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ACORDO SOBRE APLICAÇÃO DO REGIME CONSTANTE DO CCT RELATIVO AO RESPECTIVO SETOR DE ATIVIDADE E PROFISSIONAL
CONSEQUÊNCIAS DA DERROGAÇÃO DA APLICAÇÃO PELOS SEUS SIBSCRITORES DESSE CCT
COMPENSAÇÃO DE CRÉDITOS E PRESCRIÇÃO
Sumário
I - Atenta a natureza consensual dos contratos (incluído o contrato de trabalho) – art.º 405º do Código Civil –, nada obstará a que empregador e trabalhador, não havendo CCT aplicável, acordem que a regulação do contrato se faça por referência ao regime constante de CCT relativo ao respetivo setor de atividade e profissional, usufruindo, por essa via, o trabalhador das vantagens, e eventuais desvantagens, gerais decorrentes do regime do CCT escolhido. II - Porém, se o CCT em causa vier a ser considerado derrogado, não vigorando entre os seus subscritores, deixa de se poder considerar que algum CCT esteja considerado como aplicável por acordo [consensual era a aplicação daquele que foi derrogado], havendo que ver se algum é aplicável por via de Portaria de Extensão. III - O crédito prescrito só não pode ser objeto de compensação quando a prescrição já podia ser invocada no momento em que se tornou compensável (art.º 850º do Código Civil), pelo que não estando prescrito o crédito quando o contrato de trabalho cessou, embora estivesse prescrito quando foi apresentada reconvenção em que é pretendida a compensação de créditos, a prescrição entretanto ocorrida não obsta à compensação.
Texto Integral
Recurso de apelação n.º 4138/18.0T8MTS.P1
Origem: Comarca de Aveiro, Juízo do Trabalho de Oliveira de Azeméis
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:
RELATÓRIO
AA (Autora) instaurou contra “Fundação ...” (Ré) a presente ação, com processo comum, pedindo fosse:
a) reconhecido que a relação laboral existente entre a Autora e a Ré configura um contrato de trabalho sem termo;
b) condenada a Ré no pagamento das seguintes retribuições à Autora:
b.1 vencimento correspondente a 14 dias de trabalho relativos ao mês de fevereiro de 2022 no montante de € 745,50.
b.2 salário de férias vencido a 01/01/2022, no montante de € 1.491,00;
b.3 subsídio de férias vencido a 01/01/2022, no montante de € 1.491,00;
b.4 proporcionais de subsídio de férias relativo ao trabalho que prestou em 2022 no montante de € 183,82;
b.5 proporcionais de salário de férias relativo ao trabalho que prestou em 2022 no montante de € 183,82;
b.6 proporcionais de subsídio de natal relativo ao trabalho que prestou em 2022 no montante de € 183,82;
b.7 crédito relativo à falta de formação – retribuição de € 550,40 relativo a 2021, € 550,40 relativo a 2020, e € 550,40 relativo a 2019, no montante global de € 1.651,20;
c) condenada a Ré no pagamento das diferenças salariais resultantes de vencimentos que deveriam ser pagos e não o foram, e são devidos, no montante de € 24.498,72[1];
d) condenada a Ré no pagamento dos juros vencidos e vincendos à Autora, à taxa de juros cível, das quantias em que vier a ser condenada após a citação.
Fundou o seu pedido alegando, em síntese, que foi admitida como trabalhadora da Ré em 09/09/2005, com as funções correspondentes à categoria profissional de “professor de 1º ciclo”, fazendo a Autora cessar o contrato de trabalho em 15/02/2022; cessada a relação laboral e considerando os contratos coletivos de trabalho (CCT) aplicáveis estão em dívida/são devidas as quantias que peticiona.
Realizada «audiência de partes», e, frustrando-se a sua conciliação (após suspensão da instância com vista a possibilitar conversações), foi a Ré notificada para poder contestar, o que fez, apresentando contestação na qual alegou, em resumo, que o montante dos créditos devidos com a cessação do contrato de trabalho e a título de horas de formação não ministrada é inferior ao reclamado pela Autora; quanto ao crédito por diferenças salariais, a Autora labora em erro quanto aos CCTs aplicáveis, sendo o mesmo de montante inferior ao reclamado; a Ré detém sobre a Autora crédito relativo a indemnização por inobservância do aviso prévio na denúncia do contrato de trabalho no montante de € 2.996,00 que tem que ser compensado, dizendo que mesmo que se considere o crédito da Autora eventualmente prescrito não está impedida a compensação; formula pedido reconvencional dizendo dever ser:
a) reconhecido o direito de crédito da Ré sobre a Autora no montante de € 2.996,00;
b) declarada válida a compensação dos créditos ora efetuada no montante de € 2.996,00;
c) por via disso, condenada a Ré a pagar à Autora apenas a quantia de € 3.136,16, absolvendo a Ré no restante pedido formulado pela Autora.
A Autora apresentou resposta, na qual alegou, entre o mais, não aceitar a realização de compensação, estando prescritos eventuais créditos da Ré/Reconvinte por ter decorrido mais que um ano entre a cessação do contrato de trabalho (14/02/2022) e a data em que a Ré alega a compensação (apresentação da contestação em 11/04/2023).
Em despacho saneador foi afirmada a validade e regularidade da instância, sendo admitido o pedido reconvencional e fixado o valor da ação em € 30.878,88, bem como identificado o objeto do litígio e enunciados os temas de prova.
Realizada «audiência de discussão e julgamento», foi depois proferida sentença julgando a ação e a reconvenção procedentes, condenando a Ré a pagar à Autora a quantia de € 12.136,66, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento, absolvendo a Ré da parte restante do pedido formulado.
Não se conformando com a sentença proferida, dela veio a Ré interpor recurso, formulando as seguintes CONCLUSÕES, que se transcrevem[2]:
A) O presente recurso vem interposto da sentença que considerou o pedido da Recorrida parcialmente procedente e o pedido reconvencional procedente e, em consequência condenou a Recorrente a pagar à Recorrida o montante de € 12.136,66, acrescido de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento.
B) O tema a decidir no presente recurso prende-se com a questão de saber qual o instrumento de regulamentação coletiva aplicável às relações de trabalho entre a Recorrente e a Recorrida.
C) No contrato individual de trabalho foi acordado entre Recorrente e Recorrido que às relações de trabalho entre as partes se aplicava o CCT celebrado entre UIPSS (atualmente CNIS) e a FENPROF, publicado no BTE nº 6, de 15 de fevereiro de 2001 e as suas alterações subsequentes.
D) Sucede que, o instrumento escolhido pelas partes, identificado na conclusão precedente, foi entretanto, substituído, pelo menos, pelos seguintes instrumentos de regulamentação coletiva:
− pelo CCT celebrado entre a CNIS – Confederação Nacional de instituições de Solidariedade e a FNSFP – Federação Nacional dos Sindicatos da Função Pública, publicado no BTE nº 17, de 09 de maio de 2006;
− pelo CCT celebrado entre a CNIS – Confederação Nacional de instituições de Solidariedade e a FEPCES – Federação Portuguesa dos Sindicatos do Comércio, Escritório, Serviços e outros, publicado no BTE nº26, de 15 de julho de 2006.
E) Tendo como assente que a Recorrente é filiada da CNIS desde fevereiro de 2005 e a trabalhadora não era sindicalizada, nem comunicou a escolha do instrumento de regulamentação coletiva à entidade patronal,
F) O Meritíssimo Juiz a quo, decidiu que às relações de trabalho entre a Recorrente e a Recorrida era aplicável o CCT celebrado entre a CNIS – Confederação Nacional de instituições de Solidariedade e a FEPCES – Federação Portuguesa dos Sindicatos do Comércio, Escritório, Serviços e outros, publicado no BTE nº 26, de 15 de julho de 2006, em virtude de este ser o CCT mais recente, ao abrigo do disposto no artigo 482º, nos 2 e 3, alínea a) do Código do Trabalho, tendo apurado as diferenças salarias constantes da sentença.
G) É nesta parte do dispositivo que a Recorrente discorda da decisão, porquanto entende que o instrumento de regulamentação coletiva aplicável é o CCT celebrado entre a CNIS – Confederação Nacional de instituições de Solidariedade e a FNSFP – Federação Nacional dos Sindicatos da Função Pública, publicado no BTE nº 17, de 09 de maio de 2006 e as redações subsequentes.
