I. Os elementos objetivos de um tipo de ilícito constituem a materialidade do crime e emergem da descrição da ação empreendida ou omitida, produtora de uma modificação do mundo exterior apreensível pelos sentidos. Por seu turno as dimensões do elemento subjetivo traduzem a atitude interior do agente na sua relação com o facto material.
II. O dolo consiste no conhecimento e vontade de praticar o facto ilícito com consciência da sua censurabilidade. Traduzindo o seu elemento intelectual a representação da realização do facto ilícito (a consciência psicológica, ou consciência intencional); e indicando o elemento volitivo a posição ou atitude do agente contrária ou indiferente à norma de comportamento, implicando uma decisão de vontade de realização do ilícito-típico (por via de ação ou da omissão do comportamento devido).
III. Mas consciência e vontade não podem ser vistos isoladamente, pois, só se pode querer aquilo que se conhece.
IV. Em geral o sentido da ilicitude do facto ressalta da realização da factualidade típica, agindo o agente com o dolo requerido pelo tipo. Nestes casos carecerá de sentido questionar se a atuação foi conscientemente, se o agente tinha pleno conhecimento da proibição e representou todas as circunstâncias do facto, querendo mesmo assim realizá-lo. Porque se não tinha essa consciência isso terá necessariamente de lhe ser censurável (exceto se a carga axiológica do ilícito o não exigir).
V. Não é manifestamente infundada a acusação na qual se não impute expressamente o conhecimento do caráter ilícito do comportamento quando este não seja axiologicamente neutro.
VI. O princípio do acusatório, espinha dorsal do modelo processual vigente, não dispensa - antes exige - o controlo judicial do libelo (artigo 311.º, § 2.º e 3.º CPP), visando evitar acusações gratuitas, manifestamente inconsistentes, visto que a sujeição a julgamento penal é, só por si, um incómodo, muitas vezes oneroso, e não raras vezes até um vexame.
A acusação do Ministério Público imputa à arguida AA, com os demais sinais dos autos, a prática, como autora, de um crime de gravações ou fotografias ilícitas, previsto no artigo 199.º, § 2.º, al. a) do Código Penal (CP) e de um crime de perseguição, previsto no artigo 154.º-A do mesmo código.
No controlo liminar do processo, efetuado nos termos previstos no artigo 311.º do Código de Processo Penal (CPP), a Mm.a Juíza considerou que a acusação era manifestamente infundada, por os factos nela imputados ao arguido não constituírem crime, uma vez que não se alegam os factos integradores do elemento subjetivo dos respetivos tipos de ilícito, pelo que a rejeitou (artigo 311.º, § 2.º, al. a) e § 3.º, al. d) CPP).
b. Inconformado com essa decisão dela vem o Ministério Público recorrer, finalizando a respetiva motivação com as seguintes conclusões (transcrição):
«(…)
2.º Ora, “manifestamente infundada é a acusação que, por forma clara e evidente, é desprovida de fundamento, seja por ausência de factos que a suportem, por a insuficiência de indícios ser manifesta e ostensiva, no sentido de inequívoca, indiscutível, fora de toda a dúvida séria, seja porque os factos não são subsumíveis a qualquer norma jurídico-penal, constituindo a designação de julgamento flagrante violência e injustiça para o arguido, em clara violação dos princípios constitucionais”. (Ac. da Relação de Lisboa de 16.05.2006, disponível in www.dgsi.pt);
3.º A M.ma Juiz recorrida considerou a acusação manifestamente infundada, por dela não constarem factos que preencham o elemento subjetivo do crime;
4.º Discorda-se desse douto despacho porque, por um lado não existe necessidade de serem narrados na acusação os factos tendentes à descrição da consciência da ilicitude;
5.º Por outro lado, porque dos factos constantes dos pontos 3.º, 4.º, 5.º, 7.º, 15.º, 16.º, 17.º, 18.º e 19.º da acusação, resultam factos no sentido de que a arguida representou os factos, e resolveu praticá-los, não restando dúvidas que se encontram alegadas na acusação a vontade e a intenção da arguida de cometer os crimes que lhe vêm imputados;
6.º A acusação não só não é completamente desprovida de factos, de forma clara e evidente, como também se verifica que da mesma constam factos que preenchem, de forma suficiente e bastante, o elemento subjetivo;
7.º Mesmo que assim não se entenda, deveria a M.ma Juiz recorrida ter determinado o envio dos autos aos serviços do Ministério Publico para assim poder suprida a insuficiência verificada;
8.º Por último, temos para nos que cabe ao juiz de julgamento apurar a verdade material dos factos, e não cingir-se a uma visão formal do objeto da acusação;
9.º O que o Juiz não pode é antecipar-se ao julgamento, como fez a M.ma Juiz a quo – “o mérito da acusação só em julgamento pode e deve ser apreciado” (Acs. da Rel. Coimbra de 27.04.1994 e de 15.02.1995, in BMJ 436 e 444, págs. 455 e 721, respetivamente);
10.º Termos em que, decidindo como decidiu, a M.ma Juiz recorrida violou o disposto pelo art. 311.º, n.º 2, al. a), e n.º 3, al. d), do C.P.P.
