I - Os titulares dos direitos de propriedade intelectual podem propor a acção especial prevista no art. 3º da Lei nº62/2011, de 12 de dezembro, na redação do Decreto Lei nº 110/2018 de 10 de Setembro, em face da publicitação de um simples pedido de autorização de introdução no mercado.
II - O art. 3º da Lei nº 62/2011, determina uma derrogação das regras gerais sobre o interesse em agir;
III – O réu na acção prevista no art. 3º da Lei nº 62/2011, pode, em reconvenção, pedir a declaração da nulidade da patente.
1ª. Bristol-Myers Squibb Holdings Ireland Unlimited Company,
2ª. Swords Laboratories, (adiante também designada ‘2ª A.’ ou ‘Swords’),
3ª. Bristol-Myers Squibb Farmacêutica Portuguesa, S.A., (adiante também designada ‘BMSFP’), e
4ª. Pfizer Inc., (adiante também designada ‘Pfizer’)
Rés:
1ª. Stada Arzneimittel AG, (adiante também designada ‘Stada’), e
2ª. Ciclum Farma Unipessoal, Lda., (adiante também designada “Ciclum Farma’),
As autoras intentaram a presente acção pedindo que sejam as RR. condenadas a:
a) absterem-se, no território português ou com vista à comercialização nesse território, de explorar (por si próprias e/ou permitindo que terceiros o façam ao abrigo das AIMs identificadas no artigo 79, após serem concedidas) a invenção protegida pela EP ‘811, EP ‘660, EP ‘500 e EP ‘021 e, nomeadamente, de importar, fabricar, comercializar, armazenar, utilizar, colocar no comércio, vender e/ou oferecer, os Genéricos Apixaban identificados no artigo 79 da Petição Inicial, enquanto a EP ‘811, EP ‘660, EP ‘500 e a EP ‘021 estiverem em vigor;
b) absterem-se, no território português ou com vista à comercialização nesse território, de explorar (por si próprias e/ou permitindo que terceiros o façam ao abrigo das AIMs que caiam dentro do âmbito de protecção da patente) a invenção protegida pela EP ‘811 e, nomeadamente, de importar, fabricar, comercializar, armazenar, utilizar, colocar no mercado, vender e/ou oferecer quaisquer comprimidos que compreendam até 5 mg de apixaban e um diluente ou veículo farmaceuticamente aceitável, em que o comprimido é obtenível através de um processo que compreende as etapas de:
(1)p. Nº misturar as matérias-primas compreendendo partículas de apixaban cristalinas antes da granulação; (2) granular as matérias-primas da etapa (1) usando um processo de granulação em seco, em que as partículas de de apixaban cristalinas têm um D90 inferior a 89 μm como medido por dispersão de luz laser; (3) misturar os grânulos obtidos na etapa (2) com matérias-primas extragranulares; (4) comprimir a mistura da etapa (3) num comprimido; e (5) revestir com filme o comprimido da etapa (4), enquanto a EP ‘811 estiver em vigor;
c) absterem-se, no território português ou com vista à comercialização nesse território, de explorar (por si próprias e/ou permitindo que terceiros o façam ao abrigo das AIMs que caiam dentro do âmbito da patente) a invenção protegida pela EP ‘660 e, nomeadamente, de importar, fabricar, comercializar, armazenar, utilizar, colocar no mercado, vender e/ou oferecer qualquer comprimido que compreenda uma composição que compreende até 5 mg de partículas de apixaban cristalinas tendo um D90 inferior a 50 μm como medido por dispersão de luz e que compreende adicionalmente um diluente ou veículo farmaceuticamente aceitável em que a composição é preparada utilizando um processo de granulação em seco, enquanto a EP ‘660 estiver em vigor;
d) absterem-se, no território português ou com vista à comercialização nesse território, de explorar (por si próprias e/ou permitindo que terceiros o façam ao abrigo das AIMs que caiam dentro do âmbito da patente) a invenção protegida pela EP ‘500 e, nomeadamente, de importar, fabricar, comercializar, armazenar, utilizar, colocar no mercado, vender e/ou oferecer qualquer composição para comprimidos o que compreenda partículas cristalinas de apixaban tendo um tamanho médio das partículas inferior a 89 μm e um D90 inferior a 89 μm conforme medido por dispersão de luz laser, em que a composição compreende até 5 mg de apixaban, um diluente ou veículo farmaceuticamente aceitável e um tensioativo, em que o tensioativo está presente numa concentração de 0,25% a 2% em peso e serve como um auxiliar de humedecimento para a substância farmacológica apixaban, em que a composição é obtenível através de um processo que compreende um processo de moagem por jato de ar para reduzir o tamanho das partículas de apixaban até ao tamanho desejado e granulação em seco, enquanto a EP ‘500 estiver em vigor;
e) absterem-se, no território português ou com vista à comercialização nesse território, de explorar (por si próprias e/ou permitindo que terceiros o façam ao abrigo das AIMs que caiam dentro do âmbito da patente) a invenção protegida pela EP ‘021 e, nomeadamente, de importar, fabricar, comercializar, armazenar, utilizar, colocar no mercado, vender e/ou oferecer qualquer comprimido o que compreenda até 5 mg de partículas cristalinas de apixaban tendo um D90 inferior a 89 μm medido por dispersão de luz laser e um diluente ou veículo farmaceuticamente aceitável, em que a formulação exibe propriedades de dissolução tais que uma quantidade do fármaco equivalente a pelo menos 77% é dissolvida no espaço de 30 minutos, em que o ensaio de dissolução é realizado num meio aquoso tamponado numa gama de pH 1 a 7.4 e controlado a 37º C, enquanto a EP ‘021 estiver em vigor;
f) pagar uma sanção pecuniária compulsória de valor não inferior a 60.000, € (sessenta mil euros) por cada dia de atraso no cumprimento da condenação que vier a ser proferida.
Para tanto alegam, em síntese, que a 1ª e 4ª AA., BMSHI e Pfizer, são co-titulares das patentes europeias nº 3017811 (adiante ‘EP 811’) validada em Portugal em 4.03.2019 (doc. 2, a fls. 77v-95), nº 3251660 (adiante ‘EP 660’) validada em Portugal em 19.11.2019 (doc. 3, a fls. 97-137v) e nº 3257500 (adiante ‘EP 500’) validada em Portugal em 18.11.2019 (doc. 4 a fls. 139-181) e nº 3246021 (adiante ‘EP 021’) validada em Portugal em 11.02.2020 (doc. 5 a fls. 181v-213v), todas referentes a ‘Formulações de apixaban’, todas resultantes de pedidos divisionários da patente europeia nº 2538925 (‘EP 925’) apresentados junto do Instituto de Patentes Europeu (EPO) em 24.02.2011, com prioridade reportada à do pedido de patente US 308056 P (25.02.2010), e que se manterão em vigor até 24.02.2031.
A patente EP 811 protege, inter alia, um comprimido que compreende até 5 mg de apixabano e um diluente ou veículo farmaceuticamente aceitável, em que o comprimido é obtenível de um processo que compreende as etapas de: (1) misturar as matérias-primas compreendendo partículas de apixaban cristalinas antes da granulação; (2) granular as matérias-primas da etapa (1) usando um processo de granulação em seco, em que as partículas de de apixaban cristalinas têm um D90 inferior a 89 μm como medido por dispersão de luz laser; (3) misturar os grânulos obtidos na etapa (2) com matérias-primas extragranulares; (4) comprimir a mistura da etapa (3) num comprimido; e (5) revestir com filme o comprimido da etapa (4).