H) Porquanto, a regra é que as convenções coletivas apenas obrigam aqueles que, durante a respetiva vigência das CCT, estiverem filiados ou se venham a filiar nas entidades outorgantes (associações de empregadores e associações sindicais).
I) Este princípio, denominado por princípio da dupla filiação, encontra-se consagrado no artigo 496.º do CT, nos termos do qual uma CCT “obriga o empregador que a subscreve ou filiado em associações de empregadores celebrantes, bem como os trabalhadores ao seu serviço que sejam membros de associação sindical celebrante”.
J) Porém, as disposições consagradas numa CCT podem alargar-se, total ou parcialmente, a entidades não signatárias na CCT, nos termos do artigo 514.º do CT, ultrapassando a problemática relacionada com o princípio da dupla filiação.
K) Ora, A Portaria nº 900/2006, 01 de setembro (que entrou em vigor em 06 de setembro de 2006) aprovou o regulamento de extensão da CCT celebrada entre a CNIS e a FNSFP – Federação Nacional dos Sindicatos da Função Pública, publicado no BTE nº 17, de 09 de maio de 2006, estendeu os efeitos da mesma às relações de trabalho entre instituições particulares de solidariedade social que prossigam as atividades reguladas pelas convenções não filiadas na Confederação outorgante, e trabalhadores ao seu serviço das profissões e categorias profissionais neles previstas e às relações de trabalho entre instituições particulares de solidariedade social filiadas na Confederação outorgante e trabalhadores ao seu serviço das profissões e categorias profissionais previstas nas convenções não representados pelas associações sindicais outorgantes.
L) Por outro lado, de forma expressa, consignou-se em tal Portaria que a mesma não se aplicava aos trabalhadores representados por associações sindicais signatárias do contrato coletivo de trabalho entre a CNIS – Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade e a FEPCES – Federação Portuguesa dos Sindicatos do Comércio, Escritórios e Serviços e outros, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, 1.ª série, n.º 26, de 15 de julho de 2006, por oposição expressa desta.
M) No entanto, não existe Portaria de Extensão que determine a aplicabilidade do CCT celebrado entre a CNIS e a FEPCES aos trabalhadores não sindicalizados, pelo que este CCT era apenas aplicável às entidades patronais associadas da CNIS e aos seus trabalhadores sindicalizados.
N) Razão pela qual se defende que, o CCT celebrado entre a CNIS e FEPCES, apesar de ser o mais recente, não se aplica às relações de trabalho entre a Recorrente e a Recorrida em virtude de não existir Portaria de extensão que ultrapasse o dilema resultante do princípio da dupla filiação.
O) De sorte que, na decisão recorrida não se fez boa aplicação da lei, tendo-se interpretado de forma desadequada, o instrumento de regulamentação coletiva aplicável às relações de trabalho entre Recorrida e Recorrente.
P) Circunstância que determina que a douta decisão ora posta em crise deve ser revogada e substituída por outra que considere aplicável às relações de trabalho sub judice o contrato coletivo de trabalho celebrado entre a CNIS e a FNSFP – Federação Nacional dos Sindicatos da Função Pública, publicado no BTE nº17, de 09 de maio de 2006, com as suas alterações subsequentes.
Q) E, consequentemente, considere devido à Recorrida, apenas, o montante global de € 2.938,51.
R) Salvo melhor opinião e com o devido respeito, a douta sentença recorrida violou vários preceitos legais, nomeadamente, os artigos 482º, nos 2 e 3, alínea a), 483º, 496º e 514º, todos do Código do Trabalho e a Portaria nº 900/2006, 01 de setembro.
Termina dizendo dever o recurso ser julgado procedente e, em consequência ser revogada a sentença, decidindo em consonância com o exposto na motivação do recurso.
A Autora apresentou resposta, sem apresentar formalmente conclusões, terminando dizendo ser devido, e conforme calculado na Petição Inicial a quantia de € 24.498,97, com os acertos em relação aos períodos de baixa médica da trabalhadora, ou seja descontando-se € 6,14 e € 188,52, num total de € 194,66, que constam da Sentença e que se aceita, não obstante a Autora ficar prejudicada – com efeito, se declarou menos, auferirá menos em sede de baixa médica e, no futuro, de reforma, pelo que deve o recurso da Ré ser julgado totalmente improcedente.
Não se conformando igualmente com a sentença proferida, dela veio a Autora interpor recurso, formulando as seguintes CONCLUSÕES, que se transcrevem:
1. A Autora, em síntese, em decorrência da relação laboral havida com a Ré, e após a cessação do contrato, reclama o pagamento de créditos laborais devidos vencidos de acordo com a Lei laboral e respetiva Convenção Coletiva de Trabalho aplicável e que nunca lhe foram pagos.
2. O Tribunal a quo, veio a deferir parcialmente os pedidos, absolvendo a Ré, justificando que se aplicava à relação laboral um terceiro instrumento de regulamentação coletiva e reconhecendo a compensação dos créditos alegados por parte da Ré.
3. Discorda a Autora da interpretação do Tribunal, discordando do CCT que o Tribunal aplica à relação laboral havida, bem como do reconhecimento da compensação alegada pela Ré.
4. Assim sendo e em relação à convenção coletiva aplicável, resultou claro que a convenção coletiva acordada entre as partes – o CCT celebrado entre a UIPSS - União das Instituições Particulares de Solidariedade Social e a FENPROF - Federação Nacional dos Professores e outros, publicada no BTE nº 6, I Série, de 15 de fevereiro de 2001, com as alterações subsequentes foi revogada, ou seja, extinguiu os seus efeitos, não tendo sido alterada ou substituída por outra.
5. Nessa medida, não podia o Tribunal a quo presumir a existência contratos coletivos negociais que substituíram o anterior, sendo que necessariamente, e no vazio têm-se que aplicar o que decorre por determinação de portaria de extensão e que no caso em concreto é do Contrato Coletivo entre a AEEP - Associação dos Estabelecimentos de Ensino Particular e Cooperativo e a FNE - Federação Nacional dos Sindicatos da Educação e outros, entre a mesma associação de empregadores e o SINAPE - Sindicato Nacional dos Profissionais da Educação, entre a mesma associação de empregadores e o SPLIU - Sindicato Nacional dos Professores Licenciados pelos Politécnicos e Universidades e, ainda, entre a mesma associação de empregadores e a FENPROF - Federação Nacional dos Professores e outros, publicados no Boletim do Trabalho e Emprego, 1.ª série, n.º 11, de 22 de março de 2007, bem como as correspondentes alterações publicadas, respetivamente, no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 5, de 08 de fevereiro de 2009, n.º 8, de 28 de Fevereiro de 2009, e n.º 13, de 08 de abril de 2009, a primeira com retificação publicada no citado Boletim, n.º 14, de 15 de abril de 2009 - Portaria de Extensão n.º 462/2010, de 01 de julho, o qual foi posteriormente substituído pelo Contrato coletivo entre a Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade - CNIS e a Federação Nacional dos Sindicatos dos Trabalhadores em Funções Públicas e Sociais - Revisão global publicado no BTE nº 31 de 22 de agosto de 2015 e com revisão global publicado no BTE nº 1, de 08 de janeiro de 2020 - alterado pelo contrato coletivo entre a Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade - CNIS e a Federação Nacional dos Sindicatos dos Trabalhadores em Funções Públicas e Sociais - FNSTFPS, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego (BTE), nº 1, de 08 de janeiro de 2021, estendido por Portaria n.º 184/2021 de 3 de setembro publicada no Diário da República, em estreito respeito pelos artigos 483.º e 482.º do Código de Trabalho, sendo que estes CCT reportam-se, em pleno, ao sector de atividade profissional da Ré e seus trabalhadores (art.º 514º, nº 1 do Código de Trabalho).
6. Neste pressuposto são devidas as diferenças salariais já requeridas na Petição Inicial, e que renovam, aceitando, é certo os acertos em relação aos períodos de baixa médica da trabalhadora, que constam da Sentença e que se aceita, não obstante a Autora ter ficado prejudicada – com efeito, se declara menos, auferirá menos em sede de baixa médica e, no futuro, de reforma
Diferenças a receber
Ano
Valor
2008
€ 502,35
2009
€ 118,80
2014
€ 1.998,50
2015
€ 1.521,02
2016
€ 4.384,38
2017
€ 4.384,38
2018
€ 4.024,23
2019
€ 2.833,56
2020
€ 2.574,51
2021
€ 1.853,68
2022
€ 303,56
Total € 24.498,97
7. Relativamente à compensação do crédito da Ré, relativo à alegada falta de aviso prévio com o crédito da Autora, e considerando que o contrato cessou a 15 de fevereiro de 2022, por denúncia da Trabalhadora, e que desde 14 de fevereiro de 2022 até ao presente momento não houve mais qualquer contacto entre a Autora e Ré, e que esta somente alegou a compensação em sede de Reconvenção a 11 de abril de 2023, não tendo demonstrado até essa data que pretendia operar a qualquer tipo de compensação, o mesmo ter-se-á que considerar prescrito.
