CONTRATO DE MEDIAÇÃO IMOBILIÁRIA
Sumário


1) O direito da mediadora à retribuição acordada no âmbito de um contrato de mediação imobiliária pressupõe, por regra e sem prejuízo das exceções previstas na lei, que a mediadora tenha desenvolvido uma concreta atividade no sentido de angariar um interessado para a celebração do negócio, que o negócio visado pelo contrato de mediação tenha sido concretizado e que este negócio tenha sido celebrado com um terceiro angariado pela mediadora, de tal modo que se possa afirmar que a conclusão do contrato foi o resultado da atividade desenvolvida pela mediadora em virtude de esta se integrar na cadeia de factos que deram lugar ao negócio pretendido, ainda que não tenha sido a única causa;
2) O mediador só tem direito à remuneração quando haja desenvolvido uma atividade que haja influído na conclusão do negócio visado, sendo a sua atividade causal dessa efetivação.

Texto Integral


Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

I. RELATÓRIO

A) EMP01..., Unipessoal, Limitada, veio intentar Ação Especial para o Cumprimento de Obrigações Emergentes de Contratos (AECOP) contra AA, onde conclui entendendo que deve a ação ser julgada procedente, por provada e o réu condenado a pagar à autora a quantia de €11.586,60, bem como os juros moratórios à taxa legal.
Para tanto alega a autora, em síntese, que o réu vendeu, através de outra agência imobiliária o imóvel angariado, na vigência do contrato que havia celebrado com a autora, assim violando o acordado regime de exclusividade.
O réu apresentou contestação onde conclui entendendo dever considerar-se nulo o contrato de mediação imobiliária com as legais consequências e ser julgada improcedente a ação, absolvendo-se o réu do pedido formulado pela autora, alegando, em síntese, que desde os primeiros contactos com o funcionário da autora transmitiu a sua vontade contra qualquer exclusividade, além de não ter sido cumprido o disposto no artigo 16º da Lei 15/2013, de 08/02, que determina a nulidade do contrato.
B) Realizou-se julgamento e foi proferida sentença onde foi decidido julgar a ação improcedente e, em consequência, absolver o réu do pedido.

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C) Inconformada, a autora, EMP01..., Unipessoal, Limitada, veio interpor recurso, que foi admitido como sendo de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos, com efeito devolutivo (fls. 49).
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Nas alegações de recurso da autora EMP01..., Unipessoal, Limitada, são formuladas as seguintes conclusões:
1. A recorrente não concorda com o elenco fáctico considerado como não provado pelo Tribunal a quo.
2. Assim como como a sua interpretação de Direito ao caso concreto.
3. Considerou o Tribunal a quo não ter sido demonstrado, pela recorrente, que o recorrido aceitou a exclusividade do contrato de mediação imobiliária celebrado entre as partes.
4. Não obstante, consideramos que esse facto ficou demonstrado no decorrer do processo.
5. O recorrido sempre afirmou que a recorrente lhe comunicou que o contrato teria de ser celebrado de acordo com o regime da exclusividade.
6. O que se demonstra do seu depoimento, a cuja gravação ora se remete, de 00:32:26 a 00:33:05.
7. Em momento algum, no seu depoimento, o recorrido afirma, categoricamente, sem margem para qualquer dúvida, que lhe foi transmitido, pela recorrente, que o seu contrato iria, em absoluta exceção face à sua política comercial, ser celebrado em regime de não exclusividade.
8. Dizendo ter ficado convencidíssimo de que tinha outorgado um contrato sem exclusividade, conforme o seu depoimento de parte, a 00:33:44.
9. O recorrido é médico, tem formação superior, e esta não foi a primeira vez que celebrou um contrato na sua vida. Portanto, é pouco crível que, segundo as regras da experiência comum, alguém fique convencido de que celebrou um contrato em regime de não exclusividade quando nunca lhe foi dito que esse seria o regime do contrato.
Ademais,
10. O Tribunal a quo valorou, de forma exagerada, os depoimentos dos familiares do recorrido.
11. Do depoimento de BB, de 00:02:45 a 00:02:58, em algum momento se retira que a dita testemunha soubesse, sequer, se o recorrido tinha ou não outorgado o contrato em regime de exclusividade.
12. Pelo que de forma alguma, ficou demonstrado, em audiência de julgamento, que a recorrente alguma vez tenha afirmado, perante o recorrido, que o contrato celebrado seria em regime de não exclusividade.
