PROVA DOCUMENTAL
INDEFERIMENTO
DOCUMENTOS EM PODER DA PARTE CONTRÁRIA OU DE TERCEIRO
Sumário


1. A parte onerada com o ónus de provar os factos alegados (constitutivos do direito da causa de pedir ou da defesa por exceção): deve apresentar a prova nas fases processuais previstas para o efeito; pode requerer a remoção de obstáculo de obtenção de documento ou informação que estão no seu âmbito de acesso pessoal, se alegar e documentar factos que permitam integrar qualquer impossibilidade ou obstáculo sério na obtenção do documento ou informação, nos termos do nº4 do art.7º do CPC (como a omissão ou o atraso de resposta de um banco a pedido de entregar documentos e prestação de informações em relação a conta bancária titulada pela parte).
2. A admissão da requisição de documentos à contraparte ou a terceiro (arts.429º e 432º do CPC) depende da apreciação da sua adequação para provar factos relevantes para a decisão da causa (arts.341º ss do CC e 410º ss do CPC) e não está subtraída à ponderação da proibição de prática de atos inúteis (art.130º do CPC).

Texto Integral


Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

ACÓRDÃO

I. Relatório:
Na presente ação declarativa comum, instaurada por AA e BB contra CC, advogado:
1. Os autores:
1.1. Pediram a condenação do réu a restituir-lhes a quantia de € 11 947,75, acrescida de juros de mora, contados à taxa legal, desde a data em que o réu recebeu cada uma das quantias de € 6 641,60 e de € 5 306,15 até efetivo e integral pagamento, nas custas e demais legal.
1.2. Alegaram como fundamento que o réu, na qualidade de mandatário do pai dos autores (entretanto falecido), recebeu a quantia exequenda destinada ao exequente/seu pai (as quantias de € 6.641,60 e de € 5.306,15), sem que jamais as tenha depois devolvido quer àquele, quer aos aqui autores, não obstante o terem instado para o efeito.
2. O réu apresentou contestação, na qual:
2.1. Impugnou parcialmente os factos, alegando (em relação ao valor de € 6 641, 60, invocado pelos autores como tendo por si retido):
«8º
Pelo que a quantia efectivamente recebida pelo R., em 26/12/1996, foi de 1.352.799$00, equivalente a € 6.747,73 – Doc. nº ....

De tal quantia, com a concordância do mandante, DD, o R. reteve a importância de 100.000$00, a título de provisões por conta das despesas e honorários dos serviços prestados pelo R. no Pº 73-A/94.
10º
E em consequência, emitiu e entregou ao mandante, em 10/03/1997, o cheque do valor diferencial, de 1.252.799$00 (um milhão, duzentos e cinquenta e dois mil, setecentos e noventa e nove escudos).
11º
Cheque com o nº 311, sacado sobre a conta nº ...01, titulada pelo R. junto do balcão de ... do Banco 1....
12º
Título que foi depositado pelo mandante ou eventualmente por ele endossado a outrem, e que foi movimentado a débito da conta do R..
13º
E que, com toda a certeza, o mandante não deixou de registar na contabilidade da sua actividade comercial, enquanto pagamento por conta das dívidas do seu cliente, EE.»

2.2. Nos requerimentos de prova, requereu em A) a produção de prova documental, nos seguintes termos:
«A) – POR DOCUMENTOS

1) – Requer a notificação dos AA., ao abrigo do disposto no artº 429º do CPC, para apresentarem nos autos:
a) – cópia da ficha de conta-corrente relativa a EE como cliente do mandante, DD;
b) – cópia dos balanços e dos balancetes referentes à actividade comercial/ industrial do mandante DD e relativos aos anos de 1996 e 1997;
c) – cópia dos extractos das contas bancárias de depósitos à ordem tituladas pelo mandante DD, referentes ao mês de Março/1997;
para prova dos factos supra alegados nos artigos 10º a 13º.

2) – Requer a notificação do Banco 1..., S.A., com sede na Rua ..., ... ..., ao abrigo do disposto no artº 432º do CPC, para apresentar nos autos:
a) – cópia frente e verso do cheque nº 311, emitido em .../.../1997, sacado sobre a conta nº ...01 (NIB  ...81), titulada pelo R., junto do balcão de ..., no valor de 1.252.799$00 (um milhão, duzentos e cinquenta e dois mil, setecentos e noventa e nove escudos);
b) – cópia do extracto referente aos movimentos a crédito e a débito daquela conta bancária, no mês de Março/1997;
c) – e ainda, para informar nos autos se aquele referido cheque foi debitado na identificada conta bancária e pago através do saldo existente na conta;
para prova dos factos supra alegados nos artigos 10º a 12º.

