Ups... Isto não correu muito bem. Por favor experimente outra vez.
CUSTAS DE PARTE
NOTA DISCRIMINATIVA E JUSTIFICATIVA
TÍTULO EXECUTIVO
NOTIFICAÇÃO AO DEVEDOR
EXIGÊNCIA
Sumário
Inexistindo norma especial que determine que a notificação da nota de custas de parte tenha de ser feita diretamente, de forma pessoal, à parte devedora, é suficiente que a referida notificação se faça na pessoa do seu mandatário, em conformidade com as regras da notificação constantes dos artºs 221º e 247º do CPC e das regras gerais do mandato forense (artº 1157º do CC e 44º do CPC). Esta é a interpretação que se nos afigura de acordo com os ditames do artº 9º do CC.
Se o legislador pretendesse que a notificação fosse efectuada pessoalmente à parte vencida ter-se-ia expressado em consonância, tal como o fez no artº 31º, nº 1 do Regulamento das Custas Processuais.
À notificação da nota discriminativa e justificativa de custas de parte não há que aplicar analogicamente o artº 31º do RCP, pois não há lacuna a integrar (artº 10º do CC): não estamos perante um caso omisso e, ainda que se entendesse em sentido contrário, não procedem as razões justificativas da regulamentação do caso previsto naquele preceito. Com efeito, o artº 31º regula a conta de custas, concretamente a reforma e reclamação, numa relação jurídica que se estabelece entre os utentes dos serviços de justiça e o Estado, enquanto o artº 25º rege uma relação entre partes do processo.
Texto Integral
Acordam os Juízes da 8ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa
Nos autos de execução intentada por AC, S.A. e MASSA INSOLVENTE DE J, S.A. contra S, S.A., as exequentes apresentaram requerimento executivo do seguinte teor:
“1.–Por sentença datada de 14-12-2017, proferida no âmbito do processo n.º 0000, pelo Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste - Juízo Central Cível de Cascais - Juiz 2, a Executada foi condenada nos seguintes termos:
“Pelo exposto, decide-se julgar: A)-procedente a exceção perentória de caducidade invocada no tocante aos pedidos de € 579.452,02 (revisão de preços de trabalhos contratuais); € 347.659,52 (trabalhos a mais executados pela A. J.), € 37.940,81 (trabalhos a mais executados pela A. AC), deles absolvendo a R.; B)-a ação (principal) parcialmente procedente, por provada, e em consequência, condena-se a ré a pagar às autoras a quantia de € 724.553,63 (setecentos e vinte e quatro mil, quinhentos e cinquenta e cinco euros e sessenta e três cêntimos), deduzido o valor de € 102.214,72, acrescida de juros de mora desde a data da citação até integral pagamento, bem como a quantia que se vier a liquidar a título de revisão de preços de trabalhos a mais, em função do cronograma financeiro, até ao limite de € 86.356,50 (oitenta e seis mil, trezentos e cinquenta e seis euros e cinquenta cêntimos), absolvendo a R. do demais peticionado; C)-a ação (apensada) procedente, por provada, e em consequência, condenar a R. a reconhecer às AA. o direito à quantia de € 552.816,80 (quinhentos e cinquenta e dois mil, oitocentos e dezasseis euros e oitenta cêntimos), a título de sobrecustos indiretos, se, e na medida em que tenha recebido ou venha a receber da RF; de € 1.181.063,48 (um milhão, cento e oitenta e um mil, sessenta e três euros e quarenta e oito cêntimos), a título de indemnização por danos emergentes e lucros cessantes devidos às AA. referentes às atividades por estas desenvolvidas, se e na medida em que tenha recebido ou venha a receber da RF; de € 266.016,00 (duzentos e sessenta e seis mil e dezasseis euros), a título de trabalhos a mais e sobrecustos na execução de atividades das AA., se e na medida em que tenha recebido ou venha a receber da RF. D)-parcialmente procedente o pedido reconvencional deduzido na ação principal, relativamente ao valor de € 102.214,72 (já considerado na alínea A) deste dispositivo), absolvendo a A. AC do demais peticionado.
Custas da ação (principal e apensada) a cargo das autoras e da ré na proporção, respetivamente, de 2/6 e 4/6.
