IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO
LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA
Sumário

I - Salvo quando a lei dispuser diferentemente, a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente.
II - Contudo, a livre apreciação da prova, não se confunde, de modo algum com apreciação arbitrária da prova, nem com a mera impressão gerada no espírito do julgador pelos diversos meios de prova; a prova livre tem como pressupostos valorativos a obediência a critérios de experiência comum e da lógica do homem médio suposto pela ordem jurídica.
III - A formação da convicção do juiz não pode resultar de partículas probatórias, mas tem necessariamente de provir da análise global do conjunto de toda a prova produzida.

Texto Integral

Recurso de Apelação - 3ª Secção
ECLI:PT:TRP:2023:115837/19.2YIPRT.P1




Acordam no Tribunal da Relação do Porto


1. Relatório
“A..., S.A.”, com sede na Rua ..., ..., ..., Maia, instaurou acção declarativa sob a forma de processo comum contra “B..., Lda.”, com sede na Avenida ..., Porto, onde concluiu pedindo a condenação da ré no pagamento da quantia de €10.528,48, acrescida de juros de mora contabilizados à taxa legal de juro comercial até integral e efectivo pagamento, ascendendo os já vencidos à data do requerimento de injunção ao valor de €58,56.

*
Citada, a ré apresentou oposição e deduziu reconvenção, onde concluiu pedindo:
- se declare a redução do pedido considerando o valor de €6.567,80 que a ré pagou a terceiros para executarem obras da responsabilidade da autora e por ela orçadas mas que se mostrou indisponível para executar;
- se declare a redução do preço da obra adjudicada à autora, no montante da totalidade da obra, por cumprimento defeituoso devido a culpa exclusiva da autora;
- se condene a autora a pagar à ré a quantia de €29.250,00 a título de danos patrimoniais e a quantia de €5.000,00 a título de danos na sua imagem e reputação;
- caso se entenda ser de julgar procedente a acção, que seja operada a compensação de créditos.
*
Notificada, a autora apresentou réplica.
*
Foi proferido despacho saneador, fixado o objecto do litígio e enunciados os temas da prova.
*
Procedeu-se a audiência de julgamento com observância do legal formalismo.
*
Após a audiência de julgamento foi proferida sentença, que:
- julgou parcialmente procedente a acção e, em consequência, condenou a ré a pagar à autora a quantia de €10.178,48, acrescida de juros de mora contabilizados à taxa legal de juro comercial desde a data de vencimento da respectiva factura (31.10.2018) até efectivo e integral pagamento;
- julgou improcedente a reconvenção, absolvendo a autora dos pedidos contra ela formulados.
*
Não se conformando com a decisão proferida, veio a ré “B..., Lda.” interpor recurso de apelação, em cujas alegações concluiu da seguinte forma:
ERRO NA DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO
I. A decisão sobre o ponto 2.2 da matéria de facto devia ter considerado o que fora provado no ponto 1.15, bem como o depoimento da testemunha Eng.º AA [depoimento na audiência de 26-05-2022, com início pelas 10:04 horas e términus pelas 11:02 horas gravado no sistema Citius no ficheiro com a referência 20220526 100456_15895098_2871560], na passagem na gravação minuto 2,50 até 3.18,

II. Pelo que devia ser considerado provado no ponto 2.2: A ampliação referida em 1.8. mostrava-se urgente face às solicitações do ISS, IP/Segurança Social nesse sentido e para, desse modo, evitar a aplicações de coimas por banda daquela entidade.

III. A decisão sobre o ponto 2.5 da matéria de facto devia ter considerado o depoimento que prestou, vide passagem na gravação minuto 3.48 até 4.28, a testemunha Engº AA [depoimento na audiência de 26-05-2022, com início pelas 10:04 horas e términus pelas 11:02 horas gravado no sistema Citius no ficheiro com a referência 20220526 100456_15895098_2871560] bem como a passagem na gravação minuto 6.38 até 7.12, e a passagem na gravação minuto 10.48 até 12.40, da mesma testemunha Engº AA,

IV. Tal como devia ter considerado os emails juntos pela Ré (documento nº 3) da testemunha Arqtº BB, enviados em 27-09-2019, 02-10-2019, e em 14-10-2019, bem como o depoimento desta testemunha passagem na gravação minuto 18.40 até 19.19, [in depoimento na audiência de 26-05-2022, com início pelas 11:04 horas e términus pelas 11:32 horas gravado no sistema Citius no ficheiro com a referência 20220526 110449_15895098_2871560]

V. E ainda o depoimento da testemunha CC [depoimento na audiência de 26-05-2022, com início pelas 14:19 horas e términus pelas 15:15 horas, gravado no sistema Citius no ficheiro com a referência 20221116 141903_15895098_2871560] nas passagem na gravação minuto 3.32., minuto 4:24, minuto 6:00, e minuto 6:37.

VI. Pelo que devia ser considerado provado no ponto 2.5: Estava planeado com o empreiteiro e demais especialidades, que a obra deveria estar estar totalmente executada até 31 de julho de 2019.

VII. A decisão sobre o ponto 2.6 da matéria de facto devia ter considerado o depoimento aa testemunha CC [[in depoimento citado]] na passagem na gravação minuto 3.32.

VIII. Pelo que devia ser considerado provado no ponto 2.6: A Ré deu a conhecer à Autora de que a garantia da conclusão que a conclusão dentro do indicado prazo de 15 dias era condição essencial da adjudicação da obra à Autora.

IX. A decisão sobre o ponto 2.7 da matéria de facto devia ter considerado o depoimento na passagem na gravação minuto 3.48 até 4.28, da testemunha Engº AA [in depoimento citado], da testemunha Arqtº BB, vide passagem na gravação minuto 18.40 até 19.19, [in depoimento citado] , bem como o depoimento da testemunha CC [in depoimento citado - vide passagem na gravação minuto 3.32.]

X. Pelo que devia ser considerado provado no ponto 2.7: A Autora ficou ciente de que a obra a adjudicar teria que estar terminada no prazo de 15 dias após a conclusão da colocação da laje do piso, sob pena de as restantes especialidades não poderem executar os trabalhos e, consequentemente, a obra final não estar concluída durante o tempo seco e, bem assim, de que para a Ré a adjudicação da obra estava dependente da garantia, por banda da Autora, de que a obra adjudicada estaria integralmente executada no prazo de 15 dias após a conclusão da colocação da laje do piso.

XI. A decisão sobre o ponto 2.8 da matéria de facto devia ter considerado as afirmações da testemunha Engº AA [in depoimento citado] passagens na gravação minuto 3.48 até 4.28, e 6.38 até 7.12, e o testemunho da testemunha CC [[in depoimento citado - vide passagem na gravação minuto 3.32.]

XII. Pelo que devia ser considerado provado no ponto 2.8: A Autora, confrontada com os referidos prazos de início e conclusão da obra, concordou com eles e garantiu à Ré o cumprimento dos mesmos no caso de o seu orçamento ser aceite.

XIII. A decisão sobre o ponto 2.9 da matéria de facto devia ter considerado a falta de contestação, nomeadamente pela testemunha Engº AA [in depoimento citado] e feito o uso de presunção, de acordo com o artº 349º do Cód. Civil, concretizando um juízo de indução ou de inferência extraído do facto de base ou instrumental para o facto essencial presumido, à luz das regras da experiência (de acordo com o art.º 351º do Cód. Civil).

XIV. Pelo que devia ser considerado provado no ponto 2.9: a Ré forneceu à Autora todas as informações por ela solicitados.

XV. A decisão sobre o ponto 2.15 da matéria de facto devia ter considerado o depoimento dos Srs. Peritos, em audiência [depoimento na audiência de 26-05-2022, com início pelas 10:01 horas e términus pelas 10:03 horas gravado no sistema Citius no ficheiro com a referência 20220526094547_15895098_2871560],– na passagem na gravação entre minutos 1:20 e 1:30, e entre minutos 4:56 e 5:30.

XVI. Bem como o depoimento da testemunha DD, [depoimento na audiência de 26-05-2022, com início pelas 15:23 horas e términus pelas 15:46 horas gravado no sistema Citius no ficheiro com a referência 20221116 152314_15895098_2871560]na passagem na gravação entre min 7:49 e 8:48,

XVII. Pelo que devia ser considerado provado no ponto 2.15: Os defeitos em causa, não tendo sido detectados, e tratados e reparados no devido momento, no decurso da obra, não são passíveis de conserto, na perspectiva de um conserto autónomo e apenas dos problemas encontrados, e que a reparação dos problemas apenas pode ocorrer com uma intervenção de fundo, que implica, entre outras, a remoção de toda a cobertura instalada

XVIII. A decisão sobre o ponto 2.20 da matéria de facto devia ter considerado o depoimento da testemunha DD, [depoimento na audiência de 26-05-2022, com início pelas 15:23 horas e términus pelas 15:46 horas gravado no sistema Citius no ficheiro com a referência 20221116 152314_15895098_2871560] representante da sociedade “C..., Lda., na passagem na gravação entre min 7:49 e 8:48.

XIX. Pelo que devia ser considerado provado no ponto 2.20: A Ré solicitou à sociedade “C... Lda.” orçamento para realização do seguinte trabalho não executado pela Autora: colocação de placagem inferior em OSB na cobertura (previsto no ponto 2.2.1 do orçamento da Autora), e que esta lho forneceu.

ERRO NA DECISÃO SOBRE MATÉRIA DE DIREITO
XX. A sentença apenas tomou em consideração que a Autora não executou o capoto, previsto no seu ponto 3.1., no valor de 2.700,00€, e não procedeu à colocação de placas OSB no interior de paredes exteriores (prevista no ponto 2.1.1.3 do orçamento da Autora), e que a colocação das placas em falta foi orçada pela “C..., Lda.” no valor de 350,00€.

XXI. Tendo apurado o valor de 10.178,48€ como correspondente aos trabalhos efetivamente executados pela Autora e não pagos pela Ré, entendendo que, não tendo a Autora executado a totalidade dos trabalhos por si orçamentados, haveria que descontar ao valor do orçamento o valor nele previsto para os trabalhos não executados.

XXII. Mas devia ter considerado o valor a mais que a Ré pagou a terceiros para substituírem a Autora na execução dos trabalhos em falta, valor que constituiu um dano causado à Ré por culpa exclusiva da Autora, e decorrente de parcial incumprimento do contrato, pelo que a Autora teria de ressarcir a Ré desse valor, nos termos do artº 798º do Código Civil.

XXIII. Em consequência deverá a sentença ser revogada neste ponto, julgando-se procedente o pedido formulado pela Ré de redução do pedido formulado pela Autora no montante de 6.576,80€, por ser o valor por aquela pago a terceiros para executarem as obras orçamentadas pela Autora, por esta não executadas, acrescido do ressarcimento dos danos pela Autora causados à Ré.