3) – Requer a notificação do Banco de Portugal, com sede na Rua ..., ..., ... ..., ao abrigo do disposto no artº 432º do CPC, para informar nos autos:
a) – o número de todas as contas bancárias de depósitos à ordem tituladas em Março/1997 pelo mandante DD, titular do NIF ...53, junto de instituições bancárias a operar em Portugal;
para prova dos factos supra alegados no artigo 12º.

4) – Requer desde já, a notificação das instituições bancárias que venham a ser indicadas pelo Banco de Portugal, ao abrigo do disposto no artº 432º do CPC, para juntarem aos autos:
a) – cópia dos extractos das contas bancárias de depósitos à ordem, tituladas pelo mandante DD, referentes ao mês de Março/1997;
para prova dos factos supra alegados no artigo 12º.».
3. Foi proferido despacho saneador, no qual, em relação aos requerimentos de I-2 supra:
«Quanto ao requerimento probatório do réu no ponto A-1, A-3 e A-4, afigura-se bastante para prova do alegado os elementos identificados em A-2, pelo que se indefere o requerido, sem prejuízo de, a posteriori, o Tribunal, oficiosamente, determinar a sua junção, caso entenda necessário em face dos elementos entretanto obtidos ou restante produção de prova.
No que concerne ao ponto A-2, uma vez que tais elementos respeitam diretamente ao réu, pode o mesmo obtê-los junto da instituição bancária.
Pelo que se indefere o requerido, porquanto não se encontra alegada a impossibilidade de obter os mesmos, devendo o réu proceder `sua junção no prazo de 15 dias, sem prejuízo de dar conhecimento ao processo da demora da instituição bancaria na resposta.».

4. O réu interpôs recurso do despacho referido em I-3 supra, no qual apresentou as seguintes conclusões:
«1ª) – Os documentos mencionados nos pontos A-1, A-3 e A-4 da prova documental requerida pelo Recorrente na Contestação são essenciais para demonstrar os factos por si alegados nos artigos 10º a 13º da Contestação, independentemente dos documentos referidos no ponto A-2.
2ª) – Nomeadamente, os documentos identificados no ponto A-1, para mais tratando- se o Constituinte do Recorrente e pai dos AA./Recorridos de um empresário em nome individual, devidamente colectado na competente Repartição de Finanças, com registo contabilístico de tal actividade.
3ª) – Os Recorridos nem sequer alegaram qualquer impossibilidade de forneceram nos autos tal documentação.
4ª) – Mesmo que produzida a prova documental aludida no ponto A-2, os documentos referidos nos pontos A-1, A-3 e A-4 são complementares daqueles, e nesse caso, serão ainda relevantes para fundamentar o pedido de condenação dos AA./Recorridos como litigantes de má-fé.
5ª) – Os documentos identificados no ponto A-2 da Contestação dizem efectivamente, respeito ao R./Recorrente, mas não são documentos que estejam na sua posse; pelo contrário, estão na posse do Banco sacado, proprietário da conta bancária titulada pelo Recorrente.
6ª) – Trata-se portanto, de documentos em poder de terceiro, essenciais para a prova de factos alegados pelo Recorrente e que por isso, independentemente das diligências do Recorrente, devem ser solicitados pelo Tribunal à instituição bancária mencionada.
7ª) – Acresce que a realização de tal diligência probatória por solicitação do Tribunal, sempre colocará o Recorrente a salvo das limitações consignadas nos artigos 423º e 424º do CPC.
8ª) – Finalmente, a solicitação pelo Tribunal de tal prova documental afastará o risco de impossibilidade de junção aos autos de tais documentos pelo Recorrente antes da realização da Audiência de Julgamento, com os inerentes riscos de impossibilidade de demonstração pelo Recorrente dos pertinentes factos alegados, cuja prova documental só pode ser feita com aqueles documentos, detidos pela instituição bancária sacada.
9ª) – Toda a prova documental requerida pelo Recorrente diz respeito a factos necessitados de prova, incumbindo ao Juiz, em cumprimento e observação do princípio do inquisitório, ordenar, como requerido, as diligências necessárias à produção de tal prova documental e essenciais ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio.
10ª) – Foram violados ou mal interpretados os artigos 410º, 411º, 429º, 432º e 436º do CPC.

