REJEIÇÃO DA ACUSAÇÃO
FALTA DE ALEGAÇÃO DE ELEMENTOS DO TIPO DE CRIME
AGIR POR FORMA LIVRE
Sumário


1. Crime é uma ação típica, ilícita, culposa e punível.
2. A configuração dogmática do dolo penal, designadamente da sua abrangência, bem
como a sua arrumação dentro das categorias pertinentes à teoria da infração penal é
objeto das mais controversas discussões na Doutrina nacional e estrangeira.
3. Para a escola clássica, o dolo é a culpa, para a neoclássica, o dolo, associado à
censurabilidade, é um dos componentes do juízo de culpa, e para a finalista o dolo é um
elemento do tipo, o tipo subjetivo, sendo a culpa um juízo puramente normativo.
3. No finalismo, a imputabilidade e a consciência da ilicitude são, mais que pressupostos, elementos do juízo de culpa, pelo que o juiz tem de dispor de elementos sobre o caráter livre da atuação do agente, que devem constar da acusação.
4. Não se exige à acusação o uso de fórmulas ou de automatismos: o que está em causa é o dever de alegação, se bem que sintética, o mais completa e abrangente possível, tendo em conta, designadamente, as várias posições conhecidas sobre a teoria da infração penal, equacionando todas as perspetivas de resolução do objeto do processo, de modo a que a possibilidade da prolação de uma decisão puramente formal seja reduzida ao mínimo.

Texto Integral


I RELATÓRIO

No processo n.º 122/21.... do Juízo Local Criminal ... – J... do Tribunal Judicial da Comarca ... foi proferido despacho que rejeitou a acusação formulada pelo Ministério Público, por ser manifestamente infundada, nos termos do art.º 311.º, n.º 2, alínea, e 3, alínea b), do Código de Processo Penal.

2
Não se tendo conformado com a decisão, o Ministério Público interpôs o presente recurso, formulando as seguintes conclusões:

1.Por despacho proferido no dia 11 de Janeiro de 2023, o Ministério Público deduziu acusação para julgamento em processo comum perante Tribunal Singular contra o arguido AA imputando-lhe a prática, como autor material de um crime de violência doméstica, previsto e punido pelos artigos 14º, 26º e 152º nº1 alínea b), e nºs 2, alínea a), 4, do Código Penal
2. Sucede porém, que remetidos os autos à distribuição, por despacho proferido no dia 12 de Maio de 2023, o Tribunal a quo rejeitou a dita acusação pública, nos termos do disposto no artigo 311º, nº 2, alínea a) e nº 3, alínea b), do Código de Processo Penal, por entender que o libelo acusatório é manifestamente infundado na medida em que o elemento subjectivo se mostra insuficientemente narrado, porquanto “na acusação deduzida, nada se diz quanto à liberdade da ação”.
3. Todavia, no caso em apreço, a acusação pública deduzida possui todos os factos necessários à subsunção ao crime de violência doméstica imputado ao arguido, encontrando-se todos os elementos, objectivo e subjectivo, deste ilícito penal suficientemente narrados.
4. De facto, resulta do libelo acusatório em questão que “com a conduta supra descrita, o arguido agiu com o propósito concretizado de molestar a sua saúde física e psíquica, a liberdade de determinação, paz, sossego e recato pessoal da assistente, mais sabendo que atentava contra o seu bem-estar emocional e a atingia na sua honra e consideração e, ainda, que a mesma era e havia sido sua companheira.
14. O arguido sabia que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei.”.
5. Ou seja, resulta do libelo acusatório que o arguido actuou com vontade de molestar fisicamente e achincalhar a vítima (sua ex-companheira) e colocar em causa a sua paz individual, por determinação da sua vontade, da sua escolha, dos seus motivos, com determinada intenção, de forma resoluta, da sua decisão, não obstante saber que tal colocaria em causa em causa a dignidade e integridade moral como ser humano da assistente e que ao actuar desse modo estava ciente da censurabilidade da sua conduta, que a mesma não era permitida e que incorria na prática de um crime, estando, por conseguinte, suficientemente descritos os elementos volitivo, intelectual e emocional do dolo.
6. O que vale por dizer que resulta da acusação pública que o arguido sabia o que fazia, queria fazê-lo e agiu com a consciência de que praticou um crime e que tal só poderia ter ocorrido de forma livre.
7. Veja-se, a propósito, o que ficou decidido no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, datado de 28 de Março de 2019, proferido no âmbito do Processo nº 373/15...., no qual se decidiu que “I- Ao nível do que a doutrina de referência designa por dolo do tipo expresso na formulação “conhecimento e vontade de realização do tipo subjectivo de ilícito” assume- se uma decomposição em dois “momentos” que são o intelectual e o volitivo.
8. II-Como se extrai da leitura do AFJ!/2015, não há fórmulas sacramentais sendo possível transmitir o “dolo de culpa” ou “tipo-de-culpa dolosa” de diferentes formas desde que inequivocamente signifique, uma atitude, revelada no facto, de contrariedade ou indiferença do agente perante o dever- ser jurídco-penal.
9. III-Incorre em contradição o Acórdão da Relação na analise semântica que faz do facto 18 dado como provado (“Agiram os referidos arguidos deliberada, voluntária e conscientemente, porquanto sabiam que tas condutas eram proibidas e punidas por lei penal”), pois embora reconheça que não há “fórmulas sacramentais” acaba por “exigir” a costumeira fórumula “agiu livre” alegando que ao gente pode agir de forma consciente e voluntária e, no entanto, a sua conduta não decorrer com liberdade, sugerindo que disso é exemplo uma actuação devida a coacção moral, concluindo pela nulidade contemplada na al. b) do nº 3 do art. 311º do CPP, por falta de descrição na acusação dos elementos subjectivos do crime.
10. IV-Um acto voluntário é um acto que se faz sem constrangimento, sem limitação. E se se age deliberadamente, age-se com o propósito de praticar o acto, com resolução prévia, o que é incompatível com um acto “forçado”, um acto praticado por uma qualquer imposição exógena.
11. V- Agir voluntariamente é agir como se quer, e não por imposição, é agir de um modo livre e agir deliberadamente é agir como se decidiu agir. Por conseguinte, o entendimento que se perfilha é o de que o ponto 18 dos factos provados contém a cabal descrição dos elementos subjectivos do crime de tráfico de estupefaciente de menor gravidade (…)”.
12. Ademais, sempre se dirá que o arguido ao ser confrontado com o teor do libelo acusatório em questão percebe perfeitamente o que lhe está a ser imputado e do que está a ser acusado, não se vislumbrando que resultem coartados quaisquer direitos de defesa.
13. Nesta senda, urge concluir que a decisão recorrida não se afigura correcta, tanto mais que o julgador apenas deve rejeitar a acusação quando seja de todo inviável a condenação do arguido e, por isso, quando seja de evitar que seja sujeito injustificadamente à “violência” de um julgamento, o que não é, claramente, o caso dos autos, pois a mesma contém a narração dos factos imputados.
14. Veja-se a propósito o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, datado de 11 de Julho de 2017, proferido no âmbito do Processo nº 649/16.0T9BRG.G1 (disponível in www.dgs.pt), no qual ficou exarado que “ainda que a matéria alegada no RAI possa não ter sido descrita de forma exemplar, se tal peça permitir aferir da verificação dos elementos objectivos e subjecivos do crime, o RAI não deverá ser rejeitado”.
15. Pelo que se entende que o Tribunal a quo violou o disposto nos artigos 14º, 26º e 152º nº1 alínea b), e nºs 2, alínea a), 4, todos do Código Penal, e 311º, nº 2, alínea a) e nº 3, alínea b), do Código de Processo Penal.

