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LIMITES DA LIBERDADE DE EXPRESSÃO DO TRABALHADOR
AFIRMAÇÕES NÃO VERDADEIRAS SOBRE O EMPREGADOR
DIVULGAÇÃO NAS REDES SOCIAIS
JUSTA CAUSA PARA O DESPEDIMENTO
Sumário
I - A liberdade de expressão de que gozam os trabalhadores tem limites, decorrentes, designadamente, do respeito pelos direitos de personalidade do empregador e do normal funcionamento da empresa, que se ultrapassados podem gerar infração disciplinar. II - Constitui justa causa de despedimento as afirmações proferidas pela A., mencionadas no texto de acórdão, marcadas por um tom manifestamente hostil e excessivo para com a Ré, com imputações que a A. sabia não corresponderem à verdade, fazendo passar a “mensagem” da inexistência de quaisquer medidas de prevenção à propagação do vírus SARS-CoV-2 e a imagem de empresa totalmente incumpridora e desinteressada quer no combate à disseminação da doença, quer quanto à saúde dos seus trabalhadores e bem assim a da existência, não provada, de comportamento discriminatório dos trabalhadores que, como a A., não aderiram ao banco de horas e, como tal, teriam sido excluídos da atribuição do prémio de 20%, afirmações que foram divulgadas em “Sessão/Debate” organizado por terceiros, e que foi partilhado nas redes sociais, e que deu azo a várias visualizações, aposição de “gostos”, comentários e partilhas tudo conforme decorre do texto do acórdão.
Texto Integral
Procº nº 5913/20.0T8VNG.P1
Relator: Paula Leal de Carvalho (Reg. nº 1357)
Adjuntos: Des. Rui Penha
Des. Germana Ferreira Lopes
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:
I. Relatório
AA, de ora em diante designada como Autora (A), intentou ação declarativa de condenação, com processo especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento, contra “A..., S.A.”, de ora em diante designada de Ré,tendo apresentado, ao abrigo do disposto nos arts. 98º-C e 98º-D, ambos do CPT (aprovado pelo DL n.º 295/09 de 13/10), o respetivo formulário opondo-se ao despedimento.
A Ré apresentou articulado motivador do despedimento no qual, em síntese, alegou os factos que estiveram na origem da decisão de despedir a trabalhadora, factos que, pela sua gravidade, tornam insustentável a manutenção da relação laboral, traduzindo-se numa quebra absoluta e irreparável da confiança subjacente à dita relação, constituindo justa causa de despedimento.
A A. contestou alegando, em síntese, não ter cometido qualquer infração disciplinar que justificasse a instauração de procedimento disciplinar e que, de todo o modo, a sanção disciplinar de despedimento sempre seria totalmente inadequada.
Reconvencionalmente, pelos fundamentos que invoca, reclamou o pagamento da quantia de €10.000,00 a título de danos não patrimoniais.
Termina formulando os seguintes pedidos: “a) Julgar o articulado da requerida empregadora improcedente, por não provado; b) Julgar improcedente o pedido de declaração de regularidade e licitude do despedimento, formulado pela requerida empregadora; c) Julgar procedente, por provado, o pedido de declaração de ilicitude de despedimento da requerente trabalhadora; e em consequência, d) Condenar a requerida empregadora a pagar à requerente trabalhadora todas as prestações pecuniárias que ela deixar de auferir desde a data do despedimento até à data do trânsito em julgado da decisão a proferir nos autos; e) Condenar a requerida empregadora a readmitir a requerente trabalhadora, no seu posto e local de trabalho, sem prejuízo da sua antiguidade, ou se esta vier a optar, f) Condenar a requerida empregadora a pagar-lhe uma indemnização por antiguidade no valor 33.840,00€; g) Condenar a requerida empregadora a pagar à requerente trabalhadora, a título de compensação pelos danos não patrimoniais a importância de 10.000,00€. h) Pagar juros de mora, à taxa legal, desde a data do despedimento.”
Proferido despacho saneador, com dispensa da fixação dos factos assentes e dos temas de prova e realizada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença que julgou a ação nos seguintes termos:
“Pelo exposto, julgo improcedente, por não provada, a presente acção e, em consequência:
a) declaro lícito e regular o despedimento da autora, AA, efectuado pela ré “A..., S.A.”;
b) absolvo a ré do pedido reconvencional contra ela formulado.
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Custas da acção a cargo da autora – art.º 527.º, n.os 1 e 2 do Código do Processo Civil ex vi art.º 1.º, n.º 2, al. a) do Código de Processo do Trabalho.
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Valor da causa: €43.840,00, indicado pela autora e que não foi objecto de oposição.”
Inconformada, a A. recorreu, tendo formulado as seguintes conclusões [já aperfeiçoadas na sequência de despacho da ora relatora]:
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A Recorrida contra-alegou, tendo formulado as seguintes conclusões:
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Nestes termos, requer a Vossas Excelências se dignem julgar totalmente improcedente o recurso interposto pela Recorrente, mantendo-se assim a decisão recorrida de justa causa de despedimento da Recorrente.”
O Exmº Sr. Procurador Geral Adjunto emitiu douto parecer no sentido do não provimento do recurso referindo, para além do mais, o seguinte:
“ Com efeito, deu-se como provado que a Ré/Recorrida decidiu gratificar os colaboradores no momento da pandemia – n.ºs 35, 36, 37, 38 e 39, dos factos provados - e que a autora disse declarou, publicamente, com acesso a inúmeras pessoas, que era apenas para os trabalhadores que tinham banco de horas e ela o havia já recebido – n.ºs 77, 78, 79, 80, 81 dos factos provados.
Deu-se como provado, ainda, que a Ré/Recorrida tomou inúmeras medidas para controlar e debelar a pandemia – n.ºs 29 a 33, 40 a 59 – e que a autora disse que a ré nada fazia para segurança e saúde dos trabalhadores – n.ºs 74, 75 e 76.
Não usou a máscara correctamente e cumprimentou de beijo o colega de trabalho.
Valorado estes factos a douta sentença recorrida entendeu que foram violados deveres por parte da Recorrente/Apelante, não sendo exigível à Recorrida manter a continuação da relação de trabalho.
Na verdade, parece quebrada irremediavelmente a relação de confiança entre a Recorrida e a Recorrente por forma a justificar-se o seu fim.”, ao qual as partes não responderam.
Colheram-se os vistos legais [por virtude de jubilação do anterior 2º Adjunto, foram os autos à distribuição para sorteio de novo 2º Adjunto].
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III. Objeto do recurso
Salvas as matérias de conhecimento oficioso, o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões formuladas pelo recorrente, não sendo lícito ao tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas (arts. 635, nº 4, e 639º, nº 1, do CPC aprovado pela Lei 41/2013, de 26.06, aplicável ex vi do art. 1º, nº 2, al. a), do CPT aprovado pelo DL 295/2009, de 13.10).
Assim, a única questão a apreciar consiste em saber se (não) se verifica justa causa para o despedimento da A.
***
III. Fundamentação de facto
Foi a seguinte a decisão da matéria de facto proferida pela 1ª instância: Factos Provados:
“1. A ré é uma sociedade comercial que, na prossecução do seu escopo social, se dedica ao comércio retalhista, nomeadamente a exploração de grandes armazéns, centros comerciais, estabelecimentos de charcutaria, confeitaria, café, restaurante, padaria e talho e ainda a fabricação de artigos vendidos em grandes armazéns, indústrias de confeitaria, padaria e salsicharia.
2. A autora, por sua vez, foi admitida ao serviço da ré com uma antiguidade reportada a 06.08.1997 detendo, no momento do seu despedimento, a categoria profissional de operador especializada.
3. O contrato de trabalho celebrado entre a autora e a ré cessou no dia 04.09.2020 em virtude da produção dos efeitos de decisão por despedimento com justa causa da autora.
4. À data do despedimento a autora auferia a remuneração base de € 705,00.
5. A ré emitiu uma participação disciplinar para ser dado seguimento ao procedimento com vista ao apuramento da responsabilidade da autora e, no seguimento desta participação, no dia 28.04.2020, foram ouvidas testemunhas em sede de inquérito prévio.
6. No dia 20.05.2020 e 27.05.2020 o instrutor nomeado juntou aos autos documentos com vista ao apuramento da verdade dos factos.
7. No dia 01.06.2020, a autora recebeu uma nota de culpa com a descrição dos factos que lhe foram imputados por parte da ré.
8. Sendo a autora representante sindical, a nota de culpa foi igualmente enviada para o CESP, que a recebeu no dia 04.06.2020.
9. No dia 17.06.2020, a autora apresentou a resposta à nota de culpa, sem ter requerido a produção de qualquer diligência probatória.
10. Em virtude da versão dos factos apresentados pela AUTORA, o instrutor tomou a iniciativa de realizar uma diligência probatória a 09.07.2020 de inquirição de testemunhas.
11. A ré enviou o procedimento disciplinar para o CESP, que foi recebido a 03.08.2020.
12. O CESP apresentou o seu parecer a 07.08.2020.
13. A ré elaborou a decisão que enviou para o CESP e para a autora.
14. Houve uma primeira tentativa de entrega da decisão a 31.08.2020 sem sucesso, devido a problemas com a morada da autora.
15. O CESP recebeu a decisão e o relatório no dia 02.09.2020 e a autora recebeu a decisão e relatório no dia 04.09.2020, tendo o contrato cessado nessa data por despedimento com justa causa invocada pela ré.
16. A autora exercia as suas funções de operadora de caixa na loja A... ....
17. No decurso do mês de janeiro de 2020, foi tornada pública a existência de um surto epidemiológico na cidade de Wuhan, na China, provocado pela doença SARS-CoV-2.