Custas dos pedidos reconvencionais a cargo das autoras e da ré, na proporção, respetivamente, de ¼ e ¾.” (cf. cópia que se junta como doc. 1., o qual se dá por integralmente reproduzido) 2.–As Exequentes e a Executada recorreram da referida decisão. 3.–Por acórdão datado de 13-05-2021, o Tribunal da Relação de Lisboa, decidiu o seguinte:
“IV.– DECISÃO
Destarte e por todo o exposto, acordam os Juízes desta 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa no seguinte:
no que concerne ao recurso interposto pelas Autoras J, S.A. (presentemente, “T habilitada para os termos da presente acção, em substituição de MASSA INSOLVENTE DA SOCIEDADE J., S.A., até ao limite do valor de € 653 005,77), e AC, S.A., em que figura como Ré S., S.A.:
I)- Julgar totalmente improcedente a apelação (ressalvando a alteração de redacção do facto provado 174, decorrente da impugnação da matéria de facto apresentada) ;
II)- Deferir, parcialmente, o requerido relativamente às custas na presente instância de recurso, no sentido de fixar o valor tributário da acção, para efeitos de custas, em 600.000,01 €, e indeferir a requerida dispensa das partes no pagamento do remanescente da taxa de justiça, bem como na redução do pagamento de tal valor ;
no que concerne ao recurso interposto pela Ré:
I)- Julgar a apelação parcialmente procedente, determinando-se a alteração do 1º segmento da alínea B) do dispositivo condenatório, no sentido de condenar a Ré a pagar às Autoras a quantia de 198.494,21 € (cento e noventa e oito mil quatrocentos e noventa e quatro euros e vinte e um cêntimos) = 294.871,27 (+) 5.837,66 € (-) 102.214,72 € ;
II)- Mantendo-se, no demais, o decidido na sentença apelada.
Relativamente à tributação:
- recurso das Apelantes Autoras:
Custas a cargo das Recorrentes/Apelantes, em virtude do pedido de fixação do valor tributário e dispensa ou redução do pagamento do remanescente de taxa de justiça não fazer propriamente parte do objecto recursório qua tale ;
- recurso da Apelante Ré:
Custas a cargo da Recorrente/Apelante e Recorridas/Apeladas/Autoras, na proporção, respectivamente, de 64% e 36%.” (cf. cópia que se junta como doc. 2, o qual se dá por integralmente reproduzido)
4.– A Exequente e as Executadas recorreram da referida decisão.
5.– O recurso da Executada não foi admitido, conforme decisões do Supremo Tribunal de Justiça datadas de 11-11-2021 e 15-12-2021 (cf. cópias que se juntam como docs. 3 e 4, os quais se são por integralmente reproduzidos), já transitadas em julgado.
6.– O recurso das Exequentes também não foi admitido, conforme decisões do Supremo Tribunal de Justiça datadas de 17-03-2022 e 11-05-2022 (cf. cópias que se juntam como docs. 5 e 6, os quais se são por integralmente reproduzidos), tendo esta última transitado em julgado no dia 27-05-2022.
7.– Assim, com a decisão proferida pelo Supremo Tribunal de Justiça, no dia 11-05-2022, e transitada em julgado no dia 27-05-2022, as questões em discussão nos presentes autos encontravam-se dirimidas em definitivo.
8.– Por tal, no dia 06-06-2022, e dentro do prazo previsto no artigo 25.º, n.º 1, do Regulamento das Custas Processuais, as Exequentes remeteram à Executada e ao Tribunal, nota discriminativa e justificativa de custas de parte (cf. cópia que se junta como doc. 7, o qual se dá por integralmente reproduzido)
9.– A referida nota discriminativa e justificativa não foi alvo de qualquer reclamação por parte da Executada.
10.– Até à presente data, não foi pago qualquer valor por parte da Executada, às Exequentes.
11.– Assim, a Executada deve à Exequente AC, S.A., a quantia de € 4.772,25.
12.– À referida quantia acrescem juros de mora, calculados à taxa de 4%, desde a data de vencimento do pagamento (17-06-2022) e até efetivo e integral pagamento, computando-se os vencidos, na presente data, em € 120,81.
13.– Bem como juros compulsórios, à taxa de 5%, desde a data de vencimento (17-06-2022), até efetivo e integral pagamento, computando-se os vencidos, na presente data, em € 151,01.
14.– A Executada deve à Exequente Massa Insolvente de J., S.A. a quantia de € 5.063,31.
15.– À referida quantia acrescem juros de mora, calculados à taxa de 4%, desde a data de vencimento do pagamento (17-06-2022) e até efetivo e integral pagamento, computando-se os vencidos, na presente data, em € 128,18.
