MEDIAÇÃO IMOBILIÁRIA
CLÁUSULA DE EXCLUSIVIDADE
DIREITO À REMUNERAÇÃO
FACTOS CONCLUSIVOS
Sumário

I - A alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto, nos termos do n.º 1 do art. 662.º do Cód. Proc. Civil, apenas pode e deve ser efetuada quando tal se impuser, ou seja, quando, face aos meios de prova existentes no processo e às regras de direito probatório material, seja de concluir pela falta de suporte probatório explicativo e justificativo da descrição factual efetuada na sentença recorrida.
II - Não obstante inexistir, no Cód. Proc. Civil vigente, norma com teor idêntico ao art. 646.º, n.º 4, do anterior Código de 95/96 – cujo desaparecimento se deveu unicamente à expressa consagração, na reforma de 2013, do fim do tribunal de estrutura coletiva nos julgamentos em sede de primeira instância, não se podendo, por conseguinte, retirar dessa eliminação qualquer alteração quanto ao que pode e deve integrar a decisão de facto –, mantém-se a inadmissibilidade de inclusão na decisão da matéria de facto da sentença de afirmações genéricas, conclusivas ou que comportem matéria de direito, como emerge do disposto no n.º 4 do art. 607.º do Cód. Proc. Civil.
III - No regime jurídico regulador da atividade de mediação imobiliária vigente (Lei n.º 15/2013, de 8 de fevereiro, com as alterações do Decreto-Lei 102/2017, de 23 de agosto), em que tenha sido acordado o regime de exclusividade em termos idênticos aos previstos na Cláusula 4.ª, n.º 2, do modelo de contrato aprovado pela Portaria n.º 228/2018, de 13 de agosto, é de entender que tal cláusula de exclusividade impede a contratação de outras mediadoras, mas não impede o próprio cliente de procurar interessados no negócio pretendido.
IV - A mediadora tem direito à remuneração acordada se, em cumprimento da obrigação assumida de diligenciar no sentido de conseguir interessado em negócio de compra e venda de imóvel (no âmbito de contrato com cláusula de exclusividade com o alcance referido em 3), consegue, através das ações de promoção e publicitação do imóvel por si desenvolvidas, obter contacto de interessado na aquisição do imóvel mas, por atuação do cliente – que, entretanto, tomando conhecimento da existência desse interessado, entra em contato direto com o mesmo, sem disso dar conhecimento à mediadora –, fica impedida de dar seguimento a esse contacto, vindo a concretizar-se entre o cliente e o referido interessado o contrato de compra e venda do referido imóvel.

Texto Integral

Processo – Apelação n.º 2142/20.7T8BRG.P1
Tribunal a quo – Juízo Local Cível de Santo Tirso - Juiz 1
Recorrente(s) – A..., S.A.
Recorrido(a/s) – B..., UNIPESSOAL, LDA.

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Sumário
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Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto:

I. Relatório:
Apelante (réu): A..., S.A.
Apelada (autora): B..., Unipessoal, L.da.

A autora B..., Unipessoal, L.da., intentou ação de processo comum contra a ré A..., S.A., pedindo a condenação desta no pagamento da quantia de € 9.840,00 (€8.000,00 desde + IVA à taxa legal em da vigor), acrescida de juros vencidos desde a data da celebração da escritura de compra e venda (20-02-2020) até ao dia de hoje, no valor de € 128,32, e dos juros vincendos até efetivo e integral pagamento.
Para o efeito, alegou, em síntese, ter celebrado com a ré contrato de mediação imobiliária em regime de exclusividade, para angariar interessado na aquisição de uma fração autónoma da ré, ficando a ré obrigada, se a autora conseguisse interessado no negócio, a pagar, na data da celebração de contrato-promessa de compra e venda com tal interessado, a quantia de 5% do preço da concretização do negócio, acrescida de IVA à taxa legal.
A autora desenvolveu ações de promoção do imóvel e obteve contactos de interessados, não tendo conseguido realizar as visitas com os interessados ao imóvel porque a ré nunca entregou as chaves para o efeito, não obstante as diversas solicitações da autora.
A ré veio a vender a fração a comprador que foi um dos interessados na aquisição angariado pela autora, não tendo pago a comissão acordada.

Citada, a ré contestou, alegando, em síntese, a nulidade do contrato de mediação imobiliária a) por falta de especificação dos efeitos para o cliente da adesão ao regime de exclusividade; b) porque o modelo de contrato com cláusulas contratuais gerais apresentado pela autora não foi validado pela Direcção-Geral do Consumidor ou pelo IMPIC, I.P., e não corresponde ao modelo pré-aprovado que consta como anexo da Portaria nº 228/2018, de 13 de agosto.
Impugnou o contrato de mediação imobiliária apresentado por não se mostrar carimbado pela ré e por não corresponder ao contrato efetivamente celebrado porque a ré não atribuiu exclusividade à autora.
Alega que a venda foi efetuada por interessado por si diretamente angariado e não por intermédio da autora, e que a autora litiga com má-fé.
Conclui pela improcedência da ação e condenação da autora como litigante de má-fé em custas e no pagamento à ré das despesas com o processo.

A autora peticionou igualmente a condenação da ré como litigante de má-fé (requerimento de 25-08-2020; REFª: 36311201).
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Realizado o julgamento, foi proferida sentença que julgou a ação procedente, condenando a ré A..., S.A. a pagar à autora B..., Unipessoal, L.da. a quantia de € 9.840,00, acrescida dos juros à taxa civil, calculados desde a data de celebração da escritura de compra e venda (20-02- 2020) até efetivo e integral pagamento, e absolveu as partes da condenação como litigantes de má-fé.
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Inconformada com a sentença, a ré/apelante A... interpôs recurso de apelação, apresentando as seguintes conclusões:
1. A A..., S.A., nos autos supra identificados, foi notificada da sentença proferida nos presentes autos, que a condenou no pagamento de 9.840,00 €, acrescidos de juros de mora, algo com o que a Ré, ora Recorrente, não se pode de forma alguma conformar.
2. A Ré vem assim apresentar recurso, por entender que a referida sentença é (A) nula por omissão de pronuncia sobre questão que deveria apreciar (cfr. art 615º/1-d) do CPC); (B) padece de erro na determinação, aplicação e interpretação das normas jurídicas, violando o artigo 16º, nº 2, alínea g), e nº 5 da Lei nº 15/2013, de 8 de Fevereiro; e (C) padece de erro no julgamento da matéria de facto provada e não provada, nomeadamente dos “Factos julgados Provados” com as alíneas F, H, I, J, K, L, M, O, P, Q, R, S, T, U e W; tal como dos "Factos julgados Não Provados” sob os números 2 e 3, como se irá aqui demonstrar.
3. Em causa está aqui a eventual comissão/remuneração resultante de um contrato de mediação imobiliária, celebrado entre as partes em litígio e relativo à venda de um imóvel, que constitui a fração autónoma designada pela letra “M”, correspondente a um apartamento de tipologia T3, do prédio urbano constituído em regime de propriedade horizontal sito na Rua ..., ..., da união de freguesias ..., do concelho da Trofa, descrito na Conservatória de Registo Predial da Trofa sob o número ... e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ..., adquirido pela testemunha AA e seu respectivo marido.
4. Antes de mais, é de notar que se verifica desde logo a nulidade da sentença, nos termos do art 615º/1-d) do Código de Processo Civil, pois o tribunal não se pronunciou sobre questão que deveria apreciar, nomeadamente sobre a alegada - nos artigos 3º a 9º da contestação - “Nulidade do Contrato de Mediação Imobiliária” celebrado entre as partes, por violação do disposto no artigo 16º, nº 2, alínea g), e nº 5 da Lei nº 15/2013, de 8 de Fevereiro.
5. A supra referida “Nulidade do Contrato de Mediação Imobiliária” decorre precisamente da violação das normas do artigo 16º, nº 2, alínea g), e nº 5, da Lei nº 15/2013, de 8 de Fevereiro - que estabelece o regime jurídico a que fica sujeita a atividade de mediação imobiliária -, que deveriam ter sido rigorosamente aplicadas.
6. E com efeito, a sentença proferida errou na determinação, interpretação e aplicação destas mesmas normas jurídicas.
7. Ora, a cláusula 4ª do Contrato de Mediação Imobiliária celebrado entre as partes não especifica de forma alguma os efeitos que decorrem do eventual regime de exclusividade, quer para a empresa quer para o cliente.
8. Enquanto o artigo 16º, nº 2, alínea g), e nº 5, da Lei nº 15/2013, de 8 de Fevereiro, estabelece que:
“(…) 2 — Do contrato constam, obrigatoriamente, os seguintes elementos: (…)"
“g) A referência ao regime de exclusividade, quando acordado, com especificação dos efeitos que do mesmo decorrem, quer para a empresa quer para o cliente. (…)”
“5 - O incumprimento do disposto nos nºs 1, 2 e 4 do presente artigo determina a nulidade do contrato, não podendo esta, contudo, ser invocada pela empresa de mediação.”
9. Normas estas que deveriam então, por comparação, ter sido interpretadas e aplicadas no sentido de se julgar o Contrato de Mediação Imobiliária celebrado entre as partes como NULO, por não cumprir com os requisitos legais exigidos, nomeadamente com a devida “especificação dos efeitos” que decorreriam para o cliente, da hipotética adesão ao regime de exclusividade (ainda que, “in casu”, não tenha sido efectivamente acordado), conforme o disposto no artigo 16º, nº 2, alínea g), e nº 5 da Lei nº 15/2013, de 8 de Fevereiro.
10. A lei exige que os efeitos da exclusividade sejam devidamente “especificados” no contrato, sendo que essa especificação não se conforma com uma mera remissão para a norma legal.
11. É o que resulta do n.º 5 do artigo 16.º da Lei n.º 15/2013, segundo o qual a falta de referência ao regime de exclusividade, quando acordado, com “especificação dos efeitos” que do mesmo decorrem, determina a nulidade do contrato.
12. Assim, fica claro que os efeitos devem ser expressamente descritos nas cláusulas contratuais, o que “in casu” não se verifica plenamente.
13. Mas a sentença proferida e ora recorrida errou igualmente na interpretação e aplicação das normas dos artigos 19º e 40º da Lei 15/2013, de 8 de Fevereiro, e violou igualmente as normas dos artigos 342º, 346º, 347º, 364º, 371º ou 376º e 372º do Código Civil.
14. Ora, se o direito da mediadora à remuneração da comissão apenas emerge se forem provados factos que permitam imputar um juízo ético jurídico de censura ao comitente e, bem assim, se ficar provado que, não fora a atuação deste, a venda a cliente por ela apresentado seria realizada no período de vigência do contrato.
15. E com efeito, tendo a proprietária - Ré - vendido o imóvel a pessoas por ela conhecidas ou angariadas e não angariadas pela mediadora - como sucedeu no caso “sub judíce” -, nada indicando que tivesse actuado de forma maliciosa ou apenas com o intuito de se eximirem ao pagamento da comissão, e tal não o demonstrando a mediadora, não pode a mesma reclamar o pagamento da remuneração.
16. Como decorre da prova documental e testemunhal apresentada pela Ré, a Autora não conseguiu cumprir com o contratualizado, tendo sido a própria Ré a angariar directamente os compradores, o que fez por si própria e directamente, através dos seus contactos no meio e no mercado, razão pela qual não se constituiu a obrigação da Ré pagar à Autora a referida remuneração pela angariação imobiliária, que não se verificou.
17. Não se encontrando preenchidos os requisitos da norma do art 19º da Lei nº 15/2013, de 8 de Fevereiro, pelo que não seria devida qualquer remuneração à Autora, devendo ter sido desta forma interpretada e aplicada pelo tribunal a referida norma jurídica.
18. De resto, e a este propósito, o entendimento pacífico e unânime na Jurisprudência, de que a cláusula de exclusividade apenas proíbe o cliente de contratar outros agentes ou empresas para realizar o trabalho de mediação, não o proibindo de contactar diretamente terceiro interessado, que ele próprio encontrou ou que o procurou espontaneamente, sem intermediação da agência, conforme resulta dos Acórdãos que de seguida se mencionam:
19. E assim, consequentemente, cumpria-se com a devida aplicação da norma do art 40º a Lei 15/2013, de 8 de Fevereiro, que o tribunal tão pouco soube interpretar e aplicar.
20. Acrescentando-se que constituindo a escritura pública (do contrato de compra e venda - cfr. elemento de prova nº 9 da “Motivação” da sentença) um documento autêntico e, como tal, fazendo prova legal plena, só com prova que mostre não ser verdadeiro o facto que dela é objecto poderia a Autora colocar em causa o que consta desse documento, o que de todo não logrou fazer.
21. Faltando tal prova, a sentença violou igualmente as normas dos artigos 342º, 346º, 347º, 364º, 371º ou 376º e 372º do Código Civil, sendo que não foi sequer alegada pela Autora a falsidade do documento, nem o tribunal recorrido declarou tal falsidade.
22. A sentença padece manifestamente de erro no julgamento da matéria de facto provada e não provada, nomeadamente nos “Factos julgados Provados” com as alíneas F, H, I, J, K, L, M, O, P, Q, R, S, T, U e W, que foram incorrectamente julgados e que exigem uma devida reapreciação da prova gravada;
23. Tal como sofre também de erro na apreciação dos "Factos julgados Não Provados” sob os números 1 - “Que a cópia do contrato após a sua assinatura não foi entregue à ré devido a ausência da Directora da Agência - da Autora -, que não assinou na data” -, 2 - “Foi a Ré que angariou directamente os compradores, o que fez por si própria e directamente, através dos seus vastos contactos no meio e no mercado” - e 3 - “Que a R. não atribuiu a “Exclusividade” à A., não tendo sido colocada qualquer cruz (X) no quadrado correspondente, presente no número 1 da Cláusula 4a do contrato”, que também se consideram ter sido incorrectamente julgados e a necessitar da devida reapreciação da prova gravada.
24. a) - Os meios probatórios que impõe uma decisão sobre os referidos pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida são, desde logo, toda a Prova Documental apresentada pela Ré, e mais concretamente:
25. As certidões comerciais permanentes da e da firma “C..., Lda.”, através das quais se pode verificar que ambas têm em comum o mesmo sócio e gerente único, a BB - para prova de que o grupo empresarial da Ré tem também no seu seio uma empresa cujo objecto social e CAE é precisamente a mediação imobiliária - tal como se pode constatar igualmente pela consulta do seu site de internet em: https:// www.C....com/ - e através da qual a Ré obteve o contacto e manifestação de interesse dos compradores - conforme alegado nos artigos 17º a 21º e 37º da contestação (cfr. Docs. nº 1-A e 1-B) - Conforme os “Factos Provados” X, Y e Z.
26. A escritura do “Contrato de compra e venda” do imóvel - fracção autónoma - em causa (elemento de prova nº 9 da “Motivação” da sentença), onde se pode verificar no artigo “Terceiro” do respectivo Termo de Autenticação, que nele consta expressamente a declaração dos intervenientes no contracto - compradores e vendedor - de que “não recorreram a mediação imobiliária”, para efeitos do disposto no art. 40º, nº 3, da Lei nº 15/2013, de 8 de Fevereiro - para prova do alegado nos artigos 17º, 21º, 28º, 34º, 37º e 47º da contestação (cfr. Doc. nº 2 da contestação)-, ou seja, não consta (nem tinha de constar, porque tal não se verificou) a obrigatória (se fosse o caso) indicação de o contrato ter sido celebrado com recurso a mediação.
27. E ainda a "Ficha de Visita (da C...) ao imóvel” (elemento de prova nº 10 da “Motivação” da sentença), elaborada e apresentada pela empresa “C..., Lda.” (do grupo empresarial da Ré), que se encontra devidamente assinada pela própria compradora do imóvel, AA, testemunha no processo, e cuja data: 25/06/2019 é até anterior ao contracto de mediação celebrado com a Autora, datado de 02/09/2019 - para prova do alegado nos artigos 17º a 21º, 26º, 27º, 28º, 34º, 35º, 37º e 47º da contestação (cfr. Doc. nº 3).
28. E mais relevante ainda, como meios probatórios que impõe uma decisão sobre os referidos pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida, foi a Prova Testemunhal apresentada Ré, traduzida nos depoimentos de BB, CC e, fundamentalmente, de AA (compradora do imóvel em causa), conforme se especifica de seguida:
29. b) - As passagens da gravação em que se funda o recurso são as seguintes: (i) a do Legal Representante da Ré, BB - com depoimento efectuado no dia 17 de Novembro de 2022, pelas 09H30, e gravado no Sistema H@bilus Media Studio (gravação com Inicio: 00m01seg e Fim: 43m 04seg ) - que declarou: “não ter atribuido a Exclusividade à Autora, o que nem fazia sentido atendendo à actividade e objecto social do seu grupo empresarial, dedicado também à mediação imobiliária”; que “a cópia do contrato após a sua assinatura não lhe foi entregue devido a ausência da Directora da Agência, que não o assinou na mesma data”; e que “Foi a Ré que angariou directamente os compradores, o que fez por si própria e directamente, através dos seus vastos contactos no meio e no mercado”.
30. (ii) A da Testemunha CC - cujo depoimento foi prestado na audiência realizada no dia 17 de Abril de 2023 (gravação com Inicio: 12m23seg e Fim: 28m 07seg ) confirmou que “foi a Ré que angariou directamente os compradores, o que fez por si própria e directamente, através dos seus vastos contactos no meio e no mercado”, que foi ele “que fez a vista ao imóvel com a compradora AA, tal como foi ele “que esteve presente na celebração da escritura publica de compra e venda do imóvel em representação da vendedora”.
31. (iii) E, fundamentalmente, a relativa ao depoimento da Testemunha AA, apresentada pela Ré, que se trata da própria compradora do imóvel em causa - cujo depoimento foi prestado na audiência de julgamento realizada no dia 17 de Abril de 2023, agendada para as 13H30, encontrando-se gravado pelo Sistema H@bilus Media Studio, à passagem das 14H35 (Inicio: 29m01seg Fim: 52m 07seg )- confirmou ser ela mesmo quem consta como compradora na escritura de compra e venda do imóvel - correspondente à fração autónoma designada pela letra “M”, correspondente a um apartamento de tipologia T3, do prédio urbano constituído em regime de propriedade horizontal sito na Rua ..., ..., da união de freguesias ..., do concelho da Trofa, descrito na Conservatória de Registo Predial da Trofa sob o número ... e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ... -; confirmou ser dela a assinatura constante da “Ficha de Visita da C... ao imóvel” que acabou por comprar, visita essa que fez com o Sr. CC; e confirmou mesmo, de forma expontânea e peremptória, ter tido “conhecimento do imóvel exclusivamente através da Ré, e que encetou directamente contacto com a Ré com vista a obter mais informações sobre o mesmo e a visitá-lo, tendo também por essa via directa negociado e decidido a compra do referido imóvel, sem qualquer intervenção da Autora”; mais explicou que o seu eventual “contacto com a Autora, através do site, deveu-se apenas e só ao facto de, como é normal nestas situações, ter pesquisado diversos outros imóveis” -alguns até da lista de angariações da própria Autora e “sem se aperceber de imediato que seria o mesmo que já havia visitado” - antes de optar pela aquisição do imóvel da Ré, que para o efeito já havia contactado directamente e visitado o imóvel, sem intervenção da Autora ou de qualquer outro mediador que não a própria Ré.
32. c) - Face a todos estes elementos probatórios, a decisão que deveria ter sido proferida sobre as questões de facto impugnadas teria de ser a oposta da que foi proferida, ou seja, deveriam ter sido julgados como Factos Provados os seguintes:
33. (1) Que a cópia do contrato após a sua assinatura não foi entregue à ré devido a ausência da Directora da Agência - da Autora -, que não assinou na data;
34. (2) Foi a Ré que angariou directamente os compradores, o que fez por si própria e directamente, através dos seus vastos contactos no meio e no mercado; e
35. (3) Que a R. não atribuiu a “Exclusividade” à A., não tendo sido colocada qualquer cruz (X) no quadrado correspondente, presente no número 1 da Cláusula 4a do contrato.
36. E, ao invés do decidido, deveriam ter sido correctamente julgados como Factos Não Provados os factos erradamente elencados como provados sob os artigos F, H, I, J, K, L, M, O, P, Q, R, S, T, U e W; ou alterando-se o descrito no facto F (retirando do mesmo a menção ao regime de exclusividade) e todas as menções constantes dos factos elencados de que “foi a Autora que angariou os compradores” - conforme desmentido pela própria compradora!
37. Acresce que, tal como confirmado pela própria compradora do imóvel, o seu eventual contacto com a Autora deveu-se ao facto de aquela ter, como é normal, pesquisado diversos outros imóveis - alguns da lista de angariações da própria Autora - antes de optar pela aquisição do imóvel da Ré, que para o efeito já havia contactado directamente e visitado o imóvel, sem intervenção de qualquer mediador.
38. Razões pelas quais os documentos juntos pela Autora não fazem prova de absolutamente nada e muito menos de que foi a Autora a angariar os compradores do negócio em causa nos presentes autos.

