – Tomé Gomes, “Um olhar sobre a demanda da verdade no processo civil”, in Revista do CEJ, 2005, Nº 3, pp. 158-159 –.
De acordo com as regras da experiencia comum, não deve descurar-se o comportamento processual das partes, em casos como o que se apresenta. A experiência comum pode indicar-nos que, se os elementos solicitados forem favoráveis à ré, e sendo eles referidos na PI, quando aquela ainda os possuía, a mesma não os teria destruído. Não se trata de afirmação, com cunho de verdade absoluta, que não possa estar errada e não possa ser contrariada, contudo nada obstar à consideração do comportamento, na formulação da conclusão do julgador quanto ao facto em análise, e tendo em conta a totalidade da prova produzida.
Merece igualmente ponderação o facto de o trabalhador poder ele próprio descarregar os dados do cartão de motorista, bem como diligenciar por outros elementos, tal como os referidos na fundamentação da sentença recorrida.
Referencia o autor que o doc. ...5 constitui descarga do seu cartão, e nada apontando que assim não seja, apresentando a configuração do sistema de descarga TachoSafe, como pode conferir-se na net, sendo que facilmente a ré demonstrava o contrário apresentando os documentos solicitados. É de considerar tal elemento documental, tendo contudo em conta a atribuição de alguns tempos depende do trabalhador - disponibilidade, descansos, outros trabalhos -. A ré, impugnando o invocado pelo autor quanto aos períodos trabalhados, não questionou tal documento, que os depoentes confirmaram tratar-se de descarga do cartão do condutor. Assim, embora na falta de outros elementos não possa considerar-se terem sido efetuadas as horas de trabalho efetivas invocadas, (basta atentar nas horas de entrada e saída, descontar os valores normais de almoço e descanso, para se verificar algumas desconformidades, com o que seria normal, o trabalhador comeu uma sandes a conduzir, como sugeriu um depoente? Não há prova bastante para considerar a veracidade de tal afirmação. Assim é de dar como assente o seguinte:
- O autor trabalhou nos dias indicados no doc. ...5 junto com a petição inicial, com os períodos de início e fim ali referenciados.
- Do cartão do trabalhador, e tendo em conta os dados registados tal como introduzidos por este, resultam os tempos de condução, descanso, e tempo de serviço referenciados no doc. ...5 junto com a petição inicial cujos dizeres se dão por reproduzidos, resultando designadamente os seguintes tempos de serviço:
13-mar 10:37 / 14-mar 12:14 / 15-mar 8:58 / 18-mar 12:32 / 20-mar 4:14 / 21-mar 10:54 / 22-mar 10:03 / 23-mar 5:45 / 25-mar 11:08 / 26-mar 10:44 / 01-abr 6:48 / 02-abr 8:06 / 03-abr 9:49 / 04-abr 8:16 / 05-abr 11:09 / 08-abr 6:33 / 09-abr 10:17 / 10-abr 8:41 / 11-abr 10:54 / 12-abr 11:29 / 13-abr 8:47 / 27-abr 6:41 / 07-mai 9:07 / 08-mai 8:38 / 09-mai 10:06 / 10-mai 9:42 / 13-mai 9:13 / 14-mai 10:17 / 15-mai 11:02 / 16-mai 9:22 / 17-mai 11:34 / 18-mai 5:54 / 21-mai 9:28 / 22-mai 10:04 / 23-mai 9:20 / 24-mai 9:14 / 27-mai 10:37 / 28-mai 7:22 / 29-mai 6:17 / 30-mai 9:53 / 31-mai 7:45 / 03-jun 8:55 / 04-jun 10:12 / 05-jun 8:41 / 06-jun 6:49 / 10-jun 6:23 / 11-jun 8:03 / 12-jun 10:55 / 13-jun 11:01 / 14-jun 10:58 / 