ESCUSA DE JUIZ
DENÚNCIA
Sumário

I - A circunstância de o arguido ter apresentado uma denúncia contra a Juíza interveniente nos autos (denúncia na qual é imputada a essa Juíza a prática de “falsidade de ato judicial”) é suscetível de criar nos destinatários da administração da justiça sentimentos de suspeita sobre a sua imparcialidade.
II - A apresentação dessa denúncia criminal contra a Juíza a quem incumbe o julgamento do arguido/denunciante constitui, por isso, motivo sério e grave para fundamentar o deferimento do pedido de escusa.

Texto Integral




Acordam, em conferência, os Juízes na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora

Relatório:

(A), Juiz de Direito em exercício de funções no Juízo de Competência Genérica de Sesimbra, suscitou, ao abrigo do disposto nos artigos 43º, nºs 1 e 4 do Código de Processo Penal o presente incidente de escusa na intervenção no Processo com o nº 100/19.3T9SSB, aduzindo para tanto os seguintes fundamentos:

“(A), juiz de direito a exercer atualmente funções no Juízo de Competência Genérica de Sesimbra, vem expor e, a final, requerer escusa para julgamento e demais intervenção no âmbito do processo n.º 100/19.3T9SSB, nos termos e com os seguintes fundamentos:

(B) é arguido nos autos referidos, aos quais os presentes são apensos, e bem assim nos autos sob o n.º de processo 480/18.8T9SSB;

O arguido apresentou denúncia, nos próprios autos supra referidos (480/18.8T9SSB), contra a ora requerente, tendo originado a extração de certidão, aliás, pela própria, e remetida à Procuradoria Geral Regional de Évora, e na qual imputa à requerente a prática de “falsidade de ato judicial”.

O mesmo tem vindo a fazer, em vários processos nos quais é interveniente, em relação a Magistrados Judiciais, Magistrados do Ministério Público e outros intervenientes e entidades.

Reconhece a requerente que se sente em plena capacidade de proferir uma decisão justa e imparcial, caso venha a ser recusado o presente pedido.

Prevê, porém, o artigo 43.º, do Código de Processo Penal, a possibilidade de o juiz requerer a sua própria escusa, quando se se verifique motivo, sério e grave, adequado a gerar desconfiança sobre a imparcialidade do juiz.

Assim, entende-se, salvo melhor opinião, que o que relevará para efeitos da concessão do pedido de escusa, não é a perceção do próprio, mas sim a perceção comunitária, de terceiros, em relação à imparcialidade do julgador.

No entender da requerente, os factos descritos levam a que os demais intervenientes processuais e a comunidade em geral possam levantar a suspeita da sua parcialidade em relação ao arguido, uma vez que se poderá transmitir a imagem de que a signatária tramitará os autos decidindo em prejuízo do mesmo.

A requerente não pode assim de deixar de considerar a imagem da sua imparcialidade afetada pela denúncia instaurada pelo arguido, que naturalmente, ainda que na perceção da própria assim não seja, poderá criar uma impressão de parcialidade e falta de isenção no exercício da sua função.

Pelo exposto, ao abrigo do disposto no artigo 43.º, do Código de Processo Penal, a signatária vem requerer a V.ªs Ex.ªs se dignem deferir a sua escusa de intervir no processo n.º 100/19.3T9SSB.

Extraia certidão dos despachos de 20-09-2023 e de 14-11-2023, do requerimento de 02-10-2023, e bem assim da certidão extraída e remetida à Procuradoria Geral Regional de Évora, tudo por referência ao processo n.º 480/18.8T9SSB, e faça subir os presentes ao Venerando Tribunal da Relação de Évora para apreciação.

Sesimbra, d.s.”

O Exm. Procurador-Geral Adjunto neste Tribunal da Relação de Évora pronunciou-se nos seguintes termos:

“A Exm.ª Senhora Juiz do Juízo de Competência Genérica de Sesimbra– Juiz 2 – da Comarca de Setúbal veio requerer escusa na intervenção do Proc.º n.º 100/19.3T9SSB que corre termos naquele juízo, invocando o disposto no art.º 43º, do Código de Processo Penal (CPP).