8. De realçar que o crédito da Ré é de natureza laboral, e que não ocorreu nenhuma causa de interrupção da prescrição ou suspensão da mesma, ou tal não foi alegada pela Ré e que a Autora alegou a prescrição do crédito da Ré, na resposta à Reconvenção, nunca tendo aceite em qualquer momento que devia o referido crédito à Ré, alegando inclusive, que da forma que cessou o contrato, teve anuência por parte da Ré a qual não lhe exigiu qualquer formalidade ou lhe comunicou qualquer irregularidade.
9. Acrescendo que a Ré nem tão pouco comunicou o recibo de vencimento de fevereiro de 2022 à Autora, onde previa a alegada compensação.
10. Bem como resultou provado e demonstrado que não houve qualquer comunicação entre as partes após a cessação do contrato de trabalho e tão pouco a Ré emitiu declaração alegar a referida compensação – não enviou carta, e-mail, SMS, mensagem nas redes socais, nem qualquer contacto, nem sequer entregou o recibo de vencimento à Autora no qual pretendia espelha a compensação.
11. Pelo que, nestes termos a compensação reconhecida no montante de € 2.996,00 por Sentença é ilegal, violando claramente a lei, pelo que nessa parte, a Sentença, necessariamente terá que ser revogada.
12. Ora, nestes termos, o tribunal a quo violou de forma direta as normas constantes dos artigos 1º, 337º, nº 1, 483.º, nº 1, alínea b) e nº 2, todos do Código de Trabalho.
Termina dizendo dever ser:
a) reapreciada e alterada a decisão da 1.ª Instância, condenando a Ré no pagamento integral dos pedidos deduzidos na Petição Inicial, nomeadamente:
b.1 vencimento correspondente a 14 dias de trabalho relativos ao mês de fevereiro de 2022 no montante de € 745,50.
b.2 salário de férias vencido a 01 de janeiro de 2022, no montante de € 1.491,00;
b.3 subsídio de férias vencido a 01 de janeiro de 2022, no montante de € 1.491,00;
b.4 proporcionais de subsídio de férias relativo ao trabalho que prestou em 2022 no montante de € 183,82;
b.5 proporcionais de salário de férias relativo ao trabalho que prestou em 2022 no montante de € 183,82;
b.6 proporcionais de subsídio de Natal relativo ao trabalho que prestou em 2022 no montante de € 183,82;
b.7 crédito relativo à falta de formação – retribuição de € 550,40 relativo a 2021, € 550,40 relativo a 2020 e € 550,40 relativo a 2019, no montante global de € 1.651,20;
c) diferenças salariais resultantes de vencimentos que deveriam ser pagos e não o foram e são devidos nos termos supra descritos e calculados conforme descritos nos artigos 23 a 25 da PI, no montante de € 24.948,72, e absolvendo a Autora do pedido reconvencional.
A Ré apresentou resposta, formulando as seguintes CONCLUSÕES, que se transcrevem:
A) A Autora Recorrente defende, tal como Ré Recorrida defendeu no recurso interposto no dia 01/09/2023, com a referência Citius 14980965, embora em período temporal diverso e por motivos diferentes, a aplicabilidade da CCT celebrada entre a CNIS – Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade e a FNSTFPS – Federação Nacional dos Sindicatos dos Trabalhadores em Funções Públicas e Sociais, bem como as sucessivas revisões.
B) O critério de determinação da CCT aplicável a relações de trabalho defendido pela Autora Recorrente não tem acolhimento legal, porquanto, ofende os princípios da dupla filiação e da subsidiariedade.
C) A CCT celebrada entre a CNIS – Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade e a FNSTFPS – Federação Nacional dos Sindicatos dos Trabalhadores em Funções Públicas e Sociais, bem como as sucessivas revisões é aplicável às relações de trabalho entre a Autora Recorrente e a Ré Recorrida por ser a única CCT aplicável às relações de trabalho que substituiu à CCT acordada entre as partes porque, apesar de não ser a CCT mais recente, uma vez que é a única que tem Portaria de Extensão que determinou a aplicabilidade daquela CCT às relações de trabalho aos trabalhadores não filiados em Sindicato.
D) Tal como defendido pela Ré, ora Recorrida, no recurso que interpôs em 01/09/2023, com a referência Citius 14980965.
E) O crédito que a Ré Recorrida detinha sobre a Autora Recorrente relativo à indemnização devida pela falta de aviso prévio, apesar de prescrito é compensável com os créditos detidos por esta, nos termos do disposto no artigo 850º do Código Civil, uma vez que à data em que os créditos se tornaram compensáveis a prescrição ainda não tinha ocorrido.
Termina dizendo dever o recurso interposto pela Autora ser julgado improcedente e, em consequência, ser revogada a sentença, decidindo-se em consonância com o exposto no recurso por si interposto por requerimento de 01/09/2023, com a referência Citius 14980965.
Foi proferido despacho a mandar subir ambos os recursos de apelação (interpostos por Ré e Autora), imediatamente, nos próprios autos, e com efeito meramente devolutivo.
O Digno Procurador-Geral-Adjunto, neste Tribunal da Relação, emitiu parecer (art.º 87º, nº 3 do Código de Processo do Trabalho), pronunciando-se no sentido de ser provido o recurso da Autora e não provido o recurso da Ré, dizendo, essencialmente, o seguinte:
A crise da decisão assenta no argumento de que o Mmº Juiz a quo aplicou ao caso o CCT celebrado entre a CNIS e a FEPCES, publicado no BTE, nº 26, de 15 de julho de 2006 e no que ambas as Recorrentes divergem, invocando cada uma, por seu lado, o Instrumento de Regulamentação Coletiva de Trabalho que entendem ser concretamente aplicável à relação laboral que entre ambas foi estabelecida – cfr. conclusões G. e 4. e 5. dos respetivos recursos.
As Recorrentes pugnam pela revogação da sentença na parte em que se dizem afetadas, sendo que a primeira defende que seja condenada no pagamento do montante global de € 2.938,51 e a segunda pelo pagamento das quantias que reclama a final, por diferenças salariais, por via de tal dissídio.
(…)
Ressalvado o respeito devido por melhor opinião em contrário, a decisão recorrida merece o reparo que lhe é feito pela segunda Recorrente.
Com efeito, atenta a natureza jurídica da primeira Recorrente, do que se depreende dos autos, apesar de não esclarecido, será uma fundação de direito privado que intervém na área da solidariedade social submetida, no essencial e na parte que aqui interessa, ao disposto no regime jurídico das instituições particulares de solidariedade social, por via da sua filiação na “Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade (CNIS) desde 02 de fevereiro de 2005” – cfr. ponto 11 da matéria de facto dada como provada.
Daí que ao caso em apreço não seja passível de aplicação o “CCT CNIS FEPCES” por exclusão expressa decorrente do art.º 1º, nº 2 da Portaria n.º 900/2006, de 01 de setembro – cfr. Ac. TRC de 16/01/2014, “II – A Portaria nº 900/2006, de 01/09, publicada no DR 1ª série de 01/09/2006, dirigida às IPSS que prossigam as atividades reguladas na CCT da CNIS – Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade, não pode ser aplicada, por via de extensão, a entidades equiparadas a IPSS, por na mesma não se referir tal”.
Considerados os vários instrumentos regulatórios que possam ser aplicáveis e que lhe são subsequentes [em caso de dúvida deveria ser consultada, a título meramente informativo, a Direção-Geral da Administração e do Emprego Público (DGAEP)], terá de ser considerado, neste caso, o que vem invocado pela segunda Recorrente nas sobreditas conclusões, nos termos do art.º 483º, nº 1, alínea b) e n.º 2, do Código de Trabalho.