17-jun 9:48 / 18-jun 9:04 / 19-jun 10:56 / 20-jun 7:50 / 21-jun 7:41 / 22- jun 3:13 / 24-jun 4:15 / 25-jun 05:00 8:08 / 26-jun 12:13 / 27-jun 9:03 / 28-jun 9:46 / 01-jul 8:34 / 02-jul 9:43 / 03-jul 8:31 / 04-jul 10:45 / 05-jul 10:22 / 08-jul 9:58 / 09-jul 10:23 / 10-jul 9:59 / 12-jul 9:38 / 13-jul 9:54 / 15-jul 10:19 / 16-jul 9:28 / 17-jul 10:25 / 18-jul 8:43 / 19-jul 10:49 /… 29-jul 9:05 / 30-jul 11:02 / 31-jul 10:57 / 01-ago 8:23 / 02-ago 11:21 / 03-ago 8:23 / 02-set 9:01 / 03-set 10:32 / 04-set 10:07 / 05-set 9:11 / 06-set 9:28 / 09-set 8:08 / 10-set 11:08 / 11-set 8:36 / 12-set 11:35 / 13-set 10:22 / 16-set 8:31 / 17-set 9:27 / 18-set 11:49 / 19-set 9:59 / 20-set 8:27 / 21-set 4:59 / 23-set 9:38 / 24-set 7:55 / 25-set 9:34 / 26-set 8:21 / 27-set 8:27 / 30-set 8:25 / 01-out 9:52 / 02 e 3 -out 33:40 / 04-out 8:03 / 07-out 10:37 / 08-out 8:04  / 09-out 10:06 / 10-out 11:09 / 11-out 8:13 / 14-out 11:14 / 15-out 10:08 / 16-out 8:39 / 17-out 10:14 / 18-out 9:46 / 21-out 8:47 / 22-out 7:13 / 23-out 7:48 / 24-out 7:06 / 25-26 out 9:25 / 28-out 7:50 / 29-out 8:31 / 30-out 8:07 / 31-out 8:03 / 18-nov 7:06 / 19-nov  9:03 / 20-nov 9:24 / 21-nov 9:24 / 22-nov 8:10 / 25-nov 8:14 / 26-nov 10:04 / 27-nov 10:25 / 28-nov 6:17 / 29-nov 8:35 / 02-dez 8:25 / 03-dez 7:56 / 04-dez 9:31 / 05-dez 8:46 / 06-dez 8:33 / 09-dez 6:31 / 12-dez 7:20 / 13-dez 7:52 / 16-dez 9:32 / 17-dez 10:31 / 18-dez 9:31 / 19-dez 10:32 / 20-dez 10:32 / 23-dez 8:54 / 24-dez 4:57 / 26-dez 9:43 / 27-dez 6:08 / 30-dez 8:43 / 31-dez 8:53.
***
W. (…) nem sempre os dias de descanso coincidam com o sábado e com o domingo.
Não resulta indicada prova no sentido de que os dias de descanso seriam sempre nesses dias. O facto foi considerado com base do contrato de trabalho, tendo sido fixado o horário num período normal de trabalho de quarenta horas semanais, prestado em regime de horário flexível e móvel.
É de manter o decidido.
*
Pretende seja considerado provado os seguintes pontos da matéria dada como não provada:
14. (…) a ré tenha atuado com o propósito de confundir e impossibilitar o autor de exigir o pagamento do excesso de horas de trabalho suplementar que lhe viria a impor.
15. (…) e impedir, também, que o valor devido a titulo de trabalho suplementar e noturno integrassem o valor da retribuição e desta feita, não se refletissem no valor de calculo do subsídio de férias, de natal e retribuição de férias;
16. (…) independentemente das horas que o autor trabalhasse receberia sempre o mesmo valor de €1.350,00;
18. A ré pagasse mensalmente ao autor ajudas de custo até perfazer, pelo menos, o valor da retribuição acordada de €1.350,00;
Todos estes factos baseiam-se em depoimento do autor, e algumas referências esparsas de testemunhas por si indicadas, mas baseados em opinião pessoal, sem indicação de razões de ciência válidas, a não ser o conflito que os opõem à ré. O autor e os colegas que depuseram fizeram uma interpretação própria da promessa de receberem 1350 euros, como se se tratasse de vencimento base, completamente desconforme aos valores usuais em Portugal para esta atividade, extrapolando daí uma série de considerações sobre a motivação da ré quanto ao modo como eram elaborados os recibos de pagamento.