Termos em que deverá dar-se provimento ao presente recurso, revogando-se, consequentemente, o douto despacho ora recorrido, devendo o mesmo ser substituído por outro que determine a remessa dos autos para julgamento, com a designação de data para realização da audiência de julgamento, ou então que determine a remessa dos autos ao Ministério Publico para os fins tidos por convenientes.»
c. Subidos os autos a este Tribunal da Relação, o Ministério Público junto desta instância pronunciou-se no sentido da procedência do recurso.
d. Cumprido o disposto no artigo 417.º, § 2.º do CPP, a arguida nada disse.
e. Efetuado exame preliminar e nada obstando ao prosseguimento do recurso foram os autos à conferência, com precedência de vistos ao Ex.mo Presidente da Secção Criminal e aos Ex.mos Desembargadores adjuntos.
Cumprindo apreciar e decidir.
II – Fundamentação
1.Objeto do recurso
O âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões do recorrente, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (artigo 412.º, § 1.º CPP) (2).
De acordo com as conclusões do recorrente, verificamos que a única questão aportada ao conhecimento desta instância de recurso é a de saber se a acusação deduzida pelo Ministério Público é/não é manifestamente infundada.
2. O despacho recorrido
A Mm.a Juíza a quem os autos foram distribuídos para julgamento na 1.º instância proferiu o seguinte despacho liminar (311.º CPP):
«O Tribunal é competente em razão da nacionalidade, da matéria e da hierarquia.
*
Questão Prévia:
O Digno Magistrado do Ministério Público acusou AA da prática de um crime de gravações ou fotografias ilícitas, p. e p. pelo art. 199º, nº2, al. a), do Código Penal, na redação dada pela Lei nº 59/2007, de 4 de Setembro, em concurso real com um crime de perseguição, p. e p. pelo art. 154º-A, do mesmo diploma legal.
Para tanto acusa a Arguida de:
«1. No dia 12 de abril de 2022, pelas 19 horas e 30 minutos, a ofendida BB, melhor ido nos autos, encontrava-se no interior das instalações do hipermercado denominado "…", sito na Avenida …, na vila e freguesia de …, deste concelho de …;
2. Depois de realizar umas compras, encontrava-se já na caixa de pagamento, juntamente com o seu filho menor de cerca de 1 ano de idade, quando ali surgiu a ora arguida;
3. Esta muniu-se do seu aparelho de telemóvel, virou-o ma direção da ofendida, e tirou-lhe uma foto;
4. O que fez sem a autorização e contra a vontade da ofendida, que por mais que uma vez lhe disse para parar com a sua conduta;
5. A arguida não só não parou, como fez publicar tal foto na sua conta da rede social do facebook;
6. Mas a arguida não se limitou tão só a obter tal foto;
7. Em datas não apuradas mas que se sabe terem sido anteriores ao dia 12 de abril de 2022, pelo menos em dois ou três momentos, a arguida dirigiu-se ao local de trabalho da ofendida, sito no hipermercado "…", sito na Avenida …, na vila e freguesia de …, deste concelho de …, apenas e tão só com a intenção de se intrometer com ela;
8. Em dia e hora não apurados, mas em data posterior ao referido dia 12 de abril de 2022, a ofendida encontrava-se com o seu filho menor de idade no parque infantil de …;
9. A arguida nesse momento, dirigindo-se para a ofendida, disse-lhe que "esperasse, que ia ver o que lhe ia acontecer";
10. A ofendida sentiu-se de tal modo receosa pelo que a arguida lhe poderia fazer, que solicitou a algumas pessoas ali presentes que a acompanhassem até um lugar seguro;
11. Noutro momento que não foi possível determinar no tempo, a ofendida encontrava-se juntamente com uma amiga junto ao estabelecimento de farmácia sito na Rua …, na vila de …;
12. Nesse momento ali chegou a arguida, a qual ficou imobilizada, a olhar fixamente para ambas;
13. Alguns momentos depois a ofendida dali saiu em direção à sua residência, tendo a arguida prosseguido a sua marcha atrás dela;
14. Ao mesmo tempo que ia proferindo várias expressões que a ofendida não percebeu, uma vez que a sua única preocupação era chegar o mais rápido possível à sua residência;
15. A arguida tem continuado a aparecer no local de trabalho da ofendida indicado em 7.°, onde fala alto dirigindo-se á ofendida, o que faz esta recear que a sua entidade empregadora a despeça;
16. A ofendida tem também receio que a arguida atinja a o seu filho menor na sua integridade física, em momento em que estejam sozinhos;
17. A ofendida sentiu-se em todos esses momentos coartada na sua liberdade de deslocação, temendo sempre qualquer atitude violenta da arguida;
18. A arguida, não obstante já ter sido chamada a atenção pela ofendida para não a incomodar mais, continua a persistir na sua conduta, bem sabendo que esta se mostra adequada a tornar-se incómoda, inconveniente e indesejada;
19. Resultado esse que representou, e quis levar a cabo;
20. A arguida agiu sempre de forma livre, deliberada e consciente
21. Bem sabendo que a sua conduta não lhe era permitida, e que a mesma era punida por lei.»
Dispõe o artigo 311.º do Código de Processo Penal que:
“1 - Recebidos os autos no tribunal, o presidente pronuncia-se sobre as nulidades e outras questões prévias ou incidentais que obstem à apreciação do mérito da causa, de que possa desde logo conhecer.
