PROCESSO DE INVENTÁRIO NOTARIAL
DECISÕES PROFERIDAS PELO NOTÁRIO
DECISÕES INTERCALARES
ADMISSIBILIDADE DO RECURSO
OBJECTO DO RECURSO DA SENTENÇA HOMOLOGATÓRIA
Sumário

I–No âmbito do Regime do Inventário Notarial, aprovado pela Lei n.º 117/2019, de 13.09., as decisões proferidas pelo notário, após o momento de saneamento do processo e de determinação dos bens a partilhar e da forma da partilha, não são recorríveis autonomamente, mas apenas conjuntamente com o recurso que for interposto da sentença homologatória da partilha, competindo ao Tribunal da Relação conhecer desse recurso conjunto, por força do disposto nos arts. 4.º, n.º 2 al. c) do referido Regime e 1123.º, n.º 5 do CPC;

II–Tendo sido apresentado recurso autónomo de uma decisão intercalar que só era recorrível conjuntamente com o recurso da sentença homologatória da partilha, o mesmo é legalmente inadmissível, pelo que o Tribunal da Relação deve rejeitá-lo, não bastando que o recorrente requeira, no recurso que interpôs da sentença homologatória da partilha, a subida do recurso que havia interposto autonomamente;

III–Não tendo sido apresentando, conjuntamente, recurso da decisão intercalar, terá de entender-se, em face do disposto no art. 620.º, n.º 1, do CPC, que a mesma transitou em julgado, tendo força obrigatória dentro do processo, pelo que não pode o Tribunal da Relação sobre ela pronunciar-se, apenas lhe cabendo apreciar a sentença que homologou a partilha;

IV–A sentença homologatória da partilha, sendo embora uma sentença de mérito, limita-se a absorver o conteúdo do acordo de partilha decorrente do encontro de vontades dos interessados, sendo a intervenção do juiz meramente fiscalizadora da legalidade do objecto desse acordo e da qualidade das pessoas que o celebraram, sem interferir no seu conteúdo material;

V–As questões relativas ao conteúdo ou validade material do acordo de partilha, nomeadamente, a de saber se o mesmo está afectado por vícios da vontade, só poderão ser conhecidas em acção própria (art. 291.º, n.º 1 do CPC) ou em recurso extraordinário de revisão (art. 696.º al. d) do CPC);

VI–O recurso da sentença homologatória da partilha tem que incidir, necessariamente, sobre um vício da própria sentença e visa obter a sua reapreciação e não obter uma primeira decisão sobre questões novas que não tenham sido suscitadas pelas partes perante o tribunal/entidade recorrida.

Texto Integral

Acordam os juízes na 8.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:


I–RELATÓRIO


1.1.–Nos autos de inventário para partilha dos bens deixados por J e M, que correu termos no Cartório Notarial de …., em que exerce o cargo de cabeça-de-casal A e que em que é interessada M, veio esta, após a realização da conferência de interessados, apresentar requerimento, dirigido à senhora notária, onde concluiu da seguinte forma:
«Assim, e tendo em consideração que a aceitação da proposta ocorreu em erro, deve ser ordenada o cancelamento da adjudicação, e em consequência:
a)-Ser ordenada a realização de uma avaliação do imóvel, e após esse facto, serem determinadas as tornas caso exista efetivamente obrigação das mesmas serem prestadas;
b)-Caso o pedido de avaliação seja indeferido, desde já a Requerente indica que o imóvel tem o valor de pelo menos € 70.000,00, disponibilizando-se para efetuar o pagamento de metade a título de tornas».
1.2.–A interessada A, pronunciou-se, requerendo o desentranhamento do referido requerimento, por ser intempestivo e carecer de fundamento legal.
1.3.–Por despacho da senhora notária de 22.12.2022, foi negado provimento à pretensão da interessada M e determinado o prosseguimento dos autos.

1.4.–Inconformada, recorreu, em 18.01.2023, a interessada M, dizendo que o faz «para o Tribunal da Relação de Lisboa, nos termos do art.º 4.º n.º 2 al. b) e c) do Regime do Inventario Notarial», pedindo que tal decisão seja revogada e que seja ordenada a realização de nova conferência de Interessados, formulando as seguintes conclusões:
«a)-Foi proferido Despacho em 22 de dezembro de 2022, pela Sr.ª Notária que indeferiu o pedido da Interessada, ora Recorrente, …., de anulação da adjudicação dos bens realizada na conferência de interessados.
b)-A ora Recorrente requereu o pedido de anulação da Adjudicação indicando que tinha apresentado a sua declaração negocial em erro, requerendo a realização de uma avaliação do imóvel objeto da partilha; ou caso o pedido de avaliação fosse indeferido, indicava que o imóvel tem o valor de pelo menos € 70.000,00, disponibilizando-se para efetuar o pagamento de metade a título de tornas.
c)-Ora a Sr.ª Notária, indeferiu o Requerimento, pois entendeu que não tinha ocorrido erro na declaração negocial, e manteve a decisão de considerar que o imóvel teria o valor de € 30.612,40, e deste modo atribuiria metade deste valor a título de tornas à Interessada, aqui Recorrente.
d)-O Despacho, proferido, não aprecia a questão essencial no presente caso, ou seja, o erro negocial, com efeito o referido despacho limita-se a indicar que foi celebrado um acordo e as respetivas mandatárias devidamente notificadas, sem analisar se a declaração da interessada foi proferida em erro.
e)-Em consequência é assim o referido despacho Nulo, devendo o mesmo ser substituído por outro que aprecie a existência de erro na declaração.
f)-Acresce que a conferência de interessados destina-se a determinar o valor porque devem ser adjudicados os bens que os integram a herança.
g)-Ora, na ata da conferência de interessados, não foi fixado o valor dos bens integrantes na herança, incluindo o valor atribuído ao imóvel.
h)-Efetivamente a referida ata omite, totalmente o valor atribuído ao imóvel, só identificando o valor de um sofá e uma televisão, não tendo sido dado cumprimento ao despacho de 22 de setembro de 2022, proferido pela Sra. Notária, pois não foi fixado o valor dos bens designadamente o valor do imóvel.
i)-O valor global, identificado na ata, não pode ser entendido como fixação do valor do imóvel, pois inclui, ao que se julga diversos bens.
j)-Assim, deve também por este facto a conferência de interessados ser anulada.
k)-A Interessada, aqui Recorrente, esteve efetivamente na conferência de interessados, e foi surpreendida pela proposta apresentada pelo Cabeça de Casal, que indicou atribuir ao imóvel o valor de cerca de € 30.000,00.
l)-A Recorrente, surpreendida com a proposta, e desconhecendo o valor dos imóveis na zona onde se localiza o mesmo, acabou por aceitar o valor indicado.
m)-A Recorrente vive há vários anos no imóvel, que integra a herança, e que era dos seus pais, e ficou com a convicção que poderia continuar a viver na mesma.
n)-Acresce que o facto da sua mandatária não estar presente “fisicamente”, levou a que a comunicação fosse difícil, e inibiu a interessada de realizar diversas questões.
o)-A Recorrente tem como habilitações literárias o 9º ano de escolaridade, e não tem nem nunca teve qualquer função na área imobiliária.
p)-O valor proposto para o imóvel, foi o valor patrimonial, mas fixado em 2018, que se encontra claramente desajustado, para a situação atual, pois imóveis semelhantes encontram-se a ser comercializados nos valores que variam entre € 159.000,00 € e € 172.000,00.
q)-A declaração negocial apresentada pela Recorrente, foi efetuada, no entanto, em erro, pois desconhecia qual o valor dos imóveis naquela zona, e julgava que poderia continuar a habitar no mesmo.
r)-Sendo que o facto de poder habitar no mesmo, era essencial na declaração negocial da interessada.
s)-Ora a Recorrente, realizou uma errada representação da realidade, o que leva a que a declaração que emitiu não esteja de acordo com a sua vontade, o que configura a existência de um “erro obstáculo”, conforme bem descreve o Dr. Pedro Nunes de Carvalho em “Considerações acerca do erro em sede de patologia da Declaração Negocial”.
t)-Um homem médio, nunca aceitaria que fosse fixado o valor de cerca de € 30.000,00 a um imóvel, localizado numa área nobre da cidade, junto ao metropolitano, com duas divisões, e ainda tivesse que deixar o mesmo e procurar outro para arrendar.
u)-A Recorrente não teve consciência do facto de ao aceitar a atribuição do valor e a fixação das tornas, teria que deixar a habitação, e não tinha consciência do valor das habitações naquela localização.
v)-Existiu claramente uma discrepância entre a vontade real e a declaração, porquanto a vontade real era a de permanecer a habitar a fração autónoma, e a de lhe ser fixado um valor justo.
w)-Ocorreu a divergência entre a vontade real e a declarada, ou seja a vontade real é continuar a habitar a fração autónoma, e a vontade declarada tem como implicação ter de deixar de habitar a referida fração.
x)-No caso de erro na declaração, apesar de outras posições, entende-se que a mesma é anulável, e deste modo afeta a ata de conferência de interessados, devendo a mesma ser anulada e marcada nova conferência de interessados».