XXIV. A sentença apreciou o pedido da Ré, no sentido de ser declarada a redução do preço da obra adjudicada à Autora, no montante da totalidade da obra, por cumprimento defeituoso devido a culpa exclusiva da Autora.

XXV. Na perspetiva de que ocorre cumprimento defeituoso sempre que o empreiteiro não execute a obra nos termos descritos, e as execute com deformidades ou com vícios, genericamente designados por defeitos, e que, provado o defeito e a sua presume-se que o cumprimento defeituoso é imputável ao empreiteiro, nos termos do art.º 799º, n.º 1, do CC, pelo que lhe cumprirá a este último ilidir essa presunção, demonstrando que o defeito não lhe é imputável.

XXVI. A sentença considerou estar alegado e provado pela Ré, que a obra executada pela Autora apresenta defeitos, acrescente-se, que defeitos que perduram. Os defeitos foram descritos e dão-se aqui por reproduzidos para os necessários efeitos.

XXVII. Ficou provado que, comunicados esses defeitos à Autora, esta não reconheceu a existência dos mesmos.

XXVIII. A sentença devia, então, ter tido em conta estar provado (conforme ponto 2.15 da factualidade) que «Os defeitos em causa, não tendo sido detectados, e tratados e reparados no devido momento, no decurso da obra, não são passíveis de conserto, na perspectiva de um conserto autónomo e apenas dos problemas encontrados, e que a reparação dos problemas apenas pode ocorrer com uma intervenção de fundo, que implica a remoção de toda a cobertura instalada»

XXIX. E, tendo-se a Autora recusado a aceitar os defeitos e a proceder à sua reparação, devia considerar que tal reparação não é possível no âmbito da empreitada em curso, obrigando a uma obra nova que a Autora também recusou efectuar.

XXX. Provado que a reparação dos defeitos não é possível, mas apenas a execução de obra nova que evite os defeitos verificados e cumpra o objectivo construtivo traçado pela Ré, errou a sentença ao exigir que a Ré lançasse previamente mão de processo judicial para obrigar a Autora a proceder a reparações impossíveis.

XXXI. Deste modo, quer a título de redução do preço ou de resolução do contrato de empreitada, cabe à Ré o direito de peticionar judicialmente (como fez na presente acção) a redução do preço da obra executada pela Autora que, em suma, para obviar a todos esses defeitos da obra executada, terá de ser substituída por nova e integral obra, que a Ré terá de custear na totalidade (de acordo com os artºs 1222º, 1223º e 798º do Código Civil).

XXXII. A sentença, ao analisar o pedido de condenação da Autora no pagamento de uma indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, elencou a vasta prova apurada, que se repete, de forma graficamente condensada, apenas por mera facilidade de apreciação das questões.

XXXIII. Estando provado que “a execução das obras de ampliação levadas a cabo pela Ré colocou em causa o sossego e descanso dos utentes”,

XXXIV. E que, “por esse facto, em data não concretamente apurada, um dos utentes rescindiu o contrato com a Ré, mudando-se para a residência sénior existente do outro lado da avenida.”

XXXV. E estando ainda provado que “que a demora na conclusão das obras levou igualmente a que os familiares de alguns utentes indagassem junto da Ré acerca de tal circunstância.

XXXVI. Tendo em conta que tais factos constituíram danos não patrimoniais, a sentença errou ao considerar que os mesmos não revestem gravidade suficiente para merecerem a tutela do direito.

XXXVII. A sentença devia ter tido em conta as condicionantes da actividade específica da Ré, e a finalidade para a qual necessitava da construção que adjudicou à Autora, bem como todas as circunstâncias do contrato de empreitada celebrado, e o motivo das suas exigências específicas.

XXXVIII. Assente que a execução das obras de ampliação levadas a cabo pela Ré colocou em causa o sossego e descanso dos utentes, o atraso e não cumprimento de prazos acarretou incómodo e moléstia nos utentes da residência, de tal forma que um dos utentes rescindiu o contrato com a Ré, mudando-se para a residência sénior existente do outro lado da avenida.

XXXIX. Assente ainda que tal causou mal-estar no relacionamento da Ré com os seus utentes/clientes, que se sentiram desconsiderados,

XL. O que se refletiu no facto de, por causa da demora na conclusão das obras, os familiares de alguns utentes terem indagado junto da Ré acerca de tal circunstância.

XLI. A sentença devia ter tomado em conta os danos no bem-estar dos utentes, e no relacionamento destes com a Ré, e que com saída de pessoas para outro lar, constituem no ramo de actividade a que se dedica a Ré danos efetivos na sua reputação e imagem de trabalho, sendo que estes merecem efectiva tutela do direito.