2 - Se o processo tiver sido remetido para julgamento sem ter havido instrução, o presidente despacha no sentido:
a) De rejeitar a acusação, se a considerar manifestamente infundada;
b) De não aceitar a acusação do assistente ou do Ministério Público na parte em que ela representa uma alteração substancial dos factos, nos termos do n.º 1 do artigo 284.º e do n.º 4 do artigo 285.º, respetivamente.
3 - Para efeitos do disposto no número anterior, a acusação considera-se manifestamente infundada:
a) Quando não contenha a identificação do arguido;
b) Quando não contenha a narração dos factos;
c) Se não indicar as disposições legais aplicáveis ou as provas que a fundamentam; ou
d) Se os factos não constituírem crime.”
Resulta do disposto no artigo 283.º, n.º 3, do Código de Processo Penal a acusação tem que narrar, ainda que sinteticamente, os factos que fundamentam a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança, incluindo, se possível, o lugar, o tempo e a motivação da sua prática, o grau de participação que o agente neles teve e quaisquer circunstâncias relevantes para determinação da sanção que lhe deve aplicada, bem como a indicação das disposições legais aplicáveis (alíneas b) e c) do citado preceito).
E tal exigência legal deriva da circunstância de ser a acusação que fixa o objeto do processo, delimitando o âmbito da ulterior atividade investigatória a desenvolver pelo juiz, nomeadamente na fase de julgamento. Deve, pois, conter a descrição fáctica com a indicação precisa e completa dos factos que o Ministério Público entende estarem indiciados, integradores, tanto dos elementos objetivos do crime, como dos seus elementos subjetivos e que justificam a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança. Caso a acusação não obedeça a tais requisitos é nula como expressamente se contempla no mencionado artigo 283º, nº 3.
O que se pretende, pois, é que a acusação contenha o facto, normativamente entendido, isto é, em articulação com as normas violadas pela sua prática e que irão, constando da acusação, conformar o “objeto do processo que, por sua vez, delimita os poderes de cognição do tribunal e o âmbito do caso julgado” [Cf. o Ac. do Tribunal Constitucional n.º 130/98].
Ora, se é verdade que não é uma exigência inultrapassável que a acusação seja uma peça rígida e imutável, não menos verdade será que ela deve conter os factos essenciais à integração num ou mais tipos penais. Principalmente se tais factos são conhecidos nos autos no momento em que é deduzida a acusação.
O fundamente da inexistência de factos na acusação que constituem crime só pode ser aferido diante do texto da acusação, quando faltem os elementos típicos objetivos e subjetivos de qualquer ilícito criminal da lei penal Portuguesa ou quando se trate de conduta penalmente irrelevante [como refere PAULO PINTO DE ALBUQUERQUE, Comentário do Código de Processo Penal, Univ. Católica Editora, pp. 791, ponto 8].
Estabelece o artigo 199.º n.º 2 al. a) do Código Penal que « - Na mesma pena [pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 240 dias] incorre quem, contra vontade: Fotografar ou filmar outra pessoa, mesmo em eventos em que tenha legitimamente participado;»
O tipo objetivo do crime em presença consiste no registo fotográfico ou audiovisual da imagem de qualquer parte do corpo de outra pessoa ou na sua utilização ou permissão de utilização dessas imagens por terceiro.
É ao próprio, que aparece nas fotografias, que assiste o poder soberano de decidir quem pode gravar, registar, utilizar ou divulgar a sua imagem. Isto em consonância com o disposto no art.º 79.º, n.º 1, Código Civil.
Na vertente subjetiva, exige-se a forma de cometimento a título de dolo (de acordo como o disposto no artigo 13.º, do Código Penal, “só é punível o facto praticado com dolo ou, nos casos especialmente previstos na lei, com negligência”), em qualquer das modalidades enunciadas no artigo 14.º, do mesmo Código.
Sob a epígrafe “Perseguição”, estabelece o artigo 154.º-A do Código Penal:
“1 - Quem, de modo reiterado, perseguir ou assediar outra pessoa, por qualquer meio, direta ou indiretamente, de forma adequada a provocar-lhe medo ou inquietação ou a prejudicar a sua liberdade de determinação, é punido com pena de prisão até 3 anos ou pena de multa, se pena mais grave não lhe couber por força de outra disposição legal.
2 - A tentativa é punível.
3 - Nos casos previstos no n.º 1, podem ser aplicadas ao arguido as penas acessórias de proibição de contacto com a vítima pelo período de 6 meses a 3 anos e de obrigação de frequência de programas específicos de prevenção de condutas típicas da perseguição.
4 - A pena acessória de proibição de contacto com a vítima deve incluir o afastamento da residência ou do local de trabalho desta e o seu cumprimento deve ser fiscalizado por meios técnicos de controlo à distância.