A patente EP 660 protege, inter alia, um comprimido que compreenda uma composição que compreende até 5 mg de partículas de apixaban cristalinas tendo um D90 inferior a 50 μm como medido por dispersão de luz e que compreende adicionalmente um diluente ou veículo farmaceuticamente aceitável em que a composição é preparada utilizando um processo de granulação em seco.
A patente EP 500 protege, inter alia, uma composição para comprimidos o que compreenda partículas cristalinas de apixaban tendo um tamanho médio das partículas inferior a 89 μm e um D90 inferior a 89 μm conforme medido por dispersão de luz laser, em que a composição compreende até 5 mg de apixaban, um diluente ou veículo farmaceuticamente aceitável e um tensioativo, em que o tensioativo está presente numa concentração de 0,25% a 2% em peso e serve como um auxiliar de humedecimento para a substância farmacológica apixaban, em que a composição é obtenível através de um processo que compreende um processo de moagem por jato de ar para reduzir o tamanho das partículas de apixaban até ao tamanho desejado e granulação em seco.
A patente EP 021 protege, inter alia, um comprimido o que compreenda até 5 mg de partículas cristalinas de apixaban tendo um D90 inferior a 89 μm medido por dispersão de luz laser e um diluente ou veículo farmaceuticamente aceitável, em que a formulação exibe propriedades de dissolução tais que uma quantidade do fármaco equivalente a pelo menos 77% é dissolvida no espaço de 30 minutos, em que o ensaio de dissolução é realizado num meio aquoso tamponado numa gama de pH 1 a 7.4 e controlado a 37º C.
As referidas patentes protegem assim formulações de medicamentos compreendendo a substância activa apixabano, que é a única substância activa do medicamento Eliquis®, desenvolvido em colaboração entre a Brystol-Myers Squibb e a Pfizer Inc. e indicado para as seguintes terapias cfr. cópia do correspondente Resumo das Características do Medicamento (RCM) – doc. 1, fls. 32-77:
- prevenção de acontecimentos tromboembólicos venosos (TEV) em doentes adultos que foram submetidos a artroplastia electiva da anca ou joelho;
- prevenção de acidente vascular cerebral e embolismo sistémico em doentes adultos com fibrilação auricular não valvular com um ou mais factores de risco tais como acidente vascular cerebral ou acidente isquémico transitório prévios; idade ≥ 75 anos; hipertensão; diabetes mellitus; insuficiência cardíaco sintomática (Classe NYHA ≥ II);
- tratamento de trombose venosa profunda (TVP) e embolia pulmonar (EP), e prevenção de TVP recorrente em adultos (para doentes com EP hemodinamicamente instáveis ver secção 4.4).
De acordo com a lista publicada na página electrónica oficial do Infarmed, a 1ª Ré Stada Arzneimittel A.G. requereu em 31.10.2019 as autorizações de introdução no mercado (AIMs) nº 650624 e nº 650747, publicadas em 8.01.2020, para medicamentos genéricos contendo a substância activa ‘Apixaban’ nas dosagens 2,5mg e 5 mg, respectivamente, em forma de ‘comprimidos revestidos por película’ (adiante também designados ‘genéricos apixaban’), cujo medicamento de referência é aí identificado como ‘Eliquis’, cfr. certidões emitidas pelo INFARMED juntas como docs. 7 e 8 a fls. 221v-222v dos autos, que se dão por reproduzidos.
Decorre das ditas certidões juntas que a 2ª R. Ciclum Farma Unipessoal, Lda. é a futura titular proposta da AIM dos genéricos apixaban, assim que esta for concedida.
Enquanto bioequivalentes ao correspondente medicamento de referência Eliquis® indicados para serem tomados por via oral duas vezes ao dia para prevenção e tratamento de distúrbios tromboembólicos, os genéricos apixaban estão abrangidos no âmbito de protecção das patentes EP 811, EP 660, EP 500 e EP 021.
A exploração da invenção protegida pelas patentes EPs 811, 660, 500 e 021 e, nomeadamente, o fabrico, a oferta, a venda, a armazenagem, a colocação no mercado, a utilização, importação ou posse, no território português, dos genéricos apixabano constituirá uma violação dos direitos da BMS decorrentes das patentes EP 811, EP 660, EP 500 e EP 021.
As RR. não solicitaram nem obtiveram nem requereram o consentimento das AA. para explorar a invenção protegida pelas patentes EP 811, EP 660, EP 500 e EP 021, pelo que violarão claramente o direito exclusivo das AA. decorrente das ditas patentes.
Regularmente citadas, as RR. contestaram, alegando designadamente falta de interesse em agir por parte das AA. e pedindo a consequente absolvição da instância, impugnando a invocada violação de patentes das AA., pedindo a suspensão da instância enquanto pendem os procedimentos de oposição apresentados junto do Instituto Europeu de Patentes (EPO) contra as patentes EP 811, EP 660, EP 500 e EP 021, e pedindo ainda, em reconvenção, a revogação das referidas patentes com efeitos no território português.
As AA. replicaram, pronunciando-se pelo indeferimento da requerida suspensão da instância e improcedência da excepcionada falta de interesse em agir e da reconvenção.
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Findos os articulados, foi proferido despacho que não admitiu o pedido reconvencional, por legalmente inadmissível;
E foi proferida sentença que julgou procedente a excepção de falta de interesse em agir deduzida pelas Rés que, em consequência, foram absolvidas da instância.
Inconformadas, ambas as partes interpuseram recurso de apelação: as AA da sentença que absolveu as RR da instância; estas da não admissão do pedido reconvencional.
Por acórdão da Relação de Lisboa de 09.11.2022, foram ambos os recursos julgados improcedentes, embora com um votos de vencido: o 1º Adjunto votou vencido quando à falta de interessem agir, que em seu juízo, se verifica; o 2º Adjunto quanto à inadmissibilidade do pedido reconvencional.
Ainda inconformadas, AA e RR interpuseram recursos de revista.
As Autoras rematam a sua alegação com as seguintes conclusões:
A. O presente recurso vem interposto do Acórdão do Tribunal da Relação
de Lisboa de 9 de novembro de 2022, na parte em que manteve a Sentença de 3 de março
de 2022, que absolveu as Rés (ora Recorridas) da instância por verificação da exceção
inominada de falta de interesse em agir por parte das Autoras (ora Recorrentes).
B. Admissibilidade do recurso: não existe dupla conforme neste caso porque o Acórdão Recorrido conta com um voto de vencido do Venerando Juiz Desembargador Sérgio
Rebelo na parte que ora se recorre, tendo este entendido que os titulares do direito de
propriedade industrial têm interesse em agir ao propor a ação prevista na Lei 62/2011
após a publicação de pedido de AIM, acolhendo a jurisprudência uniforme deste STJ,
devendo o recurso ser admitido ao abrigo do artigo 671.º, n.º 1 do CPC, por não se
verificar a situação do seu n.º 3.