Conclui a apelante pela procedência do recurso, revogando-se a sentença proferida e alterando-a por acórdão que julgue improcedente a ação, absolvendo a ré do pedido.

A autora/apelada apresentou resposta às alegações, defendendo, em síntese:
– A rejeição do recurso relativamente à impugnação da matéria de facto, por falta de cumprimento do disposto na al. b) do n.º 1 do art.º 640.º do CPC, por a apelante se limitar a invocar genericamente os meios de prova em bloco para fundamentar a pretendida alteração da matéria de facto, e por não cumprir o disposto na al. a) do n.º 2 do art. 640.º do CPC.
– Na eventualidade de assim se não entender, a manutenção da decisão quanto à matéria de facto, por a decisão recorrida só ser de alterar quando for evidente que as provas não conduzem a ela, já não o devendo ser quando, perante duas versões, o juiz optou por uma, fundamentando-a devida e racionalmente, não havendo nem sendo indicados elementos que imponham uma decisão diversa.
– A inexistência de nulidade da sentença, por ter sido apreciada a nulidade arguida.
– A inexistência de erro na determinação, interpretação e aplicação do art. 16.º, n.º 2, alínea g) e n.º 5 e arts. 19.º e 40.º da Lei n.º 15/2013, de 08 de fevereiro e dos arts. 342.º, 346.º, 347.º, 364.º, 371.º ou 376.º e 372.º CPC.
Conclui pela improcedência do recurso.

Após os vistos legais, cumpre decidir.

II. Objeto do recurso:
Face às conclusões das alegações de recurso, são as seguintes as questões a apreciar:
1. Se há nulidade da sentença por omissão de pronúncia.
2. Se estão preenchidos os requisitos de admissibilidade do recurso quanto à impugnação da decisão sobre a matéria de facto e, em caso afirmativo, apreciação da impugnação da matéria de facto.
3. Se o contrato de mediação imobiliária é nulo.
4. Se a sentença errou na interpretação e aplicação das normas dos artigos 19º e 40º da Lei nº 15/2013, de 8 de fevereiro, e violou igualmente as normas dos artigos 342º, 346º, 347º, 364º, 371º ou 376º e 372º do Código Civil.

III. Apreciação dos fundamentos do recurso:

1. Nulidade da sentença por omissão de pronúncia

Invoca a apelante que a sentença é nula, nos termos do art. 615.º, n.º 1, al. d), do CPC, por falta de apreciação da arguição de nulidade do contrato de mediação imobiliária efetuada nos arts. 3.º a 9.º da contestação.
Nos referidos artigos a ré alegou que o contrato de mediação é nulo – nos termos do n.º 5 do art. 16.º da Lei n.º 15/2013 – por não terem sido especificados no mesmo os efeitos da exclusividade.
A sentença apreciou a questão e decidiu pela improcedência da arguida nulidade.
Tal retira-se suficientemente dos seguintes segmentos da fundamentação de direito da sentença proferida pelo tribunal a quo:
«(…) Coloca em crise a ré apenas o elemento da exclusividade, alegando que o contrato em causa é nulo porque as partes não acordaram quanto aos efeitos da exclusividade nos termos previstos no art. 16º, nº 2 al. g) e o nº 5 da Lei nº 15/2013 de 8.02.
Vejamos.
Dispõe o art. 16º, nº 5 da Lei nº 15/2013 de 8.02 o seguinte: O incumprimento do disposto nos n.os 1, 2 e 4 do presente artigo determina a nulidade do contrato, não podendo esta, contudo, ser invocada pela empresa de mediação.
Ora, sabe-se que neste contrato de mediação pode ser acordado com ou sem exclusividade.
Como salienta Higina Orvalho Castelo, In «Contrato de Mediação Imobiliária», Verbo Jurídico, a que se pode aceder na internet, pág. 14, bem como em «Regime Jurídico da Atividade de Mediação Imobiliária Anotado», Almedina, 2015, pág. 96, esta norma foca dois aspetos diferentes do contrato de mediação em regime de exclusividade: por um lado, a sua formação, necessariamente sujeita à forma escrita; por outro, os seus efeitos concretos, cuja especificação se deixa na disponibilidade das partes, mas que têm de constar obrigatoriamente do texto contratual».
A abrangência da cláusula de exclusividade dependerá, pois, do convencionado pelas partes, podendo, desde logo, ser “simples” ou “reforçada.
Ou seja, dentro do tipo contrato de mediação com exclusividade, a doutrina e também a jurisprudência vem distinguindo a convenção de exclusividade simples e a de exclusividade reforçada.
Distinguem-se essas sub-espécies por na primeira estar vedada a intervenção na publicidade e angariação do negócio mediado de outras mediadoras, para além da contratada, e na segunda estar vedada a realização do negócio mediado sem intervenção da mediadora contratada na publicidade e angariação.
A este propósito escreveu, ainda, Maria de Fátima Ribeiro, In «O contrato de mediação e o direito do mediador à remuneração» a que se poderá aceder em https://www.revistadedireitocomercial.com/o-contrato-de-mediacao, págs. 248-249 o seguinte: (…)
(…)
Quando do teor do próprio contrato de mediação não resulte expressamente qual o alcance da exclusividade estabelecida em benefício do mediador, saber se se está perante uma cláusula de exclusividade simples ou uma cláusula de exclusividade reforçada vai depender da interpretação do mesmo, considerando-se todas as circunstâncias conhecidas por ambas as partes, embora seja de considerar que, na dúvida, a exclusividade é simples pois deve resultar claramente do contrato que o comitente se abstém de procurar ele próprio o melhor negócio, dispondo-se a remunerar o mediador no caso em que o consiga directamente (e não em resultado da actividade de mediação).
No caso em apreço, consta do acordo escrito celebrado que a ré contrato[u] a Mediadora (Autora) em regime de exclusividade (Cláusula 4ª, n.º1), prevendo o n.º 2, alínea a), da Cláusula 4.ª que a Mediadora e as sociedades de mediação que integram a rede D... em Portugal (tal como se encontram definidas no 3 da cláusula têm o direito de promover o negócio objeto do contrato de mediação durante o respetivo período de vigência não podendo o(s) segundos(s) contraente(s), nesse período celebrar outro CMI referente ao imóvel.
(…)
A alusão, naquela cláusula, a “promover” o negócio objecto do contrato de mediação imobiliária inculca estarmos perante um caso de exclusividade simples – a dita “promoção” reconduzida à actividade característica de uma mediadora (cfr. art.º 2 do RJAMI) não exclui a possibilidade de o proprietário do imóvel diligenciar pela sua venda.
(…)
Disse, ainda, a ré que o contrato de mediação mobiliária é nulo, nos termos do art. 16º, nºs 4 e 5 da Lei 15/2013 de 8 de fevereiro, uma vez que o formulário do contrato apresentado, com cláusulas contratuais gerais não foi validado pela Direção-Geral do Consumidor ou pelo IMPIC, I.P..
(…)
Pelo que também nesta parte improcede a invocada nulidade do contrato de mediação imobiliária, celebrado entre as partes. (…)».