18. Em fevereiro de 2020, a SARS-CoV-2 começou a ter focos relevantes na Europa, nomeadamente em Itália.
19. Em face do risco associado à propagação do vírus e à necessidade de garantir a regularidade da operação nas lojas, a ré criou um gabinete de crise para análise e acompanhamento do tema, constituído por uma equipa multidisciplinar, da qual faz parte a equipa de segurança e saúde no trabalho e saúde ocupacional.
20. Havendo a propagação da SARS-CoV-2, as lojas do retalho alimentar teriam de manter sempre a sua atividade de forma regular com vista a garantir o abastecimento de bens essenciais às populações.
21. A equipa referida em 18. ficou responsável pela gestão de todos os temas relacionados com o mencionado surto epidemiológico, nomeadamente quanto aos planos de contingência.
22. Estes planos de contingência incluíam a proteção dos trabalhadores das lojas por forma a assegurar o seu normal funcionamento e o recurso a HomeOffice para equipas cujas funções fossem compatíveis com tal prestação de trabalho.
23. No dia 02.03.2020, foram identificados os primeiros dois casos de infetados em Portugal com a SARS-CoV-2, tonando-se cada vez mais premente dinamizar medidas de distanciamento social.
24. Começaram a ser implementados os planos de contingência em loja de forma gradual e em acompanhamento das medidas promovidas pela DGS, as quais iam surgindo de forma evolutiva.
25. A ré iniciou um processo de comunicação de regras de segurança e saúde no trabalho e passou, através dos seus serviços de segurança, a tentar impedir a acumulação de mais de 4 clientes por cada m2 da loja.
26. Com o cumprimento desta nova regra legal, a loja do ... reduziu o acesso de clientes à loja a partir do dia 16.03.2020.
27. A ré teve a seguinte evolução no número de transações(vendas) por hora:
“(…)” – Dada a sua extensão (pág. 4 a 50 da sentença), ao abrigo do disposto no art. 663º, nº 6, do CPC, remete-se para o teor do nº 27 dos factos provados constantes da sentença.
29[1]. A loja da ré no ... tem cerca de 11.000 m2, podendo comportar cerca de 400 cientes a cada momento.
30. A ré decidiu que o acesso de clientes à loja deveria ser mais reduzido, para evitar grandes acumulações dos mesmos no seu interior.
31. Não sendo permitido, mesmo no momento de abertura ao público, o acesso de 460 clientes à loja.
32. À medida que os clientes iam saindo da loja os vigilantes iam permitindo a entrada de outros.
33. A ré implementou sinalética na loja, de forma a evitar que os clientes se aglomerassem e depois foi colocando proteções acrílicas e mensagens via sistema de som com alertas.
34. A loja tem sempre um elemento a controlar no CCTV.
35. A autora entendeu gratificar os seus trabalhadores no momento da pandemia, porque os mesmos contribuíram para a capacidade de as lojas assegurarem o abastecimento das populações no decurso do Estado de Emergência, tendo criado um prémio, durante dois meses, correspondente a 20% do salário bruto mensal de cada trabalhador.
36. Este prémio não excluía nas suas regras qualquer trabalhador
37. O único pressuposto para a sua atribuição consistia na presença na loja durante o período de pandemia
38. Ficando excluídos os trabalhadores com ausências durante o período de referência para a atribuição do prémio.
39. Sem exclusão de qualquer trabalhador pelo facto de se ter oposto ao regulamento de banco de horas em vigor.
40. A ré promoveu, junto dos trabalhadores, ações de divulgação relativamente ao CoVid-19, de acordo com as informações disponibilizadas pela D.G.S., as quais se iniciaram, no ..., em 03.03.2020.
41. Em todas as áreas sociais, passaram a constar cartazes designados de “Alerta saúde”.
42. No dia 26.02.2020, iniciou-se a colocação de cartazes, na loja para adoção de boas práticas relacionadas com o COVID-19.
43. De acordo com este cartaz: COVID-19 é o nome dado a um novo coronavírus que causa doença respiratória potencialmente grave, como a pneumonia. Este vírus foi identificado pela primeira vez em humanos na cidade chinesa de Wuhan, província de Hubei, tendo sido confirmados casos em outros países.”
E possui as seguintes três recomendações: (i) Quando espirrar ou tossir, tape o nariz e a boca com lenço de papel ou com o antebraço; (ii) Lave frequentemente as mãos com água e sabão ou use solução à base de álcool; (iii) Evite contacto próximo com pessoas com infeção respiratória;
44. A autora assistiu a uma divulgação sobre o CoVid-19.
45. No dia 09.03.2020, foram afixados cartazes nas lojas fornecidos pela DGS com as recomendações em período de pandemia onde resultava informação sobre cuidados de higiene e isolamento.
46. No dia 11.03.2020, iniciou-se um sistema de alertas sonoros para os trabalhadores nas áreas sociais onde em cada duas horas eram passadas mensagens relativas a recomendações de distanciamento social.
47. Um dos cartazes divulgado nas lojas a 03.04.2020 contém a seguinte informação: “NESTES TEMPOS ESPECIAIS QUE VIVEMOS, DEVES TER CUIDADOS ACRESCIDOS RELACIONADOS COM A MANIPULAÇÃO DE ALIMENTOS E EMBALAGENS, BEM COMO NA UTILIZAÇÃO DOS ESPAÇOS COMUNS.”
Consta ainda do cartaz a seguinte informação: “COVID-19: CUIDADOS QUE DEVES TER NO “CANTINHO DA PARTILHA”:
1. Respeita a distância social recomendada. Senta-te a pelo menos 2m (2 lugares) do teu colega do lado ou da frente.
2. Lava bem as mãos (mínimo 20s) com água e sabonete antes de pegares em qualquer alimento ou embalagem e volta a lavá-las após o seu consumo.
3. Para os alimentos sem embalagem, usa sempre uma pinça ou um guardanapo para os retirares. Lava a pinça após a teres utilizado e deita o guardanapo no lixo.
4. Quando aplicável, lava bem os alimentos crus, nomeadamente as frutas ou legumes. 5. Evita a manipulação desnecessária de produtos ou embalagens. Não toques em nada que não vais usar e coloca as embalagens no lixo no final. 6. Limpa e desinfeta a mesa que utilizaste, assim como qualquer equipamento ou consumível.”
48. Outro cartaz colocado em vários locais em vários locais em 03-04-2000, com o título “Alerta Saúde”, continha uma pergunta seguinte teor:
“JÁ CONHECES TODAS AS MEDIDAS DE PREVENÇÃO DA TRANSMISSÃO DO COVID-19 PARA AS LOJAS?”
E tem as seguintes respostas.
“1. Em áreas sociais/ refeitórios • Tenta manter horários desfasados para evitar grande aglomeração de pessoas nos horários de refeição; • Não te sentes frente a frente, nem lado a lado e fica a pelo menos 2 lugares de intervalo do teu colega; • As janelas, quando existentes, devem ser abertas para adequada ventilação do espaço • As superfícies devem estar devidamente higienizadas; • Lava as mãos no início e no final da tua pausa; • Após a sua jornada de trabalho, deves tomar banho e descartar toda a roupa para lavar; • Reduz ao máximo o uso de acessórios (anéis, brincos, pulseiras, relógios) • Lava as mãos de forma regular ao longo do dia e sempre que se justifique - a lavagem das mãos deve ser feita com água e sabão durante, pelo menos, 20 segundos, secando bem as mãos no final • Evita o contacto das mãos com os olhos, nariz e boca • Quando espirrares ou tossires, tapa o nariz e a boca com o braço ou com lenço de papel que deverá ser colocado imediatamente no lixo • Higieniza superfícies de contacto – tem atenção a maçanetas de portas ou puxadores • Não partilhes objetos, nomeadamente pratos, copos, chávenas e outros itens como telemóveis, auscultadores, canetas • Não deves beber por pacotes ou garrafas, nem partilhar alimentos ou embalagens cujo interior é manipulado com as mãos (batatas fritas, frutos secos e outros snacks) • Reduz o número de conviventes no domicílio apenas aos habitantes da casa • Mantém o distanciamento social, sempre que possível • Resguarda os idosos, reduzindo o contacto ao mínimo possível, dado serem um importante grupo de risco • Faz uma autovigilância de sintomas (febre, tosse, falta de ar, dores musculares, dores de cabeça) • Em caso de doença, fica em casa e faz abstenção social
2. Na loja: • Evita usar objetos pessoais como relógios, anéis, brincos, pulseiras; • Deves usar o cabelo apanhado; • Garante que o atendimento em balcão se faz com a distância apropriada (pelo menos 1 metro, idealmente 2); • Garante que nas caixas os clientes cumprem pelo menos 1 metro de distância na fila de espera”
49. No dia 07.04.2020, a ré tomou a iniciativa de facultar aos seus trabalhadores máscaras para utilizar no local de trabalho.
50. Quando passou a ser obrigatória a utilização de máscara por alteração da recomendação da DGS, a 10.04.2020, a ré preparou as suas equipas para a sua utilização correta utilização.
51. Para além disso, desde essa altura passaram a existir cartazes com explicações visuais da forma de utilização das máscaras.
52. Estes cartazes permitem uma fácil compreensão de qual a parte da máscara que deve estar para fora e a que deve estar para dentro, em virtude da diferença de cores.
53. Em todas as lojas, incluindo a do ..., sempre que era detetado um caso positivo na equipa, eram colocados em quarentena os colegas mais próximos.