C. Do mérito do recurso – A JURISPRUDÊNCIA UNIFORME DESTE SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: tal como tem sido reiteradamente decidido por este Alto Tribunal, os titulares dos direitos de propriedade intelectual podem propor a ação prevista na Lei 62/2011 em face da publicação de um simples pedido de autorização de introdução no mercado (cf. Acórdãos proferidos no âmbito dos processos n.os 219/19.0YHLSB.L1.S1, 225/20.2YHLSB.S1, 115/20.9YHLSB.L1.S1, 40/20.3YHLSB.L1.S1 e 358/20.5YHLSB.L1.S1).
D. Finalidades da Lei 62/2011: A Lei 62/2011 tem duas finalidades primordiais (i) pôr termo à consagração prática do chamado patent linkage pelos tribunais administrativos e (ii) criar
uma ação preventiva precoce, tendente a prevenir a infração de patentes farmacêuticas
por medicamentos genéricos
E. Esta ação visa, assegurar, em tempo anterior à sua lesão, a efetividade dos direitos de propriedade industrial (no caso, das Recorrentes), tutelando adequada e oportunamente o jus prohibendi dele resultante e obtendo, desse modo, a realização de garantia constitucional da tutela jurisdicional efetiva – neste caso, preventiva.
F. A importância da tutela preventiva: A tutela preventiva é crucial para defesa dos direitos de propriedade industrial, considerando a natureza temporária dos mesmos. Como
reconheceu por exemplo o STJ já em 2010, o prejuízo decorrente da entrada prematura e
ilegal de um medicamento genérico num mercado exclusivo poderá nunca vir a ser
devidamente ressarcido.
G. Importa recordar que o artigo 20.º, n.º 5, da CRP é perentório e absolutamente definitivo a estabelecer o direito fundamental à tutela jurisdicional preventiva efetiva, para defesa de ameaças de violação, o que foi reconhecido também no artigo 2.º, n.º 2 do CPC. Isto
significa que as ações judiciais declarativas tanto podem servir para prevenir a violação
de um direito como para realizá-lo coativamente ou para reparar a sua violação quando
cometida.
H. Os erros dos fundamentos do Acórdão recorrido – A configuração a ação prevista na lei 62/2011: A tutela cautelar exige a iminência da violação, contrariamente ao que sucede na ação preventiva da Lei 62/2011, pelo que não se podem, de modo algum confundir, servindo desideratos distintos, sendo habitualmente tarde de mais reagir contra a iminência de violação ou contra a violação efetiva, correndo o sério risco de se afetar, irremediável e permanentemente, os direitos de propriedade industrial – temporários – dos titulares de patentes farmacêuticas.
I. Uma interpretação como a que o Acórdão Recorrido pretende levar a cabo – de que os princípios constitucionais de garantia do acesso ao direito e aos tribunais estaria verificado, na sua tutela preventiva, através das providências cautelares – não só é legalmente infundada, como inconstitucional.
J. O RISCO DE VIOLAÇÃO DO DIREITO DE PATENTE: As Autoras Recorrentes alegaram (e provaram) na sua Petição Inicial, em concreto, no artigo 79 e documentos 7 e 8 aí juntos, a existência de pedidos de AIM formulados pelas Rés Recorridas, o que bastaria para lançar mão da ação prevista na Lei 62/2011 e sempre constituiria risco de ocorrência de violação dos direitos invocados.
K. Por um lado, o interesse em agir dos titulares de direitos de propriedade industrial decorre da própria Lei 62/2011, que arvora o pedido de AIM de um medicamento genérico abrangido pela proteção patentária em (único) facto motivador e legitimador da iniciativa propositiva da ação.
L. Numa outra perspetiva, afigura-se claro que os factos alegados pelas Autoras Recorrentes e que resultam dos presentes autos – só por si –, provocariam, a qualquer observador médio colocado na posição das Autoras Recorrentes, um justificado juízo de previsão ou, pelo menos, de forte probabilidade de que os direitos invocados viessem a ser violados justificando-se assim, o óbvio interesse em agir das Recorrentes, nos termos gerais do disposto no artigo 10.º do CPC (cfr. Decisão Singular de 22.03.2022, no âmbito do processo n.º 130/21.5YHLSB.L1).
M. É incabível o argumento do Tribunal a quo segundo o qual a AIM é um risco tão potencial de violação dos direitos exercidos nestes autos como qualquer outro, uma vez que, como o próprio nome indica, um pedido de AIM (Autorização de Introdução no Mercado) permite o lançamento do medicamento em causa no mercado.
N. Além da sua natureza permissiva, a AIM tem também uma eficácia de natureza impositiva ou injuntiva, visto que da sua concessão decorre para o destinatário a obrigação de comercialização efetiva do medicamento que é objeto imediato desse ato administrativo (artigo 29.º, n.º 1, alínea a) do Estatuto do Medicamento).
O. É, pois, evidente que o risco que advém da apresentação de um pedido de uma AIM não pode ser considerado tão potencial como qualquer outro risco – tendo sido de resto, por isso, que a Lei 62/2011 estabeleceu este ato e não outro como desencadeando a ação que regula (neste sentido, cf. jurisprudência deste Tribunal da Relação de Lisboa, por exemplo Processos n.os346/20.1YHLSB.L1 e 314/19.6YHLSB.L1).
P. A NECESSIDADE/UTILIDADE DE OBTENÇÃO DE UMA DECISÃO CONDENATÓRIA: A posição tomada no Acórdão Recorrido que os pedidos de condenação formulados na Petição Inicial não possuiriam a suscetibilidade de conferir maior proteção ao direito do que a resulta da própria patente ignora que, no direito português, a possibilidade de recurso à ação direta existe apenas em casos extremos, quando o recurso às vias coercivas normais – leia-se a via judicial – for impraticável (cf. artigo 336.º do Código Civil).
Q. Ademais, o artigo 102.º do CPI limita-se a definir o conteúdo substantivo dos direitos de exclusivo derivados da patente, ao passo que a Lei 62/2011 estabelece os contornos da ação especial por ela criada e, nomeadamente, estipula quais os requisitos circunstanciais para exercício jurisdicional daquele direito.
R. O facto de um direito estar previsto na lei substantiva é precisamente a premissa básica e necessária para que o seu titular possa intentar uma ação judicial, como aconteceu no presente caso, com vista a que o mesmo seja reconhecido e protegido através de uma decisão judicial, que é precisamente o que as Recorrentes pretendem obter.
S. A Lei 62/2011 não leva a contencioso inútil, antes, como se nota, tem vindo a, sem necessidade da criação de qualquer sistema legal de conciliação prévia, incentivar as empresas originadoras e as empresas de genéricos a, antes de se lançarem na via contenciosa (arbitral ou judicial), envidar esforços de composição amigável, esforços esses que deram origem a largas centenas de transações extrajudiciais, excedendo em muito o número de ações propostas nos tribunais.
Ao ter absolvido as Rés Recorridas da instância por alegada falta de interesse em agir das Autoras Recorrentes, o Acórdão Recorrido violou o disposto nos artigos 2 e 3.e, n.e 1 da Lei 62/2011 e ainda o disposto no artigo 102.S do CPI, no artigo 203.2, n.e 1 da Constituição da República Portuguesa, no artigo 4.2, n.e 1 da Lei n.s 62/2013, de 26 de agosto e no artigo 8.9, n.e 2 do Código Civil.