Ainda que se possa entender que a abordagem da questão efetuada na sentença recorrida se dispersa nas considerações expendidas a propósito da distinção entre tipos de cláusula de exclusividade em razão da sua abrangência, retira-se suficientemente da leitura da transcrição da fundamentação que antecede que o tribunal a quo considerou não se verificar a arguida nulidade, por entender que na cláusula 4.º, n.º 2, do contrato de mediação imobiliária junto aos autos, se estabeleciam de forma suficiente os efeitos da exclusividade. A falta de análise de todos os argumentos esgrimidos não se confunde com a omissão de pronúncia sobre a suscitada questão da nulidade do contrato, a qual foi apreciada e decidida no sentido da sua inexistência.
Improcede, assim, a arguida nulidade por omissão de pronúncia.

2. Impugnação da decisão sobre a matéria de facto
Não obstante a estruturação das alegações de recurso (e conclusões), a apreciação da impugnação da matéria de facto precede necessariamente o conhecimento do recurso quanto ao invocado erro na interpretação e aplicação das disposições legais da Lei n.º 15/2013, de 8 de fevereiro: só é possível proceder à subsunção dos factos ao direito após estar determinada qual é a matéria de facto provada e não provada a considerar para o efeito.
Passa-se, pois, a apreciar a impugnação da decisão sobre a matéria de facto efetuada pela apelante.
Arguiu a apelante a existência de erro no julgamento da matéria de facto provada e não provada, indicando quais os pontos elencados nos factos provados que considera que devem ser considerados não provados (ou alterando-se o descrito no facto F, retirando do mesmo a menção ao regime de exclusividade, e todas as menções constantes dos factos elencados de que “foi a Autora que angariou os compradores”), e indicando quais os pontos elencados nos factos não provados que considera que devem ser considerados provados.

2.1. (In)admissibilidade do recurso
Defende a apelada a inadmissibilidade do recurso quanto à matéria de facto, por violação do disposto no art. 640.º, n.º 1, al. b) e n.º 2, al. a), do CPC, alegando que a recorrente “agrega a totalidade da matéria de facto em bloco e indica os meios de prova com referência a esse bloco, isto é, com referência a toda a matéria de facto, omitindo-os, contudo, relativamente a cada um dos factos concretos cuja decisão impugna”, e que “indicando toda a gravação do depoimento do legal representante da Ré, da testemunha CC e da testemunha AA”, “não indica com exatidão as passagens de gravação em que funda o seu recurso, limitando-se a apreciar os depoimentos das testemunhas de forma geral e descritiva, sem qualquer transcrição e/ou indicação precisa e/ou exacta das passagens da gravação de que extraiu tal ideia e/ou facto.
Vejamos.
Dispõe o art. 640.º do CPC sobre os Ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto nos seguintes termos:
1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
3 - O disposto nos n.os 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º.

Conforme é referido no Ac. do STJ de 12-10-2023 (processo n.º 1/20.2T8AVR.P1.S1)[1], a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça “(…) na aferição do cumprimento dos ónus consagrados no art. 640.º do CPC, tem adoptado um critério de proporcionalidade e de razoabilidade, propugnando que aqueles ónus pretendem garantir uma adequada inteligibilidade do fim e do objecto do recurso. (…)», no sentido de que a rejeição do recurso por incumprimento de tais ónus está afastada desde que no recurso sejam (de forma percetível) identificados os concretos pontos da matéria de facto que o recorrente entende que foram incorretamente apreciados, especificados os concretos meios de prova que impunham decisão diversa e indicada(s) a(s) resposta(s) alternativa(s) que deve(m) ser dada(s) a tal matéria de facto – assim, Ac. do STJ de 28-04-2016 (processo n.º 1006/12.2TBPRD.P1.S1)[2].
Neste âmbito, tem sido efetuada pelo Supremo Tribunal de Justiça uma distinção entre o cumprimento dos requisitos previstos nas alíneas do n.º 1 do art. 640.º do CPC – que integram o que Supremo Tribunal de Justiça tem denominado de ónus primário –, e o cumprimento da exigência prevista na al. a) do n.º 2 do referido art. 640.º do CPC, que tem sido considerado que integra um ónus secundário. Assim, «(…) integram um ónus primário, a exigência da concretização dos pontos de facto incorretamente julgados, da especificação dos concretos meios probatórios convocados e da indicação da decisão a proferir, previstas nas als. a), b) e c) do nº1 do citado art. 640º, na medida em que têm por função delimitar o objeto do recurso e fundamentar a impugnação da decisão da matéria de facto.
Mas, já constituirá um ónus secundário, a exigência da indicação exata das passagens da gravação dos depoimentos que se pretendem ver analisados, contemplada na al. a) do nº 2 do mesmo art. 640º, pois tem, sobretudo, por função facilitar a localização dos depoimentos relevantes no suporte técnico que contém a gravação da audiência.
E se é certo cominar a lei o incumprimento do ónus primário e do ónus secundário de igual forma, ou seja, com a sanção da rejeição imediata do recurso [cfr. art 640.º, n.º 1, proémio, e n.º 2, alínea a), do mesmo artigo], não sendo consentida a formulação ao recorrente de um convite ao aperfeiçoamento de eventuais deficiências, a verdade é que, tal como se afirma no citado Acórdão do STJ, de 29.10.2015, «não poderá deixar de ser avaliada diferentemente a falha da parte consoante ocorra num ou noutro âmbito».
Dito de outro modo e nas palavras do Acórdão do STJ, de 19.02.2015 (processo nº 299/05.6TBMGD.P2.S1)[7], enquanto a falta de especificação dos requisitos enunciados no nº 1 do referido art. 640º implica a imediata rejeição do recurso na parte infirmada, já, quanto à falta ou imprecisão da indicação das passagens da gravação dos depoimentos a que alude o nº 2, al. a) do mesmo artigo, tal sanção deverá ser aplicada com algum tempero, só se justificando nos casos em que essa omissão ou inexatidão dificulte, gravemente, o exercício do contraditório pela parte contrária e/ou o exame por banda do tribunal de recurso.
Desde que não exista essa dificuldade, apesar da indicação pelo recorrente da localização dos depoimentos não ser totalmente exata e precisa, não se justifica a rejeição do recurso.
É que, como adverte o Acórdão do STJ, de 28.04.2016 (processo nº 1006/12.2TBPRD.P1.S1), dando voz à jurisprudência cada vez mais consolidada neste Supremo Tribunal[8], «é necessário que a verificação do cumprimento do ónus de alegação regulado no art. 640 do CPC seja compaginado com os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, atribuindo maior relevo aos aspectos de ordem material», por forma a não se exponenciarem os efeitos cominatórios previstos no mesmo artigo, havendo, por isso, que extrair do texto legal soluções conformes com estes princípios. (…)» – vd. Ac. do STJ de 03-10-2019 (processo n.º 77/06.5TBGVA.C2.S2) [3].

Aplicando o supra expendido ao caso dos presentes autos, a apelante cumpriu o ónus primário, ao ter indicado as alíneas dos factos provados que considera que devem ser considerados não provados e os números dos factos não provados que entende que devem passar a ser considerados provados, tendo identificado quais os depoimentos gravados e os documentos juntos que, no seu entender, justificam a requerida alteração da decisão do tribunal a quo.
No que concerne ao cumprimento do ónus secundário, nomeadamente, quanto à prova gravada, a apelante indica a totalidade do depoimento do legal representante da Ré – “gravado no Sistema H@bilus Media Studio (gravação com Inicio: 00m01seg e Fim: 43m 04seg)” – e as seguintes partes da gravação do depoimento da testemunha CC – “(gravação com Inicio: 12m23seg e Fim: 28m 07seg )” – e da gravação do depoimento a testemunha AA – “(Inicio: 29m01seg Fim: 52m 07seg )”. Indica ainda, entre aspas, o que refere resultar de tais depoimentos que justificam (na sua perspetiva) a pretendida alteração da decisão quanto à matéria elencada na decisão recorrida sob a designação de Factos provados e Factos não provados, e identifica os documentos que considera que também implicam a alteração dessa matéria no sentido por si requerido. Ou seja, a apelante, nas alegações de recurso, para cumprimento deste seu ónus de indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso:
– indica a gravação integral do depoimento do legal representante da ré;
– quanto à testemunha CC (cuja gravação do depoimento perfaz um total de 13m e 40seg), indica que a passagem da gravação que a apelante considera relevante para alterar a decisão de facto tem o seu início aos 12m e 23seg e o seu fim aos 28m e 07seg, ou seja, a maior parte do segmento da gravação indicado não existe;
– quanto à testemunha AA (cuja gravação do depoimento perfaz um total de 21m e 36seg), é indicada a passagem da gravação do depoimento com inicio às 29m01seg e fim aos 52m e 07seg, ou seja, indica-se como passagem da gravação relevante uma gravação inexistente: a gravação do depoimento teve a duração de 21 minutos e 36 segundos, inexistindo, por conseguinte, gravação com início aos 29m01seg e com fim aos 52m 07seg.
Daqui resulta que não houve um cumprimento mínimo, por parte da apelante, do ónus secundário de indicação com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, no que concerne à prova gravada. A forma como foi efetuada a indicação das passagens da gravação em que o recorrente funda a impugnação da matéria de facto implica que este tribunal de recurso, para superar tais falhas, proceda à audição integral dos depoimentos.
Estamos aqui perante um caso limite/fronteira de incumprimento do ónus estabelecido no art. 640.º, n.º 2, al. a), do CPC, em termos que impliquem a rejeição do recurso quanto à impugnação da decisão relativa à matéria de facto.
Ora, ainda que entendamos que tal ónus não foi cumprido, considerando o entendimento preconizado pelo Supremo Tribunal de Justiça supra expendido [4] – à luz do qual pode ser entendido que tal falta de indicação precisa pela apelante das passagens da gravação em que funda a impugnação não dificulta gravemente o exame por este tribunal, atenta a duração total dos depoimentos em causa –, apreciar-se-á a impugnação da decisão da matéria de facto, abrangendo também os depoimentos indicados pela apelante (procedendo-se, para o efeito, à integral audição dos mesmos).

2.2. Apreciação da impugnação da decisão sobre a matéria de facto
A apreciação da impugnação efetuada implica que se tenha em consideração a decisão proferida pelo tribunal a quo sobre a matéria de facto.

É o seguinte o teor da fundamentação de facto da sentença recorrida:

Fatos Provados
A. A Autora é uma sociedade comercial que se dedica à atividade de mediação imobiliária.
B. Por sua vez, a Ré é uma sociedade comercial que se dedica à atividade de construção, compra e venda de imóveis e revenda dos adquiridos para esse fim.
C. Em meados do mês de agosto de 2019, a Autora foi abordada pela Ré, na pessoa do seu Administrador BB, tendo a Ré comunicado à Autora que pretendia contratá-la para que esta diligenciasse pela angariação de interessados na aquisição de um imóvel de que era proprietária.
D. Precisou a Ré que era dona e legítima possuidora da fração autónoma designada pela letra “M”, correspondente a um apartamento do tipo T3, do prédio urbano constituído em regime de propriedade horizontal, sito na Rua ..., ..., da união de freguesias ..., do concelho da Trofa, descrito na Conservatória de Registo Predial da Trofa sob o número ... e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ....
E. Mais referiu a Ré que pretendia contratar a Autora para que esta diligenciasse pela angariação de interessados na aquisição do referido bem imóvel.
F. E, em 26 de agosto de 2019, Autora e Ré celebraram um contrato de mediação imobiliária, em regime de exclusividade, tendo ficado convencionado que a Autora se obrigava, enquanto entidade Mediadora, a diligenciar no sentido de angariar interessado na compra do imóvel da Ré, desenvolvendo para o efeito ações de promoção.
G. Mais ficou convencionado que se a ora Autora, conseguisse interessado no negócio visado pelo contrato de mediação imobiliária, a Ré obrigava-se a pagar à Autora, a título de remuneração, e aquando da celebração do contrato promessa de compra e venda, a quantia de 5% calculada sobre o preço de concretização do negócio, acrescida de IVA à taxa legal em vigor.
H. De imediato, a Autora colocou um anúncio nas suas instalações físicas e no seu site da internet a promover/publicitar o bem imóvel da Ré para venda, pelo preço de € 160.000,00 (cento e sessenta mil euros).
I. Nos dias seguintes, entraram em contacto com a Autora algumas pessoas que disseram estar interessadas na compra do referido bem imóvel.
J. A Autora informou a Ré que tinha interessados na aquisição do imóvel e tinha interesse em agendar uma visita ao imóvel, pelo que era conveniente fazê-lo assim que possível.
K. Mediante solicitação da Ré, a Autora ficou a aguardar o contacto da Ré, por forma a agendar a visita ao imóvel com os interessados, designadamente com DD e com a sua mulher.
L. Acontece que, após ter tomado conhecimento que a Autora tinha angariado um interessado na compra do imóvel, a Ré nunca mais entrou em contacto com a Autora e nunca mais atendeu as chamadas telefónicas da Autora e/ou respondeu aos seus emails, o que a Autora estranhou.
M. Apesar de não responder aos diversos contactos da Autora, no início do mês de janeiro de 2020, e sem que nada o fizesse prever, o legal representante da Ré solicitou à Autora o envio de cópia do contrato de mediação imobiliária celebrado em 26 de agosto de 2019, apesar de ter sido entregue à Ré uma cópia do referido contrato momentos após a sua assinatura.
N. Conforme solicitado, no dia 07 de janeiro de 2020, a Autora enviou à Ré um email com cópia do contrato de mediação imobiliária.
O. Apesar do contacto, a Ré não respondeu ao pedido da Autora quanto ao agendamento de visita ao imóvel pelo interessado DD e pela sua esposa, tendo ficado a Autora a aguardar ulterior contacto da Ré.
P. Semanas mais tarde, e após a ausência de respostas da Ré às várias comunicações da Autora, quer por via telefónica, quer por via de email, tomou a Autora conhecimento, através da consulta às respetivas bases de dados, que a Ré tinha vendido o bem imóvel, melhor identificado nos presentes autos, ao cliente - DD - por si angariado.
Q. Sem que a Ré tivesse dado conhecimento à Autora e, consequentemente, sem que tivesse procedido ao pagamento da remuneração devida pela angariação imobiliária, nos termos do contrato de mediação imobiliária celebrado em 26 de agosto de 2019.
R. Ou seja, após se ter apercebido que já havia um interessado na compra do bem imóvel de que era proprietária, graças às diligências de divulgação da B..., a Ré decidiu, em contacto direto com o interessado e, em simultâneo, deixar de responder às comunicações/ contactos da Autora, por forma a tentar “desvincular-se” do contrato de mediação imobiliária, com o único intuito de [não proceder ao pagamento da][5] remuneração pagamento da remuneração devida à entidade mediadora, no valor global de € € 9.840,00 (€ 8.000,00 + IVA à taxa legal em vigor),
S. Apesar da ausência de resposta da Ré à Autora, o negócio foi angariado e concretizado devido às diligências de mediação imobiliária encetadas pela Autora, uma vez que o comprador – DD - tomou conhecimento de que o imóvel in casu se encontrava à venda através das diligências de promoção da sociedade de mediação imobiliária B....
T. Ademais, não só o interessado na aquisição do bem imóvel da Ré foi angariado pela Autora, nos termos do contrato de mediação imobiliária, como o negócio angariado pela Autora foi concluído com sucesso, pois já foi celebrada a escritura de compra e venda e o mesmo já se encontra registado em nome do cliente angariado pela Autora.
U. Apesar de a Autora ter angariado o interessado na compra do imóvel da Ré, negócio que já foi concretizado nos termos supra expostos, a Ré não procedeu ao pagamento da comissão devida à entidade mediadora, no valor global de € 9.840,00 (€ 8.000,00 + IVA à taxa legal em vigor).
V. O que motivou a interpelação da ora Ré, por cartas registadas, com aviso de receção, enviadas nos dias 09 de março e 07 de abril de 2020, e rececionadas pela Ré nos dias 10 de março e 08 de abril respetivamente.
W. Apesar de devidamente notificada/ interpelada, a Ré não procedeu ao pagamento da quantia em dívida, no valor de € 9.840,00 (€ 8.000,00 + IVA à taxa legal em vigor), a título de remuneração devida pela angariação imobiliária efetuada nos termos do contrato de mediação imobiliária celebrado em Agosto de 2019, nem nada disse.
X. A R. trabalha no mercado imobiliário (dedicando-se à construção, promoção, compra e venda e gestão patrimonial), tendo os seus próprios contactos, nomeadamente com investidores.
Y. A R tem até, no seu grupo empresarial, a sociedade “C..., Lda.” que exerce, ela própria também, a actividade de medição imobiliária, sob a licença AMI: ….
Z. Os CAE da Ré, A..., são:
a) Principal: 41200 - Construção de edifícios (residenciais e não residenciais);
b) Secundário 1: 68100 - Compra e venda de bens imobiliários; e
c) Secundário 2: 68200 - Arrendamento de bens imobiliários.
AA. Os CAE da C... são:
a) Principal: 68311 - Atividades de mediação imobiliária; e
b) Secundário 1: 68321 - Administração de imóveis por conta de outrem.

Factos Não Provados
1. Que a cópia do contrato após a sua assinatura não foi entregue à ré devido a ausência da Directora da Agência - da Autora -, que não assinou na data.
2. Foi a Ré que angariou directamente os compradores, o que fez por si própria e directamente, através dos seus vastos contactos no meio e no mercado.
3. Que a R. não atribuiu a “Exclusividade” à A., não tendo sido colocada qualquer cruz (X) no quadrado correspondente, presente no número 1 da Cláusula 4ª do contrato.
4. Que o imóvel não foi vendido pelo preço de 160.000,00 €.

2.2.1. Modificabilidade da decisão de facto
Sobre a modificabilidade da decisão de facto no âmbito do recurso de apelação, dispõe o n.º 1 do art. 662.º do Cód. Proc. Civil que “A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.”
Não subsistem dúvidas que a reforma de 2013 veio consagrar um modelo no qual a Relação reaprecia a prova sobre os pontos impugnados com a mesma amplitude da apreciação da prova pela 1.ª instância, em termos de formação, por parte do tribunal de recurso, da sua própria convicção para efeitos de apreciação dos fundamentos do recurso sobre a matéria de facto. Neste sentido vai a jurisprudência consolidada do STJ, conforme resulta, além de outros, dos recentes Acórdãos do STJ de 09-02-2021 (processo n.º 26069/18.3T8PRT.P1.S1), de 08-03-2022 (processo n.º 656/20.8T8PRT.L1.S1) e de 24-10-2023 (processo n.º 4689/20.6T8CBR.C1.S1) [6] e anteriores decisões do STJ citadas nos arestos referidos.
Não se questionando, após a reforma de 2013, que «(…) a reapreciação não se contenta com a sindicância da convicção formada na primeira instância com o objectivo de apenas debelar erros grosseiros na valoração da prova, assente numa hipervalorização do princípio da livre apreciação (…) e da imediação por parte do juiz a quo, devendo ultrapassar o mero controlo formal da motivação da decisão da 1.ª instância em matéria de facto. [e que] Pelo contrário, o pleno exercício dos poderes de reapreciação da matéria de facto da Relação exige a formação de uma convicção própria, obtida activa e criticamente em face dos elementos probatórios indicados pelas partes ou mesmo adquiridos oficiosamente. (…)» [7], entendemos que o poder/dever previsto no n.º 1 do art. 662.º do CPC, de “alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa” significa que tal alteração apenas pode e deve ser efetuada quando tal for necessário, ou seja, quando face aos meios de prova existentes no processo, se constate/conclua pela falta de suporte probatório explicativo e justificativo da descrição factual dos eventos efetuada na sentença recorrida.
Seguimos, pois, o entendimento de RITA MOTA SOARES[8], quando refere que a adoção do verbo ‘impor’ significa que «(…) só mesmo quando a alteração da decisão resultar necessária é que, nos termos do n.º 1 do art. 662.º, a Relação pode, sem mais, alterá-la.
Assim sendo, se aquela prova produzida não impuser decisão diversa, porque a decisão do facto em primeira instância é racional, lógica e possível, em suma, está correctamente motivada, uma diferente convicção que a Relação possa formar após a análise da prova produzida, não permitirá alterar o(s) facto(s) decidido(s) nos termos do n.º 1 do art. 662.º.
Contrariamente ao que parece resultar de alguma jurisprudência menos tolerante quanto aos entendimentos que limitam em determinados aspectos a intervenção da Relação em sede de reapreciação da matéria de facto, creio que, além do referido argumento literal, que não deve ser desconsiderado (art. 9.º do CC), esta é a leitura que compatibiliza o princípio da livre apreciação da prova (n.º 5 do art. 607.º) com o princípio do duplo grau de jurisdição em termos mais razoáveis, não comprimindo qualquer um deles.
De facto, uma leitura que afrouxe o sentido impositivo do n.º 1 do art. 662.º tenderá a diminuir o princípio da livre apreciação da prova: a apreciação crítica que o juiz de primeira instância efectuou, beneficiando do contacto imediato que teve com a prova, pouco valerá contra o que a Relação vá ouvir, guiada pelas alegações recursivas das partes quanto aos aspectos que para si mais relevam .
Já um entendimento menos lasso do referido n.º 1 do art. 662.º não diminui nem prejudica o princípio do duplo grau de jurisdição, já que este foi também assegurado pelas als. a) e b) do n.º 2 e na al. a) do n.º 3 do art. 662.º: aqui se definem os termos em que a Relação reaprecia o facto nos casos em que a prova produzida não impõe solução diversa, mas convence diferentemente.
Ou seja, quando não esteja em causa a necessidade de melhor fundamentação de um facto essencial, a determinar a remessa a que alude a al. d) do n.º 2 do art. 662.º, e suceder que a Relação considere não acompanhar a valoração que foi efectuada pelo tribunal de primeira instância, por se suscitarem dúvidas sobre a credibilidade ou o sentido de um depoimento ali positivamente valorado, ou sobre a prevalência dada a um depoimento sobre o outro [al. a) do n.º 2 do art. 662.º], ou por considerar que carece de novos elementos probatórios para formar uma convicção definitiva quanto a determinado facto, por não estar suficientemente elucidada [al. b) do n.º 2 do art. 662.º], deverá renovar a produção da prova e/ou produzir nova prova e, só após essa imediação, dissipar dúvidas e decidir o facto como entender — al. a) do n.º 3 do art. 662.º. (…)».
Afigura-se-nos que esta interpretação assegura a compatibilidade entre a garantia do duplo grau de jurisdição da matéria de facto e o respeito do princípio da livre apreciação da prova, previsto no n.º 5 do artigo 607.º do Código de Processo Civil, pelo que será este o entendimento que seguiremos na apreciação da impugnação da matéria de facto.

2.2.2. Alteração dos factos provados F, H, I, J, K, L, M, O, P, Q, R, S, T, U e W para não provados e dos factos não provados 1. a 3. para provados

Defende a apelante que as alíneas F, H, I, J, K, L, M, O, P, Q, R, S, T, U e W dos factos provados [F. E, em 26 de agosto de 2019, Autora e Ré celebraram um contrato de mediação imobiliária, em regime de exclusividade, tendo ficado convencionado que a Autora se obrigava, enquanto entidade Mediadora, a diligenciar no sentido de angariar interessado na compra do imóvel da Ré, desenvolvendo para o efeito ações de promoção; H. De imediato, a Autora colocou um anúncio nas suas instalações físicas e no seu site da internet a promover/publicitar o bem imóvel da Ré para venda, pelo preço de € 160.000,00 (cento e sessenta mil euros); I. Nos dias seguintes, entraram em contacto com a Autora algumas pessoas que disseram estar interessadas na compra do referido bem imóvel; J. A Autora informou a Ré que tinha interessados na aquisição do imóvel e tinha interesse em agendar uma visita ao imóvel, pelo que era conveniente fazê-lo assim que possível; K. Mediante solicitação da Ré, a Autora ficou a aguardar o contacto da Ré, por forma a agendar a visita ao imóvel com os interessados, designadamente com DD e com a sua mulher; L. Acontece que, após ter tomado conhecimento que a Autora tinha angariado um interessado na compra do imóvel, a Ré nunca mais entrou em contacto com a Autora e nunca mais atendeu as chamadas telefónicas da Autora e/ou respondeu aos seus emails, o que a Autora estranhou; M. Apesar de não responder aos diversos contactos da Autora, no início do mês de janeiro de 2020, e sem que nada o fizesse prever, o legal representante da Ré solicitou à Autora o envio de cópia do contrato de mediação imobiliária celebrado em 26 de agosto de 2019, apesar de ter sido entregue à Ré uma cópia do referido contrato momentos após a sua assinatura; O. Apesar do contacto, a Ré não respondeu ao pedido da Autora quanto ao agendamento de visita ao imóvel pelo interessado DD e pela sua esposa, tendo ficado a Autora a aguardar ulterior contacto da Ré; P. Semanas mais tarde, e após a ausência de respostas da Ré às várias comunicações da Autora, quer por via telefónica, quer por via de email, tomou a Autora conhecimento, através da consulta às respetivas bases de dados, que a Ré tinha vendido o bem imóvel, melhor identificado nos presentes autos, ao cliente - DD - por si angariado; Q. Sem que a Ré tivesse dado conhecimento à Autora e, consequentemente, sem que tivesse procedido ao pagamento da remuneração devida pela angariação imobiliária, nos termos do contrato de mediação imobiliária celebrado em 26 de agosto de 2019; R. Ou seja, após se ter apercebido que já havia um interessado na compra do bem imóvel de que era proprietária, graças às diligências de divulgação da B..., a Ré decidiu, em contacto direto com o interessado e, em simultâneo, deixar de responder às comunicações/ contactos da Autora, por forma a tentar “desvincular-se” do contrato de mediação imobiliária, com o único intuito de pagamento da remuneração devida à entidade mediadora, no valor global de € € 9.840,00 (€ 8.000,00 + IVA à taxa legal em vigor); S. Apesar da ausência de resposta da Ré à Autora, o negócio foi angariado e concretizado devido às diligências de mediação imobiliária encetadas pela Autora, uma vez que o comprador – DD - tomou conhecimento de que o imóvel in casu se encontrava à venda através das diligências de promoção da sociedade de mediação imobiliária B...; T. Ademais, não só o interessado na aquisição do bem imóvel da Ré foi angariado pela Autora, nos termos do contrato de mediação imobiliária, como o negócio angariado pela Autora foi concluído com sucesso, pois já foi celebrada a escritura de compra e venda e o mesmo já se encontra registado em nome do cliente angariado pela Autora; U. Apesar de a Autora ter angariado o interessado na compra do imóvel da Ré, negócio que já foi concretizado nos termos supra expostos, a Ré não procedeu ao pagamento da comissão devida à entidade mediadora, no valor global de € 9.840,00 (€ 8.000,00 + IVA à taxa legal em vigor); W. Apesar de devidamente notificada/ interpelada, a Ré não procedeu ao pagamento da quantia em dívida, no valor de € 9.840,00 (€ 8.000,00 + IVA à taxa legal em vigor), a título de remuneração devida pela angariação imobiliária efetuada nos termos do contrato de mediação imobiliária celebrado em Agosto de 2019, nem nada disse.] deviam ter sido julgadas não provadas, ou alterado o descrito no facto F (retirando do mesmo a menção ao regime de exclusividade) e todas as menções constantes dos factos elencados de que “foi a Autora que angariou os compradores”.
E que deviam ter sido julgados provados os pontos 1), 2) e 3) dos factos não provados [1) Que a cópia do contrato após a sua assinatura não foi entregue à ré devido a ausência da Directora da Agência - da Autora -, que não assinou na data; 2) Foi a Ré que angariou directamente os compradores, o que fez por si própria e directamente, através dos seus vastos contactos no meio e no mercado; 3) Que a R. não atribuiu a “Exclusividade” à A., não tendo sido colocada qualquer cruz (X) no quadrado correspondente, presente no número 1 da Cláusula 4ª do contrato.].