13. O depoimento da Diretora Comercial da recorrente, CC, é absolutamente claro em relação a esse ponto, no seu depoimento de 00:23:18 a 00:23:31.
14. A recorrente não celebra contratos sem exclusividade, a não ser que o cliente seja construtor, o que não é o caso.
15. Razão pela qual nunca acedeu às pretensões do recorrido.
16. Pelo que, não se percebe, s.m.o., de que forma é que o Tribunal a quo concluiu não estar demonstrado que o contrato foi celebrado em regime de exclusividade e com o conhecimento do recorrido.
17. Em suma, se o contrato de mediação foi celebrado é porque o recorrido aceitou o regime de exclusividade.
18. Consideramos, assim, como provada a outorga de um Contrato de Mediação Imobiliária em regime de exclusividade, pelo que tem sempre de se considerar que a recorrente tem direito a receber, do recorrido, a quantia peticionada.
19. Ora, o Tribunal a quo considerou como provado que o Contrato de Mediação Imobiliária entre as partes foi unilateralmente revogado pelo recorrido. E considerou como provado, também, o facto de a Recorrente ter praticado atos com vista à realização do negócio.
20. Circunstâncias que, na verdade, fazem o recorrido incorrer na obrigatoriedade de remunerar a recorrente pelos serviços que prestou, conforme a jurisprudência, unanimemente, exara.
21. Ora, o desiderato da recorrente é justamente esse. Receber o que é seu por direito, considerando-se que (i) o contrato foi celebrado em regime de exclusividade; (ii) o contrato foi unilateral e ilicitamente revogado pelo Recorrido; (iii) o Recorrido vendeu o imóvel objeto do contrato de mediação com auxílio de outra sociedade de mediação imobiliária.
22. Cumprindo-se, desta forma, o disposto no artigo 19.º, n.º 2 da Lei n.º 15/2013 de 08/02.
Termina entendendo que deve ser revogada a decisão recorrida e julgada a ação totalmente procedente
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Pelo apelado AA foi apresentada resposta onde entende que deverá a presente apelação ser julgada totalmente improcedente, por não provada e, em consequência, ser confirmada a decisão proferida pelo tribunal recorrido, com todos os efeitos legais.
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D) Foram colhidos os vistos legais.
E) As questões a decidir na apelação são as de saber:
1) Se deverá ser alterada a decisão quanto à matéria de facto;
2) Se deverá ser revogada a sentença e, condenado o réu a pagar à autora a quantia peticionada na PI.
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II. FUNDAMENTAÇÃO

A) Na 1ª instância resultou apurada a seguinte matéria de facto:

I. FACTOS PROVADOS
1. No dia 18 de setembro de 2020, a autora – empresa que se dedica à mediação imobiliária - apresentou ao réu para assinar um contrato de mediação imobiliária.
2. O contrato é formado por um formulário, preenchido pelo mediador, tendo ainda uma folha autónoma de denominadas “cláusulas contratuais gerais do contrato de mediação imobiliária”, que se apresenta assinado pelo réu.
3. Na parte do formulário consta que o réu, como proprietário do prédio, sito na rua ..., freguesia ..., descrito na CRP ... sob o nº ...87/... e inscrito na respetiva matriz ...00, pretendia vendê-lo pelo preço de €157.000,00 [cento e cinquenta e sete mil euros].
4. Fixou-se ainda aí, a título de remuneração, a percentagem de 6% calculada sobre o preço pelo qual o negócio é efetivamente concretizado, com o mínimo de €6.000,00 (seis mil euros), valor a que acresceria o IVA.
5. Nos termos do formulário foi aí aposta uma cruz no regime de exclusividade, e indicado o prazo de 4 (quatro) meses, constando das cláusulas contratuais gerais juntas que o mesmo se renova «automaticamente, por iguais e sucessivos períodos de tempo, caso não seja denunciado, por qualquer uma das partes contratantes, através de carta registada com aviso de receção ou outro meio equivalente, com uma antecedência mínima de 10 (dez) dias em relação ao seu termo».
6. A autora promoveu a venda do prédio através de publicidade, apresentou o imóvel a clientes e promoveu visitas.
7. No dia 11.05.2022, na sequência de conversa telefónica prévia, o réu remeteu um email à autora, solicitando que o imóvel fosse retirado da exposição, por indisponibilidade do mesmo.