Nestes termos, (…) deve o presente recurso de revista ser julgado procedente e, em consequência, deve o Acórdão Recorrido ser revogado e substituído por outro que, sem os vícios de Direito nesta sede alegados, julgue verificado o interesse em agir das Autoras Recorrentes e ordene o prosseguimento dos autos.
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Conclusões do recurso de revista interposto pelas Rés:
a) Na decisão recorrida concluiu-se que nos termos do regime previsto na Lei n.º 62/2011, as Rés estão impedidas de se defender mediante pedido reconvencional, em particular porque “conhece apenas dois articulados – petição e contestação”.
b. Esta decisão contradiz o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa proferido no dia 18/05/2022, no processo n.º 119/21.4YHLSB.L1-PICRS (Documento 1), pelo que estão preenchidos os requisitos previstos no artigo 671º, n.º 2 al. a) e 629º, n.º 1 d) do CPC.
c. A questão que importa apreciar no presente recurso é a seguinte: As regras previstas na Lei n.º 62/2011 impedem a Ré de deduzir um pedido reconvencional?
d. Até à presente data, não foi proferida acórdão uniformizador de jurisprudência sobre a matéria de direito, pelo que é essencial que, por via da interpretação jurisprudencial, os aplicadores do Direito sejam guiados no sentido em que devam ser interpretadas aquelas normas.
e. Estão presentemente pendentes dezenas de processos que foram intentados ao abrigo da Lei n.º 62/2011 e nos quais foram deduzidos pedidos reconvencionais. Consequentemente, a interpretação da lei relativamente às questões acima referenciadas assume uma superior relevância para garantir a aplicação correcta da lei.
f. A interpretação adoptada pelo Tribunal da Relação não está de acordo com a redação e espírito previsto no artigo 3º da Lei n.º 62/2011, artigo 29º, n.º 1, al. d) do CPI e artigos 3º, 4º, 411º, 413º e 573º (a contrario) do CCP.
g. A interpretação adoptada pelo Tribunal da Relação constitui uma violação do princípio a uma defesa condigna do Réu, constitucionalmente previsto no artigo 20º do CRP.
h. A rejeição em termos gerais de recusar apreciar um pedido reconvencional levaria à situação inaceitável do Réu ser automaticamente condenado sem qualquer defesa, com base na violação de patentes nulas e ineficazes, quando os seus argumentos de defesa residem apenas na invalidade dessas mesmas patentes.
i. Ao criar a Lei n.º 62/2011, o legislador não quis reduzir ou denegar os meios de defesa das empresas de medicamentos genéricos, e impossibilitar a entrada no mercado dos medicamentos genéricos cuja defesa assente na invalidade dos direitos de propriedade industrial.
j. Não existe qualquer referência na Lei n.º 62/2011 a uma proibição de dedução de pedidos reconvencionais.
k. O artigo3º da Lei n.º 62/2011 prevê nonúmero1desse artigoo prazopara a propositura da ação e no número 2 os efeitos (específicos) da falta de contestação.
l. A única norma da Lei n.º 62/2011 referente à tramitação processual é o n.º 4 do artigo 3º, que se refere, expressa e exclusivamente, aos processos arbitrais.
m. A jurisprudência tem vindo a afirmar que a natureza especial de um processo não é impeditiva da dedução de um pedido reconvencional, indicando-se a título de exemplo os acórdãos proferidos no processo n.º 77375/19.8YIPRT-A.L1-7 e no processo n.º 58534/18.0YIPRT.P1.
n. No artigo 29º, n.º 1 al. d) do CPI está, precisamente, previsto o averbamento quer das ações para declaração de nulidade e anulação, como, também, de pedidos reconvencionais com a mesma finalidade, pelo que qualquer interpretação no sentido de que a Lei n.º 62/2011 impede a dedução de pedido reconvencional para a declaração de nulidade de uma patente tornaria o disposto no artigo 29º do CPI letra morta.
o. Deverão ser aplicáveis à Lei n.º 62/2011 os princípios gerais do processo civil, tal como o princípio do direito ao contraditório previsto no artigo 3º do CPC, o princípio da concentração decorrente do artigo 573º do CPC (a contrario), o princípio da economia processual e ainda o princípio da descoberta da verdade que sobressai do disposto nos artigos 411º e 436º, do CPC.
p. A interpretação do Tribunal da Relação é contrária ao disposto no artigo 3º da Lei n.º 62/2011, no artigo 29º, n.º 1 al. d) do CPI e nos artigos 3º, 4º, 411º, 413º e 573º (a contrario) do CPC.
q. Nos presentes autos o princípio de acesso ao direito e tutela jurisdicional efetiva deverá ser apreciado na sua vertente de garantia de um processo equitativo porquanto assume uma das dimensões em que a tutela jurisdicional efetiva foi violada pela posição do Tribunal da Relação.
r. O princípio da garantia a um princípio equitativo está subjacente a vários subprincípios, em particular o direito de defesa e direito ao contraditório, traduzido na possibilidade de cada uma das partes apresentar a sua versão e os seus argumentos, de facto e de direito, oferecer provas e pronunciar-se sobre os argumentos e material probatório carreado pela parte contrária, antes da prolação da decisão sobre o litígio.
s. A invocação da nulidade das patentes constitui, assim, o exercício de umdireito à defesa previsto usado em todo o mundo, previsto e protegido pelo artigo 20º, n.º 4 da Constituição da República Portuguesa, tal como decorre do acórdão proferido n.º 251/2017 do Tribunal Constitucional do dia 8 de março de 2018.
t. A decisão do Tribunal da Relação que determinou a inadmissibilidade do pedido reconvencional para declaração de nulidade de direitos de propriedade industrial é inconstitucional por violação do princípio da proibição de indefesa previsto no artigo 20º, em conjugação com o artigo 18º, n.º 2 ambos da Constituição da República Portuguesa, devendo o acórdão ser revogado e substituído por decisão que ordene o prosseguimento dos autos para apreciação do pedido reconvencional deduzido pela Recorrentes.
u. O pressuposto de que a lei tem como desiderato “acelerar e simplificar toda a tramitação” não permite concluir que o tribunal está a praticar justiça ao assegurar uma condenação rápida dos Réus, sem atentar à defesa dos Réus.
v. As empresas de medicamentos genéricos não dispõem de condições para antecipar os direitos de propriedade industrial que podem ser invocados nas ações intentadas ao abrigo da Lei n.º 62/2011. Isto porquanto as empresas de medicamentos genéricos apenas sabemquais sãoos direitos de propriedade industrialque serãoexercidos contra si quando são citadas da petição inicial.
w. A interpretação do Tribunal da Relação torna as empresas de genéricos reféns dos titulares de direitos de propriedade industrial.
x. Ao obrigar as empresas de genéricos a saberem e anteciparem que direitos as titulares de propriedade industrial associam aos seus medicamentos de referência é, como viu, no mínimo, abusivo.
y. O recurso de revista deverá ser julgado procedente e proferida decisão a revogar a decisão que rejeitou a apreciação do pedido reconvencional e sua substituição por decisão que admita o pedido reconvencional e ordene o prosseguimento dos autos para a sua apreciação.
Termos em que deve o presente recurso de apelação ser julgado procedente, e, consequentemente, ser revogado o despacho recorrido, admitindo-se o pedido reconvencional das Recorrentes e ordenando o prosseguimento dos autos.