Alega a apelante que da apreciação conjugada dos documentos consistentes nas certidões comerciais permanentes da Ré e da firma “C..., Lda., na escritura do contrato de compra e venda do imóvel, que constitui documento autêntico, e na "Ficha de Visita (da C...) ao imóvel, conjugado com os depoimentos do legal representante da ré BB, da testemunha CC e, essencialmente, da compradora do imóvel AA, resulta que os factos das alíneas referidas deviam ter sido julgados não provados, face aos depoimentos prestados e à prova que emerge dos referidos documentos (nos moldes constantes das conclusões das alegações de recurso supra transcritas, que nos abstemos de repetir), sendo inadmissível que o tribunal a quo dê credibilidade apenas aos depoimentos das testemunhas arroladas pela autora, que são todos eles agentes imobiliários (comerciais), cuja remuneração depende em exclusivo das comissões dos negócios angariados e concretizados em nome da Autora, tendo todas elas um interesse direto no resultado da presente lide, razão pela qual os respetivos testemunhos não deveriam ser julgados relevantes, não podendo ser atribuída credibilidade à documentação da autora porque se trata de um mero documento interno, produzido pela própria Autora, que insere e altera livremente os dados no seu sistema informático, conforme foi confirmado pela sua segunda testemunha, tal como sucede com as mensagens de telemóvel, pelo que tais meios de prova não provam que foi a autora a angariar os compradores para o negócio.
O tribunal a quo, na motivação da sua convicção, deu conta, de forma lógica e fundamentada, das razões subjacentes à formação da mesma, analisando criticamente as declarações de parte prestadas pelo legal representante da ré e os depoimentos prestados pelas testemunhas, tendo no exercício da livre valoração desses meios de prova (declarações de parte e depoimentos das testemunhas) considerado credível o depoimento da testemunha EE, pela razão de ciência e pela forma como depôs – “(…) interveniente na celebração do contrato, na promoção da venda do imóvel, remetente das mensagens enviadas ao legal representante da ré a solicitar insistentemente as chaves, destinatária das respostas e remetente da mensagem enviada à compradora mulher e destinatária da sua resposta (…)”; “(…) Falou, pois, na primeira pessoa e confirmou de forma concretizada a versão da autora e daí que tivéssemos acreditado que a mesma apenas falou com verdade. (…)” –, mas já não as declarações do legal representante da ré nem da testemunha AA – explicitando com detalhe as razões de tal convicção quanto à falta de capacidade de convencimento destes últimos meios de prova.
Assim, quanto às declarações de parte do legal representante da ré, o tribunal a quo ponderou devidamente o que este disse e, na análise efetuada, considerou tal depoimento pouco credível, fundamentando de forma racional e justificada essa sua análise, como resulta do seguinte excerto da motivação da convicção:
(…) o legal representante da ré teve um depoimento muito vago, na parte que mais divergia as partes, parecendo mesmo que a parte nem sabia muito bem ao que vinha, demorando a responder às questões, dando tempo para dar respostas sem qualquer concretização (…) Foi evidente na parte a preocupação única de afirmar que a venda do imóvel resultou do trabalho da ré. Daí que esta ambiguidade e abstração do depoimento de parte apenas tivesse a virtualidade de credibilizar a versão da autora, porque, na verdade, a memória da parte foi cirúrgica quanto ao caso específico destes compradores. Mas a ambiguidade e confusão da parte aumentou quando foi confrontado com as mensagens sucessivas a pedir as chaves. (…)”.
De igual forma, quanto aos depoimentos prestado pela testemunha AA e pela testemunha CC, foi dada pelo tribunal a quo a devida conta da sua convicção quanto à falta de credibilidade e de capacidade de convencimento desses meios de prova.
Assim, quanto à testemunha AA, referiu o tribunal a quo que:
(…) Esta testemunha teve um depoimento parcial, procurando defender a tese da ré, omitindo fatos relevantes, desde logo quanto à sua razão de ciência no que toca ao conhecimento da autora.
Na verdade, esta testemunha, quando no âmbito do inquérito preliminar foi perguntada se conhecia a B... Unipessoal, limitada, respondeu que sim porque vive na Trofa e está em causa uma empresa da Trofa.
Esta resposta não teria especial relevância, não fosse o que depois foi dito pela mesma ao longo do seu depoimento.
Na verdade, esta testemunha não só conhecia a autora pelo fato de residir na Trofa, mas também pelo fato de também ela desempenhar funções na área da mediação imobiliária e ter contatado a autora a propósito da venda do imóvel, por ter interesse nele, como acabou por demonstrar quando o adquiriu diretamente à proprietária.
Nesta nossa convicção de parcialidade desta testemunha, foi também o fato de a mesma, quando confrontada com a mensagem trocada com a funcionaria da autora em 1.10.2019, ter dito, no essencial, que se este documento for legal admitia que essa mensagem poderia ser sua, até porque eu só posso atender chamadas na hora do almoço, como aí se refere.
Depois e após longa insistência acabou por admitir ter contactado a autora por causa da promoção do imóvel que acabou por comprar, sendo que depois a visitou através da ré, por ser uma empresa que uma amiga sua lhe apresentou.
Aliás, no mesmo sentido do seu depoimento, quando lhe foi perguntado se contatou a B... antes de fazer a visita através da ré, a testemunha respondeu que pelas fotografias que lhe foram exibidas lhe parecia tratar-se do mesmo imóvel que acabou por comprar depois.
Mas a verdade é que esta testemunha respondia sempre com reserva a todas as questões que poderiam confirmar a versão da autora, o que acabou por fazer.
Aliás, disse também que tomou conhecimento que o imóvel estava à venda através de uma amiga, cuja identificação não deu.
Confirmou, ainda, que o contato constante dos documentos juntos pela autora com vista a confirmar os contatos com os compradores, correspondia ao seu número de telemóvel. (…)”.
E, quanto à testemunha CC, explicitou o tribunal na análise crítica deste depoimento efetuada na sentença recorrida, o seguinte:
(…) a testemunha CC parecia mais parte do que testemunha.
Na verdade, foi ele quem mostrou o apartamento aos compradores na qualidade de funcionário da empresa C... e depois surge como procurador da ré na escritura de compra e venda do imóvel, uma promiscuidade que coloca em causa o próprio posicionamento da ré.
Daí que não tivéssemos acreditado que a visita da compradora AA tivesse ocorrido na data que se fez constar da Ficha de Visita, ou seja em 25.06.2019.
Aliás do seu depoimento ficámos convencidos que esta visita ocorre apos os contatos que fez com a autora.
Não seria minimamente credível que tivesse existido uma vista ao imóvel por parte de potenciais compradores – que acabaram por serem compradores, imagine-se, pelo preço anunciado – e que a ré tivesse vindo à Trofa celebrar m contrato de mediação imobiliária. (…)”.

Efetuada a audição integral das declarações de parte do legal representante da ré e dos depoimentos prestados pelas testemunhas AA e CC, não merece reparo a avaliação crítica e a livre convicção formada pelo tribunal a quo, designadamente, quanto aos meios de prova consistentes nas declarações prestadas pelo legal representante e pelas referidas testemunhas.

Diferentemente do que defende a apelante, entendemos – conforme é referido no Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa de 28-04-2022, processo n.º 9338/21.2T8LSB.L1-2 [9]– que «(…) Para se considerarem provados ou não provados determinados factos, não basta que as testemunhas chamadas a depor se pronunciem sobre os factos num determinado sentido, para que o juiz necessariamente aceite esse sentido ou versão.
O julgamento dos factos, na sua valoração, mormente quando se reporta a meios de prova produzidos oralmente, não se reconduz a uma operação aritmética de número ou de adição de depoimentos, antes tem de atender a uma multiplicidade de factores, não se bastando com a palavra pronunciada, mas nele confluindo aspetos tão variados como, as garantias de imparcialidade, as razões de ciência, a espontaneidade dos depoimentos, a verosimilhança, a seriedade, o raciocínio, as lacunas, as hesitações, a linguagem, o tom de voz, o comportamento, os tempos de resposta, as coincidências, as contradições, o acessório, as circunstâncias, o tempo decorrido, o contexto sócio-cultural, a linguagem gestual (como por exemplo os olhares) e até interpretar as pausas e os silêncios dos depoentes, para poder perceber quem estará a falar com verdade e até que ponto é que, consciente ou inconscientemente, poderá a verdade estar a ser distorcida. (…)».
Improcede, assim, a pretendida alteração da decisão de facto com base nos depoimentos do legal representante da ré e das testemunhas AA e CC.

Os meios de prova documental que a apelante refere imporem a pretendida alteração da decisão de facto são os seguintes:
a) Certidões comerciais permanentes da Ré e da firma “C..., Lda.
Alega a apelante que das certidões comerciais das sociedades ré e da C..., Lda., se verifica que “ambas têm em comum o mesmo sócio e gerente único”, o que prova que a ré tem “no seu seio uma empresa cujo objeto social e CAE é precisamente a mediação imobiliária”, sociedade essa “através da qual a Ré obteve o contacto e manifestação de interesse dos compradores, conforme alegado nos artigos 17º a 21º e 37º da contestação (cfr. Docs. nº 1-A e 1-B) - Conforme os “Factos Provados” X, Y e Z.”.
A apelante não indica expressamente qual é a concreta alteração da decisão de facto que entende que tais certidões determinam.
Num esforço interpretativo do alegado no ponto 25. das conclusões, afigura-se-nos que a apelante entende que as certidões em causa fazem prova de que a ré obteve o contacto e manifestação de interesse dos compradores através da sociedade C..., Lda..
A matéria de facto que as certidões provam – constante de parte do art. 17.º e dos arts. 18.º a 20.º da contestação – foi considerada provada na sentença recorrida, designadamente, nas als. X) – onde foi considerada a parte da alegação constante do art. 17.º da contestação que integra efetiva matéria de facto – e Y) a AA) dos factos provados. As certidões do registo comercial referidas apenas comprovam os factos que o tribunal a quo incluiu nas alíneas acabadas de referir, não tendo as mesmas qualquer capacidade de servir de meio de prova da matéria considerada não provada nos pontos 1. a 3. dos factos não provados, nem de infirmar a convicção formada pelo tribunal a quo com base na apreciação conjugada e crítica dos meios de prova, nos moldes explicitados na motivação da convicção.

b) – Contrato de compra e venda da fração autónoma “M” referida na al. D. dos factos provados.
Defende a apelante que o facto de constar da escritura do contrato de compra e venda do imóvel que os intervenientes declararam que não recorreram a mediação imobiliária constitui prova do que alegou nos arts. 17.º [Exclusividade essa que, aliás, a R. nunca iria atribuir à A. (nem a qualquer outra mediadora imobiliária), tal não fazendo qualquer sentido, uma vez que, como a A. bem sabia, a própria R. trabalha no mercado imobiliário (dedicando-se à construção, promoção, compra e venda e gestão patrimonial), tendo os seus próprios contactos, nomeadamente com investidores;], 21.º [Tendo sido assim, por via de contactos próprios e directos de elementos do seu grupo empresarial, que a R angariou os interessados que acabaram por adquirir o imóvel em causa;], 28.º [A propósito, aceita-se como verdadeira a afirmação da Autora que consta do art 52º da p.i., apenas e só na parte onde esta diz: “ao não ter agendado uma visita ao imóvel com o cliente” - o que deve desde logo ser considerado como Confessado], 34.º [A A. não realizou qualquer diligências de mediação imobiliária junto do comprador, a A. não o angariou, não tendo existido qualquer intervenção da A. no negócio concretizado], 37.º [Mas a realidade é que a A. não conseguiu cumprir com o contratualizado, tendo sido a própria Ré a angariar directamente os compradores, o que fez por si própria e directamente, através dos seus vastos contactos no meio e no mercado, razão pela qual não se constituiu a obrigação da R. pagar à A. a referida remuneração pela angariação imobiliária, que não se verificou] e 47.º [A A. age assim de manifesta má-fé, sabendo que não lhe assiste qualquer razão e tentando, desta forma, retirar proveito financeiro do trabalho alheio, em que não teve qualquer intervenção, devendo por este motivo ser condenada, nos termos legais do art 542º e seguinte do CPC.] da contestação.
Tal contrato, que constitui um documento particular autenticado, com a força probatória de documento autêntico (arts. 377.º e 371.º do Cód. Civil), apenas faz prova de que foi declarado perante a entidade autenticadora que comprador e vendedor não recorreram a mediação imobiliária, e não da veracidade do facto declarado (veja-se, de resto, a advertência feita no termo de autenticação do referido contrato às partes vendedora e compradora, de que “a omissão ou a prestação de falsas declarações sobre a intervenção de mediador imobiliário no contrato faz incorrer as partes na pena aplicável ao crime de desobediência”).
Assim, diferentemente do pretendido pela apelante, tal documento não faz prova dos factos da contestação elencados, nem ocorreu qualquer violação das regras de direito probatório material (nomeadamente, do regime probatório material da prova documental, constante dos arts. 362.º a 379.º do Cód. Civil), passível de determinar a alteração da decisão de facto do tribunal a quo quanto aos factos provados e não provados nos moldes pretendidos pela apelante (passagem das indicadas alíneas dos factos provados para os não provados e consideração dos n.º 1 a 3 dos factos não provados como factos provados).