Pelo exposto, deverá ser concedido provimento ao recurso, revogando-se a decisão recorrida que deverá ser substituída por outra que receba a acusação pública proferida e determine o prosseguimento dos autos, nos termos do disposto no artigo 311º- A, do Código de Processo Penal.

3
Não foi apresentada resposta ao recurso.

4
Recebidos os autos neste Tribunal da Relação, o Ministério Público emitiu parecer propondo o provimento do recurso.

5
Foi cumprido o disposto no art.º 417.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, não tendo sido apresentada resposta.

6
Colhidos os vistos, teve lugar a conferência.

II FUNDAMENTAÇÃO

1 Objeto do recurso:

A acusação pública apresentada nos autos deve ser rejeitada por nela não constarem factos demonstrativos do caráter livre e consciente da ação do agente?

2 Decisão recorrida:

Da rejeição da acusação:
Nos termos do disposto na al. a), do n.º 2, do art.º 311.º, do Código de Processo Penal, “Se o processo tiver sido remetido para julgamento sem ter havido instrução, o presidente despacha no sentido:
a) De rejeitar a acusação, se a considerar manifestamente infundada;”
Esclarecendo as als. b) e c), do n.º 3, do mesmo artigo, que se considera a acusação manifestamente infundada quando não contenha a narração dos factos ou se os factos não constituírem crime.
No que respeita à narração dos factos, preceitua a al. b), do n.º 3, do artigo 283.º, do Código de Processo Penal, que a acusação deve conter a “narração, ainda que sintética, dos factos que fundamentam a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança, incluindo, se possível, o lugar, o tempo e a motivação da sua prática, o grau de participação que o agente neles teve e quaisquer circunstâncias relevantes para a determinação da sanção que lhe deve ser aplicada;”.
Para que se preencha o requisito da narração dos factos, é necessário que a acusação contenha a “descrição dos factos imputados”, e acrescenta-se, “todos” os factos imputados, uma vez que o artigo 13.º, do Código Penal, dispõe que “Só é punível o facto praticado com dolo ou, nos casos especialmente previstos na lei, com negligência”, sendo que a acusação tem de descrever os factos provados relativos ao elemento subjectivo. Isto porque não se pode presumir que o agente agiu nem com dolo, nem com negligência.
O que atrás fica dito é corroborado pela jurisprudência dos nossos tribunais superiores. De facto, a título de exemplo pode ler-se no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 17/06/2003 (processo 10164/02-5, publicado no sítio www.dgsi.pt), que, “sendo a decisão omissa de factualidade provada quanto ao elemento subjectivo do ilícito contra-ordenacional imputado à ora recorrente, não poderia esta ter sido sancionada, impondo-se a respectiva absolvição”.
A indicação precisa e discriminada dos elementos indicados na norma do art. 283.º, n.º 3, do Código Penal, constitui, também, elemento fundamental para garantia do direito de defesa do arguido, que só poderá ser efectivo com o adequado conhecimento dos factos imputados, das normas que integrem e das consequências sancionatórias que determinem.
A indicação dos factos imputados com menção das provas obtidas é uma exigência em tributo aos mais elementares princípios que devem reger um direito de carácter sancionatório e que têm a ver sobretudo com garantias mínimas relacionadas desde logo com o direito de defesa, consagrado na Constituição da República Portuguesa – cfr. art.º 32.°.
Entre essas garantias mínimas de defesa, avulta, a de “serem conhecidos os factos que são imputados ao arguido, pois sem que os mesmos estejam estabelecidos não é possível avaliar a justiça da condenação, fica inviabilizado o direito ao recurso e não há salvaguarda do ne bis in idem” - cf. Ac. deste STJ de 21-09-2006, Proc. n.º 3200/06 - 5.ª.
Descendo ao caso dos presentes autos, verifica-se que a acusação não contém a descrição de todos os factos no que concerne ao elemento subjetivo do ilícito.
De facto, analisada a mesma à luz dos considerandos supra expostos, verifica-se que não indica todos os factos dos quais se possa concluir pelo preenchimento do dolo.
Num crime doloso, da acusação há-de constar necessariamente, pela sua relevância para a possibilidade de imputação do crime ao agente, que o arguido agiu livre (afastamento das causas de exclusão da culpa - o arguido pôde determinar a sua ação), deliberada (elemento volitivo ou emocional do dolo - o agente quis o facto criminoso) e conscientemente (imputabilidade - o arguido é imputável), bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei (elemento intelectual do dolo, traduzido no conhecimento dos elementos objetivos do tipo). O dolo como elemento subjetivo - enquanto vontade de realizar um tipo legal conhecendo o agente todas as suas circunstâncias fácticas objetivas - constitutivo do tipo legal, será, então, em definitivo, um dos elementos que o artigo 283.º, n.º 3, do C.P.Penal, impõe que seja incluído na acusação.
No que se refere ao seu elemento subjetivo, o crime de violência doméstica é um crime doloso, bastando, para uma plena imputação subjetiva, o mero dolo eventual, como resulta da conjugação do artigo 14.º do C.P. com o artigo 152.º, do mesmo diploma legal.
Nestes termos, entende-se que não consta, na acusação, a descrição de todos os factos pelos quais se possa concluir pelo preenchimento do elemento subjetivo.
Efetivamente, na acusação deduzida, nada se diz quanto à liberdade da ação.
Como se pode ler no ac. T.R.E., pr. n.º 967/19.5T8ABT.E1, disponível in www.dgsi.pt:
“Convoquemos novamente a este propósito o Acórdão de Fixação de Jurisprudência nº 1/2015, de 20 de Novembro, no qual podemos ler relativamente ao dolo, que a sua alegação deverá ser feita através de uma «fórmula em que se imputa ao agente o ter atuado de forma livre (isto é, podendo ele agir de modo diverso, em conformidade com o direito ou o dever ser jurídico), voluntária ou deliberadamente (querendo a realização do facto), conscientemente (isto é, tendo representado na sua consciência todas as circunstâncias do facto) e sabendo que a sua conduta é proibida e punida por lei (consciência da proibição como sinónimo de consciência da ilicitude).»
(…)
Somos assim a concluir que a factualidade imputada à arguida na acusação particular deduzida nos autos pela assistente não preenche a totalidade dos elementos do tipo penal do crime de injúria, pois que, no que diz respeito ao elemento subjetivo, apenas se alegam factos que se traduzem no elemento cognitivo do dolo – conhecimento e consciência da arguida de que os factos que as palavras que dirigia à ofendida eram ofensivos da sua honra ou consideração – faltando na referida peça processual os factos que corporizariam o elemento volitivo do dolo – a vontade livre da arguida de praticar os factos.”.
É que o arguido pode querer agir mas não de forma livre, pelo que, sem a alegação desse facto, não se poderá inferir pela culpa do mesmo e, consequentemente, pela existência de um ilícito penal.
Também nada é dito na acusação quanto à consciência da ação por parte do arguido, no que concerne ao propósito de molestar a saúde física da assistente.
Por fim, cumpre referir que não é admissível ao juiz ordenar qualquer convite ao aperfeiçoamento ou correção de uma acusação, formal ou substancialmente deficiente (neste sentido, Acórdão da Relação de Lisboa, de 10/10/2002, Col. de Jur., ano XXVII, tomo IV, pág. 132).
Pelo exposto, e ao abrigo do disposto no artigo 311º, nº2, alínea a) e nº3, alínea b), considero a acusação apresentada manifestamente infundada e, consequentemente, rejeito a mesma.
Sem custas – artigo 522.º, do C.P.P.