XLII. Como tal, nos termos do artº 496º, nºs 1 e 4 do Código Civil, devia ser atribuída uma indemnização à Ré, a título de danos não patrimoniais, a fixar equitativamente pelo tribunal.
Nestes termos e nos melhores de Direito que V.Exas doutamente suprirão deverá ser concedido provimento ao presente recurso e por via dele ser revogada a douta sentença recorrida:
- Atendendo à prova documental e testemunhal atinente e alterando-se a decisão da matéria de facto, de molde a considerar provados os indicados factos, designados por 2.2, 2.5, 2.6, 2.7, 2.8, 2.9, 2.15 e 2.20;
- E julgando-se procedente o pedido formulado pela Ré de redução do pedido formulado pela Autora no montante de 6.576,80€, valor pago a terceiros para executarem as obras orçamentadas pela Autora, e por esta não executadas, acrescido do ressarcimento dos danos pela Autora causados à Ré.
Sem prejuízo de
- Quer a título de redução do preço ou de resolução do contrato de empreitada, considerar o direito da Ré de redução do preço da obra executada pela Autora, para obviar a todos os defeitos da obra executada, atendendo que a mesma terá de ser substituída por nova e integral obra (de acordo com os artºs 1222º, 1223º e 798º do Código Civil),
Mas sempre,
- Concluindo pela condenação da Autora, nos termos do artº 496º, nºs 1 e 4 do Código Civil, a pagar uma indemnização à Ré, a título de danos não patrimoniais, a fixar equitativamente pelo tribunal.
*
Não foram apresentadas contra-alegações.
*
Colhidos que se mostram os vistos legais e nada obstando ao conhecimento do recurso, cumpre decidir.
*
2. Factos
2.1 Factos provados
O Tribunal a quo considerou provados os seguintes factos:
1.1. A autora é uma sociedade anónima que se dedica á comercialização e aplicação de estruturas metálicas, bem como dos seus componentes e acessórios.
1.2. No exercício da sua atividade, a autora, a pedido da ré, forneceu e aplicou LSF, procedeu à aplicação OSB e forneceu e aplicou cobertura, numa edificação na Avenida ..., Porto.
1.3. A ré não pagou à autora a quantia de 10.528,48€, respeitante a parte do valor da fatura n.º...9, emitida pela autora em 31.10.2018, com vencimento na mesma data.
1.4. A fatura n.º...9 foi entregue à ré.
1.5. A ré é uma sociedade por quotas que se dedica, na prossecução do seu escopo social, designadamente, à gestão de centros residenciais para pessoas da terceira idade, tais como residências geriátricas.
1.6. O público-alvo da ré é de classe média-alta e alta.
1.7. A ré explora dois centros residenciais para pessoas de terceira idade em dois prédios, ambos sitos à Avenida ..., com os n.ºs ...09 e ...79, na cidade do Porto.
1.8. Com vista ao aumento da capacidade do número de utentes na sua instalação e, bem assim, para repor a zona de enfermaria, gabinete de direção, zona de pessoal, despensas e lavandaria, em meados do ano de 2018 a ré decidiu proceder a obras de ampliação da residência sénior sita à Avenida ..., ....
1.9. A referida ampliação mostrava-se urgente.
1.10. No referido prédio a ré contava já com dez utentes, mostrando-se necessárias as referidas alterações para a receção de mais três utentes.
1.11. Em 21 de agosto de 2018 a ré contactou a autora a fim de lhe solicitar cotação para a realização da ampliação do mencionado prédio, tendo anexado o correspondente projeto de arquitetura.
1.12. A ré informou a autora de que se encontrava a aguardar a licença de obra a ser emitida pela Câmara Municipal do Porto e que após a obtenção deste licenciamento e a construção da laje de piso, a obra teria que ser iniciada de imediato.
1.13. No que se refere à montagem da estrutura em LSF, ficou inicialmente acordado que a mesma seria concluída no prazo de 15 dias após o seu início, sendo que, por email de 11.07.2019, a autora comunicou à ré que a totalidade da obra estaria concluída a 31.07.2019.
1.14. Os trabalhos adjudicados à autora tinham que ser executados em coordenação com as demais especialidades adjudicadas a terceiros, como acabamentos de construção civil, eletricidade, pichelaria, incêndio, vídeo - vigilância, painéis fotovoltaicos, ar condicionado e carpintaria.
1.15. A ré pretendia que a obra fosse integralmente realizada durante o tempo seco do Verão (melhor época para a construção) e que fosse licenciada pela Segurança Social o quanto antes.
1.16. Em novembro de 2018 a autora apresentou à ré orçamento datado de 16.11.2018, no valor de €25.486,97, com vista à realização da obra a adjudicar.
1.17. A ré aceitou o referido orçamento e adjudicou a obra à autora.
1.18. Na sequência da aceitação do orçamento, acordaram a ré e a autora que o respetivo pagamento seria efetuado nos seguintes termos: pagamento de €12.743,49, correspondente a 50% do valor orçamentado, na data da aceitação do orçamento; e pagamento de €12.743,49, correspondente a 50% do valor orçamentado, no final da obra concluída.
1.19. Na sequência do acordado, a ré, no dia 19.01.2019, pagou à autora, por transferência bancária para a conta por esta titulada junto do “Banco 1...” e com o IBAN ...30, o valor de €12.743,49, correspondente a 50% do valor orçamentado.
1.20. Valor que a autora efetivamente recebeu e fez integrar no seu património.
1.21. A “D...” concluiu a construção da laje do piso em 20 de maio de 2019.
1.22. Imediatamente após a conclusão da obra de colocação da laje do piso, a ré comunicou à autora tal circunstância.
1.23. Concomitantemente forneceu-lhe livre acesso à obra e as licenças necessárias.
1.24. O local encontrava-se pronto a receber as obras a efetuar pela autora.
1.25. A autora não iniciou imediatamente a obra.
1.26. A autora não concluiu a obra no prazo de 15 dias após o seu início.
1.27. No dia 11 de julho de 2019, após instada pela ré, a autora comunicou-lhe, por mensagem de correio eletrónico, o seguinte:
“As datas que tenho para conclusão da nossa empreitada são as seguintes:
- Montagem de estrutura concluída até 16 de julho de 2019
- Placagem com MGO concluída até ao dia 17 de julho de 2019
- Colocação de cobertura concluída até dia 23 de julho de 2019
- Colocação de capoto concluída até dia 31 de julho de 2019
A entrada em obra será feita amanhã dia 12 de julho. Iremos fazer tudo que está ao nosso alcance para antecipar as datas descritas acima.
De referir que a partir de 17 de julho todas as outras empreitadas podem entrar uma vez que a obra estará fechada (…).”
1.28. A autora não iniciou a obra no dia 12.07.2019.
1.29. A autora não terminou a obra no dia 31.07.2019.
1.30. No dia 15.07.2019 a autora ainda não tinha iniciado a obra.
1.31. No dia 05.08.2019 a autora remeteu à ré mensagem de correio eletrónico na qual lhe comunicou:
“1 - A obra não se encontra abandonada, apenas estivemos, como sabe, com inúmeros incumprimentos por parte dos sub-empreiteiros de montagem. Hoje estivemos em obra por volta das 8:30h da manhã e terminou-se a placagem do vão inferior. Entretanto foram buscar andaimes para montar em obra ainda hoje.
2 - Informo que prevemos que a obra ficará completamente placada durante esta semana e com a cobertura montada.
3 - Independentemente do dia de entrada até final da semana estas tarefas ficam concluídas.”
1.32. No dia 02.09.2019 a autora ainda não tinha colocado a cobertura na obra.
1.33. A ré, aquando do pedido de cotação, remeteu à autora a cor dos painéis (7022).
1.34. A autora não obteve a entrega atempada dos painéis necessários para a colocação da cobertura na cor pretendida pela ré.
1.35. No dia 04.09.2019, a autora remeteu à ré e-mail com o seguinte teor:
“Conforme falado telefonicamente foi encomendado o painel sandwich para a cobertura no RAL 7022. A fábrica comprometeu-se a entregá-la na próxima quarta-feira dia 11/09. Dessa forma, a A... entrará em obra a colocar a cobertura no dia seguinte dia 12/09. (…)”.
1.36. Dada a referida informação, em virtude da urgência da ré em ver concluída a obra adjudicada à autora no mais curto espaço de tempo, esta decidiu alterar a cor do painel para aquela com a referência 7016.
1.37. No dia 27.09.2019, pelas 14:00 horas, dada a parede de trás do edifício se encontrar inacabada, com uma abertura de cerca um metro de altura e a todo o comprimento do edifício, obra da responsabilidade da autora, a ré remeteu-lhe e-mail com o seguinte teor:
“Boa tarde Eng. AA,
Conforme falamos a parede de trás do edifício não se encontra acabada, ou seja, encontra-se com uma abertura de cerca de um metro de altura e a todo o comprimento do edifício, agradecemos assim, que nos resolvam esta situação de imediato pois assim não conseguimos aplicar o acabamento final daquela parede que aliás era da Vossa responsabilidade e que na ultimo encontro em obra transferiram para nós”.
1.38. A prestação mínima na residência da ré era de 1.800,00€, sendo que o lucro da autora por utente era de cerca de 40%.
1.39. A autora apenas concluiu as obras em outubro de 2019.
1.40. A obra esteve sujeita a chuvas.
1.41. Caso a autora tivesse concluído a obra em tempo seco, a mesma não teria sido sujeita a chuvas.
1.42. Na superfície da caleira montada pela autora existe condensação anormal.
1.43. O que sucede em virtude de o processo de execução utilizado pela autora não ter sido o adequado e, bem assim, executado da melhor forma.
1.44. A ré comunicou a situação referida em 1.42. e 1.43. à autora, tendo esta declinado qualquer responsabilidade, por entender que a condensação na superfície da caleira não é um defeito de construção mas sim um fenómeno natural que seria ultrapassado com a colocação do teto falso e o respetivo isolamento térmico.
1.45. Também os rufos a cargo da autora foram mal executados.
1.46. Comunicado o defeito, a autora limitou-se a colocar um produto que não configurou solução adequada para a sua eliminação.
1.47. Como consequência da má execução dos trabalhos da autora referidos em 1.42., 1.43. e 1.45., entra água na instalação da ré, o que conduz a uma diminuição do valor da obra.
1.48. A parede de trás do edifício, da responsabilidade da requerente, ficou inicialmente inacabada.
1.49. O facto a que se alude em 1.48. foi comunicado à autora que procedeu posteriormente a esse acabamento.
1.50. A estrutura de aço leve foi montada com afastamento do muro do vizinho.
1.51. O facto a que se alude em 1.50. foi comunicado à autora, não tendo a mesma resolvido a situação.
1.52. No decurso da obra, a autora informou a ré, por email de 09.10.2019, de que “o meu sub-empreiteiro de “Capotto” está a terminar uma obra e só poderia entrar na vossa, no decorrer da próxima semana.
Uma vez que não podem aguardar mais tempo pela execução do “Cappoto”, e visto que têm quem vos execute essa arte de imediato, irei cancelar esse artigo no meu orçamento, ficando a aguardar que me confirmem quando terminarão, de forma a poder entrar em obra e terminar a colocação dos rufos de cobertura.”
1.53. A ré, face à urgência na conclusão da obra, optou pela não execução pela autora do capoto.
1.54. A ré solicitou à sociedade “C..., Lda.” orçamento para realização dos seguintes trabalhos não executados pela autora: colocação de placas OSB no interior de paredes exteriores (prevista no ponto 2.1.1.3 do orçamento da autora); e, aplicação de capoto (previsto no ponto 3.1. do orçamento da autora).
1.55. Aquela sociedade apresentou à ré orçamento no valor total de 4.982,00€, no qual se incluem 3.000,00€ referentes à aplicação de capoto e 350,00€ referentes à aplicação de revestimento OSB em parte interior de parede exterior.
1.56. Orçamento que por ela foi aceite.
1.57. A sociedade “C..., Lda.” realizou obras descritas no orçamento por si apresentado, tendo procedido à aplicação do capoto.
1.58. A ré, pela realização dos referidos trabalhos, pagou à “C..., Lda.” o valor total de 4.632,00€, dos quais 3.000,00€ dizem respeito à colocação de capoto.