1.5.–A interessada A contra-alegou, defendendo a improcedência do referido recurso, concluindo da seguinte forma:
«I.-No recurso apresentado, a recorrente não indicou a espécie, o efeito e o modo de subida do recurso interposto.
II.-Mais, não deu cumprimento ao ónus previsto no n.º 2 do artigo 639.º, quanto à matéria de direito, e ao n.º 1 do artigo 640.º, quanto à matéria de facto. 
III.-Por outro lado, a recorrente extravasa o anterior pedido, pois requer agora que seja ordenada a realização de uma nova conferência de Interessados.
IV.-Consequentemente, deverá ser rejeitado o douto recurso.
V.-Caso assim não se entenda, o que não se concede, importa realçar que teor do despacho objeto de sindicância, apreciou corretamente a questão do erro negocial, concluindo-se que não poderia a interessada vir aos autos, sob o manto do erro da declaração negocial, requerer a avaliação do imóvel e a sua adjudicação.
VI.-Com efeito, durante a conferência de interessados, a aqui recorrida manifestou o seu interesse na adjudicação do imóvel, obrigando-se a entregar as tornas devidas.
VII.-Questionada, a recorrente não demonstrou interesse na aquisição do imóvel pelo valor atribuído, tendo aceitado a proposta apresentada.
VIII.-A sua declaração negocial formou-se de maneira esclarecida, assente em bases corretas, e livre, sem deformações provindas de influências exteriores.
IX.-Não poderá a recorrente invocar agora que ficou surpreendida com o valor atribuído ao imóvel uma vez que, na relação de bens por si subscrita em 15/06/2021, atribuiu ao imóvel precisamente a quantia de 30.612,40 €.
X.-Como tal, a recorrente apercebeu-se do alegado erro pelo menos desde 15/06/2021 e, será a partir desta data que deverá contar-se o prazo de um ano para arguição da anulabilidade.
XI.-Por conseguinte, caducou o direito para arguir a anulabilidade, o que desde já se invoca.
XII.-Sem prescindir, importa notar que a recorrente não apresentou oposição, reclamação ou impugnação no que respeita à relação de bens ou valores relacionados pela cabeça de casal, aqui recorrida.
XIII.-E ainda que se reconheça que a declarante se encontrava em erro - o que não se concede -, sempre se dirá que a declarante, aqui recorrente, se encontrava culposamente em erro pois, não cumpriu todos os cuidados que lhe eram exigíveis para que pudesse, por si própria, ter juntado todos os conhecimentos necessários à boa formação da sua vontade negocial, p.e. ter solicitado atempadamente a avaliação ao imóvel.
XIV.-Sem olvidar que a recorrente está desde o início deste processo patrocinada por Mandatário, que certamente a terá orientado nos meandros do processo de inventário.
XV.-Assim sendo, se a real vontade da recorrente era permanecer na fração autónoma, então deveria propor que lhe fosse adjudicado o apartamento, o que não se verificou.
XVI.-Aliás a recorrente foi clara ao informar que dos bens que compunham a herança, apenas pretendia o sofá em tecido e a televisão LCD.
XVII.-Como tal, causa enorme perplexidade à aqui recorrida que a recorrente venha agora afirmar que não tinha consciência que com a atribuição do valor e a fixação de tornas, implicaria a desocupação do apartamento.
XVIII.-Colocando-se a seguinte questão: pretendia a recorrente receber tornas, e ainda se manter no imóvel sem qualquer contrapartida financeira para a recorrida?!
XIX.-Quando foi advertida na conferência de interessados que, em caso de venda ou adjudicação, teria de desocupar o imóvel, tendo respondido que precisaria de tempo para desocupar o imóvel.
XX.-Pelo circunstancialismo supra, não poderá proceder a argumentação da aqui recorrente quanto refere que a sua declaração negocial, foi efetuada em erro, por desconhecer o valor dos imóveis naquela zona, e por pretender continuar a habitar no mesmo.
XXI.-Com efeito, ocorre erro na declaração, ou erro obstáculo, quando, não intencionalmente, a vontade declarada não corresponde a uma vontade real do autor, existente, mas de sentido diverso.
XXII.-In casu, não ocorre erro da declaração porque não existe qualquer divergência entre a declaração efetuada (adjudicação dos bens) e o realmente querido pela declarante, aqui recorrente (receber tornas).
XXIII.-Mais, quando tais declarações foram constatadas presencialmente por oficial público (neste caso perante um Notário)!
XXIV.-Portanto, o que a recorrente acordou na conferência de interessados não foi motivado por qualquer erro ou engano, mas sim porque ela assim o quis.
XXV.-Mais, em momento algum a recorrente fez valer a sua posição (adjudicar o imóvel para si, e manter-se no imóvel), ou seja, que estaria em erro sobre as circunstâncias do acordo.
XXVI.-Inclusive, com a adjudicação de todos os bens, foram as partes pessoalmente notificadas para, em vinte dias, proporem o mapa da partilha, não tendo a recorrente apresentado mapa de partilhas, ou informado sobre a sua vontade de se manter a residir no apartamento.
XXVII.-Por outro lado, nada nos autos foi alegado que determine que a aqui recorrida tinha conhecimento ou não devesse ignorar da essencialidade do elemento sobre o qual incidiu o erro.
XXVIII.-Assim, e face ao circunstancialismo acima descrito, inexiste erro na declaração determinante para a anulabilidade afirmada em sede de recurso.
XXIX.-Face ao exposto, o douto despacho recorrido não merece qualquer censura, pelo que deve ser mantido na íntegra».

1.6.–Por despacho da senhora notária de 23.02.2023, foi decidido que o referido recurso ficaria a aguardar o que viesse a ser interposto da sentença homologatória da partilha, nos termos do art. 4.º do Regime do Inventário Notarial (anexo à Lei n.º 117/2019 de 13.09) e do art. 1123.°, n.°s 2 al. c), e 5 do CPC.
1.7.–Remetidos os autos a tribunal judicial da Comarca competente, foi proferida sentença que homologou «(…) a partilha constante do acordo exarado na conferência de interessados, ocorrida em 03/11/2022 (acta com a referência 156400617) – artigo 5.º do regime anexo à Lei n.º 117/2019, de 13 de Setembro».

1.8.–Mais uma vez inconformada, apelou a interessada M, pedindo que a referida sentença seja revogada e ordenada a realização de nova conferência de interessados, para o que formulou as seguintes conclusões:
«a)-A sentença, homologou o acordo exarado na conferência de interessados, mas ignorou totalmente, que a Recorrente, veio antes daquela homologação, ou seja, em 18 de dezembro de 2022, indicar que a aceitação da proposta realizada na conferência foi-o em erro, e tendo requerido, em consequência:
a)-Ser ordenada a realização de uma avaliação do imóvel, e após esse facto, serem determinadas as tornas caso exista efetivamente obrigação das mesmas serem prestadas;
b)-Caso o pedido de avaliação seja indeferido, desde já a Requerente indica que o imóvel tem o valor de pelo menos € 70.000,00, disponibilizando-se para efetuar o pagamento de metade a título de tornas.
b)-Ignorou ainda a douta sentença, que a Recorrente apresentou um recurso, do despacho a Fls ..., que indeferiu o indicado Requerimento.
c)-Da leitura da conferência de interessados resulta à saciedade que a Recorrente se encontrava na mesma em erro, sendo este notório.
d)-A Interessada, ora Recorrente, esteve efetivamente na conferência de interessados, e foi surpreendida pela proposta apresentada pelo Cabeça de Casal, que indicou atribuir ao imóvel o valor de cerca de € 30.000,00.
e)-A Recorrente, surpreendida com a proposta, e desconhecendo o valor dos imóveis na zona onde se localiza o mesmo, acabou por aceitar o valor indicado.
f)-A Recorrente vive há vários anos no imóvel, que integra a herança, e que era dos seus pais, e ficou com a convicção que poderia continuar a viver no referido imóvel.
g)-Acresce que o facto da sua mandatária não estar presente “fisicamente”, levou a que a comunicação fosse difícil, e inibiu a interessada de realizar diversas questões.
h)-A Recorrente tem como habilitações literárias o 9º ano de escolaridade, e não tem nem nunca teve qualquer função na área imobiliária.
i)-O valor proposto para o imóvel, foi o valor patrimonial, mas fixado em 2018, que se encontra claramente desajustado, para a situação atual, pois imóveis semelhantes encontram-se a ser comercializados nos valores que variam entre € 159.000,00 € e € 172.000,00.
j)-A declaração negocial apresentada pela Recorrente, foi efetuada, no entanto, em erro, pois desconhecia qual o valor dos imóveis naquela zona, e julgava que poderia continuar a habitar no mesmo.
k)-Sendo que o facto de poder habitar no mesmo, era essencial na declaração negocial da interessada.
l)-Ora a Recorrente, realizou uma errada representação da realidade, o que leva a que a declaração que emitiu não esteja de acordo com a sua vontade, o que configura a existência de um “erro obstáculo”, conforme bem descreve o Dr. Pedro Nunes de Carvalho em “Considerações acerca do erro em sede de patologia da Declaração Negocial”.
m)-Um homem médio, nunca aceitaria que fosse fixado o valor de cerca de € 30.000,00 a um imóvel, localizado numa área nobre da cidade, junto ao metropolitano, com duas divisões, e ainda tivesse que deixar o mesmo e procurar outro para habitar.
n)-A Recorrente não teve consciência do facto de ao aceitar a atribuição do valor e a fixação das tornas, teria que deixar a habitação, e não tinha consciência do valor das habitações naquela localização.
o)-Existiu claramente uma discrepância entre a vontade real e a declaração, porquanto a vontade real era a de permanecer a habitar a fração autónoma, e a de lhe ser fixado um valor justo.
p)-Ocorreu a divergência entre a vontade real e a declarada, ou seja, a vontade real é continuar a habitar a fração autónoma, e a vontade declarada tem como implicação ter de deixar de habitar a referida fração.
q)-No caso de erro na declaração, apesar de outras posições, entende-se que a mesma é anulável, e deste modo afeta a ata de conferência de interessados, devendo a mesma ser anulada e marcada nova conferência de interessados.
r)-Acresce que a conferência de interessados destina-se a determinar o valor porque devem ser adjudicados os bens que os integram a herança.
s)-Ora, na ata da conferência de interessados, não foi fixado o valor dos bens integrantes na herança, incluindo o valor atribuído ao imóvel.
t)-Efetivamente a referida ata omite, totalmente o valor atribuído ao imóvel, só identificando o valor de um sofá e uma televisão, não tendo sido dado cumprimento ao despacho de 22 de setembro de 2022, proferido pela Sra. Notária, pois não foi fixado o valor dos bens designadamente o valor do imóvel.
u)-O valor global, identificado na ata, não pode ser entendido como fixação do valor do imóvel, pois inclui, ao que se julga diversos bens.
v)-Assim, deve também por este facto a conferência de interessados ser anulada.
w) Por outro lado, a referida conferência não identifica as verbas atribuídas a cada uma das interessadas, pois indica que “...Adjudicar á interessada A os restantes bens móveis e ainda o imóvel relacionado como verba 6...”.
x)-Quais as verbas atribuídas a cada interessada? Não se sabe, pois a conferencia de interessados não indica.
y)-Facto que leva a que a referida conferência seja nula e tenha que ser repetida.
z)-Foi proferido Despacho em 22 de dezembro de 2022, pela Sr.ª Notária que indeferiu o pedido da Interessada, ora Recorrente, …., de anulação da adjudicação dos bens realizada na conferência de interessados, tendo sido apresentado recurso relativamente a esse indeferimento, pelo que deve o mesmo subir com o presente recurso.
aa)-Sendo o referido despacho Nulo, devendo o mesmo ser substituído por outro que aprecie a existência de erro na declaração.
bb)-A Recorrente requereu o pedido de apoio judiciário no processo de inventário».