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Cumpre ainda reproduzir o teor da acusação formulada nos autos:

“1. 1. A assistente BB e o arguido AA conheceram-se no mês de Novembro de 2019, em dia não concretamente apurado e iniciaram uma relação de namoro em data não concretamente apurada, mas situada, sensivelmente, entre a data anteriormente referida e os meses de Janeiro ou Fevereiro de 2020, a partir dos quais passaram a residir juntos, partilhando mesa, leito e habitação, como se de marido e mulher se tratassem, na Rua ..., ..., ....

2. Durante o relacionamento e até pelo menos o início do mês de Outubro de 2021, que a assistente trabalha no estabelecimento de restauração e bebidas, sito na Rua ..., cuja identificação completa não foi possível apurar.
3. Sucede que, a partir do mês de Julho de 2021, o comportamento do arguido começou a pautar-se por controlo da vida pessoal da assistente, designadamente impedindo-a de contactar com amigos seus, de quem tinha ciúmes e, posteriormente, começou a mostrar desagrado perante o facto de a mesma terminar o seu horário de trabalho e regressar a casa após as 20:30h da noite, alegando que a mesma não passava tempo consigo, o que originava discussões entre o então casal.
4. Na sequência do ambiente de controlo experienciado pela assistente, ambos passaram a dormir em quartos separados na residência descrita em 1., a partir do início do mês de Agosto de 2021, sendo que aquela dormia com a porta fechada, para impedir que o arguido entrasse no quarto onde pernoitava.
5. Posteriormente, no dia 10/09/2021, o arguido abandonou a residência descrita em 1. e a relação terminou no dia 15/09/2021.
6. Em data não concretamente apurada, mas situada no período compreendido entre pelo menos o mês de Janeiro de 2020 até ao dia 15/09/2021, o arguido entrou no quarto da assistente e retirou do mesmo um relógio da marca “...”, 2 fios de ouro, 2 anéis e um solitário, bem como diversos brincos, sendo que, posteriormente, a contactou, de modo não concretamente apurado, para devolver tais bens.
7. No período compreendido entre o início do mês de Agosto de 2021 e até, pelo menos, a data anterior ao dia .../.../2021, o arguido começou a perseguir e a importunar a assistente através de diversas chamadas telefónicas e do envio de diversas mensagens escritas (“SMS”) para n.ºs de telemóvel ...52 e ...64, então utilizados por esta, ou para o n.º adstrito ao seu local trabalho, que não foi possível apurar, através do n.º de telemóvel ...35 e, posteriormente, do n.º ...08, desta forma demonstrando estar ciente das rotinas diárias da mesma ofendida e dizendo-lhe, inter alia, que o “roubou”, sendo que tal situação se tem vindo a agravar com o passar do tempo, e para as quais remetemos, dando-as aqui por reproduzidas para todos os efeitos legais.
a) Designadamente (quanto às mensagens):

- 19/08/2021, recebidas pela ofendida pelo menos às 18:47h: “eu quando vim para aqui tive que pagar a tua dívida empretates o CC.mais o das obras. I tu fazesisto. queres guerra? Eu quero paz”; “eu tinha vergonha. Nunca jures pelos teus netos. Agora acordei”; “o ditado antigo. Tudo se paga neste mundo., o que é preciso calma.não enganes mais ninguém”;
- 02/09/2021, recebidas pela ofendida pelo menos às 16:04h: “A tua sentença já está feita.”; “Pensas que sou algum palhaço. Estas enganada”; “estás a gozar com 11500euros meus.
Tens de pagar (emoji a sorrir)”;
- 02/09/2021, recebidas pela ofendida pelo menos às 19:51h: “só te digo uma coisa i mete na cabeça. Não estás a brincar com os teus netos. Mete na cabeça”; “eu tinha vergonhja de andar na rua. Tu roubaste me”;
- 02/09/2021, recebidas pela ofendida pelo menos às 19:57h: “ainda me deixaste uma dívida de um cartão de crédito nas finanças.eu nunca tive cartão crédito.vais pagar tudo eu não chamo AA com AA a meio”.
- 06/09/2021, recebidas pela ofendida pelo menos às 08:05h: “parabéns”; “vais festejar à minha custa do que me roubaste”;
- 06/09/2021, recebidas pela ofendida pelo menos às 19:45h: “estás a vir a janela muitas vezes”.
- 13/10/2021, recebida pela ofendida ás 19:54h: “Estou à tua espera. Vai ser hoje que vais dar a cara.”;
- 14/10/2021, recebida pela ofendida às 17:08: “já passei a ver te via. Vi as janelas avertas.
Passai na casa da tua filha nem o carro vi dei um tk. Estou em ... i vai ser hoje”.
- 14/10/2021, recebida pela ofendida às 18:13h: “enquanto não falares comigo de cara a cara vais pagar mais juro.tu é que sabes. Eu é dificel esquecer quem me rouva.vaite ficar caro. olha o que digo. Sou calmo se não mexer comigo agora pensa.”
- 15/10/2021, recebida pela ofendida às 01:30h: “estou aqui a tua espera”.
- 25/10/2021, recebida pela ofendida pelo menos às 11:15h: “andas em limpeza. “O piriquito está a pagar frio”; “tde alguma maneira des de pagar. Eu quero apanhar- te na rua”; “vou por uma foto tua no feicebok a dizer que me roubaste”.
- 27/10/2021, recebida pela ofendida às 15:01h “Daqui a pouco vou passar por aí”; “quero estar contigo”;
- em data não concretamente apurada, mas situada antes do dia .../.../2021, pelas 17:00h e 20:50h, a assistente recebeu no seu telemóvel as seguintes mensagens: “vai apanhar a roupa.
Avental preto. Eu vou-te apertar o pescoço ainda este ano verdade”.

b) designadamente (quanto às chamadas telefónicas):