5 - O procedimento criminal depende de queixa”.
O crime de “perseguição”, olhando à própria redação do preceito legal acabado de transcrever, tem como elementos constitutivos:
- A ação do agente, consubstanciada na perseguição ou assédio da vítima, por qualquer meio (direto ou indireto);
- A adequação da ação a provocar na vítima medo ou inquietação ou a prejudicar a sua liberdade de determinação;
- A reiteração da ação.
Exige-se ainda o dolo do agente, em qualquer das suas modalidades.
Tem-se sedimentado na doutrina penalista o entendimento do dolo do tipo de ilícito como composto pelo conhecimento (momento intelectual) e vontade (momento volitivo) de realização do facto, o que plasmado está no referenciado artigo 14.º.
Assim, para que o dolo do tipo esteja presente necessário se torna, desde logo, que o agente conheça, saiba, represente corretamente ou tenha consciência das circunstâncias do facto que preenche um tipo objetivo de ilícito (isto é, o conhecimento dos elementos materiais constitutivos do mesmo).
Com efeito, é necessário que ao atuar, o agente conheça “tudo quanto é necessário a uma correta orientação da sua consciência ética para o desvalor jurídico que concretamente se liga à ação intentada, para o seu carácter de ilícito”, porquanto só quando os elementos do facto estão presentes na consciência psicológica do agente se poderá vir a afirmar que ele se decidiu pela prática do ilícito – assim, Figueiredo Dias, Direito Penal – Parte Geral, Tomo I, Coimbra Editora, pág. 351 - exigindo-se ainda que a prática do facto seja presidida por uma vontade dirigida à sua realização.
Daí que, como se refere no Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 13/09/2017, Proc. nº 146/16.3 PCCBR.C1 [disponível em www.dgsi.pt], “a acusação tem de descrever os elementos em que se analisa o dolo, ou seja: o conhecimento (ou representação ou, ainda, consciência em sentido psicológico) de todas as circunstâncias do facto, de todos os elementos descritivos e normativos do tipo objetivo do ilícito; a intenção de realizar o facto, se se tratar de dolo direto, ou a previsão do resultado danoso ou da criação de perigo (nos crimes desta natureza) como consequência necessária da sua conduta (tratando-se de dolo necessário), ou ainda a previsão desse resultado ou da criação desse perigo como consequência possível da mesma conduta, conformando-se o agente com a realização do evento (se se tratar de dolo eventual)”.
Aliás, no Acórdão do STJ nº 1/2015, de 20/11/2014, DR n.º 18, I Série, de 27/01/2015, fixou-se a seguinte jurisprudência: “a falta de descrição, na acusação, dos elementos subjetivos do crime, nomeadamente dos que se traduzem no conhecimento, representação ou previsão de todas as circunstâncias da factualidade típica, na livre determinação do agente e na vontade de praticar o facto com o sentido do correspondente desvalor, não pode ser integrada, em julgamento, por recurso ao mecanismo previsto no art. 358.º do CPP”.
Nele se podendo ler que “a acusação, enquanto delimitadora do objeto do processo, tem de conter os aspetos que configuram os elementos subjetivos do crime, nomeadamente os que caracterizam o dolo, quer o dolo do tipo, quer o dolo do tipo de culpa no sentido acima referido, englobando a consciência ética ou consciência dos valores e a atitude do agente de indiferença pelos valores tutelados pela lei criminal, ou seja: a determinação livre do agente pela prática do facto, podendo ele agir de modo diverso; o conhecimento ou representação, de todas as circunstâncias do facto, tanto as de carácter descritivo, como as de cariz normativo e a vontade ou intenção de realizar a conduta típica, apesar de conhecer todas aquelas circunstâncias, ou, na falta de intenção, a representação do evento como consequência necessária (dolo necessário) ou a representação desse evento como possível, conformando-se o agente com a sua produção (dolo eventual), atuando, assim, conscientemente contra o direito.”
Acrescentando-se ainda: “conexionada com o problema anterior, coloca-se finalmente a questão de saber se a falta, na acusação, de todos ou alguns dos elementos caracterizadores do tipo subjetivo do ilícito, mais propriamente, do dolo (englobando o dolo da culpa, no sentido atrás referido), pode ser integrada no julgamento por recurso ao mecanismo previsto no artigo 358.º do CPP.
Tal equivalerá a considerar essa integração como consubstanciando uma alteração substancial dos factos.
Já vimos que esses elementos têm de constar obrigatoriamente da acusação, implicando a sua falta a nulidade do libelo (artigo 283.º, n.º 3, alínea b) do Código de Processo Penal)” (…) a exigida narração dos factos é a de todos os factos constitutivos do tipo legal de crime, sejam eles pertencentes ao tipo objetivo do ilícito, sejam ao tipo subjetivo e ainda, naturalmente, na sequência do que temos vindo a expor, os elementos referentes ao tipo de culpa. A factualidade relevante, como factualidade típica, portadora de um sentido de ilicitude específico, só tem essa dimensão quando abarque a totalidade dos seus elementos constitutivos. Não existem puros factos não valorados, como vimos, a propósito, nomeadamente, das teorias do objeto do processo, e a valoração especifica que aqui se reclama, consonante com um tipo de ilícito, só se alcança com a imputação do facto ao agente, fazendo apelo à representação do facto típico, na totalidade das suas circunstâncias, à sua liberdade de decisão, como pressuposto de toda a culpa, e, envolvendo a consciência ética ou dos valores, à posição que tomou, do ponto de vista da sua determinação pelo facto. Sem isso, não está definida a conduta típica, ilícita e culposa.”