8. Por documento particular outorgado no dia 21 de junho de 2022, o réu e a mulher DD, declararam vender o prédio supra identificado, a EE, pelo montante de €135.000,00 [cento e trinta e cinco mil euros].
9. No mesmo foi declarado que as partes recorreram à intervenção de mediação imobiliária, a qual foi levada a cabo pela sociedade “EMP02..., Lda., AMI ...58.
10. No dia 16.05.2022 tinha sido celebrado pelo autor um contrato-promessa de compra e venda relativo ao imóvel referido, com o pagamento de um sinal de €25.000,00 (vinte e cinco mil euros).
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II. FACTOS NÃO PROVADOS

Não resultaram provados outros factos relevantes, excluindo considerações, conclusões jurídicas, designadamente que o réu aceitou a cláusula de exclusividade; que, antes de assinar, lhe foram lidas, comunicadas e explicadas todas as cláusulas contratuais e que lhe foi entregue uma cópia do contrato. 
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B) O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações da recorrente, não podendo o tribunal conhecer de outras questões, que não tenham sido suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.
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C) A apelante afirma impugnar a decisão da matéria de facto, com recurso a prova gravada, propondo-se especificar os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, a resposta que, no seu entender, lhes deveria ser dada e as concretas passagens dos depoimentos em que funda o seu entendimento.
E não obstante a apelante refira que existe uma errada apreciação e valoração da prova, no que respeita à matéria considerada como não provada, a verdade é que se limita a referir à “aceitação da cláusula de exclusividade”, conforme epígrafe das alegações.
Importa notar, quanto à apreciação da prova, como se refere no Acórdão da Relação de Coimbra de 10/12/2010, disponível na base de Dados do Ministério da Justiça, no endereço www.dgsi.pt que “a apreciação das provas resolve-se, assim, em formação de juízos, em elaboração de raciocínios, juízos e raciocínios estes que surgem no espírito do julgador, como diz o Prof. Alberto dos Reis, “...segundo as aquisições que a experiência tenha acumulado na mentalidade do juiz segundo os processos psicológicos que presidem ao exercício da atividade intelectual e, portanto, segundo as máximas de experiência e as regras da lógica...”
A prova não visa, adverte o Prof. Antunes Varela, “...a certeza absoluta, (a irrefragável exclusão da possibilidade de o facto não ter ocorrido ou ter ocorrido de modo diferente) ...”, mas tão só, “...de acordo com os critérios de razoabilidade essenciais à prática do Direito, criar no espírito do julgador um estado de convicção, assente na certeza relativa do facto.”
A certeza a que conduz a prova suficiente é, assim, uma certeza jurídica e não uma certeza material, absoluta.
Conforme se escreveu no Acórdão do STJ de 07/06/2005, relativamente à apreciação da prova, “quer seja na 1ª instância, quer seja na Relação, a questão é sempre de valoração das provas produzidas em audiência ou em documentos de livre apreciação.
Vigoram, em ambos os casos, para os julgadores desses tribunais, as mesmas regras e os mesmos princípios, dos quais avulta o da livre apreciação da prova ou sistema da prova livre (...) consagrado no artigo 655º nº 1 do Código de Processo Civil (atual 607º nº 5 NCPC).
Significa isto que a prova há de ser sempre apreciada segundo critérios de valoração racional e lógica do julgador, pressupondo o recurso a conhecimentos de ordem geral das pessoas normalmente inseridas na sociedade do seu tempo, a observância das regras da experiência e dos critérios da lógica, tudo se resolvendo, afinal, na formulação de juízos e raciocínios que, tendo subjacentes as ditas regras, conduzem a determinadas convicções refletidas na decisão dos pontos de facto sob avaliação.”
Um dos princípios que devem presidir ao julgamento é o da livre apreciação da prova, impondo-se ao juiz que decida de acordo com a sua prudente convicção acerca de cada facto, mas, quando a lei imponha para a existência ou prova do facto jurídico qualquer formalidade especial, não pode esta ser dispensada (artigo 655º do Código de Processo Civil – artigo 607º nº 5 NCPC).
Segundo este princípio, o que torna provado um facto é a íntima convicção do juiz, gerada em face do material probatório trazido ao processo (bem como da conduta processual das partes) e de acordo com a sua experiência de vida e conhecimento dos homens; não a pura e simples observância de certas formas legalmente prescritas (Professor Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, 1979, página 384).