1.9.–A interessada A contra-alegou, pronunciando-se pela improcedência do recurso e alinhando as seguintes conclusões:
«I.-No recurso apresentado, a recorrente não indicou a espécie, o efeito e o modo de subida do recurso interposto.
II.-Mais, não deu cumprimento ao ónus previsto no n.º 2 do artigo 639.º, quanto à matéria de direito, e ao n.º 1 do artigo 640.º, quanto à matéria de facto.
III.-Consequentemente, deverá ser rejeitado o douto recurso.
Caso assim não se entenda, o que não se concede,
IV.-pretende a aqui recorrente, sob o manto do erro da declaração negocial, requerer a realização de uma nova conferência de interessados.
V.-Sucede que, atento o circunstancialismo acima descrito, a sua declaração negocial formou-se de maneira esclarecida, assente em bases corretas, e livre, sem deformações provindas de influências exteriores.
VI.-Não podendo a aqui recorrente invocar que ficou surpreendida com o valor atribuído ao imóvel uma vez que, na relação de bens por si subscrita em 15/06/2021, atribuiu ao imóvel precisamente a quantia de 30.612,40 €.
VII.-Assim sendo, a recorrente está alegadamente em erro pelo menos desde 15/06/2021 sendo que, será a partir desta data que deverá contar-se o prazo de um ano para arguição da anulabilidade.
VIII.-Por conseguinte, caducou o direito para arguir a anulabilidade, o que desde já se invoca.
IX.-Sem prescindir, importa notar que a recorrente não apresentou oposição, reclamação ou impugnação no que respeita à relação de bens ou valores relacionados pela cabeça de casal, aqui recorrida.
X.-E ainda que se reconheça que a declarante se encontrava em erro - o que não se concede -, sempre se dirá que a declarante, aqui recorrente, se encontrava culposamente em erro pois, não cumpriu todos os cuidados que lhe eram exigíveis para que pudesse, por si própria, ter juntado todos os conhecimentos necessários à boa formação da sua vontade negocial.
XI.-Sem olvidar que a recorrente está desde o início deste processo patrocinada por Mandatário.
XII.-Assim sendo, se a real vontade da recorrente era permanecer na fração autónoma, então deveria propor que lhe fosse adjudicado o apartamento, o que não se verificou.
XIII.-Como tal, não pode a recorrente afirmar que não tinha consciência que com  a atribuição do valor e a fixação de tornas, implicaria a desocupação do apartamento.
XIV.-Quando foi advertida na conferência de interessados que, em caso de venda ou adjudicação, teria de desocupar o imóvel, tendo respondido que precisaria de tempo para desocupar o imóvel.
XV.-Pelo circunstancialismo supra, não poderá proceder a argumentação da aqui recorrente quanto refere que a sua declaração negocial, foi efetuada em erro, por desconhecer o valor dos imóveis naquela zona, e por pretender continuar a habitar no mesmo.
XVI.-Com efeito, ocorre erro na declaração, ou erro obstáculo, quando, não intencionalmente, a vontade declarada não corresponde a uma vontade real do autor, existente, mas de sentido diverso.
XVII.-In casu, não ocorre erro da declaração porque não existe qualquer divergência entre a declaração efetuada (adjudicação dos bens) e o realmente querido pela declarante, aqui recorrente (receber tornas).
XVIII.-Mais, com a adjudicação de todos os bens, foram as partes pessoalmente notificadas para, em vinte dias, proporem o mapa da partilha, não tendo a recorrente apresentado mapa de partilhas, ou informado sobre a sua vontade de se manter a residir no apartamento.
XIX.-Por outro lado, nada nos autos foi alegado que determine que a aqui recorrida tinha conhecimento ou não devesse ignorar da essencialidade do elemento sobre o qual incidiu o erro.
XX.-Assim, e face ao circunstancialismo acima descrito, inexiste erro na declaração determinante para a anulabilidade afirmada em sede de recurso.
XXI.-De igual modo, inexiste qualquer nulidade da ata da conferência de interessados, a qual cumpre com todos os requisitos legais.
XXII.-Face ao exposto, tanto o despacho da Sra. Notária, como a douta sentença que homologou o mapa de partilhas, não merecem qualquer censura, pelo que devem ser mantidos na íntegra».

1.10.–Colhidos os vistos, cumpre decidir.

II–DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO

Decorre do disposto nos arts. 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1 do CPC, que as conclusões delimitam a esfera de actuação do tribunal ad quem, exercendo uma função semelhante à do pedido na petição inicial (cfr., neste sentido, Abrantes Geraldes, in Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 2017, pág. 105 a 106), sendo que o tribunal ad quem não está obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes e é livre na interpretação e aplicação do direito (cf. art. 5.º, n.º 3 do CPC).
Assim, atendendo às conclusões supra transcritas, as questões essenciais a decidir, por ordem de precedência lógica, consistem, basicamente, em saber:
a)-se a decisão da senhora notária de 22.12.2022 é recorrível e, em caso afirmativo, se este tribunal da Relação pode conhecer do recurso interposto pela interessada M em 18.01.2023 (conclusões z) e aa));
b)-se a sentença homologatória da partilha é nula por omissão de pronúncia (conclusões a) e b));
c)-se a conferência de interessados realizada em 03.11.2022 deve ser anulada e repetida, por a declaração negocial da interessada M ter sido efectuada em erro-obstáculo (conclusões c) a q));
d)-se a mesma conferência de interessados é nula e deve ser repetida, por não ter fixado o valor dos bens que integram a herança, nem identificado as verbas atribuídas a cada interessado (conclusões r) a y)).

III–FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Da tramitação dos autos, resultam provados os seguintes factos com relevância para a apreciação do objecto do presente recurso:
1.–Em 09.04.2021, A requereu junto do Cartório Notarial de …, que se procedesse a inventário para partilha dos bens das heranças de J e M, que foram casados entre si, indicando como interessada M, tendo o processo sido aí registado com o n.º …/21;
2.–Por despacho da senhora notária de 19.04.2021, foi nomeada cabeça-de-casal a interessada M, que foi citada na sua própria pessoa e constituiu mandatário nos autos;
3.–Por despacho da senhora notária de 20.01.2022, foi a referida M removida do cargo de cabeça-de-casal e nomeada, em sua substituição, a interessada e requerente do inventário A;
4.–Em 25.01.2022, a cabeça-de-casal juntou a relação de bens, que não foi objecto de qualquer reclamação;
5.–Por despacho da senhora notária de 22.09.2022, notificado às partes, foi designada data para  a realização da conferência de interessados, nos seguintes termos:
«(…) designa-se o dia 03 de novembro de 2022 pelas 14:30 horas para a realização da conferência de interessados.
Notifiquem-se os interessados para comparência pessoal no dia referido, podendo fazer-se representar por mandatário com poderes especiais ou confiar o mandato a qualquer outro interessado, sob pena de lhes ser aplicável a multa prevista no artigo 28º da Portaria 278/2013 na redação dada pela Portaria 46/2015 de 23 de fevereiro.
Notifiquem-se igualmente para comparência pessoal, e com a mesma cominação, os respetivos cônjuges dos interessados, salvo se o regime de casamento que entre eles vigore for o da separação de bens, caso em que apenas será necessária a presença se, de entre os bens a partilhar, constar a casa de morada de família respetiva.