54. Sendo chamada uma empresa especializada para fazer a desinfestação da loja – “B..., Lda.”
55. Na loja do ..., até à data da apresentação do articulado motivador pela ré, foram realizadas desinfestações nos seguintes dias 04.04.2020, 07.04.2020, 15.04.2020, 19.04.2020.
56. É sempre assegurada a limpeza de todos os locais de trabalho com desinfetante germicida, viricida, fungicida Lis Germ.
57. O produto utilizado está devidamente notificado na DGS de acordo com o Decreto-Lei n.º 121/2002, Regulamento dos produtos biocidas para os tipos de produtos TP 2– Desinfetantes utilizados nos domínios privado e da saúde pública e outros produtos Biocidas e TP4 – Desinfetantes das superfícies em contato com géneros alimentícios e alimentos para animais.
58. As referidas desinfeções foram realizadas aos vários espaços da loja extensível a armazéns, áreas sociais, balneários, refeitórios, escritórios e salas de reuniões.
59. Por forma a cumprir a obrigação legal de manter a loja do ... aberta durante a pandemia, a ré teve de alocar trabalhadores de outras lojas.
60. A ré, além do serviço contínuo de limpeza, a loja tem uma trabalhadora cuja função consiste e, limpar os carrinhos, os cestos, os puxadores e corrimões com desinfetante.
61. No dia 03.04.2020, antes de entrar ao serviço, a autora foi às compras na loja da ré, tendo adquirido uma fita métrica.
62. Após a aquisição da fita métrica e em cumprimento dos procedimentos da ré, a autora dirigiu-se ao vigilante da entrada para colocar um selo no artigo.
63. A autora revelou preocupação com a sua segurança no local de trabalho relacionado com a SARS-CoV-2.
64. Durante a hora do almoço – entre as 13h/13h30 deste mesmo dia – a autora foi almoçar à cantina.
65. Quando chegou ao refeitório, estavam presentes o BB, coordenador de frutas e legumes, a CC, chefe de frescos e o DD da equipa de charcutaria.
66. A autora foi aquecer a sua refeição.
67. O DD ficou de folga nos dias 04.04.2020 e 05.04.2020.
68. No dia 06.04.2020 foi fazer o teste à CoVid-19, vindo a testar positivo no dia 08.04.2020.
69. A ré colocou a autora em quarentena, tendo aquela permanecido ausente do serviço, por esse motivo, entre 09-04-2020 e 12-04-2020 e regressado a 18-04-2020, depois de gozo de folga.
70. Durante o isolamento profilático, no dia 11.04.2020, a autora participou numa Sessão/Debate - Combater o vírus, defender os trabalhadores organizada pelo PCP – Partido Comunista Português no Facebook e depois divulgada no Youtube.
71. No âmbito desta sessão, a autora identificou-se como delegada sindical do ....
72. Durante o seu depoimento referiu que a maioria dos trabalhadores da loja sentia insegurança e medo.
73. Afirmou ainda que “o fluxo dos clientes tem sido enorme dentro e fora da loja, o que muito me faz admirar as autoridades competentes passaram e nada fazerem”.
74. Disse ainda “eu trabalho oito horas na linha de caixas, que são de ansiedade, de pressão, porque passo essas horas a tentar afastar os clientes, clientes esses que deveriam ter sido mais afastados e devíamos estar a ser protegidos pela entidade patronal”.
75. Tendo afirmado “neste caso a ... nada faz, se tem poucos trabalhadores, poucos vigilantes, tem mais é que assegurar que haja mais, não é? Para conseguir esse tipo de proteção aos trabalhadores”.
76. Disse também: “Tem sido surreal, surreal, estar na caixa e levar com insultos, com tentativas de agressão, alguns clientes até já cuspiram para algumas trabalhadoras, isto é inadmissível para uma empresa que se diz tão preocupada com os trabalhadores”.
77. Quanto ao prémio referiu: “ultimamente tem vindo a público que nos davam e iam dar em março e em abril um prémio de 20%. Para já vos digo a vocês que nos estão a assistir que a minha saúde não está à venda por 20 nem por valor nenhum. Até porque este 20% não é para todos os trabalhadores como andam para aí a apregoar. Os 20% de prémio são para aqueles trabalhadores que têm banco de horas. Porque tal como eu que não tenho banco de horas e muitos daqueles que não têm banco de horas, basta ter um atraso no trânsito ou nos transportes públicos, uma ida ao médico, uma consulta por telefone, seja o que for, um atraso até que seja na casa de banho, a picagem de ponto para além daquela hora já invalida os 20%. O que a mim me foi dito como delegada porque fiz questão de questionar o que eram os 20% e quem é que os iria receber, e qual era o valor, foi-me dito que não ia receber porque não pertencia ao banco de horas. Portanto, a minha saúde não é igual à dos outros trabalhadores. Aqui há uma discriminação total. Não somos trabalhadores iguais. Portanto, estes 20% é tudo uma mentira. Eu a única pergunta que faço à ... e gostaria que me respondessem que isso é surreal obviamente é que se estes mesmos trabalhadores que estão há mais de 30 anos e que estão expostos, hoje em dia expostos ao COVID-19, são os mesmos que ganham 635 euros de salário miserável e ainda continuam a insistir em não aumentar os salários. Então compram os trabalhadores com este tipo de prémios. 20% num estado de pandemia pelo foco e pela exposição e que, como já disse, e volto a repetir, não é para todos. Eles querem é comprar os trabalhadores como fazem no dia 1 de maio para evitar que os trabalhadores façam greve, fazem banquetes, fazem porco no espeto, por aí. São empresas destas que temos de denunciar. A minha parte é fazê-lo. Lutar diariamente”.
78. Acrescentou ainda: “não temos proteção, temos vários infetados na loja. Já temos casos positivos de COVID-19. Temos outros de quarentena. Mais virão decerto. A proteção é nula. É zero. Entram clientes à desmedida. À desmedida. Embora nós e muitos clientes tenhamos chamado as autoridades competentes, inclusive a PSP. A PSP faz a ronda às galerias, mas não intervém, o que me espanta a mim e a muita gente. Isto não pode acontecer. O aglomerado é incrível dentro e fora da loja e a loja não faz nada. Não fazem absolutamente nada. Zero. Nós estamos por nossa conta. Não temos proteção a esse nível e aquele sentimento que eu tenho e acho que transmito, já vos disse, pelos outros meus colegas de trabalho, é isso, uma insegurança. Uma insegurança e um medo enorme porque nunca sabemos quem é o cliente que vem nos tentar agredir ou insultar, ou até sabe nos infetar. Porque não há qualquer tipo de proteção a esse nível”.
79. Disse ainda a autora, que o lucro de um dia de uma loja dá para pagar todos os trabalhadores e mais alguns.
80. Na data em que proferiu as suas declarações, a autora já tinha recebido o valor correspondente ao dito prémio e também o respetivo recibo de vencimento com o respetivo valor.
81. A autora sabia que tinha recebido esse prémio, no valor de € 127,36 brutos, apesar de não ter aderido ao banco de horas.
82. No Youtube, este vídeo teve 322 visualizações e 35 gostos (12.05.2020), estando disponível em https://www.youtube.com/watch?v=Dc7UjelJVeg&feature=emb_title.
83. Este vídeo foi, contudo, partilhado no Facebook do PCP.
84. No Facebook, a 12.05.2020, a live contava com 365 gostos, 80 comentários, 32 partilhas e 8.500 visualizações.
85. Número não concreto de pessoas que visualizaram o dito vídeo teceram comentários depreciativos à ....
86. No dia 18.04.2020, a autora regressou ao trabalho.
87. No dia 21.04.2020, parte da manhã, a autora colocou a máscara de forma errada – a parte de cor branca estava para fora e a azul para dentro.
88. A colega da autora EE alertou-a para o facto de ter colocado a máscara ao contrário.
89. A autora disse que a máscara não estava mal colocada.
90. Autora continuou o resto da jornada de trabalho com a máscara ao contrário.
91. Depois desta ocorrência, a autora começou a usar a máscara de forma correta.
92. Em 2019 a autora foi sancionada com uma repreensão registada por ter faltado injustificadamente ao trabalho.
93. Em alguns momentos o número de clientes era mais reduzido, mas noutros momentos o número de clientes não permitia o distanciamento aconselhado.
94. Acontecendo com alguma frequência, que nas secções de talho, peixaria, frutas, charcutaria e linhas de caixa se concentravam grupos de clientes, sem que a segurança interviesse.
95. Em algumas situações, os próprios trabalhadores da loja tinham de tentar dissuadir os clientes de se aglomerarem, sendo que alguns clientes não aceitavam tais chamadas de atenção, insurgindo-se contra aqueles trabalhadores, chegando a insultá-los.
96. Em algumas destas situações nem as chefias da loja, nem a segurança, intervieram.
97. A sinalética existente no chão era, com frequência, desrespeitada pelos clientes, sendo as operadoras de caixa quem lhes a chamava a atenção para o cumprimento das regras de distanciamento.
98. A autora teve acesso a prospetos com informações sobre o CoVid-19 e visionou os cartazes referidos em 42., 43. e 47.
99. A autora muniu-se da fita métrica referida em 61. para se certificar que não estavam a ser cumpridos os 2 metros de distanciamento entre e as operadoras de caixa, referenciados pela DGS era respeitado.
100. Depois de a autora ter verificado o não cumprimento da orientação da DGS para manutenção do distanciamento de dois metros, foi chamada ao gabinete do Sr. Diretor de Loja, ao qual explicou o facto de se ter munido de uma fita métrica, por entender que as marcações não respeitavam as orientações da DGS.