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Afirma a apelante que em momento algum se demonstrou em audiência de julgamento que a recorrente aceitou que o contrato celebrado com o recorrido ficasse fora do âmbito do regime de exclusividade.
Importa, porém, esclarecer que a questão em apreço terá de ser perspetivada em termos de saber a quem compete o ónus da prova, se seria ao réu que competiria demonstrar que a autora aceitou que o contrato celebrado com o recorrido ficasse fora do âmbito do regime de exclusividade, ou, antes, se competia à autora demonstrar que o réu aceitou que o contrato tivesse e a cláusula de exclusividade.
De acordo com as regras do ónus da prova a que se refere o artigo 342º nº 1 do Código Civil, àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado.
Por outro lado, nos termos do nº 2 do mesmo artigo e diploma, a prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito invocado compete àquele contra quem a invocação é feita.
Como muito bem referem os Profs. Pires de Lima e Antunes Varela no seu Código Civil anotado, volume I, 3ª Edição, a páginas 304, “...o significado essencial do ónus da prova não está tanto em saber a quem incumbe fazer a prova do facto como em determinar o sentido em que deve o tribunal decidir no caso de se não fazer a prova do facto.”
Por outro lado, como ensina o Prof. Manuel de Andrade, “Noções Elementares do Processo Civil”, 1976, págs. 195 e 196, “O onus probandi respeita aos factos da causa, distribui-se entre as partes segundo certos critérios.
Traduz-se, para a parte a quem compete, no encargo de fornecer a prova do facto visado, incorrendo nas desvantajosas consequências de se ter como líquido o facto contrário, quando omitiu ou não logrou realizar essa prova; ou na necessidade de, em todo o caso, sofrer tais consequências se os autos não contiverem prova bastante desse facto (trazida ou não pela mesma parte).”
Isto é, como referem Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora no Manual de Processo Civil, 2ª Edição, a páginas 452 e segs., “a quem invoca um direito em juízo incumbe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado, quer o facto seja positivo, quer negativo. À parte contrária compete provar os factos impeditivos, modificativos ou extintivos desse direito.
E, acrescentam que “cada uma das partes terá assim (o ónus) de alegar e provar os factos correspondentes à previsão da norma que aproveita à sua pretensão ou à sua exceção. Cada uma das partes tem de provar os factos que constituem os pressupostos da norma que lhe é favorável.”
Como é manifesto, competia à autora e ora apelante alegar e provar a existência da cláusula de exclusividade, aceite pelo réu e, como tal, não competia ao réu demonstrar que a autora aceitou que o contrato celebrado com o recorrido ficasse fora do âmbito do regime de exclusividade, pelo que a questão colocada pela apelante subverte o regime legal do ónus da prova e daí que se compreenda a indevida alteração da imposição da demonstração dos factos, nos termos pretendidos pela apelante.
Atento o exposto cumpre referir que, relativamente ao depoimento de parte do réu AA, nomeadamente no que se refere ao excerto transcrito, nada resulta que justifique a pretendida alteração à matéria de facto, pelo contrário, o depoimento prestado vai no sentido de confirmar a posição por si sustentada na contestação.
Aliás é sintomático que o réu tenha afirmado que a assinatura que consta do contrato de mediação seja a sua (cfr. fls. 14 vº) mas que não constava do mesmo que o contrato fosse em regime de exclusividade, pelo que se depreende que as duas primeiras páginas do mesmo, preenchidas manualmente, não lhe foram exibidas, nem entregues, até porque as páginas não estão rubricadas pelo réu.
No que se refere ao depoimento da testemunha BB, irmão do réu, nada demonstrou saber que permita sustentar a tese defendida pela autora, nomeadamente no brevíssimo excerto que a apelante invoca e transcreve.  
Relativamente à testemunha CC, Diretora Comercial da autora, não esteve presente na angariação, nem na assinatura do contrato e, portanto, o conhecimento que tem dos factos foi obtido através de documentação, bem como da informação que lhe foi prestada pelo comercial da autora, FF, pelo que se referiu à situação em termos do que é usual fazer e não por ter estado presente, depoimento este que não tem a virtualidade de corroborar a tese da autora.