A conferência destina-se a deliberar sobre:
a)-A composição total ou parcial dos quinhões dos interessados e o valor porque devem ser adjudicados os bens que os integram; a indicação dos bens que devem ser objeto de sorteio; e o eventual acordo na venda de bens da herança e na distribuição do produto da alienação pelos interessados ou, não havendo deliberação sobre estas matérias, deliberar sobre quaisquer questões cuja resolução possa influir na partilha.
b)-A aprovação do passivo da herança e forma de cumprimento dos legados.
c)-Os pedidos de adjudicação de bens indivisíveis; e, eventualmente
d)-Quaisquer questões cuja resolução possa influir na partilha.
Notifiquem-se os interessados com a advertência de que:
a)-A conferência pode ser adiada, por determinação do notário ou a pedido de qualquer interessado, por uma só vez, se faltar algum dos convocados e houver razões para considerar viável o acordo sobre a composição dos quinhões.
b)-A deliberação dos interessados presentes, relativa a questões cuja resolução possa influir na partilha, vincula os demais que, devidamente notificados, não tenham comparecido na conferência.
Atualize-se o valor do processo de inventário de acordo com o valor resultante da relação de bens apresentada € 32.332,40»;
6.–No dia 03.11.2022 realizou a conferência de interessados, com a presença das interessadas A e M, o marido desta última e as mandatárias das interessadas (sendo a mandatária da interessada M, por teleconferência), constando da respectiva acta o seguinte:
«(…)
Explicados os motivos da presente diligência teve a mesma inicio com o seguinte resultado:
Não houve oposição, reclamação ou impugnação quanto ao inventário, relação de bens ou valores porque as mesmas foram relacionadas.
As interessadas, por acordo, compuseram o quinhão respetivo da seguinte forma:
Acordaram em adjudicar à interessada M o sofá em tecido, com três lugares, com marcas de uso no valor de € 40,00 e a televisão LCD no valor de € 120,00 vendo o restante do seu quinhão hereditário preenchido com o dinheiro das tomas.
Acordaram em adjudicar à interessada A os restantes bens móveis e ainda o imóvel relacionado como verba 6, tudo no valor global de € 32.172,40, devendo a mesma prestar de tornas o que levar a mais do que competir.
Ficando, assim, adjudicados todos os bens, foram as presentes pessoalmente notificadas para, em vinte dias, proporem o mapa da partilha nos termos do artigo 1120º do CPC aditado pela Lei 117/2019 de 13 de setembro, fiando ainda a requerente pessoalmente notificada para juntar aos autos o DUC e respetivo comprovativo de pagamento devido pela remessa dos autos ao Tribunal para que seja proferida sentença homologatória da partilha.
Não havendo outro assunto a tratar foi encerrada a diligência e lavrada a presente ata»;
7.–Apenas a interessada A apresentou proposta de mapa da partilha;
8.–No dia 18.12.2022, a interessada M apresentou requerimento, dirigido à senhora notária, com o seguinte teor:
«…tendo tomado conhecimento do teor da Ata da Conferência de Interessados, vem expor e Requer conforme se segue:
I-Valor do Imóvel e Tornas a fixar
1.-A Requerente aquando da Conferência de Interessados, ocorrida em 03 de novembro de 2022, foi surpreendida pela proposta apresentada pelo Cabeça de casal.
2.-Colocada perante a questão do valor a atribuir ao imóvel, a Requerente aceitou fixar o valor do imóvel em €32.172,40.
3.-Em face do valor fixado ao imóvel, aceitou que lhe fossem prestadas tornas.
4.-A declaração negocial apresentada pela Requerente, foi efetuada, no entanto, em erro.
5.-Com efeito a Requerente desconhecia o valor dos imóveis naquela zona.
6.-Sendo que para imóvel daquela tipologia, os valores variam entre € 159.000,00 € e € 172.000,00, conforme documentos n.ºs 1, 2, 3 e 4, que se juntam.
7.-O valor indicado do imóvel foi referido em erro e encontra-se claramente desajustado, pois trata-se de um imóvel com área privativa de 50,65 m2, com 2 divisões, localizado em Moscavide, a escassos minutos a pé de uma estação do metropolitano, e junto a Expo.
8.-A valor atribuído ao imóvel, pela Requerente, ocorreu em profundo erro, cuja consciência só ocorreu quando verificou o valor dos imóveis à venda em Moscavide.
9.-Para esse erro previsivelmente contribuiu a ausência presencial da sua mandatária, o que dificultou o contacto com a mesma.
10.-Ora a Requerente, realizou uma errada representação da realidade, o que leva a que a declaração que emitiu não esteja de acordo com a sua vontade, o que configura a existência de um "erro obstáculo", conforme bem descreve o Dr. Pedro Nunes de Carvalho em "Considerações acerca do erra em sede de patologia da Declaração Negociar”.
11.-No mesmo sentido se pronuncia o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, proferido no processo n.º 67/14.4T8OHP-A.C1, que salienta que "I-O erro na declaração, ou erro obstáculo, existe quando, não intencionalmente v.g., por inadvertência, engano ou equívoco, a vontade declarada não corresponde a uma vontade real do autor, existente, mas de sentido diverso.
II-Existe erro obstáculo sobre a identidade da coisa que constitui objeto da declaração - error in corpore, quando a indicação ou a descrição que dela se faz, leve a identificar uma coisa diferente da que o declarante pretende".
III-Contudo, a relevância do erro obstáculo, para que o negócio seja anulável, carece:
-Que para o declarante seja essencial o elemento sobre o qual incidiu o erro, de tal forma que, se deste se tivesse apercebido, não teria celebrado o negócio;
- Que o declaratário conheça ou não deva ignorar a essencialidade do elemento sobre o qual incidiu o erro para o declarante."
12.–Ora, no caso concreto se a Requerente tivesse consciência do valor atual do imóvel nunca tinha aceite o acordo, e desconhecia que naquela audiência iria ser discutido aquele facto.
13.–Por outro lado, a Requerente não trabalha, nem nunca trabalhou na área imobiliária, pelo que desconhecia o valor do mesmo, e não lhe pode ser imputado qualquer obrigação de o saber.
14.–Como refere Pedro Pais de Vasconcelos (Teoria Geral do Direito Civil, Almedina, 2010, 6 edição, págs. 658/659) "a vontade negocial pode estar viciada na sua formação, no processo de volição e de decisão, por deficiência de esclarecimento......e a parte cuja vontade tenha sido perturbada pode, se assim o desejar, libertar-se do negócio viciado, procedendo à sua anulação".
15.–Também Manuel A. Domingues de Andrade, in (Teoria Geral da Relação Jurídica, vol. II, 9ª reimpressão, Coimbra, 2003, pág. 233), caracteriza o erro nos moldes seguintes: "[o] erro-vício consiste na ignorância (falta de representação exacta) ou numa falsa ideia (representação inexacta), por parte do declarante, acerca de qualquer circunstância de facto ou de direito que foi decisiva na formação da sua vontade, por tal maneira que se ele conhecesse o verdadeiro estado das coisas não teria querido o negócio, ou pelo menos não o teria querido nos precisos termos em que o concluiu".
16.–Pelo que se compreende que a Requerente se encontre em erro.
17.–Sucede que o imóvel não foi adquirido pela Requerente mas sim pelos seus pais.
18.–A Requerente por outro lado vive no imóvel, que integra a herança, sendo aquele a sua casa de família, pelo que terá direito de preferência na adjudicação do mesmo, direito esse que pretende exercer.
19.–Assim, e tendo em consideração que a aceitação da proposta ocorreu em erro, deve ser ordenada o cancelamento da adjudicação, e em consequência:
a)-Ser ordenada a realização de uma avaliação do imóvel, e após esse facto, serem determinadas as tornas caso exista efetivamente obrigação das mesmas serem prestadas;
b)-Caso o pedido de avaliação seja indeferido, desde já a Requerente indica que o imóvel tem o valor de pelo menos € 70.000,00, disponibilizando-se para efetuar o pagamento de metade a título de tornas»;