1.59. A execução das obras a que se alude em 1.8. colocou em causa o sossego e descanso dos utentes.
1.60. Por esse facto, em data não concretamente apurada, um dos utentes rescindiu o contrato com a ré, mudando-se para a residência sénior existente do outro lado da avenida.
1.61. A demora na conclusão das obras levou a que os familiares de alguns utentes indagassem junto da ré acerca de tal circunstância.
1.62. Desde 16.11.2018 a ré tinha em seu poder o orçamento apresentado pela autora e em 15.01.2019 aquela adjudicou a esta a execução da obra.
1.63. A autora foi autorizada a entrar em obra logo após 20.05.2019.
1.64. Após a adjudicação da obra, a autora iniciou a fabricação da estrutura em LSF.
1.65. Face à incerteza da data do início da obra, a autora (bem como os seus subempreiteiros), direcionou os seus trabalhos para outras obras.
1.66. Quando a ré comunicou à autora que poderia iniciar a obra, esta tinha outras obras pendentes e não as parou e começou a da ré.
1.67. Bem como, os vários subempreiteiros com quem a autora trabalha, também dirigiram os seus serviços para outras obras.
1.68. Os trabalhos da autora teriam que ser coordenados com trabalhos de outras artes de construção civil, nomeadamente, canalizações, eletricidade e serralharia, os quais não eram da responsabilidade da autora.
1.69. No decorrer da execução da estrutura em LSF, a autora verificou que era necessário implantar pilares e vigas em tubulares de aço, o que obrigou a recorrer a um serralheiro externo à autora.
1.70. Por email de 08.07.2019 a autora comunicou à ré que “(…) Há data de hoje encontra-se em obra uma equipa da A... a terminar as obras de implantação dos pilares e vigas em tubulares de Aço começada no último dia útil, ou seja, 05/07/19 e prevendo concluir esta fase até dia 10/07/19.
- Nessa data a obra estará em condições para que todas as demais sub-empreitadas contratadas diretamente pelo Dono-de-Obra possam terminar o seu trabalho, restando à A... a colocação da Cobertura e do revestimento exterior das Paredes, o que não compromete o avanço da obra. (…)”
1.71. A autora não cumpriu com os prazos que tinha apontado.
1.72. Na sequência do email a que se alude em 1.37., a autora, por email de 27.09.2019, comunicou à ré o seguinte:
“Relembro que ficou decidido em reunião de obra há 3 semanas atrás que essa parte seria recoberta por painel sandwich a aplicar pelo Arq. BB, pela impossibilidade de montar andaime no terreno vizinho, dispensando dessa forma a aplicação de revestimento em MgO.
No entanto, e uma vez que me enviou este email, será feito um levantamento das necessidades na próxima segunda-feira, de forma a revestir a fachada posterior em falta durante o decorrer da próxima semana.
Relembro que tenho programada a entrada da aplicação do Capotto na semana de 07/10, pelo que necessito que a caixilharia esteja colocada até ao final da próxima semana.”
1.73. Por email de 14.11.2019, a ré comunicou à autora o seguinte:
“Ora quanto às caleiras esteve ontem cá na obra o Vosso instalador que observou a enorme condensação de água que as mesmas acumulam e disse-me que quando estava a instalar pensou logo que isto ia acontecer, mas que tinha sido o que lhe tinham pedido e corroborou que o processo de execução teria que ser outro, ou seja, caleira dupla com isolamento. Também a utilização de silicone como vedação em todas as juntas existentes, trás sempre problemas, como é o caso.
Quanto aos rufos, conforme já comunicamos encontram-se mal executados e mais uma vez a utilização de silicone como salvação para o problema de algumas vedações é um erro, por estas razões já temos entradas de água (…).”
1.74. A parede edificada pela autora tinha de seguir o projeto e a base da fundação que foi realizada pelo dono de obra.
1.75. O valor unitário orçamentado para a colocação de capoto na rubrica 3.1., no valor de 2.700,00€, foi descontado pela autora.
*
2.2. Factos Não Provados
O Tribunal a quo considerou não provados os seguintes factos:
2.1. A ré reconhece a dívida referida em 1.3.
2.2. A ampliação referida em 1.8. mostrava-se urgente face às solicitações do “ISS, IP” nesse sentido e para, desse modo, evitar a aplicações de coimas por banda daquela entidade.
2.3. A unidade de geriatria da ré tinha lista de espera, a aguardar vagas.
2.4. A informação a que se alude em 1.12. foi prestada pela ré à autora na data referida em 1.11.
2.5. Estava planeado com o empreiteiro geral e demais especialidades a obra estar totalmente executada até 31 de julho de 2019.
2.6. A ré expressamente advertiu a autora de que a garantia da conclusão da obra no prazo de 15 dias após a colocação da laje do piso era conditio sine qua non para a adjudicação da mesma.
2.7. A autora ficou ciente de que a obra a adjudicar teria que estar terminada no prazo de 15 dias após a conclusão da colocação da laje do piso, sob pena de as restantes especialidades não poderem executar os trabalhos e, consequentemente, a obra final não estar concluída durante o tempo seco e, bem assim, de que para a ré a adjudicação da obra estava dependente da garantia, por banda da autora, de que a obra adjudicada estaria integralmente executada no prazo de 15 dias após a conclusão da colocação da laje do piso.
2.8. A autora, confrontada com os referidos prazos de início e conclusão da obra, concordou com eles e garantiu à ré o cumprimento dos mesmos no caso de o seu orçamento ser aceite.
2.9. Na ocasião a que se alude em 1.22., a ré forneceu à autora todas as informações por ela solicitados.
2.10. A obra adjudicada à autora deveria estar totalmente acabada, pelo menos, até ao dia 07 de junho de 2019.
2.11. A ré comunicou à autora que não aceitava a obra.
2.12. O constante abandono da obra pela autora e consequente não acabamento da mesma no prazo acordado, levaram à sua precoce deterioração, designadamente, toda a estrutura em aço se encontra cheia de ferrugem desencadeada pelas chuvas a que se alude em 1.40.
2.13. À data da constatação de tal defeito já não era possível retirar / alterar a estrutura de aço leve por outras especialidades já terem finalizado os trabalhos à volta da estrutura.
2.14. Toda a estrutura se encontra mal construída e mal montada, com paredes desalinhadas, paredes fora de esquadrias, alturas de vãos de portas inexistentes.
2.15. Defeitos que por não terem sido detetados à data são agora impossíveis de serem consertados, por implicarem “desmanchar” toda a obra.
2.16. Para além da parede a que se alude em 1.48. outras ficaram inacabadas.
2.17. Há placas de OBS mal colocadas.
2.18. A situação a que se alude em 1.48. não é passível de eliminação, pois implicaria desmanchar toda a obra.
2.19. O facto a que se alude em 1.50. conduz a uma diminuição do valor da obra.
2.20. A ré solicitou à sociedade “C... Lda.” orçamento para realização do seguinte trabalho não executado pela autora: colocação de placagem inferior em OSB na cobertura (previsto no ponto 2.2.1 do orçamento da autora).
2.21. A ré, face à indisponibilidade da autora em concluir os trabalhos que foram adjudicados, contratou EE e FF, os quais realizaram as obras da responsabilidade da autora e por ela orçadas e pelos quais pagou a quantia de 1.935,80 €.
2.22. Para além do que se refere em 1.61., houve quem insinuasse a falta de pagamento.
2.23. Quando foi efetuada a adjudicação à autora, o prazo indicado pela ré para a obra se iniciar era num espaço de cerca de um mês.
2.24. A autora iniciou a obra, com a montagem da estrutura em LSF, em 06.06.2019.
2.25. Os pilares e vigas em tubulares de aço a que se alude em 1.69. começaram a ser implantados em obra em 05.07.2019.
2.26. Entre os dias 06.06.2019 e 05.07.2019, a autora coordenou com os empreiteiros de eletricidade e canalizações para estes avançarem com as suas especialidades.
2.27. O incumprimento a que se alude em 1.71. deveu-se ao atraso de vários subempreiteiros da autora.
2.28. Sempre foi transmitido à ré que a autora estava dependente dos seus subempreiteiros na realização dos trabalhos e que havia grande dificuldade em arranjar mão de obra na área da construção civil, daí os contínuos atrasos na realização e coordenação dos diversos trabalhos.
2.29. O aço leve aplicado pela autora é galvanizado com proteção de zinco, o que impede o aço de enferrujar.
2.30. As situações a que se alude em 1.42., 1.43. e 1.45. apenas foram comunicadas à autora com o email de 14.11.2019, referido em 1.73.
2.31. A caleira referida em 1.42. não tinha qualquer deficiência na sua colocação, porquanto a existência de condensação é decorrente de um fenómeno natural, provocado pela diferença de temperatura, que seria ultrapassado com a colocação de teto falso com o respetivo isolamento térmico.
2.32. Foi este tipo de caleira que foi contratado e orçamentado.
2.33. Os rufos referidos em 1.45. foram devidamente executados pela autora, mas os trabalhadores contratados pela ré para colocarem os painéis solares rasgaram parte dos rufos.
2.34. O facto a que se alude em 1.37. deve-se ao facto de o muro do vizinho não estar em linha reta (muro torto).
2.35. A autora aplicou placas MGO no interior do edifício conforme contratado na rúbrica 2.1.1.3. do orçamento.
2.36. A autora colocou a placagem interior em OSB na cobertura prevista na rúbrica 2.2.1 do orçamento.
2.37. Todas as deficiências da obra que foram denunciadas e que eram da responsabilidade da autora foram resolvidas atempadamente.
*
3. Delimitação do objecto do recurso; questões a apreciar e decidir:
Das conclusões formuladas pela recorrente as quais delimitam o objecto do recurso, tem-se que as questões a resolver no âmbito do presente recurso são as seguintes:
- Impugnação da matéria de facto;
- Do mérito da decisão.
*
4. Conhecendo do mérito do recurso:
4.1. Da impugnação da Matéria de facto
A apelante em sede recursiva manifesta-se discordante da decisão que apreciou a matéria de facto, pretendendo que a matéria constante das alíneas 2.2, 2.5, 2.6, 2.7, 2.8, 2.9, 2.15 e 2.20 dos factos não provados seja dada como provada.
Consta das referidas alíneas a seguinte factualidade:
“2.2. A ampliação referida em 1.8. mostrava-se urgente face às solicitações do “ISS, IP” nesse sentido e para, desse modo, evitar a aplicação de coimas por banda daquela entidade.
2.5. Estava planeado com o empreiteiro geral e demais especialidades a obra estar totalmente executada até 31 de julho de 2019.
2.6. A ré expressamente advertiu a autora de que a garantia da conclusão da obra no prazo de 15 dias após a colocação da laje do piso era conditio sine qua non para a adjudicação da mesma.
2.7. A autora ficou ciente de que a obra a adjudicar teria que estar terminada no prazo de 15 dias após a conclusão da colocação da laje do piso, sob pena de as restantes especialidades não poderem executar os trabalhos e, consequentemente, a obra final não estar concluída durante o tempo seco e, bem assim, de que para a ré a adjudicação da obra estava dependente da garantia, por banda da autora, de que a obra adjudicada estaria integralmente executada no prazo de 15 dias após a conclusão da colocação da laje do piso.
2.8. A autora, confrontada com os referidos prazos de início e conclusão da obra, concordou com eles e garantiu à ré o cumprimento dos mesmos no caso de o seu orçamento ser aceite.
2.9. Na ocasião a que se alude em 1.22., a ré forneceu à autora todas as informações por ela solicitados.
2.15. Defeitos que por não terem sido detetados à data são agora impossíveis de serem consertados, por implicarem “desmanchar” toda a obra.
2.20. A ré solicitou à sociedade “C... Lda.” orçamento para realização do seguinte trabalho não executado pela autora: colocação de placagem inferior em OSB na cobertura (previsto no ponto 2.2.1 do orçamento da autora).”
Vejamos, então.