Do exposto resulta que a prova apresentada, rectius, os brevíssimos excertos referenciados pela apelante para justificar a alteração da decisão da matéria de facto, são, de todo, insuscetíveis de fundamentar tal alteração, motivo pelo qual se manterá a formulação da matéria de facto, nos termos decididos na 1ª Instância.
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No que se refere à questão de direito, a apelante, baseando-se na pretendida alteração da matéria de facto, que não ocorreu, pretende que se altere a decisão propriamente jurídica, pelo que igualmente se terá de manter esta.
Como consta do acórdão desta Relação de 25/06/2020 no processo  184/19.4T8BRG.G1, “o contrato de mediação imobiliária acha-se atualmente regulado pela Lei nº 15/2013, de 08/02 (a que nos referiremos na falta de indicação de origem diversa), o qual entrou em vigor em 01/03/2013 (artigo 45º nº 1) e revogou o Decreto-Lei nº 211/2004, de 20/08 e teve em vista a conformação com a disciplina constante do Decreto-Lei nº 92/2010, de 26/07, que transpôs para a ordem jurídica interna a Diretiva nº 2006/123/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2006, relativa aos serviços no mercado interno (artigo 1º nº 1).
Sobre o que seja mediação imobiliária diz-se no artigo 2º nº 1 que consiste na procura, por parte das empresas, em nome dos seus clientes, de destinatários para a realização de negócios que visem a constituição ou aquisição de direitos reais sobre bens imóveis, bem como a permuta, o trespasse ou o arrendamento dos mesmos ou a cessão de posições em contratos que tenham por objeto bens imóveis.
Conforme se refere no Acórdão da Relação de Guimarães de 12/06/2014, no processo nº 1218/10.3TBBCL.G1, relatado pelo Desembargador Filipe Caroço e subscrito pelo ora relator, “tem-se entendido que a remuneração é devida mesmo que a ação do mediador não constitua a única causa da conclusão e perfeição do negócio visado [Acórdão da Relação do Porto de 20.9.2001, proc. nº 0131169, in www.dgsi.pt], mas uma sua causa adequada.
Como se refere naquele aresto, “nos contratos de mediação, o direito à remuneração nasce da conclusão dos negócios objeto da mediação, mas a conclusão, para o mediador – isto resulta da essência do contrato – surge quando tais negócios se consideram aproximados entre o comitente e terceiros e consegue a adesão destes, haja ou não execução posterior.
Deve, porém, haver um nexo de causalidade entre a atividade do mediador e a conclusão do negócio.”
Também o Dr. Fernando Baptista de Oliveira, O Contrato de Mediação Imobiliária na Prática Judicial, CEJ, 2016, páginas 14 e segs, refere que “agora (diferentemente, portanto, do anterior DL 211/2004) a atividade do mediador já não é definida por uma obrigação de diligenciar, mas, sim, de procurar (... destinatários para a realização de negócios). O que é bem diferente da obrigação de... concretização do negócio visado, (obrigação) esta que inexiste, pois isso não depende da vontade do mediador, mas do seu cliente e do interessado encontrado. O termo destinatários parece algo impreciso, pois destinatário é aquele que já celebrou o negócio visado, ou que seguramente o celebrará. E não é isso que se visa com aquela palavra destinatários, antes o que se pretende ali falar é de meros interessados no negócio visado, que podem celebrá-lo, ou não!
Mas sendo a obrigação essencial que impende sobre a mediadora a de angariar interessado para o negócio, praticar atos isolados, tal significa que não basta que a mediadora faça diligências no sentido de aproximar os interessados na realização do negócio. Se assim fosse bastar-lhe-ia simular um comprador que se mostrasse interessado e depois desistisse do negócio, mesmo que sem qualquer fundamento sério. Portanto, em princípio parece que se torna necessário que o contrato previsto seja levado a bom termo. Claro que o contrato visado pode não ser integralmente cumprido. Mas aí já não será a mediadora responsável por tal incumprimento, tendo direito a receber a comissão acordada. De qualquer forma, em princípio, o pagamento da comissão encontra-se ligado à conclusão do negócio pretendido, no caso, a projetada venda.
E citando alguma jurisprudência, menciona aquele autor alguns arestos:
«São pressupostos do contrato de mediação: a) Um acordo de vontades pelo qual uma pessoa – o mediador – se encarrega, perante outra – o comitente – de encontrar uma terceira pessoa – interessado - com vista à conclusão, entre ambas, de um negócio pretendido pela segunda; b) Conclusão efetiva do negócio entre o comitente e o terceiro, como consequência adequada da atividade do mediador.» - Ac. RL de 14.04.2011, proc. 761/07.6TCFUN.L1-2, Ondina do Carmo Alves.