101. A autora esteve doente em Abril de 2019, com uma pneumonia e tem uma filha adolescente.
102. Por ter de prestar serviço diariamente numa loja, com elevado movimento, a autora sentia medo de poder ser contagiada com CoVi-19, e poder contagiar os familiares.
103. Pouco tempo depois, as marcações existentes no solo para controlo da distância entre os clientes, foram alteradas, passando a ser respeitados os dois metros de distanciamento.
104. Quando chegou à cantina, na situação descrita em 64. a autora foi aquecer a sua refeição, logo de seguida e sem sequer se ter sentado.
105. Quando chegou de novo à mesa o colega de trabalho DD já estava de saída.
106. No dia 08/04/2020 a autora prestou serviço durante todo o dia.
107. Na situação de quarentena a autora enviou um email ao Sr. Diretor de Loja, pretendendo saber qual a sua situação, não tendo obtido qualquer resposta.
108. A médica de Medicina do Trabalho da ré passou uma declaração de isolamento à autora até ao dia 17/04/2020.
109. À data do procedimento disciplinar e do despedimento, a requerente trabalhadora era Delegada Sindical, no exercício das suas funções.
110. A requerente trabalhadora é uma pessoa frontal, e combativa no desempenho nas suas funções de defesa dos trabalhadores.
111. A autora sentiu amargura e revolta quando foi confrontada com o procedimento disciplinar e subsequente despedimento.
112. O despedimento fê-la sentir-se perturbada, triste e deprimida.
113. À data do procedimento disciplinar e despedimento a autora era Delegada Sindical, exercendo as respectivas funções.
Factos não provados
“1. Quando surgiu a norma de limitação de acessos à loja, os vigilantes foram informados que face à sua dimensão poderiam ter ao mesmo tempo 360 a 410 clientes, sendo que até podiam ter 460.
2. E no momento da abertura da loja só deixavam entrar entre 100-150 clientes.
3. Durante o fluxo maior de clientes, os vigilantes analisavam onde há as maiores concentrações – talho, peixaria; frutas e legumes, charcutaria e linha de caixas.
4. De vez em quando, alertavam alguns clientes para manter as distâncias.
5. O mesmo se passando na linha de caixas.
6. Durante a pandemia não existe qualquer reporte de agressões de clientes a trabalhadores da loja ....
7. Também não há qualquer reporte de cuspidelas de clientes a trabalhadores.
8. Todos os problemas que surjam desta índole implicam um contacto à central de segurança.
9. A formação dos trabalhadores sobre o CoVid-19 continha 27 slides que explicavam o plano de contingência para o cenário de pandemia.
10. Na loja do ... tenham sido realizadas desinfestações nos dias 26.03.2020 e 29.03.2020.
11. Perante os seus colegas, a autora foi ao bolso das calças e tirou a fita métrica, dizendo que já tinha dado conhecimento à segurança
12. Para este efeito referiu que a fita tinha uma etiqueta de segurança e que ia levar com ela para a caixa.
13. A sua colega FF, questionou a autora sobre o que ia fazer com a fita.
14. A autora disse que se os clientes se aproximassem muito, ela ia medir a distância.
15. Tendo-lhe sido dito que não o podia fazer, a autora disse que a segurança tinha conhecimento.
16. A autora nada disse aos serviços de segurança quanto às suas intenções.
17. O BB, coordenador de frutas e legumes, a CC, chefe de frescos e o DD da equipa de charcutaria encontravam-se todos a respeitar as regras estabelecidas pela arguente para proteção de todos os trabalhadores da loja.
18. A dado momento, a autora dirigiu-se ao DD e disse-lhe alguma coisa ao ouvido.
19. Em ato contínuo, a autora deu um beijo na face do DD e disse alto: “se ficarmos os dois contaminados também não faz mal”.
20. A autora, enquanto aquecia a sua refeição, olhava para as chefias presentes “em jeito de provocação”.
21. Após esta ocorrência, a CC ficou preocupada com o DD porque era da sua equipa.
22. Pelo que pretendeu conversar com o DD sobre o que tinha ocorrido.
23. Entre a sua hora de almoço e saída do DD neste dia não conseguiram falar.
24. Mas conseguiu falar com a GG – chefia direta do trabalhador – no sentido de que tinham de conversar com o DD tendo em conta a gravidade do comportamento em contexto de pandemia.
25. A ré colocou em quarentena o colega de equipa do DD, HH.
26. A ausência da autora tenha sobrecarregando a sua equipa de linha de caixas numa altura de grande dificuldade.
27. Na Direção de Operações A... Norte existe um total de 208 trabalhadores que não aceitaram o regime de banco de horas individual.
28. Destes 208 trabalhadores, no início de abril apenas 64 não receberam o prémio de 20%.
29. Tendo 144 recebido o valor do prémio respeitante ao mês anterior.
30. A autora acrescentou ainda que tinha a certeza e consciência que a máscara devia ser colocada da forma como se encontrava naquele momento.
31. Houve clientes profissionais de saúde, mais conscientes, que manifestaram indignação e desagrado perante as concentrações de clientes que existiam na loja.
32. Nas situações descritas em III. 95. a 97. os trabalhadores da loja não dispunham ainda de EPI (máscaras, viseiras, desinfetantes).
33. Alguns clientes mais exaltados chegaram mesmo a cuspir para os check-outs.
34. A situação descrita em 96. ocorria, por receio de qualquer incidente ser noticiado, e ser entendido como publicidade negativa. 35. E essa não ação das chefias e da segurança acontecia mesmo quando os trabalhadores reportavam os factos à caixa central e à segurança.
36. Os acrílicos só foram colocados numa fase muito adiantada.
37. Ficavam excluídos do referido prémio os trabalhadores, que estando ao serviço durante o período de pandemia, registassem quaisquer minutos de atrasos, considerados pela requerida empregadora injustificados.
38. Foi dito a esses trabalhadores, como aconteceu com a autora, que não teriam direito ao prémio, a não ser que aderissem ao banco de horas.
39. As chefias, por diversas vezes, foram vistas a comerem juntos, três em cada mesa e sem respeito pelas medidas de distanciamento.
40. A autora não tenha assistido a uma formação/divulgação sobre o CoVi-19 no dia 03-03-20.
41. Nesse dia a autora, depois de ter prestado serviço na linha de caixa, foi ajudar na secção de perfumaria, por indicação da sua chefia, regressando, de seguida, à sua caixa.
42. Foi essa a sua atividade no dia em causa.
43. A autora esteja em contacto permanente e constante com familiares, quer com idade critica, quer com doenças de elevado risco.
44. As chefias estavam a almoçar lado a lado e não frente a frente conforme as regras de segurança assim estabeleciam.
45. A autora, quando chegou à cantina, dirigindo-se ao seu colega de trabalho DD disse “Agora não há beijos” tendo este manifestado total concordância.
46. No final desse dia o Sr. Diretor de Loja ligou para a autora, comunicando-lhe que o colega de trabalho DD testara positivo, e que, como lhe disseram que ela “tinha andado aos beijos ao colega” teria de comunicar a situação à Delegada de Saúde.
47. No dia 09/04/2020, a requerente trabalhadora foi contactada telefonicamente pela Delegada de Saúde.
48. A requerente trabalhadora informou-a pormenorizadamente sobre o ocorrido na cantina.
49. A Delegada de Saúde concluiu que o contacto com o infetado era de baixo risco, que não tinha ocorrido qualquer comportamento de risco, e que a autora poderia regressar ao serviço.
50. A autora telefonou ao Sr. Diretor de Loja, que se mostrou indisponível para, naquele momento, falar com a requerente trabalhadora, mas informou-a que ligaria mais tarde.
51. Nesse telefonema, mais tarde, a autora informou o Sr. Diretor de Loja da conversa tida com a Delegada de Saúde, e da decisão desta em a mandar trabalhar, já que não ocorrera qualquer comportamento de risco, estava assintomática, e que, de qualquer forma, o contacto era de muito baixo risco.
52. O Sr. Diretor de Loja comunicou à requerente trabalhadora que, de qualquer forma, não queria que ela regressasse ao trabalho.
53. Em 13/04/2020, a requerente trabalhadora ligou para a Delegada de Saúde, tendo-lhe sido reafirmado que poderia ir trabalhar.
54. A autora esclareceu a Delegada de Saúde que o Sr. Diretor de Loja não a tinha deixado retomar o serviço, e que, por isso, precisava de uma Declaração Médica que esclarecesse a situação.
55. A Delegada de Saúde esclareceu a autora que, tendo sido a ré a impedir a trabalhadora a prestar serviço, não podia estar a emitir qualquer declaração, mas que iria falar com os colegas e que depois ligaria.
56. No dia 24/04/2020 a autora esteve no IPO do Porto para doar sangue, tendo realizado todos os testes prévios.
57. A requerente trabalhadora nunca esteve infetada.
58. A autora sempre pautou o seu comportamento por absoluta lealdade com a empresa, total urbanidade com superiores hierárquicos, colegas de trabalho e clientes.
59. Sempre cumpriu os seus deveres funcionais com totais empenho, dedicação e zelo.
60. A requerente trabalhadora passou a ter insónias permanentes, completa perda de apetite e uma queda na sua autoestima.
61. Por isso, passou a isolar-se, deixando de sair de casa, deixando de contactar com familiares, amigos e conhecidos e sentindo-se desesperada.
62. Os sentimentos referidos em III. 111. e 112. intensificaram-se porque a autora tem a percepção que o seu despedimento resultou do facto de ser uma Delegada Sindical “incómoda” porque sempre interventiva na defesa dos legítimos direitos e interesses dos seus colegas de trabalho.”