Ré e Autora apresentaram resposta, dizendo essencialmente:
− a Ré que é uma instituição privada de solidariedade social e já não uma entidade equiparada, pelo que não se encontra excluída a sua aplicação da Portaria 900/2006, de 01/09 publicada no DR 1º Série de 01/09/2006, e por força da alínea b) do artigo 1º da mencionada Portaria de Extensão, aplicável às relações de trabalho entre instituições particulares de solidariedade social filiadas na Confederação outorgante (como é o caso da Ré) e trabalhadores ao seu serviço das profissões e categorias profissionais previstas nas convenções não representados pelas associações sindicais outorgantes (como era o caso da Autora), devendo ser dado provimento ao recurso por si apresentado.
− a Autora subscrevendo o parecer do MºPº.
Procedeu-se a exame preliminar, foram colhidos os vistos, após o que o processo foi submetido à conferência.
Cumpre apreciar e decidir.
*
FUNDAMENTAÇÃO
Conforme vem sendo entendimento uniforme, e como se extrai do nº 3 do art.º 635º do Código de Processo Civil (cfr. também os art.ºs 637º, nº 2, 1ª parte, 639º, nºs 1 a 3, e 635º, nº 4 do Código de Processo Civil – todos aplicáveis por força do art.º 87º, nº 1 do Código de Processo do Trabalho), o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação apresentada [3], sem prejuízo, naturalmente, das questões de conhecimento oficioso.
Assim, aquilo que importa apreciar e decidir neste caso[4] é saber se: Do recurso da Autora:
● é de aplicar à relação laboral que vigorou entre as partes, por via de Portaria de Extensão, o Contrato Coletivo de Trabalho (CCT) outorgado entre a AEEP – Associação dos Estabelecimentos de Ensino Particular e Cooperativo e a FNE – Federação Nacional dos Sindicatos da Educação e outros [e aquele que depois o substituiu], pelo que o valor devido a título de diferenças salariais é o peticionado na PI?
● não pode ter lugar a compensação de crédito da Autora sobre a Ré com indemnização à Ré por falta de cumprimento do aviso prévio pela Autora, por se verificar a prescrição deste? Do recurso da Ré:
● é de aplicar à relação laboral que vigorou entre as partes, por via de Portaria de Extensão, o CCT celebrado entre a CNIS e a FNSFP – Federação Nacional dos Sindicatos da Função Pública, pelo que o valor devido a título de diferenças salariais é o indicado no articulado da contestação?
**
Porque tem interesse para a decisão do recurso, desde já se consignam os factos dados como PROVADOS na sentença recorrida, que foram os seguintes, que se reproduzem:
1. A Autora foi admitida ao serviço da Ré a 09 de setembro de 2005, por contrato de trabalho por escrito a termo certo por 12 (doze) meses, para exercer, por conta e direção da Ré as funções correspondentes à categoria profissional de professor de 1.º Ciclo.
2. Por comunicação entregue em mão, e aceite pela Ré, sem exigência de qualquer outra formalidade, veio a Autora cessar o contrato de trabalho havido com a Ré por denúncia do mesmo em 14 de fevereiro de 2022, com efeitos a partir do dia 15 de fevereiro de 2022.
3. Na cláusula 9.ª do contrato de trabalho celebrado entre Autora e Ré constava que o Instrumento de Regulamentação coletiva de trabalho aplicável à relação laboral era o CCT das Instituições Particulares de Solidariedade Social, publicado no BTE n.º 6, I Série, de 15 de fevereiro de 2001, com as alterações subsequentes.
4. Nos anos de 2019, 2020, 2021 e 2022 a Ré apenas forneceu à Autora 4 horas de formação profissional em 2021.
5. A Autora auferiu, ao longo da relação de trabalho, as seguintes retribuições base mensais:
Ano de 2005 – € 784,38;
Ano de 2006 – € 784,38;
Ano de 2007 – € 964,50;
Ano de 2008 – € 1.149,00;
Ano de 2009:
até setembro – € 1.149,00;
a partir de outubro – € 1.286,95;
Ano de 2010 – € 1.286,95;
Ano de 2011 – € 1.286,95;
Ano de 2012 – € 1.286,95;
Ano de 2013 – € 1.286,95;
Ano de 2014 – € 1.286,95;
Ano de 2015 – € 1.286,95;
Ano de 2016 – € 1.286,95;
Ano de 2017 – € 1.286,95;
Ano de 2018:
até outubro – € 1.286,95;
a partir de novembro – € 1.407,00;
Ano de 2019 – € 1.407,00;
Ano de 2020:
até agosto – € 1.407,00;
a partir de setembro – € 1.487,00;
Ano de 2021:
até agosto – € 1.487;
a partir de setembro – € 1.491,00; e
Ano de 2022 – € 1.491,00.
6. Com a cessação do contrato, a Ré emitiu recibo de vencimento da Autora com os seguintes créditos:
− € 745,50, 14 dias de trabalho do mês de fevereiro de 2022;
− € 1.491,00, férias não gozadas vencidas em 01/01/2022;
− € 1.491,00, subsídio de férias vencido em 01/01/2022;
− € 183,82, proporcional de férias não gozadas vencidas com a cessação do contrato;
− € 183,82, proporcional subsídio de férias vencido com a cessação do contrato;
− € 183,82, proporcional subsídio de Natal vencido com a cessação do contrato;
no valor global ilíquido de € 4.278,96.
7. Nesse recibo, fez incidir, sobre o montante referido, descontos legais, no montante de € 1.493,68, correspondendo:
− € 306,68 ao desconto de 11% para a Caixa Geral de Aposentações;
− € 1.187,00 a 29% de retenção de IRS.
8. Nesse recibo, a Ré descontou ainda a quantia de € 2.982,00 a título de indemnização por falta de aviso prévio.
9. A Autora nunca comunicou à Ré a sua filiação em qualquer sindicato.
10. A Autora nunca comunicou à Ré a escolha de qualquer contrato coletivo de trabalho.
11. A Ré é associada da Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade (CNIS) desde 02 de fevereiro de 2005.
12. Pelo menos em 30 de abril de 2020, a Ré afixou em placard existente na sua secretaria uma declaração em que escolhia como instrumento de regulamentação coletiva do trabalho aplicável às relações laborais com a generalidade dos seus trabalhadores o Contrato Coletivo do Trabalho celebrado entre a CNIS e a FNSTFPS publicado no BTE n.º 1, de 08 de janeiro de 2020, resultante da Portaria de Extensão publicada no BTE n.º 15 de 22 de abril de 2020.
13. Desde a data da cessação do contrato, não houve qualquer comunicação entre Autora e Ré.
14. Para além de outros períodos de baixa, a Autora esteve em situação de baixa nos seguintes períodos:
2021:
Janeiro – 11 dias.
Outubro – 05 dias.
Dezembro – 16 dias.
2019:
Março – 02 dias.
15. Em agosto de 2021, a Ré pagou à Autora, para além da retribuição referida, a quantia de € 28,00 a título de diferenças de remunerações.
** Da quantia devida a título de “diferenças salariais”/CCT aplicável (recursos da Autora e da Ré):
Vamos começar por colocar em quadro, lado a lado, as quantias peticionadas pela Autora quando impulsionou a presente ação [na petição inicial (PI)], as quantias reconhecidas pela Ré no articulado de contestação, e as quantias considerado serem devidas pelo tribunal a quo na sentença recorrida.
Assim:
Petição inicial
Contestação
Sentença
Diferenças salariais
€ 24.498,72
€ 1.793,70
€ 11.202,57
Crédito por horas de formação não ministradas
€ 1.651,20
€ 1.553,15
€ 1.144,81
Créditos em falta
€ 4.278,96
€ 2.784,78
€ 2.785,28 líquidos
[€ 4.278,96 – € 1.493,68]
Sendo que a Ré na contestação defendeu dever ser compensada pelo crédito sobre a Autora, no valor de € 2.996,00, a título de indemnização por inobservância do aviso prévio, o que foi acolhido na sentença recorrida.
Nos recursos apresentados, por Autora e Ré, está apenas em causa o valor relativo a “diferenças salariais” [além de saber se pode operar a compensação, que se apreciará infra], defendendo a Autora ser devido o que peticionou inicialmente [€ 24.498,72], mas aceitando “os acertos em relação aos períodos de baixa médica da trabalhadora, que constam da sentença” [− € 194,66], e reafirmando a Ré ser devida a quantia de € 1.793,70.