- 28/11/2021, o arguido, através do n.º de telemóvel ...08 efectuou duas chamadas telefónicas para a assistente, a qual não atendeu, às 04:59h e outras duas às 22:13h;
- 27/11/2021, o arguido, através do n.º de telemóvel ...08 efectuou uma chamada telefónica para a ofendida, a qual não atendeu, às 15:36h;
8. Em data não concretamente apurada, mas situada, sensivelmente, na primeira metade do mês de Outubro de 2021, o arguido contactou telefonicamente para um dos n.ºs da assistente, a qual passou o telefone para o seu então chefe de trabalho, que atendeu a chamada e, em conversa com o mesmo, quando foi dito ao arguido que a ofendida não podia atender porque estava a trabalhar, este retorquiu: “o quê?! Está a dar umas fodas?!”.
9. Ainda no mesmo período temporal, sem que seja possível concretizar data, o arguido telefonou para o local de trabalho da assistente, tendo atendido a testemunha DD, patrão da ofendida.
10. Na sequência da conversa, o arguido disse “vou matar essa filha da puta”, referindo-se à assistente.
11. No dia 5 de Novembro de 2021, o arguido deslocou-se ao local de trabalho da assistente, melhor descrito em 2., onde se disse que ia colocar fotografias da mesma, nas quais dizia que a mesma era uma “puta, uma ladra”.
12. Na sequência da conduta supra descrita, a assistente passou a sentir-se perseguida, importunada e constrangida na sua liberdade de determinação, na vida privada, na sua paz e sossego, chegando inclusivamente a recear pela sua própria vida e integridade física e a ter receio de circular sozinha na rua por o arguido a poder seguir na via pública ou, até, na sua residência, como tem vindo a fazer, mais se sentido humilhada e atingia na sua honra e consideração pelo teor depreciativo das mensagens que o denunciado lhe tem vindo a enviar.
13. Por seu turno, com a conduta supra descrita, o arguido agiu com o propósito concretizado de molestar a sua saúde física e psíquica, a liberdade de determinação, paz, sossego e recato pessoal da assistente, mais sabendo que atentava contra o seu bem-estar emocional e a atingia na sua honra e consideração e, ainda, que a mesma era e havia sido sua companheira.
14. O arguido sabia que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei.
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3 O direito.

A questão a decidir nos autos tem que ver com os pressupostos da punição e com a alegação factual que é necessário existir na acusação para que, desde que provada, aqueles se possam considerar preenchidos, para se fundamentar assim a aplicação ao agente de uma pena ou medida de segurança.

A matéria consta dos artigos 10.º a 20.º do Código Penal, sendo, precisamente, essa a epígrafe do capítulo primeiro do título segundo do livro primeiro do referido diploma legal – pressupostos da punição.

“A definição possível, hoje em dia tida como mais correta ou mais aproximada da verdade, que quadra a qualquer sistema penal idêntico ao nosso, é: crime é uma ação típica, ilícita, culposa e punível.” – Teresa Pizarro Beleza, Direito Penal, II Vol. pag. 15, AAFDL.

Nenhum problema se coloca nos autos em relação ao preenchimento pela narração factual acusatória dos pressupostos da tipicidade objetiva e da ilicitude da conduta – os factos referentes ao comportamento do agente subsumem-se claramente a, pelo menos, parte do tipo de ilícito que consta do artigo 152º nº1 alínea b), e nºs 2, alínea a), 4, do Código Penal; no primeiro caso, porque o comportamento descrito integra, pelo menos parte, da previsão típica, no segundo, porque tal comportamento viola bens jurídicos protegidos e tutelados pela norma, como sejam, por exemplo, a dignidade humana, a liberdade de autodeterminação, a tranquilidade e a saúde psíquicas.

O dissídio ocorre, portanto, em relação aos elementos subjetivos da infração.

A decisão recorrida entende que a alegação factual da acusação no que se refere ao preenchimento destes elementos, designadamente do dolo, é insuficiente.

A este respeito, dispõe o Código Penal o seguinte:

Artigo 14.º
Dolo
1 - Age com dolo quem, representando um facto que preenche um tipo de crime, actuar com intenção de o realizar.
2 - Age ainda com dolo quem representar a realização de um facto que preenche um tipo de crime como consequência necessária da sua conduta.
3 - Quando a realização de um facto que preenche um tipo de crime for representada como consequência possível da conduta, há dolo se o agente actuar conformando-se com aquela realização.


Resulta assim da lei que o dolo é um dos pressupostos da punição, ou, mais rigorosamente “(…) um dos fundamentos possíveis da imputação” – cfr. Teresa Pizarro Beleza, ob. cit., loc. cit., pag. 161.

“Dolo quer dizer, como aqui o entendemos, o elemento subjetivo do tipo de crime que consiste no conhecimento dos elementos objetivos desse tipo e na vontade de praticar um certo ato ou de atingir um certo resultado (…) dolo corresponde ao conhecimento e à vontade de praticar um certo ato que é tipificado na lei como crime.” – cfr. ob. cit., loc. cit., pag. 166.

“É vulgar distinguir, dentro do dolo, para efeitos de análise e de entendimento, fundamentalmente, dois elementos: o chamado elemento intelectual e o chamado elemento volitivo. O elemento volitivo corresponde ao elemento querer a prática de um certo facto ou querer a produção de um certo resultado.” – cfr. ob. cit., loc. cit., pag. 166.

“Para se poder dizer que há dolo em relação a um certo crime, é necessário, em primeiro lugar, que o agente tenha conhecimento dos elementos desse mesmo crime. Por exemplo, (…) para se poder dizer que alguém tem dolo de passagem de moeda falsa, esse alguém tem de saber que a moeda que lhe entregam para passar é falsa (..). Todos os elementos essenciais do facto típico, da parte objetiva do tipo de crime tem de ser conhecidos pelo agente para se poder dizer que ele atuou dolosamente e, portanto, preencheu, nesse aspeto subjetivo, o tipo legal e crime.” – cfr. ob.cit., loc. cit, pag. 167.

O elemento intelectual, ou seja, o conhecimento, desdobra-se em dois vetores, quais sejam, o descritivo e o normativo.

Os elementos descritivos do facto típico correspondem a conceitos da linguagem comum, vulgar, como, por exemplo, pessoa para o crime de homicídio e coisa para os crimes de furto ou dano.

Os elementos normativos do facto típico são aqueles que, constando do tipo, não são reconduzíveis à linguagem comum, consistindo em conceitos jurídicos derivados de regras legais: por exemplo, o caráter alheio da coisa subtraída no crime de furto, que resulta das disposições legais sobre o direito de propriedade – cfr. ainda ob. cit., loc. cit, pag. 170, e Figueiredo Dias, Direito Penal, Parte Geral, Tomo I, Coimbra Editora, 2.ª Edição, pag. 349 e segs., em especial, pag. 351.

A disposição legal do Código Penal acima transcrita contém, evidentemente, estes dois elementos na sua previsão:

Age com dolo quem,

- representando um facto que preenche um tipo de crime (elemento intelectual),

 - actuar com intenção de o realizar (elemento volitivo).

Assim, em todos os tipos de dolo, é necessário, em primeiro lugar, tal como ensina a autora que se tem citado, e como diz a lei, representar um facto que preenche um tipo de crime.

Representar é um vocábulo com imensos significados, mas o que para aqui importa é o de “trazer à memória” – cfr. Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea da Academia das Ciências de Lisboa, das Verbo, Vol. II pag. 3204. Assim, representar é ter presente no intelecto, na memória, um determinado cenário (palavra também intimamente ligada à representação), por assim dizer, que corresponde a um (tipo de) crime previsto na lei.