NESTES TERMOS e nos mais de direito aplicáveis, devem Vas Exas, Meritíssimos Senhores Juízes Desembargadores, julgar a presente Apelação procedente, e em consequência, revogar as doutas decisões recorridas e ordenar a sua substituição por outras que admitam e ordenem a produção de prova documental, tal como requerida pelo Recorrente no final da sua Contestação,
ASSIM se fazendo, como sempre, inteira e merecida JUSTIÇA.».
5. O Tribunal a quo admitiu o recurso de apelação, com subida imediata, em separado e com efeito devolutivo.
6. Este Tribunal da Relação, depois de ter sido proferida decisão sumária a rejeitar o recurso por intempestividade e falta de pagamento da multa, atendeu à reclamação e recebeu o recurso nos termos admitidos na 1ª instância.

II. Questões a decidir:

As conclusões das alegações do recurso delimitam o seu objeto, sem prejuízo da apreciação das questões de conhecimento oficioso não decididas por decisão transitada em julgado e da livre qualificação jurídica dos factos pelo Tribunal, conforme decorre das disposições conjugadas dos artigos 608º/ 2, ex vi do art. 663º/2, 635º/4, 639º/1 e 2, 641º/2- b) e 5º/ 3 do Código de Processo Civil, doravante CPC.
Define-se, como questão a decidir, se deve ser revogado o despacho recorrido e ordenada a requisição dos documentos pedidos em A-1, 2, 3 e 4.

III. Fundamentação:

1. Matéria de facto provada:
Julgam-se provados os atos processuais relatados em I supra, face à força probatória plena dos atos a que se referem, remetidos eletronicamente pelo Citius (art.371º do CC).

2. Apreciação do objeto do recurso:
2.1. Enquadramento geral:
2.1.1. Cabe às partes o ónus de alegar os factos essenciais (art.5º/1 do CPC e art.342º/1 e 2 do Código Civil, doravante CC) em que baseiam as suas pretensões (arts.552º/1-d) e 583º/1 do CPC) e a sua defesa por exceção (arts.572º/c) e 584º do CPC), factos estes que podem ser complementados ainda: na fase de articulados (arts.588º, 589º e 611º CPC); na fase de pré- saneamento, com os limites do art.265º do CPC, ex vi do 590º/6 do CPC (art.590º/2-b), 4, 6 do CPC); na audiência prévia (arts.3º/4 e 591º/1-c) CPC) ou em julgamento (art.5º/2-b) do CPC).
O Tribunal, por sua vez, deve ter em consideração os factos alegados pelas partes e, ainda, os factos instrumentais, complementares, concretizadores decorrentes da instrução ou notórios de que possa ter conhecimento (art.5º/1 e 2-a), b) e c) do PC), de acordo com a narrativa das partes e com a captação real e histórica dos mesmos, que sejam aptos a preencher facti species das normas, de acordo com todas as soluções plausíveis das questões de direito suscitadas.
2.1.2. As provas têm por função a demonstração da realidade dos factos (art.341º do CC), através dos meios e do regime legal material e processual aplicável (arts.341º a 396º do CC; 410º a 526º do CPC).
Estes factos a demonstrar pela prova, salvo aqueles que o Tribunal pode considerar oficiosamente (arts.5º/2 e 411º do CPC) ou que não carecem de alegação e prova (art.412º do CPC), correspondem àqueles que foram oportunamente alegados pela parte a quem os mesmos aproveitam, nos termos já referidos em III-2.1.1. supra.
E, assim, o ónus de prova é repartido pelas partes em consonância com o seu prévio ónus de alegação, cabendo: aos autores e reconvintes o ónus de provar os factos constitutivos do direito de que se arrogaram (art.342º/1 do CC); aos réus e reconvindos o ónus de provar todos os factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito contra si invocado, integrativos das exceções (art.342º/2 do CC).
As provas e os requerimentos de prova: devem ser apresentados com os articulados nos quais a parte alegue os factos de que lhe cabe produzir prova (petição inicial para o autor- art.552º/2 do CPC; contestação para o réu- art. 572º/d) do CPC), nomeadamente a prova documental (art.423º/1 do CPC); podem ser alterados nos termos e prazos previstos por lei, finda a fase dos articulados e antes da audiência (na audiência prévia ou 10 dias após o despacho de dispensa da mesma- arts.591º e 593º/3, ex vi do art.598º do CPC; até 20 dias antes da audiência quanto à prova testemunhal e quanto à prova documental, sujeita a multa- arts.598º/2 do CPC e 423º/2 do CPC); são apreciados na audiência prévia ou no despacho que a dispensar (art.591º/1-g) ou 593º/2-d) do CPC) ou, após, quando forem apresentados requerimentos de aditamento ou de alteração, depois de definido previamente o objeto do litígio e enunciados os temas de prova, face aos factos concretos alegados (art.596º do CPC).
Apesar destes ónus de cada uma das partes e das regras de tramitação, a lei prevê algumas possibilidades de operar o princípio da cooperação do art.7º do CPC para a produção de prova, que, no seu nº4, prevê «4 - Sempre que alguma das partes alegue justificadamente dificuldade séria em obter documento ou informação que condicione o eficaz exercício de faculdade ou o cumprimento de ónus ou dever processual, deve o juiz, sempre que possível, providenciar pela remoção do obstáculo».
Em particular, no que se refere à prova documental, o legislador no Título V respeitante à «Instrução do processo» e no Capítulo II respeitante à «Prova por documentos» consagra:
__ Uma possibilidade de admissão da cooperação da contraparte para a produção da prova, no art.429º do CPC, sob a epígrafe «Documentos em poder da parte contrária», sujeita às seguintes exigências: «1 - Quando se pretenda fazer uso de documento em poder da parte contrária, o interessado requer que ela seja notificada para apresentar o documento dentro do prazo que for designado; no requerimento, a parte identifica quanto possível o documento e especifica os factos que com ele quer provar. 2 - Se os factos que a parte pretende provar tiverem interesse para a decisão da causa, é ordenada a notificação.».
__ Outra possibilidade de admissão da cooperação de terceiro para a produção da prova, no art.432º do CPC, sob a epígrafe «Documentos em poder de terceiro», sujeita às seguintes exigências: «Se o documento estiver em poder de terceiro, a parte requer que o possuidor seja notificado para o entregar na secretaria, dentro do prazo que for fixado, sendo aplicável a este caso o disposto no artigo 429.º.».
A apreciação conjugada destas normas permite concluir que a parte onerada com o ónus de produção de prova: se tiver dificuldade séria em obter documento que condicione o eficaz cumprimento do seu ónus de prova, deve justificar essa dificuldade (art.7º/4 do CPC); se o documento estiver na posse da contraparte ou de terceiro, deve indicar os factos alegados cuja prova pretende produzir através da junção do documento na posse da parte contrária, identificar o documento e especificar os factos concretos que pretende provar com o mesmo, caso em que o tribunal, face a estes pressupostos, apreciará o pedido de notificação, aferindo se os factos indicados são relevantes para a decisão da causa.