Isto é, o tipo legal de gravações ou fotografias ilícitas apenas se preenche na sua dimensão subjetiva se a Arguida sabia que (ou pelo menos representou que) mantinha a câmara do telemóvel dirigida à Ofendida, sabendo que estava a fotografar a ofendida, contra a vontade desta, como sucedeu, conduta que representou e quis levar a cabo, como fez, tendo publicado a foto tirada na rede social facebook, bem sabendo que não estava autorizada pela Ofendida a fazê-lo e que agia contra a sua vontade.
Por seu turno, o tipo legal de perseguição apenas se preenche na sua dimensão subjetiva se a Arguida sabia que (ou pelo menos representou que) atuava com o propósito concretizado de constranger a Ofendida, de lhe incutir medo, de lhe limitar a sua liberdade pessoal e de movimentos, e de a molestar psicologicamente, bem como com o intuito conseguido de levá-la a sentir-se vigiada e perseguida.
Constata-se, porém, que a acusação nada diz a este respeito, limitando-se a reproduzir a fórmula tabelar: “A Arguida agiu sempre de forma livre, deliberada e consciente.”.
Com efeito e relativamente ao crime de gravações ilícitas nada se refere quanto ao dolo. Na verdade, não consta da acusação que a Arguida quis agir bem sabendo que não podia tirar a fotografia em causa e que não tinha autorização da visada para tirar a foto e para a publicar na rede social facebook.
Também no que diz respeito ao crime de perseguição não resulta de qualquer ponto da acusação que a Arguida tenha atuado com o propósito de constranger a Ofendida e de limitar a sua liberdade pessoal, não sendo suficiente referir, salvo melhor entendimento, que agiu da forma descrita bem sabendo que com tal conduta se tornava incomoda, inconveniente e indesejada (pontos 18 e 19).
Na verdade, para o cometimento do crime de perseguição não basta um mero incómodo, mas sim uma restrição da liberdade pessoal.
Ora, sem essa narração, salvo o devido respeito por entendimento contrário, não se mostra perfectibilizada as imputações criminosas em causa, já que não é admissível, como vem sido entendimento da jurisprudência, a ideia de um dolus in re ipsa, ou seja, a presunção do dolo resultante da simples materialidade de uma infração, pelo que, em face da referida omissão, não há fundamento para aplicação à Arguida de uma pena ou de uma medida de segurança, nos termos do artigo 283.º, n.º 3 do Código de Processo Penal.
Quanto à consequência a extrair de tal omissão, a mesma não poderá deixar de a rejeição da acusação, já que tal omissão acarreta a nulidade da acusação, nos termos do n.º 3 do artigo 283.º do Código de Processo Penal, nulidade que não se mostra possível de sanação/correção à luz do nosso ordenamento jurídico. Também neste sentido, vide, o Acórdão de Fixação de Jurisprudência n.º 1/2015 que –se e enquanto não vier a ser alterado – fixou jurisprudência no sentido de «A falta de descrição, na acusação, dos elementos subjetivos do crime, nomeadamente dos que se traduzem no conhecimento, representação ou previsão de todas as circunstâncias da factualidade típica, na livre determinação do agente e na vontade de praticar o facto com o sentido do correspondente desvalor, não pode ser integrada, em julgamento, por recurso ao mecanismo previsto no art. 358.º do Código de Processo Penal.»
Por conseguinte, e em face do exposto, decide-se rejeitar a acusação deduzida pelo Digno Magistrado do Ministério, por manifestamente infundada, nos termos do artigo 311.º, n.º 2, al. a) e n.º 3 al. d) do Código de Processo Penal.
Sem custas.
Notifique.»
4. Apreciando
4.1 Do vício estrutural da acusação (manifestamente infundada)
O teor da acusação rejeitada consta do despacho impugnado.
Sustenta o recorrente que tal acusação não é manifestamente infundada, porquanto:
a) A descrição dos factos constitutivos dos elementos subjetivos dos tipos de ilícito imputados à arguida não carece de incluir aqueles que descrevem a consciência da ilicitude;
b) Constando dos pontos 3.º, 4.º, 5.º, 7.º, 15.º e 16.º a 19.º da acusação os factos necessários à descrição dos elementos subjetivos respeitantes aos crimes imputados à arguida.