***
IV. Fundamentação de direito
1. Tem a questão em apreço por objeto apreciar da existência, ou não, de justa causa para o despedimento, pugnando a Recorrente pela inexistência da mesma, quer por, em síntese da argumentação que invoca, não ter cometido infração disciplinar, quer pela desadequação da sanção disciplinar do despedimento. Em sentido contrário entendeu a sentença recorrida, acompanhada pela Recorrida nas contra-alegações.
2. Dispõe, como já referido, o artº 351º, nº 1, do CT/2009 que constitui justa causa do despedimento “o comportamento culposo do trabalhador que, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho”, elencando-se no nº 2, a título exemplificativo, comportamentos suscetíveis de a integrarem. E, de acordo com o nº 3 do mesmo, “3. Na apreciação da justa causa, deve atender-se, no quadro de gestão da empresa, ao grau de lesão dos interesses do empregador, ao carácter das relações entre as partes ou entre o trabalhador e os seus companheiros e às demais circunstâncias que sejam relevantes”.
É entendimento generalizado da doutrina e jurisprudência[2] que são requisitos da existência de justa causa do despedimento: a) um elemento subjetivo, traduzido no comportamento culposo do trabalhador violador dos deveres de conduta decorrentes do contrato de trabalho; b) um elemento objetivo, nos termos do qual esse comportamento deverá ser grave em si e nas suas consequências, de modo a determinar (nexo de causalidade) a impossibilidade de subsistência da relação laboral, reconduzindo-se esta à ideia de inexigibilidade da manutenção vinculística[3].
Quanto ao comportamento culposo do trabalhador, o mesmo pressupõe um comportamento (por ação ou omissão) imputável ao trabalhador, a título de culpa, que viole algum dos seus deveres decorrentes da relação laboral.
O procedimento do trabalhador tem de ser imputado a título de culpa, embora não necessariamente sob a forma de dolo; se o trabalhador não procede com o cuidado a que, segundo as circunstâncias está obrigado e de que era capaz, isto é, se age com negligência, poderá verificados os demais requisitos, dar causa a despedimento com justa causa (Abílio Neto, inDespedimentos e contratação a termo, 1989, pág. 45).
Porém, não basta um qualquer comportamento culposo do trabalhador, mostrando-se necessário que o mesmo, em si e pelas suas consequências, revista gravidade suficiente que, num juízo de adequabilidade e proporcionalidade, determine a impossibilidade da manutenção da relação laboral, justificando a aplicação da sanção mais gravosa.
Com efeito, necessário é também que a conduta seja de tal modo grave que não permita a subsistência do vínculo laboral, avaliação essa que deverá ser feita , segundo critérios de objetividade e razoabilidade, segundo o entendimento de um bom pai de família, em termos concretos, relativamente à empresa, e não com base naquilo que a entidade patronal considere subjetivamente como tal, impondo o art. 351º, n.º 3, que se atenda ao quadro de gestão da empresa, ao grau de lesão dos interesses da entidade empregadora, ao carácter das relações entre as partes ou entre o trabalhador e os seus companheiros e às demais circunstâncias que ao caso se mostrem relevantes.
Quanto à impossibilidade prática de subsistência da relação laboral, a mesma verifica-se por deixar de existir o suporte psicológico mínimo para o desenvolvimento da relação laboral, quando se esteja perante uma situação de absoluta quebra de confiança entre a entidade patronal e o trabalhador, de tal modo que a subsistência do vínculo laboral representaria uma exigência desproporcionada e injusta, mesmo defronte da necessidade de proteção do emprego, não sendo no caso concreto objetivamente possível aplicar à conduta do trabalhador outras sanções, na escala legal, menos graves que o despedimento.
Diz Monteiro Fernandes, inDireito do Trabalho, 8ª Edição, Vol. I, p. 461, que se verificará a impossibilidade prática da manutenção do contrato de trabalho “sempre que não seja exigível da entidade empregadora a manutenção de tal vínculo por, face às circunstâncias concretas, a permanência do contrato e das relações pessoais e patrimoniais que ele implica, representem uma insuportável e injusta imposição ao empregador.”
E, conforme doutrina e jurisprudência uniforme, tal impossibilidade ocorrerá quando se esteja perante uma situação de absoluta quebra de confiança entre a entidade patronal e o trabalhador, porquanto a exigência de boa-fé na execução contratual (arts. 126º, nº 1, do CT/2009 e 762º do C.C.) reveste-se, nesta área, de especial significado, uma vez que se está perante um vínculo que implica relações duradouras e pessoais.
Assim, sempre que o comportamento do trabalhador seja suscetível de ter destruído ou abalado essa confiança, criando no empregador dúvidas sérias sobre a idoneidade da sua conduta futura, poderá existir justa causa para o despedimento. Como se diz no Acórdão do STJ de 03.06.09 (www.dgsi.pt,, Processo nº 08S3085) “existe tal impossibilidade quando ocorra uma situação de absoluta quebra de confiança entre o empregador e o trabalhador, susceptível de criar no espírito do primeiro a dúvida sobre a idoneidade futura da conduta do último, deixando de existir o suporte psicológico mínimo para o desenvolvimento dessa relação laboral.”
O apontado nexo de causalidade exige que a impossibilidade da subsistência do contrato de trabalho seja determinada pelo comportamento culposo do trabalhador.
Importa, também, ter em conta que o empregador tem ao seu dispor um alargado leque de sanções disciplinares, sendo que o despedimento representa a mais gravosa, por determinar a quebra do vínculo contratual, devendo ela mostrar-se adequada e proporcional à gravidade da infração.
Há que referir também que dispõe o art. 128º, nº 1, que constituem deveres do trabalhador, designadamente, os de: respeitar e tratar o empregador, os superiores hierárquicos, os companheiros de trabalho e as pessoas que se relacionem com a empresa com urbanidade e probidade [al. a)]; cumprir as ordens e instruções do empregador respeitantes a execução ou disciplina do trabalho, bem como a segurança e saúde no trabalho, que não sejam contrárias aos seus direitos ou garantias [al. e)]; guardar lealdade ao empregador [al. f)].
E, nos termos do disposto no art. 126º, nº 1, do mesmo, “1. O empregador e o trabalhador devem proceder de boa-fé no exercício dos seus direitos e no cumprimento das respectivas obrigações.”
Por fim, resta referir que sobre o empregador impende o ónus da prova da justa causa do despedimento – art. 342º, nº 2, do Cód. Civil -, sendo que, nos termos dos arts. 357º, nº 4, e 387º, nº 3, do CT/2009, apenas a poderão fundamentar os factos constantes da nota de culpa ou da resposta à nota de culpa, salvo se se tratar de factos que atenuem ou diminuam a responsabilidade do trabalhador.
3. Na sentença recorrida foi referido, para além do mais, o seguinte:
3.1. “(…) No caso sub judice a ré sustentou factualmente a decisão de despedir a autora em quatro situações distintas:
- mentir a uma colega de trabalho com vista a sustentar que podia apresentar-se com uma fita métrica para afastar clientes, facto que bem sabia não ser verdadeiro, uma vez que se limitou a cumprir os procedimentos da empresa sem pedir autorização para esse efeito;
- ter dado um beijo a um colega de trabalho, em total desrespeito por prescrições de saúde e segurança, assumindo um comportamento temerário e de risco, na medida em que colocou em perigo quer a sua saúde, quer a saúde dos colegas, violando as recomendações de distanciamento social;
- numa postura de constante confrontação com a ré, a arguida não aceitou a chamada de atenção para utilizar corretamente a máscara, revelando uma “conduta inaceitável de uma trabalhadora minimamente responsável”;
- ter participado, durante o período de isolamento profilático, de um webinar público e divulgado no Facebook e no Youtube onde se apresentou como trabalhadora da ré, onde fez várias acusações que sabia não corresponderem à verdade, tentando denegrir a imagem da ré ao sustentar que esta nada fez para proteger os trabalhadores e clientes durante a pandemia causada pelo SARS-CoV-2, sendo que a assistência a tal vídeo (tinha) e tem um potencial ilimitado. (…)”
Quanto às 1ª, 2ª e 3ª das mencionadas imputações foi considerado não se verificar infração disciplinar, pelo que, quanto a estas, nada mais a referir, não sendo a matéria atinente a essas imputações atendíveis.
3.2. Quanto à 4ª das referidas imputações foi referido o seguinte:
“Finalmente, provou-se que a autora, durante o isolamento profilático, no dia 11.04.2020, participou numa Sessão/Debate - Combater o vírus, defender os trabalhadores organizada pelo PCP – Partido Comunista Português no Facebook e depois divulgada no Youtube, tendo-se identificado como delegada sindical do ....
Durante a sua intervenção fez várias afirmações, das quais se salientam as seguintes:
- “…passo essas (oito) horas a tentar afastar os clientes, clientes esses que deveriam ter sido mais afastados e devíamos estar a ser protegidos pela entidade patronal”;
- “Tem sido surreal, surreal, estar na caixa e levar com insultos, com tentativas de agressão, alguns clientes até já cuspiram para algumas trabalhadoras, isto é inadmissível para uma empresa que se diz tão preocupada com os trabalhadores”; - “Os 20% de prémio são para aqueles trabalhadores que têm banco de horas. Porque tal como eu que não tenho banco de horas e muitos daqueles que não têm banco de horas, basta ter um atraso no trânsito ou nos transportes públicos, uma ida ao médico, uma consulta por telefone, seja o que for, um atraso até que seja na casa de banho, a picagem de ponto para além daquela hora já invalida os 20%”; - “Portanto, a minha saúde não é igual à dos outros trabalhadores. Aqui há uma discriminação total. Não somos trabalhadores iguais. Portanto, estes 20% é tudo uma mentira.”