A questão está em saber em que medida devia a Autora ter recebido retribuição por valor superior ao pago pela Ré, o que implica saber qual o Contrato Coletivo de Trabalho que é aplicável.
Em termos de factos provados, acima transcritos, recordamos os seguintes (de modo a perceber as posições dos intervenientes):
• a Autora nunca comunicou à Ré estar filiada em algum Sindicato, ou a escolha de algum CCT;
• a Ré, desde 02/02/2005, que é associada da CNIS (Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade);
• no contrato de trabalho celebrado por escrito em 09/09/2005, entre Autora e Ré [a termo certo], constava [cláusula 9ª] ser aplicável à relação laboral o CCT das Instituições Particulares de Solidariedade Social [IPSS], publicado no BTE, nº 6, de 15/02/2001, com as alterações subsequentes].
• em 30/04/2020 (pelo menos), a Ré afixou em placard uma declaração escolhendo como instrumento de regulamentação coletiva do trabalho aplicável às relações laborais com a generalidade dos seus trabalhadores o CCT celebrado entre a CNIS e a FNSTFPS [publicado no BTE, nº 1, de 08/01/2020, resultante da PE publicada no BTE n.º 15 de 22/04/2020].
O tribunal a quo considerou ser de aplicar o CCT referido no contrato de trabalho escrito, que se traduziu em aplicar o CCT celebrado entre a CNIS – Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade e a FEPCES - Federação Portuguesa dos Sindicatos do Comércio, Escritórios e Serviços e outros [publicado no BTE[5] nº 26, de 15/07/2006, que substituiu o mencionado no contrato de trabalho], escrevendo o seguinte:
Na situação em apreço, esta cláusula assume natureza dinâmica, definindo o instrumento de regulamentação coletivo aplicável e estabelecendo a aplicação das alterações subsequentes.
Por isso, conclui-se que o instrumento de regulamentação coletiva do trabalho aplicável à relação dos autos era o CCT celebrado entre a UIPSS - União das Instituições Particulares de Solidariedade Social e a FENPROF - Federação Nacional dos Professores e outros, publicada no BTE nº 6, I Série, de 15 de fevereiro de 2001, com as alterações subsequentes.
Mas a questão coloca-se no referido dinamismo, ou seja, na identificação das alterações subsequentes, pois a UIPSS veio a dar origem à CNIS e o instrumento de regulamentação coletiva do trabalho identificado é substituído por, pelo menos, dois instrumentos de regulamentação coletiva do trabalho, mais concretamente:
Pelo CCT entre a CNIS - Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade e a FEPCES - Federação Portuguesa dos Sindicatos do Comércio, Escritórios e Serviços e outros, publicado no BTE nº 26, de 15 de julho de 2006; e
Pelo CCT entre a CNIS - Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade e a Federação Nacional dos Sindicatos da Função Pública, publicado no BTE n.º 17, de 08 de maio de 2006.
Repare-se que ambos os instrumentos de regulamentação coletiva do trabalho têm uma nota final que estabelece a revogação do instrumento de regulamentação coletiva do trabalho publicado no BTE 6/2001, mais precisamente, a nota 10 do CCT CNIS FEPCES determina que «A presente convenção coletiva de trabalho revoga o IRCT publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, 1ª série, n.º 6, de 15 de Fevereiro de 2001, com as alterações introduzidas pelo Boletim do Trabalho e Emprego, 1ª série, nº 8, de 28 de fevereiro de 2002»; e a nota 8 do CCT CNIS FNSFP estabelece que «o presente CCT substitui a convenção publicada no Boletim do Trabalho e Emprego, 1ª série, nº 6, de 15 de fevereiro de 2001».
Por outro lado, os subscritores iniciais, do lado dos sindicatos, são os seguintes:
FENPROF - Federação Nacional dos Professores;
Federação Nacional dos Sindicatos da Função Pública;
FEPCES - Federação Portuguesa dos Sindicatos do Comércio, Escritórios e Serviços;
FESTRU - Federação dos Sindicatos de Transportes Rodoviários e Urbanos;
FESAHT - Federação dos Sindicatos da Alimentação, Bebidas, Hotelaria e Turismo de Portugal;
Federação Nacional dos Sindicatos da Construção, Madeiras, Mármores e Materiais de Construção;
FESETE - Federação dos Sindicatos dos Trabalhadores Têxteis, Lanifícios, Vestuário, Calçado e Peles de Portugal;
SEP - Sindicato dos Enfermeiros Portugueses;
Sindicato Nacional dos Trabalhadores e Técnicos da Agricultura, Florestas e Pecuária;
Sindicato dos Técnicos de Serviço Social;
SIFAP - Sindicato Nacional dos Profissionais de Farmácia e Paramédicos;
Sindicato dos Trabalhadores da Saúde, Solidariedade e Segurança Social; e
Sindicato dos Trabalhadores das Indústrias de Celulose, Papel, Gráfica e Imprensa.
No CCT CNIS FEPCES os subscritores são:
FEPCES - Federação Portuguesa dos Sindicatos do Comércio, Escritórios e Serviços;
FENPROF - Federação Nacional dos Professores;
FESTRU - Federação dos Sindicatos de Transportes Rodoviários e Urbanos;
FESAHT - Federação dos Sindicatos da Agricultura, Alimentação, Bebidas, Hotelaria e Turismo de Portugal;
FEVICCOM - Federação Portuguesa dos Sindicatos da Construção, Cerâmica e Vidro;
SEP - Sindicato dos Enfermeiros Portugueses; e
Sindicato Nacional dos Profissionais de Serviço Social.
Por sua vez, no CCT CNIS FNSFP a subscritora é apenas a FNSFP - Federação Nacional dos Sindicatos da Função Pública.
Então, o instrumento de regulamentação coletiva do trabalho escolhido pelas partes como sendo aplicável à relação laboral dividiu-se em dois, sendo necessário escolher, entre estes dois, qual o instrumento de regulamentação coletiva do trabalho aplicável por força da cláusula de remissão existente no contrato.
Então, o dilema é o de escolher qual o CCT aplicável, por força de uma cláusula de remissão, que foi revogado por dois instrumentos de regulamentação coletiva diferentes, um que foi subscrito, na parte dos sindicados, pelos subscritores anteriores com exceção de um deles e outro que foi subscrito por esse subscritor.
As regras subjacentes à determinação do instrumento de regulamentação coletiva em caso de concorrência, negociais ou não negociais, subjacentes aos artigos 482º, nos 2 e 3 (concorrência entre instrumentos negociais) e 483º, nº 2 (concorrência entre instrumentos não negociais), do Código do Trabalho, são as seguintes: escolha dos trabalhadores e, em caso de não haver escolha dos trabalhadores, aplicação do instrumento de regulamentação coletiva do trabalho mais recente (as regras referidas resultavam igualmente dos artigos 536º e 537º, do Código do Trabalho). É certo que, na origem, não estamos perante uma concorrência de instrumentos de regulamentação coletiva do trabalho, mas perante uma cláusula de remissão, mas com a sua evolução subsequente vem a ocorrer uma concorrência de instrumentos de regulamentação coletiva do trabalho.