16.– Bem como juros compulsórios, à taxa de 5%, desde a data de vencimento (17-06-2022), até efetivo e integral pagamento, computando-se os vencidos, na presente data, em € 160,22.
Nestes termos e nos demais de Direito que V. Exa. doutamente suprirá, deverá a Executada ser condenada a pagar as quantias de € 5.044,07, à Exequente AC, e € 5.351,71, à Exequente Massa Insolvente de J., S.A., acrescidas dos juros moratórios e compulsórios vincendos, calculados às taxas supra referidas, a contar desde a data da apresentação do presente requerimento até efetivo e integral pagamento do capital em dívida, e demais encargos com a execução.”
A executada deduziu embargos à execução. Alegou, em síntese, a inexistência de título executivo por não ter a parte, ora embargante, sido diretamente notificada da nota discriminativa das custas de parte, não bastando a notificação efetuada ao seu mandatário.
Conclui pela extinção da execução e consequente levantamento das penhoras.
As exequentes apresentaram contestação, concluindo pela improcedência dos embargos. Alegaram, em suma, que a notificação prevista no artigo 25.º, n.º 1, do RCP, é uma notificação entre sujeitos privados, em relação à qual o legislador não pretendeu impor o ónus de notificação pessoal. Mais aduziram que, ainda que assim não se entendesse, no dia 06/03/2023, a embargante foi pessoalmente notificada da execução e das notas discriminativas e justificativas de custas de parte, pelo que, sempre a partir dessa data, esta deve considerar-se pessoalmente notificada do conteúdo das notas discriminativas de custas de parte e interpelada para pagar. Por notificações datadas de 11/04/2023, a embargada AC e a embargante foram notificadas, no âmbito do processo n.º 0000, da conta de custas. Por comunicação datada de 20/04/2023, as embargadas enviaram, nos termos do disposto no artigo 25.º, n.º 1, última parte, nota discriminativa e justificativa de custas de parte retificada, que contempla os valores devidos na conta de custas, bem como os já cobrados nos presentes autos, para a mandatária da Embargante e também para esta. O não cumprimento do prazo de 10 dias previsto no artigo 25.º, n.º 1, do RCP, não preclude o direito da parte a receber custas de parte.
Com dispensa de realização de audiência prévia, foi proferido despacho saneador sentença do seguinte teor: “(…) Estabelecendo o nº 1 do artigo 25º do R.C.P. que “até 10 dias após o trânsito em julgado (…), as partes que tenham direito a custas de parte remetem para o tribunal, para a parte vencida e para o agente de execução, quando aplicável, a respectiva nota discriminativa e justificativa, (…).”, a única dúvida interpretativa é a de saber se “parte vencida” exclui o respectivo mandatário. Na interpretação defendida pela embargante, e contrária à regra geral do artigo 247º/1 do CPC, também as notas não poderiam ter sido remetidas pelo mandatário das ora exequentes – mas, sim e apenas, pelas próprias. Concorda-se com a conclusão das embargadas: nenhum motivo há para afastar, neste caso e apenas neste, a regra geral do nº 1 do artigo 247º do CPC. Decisão Pelo exposto, julgam-se os embargos improcedentes. Custas pela embargante.”
A executada/embargante recorre desta decisão, terminando a sua alegação com as seguintes conclusões, que aqui se reproduzem:
“A.– Vem o presente recurso interposto da Sentença com a ref. CITIUS n.º 144971941 que julgou totalmente improcedentes os embargos de executado apresentados pela Recorrente, e com a qual não pode a Recorrente conformar-se, porquanto fez errada interpretação e aplicação da norma legal aplicável ao caso.
B.– A norma contida no art.º 25, n.º 1 do RCP é perentória ao determinar que a nota discriminativa e justificativa das custas de parte deve ser remetida, pessoalmente, para a parte vencida.
C.– Não tendo a Recorrente sido notificada da nota discriminativa e justificativa das custas de parte, não existiu uma interpelação concreta, pelo que não se criou qualquer título executivo, para efeitos da alínea b) do n.º 1 do art. 703.º do CPC.
D.– É esta a solução que melhor se coaduna com a certeza e segurança que deve estar na base do título em causa e que melhor protege a parte vencida.
E.– Ademais, a propositura de uma ação executiva visa a adoção das providências adequadas à efetiva reparação do direito violado com base num título executivo.