Só depois de realizar esta operação intelectual, racional, é possível então atuar com o intuito de levar a cabo a cena que se representou no intelecto.

Argumentando a respeito do dolo, diz-se na decisão recorria que:

Efetivamente, na acusação deduzida, nada se diz quanto à liberdade da ação.
(…)
Também nada é dito na acusação quanto à consciência da ação por parte do arguido, no que concerne ao propósito de molestar a saúde física da assistente.

Ou seja, no entendimento subjacente à decisão recorrida, falta dizer na acusação que o agente agiu de modo livre e consciente – o primeiro para permitir a  conclusão de que ele podia ter agido de modo diverso, em conformidade com o direito (o que, para alguns autores, tem que ver com o afastamento das causas de exclusão da culpa - o arguido pôde determinar a sua ação); o segundo, para demonstrar que o arguido representou na sua consciência todas as circunstâncias do facto (no dizer da decisão recorrida, se bem percebemos, para assegurar o elemento cognitivo do dolo).

Assim sendo, entende a decisão recorrida que tudo isto tem que ver com o dolo; na verdade, lê-se ali que:

De facto, analisada a mesma à luz dos considerandos supra expostos, verifica-se que não indica todos os factos dos quais se possa concluir pelo preenchimento do dolo.

Ora, como é consabido, a configuração dogmática do dolo penal, designadamente da sua abrangência, bem como a sua arrumação dentro das categorias pertinentes à teoria da infração penal é objeto das mais controversas e dilacerantes discussões na Doutrina nacional e estrangeira.

Para a escola clássica, o dolo integrava-se na culpa, assumindo esta uma dimensão puramente psicológica – haveria culpa do agente caso o facto estivesse ligado à sua vontade (do grego psyque - mente). Assim, o dolo era para esta orientação um elemento da culpa penal.

A escola neoclássica veio introduzir um conceito normativo de culpa, acrescentando, por assim dizer, àquela maneira de ver, o conceito de censurabilidade do ato – assim, além daquela ligação psicológica entre o facto e a mente da pessoa, seria necessário averiguar se sobre o comportamento deste modo apurado era possível exercer um juízo de censura (procurava-se, desta forma, entre outras coisas, obviar ao caso de alguém ter praticado um ato criminoso coagido). E diz-se que se trata agora, não apenas de um juízo psicológico de culpa, mas já de um juízo normativo de culpa porque se vai proceder a uma análise, a um exame, da conduta, com base em determinados parâmetros para concluir, ou não, pela sua reprovação – norma era o nome que os geniais pedreiros e carpinteiros romanos davam ao esquadro, que garantia o carater absolutamente reto dos ângulos, bem como a incólume perpendicularidade das construções, assegurando assim a sua admirável estabilidade (muitos, em pé até aos dias de hoje, como é consabido), passando a usar-se essa expressão como regra, padrão, modelo, sendo, portanto, normallis, o que é ou está de acordo com a regra, o que segue o padrão.

“E para esse juízo de censura, esse juízo de culpa, para além desse elemento de ligação psicológica, isto é, para além de se verificar se a pessoa agiu efetivamente com dolo, com intenção, ou se agiu apenas com negligência, com descuido, interessa saber se naquelas circunstâncias era exigível que a pessoas e portasse de outra maneira, se a pessoa podia comportar-se de outra maneira, se lhe era humanamente e socialmente, e portanto juridicamente, exigível que tivesse feito outra coisa.
Isso significa, portanto, que o juízo de culpa implica uma série de elementos, implica por um lado verificar se houve dolo ou negligência, implica por outro lado verificar se a pessoa é imputável, isto é se tem, em termos de idade ou saúde mental, condições de poder ser responsabilizada pelos seus atos, e para além disso saber se, no processo de motivação que levou a pessoa a uma certa decisão, não houve intervenção de elementos estranhos que lhe tirassem a liberdade de decisão. Será justamente essa tal situação em que uma pessoa age sob uma coação moral, psíquica, em que, portanto, se pode dizer que a pessoa não é censurável” – cfr. Teresa Pizarro Beleza, ob. cit.,loc.cit., pag. 68.

Por último, a escola finalista, partindo do conceito de ação final – cada comportamento humano tem uma finalidade -, vai propor que a ação penalmente relevante já não é a pura ação exterior do agente (escola clássica), ainda que traduzida na negação de valores (escola neoclássica), mas antes “(…) um comportamento humano através do qual as pessoas utilizam o seu saber do mundo objetivo, o seu saber das leis causais desse mundo para atingir uma certa finalidade”. Por esta perspetiva, “ (…) o dolo, ou seja, a intenção que a pessoa tem quando pratica uma certa ação que corresponde a um crime, não é já uma forma ou um elemento da culpa; o dolo é um elemento essencial da própria ação,  da ação proibida pelo direito penal, i.e., do tipo legal de crime.” -  cfr. Teresa Pizarro Beleza, ob. cit., loc. cit, pag. 72. O dolo é assim deslocado da culpa para o tipo. O juízo de culpa é agora puramente normativo, ou seja, já não se socorre, como faziam os neoclássicos, dos elementos de ligação psicológica para graduação do juízo de culpa, pois este foram definitiva e exclusivamente remetidos para o tipo – e este juízo de culpa é aquilatado através de dois elementos, quais sejam, a imputabilidade e a consciência da ilicitude.

Assim vemos que para a primeira das orientações, o dolo é a culpa, para a segunda o dolo, associado à censurabilidade, é um dos componentes do juízo de culpa, e para a terceira o dolo é um elemento do tipo, o tipo subjetivo, sendo a culpa um juízo puramente normativo.

 No finalismo, como se disse já, a imputabilidade e a consciência da ilicitude são, mais que pressupostos, elementos do juízo de culpa – em relação a isto, consta da acusação que o arguido sabia que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei, pelo que, sendo seguro que não se refere o acusador à inexistência de erro sobre a proibição, previsto no artigo 16.º, n.º 1, do Código Penal, está obviamente a afirmar que o agente tinha consciência da ilicitude.

Portanto, em face destas dissonâncias doutrinárias, que aqui se apresentam de forma comprimidamente resumida, não é incontornável que os elementos que a decisão recorrida entende faltarem na acusação digam respeito ao dolo - podem dizer ou não, conforme a posição doutrinária assumida.
Repare-se que o Prof. Cavaleiro de Ferreira, por exemplo, defende que o elemento cognitivo do dolo inclui a representação da ilicitude do facto, afirmando mesmo que “(…) a consciência da ilicitude faz parte da estrutura do dolo, pois que a ilicitude é objeto do dolo.” – cfr. Lições de Direito Penal, Parte Geral I, pag. 292, Almedina, Reimpressão da Edição de 1989. Sobre a intrincada questão da relação entre dolo e falta de consciência da ilicitude, veja-se com muito interesse a exposição do Prof. Figueiredo Dias, in Direito Penal, Parte Geral, Tomo I, 2.ª edição, pag. 531 e segs.