Alega, em suma, que nos referidos autos é arguido (B) que a denunciou da prática de falsidade de acto judicial e que o mesmo já denunciou, por factos idênticos, outros magistrados judiciais e do Ministério Público, bem como outros intervenientes e entidades.

No entendimento da requerente, tais circunstâncias podem levar a que a mesma (a requerente) seja considerada suspeita, configurando um motivo sério e grave, adequado a gerar desconfiança sobre a sua imparcialidade.

Nos termos do disposto no n.º 1 do art.º 43º do Código de Processo Penal, “A intervenção de juiz num processo só pode ser recusada quando correr o risco de ser considerada suspeita, por existir motivo, sério e grave, adequado a gerar desconfiança sobre a sua imparcialidade.

E o n.º 4 do mesmo preceito determina que “O juiz não pode declarar-se voluntariamente suspeito, mas pode pedir ao tribunal competente que o escuse de intervir quando se verificarem as condições dos n.os 1 e 2.”

Estas disposições têm que ser conjugadas com preceituado no artigo 32.º, n.º 9 da CRP, i. e., com princípio do Juiz Natural, segundo o qual deve intervir no processo o Juiz competente, de acordo com as regras de competência legalmente estabelecidas.

O afastamento daquela regra só deve ocorrer quando se verifiquem quaisquer vícios que afectem aquela regra como, por exemplo, aquele Juiz Natural não ofereça garantias de imparcialidade e isenção no exercício das suas funções.

Nos termos do disposto naquele artigo 43.º do CPP, o Juiz Natural deixa de oferecer essas garantias quando:

– A sua intervenção no processo corra risco de ser considerada suspeita;

– Por se verificar motivo, sério e grave;

– O motivo for adequado a gerar desconfiança (estado de forte verosimilhança) sobre a sua imparcialidade (propósito de desfavorecimento de um certo sujeito processual, designadamente em favor de outro).

“O conceito de imparcialidade tem sido associado pela jurisprudência e doutrina a duas dimensões, uma subjectiva e outra objectiva.

Na perspectiva subjectiva a imparcialidade do Juiz está relacionada com o que o Magistrado pensa no seu foro íntimo perante um determinado acontecimento da vida real. Nesta perspectiva, se internamente o Magistrado Judicial tiver algum motivo para desfavorecer um sujeito processual em favor de outro, ou por outras palavras, se tiver um preconceito sobre o mérito da causa, ocorrerá uma situação de parcialidade. A imparcialidade subjectiva dos juízes, contudo, presume-se até prova em contrário.

Sob o ponto de vista objectivo a imparcialidade do Juiz encontra-se relacionada com o comportamento exteriorizado pelo Magistrado Judicial, apreciado do ponto de vista do cidadão comum e das dúvidas fundadas sobre a sua conduta.

Só os factos objectivos evidentes, sérios e graves devem afastar a presunção de imparcialidade subjectiva do Juiz.

A gravidade e a seriedade do motivo de recusa deve ser óbvia, para um homem médio, pois do uso indevido de tal mecanismo resulta a lesão do princípio constitucional do Juiz Natural com o consequente afastamento do Magistrado Judicial titular por motivo infundado.

(…)

Só são objetivamente parciais as condutas dos Magistrados Judicias que façam perigar, de forma séria e grave, a confiança pública na administração da justiça.

De outro modo, poder-se-ia estar a dar aval, com o pedido de escusa, a formas hábeis para um qualquer interveniente processual se libertar de um determinado Juiz, para fazer intervir o substituto legal deste, por quem, por exemplo, nutrisse mais empatia, ou seja, por motivo fútil.

No plano objetivo, são relevantes as aparências, que podem afetar, não rigorosamente a boa justiça, mas a compreensão externa sobre a garantia da boa justiça que seja mas também pareça ser, numa fenomenologia de valoração entre o “ser” e o “dever ser” (Ac. de 22.09.21, deste T.R.E., no processo 2306/19.6T9PTM-A.E1).

Ora o fundamento invocado pela requerente, com os contornos referidos, não pode integrar aquele conceito previsto na Lei, ou seja, “motivo, sério e grave, adequado a gerar desconfiança sobre a sua imparcialidade”.