- “não temos proteção, temos vários infetados na loja. Já temos casos positivos de COVID-19. Temos outros de quarentena. Mais virão decerto. A proteção é nula. É zero. Entram clientes à desmedida. À desmedida….” - “o aglomerado é incrível dentro e fora da loja e a loja não faz nada. Não fazem absolutamente nada. Zero. Nós estamos por nossa conta. Não temos proteção a esse nível…” - “Porque não há qualquer tipo de proteção a esse nível”.
Como escreveu J. F. Moreira das Neves (in “A tutela da honra frente à liberdade de expressão numa sociedade democrática”, Data Venia, Ano 4, N.º 05 p. 77, https://www.datavenia.pt/ficheiros/edicao05/datavenia05_p073-096.pdf) “a liberdade de expressão, de informação e de imprensa, a que se referem os artigos 37.º e 38.º da Constituição, 19.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, 19.º, n.º 2 do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, 10.º, n.º 1 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, das Leis n.ºs 1/99 e 2/99, ambas de 13 de janeiro, constitui um dos pilares fundamentais que estruturam qualquer sociedade democrática, uma condição primordial do seu progresso, bem assim como da autonomia e realização individual. É conatural ao funcionamento da democracia, não se concebendo esta sem aquela. Promove e estimula a autonomia pessoal e, a mais disso, constitui um dos mais relevantes meios de controlo do exercício dos poderes (político, económico ou social), nomeadamente no caso de abuso pelos seus titulares”.
O artigo 14.º do Código do Trabalho reconhece “no âmbito da empresa, a liberdade de expressão e de divulgação do pensamento e opinião, com respeito dos direitos de personalidade do trabalhador e do empregador, incluindo as pessoas singulares que o representam, e do normal funcionamento da empresa”.
Por sua vez, o artigo 460.º do mesmo código garante aos trabalhadores o direito a atividade sindical na empresa, “nomeadamente através de delegados sindicais”.
A liberdade de expressão e de opinião, como refere Guilherme Dray, no “âmbito da empresa constitui uma condição necessária à tutela da dignidade do trabalhador”, pois, “a circunstância de o trabalhador se obrigar a prestar uma atividade sob ordens e direção de outrem em regime de subordinação jurídica não significa que lhe seja vedada a possibilidade de expor e de divulgar livremente no local de trabalho o seu pensamento e opinião acerca de múltiplos aspetos da vida social, como se de um normal cidadão se tratasse.” - Código do Trabalho Anotado, Direção de Pedro Romano Martinez, Almedina, 9.ª Edição, 2013, pp. 150.
Na verdade, cada trabalhador é, antes de mais um cidadão e, como tal, tem todo o direito de se exprimir livremente, sendo que “a garantia da liberdade de expressão é a condição prévia do exercício de outros direitos e liberdades”. E, como também é verdade, no Direito do Trabalho, a liberdade de expressão tem que ser tutelada, mesmo quando o conteúdo da mensagem não é do agrado do seu destinatário ou da maioria. Como o TEDH afirmou, em Acórdão proferido a 3 de fevereiro de 2009, “é justamente quando se apresentam ideias que ferem, chocam e contestam a ordem estabelecida que a liberdade de expressão é mais preciosa” - N.º 42, do Acórdão Women on Waves e Outros c. Portugal, Queixa n.º 31276/03 citado no Ac. RPt. de 15-02-2016, proc n.º 276/13.3TTSTS.P1, www.dgsi.pt.
E, neste contexto, desde já se adianta que consideramos que algumas das expressões utilizadas pela autora (que não as propositalmente transcritas acima), como quando faz referência aos “635 euros de salário miserável”, “ainda continuam a insistir em não aumentar os salários”, “Eles querem é comprar os trabalhadores como fazem no dia 1 de maio para evitar que os trabalhadores façam greve, fazem banquetes, fazem porco no espeto, por aí” ou quando se refere ao medo e receio por si sentido dos outros trabalhadores, face ao perigo de contágio pelo CoVi-2019, pese embora o exacerbar de linguagem, são perfeitamente legítimas, inserindo-se no direito de crítica, de reivindicação, ainda que incómodo ou causando mal-estar e não seja do agrado da entidade patronal. Aliás é perfeitamente normal e natural que no decurso de uma situação pandémica, os trabalhadores da ré, contactando diariamente com um número mais ou menos elevado de pessoas, por força da sua actividade profissional, se sentissem receosos, inseguros e temessem pela sua saúde, mutos medidas que se adotassem para a respectiva protecção.
Por outro lado, consabidamente, a liberdade de expressão não é um direito absoluto, podendo nalguns casos, e segundo princípios de necessidade, adequação valorativa e proporcionalidade, ser limitados, nomeadamente quando embatam no princípio da liberdade de gestão empresarial.
A este mesmo propósito, ensina Maria do Rosário Palma Ramalho (Direito do Trabalho, Parte II, 3.ª Edição, Almedina, pp. 432 a 435) que os direitos fundamentais e de personalidade dos trabalhadores, entre os quais se conta o da liberdade de expressão, estão sujeitos a limites extrínsecos decorrentes do relevo de outros interesses ou direitos que com eles colidam, sendo que os casos de colisão devem resolver-se nos termos gerais enunciados no art. 335º do CC, preferencialmente com a cedência recíproca e equilibrada dos direitos em confronto, ou, se tal não for possível, através da prevalência do direito que, em concreto, se considere superior.
Daí que para aferir sobre se determinada conduta ainda pode ter-se por compreendida nos limites de um determinado direito fundamental ao abrigo do qual foi protagonizada ou se pelo contrário tais limites foram ofendidos, há sempre que fazer uso de uma técnica de ponderação/concordância prática dos interesses/direitos em presença, com utilização de critérios de necessidade, proporcionalidade, proibição do excesso e intangibilidade do conteúdo essencial dos direitos fundamentais – cf. José João Abrantes, Contrato de Trabalho e Direitos Fundamentais, 2005, pp. 229 a 234.
Por outro lado, cumpre ter presente que os trabalhadores estão adstritos para com a sua entidade patronal pelo dever de lealdade (art. 128.º/1, f) do C.T.) e que no âmbito das relações jurídicas de trabalho subordinado, o trabalhador deve proceder de boa-fé no exercício dos seus direitos e no cumprimento dos seus deveres (cf. arts. 126.º/1 do C.T. e 762.º/2 CC, sendo que com a ideia de boa-fé estão relacionadas as ideias de fidelidade, lealdade, honestidade e confiança na realização e cumprimento dos negócios jurídicos - Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, vol. II, Coimbra Editora, 1968, p. 2) - Maria do Rosário Palma Ramalho qualifica o referido dever de lealdade e outros, como por exemplo os de respeito e urbanidade e de custódia, como deveres acessórios autónomos, os quais, não dependendo propriamente da prestação principal (a actividade laboral), surgem com a celebração do contrato, mantêm-se ao longo da sua execução, subsistem nas situações de não prestação do trabalho e/ou de suspensão do contrato e perduram mesmo para além da cessação do vínculo (Direito do Trabalho, Parte II, 2010, p. 412).
É sabido também que a confiança entre o empregador e o trabalhador desempenha um papel essencial nas relações de trabalho, tendo em consideração a forte componente fiduciária daquelas; com efeito, a relação juslaboral pressupõe a integridade, lealdade de cooperação e absoluta confiança da/na pessoa contratada.
O direito de livre expressão não pode deixar de respeitar o direito à honra e ao bom nome tutelados pelo art. 70.º, n.º 1 do Código Civil, sendo que o direito de crítica não deve entrar em domínios de maledicência desnecessária para o debate de ideias, mas antes traduzir-se na apreciação e avaliação de actuações ou comportamentos de outrem, com a correspondente emissão de juízos racionais apreciativos ou depreciativos. O seu limite lógico deve ser, consequentemente, o resultante do próprio conceito de crítica, correspondendo este ao confronto de ideias, a apreciação racional de comportamentos e manifestação de opiniões; por afastadas e exorbitantes do conteúdo do direito se hão-de ter considerações imotivadas ou de pura malquerença pessoal.
A questão deve ser analisada numa perspectiva de conflito e de concordância prática entre os direitos fundamentais dos trabalhadores à liberdade de expressão e a honra ou bom nome dos visados, conforme tem entendido a jurisprudência.
Assim, tem reconhecido a doutrina, nas palavras de Júlio Gomes (Direito do Trabalho, Volume I, Relações Individuais de Trabalho, Coimbra Editora, Coimbra, 2007, p. 531): “O dever de urbanidade não é, como vimos, incompatível com um direito à crítica por parte do trabalhador, desde que essa crítica seja feita, ela própria em termos corteses e educados e não viole um dever de sigilo, nem prejudique a imagem da empresa. A crítica, mormente a interna, que obedeça a estes requisitos poderá ser considerada um facto normal e saudável na vida de uma empresa.” Mais, acrescentamos nós, esta crítica saudável e respeitosa é cada vez mais desejável em face das novas realidades laborais que privilegiam o trabalho de equipa, o sentimento de pertença às mesmas e coesão, através do envolvimento dos trabalhadores, de uma forma ou outra, na tomada de decisões importantes.
Em última análise, o direito de liberdade de expressão esbarrará sempre com a propalação de inverdades, que possam induzir, fácil e ardilosamente, em erro os todos os destinatários das expressões proferidas (no caso concreto em número ilimitado, atendendo a que foram reproduzidas e partilhadas em duas redes sociais) e que coloquem em causa o bom nome, honra e reputação da entidade empregadora – cf. quantos aos danos reputacionais de pessoas colectivas Ac. TRC de 27-04-2017, proc. n.º 289/14.8T8FND.C1; STJ 09-05-2005, proc. º 05B1616, www.dgsi.pt.