«O mediador obriga-se a uma atividade, que não a um resultado, embora seja em função da realização do negócio que ele desenvolve toda a sua atividade, sendo a sua remuneração, em princípio, apenas devida se o negócio se efetivar.» - Ac. STJ de 29-03-2011, Revista nº 2439/07.1TBPTM.E1.S1 - 1ª Secção, Paulo Sá.
«O comitente só fica constituído na obrigação de remunerar o mediador se o negócio tido em vista pelo incumbente for concretizado em virtude da atividade do mediador, ou seja, a obrigação de meios que lhe incumbe há-de desembocar no resultado pretendido...» - Ac. STJ de 28.04.2009, Proc. 29/09.3YFLSB – Fonseca Ramos.
Acórdão do TRL de 14/04/2011, proc. 5500/05.3TJLSB.L1-6 – «No dizer do acórdão do STJ de 28.04.2009, cuja doutrina se acompanha, “O comitente só fica constituído na obrigação de remunerar o mediador se o negócio tido em vista pelo incumbente for concretizado em virtude da atividade do mediador, ou seja, a obrigação de meios que lhe incumbe há de desembocar no resultado pretendido – a celebração do negócio para que foi mandatado o mediador (…)”».
«I – O mediador, que exerce uma atividade essencialmente de carácter material e em nome próprio, obriga-se perante o comitente apenas a diligenciar por conseguir interessado em certo negócio e a aproximá-lo daquele (facilitando a conclusão do negócio).» - Ac. TRP de 19.02.2009, José Ferraz.
Entende ainda o Dr. Fernando Baptista de Oliveira, ibidem, páginas 57 e segs que “tem sido entendimento generalizado na jurisprudência que o mediador, no contrato de mediação imobiliária, só tem direito à remuneração convencionada com o comitente/cliente se o negócio visado (constituindo objeto legal da sua atividade de mediação) vier a ser concluído/concretizado e desde que a celebração deste tenha sido o corolário ou a consequência da sua atividade – exigindo-se um nexo causal entre a sua atuação (no âmbito da mediação) e a outorga do contrato visado (competindo ao mediador a alegação e prova dos pressupostos do seu direito, particularmente da verificação desse mesmo nexo causal).
Isto é, o direito à remuneração implica a execução da prestação contratual a que o mediador se obrigou, nomeadamente a prática dos atos adequados a conseguir que seja atingido o objetivo do contrato – a concretização e perfeição do negócio visado com a mediação.
Dito de outra forma: o mediador adquire o direito a receber a remuneração/comissão quando o seu trabalho influi sobre a conclusão do negócio – ou seja, o mediador tem direito à comissão quando, embora a sua atividade não seja a única causa determinante da cadeia dos factos que deram lugar ao negócio pretendido pelo comitente, contribuiu/influiu (decisivamente) para ela, (Cfr., v.g.: «O direito da mediadora à retribuição acordada no âmbito de um contrato de mediação imobiliária pressupõe, por regra e sem prejuízo das exceções previstas na lei, que a mediadora tenha desenvolvido uma concreta atividade no sentido de angariar um interessado para a celebração do negócio, que o negócio visado pelo contrato de mediação tenha sido concretizado e que este negócio tenha sido celebrado com um terceiro angariado pela mediadora, de tal modo que se possa afirmar que a conclusão do contrato foi o resultado da atividade desenvolvida pela mediadora em virtude de esta se integrar na cadeia de factos que deram lugar ao negócio pretendido, ainda que não tenha sido a única causa.» Ac. TRC de 17.12.2014, proc. 242/11.3TBNZR.C1, Catarina Gonçalves.
«… o mediador só tem direito à remuneração quando haja desenvolvido uma atividade que haja influído na conclusão do negócio visado, sendo a sua atividade causal dessa efetivação.» - Ac. STJ de 19-05-2009, Revista nº 5339/06.9TVLSB - 6ª Secção, Silva Salazar.