Tem razão o recorrente. Os elementos objetivos de um tipo de ilícito constituem a materialidade do crime e emergem da descrição da ação empreendida ou omitida e produtora de uma modificação do mundo exterior apreensível pelos sentidos. Ao passo que as dimensões do elemento subjetivo traduzem a atitude interior do agente na sua relação com o facto material. O Código Penal não define o dolo do tipo, apenas cada uma das formas em que ele se analisa (artigo 14.º CP). Mas a doutrina conceptualiza-o, sintetizando que corresponde ao conhecimento (elemento intelectual) e vontade de realização do tipo objetivo de ilícito (elemento volitivo). O dolo consiste no conhecimento e vontade de praticar o facto ilícito com consciência da sua censurabilidade. O seu elemento intelectual traduz a representação da realização do facto ilícito (a consciência psicológica, ou consciência intencional) das circunstâncias do facto que preenche um tipo de ilícito objetivo. Visa que «o agente conheça tudo quanto é necessário para uma correta orientação da sua consciência ética para o desvalor jurídico que concretamente se liga à ação intentada». (3) Por seu turno o elemento volitivo, ligado ao elemento intelectual, serve para indicar uma posição ou atitude do agente contrária ou indiferente à norma de comportamento. Supõe uma decisão de vontade do agente para a realização de um ilícito-típico, por via de uma ação (ou omissão do comportamento devido), sendo que é, especialmente, através do grau de intensidade desta relação de vontade que se diferenciam as várias formas de dolo. Mas consciência e vontade não podem ser vistos isoladamente, pois, só se pode querer aquilo que se conhece.
No concernente aos crimes imputados à arguida pela acusação rejeitada, o elemento subjetivo constitutivo dos mesmos é o dolo genérico, em qualquer das modalidades prevista no artigo 14.º CP.
Os problemas em redor do elemento intelectual do dolo, evidenciados no despacho recorrido, não são novos na jurisprudência dos tribunais criminais. É certo – como assinala a Mm.a Juíza – que a acusação não contém o habitual «bordão» sintetizador do elemento intelectual do dolo: «sabendo que a sua conduta é proibida e punida por lei» (a consciência da ilicitude). Só que os tipos de ilícito dolosos imputados à arguida (gravações ou fotografias ilícitas e perseguição) encerram uma carga axiológica que inexoravelmente determina que a falta de consciência da ilicitude sempre será censurável ao agente, razão por que ele não deixará de ser responsabilizado mesmo se a afirmação daquele facto se não vier a provar. Para bem se compreender esta afirmação, importará ter presente o disposto no artigo 17.º CP, que se reporta justamente aos crimes mala in se, i. e. aos crimes cuja ilicitude se presume conhecida de todos os cidadãos, sendo-lhes exigível tal conhecimento. Neste contexto, como ensina Figueiredo Dias(4), «o conhecimento da proibição legal, que não é exatamente equivalente a “consciência da ilicitude” será de exigir em certos casos em que a relevância axiológica de certos comportamentos é muito pouco significativa ou não está enraizada nas práticas sociais e em que, portanto, o conhecimento dos elementos do tipo e a sua realização voluntária e consciente não é suficiente para orientar o agente de acordo com o desvalor comportado pelo tipo de ilícito. Por isso, o desconhecimento desta proibição impede o conhecimento total do substrato de valoração e determina uma insuficiente orientação da consciência ética do agente para o problema da ilicitude. Por isso, em suma, neste campo o conhecimento da proibição é requerido para a afirmação do dolo do tipo […])» A exigência do conhecimento da proibição ocorre sobretudo a nível do direito contraordenacional ou do direito penal secundário, relativamente a incriminações de menor carga axiológica ou de carga axiológica neutra. Equaciona-se que possa cogitar-se também ao nível de algumas incriminações do direito penal primário, relativamente a ilícitos típicos virados para a tutela de bens jurídicos cuja consciência ainda se não encontra suficientemente interiorizada na comunidade. (5) Nesses casos fará todo o sentido exigir o conhecimento da proibição como forma de realização do dolo do tipo. Mas em geral o sentido da ilicitude do facto ressalta da realização pelo agente da factualidade típica, agindo com o dolo requerido pelo tipo. Et pour cause, nestes casos carecerá, pois, de sentido questionar se o agente atuou conscientemente, se tinha pleno conhecimento da proibição, representando todas as circunstâncias do facto, e querendo, mesmo assim realizá-lo. Porque se não tinha isso terá necessariamente de lhe ser censurável. Quer-se dizer: no respeitante aos crimes relativamente aos quais a ilicitude é de todos conhecida, por integrar o conhecimento normalmente exigível do homem comum – como é aqui manifestamente o caso -, não é necessário alegar a consciência da ilicitude, por ela estar pressuposta. Nestes casos o que deveras releva para que o agente se livre de punição, ao abrigo do disposto no artigo 17.º do CP, é a prova do facto que integre a inconsciência dessa realidade jurídica. Assim, mesmo que não alegada a consciência da ilicitude - ou alegando-se, ela se não prove, essa falta não releva, pois, como já referido, poderá ocorrer condenação na mesma, em decorrência do que se dispõe no § 2.