É de manter o decidido.
*
21. A diminuição do valor liquido da retribuição paga ao autor referida em K) e L) tenha resultado da diminuição injustificada do montante pago a titulo de ajudas de custo;
22. (…) facto referido em L) [diminuição do valor liquido recebido] tenha ocorrido apesar do autor ter trabalhando as mesmas horas;
23. (…) a diminuição da retribuição tenha sido retaliação da ré por o autor ter apoiado os seus colegas na greve de agosto de 2019.
O CC referiu que consequências da participação na greve foram cortes nos salários dos quatro trabalhadores que participaram nesta.
O BB referiu que os vencimentos foram cortados, “os vencimentos depois da greve foram cortados, a ré passou a pagar o que estava na convenção coletiva de trabalho”.
Resulta dos factos K e L que após a greve a ré alterou o modo de processamento dos salários. Não resulta da factualidade em que moldes ou termos ocorreu essa alteração. Não obstante a “opinião “dos depoentes e do autor, não existem elementos seguros de que possa deduzir-se tratar-se de retaliação por causa da greve. Conforme resulta dos recibos, as diferenças essencialmente ocorrem na verba ajudas de custo, mas ignora-se por que motivo. Sobre estas a recorrida referiu na contestação que correspondia a um valor diário fundamentado pela sua deslocação, obrigatório nos termos da CCT (artigo 58º da CCT). Vejam-se os boletins itinerários juntos com a PI, relativos a tal abono. Desconhecendo-se cargas horárias, e não resultando claros os boletins, é de manter o decidido, sem prejuízo dos dias de trabalho que resultam do facto aditado.
*
25. O autor tenha trabalhado, no ano de 2019, nos dias de feriado seguintes (art. 86 da petição inicial): 19/04 (das 08:00 às 18:45), no dia 25/04 (das 05:00 às 14:00) e no dia 20/06 (das 05:00 às 15:30).
26. O autor tenha trabalhado em dias correspondentes a descanso semanal e descanso complementar (tabela art.84 da petição inicial), designadamente: 23/mar das 05:00 às 12:00; 20/abr das 04:30 às 16:00; 27/abr das 04:30 às 13:00;18/mai das 03:30 às 10:30;13/jul das 05:00 às 17:00 e 28/dez das 05:00 às 11:00
27. O autor tenha prestado trabalho suplementar (trabalho noturno; dias de descanso trabalhados e feriados e bem assim, descansos complementares) a seguir descritos (facto alegado no art.100º da petição inicial): (…)
É de considerar o que resulta do facto aditado, pelas razões ali indicadas. O autor trabalhou nos dias que resultam de tal facto. Não resulta demonstrado quais os dias de descanso semanal e complementar, tendo em conta o regime de trabalho acordado. É de manter o decidido.
***
A relação laboral objeto destes autos é sujeita à aplicação do Contrato Coletivo de Trabalho Vertical do setor dos transportes rodoviários de mercadorias, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 9, de 8 de março de 1980; e alterações; Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 32, de 29 agosto de 1998.  34 de 15 de setembro/2018. Posteriormente os CCT no BTE 45 de 9 de dezembro 2019 e 5/2023.
*
Quanto à questão do salário base, dependia tal questão da alteração da matéria de facto, pelo que nesta parte é de manter o decidido.
O autor questiona ainda a decisão quanto aos créditos de invoca de:
– Trabalho suplementar e noturno.
O autor invocou trabalho suplementar e noturno desde ../../2019 a 31/1/2020.
Pretende o recorrente a inversão do ónus de prova quanto ao trabalho suplementar. A questão, contudo, fica prejudicada pelo teor da clausula 61º invocada pela recorrida e aplicável ao caso, tendo em conta os valores que resultariam do documento ...5 junto com a PI, considerando o tempo de trabalho efetivo aí referenciado, de que resulta a não violação dos períodos máximos referenciados na clausula 21ª da CCTV (34/2018 e 45/2019).
Relativamente ao trabalho suplementar a ré invoca o teor da clausula 61º do CCTV.
Em vigor em 2019 a redação da CCT de 2018.