c) – Ficha de Visita (da C...) ao imóvel
Novamente, a apelante não identifica qual é a concreta alteração da decisão de facto (dentro da requerida passagem das als. F, H, I, J, K, L, M, O, P, Q, R, S, T, U e W dos factos provados para os factos não provados e da passagem dos pontos 1. a 3. dos factos não provados para factos provados) que entende que tal documento impõe.
E, novamente, num esforço interpretativo do alegado, desta feita, no ponto 27 das conclusões – no qual a apelante alega que tal documento faz prova dos artigos 17º a 21º (já acima transcritos), 26º [A R nunca foi informada pela A de que esta teria angariado algum interessado na compra do imóvel, até porque nem sequer foi por esta solicitada ou “conduzida” qualquer visita ao imóvel;]; 27º [E, como é óbvio, ninguém manifesta interesse efectivo na compra de um imóvel sem o visitar primeiro], 28º, 34º (já acima transcritos), 35º [Caso a A. tivesse efectivamente angariado o cliente, como afirma, teria de ter, obrigatoriamente, a respectiva Ficha de Visita ou Reserva], 37º e 47º da contestação (já acima transcritos) –, parece a apelante entender que o teor do referido documento faz prova plena de que a compradora do imóvel tomou conhecimento que a fração se encontrava para venda em data anterior à celebração do contrato de mediação imobiliária; que foi através da C... que tomou esse conhecimento e que, em data anterior à celebração do contrato de mediação, visitou o imóvel.
Resulta claramente da leitura da motivação do tribunal a quo – veja-se a motivação supra transcrita quanto ao depoimento da testemunha CC – a valoração que do referido documento aí foi efetuada (em conjugação com os demais meios de prova), e o processo subjacente à formação dessa convicção.
Ora, o documento em causa – documento particular, com a força probatória do art. 376.º do Cód. Civil, a qual se reporta “(…) à materialidade das declarações documentadas, e não à sua exatidão (…)”[10] – não determina, ao contrário do que entende a apelante, que se tenha que considerar provado plenamente os factos aí descritos, tendo sido explicitada devidamente pelo tribunal a quo as razões pelas quais não se convenceu da exatidão do aí inscrito, nomeadamente, quanto à data em que foi efetuada a visita à fração pela compradora do imóvel.

Conclui-se, assim, que os meios de prova indicados pela apelante nas alegações de recurso não impõem as alterações requeridas de passagem das alíneas F, H, I, J, K, L, M, O, P, Q, R, S, T, U e W dos factos provados para os não provados, e de consideração dos n.ºs 1, 2 3 dos factos não provados como provados, improcedendo o recurso de impugnação da decisão de facto.

2.2.3. Alteração do descrito no facto F, retirando do mesmo a menção ao regime de exclusividade, e todas as menções constantes dos factos elencados de que “foi a Autora que angariou os compradores
Quanto a este pedido de alterações na decisão de facto, há que proceder a diversas alterações ao elenco dos factos provados e não provados, não em razão da invocada existência de erro no julgamento da matéria de facto, mas sim por se ter incluído na decisão sobre a matéria de facto constante da sentença recorrida afirmações conclusivas e que comportam matéria de direito, que não podem nem devem integrar tal decisão.
Com efeito, atento o disposto no art. 607.º, n.º 4 e n.º 5, do Cód. Proc. Civil, na sentença o juiz declara os factos que julga provados e quais os que julga não provados.
Factos são «(…) acontecimentos concretos da vida, reais ou hipotéticos, que sirvam de pressuposto às normas legais aplicáveis, não obstando, por conseguinte, que se considere, como realidades suscetíveis de averiguação e demonstração, as ocorrências virtuais ou factos hipotéticos quando constituem uma consequência lógica retirada de factos simples e apreensíveis, não decorram da interpretação e aplicação de regras de direito e não contenham, em si, uma valoração jurídica que, de algum modo, represente o sentido da solução final do litígio (…)»[11].
O desaparecimento no atual Cód. Proc. Civil do art. 646.º, n.º 4, do anterior Cód. Proc. Civil de 95/96 – que dispunha que “Têm-se por não escritas as respostas do tribunal coletivo sobre questões de direito e bem assim as dadas sobre factos que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados, quer por documentos, quer por acordo ou confissão das partes.” – deveu-se unicamente à expressa consagração, na reforma de 2013, do fim do tribunal de estrutura coletiva nos julgamentos em sede de primeira instância (que já praticamente não operava, desde a alteração legislativa do DL n.º 183/2000, de 10 de agosto); dessa eliminação não se retira qualquer alteração quanto ao que pode e deve integrar a decisão de facto, nem quanto à inadmissibilidade de inclusão na decisão da matéria de facto da sentença de afirmações genéricas, conclusivas ou que comportem matéria de direito.
Assim, mantendo-se no atual Código de Processo Civil a inadmissibilidade de inclusão na decisão de facto de afirmações genéricas, conclusivas ou que comportem matéria de direito, quando “(…) um ponto da matéria de facto integre uma afirmação ou valoração de factos que se insira na análise das questões jurídicas que definem o objecto da acção, comportando uma resposta, ou componente de resposta àquelas questões, o mesmo deve ser eliminado. (…)” [12].

Em consequência, impõe-se a expurgação da decisão de facto da matéria de natureza conclusiva nela incluída, nomeadamente, todas as referências à imputação (a qualquer uma das partes) da angariação dos compradores, por tal expressão constituir um juízo conclusivo a extrair dos factos, juízo/conclusão essa com relevância e pertinência ao nível da decisão do litígio (de tal forma que a referida conclusão encerra a resposta à questão jurídica em litígio).
De igual modo se impõe a eliminação da decisão de facto da conclusão jurídica plasmada nas als. U) e W) – de ser devida à autora a comissão/remuneração acordada no contrato celebrado.
Note-se que “(…) a supressão das expressões de cariz jurídico-conclusivo, não tem a virtualidade de afastar a valoração dos concretos factos que (…) [constam] (…) da matéria de facto provada, pois é com base em factos concretos que pode sustentar-se o juízo e não a partir de expressões conclusivas que representam conceitos/conclusões que não podem ser objecto de prova (…)”, pelo que esta nossa intervenção ao nível da fundamentação de facto “(…) não se dá ao nível da (re)apreciação da prova, mas antes “na despistagem (identificação/qualificação/expurgação), nos pontos da matéria de facto em causa, das afirmações genéricas, conclusivas ou que comportem matéria de direito”, ao abrigo da previsão constante do n.º 4 do art.º 607.º do CPC, que não no âmbito do disposto nos art.ºs. 640.º (impugnação da decisão relativa à matéria de facto feita pela parte/recorrente) ou 662.º (modificabilidade da decisão de facto) do CPC. (…)”[13].
Proceder-se-á ainda à substituição das referências conclusivas constantes da decisão de facto relativamente à ‘celebração de um contrato de mediação imobiliária’ –
ver als. F, G, N, Q, R, T e W – e à ‘conclusão com sucesso do negócio por escritura de compra e venda’ – ver al. T –, pela factualidade emergente dos documentos tituladores de tais contratos que contêm a matéria de facto em causa.

Expurgando a decisão de facto das expressões conclusivas e jurídicas, nos moldes supra referidos, passa a ser a seguinte a matéria de facto a considerar (as alterações efetuadas aparecem sublinhadas):

Factos Provados
A. A Autora é uma sociedade comercial que se dedica à atividade de mediação imobiliária.
B. Por sua vez, a Ré é uma sociedade comercial que se dedica à atividade de construção, compra e venda de imóveis e revenda dos adquiridos para esse fim.
C. Em meados do mês de agosto de 2019, a Autora foi abordada pela Ré, na pessoa do seu Administrador BB, tendo a Ré comunicado à Autora que pretendia contratá-la para que esta diligenciasse pela angariação de interessados na aquisição de um imóvel de que era proprietária.
D. Precisou a Ré que era dona e legítima possuidora da fração autónoma designada pela letra “M”, correspondente a um apartamento do tipo T3, do prédio urbano constituído em regime de propriedade horizontal, sito na Rua ..., ..., da união de freguesias ..., do concelho da Trofa, descrito na Conservatória de Registo Predial da Trofa sob o número ... e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ....
E. Mais referiu a Ré que pretendia contratar a Autora para que esta diligenciasse pela angariação de interessados na aquisição do referido bem imóvel.
F. E, em 26 de agosto de 2019, Autora e Ré, outorgaram o documento escrito denominado “Contrato de Mediação Imobiliária” (no qual a autora é designada como Mediadora e a ré como Segunda Outorgante), cuja cópia se encontra junta aos autos como documento 4 junto com a petição inicial, pelo qual, além do mais que do mesmo consta e que aqui se dá por reproduzido, os outorgantes acordaram:
– nos termos da Cláusula 2.ª (Identificação do Negócio), que a autora, como Mediadora, “obriga-se a diligenciar no sentido de conseguir interessado” na compra do imóvel identificado na cláusula 1.ª (fração autónoma descrita na al. D), “pelo preço de € 160.000,00 (…), desenvolvendo para o efeito ações de promoção e recolha de informações sobre os negócios pretendidos e caraterísticas dos respetivos imóveis.”
– nos termos da Cláusula 4.ª (Regime de Contratação), que:
“1- O Segundo Contratante contrata a Mediadora em regime de exclusividade (…)
2 – Nos termos da legislação aplicável, sendo o contrato celebrado em regime de exclusividade:
a) Só a Mediadora e as sociedades de mediação que integrem a Rede D... em Portugal (tal como se encontram definidas no n.º 3 da cláusula 2.ª) têm o direito de promover o negócio objeto do contrato de mediação durante o respetivo período de vigência não podendo o(s) segundo(s) contraente(s), nesse período, celebrar outro CMI referente ao imóvel.
b) Será devida à Mediadora a remuneração acordada na cláusula seguinte quando o negócio visado no CMI não se venha a concretizar por causa imputável ao segundo contratante.
G. Mais ficou convencionado, nos termos da Cláusula 5.ª (Remuneração), que se a ora Autora “conseguir interessado que concretize o negócio visado pelo presente contrato, nos termos e com as excepções previstas no art. 19.º da Lei n.º 15/2013, de 08 de Fevereiro”, a Ré obrigava-se a pagar à Autora, a título de remuneração, e aquando da celebração do contrato promessa de compra e venda, a quantia de 5% calculada sobre o preço de concretização do negócio, acrescida de IVA à taxa legal em vigor.
H. De imediato, a Autora colocou um anúncio nas suas instalações físicas e no seu site da internet a promover/publicitar o bem imóvel da Ré para venda, pelo preço de € 160.000,00 (cento e sessenta mil euros).
I. Nos dias seguintes, entraram em contacto com a Autora algumas pessoas que disseram estar interessadas na compra do referido bem imóvel.
J. A Autora informou a Ré que tinha interessados na aquisição do imóvel e tinha interesse em agendar uma visita ao imóvel, pelo que era conveniente fazê-lo assim que possível.
K. Mediante solicitação da Ré, a Autora ficou a aguardar o contacto da Ré, por forma a agendar a visita ao imóvel com os interessados, designadamente com DD e com a sua mulher.
L. Acontece que, após ter tomado conhecimento que a Autora tinha um interessado na compra do imóvel, a Ré nunca mais entrou em contacto com a Autora e nunca mais atendeu as chamadas telefónicas da Autora e/ou respondeu aos seus emails, o que a Autora estranhou.
M. Apesar de não responder aos diversos contactos da Autora, no início do mês de janeiro de 2020, e sem que nada o fizesse prever, o legal representante da Ré solicitou à Autora o envio de cópia do contrato celebrado em 26 de agosto de 2019 supra referido em F e G, apesar de ter sido entregue à Ré uma cópia do referido contrato momentos após a sua assinatura.
N. Conforme solicitado, no dia 07 de janeiro de 2020, a Autora enviou à Ré um email com cópia do referido contrato celebrado em 26 de agosto de 2019.
O. Apesar do contacto, a Ré não respondeu ao pedido da Autora quanto ao agendamento de visita ao imóvel pelo interessado DD e pela sua esposa, tendo ficado a Autora a aguardar ulterior contacto da Ré.
P. Semanas mais tarde, e após a ausência de respostas da Ré às várias comunicações da Autora, quer por via telefónica, quer por via de email, tomou a Autora conhecimento, através da consulta às respetivas bases de dados, que a Ré tinha vendido o bem imóvel, melhor identificado nos presentes autos, ao cliente – DD – referido na al. K.
Q. Sem que a Ré tivesse dado conhecimento à Autora e, consequentemente, sem que tivesse procedido ao pagamento da remuneração a que alude a cláusula 5.ª do contrato celebrado em 26 de agosto de 2019, referido nas als. F e G.
R. Ou seja, após se ter apercebido que já havia um interessado na compra do bem imóvel referido na al. D, graças às diligências de divulgação da B..., a Ré decidiu, em contacto direto com o interessado e, em simultâneo, deixar de responder às comunicações/contactos da Autora, por forma a tentar “desvincular-se” do contrato celebrado em 26 de agosto de 2019, referido nas als. F e G, com o único intuito de não proceder ao pagamento da remuneração prevista na cláusula 5.ª do referido contrato.
S. Apesar da ausência de resposta da Ré à Autora, foi através das atividades desenvolvidas pela autora, designadamente, referidas na al. H, que o comprador – DD – tomou conhecimento de que o imóvel referido na al. D se encontrava à venda.
T. Ademais, além da obtenção de interessado no imóvel através das atividades desenvolvidas pela autora, nos termos referidos na al. S, veio a ser concretizada pela ré a venda do imóvel referido na al. D ao interessado DD e mulher, AA, através da outorga, em 20 de fevereiro de 2020, do documento escrito denominado “Contrato de Compra e Venda e Mútuo com Hipoteca”, com termo de autenticação, cuja cópia se encontra junta aos autos (doc. 3 junto com o requerimento de 10-02-2022, REFª: 41279176), pelo qual, além do mais que do mesmo consta e que aqui se dá por reproduzido, a ré A..., representada no ato por procurador, declarou vender ao referido interessado DD e mulher, AA, a fração autónoma designada pela letra M, referida na al. D, pelo preço de € 160.000,00, tendo estes declarado aceitar a venda, encontrando-se tal aquisição registada na Conservatória dos Registos Civil, Predial, Comercial e Automóveis de Trofa, freguesia ..., sob o n.º ...-M, pela Ap. ... de 2020/02/20, conforme certidão do registo predial junta como doc. 6 com a petição inicial.
U. Apesar de a Autora ter conseguido, nos termos referidos na al. S, o interessado na compra do imóvel da Ré, negócio que já foi concretizado nos termos supra referidos na al. T, a Ré não procedeu ao pagamento da remuneração a que alude a cláusula 5.ª do contrato celebrado em 26 de agosto de 2019, referido nas als. F e G.
V. O que motivou a interpelação da ora Ré, por cartas registadas, com aviso de receção, enviadas nos dias 09 de março e 07 de abril de 2020, e rececionadas pela Ré nos dias 10 de março e 08 de abril respetivamente.
W. Apesar de notificada/ interpelada nos termos referidos na al. V, a Ré não procedeu ao pagamento da quantia peticionada naquelas cartas registadas, nas quais foi solicitado “(…) o pagamento da quantia de 8.000,00€ acrescido de IVA à taxa em vigor, correspondente a 5% do valor de venda que consta do CMI (cópia em anexo) (…)”, num total de € 9.840,00, nem nada disse.
X. A R. trabalha no mercado imobiliário (dedicando-se à construção, promoção, compra e venda e gestão patrimonial), tendo os seus próprios contactos, nomeadamente com investidores.
Y. A R tem até, no seu grupo empresarial, a sociedade “C..., Lda.” que exerce, ela própria também, a actividade de medição imobiliária, sob a licença AMI: 8850.
Z. Os CAE da Ré, A..., são:
a) Principal: 41200 - Construção de edifícios (residenciais e não residenciais);
b) Secundário 1: 68100 - Compra e venda de bens imobiliários; e
c) Secundário 2: 68200 - Arrendamento de bens imobiliários.
AA. Os CAE da C... são:
a) Principal: 68311 - Atividades de mediação imobiliária; e
b) Secundário 1: 68321 - Administração de imóveis por conta de outrem.