º do artigo 17.º CP. Este Tribunal da Relação de Évora vem reafirmando (6) esta mesma ideia - de que não é necessário utilizar uma «fórmula» genérica e abstrata do dolo -, uma vez que o elemento relevante do dolo, no contexto de ilícitos de proeminente carga axiológica é a inconsciência da ilicitude (ou seja, a afirmação de facto negativo relativamente à consciência da ilicitude). Isto é, as circunstâncias que possam revelar que a falta de consciência não pode ser censurada ao agente é que relevará, na medida em que tal excluirá a sua culpa e, por essa via, a respetiva responsabilidade criminal (artigo 17.º, § 1.º CP). Em abono da sua tese, a Mm.a Juíza recorrida invoca o Acórdão Uniformizador da Jurisprudência n.º 1/2015, que refere: «a falta de descrição, na acusação, dos elementos subjetivos do crime nomeadamente dos que se traduzem no conhecimento, representação ou previsão de todas as circunstâncias da factualidade típica, na livre determinação do agente e na vontade de praticar o facto com o sentido do correspondente desvalor, não pode ser integrada, em julgamento, por recurso ao mecanismo previsto no artigo 358.º do Código de Processo Penal.» Sucede que a interpretação normativa que se afirma no citado acórdão uniformizador da jurisprudência, não resolve a questão aqui em equação. Deveras, para bem se compreender a conclusão tirada nesse aresto uniformizador deverá atentar-se na globalidade da sua, aliás proficiente, fundamentação. Mormente no que se refere no § 6.º do seu ponto 10.2.3.1, sobre a consciência da ilicitude, ali se afirmando que ela se coloca no plano dogmático a um nível diferente da avaliação do dolo na realização do facto típico, porque tem a ver com a questão da relevância do erro sobre a ilicitude ou sobre a proibição. Acrescentando-se ainda que, não se tratando de caso em que se possa afastar a censurabilidade do ato, o facto praticado sem consciência da ilicitude é equiparável ao praticado com essa consciência. E para ilustrar essa exata ideia faz-se uma menção expressa à excelente síntese tirada noutro acórdão do mesmo Supremo Tribunal (7), no qual se faz luz sobre a controvérsia aqui instalada, na circunstância a propósito (dir-se-ia, enfaticamente) do crime de homicídio, do seguinte modo: «a consciência da ilicitude está implícita no conhecimento do próprio facto, sendo impensável que alguém, provido de razão, desconheça que a lei proíbe e pune o homicídio.» Ora, o mesmo se dirá (como já se afirmou supra), pela igualdade de razão, dos crimes aqui em referência. A acusação tem alguns outros defeitos (8) – que de resto o recorrente reconhece – mas não padece daquele que o despacho recorrido lhe assaca. A descrição feita nos pontos 4.º, 5.º, 7.º e 15.º a 21.º da acusação é suficiente para integrar o elemento subjetivo dos dois ilícitos que se imputam à arguida.
Importa ainda apreciar a dimensão processual, também posta em crise no recurso, ainda que meramente «de flanco».
O vício que o despacho recorrido apontou à acusação é o mais grave que se lhe pode assacar: os factos narrados (rectior: tal como se mostram narrados) não constituem crime.
O modelo basicamente acusatório do processo penal português, pressupõe que o objeto do processo (o «acontecimento histórico à luz da sua relevância jurídica» (9); ou o «pedaço de vida» juridicamente relevante (10)) é delimitado pela factualidade vertida no libelo - sendo este da competência de entidade distinta do tribunal.
«A densificação semântica da estrutura acusatória faz-se através da articulação de uma dimensão material (fases do processo) com uma dimensão orgânico-subjetiva (entidades competentes). Estrutura acusatória significa, no plano material, a distinção entre instrução, acusação e julgamento; no plano subjetivo, significa a diferenciação entre juiz de instrução (órgão de instrução) e juiz julgador (órgão julgador) e entre ambos e o órgão acusador.» (11)
Sendo o objeto do processo delimitado pela acusação, nesta se deverá conter a descrição dos factos (sobre os quais incidirá a prova) necessários à integração dos elementos objetivos e subjetivos constitutivos do(s) ilícito(s) em referência (artigo 283.º, § 3.º CPP), sem o que não poderá seguir para julgamento. O mesmo devendo suceder, logicamente, se os factos não constituírem crime, talqualmente expressa a al. d) do § 3.º do artigo 311.º CPP.
O direito processual penal é «verdadeiro direito constitucional aplicado (12), e numa dupla dimensão: os fundamentos do direito processual penal são, simultaneamente, os alicerces constitucionais do Estado; e a concreta regulamentação de singulares problemas processuais deve ser conformada jurídico-constitucionalmente» (13).
Ora, é esse, justamente, o substrato contextual do controlo liminar do processo, previsto no artigo 311.º, § 2.º CPP (onde não há – como não poderia haver - qualquer menção a devolução dos autos para correção de insuficiências manifestas!).
O princípio do acusatório, que como referido constitui a espinha dorsal do modelo processual vigente, não dispensa - antes exige – o controlo judicial da acusação (artigo 311.º, § 2.º e 3.º CPP). Por forma a evitar acusações gratuitas, manifestamente inconsistentes, visto que a sujeição a julgamento penal é, só por si, um incómodo, muitas vezes oneroso, e não raras vezes até um vexame.