///
Fundamentação.
A matéria de facto provada, após as alterações introduzidas pela Relação, é a seguinte:
1- As 1ª e 4ª AA. são titulares das patentes europeias n.º 3017811 (adiante “EP 811”),
3251660 (adiante “EP 660”), n.º 3257500 (adiante “EP 500”) e n.º 3246021 (adiante “EP
021”) referente a “Formulações de apixaban” e resultantes de pedidos divisionários da
patente europeia n.º 2538925 (“EP 925”) com prioridade reportada à do pedido de patente US
308056 P (25.02.2010), sendo as 2ª A. licenciada da 1ª A. e a 3ª A. sublicenciada da 2ª A.
para exploração dos direitos conferidos por estas patentes no mercado português, cfr. docs. 2 a
6 da petição inicial juntos a fls. 77v-217v dos autos que se dão por reproduzidos.”
2 - Os pedidos de patente que deram lugar às EP 811, EP 660, EP 500 e EP 021 foram apresentados no Instituto Europeu de Patentes em 24.02.2011.
3 - As traduções em português dos fascículos das patentes EP 811, EP 660, EP 500 e
EP 021 foram apresentadas no INPI, em Portugal, em 22.10.2009.
4 - “As EP 811, EP 660, EP 500 e EP 021 vigorarão até 24.02.2031 e têm 11 reivindicações (as duas primeiras), 15 reivindicações (a 3ª) e 10 reivindicações (a 4ª), cfr. docs 2 a 5 supra dados por reproduzidos (ponto 1 do presente enunciado de factos)”.
5 – A patente EP 811 reivindica, inter alia, um comprimido que compreende até 5 mg de apixabano e um diluente ou veículo farmaceuticamente aceitável, em que o comprimido é obtenível de um processo que compreende as etapas de: (1) misturar as matérias-primas compreendendo partículas de apixaban cristalinas antes da granulação; (2) granular as matérias-primas da etapa (1) usando um processo de granulação em seco, em que as partículas de de apixaban cristalinas têm um D90 inferior a 89 μm como medido por dispersão de luz laser; (3) misturar os grânulos obtidos na etapa (2) com matérias-primas extragranulares; (4) comprimir a mistura da etapa (3) num comprimido; e (5) revestir com filme o comprimido da etapa (4).
6 – A patente EP 660 protege, inter alia, um comprimido que compreenda uma composição que compreende até 5 mg de partículas de apixaban cristalinas tendo um D90 inferior a 50 μm como medido por dispersão de luz e que compreende adicionalmente um diluente ou veículo farmaceuticamente aceitável em que a composição é preparada utilizando um processo de granulação em seco.
7 – A patente EP 500 protege, inter alia, uma composição para comprimidos o que compreenda partículas cristalinas de apixaban tendo um tamanho médio das partículas inferior a 89 μm e um D90 inferior a 89 μm conforme medido por dispersão de luz laser, em que a composição compreende até 5 mg de apixaban, um diluente ou veículo farmaceuticamente aceitável e um tensioativo, em que o tensioativo está presente numa concentração de 0,25% a 2% em peso e serve como um auxiliar de humedecimento para a substância farmacológica apixaban, em que a composição é obtenível através de um processo que compreende um processo de moagem por jato de ar para reduzir o tamanho das partículas de apixaban até ao tamanho desejado e granulação em seco.
8 - A patente EP 021 protege, inter alia, um comprimido o que compreenda até 5 mg de partículas cristalinas de apixaban tendo um D90 inferior a 89 μm medido por dispersão de luz laser e um diluente ou veículo farmaceuticamente aceitável, em que a formulação exibe propriedades de dissolução tais que uma quantidade do fármaco equivalente a pelo menos 77% é dissolvida no espaço de 30 minutos, em que o ensaio de dissolução é realizado num meio aquoso tamponado numa gama de pH 1 a 7.4 e controlado a 37º C.
9 - No mercado português os medicamentos de referência que contêm apixaban como substância activa são comercializados sob a marca Eliquis®.
10 - A Bristol-Myers Squibb Pfizer EEIG é a titular da AIM para os medicamento de referência contendo apixabano como substância activa comercializados em Portugal pelas 1ª e 4ª AA., sob a designação comercial Eliquis®.
11 - “De acordo com a lista publicitada no dia 8.01.2020 na página eletrónica do Infarmed, a 1ª R. requereu em 31.10.2019 autorizações de introdução no mercado (AIMs) para medicamentos que contêm a substância ativa ‘Apixaban’ sob a forma farmacêutica de ‘Comprimidos revestidos por película’, nas dosagens de 2,5mg e 5 mg, tendo por medicamento de referência o Eliquis® das AA.”.
12 - A 2ª R. foi indicada como futura titular das referidas AIMs.
13 - As RR. nunca solicitaram autorização para explorar as invenções protegidas pelas
EP 811, EP 660, EP 500 e EP 021.
O direito.
No recurso está em causa a interpretação do art. 3º da Lei 62/2011 de 12 de Dezembro , na redacção do DL nº 110/2018, de 10 de Setembro, que criou um regime de composição dos litígios emergentes de direitos de propriedade industrial, quando estejam em causa medicamentos de referência e medicamentos genéricos.
O referido art. 3º diz o seguinte:
1. No prazo de 30 dias a contar da publicitação na página electrónica do INFARMED – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde, I.P. (Infarmed I.P.), de todos os pedidos de autorização, ou registo, de introdução no mercado de medicamentos genéricos, o interessado que pretenda invocar o seu direito de propriedade industrial nos termos do artigo anterior deve fazê-lo junto do Tribunal de Propriedade Intelectual ou, em caso de acordo entre as partes junto do tribunal arbitral institucionalizado ou efectuar pedido de submissão do litígio a arbitragem não institucionalizada.
2. A não dedução de contestação, no prazo de 30 dias após citação na acção intentada no Tribunal da Propriedade Intelectual ou da notificação pelo tribunal arbitral, implica que o requerente de autorização, ou registo, de introdução no mercado do medicamente genérico, não pode iniciar a sua exploração industrial ou comercial na vigência dos direitos de propriedade invocados nos termos do número anterior.
Entendeu a sentença, e a Relação por maioria, que o interessado que pretenda invocar o seu direito de propriedade industrial através da acção especial prevista no art. 3º da Lei nº 62/2011, carece de invocar a violação ou iminência de violação do seu direito, sob pena de não demonstrar ter interesse em agir, excepção dilatória inominada que obsta ao conhecimento do mérito da causa e conduz à absolvição da instância, nos termos dos artigos 576º, nºs 1 e 2 e 577º do CPC.
E aplicando tal entendimento ao caso concreto, concluíram pela falta de interesse em agir das AA, como se extrai do seguinte passo da sentença:
(…)
“Considerando os factos alegados e dados como assentes, não resulta que as RR explorem o produto visado pela patente das AA no território nacional, nem que fabriquem, ofereçam, armazenam, coloquem no mercado, importem ou utilizem o produto objecto das patentes.
(…)
Resulta apenas que a R. apresentou pedidos de AIM para um genérico do medicamento de referência protegido pelas patentes das AA., o que constitui exercício de um direito que não interfere com direitos de propriedade industrial, nem depende do consentimento dos respectivos titulares, nos termos dos citados artigos 14º nº 1, 15º nº 1, 19º nº 8 e 25º nº 2 do DL 176/2006, 103º, nº 1, al. c) do CPI e 5º do Regulamento 469/2009/CE.