F.– No caso sub judice, estamos perante um título composto, em conjunto, pela sentença condenatória nas custas stricto sensu e pela nota discriminativa e justificativa das custas de parte devidamente consolidada.
G.– Esta necessária consolidação não teve lugar no caso que ora nos ocupa, uma vez que a referida nota, ao contrário do legalmente estatuído, não foi enviada directamente à parte, tendo apenas sido enviada aqueles que eram os seus mandatários no processo donde emana a referida nota.
H.– Por conseguinte, os Recorridos não detêm um título executivo bastante que sustente a execução movida contra a Recorrente.
Termos em que, deve ser dado integral provimento ao presente Recurso de Apelação e, em consequência, ser revogada a Sentença a quo e substituída por outra que julgue integralmente procedentes os embargos deduzidos e, consequentemente, seja extinta a execução apensa a estes autos por inexistência de título executivo bastante.”
As exequentes/embargadas apresentaram contra-alegação, terminando com as seguintes conclusões:
1.- As próprias sentenças condenatórias são apenas notificadas aos mandatários das partes.
2.- Pelo que, o argumento de que a nota discriminativa deveria ser pessoalmente notificada à parte, porque chama a parte a fazer um pagamento, não pode obter vencimento.
3.- Também o entendimento de que a notificação pessoal da nota de custas de parte a esta se impõe em virtude da aplicação analógica do regime previsto no artigo 31.º, n.º 1, do RCP, não se apresenta correto.
4.- Com efeito, na situação prevista no artigo 31.º, n.º 1, do RCP, encontra-se prevista uma situação em que são devidas quantias processuais ao Estado.
5.- A notificação prevista no artigo 25.º, n.º 1, do RCP, é uma notificação entre sujeitos privados, em relação à qual o legislador claramente não pretendeu impor o ónus de notificação pessoal.
6.- É preciso ter presente que os mandatários representam as partes no processo e só podem deixar de o fazer caso exista uma renúncia ou uma revogação do mandato, que sempre será comunicado às demais partes no processo.
7.- Não faz qualquer sentido que toda e qualquer notificação no processo possa ser feita às partes na pessoa dos seus mandatários, mas a notificação para pagar as custas de parte não.
8.- Aliás, são diversas as decisões dos tribunais que assim consideram.
Mas mesmo que assim não se entendesse, o que apenas se pondera, sem conceder,
9.- No dia 06-03-2023, a Embargante foi pessoalmente notificada da execução e das notas discriminativas e justificativas de custas de parte (cf. documentos ref. CITIUS 22845980 e 22965842).
10.- Pelo que, sempre a partir dessa data, esta deve considerar-se pessoalmente notificada do conteúdo das notas discriminativas de custas de parte e interpelada para pagar.
11.- O acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, no âmbito do processo n.º 1669/17.2T8SNT-A.L1.S1, já se pronunciou sobre o valor da citação enquanto interpelação para pagamento.
Mas mesmo que assim não se entendesse, o que apenas se pondera, sem conceder,
12.- Por notificações datadas de 11-04-2023, a Embargada AC e a Embargante foram notificadas, no âmbito do processo n.º 0000, da conta de custas (cf. doc. 1 da contestação aos embargos de executado, o qual se dá por reproduzido).
13.- Assim sendo, por comunicação datada de 20-04-2023, as Embargadas enviaram, nos termos do disposto no artigo 25.º, n.º 1, última parte, nota discriminativa e justificativa de custas de parte retificada, que contempla os valores devidos na conta de custas, bem como os já cobrados nos presentes autos, para a mandatária da Embargante e também para esta. (cf. doc. 2 da contestação aos embargos de executado, o qual se dá por reproduzido)
14.- A Embargante recebeu a nota discriminativa no dia 24-04-2023. (cf. doc. 2 da contestação aos embargos de executado, o qual se dá por reproduzido)
15.- Pelo que, desde o dia 24-04-2023, a Embargante considera-se pessoalmente notificada da nota discriminativa e justificativa de custas de parte que inclui os valores cobrados nos presentes autos.
16.- Mesmo que se queira considerar que esta notificação pessoal feita à Embargante não cumpre com o prazo de 10 dias previsto no artigo 25.º, n.º 1, do RCP, a verdade é que tal prazo não preclude o direito da parte a receber custas de parte.