9.–Por requerimento de 19.12.2022, a interessada A requereu o desentranhamento do referido requerimento, por ser intempestivo e carecer de fundamento legal;
10.–Por despacho da senhora notária de 22.12.2022, foi organizado o mapa da partilha, de acordo com as adjudicações feitas na conferência de interessados;
11.–Ainda por despacho da senhora notária de 22.12.2022, foi decidido que:
«Por requerimento registado em www.inventarios.pt com o número 2579569 de documento veio a interessada M alegar, em suma, erro na sua declaração negocial de aceitação do valor atribuído por acordo ao imóvel; desconhecimento de que na audiência iria ser discutido aquele facto; pretensão de exercer o direito de preferência na adjudicação do imóvel por nele residir vindo, ainda, requerer seja ordenada avaliação do imóvel e, em caso de indeferimento desta ultima pretensão seja fixado ao imóvel o valor de € 70.000,00 disponibilizando-se para efetuar o pagamento de metade a titulo de tornas.
Por requerimento registado na referida plataforma com o número 2579582 de documento veio a cabeça de casal, A requerer o desentranhamento do requerimento suprarreferido por ser intempestivo e carecer de fundamento legal.
Cumpre tomar posição;
Em 03 de novembro de 2022 pelas 14:30 minutos realizou-se neste Cartório Notarial a Conferência de Interessados previstas no artigo 1111º do CPC aditado pela lei 117/2019 de 13 de setembro.
Nessa conferência, para a qual foram expedidas às interessadas as notas postais que se encontram registadas nos autos, encontravam-se presentes não só as interessadas como ainda o cônjuge da requerente …. e as ilustres mandatárias das mesmas.
Do despacho de agendamento da conferência de interessados que acompanhava a notificação para comparência pessoal constava:
(…)
Na conferência as interessadas chegaram a acordo nos termos que constam da Ata da Conferência e que se transcrevem:
(…)
Assim,
As interessadas, acompanhadas das suas ilustres mandatárias, puseram fim ao processo, por acordo, na referida conferência de interessados.
A fracção em apreço tem um VPT de € 30.612,40.
Notificada a interessada M da relação de bens para, em trinta dias, querendo, reclamar da relação de bens ou impugnar o valor dado aos mesmos, nada velo dizer ou peticionar.
Em sede de conferência de interessados, e na impossibilidade de obter acordo, a Lei ainda permite que os interessados requeiram a avaliação dos bens e/ou, nos casos em que a mesma é admissível, o pedido de adjudicação de bens nos termos dos artigos 1114° e 1115° do CPC.
Não foi o caso dos presentes autos, uma vez que as interessadas coadjuvadas pelas respetivas mandatárias, alcançaram o acordo que consta do Ata pelo que, tendo precludido o seu direito não pode agora a interessada vir aos autos, sob o manto do erro da declaração negocial, requerer a avaliação do imóvel e a sua adjudicação.
Como se retira da Ata da diligência, no final da mesma foram as ilustres mandatárias notificadas:
“…..
Ficando, assim, adjudicados todos os bens, foram as presentes pessoalmente notificadas para, em vinte dias, proporem o mapa da partilha nos termos do artigo 1120º do CPC aditado pela Lei 117/2019 de 13 de setembro, fiando ainda a requerente pessoalmente notificada para juntar aos autos o DUC e respetivo comprovativo de pagamento devido pela remessa dos autos ao Tribunal para que seja proferida sentença homologatória da partilha……”
Termos em que se nega provimento à pretensão da requerente e se determina o prosseguimento dos autos»;
12.–Em 18.01.2022, a interessada M apresentou requerimento pelo qual interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa do despacho referido no n.º 11;
13.–Por despacho da senhora notária de 23.02.2023, foi decidido:
«Por requerimento registado em www.inventarios.pt com o número 2588474 de documento veio a Interessada M interpor recurso da decisão proferida por este Cartório Notarial em despacho datado de 22 de dezembro de 2022 registado na referida plataforma com o número 2580950 de documento.
Notificada, velo a interessada A apresentar as suas contra-alegações com os fundamentos que constam do seu requerimento registado com o número 2594811 de documento.
Cumpre tomar posição;
O regime dos recursos em processos de inventário que tenham sido instaurados após 01 de janeiro de 2020 e estejam a correr em Cartórios Notariais encontra-se previsto no artigo 4º do Regime de Inventário Notarial, Regime este aprovado em anexo à Lei 117/2019 de 13 de setembro, nos termos do seu artigo 2°.
De acordo com o artigo 4º do RIN é igualmente aplicável o regime previsto no artigo 1123° do CPC, aditado pela já referida Lei.
Ora, por força da aplicação deste regime, e conforme o disposto no artigo 1123° n° 2 al. c) e n° 5 as decisões proferidas pelo notário na fase da partilha apenas sobem a final com o que vier a ser interposto da sentença homologatória da partilha.
No caso dos autos a interessada M não deduziu impugnação ou reclamação, nem do despacho determinativo da partilha, nem do mapa da partilha.
Assim, o recurso interposto fica a aguardar o que vier a ser interposto da sentença homologatória da partilha».
14.–Por despacho da senhora notária de 30.03.2022, foi decidido:
«Nos presentes autos de inventário abertos para partilha dos bens deixados por óbito de J e M, tendo as interessadas chegado a acordo nos termos enunciados na Ata da Conferência de Interessados e tendo sido proferido despacho que retém o recurso entreposto até àquele que vier a subir com a sentença homologatória da partilha;
Remete-se, nos termos do artigo 5º do Regime do Inventário Notarial aprovado em anexo à Lei 117/2019 de 13 de setembro, e cumprido o disposto no artigo 7º o presente processo ao tribunal para que seja proferida sentença homologatória da partilha».
15.–Remetidos os autos ao Juízo Local Cível de Loures, foi, em 25.04.2023, proferida a sentença recorrida, com o seguinte teor:
«Nos presentes autos de inventário para partilha de bens a que se procede por óbito de J e M, homologo por sentença a partilha constante do acordo exarado na conferência de interessados, ocorrida em 03/11/2022 (acta com a referência 156400617) – artigo 5.º do regime anexo à Lei n.º 117/2019, de 13 de Setembro.
Custas em conformidade com o disposto no artigo 1130.º do Cód. Processo Civil (artigo 2.º, n.º1, do regime anexo à Lei n.º 117/2019, de 13 de Setembro).
Registe e notifique».