2.1.3. Em qualquer caso, na tramitação do processo, ao abrigo do Princípio da limitação dos atos, «Não é lícito realizar no processo atos inúteis» (art.130º do CPC).
De facto, e como referem António Santos Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, in Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, 2ª Edição, 2021, Almedina, anotação ao art.130º, pág.161, «O Direito adjetivo não constitui um fim em si mesmo, sendo um mero instrumento para a resolução de litígios de acordo com o que emergir do direito material. Daí que no processo em que o litígio se dirime apenas devam ser praticados os atos que se revelem úteis para alcançar aquele desiderato, de forma simples e ágil, como o impõe o art.6º.».
Este princípio pode condicionar, também, a amplitude de prova documental a admitir para demonstração de factos alegados.

2.2. Apreciação do recurso em análise:
2.2.1. Quanto ao deferimento parcial da prova de A2 (2ª parte do despacho transcrito em I-3 supra, em referência a I-2 supra):
Examinando o requerimento de I-2 supra em relação a A2 e o despacho de I-3 supra, em confronto com o regime legal aplicável, verifica-se que os fundamentos do recurso não permitem reconhecer ao despacho qualquer erro de direito.
De facto: cabe ao réu o ónus de provar os factos integrativos da restituição ao mandante da quantia recebida como mandatário, a que se referem os factos 10º a 12º por si alegados (art.342º/2 do CC); os documentos e as informações pedidas em A- 2) pelo réu para prova dos referidos factos (referidas em I-2 supra), respeitam, na própria posição do réu, a conta bancária por si titulada, em relação à qual este tem natural direito contratual de acesso; o réu não alegou e documentou factos que permitam integrar qualquer impossibilidade ou obstáculo sério no cumprimento do seu ónus de prova (nomeadamente por falta de resposta ou atraso do banco), para justificar a ação do tribunal nos termos do nº4 do art.7º do CPC; o despacho não impediu a possibilidade de vir a acionar o pedido de auxílio do art.7º/4 do CPC, caso a impossibilidade ou o sério obstáculo venham a ocorrer, no âmbito das diligências que fizer junto do banco para obter os documentos e as informações em causa.
A pretensão de deferimento da sua pretensão para o acautelar de efeitos dos prazos, sanções ou preclusões dos arts.423º e 424º do CPC, é totalmente impertinente: quer em abstrato, para afastar o seu ónus de prova e as suas onerações; quer em concreto, uma vez que o seu requerimento de prova foi apresentado na contestação à ação e foi objeto de despacho que, não deferindo um dos efeitos, o convidou a juntar documentos e informações pedidas, sem qualquer sanção.
Desta forma, indefere-se o recurso neste segmento.