Sendo, aliás, que, de forma mais abrangente, MANUEL SALVADOR até admite (como orientação que melhor acode aos interesses em causa) que o mediador adquire o direito à remuneração quando influir no resultado final, mas sem que seja necessário para isso “que tenha cooperado no desenvolvimento das negociações, pelo que basta ter-se limitado a dar o nome de uma pessoa disposta a pagar determinado negócio” (situação que também consubstancia a aludida influência (decisiva) para a celebração do negócio) – acrescentando nós, que também bastará ter-se o mediador limitado a pôr em contacto as partes interessadas no negócio (obviamente, é claro, desde que tal atividade da mediadora tenha influído de algum modo no negócio) (Assim também, v.g.: «No contrato de mediação imobiliária, o mediador tem direito à comissão quando, embora não sendo a sua atividade a única causa determinante da realização do negócio pretendido pelo comitente, ela contribuiu para a sua realização, bastando que se tenha limitado a dar a conhecer o nome de uma pessoa disposta a fazer determinado negócio» - Ac. RL de 07.04.2003, Roque Nogueira.
Ac. TRC de 03.02.2015, proc. 1399/11.9TBCLD.C1 (Carvalho Martins): «(...) O mediador só adquire o direito à remuneração, quando influir no resultado final, mas sem que seja necessário para isso, que tenha cooperado no desenvolvimento das negociações, pelo que basta ter-se limitado a dar o nome de uma pessoa disposta a pagar determinado negócio. Não é necessária a continuidade do nexo causal, sendo suficiente que o mediador tenha posto em contacto as partes e que isso tenha influído na conclusão do negócio.».
Escreveu-se, pertinentemente, no Acórdão do STJ, de 28-04-2009: «O comitente só fica constituído na obrigação de remunerar o mediador se o negócio tido em vista pelo incumbente for concretizado em virtude da atividade do mediador, ou seja, a obrigação de meios que lhe incumbe há-de desembocar no resultado pretendido – a celebração do negócio para que foi mandatado o mediador – sob pena de se considerar que o contrato não almejou a perfeição e, não surtindo efeito útil a atividade do mediador – o risco, a álea negocial –, não há lugar à remuneração (comissão), nem ao pagamento de despesas se o contrato for celebrado pelo incumbente com terceiro, que não se interessou pelo negócio por causa da atuação do mediador.». Neste aresto, citando-se CARLOS LACERDA BARATA, acrescentou-se: «O direito à retribuição depende da celebração do contrato prometido embora seja independente do cumprimento do mesmo. Só com a verificação de um “resultado útil” – a realização do negócio – da atuação do mediador, este ganha o direito à retribuição. Está em causa mais do que a mera exigibilidade; é da própria constituição do direito que se trata. Pode-se, assim, afirmar que o direito à retribuição está sujeito a condição suspensiva: a celebração do negócio. Naturalmente, que só o negócio cuja celebração advenha (exclusivamente ou não) da atuação do mediador relevará, para este efeito. A prestação do mediador terá de ser causal, em relação ao negócio celebrado entre o comitente e o terceiro... Em matéria de direito à retribuição, o momento relevante é o da constituição do contrato promovido, pelo que as ocorrências supervenientes que incidam sobre a execução ou o conteúdo do contrato serão, em regra, indiferentes” – como abaixo melhor se explicitará.”
No caso presente não ocorreu a celebração da escritura de compra e venda em resultado da atividade da autora, a atividade desta não foi uma causa adequada de tal resultado, não há nexo causal entre esta e a celebração da escritura, pelo que não se mostram preenchidos os requisitos necessários à procedência da ação, não se tendo provado, como se viu, que o réu tenha aceitado a cláusula de exclusividade, nem se provou que a autora tenha desenvolvido qualquer atividade tendo em vista a celebração da escritura de compra e venda do imóvel, que veio a ocorrer.
 Por todo o exposto, sem necessidade de ulteriores considerações, resulta que não existe violação de qualquer das normas invocadas pela apelante, pelo que terá de ser confirmada a douta sentença recorrida e, em consequência, a apelação julgada improcedente.
Face ao decaimento da posição da apelante, sobre a mesma recai a obrigação de suportar as custas (artigo 527º nº 1 e 2 NCPC).
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III. DECISÃO

Pelo exposto, tendo em conta o que antecede, acorda-se em julgar a apelação improcedente, confirmando-se a douta sentença recorrida.
Custas pela apelante.
Notifique.
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Guimarães, 25/01/2024

Relator: António Figueiredo de Almeida
1ª Adjunta: Desembargadora Carla Sousa Oliveira
2º Adjunto: Desembargador José Cravo