Não se verifica, pois, qualquer violação de direitos exclusivos das AA. por parte das RR., susceptível de fundamentar a condenação destas nos termos peticionados.
O pedido de AIM, enquanto acto realizado exclusivamente para instrução de processo administrativo necessário à aprovação de produtos farmacêuticos pelos organismos oficiais competentes, está excluída dos direitos conferidos pela patente, nos termos dos artigos 103º, nº 1, al. c), 19º, nº 8 do DL 176/2006 e 5º do Regulamento 469/2009/CE.
Não se demonstra (e nem alegado foi) que as RR. tenham iniciado qualquer exploração de medicamento contendo o ingrediente activo apixabano, ou sequer que para tal tenha obtido a solicitada autorização.
Com efeito, o exercício de um direito (de pedir uma AIM, como condição legalmente requerida para ulterior comercialização de um medicamento) não pode, enquanto tal, ser entendido como dando causa a uma acção de protecção de um direito que expressamente exclui tais actos do seu âmbito de protecção.
Com efeito, a proibição de iniciar a exploração dos produtos em causa antes da caducidade da patente que os protege já resultava do citado artigo 103º, nº 1 al. c) do CPI.
(…)
Estando assente que o pedido de AIM não configura, por si só, qualquer violação de direitos exclusivos, e não resultando dos factos provados que as RR. tenham iniciado ou estejam em vias de iniciar a comercialização de medicamentos genéricos que violem o direito exclusivo das AA., inexiste qualquer litígio que careça de ser julgado por este tribunal.
Mas, como se disse, os tribunais visam solucionar conflitos, não são um meio que vise obter títulos executivos de forma expedita.
Isto mesmo resulta igualmente do artigo 3º, nº 1, do CPC, que expressamente prevê
um ‘conflito de interesses’, como ‘pressuposto’ de qualquer acção.
Em suma, não se tendo provado qualquer violação ou iminência de violação dos direitos das AA., sendo que nem tal foi, sequer, alegado, falece o interesse em agir das AA., o que constitui excepção dilatória inominada que obsta ao conhecimento do mérito da causa e conduz à absolvição da instância, nos termos dos artigos 576º, nºs 1 e 2 e 577º do CPC.”
No mesmo sentido, se orientaram os Senhores Desembargadores que fizeram vencimento na Relação, que concluíram:
“(…) sendo exigível, à luz da Lei 62/2011, a verificação do pressuposto do interesse em agir e não tendo as autoras alegado qualquer factualidade que permita aferir da sua presença, o tribunal de primeira instância julgou corretamente verificada exceção inominada de interesse em agir, com as devidas consequências.”
Vejamos, então.
Entre os pressupostos processuais, não obstante ser inominado, encontra-se o interesse em agir (como resulta do art. 557º do CPC, segundo o qual a lista das excepções dilatórias é meramente exemplificativa), que habitualmente se identifica com a necessidade de tutela judiciária, e se justifica com a consideração de que o funcionamento da máquina da justiça só deve ser desencadeada quando a situação do direito invocado pelo autor o exija e com o objectivo de protecção do réu, que sempre corre o risco de ter uma decisão com força de caso julgado proferida contra si e que dispõe de um curto prazo para organizar a sua defesa, como referido no acórdão do STJ de 29.11.2022, P. 104/22, (Maria dos Prazeres Beleza), também proferido numa acção intentada com base no art. 3º da Lei nº 62/2011.
Ora a orientação que tem prevalecido claramente no Supremo Tribunal de Justiça (cf., por exemplo, os acórdãos de 08 de Abril de 2021 (P.219/19), de 09 de Dezembro de 2021 (P. 225/20) de 21 de Abril de 2022 (438/21), de 24 de Maio de 2022 (P.346/20) relatado pelo relator do presente e subscrito pelo ora 1º Adjunto, de 21 de Junho de 2022 (P.226/20), de 07 de Junho de 2022 (P.226/20), e de 07 de Março de 2023 (P.2/22), e P.130/21)2, e que se reitera, tem sido a de que no âmbito destas acções e tendo em conta a previsão expressa de podem ser propostas após a publicitação dos pedidos de AIM dos medicamentos genéricos e, por outro, a razão de ser que determinou a sua criação, basta – mas é necessária – a publicitação dos pedidos de AIM para que o demandante tenha interesse em agir, não sendo exigível a alegação de violação ou de um perigo pelo menos iminente de violação dos direitos de propriedade industrial do demandante – que não decorre do pedido de ou da concessão de AIM.
Neste sentido decidiu o acórdão de 07.03.2023, P. 130/21:
“O processo previsto no art. 3º da Lei nº 62/2011 de 12 de Dezembro, configura processo especial de acertamento de direitos que sendo susceptível de ser desencadeado em face da publicitação de um simples pedido de autorização de introdução no mercado (altura em que não haverá, em princípio, qualquer infração ou ameaça iminente de infração dos direitos de propriedade industrial) permite aos titulares dos direitos poderem instaurá-lo ou não consoante o interesse que vejam nele. E pode tal procedimento ser instaurado dentro do prazo de um mês a contar dessa publicitação, porque tal se enquadra na lógica de um processo rápido, destinado a ter fim, idealmente, antes de haver uma decisão do Infarmed sobre o pedido de autorização de introdução no mercado – neste sentido Evaristo Mendes, in “Patentes de medicamentos. Arbitragem necessária, Comentário de jurisprudência, Súmula da Lei nº 62/2011”, in Propriedades Intelectuais, nº4, 2015, 26-40.
(…)
O critério geral de apreciação do interesse processual, dependente da concreta alegação de violação do seu direito invocado, é derrogado pelo art. 3º da Lei 62/2011, na redação da Lei n~110/2018 de 10.09), a qual acolhe a possibilidade excecional de os titulares dos direitos de propriedade intelectual não carecerem de justificar o recurso à acção com base numa infracção, actual ou iminente, sendo suficiente a publicitação, na página electrónica do Infarmed, de um pedido de autorização de introdução no mercado (ou registo) para medicamente genérico. Todavia este entendimento, em desvio da aludida regra geral, é admitido porque, não existindo qualquer violação concreta do direito dos autores a existência/publicação do pedido de AIM compreende, na economia interpretativa dos preceitos observados, se conceder tutela de interesse à pretensão dos autores. Mesmo que não exista violação do direito invocado, existe um pedido de publicação AIM e é esta existência e o que ela significa que determina a configuração do interesse em agir.”
Neste mesmo sentido, decidiu o acórdão também de 07.03.2023, P. 2/22.6YHLSB.L1.S1, (Nuno Pinto Oliveira) e subscrito pelo relator do presente acórdão, em cujo sumário se lê:
I - O art. 3º da Lei nº 62/2011 de 12.12., na redacção do Decreto Lei nº 110/2018 de 10.09, determina uma derrogação das regras gerais sobre o interesse em agir;
II – A publicitação de um pedido de autorização no mercado é condição necessária para os titulares dos direitos de propriedade intelectual tenham interesse em agir;
III – Existindo publicitação de um pedido de autorização no mercado, os titulares dos direitos de propriedade intelectual podem propor a acção especial prevista no art. 3º da Lei nº 62/2011 de 12.12, na redacção do DL nº 110/2018.