Factos Não Provados

1. Que a cópia do contrato após a sua assinatura não foi entregue à ré devido a ausência da Directora da Agência - da Autora -, que não assinou na data.
2. Foi a Ré que, por si própria e directamente, através dos seus vastos contactos no meio e no mercado, conseguiu obter o interesse dos compradores no imóvel.
3. Que a R. não atribuiu a “Exclusividade” à A., não tendo sido colocada qualquer cruz (X) no quadrado correspondente, presente no número 1 da Cláusula 4ª do contrato.
4. Que o imóvel não foi vendido pelo preço de 160.000,00 €.

Fixada assim a decisão da matéria de facto, cumpre apreciar os demais fundamentos do recurso, designadamente, quanto à subsunção jurídica dos factos ao direito.

3. Nulidade do contrato de mediação imobiliária
Defende a apelante, no recurso interposto, que o contrato celebrado entre as partes é nulo por violação das normas do artigo 16.º, n.º 2, alínea g), e n.º 5, da Lei nº 15/2013, de 8 de Fevereiro, porque “a cláusula 4ª do Contrato de Mediação Imobiliária celebrado entre as partes não especifica de forma alguma os efeitos que decorrem do eventual regime de exclusividade, quer para a empresa quer para o cliente”, o que a lei exige, nos termos do n.º 5 do artigo 16.º da Lei n.º 15/2013.

É o seguinte o teor do artigo 16.º da Lei n.º 15/2013, de 8 de fevereiro, na redação emergente das alterações introduzidas pelo DL n.º 102/2017, de 23 de agosto, com início de vigência em 1 de julho de 2017 (art. 12.º, n.º 1, do DL n.º 102/2017, de 23 de agosto):
Artigo 16.º
Contrato de mediação imobiliária
1 - O contrato de mediação imobiliária é obrigatoriamente reduzido a escrito.
2 - Do contrato constam, obrigatoriamente, os seguintes elementos:
a) A identificação das características do bem imóvel que constitui objeto material do contrato, com especificação de todos os ónus e encargos que sobre ele recaiam;
b) A identificação do negócio visado pelo exercício de mediação;
c) As condições de remuneração da empresa, em termos fixos ou percentuais, bem como a forma de pagamento, com indicação da taxa de IVA aplicável;
d) A identificação do seguro de responsabilidade civil ou da garantia financeira ou instrumento equivalente previsto no artigo 7.º, com indicação da apólice e entidade seguradora ou, quando aplicável, do capital garantido;
e) A identificação do angariador imobiliário que, eventualmente, tenha colaborado na preparação do contrato;
f) A identificação discriminada de eventuais serviços acessórios a prestar pela empresa;
g) A referência ao regime de exclusividade, quando acordado, com especificação dos efeitos que do mesmo decorrem, quer para a empresa quer para o cliente.
3 - Quando o contrato for omisso quanto ao respetivo prazo de duração, considera-se celebrado por um período de seis meses.
4 - Os modelos de contratos com cláusulas contratuais gerais de mediação imobiliária só podem ser utilizados pela empresa após aprovação prévia dos respetivos projetos pelo Instituto dos Mercados Públicos, do Imobiliário e da Construção, I. P. (IMPIC, I. P.).
5 - Para a aprovação prévia prevista no número anterior, a empresa submete o projeto de modelo de contrato ao IMPIC, I. P., por via preferencialmente eletrónica.
6 - Sempre que a empresa utilize o modelo de contrato com cláusulas contratuais gerais aprovado por portaria dos membros do Governo das áreas da justiça, do imobiliário e da defesa do consumidor, está dispensada da aprovação prévia prevista no n.º 4, devendo depositar o modelo de contrato, por via preferencialmente eletrónica, junto do IMPIC, I. P.
7 - O incumprimento do disposto nos n.os 1, 2, 4 e 6 determina a nulidade do contrato, não podendo esta, contudo, ser invocada pela empresa de mediação.
8 - O disposto nos números anteriores aplica-se apenas a contratos sujeitos à lei portuguesa.
9 - Quando, por motivo de indisponibilidade técnica, não for possível o cumprimento do disposto nos n.os 5 e 6, pode ser utilizado qualquer outro meio legalmente admissível.

A nulidade do contrato de mediação está prevista, desde as alterações introduzidas pelo DL n.º 102/2017, de 23 de agosto à Lei n.º 15/2013, de 8 de fevereiro, no n.º 7 do art. 16.º (e não no n.º 5 que foi indicado pela apelante).
Do contrato celebrado pelas partes consta, na sua Cláusula 4.ª, a indicação expressa de que as partes optam pela contratação em regime de exclusividade, e nessa cláusula são indicados os efeitos que para as partes decorre da estipulação de tal regime, nos seguintes termos:
– só a autora e as sociedades de mediação da rede D... em Portugal têm o direito de promover o negócio referido na Cláusula 2.ª (diligenciar no sentido de conseguir interessado na aquisição a fração autónoma designada pela letra M, de que a ré é a proprietária, pelo preço de € 160.000,00);
– a ré está proibida de, no período de vigência do contrato de mediação celebrado com a autora, celebrar outro Contrato de Mediação Imobiliária referente à aludida fração autónoma designada pela letra M;
– a autora tem o direito e a ré a obrigação de efetuar o pagamento da remuneração acordada quando o negócio de compra e venda da fração autónoma designada pela letra M não se venha a concretizar por causa imputável à ré.

Conforme é referido por HIGINA CASTELO, Contratos de mediação imobiliária: simples e com exclusividade[14] - REVISTA DE DIREITO COMERCIAL – 2020-07-05, fls. 1428 a 1431, a al. g) do n.º 2 do art. 16.º «(…) dispõe sobre dois aspetos diferentes do contrato de mediação em regime de exclusividade: por um lado, a sua formação, necessariamente sujeita à forma escrita; por outro, os seus efeitos concretos, cuja especificação se deixa na disponibilidade das partes, mas que têm de constar obrigatoriamente do texto contratual.
No anterior regime, estes dois aspetos constavam de disposições separadas (art. 19, n.ºs 4 e 5, do DL 211/2004) e explicitava-se o efeito do regime de exclusividade, determinando-se que, com a sua instituição, só a mediadora tinha o direito de promover o negócio objeto do contrato de mediação durante o respetivo período de vigência (art. 19, n.º 4, do DL 211/2004). A interpretação desta norma suscitou dúvidas sobre a abrangência da cláusula: permitia afastar apenas a concorrência de outras mediadoras ou inibia também o cliente de celebrar o contrato visado com interessado por si diretamente encontrado?
O RJAMI absteve-se de estabelecer os efeitos da cláusula de exclusividade, fazendo recair sobre as partes o ónus de os explicitarem, sob pena de nulidade do contrato. De lembrar que tal nulidade, além de não invocável pela empresa de mediação, não impede a conversão do contrato num contrato de mediação simples, ao abrigo do disposto no art. 293 do CC.
Todavia, apesar de as partes terem de estipular os concretos efeitos da cláusula de exclusividade, sempre o seu texto terá de ser interpretado, e, caso seja de teor semelhante ao da revogada norma, manterá atualidade a discussão sobre a sua extensão – afastar apenas a concorrência ou também a atividade do próprio cliente?
O modelo de contrato de mediação imobiliária com cláusulas contratuais gerais aprovado pela Portaria 228/2018, de 13 de agosto, que será, tendencialmente, o mais utilizado pelas empresas de mediação, estabelece que o «regime de exclusividade previsto no presente contrato implica que só a mediadora contratada tem o direito de promover o negócio objeto do contrato de mediação imobiliária durante o respetivo período de vigência» (cláusula 14.ª, n.º 2).
Ou seja, de acordo com este modelo contratual, o efeito do regime de exclusividade é exatamente o mesmo que estava previsto no art. 19, n.ºs 4 e 5, do revogado DL 211/2004 e que tinha suscitado as referidas divergências.
A jurisprudência que encontramos publicada tem oscilado entre as seguintes soluções:
- A cláusula de exclusividade impede a contratação de outras mediadoras e também a promoção direta do cliente, mas não impede o cliente de aceitar propostas que espontaneamente lhe www.revistadedireitocomercial.com 2020-07-05 1430 sejam feitas por terceiros34;
- A cláusula de exclusividade impede a contratação de outras mediadoras, mas não impede o próprio cliente de procurar interessados no negócio pretendido35 .
Penso que, sem prejuízo de as partes poderem manifestar claramente o seu acordo noutro sentido, a melhor interpretação de uma cláusula de teor idêntico ao do art. 19, n.º 4, do revogado DL 211/2004 e ao do n.º 2 da cl. 14.ª do modelo aprovado pela Portaria 228/2018 (só a empresa de mediação tem o direito de promover o negócio objeto do contrato de mediação) restringe a operacionalidade da cláusula ao afastamento da concorrência, não podendo ver-se como tal a iniciativa do próprio cliente.
Por um lado, o campo de regulação do RJAMI é o da atividade empresarial de mediação imobiliária, devendo a cláusula em causa ser lida a esta luz. Por outro lado, a interpretação mais lata contende com as normas dimanadas do princípio da autonomia privada, na sua modalidade de liberdade contratual, que tanto peso têm no âmbito do direito privado, pelo que carece de uma indicação clara das partes nesse sentido.
A posição defendida não prescinde do cumprimento pelo cliente do seu dever de informar previamente a mediadora exclusiva da sua intenção de celebrar contrato com pessoa por si diretamente encontrada e de se assegurar que tal pessoa não chegou a si graças à atividade da mediadora.
De acrescentar que as partes são livres de acordarem um regime de exclusividade mais forte (qualifizierter Alleinauftrag36), estipulando, por exemplo, que só a mediadora contratada tem o direito de promover o negócio objeto do contrato de mediação imobiliária durante o respetivo período de vigência e que o cliente se absterá de celebrar contrato com qualquer interessado que não seja angariado pela mediadora, incluindo com interessado encontrado por si próprio ou que a si se apresentou espontaneamente, sob pena de dever pagar a remuneração à mediadora. (…)».

Concluímos, deste modo, que está na disponibilidade das partes fixar os efeitos da estipulação de exclusividade que, no caso, são os que foram indicados na Cláusula 4.ª do contrato sub judice. Não se vislumbra de onde retira a apelante que no contrato outorgado em 26 de agosto de 2019 ‘inexiste a especificação dos efeitos’ nem que essa especificação tenha sido efetuada por ‘mera remissão para a norma legal’.
Improcede a arguida nulidade do contrato.