Por outro lado, o Prof. Eduardo Correia, um neoclássico, tal com os autores citados no parágrafo anterior, embora o segundo deles com significativas particularidades, por assim dizer, entende ainda que o dolo contém em si, na sua componente volitiva, além do elemento objetivo de querer (psicologicamente, mentalmente) o facto, o elemento emocional representado pela atitude interior do agente, revelador de que “(…) lhe não repugna a produção desse facto contrário ao direito” – cfr. Direito Criminal, Vol. I, pag. 375/376, Almedina, Reimpressão. Numa versão ainda mais aprofundada deste modo de ver, o Prof. Figueiredo Dias conclui pela existência, a partir dessa atitude íntima ou interior de um verdadeiro tipo de culpa – ob. cit., loc. cit., ag. 530, e Teresa Pizarro Beleza, ob. cit., loc. cit., pag. 205.

Vemos, deste modo, diferentes configurações teóricas entre a escola clássica e a neoclássica, e algumas divisões dentro desta última, em contraposição clara com a orientação finalista, na qual se pode observar uma maior compartimentação entre os planos de análise da teoria da infração, designadamente no que se refere ao dolo, à culpa e à consciência da ilicitude.

Importa, contudo, saber, não obstante o local onde se arrumem todas estas categorias, se os factos aludidos são ou não indispensáveis para apreciação da responsabilidade do agente.

Recordemos o que diz a acusação em relação aos, para tentar dizer de modo mais abrangente possível, elementos subjetivos da infração:

13. Por seu turno, com a conduta supra descrita, o arguido agiu com o propósito concretizado de molestar a sua saúde física e psíquica, a liberdade de determinação, paz, sossego e recato pessoal da assistente, mais sabendo que atentava contra o seu bem-estar emocional e a atingia na sua honra e consideração e, ainda, que a mesma era e havia sido sua companheira.
14. O arguido sabia que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei.

Vamos decompor o propósito concretizado do agente:

- molestar a sua saúde física e psíquica: ora, uma vez que não existe a alegação de qualquer agressão física à vítima, não parece que o primeiro propósito possa existir, a não ser no sentido em que toda a perturbação emocional pode ter repercussões físicas, através dos chamados efeitos psicossomáticos; além disso, a factualidade alegada suporta o desiderato pessoal do agente de perturbar a saúde mental ou psíquica da vítima;

- a liberdade de determinação, paz, sossego e recato pessoal da assistente, ou seja, mais concretamente, em face da factualidade alegada, impedi-la de conviver com os seus amigos, de se movimentar livremente, de lhe provocar medo e sensação de insegurança física e até receio de perda da vida, de a insultar, de a difamar – o agente quando atuou não orientou na sua mente, certamente, o seu comportamento para atacar a liberdade de determinação da vítima ou o seu recato; quis, mais prosaica e menos elaboradamente, impedi-la de estar com os  amigos, assustá-la, insultá-la difamá-la, etc.

- mais sabendo que atentava contra o seu bem-estar emocional e a atingia na sua honra e consideração: poderíamos aceitar, com algum esforço interpretativo, que aqui se situaria o elemento intelectual do dolo, pois a alegação de sabendo, isto é, conhecendo, visa, parece-nos, precisamente desse fim; todavia, trata-se, em termos de alegação, de um conhecimento algo conclusivo, de um conhecimento de conceitos que não estão sequer descritos no tipo, não obstante ser óbvio que, estes como os anteriormente referidos, são vetores por esta incriminação protegidos, constando ainda de forma evidente dos objetivos protegidos pela Convenção de Istambul; talvez fosse preferível dizer que sabia que com o seu comportamento a impedia de conviver com os amigos, a assustava, a insultava, etc.

- e, ainda, que a mesma era e havia sido sua companheira – aqui sim, um facto simples e cristalino, importantíssimo nesta sede, pois imprescindível é que o agente saiba que a vítima dos seus atos tem esta qualidade, já que só assim se pode integrar o tipo de crime de violência doméstica.

Vejam-se casos concretos de simplicidade factual na alegação do segmento intelectual do dolo:

“ (…) para se poder dizer que (…) uma pessoa tem conhecimento, para efeitos de se afirmar a existência de dolo, em relação ao crime de homicídio, ela tem de saber que aquilo contra o que dispara (por exemplo) é uma pessoa, e não por hipótese um animal ou uma árvore ou uma sombra  (…), para se poder dizer que uma pessoa tem dolo de emissão de cheque sem provisão essa pessoa tem de saber que, na data em que é devido o pagamento do cheque por parte do banco, a sua conta não tem dinheiro suficiente para pagar esse cheque. Todos os elementos essenciais do facto típico, da parte objetiva do tipo de crime, têm de ser conhecidos pelo agente para se poder dizer que ele atuou dolosamente e, portanto, preencheu, nesse aspeto, o tipo legal de crime.” – Teresa Pizarro Beleza, ob. cit., loc., cit, pag. 167. Assim, percute-se, interessa o conhecimento de todos os elementos essenciais do facto típico; nada mais que isso, mas, pelo menos isso.

No que se refere à consciência da ilicitude, constante do ponto 14.º da acusação, nada há a objetar.

Assim, verificamos que na alegação da factualidade referente ao dolo (para alguns autores, como se viu, referente ao dolo e à culpa), a acusação socorreu-se amiúde de conceitos e de juízos conclusivos, sendo, pelo menos duvidoso, que em termos de cognoscibilidade por parte do agente da factualidade por si querida, o libelo introduzido em juízo seja plenamente satisfatório. E o duvidoso neste campo, atenta a enorme clivagem doutrinária existente, e as consequências a que pode levar a opção por umas ou por outras orientações, assume-se como particularmente significativo, mesmo em sede de apreciação liminar de uma acusação que se visa submeter a julgamento.

Evidente é que no que concerne ao caráter livre da conduta, nada de absolutamente claro se diz na acusação.

“Hoje em dia o conceito moderno, na dogmática, de culpabilidade ou de culpa no sentido próprio tem que ver fundamentalmente com dois elementos: por um lado o conhecimento da ilicitude do facto e por outro a liberdade de se determinar segundo esse conhecimento.” Cfr. Teresa Pizarro Beleza, ob. cit., loc. cit. P ag. 295.
Assim, diríamos, o juiz tem de dispor de elementos sobre o caráter livre da atuação. E sobre isso, como se disse antes, nada consta na acusação.

É certo que, por exemplo, o Prof. Figueiredo Dias afirma que “ nisto residirá a autêntica liberdade pessoal do homem, a sua característica irrenunciável: ele, no concreto existir, é sempre ser-livre” , e que, “ (…) toda a culpa é materialmente, em direito  penal, o ter de responder pelas qualidades juridicamente desvaliosas da personalidade que fundamentam um facto ilícito-típico e nele se exprimem.” – ob. cit., loc. cit., pag. 524/525, parecendo poder inferir-se daqui que o ser-livre  é a regra, que poderá ser afastada se ocorrer demonstração de causas de exclusão da culpa.
Nesta conformidade, talvez não seja arriscado afirmar que partindo natureza eminentemente de ser-livre da pessoa, apenas a demonstração de factos que a neguem teria relevância – como se disse, factos integradores de causas de exclusão da culpa.