17.- Nesse sentido já decidiram os seguintes acórdãos: acórdão do Tribunal da Relação do Porto, proferido no âmbito do processo n.º 462/06.2TBLSD-C.P1, de 14-06-2017; acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, proferido no âmbito do processo n.º 1148/16.5T8GRD-B.C1, de 28-06-2022; acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Guimarães, proferido no âmbito do processo n.º 1359/06.1TBFAF-B.G1, datado de 07-12-2017; acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, proferido no âmbito do processo n.º 0552/16.3BELRA, datado de 04-12-2019.
18.-Pelo que, mesmo que se entendesse que as notas discriminativas e justificativas de custas de parte dadas à execução nos presentes autos ainda não constituíssem título executivo, à data da instauração da execução, o que apenas se pondera, sem conceder, não há dúvida de que, na presente data, tais notas discriminativas e justificativas de custas de parte constituem título executivo, porquanto foram pessoalmente notificadas à Embargante.
Mas mais ainda,
19.- Mesmo que as Embargadas tivessem promovido a notificação pessoal da Embargante da nota discriminativa e justificativa de custas de parte, a verdade é que tal ato sempre estaria votado ao insucesso.
20.- Com efeito, a morada processual da Embargante, no âmbito do processo n.º 0000, é a seguinte: Rua…. (cf. doc. 3 da contestação aos embargos de executado, o qual se dá por reproduzido)
21.- Tendo sido essa a morada para a qual o tribunal enviou a conta de custas no âmbito do processo n.º 0000. (cf. doc. 2 da contestação aos embargos de executado, o qual se dá por reproduzido)
22.- Sucede que, a notificação da conta de custas, enviada pelo tribunal, foi devolvida pelos CTT com a indicação de que a Embargante é desconhecida na morada. (cf. doc. 4 da contestação aos embargos de executado, o qual se dá por reproduzido)
23.- E isto porquê? Porque a Embargante mudou de domicílio e nada comunicou ao processo nem às Embargadas.
24.- Consequentemente, recorrendo, as Embargadas, à morada constante do processo - porque a outra não se encontravam obrigadas- para o envio da nota discriminativa e justificativa de custas de parte, também esta não chegaria ao seu destino.
25.- Daí a importância de as partes se encontrarem representadas por mandatário nos processos: a mudança de morada em nada condiciona a receção das notificações enviadas pelo CITIUS.
26.- Em relação ao alegado pela Recorrente nos pontos 18.º a 21.º, a verdade é que o disposto no artigo 35.º, n.º 5, do Regulamento das custas Processuais, é apenas aplicável à execução de custas de parte quando a parte vencedora seja a administração pública ou quando àquela tenha sido concedido apoio judiciário na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo -em relação às quantias que esta não pagou em virtude de ter tal isenção - uma vez que esta execução apresenta a especificidade de ser promovida pela administração tributária.
27.- Pelo que, o artigo 85.º, é aplicável à presente execução.
28.- Assim, o Tribunal recorrido não violou o disposto no artigo 25.º, n.º 1, do RCP, ou qualquer outra disposição legal.
Nestes termos, e nos demais de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, deverá o recurso ser julgado improcedente por não provado e, consequentemente, mantida a decisão.”
*
A factualidade com relevo para a apreciação do presente recurso é a constante do relatório que antecede, bem como a seguinte, decorrente da tramitação, documentos juntos aos autos, e admissão de factos por acordo:
A)- Com o requerimento executivo foram juntos:
- a sentença de 1ª instância, proferida em 27/04/2018, na ação declarativa comum com o nº 0000;
- o acórdão da Relação de Lisboa de 13/05/2021, que conheceu dos recursos interpostos da referida decisão;
- as decisões proferidas pelo STJ, relativas aos recursos interpostos do mencionado acórdão, designadamente o acórdão proferido em 11/05/2022, que não admitiu o recurso, notificado às AA. em 16/05/2022;
- nota discriminativa de custas de parte junta à ação declarativa em 06/06/2022;
- comprovativo do envio da nota discriminativa de custas de parte ao mandatário da embargante, por correio eletrónico de 06/06/2022.
B)-A embargante não apresentou reclamação da nota discriminativa de custas de parte.
Sendo o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das alegações, impõe-se conhecer das questões nestas colocadas pelo apelante e das que forem de conhecimento oficioso (arts. 635º e 639º do CPC), tendo sempre presente que o tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito (art.º 5º, nº3 do CPC).