4. Erro na interpretação e aplicação das normas dos artigos 19º e 40º da Lei nº 15/2013, de 8 de fevereiro e dos artigos 342º, 346º, 347º, 364º, 371º ou 376º e 372º do Código Civil.
Defende ainda a apelante que não se encontram preenchidos os requisitos da norma do art. 19.º da Lei n.º 15/2013, de 8 de fevereiro, pelo que não é devida qualquer remuneração à autora, havendo o entendimento pacífico e unânime na Jurisprudência, de que a cláusula de exclusividade apenas proíbe o cliente de contratar outros agentes ou empresas para realizar o trabalho de mediação, não o proibindo de contactar diretamente terceiro interessado, que ele próprio encontrou ou que o procurou espontaneamente, sem intermediação da agência.
Vejamos.
Não há controvérsia quanto ao facto de estarmos aqui perante um contrato de mediação imobiliária, previsto e regulado na Lei n.º 15/2013, de 8 de fevereiro (com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei 102/2017, de 23 de agosto), diploma que estabelece o regime jurídico a que fica sujeita a atividade de mediação imobiliária (RJAMI).
No art. 2.º (Definições) deste diploma define-se a atividade de mediação imobiliária nos seguintes termos:
1 – A atividade de mediação imobiliária consiste na procura, por parte das empresas, em nome dos seus clientes, de destinatários para a realização de negócios que visem a constituição ou aquisição de direitos reais sobre bens imóveis, bem como a permuta, o trespasse ou o arrendamento dos mesmos ou a cessão de posições em contratos que tenham por objeto bens imóveis.
2 - A atividade de mediação imobiliária consubstancia-se também no desenvolvimento das seguintes ações:
a) Prospeção e recolha de informações que visem encontrar os bens imóveis pretendidos pelos clientes;
b) Promoção dos bens imóveis sobre os quais os clientes pretendam realizar negócios jurídicos, designadamente através da sua divulgação ou publicitação, ou da realização de leilões.”

O regime regulador da atividade de mediação imobiliária, que inicialmente estabelecia uma obrigação de resultado a cargo da mediadora (o art. 2.º do DL 285/92, de 19 de dezembro, definia a atividade de mediação imobiliária como a atividade comercial em que, por contrato, a entidade mediadora se obriga a conseguir interessado para a compra e venda de bens imobiliários ou para a constituição de quaisquer direitos reais sobre os mesmos, para o seu arrendamento, bem como na prestação de serviços conexos), passou, com o Decreto-Lei n.º 77/99, de 16 de março (que revogou aquele Decreto-Lei n.º 285/92, de 19 de Dezembro), a configurar a obrigação da mediadora como uma obrigação de meios, ao consagrar no n.º 1 do seu art. 3.º a atividade de mediação imobiliária como “aquela em que, por contrato, uma empresa se obriga a diligenciar no sentido de conseguir interessado na compra ou na venda de bens imóveis ou na constituição de quaisquer direitos reais sobre os mesmos, bem como para o seu arrendamento e trespasse, desenvolvendo para o efeito ações de promoção e recolha de informações sobre os negócios pretendidos e sobre as características dos respetivos imóveis.”, o que se manteve com o Decreto-Lei n.º 211/2004, de 20 de agosto, que revogou aquele Decreto-Lei n.º 77/99, de 16 de março.
O regime atual «(…) abandona a referência a uma obrigação da mediadora de efetuar dadas diligências e descreve simplesmente a atividade na perspetiva da sua execução fáctica, como a procura de destinatários, sem fazer corresponder essa procura a uma obrigação contratual.
Só por via da interpretação dos concretos contratos de mediação imobiliária, se poderá aferir se a mediadora assumiu uma obrigação e, se sim, qual a sua extensão. A lei vigente, ao não classificar a atividade que a mediadora desenvolve no âmbito do contrato e por causa dele como obrigação, permite que o modelo legalmente típico inclua contratos em que a mediadora se vincula ao exercício da atividade e outros em que não se vincula. (…)»[15].

No caso em apreciação, resulta da Cláusula 2.ª do contrato que a autora assumiu uma obrigação de meios: a obrigação de ‘diligenciar no sentido de conseguir interessado’ (na compra da fração autónoma designada pela letra M) ‘pelo preço de € 160.000,00’, ‘desenvolvendo para o efeito ações de promoção e recolha de informações sobre os negócios pretendidos e caraterísticas dos respetivos imóveis.’
A autora vinculou-se, assim, pelo referido contrato, ao exercício da atividade (obrigação de meios).
O primeiro pressuposto do direito à remuneração (prevista no art. 19.º da Lei n.º 15/2013, de 8 de fevereiro) é, assim, o cumprimento dessa obrigação contratualmente assumida pela autora na Cláusula 2.ª.
Tal obrigação foi cumprida, como resulta das als. H a K e O da fundamentação de facto.
O segundo pressuposto prende-se com a conclusão do contrato visado (ver Cláusula 5.ª do contrato e art. 19.º, n.º 1, da Lei da Lei n.º 15/2013, de 8 de fevereiro).
Dispõe o art. 19.º (Remuneração da empresa), no que aqui releva, nos seguintes termos:
1 - A remuneração da empresa é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação ou, se tiver sido celebrado contrato-promessa e no contrato de mediação imobiliária estiver prevista uma remuneração à empresa nessa fase, é a mesma devida logo que tal celebração ocorra.
2 - É igualmente devida à empresa a remuneração acordada nos casos em que o negócio visado no contrato de mediação tenha sido celebrado em regime de exclusividade e não se concretize por causa imputável ao cliente proprietário ou arrendatário trespassante do bem imóvel.

Das disposições legais transcritas resulta que «(…) A remuneração da mediadora, porém, não é devida apenas pelo exercício da atividade de mediação, pelas diligências no sentido de encontrar interessado no negócio visado, nem sequer pelo bom sucesso dessa atividade (obtenção desse interessado). Conforme determina o artigo 19, n.º 1, do RJAMI, a remuneração da empresa é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação (ou com a celebração do contrato-promessa, se assim tiver sido estipulado no contrato de mediação imobiliária). É sobretudo nisto que reside o cariz inconfundível do contrato de mediação: o direito à remuneração depende de uma circunstância futura, incerta e externa à prestação da mediadora, ainda que com esta relacionada. (…)» [16].
No caso, o contrato visado – contrato de compra e venda da fração autónoma designada pela letra M – foi concretizado: ver als. P e T dos factos provados.
Um terceiro pressuposto diz respeito ao nexo causal entre a atividade da mediadora e o contrato celebrado, no sentido de que a atividade da mediadora tem que ter contribuído – ainda que não tenha que ser a única causa – para a celebração do contrato. Tem que se verificar um nexo entre a atividade do mediador e o contrato final celebrado, sendo através da afirmação da existência desse nexo que se afere o cumprimento pela mediadora da sua obrigação (de meios).
Seguimos o entendimento de que é necessário que o trabalho/atividade desenvolvida pela mediadora tenha contribuído, ainda que não tenha sido a única causa, de forma importante para a conclusão do negócio [17]
No caso em análise, a existência de tal nexo causal resulta dos factos constantes das als. I a L e S dos factos provados. E resulta ainda dos factos apurados constantes das als. O, P e R que a ré, tendo tomado conhecimento de que havia esse interessado, cujo interesse na fração autónoma surge em consequência da atividade de publicitação do imóvel desenvolvida pela autora, entrou em contato direto com tal interessado e atuou por forma a obstar a que a autora desenvolvesse as demais diligências de contacto e negociação com o referido interessado, impedindo, nomeadamente, que fosse a autora a levar tal interessado a visitar o imóvel – ver als. J, K e L dos factos provados.

Ora, o facto de se entender que a cláusula de exclusividade acordada pelas partes no contrato sub judice impede a contratação de outras mediadoras, mas não impede o próprio cliente de procurar interessados na aquisição a fração autónoma designada pela letra M, «(…) não prescinde do cumprimento pelo cliente do seu dever de informar previamente a mediadora exclusiva da sua intenção de celebrar contrato com pessoa por si diretamente encontrada e de se assegurar que tal pessoa não chegou a si graças à atividade da mediadora. (…)»[18], como já acima foi referido (na apreciação da arguição a nulidade do contrato – ponto 3).
A ré, manifestamente, não cumpriu tal dever, como resulta dos factos provados.
Atendendo ao supra exposto e à improcedência do recurso quanto à decisão de facto – nomeadamente, no que concerne à pretendida alteração da matéria de facto constante do ponto 2 dos factos não provados para os factos provados –, falece o pressuposto da sustentação pela apelante da inexistência do direito da autora ao pagamento da retribuição acordada: o conhecimento pelos compradores de que o imóvel da ré se encontrava à venda pelo preço de € 160.000,00 deveu-se à atuação da autora; a ré tomou conhecimento da existência desse interessado e entra em contato direto com o mesmo, não só abstendo-se de dar conhecimento desse facto à autora, mas impedindo que esta desse continuidade ao contacto iniciado com tal interessado, nomeadamente, com a sua falta de resposta às solicitações da autora para agendamento de visita ao imóvel com o referido interessado, interessado esse que acaba por vir a concretizar o negócio com a ré. Ou seja, contrariamente ao por si defendido, o que resulta dos factos provados elencados nas alíneas R a T é que a ré entrou em contato direto com o interessado que a mesma sabia ter anteriormente contactado a autora, na sequência das atividades desenvolvidas por esta descritas na al. H, pelo que não foi a ré que encontrou tal interessado por si só, nem o contacto de tal interessado ocorreu independentemente das atividades que a autora, em execução da obrigação assumida na Cláusula 2.ª, desenvolveu.
Não ocorre, assim, o invocado erro do tribunal a quo na aplicação e interpretação do art. 19.º da na Lei n.º 15/2013, de 8 de fevereiro.

No que concerne ao erro na aplicação e interpretação do disposto no art. 40.º da Lei n.º 15/2013, de 8 de fevereiro e nas normas dos artigos 342.º, 346.º, 347.º, 364.º, 371.º ou 376.º e 372.º do Código Civil, a questão já acima foi apreciada e decidida, no âmbito da alteração da decisão quanto a matéria de facto (ver al. b) do ponto 2.2.2.).
Improcede a apelação.

IV. Dispositivo:
Pelo exposto, acordam os juízes que compõem o tribunal coletivo desta 3.ª Secção Cível em julgar improcedente a apelação, confirmando-se – sem prejuízo da efetuada expurgação da decisão de facto dos juízos e expressões conclusivos e jurídicos – a decisão recorrida.
Custas pela apelante.
Notifique.
***
Porto, 9 de novembro de 2023
Ana Luísa Loureiro
Leonel Serôdio
Paulo Duarte Teixeira
________________
[1] Acessível na íntegra na base de dados de jurisprudência do IGFEJ – http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/
[2] Acessível na íntegra na base de dados de jurisprudência do IGFEJ – http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/
[3] Acessível na íntegra na base de dados de jurisprudência do IGFEJ – http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/
[4] Sendo que o AUJ do STJ n.º 8344/17.6T8STB.E1-A.S1, ainda não transitado (nem publicado), consolida a tese restritiva dos requisitos formais do recurso de facto.
[5] Existe manifesto lapso de escrita na al. R da fundamentação de facto da sentença, que se retifica (por revelado pelo contexto da declaração), mediante a inserção da parte inadvertidamente suprimida entre parenteses retos (ver o teor do art. 18.º da petição inicial, que o tribunal a quo ´transcreve’ – com o lapso apontado – na al. R.).
[6] Acórdãos citados acessíveis, na íntegra, na base de dados de jurisprudência do IGFEJ, em http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/.
[7] MARIA ADELAIDE DOMINGOS, “Recursos, um olhar convergente sobre aspectos dissonantes: questões práticas”, Caderno II – O Novo Processo Civil, Contributos da doutrina no decurso do processo legislativo, designadamente à luz do anteprojecto e da proposta de lei n.º 113/XII, Coleção de Formação Contínua do Centro de Estudos judiciários, novembro de 2013, disponível em https://www.oa.pt/upl/%7B5a01c252-3701-453a-8426-8116f7d1cff0%7D.pdf.
[8] “Poderes/deveres da Relação na reapreciação da matéria de facto. O dano biológico quando da afectação funcional não resulte perda da capacidade de ganho – O princípio da Igualdade”, Revista Julgar – n.º 33 – 2017, Almedina, disponível em https://julgar.pt/wp-content/uploads/2017/09/05R-Rita-Mota-Soares-Reaprecia%C3%A7%C3%A3o-da-mat%C3%A9ria-de-facto-na-Rela%C3%A7%C3%A3o-dano-biol%C3%B3gico-quantifica%C3%A7%C3%A3o.pdf.
[9] Acessível em http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/.
[10] Vd. Ac. do Tribunal da Relação do Porto de 07-02-2023, Processo n.º 1330/19.3T8PRT.P1, acessível na íntegra na base de dados de jurisprudência do IGFEJ – http://www.gde.mj.pt/jtrp.nsf/.
[11] Assim, Ac. do STJ de 18-10-2018, processo n.º 3499/11.6TJVNF.G1.S2, acessível na íntegra na base de dados de jurisprudência do IGFEJ - http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/
[12] Assim, Ac. do Tribunal da Relação de Évora de 28-06-2018, processo n.º 170/16.6T8MMN.E1 - http://www.dgsi.pt/jtre.nsf/.
[13] Ac. do Tribunal da Relação de Évora de 28-06-2018 identificado na nota 11.
[14] Artigo acessível em:
https://static1.squarespace.com/static/58596f8a29687fe710cf45cd/t/5f022e6c04cf460c9abc7f88/1593978480039/2020-26+-+1401-1462.pdf
[15] HIGINA CASTELO, Op. cit., pág. 1411.
[16] HIGINA CASTELO, Op. cit., págs. 1414 e 1415.
[17] Neste sentido, vd. Ac. TRG de 14.09.2017, proc. 262/16.1T8VCT.G1, e jurisprudência aí citada.
[18] HIGINA CASTELO, Op. cit., págs. 1430 e 1431.