Aceitar-se o contrário seria abrir a porta que os intervenientes processuais (que não o Juiz do processo) passassem a participar disciplinar, ou criminalmente, do Juiz que não lhe agradasse, e por aí adiante, potenciando uma situação em que, no limite, não haveria Juiz para intervir (passe o exagero) …

Pelo exposto, somos do parecer que seja indeferida a pretendida escusa.”

*

Colhidos os vistos e realizada a conferência, cumpre decidir.

*

Vejamos, então, se estamos perante situação que justifique deferir a escusa solicitada pela Mmª Juiz.

Estipula o art. 43º, n.ºs 1 e 4 e 45, n.º 1, al. a), ambos do Código de Processo Penal o seguinte:

"Artigo 43.º

Recusas e escusas

1 - A intervenção de um juiz no processo pode ser recusada quando correr o risco de ser considerada suspeita, por existir motivo, sério e grave, adequado a gerar desconfiança sobre a sua imparcialidade.

2 - (...)

3 - (...)

4 - O juiz não pode declarar-se voluntariamente suspeito, mas pode pedir ao tribunal competente que o escuse de intervir quando se verificarem as condições dos n.ºs 1 e 2. ".

"Artigo 45.º

Processo e decisão

1 - A recusa deve ser requerida e a escusa deve ser pedida, a ela se juntando logo os elementos comprovativos, perante:

a) O tribunal imediatamente superior;

(...)".

Dispõe assim aquele art.43º do C.P.P., que a intervenção de um juiz no processo pode ser recusada ou o pedido de escusa ser requerido quando correr o risco de ser considerada suspeita, por existir motivo, sério e grave, adequado a gerar desconfiança sobre a sua imparcialidade.

Para que possa ser pedida a recusa ou a escusa de juiz, é necessário que:

- a sua intervenção no processo corra risco de ser considerada suspeita;

- por se verificar motivo, sério e grave;

- adequado a gerar desconfiança sobre a sua imparcialidade.

“Não tipifica a lei quais sejam os casos que justificariam tal juízo de suspeição, mas tratar-se-á de factos objetivos e exteriorizados, os quais porque respeitantes (i) a situações pessoais, atinentes ao magistrado (ii) a relações sociais ou familiares que o envolvam (iii) a situações de tipo ideológico ou filosófico que funcionem como preconceitos quanto aos factos em análise (iv) ou a situações do foro psíquico, ainda que não patológico, possam colidir com o auto domínio ou ponderação da sua intervenção processual, enfim com a serenidade isenta e descomprometida que é apanágio da arte de julgar” ( José António Barreiros, Sistema e Estrutura do Processo Penal Português, Lisboa, 1997, vol. II, pág. 46).

Para a correta processualização de tal incidente “haverá no entanto que alegar sempre no pedido (…) factos concretos que possam alicerçar a desconfiança imputada e indicar as normas legais aplicáveis que fundamentam a mesma “( cfr. Acórdão do STJ, de 26/06/2000, Proc. Nº943-B/98).

Se a imparcialidade do juiz é uma garantia e um pressuposto insuprível da atuação dos tribunais – como resulta do art.32º, nº1, da C.R.P. - o princípio do juiz legal ou do juiz natural, assume de igual forma foros de dignidade constitucional.

Entre as garantias do processo criminal consagradas no art. 32º da C.R.P. conta-se, no nº 9 de tal preceito, a de que “nenhuma causa pode ser subtraída ao tribunal cuja competência esteja fixada em lei anterior”. O princípio do juiz natural ou legal, consagrado nesta norma, consiste essencialmente na predeterminação do tribunal competente para o julgamento e tem por finalidade evitar a designação arbitrária de um juiz ou tribunal para decidir um caso submetido a juízo, protegendo-se por essa via a liberdade e o direito de defesa do arguido contra arbitrariedades no exercício do direito de punir.

Porém, tal princípio não é absoluto, porquanto admite exceções justificadas pela necessidade de obviar a alguns efeitos perversos que da sua aplicação estrita poderiam advir quando possa estar em causa a garantia de imparcialidade do juiz, que é corolário do princípio fundamental da independência dos Tribunais também consagrado no art. 203º da C.R.P. Portuguesa.

Com efeito, a administração da justiça é impensável sem um tribunal independente e imparcial, constituindo a imparcialidade do Tribunal um requisito fundamental do processo justo (art.10º da DUDH, e art.6º, nº1, da CEDH).