Atente-se que dado o carácter absoluto do dever de lealdade e a consequente impossibilidade de gradações na perda da confiança (v.g., acórdãos do STJ de 22/1/1992, Ac. Dout. 373º, p.108, de 20/3/1996, Ac. Dout. 416º-417º, p.1069, e de 18/12/1991, BMJ 412, p. 342, acórdãos da Relação do Porto de 10/6/1997, CJ, 1997, T. 4, p. 256, de 5/12/11, proferido na apelação 513/10.6TTMAI.P1, de 12/9/2011, proferido na apelação 787/10.2TTPRT.P1, de 21/5/2012, proferido no âmbito da apelação 1212/09.7TTGMR.P1, da Relação de Lisboa de 8/2/2012, proferido no âmbito da apelação 3061/03.7TTLSB.L1-4, de 26/9/2012, proferido no âmbito da apelação 1004/10.0TTLRS.L1, de 15/1/03, proferido no processo 7777/02; na doutrina pode consultar-se, por exemplo, Menezes Cordeiro, Manual de Direito do Trabalho, pp. 826 a 828, Lobo Xavier, Da Justa Causa de Despedimento no Contrato de Trabalho, p. 19, e José Andrade Mesquita, Direito do Trabalho, 2ª edição, 2004, p. 556), a diminuição de confiança resultante da violação deste dever não está dependente da verificação de prejuízos materiais, nem da existência de culpa grave do trabalhador: por isso, a simples materialidade desse comportamento lesivo do dever em apreço, aliado a um moderado grau de culpa do trabalhador pode, em determinado contexto, levar a um efeito redutor das expectativas de confiança (acórdão do STJ de 11/10/1995, publicado na CJ, tomo III, p. 277) – toda a jurisprudência e doutrina citados no já referido Ac. TRPt. de 15-02-2016.
Citando o Ac. do TRLx. de 30-06-2021 (proc. n.º 22238/20.4T8LSB-A.L1-4, jurisprudência.pt), que com a devida vénia, pela sua clareza e pertinência seguimos de perto “…a disseminação de informações falsas (as chamadas fake news, criadas com o intuito de moldar a opinião pública sobre determinados assuntos) através de meios de comunicação massiva tem sido um problema crescente da sociedade contemporânea, sendo muitas vezes motivadas por motivos distintos da mera informação e causando um dano social evidente. Particularmente no que concerne à pandemia, a divulgação de notícias falsas influencia de forma directa a consciência colectiva, levando-a, perante o desconhecido…assumir como verdadeiras informações que o não são. A divulgação de factos falsos relacionados com a doença Covid 19 e a sua propagação, contribuindo para o aumento do medo e angústia das pessoas (havendo quem fale em infodemia) é, por isso, particularmente censurável. Tendo isso em conta, é apodíctico considerar que a divulgação pública de uma postura no mínimo que fosse descuidada (negligente) da apelada, enquanto empresa de distribuição alimentar, na observação das medidas determinadas pela autoridade de saúde pública como básicas para combater o alastramento da pandemia teria consequências nefastas para os fins tidos em vista (para além, naturalmente, das consequências jurídicas e judiciais que porventura lhe fossem imputadas e aos seus administradores, caso tal se comprovasse, desde logo ao nível penal e em resultado do estatuído pelos art.os 11.º, n.º 2 e 283.º do Código Penal). Assim sendo, quaisquer afirmações públicas dessa natureza, amplificadas pela circunstância de o serem através de diversos meios de comunicação de massas, pretensamente factuais mas que afinal o agente sabe não corresponderem à verdade, são manifestamente lesivas do bom-nome de quem explora o tipo de empresas da apelada e com manifesto potencial para lhe infligir danos reputacionais capazes de a lesar economicamente e são, por conseguinte, constitucionalmente proibidas e passíveis de serem consideradas criminosas (art.os 26.º, n.º 1 da Constituição da República e 180.º e 183.º do Código Penal…”.
No caso dos autos a autora, no dito webinar, afirmou que a entidade patronal, “que se diz tão preocupada com os trabalhadores”, lhes proporcionou “… proteção é nula. É zero.”. Ora, “zero” é “nada”, não admitindo qualquer tipo de graduação o que, notoriamente, não corresponde à verdade. E a autora sabia que tal afirmação não correspondia à verdade (notando-se que a mesma se encontrava em situação de isolamento profilático, medida destinada a conter a propagação do vírus e, logo, proteger a saúde dos demais trabalhadores). Na verdade, provou-se que a ré adoptou toda uma panóplia de condutas, que não vamos aqui repetir para não nos tornarmos desnecessariamente fastidiosos, desde a colocação de cartazes informativos sobre o vírus, cuidados de higiene, necessidade de distanciamento social, prestação de informação aos trabalhadores, sinalética destinada a preservar o distanciamento entre os clientes, alertas sonoros, fornecimento de máscaras aos trabalhadores e explicação sobre o respectivo uso, desinfestações, limpeza com desinfetantes devidamente aprovados e com especial enfoque em locais susceptíveis de serem tocados por vários clientes, colocação de acrílicos e colocação em quarentena dos colegas mais próximas de trabalhador que testasse positivo ao vírus.
Naturalmente que tais meios/divulgações/informações não foram instantaneamente colocados à disposição dos clientes e trabalhadores. Recordemos que o confinamento obrigatório foi decretado a 18/03/2020 e as afirmações em causa foram proferidas a 11/04/2020. Muito pouco se sabia ainda sobre o vírus, respectiva transmissão e consequências, a informação pelos canais oficiais ia sendo emitida de forma gradual e, muitas vezes, até contraditoriamente.
Poder-se-ia discutir, cremos que legitimamente, se tais medidas eram ou não suficientes, as mais adequadas e sugerir outras, porventura mais eficazes. O que não podia a autora ter afirmado, como fez, é que não foi proporcionada qualquer protecção. O que a autora afirmou é, pura e simplesmente, falso e ostensivamente atentatório da imagem e reputação da ré, difundindo a mensagem que esta, dizendo-se “tão preocupada com os trabalhadores” nada fez para os proteger, sendo a protecção “zero” e não diligenciando por “…qualquer tipo de proteção a esse nível”.
Assim como não corresponde à verdade que o “estes 20% é tudo uma mentira.” ao referir-se ao prémio de assiduidade. A verdade é que a autora, quando proferiu as declarações em causa, sabia que tinha recebido esse prémio, no valor de € 127,36 brutos, apesar de não ter aderido ao banco de horas. E, não obstante, não se coibiu de acusar a entidade empregadora de discriminação afirmando que o dito prémio só era atribuído aos trabalhadores que tinham aderido ao banco de horas. Aliás, neste ponto concreto, as declarações da autora são até contraditórias porque, por uma lado diz que só recebiam o prémio os trabalhadores que tinham aderido ao banco de horas e, por outro lado, refere que aqueles que não aderiram viam os 20% ser invalidados se tivessem qualquer percalço, por insignificante que fosse. Ou seja, os trabalhadores que não tinham aderido ao banco de horas afinal também recebiam o prémio.
A autora tinha toda a legitimidade para entender que tal prémio era insignificante ou insuficiente, atendendo ao risco que corriam diariamente os trabalhadores. O que não podia afirmar, como fez, por não corresponder à verdade, é que “estes 20% é tudo uma mentira.”, veiculando a mensagem de que a ré transmitia mentiras e discriminava os trabalhadores – “Aqui há uma discriminação total. Não somos trabalhadores iguais.”, discriminação proibida no art. 25.º do C.T. e, consabidamente, conotada de forma muito negativa por qualquer cidadão minimamente informado. Ficou provado, note-se, que o prémio não excluía nas suas regras qualquer trabalhador, sendo o único pressuposto para a sua atribuição a presença na loja durante o período de pandemia e, logo, ficando excluídos os trabalhadores com ausências durante o período de referência para a atribuição do prémio.
Provou-se ainda que a ré decidiu ainda reduzir o acesso de clientes à loja, para evitar grandes acumulações dos mesmos no seu interior, sendo que à medida que os clientes iam saindo da loja os vigilantes iam permitindo a entrada de outros.
Mais uma vez a autora, ao declarar que “Entram clientes à desmedida. À desmedida…” e que a loja nada fez para evitar o “aglomerado” de clientes, enfatizando a mensagem de que os trabalhadores “estavam por conta deles” faltou à verdade. “À desmedida” significa exceder a medidas, excessivo, exorbitante, enorme, desmesurado (Dicionário Priberam da Língua Portuguesa, 2008-2021, https://dicionario.priberam.org - consultado em 24-01-2023). Ora, não só não se provou ter ocorrido tal circunstância, como se provou que a ré tomou medidas para que a mesma não ocorresse. Mais uma vez, podia a autora defender que as medidas tomadas não foram as mais adequadas e suficientes (até porque se provou, efectivamente, que os clientes já dentro da loja, se concentravam mais em determinadas áreas). Não podia, por não corresponder à verdade, dizer, como fez, que a “loja nada faz”, “entrando clientes à desmedida”, transmitindo um cenário quase apocalíptico de total descontrole e desorganização, que não se provou corresponder minimamente à verdade.