No caso concreto, não houve escolha dos trabalhadores, pelo que temos de considerar aplicável o instrumento de regulamentação coletiva mais recente que, no caso, era o CCT CNIS FEPCES. Na alegação da Ré, esta considera aplicável o CCT CNIS FNSFP com base na sua escolha; mas não resulta do contrato ou da lei a faculdade de a Ré, entidade empregadora, escolher o instrumento de regulamentação coletiva do trabalho aplicável. (…)
A Autora/Recorrente defende que “a convenção coletiva acordada entre as partes – o CCT celebrado entre a UIPSS - União das Instituições Particulares de Solidariedade Social e a FENPROF - Federação Nacional dos Professores e outros, publicado no BTE n.º 6, I Série, de 15 de fevereiro de 2001, com as alterações subsequentes foi revogado, ou seja, extinguiu os seus efeitos, não tendo sido alterado ou substituído por outra, pelo que não podia o tribunal a quo aplicar o CCT que aplicou, defendendo a aplicação de CCT por força de Portaria de Extensão (PE), que no caso é o seguinte (modificando-se a apresentação do texto de modo a ser mais facilmente apreendido):
… CCT entre a AEEP - Associação dos Estabelecimentos de Ensino Particular e Cooperativo e a FNE - Federação Nacional dos Sindicatos da Educação e outros, entre a mesma associação de empregadores e o SINAPE - Sindicato Nacional dos Profissionais da Educação, entre a mesma associação de empregadores e o SPLIU - Sindicato Nacional dos Professores Licenciados pelos Politécnicos e Universidades e, ainda, entre a mesma associação de empregadores e a FENPROF - Federação Nacional dos Professores e outros, publicados no BTE, 1.ª série, n.º 11, de 22/03/2007, bem como as correspondentes alterações publicadas, respetivamente, no BTE, n.º 5, de 08/02/2009, n.º 8, de 28/02/2009, e n.º 13, de 08/04/2009, a primeira com retificação publicada no citado Boletim, n.º 14, de 15/04/2009 – Portaria de Extensão n.º 462/2010, de 01 de julho,
o qual foi posteriormente substituído pelo CCT entre a Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade - CNIS e a Federação Nacional dos Sindicatos dos Trabalhadores em Funções Públicas e Sociais – Revisão Global publicada no BTE nº 31, de 22/08/2015, e com Revisão Global publicada no BTE n.º 1, de 08/01/2020 – alterado pelo CCT entre a Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade - CNIS e a Federação Nacional dos Sindicatos dos Trabalhadores em Funções Públicas e Sociais - FNSTFPS, publicado no BTE, n.º 1, de 08/01/2021, estendido por Portaria n.º 184/2021 de 03 de setembro, publicada no Diário da República…
A Ré/Recorrente, por sua vez, defende que o instrumento de regulamentação coletiva aplicável às relações de trabalho entre a Recorrida e a Recorrente passou a ser o CCT celebrado entre a CNIS e a FNSFP - Federação Nacional dos Sindicatos da Função Pública, publicado no BTE nº 17, de 09 de maio de 2006, com as suas alterações subsequentes, por força da Portaria nº 900/2006, de 01 de setembro (que entrou em vigor em 06/09/2006).
Vistas as posições das partes, quid iuris?
No contrato de trabalho reduzido a escrito ficou previsto, na cláusula 9ª, como consta no ponto 3. dos factos provados, que «o instrumento de regulamentação coletiva de trabalho aplicável às relações entre os outorgantes deste contrato, é o contrato coletivo de trabalho das instituições particulares de solidariedade social, publicado no BTE n.º 6, I Série, de 15 de fevereiro de 2001, com as alterações subsequentes» [contrato a termo certo, que se converteu em contrato por tempo indeterminado, como se depreende dos factos provados (e que não é questionado)].
É pacífico que o legislador consagrou – art.º 496º do Código do Trabalho, com a epígrafe «princípio da filiação» – a regra da eficácia limitada dos CCTs, ou seja, a sua eficácia limita-se aos empregadores que as subscrevam e estejam filiados em associação de empregadores celebrante, bem como aos trabalhadores ao serviço desses empregadores que sejam membros da associação sindical celebrante ou sejam membros dos sindicatos representados pelas uniões, federações ou confederações celebrantes – a regra da dupla filiação, que no caso sub judice não se verifica.
Porém, sem prejuízo desse princípio, atenta a natureza consensual dos contratos (incluído o contrato de trabalho) – art.º 405º do Código Civil –, nada obstará a que empregador e trabalhador, não havendo CCT aplicável, acordem que a regulação do contrato se faça por referência ao regime constante de CCT relativo ao respetivo setor de atividade e profissional[6], usufruindo, por essa via, o trabalhador das vantagens, e eventuais desvantagens, gerais decorrentes do regime do CCT escolhido.
Ideia mestra aqui subjacente é a de que, neste caso, empregador e trabalhador ficam vinculados ao CCT apenas e só por força do contrato individual de trabalho que celebraram [7]. In casu, a questão está em que o CCT referido no contrato de trabalho celebrado pelas partes, foi considerado derrogado, pouco depois da celebração do contrato de trabalho (logo em 2006), por, como está dito na sentença recorrida, pelo menos dois CCTs, nos quais teve intervenção, do “lado dos empregadores”, a mesma entidade, a CNIS - Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade (antes denominada União das Instituições Particulares de Solidariedade Social[8]), e do “lado dos trabalhadores” encontramos subscritores do CCT referido no contrato de trabalho num e no outro dos CCTs que consideraram derrogado aquele, o que levou o tribunal a quo a considerar que esses dois CCTs eram os “sucessores” daquele outro [como consta do excerto supra citado foi considerado que o instrumento de regulamentação coletiva do trabalho escolhido pelas partes como sendo aplicável à relação laboral dividiu-se em dois], e como tal havia que escolher entre eles [e só eles] qual o aplicável.
Todavia, não se nos afigura que a questão se possa colocar nesses termos, não se nos afigurando que seja de apelar às normas de resolução das situações de concorrência entre CCTs, como se passa a explicar.
Desde logo há que referir que o próprio texto da cláusula 9º do contrato de trabalho celebrado entre as partes, nos leva a dizer que foi querida a aplicação do CCT ali identificado, estando subjacente que se traduz no CCT que estava, então, em vigor, e estando expresso que sem prejuízo das alterações subsequentes, mas sem se poder afirmar qualquer propósito de aplicação de CCT que sucedesse/substituísse aquele (mormente sucedendo dois CCTs).
Ou seja, as alterações subsequentes estavam necessariamente abrangidas pela escolha feita pelas partes de aplicação daquele CCT, e teriam que ser consideradas, mas não se pode dizer abrangida por essa escolha um CCT que derrogasse aquele [e não se pode esquecer que contemporânea com esta cláusula está outra que prevê o termo certo do contrato de trabalho em 12 meses].
Assim, se o CCT em causa foi considerado derrogado [ainda que sem intervenção da Autora, ou melhor, de quem representasse a Autora, deixa de estar em vigor], não vigorando entre os seus subscritores, deixa de se poder considerar que algum CCT esteja considerado como aplicável por acordo [consensual era a aplicação daquele que foi derrogado][9].
É que, seguir o trilho seguido em 1ª instância vem a traduzir-se, afigura-se-nos, em considerar como consensual a aplicação de dois CTTs [os “sucessores” do consignado no contrato escrito, que foi derrogado], ou seja, considerar ser consensual haver concorrência de CCTs para regular a relação laboral, quando a cláusula do contrato de trabalho (individual) celebrado não o permite dizer, sendo a Autora totalmente alheia à celebração de (pelo menos) dois CCTs que derrogaram aquele que está referido no contrato de trabalho.
Na verdade, só a considerar-se assim se poderia dizer estar para resolver um “conflito de contratos coletivos de trabalho sucessivamente vigentes” (com base no critério da modernidade), e efetivamente a divergência das partes não está aí, pois aquilo que se passa, em termos factuais, é o seguinte: na celebração do contrato de trabalho foi consensual entre as partes ser aplicável à relação laboral determinado CCT vigente, mas esse CCT foi derrogado [com a intervenção de entidade de que a Ré é associada] – já o estando no momento em relação ao qual a Autora faz situar o início de serem devidas diferenças salariais [setembro de 2008] –, pelo que não existe CCT que seja consensual ser aplicável, tudo se passando como se o contrato de trabalho não fizesse referência a algum.
Em suma, se não é de aplicar à relação laboral CCT em relação ao qual houve consenso para aplicação, porquanto a entidade de que um dos polos da relação [no caso a Ré] é associado negociou a sua derrogação, também não se pode considerar haver consenso para aplicar um de dois CCTs que derrogaram aquele.
Aqui chegados, concluindo não haver, com a derrogação do identificado no contrato de trabalho, CCT aplicável por força do contrato individual de trabalho celebrado, importa ver se tem lugar a aplicação daquele que diz a Autora ser aplicável, ou a aplicação daquele que diz a Ré ser aplicável [a divergência das partes está aqui e não se tratando dum “conflito de contratos coletivos de trabalho sucessivamente vigentes”, como se disse].
Aquilo que está em causa é ver se é aplicável, e qual, CCT por via de Portaria de Extensão, como prevê o art.º 514º do Código do Trabalho (o contrato coletivo de trabalho em vigor pode ser aplicado, por via de portaria de extensão, a empregadores e a trabalhadores integrados no âmbito de setor de atividade e profissional definido naquele instrumento de regulamentação coletiva).