No caso vertente, mostram-se minimamente cumpridos os requisitos da impugnação da decisão sobre a matéria de facto previstos no artigo 640.º do Código de Processo Civil, nada obstando a que se conheça da mesma.
Entende-se actualmente, de uma forma que se vinha já generalizando nos tribunais superiores, hoje largamente acolhida no artigo 662.º do Código de Processo Civil, que no seu julgamento, a Relação, enquanto tribunal de instância, usa do princípio da livre apreciação da prova com a mesma amplitude de poderes que tem a 1ª instância (artigo 655.º do anterior Código de Processo Civil e artigo 607.º, n.º 5, do actual Código de Processo Civil), em ordem ao controlo efectivo da decisão recorrida, devendo sindicar a formação da convicção do juiz, ou seja, o processo lógico da decisão, recorrendo com a mesma amplitude de poderes às regras de experiência e da lógica jurídica na análise das provas, como garantia efectiva de um segundo grau de jurisdição em matéria de facto; porém, sem prejuízo do reconhecimento da vantagem em que se encontra o julgador na 1ª instância em razão da imediação da prova e da observação de sinais diversos e comportamentos que só a imagem fornece.
Como refere A. Abrantes Geraldes in Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2013, Almedina, págs. 224 e 225, “a Relação deve alterar a decisão da matéria de facto sempre que, no seu juízo autónomo, os elementos de prova que se mostrem acessíveis determinem uma solução diversa, designadamente em resultado da reponderação dos documentos, depoimentos e relatórios periciais, complementados ou não pelas regras de experiência”.
Importa, pois, por regra, reexaminar as provas indicadas pela recorrente e, se necessário, outras provas, máxime as referenciadas na fundamentação da decisão em matéria de facto e que, deste modo, serviram para formar a convicção do Julgador, em ordem a manter ou a alterar a referida materialidade, exercendo-se um controlo efectivo dessa decisão e evitando, na medida do possível, a anulação do julgamento, antes corrigindo, por substituição, a decisão em matéria de facto.
Reportando-nos ao caso vertente constata-se que a Senhora Juiz a quo, após a audiência e em sede de sentença, motivou a sua decisão sobre os factos nos seguintes meios de prova:
“Neste âmbito cumpre começar por referir que a factualidade elencada como provada em 1.1., 1.2., 1.3., 1.4., 1.8., 1.11., 1.16., 1.17., 1.18., 1.19. e 1.20. está assente entre as partes, conforme resulta das posições assumidas pelas mesmas nos respetivos articulados.
No que à demais factualidade considerada como provada se refere, o tribunal considerou, desde logo, o teor dos documentos juntos aos autos, de entre os quais se destacam os seguintes:
- O email datado de 16.11.2018, remetido pela autora à ré, contendo o orçamento apresentado pela primeira à segunda, junto com a réplica como doc. 1 e 1A (fls. 28 e 28 verso), com base no qual foi considerada como provada a factualidade contida em 1.62. (1ª parte);
- O email datado de 15.01.2019, remetido pela ré à autora e relativo à adjudicação da obra, junto com a réplica como doc. 2 (fls. 29), com base no qual foi considerada como provada a factualidade contida em 1.62. (2ª parte);
- O email datado de 08.07.2019, remetido pela autora à ré em resposta ao email desta última de 06.07.2019, do qual decorre que nessa data a obra ainda não estava concluída, os quais foram juntos com a réplica como doc. 3 (fls. 29 verso a 30), contribuindo para que se considerasse como provada a factualidade contida em 1.25., 1.26., 1.65., 1.66. e 1.70.;
- Os emails datados de 04.09.2019, remetidos pela autora à ré, nos quais é feita referência ao painel sandwich para a cobertura e ao capoto, juntos com a réplica como doc. 4 e 4B (fls. 30 verso e 31), com base nos quais foi considerada como provada a factualidade contida em 1.32., 1.34., 1.35. e 1.36.;
- O email datado de 27.09.2019, remetido pela autora à ré na sequência do email da mesma data que lhe foi remetido pela ré, ambos relativos à “parede de trás do edifício inacabada”, juntos com a réplica como doc. 5 (fls. 32), com base nos quais foi considerada como provada a factualidade contida em 1.37., 1.48., 1.49. (1ª parte) e 1.72.;
- O email datado de 19.11.2019, remetido pela autora à ré na sequência do email da mesma que lhe foi remetido em 14.11.2019, ambos relativos aos “problemas com as caleiras e também com os rufos”, juntos com a réplica como doc. 6 e 6A (fls. 33 a 33 verso), com base nos quais foi considerada como provada a factualidade contida em 1.42., 1.43., 1.44., 1.45., 1.46., 1.47. (1ª parte) - sendo que a 2ª parte constitui decorrência lógica da 1ª parte - e 1.73.;
- O email datado de 09.10.2019, remetido pela autora à ré na sequência do email desta última de 08.10.2019, relativo ao “capoto”, o primeiro junto com a réplica como doc. 7 (fls. 34) e o segundo com o requerimento da ré de 16.04.2021 (fls. 58), com base nos quais foi considerada como provada a factualidade contida em 1.52. e 1.53.;
- O email datado de 31.10.2019, remetido pela autora à ré, com o qual é enviada a fatura ...9, conjugado com o orçamento retificado e com a fatura em causa, juntos com a réplica como doc. 8, 8A e 8B (fls. 34 verso a 35 verso), com base nos quais foi considerada como provada a factualidade contida em 1.75.;
- Os emails datados de 14.10.2019 e de 02.10.2019 e 27.09.2019, remetidos pela testemunha BB da “D...” à ré e relativos, respetivamente, ao “reinício dos trabalhos” e à “parede traseira do edifício por acabar e serralheiro”, juntos com o mesmo requerimento, respetivamente, a fls. 56 e 59 a 61, com base nos quais foi considerada como provada a factualidade contida em 1.40., 1.48. e 1.49.;
- Os emails datados de 02.09.2019, 23.08.2019, 05.08.2019 e 31.07.2019, remetidos pela ré à autora e relativos ao “prazo de conclusão da obra” e ao “abandono da obra”, juntos com o mesmo requerimento a fls. 68, 69, 71 e 72, com base nos quais foi considerada como provada a factualidade contida em 1.26., 1.29., 1.32. e 1.67.;
- Os emails datados de 05.08.2019, 15.07.2019 e 11.07.2019, remetidos pela autora à ré e relativos o primeiro ao “abandono da obra” e os segundos ao “plano de trabalhos”, juntos com o mesmo requerimento a fls. 70, 73 e 74, com base nos quais foi considerada como provada a factualidade contida em 1.13. (2ª parte), 1.25., 1.27., 1.28., 1.29., 1.30. e 1.31.;
- As faturas, e respetivo orçamento, emitidas por “C...”, juntas com o mesmo requerimento da ré como doc. 4, 6 e 8 (fls. 75, 77 e 78 verso), com base nas quais foi considerada como provada a factualidade contida em 1.54., 1.55., 1.56. e 1.58. Quanto às faturas emitidas por FF e EE, juntas com o mesmo requerimento da ré como doc. 5 e 7 (fls. 76 e 78), cumpre referir que a primeira não possui qualquer descritivo, enquanto o descritivo da última não foi acompanhado de prova que o permita relacionar com a situação dos autos. Assim sendo, foi considerada como não provada a matéria elencada em 2.20.
Foi também considerado o relatório pericial junto aos autos a fls. 93 a 96 verso, conjugado com os esclarecimentos prestados pelos respetivos peritos em audiência, com base no qual foi considerada como não provada a factualidade contida em 2.12., 2.13., 2.14. e 2.15.
Em conjugação com os documentos acima assinalados e com a prova pericial, foram igualmente avaliados os depoimentos das várias testemunhas inquiridas, bem como as declarações de parte prestadas pela legal representante da ré, estas últimas na estrita medida em que encontraram correspondência nos demais meios de prova.
AA, engenheiro, é funcionário da autora.
Declarou que a autora reuniu com a ré em obra e disse-lhe o que pretendia. O primeiro orçamento dado pela autora remonta a novembro de 2018 e em janeiro de 2019 a obra foi-lhe adjudicada. Nessa altura foi pago à autora o valor de 50% da obra. A autora ficou a aguardar a entrada em obra porque existia um problema com as licenças camarárias e, entretanto, comunica que apenas vão entrar em obra em maio de 2019. Para si ficou percetível que havia urgência na execução da obra porque existiam problemas com um vizinho. Foi usada uma tecnologia nova e mais rápida. A autora não se comprometeu com prazos, o que era impossível definir, pois existiam trabalhos a executar por entidades externas à autora sem os quais os trabalhos a cargo da mesma não podiam ser realizados, como é o caso do capoto que só pode ser colocado depois das caixilharias (no entanto, constatamos que essa sua afirmação de que a autora não se podia comprometer com prazos resulta contrariada pelo teor do seu email de 11.07.2019). Admite que possa ter sido dito que era possível montar a estrutura LSF num prazo de 15 dias a 3 semanas. Começaram a fazer o projeto da referida estrutura em janeiro de 2019 e iniciaram a sua execução em fábrica, pois tinham a expetativa de entrar em obra em março de 2019 (sendo que do seu depoimento, ou de qualquer outro meio de prova, não resulta que tenha acordado com a ré entrar em obra em março de 2019). No entanto, só entraram em junho. Explicou que para além da estrutura LSF em si mesma podem ser necessários outros elementos, dando o exemplo da existência de janelas grandes, caso em que são ainda necessárias vigas e perfis. E a autora apercebe-se da necessidade desses elementos, que são fornecidos por uma entidade externa, na execução do projeto. No caso dos perfis já tinham apalavrado com uma empresa o fornecimento dos mesmos mas como a entrada em obra se atrasou (tendo em conta a expetativa da própria autora de entrar em obra em março) tiveram que contactar outra. A estrutura em LSF estava feita para entrar em obra em março de 2019. Efetuaram a “placagem” entre 11 a 14 de julho (o que resulta contrariado pelo seu email de 11.07.2019, onde refere que a “placagem” será concluída até 17.07.2019), sendo que os perfis ficaram prontos dentro do prazo. Nessa altura já existiam trabalhos de picheleiro e de eletricista na obra. A cobertura e o capoto eram também trabalhos externos à autora (querendo com isso referir que a autora recorreu à subcontratação). Estavam em agosto, mês em que na construção civil tudo fecha. Contactaram muita gente para a execução desses trabalhos, inclusive quem tinham apalavrado para realizar os mesmos em março de 2019, mas não conseguiram. Tentaram por todos os meios executar a obra e entregá-la. Esclareceu que não procedeu à coordenação dos trabalhos dos subempreiteiros mas pelo que viu era tudo por administração direta (referindo-se à pichelaria e serralharia). A perceção que tem é a de que todos se atrasam. Em setembro conseguiu um subempreiteiro para a execução da cobertura. Esse empreiteiro diz-lhe que não tinha a cor pretendida em stock, pelo que teriam que a encomendar. No entanto, tinha em stock uma cor similar. Contactou a ré que lhe disse que podiam avançar com essa cor. O preço era o mesmo.
Explicou que o edifício que construíram constituía um corpo retangular que assentava numa base pré feita e que ia até ao muro de meação com a propriedade vizinha, encostando a esse muro. Quando em julho efetuaram a placagem, não puderam fazer o respetivo revestimento em capoto do lado do muro. Para esse efeito era necessário colocar andaimes no prédio vizinho, o que o respetivo proprietário não autorizou. Assim, optaram pela colocação de painel sandwich em vez de capoto. Há uma área de cerca de metro e meio (3 m2) junto ao muro que não fica revestida. São depois contactados pela ré que diz que quer a placagem dessa área, o que foi feito em setembro de 2019 com recurso ao uso de arnês (constatando o tribunal que a colocação do painel sandwich surge orçamentada e faturada pela “C...”). A cobertura foi rematada entre 10 a 15 de setembro. Depois desse remate tiveram que aguardar o revestimento em capoto feito pelo dono da obra para colocarem os rufos e os tubos de queda de água. Acabaram esse trabalho em outubro. Esclareceu que a entidade contactada pela autora para efetuar o revestimento em capoto só podia executar esses trabalhos mais tarde, motivo pelo qual os mesmos foram efetuados pelo dono da obra, que arranjou quem os executasse mais cedo, abdicando a autora da sua execução. O facto é que mesmo assim os mesmos não foram concluídos a tempo. No final de outubro a autora emite a respetiva fatura que excluí esses trabalhos e acrescenta os perfis. Nessa altura falou com a legal representante da ré que lhe disse que dentro de uma semana a 15 dias a fatura seria paga, sem que tenha levantado qualquer problema com a obra (o que resulta contrariado por vários dos emails juntos aos autos).