Cláusula 61.ª (Regime de trabalho para os trabalhadores deslocados)
1- Os trabalhadores móveis afetos ao transporte internacional, ibérico e nacional, excecionando-se destes últimos os trabalhadores móveis que conduzem veículos com menos de 7,5 toneladas, terão obrigatoriamente o direito a receber o correspondente a duas horas de trabalho suplementar, retirado o montante referido no número três.
2- Para efeito de cálculo da prestação pecuniária prevista no número anterior, será aplicável a seguinte fórmula: (Retribuição base, complementos salariais (cláusula 45.ª) e diuturnidades) x 12 VH = Período normal de trabalho semanal x 52 1.ª hora x 50 % 2.ª hora x 75 % Valor total das duas horas de trabalho suplementar, conforme o caso, deverá ser multiplicado por 30 dias.
 3- Ao valor apurado nos termos do número anterior, será retirado o valor correspondente ao subsídio de trabalho noturno, calculado nos termos do número 2 da cláusula 48.ª do CCTV.
4- Estes trabalhadores, de acordo com o estabelecido nos números anteriores, não lhes é aplicável o disposto na cláusula 49.ª (Retribuição do trabalho suplementar em dia útil).
5- O pagamento desta prestação pecuniária substitui o número 7 da cláusula 74.ª do anterior CCTV e, bem assim, todas e quaisquer formas de pagamento do trabalho suplementar que tenham sido criadas, unilateralmente pelas empresas ou estabelecidas por acordo entre estas e os trabalhadores, mesmo que o valor desta prestação seja inferior ao anteriormente praticado.
6- No período máximo de três meses a contar da entrada em vigor do presente CCTV, as entidades empregadoras, deverão substituir as anteriores formas de pagamento do trabalho suplementar praticadas, adaptando designadamente os recibos de vencimento e declarações de remunerações, pela prestação pecuniária prevista nesta cláusula.
A referida cláusula consagra uma retribuição especial, que não depende da efetiva prestação de trabalho suplementar, e que se destina a compensar os trabalhadores pela penosidade decorrente de, no exercício da função, se encontrarem deslocados, e pelo facto de com alguma regularidade tal atividade implicar a prestação de trabalho suplementar, de difícil controlo pela empregadora. Os registos do tempo dependem do próprio trabalhador.
Importa ter em linha de conta que a empregadora deve proceder regularmente à recolha dos dados e sua conservação, pelo menos de 28 em 28 dias – artigo 4º do Decreto-Lei n.º 169/2009, de 31 de julho -, e 33 do Regulamento (UE) N.º 165/2014, sendo-lhe assim possível verificar do cumprimento das regras relativas ao registo por banda do trabalhador, e cumprimento das suas ordens.
Como refere o recorrente, a referida cláusula, apenas afasta o pagamento de trabalho suplementar em dia útil, e pressupõe o respeito pelos limites temporais da clausula 21ª, além desses limites deve o trabalho suplementar ser pago nos termos normais. O que ficou explicitado na CCT de 2019, alterando-se ainda a epigrafe.

A Clausula na redação da CCT de 2019 refere:
(Retribuição do regime específico de trabalho dos motoristas)
1- Os trabalhadores que, por acordo com a empresa, desempenhem a função de motorista afeto ao transporte internacional, ibérico ou nacional, excecionando-se destes últimos os motoristas que conduzem veículos com menos de 7,5 toneladas, por prestarem uma atividade que implica regularmente um elevado grau de autonomia e a possível realização de trabalho extraordinário de difícil controlo e verificação pela empresa, decorrente da imprevisibilidade da duração concreta dos serviços a serem realizados e encontrando-se deslocados das instalações dos empregadores e sem controlo hierárquico direto, terão obrigatoriamente o direito a receber, em contrapartida de tal regime, uma retribuição especifica no montante correspondente a 48 % do valor total resultante da soma da retribuição base (cláusula 44.ª), diuturnidades (cláusula 46.ª) e complemento salarial (cláusula 59.ª), não lhes sendo devido qualquer outro valor a título de trabalho suplementar em dia normal de trabalho.