IV–FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

4.1.–A primeira questão que se suscita é de saber se a decisão da senhora notária de 22.12.2022 é recorrível e, em caso afirmativo, se pode este tribunal da Relação conhecer do recurso dela interposto pela interessada M em 18.01.2023.
Está em causa o regime dos recursos no processo de inventário notarial, decorrente da Lei n.º 117/2019, de 13.09, que aprovou o Regime do Inventário Notarial (RIN) e em cujo art. 4.º se estipula que:
«1–A decisão do notário que, nos termos do artigo anterior, não decretar a suspensão do processo e não remeter os interessados para os meios judiciais pode ser impugnada por qualquer dos interessados diretos na partilha, mediante recurso interposto para o tribunal competente.
2–O regime dos recursos é o seguinte:
a)-O recurso previsto no número anterior sobe imediatamente e tem efeito suspensivo da marcha do processo;
b)-O recurso previsto na alínea b) do n.º 2 do artigo anterior sobe imediatamente e em separado dos autos de inventário, sem efeito suspensivo da marcha do processo;
c)-Aos recursos interpostos das restantes decisões proferidas pelo notário no decurso do processo é aplicável, com as necessárias adaptações, o regime previsto no artigo 1123.º do Código de Processo Civil.
3–Os recursos das decisões proferidas pelo notário são interpostos no prazo de 15 dias a contar da notificação da decisão, devendo o requerimento de interposição do recurso incluir a alegação do recorrente.
4–A decisão do notário de remessa dos interessados para os meios judiciais não pode ser posta em causa pelo juiz».
O tribunal competente para apreciar os recursos interpostos de decisões do notário é o tribunal da Comarca (art. 2.º, n.º 4 do RIN).
Assim sendo, competiria, em princípio, ao Tribunal Judicial da Comarca de Loures conhecer do recurso interposto em 18.01.2023.
Sucede que a decisão de 22.12.2022 enquadra-se na previsão da al. c) do n.º 2 do art. 4.º do RIN (já que não versa sobre a suspensão do processo ou a remessa dos interessados para os meios judiciais, nem resolve um litígio entre os interessados relativo, nomeadamente, à definição dos bens ou dívidas que integram o património a partilhar), que remete para o regime previsto no art. 1123.º do CPC.
Ora, dispõe este art. 1123.º que:
«1–Aplicam-se ao processo de inventário as disposições gerais do processo de declaração sobre a admissibilidade, os efeitos, a tramitação e o julgamento dos recursos.
2–Cabe ainda apelação autónoma:
a)-Da decisão sobre a competência, a nomeação ou a remoção do cabeça de casal;
b)-Das decisões de saneamento do processo e de determinação dos bens a partilhar e da forma da partilha;
c)-Da sentença homologatória da partilha.
3–O juiz pode atribuir efeito suspensivo do processo ao recurso interposto nos termos da alínea b) do número anterior, se a questão a ser apreciada puder afetar a utilidade prática das diligências que devam ser realizadas na conferência de interessados.
4–São interpostos conjuntamente com a apelação referida na alínea b) do n.º 2 os recursos em que se pretendam impugnar decisões proferidas até esse momento, subindo todas elas em conjunto ao tribunal superior, em separado dos autos principais.
5–São interpostos conjuntamente com a apelação referida na alínea c) do n.º 2 os recursos em que se impugnem despachos posteriores à decisão de saneamento do processo».
O despacho da senhora notária de 22.12.2023 foi proferido após a conferência de interessados e na mesma data do despacho relativo ao modo como deve ser organizada a partilha, sendo, portanto, posterior ao saneamento da causa (art. 1110.º, n.º 1 do CPC, ex vi do art. 2.º, n.º 1 do RIN). Por conseguinte, e de acordo com o n.º 5 do art. 1123.º do CPC, tal despacho é, apenas, impugnável com o recurso de apelação da sentença homologatória da partilha, recurso este para o qual é, inequivocamente, competente o tribunal da Relação.
Já no âmbito do anterior Regime Jurídico do Processo de Inventário, aprovado pela Lei n.º 23/2013, de 05.03., alguma jurisprudência defendia que a conjugação dos respectivos arts. 66.º, n.º 3 (que estipulava que da decisão homologatória da partilha cabia recurso de apelação para o Tribunal da Relação) e 76.º, n.º 2 segunda parte (que dispunha que as decisões interlocutórias deviam ser impugnadas no recurso que viesse a ser interposto da decisão de partilha) levava a concluir que as decisões interlocutórias proferidas no processo de inventário, que se mostrassem recorríveis, quer o tivessem sido pelo notário, quer o tivessem sido pelo tribunal de Comarca, eram impugnáveis no recurso que viesse a ser interposto da decisão homologatória da partilha e, portanto, num caso e noutro, para o Tribunal da Relação territorialmente competente. Entendia esta jurisprudência que, só existia recurso para o tribunal de Comarca das decisões dos notários que indeferissem o pedido de remessa das partes para os meios judiciais comuns (art. 16.º, n.º 4 do RJPI) e do despacho determinativo da forma à partilha (art. 57.º, n.º 4 do RJPI).
Assim, neste sentido, o acórdão da RC de 15.06.2020, in www.dgsi.pt., decidiu que: «II-Como a grande maioria das decisões interlocutórias proferidas no processo de inventário são tomadas pelos notários no âmbito da respetiva competência, que se quis geral, não haverá como excluir que o RJPI previu como que recursos “per saltum” de decisões de notários para o Tribunal da Relação, o que, apesar de tudo, não contraria o nº 1 do art. 68º CPC, onde apenas se diz que «as Relações conhecem dos recursos», não se dizendo que conhecem necessariamente dos recursos das decisões dos tribunais de 1ª instância. IV-Não se admite, assim, que de uma decisão de um Notário seja interposta “impugnação judicial” para o tribunal da 1ª instância, não se conhecendo tal figura, com suficiente autonomia, quer no CPC, quer no RJPI».
No mesmo sentido, o acórdão da RL 06.12.2018, in www.dgsi.pt, considerou que: «III-As decisões dos notários ou são recorríveis de imediato (e são-no apenas nos casos dos arts. 16/4 e 57/4 do RJPI e 644/2 do CPC), caso em que o recurso é para o tribunal da comarca (por força daquelas normas e dos arts. 76/2, 1.ª parte, e 66/3, ambos a contrario, do RJPI), ou então apenas podem ser impugnadas no recurso que vier a ser interposto da decisão final (e neste caso o conhecimento da impugnação cabe, por arrastamento, ao tribunal da relação - arts. 76/2, 2ª parte, e 66/3, do RJPI)».
Outros entendiam, no entanto, que os tribunais da Relação eram incompetentes, em razão da hierarquia, atento o disposto no art. 67.º do CPC, para conhecerem das decisões interlocutórias dos notários, só podendo apreciar as decisões interlocutórias dos tribunais de 1ª instância (cfr., Augusto Lopes Cardoso, in Partilhas Judiciais, 6.ª ed., 2015, p. 83 e 84; Eduardo Sousa Paiva, in O Novo Processo de Inventário – Traves Mestras da Reforma, Tutela Jurisdicional, Algumas Questões; acórdãos da RE de 05.04.2016, da RC de 09.01.2017, de 09.5.2017, de 20.06.2017 e de 08.10.2019, da RP de 26.04/2018 e de 27.06/2018, e da RL de 25.9.2018 e 15.12.2022, todos em www.dgsi.pt).
No referido acórdão da RL de 15.12.2022 escreveu-se que «(…) constata-se que a impugnação das decisões da Sra. Notária são efectuadas/interpostas para o Tribunal de 1ª instância, podendo estas decisões (tribunal), caso assim as partes o entendam, ser impugnadas por meio de interposição de recurso para o Tribunal da Relação. In casu, a apelante não impugnou/interpôs recurso da decisão de forma à partilha proferida pela Sra. Notária (para o tribunal de 1ª instância), nele se incluindo as demais decisões (interlocutórias) proferidas no processo de inventário, nomeadamente, a decisão que indeferiu a remessa do inventário para os meios comuns. Assim, face à inexistência de recurso para o tribunal competente (1ª instância), as decisões proferidas pela Sra. Notária transitaram em julgado, mormente, a questão da remessa dos autos para os meios judiciais comuns. Acresce que, face à não interposição de recurso por parte da apelante e uma vez que o tribunal de 1ª instância não se pronunciou sobre a questão colocada, vedado está a este tribunal da Relação pronúncia sobre questões não apreciadas pelo tribunal recorrido, não só por se tratarem de questões novas, como não admissibilidade do nosso sistema jurídico de recursos per saltum, salvo em casos excepcionais que não o dos autos».
No âmbito do regime do processo de inventário notarial actualmente em vigor, Tomé D'Almeida Ramião, in O Regime dos Recurso e as Normas Transitórias do Novo Regime do Processo de Inventário, e-book Inventário: O Novo Regime, Coleção Formação Contínua, CEJ, 2020, defendeu que «Quanto às decisões proferidas pelo notário após o momento de saneamento do processo e de determinação dos bens a partilhar e da forma da partilha, sendo inaplicável a alínea c) do n.º 2 do artigo 1123.º, já que compete ao juiz a prolação da sentença homologatória da partilha, pode questionar-se se os recursos de decisões posteriores podem ser interpostos conjuntamente com o recurso que for interposto dessa sentença, competindo ao Tribunal da Relação conhecer do recurso dessas decisões, ou se o recurso deve ser interposto autonomamente para o tribunal da comarca competente, visto que a este se atribui a competência para apreciar os recursos interpostos de decisões do notário (n.º 4 do artigo 2.º). Estamos em presença de decisões interlocutórias que não são recorríveis autonomamente, mas juntamente com o recurso que vier a ser interposto da sentença homologatória da partilha. Assim sendo, parece que a melhor solução aponta no primeiro sentido, ou seja, de que compete ao Tribunal da Relação conhecer desses recursos».
Acompanhamos este entendimento, que, quanto cremos, é o único que permite encontrar um sentido para  a remissão que o art. 4.º, n.º 2 al. c) do RIN faz para o art. 1123.º, n.º 5 do CPC.
Sucede que, mesmo a entender-se que compete ao tribunal da Relação conhecer dos recursos das decisões interlocutórias proferidas no processo de inventário pelo notário, teremos, naturalmente, que estar perante uma decisão impugnável, apenas, no recurso interposto da decisão homologatória da partilha.
Ora, no caso dos autos é inquestionável que da decisão da senhora notária de 22.12.2022 não cabe recurso de apelação autónoma (por não ser decisão que ponha termo a um incidente processado autonomamente e não integrar nenhuma das previsões do art. 1123.º, n.º 2, nem do art. 644.º, n.º 2 do CPC, ex vi do art. 1123.º, n.º 1), pelo que a mesma só podia ser impugnada no recurso que viesse a ser interposto da decisão homologatória da partilha.
Como referem Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, in CPC Anotado, II, Almedina, 2020, p. 614, «quanto às decisões interlocutórias cuja recorribilidade não seja assegurada, quer por normas especiais do processo de inventário, quer por aplicação remissiva do art. 644.º (…), devem ser impugnadas no momento processualmente oportuno (art. 1123.º, n.º 4 e 5), em dois blocos: com o recurso da decisão sobre o saneamento do processo (art. 1110.º) ou com o recurso da sentença homologatória da partilha (art. 1122.º; RL 8-2-19, 2747/14)».