Assim, a única questão a decidir consiste em aferir da insuficiência do título executivo por falta de notificação pessoal à embargante da nota discriminativa das custas de parte. *
O título define o fim e fixa os limites da ação executiva (cfr. art.º 10º, n.º 5, do CPC) e deve demonstrar uma obrigação que seja certa, líquida e exigível (artº 713º e 724º, nº 1, a. h) do CPC).
O título executivo na execução por custas de parte é composto pela sentença condenatória nas custas e pela nota discriminativa e justificativa das custas de parte devidamente consolidada.
Considera-se consolidada a nota se a parte devedora não apresentar reclamação no prazo de 10 dias após a notificação (artº 26º-A do RCP), ou, apresentando-a, com o trânsito em julgado da decisão que sobre a mesma recair. Neste caso, a decisão que julgar a reclamação integra também o título executivo.
No caso dos autos não foi apresentada reclamação.
O único fundamento invocado nos embargos à execução foi o da insuficiência do título executivo por não ter sido notificada pessoalmente a embargante da nota discriminativa das custas de parte, defendendo que a norma do art.º 25, n.º 1 do RCP é perentória ao determinar que a nota discriminativa e justificativa das custas de parte deve ser remetida, pessoalmente, para a parte vencida. Mais aduziu a apelante que, não tendo sido notificada da nota discriminativa e justificativa das custas de parte, não existiu uma interpelação concreta, pelo que não se criou qualquer título executivo, para efeitos da alínea b) do n.º 1 do art. 703.º do CPC.
Estabelece o artº 25º, nº 1 do RCP que “até 10 dias após o trânsito em julgado ou após a notificação de que foi obtida a totalidade do pagamento ou do produto da penhora, consoante os casos, as partes que tenham direito a custas de parte remetem para o tribunal, para a parte vencida e para o agente de execução, quando aplicável, a respetiva nota discriminativa e justificativa, sem prejuízo de esta poder vir a ser retificada para todos os efeitos legais até 10 dias após a notificação da conta de custas.”
Dispõe o artigo 31.º, n.º 1, da Portaria n.º 419-A/2009, de 17 de abril que “as partes que tenham direito a custas de parte devem enviar para o tribunal e para a parte vencida a respetiva nota discriminativa e justificativa, nos termos e prazos previstos no artigo 25.º do RCP”.
Na jurisprudência existem duas posições sobre a forma que deve revestir a notificação a que alude o artº 25º: uma no sentido de que é exigida a notificação da nota discriminativa e justificativa de custas de parte, diretamente ao devedor; outra, no sentido de que basta que seja enviada ao respetivo mandatário.
Esta última posição é maioritária, como se esclarece no Ac. RL de 22/06/2023, proc. nº 23320/19.6T8LSB-A.L1-2, em www.dgsi.pt:
“(…) até 2019 não havia divergência sobre o assunto, sendo que o primeiro acórdão publicado sobre a questão foi o do TRC de 2016 que seguiu a posição contrária, divergência que só surgiu com os dois acórdãos do TRL de 2019, que incorreram no equívoco (potenciado pelo texto e sumário dos mesmos) de lerem, nos dois acórdãos do TRP de 2017 e num outro do TRE de 2018, o contrário do que deles decorria.
Ou seja, os acórdãos do TRP de 09/01/2017, proc. 1388/09.3TBPVZ-A.P1, e de 18/04/2017, proc. 13884/14.6T8PRT-A.P1, e acórdão do TRE de 12/04/2018, 716/17.2T8SLV-A.E1 resolviam uma questão completamente diferente, qual seja: se bastava enviar a nota discriminativa para o tribunal e dar conhecimento desse envio ao advogado da parte vencida; estes três acórdãos entendiam que não bastava dar conhecimento desse acto, tinha que ser enviada a nota discriminativa ao advogado da parte vencida, como diz expressamente o primeiro acórdão do TRP e implicitamente os outros dois, do TRP e do TRE.
Equívoco que também é salientado pelo ac. do TRL de 18/11/2021 e referido no parecer 18/PP/2017-C, do CRCOA de 22/09/2017 lembrado por aquele acórdão do TRL, que transcrevem a seguinte passagem daquele acórdão do TRP de Jan2017: a “parte credora deve remeter uma comunicação dirigida pessoalmente à parte (ao seu advogado) devedora exigindo o pagamento”.
Assim, embora estes três acórdãos (do TRP e do TRE) tenham decidido uma questão diferente, apontavam no sentido da solução a dar ao caso dos autos e que é de que basta dar o devido conhecimento da nota ao advogado da parte vencida. Note-se: da nota, não do acto do envio da nota ao tribunal.