Em novembro a ré envia um email a dizer que entrou água no edifício e que existe oxidação. Deslocou-se à obra com a pessoa que executou as caleiras. Verificou que os rufos estavam rasgados. Alguém terá pisado os mesmos, rasgando-os (o que o tribunal considera não ter ficado devidamente demonstrado). Verificou ainda que as caleiras tinham condensações na parte de baixo, o que é normal. Explicou que as caleiras ficam na cobertura do edifício e que, existindo platibandas, elas andam por dentro da cobertura. Dadas as temperaturas, como ainda não existia isolamento, existiam condensações. Essa situação resolve-se com a colocação de teto falso. Depois disso, em janeiro de 2020, recebe um email a dizer que existiam inundações mas não as viu. Nunca lhe falaram em ferrugem, referindo que o que se vê nas fotos de fls. 53 verso e 54 é sujidade. Acrescentou que a estrutura em LSF esteve lá uns meses montada e que existem ferrugens e fuligens no ar que se depositam minério em cima do aço galvanizado. Também nunca lhe falaram em paredes desalinhadas nem em alturas dos vãos inexistentes. Num corredor a dona da obra disse a um funcionário que queria alargar um vão em 10 cm para a passagem das cadeiras de rodas. Esse funcionário ligou-lhe e isso foi feito, constituindo uma alteração ao projeto. Ninguém lhe pediu correções.
O ponto 2.1.1.3. do orçamento junto a fls. 35 foi executado em julho de 2019 (sendo que existiu um espaço no qual o eletricista pediu para não colocarem nada) e, posteriormente, foi executado o ponto 2.1.1.4. (este último também nos 3 m2 acima referidos, junto ao muro com a propriedade vizinha). O acabamento exterior não foi executado pela autora. Explicou que o “MgO” era para exterior, não sendo necessário para interiores.
Relativamente ao muro de meação com a propriedade vizinha declarou que o mesmo apresenta ondulações, afastando-se do edifício em vários pontos 5 a 10 cm, facto para o qual alertaram a dona da obra, bem como para a necessidade de preencher esses espaços (ondulações essas que o tribunal considera não terem resultado confirmadas). Esse preenchimento não foi feito pela autora uma vez que a dona da obra disse que tinha quem o fizesse nessa semana.
Declarou que efetuaram toda a placagem, podendo ter sido deixado um ou outro ponto por placar a pedido das outras artes, como foi o caso da zona junta ao quadro elétrico (o que resultou contrariado por outros depoimentos). No entanto, deixaram lá as placas.
A colocação da estrutura em LSF depende da colocação de uma base de betão nivelado, a placagem da realização dos trabalhos de eletricidade e pichelaria e a cobertura da realização da parte hidráulica, por exemplo, da ventilação.
Mais declarou que na elaboração do projeto da estrutura em LSF foi prevista a colocação de dois perfis laminados e de uma viga.
O seu depoimento, considerando o que ficou exposto, contribuiu para que se considerasse como provada a factualidade contida em 1.13. (1ª parte), 1.14., 1.16., 1.17., 1.21., 1.26., 1.29., 1.34., 1.36., 1.48., 1.49., 1.50., 1.53., 1.62., 1.64., 1.65., 1.66., 1.67., 1.68., 1.69. e 1.75., sendo que, relativamente à factualidade contida em 1.65., 1.66. e 1.67. foram ainda consideradas as regras da experiência comum, as quais apontam para a normalidade desses factos na área da construção civil.
BB, arquiteto, fez a direção de uma parcela da obra, a “obra de grosso”, em representação da “D...”, onde, à data, trabalhava.
Declarou que a parcela da obra em causa foi realizada por administração direta da dona da obra e que não se coordenou com a autora, não sendo responsável pelos outros intervenientes em obra. Também não acompanhou os trabalhos da autora.
Foram os primeiros a entrar em obra. Pensa que terão iniciado os trabalhos no final de 2018 ou no início de 2019, não conseguindo precisar quanto tempo estiveram em obra, apontando para cerca de 6 meses. Ia à obra uma ou duas vezes por semana. Não se recorda da data em que foi colocada a laje. Efetuaram o isolamento, já não a caixilharia nem o capeamento.
Só depois de colocada a laje é que lá foram tirar medidas para verificar se as mesmas estavam conformes. Explicou que para inserir a estrutura em LSF a autora tem primeiro que confirmar as medidas.
Relativamente à abertura de metro e meio junto ao muro, pensa que a mesma foi preenchida com poliuretano.
A dona da obra chegou a dizer-lhe que havia uma caleira ou um rufo que deixava entrar água. Foi lá e colocou a possibilidade de a caleira não estar bem isolada, o que fez por a escorrência vir do local onde estava a caleira. No entanto só observou, não averiguou a origem das escorrências.
O seu depoimento, que se revelou objetivo e isento, contribuiu para que se considerasse como provada a factualidade contida em 1.37. (no que à existência da parede inacabada se refere), 1.47. (quanto à entrada de água) e 1.74.
GG, funcionário da autora, é operador da máquina perfilhadora e executa todos os trabalhos em armazém.
Declarou que acompanhou a obra em causa nos autos, a qual decorreu a um ritmo normal (a si competia-lhe a montagem da estrutura em LSF e a placagem). A autora também acompanhou a obra e nunca disse que a estrutura estava mal montada, que tinha ferrugem ou que existiam paredes tortas ou desniveladas. Nunca colocou problemas.
Levantaram as paredes em junho e foram placando em julho. Regressaram depois em setembro para colocar as últimas paredes na frente da obra. Foram lá outras pessoas colocar uns postes e vigas metálicas na laje de betão, na frente da obra.
Confrontado com as fotografias juntas a fls. 53 verso a 54 disse que o que vê nas mesmas não lhe parece ferrugem mas sujidade.
Existiam duas portas num corredor que foram executadas de acordo com o projeto. No entanto, a dona da obra perguntou se os vãos podiam ser mais largos por causa da mobilidade reduzida dos utentes e das cadeiras de rodas.
Não era possível placar a parede encostada ao muro da propriedade vizinha, pois não havia espaço para o fazerem. Também havia uma zona junto a um quadro elétrico onde foi pedido para não placarem e para deixarem lá a placa para ser colocada depois.
O seu depoimento contribuiu para que se considerasse como provada a factualidade elencada em 1.26.
HH efetuou a cobertura da obra, decorrendo do seu depoimento que foi subcontratado pela autora para esse efeito e que, por sua vez, também recorreu à subcontratação para executar esse trabalho.
Declarou que tudo foi bem feito mas que passada cerca de uma semana depois de executada a obra a cobertura foi furada para instalação do ar condicionado (revelando-se o seu depoimento insuficiente para convencer o tribunal desse facto). Isso nunca deveria ter sido feito e nunca se fura a cobertura sem tapar. Depois choveu. Foram lá reparar sem culpa com “cola e veda” (não com silicone). Os furos estavam no local do ar condicionado. Depois disso queixaram-se de uma caleira. Nessa altura já lá não estava.
Do seu depoimento apenas se retira que existiram reclamações por parte da ré à autora relativamente à cobertura do edifício e, designadamente, à caleira, o que já resulta dos emails trocados entre as partes.
II foi subcontratado pela testemunha anterior.
Procedeu à colocação de cobertura em painel sandwich. Um mês ou dois depois de concluída essa obra foi lá chamado. Quando lá chegou estava “tudo aberto”. Viu que havia condensações nas chapas das caleiras. Não havia fuga nenhuma. Disse que não havia muito a fazer. Era necessário colocar o isolamento junto às caleiras. Foi lá reparar. Também lá foi por causa do ar condicionado. Tinham feito furos e rasgos na cobertura e deixado tudo a “céu aberto” (revelando-se o seu depoimento insuficiente no sentido de convencer o tribunal da realidade desse facto. Tapou tudo com “cola e veda”.
Há semelhança do que se referiu a propósito da testemunha anterior, do seu depoimento apenas se retira que existiram reclamações por parte da ré à autora relativamente à cobertura do edifício e, designadamente, à caleira, o que já resulta dos emails trocados entre as partes.
CC é sócio da ré desde 2017 e filho da sua legal representante. É também arquiteto de formação, pese embora não exerça. Por esse motivo e porque trabalhava na ré, acompanhou a obra diariamente.
Declarou que a ré explora duas residências geriátricas na mesma rua e que está em causa uma obra de ampliação para aumento da capacidade da estrutura. Têm capacidade para 10 a 11 idosos e queriam aumentar para 13 a 14. À data, a estadia por pessoa andaria nos 1.800,00€/1.950,00€ por mês.
Para esse efeito foi pedido um orçamento à autora no final de 2018, o qual foi apresentado ainda nesse ano e adjudicado em janeiro de 2019. Com a adjudicação pagaram metade do valor do orçamento. Isso foi tratado com a legal representante da ré mas esteve a par da situação. Contactaram a autora com o objetivo de uma obra rápida, o que era possível com as estruturas da mesma. A licença da obra saiu em abril de 2019. Acordaram que a autora arrancaria com a obra logo que fosse colocada a laje, o que sucedeu por volta de 20 de maio de 2019, e que a obra seria terminada em 2 meses. Para montar uma estrutura como aquela seriam necessárias 2 semanas, no máximo, pressupondo que a mesma estaria pronta a ser montada. No entanto, a autora só entra em obra no final de junho de 2019 e só sai em outubro ou novembro desse ano. Explicou que a obra envolvia trabalhos a executar por etapas, sendo necessária uma sequência que, se falhasse, atrasava tudo. A autora tinha que montar a estrutura e fechar as paredes. Está em causa a montagem de perfis em aço, após a qual a estrutura tinha que ser fechada por fora. Só depois era feita a placagem interior, o isolamento térmico, a cobertura e os rufos. A autora ficou ciente de que havia um prazo para a montagem da estrutura, o qual não podia ultrapassar as 2 semanas. A autora montou a estrutura um pouco antes do inverno e a mesma ficou ao abandono. Fez o fecho das paredes externas e colocou parte dos rufos na cobertura. Quando foram executar a cobertura entrou água na obra. A autora deixou trabalhos por fazer e executou outros com defeito (a estrutura tinha falta de esquadria; havia ferrugem no LSF; montaram uma caleira simples quando devia ser dupla, pelo que têm grandes problemas com condensações e riscos de curto-circuito, sendo que nas juntas das caleiras havia fugas de água; os rufos deixam entrar água; e, há um problema numa parede com águas).
A execução da cobertura atrasou, motivo pelo qual, com as chuvas, não conseguiram fazer quase nada.
A autora contratou alguém que foi corrigir algumas coisas.
Não foram feitos furos na cobertura por causa do ar condicionado.
Parte do que não foi feito pela autora – isolamento e capoto – foi acabado pela “C...”, a qual também teve que retificar a questão da má execução da parede. Esse segundo empreiteiro entrou na obra em outubro ou novembro de 2019. Ter-lhe-ão sido pagos 7.000,00€/7.500,00€. Para além dele foi lá outra entidade minimizar o problema das caleiras.