2- O pagamento desta prestação pecuniária não prejudica o direito a dia de descanso semanal, obrigatório ou complementar, feriado ou a descanso diário bem como o respetivo pagamento nos termos previsto na cláusula 50.ª
3- O pagamento desta retribuição específica não afasta o cumprimento dos limites da duração do trabalho previstos na cláusula 21.ª do presente CCTV, não podendo ser solicitado nem prestado trabalho para além dos mesmos.
4- Esta retribuição específica é devida por 13 meses.
Nota explicativa:
Para efeitos do acordo mencionado no número 1 desta cláusula, estão incluídos todos os contratos de trabalho para a função de motorista, celebrados antes deste contrato coletivo de trabalho. Mais se esclarece que esta retribuição específica substituí a anterior cláusula 61.ª do CCTV celebrado entre a ANTRAM e a FECTRANS e publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 34, de 15 de setembro de 2018 e primitiva cláusula 74.ª número 7 prevista no CCTV celebrado entre a ANTRAM e a FECTRANS (anterior FESTRU) e publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 9, de 8 de março de 1980 e demais alterações.
A cláusula 21.ª reflete a proibição, que vincula empregadores e trabalhadores, prevista no Decreto-Lei n.º 237/07, de 19 de junho, de ser prestado trabalho semanal para além dos limites nesta fixados.
Apesar de não ser obrigatório, face ao concreto modo como o trabalho é prestado, esta figura poderá ser aplicada na relação mantida entre empresas e motoristas que, por acordo, estão afetos ao transporte nacional, conduzindo viaturas inferiores a 7.5 ton., sejam elas superiores ou não a 3,5 ton.
Refere a cláusula 21:
 (Limites da duração do trabalho)
1- A duração do trabalho semanal dos trabalhadores móveis, incluindo trabalho suplementar, não pode exceder sessenta horas, nem quarenta e oito horas em média num período de quatro meses.
2- A duração do trabalho, incluindo trabalho suplementar, no caso de abranger, no todo ou em parte, o intervalo entre as 0 e as 5 horas, não pode exceder dez horas por dia salvo quando, por motivos objetivos, nomeadamente razões técnicas ou de organização do trabalho, tal seja justificado.
3- Entende-se por conceito de dia referido no número anterior, o período de 24 horas, a contar do início da jornada de trabalho.
4- Para efeitos do disposto nos números anteriores da presente cláusula, é excluído o tempo de disponibilidade
Com atrás deixamos referido, os valores constantes do documento ...5 junto pelo autor, encontram-se dentro dos limites desta norma.
Assim nada é devido a título de trabalho suplementar, já que a recorrida procedia ao pagamento da clausula 61º.
Quanto ao trabalho noturno, a ré procedia ao pagamento do subsídio a que alude a cláusula Cláusula 48.ª
(Remuneração do trabalho noturno)
1- O trabalho noturno será remunerado com um acréscimo de 25 % em relação à retribuição a que dá direito o trabalho equivalente prestado durante o dia.
2- A entidade empregadora poderá optar pela remuneração do trabalho noturno como previsto no número anterior ou pela atribuição de um subsídio de trabalho noturno no valor de 10 % da remuneração base, caso em que se entenderá que a retribuição foi estabelecida atendendo à circunstância de o trabalho dever ser prestado em período noturno, nos termos do artigo 266.º, número 3 alínea c) da Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro.
3- O pagamento do subsídio de trabalho noturno referido no número anterior, é obrigatório para os trabalhadores com a categoria profissional de motorista afetos ao transporte ibérico ou internacional, sendo devido por 13 meses.
4- No caso dos trabalhadores com a categoria profissional de motorista afetos ao transporte nacional, o pagamento do subsídio de trabalho noturno é facultativo.
Consequentemente improcede o alegado.
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Reclama o recorrente trabalho efetuado em dia de descanso semanal (referencia os sábados). Ora da prova resultas que o horário era móvel, não resultando demonstrado que não tenham sido dados os descansos legalmente devidos. Veja-se a clausula 8ª do contrato de trabalho, em que se acorda num horário flexível ou móvel.
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Quanto ao trabalho em dias feriados:
Reclama ter trabalhador nos seguintes dias:
19/abr; 25/abr e 20/jun.