O que parece evidente: dizendo a lei que a parte deve comunicar a nota também ao tribunal, está a pressupor que essa notificação é feita pelo mandatário (quando exista), como qualquer outro acto processual, pelo que lhe atribui poderes para o efeito. E se o advogado da parte vencedora pode decidir a prática desse acto, também o advogado da parte vencida tem poderes para receber a notificação, ou seja, a lei está a dar ao advogado da parte poderes para receber a notificação da nota, pelo que o acto serve de interpelação para o cumprimento. Por outro lado, o facto de ser possível reclamar da nota justificativa e de a questão ser resolvida num incidente do processo, reforça a ideia de que se trata de um acto processual, apesar de o processo já ter a sua questão principal decidida e por isso já não estar pendente. Ora, os mandatários são os representantes das partes no processo e podem praticar actos em nome delas, incluindo o de receber notificações, que podem ter a natureza de interpelações. Ainda: o art. 25/1 do RCP só fala na notificação da parte vencida e não faz a distinção entre a parte que tem advogado e a que o não tem, e isto numa fase do processo em que ainda se praticam actos em que quem é notificado é o advogado, quando exista, e não a própria parte. Pelo que, não distinguindo a lei e não impondo uma dupla notificação, a notificação a fazer é ao advogado e não à parte. Se não fosse assim e se só se notificasse a parte, embora o advogado ainda pudesse ter que praticar actos no processo, não se lhe dava conhecimento de um acto que podia implicar a prática desses actos, o que é um absurdo.” (sublinhado nosso)
“Resumidamente, para os defensores da primeira opção, exige-se a notificação directa à parte devedora, não bastando a efectuada na pessoa do seu mandatário, porque no artigo 25.º, n.º 1, do RCP, se dispõe que a parte devedora receberá uma notificação pessoal, autónoma; porque sendo apenas remetida a notificação ao tribunal, a parte devedora poderá ou não considerar cumprido, quanto a si, o disposto no artigo 25.º, n.º 1, do RCP; porque a notificação da junção da nota de custas de parte é uma interpelação para pagamento, pelo que terá de ser pessoal e inequívoca e ainda porque é a que está mais próxima do texto da lei, gera menos dúvidas na mente do destinatário e fixa o prazo a partir do qual, a parte pode reclamar da nota de custas que lhe foi enviada.
Por último, aduz-se, ainda, que inexistindo esta notificação pessoal e autónoma, não se forma título executivo, porque a nota de custas de parte só adquire eficácia executiva se não for impugnada pela parte ou sendo-o, depois de decidida a reclamação pelo tribunal e não sendo notificada a própria parte (presume-se que por não se iniciar o prazo para a reclamação), nunca a nota de custas de parte poderá ter a natureza/qualidade, de título executivo.
Para os defensores da segunda opção, a questão resolve-se de acordo com as regras gerais do mandato e das que regem a forma das notificações a efectuar às partes, tendo em linha de conta se estas têm ou não, mandatário constituído.
E inexistindo norma especial que determine que a notificação da junção da nota de custas de parte tenha de ser feita directamente, de forma pessoal, à parte devedora, então, é suficiente que a referida notificação se faça na pessoa do seu mandatário, o qual, estará em melhor posição, dados os seus conhecimentos técnicos, para aferir se deverá ou não reclamar da nota de custas apresentada.
Como é óbvio, se a parte não tiver mandatário constituído, terá de ser esta a ser directamente notificada, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 25.º, n.º 1, do RCP.” [1]
“Não se tratando de chamar esta “para a prática de acto pessoal” (o exercício do direito de reclamação é eminentemente acto da competência do mandatário e não é condição do pagamento que este seja efectivado pelo próprio mandante bem podendo sê-lo, prática, desejável e até estatutariamente, pelo seu advogado, desde que provisionado com os fundos para o efeito), nem resultando expressamente da lei, apesar a sua letra, que se esteja perante um “caso especial” de “notificação pessoal”à parte, tudo, na redacção dos preceitos e no sistema de relacionamento processual em que pontifica o mandato, apontando no sentido de que, tendo o devedor um mandatário constituído, a nota justificativa das custas de parte pode e deve ser remetida pessoal e directamente a este, assim produzindo todos os efeitos, mormente o de liquidação e de consolidação do título executivo originado pela sentença condenatória nas custas de parte.”