Contrariamente ao que parece pressupor o recorrente os incidentes que a lei prevê para a fase de julgamento, nomeadamente de alteração substancial ou não substancial da factologia (artigos 358.º e 359.º CPP), não contrariam o que fica dito, uma vez que tais institutos pressupõem que a conduta descrita na acusação integra todos os pressupostos essenciais de que depende a aplicação ao agente de uma pena ou de uma medida de segurança, tal como se prevê no artigo 283.º, § 3.º CPP, bem assim que a conduta descrita seja típica. Em suma: o sentido interpretativo fixado no acórdão uniformizador citado na decisão sob recurso, não é aplicável à omissão na acusação dos factos integradores do conhecimento da ilicitude (14) quando o relevo axiológico dos crimes em causas for inquestionável – como é aqui manifestamente o caso. E assim sendo – ainda que só por isso - não se pode considerar que a acusação seja manifestamente infundada. Razão pela qual o recurso é merecedor de provimento.
III - Dispositivo
Destarte e por todo o exposto, acordam em conferência, os Juízes que constituem a Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora:
a) Conceder provimento ao recurso e, em consequência, determinar que a acusação censurada siga para julgamento, devendo ser proferido o despacho que nos termos da lei tal determine. b) Sem custas.
Évora, 5 de dezembro de 2023
J. F. Moreira das Neves
Maria Margarida Bacelar
Artur Vargues
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1 A utilização da expressão ordinal (1.º Juízo, 2.º Juízo, etc.) por referência ao nomen juris do Juízo tem o condão de não desrespeitar a lei nem gerar qualquer confusão, mantendo uma terminologia «amigável», conhecida (estabelecida) e sobretudo ajustada à saudável distinção entre o órgão e o seu titular, sendo por isso preferível (artigos 81.º LOSJ e 12.º RLOSJ).
2 Cf. acórdão do STJ n.º 7/95, de 19/10/1995 (Fixação de Jurisprudência), publicado no DR, I-A, de 28/12/1995.
3 Cf. Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal, Parte Geral, tomo I, 3.ª ed., 2019, Gestlegal, p. 410.
4 Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal, Parte Geral, Tomo I, Gestlegal, 2.ª ed., pp. 363/364.
5 Neste sentido Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal, Parte Geral, Tomo I, Gestlegal, 3.ª ed., p. 426.
6 Neste sentido tem decidido este Tribunal da Relação. Cf. acórdãos de 10jan2017, proc. 20/16.3PTFAR.El, Desemb. Sérgio Corvacho; de 26jun2018, proc. 80001/15.8TDLSB.E1, Desemb. Sérgio Corvacho; de 19dez2018, proc. 219/18.8GCSLV.E1, Des. Renato Barroso; de 12mar2019, proc. 251/15.3GESTB.E1, Desemb. António João Latas; de 26out2021, proc. 89/98.0TBELV.E1, Desemb. Beatriz Marques Borges; de 24mai2022, proc. 1194/20.4T9STR.E1, Desemb. Maria Margarida Bacelar; de 11out2022, proc. 431/18.0PBRLV.E1, Desemb. João Carrola. Também no Tribunal da Relação do Porto cf. acórdão de 12jul2017, proc. 833/15.3SMPRT.P1, Desemb. Maria Dolores da Silva e Sousa; de 13jun2019, proc. 333/16.4T9VFR.P2, Desemb. Maria Dolores da Silva e Sousa; de 26mai2021, proc. 46/19.5PEMTS.P1, Desemb. José Carreto; acórdão de 10jan2023, no proc. 49/21.0GTEVR-C.E1, de que foi relator o que aqui é também relator.
7 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, julgado a 7out1992, proc. 042918, Cons. Noel Pinto.
8 De que não cabe especificar nem (muito menos) curar neste recurso.
9 Assim, Henrique Salinas, Os limites Objetivos do ne bis in idem e a Estrutura Acusatória do Processo penal Português, Universidade Católica Portuguesa Editora, 2014, p. 221.
10 Jorge de Figueiredo Dias, Extradição e non bis in idem», Parecer, DJ, 1995, tomo I, p. 219; e Frederico Isasca, Alteração Substancial dos Factos e sua Relevância no Processo Penal Português, Almedina, 1992, pp. 96 e 144.
11 Acórdão do T. Constitucional n.ºs 219/89 e 124/90), cit. por J. J. Gomes Canotilho/Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, vol. I, 4.ª edição revista, p. 522.
12 H. Henkel citado por Jorge de Figueiredo, 2004, Direito Processual Penal, Reimpressão da 1.ª edição (1974), Coimbra Editora, p. 74.
13 Claus Roxin, Strafverfahrensrecht, München, 1987, pp. 9, apud Maria João Antunes, Direito Penal, Direito Processual Penal e Direito da Execução das Sanções Privativas da Liberdade e Jurisprudência Constitucional, JULGAR, n.º 21, 2013, pp, 103.
14 Lá quando tal suceda - o que não é aqui o caso. Como ficou dito, nos pontos 4.º, 5.º, 7.º e 15.º a 21.º da acusação contém-se o elemento subjetivo dos dois ilícitos - incluindo o intelectual (ponto 21.º).