Certo é que a autora se identificou no dito webinar como delegada sindical do .... A C.R.P. reconhece aos trabalhadores liberdade sindical, condição e garantia da construção da sua unidade para a defesa dos seus direitos e interesses (art. 55.º/1). Por outro lado, a CRP, expressamente confere aos representantes sindicais o direito à proteção legal contra quaisquer formas de condicionamento, constrangimento ou limitação do exercício legítimo das suas funções, como é essencial em qualquer sistema democrático (cf. ainda art. 410.º/3 do C.T.). Todavia, é de notar que, no caso concreto, não consta que a autora, ao proferir as declarações em causa o fizesse representando o sindicato a que pertence e que aquelas correspondessem a qualquer decisão ou posição pelo mesmo assumida, pelo que não se pode entender que tais declarações tenham sido proferidas no exercício da actividade sindical e ao abrigo da liberdade da mesma, de forma a demandar uma especial protecção da autora na situação concreta e, correspondentemente, uma “malha mais larga” na apreciação do que por ela foi dito.
A linguagem e expressões utilizadas são claramente pejorativas, desnecessárias, generalistas e desviadas da realidade, mesmo tendo em consideração que se tratou de linguagem oral, cujos excessos são normalmente considerados mais desculpáveis, precisamente porque associados, a esmagadoramente maioria das vezes, a atitudes impulsivas e precipitadas, em muito extravasando o direito à contestação, consagrado no art. 45.º/2, da Constituição e o direito de crítica, previsto no art. 37.º do mesmo diploma. Se é verdade que o trabalhador tem direito a reclamar da sua situação laboral, bem como a promover, junto da entidade patronal, a correcção de ilegalidades e/ou a denunciá-las às autoridades competentes também o é que, ao fazê-lo, não adopte comportamentos também eles ilegítimos e desadequados. E cremos que especialmente censuráveis no caso concreto porque proferidas numa rede social com um potencial de visualizações ilimitado, porque transmite a mensagem de que a entidade empregadora demonstra total indiferença pelo bem-estar e saúde dos trabalhadores, contribuindo para aumentar a sensação de insegurança num momento, por razões que todos conhecemos, muito crítico e sensível.
Considera-se, assim, devido ao carácter grave e inverdadeiro das afirmações feitas pela autora, perceptível por qualquer pessoa média colocada no lugar daquela susceptíveis de causar danos reputacionais graves à entidade patronal, que aquela praticou, com culpa, infracção disciplinar por violação do dever de urbanidade, respeito e lealdade, expressamente previsto como justificativo para o despedimento, na alínea i) do n.º 2 do art. 351.º CT.
Como se referiu já, a violação de um dever laboral não dá lugar necessariamente à sanção máxima do despedimento, por aplicação do princípio da proporcionalidade da sanção à gravidade da conduta (art. 330.º/1), tornando-se imperioso avaliar o grau de ilicitude e de culpa do trabalhador e a proporcionalidade entre a sanção e a gravidade do facto, sempre tendo presentes que no domínio laboral, dado o princípio da independência da responsabilidade disciplinar, há que atender a critérios distintos da responsabilidade civil e penal, e a interesses específicos, nomeadamente, à tranquilidade do ambiente laboral e ao equilíbrio da organização, tendo em conta que a empresa, enquanto pessoa colectiva, é uma pessoa jurídica autónoma das pessoas físicas que em cada momento a representam.
Tudo ponderado e mesmo tendo em conta a longa permanência da autora ao serviço a ré, sendo certo que aquela teve já uma sanção disciplinar, entendemos não ser exigível à empresa que a mantivesse ao seu serviço, em virtude de dúvidas sérias e legítimas quanto à conformidade do comportamento da trabalhadora no futuro, tornando-se prática e imediatamente impossível a manutenção da relação laboral, pelo que se preenche a justa causa de despedimento. Como assinala Joana Vasconcelos, em artigo que publicou sobre “O conceito de justa causa de despedimento”, é necessário fazer “um juízo de prognose, de probabilidade sobre a viabilidade futura da relação de trabalho” (Estudos do Instituto de Direito do Trabalho, Vol. II, Almedina, pp. 33/34) e, no caso concreto, em face d conduta adoptada pela autora, não se vislumbra a possibilidade desse juízo de prognose seja favorável no sentido de irreparabilidade da quebra de confiança e viabilidade da manutenção da relação laboral.
A sanção aplicada não violou o princípio da proporcionalidade consagrado no art. 330.º, pois a aplicação de medidas conservatórias do vínculo representaria uma insuportável imposição à empresa, sendo compreensível, à luz de critérios de razoabilidade, que a mesma tenha perdido a confiança no cumprimento, pela autora, do seu dever de respeito no âmbito do relacionamento laboral.”
Salvo quanto à afirmação “sendo certo que aquela teve já uma sanção disciplinar”, concorda-se com as doutas e aprofundadas considerações tecidas na sentença recorrida, que fazem um correto enquadramento jurídico e subsunção do caso ao mesmo e que dão resposta, no essencial, ao alegado pela Recorrente, sendo apenas de salientar o seguinte:
Quanto à forma oral, alegadamente menos pensada, das afirmações proferidas pela A. e ao contexto de incerteza e receio que, à data, se verificava face ao início da pandemia provocada pelo vírus SARS-COV-2 , tal não obsta à gravidade das mesmas, marcadas por um tom manifestamente hostil e excessivo para com a Ré, com imputações que a A. sabia não corresponderem à verdade, sendo o caso da imputada inexistência de quaisquer medidas de prevenção à propagação do mesmo [medidas “igual a zero”, ou seja, nenhumas], fazendo passar a mensagem e imagem de empresa totalmente incumpridora e desinteressada quer no combate (ou tentativa) à disseminação da doença, quer quanto à saúde dos seus trabalhadores. E fazendo também passar a mensagem de comportamento discriminatório e, quiçá, de retaliação dos trabalhadores, mas não provado, que, como ela, não aderiram ao banco de horas e, como tal, excluídos da atribuição do prémio de 20%, afirmações que a isso poderiam induzir.
Não obstante a natural tensão na dialética existente entre os interesses dos trabalhadores e do empregador, isso não obsta a que a defesa daqueles se deva fazer sem recurso à utilização de expressões ofensivas da reputação e bom nome do empregador, muito menos não correspondentes à verdade, e divulgadas em “Sessão/Debate” organizado por terceiros, que teve lugar Facebook e depois divulgada no Youtube, vídeo que, no Youtube, teve 322 visualizações e 35 gostos (12.05.2020), foi partilhado no Facebook com 365 gostos, 80 comentários, 32 partilhas e 8.500 visualizações, para além de que um número não concreto de pessoas que visualizaram o dito vídeo teceram comentários depreciativos à ....
Realça-se também o Acórdão desta Relação de 15.02.2016, Proc. 276/13.3TTSTS.P1, in www.dgsi.pt, citado na sentença recorrida, em cujo sumário se refere que: “III - Em qualquer caso, não serão dignas de tutela jurídica, designadamente, as expressões qualificativas duras, exageradas e excessivas que se revelem desnecessárias/gratuitas, totalmente infundadas ou destituídas de base factual.”
Diga-se que ao referido não obsta a falta de intervenção da segurança ou das chefias, pelo menos em algumas situações, de maior aglomeração de clientes ou de comportamentos incorretos por parte destes (cfr. nºs 93 a 97 dos factos provados), daí não decorrendo a total falta de medidas por parte da Ré propagada pela A., nem tal justificando as afirmações hostis, depreciativas, excessivas e inverídicas que fez e difundiu perante terceiros estranhos à Ré.
Também não se mostra relevante que, no caso, não se tenham provado concretos prejuízos, designadamente patrimoniais e/ou decorrentes de dano reputacional, para a Ré, não constituindo a existência de efetivos prejuízos requisito indispensável à justa causa de despedimento na medida em que o comportamento da A. é, em si mesmo, de tal modo grave que determina a impossibilidade/inexigibilidade da manutenção da relação laboral e sendo ele, como é, suscetível, ainda que em abstrato, de afetar o bom nome da Ré.
Por fim, para a consideração da existência da justa causa e adequabilidade de tal sanção, não se nos afigura, na verdade relevante, a anterior sanção disciplinar tendo em conta a factualidade que a justificou, de menor gravidade face à sanção de repreensão registada que foi aplicada [cfr. nº 92 dos factos provados:”92. Em 2019 a autora foi sancionada com uma repreensão registada por ter faltado injustificadamente ao trabalho”].
Não obstante, tal, bem como a antiguidade da A., também não afetam o juízo quanto à existência de justa causa para o despedimento bem como a adequabilidade e proporcionalidade de sanção, ainda que a mais gravosa, dada a gravidade dos factos praticados e a culpabilidade da A., violadores dos deveres de respeito e urbanidade, bem como o de lealdade, para com a Ré, os quais são de molde a tornar inexigível à Ré a manutenção da relação laboral.
Conclui-se, pois, pela improcedência do recurso.
***
V. Decisão
Em face do exposto, acorda-se em negar provimento ao recurso, confirmando-se a sentença recorrida.
Sem custas por delas estar isenta a A. (art. 4º, nº 1, al. h), do RCP), sem prejuízo porém do nº 6 do citado art. 4º.
Porto, 30.10.2023
Paula Leal de Carvalho
Rui Penha
Germana Ferreira Lopes
___________ [1] Na sentença recorrida “salta-se” do nº 27 para o nº 28, não contendo a mesma o nº 28. [2] Cfr., por todos, os Acórdãos do STJ, de 25.9.96, CJ, Acórdãos do STJ, 1996, T 3º, p. 228, de 12.03.09, 22.04.09, 12.12.08, 10.12.08, www.dgsi.pt (Processos nºs 08S2589, 09S0153, 08S1905 e 08S1036), da Relação do Porto de 17.12.08, www.dgsi.pt (Processo nº 0844346). [3] Acórdão do STJ de 12.03.09, www.dgsi.pt (Processo 08S2589).