Acrescentando relativamente à interpelação que “esta consuma-se inequivocamente com a remessa da nota discriminativa das quantias devidas e indicação nela do “valor a receber”. O procedimento legalmente previsto tal pressupõe e nada mais exige.” [2]
Subscrevemos a posição de que a notificação da nota discriminativa e justificativa das custas de parte se basta com a notificação ao mandatário da parte vencida.
Aos fundamentos expostos, a que aderimos, diremos ainda que se o legislador pretendesse que a notificação fosse efetuada pessoalmente à parte vencida ter-se-ia expressado em consonância, tal como o fez no artº 31º, nº 1 do mesmo diploma legal (Regulamento das Custas Processuais).
Dispõe este preceito que “a conta é sempre notificada ao Ministério Público, aos mandatários, ao agente de execução e ao administrador de insolvência, quando os haja, ou às próprias partes quando não haja mandatário, e à parte responsável pelo pagamento, para que, no prazo de 10 dias, peçam a reforma, reclamem da conta ou efetuem o pagamento.”
A redação substancialmente diferente constante do artº 25º, nº 1 do RCP (e artº 31º da Portaria 419-A/2009, de 17 de abril), sem se referir expressamente à parte vencida, ainda que tenha mandatário constituído, leva-nos a concluir que não contempla a exigência de notificação pessoal da parte vencida - exceto no caso de esta não ter mandatário constituído, tudo em conformidade com as regras da notificação constantes dos artºs 221º e 247º do CPC e das regras gerais do mandato forense (artº 1157º do CC e 44º do CPC). Esta é a interpretação que se nos afigura de acordo com os ditames do artº 9º do CC.
Decorre das mencionadas regras que as notificações entre as partes, são efetuadas pelos respetivos mandatários, as notificações às partes em processos pendentes são feitas na pessoa dos seus mandatários judiciais, exceto quando a notificação se destine a chamar a parte para a prática de ato pessoal – o que não é o caso.
Está em causa a notificação de nota discriminativa de custas de parte, com interpelação para o seu pagamento – o que é efetuado de e para os respetivos mandatários. A tal não obsta o facto de ter ocorrido o trânsito em julgado da sentença, pois também a conta de custas é notificada aos mandatários das partes, como previsto no artº 31º, nº 1 do RCP, a que subjaz entendimento de que o mandatário continua a ser o representante da parte. Tal como ocorre com a notificação da conta de custas, a notificação da nota discriminativa e justificativa das custas de parte ao mandatário da parte vencida melhor acautela os interesses da parte, já que o seu mandatário estará em melhores condições para avaliar se a conta está em harmonia com as disposições legais, e, eventualmente apresentar reclamação, da conta de custas ou das custas de parte, e da respetiva decisão interpor recurso - cfr. respetivamente artº 31º, nº 1 e 6 do RCP e artºs 26-A, nºs 1 e 3 do RCP e 33º, nºs 1 e 3 da Portaria 419-A/2009, de 17 de abril.
À notificação da nota discriminativa e justificativa de custas de parte não há que aplicar analogicamente o artº 31º do RCP, pois não há lacuna a integrar (artº 10º do CC): não estamos perante um caso omisso e, ainda que se entendesse em sentido contrário, não procedem as razões justificativas da regulamentação do caso previsto naquele preceito. Com efeito, o artº 31º regula a conta de custas, concretamente a reforma e reclamação, numa relação jurídica que se estabelece entre os utentes dos serviços de justiça e o Estado, enquanto o artº 25º rege uma relação entre partes do processo.
Não ocorrendo insuficiência do titulo executivo impunha-se a improcedência dos embargos.
Pelos fundamentos ora expostos, julga-se improcedente o recurso, mantendo-se a decisão recorrida.
Custas do recurso a cargo da apelante.
Lisboa, 7 de dezembro de 2023
Teresa Sandiães Teresa Prazeres Pais Maria Carlos Duarte do Vale Calheiros
[1]Ac. RC de 08/03/2022, proc. nº 2083/14.0T8CBR.C3. No mesmo sentido, cfr. ainda, Ac. RG de 21/10/2021, proc. nº 3222/19.7T8VNF-B.G1 e Ac. RL de 18/11/2021, proc. nº 2766/16.7T8VFR-A.L1, todos disponíveis em www.dgsi.pt. [2]Ac. RG de 21/10/2021, proc. nº 3222/19.7T8VNF-B.G1, www.dgsi.pt