A empresa para a qual a testemunha BB trabalhava executou outros trabalhos.
Depois da autora sair da obra foram feitas pinturas e acabamentos. Existiram outras especialidades que estavam a cargo de outras entidades, como é o caso das caixilharias e das carpintarias, mas quem atrasou a obra toda foi a autora.
Existem ainda defeitos que estão por resolver, referindo-se à entrada de água por má execução da obra, com risco de incêndio. Referiu que a água entra e é visível na zona das caleiras colocadas pela autora.
Na estrutura cuja execução foi adjudicada à autora não recebiam clientes, sendo que a mesmo só ficou concluído no final do ano de 2019.
Declarou que a situação causou danos à ré, pois tiveram problemas com dois clientes que acabaram por sair. Eram esquizofrénicos e necessitavam de sair e andar na área exterior, o que era impossível com o estaleiro montado. As famílias não compreenderam a demora da obra. Também não conseguiram clientes novos. O prejuízo andará nos 10.000,00€ por mês.
Com base no seu depoimento, o qual se revelou sincero e espontâneo, o tribunal considerou como provada a factualidade contida em 1.5., 1.6., 1.7., 1.9., 1.10., 1.12., 1.13. (1ª parte), 1.14., 1.15., 1.21., 1.22., 1.23., 1.24., 1.25., 1.26., 1.29., 1.33., 1.38., 1.39., 1.40., 1.41., 1.42., 1.43., 1.44., 1.45., 1.47. (1ª parte), 1.48., 1.49., 1.50., 1.51., 1.53., 1.59., 1.60., 1.61., 1.62., 1.63., 1.68. e 1.71.
JJ é vizinho das instalações da ré, na loja da “E...”.
Viu a obra a decorrer no ano de 2019, pelo verão, tendo chegado a comentar com a legal representante da ré que a obra estava demorada. É construtor e as estruturas em LSF são-lhe familiares, usando-as. É possível montar uma estrutura dessas numa semana.
Foi ver a obra depois de fechada. Viu ressoados nos vidros, humidades e escurecimentos nas paredes e nos tetos, desconhecendo a respetiva origem.
O seu depoimento, desinteressado, contribuiu para que se considerasse como provada a factualidade contida em 1.47. (2ª parte).
DD é o legal representante da “C...”.
Declarou que terá entrado em obra em outubro de 2019 e concluído a mesma em dezembro desse ano. A estrutura em aço estava concluída e a cobertura estava feita. Da sua parte executou o capoto no exterior, revestiu a pladur tetos e paredes interiores, procedeu ao isolamento desses tetos e paredes com lã de rocha e colocou painel sandwich na parede junto ao muro. Entrava água numa parede da parte de trás, a qual caía da caleira que só tinha “uma chapa”. Essa água passou para o pladur que deve estar estragado. Há um choque térmico e “pinga bastante”. Também aparecia água no chão por trás da caixa de eletricidade. A humidade vinha do exterior. Chegou a ver lá alguém a arranjar essa segunda situação mas desconhece se ficou resolvido ou não.
Os trabalhos que executou terão andado nos 7.000,00€ a 8.000,00€.
Apresentou um orçamento para arranjar a questão das caleiras. É necessário levantar a cobertura para as tirar.
O seu depoimento, também ele objetivo e imparcial, contribuiu para que se considerasse como provada a factualidade contida em 1.42., 1.43., 1.45., 1.47., 1.48., 1.54., 1.55., 1.56., 1.57. e 1.58.
Foi também ouvida em declarações de parte a legal representante da ré, KK.
Declarou que a obra em causa nos autos constituiu uma ampliação de um edifício, pois necessitavam de aumentar a capacidade da autora para mais 3 utentes. Para isso, precisavam de mudar para essa nova zona serviços, como gabinetes técnicos e enfermaria. Optaram por uma estrutura em LSF porque a residência geriátrica estava em funcionamento e a área do jardim era necessária para os utentes. A obra tinha que ser rápida. A ré contactou a autora em 2018 para executar a obra em 2019, remontando a respetiva adjudicação a janeiro de 2019. A autora disse que a obra estaria pronta no prazo máximo de 2 meses. Estavam em causa os 2 meses antes do início do verão. Não podiam arrancar logo porque a ré estava a aguardar a respetiva licença mas tudo tinha que ser muito bem programado em termos de “timing”. A ré já tinha contratado um empreiteiro para a construção da laje e combinaram que a autora entrava em obra logo que a laje estivesse pronta. Da parte da autora tratou de tudo com a testemunha AA. A laje ficou pronta a 20.05.2019. Quando a obra foi adjudicada à autora a testemunha AA disse que precisava de 50% do valor da obra para executar a estrutura em LSF nas suas oficinas, o que podia fazer de imediato. Disse-lhe também que após a entrada em obra não levaria mais do que um mês a concluir os trabalhos. No entanto, concluída a laje, a autora não entrou logo em obra, dizendo que tinha outras obras e que não tinha pessoal disponível para o efeito. Só em junho de 2019 é que a autora leva a estrutura para a obra mas não tinham pessoal disponível para a montar. Ou não aparecia ninguém ou aparecia apenas um funcionário ou apareciam apenas durante parte do dia. A dada altura apercebem-se que a autora subempreitou a obra e aí já diz que a culpa é do subempreiteiro. Levaram todo o verão. A cobertura só teve início em setembro de 2019. Colocaram caleiras e rufos, sendo que ambos têm problemas. Colocaram um tubo de queda de água que também apresentou problemas e teve que ser substituído.
Confrontada com o orçamento junto a fls. 35, declarou que a autora executou a estrutura em LSF e parte do OSB (apenas a placagem exterior com a colocação de lã de rocha, pese embora tenha deixado uma parede por placar, junto ao muro com o vizinho). Não executou a placagem interior nem o capoto. Explicou que a ampliação encostou ao muro em pedra com a propriedade vizinha. No entanto, foi deixado um afastamento, o qual iria gerar humidades. O isolamento dessa área, incluindo a placagem exterior, não foi feito pela autora.
O grande problema da obra é a caleira que estava sempre a pingar. Essa caleira fica no interior do edifício, entre o painel sandwich. Foi lá um picheleiro tentar resolver o problema mas sem êxito. A água entra e os tetos estão pretos.
Todos os defeitos foram comunicados à autora, pessoalmente, por telefone e por email. No entanto, era muito difícil falar com a testemunha AA, era altivo e nunca assumia nada, achava que tinha sempre razão.
A autora entregou a obra em meados de setembro de 2019, quando a mesma deveria ter ficado pronta no final de junho de 2019. E só em setembro é que a ré soube que a autora não faria o capoto.
A ré teve prejuízos com a situação. Tinham um estaleiro montado numa área aberta com o inverno a entrar. Os utentes necessitavam de sair para andar no jardim e não podiam devido ao estaleiro. Havia pós no ar. Por causa disso tiveram problemas com os familiares dos utentes. Dois deles eram esquizofrénicos e acabaram por sair para outro lar. Pagavam entre 1.950,00€/2.000,00€ por mês. A partir de março de 2020 a situação normalizou com a entrada de novos utentes. Explicou que o lucro da autora por utente é de cerca de 40%.
Pediram orçamentos para debelar os defeitos da obra, os quais ascendem a 15.000,00 €. É necessário levantar a cobertura e colocar novas caleiras e rufos.
As suas declarações contribuíram para que se considerasse como provada a factualidade contida em 1.5., 1.6., 1.7., 1.9., 1.10., 1.12., 1.21., 1.22., 1.23., 1.24., 1.25., 1.26., 1.29., 1.32., 1.38. (2ª parte), 1.42., 1.43., 1.44., 1.45., 1.47., 1.48., 1.49., 1.50., 1.51., 1.53., 1.54., 1.59., 1.60., 1.61., 1.63., 1.66. e 1.71.
O depoimento de parte prestado pela legal representante da ré, LL, não assumiu qualquer relevo, porquanto, dadas as suas funções na ré (só lida com os bancos, com contas e tesouraria), nada demonstrou saber sobre os factos sobre os quais foi requerido o seu depoimento.
Aqui chegados e prosseguindo para a factualidade considerada como não provada, cumpre apenas referir que a prova produzida foi de todo insuficiente no sentido de permitir ao tribunal formar convicção segura a propósito da mesma.”.
Tendo presentes estes elementos probatórios e demais motivação, ouvida que foi a gravação dos depoimentos prestados em audiência, vejamos então se, na parte colocada em crise, a referida análise crítica corresponde à realidade dos factos ou se a matéria em questão merece, e em que medida, a alteração pretendida pela apelante.
Insurge-se a Recorrente contra tal decisão por entender que o Tribunal a quo valorou erradamente a prova oferecida nos segmentos fácticos em causa.
Entendemos, porém, que a Senhor Juiz a quo fundamentou a sua decisão de forma rigorosa, bem sistematizada, não contornando as questões que se colocavam, invocando sempre com ponderação as regras da experiência comum e o juízo lógico-dedutivo.
Após audição da prova afigura-se-nos, ainda, que a apreciação da Sr. juiz a quo - efectivada no contexto da imediação da prova -, surge-nos como claramente sufragável, com iniludível assento na prova produzida e em que declaradamente se alicerçou, nada justificando, por isso, a respectiva alteração.
Com efeito, a convicção expressa pelo tribunal a quo tem razoável suporte naquilo que a gravação das provas e os demais elementos dos autos lhe revela.
Isto porque salvo quando a lei dispuser diferentemente, a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente.
Contudo, a livre apreciação da prova, não se confunde, de modo algum com apreciação arbitrária da prova, nem com a mera impressão gerada no espírito do julgador pelos diversos meios de prova; a prova livre tem como pressupostos valorativos a obediência a critérios de experiência comum e da lógica do homem médio suposto pela ordem jurídica. Dentro destes pressupostos se deve, portanto, colocar o julgador ao apreciar livremente a prova.
Importa, isso sim, aquilatar se as conclusões que foram retiradas a partir da prova que foi produzida e credibilizada pelo tribunal, não contende com as regras da experiência comum e da lógica.
A livre apreciação da prova tem de se traduzir numa valoração racional e crítica, de acordo com as regras comuns da lógica, da razão, das máximas da experiência e dos conhecimentos científicos, que permita objectivar a apreciação, requisito necessário para uma real motivação da decisão: com a exigência de objectivação da livre convicção poderia pensar-se nada restar já à liberdade do julgador, mas não é assim: a convicção do julgador há-de ser sempre uma convicção pessoal, mas há-de ser sempre uma convicção objectivável e motivável, portanto capaz de impor-se aos outros em termos de racionalidade e perceptibilidade.
Não esqueçamos, por fim, que a formação da convicção do juiz não pode resultar de partículas probatórias, mas tem necessariamente de provir da análise global do conjunto de toda a prova produzida.
A actividade dos Juízes, como julgadores, não pode ser a de meros espectadores, receptores de depoimentos. A sua actividade judicatória há-de ter, necessariamente, um sentido crítico. Para se considerarem provados factos não basta que as testemunhas chamadas a depor se pronunciem sobre as questões num determinado sentido, para que o Juiz necessariamente aceite esse sentido ou essa versão. Os Juízes têm necessariamente de fazer uma análise crítica e integrada dos depoimentos com os documentos e outros meios de prova que lhes sejam oferecidos.
Conforme atrás referimos, no caso ajuizado, a Apelante pretende que a matéria de facto dada como não provada sob as alíneas 2.2, 2.5, 2.6, 2.7, 2.8, 2.9, 2.15 e 2.20 passe a constar da matéria de facto provada.
Ora, vejamos.
Relativamente à matéria de facto dada como não provada sob a alínea 2.2 não olvidamos que a urgência que a Apelante tinha na ampliação da residência sénior sita na Avenida ..., foi matéria dada como provada no item 1.9 dos factos provados.