Assim sendo, o recurso da interessada MG..... apresentado em  18.01.2023, por interposto autonomamente e ter por objecto uma decisão interlocutória apenas impugnável com o recurso da decisão homologatória da partilha, não é legalmente admissível (veja-se, em situação similar, o decidido no acórdão da RC de 15.06.2020, já citado).
Na verdade, como se viu, a interessada M só poderia impugnar a decisão interlocutória de 22.12.2022, que é posterior ao saneamento, no recurso da sentença homologatória da partilha, alargando o âmbito do recurso a tal despacho, em vez de o circunscrever à decisão final.
Ora, no requerimento de interposição de recurso, a recorrente refere, apenas, que «(…) vem, com Apoio Judiciário, notificada da homologação por sentença da partilha constante do acordo exarado na conferência de interessados, interpor recurso da referida sentença, para o Tribunal da Relação de Lisboa, nos termos do art.º 4.º n.º 2 al. b) e c) do Regime do Inventário Notarial e artigo 1123.º n.º 2 al. c) do CPC» (sublinhado nosso).
Nas alegações (arts. 44.º a 52.º) e conclusões do recurso (conclusões z) e aa)), a recorrente limita-se a requerer a subida - e, portanto, a apreciação - do recurso interposto em 18.01.2023, sem referir que pretende, também, recorrer do despacho interlocutório de 22.12.2022.
Daqui decorre, manifestamente, que a única decisão recorrida é a sentença homologatória da partilha.
Com efeito, das conclusões apresentadas pela recorrente não resulta que a mesma pretenda atacar o despacho de 22.12.2022 (certamente, por já o ter feito autonomamente…). Embora a recorrente refira que tal despacho é nulo por não ter apreciado as questões por si suscitadas no requerimento de 18.12.2022 (nomeadamente, a questão do erro na declaração), limita-se a pedir a subida do recurso por si, autonomamente, interposto, e, por conseguinte, a sua apreciação por este tribunal superior, acabando por, nas conclusões formuladas (que, repete-se, delimitam o objecto do recurso - arts. 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1 do CPC), colocar, apenas, em causa a sentença homologatória da partilha, com os seguintes fundamentos:
- ignorar a mesma o requerimento por si formulado em 18.12.2022 (e, portanto, que a aceitação da proposta feita na conferência de interessados foi-o em erro) e o recurso interposto em 18.01.2023 (conclusões a) e b)), o que se traduz na arguição da nulidade dessa sentença por omissão de pronúncia;
- a conferência de interessados realizada em 03.11.2022 ser anulável e dever ser repetida, na medida em que a declaração negocial da interessada M foi efectuada em erro-obstáculo (conclusões c) a q)), o que, subentende-se, conduzirá á anulação da sentença recorrida;
- a mesma conferência de interessados ser nula e dever ser repetida, já que não fixou o valor dos bens que integram a herança, nem identificou as verbas atribuídas a cada interessado (conclusões r) a y)), o que, mais uma vez por dedução lógica, afectará a sentença recorrida.
Desta forma, não tendo sido apresentado, conjuntamente, recurso do despacho da senhora notária de 22.12.2022, que negou provimento à pretensão da interessada M de “cancelamento da adjudicação” feita na conferência de interessados (com as consequências que peticionou) e que determinou o prosseguimento dos autos, terá de entender-se, em face do disposto no art. 620.º, n.º 1, do CPC, que tal despacho transitou em julgado, tendo força obrigatória dentro do processo, pelo que não pode este tribunal da Relação sobre ele pronunciar-se, apenas lhe cabendo apreciar a sentença que homologou a partilha (cfr., neste sentido, em situação similar, vide o acórdão da RG de 31.03.2022, in www.dgsi.pt).
É o que se fará de seguida.
4.2.-Começa a recorrente por alegar que a sentença homologatória da partilha ignorou o requerimento por si formulado em 18.12.2022 (e, portanto, não atentou que a aceitação da proposta por si feita na conferência de interessados foi determinada por erro), assim como ignorou que a recorrente apresentou recurso do despacho da senhora notária que indeferiu aquele requerimento (conclusões a) e b)).
Tal alegação configura, salvo melhor opinião, a arguição da nulidade da sentença por omissão de pronúncia.
Com efeito, de acordo com o disposto no art. 615.º, n.º 1 al. d) do CPC, a sentença é nula quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar.
Esta nulidade prende-se com o facto de caber ao juiz a resolução de todas as questões que as partes tiverem submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução das outras (art. 608.º CPC).
Certo é que só existe omissão de pronúncia quando o tribunal não se pronuncia sobre as questões com relevância para a decisão de mérito e não já quanto a todo e qualquer argumento aduzido.
Neste sentido, decidiu o acórdão do STJ de 10.12.2020, in www.dgsi.pt., que «A nulidade por omissão de pronúncia, representando a sanção legal para a violação do estatuído naquele nº 2, do artigo 608.º, do CPC, apenas se verifica quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre as «questões» pelas partes submetidas ao seu escrutínio, ou de que deva conhecer oficiosamente, como tais se considerando as pretensões formuladas por aquelas, mas não os argumentos invocados, nem a mera qualificação jurídica oferecida pelos litigantes».
Também o acórdão da RL de 08.05.2019, in www.dgsi.pt., considerou que «O vocábulo legal -“questões”- não abrange todos os argumentos invocados pelas partes. Reporta-se apenas às pretensões deduzidas ou aos elementos integradores do pedido e da causa de pedir, ou seja, às concretas controvérsias centrais a dirimir».
In casu, o tribunal a quo pronunciou-se sobre todas as questões que se lhe impunha apreciar na sentença homologatória da partilha.
Trata-se, como o próprio nome indica, de uma sentença homologatória, que serve para autenticar as partilhas e condenar os interessados no pagamento das custas e, eventualmente, do passivo aprovado ou reconhecido, sendo uma «decisão de natureza essencialmente formal, ainda assim, com reflexos na estabilização da partilha, logo que ocorra o seu trânsito em julgado» (cfr. Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Pires de Sousa, in CPC Anotado, II, pág. 608).
Nas palavras de Lopes Cardoso, in Partilhas Judiciais, II, Almedina, 4.ª ed., 1990, p. 520, «constitui uma verdadeira chancela do que se deliberou, e o próprio art. 1382.º a considera mais como uma homologação das partilhas do que um acto final de julgamento delas. Breve, concisa, a sentença limita-se a homologá-las, fazendo expressa referência aos nomes do inventariado e inventariante e condenando os interessados nas custas; destina-se a autenticar as partilhas».
As questões susceptíveis de influir na partilha e na determinação dos bens a partilhar são decididas em momento anterior, no saneamento do processo ou, quanto muito, no despacho que determina a organização do mapa da partilha.
O tribunal a quo não tinha, pois, que se pronunciar, na sentença homologatória, sobre o requerimento da interessada M de 18.12.2022.
A este respeito, não podemos deixar de salientar que a sentença em causa limitou-se a homologar a partilha nos precisos termos que haviam sido acordados pelas duas interessadas na conferência de interessados realizada em 03.11.2022 (da qual consta, aliás, não ter havido qualquer oposição, reclamação ou impugnação quanto ao inventário, relação de bens ou valores por que foram relacionados).
Tal acordo das partes relativo à partilha configura uma verdadeira transacção, que  é, como se sabe,  o contrato pelo qual as partes previnem ou terminam um litígio mediante recíprocas concessões, e que pode envolver, nomeadamente, a extinção de direitos diversos do controvertido (art. 1248.º do CC).
Desta forma, através do referido acordo de partilha, as partes dispuseram da situação jurídica de direito substantivo afirmada em juízo, determinando, assim, o conteúdo dos seus próprios direitos e deveres (cfr., por exemplo, o acórdão da RP de 20.09.2021, in www.dgsi.pt).
Trata-se, pois, de um negócio jurídico privado e, como tal, assenta na autonomia de vontade dos contraentes, visando a criação, modificação ou extinção de direitos e deveres com conteúdo patrimonial.
Os efeitos jurídicos do referido acordo de partilha decorrem, portanto, do encontro de vontades das partes, sendo que a sentença homologatória, sendo embora uma sentença de mérito, limita-se a absorver o conteúdo do negócio jurídico das partes, condenando e absolvendo nos termos exactamente pretendidos e resultantes das concessões recíprocas das partes.
Vê-se, assim, que o juiz nada tem que ver com o conteúdo material do acordo de partilha, limitando-se, para conceder a respectiva homologação, à verificação de determinadas condições que se mostram extrínsecas àquele conteúdo. Daí que, repete-se, o tribunal a quo não tivesse que pronunciar-se, na sentença homologatória, sobre o requerimento da interessada M de 18.12.2022.
De resto, a acta de conferência de interessados que contém o acordo quanto à partilha, na medida em que explana o conteúdo de um acto presidido pelo notário, que a assinou, consubstancia um documento autêntico (arts. 369.º e segs. do CC), pelo que, salvo invocação da respectiva falsidade, mediante o incidente de falsidade (art. 372.º do CC), faz prova plena de todos os factos que nela constam exarados como tendo sido praticados e/ou percepcionados pelo notário que presidiu a essa conferência.
Inexistiam, por isso, quaisquer razões para que o juiz, no momento de proferir a sentença homologatória da partilha, não tivesse em conta o acordo das partes nela exarado, nos exactos termos que constam da acta, cuja falsidade não foi invocada.
De resto, a interessada M não coloca em causa os termos do acordo de partilha tal como constam da acta. O que ela defende é que as declarações negociais que fez e que foram aí exaradas estão inquinadas por erro (que qualifica de erro-obstáculo).
Ora, é certo que nos termos do art. 371.º, n.º 1, do CC, a acta em causa apenas constitui prova plena de que as interessadas estiveram presentes na conferência de interessados e aí fizeram as declarações nela exaradas, não resultando plenamente provada a veracidade e validade dessas declarações.
Importa, no entanto, não esquecer que estamos perante um processo de inventário notarial, pelo que competia à senhora notária a apreciação e decisão do requerimento da interessada M de 18.12.2022 e, nomeadamente, das questões que a mesma suscitou relativas aos vícios da sua vontade.
É o que decorre do art. 2.º do RPI, onde se dispõe que:
«3–Ao notário compete realizar todas as diligências do processo, sem prejuízo dos casos em que os interessados devam ser remetidos para os meios judiciais».