Resulta da prova que foi prestado trabalho no feriado de 20 de junho.
Nos termos da Cláusula 51, o trabalho prestado em dias de descanso semanal, obrigatório ou complementar ou em feriado é pago em dobro do valor dia, independentemente do concreto número de horas de trabalho prestado. É devido o valor de 42 euros, com juros de mora tal como definidos na sentença recorrida.
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Reclama da diminuição da retribuição a partir de agosto de 2019
Da factualidade resulta que aquando da contratação do autor foi verbalmente acordado que este auferiria o rendimento mensal liquido de €1.350,00, valor que a ré terá indicado como sendo o montante total, incluindo o base e as diversas cláusulas do CCTV. Os recibos eram elaborados tendo em conta o acordado, constante do contrato individual de trabalho.
Apos agosto, consta do facto “K”, a ré alterou o modo de processamento de salários, resultando dessa alteração – facto “L”, uma diminuição do valor liquido pago ao trabalhador. Não resulta, no entanto, demonstrada a legalidade de tal diminuição, até face ao que havia sido individualmente acordado.
Não se descortina o processo de alteração, resultando antes, como o autor aliás refere, que as diferenças decorrem no essencial da diminuição das verbas colocadas como ajudas de custo. Da análise dos boletins itinerários não se depreende critério seguro, e seguido, para atribuição em cada mês de determinado valor de ajudas de custo, resultando, até no mesmo mês, para horários muito equivalentes, atribuições dispares.
Resulta dos recibos (indicando-se aqui apenas o base e os valores de ajudas de custo e líquidos recebidos), o seguinte:
Março – mês da admissão (inicia dia 13) – total de abonos 676,97; liquido de 517,88.
Abril – total de 1415,96 (ajudas custo de 344,25) descontados 100,42 de 3 dias – liquido 1087,29
Maio – total de 1977,39 (AC de 808,18) – liquido de 1678,08
Junho – total de 1692,34 (AC 523,13) – liquido de 1393,03
Julho – total de 1782,09 (AC 635,38) – liquido de 1488,53
Agosto – total de 1685,96 – (AC 509,25) baixa de 27 dias, descontado 903,79 – liquido de 718,15
Setembro – total de 1610, 24 (a deduzir 502 de sub férias pago) - (AC 81,50) – liquido 1314,08
Outubro – total de 1452,21 (AC 283) – liquido de 1153,60
Novembro – total de 1398,96 (AC 222,25) – liquido de 1098,52
Dezembro – total de 1183,95 (AC 104,75) – liquido de 919,25
Janeiro – total de 1658,47 (AC 274,75) – liquido de 1285,26.
Fevereiro – total 1642,62 (AC 236,40) – liquido 1262,94
Março (fecho - 11 dias) – Total 996,30 sendo 420 de compensação) – (AC 78,50) – liquido 872,54
 Ora, não resulta ter ocorrido alteração no modo de prestação do trabalho, não se justificando o incumprimento do acordado quanto ao valor líquido acordado a receber pelo trabalhador.
Da análise dos recibos resulta que antes de agosto a média recebida rondava em termos líquidos valor superior a 1350 euros. Posteriormente, e considerando quanto a março de 2020 apenas 11 dias, resulta como média o valor líquido de 1181,12, inferior ao devido.

setembro1314,08
outubro1153,6
novembro1098,52
dezembro919,25
jan1285,26
fevereiro 1262,94
março1234,2
total8267,85
média1181,121
diferença mês168,8786
devido 6 meses1013,27
devido março61,92211075,194


Assim o total em débito atinge os 1075,20 euros, com juros de mora tal como definidos na sentença recorrida.
Quanto ao demais é de confirmar a sentença pelas razões da mesma constantes.
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DECISÃO:

Acordam os juízes do Tribunal da Relação de Guimarães em julgar parcialmente procedente a apelação, condenando-se a ré a pagar ao autor a quantia de 11107,2, com juros de mora tal como definidos na sentença recorrida.
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Custas nesta instância por recorrente e recorrida, na proporção de ¾ pelo autor e ¼ pela ré
4/4/2024

Antero Veiga
Vera Sottomayor
Leonor Barroso