2.2.2. Quanto ao indeferimento da prova de A1, A3 e A4 (1ª parte do despacho transcrito em I-3 supra, em referência aos pedidos de I-2 supra):
Examinando os requerimentos de I-2 supra em relação a A1, A3 e A4 e o despacho de I-3 supra, em confronto com o regime legal aplicável, verifica-se que os fundamentos do recurso permitem apenas reconhecer razão parcial ao mesmo.
Por um lado, examinando os factos que o réu/recorrente declarou pretender provar (10º a 13º com o requerimento A-1 e 12º quanto aos requerimentos A3 e 4), verifica-se: que os factos alegados nos arts.10º a 12º da sua contestação, respeitantes à entrega do cheque pelo réu mandatário ao mandante falecido e o seu depósito ou endosso por este (referidos em III- 2.1.) são relevantes para a sua defesa de exceção; que o facto alegado no art.13º , relativo ao possível registo do cheque na contabilidade, para além de ser um facto hipotético, não corresponde a qualquer facto essencial integrativo da defesa por exceção mas a indicação de um meio de prova possível para apurar os referidos factos essenciais, a que se referem os arts.10º a 12º da contestação.
Por outro lado, verifica-se: que os elementos de prova admitidos em A2 são aptos, em abstrato, a poder decidir sobre a prova dos factos 10º e 11º, sem necessidade de apreciação da necessidade de prova complementar após a análise do resultado dos mesmos; que a apreciação da necessidade de requisitar outros elementos de prova e/ou da amplitude concreta dos mesmos para provar os factos alegados no art.12º da contestação- se o cheque foi depositado pelo mandante (em que conta concreta? titulada por quem?) ou se foi endossado por este a terceiro (e quem?)- carece da prévia análise da resposta à prova documental admitida em A2 (da análise do cheque na sua frente e verso, da análise dos registos do extrato bancário de onde este foi debitado e as informações do banco), quer ao abrigo da adequação da prova aos factos a provar, nos termos do art.429º/2, por si e ex vi do art.432º do CC, quer ao abrigo da proibição de prática de atos inúteis (art.130º do CPC).
Desta forma, admite-se apenas que o despacho recorrido, em vez de indeferir os requerimentos de prova (e apesar de ter salvaguardado a possibilidade de requisição oficiosa posterior), deveria ter relegado a sua apreciação concreta para depois da apreciação da prova referida em A2, quando a mesma for junta aos autos.

IV. Decisão:  

Pelo exposto, as Juízes da 1ª Secção Cível deste Tribunal da Relação de Guimarães, julgando parcialmente procedente e improcedente o recurso, determinam a alteração da 1ª parte do despacho transcrito em I-3 supra, em relação aos requerimentos de prova de A1, A3 e A4, de forma que neste conste o seguinte:
«Relega-se a apreciação dos requerimentos de prova documental formulados em A1, A3 e A4 para depois da junção da prova requerida em A2, para apreciar: se é necessário prova complementar para prova dos factos 10º e 11º; se é necessário requisitar outros elementos de prova e quais para provar os factos alegados no art.12º da contestação- se o cheque foi depositado pelo mandante (em que conta concreta? titulada por quem?) ou se foi endossado por este a terceiro (e quem?).»

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Custas do recurso pelo recorrente, face ao decaimento e ao proveito no que não decaiu (arts.527º e 530º do CPC).
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Guimarães, 18.01.2024
Assinado eletronicamente pelas Juízes Relatora, 1ª Adjunta e 2ª Adjunta

Alexandra M. Viana P. Lopes
Rosália Cunha
Lígia Venade