E também nada consta da acusação a respeito da imputabilidade do agente.

É verdade que o Código Penal atual não elenca expressamente a culpa e a imputabilidade como pressupostos da punição, mas regula, nos artigos 17.º, 19.º e 20.º, os casos em que elas se não verificam, o que autoriza a afirmação de que assume a sua pertinência implícita - por isso que, por exemplo, mais não seja, na identificação do arguido na acusação deve constar a sua data de nascimento, para poder afastar-se a inimputabilidade legalmente presumida em função da idade inferior a 16 anos.

Ainda por isso, diz Cavaleiro de Ferreira:

“Do Código de 1982 só consta a noção de inimputabilidade penal. A inimputabilidade penal é incapacidade de culpa; aliás é esta a expressão usada pelo Código alemão para substituir a de inimputabilidade. Correlativamente imputabilidade penal será a capacidade de culpa. Definindo inimputabilidade, indicam-se, como faltosos, os requisitos da imputabilidade.
A preferência pela definição de inimputabilidade resulta de que, sendo o homem um ser racional e livre, por sua natureza é normalmente imputável: a imputabilidade não carece de comprovação. A falta de imputabilidade, ou inimputabilidade, é que precisa de ser provada.” – cfr. oc. Cit., loc. cit., pag. 271.

Por este modo de ver, não seria preciso, igualmente, alegar factualidade para demonstrar a imputabilidade penal, sendo desnecessária a demonstração de que o agente atuou sem perturbação do espírito ou da mente, encontrando-se, portanto, em condições de imputabilidade penal. Todavia, esta posição é discutida, como se viu, não faltando quem exija a demonstração da imputabilidade do agente, que pode ser feita pela utilização de um simples vocábulo, conscientemente, por exemplo, ou por outra formulação que alcance o mesmo desiderato.

Todos temos presente que ao longo de décadas vimos nas acusações determinadas formulações tendentes à integração dos elementos subjetivos da infração, mais ou menos cristalizadas ou normalizadas, mas, não obstante, eficazes, no sentido de evitar todas estas elucubrações teóricas, muito interessantes, mas reveladoras de profundíssimas divergências de entendimento, e, não raras vezes, causadoras das mais surpreendentes consequências.

Muito provavelmente, algumas dessas “fórmulas” tiveram a sua origem no anterior Código Penal (de 1886) que estatuía no artigo 26.º que somente podem ser criminosos os indivíduos que têm a necessária inteligência e liberdade. Talvez tenha sido por isso que a sacramental fórmula agiu livre, deliberada e conscientemente, que todos conhecemos, tenha passado a integrar a maioria das acusações.
E a Jurisprudência continua a acolher essa formulação, como se vê nas decisões exemplificativamente a seguir referidas:

O Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 25.02.2015, processo n.º 290/13.9TACNT.C1, disponível na Internet, em www.dgsi.pt, onde se pode ler que:
“Num crime doloso – só esse está aqui em causa – da acusação há-de constar necessariamente, pela sua relevância para a possibilidade de imputação do crime ao agente, que o arguido agiu livre (afastamento das causas de exclusão da culpa - o arguido pôde determinar a sua ação), deliberada (elemento volitivo ou emocional do dolo - o agente quis o facto criminoso) e conscientemente (imputabilidade – o arguido é imputável), bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei (elemento intelectual do dolo, traduzido no conhecimento dos elementos objetivos do tipo). Quanto ao elemento volitivo não se basta com a alegação isolada de uma atuação deliberada, mas antes com a descrição do que efetivamente foi querido pelo agente, ou seja, que a arguida quis ofender a honra e consideração do assistente ou que sabiam que as expressões utilizadas eram suscetíveis de ofender, nisso se traduzindo querer praticar um facto criminoso.” – ou, no seu sumário, “Não é admissível a presunção do dolo com recurso à factualidade objetiva descrita na acusação; a lei exige a narração, ainda que sintética, dos factos - de todos os factos - que fundamentam a aplicação ao arguido de uma pena, não se contentando, pois, com “subentendimentos” ou “factos implícitos.
- Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 18.09.2018, processo n.º - 1453/15.8S5LSB.L1-5: disponível na Internet, em www.dgsi.pt, onde se pode ler que :
“- A falta de descrição, na acusação, dos elementos subjetivos do crime, nomeadamente dos que se traduzem no conhecimento, representação ou previsão de todas as circunstâncias da factualidade típica, na livre determinação do agente e na vontade de praticar o facto com o sentido do correspondente desvalor, não pode ser integrada, em julgamento, por recurso ao mecanismo previsto no art. 358.º do CPP”. - Se dos fundamentos de facto da decisão recorrida (factos provados) não consta a narração concretizada da factualidade integradora dos elementos do tipo subjetivo do crime imputado (que na acusação pública descritos também se não encontram) preenchidos não estão os elementos típicos desse crime nem, aliás, de qualquer outro, pelo que o recorrente tinha necessariamente de ser absolvido.”
- Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 11.09.2018, processo n.º 537/15...., disponível na Internet, em www.dgsi.pt:, no qual se pode ler que:
 “A falta de descrição, na acusação, dos elementos subjetivos do crime, nomeadamente dos que se traduzem no conhecimento, representação ou previsão de todas as circunstâncias da factualidade típica, na livre determinação do agente e na vontade de praticar o facto com o sentido do correspondente desvalor, não pode ser integrada, em julgamento, por recurso ao mecanismo previsto no art. 358.º do CPP, sendo necessária a narração, na acusação, dos factos conformadores da consciência da ilicitude, enquanto elemento do dolo da culpa e, consequentemente, da sua comprovação (ou não) em julgamento.”

Assim, não tem de modo evidente acolhimento na Jurisprudência a seguinte afirmação que consta da motivação de recurso:

O que vale por dizer que resulta da acusação pública que o arguido sabia o que fazia, queria fazê-lo e agiu com a consciência de que praticou um crime e que tal só poderia ter ocorrido de forma livre.

O segmento que tal só poderia ter ocorrido de forma livre é, como se viu, doutrinariamente muito discutido e jurisprudencialmente, maioritariamente, pelo menos, recusado.

E o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 28/03/2019, referido pelo recorrente na sua motivação em favor do seu entendimento, é proferido sobre um diferente enquadramento: na verdade, naquele aresto diz-se que dos factos dados como provados na decisão recorrida (e, portanto, também na acusação) constava que agiram os referidos arguidos deliberada, voluntária e conscientemente, e afirma-se que voluntariamente também quer dizer livremente, censurando-se, assim, a decisão recorrida por apontar a omissão da palavra livre nos factos provados. Ora, na acusação que se aprecia neste recurso, nada disto consta: nem deliberada, nem voluntaria (ainda que no sentido de livre) nem conscientemente, como se viu.