Admite-se, pois, que o princípio do juiz natural seja afastado em situações-limite, isto é, apenas quando outros princípios ou regras, porventura de maior dignidade, o ponham em causa, como sucede, por exemplo, quando o juiz natural não oferece garantias de imparcialidade e isenção no exercício do seu munus, só podendo, teoricamente afirmar-se que o juiz deixou de oferecer garantias de imparcialidade quando o seu posicionamento revela, de forma insofismável, algum comprometimento com um pré-juízo acerca do thema decidendum (cfr. Acórdão do STJ, de 2/12/03, Proc.nº3376/03, 3ª Secção).

As regras da independência e imparcialidade são inerentes ao direito de acesso aos tribunais (art. 20º, nº 1 da C.R.P.), constituindo, ainda, no processo criminal português, atenta a sua estrutura acusatória (art. 32º, nº 5 da C.R.P.), uma dimensão importante do princípio das garantias de defesa (art. 32º, nº 1 da C.R.P.).

Pretende-se «assegurar a confiança geral na objetividade da jurisdição. É que, quando a imparcialidade do juiz ou a confiança do público nessa imparcialidade é justificadamente posta em causa, o juiz não está em condições de “administrar a justiça”. (…) Importa, pois, que o juiz que julga o faça com independência. E importa, bem assim, que o seu julgamento surja aos olhos do público como um julgamento objetivo e imparcial. É que a confiança da comunidade nas decisões dos seus magistrados é essencial para que os tribunais ao “administrar a justiça”, atuem, de facto, “em nome do povo” (cfr. art. 205º, nº 1 da Constituição)» ( Ac. do TC nº 135/88, DR II Série de 8/9/1988 - apud cit. ac. do TC nº 935/96).

É “o dever de imparcialidade” que determina o pedido de escusa do juiz, imparcialidade essa que impõe o exercício de facto das suas funções com “total transparência (…). Não basta ser é preciso parecer. Assim o exige o princípio da confiança dos cidadãos na justiça” ( José António Mouraz Lopes, A Tutela da Imparcialidade Endoprocessual no Processo Penal Português, Coimbra Editora, 2005, p. 87).

Como a jurisprudência tem assinalado, a seriedade e a gravidade do motivo que causa o sentimento de desconfiança sobre a imparcialidade do juiz só é suscetível de conduzir à sua recusa quando objetivamente considerada, não bastando um puro convencimento subjetivo de um dos sujeitos processuais para que se tenha por verificada a suspeição.

“O motivo sério e grave, adequado a gerar desconfiança sobre a imparcialidade do julgador, há de resultar de objetiva justificação, aliando as circunstâncias invocadas pelo requerente, não pelo convencimento subjetivo deste, mas pela valoração objetiva das mesmas circunstâncias, a partir do senso e experiências comuns, conforme o juízo de cidadão de formação média da comunidade em que se insere o julgador; o que importa é, pois, determinar se um cidadão médio, representativo da comunidade pode, fundadamente, suspeitar que o juiz influenciado pelo facto invocado, deixe de ser imparcial e injustificadamente o prejudique” (cfr. Acórdão da Relação de Évora, de 5/12/00, in C.J. Ano XXV-2000, Tomo 5, pág.286).

E refere-se no sumário do Acórdão do STJ de 25/1/01, proferido no Processo nº2452/01, da 5ª Secção, que “os atos geradores de desconfiança sobre a imparcialidade do juiz hão de ser de tal modo suspeitos que a generalidade da opinião pública sinta – fundadamente – que o juiz em causa (…) está tomado de preconceito relativamente à decisão final; enfim, de algum modo, antecipou o sentido do julgamento, já tomou partido. A gravidade e seriedade do motivo de que fala a lei – art.43º, nº1, do CPP – hão de ser aferidas em função dos interesses coletivos, mormente do bom funcionamento das instituições em geral e da justiça em particular, não bastando que uma avaliação pessoal de quem quer que seja, nomeadamente do arguido, o leve a não confiar na atuação concreta do magistrado”.