4–Compete ao tribunal de comarca da circunscrição judicial da área do cartório notarial praticar os atos que caibam ao juiz, bem como apreciar os recursos interpostos de decisões do notário».
No caso dos autos, estava-se em face de uma questão que não era relativa à definição dos bens ou dívidas que integram o património a partilhar, pelo que competia à senhora notária, e não ao tribunal a quo, decidir a matéria em litígio (art. 3.º, n.º 2 a contrario do RPI).
De igual modo, o tribunal a quo não podia ter conhecido do recurso interposto em 18.01.2023, quer porque o mesmo foi dirigido, expressamente, ao tribunal da Relação, quer porque, como se concluiu no ponto 4.1. deste acórdão, da decisão da senhora notária de 22.12.2022 apenas era admissível recurso a final, por não se tratar de uma decisão imediatamente impugnável perante o tribunal de Comarca.
Enfim, contrariamente ao propugnado pela recorrente, o tribunal a quo não ignorou, isto é, não omitiu pronúncia sobre o seu requerimento de 18.12.2022 ou sobre o seu recurso de 18.01.2023, uma vez que, quer um, quer outro não lhe foram dirigidos, pelo que se limitou a homologar, como lhe competia (art. 5.º do RIN), o acordo/negócio de partilha, verificando determinadas condições que são extrínsecas ao conteúdo daquele negócio (validade do objecto e qualidade dos intervenientes) e absorvendo o conteúdo do mesmo.
Tal como se refere no acórdão da RP, de 20.09.2021, in www.dgsi.pt, «(…) dependendo é certo a eficácia da transação da prolação da sentença homologatória, constata-se que a função dessa sentença não é a de apreciar/decidir as razões e argumentos das partes sobre a respetiva controvérsia substancial e sim, apenas, diversamente, a de verificar/fiscalizar a regularidade e a validade do acordo, pelo seu objeto e pela qualidade das pessoas que nele intervieram».
A intervenção do juiz é meramente fiscalizadora da legalidade do objecto do acordo de partilha e da qualidade das pessoas que o celebram, não lhe cabendo conhecer do mérito do mesmo, sancionando a solução que as partes encontraram, antes absorvendo a solução que os interessados deram ao litígio, no âmbito da autonomia privada e dentro dos limites da lei.
As questões relativas ao conteúdo ou validade material desse negócio, nomeadamente, a de saber se o mesmo é anulável por vícios da vontade, só poderão, salvo melhor opinião, ser conhecidas em acção própria (art. 291.º, n.º 1 do CPC) ou, quanto muito, em recurso extraordinário de revisão (art. 696.º al. d) do CPC), reunidos que estejam os seus pressupostos legais e contextos temporais.
Neste sentido, decidiu-se no RC de 26.04.2022, in www.dgsi.pt., que «I– Se alguma das partes pretender, no próprio processo em que foi proferida a sentença de homologação da transacção, que esta seja anulada terá de demonstrar que o objecto do litigio não estava na disponibilidade das partes ou não tinha idoneidade negocial ou as pessoas que intervieram na transacção não se apresentavam com capacidade e legitimidade para se ocuparem desse objecto. II–Se a parte pretender dar sem efeito a transacção com base na existência de vícios da vontade ou de vícios no objecto do negócio jurídico em que se traduz a transacção terá de instaurar acção na qual peça a declaração da nulidade ou a anulação desse negócio jurídico» (cfr., no mesmo sentido, o acórdão da RG de 30.11.2022, in www.dgsi.pt).
Conclui-se, pois, que a sentença recorrida não padece de qualquer nulidade por omissão de pronúncia sobre o requerimento da interessada M de 18.12.2022 ou sobre o recurso interposto em 18.01.2023.
4.3.–Prossegue a recorrente, defendendo que a conferência de interessados realizada em 03.11.2022 deve ser anulada e repetida, na medida em que a sua declaração negocial foi efectuada em erro-obstáculo (conclusões c) a q)).
No ponto 4.2. deste acórdão, viu-se já que as questões suscitadas pela recorrente no seu requerimento de 18.12.2022, nomeadamente, a relativa ao erro na sua declaração negocial exteriorizada em conferência de interessados, não foi colocada perante o tribunal recorrido, que sobre ela não se pronunciou na sentença homologatória da partilha, nem tinha que o fazer.
Tal pretensão de “anulação da conferência de interessados” nunca sequer foi formulada perante a senhora notária, sendo certo, ainda, que as questões suscitadas no requerimento de 18.12.2022 se mostram já, definitivamente, decididas (cfr. ponto 4.1. deste acórdão).
Ora, como é consabido, os recursos têm por escopo a reapreciação daquilo que foi decidido, estando vedado ao tribunal de recurso o conhecimento de questões novas, com excepção daquelas que devam ser de conhecimento oficioso.
Tal como salienta Abrantes Geraldes, in Recursos em Processo Civil, Almedina, Coimbra, 7.ª ed., 2022, p. 139, «a natureza do recurso, como meio de impugnação de uma anterior decisão judicial, determina outra importante limitação ao seu objeto decorrente do facto de, em termo gerais, apenas poder incidir sobre questões que tenham sido anteriormente apreciadas, não podendo confrontar-se o tribunal ad quem com questões novas. Na verdade, os recursos constituem mecanismos destinados a reapreciar decisões proferidas, e não a analisar questões novas, salvo quando, nos termos já referidos, estas sejam de conhecimento oficioso e, além disso, o processo contenha os elementos imprescindíveis». E, mais à frente (p. 141), «a assunção desta regra encontra na jurisprudência numerosos exemplos: a) As questões novas não podem ser apreciadas no recurso, quer em homenagem ao princípio da preclusão, quer por desvirtuarem a finalidade dos recursos, pois estes destinam-se a reapreciar questões, e não a decidir questões novas, por tal apreciação equivaler a suprimir um ou mais órgãos de jurisdição. b) os recursos destinam-se à apreciação de questões já antes levantadas e decidias no processo, e não a provocar decisões sobre questões que não foram antes submetidas ao contraditório e decididas pelo tribunal recorrido, a mesmo que se trate de questões de conhecimento oficioso».
A este respeito, o acórdão do STJ de 02.06.2015, in www.dgsi.pt., decidiu que «a questão nova não é susceptível de vir a obter um novo enquadramento jurídico, em sede de recurso, mas antes uma primeira e definitiva abordagem, pelo que, a menos que se reconduza a uma hipótese de conhecimento oficioso, está vedado, até com base no princípio da estabilidade da instância, ao Tribunal Superior a sua apreciação, que não pode conhecer e decidir o que, anteriormente, o não foi, por falta de atempada invocação».
Também o acórdão do STJ de 08.10.2020, in www.dgsi.pt, considerou que «(i)  Os recursos são meios a usar para obter a reapreciação de uma decisão mas não para obter decisões de questões novas, isto é, de questões que não tenham sido suscitadas pelas partes perante o tribunal recorrido. (ii) - As questões novas não podem ser apreciadas, quer em homenagem ao princípio da preclusão, quer por desvirtuarem a finalidade dos recursos: destinam-se a reapreciar questões e não a decidir questões novas, por tal apreciação equivaler a suprir um ou mais graus de jurisdição, prejudicando a parte que ficasse vencida».
A questão relativa à anulação da conferência de interessados, suscitada pela recorrente nas conclusões c) a q) é, portanto, uma questão nova, que não foi abordada na sentença recorrida e que, por isso, está vedado a esta Relação conhecer.
De resto, o fundamento invocado pela recorrente para a anulação dessa conferência reside, em última análise, nos alegados vícios da sua vontade, sendo certo que, tal como se decidiu no acórdão da RG de 30.11.2022, in www.dgsi.pt., «para se poder concluir pela anulabilidade da transação, por erro na declaração indispensável se torna uma discussão processual, com alegação e prova dos factos correspondentes ao invocado vício da vontade, pelo que não constitui este recurso o meio próprio para discutir a anulação da transação nos moldes pretendidos».
A sentença homologatória da partilha, ao concluir pela validade do acordo das partes exarado na acta da conferência de interessados, limitou-se, como se expôs anteriormente, a confirmar os termos e efeitos de um negócio jurídico de direito substantivo praticado no processo, exercendo uma função meramente fiscalizadora da legalidade do objecto desse negócio e da qualidade das pessoas que o celebraram, não lhe cabendo conhecer do mérito do mesmo e, muito menos, dos eventuais vícios da vontade que o inquinem.
O recurso dessa sentença homologatória tem de incidir, necessariamente, sobre um vício da própria sentença e não do acordo celebrado.
No caso dos autos, a recorrente não invoca qualquer vício da própria sentença homologatória (nomeadamente, que a fiscalização feita pelo juiz da regularidade e validade do acordo foi erroneamente realizada, por o objecto do litígio não estar na disponibilidade das partes ou por não possuir idoneidade negocial ou por os interessados intervenientes não se terem apresentado com capacidade e legitimidade requeridas), mas sim um vício da sua vontade no acordo de partilha que celebrou.
Tal vício convoca o regime da anulabilidade dos negócios jurídicos, sendo que o direito potestativo da destruição dos efeitos do acordo de partilha celebrado só pode ser feito através de acção judicial (art 287.º CC), onde a interessada alegará e provará a existência dos pretensos vícios da vontade, e nunca em recurso da sentença homologatória.
Soçobra, pois, a pretensão da recorrente.
4.4.–Finalmente, defende a recorrente que a conferência de interessados realizada em 03.11.2022 é nula e deve ser repetida, já que não fixou o valor dos bens que integram a herança, nem identificou as verbas atribuídas a cada interessado (conclusões r) a y)).
Também aqui, estamos perante uma questão nova, que não foi objecto da sentença recorrida e que foi suscitada, apenas, em sede de recurso.
Está, por conseguinte, vedado o conhecimento da referida questão, valendo neste lugar as considerações e conclusão já expostas no ponto 4.3.
4.5.–Aqui chegados, conclui-se pela total improcedência das conclusões formuladas pela recorrente e, por esta via, do recurso, cujas custas serão por si integralmente suportadas (sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficie) – art. 527.º do CPC.

V–DECISÃO

Pelos fundamentos expostos, acorda-se em:
a)-rejeitar, por inadmissibilidade legal, o recurso autónomo interposto em 18.01.2023 da decisão da notária de 22.12.2022, que negou provimento à pretensão da interessada M (de “cancelamento da adjudicação” na conferência de interessados, com as consequências que referiu) e que determinou o prosseguimento dos autos;
b)-julgar totalmente improcedente a apelação interposta da sentença homologatória da partilha, confirmando-se a mesma.
Custas pela apelante.
Notifique.
*


Lisboa, 11.01.2024

RUI MANUEL PINHEIRO DE OLIVEIRA
ANA PAULA NUNES DUARTE OLIVENÇA
MARILIA DOS REIS LEAL FONTES