Não vemos razões para nos afastarmos desta orientação, que nesta secção do Supremo Tribunal de Justiça, com competência para as questões da propriedade intelectual, tem prevalecido.
Em suma, deve reconhecer-se às AA, titulares de direitos de propriedade intelectual, o direito de intentarem a acção especial prevista no art. 3º da Lei nº 62/2011, em face da publicitação de um simples pedido de autorização de introdução no mercado.
Interesse em agir que existe relativamente aos pedidos de AIMs publicitados, identificadas no art. 79º da petição inicial, e a que se refere a pedido formulado em a).
Nos pedidos formulados em b), c), d) e e), peticiona-se a condenação das RR a absterem-se de explorar, importar, fabricar, comercializar, armazenar, utilizar, colocar no mercado, vender e/ou oferecer quaisquer comprimido, protegidos pelas EP 811, EP, 660, EP 500 e EP 021, respectivamente, ao abrigo das AIMs que caiam dentro do âmbito da patente.
Ora, como vimos, o elemento decisivo para ser reconhecido o interesse em agir é a publicitação dos pedidos de AIMs, na página electrónica do Infarmed
Relativamente aos pedidos formulados em b), c) d) e e), estão em causa pedidos de AIMs não publicitados, relativamente aos quais não se deve reconhecer um interesse em agir, vigorando aqui as regras gerais.
Disse-o expressamente o acórdão de 07.03.2023, P. 130/21, supra referido:
“Não existindo publicação de um pedido de autorização de introdução no mercado, ser a demandante titular de um composto (e suas associações) protegido por um EP e no CPP não lhe confere interesse em agir.”
Como se escreveu no acórdão do STJ de 29.11.2022, supra referido, citando o acórdão de 21.04.2022, P. 40/20:
Permitir que a invocação de AIMs publicadas para obter a abstenção mencionada quanto a elas, mas também, extensivamente e de forma universal para obter a mesma proibição fora de qualquer AIM” – significaria “criar, mais que uma presunção – arts. 349º e 351º do CC - que as regras da experiência comum não admitem, uma verdadeira petição de princípio. Estar-se-ia a configurar, quanto à substância activa em causa, a publicitação de uma AIM como um elemento objectivo de interesse em agir para evitar a actualidade dessa AIM, mas ao mesmo tempo utilizar esse facto (a publicação) como prognose certa e segura para declarar perigo real sério e actual de violação do direito da demandante relativamente a algo que é de todo improvável e sem qualquer consistência: que o requerente da AIM, contrariado pela ação do demandante venha a requerer outras AIMs iguais quanto à substância activa. Um tal raciocínio, em nosso entender, estaria inquinado de ilogismo, incerteza e insegurança. Não encontramos nenhum nexo de lógica normativa ou naturalística para que a publicitação da AIM possa, por si só fundar qualquer interesse por parte do demandante para obter uma condenação de abstenção fora do âmbito das AIMs publicadas.”
Neste sentido, decidiram os acórdãos do STJ de 21.04.2022, P. 40/20, de 21.06.2022, e de 07.03.2022 (P.2/22).
Conclui-se assim faltar o interesse em agir relativamente aos pedidos formulados em b), c), d) e e).
Tratando-se da falta de um pressuposto processual, a decisão a proferir será a de absolvição da instância, e não de improcedência.
///
A revista interposta pelas RR.
As RR interpuseram revista do acórdão que, com um voto de vencido, confirmou a decisão de 1ª instância que não admitiu o pedido reconvencional, “por ser processualmente inadmissível”, fundamentando a revista no disposto nos arts. 671º, n.º 2 al. a) e 629º, n.º 1 d) do CPC.
O acórdão recorrido fundamentou a inadmissibilidade do pedido reconvencional nos seguintes termos:
A ação foi interposta nos termos da Lei n.º 62/2011, de 12/12.
O processo resultante desta lei é um processo especial, pelo que lhe é aplicável a tramitação própria e não a tramitação do processo comum – artigo 546.º, do Código de Processo Civil.
O procedimento da Lei n.º 62/2011 previsto conhece apenas dois articulados – petição e contestação e não é compatível com os princípios de celeridade que estiveram na génese da sua criação aceitar que o mesmo é compatível com a dedução de pedido reconvencional.
Trata-se, de forma indubitável, de um procedimento de natureza especial.
Nem pela leitura da redação do n.º 4 do artigo 3.º se pode concluir o seu contrário. Isto é, que esta ação seja uma ação comum.
A diferente forma de processo é um obstáculo à admissão do pedido reconvencional.
Atenta a natureza do pedido reconvencional a que já aludimos, uma tal decisão não
prejudica os direitos de defesa das apelantes rés na medida em que:
- O pedido reconvencional não visou garantir a defesa das reclamantes, mas constituiu
a concretização de um direito de ação que as reclamantes, por motivos de economia
processual, escolheram deduzir em forma de reconvenção;
- As reclamantes nunca estiveram impedidas de intentarem ação de nulidade
autónoma;
- A posição defensiva das reclamantes nesta ação não ficou mais garantida pela a
dedução do pedido reconvencional.
Também os princípios de acesso ao direito e de defesa constitucionalmente
consagrados no artigo 20.º, da CRP se mostram salvaguardados.
A natureza de ação cruzada que o pedido reconvencional configura, afasta qualquer
risco de, não sendo aceite do ponto de vista processual, sejam violadas normas constitucionais
de direito de defesa ou acesso ao direito.
Deve, pois, ser mantida a decisão do tribunal de primeira instância.
A revista é admissível, não nos termos das disposições invocadas, mas sim no nº1 do art. 671º.
O art. 671º, nº2 prevê a possibilidade do recurso de revista de decisões interlocutórias, enquanto o art. 629, nº2, d), aplica-se apenas aos casos em que o recurso de revista está excluído por motivo estranho à alçada. (cf. Acórdãos dos STJ de 24.05.2022, P. 75/19 e de 11.10.2022, P. 3450/20).
Nenhuma destas situações se verifica com a revista interposta pelas RR.
A situação cabe na previsão do nº1 do art. 671º que admite recurso de revista “do acórdão da Relação, proferido sobre decisão de 1ª instância, (…) que ponha termo ao processo, absolvendo da instância o réu ou algum dos réus quanto a pedido ou reconvenção deduzidos.”
É o que sucede com o acórdão da Relação que, julgando inadmissível a reconvenção, determina, por si, a extinção da instância reconvencional. (Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 5ª edição, p. 357).
Vejamos então.
Na versão originária da Lei 62/2011, a questão de saber se na acção arbitral o demandado podia invocar a invalidade da patente ou CPP, foi controvertida.
Parte da doutrina e da jurisprudência da Relação de Lisboa (competente para apreciar os recursos interpostos das decisões arbitrais), negava a possibilidade de invocar na acção arbitral, como excepção (com efeitos inter partes), a invalidade da patente, e outra afirmava a possibilidade de tal defesa como uma exigência constitucional (art. 20º da CRP).