A Portaria de Extensão é um ato administrativo, provindo do ministro responsável pela área laboral, mediante o qual se estende, no que ora importa, o âmbito de aplicação de uma convenção coletiva a empregadores (ou associação de empregadores) que não subscreveram a convenção e/ou a trabalhadores não filiados nas associações sindicais outorgantes – artos 514º a 516º Código do Trabalho –, visando evitar o vazio de regulamentação e uniformizar o regime laboral dos trabalhadores num mesmo sector de atividade e profissional, sendo ainda o prolongamento de um regime negocial coletivo, um aproveitamento da regulamentação da autoria dos próprios interessados (empregadores e trabalhadores) aplicável a outros sujeitos dentro do sector de atividade[10].
A Ré apurou diferenças salariais devidas a partir de setembro de 2017, defendendo a aplicação do CCT celebrado entre a CNIS e a FNSFP – Federação Nacional dos Sindicatos da Função Pública [depois FNSTFPS – Federação Nacional dos Sindicatos dos Trabalhadores em Funções Públicas e Sociais], publicado no BTE nº 17, de 08 de maio de 2006, fazendo apelo à Portaria de Extensão (PE) nº 900/2006, de 01 de setembro, a qual no art.º 1º estabelece o seguinte:
1- As condições de trabalho constantes dos contratos coletivos de trabalho entre a CNIS – Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade e a FNE – Federação Nacional dos Sindicatos da Educação e outros e entre a mesma Confederação e a Federação Nacional dos Sindicatos da Função Pública publicados, respetivamente, no Boletim do Trabalho e Emprego, 1ª série, nos 25, de 08 de julho de 2005, e 17, de 08 de maio de 2006, são estendidas, no território do continente: a) Às relações de trabalho entre instituições particulares de solidariedade social que prossigam as atividades reguladas pelas convenções não filiadas na Confederação outorgante, exceto as santa casas da misericórdia, e trabalhadores ao seu serviço das profissões e categorias profissionais neles previstas; b) Às relações de trabalho entre instituições particulares de solidariedade social filiadas na Confederação outorgante e trabalhadores ao seu serviço das profissões e categorias profissionais previstas nas convenções não representados pelas associações sindicais outorgantes.
2- A presente portaria não se aplica aos trabalhadores representados por associações sindicais signatárias do contrato coletivo de trabalho entre a CNIS – Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade e a FEPCES – Federação Portuguesa dos Sindicatos do Comércio, Escritórios e Serviços e outros, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, 1ª série, nº 26, de 15 de julho de 2006.
3- As retribuições previstas nas convenções inferiores à retribuição mínima mensal garantida em vigor apenas são objeto de extensão em situações em que sejam superiores à retribuição mínima mensal garantida resultante da redução relacionada com o trabalhador, de acordo com o artigo 209º da Lei nº 35/2004, de 29 de julho.
4- Não são objeto de extensão as cláusulas contrárias a normas legais imperativas.
De acordo com o Estatuto das Instituições Particulares de Solidariedade Social (EIPSS) – cfr. DL nº 172-A/2014, de 14 de novembro, que, alterando o referido Estatuto, republicou o mesmo em anexo –, [s]ão instituições particulares de solidariedade social, adiante designadas apenas por instituições, as pessoas coletivas, sem finalidade lucrativa, constituídas exclusivamente por iniciativa de particulares, com o propósito de dar expressão organizada ao dever moral de justiça e de solidariedade, contribuindo para a efetivação dos direitos sociais dos cidadãos, desde que não sejam administradas pelo Estado ou por outro organismo público.
Ora, não está provado que a Ré se trate de uma IPSS [eventualmente fundação de solidariedade social – cfr. artos 2º, nº 1, al. d), 77º e 77º-A do EIPSS], mas tal decorre dos factos provados pois está provado que a Ré é associada da Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade (CNIS) – ponto 11. dos factos provados –, o que leva a concluir tratar-se a Ré de uma IPSS, porquanto, como resulta do EIPSS, a Confederação é um agrupamento de uniões e federações de instituições (se não fosse uma IPSS não seria associada [11] [12]).
Assim, salvo o devido respeito por opinião contrária, não há que fazer apelo ao acórdão do TRC de 16/01/2014 citado no parecer do MºPº[13], porquanto nele não está em causa IPSS, mas situação em que a ré, para efeitos do disposto na Lei n.º 101/96, de 13/09, foi reconhecida como cooperativa de solidariedade social que prossegue os objetivos previstos no Estatuto das IPSS, por despacho proferido … , para efeitos de equiparação àquelas IPSS e com efeitos a partir de ….
Sendo a Ré associada da CNIS, há que ver, então, se a situação dos autos se enquadra na al. b) do nº 1 do art.º 1º da PE, designadamente se estamos perante trabalhadores ao seu serviço das profissões e categorias profissionais previstas nas convenções.
Ora, dos factos provados apenas consta que a Autora exercia as funções correspondentes à categoria profissional de professor de 1º Ciclo, encontrando-se no CCT que foi consignado no contrato de trabalho ser aplicável [até à revogação, como se viu], entre os «trabalhadores com funções pedagógicas», o professor como sendo aquele que exerce atividade docente em estabelecimentos de ensino particular.
Assim, e porque no CCT agora em causa encontramos, entre os «trabalhadores com funções pedagógicas», o professor como sendo aquele que exerce atividade pedagógica em estabelecimentos socioeducativos, poderá o CCT invocado pela Ré ser aplicável.
Abre-se um parêntesis para referir que a Portaria em causa [nº 900/2006] também estende o âmbito de aplicação do CCT celebrado entre a CNIS – Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade e a FNE – Federação Nacional dos Sindicatos da Educação e outros, mas não se pondera aqui a sua aplicação dado ser o celebrado com FNSFP [FNSTFPS] o mais recente [cfr. artos 483º, nº 2 e 482º, nº 3, al. a) do Código do Trabalho].
Mas, serão aplicáveis os CCTs invocados pela Autora?
Como se disse, invoca a Autora a Portaria nº 462/2010, de 01 de julho e a Portaria nº 184/2021, de 03 de setembro.
Quanto à primeira, prevendo que as condições de trabalho constantes dos CCTs aí referidos são estendidas, no território do continente, às relações de trabalho entre estabelecimentos de ensino particular e cooperativo não superior não filiados na associação de empregadores outorgante e não abrangidos pela Portaria n.º 1483/2007, de 19 de novembro, e trabalhadores ao seu serviço das profissões e categorias profissionais neles previstas (sublinhou-se), não constando dos factos provados [nem se alcança que estivesse alegado que assim fosse, apenas sendo feito apelo a CCCT outorgado pela Associação dos Estabelecimentos de Ensino Particular e Cooperativo – AEEP] que a Ré detenha um estabelecimento de ensino desses, não se vê como se possa aplicar.
Assim, não existem fundamento para aplicar os CCTs que invoca no período de setembro de 2008 a março de 2021.
Quanto à segunda, está em causa a aplicação de CCT que a Ré também aplicou (entre outros), a saber CCT celebrado entre a CNIS – Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade e a FNSTFPS – Federação Nacional dos Sindicatos dos Trabalhadores em Funções Públicas e Sociais [BTE nº 31, de 22/08/2015, BTE nº 1, de 08/01/2020 e BTE nº 1. de 08/01/2021[14]], donde ser consensual.
Uma nota para referir que apesar de ser consensual o CCT aplicável nesse período, Autora e Ré chegam a valores de diferenças salariais diversos (o valor indicado pela Autora é superior).
Todavia, ponderados os anos de serviço da Autora, vistos os CCTs, não se alcança que os valores (mínimos) a considerar sejam os indicados pela Autora.
Sendo assim, há que considerar a aplicação do CCT que a Ré fez, procedendo o seu recurso.
Da compensação de créditos (recurso da Autora):
O tribunal a quo aos créditos reconhecidos à Autora deduziu a quantia de € 2.996,00 correspondente ao pedido pela Ré a título de indemnização por não cumprimento do aviso prévio.
A Recorrente/Autora, sustenta que não podia ter sido operada a compensação porquanto já tinha decorrido o prazo de prescrição.
Há que começar por esclarecer que, ao contrário do que parece referir a Recorrente, a Ré individualizou na contestação pedido reconvencional, tendo o tribunal a quo admitido (liminarmente) o mesmo.
O tribunal a quo entendeu que se verifica a prescrição, mas a mesma não impede a compensação, referindo o seguinte:
Acresce que o artigo 850º, do Código Civil, determina que «O crédito prescrito não impede a compensação, se a prescrição não podia ser invocada na data em que os dois créditos se tornaram compensáveis».