Questão diversa é o constante do item 2.2 dos factos não provados, de que existia tal urgência “face às solicitações do “ISS, IP” nesse sentido e para, desse modo, evitar a aplicações de coimas por banda daquela entidade”.
Ora, quanto a este facto afigura-se-nos que não foi produzida prova que nos leve a concluir pela sustentabilidade do mesmo, não assistindo, por isso, razão à Apelante para dar como provada a matéria constante do item 2.2 dos factos não provados.
Além disso, também não foi produzida prova no respeitante à matéria constante do item 2.5, ou seja “Estava planeado com o empreiteiro geral e demais especialidades a obra estar totalmente executada até 31 de julho de 2001”.
Com efeito, dos depoimentos das testemunhas AA, BB e CC, indicados pela Apelante não resulta expressamente que estava planeado com o empreiteiro geral e demais especialidades a obra estar totalmente concluída até 31 de Julho de 2001, pelo que se nos afigura, igualmente, não merecer censura a referida matéria ter sido dada como não provada
Por sua vez, acerca das matérias constantes dos itens 2.6, 2.7 e 2.8 nenhuma das testemunhas indicadas pela Recorrente nas suas alegações refere que a obrigação de conclusão da obra por parte da Recorrida era de 15 dias.
De resto, foi firmemente negado pela testemunha AA, que tenha sido fixado um prazo de 15 dias para conclusão da obra.
É certo ter dito que a estrutura ficaria concluída num prazo de 15 dias, mas nunca a totalidade da empreitada adjudicada à Recorrida.
De particular importância e que deverá ser salientado, é que foi esta testemunha que em representação da Recorrida, negociou com a sócia gerente da Recorrente (KK) as condições da obra. O que esta no seu depoimento reconhece expressamente, conforme se verifica do seu depoimento quando refere que “Fui eu que tratei de tudo, e falei com o engenheiro AA”.
Assim, dos referidos depoimentos resulta que nunca foi assumido pela Recorrida a conclusão da obra num prazo de 15 dias, sendo certo, aliás, que a própria gerente da Recorrente, KK refere a conclusão da mesma num prazo de 2 meses.
De resto, é certo ter sido falado entre as partes um prazo de 15 dias, mas somente para a conclusão da estrutura, resultando, assim, que a Recorrida nunca se obrigou a cumprir qualquer prazo, muito menos o prazo de 15 dias referidos nos itens 2.6, 2.7, 2.8 dos factos não provados.
Ou seja, não resulta da prova que tenha ficado a Recorrida vinculada à execução de qualquer prazo perentório para realização da sua empreitada.
Por sua vez, relativamente ao ponto 2.9 dos factos não provados, a Apelante não refere qualquer documento ou qualquer trecho de depoimento testemunhal, que levasse tal matéria a levar resposta positiva.
Consta, ainda, do item 2.15 dos factos não provados que:“defeitos que por não terem sido detetados à data são agora impossíveis de serem consertados, por implicarem “desmanchar” toda a obra”.
Ora, a referida matéria foi alegada pela Recorrente na sua contestação no artigo 58º (item 2.14 dos factos não provados), e refere-se à matéria constante dos artigos 55º a 57ª da contestação, ou seja, a suposta existência de ferrugem na estrutura de aço leve e estrutura mal construída e mal montada com paredes desalinhadas, paredes fora de esquadria, alturas de vãos de portas inexistentes.
Assim, a referida matéria constante do referido item 2.14, foi dada como não provada, pelo que, por inerência, a matéria constante do item 2.15 nunca poderia ser dada como provada.
De resto, se tais defeitos constantes do referido item 2.14 dos factos não provados existissem realmente, tendo em conta a gravidade dos mesmos, a obra nunca poderia ter continuado, conforme é referido pelos Senhores Peritos.
Afigura-se-nos, por isso, não existirem motivos que justifiquem a alteração, devendo manter-se as respostas dadas aos referidos pontos da matéria de facto provada.
Na realidade as observações feitas aos depoimentos prestados e à prova documental oferecida são pertinentes e acutilantes e em sintonia com as regras da lógica e da experiência comum.
Em face do que vem de ser exposto, improcede o recurso sobre a decisão da matéria de facto.
*
4.2. Do mérito da decisão.
A apelante clama pela revogação da sentença de que recorre.
Sustenta, desde logo, tal pretensão na modificação da decisão sobre a matéria de facto que, pela via recursiva, reclama.
Mantendo-se, todavia, inalterada a decisão relativa à matéria de facto, em consequência da improcedência do recurso impugnativo da mesma, afigura-se-nos que, à luz da mesma, se deve manter a decisão proferida pelo Tribunal a quo.
No caso vertente, a Recorrida peticiona na acção a quantia de €10.528,48, acrescida de juros de mora contabilizados, à taxa legal de juro comercial, até integral e efectivo pagamento, respeitante a parte do preço em falta do valor da fatura n.º...9 - €23.271,97 - respeitante à empreitada sita na Avenida ..., ..., no Porto.
A Recorrente pagou, referente à mencionada factura, a quantia de €12.743,49, estando em falta a quantia de €10.528,48.
De resto, a factura no mencionado montante de €23.271,97 foi emitida na sequência do orçamento apresentado pela Recorrida à Recorrente do montante de 25.486,97€.
Ora, deste orçamento foi descontado a quantia de €2.700,00 respeitante ao trabalho orçamentado para a realização do capoto identificado na rúbrica 3.1 e acrescentado a realização de trabalhos de Tubos Metálicos no valor de €485,00.
Ademais, a não realização dos trabalhos da aplicação de capoto por parte da Recorrida, foi acordado entre esta e a Recorrente, tendo a Apelante optado por dar estes trabalhos à sociedade “C..., Lda.” conforme resulta da matéria constante dos itens 1.16 a 1.19; 1.52, 1.53 e 1.75 dos factos provados.
Além disso, ao valor inicial do orçamento deverá ser, igualmente, descontado a quantia de €350,00 referente à aplicação de revestimento OSB em parte interior e exterior não aplicados pela Recorrida.
Assim, resulta dos factos constantes da matéria dada como provada que a Recorrida é credora da Recorrente da quantia de €10.178,48.
É certo que pretende a Apelante que a este valor de €10.178,48 deveria ser deduzido o valor que esta pagou a terceiros para realização de trabalhos não realizados pela Requerida no montante de €6.567,18.
Convém, todavia, referir que não ficou provado que a Apelante tenha pago a terceiros a quantia de €6.567,18 por conta de trabalhos não realizados pela Recorrida, tendo antes ficado provado que pagou a quantia de €4.632,00 à referida sociedade “C... lda”.
Afigura-se-nos, no entanto, que o referido valor de €4.632,00 não poderia ser imputado à Recorrida porquanto a não realização dos trabalhos de aplicação de capoto por parte desta, foi livremente acordado entre as partes, pelo que não merece censura a sentença, quanto a este ponto.
Com efeito, não tendo a Apelada executado a totalidade dos trabalhos por si orçamentados, haverá que descontar ao valor do orçamento o valor nele previsto para os trabalhos não executados e não o valor que a Apelante terá pago a terceiros para substituírem a autora na execução desses trabalhos.
A Apelante pretende, ainda, a alteração da sentença, também no sentido de que deve ser reduzido o preço do valor da empreitada pelo facto de terem sido dado como provados a existência de alguns defeitos de construção.
Como é sabido, os artigos 1221.º e 1222.º ambos do Código Civil preveem que, se os defeitos puderem ser suprimidos, o dono da obra tem o direito de exigir do empreiteiro a sua eliminação e, não sendo eliminados os defeitos, a redução do preço ou a resolução do contrato.
Ora, no caso vertente, a Apelante não fundou o seu pedido com argumentação que obstasse a respeitar a tramitação legal, ou seja exigir previamente o reconhecimento judicial da existência de defeitos, não seguindo a hierarquia tipificada legalmente.
Na verdade, a Recorrente após a denúncia dos defeitos, e a sua não aceitação pela Recorrida, de imediato pediu a redução do preço.
Afigura-se-nos, por isso, também não merecer censura a sentença, relativamente a este ponto.
Pugna, por fim, a Apelante que lhe seja atribuída indemnização pelos danos não patrimoniais por si invocados.
Como é sabido, a indemnização por danos não patrimoniais cuja gravidade merece a tutela do direito (artigo 496.º do Código Civil) deve, nos termos do n.º 4, primeira parte deste preceito, ser fixada segundo juízos de equidade, tendo em conta as demais circunstâncias do caso (artigo 494.º do Código Civil).
A indemnização destes danos não tem por objecto a reposição da situação em que o lesado estaria se não tivesse sofrido o dano (artigo 566º, nº 2, do Código Civil) mas apenas dar-lhe algo que possa constituir uma compensação do dano sofrido, contribuindo para aliviar ou reduzir o seu sofrimento e a sua perda. Por isso mesmo, a indemnização tem de ser fixada com base na mera equidade (artigo 496.º, n.º 4, do Código Civil), levando em linha de conta as circunstâncias do caso.
Com a cláusula de equidade, prevista em geral no artigo 4.º e permitida, no que ora interessa, nos artigos 496.º, n.º 3 e 566.º, n.º 3, do Código Civil, o tribunal resolverá o litígio ex aequo et bono e não ex jure stricto.
Resulta da matéria dos factos provados constantes dos itens 1.2; 1.8 e 1.14 o seguinte:
“1.2 No exercício da sua atividade, a autora, a pedido da ré, forneceu e aplicou LSF, procedeu à aplicação OSB e forneceu e aplicou cobertura, numa edificação na Avenida ..., Porto.
1.8. Com vista ao aumento da capacidade do número de utentes na sua instalação e, bem assim, para repor a zona de enfermaria, gabinete de direção, zona de pessoal, despensas e lavandaria, em meados do ano de 2018 a ré decidiu proceder a obras de ampliação da residência sénior sita à Avenida ..., ....
1.14. Os trabalhos adjudicados à autora tinham que ser executados em coordenação com as demais especialidades adjudicadas a terceiros, como acabamentos de construção civil, eletricidade, pichelaria, incêndio, vídeo - vigilância, painéis fotovoltaicos, ar condicionado e carpintaria.”
Isto é para além dos trabalhos da Recorrida também existiram outros trabalhos, de várias artes construtivas, nomeadamente trolhas, pedreiros, electricistas, canalizadores, carpinteiros e outros.
Todos estes trabalhos inerentes à construção civil, conforme é das regras da experiência comum causam transtornos a vizinhos e pessoas que eventualmente habitem no local se as obras decorrem em simultâneo com a sua permanência.
Ora, o que resultou provado no item 1.59 dos factos provados é que “A execução das obras a que se alude em 1.8. colocou em causa o sossego e descanso dos utentes”.
Todavia, não foram somente os trabalhos realizados pela Recorrida que causaram transtornos aos utentes da Recorrente.
Ou seja, além dos mencionados trabalhos da Recorrida também outras artes de construção civil causaram transtornos a terceiros.
E conforme referido muito bem pela Sr.ª Juiz a quo, os mesmos não revestem gravidade suficiente que mereça a tutela do direito.
Afigura-se-nos, assim, também não merecer censura quanto a este ponto a sentença proferida pelo Tribunal recorrido.
Pelo que se impõe confirmar a decisão recorrida.
Impõe-se, por isso, a improcedência da apelação.
*
5. Decisão
Nos termos supra expostos, acordamos neste Tribunal da Relação do Porto, em julgar improcedente o recurso, confirmando a decisão recorrida.
*
Custas a cargo do apelante.
*
Notifique.




Porto, 25 de Janeiro de 2024
Paulo Dias da Silva
Isabel Silva
Isabel Peixoto Pereira
(a presente peça processual foi produzida com o uso de meios informáticos e tem assinaturas electrónicas e por opção exclusiva do relator, o presente texto não obedece às regras do novo acordo ortográfico, salvo quanto às transcrições/citações, que mantêm a ortografia de origem)