A imparcialidade deve ser avaliada de acordo com um duplo teste: subjetivo e objetivo. O subjetivo visa apurar se o juiz deu mostras de ter interesse na causa ou estar imbuído de algum preconceito sobre o mérito da mesma. O teste objetivo reporta-se, por sua vez, ao ponto de vista da opinião pública, visando determinar se a intervenção do juiz pode suscitar dúvidas sobre a sua imparcialidade junto dos cidadãos comuns (cfr. Paulo Albuquerque, Comentário do Código de Processo Penal, págs. 127-128).

Importa usar de uma certa flexibilidade (ou de um menor rigorismo) sempre que se pondere sobre a razoabilidade de um pedido de escusa, uma vez que o juízo a respeito dessa razoabilidade - ao invés do que sucede na recusa - implica, forçosa e fundamentalmente, com as inerentes dificuldades e delicadeza, a valorização de uma atitude subjetiva assumida pelo magistrado que requer a concessão de escusa, atitude esta cuja razão de ser é de custosa sindicância por parte de quem tenha de fazer aquela ponderação e emitir aquele juízo.

Assim sendo, torna-se óbvio que os elementos objetivos (probatórios da sentida necessidade do que se pede) hajam apenas de conter ou possuir um mínimo de relevância, o mínimo que baste à concessão da escusa.

O que, nesta perspetiva se torna, pois, importante realçar é que o que, geralmente e por forma decisiva, avulta e deve prevalecer e contar, será justamente evitar-se que uma não concessão de escusa venha a radicar e gerar uma futura e eventual recusa, com todos os inconvenientes que daí possam advir, quer para a imagem da Justiça, quer para o prestígio dos Tribunais. (cfr. Acs. do S.T.J, de 10-10-2002, Proc. n.º 1237/02 - 5.ª Secção, e de 20-02-2008; Proc. n.º 310/08-3.ª Secção).

Ora, no caso sub judice, ponderando todos os itens a ter em conta, dir-se-á que se julga não existirem razões para colocar em causa a imparcialidade da Senhora Juiz, sob o ponto de vista subjetivo, não se vislumbrando motivos para admitir que a circunstância de ter sido apresentada denúncia, nos autos com o nº480/18.8T9SSB, contra a ora requerente, tendo originado a extração de certidão, aliás, pela própria, e remetida à Procuradoria Geral Regional de Évora, e na qual se imputa à requerente a prática de “falsidade de ato judicial”, possa ter repercussões na intervenção como Juiz no Processo com o nº100/19.3T9SSB.

Todavia, analisada a situação sob a perspetiva objetiva, considera-se que existe efetiva suscetibilidade de, perante a comunidade em geral, ser posta em causa a isenção e imparcialidade da Senhora Juiz, pois que os elementos documentais juntos aos autos e que fundamentam o pedido de escusa, poderão efetivamente abalar a confiança acerca da imparcialidade da requerente, ainda que apenas objetivamente e, como tal, suscitar reservas sérias em decisão que venha a proferir nos autos.

E o critério a seguir não é o de apurar se nas circunstâncias concretas o juiz é ou não capaz de julgar imparcialmente, mas o de avaliar se a sua intervenção no processo pode, ou não, ser objeto de desconfiança quanto à sua imparcialidade. E o critério apontado tem de ser definido em termos consentâneos com a exigência legal de que haja um motivo sério e grave para aquela desconfiança, devendo exigir-se um quadro fáctico que seja sua causa adequada, independentemente de pura convicção subjetiva.

Assim sendo, e atento o invocado, é de molde a concitar em termos de normalidade e experiência comum para o cidadão médio um risco de desconfiança, ainda que difusa, sobre a imparcialidade da requerente.

Deste modo, concluímos pela existência de fundamento legítimo para a concessão de escusa, em conformidade com o disposto no artº 43º do Código de Processo Penal, pelo que entendemos ser de deferir o pedido de escusa requerido pela Exmª Sr. Juiz.

Decisão

Pelo exposto, acordam os Juízes na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora em deferir o pedido de escusa formulado pela Exmª Srª. (A) em intervir no Processo nº100/19.3T9SSB.

Sem tributação.

Notifique.

Elaborado e revisto pela primeira signatária

Évora, 19 de março de 2024

Laura Goulart Maurício

Jorge Antunes

António Condesso