Na realidade, os créditos tornaram-se compensáveis no dia seguinte à cessação do contrato e, nessa data, a prescrição não podia ser invocada, pois não estavam verificados os respetivos requisitos.
Logo, a prescrição atual não impede a compensação e, por conseguinte, procedendo a reconvenção e deduzindo-se o valor de € 2.996,00 ao valor do crédito da autora no montante de € 15.132,66, concluímos que a autora é titular de um crédito de € 12.136,66.
É pacífico que a Ré fez a declaração compensatória no articulado de contestação, e nesse momento o seu crédito (a compensar, a saber indemnização por não ter observado o prazo de aviso prévio) encontrava-se prescrito [o contrato cessou em 15/02/2022 e a contestação foi apresentada em 11/04/2023].
Todavia, há que, como refere a sentença recorrida, ter presente o disposto no art.º 850º do Código Civil, sendo o seguinte o seu regime, como está referido no acórdão desta Secção Social do TRP de 13/06/2005[15], que se reproduz:
Dispõe o art.º 847.º do Código Civil:
1. Quando duas pessoas sejam reciprocamente credor e devedor, qualquer delas pode livrar-se da sua obrigação por meio de compensação com a obrigação do seu credor, verificados os seguintes pressupostos:
a) ser o seu crédito exigível judicialmente e não proceder contra ele exceção, perentória ou dilatória, de direito material;
b) terem as duas obrigações por objeto coisas fungíveis da mesma espécie e qualidade.
2. Se as duas dívidas não forem de igual montante, pode dar-se a compensação na parte correspondente.
3. A iliquidez da dívida não impede a compensação.
Ponto é que uma das partes declare à outra a sua vontade nesse sentido, como dispõe o art.º 848º, n.º 1 do mesmo diploma.
Por outro lado, se ambos os créditos não estavam prescritos no momento em que se tornaram compensáveis, a verificação da prescrição antes daquela declaração não impede que a compensação se opere, como determina o art.º 850.º do Código Civil [o crédito prescrito não impede a compensação, se a prescrição não podia ser invocada na data em que os dois créditos se tornaram compensáveis], uma vez que a declaração tem efeitos retroativos e o legislador visa permitir que o Réu não seja penalizado pela circunstância de não ter tomado a iniciativa de propor uma ação para reclamar o seu crédito.
No entanto, como se está a ver, a declaração não é um requisito da compensação, mas apenas uma condição que, preenchida, opera automaticamente, retroagindo os seus efeitos à data em que os créditos se tornaram compensáveis.
Daí que, de acordo com o disposto no art.º 854.º do mesmo diploma, feita a declaração de compensação, os créditos consideram-se extintos desde o momento em que se tornaram compensáveis, em harmonia com as outras soluções do instituto.
(…)
É que, tendo-se os créditos tornado compensáveis à data em que cessou o contrato de trabalho, pelo menos, a declaração decorrente da apresentação do articulado do demandado-reconvinte retroage a essa data, pelo que a prescrição é inoperante, nesta parte, como refere o art.º 850.º do Cód. Civil.
Ou seja, o crédito prescrito só não pode ser objeto de compensação quando a prescrição já podia ser invocada no momento em que se tornou compensável[16], que não é o caso dos autos.
Em suma, não merece censura o decidido em 1ª instância, improcedendo o recurso da Autora.
*
Para ficar claro, antes de avançarmos, façamos a comparação em quadro entre a condenação de 1ª instância, e a condenação em consequência da procedência do recurso.
Assim:
Condenação em 1ª instância
Condenação na procedência do recurso da Ré
Diferenças salariais
€ 11.202,57
€ 1.793,70
Crédito por horas de formação não ministradas
€ 1.144,81
Créditos em falta
€ 2.785,88 líquidos
Compensação
− € 2.996,00
Total
€ 12.136,66
€ 2.728,39
* Quanto a custas, havendo improcedência do recurso da Autora e procedência do recurso da Ré, as custas de ambos ficam a cargo da Autora (Recorrente e Recorrida) – art.º 527º do Código de Processo Civil.
***
DECISÃO
Pelo exposto, acordam os juízes desembargadores da Secção Social do Tribunal da Relação do Porto em julgar improcedente o recurso da Autora e julgar procedente o recurso da Ré, e, em consequência substituir o valor da condenação da Ré de € 12.136,66 para € 2.728,39, correspondendo às quantias supra expostas em quadro, mantendo-se no mais a sentença recorrida.
Custas de ambos os recursos pela Autora (como Recorrente e Recorrida), com taxa de justiça conforme tabela I-B anexa ao RCP (cfr. art.º 7º, nº 2 do RCP).
Valor dos recursos: o da ação (art.º 12º, nº 2 do RCP).
Notifique e registe.
(texto processado e revisto pelo relator, assinado eletronicamente)
Porto, 29 de janeiro de 2024
António Luís Carvalhão
Rui Penha
Teresa Sá Lopes
______________ [1] Embora no final do articulado refira € 24.948,97, quando faz a soma das quantias parcelares refere € 24.498,97 [artigos 23º e 24º da petição inicial], donde se considerar ter havido troca de algarismos (lapso), e como tal se corrigiu.. [2] As transcrições efetuadas respeitam o respetivo original, salvo correção de gralhas evidentes e realces/sublinhados que no geral não se mantêm (porque interessa o texto em si), consignando-se que quanto à ortografia utilizada se adota o Novo Acordo Ortográfico. [3] Vd. António Santos Abrantes Geraldes, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, 5ª edição, pág. 156 e págs. 545/546 (estas no apêndice I: “recursos no processo do trabalho”). [4] Seguindo a ordem da precedência lógica, sendo que a solução de alguma pode prejudicar o conhecimento de outra(s) – art.ºs 608º e 663º, nº 2 do Código de Processo Civil (cfr. art.º 87º, nº 1 do Código de Processo do Trabalho). [5] Consultável em http://bte.gep.mtss.gov.pt . [6] Vd. a propósito os acórdãos do TRE de 17/01/2012, do TRC de 15/09/2017 e do TRL de 13/02/2019, consultáveis em www.dgsi.pt, processos nº 197/09.4TTSTB.E1, nº 3910/16.0T8VIS.C1 e nº 14532/17.8T8SNT.L1-4, respetivamente, contendo o segundo deles extensa citação de Bruno Mestre, “Cláusulas de Remissão a CCT””, in Questões Laborais, nº 30, julho/dezembro de 2007, págs. 139ss (inclusive na parte em que afasta as duvidas levantadas, inclusive de índole constitucional, sobre a validade das cláusulas de remissão), que aqui nos dispensamos de reproduzir. [7] Podendo equacionar-se a aplicação da proteção decorrente do regime das cláusulas contratuais gerais (art.º 105º do Código do Trabalho). [8] O que se alcança da consulta dos Estatutos da CNIS [art.º 1º], acessível em https://cnis.pt. [9] Note-se que, uma das exceções ao «princípio da filiação», estabelecidas pelo legislador, é a possibilidade de o trabalhador optar pela aplicação de um CCT quando exista um ou mais CCTs aplicáveis à “empresa”, mas a escolha incide sobre CCT em vigor até ao final da sua vigência (cfr. art.º 497º do Código do Trabalho e Luís Gonçalves da Silva, Da Eficácia da Convenção Coletiva”, vol. II, Imprensa FDUL, Teses de Doutoramento, abril de 2022, pág. 2016). [10] Vd. Maria do Rosário Palma Ramalho, “Tratado de Direito do Trabalho, Parte III – Situações Laborais Coletivas”, Almedina, 3ª edição atualizada, 2020, págs. 389/390. [11] Associada de base, como referem os Estatutos da CNIS (art.º 6º). [12] Em consonância, a “declaração” junta como doc. 2 com a contestação (declaração comprovativa de filiação CNIS-UDIPSS-Aveiro) refere “a Instituição Fundação ... é associada …”). [13] Consultável em www.dgsi.pt, processo nº 667/12.7T4AVR.C1. [14] No quadro constante do artigo 71º da contestação existe lapso ao ser referido 01/08/2021, como se alcança do confronto com o artigo 69º da contestação. [15] Consultável em www.dgsi.pt, processo nº 0541428. [16] Cfr. os acórdãos do STJ (Secção Social) de 24/05/2006 e 06/07/2006, consultáveis em www.dgsi.pt, processos nº 05S369 e nº 06S1067, respetivamente.