O acórdão do STJ de 14.12.2016, P. 1248/14.6YRLSB.S1. (Lopes do Rego), expôs as teses em confronto, tendo-se pronunciado pela negativa como se extrai do respectivo sumário:
“O tribunal arbitral necessário previsto na Lei 62/2011 é incompetente para apreciar, ainda eu por via da dedução de mera excepção peremptória, cujos efeitos ficariam circunscritos ao processo, a questão da nulidade da patente do medicamento em causa, por tal matéria estar reservada à competência exclusiva do TPI;
A inviabilidade de o R. suscitar incidentalmente, naquele processo, a excepção peremptória de nulidade do direito patenteado configura-se como proporcional e adequada, radicando em última análise, na natureza da relação controvertida, no carácter constitutivo do acto de reconhecimento dos direitos de propriedade industrial e nas razões de interesse público e de congruência do sistema que levaram a reservar o conhecimento de tais vícios apenas ao TPI – não implicando, consequentemente, neste caso, o desvio à regra constante do nº1 do art. 91º do CPC qualquer violação do direito de defesa, da regra do contraditório ou do processo equitativo.
Este entendimento foi rejeitado pelo Tribunal Constitucional, no acórdão nº 251/2017 (Maria de Fátima Mata-Mouros) de 14.05.2015, publicado em www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos,20170251”, que decidiu:
“Julgar inconstitucional a norma interpretativamente extraível do art. 2º da Lei nº 62/2011, de 12 de Dezembro, e arts. 35º, nº1, e 101º, nº2 do Código da Propriedade Industrial, ao estabelecer que, em sede de arbitragem necessária instaurada ao abrigo da Lei nº 62/2011, a parte não se pode defender, por excepção, mediante a invocação a invalidade da patente, como meros efeitos inter partes.”
Na fundamentação do acórdão lê-se o seguinte:
“Embora se compreendam as preocupações que levam à imposição de apenas uma via processual e um tribunal no âmbito do conhecimento da invalidade das patentes, o sistema montado para prosseguir este fim é suscpetível de ter como consequência, por vezes, uma ablação total do direito de defesa ou, noutras vezes, uma significativa compressão. Inexiste a demonstração cabal de que a possibilidade de o tribunal arbitral se pronunciar sobre a validade da patente, como meros efeitos inter partes, produza danos irreversíveis ou gravosos à protecção da patente, equivalentes ao sacrifício imposto ao direito de defesa do requerente de AIM. Efectivamente, afastar possibilidade pode ter como consequência, ainda que apenas por vezes impedir um agente económico de exercer a sua liberdade de iniciativa com base numa patente nula ou inválida – o que dificilmente encontra justificação.
(…)
Assim, a norma objecto do presente julgamento revela-se excessiva porquanto prejudica de modo desproporcionado o direito de defesa do requerente de AI. Termos em que deve ser julgado inconstitucional por violação da proibição de indefesa (art. 20º Constituição em conjugação com o seu art. 18º, nº2).”
Já o acórdão nº 51/2021 do mesmo Tribunal (Rel. Joana Costa), consultável no mesmo endereço, decidiu:
“Não julgar inconstitucional a norma interpretativamente extraível do art. 2º da Lei nº 62/2011, de 12 de Dezembro (redação original) e arts. 35º, nº1, e 101, nº2 do CPI, ao estabelecer que, em sede de arbitragem necessária instaurada ao abrigo da Lei nº 62/2011, a parte não se pode defender, por excepção, mediante invocação da invalidade de patente, com efeitos inter partes.”
O aresto teve dois votos de vencido, nos quais se defendeu a orientação do acórdão nº 251/2017.
Sucede que o DL nº110/2018, de 10 de Dezembro acabou com o regime da arbitragem necessária e alterou a Lei nº 62/2011, aditando um novo número ao art. 3º, que passou a dispor no nº3:
No processo arbitral pode ser invocada e reconhecida a invalidade da patente com efeitos inter partes.
Com a nova redacção do art.3º, nº3, o Supremo Tribunal de Justiça, por considerar que o art. 4º do DL nº 110/2018, na parte em que adita o novo nº3 ao art. 3º, tem natureza interpretativa, passou a decidir pela competência do tribunal arbitral para conhecer, por via de excepção, da invalidade (do facto constitutivo) da patente, com meros efeitos inter partes nos caso ainda pendentes de arbitragem necessária (cf. acórdãos de 14.03.2019, P. 582/18, de 17.10.219, P. 2552/18, de 17.12.2019, P. 1956/18, e de 09.11.2021, P. 772/19).
Ora, se o tribunal arbitral passou a ter competência para conhecer da validade da patente invocada como meio de defesa do requerente de AIM, embora com meros efeitos inter partes, não se vê razão válida para negar a possibilidade de na acção instaurada no TPI ser apreciado o pedido de nulidade, seja por via de excepção, para pedir a absolvição do pedido, seja por via de reconvenção, para obter a declaração de nulidade do registo, relativamente ao qual não se coloca qualquer problema de competência. Com efeito, é ao TPI que a lei defere a competência para as acções de declaração de nulidade e de anulação de patentes (arts. 34º, do CPI e 111º, nº1, c) da LOSJ).
As razões de celeridade avançadas para negar a possibilidade da dedução de pedido de invalidade da patente não podem ter como consequência a ablação total do direito de defesa, ou uma significativa compressão do mesmo.
Afigura-se-nos, pois que a razão está com o Senhor Desembargador que votou vencido, assim também tendo decidido o acórdão da Relação de Lisboa de 18.05.2022, P. 119/21: “É admitida a dedução do pedido de nulidade da patente ou do CCP em que as demandantes sustentam a sua pretensão, pela demandada, na contestação, devendo depois adequar-se o processado por forma a fazer cumprir o contraditório.”
Não havendo qualquer obstáculo processual à dedução do pedido reconvencional de declaração de nulidade da patente – pelo contrário, tem suporte nos arts. 93º e 266º, nº2, alínea a) do CPC – a admissibilidade do pedido reconvencional deduzido pelas Rés é a solução que respeita os princípio da proibição da indefesa e do contraditório.
Nestes termos, a revista das Rés deve proceder.
Decisão.
Pelo exposto, concedendo-se em parte a revista dos AA, decide-se:
A. Condenar as RR a absterem-se, no território português ou com vista à comercialização nesse território, de explorar (por si próprias e/ou permitindo que terceiros o façam ao abrigo das AIMs identificadas no artigo 79, após serem concedidas) a invenção protegida pela EP ‘811, EP ‘660, EP ‘500 e EP ‘021 e, nomeadamente, de importar, fabricar, comercializar, armazenar, utilizar, colocar no comércio, vender e/ou oferecer, os Genéricos Apixaban identificados no artigo 79 da Petição Inicial, enquanto a EP ‘811, EP ‘660, EP ‘500 e a EP ‘021 estiverem em vigor;
- Absolver as RR da instância relativamente aos pedidos formulados em b), c), d) e e);
- Determinar o prosseguimento acção para apreciação do pedido formulado em f)-
B. Conceder provimento à revistas Rés, revogar o acórdão recorrido que não admitiu o pedido reconvencional, que vai admitido, devendo os autos prosseguir para conhecimento do mesmo.
Custas: da acção, por AA e RR na proporção de 50% para cada; as da reconvenção são da responsabilidade das Autores/recorridas.
Lisboa, 11 de janeiro de 2024
Ferreira Lopes (relator)
Nuno Ataíde das Neves
Lino Ribeiro