E na fundamentação do Acórdão Uniformizador de Jurisprudência n.º 1/2005 (DR, I Série, n.º 18, de 27 de Janeiro) lê-se que:

Em conclusão: a acusação, enquanto delimitadora do objeto do processo, tem de conter os aspetos que configuram os elementos subjetivos do crime, nomeadamente os que caracterizam o dolo, quer o dolo do tipo, quer o dolo do tipo de culpa no sentido acima referido, englobando a consciência ética ou consciência dos valores e a atitude do agente de indiferença pelos valores tutelados pela lei criminal, ou seja: a determinação livre do agente pela prática do facto, podendo ele agir de modo diverso; o conhecimento ou representação, de todas as circunstâncias do facto, tanto as de carácter descritivo, como as de cariz normativo e a vontade ou intenção de realizar a conduta típica, apesar de conhecer todas aquelas circunstâncias, ou, na falta de intenção, a representação do evento como consequência necessária (dolo necessário) ou a representação desse evento como possível, conformando-se o agente com a sua produção (dolo eventual), actuando, assim, conscientemente contra o direito.
(…)

Tudo isso, que tradicionalmente se engloba nos elementos subjetivos do crime, costuma ser expresso na acusação por uma fórmula em que se imputa ao agente o ter atuado de forma livre (isto é, podendo ele agir de modo diverso, em conformidade com o direito ou o dever-ser jurídico), voluntária ou deliberadamente (querendo a realização do facto), conscientemente (isto é, tendo representado na sua consciência todas as circunstâncias do facto) e sabendo que a sua conduta é proibida e punida por lei (consciência da proibição como sinónimo de consciência da ilicitude).

(…)

De forma alguma será admissível que os elementos do dolo, quando não descritos na acusação, possam ser deduzidos por extrapolação dos factos objetivos, com «recurso à lógica, à racionalidade e à normalidade dos comportamentos, de onde se extraem conclusões suportadas pelas regras da experiência comum»

(…)

Ou seja: a exigida narração dos factos é a de todos os factos constitutivos do tipo legal de crime, sejam eles pertencentes ao tipo objetivo do ilícito, sejam ao tipo subjetivo e ainda, naturalmente, na sequência do que temos vindo a expor, os elementos referentes ao tipo de culpa. A factualidade relevante, como factualidade típica, portadora de um sentido de ilicitude específico, só tem essa dimensão quando abarque a totalidade dos seus elementos constitutivos. Não existem puros factos não valorados, como vimos a propósito, nomeadamente, das teorias do objeto do processo, e a valoração específica que aqui se reclama, consonante com um tipo de ilícito, só se alcança com a imputação do facto ao agente, fazendo apelo à representação do facto típico, na totalidade das suas circunstâncias, à sua liberdade de decisão, como pressuposto de toda a culpa, e, envolvendo a consciência ética ou dos valores, à posição que tomou, do ponto de vista da sua determinação pelo facto. Sem isso, não está definida a conduta típica, ilícita e culposa. 

Não se trata, portanto, de exigência de fórmulas ou de automatismos de alegação; o que está em causa é a alegação, se bem que sintética, o mais completa e abrangente possível, tendo em conta, designadamente, as várias posições conhecidas sobre a teoria da infração penal, equacionando todas as perspetivas de resolução do objeto do processo, de modo a que a possibilidade da prolação de uma decisão puramente formal seja reduzida ao mínimo – é quase como quando se acusa por dolo direto, para poder abranger um caso de dolo eventual ou necessário, ou por homicídio doloso para poder comportar o negligente, ou outros casos semelhantes. E, convenhamos, o que está em causa é até muito pouco em termos puramente materiais (meia dúzia de palavras, dir-se-ia), em comparação com as extensas, complexas e controversas questões suscitadas pela sua ausência.
Ainda, por exemplo, nesse mesmo Acórdão Uniformizador diz-se:

Na generalidade dos casos, porém, o sentido ou significação da ilicitude do facto promana da realização pelo agente da factualidade típica, agindo com o dolo requerido pelo tipo. Na verdade, em crimes como o de homicídio, ofensa à integridade física, furto, injúrias, pôr a questão de saber se o agente, que actuou conscientemente, representando todas as circunstâncias do facto, e querendo, mesmo assim, a sua realização, actuou ou não com conhecimento da proibição legal, isto é, se sabia que matar, agredir fisicamente uma pessoa, subtrair coisa alheia para dela se apropriar, ofender a honra de alguém, era proibido legalmente, seria o mesmo que questionar se ele efectivamente vivia neste mundo ou se não seria um extraterrestre acabado de aterrar neste planeta, como no filme de Steven Spielberg.
A essa pressuposta exigência responde o acórdão do STJ de 07/10/92, referido supra, 9.2.1., que à questão colocada de inexistir qualquer referência, na matéria de facto, ao conhecimento que o arguido, autor de um crime de homicídio, teria ou não teria da proibição legal, considerou que, «tendo [o arguido] agido livre e conscientemente com o intuito de tirar a vida ao filho, não podia deixar de conhecer o desvalor da sua conduta”.

Assim sendo, juntando esta posição à que o Prof. Cavaleiro Ferreira enuncia em relação à imputabilidade, e à que o Prof. Figueiredo Dias constrói em relação à culpa, ambas sinteticamente acima referidas, para, por exemplo, termos como verificado um crime de homicídio bastaria alegar e provar que A disparou a munição de uma pistola contra B para o matar, e que este morreu por causa das lesões causadas pelo projétil, bem sabendo A que B era uma pessoa, eventualmente com indicação dos motivos da atuação, se conhecidos – a imputabilidade presume-se, a culpa existe porque o agente é um ser-livre e a consciência da ilicitude é evidente, atenta a gravidade da conduta, importando apenas, portanto, averiguar se ocorre inimputabilidade, exclusão da culpa ou erro não censurável sobre a ilicitude. É um caminho possível, muito arriscado, contudo, atenta a nossa tradição neste campo, e passível das mais díspares soluções. Convém, contudo, recordar que no caso presente, para muitos cidadãos de mais arreigado e empedernido machismo, que ainda os há, talvez não seja assim tão evidente (embora, obviamente, o devesse ser) a ilicitude penal das condutas descritas nesta acusação. Mas, como se disse já, neste aspeto nada há a censurar à acusação, pois estão alegados factos demonstrativos da consciência da ilicitude.

Algo que nos deve fazer refletir sobre a necessidade das tais “fórmulas” tem que ver com a circunstância de elas, ou, pelo menos, algumas delas, não constarem, como é evidente, numa acusação de um inimputável em relação ao qual se pretende a aplicação de uma medida de segurança.

E, a finalizar, devemos ter sempre presente a lapidar afirmação de Jeschek: “Não há nenhuma teoria da infração que possa ser mais do que um projeto passageiro.” - citado por Teresa Pizarro Beleza, ob. cit., loc. cit., pag. 45 -, para trabalharmos com a maior abrangência e com a mais prudente das cautelas neste campo de tão burilada filigrana intelectual doutrinária, de modo a assegurar uma eficaz e rápida resolução dos litígios – repare-se que por causa de meia dúzia de palavras, se tanto, há uma alegada vítima e um arguido que esperam uma decisão sobre o objeto real do processo.

III DISPOSITIVO

Por todo o exposto, acordam os juízes que integram a Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães em negar provimento ao recurso, e, em consequência, confirmam a decisão recorrida.

Sem tributação.

Os Juízes Desembargadores

Bráulio Martins
Fátima Furtado
Florbela Sebastião e Silva